Resumo Do Livro A Publicidade É Um Cadáver Que Nos Sorri
Resumo Do Livro A Publicidade É Um Cadáver Que Nos Sorri
Resumo Do Livro A Publicidade É Um Cadáver Que Nos Sorri
(RESUMO)
Sumário
1
1. Aleluia! O Neném faz Xixi Azulzinho!
2. Crime Contra a Inteligência
3. A Rainha da Inglaterra Toda Negra
5. Uma Voltinha no Mundo dos Preconceitos
6. Eis A Publicidade, Vou ao Banheiro.
7. Cruz, Suástica, Coca-Cola
8. Brainstorming, Briefing, Mediaplanning, Bullshiting
9. Contra a Monocultura
10. Modelo Turbo GTI, Quatro Babacas A Menos.
2
De acordo com a AACC11 a publicidade representa para as empresas
européias um orçamento de 330 bilhões por ano, 406,7 bilhões nos estados Unidos, 172
bilhões no Japão, cifras de 1992 em plena crise.
Armada desse colossal financiamento, a publicidade cobre cada esquina de
rua, praças históricas, os jardins públicos, os pontos de ônibus, o metrô, os aeroportos,
as estações de trem, os jornais, os cafés, as farmácias, as tabacarias, os isqueiros, os
cartões magnéticos e de telefone. Interrompe filmes na televisão, invade o rádio, as
revistas, as praias, os esportes, as roupas, acha-se impressa arte nas solas dos nossos
sapatos, ocupa todo o nosso universo, todo o planeta! É impossível esboçar um passo,
ligar um rádio, abrir uma correspondência, ler o jornal sem dar de cara com a amiga
publicidade. Ela está por toda a parte. É o irmãozinho, sempre sorridente.
Apavorante todo esse imenso espaço de expressão e de afixação de cartazes;
o maior museu vivo da história moderna, esses milhares de quilômetros quadrados de
cartazes mostrados no mundo inteiro, esses painéis gigantes, esses slogans pintados,
essas centenas de milhares de páginas de jornal impressas, esses milhões de horas de
televisão, mensagens radiofônicas, fiquem reservados a esse paradisíaco mundo de
imagens imbecil, irreal e mentiroso. Uma comunicação sem qualquer utilidade social,
uma exaltação grotesca de um modo de vida yuppie, agradável e bem-humorado. A
Renault, a Ford, a Fiat, a Honda, fazem as suas propagandas de automóveis deslizando
ao sol poente. Quem financia estas campanhas, somos nós os consumidores, o
investimento de publicidade fica embutido no preço da mercadoria. A publicidade é o
primeiro imposto direto.
3
financiamento dos programas de metadona, criaria uma dinâmica sem precedentes. Hoje
todos os automóveis se parecem. Como mostrar a diferença entre eles senão pelo
engajamento, uma visão do mundo, tomadas de posição, criatividade?
“Durante a agonia, a venda continua”, declarava uma vítima da Aids na
legenda da foto que julgava com isso ter encontrado uma maneira de protestar contra os
meus anúncios que evocavam o drama da Aids. Ora, eu mesmo estou de acordo com a
idéia terrível deste slogan. Durante a agonia dos acidentados nas estradas, a venda deve
continuar. Durante a agonia dos que sofrem de câncer, a propaganda tabagista deve
continuar. Durante a agonia de milhões de alcoólatras americanos e europeus, a
publicidade nos excita com belas garotas abraçando garrafas.
Os publicitários não cumprem a sua função: comunicar. Carecem de ousadia
e de senso moral. Não refletem sobre o papel social, publico e educativo da empresa que
lhe confia o orçamento. Preferem despender milhares de dólares para galopar atrás de
um Citroen. Não querem pensar nem informar o público, com medo de perder os
anunciantes. A responsabilidade deles é imensa.
3) CRIME DE MENTIRA.
A publicidade não vende produtos nem idéias, mas um modelo falsificado e
hipnótico da felicidade, seduz um grande publico com um modelo de existência cujo
padrão exige uma renovação constante de todos os objetos do dia-a-dia. A publicidade
oferece aos nossos desejos um universo subliminar que insinua que a juventude, a
saúde, a virilidade, a feminilidade dependem daquilo que compramos.
4
desemprego, a Aids, as drogas, vai se persuadindo um pouco mais a cada dia que ele
nunca chegará a viver do modo apregoado pelas propagandas.
O capitalismo tem que se adaptar à nova situação: a sociedade de consumo
não consome mais. Se o consumo se acha à deriva, é porque a publicidade mistifica o
público. Ela o engana sobre a mercadoria. Ela o excita para que acabe pagando o maior
preço. Ela mente para ele.
5
8) CRIME CONTRA A PAZ CIVIL.
De tanto querer nos vender a felicidade, a publicidade acaba fabricando
legiões de frustrados, dá origem a deprimidos e delinqüentes, que acabam por se sentir
alijados da sociedade. Fracassados, os filhos ficam pressionando para que eles lhes
comprem aquele videogame radical, suas mulheres choram por não possuírem aquele
creme de polpa de seda à base de fruta ou aquele eterno diamante. A publicidade não
vende felicidade, ela gera depressão e angústia. Cólera e frustração.
6
Logo que um grande filme chega às telas, uma corrente de idéias se impõe.
Eles copiam tudo, adaptam tudo, recuperam tudo. Spielberg dirigiu “Os caçadores da
arca perdida”, os clipes fizeram disso paródias que não acabam mais, com aventureiros
de todo tipo e idade. Nove semanas e meia de amor foi copiado para vender roupas de
cama. A maioria das cenas famosas dos filmes alimenta inumeráveis clipes e fotos
publicitárias. Os diretores publicitários, pagos a peso de ouro enquanto o cinema está
,morrendo, servem-se sem pudor. Pois a publicidade é uma máfia. Quanto ao paraíso,
pode ser encontrado debaixo do chuveiro, numa viagem de avião ou numa padaria.
Exemplo: um gosto de paraíso (Bounty).
Hoje os produtos se parecem cada vez mais. Entramos na era do “me too
product”. A publicidade é um cadáver perfumado. Sempre se diz a respeito dos
defuntos: “ele está bem-conservado, parece até que sorri”. O mesmo vale para a
publicidade. Acha-se morta, mas continua sorrindo.
7
⇒ Uma mulher loura e uma mulher negra;
⇒ Uma criança asiática;
⇒ Um par de algemas ligando um adulto branco e um negro;
⇒ Uma criança que acabava de nascer, nua, coberta de placenta, ainda ligada à
mãe pelo; cordão umbilical;
⇒ Um carro esporte todo amassado;
⇒ Um cemitério;
⇒ Um soldado negro com um osso humano na mão;
⇒ Vários órgãos genitais, dos dois sexos, de todas as idades e cores;
⇒ Um doente de Aids morrendo no hospital ao lado dos pais;
⇒ Um pássaro sujo de óleo;
⇒ Um corpo tatuado escrito HIV positivo;
⇒ A bandeira americana;
⇒ Camisinhas de todas as cores.
Spike Lee, que dirigiu o filme Malcolm X, escreveu um artigo para a revista
Rolling Stone, onde se podia ler: “O emprego, a droga, o crime, a Aids, a guerra, o
racismo, a educação, os sem-teto, o meio ambiente, são esses realmente os grandes
problemas da atualidade, a cujo respeito teremos de tomar iniciativas”. (...)
8
Continuei realizando uma série de fotos que embaralhavam todas as idéias
consagradas sobre a cor da pele: uma mulher loura e uma mulher negra, uma criança
asiática, um par de algemas ligando um adulto branco e um negro, uma série de bonecos
Pinóquio de todas as cores, um casal de mineiros cobertos de pó negro - o trabalho
vence a cor da pele, etc.
Em 1985 uma bandeira americana aparecia nas minhas fotos. Qualquer
utilização não-oficial da bandeira americana era proibida nos Estados Unidos: eu
ignorava isso. No final, o regulamento foi suprimido. Eu tinha mandado a lei pelos ares.
As sociedades conservam os clichês que merecem.
Quando o mundo tem medo de uma criança que acaba de nascer: concebi a
foto de uma criança que acabava de nascer, nua, coberta de placenta, ainda ligada à mãe
pelo cordão umbilical. Em plena guerra do Golfo a vida continuava. Fui atacado por
quase toda a imprensa européia. Foi a partir daquele bebê novinho que comecei a
utilizar fotos de reportagem das agências Magnum, Sygma e outras.
Como o militar negro, a mulher que chorava a perda do filho, o pássaro sujo de óleo, o
navio de refugiados e o doente de Aids. Me trataram como um provocador cínico, e até
de safado. Eu agora estava brincando, diziam eles, com a doença, o sofrimento, com o
mal absoluto para vender pulôveres. Uma brincadeira? Não, um combate.
9
imagem provocante, dando-lhe uma dimensão psicanalítica ou social, que garantia sua
assimilação na opinião pública”.(...)
Dize-me o que te incomoda que eu te direi quem és. Fim de 1993. A guerra
se alastrava por toa a ex-Iugoslávia nessa época toda a imprensa européia não falava
senão das discórdias conjugais do príncipe Charles e de Diana! Toda a atualidade
parecia resumir-se nesse folhetim melodramático, enquanto a guerra na ex-Iugoslávia
era jogada para as páginas internas, reduzida à pequenos artigos sem força, enquanto os
sérvios massacravam, violavam, enquanto se descobria a atroz "depuração étnica".
Fizemos um cartaz e uma página dupla de jornal com o uniforme manchado de jovem
soldado e o lançamos em 110 países: sobre uma página dupla com um fundo branco, a
blusa de meia rosa suja de sangue à direita, o zuarte à esquerda, mas de maneira que
estas duas peças desenhassem o corpo do homem que a tinha usado. O buraco causado
pelo impacto da bala era visível, toda a sua vida tinha se escoado por ali.
Com a campanha sobre os órgãos sexuais de todas as idades e de todas as
cores, com esta foto me pergunto se podemos ser reconhecidos à simples vista de nossos
sexos, como no caso do rosto. A Bienal de Veneza então me convidou para expor fotos
de sexo.
CAPÍTULO 6. Eis a Publicidade, Vou ao Banheiro.
10
A maior campanha publicitária da história da humanidade foi a de Jesus
Cristo. Ela lançou um slogan universal: "Amai-vos uns aos outros”. E um admirável
logotipo: a cruz.
No Renascimento, os grandes produtores e os mecenas da Igreja, a agência
vaticano, não hesitavam em contratar os maiores criadores de sua época: Miguelangelo,
Leonardo da Vinci , Rafael, Lê Benin e tantos outros. As igrejas foram durante séculos
consideráveis centros culturais, com escolas, concertos, grandes músicos, bibliotecas,
afrescos, esculturas, artistas e mestres.
A publicidade sempre viveu da contribuição fundamental da agência. Os
Apóstolos da comunicação. Ela procura sem esmorecer logotipos e símbolos universais.
Quebra a cabeça para bolar slogans que se tornem divisas tão simples e fortes como o
“Amai-vos uns aos outros”. Enche as revistas de mulheres belíssimas, intocáveis,
virgens sobre o papel glacê. Mas esquece tudo o mais, toda a imagística piedosa do
caminho da cruz, a violência dos soldados, os corpos feridos, a dor aceita como
redenção.
“Nunca falar de modo negativo, evitar os textos profundos, e o sentido,
principalmente não confrontar o público com o real, mostrar-se simplório, pensar
sempre que você está se dirigindo a subdotados”, eis o que não cessam de repetir nos
seminários de formação de publicitários. Quanta asneira!
Eu acreditava que os Beatles tinham dito a verdade quando afirmaram ser
tão famosos quanto Jesus Cristo.
A publicidade é o contrário do amor. Promete tudo e não dá nada. É o
catecismo da religião do consumo. A publicidade é um livro de missa sem imaginação,
sem nenhum senso do drama nem do mistério humano. É uma religião materialista, uma
monstruosidade. Para os cristãos, o paraíso não é deste mundo, o reino anunciado
constrói-se depois de séculos e séculos de reflexão e de provas. A publicidade confunde
milagre e carteira de dinheiro, os afrescos da Capela Sistina e catálogo pornográfico,
música sagrada e música internacional, o sonho de uma outra vida e o paraíso imbecil
do frescor de vida, a pietà e a garota.
11
Depois que Baudelaire, com a sua obra Flores do mal, cantou a feiúra
fascinante das cidades e inaugurou a literatura moderna, entre os maiores escritores do
século, nos livros de Henry Miller, de Céline, de Genet, em Moravia, Malraux, Cioran,
Beckett, germinou a mesma mentalidade. A literatura moderna não dá a mínima para as
narrativas felizes. No que, aliás, ao fim deste século atroz, ela se mostra bastante lúcida.
E a publicidade? Está com um século de atraso.
A agência é o reino da assepsia e da mediocridade. Sempre se encontra um
chefe medroso, que fala de direito divino – o ponto de vista do cliente -, capaz de cortar
o pescoço diante de qualquer ousadia. Vêm em seguida o diretor de arte e o diretor de
criação. Estes dois pretendem ter o grande saber da arte. Têm plena confiança em sua
intervenção. Assim que intervêm diante e um verdadeiro artista – este, que tateia e
avança passo a passo -, tratam-no com grosseria, aterrorizam-no e acabam por lhe cortar
as asas. Esta tragédia se repete a cada dia, em todas as agências do mundo inteiro.
Quando Gustave Eiffel propôs a construção de uma torre de metal de
trezentos metros de altura à margem do Sena, riram na cara dele, os grandes espíritos
começaram a dizer que ia desfigurar a capital da França . Somente os artistas, os
precursores o saudaram. Hoje a Torre Eiffel é o símbolo de Paris.
Durante um jantar em Milão com gente de publicidade, a conversa recaiu
sobre a publicidade, e esse senhor dirigiu-se a Luciano: “Não compreendo! Nossa
agencia me fez gastar uma fortuna para comprar grandes desportistas como Baggio,
Boris Becker, Steffi Graf, e ninguém fala da nossa comunicação, nenhum jornal,
ninguém! Já o seu fotografo comprou algumas camisinhas de todas as cores num
supermercado, fez uma única foto, e fala-se na Benetton no mundo inteiro”. Luciano
Benetton financia hoje uma escola de comunicação para criticar a comunicação, a
Fabrica. Oferecemos a direção da Escola da Benetton a Fidel Castro.
12
publicidade. A publicidade não vende produtos, mas um modelo de vida uniforme. O
público mal percebe a que ponto o que ele consome muda a face do mundo.
O gado para hambúrguer ocupa hoje 24% das terras cultivadas do planeta.
Um quarto das terras cultivadas no Brasil serve à alimentação do boi exportado. Com
suas dejeções gigantescas, dezenas de milhões de toneladas de bosta que poluem a água
e a atmosfera. Aquilo que consumismo no ocidente muda a face do planeta, porque
nossos produtos, nosso modo de vida, nossos hábitos alimentares colonizam o mundo
inteiro. Seja. É lei do capitalismo. Logo a Ásia vai ter a sua revanche.
Quando Cristóvão Colombo - de onde deriva a palavra “colonialismo”- e os
conquistadores desembarcaram no Novo Mundo, eles tinham vindo praticar a pilhagem,
mas também vender os seus produtos.
A publicidade é a última ideologia conquistadora. A Coca-Cola tornou-se
símbolo do capitalismo americano. Assim que o primeiro outdoor da Coca-Cola foi
erguido nas ruas de Pequim, a imagem deu a volta ao mundo. A inauguração do
primeiro Mac Donald em Moscou teve a mesma significação de mudança. Hoje em dia,
o público acredita no que ele vê na televisão, nos telejornais, nos programas, nos
anúncios. A realidade é a imagem da televisão. Uma tela. Eles controlam a imagem,
portanto, a realidade.
Cada foto possui uma força intrínseca. Achava-me num estúdio , ocupado
em fotografar Kirsti, a mulher com quem viria a me casar mais tarde. Ela estava usando
um vestido de noiva Dior. Já vivíamos juntos. Por brincadeira, peguei uma camisa e
uma gravata iconoclasta com a costureira e pedi ao meu assistente que tirasse uma foto
nossa. Mandamos cópias aos parentes e aos familiares. Eles acreditaram que
estivéssemos realmente casados. Isso vale também paras os negócios. O espírito
publicitário invade tudo, telenovelas, jornais, revistas, tele compras. Entramos na era do
pós-humano.
Vivemos numa tecnosfera onde os corpos tornados inúteis serão
combinados a televisões gigantes e computadores equipados com “luvas táteis”. Joguei
a minha televisão no lixo.
13
Escolhi a foto de um carrão todo arrebentado. Colei a imagem no meio de
um cartaz branco. Acima do veículo estraçalhado, escrevi o número de pistões e
válvulas, a aceleração de 0 a 100 km/h em seis segundos, 120 cavalos-motor, GTI...
embaixo, coloquei:
Modelo Quatro Babacas a Menos. O tabaco é igual à maconha: é preciso
informar sobre os perigos do prazer. Por que nunca se vê um pênis ereto nas campanhas
anti-Aids? Logo o público pedirá contas às empresas: “Vocês estão poluindo? E suas
leis sociais?”.
Toda a publicidade precisa ser reinventada.
14