Cadernos Navais n39 Outubro Dezembro 2011
Cadernos Navais n39 Outubro Dezembro 2011
Cadernos Navais n39 Outubro Dezembro 2011
CADERNOS NAVAIS
Nº 39 – Outubro – Dezembro de 2011
TÍTULO:
ESPAÇOS MARÍTIMOS SOB SOBERANIA OU JURISDIÇÃO NACIONAL.
UM MODELO PARA POTENCIAR O EXERCÍCIO DA AUTORIDADE DO ESTADO NO MAR
COLECÇÃO:
Cadernos Navais
NÚMERO/ANO:
39/ Outubro-Dezembro 2011
EDIÇÃO:
Comissão Cultural da Marinha
Grupo de Estudos e Reflexão Estratégica (GERE)
ISBN 978-989-8159-42-7
Depósito Legal n.º 183 119/02
EXECUÇÃO GRÁFICA: António Coelho Dias, S. A.; Tiragem: 600 exemplares
ÍNDICE
1. INTRODUÇÃO .................................................................................... 5
7. CONCLUSÕES .................................................................................... 40
BIBLIOGRAFIA ...................................................................................... 43
3
All matters connected with the sea tend to have, in a greater or less
degree, a distinctly specialized character, due to the unfamiliarity
which the sea, as a scene of action, has for the mass of mankind.
Alfred Thayer Mahan
1. INTRODUÇÃO
5
adequada resposta aos novos desafios e realidades. Modelo que, naturalmente,
sofreu alterações, mas manteve a sua matriz essencial, ao longo de um período
que conheceu diversos regimes políticos e, consequentemente, diferentes
enquadramentos jurídico-constitucionais.
Num tempo em que transparece alguma hesitação quanto ao modelo a
prosseguir e alguma falta de coerência legislativa, que tem como conse-
quência conflitos positivos de competências, a investigação desenvolve-se na se-
quência das alterações legislativas havidas há mais de 8 anos,5 que consolidam
o actual modelo português para o exercício da autoridade do estado e após a
recente entrada em vigor de legislação fundamental na análise a esta temática,6
Já na Resolução do Conselho de Ministros n.º 163/2006, de 12 de
Dezembro, “Estratégia Nacional para o Mar”, se reconhece a necessidade
de, no âmbito da acção estratégica de Defesa Nacional, Segurança, Vigilância e
Protecção dos Espaços Marítimos sob Soberania ou Jurisdição Nacional, se
implementarem um conjunto de medidas, de que se salientam:
6
morfologia dos espaços marítimos nacionais, no conhecimento geo-marítimo e
na utilização racional dos escassos recursos de um país de pequena dimensão,
junta-se agora o cenário das novas ameaças, que encontra um modelo nacional
perfeitamente ajustado para as enfrentar com eficácia e eficiência, ao mesmo
tempo que atende ao enquadramento jurídico-constitucional vigente num
estado de direito democrático.
De facto, muitos outros países, para além dos que têm modelos seme-
lhantes, reconhecem as suas virtudes, alterando formas de actuar ou estruturas
organizacionais, convergindo para o conceito nacional de exercício do poder
público no mar.
Com efeito, as características dos espaços marítimos, de que sobressai a
continuidade, por ausência de barreiras físicas ou políticas, a permanente mobi-
lidade e mutabilidade da sua superfície, consequência dos efeitos meteo-
rológicos, a existência de uma outra dimensão, a sub-superfície, em que a vigi-
lância é muito difícil, sendo por isso um espaço a aproveitar por eventuais
agressores, o estatuto especial dos meios (navios) que nele circulam e a impos-
sibilidade de ocupar vastas zonas em permanência, não têm paralelo com as
dos espaços terrestres, tornando frágeis e sem sustentação teses que pro-
jectam para o mar princípios aplicáveis em terra.
Ao mesmo tempo, há espaço para desenvolver o modelo, procurando-se,
também, no presente trabalho contribuir para a clarificação de conceitos e,
essencialmente, identificar aspectos passíveis de melhoria, procurando mais
eficácia e eficiência, consequentemente, contribuindo para o desígnio das
medidas da Resolução do Conselho de Ministros n.º 163/2006, de 12 de
Dezembro, mostradas acima.
1.1. MÉTODO
7
2. OS ESPAÇOS MARÍTIMOS NACIONAIS
2.1. CARACTERIZAÇÃO
Tabela 1
8
Figura 1 – Zonas Económicas Exclusivas
7 Vide 3.
9
Figura 2
Figura 3
10
Este mar é ainda caracterizado por condições ambientais muito exigentes
para os meios náuticos. É um mar aberto, sem obstáculos à acção dos ventos,9
em que os dados climatológicos mostram uma elevada probabilidade de se
encontrarem condições de mar e vento desfavoráveis, especialmente no
inverno, para o cumprimento das missões. Condições que não são diferentes no
mar territorial, sendo por isso necessários meios com alguma capacidade
oceânica para poderem operar sem restrições e durante períodos prolongados
em praticamente todo o espaço marítimo nacional.
Figura 4
9 Excepto a zona a sul do continente, junto à costa algarvia, que oferece alguma protecção aos ventos
predominantes, com valores de alturas de vaga e onda inferiores aos registados na costa ocidental.
10 Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM 1997).
11
bém revela o direito de passagem inofensiva aos navios de qualquer Estado (art.º
17.º), desde que não seja prejudicial à paz, à boa ordem ou à segurança do Estado
costeiro, não tendo o Estado costeiro a faculdade de impor taxas a navios estran-
geiros só com fundamento na sua passagem pelo mar territorial (art.º 26.º), nem a
de exercer a jurisdição penal (art.º 27.º) ou civil (art.º 28.º), a bordo de navios
estrangeiros, mesmo sendo mercantis ou navios de Estado utilizados para fins
comerciais, salvo nalgumas situações muito específicas, que a Convenção apresenta.
Adicionalmente, também o grau de complexidade do estatuto dos navios
que, entre outras, depende da zona em que navegam: (CNUDM 1997) águas
interiores, mar territorial, zona contígua11, ZEE e alto mar (Figura 5); do tipo
de navio: navio de guerra, de estado, comercial, de pesca, de recreio; e ainda,
das múltiplas combinações aplicáveis a um navio de comércio que pode ter o
armador num país, estar segurado noutro, ter a bandeira num terceiro, ter uma
companhia multinacional como afretador, ter tripulantes de muitas nacionali-
dades, múltiplos donos da carga, etc.
Um navio mercante é mais que um meio de transporte, é um sistema que se
relaciona com os outros navios, influência o meio marinho, pode projectar ameaças
aos Estados costeiros e potenciar variados ilícitos penais e contra-ordenacionais.
(Diogo 35)
Outro factor relevante diz respeito à própria Convenção, que não
foi ratificada por todos os Estados, encontrando-se entre estes os Estados
Unidos da América.
High Seas
Figura 5
12
Como única superpotência, os Estados Unidos estão preocupados, entre
outras, com as limitações que a Convenção coloca à sua acção militar global, de
que são exemplo: o art.º 20.º, que estabelece que no mar territorial os
submarinos e outros veículos submersíveis devem navegar à superfície; o art.º
110.º, que estatui que os navios de guerra não têm justificação para exercer o
direito de visita a navios de outra bandeira fora das situações elencadas, e que
não inclui navios que transportem terroristas ou armas de destruição em massa
e o art.º 88.º que estipula que o alto mar deve estar reservado para fins pacíficos,
e, como afirma David Ridenour, vice-presidente do National Center for Public
Policy Research, da possibilidade de estas disputas chegarem ao International
Tribunal of the Law of the Sea (ITLOS) em Hamburgo, Alemanha, e de aí ser
muito reduzida a possibilidade de o tribunal decidir a favor dos Estados Unidos,
como resultado da composição do colectivo de juízes do ITLOS. (Ridenour)
Este elemento torna variável e sujeita aos interesses dos outros Estados
a soberania no mar, onde as fronteiras marítimas não estão marcadas com o
mesmo traço das terrestres e só pode ser reclamada se existir capacidade para
ocupar os espaços.
“Ocupemos com meios marítimos e navais o nosso mar, para podermos tirar
partido da sua exploração económica, podermos assumir as responsabilida-
des da segurança da navegação, podermos zelar pela protecção do ambiente
e garantir a defesa e a segurança da fronteira marítima cuja importância
e porosidade não param de aumentar.” (Sacchetti 18)
3. AMEAÇAS E RISCOS12
12 Neste trabalho é entendida a ameaça no seu sentido mais lato, como qualquer potencial
acontecimento ou acção, intencional, acidental ou desastre natural, que pode causar danos aos bens
materiais e morais (pessoas, infra-estruturas, material, informação, serviços, confiança, prestígio, etc).
Os danos causados dependem da gravidade da ameaça (capacidade no caso de ameaças intencionais)
e da probabilidade de ocorrência (função da vontade em ameaças intencionais), sendo o risco função
do valor dos bens materiais e morais (tangíveis e intangíveis) a defender (Bmm), da ameaça (A) e das
vulnerabilidades (V): R = f (Bmm, A, V). (Canadian Government A2+) Função que é obviamente
complexa, pelo que se considera que qualquer tentativa para aplicar uma expressão matemática
simplificada ao valor do risco, por muito atraente que possa parecer, não traz nenhum valor
acrescentado à avaliação do risco, e até poderá ter um resultado menos preciso que o resultante de uma
avaliação intuitiva.
13
O declínio da probabilidade de incidência de guerras entre Estados e a
emergência de ameaças transnacionais, principalmente no mundo ocidental,
resultou numa maior preocupação política com a segurança interna em detri-
mento da defesa.13
No entanto, a ideia muito em voga da evolução gradual dos conceitos de
segurança nacional e internacional para o conceito de segurança humana, não
deve fazer com que se negligencie a defesa, especialmente no mar, onde a
edificação de capacidades é, normalmente, um processo moroso que pode
prolongar-se por bem mais de uma década. Como se argumenta no documento
do Ministério da Defesa do Reino Unido “Global Strategic Trends – OUT to
2040 ”, é provável que a defesa veja a sua importância crescer à medida que o
aumento demográfico, as mudanças climáticas, a escassez de recursos e a
instabilidade forem ameaçando a capacidade dos Estados para proporcionarem
bem-estar e segurança às populações, e se assista, assim, a uma inversão da
referida tendência. (DCDC 76)
Apesar de serem bastante menos visíveis que as ameaças não militares
baseadas em terra, há efectivamente um aumento da insegurança marítima
devido à escala global e à intercomunicabilidade das ameaças, que directa ou
indirectamente afectam a segurança nacional,14 tais como o terrorismo e crime
organizado, a pirataria, a proliferação de armas de destruição em massa, o trá-
fico de droga e de pessoas, as migrações em massa, a interrupção das rotas
comerciais e do fornecimento de energia, a violação de leis fiscais ou aduanei-
ras e a depredação dos recursos vivos.
De facto, como afirma o Wise Pen Team no Relatório Final ao European
Defence Agency Steering Board, relativamente aos números do International
Maritime Bureau: “Entre 1995-2005, 3284 marítimos foram feitos reféns; 617
ameaçados a bordo de navios; 483 feridos; 349 mortos; 208 assaltados; 112
raptados; 164 desaparecidos…”. Se situação semelhante envolvesse motoristas
rodoviários europeus, o clamor da opinião pública seria enorme, mas como o
que se passa no mar não está à vista dos cidadãos, a percepção de insegurança
é completamente diferente, “apesar de se saber que a Al Qaeda tentou infiltrar
terroristas e explosivos na Europa por via marítima.” (Pozo et al 6)
Mas para além destas, há ainda que considerar as de índole acidental,
principalmente a poluição marítima, que pode resultar do elevado volume de
tráfego e carga, designadamente de navios petroleiros, que cruzam as águas
nacionais. (Figura 4)
Igualmente, porque os navios com registo de conveniência “são provavel-
mente os meios mais independentes à superfície da terra, muitos deles sem
obrigações de qualquer espécie, mudando frequentemente de registo, e assu-
mindo a bandeira que mais lhes convém, criando potenciais ameaças ambien-
tais e de actividades ilegais ou criminosas,” porque o controlo do Estado de
bandeira é ineficaz ou mesmo inexistente, existe uma forte possibilidade de ter-
roristas explorarem estes meios para infligir danos catastróficos ao Estado
13 Vide 6.1.1.
14 Vide 3.
14
costeiro, atendendo a que a principal característica dos navios é a sua
capacidade para transportar grandes quantidades de carga numa única viagem
para grandes centros urbanos. Também os pequenos navios de pesca e as
embarcações de recreio, que não têm obrigação de reportar a sua posição,
são uma preocupação de segurança, principalmente em termos de actividades
ilegais. (19-21)
O tráfico ilegal pode utilizar navios mercantes ou pequenas embarcações,
sendo que nuns e noutros seja difícil de detectar se estão envolvidos em acções
ilegais, sendo crescente a necessidade de controlar o mar, por razões
ambientais, económicas e de segurança, através do incremento da vigilância
marítima. Na União Europeia, a European Agency for the Management of
Operational Co-operation at the External Borders of the Member States of the
European Union (FRONTEX) é responsável pelo combate à imigração ilegal
por mar, conseguindo, em 2008, interceptar cerca de 100.000 imigrantes.
(21) (Uma das zonas de entrada mais utilizadas situa-se entre o Senegal e as
Canárias, onde meios da Marinha já intervieram).
As operações no âmbito do FRONTEX são um bom exemplo da
necessidade de se poder conjugar um sistema de informações e um sistema de
vigilância eficaz, capaz de cobrir uma área muito para além daquela que está
ao alcance dos sistemas costeiros, não se limitando ao mar territorial,
dependendo de meios oceânicos para actuar.
Esta é uma ameaça que tende a aumentar devido à crescente procura de
água e alimentos. O aumento da população mundial para 8,8 mil milhões, em
2040, vai enfatizar o problema do controlo das fronteiras marítimas para fazer
face à imigração ilegal. Em 2007, havia mais 80 milhões de pessoas subnutridas
que em 1990. Similarmente, estima-se que 2,5 mil milhões de pessoas vivam
em regiões com escassez de água, sendo África uma das regiões mais afec-
tadas. Se a isto se acrescentar que a região subsariana é uma das mais
afectadas pelo problema da subnutrição, e que estas populações já utilizam o
Norte de África para chegar à Europa, facilmente se constata que o problema
não pode ser descurado. (DCDC 110)
África 11 11
SE Ásia e Pacífico 29 53
15
Também as consequências da interrupção das rotas comerciais serão
amplificadas num futuro próximo, por ser hoje norma o fornecimento just in
time, realçando a necessidade e a importância da fiabilidade do sistema de
transporte marítimo.
A evolução das ameaças transnacionais representam agora um maior
risco para os Estados, levando a que sejam necessários meios mais com-
plexos de informações e de vigilância, assistindo-se, nos últimos anos, a um
incremento no grau de exigência dos sistemas de informações e vigilância no
combate às ameaças não militares em ambiente marítimo. Note-se que uma
ameaça proveniente de terra só pode ser combatida no território do próprio
Estado, a menos que se entre em conflito aberto com o outro Estado. Ao con-
trário, no mar o objectivo é o de eliminar a ameaça à maior distância possível
do território.
4. MISSÕES E TAREFAS
• As ajudas à navegação;
16
• A segurança e o controlo da navegação;
• A salvação marítima.
Para que estas tarefas sejam realizadas com sucesso, tem de existir um
sistema de vigilância marítima eficaz e eficiente, que permita um conhecimento
efectivo do panorama marítimo através da recolha, fusão, análise e dissemi-
nação priorizada das diversas categorias de dados, informação e informações,
sendo que, para esta recolha, dão uma preciosa contribuição, todos os meios
navais e aéreos em missão.
Cada vez mais é importante uma defesa avançada contra as diversas
actividades ilícitas, porque: as bem financiadas organizações criminosas explo-
ram a permeabilidade das fronteiras internacionais para traficar tudo, desde
droga a armas de destruição em massa; os migrantes navegarão para a Europa
fugindo da pobreza, da instabilidade nas terras de origem; as reduções de
capturas de peixe das frotas de pesca asiáticas levá-las-ão a aventurarem-se
cada vez mais para o Atlântico Norte e, se o esforço de fiscalização for baixo,
para o interior da ZEE; algumas companhias de navegação, para poderem ser
competitivas, tentarão reduzir custos, não cumprindo as regulamentações inter-
nacionais para prevenir ou mitigar acidentes.15 A Guarda Costeira dos Estados
Unidos, agência com competência para executar todas as tarefas acima refe-
ridas, entende que é importante para prevenir o crime no mar a manutenção
de uma presença activa, e que a resposta mais eficaz e eficiente perante con-
dutas criminosa é a de rapidamente enviar meios para reprimir a acção no mar,
interceptando imigrantes ilegais no alto mar, impedindo que embarcações de
pesca em actividade ilegal entrem nos bancos de pesca mais vulneráveis,
apreendendo drogas e armas antes de chegarem à costa e desviando o rumo
de navios e cargas perigosas, antes de colocarem as praias e outras zonas sen-
síveis em risco. Concluindo, considera que um sistema multimissão da Guarda
Costeira, com aviões, pequenas embarcações, patrulhas, corvetas e C4ISR16
fornece a mobilidade e prontidão necessárias para interceptar intrusos furtivos.
(The U.S. Coast Guard, Coast Guard 2020, 15)
15 Adaptado de: The U.S. Coast Guard, Coast Guard 2020, 15.
16 Sistemas de “Command, Control, Communications, Computers, Intelligence, Surveillance and
Reconnaissance”.
17
5. O EXERCÍCIO DA AUTORIDADE DO ESTADO NO MAR EM PORTUGAL
18
aplicação das normas a que se encontram sujeitas as mercadorias introduzidas
no território aduaneiro da Comunidade, exercer a acção de inspecção tributária
e efectuar os controlos relativos à entrada, saída e circulação das mercadorias
no território nacional, prevenindo e combatendo a fraude e a evasão aduaneiras
e fiscais e os tráficos ilícitos, designadamente de estupefacientes, substâncias
psicotrópicas e seus precursores, produtos estratégicos e outros produtos
sujeitos a proibições ou restrições”, pelo que, efectivamente, a Direcção-Geral
das Alfândegas e Impostos Especiais sobre o Consumo exerce poder de auto-
ridade marítima.
Dificilmente será expectável grande eficácia de um “sistema” tão hetero-
géneo. Um sistema é um conjunto de meios e processos empregues para
alcançar determinado fim, a segurança marítima. Aqui, a questão relevante é a
de se saber quem é que emprega os meios, pois o quadro jurídico em apreço não
o define, estabelecendo apenas um órgão de coordenação a um nível muito
elevado, o Conselho Coordenador Nacional, composto pelo Ministro da Defesa
Nacional, que preside, Ministro da Administração Interna, Ministro do Equipa-
mento Social, Ministro da Justiça, Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento
Rural e das Pescas, Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território e pela
Autoridade Marítima Nacional, Chefe do Estado-Maior da Força Aérea,
Comandante-geral da Polícia Marítima, Comandante-geral da Guarda Nacional
Republicana, Director Nacional da Polícia de Segurança Pública, Director Nacional
da Polícia Judiciária, Director do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, Presidente
do Instituto Marítimo-Portuário, Diretor-geral das Pescas e Aquicultura, Inspector-
geral das Pescas, Director-geral da Saúde, Presidente do Instituto da Água, um
representante de cada uma das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.19
Mais tarde, através do Decreto Regulamentar n.º 86/2007, de 12 de
Dezembro, diploma que regula a articulação entre autoridades de polícia e as
outras entidades a quem estão cometidas competências nos espaços maríti-
mos, é criado um Centro Nacional Coordenador Marítimo, numa tentativa de
colmatar a lacuna existente na coordenação das acções ou operações execu-
tadas no âmbito das atribuições do Sistema de Autoridade Marítima, mas
não responde à pergunta “Onde está a autoridade?” (Where is the authority? )
continuando a não estar definida uma entidade com autoridade sobre todos os
meios e processos empregues para alcançar determinado fim.
De facto, esse Decreto Regulamentar, por um lado, insere-se na conti-
nuidade do processo evolutivo iniciado em 1984, com a criação do centro coor-
denador, com a integração da Direcção-Geral das Alfândegas e Impostos
Especiais sobre o Consumo, a quem atribui a coordenação das acções de vigi-
lância e fiscalização nas instalações portuárias em matéria de tráfico ilícito de
mercadorias e bens, por outro, veio tentar resolver problemas, nomeadamente
conflitos positivos de competências, entretanto criados, entre a Autoridade
Marítima Nacional e a GNR.20
19 Redação do Decreto-lei n.º 43/2002, de 2 de Março. Note-se que no Conselho não figura o
Ministro das Finanças, nem o Director-geral das Alfândegas e Impostos Especiais sobre o Consumo.
20 Vide 5.3.3.
19
Consequentemente, no Sistema, os poderes de autoridade marítima
estão divididos por muitas entidades, ainda que delimitados em razão da
matéria, sem estar definida a entidade que detém a autoridade, mas
concedendo à Autoridade Marítima Nacional a intervenção em todas as
matérias, fundamentalmente decorrente do vasto leque de competências do
Capitão do Porto, que é verdadeiramente a força unificadora do Sistema e o
alicerce fundamental da Autoridade Marítima Nacional.
20
artigo, “compete ainda ao capitão do porto exercer as demais competências
previstas em leis especiais.” ).
Em matéria contra-ordenacional,23 estatui esse regime que compete ao
Capitão do Porto determinar o estabelecimento de medidas cautelares, proceder
à instrução processual, aplicar as coimas e decretar as sanções acessórias
decorrentes da prática dos ilícitos contraordenacionais. (AMN/CO 2002).
As competências do Capitão do Porto, que sempre incidiram, ao longo de
dois séculos, sobre três áreas horizontalmente agregadas e complementares:
segurança safa e segura (safety e security) e serviços de repartição e
conservatória, são exercidas nos espaços de jurisdição de vinte e oito capi-
tanias, cuja distribuição geográfica permite uma efectiva ocupação do espaço
litoral nacional.
21
posta por militares e agentes militarizados da Marinha, com os órgãos de
comando a serem considerados autoridades policiais e de polícia criminal.
Estabelece também que, ao pessoal da Polícia Marítima compete garantir e
fiscalizar o cumprimento da lei nas áreas de jurisdição do sistema de autoridade
marítima, com vista, nomeadamente, a preservar a regularidade das activi-
dades marítimas e a segurança e os direitos dos cidadãos, ou seja, trata-se de
uma polícia com competência territorial (espaços sob jurisdição da autoridade
marítima) e específica.
Consequentemente, em sede de Autoridade Marítima Nacional, são
realizados actos de polícia, designadamente a determinação de medidas caute-
lares, e procede-se, entre outras, a inquéritos a sinistros marítimos, à instrução
de relatórios e protestos de mar, à coordenação e instrução de processos jurí-
dicos relativos à remoção de embarcações naufragadas ou abandonadas, à
investigação processual cível em caso de naufrágio e à investigação criminal
sob a direcção do Ministério Público.
O preâmbulo do mesmo Decreto-lei refere:
22
Ministro da
Defesa
Nacional
Chefe do
Estado-Maior Chefe do
da Armada Estado-Maior
da Armada
Director-Geral
Director-Geral ÓÓrgãos
rgãos
deMarinha
de Marinha Consultivos
Consultivos Comandante-
Geral da Director-Geral Órgãos
Polícia de Marinha Consultivos
Chefes dos Marítima
Chefes dos
Departamentos
Departamentos
Marítimos
Marítimos Comandantes
Chefes dos
Regionais da
Departamentos
Polícia
Marítimos
Marítima
Sistema Capitães dos
de Capitães dos
Portos
Autoridade Portos Sistema de
Comandantes
Marítima Locais da Capitães dos Autoridade
Polícia Portos Marítima
Marítima
MMinistro da
Defesa
Nacional
Autoridade Chefe do
Marítima Estado-Maior
Nacional da Armada
Comandante-
Director-Geral Órgãos
Geral da
da Autoridade Consultivos
Polícia
Marítima
Marítima
Comandantes
Chefes dos
Regionais da
Departamentos
Polícia
Marítimos
Marítima
Autoridade
Comandantes Marítima
Locais da Capitães dos Nacional
Polícia Portos
Marítima
23
Refira-se também que, toda a estrutura da Autoridade Marítima Nacional,
no âmbito da orgânica do MDN, está integrada nas Outras Estruturas, enquanto
a Marinha, ramo das Forças Armadas,28 integra a Administração Directa do
Estado – Forças Armadas. (Figura 8) (LOMDN 2009)
MDN
Forças Outras
Armadas: Estruturas:
EMGFA Marinha Autoridade Marítima
Exército Nacional
Força Aérea ..........
24
• Garantir a fiscalização, no seu âmbito, dos espaços marítimos sob
soberania ou jurisdição nacional, tendo em vista o exercício da auto-
ridade do Estado relativamente ao cumprimento das disposições legais
aplicáveis;
29 Note-se que o Instituto Hidrográfico tem também intervenção na Busca e Salvamento Marítimo,
porquanto comunica os avisos aos navegantes de âmbito nacional e garante a ligação ao serviço mundial.
25
apresamento da embarcação causadora da infracção ou suspeita de a ter
causado, designadamente acompanhando-a ao porto nacional mais próximo.
(COPM 2000)
Deve sublinhar-se que as competências, e também as capacidades,
residentes na Marinha, no âmbito da segurança e autoridade do Estado no Mar,
constituem a quase totalidade daquelas que são consideradas as Funções de
Guarda Costeira.30
26
com a Direcção-Geral da Autoridade Marítima, o ponto de contacto para assis-
tência a navios, designadamente para assegurar o serviço operacional, atra-
vés do qual os navios podem obter conselho ou assistência e para o qual podem
comunicar problemas de protecção relativos a outros navios, movimentos ou
comunicações. (CIPNIP 2006)
O preâmbulo do mesmo diploma enfatiza que é no âmbito da Autoridade
Marítima Nacional, que se efectuará a coordenação de todos os intervenientes
no processo de segurança marítima nos espaços marítimos e portuários
nacionais, uma vez que os seus órgãos integram a estrutura orgânica da
segurança interna, no âmbito da qual lhe são cometidos poderes de polícia e
de polícia criminal de especialidade no domínio marítimo, bem como
competências na área da segurança da navegação.
33 Gross Register Tonnage. Uma register ton é igual ao volume de 100 pés cúbicos (~2,83 m³).
34 Esta entidade passou também a integrar o Sistema de Autoridade Marítima. (SNCTM 2009)
27
5.3.3. GUARDA NACIONAL REPUBLICANA
28
5.4. CENTRO NACIONAL COORDENADOR MARÍTIMO
6. ANÁLISE CONCEPTUAL
29
ção dos crimes, incluindo a dos crimes contra a segurança do Estado, só pode
fazer-se com observância das regras gerais sobre polícia e com respeito pelos
direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. (CRP 2005)
Às Forças Armadas incumbe a defesa militar da República, estão ao
serviço do povo português e podem ser incumbidas, nos termos da lei, de
colaborar em missões de protecção civil, em tarefas relacionadas com a
satisfação de necessidades básicas e a melhoria da qualidade de vida das popu-
lações, podendo ser empregues em situações de estado de sítio e emergência
nos termos da lei. (CRP 2005, art.º 275.º)
Consequentemente, é o próprio direito que baliza a actuação das polícias
na prevenção e repressão da ilegalidade, incluindo os crimes contra a segurança
do estado, ao impor que a mesma se desenvolva no respeito pelos direitos
liberdades e garantias dos cidadãos, numa clara subordinação à legalidade
democrática, (Lopes 9) estando ainda subordinadas ao controlo dos tribunais,
como nos casos em que se torna necessário aplicar medidas especiais de polícia,
situação que a lei obriga a comunicar ao tribunal competente. (LSI 2008)
A um outro nível situam-se as Forças Armadas. Para elas os limites de
actuação são muito mais amplos, têm uma grande capacidade destrutiva, sem
preocupações de preservação de prova. A constituição não expressa, como para
as polícias, a actuação limitada ao respeito pelos direitos liberdades e garantias
dos cidadãos, porque as Forças Armadas estão ao serviço do povo portu-
guês, estão acima dos interesses individuais, defendem todos os cidadãos das
ameaças ou agressões externas, porque a sua função é a de preservar a sobre-
vivência do Estado.
Pelo contrário, as polícias, por actuarem na ordem interna, podem ter de
defender interesses, que sendo públicos, não são comuns a todos os cidadãos,
e que podem originar situações de confronto entre polícias e cidadãos, pelo que
se concluí que a actuação das Forças Armadas na segurança interna não é
aconselhável, como princípio geral, pois pode ter implicações negativas na coe-
são nacional, devendo por esse motivo, restringir-se às situações de excepção,
justificada por em determinado momento o Estado ter perdido a capacidade,
total ou parcial, para garantir os direitos e liberdades fundamentais e o respeito
pelos princípios do Estado de direito democrático.
Relativamente à intervenção das Forças Armadas na Protecção Civil, por
não estarem em causa esses princípios, a própria Constituição estabelece que
podem ser incumbidas de colaborar nessas missões.
Não quer isto dizer, que no contexto actual, não seja cada vez mais
necessária a utilização das capacidades militares na segurança interna, deverá
é ser devidamente balizada e adequada ao risco e ao espaço de actuação:
territorial, marítimo ou aéreo.
30
por objectivos garantir, no respeito da ordem constitucional, das instituições
democráticas e das convenções internacionais, a independência nacional, a
integridade do território e a liberdade e a segurança das populações contra
qualquer agressão ou ameaça externas.”
Conceito menos abrangente que aquele que o Instituto de Defesa
Nacional apresentou, no início dos anos oitenta, juntamente com o conceito de
Segurança Nacional, que atribuía à Defesa Nacional a quase exclusividade no
combate às ameaças externas e internas:
31
prevenir e reprimir a criminalidade e contribuir para assegurar o normal
funcionamento das instituições democráticas, o regular exercício dos direitos,
liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos e o respeito pela legalidade
democrática.” (LSI 2008)
Esta incoerência conduz à utilização de “segurança externa / segurança
interna”, quando, atendendo aos conceitos acima definidos, se deveria utilizar
“defesa nacional / segurança interna”.
32
Consequentemente, há vontade política de utilizar meios militares como
forma de optimização dos recursos, aproveitando capacidades e conhecimento
instalado nas Forças Armadas evitando-se a duplicação, mas ao mesmo tempo
o enquadramento jurídico-constitucional mantém uma linha perfeitamente
visível entre defesa nacional e segurança interna.
Mas este é um assunto sensível e amplamente discutido nas democracias
ocidentais. No Colorado Independent, de 11 de Setembro de 2008, a propósito das
actividades do U.S. Northern Command, criado em 2002 para missões de defesa
interna, treinando militares para operações no interior do país, centradas na resposta
a emergências catastróficas, que de acordo com o seu comandante, General da
Força Aérea Gene Renuart, tinha sido concebido para responder a acontecimentos
de proporções calamitosas, com equipas médicas, de descontaminação química, de
engenharia e de apoio logístico, e não para intervir em situações de imposição da lei
(law enforcement), um alto responsável da American Civil Liberties Union afirmou
que um dos alicerces da democracia americana era o de os militares não serem
utilizados contra o povo americano, quando há mais de cem anos esse princípio
passou a letra de lei através do Posse Comitatus Act,38 que proíbe que os militares
sejam envolvidos em funções de law enforcement. (Rosa)
Também em Portugal, num artigo intitulado Um soldado não é um polícia,
no Diário de Notícias, de 12 de Julho de 2010, o Juiz-conselheiro (jubilado)
António Colaço afirmava que “... [a Defesa Nacional e a Segurança Interna] são
grandezas que preexistem à génese de um Estado, dando origem a formações
distintas quanto à sua salvaguarda, por distintos serem os objectivos que visam
– às Forças Armadas, a eliminação do inimigo e assegurar a paz e, às Forças
de Segurança, manter uma segura vivência quotidiana de pessoas e de insti-
tuições nacionais.” (Colaço)
Considera-se no entanto que a questão do envolvimento das Forças
Armadas na segurança interna não deve ser tratada em conjunto, porque há
diferenças substantivas que impõe diferenciação entre os três ramos.
“Os desenvolvimentos que se venham verificar . . . continuarão a ser
marcados pelo processo histórico . . . [Desde a revolta de 1817, liderada pelo
General Freire de Andrade, até à revolução de 1974, foram inúmeras as revoltas
ou revoluções militares,] os governos foram em regra depostos por revoltas
militares, ficando conotados com os aspectos negativos dos regimes que se
seguiram, designadamente quando estes impuseram restrições no exercício dos
direitos, liberdades e garantias.” (Palma 26)
Independentemente de todos os ramos poderem participar em revoltas
ou revoluções, o Exército, por ser aquele que actua no território, espaço de
actuação das polícias, e por ser o detentor dos meios bélicos necessários para
atingir os objectivos dessas acções, é o ramo sobre o qual é natural que existam
reservas em relação à actuação na segurança interna.39
38 A Guarda Costeira Americana é um dos ramos das Forças Armadas, mas tem funções de
segurança interna e não de defesa, motivo pelo qual este Acto excluí a Guarda Costeira.
39 Não é possível depor um regime sem a participação do Exército, mas é possível fazê-lo sem o
envolvimento dos outros ramos.
33
Historicamente, as marinhas sempre desempenharam um importante papel
na segurança marítima, sempre protegeram a navegação mercante e os inte-
resses económicos do Estado no mar, incluindo as operações anti-pirataria e
operações de “imposição da lei” no alto mar, que são conduzidas por meios militares.
A intervenção dos navios de guerra neste âmbito é confirmada pela
Convenção, art.º 107.º, 110.º e 224.º, respectivamente:
40 Dever-se-ia acrescentar “e no alto mar”, atento o Direito do Mar, bem como a lei que regula o
exercício dos poderes do Estado no mar. (LZMPE 2006)
34
As leis orgânicas da Marinha e da Força Aérea estabelecem que a sua
estrutura orgânica compreende outros órgãos que integram sistemas regulados
por legislação própria e que asseguram o cumprimento das missões particulares.41
Relativamente a esses órgãos, apenas os dos serviços de busca e salvamento
têm estruturas e competências semelhantes, em ambos os ramos,42 porquanto,
apesar de prevista, a Autoridade Aeronáutica Nacional43 ainda não foi implementada.
Adicionalmente, a Lei Orgânica da Marinha estabelece que a Comissão de
Direito Marítimo Internacional funciona na dependência do Chefe do Estado-
Maior da Armada.
Face ao que antecede, as competências dos ramos e a intervenção em
apoio a outras entidades é muito distinta, dependendo fundamentalmente do
meio (marítimo, aéreo ou terrestre) e do enquadramento jurídico aplicável
nesse meio, sendo que, obviamente, o marítimo é o mais específico,44 reite-
rando-se que os condicionalismos à actuação não militar das Forças Armadas
não são comuns aos três ramos.
35
venção na segurança safa,45 onde os exemplos de dupla utilização são muito mais
alargados. Tanto a Força Aérea Portuguesa como a sua congénere norte-americana,
para referir um exemplo de dimensão extraordinariamente diferente, e onde as
questões dos recursos não são tão relevantes, têm atribuídas competências no
âmbito da busca e salvamento (dupla utilização na defesa e na segurança safa).46
Consequentemente, no modelo português, o conceito de Marinha de Duplo
Uso deve ser entendido como a actuação na defesa (funções de marinha de guerra)
e a actuação na segurança e autoridade do Estado (funções de guarda costeira),
com órgãos que integram sistemas regulados por legislação própria, designada-
mente os órgãos e serviços da Autoridade Marítima Nacional. Estes órgãos não são
os únicos regulados por legislação própria, mas são aqueles que justificam esta
estrutura particular, permitindo assim atender ao quadro jurídico-constitucional,
matéria já abordada, conseguindo-se desta forma dar resposta às vantagens da
acção integrada no quadro da separação entre acções de defesa e acções de
segurança e autoridade do Estado e, ainda, conseguir uma unidade de comando que
o desempenho de funções por inerência permite, com os comandantes das zonas
marítimas a serem, por inerência, os chefes dos departamentos marítimos e estes,
por inerência, os comandantes regionais da polícia marítima. (Figura 9)
Assim, na Marinha, ramo das Forças Armadas, a missão principal é a defe-
sa militar, enquanto que a missão principal da Autoridade Marítima Nacional é a
Segurança e a Autoridade do Estado, detendo ainda autoridade de polícia.
Ministro da
Defesa
Nacional
Chefe do Autoridade
Estado-Maior Marítima
da Armada Nacional
Comandante- Direcção-
Comandante Geral da Geral da
Naval Polícia Autoridade
Marítima Marítima
Comandantes
Comandantes Chefes dos
Regionais da
das Zonas Departamentos
Polícia
Marítimas Marítimos
Marítima
Autoridade
Marinha ramo Comandantes Marítima
das Locais da Capitães dos Nacional
Forças Armadas Polícia Portos
Marítima
Figura 9: Marinha
45 Vide 6.1.2
46 Poder-se-ia a este nível referir também a dupla utilização da GNR em âmbito segurança interna
/ segurança safa atentas as competências em matéria da protecção da natureza e do ambiente, compe-
tências geralmente fora da esfera de responsabilidades das forças de segurança.
36
Quando em “O que faz Portugal é o mar”, da autoria do coronel da GNR
Armando C. Alves, se defende um modelo, coerente com a nova lei orgânica da
GNR, em que se argumenta que na Marinha “... a função Polícia assume
características residuais e complementares. A função Defesa requer priorita-
riamente o desempenho de tarefas de alto nível, que implicam o emprego de
meios pesados e claramente bélicos . . . [e que] A vocação da Marinha é a
Defesa . . . e não as minudências das fiscalizações policiais”, (Alves 24) não se
considera que as minudências das fiscalizações policiais são preocupações
primárias da Autoridade Marítima Nacional, em geral, e da Polícia Marítima, em
particular, cujas competências e esfera de acção foram abordadas acima.
Também é relevante referir que a Marinha dispõe de um conjunto muito
diversificado de meios, desde lanchas de fiscalização e patrulhas, a fragatas e
submarinos, e que a maioria dos meios executa missões no âmbito da segu-
rança e autoridade do Estado. Dos 38 navios da Marinha, 12 têm como missão
primária a defesa, mas destes 5 são auxiliares (navio reabastecedor e hidro-
gráficos), e 23 têm como missão primária a segurança e autoridade do Estado,
dos quais 11 com um deslocamento inferior a 100t, (Figura 10) meios que asse-
guram, juntamente com as lanchas semi-rígidas e outras pequenas embarca-
ções da autoridade marítima, uma actuação integrada e uniforme no espaço
marítimo nacional.
Total de Navios = 38
A Defesa Combatentes
D
A B Defesa Auxiliares
B
C
C
Segurança e
Autoridade do Estado
D Instrução
47 A legislação permite que os oficiais da marinha sejam British Sea Fisheries Officers, para que
possam fiscalizar quaisquer navios de pesca operando em águas do Reino Unido e também navios de
pesca do Reino Unido em águas internacionais. (Royal Navy)
37
águas do Reino Unido, e considera que os meios desta esquadrilha são
plataformas ideais para treinar e praticar várias perícias relacionadas com a
marinharia e o combate, assim como para refinar as capacidades de navegação
dos jovens oficiais. (Royal Navy)
Considera-se, assim, que existe um modelo que aproveita as sinergias de
meios capazes de desempenhar uma multiplicidade de missões e com capaci-
dade de se adaptar a alterações nas prioridades nacionais, no balanço entre
defesa e segurança.
A matriz complexa dos futuros desafios à segurança marítima requer
esforços combinados e é cada vez mais reconhecida a importância da integração,
como se verifica no documento apresentado, em 2007, pela U.S. Coast Guard,
U.S. Navy e U.S. Marine Corps, A Cooperative Strategy for 21st Century, ao
afirmar a necessidade de aproximar as três forças por forma a melhorar a
segurança do país, (3) e que ao falar-se de homeland defense não é suficiente a
divisão de responsabilidades entre a Marinha e a Guarda Costeira ao longo de
uma fronteira geográfica indefinida. Em vez disso, devem actuar como um único
corpo onde quer que operem. E ainda que a integração e a interoperabilidade são
a chave para o sucesso, devendo trabalhar em conjunto no apoio a operações de
defesa, de segurança e humanitárias. (15) No mesmo documento se refere, que
há muitos desafios ao exercício do controlo do mar, sendo, provavelmente, o mais
significativo, o aumento do número de países a operar submarinos. (13)
Para além da mais-valia operacional, os Estados Unidos reconhecem tam-
bém que devem reduzir custos optimizando os meios, quando em 2009 o
Congressional Budget Office avançou com a opção de programas comuns à
Guarda Costeira e à Marinha, para a construção de navios a operar por ambas
as forças. (CBO) Na União Europeia, a presidência espanhola num seminário em
Madrid, em Janeiro de 2010, identificou, entre outras, a necessidade de “. . . uma
aproximação conjunta civil militar para solucionar os problemas da segurança
marítima, que junta todos os actores com responsabilidades marítimas . . . “
(Pozo et al 12)
Também num estudo sobre a “Estratégia Naval Canadiana para o século
XXI” se afirma que a maioria das marinhas ocidentais tem um reduzido, ou
nenhum, papel no policiamento e que têm vindo a deixar essa função para as
guardas costeiras independentes [que funcionam numa estrutura independente da
Marinha]. Mas mesmo nestes casos as responsabilidades crescentes das Guardas
Costeiras requerem o apoio contínuo das forças navais. Mesmo no Canadá, país
que conta com uma Guarda Costeira, a Marinha, incluindo a aviação naval, contri-
buem com cerca de 180 dias de navegação e 1000 horas de voo por ano em
missões de vigilância e patrulha das pescas. (Bullock) Ainda em relação ao
Canadá, o comandante Hansen aponta a necessidade de programas integrados
para a construção de navios para a Marinha e Guarda Costeira. (Hansen 24)
Mas não são só as marinhas ocidentais a reconhecer esta necessidade,
como refere Alok Bansal, em Synergising Indian Navy and the Coast Guard,
para fazer face às novas ameaças, as duas forças devem cooperar mais, o seu
pessoal deve treinar e prestar serviço na outra força, as condições, carreiras,
requisitos e benefícios devem ser comuns às duas forças, devendo o pessoal da
38
Guarda Costeira continuar a treinar nas instalações navais e as facilidades
logísticas e de manutenção das duas forças devem ser complementares e não
se duplicarem. (Bansal 95-96)
Concluindo, a tendência na generalidade dos Estados, independente-
mente dos modelos organizacionais implantados, é no sentido da integração e
do eliminar fronteiras entre agências que concorrem para o mesmo fim,
especialmente as barreiras entre guardas costeiras e marinhas. Na realidade, os
países marítimos ocidentais, principalmente os do sul da Europa e Estados
Unidos 48 têm modelos para o exercício da autoridade do Estado no mar, ba-
seados num pilar principal, centralizador e unificador da autoridade, quer com
base nas marinhas quer nas guardas costeiras. Mas nem todos os grandes
países optaram por guardas costeiras, como é o caso da França, país com uma
Marinha de grande dimensão, onde os Prefeitos Marítimos49, oficiais generais
da Marinha são, por inerência, os Comandantes das Zonas Marítimas, e os
representantes do Estado no mar, dependendo directamente, naquelas funções,
do primeiro-ministro.
O modelo é semelhante ao português, mas não existe polícia marítima,
sendo por isso as funções de polícia asseguradas pela gendarmerie maritime
que efectua as suas missões em proveito dos “Prefeitos Marítimos”, dos procu-
radores da república, dos administradores dos assuntos marítimos50 e do Chefe
do Estado-Maior da Armada.
Mas também há exemplos de países com características geomorfológicas
muito diferentes, que estão a caminhar no mesmo sentido. É o caso do modelo
holandês, quando em 1987, com o objectivo de tornar mais eficaz e eficiente a
ação do Estado no mar, criou uma Guarda Costeira como uma joint venture de
seis ministérios que exerciam competências no mar e que tinham navios pró-
prios51. Contudo, tal solução veio a revelar-se insuficiente, tendo sido identi-
ficados problemas de coordenação, com consequências negativas ao nível do
planeamento e da execução das missões, pelo que, em 1995, o controlo ope-
racional da Guarda Costeira tornou-se responsabilidade da Marinha e foi
nomeado um oficial da Marinha, como seu director,52 com comando completo
sobre todas as operações da Guarda Costeira.
Esta tendência é também reforçada pelas capacidades de que dispõem as
marinhas, desde os sistemas de comando e controlo aos submarinos,53 desde
o conhecimento instalado até aos sistemas C4ISR, fundamentais no actual
e futuro contexto de segurança no mar.
48 A U.S. Coast Guard integra todas as competências do Sistema de Autoridade Marítima, tendo
atribuídas funções de autoridade marítima e de administração marítima.
49 Esta designação teve a sua origem no Consulado (1799 – 1804), havendo em França três
Prefeituras Marítimas que correspondem a outros tantos Comandos de Zona Marítima.
50 Corpo de oficiais da marinha a prestar serviço no ministério que tutela os assuntos do mar.
51 Navios das Alfândegas, da Polícia, das Pescas, da Organização de Salva-vidas, etc
52 A Guarda Costeira é tutelada pelo Ministério dos Transportes.
53 Não é possível conceber que um país marítimo não tenha capacidade para actuar e efectuar a
vigilância da sub-superfície, exercer o poder em todas as dimensões do espaço marítimo.
39
7. CONCLUSÕES
40
adequada integração de procedimentos para as questões marítimas, recomen-
dam que, como há mais de dois séculos, se continue a olhar para este modelo
como uma referência inspiradora.
41
BIBLIOGRAFIA
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Strategy for 21st Century Sea Power. October 2007. U.S. Navy. Internet.
10 Ago 2010.
47
CADERNOS NAVAIS
Volumes Publicados
49
10. A Estratégia Naval Portuguesa
Vice-Almirante António Emílio Sacchetti,
Professor Doutor António José Telo,
Vice-Almirante Magalhães Queiroz,
Almirante Vieira Matias,
Contra-Almirante Lopo Cajarabille,
Capitão-Tenente Marques Antunes,
Dr. Nuno Rogeiro,
Vice-Almirante Ferreira Barbosa,
Dr. Tiago Pitta e Cunha,
Vice-Almirante Reis Rodrigues,
Contra-Almirante Melo Gomes,
Vice-Almirante Alexandre Silva Fonseca,
Vice-Almirante Pires Neves,
Vice-Almirante Rebelo Duarte
50
17. As Grandes Linhas Geopolíticas e Geoestratégicas da Guerra e da Paz
Capitão-Tenente José António Zeferino Henriques
51
30. A “Guerra às Drogas”
Capitão-de-Mar-e-Guerra MN J. Margalho Carrilho
52