Bioetica UNIMONTES
Bioetica UNIMONTES
Bioetica UNIMONTES
Bioética
2012
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EDITORA UNIMONTES
Campus Universitário Professor Darcy Ribeiro
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Secretário de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior Chefe do Departamento de Estágios e Práticas Escolares
Nárcio Rodrigues Rosana Cassia Rodrigues Andrade
Diretora do Centro de Ciências Biológicas da Saúde - CCBS Coordenadora do Curso a Distância de Letras/Inglês
Maria das Mercês Borem Correa Machado Hejaine de Oliveira Fonseca
Diretor do Centro de Ciências Sociais Aplicadas - CCSA Coordenadora do Curso a Distância de Letras/Português
Paulo Cesar Mendes Barbosa Ana Cristina Santos Peixoto
Unidade 1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
Introdução à Bioética . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
1.1 Bioética . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18
Unidade 2 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
Ética e Cultura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23
Unidade 3 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
Epistemologia da Bioética . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
Unidade 4 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
Bioética e Biotecnologias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
4.2 Segurança . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33
Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35
Unidade 5 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
O progresso científico e a bioética . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44
Resumo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45
Atividades de Aprendizagem – AA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51
Ciências Biológicas - Bioética
Apresentação
Caro (a) acadêmico (a),
Seja bem-vindo (a) a esta nova disciplina são em torno do HOMEM e suas relações é a
que lhe apresentará uma discussão acerca do bioética. Tal problemática se apresenta como
problema da bioética. sendo uma implicação entre a ciência, a ética
Diante da problemática que é discutir a e sua inserção nos vários campos do conheci-
modernidade e também a contemporaneida- mento, pensando as ações do homem e seus
de, torna-se necessário ressaltar a dificuldade efeitos na sociedade. É claro que é sabido que
que é se interpor entre o velho e o novo, em a história das ideias éticas se apresenta des-
outras palavras, demarcar as rupturas na his- de a antiguidade greco-romana e podemos
tória do pensamento e as descontinuidades encontrar, mesmo nessa antiguidade, vários
próprias do período, principalmente quando problemas que afligiram o homem e que ain-
levamos em consideração que existe uma es- da hoje o afetam: a violência, a preocupação
pessura muito grande nos discursos ineren- com as formas de se evitá-la e controlá-la, a
tes à Idade Moderna, situando o homem/o fome, as injustiças, a guerra, assassinatos, etc.
sujeito/o humano, eternamente naquela con- Enfim, as várias formas culturais sempre se de-
cepção herdada do pensamento clássico e que bateram com os mais diferentes tipos de pro-
percorre a historia moderna, fundando seus blemas para tentar constituir uma vida social
pilares para o contemporâneo: o subjetivismo ética e o pleno desenvolvimento de um senso
epistemológico versus o objetivismo científi- moral.
co, pois, se o primeiro afirma o sujeito como A bioética consiste no estudo a respeito
condição para o conhecimento, o segundo es- das relações entre os seres vivos. Ela alcança
tabelece o mundo como limite de construção um status de maioridade no ano de 2005 com
do conhecimento. Dada essa espessura entre a aprovação da Declaração Universal de bioé-
o moderno e o contemporâneo, e as enormes tica e Direitos Humanos; a mesma foi aprovada
transformações que perpassam esse “tempo por todos os países que compõem a Organiza-
histórico”, observamos que é urgente falarmos ção das Nações Unidas (ONU). Anteriormente
desse tempo em que se inventa o homem e o as discussões em torno da “bioética” giravam
coloca como o grande pilar edificador de todo em função dos problemas relacionados às áre-
e qualquer acontecimento. E uma das áreas do as de Biomedicina e Biotecnologia. Segundo
conhecimento que se estabelece como refe- Garrafa:
rência para um entendimento e uma discus-
Este material didático deverá lhe pro- seres vivos que compõem a vida se interagem,
porcionar uma compreensão abrangente da se comunicam e fazem cultura.
bioética, a diversidade de questões que ela Ementa: Analisar aspectos históricos da
aponta e seu papel em gerar um amplo de- ética em pesquisa e da bioética. Bases filosó-
bate a respeito da vida nas suas infinitas pers- ficas da bioética. Reprodução assistida: infer-
pectivas, isto é, o conjunto de valores, padrões tilidade, pesquisa com embriões e clonagem.
de conduta, relações intersubjetivas, relações Genoma humano. Organismos geneticamen-
com o mundo, ou seja, comportamentos que te modificados. Inovações tecnológicas: pa-
venham garantir a plena existência, física e psí- tentes. Métodos aceitos para eutanásia de
quica dos indivíduos que pertencem ao teci- animais. Alternativas para animais de labo-
do social. Diante disso, nos preocuparmos em ratório. Implicações éticas, sociais e legais de
constituir uma discussão a respeito da bioética biotecnologia.
significa pensarmos como as relações entre os
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UAB/Unimontes - 8º Período
Objetivos:
• Entender o conceito de bioética e sua evolução histórica.
• Reconhecer e diferenciar os princípios da bioética e suas implicações.
• Conhecer os fundamentos morais da bioética e sua relação com a vida, a existência.
• Compreender a importância da bioética na contemporaneidade.
O autor
Figura 01: ►
Biotecnologia
Fonte: http://bioter-
ceiroano.blogspot.
com/2011/05/
fotos-de-biotecno-
logia.html. Acesso:
20/11/11
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Ciências Biológicas - Bioética
Unidade 1
Introdução à Bioética
INTRODUÇÃO: A proposta da Unidade I espaço possível de reflexão em torno dos pro-
é compreender as bases fundacionais do con- blemas experimentados na contemporaneida-
ceito de bioética partindo da origem da noção de, visando, a partir deles, encontrar respostas
de ética na Grécia até seus futuros desdobra- que possam servir para melhorar as formas de
mentos. A ideia é realizar também um percur- vida.
so histórico acerca do conceito de bioética, os De modo geral, quando falamos de ética
acontecimentos que suscitaram o aparecimen- nos referimos a uma preocupação com os valo-
to das problemáticas a serem discutidas. res do homem, os motivos e fins de suas ações,
“Ética” tornou-se palavra recorrente no ou seja, como agir e construir uma melhor con-
mundo atual, e as questões éticas estão entre duta ou prática. A princípio, a conduta e/ou a
os assuntos mais tratados. Discutida desde a prática diz respeito a uma relação direcionada
Grécia Clássica – aproximadamente 400 a.C. – em função do ideal de virtude, do bem. Mas
a ética atravessa hoje uma série de discursos não se pode daí excluir o fato de que uma prá-
que extrapolam o território da filosofia. Com tica também esteja vinculada ao prazer. Prazer
as grandes e rápidas mudanças ocorridas no que aqui deve ser compreendido como prin-
mundo, propiciadas na maioria pelo avanço cípio de manutenção da vida, propensão ele-
tecnológico, a preocupação em torno de pro- mentar que os vivos experimentam ao buscar
blemas éticos se intensificaram, em especial o agradável e fugir do desagradável, afastar-se
em razão da mudança de comportamento do sofrimento e da dor em vista do bem-estar e
que, segundo os especialistas (pensadores do das boas condições de vida.
problema), levaram a uma transformação na Nesse sentido, a bioética é um campo de
sociedade. A atenção ao debate ético e sua saber que tratará da vida em torno da ideia de
penetração nos variados campos do saber e bem e do prazer enquanto distanciamento da
do conhecimento refletem de certo modo um dor. Para isso, pensa regras e procedimentos
“mal-estar na civilização”, para usar a expres- que de alguma forma possibilitem o convívio
são de Freud, um descontentamento crescen- social e a melhor maneira de respeitar a digni-
te da sociedade com os rumos que ela mesma dade da pessoa humana, o que torna os direi-
tomou e as consequências previsíveis, por ve- tos humanos fundamentais o horizonte de suas
zes indesejáveis, de suas próprias conquistas. preocupações.
Neste contexto, a bioética surge como um
1.1 Bioética
A compreensão do que seja a bioética nidade em ato que não tenha noção da dife-
na mesma palavra que a nomina: é preciso o rença entre o vivo e o não vivo. Deste modo,
sentido dos termos associados à palavra «bio- podemos arriscar dizer que o sentido do
ética». A primeira parte do termo composto «bios» acompanha desde sempre a própria hu-
«bioética», «bio», é proveniente do termo gre- manidade e marca indelevelmente toda a sua
go «bios», que, em seu sentido fundamental, existência exatamente como existência de um
remete para a vida, não apenas para um sen- ente, que se sabe, possuidor de uma diferença
tido relativo qualquer de vida, mas para a vida fundamental relativamente ao não vivo e de
em si mesma, na sua irredutibilidade própria. uma semelhança fundamental relativamente
Tal noção, anterior a qualquer possível con- ao restante vivo, seja ele qual for. Esta desse-
ceitualização e de que esta necessariamente melhança e semelhança fundamentais cons-
depende, adveio lógica e necessariamente da tituem o objeto fundamental de estudo de
intuição precoce de algo de específico diferen- qualquer biologia e áreas afins.
ciador da entidade viva relativamente à enti- Tal noção fundamental é tão forte que
dade não viva. não nos surpreendemos, ao encontrar nas
Dificilmente se pode pensar uma huma- tradições fundadoras de muitas culturas, a
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UAB/Unimontes - 8º Período
definição das potências superiores, muitas ologia, possui antepassados do mais alto nível
vezes de tipo propriamente divino, como po- intelectual e deve, pois, ser capaz de se manter
tências de vida, mesmo de pura vida, em opo- num nível de dignidade intelectual que não os
sição radical a potências de não vida: desde deslustre. A bioética lida necessariamente com
muito cedo, senão mesmo desde sempre, o uma realidade cuja definição não pode ser
homem teve noção da importância ontológi- dada por qualquer intervenção caprichosa de
ca fundamental da «vida» e do seu contradi- índole político-prática, mas tem de ser encon-
tório, a morte. É importante notar que vida e trada através da observação da realidade, sem
morte não são contrários, que podem existir preconceitos ou condicionalismos de qualquer
concomitantemente, mas contraditórios, isto tipo, ideológicos, religiosos, etc.
é, não podem existir concomitantemente em Nesse sentido, a bioética não lida com
sentido pleno. Quando a vida está presente problemas que não sejam os que se relacio-
em determinado objeto, a morte nele encon- nam com a realidade do termo primeiro que
tra-se totalmente ausente; quando a morte se constitui matricialmente o seu mesmo nome:
encontra presente em tal objeto (que já não é o objeto da bioética é a vida na sua relação
«tal objeto» senão em artificialidade teórica e com algo que transcende a pura nacionali-
abstrata), a vida não se encontra presente. Não dade da vida e que é o poder de intervenção
há, pois, senão em más metáforas literárias, in- do homem sobre a vida. O seu âmbito coinci-
termédio entre a vida e a morte. de, pois, com o âmbito da abrangência total
Deste modo, podemos perceber o peso do conjunto intersectivo entre a cultura e a
imenso que o termo «bios» possui, não se res- vida: nada há na relação entre o homem e a
tringindo apenas a uma única tradição, a da vida que possa ficar fora do âmbito de uma
cultura que cunhou este preciso termo, mas bioética que queira ser digna de seu nome.
possuindo relevância ontológica, com matizes Não pode, pois, a bioética limitar-se a ser um
diferentes, em toda a parte em que se encon- fórum de discussão e encontro de normas po-
trem seres humanos. Assim, o termo «bios» líticas de deontologia relativas ao campo da
não é apenas uma referência técnica de uma intervenção de cuidados de saúde e atividades
ciência ou área científica, de uma doutrina ou afins. Se o for, nunca passará de uma disciplina
cultura, mas ensaia dizer aquilo que o homem menor nas mãos de endoutrinadores políticos
percebeu como sendo o cerne ontológico da de vários tipos, que visam apenas controlar a
sua existência como irredutível entidade, isso poderosíssima arma política que é a prestação
sem o que, independentemente de qualquer de cuidados de saúde e, sobretudo, as suas
estudo ou definição, não passa de um cadáver, extensões perversas de controle político de
isto é, de um pedaço de matéria inerte, física pessoas, como foi, por exemplo, o tristemente
e quimicamente indiscernível de qualquer célebre exemplo dos planos aparentemente
outro pedaço de matéria inerte, tenha ou não piedosos «de higiene» biológica inventados
essa “mesma” matéria tido uso como apoio fi- sob a égide de Adolfo Hitler.
sioquímico para a existência de vida, vida que, A presença do termo «bios» na designa-
deste modo, sempre a transcende. Para mais, ção desta disciplina obriga-a, portanto, a ser
no homem, o «bios» atingiu precisamente a uma disciplina que pensa de determinado
capacidade de se pensar a si próprio: com o modo, possivelmente de muitos modos – tan-
homem, a vida atingiu a possibilidade e a atu- tos quantos os que forem pertinentes para
alidade de algo que se pode pôr a si mesmo seu mesmo mister –, a vida e não apenas uma
como tema próprio seu, tema que é exata- sua qualquer limitação operativa. Se era esta
mente o tema fundamental de tal ato. A vida, forma limitada de pensamento que se queria
ao descobrir-se, descobre-se como o grande quando da sua fundação, então, o nome es-
tema de si própria. colhido deveria ter sido outro, por exemplo,
A reflexão sobre a vida, em seus multí- «deontologia dos atos de cuidado de saúde e
modos modos, em disciplinas várias, desde a afins» ou outro qualquer devidamente adap-
poesia mitográfica às mais variadas formas de tado à restrição de âmbito querida. Enquanto
arte, passando pela Filosofia e pela Teologia, a bioética não se tornar uma verdadeira dis-
bem como por uma multidão de disciplinas ciplina de reflexão acerca da vida no que esta
científicas, é provavelmente tão antiga como o tem de relação com a ação do homem, uni-
homem, não como entidade meramente viva versalmente entendidas ambas, mais não será
à maneira da bioética. do que uma tentativa de ganhar predomínio
Deste ponto de vista, a reflexão biológica político sobre a administração de cuidados de
é tudo, menos uma disciplina moderna e mui- saúde e sobre a definição daquilo que deve ser
to menos recente. A bioética, que não pode a vida, especialmente a humana, velhíssima
fugir a esta evidência de sua profunda arque- tentação de todos os tiranos.
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Ciências Biológicas - Bioética
Tememos que uma bioética, que não presente nesse ambiente, dado que, sem esta
respeite o caráter holístico de seu objeto e de última, seria apenas uma meteorologia ou
sua missão, que deve ser ditada por aquele uma geologia, por exemplo. Quer isto dizer
e pelo seu único e exclusivo interesse, torne- que na base de uma bioética qualquer digna
-se apenas uma mera arma a serviço de oli- de seu nome deveria existir um fundado co-
garquias e tiranias que na vida veem apenas nhecimento biológico sobre o qual se deveria
algo a dominar e a explorar em seu exclusivo fundar um profundo respeito pela vida em to-
benefício. Tem sido esta atitude e ação que das as suas formas.
têm provocado as tragédias ecológicas, no Uma bioética reduzida a uma disputa
sentido o mais lato possível deste termo e acerca de questões políticas de administração
noção, de todos conhecidas, em que predo- sanitária e de limites quaisquer para a ação
mina a maior falta de respeito precisamente de intervenientes dentro desta administração
pela vida como tal e pela vida objetivamente será sempre uma disciplina menor, sem dig-
manifestada em entidades outras que a dos nidade e de duvidosa cientificidade, pois, sem
oligarcas ou dos tiranos. a assunção plena de seu objeto, o «bios», será,
Nesse caso, uma verdadeira bioética de- por muitos bons métodos que use, sempre va-
veria ser uma ecologia. Aliás, com o nome de zio de conteúdo fundamental. Esta definição
«bioética», deveria ter nascido a ecologia, pois objetiva não pode senão depender da pura
esta mais não é exatamente do que uma for- objetividade ontológica do «bios» estudado
ma de consideração e de preocupação holís- sob pena de cair, mais do que num moralismo
tica com o ambiente – e a ação humana nele vazio, numa autêntica tirania.
– como um todo e especialmente com a vida
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UAB/Unimontes - 8º Período
Apesar disso, a bioética existe e deve exis- acaba por colocar em questão o próprio ser
tir como tentativa de responder aos desafios do homem ao humanismo, contrapondo um
que os avanços decorrentes, principalmente trans ou pós-humanismo. O desafio existe. O
da engenharia biológica, têm colocado às co- espaço existe. Trata-se de desenvolvê-lo do
letividades humanas. O avanço tecnológico melhor modo.
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UAB/Unimontes - 8º Período
gramas, o que garantia a “legitimidade” cien- O Seattle Artificial Kidney Center tinha
tífica e moral das ações desse Estado totalitá- capacidade para 9 leitos e a diálise era um tra-
rio mas, simultaneamente, violava o princípio tamento raro em muitos Estados americanos.
do consentimento voluntário das pessoas O custo do tratamento girava em torno de
contido nas Diretrizes de 1900 e 1931; e 5) a $10,000/ano e as Companhias de Seguro resis-
utilização de recursos públicos destinados à tiam em pagar um tratamento experimental. A
pesquisa científica, como forma de respon- solução encontrada foi a criação de um Comi-
der à demanda governamental por pesquisas tê de Seleção de Diálise de Seattle.
específicas envolvendo indivíduos não por- Este Comitê era composto por 7 pessoas
tadores das enfermidades que iriam ser in- de diferentes formações que analisavam caso
vestigadas. Assim, contrariamente às práticas a caso, tendo por referência critérios de mérito
anteriores, a partir de 1933 as práticas de pes- social (sexo, idade, status conjugal, nº de de-
quisa consistiam em provocar a doença no pendentes, escolaridade, ocupação, potencial
indivíduo para que pudesse ser investigada, e futuro).
os indivíduos que a ela eram submetidos es- A ideia de transferir uma decisão médica
tavam, muitas vezes, internados em hospitais de salvar vidas para um comitê de leigos aba-
psiquiátricos, asilos ou penitenciárias. (PALÁ- lou a tradicional confiança na relação médico-
CIOS; REGO; SCHRAMM, 2002) -paciente.
1945 – Fim da 2ª Guerra Mundial e das Maio de 1960 - A Pílula Anticoncepcional
atrocidades cometidas pelos nazistas contra - A Food and Drug Administration (FDA) apro-
os seres humanos. va o Enovid, primeiro contraceptivo oral eficaz
1946 – Julgamento de Nüremberg – Tri- (uma combinação de dois esteroides sintéticos
bunal de Guerra - progesterona e estrogênio). A vida sexual e
19 de Agosto de 1947 - Julgamento de social ocidental foi revolucionada pelo uso ge-
Médicos Nazistas no Tribunal de Nüremberg neralizado da pílula anticoncepcional, possibi-
Neste Tribunal, 20 médicos e 3 adminis- litando a emergência de uma bioética feminis-
tradores foram julgados por “assassinatos, ta sobre a autonomia da mulher em gerir seu
torturas e outras atrocidades cometidas em corpo. Seguiram-se debates sobre a questão
nome da ciência médica”, como também fo- do aborto.
ram levantadas questões éticas sobre experi- 1966 – Um artigo de Henry Beecher, pu-
mentação em seres humanos com que a nova blicado no New England Journal of Medicine,
ciência médica iria cada vez mais se defrontar. denunciou inúmeros casos de artigos científi-
1947 – Código de Nüremberg cos publicados com inadequações éticas.
1948 – Declaração Universal dos Direitos 03 de Dezembro de 1967 – Ocorre o pri-
Humanos – ONU meiro transplante de coração realizado pelo
1964 – Declaração de Helsinki – Assem- Dr. Christian Barnard na África do Sul. Emerge
bleia Médica Mundial e posteriores versões a questão da definição de morte, uma vez que
(1975, 1983, 1989, 1996, 1999 e 2000). é necessário que o coração ainda esteja baten-
25 de Abril de 1953 - A Estrutura do DNA do para ser transplantado.
é descoberta e a biologia molecular abre as 05 de Agosto de 1968 - Definição de
perspectivas aplicadas da engenharia genéti- Morte Cerebral
ca e do controle e transformação dos sistemas O NEJM publica “A Definition of Irrevers-
e processos vivos, levantando questões éticas ible Coma: Report of the Ad Hoc Committee
até então impensadas. at Harvard Medical School to Examine the
23 de Dezembro de 1954 – Primeiro Definition of Brain Death”. Duas razões para a
Transplante Renal, realizado pelo Dr. Joseph E. necessidade de uma definição clara, ou supos-
Murray, entre dois irmãos gêmeos univitelinos. tamente tal:
O irmão que recebeu o rim só veio a morrer – Discussão sobre os danos para as pesso-
oito anos após a cirurgia por problemas coro- as com morte cerebral mantidas por medidas
narianos. Novas questões éticas e legais são artificiais. Abrem-se discussões sobre eutaná-
também levantadas com as possibilidades de sia e distanásia.
transplantes de órgãos. – O critério de morte, até então aceito,
09 de Março de 1960 - Comitê de Sele- de parada cardiorrespiratória torna-se obsole-
ção de Diálise de Seattle (God Commission) to e o novo critério de morte cerebral trouxe
A máquina de hemodiálise e o shunt arte- controvérsias para a obtenção de órgãos para
riovenoso (fístula arteriovenosa) possibilitaram transplantes.
o tratamento de pacientes com falência renal. 1969/1970 – É fundado o Hastings Cen-
Surge o primeiro problema ético, histori- ter em Nova York por Daniel Callahan, católi-
camente conhecido como “bioético”: co com formação em teologia e filosofia, mas
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Ciências Biológicas - Bioética
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UAB/Unimontes - 8º Período
Glossário tante cuidado do trato geniturinário e sujeito Embora falemos da “bioética” como um
Filosofia: área do a graves infecções. O Departamento de Justi- conjunto de questões homogêneas, há dois
saber que trabalha na ça do Governo Reagan julgou que não fazer tipos fundamentais de preocupações que atra-
produção de conceitos. a cirurgia constituiria discriminação contra o vessam esse saber. Isso se deve ao fato de que
Etimologicamente, sig- recém-nascido deficiente. O bebê morreu em o termo “bio”, radical da palavra “bioética”, foi
nifica “amigo do saber” 15 de abril do ano seguinte. relacionado por muitos estudiosos às ques-
ou “amante do saber”.
Ética: atenção em A partir desses dois casos surge intenso tões da biomedicina e/ou da biotecnologia.
relação aos valores do debate ético/legal sobre as medidas neonatais Outros, porém, compreendem que o termo/
homem, os motivos e a participação dos pais em decisões que afe- conceito tem um sentido maior, não restrito à
e fins de suas ações, tem a vida de seus filhos. concepção técnica relacionada aos saberes e
ou seja, como agir 27 de Fevereiro de 1997 - Nasce a Ove- tecnologias genéticas. Assim, se por um lado
segundo uma melhor
conduta ou prática. lha Dolly. encontramos a implicação da bioética com
Bioética: A primei- O primeiro mamífero clonado por transfe- as questões da reprodução, transplantes, ge-
ra parte do termo rência nuclear (utilização como matéria-prima noma, por outro, nos deparamos com uma
composto «bioética», de células embrionárias ou células somáticas. discussão que traz para esse campo de estu-
«bio», é proveniente Células somáticas são todas as existentes com dos problemas relacionados à população, à
do termo grego «bios»,
que, em seu sentido exceção das reprodutivas. É retirado o núcleo demografia ou preocupações decorrentes das
fundamental, remete com o material genético desta célula que é relações entre os povos e nações, a violência
para a vida, não ape- introduzido num óvulo enucleado) é anuncia- social, saúde pública, etc.
nas para um sentido do em março de 1997 na Revista Nature pela Na verdade, encontraremos algo em co-
relativo qualquer de equipe do Roslin Institute. Abre-se o debate mum entre essas duas ordens de problemas.
vida, mas para a vida
em si mesma, na sua sobre a clonagem humana, já que a técnica é A bioética em seu processo histórico vai se afi-
irredutibilidade própria. a mesma. nando em torno do cuidado que deve existir
Tal noção, anterior a 2000 - O Genoma Humano quando o assunto é vida e, com muito maior
qualquer possível con- Na sequência dos avanços genéticos, um esforço, quando se trata da vida humana. Em-
ceitualização e de que primeiro rascunho, com 97% da sequência do bora não pretenda contestar os benefícios da
esta necessariamente
depende, adveio lógica genoma humano, foi anunciado pelo presi- ciência, a bioética pretende acompanhar os
e necessariamente da dente dos Estados Unidos, Bill Clinton, pelo desdobramentos do seu desenvolvimento e
intuição precoce de primeiro-ministro da Inglaterra, Tony Blair, colocar em questão: tais avanços melhoram
algo de específico dife- acompanhados pelo presidente da empresa ou colocam em risco a vida? Tal desafio é um
renciador da entidade Celera Genomics, o geneticista Craig Ven- problema da bioética, talvez seu problema
viva relativamente à
entidade não viva. ter e o chefe do Projeto Genoma Humano, mais fundamental: quais são os atuais riscos
o cientista molecular Francis Collins. Novas que a ação humana e, mais propriamente, a
possibilidades se colocaram, então, tanto no ação competente do saber científico podem
Dica diagnóstico das doenças genéticas como na trazer à vida?
terapia gênica.
A primeira obra a tratar
do conceito de ética
de maneira sistêmica
Referências
foi escrita pelo filósofo
Aristóteles e se chama-
va “Ética a Nicômaco”.
Para Aristóteles, o
homem busca a felici-
dade, e esta não diz res- PALACIUS, M.; REGO, S.; SCHRAMM, F. R. A regulamentação brasileira em ética em pesquisa en-
peito nem aos prazeres volvendo seres humanos. In: MACHADO, R. M. et al. Epidemiologia. São Paulo: Atheneu, 2002, p.
e nem as riquezas, mas 465-477.
na vida contemplativa
e sua implicação com a
racionalidade.
18
Ciências Biológicas - Bioética
Unidade 2
Ética e Cultura
INTRODUÇÃO: A proposta desta unidade Os antigos gregos pensavam que a ação
é apresentar uma implicação entre ética e cul- ética deveria ser direcionadas à busca da felici-
tura, mostrando que a noção de valores é re- dade (eudaimonia). A realização da perfeição hu-
sultado das relações culturais construídas pela mana estava justamente na busca pela felicidade
humanidade. Centralizaremos a discussão em do próprio ser, afastando-se dos vícios e limita-
especial a partir do século XVII – modernida- ções; realização da própria natureza humana e
de – e posteriormente será apresentado que a de seu atributo distintivo.
bioética traça uma relação com várias áreas do Desde a virada do século XVIII ao século XIX
conhecimento, tornando-se não só complexa, e também nos séculos XX e XXI, nos deparamos
mas também transdisciplinar. com grandes crises de comportamento ético. Na
A ética é o modo pelo qual podemos maioria das vezes, tais crises são geradas pela
estabelecer um espaço de pensamento a relação entre técnica (avanço tecnológico e seu
respeito da conduta, da consciência e da ex- uso) versus humanismo (marcada pela ideia de
periência das pessoas; de nossa própria ex- desigualdade social, econômica, educacional). A
periência enquanto seres vivos, humanos e violência aumenta vertiginosamente e em gran-
conscientes. Guiados pela ética que constituí- de escala. Encontramos, então, um tipo de para-
mos códigos, sejam eles particulares ou cole- doxo: se, por um lado, o crescimento econômico
tivos, e a partir deles elaboramos referências do século XIX, XX e XXI melhorou as condições
para o comportamento. Esses códigos são de vida de boa parte da população mundial, por
direcionados e nos recolocam a todo instan- outro lado, trouxe com ela um desenvolvimento
te no caminho que nos afasta da dor em fun- não sustentável e que ameaça a vida do planeta
ção da alegria, da felicidade, e impulsionam e de todos os seres que nele vivem. Trata-se de
a nossa vida para um comportamento ético um desafio ético agora aposto às pessoas que,
objetivo, vejamos: gozando das benesses da civilização, precisam
Não podemos restringir o conceito de responder à altura aos riscos a ela corresponden-
ética a princípios legais, isto é, onde há lei ne- tes.
cessariamente encontraremos ações éticas ou Desde que aceitemos o desafio da reflexão
morais. Por exemplo, ao pensarmos a tirania ética, nos deparamos com uma série de ques-
ou ditadura, nos depararemos com uma orga- tões, senão insolúveis, ao menos difíceis: Que se
nização política construída a partir de leis, mas deve fazer em relação aos outros, a si próprio e
isso não garante que tal prática seja a melhor ao ambiente em que se vive? É preciso limitar ao
para a população, para a sociedade. A vincula- deixar livre o impulso de conhecimento? Que fa-
ção necessária entre ética e bem comum esta- zer com as descobertas científicas que parecem
ria bastante distante de uma proposta política se contrapor aos valores tradicionalmente acei-
de caráter tirânica ou ditatorial. Os regimes tos? Que fazer com as tradições morais? Têm elas
autoritários de modo geral restringem o es- ainda alguma ressonância na vida contemporâ-
paço de ação das pessoas, elidindo com isso nea? — tais são, pois, questões de largo alcance
a própria dimensão da construção do caráter que transforma o debate ético num espaço de
(ethos) social. transdisciplinaridade por excelência.
19
UAB/Unimontes - 8º Período
o conceito de disciplina, que, de alguma for- lógico nos ajudam a entender todas as circuns-
ma, fecha o debate acerca de um tema, redu- tâncias que envolvem a realidade.
zindo a sua diferença e complexidade. E onde entraria a ética nessa discussão?
Todas as formas citadas acima são manei- Bem, não é difícil responder. A visão reducio-
ras de apreensão da realidade pelo conheci- nista – marcada pelo racionalismo epistemo-
mento. A questão seria: qual a melhor forma lógico – nos induz a decisões erradas quando
de apreensão da realidade? Seria pela utili- o assunto, por exemplo, for os seres humanos
zação de uma racionalidade instrumental na ou o ecossistema. Um tipo de ética que guie
busca de um princípio qualquer que explique a produção de conhecimento torna-se ne-
o real? Essa perspectiva não seria demais sim- cessária e a implicação dessa produção com
plista? Aqui entra a ideia de complexidade. A a ideia de transdisciplinaridade e complexi-
transdisciplinaridade pretende dialogar com dade ajudará na resolução de problemas éti-
as variações ou variáveis que envolvem a rea- cos que envolvem o conhecimento científico.
lidade. Será que a única forma de abordagem A bioética, nesse caso, torna-se uma área de
do real seria pelo viés científico? Nesse itine- conhecimento que se utiliza desses dois olha-
rário, transdisciplinaridade e complexidade se res: o transdisciplinar e o complexo. A bioéti-
aliam, pois a primeira como argumento episte- ca, por exigência, precisa ficar atenta a esse
mológico e a segunda como recurso metodo- debate.
2.2 Complexidade e
transdisciplinaridade
A transdisciplinaridade surge no sentido de combater antigos paradigmas da modernidade,
como, por exemplo, aquele instituído por René Descartes (foto) na busca pelas ideias claras e dis-
tintas. A presença de Descartes no cenário filosófico moderno vai marcar decididamente toda a
história do pensamento. Ele vai servir de marco para se delimitar a modernidade: o surgimento
do subjetivismo cartesiano como apelo ao homem criador, dominador e conquistador da nature-
za – o homem pensante.
Podemos dizer que Descartes, comumen-
te chamado de principal pensador da Raciona-
lidade Moderna, iniciou seu projeto metafísico
perguntando sobre como é possível conhecer
o real. E, juntamente a esta questão, a proble-
matização da verdade não é mais como dada
pelo mundo externo, físico, natural (como em
Galileu), mas sim como uma qualidade própria
do homem como ser pensante, ou seja, a partir
de Descartes, a verdade é representada sub-
jetivamente. A partir de Descartes, o conheci-
mento não está mais impresso no mundo, mas
seu lugar é na consciência do sujeito pensan-
te enquanto representação e/ou adequação
entre a “coisa” e o pensamento (o cogito). É a
Figura 02: René consciência que demarca e dá validade para o
Descartes que é conhecido.
Fonte: http://www. O cogito, segundo Descartes, cobre toda
mundodosfilosofos.com.
br/foto6.htm. Acesso: a realidade de uma experiência, sendo resul-
20/11/11 ► tado de um processo que coloca em cena uma
questão: a verdade como um projeto de fun-
dação metafísica da consciência. A proposição: “Eu sou, logo existo” põe o pensar como aspecto
essencial do sujeito. E isso em Descartes acaba por transformar a filosofia ulterior como exercício
obrigatório de se concordar ou discordar da proposição cartesiana. A verdade do sujeito, então,
é vista por Descartes como resultado de condição sine qua non da verdade de se pensar – do
cogito. A existência do sujeito como substância extensa é devedora da realidade do pensamento
como aspecto fundador do indivíduo. O sujeito, nesse caso, como expressão de uma substância
20
Ciências Biológicas - Bioética
[...] julguei que me bastariam os quatro seguintes preceitos, desde que tomas-
se a firme e constante resolução de não deixar uma só vez de observá-los: O
primeiro era o de jamais acolher alguma coisa como verdadeira que eu não co-
nhecesse evidentemente como tal; isto é, de evitar cuidadosamente a precipi-
tação e a prevenção, e de nada incluir em meus juízos que não se apresentasse
tão clara e tão distintamente a meu espírito, que eu não tivesse nenhuma oca-
sião de pô-lo em dúvida. O segundo, o de dividir cada uma das dificuldades
que eu examinasse em tantas parcelas quantas possíveis e quantas necessárias
fossem para melhor resolvê-las. O terceiro, o de conduzir por ordem meus pen-
samentos, começando pelos objetos mais simples e mais fáceis de conhecer,
para subir, pouco a pouco, como por degraus, até o conhecimento dos mais
compostos, e supondo mesmo uma ordem entre os que não se precedem na-
turalmente uns aos outros. E o último, o de fazer em toda parte enumerações
tão completas e revisões tão gerais, que eu tivesse a certeza de nada omitir
(DESCARTES, 1962, p. 53-54).
A necessidade de estabelecer um método que tenha como resultado final a clareza dos
princípios absolutos exige de Descartes uma filosofia primeira, que ilumina as regras para a di-
reção do espírito, isto é, de princípios metafísicos, que é a constatação da presença eficiente do
cogito no mundo e que só através do sujeito como substância pensante é que o mundo, naquilo
que é cognoscível, pode ser tratado como certeza científica.
Descartes, ao afirmar a necessidade e a importância primordial do cogito – do puro pensa-
mento –, rejeita a condição dos sentidos como fontes claras do conhecimento.
O método proposto por Descartes produziria um problema, ou seja, perderíamos tudo aqui-
lo que não fosse claro e distinto e determinado por um “eu” ou “ego”. Isso significaria que o cami-
nho analítico não conseguiria explicar a organização do todo. A ideia de complexidade pretende
justamente levar em consideração na produção do conhecimento todos os acontecimentos do
real, inclusive a ideia de desordem.
Segundo Edgar Morin, a complexidade se definiria como:
Para o paradigma da complexidade, vários aspectos da realidade não conseguem ser apre-
endidos pelo recurso metodológico da ciência moderna: “as inter-relações e as interdependên-
cias das partes entre si, o sistema que dá unidade a um todo organizado, a íntima relação entre
a auto- e a eco-organização dos seres vivos e a sua autoprodução, a retroação dos efeitos sobre
a causa, a relação complementar e antagônica entre ordem e desordem” (JUNGES, 2006, p. 21).
Nesse sentido, complexidade e transdisciplinaridade lidam com a ideia de paradoxo ao tratar da
realidade, ampliando as considerações feitas pela ciência clássica, suas formas de objetivação do
mundo. Para cada realidade, há uma rede de complexidade e para apreendermos essa mesma
realidade torna-se necessário um olhar mais atento, uma capacidade de percepção que envolve
um número maior de conhecimento (áreas do saber).
21
UAB/Unimontes - 8º Período
22
Ciências Biológicas - Bioética
Referências
DESCARTES, R. Obra Escolhida. Trad. de J. Guinsburg e Bento Prado Júnior. São Paulo: Difusão
Européia do Livro, 1962.
23
Ciências Biológicas - Bioética
Unidade 3
Epistemologia da Bioética
INTRODUÇÃO: Nesta Unidade, a ideia é discutir a bio-
ética enquanto um campo científico e/ou epistemológico.
Estabelecendo critérios, objetos e metodologia de investiga-
ção, a bioética se coloca no cenário da pesquisa mundial en-
quanto espaço de debate entre várias áreas do conhecimen-
to, além de se estabelecer enquanto um campo particular de
reflexão a respeito do homem e suas ações.
Alguns filósofos tendem a não reconhecer uma episte-
mologia em se tratando de éticas aplicadas. Na verdade, para
os filósofos, o valor utilitário da razão contribui decisivamen-
te para a resolução de problemas no âmbito da tecnociência
e suas complexas práticas. Um problema que surge a partir
dessa posição de alguns filósofos é a relação entre capacida-
de de análise e condição de resolver problemas. Para Kottow:
▲
A busca de decisões moralmente prudentes tem de ser protagonizada pelos Figura 4: Biociência
agentes envolvidos – os profissionais sanitários, os pesquisadores, os ecolo-
Fonte: http://bioterceiroa-
gistas, os terapeutas sociais – por meio do exercício de uma disciplina aplica- no.blogspot.com/2011/05/
da que trata especificamente dos problemas morais que a prática enfrente – e fotos-de-biotecnologia.
os filósofos têm nesses processos funções subsidiárias de assessoria (KOTTOW, html. Acesso: 20/11/11
2006, p. 33).
No século XX, em especial a partir de 1950, há uma sistematização do discurso ético em rela-
ção a determinadas práticas. Isso nos direciona para uma sorte de ética prática ou ética aplicada.
Nesse caso, seu estatuto epistemológico será mais sólido à medida que a bioética se tornar mais
sistemática e seus procedimentos forem orientados para uma aplicação social específica, como
no caso de necessidade de resolução de problemas próprios de uma prática moral enfrentada
pelos agentes envolvidos; como aqueles problemas que dizem respeito à vida humana.
Não podemos jamais esquecer que a bioética é uma disciplina que consegue juntar ou com-
por um vasto campo de conhecimentos teóricos de ética, não abre mão de um profundo debate
analítico, não escapa à experiência dos acontecimentos, incorporando-os para uma avaliação das
ações sempre que necessário. A bioética não pode abandonar a força da racionalidade, a prudên-
cia e a coerência como atitudes normativas.
No início de 1970, os Estados Unidos se assustou com a divulgação da notícia que foram
utilizados pacientes negros com sífilis e síndrome de Down em pesquisas sem a devida aceitação
por parte dos mesmos, sem o consentimento autorizado. Tal fato suscitou uma necessidade de
discussão a respeito dos direitos do paciente. Com isso, o governo americano criou uma comis-
são para discutir a questão. Essa comissão publicou após quatro anos como resultado de uma
série de discussões um relatório chamado Relatório Belmont (1978). Nesse relatório foram pro-
postos três princípios básicos que envolveriam pesquisa em seres humanos:
1° autonomia (consentimento informado do paciente);
2° beneficência (cuidado e atenção do pesquisador em relação aos riscos e benefícios para o
paciente);
3° justiça (equidade em relação aos envolvidos em processos de experimentação).
São esses princípios que nortearam as análises de casos e se tornaram a principal preocupa-
ção no desenvolvimento da bioética.
25
UAB/Unimontes - 8º Período
26
Ciências Biológicas - Bioética
A autonomia vem do grego auto (próprio) e nomos (lei, norma), ou seja, designa o autogo-
verno ou determinação do próprio destino (tudo que é bom para si mesmo trazendo bem-estar).
Essa preocupação em relação à autonomia serviu como suporte para a luta em favor dos direitos
à cidadania, à saúde. Um tipo de reflexão e consciência sobre o papel de cada um na sociedade
enquanto cidadãos. A força moral do “principialismo” defende que a consciência autônoma deve
ser maior do que toda e qualquer moral externa.
27
UAB/Unimontes - 8º Período
Referências
JONSEN, A. R. TOULMIN, S. The Abuse Of Casuistry: A History of Moral Reasoning. Berkeley/Los
Angeles: University of California Press, 1988.
28
Ciências Biológicas - Bioética
Unidade 4
Bioética e Biotecnologias
INTRODUÇÃO: Neste capítulo, abordaremos o quanto é
necessário o debate sobre bioética na área tecnológica, em es-
pecial, aquelas tecnologias que lidam diretamente com o ser
humano e seu grupo social, melhor dizendo, falamos de tecno-
logias que atingem diretamente os modos de vida humanos no
planeta, seu corpo natural.
Um dos temas mais recorrentes em se tratando de bioética
é a pesquisa com seres humanos. A partir da questão sobre as
diferenças entre seres humanos e demais animais que abordare-
mos o problema. Os animais e seres humanos são parte da na-
tureza, sendo que os animais se aproximam muito mais da ideia
de “natureza” do que os seres humanos. O ser humano, pelo con-
trário, distancia-se da natureza, problematizando-a e fazendo ▲
da mesma um laboratório de perguntas. Separamos, então, homem (seres humanos) e natureza. Figura 8: Avanços da
Dessa forma, o homem se separa da natureza, e toda relação homem-mundo é estabelecida atra- biotecnologia
vés do domínio da racionalidade que tem como objetivo a apreensão das verdades que já estão Fonte: www.fotoseach.
impressas e que, na modernidade, carecem de interpretação. Torna-se importante não deixarmos com/cd09857634. Acesso:
22/11/11
escapar que a ruptura com a idade média deixa ao homem a possibilidade de planejar seu pró-
prio destino, isto é, a sua historicidade. Desvinculando-se das verdades religiosas, o homem pas-
sa a considerar a sua diferença, a sua localização na sociedade e seu individualismo. Seguindo
as pistas do humanismo renascentista, a modernidade, a partir do século XVII, começa a trilhar
verdadeiramente os caminhos da liberdade, e isto significa uma nova postura da figura homem.
29
UAB/Unimontes - 8º Período
acerca da atividade humana. Tomemos como como já sabemos, nas grandes navegações e
exemplo o Renascimento, período que é mar- expedições rumo ao desconhecido. Esse reco-
cado pelo crescente número de cientistas ge- nhecimento tem de ser expressado, apesar de
rando conhecimento. Mas temos uma grande não ser o nosso objetivo discorrer sistematica-
dívida para com o Renascimento e o espírito mente sobre o período. Segundo Abbagnano,
aventureiro do homem renascentista. Acre- o Renascimento se mostrou como um período
ditando na ideia de que tudo é possível, ele em que um novo tipo de homem e de socie-
aguça a sua curiosidade ilimitada e parte para dade se organizou, ressaltando que:
conhecer novos horizontes, o que resultou,
Apesar das limitações epistemológicas renascentistas, a ciência moderna fundava suas bases
cada vez mais sólidas. Com a destruição do pensamento aristotélico de um mundo bem ordenado
e calmo, da terra ser o centro do universo e do mundo acessível a todos os sentidos, a ciência mo-
derna encontra as possibilidades de se pensar diferentemente do que se pensava anteriormente e
acreditava realmente na condição de organizar um mundo verdadeiro, lançando mão para isso de
um grande corte epistemológico: a introdução da geometria analítica por Galileu.
Antes de Galileu, as inovações na concepção de mundo já tinham sido iniciadas por Giordano
Bruno, Nicolau de Cusa e Copérnico. Esses pensadores desarticularam a imagem de um mundo tra-
dicionalmente aceito. Com a ajuda da astronomia, começaram a “cair por terra” os vulneráveis pres-
supostos cosmológicos que foram sustentados até o século XIV. Mas podemos dizer claramente
que foi com Galileu que, pela primeira vez, se racionalizou o cosmos, articulando-o pela linguagem
matemática. E, quando falamos em racionalização do cosmos, é no sentido de sua completa des-
mistificação: fim de qualquer crença mágica ou religiosa imperativa na implementação das leis do
universo – questão que ainda era constante como característica do renascimento.
Galileu, pensador do final do século XVI e primeiras décadas do século XVII, parte das bases
mecanicistas para pensar o mundo: movimento, força, repouso, etc. O mundo visto como uma
grande máquina que não necessitava de nenhuma lei ou determinação externa a si próprio, tan-
to para mantê-lo em movimento quanto em repouso.
Não vamos nos aprofundar nas questões internas da física galileana, não sentimos neces-
sidade disso. A referência é simplesmente para mostrar a importância histórica de seu pensa-
mento e seus pressupostos para a modernidade a partir do século XVII. A tese de Galileu foi de
extrema importância, apesar das sanções da Igreja Católica. Posteriormente ao seu corte episte-
mológico, o homem da razão, segundo Galileu, passou a ocupar um novo espaço no mundo: o
daquele que se torna responsável pela produção do conhecimento. Cabe ao homem desvendar
as leis que regem o cosmos, os mistérios que fazem funcionar essa “grande máquina” que deno-
minamos de universo. O homem, então, tem que decidir a cada instante o que vai fazer, o que vai
ser nos momentos seguintes.
Partindo de suas convicções, Galileu vem nos mostrar que o mundo é plenamente cognoscí-
vel por proposições matemáticas. A experiência e a interpretação são o caminho para elaboração
destas proposições. Não basta simplesmente ao homem observar e admirar o movimento dos
corpos, é preciso que ele saiba colocar as questões certas para encontrar as verdades que tanto
procura. Em Galileu, perde-se o sentido da ideia de verdade como revelação; esta deixa de ser
uma consideração divina, sagrada ou entendida à luz da fé. Não cabe ao homem esperar uma
resposta que “venha do céu”, já que as condições para se desvendar os mistérios e os segredos
do mundo se encontram nele mesmo. Ao homem, resta saber trilhar os caminhos certos, guiados
pelo espírito da razão, que é correspondida pela certeza proporcionada pela geometria e pela
matemática. O corte epistemológico galileano considera, então, que: o universo não é mais um
espaço fechado, organizado hierarquicamente e nem impregnado de poderes mítico-religiosos.
O universo agora é um espaço infinito, contínuo, físico e matematicamente calculado.
Sendo assim, toda a epistemologia deve submeter-se ao saber racional. E essa verdade “im-
pressa” no mundo existe independente de Deus e também dos homens. Quando Galileu afirma
essa independência, principalmente em relação ao homem, ele nos quer dizer que a verdade
30
Ciências Biológicas - Bioética
• a revolução atômica;
• a revolução molecular;
• a revolução da comunicação.
Tais questões não ficam restritas aos cientistas, mas se estendem a toda a humanidade.
Como o ser humano carrega esse ímpeto para a busca do conhecimento, o mesmo precisa ser
direcionado pelo olhar ético de forma adequada em benefício do homem. Ao fazer perguntas e
buscar respostas, questões éticas aparecem e precisam ser refletidas, afinal, preservar os valores
que dizem respeito a si mesmo e ao outro é o grande desafio. Nesse itinerário, não podemos dei-
xar de ressaltar que um sentimento de angústia surge enquanto processo de avaliação de práti-
cas, condutas, procedimentos: como deveria agir? Tal angústia deve nos impulsionar para cons-
tantemente rever conceitos e atitudes como uma forma de crescimento e evolução.
A ética exige uma perene reflexão, um olhar crítico a respeito dos juízos que formulamos
sobre algo, sobre alguma coisa. Não podemos nos ausentar quanto ao posicionamento diante
de questões que necessitam de uma resposta. A reflexão ou atitude crítica exige a tomada de
posição, escolha, opção. Claro, essa “tomada de posição” indicará uma forma de pensar, um com-
promisso, afinal, em cada ação, atitude, posição, haverá também razão, emoção, juízos. Esse tipo
de exercício da ética implica uma série de coisas:
• Liberdade
• Responsabilidade
• Humildade
• Angústia
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UAB/Unimontes - 8º Período
No caso da relação entre bioética e tec- gresso, possibilita uma melhor qualidade de
nologia – tecnociência – biotecnologia –, vida, eles também se tornam instrumentos
busca-se sempre a tentativa de uma justa para destruir a vida, a natureza. Daí a impor-
medida. Se, ao mesmo tempo, a pesquisa não tância da justa medida, do equilíbrio do bom
deve e nem pode ser censurada, proibida ou juízo. A manipulação da tecnociência pode
interditada, precisamos discutir os seus resul- ter efeitos catastróficos. Cabe à ética construir
tados e usos. Por exemplo: intervenção clíni- as condições de uma interação possível entre
ca. Quais os limites de ação do cientista nos tecnologia e as relações humanas. Conheci-
genes humanos? mento e ética devem caminhar juntos e, de
O paradoxo disso tudo é que, ao mesmo alguma forma, normatizar procedimentos, in-
tempo em que a inovação da ciência, do pro- tervenções e ações.
32
Ciências Biológicas - Bioética
plexos, é inevitável que eles se tornem caros. geral da pesquisa científica tal como foi desen-
Quem deve arcar com tais custos? Facilmen- volvido no Ocidente. Para que uma pesquisa
te as questões de cunho ético dão origem a médica seja caracterizada como tal, ela deverá
questionamentos de ordem política e econô- seguir um determinado programa que inclui a
mica que só podem ser enfrentados se o de- preparação de um projeto de pesquisa apro-
bate ético chegar a bom termo. vado por um Comitê de Ética em Pesquisa,
Para situar o exato campo de emergência que determinará se o projeto segue ou não
das variadas questões éticas que se colocam normas brasileiras e internacionais de pesqui-
em relação à medicina reprodutiva, é preciso sas em seres humanos.
diferenciar a prática médica da pesquisa mé- Nesse sentido, a prática médica se cir-
dica. A primeira representa as intervenções cunscreve ao que é estabelecido como valida-
planejadas visando somente ao bem estar do do científicamente, ou seja, nenhuma prática
paciente ou cliente individual e que apresen- médica pode ser inovadora no sentido de uti-
ta uma razoável expectativa de sucesso. São lizar nos pacientes tecnologias que não foram
estas as nossas ações do dia a dia: tomamos previamente pesquisadas e cuja eficácia e ade-
decisões com relação à melhor estratégia de quação ética não tenham sido estabelecidas.
ação médica baseadas na nossa experiência, Mas como isso é feito? Como uma nova
que, por sua vez, está sedimentada no conhe- tecnologia é avaliada (e lembremo-nos que a
cimento adquirido através da leitura de ma- valoração tem caráter ético) e validada para
terial científico ou do que captamos na nossa ser posta a disposição dos profissionais médi-
educação continuada ao frequentarmos con- cos? Diante de uma nova pesquisa ou tecno-
gressos, seminários, cursos e conferências com logia, algumas questões são absolutamente
especialistas de maior saber e experiência. Na necessárias:
maioria das vezes, utilizamos práticas médicas a) É seguro o novo procedimento?
validadas, ou seja, práticas que são baseadas b) Ele é eficaz?
em procedimentos empíricos prévios. Quando c) Ele representa uma melhora real em re-
estes procedimentos não são realizados, fala- lação ao “tradicional”?
-se de práticas não validadas. d) Qual sua utilidade (relação custo/bene-
Por outro lado, pesquisa médica pode ser fício)?
definida como qualquer atividade planejada, e) Qual a repercussão social do novo pro-
visando testar uma hipótese que permita que cedimento?
conclusões sejam tiradas e desta maneira con- Tais são aspectos éticos, ético-políticos
tribuir para um conhecimento mais generali- e mesmo econômicos que devem ser leva-
zado. Sua definição segue, portanto, o modelo dos em conta.
4.2 Segurança
O quesito segurança deve ser estabele- belecer um novo procedimento e não julgar
cido a partir do exame dos projetos originais um procedimento recém estabelecido. Nessa
de pesquisa publicados em periódicos cienti- situação como se deve proceder? Em primei-
ficamente sérios. Qual o número de pacientes ro lugar preparar um projeto de pesquisa de
examinados, como foram eles selecionados, boa qualidade. Caso não exista experiência
foram aqueles resultados já reproduzidos por prévia com o método proposto cabe, primei-
outro grupo de pesquisadores, por quanto ramente um projeto que teste o efeito da nova
tempo foram os pacientes acompanhados intervenção em animais; somente após defini-
para se saber dos efeitos a longo prazo da dos os padrões de segurança de utilização do
nova técnica (se aplicável)? São estas algumas novo procedimento, poderá um projeto de
das perguntas que o profissional médico deve pesquisa que teste sua eficácia em humanos
fazer antes de introduzir e aceitar um novo ser encaminhado para avaliação de um comitê
procedimento como rotina. de ética em pesquisa.
Outra é a situação quando se quer esta-
33
UAB/Unimontes - 8º Período
34
Ciências Biológicas - Bioética
Referências
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
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Ciências Biológicas - Bioética
Unidade 5
O progresso científico e a bioética
INTRODUÇÃO: A proposta deste capítulo é abordar a relação ciência e bioética, em espe-
cial, a relação com o progresso científico, e se nesse progresso haveria uma preocupação com a
bioética. Trataremos da importância da Declaração de Helsinque e como a reflexão em torno da
vida humana propiciou o constante cuidado com a mesma.
O universo da prática médica se alterou profundamente nos últimos cinquenta anos. Revo-
luções espantosas se sucederam na última metade de século, principalmente se a compararmos
aos cinquenta séculos precedentes. Sucederam-se duas revoluções: a revolução terapêutica,
que começou em 1937 com as sulfamidas, e a revolução biológica, que a seguiu de perto com a
engenharia genética e patologia molecular. Estas duas revoluções não só diminuíram o sofrimen-
to dos homens como vieram igualmente colocar novos problemas éticos (BERNARD, 1992).
O desenvolvimento científico parece acelerar-se cada vez mais. Atualmente ocorre uma
extraordinária explosão científica e especialmente tecnológica que abala e perturba o ritmo da
vida humana e a capacidade de adaptação desta à terceira revolução, comandada pela infor-
mática, pela robótica, pela telepática e a biotecnologia. Por isso surgiu, pois, nesse contexto, um
novo domínio da ética. O progresso já realizado e previsível nos domínios da biologia, e nomea-
damente a biologia humana, coloca questões e lança grandes desafios à reflexão ética. No cam-
po da genética, há amplas perspectivas de novos conhecimentos. As pesquisas, as experiências,
as intervenções sobre os genes, os processos de fecundação, a ação sobre o cérebro, a progra-
mação e a reorientação da personalidade estão em voga.
Recentemente, em fevereiro de 1997, foi anunciado o primeiro caso bem sucedido de
clonagem reprodutiva de mamífero realizado por transferência nuclear a partir de células
somáticas de um adulto. Este acontecimento fez cair o dogma de irreversibilidade da escola
superior de enfermagem e abriu a nossa imaginação às possibilidades perturbadoras de clo-
nar seres humanos.
Pouco depois, surgiu a possibilidade de desviar o processo de clonagem na sua fase pré-im-
plantatória para a produção de células e tecidos com potencialidade terapêutica. Em novem-
bro de 1998, foi anunciado o isolamento de células estaminais humanas a partir de embriões e
fetos, a possibilidade de as cultivar indefinidamente in vitro sem alteração das suas característi-
cas e, mais tarde, a sua capacidade de serem indiferenciadas in vitro de modo a originarem
células e tecidos de enorme interesse terapêutico. Em junho de 2000, o anúncio da sequencia-
ção quase completa do genoma humano veio marcar o início de uma nova forma de fazer biolo-
gia e de entender quem somos, como ficamos doentes, e como envelhecemos (OSSWALD, 2001).
Em 2003, sucedem-se as notícias sobre o nascimento de seres humanos clonados.
Diante desses fantásticos, mas também perturbadores, desenvolvimentos, levantou-se a ne-
cessidade de repensar a ciência e o próprio futuro da espécie humana, o meio científico neces-
sitou do contributo da bioética. A bioética é, pois, dos novos saberes da contemporaneidade,
um dos que mais tem evoluído. A sua história é extremamente recente, tendo tido início
formal e institucional em dezembro de 1970, quando o oncologista norte-americano Van
Rensselaer Potter introduz o neologismo “bioética” no seu texto Bioethics: the Science of Survival.
No entanto, qualquer que seja o nosso horizonte de reflexão, retomando a história ou recuan-
do à pré-história da bioética, é evidente o curto espaço de tempo que medeia entre a total
inexistência do que hoje entendemos por bioética e a sua extraordinária divulgação. Na pro-
posta inicial de Potter, a bioética seria uma nova disciplina do conhecimento humano, na qual
se cruzassem os conhecimentos sobre a natureza da vida e sobre a essência de todas as
manifestações da vida. O bios contribuía com os dados da biologia científica, estrutural e
molecular, da genética, enquanto genoma e fisioma, e outros dados científicos que definem
a vida como natureza. O ethos contribuía com os saberes específicos sobre as peculiaridades
das diferentes formas de vida construídas com e sobre a natureza – a vida vegetal, a vida
animal e a vida humana. Por justaposição dos textos e domínios ontológicos, abre-se uma nova
possibilidade de saber.
37
UAB/Unimontes - 8º Período
Muito bem elaborada é, portanto, a afirmação de Osswald (2001, p.10) “perdida a sua ino-
cência nas câmaras de gás de Auschwitz ou no braseiro de Hiroshima, a ciência encara, hoje
como nunca antes, o problema da sua fundamentação ética”. Também Neves (2001) concor-
da com esta perspectiva, assumindo que o irreprimível progresso técnico-científico, espe-
cialmente o biotecnológico, passa a conhecer limites que lhe são afinal impostos exteriormente
pelo Homem na sua interrogação sobre o dever ser, sobre o dever fazer. A dinâmica do
poder que estimula o progresso da ciência cede, então, ao sentido do dever que constitui a ética.
O que os desenvolvimentos da bioética parecem indicar é que o conhecimento não cons-
titui por si só um valor absoluto, mas que se deverá subordinar invariavelmente às finalidades
humanas. Não deve ser o conhecimento medido e avaliado pelo maior e inavaliável valor: a vida?
Apenas sob esta orientação se poderá vir a assegurar que o desenvolvimento histórico e o
progresso científico em particular protagonizem um bem, tomando a preservação do huma-
no como o único referencial universal.
Transdisciplinar na sua estratégia, a bioética pretende descortinar e propor, em cada nova
encruzilhada que a biologia abre à Humanidade, caminhos que conduzam à felicidade genuína
e sustentável, tanto da pessoa como da sociedade (OSSWALD, 2001).
Nesse sentido, a Declaração de Helsinque, apresentada pela Associação Médica Mundial,
afirma de forma peremptória que os interesses da pessoa humana, nomeadamente os
respeitantes à vida e saúde, se sobrepõem aos interesses da ciência. Nesta declaração sur-
ge igualmente a noção da imprescindibilidade do respeito pela autonomia e pela dignidade
humana. Este consenso não resolve, obviamente, todos os problemas de interpretação e
aplicação do princípio fundamental. A cada questão ética que se pensa resolver, muitas outras
surgem, quer delas derivadas quer não. De fato, a ofensa à dignidade humana, configurada
pela experiência cruel, causadora de lesão ou morte, de sofrimento ou perda de função, não é
posta em causa; mas há quem questione a dignidade do ser humano em determinados estados
da vida (por exemplo, no embrionário) ou condições de saúde (por exemplo, demência ou esta-
do vegetativo persistente).
Assim, a então Ministra da Saúde da Alemanha, Nida–Rumelin, e o filósofo N. Hoerster de-
fenderam a tese de que a dignidade humana só tem de ser respeitada quando o ofendido
estiver consciente da sua própria dignidade, isto é, tem autoestima. Hoerster propõe mes-
mo que a expressão direitos humanos seja substituída pela de direitos pessoais, reservando
o conceito de pessoa para os seres humanos capazes de consciência e de autoestima. As
consequências deste conceito são claras: o número dos excluídos do círculo das pessoas seria
gigantesco e abrangeria uma parte considerável da humanidade, incluindo os fetos, os be-
bês, os débeis mentais, os dementes, os escravizados e oprimidos. De resto, a fundamentação da
polêmica asserção é extremamente frágil, já que a dignidade humana é um princípio que o ho-
mem se outorga a si mesmo e que só pode sobreviver se for escola superior de enfermagem
de Viseu - 30 anos extensivo a todos os representantes da espécie por fazerem parte da sua
essência (OSSWALD, 2001).
A bioética aparece, desse modo, como uma renovada consciência do dever nas circuns-
tâncias descritas de acelerado progresso biotecnológico. Por isso, ela emerge primeiramente
no mundo ocidental, científico - tecnologicamente mais desenvolvido. No mundo anglo-ameri-
cano, a bioética começa a ganhar expressão mais cedo do que na Europa continental, devido,
em parte, ao diferente impacto que “experimentação humana”, tema originário da bioética,
obteve em ambos os espaços geográficos.
Antes da experimentação sobre seres humanos desenvolvida pelo regime nazista, ela se
vinha praticando há algumas décadas sob um modelo bastante semelhante, promovida
principalmente por norte-americanos e britânicos. Estes recorriam preferencialmente a do-
entes mentais, presos e pretos para recrutarem os seus sujeitos de experimentação para proje-
tos que se encontram descritos em vasta bibliografia e que testemunham que, nesta maté-
ria, os alemães nazistas não terão sido tão inovadores como algumas consciências gostariam
de pensar. E, mesmo depois deles, tais experiências continuaram, como o caso recentemente
revelado da Guatelamala o atesta. Em igual período da história, os japoneses procediam
a experimentações com seres humanos, não menos cruéis ou em menos escala que os
nazistas. E, mesmo após a elaboração do Código de Nuremberg em 1947, em que se esta-
beleceram regras internacionais para a legitimação ético-jurídica da experimentação hu-
mana, reconhecida como indispensável para o progresso cientifico, as violações dos direitos
humanos neste domínio mantiveram-se, diversificaram-se e, de algum modo, expandiram-se
na justa medida em que o nível de conhecimentos biomédicos ia progredindo nos países
38
Ciências Biológicas - Bioética
ocidentais. Os Estados Unidos, por exemplo, continuaram a recrutar sujeitos para experi-
mentações médicas entre os setores mais dependentes e vulneráveis da população, negli-
genciando a prática do “consentimento informado”. Foi a sucessiva exposição pública des-
tes procedimentos que veio a contribuir decisivamente para a intensificação do movimento
que anunciava a bioética (NEVES, 2001).
Esta vontade de dar um sentido ético à medicina surge também a partir da necessi-
dade sentida de se aplicar o direito à prestação médica. Tendo como exponencial máximo
dos Direitos do Homem, o direito procura legalizar e criar normas que regulamentem algu-
mas intervenções. Dessa forma, não podemos deixar de referenciar a Declaração Universal dos
Direitos do Homem, proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro
de 1948, que, ao longo da sua história, foi de uma importância vital para o ser humano. Na
contínua procura de salvaguarda desses direitos, mais recentemente, em 1996, o Comitê de
Ministros do Conselho da Europa adotou a Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e
da Dignidade do Ser Humano relativamente às aplicações da Biologia e da Medicina: Conven-
ção sobre a escola superior de enfermagem de Viseu - 30 anos, Direitos do Homem e a Biomedi-
cina. Esta convenção foi ratificada e promulgada em Portugal em 2001.
A bioética é uma nova abordagem de caráter pluridisciplinar que procura tomar decisões
à luz dos valores éticos para uma gestão responsável da pessoa humana, da sua vida e da sua
morte, no mundo em que os progressos técnicos permitem uma intervenção cada vez
maior no biológico. Assim, a bioética surge como uma nova expressão do Humanismo, isto
é, como uma nova modalidade de valorização e proteção do Humano. Simultaneamente,
estuda também os problemas que esse progresso suscita, quer em nível microssocial quer
em nível da sociedade global, e as repercussões que esse progresso tem sobre a sociedade e
seu sistema de valores. É, pois, uma troca de saberes que, encarando a vida numa perspectiva éti-
ca, questiona o sentido do progresso quando confrontado com a dignidade da pessoa.
Na realidade o progresso dos conhecimentos científicos é um bem. Representa uma res-
posta do homem ao apelo que lhe está inerente de ser co-criador do mundo. Conhecer,
investigar, interrogar-se sobre a origem das coisas e de si próprio faz parte do exercício da liber-
dade que integra a essência da humanidade (BISCAIA, 2003). A bioética poderá ser no futuro
a verdadeira ciência da preservação da identidade do homem e da sobrevivência da vida,
se persistir em ser uma ética, um aprofundamento do sentido do bem ou do dever na ação
humana. Assim sendo, não podemos prescindir da bioética sob o risco de sucumbir-nos frente
aos novos poderes e de nos demitirmos do nosso destino (NEVES, 2001).
Se não tivermos presente esta perspectiva, o progresso científico pode conter o gérmen de
uma corrosão interna que acabará certamente por desvirtuar o próprio homem. Isto só não
acontecerá se ele se mantiver ao serviço da vida humana considerada não unicamente como
vida biológica, mas como vida relacional e por isso vida da pessoa (BISCAIA, 2003).
39
UAB/Unimontes - 8º Período
está necessariamente implicada; necessariamente, isto é, sem que possa não estar, sem que se
possa sequer pensar que há um qualquer modo alternativo.
Tal evidência ontológica aplica-se a toda a entidade possível e real, sem qualquer exce-
ção. Aplica-se tanto às entidades não humanas como às humanas com as necessárias devi-
das adaptações.
No que diz respeito ao conjunto total das entidades não humanas, toda a decorrência onto-
lógica puramente própria relacional dá-se segundo um esquema que define prototipicamente
a mesma naturalidade ontológica, sendo que todos os atos que ocorrem se dão na mesma in-
trínseca e necessária decorrência quer das potencialidades ontológicas de cada uma das entida-
des em causa quer das potencialidades que a sua mesma inter-relacionalidade necessariamente
implica. Nada neste esquema, nada nestes necessários atos pode receber a qualificação quer de
ético ou moral quer de político. Ética e política referem-se única e exclusivamente ao domínio
ontológico do humano, domínio não estritamente natural, mas em que a uma natureza incoati-
va dada e dada necessariamente em seu mesmo ato de doação, se junta todo um novo mundo
formado a partir da ação não necessária, isto é, livre do homem, ação toda ela de ontológica fun-
damental base ética e também incontornável necessária repercussão ontológica política, sendo
que o caso de uma ação puramente ética e não política é apenas uma figura de razão, nunca atu-
alizável nesta nossa dimensão, sempre política, em que somos verdadeiramente homens.
Assim sendo, todo o ato de qualquer homem possui necessariamente uma dimensão po-
lítica, não havendo realmente qualquer ato de um qualquer homem que não seja também um
ato político. O âmbito da chamada «bioética» não escapa, como qualquer outro, a esta evidência
pelo que a bioética é concomitantemente uma tentativa de disciplina quer ética quer política.
Mas, se bem que seja no domínio ético, da interioridade própria de cada pessoa, que se joga o
fundamental em questão em bioética, isto é, a tomada de decisão quanto à ação a realizar, não
é no domínio propriamente ético que o fundamental das consequências da ação que à bioética
importam, se joga antes no domínio político, domínio em que a relativa bondade ou não bon-
dade de nossos atos quaisquer se derramam, não apenas para nosso exclusivo maior ou menor
bem, mas também e fundamentalmente para o maior ou menor bem de alguém que não nós:
neste realíssimo trânsito do puramente ético da esfera interior do homem para o político da rela-
ção entre homens, tais relativos bens encarnam em absolutos atos, que definem para melhor ou
para pior a ontologia própria de cada homem que conosco se relaciona, mas, também, por seu
intermédio e de todos os outros que com ele se relacionar, numa virtualmente infindável cadeia
ético-política não dominável por qualquer agente finito em nível de suas consequências ontoló-
gicas. E todos os homens são precisamente agentes finitos.
O âmbito fundamental de qualquer ato de qualquer ente humano é sempre o âmbito onto-
lógico de moldagem do ato próprio de todos os homens, dado que não é possível saber precisa-
mente que homens cada ato vai moldar, em que medida, quando, a que distância, de qualquer
tipo. Esta evidência é incontrovertível e válida para todo o campo do ato de homem. É precisa-
mente esta especificidade que define o homem como é, na sua natural propriedade de ser não
totalmente natural, forjando a mesma cultura, no que esta tem de atualidade propriamente ra-
cional do ato próprio do homem. Não é possível definir humanamente o homem fora destes pa-
drões. É nestes padrões que toda a inteligibilidade própria do homem se joga, bem como toda
a sua ação própria, apenas classificável como propriamente humana se for manifestação de ato
de inteligência propriamente humana. Inteligência que, provocada em seu ato de leitura do real
pelas diferentes formas de carência humana, orienta a parte ativa do homem no sentido da col-
matação dessas mesmas carências, nascendo, assim, aquilo que se conhece como vontade. É do
domínio próprio desta atividade inteligente do homem que diz todo o discurso acerca do pro-
priamente ético e político no homem. Tudo o mais pertence ao domínio do puramente natural
em que o homem não escapa ao mesmíssimo “reino” natural a que pertencem todos os demais
entes, desde o mais simples e primitivo ao mais sofisticado não humano (ambos desconhecidos).
A chamada «bioética» pertence, pois, a este mesmo domínio da ação própria do homem e
é como tal que deve ser encarada e criticada. Não é algo de “natural” ou de “sobrenatural”, mas
algo de cultural no sentido em que é cultural toda a ação propriamente humana por oposição a
tudo o mais em que esta mesma ação não se faz absolutamente sentir. Como todas as atividades
fundamentalmente políticas, ou se preocupa com o bem comum dos homens ou se preocupa
com o bem exclusivo de alguns homens; assim sendo, ou é uma teoria do amor ou é uma teoria
da tirania, esta última mais ou menos mitigada oligarquicamente. Não é certamente uma teoria
do primeiro tipo aquela que a chamada «bioética» configura nas suas várias formulações ditas
laicas. Ora, é precisamente como disciplina transumana, capaz, portanto, de apelar a um nível
40
Ciências Biológicas - Bioética
cultural de tal modo profundo ontologicamente que deveria ser capaz de poder transcender to-
das as formas regionais de ideologia ou de “religião”, que a bioética deveria instalar-se a fim não
de se constituir em e como mais um instrumento de poder oligárquico ou tirânico, mas de con-
tribuir para o real bem de todos os homens, que seria, deste modo, necessário bem comum, sem
alternativa possível que não a tirânica. Para tal, teria de se constituir numa teoria geral do bem de
todos os homens, indiscernível necessariamente de uma teoria do amor.
Adiantam-se mais algumas considerações acerca dos fundamentos epistemológicos do re-
ferido tentame de disciplina. Como já foi possível estabelecer, pouco do que à bioética diz res-
peito releva do campo de uma ética, sendo que o que se procura estabelecer pertence, antes,
ao domínio do político, isto é, da relação entre o ser humano e algo que o transcende enquan-
to pura individualidade ética. Mesmo a possível definição como eventual nova ética médica, ou,
mais genericamente, de saúde aplicada implica imediata e logicamente a sua fundamental ma-
triz política, pois, como é óbvio, esta aplicação não é um mero e exclusivo retorno ativo do sujei-
to ético sobre si mesmo. Deste modo, todas as questões fundamentais de uma «bioética», como
definida pelos seus fundadores e habituais cultores, são não do âmbito de uma ética, mas de
uma política e é assim que devem ser pensadas. É exatamente porque não é do domínio de uma
ética fundamental, isto é, de uma ontologia do ato próprio interior do homem, que a bioética
é tão frágil, sempre navegando nas águas baixas de uma política não ontologicamente funda-
da – precisamente porque não fez o trabalho ontoantropológico fundamental – e por entre os
escolhos da necessária relatividade etnológica que uma política sem bases ontológicas implica
sem possibilidade de saber o que seja um necessário bem comum, pois não pode saber o que
é o bem ontológico de cada homem, que cada homem tem em comum com todos os outros,
único horizonte ontológico, antropológico, ético e político sobre o qual se pode estabelecer, com
um mínimo e um possível máximo (teoricamente paradigmático e ideal, mas não utópico), uma
teoria de princípios políticos gerais acerca da ação no âmbito das dimensões biológicas da vida
humana e não só humana, dimensões que integram um todo ontológico mais vasto, que não
aceita qualquer forma de reducionismo sob pena de mortificar a mesma realidade humana fun-
damentalmente em causa.
A necessária aplicabilidade e aplicação transcendente à pessoa do sujeito ético em cau-
sa na ação em campo «bioético» faz com que todo o trabalho de uma «bioética» tenha como
finalidade não um domínio ético, mas político: a ação no domínio da «bioética» visa fundamen-
talmente não ao meu crescimento como entidade ética pessoal, mas ao bem de outrem ou de
ambos e é apenas por meio da realização transcendente desse bem que o meu próprio bem éti-
co se pode realizar numa espécie de corrente política de retorno em que o bem que fiz a um ter-
ceiro ente recai sobre mim como imediata e direta compensação desse mesmo ato de bem.
Pela negativa, o esquema aplica-se também ao mal politicamente transcendido desde mim:
o mal feito a um terceiro recai sobre mim exatamente como o bem; as consequências do mal ou
do bem feito a terceiros não se esgotam politicamente neles, mas, politicamente, recaem sobre
mim, em meu íntimo foro ético e ontológico, como seu autor. Mas também ontologicamente:
o bem ou o mal que fiz são parte de meu ato – eu sou o bem que fiz, mas sou também o mal
que fiz, pelo menos até ao terreno fim de meus dias. Assim, do ponto de vista ético, a primeira
conclusão a tirar, quer em bioética quer em qualquer outro domínio da ação do homem, é que
todos os atos que eu fizer constituem-me ontologicamente para o sempre de meu ato indepen-
dentemente do possível horizonte último que este ato tiver. Nada ou ninguém pode desfazer em
absoluto o que eu fiz: se salvei uma vida, salvei-a até ao fim de minha existência, qualquer que
esta seja; se massacrei alguém, massacrei esse mesmo alguém até ao fim de minha existência,
qualquer que seja esta.
Ontologicamente, esta evidência é absolutamente incontrovertível e de nada servem des-
culpas ou panaceias artificiosas: os atos, que são o material ontológico de que a minha dimen-
são ética pessoal é feita, constituem-me e nada pode fazer com que deixem de me constituir,
sob pena de, elidido um qualquer ato, bom ou mau, o meu ser colapse no nada, pois apenas por
meio do trânsito ontológico de ato para ato o meu ser se pode constituir como realidade ontoló-
gica contínua, continuidade sem a qual, seja ela qual for – e ninguém sabe o que é e como é –, a
minha manutenção no ser é simplesmente impossível. Como exemplo, como agente de saúde, o
paciente que salvei, salvei-o para sempre, independentemente do que lhe possa vir a acontecer
posteriormente, e do modo como entendo este «para sempre», que pode ser finito ou infinito.
Mas o mal que fiz a um paciente qualquer fica com ele e comigo para um mesmo «sempre», de
modo semelhante ao bem, só que negativamente, mas de modo também absoluto, dado que,
positivamente, a cada ato de bem feito corresponde um absoluto ontológico realizado (a mes-
41
UAB/Unimontes - 8º Período
ma definição de bem), mas, negativamente, a cada ato de bem possível não realizado (mal) cor-
responde o absoluto negativo da ausência real desse mesmo bem realizado. Mas os cuidados a
ter com o mal são obviamente muito mais dramática ou tragicamente importantes porque, por
exemplo, se sei que o paciente qualquer que salvei vai, mais tarde ou mais cedo morrer, também
sei que o ente humano que abortei não vai poder viver, mais cedo ou mais tarde. E tudo isto vale
por si mesmo, independentemente de quaisquer colateralidades etiológicas ou outras quaisquer
justificativas ou pseudojustificativas. É esta a dimensão irredutível da ética e não há outra.
É nesta dimensão que todos os atos de qualquer homem nascem e é a partir dela que se
pode dar a transcensão política para o fórum da inter-relacionalidade com os outros seres huma-
nos. Sem esta fundamental dimensão ontológica e ética, pura e simplesmente não há qualquer
ação humana possível. Sem esta dimensão ontológica, a antropologia, em qualquer das suas di-
mensões, doutrinas ou escolas, configura apenas uma qualquer mecânica imprópria para seres
humanos, mas boa para autômatos materiais com figura humana, no entanto, já não essencial e
substancialmente humanos.
Ora, parece ser precisamente para este modelo degradado de humanidade que se enca-
minham epistemologicamente muitas ciências contemporâneas, perspectivando o homem não
como uma entidade fundamentalmente semântica, mas como uma mera entidade mecânica ou
mecânico-biológica, regida pelas mesmíssimas padronizações estatísticas do restante da varie-
dade material do universo. Se for este o modelo a ter em consideração, modelo de uma humani-
dade reduzida a apenas mais um fenômeno – se mais ou menos complexo é fundamentalmente
indiferente – puramente material, então, uma disciplina como a atual bioética faz todo o sentido.
Se a humanidade for entendida como algo diferente de apenas mais uma manifestação ex-
clusivamente material, em que o sentido próprio haurido no seio da experiência de sua inteli-
gência não possa ser reduzido a uma mera excreção material, então, reclama-se não uma bio-
ética, também mecânica, de mecânicos “princípios”, sempre deontológicos e nada mais, mas
uma ética da ação para a vida que respeite fundamentalmente o caráter irredutível não apenas
da entidade humana, mas a partir da infinitizável inteligência desta e seu sentido haurido, que
respeite o caráter – por esta mesma inteligência percebido – de irredutibilidade de toda e qual-
quer entidade num mundo em que nada é ou pode ser igual, mas em que, sendo todos os entes
diferentes e todos contribuindo para a existência verdadeiramente solidária de todos e do todo,
todos os entes merecem o respeito que lhes é devido, cada um em seu lugar ontológico próprio,
numa economia da relação que, ainda que tenha de permitir o uso das entidades, nunca pode
consentir o seu abuso.
Se a chamada «bioética» quer ser algo que tenha um mínimo de dignidade como ética, tem
de evoluir no sentido de se tornar uma teoria da ação interior do homem, prévia a toda a “aplica-
ção”, anterior à transcendência política de ato que, nascendo no interior semântico do homem,
tem a faculdade de modificar a ontologia própria de outros entes para o bem ou para o mal, não
apenas do agente e do tópico, ocasional paciente, mas de todo o universo, próximo e longínquo,
num realíssimo ecossistema geral, que é muito mais do que biológico: é universal, englobando
ética, política, biologia (que inclui física, química e todas as suas dimensões asilares).
Requer-se, pois, um trabalho em que se forme a interioridade própria dos seres humanos
de modo a tornar cada homem fonte autônoma de inteligência própria, isto é, pessoa, capaz de
visão analítica, mas concomitante e necessariamente sintética, capaz de ponderação ética, mas
ontologicamente alicerçada sempre no respeito pelo único princípio objetivo que é verdadeira-
mente universal, o do bem comum, isto é, do maior bem possível, objetivamente, para todos os
entes presentes em determinado momento da existência de cada homem, que engloba neces-
sariamente em si a existência de todos aqueles que com ele estão presentes ao ser. Não é tare-
fa fácil esta. É muito mais difícil do que possuir uma tabela qualquer de regras heterônomas de
comportamento político: estas últimas evitam todo o trabalho de pensamento necessário para a
tomada de decisão, boa decisão, quando do momento em que há que decidir.
É muito mais fácil, do ponto de vista psicológico e sociológico, viver heteronomamente ape-
nas, aplicando tabelas protocolares de princípios determinados por outros quaisquer: o peso do
trabalho de deliberação e o peso ontológico da decisão tomada como que magicamente desapa-
recem e o homem sente-se muito mais leve na sua condição de instrumento de forças que o ultra-
passam e a que se entrega de forma cega. Mas este homem já não é verdadeiramente um homem,
apenas uma peça biológica numa máquina social que se limita a servir-se dele, precisamente como
peça biológica enquanto esta for necessária, enquanto não encontrar para o exercício das mesmas
funções mecânicas uma peça já não biológica, mas apenas meramente mecânica, que cumpra a
respectiva tarefa de uma forma ainda melhor, pois, então, não encerrará qualquer perigo de poder
42
Ciências Biológicas - Bioética
vir a ser, ainda, instância crítica. E o homem, este homem, torna-se perfeitamente dispensável, o Glossário
que é perfeitamente lógico e normal, neste esquema em que os homens já não são homens-pesso- Genoma: o genoma é
as, mas simples homens-máquina e quando muito homens-cidadãos. toda a informação here-
Foi no sentido da produção não de pessoas peritas em cuidados de saúde: médicos, enfer- ditária de um organis-
meiros, socorristas, técnicos auxiliares vários, mas meros «técnicos de saúde», mecânicos biológi- mo que está codificada
cos à imagem dos mecânicos de coisas não biológicas como, por exemplo, de automóveis, que a em seu DNA (ou, em
alguns vírus, no RNA).
bioética evoluiu. Em vez de procurar formar pessoas para uma capacidade pessoal de judicação Mais precisamente,
acerca da ação a executar, sempre no sentido do bem comum, procurou formas de reduzir esta o genoma de um orga-
mesma capacidade de julgamento autônomo, refugiando-se na produção de protocolos, bons nismo é uma sequência
tanto para homens como para máquinas. O mesmo protocolo deontológico que serve para a de DNA completa de
mecânica da decisão humana pode servir, posto em código binário, para programar máquinas um conjunto de cro-
mossomos.
sanitárias que sejam impecáveis do ponto de vista bioético, deixando viver segundo o regula- Ontologia: Ontologia
mento protocolar, deixando morrer ou matando, segundo o mesmo protocolo. Livra-se, assim, é um termo grego e
deste modo, a humaníssima humanidade das angústias não mecanicamente redutíveis das de- significa o conhecimen-
cisões, ficando estas para as máquinas, que teriam apenas que procurar os parâmetros paradig- to do ser. Ontologia
matizados protocolarmente, executando, obviamente sem pensar, as consequências também reproduz a natureza
do ser, da existência
protocolarmente previstas. Ninguém, sobretudo, depois de os inventores deste esquema terem dos entes, da reali-
morrido, ficará com quaisquer “problemas de consciência”. dade e das questões
Tudo o que acabou de ser dito não é uma anedota irônica qualquer, sendo perfeitamente metafísicas em geral. A
possível já hoje. Este esquema, que faria as delícias dos assassinos do Terceiro Reich de Hitler ou ontologia é uma parte
dos assassinos dos Gulags de Stalin, é hoje perfeitamente exequível e, se aqui o lembramos, é da filosofia, ela trata do
ser concebido que tem
apenas porque representa o último estágio daquilo para que a bioética se encaminha ao que- uma natureza comum
rer transformar-se numa disciplina de doutrina protocolar acerca de princípios mecânicos para que é inerente a todos
lidar com questões éticas e políticas que nunca podem obedecer a meros protocolos redutores, e a cada um dos seres.
venham eles de onde vierem, tenham eles a legitimidade jurídica que tiverem. Lembremo-nos Nazismo: O nazismo
de que, no caso de Hitler, as suas ideias fundamentais, de que nunca se afastou, receberam um foi um regime que des-
truiu a vida de milhares
chamado «mandato democrático». de pessoas nos anos
Tal carta de apresentação é bastante para infirmar qualquer pretensão de necessária bon- de 1933 a 1945 e teve
dade por parte de qualquer norma que tenha um mesmo fundamento jurídico de validação de seu principal foco na
bondade intrínseca. Uma vez basta para qualquer pessoa inteligente perceber o valor que de- Alemanha. Defendia
terminados mecanismos de validação superficial das doutrinas possuem. Tendo em conta tudo os altos ideais, como a
superioridade da raça
o que foi previamente afirmado, apenas uma bioética que se queira constituir como teoria fun- ariana. O Nazismo ou
damental do bem comum do homem, tendo que ter como fundamental consideração a ontolo- o Nacional Socialismo
gia própria da antropologia humana e da necessária ação para o serviço desse bem comum no designa a política da
âmbito da vida, pode tornar-se algo mais do que um novo instrumento intelectual a serviço de ditadura que governou
tiranias e oligarquias várias, papel que a bioética existente vai cumprindo. a Alemanha de 1933 a
1945, o Terceiro Reich.
A bioética ou visa ao bem comum do homem, isto é, da humanidade como um todo, aquela O nazismo é frequen-
que está em ato em cada instante presente no mundo político, mas também e talvez sobretudo temente associado ao
aquela que é possível vir a estar, ou visa ao bem de um qualquer tirano ou de um grupo alar- fascismo.
gado de potenciais tiranos ou de uma qualquer oligarquia. Não há outro modo possível para o O ditador Adolf Hitler,
desenvolvimento de uma bioética respeitadora do bem comum senão o trabalho no sentido da que impôs o nazismo,
chegou ao poder en-
definição do que é o ser do homem, acompanhando este trabalho com um enorme esforço pe- quanto líder de um par-
dagógico no sentido do desenvolvimento das virtudes para o bem comum, únicas capazes de tido político, o Partido
promover este mesmo bem comum. Nacional Socialista dos
Falamos das vetustas virtudes cardeais e sem o uso das quais o homem mais não é do que Trabalhadores Alemães
um voraz ente de destruição dos outros em benefício próprio, quer seja um não tão obviamente (Nationalsozialistische
Deutsche Arbeiterpar-
egoísta, mas que o é também de um Midas. Em ambos os casos, é a humanidade que sempre tei ou NSDAP). O termo
desaparece e é no segundo caso que o desenlace é verdadeiramente trágico, pois não há como Nazi é um acrônimo do
fazer reviver em carne humana todo aquele material e estúpido ouro. A bioética que por aí anda nome do partido (vem
parece oscilar estrategicamente entre a desumanização semântica do mundo de Giges e a desu- de National Sozialist). A
manização material do mundo de Midas. Alemanha deste perío-
do é também conhe-
Requere-se uma bioética que seja capaz de uma humanização da vital ontologia do ho- cida como “Alemanha
mem, que tenha como meta algo como uma «cidade de Deus» qualquer, em que os homens vi- Nazista” e os partidários
vam não por mesquinhos interesses, mas pela vontade do bem de todos, definição mesma do do nazismo eram (e
amor. A bioética, ou se converte a um sentido de amor recíproco com todas as consequências são) chamados nazistas.
que tal amor acarreta, transformando-se numa verdadeira teoria da amizade na e para a vida, ou
mais não fará do que contribuir para a aceleração da morte do homem como homem.
43
UAB/Unimontes - 8º Período
Dicas Quando falamos do horizonte da bioética, não podemos deixar de mencionar o processo
Segundo Pegoraro histórico de sua constituição:
(2002), “a ética e • Na década de 1980, a Organização Mundial da Saúde e o Conselho para organização das
a bioética não são ciências médicas redigiram as Diretrizes Internacionais para a Pesquisa e Bioética com Seres
doutrinas formuladas Humanos.
nas escolas; são • Esse documento foi traduzido e publicado no Brasil em 1993 pela Revista Bioética vinculada
dimensões profun-
das da história e da ao Conselho Federal de Medicina.
realidade científica, • Publicação da Resolução do Conselho Federal de Saúde nº 1, de 13 de junho de 1988, procu-
que cabem ao filósofo rando regulamentar (primeiro documento oficial brasileiro) e normatizar pesquisas na saú-
explicar. Daí a íntima de.
ligação entre Filosofia • Em 1995, o Conselho Nacional de Saúde revisou e decidiu atualizar a resolução anterior em
e todas as demais
áreas que de alguma conformidade com os novos desenvolvimentos da ciência. Essa nova resolução ficou conhe-
forma dialogam com a cida como Resolução nº 196/96.
bioética. • Relevância da resolução: referência a preocupações no campo da bioética (beneficência,
autonomia, justiça, equidade, sigilo, privacidade). Normas devem ser estendidas a todas as
pesquisas e todas as áreas do conhecimento que envolvam seres humanos, conceituação
da noção de risco (possibilidade de danos físico, mental, moral, intelectual, social, cultural
ou espiritual do ser humano), respeito total à dignidade humana, necessidade de termo de
consentimento livre, preservação do direito à decisão, proteção à imagem do ser humano
envolvido na pesquisa, direito à confidencialidade, respeito aos valores culturais, compro-
misso em relação ao retorno das vantagens ao país onde a pesquisa é desenvolvida, neces-
sidade de comunicação ao comitê de ética na pesquisa (CEP) em relação à pesquisa nas ins-
tituições responsáveis.
Referências
ASSOCIAÇÃO MÉDICA MUNDIAL. Declaração de Helsínquie, Adotada na 18a. Assembléia Médi-
ca Mundial, Helsinki, Finlândia. (1964).http://www.anis.org.br/Cd01/Comum/DocInternacionais/
doc_int_03_declaracao_helsinque_port.pdf
BERNARD, Jean. Evolução da ética e da biologia. Acção Médica. Porto: Associação dos Médicos
Católicos Portugueses, nº 3, p. 29-32, 1992.
BISCAIA, Jorge. Bioética e Saúde. Acção Médica. Lisboa: Associação dos Médicos Católicos Por-
tugueses, nº1, p.9-15, 2003.
NEVES, M. Patrão. A bioética de ontem, hoje e amanhã: interpretação de um percurso. In: AR-
CHER, Luís et al. Novos desafios à bioética. Porto: Porto Editora, 2001. p. 20-30.
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Ciências Biológicas - Bioética
Resumo
Unidade 1
O termo “ética” transformou-se hoje em dia numa palavra ou assunto dos mais tratados. A
bioética surge como uma forma de possibilidade para uma reflexão em torno dos problemas ex-
perimentados na contemporaneidade e, como é possível a partir deles, melhorar as formas de
vida. A conduta e/ ou a prática diz respeito a uma relação direcionada em função do ideal de
virtude, do bem. A bioética é um campo de saber que tratará da vida em torno da ideia de bem
e do prazer enquanto distanciamento da dor. A primeira parte do termo composto «bioética»,
«bio», é proveniente do termo grego «bios», que, em seu sentido fundamental, remete para a
vida não apenas para um sentido relativo qualquer de vida, mas para a vida em si mesma na sua
irredutibilidade própria. A bioética lida, pois, necessariamente com uma realidade cuja definição
não pode ser dada por qualquer intervenção caprichosa de índole político-prática, mas tem de
ser encontrada através da observação da realidade, sem preconceitos ou condicionalismos de
qualquer tipo, ideológicos, religiosos, etc. A bioética não lida com problemas que não sejam os
que se relacionam com a realidade do termo primeiro que constitui matricialmente o seu mesmo
nome: o objeto da bioética é a vida na sua relação com algo que transcende a pura nacionalida-
de da vida e que é o poder de intervenção do homem sobre a vida. O seu âmbito coincide, pois,
com o âmbito da abrangência total do conjunto intersectivo entre a cultura e a vida. Nada há
na relação entre o homem e a vida que possa ficar fora do âmbito de uma bioética que queira
ser digna de seu nome. Esta definição objetiva não pode senão depender da pura objetividade
ontológica do «bios» estudado sob pena de se cair, mais do que num moralismo vazio, numa au-
têntica tirania.
Dirigindo-se necessariamente ao domínio da relação entre sujeitos humanos, a bioética
existente é necessariamente política. Uma ética biológica diria respeito apenas ao domínio da
pura interioridade pessoal de cada ser humano, foro único da ética, na sua relação pessoalíssi-
ma com a vida, enquanto tal, no estrito foro de sua mesma interioridade sem transcendência in-
tersubjetiva, esta imediatamente política. Sendo possível, seria apenas, enquanto ciência, uma
“ciência” individual, cujo sujeito e objeto coincidiriam, dado que apenas cada pessoa pode dizer
acerca da realidade de sua mesma interioridade ética. Pode haver uma acepção racionalmente
interessante para o termo «bioética», acepção que não é científica no sentido comum moderno
do termo e que seria a da procura de um modo de sabedoria na ação, enquanto princípio subje-
tivo interior, na forma de cada pessoa lidar com a vida. Forma autopedagógica, esta bioética teria
todo o interesse, mas dependeria sempre, dado que ninguém nasce propriamente ensinado, de
qualquer formação base que pudesse fundar a capacidade autopedagógica da pessoa no sen-
tido da formação de um princípio de ação «bioético» de uma ética pessoal relativa à ação para
com a vida. Como programa pessoal, tal bioética seria muito interessante, sobretudo, se fosse
pedagogicamente conduzida no sentido da inteligência da vida como um bem comum a pro-
mover em toda a sua plenitude, mesmo quando interfere negativamente com essa outra vida
que é a humana, ação já política: melhorar, no sentido de um bem comum da vida ou da vida
entendida como bem comum, toda a ação de cada ente humano não poderia deixar de ser po-
sitivo para a vida entendida na sua globalidade pelo menos na sua globalidade conhecida. Este
sentido possível para uma bioética seria muito bem-vindo. A relação do homem com a vida em
seu sentido mais universal possível não é uma questão meramente ética, mas uma questão fun-
damentalmente política, pois, se toda a ação possível e real da pessoa humana nasce única e ex-
clusivamente, independentemente de quaisquer ismos condicionais exteriores, de seu mesmo
interior ético, é no âmbito da relação com terceiras entidades, humanas ou não, que as questões
fundamentais se põem, salvo na questão do suicídio, questão bioética em sentido geral, mas que
é fundamentalmente ética, sem mais. O erro, que não é novo, profana da confusão entre o que
são regras deontológicas, políticas por essência, e o domínio da radical fundação ética dos atos
das pessoas, domínio em que as regras nunca podem ser de etiologia política sob pena de ani-
quilação da própria pessoa por fundamental dependência heteronômica. O âmbito da fundação
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UAB/Unimontes - 8º Período
da ética é sempre da ordem do ontológico, da ontologia própria interna de cada pessoa, em que
a mesma pessoa se constrói em atos de escolha puramente interiores, irredutíveis a qualquer ou-
tra fonte ou sede. De fato, a única maneira de a humanidade poder não já viver – num sentido
de plenitude –, mas apenas sobreviver é o respeito pelo seu mesmo princípio ontológico, ne-
cessário para a existência da cidade humana universal, princípio do respeito pelo bem comum,
isto é, pelo bem de todos e de cada um dos homens concomitantemente, necessariamente con-
comitante. Entre ser nova ciência de fundamentação ontológica do ser da vida e de procura de
estabelecimento de princípios universais, ontologicamente fundados, para o exercício da ação
no âmbito da vida e ser apenas um instrumento ideológico nas mãos de oligarquias e tiranias
reinantes, a bioética parece ter escolhido a segunda opção.
Unidade 2
Não há outra forma que não seja pela ética para estabelecermos uma maneira de realiza-
ção da perfeição humana: buscando a Felicidade de todos os seres e afastando-se dos vícios e
limitações. Preocupar-se com a preservação da vida, a justa medida das relações, a tolerância e o
respeito à alteridade são assuntos recorrentes da ética e de sua derivada, a bioética. Todas as for-
mas citadas acima são maneiras de apreensão da realidade pelo conhecimento. A presença de
Descartes no cenário filosófico moderno vai marcar decididamente toda a história do pensamen-
to. A verdade do sujeito, então, é vista por Descartes como resultado de condição sine qua non
da verdade de se pensar – do cogito. A existência do sujeito como substância extensa é devedora
da realidade do pensamento como aspecto fundador do indivíduo. O sujeito, nesse caso, como
expressão de uma substância pensante: essência única e indivisível – metafísica – separada da
realidade extensa. A necessidade de estabelecer um método que tenha como resultado final a
clareza dos princípios absolutos exige de Descartes uma filosofia primeira, que ilumina as regras
para a direção do espírito, isto é, de princípios metafísicos, que são a constatação da presença efi-
ciente do cogito no mundo e que só através do sujeito como substância pensante é que o mun-
do, naquilo que é cognoscível, pode ser tratado como certeza científica. Descartes, ao afirmar a
necessidade e a importância primordial do cogito – do puro pensamento –, rejeita a condição
dos sentidos como fontes claras do conhecimento. A ideia de complexidade pretende justamen-
te levar em consideração na produção do conhecimento todos os acontecimentos do real, inclu-
sive a ideia de desordem. Essa superação responde ao princípio da reintrodução do conceptor na
concepção. Aí reside a questão central da ética do conhecimento. Nesse sentido, complexidade
e transdisciplinaridade lidam com a ideia de paradoxo ao tratar da realidade, ampliando as con-
siderações feitas pela ciência clássica, suas formas de objetivação do mundo. Podemos desdo-
brar essa questão através do debate: o que pode o sujeito e quais as suas responsabilidades? A
complexidade do agir humano exige de nós que o conhecimento seja cada vez mais amplo, que
escape às restrições de apenas uma área do saber. Os discursos da Racionalidade Moderna fun-
daram a racionalidade instrumental, simplificando via fragmentação o conhecimento. Ciência e
técnica carecem de um direcionamento ético na fundamentação do conhecimento.
Unidade 3
No século XX, em especial a partir de 1950, há uma sistematização do discurso ético em rela-
ção a determinadas práticas. Isso nos direciona para uma sorte de ética prática ou ética aplicada.
Nesse relatório foram propostos três princípios básicos que envolveriam pesquisa em seres hu-
manos:1° autonomia (consentimento informado do paciente); 2° beneficência (cuidado e aten-
ção do pesquisador em relação aos riscos e benefícios para o paciente); 3° justiça (equidade em
relação aos envolvidos em processos de experimentação). São esses princípios que nortearam as
análises de casos e se tornaram a principal preocupação no desenvolvimento da bioética. A ideia
é construir um esquema teórico da moral. O paradigma do “principialismo” é bastante utiliza-
do nos Estados Unidos. Isso significou a conversação entre ética, ciência ou avanços tecnocien-
tíficos, em especial no campo da biologia, da genética, da ética médica. Uma preocupação em
torno do nascer e do viver do homem ganha interesse nesses campos do saber. Vejamos: para
Aristóteles, não basta ao homem somente viver, mas viver bem; o Cristianismo, de alguma forma,
reforçará essa ideia introduzindo o tema do amor, do amor ao próximo, do viver de “acordo com
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Ciências Biológicas - Bioética
o bem”; chegando à Idade Moderna, a ideia era de quantificar o bem, isto é, maior bem para o
maior número de pessoas. Desses princípios, a ideia de autonomia jamais escapou ao debate éti-
co. A autonomia favorece o pensamento, a reflexão, a decisão e ação. Foi Kant (filósofo do século
XVIII) quem tratou de maneira bastante clara a respeito da autonomia do sujeito. A respeito da
discussão acerca da ética e de sua fundamentação, Kant escreveu Fundamentação da Metafísica
dos Costumes (1785) e a Metafísica dos Costumes (1798). A liberdade, portanto, é o fundamento
da prática. Os desdobramentos desse princípio na bioética poderemos ver no direito à vida e à
saúde. Essa preocupação em relação à autonomia serviu como suporte para a luta em favor dos
direitos à cidadania, à saúde. A força moral do “principialismo” defende que a consciência autô-
noma deve ser maior do que toda e qualquer moral externa. O Paradigma casuísta, ao tentar
universalizar os procedimentos através dos pressupostos “principialistas”, recebeu uma série de
críticas. Segundo os A.R. Jonsen e St. Toulin, na obra The Abuse of Casuistry (O abuso do casuís-
mo) - (1988), é preciso se preocupar com a finalidade prática da moral, distanciando-se por vezes
da perspectiva meramente teórica (conceitual). O fato de analisar casos particulares/singulares,
segundo os autores em questão, propicia um olhar histórico acerca dos acontecimentos, reme-
tendo a questões que nascem na modernidade e suas modificações em todos os âmbitos da vida
do homem, da vida social. Dessa forma, o “casuísmo” afasta-se do paradigma principialista, por-
que valoriza a particularidade em lugar da generalidade. Poderíamos dizer que a relação entre
paradigma casuísta e teologia moral é bastante próxima: reflexão ética na resolução de casos. A
ética aplicada valoriza a construção lógica dos princípios sobre a prática. É na história, na vida,
nos casos particulares que se encontram o sentido e a certeza moral.
Unidade 4
Um dos temas mais recorrentes em se tratando de bioética é a pesquisa com seres huma-
nos. Os animais e seres humanos são parte da natureza, sendo que os animais se aproximam
muito mais da ideia de “natureza” do que os seres humanos. O ser humano, pelo contrário, dis-
tancia-se da natureza, problematizando-a e fazendo da mesma um laboratório de perguntas.
Separamos, então, homem (seres humanos) e natureza. Dessa forma, o homem se separa da
natureza, e toda relação: homem - mundo é estabelecida através do domínio da racionalidade
que tem como objetivo a apreensão das verdades que já estão impressas e que na modernida-
de carecem de interpretação. Seguindo as pistas do humanismo renascentista, a modernidade, a
partir do século XVII, começa a trilhar verdadeiramente os caminhos da liberdade, e isto significa
uma nova postura da figura-homem. A liberdade proporcionada pela razão – espírito aberto à
especulação e à curiosidade científica – faz da experiência humana, enquanto inserção na natu-
reza e na história, valores imprescindíveis que ocasionarão novas vivências no campo da arte,
da economia, da política, da geografia e da filosofia. Nesse sentido, o homem se diferencia dos
demais animais, porque possui a condição de criar perguntas, elaborar problemas, buscar solu-
ções. Nessa busca por harmonia, o homem se torna pesquisador do mundo. Ao problematizar
tudo que estava ao seu redor, a Natureza e o Outro (seu semelhante), o homem estabelece rela-
ções e, a partir disso, constrói valores, e tais valores são os elementos centrais no campo da ética.
O vínculo entre pesquisa e ética é inquebrantável e essa correlação é exigência da atividade do
homem. É crescente o aumento da interrogação acerca da atividade humana. A tese de Galileu
foi de extrema importância, apesar das sanções da Igreja Católica. Posteriormente ao seu corte
epistemológico, o homem da razão, segundo Galileu, passou a ocupar um novo espaço no mun-
do: o daquele que se torna responsável pela produção do conhecimento. Em Galileu, perde-se o
sentido da ideia de verdade como revelação; esta deixa de ser uma consideração divina, sagrada
ou entendida à luz da fé. Não cabe ao homem esperar uma resposta que “venha do céu”, já que
as condições para se desvendar os mistérios e os segredos do mundo se encontram nele mesmo.
Ao homem, resta saber trilhar os caminhos certos, guiados pelo espírito da razão que é corres-
pondida pela certeza proporcionada pela geometria e pela matemática. Com o passar dos tem-
pos, os avanços científicos têm ocorrido numa velocidade surpreendente. Da chamada revolução
científica do século XVI até o século XX, o mundo mudou completamente. Somente no século XX
tivemos conhecimento de três grandes revoluções:
• a revolução atômica;
• a revolução molecular;
• a revolução da comunicação.
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UAB/Unimontes - 8º Período
Unidade 5
A medicina mudou mais nos últimos cinquenta anos que nos cinquenta séculos preceden-
tes. Sucederam-se duas revoluções: a revolução terapêutica que começou em 1937 com as sul-
famidas e a revolução biológica que a seguiu de perto com a engenharia genética e patologia
molecular. Estas duas revoluções não só diminuíram o sofrimento dos homens como vieram
igualmente colocar novos problemas éticos (BERNARD, 1992). É neste contexto que surge um
novo domínio da ética. O progresso já realizado e previsível nos domínios da biologia, e no-
meadamente a biologia humana, põe questões e lança grandes desafios à reflexão ética. No
campo da genética há amplas perspectivas de novos conhecimentos. Em 2003 sucedem-se as
notícias, em nível dos media, sobre o nascimento de seres humanos clonados. Perante estas
novas possibilidades de pensar a ciência e o próprio futuro da espécie humana, o meio cien-
tífico necessitou do contributo da bioética. Segundo NEVES (2001), a bioética é um dos novos
saberes da contemporaneidade que mais tem evoluído. A dinâmica do poder que estimula o
progresso da ciência cede, então, ao sentido do dever que constitui a ética. A Declaração de Hel-
sinque, apresentada pela Associação Médica Mundial, afirma de forma peremptória que os
interesses da pessoa humana, nomeadamente os respeitantes à vida e saúde, se sobrepõem
aos interesses da ciência. Nesta declaração surge igualmente a noção da imprescindibilidade
do respeito pela autonomia e pela dignidade humana. De fato, a ofensa da dignidade hu-
mana, configurada pela experiência cruel, causadora de lesão ou morte, de sofrimento ou perda
de função, não é posta em causa; mas há quem questione a dignidade do ser humano em de-
terminados estados da vida (por exemplo no embrionário) ou condições de saúde (por exemplo,
demência ou estado vegetativo persistente). A bioética surge, assim, como uma renovada consci-
ência do dever nas circunstâncias descritas de acelerado progresso biotecnológico. No mundo
anglo-americano, a bioética começa a ganhar expressão mais cedo do que na Europa continen-
tal, devido em parte, ao diferente impacto que a “experimentação humana”, tema originário
da bioética, obteve em ambos os espaços geográficos. Na contínua procura de salvaguar-
da desses direitos, mais recentemente, em 1996, o Comitê de Ministros do Conselho da Europa
adotou a Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e da Dignidade do Ser Humano
relativamente às aplicações da Biologia e da Medicina: Convenção sobre a escola superior de
enfermagem de Viseu - 30 anos, Direitos do Homem e a Biomedicina. Partilhamos da opinião de
NEVES (2001), ao afirmar que a continuação do sucesso da bioética dependerá da fidelidade à
sua intencionalidade originária no protagonizar do espírito humanista num contexto parti-
cularmente desumanizante, como é o científico-tecnológico ou o econômico-financeiro, e no
corroborar a natureza ética da sua reflexão, tanto mais relevante quanto cada vez mais o homem
desafia a sua condição natural encontrando-se mais amplamente entregue à sua ação.
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Ciências Biológicas - Bioética
Referências
Básicas
BERNARD, Jean. Evolução da ética e da biologia. Acção Médica. Porto: Associação dos Médicos
Católicos Portugueses. nº 3, p. 29-32, 1992.
BISCAIA, Jorge. Bioética e saúde. Acção Médica. Lisboa: Associação dos Médicos Católicos Por-
tugueses. nº1, p.9-15, 2003.
GARRAFA, V. & CORDON, J. Pesquisa em Bioética no Brasil de Hoje. Editora Global, 2006.
MORIN, Edgar. Ciência com consciência. 5 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.
NEVES, M. Patrão. A bioética de ontem, hoje e amanhã: interpretação de um percurso. In: AR-
CHER, Luís et al. Novos desafios à bioética. Porto: Porto Editora, 2001. p. 20-30.
Complementares
ANTUNES, Alexandra. Consentimento informado. In: NUNES, Rui; SERRÃO, Daniel. Ética em cui-
dados de saúde. Porto: Porto Editora, 1998. p. 13- 19.
ARCHER, Luís et al. Novos desafios à Bioética. Porto: Porto Editora, 2001.
BERNARDO, O. P. Perspectivas sobre Bioética. Accão Médica. Porto: Associação dos Médicos
Católicos Portugueses. nº 3, p. 33-40 1992.
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UAB/Unimontes - 8º Período
Suplementares
BEAUCHAMP, T. L. CHILDRES, J. F. Princípios de ética biomédica. São Paulo, Loyola, 2002.
______. Principles of Biomedical Ethics. New York: Oxford University Press, 1979.
CLOTET, Joaquim. Bioética: uma visão panorâmica. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2011.
DINIZ, Debora; GUILHERME, Dirce. O que é Bioética. São Paulo: Brasiliense, 2002.
LÉO Pessini & CHRISTIAN de Paul de Barchifontaine (orgs). Fundamentos da Bioética. São Paulo:
Paulus, 2002.
SEGRE, Marco; COHEN, Cláudio (orgs). Bioética. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo,
2002.
SOARES, André Macedo. Bioética e biodireito: uma introdução. São Paulo: Loyola, 2002.
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Ciências Biológicas - Bioética
Atividades de
Aprendizagem – AA
1) Qual o conceito de bioética? E sua importância para a inter-relação entre ciência e sociedade?
6) Conceitue modernidade.
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