Inclusao Ou Exclusaow

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INCLUSÃO OU EXCLUSÃO?

O RELATO DE UMA ALUNA COM


DEFICIÊNCIA VISUAL MATRICULADA NA ESCOLA REGULAR

Thayanne Érica Torres de Assis


[email protected]

Louise Sayonara Guedes Pereira


[email protected]

Luzia Guacira dos Santos Silva (Orientadora)


[email protected]

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Resumo

O presente trabalho tem como objetivo apresentar e analisar o relato de uma aluna,
caracterizada com cegueira congênita a partir da sua matrícula em uma escola regular de
ensino e, assim, compreender se a mesma está sendo incluída de fato ou excluída no
ambiente escolar. Considerando esses aspectos, foi realizada uma pesquisa de campo na
instituição na qual a aluna está matriculada, localizada na cidade do Natal-RN, no
sentido de acompanhar o seu cotidiano escolar, conhecer as dificuldades e os desafios
enfrentados na escola regular. Para a obtenção e registro dos dados foi utilizada a
observação direta e entrevistas semiestruturadas. A partir das observações e das
entrevistas realizadas, foi possível compreender que, a aluna ainda sofre com o
preconceito e com a discriminação em razão da sua deficiência, principalmente com os
colegas, assim se sente excluída das atividades em sala, pois muitos dos professores não
sabem encontrar estratégias pedagógicas para facilitar o processo de ensino e
aprendizagem.

Palavras-chave: Inclusão. Deficiência visual. Educação.

Abstract

The present work aims to present and analyze the report of a student, characterized with
congenital blindness as from her enrollment in a regular school of education and, thus,
to understand if she is actually being included or excluded in the school environment.
Considering these aspects, was conducted a field study at the institution in which the
student is enrolled, located in the city of Natal-RN, in order to follow your daily school,
understand the difficulties and challenges faced in regular school. To obtain and record
data, was used direct observation and semistructured interviews. From the observations
and performed interviews, it was possible to understand that the student still suffers
with prejudgment and discrimination because of her disability, specially with
classmates, so she feels excluded from activities in the classroom, because many
teachers don’t know find pedagogical strategies to facilitate the process of teaching and
learning.

Keywords: Inclusion. Visual disabilities. Education.

Introdução

De acordo com Martins (2006, p.17), a escola regular, não foi, nem é planejada
para acolher a diversidade de indivíduos, mas para a padronização, para atingir os
objetivos educativos daqueles que são considerados dentro dos padrões de
“normalidade”. Assim, nos últimos anos as escolas e os demais órgãos da sociedade
vêm sendo desafiados a alcançar e conquistar uma forma equilibrada, capaz de
proporcionar uma cultura a todos os educandos, respeitando as suas especificidades e
necessidades. Porém, percebe-se que esta não é uma tarefa fácil, embora muito já tenha
sido feito, é preciso avançar ainda mais para se ter de fato uma escola inclusiva. De
acordo com Stainback & Stainback, um ensino inclusivo deve ser:

a prática da inclusão de todos – independentemente se seu talento,


deficiência, origem socioeconômica ou origem cultural – em escolas e salas
de aula provedoras, onde todas as necessidades dos alunos são satisfeitas. [...]
para conseguir realizar o ensino inclusivo, os professores em geral e
especializados, bem como os recursos, devem aliar-se em um esforço
unificado e consistente (1999, p. 21).
O termo escola inclusiva ganhou foco principalmente com a Declaração de
Salamanca (1994), onde o seu princípio fundamental é o de que todas as crianças devem
aprender juntas, sempre que possível, independentemente de quaisquer dificuldades ou
diferenças que elas possam ter. As escolas inclusivas devem reconhecer e responder às
necessidades diversas de seus alunos, acomodando ambos os estilos e ritmos de
aprendizagem e assegurando uma educação de qualidade à todos através de um
currículo apropriado, arranjos organizacionais, estratégias de ensino, uso de recurso e
parceria com as comunidades.
Diante do exposto, se faz necessário conhecer a realidade vivida por pessoas
com alguma necessidade educacional Especial1 em escolas públicas, a fim de analisar se
estão sendo incluídas de fato, ou se prevalece nessas escolas a sua exclusão. Portanto, o
trabalho aqui delineado, objetiva conhecer a realidade vivida por uma aluna cega,
matriculada em uma escola regular da cidade do Natal-RN. E, a partir de seu relato e
observação do seu cotidiano escolar, compreender se a mesma está incluída de fato, ou
seja, participando, aprendendo, tendo as suas necessidades especificas atendidas na
escola ou se sofre algum tipo de exclusão por parte da comunidade escolar –
professores, gestores, colegas, funcionários, pais.
Tendo como objeto de estudo a educação da pessoa com deficiência visual, é
importante compreender que esta pode ser classificada em dois grupos: a cegueira e a
visão parcial ou reduzida (baixa visão). As que apresentam a cegueira são aquelas que
perderam totalmente a visão ou aquelas que têm somente a percepção da luz,
necessitando do uso do Sistema Braille como meio de leitura e escrita ou de meios de
comunicação que não estejam relacionados com o uso da visão. Já as que apresentam
visão parcial ou reduzida são aquelas que têm limitações da visão à distância, mas que

1
De acordo com a Declaração de Salamanca (1994) refere-se a todas aquelas crianças ou jovens cujas
necessidades educacionais especiais se originam em função de deficiências ou dificuldades de
aprendizagem.
são capazes de ver materiais e objetos a poucos centímetros de distância, elas são
capazes de ler textos impressos ampliados ou com o uso de recursos óticos especiais
(Kirk e Gallagher, 2002, p. 180).
As principais causas da cegueira têm sido relacionadas em amplas categorias
como doenças infecciosas, acidentes e ferimentos, e causas hereditárias como a catarata,
a atrofia do nervo ótico, e o albinismo. É importante destacar que esses fatores
hereditários ainda são mais frequentes na causa da deficiência visual do que as doenças
e os acidentes. Dentre as principais doenças que podem levar a cegueira, pode-se
destacar a diabetes, a sífilis, o glaucoma, e a ceratite2.
A criança com deficiência visual enfrenta ao longo da sua vida diversas
limitações referentes à percepção, como a capacidade de se locomover, a interação com
o meio ambiente e a extensão e a variedade de experiências. Em relação ao
desenvolvimento cognitivo, González (2007, p. 104) afirma que:

A capacidade de processamento da informação não diminui nem com a


cegueira nem total nem parcial, mas o que dificulta a cognição são as
limitações pela falta de exploração direta e os problemas da mobilidade,
mesmo que algumas possam ser substituídas por outros canais de
informação.

A esse respeito, Silva (2014, p. 55), afirma que:

Está cientificamente comprovado que crianças cegas e videntes apresentam o


mesmo padrão de desenvolvimento, embora o ritmo possa ser mais lento para
as que não enxergam. Porém, não devemos ater à afirmativa em relação ao
“ritmo mais lento” e deixar de oportunizar várias e desafiadoras atividades
que estimulem o desenvolvimento cognitivo dos alunos cegos.

Tais assertivas justificam o nosso interesse em querer responder ao nosso


questionamento sobe como está ocorrendo a inclusão das pessoas com Necessidades

2
A ceratite é a inflamação da córnea que pode ser causada por bactérias, vírus, e fungos.
Educacionais Especiais nas escolas regulares, neste caso, como alunos cegos estão
sendo acolhidos em suas especificidades de aprendizagem em escolas comuns. Se a
requerida é orientada, nos documentos legais, se há adequação de atividades
condizentes com a necessidade do aluno, adequações curriculares, pedagógicas,
metodológicas, estruturais e físicas estão ocorrendo para a inclusão de tais alunos ou, se
ao contrário, as ações, as práticas escolares contribuem para a sua exclusão.

Metodologia

Para o desenvolvimento do trabalho nos apoiamos em princípios da pesquisa


participante, pois compreendemos que nesse tipo de pesquisa, o pesquisador
compartilha da vivência dos sujeitos pesquisados participando, de forma sistemática e
permanente, ao longo do tempo da pesquisa, das suas atividades. De acordo com
Severino (2007, p. 120) na pesquisa participante o pesquisador coloca-se numa postura
de identificação com os pesquisados, passando a interagir com eles em todas as
situações, acompanhando todas as ações praticadas pelos sujeitos. Como recurso
metodológico, utilizamo-nos para obtenção dos dados de observações que foram
desenvolvidas entre os meses de junho, julho e agosto de 2014, na escola regular na
qual a aluna esta matriculada. Também recorremos à aplicação de entrevista
semiestruturada, no intuito de registrar suas impressões acerca do processo de inclusão
na escola. Ao todo foram realizadas 3 entrevistas, compostas por 5 perguntas abertas e
fechadas que buscaram saber sobre a inclusão da aluna na escola regular, suas
dificuldades, suas necessidades na condição de deficiente visual.
Análise dos resultados

De acordo com Silva (2014) a inclusão não consiste somente em “efetuar a


matrícula de alunos com deficiência nas escolas, mas sim em um processo de criar um
todo, de reunir os alunos em geral, independente de suas condições étnicas, social,
física, sensorial, intelectual, e fazer com que aprendam juntos e tenham sucesso em sua
aprendizagem”.
Assim, a partir das observações realizadas foi possível perceber que a escola na
qual a aluna frequenta ainda está se adequando a necessidade especial da aluna,
principalmente no que corresponde a sua estrutura física como, a fixação de corrimãos
em alguns corredores e pisos táteis em algumas salas.
Em relação à visão da aluna sobre a escola regular, percebe-se a partir das
entrevistas que apesar de já estar na instituição há quase 2 (dois) anos, ainda não se
adaptou ao contexto escolar:
“Antes eu não queria ir para essa escola. Tinha medo [...] na outra escola eu e
meus amigos somos todos cegos. Pra gente isso é normal. Ai nessa nova
escola, os outros alunos me ignoram porque sou cega, mas tem que estudar,
né. Eu aos poucos eu vou me acostumando” (Relato da aluna).

Assim, fica evidente que a aluna ainda sofre com o problema da discriminação e
do preconceito na maioria das vezes por parte dos alunos. Estes que deviam propiciar
situações acolhedoras, ainda estão imersos no preconceito. Com isso, a escola como
instituição educativa, tem de pensar em práticas humanizadoras que tornem toda a
comunidade escolar inclusiva, aberta ao diferente, à diversidade.
Ainda, durante as observações ficou evidente que os professores não se
adequaram a necessidade educacional da aluna na condição de deficiente visual. As
atividades são na maioria das vezes apenas oralizadas com a aluna escrevendo em
Braille com o auxílio da reglete e do punção:
“Eu fico triste porque os professores não sabem o Braille. Ai, eles deviam
trazer as atividades em Braille pra eu não perder muito tempo escrevendo no
Braille. Eu fico cansada. Se eles trouxessem as atividades no Braille, ai
facilitava muito nas aulas” (Relato da aluna).

É necessário que no processo educacional de alunos com deficiência visual, o


professor considere diversos aspectos, dentre eles o grau de aceitação do aluno de sua
condição de ser cego, as implicações decorrentes da cegueira, as características e o
funcionamento próprios de cada sentido (o tato, olfato, paladar e audição), além de
instrumentos e recursos didáticos disponíveis na atualidade, como: a leitura através do
Sistema Braille, o Sorobã para cálculos matemáticos, a audição de livros falados, os
materiais didáticos adaptados, a tecnologia, os objetos concretos e reais que rodeiam,
além de proposições didáticas e da formação do professor que deve ser conceitual,
reflexiva e prática (SILVA, 2006).

Ao questionarmos a aluna, se a mesma já foi excluída ou isenta de participar de


alguma atividade da escola em condição da sua deficiência, a mesma relatou:

“Eu já fui. Às vezes não querem fazer trabalho em grupo comigo porque não
vejo. Daí outra vez teve uma atividade na escola que não deixaram eu
participar porque sou cega. E um dia, a professora disse que eu não
precisava fazer a avaliação, ai eu disse que queria porque eu tinha estudado,
aí ela disse, não você ta cansada, e tá muito difícil pra você” (Relato da
aluna).

Diante tal depoimento, é necessário que se afirme com base nas discussões de
Silva (2006, p. 151) que “o aluno com deficiência visual seja orientado a seguir as
mesmas regras da sala de aula e as normas de disciplina, exatamente como qualquer
outro aluno deve seguir”. Que seja “estimulado a participar de todas as atividades do
dia-dia escolar, sendo-lhes apresentadas alternativas que o tornem capaz de realizá-las
com o mesmo nível de dificuldade conferido aos demais alunos” (p. 151).

Ainda de acordo com Silva (2014), é importante que o professor nunca exclua o
aluno com deficiência visual de participar plenamente das diversas atividades que fazem
parte do cotidiano da escola, muito menos minimizar a participação do mesmo.
Proporcionar oportunidades ao aluno com deficiência visual de ter sucesso ou de falhar
é uma postura correta e que deve ser seguida sempre pelos docentes. Ainda, é
imprescindível que o professor:

Possibilite diferentes instrumentos de avaliação, tais como: prova em Braille,


prova oral, apresentação de seminários e portfólios adaptados para o aluno
cego; permita, durante as aulas, o uso de gravador, da máquina de escrever
Braille, de computador com programas sintetizadores de voz e ledores de
texto; promova atividades colaborativas entre os alunos, tais como as que
podem ser desenvolvidas em dupla, possibilitando ao aluno cego ter, em seu
colega, um escriba e ledor (SILVA, 2014, p. 59).

Ao questionar se a aluna se sentia realmente incluída na escola, a mesma


afirmou que:

“Não, eu não me considero incluída nessa escola. Às vezes parece que nem
existo. Poucos se importam com a minha dificuldade, quase nenhum
professor prepara uma aula pensando em mim. É muito difícil, mas eu vou
me adaptando; tô trazendo meu notebook para escrever mais rápido e tô
pedindo aos professores que enviem minhas provas pra uma escola que tem a
impressora em Braille” (Relato da aluna).

Assim, é possível perceber que a inclusão da aluna com deficiência na escola


observada e pesquisada acontece meramente por obrigatoriedade legal, via matrícula.
Portanto, ficou evidente que a escola na qual a aluna está matriculada ainda precisa de
muitas adequações no que diz respeito à adaptação de atividades que atendam a suas
necessidades especiais na condição de deficiente visual, além de uma melhor
visibilidade perante a comunidade escolar para minimizar o preconceito “sofrido” pela
aluna por alguns componentes da escola. Para a maioria é como se aluna não existisse.

De acordo com Martins (2006, p. 19) para que a aluna seja realmente incluída na
escola é necessário que o Governo de fato adote políticas inclusivas e não apenas
divulgue, através dos meios de comunicação, que está promovendo a inclusão escolar
e que, em decorrência disto, as escolas estão sendo receptivas para receber a todos os
educandos, sem exceção; que busque formas a fim de contribuir para mudar a escola,
para torná-la receptiva às necessidades de todos os alunos.

Conclusão

O trabalho aqui apresentado e desenvolvido em uma escola regular de ensino


possibilitou-nos a reflexão, dentre outros aspectos, sobre o cotidiano escolar de uma
aluna com deficiência visual mediante a sua inserção em uma instituição inclusiva.
Ainda ficou evidente a partir das observações e das entrevistas que são muitas as
dificuldades encontradas na escola regular para atender os educandos com Necessidades
Educacionais Especiais de uma forma geral.
De acordo com o relato da aluna, é possível compreender que a mesma não se
sente incluída na escola, principalmente devido ao preconceito por parte de alguns
colegas, e a falta de preparação dos professores em adequar as atividades mediante a
necessidade da aluna, e com isso, os isentam de participar de várias atividades do
ambiente escolar.
A sua realidade é de quase total isolamento, indiferença e exclusão. O que
denota a urgente necessidade de um trabalho de formação na perspectiva inclusiva com
toda a comunidade escolar, a fim de que a aluna em questão e outros que nela estudam
sejam respeitados em suas diferenças e recebam um ensino de qualidade que os leve a
obter sucesso em sua escolarização.

Referências

Declaração de Salamanca: Sobre Princípios, Políticas e Práticas na Área das


Necessidades Educativas Especiais. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/salamanca.pdf, acessado em 21 de
outubro de 2014.

GONZÁLEZ, Eugenio. Necessidades educacionais especificas. Porto Alegra: Artmed,


2007.

KIRK, Samuel A. & GALLAGHER, James J. Educação da criança excepcional. 3°


ed.- São Paulo: Martins Fontes, 1996.

MARTINS, Lúcia de Araujo Ramos. Inclusão: compartilhando saberes. Org.


Petrópolis, RJ: Vozes, 2006.

SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 23. Ed. rev. e


atual. São Paulo: Cortez, 2007.

SILVA, Luzia Guacira dos Santos. Estratégias de ensino utilizadas, também, com
um aluno cego, em classe regular. In: MARTINS, Lúcia de Araújo Ramos. PIRES,
José. PIRES, Glaúcia Nascimento da Luz. MELO, Francisco Ricardo Lins Vieira de.
(org.) Inclusão: Compartilhando saberes. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006.

SILVA, Luzia Guacira dos Santos. Educação Inclusiva: práticas pedagógicas para uma
escola sem exclusões. 1º Ed. São Paulo, Paulinas, 2014.

STAINBACK, Susan. STAINBACK, William. Inclusão: Um guia para educadores.


Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999.

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