Serie Deficiencia Visual Vol5 Cbo BQ

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SÉRIE

DEFICIÊNCIA
VISUAL
Braille!?
O que é isso?
VOLUME V
VOLUME V

Informações
Gerais
AUTOR
Regina Fátima Caldeira de Oliveira

DIREÇÃO EDITORIAL
Itamar Santo Junior

COLABORADORES
Elza Maria de Araujo Carvalho Abreu
Fernanda Christina dos Santos
Maria Cristina Godoy Cruz Felippe

REVISÃO
Bárbara Alves de Carvalho
João Vitor de Andrade
Leticia Nishimoto

IMAGENS
Banco de imagens da Fundação Dorina Nowill para Cegos
I
Apresentação
7

“Agora, a cegueira não é mais uma tragédia”, teria dito o imperador Pedro II de-
pois que José Álvares de Azevedo demonstrou que poderia ler e escrever utilizando
o alfabeto Braille. A singela frase, que não temos certeza se realmente foi proferida
pelo simpático monarca, marcou o início das medidas de prevenção, recuperação e
reabilitação das pessoas portadoras de deficiência visual no Brasil, naquele momento
histórico, materializadas com a inauguração, meses depois, do Imperial Instituto dos
Meninos Cegos, rebatizado de Instituto Benjamin Constant com o advento da República.
De lá para cá, muita coisa mudou e atualmente as pessoas portadoras de deficiên-
cia visual têm inúmeros recursos à disposição, inclusive programas de computador e
aplicativos de celular, que podem tornar suas vidas mais fáceis e pavimentar o caminho
para a Cidadania plena. Na base de todo esse processo, está o alfabeto Braille, sólido
alicerce de um edifício de múltiplas derivações e que está em constante evolução.
Nesta publicação, que se soma às outras quatro que foram editadas por ocasião do
I Fórum Nacional de Atenção à Pessoa com Deficiência Visual (realizado em maio de
2018), a professora Regina Fátima Caldeira de Oliveira nos brinda com uma apresenta-
ção rica e didática sobre o Braille e suas potencialidades e consequências.
“Braille!? O que é isso” editado pela Fundação Dorina Nowill e pelo Conselho Brasi-
leiro de Oftalmologia por ocasião do II Fórum Nacional de Atenção à Pessoa com Defi-
ciência Visual, vem complementar a coleção iniciada no ano passado e marcar a grande
preocupação das entidades envolvidas.
Sabemos que, para a maioria das pessoas portadoras de deficiência visual, ainda
resta um longo caminho a ser percorrido para obter condições razoáveis de mobilidade,
educação, profissionalização, enfim, para a obtenção da Cidadania plena.
Foi para debater as formas de tornar este caminho mais curto que o Conselho Bra-
sileiro de Oftalmologia, a Sociedade Brasileira de Visão Subnormal e outras entidades
promovem este II Fórum e editam este pequeno /grande livro como parte dele.
Boa leitura a todos e um grande encontro para todos nós!

José Augusto Alves Ottaiano


Presidente do Conselho Brasileiro de Oftalmologia
Gestão 2018 / 2019
II
Introdução
Talvez você já tenha observado em algumas embalagens de remédios e de alimen-
tos alguns pontinhos em relevo e tenha se perguntado “O que será isso?”. Ou, quem
sabe, já tenha tido a oportunidade de ver uma pessoa cega lendo um livro no ônibus ou
no metrô e tenha pensado “Quem será que inventou essa forma de leitura?”.
Foi para responder a estas e a outras perguntas que resolvemos escrever este ma-
nual. Nele você encontrará algumas informações importantes sobre o sistema de escri-
ta e leitura que mudou a vida das pessoas cegas de todo o mundo e sobre Louis Braille,
o jovem francês que o inventou.
III
O Sistema
Braille
11
Seus Antecedentes
A invenção da escrita foi, sem dúvida, uma das maiores conquistas da humanidade.
É por meio dela que os seres humanos recebem e transmitem conhecimentos e infor-
mações. Durante séculos, muitas pessoas se esforçaram para que os cegos também se
beneficiassem dessa grande conquista.
Conta-se que, no século XIV, um célebre professor árabe, chamado Zain-Din al Ami-
di, que havia perdido a visão logo após o nascimento, desenvolveu um método para
identificar seus livros e resumir informações. Esse método consistia em fazer espirais
de papel muito fino que, depois de engomadas, eram dobradas sobre as letras.
Em 1517, na Espanha, Francisco Lucas desenvolveu um jogo de letras esculpidas em
finas placas de madeira. Essa ideia chegou à Itália em 1575, tendo sido melhorada por
Rampansetto, que passou a usar blocos maiores. As duas tentativas fracassaram, pois a
leitura através desses métodos era muito difícil.
Na Alemanha, no século XVII, foi utilizado um método que consistia em recobrir uma
placa de madeira com cera, sobre a qual as pessoas cegas podiam escrever com um estilete.
O escritor francês Diderot fala de uma mulher cega que, em 1741, foi alfabetizada por
meio de letras recortadas em papel.
Em meados do século XVIII, a cantora e pianista cega austríaca Maria Theresa von
Paradis foi alfabetizada por meio de alfinetes cravados em almofadas.

Instituto Real dos Jovens Cegos.

Em 1784, o francês Valentin Haüy fundou, em Paris, o Instituto Real dos Jovens Cegos,
a primeira escola para cegos do mundo. Ali, os alunos eram alfabetizados por meio de
um sistema tátil desenvolvido pelo próprio Haüy, que consistia na impressão dos ca-
racteres comuns em relevo linear nas folhas de papel.
E foi nessa escola de Haüy que ingressou, em 1819, o pequeno Louis Braille, que
transformaria de forma muito importante a vida de todas as pessoas cegas.
12
Sobre Louis Braille
Simon René era um seleiro muito conhecido na
região e sustentava a esposa e os filhos com o fruto
de seu trabalho, realizado em uma oficina localiza-
da na própria casa em que a família morava.
Desde que aprendeu a andar, o pequeno
Louis acostumou-se a ir para a oficina do pai,
onde permanecia por muito tempo brincando
com os retalhos de couro que caíam no chão.
Certo dia, quando estava com três anos de idade,
o garoto resolveu furar um pedaço de couro e, para
Louis Braille, filho do casal Simon René Braille e Monique Baron,
isso, aproveitou-se de um momento de distração de nasceu no dia 4 de janeiro de 1809, em Coupvray, uma cidadezinha

Simon René e apanhou um instrumento pontiagudo situada a cerca de 45 quilômetros de Paris.

chamado sovela. Aproximando o retalho de couro ao rosto, preparou-se para furá-lo, mas a
sovela resvalou e atingiu seu olho esquerdo, provocando uma grande hemorragia.
Com a ajuda de uma das filhas, Simon socorreu o pequeno Louis e, depois de tratar
o ferimento com remédios caseiros, sem grandes resultados, a família resolveu chamar
o médico de Coupvray, que também encontrou dificuldade para sanar o problema.
Após alguns meses, a infecção que
havia atingido o olho ferido passou
para o olho direito e, embora a família
fizesse todos os esforços para solu-
cionar o problema, aos cinco anos de
idade o menino ficou totalmente cego.
Muito esperto e inteligente, Louis
desde cedo manifestou grande dese-
Ilustração de Louis Braille na oficina de seu pai, momentos antes do acidente que jo de estudar. Em 1815, o velho abade
o deixaria cego.
que havia batizado Louis faleceu e seu
substituto, o abade Jacques Palluy, tornou-se grande amigo da família Braille.
Em 1816, o jovem Antoine Brecheret foi admitido como professor na escola de Cou-
pvray e o abade Palluy pediu-lhe que cuidasse da educação de Louis. Ele concordou e
durante dois anos o menino frequentou a escola como ouvinte.
Ainda preocupado com o futuro da criança, Palluy procurou um rico proprietário da
região, o marquês d’Orvilliers, que concedeu os recursos financeiros para que o menino
fosse levado a Paris onde, aos 10 anos, no dia 15 de fevereiro de 1819, ingressou como
aluno no Instituto Real dos Jovens Cegos.
13
Contudo, o instituto fundado por Valentin
Haüy passava por uma grave crise financeira
e suas instalações eram frias e úmidas. Ali, de
acordo com os padrões da época, a disciplina
era muito rígida. Embora não tenha escapado de
alguns castigos, Braille sempre foi um aluno de-
dicado e brilhante. Entretanto, a falta de livros
e as dificuldades de escrita e leitura o levaram
desde cedo a preocupar-se com a necessidade
de criar um sistema de escrita e leitura que per-
mitisse que as pessoas cegas tivessem uma edu-
Valentin Haüy (1745-1822), fundador da primeira escola para cação de qualidade.
cegos do mundo, o Instituto Real dos Jovens Cegos, de Paris.

A Origem do Sistema Braille


Em 1819, um capitão de artilharia do exército francês chamado Charles Barbier de
la Serre desenvolveu um sistema de sinais em relevo que, combinados, permitiriam a
transmissão de ordens aos soldados durante a noite. No escuro, eles conseguiriam, por
meio do tato, ler as mensagens representadas por pontos.
Barbier então pensou que o seu sistema poderia servir também para facilitar a
comunicação entre as pessoas cegas e transformou-o em um sistema que chamou de
Grafia sonora. Por meio dele, era possível escrever qualquer frase, mas as palavras não
podiam ser soletradas, pois o sistema era fonético, ou seja, representava apenas sons.
Em 1821, Barbier apresentou a Grafia sonora aos alunos do instituto, entre os quais
estava Louis Braille. Mesmo achando o sistema complicado, todos se mostraram inte-
ressados e deram sugestões para que fosse melhorado.
Braille aprendeu rapidamente a gra-
fia, que foi adotada no instituto como
um método auxiliar de ensino. Nas ho-
ras vagas, juntamente com seu amigo
Gauthier, ele lia e escrevia com o auxílio
de uma régua guia e de um estilete. Mas
Louis logo percebeu as falhas do sistema
e fez algumas propostas para melhorá-lo.
Mesmo reconhecendo a validade dessas
propostas, Barbier se recusou a fazer as
alterações nas bases de seu invento.
Representação da Grafia sonora de Charles Barbier de la Serre (1767-1841).
14

A partir de então, Louis Braille dedicou-se à criação de um sistema base-


ado em pontos que, de fato, atendesse às necessidades de escrita e leitura
das pessoas cegas. E assim, passava dias e noites debruçado sobre uma régua
guia e um estilete por ele inventados, fazendo tentativas para desenvolver um
sistema de escrita e leitura tátil.
Ao regressar das férias em Coupvray, no final de 1824, aos 15 anos, Braille
apresentou ao diretor do instituto, o Dr. Pignier, a novidade: um sistema de
escrita e leitura tátil bastante simples, que permitia a representação de letras,
números, acentuação, pontuação e símbolos básicos de aritmética. Além dis-
so, o sistema tinha a vantagem de permitir que cada um dos símbolos fosse
reconhecido por uma pessoa cega apenas com o contato da parte mais sensí-
vel do dedo indicador: a "polpa".
O Dr. Pignier interessou-se pelo invento e permitiu que o jovem Louis o
experimentasse no instituto. Os alunos receberam a novidade com entusias-
mo e em pouco tempo todos já liam e escreviam pelo novo sistema, que ficou
conhecido como Sistema Braille.

Embora continuasse as suas


pesquisas, Louis não se descuidou
dos estudos e em 1826 passou a
trabalhar como professor de Álge-
bra, Gramática e Geografia na esco-
la em que também era aluno.
Em 1827, aos 18 anos, Louis es-
creveu, em braille, a Gramática das
gramáticas e, em 1828, adaptou seu
sistema à representação de notas
Casa na qual nasceu Louis Braille (hoje, Museu Casa Natal de Louis Braille).
musicais. Em 1829, apresentou a
primeira edição do Método de palavras escritas, músicas e canções por meio de sinais,
para uso de cegos e adaptados para eles, em cujo prefácio reconheceu que a grafia de
Barbier havia sido a base para a invenção do Sistema Braille.
Em 1837, Louis apresentou a versão final de seu sistema, adotado até hoje em todo
o mundo, sofrendo apenas as adaptações necessárias em razão das evoluções das
línguas, da ciência e da tecnologia.
15
Louis Braille foi também um grande pianista e organista e graças a isso teve uma vida
social bastante intensa, prejudicada apenas pela tuberculose que adquiriu aos 26 anos.
Braille faleceu em Paris aos 43 anos, no dia 6 de janeiro de 1852 e foi sepultado em
Coupvray, quatro dias depois.
Por ocasião do centenário de sua morte, em 1952, seus restos mortais foram trans-
feridos para o Panteão, em Paris, monumento onde ficam os restos mortais de todas as
grandes personalidades francesas.

Honras militares.

Cerimônia de traslado dos restos mortais de Louis Braille para o Panteão, em 1952. Cerimônia.

Em 1854, o governo francês oficializou o Sistema Braille, reconhecendo-o como o


melhor sistema de escrita e leitura para as pessoas cegas do país.
Ainda em 1854, foi publicado o primeiro livro em língua estrangeira pelo Instituto
Real dos Jovens Cegos. Tratava-se de uma gramática em Língua Portuguesa, produzida
com recursos concedidos pelo Imperador D. Pedro II.
16

IV
A Evolução do
Sistema Braille
17
No Mundo
A primeira tentativa de levar o Sistema Braille para fora da França foi do próprio
Louis Braille que, em 1840, escreveu para o diretor da Escola de Cegos de Viena (Áustria)
falando sobre o seu invento, mas, lamentavelmente, não houve qualquer interesse por
parte dos austríacos. A introdução do braille em outros países teve início apenas na
década de 1860, mas no final dos anos 1880 já havia se espalhado por toda a Europa.
Durante o Congresso Internacional de Surdos-Mudos e Cegos de Paris, realizado em
1878, o Sistema Braille foi reconhecido como o melhor método de ensino de escrita e
leitura para cegos em todo o mundo.
Na América do Norte, o braille foi introduzido em 1860, mas a sua aceitação oficial
só aconteceu em 1918.
Na Ásia, entre 1870 e 1880, foram feitas as primeiras tentativas de adaptar o braille
às línguas não europeias. Mas os grandes responsáveis pela introdução do sistema
naquele continente, na África e em outros lugares distantes foram os missionários reli-
giosos, fundadores das primeiras escolas para cegos.
De 1949 a 1951, a Unesco promoveu uma série de reuniões destinadas a padronizar
o braille por grupos linguísticos. O resultado dessas reuniões está registrado no livro A
escrita braille no mundo, publicado pela Unesco em 1953, nos idiomas inglês, francês e
espanhol, reeditado em 1990 e 2013.
A partir da década de 1960, começaram a ser criadas comissões de braille em diferentes
países. Essas comissões, formadas por pessoas que conhecem profundamente o Sistema
Braille e nele reconhecem um instrumento indispensável para a independência, a autonomia
e a educação das pessoas cegas, vêm trabalhando incansavelmente para manter as caracte-
rísticas desse sistema e adaptá-lo à rápida evolução científica e tecnológica de nosso tempo.
Um exemplo dessa preocupação está no símbolo hashtag (#) que, mesmo sendo
bastante recente na escrita em tinta, já possui a sua representação em braille:

No Brasil
O Sistema Braille chegou ao Brasil pelas mãos do jovem
José Álvares de Azevedo, nascido no Rio de Janeiro, em 8 de
abril de 1834. O menino, que já nasceu cego, havia sido en-
viado a Paris aos dez anos de idade para estudar, permane-
cendo lá durante seis anos.
De volta ao Brasil, Azevedo escreveu diversos artigos
para jornais, falando sobre as possibilidades de educação
José Álvares de Azevedo (1834-1854), responsá-
de crianças e jovens cegos. Ele também ensinou o braille a vel pela introdução do Sistema Braille no Brasil.
18
diversas pessoas, entre as quais a jovem cega Adélia Sigaud, filha do Dr. Xavier Sigaud,
médico da Corte Imperial.
Azevedo conseguiu, por intermédio do Barão do Rio Bonito, uma entrevista com o im-
perador D. Pedro II, durante a qual fez uma demonstração de leitura e escrita em braille.
Impressionado com o desempenho de Azevedo, o imperador determinou que fossem
tomadas todas as providências para a instalação de uma escola para cegos no Rio de Janeiro.
Assim, no dia 17 de setembro de 1854, foi inaugurado o Imperial Instituto dos Meninos
Cegos, hoje Instituto Benjamin Constant, a primeira escola para cegos da América Latina.
Azevedo, porém, não viu seu sonho
realizar-se, pois faleceu exatamente
seis meses antes do grande acon-
tecimento, no dia 17 de março, em
consequência de uma infecção.
A produção de livros em braille
no Brasil teve início em 1857, com a
instalação de uma tipografia no Im-
perial Instituto dos Meninos Cegos. Imperial Instituto dos Meninos Cegos, hoje, Instituto Benjamin Constant, Rio de Janeiro, RJ.

Na Atualidade
No Brasil, o Sistema Braille foi plenamente aceito, empregando-se, a princípio, pratica-
mente toda a simbologia adotada na França. Em 1942, porém, foram necessárias algumas
alterações, em razão da entrada em vigor da reforma ortográfica da Língua Portuguesa. Na
Matemática, passou a ser adotada, nesta mesma década, a Tabela Taylor, de origem inglesa.
Em 1946, iniciou-se uma fase importante no processo educacional de pessoas cegas
no Brasil: a Portaria nº 385, de 8 de junho daquele ano, tornou oficial o Curso Ginasial do
Instituto Benjamin Constant, permitindo aos alunos o acesso aos cursos subsequentes.

Também em 1946, no dia 11 de março, a jovem cega


Dorina de Gouvêa, juntamente com um grupo de ami-
gas, deu início às atividades da Fundação para o Livro
do Cego no Brasil, hoje Fundação Dorina Nowill para
Cegos, com o objetivo de produzir livros em braille e
atuar nas áreas de educação e reabilitação de pessoas
com deficiência visual.
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Dorina havia perdido a visão aos 17 anos de idade, tendo sido a primeira aluna cega
a ingressar no Instituto de Educação Caetano de Campos, na cidade de São Paulo.
No dia 3 de setembro de 1953, foi assinada a Lei nº 2.287, que “instituía as classes
braille e o ensino itinerante no Estado de São Paulo”. Entretanto, as conquistas edu-
cacionais das pessoas com deficiência só se consolidaram em 1961, com a entrada em
vigor da Lei nº 4.024 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação).
A Lei nº 4.169, de 4 de dezembro de 1962, “oficializou as convenções braille para
uso na escrita e leitura dos cegos, além de um código de abreviaturas braille”. Esta lei,
porém, criava dificuldades para o estabelecimento de acordos com outros países e seu
conteúdo acabou sendo alterado em 2000, em benefício da unificação do sistema.
Em 1987, em Montevidéu, o Brasil participou como observador da reunião que resul-
tou na aprovação do Código matemático unificado para a Língua Castelhana.
Ainda em 1987, os participantes do II Seminário sobre o Uso do Sistema Braille no
Brasil recomendaram a criação urgente de uma Comissão Brasileira de Braille.
Enquanto as organizações nacionais de e para cegos desenvolviam esforços para
a concretização desta proposta, instalou-se a Comissão para Estudo e Atualização
do Sistema Braille em Uso no Brasil, que trabalhou de 1991 a 1994, com recursos fi-
nanceiros concedidos pelo Fundo de Cooperação Econômica da ONCE (Organização
Nacional dos Cegos Espanhóis). A principal decisão desta comissão foi a adoção do
Código matemático unificado para a Língua Castelhana, com as devidas adaptações
para a Língua Portuguesa.
Os trabalhos prosseguiram de 1995 a 1999 por meio da Comissão Brasileira de Brail-
le, instituída pela União Brasileira de Cegos, destacando-se neste período a divulgação
do Código matemático unificado em todo o território nacional, baseada na preparação
de professores, transcritores e revisores para a sua aplicação.
No dia 26 de fevereiro de 1999, foi assinada a Portaria nº 319 do Ministério da Edu-
cação, que instituiu a Comissão Brasileira do Braille (CBB), subordinada à Secretaria de
Educação Especial, que iniciou o seu trabalho em 10 de junho do mesmo ano.
No dia 25 de maio de 2000, foi assinado em Lisboa o Protocolo de colaboração Brasil/
Portugal nas áreas de uso e modalidades de aplicação do Sistema Braille, fruto do trabalho
conjunto desenvolvido pelas Comissões de Braille dos dois países. Esse trabalho resultou
também na unificação da simbologia e na produção de diversos documentos normatiza-
dores, que têm permitido mais qualidade na produção dos textos em braille, beneficiando,
inclusive, as pessoas cegas que vivem nos países de Língua Portuguesa na África.
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Esses documentos são:
· Grafia braille para a Língua Portuguesa
· Normas técnicas para a produção de textos
em braille
· Grafia química braille para uso no Brasil
· Grafia braille para a informática
· Manual internacional de musicografia brail-
le (tradução do documento produzido pelo
Subcomitê de Musicografia Braille da União
Documentos elaborados pela Comissão Brasileira do Braille (MEC). Mundial de Cegos)
· Estenografia braille para a Língua Portuguesa.
Atualmente, a Comissão Brasileira do Braille está vinculada à Diretoria de Políticas
Públicas de Educação Especial da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização,
Diversidade e Inclusão (SECADI), um órgão do Ministério da Educação.
Na década de 1980, teve início a impressão de textos em braille por meio de impres-
soras conectadas a computadores que, juntamente com o desenvolvimento de editores
de textos adaptados, permitiu um significativo aumento na oferta de livros, especial-
mente aqueles destinados aos estudantes cegos.

Impressora Tiger, que produz, simultaneamente, textos em braille e figuras Publicações em braille que permitem que as pessoas cegas desempenhem
em alto relevo. suas atividades com independência e autonomia.

Em 1º de dezembro de 2015, o Brasil ratificou a sua adesão ao Tratado de Marraqueche.


Os signatários do acordo assumem o compromisso de criar instrumentos nas res-
pectivas legislações que permitam a reprodução e a distribuição de obras, livros e
textos em formato acessível à pessoas com deficiência visual, como o braille, sem ne-
cessidade de requisitar autorização ao titular dos direitos autorais.
Em 2016, entrou em vigor a Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015, mais conhecida como
LBI - Lei Brasileira de Inclusão ou Estatuto da Pessoa com Deficiência, que beneficia
mais de 45 milhões de brasileiros. Este direito se estende a diferentes cenários sociais
21
e um deles é o acesso à informação e à comunicação. Destaque para estes quatro pa-
rágrafos sobre acessibilidade web e livros acessíveis:

· Dentro do tema de acessibilidade web, destaque para o Art. 63: "É obriga-
tória a acessibilidade nos sítios da internet mantidos por empresas com
sede ou representação comercial no País ou por órgãos de governo, para
uso da pessoa com deficiência, garantindo-lhe acesso às informações
disponíveis, conforme as melhores práticas e diretrizes de acessibilidade
adotadas internacionalmente".
· Sobre a produção e edição de livros: "Art. 68. O poder público deve adotar
mecanismos de incentivo à produção, à edição, à difusão, à distribuição e
à comercialização de livros em formatos acessíveis, inclusive em publica-
ções da administração pública ou financiadas com recursos públicos, com
vistas a garantir à pessoa com deficiência o direito de acesso à leitura, à
informação e à comunicação".
· Sobre os editais de compra de livros: "§ 1º Nos editais de compras de livros,
inclusive para o abastecimento ou a atualização de acervos de bibliotecas
em todos os níveis e modalidades de educação e de bibliotecas públicas, o
poder público deverá adotar cláusulas de impedimento à participação de
editoras que não ofertem sua produção também em formatos acessíveis”.
· Sobre os formatos acessíveis: “§ 2º Consideram-se formatos acessíveis os
arquivos digitais que possam ser reconhecidos e acessados por softwares
leitores de telas ou outras tecnologias assistivas que vierem a substituí-
-los, permitindo leitura com voz sintetizada, ampliação de caracteres, dife-
rentes contrastes e impressão em Braille”.
VI
Estrutura
e Uso do
Sistema
Braille
23

"Dentro da cela braille, a liberdade para quem não vê."


Edison Ribeiro Lemos (2001)

O sistema de escrita em relevo conhecido pelo nome de "braille" é constituído por


63 sinais formados por pontos a partir do conjunto matricial (123456). Este conjunto
de 6 pontos chama-se, por isso, sinal fundamental. O espaço por ele ocupado, ou
por qualquer outro sinal, denomina-se cela braille ou célula braille. Quando vazio, é
também considerado por alguns especialistas como um sinal; nessa interpretação, o
sistema passa a ser composto por 64 sinais.
Para facilmente se identificarem e se estabelecer exatamente a sua posição relativa,
os pontos são numerados de cima para baixo e da esquerda para a direita. Os três pon-
tos que formam a coluna ou fila vertical esquerda, , têm os números 1, 2 e 3; aos que
compõem a coluna ou fila vertical direita, , cabem os números 4, 5 e 6.

A distância entre pontos adjacentes em uma mesma cela é de 2,5 mm.

A separação horizontal entre os pontos de duas celas consecutivas é de 3,5 mm.

A distância vertical entre os pontos de duas celas em linhas imediatas é de 5 mm,


ou seja, entre os pontos 3 da cela superior e o ponto 1 da cela inferior caberia o ponto
designado como ponto 7. Da mesma forma, entre os pontos 6 e 4 caberia o ponto 8.
24

Cada ponto deve ter 1,5 mm de diâmetro, com altura do relevo em torno de 0,5 mm.
Os sinais do Sistema Braille recebem designações diferentes, de acordo com o es-
paço que ocupam.
Os sinais que ocupam uma só cela denominam-se sinais simples.

Aqueles em cuja constituição figuram os pontos 1 e/ou 4, mas em que não entram
os pontos 3 nem 6, chamam-se sinais superiores.

Aqueles que são formados sem os pontos 1 e 4 chamam-se sinais inferiores.

Os que são constituídos por qualquer conjunto dos pontos 1, 2 e/ou 3, dizem-se
sinais da coluna esquerda.

Os que são constituídos por qualquer conjunto dos pontos 4, 5 e/ou 6, dizem-se
sinais da coluna direita.
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Chamam-se sinais compostos os que se obtêm combinando dois ou mais sinais simples.

Os 63 sinais simples do Sistema Braille, apresentados adiante numa sequência denomi-


nada ordem braille, distribuem-se sistematicamente por 7 séries:

1ª série

2ª série

3ª série

4ª série

5ª série

6ª série
26
7ª série

A 1ª série é constituída por 10 sinais, todos superiores, pelo que é denominada sé-
rie superior. Serve de base às 2ª, 3ª e 4ª séries, bem como de modelo à 5ª.
A 2ª série obtém-se juntando a cada um dos sinais da 1ª o ponto 3.
A 3ª série resulta da adição dos pontos 3 e 6 aos sinais da série superior.
A 4ª série é formada pela junção do ponto 6 a cada um dos sinais da 1ª.
A 5ª série é toda formada por sinais inferiores, pelo que também é chamada série
inferior, e reproduz formalmente a 1ª.
A 6ª série não deriva da 1ª e desenvolve-se pelos pontos 3, 4, 5 e 6, e consta apenas
de 6 sinais.
A 7ª série, que também não se baseia na 1ª, é formada unicamente pelos 7 sinais
da coluna direita.
A escrita braille se faz ponto a ponto na reglete ou letra a letra na máquina braille
ou no computador.

O Sistema Braille é o processo de escrita em relevo mais adotado em todo


o mundo e se aplica não só à representação dos símbolos literais, mas tam-
bém à dos matemáticos, químicos, fonéticos, informáticos, musicais etc.

Na sua aplicação à Língua Portuguesa, quase todos os sinais conservam a significa-


ção original. Apenas algumas vogais acentuadas e outros símbolos se representam por
sinais que lhe são exclusivos.
Ao longo da história do Sistema Braille, têm sido realizados diversos estudos e experi-
ências com o objetivo de ampliar o número de símbolos representados por um único sinal,
sem prejudicar a legibilidade, nem aumentar excessivamente o espaço ocupado pelo texto.
Atualmente, o melhor sistema encontrado é o chamado "Braille de oito pontos",
constituído pela inclusão do ponto 7, abaixo do ponto 3, e do ponto 8, abaixo do ponto
6. Esta é uma solução que há muito tempo vem sendo empregada em displays, impres-
soras braille e linhas braille.
Curiosamente, o braille de oito pontos pode ser comparado a um byte (binary term);
em informática, número binário que é composto por 8 bites. Como um bit representa
27
dois valores (1 ou 0 - ligado ou desligado), e um byte possui 8 bites, com um byte é
possível representar até 256 caracteres (28 = 256).

BrailleNote Touch com 8 pontos.

Linha braille com 8 pontos.

Valor dos Sinais


Os sinais que se empregam na escrita corrente de textos em Língua Portuguesa têm
a seguinte significação:

1. Alfabeto

Obs.: O c com cedilha é representado pelo sinal


28
2. Letras com diacríticos
Tabela: equivalente textual a seguir.

3. Pontuação e sinais acessórios


Tabela: equivalente textual a seguir.
29

4. Sinais usados com números

5. Sinais exclusivos da escrita braille


30

Os sinais do Código Braille são geralmente empregados de acordo com as regras


adotadas na ortografia oficial. Entretanto, devem ser sempre seguidas as orientações
contidas nos documentos elaborados pela Comissão Brasileira do Braille (CBB) e publi-
cados pelo Ministério da Educação (MEC).
As letras maiúsculas representam-se pelas minúsculas precedidas imediatamente
do sinal , com o qual formam um símbolo composto.

Quando o número de palavras com todas as letras maiúsculas é superior a três,


pode empregar-se antes da primeira o sinal composto e antes da última o sinal
composto
31
As siglas, constituídas por iniciais maiúsculas, representam-se antepondo-lhes o
sinal composto

Quando, no original em tinta, as iniciais das siglas são seguidas de ponto abreviati-
vo, antepõe-se a cada uma delas o sinal simples . Exemplo:

6. Números
Os caracteres da 1ª série, precedidos do sinal , representam os algarismos de um
a zero. Quando um número é formado por dois ou mais algarismos, só o primeiro é
precedido deste sinal.
VII
Técnicas de
Escrita Braille
33
As regletes, uma variação do aparelho de escrita inventado por Louis Braille, são
ainda muito usadas pelas pessoas cegas. Sejam modelos de mesa ou de bolso, con-
sistem, basicamente, de duas placas de metal ou de plástico, fixas de um lado com
dobradiças, de modo a permitir a introdução do papel.
A placa superior funciona como uma
primitiva régua e possui os retângulos vaza-
dos correspondentes às celas braille. Dire-
tamente sob cada retângulo vazado, a placa
inferior possui, em baixo-relevo, a configu-
ração da cela braille. Ponto por ponto, com
o auxílio do punção, é possível formar o
Escrita com reglete e punção.
símbolo braille desejado.
Na reglete original, escreve-se da direita para a esquerda, na sequência normal das
letras ou símbolos. Retirado o papel da reglete, coloca-se o relevo para frente e faz-se
a leitura normalmente, da esquerda para a direita.
Na reglete positiva, escreve-se normalmente da esquerda para a direita na sequência
normal das letras e/ou símbolos. Em função da estrutura dessa reglete, automaticamente
o relevo dos pontos já fica sobressalente, não havendo a necessidade de inverter o papel
de lado para leitura.
Conhecendo-se a posição dos pontos correspondentes a cada letra ou símbolo, a
escrita e a leitura do braille produzido por meio de regletes não apresentam maiores
dificuldades. A utilização da reglete e do punção pode tornar-se tão automática para
uma pessoa cega como a utilização do lápis e do papel por uma pessoa com visão
normal (vidente).
Além da reglete, o braille pode ser pro-
duzido por meio de máquinas especiais de
datilografia, que contam com seis teclas
para a produção dos símbolos. O papel é
fixado e enrolado em rolo comum, desli-
zando sempre que pressionada a tecla de
mudança de linha. O toque de uma ou mais
Máquina de datilografia braille, marca Perkins.
teclas, simultaneamente, produz a combi-
nação dos pontos, em relevo, correspondentes ao símbolo desejado. O braille é produ-
zido da esquerda para a direita, podendo ser lido sem a retirada do papel da máquina.
Existem diversos tipos de máquinas de datilografia braille. A primeira delas foi in-
ventada em 1892, por Frank H. Hall, nos Estados Unidos.
34
Os avanços tecnológicos representados por softwares especiais, impressoras e
equipamentos como Braille Falado, Braille Light, linha braille e outros, vieram facilitar
o acesso das pessoas com deficiência visual à educação, à informação e à cultura. O
computador tornou-se um instrumento indispensável ao desempenho das atividades
de muitos profissionais cegos.
As novas tecnologias têm também propiciado o au-
mento da oferta de livros em braille. No Brasil, existem
duas grandes imprensas braille: uma na Fundação Dori-
na Nowill para Cegos, considerada a maior gráfica brail-
le da América Latina, em São Paulo, e outra no Instituto
Benjamin Constant, no Rio de Janeiro. Nessas imprensas,
os livros são produzidos a partir de matrizes de alumí-
nio, formulário contínuo ou folhas soltas, utilizando-se
impressoras de diversos
modelos e de grande ve-
locidade, conectadas a
Revisora utilizando uma linha braille conectada
ao computador. computadores.
A impressão do relevo pode ser feita nos dois lados
do papel ou da matriz (braille interpontado), ficando
os pontos dispostos de tal forma que a impressão de
um lado não coincide com a impressão do lado oposto, Impressora Braille Box V5.

permitindo o melhor aproveitamento do es-


paço, com a redução do tamanho dos livros
sem prejudicar a leitura.
O Brasil conta também com centros de
produção de braille, localizados em todas as
unidades da federação, destinados a atender
Vista parcial do parque gráfico da Fundação Dorina Nowill para Cegos.
às necessidades dos estudantes cegos locais.
35

VIII
Técnicas
de Leitura
Braille
36
A leitura por meio do Sistema Braille
não apresenta muitas dificuldades em re-
lação à leitura em tinta. Da mesma forma
que a leitura em tinta, a leitura em brail-
le é realizada da esquerda para a direita,
de cima para baixo. Os elementos básicos
do processo de aquisição da leitura são
os mesmos para os cegos e videntes. A
criança, possuindo ou não visão, vai se deparar com símbolos gráficos que, no começo,
carecem totalmente de conteúdo, variando unicamente as vias sensoriais (visão ou
tato). Compreender, experimentar, perceber e conceituar são fatores fundamentais no
processo de ensino-aprendizagem da leitura.
A leitura tátil é realizada letra a letra, e não por meio do reconhecimento de pala-
vras completas, como acontece com a leitura em tinta. Trata-se, portanto, de uma tarefa
lenta, a princípio, e que requer grande concentração. Conseguir maior velocidade não
é apenas questão de esforço, mas também de técnica e prática. Basicamente, são três
as técnicas empregadas:

· Na primeira, utiliza-se apenas uma das mãos e a leitura é feita com


a "polpa" do dedo indicador da mão direita, que desliza sobre a
linha, explorando o texto, com o dedo indicador da mão esquerda
sendo utilizado apenas para indicar a mudança de linha.
· Na segunda, ambos os indicadores exploram juntos a linha, movi-
mentando-se um dedo ao lado do outro.
· Na terceira técnica, os dedos realizam movimentos independentes
ao longo da linha, sendo que cada mão explora diferentes seg-
mentos da mesma. A pessoa explora a primeira metade da linha
com os dedos juntos, depois o indicador da mão direita desliza
até o final da linha, enquanto o indicador da mão esquerda vai
para o início da linha seguinte a fim de auxiliar no reconheci-
mento das primeiras palavras, encontrando-se com o indicador da
mão direita quando este passa para essa linha com a finalidade
de continuar a leitura.
A velocidade média de leitura da pes-
soa com cegueira é de aproximadamente
cem palavras por minuto. Pesquisadores
reconhecem a vantagem da terceira técni-
ca, na qual se obtêm melhores resultados
em velocidade de leitura, levando a uma
melhora na compreensão do que está
sendo lido, graças à supressão do tempo
empregado na troca de linhas.
No momento de aprender braille, é ne-
cessário considerar os vários fatores que
intervêm no processo, ou seja: o estímulo
pessoal por aprender, a idade, a patolo-
gia que causou a deficiência e também o
apoio das pessoas mais próximas.
Para ler, deve-se também cuidar da
postura, não só do corpo, de maneira que
as costas permaneçam eretas, mas igual-
Revisor de textos em braille. mente da postura das mãos. Os braços
deverão ficar simétricos ao papel, e as mãos estendidas e relaxadas, tocando suave-
mente nos pontos com a ponta dos dedos, evitando que uma pressão excessiva sobre
os pontos possa apagá-los.
Normalmente, são os dedos indicado-
res que leem, deslizando ligeiramente da
esquerda para a direita. Devem ser evita-
dos os movimentos de cima para baixo,
ou vice-versa, ou os de rotação ao redor
dos pontos de uma letra. Essa tendência
se manifesta muito nas crianças peque-
nas e nas pessoas que perderam a visão
na idade adulta. Criança em processo de aprendizagem, utilizando máquina de datilografia braille.
IX
A Importância
do Sistema
Braille
39

"É importante fazer compreender a todos os profissionais que


o braille continua a ser um instrumento muitíssimo válido de
liberdade e acesso ao saber. As novas tecnologias e o braille
devem constituir-se numa parceria harmoniosa."
Pedro A. Zurita (Espanha), ex-Secretário Geral
da União Mundial dos Cegos

Durante quase dois séculos, o braille vem sendo utilizado como o meio natural de
escrita e leitura das pessoas cegas, reconhecido como o instrumento mais preciso e
eficaz para que os que já nasceram cegos ou perderam a visão nos primeiros anos de
vida tenham acesso ao conhecimento e formem conceitos sobre seres, objetos, formas
e realidades que a falta da visão lhes torna inacessíveis.
Estudos recentes mostram que a leitura é imprescindível para o desenvolvimento
cognitivo das crianças.
Mesmo diante de um laptop, um tablet, um smartphone, as crianças que enxergam
continuam a ter um contato direto com a linguagem escrita, enquanto as crianças cegas
apenas ouvem.
Cabe aos pais ou responsáveis e aos professores estimular as crianças cegas a utili-
zar o Sistema Braille de maneira adequada e cabe aos governantes oferecer os recursos
indispensáveis para que isto se concretize. Caso contrário, estaremos transformando
estas crianças em analfabetos funcionais.
O rápido avanço tecnológico ocorrido a partir da década de 1950 permitiu que as pes-
soas cegas pudessem se beneficiar de novas formas de leitura. O livro falado (audiobook)
e, mais recentemente, o livro digital acessível DAISY e, agora, em EPUB 3 vieram, sem dúvida,
garantir o acesso mais rápido à cultura, à informação e ao lazer. No entanto, o Sistema Brail-
le continua a ser o meio natural de escrita
e leitura das pessoas cegas, imprescindível
para que elas tenham acesso direto à or-
tografia e à representação da simbologia
científica, musicográfica e fonética.
Além de representar as diferentes sim-
bologias, o Sistema Braille permite a elabo-
ração de gráficos, tabelas, diagramas, figuras Página inicial da Dorinateca ( http://www.dorinateca.org.br/link/241524 ).
40
geométricas e outras ilustrações, que contribuem significa-
tivamente para o desenvolvimento pessoal, educacional e
cultural das pessoas cegas. Por meio de pontos em relevo
também é possível a construção de mapas, plantas e ma-
quetes com suas respectivas legendas.
O Sistema Braille tem também um papel relevante no dia
a dia de muitas pessoas cegas: a identificação de embalagens de alimentos, medicamentos,
produtos de maquiagem e cosméticos, de peças do vestuário, de CDs e DVDs, a consulta de
calendários, cardápios (em alguns municípios brasileiros, o cardápio acessível em braille é obri-
gatório por lei), catálogos e programas de apresentações artísticas etc., garantem maior inde-
pendência, autonomia e segurança, fatores indispensáveis à autoestima de todo ser humano.

No exercício da cidadania, o braille tem também


uma participação indiscutível, podendo citar-se como
exemplo a identificação das teclas das urnas eletrô-
nicas que, aliada ao uso de fones de ouvido, permite
que as pessoas cegas possam escolher seus candida-
Urna eletrônica.
tos com autonomia e segurança.
Deve-se também considerar que, para aqueles que gos-
tam de ler, nada substitui o prazer de ter um livro entre
as mãos, podendo virar
suas páginas em bus-
ca de novas emoções
ou voltá-las para reviver
aquelas já sentidas, num
contato sem intermedi-
ários com o autor ou as
Pedagoga especializada orientando aluno cego no
Jovem cego utilizando caixa eletrônico adaptado. personagens. uso do Sistema Braille.
X
Por que
os livros
em braille
continuam
a ser
importantes?
42
O fato de a escrita braille ocupar um espaço grande (cada página da escrita comum
corresponde a aproximadamente três páginas em braille) e o fato de a sua impres-
são ser mais onerosa (pois além de precisar ser feita por profissionais especializados,
necessita ser feita em papel de gramatura mais elevada) não permitem que todas as
obras produzidas pelo mercado editorial sejam produzidas em braille.
Felizmente, as novas tecnologias possibilitam que essa carência seja suprida por
livros nos formatos áudio (audiobook) e digital acessível.
Entretanto, a tecnologia não deve ser vista como um substituto do Sistema Braille,
mas como um complemento a ele. A verdadeira educação das crianças cegas só acon-
tece quando elas podem dispor de livros em braille que lhes permitam:

1. Familiarizar-se com a simbologia braille nas suas diferentes


áreas de aplicação.
2. Fixar a ortografia da Língua Portuguesa e de outros idiomas.
3. Exercitar constantemente a leitura tátil, o que lhe trará maior
velocidade e consequente apreço pelo uso do sistema.
4. Aprender a ler mapas, gráficos, figuras geométricas e outras
representações, o que, além do conhecimento específico
das diferentes disciplinas, permitirá o desenvolvimento de
conceitos importantes (acima, abaixo, direita, esquerda, dia-
gonal, anterior, posterior etc.), propiciando, inclusive, mais
desenvoltura nas atividades cotidianas.

Já nas séries mais adiantadas, torna-se necessário oferecer aos alunos textos gra-
vados ou digitalizados; no entanto, o braille continua a ser imprescindível para os livros
de línguas estrangeiras, Matemática, Física, Química e Biologia.
A substituição de representações táteis (mapas, gráficos, diagramas, figuras geomé-
tricas) só deve ocorrer quando houver a total impossibilidade de representá-las em
braille. Se necessário substituí-las por descrições, estas devem ser feitas com clareza
e objetividade, sem omissão ou excesso de informações. Daí a necessidade de que os
profissionais que trabalham na produção dos livros sejam devidamente preparados.
Recursos como histórias em quadrinhos, tiras, charges etc. não devem ser omitidos.
Uma descrição fiel e clara faz deles um excelente estímulo à leitura e oferece aos alu-
43
nos cegos uma oportunidade de lazer quase tão agradável quanto aquela desfrutada
pelos alunos que enxergam.
Além disso, a produção de livros didáticos em braille merece outros cuidados espe-
ciais, embora nem sempre seja possível seguir alguns deles à risca:

1. Uso correto da simbologia braille adotada para as diferentes áreas.


2. Uso da diagramação adequada à leitura tátil, que, muitas vezes, não
corresponde à diagramação do texto original.
3. Considerando que o espaço ocupado pela escrita braille é, no mí-
nimo, três vezes maior que o espaço ocupado pela escrita comum,
o que faz com que um volume em tinta resulte em dois ou mais
volumes em braille, é necessário que a quebra do volume se faça
em final de unidade, capítulo ou correspondente.
4. O formato da encadernação deve prever a facilidade de manuseio do
livro pelo aluno e considerar também que, na maioria das salas de aula,
as carteiras não dispõem do espaço suficiente para esse manuseio.
5. Os livros em braille devem ser submetidos a, pelo menos, uma re-
visão antes de serem impressos. Esta revisão deve ser realizada por
um profissional cego que seja usuário do Sistema Braille e que do-
mine algumas das suas áreas de aplicação.

Finalizando, deixamos para reflexão as palavras do tiflólogo português Filipe Pereira


Oliva (2001, p. 292):

"Continuando a palavra escrita a ser um dos pilares principais, se não mesmo


principal de informação, a leitura, tanto de texto permanente como de texto
efêmero, continua a afirmar-se como uma das formas privilegiadas para a
aquisição do conhecimento. E se a leitura é importante para qualquer cidadão,
ela se reveste ainda de maior importância para as pessoas com deficiência
visual, privadas da capacidade de apreensão de informação pela imagem ou
drasticamente limitadas quanto à essa capacidade."
44

Instituições e Publicações de Referência no Tema·


• ABC - Accessible Books Consortium
www.dorinateca.org.br/link/241535

· CBB - Comissão Brasileira do Braille


www.dorinateca.org.br/link/241546

· Centro de Memória Dorina Nowill


www.dorinateca.org.br/link/241557

· DAISY Consortium
www.dorinateca.org.br/link/241568

· Dorinateca
www.dorinateca.org.br/link/241524

· FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - PNLD


www.dorinateca.org.br/link/241579

· Fundação Dorina Nowill para Cegos


www.dorinateca.org.br/link/241445

· Instituto Benjamin Constant


www.dorinateca.org.br/link/241580

· LBI - Lei Brasileira de Inclusão


www.dorinateca.org.br/link/241591

· MEC - Ministério da Educação


www.dorinateca.org.br/link/241603

· ONCE - Organização Nacional dos Cegos Espanhóis


www.dorinateca.org.br/link/241614

· Readium Foundation
www.dorinateca.org.br/link/241625

· Soluções em Acessibilidade
www.dorinateca.org.br/link/241636

· Tratado de Marraqueche
www.dorinateca.org.br/link/241647

• WCAG - Web Content Accessibility Guidelines


goo.gl/t2Txgt

· WIPO - World Intellectual Property Organization


www.dorinateca.org.br/link/241669
45

Bibliografia
BRASIL. Ministério da Educação; Secretaria de Educação Especial. Grafia Braille para
a Língua Portuguesa. Brasília: MEC ; SEESP, 2002. 93 p.

GARCIA, N.; LORA, T. D. P. As implicações do Sistema Braille na vida escolar da criança


portadora de cegueira. In: Apostila do Curso de Educação Especial. São Paulo: FEUSP,
1998.

LEMOS, Edison Ribeiro. A educação dos cegos. Revista Contato, São Paulo, ano 6, p.
7-19, set. 2000. Laramara - Associação Brasileira de Assistência ao Deficiente Visual.

LEMOS, Edison Ribeiro; CERQUEIRA, Jonir Bechara; VENTURINI, Jurema Lucy; ROSSI,
Teresinha Fleury de Oliveira. Louis Braille: sua vida e seu sistema. 2ª ed. São Paulo:
Fundação Dorina Nowill para Cegos, 1999.

NOWILL, Dorina de Gouvêa. ...E eu venci assim mesmo. Totalidade Editora: São Paulo,
1996. 290 p.

OLIVA, Filipe Pereira. O braille na informação. In: Anais do I Simpósio Brasileiro sobre
o Sistema Braille. MEC ; SEESP: Salvador, 2001.

OLIVEIRA, Regina Fátima Caldeira de; CERQUEIRA, Jonir Bechara. Por que os livros em
braille são importantes. Revista Benjamin Constant, Rio de Janeiro, ano 12, n. 34, p.
37-38, ago. 2006.

PIÑERO, D. M. C.; QUERO, F. O.; DÍAZ, F. R. O Sistema Braille. In: MARTÍN, M. B.; BUENO,
S. T. (Org.). Deficiência visual: aspectos psicoevolutivos e educativos. São Paulo: Li-
vraria Santos Editora Ltda, 2003. p. 227-247.

UNESCO; National Library Service for the Blind; Physically Handicapped. World Brail-
le Usage. Library of Congress: Washington, D.C., 1990. 124 p.
46
Sobre as Autoras

Da esquerda para a direita: Regina e Cristina (sentadas), Fernanda e Elza (em pé).

Elza Maria de Araujo Carvalho Abreu


Bacharel e Professora Licenciada em Matemática pela Pontifícia Universidade Cató-
lica de São Paulo (PUC-SP).

Fernanda Christina dos Santos


Bacharel em Letras (Inglês e Português) pela Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo (PUC-SP).

Maria Cristina Godoy Cruz Felippe


Mestre em Distúrbios do Desenvolvimento pela Universidade Presbiteriana Macke-
nzie ; Pedagoga Especializada em Deficiência Visual; Coordenadora da Comissão de
Prevenção da Cegueira da Unión Latino-Americana de Ciegos (gestão 2000-2008).

Regina Fátima Caldeira de Oliveira


Professora de Português e Inglês, licenciada pelas Faculdades Metropolitanas Uni-
das (FMU -SP); Membro da Consultoria Técnico-Científica da Comissão Brasileira do
Braille ; Coordenadora de Revisão da Fundação Dorina Nowill para Cegos.
47
Lista de links
www.fundacaodorina.org.br
www.sxc.hu
www.musimem.com/INJA.htm
www.brailleliga.be
www.humanware.com
www.hims-inc.com
www.perkinsproducts.org
www.indexbraille.com
www.accessiblebooksconsortium.org
www.portal.mec.gov.br/observatorio-da-educacao/30000-uncategorised/19063-comis-
sao-brasileira-do-braille
www.fundacaodorina.org.br/a-fundacao/centro-de-memoria/
www.daisy.org
www.fnde.gov.br/programas/programas-do-livro
www.ibc.gov.br
www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm
www.mec.gov.br
www.once.es
www.readium.org
www.solucoesemacessibilidade.org.br
www.wipo.int/marrakesh_treaty/en/
www.w3.org
www.wipo.int
www.solucoesemacessibilidade.org.br

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