O Que É Um Iniciado

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O QUE É UM INICIADO?

Por: Papus (dr. Phillipe Encause)


Uma das causas mais frequentes da obscuridade aparente dos estudos de Ciência oculta diz respeito à
confusão dos termos empregados por aqueles que tratam dessas questões. É, então, indispensável
definirmos primeiro as palavras que se empregam, sob pena de cairmos no erro no qual acabamos de falar.
Um dos termos que mais gera confusão é a palavra Iniciado. Uns consideram o iniciado como um ser
excepcional, designado com veneração por todos os autores do ocultismo; outros encaram o termo com uma
significação bem menos elevada e que se pode aplicar de uma maneira geral.
Basta reportarmo-nos a significação primitiva dessa palavra para verificarmos que a última acepção é a mais
correta. Com efeito, o título de iniciado na Antiguidade indicava, simplesmente, um homem instruído, cujos
graus de instrução variavam segundo os casos, sem que o título geral de iniciado sofresse a mínima
modificação.
O iniciado nos pequenos mistérios (Mistérios Menores) possuía uma instrução equivalente àquela dada em
nossos dias pela Universidade. Ele aprendia as leis que regem o Microcosmo humano, o autodomínio
completo sobre suas funções internas ou seja: como dominar a personalidade (corpo, emoções e mente)
através da meditação, técnicas respiratórias, consciência de si mesmo etc. Já o iniciado nos grandes mistérios
(Mistérios Maiores) aprendia a manejar as grandes Forças Ocultas da Natureza ou domínio das Leis do
Macrocosmo. É o caminho do domínio da existência manifesta e da apoteose do Eu. Quando chegava ao
ápice dessa instrução, ele adquiria o título de vidente, de profeta ou de Adepto.
Assim, os termos Iniciado e Adepto são duas designações que indicam, respectivamente, o começo e o
apogeu da carreira de um ocultista. Todos os homens instruídos adquiriam, na Antiguidade, o título de
iniciados e os títulos de filho da mulher, filho da Terra, filho dos deuses, filho de Deus, designando sua
elevação hierárquica na ordem dos conhecimentos humanos.
Sem querer nos aprofundar sobre o ensinamento que eles recebiam, falemos, entretanto, de um ponto muito
importante. A doutrina ensinada era sobretudo sintética e a pesquisa da Unidade Universal lhes era indicada
como o objetivo de seus esforços. De outro lado, os iniciados aprendiam a adaptar o ensinamento aos
temperamentos diversos dos povos que eles eram encarregados de organizar como legisladores. É por isso
que vemos as leis de Orfeu, de Moisés, de Licurgo, de Sólon, de Pitágoras serem tão diferentes em aparência,
enquanto que todos esses homens adquiriram seus conhecimentos numa mesma fonte. A perda desses
dados conduz nossos legisladores contemporâneos à ruína e à subjugação das nações que eles querem
organizar, todas sobre a mesma base.
O povo possuía, então, uma religião ou uma organização social, com relação absoluta a seu próprio
temperamento, e que era um excelente meio de torná-lo feliz; o homem instruído, ao contrário, sabia
convictamente que não existia senão uma religião, e que todos os cultos eram adaptações, como as cores
são aspectos diversos de uma única luz branca.
Assim, a guerra religiosa era quase totalmente desconhecida na Antiguidade, pois nenhum homem
inteligente poderia sequer pensar em tal possibilidade; o povo, tão somente, seria capaz dessas
infantilidades.
A Sociedade antiga aparece-nos, agora, com todo o esplendor de sua organização unitária e compreendemos
porque o iniciado podia entrar em todos os templos e sacrificar a todos os deuses, em comunhão com os
sacerdotes de todos os cultos, que o reconheciam como um filósofo da unidade, assim como eles próprios.
Os ignorantes sectários, que pretendem hoje em dia falar de religião, proclamam a esse respeito o politeísmo,
sem compreender que os cristãos de hoje aparecem, ao pesquisador ingênuo, mais politeísta do que os
membros de qualquer outra seita.
Imaginemos, com efeito, um homem instruído, mas ignorante de nossos costumes religiosos atuais, que
subitamente fosse convidado a fazer um estudo a esse respeito, não possuindo como dados senão
monumentos. Veja se suas conclusões não seriam essas: "A Religião desses povos curiosos parece consistir
principalmente na adoração de um velho, de um supliciado e de uma pomba. Todos seus templos apresentam
essas imagens. Eles adoram, além disso, vários deuses que se encontram sobre seus altares sob os nomes de
São José, São Luís, etc. Além disso, eles oferecem sacrifícios de flores recém desabrochadas a uma divindade
que parece ser aquela da natureza e que eles chamam Maria. Encontram-se, também, várias imagens de
animais sobre seus altares, um cachorro, ao lado de um deus inferior, São Roque, e, mesmo, um porco,
acompanhando um outro deus, Santo Antônio. Existem, também, cervos, cordeiros, etc. Eles parecem ter
particularmente adorado esse animal, que seguidamente representam deitado sobre um livro".
Essas conclusões nos fazem rir e balançar a cabeça. O que diria, com efeito, um iniciado do Mundo Antigo,
instrutor de Moisés ou de Pitágoras, acusado pelo sábio contemporâneo de adorar batatas ou crocodilos?
O argumento do politeísmo e de idolatria não prova senão uma coisa: é a ignorância ou a má fé daqueles que
o empregam. O papel do Iniciado do Mundo Antigo era, antes de tudo, social. Os iniciados formavam, no
mundo inteiro, uma fraternidade de inteligência unida por uma doutrina unitária. É essa fraternidade que
certas sociedades secretas têm como objetivo mais ou menos delineado de reconstituir. Mas esse objetivo e
esses estudos não têm para nós senão um interesse secundário. A Antiguidade, por atraente que seja seu
estudo, não incitaria tanto nossa atenção como nossa sociedade atual. É nela, que devemos ver agora o
iniciado. Digamos, inicialmente, que é muito fácil ser um iniciado. Basta, para isso, conhecer os dados mais
elementares da Ciência Oculta e compreender, graças a ela, a necessidade imperiosa de união fraternal de
todos os homens. Esses dados podem ser obtidos pelo trabalho pessoal ou pelas sociedades de iniciação. Isto
exige algumas palavras adicionais de explicação.
Se foi bem compreendida a diferença capital que atribuímos aos termos de Iniciado e de Adepto, é fácil
deduzir que se pode, até certo ponto, formar iniciados, mas não se formar Adeptos.
Esses homens, cada vez mais raros, só chegam ao Adeptado por suas próprias forças. O objetivo inicial de
uma sociedade de iniciação é indicar a seus membros, da melhor maneira possível, o caminho do
aperfeiçoamento espiritual, que deve ser realizado pelo esforço individual. A doutrina ensinada deve versar
sobre a fraternidade, fonte de todos os desenvolvimentos posteriores do ser humano.
Na prática, a sociedade deve envidar todos os seus esforços para realizar, entre seus membros, o objetivo
que ela persegue, para fazer de cada um deles um apóstolo militante e, após, um verdadeiro iniciado. Dois
grandes procedimentos são empregados para o ensino da iniciação; esses procedimentos, diferenciando
particularmente as escolas de iniciação de fonte oriental daquelas de origem ocidental, indicam facilmente
a origem de um centro oculto. A iniciação oriental opera sobretudo pela mediação, isto é, o objetivo sendo
de fazer criar, para cada indivíduo, sua doutrina sintética, sua maneira de ver o Universo e sua constituição.
A iniciação oriental dá a seu discípulo um texto bastante curto e sintético sobre o qual ele deve meditar
longas semanas, ou mesmo meses. O resultado dessa meditação é de livrar pouco a pouco os princípios
analíticos contidos no texto e de criar uma doutrina fazendo-a, por assim dizer, sair de si mesma.
A iniciação ocidental procede de maneira diferente. Ela dá, inicialmente, a seu discípulo, uma serie de dados
sobre a questão, a serem pesquisados e meditados longamente, impelindo-o a condensar todas as opiniões
e ideias diversas num resumo sintético.
Das duas maneiras, chega-se ao mesmo resultado: a Iniciação Oriental ampliando um texto sintético e a
Iniciação Ocidental condensando textos analíticos, obtendo uma síntese geral. Digamos, enfim, que certas
sociedades esotéricas praticam, ao mesmo tempo, esses dois procedimentos, escalonando-os gradualmente.
De qualquer maneira, o primeiro e, mesmo, o único objetivo procurado, é de levar o aluno a criar sua própria
doutrina. Pouco importa, inicialmente, que essa doutrina seja, em todos os detalhes, excelente ou não. O
essencial é que ela exista. A Sociedade esotérica dando as bases gerais ao iniciado evita erros fundamentais.
O iniciado tendo uma criação pessoal, modifica-a posteriormente, segundo seus estudos e sua evolução
interior.
Constata-se, dessa maneira, a insanidade dos ensinamentos dados pelas sociedades iniciáticas que perderam
totalmente essa base indispensável e que quiseram praticar a fraternidade universal sem criar, em primeiro
lugar, homens capazes de compreender seu alcance. Tais sociedades não tardam a transformar-se num corpo
político, tendendo à dissolução, desde que não retorne energicamente a seu objetivo primitivo, por uma
rápida reorganização. A utilidade social dos iniciados é incontestável; basta imaginar a grandeza possível das
gerações futuras se a unidade se realiza. Certas sociedades procuram agir sobre as massas para chegar a essa
unidade, cuja necessidade pressentiram. As sociedades de Iniciação, ao contrário dirigem-se às inteligências
menos numerosas, e mais capazes de compreender a nobreza da fraternidade universal.
O dia em que o padre católico, tornado iniciado, souber receber em sua igreja, como um igual, o iniciado
ortodoxo, o iniciado muçulmano e o iniciado budista, a fraternidade dos povos estará bem mais perto de
realizar-se na prática. Esse dia está, talvez, muito longe; quem sabe, ao contrário, ele se aproxima mais
rapidamente do que pensamos. Seria temerário esperar essa união dos povos?
É possível que esse ideal seja utópico, inatingível; entretanto, nesta época de positivismo exagerado, é
consolador viver esse sonho da união dos iniciados, realizando um pouco a união universal de todos os
homens na paz e na harmonia.
Fonte: Revista L’Initiation, No 4, 1973

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