Ivete Aparecida Patias - A Lógica Da Cooperação
Ivete Aparecida Patias - A Lógica Da Cooperação
Ivete Aparecida Patias - A Lógica Da Cooperação
Ijuí (RS)
2010
2
MESTRADO EM DESENVOLVIMENTO
Ijuí/RS
2010
3
Catalogação na Publicação
CDU: 332:631.15
338.436
elaborada por
Banca Examinadora:
Agradecimentos:
Muito Obrigada!
7
RESUMO
Este estudo foi elaborado com a intenção de compreender como foram definidas as estratégias
competitivas do programa de desenvolvimento Pacto Fonte Nova e como ocorre o
desenvolvimento local a partir da percepção dos participantes deste programa. O objetivo
central buscou analisar e compreender o processo de criação e desenvolvimento do Pacto
Fonte Nova e as relações deste empreendimento com o desenvolvimento local e regional. Para
dar suporte a este objetivo se propôs: (1) descrever o processo de criação e evolução do
empreendimento Pacto Fonte Nova a partir da sua estruturação e posicionamento no mercado,
enquanto um modo de produção associativo; (2) analisar e compreender a dinâmica utilizada
pelo empreendimento, seus processos de concepção e implementação das estratégias
organizacionais que definiram a forma de competição e o posicionamento no mercado mais
amplo; (3) avaliar a efetiva contribuição do empreendimento Pacto Fonte Nova no processo
de desenvolvimento local da sua região de inserção, a partir do impacto socioeconômico
proporcionado, com base nas percepções dos agentes envolvidos. A pesquisa se caracteriza
como aplicada, e quanto aos objetivos e fins como descritiva e exploratória. A abordagem
qualitativa norteia a investigação na medida em que a história do programa é constituída a
partir da linguagem de seus atores. Com relação aos procedimentos técnicos, é uma pesquisa
de campo e estudo de caso singular. A investigação ocorreu nas entidades envolvidas com o
Pacto Fonte Nova e nas agroindústrias integrantes deste programa de desenvolvimento local
no município de Crissiumal, Região Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, Brasil. Para a
coleta de dados foram realizadas entrevistas com lideranças políticas, empresários,
produtores, gestores das agroindústrias e da cooperativa Cooper Fonte Nova. Da compreensão
e análise do processo de criação e desenvolvimento do Pacto Fonte Nova, da relação com o
desenvolvimento local e da base teórica utilizada no estudo, conclui-se que este programa de
desenvolvimento partiu de vários segmentos da sociedade local: as entidades, de forma
coletiva e cooperada; que estas entidades buscaram alternativas para uma faixa da população
que estava marginalizada; proporcionou o desenvolvimento endógeno, com a criação de
agroindústrias, gerando benefícios a toda a população, pois houve melhoria em vários setores
do município, dentre elas a da qualidade de vida, manutenção das pessoas no campo, aumento
do trabalho e renda das famílias, diversificação da produção e crescimento socioeconômico.
Estratégias empregadas de forma coletiva por comunidades, utilizando a vocação local,
podem proporcionar bons resultados, como aconteceu no Programa Pacto Fonte Nova.
ABSTRACT
This study was designed with the intent to understand how the competitive strategies of the
development program New Source Pact were defined and how the local development occurs
starting from the perception of the participants of this program. . The main objective sought to
analyze and understand the process of creating and developing the New Source Pact of this
enterprise and the relationships with local and regional development. To support this goal are
proposed: (1) describe the process of creation and evolution of the venture New Source Pact
starting from the structuring and placement on the market as a mode of production
associations; (2) analyze and understand the dynamics used by the enterprise, its processes of
conception and implementation of organizational strategies that defined the form of
competition and positioning in the broader market;(3) evaluate the effective contribution of
the enterprise New Source Pact in the process of local development in their region of
insertion, from the socioeconomic impact proportionate, based on the perceptions of those
involved. The research is characterized as applied, and about goals and purposes as
descriptive and exploratory. The qualitative approach guides the research according as the
history of the program is formed from the language of its performers. Regarding technical
procedures, it is a field research and unique case study. The investigation occurred in the
entities involved with the New Source Pact agribusiness members of the local development
program located in the municipality of Crissiumal, Northwest Region of Rio Grande do Sul,
Brazil. To collect the data interviews were carried out with political leaders, entrepreneurs,
producers, managers of agribusinesses and the cooperative Cooper New Source.
Understanding and analyzing the process of creating and developing the New Source Pact,
from the relationship to local development and the theoretical basis used in the study,
concludes that this development program came from various segments of local society: the
entities, so collective and cooperative, that these entities have sought alternatives to a range of
people who were marginalized, provided the endogenous development with the creation of
agro-industries, generating benefits to the entire population, since there was improvement in
several areas of the city, among them the quality of life, keeping people in the field of labor
and increase family income, diversification of production and socioeconomic
growth. Strategies used collectively by communities, using local calling, can provide good
results, as happened in the Program New Source Pact.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figuras Páginas
1 — As Correntes Explicativas da Vantagem Competitiva ....................................... 32
2 — Três Estratégias Genéricas ................................................................................. 36
3 — A Rede de Valores ............................................................................................. 43
4 — A Dinâmica dos Modelos Produtivos Locais ..................................................... 51
5 — Modelo de Pesquisa ........................................................................................... 67
6 — Fases da Pesquisa ............................................................................................... 70
7 — Localização Geográfica de Crissiumal – RS ...................................................... 72
8 — Selo de Qualidade do Pacto Fonte Nova ............................................................ 75
9 — Entidades Envolvidas no Pacto Fonte Nova ...................................................... 77
10 — Prédio da Cooper Fonte Nova .......................................................................... 114
Quadros Páginas
1 — Descrição do perfil e sigla atribuída aos entrevistados das organizações
pesquisadas ................................................................................................................. 64
2 — Relação de eixos, instituições responsáveis e atividades/produtos relacionados 87
3 — Conjunto das agroindústrias integrantes do Pacto Fonte Nova e associadas
à Cooper Fonte Nova ................................................................................................... 88
4 — Demonstrativo da produção de soja e leite, apurada com base nos relatórios
anuais da Secretaria da Fazenda – DTIF – RS ............................................................. 101
5 — Evolução do emprego formal no município de Crissiumal – RS ......................... 110
6 — PIB per capita (R$) a preços correntes – período de 1997 a 2006 ....................... 111
7 — Valor Adicionado Bruto (VAB) a preços correntes (R$ mil) da agropecuária -
período 1997 a 2006 ..................................................................................................... 111
8 — Valor Adicionado Bruto (VAB) a preços correntes (R$ mil) da indústria -
período 1997 a 2006 ..................................................................................................... 111
9 — Valor Adicionado Bruto (VAB) a preços correntes (R$ mil) dos serviços -
período 1997 a 2006 ..................................................................................................... 111
10 — Valor Adicionado Bruto (VAB) total a preços correntes (R$ mil) - período
1997 a 2006 .................................................................................................................. 112
11 — Síntese do processo de estruturação do Programa de Desenvolvimento Local:
Pacto Fonte Nova ......................................................................................................... 117
11
LISTA DE ABREVIATURAS
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 14
1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO ESTUDO........................................................................... 16
1.1 Tema ...................................................................................................................................16
1.2 Delimitação do Tema ......................................................................................................... 16
1.3 Problema ............................................................................................................................ 16
1.4 Objetivos ............................................................................................................................ 17
1.5 Justificativa ........................................................................................................................ 17
3 METODOLOGIA .............................................................................................................. 58
3.1 Classificação da Pesquisa ................................................................................................. 58
3.1.1 Quanto à natureza .......................................................................................................... 58
3.1.2 Quanto à forma de abordagem ...................................................................................... 59
3.1.3 Quanto aos objetivos da pesquisa ................................................................................. 60
3.1.4 Quanto aos procedimentos técnicos .............................................................................. 62
3.2 Universo da Amostra e Sujeito da Pesquisa ..................................................................... 63
3.3 Método de Coleta e Análise de Dados ............................................................................. 65
3.4 Design da Pesquisa ........................................................................................................... 69
INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas as políticas agrícolas passaram a ser definidas pelo governo
federal, incentivando a monocultura da soja. Milhares de pessoas, então, abandonaram o
interior, resultando no êxodo rural, esse devido também às frustrações de safra, do fim dos
subsídios agrícolas e preços não compensatórios aos custos de produção. Nesse ciclo ficou
evidente, ainda, a destruição do meio ambiente, o aumento da utilização de defensivos
químicos e o uso do solo até a exaustão.
É nesse contexto que o emprego de estratégias competitivas sob a forma de
cooperação e associativismo adquire destaque.
Sob este enfoque, o desenvolvimento local, idealizado a partir de um processo
endógeno, é defendido por estudiosos, pois não há a necessidade de se ter grandes indústrias
ou estar em grandes cidades para que o desenvolvimento ocorra.
Nesse sentido, o presente trabalho busca apresentar como o desenvolvimento local a
partir de um processo endógeno ocorreu em um programa de desenvolvimento, bem como
apresentar a percepção de seus idealizadores e participantes, além de evidenciar estratégias
competitivas sob a ótica da cooperação e associativismo.
Este estudo está estruturado em cinco partes distintas, mas ao mesmo tempo
complementares. A primeira configura-se na contextualização do estudo, com a apresentação
do tema e sua respectiva delimitação, seguida da problematização da pesquisa. Em seguida
são apresentados o objetivo geral e os respectivos objetivos específicos que deram
direcionamento à realização desta investigação. Encerrando a primeira parte, é apresentada a
justificativa da pesquisa.
A segunda parte diz respeito à fundamentação teórica da pesquisa, na qual são
abordados os aspectos conceituais de acordo com a percepção de diversos autores, relativos à
conceituação e processos de formação de estratégias, os modelos de estratégias competitivas,
16
1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO ESTUDO
1.1 Tema
1.3 Problema
1.4 Objetivos
Objetivo Geral
Objetivos Específicos
1.5 Justificativa
2 REFERENCIAL TEÓRICO
Os conceitos de estratégia também são tratados por Whittington (2002), que analisa
estratégia sobre quatro abordagens genéricas, em que fazem parte a Abordagem Clássica,
Evolucionária, Processual e Sistêmica.
Essas quatro abordagens propostas por Whittington (2002) se diferenciam a partir de
duas dimensões que são os resultados da estratégia e os processos que ela utiliza. Quanto aos
resultados, a estratégia pode focar a maximização dos lucros ou obter outros resultados
(plural). Quanto aos processos, a estratégia será medida a partir de cálculos deliberados ou
emergentes, por acidente, confusão ou inércia. Essas duas dimensões abrangem as questões
de serventia da estratégia e como ela é desenvolvida. As abordagens clássica e evolucionária
almejam a maximização do lucro. As abordagens sistêmica e processual objetivam outros
resultados além do lucro, sendo mais pluralistas.
A abordagem clássica se apoia em métodos de planejamento racional, sendo o meio
para obter a lucratividade. Esta abordagem acredita na capacidade dos gerentes em estabelecer
estratégias com a finalidade de maximizar os lucros a partir de um planejamento a longo
prazo. Para que isso aconteça se faz necessária a coleta de informações sobre a organização e
o ambiente externo, que se une a uma análise racional dos planos elaborados. No que tange à
estratégia dos negócios, a abordagem clássica ainda é uma novidade, pois essa disciplina
surgiu nos anos 60 do século 20. A abordagem clássica é representada pelos estudiosos
Michael Porter, Alfred Chandler, Igor Ansoff e Alfred Sloan (apud WHITTINGTON, 2002).
Os mercados estáveis e parcialmente previsíveis são ambientes dessa abordagem, que aposta
nos gerentes, quanto a sua prontidão e capacidade em optar por estratégias de maximização de
lucro, seguindo um planejamento racional a longo prazo.
A segunda abordagem proposta por Whittington (2002), conta com a visão dos
evolucionistas Hannan & Freeman e Willianson (apud WHITTINGTON, 2002), que rejeitam
o planejamento racional e acreditam que os mercados proporcionem a maximização dos
lucros a partir de processos competitivos de seleção natural. Os estudiosos enfatizam que a
adaptação ao ambiente é que faz com que os melhores sobrevivam e os mais fracos fiquem
fora do nicho ecológico.
Nesta perspectiva, as estratégias que se sobressaem em um ambiente são definidas
pelos mercados e não pelos gerentes. Para que as empresas sobrevivam são necessárias
estratégias de diferenciação. Os teóricos evolucionistas acreditam que o sucesso das empresas
é obtido se estiverem no lugar certo e na hora certa, pois elas têm dificuldades em prever e
reagir perante as alterações do ambiente.
25
Whittington (2002) aborda que a inovação e a concorrência são elevadas, portanto essa
abordagem se adapta em mercados imprevisíveis.
Os estudiosos dessa abordagem defendem que as estratégias são muito caras e que os
mercados são muito competitivos e imprevisíveis para nelas investir, portanto os gerentes
devem focar nos custos de transação, de coordenação e de organização. O diferencial são as
iniciativas inovadoras, que, diante do ambiente, irão selecionar as melhores.
Os processualistas não concordam com a supremacia das forças do mercado, apesar de
convirem que a racionalidade do planejamento é imperfeita, assim como os evolucionistas.
Estão entre os estudiosos os processualistas Cyert & March, Mintzberg e Pettigrew (apud
WHITTINGTON, 2002). Eles levam em consideração que as organizações e os mercados são
um fenômeno desordenado, portanto aceitam e trabalham com o mundo da forma como ele se
apresenta.
Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000) propõem a estratégia de forma artesanal,
quando ela ao mesmo tempo em que é formada, também é implementada, o que chamam de
estratégia emergente, ao contrário de enxergar somente o longo prazo.
Whittington (2002) aborda dois princípios processualistas fundamentais: os limites
cognitivos da ação humana e a micropolítica das organizações. O primeiro se refere à
racionalidade limitada das pessoas, o que impede que uma série de fatos seja analisada de
uma só vez, tornando a interpretação do ambiente incompleta. O segundo princípio se reporta
à visão micropolítica das organizações, em que o autor entende que as empresas são coalizões
de indivíduos com objetivos pessoais que barganham entre si, buscando soluções aceitáveis a
todos.
Perante as imperfeições do mundo real, os processualistas podem obter níveis de
desempenho menor que ótimo, pois, ao pesquisar mercados imperfeitos para criar
competências, acreditam que alcançarão o desempenho máximo. Para os processualistas, a
estratégia tem outros objetivos além da maximização dos lucros.
A abordagem sistêmica, a última abordagem estudada por Whittington (2002), tem
como autores-chave Whitley, Granovetter e Whittington. Eles veem a estratégia dentro de um
contexto sociológico. As empresas se diferenciam conforme o sistema econômico e social em
que estão inseridas. Mesmo as grandes empresas permanecem com estilos e imagens locais.
A complexidade da sociedade é que traz uma variedade de recursos e normas de conduta em
que acontecem comportamentos de negócios diferentes. O processo é racional, mas as pessoas
estão envolvidas com os sistemas sociais, buscando não somente o lucro, mas objetivos
pluralísticos.
26
competitividade das economias nacionais como sendo algo mais do que a simples agregação
do desempenho de suas empresas.
O conceito de competitividade sistêmica destes autores ressalta que a competitividade
depende e ao mesmo tempo é também resultado de fatores situados fora do ambiente das
empresas e da estrutura industrial da qual fazem parte, como as infraestruturas, a ordenação
macroeconômica, as características socioeconômicas dos mercados nacionais e o sistema
político-institucional.
Estes autores salientam que a competitividade está fundada em condições sistêmicas
de natureza social dentre as seguintes dimensões: reconhecimento e legitimação política e
social dos objetivos da competitividade; qualidade dos recursos humanos envolvidos nos
processos produtivos e na gestão empresarial; maturidade, respeito e reconhecimento mútuo
entre o trabalho e o capital em relação a negociações trabalhistas; envolvimento amplo e
consciente dos consumidores em relação às exigências de qualidade de produtos.
O conceito de competitividade, de acordo com estes autores, está diretamente ligado à
opção teórica de quem examina o assunto, porém boa parte dos especialistas veem esse tema
como resultado de um fenômeno que está relacionado às características de algumas empresas
ou produtos. “Estas características relacionam-se ao desempenho ou à eficiência técnica dos
processos produtivos adotados pela firma...” (COUTINHO; FERRAZ, 1994, p. 17).
Especialistas visualizam a competitividade diretamente ligada às características
apresentadas por um produto ou uma firma. Estas características referem-se ao desempenho
no mercado ou à eficiência técnica dos processos produtivos que a firma adota.
Para os estudiosos que privilegiam o desempenho, a competitividade é demonstrada na
participação no mercado (market share), obtida por uma empresa ou um conjunto de
empresas, especialmente o montante de suas exportações no total do comércio internacional
da mercadoria em questão. Para os estudiosos que associam a competitividade com a
eficiência, os seus indicadores devem buscar em coeficientes técnicos ou na produtividade dos
fatores, para comparar às melhores práticas verificadas na indústria.
No caso de essas variáveis serem analisadas sob os enfoques citados, a visão sobre o
tema fica muito restrita, pois ele é abordado de uma forma estática, permitindo a análise de
como os indicadores agem em um dado momento, longe de representar a realidade dinâmica
do ambiente. De acordo com Coutinho e Ferraz (1994), se as variáveis de desempenho de
mercado e eficiência técnica forem vistas dinamicamente, elas serão:
31
Sob esse enfoque, o sucesso competitivo, que é resultado das ações estratégicas das
empresas, passa a depender da criação e da renovação das vantagens competitivas por parte
destas que ficam subordinadas à capacidade das empresas em se diferenciar das demais,
agregando valor aos seus produtos e serviços, diferindo-se das outras pelo custo e/ou preço
mais baixo, melhor qualidade, menor lead-time, maior habilidade de servir à clientela, de
acordo com os autores.
As vantagens competitivas demandam tempo para serem alcançadas. Em se tratando
de vantagens associadas à inovação, a análise da competitividade deve considerar a
cumulatividade das vantagens competitivas adquiridas pelas empresas. Coutinho e Ferraz
(1994) afirmam que a empresa deve possuir capacidade para implementar a estratégia, sendo
esta fundada na capacitação técnica e no desempenho da firma no passado, demonstrando-se
capacidade financeira, relações com fornecedores e usuários, diferenciação de seus produtos,
imagem conquistada e grau de concentração do mercado.
O entendimento desses autores é de que as empresas foram criadas no passado e
permanecem no presente com a intenção de sobreviverem no futuro. Para que isso aconteça, é
necessário um conjunto de fatores, subdivididos em:
Fatores internos à empresa – são fatores que estão envolvidos no ambiente interno da
organização, sobretudo relacionados aos níveis de competência e que sofrem influência direta
do processo decisório, podendo ser controlados ou modificados por meio dessas ações. As
áreas contempladas nesta perspectiva são: gestão, tecnologia, produção, qualidade, finanças e
pessoas.
Fatores estruturais – são aqueles ligados ao ambiente externo da organização,
notadamente as variáveis de mercado (demanda e oferta). Nesses fatores, a influência da
empresa é, de certo modo, limitada por questões da concorrência, características dos mercados
consumidores e configuração da própria indústria em que a organização atua, tais como grau
de concentração, escalas de operação e potencialidade de alianças com fornecedores.
Fatores sistêmicos – dizem respeito aos aspectos macroeconômicos, político-
institucionais, regulatórios, infraestruturais, sociais, referentes à dimensão regional e
32
Depende de
1 – Análise Estrutural da Indústria 3 – Processos de Mercado
fatores externos
como mercados
Organização Industrial: Modelo SCP Escola Austríaca
e estrutura da
Análise de Posicionamento (Porter) (Hayek; Schumpeter)
indústria
O tema estratégia vem sendo discutido ao longo dos anos, e nesse período sobressaem-
se duas linhas principais de pensamento estratégico no campo acadêmico e empresarial: a
economia da organização industrial, trabalhada por Porter e a visão baseada em recursos,
representada por estudiosos como Wernerfelt, Dierickx e Cool, Prahalad e Hamel, Grant,
Barney e Peteraf (apud VASCONCELOS; CYRINO, 2000). Essas abordagens possuem uma
vasta publicação e têm como objetivo elaborar e constituir as vantagens competitivas e as
estratégias nas organizações, considerando que cada uma tem uma maneira própria de
alcançar essa elaboração.
Houve uma evolução quanto à definição de fatores que determinam a competitividade
das empresas. A abordagem clássica, representada pelo estudioso Michael Porter, trata da
análise da indústria como um todo, ou posicionamento estratégico, e da transformação desta
em uma estratégia competitiva. Uma outra perspectiva de análise sobre competitividade é a
visão da empresa baseada em recursos (Resource-Based View of the Firm). Esta considera as
empresas como conjuntos de recursos, competências e capacidades, e Vasconcelos e Cyrino
(2000) explicam que os recursos, além de físicos e financeiros, também são intangíveis ou
invisíveis.
A recomendação de mudança de abordagem da análise da indústria para a Visão
Baseada em Recursos é adotada por Teece, Pisano e Shuen (1997), que classificam a análise
da indústria extremamente baseada na experiência militar e, portanto, inviável para ambientes
complexos e sujeitos a mudanças bruscas. Ao adotar a Visão Baseada em Recursos, os autores
acreditam que haverá uma melhor combinação entre eficiência e complexidade e mudanças.
34
Dosi e Coriat (2002) concordam com o exposto anteriormente, ao afirmar que o foco
da análise do posicionamento competitivo foi retirado e recolocado nas estratégias de
aprimoramento das competências. Porter (1996) se defende dessa nova abordagem, alegando
que pode ser enganoso identificar o sucesso em empresas competitivas a partir de pontos
fortes, competências essenciais ou recursos críticos. O próprio autor se contradiz ao criticar a
busca desenfreada por crescimento e pedir serenidade nas decisões. Porter (1996) sugere que
se busquem extensões da estratégia que promovam o sistema de atividades existentes, de tal
forma que surjam serviços que os rivais não consigam combater individualmente, conselho
que parece derivar da Visão Baseada em Recursos.
Collins e Montgomery (1995) elaboraram uma síntese da abordagem RBV (Resource-
Based-View), na qual reúnem diferentes conceitos referentes à teoria que ainda não haviam
sido definidos. Ao mostrarem a importância da influência do ambiente competitivo para o
sucesso da empresa, os autores apresentam a RBV com uma nova visão desta abordagem,
anteriormente direcionada apenas para os recursos da empresa. Os autores esclarecem que a
RBV é uma combinação da análise interna dos fenômenos que acontecem na empresa com a
análise externa da indústria e do ambiente competitivo, e o valor dos recursos é determinado
em função das forças de mercado.
Além dos quatro modelos citados, surge um quinto, no qual as firmas tentam manter
uma posição duradoura e sustentável no mercado, competindo e cooperando
concomitantemente. Este modelo trata das alianças e parcerias que as empresas fazem
procurando melhorar seus resultados. São as estratégias coletivas nas relações
interorganizacionais.
Inúmeras empresas têm aumentado sua competitividade formando redes, alianças e
parcerias, destacam Balestrin e Veschoore (2008). Os autores recomendam reavaliar as teorias
clássicas de estratégia. Na contramão ao paradigma da competição, que é o jogo de soma
zero, o paradigma da cooperação, que significa o jogo de soma positiva, tem como finalidade
adotar estratégias coletivas, formadas por um conjunto de atores, entre eles fornecedores,
concorrentes, clientes, entre outros. Estas estratégias levam à obtenção de objetivos comuns,
tornando aptas as empresas a competirem em instâncias mais elevadas, por meio da
cooperação e de formas associativas de ações empresariais.
O entendimento sobre a competitividade nas organizações é de suma importância
como referencial teórico para a presente dissertação. Serão descritas a seguir, portanto, as
abordagens de forma mais aprofundada, utilizando-se da sistematização feita por Vasconcelos
e Cyrino (2000), que enquadram os quatro modelos de vantagens competitivas sob a ótica dos
35
De acordo com Vasconcelos e Cyrino (2000), este modelo é muito utilizado, tendo
como estudiosos Edward Mason e Joe Bain, que trabalham com a análise SCP (Structure-
Conduct-Performance). O modelo SCP propõe que a performance econômica das firmas é
resultante do comportamento concorrencial a partir da fixação de preços e custos, em que a
estrutura da indústria depende desse comportamento, e da sua inserção no mercado.
Segundo Vasconcelos e Cyrino (2000), Porter destaca-se com trabalhos
neoestruturalistas, empregando o modelo de Mason e Bain para gerar um novo conceito de
formulação de estratégia, posto que o poder dos monopólios favorece a empresa. A indústria é
a unidade de análise, e não a firma individual. Porter defende que o sucesso ou fracasso da
firma, no cenário competitivo, irá depender de seu posicionamento dentro da estrutura
industrial. A estratégia tem como objetivo posicionar a empresa dentro do seu ambiente e da
sua indústria, e, ao mesmo tempo, proteger a firma das forças competitivas. Os monopólios e
os oligopólios, portanto, são o que os pesquisadores da economia industrial consideram mais
importantes.
O modelo de racionalidade das teorias da economia industrial é semelhante ao da
economia neoclássica, considerando que:
de negociação dos fornecedores. Este conjunto de forças é que determina o potencial de lucro
final na indústria.
As particularidades de cada uma dessas forças podem explicar porque as empresas
optam por determinada estratégia. Segundo Mintzberg e Quinn (2001), Porter entende que o
desempenho de uma empresa está relacionado à estrutura de seu setor de atividade e ao seu
posicionamento nele, uma vez que as empresas precisam fazer uma opção para adquirir
vantagem competitiva.
Porter (1986) afirma que para a empresa obter o retorno sobre o investimento maior,
enfrentar com sucesso as cinco forças competitivas e superar as outras empresas em uma
indústria, são necessárias três abordagens estratégicas genéricas: liderança no custo total,
diferenciação e enfoque.
Essas estratégias são descritas a seguir, a partir da visão de Porter (1986):
— Liderança no custo total: esta estratégia visa a atingir a liderança no custo total em uma
indústria. A estratégia de liderança no custo total consiste na construção de instalações em
escala eficiente, redução de custos pela experiência, controle rígido de custos e despesas
gerais, não admitir a formação de contas marginais dos clientes, minimização em áreas como
P & D, assistência, força de vendas e publicidade, lembrando que a qualidade e a assistência
não devem ser ignoradas.
— Diferenciação: esta estratégia envolve o desenvolvimento de produtos ou serviços únicos
no âmbito de toda a indústria, com base na lealdade à marca por parte dos consumidores. A
diferenciação apresenta margens maiores, fazendo com que a empresa possa lidar melhor com
os fornecedores e com os compradores; estes últimos não possuem alternativas comparáveis.
— Enfoque: parte-se do pressuposto de que a empresa atende seu alvo estratégico estreito, de
forma mais efetiva e eficiente do que seus concorrentes. A partir disso, a empresa atinge a
diferenciação ao satisfazer as necessidades do seu alvo ou obtém custos mais baixos, ou
ambos. A Figura 2 apresenta essa noção de vantagem estratégica.
37
Vantagem Estratégica
No âmbito de toda
a Indústria
DIFERENCIAÇÃO LIDERANÇA NO CUSTO
TOTAL
ALVO ESTRATÉGICO
ENFOQUE
Apenas um
Segmento Particular
Philip Selznick (apud VASCONCELOS; CYRINO, 2000) foi um dos estudiosos que
contribuiu na origem da teoria dos recursos, ao distinguir as organizações como entidades que
formam recursos específicos a partir do processo de institucionalização. Este autor demonstra
que as organizações, ao fazerem escolhas estratégicas, adquirem um caráter individual.
A teoria dos recursos baseia-se em duas generalizações empíricas e dois postulados.
Como generalizações empíricas apresentam-se: a) existem diferenças sistemáticas entre as
firmas quanto à forma como elas controlam os recursos necessários à implementação de suas
estratégias; b) essas diferenças são praticamente estáveis. Como postulados apresentam-se: a)
as diferenças nas dotações de recursos originam mudanças de performance; b) as firmas
buscam melhorar constantemente a sua performance econômica.
Esta abordagem propõe que a oferta de recursos é limitada, motivo pelo qual algumas
firmas geram uma performance superior. A escassez de recursos se deve a razões estruturais,
como limites físicos, naturais, legais ou temporais e a razões ligadas ao comportamento das
firmas, como a sua capacidade de desenvolver recursos difíceis de imitar. Os pesquisadores da
teoria dos recursos apontam para o fato de que a oferta de recursos não pode aumentar no
curto prazo, ocasionando lucros acima da média do mercado, chamados de rendas ricardianas.
Para que essas rendas ricardianas permaneçam é necessária a adoção de dois mecanismos, que
38
Estudiosos da escola austríaca de economia, entre eles Schumpeter, Von Mises, Hayek
e Kirzner (apud VASCONCELOS & CYRINO, 2000), contribuíram com uma teoria sobre a
vantagem competitiva focada na dinâmica da empresa, dos mercados e da concorrência,
valorizando os processos de mudança e inovação mais do que as estruturas das indústrias.
39
Estes teóricos selecionaram quatro temas sobre o assunto: os processos de mercado, o papel
do empreendedor, a heterogeneidade das firmas e um conjunto de fatores não observáveis.
Os processos de mercado adquirem quatro aspectos essenciais: a competição, o
conhecimento e descoberta, os incentivos e recompensas e os preços de mercado. Sendo
assim, o que alimenta os processos de mercado é a competição, especialmente entre firmas
rivais que buscam aumentar os lucros a partir da oferta de produtos e serviços melhores que
os já existentes. Para isso, deve haver uma liberdade no fluxo de capitais juntamente com a
inexistência de grandes barreiras de entrada nas indústrias.
Outro tema relacionado é quanto ao conhecimento e à descoberta, quando o
empreendedor ficará responsável em descobrir novas oportunidades de práticas correntes e
com isso criar conhecimento referente a estas oportunidades, fazendo com que este
conhecimento abasteça o mercado e o processo de competição.
Quanto aos incentivos e recompensas, para os estudiosos da escola austríaca, os lucros
são gerados a partir da descoberta de oportunidades de produção e da criação de combinações
de fatores de produção. Para estes estudiosos, os preços de mercado se apresentam como o
valor relativo das descobertas realizadas pelos empreendedores.
O empreendedor é destaque nos trabalhos de Schumpeter, sendo ele o responsável
pelo ingresso de inovações possíveis para satisfazer as demandas do mercado. Para que o
empreendedor satisfaça os consumidores é necessário que utilize os métodos científicos,
mobilização de conhecimentos explícitos e informações circunstanciais e contextuais, capazes
de associar as formas tácitas de conhecimento das especificidades locais.
Para a escola austríaca, a firma necessita de estratégias de inovação constantes para
que possa ter uma alta rentabilidade. Para isso, faz-se necessário perseguir os fatores
inobserváveis, invisíveis, que fogem do padrão de imitação do mercado e dos objetivos
mensuráveis dos processos de produção.
ambas as partes não é suficiente. É necessário uma estrutura que permita avaliar as
consequências da cooperação e da concorrência em termos financeiros.
Os autores demonstram que nos dias atuais é necessário ouvir os fregueses, criar
equipes, trabalhar em consonância com os fornecedores, estabelecer sociedades estratégicas,
inclusive com os concorrentes. Deve-se competir e cooperar ao mesmo tempo.
As empresas encontram a estratégia adequada ao identificar os elementos cooperativos
e competitivos nas relações com outras empresas. De acordo Nalebuff e Brandenburger
(1996), a coopetição estimula a criatividade e a ação ousada e auxilia a evitar armadilhas; faz
com que as empresas possuam um raciocínio lógico e firme, ao mesmo tempo em que adotam
atitudes benevolentes em relação a outras. Enquanto estão buscando aumentar o bolo,
pensando em como mudar o jogo e tendo uma visão do futuro, elas vão gerando mais lucros e
tornando o trabalho dos envolvidos mais gratificante. O lema da coopetição é fazer as coisas
de forma diferente e melhor.
Esses autores recorrem à teoria do jogo para conciliar a concorrência com a
cooperação, pois, na concepção dos mesmos, a teoria do jogo é uma ferramenta crucial para o
entendimento do mundo moderno dos negócios. Nesse sentido, a teoria do jogo concentra-se
diretamente na questão prioritária, ou seja, encontrar as estratégias certas e tomar as decisões
corretas. A teoria do jogo é eficaz principalmente quando há muitos fatores interdependentes,
e nenhuma decisão pode ser tomada isoladamente. Sob esse aspecto, a teoria do jogo é uma
ferramenta especialmente valiosa e que deve ser partilhada com os demais participantes da
organização. Sendo assim, ela é uma ferramenta a partir da qual a organização pode expandir
e construir.
Ao se referir à coopetição, Nalebuff e Brandenburger (1996) lembram que existe um
grupo de jogadores que supre produtos e serviços complementares. O complemento de um
produto ou serviço, portanto, é qualquer outro produto ou serviço que torne o primeiro mais
atraente. Para os autores, pensar em termos de complementos é diferente do que pensar em
termos de negócios, pois se deve encontrar maneiras de fazer o bolo crescer em vez de
disputar com os competidores em torno de um bolo de tamanho fixo. Trata-se de pensar em
como expandir o bolo gerando novos complementos ou tornando os já existentes mais
acessíveis.
Sob a ótica de um jogo, Nalebuff e Brandenburger (1996) definem os jogadores e os
seus papéis a partir de um mapa esquemático representado na Figura 3.
44
FREGUESES
FORNECEDORES
O mundo está cada vez mais globalizado e isto amplia a concorrência nos mercados.
Para sobreviverem, as empresas se unem, tanto na parte produtiva quanto na institucional,
fazendo com que surja uma nova organização de sistemas de cidades e regiões. Barquero
(2001) afirma que as cidades e regiões voltaram a dar importância à questão do
desenvolvimento por entenderem que é uma alternativa às necessidades e demandas dos
cidadãos.
Várias são as abordagens sobre desenvolvimento local. Todas elas, no entanto,
enfatizam as relações sociais e econômicas estabelecidas entre os atores de uma determinada
localidade. Brose (1999) traz a seguinte concepção para desenvolvimento local:
Fischer (2002) constata que essa verdadeira guerra iniciada no século 21, ao se referir
às torres do World Trade Center, sugere uma revisão de valores que conduzem à Era das
Conexões, aproximando escalas de poderes locais e transnacionais. A autora destaca que nos
anos 90 do século 20 se sobressaiu a importância do subnacional e local perante o nacional e
transnacional. O poder local ressurgiu supervalorizado. Neste momento, se destacam as
49
Esta mesma autora destaca que o desenvolvimento tem dois sentidos e significados:
um orientado para a competição e o outro para a cooperação ou solidariedade. No
desenvolvimento competitivo as estratégias têm enfoque econômico, apesar de ser tratado
como local, integrado e sustentável. A partir disso, propõem-se o conceito de trama produtiva,
ou seja, a articulação entre os agentes de desenvolvimento, as atividades inovadoras e
tecnologias de gestão social. Para que a trama produtiva seja constituída se faz necessária a
existência de recursos humanos qualificados, relações econômicas entre produtores e clientes,
circulação de informações entre agentes, instituições e indivíduos, existência de estrutura
institucional desenvolvida e a construção de uma identidade funcional facilitadora da
confiança. Os agentes do desenvolvimento serão as empresas, os governos, as comunidades
organizadas e redes produtivas, formando interorganizações configuradas, também chamado
de entorno territorial inovador, constituído de bens tangíveis e intangíveis, comunidades de
interesse, a informação e a tecnologia.
No desenvolvimento solidário ou alternativo, sobressaem-se os valores de qualidade
de vida e cidadania, com foco na inclusão dos setores marginalizados na produção e obtenção
dos resultados, aceitando a ideia de desenvolvimento econômico, mas de forma equilibrada
com os demais. Como exemplos podem ser citadas as formas associativas de produção
proporcionadas por comunidades; os movimentos sociais e governamentais; as dinâmicas
locais de orientação ecológica e sustentável; movimentos para a inclusão de mulheres nos
processos de desenvolvimento; mecanismos para concessão de microcrédito e movimentos
sociais a favor dos direitos à terra e à habitação.
50
Para isso, esta deve apoiar-se em atividades já consolidadas, como o leite, suínos, aves, ovos,
erva-mate, e desenvolver outras. O mesmo autor acredita que os hortigranjeiros, as frutas e o
fumo, além de um projeto extrativo eficiente de madeira, sem alterar a composição ecológica
da região, seriam alternativas para novas atividades. O autor entende que a região não pode
abdicar do milho e da soja, porém deve agregar valor em torno dessas atividades, com ênfase
regional e jamais apenas municipal. Sob esse enfoque, a ação cooperativista e associativa
deve ser buscada constantemente para se atingir avanços econômicos. A ideia é fortalecer a
região a partir de produções diferenciadas de acordo com as características de cada
microrregião. Nesse sentido, a captação de investimentos externos virá em consequência de a
região ter algo economicamente interessante a oferecer.
Com o passar dos anos, o número de propriedades rurais foi reduzindo, aumentando o
êxodo rural. Existe um esgotamento do atual modelo de produção, e ainda se procura
reproduzir o modelo tradicional de grãos que era possível enquanto havia subsídios, mas que
agora já está superado para áreas menores de cem hectares.
A teoria do desenvolvimento endógeno, defendida por Barquero (2001), consiste na
ideia de que a política de desenvolvimento local viabiliza uma resposta local aos desafios da
globalização de maneira eficiente, convertendo a teoria do desenvolvimento endógeno em um
instrumento para a ação.
Os fatores que determinam a evolução de cidades e regiões, de acordo com Barquero
(2001), são a forma de organização da produção, a estrutura familiar, social e cultural e os
códigos de conduta da população. Nesse sentido, o desenvolvimento local endógeno segue
uma visão territorial dos processos de crescimento e mudança estrutural, quando o território
não é apenas um espaço físico, mas um agente de transformação social. Sendo assim, as
empresas, as organizações e as instituições de cada localidade ou território são os agentes que
proporcionam os processos locais de crescimento e mudança estrutural por meio do controle
dos processos e dos investimentos.
Nessa perspectiva, cada cidade ou região segue um caminho de desenvolvimento que
irá depender da trajetória tecnológica e produtiva que as empresas adotarem.
Barquero (2001) defende a tese de que é pela existência de um sistema produtivo
capaz de oportunizar rendimentos crescentes, perante o uso de recursos disponíveis e a adoção
de inovações, que se garante a criação de riquezas e a melhoria do bem-estar local. O autor
entende que o ideal é fomentar a difusão das inovações, a capacidade empresarial, a
qualificação do capital humano, a flexibilidade do sistema produtivo, a formação e o
52
B Organização da produção A
em rede
Sistemas produtivos
locais com Sistemas locais
vinculação externa endógenos
Integração em Integração em
cadeias externas cadeias locais
Enclaves externas
Enclaves de com funções
empresas externas endogeneizadas
Organização hierárquica
D da produção C
Houve uma nova dinâmica na agricultura brasileira “... de maneira que a partir de
meados dos anos 70 já não se pode mais falar de uma única agricultura brasileira como
unidade analítica relevante” (SILVA, 1998, p. I). O autor afirma ainda que atualmente a
agricultura brasileira é uma estrutura complexa, heterogênea e multideterminada. Para
entendê-la é necessário partir de seus segmentos constitutivos, com as suas dinâmicas
específicas e entrelaçadas aos setores industriais fornecedores de insumos e processadores de
produtos agrícolas.
Foi a partir da década de 30, com a decadência do café, que surgiu uma diversificação
nas atividades agrícolas, uma otimização nos processos de industrialização, por intermédio
das novas possibilidades que surgiram com a substituição de importações. O setor agrícola
voltou-se para o mercado interno, pois antes era confundido com o setor exportador, apesar de
ter um papel importante no comércio exterior brasileiro até hoje (SILVA, 1998).
Ao se analisar as pequenas e médias cidades, percebe-se que estas estão em um estágio
intermediário do processo de êxodo rural devido à falta de infraestrutura social e
oportunidades de emprego em atividades não agrícolas, fato que acaba inchando sempre mais
as regiões metropolitanas. A proposta é que, ao lado das tradicionais políticas de reforma
agrária, deve-se urbanizar o interior com infraestrutura adequada, estimular a instalação de
agroindústrias e indústrias de pequeno porte, o que fará com que aumente o valor agregado da
produção local e se absorva a força de trabalho agrícola excedente, como, por exemplo, a dos
jovens (SILVA, 1998).
Este mesmo autor defende a ideia de que é necessário transformar a noção de setor
agropecuário, passando de atividades produtivas tradicionais, como cultivo e criação de
animais, para agregar também a produção de serviços, como o lazer, turismo, preservação do
meio ambiente, entre outros. Inclui-se também bens não agrícolas, como moradia, transporte,
artesanato e as novas formas modernas de trabalho a domicílio para aproveitar o excedente da
força de trabalho das mulheres e idosos.
A partir da análise do mercado é possível traçar estratégias para os pequenos
empreendimentos.
Batalha (2001) apresenta a escala da produção como uma das principais razões para
inserção em uma cadeia produtiva. Como a comercialização é em função do volume de
produção disponível, a escala é determinante para o escoamento da produção. Ao estabelecer
55
uma estratégia, o pequeno produtor deverá determinar o que irá produzir. Ele irá definir a
produção a partir de três fatores que são: os recursos disponíveis no empreendimento, as
condições de mercado e a vocação do produtor. Nesse contexto, os recursos disponíveis são as
condições econômicas, solo, clima, água, equipamentos, benfeitorias. Quanto às condições de
mercado, envolve este e as tendências de crescimento. Quanto à vocação do produtor, é
interessante que este trabalhe com produtos que o satisfaça.
Como afirma Batalha (2001), o maior problema entre os pequenos produtores rurais
está em obterem informações de forma rápida e prática. Normalmente o produtor não
acompanha a evolução do mercado e alterações de hábitos de consumo. Ele trabalha a partir
da sua atividade, como se esta estivesse separada dos demais segmentos.
Para que o produtor obtenha uma renda mínima, o autor sugere três fatores que se
complementam a partir da definição do produto, que são o associativismo e parcerias, a
agregação de valor e a diferenciação de produtos.
No primeiro caso, segundo Batalha (2001), Weydmann esclarece que o sistema de
parcerias tem uma importância relevada para os pequenos produtores, pois irá racionalizar o
trabalho e os custos, fazendo com que os produtores possam se inserir e permanecer nas
cadeias de suprimentos. A parceria deverá promover ganhos em ambas as partes envolvidas.
Normalmente essa relação é informal, mas sugere-se a elaboração de contratos para
formalizar essa parceria.
A parceria é composta pelo trabalho e os recursos operacionais dos parceiros. O
pagamento dos serviços é por meio de cotas de participação no final do empreendimento, o
que diferencia o arrendamento que é exclusivo à cessão da terra. O parceiro oferece o que tem
de melhor para desenvolver a parceria e a divisão do resultado será proporcional aos serviços
prestados por parceiro. Como o volume de compra é maior na parceria, isso resultará em
ganho de escala, pois haverá uma redução de custos nos insumos. Da mesma forma,
apresentará ganhos na comercialização dos produtos (BATALHA, 2001).
Megido e Xavier (2003) acrescentam que: “As cooperativas são os braços para a
realização do marketing de produtos dos agricultores, bem como o são as associações e os
modernos acordos de parceria com a agroindústria e o varejo da alimentação” (p. 224).
Dessa forma, para se formar a parceria deve existir um agente coordenador, como a
associação de produtores, a cooperativa, uma consultoria ou os próprios produtores
individualmente. É mais indicada a associação de produtores, pois envolve um número menor
de agentes, e gera um aproveitamento maior das potencialidades dos produtores e domínio de
56
decisões, e no momento da divisão dos resultados econômicos, ocorre maior confiança entre
eles (BATALHA, 2001).
Tanto Batalha (2001) quanto Barquero (2001) concordam que é necessário existir
confiança mútua entre as pessoas envolvidas nos projetos para alcançarem o sucesso das
parcerias.
O segundo fator mencionado — a agregação de valor — ocorre normalmente por meio
da incorporação de tecnologia diferenciada, uma obtenção maior de qualidade e logística de
atendimento ao mercado. É de suma importância que o pequeno produtor atenda às
expectativas dos consumidores quanto à qualidade do produto. Essa qualidade inicia desde os
atributos físicos como cor, sabor, conservação, apresentação, até os atributos químicos, como
ausência de agrotóxicos ou hormônios. Inicia no processo de produção e vai até os cuidados
pós-colheita ou pós-abate. Dependendo do mercado a que se destina o produto, a agregação
de valor se dá também quanto ao momento mais apropriado da colheita ou a determinação do
peso e do tamanho do animal.
Também se pode agregar valor quanto ao uso de embalagens para manter a qualidade
dos produtos. Sugere-se a associação da embalagem com resfriamento, pois se poderão
oferecer os produtos de forma individual, simplificando o transporte e o desperdício no
preparo.
Devem-se adotar procedimentos de logística adequados integrando os produtos
obtidos e a distância do empreendimento até as centrais de distribuição, e a melhor maneira de
transportá-los.
O pequeno produtor deve estar em contínua análise de alternativas de agregação de
valor aos seus produtos, verificando os custos e investimentos necessários (BATALHA,
2001).
Por fim, quanto à diferenciação de produtos, existe certo desequilíbrio entre a oferta e
a demanda de produtos específicos. Esses serão uma alternativa para o pequeno produtor, que
deve verificar a viabilidade de produção dos mesmos. O produtor rural deverá direcionar para
produtos de maior valor agregado, como plantas medicinais, condimentares, corantes ou
produtos orgânicos. O risco de produtos diferenciados é que os mesmos podem ser rentáveis
apenas quando a oferta é baixa e quanto ao período de permanência no mercado; muitos
fazem sucesso apenas quando é novidade (BATALHA, 2001).
Como exemplo apresenta-se os produtos orgânicos. Assis, Arezzo e De Polli (apud
BATALHA, 2001) destacam que a produção orgânica brasileira foi impulsionada pelas
grandes redes de supermercados ao se interessarem nestes produtos devido a sua
57
diferenciação, sendo mais saudáveis e atingindo um público com poder aquisitivo maior,
preparado para pagar por eles. Segundo esses autores, o consumo desses produtos não decorre
apenas da consciência ambiental, mas se deve também devido à relação com a saúde pessoal e
familiar. Nessa mesma direção, Castro, Neves e Nogueira (2003) acreditam que o consumo de
produtos orgânicos não é passageiro e é decorrente de uma mudança de valor social.
“Os consumidores tendem a gastar em produtos ambientalmente saudáveis, rejeitando
os que não são. O consumismo ambiental é uma realidade” (CASTRO; NEVES;
NOGUEIRA, 2003, p. 318). Para esses autores, é uma maneira de se obter novos negócios e
lucros. No Brasil os produtos orgânicos crescem 10% ao ano. O consumo, apesar de ser
pequeno, está aumentando.
Batalha (2001) destaca que os produtos orgânicos encontram algumas limitações de
irregularidade de abastecimento e pouca variedade de produtos no mercado interno, mesmo
assim ele é crescente. Já no mercado externo, apresenta uma maior remuneração, devido à
maior experiência e consciência ecológica dos consumidores. Para esse mercado existe uma
estrutura de certificação que aprova a qualidade dos produtos e a idoneidade dos produtores.
Megido e Xavier (2003) acrescentam que a certificação pode ser onerosa no início. Os
consumidores irão pagar mais caro (de 20% a 40% acima), mas exigem a certificação para
obter garantia da origem do produto. Os certificadores no Brasil são o Instituto de
Biodinâmica (IBD) e a Associação de Agricultura Orgânica (AAO), sendo esta certificação
importante para o aprimoramento de normas globais.
De acordo com Batalha (2001), a viabilidade econômica é indiscutível para esses
produtos, mas deve ser avaliada a produção em cada propriedade, pois os mesmos requerem
investimentos e mudança de filosofia de trabalho por parte dos produtores.
Os novos produtos de mercado surgem em função das mudanças de hábito da
população, muitas vezes devido à falta de tempo de preparo e consumo das refeições e
também pela preocupação com a saúde (BATALHA, 2001). Outros fatores são apontados por
Megido e Xavier (2003), como dificuldades de transporte, presença da mulher no mercado e
as megacidades, que induzem as pessoas a fazer suas refeições fora de casa e comprar
comidas prontas.
É o caso dos produtos food service nas redes de fast-food, cada vez mais diversificados
e saudáveis que os restaurantes tradicionais oferecem. Batalha (2001) afirma que as redes de
fast-food são uma alternativa para os produtores, porém devem atender às exigências, como
cumprimento de prazo e qualidade dos produtos. Os pequenos produtores devem procurar
conhecer os nichos de mercado.
58
3 METODOLOGIA
Trata-se de uma pesquisa aplicada. Vergara (2000) descreve que a pesquisa aplicada é
motivada principalmente pela necessidade de resolver problemas concretos, e tem finalidade
prática, ao contrário da pesquisa pura, que é motivada pela curiosidade intelectual do
pesquisador e se situa no nível da especulação.
60
A pesquisa procurou descrever como o Programa Pacto Fonte Nova foi estruturado,
como as agroindústrias de pequeno porte integrantes deste programa se organizaram para
competir no mercado e como o programa contribuiu no processo de desenvolvimento local, na
medida em que criou condições para a permanência das famílias dos produtores rurais no
campo e estabeleceu uma nova alternativa de renda a esses pequenos empreendimentos rurais,
por meio de um processo colaborativo, associativo e solidário.
Quadro 1: Descrição do perfil e sigla atribuída aos entrevistados das organizações pesquisadas
Fonte: Dados da pesquisa.
66
O design da pesquisa é considerado por Yin (2005) como a sequência lógica que
conecta os dados empíricos com as questões iniciais e suas conclusões. Isto é, procura
demonstrar as diferentes etapas que foram seguidas na pesquisa, como também o caminho
percorrido para a resposta aos objetivos da mesma.
A Figura 6, a seguir, mostra o desenho com o detalhamento das fases que a pesquisa
percorreu.
71
OBJETIVOS DA PESQUISA
Além disso, a população de Crissiumal tinha mais um fator para estar descontente com
os governantes. O município não tinha acesso asfáltico e os 27 km que ligavam o município
até a BR 468 estavam em obras há 23 anos. Em 1997 ocorreu um movimento por parte da
população chamado “Sem asfalto, sem voto”. A população foi para as urnas e votou em
branco para deputado estadual devido à falta de continuidade de ações e à baixa destinação de
recursos externos. Nesse momento, a população “cruzou os braços”, entendendo que nem o
Estado e nem mesmo a União iriam resolver os problemas locais. Tinham, contudo, a
consciência que era preciso pensar uma alternativa de desenvolvimento.
74
A busca constante por qualificação foi demonstrada com a criação da marca Fonte
Nova (Selo de Qualidade), que foi instituída em outubro de 1998 e teve como objetivo
facilitar a identificação do produto e, ao mesmo tempo, assegurar a qualidade ao consumidor,
tornando-o mais competitivo e reconhecido no comércio local e regional. Atualmente está
sendo pesquisado um novo modelo de selo para a devida adequação às embalagens dos
produtos, por exemplo o selo como uma marca-d’água.
1
De acordo com entrevistas, as entidades eram: Prefeitura de Crissiumal, Cooperativa Tritícola Mista Alto
Uruguai Ltda. (Cotrimaio), Cooperativa Mista Tritícola de Campo Novo Ltda. (Cotricampo), Associação
Comercial e Industrial (ACI), Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Empresa de Assistência Técnica e Extensão
Rural (Emater), Sindicato dos Empregadores Rurais, Cooperativa de Técnicos da Região Noroeste do Estado do
Rio Grande do Sul (Unitec), Associação de Desenvolvimento Comunitário de Crissiumal (Adesco) e Conselho
Municipal de Desenvolvimento Econômico e Social.
77
Como as leis sanitárias são muito rigorosas foi instituído o Serviço de Inspeção
Municipal (SIM), que se tornou fundamental para a viabilização das agroindústrias do Pacto.
O SIM é regido pela Lei Municipal 1.501/99, de 6/4/99, contendo as regras e normas de
funcionamento de cada empreendimento.
Para um melhor entendimento, são três níveis de inspeção para produtos de origem
animal (carnes e derivados, mel, ovos, etc.): o SIM, a Coordenadoria de Inspeção Sanitária de
Produtos de Origem Animal (Cispoa) do governo do Estado e que permite a comercialização
no território estadual e o Serviço de Inspeção Federal (SIF). A maioria dos pequenos
empreendimentos aderiu ao SIM coordenado pelo município, por sua facilidade de acesso e
normatização local. O inconveniente desse nível de inspeção é a sua limitação, pois permite
comercializar apenas no município. Ressalta-se que, desde a fase inicial do programa, a
intenção dos organizadores do Pacto era fazer com que as agroindústrias buscassem a
certificação pela Cispoa, fato registrado no regulamento interno do programa (PACTO
FONTE NOVA, 2000).
O SIM envolve um banco de dados com cadastro e fichas de controle dos
empreendimentos, controle da origem da matéria-prima (entradas e saídas), controle das
análises laboratoriais (matéria-prima, água, etc.), veterinários responsáveis, computador,
veículos, relatórios de visitas, termos de ajuste de conduta, entre outros.
78
Sicredi Banrisul
Adesco Câmara de
Vereadores
Conselho
Municipal de Pacto Fonte Nova
Atac
Desenv. Econ.
e Social
ACI
Unitec
Cooper
Fonte Nova
Cotrimaio Banco do
Brasil
Cotricampo Caixa
Empreendimentos
A Emater foi a principal parceira, com seus técnicos envolvidos desde o início do
programa, e hoje continua assessorando com equipe técnica dividida em setores para melhor
atender os produtores. A Emater possuía um técnico responsável pela área de projetos, outro
pela de horticultura e cana-de-açúcar e a extensionista pela área de farináceos, geleias, sucos,
conservas, compotas, artesanatos e turismo.
2
Uma das principais feiras em termos agropecuários e de maquinário agrícola da América Latina.
82
Mauá (Expomauá), entre outras. Essas participações abrangiam as feiras do Estado do Rio
Grande do Sul e de outros Estados, como é o caso da Expobrasília, em Brasília – DF.
Havia todo um incentivo ao produtor para que ele fosse às feiras, porque se entendia
que, na medida em que ele participava delas, como a Expointer por exemplo, interagia com
outros produtores de outras regiões, trocava experiências e, principalmente, adquiria
facilidade em comunicar-se ao oferecer e vender os produtos, pois ficava perante um público
de mais ou menos cem mil pessoas e se via no compromisso de vender para poder voltar para
casa e disseminar a ideia de bons negócios. Essas inserções em feiras foram motivo de
estímulo e orgulho por parte dos agroindustriários, resultado de bons negócios.
Ao mesmo tempo em que divulgava os produtos, essa participação em feiras também
servia para o encaminhamento de projetos. Ao participarem da Expobrasília, por exemplo, os
produtores levaram um projeto ao Ministério da Ciência e Tecnologia, que possibilitou a
destinação de recursos para promover a informatização das agroindústrias participantes do
Pacto, detalhado mais adiante.
Em 11 de dezembro de 2002 os produtores ligados ao Pacto Fonte Nova, sentindo a
necessidade de partir para uma forma de trabalho mais consistente em termos de cooperação e
associativismo, criaram a Cooperativa das Atividades Agroindustriais e Artesanais do Pacto
Fonte Nova Ltda., ou simplesmente Cooper Fonte Nova, que veio para consolidar o trabalho
dos agricultores em forma cooperativada e fortalecer as atividades dos mesmos. Foram 24
sócios-fundadores que deram início a essa nova organização.
Um dos motivos da criação da Cooperativa das Atividades Agroindustriais e
Artesanais do Pacto Fonte Nova foi a tentativa de resolver o problema da comercialização dos
produtos com a prefeitura. Com a criação da cooperativa era possível sua participação em
licitações e, portanto, viabilizar a venda dos produtos originários do conjunto de produtores
do município à prefeitura. Também por meio dessa cooperativa era possível ter acesso a
diversos programas federais, que facilitavam a venda de produtos de forma direta dos
fornecedores (agroindustriários), em melhores condições.
No caso da merenda escolar do município, pensou-se em algo para o futuro, pois esta
poderia servir como um canal para a divulgação do produto e para a formação de uma
consciência entre os alunos, especialmente os filhos de agricultores. A ideia era transmitir aos
alunos que a atividade rural, por menor que fosse a sua área, poderia produzir mais resultados
do que a soja, que era a base da produção das pequenas propriedades.
A criação da cooperativa proporcionou aos associados um importante auxílio na
obtenção de inspeção sanitária, na comercialização de produtos, na aquisição em conjunto de
83
Desde 2005 as agroindústrias podem produzir alimentos para a merenda escolar dos
municípios por intermédio da Cooper Fonte Nova, que busca recursos para esse fim junto ao
governo federal, por meio da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), e, de 2006 a
2007, o projeto de merenda escolar resultou em uma movimentação na ordem de R$
187.000,00, relativos à comercialização de produtos como salame, queijo, bebida láctea,
açúcar mascavo, pão caseiro, macarrão caseiro, peixe (carpa de açude), frango caipira,
bolacha caseira e produtos in natura de hortigranjeiros (PACTO FONTE NOVA, 2007). Em
2008 foram R$ 200.874,05 deste mesmo projeto, envolvendo 25 entidades beneficiadas e 122
produtores fornecedores.
Com a configuração do Pacto Fonte Nova, houve um incremento de investimentos e
infraestrutura, aquisição de equipamentos, treinamentos e qualificação profissional, entre
outros, em torno das atividades agroindustriais no montante de R$ 1.680.000,00 no período de
1998 a 2007. Deste valor, 55% foram recursos próprios dos agricultores, 28% tiveram origem
em financiamentos contratados pelos produtores junto as agências bancárias, principalmente
pelo Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e Fundo
Municipal de Desenvolvimento Agropecuário de Crissiumal (Fundac) e 17% oriundos de
incentivos oferecidos pela prefeitura de Crissiumal (PACTO FONTE NOVA, 2007).
Na medida em que foi formada a identidade do programa, partiu-se para a divulgação
do Pacto e, consequentemente, dos produtos. Foram veiculados comerciais de rádio
incentivando a aquisição dos produtos Fonte Nova por parte da população, enfatizando que
eram produtos de qualidade produzidos no município e, portanto, se adquiridos nele, o retorno
econômico ficaria no seu próprio âmbito.
Em 2007 o programa ganhou uma dimensão extraordinária. Quatrocentas excursões
oriundas dos mais diversos municípios do Rio Grande do Sul e de Estados vizinhos, formadas
por técnicos, lideranças e produtores, já haviam visitado as agroindústrias e conhecido o Pacto
desde a sua criação. Neste período, o prefeito, na época Walter Luiz Heck, havia realizado
84
para certificação de qualidade dos mesmos a cada seis meses; cabe aos técnicos responsáveis
pela área afim, conforme organograma do programa, a fiscalização dos produtos nas diversas
etapas de processamento industrial, bem como a suspensão da comercialização dos mesmos,
desde que não atendam às normas higiênico-sanitárias e em conformidade ao parágrafo único
do artigo terceiro; as agroindústrias que laboram produtos de origem animal deverão
encaminhar registro junto a Coordenadoria de Inspeção Sanitária de Produtos de Origem
Animal (Cispoa), a fim de comercialização para todo o Estado; as agroindústrias que
elaboram produtos de origem vegetal deverão encaminhar registro junto ao Ministério da
Agricultura e/ou em conformidade com as normas estabelecidas do órgão competente para o
processamento e comercialização dos referidos produtos.
O segundo nível decisório era composto pela Coordenadoria Executiva, constituído
por um coordenador, um secretário, um tesoureiro e um conselheiro fiscal. Todos eram eleitos
por assembleia geral e entre os participantes estavam os produtores rurais e as entidades
filiadas, com mandato de um ano, podendo ser reeleitos. Essa coordenadoria tinha como
atribuição, de acordo com o Regulamento Interno (PACTO FONTE NOVA, 2000):
O terceiro nível decisório era formado pelo corpo técnico do programa, composto por
21 pessoas, dentre eles: três veterinários, três agrônomos, onze técnicos, uma extensionista,
um nutricionista, um vigilante sanitário e um secretário. Atualmente este corpo técnico é
formado por nove pessoas que são: dois técnicos veterinários, dois agrônomos e um técnico
87
O Pacto Fonte Nova foi idealizado para que se dividisse em eixos de atuação. Essa
divisão foi de vital importância para o desenvolvimento do programa. Esses eixos são
evidenciados conforme o Quadro 2.
88
* Em substituição ao nome das pessoas encarregadas em cada atividade, como consta no documento referencial,
optou-se por citar as instituições a que pertencem.
Pacto, quando do encerramento do mandato do prefeito Walter Luiz Heck, que era o grande
articulador político do Pacto. Existe a possibilidade de haver outras agroindústrias, no entanto
não são relacionadas pela falta de contato com a cooperativa. No momento, a cooperativa
procura atender as agroindústrias que vêm ao seu encontro, ou seja, que tem interesse no
trabalho cooperativado, não tendo condições de ir ao encontro de todas para integrar mais
agroindústrias, pois a demanda de trabalho que tem atualmente não permite este tipo de
investida, segundo as palavras do gestor responsável pela cooperativa.
Nº de traba- Situação
lhadores Atual
Ramo de Nome das Agroindústrias Produto
envolvidos Ativa/
Atividade diretamente Inativa
Produtos de
Origem Animal
Nº de traba- Situação
lhadores Atual
Ramo de Nome das Agroindústrias Produto envolvidos Ativa/
Atividade diretamente Inativa
Produtos de
origem vegetal
Nº de traba- Situação
lhadores Atual
Ramo de Nome das Agroindústrias Produto envolvidos Ativa/
Atividade diretamente Inativa
Outras Atividades
Quadro 3: Conjunto das agroindústrias integrantes do Pacto Fonte Nova e associadas à Cooper Fonte Nova
Fonte: Relação das Agroindústrias de Crissiumal (PACTO FONTE NOVA, 2004) e entrevista com o ex-
presidente e o gerente da Cooper Fonte Nova (2010).
* Produtos Weber: vinhos e conservas fazem parte da mesma empresa.
foi acontecendo e hoje o programa caminha sozinho. O controle inicial se dissolveu. A ideia
do programa não é a mesma para quem está hoje na liderança e quem esteve no surgimento do
programa. A cooperativa permanece, as agroindústrias permanecem, mas, no entanto, o
enfoque mudou, direcionando para as agroindústrias de alimentos e de uma forma mais
comedida quanto à criação de novos empreendimentos.
Percebe-se que o Pacto Fonte Nova foi uma iniciativa interessante de desenvolvimento
local a partir de um processo de articulação das lideranças e das forças econômicas e políticas
do município de Crissiumal, que se encontrava num processo de estagnação econômica e de
inércia em termos de alternativas que pudessem reverter o quadro de descrédito e desânimo da
população. Aquele que foi, então, um projeto de revitalização do desenvolvimento local e que
proporcionou uma nova dinâmica de entendimento dos agentes políticos e econômicos do
município, também apresentou uma série de problemas e entraves que dificultaram um
resultado ainda mais expressivo dessa iniciativa de desenvolvimento local concebida a partir
de uma ação centrada no propósito da cooperação, da solidariedade e do associativismo.
Procurar-se-á, na sequência, elencar os principais problemas identificados no processo de
estruturação do Pacto Fonte Nova.
Na fase inicial das atividades da grande maioria dos empreendimentos faltou apoio de
órgãos fomentadores de recursos que pudessem alavancar as iniciativas. A carência de
recursos foi um importante obstáculo, pois era o momento em que os agroindustriários mais
precisavam de apoio financeiro. Era a ocasião de construir instalações, contratar pessoal
especializado para trabalhar nas empresas e contatar com assessoria especializada para
atender às normas técnicas de órgãos como a Fepam, por exemplo.
No âmbito municipal, o programa pecou em não direcionar mais técnicos para as
agroindústrias, de forma mais pontual, para a gestão, redução de custos, marketing e
comercialização dos produtos. Essa deficiência de apoio técnico dificultou a obtenção de
certificação estadual ou federal nos processos de regulamentação dos produtos das
agroindústrias.
No âmbito estadual e federal faltou apoio para o início dos trabalhos das
agroindústrias, pois muitos não tinham garantias para oferecer ou não possuíam renda para
comprovar na obtenção de financiamentos, pois a atividade estava apenas começando. O
pouco auxílio que as agroindústrias obtiveram foi por parte do governo municipal, familiares,
96
amigos e entidades financeiras locais, com taxas de juros nem sempre condizentes com a
realidade das agroindústrias.
Houve, portanto, a falta de linhas de crédito que pudessem apoiar os pequenos
empreendimentos, sobretudo na fase inicial dos negócios, quando há carência de capital de
giro e/ou de recursos para adequação de instalações e infraestrutura necessária para a
continuidade dos negócios; fatores esses cruciais para a sobrevivência das pequenas empresas.
Além disso, os empreendimentos se depararam com problemas burocráticos que lhes
impediam de qualquer possibilidade de contrair empréstimos, mesmo que em proporções
pequenas.
As exigências são tão grandes para contrair apoio financeiro de Bancos e instituições
de crédito, que limitam a possibilidade de pequenos empreendimentos usufruírem de recursos
de terceiros para alavancar seus negócios, na medida em que ainda não possuem garantias
e/ou rendas que se enquadram nas normas das instituições do sistema financeiro em vigor.
Sendo assim, a falta de apoio governamental, entendido tanto no âmbito local/
municipal ou federal, quer seja em termos de financiamentos diretos ou em programas de
qualificação e/ou de apoio tecnológico, contribui para que os produtores tenham dificuldade
de prosseguir com os seus empreendimentos. Exemplo disso é o fato de que o Pacto Fonte
Nova chegou a integrar 39 empreendimentos agroindustriais e hoje restam apenas 30.
federais que deixaram de vir para o município no contexto do Projeto Pacto Fonte Nova. Em
2010, já com a devida adaptação dos novos funcionários e técnicos, a Cooper Fonte Nova tem
a expectativa de retomar a articulação com órgãos do governo federal para reforçar a cota de
recursos a ser destinada aos incentivos dos empreendimentos do Pacto Fonte Nova.
Este processo de descontinuidade das administrações sempre prejudica os projetos em
andamento. Com o Pacto Fonte Nova a história se repetiu. A transição de uma administração
para a outra ocasiona mudança de política e interrupção de ações no campo das políticas
públicas e dos projetos de desenvolvimento. Por mais que seja um projeto como o Pacto Fonte
Nova, que é de interesse da sociedade local, com o envolvimento de vários segmentos,
independentemente das correntes políticas existentes no município, a mudança das lideranças
que estão à frente dos governos e instituições estratégicas locais traz consigo alterações de
estratégias e comportamentos.
Como o Pacto Fonte Nova teve uma influência muito forte da liderança do prefeito
Walter Luiz Heck, que foi o grande mentor e articulador deste projeto de desenvolvimento
local, com a saída dele e as alterações nas coordenações que envolviam as diferentes
organizações e instituições participantes do Pacto, foi notório o enfraquecimento desse
movimento.
Desta forma, um processo de desenvolvimento local somente é possível com o
envolvimento dos diversos atores locais: sociedade civil, poder público, mercado e políticas
articuladas com as demais esferas do Estado. Mesmo o Programa Pacto Fonte Nova tendo sua
delimitação geográfica no território do município de Crissiumal, os objetivos que se esperam
alcançar somente terão êxito com o apoio articulado destas diversas instâncias.
A falta de uma política específica para esse ramo de atividade também faz com que
muitos atuem de forma clandestina, o que inviabiliza os demais produtores que trabalham de
forma legal.
Percebe-se também que existem divisões de setores nos governos, com diferentes
visões e que competem entre si e isso dificulta o desenvolvimento das atividades produtivas.
Desta forma, a existência de uma política pública que procura se adequar às condições
destes pequenos empreendimentos é condição necessária para a sobrevivência de muitas
agroindústrias familiares. Esta política requer adequação da legislação, nos seus diversos
aspectos, linhas de crédito compatíveis aos fluxos financeiros destas pequenas empresas,
redução das taxas de juros e impostos, desburocratização nos processos de legalização,
assistência técnica e gerencial, dentre outros. A maneira de olhar e apoiar as pequenas
agroindústrias terá de ser de forma diferente daquilo que é hoje. Se as pequenas empresas
forem submetidas às mesmas condições de empresas representadas por grandes grupos
econômicos, provavelmente estarão fadadas ao fracasso.
com muitos detalhes que o produtor não tem condições de atender, tanto no aspecto sanitário,
quanto de infraestrutura exigida.
A adequação à legislação em âmbito estadual e federal exigiria um aporte de recursos
financeiros muito além das condições de vários agricultores, que tiveram de optar em
comercializar seus produtos dentro do município quando havia mercado inclusive fora dele.
Em certos casos isso ocasionou o encerramento das atividades de alguns empreendimentos
por inviabilidade financeira. É o caso da agroindústria de conservas de ovos de codorna, que
fazia parte do Pacto Fonte Nova. Seu público estava localizado em centros maiores e, como a
empresa conseguiu somente a certificação municipal, a sua área de mercado ficou restrita, o
que tornou inviável a continuidade do empreendimento. Como a legislação que regulamenta o
funcionamento e as exigências sanitárias são muito criteriosas, a empresa acabou encerrando
suas atividades em 2009.
Outro ponto a destacar se refere aos órgãos estaduais e federais responsáveis pelas
inspeções e certificações que não se entendem entre si. A legislação não está adaptada para as
pequenas agroindústrias e sim para as grandes indústrias, o que cria dificuldades na hora dos
fiscais verificarem as pequenas agroindústrias. Os procedimentos para registro e os
documentos necessários para a certificação são muito complexos, onerando e dificultando o
pequeno industriário.
No Pacto Fonte Nova a articulação política do governo anterior do município era
muito boa em termos de relacionamento com o Ministério da Agricultura, o que impulsionou
os processos de certificação federal. O programa conseguiu autorização para o funcionamento
de diversas atividades em 2008, com a prerrogativa de que se fizessem adequações, algumas
na própria Secretaria da Agricultura Municipal, com a contratação de mais técnicos, como
também alterações da legislação municipal vigente, entre outros. Em 2009, já no atual
governo municipal, as autoridades do Ministério da Agricultura verificaram as alterações e
constataram que não foram suficientes para se adequar às normas federais. Para se ajustar, o
poder público teria de montar uma nova estrutura e dar mais apoio técnico às agroindústrias.
O governo municipal não viu possibilidade de isso acontecer pelo fato de ser oneroso e
trabalhoso, uma vez que o município possuía outras demandas mais urgentes, frutos dos
problemas existentes nos mais diversos setores que precisa atender. Exemplo disso foi a seca
que assolou o município durante quatro meses aproximadamente; a crise mundial que afetou o
orçamento das prefeituras; a enxurrada que arruinou pontes e bueiros e danificou a estrutura
das estradas; e o vendaval, que destruiu mais de 400 casas em Crissiumal.
100
O grupo que esteve no projeto ao longo dos mais de dez anos sempre soube distinguir
o crescimento (pelo orçamento, pelo PIB municipal) do desenvolvimento (qualidade de vida,
satisfação do trabalho realizado, entre outros). Foi pensando em desenvolvimento que o
projeto foi adiante. A diversificação de atividades que possibilitasse melhoria na renda e
consequente melhoria nas condições socioeconômicas das famílias rurais, representou a tônica
do projeto, que tinha como principal objetivo a permanência das famílias dos pequenos
produtores no meio rural.
Neste contexto, um novo projeto representava uma forma diferente de modelo de
desenvolvimento, contrário ao padrão desenvolvimentista, baseado em grandes
empreendimentos, concentrador de renda e excludente. A proposta de desenvolvimento
primava pelo resgate das potencialidades locais, a partir de um enfoque endógeno, de dentro
para fora.
Procurou-se, então, mobilizar e articular a comunidade local em torno de um projeto
de desenvolvimento que pudesse, a partir de um processo integrado e associativo dos agentes
101
a) Agregação de renda
Com a produção diversificada, o pequeno produtor obteve uma renda extra, com a
comercialização dos seus produtos. Antes do programa, ele dependia muito da produção de
soja, milho e trigo. Atualmente tem outras fontes de renda, fazendo com que tenha mais
estabilidade para viver (situação financeira estável), desde a sua manutenção até o pagamento
de financiamentos, como os obtidos para aquisição de terras e equipamentos ou para o
melhoramento e a ampliação de suas construções. Houve, consequentemente, uma melhora no
nível de vida das pessoas. Essa renda é obtida com a comercialização dos produtos
industrializados, dentre eles os sucos, os embutidos, as conservas, as rapaduras e o melado. O
depoimento de uma das lideranças do projeto retrata bem essa questão:
102
Quadro 4: Demonstrativo da produção de soja e leite, apurada com base nos relatórios anuais da Secretaria da
Fazenda – DTIF – RS
Fonte: Prefeitura de Crissiumal. Secretaria da Fazenda, 2010.
Ao longo de dez anos a soja, atividade principal dos agricultores, passou do primeiro
para o quarto lugar, de 51% para 21,5%, o que equivale a uma diminuição de 29,5% de
participação no total da produção. Sobressaíram-se as atividades como o leite, suínos e fumo
nos primeiros lugares na participação da produção primária. Percebe-se que houve uma
mudança das atividades por parte dos produtores, quando as ligadas ao leite tiveram um maior
resultado.
Sob outro enfoque, cabe destacar que existe um aumento na procura dos produtos
produzidos pelas agroindústrias devido as suas características próprias. São características
nutricionais, culturais, sociais e ecológicas, que chamam a atenção do consumidor. No
Programa tem-se como exemplo os produtos charque suíno, a polpa para suco, os embutidos e
os queijos, que agregam um valor nutricional reconhecido pelos consumidores. Essa
103
A mão de obra subutilizada ou desempregada dos jovens no meio rural também foi
aproveitada. O programa gerou empregos e ampliou a renda para os jovens, que até então
tinham poucas alternativas. Esse aproveitamento se deu principalmente nas atividades que
requeriam melhor formação técnica, como no caso dos produtores de melado e na floricultura.
Os idosos também foram inseridos no programa, e suas experiências aproveitadas.
Exemplo disso é o resgate de conhecimentos por parte das pessoas experientes na fabricação
de alimentos, como o charque suíno, os biscoitos, a fabricação de bebidas como a cachaça e
na produção de vassouras.
Algumas agroindústrias souberam explorar nichos de mercado, produzindo produtos
mais populares para a população com renda mais baixa e, em outros casos, gerando produtos
diferenciados, visando a atender uma classe de consumidor de renda mais alta. Neste caso,
destaque para o caso dos embutidos.
A incorporação da qualidade nos produtos fez com que houvesse uma rentabilidade
maior, diminuindo a pobreza rural do município. A qualidade dos produtos também foi
evidenciada como forma de aumentar a sua demanda por meio do controle de qualidade e da
utilização de melhores insumos. Isso é facilmente percebido nos produtos como melado,
embutidos, lácteos, entre outros.
c) Diversificação da produção
que se mostra esgotada. O sucesso do programa Via Lácteo, que visava o fortalecimento da
atividade leiteira, deu o passo inicial para a diversificação da produção. O produtor foi
preparado tecnicamente para gerenciar melhor a atividade leiteira, com cursos em sala de aula
e visitas técnicas. Possibilitou-se incentivos aos produtores, como areia e pedra brita, para
melhorar as estruturas de suas atividades. Foram mais de mil produtores treinados e
qualificados nos últimos dez anos. Com isso, em 2001, Crissiumal tornou-se o maior produtor
de leite do Estado. Passou de uma produção de 30.000 litros/dia para 100.000 litros/dia. Os
produtores fizeram investimentos como aquisição de matrizes, resfriadores e ordenhadeiras, e
melhoraram a estrutura física e técnica das propriedades. O produtor deixou de ser um mero
“tirador de leite” e passou a ser um empresário do leite.
Nesse sentido, a profissionalização da atividade desencadeou uma nova mentalidade
nos pequenos produtores rurais.
O Programa trouxe novas alternativas de negócios. Aquilo que antes era produzido
apenas para consumo doméstico, agora passou a ser explorado como alternativa de negócios.
Exemplo típico está ligado ao ramo dos alimentos. Em muitas propriedades aumentou-se a
produção de massas, bolachas, queijo, salame, ovos de codorna, carne de avestruz, sucos, mel,
cachaças, vinhos, enfim, uma série de produtos que eram feitos em casa para consumo próprio
passaram a ser produzidos em escala maior para ser comercializados no município e região.
A crescente demanda por produtos ecológicos e saudáveis fez com que os
consumidores adquirissem os produtos coloniais, criando um novo espaço e mercado a partir
de uma marca própria e com um apelo de qualidade no contexto da ideia de produtos naturais.
Houve um bom nível de organização do programa, o que fez com que o número de
empresas de determinada atividade fosse limitado para não exceder a demanda. Os estudos de
viabilidade econômico-financeira também foram realizados junto aos empreendimentos para
garantir um mínimo de possibilidades de sucesso.
A transformação do que é produzido pelos pequenos produtores rurais é que torna
viável a pequena propriedade rural. Com a diversificação da produção foi extinta a
dependência alimentar que o município tinha em relação aos produtos vindos de outros
lugares, fortalecendo a economia local e fazendo com que os resultados da comercialização
ficassem nele. Foi alterada a matriz produtiva e de renda do município. Antes dependente,
quase que exclusivamente da monocultura, que sofria muita interferência das variáveis
climáticas, passou a auferir rendas de outros produtos alternativos à cultura de grãos, que
historicamente era a grande responsável pela geração de renda no município.
107
d) Diminuição da emigração
Nos últimos anos houve uma acentuada migração interna no Estado do Rio Grande do
Sul e uma forte redução na taxa de crescimento da população, fazendo com que vários
municípios tivessem crescimento demográfico negativo, com queda no número de habitantes.
As estruturas fundiárias, que concentram propriedades rurais com menos de 25 hectares, têm
contribuído muito com esse processo migratório da população. Quanto mais distante o
município for da capital (Crissiumal está situado a 500 km de distância de Porto Alegre) e
quanto mais agrícola é a vocação deste, menor é o crescimento da população. Essa população
vai aos grandes centros onde a oferta de trabalho é maior por parte das indústrias que lá se
concentram.
Ao agregar renda e melhorar a qualidade de vida dos produtores rurais oferecendo
trabalho, o Pacto fez com que a população permanecesse no meio rural e ainda possibilitou
que familiares que estavam nos grandes centros urbanos retornassem ao município. Por outro
lado, também menos pessoas migraram para as grandes cidades. Um entrevistado retrata bem
essa situação:
e) Divulgação do município
2002, a agroindústria de cachaça Colônia Nova recebeu o troféu de melhor cachaça do RS. Os
embutidos da agroindústria Saci Agroindustrial já foram divulgados nas feiras pelo programa
Anonymus Gourmet da RBS, filiada da Rede Globo.
Dentre as exposições e feiras, a Expocris, feira de exposição de Crissiumal, abrange
atualmente uma área de 6.000 m² com 258 estandes internos e externos, ocupando um estádio,
um ginásio e vários pavilhões. Um pavilhão de 800 m² foi construído especificamente para a
feira há mais de dez anos. Em paralelo à Expocris ocorre a Feira Regional da Agroindústria
Familiar, já na sua segunda edição em 2009, com espaço específico para estas agroindústrias.
A primeira feira específica para a agroindústria em Crissiumal foi realizada no início do
Pacto, em 1999, denominada “Crissiumal Degusta”, quando os expositores ficavam em
estandes móveis construídas para o evento, no centro de Crissiumal. Eram apenas 8
expositores. Depois de alguns anos a Expocris acolheu a feira de agroindústrias. Em 2009 as
agroindústrias tiveram um local de 1.000 m² dentro da Expocris, com 47 estandes, portanto
dez anos depois já eram mais de 47 expositores.
A Expocris teve um público de 35.000 visitantes em maio de 2009, apesar do contexto
socioeconômico desfavorável devido à seca, quando muitos municípios da região deixaram de
realizar feiras, como em Porto Mauá e Tuparendi, na Região Noroeste do Rio Grande do Sul.
A divulgação do município, sobretudo pela repercussão desse programa de
desenvolvimento municipal, serviu para que as autoridades estaduais e federais olhassem para
Crissiumal e região de forma mais cuidadosa, tanto é que estão em andamento as obras de
pavimentação da RS-305, estrada que liga Três Passos, Crissiumal e Horizontina, uma das
obras mais aguardadas nos últimos anos, que vai beneficiar a economia do município e região
de seu entorno.
O programa tem sido tema de trabalhos acadêmicos em várias universidades, que
também têm contribuído para a divulgação do município. Dentre os trabalhos realizados,
destaque especial para os da área de segurança alimentar e qualidade de vida, no Programa de
Mestrado em Desenvolvimento da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio
Grande do Sul – Unijuí (2007); de políticas públicas e agroindústria de pequeno porte da
agricultura familiar, no Programa de Mestrado em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade
da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro — UFRRJ (2005); de análise de
desenvolvimento de uma agroindústria familiar integrante do Pacto, no Programa de Pós-
Graduação em Educação, com Ênfase em Gestão Escolar, do Instituto de Desenvolvimento
Educacional do Alto Uruguai – Ideau (2006); e da agroindustrialização de pequeno porte e
110
f) Crescimento socioeconômico
1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007
5.339 5.329 4.703 5.705 6.280 6.414 7.583 7.844 8.367 9.687 9.589
Quadro 6: PIB per capita (R$) a preços correntes — período de 1997 a 2006
Fonte: FEE, 2010.
Quadro 7: Valor Adicionado Bruto (VAB) a preços correntes (R$ mil) da agropecuária — período 1997 a 2006
Fonte: FEE, 2010.
Constata-se que o VAB se manteve estável entre 1997 e 1998, com ligeira queda em
1999, crescendo entre 2000 e 2001. Em 2002 e 2005 houve decrescimento, recuperando-se
em 2006.
O Quadro 8 mostra o valor adicionado bruto da indústria no período de 1997 a 2006.
1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
5.111 4.964 8.977 11.124 12.167 9.933 11.663 15.212 20.148 20.372
Quadro 8: Valor Adicionado Bruto (VAB) a preços correntes (R$ mil) da indústria — período 1997 a 2006
Fonte: FEE, 2010.
No setor industrial, o VAB foi crescendo com o decorrer dos anos, com exceção de
1998 e 2002, chegando a R$ 20.372,00 em 2006.
O Quadro 9 mostra o valor adicionado bruto dos serviços no período de 1997 a 2006.
1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
38.886 38.960 30.888 33.444 35.751 43.964 49.568 49.372 54.564 61.214
Quadro 9: Valor Adicionado Bruto (VAB) a preços correntes (R$ mil) dos serviços — período 1997 a 2006
Fonte: FEE, 2010.
113
O VAB no setor de serviços se manteve praticamente estável nos anos de 1997 a 1999,
crescendo em 2000, com ligeira queda em 2002, e obteve aumento novamente de 2003 a
2006.
O Quadro 10 mostra o valor adicionado bruto total no período de 1997 a 2006.
1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
78.401 78.234 73.555 85.583 92.834 87.469 101.209 103.094 106.973 122.022
Quadro 10: Valor Adicionado Bruto (VAB) total a preços correntes (R$ mil) — período 1997 a 2006
Fonte: FEE, 2010.
Percebe-se que o VAB total teve oscilações entre os anos de 1997 a 2002, mas que de
2002 em diante esteve em um crescente de valores.
Ao analisarmos o Índice de Desenvolvimento Socioeconômico para o Rio Grande do
Sul (Idese) que mostra um conjunto de indicadores sociais e econômicos envolvendo
educação, renda, saúde, saneamento e domicílios, constata-se que no período de 2000 a 2006
ocorreu uma taxa de crescimento de 3,49% no período em Crissiumal, enquanto que na região
Celeiro3 foi de 2,36% e no Rio Grande do Sul de 1,46%. O índice municipal ficou acima da
região e do Estado, demonstrando melhora nos níveis sociais e econômicos.
Quanto ao crescimento econômico, também os tributos municipais tiveram uma
evolução. Esses tributos correspondem a: Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial
Urbana (IPTU), Imposto sobre Serviço de Qualquer Natureza (ISSQN), taxas, contribuição de
melhoria e Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI). Em 1997 totalizaram R$
351.466,00, alcançando o montante em 2006 de R$ 960.474,00, resultando em um aumento
de 173,27%. (Unijuí, 2010).
Outro dado que podemos comparar diz respeito às transferências federais, no âmbito
dos auxílios e contribuições, à cota parte do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), à
cota parte especial, ao Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre as exportações,
entre outros. Em 1997 os tributos municipais totalizaram R$ 1.713.406,41 e chegaram a R$
5.510.562,81 em 2006. Um aumento de mais de 221% (Unijuí, 2010).
Com a criação das agroindústrias, novos produtos se originaram, como é o caso do
charque suíno, da cachaça orgânica, da polpa para suco, da carne de avestruz, dos ovos de
codorna, do frango caipira, entre outros. Começam a surgir produtos que antes não eram
3
A região Celeiro é um recorte geográfico dos COREDES/RS, e compreende os municípios de Barra do Guarita,
Bom Progresso, Braga, Campo Novo, Chiapetta, Coronel Bicaco, Crissiumal, Derrubadas, Esperança do Sul,
Humaitá, Inhacorá, Miraguaí, Redentora, Santo Augusto, São Martinho, São Valério do Sul, Sede Nova, Tenente
Portela, Tiradentes do Sul, Três Passos e Vista Gaúcha.
114
sequer imaginados, como é o caso do agricultor que produz hortigranjeiros, ou aquele que faz
vassouras de palha, ou, ainda, o que faz conservas e o que fabrica melado e rapadura.
O crescimento econômico do município tem relação direta com os investimentos que
foram realizados no decorrer do programa (financeiros, capacitação, materiais para
construção, técnicos, desenvolvimento de produtos). Ocorreu uma considerável mudança com
os incentivos e investimentos em torno de um programa de desenvolvimento local que
procurou resgatar a vocação de uma população e a vontade política das lideranças locais, que
anteriormente se encontrava adormecida.
Esses dados mostram um crescimento em todos os setores da economia do município.
Isso reforça a tese de que um programa de desenvolvimento integrado e articulado pode
transformar a economia local, criando empregos, rendas, impostos e melhoria das condições
de infraestrutura e qualidade de vida num determinado espaço territorial.
O fato de o programa existir exigiu das agroindústrias uma infraestrutura básica, que
fez com que o poder público se mobilizasse. Exemplo disso são as instalações das redes de
água que foram proporcionadas para as agroindústrias, pois as mesmas necessitavam de água
de qualidade para produzirem os seus alimentos e produtos. Foram instaladas 42 novas redes
de água em um período de oito anos.
Foi construída uma sede própria entre 2008 e 2009 para a Cooper Fonte Nova, com
espaço maior para atender os associados e abrigar a parte administrativa.
A foto a seguir apresenta as atuais instalações da Cooper Fonte Nova.
Outro fato a destacar em melhorias se refere ao lixo urbano, que era depositado a céu
aberto. Durante o período do Pacto, foi criada uma usina de reciclagem, gerando em torno de
30 empregos, em que seis prefeituras se uniram e criaram o Consórcio Intermunicipal de
Tratamentos e Resíduos Sólidos Urbanos (Citresu), uma empresa pública, formada pelos
municípios de Três Passos, Crissiumal, São Martinho, Sede Nova, Campo Novo e Bom
Progresso, no Rio Grande do Sul. Atualmente mais municípios fazem parte desta empresa.
Foram destinados recursos para melhoria da habitação rural, em parceria com o poder
público, com o sindicato dos trabalhadores rurais e com as entidades financeiras, por
intermédio de programa do governo federal. Foram em torno de 350 moradias beneficiadas,
sendo 170 casas reformadas e 180 construções novas. Isso aconteceu nos últimos cinco anos,
e uma parte dos recursos os agricultores recebem a fundo perdido. Esse incentivo era de R$
5.900,00 e atualmente é de R$ 12.000,00 por produtor.
Os recursos destinados do Programa Fome Zero, por meio da Conab, onde os
agroindustriários comercializavam seus produtos pela Cooper Fonte Nova, totalizaram em
2005 em torno de R$ 85.000,00, atendendo 17 entidades, entre elas a Apae, Abemec, o asilo,
116
comprometimento geral por parte da população, ao mesmo tempo em que foi preservada a
liberdade de cada agroindústria de gerir seu negócio de forma individual.
O programa proporcionou um melhor entendimento por parte dos agroindustriários das
atividades da agroindústria e a forma de administrá-la. Com isso os proprietários começaram
a interagir uns com os outros, trocando experiências, participando juntos em feiras,
comercializando de forma colaborativa. Transferiam tecnologias de produção, buscavam
qualificação e divulgação de forma conjunta, enfim, promoviam união, entendimento e
cooperação.
Este programa mostrou que as agroindústrias de Crissiumal criaram formas efetivas de
manutenção dos produtores no meio rural. As agroindústrias localizadas na área rural ou
urbana incrementaram a renda das famílias por meio da agregação de valor aos produtos, da
criação de postos de trabalho, do incremento da arrecadação de impostos, da melhoria da
qualidade de vida da população em geral. Foi um trabalho que envolveu todos os atores
sociais (produtores, consumidores, comércio, entidades), mobilizados na construção dos
chamados projetos estruturantes, em que toda a população fica guarnecida, principalmente
pelo fato de que aquela parte da população mais empobrecida (marginalizada) teve
oportunidade de melhorar a sua condição de vida.
mais avançadas que as de municípios vizinhos, que não possuem esse tipo de empresa
cooperativa, tanto no aspecto da organização, do processamento e da estruturação, quanto da
qualidade dos produtos.
A cooperativa traz autonomia aos agroindustriários para que não tenham total
dependência do poder público, tanto na gestão quanto na capacitação dos participantes dos
empreendimentos. A cooperativa abrange um leque de interesses variados, pois seus sócios
são pessoas físicas e jurídicas, do meio urbano e rural, que engloba pequenos e médios
empreendimentos.
A cooperativa também teve importante papel no início das atividades das
agroindústrias porque assumiu a parte burocrática dos empreendimentos, apoiou na gestão,
ajudou na qualificação profissional, como também auxiliou sobremaneira na disseminação de
valores ligados à qualidade de vida e exercício da cidadania.
O selo de qualidade Fonte Nova, criado para distinguir os produtos, foi fornecido para
todos os empreendimentos assim que eles estivessem de acordo com a legislação. Quem
obteve o selo de qualidade no início das atividades permaneceu com ele, de modo que
ninguém se descuidou no compromisso com a qualidade.
Existem muitas agroindústrias que atuam no mesmo ramo de atividade que as de
Crissiumal em outros municípios, porém percebe-se que muitas delas estão trabalhando de
forma clandestina ou têm dificuldades de progredir, pois estão desamparadas, com apenas
orientação de uma entidade isolada, sem suporte de uma organização cooperativa.
Em Crissiumal, onde o envolvimento foi de todas as entidades de forma cooperada, as
agroindústrias se desenvolveram e obtiveram sucesso em termos de sobrevivência,
crescimento e adequação às normas legais.
parceria com o Senar, gratuito para os associados para estimular iniciativas de novos
negócios.
Nos treinamentos existe uma circulação grande de informações por parte dos
participantes (agroindustriários) que é muito rica. É a chamada aprendizagem coletiva, em
que os mesmos trocam conhecimentos e experiências além do previsto no curso ou
treinamento.
Vários negócios que começaram pequenos e talvez por esse fato não tivessem
condições de sobreviver, hoje já atingem um porte considerável. Acredita-se que as inovações
tecnológicas introduzidas e a tradição produtiva aceleraram esse processo de expansão dos
negócios. Os mecanismos de microcrédito intermediados pelo Pacto, tanto nos financiamentos
junto as instituições bancárias particulares e federais quanto nos auxílios fornecidos por parte
do governo municipal, alavancaram grande parte dos atuais negócios.
A percepção que se tem é de que o programa tornou os envolvidos fregueses deles
mesmos, desenvolvendo o mercado, alcançando escala e garantindo a demanda.
As empresas Produtos Weber, de vinhos, e Viveiros Weber já existiam antes do Pacto,
mas tiveram um desenvolvimento considerável a partir do apoio do programa. A empresa de
mudas Viveiros Weber começou com 12 hectares, trabalhando com mudas nativas, com uma
produção de 5 mil mudas, e atualmente cultivam 200 mil mudas frutíferas. A empresa
Produtos Weber fazia vinho colonial até 1998, sem ter uma cantina. Com o Pacto, a empresa
investiu mais e hoje os equipamentos não perdem em nada se comparados às grandes
vinícolas do Estado. A empresa obteve muitos incentivos de marketing por parte do Pacto,
utilizando as visitas na vinícola para fazer negócios com as mudas frutíferas. Isso possibilitou
divulgar o produto e ser aceito no mercado.
A empresa de laticínios Grun Willy também já existe há mais tempo, mas se
desenvolveu e se manteve no mercado em função da comercialização por meio dos programas
do governo federal, intermediados pelo Pacto, mais especificamente no campo da merenda
escolar. Atualmente a produção é de 33.000 litros/mês. A produção inicial era de 6.000
litros/mês.
A floricultura São João iniciou com três carroças de plantas em uma área alugada, e
hoje tem uma área própria de 2.000 m² e pretensões de abrir uma filial em um município
vizinho.
A tradição se reflete na produção de cachaça, e foi resgatada a maneira de produção
com os antecessores (avós). A agroindústria de cachaça orgânica iniciou com o Pacto.
Começou produzindo 12 mil litros de cachaça, aumentou para 50 mil e atualmente produz
127
cerca de 100 mil litros do produto em uma safra normal, sem estiagem, em uma área de 20
hectares. Uma parte da produção é exportada e, em torno de 85% da produção, é
comercializada na grande Porto Alegre. Participa anualmente em feiras, principalmente na
Alemanha.
A agroindústria de melado iniciou fazendo rapaduras e com o Pacto se aperfeiçou,
construiu instalações de forma adequada, teve orientações técnicas e financeiras e atinge
25.000 kg de melado/ano em safra normal. Trabalham na agroindústria o casal proprietário e
mais dois filhos.
A agroindústria Conserva Vida e Saúde iniciou na incubadora com a produção de
alguns vidros de conserva. Em 2008 iniciou com conserva de pepino, em torno de 4.000
unidades e atualmente produz 25.000 unidades. Por possuir capacidade limitada, não aumenta
a produção.
A agroindústria de frango caipira iniciou abatendo em torno de 30 cabeças/mês e hoje
abate em torno de 600.
As agroindústrias têm acompanhado as tendências tecnológicas, o que ocasiona a
expansão dos negócios. Tanto é que existem agroindústrias que participam dos leilões
eletrônicos, emitem nota fiscal eletrônica, criam novos produtos, adquirem novos
equipamentos e computadores para pesquisas de produto.
Acompanhar as tendências de mercado quanto às novas tecnologias é um fator
utilizado pelas agroindústrias. Tanto é que a agroindústria de polpa de frutas participa dos
programas do governo federal e atende a prefeitura de Horizontina no item merenda escolar,
mediante licitação e pregão eletrônico. Na época das entrevistas um funcionário da
cooperativa havia auxiliado a empresa na participação do pregão. Na próxima operação a
própria proprietária vai realizá-la.
Pode-se concluir que houve competição e cooperação ao mesmo tempo. Existiam
agroindústrias do mesmo ramo que competiam entre si, pois como se sabe a concorrência é a
forma de levar uma empresa ao melhor desempenho. Ao mesmo tempo essas agroindústrias
trocavam experiências e indicavam umas às outras, quando não conseguiam atender o
mercado. Exemplo disso é a Horticultura Verde Vida. No início de suas atividades participava
dos programas federais para abastecer as escolas e asilos. Com o decorrer do tempo, foi se
especializando, com tecnologia para irrigação, estrutura coberta para as hortaliças, embalagem
adequada para atender os supermercados e, a partir daí, desistiu da participação dos
programas federais, abrindo as portas para outros pequenos agricultores produtores de
hortaliças. A empresa desenvolveu, portanto, uma nova estratégia de nicho e tomou a decisão
128
70 esse modelo sofreu um declínio com a crise do petróleo, demonstrando o esgotamento das
principais fontes energéticas mundiais.
O novo paradigma de desenvolvimento, segundo Buarque (2004), tem como base a
aceleração e aprofundamento da revolução tecnológica e organizacional, a aceleração da
globalização que amplia a integração econômica, a formação de blocos regionais e o
surgimento de redes empresariais de grande porte com atuação global.
Tenório (2007, p. 105) define desenvolvimento local como “um processo centrado em
um território concreto no qual os protagonistas são uma pluralidade de atores que ocupam
determinadas posições no espaço social e que estabelecem relações em função de objetivos e
projetos comuns”. Destaca que o processo de desenvolvimento local é facilitado por meio de
“decisões concertadas de modo deliberativo entre a sociedade civil, o mercado e o poder
público, é a proximidade entre a autoridade pública e a população” (TENÓRIO, 2007, p. 106).
Ocorre uma interação entre a sociedade e o Estado, num contexto em que os atores ficam mais
próximos e com isso há uma facilidade de adequação quando ocorrer necessidade.
No entendimento de Buarque (2004) “o desenvolvimento local pode ser conceituado
como um processo endógeno de mudança, que leva ao dinamismo econômico e à melhoria da
qualidade de vida da população em pequenas unidades territoriais e agrupamentos humanos”.
Esse autor defende que o desenvolvimento local deve utilizar as potencialidades locais,
gerando oportunidades sociais, viabilizando a economia local, preservando os recursos
naturais e atendendo à qualidade de vida da população local.
Sob o mesmo enfoque, Barquero (2001) traz o conceito de desenvolvimento endógeno
como sendo o desenvolvimento em uma perspectiva territorial, no qual cada cidade ou região
tem um caminho de desenvolvimento, de acordo com as formas de produção e tecnologias
utilizadas pelas empresas deste local. Esta visão remete ao atendimento das necessidades
desta população, por meio da participação da comunidade. Seu objetivo está acima de obter
ganhos individuais. Busca o bem-estar social, econômico e cultural de toda a comunidade
local. A estratégia de desenvolvimento interfere nos aspectos produtivos e nas dimensões
sociais e culturais, que influenciam o bem-estar de toda a sociedade. As pequenas e médias
empresas possuem papel importante na abordagem do desenvolvimento endógeno por
possuírem flexibilidade e capacidade empresarial e organizacional. O desenvolvimento
endógeno é uma estratégia para a ação, com isso as comunidades locais que têm uma
identidade própria, tomam iniciativas que as levem ao desenvolvimento. À medida que se
fortalecem, essas comunidades conseguem evitar o êxodo de pessoas e empresas para outras
localidades.
130
Nessa ótica de desenvolvimento, o Pacto Fonte Nova nasceu como um programa que
tinha como propósito a disseminação de inovações; aproveitar a capacidade empresarial
existente; qualificar os produtores, integrando-os ao comércio local; atentar para a
conservação do meio ambiente e recuperar a história e a cultura do seu povo, que tinha uma
vocação agrícola.
O programa Pacto Fonte Nova teve como compromisso implantar um modelo de
desenvolvimento rural sustentável, que proporcionasse aos pequenos proprietários rurais
progredir em suas atividades agroindustriais com eficiência econômica, agregando renda e
gerando condições de vida na propriedade rural com dignidade (PACTO FONTE NOVA,
2007).
Duas iniciativas importantes marcam o início do Pacto. Uma delas foi a pesquisa
realizada pelos alunos da rede estadual para mostrar o que poderia ser produzido no município
e que estava vindo de outros locais. A outra iniciativa foi buscar modelos de desenvolvimento
em outros locais para subsidiar possíveis ações a serem implantadas no município.
O Pacto Fonte Nova foi fruto de uma ação gestora orientada por princípios de
mudança e desenvolvimento num determinado território (FISCHER, 2002), na medida em
que houve um grande engajamento dos agentes de desenvolvimento local (poder público,
mercado e sociedade mais ou menos organizada), em torno de um projeto alternativo e
solidário, em que valores como qualidade de vida, inclusão de setores marginalizados e
obtenção de resultados coletivos estavam presentes na estratégia gestada pelos organizadores
do Pacto.
Os componentes principais das iniciativas de desenvolvimento local são, segundo
Llorens (2001), o desenvolvimento mais equilibrado territorialmente, impulsionando-se
iniciativas de desenvolvimento local e geração de emprego e renda para enfrentar pobreza e
marginalização; criação de entornos institucionais econômicos, sociais, políticos e culturais
para impulsionar o desenvolvimento do potencial local, compreendendo difusão de inovações;
reorganização das bases empresariais e aprimoramento de infraestruturas básicas; e
capacitação de recursos humanos e criação de sistemas de informações locais.
Todos esses componentes apontados por Llorens (2001) estão presentes no movimento
que deu origem ao Pacto Fonte Nova.
Quanto ao desenvolvimento mais equilibrado territorialmente, gerando emprego e
renda para enfrentar a marginalização daquela parcela de produtores rurais anteriormente
marginalizada, constata-se o aumento de mais de 18% nos produtores rurais ativos entre os
anos de 1997 a 2007, o índice de renda cresceu 3,08% pelos dados oficiais (FEE, 2010) e se
133
criou emprego para 165 trabalhadores nas agroindústrias, além dos demais atores que
fornecem os produtos para as mesmas. O aumento da renda se deve à agroindustrialização dos
produtos, gerando ganhos superiores aos produtores.
Houve a difusão de inovações e novos conhecimentos com o processo de
agroindustrialização de produtos. Em função das agroindústrias houve uma criação de
entornos institucionais. A Cooper Fonte Nova é um exemplo dessa iniciativa. Ela foi
constituída porque os produtores sentiram a necessidade de instituir um instrumento político e
organizacional que pudesse viabilizar o entendimento em torno da gestão dos negócios, como
também criar mecanismos para viabilizar a comercialização dos produtos em escala
empresarial, para que ela pudesse contribuir nos processos de compra de insumos e
intermediação dos negócios.
O programa impulsionou o processo de melhoramentos em infraestrutura, como, por
exemplo, melhora nos índices da área da saúde, da educação, do saneamento e domicílios, e
do Índice de Desenvolvimento Socioeconômico (Idese). Além disso, foi construído o prédio
para as empresas iniciarem suas atividades, denominado incubadora; instaladas de forma mais
intensa as redes de água, num total de 42 redes no período de 2000 a 2008, construídas e
reformadas 350 moradias dos produtores rurais e destinado o lixo para uma empresa de
reciclagem.
Quanto à capacitação dos recursos humanos e sistemas de informações locais, pode-se
citar os treinamentos realizados pela Emater aos produtores no que tange à
fabricação/industrialização dos produtos, as parcerias com o Associação Comercial, Senar e
Sicredi nos treinamentos na área de gestão e empreendedorismo, os treinamentos realizados
pelos técnicos das entidades (prefeitura, cooperativas, Emater) aos agroindustriários, a
adequação às normas sanitárias, e das instalações e embalagens. Além do mais, a Cooper
Fonte Nova repassava constantemente informações quanto à forma legal de produzir e
comercializar os produtos dos agroindustriários.
Brum e Müller (2008) destacam que unir as forças dos agentes locais a fim de investir
nas localidades e transformá-las em um ambiente apto ao desenvolvimento, é uma ideia
recente. O autor entende que existe uma necessidade de direcionar ações de políticas públicas
e privadas para incentivar o processo de desenvolvimento local. Os projetos e políticas de
desenvolvimento, no entanto, devem considerar as peculiaridades locais, atentando para o
aspecto de que a agricultura é a principal característica em várias regiões brasileiras, portanto
deve-se desenvolver a cadeia produtiva da região e agregar valor ao que é produzido.
134
Com o Pacto Fonte Nova houve a união de lideranças do município, dentre elas o
poder público, a Associação Comercial, Emater, Sindicatos, cooperativas, também chamados
de agentes locais por Brum e Müller (2008), que direcionaram suas ações para os pequenos
produtores rurais, possibilitando novas alternativas de trabalho e renda aos mesmos,
provocando um processo de desenvolvimento local.
Na situação em estudo, a agricultura de Crissiumal vinha num processo de
monocultura. Com o Pacto Fonte Nova houve uma transformação das atividades, com a
criação e desenvolvimento de várias agroindústrias, nos mais diversos setores, atendendo ao
aspecto do desenvolvimento da cadeia produtiva e agregação de valor de que tratam Brum e
Müller (2008). É o que se chama de reversão da matriz produtiva, antes calcada na
monocultura e, depois da implantação do Pacto, transformada em uma economia
diversificada. Fato constatado pelo número de agroindústrias criadas e ampliadas, sendo mais
de 30 empreendimentos com diversificação de atividades, criadas em função do Pacto, como
as agroindústrias de frango caipira, cachaça orgânica, melado, conservas, embutidos como o
charque suíno, sucos de polpa de frutas, floricultura mais aprimorada, entre outras. Esses
produtos passaram a fazer parte da mesa dos crissiumalenses, antes vindos, na sua grande
maioria, de outros municípios. Em consequência, o setor de serviços ampliou seu campo de
atuação, desenvolveu o turismo e o lazer, foram criados e ampliados hotéis, cabanas, trilhas,
restaurantes, diversificando as opções.
Na abordagem sobre desenvolvimento local cabe destacar, de acordo com Brum e
Müller (2008), a importância dos produtos certificados para atender a nichos de mercado e/ou
demanda por parte da população por produtos qualificados em todas as etapas da cadeia
alimentar. De acordo com os autores, a segurança do alimento é um dos elementos mais
importantes do novo processo produtivo, e se refere ao incremento da industrialização,
urbanização, aumento da concorrência e novas demandas dos consumidores.
Cabe destacar que a busca pela certificação sanitária sempre foi um objetivo e uma
necessidade das agroindústrias participantes do Pacto, certificação essa que tornava os
produtos mais confiáveis e ampliava os mercados. Por meio do Serviço de Inspeção
Municipal (SIM), demonstrava-se que os produtos estavam de acordo com as normas, uma
vez que eles recebiam a certificação após as inspeções dos técnicos do programa. Com o
decorrer do tempo as agroindústrias foram obtendo as certificações estadual (Cispoa) e federal
(SIF), de acordo com as necessidades e exigências do mercado. A marca Fonte Nova também
foi de grande importância ao demonstrar a qualidade dos produtos, pois as agroindústrias a
135
obtinham após a inspeção dos técnicos do Pacto e a qualidade dos produtos era condição para
consegui-la.
Fischer (2002) tem afirmado que os protagonistas das ações de desenvolvimento, na
perspectiva do local (de um determinado território), são governos, empresas, comunidades
organizadas em redes produtivas, configurando o chamado “entorno territorial inovador”. A
ação desenvolvida em Crissiumal, por meio do Pacto Fonte Nova, que mobilizou o poder
público (governo), fez surgir mais de 30 novos empreendimentos agroindustriais e a
integração com o comércio existente no município (empresas) e criou uma rede produtiva de
produtos agrícolas, envolvendo as atividades de produção, industrialização e comercialização,
no contexto de uma cadeia produtiva (rede produtiva), que integrou produtores e agregou
valor aos produtos, aumentando a renda nas propriedades rurais, sem dúvida estabeleceu um
“entorno territorial inovador”, na medida em que esse movimento proporcionou uma nova
dinâmica produtiva e melhoria das condições da população daquele território.
Estabeleceu-se uma nova situação, tanto econômica, com novas possibilidades de
produção, incorporação de novas tecnologias de produção e novos canais de comercialização
e distribuição desses produtos agrícolas, quanto social, de melhoria das condições de vida das
famílias envolvidas, na medida em que proporcionou novos ganhos e criou condições de
fixação no campo e abertura de novos postos de trabalho e ocupação das pessoas que
anteriormente estavam sem alternativas de emprego. Foi, portanto, uma ideia inovadora que
trouxe grandes benefícios para aquele segmento da população do município de Crissiumal que
se encontrava numa situação de estagnação e de poucas alternativas de sobrevivência.
Esta mesma autora, ao estabelecer um contraponto entre os dois sentidos de
desenvolvimento — a orientação para a competição e a orientação para a cooperação ou
solidariedade — enfatiza que esta segunda vertente inspira-se em valores de qualidade de vida
e cidadania, ou seja, na possibilidade de inclusão de setores marginalizados na produção e
usufruto dos resultados. Esse processo de desenvolvimento local desencadeado pelo Pacto
Fonte Nova vem ao encontro dessa perspectiva. A preocupação com a qualidade de vida
daqueles produtores rurais e da população em geral do município sempre foi o mote central
dessa iniciativa de desenvolvimento. A ideia era criar condições para que a população do
município de Crissiumal pudesse ter melhor qualidade de vida na medida em que encontrasse
uma alternativa econômica que possibilitasse maior geração de renda.
De outra parte, a preocupação com a cidadania, em termos de inclusão dos pequenos
produtores rurais, que estavam sendo excluídos da atividade agrícola por força de um modelo
que tinha na produção de soja a única alternativa e que se mostrava inviável para as pequenas
136
então, mobilizar e articular um grupo de pequenos produtores rurais que pudessem, a partir de
um processo integrado e associativo, criar condições objetivas de agregação de valor aos
produtos do campo e estabelecer uma nova dinâmica produtiva e de comercialização que
garantisse a sobrevivência e permanência das pessoas no campo, além de oportunizar
possibilidades de competitividade desses produtos no mercado. É nesse contexto que surge a
criação da Cooper Fonte Nova como um importante instrumento político e econômico que
deveria organizar e unir os produtores e criar condições objetivas para a eficiente produção e
comercialização dos produtos no mercado competitivo, por meio de uma grande estratégia
coletiva, que tinha a premissa de encontrar alternativas de sobrevivência de um segmento que
enfrentava sérias dificuldades de sustentabilidade, mas também deveria preparar esses
produtores para competirem no mercado.
Na adoção de estratégias coletivas, para Balestrin e Verschoore (2008) as empresas
conseguem alcançar e sustentar diferenciais competitivos a partir das seguintes vantagens: a)
aprendizado mútuo, no desenvolvimento de novos produtos e processos; b) coespecialidade,
na exploração de novos nichos de mercado; c) melhor fluxo de informações, promovendo
ganhos com as experiências dos parceiros e redução dos níveis de incertezas; e d) economias
de escala, na medida em que desenvolvem ações conjuntas que reduzem custos e
potencializam o uso dos recursos.
Todas essas vantagens foram percebidas com a união e cooperação das agroindústrias
no Programa Pacto Fonte Nova e em torno da Cooper Fonte Nova.
O trabalho coletivo proporcionou aprendizado mútuo, na medida em que os
agroindustriários do Pacto conheciam outras propriedades em outros locais; visitavam feiras;
faziam cursos de capacitação em processos de produção, por exemplo na linha de sucos,
bolachas, conservas, hortaliças; tomavam conhecimento de novos processos de fabricação,
como os da área de embutidos e bebidas lácteas; participavam de treinamentos, por exemplo
para atendimento de visitantes ou para conservação do meio ambiente, entre outros.
As estratégias coletivas adotadas pelos agroindustriários viabilizaram a
coespecialidade, abrangendo novos mercados, como é o caso da cachaça orgânica,
comercializada dentro e fora do país; dos embutidos, que produzem produtos diferenciados
como o charque suíno e embutido com menor quantidade de sal; o frango caipira, entre
outros. A cooperação entre os agroindustriários proporcionou a comercialização dos produtos
em feiras da região e feiras de grande porte como a Expointer, totalizando um percentual
significativo das vendas efetuadas pelas agroindústrias, abrangendo um novo mercado, que
não existiria sem a colaboração de todos os agroindustriários.
138
facilita a sua identificação. As próprias cestas de produtos Fonte Nova, ofertadas nas palestras
e visitas a autoridades para divulgação do Pacto, são compostas pela maioria dos produtos
Fonte Nova, o que faz com que haja uma divulgação de todos os produtos do Pacto. Os
aspectos legais e tributários são disseminados a todos os agroindustriários, fazendo com que
os mesmos se mantenham atualizados e dentro das normas, é uma forma que se reflete no
sistema cooperativo.
As viagens realizadas por grande número de agroindustriários do mesmo ramo de
atividade para conhecer novos produtos, e a forma de produção e industrialização destes,
demonstra como é a cooperação utilizada pelo Pacto, quando todos são favorecidos, pois
muitos desses agroindustriários competem entre si. O resultado dessa forma de coopetição é
comprovada no momento em que essas agroindústrias se destacam perante outras da região
que não atingem os mesmos resultados e não permanecem no mercado, como as
agroindústrias participantes do Pacto e da Cooper Fonte Nova.
Por outro lado, as agroindústrias competem entre si. O que se percebe é que cada uma
delas busca o seu mercado, para não inviabilizar o negócio de outra. É o caso da agroindústria
produtora de frango caipira, que inicialmente participava da comercialização por meio dos
programas federais, com a prefeitura, e com o decorrer do tempo conseguiu novos mercados e
deixou essa oportunidade de comercialização para outros produtores/agroindustriários. Outro
exemplo, dentre muitos, é o agroindustriário produtor de hortaliças e verduras que se
especializou nessa atividade, e atende atualmente somente os mercados, deixando
oportunidade para outros participarem dos programas federais de merenda escolar.
Grande parte dos agroindustriários se beneficia com a cooperação, pois obtém
assessoria dos técnicos quanto às normas sanitárias para ter certificação nas esferas municipal,
estadual e federal. Esses técnicos são mantidos pela Cooper Fonte Nova e a prefeitura.
Essa estratégia coletiva adotada pelo Pacto em conjunto com a Cooper Fonte Nova fez
com que os agroindustriários recebessem treinamentos técnicos tanto nos processos de
produção quanto na gestão de seus negócios. Na sequência essa estratégia trouxe os visitantes,
via excursões, que adquirem os produtos das agroindústrias, ocorrendo um ganho extra sem
necessitar sair de sua propriedade, com menos custo para o proprietário. Todas essas
excursões são gerenciadas pela Cooper Fonte Nova, parceira dos empreendimentos.
Essa forma coletiva faz com que os custos sejam diminuídos, pois, ao participarem de
uma feira para comercializar seus produtos, os agroindustriários dividem o transporte e o
espaço na feira, um comercializa o produto do outro, se revezam na participação em feiras,
mas todos os produtos vão para a comercialização.
140
Este capítulo tem a finalidade de mostrar algumas conclusões sobre o estudo realizado
a partir do atendimento aos objetivos propostos pela pesquisa. Inicialmente são apresentadas
as conclusões relativas ao estudo de caso. Em seguida são expostas algumas limitações do
trabalho. Por fim, são relacionadas algumas possibilidades de novos estudos, como forma de
aprimoramento acadêmico neste campo de pesquisa.
Conclusões
Delimitações do trabalho
Este estudo procurou entender como o Programa Pacto Fonte Nova constituiu-se numa
iniciativa local de desenvolvimento e como ele impactou na dinâmica de desenvolvimento do
município, a partir da visão dos seus idealizadores e dos agentes envolvidos no processo, sem
estabelecer parâmetros (indicadores) que pudessem dimensionar, em termos quantitativos, o
real significado de desenvolvimento para a região. Ou seja, trabalhou-se numa perspectiva
qualitativa, considerando as opiniões e os sentimentos dos agentes envolvidos. Ocorreu a
análise e interpretação das entrevistas e a relação com a fundamentação teórica.
Este estudo se diferencia em relação aos demais realizados sobre o Pacto Fonte Nova,
pois procurou descrever o processo de mudança que aconteceu em Crissiumal, considerando
uma abordagem de desenvolvimento construída a partir da lógica da cooperação e do
associativismo por parte dos pequenos empreendimentos rurais. Este foi o enfoque que
delimitou a construção desta pesquisa. Pretendeu-se estudar o Pacto Fonte Nova como um
projeto de desenvolvimento construído a partir da capacidade de cooperação e associação dos
agentes econômicos e sociais daquele território.
O estudo limitou-se a contar a história dessa iniciativa (avanços e problemas) no
contexto da importância da lógica da cooperação e solidariedade como estratégia de
desenvolvimento. Essa foi a forma que os pequenos produtores rurais encontraram para se
tornarem mais competitivos no setor de agronegócio, setor estratégico no desenvolvimento
local. Essa narrativa do processo de criação e desenvolvimento desse programa, e
consequente impacto no desenvolvimento local, contudo, foi constituída a partir da percepção
dos seus idealizadores e gestores, como também de alguns agentes envolvidos, restringindo-
se, portanto, às percepções e interpretações destes sujeitos entrevistados. Quando trabalha-se
com percepção de sujeito, a subjetividade está presente.
146
Este tópico dedica-se a delinear algumas sugestões a fim de contribuir com a pesquisa,
por meio da indicação de novos estudos no campo de estratégias competitivas e
desenvolvimento local.
Sugere-se estudos comparativos de iniciativas de desenvolvimento local com lógicas
semelhantes para identificar diferenças de abordagens e problemas comuns existentes, como o
caso de a maioria da população habitar a área rural, com pequenas propriedades rurais, longe
dos grandes centros e pouca ou nenhuma indústria. Esta investigação analisou apenas uma
realidade de desenvolvimento, o empreendimento Pacto Fonte Nova, e, por isso, sugere novos
estudos desenvolvidos numa perspectiva multicasos, considerando outros programas de
desenvolvimento, com características semelhantes, para efeitos comparativos.
Outra sugestão de estudo pode ser na linha da utilização de uma abordagem mais
quantitativa para a análise desse programa de desenvolvimento, ou seja, que possa
dimensionar, via utilização de alguns indicadores (qualidade de vida, crescimento econômico,
retorno de impostos), o real impacto socioeconômico do programa para o município.
Finalmente, sugere-se também, um estudo que possa explorar um aspecto identificado
e não muito explorado aqui, ou seja, os problemas e dificuldades de levar em frente uma
proposta de ação coletiva que exige participação, envolvimento e espírito cooperativo de um
conjunto de agentes que têm interesses individuais e particulares e que necessita unir forças
em prol do interesse comum. Isto é, as dificuldades de implementação das formas
participativas de gestão em projetos de desenvolvimento local.
147
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154
ANEXOS
155
ANEXO I
CRIA O PROGRAMA DE
FORTALECIMENTO AGRO-
INDUSTRIAL “PACTO FONTE NOVA” E
DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.
Registre-se e Publique-se
ANEXO II
Registre-se e Publique-se