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GESTÃO EMPRESARIAL

Negociação
e administração
de conflitos

Yann Duzert
Ana Tereza Schlaepfer Spinola
Copyright © 2018 Yann Duzert, Ana Tereza Schlaepfer Spinola

Direitos desta edição reservados à


EDITORA FGV
Rua Jornalista Orlando Dantas, 37
22231-010 | Rio de Janeiro, RJ | Brasil
Tels.: 0800-021-7777 | 21-3799-4427
Fax: 21-3799-4430
[email protected] | [email protected]
www.fgv.br/editora

Todos os direitos reservados. A reprodução não autorizada desta


publicação, no todo ou em parte, constitui violação do copyright (Lei nº
9.610/98).

Os conceitos emitidos neste livro são de inteira responsabilidade dos autores.

1a edição – 2018

PREPARAÇÃO DE ORIGINAIS: Sandra Frank


EDITORAÇÃO ELETRÔNICA: Abreu’s System
REVISÃO: Fatima Caroni
CAPA: aspecto:design
PRODUÇÃO DIGITAL: Loope | www.loope.com.br

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Mario Henrique


Simonsen/FGV
Duzert, Yann, 1972-
Negociação e administração de conflitos / Yann Duzert, Ana
Tereza Schlaepfer Spinola. – Rio de Janeiro: FGV Editora, 2018.

Área: Gestão empresarial.


Publicações FGV Management.
Inclui bibliografia.
ISBN: 978-85-225-2095-4
1. Negociação. 2. Negociação (Administração de empresas). 3.
Conflito – Administração. I. Spinola, Ana Tereza Schlaepfer. II.
FGV Management. III. Fundação Getulio Vargas. IV. Título.

CDD – 658.4052
Aos nossos alunos e aos nossos colegas docentes,
que nos levam a pensar e repensar nossas práticas.
Sumário

Apresentação
Introdução

Unidadede I
O indivíduo e a nova mentalidade

1 | Interações sociais
Conflitos
Competição × cooperação
Barganhas distributiva e integrativa
Coopetição
Assimetria de informações
Teoria dos jogos
Empatia

2 | Perfil dos negociadores


Perfil autoritário
Perfil controlador
Perfil facilitador
Perfil empreendedor
Perfil visionário

3 | Razão e emoção
Escalada simétrica irracional (ESI)
Emoções
Reação-padrão das emoções à mudança
Razão
Racionalidade limitada
Heurísticas

Unidadede II
A metodologia da negociação
4 | Processo de negociação: conceitos e etapas
Negociação
Conceitos básicos
Matriz de negociações complexas
Etapas do processo de negociação
Busca de acordos pós-acordos
Dilema do negociador

5 | Elementos do processo de negociação


Cognição
Contexto/ambiente
Interesses
Opções
Padrão/critérios
Tempo
Concessão
Relacionamento
Poder
Conformidade legal

6 | Formas de negociação
Negociação direta
Negociação via agentes
Negociação via facilitador
Negociação via mediador
Metamediação
Negociação informal paralela
Diálogo multipartite (DMP)
Arbitragem
Juiz: o poder legal
Polícia e força militar

7 | Indicadores
Satisfação/racionalidade
Controle
Risco
Otimização econômica
Ética
Justiça/equidade
Produtividade
Emoções
Impacto e sustentabilidade
Auto-organização
8 | Ética
9 | Cross cultural
Estilos de negociação
Como a cultura afeta a negociação?
Áreas de desentendimentos
10 | Plataforma compartilhada
Conclusão
Referências
Entrevistas, palestras TED e Curso MOOC
Links consultados
Glossário
Os autores
Apresentação

Este livro compõe as Publicações FGV Management, programa de


educação continuada da Fundação Getulio Vargas (FGV).
A FGV é uma instituição de direito privado, com mais de meio
século de existência, gerando conhecimento por meio da pesquisa,
transmitindo informações e formando habilidades por meio da
educação, prestando assistência técnica às organizações e contribuindo
para um Brasil sustentável e competitivo no cenário internacional.
A estrutura acadêmica da FGV é composta por escolas e institutos,
todos com a marca FGV, trabalhando com a mesma filosofia: gerar e
disseminar o conhecimento pelo País. Dentro de suas áreas específicas
de conhecimento, cada escola é responsável pela criação e elaboração
dos cursos oferecidos pela FGV Educação Executiva, criada em 2003
com o objetivo de coordenar e gerenciar uma rede de distribuição única
para os produtos e serviços educacionais da FGV.
Este livro representa mais um esforço da FGV em socializar seu
aprendizado e suas conquistas. Foi escrito por professores da FGV,
profissionais de reconhecida competência acadêmica e prática, o que
torna possível atender às demandas do mercado, tendo como suporte
sólida fundamentação teórica.
A FGV espera, com mais essa iniciativa, oferecer a estudantes,
gestores, técnicos e a todos aqueles que têm internalizado o conceito de
educação continuada, tão relevante na era do conhecimento na qual se
vive, insumos que, agregados às suas práticas, possam contribuir para
sua especialização, atualização e aperfeiçoamento.
Rubens Mario Alberto Wachholz
Diretor da FGV Educação Executiva
Sylvia Constant Vergara
Coordenadora das Publicações FGV Management
Introdução

Este livro é resultado de pesquisas que vêm sendo desenvolvidas há 18


anos na Fundação Getulio Vargas, com a participação de pesquisadores
do Programa de Negociações Complexas, liderado pelo prof. dr. Yann
Duzert. Fruto desse trabalho, foi criada uma metodologia de
negociação, adaptada aos líderes públicos e privados, a qual
denominamos newgotiation – uma nova forma de negociar.
Trata-se de um novo estilo, de uma nova mentalidade, de uma nova
abordagem de negociação, voltada para as lideranças, dentro do
contexto da administração pública e de empresas. Este método é
baseado na matriz de negociações complexas, que compreende quatro
etapas, 10 elementos e 10 formas de negociar, apresentada em inúmeros
seminários acadêmicos e divulgada em algumas publicações acadêmicas.
Alguns artigos foram publicados em coletâneas que contam com artigos
de dois ganhadores do prêmio Nobel (K. Arrow e D. Kahneman), bem
como de colegas da FGV, USC, Harvard, MIT, Stanford, ISCTE,
Escola Superior de Guerra, Escola Superior de Magistratura, Essec,
Rennes School of Business, ESCP, Paris Dauphine, UFRJ e Uerj. Sua
divulgação já se estendeu a mais de 1 milhão de pessoas em todo o
mundo, notadamente na China, Itália, México, EUA, França e Brasil.
“Negociação” é uma palavra de origem latina nega otium (“negar o
ócio”), que significa negar o lazer, negar o tempo livre, negar o prazer.
Estudos mostram que passamos mais de 80% de nossa vida negociando
com a família, vizinhos, colegas, clientes, fornecedores, acionistas,
governo, entre outros. Assim, consagramos grande parte das nossas
vidas a atividades e negócios que, muitas vezes, se assemelham a
verdadeiras “lutas” e, por isso, usualmente, adotamos a expressão
“vamos à guerra” quando vamos negociar.
Por essa ótica, o mundo das organizações e o grande público
percebem a negociação como uma tática de guerra ou jogos estratégicos,
que podem ser jogos políticos, de xadrez, moba, warcraft ou quaisquer
jogos ganha/perde. O ensino de negociação, tradicionalmente, se
concentra em estratégias belicistas, em manipulações e em jogos de
persuasão. A negociação tradicional é, na melhor das hipóteses, definida
como um jogo de poder, de influência, enfim, de tática política. A antiga
escola da negociação torna-se inapropriada e superada, porque o mundo
mudou.
Negociar é gerir risco, informação e decisão. Diante da
complexidade dos dias atuais, as organizações modernas e seus gestores
passaram a ter mais dificuldade para tomar decisões com base na
autoridade e no poder. O mundo das organizações, em permanente
transformação, passa a exigir outro tipo de governança para a superação
de suas eminentes crises. A governança colaborativa proporcionará uma
coordenação melhor sobre a gestão de risco, das informações e da
decisão. As decisões baseadas na racionalidade de uma maioria, na
autoridade de um chefe ou nos jogos de poder, cada vez mais dão lugar à
construção de consenso para a resolução de conflitos.
Há novos poderes dos indivíduos que permitem monetizar lobbies,
quer na defesa de seus interesses particulares, quer na defesa de
minorias, a partir de bloqueios de decisões, sejam eles na Justiça ou na
imposição de regras, normas e posições de poder. Ao mesmo tempo, há
uma dialética pelo fim do poder, dos conflitos de interesses e da força
das redes sociais, que conduzem o indivíduo ao centro das negociações.
A luta “David contra Golias” na nova era digital revela a importância da
transparência, da integridade e da reputação, traduzidas em confiança. A
inovação e a rapidez nas decisões são próprias dessa era digital e da
transparência.
Esse novo estilo de negociação está baseado na confiança e na
eficácia, sobre as quais repousam a elegância moral, a governança
colaborativa, o compartilhamento do prazer pelo debate, da franqueza
amigável, da busca pelo bem comum e da obtenção dos ganhos mútuos,
que formam a identidade do negociador moderno.
O ex-presidente americano Bill Clinton, em seu discurso na UCLA,
em 2014, confidenciou que, enquanto presidente dos EUA, a maioria
dos conflitos que vivenciou teve origem na gestão da identidade. A
experiência tem demonstrado que, quando as identidades das partes não
estão harmonizadas, a despeito da conciliação de interesses, dificilmente
os negociadores celebram o acordo.
Há 30 anos, os professores de Harvard William Ury, Bruce Patton e
Robert Fischer (2014) publicaram o livro Como chegar ao sim, que
apresentava o método de negociação por interesses, por eles
desenvolvido. Esse método representou um ponto de inflexão nas
teorias de negociação até então existentes, pois levava em consideração a
harmonização dos interesses das partes nas negociações.
O paradigma da moderna negociação, abordado neste livro, está
alicerçado no triângulo identidade, interesses e cognição.

• identidade: é o primeiro passo para a preparação da negociação.


Os negociadores devem conhecer uns aos outros, ter foco no
indivíduo, na cultura e nas suas particularidades; buscar
afinidades, visões, jeito de viver e jeito de ser que estabeleçam
uma base de confiança e respeito, constituindo o ponto de
partida;
• interesses: os negociadores identificam seus interesses e os
interesses de cada uma das outras partes, buscando alinhá-los,
conciliá-los e modelizá-los; buscam separar as pessoas dos
problemas, esclarecendo-os de forma racional e controlando as
emoções;
• cognição: os negociadores alinham suas percepções reduzindo o
“gap perceptivo”; buscam compreender o problema, interpretam
o posicionamento das partes, eliminam os ruídos, têm clareza
sobre o contexto e mapeiam o conflito em busca de soluções
vantajosas para todas as partes. Deve-se valorizar o debate para
que novas ideias possam florescer.

A matriz de negociações complexas é uma técnica para condução de


processos de negociação complementar ao método de Harvard. As
diferenças de percepção, de etimologia, de informação e de visão de
risco, próprias dos indivíduos, constituem verdadeiras fontes de conflito.
Harmonizar interesses e individualidades em prol de resultados
ganha/ganha, dependerá da capacidade e da habilidade de comunicação
das partes.
Por outro lado, possuir técnica e praticá-la de nada adianta sem uma
boa mentalidade, sem a capacidade de gerenciar emoções, sem a
compreensão das linguagens oral e corporal, do valor e da integridade.
Deve-se buscar ser simpático, encantar o outro, ter uma estratégia justa,
saber dizer não sem ferir o outro, saber fazer concessões no momento
certo, saber definir quando ser cooperativo, quando ser competitivo,
quando guardar confidencialidades, quando “colocar as cartas na mesa”
de forma transparente, quando ser audacioso, quando se proteger dos
riscos, quando ser conservador e quando economizar recursos. Todas
essas atitudes e comportamentos integram uma nova forma de
inteligência contextual, que tem como base o domínio e a compreensão
das ciências cognitivas, da neurociência e da biologia. Para uma alta
performance em negociação, é estratégico estar atento tanto à nossa
racionalidade quanto à forma como os hormônios afetam nosso
comportamento. A negociação se utiliza das inovações da biologia no
domínio das identidades e dos relacionamentos, perpassando pela
ciência da informação, do risco e da decisão, para oferecer uma nova
visão sobre as decisões conjuntas, que sejam éticas, elegantes e racionais,
favorecendo os ganhos mútuos.
A inovação, gerada a partir de um maior conhecimento da
neurociência e da transformação digital, é essencial para os processos de
tomada de decisão, promovendo uma harmonização justa e inteligente
entre uma decisão e um contexto em um dado momento.
As plataformas colaborativas permitem o compartilhamento de
experiências em um moderno modo de operacionalizar e otimizar a
tomada de decisão, aprendendo com quem já fez. As soluções de
metamediação ajudam os negociadores a não reinventarem a roda e a se
beneficiarem com a experiência das partes envolvidas no processo, de
forma que as negociações convirjam, mais rapidamente, para um ponto
de equilíbrio e de solução.
Como em um formigueiro, em que as formigas se beneficiam do
vestígio químico deixado pela formiga precedente, como guia para
orientá-las ao local do alimento, empresas líderes, como McDonald’s ou
Hewlett Packard, desenvolveram uma plataforma de governança
p g
colaborativa, institucionalizada, com o objetivo de aumentar o
conhecimento (aprender com a experiência dos próprios colaboradores)
e a probabilidade de obtenção de acordos mais racionais, produtivos e
com valor, ampliando assim o “tamanho da torta”.
A cultura tem um impacto direto sobre a forma de negociar, uma vez
que há diferenças com relação a confiança, objetividade, racionalidade,
tempo, formalidade, emoções e posicionamento face à confrontação ou
à evitação.
Porém, apesar de todo o esforço para maximizar as chances de obter
um acordo e criar ganhos mútuos, é importante ressaltar que nem tudo
é negociável, uma vez que, muitas vezes, as questões éticas se impõem.
Mandela, Gandhi, madre Teresa de Calcutá e muitos outros não
aceitaram normas, costumes e legislação “injusta”, e empreenderam, a
despeito de todas as dificuldades e incompreensões, a integridade, a luta
em defesa das leis, os princípios da humanidade e a bondade contra a
barbárie e o obscurantismo. Nelson Mandela, por exemplo, passou 27
anos de sua vida preso, lutando pela reformulação de padrões e da
legislação de seu país, África do Sul, que defendia o apartheid. O prof.
William Ury, em seu livro O poder do não positivo (2007), analisa as
dificuldades e incapacidades que temos em dizer um “não” objetivo, um
“não” da recusa, da resistência às tentações, da manipulação e da
corrupção.
Sua contribuição para um mundo melhor é ser um cidadão, um
homem honesto, no sentido dos direitos universais do homem, com
identidade, reputação, buscando um sentido para seu trabalho. É muito
mais motivador poder contribuir para um mundo melhor, ter
capacidade de discernimento com uma inteligência flexível para
negociar, dependendo do contexto, e para saber decidir o que vale mais
a pena: lutar (greve, entrar com processo na Justiça, denunciar abuso,
fugir, dizer não) ou negociar.
Devemos sempre ter e mostrar uma capacidade de dialogar, de fazer
evoluir os pensamentos, ressalvando que não devemos nos acomodar ou
ser evasivos. A inteligência do negociador está em saber utilizar a
metodologia, a ciência, a técnica e a ética; ao mesmo tempo, reconhecer
as emoções, as identidades, o ser humano, o coração quente e o sentido
da negociação. Esse é o dever do cidadão ético, do homem honesto, do
negociador moderno, de um servidor do bem comum da res publica para
as futuras gerações.
O livro está dividido em duas unidades. A unidade I trata do
indivíduo e da nova mentalidade, abordando temas como conflitos,
competição e cooperação, barganhas integrativas e distributivas,
coopetição, teoria dos jogos, o dilema dos prisioneiros e a empatia.
Nessa unidade serão abordadas a atualidade da aplicação da teoria dos
jogos nas negociações e a antecipação dos conflitos de interesses, com o
objetivo de compreender os apelos da barganha, as motivações para se
negociar ou para se evitar uma negociação. A moralização necessária da
vida dos negócios e a redução dos riscos passam pela compreensão dos
jogos perde/perde, quais sejam: dumping, bolhas especulativas e
precificação racional.
Em seguida, definir-se-á o perfil dos negociadores e suas principais
características: autoritário, controlador, facilitador, empreendedor e
visionário. Ainda, tratando do individuo, Daniel Kahneman (2012), em
pesquisa realizada com Amos Tversky nos conduz a compreender o
equilíbrio da razão e da emoção na tomada de decisão. A um extremo da
razão, discute-se a irracionalidade nos processos de tomada de decisão, e
Max Bazerman (2004) também nos indica atalhos para a tomada de
decisão que são as heurísticas da disponibilidade, representatividade e
ancoragem que, por muitas vezes, nos conduzem a decisões equivocadas.
A negociação trabalha com a inteligência de modelizar o pensamento do
outro, buscando conhecer os interesses da(s) outra(s) parte(s). Deve-se
evitar a escalada irracional de manter-se em conflito por anos, o que, na
maioria das vezes, deve-se a incompreensões, à inveja, à rivalidade
mimética, ciúme e, sobretudo, o querer vencer a qualquer preço.
A unidade II tratará da metodologia do processo de negociação. A
matriz de negociações complexas apresenta o processo de negociação
distribuído em quatro etapas: preparação, criação de valor, distribuição
de valor e implementação. Uma negociação estará ganha ou perdida em
função da qualidade de sua preparação, que impactará todo o processo.
O método oferecerá ao leitor uma checklist para negociar, fundamentada
em 10 elementos: interesses, opções, poder, cognição, tempo,
identidade/relacionamento, concessões, conformidade legal,
padrões/critérios e contexto; 10 formas de negociação, quais sejam:
direta, por agentes, facilitação, mediação, multipartite, informal
paralela, metamediação, arbitragem, judicial e força militar; e 10
indicadores que avaliam qualitativamente o processo de negociação:
satisfação/racionalidade, controle, risco, otimização econômica, ética,
justiça/equidade, produtividade, emoções, impacto e sustentabilidade e
auto-organização. Complementando, cada vez mais o ambiente da
hipermodernidade transforma o processo de negociação, e serão
abordados os aspectos culturais nas negociações fundamentais nesse
mundo globalizado, de enorme mobilidade financeira de indivíduos, em
que se tem de lidar, diariamente, com pessoas de diferentes culturas. A
plataforma compartilhada também transforma o processo de
negociação, transferindo o foco do autoritarismo, da força, da persuasão,
e da malandragem, da “Lei de Gerson”, para um jogo cognitivo ao invés
de um jogo de poder.
Estamos na era da transparência, em que os poderes são divididos,
em que o outro deve ser uma fonte de aprendizado, uma oportunidade
de verificar suas opiniões e crenças. O novo estilo de negociar chamado
newgotiation vem utilizar técnicas que permitem uma nova forma de
liderança sobre os dinossauros da negociação, que usam a “Lei de
Gerson” (tirar vantagem em tudo), a malandragem e a negociata como
modelo de decisão.
UNIDADE I
O indivíduo e a nova mentalidade
1
Interações sociais

Conflitos
As interações sociais em todos os níveis da sociedade, frequentemente
geram conflitos. Os conflitos fazem parte da natureza humana e da
nossa vida, e são estressantes, pois colocam em jogo nosso capital social.
Basta que haja uma diferença de interesses, de opiniões, de
interpretações e de entendimentos nos relacionamentos entre pessoas,
sejam de uma mesma família, de vizinhos, de grupos religiosos, de
esportistas, de organizações, do governo ou dos cidadãos para que o
conflito se instale. Para além dos relacionamentos, a escolha entre
diferentes alternativas, quaisquer que sejam, gera conflitos para a
tomada de decisão. A pergunta que se apresenta é: Qual a alternativa a
ser escolhida? A partir dessa dúvida, estabelece-se um conflito que diz
respeito à necessidade de escolha entre as alternativas.
Frequentemente, em situações de conflito e no próprio processo de
negociação, as emoções, mais do que a razão, interferem em seu
desenvolvimento e resolução.
Buscar a compreensão e a empatia, reconhecer e minimizar as
diferenças, estar com a mente aberta às novas e diferentes ideias para
atender aos interesses das partes envolvidas constituem elementos
fundamentais para a resolução dos conflitos. Essas ações minimizam os
desgastes físico, emocional e financeiro e os custos associados, muitas
vezes desnecessários, tornando a solução mais efetiva e satisfatória para
ambas as partes.

Quem assiste a sessões da TV Justiça percebe que a frase que Rosa Weber
mais pronuncia é: “Eu gostaria de entender seu argumento”. O que,
ademais, mostra respeito aos seus pares interlocutores (Falcão, 2017:3).

Os conflitos são diferenças existentes entre duas ou mais pessoas ou


grupos, caracterizadas por tensão, emoção, discordâncias e polarização,
em que a afinidade é quebrada. Há também conflitos de cunho pessoal,
quando temos de fazer nossas escolhas pessoais para a tomada de
decisão. Nesse caso, a negociação é feita consigo mesmo, avaliando os
benefícios e custos das alternativas para a tomada de decisão.
De acordo com Dubrin (2005 apud Donati, s.d.:6) as relações
conflituosas geram desconforto e estresse. Conforme o autor,

os gerentes alegam que gastam, pelo menos, 20% de suas atividades


no trabalho resolvendo, diretamente, ou indiretamente, os conflitos e
que estes têm conteúdo emocional suficiente para levar as pessoas
envolvidas ao estresse.

Por outro lado, o conflito é um processo de construção e de


sustentação de diferentes percepções e interpretações da realidade.
Dependendo da ótica pela qual enxergamos um determinado problema,
podemos interpretar e depreender diferentes resultados. Quando dois
ou mais indivíduos vivenciam uma mesma situação, se indagados
posteriormente, eles oferecerão diferentes respostas, discorrendo sobre
emoções e razões, de formas absolutamente distintas.
O conflito, quando levado a extremos, produz perdedor(es) e
ganhador(es). Tanto o perdedor quanto o ganhador acabarão perdendo.
O perdedor, tipicamente, sente-se injustiçado, o que o leva a ficar com
raiva e a buscar, no futuro, uma retaliação (revanche). Dessa forma, o
conflito não fica encerrado, fica postergado, pois o perdedor buscará
uma nova oportunidade para “devolver” a “injustiça” que foi cometida
contra ele. O perdedor tentará buscar uma compensação no futuro, e o
ganhador obterá a vantagem no presente.

O prof. William Ury, em uma entrevista, destacou uma regra de ouro em


negociações: “O segredo é conseguir se colocar na posição do outro lado.
Se você busca vencer tentando derrotar o outro, não funciona”, diz. “Você
até terá uma vitória temporária, mas depois de um tempo volta, e aí vira uma
espécie de jogo de pingue-pongue” (O Estado de S. Paulo, 2017).

O conflito, quando não levado a extremos, com o respeito às


diferenças, pode ser uma fonte de ideias novas, de discussões abertas,
permitindo e facilitando a expressão e exploração de diferentes pontos
de vista, interesses e valores.

Competição × cooperação
A negociação é um jogo de forças? Como respondemos aos conflitos?
Podemos iniciar essas questões a partir de dois perfis: o indivíduo
competitivo (quadro 1) e o indivíduo colaborador (cooperativo) (quadro
2). Acrescentamos a essa polarização a possibilidade de sermos
colaboradores (cooperadores) e competitivos ao mesmo tempo, ou seja,
o indivíduo é, por natureza, um ser cooperativo e competitivo. Ser
competitivo não é demérito; a competição é necessária para criar novas
oportunidades, para desenvolver novas técnicas, para ter motivação para
“superar” o oponente, enfim, para evoluir.

Quadro 1
Características dos indivíduos competitivos

• Maximizam seus próprios resultados. • São desconfiados, manipuladores.


• Veem a outra parte como adversária. • Minimizam a partilha de informações.
• Fazem uso do poder para impor • Minimizam as possibilidades de
soluções que lhes sejam vantajosas. concessões.
• Recorrem a ameaças. • Tendem a apresentar menores padrões
• Realizam ofertas irrealistas. éticos que os cooperativos.
• Não são abertos. • Não reconhecem as diferenças.

Quadro 2
Características dos indivíduos cooperativos

• Têm por objetivo uma solução • Raramente ameaçam.


razoável. • Fazem concessões unilaterais.
• Maximizam resultados conjuntos. • Exploram alternativas.
Possuem comportamento afável e • Criam valor para ambas as partes.
• sincero. • Maximizam a partilha de informações-
• Confiam em parâmetros objetivos. relevantes.
• Têm atitude aberta e de confiança.

Como você negocia? Você tem um perfil mais, ou menos


competitivo? Arriscamos afirmar que os indivíduos, em determinadas
situações, podem ser mais competitivos e, em outras, mais cooperativos.

Temos que aprender que precisamos de nossos adversários para competir,


evoluir. A rivalidade tem limites (comentário do jogador de futebol, Diego –
meia do Flamengo – sobre conflitos entre torcidas). (SporTV 12 fev. 2017).

Nesses termos, a competição pode ser e deveria ser sempre saudável.


Imaginemos que não houvesse diferenças, imaginemos que não
houvesse adversários à altura para que pudéssemos aprender com eles!
Não teríamos desafios, motivação, interesse etc.

Barganhas distributiva e integrativa


Há dois tipos de barganhas: distributiva e integrativa.
A barganha distributiva tende a ser mais competitiva quando as partes
buscam o melhor para si mesmas, sem pensar no outro, em jogos
ganha/perde, também denominados jogos de soma zero. Por que soma
zero? Porque quando uma das partes ganha, a outra parte perde. Assim,
pode-se interpretar que houve um ganho para uma parte (+1), que
correspondeu a uma perda para a outra parte (-1), cujo total é igual a
zero (o balanço +1 - 1 = 0). Esse resultado é unilateral, pois somente
uma das partes ganha.
A barganha integrativa ocorre quando as partes tentam tirar algo mais
da negociação. As partes trabalham em conjunto para aumentar o
“tamanho da torta”, havendo, dessa forma, o suficiente para que todos
ganhem. Vejam o exemplo a seguir:
Caso Grécia e Turquia – Ilha de Chipre

Há uma divisão de território. A ONU, por medida de segurança, controla


uma faixa da terra que separa a Chipre grega da Chipre turca. Pode-se
observar no texto a seguir, como a existência de serviços comuns de
esgoto, linhas de celulares pode ampliar o “tamanho da torta”. Cada um
mantém suas áreas, mas ambos ampliam suas possibilidades e
racionalizam custos quando se utilizam de serviços comuns.
Transcrição de parte da reportagem do The Guardian: “[...] Akinci diz que
a mensagem de Ancara é de paz. ‘Eles desejam uma solução e a desejam
o mais breve possível’, insistiu o líder quando foi recebido pelo Presidente
Recep Tayyip Erdoğan, quando de sua visita oficial à Turquia.
‘É nosso destino que os cipriotas turcos e os cipriotas gregos vivam juntos
nesta ilha. O problema de Chipre foi negociado de forma exaustiva. Tudo
isso que é necessário, agora, é determinação, vontade política e uma
sabedoria e visão compartilhadas’.
A busca para resolver a disputa mais longa da Europa, até agora, sempre
falhou na incapacidade das duas comunidades para cederem às questões
espinhosas de governança, território e segurança.
‘O que não podemos ter é uma outra decepção’ declarou Akinci, cuja
eleição, de forma incomum, foi recebida positivamente pelos cipriotas
gregos. ‘Temos que ter cuidado em nossas mensagens. Temos que ter
empatia. Quando nós olhamos para eles, e eles olham para nós, é
importante ver que não somos inimigos, mas sim, futuros parceiros’.
[...] trabalhando com suas contrapartes gregas para estabelecer o que
deve nestes dias ser o exemplo mais notável de reconciliação feito no
passado: um sistema comum de esgoto que atenda a ambos os lados da
zona morta, patrulhada pelas Nações Unidas – Nicosia” (Smith, 2015).

Os jogos cooperativos geram resultados ganha/ganha que são


superiores aos resultados dos jogos competitivos. Um jogo ganha/ganha
é aquele em que o melhor resultado obtido é “bom” para todas as partes,
ou seja, quando todas as partes sentem-se ganhando e satisfeitas com o
resultado. No resultado ganha/ganha, não importa uma divisão 100%
equitativa entre as partes; o que importa é que as partes entendam o
resultado como justo, concordem com ele e se sintam ganhando,
obtendo ganhos mútuos.
As negociações cooperativas são muito mais ricas, pois envolvem
interesses, criam, inovam e distribuem os valores envolvidos e interesses
identificados. Nos jogos cooperativos, a comunicação prévia e a busca
conjunta de dados são recomendáveis.
Na figura 1, depreendemos que os resultados de uma negociação
competitiva ficam restritos à área próxima ao eixo do gráfico, que
corresponde a resultados (0 x 0; 1 x 0; 1 x 1 etc.), ou seja, os resultados
são bastante tímidos quando comparados com os resultados de
negociações cooperativas ou integrativas. Resultados 10 x 0; 12 x 1 não
são tímidos, porém são resultados ganha/perde, insatisfatórios para, pelo
menos, uma das partes.
Na negociação cooperativa, cada jogador vai cedendo,
gradativamente, posições que vão sendo conquistadas pelas outras
partes, e assim, ao invés de se obter um resultado 10 x 0, poder-se-á
obter resultados que sejam mais equitativos, da ordem de 5 x 5 ou 6 x 5,
ou 10 x 11 ou 12 x 14, por exemplo.
Na subseção “Etapas do processo de negociação” (unidade II),
verificar-se-á que as negociações contemplam etapas cooperativas
(criação de valor) e competitivas (distribuição de valor). Da mesma
forma que os indivíduos possuem perfis cooperativos e competitivos, o
processo de negociação será mais bem-sucedido se as etapas cooperativa
e competitiva forem bem exploradas.

Figura 1
Resultados de negociações competitiva e cooperativa
Coopetição
Cunhado por Barry J. Nalebuf e Adam M. Brandenburger (1996), o
termo coopetição foi criado para representar a forma de “colaborar para
competir”. Trata-se de um modelo no qual os agentes cooperam para
criar valor e competem na divisão de valor, a partir do que foi criado. O
paradoxo de competir e cooperar simultaneamente também maximiza
valor para as partes.
Nas negociações, coopera-se sem precisar “ser somente santo” e
compete-se “sem precisar matar a outra parte”, o que pode ser feito por
meio do relacionamento, da partilha de informações, da integração, de
ações de iniciativa comum (por exemplo, uma compra coletiva de
insumos) e da racionalização de processos. A competição é saudável para
pressionar o desenvolvimento de novos produtos e para criar novos
mercados, mantendo a individualidade de cada negócio.
Em resumo, um produto pode se tornar mais valorizado quando
associado a outro produto. Por exemplo, a oferta de um seguro gera
valor, incentivando a venda de um produto, seja um automóvel, um
micro-ondas, por exemplo; a venda “casada” do pires com a xícara, do
terno com a gravata... Quando se trata de competição, não há valor
gerado pela associação de um produto a outro, pois na verdade o que
existe é uma divisão de valor. Vejamos a competição da Pepsi-Cola com
a Coca-Cola, é um jogo ganha/perde, não agregando qualquer valor
para as empresas.
No mundo empresarial, a adoção do conceito de coopetição permite
maximizar o resultado do negócio. De que forma? As empresas obtêm as
vantagens tanto da cooperação quanto da competição, em uma
repartição justa do valor e incentivo à inovação e à diferenciação.

Pepsi vs. Coca-Cola*

“Pepsi e Coca-Cola: um duelo entre gigantes que dura há mais de um


século, a um custo de bilhões de dólares. Pepsi e Coca-Cola: cem anos de
guerra com inigualáveis consequências socioeconômicas, inúmeras vítimas,
espiões, manobras desleais, tréguas e novos ataques. Pepsi e Coca-Cola:
uma guerra de sede em fúria opondo duas multinacionais ultrarricas
determinadas a dominar o negócio de bebidas do mundo” (Simon, 2016).
“Desde que chegaram ao mercado, Coca-Cola e Pepsi rivalizam pela maior
fatia de consumidores, não se limitando aos refrigerantes e estendendo a
briga a segmentos como chás, sucos e energéticos. Acirrada, a disputa se
reflete na mídia na forma de comerciais ousados em que não é raro uma
marca recorrer à Justiça, ofendida com a atitude da outra. Mais comum nos
Estados Unidos, onde a tática é culturalmente mais aceita, a estratégia
provocativa das empresas tem rendido vídeos fantásticos ao público que
admira peças publicitárias” (documentário na RTP Portugal, 2017).
* Coca-Cola criada em 1886 e Pepsi-Cola em 1903.

O sucesso de grande parte das empresas é dependente do sucesso das


outras empresas concorrentes. Em ambientes altamente competitivos,
em que podem surgir novos rivais fortes, a dinâmica das empresas
valoriza a colaboração em coopetição. Cooperar para competir pode
caracterizar-se como um movimento ao encontro de alianças
estratégicas entre as empresas.
Uma aliança estratégica reforça as parcerias. Assim, a coopetição
entre empresas é formalizada por meio de acordos cooperativos, em um
ou vários pontos da cadeia logística. Pode-se considerar, ao lado da
concorrência no negócio, a obtenção de ganhos comuns, como o que
ocorre, por exemplo, na criação de polos comerciais de mesmo ramo de
atividade, tais como:

• polo comercial de tecidos;


• polo comercial de malhas;
• polo comercial de móveis;
• polo de artigos de decoração e casa;
• polo de informática.

Como a coopetição poderia trazer ganho para todos os envolvidos?


Vejamos, a seguir, a aplicação desse conceito nos polos comerciais:
1. compra conjunta de matérias-primas – quanto maior quantidade
comprada, melhor poder-se-á negociar vantagens de preços,
formas de pagamento, custos de entregas, prazos etc.;
2. propaganda conjunta – realização de campanhas conjuntas para
atrair clientes para o polo. Exemplo: campanhas de Natal, de
Carnaval, Dia das Mães. O custo das campanhas seria
compartilhado entre todos os lojistas;
3. atratividade de clientes – a criação de um polo traz sinergia para
os comerciantes. Os indivíduos têm maior propensão a visitar um
polo comercial, uma vez que dispõem de mais alternativas,
muitas lojas para encontrar o produto desejado, melhores preços
e prazos. Se uma loja estiver localizada em uma área de comércio
diversificado, perderá a oportunidade de receber clientes
potenciais, pois um indivíduo sente-se desmotivado a se deslocar
para uma região que possua uma única loja que comercialize o
produto desejado;
4. compartilhamento de economias externas – uma vez constituído
um polo comercial, outros negócios complementares se
instalarão no entorno do polo, oferecendo alimentação,
estacionamento, bancos etc., que facilitarão a vida dos clientes
que visitarem aquela região, incentivando a atração de clientes;
5. parceria na pesquisa e desenvolvimento – compartilhamento de
custos, de ideias, de equipamentos no desenvolvimento de
pesquisas conjuntas, além do ganho de sinergia;
6. racionalização de transporte, compras conjuntas, entre outros;
7. coprodução e joint venture (exemplo: indústria automobilística) –
permitir que empresas com produções complementares se
instalem dentro de seu negócio, compartilhando a infraestrutura.
Por exemplo, instalar na planta de uma fábrica de automóveis um
fornecedor de tintas para pintura dos automóveis (bastante
específica). Esse fornecedor terá a oportunidade de acompanhar
de perto a pintura dos automóveis, adquirindo experiência e
disseminando a técnica de pintura automotiva, características e
manuseio do produto, otimizando os resultados. Trata-se de um
jogo ganha/ganha, no qual tanto o fornecedor quanto o cliente
sairão ganhando;
8. compartilhamento de espaço físico – os comerciantes poderão,
em conjunto, compartilhar uma única área coletiva para guardar
seus estoques, minimizando a necessidade de espaço físico
individual, otimizando espaços ociosos e reduzindo custos. Essa
área tanto pode ser outro espaço externo ao seu negócio como
pode ser a otimização de um espaço ocioso de outro
comerciante.

Em resumo, a coopetição é um conceito relativo ao comportamento


de cooperação competitiva entre empresas, que cooperam para atingir
determinados objetivos e competem na hora de dividir os ganhos. Um
concorrente próspero é menos perigoso do que um concorrente
desesperado.
As empresas devem buscar:

• uma concorrência que não seja destrutiva;


• deixar que seus concorrentes sejam bem-sucedidos como
concorrentes;
• obter ganhos-mútuos com seus concorrentes.
 
No filme O poderoso chefão II, Michael Corleone afirma: “Mantenha seus
amigos perto, mas os seus inimigos mais perto ainda”.

Assimetria de informações
Não há como se conhecer todas as atividades de uma empresa, nem a
intenção, nem o conhecimento de todos os indivíduos. Cada indivíduo
possui um conjunto de informações que difere, em sua maioria, do
conjunto de informações conhecido por outros indivíduos. A
informação é um aspecto fundamental nas relações pessoais, políticas e
econômicas, principalmente em processos concorrenciais.
Muitas vezes, mal-entendidos advêm da falta de informações ou de
informações incompletas, acarretando erros de compreensão e de
percepção. Esses erros conduzem para além do problema a ser
negociado, a outros problemas de ordem pessoal, que acabam minando
o relacionamento e gerando novos conflitos.
Há várias tensões em negociação, tais como: criação e distribuição
de valor, empatia e autoafirmação, mandante e mandatário e sigilo e
transparência (Colson, 2007). Com relação a esta última, pergunta-se: o
que deve ser/estar transparente (exposto); o que deve ser/estar
estrategicamente mantido em sigilo; e o que deve ser gradativamente
tornado transparente As empresas e os indivíduos têm interesses
estratégicos em ocultar as informações a seu respeito, de forma que seus
concorrentes ou interlocutores não se beneficiem dessas informações. O
custo de obtenção das informações relevantes é muito elevado, como é
também alto o custo da manutenção do sigilo.
Nos modelos, em que as partes comportam-se estrategicamente, está
presente a assimetria de informações. Faz-se necessário, assim,
considerar: (i) as informações que cada uma das partes detém; (ii) as
informações que são do conhecimento de todos; e (iii) as informações
que se supõe que os concorrentes possuem uns sobre os outros.
Em resumo, toda negociação tem início com uma assimetria de
informações. Cada uma das partes tem informações limitadas sobre a(s)
outra(s) parte(s). Uma das habilidades a ser desenvolvida é a de reduzir,
estrategicamente, a assimetria de informações, o que pode ser feito por
meio da busca conjunta de dados. Em uma negociação, quanto maior o
número de negociadores/partes, maior será a assimetria de informações,
acentuada pela comunicação deficiente entre as partes.

Eis um exemplo de assimetria de informações

Em uma cena do filme Estrada da perdição, dois assaltantes de banco


travaram um diálogo próximo aos termos a seguir:
• Quanto vou receber pelo assalto ao banco?
• Quanto deseja receber?
• 200 dólares.
• OK, lhe pagarei os 200 dólares.
O assaltante que pediu os 200 dólares ficou intrigado com a pronta
concordância do comparsa e perguntou, em seguida:
• Se eu lhe pedisse 300 dólares, você me pagaria?
• Ah!! Isso você nunca saberá...

Pode-se depreender do diálogo apresentado a assimetria de


informações. A mesma informação não é conhecida pelas duas partes.
Cada indivíduo detém uma parte da informação. Assim, pode-se afirmar
que:

Cada parte tem informações limitadas sobre os verdadeiros objetivos e


interesses da outra parte.
Não é óbvio saber o que se deve oferecer, como oferecer ou como encontrar
o que mais poderá ser oferecido.

Destaca-se a importância de focar no outro, de se colocar no lugar


do outro e tentar perceber todas as possíveis reações suas e as dos
outros, o quanto mais puder. Devemos nos antecipar às reações dos
outros a partir das nossas próprias ações, e essa perspectiva nos permite
descobrir que as chances de sucesso são maiores na posição ganha/ganha
do que na posição ganha/perde.
Ao se preparar para uma negociação, deve-se mapear o
jogo/conflito. Seguem algumas perguntas importantes para esse
mapeamento:

• Quem são os jogadores/negociadores e como eles poderão


maximizar valor?
• Quais interesses são complementares e o que pode ser oferecido?
• Quais jogadores são competidores? Existiria alguma forma de se
beneficiar com a criação de valor?
• O que podemos fazer para alavancar o relacionamento entre
fornecedores e consumidores?
Teoria dos jogos
A teoria dos jogos sistematiza, por meio de modelos matemáticos, o
processo de decisão dos indivíduos que interagem entre si, a partir da
compreensão lógica da situação em que estão envolvidos. A teoria dos
jogos ajuda no desenvolvimento da capacidade de raciocinar
estrategicamente.
Inicialmente, sua aplicação tinha um foco eminentemente
econômico tendo, a partir da década de 1980, passado a ser objeto de
discussão de cientistas e pesquisadores das mais diversas áreas de
conhecimento, tais como: biologia evolutiva, psicologia, neurologia e
modelagem do comportamento de agentes (racionais ou não).
Dependendo da oportunidade de comunicação entre as partes, os
jogos podem ser cooperativos e não cooperativos. Nos jogos
cooperativos, é permitida uma comunicação prévia entre os jogadores,
antes de decidirem a estratégia que adotarão durante o jogo. Nos jogos
não cooperativos, não há comunicação prévia, apesar de poder haver um
conhecimento comum, partilhado pela cultura, convívio social ou
capacidade cognitiva dos jogadores, que dão uma “pista” de como as
partes envolvidas se comportarão.
Se a relação entre indivíduos ou organizações for por tempo
indeterminado, a cooperação acaba se estabelecendo. Por exemplo, se
uma empresa verifica que teria um ganho significativo desrespeitando
uma cláusula do contrato, o fato de saber que a relação entre
contratante e contratada será de longo prazo faz com que a empresa
cumpra corretamente o contrato, mantendo o caráter da cooperação; o
mesmo pode-se depreender com relação ao cartel: se as empresas
cartelizadas cumprem a determinação do cartel de reduzir a produção
para aumentar o preço do produto, todos ganham. Se uma das empresas
contrariar essa orientação e não reduzir sua produção, ela ganhará ainda
muito mais, pois manterá a produção e a venderá com preços maiores,
considerando a escassez que será provocada com a redução da produção
de algumas empresas. Mas se todas as empresas do cartel, dentro de uma
racionalidade possível, resolverem, simultaneamente, contrariar a
decisão, o cartel como um todo sairá perdendo, prejudicando assim sua
estratégia de longo prazo.
O caso a seguir, foi baseado na palestra proferida pelo prof. Michael
Ambühl no TED sobre engenharia da negociação, quando ele apresenta
o conflito das centrais nucleares ocorrido entre Irã e EUA, modelado
com base na teoria dos jogos.

Palestra “Negotiation engineering” – Michael Ambühl – TED 2016

O Irã anunciou que estava trabalhando em uma nova central nuclear em


Darkhovin e declarou seu interesse em desenvolver instalações de médio
porte e explorar novas minas de urânio.
Conflito

O governo iraniano afirmava que o objetivo do programa era desenvolver


centrais nucleares para fins pacíficos.
Os governos dos EUA e de outras nações alegavam que o programa era
um meio para obter armas nucleares e o governo iraniano negava
categoricamente tais acusações.
O Conselho de Segurança da ONU havia adotado três resoluções de
sanções contra o Irã, com o objetivo de pressioná-lo a suspender suas
atividades de enriquecimento de urânio. Os EUA e seus aliados
pressionavam para que houvesse uma quarta resolução desse tipo.
Enquanto o P5+1 (França, Reino Unido, Alemanha, EUA, Rússia e China
– membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU), acrescido
da Alemanha, discutia o conteúdo dessa quarta resolução de sanções
contra o Irã, o governo iraniano se manifestou preparado para reabrir as
discussões sobre a troca de urânio iraniano. As potências ocidentais viam
o acordo como uma forma de retirar do Irã uma boa parte do seu urânio
pouco enriquecido.
Havia uma desconfiança e uma retórica não construtiva.
O prof. Michael Ambühl, que trata do tema Engenharia da Negociação,
apresenta este problema na forma de um modelo matemático, baseado na
teoria dos jogos desenvolvida por John von Neumann e Oskar
Morgenstern. Vejamos a matriz 1, a seguir:
• Flexível: representado pelo desejo de negociar.
• Inflexível: representado pelo desejo de NÃO negociar.
Pode-se visualizar, na matriz 2 que, se o Irã e os EUA modificarem seu
posicionamento de flexível para inflexível, eles ganharão um ponto cada
um; logo, eles não têm nenhum incentivo para serem flexíveis. A
estratégia estável, nesta situação, é a de inflexibilidade, pois ambos
escolheram transferir seus pontos. Assim, a posição 2 × 2 é o equilíbrio de
Nash, uma situação de não negociação, em uma estratégia perde/perde.

Nessa estratégia da não negociação (inflexibilidade), os EUA ampliariam a


quantidade de sanções, no caso de quatro para 80, e o Irã aumentaria a
quantidade de centrífugas de 200 para 20.000. Ambos sairiam perdendo,
ampliando o nível de tensão. Como interromper esse conflito?
Somente fatores externos poderiam modificar esse jogo, por exemplo,
mudanças na presidência americana do presidente Bush para o
presidente Obama; e, no Irã, do presidente Ahmadinejad para o
presidente Rouhani.
As mudanças nos fatores externos poderiam modificar o jogo, mudar as
percepções e os resultados para os dois jogadores. Continuando a análise
apresentada, o aumento das sanções começa a ser sentido pelos
iranianos, que, para minimizar seus efeitos, se dispõem a flexibilizar. Por
outro lado, os americanos tornam-se também mais flexíveis diante da
possibilidade de aumento da quantidade de centrífugas (matriz 3).
A partir desse momento, o Irã percebe que a flexibilização das sanções
contribui para a melhoria das condições da população local e que o
envolvimento político do Irã poderia ser útil para que, algum dia,
alcançassem a estabilização da região.
A partir das mudanças de inflexibilidade para flexibilidade, tanto dos EUA
quanto do Irã, a nova estratégia estável passa a ser a estratégia
flexível/flexível, em uma posição ganha/ganha (matriz 4).

Quando as duas partes tornam-se flexíveis, uma boa solução é possível.


(Ambühl, 2016).

• A matemática pode ajudar a “desemocionalizar” um problema e


melhor atender ao processo. Outros exemplos podem ser citados:
problemas de seleção de funcionários, regulação da migração,
restrição de arsenais nucleares, compra de empresas, concessão
de empréstimos, entre outros.

Dilema dos prisioneiros

O dilema dos prisioneiros é um problema típico da teoria dos jogos,


aplicado à assimetria de informações e representa o dilema das partes
entre cooperar e não cooperar (trair) uma à outra.
Resumidamente, o dilema dos prisioneiros é representado pela
seguinte situação: dois suspeitos, A e B, são presos pela polícia, que não
tem provas suficientes para condená-los. Os dois suspeitos são levados à
delegacia, ficam separados em diferentes salas e a polícia oferece a
ambos o mesmo acordo. É pressuposto que fiquem incomunicáveis, ou
seja, não poderá haver qualquer diálogo entre eles, a partir do momento
em que forem conduzidos à delegacia.
Propostas da polícia:

1. se um dos suspeitos confessar (trair o outro) e o outro


permanecer em silêncio, aquele que confessar sairá livre,
enquanto o cúmplice silencioso cumprirá 10 anos;
2. se ambos ficarem em silêncio (colaborarem um com ou outro), a
polícia só poderá condená-los a um ano cada;
3. se ambos confessarem (traírem o comparsa), cada um será
condenado a cinco anos de prisão.

A figura 2 é a representação gráfica do dilema do prisioneiro que


permite visualizar o cenário de forma integrada, entender as opções e as
implicações para cada jogador (suspeito).

Figura 2
Matriz dilema dos prisioneiros
Como cada suspeito decidirá, sem conhecer qual será a decisão do
outro? Eles estão incomunicáveis. A reação de cada suspeito não é
conhecida por nenhum deles e ambos tomarão decisão
simultaneamente. Como os suspeitos reagirão? Existe alguma decisão
racional a tomar? Qual seria sua decisão? Sabe-se que cada suspeito, se
for o caso de condenação, deseja ficar preso o menor tempo possível, ou
seja, cada um deseja maximizar seu resultado individual (buscar o
melhor resultado para si mesmo). Então, qual a melhor decisão a ser
tomada? Existe uma única decisão racional: trair. Por quê?
Em qualquer uma das hipóteses, sendo suspeito A ou suspeito B, a
escolha da alternativa trair para qualquer um deles seria a melhor
decisão, pois ao “apostar” no silêncio do outro, o suspeito que traiu
ficaria livre e o outro, que foi acusado e tinha ficado em silêncio, ficaria
preso 10 anos, o que ambos evitarão. Ambos teriam igual raciocínio em
trair o outro, pois ambos têm desejo de ser livres, mas se os dois
pensarem assim, os dois suspeitos terão traído e, por conseguinte,
receberiam uma penalidade de cinco anos cada. A atratividade de,
individualmente, se verem livres, os faria decidir pela traição. Logo,
trair é a melhor opção.
Esse é um exemplo do equilíbrio de Nash apresentado no famoso
filme Mentes brilhantes. Pode-se depreender, a partir do dilema dos
prisioneiros, que: (i) criar credibilidade é essencial para evitar a
deserção; (ii) a cooperação traz cooperação e a deserção traz defecção;
(iii) se o jogo for infinito (sem prazo para terminar, como contratos de
longa duração), os indivíduos têm mais motivos para cooperar.
Nos casos de jogos que envolvam mais de duas pessoas (n
indivíduos), em um contexto bastante amplo, as soluções tendem a ser
soma zero ou baseadas no sistema de votação ou na construção de
coalizões, e o poder derivará da possibilidade de “expulsar” o 51o voto
em 100 (regra da maioria). A negociação salarial é um exemplo de que a
solução afeta o salário de muitas pessoas (jogos de n indivíduos),
simultaneamente, gerando impacto para as empresas em “efeito em
cascata”.
A assimetria de informações, representada pelo dilema dos
prisioneiros, pode ser expressa pelo dilema do negociador.

Dilema do negociador

Para criar valor é necessário oferecer informações sobre seus interesses;


porém, revelar seus interesses pode criar desvantagem.

O que significa o dilema do negociador?


O dilema do negociador tem por base uma assimetria de
informações entre as partes que negociam. Ao iniciar uma negociação,
têm-se algumas alternativas:

• alternativa 1: disponibilizar todas as informações para todas as


partes (segredo 0/100%). Se adotada essa alternativa, a parte que
ofereceu as informações ficará vulnerável, pois, de posse das
informações, a outra parte poderá utilizá-las contra a parte que
ofereceu as informações, o que criará uma desvantagem para ela;
• alternativa 2: não divulgar todas as informações durante a
negociação (segredo 0/0%). Se adotada essa alternativa, uma das
partes não permitirá que a outra parte conheça suas demandas,
seus interesses e, assim, a negociação tornar-se-á mais difícil, pois
ficará dificultada a possibilidade de trocas (barganhas), uma vez
que as partes não dispõem de informações umas das outras;
• alternativa 3: disponibilizar estrategicamente as informações
(segredo: ambas as partes liberam estrategicamente). Essa
alternativa reflete o melhor posicionamento, qual seja, oferecer e
disponibilizar as informações estrategicamente, na medida em
que a(s) outra(s) parte(s) também oferece(m) suas informações.
Gradativamente, as partes conquistam as informações umas das
outras, o que contribui para que seja criado um nível de
confiança e credibilidade entre as partes, favorecendo a
barganha.
Disponibilizar estrategicamente as informações significa definir a
prioridade da oferta dessas informações. Por exemplo, é possível
ordenar, por prioridade (estratégica), as informações, definindo quais
serão oferecidas em primeiro lugar (com prioridade zero), quais serão
oferecidas em segundo lugar (com prioridade um), e assim
sucessivamente, dependendo sempre da estratégia utilizada pela(s)
outra(s) parte(s) na liberação de informação. Essa estratégia de liberação
da informação não é formalmente anunciada, mas é percebida pelas
partes, em uma construção silenciosa do entendimento.
Devemos ter a capacidade de ver o jogo pela perspectiva do outro,
para entender os reais motivos, interesses e crenças envolvidos. A essa
capacidade comum de perceber o sentimento dos outros, é o que
denominamos empatia.

Empatia
Os fenômenos relacionados à empatia estão associados às habilidades
cognitivas que facilitam a compreensão interpessoal e que motivam os
seres humanos a agir de forma pró-social, principalmente quando se
percebe o sofrimento ou a angústia de outra pessoa. Trata-se da
preocupação e motivação do indivíduo em agir em prol de outro ser
humano.
Assim, temos empatia quando demonstramos uma compreensão das
necessidades, interesses e perspectivas do outro, sem necessariamente
concordar com ele. A genuína empatia pressupõe a habilidade de
diferenciar o eu do outro.
Negociadores irritados são menos precisos em defender seus
próprios interesses e em julgar prioridades da outra parte, podendo,
inclusive, prejudicar ou retaliar seus interlocutores. Os indivíduos que se
deparam com interlocutores irritados estão mais predispostos a
abandonar a negociação, a erigir barreiras no relacionamento,
conduzindo o processo a uma situação de impasse.
Atuar com empatia evita a raiva, reduz a irritação. Significa observar
uma ação e buscar a compreensão, colocando-se no lugar do outro. Ter
empatia facilita o mapeamento das ações da outra parte, com base na
predição da ação que poderá ser adotada pelo outro.

Prazer na desgraça alheia

Pesquisador defende que alegria pela ruína dos outros é motivada por
comparação social.
Os alemães têm um termo excelente para o prazer perverso em
acontecimentos como estes: schadenfreude (em tradução livre para o
português, “a alegria do mal”). A satisfação derivada do infortúnio dos
outros é o principal foco de estudo de Richard H. Smith, professor de
psicologia da Universidade de Kentucky, nos Estados Unidos. Desde o
ano 2000, o professor publicou cinco livros sobre o assunto, que falam
sobre comparações sociais, inveja e a schadenfreude num contexto
político e de identificação social.
A emoção pode parecer perversa, mas possui uma função adaptativa e foi
tema do novo livro de Smith, The joy of pain: Schadenfreude and the dark
side of human nature (“O prazer da dor: schadenfreude e o lado negro da
natureza humana”). A narrativa tem como base as comparações sociais
que nos permitem avaliar nossos talentos e determinar nossa posição na
sociedade. Elas são tão instintivas que na vida selvagem também se
manifestam. Estudos mostram que macacos e cães medem suas
qualidades por seus pares.
Assim, quando nos deparamos com alguém que é mais amado ou
apreciado do que nós, o nosso instinto é rebaixá-lo ao nosso nível. Se
este desejo ilícito é cumprido por acaso, a schadenfreude aparece.
[...]
“Nós assistimos televisão para adquirir conhecimentos preciosos sobre a
condição humana?”, pergunta Smith. E ele mesmo responde: “Por favor,
nós assistimos para ver aquelas cenas constrangedoras que nos fazem
sentir um pouquinho melhor sobre nossas vidas insignificantes”.
Esse é o combustível das revistas de fofoca. Em uma análise de 10
semanas da revista americana The National Enquirer Smith e Katie
Boucher, psicóloga da Universidade de Indiana, também nos Estados
Unidos, descobriram que a popularidade de uma celebridade era maior
quando havia um artigo tratando de alguma desgraça em sua vida.
O prazer aumenta quando a schadenfreude parece merecida. Uma
pesquisa feita por Benoît Monin, um psicólogo social de Stanford, mostra
que a mera presença de um vegetariano pode fazer onívoros se sentirem
moralmente inferiores. “Os vegetarianos não precisam dizer uma palavra,
a sua própria existência, do ponto de vista de um comedor de carne, é
uma irritante moral”, afirma Smith. Desta maneira, descobrir hipocrisia na
pessoa considerada de mente elevada faz com que o contentamento seja
ainda maior.
Por definições tradicionais, schadenfreude é uma emoção passiva entre
os espectadores que não desempenham funções nas desgraças alheias.
Quando o sentimento inclui a vingança, o termo foge da sua
especificidade. É a falta de participação por parte do testemunho que faz o
reconhecimento da schadenfreude possível: seu alvo secreto caiu e você
não teve nada a ver com isso.
A parte mais polêmica do livro é um capítulo destinado a analisar o que
levou ao surgimento do nazismo na Alemanha. Segundo Smith, a
schadenfreude foi um dos maiores motivadores para o antissemitismo,
que teria surgido como uma tática para rebaixar o objeto de comparação e
afirmar a superioridade ariana. No entanto, o Holocausto foge
completamente da expressão, pois perde o caráter passivo.
Apesar da conotação negativa do termo, Smith afirma que schadenfreude
“não precisa ser demonizada”. Segundo o autor, é melhor abraçar a
oportunidade de saciar nossos lados obscuros do que negar a sua
existência. Enquanto permanece passivo, “a alegria do mal” pode
melhorar a nossa autoestima e servir como um lembrete de que até
mesmo as pessoas mais invejáveis são falíveis – assim como nós
(Aschwanden, 2014).
2
Perfil dos negociadores

Há diferentes perfis de negociadores, e cada um desses perfis, na prática,


impacta a forma de negociar. É importante que possamos identificar o
perfil do indivíduo com quem negociamos, de forma que, ao negociar,
nos comportemos com sabedoria, buscando maximizar os resultados,
mapeando comportamentos e reações e minimizando atritos no
relacionamento. Há que se reconhecer todas as diferenças e saber lidar
com elas.
Duzert e Zerunyan (2016) definem cinco perfis de negociadores com
base em diferentes graus entre a extrema propensão ao risco e a aversão
total ao risco (figura 3). A cada um dos perfis podem ser associados
alguns hormônios que explicam de-
terminadas características do comportamento e as emoções que, por sua
vez, impactarão o processo de negociação. São os seguintes perfis de
negociadores e respectivos hormônios característicos: autoritário
(testosterona), controlador (esteroides), facilitador (estrogênio),
empreendedor (adrenalina) e visionário (serotonina).

Figura 3
Perfis de negociadores
Fonte: Duzert e Zerunyan (2016).

Perfil autoritário
Autoritário é o perfil do indivíduo que é avesso ao risco, que não gosta
de mudanças, não tolera novas ideias, aceitando apenas aquelas que
sejam de sua autoria. Pode-se dizer que o negociador autoritário atua
com base em jogos de guerra. Essas características independem do
gênero (homens e mulheres). É um negociador de difícil trato porque
está sempre disposto a utilizar quaisquer meios para atingir seus
objetivos e, por ser extremamente posicional, prevalece em suas ações a
abordagem ganha/perde.
Possui um comportamento agressivo, competitivo, frio, podendo ser,
tipicamente, cínico e pessimista. O indivíduo autoritário centraliza as
decisões, mesmo em questões familiares; sua visão é autocentrada e
prevalece o EU, sendo ele o centro de seus negócios e de sua vida
pessoal. É uma pessoa proativa, diz-se que com alto grau de
testosterona, hormônio que caracteriza um comportamento agressivo,
antissocial, persistente, de resistência, de “não largar o osso”, e cujas
decisões ignoram os ganhos mútuos, dando ênfase às barganhas
posicionais (ganha/perde).
No dia a dia, é tipicamente aquele indivíduo que não dá voz ao
outro, que paga todas as contas, que lida com bancos e se mostra pouco
solidário, sendo extremamente vaidoso. Se for necessário, para atingir
seus objetivos, é capaz de violar regras éticas e legais para se posicionar
melhor do que os outros. Em geral, esse perfil se ajusta melhor em um
sistema hierárquico de governança, quando o indivíduo possui poder
para punir aqueles que discordam das suas posições e ideias e premiar
aqueles que aceitam suas regras e imposições.
Para atrair e lidar com indivíduos com perfil autoritário, deve-se ser
light, não confrontar, ser desapegado, simples e não comprometido. Os
autoritários precisam ter a palavra final, e um negociador hábil deverá se
posicionar de forma mais neutra, oferecendo ao autoritário a
oportunidade para ele “massagear” seu próprio ego, destacar sua vaidade
e adotar as ideias de terceiros como suas, o que demandará certa
habilidade e desapego das ideias das partes. Não importa a paternidade
das ideias, o que importa é que o autoritário se sinta o autor delas e com
domínio da palavra final, sendo que, para as partes, o que importa é o
acordo final e a execução das propostas.

Nas escolas francesas conta-se uma passagem sobre Talleyrand


(embaixador de Napoleão) e o imperador da Prússia Alexander III, que
ocupou e controlou Paris como território. Para atingir os franceses, o
imperador da Prússia, Alexander III, notificou Napoleão informando que iria
destruir uma importante ponte de Paris sobre o rio Sena. O embaixador
inglês, Eaton, tentou demover Alexander III dessa ideia, mas não teve
sucesso. Assim, Talleyrand entrou em cena, sabendo que o imperador da
Prússia, autoritário, não iria modificar sua posição. Talleyrand mudou o
discurso, utilizando de criatividade e oferecendo uma oportunidade ao
imperador. Talleyrand, em nome do povo francês, convidou sua majestade, o
imperador da Prússia, para vir a Paris receber uma homenagem, batizando
a maravilhosa ponte como “Ponte Alexander III”. A partir desse dia, a ponte
Alexander III manteve-se como uma joia da capital francesa.

O presidente norte-americano Donald Trump tem um perfil


autoritário, conforme se pode observar em duas passagens de seu livro
América debilitada (2016).
Ninguém está me pagando para eu dizer estas coisas. Eu pago do
meu bolso e não estou contemplando lobistas ou quaisquer grupos de
interesses especiais.
Não estou jogando segundo as regras usuais do status quo.
Não sou um político que consulta as pesquisas para ver no que
devo “acreditar” ou o que devo dizer.
Estou falando como são as coisas e indo ao cerne do que penso
que fará a América grande outra vez.
Não sou um diplomata que deseja contentar a todos, mas sim um
empresário que aprendeu que, quando você acredita em algo, não
para nunca, jamais desiste e, se é derrubado, se reergue
imediatamente e continua lutando até vencer [Trump, 2016:19].

Comentando sobre retribuir um jantar na Casa Branca ao presidente


chinês Xi Jinping, Trump declara:

Afirmei que preparar um jantar oficial em sua honra seria


praticamente a última coisa que eu faria. Em vez disso, diria que
estava na hora de tratarmos de negócios e iríamos trabalhar [Trump,
2016:55].

Pode-se observar em suas ações, seu jeito autoritário, competitivo,


desejando ganhar do outro, o foco no elemento poder, a adoção da
estratégia ganhar/perder e da ameaça/recompensa.

Perfil controlador
O controlador é um negociador que também é avesso ao risco e sua
visão é centrada “nele mesmo”, ou seja, no EU, focado nos seus
negócios e de forma muito racional. Ele não deseja o mesmo poder que
o autoritário, mas deseja ter o controle da situação; evita situações de
insegurança, de dúvidas e, para minimizar esses sentimentos, precisa
obter provas de amor, respeito e confiança. Como é um indivíduo
temeroso, ele se baseia em normas, conformidade com as leis e
compliance, como fonte de confiança, além de ter um olhar sobre a
ciência, realidade e fatos, precisando também de provas; sua segurança
advém dos dados, métricas, padrões objetivos claros e da rotina que lhe
garante confiança. Estes elementos são tranquilizadores para ele e
funcionam, reduzindo a alta dose de cortisol que possui; suas ações são
aderentes à justiça social e à prevenção ao risco.
Os controladores temem a inovação, mas a preservam e são
guardiães da racionalidade do grupo. Para se negociar com um
controlador, deve-se ter os pés no chão, ser responsável e lógico, ter
educação e maturidade. Para obter a confiança de um negociador com
perfil controlador, tem-se de demonstrar consideração com suas raízes,
tradições, amor em família e, principalmente, ser seguidor das leis. Ele
busca referências no caráter e no trabalho ético; transparência e
integridade, que precedem a confiança. Para se proteger, tende a ser
agressivo no início das conversas e distante (pouco amigável) com as
pessoas que conhece pouco. Os controladores são mais lentos nas
análises e nas tomadas de decisão, como em um esforço para proteger
sua reputação.
Para se negociar com os controladores é fundamental que o processo
esteja lastreado em padrões, leis, tradição, tempo e contexto, devendo
ser dado um passo de cada vez. Negociar com eles exige paciência,
conhecer o momento certo e oportuno para a obtenção de um resultado
ganha/ganha.
Os controladores são pessoas proativas que introduzem os efeitos
dos esteroides e das estaminas em suas organizações. São abertos à
instituição da dúvida em seus pensamentos, têm um olhar sobre o outro
e buscam líderes em que se espelhar. Em um contexto de incerteza,
tendem fazer um benchmark de outras pessoas e/ou outras empresas,
porém são autores de suas decisões, incorporando informações do senso
comum. Controladores são negociadores sem pressa, são gentis,
meticulosos e realizam muitos cálculos baseados em dados e
informações, buscando o melhor custo/benefício para sua organização.
Como exemplo, temos os indivíduos que precisam da opinião dos
outros, ligados nas redes sociais e ansiosos para ver o like dos amigos em
suas postagens no Facebook. Há uma demanda incessante pela opinião
de outras pessoas, de jornalistas, de formadores de opinião para garantir
a tomada de decisões. No livro La petite metaphysique du Tsunam, Jean
Pierre Dupuy (2005) destaca: (i)  a importância de se perceber o risco
como forma para evitá-lo; e, (ii) que as pessoas mal-humoradas e
meticulosas tendem a fazer um melhor julgamento sobre as coisas do
que uma pessoa alegre e distraída.
Seguem exemplos de comportamentos de controladores que
explicam o clima de incerteza, dúvidas e intranquilidade em que vivem:
um fiscal ambiental que precisa de dados específicos (e neutros) de um
perito para conferir o nível de poluição; um juiz que precisa de uma
prova técnica para poder julgar; um contador do Tribunal de Contas
que precisa conhecer o preço do mercado (como padrão) para verificar
se o preço informado no processo não foi superfaturado; um estrangeiro
que deseja alugar um apartamento em Copacabana e não conhece o
valor do metro quadrado. O controlador é uma pessoa que precisa de
elementos técnicos (neutros) que ofereçam confiança e serenidade; ele
não gosta de achismos, não é romântico com os dados; não gosta de
subjetividade, decide sobre racionalidade, de forma lenta e pouco
emocionada.

Von Kuenheim (ex-CEO BMW) é uma pessoa muito inteligente, mas


passou parte de sua juventude deslocado, na área de controle soviético
da antiga Alemanha dividida do pós-guerra. Essa realidade intensificou
nele o senso de sobrevivência e o tornou uma pessoa profundamente
desconfiada em relação ao que os outros falam ou fazem. Isso fez dele,
também, alguém obcecado por controle e, portanto, com quem era difícil
trabalhar. Mas ele foi um presidente brilhante. Ocupou o cargo na BMW
por mais de 20 anos, o período mais longo de um CEO na história da
indústria automobilística, e levou a produção da empresa de cerca de 200
mil unidades por ano para 2 milhões (entrevista de Bob Lutz ao jornalista
Matthew Budman, publicada na HSM Magazine em 15 fev. 2016).
Harold Poling. Ex-CEO da Ford Motor Company entre 1985 e 1987.
Ganhou destaque na década de 1980 como o chefe de operações de
áreas problemáticas da Ford, e mais tarde como presidente e diretor de
operações da empresa, impondo disciplina financeira no início de seu
mandato. Presidiu fechamentos de plantas e cortes de empregos. A ele
também foi creditado o uso de técnicas de produção japonesas para
reduzir os custos e melhoria da qualidade (Vlasic, 2012).
Perfil facilitador
O facilitador é um indivíduo humanista, com interesse em ajudar, reunir
e interagir com pessoas, sendo um organizador nato. Ele confia nos
indivíduos, aceita as diferenças, busca flexibilidade, harmonia,
transparência e prefere a cooperação à competição.
É um indivíduo que gosta de conversar, de enfrentar desafios
intelectuais, tem o prazer do debate e não se preocupa em rever seus
pontos de vista. Não considera o desentendimento uma fonte de
conflitos, mas sim uma oportunidade de revisar, atualizar e repensar
novos pontos de vista. Diferente do autoritário autocentrado e do
controlador inseguro, o facilitador é mais aberto.
Por força de seu trabalho (esse perfil adapta-se à tarefa de facilitar
reuniões e debates), o facilitador é um líder de equipes, tem prazer em
treinar pessoas, é otimista, aprecia a lealdade, as decisões democráticas,
o compartilhamento de responsabilidades e garante a racionalidade
coletiva; possui a qualidade de ser um bom ouvinte e de identificar os
pontos fortes e fracos de sua equipe. Reconhece valor na integração, na
gentileza e na diplomacia.
Os facilitadores não se preocupam em fazer julgamentos nem
avaliações, como fazem os controladores. Eles não estão predispostos a
culpar ou a punir, como fazem os autoritários, mas preferem pensar em
termos de coevolução e na responsabilidade compartilhada. O dr.
Arthur Levitt Jr., presidente da SEC no período de 1993 a 2001, em
uma entrevista ao prof. Yann Duzert, declarou que, no século XXI, os
CEOs deveriam ter um perfil de diplomatas e facilitadores, uma vez que
reúnem, sob o mesmo guarda-chuva de colaboração, pessoas de
diferentes áreas para governança. Continuando, dr. Levitt analisa que os
líderes na década de 1980 eram, em sua maioria, da área financeira; que
os da década de 1990 eram, preferencialmente, da área jurídica e, para
os anos 2000, os líderes deveriam ser diplomatas corporativos.
O facilitador preocupa-se com o NÓS, que se sobrepõe à visão do
EU como centro do mundo. Esse profissional articula as diferentes áreas
da empresa, desenvolve o relacionamento entre os diversos setores –
comercial, recursos humanos, jurídico, produção, entre outros – com o
objetivo de promover a cooperação e harmonizar e sincronizar as ações
das pessoas e dos departamentos, uma vez que todos possuem diferentes
velocidades de ação, de raciocínio e de percepções de risco em um jogo
ganha/ganha. O facilitador busca definir uma linguagem única, alinhada
com os diferentes setores e atores. Ele tem tolerância, respeito,
capacidade de ouvir e de conhecer; possui abertura para rever posições e
perdoar; é empático, trabalha em equipe e é flexível, em busca de uma
solução mais robusta para os desafios e conflitos.
O papel do facilitador permeia contexto local e a cultura. Sua
proximidade com a comunidade e com seus pares faz dele o melhor
agente de mudança e um melhor facilitador. Tem-se a seguinte lição:
“Em Roma, faça como os romanos”. No facilitador destacam-se os
hormônios estrogênio e a oxitocina, que são hormônios da empatia, do
amor, do serviço, da atenção e da doação. São pessoas que valorizam o
lado afetivo e a conexão e conectividade, próprios de uma sociedade da
transformação digital e da comunicação.

Exemplo

Suponhamos um comprador de um equipamento petrolífero de alto valor


monetário, milhões de dólares. Essa compra envolve inúmeras áreas:
• jurídica: o advogado, percebendo riscos, incluirá no contrato de compra
do equipamento cláusulas de proteção quanto à qualidade, prazos de
entrega, formas de pagamento etc.;
• engenharia: os engenheiros, percebendo os riscos envolvidos, definirão e
acompanharão a especificação do material a ser utilizado, os testes de
garantia do equipamento, a instalação do equipamento para produção,
entre outros;
• financeira: a área financeira analisará o risco do fluxo de caixa e a
viabilidade financeira do projeto.
Não deve haver a dominância de uma área/departamento, não se deve nem
excluir nem manter as informações “escondidas” (sob sigilo). Devem-se
reunir esforços e buscar construir uma plataforma colaborativa de
compartilhamento de experiências, em que o facilitador terá um papel
fundamental no sucesso do empreendimento.
Listamos informações sobre líderes de organizações que melhor
representam este perfil.

Jeff Immelt, ex-CEO da na GE. Introduziu uma abertura amigável para


acelerar as reuniões e aumentar a confiança entre as partes,
denominando essa nova maneira de trabalhar simplification. A partir de
2016, os executivos eram orientados a preparar para as reuniões um
resumo sobre sua participação, em uma única página, para que não
houvesse perda de tempo e pudessem dedicar mais tempo às discussões
que realmente importavam. A implantação desse processo reduziu o
número de reuniões, extinguiu tarefas burocráticas e acelerou as entregas
de novos produtos, em um desafio de “fazer um gigante centenário com
300 mil funcionários e faturamento de US$ 148 bilhões operar como uma
startup” (adaptado de Scherer, 2016).
Cristiano Mantovani, gerente de facilities da Pfizer, implantou o conceito
de alternative workplace solutions (AWS), referência mundial, pautado na
flexibilidade das estações de trabalho, criando ambientes compartilhados.
Com essa iniciativa, a empresa conseguiu alocar 630 pessoas em um
prédio que caberia apenas 550. Como benefício, a iniciativa reduziu o
custo em 35% (entrevista do chefe de operações globais da Pfizer no
Brasil, Cristiano Mantovani, publicada no blog HUMA, em 22 set. 2015).
Rick Wagoner, ex-presidente da GM. Em entrevista à HSM Magazine,
Bob Lutz falou sobre Rick Wagoner: “Sem sombra de dúvida, ele foi o
melhor, o mais equilibrado, o mais ‘fácil’ dos presidentes com quem
trabalhei. Nunca teve uma daquelas ‘doenças de presidente’: nunca se
importou se o avião dele decolava antes ou depois dos outros; não ficava
bolando esquemas para ganhar mais, ou ter mais ações da empresa, ou
receber mais benefícios. Ele só dizia: ‘Nós servimos aos acionistas e
estamos sendo bem pagos para isso’ [...]. Era um executivo que sempre
buscava o consenso. Sabia o que queria e articulava na direção do que
queria, mas, quando as resistências, previsíveis, apareciam, era
excessivamente respeitoso com a opinião das outras pessoas. Nesse
momento, dizia: ‘Bem, eu ainda gostaria de fazer isso, mas, se todos
vocês acham que não é o momento certo ou que não é o que devemos
fazer, talvez não devamos fazer mesmo’. E, então, nada acontecia”
(entrevista concedida por Bob Lutz ao jornalista Matthew Budman,
publicada na HSM Magazine em 15 fev. 2016).
Perfil empreendedor
O empreendedor é um indivíduo que tem uma nova visão sobre o
mundo como testemunha de sua evolução. Ele valoriza suas
experiências, abre novas oportunidades, explora novos conhecimentos,
estabelece metas e dá o primeiro passo rumo ao futuro. O
empreendedor não fica confinado em seus talentos pessoal e intelectual
para desenvolver suas atividades, mas busca mobilizar recursos externos,
ampliando o conhecimento interdisciplinar e a experiência, para atingir
seus objetivos. Os empreendedores veem a organização como um todo –
NÓS –, desejando participação.
O empreendedor faz suas apostas, acredita no que os outros fazem e
busca uma chance/oportunidade para se desenvolver. Ele seduz, tem
charme e garante que outras pessoas olhem para ele; é pioneiro,
animado, criativo e tem muitas ideias.
De acordo com Meredith, Nelson e Neck (1982), os
empreendedores são indivíduos que têm a habilidade de enxergar e
avaliar oportunidades de negócios, fornecer recursos necessários para
estar em vantagem e iniciar as ações apropriadas para garantir o sucesso.
São orientados para a ação, altamente motivados e assumem riscos para
atingir seus objetivos.
O empreendedor tem propensão ao risco e prefere ganhar uma
bolada. Ele quer ser o primeiro a fazer mais dinheiro, a criar mais
oportunidades, a ter, a ensinar – quer ser o pioneiro, o líder e o criador.
Como um investidor em empresas “ponto.com” ou negociador da bolsa
de valores, o empreendedor é um otimista que subestima as chances de
perda e aposta nas chances de grandes ganhos. Ele é guiado pela paixão,
pelo sonho e pelo desafio de criar algo novo, enfim, tem “brilho nos
olhos”.
Ele é dinâmico, motivado e com entusiasmo contagiante; gosta de
distinções, deseja quebrar regras, vive no “fio da navalha” e tem o
espírito de um revolucionário. Pensa no médio e no longo prazos.
Considera os retornos financeiros e o risco, mas não antes do
encantamento pelos seus conceitos, desafios, perigos e paixão pela
aventura. Os empreendedores estimulam o otimismo e a excitação
necessária para promover mudanças; os facilitadores, em seguida,
implementam essas mudanças entre as organizações comunitárias,
cidadãos e stakeholders.
Para os empreendedores, o risco não é necessariamente visto como
uma coisa negativa; pode ser visto como algo lucrativo e um apelo ao
ganho, considerando a probabilidade de perda. São pessoas mais
otimistas, prontas para errar e para arriscar. O inovador, em uma
sociedade em que as margens caem, vai buscar ser o pioneiro, chegar
antes dos outros.
O empreendedor tem um perfil de franqueza amistosa, possui o
prazer do debate, da conversa exploratória, de onde surgirão os
interesses e as opções como elementos. A adrenalina do pioneiro o
motiva, energiza e dá forças para enfrentar a adversidade, o torna
apaixonado pelo que faz e por surpreender. A adrenalina facilita a
criação de laços, da intensidade, do poder da imaginação, do sonhar e de
ter seguidores. Os empreendedores cativam os colaboradores, que
passam a ser seus seguidores, acreditando no negócio, “vestindo a
camisa” e trabalhando com entusiasmo, flexibilidade, liberdade e brilho
nos olhos.
Alguns dos líderes de organizações que melhor representam este
perfil estão listados aqui.

Richard Branson, presidente do Grupo Virgin, pioneiro e com estilo de


vida arriscado. Certa vez, empreendeu uma volta ao mundo em um balão,
demonstrando assim seu impulso. Outra ideia foi promover turismo no
espaço, usando como meio de transporte um foguete. Ele encoraja seus
colaboradores com a seguinte declaração: “Eu acredito em você e vamos
em frente!”, indicando paixão, apostando no indivíduo que veste a camisa,
tudo com muita adrenalina. Seu negócio é como uma religião: “Vamos
fazer”. Ele deseja o brilho nos olhos, o risco, ser o primeiro em ação.
“Empreendedorismo é transformar o que te excita na vida em capital, para
que você possa fazer mais do mesmo e seguir em frente com isso”. ( <ww
w.businessinsider.com/quotes-from-richard-branson-2014-7?op=1>, 2014).
Ray Kroc, empresário. Tinha paixão por inovação, eficiência e uma
incansável busca por qualidade. Associou-se aos irmãos Dick e Mac
McDonald, que tinham um negócio inovador, mas não estavam dispostos
a expandir seu negócio. Ray Kroc comprou dos irmãos os direitos para
que pudesse comercializar o método McDonald’s, fundando em 1955 a
McDonald’s Corporation. Em 1958, a rede de restaurantes fast food já
havia vendido 100 milhões de hambúrgueres. Dez anos depois, esse
número já passava de 1 bilhão. Automação, padronização e disciplina dos
processos foram os diferenciais introduzidos pelo empreendedor. Seu
objetivo era construir um sistema de restaurantes que fosse famoso pela
consistência na comida, alta qualidade e métodos uniformes de
preparação. ( <www.administradores.com.br/noticias/carreira/ray-kroc-o-ho
mem-que-fez-do-mcdonalds-a-rede-de-franquias-mais-lucrativa-do-mundo/
92809/>, 2017).
Romero Rodrigues, empreendedor, fundador do Buscapé, com três
outros sócios. Quando dizem que algo é impossível, ele vai atrás para
provar o contrário. Empreendedor, nunca deixou de acreditar no modelo
do Buscapé, cujo conceito era pegar os preços dos varejistas,
disponibilizando-os ao consumidor, possibilitando a comparação dos
preços encontrados. Quando começaram, a internet ainda não era tão
popular, e os quatro sócios foram chamados de loucos. A companhia foi
envolvida em uma das maiores transações de empresas digitais da
história do Brasil. Em 2009, o conglomerado de mídia sul-africano Naspers
Limites adquiriu 91% do empreendimento pelo valor de US$ 342 milhões,
e Romero Rodrigues continuou como CEO do Buscapé até o ano de 2015.
Ser empreendedor requer percepção, pesquisa, estudo, disposição, e
exige que o indivíduo esteja aberto para errar. O site Buscapé
revolucionou o mercado de varejo online e trouxe novas formas de uso da
internet, além de abrir portas para que outros empreendedores se
arriscassem no mercado. ( <www.ibccoaching.com.br/portal/conheca-histo
ria-de-romero-rodrigues-dono-do-imperio-de-sucesso-buscape/>, 2017).

Perfil visionário
O visionário é o indivíduo que deseja mudar o mundo, introduzir novos
hábitos que modificam valores e novos padrões morais. Ao gerar tantas
mudanças e modificar paradigmas, tornam-se “imortais” no sentido de
que suas inovações, comportamentos e ações continuarão a existir,
mesmo após a morte.
Os visionários fazem concessões, possuem responsabilidade social,
tomam decisões de longo prazo, constroem capacidades, têm
perspectivas e pensam “fora da caixa”; têm o prazer do giving (Clinton,
2017) – oferecendo seu tempo, seu conhecimento e suas oportunidades
aos outros. Oferecer conhecimento não o faz perder poder ou força;
pelo contrário, o faz ser respeitado, receber mais reconhecimento e
conquistar mais relacionamentos.
Para o visionário, o poder é estratégico. São indivíduos pioneiros,
campeões e possuem uma visão de mundo. Estão sempre buscando uma
chance para apostar, daí sua propensão para arriscar, não tendo medo de
ousar; desenvolvem novas regras, metarrotinas, coevoluindo.
O visionário pensa no tempo, no legado e na forma como poderá ser
lembrado. É o símbolo da generosidade, integridade, justiça ou
elegância moral. Em geral, ele está preparado para se sacrificar por uma
boa causa, para as futuras gerações; pensa no longo prazo, na paz, no
progresso e na prosperidade para sua comunidade. Pode ser também um
extremista perigoso e um idealista, para o bem ou para o mal, para quem
os fins justificam os meios.
Não está interessado no relacionamento de curto prazo, não busca
uma satisfação imediata; trabalha com os desafios da sociedade, busca
resolver problemas, não teme a adversidade.
O visionário é mais propenso ao risco do que o empreendedor; é
mais disposto a tomar drásticas medidas para o bem de todos; e é
filantropo. Está preparado para dizer “não” baseado em princípios, se os
princípios servirem à sua causa.
O prof. Yann Duzert, nos últimos 10 anos, realizou uma pesquisa
com seus alunos em diversos países, de diversos continentes, cuja
pergunta era: “Se um extraterrestre viesse à terra e os consultasse, quais
seriam, na sua opinião, os cinco embaixadores da humanidade? Quais
nomes você sugeriria?”.
Independentemente da cultura e do lugar, as respostas mais
frequentes foram: Jesus Cristo, Nelson Mandela, Martin Luther King,
Mahatma Gandhi e madre Teresa de Calcutá.
O que há de comum dentre essas personalidades citadas é o sacrifício
que fizeram para mudar o mundo para melhor. Podemos, assim, inferir
que os indivíduos admiram os visionários, aqueles que “pensam
diferente”. Além das personalidades relacionadas, houve, de forma mais
dispersa, porém em número significativo, a citação de desportistas, além
de Steve Jobs e Bill Gates.
Mandela, por exemplo, por meio de sua liderança esclarecida, criou
um pouco mais de confiança e de interdependência saudáveis entre
negros e brancos e, ao fazer isso, tornou seu país mais resiliente
(Friedman, 2016).

Thomas Friedman, em seu livro Obrigado pelo atraso, apresenta uma


definição de liderança cunhada pelo prof. Ronald Heifetz da Universidade
de Harvard, que define o papel do líder como aquele que “ajuda as
pessoas a encarar a realidade e as mobiliza para promoverem mudanças”.
Prossegue Friedman, indicando a cena do filme Invictus para mostrar o
poder de que o líder visionário dispõe para ajudar a sociedade a encontrar
um caminho para avançar em meio a momentos cruciais que exigem
capacidade de adaptação.
A cena se passa quando, em seu primeiro mandato como presidente da
África do Sul, em 1995, depois de 27 anos preso, Mandela recruta o time
de rugby Springboks para a missão de ganhar a Copa do Mundo de
Rugby de 1995 e para curar as feridas de um país dilacerado pelo
apartheid. Integrado quase que totalmente por jogadores brancos, o
Springboks era um símbolo da dominação branca e os negros torciam
contra, sempre. Quando o novo Comitê de Esportes, liderado por negros,
quis trocar as cores e o nome do time, Mandela intercedeu em favor do
time, defendendo a manutenção de seus símbolos e explicou que fazia
parte da decisão de fazer com que os brancos se sentissem à vontade em
uma África do Sul governada pelos negros. Disse Mandela: “Isso é um
pensamento egoísta. Isso não atende aos interesses da nação”.
Referindo-se aos brancos, Mandela acrescentou: “Temos que surpreendê-
los com compaixão, comedimento e generosidade”.
Finaliza Friedman: “Não há melhor maneira de mudar uma cultura do que
contar com um líder disposto a surpreender partidários e adversários se
colocando acima da sua história, de seus eleitores e de seus
especialistas, em pesquisas de opinião e, simplesmente, fazendo as
coisas certas para o seu país” (Friedman, 2016:363-364).
A visão de Steve Jobs tornou-se sinônimo de cultura para todos; sua
ideia era de que todos deveriam ter um computador pessoal. Já Bill
Gates colocava foco no desenvolvimento da indústria de software. Ambos
viveram em uma mesma época e somaram esforços em um jogo
ganha/ganha, desenvolvendo computadores pessoais e softwares para
consumo de massa.
Como disse Steve Jobs em seu famoso discurso como patrono em
uma colação de grau na Universidade de Stanford, em 12 de junho de
2005 <www.youtube.com/watch?v=DcqwkdTvTzs>:

Você deve acreditar que os pontos o conectam com o futuro, pois


ligar os pontos somente é possível olhando para o passado. Você deve
acreditar em algo [...] Acreditar que os pontos se ligarão estrada afora
o que dará confiança para você seguir para longe do caminho
esperado e isso fará toda a diferença. [...] Tenha a coragem de seguir
seu coração e sua intuição, pois de alguma forma, eles já sabem o que
você deseja se tornar.

Os visionários introduzem novos comportamentos, novos hábitos.


Simon Sinek (2009) indica que devemos sempre começar uma
negociação com um “por que razão”, que representa um propósito, um
sonho, um estilo de vida, um humor e uma sensação. Por exemplo,
quando se compra uma motocicleta Harley Davidson, não há uma
preocupação com o preço da moto, mas busca-se um estilo de vida que
está associado a ela; ao que a Harley Davidson representa no
inconsciente coletivo: a “liberdade”, o “easy rider”, enfim, é uma marca
poderosa.
A Apple também “explora” sua marca com mensagens de sonho,
contexto, longo prazo, proposta, cultura, um novo jeito de ser. Steve
Jobs provocou a disruptura do mercado de música com o iPod e o iTunes
em 2001; o iPhone em 2007; e a App Store em 2008. Cada indivíduo
desejava esses produtos, pois representavam status, um novo jeito de ser
enfim, integrando-os a uma “comunidade cool”.

Jeito de ser
A adesão a uma ideia, a uma causa, a um porquê. Por exemplo, a adesão
dos indivíduos aos produtos Apple (iPod, iPad, iTunes, iCloud etc.) é
lastreada pela ideia de que portar esses equipamentos e fazer uso dessa
tecnologia representam um jeito “cool e clean” de ser.
Este é o sentido dessa “comunidade Apple”: justificar a razão de estarmos
neste lugar, lutando por esses interesses, todos juntos. Se nos
posicionarmos em uma negociação com um perfil de ter um propósito bem
definido, sendo capazes de inspirar pessoas e organizações a agir,
poderemos definir o desafio conjuntamente, na busca de uma solução
conjunta.

As perguntas “como?” e “o quê?” constituem as partes lógicas da


negociação. A pergunta “por que razão?” já é muito mais subjetiva.
Destaca-se, nesse perfil, o hormônio serotonina, que oferece um
senso de realização, uma sensação de felicidade como aquela de quando
se recebe um prêmio, os sentimentos de prazer e de otimismo.
Um visionário da tecnologia, Bill Gates sempre pensou à frente.
Segundo ele, a magia dos computadores nada tinha a ver com hardware,
mas com códigos de software. A ideia dele com seu amigo Paul Allen foi
criar softwares para computadores pessoais. Segundo Isaacson
(2014:481):

Mais que isso, estavam dispostos a alterar o equilíbrio de forças na


indústria emergente, para que o hardware se tornasse mercadoria
intercambiável, enquanto aqueles que criavam os sistemas
operacionais e os aplicativos ficassem com a maior parte dos lucros.

Segundo Bill Gates, em entrevista a Isaacson (2014), refletindo sobre


suas inovações, “foi a ideia mais importante que já tive”. Gates já previa
a invenção dos smartphones, como também o poder da rede como
instrumento de engajamento social. Hoje estamos na era da colaboração
e do uso da rede como poderosos instrumentos de engajamento a
causas, movimentos, manifestações e marcas.

Entrevista com Steve Jobs e Bill Gates


Qual foi a contribuição que cada um de vocês deu para a indústria do
computador e da tecnologia? Bill Gates responde sobre Steve Jobs e vice-
versa.
Steve Jobs: Bill estava focado sobre a importância do software antes que
quase todo mundo desconfiasse que, o que era realmente importante, era
o software.
Bill Gates: Jobs fez com que em 1977 a Apple II fosse uma máquina
destinada ao consumo de massa, Só a Apple apostava nisso. [...] a Apple
correu atrás do sonho de que este seria um fenômeno de possibilidades
incríveis. [...] Steve criou uma empresa que estava à frente de seu tempo.
[...] Steve voltou à Apple e incentivou inovações e assumiu riscos que
foram fenomenais. [...] A maneira como ele faz as coisas é mágica.
Programa Globo News Documento (2011).

Outro líder de organização que representa esse perfil é Lee Iacocca.

Lee Iacocca nunca seria presidente executivo da Ford. Henry Ford II certa
vez sentou-se com ele e disse: “Veja, Lee, eu simplesmente não gosto de
você e não o vejo liderando a empresa”.
Se Iacocca não tivesse deixado a Ford, nunca teria chegado à presidência
de uma organização. Ele alcançou o topo na Chrysler porque a empresa
estava em uma situação parecida com a da Apple quando chamou Steve
Jobs de volta. Eles precisavam de alguém agressivo, que poderia fazer as
coisas acontecerem, não importava sua personalidade (entrevista
concedida por Bob Lutz ao jornalista Matthew Budman, publicada na HSM
Magazine em 15 fev. 2016).

Outros líderes que se destacam como inovadores/visionários do


nosso século: Steve Jobs, Jeff Bezos, Mark Zuckerberg, Jeff Immelt,
Elon Musk, Mark Benioff, Larry Ellison. No século passado, tivemos
ícones como: Walt Disney, Edward Land na Polaroid, Henry Ford, Lee
Iacocca na Chrysler, Jack Welch na GE e Alfred Sloan na GM.
3
Razão e emoção

Escalada simétrica irracional (ESI)


A escalada simétrica irracional (ESI) tem uma forte relação com o
poder. O melhor exemplo para a ESI é o que ocorre em um leilão.
Em um leilão, o leiloeiro oferece aos participantes/interessados, um
bem por um determinado valor inicial (valor de abertura do leilão). Os
interessados pelo bem iniciam suas ofertas. No início do leilão, em
geral, há uma grande competição entre os vários interessados e, à
medida que o valor das ofertas vai aumentando, o número de
participantes interessados vai diminuindo, devido aos valores dos lances,
cada vez mais altos, restando, ao final, apenas uns dois ou três
interessados no bem e dispostos a pagar valores mais altos. A partir
desse momento, a competição se acirra entre os dois últimos
participantes. Na maioria das vezes, a competição extrapola o racional,
passando a ser uma competição de poder. Quem pagará mais pelo bem?
Muitas vezes, os valores ofertados nos lances são tão altos que
“descolam” do valor real do bem. A competição entre estes dois
interessados reflete a demonstração de poder financeiro, representado
pelo poder de compra de um bem, por um valor muito alto, em um
processo de competição “irracional”, movido apenas por emoção, poder
e status.
Tem-se, então, que o ganho potencial, acoplado à possibilidade de
vencer e, principalmente vencer o outro, é razão suficiente para que os
interessados se mantenham no leilão. Os competidores só abandonarão
o leilão quando tiverem a crença de que o resultado poderá ser
catastrófico (se é que conseguirão perceber isso).
Em negociação, os tomadores de decisão devem aprender a
identificar armadilhas, que são mobilizações emocionais que os
envolvam em escaladas de competição de poder; devem também
desenvolver estratégias que desencorajem um comportamento de
escalada por parte de seus competidores.
Nos exemplos a seguir, verifica-se que exigências extremas das partes
as conduzem à escalada simétrica irracional.

Exemplo 1: Na indústria
O exemplo da ESI na indústria é o dumping, quando uma empresa
resolve oferecer produtos a preços abaixo dos preços de mercado,
inclusive com preços abaixo do seu custo, optando por trabalhar com
prejuízo, somente para ganhar market share, ou competir “deslealmente”
com empresas concorrentes. A Lei Antidumping evita a escalação
irracional.

Exemplo 2: Batalha pela pensão dos lhos em uma separação


Em cada uma das situações apresentadas, as partes fazem exigências
extremas. No caso da batalha pela pensão dos filhos, se perguntado aos
pais, eles declaram que jamais desejariam prejudicar seus filhos e que os
amam muito. Então, por que essa briga? Na verdade, a briga está
associada à discórdia pessoal entre os pais, tendo mais a ver com “dor de
cotovelo” do que com a intenção de gerar prejuízos aos filhos. Esta
disputa torna-se, assim, irracional.

Exemplo 3: Greves
As greves podem paralisar a produção trazendo sérios prejuízos à
empresa, inclusive comprometendo maquinário (usinas). Trabalhadores
fazem piquetes na porta das fábricas para impedir o acesso dos colegas
às instalações. Nas atividades essenciais, como segurança, hospitais e
transporte, a greve tem regulação específica.

Exemplo 4: Mercado de ações (Finanças comportamentais..., 2015)


O mercado de ações tem comportamento próprio, semelhante ao das
pessoas: oscila entre a depressão e a euforia, tem humor próprio,
dependendo do dia, suas reações são diferentes, funcionando como se
reagissem com uma psicologia própria.
Como se explica quando o mercado se movimenta em alta ou em
baixa, e os investidores se comportam como “efeito manada”, ou seja,
seguindo uns aos outros, como se não soubessem para onde, nem por
qual razão estão agindo daquela forma. O “efeito manada” nos
mercados, que é traduzido por “se alguns estão indo, vou atrás”, ocorre
quando os investidores supõem que lhes faltam algumas informações
que outras pessoas podem possuir, e assim, irracionalmente, seguem o
impulso de se comportar como a maioria, sem pensar, ou seja, por
reflexo.
No caso do mercado acionário, estudos em finanças
comportamentais mostram que investidores tendem a valorizar opiniões
elaboradas a partir de pequenas amostras de dados, ou mesmo fontes
individuais. Estudos indicam: que os investidores tendem a atribuir
habilidade ou talento, ao invés de sorte, a um analista que escolheu uma
ação lucrativa; que as crenças dos investidores não são facilmente
abaladas; e, que os investidores possuem um excesso de confiança em
seus julgamentos e tendem a discutir um único detalhe, ao invés do que
é mais óbvio.
Assim, as decisões irracionais refletem uma confiança em vieses
intuitivos que desprezam as possíveis consequências. Quanto mais
importante a negociação, mais o negociador pode tornar-se irracional.
Quanto mais irracional for a atitude, maior a quantidade de emoções
envolvidas, maiores os bloqueios físicos e emocionais para ouvir e
compreender qualquer argumentação ou ponderação,  e  mais difícil
persuadi-lo. Na irracionalidade, a emoção toma conta do indivíduo e as
palavras tornam-se inúteis.

Richard Thaler, economista, ganhador do prêmio Nobel de Economia


em 2017

O campo de estudo do prof. Thaler é o de finanças comportamentais, que


busca combinar a teoria psicológica comportamental e cognitiva com
finanças e economia convencionais, para explicar as razões pelas quais
as pessoas tomam decisões irracionais.
Prof. Thaler tornou-se um especialista em analisar criticamente a teoria
econômica tradicional, em que o homo economicus, idealizado por essa
economia, toma decisões baseado na razão. Ele buscou substituí-lo pelo
homo sapiens, que é real, sujeito a emoções e escolhas irracionais. Em
suma, os trabalhos do prof. Thaler buscam analisar o homem como ele
realmente é, e não como ele deveria ser.
Exemplo (adaptado de Bolle, 2017):
Por que o não cumprimento de metas de um governante é melhor ou pior
do que o cumprimento de metas de seu sucessor? Por que um programa
de um governante é melhor ou pior do que o mesmo programa de outro
governante?
“As respostas dependem de um juízo de valor, de alianças ou aversões
políticas que transcendem os números, os fatos, somos irracionais de
modo previsível. Nossa anormalidade segue, quase sempre, em linha reta.
Somos humanos e previsíveis quando conhecidas nossas paixões e
fidelidades. A matemática e a estatística são condições necessárias, mas
não suficientes.”

Emoções
Negociadores, tipicamente, focam em estratégia, táticas, ofertas e
contraofertas, e não dão atenção suficiente às emoções que os afetam em
uma negociação (Brooks, 2015).
Pesquisas mostram que podemos controlar nossa ansiedade, raiva,
excitação, desapontamento e arrependimento no decorrer de um
processo de negociação, o que poderá trazer melhores resultados. Por
outro lado, há uma preocupação de que as emoções não podem ser
demonstradas ou ficar expostas, pois poderão ser interpretadas como
sinais de fraqueza e fragilizar o poder de barganha. As emoções têm o
poder de influenciar o processo e o resultado da negociação. As emoções
são obstáculos ao raciocínio claro e racional, mas fazem parte da
negociação.
O prof. Daniel Goleman, em seu livro Inteligência emocional (2005),
pesquisou cerca de 180 modelos de competência em 121 organizações,
nas quais identificou que 67% das habilidades consideradas essenciais
para um desempenho eficaz estavam ligadas às competências
emocionais.
São qualidades que caracterizam a inteligência emocional:
consciência de nossas emoções e de como elas afetam os outros,
capacidade de regular nosso ânimo e nosso comportamento, empatia,
motivação para atingir metas pessoais significativas e fortes habilidades
sociais, que nos ajudam a obter o que desejamos dos outros, e
capacidade de encontrar interesses comuns.
Na experiência humana é comum utilizarmos o termo emoção para
descrever um estado de sentimentos, mas a emoção é muito mais
complexa. A comunicação emocional pode beirar o conflito em
situações extremamente sensíveis.
A comunicação pode ser realizada por meio de linguagem oral e
corporal (não verbal). A linguagem não verbal, utilizada em cerca de
70% de nossas comunicações, pode ser percebida pela entonação e
intensidade da voz, expressão facial, gestos e posturas. Os músculos da
face se contraem de diferentes formas, representando diferentes
emoções: felicidade, medo, nojo, tristeza, surpresa, desprezo e zanga. O
prof. Paul Ekman, da UCLA, vem pesquisando sobre esse assunto,
tendo sido, inclusive, consultor da série Lie to me e autor do livro
A linguagem das emoções (2011).

Figura 4
Expressões faciais frente às emoções

Medo Surpresa
Sobrancelhas sobem. Boca aberta.
Aparece o branco do olho. Maxilar tomba.
Lábios crescem no sentido das orelhas. Pálpebras superiores mais erguidas.

Nojo Raiva
Enruga o nariz. Lábios apertados.
Lábio superior se eleva. Sobrancelhas abaixadas e unidas.
Desprezo Tristeza
Canto da boca enrijecido e pouco erguido. Olhar direcionado para baixo.
Canto interno das sobrancelhas sobem.
Cantos da boca abaixam.

O quadro 3 apresenta algumas reações que deixam transparecer


nossas emoções e respectivas reações corporais.

Quadro 3
Reações e sinais corporais
Reações Sinais

Apreensão e nervoso • limpar a garganta • ficar se mexendo


• barulho de moedas no bolso • transpirar

Implicar ou criar suspeição • mexer nas unhas • morder os lábios


• mexer nas orelhas • olhar para longe
• impaciência

Autoritarismo • colocar as mãos para trás • apoiá-las na lapela

Quais são as emoções? A seguir, distinguiremos algumas emoções,


positivas e negativas.

Quadro 4
Emoções positivas e negativas
Emoções positivas Emoções negativas Emoção neutra

Felicidade Raiva e medo Surpresa


Amor Ansiedade e vergonha
Orgulho Tristeza e depressão
Desgosto, desprezo e inveja.

Em nosso dia a dia, buscamos maximizar a experiência das emoções


positivas e minimizar a experiência com as emoções negativas.
O prof. Robert Plutchik (1927-2006), psicólogo norte-americano,
desenvolveu a teoria psicoevolucionária da emoção, criando a “roda das
emoções”, identificando oito emoções primárias: raiva, medo, tristeza,
nojo, surpresa, curiosidade, aceitação e alegria. Destas, derivam diversas
outras emoções secundárias, com variadas intensidades, como pode se
observar na figura 5.

Figura 5
A roda das emoções de Plutchik

Fonte: Plutchik (2003).

Para uma compreensão melhor, estão relacionadas algumas emoções


associadas às situações sentidas. É interessante notar que alguns
sentimentos estão associados ao passado; outros, ao futuro (ao porvir).

• felicidade: algo de bom aconteceu, pede comemoração;


• tristeza: algo de ruim aconteceu, pede lamentação;
• medo: algo de ruim poderá acontecer, pede preparação para
enfrentar e proteção contra esse medo;
• entusiasmo: algo de bom poderá acontecer, pede esforço para se
atingir o que se deseja;
• gratidão: quando acreditamos que alguém deixou de cuidar de
seus próprios interesses para fazer algo de bom para nós, pede
agradecimento;
• raiva: quando acreditamos que alguém nos tenha prejudicado de
forma inapropriada, pede reclamação. Exige um esforço para
restabelecer limites que foram violados;
• culpa: quando acreditamos que fizemos algo inconsistente com os
nossos valores. É representada pela raiva dirigida a si próprio.
Exige um pedido de desculpas e um esforço para corrigir.

É importante que se possa fazer uma leitura sobre o estado


emocional e circunstancial dos indivíduos que estão na mesa de
negociações, mesmo que os conheçamos bem. Como será que estão se
sentindo? O que estão pensando? Como estão vendo as coisas no
momento da discussão?
Para reconhecer que estamos em conflito é necessário reconhecer
que fomos mobilizados emocionalmente. A intensidade das emoções
varia ao longo do processo. Por exemplo, pesquisas do prof. Allred
Keith (2016) da Faculdade John Kennedy de Administração Pública de
Harvard, indicam que a raiva: influencia a percepção de risco e a
preferência das pessoas; nos conduz a comportamentos de risco, à
competição, na maioria das vezes predatória; reduz ganhos agregados;
diminui a colaboração; intensifica o comportamento competitivo; e
aumenta a taxa de rejeição das propostas. A irritação demonstrada pelo
outro frequentemente nos ameaça, pois tendemos a achar que o outro é
mais poderoso e forte do que nós.
A irritação e a raiva prejudicam o processo de negociação,
exacerbando o conflito, enviesando as percepções e aumentando a
predisposição para o impasse. Os negociadores irritados e raivosos são
menos precisos do que os neutros, podendo prejudicar ou retaliar as
outras partes.
Devemos estar atentos a algumas habilidades básicas associadas às
emoções:

• ter consciência do momento em que estamos ficando


emocionados, antes de falar ou agir;
• avaliar nosso comportamento quando nos emocionamos, ao
atingir nossos objetivos sem prejudicar outras pessoas;
• tornar-se mais sensível em relação à maneira como os outros
estão se sentindo;
• usar cuidadosamente as informações que adquirimos a respeito
do sentimento dos outros;
• ter consciência de que cada emoção gera um padrão único de
sensações em nosso corpo, principalmente na fisionomia e na
voz.

Reação-padrão das emoções à mudança


Quando somos afetados emocionalmente, apresentamos diferentes
reações, dependendo do nosso momento, do tipo de emoção, da nossa
sensibilidade, entre outros fatores. Por outro lado, face a um anúncio de
alguma notícia que nos atinja emocionalmente, positiva ou
negativamente, tendemos a apresentar um comportamento emocional
que se assemelha ao que é apresentado na figura 6. Nesse momento,
cada um de nós vive um “tobogã” de emoções. Tomemos como exemplo
a notícia de nossa demissão do trabalho (anúncio de mudança).

Figura 6
“Tobogã” de emoções
A partir da notícia da nossa demissão, que nos causa grande impacto
e que representa uma significativa mudança em nossa vida,
imediatamente reagimos emocionalmente. Inicialmente, ficamos
imobilizados com a notícia, ficamos sem palavras; em seguida, tendemos
a negar o ocorrido: “Não acredito! Não é possível! Por quê? Logo
eu?...”. Passada essa indignação e questionamentos, ficamos com raiva:
“Foi injusto! Eu sempre me dediquei! Eles não reconheceram o meu
esforço!...”. Na emoção de oposição, depois da raiva, desejamos não
colaborar com ninguém, buscamos dificultar tudo o que pudermos e, em
seguida, caímos em depressão. Nesse momento, passamos a refletir: “É
verdade! O que vou fazer agora? Como vou me virar? O que vou dizer
para minha família?...”; na próxima etapa “checamos” o que ocorreu,
tiramos dúvidas e, já com a emoção reduzida, passamos a pensar mais
racionalmente, até o momento em que percebemos que não há volta, e
que “só nos resta então aceitar e pensar: vida que segue”.
Assim, pode-se observar que os conflitos são emocionalmente
definidos e a intensidade das emoções variam ao longo do processo.
Ameaças à identidade produzem emoções (por exemplo: vergonha,
orgulho, culpa, raiva) fortemente associadas à escalada do conflito.
Acontecimentos que provocam emoções são os mesmos que
desencadeiam e definem o conflito. Para reconhecer que estamos em
conflito, é necessário reconhecer que fomos mobilizados
emocionalmente. Emoção e conflito resultam da percepção de que algo
importante e pessoal está em jogo.

Razão
Prof. Daniel Kahneman, prêmio Nobel de Economia em 2002, em seu
livro Rápido e devagar (2012), apresentou estudos que indicam que as
pessoas tomam decisões baseadas em questões objetivas e são
igualmente influenciadas por suas emoções, crenças e intuições. Ele
distinguiu dois sistemas que norteiam o nosso comportamento na
tomada de decisão: sistema 1 e sistema 2.

Sistema 1 – intuição

Quando acionado o sistema 1, as decisões são tomadas rapidamente, as


ações são mais automáticas, intuitivas e sem esforço, mais difíceis de
controlar, de modificar, e são baseadas em nossa memória associativa
(sistema rápido). A maioria das escolhas e dos julgamentos é feita
intuitivamente. Temos como exemplos: jogar futebol, fazer previsões ou
tirar conclusões exageradas sem ter evidências suficientes para isso,
dirigir um carro quando não ficamos, a cada minuto, raciocinando em
como devemos dirigir, nem se há tempo para atravessar a rua. No
sistema 1, tendemos a superestimar nossa compreensão do mundo e
subestimar o papel do acaso.

Sistema 2 – razão

O sistema 2 é responsável pela reflexão, racionalização e solução de


problemas complexos. É mais lento, serial, deliberadamente controlado,
regulamentado e acionado quando nos encontramos em uma situação
que exige concentração (sistema devagar). Quanto mais informações o
indivíduo possuir, mais habilitado estará para tomar decisão. As
informações e fatos ajudam a criar alternativas, argumentos e estratégias
para “convencer” a outra parte (Kahneman, 2012). A dúvida,
representada por se ter a consciência de existirem pensamentos
diferentes sobre uma mesma coisa, é um fenômeno próprio do sistema
2.

Figura 7
Características dos sistemas 1 e 2

As regras que regem a intuição são similares às que regem a


percepção.

Racionalidade limitada
A racionalidade limitada é um modelo comportamental proposto por
Herbert Simon (1984) para analisar o processo de tomada de decisão
que, segundo o autor, está limitado a três dimensões: a informação
disponível, a limitação cognitiva da mente individual e o tempo
disponível para tomada de decisão. Assim, as pessoas criam modelos
simplificados para a resolução de problemas, de acordo com seu próprio
modus operandi. Premissas já definidas, como o “pensar dentro da caixa”,
constituem barreiras mais críticas às decisões criativas. Os indivíduos
fazem premissas falsas sobre problemas, de forma que possam encaixar
os problemas em seus processos de decisão previamente estabelecidos.
As decisões de cada indivíduo exercem impactos sobre os outros.
Cada indivíduo deve considerar as respostas prováveis dos outros às suas
próprias decisões.
Os indivíduos cometem erros, muitas vezes erros sistemáticos e
previsíveis, e desenvolvem regras práticas ou heurísticas que são
“atalhos” mentais ou vieses cognitivos para reduzir a exigência de
processamento de informações para a tomada de decisões.
A tomada de decisão é influenciada por alguns fatores cognitivos,
entre os quais: a facilidade de lembrar os eventos que são
disponibilizados maciçamente pela mídia; a recuperabilidade de
informações a partir de estruturas de memória (por exemplo, procurar
postos de gasolina mais próximos a entroncamentos de ruas); as
associações pressupostas que fazemos (por exemplo, associando dois
eventos semelhantes e esperando que as condições do evento já ocorrido
sejam reproduzidas em outro evento semelhante no futuro); e tendência
de procurar, interpretar, focar e lembrar a informação de forma que
confirme nossos preconceitos (por exemplo, “na última vez que comi
manga junto com leite passei mal. Será que agora, se eu comer manga
com leite novamente, também passarei mal?” ou “na última vez que fiz
prova com esta camisa tirei nota boa. A partir de agora só farei prova
com esta camisa”) (Bazerman, 2004); tendência a confiar demais, ou
“ancorar-se”, em uma referência do passado ou em uma parte da
informação na hora de tomar decisões, entre outros.
Pode-se depreender que a racionalidade limitada leva à adoção de
premissas que dificultam alcançar um resultado ótimo e conduzem à
tomada de decisão com base na intuição. A tomada de decisão com base
na intuição conduz ao desenvolvimento de regras práticas, heurísticas,
que otimizam etapas do processo de decisão.

Heurísticas
São regras simplificadoras ou regras práticas que facilitam a tomada de
decisão, porém podem conduzir a erros sistemáticos que afetam a
qualidade e a ética das decisões. As heurísticas respondem a algumas
perguntas, tais como: Somos tendenciosos na tomada de decisão?
Podemos ser inconscientemente manipulados por terceiros? O que
poderá influenciar a tomada de decisão?
Podemos relacionar três heurísticas que impactam diretamente a
tomada de decisão e o comportamento das partes em um processo de
negociação. São elas: heurística da disponibilidade, heurística da
representatividade e heurística da ancoragem.

Heurística da disponibilidade

Essa heurística leva o indivíduo a avaliar um determinado assunto em


função da disponibilidade desse assunto em sua memória. Os assuntos
mais frequentes e mais recentes são lembrados de forma mais
representativa e imediata.
Os temas que evocam emoções ou que são fáceis de imaginar, ou que
se destacam por sua especificidade estarão mais disponíveis na nossa
memória e serão lembrados com mais facilidade.
Temas não emocionais são mais difíceis de ficar registrados em nossa
memória, são mais difíceis de imaginar e são mais dispersos.
De acordo com a heurística da disponibilidade, o tomador de decisão
analisará e decidirá, com base na similaridade do caso com as situações
vividas por ele e com base na disponibilidade da situação em sua
memória recente.

Exemplo 1: Imagine que você fosse da Secretaria Estadual de Saúde e tivesse de


decidir sobre a alocação do orçamento para sua área em função das causas
mortis mais comuns. Sem consultar dados estatísticos, quais doenças você
privilegiaria com investimentos? (Colocar em ordem da maior para a menor
causa mortis na sua suposição).
1. doenças cerebrovasculares;
2. homicídios por armas de fogo;
3. infarto agudo do miocárdio;
4. acidentes de transporte terrestres;
5. pneumonia;
6. diabetes.

Resposta do exemplo 1: Uma escolha poderia recair sobre pneumonia, pois há


muita publicidade e vacinação em massa para evitar gripes e consequente
pneumonia.
Podemos verificar que as doenças, que supúnhamos mais frequentes,
não o são. A disponibilização de informações de determinadas doenças
na mídia faz com que tenhamos uma ideia distorcida das doenças que,
efetivamente, causam mais mortes. Vejamos

Quadro 5
Informações sobre mortalidade
# Doenças Incidência
(1000)

1 Doenças cerebrovasculares 100,0

2 Infarto agudo do miocárdio 85,9

3 Pneumonia 68,3

4 Diabetes 58,0

5 Homicídios por armas de fogo 50,0

6 Doenças hipertensivas 46,8

7 Bronquite, enfisema e asma 43,5

8 Acidentes de transporte terrestres 41,7

9 Insuficiência cardíaca 27,3

10 Câncer de pulmão 24,4

Fonte: Sistema de Informações sobre Mortalidade, do Ministério da Saúde. Exame.com.


Atualizado em 13 set. 2016.

Exemplo 2: Gerentes que fazem avaliação de desempenho de seus colaboradores


são vítimas da heurística da disponibilidade. Os gerentes tendem a avaliar o
desempenho (positivo ou negativo) do colaborador a partir de informações mais
recentes de que eles dispõem, por exemplo, informações dos últimos três meses
anteriores à avaliação. É muito difícil que se lembrem de situações mais
remotas, como de nove meses anteriores ao período de avaliação (disponibilidade
da informação na memória), e acabam fazendo uso das informações mais
recentes.

Exemplo 3: Pesquisas mostraram que é mais fácil vender seguro de desastre


natural para pessoas que já experimentaram esse tipo de acidente, do que para
pessoas que nunca sofreram qualquer desastre natural. Estas últimas o
adquiririam apenas como prevenção.

Em resumo, nossas memórias e experiências recentes têm um forte


impacto sobre as nossas decisões.

Heurística da representatividade

Essa heurística tem como característica a comparação entre os assuntos


em análise, considerando as referências e as ideias preestabelecidas sobre
pessoas e objetos ou eventos.
É usual que a heurística da representatividade esteja presente
quando, por exemplo, um gestor participa de um processo de seleção de
pessoas. Nesse processo, o gestor tende a comparar um determinado
perfil de candidato com uma categoria preestabelecida por ele. Outro
exemplo pode ser observado quando um consumidor, face ao
lançamento de um novo produto, compara-o com produtos similares já
existentes.

Exemplo 1: Um indivíduo é introvertido, gosta de quebra-cabeças e se interessa


por leitura. Qual a probabilidade de essa pessoa ser um engenheiro (civil +
produção) ou um advogado?

Resposta do exemplo 1: A maioria das pessoas interpreta e responde que a


formação desse indivíduo é engenheiro. Nesse caso, as avaliações realizadas não
consideraram as diferenças possíveis da quantidade de concluintes de cada um
dos cursos, mas sim características que os indivíduos dessas pro ssões devem ter.
Vejamos alguns dados de 2015: cerca de 40 mil indivíduos
concluíram o curso de engenharia e 105 mil concluíram direito. Assim, a
probabilidade de esse indivíduo ser advogado seria muito maior do que
ser engenheiro (105.000 / 40.000).
Pode-se observar, no exemplo apresentado, que os indivíduos são
insensíveis à dimensão da amostra ao avaliar uma informação. Há uma
tendência a generalizar a informação, a partir de um número reduzido
delas. No exemplo apresentado, o perfil (introvertido, amante de
quebra-cabeça e da leitura) influenciou a decisão de considerar esse
indivíduo como engenheiro, apesar de a quantidade de engenheiros ser
inferior à quantidade de advogados no mercado de trabalho.

Exemplo 2: Se três candidatos de uma universidade X forem mal em uma


entrevista de processo seletivo para estagiário em uma empresa, a tendência é
generalizar e achar que todos os candidatos advindos da universidade X
também se sairão mal na entrevista. Depreende-se que indivíduos tendem a
avaliar a probabilidade de ocorrência de um evento, a partir da semelhança dos
acontecimentos.
A seguir, serão apresentados outros dois exemplos que ajudarão a
melhor compreender a heurística da representatividade.

Exemplo 3: Falácia do jogador (Tvesky e Kahneman, 1974).


A chance é comumente vista como um processo autocorretivo no
qual um desvio em uma direção leva a um desvio na direção oposta
para restaurar o equilíbrio. Na verdade, os desvios não são corrigidos
à medida que um processo de chance se desenrola, eles são
meramente diluídos [Kahneman e Tvesky, 1974 in Bazerman,
2014:83].

• Após 10 rodadas de carta “ruins” no jogo de pôquer, o jogador


acha que está na hora de receber uma “mão boa”. Temos uma
falsa noção de conectividade, mas, na verdade, o que ocorre é a
aleatoriedade. Tendemos a nos afastar da aleatoriedade, pois a
incerteza nos oferece a sensação de insegurança.
• A crença de existir a “mão quente” tem implicações na forma de
competir. Passar a oportunidade para um jogador “mão quente”
em um jogo de basquete é uma boa estratégia, e o time
adversário se preocupa em marcar aquele jogador que tem “mão
quente”.
• Após ter ganho R$ 1.000 na loteria, uma senhora muda o
número que sempre apostou – afinal, qual é a probabilidade de
um mesmo número ser sorteado duas vezes? O desempenho nos
lances imediatamente anteriores, não mudaria a probabilidade de
sucesso nos lances posteriores.

Exemplo 4: Armadilha da con rmação.

Refere-se à forma como procuramos informações. Nossa atenção e


processo cognitivo são limitados e, por isso, procuramos informações
seletivamente e damos crédito às informações que nos permitam chegar
à conclusão do que desejamos alcançar.
Por exemplo, você comprou um carro novo. No dia seguinte, o
caderno de automóveis do jornal lança uma reportagem com uma
classificação de carros, de acordo com seu desempenho: economia de
combustível e resultados de testes de estabilidade do veículo. Ao ler a
reportagem, sua atenção estaria dirigida para procurar qual marca de
carro?

Resposta mais frequente: A maioria das pessoas prestaria mais atenção á


informação que con rmasse sua boa compra, ou seja, a maioria das pessoas
buscaria os indicadores associados ao seu carro recém-comprado. Desejamos
con rmar nossas ações, principalmente buscando serem elas boas. Talvez pudesse
ser mais produtivo e vantajoso analisar as informações negativas, para provocar
pensamentos e análise; buscar a con rmação das informações positivas só
garante manter-se na zona de conforto. E esta última posição é menos
proveitosa.
Heurística da ancoragem

A âncora é representada pela primeira oferta realizada em uma


negociação, seja essa oferta de qualquer das partes, seja do comprador
ou do vendedor. Há uma tendência em nos fixarmos em uma dada
informação como ponto de partida, ou de ajustarmos a resposta com
base em um valor inicial. A âncora define as bases e os parâmetros da
negociação e pode influenciar a resposta final. Como é um elemento
informativo, a âncora deve ser utilizada estrategicamente, atendendo aos
interesses da parte que a lançou. A ancoragem, como é a primeira
informação, tem um significado muito forte, tornando mais difícil
ajustar novas informações. A âncora será o “ponto de partida” e todos
conhecerão, a partir dessa informação, o real interesse (ou o
posicionamento) da parte que ancorou. As âncoras afetam nossas
decisões (Bazerman, 2004).
Se a âncora disponibilizada por uma das partes for extrema ou
irracional, a mesma se tornará impeditiva para o acordo, pois as partes,
ao perceberem que a oferta é irreal, abandonarão a negociação. Se a
âncora “irreal” vier seguida de outra proposta, reduzindo-a ou
modificando-a significativamente, essa mudança intempestiva
promoverá uma “desconfiança”, impactando a credibilidade de todo o
processo. Uma ação dessa natureza põe em risco o relacionamento e
confiança, estabelecidos após muitas conquistas.

Efeito da ancoragem em negociações salariais

Você acabou de concluir um MBA e deseja renegociar seu salário. Vamos


supor duas âncoras de forma a comparar seus efeitos: salário atual e
salário pago pelo mercado a profissionais com MBA.
1. Âncora: salário atual. Esta é uma âncora (ponto de partida na negociação) que
pode ser fraca, pois tem como a base seu salário atual, sem o MBA. Os salários
pagos a quem possui o MBA são muito superiores ao seu salário atual. Assim, se
seu salário atual for utilizado como base para cálculo do novo salário com o MBA, a
variação % do aumento será grande, fora das normas de sua empresa, que é, por
exemplo, dar aumentos de, no máximo, 20% ao ano. Mas se a âncora for salário
pago pelo mercado àqueles que possuem MBA, vejamos a seguir.
2. Âncora: salário no mercado para profissionais com MBA. Essa âncora seria mais
vantajosa, pois você estaria negociando valores compatíveis com os valores de
mercado, para profissionais de mesma especialização, independentemente de seu
salário atual. Essa âncora poderia ser muito mais poderosa para você em uma
negociação salarial na sua empresa atual (adaptado do Bazerman, 2004).

Comportamentos e ancoragem

Quando negocia, muitas vezes você ouve a frase: “Todo mundo sabe que
funciona dessa maneira”. Isso pode ser muito frustrante; não menos
importante, porque muitas vezes você diz: “Essa é a coisa mais louca que
já ouvi!”
Esse fenômeno, bastante comum, é resultado da “negociação tácita”, um
termo cunhado por Thomas Schelling, ganhador do prêmio Nobel em
2005, por seus estudos sobre conflito e cooperação.
Considere os seguintes resultados experimentais de pesquisas realizadas
por Schelling:
• Quando os indivíduos são solicitados a escolher qualquer número,
40% escolhem o número 1.
• A maioria esmagadora das pessoas, no lançamento da moeda,
escolhem “cara” ao invés de “coroa”.
• Quando solicitadas a escolher qualquer valor monetário, as pessoas,
em sua maioria, tendem a escolher um valor divisível por 10.
• Quando as pessoas combinam um encontro e têm de sugerir um
horário, quase todas escolhem “meio-dia”.
• Uma maioria esmagadora de pessoas prefere pagar taxas a impostos.
Muitas vezes, cumprimos uma norma, sem sequer conhecê-la (embora
seja muito mais evidente quando estamos diante de costumes a que não
estamos habituados). É natural que desejemos respeitar as noções de
justiça e precedência.
Portanto, na maioria das vezes, é vantagem fazer o primeiro movimento
em uma negociação, mesmo que a maioria das pessoas seja reticente em
fazê-lo. Fazer a primeira proposta oferece a oportunidade de enquadrar a
negociação e estabelecer precedência.
Outra visão, identificada na pesquisa sobre a negociação tácita, é que,
muitas vezes, um estranho pode ser mais eficaz. É por isso que, quando
você inicia uma negociação para comprar um carro e acaba ficando
“confortável e amigo” do vendedor, você é, inevitavelmente, levado pelo
próprio vendedor para o escritório do gerente para fechar o negócio
(Satell, 2009).
UNIDADE II
A metodologia da negociação
4
Processo de negociação: conceitos e etapas

Negociação
A imagem da figura 8 representa, esquematicamente, uma negociação
multipartite (múltiplas partes). Imaginemos uma reunião na Secretaria
de Transportes do estado ou do município para discussão sobre a
distribuição do orçamento, que é limitado, pelos diferentes órgãos que
tratam dos transportes: ferroviário, rodoviário, metrô etc. Será
interessante que fiquemos com esta imagem na mente enquanto
tratamos, a seguir, do processo de negociação.

Figura 8
Negociação multipartite
Fonte: <www.asmetro.org.br/portal/gestao/mesa-de-negociacao/6639>. Acesso em: 18 fev.
2017.

Interesse comum: todos desejam investir e melhorar o serviço de


transporte, seja de qual modalidade for.
Interesses con itantes: cada uma das partes deseja a maior “fatia”
(parcela) possível do orçamento disponível. O orçamento, como
sabemos, é limitado. Há uma dificuldade de se alcançar um acordo que
satisfaça todas as partes (ganha/ganha).

Definição de negociação

As negociações ocorrem como modelo de tomada de decisão, quando


não existem regras, não há autoridade para reger a decisão e/ou não
há preço definido para a troca de bens e serviços [Zartman, 2007:15].

Depreende-se, da definição apresentada, que se negocia a partir de


situações de incerteza – quando não existem regras, nem autoridade,
nem preços definidos. Para se jogar, qualquer que seja o jogo, há a
necessidade de regras. Diz-se popularmente que: “o que é combinado
não sai caro”.
Pode-se também entender que negociação é um processo de revisão,
atualização e realização de perguntas relevantes, que proporcionam um
aprendizado conjunto, com o objetivo de minimizar as diferenças na
definição de valor.
A base de uma negociação ganha/ganha é a confiança entre as partes,
que pode ser alcançada a partir do relacionamento, desenvolvido por
meio de conversas preliminares, de cunho geral, com identificação de
interesses comuns, e da busca conjunta de dados que se referem à coleta
de informações, indicadores (padrões) que sejam críveis, dando a
oportunidade às partes de estabelecerem entre si relacionamento e
confiança, se as fontes de informações forem fidedignas e aceitas pelas
partes.
Negocia-se quando existem alternativas a serem escolhidas. As
alternativas apresentam interesses comuns e interesses conflitantes,
significando a complexidade das relações. Os interesses comuns não
causam quaisquer problemas, uma vez que todos, unanimemente,
concordam. As negociações decorrem somente quando há interesses
conflitantes.

Bons negociadores obtêm grandes acordos para si, mas fazem com
que seus oponentes acreditem que também fizeram um bom negócio,
mesmo que a verdade seja outra; os melhores, porém, são os que
sabem dividir as vantagens para que, de fato, todos lucrem [Brooks,
2016:37].

Podem-se distinguir dois tipos de negociação e de barganhas:


posicional e por interesses.

Negociação posicional (barganha posicional ou distributiva)

Na barganha posicional as partes buscam o melhor para si mesmas, sem


pensar no outro. A barganha posicional tende a ser mais competitiva.
Na barganha posicional, as partes ficam firmes em suas posições
originais. Não há qualquer ponderação, mas há a firmeza de dizer o não
pelo não, independentemente dos interesses das partes. O interesse que
prevalece é o interesse da parte mais forte. A regra passa a ser: ceder à
outra parte ou não haverá negociação. Trata-se do jogo denominado
ganha/perde. Para que uma parte ganhe, a outra parte, necessariamente,
perderá. É um jogo bastante traiçoeiro, pois não elimina o conflito;
muito pelo contrário, perpetua e amplifica o conflito. A parte perdedora
fica em uma posição desvantajosa, sentindo-se injustiçada, humilhada, e
seu único pensamento será o de buscar uma revanche, buscar outra
situação, sobre a qual lutará muito, com o objetivo de derrotar aquele
seu oponente, que o ganhou no passado, deixando-o em uma posição
humilhante: a de perdedor.

Negociação por interesses (barganha por interesse ou integrativa)

A negociação por interesses ocorre quando as partes conseguem algo


mais do que previam com a negociação. As partes trabalham em
q p g p
conjunto para aumentar o tamanho da “torta” (das opções de negócios),
proporcionando a todas as partes um ganho real, além da percepção de
que não houve perdedor (Mnookin e Susskind, 1999). Como resultado,
todos ganham e ficam satisfeitos com o resultado.
Para alcançar esse resultado, deve-se: buscar o efetivo interesse de
cada uma das partes na negociação; fazer perguntas para conhecer os
interesses da outra parte; e focar nos interesses que motivem as partes a
escutar, cuidadosamente, umas às outras, percebendo o que o outro
realmente sente/necessita como o mais importante. Os interesses
definem o problema, de modo a promover a colaboração e a criatividade
que geram soluções inovadoras. O desafio torna-se o de encontrar, de
forma conjunta, a solução para um problema em vez de fazê-lo pelo
enfrentamento competitivo. Busca-se um resultado que seja de ganhos
mútuos, um resultado ganha/ganha, que ocorre quando as duas partes
saem satisfeitas da negociação, sentindo que ganharam com o resultado
alcançado e, assim, encerram a negociação sem qualquer sentimento de
injustiça.

Considerações sobre o jogo do ganha/ganha

• Ganhos de curto prazo podem tornar-se perdas de longo prazo.


• Não é seu interesse que as outras partes sintam-se como se tivessem
que recuperar perdas anteriores, proporcionadas por você.
• Negocie com percepção e intuição, não só com palavras.
• Busque reciprocidade.
• Construa uma coalizão positiva.
• Destaque sua reputação e a deles.
• Crie mecanismos de confiança, se necessário.
• Faça de você uma pessoa confiável para a outra parte.
• Qualidade de um negociador? Ouvir, ouvir, ouvir...

A figura 9 apresenta a disputa representada pelas negociações


posicionais e por interesses, que resultam em um jogo ganha/perde e
ganha/ganha, respectivamente.
Figura 9
Negociação posicional e negociação por interesses

Fonte: adaptado de Securitas <http://securitas.blogs.sapo.pt/70623.html>.

Conceitos básicos
Há conceitos básicos fundamentais para o processo de negociação. São
eles: BATNA, preço reserva, ancoragem e Zopa.

BATNA (best alternative to a negotiation agreement) ou Maana


(melhor alternativa a um acordo negociado)

Trata-se de um “plano B” para a negociação, ou seja, o negociador deve


ter sempre uma alternativa denominada “plano B” ou BATNA, que o
atraia caso a negociação em que está envolvido não dê certo. A BATNA
é uma alternativa fora da negociação que o indivíduo está
empreendendo. Seria outra oportunidade ou opção.
A BATNA corresponde à alternativa que será adotada caso não se
alcance um acordo, e deve ser definida antes do início de qualquer
negociação, na etapa de preparação. Ter uma BATNA faz com que o
negociador tenha uma posição vantajosa em relação à outra parte, ou
seja, faz com que, ao tê-la, ele esteja em uma situação de poder. Por quê?
A BATNA é um instrumento de poder. O negociador que não a
possui fica refém das condições apresentadas pelo outro negociador e
fica à mercê de aceitar inúmeras concessões, que não aceitaria se
estivesse em uma posição mais vantajosa na negociação. Acaba aceitando
algumas concessões somente por não possuir outra alternativa a não ser
aceitar as condições impostas. Se o negociador tiver uma BATNA, ele
poderá se impor na negociação, ele terá a segurança de que, caso a
negociação não alcance um acordo, sua BATNA lhe garantirá outra
oportunidade, que poderá não ser ótima, porém será uma oportunidade.

Você encaminhou um currículo para uma empresa multinacional e foi


chamado para uma entrevista de emprego.
Negociação: você irá para uma entrevista em busca de um novo emprego.
Nessa entrevista, em primeiro lugar, você mostrará ao entrevistador seu
valor como profissional. Por outro lado, você se interessou muito pelo
desafio que terá e o trabalho muito lhe interessa. Uma vez aprovado na
entrevista, o empregador apresenta o salário, benefícios, plano de carreira
etc. (essa é a negociação propriamente dita).
Vamos supor duas BATNAs: BATNA 1 – você está empregado, satisfeito e
está buscando prospectar uma nova oportunidade; BATNA 2 – você está
desempregado.
BATNA 1: Enquanto você enfrenta uma rodada de entrevistas, o fato de
estar empregado lhe garante uma segurança de que não há nada o que
perder (você está empregado e isso não está em jogo); essa entrevista
está lhe oferecendo a oportunidade de prospectar outra posição, em outra
empresa, que você poderá aceitar ou não. Esta BATNA (estar empregado)
lhe oferece poder e margem para barganha na negociação. Você irá
negociar com mais tranquilidade, sabendo que, se as condições
oferecidas não forem interessantes, você continuará no seu emprego atual
(que é sua BATNA/plano B), que é sua segurança, é seu poder. Você
negociará as condições de trabalho com muito menos ansiedade,
conseguirá ponderar e explorar interesses com muito profissionalismo,
criando valor, inclusive.
BATNA 2: Estar desempregado (BATNA fraca). Você possui uma BATNA
frágil, pois está desempregado e o que mais que você precisa hoje é
conseguir um trabalho. O fato de estar desempregado e precisando desse
emprego o faz mais frágil para negociar – você terá menos poder e estará
mais sujeito a aceitar qualquer proposta. O nível de concessões unilaterais
(somente do lado do empregado) será altíssimo, pois, se não aceitar as
condições impostas, não terá outra alternativa a não ser permanecer
desempregado.
Assim, aquele que possuir uma BATNA poderá avaliar melhor as
propostas decorrentes do processo; poderá dizer não a uma proposta
desfavorável e não se tornar refém do processo.

Preço reserva

Representado pelo valor máximo que o comprador está disposto a pagar


e pelo valor mínimo que o vendedor está disposto a receber pelo
produto. Esse valor, que não é necessariamente financeiro, não é
divulgado pelas partes, sob pena de prejudicar a negociação, pois deixa
claro os seus limites (fica reservado). Pode ser entendido, também, como
o limite máximo possível de concessões a serem feitas em um acordo.
Não necessariamente, esse preço reserva refere-se a valores
monetários, mas refere-se a informações quantitativas, sejam financeiras,
sejam de pessoas, produtos etc. No exemplo a seguir, o preço reserva
estará associado à quantidade de técnicos.

A empresa na qual você trabalha o indicou como líder de um novo projeto.


Você irá a uma reunião com o diretor de projetos para conhecer sua nova
atividade. Você conhece bem o projeto, pois participou da elaboração da
proposta.
Você sabe que o projeto foi dimensionado com a participação de 35
técnicos. O diretor, considerando a necessidade de redução de custos e
de aumento de produtividade, autorizou a contratação de 27 novos
técnicos. Por outro lado, você, conhecendo a proposta e com base na
autorização anunciada pelo diretor, contrapropôs com um pedido para a
contratação de 38 técnicos.
Preço/valor reserva: o diretor guardou a informação de que, se necessário,
ele concordaria com a contratação de 35 técnicos no total, mas se ele
informasse esse número, a negociação seria iniciada a partir de 35
técnicos, e não a partir de 27, como ele inicialmente anunciou. Essa
informação (preço reserva) não é divulgada. O mesmo aconteceu com
você, ao indicar a necessidade de contratação de 38 técnicos, sabendo
que o projeto havia definido 35. Você poderia desenvolver o trabalho com
33 técnicos, mas, se anunciasse inicialmente que poderia fazê-lo, a
negociação iniciaria com o limite máximo da contratação de 33 técnicos.
Assim, o preço reserva para o diretor era de 35 técnicos e para o líder do
projeto era de 33 técnicos. Para o diretor, 35 representa o limite máximo
de contratação, e para o líder do projeto, o mínimo de técnicos possível é
33.

Diretor 27 35 (PR)

33 (PR) 38 Líder projeto

Ancoragem

Refere-se à oferta inicial, ou seja, a primeira divulgação de preço/valor


ou das condições, anunciada por qualquer uma das partes. Ancora quem
primeiro oferecer a informação de preço ou das condições ancora.
Quem ancora, informa e assume riscos. A âncora deve ser utilizada
estrategicamente pelas partes, pois as condições da negociação irão
ocorrer tendo como média ou limite o valor que foi ancorado.
Quem deve ancorar primeiro? Quem faz a primeira oferta estabelece
uma gama de possibilidades razoáveis na mente de cada pessoa.
Dependerá da estratégia, dependerá da necessidade sobre o resultado,
dependerá da BATNA forte ou fraca que você tiver, dependerá do
interesse em definir valores, enfim, dependerá de muitas variáveis. Não
há uma regra. Se a outra parte ancorar, deve-se analisar a qualidade da
âncora. Se você ancorar, formule objetivos ousados como âncoras.

Você irá negociar a compra de uma máquina, sabendo que a média de


preço dessa máquina no mercado é R$ 5 mil. O vendedor oferece a
máquina por R$ 9 mil (âncora), valor esse bastante acima da média do
mercado. O valor ancorado pelo vendedor faz com que você fique
desconfiado e contraproponha um valor muito abaixo, de R$ 3 mil pela
máquina.
Em seguida, diante de sua contraproposta, o vendedor reduz o preço de
venda da máquina para R$ 5,5 mil. Essa redução de preço, de R$ 9 mil para
R$ 5,5 mil, faz com que você fique desconfiado, pois qual a razão de
tamanha redução de preço? Por que o vendedor, já de início, não teria
ancorado nesse valor (R$ 5,5 mil)? Se o vendedor estivesse propondo um
preço próximo ao preço de mercado, ele não teria ancorado em R$ 9 mil e
sim em um valor mais próximo de R$ 5 mil. Estaria o vendedor querendo
levar vantagem? Essas dúvidas geram uma desconfiança.

No exemplo do conceito de preço reserva, quem ancorou foi o


diretor, que informou, antes de todos, sua disposição de contratar 27
técnicos. Esses 27 técnicos representaram a âncora.

Zopa (zona de possíveis acordos)

Refere-se à amplitude entre os valores de compra e de venda divulgados


pelas partes em uma negociação. É um conjunto de
valores/preços/condições possíveis, para ambas as partes, situados entre
os limites superiores e inferiores de uma negociação. O acordo cujo
resultado satisfaça ambas as partes será encontrado em algum ponto no
interior desse intervalo.
O vendedor informa o valor pelo qual ele deseja vender o bem, que
em geral é superior ao valor que o comprador deseja pagar por ele. Ao
intervalo entre o valor divulgado pelo vendedor e o valor pretendido
pelo comprador denominamos zona de possíveis acordos (Zopa).
No exemplo da negociação da contratação de técnicos para o
projeto, indicado anteriormente, tem-se que o acordo tem como Zopa
entre 27 e 38 técnicos, ou seja, o acordo será concluído em uma
quantidade dentro de um intervalo que está entre o mínimo de 27 e o
máximo de 38 técnicos (Zopa).

Figura 10
Limites da Zopa

Matriz de negociações complexas


A matriz de negociações complexas (MNC) sintetiza o processo de
negociação, em etapas, elementos, formas de negociação e indicadores
de avaliação. Estruturada a partir da abordagem de ganhos mútuos, o
foco das negociações é sobre os interesses, não em posições (Spinola,
Brandão e Duzert, 2011).
A MNC é um conjunto de estratégias e princípios que permite:

1. maximizar as chances de buscar os interesses das duas partes;


2. criar e manter bom relacionamento entre as partes.

Veja o quadro 6.

Quadro 6
Matriz de negociações complexas
Etapas do processo de negociação
Preparação Criação de Distribuição de Implementação
valor valor

Elementos Formas Indicadores

Contexto Direta Satisfação/racionalidade

Interesses Agentes Controle

Opções Facilitador Risco

Poder Mediação Otimização econômica

Cognição Diálogo entre múltiplas partes Ética

Relacionamento Informais paralelas Justiça/equidade

Concessões Metamediação Produtividade

Conformidade Arbitragem Emoções


legal

Padrões Judicial Impacto e sustentabilidade

Tempo Força (policial ou militar) Autopoiese/auto-


organização

A MNC organiza o processo de negociação em quatro etapas:


preparação, criação de valor, distribuição de valor e
implementação/fechamento.
Além das etapas, a metodologia da MNC destaca elementos, formas
e indicadores. Veja:

• elementos (10) fundamentais para a definição e desenvolvimento


do processo de negociação: contexto, interesses, opções, poder,
cognição, relacionamento, concessão, conformidade legal,
critérios/padrões e tempo.
• formas (10) de se negociar, dependendo do nível de interferência
de terceiros até a forma extrema de litígio. A negociação direta é
a forma mais simples, que não tem interferência de terceiros. A
partir daí, quando as partes se veem em dificuldades para
alcançar um acordo, solicitam a ajuda de terceiros (agentes,
facilitadores, mediadores, árbitros). Caso o conflito não se
encerre, pode-se buscar uma ajuda legal, quando a negociação
será decidida por um terceiro, sem qualquer interferência e
controle das partes, que deixam de ter a autonomia sobre a
decisão (judicial e policial). Além dessas formas aqui descritas, há
ainda as negociações com múltiplas partes (multipartites), as
negociações paralelas informais e as metamediações.
• indicadores (10) são métricas quantitativas e qualitativas que se
deseja alcançar, com sucesso, em uma negociação. São elas:
satisfação/racionalidade; controle; risco; otimização econômica;
ética; justiça e equidade; produtividade; emoções, impacto e
sustentabilidade; e autopoieses e auto-organização..

Etapas do processo de negociação


São quatro as etapas do processo de negociação. Excetuando as etapas
de preparação e de implementação/fechamento, as demais (criação de
valor e distribuição de valor) refletem ações de cooperação e
competição, respectivamente.

• primeira etapa: preparação – representada pelo planejamento do


processo;
• segunda etapa: criação de valor – é aquela em que os negociadores
identificam os interesses (os deles e os dos outros) e elencam as
oportunidades (opções) para serem trocadas. Prepondera o
espírito cooperativo em busca de opções, de alternativas entre
todos os envolvidos;
• terceira etapa: distribuição de valor – depois de reunidas as
oportunidades identificadas (opções), são realizadas trocas. Essa é
a etapa da negociação propriamente dita, quando os
negociadores trocam suas opções com base em suas estratégias e
interesses. Nesse momento, prepondera o espírito competitivo;
• quarta etapa: implementação e fechamento – etapa final do processo,
quando encerram-se as negociações, definem-se as condições de
direitos e obrigações do contrato, implementação e
controle/acompanhamento dos acordos firmados.

Preparação

É a etapa inicial de um processo de negociação. Busca-se obter o


máximo de dados e informações a respeito da outra parte. Como obter
essas informações? A principal estratégia é perguntar e, principalmente,
ouvir sempre, ouvir muito, “ficar rouco de tanto ouvir”.
Para se preparar para uma negociação, deve-se, além de analisar
alguns elementos da MNC, buscar responder às perguntas a seguir,
considerando seu ponto de vista e o da(s) outra(s) parte(s):

• Qual é a questão que me/nos trouxe a esta reunião?.


• As minhas questões são iguais às questões dos outros
negociadores?.
• Qual(is) o(s) meu(s) interesse(s) nesta negociação? O que desejo
alcançar? E quais devem ser os interesses de cada um dos
negociadores? O que será que os outros negociadores desejam
com esta negociação? Dependendo dos interesses em jogo, o
processo de negociação poderá ser diferenciado. Cada uma das
partes, em um mesmo processo de negociação, tem interesses
absolutamente distintos. Assim, devemos conhecer esses
interesses, para que possamos oferecer a cada uma das partes o
que cada um deseja, que é função de seus interesses.
• A partir da identificação dos interesses, deve-se traçar cenários de
possibilidades e de resultados possíveis.
• Já possuo uma BATNA? Se não, devo construir uma; se sim,
como posso avaliá-la: forte ou fraca? Será que eu posso melhorá-
la para ter mais conforto e ter mais poder na negociação? Qual a
BATNA que suponho ser a dos outros negociadores? A BATNA
é uma informação estratégica. Há que se avaliar se é interessante
expô-la para os demais negociadores ou se é melhor deixá-la sob
sigilo.
• Defina seu preço reserva e a estratégia da ancoragem. Você ancorará
primeiro ou aguardará a outra parte ancorar? Lembre que quem
ancora oferece às outras partes informações sobre sua posição, e
a negociação transcorrerá a partir dessa informação base.
• A partir dos interesses, devemos definir as prioridades entre eles.
O que desejo em primeiro lugar, e em segundo lugar, e assim por
diante.
• Quais as informações necessárias para que se possa oferecer à
outra parte credibilidade, que pode ser traduzida na definição de
padrões e critérios que sejam aceitos por todos os negociadores.
O que a outra parte poderá oferecer para sinalizar confiança, que
ofereça credibilidade para iniciar uma negociação?
• Desenvolver e manter um relacionamento é importante em
qualquer etapa do processo de negociação. Relacionar-se com
pessoas é o maior ativo que se pode ter.
• Guardar as emoções difíceis e tratar de transformá-las em ativos.
• Ativar a percepção, a partir de detalhes da linguagem corporal e
verbal.
• Reduzir os gaps perceptivos. Estamos todos compreendendo a
mesma coisa? Todas as partes têm o mesmo entendimento, os
mesmos conceitos? Estamos falando a mesma linguagem? Há
necessidade de se alinhar essa compreensão. Muitas vezes, o
conflito ocorre muito antes da negociação, não só pela questão
em si, mas na interpretação que cada um faz antecipadamente das
palavras, das situações, dos conceitos etc. A maior barreira é o
“pré-conceito” (algo que antecede o real conceito).

Exemplo: Imagem da reunião na Secretaria de Transportes.

a) Os indivíduos têm uma tendência de achar que todos


possuem a mesma compreensão sobre as mesmas coisas e
assuntos. Esquecem-se de que somos diferentes uns dos
outros, temos diferentes culturas e, portanto, podemos ter
diferentes compreensões sobre o mesmo assunto.
b) Se a questão estiver associada a transporte, deve-se,
inicialmente, definir com as partes o tipo de transporte que
estará em pauta (ferroviário, rodoviário, marítimo, metrô
etc.). Caso não haja um alinhamento inicial, ou seja, se cada
negociador não se apresentar como representante do meio
de transporte “x”, todos negociarão algo associado a
transporte, porém cada um irá defender e ponderar pontos
de vista associados ao meio de transporte que representa, o
que tornará esse diálogo uma “Torre de Babel”, quando cada
um defenderá uma coisa diferente do outro (ver elemento
cognição).
• Será fundamental estabelecer as bases da confiança e da
credibilidade, que são frutos do relacionamento inicial
estabelecido, da identificação de fontes fidedignas e que sejam da
confiança das partes.
• Percepção do ambiente: buscar perceber o ambiente, verificar o
clima (pesado ou leve), as emoções que perpassam as pessoas.
Deve-se ficar antenado, perceber além das palavras, perceber o
gestual, a ostentação do ambiente etc.
 
Durante evento organizado pela Associação dos Dirigentes de Marketing e
Vendas do Brasil (ADVB/RS), o palestrante internacional Renato Hirata
destacou que “o negócio de alta performance gasta 90% se preparando e
10% negociando”.

Criação de valor

Significa inventar soluções que sejam vantajosas e que permitam


expandir o conjunto de opções, de benefícios mútuos viáveis para ambas
as partes. Deve-se estar com o pensamento livre: tudo é possível de ser
pensado, todas as ideias podem e devem aflorar, sem censura, sem
preconcebimentos. Deve-se evitar a racionalidade limitada, permitindo-
se “pensar fora da caixa”.
Assim, criar valor é fazer um exercício de descobrir, inventar, criar,
pensar, fazendo um brainstorming (tempestade de ideias) em inúmeras
opções. Elencadas as ideias (opções), defina as prioridades para poder
oferecê-las estrategicamente.
Para facilitar a criação de valor, deve-se:

• Perceber as emoções que estão dominando cada uma das partes e


o ambiente.
• Relacionar-se com a outra parte (e muito).
• Não confrontar e sim somar esforços.
• Reduzir a tensão no ambiente.
• Definir objetivos em conjunto; usar processos colaborativos. Por
isso esta é uma etapa da cooperação.
• Obter a concordância para prosseguir, usar processos
colaborativos, quebrar barreiras e achar soluções.
• Apresentar ao outro negociador suas demandas e expectativas, de
forma estratégica.
• Suspender as críticas, quebrar barreiras e buscar soluções. Pensar
“fora da caixa”, sem racionalidade limitada.
• Analisar a estrutura de poder. Você se sente mais forte que a
outra parte?
• Separar as pessoas dos problemas. Um “não” dito a uma proposta
é um “não” à proposta; não é um “não” dito à pessoa. O
relacionamento permanece estável, mas a proposta não agradou.
Não se deve personalizar.
• Concentrar-se nos interesses (o que o outro de fato quer) e não
nas posições (o que o outro fala).
• Inventar opções de ganhos múltiplos.
• Insistir em critérios objetivos.
• Permitir que as ideias fluam, sem críticas. Não restrinja nenhum
pensamento, não critique antecipadamente. Deixe para a etapa
seguinte o trabalho de adequar as ideias à legislação, às
possibilidades reais de exequibilidade. Cada ideia conduz a uma
nova ideia, a um novo pensamento e aí encontra-se a riqueza do
processo. Quanto mais livres formos na criação de valor, mais
possibilidades de acordos ganha/ganha e maior a satisfação com
os resultados alcançados.

Em resumo, como criar valor?

a) cultive confiança e compartilhe informações, o que pode ser


realizado com uma “busca conjunta de dados”;
b) faça perguntas para identificar desejos, medos, necessidades,
preferências e posições;
c) revele informações estrategicamente;
d) faça múltiplas ofertas simultaneamente.

Distribuição de valor

Significa escolher as opções geradas na etapa de criação de valor,


oferecê-las de acordo com sua estratégia e a estratégia que você percebe
nas outras partes. As opções serão então trocadas, de comum acordo
entre os participantes. A escolha e a troca de opções entre as partes
constitui, verdadeiramente, o processo de negociação. Nessa etapa, as
partes fazem concessões, maiores ou menores, em função dos interesses
e da BATNA (Ury, Patton e Fisher, 2014) de cada um. Lembramos que
a BATNA é um instrumento de poder e, quanto mais forte ela for,
menores serão as concessões para a aceitação das opções.
Enquanto na etapa da criação de valor prevaleceu a cooperação, a
busca conjunta de dados, o estabelecimento do relacionamento e da
confiança, nessa etapa de distribuição de valor, prevalecerá a competição,
a estratégia para oferecer às outras partes as opções identificadas na
etapa da criação de valor.
Na troca das opções, deve-se traçar uma estratégia que consiste em
priorizar as opções para trocá-las pouco a pouco, cada uma a seu tempo,
dependendo da estratégia definida.
Para que a etapa da distribuição de valor transcorra naturalmente,
sem sobressaltos, sem desconfianças, sem sentimentos de que se está
sendo ludibriado, será fundamental que o relacionamento e a confiança
estejam bem alicerçados. Acredita-se, dessa forma, que todos farão a
jogada combinada, que honrarão os compromissos, cabendo nessa etapa
a inserção de critérios e padrões (definidos na criação de valor) para as
trocas, bem como para o acompanhamento e controle da execução do
acordo firmado.
Tem-se como exemplo, na área financeira, a negociação de formas de
pagamento, prazos, composição dos valores e, também, de preços, pois
todas essas variáveis são dependentes umas das outras. Você pode definir
um valor um pouco mais alto, porém ofereça a concessão de maiores
prazos para pagamento.
Desenhe acordos que envolvam as partes nos resultados, pois
quando as partes estão envolvidas no resultado, todos farão esforços
para que os termos sejam cumpridos. Todas as partes se esforçarão para
obter os melhores resultados.
Na etapa de distribuição de valor, devem também ser negociados os
prazos de execução, penalidades, direitos, obrigações, enfim, todas as
condições que deverão constar no contrato a ser firmado.
Deve-se, ainda, alinhar a compreensão do que está sendo negociado,
lembrando que cada uma das partes possui diferentes percepções da
realidade; evitar os riscos associados ao viés de julgamento; ouvir
ativamente; fazer anotações; validar os acordos; perceber e interpretar o
gestual da outra parte, além de separar as pessoas dos problemas.

Implementação/fechamento

Uma vez definidos os termos finais da negociação, as ações dessa etapa


consistem em validar e acompanhar os acordos alcançados, de forma que
nenhuma das partes precise se preocupar com a violação dos resultados
alcançados. Deverão ser realizados acordos de monitoramento da
execução da negociação; definição de incentivos organizacionais e
controles. Deve-se trabalhar para a manutenção do relacionamento.
Há uma clara associação entre as etapas e os elementos do processo
de negociação, conforme pode ser observado no quadro 7.
Quadro 7
Etapas e elementos do processo de negociação
Elementos Preparação Criação de Distribuição de valor Implementação
valor

Contexto x

Interesses x x

Opções x x

Poder x x x

Cognição x x x x

Relacionamento x x x x

Concessão x

Conformidade x x

Critérios/padrões x x x

Tempo x x

Fonte: Duzert (2007).

A MNC distinguiu 10 elementos, quais sejam: contexto, interesses,


opções, poder, cognição, relacionamento, concessão, conformidade
legal, critérios/padrões e tempo. Cada um desses elementos está
associado às diferentes etapas do processo de negociação. Sendo um
processo, não há rigidez nem regra para a adoção dos elementos ao
longo das etapas.
Pode-se depreender do quadro 7 que o elemento “contexto” tem um
papel fundamental na etapa da preparação da negociação, ambientando
o negociador (ambiente, clima etc.). O elemento “interesses” será
fundamental nas etapas de preparação e criação de valor. Na etapa de
preparação, as partes têm que ter clareza do que estão negociando e do
que desejam. Na etapa da criação de valor, o negociador criará opções e
oportunidades para trocar, tendo o que oferecer como contrapartida ao
atendimento de seus interesses. Os demais elementos serão apresentados
no capítulo 5.

Busca de acordos pós-acordos


Trataremos desse tema em separado das etapas do processo de
negociação, pois constitui-se uma etapa que ocorrerá depois de
finalizada a negociação (Raiffa, 2002).
Uma vez que o processo de negociação está finalizado e
considerando que as partes estão satisfeitas com o resultado
ganha/ganha alcançado, com o nível de confiança entre as partes em
alta, com o relacionamento bem estruturado, com as tensões e emoções
amainadas, as partes podem fazer uma nova rodada de negociação,
buscando melhorar as posições/acordos alcançados.
Não há mais a ansiedade para alcançar resultados, pois estes já foram
pactuados, não paira mais nenhuma ameaça de rompimento de acordo,
mas as partes podem, de comum acordo, sem qualquer estresse, voltar a
conversar para melhorar suas posições no acordo recém-concluído.
Lembramos que, quando estamos ansiosos, tensos, sob pressão,
podemos ter visão, audição e compreensão seletivas, limitando e
comprometendo a tomada de decisão. Se estivermos livres de tudo isso,
poderemos pensar melhor e, quem sabe, buscar soluções (criação de
valor) ainda não pensadas e enriquecedoras para todas as partes.

Dilema do negociador

Para criar valor é necessário oferecer informações sobre seus interesses,


porém revelar seus interesses pode criar desvantagem.

Podemos associar esse dilema às duas etapas do processo de


negociação: criação de valor e distribuição de valor. Podemos também
associá-lo à nossa tendência de cooperar e de competir.
Na etapa da criação de valor é fundamental “oferecer informações
sobre seus interesses”, quando devemos, estrategicamente, fazer com
que as outras partes conheçam nossos interesses, nossas argumentações
e justificativas. Essa é uma etapa de colaboração/cooperação entre as
partes. Essas informações devem ser oferecidas estrategicamente, na
medida em que a outra parte também oferece informações. Devemos
criar credibilidade e confiança no decorrer da negociação.
Por outro lado, “revelar seus interesses pode criar desvantagem para
você”, indica a competição. A competição é saudável, compete-se por
melhores resultados e para melhor atender aos interesses, porém não se
deseja com essa competição aniquilar a outra parte. É necessário,
portanto, que as partes informem seus interesses, de forma cuidadosa e
estratégica, buscando uma reciprocidade nesta troca, sob pena de a
negociação ser ganha/perde.
Uma negociação ganha/perde faz com que o perdedor se sinta
desconfortável, injustiçado, humilhado, o que o incentivará a buscar
uma revanche em outra oportunidade. Dessa forma, a negociação não
acaba, ela retornará ao primeiro sinal de fragilidade daquele que
ganhou, ou de fortaleza daquele que se sentiu perdendo. É prejuízo na
certa.
5
Elementos do processo de negociação

Cognição
É um processo de conhecimento, que tem como fontes: a informação do
meio em que vivemos e o que está registrado em nossa memória. Esse
processo envolve: atenção, percepção, raciocínio, juízo, imaginação,
pensamento e linguagem.
A tomada de decisão reflete processos cognitivos e motivacionais que
dependem da forma pela qual interpretamos as informações, avaliamos
riscos, estabelecemos prioridades e vivenciamos sentimentos de perdas e
ganhos.
Críticas, ao invés de produzir mudanças positivas, inspiram atitudes
defensivas e de retaliação porque atacam o orgulho e afetam a
autoestima dos indivíduos. Por outro lado, o sentimento de
inferioridade pode encorajar os indivíduos, especialmente em
circunstâncias competitivas.

“Nunca interrompa um inimigo quando ele está cometendo um erro” (citação


atribuída a Napoleão Bonaparte em: <www.brainyquote.com/quotes/napoleo
n_bonaparte_103585>).

Os comportamentos são analisados a partir de escolhas apoiadas em


julgamentos e avaliações sobre a própria situação no processo de
negociação. Muitas vezes, tomamos decisões que são inconsistentes com
nossos interesses de longo prazo por causa de motivações temporárias
ou para perseguir metas alternativas. Para tomarmos decisão levamos
em consideração:
• as informações disponíveis sobre a situação;
• a análise do comportamento da outra parte;
• a predição sobre o que acontecerá;
• a avaliação das potenciais consequências.

Os processos cognitivos nos levam à definição de táticas de


negociação. Veja a figura 11 inserida a seguir:

Figura 11
Optical art

Fonte: <www.fatosdesconhecidos.com.br>. Acesso em: jan. 2018.

Pode-se observar na figura 11 apresentada, que vemos movimento


até onde não existem. Se nos fixarmos em pontos da imagem,
verificaremos que ela é estática. Tudo que se move nos atrai como um
imã. O sistema visual cria nossa imagem do mundo a partir de hipóteses
muito bem fundamentadas e ancoradas no cérebro.
A plasticidade do cérebro ajusta, revisa e atualiza informações a todo
o instante, como observamos na imagem em que, apesar de estática,
nosso cérebro cria movimento. O homem não tem controle sobre essas
atualizações que o cérebro empreende. Estamos permanentemente
aprendendo e revendo posições. As permanentes organização,
atualização, rescisão e reanálise empreendidas pelo cérebro apresentam
uma semelhança necessária ao processo de negociação, principalmente
em suas etapas de preparação e de criação de valor.
Os negociadores revisam e atualizam seus interesses acrescentando
novas informações, que vão, paulatinamente, modificando a condução
do processo de negociação na busca de ganhos mútuos.

Modelo cognitivo

Existe uma tendência de nos prendermos a uma única interpretação,


principalmente se ela for negativa, e resistirmos às outras.
Nosso sistema de raciocínio comete alguns enganos:

• abstração seletiva: escolhemos o que enxergar e o que ouvir,


descartamos e não prestamos atenção quando queremos;
• supergeneralização: ao ocorrer uma determinada ação,
generalizamos ao comunicar o que está ocorrendo “com todo
mundo”, ou que acontece “em todos os lugares” etc.;
• maximização ou minimização: tendemos a amplificar ou reduzir as
ocorrências. Por exemplo, duas pessoas portavam um
determinado objeto. Tendemos a dizer que vimos “muitas
pessoas” ou que “quase ninguém”;
• pensamento dicotômico: nosso pensamento oscila entre o sim e o
não, entre o desejo e não desejo. Temos altos e baixos;
• personalização: quando um indivíduo está emitindo um
determinado comentário, tendemos a achar que ele está se
referindo a nós mesmos e não a uma outra pessoa. É necessário e
fundamental que separemos as pessoas dos problemas. O não
dado a uma proposta é um não à proposta e não à pessoa.

Percepção da realidade

Nosso cérebro cria uma realidade, porém existe uma limitação sobre o
que somos capazes de ver e perceber (Klein, 2013). Devemos buscar
conhecer quais as informações que os outros negociadores/indivíduos
têm sobre um mesmo objeto.
Por exemplo: duas pessoas assistiram a um mesmo filme. É possível
que algumas cenas tenham passado despercebidas por uma das pessoas,
ou que um detalhe não tenha sido visto, enfim, cada indivíduo pode
depreender uma mesma informação de diferentes formas.
Assim, o elemento cognição trata do conhecimento e do
alinhamento das diferentes compreensões sobre o assunto em pauta,
sobre o significado das palavras, ou seja, trata de reduzir o gap de
percepção das partes sobre uma mesma questão.

“‘Descobrimos muito cedo uma coisa interessante’, relata Amit Singhal,


engenheiro de busca, que trabalhou de perto com sinônimos. ‘As pessoas
trocam as palavras em suas buscas. Então alguém diria ‘Fotos de cachorros’
e, depois, ‘Fotos de filhotes’. Isso significa que talvez ‘cachorros’ e ‘filhotes’
fossem intercambiáveis. Também descobrimos que, quando você ferve
água, é água quente. Aprendemos a semântica com os humanos, e isso foi
um enorme avanço’.
O sistema de sinônimos do Google passou a entender que ‘cachorro’ era
similar a ‘filhote’ e que ‘água fervente’ era sinônimo de ‘água quente’.
Todavia, os engenheiros também descobriram que a ferramenta de busca
considerava que um ‘cachorro-quente’ era sinônimo de ‘filhote fervendo’. ‘O
problema foi corrigido’, diz Singhal, ‘por meio de um avanço no final de 2002,
que usava as teorias de Ludwig Wittgenstein sobre como as palavras são
definidas pelo contexto’” (Levy, 2012:66-68).

Contexto/ambiente
O contexto é representado pelos ambientes externo e interno onde se
desenvolve o processo de negociação, que podem ser mapeados por
meio da identificação do clima organizacional e das emoções que
envolvem todos no ambiente. O negociador deve ter uma visão holística
do processo, que lhe permita identificar posições, status e perfis das
partes, que servirão de subsídio para a definição da estratégia a ser
adotada. Condicionar as pessoas a um determinado contexto pode
prepará-las a aceitar um ponto de vista ou decisão – pré-suasão
(Cialdini, 2017).
O ambiente externo é composto pelos cenários político, econômico,
social, ambiental, cultural, religioso, comercial, entre outros (visão
macro).
Já o ambiente interno é representado pelas condições do seu entorno
próximo: relacionamento, estresse, ambiente organizacional etc. (visão
micro).
O negociador estará com a “fotografia” de todo o ambiente
disponível que servirá de base para as reflexões e para facilitar a
identificação das opções. Como o ambiente é dinâmico, há necessidade
de ficar atento à percepção, intuição e cognição, de forma que se tenha
um mapa, o mais fiel e atual possível, que permita balizar
posicionamentos e abordagens.
A figura 12 apresenta, de forma esquemática, as relações de
dependência e interdependência dos agentes/pares em uma empresa.
No centro da figura tem-se o time, composto pelo chefe e pelos
indivíduos que são pares (estão no mesmo nível hierárquico) e
subordinados. Essa relação entre chefe e subordinados exige uma
negociação vertical, e a relação entre os pares exige de cada um uma
negociação horizontal.

Figura 12
Ambientes interno e externo de uma empresa
Fonte: Burbridge et al. (2001).

Dentro da organização, o chefe tem que se relacionar com seus pares


que são chefes de outras áreas, relacionamento esse que exige também
uma negociação em muitos momentos. Há negociação entre times,
como os representados por clientes e fornecedores de serviços em que,
por exemplo, o setor jurídico é um fornecedor interno de contratos,
tendo como cliente o setor comercial.
Ultrapassando seus portões, as empresas se relacionam com seus
fornecedores e clientes externos, além de se relacionarem com seus
acionistas e com a comunidade na qual estão inseridas. Todas essas
relações conduzem à necessidade de negociações.
Qualquer negociação exige uma análise do contexto da cultura, da
macroeconomia, da geografia, da história, entre outros; permite
identificar a melhor forma de se negociar – negociação direta,
negociação por meio de agentes (advogados, agentes imobiliários,
procuradores etc.), facilitadores, mediadores, leilões, negociações
informais paralelas, negociações multipartites, arbitragem; e resolução
de conflitos por meio de terceiros, sendo eles juízes e o poder de polícia.

Interesses
Interesses são os resultados que se deseja obter em uma negociação.
Pergunta-se: Quais seus reais interesses na negociação? Quais os
interesses da outra parte?
Para alcançar esses resultados, devem ser superados emoções,
intempestividades, preocupações, medos, desejos, necessidades e
esperanças. As pessoas têm seus próprios interesses e eles variam em
função das circunstâncias.
Interesses são valores subjacentes às posições e constituem as razões
pelas quais são estabelecidas as posições e as exigências. Quais os
motivos, desejos que estão por trás dos pedidos e das posições? A
definição dos interesses conduzirá a negociação. Veja a figura 13.

Figura 13
Posições e interesses
Fonte: adaptada de: <http://lucianameirelles.blogspot.com.br/p/conversando-sobre-
nos.html>.

Pode-se depreender da imagem apresentada na figura 13 que as


posições ficam na superfície, aparentes, expostas, visíveis; externalizam a
razão de os indivíduos realizarem seus pedidos e agirem; os interesses
ficam submersos, não aparentes, são dedutíveis e envolvem sensações,
valores e memórias do passado; são intangíveis e percebidos pela nossa
intuição. Há que se buscar dentro de cada um de nós, e com a outra
parte, o real interesse com relação à negociação.
Perguntas fundamentais: Por que estamos aqui negociando? O que
eu desejo da outra parte? O que a outra parte deseja de mim? Como
procederíamos se estivéssemos no lugar deles? Existem stakeholders
envolvidos (Susskind, Cruickshank e Duzert, 2008)? Quais interesses
devem nos preocupar? Quais interesses são compartilhados? Quais
interesses são diferentes? Quais interesses são conflitantes? O que se
busca atingir nessa negociação? Essas questões deverão levar a uma
satisfação dos interesses para que o acordo seja durável.
Além dessas perguntas, os interesses podem ser identificados a partir
dos questionamentos apresentados no quadro 8.
q p q
Quadro 8
Identificação dos interesses
Você O outro

O que se deseja alcançar? x x

Qual a sua meta? x x

Qual o seu objetivo? x x

Por que estamos negociando? x x

Quais são as diretrizes? Empresa

Qual é a estratégia? Empresa

Quais são as prioridades? Empresa

Dentro de um CONTEXTO

É importante destacar que uma análise criteriosa dos interesses pode


desvendar a existência de uma quantidade muito maior de interesses
comuns ou compatíveis do que de interesses antagônicos. As partes
devem ser amigáveis, ter bom relacionamento, de modo a construir um
clima que facilite a abordagem do problema, a busca de uma solução
conjunta, que proporcionará o melhor resultado para todos os
envolvidos.

Exemplo

Em uma organização, no momento da definição do orçamento das áreas


jurídica, comercial, marketing, recursos humanos, finanças e logística, há
conflitos na distribuição dos recursos entre as áreas, há poder envolvido. A
área que receber mais recursos pode ser mais poderosa; quem receber uma
fatia menor do orçamento pode ter menos poder. O CEO deve definir com a
diretoria uma política de prioridades e quais interesses são estratégicos para
aquele ano, o que definirá os percentuais de aumento no orçamento de cada
área.
Para que os resultados sejam alcançados, deve-se proceder às
seguintes ações especí cas:

• concentrar-se em interesses e não em posições;


• comunicar nossos interesses (talvez não sua intensidade);
• perguntar sobre os interesses deles.
 
Conheça todos os interesses, mas não revele suas preferências.

Há diferenças entre preferência, desejo e necessidade. A preferência


está associada à prioridade que será definida para os diferentes interesses
existentes em uma negociação. A intensidade das necessidades definirá o
poder de barganha: quanto maior a necessidade, menor o poder de
barganha e maiores as concessões. O desejo está associado à utopia, o
que eu desejaria, o que as outras partes desejariam – seria a condição
ótima.
A conciliação, o alinhamento dos interesses, o estabelecimento de
estratégias tem como “pano de fundo” uma análise benefício/custo,
como é modelizado na teoria dos jogos. Cada estratégia, cada decisão
tem um custo e um benefício e, analisadas e ponderadas essas variáveis, a
escolha acaba recaindo sobre aquela que apresenta maior benefício. Há
interesses que são negociáveis e outros não negociáveis, definidos pelos
princípios; há limites para os interesses, que são os padrões de
comportamento, critérios éticos, critérios morais. Definir os interesses
nos permite identificar os possíveis conflitos.

Opções
Referem-se ao conjunto de oportunidades que cada uma das
partes/atores/negociadores elenca, a partir do conhecimento dos
interesses da outra parte e que poderão ser utilizadas nas trocas. As
opções enriquecem a negociação, aumentam o “tamanho da torta”. São
oportunidades que podem ser oferecidas e trocadas para além das
negociações financeiras. Quanto mais opções, maiores as possibilidades
de troca, mais “rico” se tornará o acordo.
Enriquecer o resultado da negociação depende de criar novas
oportunidades que agreguem valor e complementem a negociação.
Essas oportunidades podem ser criadas por meio de uma “tempestade de
ideias”, com liberdade de pensamento, pois não representam qualquer
compromisso, simplesmente são ideias livres. Quanto mais opções
existirem, mais poder se terá na negociação, pois você passará a ter mais
oportunidades a serem trocadas, ampliando assim as possibilidades de
ganhos mútuos (Ury, 2014).

Deve-se ser suave com as pessoas, porém duro na defesa de seus


interesses.

Para “inventar/criar” opções criativas, portanto, é preciso: separar o


ato de criar opções do ato de julgá-las; ampliar as opções a serem
apresentadas, em vez de buscar uma resposta única; buscar benefícios
mútuos; e inventar meios para facilitar as decisões do outro.
Julgamento prematuro; busca de uma resposta única; pressuposição
de um bolo fixo e pensar que “resolver o problema deles é problema
deles” constituem obstáculos que inibem a criação de opções.

Padrão/critérios
Refere-se à necessidade de estabelecer/definir parâmetros que sejam
aceitos e que tenham a confiança de todas as partes. Conflitos de
interesses ocorrem quando não se encontram padrões que satisfaçam as
partes.
Definir padrões ou critérios é fundamental para qualquer
negociação. Há um dito popular que apregoa: “o que foi combinado
[quando há regras] não sai caro”. Qualquer organização tem um estatuto
ou um regimento que define sua operação e o padrão de conduta com o
qual todos devem concordar ao integrar a organização. A economia tem
como métricas índices e indicadores; já os bens e serviços são
produzidos de acordo com padrões de qualidade previamente
estabelecidos.
O padrão dá legitimidade a uma decisão. A pauta ou um manual é
um instrumento que representa um padrão do processo; a política de
uma empresa também é um padrão com o qual todos que dela
participam devem concordar.
Como exemplos de padrão, têm-se os preços, como o do barril de
petróleo, o dos aluguéis de temporada quando há eventos etc., pois são
balizadores e definidores de âncoras.
Como padrões e critérios incluem-se também os padrões moral, de
comportamento, de etiqueta, de costume, de rotinas, de funcionamento
de empresa, de código de informática, de normas de compliance,
definindo o que é e o que não é permitido dentro do sistema. Tudo isso
está associado com a conciliação e com a liberdade de opções dentro dos
padrões, sejam técnicos, de produtos, químicos. Por exemplo: a Aneel
definiu padrões para as tomadas elétricas de dois ou três buracos (este é
um padrão). O padrão permite a conciliação técnica, cultural, até
mesmo de comportamento, dos costumes, facilitando o alinhamento
entre as pessoas na busca da conciliação.

Tempo
O tempo é um elemento que pode ser utilizado estrategicamente ao:

• retardar ou acelerar o processo;


• desvalorizar a outra parte, deixando-a esperando;
• afetar as emoções, expectativas e a conquista dos interesses.

A velocidade com que um processo de negociação se desenvolve é


um fator que pode gerar decepção nos negociadores. Quando a
negociação se desenvolve ou termina rapidamente demais, os
participantes tendem a ficar insatisfeitos, especulando que poderiam ter
despendido mais tempo negociando ou pressionando para obter
melhores resultados (Trump, 2016). Também, se o processo de
negociação for muito lento, cria uma sensação de desestímulo,
desinteresse, que pode contaminar o resultado da negociação.
Um exemplo de velocidade do processo, segundo pesquisas, pode ser
observado em sala de aula, quando os primeiros alunos que entregam as
provas são os mais decepcionados com os resultados que alcançaram,
principalmente quando a nota da avaliação é baixa. A forma de reduzir
as chances de decepção é agir com calma e ponderação (Wood, 2016).
Fazer uma breve interrupção pode ter o sentido de acalmar as partes,
de distensionar o ambiente, de gerar distância do problema, em busca de
solução. Por outro lado, poderá também gerar mais ansiedade, o que
tem um efeito negativo para quem ficou ansioso.
Em momentos de incerteza há uma dificuldade de os negociadores
se comprometerem com resultados futuros, o que inviabiliza a
possibilidade de acordo. Os contratos contingenciais são utilizados para
diluir o risco entre as partes, pois definem condições de efetivar acordos
no futuro, quando as condições ajustadas ocorrerem. Há uma garantia
de que dadas determinadas condições o acordo prevalecerá; se as
condições não se configurarem, partes do acordo, vinculadas a essas
condições, estarão cobertas pelo contrato e não haverá qualquer
punição. Uma parte ganhou uma garantia no presente, se futuras
condições ocorrerem.

Negociação sobre a cota de pesca entre a Secretaria de Meio


Ambiente (SMA) e a Associação de Pescadores de Atum – contratos
contingenciais

A SMA se reuniu com a Associação de Pescadores de Atum (APA) para


negociar a cota de pesca de atum vermelho, em uma zona portuária da
Bahia.
A SMA trouxe para a reunião dados que comprovam a existência de 10
toneladas de atum vermelho, enquanto os pescadores dispõem de
informações que indicam a existência de 20 toneladas de atum vermelho
nessa zona portuária.
A negociação para uma definição sobre a cota de pesca ideal para aquela
região gerou um impasse, uma vez que cada uma das partes tem
opiniões, informações e visões diferentes sobre o problema. A APA deseja
ter a autorização para explorar uma cota superior à desejada pela SMA, e
esta defende a preservação dos atuns na região.
Uma solução encontrada pelas partes foi a de reduzir o gap de percepção,
realizando uma busca conjunta de dados e contratando um especialista
em gestão marítima, que fosse acadêmico ou um profissional de outro
estado, tendo esse especialista uma postura imparcial, comprometido
somente com a questão. Foi assinado, assim, um contrato contingencial,
no qual ambas as partes assumiriam o risco sobre as condições futuras
(que são incertas).
O contrato permitia que os pescadores explorassem a pesca do atum
vermelho sob determinadas condições, de forma que os pescadores não
ficassem parados durante a realização das pesquisas (busca de dados).
As condições poderiam assim ser descritas:
• no primeiro ano: seria liberada a pesca de quatro toneladas de atum
vermelho e, no final daquele, seria avaliado o plantel de atuns. Caso a
avaliação comprovasse uma disponibilidade de oito toneladas de atum
vermelho, os pescadores poderiam passar a pescar oito toneladas por
ano;
• no segundo ano: atendendo às condições do primeiro ano, seria
liberada a pesca de oito toneladas por ano e, no final daquele ano,
seria avaliado o plantel de atuns. Caso a avaliação comprovasse a
disponibilidade de 20 toneladas de atum, os pescadores poderiam
passar a pescar até 10 toneladas de atum vermelho por ano, e assim
sucessivamente.
Conclusão:
O contrato com contingência permite decidir no presente quando existe
incerteza, e considera a boa-fé de cada um nas propostas e interesses
que estão sendo negociados. Se os pescadores têm tanta certeza de que
existem 20 toneladas de atum vermelho na região, eles não deveriam ter
problemas em aceitar uma cláusula conservadora; e, se a SMA é
pessimista achando que a região tem apenas 10 toneladas de atum, eles
não deveriam ter medo de colocar uma cláusula otimista de cota de
pesca.
O contrato com contingência permite dividir os riscos, apostando neles;
permite trabalhar o elemento tempo quando ele se torna uma fonte de
impasse; permite alinhar o lado cognitivo, administrando de forma mais
racional a gestão do risco, da informação e da decisão.
Conforme apresentado por Fisher, Ury e Patton (1994:24), “quanto
mais extremadas as posições iniciais e menores as concessões, maiores
serão o tempo e o esforço despendidos para descobrir se o acordo é ou
não possível”.

No caso das relações comerciais entre Brasil e China, os brasileiros se


caracterizam por possuir uma abordagem mais pragmática, voltada para o
problema e visando a resultados rápidos, enquanto os chineses se
preocupam mais com o relacionamento entre as partes, com a aquisição da
confiança e de um estudo prévio do caso negociado.
Portanto, os brasileiros devem se preparar para despender mais tempo na
etapa de preparação e criação de valor, analisando interesses e
desenvolvendo opções.

Temos como exemplos do elemento tempo:

1. Questões que devem ser perguntadas pelas partes a fim de


dimensionar o planejamento e desenvolvimento das negociações:
a) De quanto tempo se dispõe para preparar uma negociação e
para negociar?
b) O tempo de que uma das partes dispõe é semelhante ao
tempo disponível da outra parte?
c) A falta de tempo pode facilitar a quebra de um impasse? Ou
poderia inviabilizar o melhor resultado de uma negociação?

2. Um bom resultado pode ser alcançado por meio de:


a) contratos contingenciais, vinculando uma ação a outra;
b) avaliação da produtividade das negociações, que representa
tempo e dinheiro;
c) percepção de risco (atritos, pânico e impressão negativa)
difere quando as partes dispõem de diferentes tempos;
d) a demora no julgamento das ações pelo Judiciário tem um
custo muito alto:
Justiça é cara para ações de menor valor: estudo mostra
que a causa de menos de R$ 500 traz perda financeira
para o autor, mesmo que seja vitorioso, levando-se em
conta as custas processuais cobradas, o gasto com
advogados e o tempo em que o processo tramita até que
seja fixada uma sentença. No caso de uma ação de R$ 50
mil, quase 76% desse valor se perderiam ao longo do
processo judicial (Estudo realizado pelo Ministério da
Fazenda) [O Globo, 4 dez. 2005].

A definição de um tempo-limite (deadline) obriga as partes a


convergirem para um resultado de acordo. Há riscos envolvidos: atritos,
pânico e impressão negativa. Uma negociação sem prazo, apesar de
permitir mais tempo para a criação de valor, permite aumentar
benefícios mútuos. Muitas vezes é importante ir devagar para ir rápido,
devagar para conseguir melhores resultados, consertar todas as partes
para não haver necessidade de reengenharia e reajuste no futuro.
Qual é o tempo da pessoa? O tempo é diferente para cada indivíduo,
para cada empresa e para cada tipo de negócio. Quando se trata de
investimentos em bens de capital, como estradas, infraestrutura, grandes
maquinários, não se esperam retornos com menos de 25 anos; quando se
trata de commodities, o prazo de retorno poderá ser estimado em cinco
anos.
A visão de dar tempo ao tempo, de que tudo o que você faz com
tempo, o tempo respeita significa que se deve verificar o timming da
pessoa e suas preferências, tais como: desejo de liberdade, agilidade,
flexibilidade, compromisso de longo prazo, redução da liberdade e/ou
segurança. Todas essas questões estão associadas a maior ou menor
disponibilidade do elemento tempo.
Pode-se observar, como exemplo, a dificuldade de conciliar o tempo
na cozinha de um restaurante, onde pratos com diferentes cozimentos
solicitados por cinco clientes em uma mesma mesa devem sair todos
juntos, de forma equilibrada e correta para a mesa dos comensais.
Similarmente, uma das maiores dificuldades em negociação é conciliar o
timming das pessoas, a sincronização e a percepção da velocidade.
Concessão
Conceder significa oferecer à outra parte algo de que dispomos e que
seja de interesse dela. A concessão não significa perder poder. Conceder
significa ter poder para oferecer algo que seja de interesse para a outra
parte. Trata-se de um jogo de estratégia (Dupuy, 1989). Concessão não
é fraqueza; pode ser um facilitador para fechamento de um acordo,
especialmente, se houver uma reciprocidade de concessão. Refere-se a
comprometimento das partes, formulação de compromisso,
reciprocidade e colocar-se no lugar do outro.
Cabem as perguntas: O que é conceder? Concessão significa perder?
Concessão está associada à reciprocidade? Conceder é tornar-se refém?
Conceder é submeter-se? Conceder é perder o poder?
Concessão refere-se a:

• comprometimento das partes;


• formulação de compromisso;
• reciprocidade;
• colocar-se no lugar do outro (empatia).

Para negociar, é necessário que a outra parte possua algo desejável e


que nossos próprios objetivos sejam atingidos quando oferecemos algo
em troca. A disposição para negociar é uma confissão de necessidade
mútua.
A concessão pode ter relação com a ancoragem. Se a âncora for
muito distante do que poderá ser acordado, significa que há uma
amplitude grande para fazer concessões. Há que se cuidar para que a
relação âncora/concessão não seja muito grande, pois, apesar de ser
interessante fazer concessões mútuas, se a amplitude da concessão for
muito grande, essa diferença poderá representar desconfiança. Tudo que
é em excesso torna-se prejudicial. Ancorar com agressividade excessiva
pode levar o outro lado a concluir que é impossível entrar em um
acordo; ou o outro lado poderá sentir-se insultado com a oferta.
Grandes concessões podem ser interpretadas como indício de uma
significativa flexibilidade adicional, e o outro lado pensará que você
poderá voltar a ceder muito. Um movimento menor poderá significar
que a oferta está próxima do preço, e as concessões, nesse ponto, serão
cada vez menores. Não se deve ceder ao impulso de fazer concessões.
As concessões poderão ser menores:

• se a BATNA for forte e se não houver pressa (tempo);


• se puderem surgir novos interessados (players).

Desejamos que nos achem razoáveis, que gostem de nós (persuasão),


o que nos leva a empreender grandes concessões para conquistar.

Desvalorização reativa

As propostas e as ofertas sugeridas pela outra parte tendem a ser


desvalorizadas pelo negociador. Negociadores tendem a agir
menosprezando a capacidade cognitiva da outra parte, interpretando,
muitas vezes erroneamente, as concessões oferecidas pela outra parte.
O valor de uma ideia não depende da ideia em si, mas do indivíduo
que a apresenta. Vejamos o exemplo de uma pesquisa desenvolvida em
Stanford, conforme apresentado por Bazerman (2004):

Três grupos de alunos foram apresentados a duas estratégias (A e B) sobre


apartheid. Foi solicitado que cada grupo escolhesse uma das duas
estratégias.
Ao primeiro grupo, informaram que a estratégia A foi a preferida do
Conselho Stanford. O resultado da pesquisa indicou que os alunos
escolheram a estratégia B (contrária à preferida pelo conselho).
Ao segundo grupo, informaram que a estratégia B foi a preferida do
Conselho Stanford. O resultado da pesquisa indicou que os alunos
escolheram a estratégia A (contrária à preferida pelo conselho).
Ao terceiro grupo nada foi dito. O resultado da pesquisa indicou que 50%
dos alunos escolheram a estratégia A e 50% escolheram a estratégia B
(adaptado de Bazerman, 2004).
Conclusão: quanto maior for o desejo de “impor-se ao outro”, maior
o risco de ser bloqueado/contrariado por ele. Quanto mais nos
preocupamos com “nossas” proposições, mais nos arriscamos a ver
nenhuma delas acatada pelo outro.

Em 1814 Napoleão desejava que a imperatriz Maria Luísa deixasse Paris.


Para fazê-la sair e sabendo que ela agia contrariamente aos seus desejos
(os de Napoleão), ele resolveu então insistir para que ela permanecesse na
cidade. Como resultado, a imperatriz Maria Luísa saiu de Paris.

Excesso de confiança e dificuldade de conceder

O negociador que tem confiança excessiva acredita que sabe tudo, que
sabe a solução, que sabe o que tem de ser feito e o que o outro deveria
fazer. Na verdade, ele superestima sua performance.
Como isso se manifesta?

• reflexos acusatórios (pessoas): a culpa é sempre do outro, que


deve admiti-la, mesmo que para isso o relacionamento fique
prejudicado. Gera tensão;
• reflexos posicionais (problemas): “Existe apenas uma solução e é
a minha”. Há uma falta de consideração pelos desejos dos outros;
• colocar-se como líder no que tange ao processo: “Sei mais do que
os outros e devo decidir o desenrolar da negociação”.

O excesso de confiança pode levar a comportamentos intransigentes,


a menores concessões e a acordos não colaborativos nas negociações.
O excesso de confiança pode ser benéfico em algumas situações,
como “se garantir” ao se aventurar em empreendimentos ou inspirar
respeito e confiança nos outros. Mas também o excesso de confiança
conduz a um posicionamento arrogante que gera uma barreira, muitas
vezes intransponível, para a tomada de decisões profissionais efetivas.

Um líder deve criar uma cultura de dúvida, sabendo escutar as minorias, que
podem ver diferentes da maioria e, ao mesmo tempo, ter razão.

Na concessão, há também a ideia de doação. Doar pode ser um


prazer e não custa, não gera inveja. A noção de doar vem com a
concessão e pode ser um sacrifício se for unilateral. Quando associada a
uma causa maior, está associada a uma generosidade. Não fazer
concessões pode estar ligado à falta de opções.

Relacionamento
Esse elemento trata de como as partes se relacionam. Qualquer
negociação, tendo ou não alcançado um acordo, busca manter o
relacionamento em boas condições, “não se deve fechar uma porta”. Um
bom relacionamento é uma das chaves para o sucesso da negociação.
Não é preciso que as partes gostem umas das outras, nem que tenham os
mesmos interesses; devem prevalecer o respeito e a integridade.
Em uma negociação as partes conversam muito entre si, sobre
diversos assuntos que as ajudam a se conhecer melhor. Pesquisas
indicam que cerca de 95% do tempo da negociação (criam-se laços,
credibilidade, confiança) são despendidos com conversas, e a negociação
propriamente dita só ocorre ao longo de 5% do tempo. Trata-se de um
investimento realizado no tempo e que traz ótimos resultados.
Fazer acordos não significa fazer amigos, mas há que se preocupar
com a manutenção do relacionamento. À medida que a negociação se
aproxima dos parâmetros que interessam ao acordo final, sinalize. Se seu
interlocutor não tiver autoridade final, reserve um espaço de manobra
nos termos finais.
Um bom relacionamento e a construção de um ambiente amistoso
facilitam a troca de informações, a identificação de interesses, a criação
de valor, de opções e de alternativas. Deve-se buscar “entrar na
frequência” do outro, o que gera credibilidade. Devemos nos relacionar
antes de racionalizar; o relacionamento antecede o negócio.
Na etapa de criação de valor, deve-se privilegiar a análise da situação
e das pessoas, ser afável, partilhar preocupações, sugerir soluções,
respeitar as diferenças, dar espaço aos outros e elogiar. O elogio derruba
barreiras e faz com que a outra parte fique mais aberta a ouvi-lo e a
barganhar no ganha/ganha.
Durante a etapa da distribuição de valor, as tensões costumam ser
maiores e mais intensas, desgastando bastante o relacionamento e
alterando o comportamento dos participantes. Deve-se cuidar do
relacionamento.
A conclusão dos acordos e a satisfação com os resultados obtidos
podem estar diretamente ligadas à qualidade do relacionamento entre as
partes.
Atualmente, nas organizações, há uma redução dos níveis
hierárquicos, gestão por projetos, criação de unidades de negócios,
organização matricial servidos por sistemas de informações integrados.
Nesse contexto, desconcentram-se as informações, amplia-se a rede de
relacionamentos, exigem-se negociações entre diversas áreas. Todos
esses fatores colaboram para a ampliação dos conflitos.
É importante saber que:

• o excesso de cobiça implica perder transações valiosas no futuro;


• fazemos ofertas hoje, na perspectiva de obter retorno em outra
oportunidade;
• a confiança reduz o custo de monitoramento da execução do
acordo;
• um bom relacionamento modera as tentativas extremas de exigir
valor.

As concessões acabam sendo maiores para os clientes mais difíceis e


menos valorizados, pois há sempre uma esperança de que o
relacionamento melhore, o que pode ser uma armadilha. Ambos devem
ganhar ou perder juntos.
Em resumo:

• um relacionamento sólido gera confiança, e as partes


compartilham informações mais livremente. Os acordos tornam-
se mais criativos e valiosos e há uma maior disposição para
trabalhar junto;
• um relacionamento ruim gera desinvestimento em tempo e
esforço no processo de negociação, desconfiança e retenção de
informação, e há necessidade de maior cautela na comunicação.

Para manter o equilíbrio no relacionamento:

• crie confiança com palavras e atos em harmonia. Não assuma


compromissos que não possa cumprir; reconheça e respeite os
interesses fundamentais da outra parte;
• comunique seus interesses, recursos e preocupações às outras
partes;
• reconheça e enfrente rapidamente os erros, que são inevitáveis;
• solicite um feedback. Não suponha o que a outra parte esteja
pensando, tome a iniciativa de trazer o problema à tona.
Pergunte: “Tudo está acontecendo conforme o esperado?”.

É importante compreender que três segundos são necessários para se


decidir um voto no Congresso norte-americano; que uma fração de
segundos faz com que “escaneemos” uma pessoa desconhecida que entra
em um ambiente; o relacionamento cortês, a atenção e a gentileza de
um cirurgião podem decidir se, a um erro médico, o paciente o
processará ou não.
Segundo Hal Movius (2017), o indivíduo confiante poderá melhorar
e acelerar os resultados de uma negociação. Hal Movius define, assim, as
características de indivíduos confiantes e não confiantes. Veja a seguir o
quadro 9.

Quadro 9
O que significa ser confiante?
Confiante Não confiante

Engajado Desviante

Calmo e focado Nervoso e distraído

Claro, transparente Confuso e ambivalente


Falante: assertivo Tem medo de falar

Sabe o que fazer Não tem certeza do que fazer

Monitora a situação Monitora seus pensamentos e


sentimentos

Elabora boas perguntas Teme fazer perguntas

Otimista: vê possibilidades de bons resultados Vigilante: não espera bons resultados

Olha para frente buscando aprender com a Teme ser dominado e ser explorado
interação dos outros pelos outros

Age Reage

Fonte: Movius (2017:11).

A profa. Amy Cuddy (2012), em sua palestra TED, mostra a


importância da linguagem corporal e o controle do metabolismo
hormonal.
Como Daniel Goleman e Dalai Lama (2003) em seu livro Como lidar
com emoções destrutivas, a profa. Amy Cuddy mostra a importância do
sorriso, da empatia, do bem-estar e das emoções positivas. Isso revela a
mudança de paradigma apresentada pelo prof. Martin Seligman na área
de psicologia positiva que, por exemplo, apresenta mesas de negociações
mais calmas quando o ambiente foi criado tendo em vista ergonomia,
salas de reuniões mais encantadoras, lojas ou hospitais com cores mais
aconchegantes, ou seja, em locais onde as pessoas experimentam
sensações agradáveis.
O mundo empresarial deve seduzir o cliente, o cliente interno, o
acionista e, para isso, precisa cuidar do relacionamento, das palavras, das
atitudes verbais e não verbais. Cada vez mais, estudantes, empresas,
funcionários públicos insistem em trabalhar a mentalidade, o modo de
se relacionar e de garantir as habilidades de simpatia, integridade moral
e elegância moral. A nova forma de negociar transforma o estilo de
negociar duro, fechado e estressado para dar lugar ao prazer do debate,
da franqueza amistosa, da confiança e do relacionamento de longo
prazo, fidelização. Os resultados das negociações são muito melhores.
Poder
Na maioria das negociações há uma assimetria de poder e a tendência é
buscar um equilíbrio. Como buscar um equilíbrio? Em negociações
entre duas pessoas, utiliza-se a teoria dos jogos, como exemplificado no
“dilema dos prisioneiros”, já apresentado. Nas negociações
multipartites, deve-se verificar as possibilidades de coalizões e definir
uma BATNA. Quanto mais interessante e forte for a BATNA, mais
poder você terá na negociação. No caso de se possuir uma BATNA
fraca, há o risco de se tornar “refém” da outra parte no processo de
negociação. Há também elementos vinculados às “aparências de poder”
(deixar a outra parte esperando, “fazer-se de importante”, ostentar
símbolos de poder  etc.) que fazem com que a outra parte se sinta
diminuída, levando-a a fazer um acordo ruim para ela e ótimo para o
“poderoso”.
Há também o poder psicológico, representado por manipulações
(ameaças) até mesmo quando há uma aparente falta de poder. O poder
não tem valor, a menos que você o utilize para obter uma vantagem. O
poder não é ruim, mas abusar dele é péssimo.

Se você tem a habilidade de influenciar a outra parte e o resultado de uma


negociação, você tem poder.

Negociadores avaliam se possuem mais ou menos poder com base


não só nas suas próprias alternativas como também nas alternativas da(s)
outra(s) parte(s).
A cooperação é uma forma de poder, por exemplo, ao se trabalhar
com os outros para fazer algo que não se consegue fazer por conta
própria; no aprendizado de escutar o outro com atenção e na capacidade
de dialogar, em oposição a debater ou discutir.

Poder advindo da cooperação

Primavera Árabe: movimentos de massa nos quais as pessoas cooperavam


em rede, formando grandes multidões. A grande quantidade de pessoas
juntas foi a força/o poder deste movimento.
Movimentos occupy: movimentos de 200 a 300 pessoas, apoiados na
persistência e na resiliência em provocar uma conscientização no público.
Eram cerca de 200 a 300 pessoas dormindo juntas no parque, onde criaram
laços sociais que permitiram que perseverassem.
Demonstrações de longo prazo: dão às pessoas a força para continuar a
tentativa de despertar o público.

Negociadores poderosos estão mais inclinados a fazer a primeira


oferta (ancorar) do que os negociadores mais “fracos”. Os negociadores
poderosos são mais persistentes, custam a concordar quando
confrontados com obstáculos e buscam metas mais agressivas. Se eles
têm algo a ganhar, dificilmente aceitam um impasse. Sua assertividade
não só produz ganhos, mas lhes permite descobrir mútuos benefícios,
que podem ser trocados, trazendo vantagens para as duas partes (veja
perfil autoritário).

Táticas de negociações

É importante conhecer as diversas táticas utilizadas em muitos processos


de negociação, para não ser apanhado de surpresa. Conhecê-las facilita
desarmá-las e neutralizá-las. Apresentamos, a seguir, algumas táticas
mais utilizadas.
• O gentil e o mau (good cop and bad cop)
Dois agentes conduzem a conversa com um terceiro. Um dos agentes
desempenha o papel de gentil, paciente, educado, compreensivo,
buscando empatia com a outra parte e tentando controlar o agente
agressivo; o outro agente desempenha o papel de mau, sendo agressivo,
não conciliador, rígido e muito crítico com seu par (colega).
O agente que faz o papel de mau abandona a negociação, para
pressionar, demostrando desinteresse, de forma que o terceiro fique face
a face com o agente gentil, que aproveita a oportunidade da ausência do
agente mau para propor um acordo.
• Ducha escocesa
Um agente apresenta-se a um interlocutor desempenhando dois papéis,
simultâneos e intercalados. Em um momento apresenta-se agressivo,
imprevisível e irritado; em seguida, esse mesmo agente mostra-se
também aberto e compreensivo.
A imprevisibilidade tem como objetivo desestabilizar e fragilizar o
interlocutor. Essa técnica é utilizada para negociações de longo prazo,
quando o agente pressiona, apresenta opções pesadas e age estressando
o interlocutor. Em seguida, o agente apresenta uma opção mais leve e de
seu interesse. Comparativamente, a opção mais leve, diante das opções
pesadas e anteriores, será a melhor. Conhecemos essa tática pela
expressão “morde e assopra”.
• Cortina de fumaça
Uma das partes esconde o verdadeiro objetivo de seus interesses, não
deixa transparecer sua demanda e ainda formula demandas que não
tenham relação com o verdadeiro desejo. Dessa forma, ela cria uma
“nuvem de fumaça”, mudando o foco da questão principal para uma
questão secundária. Ela cansa o interlocutor com as questões
secundárias e, posteriormente, já no final, apresenta sua real demanda.
Sendo essa real demanda apresentada no final, depois de já terem sido
aceitas ou rejeitadas as questões “secundárias” pela outra parte, ela se
afigura como uma concessão, aumentando as chances de aceitação, que
se dará por culpa de já ter rejeitado inúmeras questões ou por já ter
aceitando muitas questões “secundárias”, chegando o momento de
conceder à outra parte uma demanda.
Deve-se conhecer bem o interlocutor, as reações, os egos, as
expectativas para antecipar as reações. Essa tática foi muito utilizada
durante a Guerra Fria, por russos e americanos.
 Exemplo:
 Uma indústria têxtil (IT) deseja exclusividade de uma tinta para seus
tecidos. E há uma negociação com um fornecedor de tintas:
 IT: pede cotação de preço para uma determinada demanda de tintas,
inferior à real.
 Fornecedor: cota um valor alto, dada a quantidade solicitada.
 IT: solicita desconto sobre o valor informado.
 Fornecedor: oferece como condição para reduzir o preço que o cliente
adquira uma quantidade maior de tintas.
 IT: aumenta o pedido e, em contrapartida, solicita, em função da
quantidade, a exclusividade.
• Vantagem futura
Oferta de uma oportunidade futura em troca de uma vantagem
imediata, como se fosse trocar algo concreto por promessas. Essa
tática não pode ser utilizada em uma perspectiva de médio e longo
prazos, pois a reação pode significar abuso de confiança. É necessário
se ter o exato conhecimento do que poderá ser afetado.
• Desvalorização da oferta
Uma das partes menospreza a oferta da outra parte, mostrando que
não é interessante, mesmo quando comparada com a dos
concorrentes.
Para que essa tática seja utilizada, será necessário, antes do início da
negociação, que uma das partes discorra sobre os defeitos e sobre os
problemas do objeto a ser negociado, de forma a depreciá-lo. A outra
parte, que detém o objeto, diante da depreciação do mesmo, rejeitará
qualquer negociação ou flexibilizará em muito as condições. Há que se
ter o cuidado para não ferir a outra parte e deve-se mostrar que a
posição não é pessoal.
Pode-se ensaiar um discurso em forma de desinteresse ou de irritação,
cujo objetivo é desestabilizar ou instaurar um jogo de forças.
• Desvalorização da pessoa
Coloca-se a outra parte em uma posição de desvantagem, inferiorizada
e reprimida com ações tais como: deixar o interlocutor esperando e/ou
acomodá-lo em local pequeno e desconfortável e/ou atendê-lo de
forma seca, e/ou interromper a conversa com ligações “importantes”.
• Jack, o estripador
Essa estratégia é utilizada quando se “fatia” questão muito grande em
pequenas partes, para melhor decidir ou negociar cada fatia
individualmente. Se não se consegue resolver o todo, por que não se
pode resolver cada uma das partes?
Quando a exigência é cortada em pequenas fatias, as concessões não
“chamam atenção”, passam despercebidas e, assim, aparentam ser
irrelevantes, individualmente.
• Ultimatum
Apressar o resultado de uma negociação pode gerar estresse, reduz o
tempo para criar opções e valores na negociação. Trata-se de uma
técnica bastante autoritária.
O ultimatum aparece como um resultado de uma discussão dura e
intransigente sobre um ponto-chave, porém não convém mostrar-se
ríspido ou agressivo quando se trata de propor um prazo.
• Leilão
O leilão é utilizado, na maior parte das vezes, por grandes empresas.
Estas reúnem os fornecedores para ofertarem seus produtos e
concorrerem entre si. Uma das formas de leilão mais disputadas, é o
leilão reverso, quando o “relógio dos valores” é acionado com valores
mais altos. O lance é dado parando-se o “relógio” em uma competição
de menores preços para o comprador. O comprador tem de saber lidar
com própria ansiedade, pois, ao parar o relógio com um lance, ele
paga um valor mais alto do que se tivesse esperado mais um pouco.
Por outro lado, esperar pode significar a perda de oportunidade, pois
um concorrente poderá “parar o relógio”. Sites da internet permitem
fazer leilões, comparar preços e pesquisar as melhores ofertas.
• Ataques individuais
Ocorrem quando a empresa, ao receber cotação de todos os
fornecedores, contata um dos fornecedores para anunciar o preço dos
concorrentes e barganhar uma posição melhor. Há uma desvantagem:
a possibilidade de blefe do comprador e pressão sobre o fornecedor.
Há também o “desvio” em oferecer um produto mais customizado,
atendendo aos interesses do comprador, diferenciando-se dos demais
fornecedores, criando uma dificuldade para o comprador comparar
preços, ou induzindo a compra de um específico produto de um
fornecedor específico.
• Ficar calado
Diante do silêncio prolongado, uma das partes busca preencher o
vazio. Ao falarem, as partes informam e demonstram seus interesses.
Há uma enorme dificuldade em ficar calado, diante do vazio, do
silêncio.
• Salame
Dividir, “fatiar” um problema maior em pequenos problemas. Muitas
vezes é mais fácil negociar pequenas partes do que negociar um
montante significativo. As pequenas concessões são menos dolorosas.
Por exemplo, o estado aumenta 3% no imposto de comunicações, 5%
sobre a água, 4% sobre a eletricidade. No final, houve um aumento
significativo de arrecadação, sem que se tivesse de anunciar um
aumento de 12% como um todo.
Conformidade legal
O elemento conformidade refere-se à legitimidade dos contratos
necessária à viabilização de um acordo, observando-se as leis e a
estabilidade dos órgãos reguladores, responsáveis por legislar sobre o
assunto, estabelecer regras e constituir-se um foro de discussão.
A análise da conformidade compreende, para além dos contratos,
todo o ambiente no qual a negociação deve ser realizada, a fim de que a
implementação e a sustentação dos acordos possam ser asseguradas.
As negociações realizadas em ambientes que apresentam baixo grau
de conformidade irão incorporar custos mais altos, associados ao risco
assumido e às poucas garantias de cumprimento.
Devem ser realizadas ações específicas de consultas à legislação e aos
advogados especialistas para verificar a legalidade e as implicações das
iniciativas.
6
Formas de negociação

A matriz de negociações complexas sintetiza as etapas do processo de


negociação, os elementos, formas de negociar e indicadores.
O quadro 10 apresenta as 10 formas de negociação, considerando
sua distribuição em dois grupos, dependendo da autonomia das partes
em determinar como desejam negociar e qual(is) resultado(s) deseja(m)
alcançar. Independentemente da forma de negociar, espera-se que as
partes tenham bem definidos seus interesses e o objeto da negociação.

Quadro 10
Formas de negociação
Formas de negociação

Direta

Agentes

Facilitador

Mediador
Baseadas em interesses
Metamediador

Informais paralelas

Multipartite

Arbitragem

Baseadas Judicial
na lei
Força policial
Fonte: Spinola, Brandão e Duzert (2011).

Nas oito formas de negociação baseadas nos interesses, há um


elemento comum, que é a autonomia das partes para negociar. A gestão
do processo de negociação está sob inteiro controle das partes. Não há
qualquer interferência de terceiros sobre os resultados; as partes têm
total liberdade para decidir se aceitam ou não o acordo e como irão
conduzir o processo.
Nas duas formas de resolução de conflitos baseada nas leis, via
Justiça ou pela força policial, há um enfraquecimento para a negociação,
uma vez que a liberdade e a autonomia abrem espaço para a decisão de
um terceiro, seja um juiz, seja um mandado policial. Nesse momento,
não há mais negociação, não há mais a possibilidade de interferência das
partes no processo, mas um terceiro irá definir um veredicto, a despeito
da participação das partes. Uma sentença não resolve o conflito entre as
pessoas; na verdade, posterga-o.

Negociação direta
Trata-se de uma negociação entre as partes em que os interessados
tratam diretamente com a outra parte, sem intermediários (mediadores,
agentes, facilitadores), a fim de defender seus interesses e chegar a um
acordo.
Na negociação direta é fundamental:

• separar as pessoas do problema;


• voltar a atenção para os interesses e não para as posições;
• criar uma variedade de possibilidades antes de decidir o que
fazer;
• insistir para que o resultado tenha por base algum padrão objetivo.

Negociação via agentes


Agentes possuem seus próprios interesses sobre o fato negociado e, por
vezes, os indicadores ou metas para mensuração de seu resultado ou do
êxito de sua atuação podem diferir dos parâmetros e resultados da
negociação. Os agentes são procuradores, representantes, quaisquer
indivíduos que sejam mandatários e que representem o principal
(Mnookin e Susskind, 1999).
Sua forma de atuação não se dá por meio da neutralidade, pois,
como representam uma das partes, agem por ela ou no lugar dela.
Os agentes possuem importância e agregam valor quando possuem
conhecimentos específicos sobre o objeto negociado ou sobre o
ambiente em que a negociação se desenvolve.

Negociação via facilitador


Os facilitadores são pessoas que têm a habilidade de gerenciar encontros
e conversas entre partes que estão em litígio. Fazem seu trabalho frente
a frente com as partes.
O facilitador deve apresentar-se com imparcialidade, não possuindo
autoridade para decidir pelos grupos envolvidos na negociação. São suas
responsabilidades:

• desenvolver as agendas de reuniões;


• estabelecer padrões e regras de conduta para preservar o
relacionamento entre as partes;
• garantir a fluidez nos encontros, estabelecendo canais de
comunicação;
• fomentar a interação a fim de conduzir às soluções para a
construção do acordo.

Negociação via mediador


Na década de 1970, nos Estados Unidos da América, a administração do
presidente Jimmy Carter impulsionou a criação de centros de mediação
comunitária.
O objetivo desses centros era oferecer uma alternativa aos tribunais,
permitindo aos cidadãos reunirem-se e procurarem uma solução para a
questão que ali os levava. Estes programas, que tiveram enorme êxito,
estenderam-se a todo o país e, um pouco mais tarde, a todo o mundo.
O que é mediação?

De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ, s.d.):

A Mediação é uma forma de solução de conflitos na qual uma terceira


pessoa, neutra e imparcial, facilita o diálogo entre as partes, para que
elas construam, com autonomia e solidariedade, a melhor solução
para o problema. Em regra, é utilizada em conflitos
multidimensionais ou complexos. A Mediação é um procedimento
estruturado, não tem um prazo definido, e pode terminar ou não em
acordo, pois as partes têm autonomia para buscar soluções que
compatibilizem seus interesses e necessidades.

No Brasil, adota-se a conciliação, como uma variante da mediação,


que é um método mais simples,

no qual o terceiro facilitador pode adotar uma posição mais ativa,


porém neutra com relação ao conflito e imparcial. É um processo
consensual breve, que busca uma efetiva harmonização social e a
restauração, dentro dos limites possíveis, da relação social das partes.
As duas técnicas são norteadas por princípios como
informalidade, simplicidade, economia processual, celeridade,
oralidade e flexibilidade processual.
Os mediadores e conciliadores atuam de acordo com princípios
fundamentais, estabelecidos na Resolução n. 125/2010:
confidencialidade, decisão informada, competência, imparcialidade,
independência e autonomia, respeito à ordem pública e às leis
vigentes, empoderamento e validação.
[...]
No dia 3 de maio de 2016, o CNJ lançou o sistema de Mediação
Digital que permite acordos, celebrados de forma virtual, de partes
do processo que estejam distantes fisicamente, como, por exemplo,
entre consumidores e empresas. O sistema facilita a troca de
mensagens e informações entre as partes, que podem chegar a uma
solução. Esses acordos podem ser homologados pela Justiça, se as
partes considerarem necessário. Caso não se chegue a um acordo,
uma mediação presencial será marcada e deverá ocorrer nos
Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejuscs),
criados pela Resolução CNJ n. 125 [CNJ, s.d.].

Lei no 13.140, de 26 de junho de 2015

A Lei no 13.140/2015 dispõe sobre a mediação entre particulares como


meio de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos
no âmbito da administração pública. O parágrafo único do art 1o define
mediação como:

a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder


decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a
identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia.

Ainda, de acordo com a Lei no 13.140/2015:

Art 2o. A mediação será orientada pelos seguintes princípios:


I – imparcialidade do mediador;
II – isonomia entre as partes;
III – oralidade;
IV – informalidade;
V – autonomia da vontade das partes;
VI – busca do consenso;
VII – confidencialidade;
VIII – boa-fé.

Escola Nacional de Mediação e Conciliação (Enam)

Em 2014, foi criada a Escola Nacional de Mediação e Conciliação


(Enam), com o objetivo de facilitar o acesso à Justiça, difundir técnicas
de resolução extrajudicial de conflitos, formar mediadores e
conciliadores para trazer soluções mais harmônicas aos conflitos, criar a
cultura da mediação e conciliação para evitar que novos processos
entrem na Justiça, liberando os juízes para atuar em processos que
necessitem efetivamente da sua presença.

Características do mediador

Com base na experiência dos autores e em Moore (1996), elencamos as


principais caraterísticas que o mediador deve possuir:

• o mediador caracteriza-se por ser uma pessoa que ajuda as partes


principais a chegarem, de forma voluntária a um acordo,
mutuamente aceitável, das questões em disputa;
• o mediador não tem poder normativo, deve possuir uma cultura
de debates, de entendimentos, de atualização e de revisão de
posições;
• o mediador não resolve o problema, nem impõe solução: sua
função é auxiliar as partes a buscar o melhor caminho e fazer
com que estejam de acordo, depois de encontradas as soluções;
• o mediador tem controle do processo, mas não dos resultados.
• o mediador deve fazer simulações mentais, ver as dimensões
ocultas, usar metáforas para superar impasses, resistências e
barreiras cognitivas, improvisar, aliar padrões, detectar anomalias
e saber reconhecer e gerar um clima de simpatia e confiança.

No desenvolvimento da sua atividade, o mediador deverá


compartilhar informações relevantes, explicar os raciocínios, manter o
foco nos interesses, e não nas posições, combinar defesa e pesquisa por
meio de procura conjunta de dados (PCD), mapear os interesses dos
participantes, manter-se neutro, formatar uma descrição consensual do
conflito, oferecer desempenho atrativo, convidar sem impor.
Deverá também preparar a documentação sobre a natureza do
conflito, entender as opções e antecipar os possíveis cenários de
resolução, organizar e definir as regras gerais e os valores para
programar um ambiente cooperativo e consensual (Susskind, Cruikshanl
e Duzert, 2008).
Construir confiança e compartilhar informações, fazer perguntas e
sugerir múltiplas ofertas simultaneamente são ações que facilitarão a
criação de valor pelo mediador.

Metamediação
A metamediação é executada por pessoa e/ou organização que constrói
os referenciais políticos e as visões de mundo comuns a um sistema
social.
Os metamediadores têm papel estratégico no sistema de decisão, já
que formulam o conjunto de referenciais do eixo das negociações e
atuam nos conflitos e alianças que direcionarão as negociações. Possuem
também o poder de recomendação para a melhoria das posições.

Caso CDES

Na era Lula, em 2003, foi criado o Conselho de Desenvolvimento


Econômico e Social (CDES) para permitir, de forma concreta, que a
sociedade civil participasse do processo para a tomada de decisão, no
âmbito das reformas legislativas previdenciária, tributária e trabalhista.
O CDES era uma agência de assessoramento do presidente da
República, integrada por diversos segmentos da sociedade civil, com um
secretário executivo, com status de ministro de Estado.
Seu principal objetivo era buscar o consenso sobre importantes questões
do país e igualmente servir como um órgão consultivo da Presidência da
República.
Na condução das negociações complexas, o mediador do CDES construiu
um elo de confiança com 90 conselheiros do presidente, criando uma
atmosfera de diálogo, inspirando valores-chave, como o respeito, e não
permitindo críticas pessoais.
[...]
O CDES corresponde a um órgão de metamediação que engloba
múltiplos mediadores dentro de um mesmo espaço e visa, por meio do
consenso, estabelecer um maior número de regras equitativas e
satisfatórias.
O metamediador facilita o trabalho do presidente da República e do
Congresso, discriminando todos os interesses e pré-selecionando um
conjunto de possibilidades de equilíbrio para cada indivíduo e para a
sociedade como um todo.
O CDES, como metamediador, pode atuar como guardião da
racionalidade do mediador (cada conselheiro), como o escriba da
racionalidade dos mediadores e dos cidadãos, como catalisador da
racionalidade social. A metamediação se consolida, portanto, como um
instrumento de gestão híbrida entre um modelo de julgamento arbitrário do
Estado e um modelo de negociação mais suave (preventivo) interno da
sociedade civil (adaptado de Duzert, 2007:71-79).

Negociação informal paralela


As negociações informais paralelas são realizadas por representantes não
oficiais que discutem entre si, buscando elementos para um acordo
enquanto as hostilidades permanecem, muitas vezes, no âmbito dos
representantes oficiais.
As partes atuam informalmente, agilizando as questões a partir de
workshops, com ênfase em brainstorming, e na busca de solução de
problemas.
Os representantes estão livres para ouvir os outros, perceber como o
mundo observa os pontos de vista das outras partes e, também, explorar
opções que os negociadores oficiais não consideram.

Diálogo multipartite (DMP)


Processo atualmente utilizado pelas Nações Unidas e por organizações
multilaterais, na busca do desenvolvimento de conversações entre
representativos grupos de interesse.
Os objetivos do DMP referem-se à construção do relacionamento,
reunião e troca de informações, e construção de consenso, sendo este
último o mais ambicioso. Assim, o diálogo multipartite é um processo
que auxilia a organização de uma governança colaborativa.
A construção de consenso deve ser buscada entre os participantes e
ele é alcançado quando todos os participantes concordam que poderão
se satisfazer com o pacote de resultados que foi definido pelas partes.
Para que as negociações multipartites prosperem, deve-se estruturar
corretamente a estratégia das coalizões, construindo alianças para
ampliar o poder de barganha.

A Organização Mundial do Comércio (OMC) (2018)

A OMC iniciou suas atividades em 1o de janeiro de 1995 e, desde então, tem


atuado como a principal instância para administrar o sistema multilateral de
comércio.
A organização tem por objetivos estabelecer um marco institucional comum
para regular as relações comerciais entre os diversos membros que a
compõem, estabelecer um mecanismo de solução pacífica das controvérsias
comerciais, tendo como base os acordos comerciais atualmente em vigor, e
criar um ambiente que permita a negociação de novos acordos comerciais
entre os membros.
Atualmente, a OMC conta com 160 membros, sendo o Brasil um dos
fundadores.

Arbitragem
Num processo de arbitragem, cada parte apresenta sua posição para um
árbitro, que, por sua vez, estabelece regras a respeito das questões
envolvidas.
O acordo arbitral só precisará ser levado a juízo caso não seja
cumprido espontaneamente pelas partes.
Para contratos comerciais, a arbitragem aparece como alternativa
eficiente ao oferecer menores custos, menor prazo para apresentação de
sentença, profissional especializado e preparado escolhido pelas partes,
sigilo e confidencialidade.

Juiz: o poder legal


A resolução dos conflitos é “alcançada” com a aplicação das leis, de
forma que o processo de criação de valor é suprimido e o juiz exerce o
papel de autoridade máxima, responsável por determinar o resultado
final da disputa. Dessa forma, as partes perdem a liberdade e a
autonomia de decidir sobre a resolução do conflito, deixando a decisão a
um terceiro.

Polícia e força militar


Essa forma de negociação é a de maior coerção para as partes. Há o uso
da força para o atendimento da solução e uma das partes,
irremediavelmente, sairá perdendo (Mnookin, 2009). A implementação
da força expõe possibilidades de retaliações e ameaças, devendo-se
observar os riscos e as consequências dessas abordagens. O conflito não
se resolve, tanto quanto não se resolve o conflito via Judiciário. Amplia-
se e posterga-se o conflito.
A utilização da força pode promover uma escalada do conflito, de
forma que o objetivo principal, que é a defesa dos interesses, acaba
sendo subavaliada.
7
Indicadores

Complementando a Matriz de Negociações Complexas (MNC), os


indicadores são métricas qualitativas e quantitativas que se deseja
alcançar no processo de negociação. Na verdade, esses indicadores
perpassam todo o processo. A seguir destacaremos os indicadores.

Satisfação/racionalidade
Busca-se identificar se interesses iniciais foram atendidos com a
negociação. Pode-se considerar também se um novo raciocínio ou novo
objetivo, fruto do aprendizado com a outra parte, foi incorporado
trazendo satisfação. Algumas vezes, as pessoas avaliam um acordo como
satisfatório sem perceber que poderia haver um resultado ainda mais
satisfatório. Realizar um benchmarking com outros acordos similares
poderia orientar as partes a conhecerem outras possibilidades.
Por exemplo, os indivíduos podem avaliar que um acordo 4/4 é
satisfatório, porém se souberem que outras negociações similares
fecharam acordos 10/10, eles poderão perceber que ficaram restritos a
um viés de julgamento (heurística) ou à racionalidade limitada, em vez
de criar valor. Outro exemplo seria a utilização de uma plataforma
digital (repositório de informações) que reúna informações para
consultas e troca de experiências, comparada a outros acordos que
facilitem a racionalização dos processos.

Controle
Há necessidade de definição de métricas que facilitem o controle do
acompanhamento e implementação dos acordos firmados, o que é
fundamental para o sucesso. Um contrato deve refletir os acordos e
definir multas e recursos, caso o acordo não esteja sendo cumprido.
Muitos acordos são apenas intenções, que não são, de fato, levadas a
efeito.

Risco
Avaliação do risco do acordo e do perfil dos negociadores – de aversão
ou de propensão ao risco – é determinante na ousadia de enfrentamento
da incerteza. Os negociadores podem, por exemplo, identificar os riscos
financeiros, mas não identificar os riscos técnicos ou jurídicos. Por isso,
é fundamental uma cultura de governança colaborativa, um facilitador
que harmonize as diferentes linguagens da empresa, para considerar
todos os diferentes setores, em que cada um detém sua informação e
percepção do risco. Não existe preço justo sem avaliação criteriosa do
risco.

Otimização econômica
Buscam-se resultados que minimizem desperdícios. Busca-se ver se
todos os interesses foram atendidos, conhecer o valor de cada interesse,
o custo de cada interesse e, assim, avaliar, por meio da teoria dos jogos,
ou por análise do faturamento, ou da contabilidade de custos, se o
contrato é rentável e próximo dos objetivos iniciais. Caso não seja
aderente aos objetivos iniciais preconcebidos, uma vez que o
aprendizado com o outro permite revisar, atualizar e modificar os
objetivos, a direção poderá tomar um rumo diferente, que seja mais
inteligente.

Ética
É a base para nossas ações, conduta e relacionamento. O pensamento de
longo prazo, o cuidado com a satisfação do cliente interno, do acionista,
do cliente externo, com a sustentabilidade das decisões faz com que as
empresas com alta rentabilidade pensem no longo prazo. A ética da
transparência, do modo de tratar as pessoas, de ser um cidadão que
harmoniza o interesse privado e o bem comum é a base da confiança. A
ética é um conceito para além de respeitar as leis e os códigos
tradicionais. Por exemplo: Nelson Mandela, que discordava da
Constituição da África do Sul, a qual legalizava o racismo do apartheid,
entendeu que um ato ético seria o de lutar contra uma legislação arcaica
ou de tradições obsoletas.

Justiça/equidade
Os resultados têm de ser justos para todos os envolvidos, sem que haja
ganhadores ou perdedores. Um acordo negociado tem a anuência das
partes, porém, para ter valor jurídico e ser implementado, precisa ser
validado após análise jurídica, de forma que o que for acordado se ajuste
à legislação e a respeite.

Produtividade
Diante da escassez de recursos, deve-se conseguir obter o máximo de
resultados com os recursos existentes, atendendo sempre aos
indicadores elencados (ética, justiça, otimização etc.). A transformação
digital, com plataforma de compartilhamento de experiências, permite
acelerar o processo para um acordo sem ter de “reinventar a roda”.
Cada vez mais, os leilões eletrônicos, o comércio eletrônico, as
plataformas ring (Duzert, 2017) de compartilhamento de experiência
entre vendedores da empresa ou compradores da mesma empresa,
permitem tornar mercados mais líquidos e acelerar a produtividade, na
criação de acordos ou na resolução de conflitos. A mediação é também
um mecanismo que permite uma resolução de conflitos de forma mais
rápida do que quando a questão é enviada ao Judiciário.

Emoções
As negociações refletem nossos comportamentos, que são balizados
pelos sistemas 1 e 2 – razão e emoção. Como você se sente no final da
negociação? Feliz, triste, enganado, humilhado, enojado ou otimista,
raivoso ou pacificado, medroso ou confiante? Todas essas emoções
impactam seu futuro relacionamento com o interlocutor com quem
você negociou. É fundamental tentar sair de uma negociação com
emoções positivas (Seligman, 2004) e ver as concessões não como sinal
de fraqueza, mas, muitas vezes, como sinal de bondade (Goleman,
2005).

Impacto e sustentabilidade
Compromisso com o meio ambiente e respeito ao próximo. Uma busca
conjunta de dados, um relatório de impacto ambiental consiste em
compartilhar o resultado com um especialista neutro ou um agente do
setor público, para verificar se o acordo respeita o meio ambiente, o
espaço em que vivemos, pois o futuro dos negócios deve ser projetado
para 10/20 ou mais anos. Por exemplo, no projeto para a implantação de
uma fábrica em uma determinada região, faz-se necessário negociar e
analisar, juntamente com a comunidade e com os agentes públicos, o
impacto que o projeto causará na região. Dever-se-á buscar,
conjuntamente, uma solução para os efeitos perversos.

Auto-organização
Devemos ter a consciência de que a todo instante estamos nos
transformando, adquirindo novos conhecimentos, e todo o contexto se
reorganizará em função dessas mudanças. O fato de vivenciar uma
experiência já nos faz diferentes do que éramos. Por exemplo, assistir
uma aula, vivenciar uma discussão, compartilhar experiências nos
modificam, e passamos a ser diferentes com essa experiência acumulada.
A inteligência é capaz de se adaptar às mudanças de contextos –
mudanças no preço do petróleo, mudanças no padrão do aluguel no
bairro e tudo que pode justificar um acordo pós-acordo (Raiffa,
Richardson e Metcalfe, 2002). Os princípios da auto-organização, de
constante revisão, atualização de rotinas ou percepções foram estudados
por Varela e Maturana (2001) com os termos inação, como a capacidade
de fazer surgir reações adaptadas, e autopoiese como sistema capaz de se
auto-organizar para estar em harmonia com o ambiente ou contexto.
A auto-organização também se apresenta na capacidade dos gerentes
equalizadores (Calvalcanti, 2005), que podem corrigir as divergências
entre departamentos, sincronizar e ajustar as mudanças para criar coesão
e comportamento coletivo inteligente.
8
Ética

A ética perpassa todo o processo de negociação, todas as nossas ações,


nossa conduta e todos os nossos relacionamentos.
No passado, as sociedades eram homogêneas, as pessoas
compartilhavam mais ou menos os mesmos valores, as mesmas
tradições. Elas estavam integradas em um contexto com as mesmas
características e assim, a partir dessa estabilidade, ligavam um “piloto
automático” para tomar decisões. As soluções aprendidas e os problemas
enfrentados no passado já não se encaixam nas rotinas desenvolvidas.
Estamos no meio de uma crise de orientação na qual faz-se cada vez
mais necessária a valorização da ética.
A sociedade moderna, ao contrário, é pluralista e heterogênea. As
regras do jogo muitas vezes não são claras; os tempos atuais são tempos
de grandes transformações, de grande velocidade; de inovações em
tecnologia da informação e globalização; sobrecarga de informações;
velocidade crescente para a tomada de decisão. Com regras dos jogos
pouco claras, é óbvio que pelo ponto de vista da ética as questões
tornam-se mais importantes.
De acordo com citação de Thomas Hobbes (1588-1679), se não há
regras do jogo, haverá violência por meio da dominação do mais forte e,
como consequência, haverá o medo, fazendo com que toda a sociedade
fique altamente instável.
A elaboração de contratos é uma forma de criar regras mediante as
quais renunciamos algumas das nossas liberdades na busca de
estabilidade e paz.
De acordo com o pensamento de David Hume (1713-1784), a razão
pela qual devemos nos envolver em definir regras é que precisamos de
cooperação, pois é por meio da cooperação que podemos aumentar o
“tamanho da torta”, e assim superamos os recursos limitados. Mas, se
quisermos cooperar, precisamos ter confiança. Se quisermos confiar uns
nos outros, precisamos poder confiar que todos sigam e concordem com
as mesmas regras.
Portanto, há duas razões para ter regras em uma sociedade: evitar a
violência e cooperar cada vez mais. Isso é verdade para as organizações e
para os indivíduos. Nas sociedades homogêneas, o certo e o errado são
bastante claros. Nas sociedades heterogêneas, a maioria das decisões é
complexa, não se restringindo à polarização do certo e do errado, mas
situando-se em algum ponto inserido na amplitude entre o certo e o
errado. Essa região entre o certo e o errado é denominada zona
cinzenta. A ética se faz necessária justamente quando tomamos decisões
nessa área cinzenta, e as decisões nessa área constituem decisões sobre
dilemas (Sebenius, 2008).
Quando as negociações contêm elementos competitivos, os
negociadores podem sentir-se tentados a usar táticas que lhes permitam
ganhar vantagem numa determinada fase do processo de negociação.

Caso Enron

A Enron foi uma empresa que, durante alguns anos, transformava tudo em
ouro. Era a empresa mais desejável para se trabalhar, até que entrou em
colapso devido a um enorme escândalo de contabilidade fraudulenta, no
ano de 2001. Pergunta-se: Como é possível criar no topo de uma empresa
um sistema que seja criminoso?
Pode-se fazer uma releitura da história da Enron por meio da lente da
cegueira ética.
Enron é o resultado da fusão, em 1985, de duas corporações – Houston
Natural Gas e InterNorth, esta última uma companhia de gás natural do
estado americano de Nebraska. A empresa era uma operadora de
gasodutos com mais de 37 mil quilômetros de dutos sob seu controle. Até
o início dos anos 1990, a Enron era líder no fornecimento de tubos para
transporte de gás em todo o país. Seu modelo de negócios era muito
simples e lucrativo. O negócio de pipeline da Enron foi fortemente
regulamentado, até 1988, quando o governo decidiu desregulamentar
esse tipo de indústria.
Os problemas da Enron tiveram início a partir desse momento, quando,
devido à desregulamentação, sua rentabilidade diminuiu, além de estar
endividada por conta da recente fusão. Em busca de um modelo de
negócios mais inovador, Kenneth Lay, o CEO da empresa, contratou uma
empresa de consultoria, a McKinsey. Jeff Skilling, da equipe McKinsey,
propôs transformar a Enron em um banco de gás.
Em vez de somente transportar o gás entre diferentes pontos, o novo
modelo de negócios passaria a comprar o gás e o transportaria para
vendê-lo. Dessa forma, a Enron poderia controlar toda a cadeia de
fornecimento de gás no país, sendo cobrada uma taxa pelo transporte e
pela venda de gás.
Em 1990, Kenneth Lay criou uma nova divisão, a Enron Finance
Corporation, e contratou Jeff Skilling para liderar essa divisão. Ao longo do
tempo, eles aumentaram seu poder sobre o mercado, dominando o
mercado de gás (compra e venda), além do transporte, ampliando
significativamente o lucro da empresa.
Em novembro de 1999, a Enron ampliou seu escopo de negócios, criando
o Enron online, um sistema global de transações na web que permite que
os consumidores consultem os preços da energia e façam transações
instantaneamente. Com dois anos de existência, ocorriam diariamente 6
mil transações no site, no valor de US$ 2,5 bilhões.
Passo a passo, a Enron transformou-se em uma das maiores corporações
nos EUA. O valor da ação da Enron cresceu 1.400% em 10 anos. Em
agosto de 2000, o preço da ação da Enron atingiu a máxima histórica de
cerca de US$ 84,97.
Admirada pela Goldman Sachs, a revista Fortune classificou a Enron
como a empresa mais admirada e inovadora do mundo, o CEO Kenneth
Lay foi louvado por ser um messias energético e, por um bom tempo, a
Enron tornou-se uma história de sucesso.
Os funcionários da empresa sempre foram encorajados a fazer seus
próprios negócios, a inventar novos produtos para vender e a comprar e
vender novas commodities. Em meados de 2000, a Enron estava
negociando mais de 800 produtos diferentes. Estavam, naquele momento,
diante de um dilema: quanto mais bem-sucedidos eles se tornavam, mais
recursos financeiros eram necessários para cobrir o capital de giro (entre
compra e venda de mercadoria) e, dessa forma, foram expostos a um alto
custo de crédito, representando menores lucros e menor valor no preço da
ação. Em junho de 2000, a empresa precisava de US$ 2 milhões/dia
apenas para pagar créditos a bancos.
Andy Fastow, CFO da empresa naquela época, criou “entidades de
propósito especial”, com o objetivo de resolver as questões financeiras.
Essas “entidades” seriam parceiras externas e, portanto, poderiam ser
removidas dos pagamentos da empresa. Para ter o direito de ser
denominada parceira externa, uma “entidade de propósito especial” tem
de ter 3% de participação como investidor externo.
Desse modo, a Enron poderia remover dívidas do balanço patrimonial,
colocando-as nas “entidades de propósito especial”, apresentando assim
um desempenho melhor com efeito positivo sobre o valor das ações.
Problema: A maioria das “entidades de propósito especial” tinha o CFO
Andy Fastow como proprietário dos 3% do parceiro externo. Essas
“entidades”, que pareciam independentes, na realidade eram a própria
Enron. O problema do capital de giro entre a compra e venda de
commodities deixou de existir, sendo transferido para as entidades
externas.
Então, o que levou a Enron ao colapso? Havia um ceticismo crescente no
mercado para as novas empresas ponto.com. Em 16 de outubro de 2001,
a US Securities and Exchange Commission (SEC) anunciou que estava
investigando as “entidades de propósito especial”. Em 28 de novembro, a
Enron foi rebaixada pela SEC e o valor da empresa caiu rapidamente.
Olhando para a cultura dessa empresa, pode-se verificar que o ambiente
de trapaça poderia surgir. A diretoria da empresa era agressiva e
composta por indivíduos gananciosos, motivados por interesses próprios.
Estavam enganando, levados pela arrogância de estarem acima de
qualquer suspeita.
O que é interessante no caso Enron é o grande espírito de
“comportamento divino”, que tomou toda a organização, em todos os
níveis de hierarquia. Muitas pessoas, em várias áreas da empresa,
ficaram corrompidas. Essas pessoas, em sua maioria, foram recrutadas
nas melhores universidades americanas, principalmente Harvard e
Wharton. Com certeza, nunca sonharam em se tornar criminosas. Porém
a atmosfera da Enron pode tê-las “empurrado” para terem um
comportamento que elas não esperavam.
A atratividade da empresa Enron era forte, conectada à nova economia
associada à inovação e à startup de alta velocidade. A Enron era um
exemplo de como você poderia transformar uma velha corporação da
economia tradicional, lenta e burocrática, em um novo modelo econômico.
E as regras aprendidas e aplicadas no passado não contam mais; a nova
economia está fazendo suas regras para esse novo tipo de organizações.
O comportamento dos gerentes da Enron estava praticamente em linha
com a ideologia geral da desregulamentação, na qual os mercados são
percebidos como bons, e os governos, como um problema. A Enron criou
sua própria realidade. Considerando ser um ente superior, Skilling, mais
uma vez, declara que “Estamos aqui em cima, todo mundo está lá
embaixo”.
Mas a realidade reflete exatamente os valores e crenças que caracterizam
a sociedade ou a economia. A Enron representava a regra dos sistemas
de crença de seu tempo. No que acreditávamos estar errado, os gerentes
da Enron poderiam ter se percebido como inteligentes. A inteligência é,
provavelmente, o termo que descreve melhor a cultura geral da Enron. É
uma cultura que tem a arrogância e a astúcia, que impulsionam o contexto
organizacional, o que se denomina cegueira ética.
A Enron admitia apenas graduados das melhores escolas de negócios dos
EUA, que eram contratados como comerciantes em um contexto de
empreendedorismo, agressividade da concorrência, de destruição criativa
e rápido crescimento. Eles tinham pouca experiência, plena autonomia e
seriam recompensados regiamente desde que trouxessem negócios.
Como era o sistema de avaliação da Enron?
Havia um grupo de 20 gerentes que avaliavam seus pares todos os anos,
de acordo com sua performance. Os “comerciantes” da Enron eram
categorizados em dois grupos: de alto desempenho e de baixo
desempenho. Os colaboradores de alto desempenho, cerca de 5%,
recebiam enormes bônus financeiros, que incluíam carros da marca
Ferrari (símbolo de poder). No dia de pagamento de bônus, havia muitas
Ferraris estacionadas na frente do prédio sede. Os colaboradores de mais
baixo desempenho, aproximadamente 15%, eram demitidos no mesmo
dia.
O que se faz para sobreviver em um ambiente desse tipo?
Busca-se não criar problemas, não criticar seus superiores, fazer o que for
esperado de você: trazer negócios para receber bônus e para não ser
humilhado diante dos pares.
Coloquemo-nos no lugar desses “comerciantes”.
Você vem de uma escola de negócios de elite superior. Você foi treinado,
é um dos melhores e mais brilhantes. Trabalha para a empresa que é
percebida como modelo de negócios do futuro. Você quer ser demitido
depois de seis meses porque é um funcionário de baixo desempenho?
Não, você não pode se dar ao luxo de fazer isso. Esse seria o fim de sua
carreira.
Esse é o darwinismo empresarial, uma luta para sobrevivência em um
contexto muito agressivo.
Que conclusões podemos desenhar no contexto de nosso conceito de
cegueira ética?
O escândalo da Enron não é simplesmente o resultado do comportamento
criminal de algumas pessoas no topo da empresa. Não é o resultado do
comportamento do que chamamos de pessoas sem moral e sem ética. Há
indivíduos aéticos, que dirigem a corporação nessa direção, mas só
entenderemos isso se olharmos para toda a cultura da organização. O
comportamento desviante dos principais líderes foi contagioso.
Então, a cultura da corporação foi caracterizada por uma mistura perigosa
de astúcia, arrogância, vaidade, agressividade, ganância e medo. Se você
adotasse essa cultura, seria promovido por seu sistema de avaliação, seu
sistema de bônus e seu plano de carreira (adaptado de Palazzo e
Hoffrage, 2014).

A integridade do negociador se traduz em melhores resultados e


evita quatro consequências de custos muito elevados:

• rigidez em futuras negociações;


• destruição da relação com o oponente;
• criação de uma reputação negativa;
• perda de oportunidades (não detecção de assuntos que poderiam
se revelar benéficos para ambas as partes).

Pressão do tempo e ética

Estudo conduzido por Darley e Batson (1973) apresentado no artigo de


“Jerusalém a Jericó”, que destaca aspectos associados ao comportamento
humano face à pressão do tempo, empatia e ética.
Os participantes da pesquisa eram estudantes do seminário de estudos
religiosos, isto é, estavam estudando para ser sacerdotes. Foi-lhes
solicitada, como trabalho, uma palestra, dentro de uma hora, sobre o bom
samaritano. Trata-se de uma parábola do Novo Testamento e Jesus Cristo
a utilizou para explicar que “não conta quem você é, mas o que você faz”.
Resumidamente, a parábola é a seguinte: um homem foi roubado e
precisou de ajuda. Passaram por ele um padre e um aristocrata, que não
o ajudaram. Finalmente, passou um samaritano. Os samaritanos, na
época, faziam parte da classe social mais baixa, eram marginalizados pela
sociedade. O samaritano ajudou o homem e Jesus deixou claro que o
samaritano – e não o padre e não o aristocrata – seria recompensado
após a morte.
Os participantes desse experimento tiveram uma hora para preparar seu
discurso sobre essa parábola, que seria apresentado na igreja do outro
lado da rua. Depois de uma hora, os participantes se deslocaram para a
igreja, porém no caminho havia uma pessoa caída na rua pedindo ajuda.
A situação era muito similar ao conteúdo da palestra que iriam proferir.
Quantas pessoas ajudaram o pedestre caído? Resultado: 65%. Não foram
todos, porém foi a maioria.
A outro grupo de participantes, os pesquisadores interromperam depois de
30 minutos, de iniciado o trabalho. “Desculpe-nos, mas tivemos que mudar
nosso cronograma. Corram para a igreja que vocês terão de apresentar o
discurso agora.”
Eles se depararam com a mesma situação de seus pares: o mesmo
homem estava caído na frente deles, no caminho, enquanto eles corriam
para fazer seu discurso sobre o bom samaritano na igreja. Quantos se
comportaram como o samaritano na parábola? Somente 10%.
Esse estudo demonstra que a pressão do tempo prende nossa atenção e
pode remover de nossa cabeça algumas dimensões – neste caso,
dimensões éticas, aumentando, portanto, o risco de comportamento não
ético.
9
Cross cultural

A prática da negociação difere de cultura para cultura e influencia o


“estilo de negociação”. Nações, grupos de trabalho, classes sociais,
gêneros, raças, tribos, corporações, clubes e movimentos sociais podem
tornar-se bases para subculturas específicas.
Como deve um executivo se preparar para lidar com a cultura
quando negocia?
Em uma negociação entre culturas, é desafiante analisar os interesses
do outro lado, pois há que se identificar o estilo de negociação da outra
parte, além de seus valores e crenças subjacentes. A cultura pode
influenciar os resultados e o sucesso de uma negociação. Harmonizar o
local e o global é um trabalho da negociação, de coordenação, que
impõe um entendimento das similaridades e das diferenças culturais,
regionais, nacionais, internacionais e identitárias. Buscar o
universalismo, o reconhecimento da diversidade torna-se um desafio
para uma gestão moderna nacional e internacional.
Por exemplo, no Brasil, a cultura difere de região para região, o povo
do Sul, difere do povo do Norte e assim por diante. Não se trata de ser
bom ou ruim, simplesmente é diferente. Quando se menciona a Itália, o
povo do Norte é diferente do povo do Sul. Há muitas variações dentro
de uma cultura e devemos ser sensíveis a isso, sem criar estereótipos.

Estilos de negociação
Segundo o prof. Salacuse, o executivo deve identificar as áreas
importantes nas quais as diferenças culturais podem ocorrer durante o
processo da negociação. O conhecimento dessas áreas pode ajudar um
negociador a compreender a ótica de outra cultura, e antecipar possíveis
focos de atritos e enganos, e superar as diferenças culturais na
negociação internacional.
Segundo Salacuse (2004),

Quando a Enron ainda era – e apenas – uma empresa de pipeline, ela


perdeu um contrato importante na Índia porque as autoridades locais
sentiram que as negociações estavam sendo conduzidas muito rápido.
De fato, a perda do contrato sublinha o papel importante que as
diferenças culturais desempenham na negociação internacional. Para
os negociadores de um país, o tempo é dinheiro, para outros, quanto
mais lentas forem as negociações, elas podem sair melhor e oferecer
mais confiança.

Atualmente, os negócios internacionais ultrapassam fronteiras e


atravessam diferentes culturas. A cultura afeta os tipos de transações
realizadas e a forma de negociar. As diferenças de cultura entre os
executivos de empresas – por exemplo, entre um gerente de área do
setor público chinês em Hangzou e um chefe de divisão francesa de uma
empresa familiar em Bordeaux – podem criar barreiras que impeçam ou
bloqueiem o processo de negociação.
A pesquisa realizada há alguns anos pelo prof. Salacuse é uma
referência para as negociações internacionais. São 10 fatores de impacto
associados ao comportamento que caracterizam as diferentes culturas e
que mapeiam nossa compreensão sobre a outra parte em uma
negociação internacional. No quadro 11 serão destacadas algumas
características e observações do prof. Salacuse, resultados de sua
pesquisa:

Quadro 11
Fatores de impacto de comportamento e respectivas amplitudes
Fatores de impacto Amplitude

Metas Contrato Relacionamento

Atitudes Ganha/perde Ganha/ganha

Estilos pessoais Informal Formal


Comunicação Direta Indireta

Sensibilidade ao tempo Alta Baixa

Intensidade das emoções Alta Baixa

Formas de acordo Específico Geral

Construção do acordo Bottom-up Top-down

Organização da equipe Um líder Por consenso

Disposição ao risco Alta Baixa

Fonte: Salacuse (1998).

Meta da negociação: contrato ou relacionamento?

• Qual é sua meta na negociação: fechar o contrato de qualquer


forma ou desenvolver o relacionamento?
• Para algumas culturas, o objetivo de uma negociação empresarial
é um contrato assinado entre as partes; para outras culturas, o
objetivo de uma negociação é o desenvolvimento do
relacionamento (Mnookin, 2009).
• A maioria dos entrevistados espanhóis tem como objetivo em
uma negociação um contrato, e os executivos indianos desejam
ter relacionamento.
• Negociadores asiáticos, que têm como objetivo a criação de um
relacionamento, tendem a dedicar mais tempo e esforço para
preliminares de negociação, enquanto os norte-americanos
aceleram a primeira fase de negociação.

Atitude de negociação: win/lose ou win/win?

• Qual é sua atitude na negociação: ganha/perde ou ganha/ganha?


• Os negociadores com atitudes ganha/ganha (win/win), em
qualquer cultura veem o acordo como um processo colaborativo
de resolução de problemas; os negociadores com atitude
ganha/perde (win/lose) veem isso como um confronto.
• Enquanto 100% dos entrevistados japoneses alegaram que
buscam um processo colaborativo ganha/ganha, apenas 33% dos
executivos espanhóis se identificaram com atitudes ganha/ganha,
ou seja, os espanhóis apresentaram um perfil mais confrontador.

Estilo pessoal: informal ou formal?

• Durante as negociações, seu estilo é formal ou informal?


• O estilo pessoal, fortemente influenciado pela cultura, refere-se à
forma como um negociador fala com os outros, usa títulos, veste-
se, fala e interage com outras pessoas.
• Um negociador com um estilo formal se dirige às contrapartes
tratando-as por seus títulos, evita anedotas pessoais e se abstém
de questões associadas à vida privada ou familiar das outras
partes.
• Um negociador com um estilo informal se dirige à contraparte
pelo pronome pessoal, busca rapidamente desenvolver um
relacionamento pessoal e amigável e fica mais despojado com a
vestimenta (tirando sua jaqueta e enrolando as mangas) quando o
clima fica tenso.
• Para um norte-americano, chamar alguém pelo primeiro nome é
um ato de amizade e, portanto, uma coisa boa. Para um japonês,
o uso do primeiro nome em uma primeira reunião é um ato de
desrespeito e, portanto, ruim.
• Os alemães têm um estilo mais formal do que os norte-
americanos.
• Os negociadores em culturas estrangeiras devem respeitar as
formalidades apropriadas. Como regra geral, é sempre mais
seguro iniciar com um estilo formal e passar a um estilo
informal.

Comunicação: direta ou indireta?


• Seu estilo de comunicação em uma negociação é direto (claro,
com propostas e respostas definidas e simples) ou indireto (vago,
evasivo e complexo)?
• Como métodos complexos e indiretos podem ser usadas formas
figurativas de fala, expressões faciais, gestos e outros tipos de
linguagem corporal.
• O norte-americano e o israelense valorizam a franqueza e se
pode receber deles uma resposta clara e definitiva às suas
propostas e perguntas (comunicação direta).
• Os japoneses usam a comunicação indireta, reagindo às suas
propostas por meio da interpretação de comentários, gestos e
outros sinais aparentemente vagos. Por exemplo, os japoneses
expressam desaprovação de forma indireta cujo gestual induz os
executivos das empresas estrangeiras a acreditarem que suas
propostas ainda estavam em consideração quando, de fato, o lado
japonês as rejeitava.
• Nas negociações de paz em Camp David, entre o Egito
(comunicação indireta) e Israel (comunicação direta),
exacerbaram-se as relações entre os dois lados. Os egípcios
interpretaram a franqueza israelense como agressiva e, portanto,
um insulto. Os israelenses interpretaram a comunicação indireta
egípcia como impaciência e insinceridade, por não dizerem
claramente o que queriam dizer.

Sensibilidade ao tempo: alta ou baixa?

• No processo de negociação, sua sensibilidade ao tempo é alta


(chegar a um acordo rapidamente) ou baixa (processo de
negociação lento)?
• Os negociadores podem valorizar de formas diferentes a
quantidade de tempo disponibilizada para a negociação. Para os
norte-americanos, o acordo é um contrato assinado e o tempo é
dinheiro; logo, buscam fazer rapidamente um acordo e tentam
reduzir ao mínimo as formalidades.
• Os japoneses e outros asiáticos investem tempo no processo de
negociação para que as partes possam se conhecer mutuamente e
avaliar se desejam um relacionamento de longo prazo. Podem
considerar as tentativas de encurtar o tempo de negociação como
esforços para se esconder algo. Por exemplo, na década de 1990,
havia um contrato de fornecimento de energia elétrica de longo
prazo entre uma subsidiária da Enron, a Dabhol Power
Company e o governo do estado de Maharashtra, na Índia, que
quase foi cancelado, pois os indianos achavam que tinha sido
concluído com uma “pressa indecorosa”. A sociedade indiana
reagiu por entender que o governo não conseguiu proteger o
interesse público, uma vez que as negociações se desenvolveram
muito rapidamente. Na defesa da empresa, Rebecca Mark
(1997a, 1997b), presidente e CEO da Enron International,
declarou à imprensa: “Estamos extremamente preocupados com
o tempo, porque o tempo é dinheiro para nós”.
• Os alemães são sempre pontuais, os latinos são habitualmente
atrasados, os japoneses negociam lentamente e os norte-
americanos são rápidos em fazer um acordo.
• Entre as 12 nacionalidades pesquisadas, os indianos tinham a
maior porcentagem de pessoas que se consideravam com baixa
sensibilidade ao tempo.

Ser emocional: muito ou pouco?

• Durante a negociação você é muito emocional e tem uma


tendência a demonstrar emoção ou você consegue se conter e
não demonstrar seus sentimentos?
• De acordo com o estereótipo, a maioria dos latino-americanos
mostra suas emoções na mesa de negociação, enquanto a maioria
dos japoneses e muitos outros asiáticos guardam seus
sentimentos.
• Várias culturas têm regras diferentes quanto à adequação e forma
de exibir emoções, e essas regras também estão presentes na
mesa de negociação.
Os latino-americanos e os espanhóis constituem grupos culturais

mais emotivos. Entre os europeus, os alemães e os ingleses são
menos emotivos, enquanto, entre os asiáticos, são os japoneses
que ocupam essa posição.

Forma de acordo: geral ou específico?

• Os fatores culturais influenciam a forma do acordo escrito que as


partes fazem. Você prefere acordos que são mais ou os que são
menos detalhados?
• Os norte-americanos preferem contratos muito detalhados que
buscam antecipar todas as circunstâncias e eventualidades
possíveis, não importando o quão improvável sejam. Por quê?
Porque o negócio é o próprio contrato e é necessário referir-se
ao contrato para lidar com as situações que poderão surgir.
• Os chineses, por exemplo, preferem um contrato na forma de
princípios gerais, ao invés de regras detalhadas. Por quê? Porque
a essência do acordo é a relação entre as partes. Se surgirem
circunstâncias inesperadas, as partes devem buscar,
principalmente, o relacionamento e não o contrato, para resolver
o problema. Assim, em alguns casos, um negociador chinês pode
interpretar o impulso norte-americano para estipular todas as
contingências como evidência de falta de confiança na
estabilidade do relacionamento.
• Apenas 11% dos ingleses preferiram acordos gerais e 45,5% dos
japoneses e alemães alegavam fazê-lo.

Construindo um acordo: de baixo para cima ou de cima para baixo?

• Com relação à forma do acordo, busca-se conhecer se a


negociação é um processo indutivo ou dedutivo. Você negocia
buscando o acordo, a partir dos detalhes em primeiro lugar ou o
acordo começa a ser negociado a partir dos princípios gerais?
• Indutivo: começa a partir de um acordo sobre princípios gerais e
segue na definição de itens específicos.
g p
• Dedutivo: começa com um acordo sobre especificações, como
preço, data de entrega e qualidade do produto para, em seguida,
finalizar o contrato como um todo.
• Alguns observadores acreditam que os franceses preferem iniciar
uma negociação a partir dos princípios gerais, enquanto os norte-
americanos tendem a buscar, primeiro, um acordo sobre as
especificidades. Para os norte-americanos, negociar um acordo é
basicamente “alinhavar” uma série de compromissos e trade-offs
em uma longa lista de detalhes. Para os franceses, a essência é
concordar com princípios básicos (as “grandes linhas”) que
determinarão, posteriormente, o detalhamento das condições.
• A pesquisa identificou que os franceses, os argentinos e os
indianos tendiam a considerar a negociação como um processo
dedutivo, enquanto os japoneses, os mexicanos e os brasileiros
tendiam a vê-lo como um processo indutivo.

Organização da equipe: um líder ou consenso do grupo?

• Como membro de uma equipe de negociadores, você prefere ter


um líder que tenha a autoridade de tomar decisões ou prefere
que a decisão seja tomada por consenso?
• Em qualquer negociação, é importante saber como a outra parte
está organizada, quem tem autoridade para assumir
compromissos e como as decisões são tomadas.
• Algumas culturas enfatizam o indivíduo, enquanto outras
enfatizam o grupo. Esses valores podem influenciar o processo
de negociação.
• Muitas equipes norte-americanas tendem a constituir uma
equipe de negociação com um líder investido de completa
autoridade para decidir todos os assuntos.
• Os japoneses e os chineses não deixam evidente quem é o líder,
nem quem tem autoridade para assumir decidir o acordo.
• Em negociações dos EUA com a China, não é incomum que os
norte-americanos cheguem à reunião, com uma equipe de três
pessoas, enquanto os chineses se apresentem com 10.
A equipe que possui um líder que toma decisões assume

compromissos mais rapidamente do que uma equipe que toma
decisão por consenso que, por questões óbvias, leva mais tempo
para negociar um acordo.
• Entre todos os pesquisados, 59% preferiam equipes com um
líder decidindo, enquanto 41% preferiam equipes cuja tomada de
decisão era por consenso, a exemplo dos franceses.
• Apesar da reputação japonesa de acordos com base em consenso,
apenas 45% dos entrevistados japoneses alegaram preferir esse
tipo de equipe. Os brasileiros, chineses e mexicanos, em um grau
muito maior do que qualquer outro grupo, preferiram a
liderança de uma pessoa – um reflexo, talvez, sobre as tradições
políticas desses países.

Assumir risco: alto ou baixo?

• Sua tendência é assumir altos riscos durante a negociação ou


você prefere assumir menores riscos?
• A pesquisa do prof. Salacuse apoia a conclusão de que certas
culturas são mais avessas ao risco do que outras.
• Há diferenças na disposição para assumir riscos – divulgar
informações, tentar novas abordagens e tolerar incertezas – em
um curso de ação proposto. Os japoneses, com sua ênfase em
exigir grande quantidade de informações e seu intrincado
processo de decisão de grupo, tendem a ser avessos ao risco. Os
norte-americanos, em compensação, são tomadores de risco.
• Aproximadamente 70% dos entrevistados apresentaram uma
tendência para a tomada de risco.
• Grande percentual de franceses, britânicos e indianos afirmou
serem tomadores de risco.
• Diante de um negociador avesso ao risco, prof. Salacuse orienta:
a) não apresse o processo de negociação, pois aumenta a
percepção da outra parte sobre os riscos no negócio
proposto;
b) proponha regras e mecanismos que reduzam os riscos
aparentes no negócio;
c) certifique-se de que a(s) outra(s) parte(s) tenha(m)
informações suficientes sobre você, sua empresa e o acordo
proposto;
d) concentre seus esforços na construção de um
relacionamento e promova a confiança entre as partes;
e) considere a reestruturação do negócio para que o negócio
avance passo a passo ao invés de acontecer de uma única vez.

Você acabou de chegar a um acordo em uma negociação e já está indo


embora. Ao se virar, tocou nas costas do outro negociador e expressou:
– Foi um excelente trabalho essa nossa negociação.
Pergunte-se: Será que você violou algum aspecto cultural do outro país
quando tocou a outra parte nas costas e disse “excelente trabalho”?
Você, provavelmente, pode pensar em uma série de problemas: talvez o
toque sozinho seja um problema, mas nem lhe ocorreram o jeito e a mão
que você usou.
Em algumas culturas, não se toca ninguém com a mão esquerda, essa é a
mão do banheiro; e, quando se fala em excelente trabalho, em algumas
culturas isso equivale a um dedo do meio.
Assim, sua gentileza e proximidade com a satisfação do acordo podem ser
algo altamente ofensivo (adaptado de curso em vídeo ministrado pelo prof.
George Siedel. Successful Negotiation. MIT University. Coursera).

Em resumo, em negociações com diferentes culturas, observe os


tópicos relacionados pelo prof. Salacuse e busque identificar como seu
estilo de negociação difere do estilo da outra parte. Tenha sempre em
mente que há variações dentro de cada cultura (Cavalcanti, 2005).
Realize pesquisas para que você possa evitar ações ofensivas sobre a
outra cultura.

Como a cultura afeta a negociação?


O trabalho do negociador é respeitar e entender a cultura da pessoa com
quem está negociando. Deve-se ter cuidado com os preconceitos e
prejulgamentos que são articulados, de forma intuitiva, na mente.
Perceber as diferenças culturais se transforma em competência para o
negociador. O negociador brasileiro frequentemente valoriza mais o
processo de negociação do que o resultado final. As discussões tendem a
ser mais provocativas, animadas, inflamadas, eloquentes e engenhosas.

O prazer do debate

Desde os seis anos, Dalai Lama dedica muitas horas de seu dia ao
estudo, trabalhando muito a memorização; pratica a meditação e a
concentração – que são fatores da disciplina mental.
Ele exerce também, intensamente, a dialética e o debate, que constituem
o coração da educação monástica tibetana. O esporte preferido dos
monges tibetanos não é nem o futebol, nem o xadrez: é o debate. Os
monges discutem tanto no centro do monastério que é possível imaginar
como seria uma versão intelectual de um jogo de rugby. Um pequeno
grupo se posiciona desordenadamente em torno do contraditor, que
discursa de forma muito enérgica – ele propõe uma proposição filosófica e
desafia os demais monges a desmantelá-la.
Os monges disputam o direito de lhe oferecer a réplica, fazendo-o, muitas
vezes, com o vigor de um jogador de rugby.
[...]
Para os monges, a habilidade do debate é o melhor indicador de
desenvolvimento intelectual e o principal critério de sua avaliação
(Goleman, 2003:75-76).

Quando se está negociando com indivíduos de outro país, deve-se


adotar o estilo da cultura da outra parte? Devemos nos comportar como
se fôssemos nativos de sua cultura? Há que se ter cuidado, pois devemos
fazê-lo de forma respeitosa e conhecedora; precisamos estar
familiarizados com outras culturas para fazer isso confortavelmente.
Tentar ser o que não somos não confere credibilidade.
Áreas de desentendimentos
A linguagem corporal é distinta nas diferentes culturas e pode ser
dividida nas seguintes categorias: expressões faciais, olhar, contato físico,
espaço entre pessoas, gestual, sons e outras ações. O único
comportamento universal que todas as culturas compartilham é o
sorriso.
A seguir, são apresentadas diversas características das diferentes
culturas:

1. Olhar para baixo e evitar o contato olho a olho:


• árabes e asiáticos: é um sinal de respeito;
• europeus e americanos: é um sinal de desrespeito.

2. Espaço entre as pessoas:


• Oriente Médio: há separação física dos grupos de mesmo
sexo;
• Japão: ficam distantes uns dos outros na discussão (cerca de
um metro).

3. Contato físico: o contato físico tem diferentes interpretações nas


diferentes culturas. Trata-se de uma questão delicada. Assim,
deve-se evitar o toque em uma negociação:
• França: o toque no outro é frequente;
• árabes: o toque no outro é nenhum;
• EUA, Inglaterra, Ásia e norte da Europa: o toque no outro é
esporádico.

4. Posição das pernas ao se sentar: essa característica, que


aparentemente é irrelevante, tem um significado muito
importante:
• Oriente Médio: estar com o pé da perna que está cruzada
direcionado para a outra pessoa é uma grande ofensa, causa
desconforto, simboliza acusação e o pé pode ser percebido
simbolicamente como uma arma.
• Em geral: evite manter os braços cruzados sobre o peito e
pernas cruzadas; isso pode ser entendido como uma posição
de defesa.

Quadro 12
Outros gestos e seus significados locais
Ação País/região Sinal

EUA e Inglaterra Positivo


Dedo para cima em sinal de
OK Espanha e Itália Gesto
obsceno

Mexer a cabeça para cima e Bulgária e algumas regiões do Japão, da Significa


para baixo Grécia, da Itália e do Irã não

Erguer as sobrancelhas Filipinas Significa


sim

Tombar a cabeça para o Significa


Índia
lado sim

Nas negociações interculturais, é uma sabedoria ser versátil, falar


múltiplas línguas, fazer diplomacia corporativa, lidar com o diferente,
abraçar a diversidade, ouvir o outro, o diferente, como uma forma ética
de altruísmo, de aceitação da diferença, da tolerância.
O intercultural é, justamente, um jogo de saber ser camaleão, de se
adaptar às diferentes linguagens, diferentes costumes e se adequar a um
domínio de comunidade, de universalidade, de ciência e, ao mesmo
tempo, aceitar a singularidade, especificidade, a identidade particular e
originalidade.
10
Plataforma compartilhada

Os especialistas em administração John Hagel III, John Seely Brown e


Lang Davison chamaram de “grande mudança” a transferência do
padrão de medida de riqueza: anteriormente era o estoque (quantidade
de qualquer recurso passível de ser armazenado, para aproveitamento
futuro) e passou a ser fluxo, fonte de maiores vantagens comparativas.
Os fluxos transitam pelos países, comunidades, e a grande questão é em
que medida os cidadãos-trabalhadores estão capacitados para tirar
vantagens desses fluxos.
Vale mencionar as mudanças ocorridas ao longo da história. A
medida de riqueza das nações, que no século XV era o estoque de ouro e
prata, passou a ser a capacidade de produzir bens e serviços necessários
ao bem-estar da população. Mais recentemente, abandonaram-se os
estoques para adotar os fluxos como nova medida de riqueza. O valor
está se transferindo dos estoques de conhecimento para os fluxos de
conhecimento.
Como se dá?
Como explica Thomas Friedman (2016), à medida que o mundo
acelera, os estoques de conhecimento se desvalorizam. Atualmente, os
estoques de conhecimento têm de ser renovados continuamente para se
manterem como relevantes como novos conhecimentos.
Ainda, Friedman destaca que a participação dos indivíduos nos
fluxos de conhecimento exige contribuição, uma vez que os
participantes desejam desenvolver relacionamentos com pessoas e
instituições capazes de contribuir com conhecimentos próprios. Não há
espaço para free riders. A velocidade com que as coisas se tornam
obsoletas reduz os danos provocados pelos roubos de propriedade
industrial e intelectual. As recompensas com o compartilhamento do
conhecimento aumentam significativamente e em grande velocidade.
Estar no fluxo passa a ser uma importante vantagem econômica e
estratégica nos dias de hoje. Quando a conectividade é onipresente e a
complexidade é gratuita, o mundo se torna extremamente rápido. Esse é
o mundo atual, o do compartilhamento, da cooperação, da velocidade,
do fluxo, das ideias etc. que negociamos. Faz-se necessário que
conheçamos esse novo mundo para que possamos lidar com ele com
vantagens competitivas.
Na plataforma compartilhada, existe uma força intelectual coletiva a
ser gerada que pode ser espantosa. A “nuvem” armazena todos os
softwares e todas as informações de forma que possamos utilizá-las em
qualquer momento, em qualquer lugar e com custo zero. As operações
de detectar, coletar e armazenar dados, assim como transmiti-los para a
“nuvem” e analisá-los por meio de softwares tornaram-se absolutamente
gratuitas.
Por exemplo, os fundadores da Airbnb compreenderam que o
mundo estava ficando interdependente, pois a tecnologia poderia
conectar qualquer proprietário de um espaço para alugar com qualquer
viajante interessado, de qualquer lugar do planeta. A Airbnb, com base
nessas necessidades, criou uma plataforma de confiança que fosse capaz
de unir essas pontas – proprietários e viajantes –, gerando uma
quantidade enorme de valor para todas as partes envolvidas. Nessa
plataforma, as pessoas podiam verificar a identidade umas das outras,
poderiam avaliá-las, significando que o usuário do sistema viria
rapidamente a desenvolver uma “reputação” relevante, visível para todos
os demais. A opinião de pessoas desconhecidas que postam suas
impressões no site passa a ser mais significativa do que a opinião de um
especialista. Essa é uma mudança significativa.
Conclusão

A negociação está se transformando, deixando de lado o foco na força,


na persuasão, na malandragem, no autoritarismo, e está se tornando um
jogo cognitivo em vez de um jogo de poder.
Porém ainda existem muitos negociadores, como na Coreia do
Norte, que usam ameaças para depois negociar; ainda existem
malandros com Bernard Madoff, que manipulou e lesou clientes em um
esquema multibilionário e fraudulento de pirâmide financeira, como
também ainda existem marcas que escondem suas informações para
acionistas e clientes e negociadores que criam medo e raiva para
influenciar os indivíduos a segui-los para onde determinam.
Estamos entrando na era da transparência, em que os poderes são
divididos, em que o outro deve ser uma fonte de aprendizado, uma
oportunidade de conhecer suas opiniões e crenças. O novo estilo de
negociar faz uso de técnicas, de metodologias que facilitam uma nova
forma de liderança sobre os “dinossauros da negociação”, que utilizam a
“Lei de Gerson” para levar vantagem em tudo, sobre a malandragem e a
negociata como modelos de decisão.
A ciência da tomada de decisão, da gestão do risco e da informação
amplia as possibilidades se criar acordos e, sobretudo, tem a técnica para
prevenir futuros conflitos. A maioria dos conflitos tem origem nos
indivíduos com conflitos de interesses, conflitos de valores (cultura,
identidade, emoções, religião), conflitos de cognição (percepção, visão
do risco, mal-entendidos, viés decisório). Harmonizar e construir uma
ética na nova era digital dependem da capacidade de pensar e de ter uma
visão de longo prazo que garanta a fidelização de clientes, sejam
externos e internos, vista a importância do desenvolvimento e
manutenção do relacionamento, buscando romper com a máxima de
“Perco o amigo, mas não perco a piada!”, que não cabe mais nos dias
atuais.
As empresas com maior competitividade são aquelas que pensam
estratégias de longo prazo, que usam plataformas colaborativas de
compartilhamento de experiência, que não têm margens altas porque se
preocupam em cuidar da reputação, da empatia com cliente interno,
fazendo-o feliz e comprometido com o projeto, e satisfazendo o cliente
externo.
As empresas negociadoras são aquelas que sabem ser equalizadoras,
valorizar os clientes, o acionista e o compromisso com a
responsabilidade social/ambiental para futuras gerações.
A economia positiva e moderna reside na construção de acordos
éticos, elegantes, racionais, colaborativos visando benefícios mútuos. A
automatização das negociações vai aprimorar a produtividade e a
eficiência dos mercados, sem deixar de lado o fator humano, os valores e
os sentimentos.
Por isso, o sucesso de uma empresa, de um governo, de um
indivíduo depende não apenas de ter conhecimento técnico, mas da
capacidade de comunicar, dirigir o processo de negociação, negociar de
forma simpática, clara e coerente. Essa coerência será capaz de equalizar
um perfil calculista frio, pronto para fazer algoritmos, modelizar a teoria
dos jogos, buscando o equilíbrio de Nash, com um perfil de ser
caloroso, empático, possuidor de palavras sábias, justas e verdadeiras que
permitem criar laços de sólido relacionamento. A confiança “azeita” o
motor da negociação. Cada vez mais, os executivos precisam comprovar
que são confiáveis, simpáticos, empáticos e que não tentam enganar o
outro nem desejam levar vantagem sobre ele.
Simpatia, elegância moral e integridade são os novos padrões da
nova era digital, da “e-reputação” para aumentar as possibilidades de
construção de acordos sustentáveis. As inovações do neuromarketing, do
controle das moléculas das emoções; a inteligência de saber lidar com
diferentes identidades e a inovação da economia contributiva
demonstram que é possível ser cooperativo e, ao mesmo tempo,
competitivo; ser cuidadoso e, ao mesmo tempo, egoísta, numa relação
em que o altruísmo racional e altruísmo interesseiro se alinham com a
inovação da teoria dos jogos.
É possível organizar uma economia contributiva na qual um
vendedor de uma empresa pode ser remunerado e valorizado com as
p p
dicas/informações/experiências que ele pode repassar para seus pares
vendedores. Por exemplo, poder-se-ia considerar como pontos na
avaliação de um colaborador sua contribuição em compartilhar
conhecimentos, evitando a “reinvenção da roda” e permitindo que seus
pares tenham maior produtividade. O sistema de avaliação deveria ser
alterado para que todos ganhem, todos sejam bem-avaliados e possam
ser, corretamente, chamados de colaboradores. É o ganha/ganha no
compartilhamento de informações. Ficará fora do jogo aquele
colaborador que esconder informações, que não colaborar, que jogar o
jogo do ganha/perde, não honrando a denominação colaborador.
A construção da empresa negociadora e a institucionalização da
negociação por meio de plataformas colaborativas geram mudanças na
organização do trabalho e vêm facilitar ganhos de produtividade
inéditos.
O negociador moderno não se deixa cair em armadilhas e fica atento
à manipulação, à inveja e à rivalidade mimética. Esse negociador
moderno é mais maduro e sábio, menos vaidoso e mais capaz de
perceber o legado e a honra de ser um cidadão justo, um executivo
respeitado, racional e simpático.
Se é verdade que passamos 80% da nossa vida negociando, e que isso
significa luta, debates e emoções destrutivas, como medo ou raiva,
opressão, sofrer ameaças ou ser manipulado, a nova forma de negociar
facilitará uma mudança de estilo, a gestão com governança colaborativa,
além de proporcionar o prazer do debate com franqueza, gentileza e
prazer.
O negociador tradicional traduzia o sorriso em manipulação ou
sedução, enquanto o negociador moderno busca a autenticidade dos
sentimentos e da linguagem corporal (Goleman e Lama, 2003; Cuddy,
2012). Ele busca uma coexistência pacífica, ser o vendedor conselheiro,
ver os conflitos como problemas a serem resolvidos de forma racional e
objetiva.
Humor, carinho, respeito, o prazer do debate, a capacidade de
mudar de ideia sem se sentir humilhado ou incompetente, assim é o
novo jeito de ser dos executivos, sendo aquele que deseja ganhar com o
outro, coexistir e de construir margem por meio da construção de valor.
A construção de acordos de longo prazo, acordos em que as partes
irão se encontrar muitas vezes em outras negociações (entendido como
jogos infinitos), o envolvimento e o comprometimento das partes no
processo conduzem a uma negociação mais ética; contrapõe-se às
negociações imediatistas, em que o comprometimento das partes é
superficial e o relacionamento se extingue naquela negociação
(entendido como jogos finitos), em que o compromisso com a ética
pode ficar mais frágil.
Porém negociar de forma moderna, com o estilo de newgotiation, é
também dizer que o objetivo não é de chegar ao sim a qualquer custo.
William Ury (2007) fala do “poder do não positivo”, Robert Mnookin
(2011) fala de “negociar com o diabo; quando lutar, quando negociar”,
mostrando-nos que é fundamental dizer que não se pode negociar a
qualquer custo, e que devemos sempre poder dizer “não, obrigado”.
Podemos ter como exemplos o poder de dizer não ao movimento
nazista, à ditadura do apartheid na África do Sul.
Devemos manter critérios, padrões e não aceitar tudo. Aceitar tudo
conduz à fuga, gera alternativas, resistência, conduz a tribunais e gera
guerra, ou seja, exacerba o conflito.
A negociação tem limites; por isso é que devemos ter o poder de
dizer não, o que não significa fragilidade. O negociador cidadão
pacificador deve ser firme, ser capaz de desempenhar diferentes papéis,
ter emoções e ter o jeito múltiplo de ser. Ele deve ser firme num certo
contexto, suave e amigável em outro momento; deve jogar justo, alinhar
um contexto e, para cada momento encontrar um comportamento
adequado.
A capacidade de ser competitivo e cooperativo, ser firme e amigável,
ser flexível e ter princípios, revela a dinâmica da negociação moderna, o
pensamento sistêmico, a coevolução que permite ser adaptável e
inteligente, crescer e viver em harmonia e ser uma criatura viva
contribuindo para um mundo melhor.
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Entrevistas, palestras TED e Curso MOOC

Entrevistas

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em 2011. Disponível em: <www.youtube.com/watch?v=W0onwYW
QJH0>. Acesso em: 15 out. 2017.
Entrevista de Cristiano Mantovani, chefe de operações globais da Pfizer
no Brasil, publicada no blog HUMA em 22 set. 2015, sob o título
“Soluções alternativas no local de trabalho”. Disponível em: <www.l
g.com.br/blog/solucoes-alternativas-no-local-de-trabalho/>. Acesso
em; 5 out. 2017.
Entrevista de Bob Lutz ao jornalista Matthew Budman, publicada na
HSM Magazine em 15 fev. 2016, sob o título “Há um tipo de líder
certo para cada organização (e há o líder idiota)”. Disponível em: <w
ww.revistahsm.com.br/lideranca-e-pessoas/lideres-para-todos-os-go
stos/, em 11/10/2017>. Acesso em: 5 out. 2017.
Entrevista com o prof. René Girard, publicada no You Tube em 26 set.
2016, sob o título “Teoria do desejo mimético”. Disponível em: <ww
w.youtube.com/watch?v=172Hn5HxpPo>. Acesso em: 5 out. 2017.
Entrevista Diego (jogador futebol) ao Programa Troca de Passes do
SporTV em 12 fev. 2017. Disponível em: <http://sportv.globo.com/s
ite/programas/troca-de-passes/noticia/2017/02/diego-diz-que-rivali
dade-tem-limite-e-admite-preocupacao-apos-confrontos.html>.
Acesso em: 25 nov. 2017.
Entrevista de William Ury a Monica Scaramuzzo, publicada no jornal O
Estado de S. Paulo, no Caderno Economia, p. B9, em 27 ago. 2017,
sob o título “De mediador de guerrilha a guru de Abilio”.

Palestras TED/curso MOOC

AMBÜHL, Michael. Negotiation engineering. TED, 2016. Disponível em:


<www.youtube.com/watch?v=TYVC7TyGNWo>. Acesso em: 1 out.
2017.
CUDDY, Amy. Sua linguagem corporal molda quem você é. TED, 2012.
Disponível em: <www.ted.com/talks/amy_cuddy_your_body_langua
ge_shapes_who_you_are?language=pt-br#t-1198>. Acesso em: 25
nov. 2017.
PALAZZO, Guido; HOFFRAGE, Ulrich. Unethical decision making in
organizations. MOOC-UNIL. Lausanne: Université de Lausanne,
set. 2014.
SELIGMAN, Martin. Martin Seligman fala sobre a psicologia positiva.
TED, 2004. Disponível em: <www.ted.com/talks/martin_seligman_o
n_the_state_of_psychology?language=pt-br>. Acesso em: 25 nov.
2017.
SINEK, Simon. Como grandes líderes inspiram a ação. TED 2009.
Disponível em: <www.ted.com/talks/simon_sinek_how_great_leader
s_inspire_action?language=pt-br>. Acesso em: 25 nov. 2017.

Links consultados
<www.rtp.pt/programa/tv/p33174/e9>, em 25 nov. 2017. Pepsi vs.
Coca-Cola. Cara a Cara. Documentário na RTP Portugal, 2014.
<www.advb.com.br/site/noticia/o-futuro-da-economia-brasileira-e-a-ne
gociacao-como-estrategia-no-segundo-dia-da-semana-do-conhecim
ento/>, em 13 jan. 2018. O futuro da economia brasileira e a
negociação como estratégia. Publicação no site da Associação dos
Dirigentes de Marketing e Vendas do Brasil – ADVB/RS, 2014.
<www.youtube.com/watch?v=DcqwkdTvTzs>, em 13 jan. 2018.
<www.terra.com.br/noticias/tecnologia/internet/leia-o-discurso-de-jobs
-aos-formandos-de-stanford,bc38d882519ea310VgnCLD200000bbc
ceb0aRCRD.html>, em 13 jan. 2018. Steve Jobs: discurso proferido
em junho de 2005 na Stanford University.
<www.businessinsider.com/quotes-from-richard-branson-2014-7?
op=1>.
<www.cienciadaestrategia.com.br/teoriadosjogos/capitulo.asp?cap=m6>,
em 24 nov. 2017.
<www.ibccoaching.com.br/portal/conheca-historia-de-romero-rodrigue
s-dono-do-imperio-de-sucesso-buscape/>, em 24 nov. 2017.
<www.paulekman.com>.
<www.williamury.com/pt-br/guerrilha-a-guru-de-abilio/>.
<www.youtube.com/watch?v=WPnHqIbgVRo>, em 28 nov. 2017.
Robert Bordone: breaking free of gridlock in the negotiation
process. Harvard Law School.
<www.itamaraty.gov.br/pt-BR/politica-externa/diplomacia-economica-c
omercial-e-financeira/132-organizacao-mundial-do-comercio-omc>.
Itamaraty.
<www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/conciliacao-e-mediacao-portal-da-c
onciliacao>. Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Portal da
Conciliação.
Glossário

Ancoragem. Refere-se à oferta inicial, ou seja, a primeira divulgação de


preço/valor ou das condições, anunciada por qualquer uma das
partes.
Apartheid. Foi um regime de segregação racial que vigorou entre 1948 e
1994 na África do Sul, no qual os direitos da maioria dos habitantes
foram cerceados por um governo formado pela minoria branca.
BATNA (best alternative to a negotiation agreement). É uma alternativa
fora da negociação que o indivíduo está empreendendo.
Corresponde à alternativa que será adotada caso não se alcance um
acordo na negociação.
Coopetição. Termo cunhado por Branderburger e Nalebuff para
representar um modelo no qual os agentes cooperam para criar valor
e competem na divisão de valor.
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (em francês:
Déclaration des Droits de l’Homme et du Citoyen). É um
documento culminante da Revolução Francesa, que define os
direitos individuais e coletivos dos homens (tomada a palavra na
acepção de “seres humanos”) como universais.
Dumping . Prática comercial que consiste em uma ou mais empresas de
um país venderem seus produtos, mercadorias ou serviços por preços
extraordinariamente abaixo de seu valor justo para outro país, por
um tempo, visando prejudicar e eliminar os fabricantes de produtos
similares concorrentes no local, passando então a dominar o
mercado e impondo preços altos.
Equilíbrio de Nash. É um equilíbrio não cooperativo em que cada
parte toma suas decisões buscando fazer o melhor que pode em
função do que a outra parte está fazendo.
Etimologia. É a parte da gramática que trata da história ou origem das
palavras e da explicação do significado de palavras por meio da
análise dos elementos que as constituem.
Gap perceptivo. Diferenças na interpretação dos conceitos e
posicionamento das partes.
Jogos ganha/ganha. Também denominados ganhos mútuos, em que
todas as partes ganham.
Jogos ganha/perde. Também denominados jogos soma zero, são
situações em que há uma perda correspondente a um ganho (+ 1/ -
1).
Lei de Gerson. Expressão utilizada quando se busca obter uma
vantagem a qualquer preço.
Luta “Davi contra Golias”. Golias foi um guerreiro de Gate (1 Samuel
17:4), descrito como um homem medindo 2,90 que participou do
episódio da batalha entre os filisteus e o povo de Israel. Golias foi
confrontado e morto por Davi, segundo relatos da Bíblia. Davi
pegou uma pedra e atirou com a funda e ela penetrou a testa de
Golias, que estava todo paramentado para a luta.
MAANA (melhor alternativa a um acordo negociado). O mesmo que
BATNA.
Matriz de negociações complexas (MNC). Metodologia/técnica para
condução de processos de negociação, complementar ao método de
negociação por interesses desenvolvido por Harvard.
Moba. Jogos cujos resultados definem ganhadores e perdedores (jogos
de dama, de xadrez, de tênis etc.) são denominados “jogos
ganha/perde”. Uma negociação ganha/perde ocorre quando uma
parte obtém o resultado desejado, em consequência do insucesso da
outra parte, que sai perdedora, não encerrando assim o conflito, mas
adiando-o.
Newgociador – denominação dada ao moderno estilo de negociar;
negociador que busca ganhos mútuos, utilizando técnicas e
metodologias que facilitam uma nova forma de liderança sobre os
negociadores autoritários tradicionais que buscam levar vantagem
em tudo, em um jogo de ganha/perde.
Preço reserva. Representado pelo valor máximo que o comprador está
disposto a pagar e pelo valor mínimo pelo qual o vendedor está
disposto a vender o produto.
SEC (Secutiries and Exchange Commission). Corresponde, no Brasil, à
Comissão de Valores Mobiliários. A SEC tem a função de proteger
os investidores norte-americanos.
Stakeholder . Pessoa ou grupo de pessoas afetadas por uma decisão ou
que desejem fazer parte em uma tomada de decisão em qualquer
nível.
Tamanho da torta. Expressão utilizada pelos negociadores para
identificar as condições que são negociadas. Quando se cria valor
“aumenta-se o tamanho da torta”.
Tempestade de ideias. Expressão traduzida do conceito de brainstrom,
que é uma técnica de dinâmica de grupo utilizada para explorar a
potencialidade criativa de um indivíduo ou de um grupo
(criatividade em equipe), colocando-a a serviço de objetivos
predeterminados. Não há compromisso, mas liberdade de expressar
o que vier à cabeça.
Zopa (zona de possíveis acordos). Refere-se à amplitude entre os
valores de compra e de venda divulgados pelas partes em uma
negociação. O acordo cujo resultado satisfaça ambas as partes será
encontrado em algum ponto no interior desse intervalo.
Os autores

Yann Duzert
Pós-doutor pelo MIT-Harvard Public Disputes Program, baseado no
Program on Negotiation de Harvard. Doutor em gestão do risco, da
informação e da decisão pela Ecole Normale Supérieure na França.
Professor da Rennes School of Business e dando aulas na Fundação
Getulio Vargas (FGV). Autor de 17 livros de negociação e gestão de
conflitos publicados no Brasil, nos EUA, na França, Itália e China, com
professores de Harvard, MIT, Stanford, USC, FGV, Paris Dauphine,
Essec, ESCP, UFRJ e Uerj. Consultor de resolução de conflitos, tendo
trabalhado para diversas grandes empresas, com destaque para
Presidência da República do Brasil, World Bank, Banco Central, Banco
do Brasil, Siemens, Petrobras, Embraer, entre várias. Especialista na
resolução de conflitos, é comentarista da CGTN TV, GloboNews, Veja,
Folha de S.Paulo, Le Monde, entre outros. Eleito um dos 100 melhores
palestrantes do Brasil na categoria negociação. Criador da técnica
newgotiation utilizada no mundo inteiro.

Ana Tereza Schlaepfer Spinola


Mestre em administração pela Fundação Getulio Vargas (FGV).
Doutoranda pela Rennes School of Business. Pós-graduada em pesquisa
operacional pela Coppe/UFRJ. Pós-graduada em finanças corporativas
pela PUC-Rio. Coordenadora executiva da Pró-Reitoria de Ensino,
Pesquisa e Pós-graduação da FGV. Autora de diversos livros e artigos de
negociação. Professora da disciplina Negociação no Programa de Pós-
Graduação em Administração da FGV. Pesquisadora.
Table of Contents
Capa
Folha de rosto
Créditos
Dedicatória
Sumário
Apresentação
Introdução
Unidadede I | O indivíduo e a nova mentalidade
1 | Interações sociais
Conflitos
Competição × cooperação
Barganhas distributiva e integrativa
Coopetição
Assimetria de informações
Teoria dos jogos
Empatia
2 | Perfil dos negociadores
Perfil autoritário
Perfil controlador
Perfil facilitador
Perfil empreendedor
Perfil visionário
3 | Razão e emoção
Escalada simétrica irracional (ESI)
Emoções
Reação-padrão das emoções à mudança
Razão
Racionalidade limitada
Heurísticas
Unidade II | A metodologia da negociação
4 | Processo de negociação: conceitos e etapas
Negociação
Conceitos básicos
Matriz de negociações complexas
Etapas do processo de negociação
Busca de acordos pós-acordos
Dilema do negociador
5 | Elementos do processo de negociação
Cognição
Contexto/ambiente
Interesses
Opções
Padrão/critérios
Tempo
Concessão
Relacionamento
Poder
Conformidade legal
6 | Formas de negociação
Negociação direta
Negociação via agentes
Negociação via facilitador
Negociação via mediador
Metamediação
Negociação informal paralela
Diálogo multipartite (DMP)
Arbitragem
Juiz: o poder legal
Polícia e força militar
7 | Indicadores
Satisfação/racionalidade
Controle
Risco
Otimização econômica
Ética
Justiça/equidade
Produtividade
Emoções
Impacto e sustentabilidade
Auto-organização
8 | Ética
9 | Cross cultural
Estilos de negociação
Como a cultura afeta a negociação?
Áreas de desentendimentos
10 | Plataforma compartilhada
Conclusão
Referências
Entrevistas, palestras TED e Curso MOOC
Links consultados
Glossário
Os autores

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