Livro Professor Vidal Vol02 BAIXA
Livro Professor Vidal Vol02 BAIXA
Livro Professor Vidal Vol02 BAIXA
PENSANDO
O LEITE
Vidal Pedroso de Faria
VOL 2 - ECONOMIA
FAERJ – Federação da Agricultura, Pecuária e Pesca do Estado do Rio de Janeiro
PENSANDO
O LEITE
Vidal Pedroso de Faria
INSTITUIÇÕES EXECUTORAS Maria Cristina Teixeira de Carvalho
Tavares – Superintendente
FEDERAÇÃO DA AGRICULTURA,
PECUÁRIA E PESCA DO ESTADO DO REVISTA BALDE BRANCO
RIO DE JANEIRO Nelson Rentero – Editor Chefe
Rodolfo Tavares – Presidente
ORGANIZADOR
SEBRAE-RJ – SERVIÇO DE APOIO ÀS Artur Chinelato de Camargo
MICRO E PEQUENAS EMPRESAS
DIAGRAMAÇÃO E PROGRAMAÇÃO
Angela Costa - Presidente do Conselho
VISUAL
Deliberativo Estadual
Estúdio Hibrido
Cezar Vasquez - Diretor Superintedente
Armando Augusto Clemente - Diretor IMPRESSÃO E ACABAMENTO
Evandro Peçanha Alves - Diretor Print Karioca Serviços Gráficos
15-09278 CDD-637.181
Índices para catálogo sistemático:
1. Brasil : Leite : Engenharia de produção :
Tecnologia 637.181
Sumário
CAPÍTULO 1 - Consumo e defesa do leite
Em defesa do leite 10
Consumo de leite 13
A imagem do leite 16
Um fato curioso 18
Sinal de evolução 22
O leite denegrido 26
Sabor de leite 29
A ameaça da importação 38
Falta de notícias 40
Leite adulterado 45
O fantasma da cota 54
Dúvidas e certezas 62
Pensando no futuro 64
A marcha do leite 70
Acredite se quiser 76
Leite e pobreza 84
O enigma do leite 86
Vontade de parar 88
CAPÍTULO 3 - Qualidade
Além de nutritivo, o leite pode ser usado para a fabricação de outros ali-
mentos muito apreciados como queijos, manteiga, iogurte e serve de base
para a produção de sorvetes, chocolates, balas, pudins e outras sobremesas.
O setor leiteiro é também muito importante sob o ponto de vista social,
pois reconhecidamente é gerador de empregos na roça e nas cidades, onde
se constitui em matéria prima para várias atividades industriais. Na forma-
ção da renda bruta da agricultura tem sempre um grande destaque, ocu-
pando os primeiros lugares.
O que vocês acabaram de ler não é ficção, pois se encontra inserido na “Agen-
da Livro da Tribo”, bastante popular entre os universitários e secundaristas do
País, de autoria de Sônia Hirsch. O mais grave é que as referências sobre o leite
como alimento não estão restritas a folhetins, mas também aparecem em livros
de grande circulação em todo o mundo. Anthony Robbins, um dos “papas” da
neurolinguística, também fez referências pouco recomendáveis sobre o leite e
seus subprodutos em seu livro “Poder sem Limites”, atribuindo ao leite pro-
blemas digestíveis graves, alergias e até mesmo deficiências de cálcio. Escreve
absurdos como ““os fortes hormônios de crescimento no leite das vacas desti-
nam-se a fazer um bezerro crescer de 40 kg ao nascer até 450 kg na maturidade
física, dois anos mais tarde. Em comparação, uma criança humana nasce com
cerca de 2,8 a 3,5 kg, atingindo a maturidade física de 46 a 90 kg, 21 anos mais
tarde”. Há uma grande controvérsia sobre o efeito que isso tem na população.
Com toda certeza, técnicos e cientistas que trabalham com nutrição huma-
na tomariam toda essa baboseira como piada de mau gosto, mas os mem-
bros da cadeia produtiva do leite devem levar a sério e entender que existe
no mundo uma campanha contra o leite e seus subprodutos. Em várias
regiões evoluídas, o setor leiteiro estabeleceu campanhas publicitárias so-
13
bre a qualidade e o valor do leite como alimento para o homem, não só
para combater a ação difamatória, como também para elevar o consumo,
que mostrava sinais de declínio. Especialistas em “marketing” no País têm
sugerido que “se os produtores de leite sempre reclamaram das dificuldades
que caracterizam o negócio, daqui para frente irão à loucura”.
Consumo de leite
Revista BALDE BRANCO - nº 413 - março de 1999
No Brasil, por outro lado, verifica-se que a produção é pequena para a po-
pulação existente. Estimativas indicam uma disponibilidade teórica de so-
mente 135 litros por habitante por ano, quando se considera nesse cálculo
os produtos importados. O País tem sido um ativo importador de lácteos,
comprando leite em pó integral e desnatado, longa vida, queijos, manteiga e
outros produtos. As crises periódicas de excesso são aparentes e provocadas
por períodos de retração de consumo, produção desequilibrada no decor-
rer do ano e importações injustificadas para determinadas épocas. Como
consequência da concentração da produção e da renda nas regiões Sudeste,
Centro-Oeste e Sul, no Norte e Nordeste a disponibilidade e o consumo de
leite e derivados são muito baixos e comparáveis àqueles observados nos
países muito pouco desenvolvidos dos continentes africano e asiático.
O baixo consumo médio de produtos lácteos no Brasil não pode ser atri-
buído somente à pequena produção, nem tampouco ao problema da into-
lerância ao leite, observada em grupos étnicos africanos, asiáticos e medi-
terrâneos. Estudos indicaram que uma grande parcela dessas populações
apresenta dificuldade para a digestão da lactose por herança ou lesões in-
testinais, mas o problema é desconsiderado, como consequência da peque-
na ingestão de leite e subprodutos.
Poucas pessoas ligadas ao setor lácteo ouviram falar que a Federação Pau-
lista de Criadores de Bovinos propôs criar, em setembro de 1927, o “Conse-
lho do Leite” que deveria ser composto por criadores, industriais, técnicos
ligados à atividade, professores e senhoras da sociedade, com o objetivo de
“promover a produção intensa do bom leite higiênico ou sanitário e propa-
gar o seu uso como bebida e como alimento incomparável que é, desper-
tando assim, entre nós, o hábito de cada pessoa tomar por dia, no mínimo,
meio litro de leite, e ainda mais, o hábito de tomarem o queijo, a manteiga e
o creme como alimentos e não como accessórios de refeições e sobremesas”.
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Sabe-se, hoje, que o leite também contém fatores nutricionais que benefi-
ciam vários aspectos relacionados com a saúde humana como peptídeos
bioativos, componentes importantes na gordura como CLA (Ácido Li-
noleico Conjugado), vitaminas, ácidos graxos essenciais ao organismo,
Omega 3, etc. Acima de tudo, é uma fonte importantíssima de proteína de
elevado valor biológico, sendo um líquido que contém proteína não dis-
solvida, mas, sim, na forma de micélio (caseína). Além de todas as qua-
lidades mencionadas, o leite pode ser usado para produção de alimentos
de grande aceitação como queijos, iogurtes, sorvetes e outros produtos
doces e salgados, todos bastante apreciados por crianças e adultos.
NOTA DE RODAPÉ: *Fome Zero - programa do governo federal brasileiro criado em 2003 para
o enfrentamento da fome e da miséria.
Sinal de evolução
Revista BALDE BRANCO - nº 508 - fevereiro de 2007
Desmentir afirmações caluniosas sobre o leite não deve ter como objetivo
somente eliminar barreiras que possam reduzir seu consumo, mas também
difundir conceitos corretos de nutrição para o bem estar da humanidade.
O leite denegrido
Revista BALDE BRANCO - nº 518 - dezembro de 2007
agora só bebe leite. Outra charge mostra uma jovem morena bebendo leite
no primeiro quadro e, no segundo, ela se transforma em loura, e o texto diz
““o Ministério da Saúde adverte que beber leite com água oxigenada pode
fazer você demorar a entender essa piada”. Uma empregada com um frasco
de produto de limpeza na mão dizendo para a patroa que acabou a água
sanitária recebe como resposta de que pode utilizar leite para a limpeza,
porque o efeito é o mesmo.
Os desenhos bem feitos e sugestivos não pouparam nem os políticos que uti-
lizaram bovinos para justificar o injustificável, pois em um deles, uma vaca
malhada e chifruda diz que depois da boiada de Alagoas, da bezerra de Bra-
sília e da fraude do leite, a reputação da categoria está abalada em todo o País.
Esta é uma rotina que se repete desde a metade do século XX, quando o governo
brasileiro, em 1945, passou a tabelar o preço de aquisição e venda do produto,
visando fundamentalmente atender à expectativa do consumidor por preços su-
postamente compatíveis com o nível de renda da população. Durante os 46 anos
de intervenção, as donas de casa acompanharam com grande interesse as inter-
mináveis discussões que se estabeleciam entre produtores, indústrias e governo.
Esta situação não é favorável ao setor leiteiro, pois o produto passa a ser
uma espécie de vilão e é sempre motivo de críticas e reclamações, sem ha-
ver uma tentativa de caracterização de fatores que determinam elevação
de preços ao consumidor. Na economia de mercado o preço do leite, como
também de outros produtos agropecuários, são frequentemente determi-
nados por fatos e fatores desvinculados da atividade produtiva e as oscila-
ções são normais e características do modelo econômico prevalecente.
32 Numa época em que campanhas bem orquestradas contra o consumo de
leite e derivados, apontados como alimentos desnecessários e até mesmo
“venenos mortais” em livros, revistas e TV, a insatisfação de ter havido ele-
vação de preço pode ser um componente perigoso para estímulo ao aban-
dono do leite como alimento. Deveria existir uma reação esclarecedora
para a população sobre os fatores determinantes da elevação de preços no
varejo e, ao mesmo tempo, um reforço na imagem do leite como alimento
de qualidade inigualável e essencial para a humanidade.
Fica assim caracterizada uma polêmica pró e contra o leite como agente
causador ou benéfico para a solução de uma das mais temíveis doenças da
humanidade. Entretanto, a divulgação maciça das forças que se aglutinam
contra o consumo de produtos animais tem um poder de convencimento
maior pela frequência com que são veiculadas na mídia eletrônica. Deve-se
atentar para o fato de que a redação das mensagens é simples, despretensio-
sa e contundente, talvez procurando sensibilizar pessoas de todos os níveis
culturais. Resta saber a quem interessa denegrir, com tal intensidade, o leite
ou se o conceito faz parte de uma ideologia fundamentalista de pessoas que
se aglutinam contra o uso de animais para a produção de alimentos.
A ameaça da importação
Revista BALDE BRANCO - nº 553 - novembro de 2010
É fato reconhecido que o consumo de lácteos por habitante sempre foi mui-
to pequeno no Brasil, bem abaixo do que seria necessário para atender às
recomendações para uma nutrição saudável. Por isso, o País consegue ter
excedente mesmo com produção pequena em relação à população, pois a de-
manda é restrita e está estagnada num patamar pouco recomendável. Para se
ter uma ideia real do significado desse fato, se o brasileiro médio consumisse
mais 40 kg de leite por ano, que não seriam suficientes para atingir o nível
recomendado, haveria, talvez, um déficit de 7 a 8 bilhões de litros. Com isso,
para atender a população, o País seria importador e, nessas condições, o leite
local, com certeza, não seria facilmente desvalorizado. Estímulo de consumo
deveria ser um tema incluído nas reivindicações dos produtores para a defesa
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do leite nacional, como, por exemplo, lutar pela introdução obrigatória do
leite na merenda escolar, fato que traria benefícios reais e mensuráveis para a
população jovem, como comprovado em outros países.
Falta de notícias
Revista BALDE BRANCO - nº 566 - dezembro de 2011
No final do ano de 2011, notícias sobre a elevação dos preços da cesta bási-
ca, outro fantasma, associado ao monstro da inflação, que novamente ron-
da e apavora a sociedade brasileira, elegeram a carne, o pão, o café e o óleo
de soja, como os vilões dos aumentos detectados nas pesquisas do DIEESE
(Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos).
Ficando fora da lista, o leite mais uma vez não participou das manchetes,
apesar se ser integrante da citada cesta básica dos brasileiros.
Por outro lado, parece ser uma constante a não divulgação de fatos enalte-
cendo o setor que produz matéria prima para elaboração de grande núme-
ro de produtos bastante apreciados pela população e, sobretudo, alimentos
considerados insubstituíveis para a nutrição adequada de crianças e pesso-
as idosas, e também adultos, que necessitam de alimentação balanceada.
Também não é divulgado com frequência, o papel social do setor oferecen-
do empregos no campo e na cidade, e meio de sobrevivência para peque-
nos proprietários rurais, que, muitas vezes, dependem da produção de leite
para a sobrevivência da família no meio rural.
Quem visita países com tradição na produção de leite pode verificar que
noticias positivas sobre o leite sempre fazem parte do noticiário, porque o
setor é organizado e existem órgãos representativos poderosos, financiados
pelos elos da cadeia produtiva para cuidar da imagem do leite como ali-
mento e como atividade digna e importante do agronegócio.
Questionamentos sem sentido
devem ser rebatidos
Revista BALDE BRANCO - nº 568 - fevereiro de 2012
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Recentemente, uma consulta feita em voz baixa e reservada, reve-
lou que um dos alimentos considerados mais importantes para a
humanidade continua ameaçado por infâmias, que têm por objeti-
vo denegrir sua imagem para que seja banido do consumo diário. A
pergunta apresentada por uma senhora de meia-idade era rele-
vante, porque dizia respeito à preocupação atual sobre fatores
que desencadeiam a doença de Alzheimer*, e ela tivera conheci-
mento de que o consumo de leite de vaca estava relacionado com
o mal, que assusta por suas consequências e gravidade. A infor-
mação foi obtida em um longo artigo postado na internet e, como
sempre acontece, escrito com um linguajar pseudocientífico, re-
velando nomes e lugares para conferir credibilidade ao assunto.
O impulso imediato de responder que tudo não passa de uma grande bo-
bagem deve ser substituído por uma resposta mais consistente e baseada
no argumento de que não se sabe ainda o que desencadeia tal doença, que
os artigos escritos na internet não sofrem nenhuma análise crítica de espe-
cialistas e que somente artigos científicos, publicados em revistas especia-
lizadas, devem ser considerados, porque são revisados por cientistas reno-
mados antes de serem publicados. A defesa do leite deve ser levada a sério
porque a propaganda contrária é grande e se renova sempre.
Dúvidas sobre o leite como alimento também foram externadas por uma jo-
vem mãe que ficou muito preocupada com o que acabara de ler na caixa de
leite longa vida: “Aviso importante: este produto não deve ser usado para ali-
mentar crianças, a não ser por indicação expressa de médico ou nutricionis-
ta. O aleitamento materno evita infecções e alergias e é recomendado até os
dois anos de idade ou mais”. Ao ler a mensagem, ela teve a certeza de que não
deveria alimentar seu filho com leite de vaca porque o mesmo poderia desen-
cadear infecções na criança e que só em casos excepcionais, sob orientação,
poderia fazer uso do alimento. A dúvida, advinda da mensagem impressa, era
se o mesmo problema existiria para o leite de cabra, pois a produção de leite
materno era insuficiente, havendo, então, a necessidade de suplementação.
Leite adulterado
Revista BALDE BRANCO - nº 584 - junho de 2013
Uma vez mais, o leite é destaque na mídia por conta da adição de pro-
duto químico a um alimento considerado importante e insubstituí-
vel na alimentação de crianças e idosos, pelo alto valor nutritivo.
Com isso, mesmo sendo um fato isolado, toda a cadeia produtiva, de certa
forma, é afetada, pois condenar o todo pela exceção parece fazer parte da
natureza humana. Seria recomendável que se divulgasse aos consumidores
dos grandes centros urbanos o que realmente é, e como funciona a ativida-
de leiteira, e que a maioria dos produtores e laticínios trabalha com serie-
dade, adotando princípios éticos para a produção de um alimento saudável.
A mais recente fraude do leite registrada no Rio Grande do Sul tinha como
objetivo mascarar a adição de água ao leite pela colocação de ureia, produto
comumente encontrado em pequenas quantidades no leite e de difícil de-
tecção pelos laticínios, por não existirem testes rápidos. Adição de água é a
fraude mais comum e antiga porque o produto é vendido por volume e, no
caso detectado, existe a estimativa de ganhos de 10% na comercialização de
47
100.000.000 de litros, possibilitando ganhos fáceis e substanciosos. Relatos
da investigação revelaram que a fórmula para a adulteração era vendida
por R$ 10.000,00*, indicando que pessoas com conhecimentos de química,
também participavam, possibilitando ganhos aos transportadores.
Dessa maneira, os agentes da cadeia produtiva que agem dentro da lei não
seriam denegridos em episódios isolados em que párias da sociedade atu-
am, mesmo sabendo que cometem delitos graves que podem comprometer
a saúde da população.
De acordo com dados da FAO (Organização das Nações Unidas para Alimen-
tação e Agricultura) de 2011, existe um grande déficit de leite no mundo, pois,
considerando o volume produzido por todas as espécies, a disponibilidade teó-
rica, segundo o mais recente levantamento, é de somente 106 litros por habitan-
te, valor muito abaixo do que se considera adequado para o consumo humano.
Do total de leite disponível, 83% são produzidos pelos bovinos, o que mos-
tra a importância da espécie para a oferta do produto no mundo; 13% pelos
bubalinos; 2,3% pelos ovinos; 1,3% pelos caprinos, e somente 0,3% por ca-
melídios, principalmente na região norte da África. A quantidade de leite
de éguas e jumentas, que é utilizada em determinadas regiões da Ásia, não
foi relacionada nos dados publicados.
92%, sendo, então, uma atividade bastante restrita a uma região. O mesmo
ocorre com o leite de cabras e de ovelhas, porque 82% e 68% do total foram
produzidos na África e na Ásia, respectivamente.
Citam ainda que as vacas viveriam 25 anos se não produzissem leite, mas,
por conta da atividade são abatidas com cinco ou seis anos, fato incompa-
tível com o “sagrado direito dos animais”. Além disso, mencionam que a
produção de metano é muito grande nas fazendas leiteiras e que, por este e
os demais fatos citados, a produção de leite deveria ser banida.
O homem passou então a contar com uma nova fonte de alimento de alto
valor nutritivo que podia ser utilizada sem restrições. Assim, os produtos
lácteos podiam ser armazenados para garantir a sobrevivência nos inver-
nos longos e rigorosos, e a vaca se constituía num depósito vivo de alimento
fornecendo leite e, se necessário, era abatida para fornecimento de carne.
NOTA DE RODAPÉ: *A expressão originou-se em uma propaganda de 1976 criada pela Caio
Domingues & Associados, que havia sido contratada pela fabricante de cigarros J. Reynolds,
proprietária da marca de cigarros Vila Rica, para divulgação do produto. O vídeo apresentava
o meia-armador Gérson, jogador da seleção brasileira de futebol como protagonista finali-
zando com a frase: “Por que pagar mais caro se o Vila me dá tudo aquilo que eu quero de um
bom cigarro? Gosto de levar vantagem em tudo, certo? Leve vantagem você também, leve
Vila Rica!” Mais tarde, o jogador anunciou o arrependimento de ter associado sua imagem
ao anúncio, visto que qualquer comportamento pouco ético foi sendo aliado ao seu nome na
expressão Lei de Gérson.
E a tal política do leite?
Revista BALDE BRANCO - nº 351 - janeiro de 1994
Argumenta-se que a falta de uma diretriz clara, precisa e definida por parte
do governo impede a estruturação das fazendas produtoras de leite. Entre-
tanto, parece também existir unanimidade na afirmação de que as tentati-
vas governamentais de intervir no setor criaram problemas adicionais ou
trouxeram resultados desastrosos.
Não faz sentido dividir o esforço com o oportunista, que espera ver solucio-
nado o seu problema através de preços compostos de leite cota e extracota,
mesmo com prejuízos para quem garantiu o mercado na época de escassez.
A paixão pelas vacas de leite pode ser facilmente detectada nos indivídu-
os que, iniciando a atividade, aprendem a conhecer um animal de fácil e
agradável convivência. A aprendizagem lenta e detalhada do tipo leiteiro,
da base anatômica e fisiológica da lactação, geralmente desperta interesse
e satisfação. As grandes multidões urbanas que frequentam as exposições
ficam maravilhadas com a docilidade, beleza e elegância da vaca, capaz de
encher baldes de leite puro, palatável e nutritivo.
O gosto pela atividade leiteira talvez tenha sido o fator responsável pelo de-
senvolvimento do setor nos países evoluídos, onde o dono trabalha a terra,
tira o leite, não tem folga e executa tarefas rotineiras e inesperadas 365 dias
por ano. Se não apreciasse o que faz, seguramente mudaria de atividade,
pois quem planta milho, trigo ou soja trabalha duro num período limitado
de tempo e pode programar férias para a entressafra.
O produtor de leite, que gosta do que faz, considera-se recompensado pelo
nascimento de uma bezerra trazendo esperança, pelo desenvolvimento do
amojo na novilha criando expectativa e pelo parto confirmando a certeza
de uma boa produção. Apesar de tudo, os produtores conscientes sabem
que a atividade leiteira é, na realidade, um negócio e, portanto, não basta
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simplesmente gostar da atividade: é preciso também ganhar dinheiro.
NOTA DE RODAPÉ: *Estado Novo - nome do regime político fundado pelo presidente Getúlio
Vargas em 10 de novembro de 1937 que durou até 29 de outubro de 1945, caracterizado pela
centralização do poder, nacionalismo, anticomunismo e autoritarismo.
Dúvidas e certezas
Revista BALDE BRANCO - nº 364 - fevereiro de 1995
Será que com essa quantidade de leite vendida existiriam recursos sufi-
cientes para cobrir custos e ainda sobrar dinheiro para remunerar o ca-
pital e a administração da empresa? Escala pequena indiscutivelmente é
um problema crônico do setor leiteiro no País. Ninguém tem dúvida de
que receita é fundamental à empresa para pagar custos e obter sobras que
justifiquem o empreendimento. Quando as margens são pequenas, como
acontece com frequência na exploração leiteira, a magnitude da receita
passa a ser a base da sobrevivência da empresa, que poderá assim esperar
por dias melhores no futuro.
Sabe-se que produzir leite não é uma tarefa muito fácil. Exige administra-
ção e manipulação de fatores que afetam o potencial produtivo, visando à
produção por área, por vaca do rebanho, por unidade de mão de obra, por
real investido, etc. Aumentos substanciais de 30 a 40% na produção, inde-
pendentemente do nível de produção das matrizes, podem ser obtidos se
85% das vacas participarem efetivamente do processo produtivo.
Vendas de 2 litros a mais de leite por dia para cada vaca do rebanho podem
se conseguidos através da racionalização do aleitamento de bezerros, o que
representaria 200 litros para qualquer rebanho de 100 matrizes.
A marcha do leite para o Centro, Oeste e Norte do País é, hoje, uma realida-
de, mas a tendência não é nova. No Estado de São Paulo, o maior consumi-
dor, a pecuária leiteira já havia migrado na década de 1970 para os cerrados
e regiões mais planas, pois o Vale do Paraíba, a grande bacia do passado,
contribuía na época com somente 13% do total. Com a mudança, a ativida-
de atingiu áreas remotas, e, hoje, o maior volume de leite se concentra na
região de São José do Rio Preto. Antigamente, era inconcebível imaginar
pecuária de leite no Centro, Norte ou Oeste do Estado de São Paulo.
O Estado de São Paulo apresenta uma situação privilegiada para produzir lei-
te, porque apresenta uma agricultura estruturada e, no mundo todo, as duas
atividades estão sempre juntas. Além disso, a introdução do leite nas fazen-
das de cana-de-açúcar cria uma situação extremamente favorável, pelo uso
das terras de reforma para o plantio de milho, o uso de máquinas que estão
paradas, mão de obra abundante e tradição em agricultura. A área física ocu-
pada pelo leite pode ser pequena, mas a operação é grande, para que a escala
possa contribuir para a economicidade. Um número relativamente pequeno
de grandes fazendas poderia abastecer a cidade de São Paulo. Modelos em
funcionamento podem atestar o potencial que está sendo perdido.
As mudanças ocorridas podem ter sido causadas por vários fatores como:
invernos menos rigorosos, sem geadas fortes; secas mais brandas, com al-
gumas chuvas nos meses reconhecidamente secos; tendência de abandono
da capineira de capim-elefante em detrimento do uso de recursos forragei-
ros de melhor qualidade; coleta de leite em novas regiões, etc. Qualquer que
seja a razão, a verdade é que o equilíbrio aparente da produção leiteira trou-
xe novos e complexos problemas para os produtores e indústrias que não
estavam preparados para manipular excesso de leite, enfrentar estocagem
por longos períodos, e tampouco, a entrada de produtos lácteos do exterior
numa época considerada desfavorável e difícil.
Alguns produtores acreditam que aquele que procura mostrar o outro lado
da medalha, utilizando argumentos sobre eficiência de produção e redução
de custos através de tecnificação, esteja trabalhando contra o fazendeiro,
pois fornece argumentos fortes para que os compradores de leite pratiquem
preços mais baixos. Aparecem também insinuações de que os técnicos são
comprados pelos laticínios para facilitar a queda dos preços através de ar-
gumentos considerados teóricos. A falta de julgamento adequado, a inca-
pacidade gerencial ou a fé inabalável de que o custo obtido, sempre elevado,
se constitui no problema principal da fazenda leiteira, leva ao estabeleci-
mento de dogmas difíceis de serem quebrados. Reduzir o preço do produto
tem o mesmo significado para a empresa que elevação do custo, ou seja, a
margem líquida é reduzida ou fica negativa se nada mudar na fazenda.
Para quem faz uma análise mais detalhada e atenta, o significado das liqui- 79
dações de plantéis pode ter outro sentido, pois o que foi vendido no leilão
poderá ir para fazendas tradicionais, ou então, para o estabelecimento de
outras fazendas que estão se adaptando para o início da produção leiteira.
O problema poderia realmente ser sério, se ninguém se interessasse pelo
plantel, que tomaria, então, o destino dos matadouros.
Leite e pobreza
Revista BALDE BRANCO - nº 417 - julho de 1999
O leite entrou naquelas regiões, outrora ricas e prósperas, para substituir o café,
que cultivado de maneira imprópria, com conceitos meramente extrativistas,
exauriu o solo e teve de se mudar em busca da fertilidade natural de outras
paragens. O que restou não oferecia condições, na época, para o estabelecimen-
to de outras atividades agrícolas, seja pela baixa fertilidade ou por limitações
impostas pelo relevo acidentado. Para agravar a situação, as glebas que vinham
sendo exploradas por um longo período foram então subdivididas por herança
em famílias numerosas. Com isso, passou a haver predominância de pequenas
propriedades, difíceis de serem exploradas economicamente.
O conceito, outrora generalizado de que onde existe vaca aparece a pobreza, pas-
sou a ser cada vez menos considerado quando a produção de leite migrou para
as regiões planas do cerrado, apesar de serem as condições de estabelecimento
semelhantes, ou seja, iniciou-se com a exploração de gado de corte em terras
de baixa fertilidade. Entretanto, existia um grande potencial agrícola em gle-
bas maiores e, sobretudo, disposição de fazendeiros em aceitar novos conceitos.
Com isso, a atividade leiteira de subsistência perdeu significado, e surgiram fa-
zendas maiores, onde a venda do leite passou a ter outro significado econômico.
O enigma do leite
Revista BALDE BRANCO - nº 425 - março de 2000
Não dá para entender porque muitos produtores afirmam que o leite sempre
deu prejuízo e, mesmo assim, continuam no processo produtivo, quando a ló-
gica indicaria a procura de outras atividades para obtenção de bons resultados
econômicos. O enigma do leite no Brasil fica mais difícil de ser desvendado
quando se constata que o eminente colapso do setor sempre foi anunciado,
mas, na realidade, o que houve foi um crescimento muito significativo nas últi-
mas décadas, com o aparecimento de novos polos de produção em áreas onde
a pecuária leiteira nunca teve no passado, condições de estabelecimento.
Esses fatos contraditórios são agravados pelas análises sobre economia de
produção leiteira, pois resultados muito discrepantes são apresentados em
estudos ou informações divulgadas pela mídia. Como seria de se esperar
em qualquer atividade econômica, os custos estimados para a produção
são muito diferentes de fazenda para fazenda, mas, no setor leiteiro, o fato
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tem sido motivo de discussões intermináveis e levantamento de dúvidas
sobre a seriedade de estudos realizados sobre o tema. Em vez de estimular
a curiosidade e a análise do que causa a diferença, o tema provoca, muitas
vezes, revolta e descrédito.
Vontade de parar
Revista BALDE BRANCO - nº 427 - maio de 2000
caso de uma família inglesa, cujo filho único decidiu trabalhar na cidade,
e os pais velhos não tinham mais condições de tocar a fazenda leiteira. O
fato foi apresentado com emoção e lágrimas, pois todos os animais seriam
enviados para o abate, e as terras ocupadas com o cultivo de grãos. Em
qualquer circunstância, fechar uma fazenda leiteira não é fácil. Existem re-
latos de problemas psicológicos, depressão, complexo de incapacidade e
desajuste em outras atividades. Afinal, encerra-se com a atitude, um estilo
de vida e de trabalho e, muitas vezes, o sonho de uma existência.
Essa atitude parece trazer, não se sabe por que, uma espécie de alívio, mas
não irá alterar a situação atual, e os resultados só podem ser mensurados
de três a quatro anos depois, quando as novilhas completarem a primeira
lactação. Medidas complementares de mudanças no manejo podem levar a
alterações nos índices reprodutivos com reflexos bem definidos na capaci-
dade produtiva da fazenda. A redução da produção leva a uma renda bruta
menor, e os problemas não são solucionados ou podem ser agravados.
Ao que tudo indica, a verdade nem sempre causa indignação, mas, certa-
mente, não é aceita por falta de uma visão crítica, contrária à crença de
que o melhor estava sendo feito, numa fazenda considerada moderna,
com um rebanho de qualidade controlado por computadores, conduzida
por um capataz de larga experiência e confiança e, além de tudo, locali-
zada em uma região tradicional da atividade leiteira onde existe mercado
para leite e reprodutores.
O problema de fazendas que apresentam dificuldades técnicas, administra-
tivas e financeiras não é exclusivo de sistemas de produção ou localização
geográfica, mas sim de condições desfavoráveis existentes na propriedade,
que não são devidamente caracterizadas, analisadas e resolvidas. A ideia
generalizada de que investimentos vultosos em instalações, animais, equi-
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pamentos de ordenha, máquinas e implementos são pré-requisitos indis-
pensáveis para o sucesso de propriedades leiteiras no Brasil e no exterior, é
falsa e pode concorrer para que os problemas reais sejam deixados de lado.
A escassez fez com que o preço pago pelo leite tivesse no meio do
ano 2000 uma elevação considerável, trazendo de novo ao setor
estímulo e esperança de dias melhores. Uma série de fatores in-
ternos e externos fez com que a lei da oferta e da procura mais
uma vez mostrasse sua eficácia, levando inclusive ao reapareci-
mento do leilão para a obtenção de preços mais significativos.
Nessa suposição, não foi sequer comentado que o consumo brasileiro, prin-
cipalmente no meio rural, é muito baixo, devido ao hábito e ao fato de
o leite ser fundamental para a formação da renda familiar. Corrigindo a
metodologia, o autoconsumo passou a representar pouco menos que 3%, o
que significa 250 a 300 litros, mas esses valores devem estar também supe-
restimados. Surge então a dúvida do que seja autoconsumo. Estaria inclu-
ído nesse item o leite gasto também com a alimentação dos bezerros, leite
desprezado por mastite, colostro, doação ao vizinho por serviços prestados,
troca na aquisição de outros alimentos ou outros destinos não imaginados?
Como acontecia no passado, são números frios que podem ser mani-
pulados, dependendo dos critérios adotados para o cálculo, servindo
ainda para demonstrar que a atividade não é viável e assim solicitar
reajustes periódicos dos preços pagos pelo produto. Na época das bem
estruturadas negociações, a sistemática era válida, efetiva e sempre
trazia resultado, mesmo que os valores não fossem os desejados, pelo
simples fato de que a boa ou má vontade dos agentes governamentais
estabelecia os valores a serem pagos pelo leite.
Assim, pode-se ter uma ideia real do que se perde de receita por falhas
no manejo, problemas de reprodução e, sobretudo, uso de vacas sem per-
sistência de produção. Se for levado em consideração que somente a vaca
em lactação, que para tanto já deu cria, gera renda, fica evidente a impor-
tância de se preocupar também com a estrutura do rebanho, pois todas as
outras categorias de animais somente promovem gastos, sem participar
do esforço para produzir “moeda” na situação em que se encontram.
Todas as vezes que se demonstrava com dados reais que o tema agora
discutido era viável, havia uma reação muito grande, com manifesta-
ções curiosas e incompreensíveis. Talvez, uma das mais expressivas para
demonstrar a atitude dos que não admitiam a divulgação da possibili-
dade de que produzir leite era viável economicamente, seja a afirmação
extraída de um importante veiculo de comunicação na virada do século
XX: “Toda vez que especialistas apresentarem custos de produção para
104
produtores eficientes, completamente fora da realidade das fazendas, é
preciso reagir mostrando os custos reais”.
Nos Estados Unidos, a fazenda média tem, hoje, cerca de 100 vacas; em
1980, por volta de 32; em 1950 somente 6. No mundo desenvolvido a
pecuária de leite foi estruturada e ainda é dependente da pequena pro-
priedade. O que está acontecendo é um crescimento gradativo e aumento
na quantidade de leite vendida por dia nas fazendas, como se observa nos
EUA, com 2.500 kg nos dias atuais e somente 477 kg em 1980. Um fazen-
deiro americano que em 1950 tinha somente 18 vacas e tem hoje 4.000
é exemplo de que, quem não nasceu grande pode crescer se dedicando
exclusivamente ao leite.
Venda de leite
Revista BALDE BRANCO - nº 473 - março de 2004
No mundo todo, existe uma proposição que vem sendo repetida ao longo
dos anos em todos os países desenvolvidos: produzir leite não é tarefa mui-
to complexa quando se aplica conceito tecnológico objetivando eficiência e
gerenciamento. O difícil é vender um produto perecível que exige tecnolo-
gia para processamento, transformação e comercialização eficientes. Além
disso, é necessário enfrentar não só a concorrência de outros laticínios, mas
também o poder crescente das redes distribuidoras que dominam os gran-
des mercados consumidores.
Este fato não é bem entendido no Brasil, onde a comercialização de leite in-
formal parece simples por falta de fiscalização e, também, pela aceitação por
parte da comunidade, mas, na realidade, o que possibilita sucesso é o fato
de pequenos volumes serem vendidos em locais próximos à produção, num
período de tempo relativamente curto, de maneira a garantir certa qualidade.
Por esse motivo, a atividade não apresenta expansão rápida e generalizada, ou
107
é facilmente adotada por produtores maiores, apesar de ser sempre atrativa a
perspectiva de ganhar a parte do “leão”.
A crise talvez possa servir para mostrar como é importante para produto-
res, e também, consumidores, a existência de várias empresas que se encar-
regam de industrializar e comercializar produtos lácteos. Por outro lado,
para a indústria deve interessar o fortalecimento do setor produtivo, pois
só a união dos segmentos consegue criar um todo harmônico, semelhante
ao que existe para o setor lácteo em várias partes do mundo, objetivando a
venda de produtos de boa qualidade.
—
108
Enfim, o otimismo
Revista BALDE BRANCO - nº 475 - maio de 2004
O clima de entusiasmo que existe no meio rural brasileiro parece ter tam-
bém contaminado o setor leiteiro, pois já é possível encontrar na mídia,
manchetes dizendo que o número de vacas e a produção continuam cres-
cendo, que é possível vislumbrar autossuficiência, que os sinalizadores eco-
nômicos apontam para uma provável estabilização de preços e que o País
começa a se firmar como exportador, com condições boas para competir
no mercado internacional.
Um caso real poderá ilustrar o problema e mostrar como o custo em R$ por 111
litro pode revelar uma situação que não era de todo desfavorável: a compa-
ração entre o custo de produção e preço do leite em uma fazenda indicou
resultado negativo de R$ 0,035* por litro, mas quando a renda de animais foi
computada como equivalente-leite (divide-se o valor das vendas pelo preço
do leite) e o valor obtido somado à produção, houve reversão, obtendo-se um
resultado positivo de R$ 0,021, de maneira que a atividade não era o que po-
deria parecer à primeira vista. Esse fato acontece quando a renda proveniente
da venda de leite não é suficiente para pagar o custo de produção, e parte dos
recursos originários da venda de animais é usada para cobrir o déficit, e o re-
sultado final pode não ser bom, apesar de positivo. Em casos como o descrito,
a fazenda não tem o perfil característico do que deve ser uma propriedade
leiteira, pois depende da venda de animais para sobrevivência.
ros, quando existe euforia sobre o setor agrícola por parte dos
habitantes da nação, como também por residentes de outras re-
giões do planeta. Dados de produção e produtividade de grãos, ci-
tros, volume de carne produzida e exportada, revelam que o agro-
negócio brasileiro avança e que o meio rural, indiscutivelmente,
atingiu uma posição de progresso e de maturidade.
Relatos na mídia indicam que nas áreas mais pujantes não existe desemprego,
que a renda per capita é alta e que a venda de máquinas e insumos assume
proporções impressionantes. Comenta-se também que os visitantes de ou-
tros países ficam impressionados com a possibilidade de se estabelecer duas
ou mais culturas anuais como consequência de condições climáticas favorá-
veis. O desenvolvimento de variedades de plantas adaptadas, o conhecimen-
to e o combate de fatores limitantes, a existência de técnicos competentes e a
atitude profissional e arrojada de empresários modernos e eficientes colocam
o Brasil em posição de destaque como potência agrícola atual e do futuro.
Por outro lado, uma parcela muito grande das propriedades rurais, indepen-
dentemente do tamanho, não consegue participar do cenário descrito, como
sendo resultado de desinformação sobre tecnologia agrícola, falta de recursos
ou de ambição, se mostrando incapazes de se integrar, por não ter possibi-
lidade de produzir produtos de qualidade, de gerar excedentes em grandes
quantidades para a comercialização, nem de aproveitar os recursos existentes
que se encontram inexplorados.
Essa situação cria um conjunto de produtores que, a cada dia, mais se afasta
do mundo moderno da agricultura competitiva, fato facilmente caracteriza-
do em regiões que estão em declínio mostrando, na paisagem, nas cidades e
na atitude das pessoas, o resultado da estagnação. Áreas relativamente gran-
des apresentam características de subdesenvolvimento, e o que é pior, a falta
de perspectiva para o futuro ou para uma reversão na tendência estabelecida.
Considerar que esse segmento não é importante porque o progresso continua
e as perspectivas de aumento de safras são inegáveis não faz sentido, pois ele
representa uma parcela importante para a formação da renda bruta de agri-
cultura, principalmente, no caso dos produtos animais. Além desse aspecto,
contribuem para colocar as produtividades médias dos produtos brasileiros
118
num patamar típico das regiões subdesenvolvidas.
Leite empresarial
Revista BALDE BRANCO - nº 486 - abril de 2005
entre 7,7 e 14,0 kg de leite por dia, indicado que o conceito divulgado no
Brasil não é correto e contribui para o desestímulo do setor.
Por que razão se associa leite empresarial com tamanho, grandes inves-
timentos, modelos sofisticados, e por que ligar essas características com
tecnologia, como faz a mídia? A distorção perde sentido quando se analisa
o fato de que fazendas que se enquadravam nesse perfil deixaram de pro-
duzir, por causa de resultados negativos. Empresas leiteiras independem
de modelos, tamanho de área, investimentos em sofisticação ou volume de
produção, mas, sim do conceito de administração dos recursos produtivos.
Analisando a produção de leite no mundo, se vê que não é só nas grandes
fazendas dos Estados Unidos, com vacas de alta produção, que se produz
visando ao lucro e à remuneração do capital.
A magia do leilão
Revista BALDE BRANCO - nº 488 - junho de 2005
Não é raro oferecer bebidas alcoólicas para provocar euforia em alguns parti-
cipantes, o que pode estimular a disputa e a consequente elevação dos preços.
A venda em leilão público assume características interessantes, quando dois
ou mais indivíduos disputam um mesmo animal, movidos por sentimentos de
vaidade, determinação ou desejo de conseguir o que consideram ser o ideal.
Nessas condições, o proprietário atinge seus objetivos e a plateia aplaude quan-
do preços recordes são obtidos.
Para não ser enfeitiçado pela magia do leilão, o comprador deve ser racional,
estipulando o preço com antecedência e dando lances até o ponto em que a
aquisição possa ser considerada, em qualquer situação, um bom negócio.
Um caso real pode servir de exemplo para justificar a proposição de que uma
fazenda produzindo 895 litros por dia, um volume considerado grande para
o País, na realidade, deveria ser rotulada como pequena, quando se considera
o aproveitamento dos recursos produtivos. Com área de 700 hectares, um
rebanho de 467 cabeças, ordenha mecânica e boa localização, apresentava
45% de vacas, das quais, somente 55% produziam leite durante o ano, o que
125
significava que apenas 24,75% do rebanho eram de vacas em lactação, sendo
a produtividade da fazenda de 466 litros de leite por hectare.
O estudo detalhado dos bons resultados econômicos que têm sido obtidos
em fazendas pequenas revela que isso é consequência, não só de um plane-
jamento adequado do uso dos fatores de produção, como também da estru-
turação dos rebanhos, visando à obtenção de um volume elevado de leite
para o sistema proposto. Na realidade, o que se deve almejar é uma quanti-
dade de leite compatível com o potencial instalado, e não o valor absoluto.
Lembrou-se dos comentários que sempre ouviu de amigos que, também atra-
ídos pelo feitiço do leite, amargaram decepções investindo em fazendas e que,
depois de alguns anos, mudaram de atividade. As opiniões divulgadas pelos
meios de comunicação foram, na maioria das vezes, desfavoráveis, e a situação
geral sempre foi utilizada para predizer um futuro sombrio, que parece estar
cada vez mais sufocado por falta de condições adequadas para a produção.
A propriedade chamava atenção pelo capricho visto nas cercas bem feitas,
estradas conservadas, galpão de máquinas para abrigo, e boa manutenção,
organização e limpeza de todos os setores. Enfim, era uma fazenda admi-
rada e citada como modelo para toda a região, e, muitas vezes, usada para
demonstrações do manejo bem feito de vacas leiteiras.
O comportamento oscilante dos preços pagos aos produtores pode ser atri-
buído principalmente a fatores essenciais para o mercado, como baixo consu-
mo, produção em crescimento, queda no volume de exportações e aumento
das importações. Quando foi abruptamente inserida na economia de mer-
cado, a lei da oferta e procura passou a determinar o valor do produto. Até a
época em que o governo estabelecia preço mínimo, chamado de tabelamento
ou intervenção, o efeito favorável da medida para o produtor não era perce-
bido por causa dos índices elevados de inflação e pelo resultado da planilha
de negociação que superestimava custos e criava a ideia de preços injustos.
Terminada essa fase, os produtores não tiveram tempo, conscientização, nem
disposição de compreender as implicações do fato e também não entenderam
que os preços oscilantes são uma realidade para os produtos agrícolas, e que,
na globalização, estes são afetados também pelo comportamento do mercado
externo. Fato semelhante ocorreu nos Estados Unidos, pois até 1989, o governo
130
determinava um preço de garantia relativamente elevado e o preço real do lei-
te numa série histórica mostrava um comportamento de relativa estabilidade.
As análises mostram que, após a medida, o produto praticamente entrou na
economia de mercado e a variação média dos preços passou a ser oscilante
e afetada pela oferta e procura. Por exemplo, o ano de 2002 foi problemático
porque o preço efetivamente recebido pelos produtores ficou o ano todo abaixo
da média histórica e os fazendeiros não conseguiram cobrir depreciações, juros
sobre o capital empatado, nem a remuneração do empresário.
Para aumentar a produção de leite, não basta ter vacas com produção diária
elevada, sendo também essencial aproveitar efetivamente o potencial produ-
tivo instalado (terra e rebanho), para que seja possível haver compatibilidade
entre o capital empatado e a renda, porque cerca de 80 a 90% são provenien-
tes da venda de leite em fazendas cujo objetivo maior seja a produção.
Aumentos de produção de um litro de leite por vaca do rebanho por dia po-
dem ter um impacto muito grande na economia do processo de produção,
apesar de a quantidade parecer pequena. O fato não desperta curiosidade
porque o número de vacas nas fazendas não é grande e o conceito de pro-
dução por dia de vida útil raramente é utilizado. Entretanto, para fazendas
com 3.000 matrizes, como ocorre em outros países, o incremento anual de
produção seria de 1.095.000 litros. Por essa razão, os estrangeiros adotam
134
práticas para incrementar a produção em pequenas quantidades porque a
relação custo-benefício é favorável. Quando conceitos corretos de avaliação
de produtividade são adotados, se torna possível entender o significado de
não perder ou de ganhar um litro por vaca, desde que a consideração seja
feita em relação ao total de vacas existentes no rebanho.
Para o Brasil que tem fixação pela quantidade produzida e pretende ser ex-
portador, um litro de leite a mais por vaca do rebanho por dia teria um sig-
nificado surpreendente. O aumento de um simples litro resultaria em uma
elevação anual de 7,5 bilhões de litros, uma quantidade próxima da produção
da Argentina. Com 2 litros, o aumento ultrapassaria a produção da Nova
Zelândia, revelando um potencial imenso e inexplorado. A tarefa não é fácil
porque existe a necessidade de modificar conceitos tradicionais de manuten-
ção de rebanhos desestruturados e porcentagens baixas de vacas em lactação
por ano nas fazendas, fatores pouco alterados com o correr dos anos.
O preço pago pelo leite em agosto de 2007 foi o maior obtido nos
últimos anos, ultrapassando em mais de 30% o pico do valor médio 135
Apesar de todo o panorama favorável, existe sempre dúvida sobre qual será
o preço de venda no futuro e o que esperar em curto, médio e longo prazo?
Essa insegurança preocupa agricultores no mundo todo porque produtores
de leite enfrentam riscos econômicos devido a mudanças consideráveis, às
vezes, bruscas, nos preços do produto e dos insumos. No ano de 2005, con-
siderado problemático, a diferença entre o preço médio mais baixo e o mais
alto, praticados durante o ano, atingiu cerca de 30%. Valores semelhantes fo-
ram relatados para anos difíceis nos Estados Unidos, como 1990.
Flutuações nos preços dos insumos dentro do ano podem também atingir
valores significativos, fato que se configura como um desafio na conjuntura
atual. Como oscilações fazem parte do jogo de preços sujeitos à lei da ofer-
ta e da procura, seria interessante, para fins de planejamento, que houvesse
consciência do que é um preço suficientemente elevado para que haja proba-
bilidade de recuo em curto prazo ou o que seria muito baixo para estimular
a elevação em função de retrações na produção, que se observa em situações
de oferta deprimida, quando existe desânimo no setor.
Expectativa e realidade
Revista BALDE BRANCO - nº 524 - junho de 2008
O crescimento do leite nas regiões Norte e Nordeste revela expansão para novas
áreas, e a constatação da presença de grandes empresas comprando em rincões
remotos, competindo com pequenos laticínios regionais, cria uma nova e ines-
138 perada perspectiva, onde o leite era somente uma alternativa por falta de outras.
pectativa pode ser revelada pelo fato de que em 2006, de acordo com a
FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura), as
produções da França e do Brasil não foram muito distantes (25,3 e 24,2 bi-
lhões de litros, respectivamente). Entretanto, se o rebanho nacional tivesse
o tamanho do rebanho francês, o Brasil produziria cerca de cinco bilhões
de litros anualmente, uma quantidade menor do que a obtida em Minas
Gerais. O gigantismo do rebanho de vacas distorce a realidade, mas são
necessários mais esforços para que se reconheça que muito ainda deve ser
realizado para a solução de problemas relativamente simples, responsáveis
pela perpetuação de uma situação difícil de ser comemorada.
Carne de vaca
Revista BALDE BRANCO - nº 526 - agosto de 2008
Entretanto, nos dias atuais, a carne de vaca ainda é encontrada e conhecida nas
pequenas comunidades isoladas do Brasil e continua com essa denominação
entre os mais velhos, que, mesmo migrando para as metrópoles, continuam
interioranos na maneira de falar. Quem nunca ouviu alguém com um pedaço
de carne de novilho na mão dizer que, de todas as carnes, a única que não
enjoa quando consumida todos os dias é a de vaca. Existem casos verídicos de
patrícios que se encontraram no exterior e usaram martelo para amaciar carne
de Angus, objetivando fazer um bom bife acebolado de carne de vaca, acompa-
nhado de arroz e feijão, para matar a saudade da comida de casa.
—
144
Nestas ocasiões, cálculos feitos com vários cenários de preços podem indicar a
tão sonhada viabilização da atividade leiteira. Vender bem um animal é motivo
de grande satisfação porque representa para o vendedor o reconhecimento da
qualidade do rebanho, e também, demonstra habilidade de negociação.
O patinho feio
Revista BALDE BRANCO - nº 557 - março de 2011
É fato também discutido com frequência que o setor está relacionado com
pobreza, porque o meio rural das antigas bacias que abasteciam as metró-
poles de São Paulo e Rio de Janeiro está em decadência, uma vez que, nelas,
o leite ainda é a principal atividade econômica.
Prejuízos na produção
Revista BALDE BRANCO - nº 567 - janeiro de 2012
Visitando uma fazenda no Brasil com este perfil, o estrangeiro ficou cho-
cado com a afirmação do dono, de que os prejuízos operacionais não iriam
promover a desistência, pois produzir leite era uma espécie de terapia con-
tra o estresse provocado pela atividade urbana. Algum tempo depois, a fa-
zenda liquidou o plantel com a justificativa de que produção de leite com
“alta tecnologia” era inviável no País, devido ao preço pago pelo leite, à falta
de apoio governamental, etc. Nada foi comentado sobre resultados zootéc-
nicos e econômicos desfavoráveis.
O futuro não pode ser previsto, mas com toda certeza pode ser programado,
visando à mudança no sistema de produção, à evolução na rentabilidade,
ou à manutenção da boa situação em que se encontra o empreendimento.
Quem quiser ter sucesso como vendedor deve ter reputação de seriedade,
possuir um bom rebanho, administrar uma fazenda bem estruturada e di-
vulgar resultados para promover seu trabalho como criador, se esforçando 161
para ser reconhecido. O comprador, por outro lado, está sempre à procura
de matrizes de qualidade a preços razoáveis e recebe estímulos do que vê,
ouve, imagina, e da expectativa de possuir os animais escolhidos.
Para não ser enfeitiçado pela magia do “marketing caboclo” ou pelo clima dos
leilões, o comprador deve ser racional, reconhecendo que o valor a ser pago
por um animal deve ser estabelecido em função do retorno esperado pelo in-
vestimento feito na unidade produtora. Por isso, é preciso ter sempre em mente
que a vaca só é eficiente na geração de receita se reproduzir regularmente e se
possuir persistência na produção de leite. E que a probabilidade de novilhas se
tornarem boas matrizes é maior quando são filhas de touros provados.
3.
Qualidade
O novo produtor de leite
Revista BALDE BRANCO - nº 398 - dezembro de 1997
Nos países aonde a medida vem sendo adotada há anos, tudo funcio-
na harmonicamente porque fatores como indenização de toda carreta
contaminada, multa e, até mesmo, expulsão do quadro social, já estão
incorporados à cultura do produtor de leite. A nova concepção requer
tecnificação para auxiliar na eliminação de problemas de qualidade, no
manejo correto da retirada de leite, nas flutuações acidentais, na manu-
tenção consciente das ordenhadeiras, etc.
166
É bem evidente na atualidade o fato de que o parque industrial de
laticínios está cada vez mais procurando obter leite de boa qua-
lidade. A tendência pode ser atribuída à competição crescente, à
exigência de consumidores mais conscientes, ao maior rendimento
industrial e, até mesmo, às condições para exportações futuras
para o grande mercado latino-americano. Pagamento de leite pela
qualidade é a palavra do momento, e tecnologias desconhecidas
para a maioria dos fazendeiros são, de certa maneira, impostas
através do pagamento diferenciado do leite resfriado, com baixa
contaminação bacteriana e composição físico-química compatível
com o que se considera leite em qualquer local do mundo.
A verdadeira revolução por que passa o setor leiteiro do Brasil deve pro-
vocar, em vez de revolta, um alerta para que o produtor se prepare para o
futuro. Quem não se adaptar para o amanhã certamente terá dificuldade
de permanecer no setor, por pressões dos laticínios e dos outros fazendei-
ros, que terão consciência de que alguns podem estragar o seu esforço de
produzir com qualidade. A mistura nas plataformas de recepção e nos ca-
minhões-tanque nivela o leite por baixo e, com isso, a remuneração final ao
fazendeiro é penalizada por aqueles que, mantendo práticas tradicionais,
não conseguem alterar a qualidade do produto produzido.
Leite de qualidade
Revista BALDE BRANCO - nº 415 - maio de 1999
Mais tarde, mesmo com a mudança das vacas para outra fazenda, onde exis-
tia um estábulo, a ordenha continuava manual, não havia eletricidade, res-
friadores, e o leite tinha de ser transportado “quente” em uma carroça até o
laticínio, dentro de latões. Nos dias mais quentes, se tentava resfriar o leite
colocando os latões dentro de recipiente contendo água retirada de um poço,
através de bomba manual, mas o esforço nem sempre era recompensado. O
trabalho executado pelos proprietários da fazenda era consciente, dedicado,
mas as condições existentes não ofereciam oportunidade para a produção de
um leite que pudesse ser, nos dias atuais, considerado de boa qualidade.
O manejo do rebanho deve também ser adequado para que o leite não con-
tenha antibióticos, pesticidas, micotoxinas e sabor e odor estranhos. Infra-
estrutura não significa a existência de prédios, instalações, equipamentos
de ordenha, roupa branca para os ordenhadores, azulejos nas paredes, mas,
sim, uma concepção correta do que é produzir leite de qualidade. A orde-
nha mecânica não garante, por si só, a obtenção de leite livre de contami-
nação, pois a limpeza, a operação e a manutenção dos equipamentos e a
maneira de ordenhar podem afetar a qualidade do leite produzido.
O que comentar sobre a maioria dos produtores do Brasil, que além de não
terem a concepção correta para obtenção de leite de qualidade, também
não possuem nenhuma estrutura? Levantamentos realizados em Minas
Gerais, o Estado líder na produção, revelaram que só 6% das fazendas usa-
vam ordenha mecânica, e que os indivíduos que cuidavam da atividade não
tinham conhecimentos básicos.
Por tudo isso, nos últimos tempos, mesmo sem a legislação aprovada, esfor-
ços têm sido dirigidos no sentido de antecipar alguns acontecimentos. Por
exemplo, a coleta de leite resfriado em tanques de expansão é, hoje, imposta
por muitos laticínios, que não mais coletam leite quente, armazenado em
latões. O transporte a granel passou a ser rotina em muitas linhas de regiões
tradicionais, e a mídia tem mostrado sinais de dar um pouco de atenção à
qualidade, um problema que tem preocupado muitas pessoas num longo
período de tempo.
Como parte dessa nova consciência, que parece estar ganhando corpo,
muitos laticínios têm procurado coletar informações sobre o leite produzi-
do por seus fornecedores, visando estabelecer novos programas industriais,
estratégias de “marketing” e, quem sabe, uma base realista para o pagamen-
to por qualidade, como o adotado nos países de pecuária leiteira evoluída.
O banco de dados existente é significativo e pode dar uma ideia realista
do que está acontecendo. A contaminação com corpos estranhos é alta.
Quando se faz o teste de lactofiltração, a contaminação bacteriana, como
consequência, é também muito grande, enquanto a contagem de células
somáticas se mostra elevada. Preocupa também o fato de que a composição
171
química do leite, muitas vezes, não pode ser considerada normal, quan-
do comparada com o padrão estabelecido pela legislação e desejado pela
indústria. Ao que tudo indica, o País ainda enfrenta problemas reais na
qualidade do leite disponível para o processo industrial.
Conceitos distorcidos
Revista BALDE BRANCO - nº 441 - julho de 2001
Com toda certeza, as pessoas resistentes às medidas que visam obter matéria
prima de melhor qualidade nunca viram o filtro dos postos de recebimento de
um alimento que será consumido por seus familiares. A boa qualidade do leite
possibilitaria maior rendimento industrial e maior duração dos produtos comer-
cializados, além de sabor mais agradável e característico de produtos lácteos.
In51: realidade
por trás da prorrogação
Revista BALDE BRANCO - nº 562 - agosto de 2011
O mesmo padrão deveria ser aplicado nas regiões Norte e Nordeste um ano de-
pois, banindo, assim, definitivamente do País, o leite sem qualidade. A medida
também exigia que o produto ficasse armazenado nas fazendas em temperaturas 177
No entanto, nove anos após a edição e seis anos depois da implantação da pri-
meira etapa, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento prorrogou
por seis meses a entrada em vigor das novas exigências de qualidade para a pro-
dução de leite, acatando argumentação das entidades de classe e da indústria.
Se aplicada, a medida retiraria do mercado um número muito grande, mas não
especificado, de produtores, por não serem capazes de atender às exigências
estabelecidas. Este fato traria problemas de abastecimento, porque a produção
brasileira de leite não é grande, quando se considera a população.
Além disso, a maioria das fazendas faz uso de ordenha manual, e a porcen-
tagem das que adotam uma ordenha diária é alta, mesmo nos estratos de
produção mais elevados. Os rebanhos não são adequados para a produção
de leite, como consequência do elevado grau de sangue zebuíno das matri-
zes que são servidas por touros também não qualificados. Em resumo, não
existem dados indicativos de que a produção de leite seja uma atividade
bem estruturada ou organizada em bases empresariais.
Um produtor americano que visitou o Brasil revelou que teve que execu-
tar em sua fazenda cerca de 6.000 ordenhas e tratos sem uma falta sequer.
Então, numa determinada época, decidiu expandir a escala, ampliando o
rebanho para um nível onde sentiu necessidade de contratar mão de obra
permanente. Seus empregados, todos mexicanos, de nível cultural baixo e
considerados muitas vezes trabalhadores preguiçosos, ruins e desprepara-
dos em seu país de origem, são produtivos e determinados na fazenda ame-
ricana. Na avaliação do fazendeiro, existe necessidade de seleção, acom-
panhamento e orientação, e o fato de sua família continuar trabalhando
ativamente cria uma escola permanente de ações e atitudes corretas para
181
com a atividade leiteira. A postura do empregado em relação ao trabalho
foi atribuída ao ambiente e à remuneração.
Essa visão prevalece no meio rural, mas nunca afetou o crescimento acele-
rado da produção, porque o leite é fonte de renda mensal e adotada espon-
taneamente quando existe possibilidade de captação do produto em regiões
afastadas. Por ser conduzida de maneira extrativa, vem a ideia de que é fácil
de ser executada, não exigindo nenhuma qualificação, a não ser a posse de
vacas que reproduzem. Taxas de crescimento muito altas na região norte
do Brasil revelam que continua a expansão com conceitos extrativistas em
regiões típicas de gado de corte, seja por falta de outra opção ou por proble-
mas de deficiências tecnológicas para implantação de outras atividades. O
leite se estabelece quando surgem nas fronteiras unidades de compra para
o processamento do produto.
Após o parto, para a primeira ordenha, não amarrar as pernas, pois a ação
causa estresse, devendo-se trabalhar com movimentos suaves e calmos.
188 Normalmente com esses cuidados, o animal poderá aceitar a ordenha sem
o bezerro, não mostrará reações de medo e a descida do leite será normal.
Esta ação, raramente utilizada, poderá revelar que estabelecendo uma inte-
ração amistosa com o animal, se consegue resultados muito favoráveis no
manejo, com reflexos favoráveis na produção.
Artigos, palestras, livros e cursos são oferecidos aos donos de fazenda para
que possam entender conceitos filosóficos, se adaptar e aplicar métodos
para a obtenção de resultados, de forma que possam estar na propriedade
sem se aborrecer com fatos inesperados e irritantes. Muitas vezes, as decep-
ções estão relacionadas com irresponsabilidade, falta de comprometimento
e desonestidade, razões muito fortes para desencadear desânimo.
são pouco favorável sobre a atuação do trabalhador rural não deve ser de
todo inapropriada, porque vários técnicos estrangeiros de renome interna-
cional que vieram ao Brasil observaram o mesmo em fazendas de elite visi-
tadas. Confessaram, sem nenhum questionamento a respeito, que notaram
problemas sérios na condução dos trabalhos e que tal fato comprometeria
seriamente e eficiência do processo produtivo.
Crescimento da
produção: um desafio
Revista BALDE BRANCO - nº 560 - junho de 2011
Nesse caso, devem ser feitas análises a fim de quantificar o volume de leite
192 necessário para pagar o salário e os encargos sociais, e também, visando à
estabelecer critérios de avaliação do impacto do trabalho contratado so-
bre a produção e a produtividade. Estudos norte-americanos da década de
1970, quando mudanças estruturais dos rebanhos começaram a se tornar
evidentes, revelaram que apareceram problemas de mortalidade de bezer-
ros, elevação no índice de mastite e piora na reprodução, indicando que o
preparo e o comprometimento dos funcionários são fatores muito impor-
tantes para a manutenção de condições favoráveis ao sucesso.
Um produtor americano, que visitou o nosso País, relatou que em sua fazenda de
600 vacas leiteiras não tinha problemas com funcionários contratados, porque
nunca a ordenha ou a rotina de alimentação eram executadas sem a presença
de um dos membros da família, que também participavam das atividades. Além
disso, a responsabilidade pelo controle da reprodução e por outros fatores es-
senciais para a atividade era sempre compartilhada com os membros da família.
Assim, seria esperado que quanto maior a produção de leite por dia por
homem, mais efetiva, consciente, comprometida e acertada seria a atuação
dos trabalhadores, provavelmente capacitados para o trabalho por meio de
treinamento específico, bonificação por resultados obtidos e, sobretudo,
motivação e trabalho em equipe.
Entretanto, a produção de leite que faz parte do cálculo do índice não está
na dependência única da qualidade do trabalho das pessoas encarregadas
de executar o manejo do rebanho, pois é fortemente influenciada pela qua-
lidade das matrizes, estrutura do rebanho e pelo uso intensificado do solo
para garantir produção de alimento e manutenção de grande contingente
de animais produtivos na propriedade.
Os estábulos convencionais típicos da época áurea do leite tipo B são pouco fun-
cionais, pois exigem contenção de cada animal num mesmo ponto duas vezes
por dia, distribuição manual de alimentos e, com frequência, ordenha com bal-
de ao pé. Trabalhos desnecessários e prejudiciais, que tomam tempo e exigem
mão de obra, são comuns nas fazendas leiteiras, como lavagem de úberes e está-
bulos, colocação de água no cocho de ração, moagem de feno, aleitamento arti-
ficial prolongado, colocação de peia em vacas na sala de ordenha, entre outros.
sistemas de pasto irrigado com pivô central, no sul dos Estados Unidos,
ordenham, em cada uma delas, 600 vacas com uma força de trabalho com-
posta por quatro pessoas por fazenda, que se encarregam de todas as ati-
vidades, como ordenha, aleitamento de bezerros, inseminação artificial,
diagnóstico de prenhez, adubação dos pastos, tratamento de doenças e feri-
mentos, etc. Como a média das vacas em lactação é de 20 litros, a produção
de leite por homem por dia é de 3.000 litros.
São fazendas leiteiras que buscam soluções simples e econômicas para esta-
belecer um sistema de produção em que a estrutura permite racionalização
do trabalho e economia de tempo e esforço, que, associados a um planeja-
mento efetivo das atividades, maximizam o desempenho da mão de obra.
A população urbana vem sendo, há muito tempo, alimentada por uma pe-
quena parcela da população que é capaz de produzir para o seu sustento e
para milhões de indivíduos que ganham a vida fora do campo, sem ter que
enfrentar o trabalho exaustivo vivido pelo agricultor, na difícil tarefa de pro-
duzir alimento cada vez melhor e mais barato. Membros bem alimentados da
sociedade não são capazes de imaginar o que significa escassez de alimento,
impossibilidade de escolha, ou mesmo, preços proibitivos por procura maior
que oferta e, mesmo assim, se acham no direito de ditar regras para uma mi-
noria de agricultores, que vai ficando cada dia mais insignificante, pelo uso
eficiente de tecnologia gerada pelo conhecimento científico.
Movimentos organizados para modificação de métodos e ações praticadas
pelos agricultores têm sido também dirigidos para a criação de animais do-
mésticos, visando impor condições consideradas naturais para os sistemas
de produção de todas as espécies domésticas. Os argumentos utilizados en-
contram eco emotivo na sociedade urbana, que gostaria de ver os animais
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vivendo como se estivessem em seu ambiente natural. Acreditam que só as-
sim, se sentiriam felizes e que o fazendeiro utiliza ambientes artificiais, que
não atendem às necessidades de uma vida saudável e prazerosa. Essas ideias
encontraram grande repercussão nos países desenvolvidos, com abundância
de alimentos, riqueza e, como no caso da Europa, onde existem restrições
para aumento da produção agropecuária. Entretanto, a ideia tem se espalha-
do pelo mundo, fato que pode provocar problemas em regiões onde ainda
existe deficiência de alimentos. O movimento está chegando ao Brasil.
Algumas propostas para garantir o bem estar dos bovinos são esdrúxulas,
porque procuram transferir para os animais o conceito humano de felicida-
de. Fala-se, por exemplo, que um dos aspectos mais cruéis observados nas
fazendas leiteiras é a separação do bezerro logo após o nascimento, contra-
riando o forte instinto maternal e privando a cria do contato com a mãe.
Surgem sugestões no sentido de que, se o fato acontecer, o homem deverá
procurar substituir o afeto materno, estabelecendo um contato mais íntimo
com o bezerro. Um fazendeiro americano que ouviu essa proposta em uma
reunião europeia achou graça e perguntou como acariciar e conviver mais
intimamente com o bezerro, quando se tem um rebanho de 9.000 vacas? O
aleitamento artificial tem sido aplicado há mais de 50 anos, visando grande
economia e facilidade operacional, sem prejuízo para o desenvolvimento
do bezerro ou da produção de leite.
Bovinos leiteiros necessitam de conforto, pois o animal não pode viver com
sede, fome, calor ou frio excessivos, dores, ferimentos, doenças e parasitos,
medo, angústia, e em ambientes úmidos. Existem métodos de avaliação de
estresse por alterações hormonais, mudança no comportamento, produção,
crescimento, susceptibilidade a doenças e, sobretudo, reprodução. Uma
vaca feliz consegue produzir bem, garantindo o sustento do fazendeiro e
alimentando populações urbanas que adquirem lácteos de boa qualidade,
embalados e a preços satisfatórios.
Quando a galinha era criada livre na natureza e o frango caipira era comida
de domingo ou de pessoas doentes, a época era de escassez, como lembram,
sem saudades, pessoas que viveram em tal época.
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