Dissertacao Antonio Lazaro Pereira de Souza

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA - UNEB

DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO E
CONTEMPORANEIDADE – PPGEDUC – CAMPUS I

RPG DIGITAL INSTRUMENTO PEDAGÓGICO PARA O ENSINO DA ABOLIÇÃO


DA ESCRAVIDÃO

ANTONIO LÁZARO PEREIRA DE SOUZA

Salvador
2016
ANTONIO LÁZARO PEREIRA DE SOUZA

RPG DIGITAL INSTRUMENTO PEDAGÓGICO PARA O ENSINO DA ABOLIÇÃO


DA ESCRAVIDÃO

Dissertação de Mestrado apresentada a Banca Examinadora


como exigência para a obtenção do título de Mestre em
Educação e Contemporaneidade, na área da Linha I:
Processos Civilizatórios, Educação, Memoria e Pluralidade
Cultural, da Universidade do Estado da Bahia – UNEB, sob
orientação do Prof. Dr. Alfredo Eurico Rodrigues Matta.

Salvador
2016
AGRADECIMENTOS

Agradeço aos meus pais e irmão, que sempre me incentivaram e apoiaram para iniciar,
desenvolver e finalizar este estudo.
A minha esposa pelo companheirismo, atenção, dedicação, paciência e encorajamento.
Aos amigos Esdras e Jaldinei que partilharam comigo diálogos e dúvidas, trazendo
novos olhares para esta pesquisa.
Aos amigos do grupo de pesquisa que com suas contribuições acadêmicas e pessoais me
ajudaram de forma ímpar na construção deste trabalho, que tem um pouco de cada um, em
especial Thiago Rodrigues, Josete Bispo e Caroline Duarte.
Aos professores e funcionários do PPGEduC que tanto me ajudaram no decorrer destes
dois anos de pesquisa e estudo.
Ao meu orientador Alfredo Matta, que trilha comigo o caminho da pesquisa deste a
graduação, com dedicação, atenção e cuidado.
Aos estudantes e professores participantes das escolas que sem eles nada aconteceria e
que para eles desejo que este trabalho se estenda a tantos outros educadores.
E a todos aqueles que direta ou indiretamente colaboraram na construção e finalização
deste trabalho.
RESUMO

Este trabalho analisa como o RPG digital enquanto instrumento pedagógica e tecnológica pode
contribuir para o ensino de história da abolição da escravatura para os jovens alunos de escolas
públicas da região do Cabula e entorno, assim como desenvolver uma consciência mais
significativa e ativa na construção do conhecimento sobre a História através do jogo. Neste
tocante, o estudo sobre a história da abolição da escravidão permite compreender como se deu
a construção histórica da transição da mão de obra escrava para a livre no Brasil. Compondo a
contextualização, é analisada os processos de escravização desde antiguidade até a modernidade
e como as revoltas dos cativos e a modernidade contribuiu para a abolição. O
socioconstrutivismo de Lev Vygotsky sustenta a base epistemológica necessária para criar
ambientes de aprendizagem na qual os jovens de forma engajada, através de mediação e
interação sejam protagonistas na relação ensino-aprendizagem. As habilidades sociais do
sujeito enquanto ser social é ampliada e promovida pelo modo de pensar histórico nos jovens
através das simulações do RPG digital. A abordagem metodológica DBR, serão desenvolvidos
na direção de abrir espaço para investigações aplicadas e voltadas para o desenvolvimento de
soluções práticas de pesquisa. Desta forma, os resultados obtidos na pesquisa a partir da
simulação de situações históricas que exigem iniciativa e engajamento, mostraram o
desenvolvimento do pensamento crítico e reflexivo sobre a História.

Palavras-chave: RPG. Abolição da Escravidão. Modo de pensar histórico, Socioconstrutivismo,


DBR.
ABSTRACT

This paper analyzes how the digital RPG, as a pedagogical and technological tool, can
contribute to the educational history of the abolition of slavery to the young students from
public schools in Cabula region and surroundings, as well as developing a more meaningful
and active consciousness in the construction of knowledge of history through the game. In this
respect, the study of the history of the abolition of slavery allows us to understand how was the
historical building Hand transition from slave labor for free in Brazil. Compounding the
contextualization, the enslavement processes are analyzed from antiquity to modernity, and as
the revolts of the captives and modernity contributed to the abolition. The socio-constructivism
of Lev Vygotsky maintains the epistemological foundation necessary to create learning
environments in which young people from engaging manner through mediation and interaction,
are protagonists in the teaching-learning relationship. Social skills of the subject as a social
being are enhanced and promoted by way of historical thinking of young people through
simulations of digital RPG. The DBR methodological approach will be developed in the
direction of open space for applied and focused on the development of practical research
solutions investigations. Thus, the results obtained in the research, from the simulation of
historical situations that require initiative and engagement, showed the development of critical
and reflective thinking about history.

Keywords: RPG; Abolition of Slavery; historical way of thinking; social constructivism; DBR.
LISTA DE QUADROS

QUADRO 1 – Condições de Vida e Trabalho dos escravos.....................................................20


QUADRO 2 – Contexto da Abolição aplicada a modelagem do RPG.....................................28
QUADRO 3 – Paradigmas Educacionais .................................................................................32
QUADRO 4 – Princípios socioconstrutivas no RPG Digital....................................................34
QUADRO 5 – Princípios do Modo de pensar histórico aplicado ao RPG ..............................35
QUADRO 6 – “Caraterísticas do historiador” para análise das ações dos jogadores no RPG
Digital “Liberdade”...................................................................................................................36
QUADRO 7 – Indicadores de domínio para o pensar histórico...............................................37
QUADRO 8 – Aplicação do Design socioconstrutivista ao RPG “Liberdade”........................42
QUADRO 9 – Background RPG “Liberdade”.........................................................................45
QUADRO 10 – Indicadores de Elementos da Campanha........................................................48
QUADRO 11 – Relação Conteúdo e Contexto social dos estudantes......................................49
QUADRO 12 – Indicadores de Elementos das Aventuras.......................................................51
QUADRO 13 – Fases da pesquisa DBR...................................................................................57
QUADRO 14 – Variável dependente e independente abordagem metodológica DBR............61
LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 – Relação Interatividade e ZDI....................................................................40


FIGURA 2 – Relação Contexto, Conteúdo e Sujeito......................................................41
FIGURA 3 – Relação Contexto e Conteúdo...................................................................41
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

RPG – Role Playing Game


DBR – Design-Based Research
ZDI – Zona de Desenvolvimento Imediato
UNEB – Universidade do Estado da Bahia
MEC – Ministério da Educação e Cultura
SEC – Secretaria da Educação e Cultura
IAT – Instituto Anísio Teixeira
NPC – Non-Player Character
PJ – Personagens jogadores
D&D – Dungeons and dragons
3D&T – Defensores de Tóquio 3º Edição
AVA – Ambiente Virtual de Aprendizagem
PHP – Hypertext Preprocessor
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ...............................................................................................................11
2 CONTEXTO HISTÓRICO DA ABOLIÇÃO DA ESCRAVIDÃO NA BAHIA.......13
2.1 CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DA ESCRAVIDÃO.........................................................14
2.2 O BRASIL NA ROTA DO TRÁFICO DE ESCRAVOS..................................................16
2.3 RESISTÊNCIA ESCRAVA..............................................................................................22
2.4 TRANSIÇÃO DO TRABALHO ESCRAVO PARA O TRABALHO LIVRE NO
BRASIL.............................................................................................................................24
2.5 ANÁLISE DO CONTEXTO EM FUNÇÃO DA MODELAGEM DO RPG...................27
3 RPG DIGITAL: FERRAMENTA PEDAGÓGICA PARA O ENSINO DE
HISTÓRIA........................................................................................................................29
3.1 UMA ABORDAGEM SOCIOCONSTRUTIVISTA PARA O ENSINO DE
HISTÓRIA.........................................................................................................................30
3.2 A RELAÇÃO DO MODO DE PENSAR HISTÓRICO COM O RPG
SOCIOCONSTRUTIVISTA.............................................................................................35
3.3 O ENSINO MEDIADO POR JOGOS DIGITAIS.............................................................37
3.4 DESIGN COGNITIVO SOCIOCONSTRUTIVA DO RPG DIGITAL............................39
4 MODELAGEM DO JOGO RPG LIBERDADE...........................................................43
4.1 PROPOSTA DE MODELAGEM DO JOGO....................................................................44
4.2 O RPG DIGITAL - ROLLING PLAYER GAME DIGITAL…………………………...44
4.3 MODELAGEM DA CAMPANHA...................................................................................46
4.3 MODELAGEM DAS AVENTURAS...............................................................................49
4.4 SISTEMA DE REGRAS...................................................................................................52
5 ABORDAGEM METODOLÓGICA.............................................................................54
5.1 CATEGORIAS DE ANÁLISE..........................................................................................58
5.1.1 VARIÁVEL DEPENDENTE..........................................................................................59
5.1.2 VARIÁVEL INDEPENDENTE......................................................................................60
6 ANÁLISE DA PROPOSTA PEDAGÓGICA PARA O ENSIO DA ABOLIÇÃO
DA ESCRAVIDÃO..........................................................................................................62
6.1 ANÁLISE DA APLICAÇÃO PEDAGÓGICA: AVALIAÇÃO DAS VARIÁVEIS
DEPENDENTES E INDEPENDENTES..........................................................................63
6.2 APLICAÇÃO DO EXPERIMENTO COM O GRUPO A: RESULTADOS DA
AVENTURA RECÔNCAVO REBELDE.........................................................................65
6.2.1 VARIÁVEIS DEPENDENTES DA AVENTURA RECÔNCAVO REBELDE..........66
6.3APLICAÇÃO DO EXPERIMENTO COM O GRUPO B: RESULTADOS DA
AVENTURA BATE-FOLHA............................................................................................76
6.3.1 VARIÁVEIS DEPENDENTES DA AVENTURA BATE-FOLHA................................76
6.4 ELEMENTOS DE REDESIGN PARA O RPG DIGITAL..................................................83
6.5 ANÁLISE GERAL DOS RESULTADOS..........................................................................84
7 CONCLUSÃO......................................................................................................................87
REFERÊNCIAS......................................................................................................................91
ANEXOA.................................................................................................................................96
ANEXO B.................................................................................................................................98
ANEXO C..............................................................................................................................105
ANEXO D...............................................................................................................................109
ANEXO E...............................................................................................................................117
11

1. INTRODUÇÃO

Este trabalho é um estudo sobre as possibilidades pedagógicas que o jogo RPG (Role
playing game) Digital oferece para aprendizagem, com base nos postulados socioconstrutivistas
do Pensar Histórico sobre a Abolição da Escravidão. O despertar em escrever sobre a temática
surgiu na graduação em História ao ingressar no programa “Conteúdos Digitais” do MEC
(Ministério da Educação), regulado pelo Edital MEC/MCT 001/2007 e pelo Convênio
656052/2008 com a Secretaria da Educação do Estado da Bahia – SEC, que fez uso do RPG By
Moodle como parte para solução didática do programa. Foram observadas as possibilidades
pedagógicas que o RPG em plataforma digital oferece na promoção dos processos de
aprendizagem numa perspectiva socioconstrutivista.
Após o programa “Conteúdos Digitais”, tivemos oportunidade de atuar na Rede Anísio
programa vinculado ao IAT – Instituto Anísio Teixeira. Na Rede Anísio produzimos,
roteirizamos e gerenciamos audiovisual e blogs voltados para estudante e professores da rede
pública de ensino da Bahia. Experiência está que contribuiu para compreensão e
amadurecimento sobre a importância da utilização de tecnologias educativas na relação-ensino
aprendizagem.
No mesmo período em que atuava na Rede Anísio, pude associar as experiências de
produção de mídias educativa aos estudos do grupo de pesquisa Sociedade em Rede,
Pluralidade Cultural e Conteúdos Digitais Educacionais. A vinculação ao grupo foi de
fundamental importância para o amadurecimento intelectual e identificação do problema desta
pesquisa que é: Qual solução pedagógica de jogo RPG digital pode ser desenvolvida para o
ensino/aprendizagem da História da abolição da escravatura?
Ao apontar o problema dessa pesquisa, trazemos as problemáticas que a circundam:
1. Como compreender o contexto da abolição da escravidão que será simulado no
jogo de RPG?
2. Qual teoria pedagógica melhor se adequa à temática?
Com a finalidade de responder a essas questões, definimos como objetivo principal
desenvolver e aplicar um jogo de RPG digital como ferramenta pedagógica que auxiliasse no
aprendizado sobre Abolição da escravidão. Dentro do objetivo geral descrito, agregaram-se os
específicos:
a) Desenvolver uma interpretação sócio-histórico-cultural sobre a Abolição da
escravidão;
12

b) Conceituar o lastro teórico que norteará a modelagem do jogo de RPG;


c) Modelar e validar, junto com estudante e professores um jogo de RPG que
contribua na relação ensino-aprendizagem sobre a Abolição da escravidão.
No intuito de atender aos objetivos propostos e ao problema de pesquisa, o estudo foi
estruturado da seguinte maneira:
Capítulo II - Contexto Histórico da Abolição da Escravidão na Bahia: Dialogando com
Albuquerque (2006), Alencastro (2000), M’Bokolo (2009), Reis (2003) e Willians (2012)
apresentamos o entendimento sobre a construção histórica da escravidão e transição para a mão
de obra livre, como parte de projeto ideológico de transição do regime senhorial brasileiro para
a modernidade. Não há nesse capitulo a pretensão de encerrar a discussão ou presentar
interpretações completas sobre o tema histórico, mas apresentar pontos que julgamos relevantes
para um entendimento crítico e engajado do estudo, e validarmos como interlocutores da
temática abordada.
Na contextualização destacamentos os elementos que compões o roteiro do jogo, assim
como conteúdo pedagógico para o ensino de história.
Capítulo III - RPG Digital: Ferramenta Pedagógica para o Ensino de História: Este
capitulo, procede-se com análises da abordagem do ensino de História associado a tecnologias
educacionais do RPG Digital, aportado na Praxiologia de Antonio Gramsci, nas concepções
pedagógicas vigosktiana, no modo de pensar histórico que resultou na modelagem do jogo. Tais
reflexões foram dirigidas a partir dos elementos apostados por Cabalero (2007), Huizinga
(2000), Martineau (1997), Matta (2011) e Vygotsky (1991) do diálogo com esses autores
conseguimos estabelecer a fundamentação teórica da pesquisa e estabelecer os princípios de
design cognitivo a ser considerados na modelagem do jogo.
Capítulo IV - Modelagem do Jogo RPG Liberdade: Apresentamos neste capitulo a
modelagem do jogo, campanha e aventuras. Resgatamos nesse capitulo todos os tópicos
apontados na contextualização e na fundamentação teórica, somado as contribuições de
estudantes e professores envolvidos na pesquisa e como todos esses elementos foram inseridos
na modelagem. Para elaboramos o jogo, campanha, aventuras, sistemas de regras e outros
elementos, utilizamos o Design Cognitivo Socioconstrutivista, discutido no final capitulo III.
Capítulo V - Abordagem Metodológica: Como abordagem metodológica este estudo
utilizou a Design-Based Research – DBR, a escolha por essa abordagem justifica-se por esta,
corroborar com a abordagem dialética do modo de pensar histórico e do socioconstrutivismo.
Sustentando assim, a importância da colaboração entre os envolvidos no processo de ensino e
aprendizagem, situados em contextos históricos e sociais de mediação e produção.
13

A DBR é uma abordagem metodológica de bricolagem, com métodos de investigação


variados, contínuos e evolutivos, adequados a pesquisa aplicada que tem a pretensão de
solucionar problemas endógenos nas práticas de ensino-aprendizagem.
A DBR esteve presente em todo o estudo elaborado desde teorização dos capítulos até
aplicação do experimento. Por assim ser, apresentamos nesse capitulo as fases de construção
da pesquisa: Fase 1 – Análise do problema por investigadores, usuários e/ou demais sujeitos
envolvidos em colaboração; Fase 2 – Desenvolvimento da proposta de solução responsiva aos
princípios de design, às técnicas de inovação e à colaboração de todos os envolvidos; Fase 3 e
4 – Ciclos iterativos de aplicação e refinamento em práxis da solução, e reflexão para produzir
“princípios de design” e melhorar implementação da solução.
Como critério para avaliação dos resultados da pesquisa desenvolvemos as variáveis
dependentes e independentes. A variável dependente é o fator, a causa ou antecedente que
determinará a ocorrência de outros fenômenos, definida pela pergunta de pesquisa, no nosso
caso o ensino de história utilizando o RPG Digital como ferramenta pedagógica. A variável
independente diz respeito ao que foi acompanhado no comportamento dos estudantes na
dinâmica do jogo, neste caso há ocorrência do modo de pensar histórico.
Capitulo VI - Analise da proposta pedagógica para o ensino da abolição da escravidão:
Neste capitulo apresentamos os resultados da aplicação do experimento RPG Liberdade, cujo
experimento desenvolveu-se com as aventuras: Recôncavo rebelde e Bate-folha. A observação
seguiu os paramentos estabelecidos nos Capítulo V, além dos princípios socioconstrutivista e
do modo de pensar histórico, abordados no Capítulo III. Os resultados sistematizados foram
obtidos a partir do acompanhamento das variáveis dependentes e independentes, estabelecidas
com a finalidades de testar a eficiência e funcionalidade do jogo RPG Liberdade como
tecnologia educacional adequada para o ensino da abolição da escravidão e, por conseguinte
para o ensino de história.

2. CONTEXTO HISTÓRICO DA ABOLIÇÃO DA ESCRAVIDÃO NA BAHIA

Neste capitulo serão apresentados elementos que consideramos influentes para


entendermos a abolição da escravidão no Brasil e na Bahia. Salientamos que o contexto
elaborado não tem a pretensão de encerrar a discussão ou presentar interpretações completas
sobre o tema histórico, mas apresentar pontos que julgamos relevantes para um entendimento
crítico e engajado do estudo, tornando-nos interlocutores válido em relação ao jogo que
pretendo implementar.
14

Consideramos o contexto, como uma leitura preliminar para a integração entre os


sujeitos da pesquisa, a fim de salientar as motivações históricas que influenciaram direta ou
indiretamente, “[... a maneira pela qual uma sociedade, uma coletividade, reproduz sua
existência; (...) suas práticas sociais, suas relações, sua estrutura organizacional, cultura e
hábitos, etc.]” (MÉSZÁROS, 2002). Somente o contexto é capaz de engajar e validar o
pesquisador na compreensão das composições sociais estudadas, estando estas conectadas a
uma ordem de reprodução social.
A elaboração do contexto se justifica pela epistemologia deste mestrado. A Praxiologia
gramsciana, que é um postulado teórico de influência marxista, sustentado na práxis dos
sujeitos como transformação das suas relações sociais. Dessa maneira, o jogo de RPG
“Liberdade” tem como proposta pedagógica socioconstrutivista favorecer à construção de um
modo de pensar histórico sobre a abolição da escravidão e suas implicações na vida dos
estudantes engajados na pesquisa. Portanto, nesse aspecto, a Praxiologia atende às necessidades
científicas desta pesquisa.
Aliados à Praxiologia utilizaremos a DBR – Design Based Research como metodologia,
que considera a contextualização a primeira fase da pesquisa, permitindo o pesquisador analisar
os problemas da temática em colaboração com os demais sujeitos envolvidos. Característica
esta que converge com a praxiologia, o socioconstrutivismo e ao modo de pensar histórico.
Todos as categorias históricas, aqui contextualizadas, configurar-se-ão como conteúdo
no jogo RPG “Liberdade”. Isso se deve ao método de modelagem que adotaremos para o jogo,
o Design Cognitivo socioconstrutivista, que será explicado no Capitulo 3.

2.1 CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DA ESCRAVIDÃO

A escravidão e o tráfico negreiro têm raízes profundas na história da humanidade. Em


diversas sociedades, desde os tempos mais remotos, os escravos eram legalmente definidos
como uma mercadoria. Quando europeus chegam a África no século XV, as práticas escravistas
já estavam enraizadas na cultura dos dois continentes, mas a insurgência de um modelo
econômico mercantilista e a expansão marítima colocariam a escravidão como peça
fundamental na produção econômica mundial do século XVI e XVIII, até que a Revolução
Industrial e o desenvolvimento do capitalismo moderno se contrapuseram à ordem senhorial e
a escravidão.
Durante muito tempo, a história tradicional procurou legitimar a ideia de que a África
era um grande continente formado apenas por sociedades tribais, fator que teria propiciado e
15

justificado a escravização do africano pelo europeu. Contudo, quando olhamos atentamente a


história, percebemos que em algumas nações africanas e europeias havia ordens sociais muito
semelhantes entre si. Por parte dos europeus, ordem senhorial, políticas de expansão territorial,
mercantilismo e cristianismo. Do outro lado, a África mostrava uma ordem social semelhante
que se baseava nas relações de parentesco familiar, reverência aos mais velhos, partilhada pelas
religiões autóctones, cristianismo e islamismo, preservação da memória dos antepassados,
coabitação de vários povos num mesmo território, exploração tributária de um povo por outro,
impérios consolidados no Mali e Kongo e práticas escravistas inter e intracontinentais. No
Magreb, na região sudanesa, África subsaariana, Golfo da Guiné e Costa do Índico, emirados e
califados organizavam-se numa ordem senhorial com uma urbanidade comercial. Ao sul, os
Bantos e outros grupos étnicos viviam em sociedades tribais, muito semelhante aos
Tupinambás. (ALBUQUERQUE ,2006)
A escravidão intracontinental ou escravidão doméstica era comum em algumas
sociedades africanas e justificada por diversos motivos: guerras entre povos; escassez de mão
de obra; em algumas sociedades, o cativeiro era a punição para quem fosse condenado por
roubo, assassinato, feitiçaria e, às vezes, adultério; a posse de escravos assegurava poder e
prestígio aos seus senhores; mulheres e crianças eram escravizadas para ampliação da estirpe
do seus senhores, mas quando os filhos de cativos nasciam na casa do senhor, não podiam ser
vendidos, e seus descendentes iam, de geração em geração, perdendo a condição servil e sendo
assimilados à linhagem. (SILVA, 2002)
A escravidão intercontinental africana remonta ao fim do quarto milênio a.C., quando
as civilizações Querma, Egípcia e Axum inserem na sua organização social o cativo e
estabelecem as primeiras rotas de tráfico dentro e fora da África. Por volta do século I, Árabes
pré-islâmicos potencializaram a exploração das rotas de tráfico até a África Negra para compra
e captura de escravos, ouro, madeira e marfim. Nesse período, o tráfico já se dava de maneira
regular em duas vias de acesso: Saara e Oceano Índico. Pelas fontes históricas existentes há
indícios de que os Árabes abriram o caminho para que europeus iniciassem o tráfico negreiro
pelos oceanos Atlântico e Índico. Sabendo disso, pode-se deduzir que a dominação de
Tuaregues, Mouros e Berberes durante expansão islâmica sobre a Península Ibérica e os
períodos em que os hispânicos foram escravizados pelos povos do Magreb tenham contribuído
para criação de um comércio escravista a partir do século XV, África-Europa, alimentado por
uma visão preconceituosa dos africanos e sua cultura. (M’BOKOLO, 2009)
16

2.2 O BRASIL NA ROTA DO TRÁFICO DE ESCRAVOS

Em 1499, Vasco da Gama retorna de sua primeira viagem à Índia e concedendo a D.


Manuel o título de “Rei de Portugal e dos Algarves d’aquém e d’além-mar em África, Senhor
de Guiné e da Conquista da Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia”. A partir
desse momento, Portugal se tornaria o maior império Ultramarino da história, ancorado em três
continentes: África, Ásia e, mais tarde, América. “[Contra vento, contra monção, contra mare
e contra a razão]” (PINTO 1952, p. 57), portugueses navegam para aumentar a sua acumulação
primitiva de capital e iniciam uma colonização ultramarina e sua exploração através de saques,
especulação comercial, monopólios mercantis e tráfico de escravos. (ALENCASTRO, 2000)
No entanto, Portugal e Espanha não conseguiram manter o seu domínio sobre o tráfico
de escravo transatlântico. Esse domínio começou a ser questionado pouco tempo após a
formalização do Tratado de Tordesilhas (1494), quando Francisco I da França questiona a
validade do tratado ao afirmar: “O Sol brilha para mim como para os outros. Eu gostaria
imensamente de ver a cláusula do testamento de Adão que me exclui de uma parte do mundo”.
A Dinamarca também recusou a aceitar o domínio Ibérico sobre as Índias Ocidentais. Pouco
tempo depois ao Tratado em 1497, a Inglaterra financia a viagem de Cabot para a América do
Norte. Em 1562, Sir John Hawkins trafica escravizados da África e mais tarde no século XVII
é criada a Companhia dos Empreendedores Reais e a Real Companhia Africana. Ainda no
século XVII a Holanda cria a instituição que mais lucrou com o tráfico de escravos, a
Companhia das Índias Orientais holandesas, que tinha a função de gerenciar todo comércio
transatlântico do seu pais. Não demorou muito para que Inglaterra, França e Holanda se
tornassem as nações que mais lucraram com o tráfico de escravizados da África. (WILLIANS,
2012)
A escravização do africano e tráfico escravo feitos pelos ibéricos não estavam restritos
a apelos econômicos, havia um caráter de reconquista contra o Islã e o fortalecimento da fé
católica perante aos rivais históricos muçulmanos. Esse fato só irá mudar quando a Holanda e
Inglaterra guiadas pela ideologia Protestante e de capitalismo primitivo começaram a escravizar
qualquer africano não cristão.
Portugueses e espanhóis, movidos pela justificativa da Guerra Santa, começaram a
capturar escravizados entre povos islâmicos do Magreb, Sudão, Guiné, Senegal, Mauritânia.
Além dos islâmicos, Yorubás, Bantos e moçambicanos também foram escravizados e levados
para o Brasil e demais colônias. Numa evidente expressão de que a escravidão iniciou-se com
pretextos religiosos pode ser percebido no fato de Etíopes e outros africanos cristãos não terem
17

sidos escravizados pelos ibéricos, e no sermão proferido em 1633 pelo padre Antônio Vieira
perante escravos de um engenho do Recôncavo baiano justifica o tráfico de escravos como
instrumento da missão evangelizadora dos infiéis africanos:

Começando, pois, pelas obrigações que nascem do vosso novo e tão alto
nascimento, a primeira e maior de todas é que deveis dar infinitas graças a
Deus por vos ter dado conhecimento de si, e por vos ter tirado de vossas terras,
onde vossos pais e vós vivíeis como gentios, e vos ter trazidos a esta, onde,
instruídos na fé, vivais como cristãos, e vos salveis. Fez Deus tanto caso de
vós, e disto mesmo que vos digo, que mil anos antes de vir ao mundo, o
mandou escrever nos seus livros, que são as Escrituras Sagradas.
(ALBUQUERQUE , 2006, p. 42)

Nesse cenário de tensões, cristãos e islâmicos, emergência do mercantilismo, expansão


marítima europeia e práticas de escravidão dos africanos, a colonização portuguesa se inicia no
Brasil.
Até a primeira metade do século XVI a escravidão do índio era predominante, mas
diversos fatores levaram a sua substituição pelo africano. As epidemias dizimaram grande
número dos índios escravizados que trabalhavam nos engenhos ou que viviam em aldeamentos
organizados pelos jesuítas. As fugas dos índios para o interior do território brasileiro
provocavam um aumento no custo de captura e transporte do cativo. Além disso, nenhuma
comunidade indígena conseguiu firmar-se como fornecedora regular de cativos, o que
dificultou a formação de comunidades indígenas capazes de capturar nativos e comercializá-los
com colonos, atendendo à crescente demanda de mão de obra.
As limitações em escravizar comunidades indígenas e a vontade da Coroa Portuguesa
em inserir o Brasil no comércio europeu e africano fizeram com que mais de 4 milhões de
cativos africanos aportassem no Brasil, entre os séculos XVI e XIX, tornando o tráfico negreiro
um grande negócio e fonte de lucros para portugueses, holandeses, ingleses, brasileiros e
africanos. A partir de então, o tráfico de escravos deixa de ser apenas uma entre as várias
atividades ultramarinas iniciadas com os “descobrimentos” para se transformar no negócio mais
lucrativo do Atlântico Sul. O tráfico negreiro estigmatizou o Brasil como o maior importador
de mão de obra escrava da américa e uniu para sempre o país à África, e também foi fonte de
riqueza para muitos colonos e traficantes ao ponto de podermos afirmar que industrialização da
inglesa foi financiada pelo tráfico negreiro, uma vez que colonos e traficantes enriquecidos iam
gastar sua fortuna na Inglaterra ou importavam produtos manufaturados.
Durante anos a Grã-Bretanha acumulou volumosa riqueza em decorrência do tráfico de
escravos. O aumento dos bens de consumo provocado pelas atividades comerciais ultramarinas
18

acarretou o desenvolvimento da capacidade produtiva do pais, gerando riqueza suficiente para


financiar a expansão industrial. Nos três primeiros quartos do século XVIII, o acúmulo do
capital britânico foi ampliado pelos plantadores de cana-de-açúcar e pelos traficantes de
escravos, os lucros decorrentes dessa atividade forneceram crédito suficiente para a construção
das fábricas, atendendo às necessidades do capitalismo industrial. (WILLIANS, 2012)
Se o tráfico era fonte de riqueza para uns, para outros era sofrimento, angustia e
resistência. O poeta abolicionista Castro Alves, melhor do que ninguém, escreveu sobre as
atrocidades ocorridas dentro dos navios negreiros:

Era um sonho dantesco... o tombadilho


Que das luzernas avermelha o brilho.
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros... estalar de açoite...
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar...

Negras mulheres, suspendendo às tetas


Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
Outras moças, mas nuas e espantadas,
No turbilhão de espectros arrastadas,
Em ânsia e mágoa vãs!

E ri-se a orquestra irônica, estridente...


E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais ...
Se o velho arqueja, se no chão resvala,
Ouvem-se gritos... o chicote estala.
E voam mais e mais...

Presa nos elos de uma só cadeia,


A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali!
Um de raiva delira, outro enlouquece,
Outro, que martírios embrutece,
Cantando, geme e ri!

No entanto o capitão manda a manobra,


E após fitando o céu que se desdobra,
Tão puro sobre o mar,
Diz do fumo entre os densos nevoeiros:
"Vibrai rijo o chicote, marinheiros! Fazei-os mais dançar!..."

E ri-se a orquestra irônica, estridente. . .


E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais...
Qual um sonho dantesco as sombras voam!...
Gritos, ais, maldições, preces ressoam!
E ri-se Satanás!...
19

Quando sobrevivia a travessia atlântica, o cativo desembarcava em algum porto das


grandes cidades do Brasil, ou em alguma praia deserta após a Lei Eusébio de Queirós.
Desenraizado de sua terra, separado de amigos e parentes por um oceano, reduzido a uma
propriedade, leiloado, vendido, comprado, permutado por outras mercadorias, rebatizado
com um nome estranho, submetido ao domínio de seus senhores e obrigado a trabalhar nas
mais diversas ocupações de sol a sol, o africano percebia que sobreviver era o grande
desafio.
A mão de obra escrava era a chave mestra para economia brasileira colonial e imperial.
O cativo produzia toda a riqueza consumida e exportada no Brasil. O escravo plantava e colhia
cana, café, cacau, algodão, na agricultura de subsistência, na criação de gado, na produção de
charque, nos ofícios manuais, nos serviços domésticos, nas minas de ouro e diamante. Nas
cidades, o escravo construía casa, fábricas, pontes, ruas e estradas, transportava pessoas e
objetos, era vendedor de ambulante quitandeiro, estava presente nas grandes e pequenas
cidades. Na Bahia para onde se olhasse havia um negro ou uma negra escravizada.
O escravo não era uma propriedade exclusiva da classe dominante: grandes senhores de
engenho, fazendeiros de café ou pessoas ricas das cidades. Até a primeira metade do século
XIX, o escravo estava presente nas diversas classes: Padres, militares, funcionários públicos,
artesãos, taverneiros, comerciantes, pequenos lavradores, pobres e até ex-escravos possuíam
escravos. A disseminação da escravidão entre as diversas classes sociais foi fundamental para
a manutenção do sistema escravista por mais de três séculos, pois o interesse de manutenção da
escravidão convergia entre os grandes e pequenos escravistas.
A perpetuação da escravidão por mais de 300 anos, moldou estruturas sócio
contemporâneas do Brasil com sentimentos e valores definindo a cor da pele predominante em
cada classe social e esfera de poder, normatizou desigualdades sociais e raciais. A classe
oprimida no Brasil é uma construção histórica profundamente ligada à escravidão.
A trama da escravidão baiana era tencionada por duas forças antagônicas: de um lado a
classe oprimida formada na sua maioria por escravos, e, do outro, a classe dominante com os
senhores de engenho, sendo a sua maior expressão que controlava uma realidade complexa e
perversa. Conforme apresenta Reis:

Os senhores de engenho eram proprietários e controlavam em seus aspectos


essenciais os principais meios de produção da sociedade e, não só por isso,
mas por seu imenso poder social, político e simbólico, eles representavam a
classe dominante por excelência. Mesmo descontando todo o exagero que a
20

mitologia senhorial, e depois a historiografia, produziu para superdimensionar


a estatura do senhor de engenho, este ainda persiste como figura de grande
poder. Já os escravos formavam a principal categoria de trabalhadores,
submetidos política, social e economicamente aos senhores, e por isso,
inclusive por seu peso numérico, pode-se dizer que constituíam a principal
classe subordinada da Bahia na época. Por essa razão, qualquer análise terá
que levar em conta o fato de que as relações senhor – escravo constituíam
matriz estruturante da sociedade e da economia baiana. (REIS, 2003, p. 19-
20)

Diante da quantidade de escravos, Salvador possuía uma população predominantemente


negra, segundo Reis (2003) em 1835 havia 27.500 escravos (42% da população) e 38.000 livres
e libertos (58% da população). Essa característica populacional era similar no Recôncavo
baiano, onde maioria dos engenhos possuía entre sessenta e oitenta escravos e algumas
propriedades operando com mais de duzentos cativos, por esse motivo, a dominação senhorial
se dava de maneira severa e sutil.
Desde a escravidão na antiguidade que muitos donos de escravizados perceberam que
não dava para controlar o cativo apenas com violência física e/ou castigos injustificados, essas
formas de dominação estimulavam ainda mais as rebeliões e fugas. Era necessário não apenas
subjugar, mas cooptar o escravo. Para isso, os senhores de escravos no Brasil resgataram a
ideologia paternalista aplicada à escravidão, que consistia em colocar o escravo sob “proteção”
familiar, como relata Antonil na obra Cultura e opulência do Brasil:

O certo é que, se o senhor se houver com os escravos como pai, dando-lhes o


necessário para o sustento e vestido, e algum descanso no trabalho, se poderá
também depois haver como senhor, e não estranharão, sendo convencidos das
culpas que cometeram, de receberem com misericórdia o justo e merecido
castigo (ANTONIL, 1982, P.33).

Ainda sobre as formas de dominações dos senhores, o jesuíta italiano Jorge Benci, que
viveu na Bahia em princípios do século XVIII, instruía os senhores a tratarem humanamente
seus cativos, alimentando, vestindo, fazendo-os trabalhar, mas também punindo-os com
“caridade cristã”.

QUADRO 1 - Condições de Vida e Trabalho do Escravos

Condições de Vida e Trabalho do Escravos

Local Área de Função Formas de


Produção resistência escrava
21

Nordeste Fazendas de  Preparar o campo para o plantio.  Fugas


Cana-de-  A colheita era feita por homens,  Sabotagens
Sudeste mulheres e Crianças. na Produção.
açuca
 Na casa de engenho o feitor da moenda  Furtos
era responsável pela moagem da cana.  Rebeliões
 Na casa das caldeiras, o mestre de
Fazendas de açúcar operava o beneficiamento do
Café melaço.
 O escravo era responsável pela
manutenção de toda infraestrutura e
utensílios da fazenda.
Os escravos trabalhavam de quinze a
dezoito horas diárias nas Fazendas
Sudeste Mineração  Exploração aurífera  Rebelião
 Construção de açudes, tanques e  Furtos de
Centro- represas de córregos para facilitar a metais
Oeste exploração do ouro. precioso
 O escravo garimpeiro ficava muito para
tempo com parte do corpo mergulhada comprar
na água dos rios e córregos. O escravo alforria. A
quase que não tinha tempo para si alforria era
mesmo. também
 A expectativa de vida do escravo que comprada
trabalhava nas minas era menor com o
comparado aos que trabalhavam no trabalho
engenho e fazendas de café. Para evitar árduo de
a morte precoce do cativo os senhores prospecção,
mineiros enfermeiros(as) negros(as) autorizada
para cuidar dos trabalhadores do ou não pelo
garimpo. Para muitas doenças recorria- senhor, nas
se ao uso de ervas típicas da medicina áreas
africana e indígena. abandonadas
 Os escravos trabalhavam sob a por outros
supervisão constante do “vigia de garimpeiros.
canoas”, que era geralmente branco ou
mulato. Os cativos eram obrigados a
trabalhar curvados, de frente para o
capataz, para que não furtassem ouro
ou diamante.
Rio Criação e  O abate do gado, o corte e o  Fugas
Grande do pastoreio de armazenamento das carnes e do couro  Rebeliões
Sul gado, exigiam trabalho intenso e prolongado
produção de dos escravos.
 No período outubro e maio, temporada
charque
de maior produção, os cativos
chegavam a trabalhar dezesseis horas
seguidas sob vigilância dos capatazes,
como eram chamados os feitores
gaúchos. Quando o trabalho se estendia
22

à noite os senhores ofereciam


aguardente para estimular a produção
dos cativos
Fonte: Autoria nossa.

2.3 RESISTÊNCIA ESCRAVA

Onde houve escravidão houve resistência. E de vários tipos. Mesmo sob


a ameaça do chicote, o escravo negociava espaços de autonomia com
os senhores ou fazia corpo mole no trabalho, quebrava ferramentas,
incendiava plantações, agredia senhores e feitores, rebelava-se
individual e coletivamente (REIS, 1992, p.9).

Em nenhum momento da história da escravidão moderna houve uma passividade do


negro escravizado. Desde o século XVI quando os primeiros cativos foram trazidos da África
para o Brasil, os escravizados criaram estratégias para fugir da condição de “mercadoria”,
mesmo numa terra distante estabeleceram vínculos amorosos, construíram famílias e não se
esqueceram de cultuar e venerar seus deuses.
As formas de resistência da escravidão no brasil foram inúmeras: desobediência
sistemática, lentidão na execução das tarefas, sabotagem da produção e as fugas individuais e
coletivas.
A fuga era uma das formas mais perigosas e difíceis de resistência, pois para fugir o
escravo precisava da colaboração de outros escravos, libertos e livres. Alguém que pudesse
fornecer abrigo, alimento e trabalho. Muitos escravos buscavam refúgio em fazendas,
povoados, cidades onde podiam se misturar aos negros livres e libertos, em comunidades
indígenas onde muitos negros Bantos receberam refúgio dos Tupinambás, mas também muitos
cativos fugiam para quilombos.
Desde o início da escravidão que os quilombos se tornaram centros de resistência.
Palmares, um dos quilombos mais conhecidos da história desde 1580 recebia escravos fugidos
das capitanias da Bahia e de Pernambuco. No entanto, os quilombos não se formavam apenas
em lugares afastados, era comum encontrar comunidades bem próximas às cidades, a exemplo
de Salvador. A capital baiana era cercada por mata e tinha diversas áreas quilombolas em seu
entorno, sobretudo entre os séculos XVIII e XIX. A presença desses quilombos determinou a
configuração das cidades, alguns bairros de Salvador se desenvolveram de quilombos ou
entorno deles, como o Quilombo dos Urubus que ficava localizado nas imediações do que hoje
é Pirajá, Quilombo Buraco do Tatu, localizado em Itapuã; Quilombo do Cabula, originado de
uma aldeia Tupinambá que passou a acolher escravos fugidos; Beirú, hoje denominado também
23

de Tancredo Neves, foi chefiado pelo negro angola Beirú. Suspeita-se que o Beirú no período
Colonial tenha servido de rota de ligação do Quilombo dos Urubus com o Buraco do Tatu.
(MARTINS, 2013)
Outra forma de resistência escrava no Brasil foram os inúmeros levantes e revoltas. De
norte a sul rebeliões eclodiam tanto na cidade como no campo. A partir do século XIX, as
revoltas são mais constantes e o receio da classe dominante em perder o controle social sobre
os cativos era grande, sobretudo depois da revolução escrava, iniciada em 1791 por cativos na
ilha de São Domingos, atual Haiti, que resultou no fim da escravidão e a criação de um país
independente.
A Bahia não podia perder o controle sobre seus cativos, devido a sua grande importância
dentro da economia local. Até a primeira metade do século XIX a Bahia era o maior produtor
de açúcar do Brasil, no Recôncavo estavam as terras mais férteis e propícias para o cultivo da
cana-de-açúcar e os engenhos mais produtivos. Toda a produção açucareira era movida por
enorme contingente do trabalho escravo de africanos e crioulos, essa alta concentração de
escravos tornou Salvador e o Recôncavo palcos de grandes tensões e rebeliões.
Ao longo do século XIX inúmeros levantes de escravos aconteceram na cidade e no
campo:

 Em 28 de maio 1808, rebeldes da étnica huassá pretendiam incendiar a Casa da


Alfândega e uma igreja na noite de Corpus Christi, eliminar os brancos por
envenenamento, queimar as imagens católicas em praça, assumir o governo da Bahia e
Pernambuco para formar o reino independente. No entanto, cinco dias antes do levante,
um escravo delata os planos ao seu senhor e os setes líderes do movimento são presos
por homens do Conde da Ponte. Os líderes e outro 13 rebeldes foram açoitados em praça
pública, alguns degredados para Angola e as festas africanas foram proibidas.
 4 de janeiro de 1809, escravos de diversas etnias organizam uma fuga de mais de 80
cativos de Salvador para um quilombo no Recôncavo. Contudo, a maioria dos cativos
são presos e mortos por soldados e capitães-do-mato, os sobreviventes foram marcados
a ferro e chicoteados publicamente. Os escravos que escaparam continuaram a vagar
pelo interior da província roubando, matando e incendiando fazendas.
 Nos anos 1814, 1816, 1822, 1826, 1827, 1828, 1830 e 1835 cerca de trinta revoltas
aconteceram na Bahia, a maioria delas promovidas por escravos Haussás e nagôs.
 25 de janeiro de 1835, escravos e libertos Malês planejavam o assassinato e confisco
dos bens de todos os brancos, implantação de uma monarquia islâmica, com
24

a escravidão dos não muçulmanos, fim do catolicismo. O levante teria seu início na
Vitória e seguiria em direção a Itapajipe. Uma vez que Salvador fosse conquistada, o
passo seguinte seria a dominação dos engenhos no Recôncavo. No entanto, o plano Malê
foi delatado por três africanos libertos: Domingos, Guilhermina e Sabina. Ciente dos
acontecimentos a polícia foi em busca dos rebeldes. Mais de 500 revoltosos, entre
escravos e libertos, foram mortos e capturados na vizinhança do Quartel de Cavalaria
em Água de meninos, 281 revoltosos foram presos no Forte do Mar, os líderes foram
condenados a trabalho forçado e degredados.
A conjunção das inúmeras formas de resistência escrava junto às pressões resultantes
de políticas econômicas e humanitárias nacionais e internacionais resultariam no fim legal da
escravidão no Brasil.

2.4 TRANSIÇÃO DO TRABALHO ESCRAVO PARA O TRABALHO LIVRE NO BRASIL

A história do processo de abolição da escravidão no Brasil é decorrente de uma longa


luta que se origina desde os primeiros anos da escravidão moderna, como o escravizado em
afirmar a sua condição humana, a defesa de sua cultura, as revoltas, fugas, formações de
quilombos e no século XIX o aumentos das pressões internas (as lutas pela independência,
rebeliões escravas o medo de um levante de negros na Bahia) e externas (imposições da
Inglaterra, capitalismo industrial, independência e o fim da escravidão no Haiti), que forçaram
o Estado Imperial a legalmente estabelecer o fim da escravidão.
O século XIX foi um período marcante para delinear o perfil de nação que seria o Brasil.
Um período de profundas mudanças no cenário mundial e o Brasil viveu de maneira intensa
essas mudanças. Aqui os ideais Liberais, Evolucionistas, Darwinistas, Positivistas, Marxistas e
outros foram conciliados às contradições da sociedade oitocentista. Que outro lugar conseguiria
conciliar o Liberalismo com o sistema escravista? Como um país conseguiu manter
características senhoriais em um momento em que o capitalismo emergia como ordem social
predominante? Esse Brasil que vai ser questionado pelas ideologias do século XIX, sobretudo
pela geração de 1870 que se propõe a delinear uma identidade nacional.
Algo que podemos colocar como marco inicial das mudanças enfrentadas pelo Brasil do
século XIX foi a chegada da família real portuguesa em 1808. A corte do então príncipe regente
D. João aproximou mais a Europa dos costumes do Brasil. Não somente no plano das ideias,
mas também no plano das instituições, pois compondo a corte portuguesa chegaram ao Brasil
artistas, pensadores e cientistas. A presença da corte resulta num ensaio à modernização com a
25

fundação de museus, bancos e bibliotecas. Vale ressaltar que no período de 1816 chega ao
Brasil – sob a iniciativa da família real – a Missão Artística Francesa, que “trouxe um padrão
estético universalista e imprimiu um gosto cosmopolita, que dominou toda a cultura urbana
brasileira do século XIX”. (VELOSO, 2000)
O projeto de independência instaurado em 1822, vislumbrava manter o Brasil de um
certo modo vinculado a Portugal e perpetuar o sistema escravista. Diferente de alguns países da
América, o Brasil e os Estados Unidos após a Independência não aboliram a escravidão, pelo
contrário, houve um aumento na “criação de escravos”.
Por outro lado, a independência acabou alimentando o ideal de construir uma nação com
uma cultura nacional e fortalecer-se enquanto Estado. Não é por acaso que no segundo reinado
houve fundações de diversas instituições para auxiliar na construção de um Estado Nacional,
como é o caso dos Institutos Históricos e Academias Científicas e Artísticas, que influenciaram
a formação de política do movimento abolicionista. (TAVARES, 2008)
A partir de 1870 os intelectuais brasileiros engajam-se em questões sociais e lutam pela
ampliação de um projeto de afirmação da identidade nacional. Foram os intelectuais da
“Geração de 1870” como: Silvio Romero, João Batista Lacerda e tantos outros que levantaram
polêmicas em torno de uma identidade nacional que até hoje não foram resolvidas, como as
discussões sobre os conceitos de Raça, Miscigenação e tantas outras teorias que tentavam
explicar o Brasil pela convergência de povos Indígenas, Africanos e Europeus (SCHWARCZ,
1993). Sob influência do Positivismo surge a Teoria do Meio Geográfico, que tentou explicar
o Brasil por influência do meio ambiente, diversidade ecológica e clima. É nesse período que
começa a sair os primeiros Bacharéis formados nas universidades brasileiras em Direito e
Medicina. Esses bacharéis exerceram função importante na conciliação do Liberalismo com o
sistema escravista, no qual foram suprimidos os ideais de liberdade e igualdade.
A geração de 1870 conquistou avanços na discussão em torno da construção da nação,
os Institutos e Academias diziam ao Brasil quem ele devia Ser. Influenciados pelos ideais
progressistas, a República e o Abolicionismo se mostravam como necessidades que deveriam
ser conquistadas, já que o Brasil queria se tornar uma nação moderna.
O Brasil, a partir de meados do século XIX, é palco das tensões entre o Moderno e o
Tradicional. O locus dessa contenda era a Cidade, onde se encontrava a emergente Burguesia,
a Cidade representava o novo contrário ao Campo, que representava o atraso.
A ordem senhorial brasileira vivia uma crise, e pouco a pouco, perdia espaço para o
capitalismo. A ordem capitalista é um modo de produção inconciliável com qualquer outra
ordem, uma vez que se torna dominante, ela tende a extinguir ou transformar as estruturas
26

sociais divergentes de sua lógica (MÉZÁROS, 2008). Umas das transformações ocorridas no
Brasil entre os séculos XIX e XX, foi a manutenção dos Senhores e suas relações de prestígios
e poder como classe dominante junto à burguesia, e uma das extinções exigidas era o fim legal
da escravidão, para que o trabalho livre fosse garantido no país.
A escravidão apresentava-se inconciliável com o contexto econômico e político
mundial. Se o mercantilismo, a expansão europeia e colonização legitimavam a escravidão, a
sua derrocada se deu a partir do rompimento do sistema colonial, as transformações do sistema
produtivo mundial com a consolidação da industrialização e as novas formas de colonialismo.
(MENEZES, 2009)
No sistema escravista o escravo é a mercadoria, portanto a relação de dominação se dá
no ato da escravidão, enquanto o trabalhador assalariado desprovido dos meios de produção
vende sua força produtiva transformando-a em mercadoria, dessa maneira uma das formas de
dominação do capital sobre o trabalhador será no valor atribuído na força de trabalho,
transformando o trabalho em um produto e ainda gerar o trabalho excedente.
A abolição da escravidão era parte do projeto de modernidade e implantação do
capitalismo no Brasil. Mas essa transição da mão de obra escrava para livre não seria tão fácil.
O Estado brasileiro era centrado numa lógica escravista e as justificativas ideológicas,
econômicas e religiosas exigiam um desmantelamento gradual da escravidão, ou seja, era
necessário desarmar a engrenagem peça por peça. Por esse motivo, o Estado levou quase 40
anos para pôr um fim legal na escravidão, iniciando com a Lei Eusébio de Queirós (1850),
dando sequência com as Leis Ventre Livre (1871) e Sexagenários (1885), culminado na Lei
Áurea (1888).
O modelo de abolição da escravidão adotado no Brasil fazia parte de projeto para
transformar a ordem senhorial numa sociedade pautada no acúmulo de capital, na expropriação
do trabalho livre e com contradições sociais e a consolidação do trabalho livre era condição
históricas para a existência do capitalismo:

Um dos pressupostos do trabalho assalariado e uma das condições históricas


do capital é o trabalho livre e a troca de trabalho livre por dinheiro, com o
objetivo de reproduzir o dinheiro e valoriza-lo; de o trabalho ser consumido
pelo dinheiro, não como valor de uso para o desfrute, mas como valor de uso
para o dinheiro. Outro pressuposto é a separação do trabalho livre das
condições objetivas de sua efetivação dos meios e do material. Isto significa,
acima de tudo, que o trabalhador deve ser separado da terra enquanto seu
laboratório natural significa a dissolução tanto da pequena propriedade livre
como da propriedade comunal da terra assentada sobre a comuna oriental
(Marx, 1985, p. 65).
27

A abolição da escravidão no Brasil foi uma conquista de muitos, como dos


abolicionistas Luis Anselmo, Castro Alves, Theodoro Sampaio, Maria Helena Machado e
tantos outros anônimos que davam guarida ao escravo fugido, compravam cartas de alforrias.
As agremiações Club de Fantoches, Cruz Vermelha, Sociedade libertadora da bahiana,
Sociedade Abolicionista 25 de julho, Club Abolicionista 24 de Maio, Faculdade Bahiana de
Medicina, Faculdade de Direito de Recife. Os Jornais como O Asteroides, Echos D’Alem
Tumulo, Diário da Bahia, O Guarany e o Tempo, Jornal da Tarde. Além lutas como Alfaiates,
Sabinada, Balaiada, Malê, Beckman e tantas outros que por séculos lutaram. (BRITO, 1996)
No entanto, o modelo de abolição adotado gerou negativas consequências para a
inclusão do negro e contribuiu na configuração da classe dominada e explorada pelo capital.
Por isso pode-se deduzir que o fim da escravidão foi conquistado a sangue e suor por negros e
aliados, em que o preço da liberdade resultou, muitas vezes, no preço da vida.

2.5 ANÁLISE DO CONTEXTO EM FUNÇÃO DA MODELAGEM DO RPG

A partir do exame deste contexto, pudemos amadurecer uma leitura crítica e engajada
da situação à qual pertence este estudo, tornando-nos assim interlocutores válidos em relação
ao jogo que pretendo implementar, critério importante para a praxiologia, base epistemológica
desta investigação. Além disso, estamos agora em condição de elaborar quais elementos serão
levados deste contexto para o roteiro, campanha e aventuras do futuro jogo, a ser modelado do
Capítulo 4.
No tópico 2.1 discutimos a construção histórica da escravidão, este conceito será
inserido principalmente na campanha, mas também as aventuras, além das ações dos jogadores,
serão projetadas situação que os levem à compreensão da escravidão dentro do regime senhorial
e como ela se tornou legalmente incompatível com os ideais de modernidade e a hegemonia do
capitalismo no Brasil. Para tanto, o jogo deverá ter situações que possibilite aos jogadores
relacionarem os impactos da escravidão no seu contexto cotidiano.
Como vimos no tópico 2.2, julgamos relevante transportar para o jogo a dinâmica do
tráfico de escravos, que tem suas primeiras rotas estabelecidas há quatro mil anos a.C. pelas
civilizações de Querma, egípcios, e que ao longo de milênios foi ampliado pelos árabes e mais
tarde na era moderna por Portugal, Espanha, França Inglaterra e Holanda, sendo que os dois
últimos foram os que mais lucraram com o tráfico transatlântico. O tráfico de escravo não se
restringiu à prática de captura-transporte-venda, mas gerou recursos financeiros capazes de
financiar o capitalismo industrial.
28

É importante não perder de vista que a escravidão é um elemento importante para


entender a lógica social do regime senhorial, pauta nas relações tributarias e no prestígio que
legitima as relações de superioridade e subserviência. Esses valores legitimam e norteiam o
emprego do escravo dentro da economia colonial/imperial, conforme explicitado na Tabela 1,
impactando na qualidade de vida e longevidade do cativo.
Neste capitulo, tivemos oportunidade de perceber que a partir do século XIX a
sociedade senhorial brasileira começa a perder espaço para a emergente modernidade. Esse
projeto de modernidade, discutido no tópico 2.4, trazia no seu bojo a consolidação do
capitalismo, tornando incompatível o reconhecimento legal da escravidão com a nova ordem
social. Dessa maneira, o acúmulo das lutas contra a escravidão que se origina desde os primeiros
anos da colonização, se intensificando no século XIX, como foi elencado no final do tópico 2.3,
culmina na abolição da escravidão 1888.
Por outro lado, o modelo de abolição adotado acabava com a escravidão, mas não
concedia liberdade, não legitimou a cidadania do negro, manteve os valores senhoriais nas
relações entre livres e libertos. Até hoje, esse projeto de modernidade idealizado no século XIX,
delineia as relações sociais atuais.
Para apresentar a sistematização desses posicionamentos e sua aplicação na
modelagem do jogo, mostramos o quadro abaixo:
QUADRO 2 - Contexto da Abolição aplicada a modelagem do RPG
Contexto da Abolição aplicada a modelagem do RPG
Nº Categoria Descrição Na Modelagem do RPG
1 Escravidão Pratica social com raízes na antiguidade  Campanha
e largamente utilizado na sociedade  Aventura
senhorial, em que o ser humano é
forçado a uma condição de mercadoria e
perde a autonomia sobre sua liberdade.
2 Tráfico de Dinâmica de Captura-transporte-venda  Campanha
escravos de escravos, que a realizados por  Aventura
diversas sociedades escravistas.
4 Modernidade Processo de ideológico ocorrido no  Campanha
século XIX que objetivou a  Aventura
consolidação da ordem de reprodução
social capitalista no Brasil.
29

5 Abolição da Transição do trabalho escravo e para o  Campanha


escravidão trabalho livre dentro do projeto de  Aventura
modernidade.  Objetivo dos
Jogadores

6 Condições de Na logica escravista brasileira o trabalho  Campanha


Trabalho e executado pelo escravo influencia  Aventura
vida do diretamente na sua qualidade de vida.  Objetivos dos
escravo Jogadores

7 Formas de As resistências e revoltas são forças  Campanha


resistência e internas dentro da dinâmica escravista  Aventura
revoltas que evidencia a não passividade do  Objetivo do
escravas cativo perante sua condição social. Jogadores

Fonte: Autoria nossa.

3. RPG DIGITAL: INSTRUMENTO PEDAGÓGICA PARA O ENSINO DE HISTÓRIA

Neste capítulo, discutiremos uma abordagem do ensino de História com uso do RPG na
modalidade virtual, aportado na Praxiologia de Antonio Gramsci, nas concepções pedagógicas
vigosktiana, no modo de pensar histórico que resultará na modelagem do jogo.
O jogo modelado será o RPG, uma simulação baseada na interpretação de personagens,
que muito se aproximam da dramatização e dos jogos teatrais. No RPG os jogadores são
obrigados a interpretar personagens em aventuras, simulando, dessa maneira, diferentes
realidades. No nosso jogo, o RPG “Liberdade”, os estudantes simularão o contexto histórico
da abolição da escravidão, conforme sintetizada na tabela 2 do Capítulo II.
Dentre tantas tecnologias da informação, tipos e plataformas de jogos, escolhemos o
RPG por percebermos nele características que convergem com o modo de pensar histórico, por
possibilitar aos jogadores/estudantes desenvolverem uma relação ensino-aprendizagem
autentica, crítica e engajada.
O design cognitivo do jogo RPG será norteado por aspectos da teoria Vygoskiana com
o propósito de contribuir para a ocorrência do pensar histórica na aplicação do experimento. A
30

adesão do socioconstrutivismo como proposta pedagógica para modelagem de virtuais de


aprendizagem justifica-se por acreditamos que os aspectos que serão elencados nesse capitulo
contemplam a pesquisa, não impedindo mais adiante uma revisão do design de modelagem
escolhido. Afinal, entendemos que o socioconstrutivismo e a DBR partem do princípio de
contínua construção e reconstrução dos processos de modelagem e aplicação.
A contextualização do tema discutida no Capítulo 2 nos permitiu uma compreensão
não tradicionalista da escravidão e dos processos que culminaram na abolição, e conforme
apresentado no tópico 2.5, nos possibilitou perceber quais elementos históricos serão levados
do para o roteiro, campanha e aventuras do futuro jogo, que começará a ser modelado neste
capítulo.

3.1 UMA ABORDAGEM SOCIOCONSTRUTIVISTA PARA O ENSINO DE HISTÓRIA

Desde tempos primórdios e em diferentes sociedades que o conhecimento do passado é


utilizado como fonte de educação, e dele tiradas referências para que o homem pudesse explicar
a sua própria existência. Ao longo de séculos, diversas metodologias foram elaboradas para
ensinar História, desde a ciência clássica até a Nova História. No entanto, esta pesquisa toma
como perspectiva para o ensino de História o socioconstrutivismo e o modo de pensar histórico,
ambas referenciadas do Materialismo Histórico.
É inquestionável que as diversas correntes historiográficas do século XX consolidaram
a História como ciência e ampliaram as possibilidades pedagógicas para a História. Por outro
lado, uma equação permaneceu pendente de solução. Muito do que historiadores produzem na
academia não chega ao ensino básico, assim como as contemporâneas abordagens do ensino de
História, aliadas ao uso de tecnologias. Silma Nunes em sua pesquisa constata esse hiato entre
academia e escola:

[...] um hiato existente entre a produção de conhecimento histórico


universitário e a apresentação e estudo do mesmo nos ciclos básicos da
educação brasileira. [...] Entre 1984 e 1989, das 1729 dissertações e teses de
mestrado e doutorado, produzidas pelas universidades brasileiras sobre
educação, apenas 13 (0,75%) tratavam do ensino de História... de 1048 artigos
publicados em revistas especializadas de História no país, apenas 44 (4,19%)
tratavam do assunto. Por outro lado, entre 1944 e 1992, dos 3248 artigos das
revistas especializadas em educação, somente 11 (0,33 %) se interessavam
pela História e seu ensino. (NUNES,1996, p. 9-22).
31

As pesquisas de Nunes e Matta (2001) mostram que o ensino de História praticado nas
escolas tem sofrido de um grave anacronismo. Isso se evidencia logo ao entrar numa sala de
aula, onde professores ministram aulas expositivas baseadas na memorização de fatos - uma
prática pertinente ao século XIX - e estudantes do século XXI imergidos em tecnologias
informatizadas e com profundo desinteresse e estranhamento aos conteúdos históricos
lecionados.
Sobre essa realidade do ensino Alfredo Matta conclui que:

Esta perspectiva produz uma predominância do intelectualismo e


enciclopedismo, que impedem os problemas de serem sentidos como
realidade vivida pelos alunos e pela sociedade, ou de serem vistos como
historicamente constituídos. A metodologia de ensino é dirigida e controlada
por um professor tradutor do conhecimento certo, e terá que ser baseada na
exposição verbal do conteúdo, enfatizando a memorização, a repetição, e a
resolução de exercícios que não levam ao desenvolvimento da criatividade, e
sim da reprodução simples do conhecimento. A produção do conhecimento
histórico é algo inatingível por alunos e professores, sendo que os primeiros
serão sempre simples ouvintes, ou melhor, “gravadores”, devendo estar
idealmente sempre atentos e sem questionamentos (MATTA, 2001, p. 28).

Com esse grave problema no ensino da disciplina de História, o professor deixa de


cumprir uma de suas atribuições primordiais que é criar uma consciência de pertencimento
histórico, engajar a si e os estudantes como agentes ativos da História e capazes de racionalizar
o seu contexto.
Contudo, a raiz desse problema está para além dos muros das escolas. Ao longo de anos,
pressões de ordem social, política e econômica resultaram num empobrecimento no ensino de
História, que a tornou liberal, tradicional e conservadora.

Liberal, porque faz apologia da sociedade de classes, do individualismo e da


propriedade privada dos meios de produção. Tradicional, pois defende o
ensino discursivo e erudito do aluno, afastando-o das questões de sua realidade
local e contexto, para dar-lhe noções de cultura geral e de problemas sociais,
vistos como inerentes à sociedade. Conservador, já que o professor e o aluno
normalmente não têm nada a ver com esses problemas sociais, e nada podem
fazer para modificar a realidade inquestionável. O engajamento e
autenticidade da problemática estudada são quase impossíveis, já que o
conhecimento é passado ao aluno como “verdade” absoluta. Os valores sociais
são geralmente tradicionais, e devem ser cultivados sem questionamento,
criando-se a percepção de que existe alguém que produz o saber histórico
correto. (MATTA, 2006, p. 28)
32

Contrapondo-se a essa realidade o socioconstrutivismo aponta possibilidade de


superação dessa problemática, uma vez que para Vygotsky o homem se forma na constante
relação dialética com o meio social, sendo assim:

A aprendizagem surge, então, mediante construção social e é


interiorizada por aquele que aprende, tanto sujeito individual, como
coletivo. Vygotsky indica que esta interação ocorre através da mediação
com sistemas simbólicos – instrumentos e signos - tais como: a
linguagem, a escrita, o sistema numérico. Portanto, os sujeitos
envolvidos no processo de aprendizagem (educandos e educador)
interagem, mediatizados pelos instrumentos e signos construídos
culturalmente (CABALERO, 2008, p. 3).

O socioconstrutivismo aponta possibilidades de superação para as precariedades


relatadas anteriormente que atingem o ensino de História atualmente. Uma vez que o professor
pressupõe que a construção do conhecimento se dá numa relação dialética entre o sujeito e o
contexto social, a relação ensino-aprendizagem pode ser potencializada a partir de uma
abordagem colaborativa na prática social, ou seja, a construção do conhecimento se dá em
comunidade.

A proposta socioconstrutivista, ao contrário da construtivista, não se propõe a


construir um ambiente capaz de deixar o sujeito imerso em interação
desejáveis e construídas, mas sim preparar o sujeito e o que se vai aprender
para que participe do ambiente e mundo no qual o sujeito vive. É uma
diferença elementar e que nos ajuda a entender as duas. O construtivismo
pretende imergir o sujeito no ambiente criado para a aprendizagem, enquanto
o socioconstrutivismo pretende engajar a aprendizagem e o processo
pedagógico proposto no mundo e no ambiente concreto e cotidiano do sujeito
(MATTA, 2011, p. 245).

A partir desta diferenciação entre proposta do ensino tradicional e o socioconstrutivisto,


segue o quadro que sintetiza o contraste que há entre as abordagens de aprendizagem pertinentes
nos séculos XX e XXI, sendo possível concluir como o modelo de ensino de História ainda
vigente é ultrapassado.

QUADRO 3 - Paradigmas Educacionais


PARADIGMAS EDUCACIONAIS
Aprendizagem do Século XX (centrada Aprendizagem do Século XXI (centrada
no docente) no discente)
Aula expositiva Processo de facilitação
Aprendizagem individual Aprendizagem coletiva
33

Estudante espectador Estudante colaborador


Professor é fonte Professor é guia
Conteúdo estável Conteúdo dinâmico
Homogeneidade Diversidade
Avalição e testes Performance
Fonte: (MATTA, 2001, p. 26)

Nesse contexto de mudanças dos paradigmas do ensino aplicado à disciplina de História,


percebe-se que o RPG apresenta características que convergem com o socioconstrutivismo e o
modelo de aprendizagem centrado no discente.
Diferente do ensino tradicional que é centrada no professor como fonte do
conhecimento, o socioconstrutivismo acredita que:
a) A Interação Social entre os sujeitos e o objeto de estudo resulta na aprendizagem
coletiva;
b) O professor torna-se mediador do processo de construção do conhecimento e
cria condições para que ZDI aconteça;
c) O professor planeja atividades que relacione os temas de ensino-aprendizagem
ao contexto social dele e dos estudantes;
d) Valorização do processo de produção criativa e lúdica, assim como os seus
resultados;
e) O processo produção de conhecimento é valorizado em detrimento do resultado;
f) A colaboração mutua entre educando-educando, educador-educando é premissa
básica no relação ensino-aprendizagem;
g) Uma constante revisão do processo de ensino-aprendizagem, para que aja um
respeito e valorização das habilidades dos processos metacognitivos de cada
sujeito.
Para sintetizar a convergência entre os princípios socioconstrutivistas e o RPG em
plataformas virtuais, apresentamos o quadro a seguir que utilizaremos como referência na
modelagem do ambiente virtual de aprendizagem RPG Digital, assim como da
campanha/aventuras RPG “Liberdade”.
34

QUADRO 4 - Princípios socioconstrutivas no RPG Digital


Princípios socioconstrutivas no RPG Digital

A interação social é um dos fundamentos


básicos do jogo de RPG. Os Jogadores
constroem uma História de forma coletiva
Interação social e colaborativa, se ajudando mutuamente
para resolver os desafios colocados pelo
Mestre.

O Play by Forum é visto neste estudo


ZDI como um instrumento mediador de
aprendizagem.

Assim como a brincadeira de faz-de--


conta, o jogo de papéis e o jogo
Criação – imaginação protagonizado, o RPG digital,
especialmente o Play by Forum, também
envolve situação imaginária.

Em lugar de reproduzir um modelo, os


sujeitos produzem um texto de forma
espontânea e coletiva, conforme previsto
Autoria colaborativa pelo Socioconstrutivismo. Esta habilidade
pode ser potencializada pela mediação
com o Play by Forum.

Envolve a decisão sobre o tema que será


tratado no texto. Neste caso, trabalha-se
com os temas geradores, propostos por
Planejamento Freire (2005). A estrutura cognitiva dos
sujeitos é tomada como ponto de partida,
e o processo de aprendizagem
significativa é favorecido.

Envolve reflexão sobre a organização das


Revisão próprias ideias, o que pode ser
caracterizado como atitude metacognitiva.

Fonte: Cabalero (2007, p. 109)


35

3.2 A RELAÇÃO DO MODO DE PENSAR HISTÓRICO COM O RPG


SOCIOCONSTRUTIVISTA

Nessa pesquisa, adotamos o modo de pensar histórico como metodologia para o ensino
de História, por ela antagonizar as práticas dos tradicionais de docência e apresentar como
proposta um ensino de História que desenvolve o pensamento crítico e capacita os educandos
e educadores como agentes ativos na produção de conhecimento.
O modo de pensar histórico esta alicerçado no socioconstrutivismo e tem como
princípios para o ensino de História: a) Riqueza de significado pessoal, por estabelecer uma
relação entre o conteúdo e o contexto do sujeito; b) Autenticidade, por ser validado e construído
pelo coletivo de maneira colaborativa; c) Engajamento para a vida social, devido a relação
ensino-aprendizagem permeada de interatividade entre sujeitos e objeto de estudo. (MATTA,
2001)
Nas etapas de modelagem do jogo e aplicação consideraremos os princípios do modo de
pensar histórico da seguinte maneira:
QUADRO 5 - Princípios do Modo de pensar histórico aplicado ao RPG
Princípios do Modo de pensar histórico aplicado ao RPG
Conceito Aplicação no RPG
O jogo é modelado em diálogo com os estudantes. Tendo
Significado Pessoal na aventura elementos do contexto da abolição (Quadro
2) relacionado ao contexto social dos estudantes
O RPG é um jogo essencialmente colaborativo. Para
Autenticidade superar os problemas durante a aventura os jogadores são
motivados a elaborar soluções em coletivo.
Engajamento para a vida A interatividade permite um compartilhamento de
social informação e experiências entre os jogadores.
Fonte: Autoria nossa

Para o modo de pensar histórico o maior objetivo da docência de História no ensino


básico é o desenvolvimento e maturação dos estudantes e pensar a sua historicidade. Conceito
este que adequa-se a esta pesquisa e serve como parâmetro para a modelagem do jogo de RPG
como ferramenta pedagógica para o ensino de história.
O RPG “Liberdade” será modelado a partir do conteúdo do capítulo II e do contexto
social relato pelos professores e estudantes de colégios públicos do bairro do Cabula e entorno.
36

Nessas tensões sociais relatadas por professores e estudantes percebemos que a origem
delas está relacionada a sociedade escravista brasileira. Ciente disso, entendemos que a adoção
do modo de pensar histórico como um dos conceitos norteadores da pesquisa é justificada, por
esta apresentar à docência de História na da seguinte perspectiva:

[...] a História é um produto do pensamento; uma representação mental


construída a partir do trabalho intelectual. Consequentemente, representações
do passado são o resultado do trabalho dos historiadores. A História é um
método, uma resposta elaborada por um pesquisador, a partir de documentos
e evidências diversas à uma questão levantada sobre o passado, no presente;
um ato do pensamento. Sendo assim, o trabalho do historiador não é o de criar
leis, como em outras ciências; o historiador cria problemas. Se não há
problema, não há História. Um problema histórico é uma interrogação do
presente endereçada ao passado, cuja resposta será obtida pelo pensamento,
utilizando métodos, para analisar as evidências e documentos (MATTA, 2006,
p. 30).

O modo de pensar histórico é baseada em quatro operações metacognitivas: formular


hipótese a partir de uma situação problema, criticar as fontes de informação, interpretar as
informações e chegar a uma síntese interpretativa. Essas operações levam o estudante a
desenvolver três características do historiador: atitude, metodologia e linguagem.

Sendo assim, provocado por processos organizados pelo professor, o aluno


deverá elaborar um problema, depois pensar nele, usar em raciocínio método
para resolve-lo e, finalmente, propor uma explicação a partir de suas
interpretações. Para o desenvolvimento do pensar histórico, ou seja, para a
aprendizagem de História nesta abordagem, é importante que os alunos
cheguem a síntese interpretativa, elaborem opiniões fundamentadas e
interpretações plausíveis como respostas às questões levantadas (MATTA,
2001, p. 31).

QUADRO 6 - “Caraterísticas do historiador” para análise das ações dos jogadores no RPG
Digital “Liberdade”
“Caraterísticas do historiador” para análise das ações dos jogadores no RPG
Digital “Liberdade”
Característica do historiador Analise das Ações no RPG
Na aventura os jogadores se deparam um
problema social, ex. trafico de escravo, ou
Atitude
um desafio proposto pelo mestre, ex.
defender o quilombo de um ataque.
No RPG há uma etapa de reflexão (rodada
de reflexão), nesse momento os jogadores
são estimulados a realizar quatro
Metodologia
operações metacognitivas do pensar
histórico: Formula hipótese, criticar a
fonte (nesse caso, a aventura),
37

interpretar o contexto simulado para


chegar a uma conclusão. Esses processos
são analisados a partir dos diálogos e
decisões tomadas no Chat.
Execução da solução do problema
Linguagem
realizada pelos jogadores.
Fonte: Autoria nossa

O método do modo de pensar histórico está presente em todas as etapas desta pesquisa,
inclusive na análise do jogo após a sua aplicação. Os parâmetros do modo de pensar histórico
que utilizaremos para verificar se foi positivo ou negativo o RPG enquanto ferramenta
pedagógica serão os seguintes:

QUADRO 7 - Indicadores de domínio para o pensar histórico


Indicadores de domínio para o pensar histórico
Se o aluno conhece a função da aprendizagem e o papel das informações no processo;

Se tem consciência da historicidade dos processos e da sociedade;

Se percebe a natureza reflexiva e construída do conhecimento histórico e o papel do


pensar histórico nesta construção;

Se distingue fato de evento, opinião de fato estabelecido;

Se é consciente do valor social da História e do papel educativo do pensar histórico;

Se é capaz de declarar um problema de investigação;

Se é capaz de construir hipóteses explicativas e/ou interpretativa;

Se é capaz de encontrar fontes e recolher dados de forma crítica;

Se é capaz de tratar e analisar dados em acordo com a hipótese e definição do problema;

Se propõe conclusões e resultados;

Se conhece a linguagem suporte do pensar histórico.

Fonte: (MATTA 2006, p.152)

3.3 O ENSINO MEDIADO POR JOGOS DIGITAIS

Antes de caracterizar o jogo de RPG digital, julgamos importante analisar a relação do


jogo com os processos de aprendizagem, devido a importantes contribuições que este tem a
oferecer para o desenvolvimento cognitivo do estudante.
38

CABALERO (2007) destaca que o jogo é antes de tudo o lugar de construção de uma
cultura lúdica, com elementos socioantropológicos, filosóficos e psicológicos, que contribui no
desenvolvimento social do homem, coadunando dessa ideia HUIZINGA (2000) que ressalta:

No jogo existe alguma coisa "em jogo" que transcende as necessidades


imediatas da vida e confere um sentido à ação. Todo jogo significa alguma
coisa. Não se explica nada chamando "instinto" ao princípio ativo que
constitui a essência do jogo; chamar-lhe "espírito" ou “vontade" seria dizer
demasiado. Seja qual for a maneira como o considerem, o simples fato de o
jogo encerrar um sentido implica a presença de um elemento não material em
sua própria essência. (HUIZINGA, 2000, p. 5).

Ao tratar da natureza e significado do jogo, Huizinga destaca três características


fundamentais: a) Liberdade. Os jogadores engajam-se de maneira voluntária e espontânea para
o jogo; b) O jogo não é vida real. É uma evasão temporária da realidade, o jogador sabe
diferenciar quando está “fazendo de conta” ou quando está na vida “real”. c) O jogo se distingue
da vida comum por dois aspectos: isolamento e limitação. O jogo é limitado pelo tempo e
espaço.
Além de ser uma atividade lúdica, Vygotsky (1991) apresenta o jogo como uma
poderosa ferramenta de aproximação de uma herança cultural histórica a ser simulada pelo
jogador. Essa simulação ocorre pela capacidade de imaginação e reprodução social que o
jogador faz ao transportar para o jogo elementos do seu contexto.

Pode-se ainda ir além, e propor que não existe brinquedo sem regras. A
situação imaginária de qualquer forma de brinquedo já contém regras de
comportamento, embora possa não ser um jogo com regras formais
estabelecidas a priori. A criança imagina-se como mãe e a boneca como
criança e, dessa forma, deve obedecer as regras do comportamento maternal.
Sully já observara que, notavelmente, crianças pequenas podem fazer
coincidir a situação de brinquedo e a realidade. Ele descreveu um caso em que
duas irmãs, com idades de cinco e sete anos, disseram uma para outra:
Vamos brincar de irmãs?". Elas estavam encenando a realidade. É muito fácil,
por exemplo, fazer uma criança brincar de ser criança enquanto a mãe
representa o papel de mãe, ou seja, brincar do que é realmente verdadeiro. A
diferença fundamental, como Sully descreve, é que, ao brincar, a criança tenta
ser o que ela pensa que uma irmã deveria ser. Na vida, a criança comporta-se
sem pensar que ela é a irmã de sua irmã. Entretanto, no jogo em que as irmãs
brincam de "irmãs", ambas estão preocupadas em exibir seu comportamento
de irmã; o fato de as duas irmãs terem decidido brincar de irmãs induziu-as a
adquirir regras de comportamento (Vygotsky, 1991, p. 63)

De acordo com Vygotsky, o jogo atua na ZDP – Zona de Desenvolvimento Proximal e


consequentemente, na relação direta entre o conhecimento e apropriação. No que tange a nossa
pesquisa, deduzimos que ao modelarmos e aplicarmos o jogo de RPG, os estudantes ao criarem
39

as campanhas, aventuras e/ou interpretarem os seus personagens, não somente incorporem as


regras e o conteúdo do jogo, como estabelecem uma relação entre essas regras e conteúdos com
as suas relações sócias na vida “real”/contexto.
Portanto, entendemos que a proposta do RPG ser um jogo de simulação o aproxima do
modo de pensar histórico. Ambos possibilitam: a) O desenvolvimento critico-reflexivo da
História e rico de significado pessoal. Quando o jogador imergir no tema histórico
contextualizado no jogo, será levado a estabelecer uma relação com a sua historicidade; b)
Autêntico. Devido a sua Liberdade que permite o engajamento voluntário dos jogadores
validando o conhecimento produzido.
O RPG socioconstrutivista se opõe ao anacronismo do ensino de História apontado no
tópico 3.1, que coloca o educando submisso e passivo perante aos professores. Quando
envolvido no jogo, o estudante é instigado a agir ativamente, reconstruindo as suas relações
sociais e atuando como protagonista no processo ensino-aprendizagem. Deste modo, o jogo
constitui-se espaços de aprendizagem.

3.4 DESIGN COGNITIVO SOCIOCONSTRUTIVA DO RPG DIGITAL

Como foi supracitado, o jogo RPG apresenta uma proposta convergente à pedagogia
vygotskyana. No entanto, não há pretensão de esgotar aqui todas essas propostas ou colocá-las
como definitivas, uma vez que o socioconstrutivismo tem como princípio o engajamento dos
sujeitos e o contexto influenciando na construção e reconstrução contínua dessas propostas.
Compreendendo isso, apresentam-se a seguir aspectos/propostas, apontados por Matta (2011)
que norteiam o design cognitivo socioconstrutivista, que referenciará a modelagem do jogo
RPG “Liberdade”
Interação Social: As relações entre os sujeitos/usuários/jogadores dentro de um
contexto/ambiente somando aos seus objetivos/tarefas/intenções resulta numa produção
colaborativa de aprendizagem.
Interatividade: A interatividade aqui compreendida é dialogada, com a teoria do Zona
de Desenvolvimento Proximal (ZDI), que entende que a interatividade é definida como a
intersecção entre as práticas sociais de sujeitos engajados na resolução e compartilhamento de
construção de conhecimento e prática de vida comum.
40

FIGURA 1 – Relação Interatividade e ZDI

Interação Social

Estudante Estudante

Interatividade

Professor
ZDI

Contextualidade: É o plano de fundo do design. Nele é considerado a construção sócio-


histórica e práticas sociais dos sujeitos participantes do processo pedagógico, tendo em vista,
que os processos mentais humanos se desenvolvem a partir de uma construção histórica.
Baseado nos estudos de Duchastel e Molz, Matta (2011) divide o contexto em quatro
dimensões:
1. Contexto interno e individual é o contexto experiencial:
Considera-se aqui o conjunto histórico de construção cognitiva do sujeito, ou
sejam seu mapa cognitivo, as diversas e variadas concepções, posturas,
sentimentos e relações estabelecidas entre eles, no interior da subjetividade de
cada sujeito (MATTA, 2011, p. 248).

2. Contexto interno e coletivo é o contexto comunitário:


A coletividade interage engajada de acordo e interesses e práticas comuns, e
assim sendo compartilha afetividade, objetivos, valores, sentimentos,
necessidades. O sujeito individual está engajado e de fato faz parte do coletivo
permeando suas condições e práticas, e realizando a interatividade no sentido
de construir sujeitos coletivos (MATTA, 2011 p. 248).

3. Contexto externo e individual é o contexto informacional:


As informações sempre devem estar contextualizadas e validadas pelo
ambiente e relações sociais, de maneira que sirva como matéria prima e
elementos de base para as construções do processo cognitivo do sujeito-
aprendiz (MATTA,2011, p. 248-249).

4. Contexto externo e coletivo é o contexto institucional:


Aqui há uma referência às relações institucionais e históricas, incluindo as
relações de poder, hegemonias, dominações, relações concretas de construção
de existência na sociedade, na qual os sujeitos e comunidade estão inseridos
(MATTA, 2011, p. 249).

Mediação: É a relação entre os sujeitos e o mundo mediado por um instrumento, que


será a interface entre o dinâmico complexo de processo de construção de conhecimento na
41

mente humana com o contexto exterior do sujeito que abarca processos sociais e históricos. Ao
construir o design cognitivo do instrumento de mediação, é importante criar condições de
relações entre as dimensões de contexto dos sujeitos, e entre a singularidade e colaboratividade.
Quando esses critérios são levados em consideração, consequentemente se delineia a
arquitetura entre as ZDI dos sujeitos engajados na atividade.
Metacognição: A metacognição é a autogestão mental que permite o ser humano sentir
os êxitos e as dificuldades do processo cognitivo. Para potencializar o seu aprendizado, ele cria
estratégias que são elaboradas em três etapas: identificar, escolher e administrar os saberes. Em
um design que possibilite entre os sujeitos ou sujeito-objeto uma interatividade – jogos de
diálogos, ações colaborativas – há um estimulo do desenvolvimento do pensamento crítico.
Inserção do conteúdo ou do tema do ensino-aprendizagem: A inserção do conteúdo
deve respeitar sempre duas instâncias de interesse do sujeito-aprendiz, primeiro, as suas
necessidades metacognitivas e, segundo, as determinações sociais do contexto. Na proposta
socioconstrutivista os conteúdos inseridos não são decididos unilateralmente, mas
apresentados, validados e construídos coletivamente.
Em sua pesquisa Matta (2011) apud Figueiredo (2006) sintetiza nas figuras a relação
entre contexto, conteúdo e aprendiz.

FIGURA 2 FIGURA 3

Contexto

Conteúdo
Contexto
Aprendiz
Conteúdo

Fonte: Figueiredo: Afonso (2006) Fonte: Figueiredo: Afonso (2006)

Colaboração: Todos os aspectos elencados acima levam a construção de um design


cognitivo colaborativo, que possibilite o desenvolvimento de trabalho em grupo, articulação de
tempo e objetivos, gestão da complexa dinâmica coletiva, presença social, construção social,
processos de comunicação, gestão de conflitos cognitivos, conflitos afetivos e emocionais, tudo
isso mediado em um ambiente educacional de aprendizagem colaborativa.
42

QUADRO 8 - Aplicação do Design socioconstrutivista ao RPG “Liberdade”


Aplicação do Design socioconstrutivista ao RPG “Liberdade”
Conceito Descrição Aplicação no jogo
A partir de uma socialização entre jogadores e
São relações entre os mestre trocando ideias e executando as ações no
Interação sujeitos dentro do jogo, esperasse que todos tenham uma
contexto do jogo. participação ativa na construção do
conhecimento sobre escravidão.
Ocorre no momento Nos momentos de desafios e objetivos contidos
que os sujeitos estão nas aventuras os mestre e jogadores serão
Interatividade interação social e a estimulados dialogarem numa permuta de
uma troca ou produção conhecimento e construírem uma solução
de conhecimento. autentica e validadas por todos.
As aventuras/campanha serão construídas em
Plano de fundo do
colaboração com os estudantes, levando em
design que considera a
consideração a sua historicidade e suas relações
Contextualidade construção sócio
sócias. Para que elementos do contexto local
histórica dos sujeitos
sejam contemplados e respeitados no nas
engajados no jogo.
aventuras.
É a interface entre o de
Dentro do jogo interpretando os seus
construção do
personagens numa simulação do Brasil
conhecimento na
escravista, os jogadores são obrigados a
Mediação mente com o contexto
reflexionar sobre o contexto desenvolvido no
exterior do sujeito e os
capitulo I e estabelecer conexões com o seu
seus processos sociais
contexto e relações da “vida real”.
e históricos.
Autogestão mental que Usando a criatividade os estudantes produzirão
permite o ser humano aventuras e ao jogar com os seus personagens
Metacognição sentir os êxitos e as decidirão como os seus personagens reagem e
dificuldades do resolvem aos desafios de viver numa sociedade
processo cognitivo. escravista e lutar pela liberdade.
Inserção do São os temas de Em RPG “Liberdade” os conteúdos a ser
Conteúdo ensino-aprendizagem trabalhados são os elencados no Capitulo I
43

inseridos na somado a colaboração dos estudantes no


modelagem em diálogo momento de escrita do jogo.
com o contexto dos
participantes.
No RPG “Liberdade” os desafios em contribuir
É o resultado das ações
para o fim da escravidão só poderão ser
de interação social e
vencidos pela cooperação entre os jogadores.
Colaboração interatividade entre os
No jogo Mestre e Jogadores não competem
sujeitos na produção do
entre si, pelo contrário, contribuem para o êxito
conhecimento.
de todos nas aventuras.
Fonte: Autoria nossa

4. MODELAGEM DO JOGO RPG LIBERDADE

Neste capítulo, apresentamos a modelagem do jogo de RPG Digital para o ensino de


História que será aplicada com estudantes de escolas públicas do bairro do Cabula e entorno.
Considerando o Terceiro Ciclo de aplicação da abordagem metodológica DBR, este capítulo
será constituído a partir de todas as informações amadurecidas nos dois ciclos anteriores:
contextualização da escravidão no capítulo II; socioconstrutivismo e Modo de pensar histórico,
fundamentos teóricos da pesquisa, no capítulo III.
O capítulo II nos possibilitou um amadurecimento e engajamento do tema pesquisado,
assim como identificar elementos que consideramos preponderantes simular no jogo, conforme
elucidado no quadro 2.
No capítulo III, abordamos o socioconstrutivismo e o modo de pensar histórico como
fundamentos teóricos, aplicados ao uso do RPG Digital como ferramenta pedagógica. Este
segundo ciclo nos revelou princípios elencados no quadro 4, 5, 8, que serão as diretrizes
pedagógicas que lastrearão a modelagem do nosso jogo.
Por fim, apresentamos neste capítulo a campanha do RPG Digital “Liberdade”, que será
utilizado como ambiente educacional de aprendizagem, para o ensino da abolição da
escravidão. Diante dos conteúdos apresentados nesta pesquisa, pretendemos que o jogo
estimule nos estudantes uma produção autoral e colaborativa do conhecimento, identificado ao
seu contexto e uma interpretação própria e crítica da história.
44

4.1 PROPOSTA DE MODELAGEM DO JOGO

Com o propósito de validar o RPG Digital como ferramenta pedagógica para o ensino
de História, neste capítulo modelaremos a campanha “Liberdade” composta por três aventuras
relacionadas à Abolição da Escravidão no Brasil.
As discussões contidas nos capítulos I e II nos possibilitou uma perspectiva sobre a
construção histórica da escravidão, como suas raízes, jogos de poder, as relações de forças
ideológicas, ordens de reprodução e, sobretudo, a resistência do escravizado perante o regime
escravista. No capítulo subsequente, apresentamos as referências teóricas para o ensino de
História, o design cognitivo que serve de base para a arquitetura do jogo e garantirá que o enredo
se aproxime da realidade social dos estudantes e simule mais fidedignamente a sociedade
escravista brasileira.
A Campanha é o fio condutor do jogo. É o texto que encadeia todo o desenvolvimento
das aventuras e introduz o ambiente em que mestre e jogadores criarão suas personagens. É na
Campanha que os jogadores começam a estabelecer estratégias para vencer os desafios, como
o tipo de personagem que será criado.
Conforme apontamos nos tópicos 3.3 o RPG é um jogo, e por assim ser, a modelagem
da campanha e aventura deve se preocupar com o desenvolvimento cognitivo e social dos
estudantes, para que ao fim do jogo haja uma conhecimento critico-reflexivo da História,
autêntico e rico de significado pessoal.

4.2 O RPG DIGITAL - ROLLING PLAYER GAME DIGITAL

O RPG é um jogo/simulação de interpretação de personagens, em que os jogadores


assumem papéis e criam uma narrativa colaborativa. Criado na década de 70 nos EUA, o RPG
tem influências da linguagem teatral e de tradicionais brincadeiras infantis de “faz de conta”. É
possível perceber uma ligação da forma de narrativa do RPG com a história oral, na qual um
narrador relata as histórias e tradições de sua comunidade e aqueles que ouvem interagem,
colaboram e vivenciam no seu imaginário. (CABALERO, 2012)
O RPG por ser um jogo possui uma mecânica básica, que se dá na seguinte maneira:
 Ambiente: É o lugar onde se encontram as personagens e se passa a narrativa.
 Sistema de Regras: é a regra que ordena o mundo fictício
 Enredo: É o que conduz a narrativa do jogo, os objetivos e o motivo do jogo. O enredo
é divido em Aventura e Campanha.
45

 Dados: o rolamento de dados junto com as regras dá o caráter aleatoriedade e a ação dos
jogadores, ou seja, se um jogador deseja realizar uma ação, o êxito ou fracasso
dependerá dos valores obtidos nos dados.
 Mestre: É o narrador que inicia a história e que interpreta os personagens não jogáveis
NPC (non-player character).
 PJ – Personagens jogadores: são personagens inseridos na história interpretados pelos
jogadores;
 Raça: No mundo do RPG, além dos humanos, há uma diversidade de raças fictícias,
como: elfos, orcs, dracônicos, etc.
 Classe: é a profissão do personagem. Cada classe possui habilidades e características
particulares.

QUADRO 9 – Background RPG “Liberdade”


Background RPG “Liberdade”

Conceito Descrição Aplicação no jogo

Ambiente Contexto do Jogo Brasil século XIX

Sistema de Regras que RPG By Moodle. Sistema de Regra


Regras norteiam a adaptado do sistema D&D e 3D&T
dinâmica do jogo.
Mestre Narrador Pesquisadores e professores

PJ Jogadores Estudantes e outros interessados

Enredo Conteúdo ou O enredo é centrado na história de nas


temática que são lutas contra a escravidão no final do
desenvolvidos no século XIX.
jogo. Os pontos que se destacam no roteiro
são os elementos destacados no quadro
2

NPC Personagens que Abolicionista, senhores de escravos,


são controlados capatazes, indígenas representantes do
pelo mestre. estado imperial, escravos, libertos e
46

outros sujeitos históricos de época que


se façam necessários.

Raça Espécie que No RPG “Liberdade” substituímos a


constitui os PJ’s e categoria Raça por Etnia, por
NPC’s consideramos que cada Etnia tem uma
peculiaridade que influencia no modo
de socialização com o contexto.
Classe Estereótipo que No nosso jogo, adaptamos as classes
concede típicas do RPG D&D e 3D&T aos
habilidades e personagens que constituem o contexto
determina a função da sociedade escravista. Exemplos:
do personagem no Escravos, Articulador Social
jogo. (militantes, professores, políticos),
Capoeiristas, Guardas, Sacerdotes
(Padres, Clérigos, babalorixás,
yalorixás, Pajés), Capangas,
Traficantes de escravos, Senhores de
Escravos.

Fonte: Autoria nossa

4.3 MODELAGEM DA CAMPANHA

Para começamos a modelagem da campanha “Liberdade”, entendemos que o RPG


Digital é Ambiente Educacional de Aprendizagem e também um Conteúdo Digital.
Sendo um Ambiente Educacional de Aprendizagem, entendemos que o RPG Digital
deve possibilitar uma elaboração e construção de procedimentos de ensino-aprendizagem
mediados por uma ferramenta digital, projetada para que estudantes e professores desenvolvam
os processos cognitivos em ambiente digital. Como Conteúdo Digital o RPG Digital é um
software modelado para fins pedagógicos. Portanto, deve ser dotado de uma interatividade
voltada para o ensino-aprendizagem e com conteúdo de disciplina escolar, no nosso caso
História da Abolição da Escravidão.
47

Sendo fiel ao design cognitivo socioconstrutivista, começamos a projetar o nosso jogo


a partir dos elementos do Quadro 2, 4, 5 e 8
A campanha “Liberdade” é ambientada na Bahia oitocentista, com o cotidiano da
escravidão, resistência, revolta e convergência de força ideológicas que resultaram na Abolição
1888. Entendemos que é impossível dar conta da complexa totalidade da prática escravista
moderna em um jogo RPG. Por esse motivo, contextualizamos no Capítulo II os elementos que
consideramos importantes para o entendimento da Abolição da escravidão na Bahia. A
campanha “Liberdade” inicia-se da seguinte maneira:

Após milênios, de complexos jogos de captura, tráfico e justificativa da


escravidão. No final século XIX, o sistema escravista no Brasil chega ao seu
limiar de existência legal, impulsionado por lutas internas e pressões
internacionais.
A história da abolição da escravidão no Brasil é escrita com astúcia, sangue e
suor. Nenhum país importou e reproduziu tantos escravos como Brasil, entre
os séculos XV e XIX foram aproximadamente 3.650.000 africanos
escravizados. Eram homens e mulheres de diversas nações: Bantos, Nagôs,
Jejes, Malês... e escravizados nascidos no Brasil que lutaram por sua
liberdade. Desde o século XVI até XIX não houve um momento de
subserviência espontânea e pacífica no Brasil escravista; fugas, sabotagens,
suicídios, assassinatos foram algumas das muitas formas de resistência que
construíram a inevitabilidade do fim do sistema escravista.

Na citação acima, nos baseamos nas discursões do tópico 2.1 quando tratamos das raízes
da escravidão que remetem à antiguidade, no 2.3 ao apontarmos as formas de resistência da
escravidão, e no 2.4, quando discutimos a correlação de forças que aconteceram dentro e fora
do Brasil que resultaram na Abolição.
No capítulo III, afirmamos que o design cognitivo socioconstrutivista é o gabarito do
nosso jogo. Sendo assim, o conteúdo do jogo que é a Abolição da Escravidão não poderia ser
colocado sem atender a relação que há entre contexto e conteúdo, conforme expressamos nas
figuras 2 e 3. A abolição está imersa em um contexto histórico e vinculada ao contexto dos
estudantes/jogadores, por esse motivo que na campanha colocamos elementos pertencentes ao
contexto dos estudantes, como o quilombo Cabula, que deu originem ao bairro homônimo.
Ainda no capítulo 3 afirmamos que o Modo de pensar Histórico propõe um
conhecimento histórico rico em significado pessoal, autêntico e engajado para vida social. Essas
características convergem como a dinâmica de jogo do RPG, como sintetizamos no quadro 5.
Respeitando esses princípios na campanha e nas aventuras colocamos situações-problemas que
proporcionem reflexão e ação dos jogadores para o aprendizado da abolição, como pode ser
visto no seguinte trecho da campanha:
48

[...] os PJ’s ganham notoriedade e respeito entre escravos, libertos, livres e


abolicionistas. Mas a luta pela liberdade do escravo continua, o inimigo dessa
vez não é um mero senhor de engenho, é o Estado Imperial. Nessa aventura,
os PJ’s são convidados por André Rebouças e Joaquim Nabuco a assumirem
a Liderança da Sociedade Brasileira Contra a Escravidão na Bahia e
elaborarem um projeto político de abolição destinado à Câmara de Salvador,
mas para isso os PJ’s vão se deparar com um novo campo de batalha: a
política.

A campanha “Liberdade” foi modelada com a intenção de apresentar a formação sócio-


histórica-cultural da Abolição da escravidão, e nela os estudantes/jogadores terão oportunidade
de simular os processos de lutas e tensões sociais que conduziram ao fim legal da escravidão e
a possibilidade de identificar traços dessa historicidade no contexto atual. Os estudantes serão
levados a reflexionar que em nenhum momento na história houve uma submissão da classe
escravizada a ordem senhorial, que a modo de reprodução social escravista palmilhou o
caminho das contradições sociais presentes na Bahia e no Brasil contemporâneo e a pluralidade
cultural de hoje é um produto das complexas relações entre as diversas etnias africanas,
indígenas e ibéricas.
Para sintetizar os elementos presentes na campanha RPG “Liberdade” elaboramos o
quadro a seguir e no Anexo o leitor encontra a campanha na integra:

QUADRO 10 - Indicadores de Elementos da Campanha


Indicadores de Elementos da Campanha

Titulo Liberdade

Objetivo Pretendemos que os Estudantes/jogadores simulem a luta


de escravizados para conquistarem a sua liberdade

Contudo a ser trabalhado Escravidão, revoltas escravas, formas de resistência à


escravidão, modernidade, pluralidade cultural,
modernidade e abolição da escravidão

Personagens Escravos, Senhores-de-engenho, capangas, traficantes de


escravos, abolicionistas e políticos;

Descrição do ambiente Recôncavo Baiano e Salvador no século XIX


49

Enredo Retratar o contexto da abolição a partir da simulação,


permitindo aos jogadores a criação de uma compreensão
crítica da abolição da escravidão.

Fonte: Autoria nossa

4.4 MODELAGEM DAS AVENTURAS

Apresentamos aqui a modelagem das aventuras da campanha “Liberdade”. Todas as


aventuras foram construídas atendendo os tópicos dos capítulos II e III.
Por adotamos uma abordagem socioconstrutivista e praxiológica, antes de começarmos
a escrever as aventuras, tivemos dois encontros com os estudantes vinculados ao projeto
Turismo de Base Comunitária 1, que envolve escolas do bairro Cabula e entorno. Nessas
reuniões, estudantes e professores relataram problemas pertinentes a comunidades em que estão
inseridos, e um grupo de estudantes sugeriu diversas linguagens para relatar os problemas da
comunidade e valorizar a história local, dentre as linguagens propostas, uma delas foi a
elaboração de um jogo de RPG.
Nessa perspectiva e atendendo aos quesitos dos tópicos 3.2 e 3.4, começamos a
modelagem das aventuras estabelecendo uma relação entre os conteúdos do capítulo II e os
elementos do contexto social dos estudantes. Dessa maneira, convergindo com modo de pensar
histórico e aos seus princípios, conforme apresentamos no quadro 5.
Sendo assim, os conteúdos estão distribuídos da seguinte maneira:

QUADRO 11 - Relação Conteúdo e Contexto social dos estudantes


Relação Conteúdo e Contexto social dos estudantes

Aventura Conteúdos Contexto social dos


estudantes

Aventura 1 Escravidão e rebelião escrava, condições Violência, racismo


de vida e trabalho do escravizado.

1
Turismo de Base Comunitária no Cabula – TBC Cabula, é um projeto elaborado e executado por uma equipe multi e
interdisciplinar, articulado à pesquisa, ensino e extensão, com objetivo de construir com as comunidades do Antigo Quilombo
Cabula, que compreende 17 bairros circunvizinhos à Universidade do Estado da Bahia (UNEB), caminhos alternativos para o
desenvolvimento local sustentável, a partir do turismo de base comunitária e da ecossocioeconomia, mediante metodologia
participativa sustentada na pesquisa-ação, na praxiologia e em pesquisa de desenvolvimento (DBR).
50

Aventura 2 Rotas de tráfico de escravo, resistência e Carência de Infraestrutura


revoltas escravas, movimentos urbana, intolerância
Abolicionistas religiosa

Aventura 3 Revoltas Escravas, Abolição, Poluição, depredação


Modernidade. escolar

Fonte: Autoria nossa.

Nas aventuras, o contexto social dos estudantes está relacionado ao conteúdo histórico
do jogo. Sendo assim, ao aplicarmos o jogo poderá acontecer uma identificação dos estudantes
ao tema da Abolição, uma vez que o contexto experiencial e comunitário dos estudantes tem
estreita relação com o contexto da sociedade escravista brasileira.
Optamos em começar a primeira aventura a partir do processo de venda dos
escravizados na cidade de Cachoeira e o uso dessa mão de obra num engenho da Vila de
Santiago do Iguape. A escolha pelo recôncavo, em particular Santiago do Iguape, é justificada
por esta ter sido no século XIX a freguesia mais rica e tradicional da cultura açucareira no país
e, por consequência, concentrava uma população escrava superior aos livres. (BARICKIMAN,
2003)
Nessa aventura, os estudantes/jogadores interpretarão personagens que trabalharam
num engenho fictício chamado Santa Maria. Nessa aventura os estudantes simularam o
cotidiano de escravo que trabalhavam na produção de açúcar, as formas de resistência, a
violência resultante dos abusos de poder das autoridades, o racismo e para conseguirem a
liberdade os jogadores terão que organizar a fuga de um grupo de escravos.
A segunda aventura ocorre no recôncavo baiano e no Quilombo Buraco do Tatu,
localizado no atual bairro de Itapuã. Nessa aventura, os estudantes terão que organizar
emboscadas, fugas e estabelecer alianças com líderes de outros quilombos e com os
abolicionistas. A simulação retrata a condição de vida de algumas freguesias do recôncavo e de
Salvador com suas carências de infraestrutura e a não aceitação das práticas religiosas africanas.
Na terceira aventura, os estudantes conhecerão um outro campo de luta contra a
escravidão, a política. Convidados pelos abolicionistas André Rebouças e Joaquim Nabuco, os
estudantes assumirão a liderança da Sociedade brasileira contra a escravidão na Bahia. Para
51

concluir a aventura, os estudantes deverão elaborar um projeto de lei para abolir a escravidão e
defendê-la na Câmara de Salvador.

QUADRO 12 - Indicadores de Elementos das Aventuras


Indicadores de Elementos das Aventuras

Categorias Aventura 1 Aventura 2 Aventura 3

Titulo Recôncavo Rebelde Bate-folha O jogo político da


Liberdade

Objetivo Os jogadores deverão Os Jogadores terão Elaborar um projeto de


organizar uma fuga que organizar lei que ponha um fim
dos Engenho Santa emboscadas, fugas e na escravidão;
Maria estabelecer alianças
com líderes de outros
quilombos e com os
abolicionistas.

Contudo a ser Escravidão e rebelião Rotas de tráfico de Revoltas Escravas,


trabalhado escrava, condições de escravo, resistência e Abolição,
vida e trabalho do revoltas escravas, Modernidade.
escravizado. movimentos
Abolicionistas.

Personagens Escravos, Traficante Quilombolas, Escravos, Libertos,


de escravos, capangas, escravos, Abolicionistas e
capitão do mato e fazendeiros, políticos.
senhor-de-engenho. comerciantes,
militares,
Abolicionistas.

Descrição do Cachoeira e Santiago Cachoeira, Salvador século XIX.


ambiente do Iguape, século XIX. Quilombos Bate-
folha, Urubu, Buraco
do tatu, Beirú,
52

Cabula e Bate-folha,
Salvador do século
XIX.

Enredo Os jogadores Nessa aventura, os Na terceira aventura,


simularão o cotidiano jogares deverão os Jogadores tornam-
de engenho no estabelecer uma rede se líderes da
Recôncavo Baiano e as de relação entre os Sociedade brasileira
tramas e formas de quilombos e contra a escravidão na
resistir a condição de conseguir chegar na Bahia e deverão
escravo nessa cidade de Salvador. elaborar e defender um
sociedade. projeto de lei que
finalize a escravidão.

Fonte: Autoria nossa.

4.5 SISTEMA DE REGRAS

No RPG, o sistema de regras é o que controla toda a dinâmica da simulação, delineia


limites para a ação dos jogadores e do mestre, garantindo também uma originalidade para o
jogo. No RPG “Liberdade” utilizaremos o sistema de regras by Moodle, que é uma adaptação
do D&D e do 3D&T.
O by Moodle foi elaborado para RPG’s digitais educativos, numa proposta
socioconstrutivista, portanto o sistema converge com a proposta do RPG “Liberdade”. A
mecânica desse sistema de regras é composta pelos seguintes itens: dados, aleatoriedade e
testes. Qualquer tentativa de realizar uma ação por parte de um personagem deve ser resolvida
por um teste no qual o jogador realiza uma rolagem de dados representando a ação do seu
personagem, e o Mestre avalia se o resultado foi suficiente para realizar a ação.
Background: O processo de criação da ficha de personagem envolve uma série de passos
seguindo as regras do jogo a fim de produzir a ficha, contudo, ele não se resume apenas ao
sistema. A criação de um personagem envolve o desenvolvimento de uma persona, com
motivações e princípios. A ficha é apenas uma forma de representá-lo, mas deve sempre estar
atrelada à ideia que o jogador tem de seu personagem. Um jogador que pretende interpretar a
classe Articulador Social, encontrará alguns problemas durante o jogo se na ficha do seu
personagem houver um carisma muito baixo, que não condiz com o conceito inicial do seu
53

personagem. A criação de um background (a história pregressa da personagem) ajuda o jogador


durante a criação da personagem e durante o resto do jogo.
Atributos: Os atributos definem e compõem a personagem. É a descrição mais crua dele
mesmo. Praticamente todos os testes envolvem os atributos, as habilidades naturais do
personagem, portanto eles são de suma importância na criação do personagem, norteando todo
o resto. No Sistema by Moodle existem seis atributos são eles: Força, Destreza, Constituição,
Cognição, Percepção, Carisma.
Raça: É comum encontrar em alguns RPG’s espécies fictícias, como Elfos, Orc’s e
outros. Cada espécie atribui uma particularidade na criação dos personagens. No RPG
“Liberdade” substituímos a categoria Raça por Etnia. Por consideramos que cada Etnia tem
uma peculiaridade que influencia no modo de socialização num contexto.
Classe: É o estereótipo que concede habilidades e determina a função do personagem
no jogo. Na nossa modelagem adaptamos as classes típicas do RPG D&D e 3D&T aos
personagens que constituem o contexto da sociedade escravista. Exemplos: Escravos,
Articulador Social (militantes, professores, políticos), Capoeiristas, Guardas, Sacerdotes
(Padres, Clérigos, babalorixá, yalorixá, Pajé), Capanga, Traficantes de escravos, Senhores de
Escravos.
Quando o estudante começa a elaborar o seu personagem, a partir dos itens acima, já há
um engajamento e autonomia conforme tratamos no tópico 3.3. Ao criar os seus Background o
estudante é levado a pensar de que maneira o escravizado estava inserido na sociedade
oitocentista e como era o seu cotidiano. Ao escolher qual grupo étnico há nesse momento uma
compreensão de que cada etnia tem uma particularidade cultural e social. O mesmo processo
ocorre ao selecionar a classe, identificando que era o grupo de sujeito que compunha a dinâmica
escravista.
É a partir da construção do personagem que os estudantes imergem nas etapas descritas
no quadro 8, como Interação e interatividade, os estudantes dentro do jogo devem partir de um
contexto igual, cada um particularizado pela sua Background, etnia e classe. Para superar
situações-problemas do jogo, os jogadores são levados a trocarem ideias e conhecimento e,
nesse momento, ocorre ZDI.
Ao criar o personagem, o estudante é levado a ter características do historiador tratados
no quadro 6, a) atitude: ao criar o personagem, já há uma identificação e um engajamento da
situação-problema; b) metodologia: nessa etapa o jogador estabelece estratégias na criação do
personagem e sua atuação no jogo; c) linguagem: o personagem no jogo executará tudo aquilo
que foi pensado pelo jogador.
54

5 ABORDAGEM METODOLÓGICA

Como sinalizado nos capítulos anteriores, esta pesquisa tem como pressuposto
epistemológico a praxiologia, por consideramos que a relação ensino-aprendizagem do sujeito
deve engajá-lo na transformação de sua prática social. Apontamos, anteriormente, que o
conhecimento é passível de ciclos de refinamentos e mudanças e, por esses motivos, adotamos
uma abordagem de pesquisa conhecida como Design-Based Research - DBR, dentre as
diferentes denominações existentes em inglês, tais como Design Experiments, em 1992
(BROWN; COLLINS); Development Research, em 1999 (VAN DEN AKKER apud MATTA
2014), cujo significado da tradução “Pesquisa de Desenvolvimento” melhor se aplica ao
trabalho desenvolvido por ter como foco o engajamento do pesquisador com seu grupo de
pesquisa e o refinamento das práticas adotadas para a resolução do problema identificado.
A utilização da DBR nesta pesquisa é justifica por ela apresentar métodos de pesquisas
voltados para as tecnologias educativas e nos estudos sobre o uso de informática na educação,
evidenciando os impactos delas na transformação da prática educacional e no cotidiano escolar,
ou mesmo em procedimentos de educação informal. A DBR é constituída de etapas de
planejamento, desenvolvimento, avaliação e reavaliação das variáveis por parte do pesquisador
e dos sujeitos envolvidos na pesquisa, tais características metodológicas nos conduzem à
elaboração de projetos tecnológicos educacionais socioconstrutivistas, havendo assim uma
aderência aos pressupostos epistemológicos da Filosofia da Práxis, Teoria Vigotskiana e do
Modo de Pensar Histórico, utilizados na elaboração dos Capítulos II e III.
A DBR é uma abordagem metodológica de bricolagem, com métodos de investigação
variados, contínuos e evolutivos, adequados à pesquisa aplicada, que tem a pretensão de
solucionar problemas endógenos nas práticas de ensino-aprendizagem.
A construção DBR enquanto abordagem de pesquisa aplicada está dividida em fases:
Fase 1 (Contextualização)  Fase 2 (Validação Interna + Aperfeiçoamento)  Fase 3
(Validação Externa  Aperfeiçoamento)  Fase 4 (Design do projeto + Aperfeiçoamento) 
Fase 5 (Aplicação do projeto + Aperfeiçoamento)  Fase 6 (Redesign 1)  Fase 7 (Redesign
2)  Fase n (Redesign n). Todas as fases são construídas em coletividade e colaboração entre
os pesquisadores e os sujeitos pesquisados, dotando assim a pesquisa de uma abordagem
metodológica, essencialmente socioconstrutiva.
Durante toda a nossa pesquisa, consideramos as fases da DBR, desde a contextualização
até a análise dos dados, por assim ser, este estudo configurou-se da seguinte maneira:
55

Fase 1 – Análise do problema por investigadores, usuários e/ou demais sujeitos


envolvidos em colaboração.
Nesta fase, procuramos definir o problema, que é o desenvolvimento de um RPG Digital
enquanto ferramenta pedagógica para o ensino da Abolição da Escravidão a estudantes da
escola pública de Salvador. Por isso fizeram-se necessários uma contextualização do tema no
Capítulo II e o diálogo com professores estudantes envolvidos na pesquisa, para delinearmos o
contexto social desses sujeitos, e, por fim, no Capítulo II o amadurecimento das teorias
norteadoras para a modelagem do jogo, o socioconstrutivismo e o modo de pensar histórico.
O Contexto na DBR foi o ponto mais complexo da pesquisa, porque era preciso que nós
pesquisadores nos apropriássemos não somente da história da abolição, mas como o processo
de abolição impactava, ainda hoje, na comunidade em que estavam estudantes, e, por sua vez,
que consciência histórica estes tinham sobre o fato.
Tal contextualização histórica nos levou a aderir duas teorias como referência para a
modelagem do jogo de RPG, o socioconstrutivismo e o modo de pensar histórico. Tais teorias
apresentam soluções pedagógicas para os problemas do ensino de história e a construção de
uma consciência histórica, conforme discutido no Capitulo III.
A fase 1 (contextualização) foi de valiosa importância para a pesquisa, pois havia a
necessidade de termos uma compreensão clara dos locais, da temporalidade e dos sujeitos
engajados. Se assim não fosse, seria praticamente impossível desenvolver uma pesquisa DBR,
uma vez que sua característica precípua é o pesquisador ser validado pelos sujeitos como seu
representante, além dos próprios sujeitos tornarem-se coautores da pesquisa. (SANTIAGO,
2016)
Para reforçar o nosso pensamento Santos completa:

É impossível estar engajado e implicado na pesquisa sem desenvolver um


diálogo com o conhecimento existente sobre o contexto em questão, sem a
aquisição, reflexão, criticidade e compartilhamento das informações junto aos
sujeitos implicados nela, sem a leitura de autores que não estarão presentes
para uma mera revisão bibliográfica, mas para reflexões e referências sobre o
contexto trazido. Os pressupostos aqui propostos tendem a levar o pesquisador
a situar-se ante o problema, consequentemente ao contexto que envolve a
comunidade baseada em seus processos históricos e sociais e nos sujeitos
presentes nela, compondo um processo integrador constante (Santos, 2014, p.
15).

Fase 2 – Desenvolvimento da proposta de solução responsiva aos princípios de design,


às técnicas de inovação e à colaboração de todos os envolvidos.
56

Nesta fase, identificamos que o RPG Digital possui características de ferramenta


pedagógica socioconstrutivista, que possibilita um aprimoramento na relação ensino-
aprendizagem. Cientes disso, começamos nos Capítulos III e IV a modelagem do jogo
considerando os elementos destacados por professores e estudantes, além das discussões nos
capítulos anteriores, sintetizados em quadros ao final de cada tópico.
Nos primeiros diálogos que tivemos com os estudantes foram apontadas as tensões
sociais presentes na comunidade e seus reflexos na escola, além dos problemas nas práticas de
ensino. No segundo encontro, os estudantes sugeriram diversos instrumentos pedagógicos que
colaborassem positivamente para uma melhor relação comunidade –escola e que ajudassem na
construção de uma consciência histórica. Dentre as sugestões, a criação de uma rádio, um jornal
e um jogo de RPG foram os que mais se destacaram. Interessante registrar que o jogo de RPG
sugerido pelos estudantes foi feito antes de nós pesquisadores apresentarmos a elaboração do
jogo como proposta pedagógica, e por ter ocorrido desse modo, tínhamos garantido nesses
primeiros momentos o engajamento dos sujeitos na pesquisa e a primeira validação interna e
externa.
Ainda na Fase 2, fizemos uma correlação entre as informações levantas no contexto
(Capítulo II) com os relatos dos estudantes e adotamos o socioconstrutivismo e o modo de
pensar histórico como lastro teórico para o desenvolvimento de um design cognitivo do jogo de
RPG.
A escolha desses pressupostos teóricos não foi aleatória. Conforme apresentado no
quadro 3, os estudantes vivenciavam um modelo de aprendizagem centrada no docente,
enquanto o socioconstutivismo tem como proposta o contrário, justificando, assim, a adoção
dos seus princípios nesta pesquisa como foi expresso nos quadros 4 e 8. Aliado ao
socioconstrutivismo e antagonizando com o modelo de ensino tradicional, utilizamos o modo
de pensar histórico como metodologia de ensino de História, as suas etapas, características e
indicadores expressos nos quadros 5, 6 e 7, que serviram de referência durante todo o
desenvolvimento e aplicação do jogo.
Para validarmos o nosso lastro teórico foi realizado com os estudantes e professores um
encontro apresentando e debatendo o socioconstrutivistas e o desing cognitivo
socioconstrutivista como possível solução pedagógica para as práticas de ensino-aprendizagem.
Fase 3 e 4 – Ciclos iterativos de aplicação e refinamento em práxis da solução. Reflexão
para produzir “Princípios de Design” e melhorar implementação da solução.
Na fase 3 e 4 de aplicação da abordagem DBR, foram realizados modelagem (Capítulo
IV), validação, aplicação e refinamentos do jogo RPG Liberdade. O objetivo nessas fases foi o
57

desenvolvimento de um jogo que estimulasse nos estudantes uma produção autoral e


colaborativa do conhecimento, identificado ao seu contexto e uma interpretação própria e crítica
da história. Mas para isso, foi preciso uma imersão no universo do RPG, construção de roteiros
para campanha e aventuras, elaboração de um sistema de regras que contemplasse ao grupo de
estudantes que nunca havia jogado RPG, e o outro que já era familiarizado com o jogo. Ao
passo que elaborávamos a gamificação, era preciso inserir no jogo os conteúdos históricos da
abolição discutidos no Capítulo II, juntamente com os elementos do contexto social dos
estudantes (quadro 11).
A construção das aventuras envolveu um intenso trabalho de colaboração e cooperação
entre os pesquisadores e os estudantes. Desde o protótipo da primeira aventura até a última
versão da aventura dois, houve constante diálogo com os estudantes, para que o roteiro do jogo,
sistema de regras e o ambiente digital atendessem ao contexto dos pesquisados, assim como
toda as teorias discutidas no Capítulo III fossem transportadas para o RPG Liberdade.
Tais procedimentos foram mais que necessários, uma vez que a DBR é uma abordagem
metodológica que prima pela interação teórico-prática nas pesquisas e estudos científicos.
Pensando sobre isso, Matta, Silva e Boaventura, concordando com Herrington et alli (2007),
afirmam:

Um projeto DBR precisa ter seu foco na participação e envolvimento


colaborativo dos sujeitos envolvidos na prática para a qual a DBR vai dirigir
seu estudo e construção de proposta para aplicação. Uma das maiores virtudes
da DBR é que todos os participantes do processo têm conhecimento e controle
da totalidade do procedimento de investigação. (MATTA, SILVA e
BOAVENTURA, 2014, p. 29)

Para resumir o que foi esboçado até aqui, elaboramos o quadro que sintetiza as fases da
DBR aplicadas as etapas da nossa pesquisa:

QUADRO 13 - Fases da pesquisa DBR

Fases da pesquisa DBR

Fases Descrição Aplicação na Pesquisa

Fase 1 Análise do problema por  Definição de Problema;


investigadores, usuários e/ou
 Contextualização;
58

demais sujeitos envolvidos em  Diálogos com os sujeitos


colaboração. participantes da pesquisa.
Fase 2 Desenvolvimento da proposta de  Fundamentação teórica;
solução responsiva aos princípios
 Design Cognitivo do jogo;
de design, às técnicas de inovação e
à colaboração de todos os
envolvidos.

Fase 3 Ciclos iterativos de aplicação e  Modelagem do Jogo em


refinamento em práxis da solução. colaboração com os estudantes e
professores;
 Aplicação e refinamento do
jogo;
 Levantamento e análise dos
dados.
Fase 4, 5 Reflexão para produzir “Princípios  Validação e análise do jogo
, 6 ... de Design” e melhorar junto aos estudantes e
implementação da solução.
professores;
 Aplicação e refinamento do
jogo;
 Levantamento e análise dos
dados.
Fonte: Autoria nossa

5.1 CATEGORIAS DE ANÁLISE

Para a verificação e possíveis aprimoramentos do jogo, consideraremos as variáveis


independentes e dependentes. A variável dependente pode ser caracterizada como o fator, causa
ou antecedente que determinará a ocorrência de outros fenômenos, definida pela pergunta de
pesquisa; ela se tornará o resultado decorrente da ação da variável independente. Para esse
estudo, a variável dependente será o jogo RPG Liberdade, modelado a partir dos princípios
elementares do socioconstrutivismo, e a variável independente será a aplicação do jogo
referenciado no método do modo de pensar histórico.
59

5.1.1 Variável dependente

A variável dependente é o jogo RPG Liberdade, construído coletivamente por


estudantes e pesquisadores. O jogo enquanto variável é composto de subvariáveis que
derivam dos propósitos pedagógicos e do design cognitivo.
Nesta pesquisa a variável dependente ordena-se do seguinte modo:
 Ambientais: O RPG Liberdade enquanto ferramenta pedagógica digital foi
modelado para ser um AVA – ambiente virtual de aprendizagem, possibilitando
uma elaboração do conhecimento histórico da abolição. Para isso, o seu design
cognitivo e socioconstrutivista foi conjugado ao sistema de regras e roteiro do
jogo, ambos construídos a partir do contexto histórico apontado no Capítulo II e
das contribuições dos estudantes. Para aplicar o jogo foram utilizadas três
plataformas virtuais:
o O RPG Digital construído no ambiente WEB SERVICE, com suporte à
linguagem de programação PHP e ao banco de dados mysql, com o
wordpress.
o Skype e WhatsApp.
Em todas plataformas, o Mestre (narrador e mediador) está presente, com
autoridade de realizar as intervenções necessárias e promover as interações entre
os jogadores/estudantes, estimulando, desse modo, ações reflexivas, feedback,
bem como aplicando o sistema de regra no jogo.
 Cognitivas: Os princípios do design cognitivo – interação, interatividade,
contextualidade, mediação, metacognição, inserção de conteúdos e colaboração
– discutidos no tópico 3.4 e sintetizados no quadro 8. São aqui considerados
como uma subvariável para analisar a abordagem do conteúdo dentro do AVA
RPG Liberdade e as estratégias de solução adotadas pelos estudantes.
 Sistêmicas: São analisados o comportamento do Software RPG Digital durante
a aplicação do jogo. Para isso, consideraremos três aspectos: sustentabilidade e
estabilidade sistêmica, facilidade de adoção e operabilidade a distância. Os
dados coletados nessa subvariável serão utilizadas a posteriori no
refinamento/aperfeiçoamento do software, que até então encontra-se na versão
beta.
60

5.1.2 Variável independente

A variável independente, para esse experimento, diz respeito ao que iremos acompanhar
no comportamento dos estudantes na dinâmica do jogo. Nessa categoria, adotamos o modo de
pensar história como variável independente, pelos motivos expostos no Capítulo III, tópico 3.2.

A variável independente está subdivida em três princípios, são eles:

 Significado pessoal: As duas aventuras aplicadas no experimento foram


modeladas numa perspectiva em que o conteúdo histórico e contexto social dos
estudantes se conjugassem, resultando assim em um pensar histórico
enriquecido de significado pessoal.
 Autenticidade: No RPG Liberdade, os estudantes se deparam com situações
problemas/desafios que exigem do grupo momentos de reflexão, elaboração de
estratégias e soluções autênticas. Nessa categoria serão consideradas as
“características do historiador” (Formular hipótese, criticar a fonte, interpretar
e chegar a uma conclusão) sintetizadas no quadro 6.
 Engajamento para a vida social: O RPG Liberdade é uma simulação que retrata
o cotidiano do escravizado na última década da escravidão (1870-80). Por ser
uma simulação, os estudantes são levados a refletirem sobre o cotidiano do
escravizado que luta pela sua liberdade e compreende que as práticas escravistas
e a sua abolição não estão absortos no tempo, elas têm raízes seculares na história
e os seus desdobramentos são repercutidos na contemporaneidade.

Além dos princípios do modo de pensar histórico apontados, utilizamos os indicadores


de domínio do pensar histórico (tópico 3.2, quadro7). Esses indicadores são considerados em
todas as subvariáveis independentes.
Para melhor entendimento das variáveis de análises, apresentamos o quadro a seguir,
que sintetiza os elementos discutidos no presente capítulo:
61

QUADRO 14 – Variável dependente e independente abordagem metodológica DBR


CATEGORIA SUBCATEGORIA CATEGORIA

AVENTURA 1: RECÔNCAVO REBELDE V


RPG LIBERDADE A Modo de Pensar Histórico
V AVENTURA 2: BATE-FOLHA
R
A NATUREZA ELEMENTOS PROCEDIMENTO DO EXPERIMENTO PROPOSITO PEDAGÓGICO I PRINCÍPIOS CONCEPÇÃO
R Á
I Mídias: imagens, vídeos, da biblioteca wordpress
Ambiente Virtual
e link externos. RPG Digital,
Compreensão do contexto histórico simulado. V SIGNIFICADO
Desenvolver um pesar histórico, em que
de Aprendizagem o conteúdo histórico esteja relacionado
Á E PESSOAL
Construção de uma consciência histórica critico/reflexivo. ao contexto dos Estudante
Skype, WhatsApp
V AMBIENTAIS L
E
O Sistema de Regras concede ao Mediador do 1. Estimular reflexão Aplicação Aventuras/simulações e
L experimento (Mestre) a autoridade promover as 2. Promover interação
I AUTENTICIDADE desafios que os estudantes são motivados
Mediação
intervenções 3. Apresentação de Feedback N a elaborar em coletivo um conhecimento
4. Regulação do Sistema de Regras histórico autentico.
D D
Abordagem do
E Inclusão das informações da Campanha E
Conteúdo
Liberdade no AVA RPG Liberdade em formato
P de Aventura/simulação e desafios.
1.
2.
Desenvolver o experimento
Promover práxis simulada via RPG Digital P
E E
COGNITIVAS
N 1. Simular o cotidiano dos escravizados no recôncavo N
Intervenção com “rodadas reflexivas”, desafios e baiano e em salvador.
D Estratégia de ajuda durante o experimento. 2. Estimular uma compreensão das múltiplas estratégias D
resolução de resistência do escravizado ao sistema escravista. Potencializar interatividade entre os
E 3. Compreender as consequências modelo de abolição E estudantes.
N adotado no Brasil na contemporaneidade.
N ENGAJAMENTO
Sustentabilidade e Possibilitar a reprodução do experimento com maior número de PARA A VIDA Estimular práticas de trocas de
T T SOCIAL experiência do contexto social.
Escalabilidade estudantes e professors
E O RPG Digital foi construído no ambiente WEB
SERVICE, com suporte à linguagem de E Engaja-lo para a vida social com uma
programação PHP e ao banco de dados mysql, Favorecer sua aplicação em outras unidades escolares.
consciência de pertencimento histórico.
Facilidade de com o wordpres
SISTÊMICAS adoção Possibilitar à estudantes e professores um Sistema de RPG de
Digital,prático e acessivel ao contexto escolar da Bahia

O RPG Liberdade foi construído numa


Aperfeiçoar o uso do RPG Digital como uma tecnologia
Operabilidade a plataforma tecnologica para ser utilizado por
educacional acessível para o ensino de História a distância
distância meio da internet
62

6 ANÁLISE DA PROPOSTA PEDAGÓGICA PARA O ENSIO DA ABOLIÇÃO DA


ESCRAVIDÃO

Neste capítulo apresentaremos os resultados da aplicação do experimento RPG


Liberdade, cujo jogo experimento desenvolveu-se com as aventuras: Recôncavo rebelde e Bate-
folha. Nossa observação seguirá os paramentos estabelecidos no Capítulo V, além dos
princípios socioconstrutivistas e do modo de pensar histórico, abordados no Capítulo III. Os
resultados aqui sistematizados foram obtidos a partir do acompanhamento das variáveis
dependentes e independentes, estabelecidas com a finalidades de testar a eficiência e
funcionalidade do jogo RPG Liberdade como tecnologia educacional adequada para o ensino
da abolição da escravidão e, por conseguinte, para o ensino de história.
Para melhor acompanhamento dos dados que serão expostos, compete-nos fazer uma
breve distinção da abordagem metodológica DBR dos outros métodos tradicionais para
avaliação de tecnologias educativas. Esta distinção está alicerçada nos estudos de Matta, Silva
e Boaventura2 ao tratarem sobre os principais outputs da DBR:
1. Resultados na forma de contribuição à teoria: Enquanto as pesquisas clássicas
se preocupam em testar e provar hipóteses, com etapas fixas, planejadas e
padronizadas, sendo possível a reprodução na íntegra por outros pesquisadores,
a DBR se preocupa com o teste dos princípios teóricos na prática, os princípios
de design são sempre passíveis de análise e crítica, exigindo da pesquisa uma
constante revisão sucessiva e processual (redesign), que é replanejada a partir
dos indicadores de sucesso ou insucesso apresentados na prática.
2. Resultados de âmbito social e comunitário educacional: Diferenciando dos
métodos tradicionais em que os assuntos são apresentados de forma isolada, não
ocorrendo interação entre os estudantes, professor e especialista, sendo que o
material a ser aprendido é apresentado por texto ou vídeo. Na DBR, as
experiências de projeto são definidas considerando o contexto dos sujeitos, em
que a interação acontece naturalmente como uma sala de aula. Esse diálogo com
a comunidade implicada em seus problemas concretos faz com que a DBR refine
seus procedimentos e os resultados, validados por essa mesma comunidade,
atendam ás dificuldades das práxis educacionais do contexto pesquisado.

2
MATTA, A. E. R.; SILVA, F. P. S.; BOAVENTURA, E. M. Design-Based Research ou Pesquisa de Desenvolvimento:
metodologia para pesquisa aplicada de inovação em educação do século XXI. 2014. Revista da FAEEBA – Educação e
Contemporaneidade, v. 23, n. 42, 2015, p. 23-36.
63

3. O desenvolvimento e habilitação dos engajados: No método tradicional, o


pesquisador toma todas as decisões sobre a pesquisa e análise dos dados, a fim
de manter o controle do que acontece. Na DBR, os sujeitos implicados
participam do processo de decisão sobre os próximos passos do projeto ao
trazerem as suas experiências e análises sobre a pesquisa, sendo que os estudos
e resultados desenvolvidos são transportados para sua prática social.

6.1 ANÁLISE DA APLICAÇÃO PEDAGÓGICA: AVALIAÇÃO DAS VARIÁVEIS


DEPENDENTES E INDEPENDENTES

Os trabalhos inicias para o desenvolvimento do jogo ocorreram nas oficinas do projeto


“Turismo de Base Comunitária” 3, com participação dos estudantes e professores do Colégio
estadual Helena Magalhães, Colégio Estadual Governador Roberto Santos, Colégio Estadual
Ministro Aliomar Baleeiro, Colégio Estadual Edvaldo Fernandes.
Nas oficinas realizadas por Alfredo Matta, Caroline Alcântara Duarte e demais
pesquisadores dos projetos Turismo de Base Comunitária e Conteúdos Digitais nas Escolas 4,
no Colégio Estadual Governador Roberto Santos e na Universidade do Estado da Bahia
(UNEB), foi apresentada uma das bases teóricas utilizadas em nossa pesquisa, o
socioconstrutivismo. Essa oficina foi mais que necessária, pois nela professores e estudantes
tomaram ciência dos princípios elementares do socioconstrutivismo, o design cognitivo que
utilizaríamos para modelar o RPG. Nesses dois encontros, tivemos a primeira validação interna
e externa, na qual os partícipes da pesquisa opinaram e concordaram com a base metodológica
adotada.
Após as duas primeiras oficinas, ocorreram mais dois encontros na Universidade do
Estado da Bahia (UNEB). No primeiro encontro, dialogamos e pontuamos problemas
pertinentes ao contexto social de cada estudante, como: infraestrutura urbana deficiente, sistema
de saúde e segurança pública precários, depredação de instituições de ensino público,

3
Turismo de Base Comunitária no Cabula – TBC Cabula, é um projeto elaborado e executado por uma equipe multi e
interdisciplinar, articulado à pesquisa, ensino e extensão, com objetivo de construir com as comunidades do Antigo Quilombo
Cabula, que compreende 17 bairros circunvizinhos à Universidade do Estado da Bahia (UNEB), caminhos alternativos para o
desenvolvimento local sustentável, a partir do turismo de base comunitária e da ecossocioeconomia, mediante metodologia
participativa sustentada na pesquisa-ação, na praxiologia e em pesquisa de desenvolvimento (DBR).
4
Pesquisa que utiliza metodologia DBR, que objetiva habilitar escolas públicas baianas, professores e alunos, na autoria de
conteúdos digitais educacionais voltadas para sua realidade e contexto social e cultural. Atualmente a pesquisa desenvolve
ações nas escolas públicas dos bairros do Cabula e entorno. A investigação científica decorre da necessidade de desenvolver
conhecimento social, e a cultura escolar, para a autoria hipermídia digital. A pesquisa desenvolve conhecimento científico sobre
modelagem de sistemas educacionais socioconstrutivistas, soluções de educação digital para as unidades escolares, e também
habilitação de sujeitos da unidade escolar parceira para que adquira autonomia e prática de autoria hipermídia.
64

desconhecimento da história local e abordagens de ensino centradas no docente. Esse diálogo


foi importante para entendermos o contexto dos participantes da pesquisa e percebermos os
elementos que seriam inseridos junto ao conteúdo do jogo, realizando, assim, a segunda
validação interna e externa.
No segundo encontro da oficina realizada na UNEB, os estudantes e professores
sugeriram utilização de mídias como ambientes de diálogo e aprendizagem. Dentre as sugestões
estava a criação de uma rádio 5, a produção de um jornal e um jogo de RPG. Todas as sugestões
foram incorporadas ao projeto TBC e Conteúdos digitas nas escolas, e encontram-se em ativa
produção. A partir desse encontro, começamos a modelagem do jogo junto ao Grupo A de
estudantes: Ycaro, Camila e Emerson, todos estudantes do Ensino Médio.
À medida que a pesquisa avançava e as aventuras passavam por refinamentos,
percebemos a necessidade de uma nova aplicação, com outros estudantes, e, dessa maneira,
foram incorporados quatro estudantes para compor o Grupo B: Ian, Cesar, Filipe e Victor. Nesse
grupo, foram realizados novos refinamentos e validações do jogo, para que chegássemos na
última versão apresentada.
A escolha de três a quatro estudantes por grupo deve-se a condições sistêmicas da versão
beta software RPG Digital, que suportava o máximo de cinco usuários online, um mestre e
quatro jogadores. Além disso, tivemos que suprimir o uso de recursos gráficos como mapas,
dados, totens, chat e vídeos, foi preciso simplificar o uso gráfico para evitar uma sobrecarga do
software. Mesmo assim tivemos problemas como atrasos na atualização de diálogos entre os
usuários no RPG Play (fórum).
No entanto, tais dificuldades não impediram a aplicação do jogo. Espontaneamente cada
grupo de estudantes elaborou soluções distintas para contornar as limitações do software.
O Grupo A criou um grupo no WhatsApp, para suprir a ausência de chat e o atraso na
atualização dos diálogos. Pelo Whatsapp, os estudantes dialogavam e estabeleciam estratégias
para solucionar os desafios da aventura. Outra estratégia adota foi “rodadas assíncrono”, cada
partida tinha um horário especifico para acessar o sistema e executar sua ação no jogo.
Para essa primeira aplicação do jogo hospedado no site:
<http://kleibung.com.br/rpgdigital/rpgliberdade>.

5
Hospedada no site < http://www.radiowebjuventude.com.br/site/> A Rádio Web Juventude é uma rádio escolar, alicerçada na
prática pedagógica do socioconstrutivismo, que busca o desenvolvimento do processo de ensino/aprendizagem colocando o
educando como centro do processo, corresponsável pela construção ativa de seu conhecimento.
65

Na aplicação do Grupo B o sistema apresentou melhoras no quesito de atualização de


diálogo, mas os outros problemas persistiram. No Grupo B, tivemos rodadas síncronas para
diálogos, deliberações e rolagem de dados, em que foi utilizado o Skype.
Nessa segunda aplicação foi criado um novo site para hospedar o jogo:
<http://kleibung.com.br/rpgdigital/rpgliberdade2>

6.2 APLICAÇÃO DO EXPERIMENTO COM O GRUPO A: RESULTADOS DA


AVENTURA RECÔNCAVO REBELDE

A aplicação da aventura Recôncavo Rebelde, com o Grupo A, iniciou com um encontro


de estudantes na sala do Grupo de Pesquisa Sociedade em Rede, no prédio de pós-graduação
da Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Nesse primeiro dia realizamos a apresentação da
campanha do RPG Liberdade, explicamos o sistema de regras do jogo, e os estudantes criaram
os seus personagens. Para a primeira aventura foram elaborados os seguintes personagens
jogáveis:
 Estudante Ycaro: Personagem – Ahuna, Classe: Sacerdote islâmico,
Situação: Escravizado.
 Estudante Camila: Personagem – Nina, Classe: Amazona, Situação:
Escravizada.
 Estudante Emerson: Personagem – João Ninguém, Classe: Guerreiro,
Situação: Escravizado.

No segundo dia de aplicação, realizado na sala cinco no prédio de pós-graduação da


Universidade do Estado da Bahia (UNEB), começamos a jogar a aventura “Recôncavo
Rebelde”, no modo presencial. Essa medida foi necessária porque nenhum dos estudantes havia
jogado RPG anteriormente e, por esse motivo, era preciso apresentar o “RPG de mesa”, antes
de partimos para o “RPG Digital” via WEB. As sessões que seguiram, após a presencial, foram
todas realizadas no AVA – Ambiente Virtual de Aprendizagem RPG Digital.
Concomitantemente a aplicação do jogo no AVA, os estudantes criaram um grupo no WhatsApp
intitulado “RPG Liberdade”. Durante a aplicação, os envolvidos no jogo tiravam dúvidas sobre
a utilização do sistema RPG Digital e dialogavam sobre o desenvolvimento do jogo.
Com base nestas informações gerais, apresentamos uma avaliação das variáveis
dependentes e independentes selecionadas para este experimento. Iremos apresentar o
comportamento de cada variável individualmente tendo como base de avaliação o propósito
66

pedagógico pelo qual ela foi selecionada, conforme sintetizados no quadro 14 do Capítulo V.
Em seguida, poderemos auferir classificação qualitativa, caso haja ocorrido a efetividade da
variável em questão.

6.2.1 VARIÁVEIS DEPENDENTES DA AVENTURA RECÔNCAVO REBELDE

Variáveis ambientais:
Ambiente Virtual de Aprendizagem: A princípio, o sistema RPG Digital não funcionou
como esperado. Para essa primeira aplicação, tivemos de selecionar três estudantes. As mídias
internas e externas (mapas, vídeos, imagens) não foram utilizadas no experimento em função
de um sobrecarregamento do software, conforme relatado anteriormente. O prazo de
desenvolvimento do experimento, bem como a inexistência de recursos para correção desse
problema, impossibilitaram a utilização dessas mídias neste experimento.
Diante das dificuldades como ausência do chat, mídias internas, mapas, rolagem de
dados 3d, imagens de personagens previstos, que não puderam ser aplicadas e a deficiência do
software em sustentar todos os usuários online, adotamos o sistema de rodadas assíncronas, ou
seja, cada estudante tinha uma janela de tempo para executar sua ação no jogo.

– Lázaro: Camila você será a primeira a jogar. Você terá de 13h até 15h para
colocar sua ação, Ycaro você terá 15 até 17h e Emerson de 17h até 19h.
- Ycaro: Certo.
- Camila: Certo
- Emerson: Ok.6

Foi criado um grupo junto com os estudantes no WhatsApp intitulado RPG Liberdade,
para suprir as deficiências sistêmicas de comunicação, e a partir de então prosseguimos com a
aplicação do experimento em ambiente virtual.
Mediação: A mediação foi desenvolvida na sessão presencial e nas sessões online, em
ambas situações houve estímulo à reflexão, promoção de interação e regulação. No entanto, o
Feedback foi identificado apenas na sessão presencial. Seguem abaixo os registros de mediação
observados na primeira aplicação da aventura Recôncavo Rebelde.

Estimulo a reflexão:

6
Trecho extraído de discussão online realizada em 08/12/2015, no Grupo Social do WhatsApp RPG Liberdade.
67

Mestre: Após sobreviver a um mês de viagem no navio negreiro, vocês


chegaram a seu destino, Cidade de Cachoeira. As lembranças dos horrores
vividos no navio durante a travessia ainda estão acesas na mente de vocês. A
família, os amigos, a terra natal, tudo parece lembranças de vidas passadas.
O que lhes restam é o futuro incerto, o que lhes restam é sobreviver!
Ao desembarcarem na Cidade de Cachoeira, vocês são levados para um
mercado próximo ao porto, onde há também outros africanos Bantos, Jejes,
Nagôs.... Vocês ficam enfileirados dentro de uma tenda e acorrentados pelas
mãos e pés. Senhores de engenhos, capangas, comerciantes, outros escravos
passam pela tenda olhando para vocês.7

Promover Interação:

Mestre: É noite e vocês estão reunidos no pátio que fica no fundo da Casa-
Grande, ao lado da senzala. Próximos a vocês um grupo de escravos estão
tocando um samba de roda, e um outro conversando. Mãe Obá está junto com
esses escravos conversando. Vocês percebem que ela convence eles a
participarem da fuga.
No pátio há três capangas que vigiam a festividade. Dois deles estão um pouco
alcoolizados e chegam até a participar da festa.
O que vocês fazem?
Camila: Eu danço mais eles, sambo ao redor deles, paro e puxo conversa com
Mãe Obá.
Emerson: Eu estou junto com alguns escravos dançando. Mas eu estava atento
ao que Nina estava fazendo.
Mestre: Camila. Ao se aproximar, Obá relata o seguinte: Minha filha, a festa
faz parte do plano de fuga, dentro de instantes alguns seguidores de Ahuna
que estão armados iniciarão uma briga com os capangas. E dessa maneira, nós
teremos como fugir. Ao terminar, ela lhe entrega uma faca.
Emerson você ouve a mesma conversa. Um dos escravos lhe entrega um facão
escondido. 8

7
Trecho extraído do diálogo resultante da sessão presencial da Aventura Recôncavo Rebelde, sessão realizada em
03/12/2015, na sala 05, do prédio de pós-graduação da Universidade do Estado da Bahia (UNEB).
8
Trecho extraído de sessão online da Aventura Recôncavo Rebelde realizada em 21/12/2015, no software RPG
Digital
68

Apresentar Feedback:

Vocês estão sendo traficados para o Brasil de maneira ilegal, pois o tráfico de
escravos foi legalmente extinto em 1850, com a Lei Eusébio de Queirós. No
entanto, vários traficantes brasileiros mantiveram o tráfico negreiro na
ilegalidade, pois ainda havia uma demanda comercial no Brasil, sobretudo nas
áreas de produção rural, a exemplo do recôncavo baiano.9

Regulação do Sistema de Regras:

Mestre: Boa tarde, pessoal. Aqui daremos continuidade a nossa aventura


A ordem de iniciativa dos jogadores será seguinte: Camila, Ycaro e
Emerson.10
Mestre: Camila e Emerson, joguem um dado de 6 faces para saber se vocês
vão conseguir se esconder.
Camila: Eu tirei 2
Emerson: Eu tirei 5 11

Resultado: Apesar dos problemas apresentados pelo software RPG Digital, a aplicação
do experimento não foi impossibilitada de acontecer e evidenciar a ocorrência do modo de
pensar histórico enquanto variável independente:
a) Significado pessoal: A proposta de modelar um ambiente virtual que
possibilitasse uma construção de conhecimento rico em significado pessoal foi
parcialmente prejudicada devido à ausência de recursos gráficos como mapas e
imagens que retratariam determinadas situações- problemas da aventura,
conectadas ao contexto social dos estudantes. Foram suprimidas da aplicação
mapas do engenho, recôncavo baiano, cidade de Salvador no século XIX e o
quilombo cabula.
Diante de tal circunstância, optamos durante a aplicação por utilizar uma
narração descritiva, afim de suprir a ausência dos recursos gráficos. Desse ponto

9
Trecho extraído do diálogo resultante da sessão presencial da Aventura Recôncavo Rebelde, sessão realizada em
03/12/2015, na sala 05, do prédio de pós-graduação da Universidade do Estado da Bahia (UNEB).
10
Trecho extraído de sessão online da Aventura Recôncavo Rebelde realizada em 21/12/2015, no software RPG
Digital
11
Idem
69

em diante foi possível atestar a ocorrência de conhecimento histórico ligado ao


contexto social do estudante.
b) Autenticidade: Está subvariável independente tem a função de atestar na
utilização do software RPG Digital o que motivou os estudantes a elaborarem
em coletivo um conhecimento histórico autentico, e se para isso as
“características do historiador” (Formular hipótese, criticar a fonte, interpretar
e chegar a uma conclusão) foram consideradas no processo metacognitivo.
Diante dos problemas supracitados, como ausência de recursos gráficos,
ausência de chat, atraso dos diálogos entre os estudantes no RPG Play/forun, o
RPG Digital não atendeu à subvariável Autenticidade. Durante a primeira e
segunda sessões presenciais do RPG, percebemos de maneira clara nas rodadas
sincrônicas a interação, o feedback, a produção de conhecimento autêntico
durante criação de personagens e as ações na aventura. Quando passamos a
aplicar o jogo no ambiente virtual e adotamos as rodadas assíncronas, não foi
possível perceber dentro do software a produção de Autenticidade, devido à
ausência de interação simultânea entre os participantes e a inexistência de
feedback. Para suprir essa deficiência sistêmica, criamos com os estudantes no
WhatsApp o grupo RPG Liberdade. Nele, os envolvidos no experimento
discutiam a deliberação sobre as ações que deveriam ocorrer no jogo, e então
tornamos a perceber a produção de autenticidade, ainda que de maneira
insatisfatória.
c) Engajamento para a vida social: Está subvariável avalia se o jogo conseguiu
levar os estudantes a refletirem sobre o cotidiano do escravizado, a luta pela sua
liberdade, além de compreenderem que as práticas escravistas e a sua abolição
não estão desconexas do seu contexto social e da contemporaneidade.
O RPR Digital, com limitações, conseguiu realizar a simulação do RPG
Liberdade, e foi possível perceber nas interações realizadas pelos estudantes no
grupo do Whatsapp que as situações simuladas no software RPG Digital
repercutiram na vida social dos estudantes, quando estes perceberam que
determinadas tensões sociais do seu cotidiano estavam enraizadas na história
local.
Variáveis cognitivas:
Abordagem de conteúdo: As informações da aventura foram incorporadas no AVA,
processual e continuamente, de forma que foi possível desenvolver o experimento simulando o
70

contexto da escravidão e os caminhos para a sua abolição no ambiente virtual, conforme trechos
a seguir:

Passaram-se dois meses após a fuga do Engenho Santa Maria. Devido à proeza
da fuga organizada por vocês, diversos escravos se rebelaram em diversos
engenhos. O plano elaborado em promover rebeliões nas cidades que ficam a
caminho de Salvador surtiu efeito. Junto com vocês estão centenas de ex-
escravos.
Por outro lado, os personagens de vocês, Nina, Ahuna e Zé Ninguém estão
sendo procurados pela guarda da província.
Atualmente, vocês estão na estrada das boiadas (atual Retiro) às margens do
Rio Camarajipe. Do lado direito do rio, vocês veem uma fazenda e algumas
freiras dentro dos casebres. Do lado esquerdo, está um morro bem íngreme
(atual Arraial do Retiro), o rio Camarajipe, segundo informações de um ex-
escravo do grupo de vocês, ira desaguar na Praia do Chega Nego (atual Jardim
dos namorados).
O objetivo de vocês é conseguir levar o grupo de ex-escravos para o quilombo
cabula, no entanto, há feridos entre vocês, crianças, idosos cansados da
viagem e é noite. O que vocês fazem? 12

Estratégia de resolução: As Rodadas Reflexivas e Desafios foram incorporados durante


o experimento, à medida que os jogadores progrediam na aventura. Destacamos os trechos
abaixo como registro das estratégias de resolução:

Mestre: Ahuna e Nina, a fama de vocês antecede a sua chegada. Ficamos


muito felizes com a presença vocês. No entanto, a luta não acaba aqui. –
Continua Nicacia – Quero lhes apresentar um grande amigo nosso André
Rebouças. André tem sido a nossa voz na câmara imperial, articulando ações
pró-abolição na capital do império.
Mestre: Dirigindo a vocês, André diz: - As revoltas promovidas por vocês
despertaram bastante interesse dos abolicionistas. Creio que vocês podem
contribuir enormemente para o fim da escravidão. Nós, da Sociedade
Brasileira contra a escravidão, estamos reunindo diversas propostas de
abolição para encaminharmos em petição para o senado imperial. Será que

12
Trecho extraído de sessão online da Aventura Recôncavo Rebelde realizada em 07/01/2016, no software RPG
Digital
71

vocês podem elaborar uma proposta de Lei para o fim da escravidão? A


propostas de vocês será somada a de outros líderes abolicionistas.
Ycaro: 1. Todos os escravos, que entrarem em solo brasileiro, estão livres 2.
Todos os escravos receberão remuneração pelo seu tempo de trabalho num
prazo de 10 anos. 3. Todos os escravos terão direitos e deveres iguais a todos
os brasileiros. 4. Territórios públicos serão cedidos para construção de
moradia financiado pelo Império. 13

Resultado: A variável cognitiva apresentou efetividade satisfatória, uma vez que foi
possível notar o desenvolvimento do modo de pensar em um jogo virtual de RPG modelado
com princípios da teoria vygotskyana.
Apresentamos aqui a interseção que houve entre a variável cognitiva e a variável modo
de pensar histórico:
a) Significado Pessoal: O modo como o conteúdo foi abordado na aventura e as
estratégias de resolução inseridas em forma de rodadas reflexivas e desafios
promoveram uma práxis simulada via RPG Digital, permeada de um rico
contexto pessoal dos estudantes, conforme apresenta-se a seguir:

Mestre: Vocês foram acordados antes do Sol nascer, para trabalhar na colheita
da cana. Já se passa do meio-dia e vocês continuam a colheita. O Sol
escaldante de Recôncavo torna o trabalho ainda mais extenuante. Durante todo
o trabalho, os capangas armados vigiam vocês.14
Ycaro: Essa realidade é parecida com a dos trabalhadores do dia de hoje. Aqui
mesmo tem vários operários de construção, os caras saem cedo de casa, voltam
já de noite e ainda recebem um salário muito baixo em relação ao trabalho que
eles fazem. E ainda tem os capangas de hoje, que são a polícia, que só aborda
quem é negro e quem é da periferia.15

b) Autenticidade: O desenvolvimento do conhecimento crítico/reflexivo no


experimento foi estimulado pelas estratégias decisórias e coletivas realizadas
pelos envolvidos no experimento. As “características do historiador” (formular

13
Trecho extraído de sessão online da Aventura Recôncavo Rebelde realizada em 11/01/2016, no software RPG
Digital.
14
Trecho extraído do diálogo resultante da sessão presencial da Aventura Recôncavo Rebelde, sessão realizada em
03/12/2015, na sala 05, do prédio de pós-graduação da Universidade do Estado da Bahia (UNEB).
15
Idem.
72

hipótese, criticar a fonte, interpretar e chegar a uma conclusão) observadas


durante todo o jogo resultaram em comportamento de colaboração para uma
produção autêntica do conhecimento histórico.
A formulação de hipótese, crítica às fontes e as conclusões realizadas no
experimento foram observadas quando espontaneamente os estudantes
pesquisaram sobre etnias africanas, história de vida dos escravizados e o
cotidiano da escravidão em sites, e-books e vídeos, buscando informações
necessárias para construir a background dos personagens e referências para
elaborar estratégias e soluções dentro do jogo, como demostram os trechos
citados:

Olá, meu nome é João. Eu nasci na África, para ser mais específico, eu nasci
em Angola. Fazia parte do povo Bakongo. Eu vivia próximo à Costa Atlântica
da África. Quando eu tinha 7 anos, fui traficado para o Brasil. Fui o garoto
mais novo a ser trazido no navio onde eu estava, e por isso sofri vários abusos
até chegar aqui. Foram os primeiros dos piores dias da minha vida.
Chegando ao Brasil sem saber de absolutamente nada, fui levado para ser
vendido, mas percebi que ninguém queria uma criança desnutrida e sem força
alguma para fazer o trabalho pesado. No fim da tarde, um senhor veio dizendo
que queria me comprar. Ele tinha uma cara de malvado e me assustava. Não
queria ir, e quando ia ser levado para o meu futuro senhor, eu saí correndo o
mais rápido que pude, mas, infelizmente, fui capturado e, ainda por cima,
tomei o meu primeiro castigo. Além disso, meu senhor me ele falou que eu
seria chamado de João Ninguém, pois meus pais me deixaram para que eu
fosse traficado. 16
Mestre: Ahuna. Você ainda está dentro da fazenda, um dos seus companheiros
lhe deu um facão. Você está cercado por 5 capangas e tem o auxílio de dois
companheiros que aguardam as suas ordens.
Ycaro: Eu ordeno o ataque e fortaleço eles (meus companheiros) com meu
poder de sacerdote.
[...]
Mestre: Um grupo de escravos chega até você e diz: para onde vamos agora,
Mestre Ahuna?
Ycaro: Ao encontro de Mãe Obá.

16
Trecho extraído da ficha de personagens do estudante Emerson.
73

Mestre: Por ser noite, é muito difícil enxergar na mata, mas os escravos levam
você até um riacho. Na beira do riacho está Obá bem debilitada devido ao
combate. Ela olha para você e diz: - Enfim demos o primeiro passo para a
liberdade. Eu não tenho condições de liderar esse povo, Você será o líder deles
agora. Você aceita, Ahuna?
Ycaro: Com toda honra, vamos lutar bravamente pela libertação dos
escravos.17
Mestre: Dirigindo-se a vocês André diz: - As revoltas promovidas por vocês
despertaram bastante interesse dos abolicionistas. Creio que vocês podem
contribuir enormemente para o fim da escravidão. Nós, da Sociedade
Brasileira contra a escravidão, estamos reunindo diversas propostas de
abolição para encaminharmos em petição para o senado imperial. Será que
vocês podem elaborar uma proposta de Lei para o fim da escravidão? A
propostas de vocês será somada a de outros líderes abolicionistas.
Ycaro: 1. Todos os escravos que entrarem em solo brasileiro, estão livres 2.
Todos os escravos receberão remuneração pelo seu tempo de trabalho num
prazo de 10 anos. 3. Todos os escravos terão direitos e deveres iguais a todos
os brasileiros. 4. Territórios públicos serão cedidos para construção de
moradia financiado pelo Império. 18

c) Engajamento para a vida social: A produção de um conteúdo historiográfico


sobre a abolição da escravidão relacionado ao contexto social dos estudantes, e
o modo como esta foi inserida no jogo potencializou a interatividade entre os
jogadores, estimulou trocas de experiência e reflexões acerca do contexto social
dos envolvidos no experimento.
Para reforçar a afirmativa destacamos os seguintes trechos do experimento:

Ao seguirem pelo rio vocês não encontram obstáculos, após três horas de
caminhada, todos chegam às imediações do quilombo cabula.
O quilombo lembra muito um arraial. Vocês são recebidos como heróis por
Nicácia19, a líder do quilombo. Ela olha para vocês e diz:

17
Trecho extraído de sessão online da Aventura Recôncavo Rebelde realizada em 21/12/2015, no software RPG
Digital.
18
Trecho extraído de sessão online da Aventura Recôncavo Rebelde realizada em 11/01/2016, no software RPG
Digital.
19
Personagem fictícia.
74

Ahuna e Nina, a fama de vocês antecede a sua chegada. Ficamos muito felizes
com a presença vocês. No entanto, a luta não acaba aqui. – Continua Nicacia
– Quero lhes apresentar um grande amigo nosso, André Rebouças. André tem
sido a nossa voz na câmara imperial, articulando ações pró-abolição na capital
do império.”20
Quer dizer que eu moro num local que foi um quilombo. Que massa, veio! 21
- Sejam bem-vindos à Fazenda Engenho Santa Maria, sejam bem-vindos à
Cachoeira! Imagino que a viagem de vocês foi muito penosa, mas tudo isso
ficou para trás. Aqui vocês vão encontrar um novo futuro, um futuro próspero,
para aqueles que forem bons. Se vocês forem bons, serão bem tratados, se não
forem, serão disciplinados. Afinal, estamos numa sociedade civilizada (risos).
Mas deixamos de proselitismo, vocês devem estar morrendo de fome.
Guilhermino, leve eles para tomarem um bom banho e depois para o barracão,
para que eles possam comer. Ah! Acabei esquecendo de me apresentar, eu sou
Senhor Pedro Rodrigues Guedes e, a partir de agora, vocês servem a mim.
Guilhermino levará vocês até o local do banho no meio do mato. Cercado
ainda pelos capangas o banho não demora muito e vocês vestem as roupas que
estavam juntas com os baldes.
Em pouco tempo, vocês estão no Barracão, uma mesa farta está diante de
vocês, uma moqueca de beijupirá está na mesa, frutas diversas também estão
à disposição de vocês.22
Ycaro: Mesma política de “pão e circo” e cooptação que existe hoje. O político
chega, compra, dá uma cesta básica ou faz uma festa no bairro, e a maioria
das pessoas acha que ele está certo. 23

Variáveis sistêmicas:
Sustentabilidade e Escalabilidade: No aspecto Sustentabilidade e Escalabilidade,
prevemos avaliar a possibilidade de reprodução do experimento com maior número de
estudantes e professores. Neste aspecto, o RPG Digital demonstrou aspectos
tecnoinformacionais que não permitem replicá-lo em escalas maiores ao que foi utilizada.
Correções, especialmente da área de informática, devem ser desenvolvidas visando melhorar a

20
Trecho extraído de sessão online da Aventura Recôncavo Rebelde realizada em 11/01/2016, no software RPG
Digital.
21
Trecho extraído de discussão online realizada em 08/12/2015, no Grupo Social do WhatsApp RPG Liberdade.
22
Trecho extraído do diálogo resultante da sessão presencial da Aventura Recôncavo Rebelde, sessão realizada em
03/12/2015, na sala 05, do prédio de pós-graduação da Universidade do Estado da Bahia (UNEB).
23
Idem.
75

sustentabilidade do software, tendo em vista que este apresentou-se inoperante para


experimentos com cinco usuários, um mestre e quatro jogadores/estudantes. Em função desse
problema, realizamos a aplicação com quatro usuários, um mestre e três jogadores/estudantes.
Facilidade de Adoção: O aspecto Facilidade de Adoção foi avaliado a partir da
perspectiva de ser adotado em outras escolas e instituições de ensino. O ambiente virtual
apresentou operabilidade adequada para realização de experimentos através de sites hospedados
no Wordpress.
Operabilidade a distância: Esta variável visa avaliar o RPG Digital Liberdade como uma
tecnologia educacional acessível a outras unidades de ensino. Para tanto, ele foi modelado numa
plataforma tecnológica para ser utilizado online. Aplicação do RPG Liberdade ocorreu com os
estudantes em locais físicos diferentes e distantes uns dos outros. Este fato deu-nos condições
de avaliar a efetividade da aplicação pedagógica, quando realizada a distância. Apesar dos
problemas sistêmicos apontados anteriormente o software RPG Digital apresentou
operabilidade adequada para realização de jogos de RPG à distância.
Resultado: O software RPG Digital apresentou limitações em sustentar um número
superior de usuários, não entanto, isso não impediu a ocorrência de uma relação ensino-
aprendizagem do modo de pensar histórico e do socioconstrutivista, entre os participantes da
pesquisa.
Para cada jogo modelado um site próprio é desenvolvido, este aspecto não alterou as
diretrizes para a aplicação do experimento, tal fato pôde ser notado quando concomitante à
aplicação do jogo RPG Liberdade mais dois experimentos (RPG PMBA 24 e RPG Tibete25)
estavam sendo aplicados no sistema RPG Digital e não notamos nenhuma intercorrência
negativa para nenhum dos experimentos.
Portanto, concluímos que RPG Digital, apesar de estar na sua versão beta, apresenta
potencial para uma relação ensino-aprendizagem baseada no modo de pensar histórico e no
socioconstrutivista. Contudo, para isso é necessário corrigir as deficiências sistêmicas
apresentadas nas variáveis ambientas.

24
Experimento desenvolvido pelo Doutoranda Josete Bispo Ribeiro, parte da tese Rede de Aprendizagem Colabora
tiva para Difusão do Conhecimento em Direitos Humanos.
25
Experimento desenvolvido pelo Mestranda Caroline Alcantara Duarte, parte da dissertação A aplicação do jogo
RPG DIGITAL no Combate ao Trabalho Infantil
76

6.3 APLICAÇÃO DO EXPERIMENTO COM O GRUPO B: RESULTADOS DA


AVENTURA BATE-FOLHA

A aplicação da aventura Bate-folha com o Grupo B iniciou-se com uma


videoconferência via Skype com os estudantes. Nesse primeiro dia, dialogamos sobre a
campanha do jogo, que havia sido previamente enviado para o e-mail de cada participante junto
com a ficha de personagens. Nessa videoconferência foi explicado o funcionamento do sistema
de regras e feita a criação dos personagens jogáveis. Para a segunda aventura, os estudantes
elaboraram os seguintes personagens:

 Estudante Victor: Personagem – Kayin, Classe: Arqueiro, Situação:


Escravizado.
 Estudante Filipe: Personagem – Isaura, Classe: Sacerdote
candomblecista, Situação: Escravizada.
 Estudante Cesar: Personagem – João de Barros, Classe: Guerreiro,
Situação: Escravizado.
 Estudante Ian: Personagem – Bomani, Classe: Guerreiro, Situação:
Alforriado.

No segundo dia de aplicação realizado no sistema RPG Digital e com auxílio do Skype,
começamos a jogar a aventura “Bate-folha”. Diferentemente do primeiro grupo, os estudantes
envolvidos na segunda aplicação já estavam habituados ao jogo de RPG, não havendo assim
necessidade de sessões presencias.

6.3.1 VARIÁVEIS DEPENDENTES DA AVENTURA BATE-FOLHA

Variáveis ambientais:
Ambiente Virtual de Aprendizagem: Na segunda aplicação o sistema apresentou
algumas melhoras, conseguimos acrescentar cinco usuários, um mestre e quatro jogadores. As
mídias internas não puderam ser utilizadas devido a problemas sistêmicos, mas conseguimos
inserir mídias externas (vídeo e imagens). Houve uma melhora na atualização dos diálogos no
RPG Play (fórum), permitindo rodadas sincrônicas. No entanto, outros problemas relatados
anteriormente persistiram.
77

Mediação. A mediação, desenvolvida integralmente em meio virtual, indicou situações


de: estímulo à reflexão, promoção de interação, regulação e Feedback, com o auxílio do Skype.
Estimulo a reflexão:

Santiago do Iguape está em polvorosa depois que ocorreu um levante de


escravos em Cachoeira. Muitos escravizados conseguiram fugir das fazendas,
engenhos e das casas dos senhores. Santiago, que é um dos principais polos
de produção de açúcar do Brasil, está sobre constante tensão social, todos
sabem que uma revolta pode acontecer a qualquer momento, sobretudo diante
dos últimos avanços políticos do abolicionista e a adesão de vários intelectuais
e parte da classe burguesa, que exercem cada vez mais pressão sobre o
governo para abolir a escravidão. Ao longo de mais de trezentos anos os
escravizados não pararam de lutar um momento pela sua liberdade. 26

Promover Interação:

Após o encontro com Nadir (escrava do Sr. Brandão), vocês ouvem sons de
carruagens e cavalos passando por uma estrada próxima. Aparentemente são
caixeiros viajantes que levam as novidades em tecnologia, culinária,
cosméticos e outros produtos vindos da Europa e do Rio de Janeiro, capital do
Império. Além de vender produtos, os caixeiros viajantes são grandes fontes
de informações. O que vocês fazem?

Ian: bom dia, senhor viajante, qual seria o seu nome? O meu nome é Bomani
e eu gostaria de saber onde eu estou, pois acabei me perdendo na mata.

Victor: Eu ouço algumas vozes estranhas e me escondo subindo em uma


árvore até ter certeza de quem vem lá.

Cesar: Eu vou me esconder também e esperar eles passarem.27

Apresentar Feedback: Nessa segunda aplicação, todos os Feedback foram realizados via
Skype, devido à ausência de chat no sistema RPG Digital.

No período colonial, um padre chamado André João Antonil escreve o livro Cultura
e Opulência no Brasil, que retrata essa parte da aventura. A maneira que Brandão de
Barros trata os seus personagens e outros NPC’s é baseada em Antonil, quando ele
disse que o escravo precisava apenas de PPP – Pão, Pano e Pau.28

O candomblé praticado no Brasil difere do praticado na África. Devido à


confluência de diversas culturas e etnias africanas que vieram para cá, o
candomblé aqui passou a ter característica particulares. Vocês já devem ter

26
Trecho extraído de sessão online da Aventura Bate-folha realizada em 25/01/2016, no software RPG Digital
27
Trecho extraído de sessão online da Aventura Bate-folha realizada em 30/01/2016, no software RPG Digital
28
Transcrição do trecho de uma áudioconferência realizada em 25/01/2016, via Skype
78

percebido que existem algumas terminologias, como candomblé de Ketu,


Banto, Jeje. Pois bem! Esses termos identificam de qual etnia deriva aquele
terreiro.29

Regulação pelo Sistema de Regras:

Mestre: Pessoal, cada um vai jogar 1d630 para iniciativa


Ian: Eu tirei 6
Victor: Eu, 3
Cesar: 4
Filipe: Eu tirei 1 31

Mestre: Bonani, antes de você tentar imobilizar Eloísa, a mesma lhe aplica
um chute giratório, jogue 1d6 para defender. João jogue um 1d6 para
destreza.
Ian: Eu tirei 05
Cesar: eu tirei 06
Mestre: Bonani, você consegue defender o golpe de Eloisa. João, Hélio
defende o seu chute, mas o impacto do golpe o joga no corredor. 32

Resultado: Na segunda aplicação do experimento, o software RPG Digital apresentou


melhoras na atualização dos diálogos entre os usuários no RPG play/fórum, possibilitando
rodadas sincrônicas e a inserção de mídias externas. No entanto, chat, mapas, rolagem de dados
3d, totens e imagens de personagens previstos não puderam ser utilizadas. Apesar de alguns
problemas persistirem, a aplicação do experimento não foi impossibilitada de acontecer,
evidenciando a ocorrência do modo de pensar histórico:
a) Significado pessoal: nessa segunda aplicação do experimento, tivemos a
ausência de recursos gráficos como totens, dados em 3d e dos mapas do
Recôncavo baiano, cidade de Salvador, no século XIX, e do quilombo buraco
do tatu. Por esse motivo, adotamos uma narração descritiva, afim de suprir a
ausência dos recursos gráficos. Assim como no experimento anterior, o
conhecimento produzido mostrou-se permeado de significado pessoal.

29
Transcrição do trecho de uma áudioconferência realizada em 15/02/2016, via Skype
30
1d6 – sigla utilizada no RPG para indicar um dado de 6 faces.
31
Transcrição do trecho de uma áudioconferência realizada em 25/01/2016, via Skype
32
Trecho extraído de sessão online da Aventura Bate-folha realizada em 15/02/2016, no software RPG Digital
79

b) Autenticidade: Como consequência de um conhecimento rico em significado


pessoal, a autenticidade ocorreu de modo satisfatório. A adoção de rodadas
sincrônicas possibilitou maior interação entre os partícipes do experimento,
assim como o feedback. A produção de conhecimento autêntico foi observada
durante toda a aplicação online, desde a criação dos personagens até as ações na
aventura. A melhoria na atualização dos diálogos no RPG Play/fórum e a adoção
do Skype contribuíram positivamente para a fluidez das discussões e
deliberações sobre as ações que deveriam ocorrer no jogo.
c) Engajamento para a vida social: A adoção do Skype como ferramenta
complementar e as melhorias na atualização dos diálogos do RPG Digital
possibilitaram uma melhor qualidade nas mediações, feedbacks e interações
entre os estudantes, aumentando o volume de diálogos e trocas de experiências,
resultando numa maior percepção entre conteúdo historiográfico e os seus
impactos na vida social do estudante.
Variáveis cognitivas:
Abordagem de conteúdo: Assim como no primeiro experimento as informações da
aventura foram incorporadas no AVA de modo processual e contínuo, na medida em que a
aventura se desenvolvia:

Mestre: As pessoas não acreditam nem um pouco nas suas palavras, algumas
delas já querem partir na sua direção para “salvar” Hélio. Mas, para sua sorte,
de repente, um velho vestido todo de branco, portando um cajado com uma
ampulheta na ponta, entra na estalagem. Todos olham para ele – você sabe que
aquele homem velho é ninguém menos que o orixá Iroko? –. Ele bate o cajado
no chão e como mágica o tempo passa lentamente para todos, menos para você
33
e Bonani. Ele diz: vá atrás do homem que liberta e constrói.

Estratégias de Resolução: Os diálogos, reflexões e estratégias elaboradas pelos


estudantes, apresentaram um maior volume comparado ao experimento anterior. Isso se deve
pela melhoria do software, a aplicação ter ocorrido toda em ambiente virtual e pela
familiarização dos estudantes envolvidos com o jogo de RPG.

Mestre: Vocês vão até um casarão no centro da cidade próximo a Casa de


Câmara e Cadeia Pública de Cachoeira. Chegando lá, André Rebouças

33
Idem
80

recebem vocês e diz: Meus Amigos, que bom recebê-los. Como havia dito
antes, eu preciso que vocês me paguem o favor que lhe fiz. Na cadeia da cidade
há uma escrava de nome Isaura, que está presa por ter tentado matar
envenenada a senhora que lhe matinha cativa. No entanto, ela possui uma
informação valiosa para nós, que é a localização do Quilombo Buraco do Tatu
que fica próximo à cidade de Salvador, mas ela só passará essa informação se
conseguirmos libertá-la. Eu preciso de vocês para libertá-la.

Ian: Ok! Você me ajudou e eu te devo um favor, mas vou acabar lhe devendo
dois, meu caro. André, eu irei te ajudar independentemente do que meu amigo
disser, mas antes preciso elaborar um plano para retirá-la de lá, se o senhor já
tiver um plano, vai ser muito útil . No entanto, depois que fizermos isso, eu
irei te pedir para me levar até a minha irmã chamada Dziko, que está em
Salvador, em nome de Ogum!!! 34

Resultados: A variável cognitiva foi o critério que apresentou maior evolução


comparado ao experimento anterior. As melhorias realizadas no software, a utilização de um
grupo de estudantes com conhecimento prévio em RPG e os refinamentos realizados no roteiro
impactaram positivamente na variável em análise. Por consequência, os critérios do modo de
pensar histórico apresentaram uma efetividade satisfatória.
Tal resultado nos leva a concluir: 1º) À medida que estudantes participam da modelagem
de campanha, aventuras e jogam essas simulações, o modo de pensar histórico é estimulado e
ampliado a cada simulação. 2º) Uma vez que o roteiro do RPG é modelado sob um design
socioconstrutivista, os estudantes podem ocupar a posição de mestre no jogo (com o auxílio do
professor), porque o modo de pensar histórico não ocorre apenas nas sessões do jogo e com
jogadores/estudantes, mas também para o mestre no período em que o roteiro é modelado, e no
preenchimento da ficha de personagens pelos jogadores/estudantes.
Para ratificar o resultado exposto, destacamos os seguintes trechos:
a) Significado Pessoal:

Mestre: Enquanto vocês discutem sobre o mapa, centenas de pessoas marcham


e gritam palavras de ordem a favor da escravidão e insultos racistas. São
pessoas com tochas, cavalos, e à frente de todos está o Senhor de Engenho
Brandão de Barros liderando todos com seu exército particular. Brandão
ameaça entrar na casa e exige falar com vocês.35

34
Trecho extraído de sessão online da Aventura Bate-folha realizada em 15/02/2016, no software RPG Digital
35
Trecho extraído de sessão online da Aventura Bate-folha realizada em 23/02/2016, no software RPG Digital
81

Victor: “Veio!” Quando a galera chegou na porta da casa de André, me lembrei


das manifestações que estão (tá) rolando em prol do impeachment da
presidente. Conflito entre poder e politicas divergentes... ”36
“Ian: Me lembrou também os discursos racistas que o pessoal faz nas redes
sócias e na mídia. 37

b) Autenticidade:

Kayin nasceu na fazenda do Engenho Brandão. Filho de pai e mãe escravos,


passou boa parte da infância nos canaviais, quando aos seus 10 anos foi
instruído pelo seu pai a fugir para o quilombo, deixando todo aquele
sofrimento para trás. A princípio, não queria deixar seus pais naquele lugar e
partir sozinho naquela jornada rumo ao desconhecido, mas, fazendo jus ao seu
nome - Kaiyin - “Filho célebre” - ele partiu. No quilombo, foi recebido pelo
ancião Folami (Respeito e honra), que o ensinou a usar o arco e flecha, a
zarabatana e os macetes de andar escondido pelas plantações e matar
sorrateiramente. 38

João foi trazido da África ainda pequeno, sua mãe foi lhe deu à luz durante a
invasão da tribo onde morava, foi uma grande catástrofe, muitas pessoas
morreram, inclusive pessoas que faziam parte da sua família. João cresceu, foi
trazido num navio negreiro para a Bahia e escravizado numa das principais
fazendas de cana-de-açúcar da região no Recôncavo baiano.
Ao completar 18 anos, havia aprendido e se tornado mestre em capoeira. Era
um grande guerreiro, o principal articulador e defensor de seu grupo e queria
a liberdade para todos que moravam naquele local, também sabia mexer com
lanças e tinha dotes para caçar.39

c) Engajamento para a vida social:

Filipe: Senhores e Senhoras, nesse momento venho lhes dizer que o Sr.
Brandão acabou de morrer em uma luta contra a nossa resistência em sermos
livres, mas não se espantem, somos pessoas boas que só queremos a nossa
liberdade sem matar ninguém, possuímos as mesmas necessidades físicas,

36
Transcrição do trecho de uma áudioconferência realizada em 23/02/2016, via Skype
37
Idem
38
Trecho extraído da ficha de personagens do estudante Victor
39
Trecho extraído da ficha de personagens do estudante Cesar
82

sendo que todos podem chegar a nossa cor, e porque não termos a liberdade
também?40

Victor: Povo de Cachoeira! Vocês estão vendo aqui uma cena inusitada. Um
senhor de engenho, branco, sendo preso e ameaçado por negros fugidos e tidos
como criminosos. Mas onde está o crime aqui? Este homem é responsável pela
morte e sofrimento de centenas e centenas de pessoas na sua fazenda e nas de
outrem, disseminando a sua ideia escravagista. Nós, negros, não somos
animais que podem ser domesticados ao bel prazer. Somos pessoas, assim
como cada um de vocês. O que estão vendo aqui é apenas um grito de chega.
Não aguentamos mais viver sob este regime que nos inferioriza e mata. Diante
disso, eu vos pergunto: Quem é o criminoso? 41

Cesar: Vocês acham que devemos diminuir o outro pela cor da pele, pela
classe social? Não. Devemos amar uns aos outros, este senhor aqui, meus
amigos, é todo ao contrário do que nós pensamos e acha que a cor da pele
favorece ou diminui alguém. Digo a ele que você deve respeitar o seu
semelhante acima de tudo e, em sinal a todos, digo da minha cor e a minha
raça, e tenho o maior orgulho de ser quem eu sou.” 42

Ian: Todos estão vendo o que está acontecendo, o circo que está sendo feito,
as maldades que estão sendo cometidas, e tudo isso por simplesmente acharem
que há uma raça que é superior a outra, mas, no fim, somos iguais sendo filhos
de Orixás, de Jesus, de Alá, não importa o que está ocorrendo, é um
desrespeito ao direito de vida de qualquer cidadão, estamos nos tornando
animais ou algo pior, mas eu quero que por fim a esse circo. 43

Variáveis sistêmicas:
Sustentabilidade e Escalabilidade: Neste aspecto, prevemos avaliar a possibilidade de
reprodução do experimento com maior número de estudantes e professores. Na segunda
aplicação do experimento, o RPG Digital apresentou melhoras tecnoinformacionais, como a
sustentação de cinco usurários online e a utilização de mídias externas, mas ainda há limitações
que não permitem replicá-lo em escalas maiores do que as que foram utilizadas.
Facilidade de Adoção: Neste aspecto, adotamos o mesmo procedimento do experimento
anterior, realizamos o jogo no site hospedado no Wordpress. De forma similar, demonstrou
factibilidade de replicação para outras unidades escolares e instituições de ensino.
Operabilidade a distância: A segunda aplicação do jogo ocorreu integralmente online
com os estudantes em locais físicos diferentes e distantes uns dos outros dando-nos condição
de avaliar a efetividade da aplicação pedagógica quando realizada a distância. Apesar dos

40
Trecho extraído de sessão online da Aventura Bate-folha realizada em 23/02/2016, no software RPG Digital
41
Idem
42
Idem
43
Idem
83

problemas sistêmicos apontados anteriormente, o software RPG Digital apresentou


operabilidade adequada para realização de jogos de RPG a distância.
Resultado: Comparado ao primeiro experimento, o software RPG Digital apresentou
melhorias significativas, dando-nos condições de comprovar que o método do modo de pensar
histórico pode ser aplicado na relação ensino-aprendizagem a distância, utilizando o RPG em
plataformas virtuais, modeladas a partir de um design socioconstrutivista.
Conforme observado no experimento anterior, para cada jogo modelado um site próprio
é desenvolvido. Este aspecto não alterou as diretrizes para a aplicação do experimento, tal fato
pôde ser novamente notado quando concomitante à aplicação do jogo RPG Liberdade, dois
experimentos (RPG PMBA44 e RPG Tibete45) estavam sendo aplicado no sistema RPG Digital,
e, mais uma vez, não notamos nenhuma intercorrência negativa para nenhum dos experimentos.

6.4 ELEMENTOS DE REDESIGN PARA O RPG DIGITAL

A partir das observações realizadas nas duas aplicações, listamos alguns aspectos para
o redesign do próximo experimento, a saber:
1. Implementar melhorias na funcionalidade nas mídias internas e externas, para utilização
dos mapas, totens e outros recursos gráficos, visando potencializar o processo de
aprendizagem dos participantes, através destes recursos complementares.
2. Incorporar recursos que possibilitem diálogos fluidos, dinâmicos e interativos como
chat, audioconferência e/ou videoconferência, pois foi observado que as variáveis:
estimulo a reflexão, interação, feedback e todas as categorias da variável independente
ocorreram com maior efetividade quando agregamos o WhatsApp e o Skype durante
aplicação do experimento, a fim de suprir a deficiência sistêmica que o RPG Digital
apresentou nesse critério.
3. Criar uma comunicação de resposta sincrônica na rolagem de dados 3D com o RPG
Play.
4. Ajustar o sistema operacional para utilização com um maior número de participantes
por experimento, visando a melhora da variável escalabilidade e sustentabilidade.

44
Experimento desenvolvido pelo Doutoranda Josete Bispo Ribeiro, parte da tese Rede de Aprendizagem
Colaborativa para Difusão do Conhecimento em Direitos Humanos.
45
Experimento desenvolvido pelo Mestranda Caroline Alcantara Duarte, parte da dissertação A aplicação do jogo
RPG DIGITAL no Combate ao Trabalho Infantil
84

5. Modelar o RPG Digital de forma que seja possível acessá-lo em plataforma mobile
visando melhorar as variáveis facilidade de adoção e operabilidade a distância.
6. Inserir uma Wiki e outro plug-ins de forma que RPG Digital, não seja apenas um
software para aplicação de jogo, mas para roteirização e produção de outros jogos de
RPG.

6.5 ANÁLISE GERAL DOS RESULTADOS

Após analisar os resultados obtidos na aplicação do experimento com dois grupos de


estudantes, chegamos à conclusão que o RPG em plataformas virtuais é um importante
instrumento pedagógico para uma proposta ensino-aprendizagem pautada no discente,
contrapondo-se ao modelo tradicional de ensino centrado no docente, conforme discutimos no
Capítulo III.
Pesquisadores como MATTA (2006) e CABALERO (2007) comprovaram que o RPG
presencial estimula uma produção colaborativa do conhecimento, isso se deve ao fato do RPG
ser um jogo de interpretação, uma simulação, na qual os jogadores mergulham num contexto
diferente da “vida real” e devem agir conforme as regras que norteiam o contexto do jogo.
O desafio para essa pesquisa foi transportar essas características do RPG presencial para
o AVA – ambiente virtual de aprendizagem – assim como potencializar e aprimorar as
características de simulação e colaboração com o socioconstrutivismo e o modo de pensar
histórico. Diante dos resultados apresentados, acreditamos que atendemos a contento ao
propósito.
Enquanto realizávamos a análise das variáveis, chegamos a importantes conclusões de
como o RPG virtual é eficiente para o modo de pensar histórico e o socioconstrutivismo.
Destacamos aqui alguns pontos importantes: 1º O Design Cognitivo socioconstrutista como
arquitetura do jogo; 2º Sistema de regras e roteirização contextualizada; 3º O pensar histórico
inicia-se na ficha de personagens, campanha e amplia-se na aventura; 4º O RPG é uma
simulação critico-reflexiva.
1º O design cognitivo socioconstrutista como arquitetura do jogo:
Para que o ambiente virtual de aprendizagem, no nosso caso o RPG Digital, funcionasse
como esperado utilizamos o design cognitivo socioconstrutista (Capítulo III) como parâmetro
de modelagem do AVA. Os elementos interação, interatividade, contextualidade, mediação,
metacognição, inserção de conteúdo e colaboração (quadro 8), foram criteriosamente
85

considerados durante a modelagem, se fosse o contrário, dificilmente teríamos obtidos os


resultados apresentados.
Foi a partir do design cognitivo que potencializamos o caráter colaborativo do RPG; o
modo que o conteúdo foi inserido no jogo, objetivando os indicadores do pensar histórico
(quadro 7); a mediação que contribuísse na interação e interatividade dos envolvidos no
experimento, e, por fim, a contextualidade, que foi alinhada entre os elementos do RPG (mestre,
jogador, sistema de regras, campanha/aventura/conteúdo historiográfico).
2º Sistema de regras e roteirização contextualizada:
Uma vez definido o design cognitivo, partimos para roteirização da campanha “RPG
Liberdade”. As discussões apontadas no Capítulo II (Contexto) e no Capítulo V (metodologia)
foram os alicerces do jogo. O contexto histórico desenvolvido no Capítulo II converte-se em
conteúdo para a roteirização da campanha, aventura e sistema de regras. A abordagem
metodológica DBR traz para o jogo as dimensões de contextualidade (experiencial,
comunitário, informacional, institucional) dos envolvidos na pesquisa.
Quando se inicia a modelagem de um RPG, o primeiro ponto que se considera é o tema
do jogo, no nosso caso, a abolição da escravidão. Para isso, contextualizamos o tema
considerando os elementos influentes para entendimento da abolição da escravidão no Brasil e
na Bahia. Sem a criação de um contexto prévio do tema, a roteirização da campanha e a aventura
não teriam a fidelidade histórica necessária para ocorrência do modo de pensar histórico.
Além da inserção do contexto histórico no jogo, percebemos a necessidade de inserir o
contexto dos estudantes para que as categorias do modo de pensar histórico (significado pessoal,
autenticidade, engajamento para a vida social) pudessem ser desenvolvidas. As oficinas e
encontros com os estudantes e professores foram fundamentais para o levantamento desse
contexto.
Ao fim do processo de roteirização e aplicação do RPG Liberdade, percebemos que as
a aventuras produzidas em parceria com os estudantes poderia se tornar um texto pedagógico,
autêntico, carregado de valor pessoal e contextualizado à realidade, uma vez que os próprios
estudantes foram coautores desses textos.
Diante dos resultados obtidos da variável sistêmica, a possibilidade do software RPG
Digital ser aplicado com estudante e professores de diferentes estados e países é uma realidade.
Como exemplo, no futuro poderemos ter estudantes e professores brasileiros e angolanos
escrevendo um jogo de RPG sobre tráfico negreiro entre os dois países.
Outro ponto importante que percebemos ao longo da pesquisa, é a necessidade de o
sistema de regras ser contextualizado. Em nossa pesquisa, criamos um sistema de regras
86

acessível aos estudantes que nunca tiveram contato com o RPG, bem como atendendo à
jogabilidade mais desenvolta daqueles que são familiarizados com o jogo. A criação de regras
mais flexíveis e acessíveis foi fundamental para que o Grupo A de estudantes pudessem se
familiarizar com o RPG e o Grupo B, composto por estudantes com conhecimento prévio do
jogo, não achasse as regras simplórias.
O contexto histórico nos forneceu elementos para a criação de classes, personagens,
mapas, elaboração dos atributos dos personagens, por exemplo:
 Personagem Brandão de Barros – Classe: Senhor de Engenho; Vantagens:
intimidação, negociação, conhecimento de território. Desvantagens: corrupto,
escravista, má fama; Atributos importantes: Cognição, Percepção, Carisma.
3º O pensar histórico inicia-se na ficha de personagens, campanha e amplia-se na
aventura:
Antes de iniciarmos a aplicação do experimento imaginávamos que o pensar histórico
se desenvolvia quando os estudantes começavam a jogar a aventura, mas ao analisar os dados,
percebemos que a partir do preenchimento da ficha de personagens os estudantes já
apresentavam características do pensar histórico.
Durante o preenchimento da ficha, os estudantes criam os personagens e pensam como
eles estão inseridos no contexto histórico simulado. Dentre as diversas categorias presentes na
ficha, há uma que nos chama a atenção, a background ou conceito. Nesta categoria, os
estudantes escrevem a história pretérita do personagem e as suas motivações dentro do jogo.
Sem exceções os estudantes realizaram pesquisas históricas e criaram histórias onde destacam-
se temas como etnias, gênero, direitos humanos, tráfico negreiro, resistência escrava,
religiosidade e as condições de sobrevivência dos escravizados.
Essas histórias apresentavam autenticidade, significado pessoal, e em alguns casos,
engajamento para vida social. Tudo isso foi adicionado ao roteiro do jogo, e o resultado foi um
engajamento maior dos estudantes no experimento.
Além da background a escolha das classes, a priorização de determinados atributos e a
criação das vantagens e desvantagem contribuíram positivamente para o pensar histórico.
4º O RPG Digital é uma simulação critico-reflexiva:
Ao iniciarmos as pesquisas, não tínhamos uma noção muito clara da capacidade crítica-
reflexiva do RPG aplicado em ambiente virtual. Era sabido que o RPG em modalidade
presencial já apresentava essas características, devido a capacidade de interação e interpretação
dos personagens pelos participantes do jogo, mas como seria possível transportar essa dinâmica
para o ambiente virtual de aprendizagem?
87

Primeira tarefa a ser realizada era a criação de software que possibilitasse transportar a
jogabilidade do RPG presencial para o ambiente virtual. A princípio, poderíamos utilizar um
dos diversos software de RPG via internet, mas muitos destes exigiam dos usuários um
conhecimento prévio de RPG, portanto não atendendo à realidade das comunidades escolares
da Bahia; a licença de uso e o fator mais importante não possuíam um design cognitivo que
atendesse ao socioconstrutivismo e ao modo de pesar histórico. Diante de tal cenário, o grupo
de pesquisa Sociedade em rede, pluralidade cultural e conteúdos digitais educacionais
empreendeu esforços para desenvolver o software RPG Digital modelado a partir de princípios
vygotskyanos.
Mesmo estando em faze de aperfeiçoamento, o RPG Digital conseguiu transportar para
o ambiente virtual a dinâmica de jogo do RPG presencial. Esse resultado pode ser percebido
nesta pesquisa e na de Josete Bispo 46.
Após a criação do software RPG Digital, a roteirização do jogo foi iniciada junto com
os estudantes, e durante a aplicação do jogo percebemos que o pensar histórico se desenvolvia.
A campanha Liberdade aplicada no RPG Digital não se restringiu a apenas uma
simulação, ou um retrato temporal da abolição. Isso pode ser comprovado quando os estudantes
dentro do jogo mostraram um comportamento crítico-reflexivo sobre a temática simulada.
Diversas vezes durante o experimento, os estudantes apresentavam problemas e soluções que
durante a elaboração do roteiro não conseguimos prever, dando assim um caráter muito
particular a cada aventura. Ao final de cada sessão, a relação simulação/aventura com a
realidade social do estudante era pertinente nos diálogos entre eles com os pesquisadores.
Por fim, conseguimos vislumbrar o quão possível é desenvolver um pensar histórico
com utilização de RPG em ambientes virtuais de aprendizagem.

7 CONCLUSÃO

Essa pesquisa foi realizada com o intuito de investigar as potencialidades que o jogo de
RPG em plataforma virtual oferece quando utilizado na mediação do ensino do da abolição da
escravidão, por conseguinte, o ensino de História. Tal reflexão suscitou o problema de pesquisa:
Qual solução pedagógica de jogo RPG digital pode ser desenvolvida para o
ensino/aprendizagem da História da abolição da escravatura?
Através da pesquisa de Cabalero (2007), sabíamos que o RPG presencial possui
caraterísticas pedagógicas de cooperação, interdisciplinaridade, socialização. Era preciso

46
Rede de Aprendizagem Colaborativa para Difusão do Conhecimento em Direitos Humanos
88

desenvolver um Ambiente virtual de aprendizagem que tais características pudessem ser


reproduzidas. Para atender esse critério e responder ao problema da pesquisa, dedicamo-nos a
modelar o jogo RPG Liberdade, atendendo aos princípios elementares do socioconstrutivismo
e do modo de pensar histórico.
Por adotarmos a DBR como abordagem metodológica, a modelagem do jogo deu-se a
partir da constante interação entre pesquisadores e sujeitos engajados na pesquisa, estudantes
secundaristas. A construção colaborativa da pesquisa entre os participes contribuiu para que o
experimento proposto fosse dotado de um caráter socioconsturivista. Durante o processo de
pesquisa foram realizados encontros e oficinas para que as mutuas contribuições fossem
trocadas entre pesquisadores e estudantes
Em torno do problema central, haviam outras que a circundavam como: 1) Como
compreender o contexto da abolição da escravidão que será simulado no jogo de RPG? 2) Qual
teoria pedagógica melhor se adequa à temática?
Com o intuito de responder as problemáticas objetivamos a pesquisa do seguinte modo:
1) desenvolver uma interpretação sócio-histórico-cultural sobre a abolição da escravidão; 2)
conceituar o lastro teórico que norteará a modelagem do jogo de RPG; 3) modelar e validar,
junto com estudante e professores um jogo de RPG que contribua na relação ensino-
aprendizagem sobre a abolição da escravidão.
A primeira fase da pesquisa foi o contexto e a reflexão crítica sócio-histórico-cultural
da abolição da escravidão, pois permitiram tanto aos pesquisadores quanto aos sujeitos
envolvidos assumirem posturas mais ativas no processo de aprendizagem, fator que certamente
contribuiu para as bases do modo de pensar histórico e do socioconstrutivismo, resultando numa
compreensão histórica autentica e colaborativa.
A contextualização não só converteu-se em conteúdo pedagógico para o jogo, assim
como, forneceu elementos para a roteirização do jogo: cenário, classes, etnias, personagens e
sistema de regras.
Além do contexto, podemos afirmar que as problemáticas sobre as possíveis
contribuições do RPG Digital enquanto ambiente virtual de aprendizagens colaborativo e o tipo
modelagem que atendesse esse critério, foram respondidas, na medida que utilizamos a
praxiológia, cujo método dialoga com os sujeitos e pesquisadores. Assim, com base no contexto
e a validação do grupo de estudantes e professores, modelamos o ambiente lastreado pelo
socioconstrutivismo e o modo de pensar histórico
A partir dos elementos discutidos na contextualização e na fundamentação teórica
realizamos encontros com os estudantes e professores, onde pudemos levantar o contexto social
89

dos estudantes e perceber que as tensões sociais elencadas tinham suas raízes históricas no
processo de escravidão e modelo de abolição adotado. A identificação da gênese histórica das
tensões sociais era fato esperado, pois as comunidades em que as escolas e estudantes residiam
viam de uma formação quilombola e composta por uma população culturalmente influenciada
pela ancestralidade africana.
Concomitante a roteirização do jogo, iniciamos o desenvolvimento do software RPG
Digital. A necessidade de criar o RPG Digital surgiu do momento em que os softwares
pesquisados não apresentavam características de espaços colaborativos para aprendizagem,
possuíam licença de uso ou a sua complexidade operacional não se adequava ao contexto
escolar baiano. Mesmo sendo utilizado a versão beta do RPG Digital, o software apresentou
potencialidades que tornou possível responder à questão central dessa pesquisa.
Os resultados da pesquisa mostraram que a modelagem de jogo digital de RPG lastreado
pelo socioconstrutivismo contribui para modo de pensar histórico. Todos os estudantes
envolvidos na pesquisa apresentaram características do historiador (atitude, metodologia e
linguagem).
Durante a análise dos resultados percebemos que a utilização do RPG digital resulta
num amadurecimento gradativo do modo de pensar histórico. Cada etapa do jogo desde a
preparação até a simulação das aventuras, desenvolve estancias do pensar histórico. Durante a
criação dos personagens, os estudantes são levados a resgatar o seu contexto social e o
conhecimento histórico presentes em sua memória sobre o tema, ainda nessa etapa há o estimulo
a características do historiador: 1) atitude: a vontade de jogar o jogo, o engajamento para
vivenciar o contexto simulado; 2) metodologia: pesquisar conteúdos históricos e criticar as
fontes relacionadas ao tema, para construir a background do personagem; 3) formulação de
hipóteses, interpretações e conclusões: é perceptível quando os estudantes escrevem sobre a
história de vida do personagem. Podemos deduzir que nessa fase ocorre a primeira imersão no
contexto simulado na aventura.
Se na primeira etapa, “preparação para o jogo”, o estudante normalmente cria sozinho
o seu personagem, na segunda etapa, “simulação da aventura”, a relação colaborativa entre
mestre e jogadores somado AVA – RPG Digital ocorre uma potencialização do modo de pensar
histórico, resultando numa relação ensino-aprendizagem rica de significado pessoal, autentico
e engajado para a vida social.
Por último temos a terceira etapa, “pós-jogo”, foi observado em um dos grupos de
estudantes que o modo de pensar histórico, sobre tudo na categoria engajamento para a vida
social, se estendeu após o jogo. Os estudantes por inciativa própria começaram a roteirizar uma
90

terceira aventura e joga-la e um estudante passou a “mestrar” a continuação do jogo e utilizou


a história do seu personagem para escrever contos sobre a escravidão.
Para efeito, conclui-se que a adoção da abordagem metodológica DBR, que valoriza o
contexto e o diálogo entre os envolvidos, bem como a forma cíclica de aplicações a fim de
responder ao problema de pesquisa, ofereceu qualidade para o desenvolvimento do estudo e os
resultados apresentados.
Finalmente, encerro este estudo com um sentimento de satisfação pelos resultados
obtidos juntos aos estudantes, professores e pesquisadores. Constatamos que é possível
desenvolver um ensino de História critico, engajado e colaborativo em ambientes virtuais de
aprendizagem, antagonizando com as práticas docentes centradas no docente que tem como
consequência um empobrecimento da relação ensino-aprendizagem.
Finalizo com meus sinceros agradecimentos a todos os envolvidos neste estudo. As
tenções e discursões foram todas objetivando uma pesquisa que contribua para uma melhora
nas práticas de ensino. Ressaltamos que a pesquisa prossegue para além do estudo aqui
apresentado. É evidente que essa dissertação não intencionou esgotar a temática abordada, mas
desdobrasse em futuros estudos que visem à resolução de problemas práticos de educação.
91

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ANEXO A
96

CAMPANHA LIBERDADE

“Era um sonho dantesco... o tombadilho


Que das luzernas avermelha o brilho.
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros... estalar de açoite...
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar...”
(Navio Negreiro - Castro Alves)

Após milênios de complexos jogos de captura, tráfico e justificativa da escravidão, no


final século XIX o sistema escravista no Brasil chega ao seu limiar de existência legal,
impulsionado por lutas internas e pressões internacionais.
A história da abolição da escravidão no Brasil é escrita com astúcia, sangue e suor.
Nenhum país importou e reproduziu tantos escravos como Brasil, entre os séculos XV e XIX
foram aproximadamente 3.650.000 africanos escravizados. Eram homens e mulheres de
diversas nações: Bantos, Nagôs, Jejes, Malês escravizados, nascidos no Brasil que lutaram por
sua liberdade. Desde o século XVI até XIX não houve um momento de subserviência
espontânea e pacífica no Brasil escravista; fugas, sabotagens, suicídios, assassinatos foram
algumas das muitas formas de resistência que construíram a inevitabilidade do fim do sistema
escravista.
No século XIX, Salvador era uma cidade majoritariamente negra, o reflexo das diversas
culturas africanas era espelhada em cada rua e viela da cidade, dos sobrados às mansardas a
africanidade estava presente. Uma pseudo tranquilidade regada a hipocrisia velava o clima de
tensão social. Todas esperavam quando um novo levante de escravos iria acontecer, quando um
terreiro seria invadido, uma sociedade abolicionista seria depredada, um dono de escravo seria
encontrado morto. Nos jornais, sobretudo, os abolicionistas, a manchete era sempre uma
denúncia de maus tratos a um escravo, compra de alforriais, incitação a revoltas e crítica ao
governo sobre a manutenção da escravidão.
A modernidade avançava sobre Salvador no século XIX, mudando não somente
arquitetura da cidade, como também suas relações sociais, e o reconhecimento legal da
escravidão era um ponto divergente como a emergente classe dominante burguesa.
Os escravistas sabiam que o fim da escravidão era inevitável, mas era preciso retardá-la
o máximo possível, do outro lado a população escravizada não suportava mais um dia
subjugação. No meio desse cenário, estava um grupo de escravos guiados por Obá, uma escrava
97

anciã com profundos conhecimentos místicos e que no passado havia sido uma grande guerreira
do Império Edo. Esses jovens terão a missão de conquistar a sua liberdade e a liberdade do povo
escravizado.
Liberdade é um jogo que se propõe a resgatar, refletir, vivenciar e valorizar as inúmeras
lutas dos negros e negras que resistiram e conseguiram pôr um fim na escravidão.
A campanha é composta de três aventuras. A primeira aventura acontece no século XIX,
em Santiago do Iguape-BA. Na aventura, os jogadores presenciam um grupo escravizado sendo
açoitado na praça do Engenho Santa Maria por tentar uma fuga. Nessa aventura os PJ’s deverão
organizar e participar da fuga de um grupo de escravizado.
Na segunda aventura os PJ’s viajam para os arredores de Salvador e são integrados como
membros do Quilombo Bate-folha, lá eles irão organizar emboscadas, fugas e estabelecer
alianças com outros quilombos e abolicionistas. Nesse estágio os desafios são maiores, o Líder
quilombola convence a todos que é necessário tomar a cidade de Salvador, o plano é audacioso
e envolve muitos perigos.
A terceira aventura inicia-se meses após a Batalha de Santo Antônio Além do Carmo,
os PJ’s ganham notoriedade e respeito entre escravos, libertos, livres e abolicionistas. Mas a
luta pela liberdade continua, o inimigo dessa vez não é um mero senhor de engenho, é o Estado
Imperial. Nessa aventura os PJ’s são convidados por André Rebouças e Joaquim Nabuco a
assumirem a liderança da Sociedade Brasileira Contra a Escravidão na Bahia e elaborarem um
projeto político da abolição e enviar para a câmara de Salvador, mas para isso os PJ’s vão se
deparar com um novo campo de batalha, a política. Apesar de a Lei Áurea ter sido assinada, a
liberdade do povo negro não veio junto com ela, e a luta dos PJ’s pela Liberdade continuaria
pelos séculos vindouros.
98

ANEXO B

Roteiro da aventura 1 – Recôncavo Rebelde


Ao longo de três séculos o Recôncavo da Bahia foi um dos locais que mais concentrou
escravos na América, devido a sua função na economia nacional e mundial como
agroexportador dos derivados da cana-de-açúcar e do fumo.
A demanda cada vez maior por mão de obra escrava faz com que o recôncavo desponte
no século XIX como o maior importador de africanos do mundo. As cidades de Santo Amaro,
São Francisco do Conde e Cachoeira se destacavam entre os maiores produtoras de açúcar da
América. Estas cidades formavam a chamada “zona canavieira”, que através das fazendas da
cana-de-açúcar e dos engenhos ganharam destaque internacional. Os engenhos não somente
produziam o açúcar, mas também formavam povoados e atraíam numerosa população, que
trabalhava direta ou indiretamente na economia açucareira.
Cravado no coração do recôncavo estava a freguesia de Santiago do Iguape,
concentrando os maiores engenhos da Bahia e do Brasil do século XIX, ao todo eram 21
engenhos com a média 121 escravos cada.
No ano de 1835, Santiago do Iguape possuía uma população de total de 7.410 habitantes,
sendo que 3.982 (54%) eram escravos. Parafraseando o João Reis “onde houve escravidão,
houve resistência”, e Santiago do Iguape era uma bomba relógio preste e explodir.
Parte 1 – O mercado de escravos
Informação para os PJ
Após um mês de viagem no navio negreiro, os que sobreviveram chegam a seu destino,
Santiago do Iguape. As lembranças dos horrores vividos no navio durante a travessia ainda
estão acesas na mente de vocês. A família, os amigos, a terra natal, tudo parece lembranças de
vidas passadas.
O que lhes restam é o futuro incerto, o que lhes restam é sobreviver!
Vocês desembarcam na Cidade de Cachoeira. Do tumbeiro vocês são levados para um
mercado próximo ao porto onde há também outros africanos Bantos, Jejes, Nagôs.... Vocês
ficam enfileirados dentro de uma tenda e acorrentados pelas mãos e pés. Senhores de engenhos,
capangas, comerciantes, outros escravos passam pela tenda olhando para vocês.
Dica para o Mestre: Permita que os PJ’s se apresentem e interajam entre eles.
Ações dos PJ’s Ações do NPC’s
99

Interação com NPC’s Se os PJ’s questionar a um escravizado:


Ele (a) está tão perdido quanto os PJ’s, não
sabe que está no Brasil

Se for algum Capanga: Ele insultará os


PJ’s e ameaçará bater naqueles que o
importunarem novamente.

Se for o mercador: Informará que eles


estão no Brasil e serão vendidos para uma
Fazendeiro ou Comerciante.

Se for qualquer outro Transeunte, irá


ignorar os PJ’s.

Se tentarem fugir ou rebelaram-se No Mercado de escravos há muitos


guardas e capangas garantindo a seguram,
qualquer tentativa de fuga ou rebelião será
frustrada.

Informação para os PJ’s:


Passada algumas horas, aparecem na frente de vocês um grupo de 4 capangas armados
com carabinas e revólveres.
Um deles aparentando ser o líder, aponta para vocês e diz:
- Todos vocês venham comigo.
Outros dois capangas puxam vocês pela corrente. Cercados por homens armados,
acorrentados em uma terra desconhecida, tentar resistir seria inútil. Os capangas colocam vocês
numa carroça gradeada e seguem em direção por uma estrada de barro.
Pouco mais de uma hora de viajando pela estrada de barro, subindo e descendo morro,
vendo a típica vegetação do recôncavo com sua mangueiras, jaqueiras e abacateiros, do alto do
morro é possível ver as plantações de fumo e cana-de-açucar e as chaminés dos engenhos. Ao
entardecer, vocês chegam a Fazenda Engenho Santa Maria, quando descem da carroça, vocês
veem um imenso canavial que chega a tocar o horizonte, galpões e a casa grande. Os capangas
colocam todos num pátio que fica à frente da Casa.
Um dos capangas chama aquele que parece ser o dono da fazenda.
- Senhor Guedes! Senhor Guedes!
100

Em poucos segundos, aparece na varanda da casa um homem branco, de traços


caucasianos, olhos azuis, cabelo encaracolado loiro e de alta estatura. Descendo da sacada muito
cortês ele se apresenta para vocês:
- Sejam bem-vindos à Fazenda Engenho Santa Maria, sejam bem-vindos a Santiago do
Iguape! Imagino que a viagem de vocês foi muito penosa, mas tudo isso ficou para trás. Aqui
vocês vão encontrar um novo futuro, um futuro próspero, para aqueles que forem bons. Se vocês
forem bons, serão bem tratados, se não forem, serão disciplinados. Afinal, estamos numa
sociedade civilizada (risos). Mas deixamos de proselitismo, vocês devem estar morrendo de
fome. Guilhermino levem eles para tomarem um bom banho e depois para o barracão para que
eles possam comer. Ah! Acabei esquecendo de me apresentar, eu sou Senhor Pedro Rodrigues
Guedes e, a partir de agora, vocês servem a mim.
Guilhermino levará vocês até o local do banho no meio do mato. Cercado ainda pelos
capangas o banho não demora muito e vocês vestem as roupas que estavam juntas com os
baldes.
Em pouco tempo, vocês estão no Barracão uma mesa farta está diante de vocês, uma
moqueca de beijupirá está na mesa, frutas diversas também estão à disposição de vocês.
Ação dos PJ’s
DM: Num dado momento, introduza Guedes na cena.
Informação para os PJ’s
- Agora sim! Até que após um banho decente vocês pretos ficam parecidos com gente
(risos). Estão gostando do jantar. Como eu disse se vocês forem bons eu também serei generoso.
Mas qual é o nome de vocês?
Ação dos PJ’s
DM: Quando os PJ’s começarem a dizer o nome deles, Guedes irá interrompe-lo e dirá:
-Seu nome não é mais esse. O seu nome agora é (nome latino) Santos dos Guedes.
Ação dos Pj’s Ação de Guedes e outros NPC’s

Se os Pj’s perguntarem o que eles fazem Os Pj’s foram comprados para trabalha na
na aquela fazenda lavoura de cana-de-açúcar.

Se Pj’s quiserem ir embora Guedes argumentará que na fazenda os


Pj’s terão tudo que precisam e que é
impossível eles voltarem para a terra, e
101

que dentre os fazendeiros da região ele é o


mais bondoso.

Se os Pj’s tentarem atacar Guedes Serão açoitados no tronco ou pode sofrer


outros castigos

Se os PJ’s perguntarem quando eles serão “Nesse país cada homem tem a liberdade
livres que merece, vejam que agora vocês não
estão mais com as correntes, se forem
comportados poderão ir para a cidade,
terem família. A liberdade vem com
disciplina, trabalho e subserviência. ”

Após o jantar, Guedes pede aos capangas que levem vocês para a senzala.
Parte 2 - A senzala
A senzala é um grande barracão e alguns casebres com homens, mulheres, jovens,
crianças e idosos. Por ser noite alguns trabalhadores do engenho estão dormindo outros estão
reunidos no pátio que fica ao lado da senzala onde grupo de escravos estão tocando um samba
de roda.
Assim que vocês chegam próximo a senzala, Anastácio um jovem fula, se aproxima de
vocês e questiona:
- Olá, eu sou Anastácio, e vocês quem são?
- De onde vocês vieram?
- Vocês já sabem no que vão trabalhar?
Ação dos Jogadores
DM: Permita que os jogadores interajam com os NPC’s e Anastácio. O jovem Anastácio
é um escravo de ganho curioso ele interrogará os PJ’s sobre tudo.

Informação para os PJ’s: Enquanto Anastácio questiona vocês sobre os mais diversos
assuntos, uma escrava idosa com cicatrizes no rosto, se aproxima de vocês. De imediato
Anastácio se cala.
E a senhora olha para vocês e diz:
- Anastácio fala pelos cotovelos! Sejam bem-vindos, meus filhos!
Anastácio vira para um vocês e diz:
102

- Essa é Mãe Obá, é a mais velha entre nós. Ela cuida de cada uma de nós como se
fôssemos os seus filhos. Mãe Obá é única que tem a permissão dos Senhor Guedes para falar e
reverenciar os Orixás.
- Mãe, por que você não vê os destinos deles – Diz Anastácio para Mãe Obá.
- Vocês querem saber? – Questiona Mãe Obá para os PJ’s.
Ação dos Jogadores
DM: Se os Jogadores permitirem, Mãe Obá verá uma grande guerra envolvendo os Pj’s,
mas não sabe quem ganhará a batalha.
Se os Pj’s não quiserem saber do seu destino, todos irão dormir.
Parte 3 – O Engenho
Vocês foram acordados antes do Sol nascer, para trabalhar na colheita da cana. Já se
passam do meio-dia e vocês continuam a colheita. O Sol escaldante de Recôncavo torna o
trabalho ainda mais extenuante. Durante todo o trabalho os capangas armados vigiam vocês.
Por vota das 14h vocês são reunidos a margem de uma estrada de barro para almoçarem.
Um dos capangas pergunta se alguém viu Anastácio. Todos dizem que não, outros escravos
dizem que ele deve ter ido à cidade para fazer alguma compra. Mas o capataz diz que todos os
escravos hoje foram enviados para o canavial e que o Senhor Guedes não autorizou ninguém a
sair da fazenda.
Vocês ouvem alguém sussurrar: Tomará que ele não tenha tentado fugir.
Ação do Jogadores
DM: Enquanto os Pj’s trabalhavam no canavial, Guedes contrata o capitão do mato
Cosme Silva para capturar Anastácio. Ao final da tarde os PJ”s retornam do canavial e Guedes
convoca todos os escravos no pátio que fica em frente à senzala. Ao chegarem lá os PJ’s vêm
Anastácio amarrado ao pelourinho.
Informação para os PJ’s
Vocês veem Anastácio amarrado ao tronco, sendo chicoteado por Guedes, quase sem
força Anastácio mal consegue ficar em pé, o sangue que sai das feridas de sua costa cobre
praticamente todo corpo. Ao fim da tortura Guedes permite que Anastácio seja levado para a
senzala junto com outros escravos.
Guilhermino vira para vocês e diz:
- Por causa do erro de Anastácio hoje não haverá janta, todos vocês voltem para a
senzala.
Ainda desacordado Anastácio é carregado para senzala e entregue aos cuidados de Mãe
Obá.
103

Patrocínio, um escravizado malê, vira para vocês e diz:


- Guedes é o demônio em forma de gente, se permitirmos ele nos matará aos poucos,
seja de trabalho, seja de castigo. Nunca seremos livres aqui. Vejo que vocês são fortes e astutos,
vocês nos ajudariam a sair daqui?
Ação dos Jogadores
DM: Patrocínio mostra o mapa da Fazenda de Santiago do Iguape para os PJ’s. Ele
informa que tem amigos em um quilombo próximo a Salvador e que eles poderão viver lá.
DM: Deixe os Jogadores à vontade para estabelecer a melhor estratégia de fuga da
fazenda.
Informação para os PJ’s
O engenho possui 120 escravos, 80 escravos estão dispostos a lutar, outros 40 não
confiam em vocês ou nos seguidores de Mãe Obá e Patrocínio.
Dos 80 escravos, 70 têm condições de luta, os outros são crianças, idosos e feridos.
Guedes possui 50 capangas armados, liderados por Guilhermino.
Na cidade há 15 guardas.
Ação dos PJ’s
Parte 3: A caminho de Salvador
Informação para os PJ’s
Passaram-se dois meses após a fuga do Engenho Santa Maria. Devido a proeza da fuga
organizada, diversos escravos se rebelaram em outros engenhos. A fama de vocês é conhecida
não somente em Santiago ou Cachoeira, mas também em toda província. Jornais relatam as
fugas ocorridas no recôncavo, os abolicionistas acreditam que vocês podem ser as “vozes da
liberdade”, por outro lado guarda da província tem procurado os escravos fugidos por todo
recôncavo e Salvador.
Patrocínio guia vocês até a estrada das boiadas (atual bairro do Retiro) as margens do
Rio Camarajipe. Do lado direito do rio há veem uma fazenda e algumas freiras dentro dos
casebres, do lado esquerdo está um morro bem íngreme (atual Arraial do Retiro), o rio
Camarajipe segundo informações de Patrocinio ira desaguar na Praia do Chega Nego (atual
Jardim dos namorados) Local de desembarque de diversos navios negreiros que
cladestinamente chegam a Salvador, mesmo após a lei Eusébio de Queiros.
DM: O objetivo para os Pj’s é conseguir levar o grupo ex-escravos para o quilombo
cabula, no entanto a feridos entre vocês, crianças, idosos cansados da viagem. Deixe os PJ’s
elaborarem estratégias para resolução do desafio.
Ação dos PJ’s
104

DM:
 Se os Pj’s escolher seguir pelo rio Camarajipe o encontrarão alguns barcos e
canoas que poderão levar o grupo em seguram para o quilombo Cabula;
 Se os Pj’s escolher subir o morro haverá um grupo de 20 guardas que resultará
num conflito;
 Se os Pj’s escolher ficar no convento as freiras permitiram por apenas uma noite,
mas uma delas ira delatar para o grupo de guardas que o convento está
escondendo escravos fugidos.
Informação para os PJ’s:
Durante a caminhada para o quilombo vocês passam próximo a uma vasta Fazenda de
Laranjas. Fazendas como estás são fontes de abastecimento alimentício de Salvador. A
caminhada prossegue pela mata fechada até que vocês são surpreendidos por um grupo de
quilombolas armados:
- O que vocês querem aqui? Pergunta homem armado com uma lança.
Ação dos PJ’s
Informação para os PJ’s
Após muita luta vocês conseguem chegar ao Quilombo Cabula. O quilombo lembra
muito um arraial, ao entrarem vocês são recebidos como heróis por Nicácia a líder do quilombo.
Ela olha para vocês e diz:
A fama de vocês antecede a sua chegada. Ficamos muito feliz com a presença vocês.
No entanto a luta não acaba aqui. – Continua Nicacia – Quero lhe apresentar um grande amigo
nosso André Rebouças. André tem sido a nossa voz na câmara imperial e articulando ações pró-
abolição na capital do império.
Aproximando de vocês André diz:
- As revoltas promovidas por vocês despertaram bastante interesse dos abolicionistas.
Creio que vocês podem contribuir enormemente para o fim da escravidão. Nós da Sociedade
Brasileira contra a escravidão estamos reunindo diversas propostas de abolição para
encaminharmos em petição para o senado imperial. Será que vocês podem colaborar na
elaboração de uma proposta de Lei que ponha um ponto final da escravatura? A propostas de
vocês será somada a de outros líderes abolicionistas.
Ação dos PJ’s
105

ANEXO C

AVENTURA 2 – BATE-FOLHA

Parte 1 – Fuga de Cachoeira


Após o levante de escravos ocorrido no engelho Santa Clara em Santiago do Iguape, o
recôncavo convulsiona em rebeliões o clima tensão corre como rastilho de pólvora pelas ruas,
vielas, mansardas, sobrados e fazendas. Capangas armados e guardas são vistos em todos os
cantos. O rio Paraguaçu, a ponte D. Pedro II são constantemente vigiados. Não há negro ou
negra livre, liberto ou escravizado que não seja abordado pela guarda ou campanhas.
Em meio a esse clima, uma falsa tranquilidade tenta ser pintada no cotidiano. O
quitandeiro abre sua quitanda, os pescadores vendem seus peixes na feira. Senhoras e jovens
das classes dominantes se deliciam com os quitutes da padaria e do lado de fora escravos
amargam a fome sobre o sol do meio dia. Na câmara da província políticos contra e a favor da
abolição brigam entre si.
No piso inferior a câmara está a delegacia de cachoeira que não comporta mais tantos
presos, são homens e mulheres que tentaram fugir da tirania dos fazendeiros, mas foram
capturados no meio do caminho. A noite os discursos políticos dão lugar ao som do chicote, da
tortura pratica pelos guardas que tentam a qualquer custo saber para onde foram os escravos
que haviam fugidos.
Apesar do aumento da segurança em todo o recôncavo, muitos escravizados encontram-
se escondidos na densa mata atlântica do recôncavo. Muitos conseguem chegar em Salvador,
outros anseiam em vingar a morte de companheiros mortos durante os anos de cativeiros.
Informação para os PJ’s
O Recôncavo está em polvorosa depois que ocorreu um levante de escravos em Santiago
do Iguape. Muitos escravizados conseguiram fugir das fazendas, engenhos e das casas dos
senhores. O Recôncavo que é um dos principais polos de produção de açúcar do Brasil está
sobre constante tensão social, todos sabem que uma revolta pode acontecer a qualquer
momento, sobretudo mediante aos últimos avanços políticos do abolicionista e a adesão de
vários intelectuais e parte da classe burguesa, exercem cada vez mais pressão sobre o governo
para abolir a escravidão. Ao longo de mais de trezentos anos os escravizados não pararam lutar
um momento pela sua liberdade
Passaram-se dias desde que vocês conseguiram fugir do engenho de Brandão de Barros.
Escondido na mata vocês tiveram relativa seguram e alimentos, mas a cada dia capitães-do-
106

mato contratado por fazendeiros adentram a mata na tentativa de capturar escravos. Portanto, a
segurança tem diminuído com o passar do tempo.
Dica do Mestre: Os Pj’s estão entre Maragogipe, São Felix e Cachoeira. O rio
Paraguaçu e estradas são constantemente vigiados por guardas e capangas. A mata é vasculhada
constantemente por capitães-do-mato, com ordem de recuperar escravos.
A cada rodada jogue 1d6 para realizar os seguintes encontros:
1 e 2: Cacheiros viajantes aliados aos abolicionistas: Esses personagens irão ajudar os
PJ’s com informações sobre os acontecimentos nas cidades e aliados abolicionistas próximos.
3 e 4: Capitães-do-mato: Esses personagens não hesitarão em capturar os PJ’s. Os
capitães estão armados com espingardas, faca, cordas e chicote.
5 e 6: Escravos fugidos: Esses personagens forneceram informações quanto a
localização dos PJ’s, caso estejam perdidos, e sobre a presença de capitães-do-mato, guardas e
capangas.
Ação dos PJ’s
Informação para os PJ’s
Vocês ouvem alguém correndo dentro da mata, o som dos passos indica que está indo
na direção de vocês, ao se aproximar vocês identificam que é Nadir, uma escrava que vivia no
de Brandão de Barros. Ela olha para todos e diz:
- Graças a Deus que ocês estão vivos!! Quando eu sair da fazendo o Sr. Brandão tinha
mandado um exército atrás de ocês!
DM: Nadir é uma filha de Oxóssi, e dotada de uma capacidade de rastrear pessoas e
animais, é uma eximia arqueira e possui uma excelente percepção.
Ação dos Pj’s
Informações para os Pj’s
Após o encontro com Nadir, vocês ouvem sons de carruagens e cavalos passando por
uma estrada próxima. Aparentemente são caixeiros viajantes que levam as novidades em
tecnologia, culinária, cosméticos e outros produtos vindos da Europa e do Rio de Janeiro,
capital do Império. Além de vender produtos os Caixeiros viajantes são grandes fontes
informações.
DM.: O grupo de cacheiros viajantes é formado por imigrantes árabes, que vieram para
o Brasil, no final do século XIX e início do XX. Dentre eles estar o NPC Samir, personagem
fictício e aliado dos abolicionistas.
Samir é um grande articulador social e possui uma grande influência nas associações
abolicionistas.
107

Os cacheiros estão indo para cachoeira para vender os seus produtos na cidade, para os
PJ’s chegar na cidade a melhor alternativa misturar-se aos cacheiros para evitar os encontros
com os guardas e capangas.
Informação para os PJ’s:
Samir um homem de meia idade, com forte sotaque Libanês olha para vocês e diz:
- Para onde estão indo meus caros?
Ação dos Pj’s
Informação para os Pj’s
Vocês conseguem chegar em cachoeira, após dias fugindo o cansaço é inevitável,
percebendo isso, Samir leva vocês até um casarão no centro da cidade próximo a Casa de
Câmara e Cadeia Pública de Cachoeira. Chegando lá André Rebolças recebe vocês e diz: -
Caros que bom recebe-los. Saibam que na minha casa vocês são bem-vindos. Em que posso lhe
ajudar?
Ação dos Pj’s
DM.: Se os PJ’s solicitar algum tipo de favor ou queiram apenas passar a noite na casa
ou se alimentar Rebolças pedirá em troca um favor que é a fuga de Anastácia, uma yalorixá
filha de Ogum, presa na cadeia de cachoeira.
Informação para os PJ’s
Meus caros vocês chegam em boa hora, pois preciso de homens e mulheres com as
qualidades que possuem, para conseguir a libertação de Anastácia, que está presa na cadeia da
por ter tentado matar envenenado a senhora-do-engenho que lhe matinha cativa. Eu possuo um
mapa com a localização do Quilombo Buraco do Tato que fica próximo à cidade de Salvador,
mas somente Anastácia com os seus poderes é capaz de decodifica-lo, mas ela só passará essa
informação se conseguimos liberta-la. Eu preciso de vocês para liberta-la!
DM.: Deixem os Pj’s livres para organizar a melhor estratégia para organizar a fuga de
Anastácia.
Ação dos PJ’s
Parte 2 – Em Salvador
Informação para os PJ’s
Vocês atravessam a Bahia de todos os Santos num saveiro. Do mar é possível ver o
intenso movimento de saveristas vendendo o peixe, a farinha e a carne de vinha da ilha de
Itaparica e tantos outros produtos oriundos das fazendas que circundam a cidade. No final do
século XIX Salvador é uma cidade de contrastes, a cidade baixa é carente de urbanização, mal
iluminada, suja, ausência de estruturas sanitárias, povoada pela classe pobre que trabalha no
108

porto, nos trapiches e nas casas comercias. A cidade Alta é o centro da aristocracia baiana, ruas
pavimentas e iluminadas, lojas de alta-costura, cafés, teatros, praças, jardins, casarões, mansões
e prédios do governo compões o cenário luxuoso que antagoniza a cidade baixa.
Vocês desembarcam próximo ao prédio da alfandega. A espera de vocês está Nadir, que
lhes recebem com alegria.
Nadir leva todos para uma hospedaria que na freguesia de Santo Antônio Além do
Carmo. Quitéria a dona da hospedaria recebe todos com satisfação e diz:
- Os quartos de vocês já estão reservados descansem, mais tarde Samir vem ao encontro
de vocês.
DM.: Deixe os PJ’s livres para agir, caso queriam sair pela cidade permita e descreva o
cenário urbano de Salvador na transição do século XIX para o XX.
Ação dos PJ’s
DM.: Quando os PJ’s estiverem na hospedaria de Dona Quiteria, insira os NPC’s Helen
e Hélio, dois escravos que trabalham no trapiche do Senhor Brandão de Barros que foram
ordenados pelo mesmo para matar os PJ’s. Durante a batalha insira o NPC’s Samir e Anastácia
para ajudar na fuga dos PJ’s, para o quilombo buraco do Tatu.
Informação para os PJ’s
Vocês conseguem chegar ao quilombo buraco do tatu (atual região de Itapuã), no entanto
um grupo liderado por Brandão de Barros persegue vocês e ameaça a invadir o quilombo.
Diante de vocês a seguinte cena se apresenta: Centenas de pessoas marcham e gritam
palavras de ordem a favor da escravidão e insultos racistas. São pessoas com tochas, cavalo, e
a frente de todos está o Senhor de Engenho Brandão de Barros liderando todos com seu exército
particular. Brandão ameaça entrar no quilombo para matar e capturas os quilombolas.
Ação dos PJ’s
109

ANEXO D

CLASSES
Amazona

Vantagens: recebe Aparência Inofensiva gratuitamente;


pode comprar Animais por apenas l ponto
Desvantagens: nenhuma
Pontos de Vida e Magia: Rx5
Na luta pelo fim da escravidão, inúmeras mulheres com uma genuína habilidade de combate e
liderança assumiram a frentes de batalhas, protagonizaram fugas e lutaram com todas as forças
contra o seu opressor.
Mulheres com essas grandes habilidades de combate se destacam na história como:
Dandara dos Palmares, eximia capoeirista que junto com seu marido Zumbi dos Palmares
liderou o quilombo e combateu os escravistas.
Aqualtune liderou em 1665, uma força de dez mil homens na Batalha de Mbwila, entre o reino
do Congo e Portugual, derrota foi capturada e enviada para o Brasil como escrava. Nos últimos
meses de gravidez Aqualtune organiza uma fuga para Palmares, levando consigo diversos
escravos.

Arqueiro e Lanceiro
110

Vantagens Arqueiro: PdF+1 (até um máximo de PdF5); pode comprar Tiro Carregável e Tiro
Múltiplo por l ponto cada
Vantagens Lanceiro: Acrescente FA final +1 por Força e PdF (perfuração); pode comprar Tiro
Carregável por l ponto
Desvantagens: nenhuma
Pontos de Vida e Magia: Rx4
O Lanceiro e o Arqueiro é um guerreiro especialista no uso da lança e no arco e flecha. Diversos
escravizados eram habilidosos no tiro de arco ou no manuseio do arco. Muitos adotaram estas
armas serem silenciosas e sorrateiras, ideal para caçadas ou emboscadas e fácil de serem
produzidas artesanalmente.

Capoeirista

Vantagens: recebe Mestre gratuitamente


Desvantagens: deve adotar pelo menos um Código de Honra.
Pontos de Vida e Magia: Rx4
Mandinga, golpes rápidos e mortais essas incríveis habilidade de um capoeirista. Para o
capoeirista seu corpo é melhor máquina de combate e qualquer faca ou lamina torna-se uma
arma mortal.
111

Os capoeiristas aprendem não apenas técnicas de combate, mas também filosofia e religião.
Eles são recebem poderes e proteção do seu Orixá de devoção. Eles cultivam a harmonia entre
a natureza e os homens.

Capanga

Vantagens: recebe Patrono (simpatia de uma senhor de escravos) e Intimidação (de


Manipulação) gratuitamente.
Desvantagens: nenhuma
Pontos de Vida e Magia: Rx5
Truculento e rude essas são duas palavras que descreve um capanga. Responsável por defender
a fazenda ou a casa de um senhor-de-escravo, os Capangas não se preocupam muito com
treinamento — em geral ele acredita que sua força e suas armas são suficientes para resolver
qualquer problema. Para eles, a intimidação chega a ser mais importante que o próprio poder
de luta.

Capitão-do-mato
112

Vantagens: Pode comprar Animais e Sobrevivência por l ponto cada


Desvantagens: deve adquirir Má Fama
Pontos de Vida e Magia: Rx5
O capitão-do-mato era um servidor público ou morador local que capturavam fugitivos para
depois entrega-los aos seus senhores mediante prêmio. Com pouquíssimo prestígio social na
sociedade senhorial, o capitães-do-mato era tido como seus inimigos naturais dos escravizados
e libertos.

Guarda
113

Vantagens: Arena (H+ 2 em sua própria cidade, vila ou aldeia)


Desvantagens: Devoção (redutor de -1 em todas as Características quando está fora de sua
cidade, vila ou aldeia)
Pontos de Vida e Magia: Rx4
O Guarda é dedicado a proteger uma cidade, vilarejo e preservar a ordem. Eles formam as
milícias das grandes cidades e as tropas que defendem. Uma vez que raramente abandonam
seus postos para sair em grandes jornadas, Guardas são pouco indicados como personagens
jogadores.

Guerreiro

Vantagens: pode comprar Sobrevivência por l ponto


Desvantagens: nenhuma
Pontos de Vida e Magia: Rx5
No quilombo, na fazenda, na cidade existiam escravizados, libertos e livres dispostos a pegar
em armas e luta pelo fim da escravidão. Esses homens e mulheres movidos pelo ideal de
liberdade ou por motivos particulares estavam dispostos a dar sua vida por isso.
Na luta pela abolição da escravidão grandes guerreiros se destacaram: Zumbi dos Palmares,
Manuel Balaio, Maria Filipa e outros.

Articulador social
114

Vantagens: Recebe H+l (até um máximo de A5) Pericia em Manipulação


Desvantagens: nenhuma
Pontos de Vida e Magia: Rx4
Castro Alves, André Rebouças, Cipriano Barata, Luíza Mahin todos eles eram exigimos
estrategistas tinha a retorica como sua principal arma. Estratégia e o intelecto aguçado fez do
Articulador Social personagem primordial na luta política pelo fim da escravidão.

Traficante de Escravos

Vantagens: Arena (H + 2 em navios) e Sobrevivência no Mar gratuitamente; pode comprar


Sobrevivência e Crime por apenas l ponto cada
Desvantagens: nenhuma
Pontos de Vida e Magia: Rx4

O tráfico de escravos intercontinental da África remete quarto milênio a.C., quando as


civilizações Querma, Egípcia e Axum inserem na sua organização social o cativo e estabelecem
115

as primeiras rotas de tráfico dentro e fora da África. Desde esse período a figura do traficante
de escravos esteve presente dentro sistema escravista. No Brasil traficante Francisco Félix de
Sousa, o Chachá, destacou como o maior traficante de escravos brasileiro.
Os Traficantes de escravos são treinados não apenas para transportar escravos, tripular e
manejar navios, mas também para lutar a bordo deles. Escalam mastros, balançam-se em
cordas, saltam de um navio para outro. Quando conseguem abordar um navio, dificilmente
podem ser vencidos.

Sacerdotes

Vantagens: recebe Arcano gratuitamente; veja em Poderes Garantidos.


Desvantagens: veja em Obrigações e Restrições
Pontos de Vida e Magia: Rx3
Desde o início da civilização que homens e mulheres se destacam por alimentar uma fé sólida
num ser divino. Este consegue perceber a presença de uma divindade seja no brilho das estrelas,
na tempestade que cai ou na aridez do sertão.
Homens e mulheres com esse dom se denominam como sacerdotes. Possuem habilidades de
luta e realizam feitos que desafiam a ciência. Os sacerdotes se opõem a qualquer pessoa que
tente destruir a sua fé e cumprem a ordem de seus deuses a qualquer custo.

Cada Sacerdote tem também um dos seguintes poderes:


116

• Habilidades Mágicas Ampliadas. Um ponto extra de Focus em qualquer Caminho à sua


escolha, e também Pontos de Magia Extras x l.
• Magia Máxima. O Sacerdote pode, uma vez por dia, lançar uma de suas magias com efeito
e/ou dano máximos, à sua escolha. Essa magia sempre tem efeito total (dano máximo, cura
máxima...) e o alvo recebe uma penalização de -2 em seu teste para resistir.
• Magias Extras. Além das Magias Iniciais, o Sacerdote pode começar com três magias extras
à sua escolha (com aprovação do Mestre). Não é permitido escolher magias raras ou lendárias.
117

ANEXO E

FICHA DE PERSONAGEM

RPG LIBERDADE
Nome do Personagem: Nome de Jogador

Classe

Gênero Idade

Dinheiro

ATRIBUTOS Valor Proficiência Modificador

 Força

 Constituição

 Destreza

 Percepção

 Cognição

 Carisma

Constituição +2 Modificador Total


PONTOS DE VIDA

Vantagens Desvantagens
118

Equipamentos/ itens

Background/Conceito

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