Annie Besant Do Recinto Externo Ao Santu
Annie Besant Do Recinto Externo Ao Santu
Annie Besant Do Recinto Externo Ao Santu
Annie Besant
presidente mundial.
Igual origem tiveram os cinco capítulos aqui reunidos sob um título geral —
caminha lentamente rumo ao Templo, que é a sua meta, explicando o porquê dessa
EDITORA PENSAMENTO
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Sobre a autora:
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DO RECINTO EXTERNO
AO
SANTUÁRIO INTERNO
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ANNIE BESANT
DO RECINTO EXTERNO
AO
SANTUÁRIO INTERNO
Tradução
NAIR LACERDA
EDITORA PENSAMENTO
São Paulo
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Título do original:
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Índice
I. PURIFICAÇÃO ......................................................................................................... 7
II. O CONTROLE DO PENSAMENTO ...................................................................... 26
III. A FORMAÇÃO DO CARÁTER ............................................................................. 46
IV. ALQUIMIA ESPIRITUAL ...................................................................................... 66
V. NO LIMIAR............................................................................................................ 85
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I. PURIFICAÇÃO
cadeia de mundos, tal como podem ser vistos pela imaginação mais do que pelo
aspecto que apresentam, poderíamos interpretar o todo num quadro. Vejo uma
grande montanha situada no espaço, com um caminho que vai girando em torno
dela até atingir seu ápice. As voltas que esse caminho dá são sete, e em cada volta
há sete estações onde os peregrinos ficam durante algum tempo. Dentro dessas
estações eles têm de subir, volta por volta. Quando traçamos o caminho que sobe
por aquela trilha em espiral, vemos que ele termina no topo da montanha, e leva a
apenas para auxiliar os que ainda estão subindo. Se observarmos o Templo mais
atentamente, constataremos, ao tentar ver a sua construção, que ele tem, ao centro,
um Santo dos Santos. Em torno desse centro estão os quatro Pátios, circundando o
Santo dos Santos como círculos concêntricos. Todos estão dentro do Templo.
Uma parede separa cada Pátio do que lhe é contíguo, e para passar de
um Pátio para o outro o caminhante deve atravessar uma porta, apenas uma em
cada parede circundante. Assim, todos os que alcançarem o centro terão de passar
por aquelas quatro portas, uma por uma. Fora do Templo ainda há outro recinto
fechado — o Pátio Externo — e esse Pátio acolhe muitos peregrinos, mais do que
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Olhando para o Templo e para os Pátios, e para o caminho que sobe em
espiral pela montanha, vemos esse quadro da evolução humana e a trilha ao longo
da qual a raça está caminhando, bem como o Templo, que é a sua meta. Ao longo
daquele caminho que dá voltas à montanha, vasta massa de seres humanos vai de
fato subindo, mas subindo vagarosamente, passo por passo. Às vezes, tem-se a
impressão de que cada passo para a frente corresponde a um passo para trás, e
embora a tendência de toda aquela massa seja para subir, a ascensão é tão lenta
extenuante e dolorosa que nos perguntamos como podem os peregrinos ter ânimo
para subir durante tanto tempo. Dando voltas à montanha, milhões de anos se
por ali durante esses milhões de anos, uma infindável sucessão de vidas parece
multidões subindo tão lentamente, caminhando, volta por volta, na escalada daquela
vagar? Por que esses milhões de homens empreendem uma viagem tão longa? Por
A marcha se nos afigura muito lenta porque eles não vêem seu ponto de
chegada, a sua meta, e não percebem em que direção estão viajando. Observando
alguns caminhantes, vemos que estão sempre se desviando para os lados, atraídos
para cá e para lá, sem qualquer propósito em seu caminhar. Não andam diretamente
para a frente, atentos ao que fazem, mas perambulam, como crianças, correndo
atrás de uma flor ali, tentando apanhar uma borboleta acolá. Assim, temos a
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impressão de que todo seu tempo é desperdiçado, e apenas um pequeno avanço
chega a ser conquistado quando a noite cai sobre eles e o dia de marcha termina.
também é, torne o passo mais rápido. Quando observamos aqueles cujo intelecto é
vivido, mergulham no sono e dormem quase que no mesmo lugar que ocuparam na
noite anterior. E quando voltamos os olhos para aqueles que se mostram mais
devagar, muito devagar, e a cada dia de vida parecem fazer pequeno progresso.
Olhando assim para eles, nosso coração sente-se fatigado com aquela subida, e
ficamos a pensar por que não erguem os olhos e entendem em que direção seu
atingido não apenas pelo caminho circulante, volta por volta, tão longo em torno da
montanha, mas também por caminhos mais curtos que não a circundam, mas que
encontram um caminho mais rápido para o Pátio Externo do que aquele que vem
sendo trilhado por seus companheiros de viagem, parece que percebemos que o
primeiro passo é dado para fora dessa longa espiral quando alguma Alma, que
talvez por milênios tenha estado viajando volta por volta, compreende, pela primeira
Templo, lá do ápice. Porque aquele Templo branco envia raios de luz sobre os
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das flores, das pedrinhas e das borboletas que estão pelo caminho, e aquela
cintilação atrai o seu olhar. Olha para cima, para o Templo, e, por um momento, ele
o vê.
quais eram a meta e a finalidade. Viu o ápice rumo ao qual está galgando, e viu
também o caminho íngreme, mas muito mais curto, que sobe diretamente do flanco
momento, que a estrada tem um nome — "serviço" — e que os que enveredam pelo
caminho mais curto devem entrar através de uma porta, onde as palavras "Serviço
do Homem" estão brilhando com letras douradas. A Alma compreende que, antes
de poder alcançar pelo menos o Pátio Externo do Templo, deve passar através
daquela porta e compreender que a vida é feita para o serviço e não para a auto-
procura, que a única maneira de subir mais rapidamente é fazê-lo por amor dos
retardatários, a fim de que o auxílio mais eficaz, vindo do Templo, possa ser enviado
ao encontro dos que vêm subindo, o que de outra forma não seria possível.
Essa visão não passou de um vislumbre fugaz, foi apenas um rápido olhar
ziguezagueante, porque os olhos foram colhidos por um único dos raios de luz
daquela estrada em espiral, que o relancear dos olhos da Alma facilmente se deixa
atrair para elas. Mas, uma vez recebida aquela cintilação, existe a possibilidade de a
alma obtê-la de novo, com maior facilidade. Quando a meta procurada, o dever e o
permanece ali o desejo de trilhar uma senda mais curta e encontrar o caminho que
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Após aquela primeira visão, a Alma é visitada amiúde pelos raios de luz,
cujo brilho vai se tornando cada vez mais intenso. Vemos que essas Almas, que
começaram a subir com maior resolução do que suas semelhantes. Embora ainda
estejam dando voltas em torno da montanha, observamos que começam a agir com
maior firmeza no que se refere às virtudes, e que se dedicam com maior persistência
ao que reconhecemos como religião, essa religião que se esforça por ensinar-lhes
sua diligência e vigilância. Elas caminham mais depressa, porque estão seguindo
uma direção que principiam a vislumbrar qual seja, e assim começam, ainda que de
maneira imperfeita, a tentar viver com um propósito definido. Apesar de ainda mal
identificarem a natureza desse propósito — porque têm dele mais uma vaga intuição
acaso, de um lado para outro, às vezes um pouco para cima, às vezes mais para
baixo. Estão, agora, subindo deliberadamente pelo caminho em espiral, e a cada dia
multidões pela espiritualidade de sua vida, pela prática das virtudes e pelo desejo
caminho para a vanguarda com maior celeridade, estão sempre buscando ajudar os
Em breve, com aqueles que, assim, estão amando e servindo, virá ao seu
encontro uma figura que é bela, embora à primeira vista seu aspecto seja severo.
exigidas para um progresso mais rápido. A Religião, que os tem ajudado na prática
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das virtudes, é, por assim dizer, a irmã desse Conhecimento, como também o é o
Por fim, uma alvorada mais brilhante se faz presente, e, com ela, a
mesma a finalidade da sua subida, não apenas sonhando com o futuro, mas
tornando esse sonho mais concreto em sua intenção. Veremos essa Alma
suavemente dos seus lábios a promessa de ajudar no progresso da raça. Esse voto
que ainda não contém um propósito bem-definido, mas que já existe em embrião.
Lê-se, numa Escritura Antiga, que um dos Grandes Seres subiu pelo
caminho íngreme, e tão rapidamente, que deixou para trás toda a sua raça,
humanidade. Sobre ele, que posteriormente foi conhecido como o Buda, afirma-se:
"Ele aperfeiçoou seu voto, Kalpa* após Kalpa." A obra que iria coroar Sua vida teve
de iniciar-se com a promessa de Serviço. Esse voto da Alma é que vai uni-la aos
Grandes que já partiram, e produz, por assim dizer, o vínculo que a leva ao caminho
tornando-se mais pura, mais nobre e mais sábia vida após vida, a Alma revela
distintamente uma vontade que agora se faz mais forte. Quando essa vontade se
exprime como claro e definido propósito, não mais o sussurro que aspira, mas a
palavra que ordena, então essa vontade resoluta baterá à porta que leva ao Pátio
*
Longo período de tempo, composto de períodos menores chamados Manvantaras, que, por sua vez,
compreendem períodos mais curtos chamados Yugas. É palavra sânscrita. (N. T.)
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Externo do Templo, com um toque que ninguém poderá recusar. Esse toque revela
a força da Alma que está determinada a vencer, e aprendeu bastante para ter noção
É uma tarefa que não pretende menos do que isso: separar-se da sua
raça, daquela raça que vai subindo, volta por volta, durante milênios, passando
ainda pelas rondas de um globo a outro, aquilo que conhecemos como a cadeia em
apenas umas poucas vidas humanas; pretende, passo a passo, enfrentar a colina
em seu mais íngreme ponto, o caminho que a conduzirá diretamente para cima, para
o próprio Santo dos Santos. Tarefa de tal grandeza que o cérebro, ao pretender
compreender sua própria divindade e a onipotência que está dentro dela própria
vai realizando, não só quanto às raças que estão à frente, mas quanto às rondas
que também estão no futuro — fazer isso é, certamente, tarefa digna de um Deus, e
a sua realização significa que o poder divino está se aperfeiçoando dentro de uma
forma humana.
Assim, a Alma bate à porta, que se abre para dar-lhe passagem, e ela
entra no Pátio Externo. Atravessa-o, passo por passo, até alcançar a primeira das
portas que levam ao Templo. Cada uma daquelas quatro portas é uma das grandes
Iniciações. Alma alguma pode caminhar para além da primeira se não tiver aceito o
Eterno para sempre, se não tiver renunciado ao interesse pelas coisas meramente
transitórias que a rodeiam. Porque uma vez que a Alma, através da porta do
Templo, tenha adentrado um dos Pátios Interiores que ficam para além dessa
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porta e conduzem ao Santo dos Santos, nunca mais poderá sair dali. Aquela Alma
escolheu seu destino para todos os milênios vindouros, e está no lugar do qual
permissão para atravessar o limiar do Templo propriamente dito. Qual será, então,
seu trabalho no Pátio Externo? Dali por diante, Como levará suas vidas, a fim de
tornar-se digna de bater à porta do Templo? Esse é o assunto que temos pela
frente.
Ao descrever esse Pátio Externo, talvez eu diga muita coisa que possa
parecer pouco atraente, até mesmo repelente. É bastante difícil encontrar o caminho
para
que tornam a Alma humana preparada para, ao menos, bater à porta desse estágio
externo. Os que ingressam nesse Pátio fizeram grande progresso no passado. Pode
ser, e será, que para alguém que ainda não tenha compreendido de maneira
definitiva a finalidade da vida, a vida que ali se leva se lhe afigure desagradável.
Porque no Pátio Externo não há ninguém que não se tenha devotado em definitivo
ao serviço, que não tenha renunciado a tudo e que nada peça em troca, senão o
coisas terrenas e aceitaram, da mesma forma, a tarefa que desejam realizar. Haverá
muita luta, naquele Pátio Externo, porque muito precisará ser feito ali em curto
espaço de tempo.
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As divisões que fiz desta tarefa são arbitrárias. Não se trata de passos,
por assim dizer, através do Pátio, porque todas elas devem ser alcançadas
como tive necessidade de dividir para clareza da explicação. Chamei essas divisões
todas as vidas que ali passa; essas tarefas devem, pelo menos parcialmente, ser
aprendidas antes que a Alma ouse enfrentar a porta do próprio Templo. Precisamos
Alma deve obter antes de alcançar a porta da primeira Iniciação; o que ela precisa é
a purificação da natureza inferior, até que cada parte dela vibre em perfeita
harmonia com a superior. Tudo que pertence à parte temporária do homem deve ser
puro para aquilo que chamamos personalidade, que não tem em si a individualidade
indivíduo assimila, ao longo de muitas vidas. Esses são os invólucros com que a
Alma se cobre e leva consigo vida após vida; é tudo quanto a individualidade
extrai a essência, a fim de transfundi-la para seu próprio Eu, crescente e eterno.
Pátio Externo e viu o trabalho que a espera, está muito bem simbolizada na frase
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usada pelo Sr. Sinnett: "Submissão ao Eu Superior." Isso significa deliberada
Cada vida a ser vivida nesse mundo inferior deve ser devotada ao propósito único
de reunir material útil, que então pode ser entregue ao Superior, que vive e cresce
com aquilo que o Eu inferior reúne. O Eu inferior compreende que seu único
trabalho no mundo é servir de agente ativo e temporário, cujo papel é acumular tudo
que lhe cabe, o viver não mais para si mesmo, mas para o fim do serviço que deve
suportar. Toda a vida no Pátio Externo tem de ser essa vida de positiva fidelidade
caminho", mas presumo que a Alma tenha feito isso ainda antes de entrar no Pátio
Externo, porque os que ali entram já não estão sujeitos às tentações mais comuns
Pátio Externo, pelo menos terão se desviado do mau caminho e deixado de trilhá-lo
se recusa a deixá-los errar, quando o bem está diante deles. Embora a consciência
mesmo depois de ter ali entrado, ela ainda desejará, de uma forma ardente, escolher
*
Livros sagrados hindus do século VI a.C, posteriores aos Vedas. (N. T.)
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o bem. As almas que ali entraram têm o desejo deliberado de agir da melhor
maneira possível.
mas com as sutis e mais penetrantes tentações que chegam à alma, quando ela tem
de viver tão rapidamente através de suas vidas, quando tem de subir com tanta
tentações, formando as virtudes lentamente. Devem subir, para a frente e para cima,
sempre.
obtiveram. Não só irão sentir o forte apelo da ambição que mantém tudo para si e
constrói uma parede entre elas próprias e os que estão abaixo, mas também serão
conhecimento do que podem ganhar e manter, que dispõe mais contra o mundo do
amor à verdade por ela própria. Muitas vezes a Alma chega a descobrir, à medida
que sua visão se torna mais aguda e clara, que essa suposta aspiração ao amor é
apenas o desejo de estar separada de seus semelhantes, de possuir o que eles não
poder possuir. Essa é uma das tentações que irão acometê-la, mesmo depois de ela
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Em breve a Alma começará a compreender que, se quiser transpor o
Pátio Externo e alcançar a porta que está cintilando à frente, deve despojar-se da
janelas do Templo e que inunda o Pátio Externo com as ondas da sua vida
espiritual. Sob essa luz, toda sombra parece mais escura, e mesmo as coisas que se
apresentam brilhantes no mundo inferior são vistas como sendo, afinal, sombras, e
com a intelectual, deve ser purificada de qualquer contato com o eu pessoal. E ela
personalidade, tudo que tende, seja em que sentido for, separá-la dos que estão
abaixo, bem como dos que se acham acima. A Alma aprende — e essa é uma das
lições do Pátio Externo — que há uma única maneira para que as portas que a
desaparecem, absorvidas, por assim dizer, pela sua ação, porque a porta que tem
natureza e estiver desejosa de partilhar com todos tudo aquilo que conseguir.
seja pessoal. Não deseja destruir, porque o que assimilou como experiência está
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poderes que esteve amealhando. Deseja levar consigo esses poderes, mas levá-los
enquanto se afasta de tudo quanto seja pessoal. Deve levar consigo a essência de
cada qualidade, porque isso é o resultado de toda a sua subida pela montanha, mas
deve levá-la como ouro puro ao altar, e não como impureza mesclada ao ouro.
situada num estágio mais inferior, e que conhecemos como cólera, ira, como esse
tremendo poder que o homem desenvolve, com o qual ele luta em seu caminho
através do mundo, com o qual combate, e pelo qual, muitas vezes, domina toda
crescimento, até que ele tenha aprendido a guiá-la e controlá-la. Essa energia é
porque é força, embora destrutiva em suas ações, como vemos no mundo inferior.
alguma forma essa energia da Alma. Transformou-a em virtude, uma virtude muito
real, e por muito tempo manteve essa virtude no mundo externo. Até então ela
contra tudo que é injusto ou cruel. Esse homem prestou bons serviços no mundo
exterior sob muitas formas de energia destrutiva, porque, antes ainda de chegar ao
Pátio Externo, esteve trabalhando no mundo. Quando via a crueldade com que
eram tratados os fracos, sua cólera se insurgia contra isso; quando uma injustiça era
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praticava essa virtude, a depurá-la de toda impureza. A cólera que sentira no início
da sua vida era cólera por si próprio. Irava-se quando sofria uma injúria, reagia no
mesmo tom quando alguém o atingia. Mas de há muito dominara a ira simplesmente
bruta da sua natureza inferior, a ira que se defende de uma afronta através da
energia destrutiva, e retribui o mal com o mal e o ódio com o ódio. Aprendera, até
próprio era injuriado do que quando uma outra pessoa sofria essa injúria. Dessa
forma, usara a cólera superior para dominar a inferior, a paixão mais nobre para
aniquilar a paixão animal da sua vida inferior. Lembrem-se de que ele era um
homem que de há muito reconhecera que o serviço era um dever, e que uma das
infligindo sofrimento.
lugar para qualquer tipo de cólera, embora essa cólera seja depurada de
comportam de modo errôneo também são seus irmãos, e sofrem mais em suas
ações injustas do que seus semelhantes pelo mal que eles lhes possam fazer. Deve
aprender que aquela nobre indignação que sente, que aquela paixão contra a
A Vida Divina ama todos os filhos que envia a este mundo, seja qual for
sua posição, seja qual for o grau da sua evolução, por muito inferior que seja.
Porque o amor do Divino, de onde tudo emana, nada tem fora de si próprio. A Vida
Divina é o âmago de tudo o que existe, e Deus está presente tanto no coração do
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malfeitor como no coração do santo. No Pátio Externo, o Divino deve ser
reconhecido, não importando quão espessos sejam os véus que o escondem, pois
ali os olhos do Espírito abrir-se-ão e não haverá véus entre ele e o Eu dos outros
homens. Portanto, aquela nobre indignação tem de ser depurada de tudo quanto
seja cólera, e transformada numa energia que nada marginaliza do seu âmbito
abraço, tanto o opressor como o oprimido. Porque os Salvadores dos homens não
fazem acepção entre os que Eles devem servir — Seu Serviço não conhece
limitações. Os que são servidores de todos não odeiam ninguém no Universo. O que
antes era cólera tornou-se, pela purificação, proteção aos fracos, oposição
E o que fez com a cólera deve fazer com o amor. O amor começa a
manifestar-se na Alma sob seu aspecto mais pobre, sob seu aspecto inferior,
quando ela começa a progredir. Talvez sob o aspecto que só conhece a procura
que acontece àquela que amou. Quando a Alma se faz mais elevada, o amor
transforma seu aspecto, faz-se mais nobre, menos egoísta, menos pessoal, até ligar-
Esse amor deve fazer-se ainda mais puro quando o candidato entrar no
Pátio Externo do Templo. O candidato deve levar consigo o amor que perdeu seu
exclusivismo. É o amor que deve manter seu fogo sempre ardendo, mais aquecido,
mas esse calor deve espalhar-se cada vez mais amplamente, e estar depurado de
tudo quanto se refere à natureza inferior. Isso significa que o amor, dirigindo-se a
outros, procurará constantemente saber quanto poderá dar aos outros, e não quanto
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poderá receber deles. Esse é o amor que se irá tornando gradualmente Divino em
riqueza da retribuição.
que lhe serão aplicadas durante todo o processo que ela está vivendo. Quando
trabalha usando sua energia, a fim de realizar algum serviço, leva para esse serviço
toque. Quando sua energia se dirige para realizar alguma coisa que a Alma
reconhece como boa, se, ao testar essa ação e seu motivo para empreendê-la,
descobre que o "Eu" está sutilmente mesclado com essa energia, que está
acontece que ao ver esse mesmo trabalho realizado por outro sente certo
que pretendia fosse seu, então sabe que o personalismo ainda está presente. Se ele
fosse o que deveria ser, a Alma só se preocuparia com o êxito do serviço, e não
com o ter contribuído pessoalmente para esse êxito. Se perceber que quando há
fracasso pessoal ainda sente a nota de desapontamento, algo que por um momento
obscurece sua paz e sua serenidade, então a Alma compreende que ainda há uma
Pode ser que ela descubra, ao medir e testar a natureza do seu amor,
que ali existem uma certa tibieza, um leve tom de desencanto, sempre que aqueles
que ela lhes deu, que o fluxo externo do amor esteja inclinado a retrair-se, cessando
*
Ithuriel: o anjo que, no Paraíso perdido, de Milton, era encarregado de procurar Satã, que entrara no
Paraíso. O anjo estava armado de uma espada, cujo toque mais leve revelava o embusteiro. (N.T.)
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seu curso, porque aqueles a quem ama não retribuem com amor. Então, aquela
Alma — tão severa consigo mesma e tão compassiva para com todas as outras
Almas — sabe que ainda está trabalhando por alguma coisa para si própria, e não
encontra sua mais alta alegria na simples glória de servir. Então, dedica-se
permanece ali, até que o amor flua para o exterior, jamais desejando saber se há,
ali, uma resposta. Porque a Alma sabe que a necessidade de amor é mais premente
onde não há resposta ao amor, e sabe que as Almas mais necessitadas de receber
amor são as que não retribuem, de modo nenhum, ao amor que as auxilia.
com incansável esforço e incessante exigência. Está sempre de olhos fitos naqueles
que já atingiram a meta, sem olhar para baixo, para os que ainda estão apenas
subindo para o Pátio Externo. Não pode repousar nem por um momento, não pode
estar jamais satisfeita, enquanto não se vir chegando cada vez mais perto da sua
meta, até que exista dentro de si menos oposição para dar passagem à luz que vem
não aos seus vícios. Tentações sutis, que aparecem como anjos de luz, assaltam
sua natureza, vêm através do que é elevado, mais nobre neles, que já passaram
máscara da virtude é que a ilusão poderia induzi-los, extraviando-os. Por isso é que
aquelas Almas aprendem a ser tão severas consigo mesmas, por isso é que são tão
exigentes no que desejam de si próprias. Sabem muito bem — por suas próprias
faltas e pelas dos seus semelhantes — que as virtudes, cuja perfeição é difícil de se
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obter no mundo inferior, são facílimas para os que já se encontram no Pátio
Externo. Elas são, por assim dizer, roubadas pelo inimigo, a fim de que aquelas
compreendem que não devem atrever-se a postar-se ante a Porta do Templo até
que a Luz brilhe, radiante, dentro delas. Por isso, elas se esforçam continuamente
Como ousariam expor-se à luz que ofusca olhos impuros pela intensidade
de seus raios; que torna cheio de imperfeições o que chamamos virtude; para a qual
olhar vigilante do Mestre, com a Alma nua, em Sua presença? Como se atreveriam
desse coração, Ele encontraria máculas que ofendem a pureza do seu olhar?
bem-recebido. O modelo de todos os Iogues — Aquele que dizem ser Ele Próprio
e as chamas cercam sempre Sua presença, consumindo tudo o que tocam. Porque
no coração daqueles que estão no Pátio Externo ainda há lugares ocultos onde a
luz não chegou, e a purificação final, pouco antes que eles entrem no Templo, vem
das chamas vivas do próprio Senhor. Elas queimam tudo que se embosca e se
oculta no mais recôndito do coração daquele que vai ser um discípulo, que se
entregou ao Senhor e nada busca ocultar. Naquele poderoso solo ardente, defronte
à porta do Templo, jazem as chamas através das quais todos devem passar antes
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Além do fogo, e no seu bojo, a figura do Grande logue é vista, e é dele
Pés. É Dele, do Grande Guru, que vem a purificação final ao discípulo. Então, o
discípulo entra pela porta que o encerrará para sempre, separando-o de todos os
que consiga atraí-lo, porque ele viu a Face do Senhor e, diante dela, todas as luzes
se obscurecem.
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II. O CONTROLE DO PENSAMENTO
assumir sobre o lugar que a mente ocupa em relação ao homem em sua natureza
mental?
virtude que se esforça por cumprir, compreenderá aquilo que chamamos natureza
inferior, e que representa uma coisa a ser dominada. Quanto a isso não haverá
dúvidas. Nosso homem virtuoso dirá que certamente se devem dominar e restringir
impetuosas, todo aquele lado da natureza do homem que é manipulado por agentes
exerce esse domínio mental sobre a natureza inferior, de forma que a mente controle
seus desejos.
Mais do que isso: se o olharmos com mais atenção, veremos que possui
uma vontade forte — vontade que trabalha ao longo de certas linhas definidas de
conduta, e que, mesmo sob circunstâncias muito difíceis, ainda pode guiar a
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Descobriremos tratar-se de pessoa cuja mente se acha muito
desenvolvida, de forma que, quando se decide a agir e decidir sobre uma ação a
empreender, ela não se deixa determinar pelas várias atrações que possam
Perceberemos que essa pessoa está sendo induzida por uma gama de experiências
todos eles, arranjou-os, por assim dizer, comparou uns com os outros, extraindo
que dominariam uma vontade fraca, e talvez extraviassem uma pessoa comum,
esse homem mais forte, cuja mente é mais desenvolvida, orienta a sua conduta pela
regra assim determinada. Ele não admite ser afastado do seu caminho pelas
Tratando com pessoa assim, com freqüência podemos prever o que ela
— de que, sejam quais forem as tentações exteriores, aquele homem irá cumprir, em
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qual ele se pôs deliberadamente a trabalhar, a fim de dominar, refrear e dirigir essa
natureza inferior. Quando ela for mais estimulada à ação por agentes exteriores, a
Alma terá condições de sustentar-se contra a tentação que pretende assolá-la. Esse
Há, porém, um outro estágio ao qual esse homem pode chegar, porque
pode vir a ter contato com um grande filósofo da vida que lhe explique algo mais
sobre os trabalhos da mente. Pode ter contato, por exemplo, com os grandes
do Egito, da Grécia, ou da moderna Europa. Nessa filosofia talvez ele adquira uma
nova visão do Universo, e isso pode modificar deveras sua própria posição.
coisas sob o ponto de vista teosófico, a enorme influência que têm os seus,
ela exerce aquele poder criativo que, provavelmente, é tão familiar para a maioria de
mundo circundante entidades ativas, que trabalham para o bem ou para o mal, que
muitas vezes agem sobre a mente e a vida de pessoas com as quais o criador de
tais entidades não tem contato pessoal. Começará por compreender que, para
pensamento se traduza em ações, para que seu exemplo possa tornar-se forte para
o bem ou para o mal. Compreende que pode ser uma pessoa completamente
obscura no sentido em que o mundo considera a obscuridade, que pode estar bem
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longe dos olhos do público, que pode ter influência apenas no pequeno círculo de
seus amigos e parentes que estão em contato pessoal com ela. Verá, contudo, que
tem um poder que transcende tanto a força do exemplo como a força da palavra ou
da linguagem. A sós, isolada dos homens, no que se refere ao mundo físico, pode
mundo, erguendo sua raça um pouco para o plano superior, ou deprimindo-a. Essas
energias sutis do pensamento agem tanto mais fortemente pelo fato de serem
invisíveis, e exercem influência mais ampla exatamente por serem tão sutis e não
para muito mais longe do que lhe é possível ver. Muitas vezes e responsável, de
forma bastante real, pelos crimes que ocorrem na sociedade em que vive, bem como
pelos atos de heroísmo. Captará a verdade daquele grande princípio que diz que
nem sempre o autor de uma ação é o exclusivo responsável por ela e pelos seus
que sua mente engendra. Isso extrapola em muito o ponto de vista assumido pelo
pensamento que atrai para si mesmo, vindo do mundo exterior, será grandemente
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determinado pela natureza dos pensamentos gerados por ele próprio. Sente que não
é apenas um ímã que emite ondas de pensamento sobre seu campo magnético,
mas também atrai para si próprio as substâncias que respondem à força magnética
que envia. Esteja sua mente repleta de bons ou maus pensamentos, isso dependerá
amplamente das linhas através das quais sua própria força mental é exercida.
um dever supremo para com seus semelhantes, mas que — tal como sempre
acontece quando um homem está em harmonia com a Lei Divina — ele próprio está
lucrando com aquilo que dá. Sua própria mente será auxiliada e fortalecida por
esses pensamentos que dela fluem para fora, atraídos, por assim dizer, pela
afinidade magnética. Reconhece, também, com dor e vergonha, que ao enviar para
vínculos que confluem para ele de todas as direções. Em sua vida cotidiana
começará a tratar mais com o pensamento do que com a ação, compreendendo que
na região do invisível são geradas todas as forças que descem para a vida psíquica
e física.
Há, porém, um passo à frente quando ele entra no Pátio Externo. Agora,
ele é um candidato a entrar no Caminho mais íngreme e mais curto que leva para
cima; agora, ele entrou no estágio probatório daquele próprio Caminho. Então, algo
mais virá ter com ele além desse reconhecimento pertencente ao homem que
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principia a entender alguma coisa sobre a natureza da vida que o rodeia. É esse
novo conhecimento que o leva à porta e que a abre parcialmente para ele.
mente, na aparência tão grande, aquela mente que parecia tão poderosa, que ainda
mente — da qual foi dito por um pensador, que "nada há maior no Universo do que o
homem e nada maior do que o homem a não ser a mente" — estava sendo vista de
um ponto baixo, com olhos vendados. Quando essa visão começa a clarear, vê-se
que existe algo maior no Universo, algo maior do que a mente, algo mais sublime,
mais vasto, algo que fulgura apenas por um momento, e então torna a ficar velado.
O homem captou um relance do Sol. Para ele, um raio de luz desceu para a sua
mente, vindo de algo que está acima, e ainda assim pareceu-lhe sentir,
idêntica a ele. De início haverá confusão, um tatear nas trevas, entre aquilo que
parece ser ele próprio, que ele mesmo pensara tratar-se da mente, embora dando a
impressão de ser tão maior do que ela. De início, ele não sabe de onde vem aquele
clarão, nem se a esperança que esse clarão fez nele nascer é um sonho e nada
mais.
Antes, porém, que possa abordar os fatos com bastante clareza, deve
tentar ver o que entende pelas palavras "Mente" e "Alma", e o que quer dizer quando
fala de "Consciência", porque essas palavras não devem ser compreendidas como
fichas com as quais se joga, mas como moedas verdadeiras que representam algo
da riqueza mental que temos, algo de idéias. Eu defino a Alma como aquilo que
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isolado, que é, por assim dizer, um receptáculo no qual o Espírito é derramado.
Universo; que possa ter conhecimento tanto no plano físico como no psíquico, tal
como tem no plano espiritual, e que sua consciência não sofra ruptura de qualquer
espécie; que possa obter para si própria os veículos de que necessita, a fim de
adquirir consciência além do seu próprio plano. A alma, então, pode purificar
gradualmente esses veículos, um por um, até que eles não mais atuem cegamente,
derramar dentro dele algo que toma contorno definido, de acordo com o feitio do
vaso que o recebeu. O que acontece aproxima-se mais da maneira como se forma
espaço no qual nada é visível. Poderão, então, imaginar que aquele espaço — onde
invisível aos olhos — tem uma névoa tênue, tão delicada que quase não se pode
chamar assim. Então, enquanto observamos, a névoa faz-se cada vez mais densa
32
com o decorrer do tempo, agregando-se cada vez mais, e tornando-se mais
destacada no espaço que a rodeia. Aquilo que parecia ser a mais esmaecida das
sombras começa a tomar feitio, fazendo-se cada vez mais definido à proporção que
no espaço, até que um sistema viria a ser formado, com um sol central e planetas
vaga aparência de uma sombra no vácuo universal, sendo esse vácuo, entretanto, o
mais repleto entre os repletos. Essa sombra faz-se névoa, e então vai tomando
forma sempre mais clara, fazendo-se cada vez mais definida, enquanto a evolução
continua, até que haja um indivíduo, a Alma. Tal é o processo esquematizado dessa
densificada, se ainda posso usar tal imagem, até que do Universal venha o
como sabemos, de rida para vida, através de infindáveis anos, através de infindáveis
que ficou para trás no processo do seu crescimento. Seu passado historiado está
sempre presente na sua consciência que cresceu tão largamente durante a jornada
acumulada, essa Alma projeta uma parte de si mesma nos próprios novos
invólucros, para reunir nova experiência. Essa parte flutua exteriormente, nos planos
33
inferiores, para que ali possa aumentar o conhecimento através do qual a Alma
carne, literalmente falando. Sua consciência faz-se mais enevoada, porque não
pode transpor aquele véu de matéria mais espessa. Toda a grandeza que
conhecemos como Mente é apenas a parte lutadora da Alma, que trabalha naquele
que aquela Alma é ele próprio, sendo a mente uma manifestação passageira. Tal
como o corpo e a natureza de desejo devem estar sujeitos à mente, que é a parte
aprisionada da Alma, também a própria Alma deve estar sujeita à grande Alma, da
realiza.
exterior, ela reúne fatos, arranja-os, faz a tabulação deles, julga-os, e leva a cabo
para cima — ou antes, para dentro — durante essa expansão da Alma na própria
Alma. É isso que a Alma leva consigo para o Devachan, e ali trabalha sobre o que
34
fatos, com as conclusões daí extraídas; a sabedoria é a essência haurida do todo,
princípio ele deve distinguir entre o "Eu" que suporta e essa mente que é apenas
matéria.
transitório e o eterno*."
da Alma para varrer a poeira das nossas ilusões". O candidato reflete sobre essas
palavras.
*
H. P. Blavatsky, The Voice of the Silence (originalmente publicado pela Theosophical Publishing
House, Quest Miniatures, 1980), p. 36. Em português, A voz do silêncio, Ed. Pensamento, São Paulo.
35
Qual é a diferença entre o real e o transitório, e por que isso está
que reflete e a Alma que precisa espanar o espelho se quiser livrar-se da ilusão?
Qual é a parte que deve ser tomada por essa mente, que parece uma função tão
poderosa que chega a representar o próprio homem no mundo inferior? Qual é a sua
real, e a mente, de certa maneira sutil, está relacionada com a produção da ilusão?
Há outras palavras que ele também recorda terem vindo dos lábios
da natureza inferior, que não é amigo do discípulo. Lembra-se que lhe ordenaram
procurar o Rajá dos sentidos para que pudesse compreendê-lo, porque ele é o
mente em crescimento, que produz a ilusão. Essa mente é que tem incomensuráveis
imagens e desenhos, que tem a faculdade de elaborar imagens à qual nos referimos
*
The Voice of the Silence, p. 17.
36
que criou. Isso é o que realmente cria a ilusão, isso é o que destrói a Realidade, no
menos que ele consiga libertar-se desse ilusório poder da mente, limais poderá
Então, ouvindo ainda o Mestre, ele escuta também uma voz que lhe
ordena mesclar sua Mente e sua alma*. Seu trabalho consistirá em proceder a
capacite a conhecer o ente superior que a engendrou, para que o Pai e o Filho se
identifiquem em um só.
lhe que deve destruir o corpo lunar, que deve limpar o corpo da mente**. Esforçando-
como o homem astral. "Purifica teu corpo mental" — diz-lhe o Mestre, porque só
senhora, deve ser uma escrava obediente, instrumento na mão de quem a tem,
serva daquele que a envia para a frente. A natureza da sua tarefa desdobra-se
aquela mente está sempre passando de uma coisa para outra, que é difícil de
*
Ibid., pp. 36-37.
**
The Voice of the Silence, p. 25.
37
controlar, difícil de ser dominada, tal como Arjuna, do Bhagavad-Gita, descobriu, há
cinco mil anos. Começará por treiná-la como se treina um cavalo que está sendo
domado, a fim de que possa cavalgar definitivamente pela estrada escolhida, sem
pular cercas e valas, sem correr pelo campo em todas as direções, para que
caminhe pela estrada que o cavaleiro deseja percorrer. Esse nosso candidato deve
realizar tudo isso em sua vida no mundo e, assim, aos poucos, treina a mente para
prolongado. Irá ler por opção, e por um motivo premeditado — porque é aqui que o
argumentos que treinam a mente para caminhar numa direção definida durante um
período considerável. Não permitirá que ela salte de uma coisa para outra,
Assim, dia a dia, mês a mês, ano a ano, ele se ocupará de sua mente,
em que quer pensar. Já não mais permitirá ser tiranizado e subjugado por um
Poderá ter transtornos em sua vida cotidiana, mas isso não importa,
deles foi muito forte, quando se sentir inclinado a lançar os olhos para o porvir,
permanecerá em minha mente. Nada ficará ali se não for por escolha minha e por
38
meu convite." Há pessoas que passam a noite acordadas, cheias de pensamentos
ansiosos, quase se matando, não pelos transtornos em si, mas pelas preocupações
que esses transtornos causam à mente. Toda essa espécie de coisa deve ter um fim
repetir isso. Não há outra maneira senão voltar-se para tais pensamentos todas as
pensamento por outro, sempre por algum pensamento elevado que trate como
presente está passando, portanto não vale a pena perturbar-se a propósito dele. Ao
Treinando sua mente dessa maneira, e obtendo, aos poucos, poder sobre
ela, o aspirante pode fazê-la pensar nas coisas que escolher, e evitar os
outro. Irá retirar-se da própria mente e pensar sem ela — não por tornar-se
inconsciente, mas porque está buscando uma consciência mais profunda; não
porque a vida, nele, seja monótona ou se está fazendo letárgica, mas porque tornou-
39
Com esse crescimento da vida interior, com o aumento da energia vital
que flui para a Alma, ele descobrirá, lentamente, que é possível alcançar um estágio
Alma. Bem antes disso, descobrirá essa consciência e irá compreendê-la intacta, por
dos estágios mais penosos, talvez, na vida do nosso candidato ao Pátio Externo.
subjacente às palavras do Mestre: "Reprime teu eu inferior com teu eu Divino, e com
o Eterno reprime o Divino*." O Eu Divino é essa Alma que deve reprimir a mente
inferior. Não obstante, para além da Alma, está o Eterno, e, em algum ponto do
futuro que está dentro do Templo, esse Eterno vai reprimir o Divino nele, como o
Aos poucos, lentamente, ele aprende que deve ser o senhor de tudo que
está em torno, e com o que a mente está relacionada de toda maneira. Chegará a
um dos estágios, nesse Pátio Externo, onde as tentações sutis afluirão em redor,
tentações que não tocam na natureza inferior, mas ousam levantar-se contra a
superior, e se esforçam por usar a mente do aspirante para destruí-lo, tendo falhado
sobrevêm aquelas tentações sutis que lançam o homem interior em uma armadilha,
Ele deve, estão, ter obtido elevado controle sobre as imagens mentais
que ele próprio criou quando ainda não era capaz de se manter inabalável, sereno,
*
The Voice of the Silence, p. 48.
40
pensamentos vêm ter com ele, vitalizados e reforçados, não mais pela mente fraca
do homem do mundo inferior, mas com o tremendo impulso que tem algo da
natureza das forças do plano espiritual. Eles vêm do lado escuro, não do lado
branco, vêm daqueles que de bom grado matariam a Alma, e não daqueles que
desejariam ajudá-la. Atiram-se sobre ele com a energia nascida das poderosas
forças do mal. Se ele não treinou a si mesmo para ser o senhor dentro dos limites da
mente, contra os mesquinhos ataques que lhe vêm ao encontro, oriundos do mundo
exterior, como poderá manter-se contra as hostes de Mara, a perversa? Como pode
atravessar aquele quarto estágio no Pátio Externo, em torno do qual esses inimigos
da Alma estão se agrupando, estágio que recusa dar passagem a todo aquele que
Então, surge aquela força que nasce da fixidez da mente, da mente que
agora se fez tão forte que se pode fixar no que quiser e ali manter-se inabalável,
seja qual for o turbilhão que possa existir em torno. Essa fixidez é tão grande, tão
firme, que nada do que seja externo pode agitá-la, tão forte que já não precisa
mais forte a Alma, menor é o esforço em seu trabalho, mais dominante o seu poder,
Mente e da Alma. Não há mais necessidade de lutar, porque tudo quanto exigia luta
cai morto pelo recuo surgido do seu próprio golpe. Essa fixidez da mente é descrita
como lâmpada colocada em local firme, onde vento algum pode bruxulear a sua
41
chama. Ela está em um lugar de repouso, onde a vontade começa a ser
compreendida, onde reina paz absoluta, lugar que fica à sombra das paredes do
Templo.
contempla a majestade da Alma*. Na verdade, ele vê, pela primeira vez, não mais
através de relances furtivos, pelo raio que vai e vem, mas nessa paz absoluta onde
não há desejo nem inquietação pela mágoa. Ali, a majestade da Alma brilha por
inteiro, e a mente a reflete tal como ela realmente é. Porque essa mente, que antes
era um espelho coberto de pó, um lago encapelado pelos ventos que sopravam de
todos os lados, tornou-se um espelho polido que tudo reflete com perfeição. Tornou-
sentindo os grilhões que estão sobre ele — esse levante da natureza inferior da qual
Natureza se erguem contra ele, a fim de arrastá-lo para baixo; todo o poder que está
no mundo insurge-se contra ele. É a última liça a ser sustentada, através da qual
*
Kathopanishad, ii, 20.
42
chega-se à conquista plena. Nos planos superiores ainda há uma luta da qual esta é
o reflexo; em planos tão elevados que nem mesmo podemos fazer idéia a seu
respeito, e rumo aos quais o maior dos grandes encontrou seu caminho. Isso está
simbolizado na última luta de Buda sob a Árvore Sagrada, onde lhe sobreveio a
última iluminação que o tornou Buda. Todas as hostes reuniram-se à sua volta para
essa última luta, a fim de ver se sua passagem podia ser bloqueada. Embora sobre
planos infinitamente inferiores ocorra essa luta crucial na vida do discípulo que agora
se aproxima do Templo.
Como ele vencerá essa luta? Como ele irá, nesse caminho probatório,
Das palavras do Mestre vem o auxílio, dos Seus lábios, a sugestão que
nos guiará: "É preciso" — ouvimos no silêncio — "encaminhar essa luta para a Alma
Diamante*.”
a que realizou uma união com o verdadeiro Eu, sem mácula ou falha em qualquer
focaliza para os homens, através da qual a própria luz do LOGOS fulgura sobre os
homens, tão puro é o Diamante. É a Alma que procuramos ver nos momentos da
sua beleza, um toque do seu fogo. Porque a Alma cresce para cima, como a flor
cresce voltada para a luz, e as forças que a atraem para o alto são as forças
*
The Voice of the Silence, p. 37.
43
sobre o que ela própria é, embora tão fraca e hesitante, e que a levam a subir com
significa o que se chama Alma Diamante, e compreende que nele próprio também
aquela Alma Diamante deve ser reencarnada — "Olha para o interior! Tu és Buda!"
— que aquela mente, como seu corpo, não é senão um instrumento para esse
serviço.
submetidas à Alma. A Alma as torna afinadas pelo poder da devoção, e por isso
sua mente faz-se um instrumento musical, preparado para o toque do Mestre, e daí
todas as melodias do céu e da terra podem soar. Por fim, o discípulo coloca-se
diante da porta, e compreende que ele próprio encontrou Ele Próprio. A Alma, que
é Ele Próprio, está voltada para cima, para UM ainda maior, com o qual ela se irá
mesclar. Essa união vindoura tem lugar apenas no interior do Templo. Colocando-se
diante da porta, ele apenas uniu o Ele Próprio eterno ao seu eu perecível — Ele
O candidato aprende que em sua vida cotidiana a Alma pode estar sempre
estarão trabalhando pela humanidade que precisa deles, no Pátio Externo, e além
dele, no mundo. O corpo e a mente são instrumentos en quanto o homem está vivo;
44
verenação. E então ele compreende a significação de "no céu . . . Anjos contemplam
a face do Pai*", porque a visão da Alma-Pai é uma visão ininterrupta. Nuvem alguma
*
Mateus, 18:10.
45
III. A FORMAÇÃO DO CARÁTER
alcançadas no seu todo. Ele está começando, por assim dizer, a formação do seu
caráter. Compreende, até certo ponto, o que deve ser, esforça-se, com maior ou
menor sucesso, por se tornar aquilo a que aspira chegar. Não que a purificação
mesmo, a inteira transmutação do inferior para o superior, tudo isso deva ser
daquele edifício que espera levar à perfeição. A tarefa, em todas essas frentes — a
colocação da pedra final que irá coroar a obra — é realizada dentro do Templo,
vendados, estando o aspirante ainda no Pátio Externo. Ainda assim, por muito
elevadas que pareçam ser essas aspirações, por muita magnificência que os
contornos preenchidos pareçam ter, eles têm de ser definitivamente admitidos como
46
presente, nem por isso elas deixam de ser os fundamentos definidos, sobre os quais
porque, enquanto os esboços estão sendo traçados, eles podem ser considerados
apenas enquanto tais. Transposto o limiar, há ainda muitas vidas nas quais esses
colocará diante de si. Já vimos que ele precisará ter sido, em vidas passadas, um
homem virtuoso e religioso, e que quaisquer tendências que ainda existam ali devem
partes rudes da luta íntima estarão destruídas. Pedras muito brutas mas não podem
ser levadas ao Pátio Externo do Templo para a construção. O desbaste deve ter
sido feito durante muitas vidas anteriores, antes que elas estejam em condições de
um tipo inexcedivelmente alto e nobre — virtudes que não são apenas aquelas que
47
está identificado, e o objetivo é conhecido. Essa formação é deliberada, feita por
alguém que sabe que tem tempo, e que nada na Natureza pode ser perdido. Ele
começa com o material que tem em mãos, com o caráter tal como é reconhecido
contornos gerais.
O homem sabe que levará consigo tudo quanto fez, que de vida para vida
parcialmente puder repará-la, ainda assim ela se conservará reparada até aquele
ponto, até aquela parte do trabalho feito. Se adquiriu para si um poder, esse poder é
seu para sempre, uma parte da Alma que jamais será retirada, que está tecida na
O candidato trabalha com esse propósito deliberado que tem suas raízes
Por compreender que a Lei é imutável, por saber que pode confiar nela com a
máxima e mais completa fé, apela para a Lei e sabe que ela responderá. Tudo o que
distribui trará, inevitavelmente, a sua colheita. Semeia cada semente com a absoluta
certeza de que ela produzirá frutos da sua espécie; esse fruto, e nenhum outro, será
sua recompensa em tempos futuros. Assim, não há pressa alguma em seu trabalho,
nenhuma impaciência em seu labor. Se o fruto não está maduro, ele pode esperar
para colhê-lo; se a semente não está pronta, pode esperar que ela cresça. Sabe que
a Lei, à qual se entregou, é, ao mesmo tempo, imutável e boa, que a Lei tudo lhe
48
Assim, começa com o material disponível, contentando-se com ele porque
é o que a Lei lhe traz do seu passado. Farto ou escasso, pobre e pequeno, ou rico e
grande, começa a trabalhar com ele, sabendo que por muito escasso que se
apresente, não há limite para a vastidão que esse material pode alcançar durante os
anos que ele tem pela frente. O aspirante sabe que ele deve ter êxito, e isso não é
realidade. A lei deve devolver-lhe o equivalente àquilo que ele dá e, mesmo que ele
dê pouco, esse pouco lhe será ressarcido, e com isso poderá construir seu futuro,
Na seleção dos pensamentos, sejam os que ele próprio gera, sejam os que ele
permite cheguem à sua mente, seu primeiro motivo será o efeito que esses
pensamentos terão sobre os outros, não o efeito que terão sobre ele próprio. Acima
e além de qualquer outra coisa, ele está se qualificando para servir; portanto, ao
selecionar pensamentos, avalia o efeito que eles possam provocar sobre o mundo
exterior — até onde eles irão ajudar, até onde eles irão fortalecer, até onde eles irão
auxiliar o mundo.
A seguir, refletirá sobre a índole dos seus pensa mentos e no que eles o
caráter, porque ali está, realmente, o instrumento com o qual seu caráter será
edificado. Agindo como um foco para pensamentos nobres e altruístas — não mais
49
para pensamentos que são ativamente nefastos —, fará de sua consciência, de
maneira deliberada, um ímã para tudo o que é útil. Os bons pensamentos de outrem,
convergindo para ele, podem partir com novo impulso de vida. Ele pode ser não só
uma fonte de auxílio pelos pensamentos que gera, mas um canal desse auxílio pelos
mais zeloso cuidado, a fim de que nada do que seja ofensivo possa adentrar aquele
Ele aprenderá, nessa formação do seu caráter, a ter cautela com a sua
não a banal veracidade do mundo, embora ela não seja coisa desprezível. A estrita
verdade no falar, a verdade na ação. Onde não houver essa corajosa determinação
de se fazer verdadeiro, não haverá possibilidade de Ocultismo que não seja repleto
seu escudo: seu guia por conceder-lhe a intuição que lhe permite escolher entre o
escudo, porque somente quando estiver protegido por esse escudo é que todas as
ilusões e fascinações dos planos, através dos quais ele passa, vêm a sucumbir,
50
inofensivas. Porque é na prática da verdade no pensar, no falar e no agir que se vai
despertando aos poucos aquela intuição que trespassa todos os véus da ilusão, e
contra a qual não pode haver possibilidade de se estabelecer uma decepção com
êxito. Por toda a parte, no mundo da ilusão, essa falsidade das aparências será
encontrada, até que a intuição espiritual possa perpassar o todo que elas formam,
refere à intuição espiritual, a não ser quando a verdade é secundada pelo caráter,
com demasiada freqüência. A palavra nada perde da sua verdade por ser perfeita
reflete a mais íntima essência do Universo não pode ferir injustamente nenhum ser
vivo, nem se fazer falsa pela mais leve sombra de desconfiança. A austeridade da
os aspirantes.
ação será nobre, de maneira inevitável; de uma doce nascente de água só pode vir
um doce fluir; do coração e do cérebro que foram purificados a ação deve ser,
essencialmente, justa e boa. Esse é o cordão tríplice pelo qual o aspirante está
palavra e na ação — o tríplice cordão que liga o homem ao serviço, que vincula o
51
discípulo aos Pés do Mestre, o tríplice cordão que não pode ser rompido com
facilidade.
"Ideal". A mente, trabalhando dentro de si própria, constrói uma imagem interna, com
o muito que ela assimilou do mundo externo, mas a idéia é o resultado da ação
interna da mente sobre os materiais. Uma idéia é, em seu mais alto grau, uma coisa
conhecimento do cérebro, teremos, então, uma opinião muito clara sobre aquilo que
trabalhando na criança através do estudo das muitas formas que lhe dizem ser um
triângulo. A criança observará que aquelas muitas formas têm contornos diferentes,
feitos de linhas que partem para diferentes direções. Quando olha para eles
muitas figuras e não reconhecerá certas unidades subjacentes que dão a todos eles
o mesmo nome. Mas aprenderá, aos poucos, que há certas concepções definidas
que formam a base dessa concepção única do triângulo: que ele tem sempre três
linhas e não mais, que essas três linhas, quando reunidas, têm sempre um certo
valor definido, que os três lados do triângulo mantêm certo relacionamento uns com
observações, extrai delas o que se chama a idéia abstrata de um triângulo, que não
tem tamanho específico, nem feitio específico, nem ângulo específico, se tomados
52
separadamente. Essa idéia abstrata é formada pelo trabalho da mente sobre todas
No cérebro, forma-se uma idéia abstrata, sem cor nem feitio, nem qualquer forma ou
característica especial, seja de que tipo for, e que reúne em si aquilo que faz das
todas as diferentes idéias que obteve sobre as grandes virtudes — do que é belo, do
idéias diferentes, tais como foram vistas em sua limitada manifestação, a essência é
extraída. Então, a mente constrói e lança para o exterior uma vasta e heróica forma
imaginada, na qual tudo é conduzido para a perfeição, na qual tudo alcança sua
mais alta e completa expressão. Já não mais tratamos com coisas verdadeiras, mas
com a verdade; não mais com coisas fortes, mas com a força; não mais com seres
que amam, mas com o amor. Essa imagem perfeita — pujante e harmoniosa em
todas as suas proporções, maior do que tudo quanto foi visto — é que o aspirante
forma da maneira mais precisa que ele é capaz de conceber, sabendo, todo o
tempo, que seu mais belo sonho não passa de uma tênue sombra da realidade que
no mundo do Real existe, em viva luz, o que aqui embaixo ele vê, por assim dizer,
em fraco reflexo colorido, suspenso nas alturas dos céus sobre as montanhas
nevadas da aspiração humana. O ideal que ele forma é ainda imperfeito porque
assim precisa ser! É apenas a sombra da Realidade. Contudo, por mais imperfeito
que seja, para ele é o ideal, de acordo com o qual seu caráter é formado.
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Mas por que criar um ideal? Seja-me permitido citar duas frases, uma
delas de uma grande escritura hindu, e outra de uma escritura cristã, para mostrar
como os Iniciados referem-se aos mesmos fatos, seja qual for o idioma que usem,
seja qual for a civilização à qual suas palavras se dirijam. Lê-se num dos mais
místicos dos Upanishads, o Chandogya: "O homem é uma criatura que reflete;
aquilo sobre o que ele reflete é aquilo que ele se torna: portanto, reflete sobre
Brahma*."
Cristianismo, escreveu exatamente a mesma coisa, com outras palavras: "Mas todos
imagens são lançadas sobre ele e são refletidas, e a Alma que contempla a glória
que recebem — o de que devem ter um ideal diante de si, a fim de que possam
permitindo afastar-se dele, esse aspirante, que está disciplinando seu próprio
caráter, contemplará, dia após dia, o ideal que está plasmando. Fixará a mente nele
e de forma constante o refletirá em sua consciência. Dia após dia ele retornará ao
*
Chandogya, III, xiv, 1.
**
Cor., iii, 18
54
dentro dele crescerão, de maneira inexorável, aquela reverência e respeitoso temor
que são veneração, o grande poder transformador pelo qual o homem vem a ser
sobre ele, e a aspiração irá elevá-lo para abrir as janelas da Alma, a fim de recebê-
los. Esses raios o iluminam por dentro, e então lançam a luz para o exterior; o ideal
sempre brilhando dentro dele, e apontando o caminho que seus pés devem
percorrer.
Para que possa contemplar dessa forma, ele deve treinar-se para a
conosco. Temos de prender a fixá-la com firmeza. Devemos trabalhar nesse sentido,
vez, até que a mente responda, obediente, ao impulso, fazendo isso com a energia
concentrada que a dirige para um único ponto. Não importa que muitas das coisas
que tenhamos de fazer sejam triviais. Não é o tipo específico de trabalho que nos
cumpre realizar no mundo o que importa, mas a forma pela qual o realizamos, a
mente que firmamos nele, as forças com as quais o realizamos, o treinamento que
ele nos leva a obter. Não importa o que a vida possa ser, porque essa vida servirá
o objeto para o qual ela será orientada. Podemos, porém, da mesma forma, obter o
controle tanto das coisas pequenas como das coisas grandes, e isso, na verdade, é
muito melhor, porque as coisas pequenas estão em torno de nós todos os dias, e as
55
Quando surgem as coisas grandes, a mente, por inteiro, ergue-se para
forma que possamos nos conservar bem, quando a tarefa importante tenha de ser
realizada. O valor real da Alma, entretanto, é testado mais nas pequenas coisas,
quando nada há que chame a atenção, nada, em sentido algum, que provoque
disciplinar.
plano, estabeleça, para você mesmo algumas regras, pelas quais sua vida deve fluir.
manhã, porque o corpo tem de ser posto sob controle. Fixe o tempo que considera
melhor para o seu trabalho, para seu lugar no governo da casa, e quando tiver
fixado esse tempo, mantenha-o. Não permita que o corpo escolha, na hora, o seu
tempo, mas cuide de treiná-lo naquele instante para uma obediência automática que
o torna um servo fiel da mente. Se depois de algum tempo de prática perceber que
escolheu mal, então modifique o que havia estabelecido. Não seja rígido, já que está
se esforçando por fortalecer sua vontade; esteja pronto a modificar o que não
funciona bem. Mas que essa modificação seja feita por sua escolha pessoal, e com
atendendo à natureza inferior que deve ser disciplinada, mas faça-as se concluir que
escolheu mal. Nunca, ao dirigir sua própria vida, deve fazer das regras que
56
autodisciplina que irritem ou estorvem os outros, ao invés de simplesmente fazerem
o seu treinamento.
algumas das coisas que os grandes homens colocaram diante de você como
descrição do caráter que o levará à porta do Templo. Pode seguir, por exemplo, uma
quando Shri Krishna, dirigindo-se a Arjuna, diz como formar um caráter divino. Ali,
você encontrará um rol de qualidades, cada uma das quais pode bem servir como
qualidades divinas”. Nem todas essas qualidades ele as obtém ao mesmo tempo,
mas tornam-se dele e são criadas na formação do caráter. Cada uma delas deve ser
praticada, de início, como é natural, de forma imperfeita, mas, ainda assim, com
firmeza, e dia a dia — sem nunca experimentar desânimo por sentir falhas na
realização, mas exultar ao atingir a meta, sabendo que cada passo é dado para a
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Se você ler a lista dessas qualidades, com calma e cuidado, verá que
pode agrupá-las sob tópicos bem-definidos. Observe como através delas correm os
coragem, a força e a resistência encontram também seu lugar, de modo que você
tempo, um auxiliar dos fracos, sendo ele próprio forte e inabalável, que é cheio de
Suponhamos que você aceite isso, até certo ponto, como ideal para a
extensão de tempo que há diante dele, toda a vastidão da tarefa que vai ter de
executar, toda a grandeza das possibilidades que ainda existem, ocultas, à sua
frente, as coisas da vida superficial da pessoa devem tomar seu lugar em proporção
com o todo. Sobrevindo um transtorno, ele já não avultará tanto como quando uma
única vida era tudo quanto essa pessoa compreendia, porque agora ela começa a
perceber que já arrostou muitos aborrecimentos e que de cada ocasião saiu mais
forte e mais tranqüila. Sobrevindo a alegria, ela sabe que já as teve muitas e que
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também aprendeu com as suas lições, descobrindo serem elas também fugazes.
Assim, quando assoma a alegria, quando vem a dor, a pessoa as sente em seus
Isso não quer dizer que essa pessoa tornou-se incapaz de sentir. O que
acontece é que ela está sendo cada vez mais sensível a cada vibração do mundo
tornar-se responsiva a todos os tons da harmonia íntima. Mas nada disso pode
embora possa senti-las, nunca pode ser desestruturada por elas. Elas assumem seu
devido lugar na vida, mantêm sua correta proporção quanto à duração total da
existência da Alma.
fortaleza, como você pode desenvolvê-la? Primeiro pensando diariamente nela, até
saber o que entende por aquilo. A seguir, deve praticá-la em sua vida cotidiana, sem
recorrer à formação de uma concha em torno de si mesmo, uma concha que tudo
afasta, mas fazendo-se responsivo a tudo o que vem de fora. Ao mesmo tempo,
tente manter um equilíbrio interior que se recusa a ser alterado quando a mudança é
sentida diretamente, usa é uma lição difícil, mas que traz consigo muito de alegria,
abalada, sem deixar de captar toda a vibração que vem de fora, ela tem um sentido
59
mais amplo da vida, um sentido de harmonia mais completo, de consciência em
permanente crescimento, de unidade cada vez maior com aquilo de que ela é parte.
À proporção que o senso de isolamento se desfaz, flui para ela a alegria que jaz no
coração das coisas, e mesmo aquilo que para o homem comum é dor perde seu
atributo doloroso. O discípulo sente isso, por assim dizer, como parte da Vida
Manifestação. Ele pode captar o seu significado sem agonia em seu próprio
por assim dizer, sua atitude em relação a tudo o que os homens conhecem como dor
mundo exterior. Verá e sentirá o temporal, mas não será abalado por ele. A Vida
deve ser odiado, tudo tem de ser conduzido para o círculo do amor, por muito
Vida e Amor, portanto, o aspirante, que está aprendendo suas lições, não pode
fechar à entrada daquele círculo de compaixão a coisa alguma. Tudo é ali recebido,
60
de acordo com a sua própria capacidade de sentir, e ele é amigo de todo ser vivo, o
destemido porque, nada odiando, nada existe que tenha o poder de prejudicá-lo. A
ofensa que vem de fora é sempre uma reação à agressão vinda de dentro, porque,
se formos inimigos de outros, eles, por seu turno, serão nossos inimigos, e se
sairmos para o mundo como ofensores, as coisas vivas, por sua vez, ofender-nos-
ão. Devemos ser amantes de todas as coisas vivas. Aqui, o trabalho do homem é
educar seus irmãos mais jovens e levá-los a subir, com toda a ternura e compaixão.
Ainda assim, tiranizamos outros, humanos ou animais, desde que sejam mais fracos
do que nós, e pela sua fraqueza dosamos, amiúde, a nossa tirania, e pela sua
sobre eles. Em nossa cegueira, não sabemos que todo ódio que nos vem do mundo
exterior é o reflexo do mal que está em nós próprios, e também não sabemos que
para o coração amoroso nada há que seja odioso, portanto nada há que possa
ofendê-lo.
porque em seu coração nada há que seja mensagem de ódio. O amor que
irradiamos para o mundo em torno de nós atrai todas as coisas para servir e não
para prejudicar, para amar e não para odiar. Assim, aos pés do Iogue, o tigre rolará
amigavelmente; aos pés do santo, o mais selvagem dos animais irá levar seus
filhotes, pedindo para eles abrigo e ajuda. Todas as coisas vivas se aproximam do
homem que ama, porque todas elas são frutos do Divino, e o Divino é Amor.
61
Assim, paulatina e lentamente, aprendemos a caminhar pelo mundo sem
temor, intrépidos mesmo através de coisas que ainda podem prejudicar-nos, porque
sabemos que, feridos, estaremos apenas pagando uma dívida contraída num mau
passado, e que para cada dívida resgatada haverá um saldo menor contra nós, no
saber. O medo nasce da dúvida e do rancor. O homem que sabe passou para além
da dúvida e caminha com pés destemidos por onde quer que vá, porque sabe que
está palmilhando apenas terreno sólido, e ali não há armadilhas para seus passos.
Nasce daí uma vontade firme, inabalável, vontade calcada no conhecimento, e que
Externo, seus passos fazem-se mais firmes, seu roteiro torna-se mais direto e
inarredável em seu propósito, crescente cm sua força. Seu caráter começa a mostra-
Então, vêm o gradual desapego de todos aqueles desejos que nos ligam
nossas vidas passadas chegamos a descobrir que não continham satisfação para a
aquele que está crescendo não irá renascer por qualquer dos vínculos que
pertencem à terra. Os homens voltam à terra porque são mantidos ali, ligados por
esses vínculos de desejos que os prendem à roda dos nascimentos e mortes. Esse
homem que estamos estudando, que vai ser livre, deve romper tais vínculos de
desejos por iniciativa própria. Só uma coisa poderá prendê-lo, trazendo-o de volta ao
nascimento: o amor pelos seus semelhantes, o desejo de servir. Não está ligado à
62
roda, porque é livre, mas pode retornar e dar a volta à roda uma vez mais, por amor
daqueles que ainda estão presos, e junto dos quais ficará até que os vínculos de
compulsão e aprende assim o perfeito altruísmo, aprende que está buscando o que
é bom para todos, e só deseja obter o que serve para Todos. Aprende, então, a
todos, e para identificar-se com esse Eu, pois para tanto está crescendo.
É possível que o aspirante tenha de enfrentar uma das mais duras provas
nesse Pátio Externo. Quando ali entrou, sabendo e vendo o júbilo prodigioso que
tinha pela frente, voltara às costas a muito do que faz a vida agradável aos seus
da Alma, em que nada foi deixado na terra que pudesse satisfazer: quando perdeu
mãos que estão à frente, embora nos estejam amparando, ainda não são sentidas; a
pedra que está a nossos pés, embora os tenhamos plantados sobre ela, ainda não é
aquele vazio se abre, escuro e parecendo insondável, aquele que lhe está à margem
escuridão, e sentirá uma pedra sob seus pés! Solte-se das mãos que o mantêm para
trás. Mãos mais poderosas agarrarão as suas e o atrairão para diante, e são Mãos
descobrirá que a soledade é a maior das ilusões, que a treva é uma luz que ninguém
63
mais pode perder em sua vida. Essa prova, uma vez enfrentada, é também vista
como uma grande ilusão, e o discípulo que ousou mergulhar encontra-se do outro
lado dela.
virão, cada vez mais nobre à proporção que cada uma dessas vidas termina, cada
vez mais vigoroso a cada passo que se adianta. Esses são apenas os fundamentos
esboço, já que sua imaginação vê o edifício concluído e sabe para que o está
construindo.
língua sequer pode esboçar. Não há pincel, se mergulhado apenas nas cores foscas
da terra, que possa pintar algo da beleza daquele ideal perfeito, para o qual temos a
esperança de nos elevar, ou melhor, para o qual sabemos que todos temos de nos
viram alguma vez o reflexo disso, quando a terra estava serena e o céu mostrava-se
calmo? Tiveram, alguma vez, um relance daquelas Faces Divinas que vivem e se
movem — Aqueles que foram homens e agora são mais do que homens, sobre-
Se tiveram esse relance, então não precisam que minhas palavras lhes
falem disso. Sabem da compaixão que de início parece compor o todo do ser, tão
radiante é a sua perfeição, tão gloriosa é a sua divindade; e sabem da ternura, tão
grande que pode curvar-se sobre o mais baixo; sabem como transcender o mais
alto, que reconhece o menor esforço, bem como a mais importante realização — ou
melhor, que é mais terno para com o fraco do que para com o forte, porque o fraco
64
precisa mais auxílio da solidariedade que jamais se modifica, do amor que não
parece divino, de tal forma se apresenta humano, e que nos leva a compreender que
E, para além da ternura — a força que nada pode mudar, a força que traz
ser construídos e ainda assim ela não será abalada, força de tal modo infinita,
que deseja ver todos os outros compartilharem a sua beatitude, o sol radiante que
não conhece sombra, a glória da conquista dizendo que todos vencerão, o júbilo nos
olhos dos que vêem para além do sofrimento e que, mesmo contemplando a dor,
inquietações, serenidade que nada pode perturbar. Tal é o vislumbre que podem ter
E se ousamos erguer os olhos para tão alto, é porque Seus Pés ainda
pisam a terra que nossos pés estão calcando. Eles se ergueram muito alto acima de
nós, mas nem por isso deixam de estar ao lado de Seus irmãos. E se nos
transcendem, não é porque nos tenham deixado, embora, por todos os lados,
onde a humanidade está, nós, seus filhos, podemos ousar entender que moramos.
65
IV. ALQUIMIA ESPIRITUAL
Vimos que o candidato que está no Pátio Externo tentará, aos poucos,
trazer toda a sua natureza sob controle e dirigi-la para a realização do objetivo que
ele prometeu a si mesmo atingir. Suponhamos, então, que nosso candidato vai
transmutação.
uma transmutação de forças. Cada homem tem, em si próprio, vida, energia e vigor,
bem como poder de vontade, e assim por diante. Com essas forças é que ele deve
trabalhar, pois são energias através das quais seu objetivo tem de ser alcançado.
Por um processo que pode ser razoavelmente descrito como alquímico, ele
transmuta essas energias, levando-as do ponto inferior para o superior, das energias
grosseiras para as que são refinadas e espiritualizadas. Não se trata, para ele,
exteriormente, por assim dizer, tal como o alquimista, usando a matéria bruta, leva-a
purgação de impurezas, mas uma purificação que vai muito além disso. Ele tomou o
próprio metal, reduziu-o a um estado mais fino, mais rarefeito, e, então, voltou a
66
Podemos imaginar o alquimista espiritual reunindo todas essas forças da
sua natureza, consciente de que são forças, portanto, úteis e necessárias, mas,
método de refinação, bem como a forma pela qual esse trabalho pode ser
conduzido.
de levar em conta. As Almas estão ligadas à vida terrena pelos desejos, estão
escravizadora.
homem se faz mais nobre, mais sábio, mais forte, suas ações tornam-se sempre um
Como é possível, então, que a ação se realize, e ainda assim a Alma seja
livre? Aqui, vamos encontrar um caso de Alquimia Espiritual. O maior dos homens
pode ser o mais ativo no serviço, e, apesar disso, seu serviço pode não chegar a
tocá-lo como uma Alma livre. Isso parece um paradoxo — um serviço que é perfeita
liberdade.
67
Essa grande Lei no universo manifestado está na raiz de tudo e expressa-se
constantemente, embora suas formas sejam tão variadas que chegam, com
que é vista pela mente dos homens sob muitos aspectos. Ela tem, de fato, dois
pessoa tende a ser unilateral, dependendo do ponto de vista que no momento lhe
perdendo assim aquele equilíbrio constante a partir do qual somente a verdade pode
nos mundos físico, astral e mental, e assim por diante. Isso inclui certo
relacionamento entre todas as coisas vivas, bem como seres vivos de outros
mundos que nos rodeiam. Aqui também encontraremos uma lição das mais úteis, a
contínuo da roda da vida, na qual cada ser vivo recebe e dá, na qual não podemos
evitar receber, na qual não devemos recusar a dar. Em todas essas coisas tomamos
68
Essa forma de encarar o sacrifício talvez tenha sido exposta de maneira
mais clara do que em qualquer outro lugar na Canção do Senhor, uma das
nutrindo, assim, uns aos outros; assim, nutrindo uns aos outros,
que desejais."
69
Brahma, que tudo permeia, está, portanto, sempre presente no
mais pura e mais nobre for a religião, mais pura e mais nobre será a idéia do
sacrifício de que ela estará impregnada. Reparem como essa idéia alquímica é
transforma-se em seres, mas, para que haja alimento, a chuva se transformou nele,
e a fim de que a chuva possa cair, o sacrifício foi oferecido aos Deuses. Então, os
Deuses nutrem.
Encontraremos esse giro da roda da vida era destaque, por toda parte,
nas religiões antigas. O Brâmane, por exemplo, lançará ao fogo o seu sacrifício,
porque está dito: o fogo, Agni, é a boca dos Deuses. Lançando ao fogo esse
sacrifício, nos velhos dias, acompanhado o gesto, como costumava ser, com
sobre a terra, trazem à luz alimento para os homens. Embora a ação fosse, em si
mesma, um símbolo, aquilo que ela simbolizava era real, e real, também, era a força
como dever, porque é direito realizá-la, e não com outro objetivo. Deve ser levada a
*
Bhagavad-Gitã, iii, 9-16.
70
efeito para que o homem possa estar em harmonia com a Lei, porque a resposta à
Sob esse ensinamento, o sacrifício era o laço de união, o fio de ouro que
reunia todos os seres deste Universo manifestado. Como raiz do sacrifício havia a
ação; tal como a ação vem do Deus em manifestação, tal como Ele era aquilo que
pode, assim, ser realizada no mundo como um dever, não com o desejo de trazer
frutos para a pessoa, ou para proveito pessoal, porque, nesse caso, vem o modo de
ver inferior, rebaixado, egoísta, com o qual os sacrifícios foram ulteriormente feitos.
conhecimento, a ação perde toda a sua força aprisionadora da Alma. A Alma torna-
se, com a Natureza Divina, uma companheira de trabalho, e cada ação lançada
sobre o altar do dever torna-se uma força que faz girar a roda da vida, mas nunca
prende a Alma.
Essa permuta constante, esse serviço mútuo, é uma forma da grande Lei
poucos, treinando-o para realizar todas as ações de uma forma sacrificatória. Quem
quer que faça isso está em consciente harmonia com a vontade divina no universo
manifestado e torna-se, assim, uma força para a evolução, uma energia para o
progresso. Todas as nações irão beneficiar-se pela ação que, de outra forma, só
teria trazido ao sacrificador um fruto pessoal, que, por sua vez, prenderia sua Alma
e limitaria suas potencialidades para o bem. Assim, então, podemos ver essa Lei do
71
Quanto ao mais alto, do ponto de vista mais sublime, o sacrifício, visto em
sua mais íntima essência, é um "dar", um espraiar-se para fora. Vai motivado pelo
desejo de dar; sua essência está no anseio de deixar fluir algo que, sendo precioso
para o que o possui, ele deseja dar, a fim de que ajude e dê alegria a outros.
sacrifício é essa auto-limitação de Uma Existência, pela qual Ela apresenta, como
parece ser uma contradição em seus termos: "A agonia do LOGOS." Mas o que é o
Escrituras, que, por sua vez, têm suas raízes em conhecimento ainda mais antigo
Que Brahma é beatitude tem sido a tônica da mais antiga religião Ariana.
Índia e os veículos nos quais a Alma pode manifestar-se nos mundos, veremos que,
à proporção que ela se retira dos mundos inferiores, vai descartando seus
mente. A Alma sobe e sobe, sempre se aproximando de Brahma, que é ela própria,
No verdadeiro final há o revestimento mais alto, tão sutil que mal pode ser
72
guardar a colheita das eras que ficaram para trás. Esse revestimento tem um nome
nas espirais da ignorância, devem ser lembrados de que o progresso, em Ioga, que
é a união com o Divino, deve ser conduzido de estágio a estágio, até que a Alma
esteja envolvida em nada mais a não ser a beatitude, pois "Brahma é Beatitude".
Portanto, um ato sacrifical não é possível nessa região elevada, que não pode ser
Existência Ego limitadora veio o LOGOS que é Ele Próprio. O verdadeiro objetivo
do Ego limitação foi o de emanar beatitude, que é Sua própria e essencial natureza,
de forma que quando o ciclo das existências viesse a ser completado, houvesse
Próprio. Existe sofrimento apenas pela suposição da distância em que Ele está,
que se movimenta para trazer muitos a se reunirem com Ele Próprio, da qual a
compreender seu aspecto dual. O aspecto que é "dar" alegria. O inferior, entretanto,
vista da natureza inferior, como renúncia, que é dor. À proporção que o homem se
faz ele próprio, isto é, à proporção que se torna divino em sua própria consciência do
eu, sentir-se-á cada vez mais jubiloso, cada vez mais apto a dispensar alegria para
73
desenvolve, e a dor só aparece pela fricção, pela luta com o inferior — que é, na
de crescimento e evolução está nesse livrar-se da ignorância. Ele pode ser descrito,
e assim é sentido por nós, constantemente, em nossa natureza inferior, como dor,
superior, então ele compreenderá que a essência de todos os seus esforços é trazer
essa manifestação de júbilo e paz para auxiliar um mundo sofredor. Aos poucos,
será capaz, por assim dizer, de permear a natureza inferior com sua própria
homem superior sobre o inferior é do tipo mais leve possível, essa natureza inferior
74
A sabedoria é sempre uma fonte de alegria pura, não-deturpada. Essa
aumentada e força aumentada. Desse ponto de vista, mesmo a dor tem seu lado
prazeroso — já que não se recebe mal o que é doloroso para a natureza inferior.
inferior, e sim aquilo que é obtido pela natureza superior. Faz a escolha entre elas,
com serena alegria ao escolher, porque vê o término do trabalho, o ouro que sairá
do fogo.
indiferente aos sofrimentos que atingem os que o rodeiam, quando se apodera, para
seu uso, de alguma coisa que deseja. Então, com toda a certeza, ao sentir esse
daquele ponto de vista, seja uma experiência que vale a pena colher.
que o superior está vendo. Sem essa cooperação do inferior, o objetivo do superior
não pode ser alcançado. Assim, acontece a luta com a natureza inferior, às vezes
para forçá-la a adiantar-se, às vezes para contê-la. No todo, para a natureza inferior
75
imposição para que dê, desfazendo-se daquilo que deseja ter. Lentamente, porém,
que esse domínio da dificuldade pelo esforço, embora o esforço em si mesmo seja
doloroso, ainda representa tanto ganho em vigor, que a simples dor passageira se
deverá haver, até mesmo onde interessa à natureza inferior, esse duplo trabalho do
alguma coisa difícil de obter, porque percebe que ela é extremamente desejável.
Contudo, não pode obtê-la sem sacrifício de alguns desejos inferiores e fará esse
que não o deixavam avançar, e que o toque do fogo, que de início parecera
repetir-se da experiência, o homem assimila, cada vez mais, a liberação, e cada vez
Com essa observação íntima, uma vez mais aquele sofrimento converte-
se em alegria, porque ali houve, novamente, a alquimia divina. Ele vê que naquele
que tudo aquilo, na verdade, é um processo para livrar-se da limitação e que todo o
unidade com seus irmãos, bem como sua unidade com o Divino. Rompendo a
76
novo, uma questão de separação. A separação tem origem na ignorância, e com a
destruição dessa ignorância desaparece também a dor. Sente-se que essa limitação
é ilusória, aparente e não-real, pois não tem parte no mundo onde o homem
pequeno círculo em torno do qual se levanta uma cerca para o mundo exterior, e
que é assim mantido para a limitada satisfação do ser inferior. Como a Alma tratará
esse instante de busca do prazer, como algumas vezes é chamado? Há nele alguma
na qual o ganho é de quem possui essa faculdade. A Alma percebe que pode levar
dela própria naqueles mundos inferiores nos quais ela está se manifestando.
Essa Alma que está crescendo, quando chegar a descobrir que obteve
alguma força espiritual, treinar-se-á para sentir que a alegria da posse está,
realmente, no ato de dar, não no ato de ganhar. Assim, o instinto da busca de prazer
pode ser transmutado no poder de dar alegria, e aquele que um dia procurou o
77
prazer no isolamento terá a consciência de que a alegria só existe no repartir e que
não vale a pena possuir seja o que for, a não ser o que é possuído quando se dá. A
alegria de dar é, de fato, o sacrifício essencial, o deixar que se escoe, para todos, o
que, de outra maneira, iria tornar-se inteiramente inútil, ao ficar encerrado dentro de
um eu separado.
amor egoísta. Temos aqui alguma coisa superior ao instinto de busca de prazer,
porque a simples palavra amor implica dádiva a outro. Contudo, esse amor ainda
pode ser muito egoísta, um amor que está sempre procurando receber, ao invés de
dar, um amor que, por assim procurar o proveito, mostrará, com certeza, os
parte, e, por assim dizer, trazer o Sol para dentro, a fim de que brilhe apenas em sua
erro em que alguns homens incidem. Não será transmitido por se tornar frio, mas por
sozinhos e gostemos disso", seja mudado para "Vamos juntos para o mundo, para
espalhará por todo o mundo. Os que encontram essa alegria, recebendo-a do ser
78
amado, descobrirão seu deleite deixando que se escoe para os demais aquilo que
encontrou. Esse amor talvez um dia tenha sido o amor entre um homem e uma
mulher e depois expandiu-se para o círculo do lar, extravasando-se ainda mais para
finalmente, expandir-se para incluir tudo quanto vive no universo. Nada terá perdido
da sua profundidade, nada do seu calor, nada do seu fervor e intensidade, mas terá
chegado a ser um oceano de compaixão, que inclui tudo quanto sente e vive. Tal
e retraçá-las como o foram essas duas que acabamos de citar, vendo, então, que o
totalidade do processo é uma alegria para o homem verdadeiro, real, por muito que
Homem, vai adentrando cada vez mais a natureza inferior, queimando essas
liberação das energias e forças espirituais que parecem, de uma forma estranha, ser
libertar o que estava tolhido e não podia manifestar-se, mas que, quando a película
79
À medida que a Alma vai se elevando para planos superiores e
sua unidade com as outras Almas, de participar com elas e ajudá-las de várias
bem-aventurança espiritual, que não pode ser repartido com outros — pode ser
objeto de renúncia por parte dessa Alma, como um ato jubiloso, necessário à sua
própria natureza, a fim de que tudo aquilo a que ela está renunciando torne-se
lançar tudo quanto têm ao suprimento comum, elevando assim um pouco a raça da
vezes ser dado. No grande âmbito da lei que jamais pode ser rompida, pode haver
dor e sofrimento para uma Alma, e dessa dor e desse sofrimento ela própria foi a
assim dizer, ao lado de tal Alma, insuflando-lhe força e energia. Assim, enquanto o
fardo é suportado por quem criou, ainda assim são lançados sobre aquela Alma
80
uma força nova, uma nova vida e um novo entendimento, o que lhe torna possível o
cumprimento da sua tarefa, o que não modifica essa tarefa, mas modifica a atitude
da Alma. Essa é uma das maiores alegrias e a mais alta recompensa que pode ter a
Alma que está crescendo, e nada pede para si própria senão a possibilidade de
servir.
por ela construída, e que, para seu próprio bem, ela deve suportar. Mas isso
bem-merecido, que ensina sua própria lição. A Alma assim auxiliada sente-se
jubilosa, mesmo enquanto carrega o peso do seu Karma. A dádiva que lhe é
atribuída com ele é uma dádiva que a faz mais forte, agora e no futuro, e que
representa o escoar da Vida Divina para ela, proveniente do plano onde todas as
Almas são uma só. Aquele plano está sempre repleto de energia espiritual que pode
ajudar pela constante oferta dos que encontraram a alegria divina de dar de si aos
outros.
cada vez mais radiante com essa alegria divina? Enfrentando a encosta da
outra maneira, iriam espalhar-se por muitas; a descida, sobre a Alma, do Karma do
passado. Isso agora tem de ser encarado e tratado em muito pouco tempo, portanto,
Alma, pode vir com força espantosa, energia enceguecedora, que a levam a
então, não é a própria alma que sente os desgostos; é a natureza inferior, ainda
81
cega, e sempre instigada a adiantar-se pela natureza superior. Mesmo nesse
momento de amarga prova, quando tudo o que foi acumulado em muitas vidas
por fazer rapidamente o que de outra maneira iria durar através de muitas vidas, e
completamente purificada, e porque ela, a Alma, ficaria livre para seguir adiante em
porque, entrando nele, o discípulo deve abrir mão de muita coisa que significa prazer
para o mundo — prazer dos sentidos, prazeres da vida mundana, gozos de todos os
tipos. A Alma que resolveu escalar a montanha perdeu, contudo, o gosto por eles.
Essa Alma procura algo que não definha e alegrias imperecíveis. E embora o
que por outro lado significa alegria, paz e prazer aumentados. Porque não é a
aceitação dos desgostos por prazer, mas o abandono de uma felicidade passageira
pela eterna bem-aventurança, o abandono de uma coisa que pode ser tirada por
alegrias que não podem ser obscurecidas, manchadas ou enevoadas pela mudança
se cada vez mais, porque vemos, desde o início, que o desgosto tem sua origem na
de homens, mulheres e crianças voltando, século após século, milênio após milênio.
Vêem homens sofrendo sem saber o porquê desse sofrimento e, assim, sentem o
82
acúleo da ignorância, que é, realmente, a essência da dor. Olhando em redor o
tal como podemos vê-las através da tradição e da história, jamais vos ocorreu que a
agonia pela qual Eles passaram existiu antes que vissem a luz ? Aquela agonia foi a
do desamparado, o reflexo dos desgostos que Eles sentiram quando ainda não viam
nossa raça consideram, hoje, o maior, o mais alto, a verdadeira flor da humanidade,
ignorância e o sofrimento do mundo, como não via de que maneira aquelas dores
renunciou à sua esposa e ao seu filho, ao palácio, ao lar, ao reino. Saiu levando
Ele não sabia — dizia-se — como salvar o mundo e não podia sentir-se
a mais profunda treva da mente que procurava ver e não conseguia. Por fim,
sentado sob uma árvore, veio a iluminação. Conheceu a causa da dor. E veio o
palavras que vêm soando através dos séculos, palavras saídas de Seus lábios, veio
Talvez recordem os termos com que um poeta inglês exprimiu as Suas palavras,
83
mostrando como a ignorância é a causa da dor e como o conhecimento faz antever
a chegada da alegria:
os meus irmãos,
mundo inteiro.
corações dos homens estão partidos agora porque não sabem. Mas há liberdade. E
a mensagem da liberdade diz que a causa da dor está em nós próprios e não no
universo. Ela está em nossa ignorância e não na natureza das coisas; está em
nossa cegueira e não na vida. Assim, quando a luz vem, a liberdade chega com ela,
e a alegria e o riso do homem, como se diz, tornam-se divinos, porque a luz divina
flui para a Sua Alma. Ele é o iluminado, o sábio. Para o sábio, o desgosto não
existe, para a Alma divinamente iluminada, o infortúnio está morto para todo o
sempre.
*
Edwin Arnold, The Light of Ásia (originalmente publicado pela Theosophical Publishing House, Quest
Books, 1969), p. 138. Em português, A luz da Ásia, Ed. Pensamento, São Paulo.
84
V. NO LIMIAR
levam o homem para o interior do grande Templo, de onde aquele que entra nunca
mais sai. Todos os que habitam esse Pátio Externo parecem ter uma característica
que fazem, nas qualificações que já obtiveram, em sua aptidão para avançar, mas
uma coisa eles todos parecem ter em comum: a dedicação. Eles têm um propósito
aspirando.
apontada como uma das faltas mais perigosas. A dedicação, por outro lado, é uma
passaram para além dos grilhões que separam um credo dos outros,
portanto, o fato de que, voltados para as Escrituras que pertencem a uma ou outra
fé, já que todas elas vêm da mesma grande Fraternidade de Mestres, cheguemos
elas falam dessa qualidade de dedicação como uma das mais essenciais para
85
Tão claramente, talvez, e um tanto mais pormenorizado do que em
*
Coletânea de sentenças que forma o compêndio mais antigo e autêntico do Budismo. Palavra
sânscrita que significa "máximas de religião" ou "caminho da lei". (N. T.)
86
censurada. Um Bhikshu que se deleita na dedicação, que vê
olhos estão abertos. O caráter de uma pessoa pode ser claramente lido na chamada
"aura" que a circunda. Nos seus primeiros e pretéritos dias, a Alma era uma coisa
das mais indefinidas. Foi comparada a uma espécie de espiral de névoa, sem
contorno aparente, sem limite marcado com nitidez. Agora, à proporção que a Alma
progride, essa espiral de névoa assume uma forma cada vez mais definida, e a aura
da pessoa toma, por sua vez, um feitio correspondente, mais nítido, mais e mais
contorno claro e preciso, contorno esse que se fará tanto mais nítido quanto mais a
individualidade se afirmar.
da aura é o sinal do caráter definitivo que a Alma individual está assumindo. Essa
*
Dhammapada, capítulo II.
87
condição da Alma é algo que se destaca à proporção que ela se adianta. A posição
da Alma não lhe é dada como favor arbitrário por parte de alguém, não vem de
materiais.
iniciações são as da vida. Não são as claras e exatas Iniciações que vêm mais tarde,
constantes iniciações que aparecem no caminho do candidato enquanto ele faz sua
passagem pela vida cotidiana. Em sentido muito real, a vida, nesse ponto, pode ser
Fraternidade, na câmara que fica à frente da Loja propriamente dita. Essas regras
são escritas em linguagem mística, mas bastante inteligível, embora como em toda
88
Antes que os olhos possam ver devem ser
incapazes de chorar.
perdido a sensibilidade.
sangue do coração*.
explicam grande parte das dificuldades que o estudante talvez encontre no tratado
comentários, que o significado da primeira frase, "Antes que os olhos possam ver
agitada constantemente pela via dos sentidos, para a região do conhecimento, onde
embaçadas pela umidade da vida, como se diz. Tudo isso é o efeito daquelas
vividas sensações, lançando névoa sobre as janelas da Alma, de modo que ela não
pode perceber claramente quando olha através delas. Essa névoa vem do mundo
*
Light on the Path (originalmente publicado pela Theosophical Publishing House, Quest Miniatures,
1980), p. 5. Em português, Luz no caminho, Ed. Pensamento, São Paulo.
89
representada como lágrimas, porque as lágrimas podem ser tomadas como
Até que os olhos se tornem incapazes de tais lágrimas, até que as janelas
da alma não mais sejam embaçadas pela umidade que pode ser lançada sobre elas,
do exterior, até que essas janelas fiquem claras, e a luz do conhecimento passe
discípulo não perderá sua sensibilidade, porque está dito que ele sofrerá ou se
deve ter perdido a sensibilidade." A Alma deve ter alcançado o local do silêncio,
porque, como foi dito, embora a voz dos Mestres esteja sempre soando no mundo,
vida exterior. Não se trata de silêncio por parte do Mestre, porque ele está
eternamente falando, apenas os sons que estão mais próximos do discípulo são de
tal forma mais altos, que aquela harmonia, mais doce, mais suave, vê-se
enquanto ainda está no Pátio Externo, alcance o local de silêncio, a fim de que o
som verdadeiro possa ser ouvido. Esse local de silêncio que ele alcança deve,
durante algum tempo, causar uma sensação de falta de sensibilidade, por causa da
quietude que ali reina, por causa da ininterrupta serenidade da qual a Alma é
consciente.
90
Habituados como estamos a todos os sons que nos rodeiam, sentimos,
quando o silêncio cai por um momento sobre a Alma, uma impressão de inanidade.
É como se penetrássemos num abismo onde não conseguimos tomar pé, e de onde
se passa para uma escuridão que se assemelha a uma mortalha que tivesse caído
sobre a Alma. Isso traz uma sensação de absoluta solidão, de vacuidade, sensação
de que tudo se afastou, de que toda a vida se desvaneceu, com a cessação dos
sons e das coisas vivas. Afirma-se que, embora o próprio Mestre esteja ali,
vazia. Ele perdeu de vista o Mestre e tudo que se foi antes Dele.
Nesse momento de silêncio parece haver certa pausa. Tudo parece estar
parado, embora fosse a própria vida da Alma. Através desse silêncio, a voz soa do
outro lado, a voz que, uma vez ouvida no silêncio, é ouvida para todo o sempre,
entre todos os sons. Nenhum som que a terra pode produzir poderá, doravante,
mesmo por um momento, amortecer a harmonia que assim falou uma vez à Alma.
Diz-se que essas duas verdades devem ser sentidas, devem constituir
uma experiência, antes que a verdadeira Porta de Ouro possa ser tocada; essas
duas verdades devem ser compreendidas pelo aspirante, antes que lhe seja
possível ficar à soleira, e ali esperar permissão para entrar no próprio Templo.
Muitas coisas estão escritas naquela antecâmara, coisas que devem ser trabalhadas
do outro lado, e que se acham escritas para orientar o aspirante, a fim de que ele
venha a conhecer a linha ao longo da qual terá de caminhar, para que possa iniciar
a preparação para o trabalho que está dentro do Templo. Poderia parecer, pela
descrição, que essas duas grandes Verdades — como o poder de falar na presença
integralmente, pelo me nos no outro lado, mesmo que uma tentativa fosse feita no
91
Pátio Externo, para levá-las a desabrochar na Alma. Porque dizem que o poder de
falar na presença dos Mestres é o apelo ao grande Poder que está à frente do Raio
ao qual o aspirante pertence. Ele ecoa, subindo, e então ecoa novamente, descendo
discípulo falar em presença Deles, e é a de que ele, por sua vez, fale a outros do
conhecimento que obteve, e faça de si próprio um elo daquela grande cadeia que
reúne o Mais Alto ao mais baixo. Se ele pede para tornar-se um neófito, deve, de
imediato, tornar-se um servo, porque não pode receber, a menos que esteja disposto
a repartir.
Esse poder de falar não é o poder da fala que vem de fora, que pertence,
antes, aos planos inferiores, mas aquele poder que fala de Alma para Alma. Ele
que as palavras expressam tão imperfeitamente. Esse poder de falar de Alma para
Alma é concedido ao neófito apenas se dele desejar fazer uso para o serviço,
tornando-se uma das línguas de fogo vivo que se movem entre o mundo dos
Então, vem à última Verdade, a que afirma não poder ninguém postar-se
em presença dos Mestres, exceto aqueles cujos pés foram lavados no sangue do
coração. Com isso quer-se significar que da mesma forma como as lágrimas
representam esse orvalho da vida que vem de uma intensa comoção, o sangue do
coração representa a própria vida. Ele diz que o aspirante já não reivindica a vida
para si mesmo, mas está disposto a deixar que ela se expanda para além da sua
pessoa, de forma que o mundo inteiro possa partilhá-la. Sendo a vida a coisa mais
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preciosa que o homem tem, isso, afirma-se, é o que ele deve deixar, antes de poder
postar-se na presença daqueles que tudo deram. Ele já não almeja viver para si
próprio, não mais procura o nascimento pelo que possa auferir com isso, ou pelo que
possa obter como experiência. Ele lavou seus pés com o sangue do seu coração,
abandonou o desejo da vida para si próprio e está mantendo essa vida para o bem
dos últimos triunfos do Arhat, que está exatamente sob aquele ponto em que todo o
conhecimento, que irá fazer-se uma realidade viva, é um auxílio para a orientação da
vida. Portanto, penso que isso está escrito na antecâmara, embora não haja
compreender algo do que virão a ser os que estão à Porta e transpõem o Limiar.
Eles terão outras vidas diante de si, nas quais muito será realizado, ainda com
nobrezas da vida. Por um momento que seja, deixemos que nossos olhos pousem,
embora só possam fazer isso de maneira imperfeita, sobre os quatro estágios que se
encontram dentro do Templo, cada um deles com seu Portal próprio, e sendo cada
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O primeiro é descrito como a Iniciação recebida por aquele que "entra na
livros esotéricos. Ela marca um passo claro e definido que torna possíveis a
Num trecho de A voz do silêncio afirma-se ser raro, para o candidato que
entra na corrente, conquistar sua meta na mesma vida. Geralmente há sete vidas
pelas quais ele deve passar, antes que seja dado o último passo, mas não se deve
aceitar essas palavras com demasiada certeza. Porque as vidas são efeitos, não
sendo medidas pelos nascimentos e mortes dos mortais. Elas são, talvez com maior
freqüência, antes estágios de progresso do que vidas humanas, mas, ainda assim,
Desses seres se diz que passaram, vida após vida, sem romper a
fraquezas da natureza humana são rejeitadas, uma a uma, rejeitadas para sempre,
Da segunda Iniciação diz-se que aquele que passa por ela só recebe o
nascimento uma vez mais. Ele pode voltar muitas vezes à encarnação voluntária,
mas pela sua própria e livre vontade de servir e não pelo fato de estar preso à roda
dos nascimentos e mortes. Passando por esse estágio, ele alcança o terceiro Portal,
a terceira grande Iniciação, e não mais recebe o nascimento, porque passará para o
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quarto estágio, que o leva ao limiar sim surgiriam clara e indubitavelmente expressas
deveria ser posto em mãos de quem quer que fosse que não tivesse aprendido,
através da sua luta pessoal, a solidarizar-se com o mais fraco, dar-lhe auxílio e
se mostre rígida, antes que o aspirante receba permissão para transpor o limiar. É
preciso que tenha sido deixada uma porção relativamente pequena, pelo menos,
dessas falhas comuns dos homens, antes que ele caminhe para dentro daquele
da humanidade.
A tarefa que ele ainda tem de cumprir é de tal modo gigantesca, que um
bom progresso parece necessário antes que ele possa enfrentá-la. Terá de livrar-se
de qualquer traço de fraqueza humana, de obter todo o conhecimento que lhe for
possível dentro dos limites do nosso sistema, e desenvolver os poderes que colocam
todo esse conhecimento ao seu alcance quando quiser, de forma que apenas
dirigindo a atenção para onde quer que seja, tudo que ali está e possa ser conhecido
essa, é a posição do Adepto. O Adepto é "aquele que nada mais tem a aprender".
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ignorância deve ficar preso ao Arhat que está preparado para a Iniciação final. Não
é de admirar que o alicerce de que falamos, e que deve suportar o peso de tão
importante edifício, e sobre o qual uma tão vasta superestrutura irá ser erigida, deva
Quando os olhos são abertos, o Caminho deve parecer muito mais alto e
longo do que é, para aqueles cujos olhos estão nublados no lado de cá da Porta,
porque uma Alma deve ver com a maior clareza. Aqueles que estão acolá devem
medir com exatidão a distância que os separa Deles. À luz daquela glória perfeita,
como deve parecer fosca sua própria conquista, como parece imensurável sua
cruzaram o limiar, passando para um estado de vida muito diferente daquele que
deixaram para trás. O que parecia impossível aqui torna-se possível ali, e o que
do outro lado, há alguns deles sobre os quais podemos pensar e que mostram quão
diferente é a vida dentro do Templo. Antes de mais nada, os homens que ali estão
de triunfo que partiu dos lábios de Buda quando Ele proclamou o fim dos liames e a
descoberta da liberdade. Tal grito, para aqueles que estavam no mundo exterior,
revelava-lhes qual era a causa da dor e também falava da sua cessação, que está
na compreensão da realidade.
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Nada mais compele,
O homem que transpôs o limiar sabe que isso é uma verdade. Os homens
sofrem por eles próprios. Não são forçados a tanto. Quando chegam a compreender
tal coisa, o mundo inteiro deve mudar diante dos seus olhos e todas as dificuldades
desse mesmo mundo, e os homens sofrem porque não sabem que passam de vida
para vida, e crescem tão pouco porque não o sabem. A roda de nascimentos e
mortes a que estão presos só os mantém ali por causa da sua falta de
conhecimento, por não compreenderem que estão realmente livres somente pela
compreensão.
Quando surge a compreensão, por débil que seja, mas ainda assim com
inteira convicção, o mundo todo muda seus aspectos para esse homem que cruzou
o limiar. Olhando para trás, para o mundo com todas as suas dores e angústias, com
seus olhos lacrime antes e corações dilacerados, ele sabe que há um fim para a dor,
que esse fim aparece quando cessa a ignorância. Assim, aquele esfacelamento do
coração desaparece. Embora a dor possa não ser completamente suplantada, aquilo
sempre.
*
The Light of Ásia, p. 138.
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consciência que se conservará inalterável e sobre a qual a morte não terá poder,
consciência tem de ser contínua autoconsciência. Não pode, jamais, ser totalmente
perdida, desde que se iniciou no homem, mas não se transfere para a consciência
inferior, nas vidas que estão no lado mundano do Templo. Dentro do Templo, a
e a separação que vem com a descida do véu da morte. Mas a separação e a morte
não existem para aquele que transpôs o limiar. Com os grilhões da ignorância ainda
sobre ele, pelo menos parcialmente, pode sentir alguma angústia com a separação
pela distância ou pela morte, mas isso não consegue realmente perturbar sua vida
para ele, e ele pode estar fora do corpo quando desejar, e ir para onde o espaço e o
tempo já não podem detê-lo. Esses dois, entre os grandes sofrimentos, foram
extirpados da sua vida, são males do passado, e em suas formas mais terríveis
discípulo. Ele sabe que nas vidas que tem pela frente não se deixará resvalar para
trás e sentir o que sentia nas vidas que ficaram no passado. Nunca mais virá
inconsciente para o mundo, perdendo talvez a metade da vida por não saber o que
procura. Nem tornará a vir ignorante de tudo, no momento enceguecido pela matéria
que o envolve e sem conhecer o verdadeiro propósito da vida. Ele voltará com
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fizer nada por se adiantar. Ele ganhou a consciência que torna o progresso possível.
Qualquer inércia ou frouxidão será sua própria falta, de modo nenhum uma
de que será parte, companheirismo onde não há nuvens, onde não irão surgir
coisa não tem lugar, não podendo, assim, perturbar a Alma. Porque, entrando para
o Templo, ela se viu diante dos Grandes Professores, os Mestres, e com essa
se para aquele homem, e para todo o sempre. Ele teve contato com o permanente, e
o transitório não pode mais perturbá-lo como nos dias em que ainda não conhecia o
Eterno. Seus pés estão firmes sobre o rochedo, e as ondas não poderão arrastá-lo
Começamos por compreender por que ela foi executada no passado, e por que está
flanco da montanha, embora parecessem elevar tanto a Alma, podem ser dados
com rapidez relativa sob condições diferentes. A evolução pode ser bem rápida,
quase que para além de todos os sonhos, quando os poderes da Alma assim se vão
desaparece, e todos os homens são vistos como sendo "um" com o verdadeiro Eu.
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apreende a realidade das coisas, a dúvida faz-se impossível para sempre. Toda
porque em seu vivido contato com as realidades, as coisas exteriores devem tomar
sua devida proporção. Ela aprenderá como essas coisas exteriores são pouco
relevantes. Todas as coisas que separam os homens são sempre sombras e não
pertencem ao mundo inferior, são apenas paredes ilusórias erguidas entre as Almas
dos homens. Esses grilhões de sombra desaparecem para a Alma que está
aprendendo.
conhecimento jamais sonhado até então fluem de todos os lados. A Alma não mais
está limitada pelos sentidos, como aqui embaixo, não mais quase todo o Universo
lhe está fechado, apenas um fragmento dele, aqui e ali, encontrando caminho para
contatos, por assim dizer, da vida terrena que talvez tenham o poder de detê-la.
quaisquer manchas, numa situação de tal modo elevada. É verdade que está escrito
porque, como os pássaros, ele parece não guardar pegadas. Dá a impressão de que
voa pelo seu caminho, intocado, sem grilhões, naquela alta atmosfera em que se
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move. Daquela região vem uma sensação de paz inalterada, que nada pode
perturbar. Ela mantém-se inatacável por qualquer tempestade da terra, numa paz
Tolerante como a terra, como o raio de Indra, ela é como um lago sem
tranqüilas são suas palavras e ações, quando ele obteve a liberdade pelo verdadeiro
Assim é o Arhat que está no ponto mais alto do Caminho, que só tem um
passo mais a dar, e então nada mais terá a aprender; assim são a meta e o
Caminho que todos podem palmilhar; assim é o fim da luta, o término em perfeita
paz.
estão no Pátio Externo, desde que ali entraram, eles não retornariam para onde
estavam antes, nem por tudo quanto a terra lhes pudesse dar.
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Dhammapada, capítulo VII
**
Ibid.
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que os gozos mundanos. Se pudéssemos comprimir dentro do espaço de uma vida
humana todas as alegrias que a terra inferior pode dar, se pudéssemos coroar isso
alegrias do intelecto sem um toque de dor ou cansaço — vida ideal até o ponto em
que a terra pode fazê-la tal —, comparada aos passos do Caminho, aquela vida de
alegrias terrenas seria sórdida e opaca em suas cores. Suas harmonias seriam
Naquele Caminho, cada passo dado o é para sempre, cada dor sofrida é
bem-recebida, pela lição que implica. Aquele Caminho faz-se mais brilhante à
vibrações da terra têm menos poder de despertar conflitos e tumultos. Seu fim, sua
meta, só o pode saber quem nele está. Mas mesmo aqueles que estão nos primeiros
estágios sabem que a mais íntima das suas flores vale o que todas as jóias da terra
poderiam dar. Um fulgor da sua Luz faz com que a luz solar da terra não passe de
escuridão. Os que por ali transitam conhecem a paz que traz compreensão, a alegria
que as dores da terra nunca podem destruir, e o local dentro do Templo onde a
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