Jerlan Dissertacao
Jerlan Dissertacao
Jerlan Dissertacao
FACULDADE DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LINGUÍSTICA E LITERATURA
MACEIÓ – AL
2020
JERLAN PEREIRA BATISTA
Dissertação de Mestrado
apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Linguística e
Literatura da Universidade Federal
de Alagoas, como requisito parcial
para obtenção do grau de Mestre
em Linguística na linha de pesquisa
em Teoria e Análise Linguística.
MACEIÓ – AL
2020
AGRADECIMENTOS
A Deus toda minha gratidão! Foram inúmeros obstáculos no decorrer de toda minha
jornada, mas Ele não me deixou desistir, esteve comigo me dando força, guiando-me, para
que eu alcançasse mais essa conquista. Não foi fácil, mas eu venci mais uma batalha.
Agradeço aos meus amados pais Maria de Fátima Pereira e Geraldo Batista por tanto
amor concedido a mim, carinho e educação que me deram, pois eu sei o tanto da dificuldade
que eles passaram em suas vidas, inclusive já passaram fome, nunca tiveram a oportunidade
de estudar, mas fizeram de tudo para me oferecer e me dar o melhor.
A minha querida irmã Jaqueline Pereira Batista, em que tenho a satisfação pelo
convívio fraternal, mesmo distante fisicamente, obrigado por sempre acreditar em mim e
“puxar minha orelha” em momentos precisos.
Ao Prof. Dr. Jair Barbosa da Silva pela sua disponibilidade de ser meu orientador a
princípio, que acreditou em mim e me fez acreditar na importância desse estudo para
Comunidade Surda e que mesmo não estando comigo até o presente momento, contribuiu
bastante nesse processo.
Ao meu atual orientador Prof. Dr. Adeilson Pinheiro Sedrins, pois foi através do Prof.
Dr. Jair Barbosa que o conheci, sou imensamente grato, por me aceitar como orientando, pela
paciência diante dos meus erros naturais, uma vez que somos eternos aprendizes, além dos
ensinamentos e todas as contribuições nesse processo de aprendizagem.
Por fim, aos meus amigos, que são muitos, não ouso a escrever nome por nome, pois
sei que esqueceria o nome de algum e a toda comunidade surda, essa vitória também é de
vocês.
“Para alguns: ignorância, para outros riqueza de vocabulário…
Este trabalho se apresenta como uma investigação sobre a variação lexical existente em três
municípios de Alagoas, Maceió, São Miguel dos Campos e Arapiraca, com uma análise sobre
as variáveis externas sexo, escolaridade e região. A pesquisa surge da necessidade de estudos
na área da sociolinguística sobre a Libras, sobretudo em Alagoas, no que diz respeito às
variações lexicais existentes num mesmo estado. Como teoria de base, utilizamos os
pressupostos da Teoria da Variação Linguística. Como instrumento de análise, nos
amparamos no modelo de parâmetros de Stokoe (1960) e mais especificamente nos estudos
de Faria-Nascimento (2009) sobre a Libras. Metodologicamente, Seguimos a metodologia
proposta por Labov (1972), com uma estratificação a partir das variáveis sexo, escolaridade
e região. Desta forma, 12 surdos participaram da pesquisa, 4 por município, 6 homens e 6
mulheres, 6 surdos cursando ensino médio e 6 surdos cursando ou tendo concluído o ensino
superior. A coleta foi gravada em ambientes comuns aos participantes, em suas casas ou na
escola em que estuda, e o gênero entrevista foi utilizado para a coleta. 5 itens foram
analisados: AMENDOIM, em que 6 variantes foram produzidas pelos surdos, CENTRO (da
cidade), com 5 variantes produzidas, GOIABA, com 5 variantes produzidas, MARACUJÁ,
com 4 variantes e PONTO DE ÔNIBUS, com 4 variantes produzidas. Quanto aos resultados
para a análise quantitativa levando em conta as variáveis externas, vimos que não há
diferenças entre a produção lexical de homens e mulheres nem entre surdos de ensino médio
e superior. Concluímos, portanto, que as variáveis sexo e escolaridade não interferem na
produção lexical dos surdos dos três municípios. Quanto à variação regional, como resultados
mais significativos, vimos que, exceto em GOIABA, todos os outros itens apresentaram
variantes diferentes, por região, ou seja, os falantes de Maceió sempre produziram uma
variante diferente de São Miguel e de Arapiraca, e de São Miguel sempre produziram
variantes diferentes de Maceió e Arapiraca, sobretudo nos itens MARACUJÁ em que todos
os surdos de Maceió produziram a variante com a mão no peito, todos falantes de São Miguel
produziram a variante com o sinal correspondente a SONO e 3 dos quatro surdos de
Arapiraca produziram o sinal com a mão apontando as sementes, assim como em PONTO
DE ÔNIBUS, em que todos os falantes de Maceió produziram a variante correspondente a
uma placa, todos os falantes de Arapiraca produziram um sinal com um classificador de uma
banco com cobertura e os surdos de São Miguel produziram sinais representando uma
cobertura sobre a cabeça, dois de forma isolada e dois em composição com outro sinal.
This paper aims to investigate lexical variants in three cities in the Brazilian state of Alagoas:
Maceió, São Miguel dos Campos and Arapiraca, with gender, level of school instruction and
location as external variables. The research stems from the need of further studies in
sociolinguistics regarding Libras (Brazilian sign language), especially in Alagoas, as far as
existing lexical variants in the same state are concerned. We use the precepts of Linguistic
Variation as our main theory. As for analysis, the parameter model of Stokoe (1960) was
used, and studies on Libras by Faria-Nascimento (2009) were used. We follow the studies of
Labov (1972) as methodology, stratifying data by gender, level of instruction and location.
This way, participants included 12 deaf individuals, 4 for each city, 6 males and 6 females,
6 in high school and 6 others in higher education, complete or incomplete. Data was recorded
in usual environments for participants, in their homes or schools, via interviews. Five lexical
units have been analysed: PEANUTS, in which six variants were performed by the deaf,
(city) CENTER, with five variants, GUAVA, five variants found, PASSION FRUIT, four
variants and BUS STOP, also with four variants. In a quantitative analysis, taking external
variables into account, we spotted no difference between men and women or between those
with low or high levels of instruction. We conclude that gender and level of instruction do
not interfere in the lexis of the individuals researched in the three cities. The variant location
brought more significant results, since that all items except GUAVA yielded diverse variants
by region, that is, speakers in Maceió Always produced a diferente sign than those from São
Miguel and Arapiraca, and those from São Miguel Always produced different signs than
people in Maceió and Arapiraca, especially in the item PASSION FRUIT in which all deaf
from Maceió used the hand in breast variant of the sign, all speakers from São Miguel used
the variant which is similar to the SLEEP sign, and three out of four from Arapiraca
performed the sign pointing to the fruit seeds, and also in BUS STOP, in which while all
participants from Maceió performed a variant similar to that of a traffic sign, all from
Arapiraca performed the sign as a bench with a canopy and those from São Miguel performed
it as an overhead cover, two of them by itself and other two in conjunction with another sign.
ARA- Arapiraca
ASAL - Associação de Surdos de Alagoas
ASL - American Sign Language
BSL - Língua de Sinais Britânica
CM - Configuração da mão
EM - Ensino médio
H - Homem
LIBRAS - Língua Brasileira de Sinais
M - Mulher
MCZ - Maceió
SAO - São Miguel dos Campos
SU - Superior
VE - Variável escolaridade
VR - Variável regional
VS - Variável sexo
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 16
2 TEORIA DA VARIAÇÃO LINGUÍSTICA .............................................................................. 19
2.1 A língua de sinais ............................................................................................................... 24
3 PARÂMETROS........................................................................................................................ 28
3.1 Configuração das mãos ....................................................................................................... 29
3.2 Ponto de articulação ........................................................................................................... 31
3.3 Movimento......................................................................................................................... 34
3.4 Orientação e/ou direcionalidade .......................................................................................... 36
4 A ESTRUTURA LEXICAL DAS LÍNGUAS DE SINAIS ........................................................ 38
4.1 Léxico não nativo ............................................................................................................... 40
4.2 Léxico nativo ..................................................................................................................... 40
4.3 Léxico nativo nuclear ......................................................................................................... 40
4.4 Léxico nativo não-nuclear .................................................................................................. 41
4.5 Espaço ............................................................................................................................... 42
4.6 Movimento......................................................................................................................... 44
4.7 Configuração de mão .......................................................................................................... 45
4.8 O processo de Lexicalização ............................................................................................... 47
5 METODOLOGIA ..................................................................................................................... 50
5.1 Seleção dos participantes .................................................................................................... 50
5.2 A coleta de dados ............................................................................................................... 51
5.3 Tratamento e Análise dos dados ......................................................................................... 54
6 ANÁLISE DOS DADOS .......................................................................................................... 55
6.1 A descrição dos dados linguísticos ...................................................................................... 55
6.2 Análise sociolinguística dos dados ...................................................................................... 71
6.3 A experiência de coleta de dados linguísticos da Libras ...................................................... 71
6.4 Variáveis sociais ................................................................................................................ 72
6.5 Variável Sexo ..................................................................................................................... 72
6.6 Variável Escolaridade ......................................................................................................... 74
6.7 Variável regional ................................................................................................................ 75
6.8 Resultados gerais ................................................................................................................ 77
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................... 78
REFERÊNCIAS .......................................................................................................................... 79
APÊNDICE: Variáveis sinais ....................................................................................................... 83
ANEXO I – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ........................................................... 88
ANEXO II – Ficha Social do Informante ...................................................................................... 91
ANEXO III – Registos de entrevistas três municípios ................................................................... 95
ANEXO IV: Imagens – Google .................................................................................................. 113
16
1 INTRODUÇÃO
A partir desta percepção, surgiu a necessidade de investigar quais fatores externos podem
condicionar o uso da Libras por falantes de Maceió. Nossa questão de pesquisa será: “Como
ocorre a variação lexical diatópica na Libras falada em Alagoas?”. Teremos como hipótese a
explicação de que a iconicidade pode ser um fator determinante na variação lexical e que
fatores sociais como sexo/gênero e escolaridade podem influenciar a fala dos surdos
alagoanos. A pesquisa então tem como objetivo geral investigar a variação lexical diatópica
em Alagoas. Além disso, terá como objetivos específicos verificar se a variável sexo/gênero
interfere na escolha dos falantes; verificar se a variável escolaridade interfere na escolha dos
falantes; observar como a iconicidade na Libras pode estar relacionada às diferenças no
léxico.
Na primeira seção desta pesquisa, traremos conceitos ligados a teoria da variação
linguística proposta por Labov (1972), que será a base teórico-metodológica para esta
investigação. Em seguida, apresentaremos um breve apanhado sobre os estudos sobre a
Libras e mais especificamente sobre a sua estrutura lexical. Na segunda seção, abordaremos
com mais detalhes o conceito de iconicidade, trazendo estudos sobre este fenômeno na Libras
e em outras línguas de sinais.
Na quarta seção, apresentaremos a metodologia que foi empregada para a realização deste
trabalho. Para tanto, foram analisados 5 itens lexicais por meio de pesquisa com 12
indivíduos surdos, oriundos de 3 municípios do estado de Alagoas. Dentre estes, homens e
mulheres, na faixa etária de 20 a 40 anos.
Na quinta seção explicitamos os resultados da coleta e os analisaremos, discorrendo sobre
as principais descobertas. Por fim, traremos as considerações finais do trabalho, apontando
para possíveis novas investigações.
19
Ao estabelecer esta distinção, Chomsky (1965) vai dizer que os “desvios de regras”
não são da ordem da competência, ou seja, não são linguísticos. A crítica de Labov não
repousa somente na concepção de língua dos teóricos, mas em como esta visão acarreta um
método de investigação inadequado. Para Labov (1972, p.19)
A linguística, portanto, tem sido definida de tal modo a excluir o estudo do
comportamento social ou o estudo da fala. A definição tem sido
conveniente para os formuladores, os quais, por inclinação pessoal,
preferiram trabalhar com seu próprio conhecimento, com informantes
individuais ou com materiais secundários.
A questão posta aqui é a de que os teóricos criticados por Labov não se utilizaram de
usos reais de fala para desenvolver suas reflexões. O método intuitivo não é bem visto por
Labov, pois se apresenta como falho, portanto, não deveria ser encarado como um dado de
pesquisa. Somente a pesquisa voltada para a língua posta em uso, poderia fornecer descrições
e generalizações seguras sobre a língua.
Labov desenvolve sua teoria voltando-se para a metodologia que deve ser empregada
quando se deseja pesquisar dados reais de fala. Seu objetivo é não somente analisar a fala do
ponto de vista linguístico, mas observar como fatores sociais, como classe social, idade,
sexo/gênero e escolaridade podem interferir nas escolhas do falante. O autor realizou uma
pesquisa em Martha’s Vineyard nos EUA. O estudo analisou a centralização de ay e aw,
sendo a primeira a variante de pessoas mais idosas e a segunda de pessoas mais novas. O
estudo mostrou que falantes que utilizam a variante mais conservadora tinham uma forte
identificação com o lugar que viviam, enquanto que os falantes que utilizam a variante
inovadora não se identificavam muito com a ilha e estavam mais abertos a mudanças. Labov
comprovou que fatores sociais podem interferir na maneira como as pessoas falam.
Ao realizar suas investigações com dados reais de fala, o autor percebeu que há um
paradoxo quando um pesquisador se propõe a coletar dados espontâneos, denominado
paradoxo do observador. Isto acontece porque, quando o pesquisador está observando o
falante, a fala deixa de ser espontânea, uma vez que, inconscientemente o falante irá controlar
sua fala, ainda que minimamente. Desta forma, se torna impossível coletar dados totalmente
21
A metodologia proposta pelo autor envolve desde o ambiente que as entrevistas com
os falantes acontecem, uma vez que um ambiente muito distante da realidade do falante pode
intimidá-lo, até questões como o gênero textual escolhido para a coleta e a maneira como o
pesquisador irá conduzir a entrevista, de modo que o falante se sinta à vontade.
Além dessas questões, Labov também se preocupou com a estratificação dos dados.
Quando uma variável social é investigada, se faz necessário que uma amostra significativa
de falantes representem aquela variável. Se a pesquisa envolve as variáveis sexo e idade, se
faz necessário coletar dados de homens e mulheres de três faixas etárias. Um homem e uma
mulher de cada faixa etária se faz necessário para que cada variável seja representada. Neste
caso, 6 pessoas irão formar uma célula de investigação, ou seja, um grupo com um
representante de cada item do cruzamento das variáveis. Labov indica que uma estratificação
segura deve conter pelo menos cinco células, para que a análise não seja comprometida.
Além das variáveis sociais, há variáveis que são regionais, também chamadas de
diatópicas. Segundo Coelho et al. (2002, p. 76), “é a variação diatópica, também conhecida
por regional ou, ainda, geográfica, a responsável por podermos identificar, às vezes com
bastante precisão, a origem de uma pessoa através do modo como ela fala.”, ou seja, a
variação regional identifica o falante em relação ao lugar de onde ele pertence.
A variação regional não diz respeito somente diferentes estados de um mesmo país.
Para Coelho et al. (2002, p. 76)
a variação regional pode ser estudada colocando-se em oposição diferentes
tipos de unidades espaciais: podemos dizer que existe variação regional
entre Brasil e Portugal (dois países), entre o Nordeste e o Sul do Brasil (duas
regiões de um mesmo país), entre Paraná e Santa Catarina (dois estados de
uma mesma região), entre Chapecó e Florianópolis (duas cidades de um
mesmo estado) e mesmo entre falantes do Centro de Florianópolis e falantes
do Ribeirão da Ilha (dois bairros de uma mesma cidade). É comum também
que se analise variação regional entre zonas urbanas e zonas rurais ou do
interior.
22
Nossa pesquisa irá lidar tanto com variação social, quanto regional, uma vez que iremos
investigar homens e mulheres de três municípios de Alagoas com escolaridades diferentes.
Quando Labov (1972) afirma que as línguas são heterogêneas e variam, significa dizer
que dentro de uma mesma língua, a depender da comunidade linguística em que o falante
está inserido, ele poderá se expressar de inúmeras maneiras. Com a língua de sinais não é
diferente. Os sinais variam nos diferentes níveis da língua de acordo com o contexto social
que cerca o falante desta língua.
A Teoria da Variação e da Mudança Linguística trata, portanto, da variação
e da mudança linguísticas e contempla os usos variáveis de fenômenos da
linguagem em seu contexto social. A proposta de Labov se distancia da
Linguística que considera a língua como um sistema de normas abstratas,
externa ao falante e independente do contexto de enunciação e mostra que
é na heterogeneidade da língua que se deve buscar a estrutura e o
funcionamento desse sistema. (SANTOS E VITÓRIO, 2011, p. 18).
A Libras passou por diversas mudanças até se tornar a língua falada hoje em dia. Essas
mudanças aconteceram diacronicamente, mas vale salientar que as variações em Libras
também acontecem no campo sincrônico. Falantes de regiões diferentes podem apresentar
mudanças no léxico ou no nível fonológico. Xavier, (2006; 2010) aponta que discutir
variação linguística em língua de sinais requer considerar as variáveis existentes no que diz
respeito a condições de aquisição de língua entre outros fatores. Woodward et al. (1976 apud
23
Xavier e Barbosa, 2017) após analisarem sete sinais da Língua americana de sinais (ASL),
constataram que o fenômeno de variação dizia respeito também a fatores extralinguísticos,
como o local de residência. Sobre esse aspecto, Calvet assevera:
Já Johnson e Liddell (2010) afirmam que a diferença mais óbvia e imediata entre as
línguas orais e as línguas sinalizadas reside na forma como são produzidas e percebidas.
Falantes de línguas orais coordenam uma série de articuladores relacionados ao trato vocal e
produzem grupos de sons reconhecíveis como palavras. Já os falantes de línguas sinalizadas
coordenam atividades das mãos, braços, tórax, rosto e cabeça para produzir grupos de gestos
físicos visíveis reconhecíveis como sinais. Crasborn (2008) refere que a diferença mais
marcante entre as línguas orais e as de sinais é o uso de dois articuladores simétricos: dois
braços e duas mãos.
Baker e Padden (2005) afirmam que a população desenvolve línguas de sinais para
que um surdo se comunique efetivamente com outros. Assim como em qualquer comunidade
linguística, a LS é a principal característica identificadora de pertencimento de seus membros
à comunidade. Da mesma forma que as línguas orais, a LS é particular de cada comunidade
e está diretamente relacionada à cultura do local. Além disso, de acordo com McCleary e
Viotti (2011), assim como nas línguas orais, língua e gesto coexistem nas línguas de sinais.
Segundo Gesser (2008), não há dúvidas de que na comunidade surda, a LS confere
ao surdo uma libertação dos moldes e visões até então patológicos, pois desvia a concepção
da surdez como deficiência para uma concepção de diferença linguística e cultural. Padden
(1980) acrescenta que se pode considerar uma “comunidade surda” quando os sujeitos surdos
compartilham características, entre elas, a língua de sinais, e participam de eventos como
grupo. Para ela, os valores do grupo cultural são representados nas atitudes e comportamentos
que o grupo considera mais importantes.
Os estudos da Sociolinguística envolvem, principalmente, a reflexão sobre o
desenvolvimento e os diferentes usos da língua e da linguagem humana, considerando o fluxo
contínuo e ininterrupto no qual os seres humanos se apropriam e se utilizam das
possibilidades comunicativas e reflexivas que estão ligadas a essa área do conhecimento.
Nesse sentido, investigar o uso de uma língua é também investigar a enorme variação
linguística que decorre do seu uso particular (cada indivíduo tem uma forma peculiar de
apropriar-se e de utilizar-se da língua), bem como do uso coletivo, social dessa língua. Como
o uso difere na dimensão individual e na dimensão coletiva, muitos são os fatores que
influenciam nas mudanças e variações observáveis em uma língua viva: classe social, faixa
etária dos usuários (crianças, jovens, idosos), gênero, o contexto social de uso da língua,
religião, minorias, entre outros.
Atualmente, a Libras tem status de língua, mas mesmo antes desse reconhecimento
positivado é necessária certa acuidade para verificar as mudanças linguísticas, seu
26
regionalismo e suas variações. Esse processo histórico tem que ser visto tanto da perspectiva
temporal, quanto da perspectiva espacial, já que tempo e espaço são variáveis para uma
língua.
Observa-se que toda a variação linguística deve ser respeitada, tratada como um
fenômeno natural dentro da língua, já que esse processo ocorre de forma natural e é atrelado
à história que a língua traz consigo. Os novos sinais, ou sinais diferentes daquele habitual de
uma determinada região, trazem a riqueza da língua, permitem que se partilhem experiências
e conceitos que partem de pontos de vista diferentes para um dado sinal que embora diferente
em sua forma possua um mesmo significado.
A comunidade surda é de grande importância para a socialização da língua e cultura,
das experiências e forma de estar no mundo. A língua é atrelada à cultura. Strobel (2009)
apresenta características da cultura surda e a língua é um fator de elo, pois a língua de sinais
é uma das principais marcas de identidade de um povo surdo, pois é uma das peculiaridades
da cultura surda. A interação na comunidade surda produz mais sobre a língua, estabelece
um fortalecimento de identidades compartilhadas lutando assim pelo resgate da sua língua e
de tudo que foi negado historicamente aos surdos.
Além da visão social sobre a Libras, que envolve as questões culturais que envolvem
uma comunidade surda, a língua de sinais pode ser estudada do ponto de vista linguístico.
Segundo Quadros e Karnopp (2004), Finau (2006) e Rosa (2008), de forma semelhante às
línguas orais-auditivas, é estruturada segundo padrões fonológicos, morfológicos, sintáticos,
semânticos e pragmáticos. As autoras afirmam ainda que o que diferencia as línguas de sinais
das línguas orais é a estrutura simultânea da organização dos elementos das línguas de sinais.
Segundo Brentari (2002), a fonologia é um nível de análise gramatical em que
unidades estruturais primitivas sem sentido são combinadas para criar um infinito número de
sentenças repletas de significado. Para Battison (1974), a fonologia da língua de sinais é um
nível estrutural sublexical análogo, mas não apresenta qualquer relação de dependência da
fonologia das línguas orais. McIntire (1977) afirma que a fonologia das línguas de sinais é,
em muitos aspectos, diferente da fonologia das línguas orais, mas obedece aos mesmos
princípios.
Quanto à morfologia, as línguas de sinais apresentam uma morfologia sequencial e
simultânea (QUADROS, 2019, p. 62). Simultânea, porque há uma sobreposição de
morfemas, como a diferença entre CASA, em que uma das mãos está com uma configuração
de mão em B e a outra em B também e LOJA, em que a configuração de uma mão está em
B e a da outra mão está em L. Neste sentido, o L funciona como um morfema flexional se
27
3 PARÂMETROS
Stokoe (1960) e Stokoe, Casterline e Cronenberg (1965) revelam que não só a língua
de sinais é um sistema organizado linguisticamente, mas sua estrutura difere da estrutura das
línguas orais. De forma mais específica, Stokoe, Casterline e Cronenberg (1965) descreveram
a estrutura da língua de sinais americana, afirmando que a formação do sinal se dá a partir de
três parâmetros simultâneos: a configuração (formato) das mãos, a localização no espaço e a
sua movimentação1. Cada um dos parâmetros, segundo Liddell (1991) e Siedlecki Jr. e
Bonvillian (1993), apresenta um conjunto limitado de elementos formacionais, corroborando
Battison (1980), que afirma que as possibilidades dos elementos formacionais não são
infinitas.
De acordo com Liddell e Johnson (1989) e Marshall (2011), a língua de sinais, na
perspectiva de Stokoe (1960) e Stokoe, Casterline e Cronenberg (1965), é formada a partir
de “queremas”2 definidos como elementos sem significado que, quando combinados, formam
sinais com significado, de forma análoga aos fonemas das línguas orais.
Battison (1974) mostra que as descrições da língua de sinais contêm um nível de
análise sub-lexical equivalente ao nível fonológico das línguas orais. Segundo Johnson e
Liddell (2010), no sistema querêmico de Stokoe, cada sinal é composto, simultaneamente,
de uma configuração de mão, um local e um ou mais movimentos.
A seguir, os parâmetros de (a) configuração de mão, (b) localização e (c) movimento
serão descritos segundo Stokoe (1960) e Stokoe, Casterline e Cronenberg (1965). O
parâmetro de (d) orientação da palma da mão será descrito segundo Battison (1978). As
expressões não-manuais, consideradas o quinto parâmetro das línguas de sinais, por não se
configurarem em uma variável a ser investigada no presente trabalho, não serão apresentadas.
1
Após a publicação dos parâmetros, dois novos parâmetros foram propostos e é consensual a importância de
ambos para a realização dos sinais: a orientação da mão (BATTISON, 1978) e os elementos não-manuais
(LIDDELL, 1991).
2
Durante muito tempo, se adotou a terminologia “querema” em relação aos componentes dos sinais, no entanto,
com a entrada da Linguística nos estudos sobre as línguas de sinais, ela foi substituída por “fonema”,
considerando-se a sua analogia em relação às línguas orais. Da mesma forma, o termo “querologia” foi
substituído por “fonologia” das línguas de sinais. Isso, entretanto, ainda não é consensual na literatura.
29
A oficialização da configuração das mãos começou a ser formada com base nos dados
coletados nas principais capitais do Brasil. A configuração de mãos representa a forma que
a mão assume durante a realização de um sinal. Segundo Faria-Nascimento (2009, existem
75 configurações de mão em LIBRAS, e elas podem ser diferenciadas pela extensão (lugar e
número de dedos estendidos), pela contração (mão fechada, mão aberta) e pelo contato ou
divergência dos dedos, os quais podem variar, apresentando uma mão configurada, uma mão
configurada sobre a outra, que lhe serve de apoio. A figura abaixo apresenta todas as
configurações de mão da Libras encontradas pela autora.
A autora observou que há configurações que, em alguns casos, servem como alofones,
e que há semelhanças entre configurações, por isso, ela separou em grupos, como se vê na
figura, configurações com características parecidas. A estes grupos, a autora denominou
configuretos.
Além disso, é importante salientar que há sinais com uma mão ou com duas mãos
com a mesma configuração, mas há também sinais que apresentam configurações de mão
diferentes para os sinais. Quando o sinal apresenta uma mão de base e outra com um
movimento, denominamos a mão com movimento de mão dominante, enquanto que a mão
base é chamada de mão não dominante.
Assim, uma maior especificação da posição é necessária, já que a região no espaço é muito
ampla. Esse espaço é limitado e vai desde o topo da cabeça até a cintura, sendo que alguns
pontos de articulação são mais precisos. As especificações dividem o corpo das pessoas em
cabeça, tronco, braços, mãos, e também em outras pequenas partes como olhos, pescoço,
pulso, palmas, etc. Alguns adjetivos explicam ainda mais o ponto. São aqueles que
especificam a subdivisão do corpo em questão (lado direito, esquerdo, interno externo, etc.),
além daqueles que informam se há o contato ou distância quando são realizados
(imediatamente, próximo em contato, distante, etc). A seguir, apresentamos a proposta de
Faria-Nascimento para os pontos de articulação na Libras.
Vale salientar que esta não é a única proposta de pontos de articulação para a Libras,
Ferreir-Brito (1995), Xavier (2006), Rosa et al. (2014) também apresentam propostas para
pontos de articulação na Libras. Um estudo realizado por Santos (2020) apresenta pares
mínimos para pontos de articulação. O autor propõe que há distinções mínimas entre os
pontos de articulação. O quadro a seguir ilustra tais distinções.
33
O espaço neutro vai desde uma lateral a outra e da parte mais baixa de sinalização a
parte mais alta. Sinais não que estão junto ao corpo são chamados de ancorados, se opondo
aos sinais realizados no espaço neutro.
3.3 Movimento
torno do corpo dessa pessoa. Segundo Faria-Nascimento (2009), além do tipo e da frequência
do movimento, os movimentos podem ser divididos em movimento dos dedos, das mãos
direita e esquerda e do corpo, conforme a figura a seguir.
Note-se que, na ordem proposta pela autora, há uma relação de oposição entre os
movimentos, os sinais TRABALHAR e ÁGUA apresentam movimentos diferentes,
conforme as figuras a seguir.
Fonte: Elaborado pelo autor (2020) Fonte: Elaborado pelo autor (2020)
O sinal TRABALHAR tem um movimento das mãos caracterizado como para frente
e para trás, rápido, enquanto que o movimento do sinal ÁGUA é o de curvar o dedo indicador,
ambos com frequência rápida. Além disso, há uma diferença substancial entre os
movimentos, já que no primeiro sinal o braço se move, enquanto que no segundo sinal a mão
se move. No primeiro sinal o movimento é externo e no segundo sinal o movimento é interno,
tendo como referência a própria mão.
Figura 4 - Sinal de IR
Tal concepção de estrutura, que observa as línguas de sinais a partir de parâmetros, têm
norteado grande parte dos estudos em língua de sinais. Em nossa pesquisa, apesar de não
tratar do nível fonológico, poderá se valer desta terminologia para especificar sinais, uma vez
que não dispomos de uma escrita de sinais acessível a todos os leitores. A seguir,
apresentaremos questões relacionadas ao léxico das línguas de sinais, este sim, objeto da
nossa pesquisa.
38
Gestos
Língua oral
não-nuclear
(datilologia)
(sinais de representação)
O quadro apresenta uma estrutura dividida em duas categorias, léxico nativo e não
nativo. O léxico nativo, por sua vez se subdivide em léxico nuclear e não-nuclear.
Descreveremos quais são as principais características de cada categoria, de acordo com os
autores. A seguir, iremos explicar o modelo acima. Iniciaremos pelo léxico não nativo.
40
Segundo Santos (2018) “uma diferença expressiva entre os itens não nativos das
línguas de sinais é a presença de palavras das línguas orais, ou seja, de modalidades de língua
diferentes.” Isto acontece, segundo o autor, porque a língua portuguesa está mais presente na
comunicação dos surdos brasileiros do que a ASL. Vale salientar que a língua portuguesa
pode aparecer na Libras tanto através da oralização da palavra junto ao sinal, seja da palavra
completa, seja de parte da palavra, como através da sua escrita, quando a palavra escrita
acaba sendo a raiz de um dado sinal, como é o caso de N-U-N-C-A, em que a soletração do
sinal é o próprio sinal.
Outra parte do léxico das línguas de sinais é o léxico nativo. Iniciaremos esta
explicação pelo núcleo do léxico.
Estão no núcleo do léxico os sinais que já foram lexicalizados, ou seja, que obedecem
às restrições linguísticas de uma dada língua. É possível que um sinal com raiz num
empréstimo linguístico possa vir a se lexicalizar, se tornando um sinal do núcleo do léxico.
No caso do sinal N-U-N-C-A, já há em algumas regiões um processo de redução no número
de configurações de mão de forma que o sinal fora resumido a N-U-N, mantendo a mesma
configuração de mão, com um movimento do pulso para cima e para baixo.
Os sinais no núcleo do léxico estão divididos em (i) sinais completamente
especificados, (ii) sinais compostos e (iii) sinais incompletos. Os sinais completamente
especificados foram denominados por Johnston & Schembri (2007) como sinais
monomorfêmicos. Sinais como CASA, AMOR e ACREDITAR estão inclusos nesta
categoria. Estes sinais funcionam como morfemas livres, pois não precisam da presença de
outros morfemas ou sinais para possuírem uma unidade de sentido.
Os sinais compostos são definidos como uma junção de dois ou mais sinais
completamente especificados. O sinal ESTUDAR e o sinal CASA são categorizados como
completamente especificados, porém, a junção CASA+ESTUDAR dá origem ao sinal
ESCOLA. Os exemplos (1) e (2) mostram que há uma diferença entre os dois morfemas
livres ESTUDAS e CASA, e o sinal composto ESCOLA.
41
Nesta direção, encontramos o morfema que diz informações sobre o sujeito e/ou
objeto. Percebemos, portanto, que este morfema de concordância traz informações essenciais
para a semântica e para a sintaxe do verbo. Lillo-Martin & Klima (1986 apud Padden, 1988,
p. 56) apontam que “O léxico contém somente um pronome ou marcador de concordância e
os componentes da representação sintática ou discursiva da gramática executam a
interpretação da indexação e referência.” LILLO-MARTIN & KLIMA, 1986 apud Padden,
1988, p. 56). Dessa forma, morfemas de direção auxiliam na construção sintática de verbos
com concordância e direcionais, além disso são base para o entendimento dos sentidos da
frase - do que o locutor deseja informar.
Falaremos agora do léxico nativo não nuclear. Johnston & Schembri (2007) afirmam
que o léxico nativo não nuclear é parcialmente especificado, diferente dos sinais do léxico
42
nuclear, que são completamente especificados, e é composto por duas partes, os sinais de
apontamento e os sinais de representação. Os sinais de apontamento dizem respeito ao
gesto de apontar, comum aos seres humanos, que funcionam como pronomes na Libras, ora
pessoais (eu, tu, ele etc.), ora demonstrativos (este, esse, aquele etc.). Muitos sinais
relacionados ao corpo humano não possuem um sinal específico, por que apenas o
apontamento já é o suficiente para identificar o referente.
Quanto aos sinais de representação, Johnston & Schembri (2007) explicam que eles
são diferentes dos sinais do núcleo do léxico porque são criados pelos surdos a partir da
combinação das suas unidades. As unidades dos sinais representativos podem gerar novos
sinais ou modificador o significado de um sinal lexicalizado ao qual for combinado. Tais
combinações ou criações espontâneas, podem vir a se tornar parte do léxico nativo, conforme
for convencionado pela comunidade surda. O quadro abaixo apresenta um resumo da
descrição realizada pelos autores, a qual iremos explicar a seguir.
4.5 Espaço
Johnston & Schembri (2007) propõem categorias para estas unidades, baseadas no
modelo de Stokoe (1960). As categorias são, espaço, movimento e configuração de mão. Para
explicar os tipos de unidade de espaço, os autores se baseiam em Liddell (2003) e apresentam
três tipos de espaço, o real, o topográfico e o abstrato, focando a descrição no topográfico.
43
A partir da leitura das imagens acima, vemos que, mesmo sendo o mesmo referente
– uma pessoa pilotando uma moto, a configuração visual é diferente, pois o uso do espaço
muda, já que no primeiro é utilizado o espaço esquemático, e no segundo, o espaço do
espectador.
4.6 Movimento
esquerda, uma pessoa à frente e uma pessoa à direita, o sinalizante usará a configuração 26
parando à esquerda, depois à frente e depois à direita, mas não significa que uma mesma
pessoa está se movendo, mas sim que há três pessoas no ambiente.
Já no movimento de trajetória, ao sinalizar a configuração 26 indo da esquerda para
a direita, o sinalizante representa que uma pessoa saiu do lado do seu lado esquerdo para o
seu lado direito, o que é muito parecido com o movimento de modo, que indica
especificamente a maneira como o objeto ou a pessoa se moveu. Já no movimento de formato,
as mãos se movem, mas no sentido de descrever o objeto ou pessoa, não no sentido de dizer
que o objeto ou pessoa estão se movendo.
( ) com a palma voltada para baixo, que representa um pé, feito com as duas mãos é
possível representar os pés se movendo enquanto uma pessoa está andando. Além de pessoas,
animais, veículos e outros objetos podem ser representados em sua totalidade, como avião,
árvore, cobra etc. Da mesma forma que a configuração 26 pode representar uma pessoa, a
configuração 54( ) pode representar várias pessoas. Neste sentido, esta configuração é
de coletividade, que se difere da configuração de volume, que representa um amontoado, seja
de papel, de livros, ou um volume líquido, como um copo com a água, ou uma piscina
(JOHNSTON & SCHEMBRI, 2007).
Falaremos agora das configurações de manipulação. Para Johnston & Schembri
(2007) essas configurações fazem partes de sinais que dizem respeito a interação com
objetos. Os autores explicam que, “essas formas de mãos fazem parte da representação de
verbos que se concentram em como um humano ou animal lida com algum referente e o que
acontece com ele como resultado desse manuseio.” (JOHNSTON & SCHEMBRI, 2007, p.
169). Estas formas de interação podem ser subdivididas em três: Segurar, Tocar e de
Instrumento.
46
), comumente usada para manuseio de objetos finos, como bolacha (levando à boca),
etc. A exemplo disto, utilizamos a configuração 51( ) para indicar a superfície de uma
estrada. Neste caso, o movimento vai indicar se a superfície é reta e plana, ondulada, ou um
declive. Já as configurações de dimensão, servem para dar uma noção relativa de dimensão
dos objetos, como quando utilizamos a configuração 12( ) com as duas mãos para indicar
um tronco de uma árvore. Por fim, as configurações de perímetro se apresentam como uma
forma de representar a forma, desenhando o contorno do objeto. Podemos utilizar a
47
configuração 26( ) para desenhar com as duas mãos um quadro, fazendo, com cada mão,
uma parte do quadro, ou podemos desenhar um triângulo somente com uma mão.
A partir desta breve reflexão, podemos perceber a riqueza do léxico em relação à
quantidade informações linguísticas que ele carrega. A seguir, apresentaremos brevemente o
fenômeno da lexicalização na Libras, apresentando conceitos e trazendo exemplos.
Para Johnston & Schembri, a lexicalização pode ser caracterizada como “o processo
em que os sinais compostos por muitas unidades significativas e separadas passam a atuar
como morfemas únicos. ” (JOHNSTON & SCHEMBRI, 2007, p. 174). Este processo pode
acontecer com sinais que já estão no núcleo do léxico ou com empréstimos de línguas orais
ou de sinais, ou com sinais de representação que vão para o núcleo, conforme veremos nos
exemplos a seguir
Um exemplo da junção de dois sinais do núcleo que se juntam formando um novo
sinal é o sinal ESCOLA, como vimos, que é a junção de CASA+ESTUDAR.
No caso de sinais emprestados, temos o exemplo do sinal NUNCA na Libras.
Inicialmente o sinal era feito soletrando cada uma das configurações referentes às letras da
Os exemplos ilustrados apresentam uma clara evidência de que tem uma raiz como
sinal de representação. Ou seja, a formação do sinal vêm das unidades dos sinais de
representação, mas com o tempo os sinais vão se lexicalizando, tomando uma forma estática.
Os autores dizem que, no caso de MEET, o sinal deriva do classificador de entidade com a
configuração 26( ) feita para uma pessoa indo ao encontro de outro classificador de
entidade com a mesma configuração, representando duas pessoas se encontrando. No
entanto, o sinal MEET, assim como o sinal ENCONTRAR, na Libras (realizado com os
mesmos classificadores) não dizem respeito somente ao encontro de duas pessoas, mas a
qualquer encontro de pessoas, incluindo encontros nacionais, que envolvem centenas de
pessoas.
Outro exemplo de lexicalização ocorre no sinal MESA na Libras, ilustrado a seguir:
baixo. Quando observamos este sinal lexicalizado, vimos que ele deriva de um sinal de
representação, pois se apresenta num espaço esquemático, já que é feito numa escala
reduzida, num movimento de formato, já que o movimento acontece para desenhar a forma
do objeto, e numa configuração de superfície, representando a superfície reta do objeto.
A lexicalização é um fenômeno presente em todas as línguas, mas nas línguas de
sinais, e no caso desta investigação, a Libras, este fenômeno é bastante produtivo. Isto se
deve, tanto ao fato de que não há um ensino padronizado da Libras em todo o Brasil, nem
meios de comunicação de massa, como acontece com o português, por exemplo. Por conta
disso, cada região apresenta sinais específicos, que surgiram da maneira como os surdos se
comunicam entre si. Em lugares como o interior dos estados, a variação é ainda mais
presente, já que os recursos para uma aquisição padrão da Libras são menores.
Vale salientar que este fenômeno não é visto aqui como negativo, pois mostra como
a Libras é uma língua natural como qualquer outra, capaz de, através do uso dos falantes,
aumentar o seu léxico e se manifesta de maneira diversa em cada comunidade. O que
acontece na Libras aconteceria no português hoje, caso não houve canais de comunicação em
massa utilizando o português, nem um ensino padrão nacional em todas as escolas. A seguir
veremos alguns estudos que apresentam esta variação lexical presente na Libras.
50
5 METODOLOGIA
Para cumprir os objetivos propostos, foi utilizada a metodologia laboviana para coleta
e análise dos dados. Vale salientar que não foram contemplados todos os procedimentos
metodológicos previstos por Labov (1972), tanto em relação a estratificação dos
participantes, quanto em relação a entrevista e a análise dos dados, uma vez que a pesquisa
em língua de sinais apresenta diferenças em relação a pesquisa de línguas orais. Por se tratar
de uma investigação recente no Brasil, e, por conta disso, não haver aplicações do método
laboviano à risca, foi proposta uma metodologia voltada para as especificidades do fenômeno
e da língua a qual foi investigada.
Dessa forma, uma célula contém 12 participantes. Por se tratar de uma dissertação de
mestrado, em que o tempo para a coleta e a análise é um tanto curto, trabalharemos somente
com uma célula, conforme o quadro a seguir:
51
1 H-EM-MCZ
2 M-EM-MCZ
3 H-SU-MCZ
4 M-SU-MCZ
5 H-EM-SÃO
6 M-EM-SÃO
7 H-SU-SÃO
8 M-SU-SÃO
9 H-EM-ARA
10 M-EM-ARA
11 H-SU-ARA
12 M-SU-ARA
Para a coleta de dados, utilizaremos como modelo, Moraes (2018). O autor realizou
uma pesquisa em Maceió-AL com crianças surdas e ouvintes buscando investigar como estas
crianças produziam hipônimos e hiperônimos para animais. A pesquisa partir de tarefas de
52
produção eliciada (GROLA & SILVA, 2014). Este método consiste em incentivar a
produção por parte do participante de um determinado dado linguístico, objeto da pesquisa.
De acordo com Moraes (2018), foram “apresentadas às crianças fichas com imagens dos
animais” (MORAES, 2018, p. 90) para que a partir deste incentivo as crianças produzissem
o léxico a ser investigado. Nossa pesquisa seguirá este método de coleta.
O pesquisador surdo portanto, entrou em contato com os surdos que farão parte da
pesquisa. Após confirmar a participação dos surdos em cada região, o pesquisador se dirigiu
a cada município no dia e horário pré-agendado com os participantes surdos. As entrevistas
aconteceram em escolas públicas ou na casa dos participantes, de acordo com a necessidade
de cada um. Para a gravação dos dados, foi utilizado um celular smartphone, suspenso em
um tripé. A câmera foi enquadrada de maneira que o participante e o pesquisador sejam
vistos. As imagens do participante foram projetadas quase que lateralmente, conforme a
imagem a seguir.
alguns sinais com os mesmos significados usando ítens lexicais distintos, dentre os quais
estavam os ítens analisados nesta pesquisa. Foi apresentado aos surdos as seguintes imagens:
Figura 11 - CENTRO
Fonte: https://images.app.goo.gl/4SXCSz8HUT4T18uXA
Fonte: https://images.app.goo.gl/Nwxszu4h8XtUgwRc7
Figura 13 – MARACUJÁ
Fonte: https://images.app.goo.gl/ZHWYTf8bL99kApGe8
Figura 14 - GOIABA
Fonte:https://images.app.goo.gl/3ipkK6b3JH9tT3xb7
54
Figura 15 - AMENDOIM
Fonte: https://images.app.goo.gl/ZSrkSPuj8g26pfAW6
Os vídeos foram salvos no disco virtual Google Drive após a coleta nos três
municípios, assistir aos vídeos e tirar printscreen do vídeo no momento em que o participante
realizou cada sinal pesquisado. Cada print diz respeito a um token a ser analisado. Desta
forma, sendo 12 participantes, realizando 5 sinais, 60 tokens/prints foram analisados. Por
fim, foi feito um quadro no programa Word com a produção de cada participante para cada
imagem de referência. Para a análise dos dados nos gráficos foi utilizado o programa Excel
no qual foi realizada a escolha dos gráficos do tipo coluna agrupada e logo após foram
inseridos os dados variantes e a quantidade de participantes. A análise de dados consistiu em
duas etapas. Na primeira etapa, descrevemos os dados linguísticos, utilizando como base
Johnston & Schembri (2007). Na segunda etapa, utilizamos a base teórico metodológica da
Teoria Variacionista proposta por Labov (1972) para analisar as variáveis sociais envolvidas
nesta pesquisa.
55
Neste capítulo, realizaremos uma descrição das variantes encontradas para os itens
coletados. É importante apresentar o que estamos chamando de variação lexical, se opondo
a variação fonológica. As variações fonológicas são caracterizadas pela alternância de um
parâmetro (movimento, locação, configuração de mão e orientação) num mesmo sinal, com
a mesma estrutura lexical, ou seja, trata-se de uma mesma entrada lexical, com uma diferença
fonológica de produção. Na variação lexical, além da diferença entre mais de um parâmetro,
há uma diferença na estrutura lexical do sinal, no que diz respeito às unidades de
representação, por exemplo. Esta distinção é importante, pois encontramos um par de sinal,
apresentado a seguir, que apresentou uma variação fonológica na direção do movimento, mas
como estaremos analisando somente a variação lexical, consideramos os dois sinais como
sendo um único item lexical.
Houve, por outro lado um caso de dois sinais, ilustrados a seguir, que não
apresentaram uma variação significativa na estrutura fonológica, no entanto, as suas
estruturas lexicais são diferentes, que serão descritas logo mais, portanto, os consideraremos
como sendo dois itens.
Dito isto, descrevemos agora as variantes por item, levando em conta seus aspectos
fonológicos, para efeito de análise, e lexicais. O primeiro item é AMENDOIM. As variantes
encontradas para o item estão ilustradas no quadro a seguir.
57
Quadro 6 - Variantes
Iniciaremos pela primeira variante. Esta variante apresenta três partes, as quais
explicaremos separadamente e, por fim, falaremos sobre as três em conjunto. Iniciaremos
pela primeira parte do sinal. Quando realizamos a busca no dicionário Fernando C. Capovilha
para sabermos o sinal para este item, esta parte da variante apareceu isoladamente como sinal,
conforme ilustração a seguir.
58
Quanto ao conjunto das três partes, percebemos que há uma sequência na maneira
como a pessoa que sinalizou, entretanto, é possível que a pessoa tenha dito as diversas
variantes para o mesmo sinal, no sentido de ser mais assertivo.
acontece com a variante 3, que tem a mesma estrutura da terceira parte da variante 1. Nos
deteremos em analisar agora a variante 4, que apresenta uma diferença estrutural.
o sinalizante utiliza a configuração 26( ) com o dedo apontando para frente no espaço
3
Ao realizamos a busca no Aplicativo, uma outra variante apareceu para horas no sentido de quantidade, por
esta razão não aplicamos a verificação neste sinal.
61
É possível que isto se deva ao fato de que, no interior é muito comum se referir ao
centro da cidade como a cidade em si. Diferente do sinal anterior, neste sinal não vemos
marcas claras de representação. Uma hipótese é de que as mãos representem muitos
automóveis, como se cada mão representasse uma via, indo e vindo, no entanto, a orientação
da palma da mão não está com a palma voltada para baixo, como as configurações para
automóveis comumente são produzidas. Possível que, no processo de lexicalização a
iconicidade do sinal já tenha se perdido com a mudança da orientação.
não dominante, cuja configuração é a 54( ), que está com a palma voltada para cima. Não
há movimento no sinal e o ponto de articulação é o espaço neutro. Este sinal foi encontrado
no dicionário Fernando C. Capovilha quando realizamos a busca CENTRO DA CIDADE,
conforme a figura a seguir.
62
Na variante 4, vemos uma composição com dois sinais com uma estrutura parecida.
Em uma delas, há a presença da variante 2, que também significa CIDADE, como vimos.
Desta feita, descreveremos somente a segunda parte da variante.
Nesta segunda parte, vemos a configuração 54( ), a mesma do item dois, com o
mesmo movimento, realizando um movimento externo alternado, só que para frente e para
trás, com um movimento interno oscilando os dedos, no espaço neutro. A orientação desta
vez está para o lado, com a ponta dos dedos para cima. Com isso, vemos mais claramente a
representação do sinal. O espaço é esquemático, já que as pessoas são reduzidas ao tamanho
dos dedos, e o movimento é de trajetória, indicando que há pessoas andando para um lado e
para outro.
pelos autores, é exatamente a configuração 54 utilizada nesta variante. Neste sentido, há uma
complementação entre os sinais para representar o centro da cidade, pois o sinal para
CIDADE, representa automóveis, enquanto que este representa pessoas.
No entanto, há outra explicação possível para esta composição. Assim como ocorreu
no item AMENDOIM, há duas variantes que são combinações das variantes já descritas. A
variante 4, já descrita e a variante 5, que é uma composição entre as variantes 1 e 2. Em
ambos os casos, há a presença da variante 2. É possível que na descrição da imagem, os
surdos que produziram as variantes 4 e 5 estavam querendo “centro da cidade” e não somente
centro.
que há uma tentativa de representar uma pessoa comendo a fruta. Quanto ao movimento,
temos um movimento de modo, indicando como o objeto está sendo manuseado. Por fim, a
configuração é de manipulação, mais especificamente da classe segurar, já que a variantes
representa o sinalizante segurando a goiaba.
Houve também para este item, composições de sinais. A variante 4 é uma composição
das variantes 1 e 3, juntando o sinal que faz referência a comer a fruta com o sinal que
descreve as sementes da fruta. A variante 5 é uma composição entre as variantes 1 e 2, e mais
uma vez ele faz a referência a comer a fruta e, em seguida, o sinal com a larva da mosca. Isto
acontece porque, o sinal de comer a fruta também significa FRUTA como um hiperônimo.
Então estas composições envolvem um hiperônimo e um especificador, um tipo de
composição que aparece na Libras em sinais hipônimos, segundo Santos (2018).
Esta outra variante foi fundamental para que pudéssemos entender a raiz do sinal. O
sinal da variante do mini dicionário também significa CORAÇÂO em Libras. Como a flor
do maracujá no Brasil é chamada de flor da paixão, é possível que tenha surgido do referente
paixão o sinal ligado ao coração. Esta variante, portanto, tem como raiz outro sinal
lexicalizado. Diferente de outras variantes descritas, em que o sinal raiz apresentava uma
representação, neste sinal, o sinal, além de não se referir à paixão, diretamente, também não
apresenta muitas unidades de representação, tendo somente o ponto de articulação em comum
com o referente. Em suma, podemos dizer que não há marcas de iconicidade nesta variante
em relação ao sinal MARACUJÁ.
A segunda variante também surge de outro sinal do núcleo do léxico. Desta vez, o
sinal SONO é utilizado como uma referência semântica do efeito que o suco de maracujá
pode ter quando alguém o toma. A relação entre a fruta e o efeito é tão comum para as pessoas
desta comunidade que o sinal SONO se tornou representativo da fruta. No dicionário Fernando
C. Capovilha, o sinal é feito da mesma maneira. Figura a seguir
A variante 3 foi realizada da mesma maneira que a variante 4 do item goiaba. Uma
mesma pessoa produziu as duas variantes. É possível que o surdo não conheça os sinais para
os referentes e, por conta disso, se apoiou na descrição da imagem apresentada, já que em
ambas, a fruta aparece partida, com sementes no seu interior. Por fim, a variante 4, que é uma
69
composição entre a variante 2 e 3. É possível que o sinal SONO tenha aparecido para
especificar o sinal com as sementes, já que ele também foi utilizado para goiaba.
O último item a ser descrito é PONTO DE ÔNIBUS. Este item foi produzido de 4
formas diferentes, conforme a imagem a seguir.
) com a palma para baixo tocando a ponta do dedo indicador da mão não dominante. O
sinal não tem movimento e o ponto de articulação é o espaço neutro. O sinal é realizado no
espaço esquemático, pois reduz a escala da placa de ônibus. Como já dito, não há movimento
e a configuração é de entidade inteira nas duas mãos, uma vez que a mão não dominante
representa uma haste e a mão dominante representa a placa em si.
a configuração 70( ) com a palma voltada para o corpo e os dedos para cima. Já na mão
dominante, temos a configuração 52 ( ) com a palma voltada para baixo, tocando com a
palma a ponta dos dedos da mão não dominante. Não há movimento no sinal e ele é produzido
no espaço neutro. Quanto às unidades de sua representação, entendemos que o sinal é
produzido no espaço esquemático, com a escala do ponto de ônibus reduzida, não há
movimento, e a configuração de ambas as mãos é de entidade inteira. A mão dominante
representa como um todo a cobertura do ponto de ônibus, enquanto que a mão não dominante
representa suas hastes.
A variante 4 é uma composição entre as variantes 1 e 2, que apresentam referenciais
visuais diferentes para um ponto de ônibus. É possível que o sinalizante estivesse
descrevendo tanto a placa como a cobertura como sendo partes de um único ponto de ônibus,
ou pode ser que ele apresentado as duas variantes para ser mais assertivo.
Em suma, as variantes apresentaram diversos níveis de representação, de acordo com
as unidades de representação encontradas. A partir desta descrição, percebemos que há na
Libras, assim como em outras línguas de sinais, mecanismos linguísticos geradores de itens
lexicais. Estes mecanismos atuam na combinação de unidades de representação relacionados
ao espaço, ao movimento e às configurações de mão. É importante perceber que a produção
de sinais de representação não é aleatória, pois envolve combinações complexas destas
unidades.
O fenômeno da iconicidade sobre as línguas de sinais tem uma interferência
significativa no léxico da Libras, muito mais do que as onomatopeias em relação às línguas
orais. É possível que em tempos remotos, os seres humanos ouvintes tenham se valido de
onomatopeias para gerar seu léxico, mas isso na Libras, assim como em outras línguas de
sinais, acontece ainda hoje. Ao observarmos os resultados sociolinguísticos, encontraremos
mais subsídios para esta discussão. A seguir, apresentaremos uma análise quantitativa
sociolinguística dos dados coletados, a partir das variáveis sexo, escolaridade e região.
71
Quanto aos dados coletados no município de São Miguel dos Campos, busquei o
telefone de uma escola pública da cidade e eu entrei em contato com o diretor da escola e
combinamos um encontro. Senti dificuldades pelo fato de que a escola não estava muito
confortável em me receber, pois eles não tinham se planejado para isto. Desisti desta
alternativa e pensei em ir na residência destes alunos surdos, que seriam quatro surdos. Eu
obtive informações destes alunos surdos através do diretor da escola na qual eu tinha ido
visitar. Vale salientar que eu precisava entrevistar dois alunos do ensino médio e dois alunos
do ensino superior, por isso, entrei em contato com um amigo para que ele me apresentasse
duas pessoas que estivessem estudando no ensino superior. Com as informações colhidas, eu
tentei o contato pelo WhatsApp e, já que tenho conhecimento de que muitos surdos não têm
uma compreensão muito clara do português escrito, principalmente os surdos dos interiores,
resolvi fazer um vídeo sinalizando e também fiz chamadas de vídeo para conversar e poder
explicar o objetivo das entrevistas com estes alunos
Combinamos de nos encontrar em um mesmo momento, indo com um amigo surdo
em seu carro. Nós fomos de casa em casa e, em cada uma delas, meu amigo filmou a
entrevista com a câmera do meu celular na posição horizontal. No início eu pedi para que
eles assinassem o termo de consentimento livre e esclarecido e em seguida, iniciei a
entrevista. Eu mostrei cada imagem impressa para a câmera e depois para o surdo e pedi para
que ele falasse sobre a imagem, para que assim eu pudesse coletar os sinais dos referentes da
pesquisa. Realizei as entrevistas com as filmagens destes alunos surdos e armazenei todo esse
material por mim colhido.
Um segundo momento aconteceu em Arapiraca com a permissão do diretor Hugo
liberando o espaço da escola para as filmagens. Combinamos um horário e ao chegar à escola,
72
escolhi e organizei uma sala para filmagem. Como não havia alguém para segurar o celular,
utilizamos livros para apoiar o celular. O celular estava na horizontal e tive o cuidado para
que o ângulo captasse a minha sinalização e a do participante, assim como as figuras que eu
estaria apresentando. Pedi para que assinassem os termos e entrevistei um a um. Tive o
cuidado de manter os surdos fora do espaço da coleta, para que eles não tivessem acesso às
figuras antes da coleta e isso interferisse nas suas respostas. Um outro amigo, mais uma vez,
me ajudou a encontrar pessoas do ensino superior, às quais entrevistei em suas casas.
Em Maceió, fui à Escola Estadual Tavares Bastos e realizei o mesmo procedimento
utilizado em Arapiraca. Entrevistei os surdos numa sala sem pessoas assistindo, com a minha
câmera do celular posta sobre livros. Quanto aos surdos do ensino superior, eu já conhecia
alguns, então entrei em contato e fui à casa de cada um deles coletar os dados.
Apresentaremos a seguir os resultados da análise sociolinguística
Antes de apresentar os resultados item por item, se faz necessário considerar a amostra
coletada para análise. Segundo Labov (1972), seria necessária uma quantidade de
participantes maior para ser representativa da comunidade de fala. A quantidade de
participantes desta pesquisa no que se refere a homens e mulheres, e a surdos do ensino médio
ou superior não nos deixa chegar a conclusões efetivas sobre o uso real da Libras pelos surdos
de Alagoas, porém, é possível que encontremos pistas quanto o uso da Libras no estado que,
futuramente, poderão ser investigadas mais a fundo, portanto, entendemos a relevância destes
resultados e deste trabalho como um todo.
AMENDOIM CENTRO
2,5 2,5
2 2
1,5
1,5
1
0,5 1
0 0,5
0
Variante Variante Variante Variante Vairante
1 2 3 4 5
Fonte: elaborado pelo autor (2020) Fonte: elaborado pelo autor (2020)
GOIABA MARACUJÁ
2,5 2,5
2 2
1,5
1,5
1
1
0,5
0,5
0
Variante Variante Variante Variante Vairante 0
1 2 3 4 5 Variante 1 Variante 2 Variante 3 Variante 4
Fonte: elaborado pelo autor (2020) Fonte: elaborado pelo autor (2020)
PONTO DE ÔNIBUS
2,5
2
1,5
1
0,5
0
Variante 1 Variante 2 Variante 3 Variante 4
homem mulher
AMENDOIM CENTRO
3,5 2,5
3 2
2,5
2 1,5
1,5 1
1
0,5 0,5
0 0
EM SU EM SU
Fonte: elaborado pelo autor (2020) Fonte: elaborado pelo autor (2020)
GOIABA MARACUJÁ
4 2,5
3 2
2 1,5
1
1
0,5
0
Variante Variante Variante Variante Vairante 0
1 2 3 4 5 Variante 1 Variante 2 Variante 3 Variante 4
EM SU EM SU
Fonte: elaborado pelo autor (2020) Fonte: elaborado pelo autor (2020)
75
PONTO DE ÔNIBUS
2,5
2
1,5
1
0,5
0
Variante 1 Variante 2 Variante 3 Variante 4
EM SU
Os resultados para esta variável foram mais significativos. Os gráficos mostram que
o uso de cada variante é distribuído de acordo com a região do falante. Com exceção do item
GOIABA, não há sobreposição de uso de variante entre regiões distintas para nenhum dos
outros itens lexicais, indicando harmonia de uso regional nos casos investigados.
Gráfico 12 - VR Amendoim
AMENDOIM
5
4
3
2
1
0
Variante Variante Variante Variante Variante Vairante
1 2 3 4 5 6
Gráfico 13 - VR Centro
CENTRO
5
4
3
2
1
0
Variante 1 Variante 2 Variante 3 Variante 4 Variante 5
Gráfico 14 - VR Goiaba
GOIABA
5
0
Variante 1 Variante 2 Variante 3 Variante 4 Variante 5
Gráfico 15 - VR Maracujá
MARACUJÁ
5
4
3
2
1
0
Variante 1 Variante 2 Variante 3 Variante 4
PONTO DE ÔNIBUS
5
0
Variante 1 Variante 2 Variante 3 Variante 4
Nessa análise, concluímos que as variáveis sociais não são fatores decisivos para a
seleção e uso de variantes específicas dos itens lexicais aqui investigados. Por outro lado, o
fator região incide diretamente na distribuição das variantes por participante, apontando uma
estratificação bem delimitada na amostra em questão.
Vale ressaltar que, se considerarmos as múltiplas regiões, as variantes aumentam
significativamente em quantidade (entre 4 e 6 registros por item) e, mesmo em condições de
região compartilhada, os itens apresentam variantes diversas (de 1 a 3 registros por região),
o que parece afastar os itens da possibilidade de um uso padrão ou predominante. Um fator
que pode justificar esse número de variantes por item é o caráter referencial icônico presente
em línguas de sinais.
78
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
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MACEIÓ-ALAGOAS
M-EM
AMENDOIM
CENTRO
GOIABA
MARACUJÁ
96
PONTO DE ÔNIBUS
H-EM
AMENDOIM
CENTRO
GOIABA
97
MARACUJÁ
PONTO DE ÔNIBUS
M-SU
AMENDOIM
98
CENTRO
GOIABA
MARACUJÁ
PONTO DE ÔNIBUS
H-SU
99
AMENDOIM
CENTRO
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MARACUJÁ
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PONTO DE ÔNIBUS
M-SU
AMENDOIM
CENTRO
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MARACUJÁ
PONTO DE ÔNIBUS
H-SU
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CENTRO
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MARACUJÁ
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PONTO DE ÔNIBUS
M-EM
AMENDOIM
CENTRO
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GOIABA
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PONTO DE ÔNIBUS
H-EM
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AMENDOIM
CENTRO
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MARACUJÁ
PONTO DE ÔNIBUS
ARAPIRACA- ALAGOAS
M-EM
AMENDOIM
107
CENTRO
GOIABA
MARACUJÁ
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PONTO DE
ÔNIBUS
H-EM
AMENDOIM
CENTRO
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GOIABA
MARACUJÁ
PONTO DE
ÔNIBUS
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M-SU
AMENDOIM
CENTRO
GOIABA
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PONTO DE ÔNIBUS
H-SU
AMENDOIM
CENTRO
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GOIABA
MARACUJÁ
PONTO DE ÔNIBUS
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