A Acústica Musical em Palavras e Sons - Flo Menezes OCR
A Acústica Musical em Palavras e Sons - Flo Menezes OCR
A Acústica Musical em Palavras e Sons - Flo Menezes OCR
A Acústica MUSICAL
EM PALAVRAS E SONS
Ateliê Editorial
Copyright O 2004 by Flo Menezes
Menezes, Flo
A acústica musical em palavras e sons / Flo
Menezes. -- Cotia, SP: Ateliê Editorial, 2003.
Biliografia.
ISBN 978-85-7480-649-5
Este livro trata, grosso modo, de questões da física acústica, mas não
foi escrito por um físico, matemático ou acústico. Foi, ao contrário, escrito
por um compositor.
É distante já a época em que numa mesma pessoa poderiam agregar-
-se funções e atividades tão distintas. A nossa era é de especificidade, de
dedicação e concentração máximas em objetos bem circunscritos edelinea-
dos do saber ou, no caso das artes, mais precisamente da estética.
Mas os entrecruzamentos são inevitáveis, e a interseção das artes con-
temporâneas com as novas tecnologias e com os instrumentos de análise,
medição e especulação das ciências é inelutável e até mesmo imprescindível
para a criação de obras substanciais.
No caso específico da composição, o objeto principal com o qual o
músico se defronta é objeto também de uma ciência específica, precisamente
da acústica propriamente dita, e isto é, de certa forma, um privilégio tanto
para o músico quanto para o amante da música. Pois que se a linguagem
musical é, como bem pontuava Arnold Schoenberg, incondicionalmente
atrelada ao seu desenvolvimento técnico — na atualidade tanto quanto ao lon-
go da história do fazer musical —, é vantagem para o músico, e em especial
para o compositor, que a inter-relação da música com a física acústica seja
mais acirrada do que a das artes plásticas com a física que destina seus
esforços na compreensão e análise dos fenômenos relacionados à ótica,
para darmos apenas um exemplo. E isto não somente, como haveria de Destes aspectos diferenciadores de nossa abordagem origina-se a desig-
se supor, com relação exclusivamente ao âmbito especifico de atuação da nação adjetiva de seu título: acústica musical. A rigor, uma tal terminologia
música eletroacústica, na qual certos conhecimentos de questões acústi- é tão questionável quanto falar de “psicoacústica”. Em toda abordagem
cas revelam-se como absolutamente imprescindíveis e indiscutivelmente histórica das questões acústicas, jamais os fenômenos diretamente corre-
válidos, mas também na prática da música instrumental, tanto no nível da lacionados à percepção humana dos espectros sonoros deixou de ter lugar
composição quanto no da interpretação. de honra, e todo estudo da acústica compreende, necessariamente, questões
Entretanto, o “recorte” sobre a matéria em comum — o som —, por eminentemente “psicoacústicas”. De forma semelhante, seria redundante
parte do músico, é, em alguns aspectos fundamentais, substancialmente ou talvez presunçoso — segundo o ângulo a partir do qual se vê a questão
diverso do efetuado pelo cientista da física acústica. Inevitavelmente a — adjetivar a abordagem acústica como sendo, em certo sentido, “musi-
visão do músico, melhor dizendo, sua escuta, é distinta da abordagem cal”. Mas nossa abordagem é voltada, sobretudo, ao músico e ao amante
puramente acústica, uma vez que se vê imbuída continuamente de uma da música, mais ainda, ao amante dos sons — incluindo aí, obviamente, o
confrontação com seus próprios questionamentos estéticos, os quais, diga- próprio físico acústico, o qual poderá nutrir algum interesse pela leitura
-se de passagem, sempre impregnaram o espírito especulativo do físico de nosso trabalho, desprovido todavia, propositalmente, de complicadas
acústico. Com a diferença, no entanto, que o músico situa-se em posição, fórmulas e de detalhadas enunciações matemáticas —, constituindo algo
em geral, muito mais próxima de uma visão atual do ouvir, apreciar e, con- que seria muito mais próximo do que Pierre Schaeffer, pai da musique
sequentemente, investigar o som do que o cientista, o qual pode se deixar concrête (primeira forma de música eletroacústica), teria designado por
levar — e geralmente assim o faz — por uma postura mais acadêmica e, por acoulogie (“aculogia”), a qual teria por objeto de estudo os mecanismos
mais paradoxal que isto possa parecer, menos especulativa em relação à da escuta e seu campo perceptivo, bem como as propriedades dos objetos
escuta dos sons. sonoros, constituindo as bases daquilo que o inventor da música concreta
Nesse sentido, o presente livro não tem a pretensão de ser um tratado designara por solfejo experimental. Nossa abordagem, porém, deu prefe-
de acústica. Ainda que levando em consideração todas as questões mais rência a uma designação menos estranha ao leitor comum — afinal, quem |
fundamentais abordadas pelos principais livros sobre a matéria, ele pre- haveria de supor do que se trata um livro sobre “aculogia”? —, além de
tende constituir, isto sim, um tratado da escuta, ou seja, da forma como eleger como pontos igualmente indispensáveis de seu percurso aspectos
ouvimos ou, melhor ainda, podemos ouvir os sons. É claro que, para isso, que costumeiramente fazem parte da abordagem teórica e tipicamente
se faz necessário considerar, por vezes, aspectos eminentemente específicos acústica do universo dos sons, aos quais já nos referimos de algum modo,
da acústica, e que aparentemente não se correlacionam com uma escuta e que foram abordados por Schaeffer — em que pesem o inestimável valor
fenomenológica dos sons, tais como os mecanismos fisiológicos da au- e o pioneirismo de sua proposta — apenas en passant, quando não de forma
dição, as peculiaridades que concernem à propagação das ondas sonoras bastante insipiente.
na atmosfera, e assim por diante. São aspectos que interagem com outros É preciso salientar, nesse contexto, a proposital exclusão, no percurso
mais tangíveis de maneira indireta, sem os quais não se poderia entender da escrita, de questões acerca das particularidades acústicas das diversas
certos fenômenos, estes, sim, diretamente relacionados com o ato concreto famílias instrumentais. Poderiamos mesmo, nesse contexto, questionar a
da escuta. Mas quando se trata de questões relevantes para a escuta do organização de grande parte dos tratados de acústica a esse respeito: por
músico ou mesmo do ouvinte comum, será sobretudo uma postura condi- que somente delas e não de outras “famílias” instrumentais, generalizando,
zente com a música especulativa que imperará sobre a visão tradicional como o fez brilhantemente Schaeffer, o conceito mesmo de “instrumento”?
da acústica. Este é tipicamente o caso, por exemplo, da classificação dos A mesma exclusão ocorre em relação aos tipos de microfones ou apare-
tipos de sons, na qual a composição contemporânea advoga uma concep- lhos eletrônicos específicos (mais apropriados a uma abordagem circuns-
ção essencialmente diversa da que é promulgada em praticamente todos crita a técnicas de estúdio), ou até mesmo aos procedimentos típicos da
os volumes que tratam do assunto, quando escritos por físicos e não por composição eletroacústica (tais como filtragens, processos de síntese, de
compositores (como, aliás, é o caso da esmagadora maioria dos tratados do espacialização dos sons etc., que deveriam ser abordados, a nosso ver —
gênero). Tal é também o caso da questão que concerne aos atributos sonoros como aliás eu mesmo já procurei fazer —, por trabalhos que relacionassem
e em especial à visão que se tem do timbre enquanto conceito acústico, tais recursos com a própria estética da composição, sem a qual tornam-se
sem falarmos da abordagem detalhada do fenômeno das durações. esvaziados de sentido). Sob tal ângulo, este trabalho se diferencia, pois, de
NERO
“quebrados” dos sons, uma vez que, dependendo das circunstâncias, uma
Período (T) variação de 0,2 ciclo por segundo pode ocasionar interessantes fenômenos
auditivos num dado contexto sonoro (tais como batimentos etc.).
A íntima relação entre período e frequência é expressa pela equação:
VOS pt
Deslocamento
1
1.1.2. Elementos discretos da vibração: período e frequência Te
f
Uma vibração, tal como demonstrada acima, é chamada de periódica caso 0 Substituindo a unidade de 1 segundo por 1000 milissegundos, a duração
movimento se repita de forma quase exata após um certo intervalo de tempo 7. de um único período de, por exemplo, uma nota Lá 440 Hz é de apenas
Tal intervalo de tempo é denominado período ou ciclo da vibração. No Exemplo 2,3 ms, pois:
1, temos como possíveis ciclos ou períodos os segmentos abcde, cdefg, ou,
iniciando-se pela fase positiva da amplitude da vibração, o segmento bcdef. T= 000 =2,3 ms
As vibrações sonoras são discutidas mais em termos de frequência do que 440
de período, uma vez que o conceito de frequência tem maior proximidade com
o fenômeno musical. E, nesse contexto, é de grande utilidade a medição do 1.1.3. Tipos de som: som senoidal, som tônico (ou composto),
tempo pela unidade do milissegundo (1/1000 segundo, abreviado como 715). som complexo (ou mistura) e ruído; periodicidade e
aperiodicidade
* Neste livro, foi adotada a seguinte convenção: Dó = C; Ré = D; Mi = E; Fá = F; Sol=G; Lá
= A; Si = B; sendo que a oitava central possuí o Lá 440 Hz do diapasão = A,. Dessa forma,
quando nos referimos às notas de uma escala, por exemplo, fazemos uso da nomenclatura por Na realidade, porém, a grande maioria dos corpos geradores de sons
Jetras (por exemplo: C,, Bº,, G, etc.); em outros casos, faremos uso, visando à clareza, da nómen- aos quais associamos uma determinada nota musical não produz vibrações
clatura por extenso das notas (Dó, Si bemol, Sol sustenido etc.). estritamente periódicas, mas introduzem, ao contrário, flutuações consi-
* Os exemplos foram extraídos do livro The Musician 5 Guide to Acoustics (ISBN 0- 19-81 6-505-6),
deráveis no período da vibração, que geralmente só podem ser detectadas
*
de Murray Campbell e Clive Greated, Reino Unido, Oxford University Press (OUP), 2001. A partir
do Exemplo 1 apenas indicaremos o capítulo e a página, onde se encontra o gráfico. (N. do E) após certo tempo e, consequentemente, vários ciclos. Tais microvariações
DOOVODOODOOOCOMOU
Constatemos, pois, que a grande maioria dos sons não é nem exatamente
periódica, nem totalmente estável em dinâmica (amplitude), o que pode ser
facilmente constatado por uma atenta observação do Exemplo 1: existem
mínimas diferenças no contorno gráfico de cada pico do som.
Vibrações periódicas, ou, melhor ainda, quase-periódicas, são associa-
das à percepção de uma determinada nota musical, e por isso denominadas
de sons de altura definida. Tais sons são, na terminologia da composição
musical contemporânea desde o advento da música eletroacústica em 1948,
denominados de sons tônicos (sons toniques) de acordo com Pierre Schaeffer
(o pai da música concreta), ou de sons compostos (zusammengesetzte Klân-
ge) de acordo com Herbert Eimert (o pai da música eletrônica) (CD 2).
A onda sonora mais simples de que se tem notícia é conhecida pela
matemática como curva (ou onda) senoidal e representa o tipo mais 500
simples de vibração: o chamado movimento harmônico simples. Por isso,
dizemos que se trata de um som senoidal. Seu nome deriva de sua repre- ON 583
sentação gráfica: se projetarmos o seno desta onda no tempo, em intervalos
absolutamente regulares, vemos que tal onda reproduz um movimento de
total homogeneidade e continuidade, em progressão contínua, totalmente
O 667
periódica e regular, em que a projeção no tempo de um giro completo
de 360º resulta num ciclo da onda, como nos demonstra o Exemplo 2a ON — 150
e 2b. No Exemplo 2a, temos a representação do giro da circunferência
projetado no tempo; no Exemplo 2b, temos a projeção da amplitude da E ——— 833
forma de onda em relação a um deslocamento circular de um “ponteiro”
que perfaz no tempo, em 12 segmentos iguais no sentido anti-horário, os
> 917
360º da circunferência.
Exemplo 2
> 1,000
Representação de um som senoidal (b) Cf. Dodge & Jerse.)
liDINDA
A bem da verdade, podemos dizer que o som senoidal ou não existe na
li o Hj
natureza, ou na natureza é só ele que existe de fato, uma vez que os demais
sons (não-senoidais) são resultado de sobreposições de sons senoidais em
seu espectro sonoro, analisado em detalhes a partir da análise espectral que
se inicia por volta de 1928. Todo som que não é senoidal é, na verdade, um
somatório de sons senoidais. Se tal sobreposição de sons senoidais se dá
em proporção de números inteiros, a sensação periódica que existe no som
|
senoidal isolado é preservada e temos então um som tônico ou composto, de
altura definida. Cada som senoidal componente do espectro resultante é um
parcial deste som, e como parcial, cada componente senoidal é um harmônico
da frequência fundamental (em geral, a mais grave) deste som, ainda que a
presença discreta (porém marcante) de parciais ligeiramente inarmônicos meiro tipo diz respeito a sons cujos componentes espectrais (sons senoi-
nos espectros dos sons naturais não deva ser negligenciada (CD 4). dais) estão em relação inarmônica, porém nos quais o ouvido pode ainda
Porém, se a sobreposição de sons senoidais não se dá em proporção discriminar a presença de tal ou qual frequência que se destaca em meio ao
de números inteiros, dizemos que se trata de um espectro não-harmônico aglomerado sonoro. E como se se tratasse de um som tônico “desafinado”
ou simplesmente inarmônico, e perde-se a sensação de uma altura (nota em sua constituição interior. Tal som é aperiódico, porém não chega a ser
musical) definida. Neste caso, cada som senoidal componente do espectro de tal forma saturado em componentes senoidais que o ouvido só ouviria
é apenas um parcial do som resultante. Ou seja: todo harmônico é um uma certa “massa” sonora de timbre não-harmônico (para utilizarmos
parcial, mas nem todo parcial é um harmônico (CD 5). outro termo de Pierre Schaeffer, conceito que abordaremos mais tarde).
E aí se tem talvez a maior distinção entre uma abordagem meramente Dizemos, nesse caso, que se trata de um som complexo ou inarmônico,
acústica dos fenômenos sonoros e uma que leve em consideração o universo ou, de acordo com a terminologia empregada na Alemanha por Herbert
da composição musical contemporânea. Eimert, de uma mistura (Tongemisch ou Sinustongemisch = mistura de sons
Objetos que vibram de maneira não-periódica ou simplesmente ape- senoidais). Exemplo de sons complexos são os gongos e sinos, ou ainda
riódica, sem nenhum modelo definido e regular de repetição, possuem os pratos e o tam-tam (tocado em intensidade média ou baixa). Somente
espectros inarmônicos e geram sons indefinidos em altura, sem poderem quando o som aperiódico contiver um número elevado de componentes
ser associados a uma determinada nota musical (Exemplo 3). Ao contrário senoidais em uma determinada faixa frequencial ou banda de frequência,
do som harmônico, no qual se tem um espectro discreto, em que a energia implicando certa saturação sonora naquele âmbito do registro das alturas
só poderá ser encontrada, em uma banda de frequências, em determinadas sonoras, é que percebemos então um ruído propriamente dito. Entre o som
frequências harmonicamente correlatas aí presentes, no caso de tais sons complexo e O ruído, temos uma gradação do som não-saturado ao som
aperiódicos consideravelmente densos a energia existe de modo dissipado saturado, em que o extremo da saturação se dá quando um som contiver
por toda a gama de frequências de uma determinada banda, resultando daí sons senoidais em todas as frequências audíveis pelo homem, gerando o
um espectro distribuído. Tais fenômenos sonoros são denominados pela que comumente se designa por ruído branco, em analogia ao fenômeno
acústica, genericamente, por ruídos. da cor branca (mistura de todas as cores). O ruído branco caracteriza-se
Do ponto de vista da composição contemporânea, entretanto, é de por uma distribuição uniforme do espectro, em que o mesmo tanto de
fundamental importância a distinção entre duas categorias de sons de altura energia pode ser encontrado entre duas quaisquer frequências de distância
indefinida, distinção esta que o estudo da acústica prefere ignorar: o pri- fixa entre si, independentemente de sua localização no campo das altu-
QE
q
a «
=: A natureza desse tipo de evolução inicial do som depende de seu ataque. Ata-
“Es
EST ques mais abruptos ou duros atingem mais rapidarhente a amplitude máxima
do som, ataques mais brandos ou moles precisam de mais tempo para isto.
3
a o
q
Qualquer parte que indique alguma alteração da amplitude é denomina-
3a da transitório ou transiente. Por definição, o ataque é o regime transitório
Sã
ou
E inicial, ou transiente de ataque. Em contrapartida, as partes que representam
5E
U
uma certa estabilização da intensidade, com amplitude constante, consti-
RG)Ss tuem o regime estacionário ou sustentação do som. Em geral, mesmo na
sustentação de um som considerado como bastante estável dinamicamente
EE E
os
o
sg «<
s
q
q
q é, estatisticamente, claramente distinguível de fases essencialmente dinâmicas
a a
O e instáveis do evento sonoro, tais como seu fim e, principalmente, seu início.
EN
componentes senoidais, os quais ressoam em sua privilegiada caixa de
ressonância, (a)
Exemplo 6
[Cf. Campbell & Greated, “1. The Creation and Transmission of Musical Sounds”, p. 13.) O OUP [CE Hall.)
De acordo com o modelo de envelope dinâmico traçado por Herrmann
Quando falamos do envelope dinâmico de um som, reportamo-nos ao
Helmholtz (1821-1894) — que está para a acústica assim como Freud para a
seu desenvolvimento dinâmico global, resultante de cada envelope diná-
psicanálise —, o som possui, em geral, três fases essenciais, correspondentes
Deslocamento
martelo). Em consequência disso, o timbre torna-se mais brilhante.
Observamos, por fim, um curioso paralelo: a dinâmica do som apro-
xima-o, enormemente da própria vida. Tal como a vida, ele tem um início,
um desenvolvimento e um fim. Nasce, molda-se ao meio ambiente, se
desenvolve e morre. Mas ao contrário da biografia humana, para a qual a
morte certamente conta mais que o nascimento, no som é, como veremos €————S
T=12,9ms
mais tarde, a fase de nascimento (seu ataque) que adquire maior importância
em sua caracterização timbrica.
[Cf. Campbell & Greated, “1. The Creation and Transmission of Musical Sounds”, p. 14.] O OUP
F
=
Tempo (ms)
(Cf. Campbell & Greated, “1, The Creation and Transmission of Musical Sounds”, p. 15.] O OUP + (3607) = 180º
[C£ Campbell & Greated, “1. The Creation and Transmission of Musical Sounds”, p. 17.] O OUP
Deslocamento
No caso de nosso Exemplo 11, os dois violoncelos estão em defasa-
gem de:
10 As 30 VW Tempo (ms)
2 (360º) 6 09 = 55º
+13 [Cf Campbell & Greated, “1. The Creation and Transmission of Musical Sounds”, p, 17.] O OUP
Assim como todo som varia de modo contínuo em seu comportamento No século XVII, Daniel Bernoulli (1700-1782) afirmou que a vi-
dinâmico (mesmo se tal variação for mínima e quase imperceptível), sendo bração de um corpo sonoro pode ser vista como sobreposição de seus
possível uma total estabilidade dinâmica exclusivamente se fizermos uso “modos simples” (em outros termos, de seus harmônicos) com diferentes
da geração eletrônica do som, apenas instrumentos eletrônicos são capa- amplitudes. Um pouco mais tarde, em 1822, o matemático francês Jean-
zes de manter uma mesma diferença de fase durante um maior espaço de -Baptiste Joseph Fourier (1768-1830) chega a uma definição acerca das
tempo. Ínfimas flutuações (ao que Pierre Schaeffer deu o nome de allures) vibrações periódicas, estabelecendo o chamado Teorema de Fourier e as
são inerentes à grande maioria dos sons existentes, e em particular áqueles Séries de Fourier. Segundo esse teorema, todo som de altura definida
gerados por seres humanos, dando margem a constantes deslocamentos nas pode ser descrito por seus múltiplos harmônicos em relação de número
relações de fase entre sons distintos e simultâneos. Como alterar à relação inteiro com uma fundamental, e pode ser representado por um somatório
de fase implica diminuição ou aumento do tamanho do período, e como o de funções ortogonais (seno e co-seno). Por mais complexo que um som
tamanho do período está relacionado à frequência do som, deduzimos que periódico seja em sua configuração, ele será sempre o resultado da soma
existem constantes variações em frequência, ainda que mínimas, de sons de toda uma série de sons (curvas) senoidais, constituindo uma série
que julgamos, a princípio, estáveis frequencialmente. harmônica natural (no Exemplo 13, ilustrada a partir da fundamental
y
Hp
4 bobeboetockho 78 Hz. Tal frequência é então denominada frequência fundamental. Fourier
define que um som de altura definida, gerando uma curva complexa e não
senoidal, é equivalente à curva de sua frequência fundamental, somada a
uma outra curva com exatamente duas vezes a frequência da fundamental,
mais uma terceira exatamente três vezes a frequência da fundamental etc.,
resultando numa representação simétrica da forma de onda, se compararmos
A constatação da existência de uma série harmônica natural veio as fases negativa e positiva da onda:
consagrar algo já longamente previsto e intuído ao longo da história, e que
foi chegando à sua formulação definitiva através da contribuição de diver- Exemplo 14
sos pensadores. Assim o foi em 1636 com Marin Mersenne (1588-1648),
Representação de um período da sobreposição de ondas na proporção de números
padre e matemático francês, o primeiro teórico a fundamentar o estudo da
inteiros a partir da frequência mais grave, na razão: f 2£ 3 4f 5fe 6f
harmonia no fenômeno da ressonância natural, e, um pouco mais tarde,
com John Wallis (1616-1703), que induz em 1677 a vibração de uma corda
por simpatia com harmônicos de sua frequência fundamental. No século y Segundo harmônico
seguinte, Jean Le Rond d' Alembert (1717-1783) sugeriria que um som na-
tural não seria puro, mas “complexo” (leia-se aqui: composto), resultante da
sobreposição de diversos harmônicos derivados de uma série de vibrações,
dedução esta não longe das conclusões de Joseph Saveur (1653-1716),
considerado o pai da acústica moderna, que descobrira pela primeira vez
um meio de calcular o número absoluto de vibrações de um determinado
som de altura definida e a calcular a frequência dos batimentos produzida
Fundamental
por duas notas soando simultaneamente. Helmholtz, por fim, forneceria a
explicação do porquê de cada som que não o som senoidal ser composto
por sons puros (senoidais): cada partícula de ar pode efetuar somente um Assim sendo, no espectro harmônico, todo e qualquer componente
único movimento a cada vez, correspondente a um dos parciais constitutivos será uma curva senoidal com a frequência igual a um número inteiro em
do espectro sonoro. relação à frequência fundamental. Por definição, todo conjunto de sons
O conceito matemático de sobreposição de sons senoidais, inicialmente senoidais, cujas frequências constituem uma série harmônica, acarreta em
pensado por Fourier somente para os sons compostos, acabou posterior- sua sobreposição uma onda sonora composta e periódica, cuja frequência
mente sendo generalizado e estendido igualmente aos sons complexos e de repetição coincide com a frequência da fundamental. Em tal processo,
aos ruídos, ainda que a proporção entre os sons senoidais não corresponda, as ondas senoidais podem isoladamente variar livremente em amplitude e
Ç soles
se sucede à frequência fundamental; mas devemos ter clareza de que já a
a gba
frequência fundamental constitui o primeiro parcial harmônico do espectro
de um som periódico.
>» Sd É
O modo costumeiro de representar a força (amplitude) dos dife-
rentes harmônicos é o espectro harmônico, que, ao contrário da forma
de onda (que representa a projeção da amplitude no tempo), corres- (b)
ponde à distribuição de energia (amplitude de cada parcial) em relação
às frequências:
Exemplo 15
(c)
Espectro harmônico de um som, com amplitude distinta de parciais
em regiões distintas de frequência
[Cf. Campbell & Greated, “1. The Creation and Transmission of Musical Sounds”,
p. 18.] 6 OUP
Rima
Espectro harmônico correspondente ao Exemplo 18 (a)
(b) A IN |
Amplitude
O NV UVUNVA In qa
mm
123456
-D
91011 Nível do
co
harmônico
(Cf. Campbell & Greated, “1, The Creation and Transmission of Musical Sounds”, p. 19.] O OUP
[C£. Campbell & Greated, “1. The Creation and Transmission of Musical Sounds”, p. 22.] O OUP |
das e, consequentemente, na terminologia musical aplicada à instrumentação
e orquestração. Observe o Exemplo 18: Como mencionamos acima, a análise de Fourier pode ser estendida, a
rigor, a qualquer som, incluindo-se aí os sons não-periódicos (sons comple-
Exemplo 18
xos e ruídos). Nesses casos, constataremos que os componentes senoidais
(a) Harmônico natural da corda Ré do violoncelo;
(b) altura da corda tocada livremente presentes não corresponderão mais à relação de números inteiros com uma
dada frequência fundamental. Suas relações são de números não-inteiros,
O.
4 PrU 1.
irracionais, e por isso são denominadas relações inarmônicas. Assim sendo,
!
—,
o
hd tais componentes não podem ser mais descritos como sendo “harmônicos”,
mas tão somente parciais. No caso da representação espectral do som com-
(a) (b)
plexo e do ruído, não há mais razão para falar de um espectro “harmônico”,
termo que é então substituído pelo de espectro de frequência.
O músico interpreta o pequeno círculo do Exemplo 18a como uma
instrução para que toque o “harmônico natural” de oitava da nota D,, fun-
damental da segunda corda do violoncelo. Assim sendo, executa a corda D 1.2. A Transmissão dos Sons e seus Efeitos na Percepção
(= Ré) que produz normalmente a nota D,, mas encosta o dedo ligeiramente
na metade da corda, elevando a altura em uma oitava e conferindo ao som 1.2.1. Ondas sonoras no ar
uma qualidade “transparente” especial, que logo associa ao 2º harmônico
da fundamental (efeito este comum aos instrumentos de corda, incluindo O som é transmitido na atmosfera sob a forma de uma onda entre a
a harpa e o violão). Em geral, o músico acredita estar tocando este harmô- fonte sonora, responsável por sua proveniência física, e o ouvido, fenôme-
nico de forma isolada, mas ignora que harmônicos isolados não podem no já intuído desde a Antiguidade por.Arquitas de Tarento (430-360 a.C.),
jamais ser gerados sem recursos eletrônicos. O que ele realiza com seu que definira'o fenômeno sonoro como sendo o resultado de “pulsações de
dedilhado, na verdade, é a eliminação de todos os harmônicos ímpares do ar” que produzem sons cada vez mais agudos quanto mais rápidas elas
330 + A=c/f
[Cf. Campbell & Greated, “1. The Creation and Transmission of Musical Sounds”, p. 28.
A=343/78=44m
Baseado em Weast e Nederveen.] O OUP
Ou seja, os picos sucessivos de pressão na onda sonora que vai do
Avelocidade-padrão de 343 m/s tem por base uma temperatura standard violoncelo que toca aquela nota ao ouvinte sucedem-se, na atmosfera, a
de 20º com ar seco. Notamos que, em geral, quanto mais quente for o clima cada 4,4 metros de distância. Quanto mais grave a frequência de um som,
(quanto maior a temperatura), mais rápido o som se propaga, e que quanto maior o comprimento de sua onda. Tal cálculo, aparentemente de cunho
maior a umidade relativa do ar, mais lenta a velocidade de propagação do meramente físico-matemático, pode auxiliar em muito a compreensão dos
som. Tal efeito sofre inversão apenas após cerca de 38º de temperatura, fenômenos de difração e reflexão do som no espaço por parte do músico.
quando então uma maior umidade relativa do ar ocasiona uma maior velo-
cidade de propagação do som em relação a um ar mais seco. 1.2.5. A ressonância e seus itinerários
1.2.4. Comprimento de onda, frequência e velocidade A ressonância é um outro fenômeno acústico de importância incon-
testável. Por definição, consiste na faculdade que um corpo apresenta de
Em geral, a velocidade de uma onda sonora c pode ser obtida dividindo
co-vibrar, de modo espontâneo, quando excitado por vibrações exteriores
o comprimento de onda pelo período: cuja(s) frequência(s) coincide(m) com o(s) período(s) próprio(s) e natural
(naturais) de vibração de sua matéria. A ressonância significa, assim, uma
c=A/t
vibração com amplitude relativamente maior que sempre aparece quando
a frequência de uma força propulsora coincide de modo relativamente
Na medida em que — como explicado anteriormente — a frequência da
proeminente com uma frequência do próprio sistema sobre o qual atua.
vibração está simplesmente relacionada ao período T pela equação:
Se o “coração” de um instrumento musical consiste no gerador sonoro
f=1/T ou fonte de excitação, as ondas sonoras provenientes deste corpo, por sua
vez, são amplificadas e radiadas por um vessonador (ou ressoador), em
podemos combinar ambas as equações, tendo então: geral localizado na constituição material do próprio instrumento. Assim é
que as cordas de um piano, excitadas pelos martelos, são amplificadas e
c=Af propagadas em função da caixa de ressonância que envolve as cordas, da
Exemplo 24
Difração de um som (a) num pilar ou (b) por uma porta, em que o tamanho da largura
do pilar/abertura da porta é comparável ao comprimento de onda do som
A onda refletida é sempre mais fraca que a onda direta, uma vez que
parte da energia sonora é absorvida pelo objeto que a reflete. Assim sendo,
a reflexão e sua contraparte, a absorção, exercem uma grande influência na
qualidade acústica do ambiente. Reflexões iterativas dão origem aos ecos
ou à reverberação, de que logo falaremos.
Nota-se, então, que uma onda sonora pode ser refletida não apenas por [Cf. Campbell & Greated, “1. The Creation and Transmission of Musical Sounds”, p. 31.] O OUP
uma superfície sólida, mas também por qualquer obstáculo que ocasione
uma mudança abrupta no ambiente de sua propagação, podendo tal obstáculo
variar radicalmente de solidez. Quanto mais rígido o objeto contra o qual o Ambos os casos de difração dependerão da relação entre a frequência
som se projeta, maior será a reflexão sonora. Os vidros e o concreto possuem do som que se propaga e o tamanho quer seja do obstáculo (no caso do
altas taxas de reflexão; cortiças e carpetes, uma bem menor capacidade de Exemplo 24a), quer seja da abertura (no caso do Exemplo 24b). Assim
reflexão. Quanto menor a capacidade de reflexão de uma matéria, maior sendo, nem toda onda sonora sofre a mesma difração na mesma medida:
uma onda apenas será difratada de modo significativo por um obstáculo ou
sua capacidade de absorção do som.
por uma abertura se seu comprimento de onda for maior do que a espessura
1,2.7. Difração do obstáculo ou da fenda, ou seja, se o som for suficientemente grave; caso
o comprimento de onda seja bem menor (típico das frequências mais agu-
Outra importante propriedade das ondas sonoras é sua habilidade das), não haverá difração suficiente, e será gerada uma lacuna de som logo
em circundar obstáculos. Tal fenômeno é denominado difração. Quando após o obstáculo ou, no caso de uma abertura, o som tenderá a continuar
ouvimos um som, nossa escuta não recebe apenas ondas sonoras que nos se propagando apenas na dimensão da fenda, não mais se espalhando pelo
atingem após diversas reflexões, mas também a onda que se propaga dire- espaço (como bem ilustra o Exemplo 25, na página seguinte).
tamente em nossa direção, sem qualquer reflexão, e que, para chegar até Em suma, para haver difração e o som poder circundar os obstáculos
nós, sofre difração por volta dos obstáculos físicos que se situam entre nós ou preencher os espaços após frestas em sua propagação, é necessário que o
e a fonte emissora. comprimento de onda deste som seja maior que a espessura dos obstáculos
Consideremos, por exemplo, um pilar que se situe entre nós e a fonte ou que a dimensão das frestas. Obstáculos em uma onda sonora de compri-
sonora. Imediatamente após o pilar, existe uma área de “sombra sonora” mentos de onda suficientemente curtos acarretam “sombras acústicas” da
causada pelo obstáculo: um ouvinte que se situasse justamente ali receberia mesma forma que o fazem em relação a um feixe luminoso (já que a luz é um
ima =
que não esteja muito próximo de nós, e ouvintes que se afastam da fonte
sonora percebem uma nítida diminuição de volume sonoro. Refração pode
ocorrer, no mais, mesmo dentro da água, quando da existência de camadas
de água com temperaturas diversas.
Efeitos semelhantes podem ser causados pelos ventos, uma vez que a
velocidade do som é afetada pela velocidade do meio pelo qual ele se pro-
paga. A velocidade de uma onda sonora em um meio móvel como o vento
(Cf. Campbell & Greated, “1, The Creation and Transmission of Musical Sounds”, p. 32.] O OUP
resulta da soma das duas velocidades (do som e do vento), de forma que a
outro tipo de onda, com comprimento de onda extremamente curto, demons- velocidade do som aumenta se o som vai em direção dos ventos e diminui
trando igualmente difração apenas quando encontra pequenos obstáculos ou se vai contra os ventos.
infimas aberturas). Longos comprimentos de onda correspondem a baixas
frequências, e baixas frequências correspondem a notas musicais mais graves. 1.2.9. Interferências
Consequentemente, sons graves sofrem maior difração que sons agudos.
Daí a razão de nos referimos em geral a sons graves reportando-nos a uma Uma onda sonora será propagada até o ouvido da mesma maneira se for
maior presença sonora: sons graves possuem a característica de preencher ou não acompanhada por outras ondas concomitantes. As ondas sonoras,
melhor os ambientes, e tal característica decorre diretamente do fenômeno consideradas em si, não interferem nas demais ondas concomitantes a elas.
da difração. Esta é também a razão de dispormos com bastante cuidado os Entretanto, alguns interessantes efeitos ocorrem quando as ondas atingem,
alto-falantes de frequências agudas de nossos sistemas de som, enquanto simultaneamente, sua destinação — o ouvido ou, de modo simulado ao nosso
que os alto-falantes de baixas frequências não necessitam estarem dispostos sistema auditivo, a membrana de um microfone. A tais efeitos dá-se o nome
de modo tão cuidadoso, pois aonde quer que estejam, acabarão por gerar genérico de interferências. .
sons que preencherão, de toda forma, o ambiente (CD 19). Quando dois instrumentistas, tocando um mesmo tipo de instru-
Por fim, uma situação particular ocorre quando tanto o comprimento mento (por exemplo, clarinete), executam simultaneamente a mesma
de onda quanto o obstáculo possuem mais ou menos a mesma magnitude. nota com a mesma intensidade, estando ambos dispostos de modo
Nesse caso, o obstáculo servirá, na verdade, de reemissor do som, irradian- equidistante em relação a um microfone ou ao ouvido, a variação de
do-o em todas as direções por meio de reflexões sonoras. pressão que sofre o microfone ou o ouvido pelo instrumento “A” será
adicionada àquela decorrente do instrumento “B”, de forma que o re-
1.2.8. Refração sultado sonoro recebido e percebido dependerá diretamente da relação
de suas fases. Tem-se, nesse caso, uma interferência construtiva: a am-
Ao fenômeno caracterizado pela alteração da velocidade do som de plitude é simplesmente dobrada, como demonstra o Exemplo 26, na página
acordo com o lugar — pela existência de camadas de ar sobrepostas e com seguinte, tomando-se por base dois sons senoidais de mesma frequência
distintas temperaturas —, ocasionando distorções de percurso da energia e mesma amplitude.
sonora, dá-se o nome de refração. Toda espécie de onda pode sofrer refra- Nesse caso, ambos os sons estão em fase, e cada ponto de deslocamento
ção. No caso das ondas sonoras, esse fenômeno não tem implicações tão da curva de um som é somado a cada ponto da curva do outro som, resultando
substanciais, ainda que mereça ser aqui mencionado. num único som com a mesma frequência e com o dobro da amplitude (Exem-
Podemos exemplificar o fenômeno da refração se considerarmos um plo 26c). Esse fenômeno pode ocorrer mesmo quando não há equidistância
dia normal, ensolarado. Em tais circunstâncias, o solo e as camadas de ar entre as fontes sonoras. Basta que as cristas de onda dos sinais coincidam
DAP -» Tempo
(b) (a) AA LNSLN
Pressão
MM AD NT NTONS
AS 7
. PARAN |
Pressão
(b)
TI NITNI
PAN ARA » Tempo
PARAR
[Cf. Campbell & Greated, “1. The Creation and Transmission of Musical Sounds”, p. 34.) O OUP
(co) A+ B | >
[C£. Hall)
[Cf Hall]
Um efeito surpreendente se dá, todavia, quando existe, como vimos,
uma diferença de fase de 180º (portanto de meio ciclo ou período), em Interferências construtivas e destrutivas ocorrem em nível microscó-
clara oposição de fase: as duas ondas cancelam-se mútua e completamente. pico do som, ou seja, entre componentes senoidais (CD 20). Assim sendo,
Apesar de, fisicamente, ambos os sons estarem sendo gerados de fato, o interferências destrutivas raramente ocorrem de forma tão drástica a ponto
Pressão
frequência, tanto mais rápidos serão os batimentos. Tempo
(os)
Em geral, o número de batimentos por segundo é igual à diferença em
frequência entre os dois sons concomitantes.
O Exemplo 31 consiste em outra representação dos batimentos, aqui C(A+B)
entre os sons senoidais A e B. O som B é ligeiramente mais grave que o
som A, e tal diferença ocasiona, além da pequena diferença em frequência,
uma paulatina alteração da relação de fase entre os períodos dos dois sons. [Cf Campbell & Greated, “1. The Creation and Transmission of Musical Sounds”, p. 37.) O OUP
Quando existe coincidência entre as cristas de onda dos períodos de À e de
V0,5
Sirene estacionária
B A
[Cf. Stephen Hawking, Breve História do Tempo Ilustrada.)
64 FLo MENEZES
introdução — voltada, lembremo-nos bem disso, ao músico e não ao estudio- O ouvido externo consiste da pinna (orelha) e de um canal quase cilín-
so do corpo humano —, podemos ao menos entrever quais as propriedades drico de aproximadamente 25 mm de comprimento por 7 mm de diâmetro,
responsáveis por certos aspectos de nossa grande capacidade auditiva, conhecido como canal auditivo. Este canal culmina no tímpano ou membra-
aspectos estes que se demonstram fundamentais para a prática musical. na timpânica, a qual consiste numa delicada membrana semitransparente
de forma cônica e achatada.
Comportando-se como um tubo cilíndrico, o canal auditivo possui,
2.1. O Ouvido Externo: Ressonância, Filtragem e como todo ressonador (e como bem o provou Helmholtz, Carl Stumpf
Direcionalidade (1848-1936) e outros), uma tendência de ressonância a uma certa frequência.
No caso específico do canal auditivo, a frequência em tono de 3 800 Hz 6,
As partes que são vitais para nosso sentido auditivo localizam-se alguns em certa medida, privilegiada na captação sonora pelo ouvido, que tende
centímetros para dentro do esqueleto e da orelha. Dividimos o ouvido em a uma resposta mais acurada por volta desse eixo frequencial.
três seções ou partes anatômicas distintas: ouvido externo; ouvido médio;
Quando uma onda sonora chega ao ouvido, parte dela é transmitida
e ouvido interno. pelo canal auditivo e parte dela é refletida para fora de nosso ouvido.
Observemos o Exemplo 35 para, em seguida, descrevermos cada uma
As flutuações de pressão resultantes que são “admitidas” pelo ouvido
dessas partes.
forçam o timpano a vibrar. À orelha funciona, assim, como uma espécie
de funil ou filtro, coletando a energia sonora que chega ao ouvido a partir
Exemplo 35
de sua área e canalizando essa energia para uma área bem menor, qual
(a) Estrutura do ouvido humano (externo, médio e interno); seja: a do canal auditivo propriamente dito. Uma simples experiência nos
(b) Representação estilizada do tiímpano ao ouvido interno demonstra a importância da área (dimensão) da orelha: se pusermos uma
de nossas mãos atrás de uma orelha, haverá um considerável aumento da
Ouvido externo | Ouvido | Ouvido intemo
médio área responsável pela “coleta” de som, o que enfatizará o efeito causado
pela orelha na captação dos sons; os sons são imediatamente percebidos
Aparato vestibular com com maior intensidade.
(a)
Ossículos
sm
a
s
Nervo vestibular vinte em identificar a direção da qual chega uma determinada onda sonora.
Além da direção da proveniência sonora, o ouvido procura estimar a dis-
tância da fonte sonora, sendo que, quanto mais agudo for o som, maior será
a dificuldade da audição na estimação da distância. Com relação à direção
do som especificamente, a propriedade da escuta — que pode ser descrita
$$” Tímpano como escuta direcional, por implicar a percepção da direcionalidade das
Trompa de Eustáquio
|” (membrana timpânica) ondas sonoras — decorre do fato de que as ondas refletidas no canal audi-
À Janela 2 tivo a partir da captação oriunda de diferentes regiões ou partes da orelha
Cavidade nasal
viajarão distâncias distintas. O cérebro será então capaz de analisar tais
diferenças de tempo, correspondentes à direção através da qual a onda
Cadeia de ossos sonora incidiu na orelha.
Janela oval Perilinfo membrana basilar Quando a fonte sonora não se situa diante do ouvinte (ou diretamente
(b)
. P nricenccenenareneen
atrás dele), ambos os ouvidos captarão sinais distintos, pois as ondas sonoras
Tíimpano — 7 elicotrema resultantes atingirão uma orelha antes que a outra, mesmo que tal diferença
» 7 à timpani O Ápice
seja infima e aparentemente sem importância. A tal diferença de tempo na
Janela redonda P captação de um mesmo som pelas duas orelhas dá-se o nome de dispa-
Ba: Distância Jinear ao Iongo da x ridade binaural, disparidade esta que fornece os indícios mais determinantes
membrana basilar
para que o cérebro reconheça a posição da fonte sonora no plano horizontal.
[Cf. Roederer.]
e janelaoval — — z=P/V
— — fiuido coclear — Um obstáculo bem rígido (como uma peça de madeira, concreto ou
vidro) vibra muito pouco em resposta à pressão exercida por um som. Sua
específica impedância acústica é, pois, muito alta. Já no caso de uma mem-
brana, que se flexiona facilmente (como a membrana dos tom-tons e dos
[Cf. Campbell & Greated, “2. Hearing Musical Sounds”, p. 44.) O OUP
II]
área 25 vezes menor do que a área do tímpano, a pressão sonora será
elevada, nesse processo, pelo fator 25. Além disso, a ação de “alavanca”
dos três ossículos aumenta ainda a pressão sonora pelo fator 2, ao mesmo
tempo em que reduz a velocidade da janela oval pelo mesmo fator. Ou
seja, a pressão sobre a janela oval acaba sendo cerca de 50 vezes maior
que a exercida sobre o timpano, enquanto que a velocidade de amplitude
é reduzida pela metade, fazendo, afinal de contas, que o ouvido médio
(a) funcione como uma espécie de amplificador:
timpano janela oval
IN
área = 75 mm? área = 3 mm?
pressão = p pressão = 50 p
velocidade = v velocidade = 0,5 v
Exemplo 40 (e)
Membrana basilar
-
Estrib ; Helicotrema (e)
(8
Janela
redonda t-
(a) i 110 Hz EE= Em decorrência dessa constatação, tem-se o que se denomina de teoria
da localização ou teoria espacial da discriminação de frequências, uma
vez que o cérebro assumiria o papel de discriminação das alturas levando
em conta sobretudo o lugar particular da membrana basilar no qualo som a
(b) 440 Hz flexiona e no qual incide seu pico máximo, gerando a correspondência entre
frequência e dimensão da membrana tal como exposta na página seguinte.
A teoria da localização permite que expliquemos nossa habilidade
À 2
(c) 1760 Hz MS
a ema
1 em —
em distinguir dois sons sucessivos cujas frequências são ligeiramente
diferentes, assumindo que o cérebro focalize a atenção ou sobre a parte
da membrana basilar na qual se dá o pico (pico do “envelope dinâmico”),
ou sobre a parte na qual o sinal está mudando mais nitidamente de posi-
a
1À
(7040 Hz LAN
| unia
Gráfico ilustrativo da localização dos picos da membrana (a)-(e) Impulsos elétricos em 5 fibras nervosas distintas ativadas por um som senoi-
basilar de acordo com a frequência dal cuja vibração é ilustrada em (g); a soma de todos os sinais
x (mm) em todas as 5 fibras nervosas é dada em (f)
30 +
o 1 O O
E :e
1
Distância da base
RE
tocadoo
SR
cencocuf d
SU
ooo
/
0-0
a
& PD
optimMHIHmH,
D
>
=
E
Frequência / (Hz)
[Cf Roederer.) oN ANA NANA
2.3.4. A teoria temporal de discriminação das frequências
VN A NATANTempo
[Cf Campbell! & Greated, “2, Hearing Musical Sounds”, p. 56.] O OUP
As células capilares tendem a emitir sinais elétricos quando a mem-
brana está próxima do topo de seu ciclo vibratório. No entanto, como dito elétricos em uma mesma fibra nervosa (intervalos estes que ganham a
acima, isto se revela mais como uma provável tendência do que como um designação inglesa de interspike intervals, ou, abreviadamente, ISIs). Da
fato incondicional, pois que nem todo ciclo gerado por uma determinada análise de um número razoável de ISIs, poder-se-ia deduzir o período (a
frequência ocasionará impulsos elétricos exatamente nas mesmas células. frequência) do som. :
Experimentos comprovaram que, por vezes, vários ciclos se sucedem Ainda que contribua bastante para a compreensão dos nossos mecanis-
sem que seja gerado qualquer sinal em várias das fibras nervosas. Em tais mos auditivos de detecção das alturas, esta teoria temporal deixa em aberto,
sinais combinados, existe ao menos um sinal elétrico nas células a cada no entanto, a questão da percepção de alturas nos sons cujas fundamentais
período, e por vezes até mesmo diversos sinais, pontuando o pico de cada situam-se acima de 5000 Hz. Qualquer detecção de relações de fase fica,
ciclo vibratório. ao que tudo indica, comprometida acima deste limite, e as alturas de sons
Tais observações sugerem que o cérebro não faça uso somente da loca- mais agudos que 5 kHz parecem ser apreendidas somente pelo mecanismo
lização dos picos das ondas geradas na membrana basilar para discriminar de localização temporal das frequências.
as alturas, mas combine também os sinais provenientes de um largo feixe
de fibras nervosas. Dessa forma, a cada pico do ciclo vibratório uma “tor- 2.3.5. Bandas criticas
rente” de sinais elétricos viaja por sobre tal feixe. A partir de um “relógio”
interior, o cérebro pode, segundo essa teoria, estimar o número de torrentes Quando dois sons senoidais são bem próximos em frequência, tal
que chegam por segundo e, por consequência, deduzir a frequência do som. proximidade ocasiona uma considerável sobreposição de seus “envelopes
Fizeram-se outras sugestões concernentes à informação temporal pro- dinâmicos” na membrana basilar. A partir de tal sobreposição, dizemos
cessada no cérebro, como, por exemplo, a de que seria possível ao cérebro que suas frequências incidem em uma banda crítica. Ou seja, se as curvas
medir e recordar os intervalos de tempo entre sucessivos pares de sinais geradas por dois sons na membrana basilar estão separadas a ponto de não
, 3000 4 L
500 4 k
200 4 (a) B
588 Hz
H00 4 õ
(e) E 523 Hz (5)
Te
Af(Hz) S q r
20 4 -
(e)
Jo 4 h
[CL Campbell & Greated, “2. Hearing Musical Sounds”, p. 58.] O OUP
5 d L
Observando o Exemplo 46 (cf. Campbell & Greated), vemos que as
áreas pretas indicam uma sobreposição de dois envelopes dinâmicos na 2 d -
membrana basilar. Em 46a, devido ao fato de ambos os sons formarem
uma oitava, a área sobreposta é pequena, e isto significa que a excitação 1 À
das células por um dos sons não será praticamente afetada pela presença do
T r many T r T T T
-outro som, O qual ocasionará sinais elétricos em uma região bem diferencia- 20 so l0o0o 200 500 1000 2000 5000 10000
da na membrana basilar. Se a separação entre as frequências for reduzida, f(Hz)
a situação muda: um número significante de células corresponderá agora a (Cf. Campbell & Greated, “2. Hearing Musical Sounds”, p. 59. Baseado em Zwicker (a),
Plomp (b) e Nelson (c).] O OUP
700.
2.4. Sons Criados pelo Próprio Ouvido
Po 600)
EA
gs Toda a trajetória que o som realiza desde sua chegada no ouvido ex-
&“o
500
terno até seu entendimento pelo cérebro pode ser resumida pelas seguintes
[Sa
E 4004 etapas básicas:
3
S 3004 1) as ondas sonoras chegam ao ouvido externo, causando flutuações de
B
zE pressão que fazem o tiímpano vibrar; .
2004
2) esse fenômeno ocasiona movimentos nos ossiculos do ouvido médio,
100» fazendo que a janela oval vibre na entrada do ouvido interno;
3) a vibração resultante no fluido da cóclea gera uma onda que se desloca
500 1000 2000 3000 4000 5000 por sobre a membrana basilar;
Frequência central (Hz) 4) a oscilação na membrana basilar faz que células de fibras nervosas
(cílios) emitam sinais elétricos, transmitindo a informação ao cérebro,
[Cf Roederer.)
que os interpreta.
Por exemplo: na região de 3 000 Hz, será necessário que um som senoi- Assim como um som senoidal, puro, não pode ser ouvido em sua inte-
dal seja cerca de 310 Hz mais agudo que o outro para que seja distinguido gridade absoluta, sofrendo pequenas alterações quer seja da membrana de
deste outro quando ambos são tocados simultaneamente; numa região um alto-falante, quer seja do próprio mecanismo de nosso ouvido, qualquer
mais aguda, por volta de 5000 Hz, esta diferença sobe para mais de 700 som que nos atinja sofre, em certa medida, alguma distorção em nosso
Hz; enquanto que numa região mais grave, de cerca de 500 Hz, basta que próprio órgão auditivo, sendo adicionado de certos componentes que, em
ambos os sons se distanciem em cerca de 40 Hz. Três linhas pontilhadas princípio e a rigor, não estavam e não estão presentes na própria onda sonora
ilustram quais as diferenças em Hz, conforme o registro das alturas, para externa original. Esses elementos sonoros são acrescentados pelo próprio
a constituição dos intervalos de terça menor, segunda maior (tom inteiro) mecanismo de nossa audição, ou seja, pelo ouvido humano. Em suma: a
- die e -
4
3r,.
(Cf. Campbell & Greated, “2. Hearing Musical Sounds”, p. 65.) O OUP (CD 30)
Som f, (frequência fixa)
Comparando, pois, ambos os tipos de sons diferenciais, enquanto que f,
H Som de diferença: fo = £)-fj
a frequência do som diferencial simples cai quando o intervalo entre os 1
sons originais diminui, a do som diferencial cúbico sobe. Por outro lado, zh feg=3f -2f
enquanto que o som diferencial simples torna-se claramente perceptível foo=28-6
apenas no caso de os sons senoidais que lhe dão origem serem suficiente- fj unissono 2f quinta 2f, oitava Frequência do”
2 som variável
mente fortes, o som diferencial cúbico é já audível quando os sons originais
[Cf. Roederer.]
são de baixa intensidade. E isto mesmo se a dedução do som diferencial
cúbico se revela como um fruto de um “cálculo” bem mais engenhoso por
parte de nosso mecanismo perceptivo do que no caso do som diferencial Vemos que, se a frequência de um som permanece estável (som f,) en-
simples. Consequentemente, em muitas passagens da literatura musical, o quanto a de um outro torna-se cada vez mais aguda, variando em altura de
som diferencial cúbico apresenta-se como a única distorção significativa modo ascendente (som f,), o som diferencial simples se comporta, no que
proveniente da combinação entre os sons existentes. tange ao registro das alturas, de modo inverso ao som diferencial cúbico
Nesse sentido, será fundamental observar que, se esse fenômeno se dá e àquele resultado da equação 3f, - 2f. Como podemos observar através
com a simultaneidade de dois sons senoidais, ele não se ausenta de modo dos Exemplos 52, 53 e 54, quando o som mais agudo situa-se uma quinta
algum do contexto sonoro que se apoia em sons tônicos ou compostos. Os acima do som mais grave, os sons diferenciais simples e cúbico coincidem,
componentes senoidais que compõem um contexto menos “puro” continuam reforçando a oitava inferior da nota mais grave, motivo, entre outros, pelo
a exercer influência em nosso mecanismo auditivo e perceptivo, de forma qual o intervalo de quinta demonstra-se de tão aito grau de polaridade da
que a percepção de sons diferenciais, sobretudo dos cúbicos, adquire grande nota superior em relação à inferior: a nota inferior é fortemente polarizada.
relevância nos contextos musicais (CD 31). Os sons diferenciais abrem, constatemos, um interessante caminho para o
Uma vez que os sons diferenciais se situam em regiões mais graves do estudo da “cardinalidade” (termo de Edmond Costêre) ou, em outros ter-
que a dos próprios sons que os geram, as alturas mais graves de um dado mos, da potencialidade de polarização dos intervalos, agora sob o prisma
contexto sonoro podem mascará-los, e em muitos contextos musicais os da emergência dos sons de combinação.
sons de combinação podem não ser tão proeminentes, apesar de um ouvido 2.4.2. Harmônicos aurais
treinado ser capaz de identificá-los, como bem afirmara Helmholtz.
A discussão acerca de nossas capacidades dedutivas na audição de Por muitos anos acreditou-se que, independentemente do fato de que
frequências suplementares às que de fato ocorrem em um determinado dois sons possam ser ouvidos simultaneamente, um único som senoidal de
contexto sonoro ainda se encontra em plena fase de desenvolvimento. forte intensidade seria já suficiente para que toda uma série de harmônicos
Recentemente, por exemplo, muito tem-se falado a respeito de um outro aurais fosse gerada no ouvido, alguns dos quais de amplitude tão significa-
som diferencial, que seria o resultado de 3f, — 2f, ou seja, da diferença tiva quanto a do som original, Experimentos mais recentes demonstraram,
em frequência entre o que seria o 3º harmônico do som mais grave e o 2º contudo, que, apesar de o ouvido poder introduzir tais distorções, estes
harmônico do mais agudo. O Exemplo 54 ilustra a relação desses três tipos “acréscimos” são de um nível de intensidade tão baixo em comparação com
de sons diferenciais. o som original que acabam por não adquirir qualquer significado.
92 FLo MENEZES
caracterizam a música ocidental e que podem ser designadas por escritura que o som é constituído, basicamente, por sua altura, sua intensidade, sua
musical: procedimentos composicionais específicos que se distinguem da duração e seu timbre.
mera representação gráfica dos sons por intermédio da notação (escrita) O fato de o timbre ter sido, historicamente, o único dentre os pretensos
musical, Ainda fazendo outro paralelo da música com a linguagem verbal, aspectos constitutivos do som a sintomaticamente não ter sido devidamente
poderíamos dizer que a escrita está para a fonética (estudo da mera arti- representado pela notação ou escrita musical é índice, contudo, de que tal
culação dos sons da língua), assim como a escritura está para a fonologia asserção não é de todo correta ou que ela é, no mínimo, contestável.
(estudo sistêmico da função dos sons de uma determinada língua). Ao contrário do que vemos nos livros de acústica, afirmamos que o som
A partir de então, dá-se início a uma cada vez maior especificidade dos possui como parâmetros específicos a altura, a intensidade e a duração,
distintos aspectos do som pelas vias de sua notação gráfica, tais como altura e que o timbre não constitui um parâmetro do som, mas consiste antes na
e duração e, bem posteriormente, intensidade. O som, que a rigor é uma resultante dos demais parâmetros inter-relacionados entre si. E mais: os
totalidade de aspectos, passa a ser suscetível de uma fragmentação ou de parâmetros distintos do som estão inseridos tanto no nível macroscópico
uma decomposição em parâmetros ou atributos distintos, aspectos estes que do som, com relação à sua globalidade, quanto em sua estruturação mi-
serão justamente “postos de forma conjunta” — do latim componere (= pôr croscópica, Serão, em síntese, as alturas dos parciais, suas amplitudes, suas
Junto) — por aquilo que passa a ser designado, com bastante pertinência, por durações e suas respectivas evoluções no tempo (seus comportamentos
composição musical propriamente dita. Ou seja, para haver composição é dinâmicos, diretamente associados à evolução no tempo de suas amplitu-
preciso que haja antes decomposição dos sons, processo este historicamente des) que, juntas, constituem aquilo que designamos por timbre resultante
garantido ao compositor pela própria notação musical, e que o compositor de um determinado som.
eletroacústico, desprovido em geral de notação, necessita recuperar num A bem da verdade, só há sentido em detectarmos os atributos individuais
esforço duplo, decompondo o som em estúdio (processos de análise) para que caracterizam o som, numa atitude de alta abstração e “compartimen-
em seguida recompô-lo (processos de síntese); em música eletroacústica, talização” da totalidade de aspectos que efetivamente constitui os sons
seria mais apropriado falarmos de recomposição musical. que ouvimos a nosso redor, se considerarmos as constituições extremas
Certamente a acústica, ciência bem mais nova que a música e que do universo sonoro, do som mais puro, senoidal — isolado e produzido em
teve início praticamente no século XVII (com Joseph Saveur, considerado laboratório —, enquanto elemento último (ou, melhor, primeiro) do universo
como o pai da acústica moderna), se influenciou pela própria forma de sonoro, ao mais “impuro” ou complexo dos sons. Chegaremos à conclusão,
pensar o som no cerne da composição musical. Nesse sentido, qualquer então, que no som senoidal, como bem apontara Schaeffer, inexiste timbre
bom tratado de acústica aborda o som de acordo com seus parâmetros (o timbre é anulado pela extrema simplicidade do espectro, reduzido a seu
ou atributos isolados, ainda que em boa parte inter-relacionados entre si, último elemento potencialmente constitutivo — ou seja, pelo fato de inexistir
quais sejam: a altura, a intensidade e o timbre. Sobre a duração, a acústica aí qualquer espectro), assim como, no polo oposto, temos uma anulação
se limita, em geral, a comentários esporádicos inseridos na discussão dos da noção de timbre, por excesso de componentes espectrais, no chamado
demais tópicos, deixando o campo de investigação às elaborações de cunho ruído branco, mistura de todos os sons,
eminentemente musical, e isto o faz com certa razão, pois não são assim Dessa maneira, a noção de timbre será vista muito mais como aspecto
tantos elementos a serem discutidos ou medidos pela “óptica da acústica” constituído pelos e resultante dos demais atributos sonoros do que como
com relação às durações. Mas se dizemos que o faz com “certa” razão, é aspecto constituinte do som, e como tal só poderá ser aplicada aos sons
porque será pertinente abrirmos um espaço de discussão específico para que não são nem puros, nem complexos ao extremo. O timbre é, assim,
o fenômeno da percepção do tempo do som, que, como revelou a compo- acima de tudo um elemento composto, e não, como em geral se tem como
sição eletroacústica ao final da década de 1950, estabelece, por exemplo, certo, um elemento componente do som. [Em francês, tal distinção seria
curiosos paralelos com a percepção frequencial, como teremos então a de fácil descrição: o timbre seria um composé (composto), e não um com-
oportunidade de verificar. posant (componente).]
Porra, entretanto, podemos nos perguntar: quantos parâmetros consti- De toda forma, em que pese esta sua distinção essencial com relação
tuem, a rigor, o som? Quais são os aspectos ou atributos do som? Tradicio- aos atributos ou parâmetros sonoros propriamente ditos, e em que pese a
nal e convencionalmente, não haverá muitas dúvidas: a grande maioria das inevitável e inelutável inter-relação entre esses distintos parâmetros, falar-
pessoas dirá, em conformidade com a abordagem acústica mais corrente, mos de timbre significa falarmos da forma como se constitui um dado es-
em —
Hz a mais para que atinjamos o C*. (de 2217,46 Hz). Nessa altura (C, ), 0
acréscimo de 2 Hz significará um desvio, ao agudo, de menos de 2 cents,
am
ou seja, implicará uma diferença imperceptível se ambos os sons forem
e
executados um após o outro, e perceptível somente na forma de batimentos
de 2 Hz caso ambos soem simultaneamente (CD 33).
a
o am a
3.2.4. O cálculo da dimensão dos intervalos
aa
Intervalos iguais entre notas correspondem, pois, sempre às mesmas
em —
razões de frequência, independentemente dos valores absolutos de altura
e frequência, ou seja, independentemente da sua localização no registro
do —
Y
das alturas.
o
q
8
A oitava corresponde sempre a / x 2 (onde f = frequência), ou sim-
Frequência (Hz) plesmente 2 Usando-se potências, pode-se dizer que 2 = 2! que 2x 2 =
2%; que 2x 2x2 = 2º etc. Dessa forma, cada acréscimo linear no número
[Cf. Campbell & Greated, “3. Anatomy of a Musical Note”, p. 75.] O OUP
de oitavas corresponde ao dobro da potência de 2 em termos da razão do
intervalo resultante. A potência de 2 correspondente a um certo número é
vibrações por segundo dos respectivos componentes do intervalo. Ou seja, chamada de logaritmo (na base 2) desse número. Por exemplo, 8 = 2x 2
quando adicionamos dois intervalos, precisamos multiplicar suas razões x2=2º, portanto, 3 é o logaritmo (de base 2) de 8, e tal relação pode ser
de frequência. descrita como: log (6). A partir da tabela do Exemplo 56, observa-se que a
Assim sendo, o intervalo de oitava entre, por exemplo, 50 Hz e 100 Hz é dimensão de um intervalo é proporcional não à razão de frequência (/,/f),
musicalmente o mesmo do intervalo entre 500 Hz e 1000 Hz, pois sua razão mas sim ao logaritmo da razão de suas frequências:
é idêntica (2:17), mas a diferença em frequência entre ambos os componentes
Exemplo 56
do intervalo em ambas as regiões das alturas é gritante: no intervalo mais
grave, a diferença é de apenas 50 Hz, enquanto que no intervalo mais agudo Razão de frequência de múltiplos intervalos de oitava
tal diferença é de 500 Hz (ou seja, dez vezes mais que o intervalo mais
grave). Em suma: quanto mais agudo se situar um determinado intervalo Intervalo musical Razão entre as frequências Potência de 2
musical no registro das alturas, tanto maior será a diferença em Hz entre HS, correspondente a /,f,
as duas notas que o compõem, e vice-versa. = log)
Visto sob um ângulo diverso, o problema revela outra característica 1 oitava 2 l
fundamental dessa relação: uma mesma diferença em frequência entre duas
2 oitavas 4 2
notas numa determinada região das alturas corresponderá a um intervalo
bem maior em uma região mais grave e a um outro bem menor em uma 3 oitavas 8 3
região mais aguda. Ilustremos esse fato: a diferença de cerca de 262 Hz 4 oitavas 16 4
entre oC, (de 261,62 Hz) e oC, (de 523,25 Hz), que nessa região constitui
F FB
F, F,
Deslocamento
E, E,
rm
3
D; D; 120
40 80 120 40 80
(a) (b)
Tempo .
[Cf. Campbell & Greated, “3, Anatomy of a Musical Note”, p. 74.] O OUP 1
G, G, +————
praticidade, no entanto, assume-se que uma frequência fixa corresponde
F F 4
sempre a uma altura definida e praticamente invariável.
Como quer que seja, a percepção subjetiva da altura de um som de E, F, +
frequência fixa depende, em certa medida, diretamente de sua amplitude,
E, E, 4
independentemente da variabilidade efetiva do sinal acústico. A magnitude
D! D$ Lo
e até mesmo a direção desse efeito (se o som varia em direção ao grave ay 80 120
40 80 120
ou ao agudo) podem variar de pessoa para pessoa. Se um grupo de pes-
soas, dotadas de condições normais e iguais de escuta, ouve um som puro
de frequência de 440 Hz, certas pessoas irão escutar a frequência desse É ppp = fff 7 ppp me gy
som subir quando sua intensidade aumentar, enquanto que outras irão
(e) (d)
sentir que a mesma frequência decai, Varia muito de pessoa para pessoa o
(CD 35)
quanto a percepção da altura depende da amplitude, mas em geral tem-se [Cf Campbell & Greated, “3. Anatomy of a Musical Note”, p. 80.) O OUP
a seguinte constatação: a altura de um som de baixa frequência (a altura
de um som grave) parece cair ainda mais quando sua amplitude aumenta; lidade frequencial, como é o caso do som do oboé, cuja estabilidade na
alturas por volta do €, (4 186 Hz) parecem ser as que mais independem de emissão faz que se torne a referência para a afinação orquestral antes de
variações em amplitude, e somente acima do G, de quase 6272 Hz — ou um concerto sinfônico. Em se tratando, portanto, de sons não-senoidais de
seja, em uma região já bem aguda — a altura parece subir ainda mais com altura definida (sons tônicos ou compostos), a variação de amplitude não
o aumento de amplitude. chega, em geral, a alterar a percepção da altura. Nos contextos musicais,
Essa variação na percepção da altura conforme a variação de amplitude nos quais predominam os sons tônicos, a dependência da percepção da
está, todavia, intimamente ligada à escuta do som senoidal. Quanto mais altura em relação à variação das amplitudes é praticamente nula, fato que
elementos espectrais contiver o som tônico, tanto maior será sua estabi- possibilitou uma estruturação cada vez mais independente das intensida-
C;
0 5 10 15 20 25 30 35
Extensão de banda crítica (semitons)
[Cf. Campbell & Greated, “3, Anatomy ofa Musical Note”, p. 83.] O OUP p. 84.] O OUP
(Cf. Campbell & Greated, “3. Anatomy of a Musical Note”,
Cada par de harmônicos gera o som diferencial simples C,, (a) (b)
Série harmônica de Série harmônica de
correspondente à frequência da fundamental do Exemplo 64a uma fundamental uma fundamental
harmônicos a 200 Hz a 220 Bz Altura
2 3 3 4 4 5 5 6
7 F6
D
8 6 6
5 Bs
som diferencial
[Cf. Campbell & Greated, “3. Anatomy of a Musical Note”, p. 86.] O OUP
4 Gs
Es
Importantes experimentos foram realizados a partir da década de
3
1950 (mais precisamente a partir de 1956, pelo físico acústico De Boer,
|
reproduzidos por Campbell & Greated) acerca da percepção das altu- ! .
ras: executando a diversas pessoas um espectro cuja diferença entre os A3
harmônicos adjacentes era de 200 Hz, na ordem 600, 800, 1000, 1200 e
1400 Hz, todas essas pessoas ouviram como fundamental, como era de F3
esperar, o som de 200 Hz. Elevando aritmeticamente essas frequências [C£. Campbell & Greated, “3. Anatomy of a Musical Note”, p. 87,] O OUP (CD 38)
em 80 Hz — resultando, portanto, na ordem: 680, 880, 1080, 1280 e 1480
Hz, e conservando-se, assim, a diferença de 200 Hz entre os parciais —, os
A essa teoria — ainda não universalmente aceita, porém de lógica incon-
ouvintes continuavam a ouvir o conjunto do espectro como sendo um som
testável —, segundo a qual nossa percepção daquilo que podemos designar
de altura definida, muito embora os parciais já não pertencessem a uma
por tonicidade ou taxa de harmonicidade de um som (a qualidade de seu
séric harmônica (na razão de números inteiros), uma vez que nenhuma
“timbre harmônico”, nos termos de Pierre Schaeffer) guia-se pela relação do
fundamental poderia gerar esses harmônicos com tal diferença frequencial
que ouvimos com um modelo harmônico prefixado em nossa mente, dá-se
entre cles. A sensação relativa à percepção de uma fundamental foi con-
o nome de teoria da reconhecibilidade da altura por modelo harmônico.
servada, pois, devido à regularidade da diferença em frequência entre os
O experimento relatado acima, somado a outros de importantes físicos
parciais adjacentes assim como à proximidade a um modelo harmônico,
acústicos, comprovou que:
neste caso o de uma fundamental de 200 Hz. Em consequência da elevação
aritmética, por igual, de todas as frequências dos parciais, a maioria dos 1) embora desempenhem importante papel, os sons diferenciais (resultan-
ouvintes elevou, porém, o som percebido da fundamental subjetiva para tes da diferença entre os parciais adjacentes) não constituem a causa
Han
de distinguir 1/29 de tom, na região de A, mal chegamos a distinguir uma Cr
segunda menor! Assim sendo, embora a habilidade do ouvido na discrimi- Co
nação de frequências para sons puros permaneça, grosso modo, constante
l 200
em regiões graves, a discriminação da altura (do intervalo) deteriora-se
Mudança minima detectável em altura (cents)
drasticamente em relação aos sons graves.
A maior sensibilidade para pequenas alterações de altura situa-se entre [C£. Campbell & Greated, “3. Anatomy of a Musica! Note”, p. 95. Baseado em Nelson (a) e
Zwicker (b) e (c).] O OUP
C,e C, em que a média de discriminação das alturas é de 6 ou 7 cents.
Ou seja: se entre C, e Cjexistirem 16 intervalos iguais, o ouvido poderá
distinguir cada uma dessas notas, o que de modo algum ocorre para notas 2000 Hz com o desvio igualmente necessário para a região grave de 100
mais graves que o €, (abaixo da clave de Fá). Hz, percebemos que no âmbito da frequência grave será preciso um desvio
No mais, o poder de discriminação da altura é menor para sons de inten- de 3%, enquanto que no âmbito da frequência aguda, somente de 0,5%.
sidade fraca, e tanto mudanças abruptas em intensidade quanto amplitudes Exemplo 72
fortes e estáveis propiciam uma mais clara distinção do ouvido com relação
a pequenos desvios ds frequência das notas, como bem ilustra o Exemplo Quadro ilustrativo do poder de discriminação de variações das
71 (o qual nos remete ao Exemplo 47c). alturas para a escuta de dois sons senoidais justapostos
z
O Exemplo 71 pode ser reelaborado não mais em termos de cents, mas Fiz
Z
304
diferença, nesse contexto, é que somente as pessoas que possuem ouvido do Exemplo 74
absoluto podem tomar consciência dessa mutação. : Distintas formas de notação das alturas
Hilb
Hit
Uma possivel explicação sobre o deslocamento da escala interna de uma altura Dl
absoluta com a idade: o pico gerado na membrana por uma frequência de 262 Hz
é paulatinamente deslocado em direção à janela oval (ainda que o feixe de
fibras nervosas relacionado à tal vibração permaneça inalterado)
Velhice «qm Juventude
Janela «+ -» Helicotrema
[Cf. Campbell & Greated, “3. Anatomy of a Musical Note”, p. 99.]O OUP Ao (teclas) C, Ci Co Cs Cs Co Css Css
rm 1 2 3 4
No domínio das alturas definidas, uma última observação faz-se neces- é (grafia (ou e”)
sária: a variabilidade com a qual grafias distintas procuram descrevê-las : alemã)
nos diferentes registros. Ainda que tenhamos optado pela grafia standard oitava -3 -2 -1 0 l 2 3 4
das alturas, proposta em 1939 por Young e adotada pelo USA Standards 5 standard ,
Institute em 1960, para a qual o Lá 440 Hz (o Lá do diapasão) é 0 4, do MIDI co ci c2 c3 c4 | Cs C6 | €7
existem formas distintas de grafar as notas musicais, como, por exemplo, standard
a notação proposta por Helmholtz, na qual o mesmo Lá é grafado como : notas 24 36 48 60 72 84 96 108
sendo a”. MIDI
Até hoje a grafia de Helmholtz é empregada sistematicamente na Ale-
manha, país no qual a musicologia é uma das mais evoluídas do planeta.
Por tal razão, será interessante termos em mente as distintas formas de
até então discutidos pela acústica e pela própria música eletroacústica,
notação das alturas, elucidadas no Exemplo 74.
antecipando até mesmo aspectos relacionados à noção de timbre.
A resposta à questão acima formulada é, mesmo que possa parecer
3.2.13. Localização frequencial das misturas e dos ruídos: massa, perfis,
modulação de timbre e outros conceitos relacionados às alturas surpreendente para muitos, inequívoca: a percepção das alturas não é, de
forma alguma, exclusiva dos sons periódicos. Com exceção, obviamen-
Por fim, colocamos a questão: a percepção das alturas é exclusiva aos te, do ruído branco — e de sua variação com relação às amplitudes, tal
sons periódicos (senoidais ou tônicos)? Seriam os ruídos suscetíveis a uma como ocorre com o ruído rosa —, que cobre todo o campo de audibilidade
análise pelo prisma das alturas? Aqui adentramo-nos num dos tópicos mais frequencial humano e portanto toda a tessitura perceptível, os demais
interessantes e ao mesmo tempo mais dificeis de nossa abordagem, na qual ruídos e os sons complexos podem ser e são, de fato, percebidos também
operamos uma substancial mudança nos conceitos pela forma como foram com uma determinada localização no campo das alturas.
Massa Complexo-Variável
* análise da amplitude de um som senoidal de frequência fixa; Se o timpano possui uma área 4, a força aí exercida (p) será determi-
* análise da amplitude de um som senoidal variável em frequência; nada pela relação:
. análise da alteração da amplitude de um som senoidal pela presença de
um outro som senoidal; F=pA
* análise da amplitude cm contextos (musicais) mais complexos.
Assim sendo, a razão na qual a energia é transferida ao timpano será
3.3.1. Pressão e energia das ondas sonoras determinada pela equação:
E SONS 139
A Acústica MUSICAL EM PALAVRAS
138 FLo MENEZES
icas (como veremos, variações
sidade musical (7), e assim por diante. Através de experimentos, enquetes e variações relativamente pequenas entre as dinâm
amente pelo ouvido, e variações
balanços dos resultados, chegou-se à tabela abaixo (Exemplo 77), na qual de, em média, 1,5 decibel são percebidas nitid
ser captadas pela audição),
relacionam-se as dinâmicas mais comuns da prática musical comument ainda menores (na ordem de 0,2 a 0,4 dB) podem
dessas variações enquanto
associadas ao volume do som, com suas medições em Watt por metro na. dificilmente teremos consciência de cada uma
de Schaef fer), hierárquicas, se
drado, ena qual estabelecem-se correlações (na última coluna da direita) unidades cardinais (para usarmos um termo
compl exo. Se nossa percepção das
entre tais medidas eo nível de intensidade (em que 100 é considerad articuladas num contexto musical mais
za, grosso modo, em 7 oitava s, e Se OS
valor máximo, correspondente à dinâmica musical ff). o notas da tessitura orquestral se organi
-se igualmente em 7 “oitavas”,
níveis dinâmicos usados na música estruturam
Exemplo 77 s em alturas é bem maior do
nossa capacidade de discernimento de desvio
Correlações entre níveis dinâmicos musicais (volumes)
cia nominal (em Watts) entre
Watts (Wm?) e decibéis (dB) que no campo das dinâmicas, ainda que a distân
maior que a distância entre as
Nível dinâmico musical Intensidade (Wm?) Decibéis os valores das intensidades seja muitissimo
das alturas (CD 45).
DA 10º 100 frequências que separam as oitavas no âmbito
cas musicais mais correntes, as
tr 10º 90 De toda forma, constata-se que, nas práti
a 30 decibéis. É interessante,
y 104 80 dinâmicas cobrem um âmbito que vai de 100
em vista as diversas ambiências acús-
mf 105 70 nesse contexto, observarmos, tendo
ouvid o em situações diversas de nossas
mp 10% 60 ticas às quais submetemos nosso
os em relação à escala de dB
p 10º so
vidas, a medição de alguns fenômenos sonor
pp 108 40
e à potência em Watts:
ppp 10º 30
Exemplo 78
[Cf Campbell & Greated, “3. Anatomy of a Musical Note”, p. 107.] O OUP
Wim”
Alguns eventos sonoros medidos em dB e em
. No Exemplo 77, à intensidade em termos de Watts é expressa em po-
Nível sonoro I Reação
tência negativa, sendo que, por exemplo, tem-se: Fonte sonora
(dB) (Wim?)
10º = 1/10º= 1/1000 = 0,001 150 10º Insuportável
Jato a 10 m de distância
140
ms o oro (ppp) possui uma intensidade de apenas 10º
130
» OU seja: 0, 000001 Wim”. Para um som ff, a intensidade será, pois 1 Doloroso
10 milhões de vezes maior que para um som ppp! Pes Partida de um jato a 500 m de distância 120
Show de rock HO
Apesar de toda essa diferença nominal entre os dois níveis dinâmicos, o
Casa de máquinas 100
ouvido humano conglomera todas as impressões diferenciadas em intensi-
dade em mais ou menos 8 níveis de volume, em que cada passagem de nível 90 101
Metrô
equivale, de forma analógica às percepções dos intervalos, a 7 “oitavas” ou Fábrica 80
70 Musicalmente
'oitavações”. O paralelo com a dimensão das alturas esclarece no entant Trânsito
as especificidades de cada atributo sonoro: os graus distintos devem nas 60 105 utilizável
Conversa baixinha
intensidades, ser multiplicados pelo fator 10, assim como as oitavas | ara Interior silencioso de um carro 50
as frequências, eram multiplicadas pelo fator 2. Dessa forma, o célcul Biblioteca
40
logarítmico auxilia muito também na avaliação dos níveis dinâmicos : 30 10º
Sala de concerto vazia
Ainda que sejamos capazes de perceber mudanças sutis de intensidades 20
Cochicho a 1 m de distância
e apesar de nosso mecanismo fisiológico ser extremamente sofisticado, rea- 10
Queda de uma agulha
gindo a nfimas variações de pressão das ondas sonoras, nossa ca acidad 0 102 Inaudível
de reflexão, intelecção e discernimento consciente é muito mais licaitadano
[C£. Hall]
campo dinâmico que no campo frequencial. Por mais que possamos distinguir
I,
10 log,(1)
-— =10 2
L
A oitava” das intensidades organiza-se, como vimos, A razão de intensidade correspondente a um grau na escala dinâmica
pelo fator 10 (ao
contrário das alturas, que se organizam pelo fator 2). musical é de aproximadamente 10 dB, considerando-se um som senoidal
Considerando-se 10
como 10 e relembrando que o logaritmo na base standard de 1000 Hz. Se um som contiver então 10 vezes mais energia
10 (/0g,) de um número
a potência de 10 que corresponde âquele número, que um outro, diz-se que o nível de intensidade desse som é 1 bel ou 10
temos que:
dB maior que o nível de intensidade do outro. Assim sendo, se a relação
log, (1 = 1
entre as duas intensidades for de 10, a diferença entre ambos os sons será
de 10 dB, mas se a relação entre ambas as intensidades for igual a 1, ou
L
seja, se ambos os sons tiverem intensidades idênticas, não haverá diferença
Se o som de intensidade / | Situa- se, em graus em decibéis, ou seja, a diferença entre os dois será de O dB. Dessa forma,
dinâmicos, dois graus
acima do som de intensidade L, temo s então: verifica-se que uma curva não-linear se estabelece, em que 1 = 0 ao mesmo
é
tempo em que 70 = 170.
I A que corresponde então, mais exatamente, um único decibel? Qual será
Am
L 10
a relação de intensidade entre dois sons que seja correspondente, portan-
to, a 1 dB? Se multiplicarmos 10 vezes o número 1 por 1,26, chegaremos
e, consequentemente: ao valor 10,08568618887, muito próximo (ainda que jamais idêntico) ao
valor 10. Consequentemente, tem-se que a relação entre duas intensidades
logo (1) na proporção de /,26 (ou, de forma arredondada, na razão de 1,3) equivale,
L 2 aproximadamente, a 1 dB, resultando a tabela do Exemplo 79, na página
seguinte, de correspondências entre a relação de intensidades entre dois
Assim sendo, o número de graus dinâmicos entre dois sons e o nível respectivo de volume em decibéis.
sons é no mínimo
quase igual ao logaritmo (na base 10) da razão de intens Por conseguinte, para se dobrar, a nível da percepção, a intensidade
idade entre ambos.
Se de um instrumento, deve-se acoplar em unissono outros 10 instrumentos, e
para dobrar em intensidade esses 10 instrumentos, necessita-se ao todo de
100 instrumentos! Notamos, no mais, que uma relação entre duas intensi-
log, (1) dades distintas, na qual um som tem o dobro nominal de energia sonora
Ll=]
que o outro, corresponde a uma diferença de somente 3 dB. Isto significa
L
que a “oitava” das intensidades — se levarmos em conta rigorosamente a re-
lação 2.:1 que caracteriza a relação oitavante em frequências — seria sempre
diz-se que a razão de intensidade| é de um b el (unida
i de assimi denominada
i a de 3 dB. Mas como as intensidades são percebidas logaritmicamente por
partir de Alexander Graham Bell (1847-1922), invent
or do telefone). O bel é nosso ouvido a partir de uma relação que se dá pelo fator 10, e não (como
efinido, pois, como a relação de 10 para 1 entre duas
intensidades distintas. no caso das alturas) pelo fator 2, deduzimos que um som que contenha o
Qua
Distância R da fonte (m)
[Cf Campbell & Greated, “3, Anatomy of a Musical Note”, p. 106.] O OUP
NPS = 10 logoltir) =20 108; (f, Estamos defronte de um fenômeno que pode ser designado por limiar
0
de audibilidade em intensidade, e que pode ser definido como sendo o mais
baixo nível de intensidade na escuta de um som senoidal para um ouvinte
com p,=2x 10º Pa
de acurado ouvido, Na medida em que esse ouvinte não pode escutar um
som senoidal bem grave, que se situe na Oitava 0, a um nível de amplitude
3.3.9. A relação entre volume e frequência: o limiar de audibilidade em de 60 dB, tem-se que, nessa região, necessita-se de, em média, mais de
intensidade 70 dB de amplitude para que o som seja minimamente percebido. Essas
variações em amplitude de acordo com a região do som senoidal para que
Um som senoidal de frequência variável e amplitude idêntica (estável) ele seja minimamente percebido ocasionaram a medição e o consequente
será percebido como possuindo intensidades distintas conforme a região das estabelecimento de um limiar de audibilidade em intensidade em todas
alturas em que se encontre. Se percorrermos boa parte do âmbito de audibi- as regiões de frequência, gerando o quadro seguinte, no qual se tem um
lidade frequencial humano com um som senoidal, mantendo sua amplitude contorno de percepção igualitária de volume (Exemplo 83).
EGGGG fx
audição —, poder-se-ia definir o verdadeiro limiar de audibilidade como
sendo determinado pelo ponto em que os sons mais tênues são encobertos
30 40 Eu 0 7 80 90 100 110 120 fons 1000 Frequência
por esse ruído térmico constante.
Y
to df / 7 No mais, o quadro do limiar de audibilidade em intensidade tem como
, À PPP pp p mp mf f ff frF 500 Hz
(Hz)
base um ouvinte de ouvido excepcional, cuja média é uma dentre 100 pes-
4 - 200 soas. Assim sendo, o quadro deve ser, em geral, acrescido de um valor entre
- 100 30 dB e 40 dB para que se tenha uma ideia do comportamento do ouvido
é o S - SO médio humano em resposta às intensidades.
SS 20 Por fim, a observação do quadro explicita o porquê da importância da
O 20 40 60 80 100 120 140 região dominante na percepção dos espectros compostos dos sons tônicos.
Nível de intensidade (dB)
Ainda que as frequências bem graves sejam mal percebidas, o ouvido conta
[Cf. Campbell & Greated, “3, Anatomy of a Musical Note”, p. 112. Baseado em Robinson, com a presença dos demais parciais que compõem o espectro harmônico,
Dadson e Fletcher.) O OUP privilegiando a escuta daqueles harmônicos que se situam na região do-
minante, para os quais uma menor amplitude será necessária a fim de que
A curva do limiar de audibilidade mostra que nosso ouvido é mais sensível
sejam minimamente percebidos.
em intensidades com, sons senoidais de frequências em tono do C,, quase
duas oitavas acima da frequência-standard de 1000 Hz. Em vários experi- 3.3.10, Contorno igualitário de volume: fon
mentos, chegou-se à conclusão de que existe uma alta sensibilidade em torno
de 3000 Hz, fenômeno este que se deve ao fato de o canal auditivo possuir aí Observando ainda o Exemplo 83, se, ao invés de mantermos o nível de
uma ressonância privilegiada, formando inclusive ondas estacionárias nessa intensidade constante (e variarmos somente a frequência), variarmos agora
região de frequência. Aliás, entre C, (2093 Hz) e E, (5274,04 Hz) o limiar de a própria intensidade, ajustando-a a cada variação de frequência a fim de
audibilidade situa-se aquém de O dB, sendo ainda menor que a intensidade termos a cada diferente frequência a mesma sensação de volume (de dinã-
mínima padrão 1, = 10? Wm?, Mesmo sons senoidais com intensidade média, mica musical), obtemos a escala em fons. Por definição, o fon representa a
nessa região bem aguda, já são capazes de causar sensação de dor em nosso unidade de medida do nível de audibilidade de um som que, num teste de
ouvido. De um modo geral, a maior sensibilidade se dá entre 250 e 3000 audição realizado em condições idênticas, é tão audível quanto outro som,
Hz, sendo que na frequência-standard de 1000 Hz o limiar é de apenas 4 dB, tendo-se como referência um som de 1 000 Hz com intensidade sonora igual
portanto pouco mais que o dobro da intensidade mínima padrão para que o a um decibel. O fon 6, pois, a unidade do nível de volume ou nível sonoro:
som seja percebido. Em contrapartida, a sensibilidade do ouvido cai drasti- dizemos que um som senoidal tem um nível sonoro de 60 fons se ele soa
camente nas frequências graves (abaixo de 60 Hz), sendo que a cerca de 25 igual a um som de 60 dB na frequência-padrão de 1000 Hz.
Hz precisamos de 60 dB a mais que a 1 000 Hz para que se perceba um som Essa variação necessária na intensidade conforme a variação de fre-
senoidal. Notemos, por fim, que acima de 4000 Hz o limiar de audibilidade quência para que se perceba uma constância no volume dos sons resulta
em intensidade também cai consideravelmente, e perdemos a capacidade de nas linhas em fons do Exemplo 83, em que cada linha corresponde a uma
escuta dos sons em registro extremamente agudo (acima de 10 kHz). dinâmica musical corrente. Trata-se aqui das chamadas curvas isofônicas
E necessário pontuar que este quadro foi construído sem nenhuma in- ou curvas de Fletcher-Munson. Se iniciarmos com um som de 1000 Hz
terferência de ruídos ambientais. Esses ruídos do meio ambiente elevam os num nível de intensidade a 60 dB, ao abaixarmos progressivamente a fre-
limiares mínimos de audibilidade em intensidade (fenômeno ilustrado pela quência do som, precisaremos, ao início, reduzir o nível de intensidade e,
Uma curiosa propriedade da audição pode ser observada a partir do [CE Campbell & Greated, “3, Anatomy of a Musical Note”, p. 114.] O OUP
Exemplo 83: enquanto que o limite minimo de audibilidade para as intensi-
dades é 60 dB maior pata o G, em comparação como €,, o contorno ou curva A diminuição ou contração do âmbito dinâmico total em baixas fre-
igualitária de volume (curva isofônica) que tem como parâmetro 100 fons quências, apontando para uma maior sensibilidade dos sons de baixa
para se atingir uma dinâmica 7 será acrescida de apenas 22 dB entre ambas frequência nas variações dinâmicas, deve ser levada em consideração na
essas frequências. Das intensidades mais brandas às mais fortes, as curvas amplificação eletrônica dos sons: um amplificador que responde da mesma
em fons se achatam. Em outras palavras, apesar de uma frequência grave forma, com a mesma intensidade, em todas as frequências (portanto com
necessitar relativamente de uma forte intensidade (amplitude) para que seja resposta plana), não se dando conta de tais desigualdades, fará que as fre-
minimamente percebida, uma mudança relativamente pequena em seu volume quências graves sejam, em geral, percebidas como mais fortes que as agudas
(em seu nível de intensidade) já faz com que ela percorra os sete estágios quando se aumenta o volume geral da amplificação, da mesma forma que
dinâmicos musicais, do ppp ao fj. Em suma, para começar a ser percebido, uma redução desse volume fará que as baixas frequências diminuam, no
um som grave necessita de mais decibéis que sons médios ou agudos, porém, nível de nossa percepção, mais rapidamente do que as altas frequências.
uma vez percebidos, será necessária uma variação bem menor em decibéis (Este fato é também responsável pela incrementação desvairada de potentes
para que se altere consideravelmente sua sensação de intensidade. sub-woofers nos alto-falantes dos automóveis nos últimos anos, em atitude
O Exemplo 84 (página seguinte) mostra o seguinte: um som senoidal na mais preocupada com quem ouve os sons emitidos pelo carro de fora do
altura do €, necessita de um âmbito total de 70 dB em nível de intensidade para veículo do que com quem os ouve de dentro — atitude, aliás, condizente, na
que cubra os sete estágios da dinâmica musical, do ppp ao fj. Para frequências esmagadora maioria dos casos, com a mentalidade do motorista proprie-
mais agudas, uma quantidade um pouco menor será necessária para este âmbito tário do automóvel... Em suma, até mesmo a maior estupidez pode ser em
total (65 dB para o G,). Verifica-se, porém, que um âmbito bem mais restrito parte compreendida pelo prisma dos fenômenos acústicos.)
se dá nas regiões graves: para o C,, por exemplo, apenas 49 dB de variação em Este fenômeno terá consequências também na execução musical ao ar
amplitude são necessários para se ir do ppp ao 7. Ou seja, a média de variação livre, Já que, em tais circunstâncias, cada dobro de distância percorrida pelos
para cada grau dinâmico, que é de cerca de 10 dB para a região do C,, é reduzida sons ocasiona um decréscimo geral de 6 dB, quanto maior a distância do
8 mf
O contorno igualitário de volume em fons não é a única forma de medição 16 f 16
subjetiva das intensidades. Um outro escalonamento subjetivo foi estabelecido, 32 HF 2
segundo o qual pediu-se às pessoas para que elas ajustassem a intensidade de 64 ir
uim som senoidal, de altura constante, a fim de que este lhes parecesse “soar
a metade em intensidade”. Em média, tem-se como resultado deste teste que
um som senoidal é sentido como tendo “meia intensidade” de sua intensidade
80
inicial quando seu nível de volume cai em 10 fons.
A partir daí, S. S. Stevens estabeleceu, em 1936, uma nova unidade de
medida, qual seja: o sone. Por definição, o sone é, arbitrariamente, a unidade
60
de volume de um som senoidal de 40 fons. Uma intensidade de 2 sones
Volume (sones)
é, por definição, duas vezes mais forte que a de 1 sone, correspondendo
consequentemente a um nível de intensidade de 50 fons; uma intensidade
de 4 sones é o dobro de uma de 2 sones, correspondendo a 60 fons; e assim
por diante. É [
O Exemplo 85, na página seguinte, correlaciona, acima, os valores em
Ay
sones com as dinâmicas musicais e, abaixo, os valores em sones e em fons.
Verificamos, portanto, que gradações idênticas na escala em sones não
correspondem a gradações idênticas das dinâmicas musicais: a diferença
/
|
entre pp e p é de 1 sone, enquanto que, entre fe ff, tal diferença é de 16 0 40 80 120
sones. Isto nos diz, a rigor, que volume e nível de dinâmica musical são Nível de volume (fons)
duas coisas distintas, apesar de correlatas e estreitamente ligadas. Mas se
[Cf, Campbell & Greated, “3. Anatomy of a Musical Note”, p. 116.] O OUP
pelo prisma da medição em sones a discrepância entre uma e outra noção
nos parece gritante, é preciso reconhecer que nenhum músico admitirá que
entre a dinâmica fe a ff existiriam 16 possíveis gradações de intensidade propriamente dita. Constituiu-se, assim, uma escala com a unidade mel
percebidas pelo ouvido. Daí resulta que a escala em fons demonstra-se bem (Exemplo 86, na página seguinte).
mais útil musicalmente que a escala em sones. A escala em mel tem tão pouca significação musical quanto a escala
A título de curiosidade, devemos citar aqui a construção, pelo mesmo em sone. Como quer que seja, mesmo os músicos admitem em geral que
princípio, de uma escala para a medição em frequências, perguntando-se às duas notas que compõem uma oitava na região grave parecem estar mais
pessoas qual seria a frequência que corresponderia à sensação de “metade” próximas uma da outra do que duas outras que compõem uma oitava numa
de uma outra frequência, ou seja, qual a frequência que soaria como sendo região aguda. É como se, de fato, existisse um “calibre” diverso de um
metade de uma outra, independentemente da avaliação musical intervalar mesmo intervalo, dependendo do registro das alturas no qual se encontre.
Tabela comparativa entre mels e notas musicais Envelope de amplitude na membrana basilar correspondendo à frequência de: (a) um
som fraco de 1000 Hz; (b) um som forte de 1000 Hz; (c) um som forte de
“Altura” em mels Altura musical (nota) Tamanho da oitava (mels)
1000 Hz + um som fraco de 2000 Hz; (d) um som forte de
3000 C, 1000 Hz + um som fraco de 500 Hz
1950 Cc, 1050
Q P R
1050 Cc, 200
(a) | | |
460 c, 590
| | (
195 Cc, 265 LA |
92 c 103 I I T
(b) | l
|
3
[Cf. Campbell & Greated, “3. Anatomy of a Musical Note”, p. 117.] O OUP |
| |
A relação entre sones e fons foi incorporada pelas medições internacio- |
nais padronizadas em 1959, apesar de, em 1977, R. M. Warren ter sugerido
|
(e) | |
que o dobro de intensidade percebida equivaleria não exatamente a 10 fons, | |
mas sim a apenas 6 fons. | |
| t
3.3.13. Mascaramento
PEDRA
informação diz respeito a um outro som, autônomo do som de amplitude
mais pronunciada. Não se dá, nesse caso, mascaramento.
Reobservando os Exemplos 41 e 42, associados agora ao que acabamos
de verificar, chegamos a uma conclusão: uma vez que a curva de envelope
de um som na membrana basilar ocupa maior extensão à esquerda de seu
pico de amplitude do que à direita, quando então a curva se extingue de
modo mais rápido, quanto maior for o pico de amplitude, maior a área à
sua esquerda que será afetada na membrana, tornando-se o mascaramento
particularmente eficaz quando os sons ocupam a mesma banda crítica. Como
a área à esquerda do pico de amplitude, aproximando-se da janela oval, cor-
responde a sons mais agudos, a consequência é óbvia: um som forte tende 20 40 so 80
a mascarar sons mais fracos que sejam, igualmente, mais agudos que ele Limiar do nível de intensidade (dB)
próprio, afetando sons de frequências mais baixas somente se estas forem
[Cf Campbell & Greated, “3. Anatomy of a Musical Note”, p. 122. Baseado em Greenwood,
consideravelmente próximas dele e se sua amplitude for suficientemente Zwicker € Jaroszewski.] O OUP
forte para tanto (CD 49).
No mais, o mascaramento pode ocorrer não somente para sons simul- Quando dois sons forem distantes entre si por frequências menores que
tâneos, mas também quando tais sons ocorrem em sucessão cronológica, 50 Hz, medições dos limiares de mascaramento se complicam devido aos
uma vez que a fadiga ocasionada no mecanismo auditivo pela escuta de batimentos causados pela interação entre ambos os sons.
um som excessivamente forte pode prejudicar a percepção de um som mais Um efeito similar é causado pelos sons que correspondem às áreas
fraco que a ele se sucede. hachuradas no Exemplo 88: sons que seriam, em princípio, inaudíveis em
consequência do efeito de mascaramento são, contudo, detectáveis pela
3.3.13.1. Limiar de mascaramento percepção através da emergência de sons diferenciais cúbicos (resultantes,
Uma consequência evidente do mascaramento é o fato de que um som como sabemos, da relação entre f, e f, na razão: 2f, —f)).
senoidal forte eleva o limiar mínimo de audibilidade para sons mais agudos
3.3.13.2. Mascaramento parcial
e para sons imediatamente mais graves que ele. Se sozinhos tais sons são
claramente percebidos, seus limiares mínimos de audibilidade em intensi- Observando o Exemplo 88, notamos que um som de 1000 Hz a 80 dB
dade devem ser acrescidos de considerável valor dinâmico na presença de eleva o limiar mínimo de audibilidade de um som de 2000 Hz a 55 dB. Um
sons mais graves e mais fortes. A essa elevação em amplitude dos sinais som de 2000 Hz a apenas 50 dB será então totalmente imperceptível, mesmo
para que voltem a ser percebidos dá-se o nome de limiar de mascaramento. que ele seja plenamente percebido caso o som de 1000 Hz pare de soar.
Ainda que a curva do Exemplo 88 decorra de uma medição média da Se elevarmos a intensidade do som de 2000 Hz a valores acima de 55
audição humana e que seus valores possam variar substancialmente de dB, este som tornar-se-á claramente audível, porém a sensação percebida
pessoa para pessoa, percebemos, em geral, que um som puro de forte in- de sua intensidade será reduzida pela presença do som de 1000 Hz. Ou
tensidade mascara alturas mais agudas que ele mesmo de modo bem mais seja, nossa percepção reage diferentemente a um mesmo estímulo de 55
efetivo do que alturas abaixo dele. dB se este sinal acústico estiver acompanhado ou não de outro estímulo
100 4
804
40
20
T T T T T >>» 0 2 40 6 80 10
0 20 40 60 8o
Nível de intensidade (dB)
Nível de intensidade (dB)
[Cf. Campbell & Greated, “3, Anatomy of a Musical Note”, p. 124. Baseado em Chocholle e
[Cf Campbell & Greated, “3. Anatomy of a Musical Note”, p. 123. Baseado em Scharf,] O OUP Greenbaum.) O OUP
E Sons 1 ma
A Acústica MUSICAL EM PALAVRAS
170 ' FLo MENEZES
Exemplo 94 contrário da grande maioria dos livros de acústica, destinarmos todo um
Tustração do número máximo de minutos (num dia de trabalho de 8 horas) durante o capítulo à questão temporal. É como se o estudo da acústica tivesse sempre
qual a exposição a níveis de intensidade que excedem 90 dB é considerada tido que se voltar sobretudo a um “recorte” da instantancidade do som, em
como sendo ainda suportável pelo ouvido que todas as questões relativas ao desenvolvimento dinâmico dos espectros,
através de seus comportamentos e evoluções no tempo, não constituíssem
mais que concessões circunstanciais àquela abordagem que, esta sim, pre-
tendesse representar a essência acústica dos fenômenos sonoros.
É bem possível que justamente por tal viés é que o timbre não encon-
120
D) J1 2 3 4 , pô 6 7 8 Va 9 10 H 12
tas “anomalias” dos espectros que traduzem uma certa irredutibilidade
a b RI de a da percepção à medida física, ou seja, que implicam uma determinada
Ls
120
IL
R Ri
eme
Ê
“deformação perceptiva” da realidade acústica. Em suma, deformações
ou manipulações dos dados temporais dos espectros sonoros podem ser
(lá b) ou R definidas como anamorfoses do tempo.
A lei de percepção dos ataques para os sons contínuos, quando do afron- 3.4.4. Limiar temporal de discriminação dos eventos sonoros e
tamento do ouvido com ataques cuja duração não excede 10 ms, induz-nos espessura do presente
ao fato de que existe uma constante de tempo da escuta. Por tal conceito,
" entende-se a menor medida temporal aquém da qual todo e qualquer som Se existe uma duração aquém da qual todo ataque será percebido da
não-senoidal será invariavelmente percebido como um “estalido” muito mesma forma, existe igualmente uma medida de duração aquém da quai
breve, como um “impulso” de característica bem próxima ao ruído branco, o ouvido não é capaz de separar os objetos sonoros percebidos no tempo.
devido ao choque inicial da informação espectral com o próprio aparelho Trata-se de um limiar temporal de discriminação dos sons, aquém do qual
auditivo humano. Em se tratando da percepção de um som senoidal, o ou- os sons serão fundidos pela percepção como um único evento sonoro. Esta
vido necessitará de pelo menos 2 a 3 períodos de oscilação, se a frequência medida de tempo situa-se na ordem de cerca de 50 a 60 ms — ou seja, cerca
for menor que 50 Hz, para que haja qualquer sensação de som (CD 58). de 1/20”: uma duração cerca de 10 vezes mais longa do que a constante
Excetuando-se os sons senoidais, tem-se que, independentemente do de tempo do ouvido.
estímulo sonoro e de suas qualidades intrínsecas, a percepção se vê defronte Trata-se, pois, de um limite mínimo temporal da capacidade de nosso
de um estalido se considerarmos esta curtíssima medida de tempo. É como ouvido em separar os objetos sonoros percebidos no tempo. Se a distância
se este estalido muito breve estivesse presente em todo e qualquer som de temporal entre os objetos for de uma duração menor que a de cerca de 60 mas,
ataque pronunciado, mas fosse percebido enquanto tal somente nos casos o ouvido tenderá a uma acumulação dos objetos sonoros no tempo, fundin-
em que o ataque em si do som seja de curtíssima duração. Ou seja, necessa- do-os como um único som.
mento, ao mesmo tempo em que se levarão em conta as oscilações internas p. 143.) O OUP
[CF. Campbell & Greated, “3, Anatomy of a Musical Note”,
de um som tônico, responsáveis em grande parte por sua caracterização,
será igualmente considerada a permanência de tais variações na emissão
à microfonação
de sons distintos emitidos por esse mesmo agente instrumental em registros Observando o Exemplo 97, temos que, se variarmos
na captaç ão sonora ) ou ligeir amente à própria
diferentes, conferindo certa unidade (pela permanência estatística de fatores (localização do microfone
o entre as formas de
variáveis) aos sons distintos de tal ou qual instrumento. É somente por tal maneira de tocar, efetua-se substancial diferenciaçã
nto, necess ariame nte
prisma que sons em princípio tão distintos como o de uma nota grave e o onda de cada instrumento, sem que isso resulte, entreta
de uma nota aguda de um piano podem ser classificados como oriundos de ça percep tível do timbre de cada instru mento. Ainda que
numa mudan
as três emissõ es respectivas
um mesmo “timbre”, qual seja: o do piano. tanto no caso da viola quanto no do trombone
(
3.5.3. O espectro harmônico (e)
E SONS 203
A ACÚSTICA MUSICAL EM PALAVRAS
202 FLo MENEZES
os fenômenos podem incidir tanto no microfone quanto
3.5.4. Espectros harmônicos em salas reverberantes Se ambos
no ouvido, é necessário pontuarmos que existe aí uma diferença bastante
fenô-
No caso específico da captação via microfone — que simula, a seu pertinente entre ambas as formas de captação: ainda que o mesmo
dois
modo, a forma de captação sonora de nossos ouvidos —, o som que chega meno ocorra também com o ouvido humano, o cérebro conta com
tal motivo, um
ao microfone é sempre uma mistura de ondas diretas e ondas refletidas ouvidos contendo sinais, em geral, diferentes entre st. Por
nte alteração mais radical do timbre
Existem inúmeros caminhos pelos quais um som pode percorrer até atin- cancelamento de fase e uma conseque
via
gir um microfone em uma sala reverberante. Cada um desses caminhos resultante pode se dar de forma mais comum na forma de captação
microfone do que na mera escuta dos sons pelas vias de nossos órgãos
introduz um deslocamento de fase entre as ondas diretas e as refletidas no
s entre os
que tange aos componentes senoidais do espectro, deslocamento este que receptores, quais sejam: Os ouvidos. Assim é que diferença
são “acertada s”
dependerá do tamanho do caminho e do comprimento de onda do parcial espectros harmônicos de um ouvido em relação ao outro
decorren tes das proprie-
ou harmônico em questão. Ê e curiosamente interpretadas pelo cérebro como
é aconselhável,
Assim sendo, a amplitude de um parcial em particular, tal como medida dades da sala, não dos espectros em si. De toda forma,
ambientes,
pelo microfone ou percebida pelo ouvido, dependerá, portanto, de como para julgarmos a captação tímbrica dos sons em determinados
assim, ter uma melhor
exatamente as ondas refletidas serão somadas às diretas. Dessa interação mantermos a cabeça fixa, uma vez que poderemos,
, minimiz ando os eventuais efeitos dos des-
entre a “imagem” original e suas reflexões no ambiente é que resulta o caracterização dos espectros
timbre percebido do som em questão. locamentos de fase.
do espectro
E possível que, de acordo com uma determinada disposição da microfo- A melhor representação do timbre sob o ponto de vista
É a forma geral do
nação na sala, muitas dessas reflexões de um harmônico particular cheguem harmônico se dá pela média das informações recebidas.
é significa nte para o cére-
no microfone ou no ouvido em fase com o som proveniente da fonte sonora espectro, na média de sua captação variada, que
tanto (as amplitud es detalhada s
de forma direta, estabelecendo a chamada interferência construtiva de que já bro em sua detecção geral do timbre, e não
caso. Tal represen tação média
falamos, ocasionando um acréscimo de sua amplitude. Mas pode acontecer de harmônicos individuais em tal ou qual
partir da análise de vá-
também de chegarem em defasagem, ocasionando interferência destruliva constitui o envelope espectral (médio), elaborado a
Se desejarm os represent ar à importância
ou, no caso mais radical (em oposição de fase de 180º), cancelamento de rias “tomadas” de som distintas.
do som percebido , precisam os então conver-
fase, anulando por completo os parciais correspondentes. relativa de cada harmônico
de cada harmônic o num nível de volume/i ntensidade
ter cada amplitude
o será então descrito
Exemplo 100 correspondente (fons ou sones): o espectro harmônic
,
como espectro de intensidade dos harmônicos.
Diferentes cami i
aminhos percorridos pelo som, viai reflexão,
ã
o das escalas
para atingir um microfone ou o ouvido
3.5.5. Dimensões e representação do timbre; a questã
de timbre
ensionais do
Altura, intensidade e duração constituem atributos unidim
entamo s tais propri edades com número s precisos,
som: medimos e repres
os etc.). O timbre, ao
a partir de medidas correspondentes (Hz, dB, segund
1 contrário, demonstra-se como uma resultante
multidimensional, decorrente
da inter-relação dos demais atributos. Assim é que dois
sons podem se di-
de aspecto s.
ferenciar um do outro numa enorme variedade
o das línguas do ponto de
Num curioso paralelo com o funcionament
caracte rística s dos fonema s cons-
vista da fonologia, nas quais propriedades
pares de oposiç ão binária que resulta m no
tituem, segundo Roman Jakobson,
determ inada língua, O físico acústic o Bismar ck
[Cf. Campbell & Greated, “3. Anatomy of a Musical Note”, p. 146.) O OUP sistema fonológico de uma
possíve is pares de termos opostos que podem ser
coletou, em 1974, 69
da
da noção mais clássica de timbre, qual seja: aquela que concemne à mera
distinção sonora entre sons tônicos emitidos por instrumentos diversos. E,
por um
ibn rc
nesse sentido, podem ser divididas em duas espécies: Basta analisarmos os espectros de três notas distintas emitidas
exemplo , por um trombon e — para percebe rmos
mesmo instrumento — por
melodias de timbres estáticas, nas quais se tem a mesma altura “colo- de serem proveni entes de uma mesma fonte instru-
que tais sons, apesar
sad
são de forma alguma
rida” por instrumentos distintos na diacronia temporal, e que me levou mental e de possuírem aspectos bem semelhantes, não
como sendo
até mesmo a classificá-las como Klangfarbennoten (“notas timbradas”, idênticos. Ainda que os classifiquemos, todos os três sons,
mesmo timbre”), di-
como ocorre, por exemplo, no último compasso da Primeira Peça para provenientes de um mesmo “timbre” (como “tendo o
nos revela o Exemplo
Orquestra Op 10 de Webern, de 1913, no qual um F, é instrumentado de ferenças substanciais se fazem aí presentes. É o que
o envelop e espectra l (de que
quatro maneiras distintas (flauta; flauta e trompete com surdina; trompete 102, no qual se tem a constituição do chamad
(exemplo
com surdina; e celesta); ou ainda na própria peça Farben de Schoenberg, já tratamos anteriormente) para três notas distintas de trombone
inaugural do conceito, com o acorde que lhe é característico e que é mais uma vez emprestado de Campbell & Greated):
quase imutável do início ao fim, sendo instrumentado de modo variado
no decorrer da composição; Exemplo 102
melodias de timbres móveis, em que uma determinada linha melódica
Envelopes espectrais de três notas distintas de
sofre intervenção colorística de instrumentos diversos, como é tipica- trombone: (a) P,; (b) F;; (O) A,
mente o caso da famosa orquestração de 1935 de Weber do Ricercar
(DF,
da Oferenda Musical de Bach (CD 70).
seus espectros.
Percebe-se, então, uma clara proeminência em amplitude da região da Historicamente, a noção dos formantes, que nasceu justamente a
altura relativa à nota B, em todos os três espectros, independentemente de partir de uma análise acústica das vogais, foi primeiramente enunciada,
suas respectivas fundamentais e independentemente do fato de esta nota ainda que de forma inconsistente e sem o emprego desta terminologia, por
B, estar ou não presente enquanto parcial harmônico desses espectros Wheatstone em 1837, tendo sido posteriormente abordada por Helmholtz,
compostos. Aliás, nos três casos acima, será a frequência ou do C, ou do que definiu as vogais como sons produzidos pelas cordas vocais com uma
A, que será excitada, frequências vizinhas a B,. Ou seja, mesmo que a fun- câmara de ressonância, qual seja: a boca, órgão fonador (ressonador) que
- damental de cada um desses espectros difira totalmente uma da outra, há poderia alterá-las em duração, extensão e altura da ressonância, assim como
uma proeminência ressonântica nos três casos que coincide com a mesma realçar, em momentos distintos, diferentes parciais. Helmholtz chegou até
região de frequência (no caso específico do trombone, com a região do B,, mesmo a enunciar um quadro das ressonâncias vocálicas em seu tratado
portanto em torno de 494 Hz). é histórico, tendo citado Donders como tendo sido o primeiro a reconhecer 0
A tal fenômeno específico, ocorrente quando tratamos especificamente fato de que a cavidade oral, em suas diversas conformações, gera distintas
de sons tônicos, dá-se o nome de formante ou região formântica: uma região ressonâncias que caracterizam as vogais. Donders, segundo Helmholtz,
proeminente ou saliente de frequência (ou altura) na qual o envelope espec- teria realizado esta descoberta através do cochicho, o qual de fato se revela
tral parece possuir um pico de amplitude, e que é relativamente invariável, como sendo um recurso natural de “filtragem” das ressonâncias decorrentes
independendo da fundamental do espectro em questão. Um formante é, da fundamental da vogal entoada e sua série harmônica, em que apenas
portanto, uma ampla região de ressonância que realça os harmônicos que os formantes restam audíveis. Entretanto, foi Ludimar Hermann quem,
se encontram numa faixa fixa de frequências (CD 71). em 1889, denominou esse fenômeno de formantes (substantivo que, em
Formantes foram observados em espectros de muitos instrumentos, português, era originariamente feminino ou masculino, mas que se firmou
apesar de seu papel na caracterização de um instrumento em particular como masculino nos últimos tempos).
Frequência do formante 2 em Hz
(a) “ir” (b) tu”
2000
1800
1600
1400
1200
1000
900
Amplitude
[Cf Campbell & Greated, “3. Anatomy of a Musical Note”, p. 155.] O OUP
O Exemplo 105 expõe-nos, no mais, a relativa diferença entre as re-
giões formânticas para os homens, as mulheres e as crianças. Como se per-
É fundamental, aqui, a justa compreensão das regiões formânticas cebe, será sobretudo a relação entre as duas primeiras regiões formânticas
distintas das diferentes vogais. Ao observar o exemplo seguinte (Exemplo para cada uma das vogais, comparando cada vogal com as demais a partir de
105), percebe-se a compacidade da vogal /a/, ao mesmo tempo em que os um mesmo emissor (homem, mulher ou criança), que conferirá identidade
dois formantes principais (as duas primeiras regiões formânticas) de /i/ e de entre as vogais provenientes de sexos ou idades distintas, uma vez que,
fu/ encontram-se afastados um do outro (fato também claramente observável objetivamente, as qualidades ressonânticas, por exemplo, dos formantes do
no exemplo anterior). Diz-se, daí, que a vogal /a/ é uma vogal compacta, /a! masculino diferem substancialmente das relativas ao /a/ feminino ou ao
e que as vogais /i/ e /u/ são vogais difusas. Por outro lado, /i/ distingue-se fal infantil. Será, pois, a posição ou função da vogal no sistema vocálico
de /u/ por ser clara ou aberta, possuindo seu segundo formante em região relativo ao próprio emissor que possibilitará dizermos que um /a! emitido
bem aguda (acima de 2000 Hz), enquanto que a vogal /u/ é considerada por uma criança assemelha-se em essência a um /a! emitido por uma voz
uma vogal escura ou fechada, já que seu segundo formante situa-se entre grave masculina, entendendo ambas as vogais como sendo /a/.
ENSE
2500 / E CT» Carl Stumpf provou, em 1922, que as regiões formânticas, ainda que
relativamente fixas e independentes da mobilização das frequências das
2000 / / A respectivas fundamentais dos espectros, podem sofrer pequenas alterações,
F2 “As
2 mobilizando-se, de acordo com a alteração da fundamental, num âmbito es-
E
1500 á tatístico, no máximo, de terça menor— intervalo este fundamental na música
CAN
de Luciano Berio, o compositor, ao lado de Karlheinz Stockhausen, mais
Ped atento à voz e suas mais distintas manifestações no século XX, e certamente
autor da mais magnífica obra vocal da época atual, fato que me levou a
O
examinar, em meu doutorado sobre Berio (concluído há mais de dez anos),
as possíveis influências do fenômeno vocal inclusive em traços pertinentes
da escritura instrumental beriana, em que a voz se faz ausente, tais como a
O 200 400 600 800 1000 1200 1400 Hz mobilização relativa dos formantes a que acabamos de nos referir, ou ainda
Fi a oposição binária mais fundamental em todas as línguas do mundo, qual
[CE Winckel.] seja: a oposição entre som de altura definida (vogal) e ruído (consoante),
presente na escritura de Berio como sintomática oposição entre uníssonos
O problema da reconhecibilidade ou não das vogais no canto e no e aglomerados harmônicos imediatamente consecutivos. Trata-se de um
repertório histórico da música vocal passa irremediavelmente pelo pro- curioso exemplo de como um instigante fenômeno acústico pode exercer
biema dos formantes. Certamente o desconhecimento desta característica influência na poética de um grande criador.
acústica das vogais foi o grande fator responsável por inúmeras passagens Da verificação do quadro do Exemplo 106, deriva-se o chamado trián-
na história musical nas quais o ouvinte não pode absolutamente reconhe- gulo vocálico, esboçado inicialmente por Hellwag em cerca de 1781, opondo
cer o significado da palavra cantada (salvo quando conhece de antemão a vogal compacta /a/ às vogais difusas /i/ e /u/, ao mesmo tempo em que
o texto), pelo fato de que, em certas regiões agudas, as fundamentais das opõe a vogal clara (i/ à vogal escura /u/, O triângulo vocálico é essencial
notas cantadas ultrapassam ao menos a primeira região formântica daquela para a compreensão de todas as línguas do mundo, constituindo um dos
vogal empregada naquele contexto musical. Na prática, não se pode ou- universais linguísticos almejados pela fonologia estrutural, bem como da
vir com facilidade um /o/ numa região aguda de soprano coloratura, por aquisição da linguagem por parte das crianças (independentemente da lín-
exemplo. Como decorrência deste fato, a maioria das vogais enunciadas gua materna) e, inversamente, da perda gradual da capacidade de emissão
adquire, nessa região, uma sonoridade semelhante a um /i/, e a reconhe- vocálica por parte do doente afásico, como bem demonstrou o gênio de
cibilidade das palavras se deteriora, fazendo inclusive com que certos Roman Jakobson (1896-1982), talvez o maior linguista do século passado.
mestres não considerassem a inteligibilidade dos textos como algo assim Ao triângulo vocálico corresponde, no âmbito dos ruídos da fala, o
tão fundamental, como foi o caso tipicamente de Arnold Schoenberg, que, triângulo consonantal, no qual o fonema /k/, enquanto fonema oclusivo
em 1912 (por ocasião de sua genial invenção do Sprechgesang— canto linguopalatal compacto, está para a vogal /a/, assim como o fonema oclusivo
falado), declara ser o texto apenas “pre-texto” para as inflexões vocais, bilabial surdo escuro /p/ está para a vogal /u/, e o fonema oclusivo linguo-
Grande
emissão Trás
Frente Trás Frente
de energia
- — — — + 1 compacto
Quadrado vocálico de Stockhausen, estabelecido pela
primeira vez em Stimmung, de 1968
; Triângulo
Difusol p t í consonantal
TT" difuso O) 10
8 Do
s Layt
1 & 48) (8) Jy
É a partir dos formantes que se pode estabelecer toda uma “rede” de
6 16 16
conexões entre todos os fonemas vocálicos existentes, tal como o fizeram t
Exemplo HO
Espectro médio prolongado: (a) de um grupo de violinos de alta qualidade (curva Períodos Wi 24 344151 8/1 91 10]
617]
sólida); (b) de um grupo de violinos de qualidade inferior (curva pontilhada)
5000
2000 [Cf. Campbell & Greated, “3. Anatomy ofa Musical Note”, p. 158.] O OUP
1000º ÉS
s som sem qualquer transiente inicial só pode ser realizado mediante o uso
de procedimentos eletroacústicos. À irrupção repentina do som tanto na
o
50 &=
$
co
membrana do alto-falante quanto no aparelho auditivo humano ocasiona,
nesse caso, a desagradável sensação de um click inicial do som. Ao contrário
E
200
deste caso específico, a amplitude de um espectro instrumental, emitindo
um som tônico, cresce durante os primeiros ciclos, causando substancial
100
mutação na forma de onda resultante. Tal mutação decorre do fato de que
componentes distintos do espectro sonoro atuam de forma diferenciada no
o . 10 20 30
Nível de intensidade médio / banda critica (dB) ataque dos sons.
Helmholtz já havia realçado a importância dos ruídos parasitas ou
[Cf. Campbell & Greated, “3. Anatomy of a Musical Note”, p. 156. Baseado em Gabrielsson e
Jansson.] O OUP residuais na produção dos sons instrumentais como um dos elementos in-
diciais mais pertinentes na identificação dos timbres, mas se removermos
3.5.9. Transientes ou transitórios e a importância dos ataques o transiente de ataque dos sons, em geral eliminamos uma caracteristica
importantíssima para sua reconhecibilidade, uma vez que, como aponta-
Quando um instrumento executa um som tônico, sua vibração não co- mos anteriormente, o transiente de ataque constitui, via de regra, um dos
meça, como vimos, com a amplitude total, mas, ao contrário, necessita de fatores mais fundamentais na caracterização dos timbres. Para avaliamos
alguns períodos para atingi-la. A inércia das massas ocasiona um necessário o nível de importância de um ataque, havíamos constatado, de acordo com
período de estabelecimento do som, numa transição do estado de repouso as pertinentes observações de Schaeffer, que a percepção do ataque não é
(silêncio) ao vibratório, o qual se estende, em princípio, à totalidade do ligada tanto à duração em si do momento inicial do espectro, mas antes
processo oscilatório. À esta transição que parte do silêncio para chegar ao sobretudo à forma geral do som, ou seja, à sua evolução energética. Ou
pico máximo de amplitude no momento inicial do som damos o nome de seja, a percepção qualitativa do ataque — o quão o ataque é importante na
di-
transitório ou transiente de ataque. reconhecibilidade daquele som — é determinada em grande parte pela
Todo som composto que não foi gerado eletronicamente possui algum nâmica do próprio som, e a diversida de dos ataques é condicion ada pelas
tipo de transiente de ataque em seu começo. O artifício de começar um irregularidades do envelope dinâmico dos espectros.
passos de alturas,
ter lugar, inclusive no sentido de superar esse sistema, dentro do âmbito histórica e essencialmente, pela operação discretiva dos
última instânci a, pelo interva lo musical, dando
de ação da música contemporânea e, mais especificamente, da música pela descontinuidade e, em
eletroacústica. Mas, mesmo que o músico/leitor não possua tal pretensão. vazão à constituição de escalas e afinaçõe s.
a com relação
é inaceitável o fato de a maioria dos músicos exercer suas atividades aa Nesse contexto, porém, é de notar a confusão históric
respeito aos dois
torno do temperamento igual sem que tenha ciência do que se trata. Cer- aos termos escala, afinação e temperamento. No que diz
consequências,
tamente um conhecimento acerca da necessidade de seu advento histórico primeiros, em geral usa-se um no lugar do outro sem maiores
termos que deveriam
quebrará alguns tabus e contribuirá para uma prática musical mais plena, como se fossem sinônimos. Mas, na realidade, são
autêntica e, certamente, segura. reportar-se a coisas distintas.
ento é tão
Em geral, pode-se afirmar que a afinação de um instrum
organiz ação da escala musical , mas,
antiga quanto a necessidade de uma
4.1, A Mistória das Escalas e o Advento do Temperamento da à noção de escala, a afinaçã o em si é
na acepção genericamente conferi
gua o entende -se, a rigor, a organiz ação discrim ina-
bem mais antiga. Por afinaçã
(notas) disponí veis em um certo âmbito frequen cial, cujos
tória das alturas
s racionais. A
4.1.1. Escala, afinação e temperamento intervalos, sem exceção, podem ser expressos por número
as frequên cias existentes
discriminação se dá pelo fato de que nem todas
utilizad as na constituição da
Quando Helmholtz discursou sobre a essência do movimento das alturas em um determinado âmbito frequencial são
certos preceit os baseados em
na música, pontuando que este se dá por intervalos, e não por movimentos afinação. A afinação opta, de acordo com
ou transições contínuas, ressaltou, na verdade, o papel da descontinuidade de certos interva los em detrime nto de
funções matemáticas, por passos
na organização cardinal das frequências no âmbito da composição. À bem seleção das frequên cias. Por outro lado, a
outros, efetuando, assim, uma
da verdade, o glissando, elemento contínuo (descendente ou ascendente) osto fundam ental a equipa ração dos passos de
afinação teria como pressup
que efetua um “deslize” das frequências, ganhou peso e relevância somente desse âmbito, fato, entretan to, que só pôde se concret izar de
intervalo dentro
Foi somente
a partir da metade do século XX, particularmente através de seu uso sis- modo eficaz justamente com o advento do temperamento igual.
resolve ram-se
temático na música instrumental por Iannis Xenakis (notadamente com quando o temperamento se tornou de fato igual é que, a rigor,
que O precede ram.
sua obra orquestral Metastasis, de 1953-1954), logo em seguida com sua as incongruências advindas de outras afinações
seja: o de
aplicação como fenômeno estatístico e consequentemente rebelde à ope- É nesse contexto que o conceito seguinte vem à tona, qual
escala, entende -se a organiz ação
ração discretiva necessária para as tentativas de serialização do timbre no escala, em geral sinônimo de gama. Por
contexto da música eletrônica, com a obra eletrônica Glissandi de Gyôrgy notas disponí veis em uma dada afinação .
discriminatória de determinadas
Ligeti, em 1957 — realizações estas que tiveram como precursora a obra de seletiva que a afinaçã o, uma vez que, em geral,
A escala é então ainda mais
da afinação na qual
Edgar Varêse no início do século, com seu uso de sons de sirene na orquestra não pretende fazer uso de todas as notas constituintes
de percussão -, e, posteriormente, com os glissandos paradoxais de Jean- inclusiv e variar ligeira mente a afinaçã o sem que se
se baseia, podendo-se
base o sistema
-Claude Risset no âmbito da música computacional dos anos 1960. De toda desorganize a escala da qual se quer fazer uso. Tomando por
a escala de Dó
forma, em que pese seu interesse e seu caráter peculiar, o glissando é um tonal, entende-se bem a diferença entre Os dois conceitos:
da afinaçã o do sistema
fenômeno tão marginal na organização das alturas quanto o é, por exemplo Maior utiliza-se de 7 notas dentre as 12 possíveis
igual), quais sejam: das no-
a onomatopeia na organização do simbolismo sonoro das línguas (que se dá temperado (presumivelmente do temperamento
o que a de Mi Maior, por exemplo ,
de modo profícuo, como bem observou Roman Jakobson, muito mais por tas Dó, Ré, Mi, Fá, Sol, Lá, e Si; enquant
7 notas, no qual algumas são utiliza das
fenômenos de contiguidade com os veículos fonológicos e estruturais de utiliza-se de um outro conjunto de
Fá sustenido, Sol
que dispõe a língua do que por similaridade direta e elementar, ancorada pela escala de Dó Maior, e outras, não, quais sejam: Mi,
no princípio rudimentar da imitação). O glissando instiga a percepção a susteni do e Ré susteni do. No context o da tonalidade
sustenido, Lá, Si, Dó
fará uso de todas
apreender o objeto sonoro como algo unitário, ao passo que a discriminação e do sistema temperado (igual), apenas a escala cromática
de frequência instaura a percepção de uma relação, base para a constituição as notas constituintes da própria afinação.
procuraram
estrutural dos elementos que sedimentam os significados eminentemente Ao que parece, os primeiros teóricos, tais como Pitágoras,
numa fase subsequ ente, com
musicais. Assim é que a especulação musical mais consequente optou, inicialmente constituir afinações, e somente
ou alguns dentre eles, não podem ser expressos por números racionais ao | , 7 Quarta
| D/G = 4/3
UT TT
contrário do que ocorre com as afinações. “Temperar” implica, de algum =D G
modo, atenuação ou moderação de alguns intervalos. Historicamente
+ + t | — +, Tom-inteiro
no entanto, diversos temperamentos não-iguais antecederam o chamado 4 t +
——* D/E =9/8
temperamento igual ou sistema temperado, como comumente é chamada (D) (E)
a afinação da grande maioria de nossos instrumentos musicais.
o espaço entre dois
1) musicalmente, o termo implica uma diferença, como
4.1.2. Escala pitagórica pontos em um teclado;
proporção (ou razão)
2) fisicamente, um intervalo nada mais é que uma
tem que ver com diferen ças entre elas.
Ainda que Helmholtz tenha relatado que a invenção da escala de 7 entre frequências e nada
que, se somarmos
notas tenha ocorrido pelas mãos de um príncipe chinês da Antiguidade De tal divisão da noção mesma de intervalo tem-se
chamado Tsay-yu, reportando-se igualmente à divisão preconizadora da mente multip licamo s suas razões. Con-
musicalmente dois intervalos, fisica
oitava em 12 partes iguais na China antiga (apesar da predominância ção 2:1 que define a percep ção oitavante, e não
sequentemente, é a propor
O intervalo de oitava:
incontestável do pentatonismo na cultura chinesa), o advento da escala a diferença entre duas frequências que constituem
heptatônica ou simplesmente diatónica está historicamente associado como 2500 Hz e 5000 Hz,
25 Hz e 50 Hz constituem uma oitava assim
do primeiro par seja
ao filósofo e matemático grego Pitágoras (que viveu de 570 a cerca de ainda que a diferença aritmética entre as frequências
de frequências.
490 a.C). consideravelmente menor do que a do segundo par
o A partir da experiência de subdivisão da corda de um monocórdio A ordem pela qual exprimimos tais propor ções é irrelevante no que
ante apenas no que diz respeito
instrumento de medição intervalar presumivelmente por ele inventado, tange aos intervalos absolutos, sendo import
À oitava pode ser expres sa tanto pela
Pitágoras chegou à conclusão de que as combinações tidas na época como à sua direção (ao agudo ou ao grave).
dobran do-se acima a oitava, multiplica-se
consonantes” e correspondentes ao que hoje designamos por oitava, quinta razão 2:1 quanto pela razão 1:2;
quarta e uníssono estão, respectivamente, nas proporções: de uma oitava abaixo, divide -se por 2 (o que
por 2, efetuando-se o passo
icar, respectivamente,
matematicamente significa o mesmo que multipl
ponde a uma oitava acima,
2:1,3:2,4:3, Lil por Z:l e 1:2). Assim sendo, a razão 2:1 corres
com os demais in-
enquanto que 7:2 implica uma oitava abaixo, e assim
A rigor, a elaboração da afinação por Pitágoras ancorou-se na oitava € tervalos e razões. Por exemplo (onde f= frequência):
na quinta, ou seja, nos dois primeiros intervalos da série harmônica, sendo
a quarta (enquanto inversão da quinta) e o unissono decorrências naturais * quinta acima= f(3)
desses intervalos de base. À construção de toda a escala diatônica pitagó-
rica deu-se através da indução de suas proporções a partir dessas primeiras
relativas aos intervalos consonantes. , * quinta abaixo = 18)
A partir de então, o termo intervalo deve ser entendido em duas acep-
ções distintas:
o (-(gr=m
[o que corresponde a uma oitava acima]
podendo-se substituir / simplesmente por 7]
(5) (6a)
= Tas
2/64) 128
no-u-6
ou seja:
intervalo até então encontrado (qual seja: o do semitom diatônico pitagó-
rico), tem-se a quarta abaixo de B = Fº, na razão:
8/18 64 8
5) E) —-n9
4) 28) 512 C) C D E Ft
Percebe-se, já aí, que os números das razões tornam-se cada vez intervalos: y 4
maiores, processo este que não finda nesta etapa de dedução dos intervalos 81/64 9/8
pitagóricos.
ou seja:
O intervalo Fº-G, na razão:
tem-se-uma outra razão pata o semitom, então chamado de semitom cro- No entanto, tem-se que:
mático pitagórico, o qual revela-se como sendo um pouco maior que o
semitom diatônico pitagórico, pois que:
(3 (S3laat)
8 262144) — (531441:1) — 531441
1) semitom diatônico pitagórico — 256/243 = 1,053; 2 2 (262144:2) 524288
2) semitom cromático pitagórico —» 2187/2048 = 1,067
n=1200 logR
108" - 39861 C, D, E, F, Gg, A, B, Cc
log2 oER | nota
4 , ” 43 ,
Assim é que para a quinta pitagórica, na razão 3/2, tem-se, por Razão de 9 at
Sh - 2 27 243
exemplo: frequência em 1 +
3 2 16 128
8 64
relação a C,
logR = log 5)3 = 1083 - log2 = 0,477 - 0,301 = 0,176
Número de cents
204 408 498 702 906 | 1110 1200
0
acima de €,
Por conseguinte, pode-se deduzir quantos cents possui a quinta pita-
górica:
Intervalos em
204 204 90 204 204 204 99
cents entre
n = 3986:0,176 = 702c notas adjacentes
78)
[Cf. Campbell & Greated, “4. Playing in Tune”, p. 171.10 OUP(CD
Ou seja, a quinta pitagórica possui 702 cenís (ao invés de 700 cents,
como no caso da quinta temperada). Diz-se, então, que a quinta pitagórica
situa-se
é “mais alta” que a quinta temperada. Dependendo da região frequencial, a subdivisão em cents
vo das frequênc ias. Sabe-
Com relação ao tom-inteiro pitagórico, na razão de 9/8, ter-se-ão 204 aquém da capacidade de discernimento percepti
cerca de 1000 Hz, um bom ouvido
cents, portanto 4 cents a mais que a segunda maior temperada. Já o semitom -se, por exemplo, que na frequência de
apenas 3 Hz,
diatônico pitagórico terá 90 cents, 10 cents abaixo do semitom temperado. tem capacidade de perceber a sutil variação sequencial de
resulta em somente 1,003 Hz. Este interval o corres-
O semitom cromático pitagórico, na razão de 2187/2048, possui 114 cenis, cuja razão 1003/1000
0u 1 cent), O
14 cents acima do semitom temperado. Assim sendo, percebe-se que o ponde a 5 cenis. Aquém desses 5 cents (desvios de 4,3,2,
frequência. À
semitom temperado (com 1/00 cents) situa-se entre os semitons diatônico e ouvido permanece, neste registro, insensível às variações de
ias,
cromático pitagóricos; ele é “mais alto” que o semitom diatônico pitagórico, subdivisão em cents acaba sendo, de acordo com a região de frequênc
de desvios fre-
e “mais baixo” que o cromático pitagórico. até mesmo mais minuciosa do que a capacidade de detecção
por isso, um instrum ento
A partir da medição em cents, pode-se compreender a grandeza de quenciais por parte da escuta, demonstrando ser,
intervalos específicos, oriundos da escala pitagórica, como é o caso, por de medição bastante acurado (CD 79).
pelo
exemplo, da limma pitagórica, de 90 cents, que consiste no “defeito” de Além disso, a comodidade das operações com cents é evidenciada
mente somamos , evitando assim as multipli -
dois tons-inteiros pitagóricos somados (= 408 cents) em relação à quarta fato de que com cents simples
razões dos interval os. Assim sendo, os 114 cents
pitagórica (de 498 cents), o que equivale a dizer que a limma pitagórica cações e divisões entre as
diatônico
nada mais é que o próprio semitom diatônico pitagórico, já que: do semitom cromático pitagórico menos os 90 cents do semitom
em 24 cents da coma pitagóri ca, como o complic ado
pitagórico resultam
3986 lo e(deJ= cálculo anterior nos havia mostrado.
é )= 90,20 quanto
Através da constatação da coma pitagórica, perceberemos que,
de quintas pitagóri cas, tanto
mais calcularmos propagações de quartas e
quintas com € 5 2 es do == E
3/2" qu 2"/3m Razão Decimal Cents
6 6 3
B' (3/2) 3"/289 531441/524288 1,0136 23,46
E! QI! 314/20 177147/131072 1,352
a escala pitagórica precisou dar lugar a escalas mais diversificadas, que
521,51
A” (3/2)! 319/25 59049/32768 1,802 1019,56
utilizassem os intervalos ditos justos, derivados da ressonância da série
D' (3/2) 3º/214 19683/16384 1,201 317,60
harmônica natural.
G' (3/23 38/21 6561/4096 1,602 815,64 Examinando a escala pitagórica, vê-se que ela não contém nenhuma
Cc (3/2)" 3'/2M 2187/2048 1,068 113,69 terça justa, nem maior, nem menor, já que todas as suas relações de terça
Ft (3/2 3%/2º 729/512 1,424 611,73 apresentam algum desvio em relação às terças da escala justa (que examina-
B (3/2) 3/2? 243/128 1,898 1109,78 remos mais adiante). A terça maior pitagórica C-£, por exemplo, estã, como
E (3/2) 34/26 81/64 1,266 407,82 vimos, na razão 81/64. Já a terça menor pitagórica D-F, soma de um tom-
A (3/2) 33/24 27H16 1,687 905,87 -inteiro pitagórico com um semitom diatônico pitagórico, resulta na razão:
D 12) 3/2 9/8 1,125 203,91
G 32 32
(2) (259). 2304 - 22
32 1,500 701,96
C 1 1 0
F 2/3 2/3 43 1,333 8/ 1243)" 1944 27
498,05
Bt 23p 2132 16/9 1,778 996,10 Tem-se então que:
E (23y ZIP 32/27 1,185 294,14 A)a terça maior pitagórica está na razão 81/64 = 1,265625; enquan-
Ab (2/3) 243 128/81 1,580 792,18
D* (2/3
to que a terça maior justa está na razão 5/4 = 1,25. Assim sendo, a terça
2/as 256/243 1,053 90,23
GS (23% 219/36
maior pitagórica é maior ou “mais alta” que a terça maior justa na razão
1024/729 1,405 588,27
C (2/3)" 232/37
de 81/80, já que:
4096/2187 1,873 1086,32
FP QB; 23/38 8192/6561 1,249 384,36
Bb» (23P 255/3º 32768/19683 1,665 882,41
Et (2/3)1º 236/310 65536/59049 LHO 180,45
Abb (23) 2/3 262144/177147 1,480 678,50
D*» | (2/3) 22/31 1048576/531441 1,973 1176,54 B)a terça menor pitagórica está na razão 32/27 = 1,185185; enquanto
[Cf. Lattard.] que a terça menor justa está na razão 6/5 = 1,2. Ou seja, a terça menor
pitagórica é menor ou “mais baixa” que a terça menor justa exatamente
na mesma razão de 81/80, já que:
Foi comum utilizarem-se nesta escala até 3 sustenidos e 2 bemóis. 4.1.6. Escala justa ou gama de Zarlino
Porém, para além desse uso, e mesmo no primeiro processo de cromati-
Ainda que a derivação da chamada escala justa não tenha se dado de
zação da escala, têm-se sérios problemas. Senão vejamos: o enarmônico
maneira diretamente correlata à propagação dos primeiros intervalos da
de G! é 4º, obtido pela quinta abaixo de Eº (ou seja: Et“ acrescentado
série harmônica natural, mas sobretudo a partir de uma percepção coletiva,
de 1/4 de coma para o 4º quinta abaixo = 4º*** = 4%*"), Como se observa,
consciente ou inconsciente, desse fenômeno, as razões de seus intervalos
no entanto, 4º é uma coma sintônica ou 22 cents “mais alto” que o 4º
estão diretamente relacionadas às razões entre os primeiros harmônicos de
pitagórico, enquanto que G* é duas comas ou 44 cents “mais baixo” que
o G pitagórico. um som tônico, tal como nos demonstra o Exemplo 117:
cogr8-+
era pré-cristã, o que viria a ser bem mais tarde a tríade perfeita maior.
Um pouco mais tarde, Aristóxeno de Tarento (360-280 a.C.) começa,
então, a considerar como consonâncias, além da oitava, os intervalos de
quinta, quarta e terça (que começava a ser admitida, ao menos no plano
[B + terça menor]
teórico), pregando a constituição da gama pela justaposição de dois tetra-
cordes, baseados nas exposições teóricas de Arquitas, e antecipando, assim,
a escala justa tal como a conheceremos em época bem posterior.
Assim sendo, o emprego das terças como intervalos consonantes na Transpondo uma oitava acima F e 4, e uma oitava abaixo D, e dobrando
prática musical na tardia Idade Média e Renascença resultou num de- a nota fundamental da escala C, tem-se então:
senvolvimento fundamentalmente calcado numa combinação de 3 notas:
acrescentando à terça maior justa (5/4) uma terça menor justa (6/5), obtém-
-se uma combinação cujas frequências relativas estão na proporção 4:5:6, * F oitava acima:
constituindo a referida triade (perfeita) maior. Toda combinação de 3 notas
cujas frequências estão em tal proporção constitui uma tríade maior — por
exemplo, 200:250:300, sendo redutível a 4:5:6 pelo divisor comum 50. De
forma inversa, multiplicando todos os três algarismos 4:5:6 por um mesmo
« À oitava acima:
número, obtêm-se tríades maiores diversas. (Cf. o exemplo sonoro CD 67.)
Semelhantemente, pode-se enunciar a triade maior através da relação entre
a fundamental e as respectivas razões para sua terça maior e sua quinta:
l
* D oitava abaixo: 9
3)A
TN
GO. EG) 9
[o
2 412) 8
e Coitava acima = 2.
e)
Doo.
2 (3.2) 6
E já que:
2... 03) “4
Examinando tal escala, vemos a aparição de mais outras duas tríades:
(3) (1.5) 5
* atriade E-G-B, na proporção 10:12:15, correspondente a: 2
Sendo que 5/6 está para 10/12 assim como 4/5 está para 12/15.
Observa-se que o intervalo inferior é de 5/6, portanto uma terça menor,
e o superior, de 4/5, portanto uma terça maior, tendo-se a familiar tríade
perfeita menor, inversão da tríade perfeita maior.
A aparição da tríade menor não só se justifica pelas tríades acima
referidas (E-G-B e 4-C-E), como também, como relata Helmholtz, pela
Já que: brilhante constatação de Rameau e de d' Alembert acerca da ressonância
G) o
das séries harmônicas naturais das fundamentais de uma tríade menor, por
exemplo C-E!-G, as quais, ao contrário das séries harmônicas relativas às
6 do notas da tríade maior C-E-G, possuem um harmônico em comum, mais
5) (4.3) 12
precisamente o G, quinta da tríade, como bem demonstra o Exemplo 118
2
(na página seguinte). Se a triade maior revela-se enquanto produto da
E já que: ressonância natural da série harmônica de uma determinada fundamental,
a tríade menor advém, por sua vez, da afinidade, pelo viés da coincidên-
cia de um de seus primeiros harmônicos, entre as fundamentais de suas
notas constitutivas.
(5) (is) 30 15 Até aqui, a escala parece ser bem satisfatória, apresentando três tríades
maiores e duas tríades menores, com todos os seus intervalos justos, em-
6)
8) BL 10125
65)
10 80
primeiros harmônicos de Dó primeiros harmônicos de Mi bemol primeiros harmônicos de Sol
l j
Triade Perfeita Menor Com tal variação discrepante, ter-se-ão complicações similares às da
escala mesotônica quando de sua complementação cromática, a qual pode
prestando por isso a denominação à própria escala de escala justa. Porém, ser realizada de diversas maneiras. Se se quer, por exemplo, D-F* como terça
o intervalo entre as notas D-A, na razão 27/40, já que: maior justa (uma coma pitagórica abaixo da terça maior pitagórica), e se
se quer que as tríades menores com as fundamentais em C e G — fazendo
que a terça menor justa seja uma coma acima da terça menor pitagórica
Gg 03) 27 — e as triades maiores com fundamentais em E e 4 sejam jusías, tem-se O
(3) “68 40 quadro seguinte, em que os expoentes indicam, novamente, as variações
em coma pitagórica face à escala pitagórica:
não forma uma quinta justa, mas antes uma quinta rebaixada de uma coma. ct -2 Et! Ft «Í G' -2 Bt!
E o intervalo D-F, na razão de 27/32, já que:
ce DP E FG 7 4! Br Cc
Ab +]
5) 03) 27
(2 (48) 32
3 Nessa escala, constatemos, as quintas justas existentes deveriam conter
sempre expoentes iguais, e já que a terça maior justa é uma coma abaixo
é uma (terça menor pitagórica em vez de uma terça menor justa. Conse- da pitagórica, o expoente da nota central de qualquer triade maior deveria
quentemente, a “tríade menor” D-F-A está totalmente fora da afinação justa, conter invariavelmente o expoente -] em relação ao expoente das notas
revelando uma primeira incongruência grave no seio da própria escala. extremas que formam a quinta, como tipicamente o caso em:
Na escala justa, como já havia observado, à sua maneira, Arquitas de
CE G
Tarento, os intervalos entre notas adjacentes apresentam a particularidade
de o número do numerador ser sempre superior em 1 ao número do deno-
Da mesma forma, o expoente da nota central de uma tríade menor
minador: 9/8; 10/9; 16/15. O semitom, na razão de 16/15, apresenta 112
deveria ter invariavelmente o valor +1 em relação ao expoente das notas
cents, sendo chamado de semitom diatônico justo ou zarliniano, a partir de
extremas da tríade, já que a terça menor justa é uma coma acima da pita-
seu detalhamento teórico por Gioseffo Zarlino.
górica, como tipicamente o caso em:
Têm-se, por outro lado, duas razões para o tom-inteiro:
E! G? B'
* a primeira razão, de 9/8, é igual ao tom-inteiro pitagórico e possui, pois,
204 cents;
seja, a”; D* (ou E”) seria equivalente a a”; e assim por diante. 1,000 1,122 1,260 1,414 1,587 1,782 É 2,000
A fim de determinar o intervalo a, tem-se que após 12 passos interva-
lares dever-se-ia atingir a oitava, a qual deverá corresponder exatamente à
razão 2:1 —aliás, Única coincidência entre todas as escalas —, o que acarreta:
Tendo por base as razões relativas aos 12 intervalos que compreendem
a? =2 a oitava no temperamento igual, pode-se obter qualquer intervalo a partir
de qualquer frequência. Por exemplo:
onde a serão 122 avo de 2, ou:
415Hz X 1,414 = 586,810
= 587 Hz
a=(2)"?=1,05946309 G* seu tritono D
ou ainda: Na afinação temperada, a quinta justa, de 702 cents, passa a ter redondos
700 cents (ainda que esta diferença de apenas 2 cents seja, como vimos,
negligenciável pela escuta). A quarta justa, de 498 cents, passa a ter 500
2 = 1,0594
cents (diferença também negligenciável para o ouvido). Essa mesma dife-
ou simplesmente 1,06. rença existente, respectivamente, entre as quintas justa e temperada e entre
c'% = (2)!"12 = (2)1/1200 — 1,00057779 [Cf. Campbell & Greated, “4, Playing in Tune”, p. 177.] O OUP
TeDess
serviu de base para a argumentação de Helmholtz acerca desses con- executadas em um âmbito frequencial mais grave do que o são nos dias
eee
ceitos) serviram à estruturação da linguagem musical em determinado de hoje, soando cerca de meio-tom abaixo do que estamos acostumados!
período da história; Com o passar do tempo, o 4 foi sendo suspendido, por razões acustica-
2) com o advento do temperamento igual, igualaram-se totalmente as to- mente inexplicáveis. Provavelmente tal fato deveu-se à procura de um maior
nalidades, e as transposições passam a ser meramente “arbitrárias”, não “brilho” dos instrumentos de cordas, realçando-se figurações ligeiramente
havendo motivo algum para dizer, por exemplo, que uma certa tonalidade mais agudas. Ao final do século XIX, a Inglaterra chegou a ter o 4 com
é mais “solene e triste” que uma outra. A utilização, por exemplo, de 455 Hz, e os EUA, com 461 Hz (ou seja, quase como um 4º de hoje, de
todas as tonalidades do temperamento igual no Cravo Bem Temperado 466 Hz). Durante um certo período, instrumentos (de madeira).construídos
de Bach é antes de tudo estrutural. a partir de uma afinação bascada em um determinado eixo frequencial não
Dessa forma, alguns importantes tabus devem ser abolidos pelo mú- podiam executar obras em outra afinação que destoasse daquela na qual se
sico e pelo ouvinte atento. E um outro tabu — além do acima mencionado, bascou sua engenhosa construção.
de que haveria distinções essenciais entre tonalidades distintas — deve A necessidade óbvia de chegar a um consenso internacional com rela-
ser quebrado: o temperamento igual consiste em uma maravilhosa e ção a um “ponto de partida” das frequências tendo em vista a construção
engenhosa invenção, que se firmou ao longo dos tempos de modo co- dos instrumentos fez que a Organização Internacional de Standards reco-
letivo e que resolveu grande parte dos problemas mais prementes do mendasse, em 1953, a adoção internacional do 4 como tendo 440 Hz. Este
fenômeno da entonação das frequências na música, mas ele não foi, não acontecimento constitui prova inexorável de que o que define em essência
é e nem nunca será totalmente hegemônico nos contextos musicais. Se o o sistema temperado é sua razão aritmética e sua progressão logarítmica,
temperamento existe, ele existe para poder admitir, de livre e espontânea e não a tabela atual de frequências na qual em geral se baseia.
vontade ou forçado por circunstâncias específicas, desvios em relação Infelizmente, contudo, tal adoção não foi respeitada com rigor. A Los
a suas próprias amarras. Assim é nossa prática musical, e assim se dá Angeles Philharmonic Orchestra, por exemplo, adota o 4 com 442 Hz, e
com nossa escuta, nos EUA tem-se já o 4 com 444 Hz. Tal diferença, de 440 Hz a 444 Hz,
Ao que parece, mais uma vez a música nos dá uma lição de vida: implica uma considerável variação de /6 cents, de modo algum negligen-
a validade de um sistema não se dá pelo fato de se instituir algo como ciável pelo ouvido.
presumivelmente hegemônico e absoluto, mas sim pelo fato de possibili- Esses desvios podem ocasionar situações bastante problemáticas: os
tar um exercício mais seguro e flexível das atividades humanas, em que cantores das obras de Mozart e Beethoven cantam, na verdade, cerca de
“desvios” estão necessariamente implicados e até mesmo subentendidos. meio-tom acima dos cantores da época em que tais obras foram escritas —
As excentricidades fazem parte, por assim dizer, do rol de atuação do pense-se, por exemplo, na ária da Rainha da Noite da Flauta Mágica, com
próprio sistema, suas notas extremamente agudas —, e mesmo os violinos necessitam de cerca
de 6% de variação de frequência em direção ao agudo na execução atual
4.2.2. O standard de altura de obras desse período, o que acarreta cerca de 12% de tensão a mais nas
cordas, resultando daí consideráveis readaptações nos violinos dos grandes
Na medida em que a afinação temperada determina aritmeticamente mestres italianos da Antiguidade. Por tais razões, a adoção permanente do
(pelas sobreposições do semitom temperado) suas frequências, pode-se par- A central (A) contendo 440 Fiz é altamente recomendável, do ponto de
tir, em princípio, de qualquer ponto do âmbito das alturas para constituí-la. vista da acústica.
50 (NI = 166,545 Hz
Por outro lado, a equação seguinte nos possibilita deduzir quantos cents
possui um dado intervalo entre duas frequências. No exemplo que se segue,
vemos que entre 466,164 Hz do Bº e 440 Hz do A na oitava central temos
e
praticamente 700 cents:
= 100,001c
log, (“S/3) ABDOUNUR, Oscar João. Matemática e Música — O Pensamento Analógico na Construção
de Significados. São Paulo, Escrituras Editora, 1999.
Alterando a fórmula, podemos investigar relações bem menos previsíveis, Backus, John. The Acoustical Foundations of Music. New York, W. W. Norton &
Company Inc., 1968.
como no caso arbitrário seguinte, no qual deduzimos que existem 128,186 BARBOUR, J. Murray. Tuning and Temperament — À Historical Survey. Michigan, Mi-
quartos de tom (raiz 24 de 2) entre 88 Hz e 3567 Hz: chigan State College Press, 1953.
BenaDE, Arthur H. Sopros, Cordas & Harmonia — A Ciência dos Sons Agradáveis. São
jog,(3587) Paulo, Edart, 1967.
, Fundamentals of Musical Acoustics. New York, Dover Publications, 1976.
= 128,186 BLAvERT, Jens. Spatial Hearing — The Psychophysics of Human Sound Localization.
| log, (2)
Cambridge (Massachusetts)/London, The MIT Press, 2001.
CAMPBELL, Murray & GrEATED, Clive. The Musicians Guide to Acoustics. New York,
Oxford University Press, 2001.
Assim sendo, temos o firme propósito de que o leitor possa, ao longo de CHion, Michel. Guide des Objets Sonores — Pierre Schagfjer et la Recherche Musicale.
nosso exame, ter adquirido consciência de que o conhecimento dos fenômenos Paris, Buchet/Chastel & INA/GRM, 1983.
acústicos, longe de limitar o exercício musical ou de permanecer distante Cook, Perry R. et al. Music, Cognition, and Computerized Sound — An Introduction
do fazer artístico, deve na verdade, acima de tudo, aprimorar a escuta e, no to Psychoacoustics. Cambridge (Massachusetts)/London, The MIT Press, 1999.
caso específico da composição musical, instigar o pensamento a novas es- (Com CD).
Dose, Charles & Jerse, Thomas A. Computer Music — Synthesis, Composition, and
peculações, condizentes com a invenção que sedimenta cada ato de criação. Performance. New York, Schirmer Books, 1997.
Que as informações contidas nesse volume sirvam a uma nova escuta, Eimert, Herbert & Humpert, Hans Ulrich. Das Lexikon der elektronischen Musik.
diversa da que normalmente temos e definitivamente mais desperta para os Regensburg, Gustav Bosse, 1973.
fenômenos sonoros!
* As referências nos exemplos a autores que não se encontram nesta bibliografia reportam-se
a dados extraídos do compêndio de Campbell & Greated,
* Asreferências abaixo não dizem respeito a todas, mas antes às principais aparições conceituais
dos respectivos tópicos.
esa
Polarização — 91, 228 Sintese — 193 Tongemisch (ver; som complexo ou mistura)
Síntese aditiva— 193 Velocity — 133
E Spa
Potência sonora — 137 Tonicidade (ver: taxa de harmonicidade)
Pressão (sonora) — 45 e ss., 134 e ss., 148 Síntese cruzada — 207 Trama — 131 Vibração periódica — 20
“pps.
ess. Sintese granular — 225 Transientes (transitórios) - 29 e ss., 131, Velocidade do som — 46 e ss.
Primeira queda (ver: decaimento) Síntese subtrativa — 193 180, 200, 220 e ss., 223 Vibratos — 131, 224, 229 e ss.
Projeções proporcionais (técnica harmônica Sinustongemisch (ver: som complexo ou “Transientes de sustentação” — 223 e ss, Vogais -93,2ll e ss.
Rai ES
de Flo Menezes) — 273 € ss. mistura) 230 Volume — 150 e ss.
Protenção — 187 Sistema fonológico — 93 Transitórios (ver: transientes)
Sixxen —- 171 Transposição — 243 Wolf fifth (ver: quinta do lobo)
Quadrado vocálico — 217 Solfejo experimental — 15 Tratamento (sonoro; processamento sono-
Queda final (ver: extinção) Som cancelado (ver: estria) ro) -— 193 Zusammengesetzte Klênge (ver: som com-
Quinta do lobo — 251 Som complexo (som inarmônico; de altura Triângulo consonantal — 209 e ss. posto)
indefinida; mistura) — 21 e ss., 98, 112
Rastreamento de fundamental - llQ e ss. Som diferencial (simples ou cúbico) — 88
Rayl- 0 ss. ess. 112
Reflexão - Sl ess., 138, 184 e ss. Som estriado (ver: estria)
Reflexo acústico - 71 e ss. Som nodal (nó) — 27
Refração —- 54ess. Som senoidal (puro) - 21 e ss., 104, 199
Região formântica (ver: formante) Som tônico (som composto; de altura defini-
Regime de permanência (ver: sustentação) da)-21 ess., 93 (na fala), 106 e ss.,
Regime estacionário (ver: sustentação) 163ess., 206
Release (ver: extinção) Son canneté (ver: estria)
Resposta plana — 155, 219 Sones - IS6 e ss., 205
Ressoador (ou ressonador) —- 49 e ss., 211. Sons de combinação — 88 e ss.
Ressonadores (ou absorvedores) de Hel- Sons paradoxais — 115 e ss.
mholtz — SO Sons toniques (ver: som tônico)
Ressonância- 38, 49 e ss., 66 ess., 178 Sprechgesang — 214
Retenção — 187 Sustain (ver: sustentação)
Retrogradações — 175 Sustentação (regime estacionário) — 29 e
Retrógrado da inversão — 175 ss., 180
Reverberação — 184 e ss.
Ritmos não-retrogradáveis — 176 Taxa de harmonicidade — 113
Rotes Rauschen (ver: ruído rosa) — 26 Taxa de inarmonicidade — 180
Ruído - 21 e ss., 93 (na fala) Taxa (ou tempo) de reverberação — 185
- Ruído azul (blue noise) — 26 Temperamento igual (sistema temperado)
Ruido branco — 25 e ss., 96, 98, 129, 199 -233,260 ess.
Ruidos coloridos — 26 Temperamentos - 234 e ss.
Ruido marrom (brown noise) — 26 Teorema de Fourier — 37
Ruídos residuais (ou parasitas) - 221 Teoria da localização das frequências — 75
Ruido rosa (pink noise) — 26 ess.
Ruído térmico — 153 Teoria temporal de discriminação das fre-
quências — 78 e ss.
Schisma — 266 Teoria da Unidade do Tempo Musical— 98,
Serialização do timbre — 207 Va, i89ess.
Série harmônica invertida — 92 Teoria das supercordas — 50
Série harmônica natural — 37 e ss. Teoria dos conjuntos — 118
Séries de Fourier — 37 Timbre — 94 e ss., 106, 129, 130, 179, 183
Shepard tones (ver: sons paradoxais) — 119 ess. 199ess.
Sidebands (frequências circundantes) — 24 Timbre harmônico — 98, 113, 129
Antes de iniciar a reprodução do CD, veja como você pode utilizá-lo: a rigor,
este CD pode ser ouvido tanto a partir da leitura do livro, interrompendo o fluxo
de leitura na medida em que as faixas do CD a serem ouvidas são indicadas, em
geral, ao final dos respectivos parágrafos, quanto de modo autônomo, sem se preo-
cupar com o corpo do texto teórico. Mas em ambos os casos, deve-se ter à mão, de
preferência, a descrição de cada faixa no texto que segue abaixo.
No caso de escuta do CD durante a leitura do livro, pule a cada nova faixa
para estas páginas ao final do volume e leia a descrição detalhada de cada exemplo
sonoro. É aconselhável, de toda forma, que a cada término de faixa o leitor-ouvinte
acione a “pausa” em seu toca-CDs e interrompa a reprodução do CD até que se
torne ciente do conteúdo da próxima faixa. Entre o conteúdo sonoro de cada faixa
há uma pausa de 5”, plenamente suficiente para que se pressione calmamente o
botão de “pausa” do respectivo aparelho.
Mas atenção: antes de iniciar a reprodução do CD, “calibre” seu sistema sonoro
(amplificador e caixas)!
iii quim,
sição espectral não-harmônica, porém muito próxima da composição harmônica
em relação de números inteiros entre os parciais do espectro (pequeno desvio de em amplitude.
frequência dos componentes senoidais —- reprodução do Exemplo 66): * Um CC, de 2093 Hz variando em amplitude (mas não em frequência!)
* Ouve-se um som de 200 Hz; em seguida, a paulatina constituição da série juntamente com um C, de 65,4 Hz estável tanto em frequência quanto
harmônica de fundamental a 200 Hz a partir do 3º harmônico; ao final, em amplitude.
novamente a fundamental de 200 Hz.
42 - Poder da escuta na discriminação das alturas sucessivas conforme a região
Depois, ouve-se um som um pouco mais agudo, de 220 Hz; em seguida,
de frequência:
a mesma série harmônica anterior de uma vez só, porém com acréscimo
« Pouca habilidade da escuta na discriminação intervalar de sons senoidais
de 80 Hz em cada parcial, fazendo com que a série torne-se, a rigor, “inar-
na região grave: a diferença de 2 Hz é ineficiente para a discriminação de
mônica”, mas muito próximo de uma harmônica; em seguida, esta série é
alturas entre A, (= 27,5 Hz) e B» (= 29,13 Hz) - aliás, praticamente im-
explicitada com a entrada gradual de cada parcial: na medida em que vão
perceptíveis de tão graves —, ainda que plenamente suficiente para a discri-
surgindo os parciais, a diferença entre os pares adjacentes gera um som
minação de alturas entre B, (= 493,88 Hiz) e “B, mais alto” (= 495,88 Hz).
diferencial de 200 Hz, porém, com o número cada vez maior de parciais
“A + As mesmas frequências graves passam a ser claramente percebidas e dis-
acumulados, o cérebro começa a procurar um modelo mais adequado a tais
criminadas se seus espectros forem mais ricos (aqui em dente-de-serra),
proporções de parciais, e a altura de 220 Hz parece a mais provável para
dl uma vez que possuem diversos parciais na região dominante de percepção
o papel de “fundamental” desta série; ao final, ouve-se a confirmação
4 das alturas.
desta fundamental” com o som senoidal de 220 Hz.
; * 16 intervalos iguais entre €, (1046,5 Hz) e C?,(1108,73 Hz) podem ser discn-
39 - Studie II (1954) de Karlheinz Stockhausen: nova realização em estúdio (produ- minados pela audição: ouve-se primeiramente o intervalo de segunda menor
zida em março de 1999 por Flo Menezes no Studio PANaroma, através do programa e, em seguida, 16 subdivisões desse mesmo intervalo (com sons senoidais).