Leitura - Ler
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Cadernos PDE
Resumo: Esse artigo tem como objetivo refletir sobre a importância das perguntas feitas pelo professor para a
produção de inferências que favoreçam o diálogo entre o texto e o leitor, a fim de levar o aluno a produzir um
novo texto a partir da sua interpretação. O trabalho é resultado da pesquisa-intervenção pedagógica realizada no
Colégio Estadual Sebastião Paraná, Ensino Fundamental e Médio, na cidade de Palmas, interior do Paraná, a
partir da qual pretendeu-se abordar o conceito de leitura interativa, entendida como um diálogo entre o leitor e o
autor, mediado pelas inferências realizadas a partir de perguntas realizadas pelo professor sobre o texto escrito.
Assim, o texto deixou de ser visto como um mero lugar de informações prontas a serem descobertas, sendo a sua
compreensão resultado da interação entre o conhecimento de mundo do leitor e a informação contida no texto.
1. INTRODUÇÃO:
A maioria dos alunos ingressa na segunda etapa do ensino fundamental com muitas
dificuldades de leitura e problemas ao interpretar um texto, não passando da fase de
decodificação textual. Além disso, quando se trabalha um texto, não conseguem interpretá-lo
sozinhos, sendo necessária a intervenção do professor facilitando a sua interpretação, pois
muitas vezes, não são autônomos suficientes para desembaraçar-se do emaranhado de letras
e palavras que se apresentam.
Essas dificuldades se dão, em grande parte, porque não tiveram atividades de leitura e
interpretação que os levassem a sentirem-se preparados para pensar sobre o texto,
interagirem com ele e, principalmente, levarem para seu cotidiano o que do texto
conseguiram entender. Ou seja, o processo de leitura não se concretiza em sua totalidade.
Com o intuito de sanar essas dificuldades, desenvolveu-se com os alunos do 6º ano do
Colégio Estadual Sebastião Paraná, em Palmas – PR, as atividades propostas no Projeto de
Intervenção Pedagógica sob o título “A importância da elaboração de perguntas no processo
de leitura”.
Através das atividades de leitura propostas, os alunos foram instigados a compreender
que há uma distinção entre “decodificar” um texto e “interpretar” um texto.
O desenvolvimento dessas atividades visou incentivar a formação de uma
comunidade de leitores, partindo de uma situação de encantamento que favoreça o
1
Professora PDE, formada em Letras Português, Licenciatura, pela FAFI Palmas-PR. Especialista em Letras
Português/Inglês, pela FAFI. Professora QPM, da rede estadual de ensino do Paraná, há 21 anos.
2
Professora da UNICENTRO, mestra em Letras pela UEM (2012) e licenciada em Letras Português e
Literaturas de Língua Portuguesa pela UNICENTRO (2008).
aprendizado, o desenvolvimento da capacidade de produzir inferências de modo que eles
consigam produzir novos conhecimentos.
Assim, fazer com que a leitura, dentro do ambiente escolar, seja um momento
prazeroso é o desejo de muitos professores que se preocupam com as habilidades de
leitura, interpretação e escrita de seus alunos.
2. LEITURA
2.1 O que é leitura
Ler, entendido convencionalmente como receber, tirar, transmitir conhecimentos,
possui outro sentido que há muito supera o pensamento inicial de que leitura é o que acontece
quando uma pessoa olha para um texto qualquer e atribui sentido aos símbolos gráficos nele
inseridos.
A partir dos estudos sobre o processo de leitura, essa concepção se expandiu em
direção a uma visão mais interativa e dinâmica. Hoje, a leitura é vista como uma atividade
dialógica, um processo de interação que se realiza entre o leitor e o autor, mediado pelo texto,
estando todos os elementos envolvidos situados em um determinado momento histórico-
social.
Segundo Terzi (2002, p. 15), “a leitura é uma atividade complexa devido aos múltiplos
processos cognitivos utilizados pelo leitor ao construir o sentido de um texto, já que ela não se
dá linearmente, de maneira cumulativa, em que a soma do significado das palavras
constituiria o significado do texto”.
A leitura deve ser entendida, então, como um processo ativo e dinâmico, pois o “texto
tem um potencial de evocar significado, mas não tem significado em si mesmo” (MOOR et
al., 2001, p. 160).
Pode se dizer, então, que o texto e o leitor são duas entidades físicas necessárias para
que o processo possa ocorrer. Todavia, é a interação entre o texto e o leitor que constitui
realmente a leitura.
Como qualquer outra instituição social, a escola reflete as condições gerais da vida da
comunidade em que está inserida, portanto, torna-se evidente que causas externas a ela
interferem de forma decisiva na determinação desse resultado.
Para Antunes (2003, p. 27),
essa preocupação já ultrapassou os muros das universidades e vem se tornando uma
das preocupações gerais, (...) já está na boca de muitos a crítica de que a escola não
estimula a formação de leitores, não deixa os alunos capazes de ler e entender
manuais, relatórios, códigos, instruções, poemas, crônicas, resumos, gráficos,
tabelas, artigos, editoriais e muitos outros materiais escritos.
Mas, não se pode esquecer também que fatores internos à própria escola interferem na
qualidade e na relevância desse resultado, pois os professores ainda desenvolvem:
É preciso, antes de mais nada, centrar o nosso olhar e a nossa atenção sobre a
realidade social e brasileira, buscando o desvelamento dos seus modos de
convivência, existência e sobrevivência. Isto porque a leitura (...) cumpre
propósitos e finalidades de comunicação entre os homens que interagem em
sociedades específicas (SILVA, 1998, p. 21).
Por isso, é fundamental reforçar a necessidade das práticas de leitura crítica nas
escolas: Não fazer isto pode significar a manutenção do ad infinitum da
consciência ingênua junto aos professores e estudantes; e pior: pode significar,
a longo prazo, um embotamento ou cancelamento da capacidade crítica pela
ausência de espaços concretos para colocá-la em prática (SILVA, 1998, p. 24).
Conforme Silva (1998) é através da leitura crítica que o sujeito abala o mundo das
certezas, principalmente as certezas das classes dominantes. Mas a escola precisa ter essa
concepção, ela precisa ter isso como filosofia, pensar que tipo de cidadão quer para a
sociedade e ter consciência de que esse tipo de leitura não aparece automaticamente.
É no interior desse conjunto que Silva (1998) descreve que a leitura crítica precisa ser
ensinada, incentivada e dinamizada no sentido de que os estudantes desenvolvam atitudes de
questionamento perante os materiais escritos, desde as séries iniciais e que “caso o professor
não construa em sala de aula uma atmosfera de confiança e abertura, que alimente a discussão
e o debate, muito dificilmente aquelas competências serão praticadas pelo coletivo dos
estudantes” (SILVA, 1998, p. 29).
Um leitor crítico, além da sensibilidade e da capacidade de julgamento, não se
descuida de refletir e transformar as suas ideias em outro texto: o seu próprio texto.
A presença de leitores críticos na sociedade atual é uma necessidade imediata, de
forma que os processos de leitura e os de ensino de leitura devem estar diretamente ligados à
transformação da sociedade, pois leitores ingênuos, pessoas impassíveis diante das
contradições sociais e acostumadas à ótica convencional de perceber os fatos, muito
provavelmente permanecem felizes em exercer sua cidadania “de meia-tigela” a bem daqueles
poucos que detêm os privilégios (SILVA, 1998, p. 33).
A escola precisa formar leitores que vão além das linhas de um texto (não somente
leiam as entrelinhas e muito menos as linhas), mas que adentrem no texto a fim de refletir
sobre os aspectos da situação social a que esse texto remete: “mais especificamente, o leitor
crítico deseja compreender as circunstâncias, as razões e os desafios sociais permitidos ou não
pelo texto” (SILVA, 1998, p. 34).
O professor tem o dever de ajudar o aluno a construir uma ideia positiva da leitura e
dos poderes que ela permite ao cidadão e, em cada situação particular da sala de aula, deve
explicitar os objetivos de toda atividade de leitura, o que quer e/ou aonde quer chegar com
aquela atividade, convocando o aluno a ler o texto, de forma a despertar-lhe o interesse por
fazê-lo bem, e não uma mera atividade corriqueira, sem função.
Teberoski (2003, p. 18) afirma que “um leitor que se torna crítico traz consigo as
virtudes da responsabilidade, do equilíbrio, da perspicácia e do comedimento”.
O ideal seria que o aluno perceba que “nenhum texto é neutro, que por trás das
palavras mais simples, das afirmações mais triviais, existe uma visão de mundo, um
modo de ver as coisas, uma crença. Qualquer texto reforça ideias já sedimentadas ou propõe
visões novas” (ANTUNES, 2003, p. 82).
Conforme Fonseca & Fonseca (apud ANTUNES, 2003, p. 82), “é importante que não
esqueçamos que a linguagem é uma das formas de atuar, de influenciar, de intervir no
comportamento alheio, que outros atuam sobre nós usando-a e que igualmente cada um de
nós pode usar para atuar sobre os outros”.
2.3.2 A compreensão
As próximas questões a serem resolvidas nas aulas seguintes são as de Compreensão,
para as quais os alunos apresentaram um pouco mais de dificuldades, sendo necessário
frequentemente auxiliá-los no processo.
A Compreensão é a segunda das fases do processo e está diretamente ligada à
Decodificação. Na Compreensão, o aluno é capaz de captar a temática, os tópicos principais
do texto, de conhecer as regras sintáticas e semânticas da língua, de conhecer as regras
textuais, de depreender a significação de palavras novas, afinal, ele faz inferências. O leitor
retira do texto as informações, a temática e as ideias principais que ele oferece, mas, em
contrapartida, ele precisa ter conhecimento prévio do assunto e, para tanto, as questões de
decodificação já haviam sido corrigidas oralmente por alunos voluntários nas aulas anteriores.
As questões foram as seguintes:
Por que ela foi barrada na portaria?
Como os donos a tratavam?
Como ficou a vida depois que ela saiu do apartamento?
Que tipo de comida quer dizer: “um bom filé ... de gato”?
Ao conviver com os gatos de rua, como ela passa a se comportar?
Em nossa convivência familiar, quem costuma utilizar a expressão: "Fique em casa,
não tome vento!”? O que eles (elas) querem dizer com isso?
Para resolver as questões de Compreensão, foi necessário auxiliar na produção de
inferências, com o intuito de auxiliá-los no que fosse preciso e esclarecendo dúvidas, mas
nunca dando-lhes a resposta, visto que, seria a partir da compreensão individual que eles
chegariam a própria interpretação da letra da canção, sem as inferências da professora
proponente.
2.3.3 A interpretação
Um enunciado motivador abriu as atividades de Interpretação, que também lhes foram
entregues para serem coladas, a seu tempo, no caderno individual: “Agora, demonstre que
você é esperto e responda estas:”
Enquanto estava morando no apartamento, seus donos faziam algumas exigências.
Pense e respondam, quais eram?
O que você acha que ela realmente queria?
Quem manda nela no início da história?
E quem manda nela depois que ela sai do apartamento?
Você acha que ela realmente se arrependeu de ter saído por isso quis voltar?
Por que a gata diz: “eu sou mais eu, mais gata” ?
E os gatos de rua eram felizes? Justifique:
Será que ela foi infiel aos seus donos quando resolveu ir para a rua com os outros
gatos?
Qual é o tema (assunto) dessa canção?
Outras duas atividades em forma de tabela foram desenvolvidas para auxiliar na
produção textual, juntamente com uma questão que gerou um grande debate na turma:
“Depois que ficou livre, você acha que ela ficou mais feliz? Por quê?”
Na teoria da compreensão como inferência, esta será sempre atingida mediante a
participação decisiva do leitor numa ação colaborativa. A língua é vista como uma atividade
interativa e não como um instrumento. Acredita-se que a atividade inferencial é natural e
intuitiva.
É importante o professor perceber que o tipo de pergunta que ele faz e a maneira
como ela é empregada influenciam no desenvolvimento de leitura e direcionam a
compreensão do texto.
As inferências funcionam como hipóteses coesivas para o leitor compreender o texto,
são estratégias ou regras embutidas no processo. As condições textuais, pragmáticas,
cognitivas e outros fatores (conhecimento do leitor, gênero e forma de textualização)
influenciam na compreensão, por isso ela é complexa, pois envolve “não apenas
fenômenos linguísticos, mas antropológicos, psicológicos e factuais” (MARCUSCHI, 2008,
p. 249).
Ao expressarmos nosso entendimento sobre um texto estamos também produzindo
um novo texto. Para Solé (1998, p. 279), “nós sabemos que no dia-a-dia ninguém vive
respondendo a perguntas sobre textos e sim falando sobre eles, resumindo-os, reportando-os
ou opinando. Por que não se dedicar a essas tarefas na vida real?”
Durante o desenvolvimento das atividades interpretativas, os alunos não receberam
auxílio nas respostas, somente algumas reflexões e leitura de entrelinhas foram discutidas na
sala de aula e, imediatamente, a produção de texto a respeito de tudo o que havíamos
estudado/comentado/debatido foi proposta, com o intuito de levar os alunos à compreensão de
que há uma distinção entre decodificar um texto e interpretar um texto, pois é na
interpretação que o leitor expande sua leitura, permitindo que ocorra a ligação dos conteúdos
do texto com o seu conhecimento prévio (ou sua leitura de mundo).
A interpretação é a fase do processo de leitura onde o leitor utiliza sua capacidade
crítica, o momento que ele faz julgamentos sobre o que leu. Quando ocorre a interpretação, o
leitor expande seus conhecimentos e amplia suas informações, reformula seus conceitos e
esquemas sobre a temática do texto, indo além do que já há em sua bagagem cultural.
Uma questão feita pela professora, oralmente, desencadeou uma reflexão na turma: “E
você? Gostaria de ser o (a) gatinho (a) do apartamento ou da rua?” Cada aluno posicionou-
se perante as respostas dos demais e, individualmente, produziram (a partir de toda essa
análise e reflexão) um texto narrativo, contando o desfecho da história da gatinha da canção.
2.3.4 A retenção
Nessa última etapa, o aluno deve ser capaz de reter as informações trabalhadas nas
etapas anteriores e aplicá-las: fazendo analogias, comparações, reconhecendo o sentido de
linguagens figuradas ou subtendidas, e o principal, aplicar em outros contextos refletindo
sobre a importância do que foi lido fazendo um paralelo com seu cotidiano, aprendendo com
isso, a fazer suas próprias análises críticas.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
4. REFERÊNCIAS