Diálogos de Gênero 3
Diálogos de Gênero 3
Diálogos de Gênero 3
Nariel Diotto
Roana Funke Goularte
(Organizadoras)
DIÁLOGOS DE GÊNERO
PERSPECTIVAS CONTEMPORÂNEAS
Volume 3
Editora Ilustração
Cruz Alta – Brasil
2022
Copyright © Editora Ilustração
CATALOGAÇÃO NA FONTE
D536 Diálogos de gênero : perspectivas contemporâneas
/ organizadoras: Bibiana Terra, Nariel Diotto, Roana
Funke Goularte. - Cruz Alta : Ilustração, 2022.
v. 3
ISBN 978-85-92890-52-0
DOI 10.46550/978-85-92890-52-0
1. Mulheres - Direito. 2. Feminismo. 3. Desigualdade de
gênero. 4. Direitos humanos. I. Terra, Bibiana (org.). II.
Diotto, Nariel (org.). III. Goularte, Roana Funke (org.).
CDU: 396.2
Responsável pela catalogação: Fernanda Ribeiro Paz - CRB 10/ 1720
2022
Proibida a reprodução parcial ou total desta obra sem autorização da Editora
Ilustração
Todos os direitos desta edição reservados pela Editora Ilustração
Rua Coronel Martins 194, Bairro São Miguel, Cruz Alta, CEP 98025-057
E-mail: [email protected]
www.editorailustracao.com.br
Conselho Editorial
Prefácio�������������������������������������������������������������������������������������13
Deise Brião Ferraz
Apresentação�����������������������������������������������������������������������������15
Bibiana Terra
Nariel Diotto
Roana Funke Goularte
Sobre os autores�����������������������������������������������������������������������241
Prefácio
Bibiana Terra
Nariel Diotto
Roana Funke Goularte
Capítulo 1
Bibiana Terra
Bianca Tito
Considerações iniciais
direito do trabalho.
Acerca do referencial teórico adotado, conforme apresentado
já no título do artigo, esse está apoiado nos pressupostos teóricos
desenvolvidos por Silvia Federici. Por fim, cabe ainda destacar que
esse estudo se justifica pela importância de desenvolver pesquisas
que considerem abordagens feministas dentro da discussão
trabalhista e que busquem refletir sobre o trabalho invisível e
doméstico desempenhado pelas mulheres.
empregos.
Nesse sentido, inicialmente, é preciso destacar que para que
seja possível haver uma compreensão acerca das discriminações que
as mulheres sofrem em razão de gênero dentro de seus trabalhos,
primeiramente é necessário que alguns conceitos centrais sejam
apresentados e que haja uma breve contextualização desse cenário
que favorece o trabalho desempenhado pelos homens e que continua
oprimindo as mulheres trabalhadoras em razão de seu gênero.
Desde as sociedades mais primitivas, conforme demonstra
a história, as mulheres sempre foram subordinadas aos homens,
tendo sido submetidas ao seu domínio e sofrido discriminações
em razão de seu gênero. Assim, pode-se compreender que elas
foram colocadas à margem da sociedade. Essas discriminações e
desigualdades de gênero são inegáveis e afetaram todas as esferas de
suas vidas, inclusive as suas relações de trabalho (BARROS, 2009,
p. 1084-1085).
Nesse sentido, é possível compreender que as desigualdades,
discriminações e hierarquias de gênero permeiam todas as relações
nas vidas das mulheres, sendo também vivenciadas e reproduzidas
na esfera trabalhista, dentro de seus empregos. Desse modo, é
fundamental estudar e compreender acerca das discriminações de
gênero dentro do trabalho, acerca da proteção jurídica do trabalho
feminino e das consequências da divisão sexual do trabalho.
Além disso, há um ponto muito importante que carece de
mais pesquisas: o trabalho invisível das mulheres. Aquele trabalho
que é sistematicamente desempenhado por elas, mas que é oculto
na sociedade, muito embora mantenha as relações patriarcais e
capitalistas. Por essa razão, é justamente esse ponto do trabalho
invisível das mulheres que será estudado na presente pesquisa, a
partir dos pressupostos desenvolvidos por Silvia Federici.
É fundamental destacar que um dos grandes fatores que
ensejou as discriminações das mulheres na seara trabalhista e que as
excluiu de desenvolverem muitos empregos foi a compreensão de
que existem atividades que são essencialmente femininas (BIROLI,
27
Diálogos de Gênero: Perspectivas Contemporâneas
Considerações finais
Referências
Considerações iniciais
não mudou após a libertação: a relação direta dos seus corpos com
“um erotismo primitivo” e “consideradas só corpo, sem mente”
(HOOKS, 1995, p. 469). A violência que a população negra
sofria não se conteve aos períodos da escravidão, gangues racistas
se mobilizaram para infligir suas vidas com os linchamentos, no
período pré-Guerra Civil, em razão do descontentamento com
o alistamento obrigatório de homens negros em 1862 e com a
possibilidade do voto de homens negros ser aprovado, depois da
Guerra Civil. Tais acontecimentos expressavam as especificidades
da opressão de raça, que em geral não era apreendida pelos
abolicionistas brancos de classe média (DAVIS, 2016).
Após a Guerra Civil nos Estados Unidos, a possibilidade
do sufrágio do homem negro (a aprovação da décima quinta
emenda) provocou uma cisão entre o movimento pela igualdade
de direitos. Esse momento da história é uma explícita diferenciação
entre a luta de mulheres brancas e mulheres negras: essas últimas
que experienciavam conjuntamente a opressão de raça, não
podiam se opor à aprovação do voto ao homem negro quando a
população negra era brutalmente atingida por linchamentos por
gangues racistas como a Ku Kux Klan (DAVIS, 2016). Primeiro,
como pontua Davis (2016), os linchamentos eram justificados
como forma de evitar uma possível revolta da população negra,
posteriormente, o mito do estuprador negro foi criado para que
a face mais cruel do racismo fosse uma resposta conveniente dos
homens brancos que protegiam suas esposas.
Outra cisão do caminho de mulheres brancas e negras está
na luta em prol do controle de natalidade. Davis (2016) descreve
como as mulheres negras interrompiam a vida de seus filhos, durante
a gravidez ou após, desde a escravidão como recusa de submeter
suas crias àquela vida degradante de exploração eterna. Quando o
movimento de mulheres pelo direito à igualdade política emergiu,
a livre escolha pela maternidade também foi agitada, as mulheres
queriam ter tempo livre em suas vidas para atuarem além de suas
famílias. Entretanto, para as mulheres negras e trabalhadoras,
o controle de natalidade não significava apenas liberdade, mas
47
Diálogos de Gênero: Perspectivas Contemporâneas
Leitura interseccional
alcançar mães que sofrem com a morte de seus filhos. Neste sentido,
a análise interseccional disposta no segundo capítulo orienta uma
abordagem da violência que vai além das feridas imediatas.
Por isso, o conhecimento levantado pelo feminismo negro
se faz importante na medida em que permite suplantar noções
universalistas baseadas em um feminismo branco e liberal. A
consequência deste último no que tange o fenômeno da violência
contra as mulheres e meninas é a exclusão das mulheres socialmente
marginalizadas de serem contempladas por políticas públicas e,
por sua vez, a maior intensidade que estas violências as atingem.
Assim, sintomas da violência com base no gênero e na raça podem
ser percebidos de modo que, tomando estes marcadores sociais
separadamente, se exclui a possibilidade de percepção integral do
fenômeno.
Se faz necessário afirmar o direito a ter direitos, ou seja,
diante do amontoar de corpos de as mulheres negras é importante
afirmar a humanidade destas mulheres (WERNECK; IRACI,
2016). Humanizar significa também contar suas histórias e
deixar que suas vozes ecoem. Assim, é imprescindível que saia da
invisibilidade e, assim, que a preocupação com essas mulheres se
converta em amparo.
Os dados que acusam a falta de abrigos ou até mesmo a falta
de Delegacias da Mulher nos municípios evidenciam a resposta
insuficiente centrada na criminalização e como é necessário
voltar-se para assistência psicológica, para a inserção de mulheres
no mercado de trabalho para que possuam uma vida livre da
dependência econômica bem como que haja acesso à justiça e neste
último caso que as vozes das mulheres ecoem, que seus discursos
sejam ouvidos e valorizados para além da impressão de estereótipos
racistas e sexistas (FLAUZINA, 2018).
A interseccionalidade como resposta metodológica para
atender essas identidades forjadas no fluxo das opressões denuncia
o apagamento, promove a repercussão das vozes dessas mulheres e
a necessidade de pensar o tratamento simultâneo das opressões que
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Diálogos de Gênero: Perspectivas Contemporâneas
Referências
Considerações iniciais
Considerações finais
Referências
Considerações iniciais
Considerações finais
Referências
Luciana Caligaro
Júlia Pavani Padilha
Carla Rosane da Silva Tavares Alves
Vanessa Steigleder Neubauer
Considerações iniciais
de vida da criança.
[...]
Art. 9º - o poder público, as instituições e os empregadores
propiciarão condições adequadas ao aleitamento materno,
inclusive aos filhos de mães submetidas à medida privativa de
liberdade.
Sendo assim, o bebê está amparado legalmente, desde
a sua concepção, diante do que está expresso no artigo terceiro
do Estatuto da Criança e do Adolescente, no qual: “asseguram-
lhe todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar
o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social em
condições de liberdade e dignidade” (ECA, 2014, p.1041).
Nesse contexto, é importante conceber a amamentação no
cárcere, como de fato é vivenciada pelas detentas-mães, quando
inseridas no caótico sistema prisional; é necessário assimilar
que, além de um direito assegurado em lei às mães e aos filhos,
o aleitamento também é uma questão de saúde pública, devido
às inúmeras situações de vulnerabilidade, nas quais as mulheres
encarceradas são expostas. Verifica-se, com isso, a ineficiência do
sistema prisional brasileiro, como desrespeito aos direitos humanos.
Além disso, a vida no cárcere, para as mulheres, constitui-
se em uma vivência ainda mais dura do que para os homens, não
somente pela distinção de gênero, mas também porque muitas
dessas mulheres são chefes de família, mães de filhos ainda menores
ou até mesmo bebês e que, em sua grande maioria, não têm outro
responsável além da mãe, fazendo com que em muitos casos, pela
falta de estruturação prisional, essas mães percam a guarda de seus
filhos (SILVA, 2016, p. 11).
Corroborando com tais acontecimentos, Silva (2016, p.22)
reforça que o Estado de São Paulo, em 10 de fevereiro de 2012,
sancionou o Decreto nº. 57.783/2012, objetivando proporcionar
melhorias ao tratamento dispensado às presas submetidas à tamanha
brutalidade. O decreto menciona:
Considerando o disposto nos artigos 1º, inciso III, e 5º
incisos III e XLIX da Constituição Federal, segundo os quais a
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Diálogos de Gênero: Perspectivas Contemporâneas
Considerações finais
Referências
Considerações iniciais
6 Utilizamos o termo sexismo a partir de bell hooks, para quem o feminismo consiste em
um movimento para acabar com sexismo, exploração sexista e opressão” (HOOKS,
2019, p. 15).
111
Diálogos de Gênero: Perspectivas Contemporâneas
8 De acordo com Helô D’Ângelo, “Mary Wollstonecraft entrou para a história como
mãe de Mary Shelley, a célebre autora de Frankestein. Mas essa não foi sua única marca
histórica. Ainda no século 18, a filósofa produziu registros históricos da Revolução
Francesa, publicou comentários políticos que respondiam a pensadores homens,
escreveu romances e livros infantis que questionavam a ordem sexual e de gênero,
além de defender os direitos das mulheres à educação e à igualdade no casamento.
Hoje, mais de 200 anos após sua morte, Wollstonecraft é celebrada principalmente
como uma das fundadoras do feminismo” (2017).
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Diálogos de Gênero: Perspectivas Contemporâneas
9 Nesta pesquisa, utilizamos o termo “bruxa”, a partir dos estudos de Silvia Federici
(2019, p. 53), como a mulher de má reputação que na juventude apresentara
comportamento libertino/promíscuo e muitas vezes tinha crianças fora do regime
matrimonial, agindo contra o modelo de feminilidade imposto à população feminina
da Europa através do púlpito e da reorganização familiar.
114
Diálogos de Gênero: Perspectivas Contemporâneas
Considerações finais
Referências
Considerações inicias
2003).
Neste sentido, o reconhecimento da luta das minorias
sexuais são fundamentais na garantia da justiça, em que convergem
elementos políticos, como a eliminação das desigualdades e
elementos socioculturais na defesa da liberdade de vivências
identitárias múltiplas. Assim, a construção e reconstrução da
identidade de gênero constitui elemento decisivo para manutenção
cada vez mais intensa e fortalecida na conquista subjetiva de direitos
voltados a indivíduos que buscam espaço e respeito de serem o que
desejam ser.
Considerações finais
Referências
Considerações iniciais
Brasil,
[...] o conceito de direitos reprodutivos começou a ser
formulado a partir da reflexão das mulheres a respeito do
exercício de sua função reprodutiva, de seu papel e de suas
condições na sociedade [...]. A mudança da terminologia ‘saúde
da mulher’ para a de ‘conceito de direitos reprodutivos’ passou
a ser empregada sistematicamente no início dos anos 1980,
quando havia participação ativa de um grupo de feministas
brasileiras no I Encontro Internacional de Saúde da Mulher,
em Amsterdã. Porém, esse termo só foi consagrado na década
de 1990 quando a Organização das Nações Unidas (ONU)
realizou reuniões temáticas internacionais, nas quais questões
relativas ao gênero, saúde, equidade, autonomia, direitos
humanos, dentre outras, foram reafirmados e reforçados
mutuamente (LEMOS, 2014, p. 245).
Como visto, a construção dos direitos reprodutivos é fruto,
principalmente, do engajamento dos movimentos de mulheres e de
seu reconhecimento enquanto direitos humanos e fundamentais. O
ambiente dessas reivindicações também possibilitou a consagração
desses direitos, levando em consideração as necessidades que
emergiram no contexto contemporâneo, principalmente quanto
a autonomia e emancipação feminina, ao controle do corpo e
fecundidade, além da atenção à saúde reprodutiva (VENTURA,
2009).
Mas ainda há um longo caminho a ser percorrido para a
garantia integral desses direitos, principalmente no Brasil, em que
movimentos conservadores e fundamentalistas constroem barreiras
para a libertação feminina, com base na manutenção de papéis
sexuais, que desqualificam o corpo, a existência e até mesmo a
narrativa das mulheres. Dessa forma, importante se faz a reflexão
acerca da experiência de outros países, na luta pela descriminalização
e legalização do aborto, como forma de construir marcos teóricos
que possam influenciar as normas brasileiras, no intuito de articular
políticas de fortalecimento dos direitos reprodutivos, notadamente,
o direito ao aborto.
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Diálogos de Gênero: Perspectivas Contemporâneas
Considerações finais
Referências
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LEMOS, Adriana. Direitos sexuais e reprodutivos: percepção dos
profissionais da atenção primária em saúde. Saúde Debate, v. 38,
169
Diálogos de Gênero: Perspectivas Contemporâneas
Considerações iniciais
Obstétrica”:
Considerando que os resultados da pesquisa Nascer no Brasil,
realizada entre 2011 e 2012, a qual teve como um de seus
objetivos analisar as intervenções realizadas, apontaram que
em mais de 70% das mulheres foi realizada punção venosa; que
cerca de 40% receberam ocitocina e realizaram amniotomia
(ruptura da membrana que envolve o feto) para aceleração
do parto e que 30% receberam analgesia raqui/peridual. E
que, em relação as intervenções realizadas durante o parto, a
posição de litotomia (deitada com a face para cima e de joelhos
flexionados) foi utilizada em 92% dos casos; a manobra de
Kristeller (aplicação de pressão na parte superior do útero) teve
uma ocorrência de 37% e a episiotomia (corte na região do
períneo) ocorreu em 56% dos partos [...].
Ademais, na Recomendação n° 5, de 9 de maio de 2019, é
abordado sobre o primeiro caso de mortalidade materna o qual o
Brasil foi condenado pelo Comitê CEDAW (Convenção sobre a
Eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher),
nesse sentido (BRASIL, 2019):
Considerando que o primeiro caso sobre mortalidade materna
decidido por um órgão internacional de direitos humanos
foi a condenação do Brasil por parte do Comitê CEDAW
(Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação contra a Mulher) no paradigmático Caso
Alyne Pimentel que diz respeito à morte de uma mulher negra
brasileira, jovem, gestante e moradora do estado do Rio de
Janeiro (Baixada Fluminense) em decorrência da ausência de
assistência médica adequada, sendo um fato que não foi de
imediato apurado judicialmente.
No âmbito internacional, temos algumas legislações
pertinentes ao tema, como as leis da Argentina (ARGENTINA,
2009) e Venezuela (VENEZUELA, 2007). A Lei Venezuelana
n° 38.668 de 23 de abril de 2007, em seu artigo 15, inciso 13,
tipifica a prática deste ato como criminoso da seguinte forma
(VENEZUELA, 2007):
[...] qualquer comportamento, seja ação ou omissão, realizada
por profissional de saúde, direta ou indiretamente, seja na
182
Diálogos de Gênero: Perspectivas Contemporâneas
Considerações finais
Referências
Considerações iniciais
privados.
E, no meio virtual, uma das formas de violência contra
a mulher é a pornografia da vingança, que se trata de um tema
pouco evidenciado no Brasil. Ainda que não se verse sobre um
fenômeno recente, apenas nos últimos anos o tema alcançou a
visibilidade necessária para entrar em pauta. Haja vista a extensão
da problemática, o assunto é de extrema importância dada a
magnitude dos efeitos na vida de quem sofre esse tipo de abuso
Somente em 2018, com a Lei nº 13.772, que alterou o
Código Penal e a Lei Maria da Penha, houve o reconhecimento de
que violar a intimidade da mulher configura violência doméstica
e familiar, assim como criminalizou o ato. O delito é resultado de
um problema estrutural social, fundado nas raízes do patriarcado,
com a hipersexualização da mulher, estendida ao mundo virtual, e
desigualdade de gênero, onde a mulher é vista como objeto e em
posição de inferioridade.
Isto posto, destaca-se que, demasiadas vezes, a pornografia
da vingança é confundida e intitulada de “pornografia não
consensual” (SANTOS, 2017, p. 17), todavia há diferença entre
as terminologias. Já que, a pornografia da vingança, que vem
do termo originário inglês “revenge porn”, se refere à conduta de
divulgar publicamente, na rede mundial de computadores, fotos
ou vídeos íntimos de terceiros, sem a permissão, mesmo que estes
tenham sustentado a ideia de permitir-se fotografar ou filmar no
âmbito privado. Tais práticas sucedem, habitualmente, após a
cessação de um relacionamento íntimo, dado momento que um
dos envolvidos torna público o conteúdo, objetivando expor a
vítima em circunstância constrangedora, como forma de vingança.
A expressão “pornografia da vingança” ou “revenge porn”
não deve ser utilizada para a abrangência de todos os casos. A
terminologia correta para um enfoque geral é “pornografia não
consensual”, que se define como a distribuição de imagens, de
cunho sexual, de indivíduos sem o seu consentimento (SANTOS,
2017, p. 17). Isto compreende tanto as imagens obtidas sem o
194
Diálogos de Gênero: Perspectivas Contemporâneas
intimidade e a privacidade.
O direito à intimidade e a privacidade, assim como o direito
à honra e a imagem, vem positivados na CF/88, também, em seu
artigo 5º, inciso X. Na previsão do Código Civil de 2002, vem
apontado no artigo 21, onde traz que “a vida privada da pessoa
natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado,
adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato
contrário a esta norma” (BRASIL, 2002).
O direito à intimidade e a privacidade destinam-se a
preservar a privacidade em seus diversos aspectos, sejam eles
pessoais, familiares e/ou negociais. O primeiro se consubstancia em
ferramentas de defesa da personalidade humana contra injunções,
indiscrições ou intromissões alheias, auferindo tutela específica
(BITTAR, 2015a). E, o segundo, leva em consideração a autonomia
da pessoa humana, como a liberdade de tomar decisões sobre
assuntos íntimos, logo, se revela como segurança de independência
a inviolabilidade da pessoa (BELTRÃO, 2005).
Com a prática da pornografia da vingança, no que tange a
esfera de violação aos direitos da personalidade, fica comprovado
o dano à honra objetiva quando a mulher passa a ser julgada pelo
corpo social por expressar sua liberdade sexual. E, ainda, no tocante
a honra subjetiva, quando culpabilizada por ter enviado ou deixado
produzir o material, onde acaba por enxergar-se como indigna de
respeito.
O dano à imagem é perceptível quando a vítima não autoriza
que as imagens sejam divulgadas, mesmo que tenha consentido ser
fotografada ou filmada no contexto íntimo, são disseminadas sem
o devido consentimento.
E, ainda, a intimidade e a privacidade, que se configura
mediante violação de uma espécie contratual silente celebrada entre
as partes, pela divulgação não consensual de um registro de âmbito
privado, que teria de ser preservado em sigilo pelos envolvidos. Aqui,
trata-se de violação da boa-fé objetiva, pois há uma concordância
de que as imagens se adequam para um fim particular e o contrato
199
Diálogos de Gênero: Perspectivas Contemporâneas
Considerações finais
Referências
2022.
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código
Civil. Brasília, DF: Presidência da República, [2022].
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/
l10406compilada.htm. Acesso em: 07 mai. 2022.
BUZZI, Vitória de Macedo. Pornografia de vingança: Contexto
histórico-social e abordagem no Direito Brasileiro. 2015. 111
f. Monografia (Bacharelado em Direito) - Centro de Ciências
jurídicas, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis,
2015.
CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade
civil. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2014.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 28.
ed. v. 1. São Paulo: Saraiva, 2011.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 14. ed.
São Paulo: Saraiva, 2012.
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça (9ª Câmara Cível).
Apelação Cível nº 70064563927. Responsabilidade civil. Pedido
de danos morais. Responsabilidade civil subjetiva, nos termos dos
artigos 186 e 927 do Código Civil [...]. Disponibilização de vídeo
íntimo na internet. Quantificação. Sentença mantida. Apelante:
T. J. M. Apelada: E. B. Relatora: Iris Helena Medeiros Nogueira.
Comarca de Marau. Porto Alegre, 27 de maio de 2015.
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça (10ª Câmara
Cível). Apelação Cível nº 70049146152. Responsabilidade civil.
Danos morais e materiais. Publicação de fotografias na internet.
Cunho íntimo. Mensagens de natureza ofensiva. Submissão
da demandante a constrangimentos [...]. Apelante/Apelado: S.
C. Apelante/Apelado: M. Relator: Túlio de Oliveira Martins.
Comarca de Flores da Cunha. Porto Alegre, 7 de fevereiro de
2013.
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça (10ª Câmara
Cível). Apelação Cível nº 70027861202. Responsabilidade
210
Diálogos de Gênero: Perspectivas Contemporâneas
Considerações inicias
3 Sustentar, acolher –
221
Diálogos de Gênero: Perspectivas Contemporâneas
Considerações finais
Referências
Considerações iniciais
O ambiente penitenciário
Considerações finais
Referências