01 - Revisao de Mecanica - Fisica Geral

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MECÂNICA CLÁSSICA I

2019-2020

Revisão de Mecânica - Fı́sica Geral

1. Conceitos fundamentais e pressupostos da Mecânica Clássica


A Mecânica Clássica baseia-se em três conceitos fundamentais: espaço, tempo e força, a partir dos
quais se podem definir as restantes variáveis mecânicas. Subjacentes à Mecânica Clássica estão
ainda três pressupostos:
• A medida do tempo é universal;
• O Universo existe num espaço euclidiano a 3 dimensões;
• Não há limite para o rigor com que se pode medir a posição e a velocidade de um corpo.
Durante muito tempo, pensou-se que esta teoria descrevia rigorosamente os fenómenos mecânicos
ocorridos na Natureza. No entanto, no inı́cio do século XX, descobriu-se que este formalismo é
apenas aplicável a sistemas mecânicos de dimensões compreendidas entre a dimensão atómica e a
dimensão cósmica que se movem com velocidades bastante inferiores à da luz. Os restantes casos
necessitam de outras teorias mecânicas que incluam efeitos quânticos ou relativistas. Nestes casos,
um ou mais dos anteriores pressupostos não são válidos.

2. Cinemática de uma partı́cula


A cinemática estuda a descrição do movimento dos corpos, independentemente das suas causas.
As variáveis cinemáticas relevantes para o estudo do movimento de uma partı́cula são a posição, a
velocidade e a aceleração.
A posição de uma partı́cula é uma função do tempo e é definida pelo vector com ponto de aplicação
na origem do sistema de eixos e extremidade no ponto onde se situa a partı́cula:
~r(t). (1)

A velocidade de uma partı́cula é definida como a derivada do seu vector posição em ordem ao
tempo:
d~r
~v = . (2)
dt
A aceleração de uma partı́cula é definida como a derivada do seu vector velocidade em ordem ao
tempo:
d~v
~a = . (3)
dt
Cada um destes vectores pode ser decomposto em componentes tangencial e normal:
ds
~v = t̂, (4)
dt
em que s é a posição da partı́cula marcada ao longo da trajectória e t̂ é o versor tangente à trajectória
com o sentido dos valores crescentes de s e
dv v2
~a = t̂ + n̂, (5)
dt ρ

1
em que v é a velocidade escalar, ρ o raio de curvatura e n̂ o versor normal à trajectória, com o
sentido da sua concavidade.
No caso particular de uma partı́cula realizar um movimento circular, podem ser definidas coorde-
nadas angulares: a posição θ, que é o ângulo ao centro descrito pelo vector posição da partı́cula
em relação ao centro da trajectória, a velocidade angular ω e a aceleração angular α. A velocidade
angular é definida, como habitualmente, como a derivada da posição em ordem ao tempo:

ω= , (6)
dt
e a aceleração angular como a derivada da velocidade angular:

α= . (7)
dt
No entanto, é possı́vel definir um vector velocidade angular ω ~ como um vector perpendicular ao
movimento, sentido dado pela regra da mão direita e módulo igual ao módulo da velocidade angular
escalar. Então, o vector aceleração angular define-se como a derivada do vector velocidade angular:
d~
ω
α
~= , (8)
dt
e tem um módulo igual ao módulo da aceleração angular escalar.
As coordenadas angulares escalares relacionam-se com as coordenadas lineares através das equações:

s = Rθ, (9)

v = Rω, (10)
at = Rα, (11)
sendo a aceleração normal dada por
an = Rω 2 . (12)
O vector velocidade linear relaciona-se ainda com o vector velocidade angular através da equação

~ ∧ ~r.
~v = ω (13)

As variáveis cinemáticas de uma partı́cula dependem do referencial usado para as descrever. Quando
usamos dois referenciais diferentes, S e S 0 , que efectuam um movimento relativo de translação
sem rotação, as variáveis cinemáticas da partı́cula nos dois referenciais relacionam-se através das
seguintes equações:
~r = ~r 0 + R,
~ (14)
~v = ~v 0 + V
~, (15)
~a = ~a 0 + A,
~ (16)
em que ~r, ~v e ~a são as variáveis posição, velocidade e aceleração da partı́cula no referencial S, ~r 0 ,
~ V
~v 0 e ~a 0 as respectivas variáveis no referencial S 0 , e R, ~ eA ~ são as variáveis posição, velocidade
0
e aceleração da origem do referencial S em relação a S. No caso de o movimento relativo dos
referenciais ser rectilı́neo uniforme, estas equações tomam a forma:

~r = ~r 0 + V
~ t, (17)

~v = ~v 0 + V
~, (18)
~a = ~a 0 , (19)

2
~ constante. À eq.(17) dá-se o nome de transformação de Galileu.
com V
Se os referenciais S e S 0 realizam um movimento relativo de rotação uniforme sem translação (supõe-
se que a rotação se efectua em torno de um eixo que passa pelas origens dos dois referenciais, supostas
coincidentes), então as equações procuradas são:

~r = ~r 0 (20)

~v = ~v 0 + ω
~ ∧ ~r (21)
~a = ~a 0 + 2~
ω ∧ ~v 0 + ω
~ ∧ (~
ω ∧ ~r). (22)
em que ω~ é a velocidade angular de rotação de S 0 em relação a S. Ao termo 2~
ω ∧ ~v dá-se o nome
~ ∧ (~
de aceleração de Coriolis e ao termo ω ω ∧ ~r) aceleração centrı́pta.

3. Dinâmica de uma partı́cula.


Começamos por definir momento linear de uma partı́cula como p~ = m~v , em que m é a massa da
partı́cula.
Toda a dinâmica de uma partı́cula está contida em três leis, chamadas leis de Newton:

1 - Lei da inércia: uma partı́cula livre mantém o seu estado de repouso ou de movimento rectilı́neo
uniforme: F~ = 0 ⇒ ~v = const.;
2 - Lei fundamental da dinâmica: a resultante das forças que actuam sobre uma partı́cula é igual
à variação do seu momento linear por unidade de tempo: F~ = d~p
dt ;
3a - Lei da acção-reacção (enunciado lato): sempre que uma partı́cula i exerce uma força F~ij sobre
um partı́cula j, esta irá exercer sobre i uma outra força F~ji com a mesma direcção e o mesmo
módulo de F~ij , mas com sentido contrário: F~ji = −F~ij .
3b - Lei da acção-reacção (enunciado restrito): sempre que uma partı́cula i exerce uma força F~ij
sobre um partı́cula j, esta irá exercer sobre i uma outra força F~ji com a mesma direcção, o
mesmo módulo e a mesma linha de acção de F~ij , mas com sentido contrário: F~ji = −F~ij e
F~ji k ~rij , em que ~rij = ~ri − ~rj é o vector posição da partı́cula i relativamente à partı́cula j.

Os referenciais onde estas leis são válidas são chamados de referenciais inerciais.
O impulso I~ de uma força F~ no intervalo de tempo de t1 a t2 é definido por:
Z t2
~
I= F~ (t) dt (23)
t1

e demonstra-se que o impulso da resultante das forças que actuam sobre uma partı́cula num certo
intervalo de tempo é igual à variação do momento linear da partı́cula nesse intervalo de tempo:

I~ = p~2 − p~1 . (24)


~ de uma partı́cula é dado por
O momento angular L
~ = ~r ∧ p~
L (25)

e demonstra-se que a derivada do momento angular de uma partı́cula em ordem ao tempo é igual
ao momento da resultante das forças que actuam sobre essa partı́cula:

~
~ = dL .
N (26)
dt

3
O trabalho realizado por uma força F~ , que actua sobre uma partı́cula que descreve uma trajectória
desde o ponto 1 até ao ponto 2 é dado por:
Z 2
W12 (F~ ) = F~ .d~r. (27)
1

Este integral é um integral de percurso: em geral, o seu valor depende da forma da trajectória e
não apenas apenas dos pontos inicial e final.
A energia cinética de uma partı́cula é dada por
1
T = mv 2 . (28)
2

O teorema da energia cinética estabelece que o trabalho realizado pela resultante das forças que
actuam sobre uma partı́cula ao longo de um certo trajecto é igual à variação da energia cinética da
partı́cula nesse trajecto:
W12 (F~ ) = T2 − T1 . (29)

Define-se campo de forças como uma força que depende exclusivamente da posição da partı́cula
sobre a qual actua (e, possivelmente, do tempo). Campo de forças conservativo é um campo de
forças cujo trabalho não depende da forma da trajectória da partı́cula mas apenas das suas posições
inicial e final. A cada campo conservativo está associada uma função energia potencial V (~r), que
se define como o trabalho realizado por esse campo quando a partı́cula se desloca desde esse ponto
~r até um outro (O) tomado para origem das energias potenciais:

V (~rA ) = WAO (F~ ). (30)

Para um campo de forças conservativo, verifica-se que o trabalho realizado por esse campo quando
a partı́cula sobre a qual actua descreve uma certa trajectória é igual ao simétrico da variação da
energia potencial dessa partı́cula nessa trajectória:

W12 (F~ ) = −(V2 − V1 ). (31)

Quando uma partı́cula está apenas sujeita à acção de campos conservativos, a sua energia mecânica

E =T +V (32)

mantém-se constante. Se a partı́cula está sujeita à acção de forças conservativas e forças não
conservativas, então demostra-se que

E2 − E1 = W12 (F~ 0 ), (33)

em que F~ 0 é a resultante das forças não conservativas que actuam sobre a partı́cula.
Uma força conservativa é sempre dada pelo gradiente da correspondente energia potencial

F~ = −∇V
~ (~r) (34)

e inversamente, sempre que a força se pode escrever como o gradiente de uma função independente
do tempo, essa força é conservativa. No entanto, uma força que se pode escrever como

F~ = −∇V
~ (~r, t) (35)

não é conservativa, embora V (~r, t) continue a ser chamada energia potencial.

4
Qualquer campo de forças independente R do tempo a uma dimensão é conservativo, sendo a sua
energia potencial dada por V (x) = − F (x) dx. Assim, a energia mecânica de uma partı́cula que
se move num espaço a uma dimensão sujeita à acção de um campo de forças independente do tempo
mantém-se constante. A equação que descreve a conservação da energia é equivalente à segunda lei
de Newton e permite obter a equação do movimento para essa partı́cula através da equação:
Z xr
m
t = t1 ± dx. (36)
x1 2(E − V (x))

Um campo de forças no espaço a três dimensões é chamado de campo central se, em cada ponto, a
força tiver a direcção radial:
F~ (~r) = F (~r)r̂. (37)
O momento angular de qualquer partı́cula sujeita apenas a um campo de forças central mantém-se
constante.
Um campo de forças central tem simetria esférica se o escalar força apenas depender do módulo do
vector posição:
F~ (~r) = F (r)r̂. (38)

Demonstra-se que é condição necessária e suficiente para um campo central ser conservativo o ter
simetria esférica.

4. Dinâmica de um sistema de partı́culas.


Define-se centro de massa do sistema de partı́culas como sendo o ponto cuja posição é dada pelo
vector P
~ mi~ri
R= i (39)
M
P
em que M = i mi . O momento linear do sistema de partı́culas é definido por
X
P~ = p~i = M V ~ (40)
i

em que
~
~ = dR
V (41)
dt
é a velocidade do centro de massa.
(e)
Representando por F~i a resultante das forças externas sobre a partı́cula i, o enunciado lato da lei
da acção-reacção permite-nos escrever as equações
~
d2 R
F~ (e) = M 2 , (42)
dt
e
dP~
F~ (e) = , (43)
dt
P ~ (e)
em que F~ (e) = i Fi representa a resultante das forças exteriores que actuam sobre o sistema de
partı́culas.
O momento angular do sistema de partı́culas é dado por L ~ = P L~
i i . Admitindo a validade do
~
enunciado restrito da lei da acção-reacção, verifica-se que L obedece à equação do movimento:
~
~ (e) = dL ,
N (44)
dt

5
~ (e) é a soma dos momentos das forças externas que actuam sobre o sistema.
em que N
O trabalho realizado por todas as forças que actuam sobre o sistema pode escrever-se como a soma
do trabalho realizado pelas forças internas com o trabalho realizado pelas forças externas:

W12 = Wint,12 + Wext,12 (45)

em que
X Z 2 XZ 2
(e)
Wint,12 = F~ji .d~ri e Wext,12 = F~i .d~ri , (46)
i,j,i6=j 1 i 1

sendo F~ji a força que a partı́cula j exerce sobre a partı́cula i. Nestas expressões, cada um dos
limites de integração 1 e 2 representa um conjunto das posições das partı́culas do sistema num
certo instante, que designaremos simplesmente por posição do sistema. Definimos energia cinética
do sistema
P de partı́culas como a soma das energias cinéticas das partı́culas que constituem o sistema:
T = i Ti . Então, quando o sistema percorre uma certa trajectória, a variação da sua energia
cinética vai ser igual ao trabalho realizado por todas as forças que actuam sobre o sistema:

W12 = T2 − T1 . (47)

Se as forças forem todas conservativas (o que implica que as forças internas são forças centrais
com simetria esférica), é possı́vel definir a função energia potencial interna Vint (e energia potencial
externa Vext ) de uma forma idêntica à definição de energia potencial de uma partı́cula. Neste caso,
define-se como o trabalho realizado pelas forças internas (externas) quando o sistema se desloca
desde essa posição até uma outra (adiante designada pelo ı́ndice 0), tomada para origem das energias
potenciais.
A energia potencial interna do sistema quando está na posição 1 é, então, definida por

Vint = Wint,10 . (48)

Designando por rij a distância entre as partı́culas i e j na posição 1 e por rij0 essa distância na
posição 0 (origem das energias potenciais), obtemos
X Z rij0 X Z t2 d~ri X Z t2
Vint = F~ji .d~ri = F~ji . dt = F~ji .~vi dt. (49)
rij t1 dt t1
i,j,i6=j i,j,i6=j i,j,i6=j

em que se supõe que o sistema de partı́culas vai desde a posição 1 até à origem das energias
potenciais no intervalo de tempo [t1 , t2 ].
Usando o facto de os ı́ndices do somatório serem mudos e usando a lei da acção-reacção,
 
X 1 X X 1 X ~ 1 X ~
F~ji .~vi =  F~ji .~vi + F~ij .~vj  = Fji .(~vi − ~vj ) = Fji .~vij (50)
2 2 2
i,j,i6=j i,j,i6=j i,j,i6=j i,j,i6=j i,j,i6=j

em que a velocidade relativa ~vij = ~vi − ~vj se define como


d~rij
~vij = e ~rij = ~ri − ~rj . (51)
dt
Então, Z t2 Z rij0
1 X ~ 1 X
Vint = Fji .~vij dt = F~ji .d~rij . (52)
2 t1 2 rij
i,j,i6=j i,j,i6=j

Definindo Z rij0
Vij (rij ) = F~ji .d~rij , (53)
rij

6
fica então
1 X X
Vint,1 = Vij (rij ) = Vij (rij ). (54)
2
i,j,i6=j pares(i,j)

A energia potencial externa será dada por


X
Vext = Vi (~ri ) (55)
i

em que
Z ~
r0
(e)
Vi (~ri ) = F~i .d~ri . (56)
~
ri

Então, verifica-se que


Wint,12 = Vint,1 − Vint,2 (57)
e
Wext,12 = Vext,1 − Vext,2 (58)
e a energia mecânica total E = T + Vint + Vext permanece constante.
Sejam L ~ 0 e T 0 respectivamente o momento angular e a energia cinética do sistema de partı́culas
relativamente ao referencial centro de massa. Então, verifica-se que

~ 0+R 1
~ =L
L ~ ∧ P~ e T = T 0 + M V 2. (59)
2

~ 0 é
A equação do movimento para L
~0
~ 0(e) = dL
N (60)
dt
em que N ~ 0(e) é a soma dos momentos das forças exteriores calculados relativamente ao centro de
massa do sistema. Esta equação é válida, ainda que o referencial centro de massa não seja um
referencial inercial.

5. Forças fictı́cias
Já referimos que as leis de Newton são válidas apenas nos referenciais inerciais. Assim, sendo S
um referencial inercial,
F~ = m~a, (61)
em que ~a é a aceleração da partı́cula no referencial S. Vamos supor, para simplificar, que o refer-
encial S 0 realiza um movimento de translação sem rotação relativamente s S. Então, a aceleração
da partı́cula ~a 0 nesse referencial S 0 relaciona-se com ~a através da eq.(16)

~a = ~a 0 + A.
~ (62)

Substituindo ~a dado pela eq.(62) na eq.(61), obtemos

F~ = m~a 0 + mA
~ ⇔ ~ = m~a 0 .
F~ − mA (63)

Assim, embora a Lei Fundamental da Dinâmica não seja válida em referenciais não inerciais, é
possivel usar uma equação idêntica desde que adicionemos uma parcela −mA ~ às forças que actuam
sobre a partı́cula. Esta parcela não corresponde a nenhuma força real que actue sobre a partı́cula.
Apenas surge por se querer usar a Lei Fundamental da Dinâmica num referencial não inercial. Esta
parcela chama-se força fictı́cia ou força inercial. Para movimentos relativos de rotação entre os
referenciais S e S 0 , o raciocı́nio é idêntico.

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