Menos Marx, Mais Mises - Camila Rocha

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"Quando o mundo estiver


unido na busca do
conhecimento, e não mais
lutando por dinheiro e poder,
então nossa sociedade
poderá enfim evoluir a um
novo nível."
Camila Rocha

Menos Marx, mais Mises


O liberalismo e a nova direita no Brasil
Para Cibele Bastos
Capa
Folha de rosto

Introdução

1. O que há de novo na nova direita?


2. A direita tradicional: Hayek e o combate ao comunismo
3. A nova direita: Mises e o combate à “hegemonia cultural
esquerdista”
Considerações finais
Notas
Referências bibliográficas
Sobre os entrevistados

Autora
Créditos
Introdução

Anos antes da chegada de Jair Bolsonaro ao Planalto, um novo ativismo de


direita passou a ocupar as redes e as ruas brasileiras, deixando atônitos
analistas políticos acostumados a associar movimentos sociais e
manifestações apenas a grupos de esquerda. Houve quem dissesse que, a
despeito do uso de técnicas contemporâneas de ativismo, as ideias
defendidas pelos militantes seriam basicamente as mesmas da direita
tradicional atuante no país: neoliberalismo e conservadorismo.
No entanto, o bolsonarismo, que teve início entre 2014 e 2015, se apoiou
em outro fenômeno político, cuja trajetória remonta a quase quinze anos: o
surgimento de uma nova direita brasileira. Ao contrário da direita
envergonhada atuante no país desde a redemocratização, pautada em uma
defesa algo hesitante do livre mercado e em um conservadorismo difuso, a
nova direita não tem nenhuma vergonha de se afirmar como tal. Unificada
em torno do combate ao que considera ser uma “hegemonia cultural
esquerdista” que teria passado a vigorar desde a redemocratização, age em
defesa de uma combinação de radicalismo de mercado e conservadorismo
programático e visa romper com o pacto democrático de 1988.
Antes de chegar ao poder, a nova direita em formação se organizava
principalmente a partir de fóruns de debate alternativos. Nesses espaços, era
possível formular e fazer circular conteúdos se valendo de uma linguagem
disruptiva e chocante com o objetivo de chamar a atenção para pautas e
demandas pouco ou nada discutidas até então. Além disso, em contraste
com o elitismo aristocrático da direita tradicional, a nova direita passou a se
organizar em uma rede descentralizada composta de diversos grupos,
movimentos, organizações, partidos, políticos, intelectuais e militantes. É
uma rede que reúne desde direitistas antigos até pessoas comuns e jovens
oriundos da classe média, e mesmo das classes populares, que passaram a
se importar com o que acontecia no cenário político nacional nos últimos
anos.
Nas próximas páginas apontarei as origens dessa nova direita a partir da
reunião de dados coletados nos últimos cinco anos, incluindo dezenas de
entrevistas feitas com militantes e lideranças. Tais entrevistas foram
realizadas com base na construção paulatina de laços de amizade e
confiança com alguns integrantes da nova direita, a partir de agosto de
2015, quando me mudei temporariamente de São Paulo para o Rio de
Janeiro.
Minha intenção na época era passar um mês na cidade e coletar
documentos históricos junto ao Instituto Liberal, então presidido pelo
economista Rodrigo Constantino. No entanto, em março daquele ano, as
manifestações que pediam o impeachment de Dilma Rousseff haviam
atingido um pico em termos de mobilização, levando milhares de pessoas às
ruas em São Paulo, fenômeno que se repetiu em menor grau em outras
cidades brasileiras. Havia um clima de tensão política no ar que vinha se
agravando desde as eleições de 2014, em meio ao qual o Partido dos
Trabalhadores (PT) passou a ser percebido por um número cada vez maior
de pessoas como a grande nêmesis da nação, o que me fez pensar que seria
altamente improvável conseguir acesso aos documentos de que precisava.
Havia razões fortes para eu considerar a tarefa impossível. Os dados de
minha trajetória acadêmica estavam disponíveis publicamente na internet, e
um ano e meio antes eu tinha defendido meu mestrado na Universidade de
São Paulo sob a orientação do professor André Singer, intelectual público
filiado ao PT que havia atuado como porta-voz e secretário de Imprensa da
presidência da República entre 2003 e 2007, e depois publicado o livro Os
sentidos do lulismo em 2012. Além disso, no ano de 2015, quem ocupava o
cargo de diretor do Instituto Liberal era Bernardo Santoro, advogado filiado
ao Partido Social Cristão (PSC), que, em 2014, havia atuado como professor
substituto na Universidade Estadual do Rio de Janeiro mas abandonara o
cargo devido a uma polêmica ideológica que chegou até mesmo a circular
na imprensa. [1]
Ainda que na época eu não soubesse do entrevero na universidade, era algo
que tornava meu acesso ao Instituto ainda mais difícil. Mas, incentivada por
uma nova amizade que fiz assim que cheguei ao Rio, resolvi insistir, e, para
minha surpresa, após alguns e-mails, Bernardo resolveu me encontrar em
um café para conversar. No dia marcado, passados mais de vinte minutos do
horário combinado, comecei a pensar que era provável que eu voltasse para
a quitinete recém-alugada de mãos abanando, quando, pela porta do
estabelecimento, entrou um rapaz muito grande, esbaforido e simpático, que
veio até mim pedindo desculpas pelo atraso.
Como eu imaginara, Bernardo havia de fato visto meu currículo na
internet e logo quis saber afinal o que alguém como eu, que reunia todas as
credenciais de pertencimento à esquerda universitária, queria pesquisar no
Instituto. Não hesitei em confirmar minha inclinação ideológica, mas deixei
claro que minha intenção era fazer uma pesquisa acadêmica séria e não
escrever um panfleto político. Passado algum tempo de uma conversa
bastante animada sobre libertarianismo, diagrama de Nolan, esquerda e
direita — à época, para o advogado, defensores radicais do livre mercado
não poderiam ser classificados como sendo de direita, pois não seriam
autoritários —, Bernardo resolveu me levar para conhecer o Instituto
Liberal, que ficava no Edifício Rex, a apenas algumas quadras do café em
que estávamos na Cinelândia, região central do Rio.
O prédio, localizado no número 37 da rua Álvaro Alvim, vizinho de um
cinema antigo e de uma loja de artigos eróticos, ironicamente também
abrigava uma série de sindicatos trabalhistas de categorias variadas devido
ao baixo custo do aluguel dos conjuntos de salas que comportava. No
quinto andar, a porta de número 518, que correspondia à do Instituto, ainda
estava sem placa de identificação. A entrada dava acesso a um diminuto
hall decorado com dois retratos embolorados de senhores sorridentes, um
do empresário Donald Stewart Jr., fundador do Instituto, e outro do
economista austríaco Friedrich von Hayek, que ficavam de frente para um
pequeno sofá amarelo desbotado. O espaço comportava ainda um lavabo e
duas pequenas salas. Em uma delas, uma mesa retangular com um
computador dividia espaço com dezenas de caixas de papelão,
apressadamente empilhadas junto à parede, e vários panfletos do PSC,
enquanto a outra abrigava uma estante com livros de economia, política e
filosofia e uma mesa circular de granito que sustentava três notebooks e
uma impressora multifuncional.
O Instituto Liberal é o think tank voltado para a difusão do ideário pró-
mercado mais antigo do Brasil. Fundado em 1983 por um rico empresário
de origem canadense, ocupou, durante a década de 1990, uma mansão no
bairro do Botafogo — e que eu imaginava que ainda sediaria a organização.
Constatando minha surpresa ao adentrar o modesto conjunto de salas,
Bernardo riu ao me perguntar se eu seria capaz de descobrir onde estavam
escondidos os agentes da CIA e logo emendou que eu poderia pesquisar o
que quisesse sem nenhuma restrição. Porém, passada minha animação
inicial com aquele êxito improvável, descobri que boa parte dos
documentos históricos a que queria ter acesso estava completamente
desorganizada nas caixas de papelão empilhadas na primeira sala, utilizada
por Bernardo, o que prolongaria bastante minha estada no Rio de Janeiro.
Assim, após me mudar para uma nova quitinete localizada na Lapa, passei a
frequentar diariamente o conjunto 518 do Edifício Rex durante os cinco
meses que se seguiram.
O tempo que passei no Instituto Liberal foi extremamente agradável do
ponto de vista pessoal e intelectualmente enriquecedor graças a uma intensa
convivência com as pessoas que trabalhavam por lá naquela época. Como o
local era pequeno, eu dividia a mesa de trabalho com três jovens agitados e
descontraídos que se debruçavam sobre seus respectivos computadores.
Bernardo ocupava a primeira sala, e o jornalista Lucas Berlanza, a
economista Cibele Bastos e o web designer Diego Reis se reuniam na sala
ao lado, onde eu também ficava. Os poucos recursos materiais de que
dispunham para levar a cabo suas tarefas diárias eram compensados pelo
engajamento apaixonado em uma causa maior. Politizados, não perdiam
uma oportunidade de conversar sobre o que acreditavam e defender de
modo entusiasmado suas ideias para uma sociedade melhor. A despeito das
muitas diferenças existentes entre eles, a causa que os une pode ser
sintetizada de modo telegráfico no mote: “Menos Marx, mais Mises”.
Apesar de ainda ser muito pouco conhecido entre os jovens brasileiros
em comparação com Karl Marx, o nome do economista austríaco Ludwig
von Mises se tornou um dos símbolos da nova direita, que, ao longo de
mais de uma década, passou a congregar de anarcocapitalistas a
monarquistas ultramontanos. Conectados a redes de think tanks e
organizações civis de âmbito nacional, regional e internacional, os então
funcionários do Instituto Liberal faziam parte de um universo de militância
que eu desconhecia completamente até então, e que foi se tornando cada
vez mais familiar à medida que o frenesi inicial de trabalhar ao lado de uma
“esquerdista” foi perdendo força e meus novos colegas passaram a me
acolher como parte do grupo.
As idas ao Vulcão das Massas, Bob's, Starbucks, restaurantes populares
e botecos da Cinelândia no fim do dia eram contrabalançadas com almoços
em restaurantes naturais alternativos, nos quais eu era acompanhada apenas
por Cibele, dada a ausência de carne dos cardápios, que parecia afugentar
os homens. No dia a dia, Cibele por vezes me chamava carinhosamente de
“nossa esquerdinha infiltrada”, e eu trocava olhares de desaprovação bem-
humorada com Lucas, conservador e lacerdista convicto, quando Cibele se
empolgava na defesa do radicalismo de livre mercado. Não havia entre nós
quaisquer reservas ou suspeitas, mas uma relação de respeito mútuo pela
seriedade e entusiasmo com que nos dedicávamos às nossas respectivas
tarefas permeadas por um bom humor permanente que aliviava potenciais
tensões.
Passado algum tempo, com a intenção de compreender melhor os
documentos que vinha examinando, resolvi fazer algumas entrevistas com
as pessoas que trabalhavam no Instituto. Quando entrevistei Cibele, para
minha surpresa, ela me contou sobre seu “trabalho de formiguinha” — que
eu chamava de “trabalho de base” — em uma rede social chamada Orkut,
criada pelo Google em 2004 e que precedeu o Facebook em termos de
popularidade no Brasil. Movida pela curiosidade sobre o “trabalho de
formiguinha” no Orkut, resolvi entrevistar vários outros jovens militantes e
lideranças daquele ecossistema político em formação, bem como quem já
frequentava havia mais tempo os circuitos da direita tradicional usando o
que os cientistas sociais chamam de “método bola de neve”, em que um
entrevistado aponta outros, e estes, outros, até que os nomes começam a se
repetir. Foi assim que entrevistei pessoas que defendiam ideologias políticas
bastante diversas e pertenciam a diferentes grupos e organizações que, ao
longo dos anos, de modo mais ou menos pragmático, se consolidaram em
torno de um amálgama ultraliberal-conservador até então inédito no país.
Desde então, passei a ter amigos e conhecidos que militavam por causas
que não eram de esquerda e a me sentir como uma Alice que havia
atravessado um espelho ideológico. Expressões que denotavam
pertencimentos a diferentes grupos como “chicaguista”, “leftlib”, “ancap”,
“conserva” ganhavam sentido, e nomes como Ayn Rand, Murray Rothbard
e Eugen von Böhm-Bawerk, autores famosos no panteão internacional dos
“defensores da liberdade”, e conservadores ilustres como Russell Kirk,
William Buckley e Roger Scruton, já não me eram mais estranhos,
tampouco os nomes de intelectuais, políticos e lideranças nacionais que
compunham essa realidade alternativa. Disputas pela melhor estratégia em
face da conjuntura, acusações de moderação programática, traições
partidárias, rachas ideológicos, destruição de reputações, fofocas íntimas
transformadas em problemas políticos, desavenças resolvidas no bar e
discussões teóricas intermináveis me faziam sentir como se eu houvesse
voltado para a época em que participei do movimento estudantil durante
minha graduação em ciências sociais. A diferença era que agora o ideal
socialista havia sido substituído pela crença em um capitalismo utópico, a
qual, por muitas vezes, continuava a ser sacrificada do mesmo modo no
altar do pragmatismo político.
Foi assim que entre 2015 e 2018 pude acompanhar a formação de um
novo fenômeno político por meio das percepções das pessoas que
entrevistava, dos textos que postavam em redes sociais, dos eventos de que
participavam e nos quais estive presente e da análise de mensagens trocadas
em comunidades do Orkut a partir da metade dos anos 2000. [2] Informada
por essas experiências, que acabaram constituindo uma espécie de mergulho
etnográfico na nova direita, e por todas as evidências empíricas que reuni
durante os anos, não hesito em afirmar que não só a eleição de Bolsonaro
em 2018 teve uma conexão importante com a consolidação dessa nova
força política, como, a despeito do rumo de seu governo, a nova direita veio
para ficar.
1. O que há de novo na nova direita?

Antes de apontar como a nova direita brasileira surgiu, é preciso responder


à pergunta sobre o que de fato haveria de novo na nova direita. Afinal, é
muito comum entre analistas políticos o uso de expressões como “direita
radical” ou “extrema direita” para se referir a esse mesmo fenômeno,
destacando sua continuidade com a direita atuante anteriormente e sua
conexão, ou mesmo sinonímia, com o fenômeno do bolsonarismo. De
acordo com certas análises, a direita contemporânea que chegou ao poder
não passaria de um punhado de jovens e figuras saídas dos porões da
política brasileira que, em conjunto com empresários, intelectuais e
profissionais liberais, defenderiam ideias velhas com uma roupagem digital
mais apropriada aos novos tempos.
No entanto, ainda que de fato existam continuidades importantes entre
ideias e personagens antigos e novos, como será explicitado aqui, acredito
que ignorar as novidades e os tons de cinza da direita contemporânea é um
obstáculo para uma compreensão mais aprofundada. Antes de mais nada, é
preciso dizer que a nova direita é nova em comparação com a direita
atuante desde a época da redemocratização, pautada pelos marcos do pacto
de 1988. A partir de 1988 passou a vigorar no país um pacto democrático
progressista baseado em uma nova Constituição, que ficou conhecida como
Constituição Cidadã, e em um arranjo de governabilidade específico que
prevê a necessidade de governar a partir da manutenção de grandes
coalizões políticas, o chamado “presidencialismo de coalizão”. [1] Tal
ordenamento, para além de demarcar uma ruptura com o modelo político da
ditadura militar, qualificado pelo sociólogo Florestan Fernandes como uma
autocracia burguesa, abriu espaço para a ampliação de direitos de mulheres,
negros, indígenas, crianças e jovens, alterando as dinâmicas existentes na
esfera pública brasileira.
No entanto, se, por um lado, o novo pacto permitia a conquista de uma
série de demandas democráticas, por outro, também as limitava, tendo em
vista a consolidação de uma blindagem institucional que apartava o sistema
político da sociedade, como aponta o filósofo Marcos Nobre. Com o tempo,
grupos à esquerda e à direita, sobretudo durante os governos petistas,
sentindo que tinham pouca voz e representatividade na esfera pública
tradicional, passaram a circular seus discursos em fóruns alternativos.
Assim, ao mesmo tempo que movimentos mais ou menos radicalizados
começaram a demandar a aceleração de avanços democráticos
possibilitados pelo pacto, relacionados à melhoria de serviços públicos, ao
combate à corrupção e às desigualdades sociais, de gênero, orientação
sexual e raça, sobretudo a partir de 2011, quando se inaugura um novo ciclo
de protestos no país, uma nova direita que demandava o fim do pacto
emergia, provocando um curto-circuito na esfera pública tradicional, que
opera dentro dos limites estabelecidos em 1988.
A demanda pelo fim do novo pacto democrático foi uma grande
novidade no campo da direita. Afinal, a abertura política do país fez com
que diversos atores de direita que possuíam um grau importante de
interlocução com o regime militar perdessem a influência política e social
que possuíam durante a ditadura. Vários deles passaram, então, a fazer
esforços para se adaptar aos limites delimitados pelo pacto de 1988. [2] O
grande empresariado, por exemplo, acostumado a contatos diretos com
ministros e burocratas dos altos escalões dos governos militares, foi
compelido a buscar novas formas de participação política e contornar a
dificuldade de interlocução com partidos de direita, uma vez que sua
fragmentação regional e o caráter personalista de suas lideranças criavam
obstáculos para a construção de um programa em comum.
Além disso, grupos de direita esbarrariam ainda em um problema de
branding. A partir da redemocratização, se dizer de direita passou a ser algo
desconfortável, e o “medo de ficar marcado pelo regime”, nas palavras de
um dos entrevistados, era comum entre pessoas de direita, dada a
associação imediata com a ditadura militar. Sinônimo de autoritarismo, tal
autodenominação acabou sendo substituída por outra mais amena: “centro”,
fenômeno que também ocorreu na Argentina e foi apelidado pelo cientista
político Timothy Power de “direita envergonhada”. A vergonha em se
afirmar de direita, porém, não dizia respeito apenas aos políticos mas
também se estendeu a seus ideólogos, simpatizantes e eleitores. Assim,
durante as décadas de 1990 e 2000, enquanto anticomunistas, conservadores
e direitistas convictos haviam perdido a influência que possuíam durante a
ditadura, grupos que antes tinham pouca ou nenhuma penetração na esfera
pública tradicional, como feministas, LGBT+ e negros, passaram a conquistar
maior legitimidade em meio a avanços e recuos. [3]
Foi apenas após o auge da popularidade de Lula, entre 2006 e 2010, que a
vergonha em se dizer de direita começou aos poucos a se dissipar,
sobretudo a partir de uma rede social que precedeu o Facebook em termos
de popularidade no Brasil, o Orkut. Em meio à denúncia do escândalo do
mensalão, que atingiu em cheio a cúpula do primeiro governo Lula, as
comunidades do Orkut, assim como blogs e demais fóruns da internet
existentes na época, abriram a vozes pouco ou nada ouvidas na esfera
pública tradicional novos espaços de debate e discussão de ideias no campo
da direita. A grande novidade dessas falas em relação à direita que atuava
na esteira da redemocratização é justamente sinalizar uma ruptura com o
pacto de 1988, e, para tanto, a nova direita emergente passou a apostar na
substituição de seu substrato progressista por um novo amálgama de ideias:
o ultraliberalismo-conservador.
A emergência de novidades políticas, à esquerda ou à direita, costuma
ocorrer quando, em meio a embates políticos e sociais específicos, surgem
novas ideias, ou novas combinações de ideias, que não são redutíveis a
conflitos materiais, ainda que possam lhes conferir novos sentidos. Basta
pensar no surgimento de uma nova esquerda a partir da década de 1960, que
agregou novos atores e perspectivas alargando os horizontes da velha luta
de classes. Isso não significa dizer que determinadas reflexões acerca de
opressões de gênero, raça, sexualidade e colonialidade já não existissem há
décadas, ou mesmo há séculos, porém foram ressignificadas durante
embates políticos e sociais específicos, culminando em novas formações
políticas e ideológicas.
No que diz respeito à nova direita brasileira surgida nos anos 2000, tal
processo se deu a partir de uma reação ao pacto de 1988 e suas
consequências sociais e institucionais, cujo desenvolvimento ao longo do
tempo foi percebido como a consolidação de uma “hegemonia cultural
esquerdista”. Grupos muito diversos entre si, descontentes com a atuação de
neoliberais e figuras conservadoras na política — dado que boa parte delas
parecia fazer pouca ou nenhuma oposição ao modus operandi do lulismo
—, passaram a se unificar com o objetivo de combater a hegemonia
esquerdista a partir da consolidação paulatina de um novo amálgama de
ideologias políticas. Porém, antes de compreender como isso se deu na
prática, é preciso compreender o que são afinal ideologias políticas, quais
foram e quais são aquelas adotadas pelas direitas em tempos recentes e
como se difundiram internacionalmente nos últimos anos.
Ideologias políticas à direita

Tanto a esquerda como a direita, a despeito de serem categorias relacionais,


delimitadas temporal e geograficamente, não são desprovidas de conexões
com o que o cientista político britânico Michael Freeden qualifica como
ideologias políticas. Para Freeden, as ideologias políticas seriam um
conjunto de ideias, crenças, opiniões e valores que: 1) possui um padrão
recorrente; 2) é sustentado por grupos relevantes; 3) é utilizado nas disputas
em torno da adoção de planos para políticas públicas; e 4) procura justificar,
contestar ou mudar arranjos sociais e econômicos. Desse modo, as
ideologias políticas possuiriam uma relação estreita com a prática política,
permeando conflitos que se dão na esfera pública em torno do desenho de
amplos programas que dizem respeito a políticas sociais e econômicas.
Certas ideologias políticas, contudo, ganharam proeminência em relação
a outras durante o século XX se estabelecendo como macroideologias, isto é,
redes inclusivas de ideias que se consolidaram como tradições mais amplas
de pensamento como o conservadorismo, o liberalismo, o socialismo e o
fascismo. As macroideologias não se reduzem a movimentos políticos ou
partidos, inclusive sua própria classificação em um contínuo de esquerda e
direita possui certa arbitrariedade. Afinal, os deslocamentos e composições
entre diferentes macroideologias não partem de um princípio de que
estejam necessariamente ordenadas de forma gradual em uma escala, ou
que sejam mutuamente excludentes. Isso é o que permite, por exemplo, se
afirmar socialista e liberal ao mesmo tempo, ou ainda ser conservador no
que tange à preservação de certos costumes mas ser contrário à manutenção
de uma estrutura social desigual considerando a legislação trabalhista.
A despeito de sua importância, essas tradições mais amplas também
disputam espaço ou são agregadas a outras ideologias políticas
caracterizadas como ideologias modulares. As ideologias modulares
possuem esse nome porque são menos desenvolvidas em relação às
macroideologias no que diz respeito ao seu alcance e às suas ambições em
fornecer respostas a uma gama mais ampla de problemas. Um exemplo
seria o nacionalismo, exaltação à nação que, a depender de sua combinação
com outras ideologias políticas, pode resultar na defesa de pautas
progressistas, como foi o caso do nacionalismo terceiro-mundista dos anos
1960, ou reacionárias, como o nacionalismo de extrema direita que vem
ganhando terreno atualmente em vários países da Europa. Muitas vezes, é
justamente o surgimento de novas ideologias modulares, ou sua combinação
com tradições mais amplas, que possibilita a formação de novas esquerdas
ou de novas direitas.
Tendo isso em vista, neste livro procuro apontar qual foi o processo
político e social que possibilitou o surgimento de novos atores, a
reorientação de atores antigos e a ressignificação de determinadas ideias em
um sentido novo. Tais processos são mais comuns do que podem parecer à
primeira vista. Basta lembrar que, por muitos anos, os grandes adversários
dos conservadores foram os liberais. Um amálgama entre as duas tradições
pareceria pouco provável em séculos passados, afinal, o conservadorismo
tem sua origem em uma reação moderna às grandes mudanças
desencadeadas pela Reforma Protestante e pelo Iluminismo. Como bem
observa o filósofo conservador Roger Scruton, por causa de uma
desvantagem teórica, oriunda de sua recusa à abstração, os conservadores
costumam apresentar seus próprios argumentos de forma lamuriosa ao
buscar conservar tradições em vista de sua substituição por algo que se
julga pior. Tal necessidade de manter determinadas tradições está ancorada
no entendimento de que elas não configurariam costumes arbitrários, mas
uma condensação de conhecimentos advindos de um longo processo de
aprendizagem que favoreceriam a reprodução da sociedade, daí o
sentimento de responsabilidade pelos mortos, pelos vivos e por aqueles que
estão para nascer, na formulação consagrada pelo grande crítico da
Revolução Francesa, Edmund Burke.
Desse modo, se para muitas pessoas de esquerda a combinação entre
conservadorismo e neoliberalismo parece óbvia hoje, o processo de
consolidação de um neoliberalismo conservador, ou de um
“neoconservadorismo”, [4] não foi livre de tensões. Pelo contrário. Afinal,
entre as décadas de 1930 e 1970, boa parte dos conservadores era adepta da
ideia de um Estado interventor e de políticas de bem-estar social para os
trabalhadores, e foi justamente nessa época, mais precisamente no fim da
década de 1930, que surgiu o neoliberalismo. Inclusive, é importante
lembrar que não foram apenas políticos conservadores que passaram a
adotar o neoliberalismo ao longo do tempo. Ainda nos anos 1970 reformas
neoliberais também foram levadas a cabo por políticos de tendência social-
democrata, dando origem posteriormente à chamada terceira via, ou ao que
a teórica política Nancy Fraser chama de “neoliberalismo progressista”:
políticas neoliberais combinadas com a defesa de direitos humanos.
Mas qual seria, afinal, a diferença entre liberalismo e neoliberalismo?
No que diz respeito à autodeclaração dos próprios intelectuais e ativistas
brasileiros que defendem a adoção da lógica do livre mercado pela
sociedade, pouca ou nenhuma, dado que a denominação de liberal costuma
ser utilizada frequentemente como sinônimo de neoliberal. Isso teria
ocorrido porque até a década de 1980 o termo “neoliberalismo”, que era
percebido por pessoas comuns como uma expressão “neutra”, acabou
ganhando uma carga normativa negativa ao ser utilizado em slogans
anticapitalistas amplamente conhecidos no país após a adoção de políticas
de inspiração neoliberal pelo regime pinochetista no Chile. Por esse motivo,
o termo passou a ser rejeitado como forma de autodescrição e boa parte dos
defensores do capitalismo de livre mercado começou a se autodenominar
simplesmente como liberais.
Nesse sentido, é bastante ilustrativa uma experiência que tive durante
minha estada no Instituto Liberal do Rio de Janeiro. Entre os documentos
internos do Instituto, encontrei uma correspondência privada que datava da
época de sua fundação, ou seja, do início da década de 1980, na qual um
dos membros do Instituto se autodenominava, e denominava os demais
colegas, neoliberal. Comentei sobre o fato com Lucas e Cibele, membros do
Instituto na época, e logo se instalou uma disputa acalorada entre eles em
que Lucas defendia a pertinência da classificação enquanto Cibele a
refutava.
Autodenominações à parte, de acordo com a literatura especializada, de
fato existem diferenças importantes entre o liberalismo político, o
liberalismo econômico e o neoliberalismo. Durante o século XIX, o
liberalismo econômico já era defendido de forma dissociada do liberalismo
político. No Brasil, inclusive, a difusão do liberalismo econômico precedeu
a do liberalismo político na esfera pública, considerando que a obra
Observações sobre o comércio franco no Brasil, do Visconde de Cairu, foi
publicada em 1808 e a ideia moderna de liberdade política começou a
circular no país somente a partir de 1822. Anos depois, sobretudo a partir de
1850, o liberalismo econômico, também conhecido como laissez-faire,
passou a ser criticado enfaticamente por vários autores liberais até entrar em
decadência aguda com a crise econômica de 1929. Passados quase dez anos,
o laissez-faire começou a ser reformulado em 1938, em Paris, por vários
intelectuais que se reuniram no Colóquio Walter Lippmann, realizado para
celebrar a obra do publicista norte-americano. [5] Entre os 26 participantes
do encontro, estavam teóricos da Escola Austríaca, como Friedrich von
Hayek e Ludwig von Mises, intelectuais franceses como Louis Rougier e
Raymond Aron e alemães como Alexander Rüstow e Wilhelm Röpke.
As disputas ocorridas durante o Colóquio acabaram resultando na
formação de duas novas correntes principais. A primeira foi o
ordoliberalismo, defendido pelos alemães, que, ao contrário do laissez-faire,
considera que o funcionamento do mercado é imperfeito e que o Estado
deve atuar para corrigir suas falhas, as quais teriam desencadeado a crise de
1929. E a segunda seria justamente o neoliberalismo, encampada
principalmente por Hayek, que sustentaria que a crise de 1929 foi
desencadeada não por falhas de mercado, mas por um excesso de
intervenção estatal, motivo pelo qual o Estado deveria intervir na economia
apenas por meio da criação de regras e instituições que promovam o bom
funcionamento do mercado.
Ou seja, ao contrário do laissez-faire vigente até então, o neoliberalismo
propõe que o Estado possua um papel ativo como promotor do livre
mercado. Assim, se para os adeptos do laissez-faire o Estado não deveria ter
papel algum na regulação da economia, os neoliberais acreditam que o
Estado deve atuar no sentido de criar um aparato jurídico-legal para
fomentar o bom funcionamento do livre mercado, daí a novidade que
justifica o emprego do prefixo “neo”. Mises, por sua vez, foi o único dos
presentes na reunião que continuou a defender a manutenção do laissez-
faire do século XIX, de modo que, se Hayek e Milton Friedman costumam
ser classificados como neoliberais, Mises foi considerado por seus pares um
“paleoliberal”, ou seja, um liberal jurássico, porém, posteriormente,
também passou a ser lido como um “libertariano”.
O libertarianismo, diferentemente do neoliberalismo, consiste em uma
defesa moral e radical da lógica de livre mercado sem restrições de
qualquer tipo, considerando a liberdade dos seres humanos de não serem
coagidos uns pelos outros. Assim, para os libertarianos a defesa da
liberdade de mercado seria justificada sobretudo moralmente e não apenas a
partir de uma ênfase em argumentos de ordem econômica, como ocorre no
caso do neoliberalismo. [6] Essa diferenciação é importante pois é
justamente a recepção e a ressignificação recente de um ideário libertariano
para o contexto brasileiro, ancoradas na obra do economista austríaco
Ludwig von Mises, que constituem uma das principais inovações da nova
direita no país.
De qualquer modo, é preciso considerar que, a despeito de eventuais
disputas internas, todas essas vertentes ideológicas se percebem como
continuidade de uma mesma tradição que remonta ao liberalismo do século
XIX e às obras de autores como Frédéric Bastiat, Herbert Spencer, Stuart
Mill, Alexis de Tocqueville, John Locke, entre outros. Contudo, as
correntes mais radicais associadas ao libertarianismo, como o
anarcocapitalismo, [7] cujos defensores são conhecidos como ancaps, o
objetivismo [8] e o minarquismo, [9] teriam permanecido muito menos
conhecidas do grande público em comparação com o neoliberalismo, que
conquistou uma grande exposição a partir das décadas de 1970 e 1980, e
cujos defensores são chamados por aqueles que pertencem às correntes
mais radicais de “chicaguistas”. [10]
Considerando que a nova direita brasileira se baseia justamente na defesa
do radicalismo de mercado, ancorada em uma releitura da obra de Mises,
fazer uma diferenciação entre liberalismo, neoliberalismo e demais
correntes que realizam a defesa moral e radical do livre mercado é
fundamental. Afinal, liberalismo, nos termos de Freeden, se refere a uma
macroideologia política, e o neoliberalismo e o libertarianismo seriam
ideologias modulares que eventualmente entram em conflito com outras
ideologias políticas também vinculadas à tradição liberal, como o
liberalismo igualitário, por exemplo.
Desse modo, optei por falar em neoliberalismo e neoliberais
considerando os adeptos da obra de Hayek, da Escola de Chicago e da
Escola da Escolha Pública de Virgínia. Em referência a ideologias políticas
libertarianas, como o objetivismo, o minarquismo e o anarcocapitalismo,
serão utilizados os termos “ultraliberalismo” e “ultraliberais”, ressaltando
com o prefixo “ultra” tal radicalidade; e, finalmente, utilizarei termos mais
genéricos, como “pró-mercado”, quando for realizada uma referência geral
aos atores que fizeram e ainda fazem parte do ecossistema internacional de
organizações formadas a partir da década de 1940, logo após o Colóquio
Walter Lippmann, que influenciaram de modo importante a recepção do
ideário neoliberal no Brasil: os think tanks.
A disseminação da defesa do livre mercado via think tanks

As ideologias políticas costumam ser difundidas das mais diversas formas.


À esquerda, os partidos atuaram como organizações fundamentais para tal
fim durante o século XX, tendo em vista sobretudo a atuação histórica dos
partidos comunistas. Já à direita, as principais organizações responsáveis
por disseminar a defesa da propriedade privada e a liberalização da
economia na mesma época são chamadas de think tanks, como é o caso do
Instituto Liberal do Rio de Janeiro. A expressão think tank remonta às salas
secretas nas quais eram discutidas estratégias de guerra e passou a ser mais
utilizada por volta da década de 1960 nos Estados Unidos.
Os primeiros think tanks criados pelos norte-americanos eram
organizações civis privadas, mantidas com doações de pessoas físicas e
jurídicas, que reuniam especialistas e técnicos, normalmente recrutados
junto à academia. Seus membros afirmavam que sua intenção principal era
dedicar-se à pesquisa científica e à divulgação de ideias no campo das
políticas públicas da forma mais autônoma e independente possível em
relação a grupos de interesse específicos. Alguns think tanks que eram
voltados para a educação da população ficaram inclusive conhecidos como
“universidades sem alunos”.
Esse tipo de justificativa fazia jus ao espírito progressista e “científico”
que passou a predominar no início do século XX nos Estados Unidos. E foi
nesse contexto que foi fundado o primeiro think tank pró-mercado naquele
país, e provavelmente no mundo, a Foundation for Economic Education
(FEE). A organização, criada em março de 1946 na cidade de Atlanta,
Geórgia, nos Estados Unidos, foi idealizada por um empresário chamado
Leonard Read e contou por muitos anos com o auxílio financeiro do Volker
Fund, um fundo milionário criado pelo magnata William Volker e
gerenciado por um entusiasta do livre mercado. Por causa disso, a
instituição possuía uma relativa liberdade e autonomia diante de interesses
políticos imediatos para realizar seu principal objetivo: educar o povo
norte-americano para as vantagens do capitalismo de livre mercado.
Dez anos depois da criação da FEE, o radialista anticomunista Robert
LeFevre fundou uma organização similar na cidade de Colorado Springs, no
estado do Colorado, com um foco mais escolar, chamada Freedom School.
A escola funcionou até 1973 e seu quadro de professores contou com as
personalidades mais destacadas do ecossistema pró-mercado da época,
como o próprio Leonard Read, fundador da FEE, Frank Chorodov, editor da
revista The Freeman publicada pela FEE, e os acadêmicos Milton Friedman
e Ludwig von Mises. Na década de 1960, outras duas organizações ainda
seriam fundadas por membros da FEE, o Liberty Fund, sediado na cidade de
Indianapolis, em Indiana, criado pelo advogado Pierre F. Goodrich, filho de
James P. Goodrich, empresário que atuou como governador do mesmo
estado entre 1917 e 1921 pelo Partido Republicano; e o Institute for
Humane Studies (IHS), criado em 1961 por F. A. Harper na Califórnia, e que
também passou a contar com a participação de Pierre F. Goodrich.
A maioria das pessoas que circulavam nessas organizações era formada
por acadêmicos, especialmente economistas, e empresários. No entanto,
também existiam algumas pessoas comuns que entravam em contato e se
interessavam pela promoção do ideário pró-mercado a partir de outras vias,
como os admiradores das obras da romancista e roteirista de filmes de
Hollywood Ayn Rand. Ao lado de duas outras romancistas, Rose Wilder
Lane e Isabel Paterson, Rand, criadora do objetivismo, costuma ser
apontada como uma das principais fundadoras do chamado “movimento
libertariano moderno”. Sua obra mais famosa, um romance de mais de mil
páginas chamado A revolta de Atlas, foi publicada em 1957 e traduzida para
várias línguas, totalizando mais de 7 milhões de exemplares vendidos desde
sua primeira tiragem. [11]
Desse modo, a divulgação e o ensino do ideário pró-mercado realizado
pelas organizações citadas acima incluíam não apenas escritos de economia,
produzidos por membros da Escola Austríaca, como Hayek e Mises, e da
Escola de Chicago, como Milton Friedman. Havia também uma literatura
mais ampla elaborada por autoras e autores anarcocapitalistas, minarquistas
e objetivistas que, ao contrário dos economistas, procuravam fazer uma
defesa do livre mercado embasada principalmente em fundamentos morais
e filosóficos. Tais diferenças eventualmente resultavam em disputas
ideológicas, estratégicas e políticas importantes no interior dos think tanks.
Um dos alvos de tais disputas, por exemplo, foi o próprio Milton Friedman,
que, na década de 1960, foi acusado de ser muito moderado em um texto
que circulou entre os membros da FEE.
Ainda em 1945, no entanto, e antes da publicação de A revolta de Atlas,
o ideário de livre mercado já havia começado a ser disseminado para o
grande público dentro e fora dos Estados Unidos. Isso se deu por meio da
divulgação de uma versão condensada do livro O caminho da servidão,
publicada originalmente por Hayek em 1944, na Reader's Digest, uma das
revistas mais populares da época e que era traduzida para dezenas de países.
Hayek, então professor da prestigiosa London School of Economics, amigo
de longa data de John Maynard Keynes e ex-aluno de Mises, argumentava
que o aprofundamento da lógica “coletivista” e “estatista” que ampararia o
Estado de bem-estar social conduziria necessariamente ao totalitarismo e,
portanto, ao fim das liberdades individuais.
Tais teses, ainda que já tivessem sido previamente defendidas pelo
jornalista norte-americano Walter Lippmann em 1938, provocaram um
verdadeiro frisson na época. Afinal, as políticas que sustentavam o Estado
de bem-estar social estavam no auge e eram consideradas como um
consenso tanto à direita quanto à esquerda, o que fez com que em pouco
tempo Hayek angariasse muitos inimigos. Houve, no entanto, também
quem se extasiasse com suas ideias, como Antony Fisher, ex-piloto da
Força Aérea Real Britânica. Ao ler a adaptação de O caminho da servidão
na Reader's Digest, Fisher ficou tão impactado com os argumentos expostos
pelo economista que, em 1947, resolveu ir pessoalmente ao seu encontro
para pedir conselhos sobre qual seria a melhor forma de divulgar suas
ideias.
Coincidentemente, nesse mesmo ano, Hayek havia fundado a Sociedade
Mont Pèlerin em uma localidade de mesmo nome na Suíça e estava
entusiasmado com a possibilidade de divulgar o ideário pró-mercado. No
entanto, tal divulgação deveria ser dirigida apenas a elites intelectualizadas
que atuavam na sociedade civil, pois tentar influenciar diretamente um
sistema político permeado por “ideias coletivistas” seria uma perda de
tempo. Por isso Hayek desestimulou Fisher a se tornar um militante em um
partido, e afirmou que a melhor forma de divulgar o ideário pró-mercado
seria por meio da fundação de uma organização civil não partidária. Afinal,
naquela época o neoliberalismo ainda era tido como muito radical e pouco
palatável para os partidos existentes, e Hayek acreditava que, por meio de
uma organização civil privada, seria possível divulgar o neoliberalismo em
sua forma original, “pura”, e sem as limitações impostas por lógicas
político-partidárias de curto prazo.
Inspirado pela atuação dos socialistas da Sociedade Fabiana no fim do
século XIX, [12] Hayek ambicionava realizar uma mudança política e
ideológica profunda na sociedade britânica. Para tanto, acreditava que era
necessário atuar a partir de perspectivas de longo prazo com base em uma
vanguarda intelectual que agisse de forma estratégica procurando
influenciar indivíduos que denominava como “ideólogos de segunda
classe”: jornalistas, acadêmicos, escritores e professores. Dessa forma, seria
possível difundir o ideário neoliberal junto à opinião pública e criar, com o
tempo, um consenso neoliberal no seio da sociedade, de forma análoga ao
que, em sua percepção, teria ocorrido com ideias de matriz socialista ou
social-democrata.
Em 1955, seguindo as orientações de Hayek, Fisher criou em Londres o
Institute of Economic Affairs (IEA) com o objetivo de difundir ao longo do
tempo o ideário pró-mercado e, na metade da década de 1970, foi para a
América do Norte, onde ocorria uma onda de fundação de think tanks de
direita. À medida que tais organizações foram sendo criadas, políticas de
inspiração neoliberal começaram a ser implementadas para combater a
inflação durante o governo do democrata Jimmy Carter (1977-81) nos
Estados Unidos e o governo do trabalhista James Callaghan (1976-9) na
Inglaterra. Poucos anos depois, na década de 1980, os governos de Augusto
Pinochet, Ronald Reagan e Margaret Thatcher se tornaram modelares no
que tange à adoção mais ampla de políticas neoliberais.
Os governos de Pinochet e Reagan foram influenciados diretamente pela
Escola de Chicago, capitaneada por Milton Friedman, e o governo de
Thatcher por Hayek [13] e pelo IEA. Com o passar do tempo, essa dinâmica
inaugurou um processo mais amplo de incorporação do cânone neoliberal
no que diz respeito à adoção não só de certas políticas públicas, mas
também do que os filósofos franceses Pierre Dardot e Christian Laval
classificaram como uma nova racionalidade que passou a regular as
relações sociais.
Foi em meio a esse contexto que se fundou nos Estados Unidos uma
organização com o objetivo de criar e articular think tanks que defendem o
ideário pró-mercado: a Atlas Network. Hoje em dia, é possível dizer que
praticamente todos os think tanks pró-mercado mais importantes do globo
fazem parte da rede constituída pela Atlas. A articuladora norte-americana
conta hoje com mais de quatrocentos afiliados distribuídos em mais de
oitenta países: onze no Canadá, 162 nos Estados Unidos, 122 na Europa e
na Ásia Central, dez no Oriente Médio e norte da África, 25 na África,
catorze no sul da Ásia, 21 no Extremo Oriente e Pacífico, sete na Austrália
e Nova Zelândia e 102 na América Latina. Como bem aponta o historiador
britânico Richard Cockett, de fato é tentador pensar a rede de organizações
articuladas pela Atlas e pelo IHS como uma espécie de Comintern
neoliberal, exceto pelo fato de que todas afirmam enfaticamente que não
recebem nenhum tipo de financiamento estatal.
Para além de terem sido bem-sucedidos em se articular politicamente
com os conservadores, os neoliberais foram capazes de disseminar suas
ideias para segmentos mais amplos em países anglo-saxões por meio de
uma ressignificação do conceito de liberdade — valor fundamental em tais
sociedades em razão da longa influência exercida pela tradição liberal tanto
nas elites como nas camadas médias e populares. Essas características
favoreceram a propagação do que o cientista político C. B. Macpherson
chamou de individualismo possessivo, isto é, a concepção do indivíduo
como sendo fundamentalmente o proprietário de si mesmo e de suas
capacidades sem que haja o reconhecimento da contribuição da sociedade
para a sua existência como tal. Além disso, questões como pobreza e
desigualdade não estavam na ordem do dia, e os direitos civis e políticos
básicos eram tidos como garantidos, dada a existência de regimes
democráticos liberais sólidos em ambos os contextos.
No entanto, se o neoliberalismo encontrou um terreno ideológico fértil
na Inglaterra e nos Estados Unidos, o mesmo não pode ser dito dos países
latino-americanos com sua tradição filosófica iberista, [14] seus altos níveis
de pobreza e desigualdade e sua ânsia por desenvolvimento e
modernização. Por conta disso, os intelectuais latino-americanos que
procuraram viabilizar as reformas neoliberais em seus respectivos países na
mesma época esbarraram em problemas teóricos e ideológicos complexos.
Só para ficar com um exemplo mais próximo da realidade brasileira, o
jurista chileno Jaime Guzmán, principal intelectual da ditadura pinochetista
e arquiteto da nova Constituição promulgada pelo regime em 1980,
reinterpretou o conceito de “subsidiariedade” do Estado, presente na
doutrina católica, para tentar conciliar de modo minimamente coerente a
defesa do tradicionalismo católico de origem ibérica com o neoliberalismo.
Na década de 1960, época em que Guzmán passou a atuar politicamente
em seu país, a Igreja católica, ao mesmo tempo que condenava o
comunismo “ateu”, também rejeitava o capitalismo de livre mercado por
produzir uma economia “amoral” e socialmente dissolvente. Para
solucionar esse problema, baseando-se em alguns trechos selecionados da
encíclica Mater et Magistra, publicada em 1961 sob o papado de João XXIII,
Guzmán procurou demonstrar como a doutrina católica seria compatível
com o capitalismo. Sublinhando a ideia da “prioridade ontológica e de
finalidade do indivíduo”, ele propunha que o fundamento da teoria política
católica seria a primazia do indivíduo e, como decorrência lógica, uma
economia baseada na propriedade privada. Esse posicionamento o levou a
rejeitar a ideia, defendida pelos adeptos da Democracia Cristã no Chile, de
que os católicos deveriam buscar uma “terceira posição” entre comunismo e
capitalismo, e indicar claramente a opção pelo capitalismo neoliberal.
Para os neoliberais chilenos a liberalização de mercado seria a resposta
para a espiral inflacionária, o desemprego e a pobreza, problemas cujas
raízes estariam no intervencionismo estatal e no poder sindical crescentes.
Para compatibilizar tal ideia com o catolicismo, Guzmán passou a fazer um
novo uso do conceito de subsidiariedade do Estado previsto na doutrina
católica. Na visão da Igreja, o Estado como encarnação do poder político
seria subsidiário aos corpos intermediários que constituiriam a sociedade
natural, tais como a família, as sociedades profissionais, as associações de
vizinhos, as municipalidades e a própria Igreja. A partir desse
entendimento, Guzmán reinterpretou a ideia de sociedade natural tendo
como base o conceito de espontaneidade de Hayek, para quem o mercado
seria obra espontânea da natureza humana, e não uma criação arbitrária.
O mercado seria, assim, o fundamento da sociedade natural e de seus
corpos intermediários, em relação ao qual o Estado seria subsidiário,
devendo limitar-se à garantia de seu bom funcionamento. De acordo com
Guzmán, somente o Estado subsidiário ao mercado e à sociedade natural
poderia garantir a liberdade individual, em oposição a um Estado
“intervencionista” ou “totalitário”, para o qual convergiriam tanto
democratas cristãos quanto socialistas e comunistas. Porém é importante
deixar claro que o conceito de liberdade defendido por Guzmán se restringe
à liberdade econômica, baseada no direito de propriedade, e não tem
nenhuma relação com a liberdade política. Aliás, Guzmán foi muito claro
ao afirmar que o liberalismo político, oriundo da Revolução Francesa, ao
destruir as associações naturais legadas pela Idade Média e substituí-las
pelo artificialismo dos partidos políticos, teria deixado o indivíduo sem
proteção alguma diante dos abusos do Estado. Dessa maneira, em sua visão,
seriam justamente o liberalismo político e a democracia que abririam o
caminho ao socialismo e ao totalitarismo. Não à toa, no Chile a
implementação do neoliberalismo se deu durante a ditadura pinochetista, de
forma análoga ao que ocorreu na ditadura argentina, ainda que de modo
menos coeso, durante o autointitulado Processo de Reorganização Nacional.
O Brasil, no entanto, não teve seu Jaime Guzmán. Por aqui a
combinação entre o conservadorismo católico e a defesa do neoliberalismo
ocorreu de modo muito mais pragmático inicialmente, e só foi se consolidar
de fato na década de 1980, como procurarei apontar a seguir.
2. A direita tradicional: Hayek e o combate ao
comunismo

“Buzine em favor do casamento como Deus o fez: 1 homem + 1 mulher.” A


frase estampava um dos vários cartazes empunhados por militantes de
direita que faziam parte de um protesto contra a participação da filósofa
Judith Butler em uma palestra no Sesc, em São Paulo, no dia 7 de
novembro de 2017. [1] Alguns deles, vinculados ao Instituto Plinio Corrêa
de Oliveira (IPCO), chamavam atenção por seus trajes, que remetiam a
vestes eclesiais pouco usuais entre jovens de vinte e tantos anos. Criado em
2006, o IPCO é fruto de um racha da Sociedade em Defesa da Tradição,
Família e Propriedade, conhecida popularmente como TFP, e liderado pelo
empresário nonagenário, e primo de Plinio Corrêa de Oliveira, Adolpho
Lindenberg, um dos principais disseminadores do neoliberalismo no país,
que tive a oportunidade de conhecer pessoalmente no Clube Homs, em
março de 2017, durante o lançamento de um livro de sua autoria: Utopia
igualitária: Aviltamento da dignidade humana.
É possível dizer que a difusão do ideário pró-mercado baseado nas obras
de Mises, Hayek e Friedman teve início no Brasil em 1946, quando a obra
mais popular de Hayek, O caminho da servidão, foi traduzida para o
português e publicada no Brasil com o apoio de Lindenberg. Sua intenção,
ao estabelecer contato com Hayek e patrocinar a tradução e publicação do
livro, era, em suas próprias palavras, barrar o avanço da esquerda católica e
de suas principais pautas, como a reforma agrária:
No Brasil, antes da Revolução de 1964, na década de 1950, houve um
movimento católico, de esquerda, muito importante, que quis formar
comunidades comunistas chamadas de comunidades de base. Essas
comunidades eram formadas por trabalhadores, padres e feministas que
liam livros de dom Hélder Câmara, que foi a principal figura da
esquerda católica da época. Câmara era um homem inteligente que havia
sido integralista e era muito ativo e muito bem relacionado no Vaticano.
Muitos bispos chegaram a apoiar o movimento da esquerda católica e
ele cresceu muito. Eu, por outro lado, fazia parte do movimento
conhecido como “Tradição, Família e Propriedade”, dirigido por Plinio
Corrêa de Oliveira, que era um movimento tradicionalista católico e
conservador, e que desde o início se opôs ao movimento da esquerda. Na
época o Plinio Corrêa de Oliveira escreveu um livro: Reforma agrária:
questão de consciência. A reforma agrária era a bandeira da esquerda
católica. Eles achavam que era possível dividir as grandes propriedades,
fazer só pequenas propriedades, e, com isso, destruir a estrutura agrária
brasileira. O livro teve um sucesso muito grande e por conta disso
muitas pessoas acham que a “Marcha da Família” [2] que houve aqui em
São Paulo foi promovida por nós. De fato, nós participamos da Marcha,
mas não a organizamos. Na época estavam do nosso lado dois bispos,
dom Antônio de Castro Mayer, bispo de Campos, e dom Geraldo de
Proença Sigaud, arcebispo de Diamantina. Ambos escreveram cartas
pastorais, livros e discursos para mobilizar a opinião pública contra as
comunidades de base e contra a reforma agrária e tiveram muito sucesso.
Agora nós temos um movimento chamado “Paz no Campo”, publicamos
uma revista e participamos de reuniões com agricultores para alertá-los
contra ideias socialistas no campo. Ainda naquele tempo eu publiquei
um livro, Uma visão cristã da economia de mercado, e escrevi num
jornal chamado Catolicismo, que tinha uma grande difusão nos meios
católicos, mostrando como a economia liberal é a verdadeira, é a
economia baseada na lei natural e no direito de propriedade, e que os
católicos têm obrigação de combater a esquerda. Quando eu vi a
esquerda católica avançar muito eu procurei algum movimento que batia
na esquerda, e eu conheci o Hayek, peguei um livro dele, me
entusiasmei e disse: “Eu vou publicar isso aqui para dar um peso na
coisa, alguém respeitado”. Então escrevi para o Hayek e ele me
autorizou a publicar o livro. Foi bom porque o Hayek dá uma
sustentação científica comprovada para a defesa que a gente fazia. Aí
apareceu depois o Mises também, e um americano, o Friedman, essa
trinca é o principal. [3]

Foi assim que, entre as décadas de 1950 e 1960, as ideias de Hayek


começaram a circular entre certos empresários e intelectuais, dentre os
quais é possível destacar o economista Eugênio Gudin, [4] que participou da
nona reunião promovida pela Sociedade Mont Pèlerin em Princeton, Nova
Jersey, em 1958, e o empresário Paulo Ayres Filho, que possuía um contato
importante com a Foundation for Economic Education desde 1959, e se
tornou posteriormente membro da Sociedade Mont Pèlerin. Anos depois,
Ayres Filho atuaria como um dos principais articuladores do golpe civil-
militar de 1964, em conjunto com outros empresários, intelectuais, políticos
e militares, movimento que também foi apoiado por Gudin. [5] O
empresário fundou em 1961, na cidade de São Paulo, o Instituto de
Pesquisas e Estudos Sociais (IPES), por meio do qual, com o intuito de
barrar o avanço da esquerda, passou a estreitar suas relações com os
conservadores católicos, como Lindenberg:
Eu conhecia o Paulo Ayres socialmente, mas só me aproximei dele
quando vi que estava defendendo o mesmo que eu. Ele frequentava
muito São Paulo, e eu era amigo dele, tinha carteirinha do IPES, mas o
Plinio Corrêa de Oliveira tinha uma preocupação muito grande de não
dar um aspecto político ao nosso movimento, então nunca entramos na
UDN [União Democrática Nacional] nem no IPES. Nós apoiávamos, mas
não entramos, éramos apenas colaboradores. Na época o Roberto
Campos era importante, o Ives Gandra Martins, mas a principal figura é
o Paulo Ayres. Ele era muito inteligente, muito ativo, muito bem
relacionado, inclusive, tinha um empresário que andava junto com ele
que era um grande industrial da Ultragaz [Henning Boilesen], [6] ele era
muito ativo, tinha dinheiro, também financiou o IPES. [7]
Em 1962, seções do IPES foram inauguradas na cidade do Rio de Janeiro e
em vários outros estados. Teoricamente as seções eram autônomas, porém,
na prática, eram mesmo lideradas pelos núcleos paulista e carioca, sendo
que as seções de Porto Alegre e Belo Horizonte eram tidas como as mais
ativas. A estrutura organizacional do IPES, dividida em um Comitê
Executivo, uma Comissão Diretora e um Conselho Orientador, era ocupada
por empresários de diversos setores, bem como por militares e intelectuais,
que contribuíam financeiramente para sua manutenção. Os militares,
liderados pelo general Golbery do Couto e Silva, procuravam investigar
diariamente o conteúdo de órgãos de imprensa, obter informações junto a
quartéis, produzir centenas de artigos mensais distribuídos na imprensa ou
utilizados como base para panfletos e conferências, produzir informativos
para militares, sem identificação de fonte, com análises de atividades
comunistas, e compilar dossiês de indivíduos e grupos cujas atividades lhes
parecessem suspeitas de subversão. Em 1964 esses dossiês chegaram a
totalizar 400 mil unidades, formando a base para o Serviço Nacional de
Informações (SNI), criado pelo governo militar logo após o golpe.
Os intelectuais, por sua vez, eram responsáveis por produzir uma série
de publicações que promoviam o anticomunismo, valores “democráticos”
associados diretamente à defesa do livre mercado, e que forneciam
justificativas para a articulação de uma intervenção militar que visava a
derrubada de João Goulart. No entanto, assim como Lindenberg, a maior
parte desses intelectuais era de conservadores, e uma parte significativa era
católica, incluindo padres, dentre os quais estavam os membros do Instituto
Brasileiro de Filosofia (IBF).
Fundado em 1949, na cidade de São Paulo, o IBF era encabeçado pelo
jurista Miguel Reale e apoiado pelos católicos da Sociedade Convívio,
criada em 1961, também na cidade de São Paulo, pelo padre Domingos
Crippa da Ordem dos Salvatorianos.
Inicialmente o IBF reunia intelectuais dedicados ao que consideravam ser
um estudo neutro e desinteressado da filosofia como um “saber puro” e que
não deveria ser interpretado à luz dos desdobramentos históricos e da
realidade social. Dessa forma procuravam criticar e se afastar daquilo que
consideravam ser uma tendência participante da filosofia brasileira
representada, por exemplo, pelo então professor da Universidade de São
Paulo João Cruz Costa. Em 1952 o IBF passou a oferecer cursos de extensão
chamados de “Formação Filosófica” com o financiamento da Secretaria
Municipal de Cultura de São Paulo.
Na época, tanto o governador do estado de São Paulo, Lucas Nogueira
Garcez, como o prefeito da cidade de São Paulo, Armando de Arruda
Pereira, consideravam o Instituto como uma organização de utilidade
pública. Assim, não só os cursos foram ministrados de forma contínua até
1965, como foram publicadas várias obras de autoria de seus membros e
organizados cinco congressos de alcance nacional e internacional com o
financiamento de empresários, da Universidade de São Paulo, do governo
do estado, da prefeitura e do Instituto Nacional do Livro. Ao longo dos
anos, outros núcleos do IBF passaram a ser fundados em outros estados,
como Pernambuco (1951), Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro (1952),
Paraíba, Alagoas e Paraná (1953), Santa Catarina e Bahia (1955), Sergipe
(1956), Ceará (1959) e Maranhão (1964).
Já a Sociedade Convívio fora criada pelo padre Adolfo Domingos
Crippa, desde o início com o objetivo principal de combater o comunismo,
como aponta um de seus ex-membros, o professor universitário Ricardo
Vélez Rodríguez, que atuou posteriormente como o primeiro ministro da
Educação do governo Bolsonaro e com quem conversei via Skype em
agosto de 2017:

Domingos Crippa foi barrado na PUC de São Paulo porque tinha ideias de
direita. Ele fez uma tese de doutoramento primorosa, mas não quiseram
constituir uma banca para ele defendê-la, não deixaram. Moral da
história: Crippa virou um anticomunista ferrenho. Ele dizia: “Eles me
atacaram, agora eu vou atacá-los”. Ele criou o Convívio em 1962 [8] com
a finalidade de vacinar a juventude contra o comunismo, essa era a ideia
dele. O Convívio era uma entidade anticomunista. [9]
Ao contrário da TFP, o IBF e a Sociedade Convívio se envolveram
diretamente com as atividades promovidas pelo IPES, subordinando-se à sua
orientação. Seus intelectuais passaram a atuar então de forma conjunta por
meio da revista Convivium, uma publicação anticomunista criada em 1962,
dirigida por Crippa e financiada principalmente por empresas do setor
automotivo. De acordo com o historiador Rodrigo Gonçalves, seria possível
considerar que, a partir de 1962, as duas organizações praticamente se
fundiram, dado o nível de coordenação de seus esforços. Os intelectuais que
passaram a compor seu núcleo duro até os anos 1980 foram: Adolfo
Domingos Crippa, Antônio Paim, Creusa Capalho, Miguel Reale, Nelson
Saldanha, Paulo Mercadante e Ricardo Vélez Rodríguez. Miguel Reale
representaria a primeira geração do grupo, Paim e Mercadante a segunda, e
Capalho e Vélez Rodríguez a terceira. Capalho, Paim e Saldanha foram os
que publicaram mais artigos na revista ao longo do tempo, mas outros
intelectuais que não pertenciam ao núcleo duro da organização também
publicavam textos no periódico, como o economista Delfim Netto e o
cientista político Oliveiros S. Ferreira.
Nessa época o ideário pró-mercado era defendido ainda por poucas
pessoas que transitavam em circuitos de elite no Brasil e que depois vieram
a apoiar ou participar diretamente do governo do general Humberto Castelo
Branco (1964-7), como Roberto Campos, que chefiou o Ministério do
Planejamento, e Otávio Gouveia de Bulhões, que se tornou ministro da
Fazenda. Tais ideias, em suas versões mais elaboradas, circulavam apenas
em meios extremamente restritos, nos quais trafegavam apenas elites
empresariais, governamentais, militares e intelectuais, que possuíam um
grau de proximidade muito grande, por vezes até mesmo familiar. Isso se
deu pois, por um lado, o IPES havia surgido com o objetivo principal de
disseminar um ideário anticomunista para desestabilizar o governo federal e
promover um golpe civil-militar. Assim, a divulgação do ideário pró-
mercado vinha embutida no pacote ideológico promovido pelo instituto,
mas claramente não era uma prioridade, sendo realizada de modo lateral.
Por outro lado, a Associação Nacional de Programação Econômica e Social
(Anpes), fundada em 1964 por Roberto Campos e responsável pela vinda de
economistas estrangeiros ao Brasil, entre os quais Milton Friedman em
1973, era exclusivamente voltada para pensar políticas públicas para o país
e não para a divulgação do ideário pró-mercado para um público mais
amplo. Além disso, em comparação com o IPES, as duas organizações
tiveram uma duração mais curta.
Em retribuição aos esforços empenhados na derrubada de João Goulart,
em 1966 o IPES obteve do governo Castelo Branco o status de “órgão de
utilidade pública”. Porém, em 1970, em meio à consolidação do regime
militar, o IPES paulista foi desativado, e dois anos depois, as atividades no
Rio de Janeiro também foram encerradas. A Anpes, por sua vez, teve uma
atuação mais destacada entre 1964 e 1967 no que diz respeito à formação de
quadros e à produção de pesquisas econômicas, mas acabou servindo muito
mais como um meio para seus membros ingressarem no governo de Castelo
Branco do que propriamente como uma organização voltada para a defesa
do capitalismo de livre mercado junto a um público mais amplo. Tanto é
que, com apenas três anos de funcionamento, a organização se desfez.
Com o término do mandato de Castelo Branco, considerado pela maior
parte das pessoas que entrevistei durante minha pesquisa como o auge do
liberalismo econômico no Brasil, os entusiastas do ideário pró-mercado
perderam o espaço político que haviam conquistado. Os militares que
sucederam Castelo Branco passaram a adotar um programa econômico
conservador, nacionalista e desenvolvimentista, justamente o oposto do que
pregavam os defensores do livre mercado. Após a extinção das
organizações civis que lhes davam suporte, bem como do único partido que
lhes oferecia representação política, a União Democrática Nacional (UDN),
se tornou muito difícil combater a nova orientação econômica dos militares.
Ao mesmo tempo, o discurso anticomunista — que animou a militância
de direita no início dos anos 1960 — se fortaleceu ainda mais devido ao
combate promovido pelo Estado a atividades consideradas subversivas, de
modo que o anticomunismo passou a permear o discurso oficial. Isso fez
com que os intelectuais conservadores, ao contrário dos ideólogos que
pregavam o livre mercado, prosseguissem com suas atividades por meio
não apenas de suas próprias organizações, como foi o caso da TFP, que
continua a existir até hoje, mas também através da participação direta no
governo, como foi o caso dos intelectuais reunidos no IBF e na Sociedade
Convívio.
Em setembro de 1969 foi criada a Comissão Nacional de Moral e
Civismo, órgão responsável pela implementação, manutenção e fiscalização
do ensino da disciplina educação moral e cívica em todas as escolas
brasileiras, desde o ensino básico ao superior. A Comissão teve um papel
importante na formação escolar de muitos brasileiros em seus quase vinte
anos de atuação, tendo sido encerrada apenas em 1986. No ensino básico a
educação moral e cívica se voltava especialmente para temas relacionados à
moral, à adesão a valores religiosos e à exaltação da pátria, enquanto no
ensino secundário e nos ambientes universitários divulgava-se de forma
mais explícita um ideário anticomunista a partir do eixo temático intitulado
“A falácia do comunismo: Negação da liberdade social” e por meio de um
curso chamado Estudo de Problemas Brasileiros (EPB).
Nessa época, a Sociedade Convívio possuía uma parceria com o
Ministério da Educação, de modo que o curso EPB poderia também ser
oferecido pela entidade. Assim, ao longo do tempo a organização
estabeleceu convênios com 110 universidades distribuídas em várias
capitais brasileiras, e seus cursos, que já vinham sendo ministrados pela
organização para milhares de estudantes desde o início da década de 1960,
continuaram a ser oferecidos até o fim dos anos 1970 por meio da disciplina
de EPB. Posteriormente, o conteúdo de tais cursos foi reunido em dois livros
organizados por Adolfo Domingos Crippa: As ideias filosóficas no Brasil,
publicado em 1978, e As ideias políticas no Brasil, publicado em 1979. Os
livros contavam com textos de Antônio Paim, Paulo Mercadante, Oliveiros
S. Ferreira, Ubiratan Borges de Macedo, Vamireh Chacon, João Alfredo de
Sousa Montenegro, Nelson Saldanha, Roque Spencer Maciel de Barros,
Vicente Barreto, entre outros. Dois desses autores, inclusive, além de terem
escrito textos para os dois volumes coletivos, já haviam escrito livros sobre
temáticas correlatas. Em 1965, Mercadante publicou A consciência
conservadora no Brasil, e em 1967 seria a vez de Paim lançar História das
ideias filosóficas no Brasil.
Miguel Reale, por sua vez, uma das lideranças mais antigas do
IBF/Convívio, e que atuava como professor catedrático da Faculdade de
Direito do Largo São Francisco desde 1941, assumiu a reitoria da
Universidade de São Paulo em 1969, logo após o decreto do Ato
Institucional número 5, o AI-5, fundamental para o recrudescimento do
aparato repressivo do regime militar. Reale permaneceu no cargo de reitor
até 1973 e, em 1974, foi nomeado para atuar no Conselho Federal de
Cultura pelo general, e então presidente, Emílio Garrastazu Médici, onde
permaneceu até 1989.
Nesse sentido, é possível dizer que a divulgação do ideário pró-mercado
para um público mais amplo no Brasil, aquele que Hayek chamava de
“formadores de opinião de segunda classe”, passou a ocorrer de fato apenas
a partir da metade dos anos 1970. Para tanto, foi fundamental a atuação do
empresário Henry Maksoud, um dos precursores da divulgação das ideias
originais de Hayek, Mises e Friedman no Brasil para além de circuitos
elitistas.
Proprietário de empresas de ramos diversos, como a empreiteira
Hidroservice e o hotel de luxo Maksoud Plaza, Maksoud foi um ativo
divulgador do ideário pró-mercado no Brasil por meio da revista Visão,
adquirida pelo empresário entre os anos de 1974 e 1975 e que entre os anos
de 1983 e 1986 possuía uma tiragem de 150 mil exemplares. [10] Na revista
eram publicadas entrevistas e ensaios inéditos de intelectuais neoliberais
como Hayek e Milton Friedman, e ultraliberais como Murray Rothbard, um
avanço que, segundo me relataram algumas das pessoas que entrevistei, foi
percebido como muito significativo, dado que a imprensa da época,
segundo elas, seria dominada por um consenso social-democrata.
Para além da divulgação realizada por meio da revista, Maksoud
também publicou, pela editora Visão, diversos livros de autoria própria
defendendo o capitalismo de livre mercado, além de ter financiado a
primeira tradução para o português do livro Os fundamentos da liberdade,
de Hayek. O economista austríaco, inclusive, veio ao Brasil três vezes, entre
1977 e 1981, a convite do empresário, e em sua última visita realizou uma
palestra na Universidade de Brasília para um público que contava com
intelectuais pró-mercado ilustres, como Eugênio Gudin, Roberto Campos e
Otávio Gouveia de Bulhões.
As iniciativas de Maksoud relacionadas à divulgação do ideário pró-
mercado nessa época estavam alinhadas com o espírito de um grupo de
empresários crescentemente insatisfeito com as medidas que vinham sendo
adotadas durante o governo de Ernesto Geisel (1974-9). Tal grupo, ao julgar
que o governo de turno estava agindo de forma prejudicial aos seus
interesses, passou a se engajar no que ficou conhecido como a “Campanha
contra a estatização”.
Até então, e desde o golpe civil-militar, os empresários possuíam canais
de comunicação diretos com a cúpula dos sucessivos governos militares. No
entanto, passada uma década, esse mesmo empresariado constatou que o
autoritarismo exacerbado do regime havia se tornado disfuncional para
atender seus interesses de forma satisfatória. Ao mesmo tempo, começaram
a ocorrer as greves do ABC, momento em que oito líderes empresariais se
reuniram para divulgar um documento político que exigia: a aceleração do
processo de democratização, a abertura dos mercados e a redução da
participação do Estado na economia, inaugurando oficialmente a referida
campanha contra a estatização. Entre os oito empresários que participaram
da empreitada e assinaram o documento estavam Jorge Gerdau Johannpeter
(Grupo Gerdau), Antônio Ermírio de Morais (Votorantim) e Paulo Villares
(Grupo Villares).
O Primeiro Documento dos Empresários foi divulgado no dia 26 de
junho de 1978. Seus oito signatários constavam de uma lista de dez
empresários que haviam sido indicados como os mais representativos pela
própria classe um ano antes em consulta realizada pela Gazeta Mercantil,
possuindo, portanto, “autoridade para falar em nome do empresariado
nacional como um todo”. Além de Gerdau, Morais e Villares, assinaram o
documento: Claudio Bardella (ex-presidente da Associação Brasileira da
Infraestrutura das Indústrias de Base e diretor-presidente do grupo
Bardella), Severo Gomes (ex-ministro da Indústria e do Comércio do
governo Geisel e diretor-presidente do grupo Parahyba), José Mindlin
(diretor da Fiesp e diretor-presidente da Metal Leve S.A.), Paulo Vellinho
(diretor da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica, vice-
presidente da Confederação Nacional da Indústria e diretor do grupo
Springer-Admiral) e Laerte Setúbal Filho (diretor-presidente do grupo
Duratex), lembrando que o fundador do grupo Duratex já havia dirigido na
década de 1960 a Anpes, organização fundada por Roberto Campos.
Enquanto os empresários passavam a contestar a “estatização”
promovida pelo governo, vários economistas que haviam realizado seus
estudos de pós-graduação na Universidade de Chicago durante o auge da
Escola de Chicago começaram a retornar ao Brasil, entre eles, Paulo
Rabello de Castro. Empenhado em fazer com que a elite política e
empresarial brasileira trilhasse o caminho das reformas liberalizantes, o
economista tirou férias no ano de 1979 para escrever o que viria a ser o
estatuto de uma nova organização fundada no ano seguinte: a Câmara de
Estudos e Debates Econômicos e Sociais (Cedes). De acordo com Rabello
de Castro, na época em que a Cedes foi fundada, o Brasil atravessava uma
crise econômica grave de origem cambial em que havia uma falta de
reservas internacionais por causa da segunda alta súbita do petróleo,
produto que o país importava, em suas palavras, “quase cem por cento”.
Diante de tal cenário, o economista compreendia que a Câmara de Estudos
poderia fornecer uma resposta diferente para sanar a crise em comparação
com o que vinha sendo oferecido pelo modelo nacional-desenvolvimentista
autoritário promovido pelos militares e pelo desenvolvimentismo defendido
por grupos de esquerda:

Nós tínhamos uma visão de que muito precisava ser mudado,


principalmente a liberalização de preços, porque o regime era autoritário
e completamente antiliberal. A Sunab vigiava os preços do Rio de
Janeiro e de São Paulo. Havia uma Comissão Interministerial de preços
e o câmbio era controlado por um sistema de taxa fixa, na prática era um
sistema de câmbio fixo. O controle estatal era muito mais amplo do que
é hoje, havia dirigismo com estatais nos setores do petróleo, siderurgia,
petroquímica, cimento, fertilizantes. A Cedes surge pra dar uma resposta
atrelada à agricultura brasileira, prometendo que a agricultura, se
liberalizada, deixaria de ser esse suposto setor retardatário da economia.
Na época a leitura era essa: a agricultura seria um setor retardatário e
cheio de fazendeiros exploradores dos pobres e oprimidos. Toda a
nomenclatura era de esquerda, ninguém entendia nada de agricultura
mas havia toda uma doutrina intervencionista e uma proposta de reforma
agrária que ninguém sabia o que era. A parte da expropriação estava
certa, mas o que iria ser feito depois obviamente não estava planejado. E
no meio disso tudo surge o nosso grupo, que falava que estava tudo
errado e que estavam jogando fora o potencial da agricultura, porque a
agricultura poderia pagar a conta. Óbvio, não vai pagar todas as contas,
mas aproveitando que vai ter que liberalizar esse segmento nós
queríamos também fazer uma liberalização progressiva de toda a
economia, o que iria resultar em uma nova economia e em um novo
ciclo de desenvolvimento que nós já estávamos perdendo. [11]

A Cedes era composta de um grupo de acadêmicos que, em sua maioria,


eram egressos da Universidade de São Paulo, especialmente da Fundação
Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe). O grupo possuía uma grande
liberdade para elaborar suas propostas de políticas públicas a despeito de a
Câmara estar abrigada pela Sociedade Rural Brasileira, a qual o próprio
Rabello de Castro caracteriza como “o templo do conservadorismo
nacional”. A entidade até então seria, teoricamente, uma das mais
refratárias à defesa do neoliberalismo; no entanto, naquela época específica,
a Sociedade Rural era presidida por Renato Ticoulat Filho e por outros
dirigentes rurais que eram, segundo Castro, mais intelectualizados e mais
abertos a inovações. Além disso, o grupo também contava com banqueiros,
como o então presidente do Unibanco, Roberto Bornhausen, e a família
Andrade Vieira, então proprietária de um banco fortemente vinculado ao
meio rural paranaense, o Banco Bamerindus. De acordo com o historiador
René Armand Dreifuss, a Cedes era mantida por cinquenta empresas e
associações, nacionais e internacionais, e Renato Ticoulat a definia, em suas
próprias palavras, como limitada a “atividades acadêmicas”, de um
“apoliticismo absoluto”, embora tivesse como objetivo “unir o empresário
no sentido de demonstrar que o neoliberalismo não é um capitalismo
selvagem, um criador de miséria, mas uma alavanca de desenvolvimento
social”. [12]
No mesmo ano em que a Cedes foi criada, a ideia de fundar no Brasil
um think tank pró-mercado nos moldes das organizações que existiam no
contexto anglo-saxão começou a tomar forma quando José Stelle, o
principal tradutor brasileiro das obras de Hayek, retornou dos Estados
Unidos. Stelle havia participado de um seminário de verão da Foundation
for Economic Education (FEE) em 1978 e ingressado no Libertarian Party
em 1979, o que o fez ficar entusiasmado com a possibilidade de replicar o
modelo da FEE no Brasil. E Leonard Read, então presidente da fundação, lhe
deu uma carta de apresentação para levar para um de seus amigos no Brasil,
Paulo Ayres Filho, que havia tido um papel de destaque no golpe-civil
militar de 1964. Read conhecera Ayres Filho antes mesmo de fundar a FEE,
em uma viagem de negócios pela América Latina, e mensalmente enviava a
revista da organização para o empresário brasileiro. A despeito da indicação
de Read, Stelle não conseguiu o apoio que queria para fundar uma
organização pró-mercado no Brasil, pois Ayres Filho lhe disse que não
haveria massa crítica no país para tanto. Ainda assim, o empresário paulista
convidou Stelle para participar de um grupo de estudos do qual fazia parte e
recomendou ao tradutor que entrasse em contato com o empresário Henry
Maksoud, que talvez pudesse ajudá-lo a concretizar sua iniciativa.
Novamente não houve condições para a criação da organização, mas
Maksoud ofereceu a Stelle uma posição na revista Visão, como tradutor e
redator. A seu ver, nesse papel Stelle poderia exercer mais influência no
país do que chefiando um instituto. O tradutor ficou desapontado, porém
aceitou trabalhar na publicação, onde permaneceu até julho de 1995.
Stelle não se deu por vencido, e, após a negativa de Maksoud, procurou
muitos outros empresários que pudessem ajudá-lo a fundar um think tank
pró-mercado, como Lawrence Pih, então proprietário do Moinho Pacífico, e
Nahum Manela, fundador da DeMillus. A insistência de Stelle logo rendeu
frutos: em dezembro de 1982, o tradutor recebeu um telefonema de um
empresário de origem canadense que gostaria que ele traduzisse uma obra
de Hayek, a trilogia Direito, legislação e liberdade. O empresário em
questão era Donald Stewart Jr., um dos homens mais ricos do Rio de
Janeiro na época e dono da Ecisa, uma empresa do ramo da construção civil
que construía obras na África financiadas pelo Banco Mundial e projetadas
pela empresa Hidroservice, propriedade de Henry Maksoud. Stewart, que
havia participado de uma das palestras ministradas por Hayek no Brasil,
promovidas por Maksoud, havia acabado de chegar de Londres, onde, com
muito custo, tinha conseguido adquirir um exemplar da trilogia em uma
livraria especializada.
De posse do livro, e tendo conhecido Antony Fisher e o Institute of
Economic Affairs, Stewart Jr. passou a cogitar fortemente usar a tradução
da obra para lançar um centro de estudos políticos e econômicos no Rio de
Janeiro. Stelle, animado com a possibilidade de finalmente conseguir fundar
um think tank, sugeriu o nome de Instituto Liberal e apresentou o
empresário a um dos primeiros “Chicago Boys” brasileiros, o professor Og
Leme, que havia sido aluno de Hayek e Friedman e trabalhado ao lado de
Roberto Campos no governo Castelo Branco. Assim, em 1983, foi fundado
o Instituto Liberal (IL-RJ), que em seus primeiros anos tinha como sede uma
sala do 27o andar de um edifício localizado à rua Presidente Wilson, 231, no
bairro da Cinelândia, ocupado pela Ecisa. Porém, inconformado por ter de
atuar de modo subordinado aos empresários que fariam parte do Conselho
Mantenedor do IL-RJ, Stelle acabou rompendo com Donald Stewart Jr. e
abandonou o Instituto apenas um ano após sua fundação. Anos depois,
Stelle se mudaria em definitivo para os Estados Unidos, onde se tornou
professor universitário.
Stewart Jr. fazia parte de um seleto grupo de empresários que possuía
então algum interesse no ideário pró-mercado, vários dos quais haviam
participado da campanha contra a estatização no fim da década de 1970.
Jorge Gerdau, por exemplo, membro do grupo dos oito signatários do
Primeiro Documento dos Empresários, foi um entusiasta de primeira hora
da iniciativa de Stewart. Assim que a organização foi criada, tornou-se
membro da diretoria e presidente do Conselho Mantenedor. No mesmo ano
receberia o prêmio “Homem de Visão”, concedido pela revista Visão de
Henry Maksoud. O proprietário da Hidroservice, no entanto, a despeito de
possuir contatos importantes com intelectuais e organizações neoliberais
estrangeiros, tendo inclusive organizado o primeiro colóquio do Liberty
Fund no Brasil, não se integrou formalmente aos quadros do Instituto
Liberal. De qualquer forma, Maksoud desempenhou um papel fundamental
para o sucesso da organização na medida em que promoveu pontes
importantes entre Stewart Jr. e seus contatos, especialmente com a
Sociedade Mont Pèlerin, à qual Stewart Jr. veio a se filiar posteriormente.
Apenas um ano após a fundação do Instituto Liberal no Rio, os
empresários e irmãos William e Winston Ling, que faziam parte do
Conselho do Instituto, decidiram fundar um segundo think tank pró-
mercado no Rio Grande do Sul, onde residiam: o Instituto de Estudos
Empresariais (IEE). O pai de William e Winston, Sheun Ming Ling, fora
pioneiro no desenvolvimento da soja no Brasil no início da década de 1950;
posteriormente a empresa da família passou a atuar em outros ramos de
atividade, dando origem à holding Petropar, que em anos recentes passou a
se chamar Évora. A principal razão que levou Winston Ling, mestre em
economia pela Universidade de Chicago, a fundar a nova organização foi
sua preocupação em promover uma educação liberalizante para uma nova
geração de empresários, como ele mesmo relembra:
Por que a gente não faz um instituto aqui no Sul com os herdeiros dos
grandes grupos? Essa foi a ideia inicial. Naquela época as manifestações
dos empresários aconteciam nos jornais, e muitos empresários não
tinham a mínima ideia do que era livre-iniciativa, era todo mundo
pedindo coisa para o governo. Obviamente era perda de tempo tentar
fazer a cabeça desse pessoal, mas quem sabe a gente poderia fazer a
cabeça dos filhos deles? Essa foi a ideia original. [13]

Na época, com o intuito de divulgar o capitalismo de livre mercado para


audiências mais amplas, Ling recorreu à contratação de um jornalista que,
em suas palavras, “percorria o mundo jornalístico distribuindo matérias”, e
procurou promover palestras em universidades, sobretudo na Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, com “nomes de peso”. Tais iniciativas,
porém, não costumavam obter muito sucesso junto ao público. Em uma
palestra que realizou certa noite na Faculdade de Direito da UFRGS, por
exemplo, Ling disse que o auditório estava lotado — algo surpreendente,
dado que, nessa época, normalmente apareciam entre dez e vinte pessoas.
Porém, assim que o palestrante começou a falar, as pessoas foram aos
poucos se levantando para ir embora, deixando a suspeita de que a esquerda
teria, de propósito, combinado de encher o auditório para em seguida
esvaziá-lo, sabotando o evento.
A divulgação do ideário pró-mercado, no entanto, não encontrava
resistência apenas junto ao público universitário, mas também entre os
próprios empresários. Passados alguns anos da fundação do Instituto
Liberal no Rio de Janeiro e do Instituto de Estudos Empresariais, vários
livros haviam sido traduzidos, reeditados e publicados. A edição desses
livros foi justamente o que motivou a fundação do Instituto Liberal por
Donald Stewart Jr., afinal, como afirmou Winston Ling, era preciso
“munição bélica” para atingir um público mais amplo. No entanto, fazer
com que os empresários ligados ao próprio IEE lessem os livros e
incorporassem suas ideias era um desafio à parte. Para convencê-los, Ling
se valia de meios pouco ortodoxos, como a estratégia do “corpo a corpo”,
inspirada por Henry Maksoud. O proprietário do hotel homônimo havia
comprado um horário na televisão e passado a transmitir durante a
madrugada um programa chamado Henry Maksoud e Você, no qual discutia
o conteúdo de livros enviados com um mês de antecedência para
convidados, que, segundo Winston Ling, viriam acompanhados de um
bilhete indicando trechos selecionados para incentivar a leitura.
Inspirado na mesma estratégia, Ling havia estabelecido que cada pessoa
ligada ao Instituto de Estudos Empresariais deveria ler um livro por mês.
Para verificar se de fato os livros estavam sendo lidos, eram feitas ligações
semanais de acompanhamento, o que seria necessário porque, segundo o
empresário, várias pessoas não gostavam de ler. Ling também fazia esforços
semelhantes com empresários que não tinham relação com o Instituto,
como, por exemplo, quando praticamente obrigou vários empresários que
viajavam para Taiwan a trabalho a aproveitar as longas horas do voo para
ler obras que promoviam a lógica de livre mercado. Sua insistência em
procurar influenciar os empresários brasileiros a todo custo se justificaria
porque a defesa convicta do livre mercado ainda seria muito difícil para a
maioria. Até mesmo o próprio Henry Maksoud teria tido dificuldade de
colocar os princípios que defendia em prática quando se viu confrontado
com possíveis consequências para o seu ramo de atividade, como afirmou
Arthur Chagas Diniz, integrante do Instituto Liberal do Rio de Janeiro por
mais de vinte anos:

Eu conheci muito bem o Henry Maksoud quando eu trabalhava no


Ministério do Planejamento [do governo Castelo Branco]. Ele foi pra lá
e tinha uma empresa chamada Hidroservice. O Maksoud achava que
empresas estrangeiras não poderiam concorrer com a Hidroservice para
fazer estudos aqui, mas eu dizia que se o brasileiro não fosse capaz de
concorrer não valia a pena fazer com empresa brasileira, e ele ficava
uma onça. O que acontece é o seguinte: existem diferentes graus de
liberalismo, um deles é o que afeta seu bolso diretamente, e ele não
queria essa concorrência, nem pensar. Ele era monopolista de um certo
tipo conhecido no Brasil por causa da atuação da Hidroservice e não
tinha esse desejo de concorrência tão acentuado, na prática a teoria era
outra. É engraçado que nós brigamos até o fim da vida, discutíamos
sempre que tínhamos a ocasião, ele tentava me dar uma ferroada e eu
dizia sempre: “Eu entendo, o dr. Maksoud não gosta de concorrência”.
[14]

Se os empresários eram os únicos a fazer parte dos quadros do IEE, no


Instituto Liberal do Rio de Janeiro acadêmicos formados na Universidade
de Chicago também foram convidados a integrar a organização. Dois dos
profissionais que passaram a atuar no IL-RJ, os professores universitários Og
Leme, apresentado a Stewart por José Stelle, e Roberto Fendt, haviam
obtido títulos de mestrado ou doutorado em economia nos anos 1970 em
Chicago. Og Leme, inclusive, chegou a trabalhar durante o governo de
Castelo Branco em um órgão de pesquisas econômicas vinculado ao
Ministério do Planejamento comandado então por Roberto Campos, onde
teve seu primeiro contato com o engenheiro Arthur Chagas Diniz, que
também fora convidado a integrar os quadros do Instituto. De acordo com
Diniz, Og Leme era um sociólogo de esquerda que, após ter realizado um
mestrado na Universidade de Chicago, teria se convertido.
A experiência de convidar acadêmicos para ajudar na divulgação das
obras e do ideário pró-mercado se repetiu com a fundação de filiais do
Instituto Liberal em outros estados a partir de 1986. Os membros do
Conselho Mantenedor do IL-RJ que residiam no Rio Grande Sul,
encabeçados por Winston Ling, saíram na frente e criaram a primeira filial
do Instituto, ainda em 1986. Três grupos empresariais apoiavam a
iniciativa: o Grupo Gerdau, o Grupo Iochpe e o grupo ligado à família Ling.
O objetivo principal era promover a divulgação dos livros traduzidos e
publicados pela matriz no Rio por meio da arrecadação de doações, o que
também passou a ocorrer com as outras filiais que foram sendo criadas em
outros estados, como Ceará, Bahia, Minas Gerais, Brasília e Paraná.
Em 1987 foi fundado o Instituto Liberal de São Paulo, que logo adquiriu
centralidade entre as diversas filiais, passando a reunir vários membros do
antigo IBF e da Sociedade Convívio. Ao fim dos anos 1970, as organizações
anticomunistas teriam começado a incorporar aos poucos um ideário pró-
mercado em suas publicações e cursos por meio da influência do professor
universitário Ricardo Vélez Rodríguez, que passou a integrar os circuitos
dos think tanks fundados na década de 1980:

Em 1979, quando vim fazer o doutoramento aqui no Brasil, Crippa me


ofereceu o cargo de pesquisador da editora Convívio. Eu me vinculei
mas falei: “Crippa, isso está démodé. Eu acho que os comunas têm que
ser combatidos e criticados, mas só se dedicar a isso é pouco. Nós
precisamos apresentar uma proposta”. Então ele me encarregou de
refazer o manual dos cursos do Convívio e eu fiz uma análise da
realidade brasileira: o que temos que combater não é o comunismo, é o
patrimonialismo que está muito mais enraizado. Eu sempre tive um
ponto de vista liberal, porque, senão, “eu posso combater o comunismo e
ser patrimonialista também”, como, de fato, acabou ocorrendo durante o
ciclo militar. Muita gente era a favor dos militares porque era o feudo
deles. Então, eu ajudei a modificar a apostila e o Crippa aderiu um
pouco a essa visão. Ele era um anticomunista ferrenho, mas ele quis
mudar, porque ele recebia apoio financeiro dos empresários de São
Paulo, e eles não financiavam mais esse discurso anticomunista, que
ficou gasto. Eu falei: “É lógico, os empresários estão vendo que as
coisas estão mudando, que discurso anticomunista não resolve, temos
que pensar no Brasil de um ângulo mais radical e como desmontar o
patrimonialismo, para que o Brasil realmente possa ir se
desenvolvendo”. E o Crippa se beneficiou disso, porque ele passou a
conhecer o novo discurso e continuou a receber os recursos dos
empresários. [15]

Ainda que a Convívio fosse declaradamente religiosa e de direita, não


possuía nenhuma vinculação com a TFP de Plinio Corrêa de Oliveira, cujo
perfil era mais tradicionalista e, portanto, mais conservador. Desse modo, a
Convívio ainda foi capaz de atrair membros ou conferencistas de inclinação
liberal, como: o economista Silvio Passarelli, pesquisador de economia; o
professor universitário Luiz Alberto Machado; o político Marco Maciel; o
economista Delfim Netto; e Luiz Carlos Trabuco, que viria a ser diretor do
Banco Bradesco entre 1998 e 2007. Dessa forma, o Instituto Liberal de São
Paulo pôde se beneficiar da circulação de integrantes da Convívio mais
afinados com o ideário pró-mercado. Luiz Alberto Machado, inclusive,
chegou a atuar como diretor da entidade e do Instituto Liberal de São Paulo
entre 1993 e 1998.
No entanto, com o encerramento das atividades da Convívio por volta da
metade da década de 1980 e o declínio das atividades promovidas pela TFP e
pelo IBF, que foi presidido por Miguel Reale até seu falecimento, em 2006,
os conservadores acabaram perdendo o espaço político que haviam
conquistado após o golpe civil-militar em 1964. Para além do comunismo
ter deixado de ser percebido pelos empresários brasileiros como uma
ameaça iminente, a reabertura democrática e o declínio gradual do
catolicismo conservador no país, que passou a disputar fiéis com a Teologia
da Libertação e com as novas igrejas evangélicas, contribuíram para que os
conservadores perdessem boa parte da influência de que gozavam na
sociedade civil em décadas passadas.
Dessa forma, vários dos intelectuais e empresários que participaram
diretamente da articulação do golpe-civil militar em 1964, ou que o
apoiaram, começaram a orbitar o novo circuito de think tanks pró-mercado
que passou a ser formado a partir da metade da década de 1980. Até mesmo
Paulo Ayres Filho, que havia sido refratário à ideia de criar um think tank
no Brasil, acabou se tornando conselheiro do Instituto Liberal de São Paulo,
cuja biblioteca foi formada em 1992 a partir da doação de seu acervo
privado. Tal dinâmica, com o correr dos anos, fez com que o ideário pró-
mercado passasse a ganhar uma proeminência ideológica cada vez maior à
medida que era incorporado pelos intelectuais conservadores de forma mais
orgânica, consolidando um amálgama neoliberal-conservador no país. E
conservadores como Antônio Paim passaram a defender de forma ativa um
programa de privatizações.
A despeito de terem se passado quase quarenta anos entre a publicação
de O caminho da servidão no Brasil e a fundação do Instituto Liberal do
Rio de Janeiro, ainda existiam continuidades geracionais importantes no
que tange aos frequentadores dos circuitos formados pelos novos think
tanks. E, nesse sentido, Adolpho Lindenberg não exagera ao igualar os
frequentadores do IPES àqueles do Instituto Liberal:

Nós tivemos no governo militar uma orientação muito boa do Castelo


Branco, mas o Geisel era socialista, então a revolução não comungava
com a nossa ideia e o Paulo Ayres acabou se distanciando. Aí veio o
Instituto Liberal, e era mais ou menos a mesma coisa, as mesmas
pessoas. Eu já conhecia o Donald Stewart Jr. porque ele era presidente
da Ecisa, nós atuávamos no mesmo ramo. Mas o Instituto Liberal não
teve mais aquele brilho de antes, porque não havia mais aquele perigo
imenso do comunismo. [16]
O auge e o declínio dos think tanks pró-mercado no Brasil

Os efeitos da abertura democrática logo se fizeram sentir de forma mais


impactante nos anos em que ocorreu a Assembleia Nacional Constituinte
(ANC), entre 1987 e 1988. Nesse período, pouco tempo depois da fundação
de novos partidos, houve uma atividade política intensa em torno da
votação de uma nova Constituição para o país, o que fez com que grupos de
interesse dos mais diversos procurassem se organizar para influenciar no
processo, entre os quais estavam os empresários e intelectuais que
circulavam no circuito formado pelos think tanks pró-mercado. Segundo o
historiador René Dreifuss duas questões haviam ficado evidentes para tais
grupos durante o processo de abertura democrática iniciado por Geisel. A
primeira estaria relacionada à insuficiência política das associações,
federações e confederações empresariais, cuja atuação seria muito
“sindical”, o que limitaria seu raio de ação. Tal limitação teria feito com que
o empresariado, acostumado a “contatos de primeiro grau” com ministros e
burocratas dos altos escalões dos governos militares, fosse compelido a
buscar novas formas de participação política, como bem ilustra a declaração
do coordenador da União Brasileira de Empresários, Antônio de Oliveira
Santos, proferida em meio à ANC:

Nós estamos sem experiência do jogo democrático. Perdemos o jogo de


cintura. No regime anterior, o empresário conversava, no máximo, com
quatro pessoas: o Figueiredo, o Delfim, o Galvêas e o ministro da área.
E o decreto-lei resolvia o resto. Hoje o jogo é democrático… Nosso
grande interlocutor agora é o Congresso. [17]

Outro problema que também emergiu em meio à Constituinte foi a


dificuldade de interlocução entre os empresários e os partidos de direita,
uma vez que sua fragmentação regional e o caráter personalista de suas
lideranças criavam obstáculos para a construção de um programa em
comum. De acordo com Dreifuss, essa situação teria ficado patente durante
a ANC, pois, ainda que muitos parlamentares de direita tenham saído
vitoriosos das eleições gerais promovidas em 1986, teriam sido apoiados às
pressas por “uma direita preocupada em barrar os progressistas”, o que
fazia com que tais políticos fossem pouco confiáveis dado seu alto grau de
fisiologismo e visão de curto alcance. [18] Mesmo em relação aos políticos
ligados ao Partido da Frente Liberal (PFL), fundado em 1985 a partir de uma
dissidência com o Partido Democrático Social (PDS), herdeiro da Arena, o
problema da falta de coerência ideológica e programática, bem como de
quadros mais intelectualizados, continuava. Assim Ricardo Vélez
Rodríguez pontuou sua atuação ao lado de Antônio Paim:

O Paim sempre me falou: “Você quer fazer algo pelo país? Tem que se
aproximar dos partidos e tentar transformá-los”. O Paim escreveu muito,
durante vinte anos foi assessor do PFL na área de doutrina. Ele conseguiu
algumas coisas, a proposta de privatizações, de que se beneficiou o PSDB,
inicialmente, foi pensada no PFL, foi o Paim quem pensou a proposta de
privatizações. A reforma política para acabar com esse carnaval de um
monte de partidos e adotar o voto distrital é uma proposta que o Paim já
tinha na época da Constituinte e que ele conseguiu vender para o PFL,
embora ele próprio ache que aproveitaram só 5% do que ele passou. Ele
gastou muita tinta tentando modificar essa realidade. Eu participei muito
junto ao PFL dando palestras, organizei junto com o Paim, na
[Universidade] Gama Filho, uma série de cursos de formação política,
de introdução ao pensamento político brasileiro, para militantes políticos
tanto do PFL, como do PSDB, organizamos vários cursos oferecidos à
distância. A pessoa que mais se interessou pelas ideias liberais e tentou
levá-las à prática foi o senador Jorge Bornhausen, que era a pessoa mais
liberal de toda essa turma certamente. Mas o partido que mais se
beneficiou da presença de intelectuais foi o PSDB, que tem um estofo
doutrinário de maior qualidade, sem dúvida nenhuma, porque houve
mais teóricos, pessoas intelectualizadas que se filiaram ao partido, e o
PFL ficou mais com os caciques do Nordeste, um partido de grotões. [19]

A interlocução dos think tanks e intelectuais pró-mercado com o PFL nessa


época era bastante forte — alguns desses intelectuais, inclusive, chegaram a
se filiar ao partido. Foi ilustrativo o fato de que o irmão do senador Jorge
Bornhausen, Roberto Konder Bornhausen, então dirigente do Unibanco,
liderou a criação do Instituto Liberal de São Paulo em 1987, tendo dirigido
a organização ao lado do empresário Jorge Simeira Jacob, do Grupo
Fenícia.
No entanto, para além da aproximação com os políticos do PFL, os
defensores da livre-iniciativa também buscaram outras formas de
influenciar o processo da Constituinte. Henry Maksoud, por exemplo, fez
uma detalhada proposta de Constituição para o Brasil baseada no conceito
de demarquia, desenvolvido por Hayek. A proposta, porém, não só não foi
acolhida por nenhum parlamentar constituinte, como pode ser considerada
como a antítese da redação final da nova Constituição que foi aprovada.
Outro membro destacado do circuito pró-mercado que procurou
influenciar ativamente empresários e políticos nesse período foi o
economista Paulo Rabello de Castro. Após ter se afastado da Cedes em
1984, Rabello de Castro voltou a atuar na Comissão em 1986, e nesse
mesmo ano foi escalado para apresentar suas ideias para um grupo de 140
empresários que se reuniram a portas fechadas nos dias 4 e 5 de outubro em
um hotel no Guarujá, litoral do estado de São Paulo. Entre os presentes
estavam Flávio Teles de Menezes, da Sociedade Rural Brasileira; Werther
Annicchinno, da Copersucar; José Luís Zillo, do Sindicato da Indústria do
Açúcar de São Paulo; Carlos Antich, da Sanbra; Laerte Setúbal, da Duratex;
Jacy Mendonça, diretor da Volkswagen e vice-presidente da Associação
Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea); Norberto
Odebrecht, da construtora de mesmo nome; Flávio Andrade, presidente da
Standard, Ogilvy& Mather; e Jorge Simeira Jacob, do Grupo Fenícia e
presidente do Instituto Liberal de São Paulo. [20]
De acordo com o economista, a reunião visava apresentar as possibilidades
de inserção de ideias de cunho liberalizante na futura Constituinte que iria
iniciar seus trabalhos no ano seguinte:

Eu organizei o debate a pedido da Cedes, que tinha o Ticoulat como


presidente, e lá compareceu um deputado que foi bem votado, que era o
Guilherme Afif Domingos. Quem falou no jantar solene foi o [ministro-
chefe do Gabinete Civil] Marco Maciel, que constituiu a coluna
vertebral do PFL, levando para o partido algum tipo de liberalismo. Esse
grupo é que formará a base do chamado Centrão a partir de 1987, dando
uma orientação mais racional para a “viagem na maionese” que o
pessoal de esquerda queria fazer com a Constituinte. O secretário-
executivo desse Centrão veio a ser um jovem doutor em direito que foi
resgatado pela Cedes e se chamava Gastão Toledo. Ele auxiliou os
constituintes a fazer emendas e a formar o que seria a Constituição de
1988. [21]

Na época da Constituinte o cenário político nacional estava marcado pela


crise do nacional-desenvolvimentismo, aprofundada pela crise da dívida e
pela espiral inflacionária. Tal conjuntura dividia a maior parte dos políticos
entre aqueles que apostavam no abandono das políticas desenvolvimentistas
e aqueles que defendiam sua continuação com certas modificações. Os
primeiros, mais identificados com propostas de cunho neoliberal,
apostavam na abertura da economia, na integração do país nas redes do
capitalismo globalizado, no enxugamento da máquina estatal e na
eliminação de “entraves” para estimular os investimentos estrangeiros. Já os
segundos procuravam dar continuidade ao legado do desenvolvimentismo,
no que tange à manutenção das empresas estatais e à defesa do “patrimônio
nacional”, mas com certas modificações que incluíam a adoção de reformas
socializantes que visassem a redistribuição da renda e da propriedade
urbana e agrária, bem como de medidas democratizantes que
possibilitassem maior participação política e liberdade de organização por
parte das classes trabalhadoras.
É possível dizer que estes dois polos ideológicos, o “neoliberalizante” e
o “socializante”, como descreve o sociólogo Brasilio Sallum Jr., serviram
como balizas para o alinhamento de uma parte razoável dos parlamentares
em diferentes blocos e grupos. A maior parte dos membros do PMDB que se
alinhava ao polo neoliberalizante formou, junto com vários ex-arenistas do
PDS e do PFL, o bloco suprapartidário conhecido como Centrão, e aqueles
que se identificavam mais com o polo socializante, com raras exceções,
formaram o Movimento de Unidade Progressista (MUP). Definido como “a
esquerda do PMDB”, ou, como preferia o deputado Domingos Leonelli
(PMDB-BA), “a costela esquerda do PMDB”, o MUP era considerado na época
como um aliado estreito por políticos como Miguel Arraes (PSB) e Mário
Covas (PMDB). Reunia cerca de quarenta parlamentares de um total de 559
que atuavam na ANC, os quais ingressaram em um bloco interpartidário que
congregava todos os partidos de esquerda da época e que foi formado com o
intuito de apresentar emendas ao projeto de Constituição.
Ainda que os políticos agrupados no Centrão tenham obtido sucesso em
barrar os projetos de lei mais polêmicos que foram apresentados pelos
constituintes de esquerda, Rabello de Castro avalia que foi voto vencido na
reunião com os empresários no Guarujá, pois a maior parte não teria saído
convencida do discurso pró-mercado. Winston Ling, fundador do IEE, que
também esteve na reunião, conta que testemunhou disputas ásperas entre os
empresários:

Estava presente todo mundo, todos os empresários de peso do Brasil. Foi


uma reunião muito séria sobre o futuro do país. O palestrante era o Paulo
Rabello de Castro, e tinha muita gente ligada aos Institutos Liberais. Eu
me lembro bem daquela reunião porque houve um bate-boca público
entre o Donald Stewart e o Emílio Odebrecht. O objetivo da reunião era
discutir os rumos do Brasil, e o Donald Stewart, como presidente do
Instituto Liberal, estava puxando para o liberalismo quando o Emílio
Odebrecht se levantou e disse assim: “Vocês são uns sonhadores, o
mundo real não é assim como vocês estão sonhando”. E aí o Donald
replicou, e ele replicou, e depois se separaram. Eu nunca me esqueço
daquele bate-boca, eu fiquei impressionado! Naquela época eu visitava
muitos empresários tentando vender os livros, pedindo doações, mas
ninguém nunca havia falado tão agressivamente contra o liberalismo
como o Emílio Odebrecht. [22]

Ao final do encontro, o então ministro Marco Maciel afirmou em resposta


ao empresário Jorge Gerdau, ligado ao Instituto Liberal, que “a proposta
constitucional elaborada pela Comissão Afonso Arinos [23] não é liberal e
que muitos de seus membros assinariam talvez uma parte, mas não todo o
texto”. Nos anos seguintes, após a promulgação da Constituição de 1988, a
Cedes passou por um período de refluxo e foi perdendo a força do seu
discurso à medida que a crise econômica se estendia. Em agosto de 1989,
em meio ao auge da crise inflacionária, Rabello de Castro chegou a ser
convidado para assumir o Ministério da Fazenda nos últimos três meses do
governo de José Sarney, porém respondeu negativamente.
A despeito de terem conseguido exercer uma influência em Brasília
menor do que gostariam, os intelectuais e empresários reunidos nos think
tanks pró-mercado experimentavam no início dos anos 1990 o auge de suas
atividades. Em 1988, o IEE havia começado a organizar anualmente o
Fórum da Liberdade em Porto Alegre, um evento fechado do qual
participavam como palestrantes elites políticas, empresariais e intelectuais,
promovido para um público formado majoritariamente por empresários,
mas que logo passou a figurar como um dos principais eventos da direita
brasileira. O Instituto Liberal do Rio de Janeiro, além de publicar livros,
começou a promover eventos, premiações, cursos, intercâmbio de
acadêmicos, editar diversas publicações próprias que eram distribuídas
entre os associados e entre “formadores de opinião”, como a revista Notas e
outra chamada Think Tank, posteriormente rebatizada como Banco de
Ideias, além de produzir policy e position papers [24] sobre temas diversos
como educação, Previdência Social, energia, entre outros. [25] Assim,
apenas oito anos após a fundação do IL-RJ, em 1991, dado o nível de
atividade que a organização havia alcançado, decidiu-se que seria melhor
buscar uma sede maior. Nesse mesmo ano, a diretoria resolveu sair da sala
que ocupava no mesmo andar da Ecisa e alugar uma espaçosa casa no
bairro do Botafogo, de acordo com N., o funcionário do IL-RJ que estava
havia mais tempo na organização quando eu o entrevistei em 2015:

O Instituto era na rua Presidente Wilson no centro. O falecido dono,


Donald Stewart, tinha várias salas no prédio e o escritório dele era ali
também, mas o Instituto foi crescendo e foi preciso arrumar uma casa.
Então, em 1991, eles arrumaram um casarão no Botafogo e reformaram
para o Instituto ir para lá. Era um sobrado muito grande com dois
andares. Embaixo tinha uma sala, uma biblioteca enorme, um salão de
palestra, uma salinha para as meninas que trabalhavam com
contabilidade e uma copa. Toda segunda-feira tinha reunião, aparecia o
Donald, os diretores e mantenedores. Quando tinha palestra juntava
umas trinta pessoas, entre convidados e diretores, e eles iam com a
mulher e os filhos, depois que eles saíam eu ia arrumar aquilo tudinho
pra estar pronto no outro dia, era muito bom. Nessa época, tinha muita
gente no Instituto, mais de vinte funcionários. Durante o dia eu fazia o
serviço de rua, o mensageiro não dava conta porque tinha muito
movimento. Só no Botafogo eu trabalhei dezessete anos, e hoje a casa
está alugada para outra empresa. [26]

Desde sua fundação até 1993, o IL-RJ foi capaz de atrair duzentos
mantenedores do meio empresarial e promover mais de quinhentos eventos
no país com 169 palestrantes ligados ao Instituto, sendo que no ano de 1993
a reunião anual da Sociedade Mont Pèlerin foi realizada no Rio de Janeiro.
Nesse mesmo ano, decidiu-se que as atividades promovidas pelos Institutos
Liberais passariam a ter públicos-alvo mais claros. Os institutos estaduais
atuavam de modo centralizado, baseados nas decisões do Conselho
Nacional dos Institutos Liberais, organizado a partir do Instituto Liberal de
São Paulo. Em uma dessas reuniões coube ao presidente do Conselho a
coordenação do levantamento de uma listagem de 3 mil pessoas que
comporiam os públicos-alvo dos institutos, as quais deveriam ser divididas
em duas categorias de formadores de opinião, “liberais” e “prospects”,
como consta em um documento interno redigido por Donald Stewart Jr.
cujo conteúdo reproduzo abaixo:

Liberais: público-alvo cuja definição ideológica seja reconhecidamente


consistente com nosso ideário […]. Prospects: pessoas em que se
identificam possibilidades de conversão ao liberalismo. O grupo
prospects deve ser integrado por pessoas não infensas a ideia liberal ou
que estão no muro. Um bom exemplo desse tipo de pessoa são os
políticos do PSDB. […] Levando-se em conta que o público-alvo é
integrado por formadores de opinião, cada Instituto deverá procurar
listar os liberais e os prospects em seu estado dentro das seguintes
categorias: deputados federais e senadores; governadores de estado e
secretários; prefeitos influentes de grandes municípios; deputados
estaduais mais representativos; professores universitários; jornalistas;
dirigente de entidades empresariais; empresários militantes; líderes
sindicais; líderes estudantis; líderes de entidades civis. [27]

O foco em cada uma dessas categorias, contudo, era desigual, pois mais de
um terço dos indivíduos-alvo era de políticos. De acordo com um
planejamento inicial feito pelo IL, dos 3 mil formadores de opinião a serem
influenciados, 1200 eram políticos — entre os quais eram destacados os
senadores e deputados federais (trezentos) e os prefeitos (duzentos) —,
quatrocentos eram empresários e outros quatrocentos eram professores
universitários. Inclusive, uma das únicas pesquisas encomendadas pelo IL,
no ano de 1991, com o propósito de saber mais a respeito do impacto de
suas atividades, foi justamente para aferir a influência, junto a legisladores,
de uma de suas publicações, a revista mensal Notas, realizada com o apoio
da organização norte-americana Center for International Private Enterprise
(Cipe) [28] e redigida pelos membros do Instituto. A Notas possuía uma
tiragem de 5 mil exemplares, versava sobre análise de leis e procedimentos
constitucionais e era distribuída para policymakers. De acordo com a
pesquisa, cerca de 57 deputados federais afirmaram ler a revista
assiduamente, 75% afirmaram que mudaram seus votos após a leitura, e
mesmo legisladores que não eram liberais afirmaram que suas ideias foram
afetadas pela Notas. [29]
Os professores e estudantes universitários eram beneficiados pela
disponibilização de livros liberais para venda ou consulta na sede do
Instituto, por seminários, bolsas e programas de intercâmbio financiados
por organizações e universidades estrangeiras e concursos de monografias.
É possível dizer que o Instituto Liberal influenciou na formação de vários
quadros da elite acadêmica, professores e pesquisadores, principalmente da
área de economia. A atuação de Og Leme foi essencial, pois através de
Leme vários estudantes brasileiros conseguiram bolsas de estudo ou acesso
a estudos de pós-graduação na Universidade de Chicago e em outras
instituições norte-americanas, o que teria impactado uma geração, ou mais,
da inteligência brasileira, como afirma um de seus discípulos, o economista
Cláudio Contador.
De acordo com Contador, uma parte influente da geração de
economistas, engenheiros e cientistas políticos formados nas décadas de
1960 e 1970 seria grata ao professor Og Leme por ter estimulado e aberto
caminhos para que muitos jovens pudessem continuar sua formação
acadêmica nos Estados Unidos. Segundo seu entendimento, isso teria
possibilitado que muitos cursos de economia no Brasil alcançassem padrão
internacional graças aos mestres e doutores formados por obra dos esforços
de Og Leme, pois teriam sido eles que, posteriormente, implementariam os
atuais programas de pós-graduação das universidades brasileiras. [30]
Já os empresários eram beneficiados não apenas pelo contato com o ideário
pró-mercado mas também pela participação em uma rede formada por
empresários importantes do país fomentada não somente pelos Institutos
Liberais mas também pelo IEE, cujo foco era justamente a formação de
jovens empresários. De fato, até o início da década de 1990 eram raras as
iniciativas dos think tanks que não focassem nessas categorias. As exceções
foram a publicação de um gibi da Turma da Mônica sobre cidadania,
realizada pelo IL-SP, e as campanhas publicitárias de frases neoliberais
estampadas em outdoors levadas a cabo pelo IL-PR, ambas destinadas ao
público geral. Contudo, as atividades de alcance mais restrito dos ILs e do
IEE logo foram contrabalançadas pela atuação de um novo think tank liberal
no Rio de Janeiro, o Instituto Atlântico (IA), fundado em 1992 pelos antigos
membros da Cedes, liderados pelo economista Paulo Rabello de Castro.
Na época, Rabello de Castro decidiu apresentar ao então presidente
Fernando Collor de Melo um plano econômico de sua autoria, que ficou
conhecido como Plano K. No entanto, apesar de ter recebido o economista e
esboçado algum entusiasmo, Collor acabou não acatando sua orientação, e
Rabello de Castro terminou por publicar o Plano K em formato de livro:
Brasil: Este país tem jeito?. Logo após a publicação, em 1992, o
economista se uniu com o empresário carioca Thomaz Magalhães e fundou
no Rio de Janeiro o Instituto Atlântico. Um dos focos do IA, para além de
influenciar políticos e policymakers, era atingir as classes populares. Para
tanto, passaram a ser divulgadas pela organização as ideias de capitalismo
popular e privatização popular, indicando como trabalhadores comuns
poderiam se beneficiar materialmente do estabelecimento de uma ordem
política e econômica orientada para o desenvolvimento do livre mercado.
Poucos anos após a fundação da organização, foi estabelecido um
convênio estável com a Força Sindical, uma das maiores centrais sindicais
do país. Por meio da parceria, ao longo da década de 1990, foram
distribuídas aos trabalhadores mais de 1 milhão de cartilhas ilustradas pelo
cartunista Ziraldo que versavam sobre temas diversos dentro do enfoque do
capitalismo popular. Um dos temas principais veiculados pelas cartilhas era
a privatização da Previdência, e em 1997 o Instituto contratou o Ibope para
realizar uma pesquisa junto aos trabalhadores com carteira assinada na
região metropolitana de São Paulo justamente sobre o assunto. Foi uma
agradável surpresa para o Instituto constatar que 73% dos trabalhadores
entrevistados eram a favor da quebra de monopólio da Caixa Econômica
Federal (CEF) como gestora dos recursos do Fundo de Garantia do Tempo de
Serviço (FGTS), e 71% transfeririam seus fundos para uma instituição
financeira privada alternativa à CEF. [31]
No que tange à política institucional, apenas no ano de 1993 o Instituto
Atlântico apresentou mais de quatrocentas emendas à Constituição por meio
da atuação do então deputado federal Eduardo Mascarenhas, do Partido da
Social Democracia Brasileira (PSDB). Além disso, também participou da
criação de um comitê de acompanhamento de política monetária e fiscal
presidido pelo ex-ministro Ernane Galvêas, realizou um workshop sobre
privatização no Hotel Transamérica, no qual estiveram presentes
empresários, economistas de destaque e políticos, como o então presidente
do PFL, Jorge Bornhausen, e publicou cinco cadernos contendo detalhadas
propostas de políticas públicas. Ainda no mesmo ano Paulo Rabello de
Castro, em conjunto com outros quatro economistas, entre os quais estava
Paulo Guedes, doutor em economia pela Universidade de Chicago e um dos
fundadores do Banco BTG Pactual em 1983, participou da elaboração do
programa do PFL para as eleições de 1994, tendo em vista a candidatura de
Roseana Sarney. De acordo com o empresário Thomaz Magalhães,
presidente do IA na época, o partido que mais teria aberto portas para o
Instituto “vender suas ideias” teria sido o PFL, sobretudo considerando a
atuação de Marco Maciel e do então presidente da sigla, Jorge Bornhausen,
que quiseram adotar o programa de governo desenvolvido pelo think tank.
Magalhães foi convidado então para coordenar a campanha de Roseana
Sarney para a presidência, porém, o empresário mal havia aceitado o
convite quando um escândalo ligado à pré-candidata veio à tona na
imprensa, dificultando o planejamento que vinha sendo feito por seu partido
em conjunto com o Instituto. Porém, o projeto de fato foi inviabilizado com
o anúncio da aliança com o PSDB, quando Rabello de Castro abandonou
completamente a colaboração afirmando que seriam insuperáveis as
diferenças entre o programa que seria defendido pelo PFL e o programa
encampado pelos tucanos.
Após a eleição de Fernando Henrique Cardoso, em 1994, os membros
do Instituto Liberal do Rio de Janeiro, pelo vínculo com Jorge Bornhausen,
então presidente do PFL, conseguiram se reunir com o presidente eleito, que
apareceu na capa da revista Think Tank. Porém, assim como Rabello de
Castro, Arthur Chagas Diniz, que atuava então como diretor do IL-RJ,
deixou claro na entrevista concedida a mim e ao jornalista Lucas Berlanza
[32] que, em sua visão, Cardoso não era um “liberal”:

O Roberto Bornhausen era o presidente [do Instituto Liberal] em São


Paulo e irmão do Jorge Bornhausen, ele organizou o encontro com o
Fernando Henrique. Fomos eu, Og Leme e o Jorge Gerdau. O Jorge quis
nos apresentar porque o presidente achava interessante o que o Instituto
escrevia, foi uma reunião diplomática. Eu não achava que o Fernando
Henrique era liberal. Ele não era estatizante, mas para ser considerado
liberal tem uma distância. É que no Brasil não tem meio-termo, ou é o
Estado ou nada, então ele foi o presidente mais liberal, fora o maluco do
Collor, que era liberal mas era maluco, ladrão. Infelizmente o Collor foi
um desastre pro Brasil. [33]

Arthur Chagas Diniz, assim como praticamente todos aqueles que


frequentavam os circuitos dos think tanks pró-mercado, não considerava
Fernando Henrique Cardoso e os membros de seu partido como liberais
convictos. Do ponto de vista ideológico, o PSDB, que fora fundado a partir
de uma dissidência do PMDB em meio à Assembleia Constituinte, reunia
originalmente quatro tendências. A mais influente seria a centrista,
representada por Fernando Henrique Cardoso, Mário Covas, Euclides
Scalco, Pimenta da Veiga e Artur da Távola. Afonso Arinos, Jaime Santana,
Caio Pompeu de Toledo e Ronaldo Cezar Coelho integravam a corrente
mais conservadora. A tendência posicionada mais à esquerda, em
comparação com as demais, seria formada sobretudo por membros do
antigo MUP. Finalmente, a menor e última tendência, democrata-cristã, seria
representada por Franco Montoro e José Richa. [34]
É possível dizer que aquilo que de fato unia os primeiros tucanos dessas
quatro tendências foram os dois motivos que levaram à cisão com o PMDB
por parte do grupo conhecido como “históricos”, composto de FHC e Covas:
a adesão ao parlamentarismo e à manutenção do mandato de quatro anos
para José Sarney. Porém, para além disso, não havia muito consenso sobre
quais deveriam ser as orientações programáticas/ideológicas do novo
partido, o que se refletiu na dificuldade da escolha do nome dada a enorme
diversidade de sugestões: Partido Democrático Popular, Partido Popular
Progressista, Partido da Renovação Democrática, Partido da Transformação
da Sociedade Brasileira, Novo Partido Democrático, Partido das Reformas,
Partido da Conquista Democrática, entre outros. A sigla PSDB sozinha
abrigava três possibilidades: Partido da Social Democracia Brasileira,
Partido da Sociedade Democrática Brasileira e Partido Socialista
Democrático Brasileiro, de modo que a forma encontrada para tomar uma
decisão foi pelo voto. [35]
Fernando Henrique Cardoso, no entanto, não ficou satisfeito com a
escolha e teria criticado a adoção da caracterização de “social-democrata”
pelo partido. Para o sociólogo, a social-democracia corresponderia a uma
realidade da Europa durante a primeira metade da década de 1950, quando
os sindicatos possuíam um papel central no âmbito do Estado de bem-estar
social, o que não ocorreria no Brasil, onde ainda seria preciso fazer com que
o capital existisse e funcionasse como capital. O país, portanto, ainda
estaria em outro momento, em que haveria uma combinação entre atraso e
progresso. [36]
A posição adotada por Fernando Henrique Cardoso costuma estar
relacionada à ideologia política que ficou conhecida como “terceira via”,
tida por seus defensores como uma forma moderna da social-democracia
que seria mais “adaptada” à nova sociedade pós-industrial e globalizada. A
terceira via é uma denominação criada pelo sociólogo britânico Anthony
Giddens para designar uma posição de “centro radical” que implica “uma
tentativa de demonstrar que os valores mais caros da esquerda possuem
alguma ‘validade' na sociedade pós-industrial contemporânea”. [37] Para
Giddens, a terceira via seria uma maneira de modernizar a social-
democracia europeia, pois, nas palavras do sociólogo, “até nas formas mais
desenvolvidas, o welfare state nunca foi genuinamente bom. Todos os
Estados de bem-estar social criaram problemas de dependência, risco moral,
burocracia, formação de grupos de interesse e fraude”. [38]
Na visão de Chagas Diniz, o posicionamento adotado por Fernando
Henrique Cardoso e outros membros do PSDB seria um meio-termo entre
uma esquerda estatizante e o neoliberalismo convicto promovido por
lideranças do PFL como Marco Maciel e Jorge Bornhausen.
No entanto, a despeito das muitas suspeitas levantadas entre os membros
do circuito pró-mercado, o governo liderado por FHC de fato levou a cabo
várias reformas de orientação neoliberal, o que acabou contribuindo para o
declínio das atividades dos think tanks liberais. À medida que o Plano Real
atingia sua meta de reduzir os altos índices inflacionários vigentes até
então, privatizações eram realizadas e os mercados para educação e saúde
privadas se expandiam. Desse modo, muitos dos empresários que
colaboravam financeiramente com os Institutos Liberais passaram a
compreender que o ideário pró-mercado teria penetrado de fato no governo,
e que, portanto, os think tanks já haviam logrado êxito e não necessitavam
mais de um aporte contínuo de recursos. Assim, a partir do fim dos anos
1990 as atividades das filiais do IL-RJ foram diminuindo e os institutos
foram sendo fechados.
O declínio do interesse dos empresários pelos institutos teria se
acentuado mais ainda após o falecimento de Donald Stewart Jr., em 1999.
Afinal, boa parte dos empresários que contribuíam com os Institutos o fazia
principalmente por causa de networking empresarial. Assim relata Alex
Catharino:

De certo modo, muitos dos doadores entraram para o IL porque


conheceram o Donald Stewart no Jockey Club, e muitos queriam
financiar o hobby do Donald porque queriam vender coisas pra ele.
Então, o Instituto também virou uma praça de negócios em certo
sentido, e por isso o afastamento do Donald gera uma queda de
arrecadação. O pessoal que estava ali tentando fazer negócios com ele
não vai continuar, porque estava ali comprometido com os negócios que
podia fazer por fora, não com a ideia, ao contrário do Donald, que era
cem por cento comprometido. [39]
Além disso, o empresário canadense também ajudava a manter o Instituto
com seus próprios recursos, e, após seu falecimento, essa fonte de
financiamento também desapareceu. A perda progressiva de recursos e de
seu principal patrocinador fez com que a atuação dos ILs declinasse
progressivamente, inclusive porque vários dos contatos que o Instituto
possuía com instituições estrangeiras eram, segundo Alex Catharino, de
ordem mais pessoal e menos formalizada. De acordo com o historiador, por
vezes se organizava uma conferência em que era convidado um
conferencista internacional, em que se tentava trazer Prêmios Nobel de
Economia, como Douglass North, ou às vezes o convite ocorria quando
alguém vinha de férias para o Brasil, que seria o caso do próprio
envolvimento de Alejandro Chafuen, então presidente da Atlas Network,
que, quando visitava sua família na Argentina, aproveitava para fazer uma
escala no Brasil e dar uma conferência. Nesse sentido, de acordo com
Catharino, o “último grande ato” do Instituto Liberal foi organizar o evento
anual da Sociedade Mont Pèlerin no Brasil.
As atividades, que ainda foram realizadas na matriz no Rio de Janeiro
até a primeira metade dos anos 2000, ocorriam de forma bastante precária,
com base nas magras doações que ainda recebiam de alguns poucos
empresários brasileiros e de organizações estrangeiras. A organização
recebia anualmente 3 mil dólares da Atlas Network, que também contribuía
com mil dólares anuais para cada filial em outros estados, e doações que
variavam de 5 mil a 20 mil dólares do Liberty Fund, que aproveitava para
promover seus próprios colóquios e financiar traduções de livros do seu
catálogo, o que ajudava a organização a abater mais impostos nos Estados
Unidos. Com o tempo a produção de livros foi diminuindo, à medida que a
maior parte dos recursos era destinada à publicação da Think Tank e para a
realização de palestras que atraíam cerca de quinze pessoas.
Foi justamente nesse momento que a tradutora Márcia Xavier de Brito
se aproximou do Instituto em razão de sua amizade com um escritor e
filósofo chamado Olavo de Carvalho, que a convidou para participar de um
evento promovido pela organização. Na época, Carvalho possuía um blog,
criado em 1998, intitulado Sapientiam Autem Non Vincit Malitia [A
sabedoria não é vencida pela malícia], e escrevia textos e artigos de opinião
para o Jornal da Tarde, Jornal do Brasil, Diário do Comércio, O Globo e
para a revista Bravo!, entre outros veículos, os quais reproduzia em seu site.
Além disso, contava com vários livros publicados por editoras de menor
expressão em que procurava criticar a esquerda nacional e o marxismo,
como A nova era e a revolução cultural: Fritjof Capra & Antonio Gramsci,
publicado em 1994, O jardim das aflições, de 1995, e os dois volumes de O
imbecil coletivo, publicados, respectivamente, em 1996 e 1998. De acordo
com o próprio Carvalho, a publicação dessas obras, em especial de O
imbecil coletivo, na qual tecia críticas aos intelectuais e acadêmicos de
esquerda brasileiros, teria aberto um espaço para liberais e conservadores
que lhes havia sido negado desde os anos 1980. [40]
Segundo Xavier de Brito, nessa época, Carvalho tinha a intenção de se
lançar como crítico cultural. De modo que, por meio de contatos
provenientes de sua atuação em veículos jornalísticos, teria passado a entrar
em contato com algumas pessoas que frequentavam os circuitos pró-
mercado no fim dos anos 1990, tendo alegado, inclusive, que foi
apresentado à obra do economista Ludwig von Mises por Donald Stewart
Jr., fundador do IL-RJ. [41] No entanto, a tradutora considera que as obras
que o filósofo havia lançado na época, como O imbecil coletivo e O jardim
das aflições, ainda circulavam em meios mais restritos, de modo que, entre
os anos 1997 e 1998, ele teria começado a buscar apoio no circuito
frequentado por figuras ligadas ao Instituto Liberal do Rio de Janeiro, como
Roberto Campos, o embaixador José Osvaldo de Meira Pena, e teria se
aproximado do professor Og Leme e de Alex Catharino, membros da
organização.
Após ter frequentado um primeiro curso sobre pensamento social e
político organizado pelo IL-RJ para o público em geral, Carvalho não teria
causado boa impressão por causa da agressividade que dispensava aos seus
oponentes ideológicos e não conseguiu o patrocínio desejado. [42] De
acordo com a tradutora, o escritor ainda teria tentado um financiamento
junto à fabricante de cigarros Souza Cruz, à organização católica
tradicionalista Opus Dei e à articuladora norte-americana Atlas Network,
mas não obteve sucesso. Assim, contando com recursos próprios, obtidos
por meio da venda de livros, de seu trabalho na imprensa e da oferta de
cursos privados de filosofia, Carvalho, que em 1998 se declarou a favor do
livre mercado na economia, tradicionalista e conservador no que tange à
defesa da religião, [43] anarquista em relação à moral e à educação,
nacionalista e contra o “governo mundial” no que diz respeito à política
internacional e um realista no campo da filosofia, [44] passou a concentrar
esforços em divulgar suas ideias na internet e progressivamente foi
deixando de lado a ideia de se firmar como crítico cultural na esfera pública
tradicional.
Carvalho passou a enfocar cada vez mais questões políticas conjunturais,
como as denúncias dirigidas à organização de esquerda Foro de São Paulo,
[45] apontada por ele como a principal articuladora de um avanço comunista

na América Latina, e discussões de ordem moral e filosófica. Contando com


a colaboração de outros críticos do marxismo e da esquerda nacional, no
ano de 2002, o autor de O imbecil coletivo criou um site chamado Mídia
Sem Máscara (MSM), no qual eram veiculados textos de vários autores sobre
política, economia e filosofia. Logo Carvalho passou a se tornar cada vez
mais conhecido entre os frequentadores brasileiros de fóruns digitais da
época.
Ao mesmo tempo, Xavier de Brito seguia empenhada em realizar
atividades de cunho mais acadêmico no IL, porém dependia de recursos
financeiros e organizacionais limitados e afirmava não contar com a
colaboração da diretoria da organização. A tradutora havia conseguido uma
parceria com a Universidade Candido Mendes para oferecer um curso sobre
36 autores liberais, que contava com palestrantes associados ao Instituto
(como Meira Penna), com o intuito de, em suas palavras, “tirar a carga
[ideológica] e poder misturar, poder criar o debate”. Posteriormente, o curso
despertou o interesse de outra faculdade, a Estácio de Sá, que queria
transformá-lo em uma pós-graduação lato sensu. No entanto, o diretor do IL
à época teria vetado a iniciativa.
Com o passar do tempo, e a partir da metade dos anos 2000, os ILs foram
encerrando suas atividades até sobrarem apenas dois, a matriz no Rio de
Janeiro e o Instituto do Rio Grande do Sul. Mesmo o Instituto de São Paulo,
que possuía amplo financiamento, também acabou fechando as portas,
segundo Winston Ling, principalmente por causa da má administração de
seus recursos, que teriam sido empregados em equipamentos tecnológicos
caríssimos e na contratação de professores social-democratas que
produziram materiais pouco afinados com a promoção do livre mercado. A
matriz no Rio, por sua vez, por falta de verbas, precisou ser realocada para
uma casa menor no bairro do Humaitá em 2008, e seis anos depois mudou
novamente para o pequeno conjunto de salas que ficava no quinto andar do
antigo Edifício Rex no bairro da Cinelândia, que frequentei durante minha
pesquisa de campo. Já a filial gaúcha do Instituto acabou trocando seu nome
para Instituto Liberdade, porque, de acordo com Winston Ling, o IL-RJ
estava em baixa, o que teria afetado sua imagem.
Os circuitos formados pelos think tanks experimentaram, assim, um
período de refluxo. O Instituto Atlântico se afastou das tentativas de
influenciar a política do país e se voltou para outros projetos, como o
Cantagalo, que promovia a regularização fundiária para moradores de uma
comunidade no Rio de Janeiro. [46] Segundo Ling, o descontentamento com
a atuação dos empresários e líderes ligados às organizações pró-mercado
brasileiras foi tal que constituiu um dos motivos que o levaram a ir embora
do país na época. De acordo com sua percepção, o próprio Instituto de
Estudos Empresariais que ajudou a fundar, bem como seu principal evento,
o Fórum da Liberdade, acabou se tornando muito mais um espaço para
networking empresarial do que de formação de novas lideranças com base
no ideário pró-mercado. Além disso, de acordo com Xavier de Brito, a troca
anual de diretoria faria com que não houvesse muito acúmulo e
continuidade das atividades promovidas.
Em meio ao declínio acentuado dos Institutos Liberais, Xavier de Brito e
Catharino, dois de seus frequentadores mais jovens e ativos, resolveram
criar uma organização de perfil diferente. Ambos haviam se tornado em
2001 os dois únicos fellows da Atlas Network no Brasil depois de terem
participado de um projeto da organização norte-americana chamado The
Freedom Project. Um ano depois, com base nas redes que construíram com
outras organizações nos Estados Unidos, a partir do vínculo com a Atlas,
decidiram fundar uma nova organização que passou a atuar tanto no Rio de
Janeiro como em São Paulo: o Centro Interdisciplinar de Ética e Economia
Personalista (Cieep). Fundado em 2002, em conjunto com outras pessoas
que também circulavam no Instituto Liberal, o Cieep tinha o objetivo de
discutir as bases morais do livre mercado, tendo em vista um viés mais
culturalista e conservador, para fazer frente aos avanços obtidos pela
esquerda, principalmente pela esquerda católica.
Os membros da nova organização acreditavam que o discurso
econômico já havia sido ganho, e que portanto seria preciso construir um
referencial moral e religioso que sustentasse as mesmas ideias. Até porque,
segundo Xavier de Brito, “o negócio é muito mais cultural e tem raízes
muito mais profundas, economia e política são consequências”. Nesse
mesmo sentido, Catharino afirmou ainda que, embora o PT possuísse uma
base forte junto ao sindicalismo e aos intelectuais, o trabalho de figuras
como dom Cláudio Hummes, dom Paulo Evaristo Arns e dom Pedro
Casaldáliga, assim como a própria Pastoral da Terra, de onde teria surgido o
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), fora fundamental
para a esquerda. Dessa forma, os membros da nova organização procuraram
se estabelecer primeiro no Rio de Janeiro, em razão da influência de seu
cardeal na época, dom Eugênio Sales, que era mais conservador, e
começaram a se aproximar de bispos e arquidioceses por meio de um
“trabalho de formiguinha”, a partir do qual se criou uma página na internet,
uma comunidade no Orkut e foram publicados artigos diários e traduções de
textos. No entanto, o Cieep possuía enorme dificuldade para captar verbas,
pois, segundo Catharino, os doadores dificilmente se convenciam da
necessidade de ofertar cursos de ética ou poesia com viés conservador, ou
mesmo de publicar livros sobre temas correlatos, o que fez com que a
organização não prosperasse. Sem poder dispor de grandes contribuições
financeiras, as atividades do Cieep eram feitas sem que houvesse uma sede
física, de modo voluntário e descontinuado, e após oito anos de
funcionamento a organização acabou praticamente encerrando suas
atividades em 2010.
Contudo, a despeito desse período de baixa das atividades, os primeiros
think tanks pró-mercado fundados no Brasil deixaram legados fundamentais
para os militantes que passaram a atuar durante o auge do lulismo. Para
além de tradução e publicação de obras inéditas no país, bem como reedição
de livros antigos ou esgotados, um dos principais legados da atuação dos
think tanks durante as décadas de 1980 e 1990 foi a formação de quadros e
a institucionalização de uma rede de divulgadores do ideário pró-mercado.
Ao longo do tempo foi sendo estabelecida uma rede estável e formalizada
constituída por indivíduos, organizações e fóruns brasileiros e estrangeiros,
na qual trafegam apoio material e organizacional para as atividades de
difusão de tais ideias.
Assim, se por um lado muitos dos financiadores do movimento se
afastaram com o falecimento de Stewart Jr., por outro lado o IL, o IEE e o
Fórum da Liberdade, e também economistas como Paulo Rabello de Castro
e Paulo Guedes, já haviam se tornado referências permanentes e
incontornáveis dentro e fora do país na mencionada rede. Além disso,
tornaram-se financiadores cativos de organizações e iniciativas pró-
mercado no Brasil os empresários Salim Mattar e a família Ling, bem como
várias organizações estrangeiras como o Liberty Fund, a Atlas Network e a
fundação alemã Friedrich Naumann. Desse modo, foi possível dar
continuidade a certas atividades, ainda que em menor escala, como a
publicação de livros e brochuras, concursos acadêmicos e a realização de
reuniões e fóruns, entre os quais merece destaque o Fórum da Liberdade,
evento organizado anualmente pelo IEE em Porto Alegre e que se tornou o
grande ponto de encontro de neoliberais, ultraliberais e liberais
conservadores.
Por meio da articulação de tais redes foi possível que durante os anos
1980 e 1990 o ideário pró-mercado circulasse com mais força entre
acadêmicos, jornalistas, empresários, políticos e burocratas. No entanto, até
o início dos anos 2000, o núcleo duro dos divulgadores se renovou pouco, o
que fez com que muitos deles ainda continuassem carregando a pecha de
terem participado ou apoiado o regime militar, uma herança percebida como
“desconfortável” pela geração mais jovem que passou a frequentar o
Instituto Liberal nos anos 1990, como relata Alex Catharino:

A tentativa do nosso liberalismo no pós-guerra foi um fracasso porque a


UDN era muito mais autoritária e golpista do que liberal, isso é fato. O
Carlos Lacerda, que era talvez o mais próximo de um político liberal no
Brasil, era muito intervencionista. William Buckley Jr., ao entrevistá-lo,
disse: “Você foi recorrer aos militares pra resolver um problema achando
que depois que eles tomassem o poder eles iriam largar”. O que existia
de um pensamento liberal, ou de um pensamento conservador
democrático, foi morto em 1964, porque para os militares “política era
coisa de comunista”. Ao mesmo tempo, a esquerda, ao ser perseguida
por um regime autoritário, ganhou mais força e certa legitimidade. Então
tem uma geração que se perdeu. Os quadros mais liberais, Otávio
Gouveia de Bulhões, Roberto Campos, Og Leme, Pedro Aleixo, Milton
Campos, apoiaram o golpe achando que ia ser um golpe passageiro. Foi
um grande erro, porque ficaram marcados pelo regime. A Escola
Superior de Guerra pediu várias vezes ao Instituto Liberal que fosse dar
palestras lá em 1992. Alguns iam, mas a maioria se sentia
desconfortável, as pessoas ainda tinham medo de ser associadas aos
militares. [47]
3. A nova direita: Mises e o combate à “hegemonia
cultural esquerdista”

O empresariado nacional e os analistas de mercado, brasileiros e


estrangeiros, pouco reclamaram dos governos Fernando Henrique Cardoso
(1995-2002), situação que se refletiu na decadência experimentada pelos
think tanks pró-mercado. Nessa época, de acordo com a fellow da Atlas
Network no Brasil, Márcia Xavier de Brito, “o Brasil estava numa ‘fase
Fernando Henrique', as pessoas estavam achando que estava tudo mais
estável”. No entanto, às vésperas das eleições presidenciais de 2002, o
Partido dos Trabalhadores começava a surgir como um forte concorrente,
despertando a desconfiança das elites. Consciente das suspeitas que
provocava, o partido passou a ter dois objetivos principais: deixar claro para
o empresariado brasileiro que não iria contrariar seus interesses e convencer
o mercado financeiro de que iria manter o tripé econômico adotado no
governo anterior (câmbio flutuante, metas fiscais e metas de inflação). Tais
tarefas, contudo, não eram fáceis.
Dado o grau de temor dos empresários e do mercado em relação à
campanha de Lula, a agremiação esforçou-se não apenas para suavizar a
imagem do candidato durante as campanhas com o mote “Lulinha Paz e
Amor”, mas, sobretudo, para materializar suas intenções de aproximação.
Assim, em junho de 2002, por meio de uma aliança com o Partido Liberal,
apontou o empresário José Alencar para a vice-presidência na chapa
encabeçada por Lula, e, durante um encontro sobre o programa de governo
do partido, Lula leu a “Carta ao Povo Brasileiro”, documento que segundo a
Folha de S.Paulo era destinado a “acalmar o mercado financeiro”. Na Carta
se afirmava que o partido estava comprometido a:
[…] preservar o superávit primário quanto for necessário para impedir
que a dívida interna aumente e destrua a confiança na capacidade do
governo de honrar os seus compromissos. Mas é preciso insistir: só a
volta do crescimento pode levar o país a contar com um equilíbrio fiscal
consistente e duradouro. A estabilidade, o controle das contas públicas e
da inflação são hoje um patrimônio de todos os brasileiros. [1]

Tais esforços, porém, ainda se mostravam insuficientes. Em setembro de


2002, à medida que a campanha avançava e as pesquisas de opinião
mostravam que Lula poderia ser eleito, analistas de mercado estrangeiros
ainda demonstravam grande preocupação com a declaração de Lula de que
Arminio Fraga, então presidente do Banco Central do Brasil, não seria
mantido no cargo durante um possível governo do PT. A desconfiança era
tal que um operador de um grande banco de investimentos foi categórico:
“Ele [Lula] pode dizer o que quiser, que a incerteza do mercado vai
continuar”. [2] De fato, ainda em setembro a Bovespa experimentou seu pior
momento naquele ano com queda de 16,9%, em boa parte devido à
incerteza em relação à sucessão presidencial. [3] No dia 10 de outubro, a
dezessete dias do segundo turno das eleições, o dólar atingiria sua alta
histórica muito possivelmente em razão da possibilidade de vitória de Lula.
Apesar do receio do mercado, o candidato do PT foi eleito presidente no
dia 27 de outubro com votos oriundos de todos os segmentos de renda de
forma indistinta, sinalizando uma espécie de convergência do eleitorado em
torno da candidatura do ex-metalúrgico. E, embora não tenha contado com
o apoio do setor financeiro, Lula foi fiel ao que fora prometido na “Carta ao
Povo Brasileiro” e não deixou na mão os que pediam pela manutenção de
uma política econômica ortodoxa. Um “nome do mercado”, Henrique
Meirelles, que ocupara o cargo de presidente internacional do BankBoston,
foi indicado para o Banco Central, e o ministro da Fazenda, Antonio
Palocci, a despeito de ser um político petista de origem trotskista, foi ainda
mais ortodoxo do que seu antecessor no que diz respeito à manutenção do
chamado tripé econômico.
Para tanto, Palocci adotou como base do programa econômico levado a
cabo pelo governo um documento conhecido como “agenda perdida”. [4]
Elaborado inicialmente para a campanha presidencial de Ciro Gomes no
ano de 2002 pelos economistas José Alexandre Scheinkman, que atuou
como professor nas Universidades de Chicago e Princeton, e Marcos
Lisboa, na época professor da Escola Brasileira de Economia e Finanças
(FGV/EPGE), o texto acabou sendo descartado pela campanha de Gomes.
Porém, seu conteúdo foi posteriormente resgatado por Palocci, e a agenda
foi implementada de 2003 até 2005 por economistas que passaram a
compor o governo, como o próprio Marcos Lisboa, seu elaborador direto, e
o economista Ricardo Paes de Barros, doutor pela Universidade de Chicago
e que se tornou conhecido pela formulação do Programa Bolsa Família.
Foi assim que, durante o primeiro mandato de Lula, o PT conseguiu
deixar de ser visto como uma ameaça pelo mercado [5] e passou a contar
com uma aprovação popular similar à obtida por FHC em seu primeiro
governo. Apesar de ter experimentado em agosto de 2004 sua pior taxa de
aprovação, 35%, no fim do ano já havia recuperado a popularidade,
especialmente junto aos brasileiros com ensino superior, entre os quais sua
taxa passou de 30% em agosto para 47% em dezembro, e junto àqueles com
renda mensal acima de dez salários mínimos, entre os quais sua taxa de
aprovação foi de 36% para 50%. [6] Ao final dos dois primeiros anos de seu
primeiro mandato, em dezembro de 2004, Lula somava 45% de aprovação,
sendo que 40% consideravam seu governo regular e 13% o reprovavam,
taxas praticamente idênticas ao do ex-presidente tucano na mesma época;
no entanto, para 54% dos brasileiros, Lula estaria fazendo um governo
melhor. Mas a crescente aprovação que Lula vinha angariando sofreria um
forte solavanco em junho de 2005, com o escândalo de corrupção que ficou
popularizado como “mensalão”.
O mensalão acabou se tornando um dos escândalos de corrupção mais
conhecidos da população brasileira [7] provavelmente devido à ampla
divulgação que recebeu na época por parte dos grandes veículos de mídia,
os quais teriam realizado uma cobertura mais dura do escândalo em
comparação com episódios passados. No entanto, os remédios apontados
pela grande imprensa para conter a crise política instalada pelo escândalo,
notadamente a punição daqueles considerados culpados, variaram ao longo
dos anos, e o núcleo do governo federal foi atingido em ondas sucessivas
tendo em vista os desdobramentos das denúncias originais. Em uma
primeira onda, em junho de 2005, José Dirceu, ministro-chefe da Casa
Civil, renunciou ao cargo e meses depois teve seu mandato de parlamentar
cassado. Em março de 2006 foi a vez do então ministro da Fazenda,
Antonio Palocci, que renunciou ao cargo no mesmo mês a despeito de ter se
tornado peça-chave para a manutenção da política econômica do governo.
Além de provocar a renúncia de ministros-chave da gestão petista, o
escândalo político impactou a imagem do partido e contribuiu para o
aumento da desconfiança em relação ao sistema político como um todo.
Assim, não só o PT experimentou uma queda de 16% no que tange à
identificação partidária entre 2002 e 2006, como a taxa de brasileiros que
passaram a mencionar o PT entre as siglas cujos políticos “só pensam neles
mesmos” subiu de 5% para 20%; e o partido, que antes era considerado por
apenas 4% da população como aquele que possuía mais políticos corruptos,
passou a ser mencionado por 27% das pessoas. Em 2006, o PT estava na
liderança em ambas as taxas, desbancando o PMDB quanto à primeira e a
categoria espontânea “todos” quanto à segunda.
Além disso, em um artigo sobre opiniões políticas e sentimentos
partidários dos brasileiros entre 1990 e 2007, o cientista político Yan
Carreirão afirmou que ao final do período enfocado foi possível constatar
uma diluição ideológica generalizada entre os eleitores mais partidários.
Para Carreirão, tal diluição estaria relacionada principalmente ao
afastamento de eleitores petistas mais ideológicos do partido, a qual, após o
escândalo do mensalão, teria se tornado, na visão dos eleitores,
indiferenciada em relação às demais no que tange à questão ética. O
distanciamento do eleitorado petista possivelmente teve relação com a
queda no número total de eleitores que declaravam sentir-se representados
por algum partido político de 2002 para 2006, bem como com a queda, de
35% em 2002 para 27% em 2006, dos eleitores que diziam gostar de algum
partido. Finalmente, os desvios éticos atribuídos ao PT também teriam
impactado os sentimentos partidários e a confiança no Congresso, que
declinaram em comparação com outras instituições. Crescia o
descontentamento geral com o sistema político e o eleitorado passava a ter
mais dificuldade para diferenciar os partidos entre si.
Foi justamente na esteira do impacto do mensalão que foi fundado o
primeiro movimento relacionado à nova direita, ainda em 2006, o
Movimento Endireita Brasil (MEB), liderado por Ricardo Salles, que
posteriormente se tornaria ministro do Meio Ambiente do governo
Bolsonaro. A intenção do grupo, formado por jovens advogados, era
promover uma campanha pelo impeachment de Lula por causa do
escândalo. No entanto, a ideia não decolou, de acordo com um de seus
membros, o historiador Rodrigo Neves, em razão da melhora econômica
experimentada pelo país na mesma época:

O Endireita Brasil surgiu em 2006. Era um clubinho de advogados de


direita que eram amigos do Ricardo Salles. Eram todos jovens recém-
formados vindos do Largo São Francisco, PUC, Mackenzie, eram contra
o PT e haviam se chocado com o mensalão. Na época eles começaram
com uma perspectiva de montar um movimento de massa. Eles quiseram
ser o MBL na época do mensalão, a ideia era mobilizar as pessoas para
conseguir o impeachment do Lula. Era um projeto vanguardista demais
para o tempo e não colou, porque em 2006 o Brasil estava naquele hype
da bolha econômica que o PT criou, todo mundo tendo aumento do
salário artificialmente, a economia crescendo numa bolha frenética.
Todo mundo sabia que o Lula tinha cometido um crime, todo mundo
sabia que o Lula era corrupto e que o PT tinha comprado votos, mas
ninguém estava nem aí. [8]

Assim como os membros do Endireita Brasil, boa parte dos analistas


políticos que apareciam na grande imprensa avaliava que depois do
mensalão Lula já seria carta fora do baralho e Geraldo Alckmin, candidato
do PSDB, sairia vitorioso da disputa pela presidência em 2006. Porém, Lula
não apenas derrotou Alckmin, como o tucano perdeu votos entre o primeiro
e o segundo turno.
Com o intuito de compreender como Lula conseguiu se reeleger apesar
do escândalo, a Fundação Perseu Abramo coordenou uma pesquisa de
opinião publicada na revista Teoria e Debate no primeiro semestre de 2006.
A pesquisa revelou que, se por um lado a imagem de defesa da ética
promovida até então pelo partido havia se perdido, por outro a taxa dos
brasileiros que consideravam o PT como o partido mais aberto à
participação da população subira 10%. Além disso, a taxa daqueles que
consideravam que o PT era o partido que mais defendia a justiça social teve
um aumento de 6%, e a porcentagem daqueles que o consideravam como o
que defendia os mais pobres subiu dez pontos, para 57%.
Outro fator que também passou a impactar positivamente na imagem do
PT foi o seu vínculo à figura de Lula, sinalizando sua preponderância em
relação ao partido. Assim, ainda que o PT tenha se tornado mais
indiferenciado em relação aos demais no tocante à defesa da ética na
política, outros atributos foram reforçados, o que ajuda a explicar a
reeleição do ex-metalúrgico, especialmente levando em consideração que,
em 2006, ao contrário do que ocorrera em 2002, o candidato petista venceu
principalmente em razão dos votos oriundos das camadas mais pobres da
população. De acordo com o cientista político André Singer, a alteração no
padrão de votação que ocorreu em 2006 sinalizaria um realinhamento
eleitoral por meio do qual a população mais pobre do país teria passado a
apoiar o programa político encabeçado por Lula, dando origem a um novo
fenômeno na política brasileira: o lulismo.
O lulismo seria um movimento político em que o então presidente Lula
realizaria uma arbitragem do conflito social e político combinando medidas
que ao mesmo tempo beneficiariam os mais pobres, por meio de políticas
de transferência de renda, e o grande capital, por meio da manutenção de
políticas econômicas ortodoxas. Ideologicamente, o lulismo teria
promovido mudanças sociais sem romper com a ordem social-econômica
vigente, o que teria coincidido com a ideologia de mudança dentro da
ordem compartilhada pelos brasileiros mais pobres chamados por André
Singer de “subproletariado”. [9] Tal coincidência ideológica teria feito com
que a adesão à figura de Lula fosse mais forte do que uma simples
aprovação do governo de turno, desencadeando uma mudança de padrão
eleitoral em que o grupo que Singer classifica como subproletariado, que
desde 1989 votava em sua maioria em candidatos a presidente situados à
direita no espectro político, teria passado a votar em Lula e nos candidatos
por ele apoiados, enquanto a maior parte da classe média e alta teria
passado a votar de forma sistemática na oposição.
Dessa forma, se durante o primeiro governo de Lula o fenômeno da
direita envergonhada ainda estava em vigor, como aponta Renan Santos, do
Movimento Brasil Livre (MBL), em entrevista à cientista política Fanny
Vrydagh, após sua reeleição e o auge do lulismo, este se tornou ainda mais
acentuado:

Ser de direita em 2004 em um ambiente universitário era um tabu muito


maior do que é hoje em dia, especialmente considerando que nós éramos
estudantes de uma faculdade de direito, o Largo São Francisco, que
estava ativamente engajada na luta contra a ditadura militar. Então nós
tentávamos mostrar que nós estávamos à direita fazendo piadas, agindo
como independentes, anarquistas. [10]

Como também relembra Fábio Ostermann, um dos fundadores do mesmo


movimento:

As pessoas que hoje estão engajadas na difusão de ideias libertárias não


têm ideia de como a opinião pública era anos atrás. A taxa de aprovação
de Lula era algo como 90%, mesmo depois do mensalão ele tinha
conseguido se reeleger. [11]

Os membros do Movimento Endireita Brasil chegaram a ser aconselhados a


mudar o nome do grupo porque se vincular explicitamente à direita no
Brasil “pegava mal”. Tendo isso em vista, é possível dizer que o auge do
lulismo, entre os anos 2006 e 2010, coincidiu com o auge do fenômeno da
direita envergonhada, e até mesmo quem não se reivindicasse
explicitamente de direita enfrentou dificuldade em organizar manifestações
antipetistas/antilulistas em meio ao auge do lulismo sem ser menosprezado
ou ridicularizado no debate público.
Esse foi o caso das lideranças e apoiadores do movimento Cansei, criado
em 2007 após um acidente com um avião da TAM. O objetivo do movimento
era protestar contra o que foi percebido por seus membros como um “caos
aéreo” provocado pela má gestão do governo petista. O movimento chegou
a reunir cerca de 5 mil pessoas na Praça da Sé em São Paulo, que rezaram o
pai-nosso, entoaram o hino nacional e bradaram gritos de “fora, Lula” e
“Lula ladrão, seu lugar é na prisão”. As lideranças afirmavam que o
protesto era apartidário e pacífico, a despeito de manifestantes terem acuado
militantes do PSDB que resolveram desfraldar bandeiras do partido aos gritos
de “sem bandeira”, “o PSDB também é culpado”, “vagabundos, oportunistas”
e “traidores da consciência do povo”. Encabeçado por sindicatos patronais e
figuras destacadas da elite paulistana, como o empresário e atual
governador de São Paulo, João Doria Jr., e o então representante da OAB-SP,
Luiz Flávio D'Urso, e apoiado por artistas como Seu Jorge, que criticou os
governantes do país e citou o mensalão, o Cansei também contou com a
participação de outras seis entidades civis: Cidadão, Responsável,
Informado e Atuante (CRIA Brasil), Campanha Rir para Não Chorar, Casa
do Zezinho, Fundação SOS Mata Atlântica, Instituto Brasil Verdade,
Instituto Rukha e Movimento Nossa São Paulo: Outra Cidade. Porém, como
vários de seus membros pertenciam à elite do país, em pouco tempo o
movimento acabou se tornando alvo fácil de críticas ácidas.
O ex-governador do estado de São Paulo Cláudio Lembo, filiado ao
DEM, antigo PFL, afirmou que o Cansei era um movimento de “dondocas”, e
uma matéria do portal UOL, que cobriu a manifestação da Praça da Sé in
loco, acusava logo na manchete: “Movimento ‘Cansei' reúne grifes e gritos
de ‘Fora Lula' na Sé”. O texto ressaltava que aquele havia sido “um protesto
diferente, com direito a fotógrafos da revista de celebridades Caras, equipe
do programa TV Fama, bolsas Prada e óculos Dior para as mulheres e blazer
com abotoaduras, gel no cabelo e colarinho branco para os homens”. A
matéria destacou ainda que o movimento não ofereceu transporte para os
parentes das vítimas do acidente de avião, os quais chegaram atrasados ao
protesto e foram impedidos de subir no palco, informação também
confirmada pelo jornal Folha de S.Paulo.
Em virtude de inúmeras críticas similares, o ex-cônsul-geral dos Estados
Unidos em São Paulo Thomas White, que deixou o cargo em 2010, enviou
um documento oficial a Washington no dia 18 de setembro de 2007 em que
destacava a reclamação a respeito das críticas recebidas. No documento
constava que “entrevistado pela revista Veja, João Doria Jr. queixou-se que
a opinião pública discrimina os bem-sucedidos e ricos […] e que sua
imagem de alguém que nunca fumou, bebeu ou usou drogas, não briga, não
fala palavrões e usa gel no cabelo tornou difícil aos brasileiros comuns se
identificarem com sua causa”, concluindo que “os líderes do movimento,
por toda sinceridade e seriedade tornaram-se alvos fáceis para a caricatura”.
Em conversa com White, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso teria
ainda ironizado o nome do movimento afirmando que “Cansei” não é um
lema que Martin Luther King Jr. teria escolhido para inspirar seus
seguidores. Em 2011, já não havia mais vestígios do Cansei e a página do
movimento na internet tinha sido retirada do ar.
A despeito do clima refratário a manifestações integradas pela elite e
proibitivo para protestos declaradamente de direita, os membros do
Movimento Endireita Brasil não seguiram os conselhos recebidos e
resolveram manter o nome. Contudo, em vista do fracasso da ideia de
promover o impeachment de Lula, optaram por percorrer apenas circuitos
restritos e participar ativamente de determinados fóruns digitais onde
estariam protegidos das desconfianças suscitadas pela exposição pública de
suas ideias.
Nessa época, a internet funcionava como um refúgio para antipetistas,
direitistas, ou simplesmente para quem não se sentisse representado pela
bonança lulista. Sentindo-se acuadas na esfera pública tradicional, tais
pessoas descobriram nos meios digitais a possibilidade de encontrar outros
com quem pudessem trocar ideias e se solidarizar por meio da interação em
fóruns, blogs, sites e comunidades digitais. Nesse sentido, foi especialmente
importante o surgimento da rede social Orkut, criada pelo Google em 2004,
que acabou por se tornar o espaço principal de formação de arenas
discursivas que dariam origem à nova direita brasileira.
O primeiro passo nessa direção foi dado ainda no fim dos anos 1990,
com a criação do já referido blog de Olavo de Carvalho. Contando com a
colaboração de outros críticos do marxismo e da esquerda nacional, no ano
de 2002 o autor de O imbecil coletivo criou o site Mídia Sem Máscara
(MSM), fazendo com que Carvalho passasse a se tornar mais conhecido
pelos brasileiros que possuíam acesso à internet na época. Assim, quando a
rede social Orkut surgiu, já era possível encontrar duas comunidades
formadas por leitores e admiradores da obra de Olavo de Carvalho: “Olavo
de Carvalho” e “A Filosofia de Olavo de Carvalho”, além de uma
comunidade formada por seus detratores, “Eu odeio Olavo de Carvalho”,
mais tarde renomeada como “Olavo de Carvalho nos odeia”.
Voltado inicialmente para o público norte-americano, o Orkut, ao
contrário do Facebook, se popularizou tão rapidamente no Brasil que, em
janeiro de 2006, cerca de 75% do total dos usuários eram brasileiros,
sinalizando um engajamento precoce em comparação a pessoas de outras
nacionalidades em redes sociais desse tipo. No entanto, o número recorde
de brasileiros não significava que o acesso ao Orkut fosse homogêneo junto
à população como um todo, pelo contrário. Entre os anos de 2005 e 2007,
auge do Orkut no Brasil, o acesso à internet no país era bastante restrito a
grupos formados sobretudo por adolescentes e jovens adultos com alta
escolaridade, em sua maioria oriundos das classes A e B das regiões Sul e
Sudeste. Eles possuíam computadores em casa ou frequentavam centros de
acesso público pagos (lan houses e internet cafés) [12] e utilizavam a rede
principalmente para se comunicar, buscar informações e como fonte de
lazer. O Orkut era a rede social que proporcionava essas três atividades.
Ali era possível criar comunidades sobre assuntos diversos em que os
usuários inauguravam tópicos de conversação por meio dos quais
interagiam entre si. O uso de perfis falsos, porém, não era incomum, o que
contribuía para que os debates nas comunidades se desenvolvessem de
forma bastante livre e, por vezes, violenta. O ambiente de ampla liberdade
atraía justamente pessoas que não se sentiam representadas nos debates que
ocorriam na esfera pública tradicional. Inclusive, até mesmo aqueles que
não se sentiam representados em debates travados nas próprias
comunidades do Orkut poderiam criar as suas próprias comunidades, como
o fez o professor de filosofia Marcus Boeira.
Então estudante de pós-graduação em direito, Boeira já percorria os
circuitos formados pelos think tanks pró-mercado desde os anos 1990, de
onde conhecia as pessoas que atuavam no Cieep, como Alex Catharino, e
fora aluno de Olavo de Carvalho em um curso presencial em Porto Alegre
no início dos anos 2000. Com a intenção de se distanciar de discussões
conjunturais mais rasas, e por vezes agressivas, das comunidades que
frequentava, decidiu criar um grupo no Orkut, chamado “Ética e Filosofia
Política”. Seu objetivo era estabelecer debates rigorosos e razoáveis sobre
temas controversos que eram pouco discutidos na academia e nos circuitos
culturais brasileiros na época. Em sua visão, naquele momento haveria uma
“hegemonia gramsciana” mais forte da esquerda no país, de modo que
seriam “praticamente noventa e tantos por cento de pessoas falando a
mesma coisa”.
A “hegemonia gramsciana” à qual se refere Boeira está relacionada ao
argumento desenvolvido por Olavo de Carvalho a respeito de uma
revolução gramsciana capitaneada por intelectuais de esquerda e pelo PT
desde o fim da ditadura militar. Ainda que teorias similares já circulassem
em outros países, é possível dizer que Carvalho as adaptou ao contexto
nacional, [13] e, ao longo do tempo, suas ideias foram difundidas por meio
da internet numa versão simplificada que acabou por se tornar a pedra
angular do discurso da nova direita. Por esse motivo optei por reproduzir
abaixo uma síntese de seu argumento original, extraída do prefácio da
primeira edição de A nova era e a revolução cultural: Fritjof Capra &
Antonio Gramsci, escrito em junho de 1994, ou seja, ainda durante o
primeiro ano de governo de Fernando Henrique Cardoso:
A inteligência nacional está indo ladeira abaixo, ao mesmo tempo que
sobe, das ruas e dos campos, o rumo sombrio de uma revolução em
marcha. Sim, o Brasil está inequivocamente entrando numa atmosfera de
revolução comunista. […] A geração que, derrotada pela ditadura
militar, abandonou os sonhos de chegar ao poder pela luta armada […]
se dedicou, em silêncio, a uma revisão de sua estratégia, à luz dos
ensinamentos de Antonio Gramsci. O que Gramsci lhe ensinou foi
abdicar do radicalismo ostensivo para ampliar a margem de alianças; foi
renunciar à pureza dos esquemas ideológicos aparentes para ganhar
eficiência na arte de aliciar e comprometer; foi recuar do combate
político direto para a zona mais profunda da sabotagem psicológica.
Com Gramsci ela aprendeu que uma revolução da mente deve preceder a
revolução política; que é mais importante solapar as bases morais e
culturais do adversário do que ganhar votos; que um colaborador
inconsciente e sem compromisso, de cujas ações o partido jamais possa
ser responsabilizado, vale mais que mil militantes inscritos. […] A
conversão formal ou informal, consciente ou inconsciente da
intelectualidade de esquerda à estratégia de Antonio Gramsci é o fato
mais relevante da História nacional dos últimos trinta anos. É nela, bem
como em outros fatores concordantes e convergentes, que se deve buscar
a origem das mutações psicológicas de alcance incalculável que lançam
o Brasil numa situação claramente pré-revolucionária, que até o
momento só dois observadores, além do autor deste livro, souberam
assinalar, e aliás mui discretamente. […] Durante algum tempo, nutri a
insensata esperança de que o PT expeliria de si o veneno gramsciano e se
transformaria no grande partido socialista, ou trabalhista, de que o Brasil
precisa para compensar, na defesa do interesse dos pequenos, o avanço
neoliberal aparentemente irreversível no mundo, e propiciar, pelo sadio
jogo de forças, o movimento regular e harmônico da rotatividade do
poder que é a pulsação normal do organismo democrático. Movido por
essa ilusão, votei em Lula para presidente. Hoje não votaria nele nem
para vereador em São Bernardo. É que, pela sucessão de acontecimentos
desde a campanha do impeachment, o PT mostrou sua vocação, para mim
surpreendente, de partido manipulador e golpista, capaz de conduzir o
país às vias fraudulentas da “revolução passiva” gramsciana, usando
para isso dos meios mais covardes e ilícitos — a espionagem política, a
chantagem psicológica, a prostituição da cultura, o boicote a medidas
saneadoras, a agitação histérica que apela aos sentimentos mais baixos
da população —, e de adornar esse pacote de sujidades com um discurso
moralista que recende a sacristia. […] Se o PT faz isso, é porque perdeu
sua confiança no futuro majestoso a que o destinava a nossa democracia
em formação, e, excitado por indícios de um sucesso momentâneo que
teme não repetir-se nunca mais, resolveu apostar tudo no jogo voraz e
suicida do it's now or never. Não quer mais apenas eleger o presidente,
governar bem, submeter seu desempenho ao julgamento popular daqui a
cinco anos, fazer História no ritmo lento e natural dos moinhos dos
deuses: quer tomar o poder, fazer a Revolução, desmantelar os
adversários, expelir da política para sempre os que poderiam derrotá-lo
em eleições futuras. […] O que importa é aproveitar o momento, levar a
todo preço o Lulalá, carregado nos ombros de garotos raivosos,
insolentes e analfabetos, e, antes que o “consenso passivo” da população
tenha tempo de avaliar o que se passa, atrelar irreversivelmente o país ao
carro-bomba que se precipita, morro abaixo, no rumo da Revolução.

De acordo com Boeira, existiam então três grupos principais de usuários do


Orkut que circulavam nas comunidades dedicadas à apreciação positiva dos
argumentos de Carvalho. Um grupo majoritário que compreendia desde
anarcocapitalistas a neoliberais que se posicionavam consistentemente
contra a esquerda, sobretudo a partir de uma crítica baseada na disputa entre
mais mercado vs. mais Estado; um grupo disperso formado por defensores
de pautas mais conservadoras; e um público católico que seria minoritário e
menos participativo em comparação aos outros dois. A despeito de suas
diferenças, o que reunia as pessoas desses diferentes grupos nas
comunidades de Olavo de Carvalho era, sobretudo, o sentimento de não se
sentir representado em meio à esfera pública tradicional que atuava a partir
das prerrogativas estabelecidas pelo pacto de 1988, e que era percebida, em
consonância com as teses defendidas por Carvalho, como sendo
hegemonizada pela esquerda — o que fazia com o que o filósofo
conseguisse vocalizar os anseios daqueles que se sentiam marginalizados.
Boeira relata:

Ele falava tudo aquilo que muitas pessoas gostariam de falar para os
jornalistas, professores universitários, pessoas dos meios de
comunicação e que atuavam no terceiro setor e não tinham voz. Então,
de certa forma, ele canalizava essas vozes todas. Me parece que o
sucesso dele naquela altura se deve a isso, e, claro, sem contar o
brilhantismo intelectual que ele tem e isso é inegável. Um sujeito
realmente impressionante desse ponto de vista. [14]

A percepção de Boeira acerca do isolamento e da falta de representação de


pessoas de direita no debate público na época, especialmente tendo em vista
o campo das ciências humanas na academia, editoras de livros e a mídia
tradicional, era compartilhada por praticamente todas as pessoas que
entrevistei. Isso ocorria mesmo entre o grupo que o professor gaúcho
apontou como hegemônico entre os frequentadores das comunidades do
Orkut relacionadas à obra de Olavo de Carvalho, os defensores do livre
mercado, os quais também possuíam suas próprias comunidades onde
trocavam e traduziam textos que quase não circulavam nos ambientes
acadêmicos até então, como apontam Cibele Bastos e Filipe Celeti, ambos
estudantes universitários à época:

Em 2005 eu estava no segundo semestre de economia e tinha uma


disciplina chamada Evolução dos Movimentos Sociais, que era,
basicamente, Marxismo I e Marxismo II. Eu peguei um seminário de
neoliberalismo para fazer, e, na bibliografia complementar tinha um
livro do Hayek: O caminho da servidão. Aquilo ali mudou o meu rumo,
e eu comecei a querer me aprofundar um pouco mais. Então, na época
do Orkut, eu comecei a entrar em comunidades sobre liberalismo e
fiquei trocando ideias e materiais com as pessoas, porque o pessoal
estava traduzindo textos e muitos artigos que não existiam no Brasil. [15]

No último ano de faculdade eu comecei a descobrir esse universo novo


que, de certo modo, não dava as caras aqui no Brasil. A maioria dos
textos era em inglês, então era difícil de ter acesso à informação. E
aquele momento [2005-6], pelo próprio interesse das pessoas, houve
vários movimentos de tradução de obras por conta própria, muitas
pessoas montaram blogs para traduzir textos pequenos, artigos. A
necessidade de divulgar aquelas ideias que a gente não tinha acesso em
língua portuguesa estava fervilhando, e foi isso que aglutinou as pessoas.
Com o Orkut, bastava digitar o nome do autor que você queria e tinha
comunidades com vinte, trinta pessoas. A maioria não era formada de
pessoas do Brasil, mas os brasileiros foram tentando invadir esses
espaços para poder dialogar. Foi assim que as comunidades do Orkut
possibilitaram o encontro das pessoas, a troca de informações e também
grandes debates sobre as ideias. [16]

Dessa forma, as comunidades do Orkut possibilitavam discussões e debates


entre pessoas que possuíam os mesmos interesses, a despeito de não se
conhecerem, como relatam dois de seus antigos frequentadores, Rodrigo
Constantino e Joel Pinheiro da Fonseca, que anos depois viriam a ter espaço
em jornais e revistas tradicionais para expor suas ideias:

Eu fui trabalhar no mercado financeiro e tive um chefe, que é um liberal


conhecido no Brasil, o Paulo Guedes, com ph.D. em Chicago. Ali ele
começou a me dar umas dicas: “Olha, lê esse troço aí que você vai
gostar”. E esse “troço aí” era a Escola Austríaca. Então eu comecei, em
paralelo ao trabalho no mercado financeiro, que já é um ambiente muito
propício para enfrentar as ideias socialistas, a ir me abrindo o horizonte
de leituras teóricas. Assim, por volta de vinte anos eu já era um liberal,
digamos assim, radical. Eu sempre gostei de uma boa polêmica também,
então eu criava uns grupos de e-mail e mandava polêmicas ou coisas que
eu havia lido no jornal e queria contestar, mas não tinha muito feedback
dos meus amigos. Quando eu descobri o Orkut e essas comunidades
onde todo mundo passava o dia debatendo, foi uma mão na roda para
mim. Foi uma época marcante. Eu adorava esse bate-boca, essa
polêmica toda, e, ao mesmo tempo, isso ia me treinando em termos de
debate. O Orkut foi um aprendizado de vida. Eu tinha tesão em debater,
em defender as ideias que eu acreditava, e fui encontrando eco, fui
encontrando gente disposta a debater. [17]

No ensino médio eu já era um pouco mais liberal do que o resto da


classe, mas ainda sem muitas referências. Mas na faculdade eu descobri
o Instituto Mises americano e a obra do Mises, que inclusive é superior
ao aspecto militante que a coisa ganhou. Eu e um grupo de amigos
começamos a nos interessar muito pelo assunto e, graças ao Orkut, pude
conhecer mais gente que também participava de várias comunidades de
discussão sobre o tema: “Liberalismo Verdadeiro”, “Capitalismo versus
Socialismo”, e que tiveram um papel de colocar em contato pessoas que
individualmente conheciam algumas referências. [18]

Em pouco tempo os frequentadores de tais comunidades passaram a


perceber que todos defendiam uma versão do capitalismo de livre mercado
muito mais radical do que o neoliberalismo. Nas palavras do carioca
Bernardo Santoro, outro ativo frequentador dos debates no Orkut: “A gente
foi discutindo e alguém virou e rapidamente viu que todo mundo ali era
muito radical, todo mundo ali era mais libertário do que liberal
propriamente dito”. Foi justamente essa radicalidade que motivou os
debatedores a eleger como seu principal símbolo o economista austríaco
Ludwig von Mises, tido como o defensor mais radical do capitalismo de
livre mercado. No Brasil, a referência ao legado do economista costuma vir
acompanhada da defesa de ideias sintetizadas em motes como “imposto é
roubo”, “não existe almoço grátis”, “privatiza tudo!” e “menos Marx, mais
Mises”.
Contudo, na época, os ultraliberais, assim como os demais
frequentadores das comunidades de Olavo de Carvalho, não encontravam
representatividade na esfera pública tradicional, onde a defesa da ampliação
da lógica de livre mercado era realizada em grande medida por neoliberais
alinhados em maior ou menor grau ao PSDB. Além disso, entre 2005 e 2006,
quando as comunidades ultraliberais foram criadas no Orkut, os
ultraliberais brasileiros não se consideravam representados nem mesmo nos
circuitos nos quais o neoliberalismo circulava, afinal, a despeito do esforço
realizado para a divulgação das obras de Mises por parte de think tanks
como o Instituto Liberal do Rio de Janeiro, o ultraliberalismo continuava a
ser uma ideologia política praticamente inexistente no Brasil até então. Seus
defensores experimentavam intolerância, exclusões e silenciamentos em
ambientes universitários e nas redes sociais, como apontam Luan Sperandio
e Rafaela de Paula ao relembrarem suas experiências durante a graduação:

O discurso de intolerância existe. É muito forte. As pessoas te veem com


bastante preconceito sem nunca terem conversado com você. Existe um
mito muito forte de que na academia você pode discutir ideias, mas as
pessoas não estão preocupadas em debater. Um professor com quem eu
tive aula em 2014, que é petista, socialista e defende Cuba, falava mal
do Aécio em todas as aulas. Eu sempre o respeitei academicamente, mas
ele me excluiu das redes sociais. É muito triste você ver isso. Tem
muitos amigos de infância que me excluíram e eu sinceramente não sei
por quê. Por mais que a pessoa discorde de mim, por mais socialista que
ela seja, eu não a enxergo apenas como alguém que defende uma
ideologia, mas como um indivíduo que merece respeito como tal. Em
uma universidade federal é muito difícil, porque você só está querendo
aprender, estudar, debater ideias, mas as pessoas não enxergam assim.
Elas acham que você não deveria estar lá porque você discorda delas.
[19]

Eu fui fazer comunicação social em uma faculdade que, apesar de ser


particular, era extremamente de esquerda. Na minha primeira aula eu já
senti um choque enorme. Eu passei por situações de professores me
silenciando. No começo eu me senti muito sozinha. Foi muito difícil
porque eu não tinha ninguém pra conversar comigo a respeito, e foi
quando eu comecei a pesquisar os grupos e acabei me encontrando com
pessoas que fizeram com que essa experiência fizesse ainda mais sentido
para mim. Nas faculdades essa presença da esquerda está muito forte,
então a gente tem que realmente se reunir mais, falar mais. Não é só
questão de lutar para ter um espaço. É importante você lutar para ter um
espaço mas sem ter que tirar o espaço do outro de falar. [20]

Não tardou para que boa parte dos frequentadores do Orkut, assim como
outros grupos e movimentos da sociedade civil, passasse a compartilhar em
alguma medida as ideias acerca da existência de “hegemonia cultural
esquerdista” no país, considerando suas próprias experiências em ambientes
escolares [21] ou em outros circuitos relacionados à esfera pública
tradicional. E, nesse sentido, a influência de Olavo de Carvalho foi
inegável. É o que argumenta Joel Pinheiro da Fonseca:

Muita gente foi influenciada por Olavo de Carvalho. Muito liberal hoje
em dia tem muito mais a cara de direita do que da esquerda, e ele tem
uma grande parte de influência nisso, não tenho a menor dúvida. Ele
ajudou a fomentar essa ideia de hegemonia esquerdista, de formar esse
instrumento combativo. Em um plano mais prático, foi importante essa
visão de que éramos uma minoria encastelada, meio instruída, sem
representação, e que por isso tínhamos que lutar. Sem essa crença talvez
não houvesse esse ânimo para crescer e para fazer acontecer. [22]

E Lucas Berlanza:

Olavo de Carvalho foi uma das primeiras fontes de conceitos que hoje
todo mundo usa. O simples conhecimento da existência do Foro de São
Paulo, por exemplo. O Olavo não foi o primeiro a dizer que existia, mas
foi o primeiro a levar o conhecimento para o público sobre a importância
dessa instituição, em termos ideológicos e estruturais, na América
Latina. As pessoas às vezes dizem que não têm nada a ver com ele, mas
usam essas ideias. Eu reconheço que elas começaram a ser difundidas de
fato com ele, e que foram recebidas por alguns grupos de intelectuais,
sobretudo jovens, dispostos a encontrar uma bibliografia distinta das que
eles tinham até então. [23]

Com o tempo, a ideia de que existiria uma hegemonia esquerdista no país


foi acompanhada pela difusão entre a nova direita em formação de uma
estratégia discursiva contra-hegemônica para combatê-la: a política do
choque. A política do choque, que pode ser utilizada tanto à esquerda
quanto à direita, é uma forma radical de chamar a atenção para
determinados temas e demandas e aumentar a circulação pública de
discursos que se opõem a um horizonte cultural percebido como dominante.
[24] Durante as Marchas das Vadias, por exemplo, as manifestantes se

utilizavam da política do choque ao andar com os seios descobertos em


público e com palavras como “puta” pintadas em seus corpos, contra o que
compreendiam ser uma dominação machista na sociedade e na esfera
pública tradicional. Já os frequentadores das comunidades dedicadas à
discussão da obra de Olavo de Carvalho faziam uso frequente de palavrões,
exageros e de um humor ácido e agressivo com objetivo de chamar a
atenção para o que consideram ser uma dominação esquerdista no país,
como ilustram estes trechos referentes a postagens originais da comunidade
“Olavo de Carvalho”, em que se criticava até mesmo o site do próprio
filósofo, o MSM:

MSM se rende à novilíngua e ao esquerdismo


Sérgio Marcondes — 29 de outubro de 2004
Nem no antes impoluto Mídia Sem Máscara podemos nos refugiar dos
terríveis intelectuais gramscianos e suas distorções retóricas. Saiu um
artigo lá falando de fome, pobreza, exclusão social, desigualdade social,
problemas do capitalismo. Como é possível isto? Espero protestos
indignados dos membros desta comunidade contra um artigo
evidentemente esquerdista que conspurca o MSM! Depois de tantos
membros aqui dizerem que conceitos como “desigualdade social” fazem
parte da novilíngua, e que o mundo é cada vez melhor com o
capitalismo, isto não pode passar em branco!

Lavagem cerebral nas escolas


Breno Toledo — 10 de maio de 2005
Os marxistas donos da verdade estão cada dia com um maior controle na
educação e na mídia. Assim está o nosso país de Norte a Sul com um
poderoso exército marxista fazendo lavagem cerebral nos jovens
brasileiros. Os aplausos dados ao ilustre Hugo Chávez vieram de
drogados, lunáticos e fracassados que foram à Meca comunista [Fórum
Social Mundial] viver uma espécie de Woodstock brasileiro onde
ninguém é de ninguém, a Coca-Cola não pode ser servida, e o aperitivo
principal é a maconha e a publicidade paga por um banco privado.

Nova novela das 7: mais um show de comunismo


Antonio Luiz Ribeiro — 6 de janeiro de 2010
Nova novela das 7: mais um show de comunismo. Quem escreve é um
tal de Brosco Brasil.
G.B. Schmitt — 7 de janeiro de 2010
A última novela que vi foi O REI DO GADO. Aquilo era uma apologia ao
MST.

(Homenagem a Carlos Lacerda)


Priscila Garcia — 4 de outubro de 2012
Eu lamento muito, mas concordo inteiramente com o Olavo quanto a
isso. Dá vontade de ressuscitar os cadáveres desses generais e sacudir-
lhes as ossadas pra PERGUNTAR furiosamente: Vocês têm NOÇÃO da
MERDA que nos legaram, suas ANTAS SEQUELADAS? Têm NOÇÃO do que
significou, para o país que vocês queriam defender do comunismo, a
perseguição a uma pessoa como CARLOS LACERDA? Essa postagem
inflamada é em sua JUSTA HOMENAGEM, Carlos Frederico Werneck de
Lacerda!

Ainda que expressões violentas não fossem incomuns em comunidades do


Orkut, o jargão dos participantes da comunidade “Olavo de Carvalho” era
semelhante àquele utilizado pelo próprio filósofo em seu blog, em fóruns e
em redes sociais. Em 2009, Carvalho afirmou, em resposta a um leitor de
seus textos:

Mais vale um bom palavrão atirado em público à cara de um Tarso


Genro, de um Marco Aurélio Garcia, do que mil palavras construtivas
atiradas ao vento. […] O Brasil, no momento, não precisa de boas ideias.
Precisa é de uma ação vigorosa, implacável, contra o império da
maldade, da mentira e da estupidez. […] Quando nada se faz contra o
mal, a apologia do bem torna-se mera desconversa — a forma passível e
afável da mentira na qual o mal se sustenta.

O uso de palavrões e de um discurso agressivo e cáustico, especialmente


contra seus adversários, é rotineiro nas falas e nos textos publicados por
Carvalho na internet. Inclusive, no ano de 2006, o escritor apontou como
fonte direta de inspiração o repórter policial Luís Carlos Alborghetti, que
também possuía uma comunidade ativa no Orkut no ano de 2006 chamada
Alborghetti/Cadeia Sem Censura, através da qual defendia, com o uso de
palavrões e expressões chulas, o combate à corrupção por meio do
fuzilamento de políticos e a volta da ditadura militar:

Tinha que pegar os deputados e botar num paredão. Pegar essa quadrilha
do PT, a quadrilha de todos os partidos políticos, e botar no paredão!
Nada de presídio, é pegar Fernandinho Beira-Mar, Marcola, e mandar
fuzilar. Invadir o Rio de Janeiro e explodir tudo. Pegar e meter uma
trolha na bunda dos caras, tá?! Hoje eu sou a favor, pela putaria que está
acontecendo nesse país, eu seria a favor do vento das Araucárias, é o
vento verde! Mas nós não temos um Castelo Branco para retornar. [25]
Segundo Carvalho, o uso de palavrões e de uma abordagem agressiva seria
consciente e se justificaria pelas seguintes razões: [26]

O USO DO PALAVRÃO
Eu uso esses palavrões porque são NECESSÁRIOS.
São necessários no contexto brasileiro para demolir essa linguagem
polida que é uma camisa de força que prende as pessoas, obrigando-as a
respeitar o que não merece respeito.
Então, às vezes, quando você discorda de um sujeito, mas discorda
respeitosamente, você está dando mais força pra ele do que se
concordasse. Porque você está indo contra a ideia dele, mas você está
reforçando a autoridade dele. A autoridade é a respeitabilidade.
O problema dessas pessoas, desses bandidos de que eu estou falando,
não são as ideias. É justamente o fato de que são canalhas.
São canalhas, são bandidos, são ladrões.
V-Ã-O T-O-D-O-S T-O-M-A-R N-O C-U!

Certamente, a exposição de certos discursos difundidos por Alborghetti,


Carvalho e outros causaria reações de choque ou até mesmo hostilidade
entre pessoas comuns, como ocorreu na época em que o filósofo
frequentava os circuitos formados por think tanks pró-mercado.
No entanto, se por um lado a adesão de Carvalho à política do choque
lhe rendeu dificuldades em obter financiamento institucional entre o fim
dos anos 1990 e início dos anos 2000, por outro, a adoção de tal retórica foi
crucial para a nova direita em formação. Afinal, foi sobretudo a partir da
influência de Carvalho e do recurso à política do choque que debates
marginais que ocorriam em fóruns e comunidades dedicados à discussão de
filosofia e economia a partir de perspectivas conservadoras ou ultraliberais
puderam ampliar seu raio de alcance dentro e fora da internet. Carvalho não
apenas influenciou um número muito grande de ativistas e apoiadores do
que viria a ser a nova direita, mas por meio do site MSM também abriu
espaço para que outras vozes pudessem se expressar e eventualmente se
tornar, assim como ele, escritores e articulistas em veículos tradicionais de
mídia, como foi o caso de Rodrigo Constantino:

Já nessa época de debates no Orkut eu comecei a escrever uns textos um


pouco maiores. Aí eu fui em um evento que já era ligado à política, do
Partido Federalista, do Thomas Korontai, do movimento federalista. [27]
Nesse evento eu conheci o Heitor de Paula, um psiquiatra bem radical,
ligado ao Olavo de Carvalho e companhia. Ele me falou do Mídia Sem
Máscara, que eu só conhecia de nome, e eu publiquei oficialmente meu
primeiro texto lá no comecinho do governo do PT. Depois eu continuei
publicando outros textos no MSM e um editor de uma editora mineira
chamada Só Ler me pediu permissão para usar alguns trechos dos meus
artigos em um livro deles e eu falei: “Eu tenho vários textos já que eu
escrevi, se você tiver interesse, a gente pode lançar um livro meu”. E
assim nasceu meu primeiro livro, Prisioneiros da liberdade, publicado
em 2004, uma coletânea de artigos, muitos do Mídia Sem Máscara. [28]

É possível dizer que os textos e livros críticos à esquerda e ao PT que


circulavam na época, logo após o mensalão, ainda que não tivessem sido
escritos por membros da nova direita, prepararam o terreno para sua
chegada à esfera pública tradicional, inclusive adiantando o uso de um tom
mais agressivo. Em 2007, Diogo Mainardi, por exemplo, então colunista da
revista Veja, e que também atuava desde 2003 como membro do programa
Manhattan Connection transmitido pela Globosat, operadora de televisão a
cabo da Rede Globo, reuniu suas principais colunas sobre Lula em um
volume intitulado Lula é minha anta, comercializado por um dos maiores
grupos editoriais do país, o Grupo Editorial Record, e que figurou como o
quinto livro de não ficção mais vendido daquele ano.
O público leitor de não ficção dos anos 2000 demonstrava possuir maior
interesse por livros que abordassem o próprio país, e nesse sentido Lula é
minha anta acabou por se tornar o precursor de uma série de livros na
mesma linha. Dois anos depois, em 2009, o jornalista Reinaldo Azevedo,
que também escrevia na Veja, lançou, pelo mesmo grupo editorial, O país
dos petralhas e, no mesmo ano, Máximas de um país mínimo. Em 2010,
quando Lula atingiu seu auge em termos de popularidade, foi a vez de
Merval Pereira, colunista do jornal O Globo e comentarista político do
canal de televisão a cabo GloboNews, publicar, novamente pelo Grupo
Editorial Record, o livro O lulismo no poder.
Além de livros sobre política contemporânea, os leitores de não ficção,
ao fim dos anos 2000, também demonstraram predileção por narrativas
históricas. O livro 1808, de Laurentino Gomes, sobre a chegada da família
real ao Brasil, lançado em 2007, atingiu a marca de 400 mil exemplares
vendidos em 2008, abrindo espaço para outras publicações do gênero.
Assim, foi publicado pela editora Leya em 2009 o Guia politicamente
incorreto da história do Brasil, de Leandro Narloch, jornalista e admirador
das teses do economista austríaco Ludwig von Mises. A obra logo se
tornaria um best-seller e o primeiro de uma série de guias “politicamente
incorretos” que foram sendo publicados nos anos seguintes sobre os mais
diversos temas.
A publicação de livros críticos ao PT e ao “politicamente correto” logo
virou tendência, e algumas editoras pequenas começaram a demonstrar
maior interesse em investir em títulos relacionados à expressão de ideias
associadas à direita, como relembra a tradutora e fellow da Atlas Network,
Márcia Xavier de Brito:

O Edson [Filho] estava querendo fazer alguma coisa pela cultura no


Brasil e montou a É Realizações. Eu estava na casa do Olavo quando
veio o primeiro logo dessa editora. Na época, o Olavo era muito mais
“cultural”. O Edson meio que foi financiando o Olavo, e quando o Olavo
foi virando antiesquerdista, ele começou a dar um tom bem reaça para a
editora. Mas o Edson queria uma pauta mais acadêmica, e entre 2005 e
2006, ele começou a largar esse radicalismo de livros que são “do
contra”, “esquerda é malvadona”. Ele começou a descobrir os filósofos
brasileiros que o Olavo divulgava e trouxe títulos do Russell Kirk, por
exemplo. Aí um admirador de Olavo de Carvalho chamado César Kim
criou a Vide Editorial, e quando o Olavo saiu da É Realizações, o César
passou a ser o editor do Olavo e começou a entrar nesse mundinho, a
mulher dele fez um curso com a gente, enfim, tem toda uma conexão por
trás nesse sentido, de as pessoas se conhecerem. [29]

A É Realizações foi responsável por publicar vários livros de autores


citados com frequência por Olavo de Carvalho, como Roger Scruton, Eric
Voegelin, Theodore Dalrymple e Christopher Dawson, que atualmente
figuram na lista dos mais vendidos pela editora. Já a Vide Editorial, além de
publicar obras de Scruton e Voegelin, também começou a lançar títulos
relacionados mais explicitamente à crítica do marxismo e do comunismo,
como A mente esquerdista: As causas psicológicas da loucura política, O
verdadeiro Che Guevara, O livro negro do comunismo, Marxismo
desmascarado, e também promover livros de autores nacionais de direita.
Dessa forma, durante esse período, começou a se esboçar um pequeno
circuito editorial no qual circulavam alguns membros dos antigos think
tanks pró-mercado e da nova direita emergente.
A despeito da crescente popularidade de Olavo de Carvalho nesses
espaços e nos meios digitais, seus seguidores não tiveram sucesso em se
organizar formalmente, e a divulgação das ideias do filósofo era realizada
de modo intermitente. Em 2008 foi anunciada na comunidade “Olavo de
Carvalho” uma proposta de criar um fórum conservador digital, e em 2010
chegou a ser criado um Instituto Olavo de Carvalho. Contudo, o Instituto
durou pouco tempo e teve suas atividades encerradas em 2012, após dois
anos e sete meses de funcionamento. No mesmo ano a transmissão do
podcast de Carvalho, realizada por meio do site Blog Talk Radio, também
foi encerrada. Assim, a divulgação mais consistente das atividades
relacionadas à nova direita em formação para audiências mais amplas foi
levada a cabo principalmente pela ação dos ultraliberais, que, a partir de
2006, passaram a formar novas organizações civis, grupos de estudo e
chapas para centros acadêmicos, além de frequentar os circuitos
constituídos pelos antigos think tanks pró-mercado.
A nova direita na sociedade civil

A atuação da nova direita foi ganhando uma sustentabilidade maior à


medida que novas organizações, mais conectadas com o tipo de
engajamento que vinha surgindo no Orkut, foram sendo fundadas. Hélio
Beltrão Jr. e Rodrigo Constantino, ativos participantes dos debates nas
comunidades do Orkut, que já possuíam contato com personagens
importantes da rede de organizações pró-mercado previamente existente,
[30] participaram da fundação do Instituto da Realidade Nacional em 2005,

mais tarde rebatizado como Instituto Millenium e lançado oficialmente em


2006 durante o Fórum da Liberdade. Constantino relembra:

O Paulo Guedes me ligou e disse: “Rodrigo, tenho um negócio que eu


acho que você vai gostar. É um Instituto ligado ao pessoal lá no Sul que
eu sei que você conhece, o IEE, querendo fazer a mesma coisa no Rio.
Você quer ir?”. Fui no evento, que foi em uma universidade na Lagoa,
no Rio de Janeiro. Era com a Patrícia Carlos de Andrade, [31] mas eles
não sabiam muito bem o que iam fazer, a ideia original era replicar o
Instituto de Estudos Empresariais no Rio. Eles perguntaram quem tinha
interesse em tomar a frente da iniciativa e eu fui o primeiro a levantar a
mão. O Paulo Guedes ainda brincou falando com a Patrícia: “Eu falei
que estava trazendo o cara certo”. Mas no Rio a gente achava que não ia
pegar essa coisa de reunião toda segunda-feira para debater ideias com
empresários, e então surgiu um projeto muito mais com a cara do
Instituto Millenium, do qual eu sou um membro fundador. [32]

Inicialmente pensado para ser uma filial do Instituto de Estudos


Empresariais, o Instituto Millenium (Imil) foi fundado por um grupo de
acadêmicos, executivos e profissionais liberais, entre os quais estavam o
professor universitário Denis Lerrer Rosenfield e os economistas Gustavo
Franco, Patrícia Carlos de Andrade e Paulo Guedes. Com a intenção de
difundir o ideário pró-mercado para públicos mais amplos, o Imil contou
com o financiamento de vários grupos empresariais e de grandes veículos
de mídia, como o Grupo Abril, Organizações Globo, Grupo Ultra, Grupo
Gerdau, Grupo Évora, entre outros. No entanto, o Imil, assim como as
organizações civis que haviam sido fundadas com propósito similar no
passado, não atendia aos anseios das pessoas que frequentavam as
comunidades do Orkut e defendiam o capitalismo de livre mercado de
modo radical.
Os ultraliberais passaram então a somar esforços para fundar novas
organizações que pudessem representá-los de fato. Para Hélio Beltrão Jr., a
existência de um horizonte utópico seria fundamental para que fosse
possível, em suas palavras, ganhar corações e mentes, o que não ocorreria
por meio de debates complexos a respeito de quais seriam as melhores
políticas públicas a serem adotadas pelo país. De acordo com Beltrão, a
ideia de que a adoção da lógica de mercado é sempre a melhor solução para
quaisquer problemas sociais ou econômicos porque é moralmente superior
seria muito mais simples, coerente e facilmente compreensível por qualquer
pessoa do que as discussões excessivamente técnicas realizadas por
intelectuais e tecnocratas neoliberais. Assim, imbuído de tal propósito, no
dia 2 de junho de 2006, Beltrão criou uma das principais comunidades para
a discussão do liberalismo econômico no Orkut, a comunidade
“Liberalismo (verdadeiro)”, com a intenção de buscar pessoas para fundar
um novo think tank inspirado no Mises Institute norte-americano. [33]
Em 2007, com o apoio dos irmãos Cristiano e Fernando Chiocca, [34]
que estavam entre os membros mais ativos da comunidade, nasceu o
Instituto Mises Brasil (IMB), o primeiro think tank ultraliberal do país, que
passou a ser presidido por Hélio Beltrão. Em seus primeiros anos o IMB não
possuía sede nem funcionários contratados, era apenas uma página na
internet, alimentada pela avidez dos frequentadores das comunidades do
Orkut, fóruns e blogs em propagar suas ideias para públicos mais amplos.
Esse modo de funcionamento era excelente na visão de Beltrão, pois
evitaria o risco de a organização se tornar um cabide de empregos para
pessoas que não acreditavam de fato nas causas defendidas.
Quando visitei a sede do Instituto Mises, localizada no Itaim Bibi, bairro
de elite da cidade de São Paulo, constatei que o quadro de funcionários
contratados era realmente enxuto, como Beltrão fez questão de destacar. O
espaço era elegante, porém funcional, já que o foco do Instituto é o
ambiente digital. Com 280 mil seguidores no Facebook, 110 mil no
Instagram e 44 mil no Twitter, o IMB foi considerado pela Forbes o think
tank liberal mais influente na internet fora dos Estados Unidos. A influência
do Instituto era palpável entre as pessoas que entrevistei, sobretudo as mais
jovens. Ser entrevistado pelo Podcast do Mises Brasil era um sinal
importante de reconhecimento pelas contribuições prestadas à defesa do
livre mercado. Cibele Bastos e Rafaela de Paula, que tinha o braço tatuado
com palavras que remetem ao radicalismo de mercado, ficaram extasiadas
quando chamadas para o programa.
Beltrão não negava o rótulo de ultraliberal. De acordo com o fundador e
presidente do IMB, existiriam duas grandes correntes ideológicas que
atualmente disputariam a hegemonia na sociedade brasileira: a social-
democracia e o neoliberalismo. A primeira expressaria os posicionamentos
de economistas como Luiz Carlos Bresser-Pereira e Luiz Gonzaga
Belluzzo, que defenderiam políticas como a existência de empresas estatais
diversas; política industrializante; imposição de tarifas de importação;
política cambial ativa; bancos estatais, como o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Banco do Brasil e Caixa
Econômica Federal; eleição de “campeões nacionais”; aposentadoria
pública; seguro-desemprego; leis trabalhistas e políticas de distribuição de
renda. Já a segunda seria defendida por economistas como Marcos Lisboa,
Arminio Fraga, Pérsio Arida e Samuel Pessôa.
O ultraliberalismo, segundo Beltrão, se diferenciaria do neoliberalismo
por defender a abolição de uma série de políticas e instituições advogadas
pelos neoliberais, como o monopólio da moeda; o Banco Central; uma
política monetária ativa; órgãos de defesa da concorrência (antitruste);
agências reguladoras estatais; investimentos estatais em infraestrutura
essencial como estradas e portos; educação e saúde básicas públicas;
políticas de renda mínima; harmonização das leis e impostos entre os
estados. Além disso, não é incomum entre os ultraliberais a defesa de
pautas liberalizantes no plano dos costumes, como a liberação do porte de
armas para cidadãos comuns; do aborto; da união homoafetiva; de
substâncias ilícitas como a maconha; de patentes e direitos autorais, porém,
sem a existência de qualquer regulação estatal, [35] o que eventualmente
gerava tensões importantes com os conservadores que circulavam nos
circuitos formados por organizações e movimentos pró-mercado.
Apesar das possíveis divergências, os conservadores se uniam aos
ultraliberais na defesa do livre mercado e no combate à “hegemonia cultural
esquerdista”, e, nessa época, apenas alguns promoviam iniciativas voltadas
para suas próprias agendas. Esse foi o caso de Joel Pinheiro da Fonseca, que
se declarava católico e defendia pautas mais conservadoras no fim dos anos
2000, mas posteriormente adotou um ponto de vista mais liberalizante
acerca de costumes. Em 2008, Fonseca, então estudante de filosofia da USP,
formou um grupo de estudos sobre Platão composto de uma maioria de
integrantes católicos interessados em restaurar uma discussão de alto nível
cultural no Brasil que não fosse acadêmica. Foi assim que surgiu a ideia de
publicar uma revista de perfil mais conservador, a Dicta&Contradicta,
voltada para discussões acerca de literatura e filosofia, que buscava atingir
um público formado por pessoas com ensino superior, não necessariamente
da área de humanas. A revista, que teve seus volumes semestrais impressos
vendidos na Livraria Cultura, somou dez números publicados entre 2008 e
2013 e contou com uma tiragem que oscilou entre 2 mil e 4 mil exemplares.
No entanto, teve as atividades encerradas por não se sustentar
financeiramente, a despeito de o grupo recorrer a patrocínios, inclusive de
familiares (um dos membros de o grupo era enteado de Andrea Matarazzo,
empresário e ex-secretário de Comunicação do governo FHC).
Assim como Fonseca, outros estudantes universitários que frequentavam
as comunidades do Orkut também começaram a formar grupos de estudo,
sendo que o maior deles, na época, foi criado em 2008 em Fortaleza. Por
meio do Orkut, Cibele Bastos entrou em contato com outros três estudantes
universitários da cidade, Raduán Melo, Bruno Aguiar e Jeová Neto, que
compartilhavam de sua dificuldade em encontrar referências sobre temas
ligados à defesa da liberdade de mercado. Assim os quatro decidiram se
unir para criar um grupo de estudos chamado Dragão do Mar na faculdade
de economia da Universidade Federal do Ceará, inaugurado com uma
discussão sobre o livro A ação humana, de Mises.
Além de formarem grupos de estudo em suas respectivas faculdades, o
paulistano Joel Pinheiro da Fonseca e a cearense Cibele Bastos, bem como
várias pessoas Brasil afora, puderam, por meio do Orkut, participar de uma
iniciativa coletiva ousada: a tentativa de formação de um partido ultraliberal
brasileiro inspirado no Libertarian Party norte-americano, [36] cujo nome,
Líber, remetia à abreviação de “libertário”:

Partido Libertário Brasileiro — Ajudem a fundar


Alex — 12 de fevereiro de 2007
Para aqueles que não sabem, está em andamento o projeto de criação de
um partido político que nos represente. A primeira etapa para a fundação
desta nova agremiação política é conseguir 101 fundadores em 9
estados. Até o momento em que esta mensagem foi postada, estão
faltando 35 nomes. Pare de reclamar dos esquerdistas e parta para a
ação! Participe!

Passados dois anos do anúncio no Orkut, o Líber já contava com um site


oficial, um programa, contas no Twitter e no Facebook e quinhentos
membros que pagavam uma anuidade de cem reais para o partido em
formação. No entanto, havia imensas dificuldades para reunir as 500 mil
assinaturas necessárias para a oficialização, como relembra Bastos:

A gente montou um grupo de estudos em 2008 e se juntou a mais uma


pessoa, o Maris, que era mais ligado à política. Ele participou da
fundação do Partido Libertário e então a gente começou a ser uma célula
do Líber lá em Fortaleza. Eu lembro que a gente sempre tinha reuniões
estratégicas pra coletar assinaturas pra oficialização do Partido, e entre
2008 e 2012 ficamos naquele trabalho de formiguinha: fazendo inscrição
no Orkut e tentando captar gente para os grupos de estudo. A gente não
tinha dinheiro, nós éramos um bando de estudantes fazendo tudo com
dinheiro do próprio bolso. [37]

Como o surgimento do Líber ocorreu a partir do Orkut e seus membros


eram, em sua maioria, estudantes universitários e profissionais liberais que
não possuíam os meios materiais e a expertise necessários para fundar um
partido, ainda que existissem núcleos distribuídos por várias capitais do
país, a iniciativa não prosperou. Além disso, de acordo com o primeiro
presidente do Líber, o mineiro Juliano Torres, que na época era estudante de
jornalismo e publicidade e se definia como anarcocapitalista, a militância
ainda não se sentia confortável em atuar politicamente em outros partidos,
pois suas ideias seriam muito radicais:

Alguns poucos tentaram entrar no DEM, mas ficaram menos de um mês.


[…] Não tem liberdade. Seus estatutos são muito fechados. Eles
garantem o poder a certos grupos. O modelo dos partidos é muito
centralizado no diretório nacional. Nós poderíamos ser expulsos.
Quando a gente defende alguma ideia contrária ao programa do partido,
a comissão de ética pode expulsar. E eu creio que nos expulsariam. Os
nossos meios são moderados, mas os fins são radicais. [38]

No entanto, a militância reunida no Líber criou laços importantes de


amizade durante os anos em que ocorreu a tentativa de criação do partido,
os quais foram importantes para o processo de institucionalização da nova
direita na sociedade civil, como lembra Filipe Celeti, responsável pelo
partido em São Paulo:

Teve muita discussão até realmente as pessoas se encontrarem para fazer


uma assembleia para aprovar o programa e o estatuto. Foram vários anos
até juntar pessoas, juntar uma grana, juntar as ideias, formalizar isso.
Considerando as leis brasileiras, é muito difícil montar um partido,
muita gente nem queria formalizar, queria ter uma organização que
atuasse politicamente mas não necessariamente um partido político que
participasse de eleição, até porque muitos nem concordam com as
eleições. Mas isso aglutinou muita gente e se formaram vários grupos
regionais, principalmente em São Paulo, Rio, Belo Horizonte. Aqui em
São Paulo geralmente a gente se encontrava num café na avenida
Paulista e algumas pessoas ouviam a gente debatendo política, e
chegavam no grupo por aí. Um amigo traz o outro, mostra um texto, e
vai compondo. A maioria das pessoas que participavam eram
empreendedores, profissionais liberais, estudantes de direito, estudante
de economia, pessoas, por exemplo da tecnologia, programadores, web
designers, gente desse universo profissional autônomo, e um pouco um
pessoal mais revoltado com a política, com um perfil mais punk. Eu era
o coordenador de São Paulo, fiquei atuante até o fim de 2015, e
mensalmente fazia reuniões, geralmente um happy hour em um dia de
semana pra bater um papo, discutir projetos, discutir a participação em
alguma coisa. De certo modo, o que faz a gente estar junto é essa relação
de amizade que foi feita ao longo dos anos. [39]

Os encontros promovidos pelos militantes para organizar a fundação do


novo partido acabaram por fomentar uma série de novas iniciativas. Em
pouco tempo foram criados vídeos e canais de YouTube, novas
comunidades em redes sociais, novas páginas dedicadas à divulgação de
suas ideias, os quais passaram a agregar cada vez mais pessoas em torno da
defesa radical do livre mercado. Além disso, à medida que o Imil e o IMB
foram se consolidando, os frequentadores das comunidades do Orkut
começaram a circular pelas organizações pró-mercado brasileiras e
estrangeiras mais antigas, como o Instituto Liberal, o Instituto de Estudos
Empresariais e suas filiais, [40] a Fundação Friedrich Naumann, [41] a
Foundation for Economic Freedom, a Atlas Network e o Cato Institute. Foi
assim que suas atividades passaram a alcançar outro patamar em termos de
exposição e apoio, possibilitando que a divulgação de ideias e a organização
na sociedade civil acontecessem de forma mais sustentável e contínua.
Rodrigo Constantino, por exemplo, entre 2009 e 2010, passou a escrever
uma coluna semanal para o jornal O Globo e a se dedicar cada vez mais à
militância.

Nasce o Instituto Millenium e eu começo a ficar mais próximo desses


fundadores, dentre eles, a família Marinho, do Globo. Eles me colocam
em uma vitrine, então, eu saí do Facebook para uma coisa que tinha
gente da mídia olhando, e um belo dia, eu recebo uma ligação:
“Rodrigo, aqui é o editor do Globo, que tal você escrever colunas para a
gente?”. Então as coisas foram acontecendo. Eu era militante da causa
liberal, nos instrumentos que estavam disponíveis: primeiro Orkut,
depois Facebook, o Instituto Millenium, apareceram palestras no IEE, lá
em Porto Alegre, e uma coisa foi puxando a outra. Eu fui ficando mais
em evidência e aquilo que era um hobby foi deixando de ser, até o dia
em que eu decidi que queria viver disso e fui cem por cento para a
atividade de militante da causa liberal. [42]

Já o gaúcho Fábio Ostermann, outro frequentador dos fóruns digitais,


passou a atuar de modo mais orgânico em defesa do livre mercado após ter
entrado em contato com think tanks norte-americanos:
Eu sempre ficava na internet procurando coisas, e em 2007 surgiu o site
do Ordem Livre, que era o programa de difusão das ideias liberais em
língua portuguesa do Cato. Em 2008 eu fui para dois seminários, um do
Cato e outro da Foundation for Economic Education, e conheci um
pessoal que estava começando a se organizar lá nos Estados Unidos e se
intitulavam Students for Liberty. Na volta eu tive um contato mais
aprofundado com o Students for Liberty e fui estagiário do Ordem Livre
por dois meses e meio em um programa de estágio chamado Koch
Summer Fellow Program. [43]

A partir do programa Ordem Livre, ligado ao Cato Institute, foi criado em


2009 no Brasil, com o auxílio de Ostermann, o Instituto Ordem Livre. No
mesmo ano o Instituto passou a promover um projeto chamado Liberdade
na Estrada, que contava com financiamento do Grupo Localiza [44] e
promovia palestras com intelectuais em universidades espalhadas por
diversas localidades do Brasil. Em suas cinco primeiras edições, o
Liberdade na Estrada esteve presente em quase cinquenta universidades
distribuídas em mais de trinta cidades diferentes e ajudou a conectar ainda
mais a militância pró-mercado distribuída pelo território nacional. Assim
relata Cibele Bastos, responsável por organizar eventos no Ceará:

Em 2009 a gente começou a ter mais atividade porque fizeram um


projeto do Ordem Livre no Rio Grande do Sul chamado Liberdade na
Estrada. A ideia do projeto era fazer palestras em cada capital brasileira
sobre liberalismo econômico, e então entraram em contato pra gente
organizar o Liberdade na Estrada em Fortaleza, em 2009, e a gente
organizou como Líber Ceará. O evento foi na faculdade de economia e o
idealizador do projeto foi o Lucas Mafaldo, que é lá do Rio Grande do
Norte, ele que teve essa ideia de percorrer o Brasil, ele dizia que pegava
o carro e ia percorrendo o Brasil. Deu até um público considerável, a
gente filmou, mas em 2010 a gente repetiu e não deu certo, não teve
tanto sucesso de público na UFC. Teve sucesso de público em outra
faculdade porque a gente fez em outro horário. [45]

Entre os anos de 2009 e 2010, além de organizarem palestras por meio do


projeto Liberdade na Estrada e grupos de estudos, os estudantes
universitários que frequentavam as comunidades do Orkut também
começaram a montar chapas para disputar centros acadêmicos e diretórios
estudantis. A ideia era fazer frente à atuação da esquerda no movimento
estudantil, como lembra Rodrigo Neves, que fez sua graduação na USP:

Lancei a chapa Reconquista em 2009 para disputar as eleições do


Diretório Central dos Estudantes da USP. Inicialmente não era um projeto
de direita, era só um projeto antigreve. A gente venceu as eleições, teve
cerca de setecentos votos a mais do que a chapa do Psol, mas houve uma
fraude orquestrada pela maioria dos centros acadêmicos que eram
vinculados ao Psol, em que eles impugnaram algumas urnas importantes
nas quais a gente tinha vencido. A partir da Reconquista eu comecei
uma chapa em 2010 chamada “Liberdade USP”, que era um grupo
político de direita conservadora. [46] Eu comecei a postar textos na
internet, tinha uma série de discussões online, tudo via Orkut. Às vezes
eu publicava documentários do Mídia Sem Máscara, às vezes mandava
ali para um ou outro colega links de blogs. Eu cheguei a ter um blog e
fiz um artigo para o site do Endireita Brasil, que hoje não existe mais.
Eu frequentava várias comunidades no Orkut, como “Sou de direita, e
daí?”, que era uma das maiores, a comunidade “Olavo de Carvalho”
também, e tinha um grupo de zoeira [47] chamado “Marx de cu é Hegel”.
Era muito engraçado esse grupo, eu postava sempre paródias de
marxismo, eu literalmente criava um perfil fake e pensava “hoje eu vou
simular o trotskista”, e fazia lá algum texto trotskista que entrava em
contradição para estimular o pessoal a entender o quão idiota era aquilo.
Aliás nessa época eu conheci Flávio Morgenstern, [48] que foi o criador
dessa página. [49]

Lourival de Souza, que frequentou a Universidade Federal do Maranhão:

O Orkut trouxe a possibilidade de que não apenas os representantes


estudantis pudessem se manifestar sobre alguma coisa, porque o pessoal
só poderia se manifestar se estivesse dentro de um debate, em uma
reunião de Centro [Acadêmico], em uma eleição. Nessa época começa a
se formar uma turminha das antigas em meio às comunidades do Olavo
de Carvalho, comunidade “Liberalismo”. Eu não cheguei a participar da
comunidade “Olavo de Carvalho”, eu acho que eu participei da
comunidade “Liberalismo”, a primeira, eu sou raiz. Mas enfim, no Orkut
eu não discutia tanto política porque eu achava muito enfadonho, como
sou à moda antiga eu preferia nos corredores, olho no olho, falar com o
pessoal. Eu cheguei a participar de uma eleição para DCE e tive êxito, fui
eleito para o DCE em 2010. Tinha uma parte da chapa que era de gente
ligada ao PCdoB, [então fui] mantendo aquela prudência, meio Winston
Churchill, e sabendo que ali dentro eu era minoritário. [50]

E Fernando Fernandes, que se formou na Universidade Federal do Rio de


Janeiro:
Na faculdade a gente formou um grupo de cinco amigos, e uma
característica era muito clara: dos cinco, quatro não eram marxistas.
Logo em seguida, eu conheci o Bernardo [Santoro], o Rodrigo
Constantino, pelos textos na internet conheci o Olavo de Carvalho
também. E aí foi quando a minha visão de mundo se abriu. Eu comecei a
ler alguns textos e a gente discutia entre nós. A gente começava a ler as
bibliografias, não só as que eles indicavam, mas por nossa conta mesmo.
Eu acho que eu comecei a ter contato com isso mais ou menos aí entre
2009 e 2010, que coincidiu também quando eu comecei a ter uma
atuação política dentro da faculdade e eu percebi que havia um discurso
único e a gente começava a confrontar. Você observa que as pessoas não
se sentem representadas e elas passam a se afastar. Então a gente fez
uma chapa, tinha muito apoiador, mas eram cinco pessoas que realmente
tocavam, e é impossível você fazer uma boa disputa eleitoral com cinco
pessoas sem dinheiro. Era engraçado que a gente passava a sacolinha e
era uma dificuldade danada pra você conseguir dinheiro pra fazer um
material preto e branco, aqueles bem chumbregas, e, de repente, você
olhava para o lado e tinha um cara com um material colorido, tiragem
gigante, com adesivo pra caramba. Aí você pensava: “Pô, de onde eles
tiram dinheiro pra isso?”. [51]

Com intuito de fornecer auxílio organizacional e conferir maior


organicidade aos grupos de estudo e chapas estudantis que vinham sendo
formados, Juliano Torres, que havia atuado como primeiro presidente do
Líber, resolveu assumir a presidência de uma organização que havia sido
criada em 2009 por Fábio Ostermann, chamada Estudantes pela Liberdade
(EPL) e inspirada pela organização norte-americana Students for Liberty:
Nas férias de julho de 2008 eu fui para a Freedom University da FEE e
conheci o Alexander McCobin, que era o presidente da Students for
Liberty. Eles tinham acabado de fazer o primeiro encontro nacional deles
e tinha nevado até dizer chega em Nova York, mas mesmo assim eles
conseguiram agregar cinquenta pessoas de vários estados. Daí voltei
para o Brasil, comentei com o pessoal mas a coisa acabou não
evoluindo. Em janeiro de 2012 eu fui participar do primeiro seminário
de verão do Ordem Livre. Nesse seminário os participantes foram
divididos em grupos temáticos, um grupo ia falar sobre formas de
desenvolver o pensamento liberal na academia, outro sobre como
desenvolver na imprensa, outro na política por meio dos partidos
políticos, e outro ativismo estudantil. Eu fui para o grupo de ativismo
estudantil, junto comigo estavam o Juliano Torres e o Pedro Menezes, e
eu falei: “O Estudantes pela Liberdade é uma ideia legal, só que precisa
de gente pra tocar, vocês estão dispostos?”, e o Juliano, que tinha
acabado de sair da presidência do Líber, resolveu liderar a iniciativa e eu
fiquei como presidente do conselho consultivo. Na época eu estava no
final da minha diretoria do IEE e acabei sendo convidado pelo Ordem
Livre pra ser o gerente de operações aqui no Brasil. [52]

Com a fundação do EPL, a circulação de ideias pró-mercado nos meios


universitários se tornou mais institucionalizada. Desde sua fundação, o EPL
realizou 650 eventos em universidades públicas e privadas e criou cerca de
duzentos grupos de estudo. No ano de 2014 já contava com seiscentas
lideranças voluntárias, como Luan Sperandio, Cibele Bastos e Gabriel
Menegale, que passaram a coordenar as atividades da organização em seus
respectivos estados:

Em meados de 2010 eu fui lendo vários livros principalmente do Luiz


Felipe Pondé e depois participei do Fórum Liberdade e Democracia em
Vitória, em 2013. As falas do Rodrigo Constantino e do Paulo Guedes
sobre liberdade econômica fizeram muito sentido pra mim, que já estava
em um processo de me tornar liberal. Nesse evento eu comprei alguns
livros do Instituto Mises Brasil, e comecei a estudar. Em 2014 eu passei
a escrever para o site do Instituto Liberal de forma frequente, e a rede
Estudantes pela Liberdade estava tentando se articular aqui e a gente
acabou criando o Grupo Domingos Martins, que é o maior grupo de
estudos liberais do Espírito Santo. [53]

Em 2012 eu soube que teve um seminário de inverno do Ordem Livre


em Petrópolis e eles criaram uma instituição chamada Estudantes pela
Liberdade. A ideia era criar uma rede de estudantes com núcleos locais e
me convidaram para fazer a coordenação local, e aí eu virei
coordenadora do EPL lá em Fortaleza. [54]

Embora eu fosse um liberal novato, o EPL tinha o objetivo de se espalhar


e o Juliano é um sujeito que escolhe as pessoas certas. Naquela época eu
estava próximo da juventude do DEM mas eu topei participar do EPL e
para mim foi uma experiência muito boa. Eu assumi a coordenação
estadual do EPL, conheci muita gente e minha primeira missão foi
organizar um evento no Rio em abril de 2013. Vieram cinquenta
pessoas, e como eu manjo bastante de criar site, na época nós criamos
também um site do EPL, fizemos o evento no prédio do Millenium, e foi
aí que eu conheci o Juliano Torres presencialmente. [55]

Ao mesmo tempo que Juliano Torres, que havia integrado o Líber, se


tornava uma liderança conhecida entre os ultraliberais por conta de sua
atuação no Estudantes pela Liberdade, Bernardo Santoro, que, assim como
Torres, havia atuado no Líber, passou a se destacar nos circuitos pró-
mercado. Em 2012 Santoro havia se candidatado a vereador pelo Partido
Social Liberal (PSL) na cidade do Rio de Janeiro, angariando 1200 votos. A
despeito de não ter sido eleito, a candidatura chamou atenção e Santoro foi
convidado para fazer parte do Instituto Liberal do Rio de Janeiro:
Em 2012 eu fui convidado pra ser o diretor de Relações Institucionais do
Instituto Liberal do Rio de Janeiro. O IL estava morrendo e eu era um
cara que conhecia todos os institutos e também as tentativas de partidos
liberais em formação, como o Partido Novo, [56] o Partido Federalista, o
Líber, inclusive eu era presidente do Líber na época. Meu primeiro
evento como diretor foi um evento da Fundação Friedrich Naumann. Eu
apresentei um projeto de reestruturação do Instituto Liberal e todo
mundo achou aquilo o máximo mas ninguém deu nenhum centavo.
Depois eu apresentei o mesmo projeto pra empresários locais do Rio de
Janeiro, e para o Rodrigo Constantino, que gostou e conseguiu verba,
então eu larguei o meu emprego, eu era concursado como assessor
jurídico da agência de fomento do estado do Rio de Janeiro, e fui pro
Instituto de vez. [57]

Em 2013, o Instituto Liberal do Rio de Janeiro oficializou a troca de sua


diretoria, que passou de Arthur Chagas Diniz para Bernardo Santoro,
enquanto Rodrigo Constantino ficou responsável pela presidência da
organização. A partir de então, Santoro passou a levar para o Instituto
pessoas que conhecia do Líber, das comunidades do Orkut ou que atuavam
em outras organizações que haviam sido fundadas recentemente, como
Fábio Ostermann, Gabriel Menegale e Cibele Bastos. Ao contrário do que
ocorria com os primeiros think tanks pró-mercado brasileiros, que atuavam
de forma centralizada, as novas organizações criadas a partir de 2006, com
exceção do Instituto Millenium, passaram a operar de modo mais horizontal
e descentralizado. [58] Isso se deu porque, normalmente, eram fruto da
iniciativa de profissionais liberais, pequenos e médios empresários ou
mesmo estudantes universitários, de modo que a maioria não possuía sede
própria, mais de dois funcionários contratados, tampouco grande
financiamento. Assim, a fundação de novos institutos liberais em outras
cidades do país, como São Paulo e Fortaleza, por exemplo, não obedeceu a
um modelo centralizado, mas ocorreu de modo mais autônomo e
espontâneo em comparação com o que havia sido feito nas décadas de 1980
e 1990, como relata Rodrigo Saraiva Marinho:
Os think tanks antes eram centralizados, ou seja, a ideia do Hélio da
estrela-do-mar, que cria outros braços e trabalha independente, é a
grande vantagem do movimento de terceira geração. Quando eu criei o
Instituto Liberal do Nordeste, me chamaram de louco na época, mas é
uma marca forte e consolidada hoje, e foi feito completamente
independente de qualquer grande centro. Antes os ILs eram formados
como se fossem ramificações do IL Rio, e o Donald [Stewart Jr.] era
muito rico, então o pessoal montou casa, estrutura, bancou, publicou, só
que é muito caro manter estruturas, tanto é que o Instituto Liberal do
Nordeste ficava no meu escritório, o Instituto Mises fica dentro do
escritório do Hélio. [59]

Para descrever a atuação da rede formada pelas organizações


contemporâneas, Hélio Beltrão Jr., como ressaltou Marinho, recorre
acertadamente à metáfora da estrela-do-mar. Com altíssima capacidade de
regeneração, a estrela-do-mar pode perder um de seus “braços” e não
apenas reconstituir outro no lugar como o “braço” que foi perdido tem a
capacidade de gerar espontaneamente outra estrela-do-mar. Assim, ao
contrário do que ocorria com a rede de think tanks pró-mercado existente
até a metade dos anos 2000, em que a atuação das organizações era
centralizada em empresários específicos e dependia deles para funcionar,
como bem demonstrou o declínio do Instituto Liberal depois do falecimento
de Donald Stewart Jr., os militantes passaram a se organizar de modo
descentralizado e a se mobilizar sem dispor de grandes recursos iniciais,
apenas fazendo uso intensivo de suas redes na internet e fora dela.
Nessa época, os circuitos formados pelos think tanks, onde circulava a
nova direita em formação, ainda eram perpassados por uma “hegemonia
liberal-libertária”, nas palavras de Rodrigo Neves do Endireita Brasil. Isso
ocorreu porque os conservadores tiveram menos sucesso em se organizar na
sociedade civil em comparação com os jovens defensores do livre mercado,
restringindo-se aos think tanks e organizações pró-mercado, como aponta
Neves:
Eu já cheguei no Fórum da Liberdade com a reputação de ser
conservador, de ser do Endireita Brasil e de ter começado o movimento
conservador na USP. Aquele monte de anarcocapitalistas, libertários, e eu
ali, junto do Marcel van Hattem que também era conservative. O Marcel
se diz liberal, mas ele sempre teve uma pegada conserva, porque ele tem
uma base religiosa forte, embora a atuação dele seja mais pela óptica
econômica liberal. Éramos eu e o Ricardo Salles nadando contra a
corrente, porque essa nova direita brasileira era hegemonicamente
libertária e liberal. O próprio Ricardo se afirmava como direita liberal,
senão ele não conseguia vender o peixe dele. Mas eu me autodeclarei: eu
sou conserva. [60]

No entanto, em breve a “hegemonia libertária-liberal” da nova direita


brasileira em formação passaria a ceder lugar aos conservadores. Se nos
anos 1960 a Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e
Propriedade, mais conhecida como TFP, em conjunto com outras
organizações e grupos conservadores, teve um impacto importante na
sociedade civil mobilizando o discurso anticomunista e apoiando o golpe
civil-militar de 1964, [61] após a redemocratização e o declínio do
comunismo na Europa, tanto lideranças e organizações mais antigas, ligadas
à Igreja católica, como mais recentes, ligadas a igrejas evangélicas,
passaram a voltar suas atenções principalmente para questões relacionadas
às agendas feminista e LGBT+.
O “choque progressista” e a reação conservadora

Durante os governos de Fernando Henrique Cardoso a agenda de direitos


humanos teve avanços, mas ainda estavam longe da agenda proposta pelos
movimentos sociais, especialmente no que diz respeito à legalização do
aborto. Dessa forma, as lideranças e organizações conservadoras
permaneceram em stand-by até a eleição de Lula em 2002. Durante o
primeiro governo do petista, a pauta de direitos humanos despertou poucas
preocupações da maior parte dos conservadores, ainda que avanços nas
demarcações de terras indígenas e quilombolas tivessem irritado grupos
militares e setores do agronegócio. [62] No entanto, a aprovação da Lei
Maria da Penha, que fortaleceu o combate à violência doméstica, proposta
em 2004 e sancionada em 2006, e a proposição de uma legislação sobre a
criminalização da homofobia em 2006 sinalizaram que mudanças
substantivas poderiam estar a caminho.
De fato, ao longo do primeiro mandato de Dilma Rousseff os
conservadores sentiram um verdadeiro “choque progressista”. A despeito da
permanência, ou mesmo do aumento, dos altos índices de violência contra
pessoas LGBT+, negros e mulheres, em um intervalo de apenas quatro anos o
Brasil passou a contar com a legalização da união civil entre pessoas do
mesmo sexo, a garantia de cotas raciais nas universidades, a permissão para
interromper a gravidez em casos de anencefalia fetal [63] e a proibição de
castigos físicos destinados a crianças e adolescentes por pais ou
responsáveis.
Além disso, em 2011, ainda no primeiro ano do mandato de Dilma
Rousseff, foi criada no dia 18 de novembro a Comissão Nacional da
Verdade (CNV), cujo objetivo era realizar uma apuração dos crimes que
foram praticados pelo Estado entre 1946 e 1988, período que abrangia a
ditadura militar. A iniciativa irritou ainda mais determinados setores das
Forças Armadas, já incomodados com o avanço nas demarcações de terra
durante os governos Lula, especialmente considerando a trajetória de
Rousseff, que adicionava uma carga simbólica e emocional ainda maior à
iniciativa. Como bem se sabe, a presidente integrou na juventude o grupo
de guerrilha Vanguarda Armada Revolucionária Palmares (VAR-Palmares),
criado em 1969, que visava a derrubada da ditadura, e que foi dirigido por
um militar desertor, Carlos Lamarca. Na época, em razão de seu
envolvimento com a organização, Rousseff foi presa e torturada pelo
coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, oficial de um órgão de inteligência
e repressão subordinado ao Exército, o Destacamento de Operações de
Informações — Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi).
A criação da Comissão jogou sal em feridas antigas do Exército,
despertando reações de contrariedade, sobretudo entre aqueles que
defendiam o legado da ditadura e seus métodos repressivos, entre os quais
se destacava o então deputado federal Jair Messias Bolsonaro. Apesar de
fazer parte da base governista e ter feito lobby para a indicação de Aldo
Rebelo, do PCdoB, para o Ministério da Defesa, [64] a partir de 2011
Bolsonaro passou a encampar uma ofensiva aberta contra o PT e a esquerda
e a flertar com Olavo de Carvalho e a nova direita emergente.
Capitão reformado do Exército, Bolsonaro iniciou sua carreira política
após ter sido acusado publicamente de planejar explodir uma bomba no
quartel como forma de reivindicar melhores salários para os militares na
época da redemocratização do país. Afastado da ativa, em 1990 Bolsonaro
foi eleito pela primeira vez deputado federal pelo Partido Democrata
Cristão (PDC), apenas dois anos após ter se tornado vereador da cidade do
Rio de Janeiro, com votos oriundos de bases eleitorais na Vila Militar e em
algumas zonas de Resende. Em 1994 concorreu à reeleição com base em
uma plataforma que incluía a melhoria salarial para os militares, o fim da
estabilidade dos servidores públicos, a defesa do controle de natalidade e a
revisão da área concedida aos índios ianomâmis, a qual considerava
absurda. Após se reeleger com 135 mil votos, mais do que o dobro do que
obteve em sua primeira eleição, o político passou a integrar o Partido
Progressista Brasileiro (PPB) em 1995.
Em 1998, Bolsonaro decidiu se candidatar à presidência da Comissão de
Direitos Humanos da Câmara, o que provocou uma enorme polêmica tendo
em vista seus posicionamentos a respeito do tema. Em um artigo publicado
na imprensa, no mesmo mês de sua candidatura, Bolsonaro defendeu a pena
de morte, a prisão perpétua, o regime de trabalhos forçados para
presidiários, a redução da maioridade penal para dezesseis anos e um rígido
controle da natalidade como maneira eficaz de combate à miséria e à
violência. Ao final daquele mesmo ano se reelegeu novamente com 102 mil
votos e desde então o parlamentar continuou a se reeleger com patamares
similares de votação.
Em 1999, em uma entrevista ao programa Câmera Aberta, na Rede
Bandeirantes, o capitão reformado afirmou que o Congresso Nacional
deveria ser fechado e que o então presidente, Fernando Henrique Cardoso,
deveria ser fuzilado. Em 2003, envolveu-se em nova polêmica com uma
deputada do PT, Maria do Rosário, ao afirmar, em público, em meio à
entrevista para uma rede de televisão, em resposta à deputada que, segundo
ele, o teria chamado de estuprador: “Só não te estupro porque você não
merece”. Em 2006, após ter trocado de sigla três vezes, o militar se reelege
pela quarta vez, com 99 mil votos, e em 2010 pela quinta vez, com 102 mil
votos.
Em 2011, após ter feito ataques aos trabalhos da CNV, Bolsonaro se
envolveu em mais um embate. Dessa vez, a controvérsia se deu em torno de
um material contra a homofobia que seria distribuído pelo Ministério da
Educação nas escolas públicas do país. O material, intitulado “Escola sem
homofobia”, era oriundo do programa Brasil sem Homofobia, e fora
formulado originalmente em 2004 em consonância com as diretrizes da
Secretaria de Direitos Humanos. A fim de chamar a atenção para a
distribuição do material, Bolsonaro apelidou-o de “kit gay” e passou a
distribuir panfletos nas escolas do Rio de Janeiro alegando que o Ministério
da Educação e grupos LGBT+ “incentivam o homossexualismo” e “tornam
nossos filhos presas fáceis para pedófilos”.
A disputa instaurada em torno do material contra a homofobia, que fez
com que o governo recuasse e barrasse a distribuição do material, ocorreu
exatamente no mesmo mês em que o Supremo Tribunal Federal (STF)
declarou que a união civil entre pessoas do mesmo sexo era legal no país.
Passado um mês do julgamento, a comunidade LGBT+ mostrou seu potencial
de mobilização durante a Parada do Orgulho Gay de São Paulo, que ocorre
desde 1997, ao reunir na avenida Paulista, no dia 26 de junho de 2011, o
que teria sido o maior número de participantes de sua história de acordo
com a organização do evento.
No ano seguinte, o filho mais velho de Jair Bolsonaro, Flávio Bolsonaro,
então deputado estadual do Rio de Janeiro, participou de uma live com
Olavo de Carvalho [65] na qual ambos afirmaram que uma reação
institucional não seria suficiente para combater os avanços do que
entendiam ser uma hegemonia esquerdista no país:

Flávio Bolsonaro: Essas manifestações hoje em dia são a decadência do


ser humano. Recentemente, a televisão mostrou na sua intimidade como
é a parada gay de São Paulo, é assustador, é sexo explícito a céu aberto.
Olavo de Carvalho: Por que eles fazem isso? Eles podiam ter defendido
a causa deles de uma maneira discreta, tranquila, mostrando os gays
como pessoas bem-comportadas, por que eles não fizeram isso? Por que
eles escolheram o contrário? Escolheram o escândalo? A
esculhambação? O liberou-geral, o carnavalesco? Porque eles sabem que
isso vai chocar o pessoal religioso e evangélico, e esses caras vão ter
uma reação emocional, vão investir contra o homossexualismo. Daí o
que eles fazem? “Tá vendo, homofobia!” Eles usam isso como prova de
homofobia, e os evangélicos e católicos caem no engodo. Ficam numa
cruzada contra o homossexualismo. E eu digo: isso é besteira, meu filho,
o homossexualismo existe desde a queda de Adão, e vocês não vão
acabar, o que nós temos que lutar é contra essa legislação gayzista e não
botar em questão o homossexualismo em si. Isso é bobagem. Inclusive
porque tem um site maravilhoso que chama Gays de Direita, eles
denunciam toda essa coisa de que existe perseguição homofóbica, então
essas pessoas estão do nosso lado, e acredito que a maior parte dos gays
estaria do nosso lado a hora que eles entendessem a mentira constitutiva
desse movimento e as ambições absolutamente psicóticas dessa gente.

Apesar de criticarem comportamentos e performances chocantes realizados


por grupos LGBT+, ambos também apontam a importância de utilizar, de
forma consciente, a política do choque como uma estratégia contra-
hegemônica radical. Em seu entendimento, seria preciso chamar a atenção
para o que percebiam como uma ameaça iminente à manifestação de
determinadas visões de mundo e modos de vida que, segundo Flávio
Bolsonaro, não gozariam de espaço suficiente no debate público tradicional:

Flávio Bolsonaro: Eu que penso de uma forma contrária, não tenho


espaço nenhum, espaço nenhum na imprensa, é aí que fica a explicação
do que muitas pessoas nos criticam, e certamente o criticam também,
Olavo, pela forma como coloca algumas discussões. Porque é preciso
criar o fato, chamar a atenção, chocar sobre determinados assuntos
para que isso tenha espaço na imprensa e a população como um todo
tenha acesso a essa discussão. A maior prova disso é o famoso kit gay.
Se não fosse uma atuação mais ostensiva do deputado Jair Bolsonaro,
[…] nós jamais saberíamos que havia esse incentivo à sexualidade, seja
para o lado homossexual ou pro lado heterossexual, Olavo, para crianças
de seis anos de idade.
Olavo de Carvalho: Eles querem fazer clientela para os pedófilos, quem
é que não percebe isso aí? (grifo meu)

Condizente com a percepção do filho, Jair Bolsonaro nessa época


concentrava seus discursos no plenário em pautas morais e ataques ao PT e à
esquerda. [66] Em moldes similares ao que propunha Olavo de Carvalho, o
capitão reformado procurava chamar a atenção para o avanço da esquerda
na América Latina e criar polêmica em torno de iniciativas relacionadas ao
que passou a ser compreendido como parte da difusão de uma “ideologia de
gênero”. Isso ocorreu porque a expressão, utilizada em discursos da Igreja
católica desde os anos 1990, em meio aos avanços institucionais e maior
exposição de pessoas LGBT+ na mídia e nas redes sociais, passou a ser
livremente interpretada por segmentos conservadores mais amplos da
população como a defesa de que crianças possam ter liberdade para
escolher o próprio sexo e a orientação sexual. [67]
Contudo, em sua acepção original, a ideia de “ideologia de gênero”
visava responder principalmente ao movimento feminista, sobretudo no que
diz respeito aos avanços dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres,
os quais passaram a causar certa polêmica nos espaços da nova direita em
formação. Em meio ao embate que passara a ser travado na sociedade civil
em torno da questão do aborto, aqueles que eram contra a legalização da
prática começaram a se manifestar de forma mais ostensiva e a fortalecer o
campo conservador que circulava nas organizações e institutos que
promoviam a lógica de livre mercado. É o que relata José Carlos Sepúlveda,
membro do IPCO, herdeiro da antiga TFP, e assessor de Bertrand Maria José
de Orleans e Bragança, descendente de dom Pedro II e um dos líderes do
movimento monarquista brasileiro:

Claro que as pessoas que dirigiam os movimentos liberais defendiam os


ideais liberais, mas havia muita gente que estava ali dentro como
refúgio, mas que não era propriamente liberal. As bordas amplas do
movimento liberal que são conservadoras. Por exemplo, o problema do
aborto para um liberal coerente, deve ser livre, só que isso não foi aceito
pelo movimento liberal no Nordeste e esse ponto ficou definido: “Nós
não podemos defender, a vida é sagrada”, e isso é uma posição
conservadora. Isso é uma coisa que eu batalho muito, mesmo com
pessoas conservadoras, as pessoas olham pouco para as mentalidades e
olham muito para os rótulos. Dentro do movimento liberal eles
acabaram recolhendo muita gente conservadora, alguns acabaram
rompendo, outros continuaram lá dentro, mas com ideias que tendiam
mais para o conservadorismo. É uma coisa que o dr. Plinio [Corrêa de
Oliveira] sempre defendeu nos livros dele: uma mulher simples, que não
tem formação acadêmica, provavelmente tem ideias conservadoras, mas
ela nem sabe o que é um movimento conservador, nem sabe o que é um
movimento liberal nem nada, mas a mentalidade dela é conservadora.
[68]

O IPCO, organização da qual faz parte José Carlos Sepúlveda, compõe o arco
de lideranças, movimentos e organizações antiaborto que atuam no país
desde a redemocratização, momento em que as feministas passaram a
advogar institucionalmente pela descriminalização da prática, tornando-se
as principais adversárias dos ativistas antiaborto. Desde então a legalização
do aborto começou a avançar lentamente a partir do governo de Fernando
Henrique Cardoso, primeiro presidente ateu do país, cuja esposa, a
antropóloga Ruth Cardoso, já havia dado declarações favoráveis nesse
sentido. Durante o governo do sociólogo, no ano de 1998, foi editada uma
norma técnica por José Serra, então ministro da Saúde, para que as
mulheres que tivessem interrompido a gestação de acordo com os casos já
previstos na lei brasileira pudessem ter acesso a assistência médica pelo
SUS. Porém, como o PSDB havia feito uma aliança com setores políticos
conservadores, para além da ação promovida por Serra, não deu mais
nenhum indicativo de que pudesse legalizar o aborto ou encaminhar outras
medidas correlatas.
Durante seu primeiro governo, Lula também avançou pouco nesse
sentido, porém, em meio ao seu segundo mandato (2007-10), no ano de
2009 foi decretada a terceira edição do Programa Nacional de Direitos
Humanos (PNDH 3). O Programa, que contém objetivos como “considerar o
aborto como tema de saúde pública, com a garantia do acesso aos serviços
de saúde”, “apoiar projeto de lei que disponha sobre a união civil entre
pessoas do mesmo sexo”, “promover ações voltadas à garantia do direito de
adoção por casais homoafetivos”, logo foi interpretado pelos ativistas
antiaborto como um avanço contra o que classificam como “cultura da
vida”, e recebeu fortes ataques por parte de parlamentares, juristas e demais
militantes contrários à legalização da prática. De acordo com o
entendimento dos ativistas antiaborto, a “cultura da vida” diz respeito à
manutenção de uma ordem conservadora que extravasa a questão do aborto
em si e diz respeito à defesa de um modo de vida tradicional que consiste
em se posicionar contrariamente ao uso de métodos contraceptivos, ao uso
de células-tronco para pesquisa, à legalização da prática da eutanásia, aos
avanços dos direitos das mulheres e da população LGBT+, entre outras
pautas relacionadas, caracterizadas como pertencentes a uma “cultura da
morte”. Para enfrentá-la, os militantes se organizam em uma ampla coalizão
política que não se reduz à atuação de lideranças cristãs conservadoras,
sejam estas evangélicas ou católicas, afinal, também atuam na defesa de
uma moralidade tradicional pessoas que não são cristãs nem mesmo são
religiosas. Desse modo, a atuação política de cristãos conservadores não é a
causa nem a resultante da reação conservadora que passaria a ganhar maior
força a partir de 2011, ainda que seja constituinte e constituída por esta,
como bem apontou o sociólogo Ronaldo Almeida.
Um embate crítico nesse sentido ocorreu durante o período das eleições
presidenciais em 2010, momento em que a pauta do aborto se tornou central
no debate eleitoral e as principais candidaturas à presidência da República
optaram por não se posicionar a favor da legalização. No entanto, se
integrantes da política institucional não se dispuseram a enfrentar a disputa
e avançar na legalização da prática, após as eleições, o surgimento de um
novo ativismo feminista, em 2011, deu início a um período de ofensiva
aberta por parte de lideranças e ativistas antiaborto à medida que protestos
relacionados à Marcha das Vadias pipocaram em todo o território nacional,
integrando o início de um novo ciclo de protestos no país que desaguariam
nas manifestações de junho de 2013 e, posteriormente, em uma crise
política que se aprofundaria nos anos subsequentes.
O ciclo de protestos e a crise política

O ano de 2011 inaugurou um novo ciclo de protestos no país em meio ao


qual forças políticas e demandas das mais diversas passaram a se expressar
nas ruas. Nessa época, os militantes da nova direita em formação já tinham
alguma experiência com demonstrações públicas como o “Dia da Liberdade
de Impostos”, durante o qual é vendida gasolina livre de impostos, atos para
marcar os recordes do “Impostômetro”, entre outros. [69] Em meio à
profusão de protestos que tiveram lugar nessa época, alguns ultraliberais
chegaram a participar de manifestações mais amplas, como a Marcha da
Maconha/Liberdade que ocorreu em 2011 em São Paulo, enquanto outros
antigos frequentadores das comunidades do Orkut, que já haviam começado
a migrar para o Facebook, optaram por integrar manifestações contra a
corrupção, em que tomaram parte pessoas que se localizavam tanto à
esquerda como à direita.
Em 2011, quatro anos após uma primeira iniciativa lançada em Porto
Alegre, [70] em paralelo às comemorações do Sete de Setembro, foram
chamadas pelo Facebook manifestações apartidárias contra a corrupção em
34 cidades, distribuídas em dezessete estados, e que tiveram cerca de 26 mil
confirmações na rede social. Os protestos, convocados sob o título de “II
Marcha contra a Corrupção e a Impunidade”, organizados pelo Movimento
contra a Corrupção Eleitoral (MCCE), ligado à Conferência Nacional dos
Bispos do Brasil (CNBB), [71] e apoiados pela Ordem dos Advogados do
Brasil (OAB), reuniram milhares de manifestantes, entre os quais se
destacavam pessoas vestidas de preto e portando a bandeira do Brasil, com
as faces pintadas de verde e amarelo, de forma similar ao que pôde ser
observado na manifestação realizada pelo movimento Cansei em 2007,
também apoiada pela OAB de São Paulo. Em 2011, porém, as reivindicações
eram mais difusas.
Em Brasília, por exemplo, a marcha reuniu cerca de 25 mil
manifestantes que protestaram contra a absolvição da deputada Jaqueline
Roriz (PMN-DF); o voto secreto no Congresso; os escândalos de corrupção
no governo da presidente Dilma Rousseff; pela aplicação da Lei da Ficha
Limpa e contra o presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF),
Ricardo Teixeira. [72] Já no Rio de Janeiro, com apoio de ONGs como Rio de
Paz e Greenpeace, a passeata tomou a orla de Copacabana aglutinando
cerca de 2 mil pessoas, várias das quais vestindo preto e carregando
vassouras verde-amarelas, fazendo alusão à faxina no setor público.
Inclusive, aqui é importante lembrar da expressão “faxina ética” utilizada
para se referir à “faxina” ministerial realizada por Dilma Rousseff em 2011,
e que, de acordo com o cientista político André Singer, foi recebida com
aprovação pelas classes médias na época. O tema da limpeza também
aparecia no nome do projeto Ficha Limpa no STF, apoiado pelos
manifestantes, que também demandavam a transformação da corrupção em
crime hediondo. Porém, outras pautas também eram sugeridas, como
exemplifica a manifestação realizada em São Paulo, na qual 2 mil pessoas
protestaram na avenida Paulista com os rostos pintados e munidas de
bandeiras do Brasil pedindo para que 10% do PIB fosse investido em
educação. [73]
Já em 2012, os protestos contra a corrupção convocados pela internet
ocorreram em várias capitais brasileiras em outro feriado cívico, 21 de abril,
Dia de Tiradentes. Os manifestantes demandaram o fim do foro privilegiado
para parlamentares; a reversão de aumentos de salários de vereadores; a
obrigatoriedade de ficha limpa para candidatos a cargos eletivos; mais
recursos para a educação; e a saída de políticos locais. As manifestações
reuniram uma média de 2 mil pessoas em cada cidade, e novamente o preto
e as cores da bandeira nacional foram utilizados. No entanto, ao contrário
do que vinha ocorrendo desde 2007, em São Paulo houve um confronto
entre os manifestantes e a polícia, que jogou bombas de efeito moral para
dispersar as pessoas que protestavam na avenida Paulista. [74]
Assim como ocorreu em 2011, o foco principal dos atos que foram
realizados em abril de 2012 não era o repúdio aberto ao PT ou a Lula, ainda
que a pauta da condenação dos “mensaleiros” estivesse presente. [75]
Naquela época a indignação contra a corrupção expressa pela maior parte
dos manifestantes aparecia invariavelmente conjugada ao mau uso do
dinheiro público e à demanda de que uma fatia maior do orçamento fosse
destinada para a educação. No entanto, o tom mais propositivo e menos
alarmista das manifestações iria começar a mudar a partir de agosto do
mesmo ano, quando teve início o julgamento do escândalo do mensalão no
STF e frustrações antigas com o PT começaram a vir à tona com mais força.
Em maio de 2006, auge do Orkut e um ano após a eclosão do mensalão,
a comunidade “Fora Lula 2006” contava com 110 mil membros e a
comunidade “Eu odeio o PT”, 93 mil; já a comunidade de apoio a Lula da
Silva, chamada “Lula presidente 2006”, e a comunidade oficial do PT
reuniam, respectivamente, cerca de 30 mil e 12 mil pessoas. Passados seis
anos, porém, o Facebook já havia se tornado a rede social mais popular do
país, e vários administradores de comunidades no antigo Orkut se mudaram
para a nova rede junto com antigos usuários. Alguns deles, como registrou a
cientista política Fanny Vrydagh, resolveram se unir meses antes das
eleições presidenciais de 2010 para criar uma nova página, chamada
Revoltados Online, para onde teriam migrado muitos dos antipetistas do
Orkut. A página era coordenada por Marcello Reis, empresário paulistano e
entusiasta do regime militar.
Neto de militares, o empresário foi criado pelo marido de sua prima, um
metalúrgico espanhol antigrevista que reclamava das paralisações
conduzidas por Lula na década de 1980, chamando-o de “sapo barbudo” e
“vagabundo”, epítetos que o empresário utilizava desde a infância para se
referir ao ex-presidente. [76] De acordo com o depoimento do empresário a
Vrydagh, quando a página foi criada no Orkut era possível reclamar de
temas diversos, porém, ao longo dos anos teria ficado nítido que o tema da
corrupção era o que gerava mais engajamento entre os então mais de 50 mil
seguidores. A despeito disso, segundo o empresário, que participou de
protestos contra a corrupção em São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro entre
2011 e 2012, não foi possível unir os diversos grupos que se mobilizavam
nas ruas, pois existiam aqueles que eram favoráveis ao PT ou que não
partilhavam do antipetismo de Reis.
De qualquer forma, no mesmo período em que a página Revoltados
Online foi criada, outras iniciativas similares foram levadas a cabo. Carla
Zambelli, por exemplo, que atuava então como profissional liberal, passou a
integrar em julho de 2011 o coletivo NasRuas. Em abril de 2012, o
NasRuas apoiou Marcello Reis em um protesto contra a doação de terrenos
públicos pelo prefeito Gilberto Kassab (PSD) ao Instituto Lula, [77] o que fez
com que o empresário se tornasse mais popular na internet e passasse a
organizar pequenos protestos no vão livre do Masp contra Lula e o PT.
Assim, quando o ano de 2013 teve início já havia um certo clima de
descontentamento no ar. E, ainda que as pesquisas de opinião pública
revelassem que o índice de preocupação com a corrupção na época oscilava
em torno de 5%, [78] tal índice iria aumentar progressivamente após a
irrupção das manifestações de junho.
Iniciadas por atos organizados pelo Movimento Passe Livre (MPL), que
já havia realizado protestos similares em diversas localidades no país, as
manifestações se alastraram Brasil afora. Logo os protestos se difundiram e
milhões de pessoas passaram a se reunir nas ruas em torno de pautas das
mais diversas, porém o que havia em comum entre os manifestantes era a
rejeição a um sistema político desconectado das demandas oriundas da
sociedade civil. Isso teria desencadeado, nas palavras do filósofo Marcos
Nobre, um “choque de democracia” seguido de uma crise política causada
pela inabilidade dos políticos de turno em responder aos protestos.
Entre as muitas pessoas e grupos que resolveram sair às ruas estavam
justamente os militantes ultraliberais, mobilizados, sobretudo, em torno do
Líber, como relembra Joel Pinheiro da Fonseca, que esteve presente nos
atos:
Em 2013 a gente conseguiu organizar, durante as passeatas de junho,
uma manifestação libertária também. Enquanto a passeata estava
passando pela Paulista, a gente estava concentrado no vão do Masp. A
passeata grande começou pela questão da tarifa do transporte público e a
gente defendia a liberdade de concorrência e de competição dentro do
transporte público, inclusive de carros, antes de existir o Uber, a ideia já
existia ali, sem nenhum aplicativo. Esse foi um momento muito rico, um
momento que teve um grande otimismo com o projeto do Líber, foi um
período muito legal, eu gostei de ter me dedicado àquilo. [79]

Além dos ultraliberais, Marcello Reis também marcou presença nas


manifestações de junho. No entanto, sua atuação nos protestos desencadeou
conflitos mais intensos. Meses antes, em abril de 2013, ele havia organizado
um pequeno protesto com duas dezenas de pessoas em que se exibia uma
faixa que dizia: “Lula, o câncer do Brasil. Investigação do chefe da
quadrilha”, porém, em junho, a mesma faixa acabou motivando
comportamentos violentos quando foi exposta em meio a outros grupos que
também protestavam na avenida Paulista. Sem dúvida, Reis se utilizava da
mesma política de choque das comunidades do Orkut ao expressar sua
inconformidade com a corrupção na política e com o PT.
Foi justamente em meio às manifestações de junho de 2013 que
discursos que mobilizavam conjuntamente os temas da anticorrupção e do
antipetismo passaram a se tornar centrais no processo de formação da nova
direita, e, nesse sentido, a atuação dos Revoltados Online merece destaque.
Porém, naquele momento, os ultraliberais reunidos em torno do Líber e os
seguidores de Marcello Reis ainda não se misturavam. Enquanto os
primeiros estavam mais preocupados em difundir a ideia de que os
problemas do país poderiam ser resolvidos com a adoção de um radicalismo
de mercado, Reis demandava uma solução drástica, análoga à defendida
pelo jornalista policial Alborghetti em 2006: uma intervenção do Exército
“para lavar todos os políticos corruptos e comunistas que ocupam o
Congresso”, nas palavras de um membro da página Revoltados Online em
novembro de 2015 em entrevista a Fanny Vrydagh. Tais diferenças entre
ultraliberais e intervencionistas como Reis remontavam, inclusive, a
encontros anteriores nas ruas, como aponta Filipe Celeti, que atuou como
coordenador do Líber em São Paulo:
Quando estava no auge a discussão de revisitar a história da ditadura a
gente fez uma marcha, mas acabou aparecendo um povo nada a ver, uns
integralistas doidos, uns fascistões, skinheads perdidos, que começaram
a falar um monte de groselha no megafone. Aí uma hora eu peguei o
megafone e falei uns lances contra os caras também e eles acabaram
indo embora. [80]

Apesar de tais tensões, as manifestações de junho renderam uma iniciativa


que veio a ser de grande importância tempos depois. Com o intuito de
coordenar melhor a participação nos protestos, surgiu a ideia de reunir a
militância em um movimento mais amplo, sem as limitações das
organizações criadas até então. Foi o começo do MBL. Fábio Ostermann
relata:

Eu estava discutindo com o Juliano Torres a ideia de criar um


movimento focado exclusivamente em ativismo e juntar pessoas que
apoiam a causa da liberdade para mobilizar, fazer protestos, petições,
manifestações, esse tipo de coisa que a mídia gosta e que teria uma
possibilidade de alavancar ideias liberais. Tinha visto muito liberal por
aí a fim de fazer alguma coisa, mas o Ordem Livre e o Estudantes pela
Liberdade não poderiam fazer isso, pois não era seu foco, nem de outras
instituições liberais como o Líber, que era um partido em formação na
época e não devia se meter também para evitar acusações de
partidarização. Tinha gente querendo participar e a gente precisava
encontrar uma maneira de canalizar esse entusiasmo, a gente passou a
tocar isso a partir de 16 e 17 de junho de 2013. [81]

Por meio do então incipiente MBL, os ultraliberais conseguiram se organizar


melhor para participar das várias manifestações que ocorreram naquele mês
em todo o território nacional. Ao fim do ano, porém, a página do
movimento no Facebook, que contava então com cerca de 20 mil curtidas,
acabou sendo abandonada por seus fundadores, que passaram a dedicar seu
tempo a outras atividades. Fábio Ostermann, por exemplo, passou a se
engajar na campanha do político e amigo pessoal Marcel van Hattem [82]
para deputado estadual pelo Rio Grande do Sul, e Juliano Torres voltou suas
atenções para as atividades do Estudantes pela Liberdade.
A despeito da interrupção temporária das atividades do MBL, as
manifestações de junho de 2013 certamente tiveram um papel formativo
para jovens que eram de direita ou passaram a se perceber como tal. Afinal,
antes disso, os atos de rua organizados pela militância da nova direita em
formação eram pequenos, dado que, desde a redemocratização, os
movimentos de massa no Brasil costumavam ser liderados pela esquerda.
Assim, não era algo incomum que até então ativistas da nova direita se
aventurassem em manifestações de esquerda para aprender como eram
organizadas, como me relatou uma militante da nova direita, Patrícia
Bueno, que, em meio a suas “incursões em campo”, teria até mesmo
recebido um abraço de Lula durante um ato petista. Desse modo, ainda que
não seja possível dizer que o saldo das manifestações de junho tenha sido
maior à esquerda ou à direita, certamente após 2013 ficou claro para a nova
direita emergente que, a partir daquele momento, seria possível reunir um
número grande de pessoas nas ruas para protestar por pautas que não
fossem de esquerda. Tal avaliação se confirmaria um ano depois, após a
reeleição de Dilma Rousseff, que sem dúvida foi a oportunidade política
crucial para a consolidação da nova força política.
Em 2014, Dilma Rousseff, que meses antes de junho de 2013 era bem
avaliada por cerca de dois terços dos brasileiros, amargava uma queda
abrupta da popularidade. [83] Além disso, a corrupção passou a ser
percebida como um dos principais problemas do país, e, no Facebook,
acessado por 89 milhões de brasileiros, ou seja, 80,9% dos 110 milhões de
brasileiros que utilizavam a internet então, as páginas que circulavam
discursos antipetistas e as teses defendidas por Olavo de Carvalho, entre as
quais figuravam páginas de políticos tucanos e ligadas a Jair Bolsonaro, já
apelidado como “Bolsomito”, alcançavam dezenas de milhões de pessoas.
[84]Dessa forma, é possível dizer que naquele ano a crise do lulismo já se
avizinhava à medida que grupos de esquerda foram se afastando do
combate à corrupção nas ruas e nas redes, abrindo uma avenida para forças
antipetistas se apropriarem completamente da pauta e para que a nova
direita em formação entrasse em modo de combate. Nesse sentido, é
possível destacar o papel desempenhado pela campanha do empresário
Paulo Batista a deputado estadual em São Paulo, o herói do “Raio
Privatizador”.
Ainda que alguns raros candidatos ultraliberais tenham se lançado em
anos anteriores, [85] foi a campanha do Raio Privatizador que conseguiu
unificar em um mesmo projeto toda a militância ultraliberal, boa parte da
qual já havia se envolvido com a criação do Líber. O herói da campanha,
Paulo Batista, é um pequeno empresário do ramo imobiliário que atuou
durante dez anos como diácono de uma igreja local e cujo pai havia sido
vereador na cidade de Valinhos, no interior do estado de São Paulo.
Inspirado pela experiência política do pai, Batista, que passou a se
considerar liberal por volta de 2006 a partir de leituras feitas durante um
curso superior de marketing, decidiu se candidatar sem nenhum auxílio de
entidades religiosas com cujas práticas políticas não concordasse. Logo
encontrou refúgio no Partido Republicano Progressista (PRP), sigla que lhe
oferecia a possibilidade de se candidatar de forma independente.
Assim, foi a partir dos esforços de campanha iniciados no ano de 2012,
em um escritório de advocacia da cidade de Vinhedo, a sete quilômetros de
distância de Valinhos, que Batista entrou em contato com militantes
organizados em um movimento em formação chamado Renovação Liberal.
O movimento era integrado por vários membros do Líber e capitaneado por
Renan Santos, que havia atuado no movimento estudantil da Faculdade de
Direito da USP e participado ativamente das manifestações que ocorreram
em julho de 2013 contra a PEC 37, que restringiria o poder de investigação
do Ministério Público. [86] Santos apresentou Batista ao seu irmão
Alexandre Santos, dono de uma produtora de vídeo paulistana chamada
ANC, e a Marcelo Faria, que havia conhecido durante junho de 2013 e que
em 2014 fundou e passou a presidir o Instituto Liberal de São Paulo.
A partir da produtora de vídeo de Alexandre Santos e das ideias dos
militantes que se engajaram na campanha de Batista, como Fábio
Ostermann, que passou a acompanhar o grupo em 2014, foi criada uma
campanha digital em que Paulo Batista aparecia em vídeos curtos como um
super-herói ultraliberal que lançava raios “privatizadores” em cidades
comunistas transformando-as em cidades superdesenvolvidas:

Em 2014 eu estava com foco na campanha do Marcel van Hattem. O


pessoal que estava coordenando a campanha do Paulo Batista me
encontrou pela internet e eu acabei conhecendo eles aqui em São Paulo.
Era um pessoal que tinha uma produtora de vídeos, uma inclinação aos
valores liberais, e me chamaram para dar uma palestra em um evento
deles. Dei algumas dicas sobre a campanha do Paulo Batista, mas eles
estavam com pouquíssimos recursos, era um startup de campanha, e eles
resolveram fazer uma campanha inovadora para tentar fazer um case. A
gente teve uma conexão de visão em relação à necessidade de se fazer
comunicação política de uma forma inovadora, diferente, mais
iconoclasta. [87]

A candidatura de Batista, apesar de ser oficialmente abrigada pelo PRP, era


tida por seus organizadores como pertencendo ao Líber, e foi assim que
logo se tornou amplamente conhecida entre os ultraliberais, como lembra
Paulo Batista:

O grupo era o Líber, que ficou responsável pela parte de ideias,


liberalismo, libertarianismo; Paulo Batista, Rubens [Nunes] e Jeferson,
com a estratégia, e o Renan foi buscar ajuda do irmão para a parte
midiática. Ele disse: “Olha, o meu irmão, o Alexandre, tem uma
produtora, a ANC, que tal a gente juntar o escritório do Rubens, o Líber, o
Marcelo [Faria] e a ANC?”. Foi perfeito. Eu saí pelo Partido Republicano
mas utilizei o logo e o broche do Líber. O Líber teve um candidato, foi o
Paulo Batista. E aí fizemos um vídeo de trinta segundos que viralizou,
nós tivemos mais de 1 milhão de acessos em três dias, e do dia para a
noite eu virei uma celebridade. Essa foi a campanha com que os liberais
surgiram no contexto da política brasileira: eu, Marcel van Hattem,
Adolfo Sachsida, Paulo Eduardo Martins, nós fomos a vanguarda do
negócio. O Rodrigo Saraiva Marinho, do Instituto Liberal do Nordeste,
ajudou, Hélio Beltrão, do Instituto Mises, ajudou. O raio privatizador se
tornou um projeto dos liberais, era uma voz em oposição a tudo que
estava acontecendo. [88]

Além dos vídeos, os militantes unidos na campanha do Raio Privatizador


passaram a fazer vários protestos e demonstrações públicas na cidade de
São Paulo, a partir dos quais outras pessoas e grupos se aproximavam.
Conforme relata Batista:

O primeiro ato que nós fizemos foi um protesto na porta da Venezuela.


Nós levamos um caminhão de pallets de papel higiênico, na frente da
embaixada, e fizemos um protesto lá, contra a Venezuela. Apareceu a
polícia, a Folha de S.Paulo, e uma galera de um partido chamado Novo,
que era tão novo que eu não conhecia, eles disseram: “A gente ama o
seu trabalho”, e depois eu ajudei a pegar mais de trezentas assinaturas
para ajudá-los a formalizar o partido. A campanha era uma aventura por
dia! Eu fui confrontar o pessoal do PSTU [Partido Socialista dos
Trabalhadores Unificado] e PCO [Partido da Causa Operária] ali no
centro da cidade, com megafone, e quase apanhei. Eu entrei dentro do
comitê principal do PT, e do PCdoB, para levar uma carta para eles
fornecerem papel higiênico para a Venezuela. Nós levamos um bote na
porta do consulado de Cuba. Eu ia pular com um paraquedas preto e
amarelo, a cor do anarcocapitalismo, na USP, mas no dia, graças a Deus,
choveu. Várias pessoas contribuíram com essas ideias, a da USP foi do
Renan, da Venezuela foi do Marcelo do Instituto Liberal de São Paulo, a
ideia de Cuba foi o pessoal do Líber. [89]

Apesar de ter despontado como um fenômeno da internet e ter sido


entrevistado no talk show do humorista Danilo Gentili transmitido pelo SBT,
ao contrário de Marcel van Hattem, que recebeu 35 mil votos e se tornou
suplente e depois deputado estadual, Batista recebeu 16 800 votos e não foi
eleito. No entanto sua campanha conseguiu agregar boa parte da militância
ultraliberal em atividade no país, a qual, para derrotar a candidatura de
Dilma Rousseff, somou esforços com outros grupos, como o Vem Pra Rua,
criado por empresários e profissionais liberais em setembro de 2014. [90]
Havia, no entanto, divergências entre os grupos. Enquanto os membros do
Vem Pra Rua possuíam uma identificação maior com a candidatura tucana,
o apoio dos ultraliberais era totalmente pragmático e tinha apenas a
finalidade de evitar que Rousseff se reelegesse, e, finalmente, os Revoltados
Online teriam optado por não participar das manifestações contra a
reeleição da petista por considerar que tucanos e petistas seriam “farinha do
mesmo saco”.
A derrota de Dilma Rousseff era dada como certa pela oposição, tendo
em vista que a divulgação das denúncias oriundas da Operação Lava Jato,
iniciada em março de 2014, atingiu em cheio o PT, cuja imagem já estava
muito desgastada pelo julgamento do mensalão. Desse modo, a quebra de
expectativas que ocorreu com o anúncio da vitória da petista foi de tal
monta que logo se levantou a suspeita de que a eleição poderia ter sido
fraudada. A hipótese foi ventilada pelo candidato perdedor, cujo partido
requisitou uma auditoria ao Tribunal Superior Eleitoral para verificar a
lisura do pleito, alimentando reações inflamadas entre antipetistas mais
ferrenhos e criando um clima propício para quem quisesse protestar contra a
situação de alguma forma.
Sem hesitar, o núcleo duro do grupo organizado em torno de Paulo
Batista, acostumado a promover protestos e demonstrações de tom mais
agressivo contra a esquerda, [91] aproveitou a ocasião para chamar uma
manifestação pelo impeachment da presidente reeleita, passados apenas seis
dias de sua vitória. O protesto marcado para o dia 1o de novembro foi
convocado a partir da página de Facebook de Paulo Batista, teve 100 mil
confirmações online e recebeu apoio de Olavo de Carvalho. No entanto, na
época, a pauta do impeachment, a despeito de circular nas hostes
legislativas como uma ameaça implícita à presidente, era percebida como
sendo muito radical e contraproducente por adversários do PT [92] e pelas
lideranças do Vem Pra Rua, Rogerio Chequer e Colin Butterfield. Estes
viam com maus olhos a manifestação convocada por Paulo Batista, uma vez
que consideravam que o ato contra a presidente recém-eleita poderia pôr a
perder o acúmulo político que haviam conquistado nas ruas até então. [93]
Não obstante, o primeiro protesto, que marcou o início da Campanha Pró-
Impeachment, reuniu, de acordo com a imprensa, cerca de 2500 pessoas
munidas de bandeiras do Brasil e cartazes com dizeres como “Fora PT”,
“Fora Dilma” e “Fora corruptos”. Estavam presentes também outros grupos
e movimentos que, a princípio, não faziam parte das redes da militância
ultraliberal, como grupos intervencionistas e membros do grupo liderado
por Marcello Reis, o Revoltados Online. Reis teria sido responsável por
levar um caminhão elétrico e reivindicava a organização da manifestação,
mas foi vaiado pelos manifestantes ao propor uma intervenção militar, o
que fez com que ele passasse a concentrar seus discursos em público na
deposição de Rousseff. Foi assim que, pela primeira vez, os ultraliberais, os
Revoltados Online e figuras icônicas como Eduardo Bolsonaro e Olavo de
Carvalho se uniram em torno de pautas em comum, um marco no processo
de consolidação da nova direita.
No dia 15 de novembro teve lugar uma segunda manifestação na
avenida Paulista, convocada pelos Revoltados Online. Em face da repetição
do protesto, a militância organizada em torno da campanha do “Raio
Privatizador” decidiu ressuscitar o Movimento Brasil Livre criado por
Fábio Ostermann durante as manifestações de junho de 2013. O MBL
substituiria a Renovação Liberal de Renan Santos, cujo nome “não havia
colado”. Paulo Batista relata:
Nesse momento já havia sido decidido que o nome “Renova” não ia
colar. Então entre o dia 1o e o dia 15 de novembro, que foi a segunda
manifestação pelo impeachment da Dilma, decidiram usar o nome
Movimento Brasil Livre, que era o movimento do Fábio. O Fábio ligou e
falou: “Olha, gente, já temos um movimento, está tudo montadinho e é
um nome bem facinho: Movimento Brasil Livre”, “Pô, legal”. Todo
mundo topou, então na segunda manifestação nós fomos já pra rua como
Movimento Brasil Livre. [94]

Se o primeiro protesto não havia contado com a presença de políticos, com


exceção do deputado federal Eduardo Bolsonaro, o segundo e terceiro
protestos, que ocorreram ainda em 2014, tiveram o apoio de lideranças
partidárias e grupos políticos tradicionais, como lembra Batista:

Nós fomos para a segunda manifestação como Movimento Brasil Livre,


subimos em cima do caminhão e o Solidariedade subiu no caminhão. Eu
desci, e aí o Renan falou: “Você está brigando com os caras que estão
nos ajudando. São nossos amigos”. Eu falei: “Não. Amigo meu, não, eu
quero a redução do Estado, eu luto contra o envolvimento das siglas
partidárias em uma situação de decisão popular e você traz os caras para
cima do caminhão?”. Na terceira manifestação eu percebi que a minha
postura de protagonista foi alterada para a de um mero coadjuvante, e de
novo o pessoal do Solidariedade estava entregando adesivo e o
caminhão do Vem Pra Rua estava com o José Serra em cima. Nesse dia
o Serra pegou o microfone e falou: “Eu quero agradecer a todos os
partidos que apoiam e desenvolvem essa iniciativa”. Aí eu peguei o
microfone, cortei ele e falei: “Espera aí. Isso aqui não é uma
manifestação de partido. É uma manifestação popular. Partido aqui não
tem mérito nenhum. Os trabalhos foram realizados pelos populares. Se
existem méritos, os méritos são os populares. Em manifestações
passadas, o povo saiu em apoio aos partidos. Hoje o partido vem em
apoio ao povo. Hoje, de fato, nós temos uma manifestação do povo. A
expressão daquilo que o povo quer”. Foi um mal-estar muito grande. Na
semana seguinte eu falei que eu queria me desassociar do movimento.
[95]

Os protestos continuaram, apesar de eventuais baixas, no início do ano


seguinte em meio à retração econômica que experimentava o país e ao
desenvolvimento das investigações da Operação Lava Jato. Dada a ampla
cobertura que a Lava Jato recebeu da mídia, seus personagens principais,
sobretudo o juiz Sergio Moro, que se tornou sinônimo da operação, logo se
tornaram ícones do combate à corrupção, que passou a ser o principal
problema do Brasil para 21% da população. O aumento no índice
certamente ajuda a explicar o sucesso do novo ato convocado pelo MBL, em
conjunto com o Vem Pra Rua e os Revoltados Online, para o dia 15 de
março. A nova manifestação aglutinou milhares de pessoas movidas
sobretudo pelo antipetismo e pela revolta contra a corrupção. Segundo a
Polícia Militar, o número de manifestantes reunidos na avenida Paulista
bateu a cifra de 1 milhão de pessoas, porém, de acordo com o Instituto
Datafolha, o número seria menor, 250 mil, mas ainda assim muito
expressivo.
Após o êxito da mobilização e a ampla cobertura midiática por jornais,
revistas e emissoras de televisão, ausente nos atos que ocorreram
anteriormente, o MBL sentiu-se encorajado para chamar mais um protesto no
mês seguinte, no dia 12 de abril de 2015. Os Revoltados Online novamente
aderiram à ideia, e os membros do Vem Pra Rua consideraram que talvez
fosse precipitado chamar uma nova manifestação, mas acabaram
participando. No ato de abril, o MBL anunciou que faria uma marcha de São
Paulo até Brasília, a “Marcha da Liberdade”, percorrendo os mais de mil
quilômetros que separam uma cidade da outra para demandar o
impeachment de Dilma Rousseff. Marcello Reis acompanhou o MBL durante
a marcha, já as lideranças do Vem Pra Rua deram um apoio menor à
iniciativa, decidindo concentrar esforços na entrega de uma “Carta do Povo
Brasileiro” ao Congresso, em alusão ao documento assinado por Lula em
2002, na qual davam vazão à profunda insatisfação com a corrupção do
sistema político.
Ainda que houvesse uma multiplicidade de estratégias adotadas pelos
movimentos, os atos continuaram ocorrendo ao longo daquele ano,
contando com apoio de grandes organizações e empresários [96] e reunindo
milhares de pessoas insatisfeitas com o PT e com o sistema político em
geral. De acordo com uma pesquisa de opinião coordenada pela socióloga
Esther Solano e pelo filósofo Pablo Ortellado e realizada durante um dos
protestos em São Paulo, em agosto de 2015, 96% dos manifestantes
disseram não estar satisfeitos com o sistema político, 73% disseram que não
confiavam nos partidos políticos e 70% não confiavam nos políticos.
Assim, para além de compartilhar a rejeição ao Partido dos Trabalhadores e
às suas principais lideranças, corporificada em bonecos gigantescos que
passaram a compor os atos como mascotes, os manifestantes rejeitavam
quaisquer políticos associados com a política tradicional.
Nesse sentido, não foi surpreendente que 56% das pessoas presentes no
mesmo protesto, considerando a crise política e econômica que atravessava
o país, concordassem com a frase “alguém fora do jogo político resolveria
as crises”, e que 64% afirmassem que este alguém poderia ser “um juiz
honesto”, e 88% um “político honesto”. Em meio a tal cenário, ao serem
indagados sobre quem inspiraria maior confiança, 19,4% afirmaram que
confiavam muito em Jair Bolsonaro, nome que apareceu em primeiro lugar
dentre os citados. Apenas 11% disseram confiar no PSDB, partido no qual a
maioria dos manifestantes votara nas eleições de 2014, e apenas 1% no
Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), futuro MDB, sigla
do então vice-presidente Michel Temer, que ocuparia a presidência da
República caso o impeachment fosse bem-sucedido.
De fato, Bolsonaro era um dos raros políticos, se não o único, que
conseguia participar das manifestações pró-impeachment e ser ovacionado
pelo público, ao contrário dos demais políticos de oposição. Por meio de
sua atuação nas redes sociais, sobretudo a partir de 2013, quando inaugurou
uma fan page no Facebook, Bolsonaro passou a ficar mais conhecido e
angariar novos apoiadores. No ano seguinte, auxiliado pela conjuntura
política favorável de desgaste do PT, foi o deputado mais votado do Rio de
Janeiro com uma soma de votos quatro vezes maior do que sua média desde
seu ingresso na vida política.
O bolsonarismo começava a se consolidar, facilitado pelos
desdobramentos da Operação Lava Jato.
Isso se deu porque, a despeito de seus quase trinta anos de atuação
parlamentar, Bolsonaro, até aquele momento, não havia sido formalmente
acusado de participar de esquemas de desvio de recursos. Dessa forma, o
deputado conseguiu desvincular sua imagem da política tradicional,
percebida como sinônimo de corrupção, o que fez com que se tornasse a
liderança política de maior expressão nos protestos. Contudo, a adesão ao
capitão reformado ainda era bastante controversa na nova direita em
formação, especialmente entre aqueles que condenavam a ditadura militar,
caso do MBL, que seguia concentrado em promover sua “Marcha pela
Liberdade” em Brasília com o objetivo de pedir a cassação de Rousseff.
A peregrinação realizada pelo grupo, acompanhada por Marcello Reis
dos Revoltados Online, contou com pouca cobertura da mídia e ganhou
pouquíssimas adesões em comparação com os atos de rua, afinal, o pedido
de impeachment ainda não era defendido abertamente pelo establishment
nem mesmo pelo Vem Pra Rua. Foi apenas quando o Tribunal de Contas da
União declarou que havia irregularidades nas contas referentes ao último
governo petista (2011-4) que o movimento passou a encampar de forma
explícita a pauta do impedimento, o que facilitou a coordenação das ações
promovidas pelos três grupos, que continuaram a atuar intensamente nas
mídias sociais para aumentar seu número de apoiadores. [97] Tal estratégia
fez com que o MBL passasse a se expandir rapidamente de forma um tanto
desordenada, o que acabou provocando a saída de outro de seus principais
membros-fundadores, Fábio Ostermann.
Segundo o militante gaúcho, inicialmente as pessoas se aproximavam do
MBL porque o conheciam, ou conheciam outros membros que logo se
tornaram referências, como Kim Kataguiri, criador da página do Facebook
Liberalismo da Zoeira, que se juntou ao movimento no fim de 2014. Mais
tarde, porém, outros núcleos passaram a ser montados em outras localidades
de forma bastante descentralizada, desestruturada e caótica, a partir de
contatos de pessoas desconhecidas do grupo original, de modo que quem
tinha maior disponibilidade de tempo na época para se dedicar às atividades
do movimento automaticamente passava a ter maior poder decisório.
Assim, em meio à ascensão de novas lideranças, como o próprio Kataguiri,
e sem poder dispor de mais tempo e dinheiro para coordenar o movimento,
Ostermann optou por sair do grupo. Poucos meses depois, o MBL, em
conjunto com outros movimentos, lançaria mão de uma estratégia
conhecida dos movimentos de esquerda para demandar o impedimento de
Dilma Rousseff: o acampamento.
Ao contrário da esquerda, porém, que não costuma pedir permissão da
polícia para se manifestar, as lideranças dos movimentos pelo impeachment
acharam por bem fazê-lo. Com isso pretendiam demonstrar seu
compromisso com a manutenção da lei e da ordem e sinalizar para
potenciais apoiadores que o acampamento seria “limpo, organizado e
seguro”. Logo o movimento passou a organizar ônibus para levar militantes
de várias cidades até Brasília. À época, fui severamente desaconselhada por
meus colegas do Instituto Liberal a entrar em um deles para fazer pesquisa
in loco: “Esse pessoal está com sangue nos olhos, se descobrirem que você
é de esquerda já era”. Me resignei então a receber informações do evento
por terceiros.
O acampamento foi erguido no gramado em frente ao Congresso
Nacional no dia 21 de outubro com a autorização do então presidente da
Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB), que vinha
sistematicamente usando a ameaça de impeachment para chantagear a
presidente. O MBL e os Revoltados Online ocuparam o espaço com cerca de
cinquenta barracas cada um, e o Vem Pra Rua, na impossibilidade de estar
fisicamente no local, fincou uma bandeira do movimento no acampamento
para demonstrar apoio simbólico. Grupos de intervencionistas também
compareceram, o que acabou por criar tensões crescentes com os outros
manifestantes, resultando na expulsão de ativistas mais radicalizados. De
qualquer forma, o acampamento seria desbaratado pouco depois, no dia 21
de novembro, sem que o impeachment passasse a ser pautado pela Câmara,
apesar da soma de esforços de outros grupos e novas lideranças que
emergiram ao logo do protesto e se utilizavam de performances diversas
para chamar a atenção dos deputados e da mídia, como os integrantes do
NasRuas, que com algemas de brinquedo se diziam “algemados ao
Congresso”. [98]
Nessa altura, a corrupção já era percebida como o maior problema do
Brasil por 34% da população, e a nova direita, distribuída em vários
movimentos e organizações país afora, já havia se consolidado na esfera
pública tradicional. Não apenas seus integrantes dispunham de maior
espaço em rádios, jornais, revistas e canais de televisão da mídia
tradicional, mas também aumentavam de forma significativa sua presença
em circuitos culturais, sobretudo no mercado editorial.
Ainda em 2013, o Grupo Editorial Record, que já vinha publicando
livros críticos ao PT de colunistas e jornalistas conhecidos que escreviam na
revista Veja e no jornal O Globo, contratou Carlos Andreazza para o cargo
de editor de não ficção. Andreazza, na contramão da orientação da editora
anterior, Luciana Villas-Boas, passou a apostar nas vendas de livros de
direita, que ainda percorriam circuitos mais restritos. Tal movimento iniciou
uma guinada à direita no mercado editorial brasileiro, como ressalta Sérgio
Machado, presidente do grupo:

Dá para identificar uma certa guinada para a direita. A teoria que a


Luciana defendia era que a esquerda lê mais do que a direita. E, para
mim, isso sempre fez um certo sentido. O Andreazza apostou no oposto
e, para nossa surpresa, deu certo. Ficou provado que a direita também lê.
Ele percebeu um crescimento do pensamento liberal. Essa diversidade é
boa para a democracia. [99]

Em 2013 foram lançados Esquerda caviar: A hipocrisia dos artistas e


intelectuais progressistas no Brasil e no mundo, de Rodrigo Constantino, e
O mínimo que você precisa saber para não ser um idiota, de Olavo de
Carvalho, que logo passaram a integrar a lista dos mais vendidos daquele
ano. Em 2015, no auge das manifestações pelo impeachment de Dilma, o
livro de Carvalho se tornou um best-seller com mais de 120 mil cópias
vendidas, tornando o filósofo hype e representando um marco no que tange
à penetração dos discursos do Orkut no debate público tradicional. A direita
não estava mais envergonhada, e sua demanda reprimida por livros passou a
ser atendida por Carlos Andreazza, que afirmou:

O caso do Olavo é muito simbólico. O que fizemos foi dar um


tratamento pop ao autor. Nós hypamos o Olavo, desde a escolha do título
até a capa. Havia uma demanda reprimida por esses autores que nós
identificamos. [100]

Após o sucesso atingido por O mínimo que você precisa saber…, a Record
publicou livros de autores relacionados à nova direita mas que não
possuíam o mesmo grau de exposição pública de Carvalho e Rodrigo
Constantino. Ainda em 2015 foram publicados os livros Pare de acreditar
no governo, do cientista político Bruno Garschagen, que havia participado
do projeto Liberdade na Estrada em 2009 e é o responsável pelo podcast do
Instituto Mises Brasil desde 2012, e Por trás da máscara, de Flávio
Morgenstern, que havia disputado o DCE da USP ao lado de Rodrigo Neves
pela chapa “Reação” em 2011, quando ainda era estudante do curso de
letras. Além disso, aproveitando o momento político, a editora tinha
anunciado que estava em tratativas para lançar um livro de uma das
lideranças mais famosas do MBL, Kim Kataguiri, que naquele ano havia sido
considerado pela revista Time um dos trinta jovens mais influentes do
mundo e em janeiro de 2016 passaria a escrever uma coluna semanal para o
jornal Folha de S.Paulo. [101] A editora também passou a publicar autores
que abordavam temas filosóficos e culturais com maior densidade e eram
publicados apenas por selos menores, como a É Realizações e a Vide
Editorial, consolidando a nova direita no cenário cultural do país, como
aponta Márcia Xavier de Brito:

Estão revolvendo os catálogos para atender uma demanda que eles estão
vendo que existe, e aí é um movimento cultural, não adianta. O Sérgio
Machado, antes de morrer, contratou o Andreazza porque ele queria
inovar, queria dar uma sacudida na Record. O Andreazza publicou o
Roger Scruton, mas quem começou a publicar o Scruton no Brasil foi o
Edson da É Realizações, que já tinha várias coisas publicadas quando a
Record, com a megadistribuição que eles têm, compra o último livro
dele. [102]

A consolidação da nova direita no mercado editorial brasileiro também veio


acompanhada de um fenômeno cultural mais amplo que passava a ficar em
evidência na mídia tradicional: o “politicamente incorreto”. Ainda que o
tema já fosse abordado desde a década de 1990 no Brasil, inclusive por
Olavo de Carvalho, artistas e humoristas críticos ao PT passaram a aderir
cada vez mais à tendência do politicamente incorreto à medida que a crise
do lulismo avançava a passos largos. É possível destacar os músicos Lobão
e Roger Moreira da banda Ultraje a Rigor, os comediantes Marcelo
Madureira, ex-Casseta & Planeta, e o humorista Danilo Gentili, que em
2015 participou como palestrante da Conferência Nacional dos Estudantes
pela Liberdade em São Paulo — para a alegria de Cibele Bastos, sua fã, que
me acompanhava no evento como membro do Instituto Liberal do Rio de
Janeiro e fez questão de tirar uma foto com o comediante. Gentili, que
passou a apresentar o talk show The Noite no SBT em março de 2014,
acompanhado por Roger Moreira, chegou inclusive a publicar ainda em
2010 um livro com piadas oriundas de suas apresentações de stand-up
comedy intitulado justamente Politicamente incorreto. O próprio
comediante, em entrevista concedida à TV Antagonista em março de 2017,
assim definiu o seu alvo: [103]

O politicamente correto não é um meio para você preservar as pessoas,


uma etiqueta para não cometer gafes ou para não magoar ninguém, na
verdade é só uma régua para fuzilar quem eles querem que você fuzile e
para blindar quem eles querem que se sejam blindados. […] A conversa
sempre começa assim: “E aí, você concorda comigo ou é nazista? Você
concorda comigo ou é racista? Não tem outra opção. Você concorda
comigo ou é machista? […] Você concorda comigo ou é um monstro?”.
Não tem outra opção. Não existe diálogo, ou você é do “bem” ou você é
uma pessoa monstruosa, essa é a propaganda deles. Por exemplo, eu me
lembro que quando o Joaquim Barbosa se posicionou contra a Dilma e o
governo do PT o blog oficial que fazia campanha para a Dilma o
chamava de macaco, e aí estava liberado. [104]

Assim, quando a campanha pelo impeachment de Dilma Rousseff


finalmente conquistou seu objetivo em agosto de 2016, a nova direita já
havia fincado seus pés na esfera pública tradicional. Sem deixar
completamente de lado o recurso à política do choque, que continuou a ser
utilizado sobretudo nas redes sociais, já estava pronta para dar seu próximo
passo em direção a sua consolidação no cenário político brasileiro. Para
tanto procurou se espalhar em vários partidos ao mesmo tempo que
concentrava forças em três novos grupos político-partidários: a tendência
Livres, o Partido Novo e o Partido Social Cristão, que passara a abrigar a
família Bolsonaro.
A nova direita na política institucional

A menos de um ano e meio das eleições de 2018, a “hegemonia liberal-


libertária” existente no período de formação da nova direita já havia dado
lugar a um amálgama ultraliberal-conservador. Assim, ultraliberais, como
Bernardo Santoro, que havia ingressado no PSC em 2014, [105] e Rodrigo
Constantino [106] passaram a se definir como liberais-conservadores. O
intuito era anunciar que faziam uma defesa radical do livre mercado e, ao
mesmo tempo, eram conservadores na questão de costumes e no que tange à
defesa da ordem, apontando para o que é uma tendência histórica: a adesão
dos defensores do livre mercado ao conservadorismo. [107] De início, tal
movimento gerou certo desconforto entre a própria militância, pois o rótulo
de liberal-conservador parecia soar como um oximoro, como indica o
jornalista Lucas Berlanza, atual diretor-presidente do IL-RJ:
Acho que essas palavras têm acepções diferentes de acordo com o lugar,
com o tempo e com o interesse ideológico de quem está usando. Acho
que quem diz que liberal-conservador é um oximoro porque não existe a
possibilidade semântica de usar essa expressão em circunstância alguma,
diz isso movido por interesse ideológico. São, sobretudo, os libertários,
que querem afastar qualquer pensamento que valorize ordem e
instituição do campo liberal. Acho que o pensamento liberal-
conservador existe, é uma expressão usada não só no Brasil mas também
fora, essas coisas não são tão dogmáticas. [108]

Além disso, a questão eventualmente causava tensões em certos grupos,


como foi o caso da organização maranhense Expresso da Liberdade, como
relata Lourival Souza:

O Expresso da Liberdade foi concretizado em 2012 em torno do tripé


baseado no direito natural, no direito à vida, à liberdade e à propriedade.
Todos se diziam liberais, mas eram liberais de matizes conservadores,
influenciados por autores como Ortega y Gasset, que é um liberal
aristocrático e conservador, ou por autores monarquistas. Então, no final
das contas, outras questões da sociedade foram sendo discutidas, e a
iniciativa acabou tomando uma forma conservadora. [109]

De fato, como Berlanza aponta, os ultraliberais que não quiseram abraçar o


conservadorismo, comumente referidos pela própria militância como
leftlibs, [110] acabaram ficando em posição incômoda nos circuitos da nova
direita, especialmente em face da adesão de militantes ao clã Bolsonaro.
Com a ida de Jair Bolsonaro para o PSC no início de 2016, onde estava um
dos ex-presidentes do Líber, Bernardo Santoro, os liberais-conservadores
passaram a ter um espaço político próprio, o que fez com que vários
abandonassem o primeiro termo e começassem a se autodenominar
simplesmente como conservadores.
No entanto, os militantes oriundos dos fóruns do Orkut depararam,
dentro do PSC, com quadros destituídos de referências ideológicas mais
sólidas. Quando Santoro foi convidado para assessorar a campanha
presidencial do pastor Everaldo na área econômica em 2014, já teria sido
uma tarefa árdua tentar convencer o candidato e os demais membros do
partido das vantagens do livre mercado, uma vez que, na visão do
advogado, no que tange à economia, o pastor possuía mais semelhanças
com Leonel Brizola. Mas o problema também se estendia à reivindicação
do conservadorismo, segundo o carioca Fernando Fernandes, que fora aluno
de Bernardo Santoro na UFRJ e passou a atuar na juventude do PSC.
Entre alguns membros do PSC era comum ter como única referência
intelectual algumas lives de Olavo de Carvalho, enquanto outros não tinham
nenhum norte nesse sentido, dado que até então a atuação do partido teria
sido basicamente fisiológica. Isso começa a se alterar apenas depois de
2013, quando o pastor e deputado federal Marco Feliciano assume a
presidência da Comissão de Direitos Humanos e o pastor Everaldo se
candidata à presidência. Inclusive, de acordo com Fernandes, a própria
esquerda teria ajudado a definir melhor os contornos do partido, que
padeceria de falta de coerência política e ideológica, ainda que seus
membros partilhassem de um certo senso comum conservador:

Quando os partidos de esquerda viram um conservador cristão sentando


na cadeira da Comissão, eles apontaram: “Conservador, reacionário, vai
defender os valores da família, vai ser contra o aborto”. Então a
esquerda empurrou o PSC para uma posição política que podia até existir
por motivos religiosos, mas não era algo coerente. Por exemplo, o
partido era contra a Dilma, mas dentro do partido tinha gente que a
defendia. Como faz? Em Niterói teve um vereador que a gente expulsou
e ele foi para o PT! [111]

Contudo, de acordo com Fernandes, a entrada de Bolsonaro atraiu uma


multidão de jovens radicais que defendiam valores tradicionais e
radicalismo de mercado, o que ajudou na promoção interna de uma
plataforma ultraliberal-conservadora. Além disso, se antes era comum para
o PSC ceder para partidos maiores, como o PT ou PMDB, uma vez que o
partido compunha a base do governo federal — assim como o PP, antigo
partido de Bolsonaro —, após a entrada do capitão reformado as
concessões, sobretudo a partidos de esquerda, passaram a ser vistas com
maus olhos.
Na mesma época o Partido Novo também anunciava que não faria
concessões que o desviassem de seus princípios. No entanto, para
Fernandes a demanda reprimida por uma representação autêntica de direita
caberia apenas ao PSC, ainda que o legado da ditadura militar, que
acompanhava o clã Bolsonaro, continuasse a ser algo desconfortável:

Foi sinalizado que o PSC daria espaço para uma voz da direita falar, e
com isso veio essa enxurrada de gente atrás do Bolsonaro, atrás de
conservadorismo, atrás da defesa liberal. Tinha uma demanda reprimida
por representação. A gente sempre fala muito que no Brasil até 2014 não
existiam partidos de direita. Todos os partidos estavam do centro para a
esquerda por uma questão histórica, porque a direita era associada ao
movimento militar, à ditadura, o que é bizarro. [Carlos] Lacerda, que era
o principal nome da direita, foi o primeiro eLivros da ditadura. Porque a
ditadura militar não é nem de direita, é imposição, e imposição não tem
lado. [112]

Se por um lado a entrada da família Bolsonaro no PSC de fato ajudou a


reforçar sua imagem como um partido conservador, por outro Santoro
concentrou seus esforços em influenciar ativamente Jair Bolsonaro e seus
filhos para que aderissem à defesa radical do livre mercado. Na época o
deputado era tido pelos defensores do livre mercado como um adepto do
desenvolvimentismo nacionalista vigente na ditadura militar, o que
inclusive motivava esquetes cômicos muito aplaudidos em vários eventos
pró-mercado. Mas os esforços de Santoro logo começaram a render frutos.
Em março daquele mesmo ano Eduardo Bolsonaro anunciou sua matrícula
na primeira turma de pós-graduação em economia austríaca oferecida pelo
Instituto Mises Brasil.
Ao mesmo tempo que o PSC procurava adquirir contornos ideológicos
mais definidos, o Partido Novo, que havia sido oficializado em 2015,
enfrentava uma dificuldade similar no que dizia respeito à incorporação de
novos quadros. Alguns militantes ultraliberais passaram a enxergar no
partido uma alternativa ao conservadorismo do PSC, porém logo avaliaram
que o Novo estaria mais preocupado em adotar políticas públicas
consideradas eficientes do que ser um partido ultraliberal coerente como um
todo em termos ideológicos. Essa era a opinião de Fábio Ostermann. O
ativista conhecera o partido, que havia sido fundado em 2011, pela internet,
e chamara seu fundador e principal dirigente, o executivo do Itaú João
Amoêdo, para dar uma palestra no Instituto de Estudos Empresariais, no
qual atuava como diretor. Ainda que julgasse que seus integrantes estavam
muito voltados para a eficiência e a gestão da máquina pública sem que
houvesse uma base de valores por trás, Ostermann resolveu integrar o
partido e, a partir de 2013, passou a atuar como líder da sigla em seu estado
natal, o Rio Grande do Sul. No entanto, sentindo que o Novo lhe dava
pouca autonomia e limitava suas ambições políticas a curto e médio prazo,
resolveu deixar a sigla em 2015, mesmo ano em que o partido foi
oficializado, e se abrigar junto com outros militantes ultraliberais na então
pequena legenda do Partido Social Liberal (PSL).
Na época, havia discussões sobre o que o MBL faria após o impeachment
de Dilma Rousseff ou de um eventual “esfriamento dos movimentos”, e
Ostermann defendia a ideia de que seria preciso se envolver mais
diretamente na política partidária. Para isso existiriam duas opções
possíveis: entrar em partidos diversos e atuar por meio de uma frente
suprapartidária, ou, preferencialmente, entrar em bloco em um único
partido, ocupando-o. Em novembro, lideranças do PSL, um partido pequeno
que buscava uma forma de se renovar, passaram a estabelecer contatos com
pessoas de um blog chamado Mercado Popular, mais especificamente com
Felipe Melo França, que no meio ultraliberal era considerado leftlib. França,
que ajudou a fundar o MBL durante as manifestações de junho de 2013,
estabeleceu uma ponte entre o PSL e Fábio Ostermann, que, empolgado com
a abertura do partido para suas ideias, acabou se tornando diretor da
fundação do PSL e criando uma tendência chamada Livres, a qual atraiu
outros ultraliberais.
Assim, em 2016 a maioria dos militantes oriundos das comunidades do
Orkut passou a se concentrar em três frentes partidárias, atuando, inclusive,
em mais de uma ao mesmo tempo, como afirmou, na época, Filipe Celeti:

Na atuação política nós estamos construindo três frentes que são o Novo,
recém-fundado e que ainda fica transitando ao redor da figura do
Amoêdo. Tem o PSC, o próprio Bernardo Santoro fez parte do programa
do pastor Everaldo, e o PSL tentando se tornar um partido ideológico. É
uma faca de dois gumes no Brasil, porque no Brasil você vota em
pessoas, não em ideias. Agora vamos ver como a sociedade vai se
comportar com um discurso que vai começar a aparecer um pouco na
mídia, o que sempre foi a ideia do pessoal desde o início: colocar um
ponto mais distante do que existia e arrastar o debate para um lugar mais
próximo do que desejamos para poder promover mudanças reais, que
estejam mais de acordo, por exemplo, com a diminuição do tamanho do
Estado. [113]

Se era comum que militantes pertencentes aos mesmos circuitos


trafegassem entre diferentes siglas, antagonismos em relação ao
bolsonarismo já eram bastante visíveis. Em meio ao clima de campanha, foi
realizado em São Paulo em outubro de 2016 o III Fórum Liberdade e
Democracia, organizado pelo Instituto de Formação de Líderes, organização
que no passado havia sido vinculada ao IEE. Logo que cheguei ao evento,
acompanhada de Bernardo Santoro, Fábio Ostermann se aproximou e,
enérgico, passou a demandar explicações a respeito do apoio de Santoro a
Bolsonaro, que chamou de ditador. Demonstrando um desconforto similar
ao que tinha experimentado quando o militar exaltou a memória do coronel
Ustra durante a votação do impeachment de Dilma Rousseff, Santoro
procurou contornar a situação com simpatia. No entanto, o pico de tensão
daquela tarde ainda estaria por vir.
Ostermann iria participar de um debate justamente com Jair Bolsonaro e
com a senadora Ana Amélia, do DEM do Rio Grande do Sul, o qual seria
mediado por Hélio Beltrão, do Instituto Mises Brasil. O evento estava
razoavelmente cheio e o debate ocorria de forma razoavelmente tranquila
até que Bolsonaro começou a ser vaiado por metade do auditório, e, ato
contínuo, em resposta à vaia a outra metade começou a gritar em uníssono:
“Ustra, Ustra, Ustra”. Depois disso, segundo as fofocas que trafegavam nos
circuitos da nova direita, Bolsonaro teria optado por deixar de frequentar
tais espaços.
O ocorrido, no entanto, não abalou as relações que a família mantinha
com Santoro. Quando, nas eleições de 2016, Flávio Bolsonaro se lançou
candidato à prefeitura do Rio de Janeiro, o advogado decidiu acompanhá-lo
em todos os eventos de campanha. Enquanto isso, vários integrantes da
nova direita também lançavam suas próprias candidaturas. Fernando
Fernandes foi candidato a vereador pela cidade do Rio de Janeiro pelo PSC,
já as candidaturas de Filipe Celeti a vereador por São Paulo, de Rodrigo
Saraiva Marinho a vereador por Fortaleza e de Fábio Ostermann à
prefeitura de Porto Alegre foram abrigadas pela tendência partidária Livres,
formada no interior do PSL.
No que diz respeito às 44 candidaturas ao Legislativo ligadas
diretamente ao MBL, apenas duas foram abrigadas pelo Novo e quatro pelo
PSC. A maior parte, porém, acabou sendo encampada por partidos
tradicionais, como o DEM e o PSDB, cada um responsável por dez
candidaturas. Ao final das eleições, oito candidatos ligados ao MBL foram
eleitos, um pelo DEM, quatro pelo PSDB, um pelo Partido Verde, outro pelo
Partido Popular Socialista (PPS) [114] e o último pelo Partido da República
(PR). Por fim, houve ainda a conquista da prefeitura de São Paulo por João
Doria Jr., candidato que, a despeito de estar vinculado ao PSDB, ecoava o
programa proposto pela nova direita.
A partir de 2017, contudo, as três frentes principais nas quais atuava a
nova direita começaram a se alterar. As tensões entre Bolsonaro e as
lideranças de seu novo partido, cujo excessivo pragmatismo político quase
sempre sacrificava as pautas que defendia publicamente, começaram a
crescer. A gota d'água teria sido uma coligação do PSC com o Partido
Comunista do Brasil no Maranhão visando as eleições de 2016, o que fez
com que Bolsonaro e seus filhos, anticomunistas ferrenhos, passassem a
procurar uma nova legenda partidária. [115] Assim, em agosto de 2017 foi
anunciada oficialmente a migração da família Bolsonaro para o PEN, Partido
Ecológico Nacional, que mudou seu nome para Patriota como condição
para abrigar a pré-candidatura à presidência do capitão de reserva. Na
condição de secretário-geral do Patriota, Bernardo Santoro apresentou um
economista conhecido do circuito pró-mercado a Bolsonaro, Adolfo
Sachsida, doutor pela Universidade de Brasília e funcionário de carreira do
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que, a pedido de Santoro,
montou um grupo de onze economistas que semanalmente trocavam ideias
com o capitão.
As resistências dos defensores do livre mercado a Jair Bolsonaro, cuja
pré-candidatura à presidência já contava com o apoio público de Olavo de
Carvalho, pareciam começar a ceder aos poucos. Em dezembro de 2017, o
nome de Paulo Guedes, a quem Bolsonaro fora apresentado por Winston
Ling, fundador do IEE, [116] foi sugerido publicamente por Rodrigo
Constantino para ocupar o Ministério da Fazenda em um possível governo.
Contudo, no início de 2018, o pré-candidato resolveu romper com o Patriota
e se filiar ao PSL sem nem mesmo comunicar Santoro, que ficou sabendo do
ocorrido pelos jornais. A filiação-relâmpago ao novo partido logo causou
imenso desconforto entre os militantes ultraliberais do PSL, reunidos na
tendência Livres desde 2016. Antibolsonaristas convictos, logo
abandonaram o barco para se filiar ao Partido Novo.
Jair Bolsonaro ainda causaria mais um choque no circuito pró-mercado
ao recusar a participação no debate presidencial promovido naquele ano
pelo Fórum da Liberdade, evento anual do IEE que reúne as principais
lideranças e ideólogos da direita brasileira, de anarcocapitalistas a
monarquistas. Assim, se no início de 2018 sua pré-candidatura já havia
alcançado um patamar estável de 20% das intenções de voto, ainda não se
sabia qual seria sua equipe econômica, e muitos membros dos circuitos pró-
mercado duvidavam que ele fosse adotar um programa econômico
liberalizante, tendo em vista suas declarações passadas sobre o tema. Com a
intenção de afastar as desconfianças suscitadas por suas movimentações
bruscas, Bolsonaro resolveu de uma vez por todas selar sua aliança com os
defensores do livre mercado ao apontar Paulo Guedes em abril de 2018
como seu mentor econômico e candidato ao cargo de ministro da Fazenda.
[117]
Ao mesmo tempo, o Partido Novo também lançou a candidatura à
presidência de seu fundador, o empresário João Amoêdo, que, apesar de
encampar um discurso menos agressivo e mais moderado em comparação
com o capitão de reserva, também passou a defender um discurso
ultraliberal-conservador. Desse modo, ao mesmo tempo que Bolsonaro e
Amoêdo circulavam cada vez mais na esfera pública, a publicização da
defesa radical do livre mercado e a difusão da percepção acerca de uma
hegemonia esquerdista, formulada a partir do diagnóstico de Olavo de
Carvalho, passavam a atingir um novo patamar entre o grande público.
À medida que o período eleitoral foi se aproximando, a crise do lulismo
atingia seu auge com a prisão de Lula, e a polarização política no país
alcançava patamares estratosféricos. O entusiasmo popular em torno da
candidatura de Lula passou a dividir as atenções com a euforia em torno da
candidatura de Jair Bolsonaro, partilhada por inúmeros grupos de militantes
voluntários, articulados em um intenso esforço de campanha em rede, que
vinha se estruturando desde 2014 e desafiou as regras eleitorais vigentes,
ainda pouco adaptadas à nova lógica das redes sociais, como bem registrou
o especialista em direito e tecnologia Francisco Brito Cruz, no livro Novo
jogo, velhas regras: Democracia e direito na era da nova propaganda
política e das fake news.
Quando o primeiro turno se encerrou, Bolsonaro havia reunido mais da
metade dos votos válidos em doze estados e no Distrito Federal, para a
surpresa de muitos analistas políticos que imaginavam que seria impossível
Bolsonaro chegar ao segundo turno. Se por um lado o candidato do PSL se
mostrou decepcionado com os resultados eleitorais, pois imaginava que
poderia vencer no primeiro turno, por outro os militantes oriundos das
comunidades do Orkut e das manifestações de rua ficaram impressionados
com a votação que receberam.
Marcel van Hattem foi o sétimo deputado federal mais votado do país e
o primeiro do Rio Grande do Sul, e seu partido, o Novo, formou uma
bancada de oito deputados na Câmara Federal, mesmo número do PSC. Kim
Kataguiri, por sua vez, recebeu quase meio milhão de votos e foi o quarto
candidato a deputado federal mais votado do país, e Fábio Ostermann foi o
16o candidato estadual mais votado no Rio Grande do Sul. Além disso,
também foram eleitas pelo PSL novas lideranças políticas que surgiram em
meio à Campanha Pró-Impeachment, como Bia Kicis, Carla Zambelli, Joice
Hasselmann e a advogada e professora universitária Janaína Paschoal,
deputada estadual mais votada na história do país, tendo recebido mais de 2
milhões de votos. Em primeiro e segundo lugar entre os deputados federais
mais votados, ultrapassando a marca de mais de 1 milhão de votos, ficaram,
respectivamente, Eduardo Bolsonaro e Joice Hasselmann, e o PSL saiu do
primeiro turno seis vezes maior, com a segunda maior bancada no
Congresso, tendo 52 deputados eleitos.
No segundo turno, praticamente toda a nova direita, com algumas
poucas exceções, apoiou de forma mais ou menos enfática a candidatura de
Bolsonaro. E a segunda abertura das urnas naquele ano, para além da
eleição do capitão de reserva como 38o presidente da República, trouxe
mais duas surpresas para os observadores da política nacional: a eleição
para o governo do estado do Rio de Janeiro do juiz Wilson Witzel (PSC),
cujo programa de governo foi coordenado por Bernardo Santoro, [118] e a
eleição do empresário Romeu Zema (Novo) para o governo do estado de
Minas Gerais. Assim, se havia algo como uma hegemonia esquerdista no
Brasil, como argumenta Olavo de Carvalho, seria possível pensar que, após
a confirmação dos resultados das eleições de 2018, esta certamente teria
passado a enfrentar sua pior crise desde a redemocratização do país.
Considerações finais

Foram raras as análises dentro e fora da academia capazes de antever o


resultado das eleições de 2018. Isso se deu porque dinâmicas políticas e
sociais que ocorrem no seio da sociedade civil e na esfera pública, ainda
que possuam certa coerência e linearidade, dificilmente são apreendidas de
modo razoável por aqueles que concentram seu olhar apenas nos possíveis
cálculos racionais realizados por atores políticos tradicionais. Na ausência
da compreensão do ocorrido, diz-se que foi uma “onda”, fenômeno sem
origem e aparentemente sem direção definida, resultado direto da
manipulação do eleitorado por elites nacionais ou estrangeiras que teriam
investido altas somas de dinheiro em sofisticadas formas eletrônicas de
difusão de desinformação. Ou fala-se em responsabilidade de lideranças de
centro-esquerda e centro-direita que não souberam, ou não quiseram, se
coordenar politicamente para evitar a chegada ao poder de uma força
política alternativa.
Muitas vezes, a ausência de um olhar mais interessado por sutilezas e
tons de cinza impossibilita uma melhor compreensão sobre quem são e
como agem as direitas, especialmente tendo em vista o papel desempenhado
pela militância no processo político.
Tendo isso em vista, procurei adotar aqui uma sensibilidade similar
àquela que perpassa uma nova historiografia sobre a atuação das direitas
brasileiras, que já conta com excelentes trabalhos, como os de Rodrigo
Patto Sá Motta, Janaína Cordeiro e Lucia Grinberg, e constituiu uma
importante fonte de inspiração para a investigação que conduzi nos últimos
cinco anos sobre a formação da nova direita brasileira.
Em sua pesquisa sobre as mulheres engajadas na Campanha da Mulher
pela Democracia, responsáveis por organizar as Marchas da Família com
Deus pela Liberdade nas quais se demandava uma intervenção militar em
março de 1964, Cordeiro aponta como a literatura sobre as direitas, bem
como os próprios atores políticos da época, entendiam que o papel dessas
mulheres teria sido marginal no processo político. Em sua visão, essas
mulheres teriam sido como agentes manipulados por homens “mais
importantes”, como padres, maridos ou seus próprios pais, quando, na
verdade, elas se organizaram conscientemente pela defesa de seu modo de
vida, baseado em um modelo de feminilidade centrado no desempenho dos
papéis de mãe, dona de casa e esposa, que, de acordo com sua percepção,
estavam sob ameaça pelo avanço do comunismo.
Inclusive, a retórica anticomunista, presente no discurso de praticamente
todos os grupos de direita atuantes naquele período, como bem ressaltou Sá
Motta, não era fruto apenas de histeria e paranoia, pois os avanços políticos
dos comunistas dentro e fora do país constituíam ameaças reais a grupos
que, como as mulheres conservadoras, também procuravam defender sua
existência. Militares de direita, por exemplo, procuravam se organizar
contra o que percebiam como uma ameaça à soberania nacional
representada pelo comunismo internacionalista, e os cristãos, organizados
sobretudo pela Igreja católica, mas não apenas, procuravam defender sua
religiosidade dos avanços do secularismo e do ateísmo encampados
principalmente pelos comunistas. A valorização da autenticidade dos
interesses e reivindicações das direitas também passou ao largo das análises
sobre a Aliança Renovadora Nacional, que, segundo destacou Lucia
Grinberg, era percebida não apenas pela academia, mas pelos próprios
atores políticos da época, à esquerda e à direita, como um partido artificial,
fraco e pouco importante, dado que existiria apenas para referendar as
decisões tomadas pelo alto escalão do regime militar.
A percepção de que a militância de direita é inautêntica, manipulada por
elites políticas mais importantes e experientes, ou formada por pessoas
histéricas e paranoicas, possivelmente guarda alguma relação com um
entendimento implícito de que a posse de recursos materiais abundantes
explicaria o sucesso das direitas em mobilizar parte significativa da
sociedade civil em prol de suas causas. Contudo, ainda que a posse de
recursos financeiros e organizacionais de fato ajude a explicar parcialmente
o êxito de movimentos e mobilizações sociais, diversos outros fatores
podem determinar seu sucesso ou fracasso: a criação de fortes identidades
coletivas; dinâmicas emocionais que surgem a partir das interações e
conflitos entre grupos políticos; mudanças nas estruturas de oportunidades
políticas que criam momentos mais propícios para a ação de determinados
grupos; e, nos últimos anos, a habilidade no uso, e a própria lógica, das
mídias digitais.
Minha intenção aqui foi apontar para a relevância da atuação de uma
militância organizada em diversos grupos políticos e entidades civis no
processo que culminou na formação de um amálgama ideológico inédito no
Brasil: o ultraliberalismo-conservador. Além disso, também procurei
chamar a atenção para as continuidades e descontinuidades dos esforços
promovidos por essa militância tendo em vista suas conexões com redes
formadas por atores que iniciaram suas atividades políticas em décadas
anteriores, levando em consideração como os próprios personagens
analisados foram conferindo sentido às suas ações ao longo do tempo a
partir de conjunturas políticas específicas, orientando e reorientando suas
atividades na sociedade civil e na esfera pública.
Espero ter contribuído para fortalecer o entendimento de que o processo
de democratização da esfera pública abre espaço para manifestações de
atores políticos marginais dos mais diversos, incluindo grupos de direita,
compreensão que pode abrir caminhos férteis para a comparação com
processos de formação de novas direitas em outros países. Por fim, também
espero que o esforço empreendido aqui possa demonstrar a importância de
trabalhos realizados a partir de uma metodologia qualitativa que priorize a
utilização de entrevistas em profundidade e a realização de etnografias na
área de ciência política, os quais ainda são minoritários no campo não
apenas no Brasil mas em âmbito internacional. Afinal, ainda que esse tipo
de trabalho possa apresentar dificuldades iniciais, quase sempre resulta em
experiências gratificantes não apenas em termos acadêmicos mas também
pessoais.
Embora não tenha alterado minhas inclinações ideológicas depois da
pesquisa, certamente me tornei muito mais democrática e aberta à reflexão
genuína diante de opiniões divergentes graças ao convívio com as pessoas
que entrevistei, e que foram extremamente generosas — que o digam os
vários livros com que fui gentilmente presenteada e as recepções
acolhedoras em eventos — e encorajadoras em relação ao trabalho que
conduzia, motivo pelo qual espero ter feito jus à confiança que me foi
depositada.
Após minha investigação acadêmica ter chegado ao fim, os almoços e
cafés com as pessoas que conheci no Instituto Liberal continuaram a
ocorrer, ainda que de forma mais espaçada. Foi assim que, em novembro de
2019, Bernardo Santoro veio a São Paulo e combinamos um almoço, que,
para a minha surpresa, acabou acontecendo no centro empresarial que
sediou o V Congresso do MBL. Por curiosidade, acabei aceitando o convite
de Bernardo para acompanhá-lo durante o evento. Como era de praxe,
estavam representadas várias forças políticas, tanto da nova direita como da
direita tradicional e até mesmo da centro-esquerda, com exceção dos
bolsonaristas, o que, segundo Bernardo, explicaria a existência de cadeiras
vazias em um espaço que em anos anteriores costumava ficar
completamente lotado.
Ao longo da presidência de Bolsonaro, ficou evidente que o
bolsonarismo compreende um fenômeno político diferente da nova direita,
mesmo que ambos coincidam no desejo de romper com o pacto de 1988. [1]
Afinal, ainda que o bolsonarismo tenha se nutrido de ideias, de quadros e da
mesma política do choque na esfera pública que caracterizou as atividades
da nova direita, especialmente em suas origens, também foi capaz de
manter sua independência ideológica e política. Isso ajuda a compreender
como, sem a necessidade de maiores explicações, vários personagens e
movimentos da nova direita, como o próprio MBL, puderam se afastar do
governo federal ao longo dos dois primeiros anos da presidência de Jair
Bolsonaro. No momento em que finalizo este texto, após mais de um ano de
crise pandêmica, tanto o MBL como outros atores ligados à nova direita
vêm se aliando a outros segmentos da esquerda e da direita tradicional para
tentar remover Bolsonaro do poder.
Diante disso, uma pergunta parece inevitável: Mas afinal, por que
ultraliberais e conservadores que se declaram a favor de princípios
republicanos e democráticos apoiaram Bolsonaro? De fato, como procurei
destacar em várias passagens, uma característica da nova direita é
justamente seu desconforto, quando não o repúdio explícito à ditadura
militar. As homenagens de Bolsonaro a Brilhante Ustra arrepiavam boa
parte das pessoas que entrevistei de forma análoga ao que ocorria com
pessoas de esquerda. Inclusive, quando o gravador não estava ligado, não
era incomum que alguns entrevistados usassem as mesmas palavras que a
esquerda usava para se referir a Bolsonaro e seus apoiadores mais convictos
— sem que houvesse nenhum incentivo de minha parte.
Em off, vários compartilhavam um desprezo acentuado pelo então
candidato a presidente, e nisso se igualavam a praticamente todos os
frequentadores do debate público tradicional da época. Em razão disso,
acredito que foi justamente uma combinação entre o pragmatismo político e
a ânsia de se ver livre do PT e chegar ao poder — “Bolsonaro é desprezível
e será fácil que faça o que queremos” — que alimentou, ainda que a
contragosto, a inclinação da nova direita pela candidatura do capitão de
reserva.
Sem dúvida, como já apontou Martim Vasques da Cunha, a opção
política confere ares de tragédia à trajetória da nova direita brasileira.
Porém, novas escolhas podem ser feitas, e o futuro permanece em aberto.
Notas

Introdução

1. Raphael Kapa, “Troca de farpas entre aluna e professor de direito vira


alvo de investigação na Uerj”. O Globo, 26 jun. 2014. Disponível em:
<oglobo.globo.com/sociedade/educacao/troca-de-farpas-entre-aluna-
professor-de-direito-vira-alvo-de-investigacao-na-uerj-13016871>. Acesso
em: 2 jun. 2021.
[ «« ]

2. Informações complementadas pela reunião de documentos internos e


públicos de organizações pró-mercado fundadas nas décadas de 1980 e
1990, para além da bibliografia especializada.
[ «« ]
1. O que há de novo na nova direita?

1. De acordo com Sérgio Abranches, cientista político que cunhou a


expressão na seguinte passagem: “o Brasil é o único país que, além de
combinar a proporcionalidade, o multipartidarismo e o ‘presidencialismo
imperial', organiza o Executivo com base em grandes coalizões. A esse
traço peculiar da institucionalidade concreta brasileira chamarei, à falta de
melhor nome, ‘presidencialismo de coalizão'” (Sérgio Abranches,
“Presidencialismo de coalizão: O dilema institucional brasileiro”. Dados,
Rio de Janeiro, v. 31, n. 1, pp. 5-38, 1988).
[ «« ]

2. Especialmente após a tentativa fracassada do presidente Fernando Collor


(1990-2) de ignorar o arranjo de governabilidade e o consequente
impeachment.
[ «« ]

3. É importante lembrar que o avanço nos direitos de pessoas LGBT+ no


Brasil, por exemplo, continuou a conviver com altíssimos índices de
violência, fenômeno análogo aos avanços institucionais em relação às
desigualdades racial e de gênero, considerando-se a continuidade das
violências perpetradas contra mulheres e jovens negros no país.
[ «« ]

4. Apesar da popularização do termo “neoconservadorismo” para se referir


à combinação do ideário pró-mercado com elementos ideológicos
relacionados ao nacionalismo, tendo em vista a ameaça de inimigos internos
e externos, e ao conservadorismo moral no contexto anglo-saxão (Stuart
Hall e Martin Jacques (Orgs.), The Politics of Thatcherism. Londres:
Lawrence and Wishart, 1983; e David Harvey, O neoliberalismo: História e
implicações. Rio de Janeiro: Loyola, 2008), essa expressão poderia ser
substituída por “liberal-conservadorismo” — a qual pode inclusive remeter
ao legado de Edmund Burke e foi adotada pelo argentino Jorge Nállim
(Trasformación y crisis del liberalismo: Su desarrollo en la Argentina en el
período 1930-1955. Buenos Aires: Gedisa, 2014) em sua análise sobre as
transformações do liberalismo argentino —, ou ainda por “neoliberalismo-
conservador”. Acredito que estas últimas sejam mais adequadas para se
referir à fusão do conservadorismo com a defesa do neoliberalismo, afinal,
não só o termo “neoconservadorismo” oculta a influência do
neoliberalismo, como também passou a designar mais especificamente uma
vertente da direita norte-americana originada na década de 1950, que se
consolidou na década de 1970, e que defendia a ideia de que o país adotasse
uma política externa mais agressiva. Inclusive, é preciso também levar em
conta que, no caso do Brasil, assim como de outros países, historicamente o
conservadorismo não diz respeito a um nacionalismo bélico em relação a
outros países, mas está mais ligado à defesa do status quo, tendo em vista a
preservação de costumes e tradições legadas pelas gerações passadas,
posicionamento que, na maioria dos países latino-americanos, esteve
relacionado sobretudo ao tradicionalismo católico até a década de 1980.
Ainda que se possa argumentar, como o faz Marina Basso Lacerda (O novo
conservadorismo brasileiro: De Reagan a Bolsonaro. Porto Alegre: Zouk,
2019), que, do ponto de vista estritamente político, coalizões conservadoras
possam ser formadas em face da percepção de novas ameaças à ordem
moral vigente.
[ «« ]

5. Walter Lippmann é autor de The Good Society, obra publicada nos anos
1930 que tece críticas a políticas de cunho “coletivista” por conduzirem
potencialmente ao totalitarismo, argumento que também foi utilizado pelo
economista austríaco Friedrich von Hayek anos depois em sua obra mais
popular, O caminho da servidão, publicada em 1944 (ver: Richard Cockett,
Thinking the Unthinkable: Think-Tanks and the Economic Counter-
Revolution 1931-1983. Londres: HarperCollins, 1995).
[ «« ]

6. Lembrando que o libertarianismo não é a única forma possível de


defender moralmente a liberdade dos indivíduos, uma vez que, para os
liberais-igualitários, a liberdade humana estaria necessariamente ancorada
na defesa de uma justiça distributiva que possa exprimir de forma
apropriada a igualdade de status social desejável em uma sociedade
democrática. Ver: Álvaro de Vita, A justiça igualitária e seus críticos. São
Paulo: Martins Fontes, 2007.
[ «« ]

7. Os anarcocapitalistas defendem a abolição total do Estado, a manutenção


da propriedade privada, o livre mercado e a soberania individual.
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8. Corrente inspirada na obra da romancista Ayn Rand, uma imigrante russa


que mudou de nome ao se estabelecer nos Estados Unidos e criou uma
filosofia própria baseada em uma defesa radical do capitalismo de livre
mercado.
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9. Os minarquistas compreendem que as únicas instituições estatais que


deveriam existir são aquelas relacionadas à justiça e à segurança pública.
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10. Ainda que a própria militância entenda que os neoliberais


compartilhem, em algum grau, das mesmas bases morais e filosóficas de
anarcocapitalistas, minarquistas e objetivistas, Pierre Dardot e Christian
Laval (A nova razão do mundo: Ensaio sobre a sociedade neoliberal. São
Paulo: Boitempo, 2016) compreendem o neoliberalismo como uma corrente
de pensamento à parte destas últimas, que comporiam o libertarianismo. Já
os cientistas políticos Sergio Morresi e Gabriel Vommaro (Saber lo que se
hace: Expertos y política en Argentina. Buenos Aires: Prometeo, 2012)
compreendem que o libertarianismo seria uma das vertentes do
neoliberalismo, ao lado da Escola Austríaca de Economia, da Escola de
Chicago e da Escola da Escolha Pública da Universidade de Virgínia. O
brasileiro Reginaldo Moraes (Neoliberalismo: De onde vem, para onde
vai?. v. 6. São Paulo: Senac, 2001), por sua vez, também afirma que essas
três escolas comporiam o neoliberalismo, mas, apesar de citar brevemente a
existência de anarcocapitalistas e minarquistas, não os considera relevantes
o suficiente em sua caracterização.
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11. Em 2009, quando ocorreu a primeira eleição de Barack Obama e o


surgimento do movimento Tea Party, que combina elementos ideológicos
libertarianos e conservadores, as vendas de A revolta de Atlas duplicaram
em relação ao ano anterior, atingindo 500 mil exemplares.
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12. A Sociedade Fabiana participou da fundação do Partido Trabalhista


inglês e procurou difundir ideias e políticas públicas de inspiração
socialista. Tal dinâmica teria ajudado a formar um consenso em torno das
políticas de bem-estar naquele país, que vigorou durante as décadas de
1940, 1950 e 1960. A Sociedade ainda existe atualmente sob a forma de
think tank.
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13. Originalmente Hayek gostaria de ter se aproximado do Partido Liberal,


com o qual julgava possuir maior identificação ideológica, e não do Partido
Conservador, como ocorreu posteriormente. Foi dentro do Partido
Conservador, aliás, que ele veio a se tornar o mentor intelectual de Margaret
Thatcher (ver: Richard Cockett, op. cit.).
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14. A tradição ibérica é caracterizada por Richard Morse, em O espelho de


Próspero (São Paulo: Companhia das Letras, 1988), como uma concepção
orgânica e comunitária da sociedade em oposição a uma tradição anglo-saxã
em que a sociedade é pensada a partir do indivíduo.
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2. A direita tradicional: Hayek e o combate ao comunismo

1. Janaina Garcia, “Manifestantes protestam contra e a favor de filósofa


americana Judith Butler em São Paulo”. UOL, 7 nov. 2018. Disponível em:
<noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2017/11/07/manifestantes-
protestam-contra-filosofa-americana-judith-butler-em-sao-paulo.htm>.
Acesso em: 2 jun. 2021.
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2. A marcha a que faz referência Lindenberg é a Marcha da Família com


Deus pela Liberdade que ocorreu no início do ano de 1964 e foi organizada
por uma série de grupos e associações católicas lideradas por mulheres,
algumas das quais mantinham relações com a TFP. Ver: Janaina Martins
Cordeiro, Direitas em movimento: A Campanha da Mulher pela
Democracia e a ditadura no Brasil. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2009.
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3. Entrevista com Adolpho Lindenberg, IPCO, em mar. 2017.


[ «« ]

4. Eugênio Gudin figurava então como um dos principais economistas do


país, apesar de formado em engenharia civil. Foi diretamente responsável
pela regulamentação do curso de graduação em economia no Brasil, além
de ter atuado de modo importante neste campo acadêmico junto à
Universidade do Brasil, hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro, e à
Fundação Getulio Vargas do Rio de Janeiro, e ter trabalhado como ministro
da Fazenda entre 1954 e 1955 durante o governo Café Filho.
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5. Gudin afirmou à época que a articulação para derrubar o então presidente
João Goulart era uma “reação do povo brasileiro e de suas forças armadas
contra a tentativa perpetrada por um conjunto comuno-anarquista que
visava levar o país ao caos e atrelá-lo ao grupo de países comandados pelo
marxismo”. Disponível em: <www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-
biografico/eugenio-gudin-filho>. Acesso em: 2 jun. 2021.
[ «« ]

6. Albert Hening Boilesen foi presidente do Grupo Ultra e um grande


entusiasta da Operação Bandeirante (Oban), criada em 1969 em São Paulo
durante a ditadura militar. A Oban era financiada por vários empresários
vinculados à Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e foi
utilizada pelo Exército para investigar e reprimir grupos da esquerda
armada. O envolvimento de Boilesen com a ditadura militar foi retratado no
documentário Cidadão Boilesen, de 2009, dirigido por Chaim Litewski.
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7. Entrevista com Adolpho Lindenberg, IPCO, em mar. 2017.


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8. Para evitar confusão com as datas, é importante salientar que a Sociedade


Convívio foi criada em 1961 e a revista Convivium, dirigida por Crippa, em
1962.
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9. Entrevista com Ricardo Vélez Rodríguez, Faculdade Arthur Thomas, em


ago. 2017.
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10. Para efeito de comparação, no mesmo período a revista semanal Veja


possuía uma tiragem de cerca de 500 mil exemplares. Ver: Francisco
Fonseca, A imprensa liberal na transição democrática (1984-1987):
Projeto político e estratégias de convencimento (revista Visão e jornal O
Estado de S. Paulo). 2 v. Campinas: IFCH/Unicamp, 1994. Dissertação
(Mestrado em Ciência Política).
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11. Entrevista com Paulo Rabello de Castro, Instituto Atlântico, em maio


2017.
[ «« ]

12. René Armand Dreifuss, O jogo da direita na Nova República. Rio de


Janeiro: Vozes, 1989, pp. 52-3.
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13. Entrevista com Winston Ling, fundador do IEE, em abr. 2017.


[ «« ]

14. Entrevista com Arthur Chagas Diniz, ex-diretor do IL-RJ, em dez. 2015.
[ «« ]

15. Entrevista com Ricardo Vélez Rodríguez, Faculdade Arthur Thomas,


em ago. 2017.
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16. Entrevista com Adolpho Lindenberg, IPCO, em mar. 2017.


[ «« ]

17. Apud René Armand Dreifuss, op. cit., p. 44.


[ «« ]

18. Ibid.
[ «« ]
19. Entrevista com Ricardo Vélez Rodríguez, Faculdade Arthur Thomas,
em ago. 2017.
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20. Como consta no artigo “Empresários ouvem Maciel em reunião


fechada” (Folha de S.Paulo, 5 out. 1986, caderno 4, p. 41).
[ «« ]

21. Entrevista com Paulo Rabello de Castro, Instituto Atlântico, em maio


2017.
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22. Entrevista com Winston Ling, fundador do IEE, em abr. 2017.


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23. “Em setembro de 1986, alguns meses antes de a Assembleia Nacional


Constituinte iniciar seus trabalhos — o que aconteceu em fevereiro de 1987
—, uma comissão provisória criada pelo Executivo concluiu a elaboração
de um anteprojeto de Constituição que, no entanto, acabou não sendo
enviado oficialmente ao Congresso. Embora tivesse o nome de Comissão
Provisória de Estudos Constitucionais, o grupo ficou conhecido como
Comissão Afonso Arinos, pois seu presidente foi o jurista, ex-deputado
federal e ex-senador Afonso Arinos de Melo Franco”. Disponível em:
<www12.senado.leg.br/noticias/materias/2008/10/01/comissao-afonso-
arinos-elaborou-anteprojeto-de-constituicao>. Acesso em: 2 jun. 2021.
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24. Position papers eram textos curtos que procuravam influenciar o leitor a
respeito de algum tema específico e que podiam ser formulados por
qualquer membro do instituto (no contexto anglo-saxão, atualmente, fala-se
em op-eds.).
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25. As atividades e produções dos Institutos Liberais desde sua fundação
até 2001 foram compiladas de forma detalhada pela cientista política
Denise Gros e podem ser consultadas em sua tese de doutorado, bem como
pelo historiador Flávio Henrique Casimiro (ver referências bibliográficas).
[ «« ]

26. Entrevista com N., funcionário do IL-RJ, em out. 2015.


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27. Excerto extraído de carta escrita por Donald Stewart Jr. no dia 1o de
setembro de 1993 e endereçada aos presidentes dos ILs, Jorge Gerdau
Johannpeter, Jorge Simeira Jacob e Roberto Bornhausen.
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28. A Cipe é uma das quatro instituições vinculadas ao National


Endowment for Democracy (NED), fundação privada pró-mercado criada
por Ronald Reagan em 1983, e é afiliada à Câmara de Comércio dos
Estados Unidos. Desde 1983, a Cipe apoia iniciativas que promovam a
empresa privada e reformas pró-mercado.
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29. Informações contidas no informe comemorativo de dez anos do IL.


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30. Depoimento de Cláudio R. Contador, doutor em economia pela


Universidade de Chicago, para o livro Og Leme, um liberal: Crônicas,
publicado em 2011 pelo Instituto Liberal.
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31. Informação contida em informe do Instituto Atlântico de 1997.


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32. Na época em que a entrevista foi realizada, Lucas Berlanza era
funcionário do IL-RJ, responsável pela parte de comunicação do Instituto. A
partir do segundo semestre de 2018, Berlanza assumiu a diretoria da
organização.
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33. Entrevista com Arthur Chagas Diniz, ex-diretor do IL-RJ, em dez. 2015.
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34. Olavo Henrique Pudenci Furtado, Trajetos e perspectivas social-


democratas: Do modelo europeu para o PSDB e PT no Brasil. Campinas:
Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp, 1996. Dissertação
(Mestrado).
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35. Diogo Paiva, PT e PSDB: Dois programas de governo, um projeto para


o Brasil. Araraquara: Departamento de Ciências Sociais da Unesp, 2006.
Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais).
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36. Ibid.
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37. Timothy Power, “The Third Way in the Third World: Theoretical
Considerations and a Case Study of Cardoso's PSDB in Brazil”. World
Congress of the International Political Science Association, Quebec, 2000.
[ «« ]

38. Anthony Giddens, A terceira via e seus críticos. Rio de Janeiro: Record,
2001, apud André Pereira Guiot, Um ‘moderno príncipe' para a burguesia
brasileira: O PSDB (1988-2002). Niterói: Departamento de História da
Universidade Federal Fluminense, 2006. Dissertação (Mestrado).
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39. Entrevista com Alex Catharino, Russell Kirk Center, em dez. 2016.
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40. Ver: Rodolfo Borges, “A direita brasileira que saiu do armário não para
de vender livros”. El País, 1 ago. 2015. Disponível em:
<brasil.elpais.com/brasil/2015/07/22/politica/1437521284_073825.html>.
Acesso em: 2 jun. 2021.
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41. Como afirma em entrevista concedida ao apresentador do podcast do


Instituto Mises Brasil, Bruno Garschagen. Disponível em:
<www.mises.org.br/FileUp.aspx?id=274>. Acesso em: 2 jun. 2021.
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42. “Ele se aproximou do IL e foi lá fazer um projeto. Og Leme falou para o


Alex Catharino: ‘Vai lá e assiste. Eu quero saber sua opinião se a gente deve
ou não botar esse cara dentro do nosso meio'. Aí o Alex foi e achou que ele
foi desrespeitoso com o oponente ideológico. Você pode discordar? Claro
que pode, mas ultrapassou a linha do respeito, ele não falava de ideias”.
Entrevista com Márcia Xavier de Brito, fellow da Atlas Network, em mar.
2018.
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43. De acordo com o antropólogo norte-americano Benjamin Teitelbaum,


em Guerra pela eternidade: O retorno do tradicionalismo e a ascensão da
direita populista (Campinas: Editora da Unicamp, 2020), Carvalho seria
particularmente influenciado por uma corrente de pensamento esotérica
antimoderna marginal conhecida como “tradicionalismo”, a qual também
seria compartilhada pelos ideólogos Steve Bannon e Aleksandr Dugin.
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44. Para verificar o autoposicionamento ideológico de Olavo de Carvalho:
<www.olavodecarvalho.org/formula-da-minha-composicao-ideologica>.
Acesso em: 2 jun. 2021.
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45. A primeira menção crítica ao Foro de São Paulo realizada por Olavo de
Carvalho, que se encontra registrada em seu blog pessoal, apareceu em um
artigo escrito para a revista Época sobre transgênicos em Cuba, intitulado
“Quem diria? Mas nem tudo o que é bom para Cuba é bom para o Brasil”,
publicado em 21 abr. 2001 (disponível em:
<www.olavodecarvalho.org/transgenicos-em-cuba>. Acesso em: 2 jun.
2021). O Foro de São Paulo é uma articuladora latino-americana fundada
em 1990 a partir de um seminário promovido pelo PT na cidade de São
Paulo. Atualmente o Foro reúne mais de cem partidos e organizações de
esquerda da região. Ver mais informações em <forodesaopaulo.org>.
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46. As atividades desenvolvidas pelo IA desde sua fundação podem ser


consultadas em <www.atlantico.org.br>.
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47. Entrevista com Alex Catharino, Russell Kirk Center, em dez. 2016.
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3. A nova direita: Mises e o combate à “hegemonia cultural esquerdista”

1. A versão integral da Carta pode ser acessada em:


<www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u33908.shtml>. Acesso em: 2
jun. 2021.
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2. Cassuça Benevides, “Mercado externo ainda teme ‘efeito Lula' na


economia”. Folha de S.Paulo, 25 set. 2002. Disponível em:
<www1.folha.uol.com.br/folha/bbc/ult272u14285.shtml>. Acesso em: 2
jun. 2021.
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3. Ivone Portes, “Bovespa termina 2002 com queda acumulada de 17%”.


Folha de S.Paulo, 30 dez. 2002. Disponível em:
<www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u61320.shtml>. Acesso em: 2
jun. 2021.
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4. Guilherme Barros, “Ex-guru de Ciro elogia nomes da equipe econômica


de Lula”. Folha de S.Paulo, 29 dez. 2002. Disponível em:
<www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc2912200209.htm>. Acesso em: 2 jun.
2021.
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5. Gustavo Patu, “Com Palocci, mercado deixou de ver PT como ameaça”.


Folha de S.Paulo, 28 mar. 2006. Disponível em:
<www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc2803200620.htm>. Acesso em: 2 jun.
2021.
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6. Disponível em: <datafolha.folha.uol.com.br/opiniaopublica/2004/
12/1222275-apos-dois-anos-lula-e-aprovado-por-45-dos-brasileiros.shtml>.
Acesso em: 2 jun. 2021.
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7. Em uma pesquisa de opinião realizada pela Fundação Perseu Abramo em


2006, 76% da população afirmou que o mensalão havia existido, o que
apontava para a baixa adesão à versão oficial do próprio partido a respeito
do escândalo, a de que as movimentações financeiras que foram o foco
original das denúncias seriam fruto de dinheiro não contabilizado operado
pelo ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares (Gustavo Venturi, “A opinião
pública diante da crise”, Teoria e Debate, n. 66, 2006).
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8. Entrevista com Rodrigo Neves, Movimento Endireita Brasil, em abr.


2018.
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9. A ideia de que o subproletariado se orientaria ideologicamente com base


na fórmula “mudança dentro da ordem” foi proposta por Singer a partir de
uma reunião de diversas pesquisas de opinião. Ver: André Singer, Esquerda
e direita no eleitorado brasileiro. São Paulo: Edusp, 2000.
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10. Entrevista realizada pela doutoranda em ciência política pela


Universidade Livre de Bruxelas Fanny Vrydagh, em 21 nov. 2016. Ver:
Camila Rocha e Fanny Vrydagh, “Right Wing Counter Publics and the
Origins of the Brazilian New Right”. Tercer Coloquio “Pensar las derechas
en América Latina en el siglo XX”. Belo Horizonte, UFMG, 20-22 ago.
2018.
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11. Entrevista com Fábio Ostermann, Livres, em mar. 2016.


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12. Essas e outras informações mais detalhadas a respeito do acesso à


internet no Brasil nesse período podem ser consultadas em:
<www.cetic.br/media/docs/publicacoes/10/pal2007ofid-11.pdf>. Acesso
em: 15 jun. 2021.
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13. Argumentos semelhantes teriam sido mobilizados pela nova direita na


França e pela chamada alt-right norte-americana (Angela Nagle, Kill all
Normies: Online Culture Wars from 4chan and Tumblr to Trump and the
Alt-Right. Ropley: John Hunt, 2017).
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14. Entrevista com Marcus Boeira, UFRGS, em jun. 2018.


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15. Entrevista com Cibele Bastos, IL-RJ, em dez. 2015.


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16. Entrevista com Filipe Celeti, ex-Líber, em abr. 2016.


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17. Entrevista com Rodrigo Constantino, IL-RJ, em dez. 2016.


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18. Entrevista com Joel Pinheiro da Fonseca, ex-Líber, em maio 2017.


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19. Entrevista com Luan Sperandio, Mercado Popular, em 2016.


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20. Entrevista com Rafaela de Paula, Grupo de Estudos Quintino Bocaiuva,
em 2015.
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21. Experiências compartilhadas por grupos de pais, professores e alunos de


ensino fundamental e médio, de forma análoga ao que ocorreu com certos
grupos de estudantes universitários, também puderam ser ressignificadas a
partir da influência das ideias de Carvalho acerca da existência de uma
hegemonia cultural esquerdista no Brasil. Assim apontam Hannah Parnes,
Igor Lins e Paula Trindade em investigação realizada junto aos membros do
movimento Escola sem Partido, movimento fundado em 2004 por um pai
inconformado com a atuação de um professor de história da escola de seu
filho na cidade de Brasília (Ver: “Engajamento, identidade e redes: Um
estudo de caso do Escola sem Partido”. Interações Sociais, v. 4, n. 1. Dossiê
Extrema-Direita na América Latina: Redes de Sociabilidade e
Reinterpretações do Estado, 2020).
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22. Entrevista com Joel Pinheiro da Fonseca, ex-Líber, em maio 2017.


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23. Entrevista com Lucas Berlanza, IL-RJ, em maio 2016.


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24. Em conjunto com o sociólogo Jonas Medeiros, faço uma discussão


conceitual sobre a política do choque a partir das noções de públicos e
contrapúblicos de forma resumida em: Camila Rocha e Jonas Medeiros,
“‘Vão todos tomar no…': A política do choque e a esfera pública”.
Horizontes ao Sul. Disponível em: <www.horizontesaosul.com/single-
post/2020/04/27/VAO-TODOS-TOMAR-NO-A-POLITICA-DO-CHOQUE-E-A-ESFERA-
PUBLICA>. Acesso em: 2 jun. 2021. Também em: Camila Rocha, Jonas
Medeiros e Esther Solano, The Bolsonaro Paradox: The Public Sphere and
Right-Wing Counterpublicity in Contemporary Brazil. Basingstoke:
Springer-Nature, 2021.
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25. Disponível em: <www.youtube.com/watch?v=XE2PBgFHUYU>.


Acesso em: 2 jun. 2021.
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26. Uma discussão mais aprofundada sobre o tema é desenvolvida por


Olavo de Carvalho na introdução crítica e nos comentários suplementares
da edição brasileira do livro de Arthur Schopenhauer, Como vencer um
debate sem precisar ter razão (Rio de Janeiro: Topbooks, 2003), tido como
a “bíblia dos trolls” pela acadêmica Whitney Philips, em This Is Why We
Can't Have Nice Things: Mapping the Relationship between Online Trolling
and Mainstream Culture (Cambridge: MIT Press, 2015).
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27. Em 1996 Thomas Korontai, liderança do Movimento Federalista de


Curitiba, passou a envidar esforços para fundar o Partido Federalista, o qual
foi registrado em um cartório de títulos em 1999 mas ainda não foi
oficializado junto ao Tribunal Superior Eleitoral. O Partido Federalista tem
como objetivo principal “a redução das ingerências do Poder Central sobre
a vida das pessoas e sobre as estruturas autonômicas estaduais e municipais,
independentemente do regime ou do sistema de governo”. Disponível em:
<www.federalista.org.br/index.php>. Acesso em: 2 jun. 2021.
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28. Entrevista com Rodrigo Constantino, IL-RJ, em dez. 2016.


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29. Entrevista com Márcia Xavier de Brito, fellow da Atlas Network, em


jun. 2018.
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30. Hélio Beltrão é filho do ex-ministro de mesmo nome que costumava
frequentar os círculos formados em torno do Instituto Liberal do Rio de
Janeiro.
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31. Uma das principais fundadoras do Instituto da Realidade Nacional foi a


economista Patrícia Carlos de Andrade, que, na época, segundo uma das
pessoas que entrevistei, era leitora assídua da obra de Olavo de Carvalho. A
economista é filha do jornalista Evandro Carlos de Andrade, que atuou
como diretor de redação do jornal O Globo por 24 anos, integrava o
conselho editorial do Grupo Globo e, em julho de 1995, assumiu a direção
da Central Globo de Jornalismo. Disponível em:
<memoriaglobo.globo.com/perfis/talentos/evandro-carlos-de-andrade.htm>.
Acesso em: 2 jun. 2021.
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32. Entrevista com Rodrigo Constantino, IL-RJ, em dez. 2016.


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33. Fundado em 1982 por Llewellyn H. Rockwell Jr., com o apoio de


Margit von Mises, Murray N. Rothbard, Henry Hazlitt e Ron Paul, o Mises
Institute defende uma ordem baseada na propriedade privada e na economia
capitalista de livre mercado que rejeita a tributação, a degradação monetária
e o monopólio estatal coercivo dos serviços de proteção.
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34. Passados alguns anos da fundação do IMB, os irmãos Chiocca deixaram


de fazer parte do Instituto principalmente por motivos ideológicos e
estratégicos e decidiram fundar sua própria organização em 2015, o
Instituto Rothbard.
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35. Nesse sentido, é importante lembrar que também existiam muitas
discordâncias entre as diversas correntes de ultraliberais.
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36. Fundado em 1971 por David Nolan no estado do Colorado, Estados


Unidos, o Libertarian Party defende, exclusivamente, ideias libertarianas.
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37. Entrevista com Cibele Bastos, IL-RJ, em dez. 2015.


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38. Juliano Torres em entrevista para O Estado de S. Paulo em 20 jul. 2009.


Disponível em: <politica.estadao.com.br/noticias/geral,partido-nascido-no-
orkut-prega-o-ultraliberalismo,405536>. Acesso em: 2 jun. 2021.
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39. Entrevista com Filipe Celeti, Livres, em abr. 2016.


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40. Posteriormente renomeadas como Institutos de Formação de Líderes.


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41. Desde 1992 a Fundação Friedrich Naumann, organização alemã


fundada na década de 1950 para divulgar o liberalismo econômico, mantém
um escritório em São Paulo a partir do qual atua em conjunto com os
principais think tanks liberais brasileiros, como o Instituto Liberal, o
Instituto de Estudos Empresariais e o Instituto Millenium, promovendo e
financiando atividades para a difusão do ideário pró-mercado na sociedade
civil.
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42. Entrevista com Rodrigo Constantino, IL-RJ, em dez. 2016.


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43. Entrevista com Fábio Ostermann, Livres, em mar. 2016. A atuação dos
libertarianos David e Charles G. Koch, bilionários do ramo de petróleo,
junto às principais organizações pró-mercado dos Estados Unidos e ao
Partido Republicano é pública e notória (ver: Bryan Doherty, Radicals for
Capitalism: A Freewheeling History of the Modern American Libertarian
Movement. Nova York: PublicAffairs 2009; Reginaldo Moraes, “A
organização das células neoconservadoras de agitprop: O fator subjetivo da
contrarrevolução” In: Sebastião Velasco e Cruz et al. (Orgs.), Direita,
volver!: O retorno da direita e o ciclo político brasileiro. São Paulo:
Fundação Perseu Abramo, 2015; Theda Skocpol; Alexander Hertel-
Fernandez, “The Koch Network and Republican Party Extremism”. In:
Perspectives on Politics, American Political Science Association, Nova
York, v. 14, n. 3, set. 2016). Charles Koch financiou e ajudou a estruturar
diversos think tanks pró-mercado em seu país principalmente durante os
anos 1970 e 1980, entre os quais o Cato Institute, criado em 1977 em
conjunto com o ativista libertariano Ed Crane e que foi integrado por
Murray Rothbard, conhecido intelectual libertariano, e Sam Husbands Jr.,
empresário que participou do governo Reagan. Atualmente o Cato atua em
conjunto com a Atlas Network, fundada em 1981 nos Estados Unidos com
o objetivo de articular mais de quatrocentos think tanks pró-mercado
espalhados pelo mundo (Camila Rocha, “Direitas em rede: Think tanks de
direita na América Latina”. In: Sebastião Velasco e Cruz et al. (Orgs.),
Direita, volver! , op. cit., e figura como o oitavo think tank mais importante
dos Estados Unidos de acordo com o índice Global to Go Think Tanks 2014
desenvolvido pela Universidade da Pensilvânia.
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44. O mineiro Salim Mattar, proprietário do Grupo Localiza, e a família


Ling, proprietária da holding Évora, são tidos pela militância ultraliberal
como os principais financiadores de suas atividades.
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45. Entrevista com Cibele Bastos, IL-RJ, em dez. 2015.


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46. Segundo Rodrigo Neves, em entrevista concedida ao jornalista Reinaldo


Azevedo, “desde 2009 o Movimento Liberdade USP mantém contato com o
[grupo] Liberdade UnB, e, desde 2010, há uma aliança entre os dois grupos,
caracterizada por um apoio mútuo na oposição à partidarização do
Movimento Estudantil e pela troca de experiências e informações”.
Disponível em: <veja.abril.com.br/blog/reinaldo/a-eleicao-do-dce-da-usp-
se-aproxima-a-maioria-silenciosa-pode-votar-ja-contra-a-greve-que-eles-
decidiram-fazer-no-ano-que-vem-abaixo-o-que-pensa-a-chapa-reacao-ou-a-
tecnologia-ja-pode-revelar-a-vontad>. Acesso em: 2 jun. 2021.
[ «« ]

47. A zoeira era algo comum entre jovens que frequentavam fóruns digitais
e remete à influência de fóruns brasileiros, como o Vale-Tudo, do Fórum
UOL Jogos, e de norte-americanos, como o 4chan, onde teve início a
circulação de memes (Angela Nagle, op. cit.). Anos depois, Kim Kataguiri
também lançaria mão de algo similar em sua página Liberalismo da Zoeira.
Uma reportagem sobre a influência do VT do Fórum UOL Jogos e o recurso à
zoeira foi realizada pela revista Vice. Disponível em:
<www.vice.com/pt/article/d3b53m/por-que-o-vale-tudo-do-forum-uol-
jogos-foi-a-vanguarda-digital-brasileira>. Acesso em: 2 jun. 2021.
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48. Flávio Morgenstern foi estudante de letras na Universidade de São


Paulo, onde integrou a chapa Reação, ao lado de Rodrigo Neves, em 2011,
para disputar o Diretório Central dos Estudantes. Leitor de Olavo de
Carvalho, atualmente é analista político, palestrante e tradutor. Escreve para
o jornal Gazeta do Povo, além de sites como Implicante, Senso Incomum e
os sites do Instituto Millenium e do Instituto Liberal. Lançou seu primeiro
livro pela editora Record, Por trás da máscara, sobre os protestos de 2013.
[ «« ]
49. Entrevista com Rodrigo Neves, Movimento Endireita Brasil, em abr.
2018.
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50. Entrevista com Lourival de Souza, Expresso da Liberdade, em abr.


2017.
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51. Entrevista com Fernando Fernandes, IL-RJ, em mar. 2017.


[ «« ]

52. Entrevista com Fábio Ostermann, Livres, em mar. 2016.


[ «« ]

53. Entrevista com Luan Sperandio, Mercado Popular, em fev. 2017.


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54. Entrevista com Cibele Bastos, IL-RJ, em dez. 2015.


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55. Entrevista com Gabriel Menegale, ex-IL-RJ, em jan. 2017.


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56. O Partido Novo, cuja principal liderança é João Amoêdo, ex-executivo


do mercado financeiro que se candidatou à presidência da República em
2018, foi fundado em fevereiro de 2011 e obteve seu registro oficial em
setembro de 2015. O partido defende uma plataforma liberalizante baseada
em uma maior autonomia e liberdade do indivíduo e na redução das áreas
de atuação do Estado.
[ «« ]

57. Entrevista com Bernardo Santoro, IL-RJ, em out. 2015.


[ «« ]

58. Tanto que, em 2015, sentiu-se a necessidade de criar uma articuladora


de organizações e grupos, a Rede Liberdade, presidida pelo advogado
Rodrigo Saraiva Marinho.
[ «« ]

59. Entrevista com Rodrigo Saraiva Marinho, Ilin, em mar. 2017.


[ «« ]

60. Entrevista com Rodrigo Neves, Movimento Endireita Brasil, em abr.


2018.
[ «« ]

61. Rodrigo Patto Sá Motta, Em guarda contra o “perigo vermelho”: O


anticomunismo no Brasil, 1917-1964. São Paulo: Perspectiva, 2002.
[ «« ]

62. Anos depois, os conflitos em torno da demarcação de terras ficariam


mais conhecidos no debate público em virtude da demarcação da Terra
Indígena Raposa Serra do Sol em 2009, aprovada pelo STF.
[ «« ]

63. Contudo, não foram previstas regras para implementar a decisão ou


mesmo medidas para viabilizar a prática pelo Sistema Único de Saúde
(SUS).
[ «« ]

64. Na época, Bolsonaro afirmou que havia votado em Lula e, como


justificativa para sua predileção por Rebelo, declarou ao jornal Folha de
S.Paulo: “as coisas mudaram. Hoje, comunista toma uísque, mora bem e vai
na piscina”. Disponível em:
<www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc1912200206.htm>. Acesso em: 2 jun.
2021.
[ «« ]

65. A live, divulgada no YouTube, ocorreu em virtude da entrega da


Medalha Tiradentes ao filósofo Olavo de Carvalho.
[ «« ]

66. Como aponta uma pesquisa realizada pela BBC Brasil com base em mais
de 1500 discursos proferidos pelo deputado no plenário da Câmara ao longo
de 27 anos, “o Bolsonaro do início da carreira era muito mais preocupado
com a defesa dos interesses dos militares (sua base eleitoral de então) do
que em polemizar com o PT e a esquerda. […] Em seu primeiro mandato
como deputado, de 1991 a 1994, palavras como ‘militar', ‘forças armadas',
‘benefícios', ‘salários' e ‘pensões' apareceram 702 vezes nos resumos e
palavras-chave dos 279 discursos feitos por ele no plenário da Câmara
naquele período. Já no atual mandato, de 2015 até agora, o mesmo conjunto
de dezesseis palavras só aparece 110 vezes, num conjunto de 143 discursos.
[…] Com o passar do tempo e aumento de sua projeção nacional, os
assuntos corporativos do Exército, da Marinha e da Aeronáutica recuavam.
O tempo de Bolsonaro na tribuna passou a ser ocupado cada vez mais com
assuntos com ‘apelo' no novo público do deputado, que o conheceu
principalmente na internet. Um outro conjunto de dezesseis termos, com
palavras como ‘direitos humanos', ‘PT', ‘tortura', ‘Cuba', ‘esquerda' e ‘gays'
tiveram um pico no mandato passado (2011 a 2014), aparecem 297 vezes
nesse período, mas só foram citados 41 vezes no primeiro mandato de
Bolsonaro (1991-1994)”. Disponível em: <www.bbc.com/portuguese/brasil-
42231485>. Acesso em: 2 jun. 2021.
[ «« ]

67. De acordo com pesquisas qualitativas de opinião pública realizadas em


2020 pelo Instituto Update e pela Fundação Friedrich Ebert Brasil.
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68. Entrevista com José Carlos Sepúlveda, IPCO, em abr. 2017.
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69. “A militância que eu tive foi Líber. Foi participar de manifestação aqui,
a gente fez bastante barulho em São Paulo. A gente participou quando
proibiu a Marcha da Maconha e mudaram o nome pra Marcha pela
Liberdade, a gente foi lá com os nossos cartazes. A gente fazia muita
manifestação no Impostômetro também, quando ia bater os recordes a gente
estava sempre. A gente sempre apoiou aquele Dia da Liberdade dos
Impostos, a gente fazia [protesto] no posto de gasolina, que vende gasolina
com o preço que seria se não fossem os impostos.” Entrevista com Filipe
Celeti, Livres, em abr. 2016.
[ «« ]

70. Em 2007, um mês antes da manifestação organizada pelo movimento


Cansei em São Paulo, foi lançado em Porto Alegre o Movimento Contra a
Impunidade e a Corrupção, organizado pela OAB do Rio Grande do Sul e
outras setenta entidades, que reuniu centenas de pessoas na capital gaúcha.
Durante a manifestação, os dirigentes das OABs de Santa Catarina, Paraná e
Rio de Janeiro anunciaram que protestos semelhantes iriam ser organizados
em seus respectivos estados. O então presidente da OAB gaúcha, Carlos
Lamachia, afirmou que a iniciativa da seccional do Rio Grande do Sul se
transformaria em um grande protesto em Brasília, ainda sem data marcada,
para apresentação de agenda positiva ao Congresso e à sociedade em defesa
do fim do foro privilegiado, a favor da rejeição à proposta de emenda
constitucional (PEC) que estende seus efeitos a ex-agentes políticos e pela
criação de mecanismos que evitem que a renúncia seja usada para preservar
direitos políticos. Além de advogados, a manifestação também contou com
representantes de federações empresariais e centrais sindicais adversárias,
como a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Força Sindical,
funcionários públicos, juízes, estudantes, militantes do Partido Verde (PV),
do Partido Socialismo e Liberdade (Psol) e deputados estaduais do Partido
Progressista (PP) e do Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Ver: Elder
Ogliari, “Movimento contra a impunidade é lançado por 70 entidades”. O
Estado de S. Paulo, 13 jul. 2007. Disponível em:
<politica.estadao.com.br/noticias/geral,movimento-contra-a-impunidade-e-
lancado-por-70-entidades,18760>. Acesso em: 2 jun. 2021.
[ «« ]

71. “O MCCE foi instituído durante o período eleitoral de 2002. Mas pode-se
dizer que a campanha da fraternidade de 1996, que teve por tema
‘Fraternidade e Política', contribuiu para aflorar a criação do MCCE, porque
posterior à campanha, a Comissão Brasileira Justiça e Paz (CBJP), órgão
vinculado da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), lançou o
Projeto ‘Combatendo a corrupção eleitoral' em fevereiro de 1997. Assim,
era plantada, em 1998, a semente da iniciativa popular contra a corrupção
eleitoral, originando a Lei 9840. […] O MCCE ampliou sua atuação e hoje
funciona de forma permanente com ações em todo o país. Em 2006 é criada
a secretaria executiva do comitê nacional do MCCE. Em 27 de abril de 2007,
é oficializada legalmente a Secretaria Executiva do Comitê Nacional do
Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (SE-MCCE), organização não
governamental (ONG) e sem fins lucrativos.” Disponível em:
<www.mcce.org.br/quando-foi-criado>. Acesso em: 2 jun. 2021.
[ «« ]

72. Leandro Colon e Rafael Moraes Moura, “Marcha contra Corrupção


reúne 25 mil em Brasília”. O Estado de S. Paulo, 7 set. 2011. Disponível
em: <politica.estadao.com.br/noticias/geral,marcha-contra-corrupcao-reune-
25-mil-em-brasilia,769550>. Acesso em: 2 jun. 2021.
[ «« ]

73. Paulo Gama, “Ato contra corrupção reúne mais de 3.000 em São
Paulo”. Folha de S.Paulo, 12 out. 2011. Disponível em:
<www1.folha.uol.com.br/poder/2011/10/989587-ato-contra-corrupcao-
reune-mais-de-3000-em-sao-paulo.shtml>. Acesso em: 2 jun. 2021.
[ «« ]

74. “Brasileiros fazem protestos contra a corrupção pelo país”. G1, 21 abr.
2021. Disponível em: <g1.globo.com/brasil/noticia/2012/04/brasileiros-
fazem-protestos-contra-corrupcao-pelo-pais-neste-sabado.html>. Acesso
em: 2 jun. 2021.
[ «« ]

75. Daniel Roncaglia, “Ato contra corrupção em SP pede punição para


condenados do mensalão”. Folha de S.Paulo, 7 set. 2012. Disponível em:
<www1.folha.uol.com.br/poder/2012/09/1150245-ato-contra-corrupcao-
em-sp-pede-punicao-para-condenados-do-mensalao.shtml>. Acesso em: 2
jun. 2021.
[ «« ]

76. Guilherme Pavarin, “O ostracismo do maior revoltado online”. piauí, 26


maio 2017. Disponível em: <piaui.folha.uol.com.br/o-ostracismo-do-maior-
revoltado-online>. Acesso em: 2 jun. 2021.
[ «« ]

77. Fanny Vrydagh, “Gagner les Corps, les coeurs et les esprits”:
Comprendre l'Engagement dans le mouvement brésilien pro-destitution
(2014-2016). Bruxelas: Université Libre de Bruxelles, 2020. Tese
(Doutorado).
[ «« ]

78. André Singer, O lulismo em crise: Um quebra-cabeça do período Dilma


(2011-2016). São Paulo: Companhia das Letras, 2018.
[ «« ]

79. Entrevista com Joel Pinheiro da Fonseca, ex-Líber, em maio 2017.


[ «« ]

80. Entrevista com Filipe Celeti, Livres, em abr. 2016.


[ «« ]

81. Entrevista com Fábio Ostermann, Livres, em mar. 2016.


[ «« ]

82. Marcel van Hattem foi eleito em 2004, aos dezoito anos, vereador de
Dois Irmãos, município do Rio Grande do Sul. Concorreu a deputado
estadual em 2014 e foi diplomado como primeiro suplente do Partido
Progressista (PP), exercendo mandato de fevereiro de 2015 a março de 2018.
Atualmente é filiado ao Partido Novo e nas eleições de 2018 foi o candidato
a deputado federal pelo Rio Grande do Sul mais votado, somando mais de
349 mil votos.
[ «« ]

83. “Aprovação a governo Dilma Rousseff cai 27 pontos em três semanas”.


Datafolha, 29 jun. 2013. Disponível em:
<datafolha.folha.uol.com.br/opiniaopublica /2013/06/1303659-aprovacao-a-
governo-dilma-rousseff-cai-27-pontos-em-tres-semanas.shtml>. Acesso em:
2 jun. 2021.
[ «« ]

84. Marcelo Alves dos Santos Junior, Vai pra Cuba!!!!: A rede antipetista
na eleição de 2014. Niterói: Departamento de História da Universidade
Federal Fluminense, 2016. Dissertação (Mestrado).
[ «« ]

85. Como Bernardo Santoro, que se lançou candidato a vereador pelo PSL
no Rio de Janeiro ainda em 2012, ou mesmo Marcel van Hattem, que
iniciou sua carreira política no Sul como vereador do município de Dois
Irmãos, em 2004, com apenas dezoito anos.
[ «« ]

86. “Protesto em SP contra a PEC 37 reúne cerca de 30 mil pessoas”. O


Globo, 22 jun. 2013. Disponível em: <oglobo.globo.com/brasil/protesto-
em-sp-contra-pec-37-reune-cerca-de-30-mil-pessoas-8784592>. Acesso em:
2 jun. 2021.
[ «« ]

87. Entrevista com Fábio Ostermann, Livres, em abr. 2016.


[ «« ]

88. Entrevista com Paulo Batista, ex-MBL, em set. 2017.


[ «« ]

89. Ibid.
[ «« ]

90. O Vem Pra Rua foi criado em setembro de 2014 por profissionais
liberais do mercado financeiro e empresários, sob a liderança de Rogerio
Chequer e Colin Butterfield, sem experiência política prévia e que,
aparentemente, não possuíam vínculos com os membros da nova direita
emergente mas estavam inconformados com a corrupção e as políticas
econômicas associadas aos governos petistas. O grupo, que possui
inclinação ideológica autodeclarada liberal, se uniu com o objetivo de fazer
grandes protestos de rua inspirados pelas revoltas de junho de 2013 e para
tanto resolveu fundar um movimento chamado inicialmente de Movimento
Basta! Para conseguir mobilizar milhares de pessoas nas ruas, as lideranças
do movimento resolveram fazer um vídeo que transmitisse a indignação
contra o governo e pudesse ser viralizado nas redes sociais mostrando um
flashmob na avenida Paulista. Porém, após terem reunido cerca de 30 mil
reais a partir de seus próprios recursos para produzir o vídeo, contando até
mesmo com o auxílio de um drone, logo constataram que a iniciativa havia
sido um fiasco e o dinheiro investido fora jogado fora. O vídeo teve
pouquíssimas visualizações e a cor da camiseta dos participantes do
flashmob, que era laranja, foi confundida pelas poucas pessoas que
assistiram à gravação com a cor vermelha, a cor de seus adversários, mas o
grupo não desistiu. Um mês depois, quando finalmente conseguiram
mobilizar 10 mil pessoas insatisfeitas com o PT às vésperas das eleições
presidenciais por meio de um intenso uso das redes sociais, a manifestação
foi ridicularizada pela revista norte-americana The Economist, que a
chamou de The Cashmere Revolution [A revolução do cashmere], fazendo
referência ao pertencimento dos manifestantes às classes altas brasileiras e
vinculando o movimento à campanha do tucano Aécio Neves. Ver: Rogerio
Chequer e Colin Butterfield, Vem Pra Rua: A história do movimento
popular que mobilizou o Brasil. São Paulo: Matrix, 2016.
[ «« ]

91. “Eu e o Renan [Santos] ficávamos brigando, diante de alguns projetos, o


Renan muito mais atirado do que eu, sempre muito mais atirado, mais
agressivo. Pra ele não bastava só eu estar com o megafone, ele queria que
eu colocasse o dedo na cara. Coisas que às vezes não eram necessárias, não
é meu perfil. Em alguns momentos eu fui obrigado a adotar [um tom mais
agressivo], porque a situação me colocou nessa condição. Tinha dez pessoas
na minha frente, eu sozinho, o Renan e o Pedro. Se eu não tomasse uma
postura de liderança, e fosse pra cima, nós três iríamos apanhar. Então eu
tive que quebrar os meus paradigmas pessoais, às vezes, pra me defender e
para defender eles.” Entrevista com Paulo Batista, ex-MBL, em set. 2017.
[ «« ]

92. Daniela Lima, “Vice do PSDB diz que partido não apoia ato pelo
impeachment de Dilma”. Folha de S.Paulo, 1 nov. 2014. Disponível em:
<www1.folha.uol.com.br/poder/2014/11/1542090-vice-presidente-do-psdb-
diz-que-partido-nao-incentiva-atos-contra-dilma.shtml>. Acesso em: 2 jun.
2021.
[ «« ]
93. “Obviamente, a repercussão do ato foi extremamente nociva. Criou-se
uma ideia de que os eleitores do Aécio não sabiam perder. Os apoiadores do
PT nadaram de braçada diante dessa postura dos manifestantes. Nós
assistíamos incrédulos a tudo isso. ‘O que esses movimentos estão
fazendo?', nos perguntávamos. O pior foi que a imprensa colocou todos os
movimentos, participantes ou não, no mesmo balaio. Como se nós, que
havíamos feito um movimento bonito e pacífico antes da votação do
segundo turno, tivéssemos agora feito tudo aquilo. […] Resolvemos fazer
algo para deixar claro que não concordávamos com a postura daqueles
manifestantes.” Rogerio Chequer e Colin Butterfield, op. cit.
[ «« ]

94. Entrevista com Paulo Batista, ex-MBL, em set. 2017.


[ «« ]

95. Ibid.
[ «« ]

96. Além de empresários que passaram a fazer doações para os protestos, a


Fiesp, aproveitando a cobertura midiática e o grande número de
manifestantes, resolveu lançar em 2015 uma campanha contra o aumento de
impostos e a volta da CPMF, “Não vou pagar o pato”, cujo símbolo era um
gigantesco pato amarelo que passou a compor o cenário das manifestações
em São Paulo.
[ «« ]

97. Camila Rocha e Fanny Vrydagh, op. cit.


[ «« ]

98. Como recorda uma das principais lideranças do grupo, Carla Zambelli,
em seu livro Não foi golpe: Os bastidores da luta nas ruas pelo
impeachment de Dilma (São Paulo: LVM, 2018).
[ «« ]

99. Mateus Campos, “Editor de nomes conservadores, Carlos Andreazza se


firma como voz dissonante do mercado de livros”. O Globo, 31 jul. 2015.
Disponível em: <oglobo.globo.com/cultura/livros/editor-de-nomes-
conservadores-carlos-andreazza-se-firma-como-voz-dissonante-do-
mercado-de-livros-17021179>. Acesso em: 2 jun. 2021.
[ «« ]

100. Ibid.
[ «« ]

101. No entanto, o livro, intitulado Quem é esse moleque para estar na


Folha?, seguindo a fórmula da coletânea de colunas jornalísticas, foi
lançado em 2017 pela editora Simonsen, cujo dono havia participado de
cursos do Centro Interdisciplinar de Ética e Economia Personalista (Cieep)
no Rio de Janeiro.
[ «« ]

102. Entrevista com Márcia Xavier de Brito, fellow da Atlas Network, em


jun. 2018.
[ «« ]

103. Disponível em: <www.youtube.com/watch?v=zlQbDemKXG8>.


Acesso em: 2 jun. 2021.
[ «« ]

104. Gentili faz referência ao Blog da Dilma, veículo não oficial de


campanha da então presidente que veiculou uma imagem de Joaquim
Barbosa ao lado de um macaco. Ver: Marina Dias, “Site pró-Dilma que
associou Barbosa a macaco é motivo de constrangimento para Planalto”.
Folha de S.Paulo, 26 set. 2013. Disponível em:
<www1.folha.uol.com.br/poder/2013/09/1347552-site-pro-dilma-que-
associou-barbosa-a-macaco-e-motivo-de-constrangimento-para-
planalto.shtml>. Acesso em: 2 jun. 2021.
[ «« ]

105. O que explica os panfletos e adesivos do PSC em sua sala no Instituto


Liberal do Rio de Janeiro no segundo semestre de 2015.
[ «« ]

106. Em setembro de 2018 Constantino lançou um livro pela Record


chamado Confissões de um ex-libertário: Salvando o liberalismo dos
liberais modernos.
[ «« ]

107. Seria possível citar ocorrências deste fenômeno em uma série de


diferentes contextos, mas, para ficar em dois exemplos, há a adesão dos
libertarianos à campanha do senador conservador norte-americano Barry
Goldwater na década de 1960 (Bryan Doherty, op. cit.) e o já mencionado
apoio de F. Hayek à líder política conservadora britânica Margaret Thatcher
(Cockett, op. cit.). Cabe notar que, em ambos os casos, tais apoios não
ocorreram sem tensões ideológicas e identitárias importantes.
[ «« ]

108. Entrevista com Lucas Berlanza, IL-RJ, em mar. 2017.


[ «« ]

109. Entrevista com Lourival de Souza, Expresso da Liberdade, em abr.


2017.
[ «« ]

110. Abreviação de left libertarianism ou left libertarians, ou seja,


libertarianismo e libertarianos de esquerda, cuja preocupação central são as
questões de injustiça e desigualdade social.
[ «« ]
111. Entrevista com Fernando Fernandes, IL-RJ, em mar. 2017.
[ «« ]

112. Ibid.
[ «« ]

113. Entrevista com Filipe Celeti, Livres, em abr. 2016.


[ «« ]

114. Em 2019 o partido mudou seu nome para Cidadania.


[ «« ]

115. Após a saída de Bolsonaro do partido, o PSC lançou como candidato a


presidente Paulo Rabello de Castro, que, posteriormente, integrou a chapa
de Alvaro Dias (Podemos) como candidato a vice-presidente.
[ «« ]

116. Como afirmou em seu perfil do Facebook em postagem do dia 16 de


novembro de 2018.
[ «« ]

117. Posteriormente, o Ministério da Fazenda, durante o governo


Bolsonaro, seria recriado como Ministério da Economia.
[ «« ]

118. Athos Moura, “O coordenador de Witzel, a placa de Marielle e a


pichação”. O Globo, 19 out. 2018. Disponível em:
<blogs.oglobo.globo.com/lauro-jardim/post/o-coordenador-de-witzel-placa-
de-marielle-e-pichacao.html>. Acesso em: 2 jun. 2021.
[ «« ]
Considerações finais

1. Em conjunto com o sociólogo Jonas Medeiros, entendo o bolsonarismo


como um fenômeno que denominamos como “contrapublicidade
dominante”, como descrevemos em detalhe em “Jair Bolsonaro and the
Dominant Counterpublicity” (Brazilian Political Science Review, v. 15, n.
3, e0004, Jun. 2021. Disponível em:
<brazilianpoliticalsciencereview.org/article/jair-bolsonaro-and-the-
dominant-counterpublicity>. Acesso em: 18 jun. 2021.
[ «« ]
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ZAMBELLI, Carla. Não foi golpe: Os bastidores da luta nas ruas pelo
impeachment de Dilma. São Paulo: LVM, 2018.
Sobre os entrevistados

ADOLPHO LINDENBERG foi redator do jornal Catolicismo, criado em 1951,


que deu origem em 1960 à Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição,
Família e Propriedade (TFP), da qual Lindenberg foi membro-fundador ao
lado de seu primo Plinio Corrêa de Oliveira. Engenheiro e arquiteto
formado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, Lindenberg é
proprietário desde 1952 da Construtora Adolpho Lindenberg (CAL) e
publicou vários livros, entre os quais Os católicos e a economia de
mercado: Oposição ou colaboração (1999) e Utopia igualitária:
Aviltamento da dignidade humana (2016). Atualmente é presidente do
Instituto Plinio Corrêa de Oliveira (IPCO), fundado em 2006 a partir de uma
cisão da TFP após o falecimento de Corrêa de Oliveira, com o qual também
colaboram Luiz de Orleans e Bragança e Bertrand de Orleans e Bragança,
lideranças do movimento monarquista brasileiro. Entrevista realizada em
março de 2017 em São Paulo.

ALEX CATHARINO frequentou por mais de dez anos o Instituto Liberal do


Rio de Janeiro, onde foi aluno particular do professor Og Leme. É
historiador, vice-presidente do Centro Interdisciplinar de Ética e Economia
Personalista (Cieep), fellow da Atlas Network, editor-assistente da
Communio, revista internacional de teologia e cultura, e pesquisador do
Russell Kirk Center. Desde 2007 é editor-chefe da LVM Editora, ligada ao
Instituto Mises Brasil (IMB). Entrevista realizada via Skype em julho de
2016.
ANTÔNIO PAIM formou-se em filosofia pela Universidade Lomonosov, em
Moscou, e pela Universidade do Brasil, no Rio de Janeiro. Atuou como
militante do Partido Comunista Brasileiro (PCB) até os anos 1950, quando
deixou a agremiação. Foi professor na Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ), na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-
Rio) e na Universidade Gama Filho, aposentando-se em 1989. Foi membro
do Instituto Brasileiro de Filosofia (IBF), da Academia Brasileira de
Filosofia, do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, da Academia das
Ciências de Lisboa e do Instituto de Filosofia Luso-Brasileira, sediado em
Lisboa. Prestou assessoria a diversos órgãos oficiais, como BNDES, Finep,
Governo do Estado da Bahia, Ministério da Aeronáutica e Ministério da
Agricultura. É autor de vários livros, entre os quais História das ideias
filosóficas no Brasil (1967), O liberalismo contemporâneo (1995) e
História do liberalismo brasileiro, reeditado em 2018 pela LVM Editora.
Faleceu em maio de 2021. Entrevista realizada em maio de 2018 em
conjunto com o historiador Alex Catharino.

ARTHUR CHAGAS DINIZ foi vice-presidente do Instituto Liberal e presidente


entre 2008 e 2013. Formado em engenharia civil e eletrônica pela Escola
Nacional de Engenharia, trabalhou na Companhia Siderúrgica Nacional
(CSN) entre 1960 e 1964, no Ministério do Planejamento (1965-7) e no
Jornal do Brasil (1987-8). Entrevista realizada em dezembro de 2015 no
Rio de Janeiro em conjunto com o jornalista Lucas Berlanza.

BERNARDO SANTORO é bacharel em direito e mestre em teoria e filosofia do


direito (Uerj). Atuou como professor na Universidade Federal do Rio de
Janeiro, na Universidade Estadual do Rio de Janeiro e na Universidade
Presbiteriana Mackenzie. Foi vice-presidente do Líber, candidato a vereador
da cidade do Rio de Janeiro pelo Partido Social Liberal (PSL) em 2012,
diretor-executivo do Instituto Liberal (2012-6) e coordenador do Centro
Mackenzie de Liberdade Econômica (2016-7). Santoro foi filiado ao
Partido Social Cristão (PSC), com o qual colaborou ativamente até assumir
no mês de setembro de 2017 o cargo de secretário-geral do Patriota. Em
fevereiro de 2018, o advogado retornou ao PSC, onde atuou como um dos
principais coordenadores da campanha do candidato Wilson Witzel (PSC)
ao governo do estado do Rio de Janeiro. Foi assessor especial do governo
Witzel e atualmente preside o Instituto Rio Metrópole. Entrevista realizada
em outubro de 2015 no Rio de Janeiro.

CIBELE BASTOS é economista formada pela Universidade Federal do Ceará.


Foi fundadora do grupo de estudos Dragão do Mar na mesma universidade,
membro do Líber, e atuou profissionalmente no Instituto Liberal do Rio de
Janeiro e no Instituto Liberal do Nordeste (Ilin) entre os anos de 2015 e
2018. Durante as eleições de 2016, colaborou ativamente com a campanha
do advogado Rodrigo Saraiva Marinho, fundador e presidente do Ilin, a
vereador da cidade de Fortaleza pela tendência Livres, atualmente abrigada
pelo Partido Novo. Entrevista realizada em dezembro de 2015 no Rio de
Janeiro.

CRISTIANO CHIOCCA é economista e empresário. Em 2007 foi cofundador,


ao lado de Fernando Chiocca e Hélio Beltrão Jr., do Instituto Mises Brasil
(IMB), no qual atuou como vice-presidente. Em razão de dissensões internas,
porém, Chiocca se desligou da organização e fundou, em 2015, em conjunto
com seu irmão Fernando, o Instituto Rothbard Brasil. Depoimento via
questionário retornado em julho de 2016.

DIEGO BONFIM é formado em administração de empresas pelo Instituto


Brasileiro de Mercado de Capitais de Minas Gerais (Ibmec-MG), onde
fundou e presidiu seu primeiro Diretório Central dos Estudantes. Bonfim foi
fundador e conselheiro da UFMG Finance Club e da Ibmec Social-MG, diretor
da CISV International, presidente do Conselho Nacional das Ligas de
Mercado e da LB Finance. Atualmente é CEO da empresa FitiBank.
Entrevista realizada em outubro de 2015 em São Paulo.
FÁBIO OSTERMANN é formado em direito pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS), onde fundou o Núcleo de Extensão em Direito,
Economia e Políticas Públicas (Nedep). Foi diretor-executivo do Instituto
Liberdade, diretor de formação e conselheiro fiscal do Instituto de Estudos
Empresariais (IEE), cofundador da rede Estudantes pela Liberdade, tendo
sido o primeiro presidente de seu Conselho Consultivo, diretor-executivo do
Instituto Ordem Livre, fundador e coordenador nacional do Movimento
Brasil Livre (MBL). É professor (licenciado) da Faculdade Campos Salles,
associado honorário do IEE, membro do Grupo Pensar+ e líder estadual do
Livres no Rio Grande do Sul. Em 2016, lançou-se como candidato à
prefeitura de Porto Alegre pela tendência Livres, então abrigada no Partido
Social Liberal (PSL). Atualmente Ostermann é membro do Partido Novo,
tendo sido eleito em 2018 para o cargo de deputado estadual pelo Rio
Grande do Sul. Entrevista realizada em março de 2016 em São Paulo.

FERNANDO CHIOCCA é empresário e publicitário formado na Universidade


Presbiteriana Mackenzie. Em 2007, foi membro-fundador do Partido
Libertário (Líber) e cofundador do Instituto Mises Brasil (IMB), ao lado de
Cristiano Chiocca e Hélio Beltrão. Em razão de dissensões internas, porém,
Chiocca se desligou do IMB e fundou em 2015, em conjunto com Cristiano
Chiocca, o Instituto Rothbard Brasil. Depoimento via questionário
retornado em julho de 2016.

FERNANDO FERNANDES é bacharel em direito e mestre em filosofia política


pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro, formado em política e
estratégia pela Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra.
Colunista do Instituto Liberal do Rio de Janeiro, desempenhou um papel de
liderança junto à juventude nacional do Partido Social Cristão (PSC), pelo
qual concorreu ao cargo de vereador na cidade do Rio de Janeiro em 2016.
Em 2017 assumiu o cargo de segundo vice-presidente do Partido Patriota no
Rio de Janeiro, mas depois voltou a integrar o PSC. No ano de 2018 militou
ativamente na campanha do candidato a governador do estado do Rio de
Janeiro Wilson Witzel (PSC). Entrevista realizada via Skype em 10 de julho
de 2016.

FILIPE RANGEL CELETI é bacharel e licenciado em filosofia pela


Universidade Presbiteriana Mackenzie e mestre em educação, arte e história
da cultura pela mesma instituição. Professor da Faculdade Sumaré, foi
coordenador do Partido Libertário (Líber) em São Paulo, tutor no Instituto
de Formação de Líderes de São Paulo e é membro do Livres, pelo qual saiu
candidato a vereador em São Paulo em 2016. Entrevista realizada em abril
de 2016 em São Paulo.

GABRIEL MENEGALE é graduado em comunicação social pelo Ibmec-RJ.


Entre 2014 e 2015 atuou como assessor de marketing e comunicação no
Instituto Liberal e desde 2016 é editor-chefe do Boletim da Liberdade,
veículo jornalístico dedicado à cobertura do “ecossistema pró-liberdade do
país”. Entrevista realizada via Skype em janeiro de 2017.

HÉLIO BELTRÃO é graduado em finanças e possui MBA pela Universidade


Columbia, em Nova York. Foi executivo do Banco Garantia, da Mídia
Investimentos e da Sextante Investimentos. É fundador e membro do
conselho consultivo do Instituto Millenium (Imil), inaugurado em 2006, e
membro-fundador do Instituto Mises Brasil (IMB), no qual atua como
presidente desde 2007. Também é membro do conselho de administração do
Grupo Ultra, da Le Lis Blanc, da Artesia Investimentos, do conselho
consultivo da Ediouro Publicações e da companhia do setor de educação
corporativa Lab SSJ (Affero Lab a partir de 2014). Entrevista realizada em
abril de 2017 em São Paulo.

JOEL PINHEIRO DA FONSECA é economista formado pelo Insper, bacharel e


mestre em filosofia pela Universidade de São Paulo. Foi membro do Partido
Libertário (Líber) em São Paulo, editor da revista Dicta&Contradicta e
atualmente é colunista do jornal Folha de S.Paulo e da revista Exame.
Entrevista realizada em maio de 2017 em São Paulo.

JOSÉ CARLOS SEPÚLVEDA é português e vive no Brasil há 38 anos. Jurista e


analista político, colabora com o Instituto Plinio Corrêa de Oliveira (IPCO), é
assessor de Bertrand de Orleans e Bragança, escreve para a revista
Catolicismo e mantém o blog Radar da Mídia desde 2007. Atua também
como conferencista sobre temas políticos e religiosos. Entre 2006 e 2007
dirigiu a campanha “Acção Família, pelo NÃO à aprovação do aborto” no
referendo realizado em Portugal sobre o tema. Entrevista realizada em abril
de 2017 em São Paulo.

JOSÉ STELLE editou e traduziu as principais obras do economista Friedrich


August von Hayek para o português. Foi membro do Libertarian Party
norte-americano, editor de opinião da revista semanal Visão, membro-
fundador do Instituto Liberal do Rio de Janeiro, e atualmente é professor
universitário na Flórida, Estados Unidos. Entrevista realizada via Skype em
fevereiro de 2017.

LOURIVAL DE SOUZA foi estudante de engenharia na Universidade Federal do


Maranhão, onde participou do Diretório Central dos Estudantes em 2010.
Foi conselheiro executivo da rede Estudantes pela Liberdade, diretor
cultural do Instituto Liberal do Nordeste (Ilin) e fundador e presidente do
Instituto Expresso Liberdade. Graduado em gestão financeira, mestre em
economia política pelo Swiss Management Center, foi assessor executivo da
Federação das Associações Empresariais do Maranhão (Faem) e atualmente
exerce o cargo de superintendente do Patrimônio da União no Piauí.
Entrevista realizada via Skype em abril de 2017.

LUAN SPERANDIO é graduado em direito pela Universidade Federal do


Espírito Santo (Ufes) e possui MBA em Liderança e Desenvolvimento
Humano pela Fucape Business School. Escreveu artigos para o Instituto
Liberal do Rio de Janeiro e criou o grupo de estudos Domingos Martins no
Espírito Santo. Foi vice-presidente da Federação Capixaba dos Jovens
Empreendedores, editor do Instituto Mercado Popular e atuou junto ao
Instituto Millenium e ao Instituto Livre Mercado. Atualmente é editor-chefe
da Apex Partners em Vitória. Entrevista realizada via Skype em fevereiro
de 2017.

LUCAS BERLANZA é jornalista formado pela Universidade Estadual do Rio


de Janeiro (Uerj). Atuou profissionalmente no Instituto Liberal de 2015 a
2018, quando se tornou diretor da organização. Autor do livro Guia
bibliográfico da Nova Direita: 39 livros para compreender o fenômeno
brasileiro, publicado em 2017, Berlanza é criador do site Sentinela
Lacerdista e do Boletim da Liberdade, veículo jornalístico dedicado à
cobertura do “ecossistema pró-liberdade do país”. Entrevista realizada via
Skype em maio de 2016.

MÁRCIA XAVIER DE BRITO é tradutora e frequentou por mais de dez anos o


Instituto Liberal do Rio de Janeiro. Foi fundadora e membro do Centro
Interdisciplinar de Ética e Economia Personalista (Cieep), é fellow da Atlas
Network no Brasil e atuou junto a diversas organizações conservadoras
norte-americanas e como palestrante sobre temas como cultura, sociedade e
política. Entrevista realizada em março de 2018 em São Paulo.

MARCUS BOEIRA foi aluno de Olavo de Carvalho em Porto Alegre, onde


frequentou grupos de estudos ligados ao Instituto de Estudos Empresariais e
ao Instituto Liberdade. É formado e pós-graduado em direito pela
Universidade de São Paulo e autor dos livros A natureza da democracia
constitucional (2011) e A Escola de Salamanca e a fundação constitucional
do Brasil (2018). Atualmente exerce o cargo de professor de filosofia do
direito na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Entrevista
realizada via Skype em julho de 2018.
N. foi funcionário do Instituto Liberal do Rio de Janeiro, onde exerceu as
funções de contínuo, mensageiro e segurança entre 1991 e 2017, quando se
aposentou. Entrevista realizada em outubro de 2015 no Rio de Janeiro.

PATRÍCIA BUENO NETTO é uma advogada paulistana e doutoranda em direito


pela Universidade Presbiteriana Mackenzie que integrou o Movimento
Endireita Brasil. Frequentadora assídua de protestos, acompanhou a
advogada e professora Janaína Paschoal durante a campanha pelo
impeachment de Dilma Rousseff e, a convite de Paschoal, presenciou o
depoimento de Rousseff no Senado em agosto de 2016. Em 2018 se lançou
como candidata a deputada federal pelo PSL. Entrevista realizada em julho
de 2019 em São Paulo.

PAULO BATISTA é empresário do ramo imobiliário que atua no interior do


estado de São Paulo e foi candidato a deputado estadual em 2014 pelo
Partido Republicano Progressista (PRP) com a campanha virtual que ficou
conhecida como “Raio Privatizador”. Atualmente é filiado ao Patriota,
partido pelo qual disputou as eleições à prefeitura da cidade de Valinhos, no
interior de São Paulo, no ano de 2020. Entrevista realizada em setembro de
2017 em São Paulo em conjunto com a doutoranda em ciência política pela
Universidade de Berkeley Elizabeth McKenna.

PAULO RABELLO DE CASTRO é doutor em economia pela Universidade de


Chicago, diretor-presidente da SR Rating, presidente do Instituto Atlântico e
fundador da oscip Instituto Maria Stella. Integra o Comitê de Gestão do
Grupo de Líderes Empresariais (Lide), é um dos coordenadores do
Movimento Brasil Eficiente (MBE), foi presidente do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE) entre 2016 e 2017, e no segundo semestre de
2017 assumiu a presidência do Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES). Publicou diversos livros, o último, O mito do
governo grátis: O mal das políticas econômicas ilusórias e as lições de 13
países para o Brasil mudar, foi lançado em 2014. Em 2018 se lançou como
candidato à presidência pelo PSC e posteriormente passou a integrar a chapa
de Alvaro Dias (Podemos) como candidato a vice-presidente. Entrevista
realizada em São Paulo em maio de 2017 em conjunto com a jornalista
Agatha Justino.

RAFAELA DE PAULA foi coordenadora do Núcleo de Pesquisa Libertária


sobre a Cultura Brasileira do Grupo de Estudos Quintino Bocaiúva formado
em conjunto com Cibele Bastos e Edson Chinchilla em 2015 no Rio de
Janeiro. Entrevista realizada em novembro de 2015 em São Paulo.

RICARDO VÉLEZ RODRÍGUEZ é colombiano e se formou em filosofia pela


Pontifícia Universidad Javeriana e em teologia pelo Seminário Conciliar de
Bogotá. Realizou seus estudos de pós-graduação no Brasil na Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo e na Universidade Gama Filho (1982).
É membro da Academia Brasileira de Filosofia, do Instituto Brasileiro de
Filosofia (IBF) e do Instituto de Filosofia Luso-Brasileira. Atualmente é
conferencista e membro do conselho consultivo da Universidade Católica
Portuguesa, professor associado da Universidade Federal de Juiz de Fora,
professor-colaborador do Programa de Pós-Graduação em Ciência da
Religião da UFJF e professor da Faculdade Arthur Thomas em Londrina.
Atuou como ministro da Educação entre janeiro e abril de 2019. Entrevista
realizada via Skype em agosto de 2017.

ROBERTO LIMA NETTO foi fundador do Centro Brasileiro de Apoio às Micro


e Pequenas Empresas (Cebrae) e presidente da Companhia Siderúrgica
Nacional (CSN) e vice-presidente da Federação das Indústrias do Rio de
Janeiro (Firjan) na década de 1990. Engenheiro formado pela Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG), possui doutorado em planejamento de
sistemas econômicos e engenharia industrial pela Universidade de Stanford.
Membro do Instituto Atlântico no Rio de Janeiro, exerceu o mandato de
deputado federal pelo Partido da Frente Liberal (PFL) entre 1995 e 1999.
Além de diversos artigos sobre a privatização das estatais publicados na
imprensa diária e especializada, é autor dos livros Curso básico de finanças
e Introdução às finanças (1979) e Volta por cima (1993). Entrevista
realizada em junho de 2016 no Rio de Janeiro.

RODRIGO CONSTANTINO é economista e colunista brasileiro. É graduado pela


Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e possui MBA
em Finanças pelo Ibmec. Foi colunista da revista Veja, escreveu
regularmente para os jornais Valor Econômico e O Globo e é autor de vários
livros, entre os quais Privatize já! e Esquerda caviar. Foi membro-fundador
do Instituto Millenium em 2006 e atualmente é presidente do Conselho
Deliberativo do Instituto Liberal do Rio de Janeiro. Entrevista realizada via
Skype em dezembro de 2016.

RODRIGO SARAIVA MARINHO é advogado, mestre em direito constitucional e


professor da Universidade de Fortaleza (Unifor). É membro do Conselho
Editorial da revista Mises e membro do Conselho de Administração do
Instituto Mises Brasil. Em 2013 fundou e passou a presidir o Instituto
Liberal do Nordeste (Ilin), sediado em Fortaleza, Ceará. Nas eleições de
2016 saiu candidato a vereador da cidade de Fortaleza pela tendência
Livres, então abrigada no Partido Social Liberal (PSL). Em 2017 colaborou
para a organização da Rede Liberdade, que reúne dezenas de organizações
civis e grupos de estudo que defendem o capitalismo de livre mercado, e da
qual se tornou diretor de operações. Entrevista realizada via Skype em
março de 2017.

RODRIGO NEVES se formou em história pela Universidade de São Paulo e


militou no movimento estudantil universitário, onde integrou a chapa de
direita Reação em 2011 para concorrer ao Diretório Central dos Estudantes
e formou o Movimento Liberdade, vinculado a grupos de outras
universidades públicas brasileiras. Tornou-se membro da organização
Endireita Brasil e passou a trabalhar ao lado de Ricardo Salles no Palácio
dos Bandeirantes durante a gestão de Geraldo Alckmin entre 2013 e 2018.
Entrevista realizada em abril de 2018 em São Paulo.

THOMAZ MAGALHÃES atua como empresário no Rio de Janeiro. Foi


fundador e primeiro presidente do Instituto Atlântico. Em 2002 foi
convidado pelo Partido da Frente Liberal (PFL) para coordenar uma possível
candidatura de Roseana Sarney nas eleições que iriam ocorrer naquele ano.
Entrevista realizada em junho de 2016.

WINSTON LING mora em Xangai há treze anos, é mestre em economia pela


Universidade de Chicago e empresário ligado ao grupo Petropar/Évora. Foi
membro-fundador do Instituto Liberal do Rio Grande do Sul (que depois se
tornou o atual Instituto Liberdade) e do Instituto de Estudos Empresariais.
Entrevista realizada via Skype em abril de 2017.
Foto da autora
Renato Parada

Camila Rocha é mestra e doutora em ciência política pela Universidade de


São Paulo. Com a pesquisa que originou este livro, ganhou os prêmios de
melhor tese de doutorado da Associação Brasileira de Ciência Política e de
Tese Destaque USP na área de ciências humanas.
© Camila Rocha, 2021

Todos os direitos desta edição reservados à Todavia.

Grafia atualizada segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de


1990, que entrou em vigor no Brasil em 2009.

capa
Oga Mendonça
composição
Jussara Fino
preparação
Ana Cecília Agua de Melo
checagem
Érico Melo
índice remissivo
Luciano Marchiori
revisão
Huendel Viana
Valquíria Della Pozza
versão digital
Antonio Hermida
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Rocha, Camila (1984-)


Menos Marx, mais Mises : O liberalismo e a nova direita no Brasil / Camila Rocha. —
1. ed. — São Paulo : Todavia, 2021.

Inclui índice e bibliografia.


ISBN 978-65-5692-172-3

1. Jornalismo literário. 2. Livros-reportagem. 3. Política e Governo — Brasil. 4. Direita


(ideologia política). I. Título.

CDD 320.981

Índices para catálogo sistemático:


1. Brasil : Política e Governo 320.981

Renata Baralle — Bibliotecária — CRB 8/10366


todavia
Rua Luís Anhaia, 44
05433.020 São Paulo SP
T. 55 11. 3094 0500
www.todavialivros.com.br
O único avião no céu
Graf, Garrett
9786556921754
560 páginas

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Neste livro monumental, o jornalista e historiador Garrett Graff conta a


história como ela foi vivida — e nas palavras de quem a vivenciou. Com
base em transcrições nunca antes publicadas, documentos recentemente
tornados públicos, entrevistas e relatos de quase quinhentos funcionários do
governo, bombeiros, testemunhas, sobreviventes, amigos e familiares das
vítimas, Graff pinta um retrato vívido e humano do 11 de Setembro.
Assim, ouvimos a voz dos funcionários do aeroporto que, sem saber,
conduzem terroristas para seus voos, e também a dos comissários de bordo
dentro dos aviões sequestrados. Em Nova York, os bombeiros enfrentam
uma cena de horror inimaginável nas Torres Gêmeas.
Mais do que simplesmente uma coleção de depoimentos de testemunhas
oculares, O único avião no céu é a história de como pessoas comuns
lutaram contra eventos extraordinários: o pai e o filho trabalhando na Torre
Norte, pegos em extremos diferentes da zona de impacto; o bombeiro em
busca de sua esposa que trabalha no World Trade Center; a telefonista que
promete compartilhar as últimas palavras de um passageiro com a família
dele.
O único avião no céu narra as experiências de homens e mulheres que se
viram no centro de um acontecimento sem precedentes na história. O
resultado é uma exploração única, profunda e marcante da humanidade em
um dia que mudou o curso do mundo e da vida de todas as pessoas.

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Torto arado
Vieira Junior, Itamar
9786580309320
264 páginas

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Um texto épico e lírico, realista e mágico que revela, para além de sua
trama, um poderoso elemento de insubordinação social.

Nas profundezas do sertão baiano, as irmãs Bibiana e Belonísia encontram


uma velha e misteriosa faca na mala guardada sob a cama da avó. Ocorre
então um acidente. E para sempre suas vidas estarão ligadas — a ponto de
uma precisar ser a voz da outra. Numa trama conduzida com maestria e
com uma prosa melodiosa, o romance conta uma história de vida e morte,
de combate e redenção.

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Diga que não me conhece
Cafiero, Flavio
9786556921655
112 páginas

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Estudo violento do ressentimento amoroso, Diga que não me conhece é um


livro curto e impressionante. Numa escrita lancinante, a um só tempo lírica
e realista, o livro deixa o leitor sem fôlego diante do ritmo imposto, com
enorme perícia, por Flavio Cafiero. Como que mimetizando o próprio
centro da cidade, o autor traz para estas páginas a delicadeza e a ignomínia,
a agitação e a busca por transcendência, o amor e o mais fundo desprezo.

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A república das milícias
Manso, Bruno Paes
9786556920672
304 páginas

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O que fazia o policial Fabrício Queiroz antes de se tornar conhecido em


todo o país como aliado de primeira hora da família Bolsonaro? E o líder
miliciano Adriano da Nóbrega, matador profissional condecorado por
Flávio Bolsonaro e morto pela polícia em 2019? E o ex-sargento Ronnie
Lessa, apontado como autor dos disparos que mataram a vereadora Marielle
Franco e morador do mesmo condomínio do presidente da República na
Barra da Tijuca? Os três foram protagonistas de uma forma violenta de
gestão de território que tomou corpo nos últimos vinte anos e ganha neste
livro um retrato por inteiro: as milícias. Eles são apresentados ao lado de
policiais, traficantes, bicheiros, matadores, justiceiros, torturadores,
deputados, vereadores, ativistas, militares, líderes comunitários, jornalistas
e sobretudo vítimas de uma cena criminal tão revoltante quanto complexa.
O livro se constrói a partir de depoimentos de protagonistas dessa batalha.
São entrevistas que chocam pela franqueza e riqueza de detalhes, em que
assassinatos se sucedem e as ligações entre policiais, o tráfico, o jogo do
bicho e o poder público se mostram de forma inequívoca. Num cenário em
que o Estado é ausente e as carências se multiplicam, a violência se propaga
de forma endêmica, mas deixa no ar a questão: qual a alternativa?
A resposta está longe de ser simples. Sobretudo num país de urbanização
descontrolada e cultura política permeável ao autoritarismo. Dos esquadrões
da morte formados nos anos 1960 ao domínio do tráfico nos anos 1980 e
1990, dos porões da ditadura militar às máfias de caça-níquel, da ascensão
do modelo de negócios miliciano ao assassinato de Marielle Franco, este
livro joga luz sobre uma face sombria da experiência nacional que passou
ao centro do palco com a eleição de Jair Bolsonaro à presidência em 2018.
Mistura rara de reportagem de altíssima voltagem com olhar analítico e
historiográfico, A república das milícias expõe de forma corajosa e pioneira
uma ferida profundamente enraizada na sociedade brasileira.

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Não é um rio
Almada, Selva
9786556921716
96 páginas

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Com sua prosa precisa e econômica, a argentina Selva Almada é uma das
vozes mais originais da literatura de língua espanhola contemporânea. Seu
universo também é peculiar: a autora não fala da cosmopolita Buenos Aires.
Seu ambiente é o mundo interiorano, onde vilarejos quase esquecidos no
mapa abundam em histórias em que a violência, os laços familiares e velhos
costumes ainda são decisivos.
É o caso deste novo romance, um livro que trata da amizade e seus
segredos. Durante uma pescaria entre três homens, a complexidade com que
se forjam os afetos é revelada como o próprio curso de um rio. Enero Rey e
Negro levam Tilo, o filho adolescente de Eusébio (o amigo morto dos dois),
para pescar. Enquanto bebem vinho, cozinham, falam e dançam, eles lutam
com os fantasmas do passado e do presente. Esse momento íntimo e
peculiar que conecta a trajetória desses três homens também os liga à vida
dos habitantes locais nesse ambiente cercado de água e regido por suas
próprias leis.
Há perdas e mortes prematuras. Mas há também a teimosa vitalidade da
natureza: um matagal coberto de árvores centenárias, animais, pássaros; o
rio trazendo vida nas suas entranhas; as gentes nascidas e criadas nessa
paisagem que a protegem com unhas e dentes contra os intrusos. Humano,
mas ao mesmo tempo animal e vegetal, este romance flui como uma
conversa entre seres que se amam.

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