Educação e Povos Indígenas: Construindo Uma Política Nacional de Educação Escolar Indígena

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 11

ESTUDOS

Educação e povos indígenas:


construindo uma política nacional
de educação escolar indígena*
Luís Donisete Benzi
Grupioni

Palavras-chave: povos
indígenas; educação escolar
indígena; política educacional;
legislação indigenista; formação
de professores.
Ilustração: Nancy Cristina Schoola Ferreira

*
Palestra proferida em 16 de
abril de 1999, em Brasília (DF),
no Centro de Informações e Bi-
blioteca em Educação (Cibec),
do Instituto Nacional de Estu-
dos e Pesquisas Educacionais
(Inep), dentro do Programa
"Conheça a Educação" e em
comemoração ao Dia do Índio
(19 de abril).

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 81, n. 198, p. 273-283, maio/ago. 2000. 273
seus membros um modo próprio e especí-
fico de ser, que garante sua sobrevivência e
reprodução, ao longo de gerações, possi-
bilitando que valores e atitudes considera-
dos fundamentais sejam transmitidos e per-
petuados. Trata-se do modo pelo qual se
socializam os indivíduos, moldando homens
e mulheres segundo os ideais particulares
de pessoa humana de cada sociedade. Já
o segundo termo, educação para o índio,
ganhou nova roupagem nos últimos anos:
fala-se agora em educação escolar indíge-
na. Ele descreve o conjunto de práticas e
intervenções que decorrem da situação de
inserção dos povos indígenas na socieda-

A
de nacional, envolvendo agentes, conheci-
mentos e instituições, até então estranhos
nalisa avanços e à vida indígena, voltados à introdução da
impasses para a estruturação de escola e do letramento. Esta modalidade
uma política pública que atenda tem relação direta com as políticas
às demandas dos povos implementadas pelo Estado junto aos po-
indígenas por processos vos indígenas. O parâmetro que impera é o
educacionais que lhes permitam da escola formal, seja para reproduzi-lo,
o acesso a conhecimentos adequá-lo ou contestá-lo. Nesta perspecti-
va, o modelo escolar ocidental, formal,
universais e que valorizem suas
hierarquizado e individualista pauta as ex-
línguas e seus saberes periências de escolarização dos índios, se-
tradicionais. Registrando o jam elas leigas ou missionárias, oficiais ou
avanço e a consolidação da alternativas, autoritárias ou progressivas,
legislação educacional brasileira, assimilacionistas ou libertadoras (cf. Meliá,
que garante uma educação 1979; Silva, 1981).
diferenciada aos povos Aqui quero me restringir ao segundo
indígenas, analisa as alterações termo e discutir novas possibilidades que
de responsabilidade, têm surgido no panorama da educação
implementada nos últimos anos, voltada aos povos indígenas no Brasil nos
na condução das ações de últimos anos, onde se pode registrar avan-
educação indígena no País, ços e consensos na estruturação de uma
política pública, de âmbito nacional, volta-
propondo uma pauta da a atender às necessidades educacionais
programática a ser desses povos. Esses avanços podem ser
desencadeada pelo Ministério da verificados tanto no plano legal quanto no
Educação como política pública plano administrativo.
para essa área.

Avanços na legislação
Introdução
Comecemos pelas alterações que ocor-
Há mais de 20 anos, consolidou-se, reram nos últimos anos na legislação que
tanto na Antropologia como no indige- trata dos índios e do direito a uma educa-
nismo, uma distinção entre educação indí- ção diferenciada. Nesse cenário, a Consti-
gena e educação para o índio, que ainda tuição de 1988 merece especial atenção,
hoje se mostra operativa quando o assun- pois foi com a sua promulgação que se re-
to é educação e povos indígenas. O pri- conheceu aos índios o direito de permane-
meiro termo refere-se aos processos e prá- cerem índios e terem suas tradições e mo-
ticas tradicionais de socialização e trans- dos de vida respeitados e protegidos pelo
missão de conhecimentos próprios a cada Estado brasileiro, rompendo com a tradi-
sociedade indígena. Abarca os processos ção legislativa e administrativa que sempre
pelos quais uma sociedade internaliza em procurou incorporar os índios à comunhão
274 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 81, n. 198, p. 273-283, maio/ago. 2000.
nacional, entendendo-os como categoria das comunidades indígenas nas decisões re-
étnica e social transitória, fadada ao desa- lativas ao funcionamento dessas escolas. O
parecimento. A Constituição de 1998 inau- PNE prevê, ainda, a criação de programas
gurou uma nova fase no relacionamento específicos para atender às escolas indíge-
dos povos indígenas com o Estado e com nas, bem como a criação de linhas de fi-
a sociedade brasileira, ao reconhecer suas nanciamento para a implementação dos
organizações sociais, costumes, línguas, programas de educação em áreas indíge-
crenças e tradições, e ao atribuir ao Esta- nas. Atribuindo aos sistemas estaduais de
do o dever de respeitar e proteger as ma- ensino a responsabilidade legal pela edu-
nifestações das culturas indígenas. Em seu cação indígena, o PNE assume como uma
art. 210, fica assegurado aos povos indí- das metas a ser atingida nessa esfera de
genas o direito de utilizarem suas línguas atuação a profissionalização e o reconheci-
maternas e processos próprios de apren- mento público do magistério indígena, com
dizagem, abrindo caminho para transformar a criação da categoria de professores indí-
a instituição escolar em um instrumento de genas como carreira específica do magis-
valorização e sistematização de saberes e tério e com a implementação de progra-
práticas tradicionais, ao mesmo tempo em mas contínuos de formação sistemática do
que possibilite aos índios o acesso aos professorado indígena.
conhecimentos universais. Ainda em tramitação no Congresso
Desdobramentos desta grande inova- Nacional está uma proposta de lei de revi-
ção legal já se fizeram presentes em ou- são do Estatuto do Índio (Lei nº 6.001, de
tras leis e normatizações. A Lei de Diretri- 1973) que se tornou defasado diante das
zes e Bases da Educação Nacional (LDB), inovações do texto constitucional atualmen-
de 1996, apresenta dois artigos sobre a te em vigor. O Estatuto do Índio, sanciona-
questão da educação indígena preconi- do durante o governo militar, regula a situa-
zando como dever do Estado o ofereci- ção jurídica dos índios e de suas comuni-
mento de uma educação escolar bilíngüe dades com o propósito de preservar suas
e intercultural, que fortaleça as práticas culturas e de promover sua integração, de
socioculturais e a língua materna de cada forma progressiva e harmoniosa, à comu-
comunidade indígena e proporcione a nhão nacional. Estabelece-se que essa
oportunidade de recuperar suas memóri- integração vai dar-se "mediante processos
as históricas e reafirmar suas identidades, de gradativa compreensão dos problemas
dando-lhes, também, acesso aos conhe- gerais e valores da sociedade nacional" e
cimentos técnico-científicos da sociedade que seriam "estimulados o artesanato e as
nacional. Prevê-se, ainda, a articulação dos indústrias rurais no sentido de elevar o pa-
sistemas de ensino para a elaboração de drão de vida do índio com a conveniente
programas integrados de ensino e pesqui- adaptação às condições técnicas moder-
sa, que contem com a participação das nas" (arts. 50 e 53). Rechaçando todos es-
comunidades indígenas em sua formula- ses dispositivos, as propostas em discus-
ção e que tenham como objetivo desen- são no Congresso Nacional para os artigos
volver currículos específicos, neles inclu- que tratam da questão da educação indí-
indo os conteúdos culturais correspon- gena estão afinadas com os avanços jurídi-
dentes às respectivas comunidades. Para cos inscritos na Constituição Federal e na
tanto, a lei prevê a formação de pessoal LDB, prevendo que os "índios tenham aces-
especializado para atuar nessa área e a so aos conhecimentos valorizados e socia-
elaboração e publicação de materiais di- lizados no contexto nacional, de modo a
dáticos específicos e diferenciados. assegurar-lhes a defesa de seus interesses
No Plano Nacional de Educação (PNE), e a participação na vida nacional em igual-
promulgado em janeiro de 2001, há todo dade de condições, enquanto grupos etni-
um capítulo sobre a educação escolar indí- camente diferenciados" e garantindo "res-
gena, com metas a curto e longo prazos, peito aos processos educativos e de trans-
onde se estabelece a universalização da ofer- missão de conhecimento das comunidades
ta de programas educacionais aos povos indígenas". O processo de implantação de
indígenas para todas as séries do ensino escolas deverá garantir autonomia tanto
fundamental, assegurando autonomia para para o projeto pedagógico quanto para a
essas escolas, tanto no que se refere ao pro- gestão administrativa, num contexto plural
jeto pedagógico quanto ao uso dos recur- de idéias e concepções pedagógicas. Fi-
sos financeiros, e garantindo a participação cam assegurados "currículos, programas e

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 81, n. 198, p. 273-283, maio/ago. 2000. 275
processo de avaliação de aprendizagem e possa colocar em questão o velho para-
materiais pedagógicos e calendários esco- doxo que caracteriza nossa sociedade
lares diferenciados e adequados às diver- acerca da larga distância do que está es-
sas comunidades indígenas", bem como o tabelecido na lei e o que ocorre na práti-
direito destas em participar dos processos ca, não há como negar que são muitas as
de recrutamento e seleção de seus profes- conquistas efetuadas nos últimos anos
sores, dando prioridade aos próprios índi- nesse plano legal, que coloca o Brasil em
os. Para tanto, a proposta de reformulação posição de destaque em frente a outros
do Estatuto do Índio também prevê "pro- países que também contam com popula-
gramas de formação de recursos humanos ções indígenas. O desafio posto neste
especializados, possibilitando a condução momento é o de como tornar realidade
pedagógica da educação escolar pelas os avanços inscritos no plano jurídico, de
próprias comunidades indígenas". modo que a escola em áreas indígenas,
A revisão do Estatuto do Índio ainda historicamente utilizada como meio de
deve conter um dispositivo que atribua ao dominação, seja um instrumento de auto-
Conselho Nacional de Educação a defini- determinação, que respeite as tradições
ção de diretrizes para as escolas indíge- e modos de ser indígenas e esteja a servi-
nas. Isto efetivamente já ocorreu com a ço dos diferentes projetos de futuro des-
Resolução nº 3/99, que cria a categoria ses povos. Em suma, que lhes abra novas
escola indígena, reconhecendo-lhe "a con- perspectivas, a seu favor e não contra!
dição de escolas com normas e ordena-
mento jurídico próprios". Garante-se uma
formação específica para os professores Avanços administrativos
indígenas e que esta poderá ocorrer em
serviço e, quando for o caso, concomitan- O segundo marco que gostaria de cha-
temente com a sua própria escolarização. mar a atenção diz respeito à transferência
Normatizando a LDB, a resolução define de responsabilidade e de coordenação das
claramente as esferas de competência, em iniciativas educacionais em terras indígenas
regime de colaboração, entre União, Es- do órgão indigenista (Fundação Nacional
tados e municípios. À primeira cabe le- do Índio – Funai) para o Ministério da Edu-
gislar, definir diretrizes e políticas nacio- cação (MEC), em articulação com as Se-
nais, apoiar técnica e financeiramente os cretarias Estaduais de Educação, por meio
sistemas de ensino para o provimento de do Decreto nº 26/91, da Presidência da
programas de educação intercultural e de República. Essa transferência abriu a possi-
formação de professores indígenas, além bilidade para que as escolas indígenas fos-
de criar programas específicos de auxílio sem incorporadas aos sistemas de ensino
ao desenvolvimento da educação. Aos do País, para que os então "monitores bi-
Estados caberá a responsabilidade "pela língües" fossem formados e respeitados
oferta e execução da educação escolar enquanto profissionais da educação e para
indígena, diretamente ou por regime de que o atendimento das necessidades edu-
colaboração com seus municípios", inte- cacionais indígenas fosse tratado enquan-
grando as escolas indígenas como "uni- to política pública, responsabilidade do
dades próprias, autônomas e específicas Estado. Encerrava-se, assim, um ciclo mar-
no sistema estadual" e provendo-as com cado pela transferência de responsabilida-
recursos humanos, materiais e financeiros, des do órgão indigenista para missões reli-
além de instituir e regulamentar o magis- giosas no atendimento das necessidades
tério indígena. indígenas.
Todos os dispositivos legais, comen- Esse ainda é um processo em curso. É
tados acima, já em vigor ou em discus- possível elencar vários aspectos positivos
são no Congresso Nacional, apontam dessa transferência de responsabilidades
para uma verdadeira revolução no reco- que ensejou o envolvimento de outras esfe-
nhecimento do direito dos índios a uma ras do poder público, sejam agentes go-
educação específica voltada para a valo- vernamentais, sejam órgãos de governo,
rização do conhecimento indígena e pre- abrindo novos canais de interlocução para
ocupada em garantir meios e instrumen- os índios. E é possível, também, demons-
tos para um convívio menos violento e trar as inúmeras resistências dessas mesmas
desagregador dos índios com a socie- esferas de poder em absorver as escolas
dade brasileira. Ainda que sempre se indígenas, respeitando o direito dos índios
276 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 81, n. 198, p. 273-283, maio/ago. 2000.
a uma educação diferenciada, que requer povos indígenas. Foram essas experiênci-
novos aportes teóricos, metodológicos e as, que nasceram num contexto de se cons-
administrativos. truir alternativas de autonomia para os po-
Ao assumir a responsabilidade de co- vos indígenas diante da política integra-
ordenar as ações educacionais em terras cionista do Estado, que geraram um mo-
indígenas, o MEC tomou como primeira ta- delo de formação próprio para os profes-
refa a construção de um documento que sores indígenas, de modo a habilitá-los para
tivesse a função de definir os parâmetros assumirem a docência e a gestão de suas
de uma política nacional para essa modali- escolas, que, por sua vez, foi encampado
dade de educação, de modo a orientar a pelo MEC como proposta a ser dissemina-
atuação das diversas agências. Assim, em da em todo o País.
1993, foi lançado o documento Diretrizes Outras iniciativas importantes vieram
para a política nacional de educação esco- somar-se a este novo contexto. Consolidou-
lar indígena que estabelece como princípi- se uma coordenação geral de educação
os organizadores da prática pedagógica escolar indígena no âmbito do Ministério
em contexto de diversidade cultural a da Educação, ao mesmo tempo em que se
especificidade, a diferença, a intercultu- incentivou a criação de instâncias gestoras
ralidade, o uso das línguas maternas e a nas Secretarias de Educação Estaduais para
globalidade do processo de aprendizagem. cuidar das escolas e da formação dos pro-
Esse documento, elaborado pelo Comitê fessores indígenas. Formulou-se no MEC um
Nacional de Educação Escolar Indígena, programa de financiamento de projetos na
composto por representantes de órgãos área da educação indígena para apoiar
governamentais e não-governamentais que ações desenvolvidas por organizações de
atuam na educação indígena, além de re- apoio aos índios e universidades, além de
presentantes de professores indígenas, foi direcionar recursos orçamentários do Fun-
pautado em experiências inovadoras leva- do Nacional do Desenvolvimento da Edu-
das a cabo por organizações não-gover- cação (FNDE) para que as Secretarias de
namentais que atuam junto a diferentes Estado da Educação pudessem também
desenvolver ações específicas nessa área.
Com isto, reconheceu-se a importância das
experiências não-governamentais de forma-
ção de professores indígenas e, paralela-
mente, abriu-se caminho para o surgimento
de novos cursos de formação por iniciati-
vas governamentais. Outra ação significati-
va deu-se com o apoio à publicação de
materiais didático-pedagógicos elaborados
pelos próprios professores índios enquan-
to momento importante do processo de sua
formação, permitindo a ampliação de uma
literatura de autoria dos próprios professo-
res indígenas.
No plano administrativo, realizou-se um
censo escolar indígena, quantitativo e qua-
litativo, com três produtos necessários e há
muito esperados: a inclusão das escolas
indígenas no sistema educacional, a cria-
ção de um cadastro de escolas e de um
cadastro de professores índios, que permi-
tirá avaliar impasses, dificuldades e avan-
ços nas ações governamentais de melhoria
da qualidade do ensino e dos profissionais
da educação. Consolidando este quadro,
um novo documento começou a chegar às
escolas indígenas de todo o País: o
Referencial curricular nacional para as es-
colas indígenas (RCNEI), documento indutor
e orientador de novas práticas, que contou

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 81, n. 198, p. 273-283, maio/ago. 2000. 277
com a participação de especialistas, téc- ações e programas em curso, orientando e
nicos e professores índios em sua formu- congregando esforços de forma a otimizar
lação. Trata-se de um longo e detalhado recursos financeiros e a buscar objetivos
documento em que se apresentam consi- mais gerais e duradouros, estruturando-se
derações gerais sobre a educação esco- um sistema articulado de ações e parcerias
lar indígena, quer por meio da fundamen- entre o Estado e a sociedade civil. O desa-
tação histórica, jurídica, antropológica e fio do momento está posto na necessidade
pedagógica que sustenta a proposta de de se consolidar uma política pública efici-
uma escola indígena que seja intercultural, ente de atendimento das necessidades edu-
bilíngüe e diferenciada, quer meio de su- cacionais dos povos indígenas, envolven-
gestões de trabalho, por áreas do conhe- do o MEC, Secretarias Estaduais de Edu-
cimento, que permitam a construção de cação, organizações da sociedade civil de
um currículo específico e próximo da rea- apoio aos índios e organizações indígenas.
lidade vivida pelas comunidades indíge- Isto se faz necessário uma vez que se per-
nas, na perspectiva da integração de seus cebe um quadro ainda desigual, fragmen-
etnoconhecimentos com conhecimentos tado e pouco estruturado de oferta e aten-
universais selecionados. Num campo que dimento educacional aos índios.
se caracteriza por uma plêiade de con- Neste momento, é possível vislumbrar
cepções e práticas diferentes, o documen- a possibilidade de amarrar várias iniciativas,
to conhecido pela sigla RCNEI conseguiu dentro de uma política específica, com
reunir e sistematizar um mínimo de con- chances de alcançar sucesso efetivo na
senso, capaz de subsidiar diversas inter- estruturação de um sistema integrado e
pretações e propostas de construções verticalizado de educação escolar indíge-
pedagógicas e curriculares autônomas. na no País. Para que isso seja alcançado, é
Para que isto de fato ocorra, será preciso imperioso que o Ministério da Educação
qualificação profissional dos agentes edu- trace prioridades e metas a serem atingi-
cacionais e abertura nos rígidos esquemas das por meio de ações que subsidiem e
administrativos das Secretarias de Educa- orientem a ação dos diferentes parceiros
ção de modo a construir novos canais de neste campo. Não tomar essa dianteira re-
interlocução em que as comunidades in- presenta a perda de um espaço de coorde-
dígenas tenham papel ativo na definição nação e de indução de novas práticas, com
do projeto político-pedagógico de suas a conseqüente desarticulação de iniciativas,
escolas. que continuarão a ser pontuais, mas que
não efetivarão uma mudança qualitativa de
patamar nessa área específica de atuação
Impasses e dificuldades do Ministério.
Não se quer propor que o MEC assu-
É fundamental reconhecer nesse novo ma responsabilidades que vão além de sua
panorama que se constrói que nem só de esfera de competência, mas sim, que se dê
consensos e avanços vive a educação es- um rumo mais certeiro e articulado às vári-
colar indígena no País. Muitos são os as iniciativas em curso, de modo que, num
impasses, as dificuldades, a falta de vonta- curto espaço de tempo, seja possível vis-
de política e administrativa que entravam e lumbrar um novo horizonte para a educa-
retardam a consolidação de um cenário ção escolar indígena no País. Há que se
onde a escola esteja a serviço dos interes- reconhecer que hoje existe uma demanda
ses e dos projetos de futuro dos povos in- declarada, tanto por parte de outras esfe-
dígenas, permitindo que estes tenham aces- ras de governo quanto de segmentos da
so a informações essenciais para um con- sociedade civil, no sentido de uma atua-
vívio mais harmônico e menos destrutivo ção mais contundente do MEC, enquanto
com os demais segmentos da sociedade orientador e indutor da política nacional de
brasileira. educação indígena. Isto ocorre num con-
Se é fato que vários avanços foram texto em que se verificam e se consolidam,
consolidados, em anos recentes, no que como vimos, avanços importantes, tanto na
se refere à estruturação de uma política esfera jurídica quanto administrativa, da re-
pública de educação escolar indígena no lação do Estado brasileiro com os povos
Brasil, devemos também reconhecer que indígenas.
outros avanços são possíveis e necessári- É nesse contexto que se enseja a opor-
os para que se consolidem iniciativas, tunidade de traçar um plano articulado de

278 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 81, n. 198, p. 273-283, maio/ago. 2000.
ações a serem desenvolvidas pelo MEC no Secretarias assumiram seu papel execu-
sentido de consolidar a política de educa- tor. Tal postura amparava-se em leituras
ção indígena. Pois, se registramos avan- diferentes do texto da LDB, que agora foi
ços importantes, devemos também reco- interpretado pelo Conselho Nacional de
nhecer que vários impasses permanecem, Educação (CNE), definindo claramente as
notadamente em relação ao pouco responsabilidades de cada instância de
envolvimento de várias Secretarias Estadu- governo. Ao MEC, como vimos, definiu-
ais de Educação que ainda não absorve- se o papel de definidor da política, legis-
ram a temática da educação indígena como lando, emitindo diretrizes, criando progra-
uma de suas linhas de trabalho. E este é mas de auxílio ao desenvolvimento da
um dos principais "nós" a ser enfrentado, educação, orientando e avaliando o de-
uma vez que a execução da política de senvolvimento de ações para a formação
educação indígena ficou sob a responsa- de professores e apoiando técnica e fi-
bilidade dessas Secretarias. Poucas são as nanceiramente os sistemas de ensino para
que estruturaram um corpo técnico admi- o provimento da educação intercultural
nistrativo para formular e implementar uma nas comunidades indígenas. Aos Estados,
política estadual de educação indígena e por sua vez, cabe responsabilizar-se pela
que mantêm cursos regulares de formação oferta e execução da educação escolar,
e titulação de professores indígenas. Em pela regulamentação das escolas indíge-
sua maioria, as Secretarias Estaduais não nas (enquanto unidades autônomas em
contam com orçamento próprio para ações seus sistemas de ensino), pela formação
nessa área, limitando-se a realizar peque- inicial e continuada dos professores indí-
nos cursos, encontros e oficinas com re- genas e pela sua profissionalização.
cursos obtidos junto ao FNDE. Em vários Se no plano legal as incumbências das
Estados, o trabalho acumulado de organi- diferentes esferas de governo estão defini-
zações de apoio aos índios não é reco- das, devemos reconhecer que administrati-
nhecido, e parcerias desejáveis não são vamente há muito ainda a ser feito. O pas-
efetivadas. Boa parte das escolas indíge- so inicial será a criação de condições que
nas ainda não sentiu os novos ares de mu- permitam a discussão e a implementação
dança ensejados pela legislação e pela atu- da política de educação indígena, de for-
ação do MEC: é preciso, assim, investir ma verticalizada e integrada. Para isso, é
para mudar essa situação. fundamental a criação de instâncias admi-
nistrativas nas Secretarias de Educação,
com pessoal qualificado, que possam
interagir com as orientações federais e
Uma proposta de ação implementar planos e programas na esfera
para o MEC estadual. Há de se criar e fortalecer um sis-
tema de responsabilidades compartilhadas
A experiência e o conhecimento acu- nesta esfera de atuação, sob o risco de as
mulado pelo MEC nestes últimos anos pos- escolas indígenas nunca integrarem o sis-
sibilitam que se organize um plano tema de ensino do País e serem beneficia-
operacional de ações, junto aos diferentes das com os programas existentes de auxí-
parceiros que atuam nesta área, de modo lio à educação.
a induzir novas práticas e avançar na con-
solidação de um sistema forte e eficiente
de atendimento às demandas indígenas Estruturando o campo da
por processos educacionais construídos educação escolar indígena
com o objetivo de colocar a escola a servi-
ço dos projetos de futuro desses povos. Exercitando a competência que lhe cabe
Trata-se, agora, de construir um modelo nesse processo, o MEC deveria envidar es-
gerencial e operacional para as ações na forços para que fossem criadas em todas as
área de educação indígena. Secretarias de Educação instâncias adminis-
Desde que o MEC recebeu a incum- trativas para responderem às demandas pos-
bência pela coordenação das ações edu- tas pela educação indígena. Essa ação de-
cacionais em áreas indígenas, cabendo veria ser desencadeada no Conselho Nacio-
às Secretarias de Educação sua execu- nal de Secretários de Educação (Consed),
ção, assistimos um processo de convencendo as Secretarias que ainda não
indefinição administrativa, onde poucas contam com tal estrutura. O passo seguinte,

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 81, n. 198, p. 273-283, maio/ago. 2000. 279
seria a formulação de um programa de organizadas de forma a balizar suas políti-
capacitação dos técnicos das Secretarias: cas. Torna-se necessária a consolidação de
essa é uma reivindicação feita em diferentes um cadastro nacional de escolas indíge-
encontros e reuniões com esses técnicos. nas bem como um cadastro de professo-
O MEC poderia criar um programa de res contendo dados quantitativos e quali-
capacitação que seria oferecido às Secre- tativos. A esses dados, obtidos no Censo,
tarias interessadas, colaborando no proces- devem ser acrescidas informações disper-
so de criação de competências locais para sas que precisam ser organizadas e siste-
lidar com a educação escolar indígena. matizadas no próprio MEC, sobre financia-
Estabelecido o canal de comunicação mento de projetos de organizações não-go-
do MEC com as Secretarias, será preciso vernamentais, universidades e Secretarias,
que estas estabeleçam canais de interlo- eventos realizados, etc. Isto precisa ser fei-
cução direta com as comunidades indíge- to dentro de uma matriz que permita a jun-
nas, bem como com entidades e organi- ção de diferentes informações que condu-
zações que desenvolvam trabalhos na área zam à elaboração de um diagnóstico da
de educação, como as universidades, or- educação escolar indígena no País: condi-
ganizações de apoio e organizações indí- ção básica para a formulação e programa-
genas. Algumas experiências de organiza- ção de ações para os próximos anos.
ção de Conselhos Estaduais de Educação Como suporte para o trabalho das Se-
Indígena ou de núcleos de educação indí- cretarias e dos professores indígenas em
gena, enquanto instâncias consultivas e sala de aula, o MEC deve, já implementando
com representação dos diferentes atores, a resolução do CNE, criar e adaptar pro-
têm se mostrado um caminho interessante gramas de assistência educacional, como
para dar suporte e legitimidade às ações Biblioteca da Escola, Kit Tecnológico e ou-
desencadeadas pelas Secretarias. Divulgar tros, de modo a exercitar a diferenciação
tais experiências e incentivar a busca de na política de atendimento aos índios. Este
alternativas locais é também uma tarefa a será um sinal importante para as Secretari-
ser realizada. as Estaduais de Educação pensarem na
As Secretarias têm no Referencial
curricular nacional para as escolas indíge-
nas uma importante ferramenta de traba-
lho para iniciar a discussão com as comu-
nidades indígenas sobre os projetos de
escola que elas almejam. A discussão do
RCNEI pode ser, ainda, o ponto inicial do
processo de estruturação de programas de
formação dos professores indígenas. Tor-
na-se um imperativo a aproximação das
Secretarias com a realidade vivida pela
comunidade indígena, levantando suas
necessidades e aspirações.
O MEC tem condições de atender a
várias demandas e propiciar instrumentos,
recursos e pessoal que podem colaborar
para a estruturação de políticas estaduais
de educação indígena, tanto no que se
refere à formação de professores quanto
ao atendimento da educação. Mas, para
que isso ocorra de forma a estruturar práti-
cas consistentes, o próprio MEC precisa
munir-se de elementos que lhe permitam
traçar um diagnóstico da situação da edu-
cação indígena no País, de forma a poder
estabelecer, com segurança, áreas prio-
ritárias de atuação e intervenção. O Censo
Escolar Indígena será um instrumento im-
portante neste sentido, desde que as in-
formações obtidas sejam processadas e

280 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 81, n. 198, p. 273-283, maio/ago. 2000.
necessidade de um aporte diferencial e es- permaneçam letra morta, mas ganhem for-
pecífico para as escolas indígenas. ça e substância na prática e no cotidiano
É questão de primeira ordem conside- das escolas indígenas do País.
rar a diversidade destes povos, tanto na
formulação quanto na execução dessas po-
líticas. Não basta trabalhar com números Prioridade na formação dos
genéricos e com uma realidade vaga: mais
ou menos 210 povos, mais ou menos 180 professores indígenas
línguas, distribuídos em muitas aldeias (al-
gumas populosas com 200, 300, 700 indi- O esforço de construção de uma escola
víduos, outras nem tanto, com 10, 15, 30 indígena que permita acesso aos conheci-
pessoas), com níveis diferenciados de con- mentos universais e propicie a sistematização
tato com segmentos da sociedade brasi- e valorização dos conhecimentos étnicos tem
leira (há povos que contam com uma his- como pilar a formação e atuação de profes-
sores índios, membros das próprias comuni-
tória de contato que dura mais de 300 anos,
dades indígenas envolvidas em processos de
outros que ainda se negam a um convívio
escolarização.
mais duradouro), alguns monolíngües em
Até muito recentemente, as principais
sua língua materna, outros monolíngües em
e mais bem-sucedidas experiências de for-
português, outros, ainda, falantes de vári-
mação de professores indígenas em desen-
as línguas. É preciso enfrentar a diversida-
volvimento no Brasil foram iniciativas de en-
de representada por estes povos como
tidades de apoio aos índios. Consideradas
algo de fato, verdadeiro, que exige iniciati-
alternativas, vêm obtendo gradativamente
vas diferenciadas e ajustadas localmente.
reconhecimento legal. Diante do vazio
Resultam desta situação e da necessi-
propositivo das agências governamentais,
dade de dar uma resposta a ela duas im-
estas iniciativas de caráter local tornaram-
plicações: (a) os povos indígenas necessi-
se referência para a conceitualização e
tam de políticas diferenciadas em relação
implementação de uma política pública de
ao restante da população brasileira, por se-
educação escolar indígena, voltada a aten-
rem portadores de tradições culturais es-
der à demanda de escolarização das co-
pecíficas e pelo não-domínio dos códigos
munidades indígenas, a partir de um
e valores vigentes na sociedade brasileira,
paradigma da especificidade, da diferença,
e (b) essas políticas não podem ser
da interculturalidade e da valorização da di-
monolíticas e únicas; precisam, necessari-
versidade lingüística.
amente, ser diferenciadas, maleáveis, ser
O desafio atual é saber como expandir
pautadas por princípios e estratégias que
estas iniciativas pontuais de formação de
possam ser adaptados a cada contexto
professores indígenas sob a responsabili-
étnico diferenciado.
dade de agências governamentais. Será
O segundo fator que baliza o sucesso
que o modelo ou modelos praticados pe-
de qualquer política voltada para os povos las organizações de apoio aos índios pode
indígenas relaciona-se com o grau de do- ser importado e absorvido pelas Secretari-
mínio, informação e controle que os pró- as de Educação? Será que há consensos
prios índios, por meio de suas comunida- mínimos que permitem a estruturação de
des, lideranças e conselhos, ou de suas um paradigma geral de formação para
organizações, possam exercer em relação professores indígenas? O que é possível
às novidades que lhes são apresentadas aproveitar destas experiências pioneiras na
ou impostas, seja em termos assistenciais formulação de programas estaduais de for-
(saúde, educação), seja em termos econô- mação de professores indígenas? Quais os
micos ou políticos. Assim, é preciso esta- principais sucessos alcançados e os princi-
belecer canais eficazes de interlocução e pais equívocos destas iniciativas com base
divulgação das iniciativas governamentais nos quais poderiam ser balizadas novas
(sejam elas administrativas ou legais) junto propostas? Quais objetivos, resultados, eta-
aos povos indígenas e também junto a pas, cronogramas e linhas pedagógicas já
outras instâncias, como os Conselhos Es- experimentados, que poderiam ser expor-
taduais de Educação, onde várias mudan- tados? Quais pontos comuns destas pro-
ças propostas terão que ser discutidas e postas poderiam ser sistematizados em ter-
aprovadas. A tarefa maior do MEC, portan- mos de suas principais linhas curriculares,
to, deve ser a de criar condições para que vinculações políticas e institucionais e pro-
os avanços apresentados na legislação não cedimentos operacionais?

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 81, n. 198, p. 273-283, maio/ago. 2000. 281
Enfrentar essas questões, com vistas Para dar efetividade a esta ação, a
à produção de consensos mínimos que pos- Coordenação-Geral de Apoio às Escolas
sam nortear novas propostas de formação Indígenas do MEC deveria realizar um tra-
de professores indígenas, agora sob ges- balho de consolidação de um diagnóstico
tão e condução de técnicos das Secretari- de todo o trabalho que as Secretarias vêm
as Estaduais de Educação, é a prioridade realizando ou não realizando nessa área de
do momento. Ao MEC cabe, como indutor formação, assessorando as interessadas em
da política de educação indígena, traçar iniciar o processo de constituição de pro-
as diretrizes desta formação, discuti-la com postas de formação de professores indíge-
os diferentes atores e agências e buscar nas. Paralelamente a estas iniciativas, o MEC
meios para sua implementação. manteria sua linha de financiamento de pro-
O passo seguinte seria vincular o finan- postas apresentadas por organizações não-
ciamento do FNDE somente com ações que governamentais, universidades e organiza-
estejam integradas às propostas estaduais ções indígenas, tanto no que se refere aos
de formação e titulação de professores in- programas de formação dos professores
dígenas. O MEC poderia propiciar asses- indígenas quanto para a publicação de
soria qualificada que colaborasse com os materiais didáticos e de encontros e ofici-
técnicos das Secretariais na formulação nas para discussões do RCNEI.
desses programas. Essas são algumas das tarefas que se
Justifica-se essa ação por um modelo impõem nesse momento.
geral pensado e proposto: que cada Se-
cretaria de Educação tenha uma proposta
de formação dos seus professores indíge- Concluindo
nas, com vistas à titulação, isto é, que cada
Secretaria Estadual tenha delineado um Há, ainda, um longo caminho a ser
programa estadual de formação de seus percorrido para que as escolas indígenas
professores indígenas. Isto vem ocorrendo, sejam respeitadas e beneficiadas por sua
com sucesso, em pouquíssimas Secretari- inclusão nos sistemas de ensino do País.
as: Mato Grosso e Minas Gerais constitu- Para que isto ocorra de forma a se confi-
em exceções num universo marcado por gurar num sinal positivo, que evidencie a
ações isoladas, sem continuidade e valorização da diversidade étnica e abra
efetividade na qualificação do corpo do- espaços para o exercício de um diálogo
cente indígena. Estas duas Secretarias já verdadeiro e tolerante entre índios e não-
finalizaram etapas de formação de profes- índios, entre a escola indígena e a escola
sores. Outras estão iniciando esse proces- não-indígena, entre políticas públicas ge-
so, como é o caso de Santa Catarina, rais e práticas culturais específicas, é ne-
Amazonas, Mato Grosso do Sul, Rondônia, cessário superar impasses e obstáculos, e
Roraima e Amapá. Várias outras Secretari- criar aberturas legais burocráticas e admi-
as tentaram ou estão tentando pôr em prá- nistrativas que possibilitem o exercício da
tica propostas nesse sentido. criatividade e da inovação, criando um
O MEC deveria incentivar estas Secre- novo sentido para a escola em áreas indí-
tarias a formularem programas específicos genas, mais afinado com o momento atu-
de formação dos professores indígenas, al, onde a escola ganha um significado
por meio da oferta de subsídios e assesso- especial, porque é hoje uma reivindicação
ria que permitissem a discussão e a formu- de muitas comunidades indígenas.
lação de propostas. Com o documento de Se no passado a escola e a introdução
diretrizes e orientações para a titulação de da escrita foram utilizadas como um instru-
professores índios, estabelecendo compe- mento para negar diferenças culturais, assi-
tências e habilidades necessárias, as Se- milar os índios e fazer com que estes se
cretarias de Educação deveriam compor transformassem em algo diferente do que
um grupo de trabalho para a formulação eram, hoje ela é vista como um instrumento
de seus programas de formação de pro- possível e necessário à interlocução dos
fessores indígenas, em nível médio, que índios com o mundo não-indígena, como
deveriam ser apresentados aos Conselhos um meio para adquirir-se conhecimentos e
Estaduais de Educação para aprovação e saberes novos e também para valorizar-se
reconhecimento. Recursos financeiros pró- saberes, práticas e conhecimentos tradici-
prios deveriam ser alocados para a execu- onais. É nesse contexto que a educação
ção de tais programas. indígena ganha relevância para os povos
282 R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 81, n. 198, p. 273-283, maio/ago. 2000.
indígenas, e é no bojo da discussão do um desafio para os pesquisadores,
modelo de escola, que se quer construir, indigenistas e aliados do movimento indí-
que se abre possibilidades de discussão gena e um desafio para os legisladores e
sobre o próprio projeto de futuro desses para os agentes governamentais.
povos. A inclusão das escolas indígenas nos sis-
Vencer obstáculos e resistências para temas de educação do País e as propostas
que as escolas indígenas sejam um instru- de consolidação de uma política pública de
mento de autonomia, política e cultural, e educação escolar indígena são, sem dúvida,
não mais um instrumento de submissão his- uma grande conquista, mas para que isso se
tórica é o grande desafio do momento. Um torne efetivo, muitos problemas, impasses e
desafio para os próprios índios em desco- resistências devem ser enfrentados. Para tan-
brir e construir um sentido para a escola, to, vontade política é fundamental.

Referências bibliográficas
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. O governo brasi-
leiro e a educação escolar indígena: 1995-1998. Brasília, 1998. 44 p.
______. Referencial curricular nacional para as escolas indígenas. Brasília, 1998. 339 p.
GRUPIONI, Luís Donisete Benzi. Os índios e a cidadania. In: BRASIL. Ministério da Educa-
ção. Secretaria de Educação a Distância. Índios no Brasil. Brasília, 1999, p. 25-46.
(Cadernos da TV Escola, v. 3).
MELIÁ, Bartolomeu. Educação indígena e alfabetização. São Paulo: Loyola, 1979.
SILVA, Aracy Lopes (Org.). A questão da educação indígena. Comissão Pró-Índio de São
Paulo. São Paulo: Brasiliense, 1981. 222 p.

Recebido em 12 de setembro de 2001.

Luís Donisete Benzi Grupioni, antropólogo, é doutorando do Programa de Pós-Gra-


duação em Antropologia Social da Universidade de São Paulo (USP), pesquisador-asso-
ciado ao Mari – Grupo de Educação Indígena dessa universidade e consultor do Ministé-
rio da Educação (MEC) para a política de educação indígena.

Abstract
This paper analyses the advances and adverse situations for the structuring of a public
policy, which fulfils the demands of Brazilian Indian people for educational processes that
allow them to have access to universal knowledge and that value their language and traditional
knowledge. It registers the advance and the consolidation of the Brazilian educational
legislation, which guarantees a differentiated education to Brazilian Indian people, it analyses
the alteration of responsibilities, implemented over the last years, in the conducting of actions
of the Brazilian Indian education in the country, proposing a programmatic docket to be
started by the Ministry of Education as a public policy for this area.

Keywords: Brazilian Indian people; Brazilian Indian education; educational politics;


Brazilian Indian legislation; teacher formation.

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 81, n. 198, p. 273-283, maio/ago. 2000. 283

Você também pode gostar