MST - 201 - Cláudio Roddrigues Silva

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Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico

Educação do MST,
do owenismo e
do cartismo britânico

Princípios em comum

Cláudio Rodrigues da Silva


Diagramação: Marcelo A. S. Alves
Capa: Carole Kümmecke - https://www.conceptualeditora.com/
Arte de Capa: Robert Owen, 1838 "Vie communautaire dans les halls de New Lanark"

O padrão ortográfico e o sistema de citações e referências bibliográficas são prerrogativas de


cada autor. Da mesma forma, o conteúdo de cada capítulo é de inteira e exclusiva
responsabilidade de seu respectivo autor.

Todos os livros publicados pela Editora Fi


estão sob os direitos da Creative Commons 4.0
https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/deed.pt_BR

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


SILVA, Cláudio Rodrigues da

Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum [recurso eletrônico] / Cláudio Rodrigues da
Silva -- Porto Alegre, RS: Editora Fi, 2021.

256 p.

ISBN - 978-65-5917-201-6
DOI - 10.22350/9786559172016

Disponível em: http://www.editorafi.org

1. Democratização da educação; 2. Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra; 3. Cartismo; 4. Owen, Robert, 1771-
1854; I. Título.

CDD: 370
Índices para catálogo sistemático:
1. Educação 370
Agradecimentos

Esta seção, denominada agradecimentos, serve tanto para registrar


agradecimentos, quanto para uma espécie de memorial, no qual constam
algumas – portanto, diversos nomes deixaram de ser citados – pessoas,
organizações e instituições que, de alguma forma, contribuíram para o de-
senvolvimento da pesquisa que resultou neste livro. É importante registrar
que nem todos os sujeitos mencionados nesta seção necessariamente com-
partilham, total ou parcialmente, o ponto de vista ou conteúdo desta
pesquisa. Aliás, muitos sequer os conhecem, não se configurando, assim,
espécie alguma de responsabilidade solidária em decorrência dessas con-
tribuições e/ou menção.
Profa. Dra. Neusa Maria Dal Ri, pelo acolhimento, desde a Graduação,
e pela constante e rigorosa orientação durante todo o processo, inclusive
quando ocorreram imprevistos não computáveis pela lógica burocrática.
Integrantes das bancas examinadoras, tanto de Qualificação quanto
de Defesa. Além da Profa. Dra. Neusa, Profa. Dra. Érika Porceli Alaniz, Prof.
Dr. Henrique Tahan Novaes, Prof. Dr. Candido Giraldez Vieitez e Prof. Dr.
Carlos Bauer de Souza (Suplente), pelas relevantes contribuições, ainda
que várias delas não tenham sido total ou parcialmente incorporadas à
versão final deste trabalho.
Integrantes do Grupo de Pesquisa Organizações e Democracia, pelas
diversas e importantes contribuições, diretas e indiretas, para esta pes-
quisa, em especial no que se refere às leituras e discussões de textos e
temáticas prementes, atuais e pretéritas, principalmente no que se refere
à relação entre sociedade e educação.
Trabalhador@s das diversas seções da Faculdade de Filosofia e Ciên-
cias (FFC) da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Marília
– em especial da Seção do Programa de Pós-Graduação em Educação e da
Biblioteca –, da manutenção, da limpeza, entre outros, quase sempre man-
tidos no anonimato e longe das luzes da ribalta.
Capes, pelo apoio financeiro.
Assentamentos e escolas do MST que cederam documentos, abriram
espaço e/ou concederam autorização para coleta de dados em seus terri-
tórios.
Docentes, especialmente das disciplinas cursadas durante o período
do curso de Mestrado e que, direta ou indiretamente, contribuíram com
indicações bibliográficas, cessão de materiais, provocações, questionamen-
tos, entre outras contribuições: Candido Vieitez, Carlos Brandão, Célia
Tolentino, Érika Alaniz, Fábio Ocada, Fernando Fluixá, Henrique Tahan
Novaes, Jefferson Rodrigues Barbosa, Julio Cesar Torres, Leandro Galastri,
Marcos Del Roio, Natália Scartezini, Neusa Dal Ri, Jair Pinheiro e Tânia
Brabo.
Demais instituições, organizações e pessoas que contribuíram, de al-
guma maneira, seja material seja simbolicamente, para a realização desta
pesquisa, principalmente companheir@s de percursos – pessoal, acadê-
mico e/ou profissional –, que me ajudaram, nos vários percalços, a trocar
o pneu do avião em pleno voo, com destaque para Dani, Neto e, especial-
mente, Agnes.
Sumário

Introdução 11

Capítulo I 23
Conjunturas de fundação e atuação dos movimentos
1.1 Conjuntura de fundação e atuação do Owenismo e do Cartismo ............................. 24
1.2 Notas sobre o Movimento Owenista .................................................................................. 36
1.3 Notas sobre o Movimento Cartista...................................................................................... 41
1.4 Conjuntura de fundação e atuação do MST ..................................................................... 47
1.5 Notas sobre o MST ................................................................................................................... 59

Capítulo II 66
Projetos próprios de educação

Capítulo III 95
Negação dialética do ensino oficial

Capítulo IV 124
Gestão democrática

Capítulo V 151
Formação dos próprios educadores

Capítulo VI 169
Articulação entre ensino e trabalho produtivo

Capítulo VII 192


Uma visão de mundo concernente à classe trabalhadora

Conclusão 216

Referências 224
Introdução

Primeiramente, registra-se que todos os trabalhos científicos são, de


alguma forma, necessariamente coletivos, pois se valem de conhecimentos
e de contribuições anteriores que, a rigor, são cumulativos e construídos
por toda a humanidade. Assim, a pesquisa apresentada neste livro é várias
vezes coletiva, pois, além de fazer parte de um projeto mais amplo (DAL
RI, 2012), tenta aproveitar e incorporar contribuições decorrentes de lei-
turas e discussões realizadas regularmente no âmbito do Grupo de
Pesquisa Organizações e Democracia.
Esta pesquisa integra um projeto mais amplo da orientadora (DAL
RI, 2012) denominado Movimentos sociais e educação democrática: ante-
cedentes da pedagogia do trabalho associado, que propõe um estudo dos
movimentos dos trabalhadores do século XIX, tais como o cartismo britâ-
nico1, anarquismo, socialismo utópico e marxismo, realizando um
cotejamento com movimentos sociais atuais, como o Movimento dos Tra-
balhadores Rurais Sem Terra (MST) do Brasil e o Movimento Zapatista do
México, com o objetivo de verificar a existência de proposições comuns e
transcendentes nas propostas educacionais desses Movimentos. Nesta
pesquisa, no entanto, trabalha-se com o MST, com os socialistas utópicos
owenistas e com os cartistas britânicos2.
O problema de pesquisa está sintetizado na seguinte questão: há
princípios educativos comuns ou gerais entre as proposições educacionais

1
A especificação do cartismo britânico tem por objetivo distinguir ou evitar associações com o cartismo português
(SARDICA, 2012), cujos objetivos e pressupostos são outros.
2
Em dados momentos, também mencionados, respectivamente, apenas como owenistas ou owenismo, e como
cartistas ou cartismo.
12 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

e suas aplicações e/ou experiências realizadas nas escolas e associações do


MST, dos owenistas e dos cartistas?
Trabalha-se com a hipótese de que o MST, os owenistas e os cartistas
têm princípios educativos comuns, quais sejam: a) elaboração e imple-
mentação de um projeto próprio de educação conforme as necessidades e
ideologias dos respectivos Movimentos; b) a negação dialética do ensino
oficial; c) implementação da gestão democrática nas associações e escolas
dos Movimentos; d) ações visando formar os próprios educadores em con-
sonância com a concepção de mundo e de educação dos respectivos
Movimentos; e) articulação entre ensino e trabalho produtivo; f) constitui-
ção e veiculação de uma concepção de mundo concernente a cada
Movimento e à classe trabalhadora.
Desse modo, esta pesquisa tem como objetivo geral verificar os prin-
cipais princípios teórico-práticos educacionais do MST, dos owenistas e
dos cartistas e se estes princípios são comuns a esses Movimentos.
Por objetivos específicos tem-se: a) verificar a forma de operaciona-
lização desses princípios educativos nas experiências educacionais levadas
a cabo pelo MST, pelos owenistas e pelos cartistas; b) proceder a um cote-
jamento entre os princípios educativos implementados pelos três
Movimentos discriminados.
Embora denominados de princípios educativos, esclarece-se que os
itens trabalhados foram estabelecidos para fins desta pesquisa, ou seja, de-
terminados a partir da análise inicial efetuada por Dal Ri (2012; 2013). Isso
não significa que esses mesmos itens apareçam nos textos dos Movimen-
tos analisados como princípios, embora possam também ser denominados
assim por eles. Não significa também que as categorias utilizadas para no-
meação de cada princípio constem nos documentos analisados, nem
mesmo que tais categorias tenham uma compreensão unívoca entre todos
os Movimentos, não podendo, portanto, serem tomadas nas acepções
Cláudio Rodrigues da Silva | 13

correntes e atuais, haja vista as especificidades político-ideológicas e os


momentos históricos de cada Movimento.
Os procedimentos adotados foram a pesquisa documental e a pes-
quisa bibliográfica. São entendidos por documentos os materiais em sua
íntegra e sem interpretações ou ainda passíveis de novas interpretações e
por bibliografia textos escritos inclusive a partir de documentos.
Os procedimentos básicos foram o levantamento bibliográfico e do-
cumental, a leitura, a análise e a interpretação de documentos e
bibliografias relacionados às temáticas envolvidas nesta pesquisa. Foram
utilizados preferencialmente textos oficiais dos próprios Movimentos, as-
sim como de seus principais teóricos e intelectuais e, também, textos de
autores que se dedicaram ou se dedicam à pesquisa dos Movimentos e das
temáticas tratados nesta pesquisa.
Os principais autores utilizados foram, para o Owenismo, Robert
Owen (1967a; 1967b; 2002), fundador e principal ideólogo e militante
desse Movimento; para o Cartismo, Lovett e Collins (1840), dois dos prin-
cipais ideólogos e militantes desse Movimento; e para o MST, além dos
textos do próprio Movimento, foram utilizados textos de alguns de seus
principais intelectuais, entre eles, Caldart (1997; 2004) e Stedile e Fernan-
des (2001).
A escolha dos Movimentos objetos desta pesquisa decorre de sua im-
portância e de sua expressividade nos respectivos momentos históricos,
bem como das especificidades teórico-práticas de cada um deles. Os car-
tistas e os owenistas foram escolhidos por estarem entre os pioneiros e
mais importantes Movimentos organizados das classes trabalhadoras, em
especial no contexto de formação da classe operária na Inglaterra
(ENGELS, [19--]; 2008; MORTON; TATE, 1968; THOMPSON, 1987a).
Entre os Movimentos analisados, ao MST é dedicado maior espaço e
destaque por diferentes motivos, alguns deles enunciados a seguir. Há
14 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

dificuldades para a obtenção de materiais sobre os owenistas e os cartistas


que discutam seus princípios educativos. Já em relação ao MST há uma
quantidade significativamente maior de materiais relacionados aos princí-
pios educativos analisados, sejam de autoria do próprio Movimento ou de
seus intelectuais, sejam decorrentes de pesquisas acadêmico-científicas.
O MST é um movimento em atuação, propiciando, de maneira contí-
nua, elementos para análises e contribuições empíricas para a atualidade.
Além disso, dispõe de um acúmulo histórico em termos práticos e teóricos,
seja decorrente da própria atuação por aproximadamente três décadas,
seja decorrente das produções ou da atuação de outros movimentos ou
autores que o precederam.
Assim, a intenção não é apresentar o MST como vanguarda dos mo-
vimentos sociais ou da classe trabalhadora. Convém ressaltar que o
Movimento, nos documentos analisados, não se apresenta nem se propõe
a ser a vanguarda, mas, ao invés, entende que para atingir os objetivos e
bandeiras por ele propostos depende do envolvimento e da cooperação
massivos entre trabalhadores e seus movimentos, tanto da cidade, quanto
do campo.
Reitera-se também que os principais elementos do trabalho associado
estão presentes, enquanto princípios, em documentos do MST. Todavia,
isso não quer dizer que o trabalho associado esteja presente ou tenha todos
os seus princípios aplicados plenamente em todos os assentamentos, nem
mesmo que seja predominante no MST, um Movimento heterogêneo em
diversos aspectos e pelos mais variados motivos. O projeto de pesquisa
denominado Concepções teórico-práticas de educação e trabalho no Movi-
mento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), desenvolvido pelo
Grupo de Pesquisa Organizações e Democracia, coordenado pela Profa.
Dra. Neusa Maria Dal Ri, realizou análises empíricas da educação em as-
sentamentos do MST em diferentes pontos do Brasil, demonstrando, entre
Cláudio Rodrigues da Silva | 15

outros aspectos, a aplicação dos princípios do Movimento e do trabalho


associado3.
Sabe-se que há numerosos apontamentos, tanto por abordagens de
esquerda, quanto de direita – muitos deles apresentados na própria bibli-
ografia utilizada nesta pesquisa –, sobre os Movimentos mencionados, em
especial no que se refere às contradições e descompassos entre o postulado
e o executado, bem como sobre o caráter desses Movimentos, se reformis-
tas ou revolucionários. Ainda que sejam questões importantes e
pertinentes e que sua problematização possa contribuir para o aprofunda-
mento do debate e do cotejamento, não serão abordadas, haja vista as
limitações de variadas ordens desta pesquisa, em especial no que se refere
aos objetivos. É um ponto que fica em aberto, passível de aprofundamen-
tos e que, provavelmente, contribuiria para demonstrar, com mais
detalhes, as diferenças entre esses Movimentos, bem como os avanços que
determinados setores das classes trabalhadoras conseguiram no decorrer
das lutas e da história.
Com as devidas ressalvas, devido aos momentos e às especificidades
dos Movimentos, aventa-se a hipótese de que esses princípios estão, desde
a Revolução Industrial, presentes em diferentes iniciativas educacionais de
setores da classe trabalhadora. Seriam, portanto, transcendentes e co-
muns aos Movimentos mencionados (DAL RI, 2012; 2013), estando
relacionados ou condicionados principalmente pelas condições objetivas e
subjetivas dos trabalhadores, em especial a correlação de forças em cada
conjuntura.
A partir dos dados apresentados por Braverman (1974), Engels
(2008), Enguita (1989), Owen (1967a; 1967b; 1968; 2002), Thompson

3
Isso pode ser analisado de forma mais detalhada no livro Educação democrática, trabalho e organização produtiva
no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) – de Neusa Maria Dal Ri e outros autores, publicado em
2019, pelas editoras Cultura Acadêmica, Oficina Universitária e Lutas Anticapital.
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(1987a, 1987b; 1987c) e Dal Ri (2012; 2013), aventa-se que alguns dos prin-
cípios educativos adotados pelo MST já estavam presentes em movimentos
sociais de trabalhadores de outros momentos históricos. Isso reitera a tese
apresentada por Dal Ri (2012; 2013) da existência de princípios educativos
transcendentes e comuns a movimentos de trabalhadores, especialmente
a partir da Revolução Industrial. Esta pesquisa pretende contribuir para a
verificação e demonstração dessa hipótese, especificamente em relação ao
MST, aos owenistas e aos cartistas.
A relevância de se pesquisar o MST decorre do fato de, conforme Dal
Ri e Vieitez (2008, p. 183, grifos dos autores), ser “[...] uma organização
coletiva de massas que luta para alcançar determinados objetivos sociais”
e que criou um sistema educacional próprio.
Segundo o MST (2010, p. 23), seu “[...] trabalho com educação [...]
está organizado em todo o país, desde a educação infantil à educação su-
perior, em várias áreas do conhecimento”. Além disso, suas iniciativas
educacionais são reconhecidas por diversas organizações sociais e acadê-
micas nacionais e internacionais e, não sem contradições, pelo Estado, que
financia parte dessas atividades por meio de Programas, tais como o Pro-
grama Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA) (INCRA,
2010; SECOM, 2011)4.
Dal Ri e Vieitez (2008, p. 28) ressaltam ainda que “[...] a práxis edu-
cacional [...] do MST é diferenciada tanto em relação à escola oficial quanto
em relação a outras proposições críticas existentes”, o que torna significa-
tiva e pertinente a pesquisa da experiência pedagógica deste Movimento,
“[...] dada a sua originalidade e possíveis virtualidades teóricas e práticas”.

4
Em decorrência de medidas adotadas pelo governo federal, especialmente após o golpe que, em 2016, interrompeu
o mandato da então Presidenta Dilma Rousseff, diversas políticas voltadas ao campo, inclusive na área da educação,
foram prejudicadas ou interrompidas.
Cláudio Rodrigues da Silva | 17

Embora haja significativa quantidade de pesquisas sobre a educação


no ou do MST, o projeto amplo (DAL RI, 2012) e esta pesquisa inovam
pelos objetivos a que se propõem, em especial pelo cotejamento com mo-
vimentos sociais de trabalhadores de outros momentos históricos e países
e, da perspectiva desta pesquisa, não estudados no Brasil.
São investigados os cartistas e os owenistas, dois movimentos emi-
nentemente urbano-industriais, que atuaram principalmente na
Inglaterra, na primeira metade do século XIX, e o MST, um movimento
eminentemente ligado ao campo, atuante no Brasil, a partir da década de
1980.
Independentemente de suas especificidades, esses Movimentos têm
em comum o fato de serem organicamente vinculados a setores das classes
trabalhadoras. Assim, esse aspecto comum é mais relevante que os aspec-
tos específicos que os diferenciam. Além disso, o interesse desta pesquisa
está centrado na questão educacional, em especial nas propostas e experi-
ências levadas a cabo por esses Movimentos.
Ainda quanto à relevância deste trabalho, ao demonstrar que os três
Movimentos mencionados têm princípios educativos comuns e transcen-
dentes, a pesquisa contribui para a produção de dados que podem
acrescentar aos resultados de pesquisas apresentados por Dal Ri e Vieitez
(2008, p. 320, grifos dos autores).

A educação produzida pelo MST [...] pode e deve servir como uma referência
ao movimento democrático ou socialista. Porém, com a observância de que
tanto o trabalho associado quanto a educação que aparece a ele articulada,
particularmente as escolas de orientação democrática do Movimento, são for-
mas organizacionais de transição, as quais emergem numa acepção negativa
como recusa dos sujeitos sociais a certos determinantes capitalistas, e numa
acepção positiva como parte de um processo que busca construir uma socie-
dade democrático-igualitária ou socialista.
18 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Levantou-se como hipótese subsidiária que no momento histórico da


Revolução Industrial, assim como nos momentos seguintes, a aplicação
dos princípios educativos foi importante para a auto-organização com vis-
tas à ajuda mútua, à resistência aos ataques e impactos negativos
decorrentes do modo de produção capitalista e, conforme as conjunturas
e correlação de forças, para avanços sócio-político-econômicos que incidi-
ram e incidem diretamente sobre as condições de vida dos trabalhadores.
As propostas e experiências de educação – no sentido lato desse
termo – alternativas ou de resistências, em especial aquelas de iniciativa
de trabalhadores e que se contrapõem aos modelos de educação e sociabi-
lidade hegemônicos vigentes, comumente não encontram espaço na
história e nos documentos oficiais estatais (DAL RI; VIEITEZ, 2008).
Além disso, na maioria das vezes, pesquisas na área da Educação pri-
vilegiam as iniciativas de educação escolar e oficial, mais especificamente
as estatais, embora, em seu Artigo 1º, a Lei de Diretrizes e Bases da Edu-
cação Nacional (LDB/1996) (BRASIL, 1996b) reconheça que a educação
extrapola o âmbito da escola, abrangendo também os processos formati-
vos que são desenvolvidos, entre outros espaços, nos movimentos sociais.
Martins (2004, p. 13) ressalta “[...] a necessidade das ciências da edu-
cação debruçarem-se, de forma sistematizada, sobre o caráter educativo
dos movimentos sociais, e sobre as práticas educacionais exitosas presen-
tes em sua dinâmica [...]”.
Para Caldart (1997, p. 29), é importante e necessário que se desen-
volva o registro sistematizado tanto da história geral do MST quanto da
“[...] história da educação que nele e através dele se desenvolve [...]”.
Bauer (2009, p. 20) entende que

[...] se faz absolutamente imperioso acompanhar e analisar o necessário es-


forço que os trabalhadores e demais setores populares buscam empreender,
Cláudio Rodrigues da Silva | 19

na perspectiva de fortalecer sua própria experiência de auto-organização, não


apenas no plano corporativo e econômico de seus movimentos sociais, mas
também na arena da cultura, da educação, da política, da influência e da dis-
puta por hegemonia na esfera pública.

Por isso, a importância de se pesquisar, de se retomar e de se cotejar


princípios constitutivos das propostas e das experiências educacionais des-
ses Movimentos, inclusive estabelecendo relações com o ensino oficial no
Brasil, especialmente na atualidade.
Os dados resultantes desta pesquisa podem oferecer subsídios para
análises quanto à pertinência e exequibilidade de determinadas proposi-
ções e experiências educativas empreendidas no decorrer da história por
movimentos sociais de trabalhadores. Podem também oferecer subsídios
para formulações ou avaliações de políticas educacionais pretéritas, atuais
ou vindouras.
Nesta pesquisa são feitas recorrentes menções à educação escolar es-
tatal e às escolas estatais – principais instituições de ensino oficial – como
veiculadoras oficiais da ideologia e da visão de mundo hegemônicas, por-
tanto, das classes hegemônicas. Essa opção se deve ao fato de que a ampla
maioria das classes trabalhadoras depende dessas escolas para tentar se
apropriar de conhecimentos técnico-científicos ou de seus rudimentos.
Entretanto, não se desconsidera que a veiculação da ideologia e da
visão de mundo hegemônicas também ocorre em escolas não estatais. To-
davia, entre estas escolas há algumas especificidades que precisam ser
analisadas de maneira mais detida, o que não é objetivo desta pesquisa,
pois, se se considerar as categorias administrativas utilizadas pela LDB vi-
gente, as escolas próprias do MST não se configuram como públicas.
Dessa forma, é inviável apresentar, sem as devidas mediações, todas
as escolas, portanto, toda a educação escolar, como veiculadoras e repro-
dutoras da ideologia hegemônica, pois há exceções que, em alguma
20 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

medida, trabalham na contra-hegemonia, como, por exemplo, escolas do


MST ou escolas oficiais nas quais o Movimento conquista a hegemonia
(DAL RI; VIEITEZ, 2008).
Apresentam-se, na sequência, as principais categorias utilizadas
nesta pesquisa.
Por currículo oculto são entendidos os elementos educativos presen-
tes nas relações sociais de organizações e movimentos sociais, cujos
objetivos e desdobramentos não necessariamente são objetos de reflexão
intencional e consciente pelos que as vivenciam (DAL RI; VIEITEZ, 2008;
VIEITEZ; DAL RI, 2009).
Por trabalho associado e suas organizações são entendidas iniciativas
de trabalhadores visando a criação de formas de trabalho não subordina-
das ao capital, isto é, um “sistema de cooperação para si” (VIEITEZ; DAL
RI, 2009). Da mesma forma, Organizações de Trabalho Associado (OTAs)
são iniciativas de trabalhadores visando a criação de organizações de tra-
balho não subordinadas ao capital, isto é, um sistema de cooperação para
si (VIEITEZ; DAL RI, 2009).
Por gestão democrática entende-se um processo em que todas as de-
cisões são discutidas e tomadas coletivamente, com a participação de todas
as pessoas envolvidas, durante todo o processo e em condições reais de
igualdade. Parte-se do que Mészáros (2002a) apresenta como democracia
substantiva.
Por ideologia entende-se o conjunto de ideias e valores que dão sus-
tentação à determinada visão de mundo. Parte-se do que apontam
especialmente Althusser (1999), Mészáros (2006) e Severino (1986). Do
ponto de vista macro, visão de mundo é o conjunto de princípios políticos,
econômicos e culturais que configura e compõe um sistema de governo,
um regime econômico, que resultariam de uma determinada formação
econômico-social. Do ponto de vista dos indivíduos, visão de mundo, assim
Cláudio Rodrigues da Silva | 21

como ideologia, é um sistema teórico-prático de justificação das posições


sociais, tendo, portanto, implicações teórico-práticas nos mais diferentes
aspectos e instâncias que envolvem as relações sociais (DEMO, 1988).
Este livro está estruturado da seguinte forma. No primeiro capítulo
são apresentadas as conjunturas de fundação e de atuação dos Movimen-
tos analisados, enfatizando-se a questão da educação. Do segundo ao
sétimo capítulos são apresentados, problematizados e cotejados os princí-
pios que tratam, respectivamente, da elaboração e da implementação de
um projeto próprio de educação conforme as necessidades e ideologias dos
respectivos Movimentos; da negação dialética do ensino oficial; da imple-
mentação da gestão democrática nas associações e escolas dos
Movimentos; das ações visando formar os próprios educadores em conso-
nância com a concepção de mundo e de educação dos respectivos
Movimentos; da articulação entre ensino e trabalho produtivo; da consti-
tuição e veiculação de uma concepção de mundo concernente a cada
Movimento e à classe trabalhadora.
À guisa de finalização dessas notas introdutórias, ressalta-se que al-
guns aspectos desta pesquisa refletem uma conjuntura específica –
principalmente em termos políticos, econômicos e culturais no Brasil e no
mundo –, pois envolve a temática da educação em movimentos sociais, em
especial o MST, um Movimento amplo, complexo, dinâmico e em atuação.
No entanto, o cerne deste trabalho mantém sua atualidade e pertinência,
até porque a temática principal desta pesquisa são os princípios educativos
dos Movimentos analisados, princípios esses que, conforme Dal Ri (2012),
configuram-se como elementos transcendentes e comuns a alguns dos
mais relevantes movimentos sociais de trabalhadores, desde o momento
da Revolução Industrial até a atualidade.
22 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Ao mesmo tempo em que são, em alguma medida, decorrentes ou herdeiros


de iniciativas ou movimentos anteriores, movimentos como os owenistas e
cartistas, assim como o MST, deixam seus legados para movimentos sociais
contemporâneos e posteriores. Como ressaltado, esses movimentos não ape-
nas criticaram ou negaram o ensino oficial, mas, sobretudo, propuseram e
implantaram iniciativas de autoeducação. Desse modo, não se restringiram à
denúncia dos problemas da educação, mas partiram das condições objetivas
para criarem processos educacionais diferenciados e alternativos, mesmo com
adversidades das mais variadas ordens e sofrendo perseguições por parte das
classes dominantes e dos aparelhos repressivos do Estado. (SILVA; DAL RI,
2019b, p. 721)

Reitera-se, assim, a pertinência da intensificação – em abrangência e


profundidade – de pesquisas sobre a questão da (auto)educação das classes
trabalhadoras (LOUREIRO, 2019; SILVA; DAL RI, 2019b).
Destaca-se que este livro é resultante da Dissertação de Mestrado
(SILVA, 2014), desenvolvida no âmbito do Programa de Pós-Graduação
em Educação (PPGE) da Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC) da Uni-
versidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Marília. Decidiu-se
realizar o mínimo possível de alterações em relação à versão entregue ao
PPGE, até porque, considerando-se o transcurso de alguns anos da escrita
daquele texto, a continuidade dos estudos sobre essa temática (SILVA,
2019) e as alterações nas conjunturas políticas e econômicas tanto em âm-
bito nacional quanto internacional, seria quase impossível que uma
eventual tentativa de complementação ou de atualização dos dados não
resultasse numa outra Dissertação, que, assim como a anterior, ao ser fi-
nalizada, também já estaria sujeita aos riscos de desatualização em alguns
aspectos, haja vista, como ressaltado, a pesquisa envolver, entre outros, o
MST, um Movimento social em atuação.
Capítulo I

Conjunturas de fundação e atuação dos movimentos

Neste capítulo são apresentados alguns apontamentos sobre as res-


pectivas conjunturas política, econômica e educacional de fundação e
atuação dos Movimentos sociais de trabalhadores analisados nesta pes-
quisa – MST, owenistas e cartistas.
Ainda que o principal Movimento, para fins desta pesquisa, seja o
MST, o que sugeriria que a abordagem começasse por esse Movimento,
optou-se por iniciar a contextualização pelos owenistas e pelos cartistas,
portanto, pelo contexto da Revolução Industrial.
Essa opção não tem como objetivo realizar uma abordagem cronoló-
gica progressiva, mas, sim, visa à apresentação, de forma encadeada ou
concatenada, de algumas questões recorrentes na história da educação es-
colar no Brasil, mas que, se se considerar os apontamentos de Engels
(2008), Marx (1984), Owen (1967a; 1967b) e Thompson (1987a; 1987b;
1987c), entre outros autores, verifica-se que, com as devidas mediações,
são questões que perpassam a educação escolar destinada às classes tra-
balhadoras desde a época da formação da classe operária e que, portanto,
não são exclusividade da educação escolar no Brasil, nem mesmo fatos
inerentes à atualidade, como se pode depreender da análise desses e de
outros autores, como, por exemplo, Luzuriaga (1959; 1963), Manacorda
(1992), Ponce (1981), bem como se pode constatar a partir de apontamen-
tos de Carvalho (2003), Reis Filho (1981), Ribeiro (1988) e Souza (2009).
Ou seja, não se trata de questões unicamente conjunturais, mas, sim, de
questões estruturais.
24 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Mesmo que em cada momento histórico e em cada país ou região


geográfica existam especificidades, em linhas gerais, a Revolução Indus-
trial foi um acontecimento que, de forma mais imediata ou mediata, com
maior ou menor intensidade, impactou diferentes países, além de ser o
momento em que se inicia o processo de formação da classe operária e em
que o trabalho assalariado tornou-se relativamente preponderante nos
principais países da Europa Ocidental (ENGELS, 2008; MARX; ENGELS,
1982; MORTON; TATE, 1968; WILLIAMS, 1989).
Num momento posterior, o trabalho assalariado expandiu-se e tor-
nou-se, em tese, preponderante na maior parte dos países dos diferentes
continentes (CASTEL, 1998). O século XIX principalmente, enquanto mo-
mento histórico, a Revolução Industrial, enquanto evento, e a Grã-
Bretanha, mais especificamente a Inglaterra, enquanto espaço geográfico,
são espécies de marcos do surgimento e ascensão do capitalismo indus-
trial, cujos desdobramentos, com as devidas ressalvas e especificidades,
atingiriam, em maiores ou menores tempo e intensidade, a maioria dos
países do mundo (MORTON; TATE, 1968; TEIXEIRA, 2002), ainda que,
num mesmo país e num mesmo momento histórico, segundo Althusser
(1999), possam coexistir diferentes modos de produção, sendo um deles o
hegemônico.

1.1 Conjuntura de fundação e atuação do Owenismo e do Cartismo

O cartismo e o owenismo foram organizados em decorrência dos des-


dobramentos da Revolução Industrial e do desenvolvimento do
capitalismo industrial que degradaram as condições de vida e trabalho de
amplos setores das classes trabalhadoras. Assim, conforme as próprias es-
pecificidades, esses Movimentos empenharam-se para provocar
mudanças, reivindicando direitos nos planos político, econômico e cultu-
ral.
Cláudio Rodrigues da Silva | 25

Ao mesmo tempo, causa e resultado do processo de mudança no


modo de produção, a Revolução Industrial foi um dos principais marcos
na história moderna ocidental. Com ela iniciou-se o processo de formação
da classe operária e, por conseguinte, do processo de auto-organização de
setores das classes trabalhadoras, em especial por intermédio de suas as-
sociações (ENGELS, 2008; HOBSBAWM, 1977; MORTON; TATE, 1968).
Conforme Thompson (1987c, p. 13), “Independentemente das diferenças
entre seus julgamentos de valor, observadores conservadores, radicais e
socialistas sugeriram a mesma equação: energia do vapor e indústria al-
godoeira = nova classe operária.”
Alguns fatos mais emblemáticos daquele momento histórico são o
cerco das terras comunais, a expulsão dos camponeses das terras feudais,
o surgimento e o crescimento de grandes centros industriais e as altas con-
centrações demográficas nos entornos das manufaturas e maquinofaturas,
que passaram a concentrar altos números de trabalhadores num mesmo
espaço.
As mudanças no sistema produtivo, mais especificamente a introdu-
ção e o uso em escala crescente dos processos de mecanização e a utilização
da hidráulica e do vapor como forças motrizes, tiveram papel central em
todo esse processo, o que contribuiu para a precarização das condições de
trabalho, submetendo as classes trabalhadoras a condições degradantes de
vida1 (BRAVERMAN, 1974; ENGELS, 2008; HOBSBAWM, 1977;
THOMPSON, 1987c).

1
Marx e Engels destacam também aspectos contraditoriamente positivos – a curto e, possivelmente, longo prazos –
do modo de produção capitalista, quando comparado ao modo de produção feudal. Entre esses aspectos destacam-
se, por um lado, o fato de, no capitalismo, os trabalhadores deixarem de estar presos ou vinculados à terra ou ao
feudo e ao senhor feudal, haja vista o fim do estatuto da servidão. Por outro lado, ressaltam que o capitalismo resultou
em diversos impactos negativos sobre as condições de vida das classes trabalhadoras (MARX, 1984; MARX; ENGELS,
1982).
26 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Numa ordem social organizada, tais aperfeiçoamentos seriam uma coisa; po-
rém, num regime em que reina a guerra de todos contra todos, uns poucos
indivíduos se apossam das vantagens que deles derivam e subtraem à maioria
os seus meios de subsistência. Qualquer aperfeiçoamento de máquinas põe al-
guns operários na rua e quanto mais importante é o progresso, maior é a
parcela da classe jogada no desemprego; assim, todo aperfeiçoamento mecâ-
nico tem, para um bom número de operários, os mesmos efeitos de uma crise
comercial, gerando miséria, sofrimentos e crime. (ENGELS, 2008, p. 174)

Os impactos negativos nas condições de trabalho e de vida resultaram


em diversas reações de setores das classes trabalhadoras (BRAVERMAN,
1974; ENGELS, 2008; HOBSBAWM, 1977). Segundo Thompson (1987c, p.
64-65), “O século 18 e o início do século 19 são pontuados por motins oca-
sionados pelos preços do pão, pelos pedágios e portagens, impostos de
consumo, ‘resgates’, greves, nova maquinaria, fechamento de terras co-
munais, recrutamentos e uma série de outras injustiças”.
Isso remete ao primeiro aspecto do primeiro princípio elencado nesta
pesquisa, que trata da constituição de uma ideologia e de uma visão de
mundo em conformidade com os respectivos Movimentos sociais, e que,
por sua vez, remete ao que Thompson (1987a) aponta como sendo a for-
mação da classe operária, ou seja, quando trabalhadores passam a agir
como classe social.
Visando resistir à situação a que foram expostos, setores das classes
trabalhadoras se auto-organizaram em movimentos e associações, de
maior ou menor expressividade, com os mais variados objetivos imediatos
ou mediatos (ENGELS, 2008; MORTON; TATE, 1968; THOMPSON,
1987c).
Cláudio Rodrigues da Silva | 27

Destacam-se, entre esses2, os cartistas e os owenistas (MORTON;


TATE, 1968; TEIXEIRA, 2002; THOMPSON, 1987c), Movimentos que, se-
gundo Engels (2008, p. 160-161), tiveram origens nas grandes cidades,
berço do movimento operário: “[...] foi nelas que, pela primeira vez, os
operários começaram a refletir sobre suas condições e a lutar; foi nelas
que, pela primeira vez, manifestou-se o contraste entre proletariado e bur-
guesia; nelas surgiram as associações operárias, o cartismo e o
socialismo.” O movimento operário, à época, estava dividido em duas fra-
ções, quais sejam, os cartistas e os socialistas (ENGELS, 2008).
Segundo Dal Ri e Vieitez (2008, p. 17-18),

Ainda no período de formação do modo de produção capitalista, os trabalha-


dores livres, destituídos de qualquer propriedade mobiliária ou imobiliária, e
os trabalhadores proprietários dos próprios instrumentos de trabalho em es-
cala artesanal, procuraram resistir a essa subordinação criando para essa
finalidade organizações próprias.

Criar formas de sair do isolamento era uma necessidade, pois “O pro-


letariado é desprovido de tudo – entregue a si mesmo, não sobreviveria
um único dia, porque a burguesia se arrogou o monopólio de todos os
meios de subsistência, no sentido mais amplo da expressão.” (ENGELS,
2008, p. 118). Por isso, inclusive, a importância das associações que, em
determinados momentos, foram expressamente proibidas, funcionando
na clandestinidade (HOVELL, 1925; MORTON; TATE, 1968; VALADARES,
1993). “Quando, em 1824, os operários obtiveram o direito à livre associ-
ação, essas sociedades rapidamente se expandiram por toda a Inglaterra e
tornaram-se fortes.” (ENGELS, 2008, p. 250).

2
Estes são os movimentos delimitados nesta pesquisa. Há que se considerar também, entre outros, os anarquistas e
os marxistas, pesquisados no âmbito do projeto de pesquisa mais amplo (DAL RI, 2012).
28 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Esse ponto introduz ou remete mais diretamente ao segundo aspecto


do primeiro princípio educativo enunciado nesta pesquisa, que é o da cons-
tituição de uma concepção própria de educação e de ensino, conforme as
respectivas visões de mundo dos Movimentos.

Por volta de 1832, havia instituições da classe operária solidamente fundadas


e autoconscientes – sindicatos, sociedades de auxílio mútuo, movimentos reli-
giosos e educativos, organizações políticas, periódicos – além das tradições
intelectuais, dos padrões comunitários e da estrutura da sensibilidade da
classe operária. (THOMPSON, 1987c, p. 17)

Dal Ri e Vieitez (2008, p. 18) destacam que “As primeiras organiza-


ções de trabalhadores estiveram voltadas para a ajuda mútua e a luta
contra as condições subumanas de trabalho e de vida impostas pelo capi-
tal. Subsequentemente, o movimento de oposição expandiu-se a outras
esferas da atividade social.”
As formas de resistências adotadas variaram conforme as origens, as
tradições, os objetivos e, principalmente, as condições objetivas – especi-
almente as bases materiais – dos diferentes setores ou movimentos de
trabalhadores. Além das recusas ou resistências aos novos princípios e
práticas inerentes ao novo modo de produção, adotaram ou tentaram
manter princípios comunitários, solidários, democráticos, entre outros,
em um momento histórico em que passaram a prevalecer princípios opos-
tos a alguns desses, até então tradicionais e inerentes ao feudalismo
(THOMPSON, 1987a; 1987c), quando ainda prevalecia uma espécie de
“economia moral”, em contraponto à “economia livre de mercado”
(THOMPSON, 1987a, p. 71).
Outros motivos concomitantes e relacionados àqueles também im-
pulsionaram trabalhadores à resistência, como, por exemplo, a crescente
perda do controle do próprio processo de trabalho, portanto, da produção
Cláudio Rodrigues da Silva | 29

e do produto, e da própria educação, quesitos fundamentais para o exercí-


cio, com certa autonomia, de todas as dimensões da vida (BRAVERMAN,
1974; DAL RI, 2013; LOVETT; COLLINS, 1840).

Já vimos que mesmo antes do advento da energia do vapor, os tecelões de lã


não gostavam das fábricas de teares manuais. Eles ressentiam-se, em primeiro
lugar, da disciplina, mas também da campainha, da sirene da fábrica e do con-
trole do tempo que esgotava os mais debilitados, prejudicava as atividades
domésticas e impedia a dedicação a outras ocupações. (THOMPSON, 1987c, p.
166)

Conforme Dal Ri (2013) e Thompson (1987b; 1987c), setores das clas-


ses trabalhadoras resistiram de diversas formas, inclusive por meio da
educação e da instrução, entendidas como potenciais para o fortalecimento
da auto-organização e, por conseguinte, dos embates políticos.
Verificam-se, a partir do que aponta Engels (2008, p. 149-150), pre-
ocupações com a adequação da educação aos interesses das classes
trabalhadoras.

Na Inglaterra, os meios de instrução, comparados à população, são incrivel-


mente limitados. As poucas escolas que funcionam durante a semana para os
trabalhadores só podem ser frequentadas por uma pequena minoria e, além
do mais, são péssimas: grande parte dos professores (operários que já não
podem trabalhar e pessoas ineptas, que só se dedicam ao ensino para sobrevi-
ver) não possui os rudimentares conhecimentos, não dispõem da formação
moral necessária ao educador [...].

Os dados apresentados por Engels (2008) levam à reflexão especial-


mente sobre dois dos princípios elencados nesta pesquisa, quais sejam, o
que trata da negação do ensino oficial estatal e o que trata da formação dos
próprios educadores.
30 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Conforme Engels (2008) e Thompson (1987b), naquele momento


histórico, um contingente expressivo de operários não sabia ler; outro,
ainda maior, não sabia escrever. Engels (2008) ressalta que muitas das
consideradas pessoas instruídas não escreviam corretamente.
Porém, segundo Thompson (1987b, p. 304), isso “De forma nenhuma
[...] excluía os indivíduos do discurso político”, até porque, havia um con-
tingente menor de trabalhadores muito bem educado acadêmica,
profissional e politicamente, dada a cultura autodidata3.
Para Braverman (1974, p. 119), “O profissional estava vinculado ao
conhecimento técnico e científico de seu tempo na prática diária de seu
ofício.”, cujo preparo e exercício demandavam, respectivamente, o apren-
dizado e a aplicação inclusive de álgebra, geometria e trigonometria.

Sem sombra de dúvida, entre os tecelões do norte desenvolveu-se um grupo


de homens autodidatas e distintos, de consideráveis conhecimentos. Todos os
distritos têxteis possuíam tecelões-poetas, biólogos, matemáticos, músicos,
geólogos e botânicos; [...] Contam-se histórias de tecelões de aldeias isoladas
que aprenderam geometria sozinhos, escrevendo com giz sobre lajes, e que
discutiam avidamente problemas de cálculo diferencial. Em algumas ativida-
des mais simples, em que se utilizavam fios fortes, havia aqueles que apoiavam
um livro no tear, lendo-o durante o trabalho. (THOMPSON, 1987c, p. 146-147)

Eram aproveitadas mesmo escolas dominicais religiosas, que contri-


buíram para o ensino de rudimentos de leitura, de escrita e de cálculo para
as classes trabalhadoras, embora setores ou movimentos de trabalhadores
reivindicassem educação laica e em conformidade com as respectivas

3
Isso pode ser verificado também no MST, que tem um número significativo de integrantes – direção, militância,
base e massa –, que têm (ou tinham, antes de entrarem no Movimento) poucos – ou às vezes nenhum – anos de
educação escolar (SCOLESE, 2008). Por outro lado, há, principalmente entre os quadros, pessoas com elevada
formação escolar. Entretanto, nenhum desses segmentos, no âmbito do MST, é excluído das práticas e dos discursos
políticos por causa da situação acadêmica. Ressalta-se, no entanto, que o Movimento investe na educação escolar de
seus integrantes, especialmente para fins de formação de quadros para a luta política e de técnicos para as
cooperativas. Evidência disso é que o estudo é um princípio do MST (DAL RI, 2013; STEDILE; FERNANDES, 2001).
Cláudio Rodrigues da Silva | 31

ideologias e visões de mundo (FLETT, 2006; LOVETT; COLLINS, 1840;


OWEN, 1967a; 1967b). “Ao longo de toda a Revolução Industrial [...] Por
várias gerações, a educação mais usualmente acessível vinha do púlpito e
da Escola Dominical, do Velho Testamento e do Progresso do Peregrino.”
(THOMPSON, 1987a, p. 51).
Contudo, para além da laicidade, essas escolas também deixavam a
desejar em termos científicos, pois seus objetivos diferiam dos objetivos
das associações de trabalhadores (ENGELS, 2008; LOVETT; COLLINS,
1840; OWEN, 1967a; 1967b).

Durante os anos contra-revolucionários, [...] a finalidade da educação come-


çava e terminava na ‘recuperação moral’ das crianças pobres. Não só se
desencorajou o ensino da escrita, como também muitas crianças deixaram as
escolas dominicais sem saberem ler [...]. (THOMPSON, 1987c, p. 259)

Segundo Engels (2008, p. 222), a educação propiciada aos trabalha-


dores por iniciativas não orgânicas às classes trabalhadoras, especialmente
pelos industriais, era essencialmente domesticadora.

Pode até ser que ele [industrial] tenha aberto uma escola, uma igreja, um salão
de leitura; você visitará essas instalações, mas não saberá que ele só tolera no
salão de leitura materiais que defendem os interesses da burguesia e despede
os trabalhadores que para lá levam jornais ou livros cartistas ou socialistas.

Assim, devido à inexistência, à incipiência ou à insuficiência do ensino


oficial franqueado às massas, bem como à precariedade do ensino propi-
ciado aos trabalhadores, setores desses, por meio de associações, mais
preocupadas com questões corporativas ou profissionais, ou de movimen-
tos políticos, empenhados em questões mais amplas, organizaram e
implementaram iniciativas de autoeducação, que não ficaram restritas à
32 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

educação escolar, mas visavam inclusive à emancipação política (DAL RI,


2013; FLETT, 2006; HOVELL, 1925; THOMPSON, 1987c).

As diversas frações operárias – membros das associações, cartistas e socialistas


–, às vezes em unidade, às vezes isoladamente, fundaram por seus próprios
meios uma grande quantidade de escolas e salões de leitura para elevar o nível
cultural do povo. Todas as organizações socialistas, quase todas as cartistas e
muitas associações profissionais possuem instituições desse gênero; nas esco-
las, oferece-se às crianças uma educação verdadeiramente proletária, livre das
influências burguesas, e nos salões de leitura encontram-se quase exclusiva-
mente livros e jornais proletários. (ENGELS, 2008, p. 271)

Algumas dessas associações eram constituídas com base em princí-


pios comunitários, solidários e democráticos (DAL RI, 2013; FLETT, 2006;
HOVELL, 1925; LINTON; 1895; LOVETT; COLLINS, 1840). Segundo Dal Ri
e Vieitez (2008, p. 167), “O princípio democrático de deliberação em as-
sembleias remonta à gênese do movimento operário popular e também do
cooperativismo.”
Por meio delas eram organizados fundos mútuos para diversas fina-
lidades, desde provisão de recursos para o autossustento em épocas de
greves, para impressão de periódicos, para o amparo a associados em con-
dições de extremas urgências ou necessidades, como, por exemplo,
trabalhadores impossibilitados de trabalhar e viúvas, e até para os funerais
(MORTON; TATE, 1968; THOMPSON, 1987b).
Além dessas atividades, essencialmente educativas e ligadas a ques-
tões mais relacionadas às necessidades imediatas, havia associações que
promoviam palestras, grupos de leituras e discussões, publicações de pe-
riódicos, panfletos, entre outras iniciativas (FLETT, 2006; HOVELL, 1925;
LOVETT; COLLINS, 1840; OWEN, 1967a; 1967b). “Dadas as técnicas ele-
mentares de alfabetização, os diaristas, artesãos, lojistas, escreventes e
Cláudio Rodrigues da Silva | 33

mestres-escolas punham-se a aprender por conta própria, individual-


mente ou em grupo.” (THOMPSON, 1987b, p. 304).
Ao mesmo tempo que contribuíram para o processo de autoconsci-
entização e organização política de trabalhadores, essas associações
contribuíram para a ampliação do universo cultural, aperfeiçoamento e até
incentivaram trabalhadores ao aprendizado de leitura, de escrita e de cál-
culo (ENGELS, 2008; LOVETT; COLLINS, 1840; THOMPSON, 1987b).
Essas iniciativas educacionais não ficaram restritas aos ambientes
das associações, nem mesmo aos setores mais organizados de trabalhado-
res. Havia o recurso a missionários ou a lideranças, para fins de divulgação
dos objetivos dos Movimentos. Era comum a existência de jornaleiros e
discurseiros ambulantes vinculados a movimentos de trabalhadores que,
respectivamente, vendiam jornais e faziam discursos em logradouros e ou-
tros espaços públicos, sendo também, entre trabalhadores, comum a
leitura em voz alta de jornais e de outras publicações para que não alfabe-
tizados pudessem se manter informados sobre questões que afetavam as
classes trabalhadoras (THOMPSON, 1987b).
Tanto naquelas iniciativas melhor organizadas formalmente – as as-
sociações –, quanto nas iniciativas menos formais, os educadores eram dos
ou os próprios movimentos de trabalhadores, até porque, em igrejas e ou-
tras iniciativas que não as dos trabalhadores, “[...] os livros ou instrutores,
muitas vezes, eram os que contavam com a aprovação da opinião refor-
madora.” (THOMPSON, 1987b, p. 304).
Essas associações e suas atividades eram concebidas, executadas e
mantidas democraticamente pelos próprios trabalhadores, o que demons-
tra a capacidade e o empenho histórico de setores das classes
trabalhadoras na gestão de seus próprios interesses e na busca da eman-
cipação política e, para isso, uma das condições indispensáveis era
promover a própria educação (DAL RI, 2013). A tese da autoeducação das
34 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

classes trabalhadoras com vistas a sua emancipação política era defendida


por lideranças e por outros movimentos de trabalhadores (DAL RI, 2012;
TEIXEIRA, 2002).
Como apontam Engels (2008), Hobsbawm (1977), Morton e Tate
(1968) e Thompson (1987a; 1987b, 1987c) vários foram os movimentos
criados por trabalhadores a partir da Revolução Industrial, principalmente
com o agravamento dos impactos negativos nas condições de vida das clas-
ses trabalhadoras. Alguns desses movimentos tiveram maiores
expressividades e repercussões históricas, dentre os quais se destacam os
cartistas e os socialistas utópicos, em especial os owenistas, além dos anar-
quistas, marxistas, entre outros.
Conforme tese aventada por Dal Ri (2012), da análise de Combe
(1968), Donnachie (2011), Donnachie e Hewitt (1999), Engels (2008), Flett
(2006), Lovett e Collins (1840), Maclure (1968), Owen (1967a; 1967b;
2002), Thompson (1968) e de Thompson (1987a, 1987b; 1987c) consta-
tam-se práticas e princípios educativos transcendentes e comuns a
movimentos sociais de trabalhadores daquele momento histórico, em es-
pecial os cartistas e os owenistas, analisados nesta pesquisa.
Fundamental para a formação conforme as respectivas ideologias e
concepções de mundo, por conseguinte, para a reprodução dos próprios
Movimentos, a articulação entre ensino e trabalho produtivo estava dire-
tamente relacionada às condições sócio-político-econômicas das classes
trabalhadoras. O trabalho produtivo por ser necessário à produção e à re-
produção das condições materiais de vida. A educação por ser necessária
para o processo de aquisição de conhecimentos técnico-científicos, trans-
missão da ideologia e da cultura para as novas gerações. E, ambos,
trabalho e educação, por serem imprescindíveis para o processo de huma-
nização (ENGELS, 1876; MARX, 1984; 2004). Desta perspectiva, trabalho
produtivo é um princípio educativo (DAL RI; VIEITEZ, 2009).
Cláudio Rodrigues da Silva | 35

Com a Revolução Industrial, os trabalhadores foram destituídos tanto


do controle do processo de produção e do produto de seu trabalho, quanto
do controle da educação, em especial do ensino, que passou a ser prerro-
gativa da instituição escolar, quando, antes, a educação e o ensino
ocorriam no trabalho e na comunidade. Nesta abordagem, ensino e traba-
lho produtivo são questões complementares e indissociáveis das condições
de vida humana duma perspectiva emancipatória (BRAVERMAN, 1974;
DAL RI; VIEITEZ, 2008).
Porém, para que ocorra a articulação entre ensino e trabalho produ-
tivo das perspectivas dos Movimentos analisados, é indispensável que haja
educadores orgânicos, formados e atuantes em conformidade com os res-
pectivos projetos de educação e de pedagogia. Isso ocorre especialmente
no caso de Movimentos, como o MST, que adotam, em alguma medida e
em determinadas unidades, os princípios do trabalho associado
(CHRISTOFFOLI, 2010; STEDILE; FERNANDES, 2001), que tem entre
suas premissas a gestão democrática e a regulação da produção (DAL RI;
VIEITEZ, 2008; NOVAES; DAGNINO, 2011), em contraposição ao trabalho
alienado e estranhado, que é a base do capital, essencialmente heteroges-
tionário, portanto, antidemocrático (GUTIERREZ, 1983; MÉSZÁROS,
2002a; 2005).
Ainda que todos os princípios educativos elencados sejam imprescin-
díveis e indissociáveis para que projetos contra-hegemônicos de educação
e de formação econômico-social possam conseguir avanços significativos
ou serem efetivamente implementados, a gestão democrática é o princípio
mais estratégico (DAL RI, 2004; 2013), uma espécie de pré-requisito para
que ocorram avanços significativos ou para que sejam implementados, de
maneira plena, radical e generalizada, os demais princípios.
Os apontamentos de Engels (2008), Flett (2006), Lovett e Collins
(1840), Marx (1984), Owen (1967a; 1967b) e de Thompson (1987a; 1987b;
36 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

1987c) ajudam numa possível visualização do quadro conjuntural e estru-


tural em que se circunscrevem os projetos de educação e de ensino
próprios dos Movimentos Cartista e Owenista.
Em todos os quesitos – habitação, saúde, trabalho, educação, entre
outros – por Engels (2008) analisados, constatam-se as condições precá-
rias de vida das classes trabalhadoras. A situação em um ou mais desses
quesitos comumente fornece indícios – quando não são correspondentes
– da situação nos demais quesitos, bem como de outras dimensões ou
mesmo da totalidade das condições de vida de significativos setores das
classes trabalhadoras naquele momento histórico.
Verifica-se que esses Movimentos de trabalhadores, já nos séculos
XVIII e XIX, ainda que não tivessem vivenciado diversas experiências, nem
mesmo os desdobramentos de suas mobilizações e conquistas, eram cien-
tes do caráter estrutural da questão educacional, bem como de sua
vinculação com as demais dimensões da vida e com questões sociais mais
amplas, isto é, a relação prática entre a educação escolar e a formação eco-
nômico-social que a concebe. Em outras palavras, tinham ciência de que o
ensino oficial estatal é contrário aos interesses, às ideologias e às visões de
mundo das classes trabalhadoras.

1.2 Notas sobre o Movimento Owenista

Socialismo utópico, por extensão, socialistas utópicos, é uma catego-


ria formulada por Engels ([19--]). Para esse autor, o contraponto ao
socialismo utópico é o socialismo científico, que aplica as categorias do ma-
terialismo histórico dialético, em especial a de luta de classes. Os três
grandes utopistas, na concepção de Engels ([19--]), eram Saint-Simon,
Fourier e Owen.
Robert Owen (1771–1858) foi o fundador, além de principal ideólogo
e militante do Movimento Socialista Utópico Owenista, que tem suas
Cláudio Rodrigues da Silva | 37

origens na Grã-Bretanha, onde exerceu forte influência entre trabalhado-


res, em especial lideranças. Teve importante contribuição para a
organização de setores das classes trabalhadoras. Com o tempo, a influên-
cia do Owenismo e a atuação de Owen expandiram-se para outros países
e continentes.
Owen, além de militante no movimento operário, era gerente e sócio
de New Lanark, uma grande fábrica que produzia fios de algodão. New
Lanark foi a mais importante e conhecida experiência owenista. No seu
apogeu chegou a ter em torno de 2500 habitantes, heterogêneos em diver-
sos aspectos. Além de local de trabalho, New Lanark comportava, entre
outros, habitação e escola para seus trabalhadores e habitantes.

Owen [...] em Manchester, dirigindo uma fábrica de mais de quinhentos tra-


balhadores, tentara, não sem êxito, pôr em prática sua teoria: de 1800 a 1829,
conduziu, no mesmo sentido, embora com muito mais liberdade de iniciativa
e com um êxito que lhe valeu fama européia, a grande fábrica de fios de algo-
dão de New Lanark, na Escócia, da qual era sócio e gerente. Uma população
operária, que foi crescendo até chegar a 2.500 indivíduos, recrutada entre os
elementos mais heterogêneos, a maioria dos quais sem qualquer princípio mo-
ral, converteu-se, em suas mãos, numa perfeita colônia modelo, na qual não
se conhecem a embriaguês, a policia, o cárcere, os processos, os pobres nem a
beneficência pública. Para isso, bastou-lhe colocar os seus trabalhadores em
condições humanas de vida, dedicando um cuidado especial à educação de seus
descendentes. Owen foi o inventor dos jardins-de-infância, que funcionaram,
pela primeira vez, em New Lanark. As crianças, já aos dois anos de idade, eram
enviadas à escola e nela se sentiam tão satisfeitas, com os seus jogos e diver-
sões, que não havia quem de lá as tirasse. Ao passo que, nas outras fábricas
que lhe faziam concorrência, a duração do trabalho era de treze e quatorze
horas por dia, a jornada em New Lanark era de dez horas e meia. Ao estalar
uma crise algodoeira, que o obrigou a fechar a fábrica durante quatro meses,
os trabalhadores de New Lanark continuaram percebendo integralmente os
seus salários. (ENGELS, 1877, p. 138)
38 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Inicialmente, Owen pautava-se por uma perspectiva mais benevo-


lente, filantrópica ou paternalista, momento em que desfrutou de grande
receptividade, especialmente entre setores das classes hegemônicas e au-
toridades governamentais da Grã-Bretanha, além de outros países.
Posteriormente, aderiu ao socialismo, empenhando-se pela reforma
social, questionando, entre outras instituições sociais, a propriedade pri-
vada. Passou a se envolver de maneira mais direta com questões das
classes trabalhadoras, empenhando-se pela aprovação da lei que regula-
mentou o trabalho de mulheres e crianças, pela união dos trabalhadores e
de seus sindicatos, bem como pela fundação de cooperativas (ENGELS,
1877).
Ao se envolver de forma mais direta e radical com as lutas das classes
trabalhadoras e ao declarar os princípios do socialismo, a receptividade de
que desfrutava entre setores das classes hegemônicas sofreu abrupto de-
clínio (ENGELS, 1877).
O owenismo, assim como outras vertentes do socialismo utópico, tem
como característica mais elementar a crença ou opção de resolução dos
problemas sociais ou transformação da sociedade por intermédio de refor-
mas, duma perspectiva de conciliação dos conflitos entre as classes sociais.
Pelo que aponta Engels (1877), verifica-se que a contribuição de
Owen, em termos teóricos e práticos, para avanços das lutas das classes
trabalhadoras foi muito importante.
Os socialistas, conforme Engels (2008, p. 271), se cotejados com os
cartistas, “[...] têm horizontes mais amplos, apresentam propostas práti-
cas contra a miséria, mas provêm originariamente da burguesia e, por
isso, são incapazes de se amalgamar com a classe operária.”
No entendimento de Pinassi (2009, p. 44),
Cláudio Rodrigues da Silva | 39

[...] os utópicos do século XIX foram as vozes precursoras da denúncia contra


a miséria dos trabalhadores livres e assalariados, germinando a ideologia desta
classe social perigosamente insubmissa pelos golpes sofridos nas duas ocasi-
ões em que atendeu aos apelos da burguesia.

Diversos são os autores e movimentos considerados socialistas utó-


picos, sendo os séculos XVIII e XIX o momento de maior efervescência
desses movimentos4, em especial na França e na Inglaterra, com repercus-
sões também em outros países e continentes. Entre os utópicos se destaca
Robert Owen, que atuou e desenvolveu experiências de comunidades al-
ternativas, principalmente na Grã-Bretanha (DONNACHIE, 2000; 2011;
DONNACHIE; HEWITT, 1999; ENGELS, 1877; [19--]; TEIXEIRA, 2002).
Entre as experiências owenistas mais conhecidas estão as realizadas
na comunidade de New Lanark, nas quais foram aplicados princípios desse
Movimento, com inovações especialmente no que se refere à organização
e às condições de saúde, trabalho, educação, moradia, entre outros quesi-
tos, dos trabalhadores e habitantes da aldeia. New Lanark é destacada
nesta pesquisa por ser a experiência mais importante (DONNACHIE, 2011;
DONNACHIE; HEWITT, 1999; HARRISON, 1968; OWEN, 1967a; 1967b).
Há também a experiência de New Harmony, nos Estados Unidos da
América que, mesmo tendo curta duração, influenciou diversas outras ex-
periências, sendo tema de vários estudos. Além dessas, houve outras
experiências na Grã-Bretanha, no Canadá e nos Estados Unidos da Amé-
rica, porém, com menores repercussões, bem como uma espécie de flerte
com o México (CREMIN, 1968; DONNACHIE, 2000; 2011; DONNACHIE;
HEWITT, 1999; HARRISON, 1968; OWEN, 1967a; 1967b).

4
Mesmo não sendo (auto)apresentados ou (auto)denominados como socialistas utópicos, alguns dos principais
pressupostos desse movimento estão presentes em determinados movimentos sociais de trabalhadores na
atualidade, em especial os baseados na Economia Solidária, com forte influência do owenismo. Todavia, a Economia
Solidária comporta variadas tendências com significativas diferenças teórico-práticas entre si (DAL RI; VIEITEZ,
2008; NOVAES, 2011).
40 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Assim como ocorre, por exemplo, no interior dos movimentos anar-


quistas e marxistas que, mesmo compartilhando a maior parte dos
elementos das respectivas teorias, têm diferenças internas, os socialistas
utópicos, com destaque para Owen (1967a; 1967b; 2002), Saint Simon
(1964; 2002a; 2002b) e Fourier (1973), também têm especificidades e di-
ferenças entre si. Porém, também são identificadas várias semelhanças
entre eles (ALMEIDA, O., 2010; CREMIN, 1968; HARRISON, 1968; PIOZZI,
1999; TEIXEIRA, 2002).
O owenismo foi um Movimento com várias influências, ainda que não
necessária ou explicitamente mencionadas por seus ideólogos ou precur-
sores. Seria resultante de influências dos iluminismos francês e escocês,
do comunitarismo, do anticapitalismo, do utilitarismo, entre outras, con-
forme as interpretações de cada autor. Alguns nomes podem ser
mencionados como influências do owenismo, entre eles, Bell, Bellers, Ben-
than, Condorcet, Diderot, Fellenberg, Fourier, Godwin, Hamilton,
Helvetius, Hume, Humboldt, Lancaster, Locke, Pestalozzi, Rousseau,
Smith, Spence, Voltaire, Whitebread (CREMIN, 1968; DONNACHIE, 2011;
DONNACHIE; HEWITT, 1999; HARRISON, 1968; MCLAREN, [s. d.];
MORTON; TATE, 1968; OWEN, 1967a; 1967b; OWEN, J. 1968; OWEN, R.
D., 1968; PIOZZI, 1999; TEIXEIRA, 2002).
Os owenistas constituíram escolas próprias para educação dos traba-
lhadores e habitantes de New Lanark (DONNACHIE, 2000; 2011;
DONNACHIE; HEWITT, 1999; OWEN, 1967a; 1967b), pois, segundo Dal Ri
(2012), negavam a educação hegemônica.
Havia o que Owen denomina nova instituição, que seria um espaço
destinado à educação infantil. Este seria um espaço com play-ground des-
tinado às crianças, tão logo tivessem condições de se locomoverem
sozinhas. Ficariam sob supervisão e seriam “[...] preparadas
Cláudio Rodrigues da Silva | 41

gradualmente para o recebimento e a retenção de sólidos hábitos sociais.”


(OWEN, 1967b, p. 288)5.
Além dessa, Owen (1967a; 1967b) faz referências a dois estágios ou
gradações de escolas, quais sejam, a primária e secundária, que compo-
riam a Instituição para a Formação do Caráter. Defende que crianças a
partir de três anos de idade devem frequentar a escola e que ocorram, a
partir dos cinco anos, os rudimentos da aprendizagem comum. Aos dez
anos seria completado o processo de escolarização regular e as pessoas já
poderiam entrar na obra.
Os socialistas utópicos, mais especificamente os owenistas, influenci-
aram outros movimentos de trabalhadores, especialmente algumas
lideranças. Suas iniciativas tiveram amplas repercussão e adesão, em es-
pecial de segmentos das classes trabalhadoras, tanto britânicas, quanto de
outros países (ENGELS, 2008; HARRISON, 1968; MARX, 1984; MORTON;
TATE, 1968; TEIXEIRA, 2002).

1.3 Notas sobre o Movimento Cartista

O Movimento Cartista foi organizado como forma de resistência e de


luta contra a situação a que estavam expostos amplos setores das classes
trabalhadoras e atuou no âmbito da Grã-Bretanha, mais especificamente
na Inglaterra. O cartismo teve grande expressividade nas décadas de 1830
e 1840 e ficou conhecido por esse nome em decorrência da Carta do Povo,
documento encaminhado pelo movimento ao parlamento inglês contendo
várias reivindicações políticas. Do termo Carta derivam as expressões car-
tismo e cartista (ABENDROTH, 2007; DOLLÉANS, 1949; FLETT, 2006;
HOVELL, 1925; LINTON, 1895).

5
Tradução livre dos textos em inglês.
42 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

O Cartismo comportava duas grandes tendências em seu interior.


Havia a ala da força física e a ala da força moral, que tinham entre as prin-
cipais lideranças, respectivamente, Feargus Edward O’Connor (179?-1855)
e William Lovett (1800-1877). Várias das lideranças cartistas eram arte-
sãos com alta qualificação, seja profissional, seja acadêmica.
Engels (2008, p. 271), estabelecendo relações entre os owenistas e os
cartistas, entende que estes eram “[...] de longe, os mais atrasados e menos
evoluídos; mas [...] proletários autênticos, de carne e osso, e representam
legitimamente o proletariado.”
A Carta do Povo, elaborada por integrantes do cartismo e encami-
nhada para o Parlamento, apresentava seis reivindicações, quais sejam, o
sufrágio universal, a não exigência de propriedade para fins eleitorais, o
voto por intermédio de cédula ou escrutínio secreto, a renovação anual do
Parlamento, a igualdade entre distritos eleitorais e pagamento para os
membros do Parlamento.

Uma vez que os operários não respeitam a lei, mas apenas reconhecem sua
força enquanto eles mesmos não dispõem da força para mudá-la, é mais que
natural que avancem propostas para modificá-la, é mais que natural que, no
lugar da lei burguesa, queiram instaurar uma lei proletária. A proposta do
proletariado é a Carta do Povo (People’s Charter), cuja forma possui um
caráter exclusivamente político e exige uma base democrática para a Câmara
Alta. O cartismo é a forma condensada da oposição à burguesia. Nas
associações e nas greves, a oposição mantinha-se insulada, eram operários ou
grupos de operários isolados a combater burgueses isolados; nos poucos casos
em que a luta se generalizava, na base dessa generalização estava o cartismo
– neste, é toda a classe operária que se insurge contra a burguesia e que ataca,
em primeiro lugar, seu poder político, a muralha legal com que ela se protege.
(ENGELS, 2008, p. 262, grifos do autor)
Cláudio Rodrigues da Silva | 43

No entendimento dos cartistas, esses seis pontos, se atendidos, pos-


sibilitariam a todos os homens, indistintamente, o direito de votarem e de
serem votados, o que abriria espaço para que as classes trabalhadoras pas-
sassem a participar dos processos decisórios do Estado e, com isso, em
certa medida, a decidirem sobre questões que diziam respeito e impacta-
vam diretamente nas suas condições de vida, já que, até então, os
trabalhadores estavam excluídos dos direitos políticos (DOLLÉANS, 1949;
FLETT, 2006; LOVETT; COLLINS, 1840; VALADARES, 1993).
A implementação dos pontos da Carta seria indispensável para a con-
quista da igualdade política que, no entendimento dos cartistas, era
condição principal que permitiria realizar reformas radicais nas demais
instâncias sociais.

Os direitos políticos do homem são, em primeiro lugar, um direito como


membro da sociedade, direito de ter a sua pessoa e seus bens garantidos, para
determinar, em conjunto com seus semelhantes, como essas leis devem ser
executadas e seu poder de enquadramento, em segundo lugar, para unir-se a
eles na nomeção e investidura do governo, com plenos poderes para impor a
obediência às leis e para obter de cada um a sua parte da despesa nacional, em
terceiro lugar, o direito à liberdade de expressão, à liberdade de imprensa e de
reunião pública, de modo a influenciar os seus irmãos a favor de qualquer
medida que se conceba como uma melhoria nos arranjos da sociedade ou das
instituições de governo. (LOVETT; COLLINS, 1840, p. 77)6

O cartismo tinha entre seus principais objetivos a conquista da igual-


dade de direito político entre as pessoas, com vistas à luta e à conquista de
outros direitos. As alterações no sistema de representação eleitoral permi-
tiriam, no entendimento deste Movimento, uma reforma radical da
sociedade e, assim, melhorar as leis, reparar injustiças e conquistar a

6
Tradução livre dos textos em inglês.
44 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

emancipação política das classes trabalhadoras (FLETT, 2006; HOVELL,


1925; LOVETT; COLLINS, 1840). Em última análise, o cartismo extrapola
o âmbito da democracia política, pois, segundo Engels (2008, p. 263), “O
cartista inglês, politicamente, é um republicano, [...] porém, um republi-
cano puro e simples: sua democracia não se restringe apenas ao plano
político.”
Entretanto, para além da Carta, o Movimento se envolvia também
com questões políticas mais prementes e pontuais que, à época, também
tinham sérios impactos sobre as condições de vida das classes trabalhado-
ras, como, por exemplo, a Lei dos Cereais, a Lei das Fábricas, a Lei dos
Pobres, entre outras (ABENDROTH, 2007; ENGELS, 2008; MORTON;
TATE, 1968; VALADARES, 1993). Conforme Dal Ri (2013, p. 13),

Apesar da derrota estratégica, pois a plataforma democrática radical do car-


tismo não foi aprovada pelo Parlamento, o movimento conseguiu várias
vitórias parciais importantes, tais como: a primeira lei de proteção ao trabalho
infantil (1833); a lei de imprensa (1836); a reforma do Código Penal (1837); a
Lei sobre as Minas (1842); a Lei sobre as Fábricas (1844); a regulamentação
do trabalho feminino e infantil; a lei de supressão dos direitos sobre os cereais;
a lei permitindo as associações políticas e a lei da jornada de trabalho de 10
horas. Além disso, foi na linha de sua tradição de luta que uma nova Lei da
Reforma foi aprovada em 1867.

Se se considerar que o principal e mais citado documento deste Mo-


vimento é a denominada Carta do Povo, ainda que não haja menção
explícita ao regime econômico visado, esse documento, em termos, deixa
claro que o sistema de governo almejado é uma democracia na qual as
pessoas, independentemente da classe social, tivessem igual direito de par-
ticipação nos processos decisórios do Estado.
A organização cartista, a Associação Nacional do Reino Unido, foi pro-
posta por Lovett e Collins (1840) e tinha entre seus objetivos congregar
Cláudio Rodrigues da Silva | 45

pessoas interessadas na promoção da melhoria social e política do povo do


Reino Unido, divulgar os objetivos da Associação, conquistar novas ade-
sões populares à Carta para conseguir a implementação de seus princípios
e, com isso, franquear os direitos políticos às classes trabalhadoras, passo
elementar para a consecução de uma reforma política e social (DAL RI,
2013; HOVELL, 1925).
Por negarem a educação oficial, os cartistas tinham concepção de
educação própria e abriram escolas (DAL RI, 2012; 2013; ENGELS, 2008;
FLETT, 2006; HOVELL, 1925).
Flett (2006, p. 101) faz um mapeamento – nome e localização – de
escolas radicais em atividade em Londres no ano de 1849. Entre elas consta
a de Willian Lovett, importante liderança cartista.

• The John Street Institute, Fitzroy Square (off Tottenham Court Road) WCl.
• Birkbeck School, London Mechanics' Institute, Southampton Buildings, Chan-
cery Lane, WC2.
• Birkbeck School, City Road, Finsbury, EC I.
• Ellis's Academy, George St, Euston Square, NWI.
• Stanton's Day School, City o f London Mechanics' Institute, Gould Square,
Crutched Friars, EC3.
• Mutual Instruction Society, Circus St, New Road, Marylebone, NWl.
• Finsbury Mutual Instruction Society, 66 I3unhill Row, ECl.
• Soho Mutual Improvement Society, 2 Little Dean St, Wl.
• Eclectic Institute, 72 Newman St, Oxford St, W I. 242 High Holborn, WCl.
The National Hall under the proprietor ship of William Lovett.

Flett (2006, p. 101-102) apresenta também um mapeamento de al-


guns dos principais pontos de encontro de pessoas ou integrantes de
movimentos que defendiam ou lutavam por mudanças políticas radicais,
à época.
46 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

• Hall of Science, City Rd, ECl.


• Finsbury lnstitution, Bunhill Row, ECl.
• General Secular Reformers Society, Leather Lane, Holborn and High Holborn,
WCl.
• Metropolitan lnstitute, John Street, WCl.
• South London Secular Society, Blackfriars Road, SEI.
• Society of Materialists, Paddington and Marylebone, NWl.
• Society of Free Inquirers, Euston, NWl.

No que se refere à educação, a Associação tinha por objetivo a cons-


trução de salões e de escolas em todo o Reino, em conformidade com os
princípios e regulamento aprovados por seus membros. Seria propiciada
uma educação que abrangesse os aspectos físicos, mentais, morais e polí-
ticos, visando a atender pessoas de diferentes faixas etárias (DAL RI, 2013;
FLETT, 2006; HOVELL, 1925; LOVETT; COLLINS, 1840).
A escola infantil abrangeria pessoas dos três aos seis anos; a escola
preparatória, pessoas dos seis aos nove, e a escola média, pessoas a partir
dos nove anos. Além dessas, haveria ainda escolas agrícolas e industriais,
para educar, instruir e apoiar crianças órfãs da Associação em ofícios úteis,
e também escola para formação de professores, em conformidade com os
princípios e regulamentos da Associação (DAL RI, 2013; HOVELL, 1925;
LOVETT; COLLINS, 1840).
Em relação aos cartistas, foi identificada como principal influência
Cartwright, já que teriam recolocado na ordem do dia a Carta do Povo.
“Cartwritght exigia neste panfleto [...] [parlamentos] anuais, o sufrágio
universal, o voto por escrutínio secreto, a igual representação e o paga-
mento a seus membros.” (MORTON; TATE, 1968, p. 14). Outras possíveis
influências seriam as de Combe, Godwin, Hodgskin, Lancaster, Pestalozzi,
Shelley, Smith, Southwood e Wilderspin (HOVELL, 1925; LOVETT;
COLLINS, 1840).
Cláudio Rodrigues da Silva | 47

Os cartistas tiveram importante influência entre amplos setores das


classes trabalhadoras. Indicativo disso é a quantidade de assinaturas ou
adesões à Carta e a outras iniciativas desse Movimento, cujas influências e
repercussões abrangeram vários países de diferentes continentes
(ENGELS, 2008; HOVELL, 1925; MORTON; TATE, 1968; VALADARES,
1993).

1.4 Conjuntura de fundação e atuação do MST

O MST foi fundado oficialmente na década de 1980, marcada por


efervescência política, principalmente pela luta contra a ditadura civil-mi-
litar e, por conseguinte, pela, democratização ou redemocratização do país.
Esse regime, vigente desde o golpe de 1964, já passava por um processo de
esgotamento por diversos fatores, sendo oficialmente finalizado em 1985,
dando início à Nova República.

O MST teve sua gestação no período de 1979 a 1984, e foi criado formalmente
no Primeiro Encontro Nacional de Trabalhadores Sem Terra que aconteceu de
20 a 22 de janeiro de 1984, em Cascavel, no Estado do Paraná. Esse encontro
teve a participação de trabalhadores rurais de doze estados, onde já se desen-
volviam ocupações ou outras formas de luta ou de resistência na terra, bem
como de diversas entidades que se colocavam como apoiadoras ou, em alguns
casos, articuladoras dessas lutas. (CALDART, 2004, p. 101-102)

Desde o final da década de 1970, eram registrados altos e crescentes


índices de inflação e desemprego, desdobramentos da denominada década
perdida, com crescentes manifestações populares e grandes greves de di-
ferentes categorias de trabalhadores (JEZUS, 2010; LEROY, 2009; SADER,
1995; WELCH, 2009). Conforme Paula e Silva (2009), “[...] a partir da dé-
cada de 1970 a luta pela terra passa a ocupar um lugar central nos conflitos
agrários.”
48 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

A recessão continuava e a inflação disparava. Saques, depredações, manifesta-


ções e greves se sucediam. A democracia, no sentido de encontro entre as
aspirações e as manifestações populares e a política parecia, então, possível,
pois estava sendo ensaiada nas ruas e nos palcos pelas diretas. Em novembro
de 1983, realiza-se a primeira grande manifestação pelas eleições diretas para
a presidência da República. As elites cuidavam para que a política saísse da
praça e voltasse aos recintos fechados dos palácios. (LEROY, 2009, p. 259)

Cresciam as manifestações populares contra o regime ditatorial e as


reivindicações por eleições diretas e democráticas para o Legislativo e Exe-
cutivo nas três esferas de governo. Esse processo culminou no fim do
regime civil-militar e na transferência, por meio de eleição indireta, do Po-
der Executivo Federal a governantes civis.
Na década de 1980, em especial em sua primeira metade, foram or-
ganizados diversos movimentos sociais e coletivos de trabalhadores, que
tiveram importante participação no processo de contestação ao regime,
contribuindo, assim, para a democratização do país. No entendimento de
Sader (1995), trata-se de momento histórico em que novos personagens
entram em cena.

A Constituição de 1988 foi um marco no ressurgimento e recrudescimento da


disputa pela terra, refletindo-se nas organizações profissionais [...]. O seu
anúncio detona a busca por formalizações de sindicatos, reforçando os meca-
nismos de mediação e da necessidade de delimitação de interesses
diferenciados e contraditórios entre os próprios camponeses. (GUERRA, 2009,
p. 136)

Segundo Caldart (2004, p. 106), para compreender o surgimento do


MST deve ser relevada também a conjuntura política do Brasil naquele
período, “[...] considerado um momento forte no processo de redemocra-
tização do país. O povo brasileiro começava a reagir contra a ditadura
Cláudio Rodrigues da Silva | 49

militar e multiplicavam-se as lutas e as organizações de trabalhadores, es-


pecialmente nas cidades.”
Alguns desses movimentos já estavam num processo de gestação
desde décadas anteriores. Todavia, em decorrência das medidas forte-
mente repressivas, decorrentes do estado de exceção do regime ditatorial,
eram raros os movimentos ou coletivos que ousavam exposição e enfren-
tamentos mais ostensivos e intensos. “Como reflete Stédile, o MST
somente pôde se constituir como um movimento social importante porque
coincidiu com um processo mais amplo de luta pela democracia no país,
marcado especialmente pelo ressurgimento das greves operárias de 1978
e 1979.” (CALDART, 2004, p. 106).

O general Geisel consagrou o último ano do seu governo à viabilização da


‘abertura lenta, gradual e segura’. Nasceram associações de moradores com-
bativas e o Movimento contra a Carestia; reorganizou-se a UNE; 245 mil
operários fizeram a greve dos ‘braços cruzados, máquinas paradas’. [...] Res-
taurou-se o habeas corpus e eliminou-se o Ato Institucional nº 5. (LEROY,
2009, p. 255)

Com a progressiva atenuação das medidas repressivas nos anos finais


daquele regime, vários movimentos ou coletivos de trabalhadores se for-
talecem e passam a ter atuações mais ostensivas e incisivas. Aqueles
movimentos que, apesar dos riscos e da repressão, já adotavam posturas
de desafios e enfrentamentos contra o regime vigente, tornam-se mais for-
tes e combativos e ganharam maiores repercussão e representatividade,
tanto em âmbito nacional, quanto internacional. Entre esses movimentos
destaca-se o MST.
Ressalta-se, no entanto, que o Brasil registra certa tradição de resis-
tência e auto-organização entre alguns setores de trabalhadores urbanos
e rurais. Segundo Reis (2009, p. 265), “A ocorrência de lutas sociais de
50 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

pequenos produtores rurais ao longo de toda a história brasileira é um


dado inquestionável, ainda que essas lutas tenham sido escamoteadas e
mal contadas pela ‘história oficial’.”
Inclusive em decorrência do histórico de constante instabilidade po-
lítica no país, cuja história é marcada por golpes de Estado, ditaduras e
outras práticas típicas de estado de exceção, setores das classes trabalha-
doras se empenharam na luta pelo processo de democratização do país.
O Brasil é historicamente marcado por extremas desigualdades soci-
ais, como, por exemplo, grandes concentrações de terras7, por
conseguinte, alta concentração de renda, além de outras situações que re-
sultaram em maior precarização das condições de vida para os
trabalhadores.
Para Caldart (2004, p. 107), há “[...] uma trajetória de luta pela terra
nos quase cinco séculos de latifúndio em nosso país.”

O MST é um dos herdeiros do processo histórico de resistência e de luta do


campesinato brasileiro. É parte da história da luta pela terra no Brasil, assim
como das lutas já realizadas em outros lugares e em outras épocas, onde a
exploração ou a exclusão social dos camponeses também foi uma realidade.
(CALDART, 2004, p. 107)

Assim, é recorrente na história do Brasil, em especial a partir do mo-


mento de transição para o regime republicano de governo, a organização
de movimentos populares de resistência à ordem vigente e à situação a
que eram submetidos amplos setores das classes trabalhadoras.

Assim se constituiu a base social que gerou ou que permitiu o nascimento do


MST: do aumento brusco da concentração da propriedade da terra e do nú-
mero de trabalhadores rurais sem-terra, com destaque em determinadas

7
Ferraro (2009 apud PERES, 2012) aponta relações entre latifúndio, concentração de renda e analfabetismo.
Cláudio Rodrigues da Silva | 51

regiões; do fechamento progressivo das alternativas que poderiam amenizar


essa condição, gerando insegurança e miséria entre uma população acostu-
mada a viver com um certo nível de estabilidade e, talvez por isso mesmo,
também acostumada a seguir os tradicionais preceitos da ordem e progresso,
o que fez inclusive apoiar por muito tempo a ditadura militar. O MST é fruto
das iniciativas de reação a essa situação objetiva. Uma situação nova nos traços
de sua conjuntura, mas muito antiga do ponto de vista da estrutura social bra-
sileira que desnuda, historicamente baseada na concentração fundiária.
(CALDART, 2004, p. 104)

O Brasil é um país marcado por tensões e conflitos sociais das mais


variadas ordens, em especial no campo (CUNHA, 2007; STEDILE, 2000).
Setores das classes trabalhadoras, conforme as conjunturas e respectivos
objetivos e visões de mundo, procuraram resistir a determinadas situações
e imposições ou mesmo realizar transformações sociais radicais.
As resistências ou enfrentamentos se deram por intermédio de con-
flitos armados ou não, denúncias, encontros, manifestações, marchas,
mobilizações, ocupações, passeatas, greves, guerrilhas, dentre outros.
Além disso, algumas organizações faziam uso de boletins, cartas, cartilhas,
jornais, panfletos, recursos audiovisuais, petições, entre outros, como for-
mas complementares de luta e com vistas ao processo de conscientização
e à arregimentação de trabalhadores.
Setores de trabalhadores organizaram associações, conselhos, coope-
rativas, escolas (para ensino de conhecimentos técnico-científicos e,
principalmente, formação política), movimentos, sindicatos, ligas, parti-
dos políticos, uniões, entre outros. Em determinados momentos, essas
organizações não eram reconhecidas ou então eram fechadas ou lançadas
na ilegalidade pelo Estado, conforme a conjuntura.
Trabalhadores integrantes dessas organizações, em especial as lide-
ranças, sofreram ataques, perseguições e repressões das mais diversas
52 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

formas e intensidades, em conformidade ou não com o previsto pela legis-


lação e pelo dito Estado Democrático de Direito, tanto da parte dos
aparelhos repressivos do Estado, quanto da parte dos aparatos privados
das classes hegemônicas, seja isoladamente ou em colaboração com agen-
tes estatais – Forças Armadas ou Auxiliares – e privados, como, por
exemplo, jagunços, milícias, entre outros.
As violências eram das mais variadas formas e nas mais variadas in-
tensidades, como, por exemplo, agressões, ameaças de morte a lideranças,
militantes, trabalhadores ou a seus familiais, atentados, assassinatos, des-
pejos e expulsões violentas, destruições e incêndios de casas e colheitas,
ferimentos provocados por armas de fogo, migrações compulsórias, pri-
sões ilegais, sequestros, torturas, entre outras (ECKERT, 2009; ESTERCI,
2009; FERNANDES; MEDEIROS; PAULILO, 2009; GRYNSZPAN, 2009;
LEROY, 2009; PALMEIRA, 2009; PAULA; SILVA, 2009; SCOLESE, 2008;
SIGAUD, 2009; SILVA, 2009; WELCH, 2009).
Entre os principais móbeis de lutas estavam a reforma agrária radi-
cal, a democratização do país, o direito a condições elementares de vida
(saúde, habitação, trabalho, educação, entre outros), agravadas pelo arro-
cho salarial e pelo crônico e crescente processo inflacionário.

Era uma conjuntura de crise econômica, de grandes transformações na agri-


cultura [...]. Essa crise e essas transformações abriram brechas para a luta pela
terra e para o crescimento dos movimentos de massas urbanos que lutavam
pela democratização do país. (STEDILE; FERNANDES, 2001, p. 65)

Alguns movimentos tinham como objetivos questões mais imediatas


ou pragmáticas para fins de sobrevivência ou de vida com alguma digni-
dade. Outros movimentos, além desses objetivos, tinham em vista
transformações sócio-político-econômicas radicais, colocando em tela in-
clusive a revolução socialista. Entretanto, em algumas dessas
Cláudio Rodrigues da Silva | 53

organizações, os trabalhadores, embrionariamente ou não, visavam ou


pautavam suas ações por princípios, tais como solidariedade, ajuda mútua,
reciprocidade, coletividade, cooperação, sendo as decisões tomadas demo-
craticamente em assembleias ou conselhos com a participação direta dos
trabalhadores integrantes (CUNHA, 2009; ESTERCI, 2009; GRYNSZPAN,
2009; LEROY, 2009; PAULA; SILVA, 2009; REIS, 2009; SCOLESE, 2008;
SILVA, 2009; WELCH, 2009).
Destacam-se alguns dados, com vistas a apresentar uma breve pano-
râmica da educação escolar oficial estatal no contexto de fundação e
atuação do MST.
No que se refere ao analfabetismo entre pessoas a partir de 15 anos,
segundo o IBGE ([19--]), o Brasil apresentava, na década de 1970, 33,60%,
e na de 1980, 25,50% de populações analfabetas.
Nos anos 1990, quando o MST dá início à implementação de projeto
próprio de educação, o índice de analfabetismo no Brasil era de 20,10% e,
nas décadas seguintes, 2000 e 2010, os índices foram, respectivamente,
13,60% e 9,6%. Entretanto, esses índices têm especificidades, quando
analisados em relação a diferentes Regiões e Unidades da Federação, bem
como se se considerar áreas urbanas e rurais, sexo, etnia, idade, faixas de
renda, entre outras variáveis (IBGE, [19--]; 2011a; 2011b).
Na década de 1990 e nas seguintes, em especial quando a LDB/1996
foi promulgada, verifica-se, segundo Cury (1997) e Grossi (1997), certo re-
fluxo em relação aos avanços conquistados na Constituição Federal de
1988 (CF/1988) (BRASIL, 1988). A Emenda Constitucional número 14
(BRASIL, 1996a) exemplifica isso.
No decorrer do século XX e no início do XXI, diversas reformas e po-
líticas educacionais, inclusive duas Leis de Diretrizes e Bases – 1961 e 1996
–, foram implementadas, sem que históricas questões básicas e prementes
da educação escolar, como, por exemplo, o analfabetismo, fossem
54 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

resolvidas, considerando-se indicadores oficiais atuais, como, por exem-


plo, do IBGE (IBGE, [19--]; 2011a; 2011b).
Passadas quase três décadas de promulgação da CF/1988 e quase
duas décadas do decreto da LDB/1996, embora tenha havido a quase uni-
versalização do acesso ao Ensino Fundamental (IBGE, [19--]; 2011a;
2011b), velhas questões são transformadas em novas pautas e novos obje-
tos de novas políticas educacionais, porém, sem resolução efetiva.
Como exemplo desses problemas históricos vale citar a questão da
qualidade da educação escolar, em termos de ensino-e-aprendizagem de
conteúdos mais elementares – quase consensualmente entendidos como
especificidade da escola, como, por exemplo, leitura, escrita e cálculo –, os
altos índices de analfabetismo, em especial entre alguns segmentos das
populações, além do denominado analfabetismo funcional.
Aproximadamente um século após as primeiras políticas educacio-
nais visando à massificação da educação escolar estatal, seja nas áreas
urbanas, seja nas áreas rurais8, os indicadores oficiais do Governo Federal
brasileiro apontam que o acesso ao Ensino Fundamental foi quase univer-
salizado no Brasil (IBGE, [19--]; 2011a; 2011b).
Porém, em termos pedagógicos, isto é, de ensino-e-aprendizagem, a
qualidade da educação escolar, para significativo percentual das classes
trabalhadoras, está aquém do que os próprios documentos oficiais estatais
consideram satisfatório ou adequado, como é o caso, por exemplo, do Es-
tado de São Paulo (SÃO PAULO, 2011a).
O que tem ocorrido é a quase universalização do acesso – que não
necessariamente resulta em apropriação dos conhecimentos por todos – à

8
No Brasil, as primeiras políticas educacionais para as massas em áreas urbanas datam do contexto da Proclamação
da República (REIS FILHO, 1981; SOUZA, 1998) e, para as áreas rurais, com variações conforme as Unidades da
Federação, datam, como é o caso do Estado de São Paulo, da década de 1930 (ÁVILA, 2013; MORAES, 2019; SOUZA,
2009).
Cláudio Rodrigues da Silva | 55

escola de Ensino Fundamental, o que é diferente de democratizar a educa-


ção, visto que “[...] o ensino público, no geral, é tão ruim que compromete
a sua generalização.” (DAL RI; VIEITEZ, 2008, p. 26).
Especificamente em relação à educação escolar no campo, mais dire-
tamente relacionada ao foco de atuação do MST, o que se verifica na
atualidade é o processo de fechamento de escolas localizadas nessas áreas
(BRANDÃO, 2012; CASA, 2005; MST, 2009; 2011b; TORRES; SILVA;
MORAES, 2014), o que tem ou pode ter diversos impactos negativos para
a educação e para o trabalho de populações do campo, em especial para
trabalhadores de faixas de rendas mais baixas.
Povos do campo foram historicamente marginalizados9 em relação à
educação escolar (ARROYO, 2004; MORAES, 2019).

Essa visão poderia ser uma síntese da história do pensamento político e edu-
cacional ao longo do século 20: a escola rural apenas das primeiras letras,
milhões de camponeses condenados ao analfabetismo, a educação básica do
campo ignorada e marginalizada. Ignorada inclusive pelas pesquisas, pela re-
flexão pedagógica, pelas propostas curriculares e até pelas Leis de Diretrizes e
Bases da educação Nacional. (ARROYO, 2004, p. 7)

Essa política pode ainda ter diversos impactos negativos para a edu-
cação e a pedagogia do MST, haja vista a especificidade de seu processo
educativo. O Movimento reage a essa política com a campanha “Fechar
escola é crime!” (MST, 2009; 2011b).
Além da dimensão político-ideológica e das implicações para o pro-
jeto educativo do MST, a instalação, a manutenção, o funcionamento ou o
fechamento de escolas e outros equipamentos públicos podem impactar
direta ou indiretamente nas condições materiais de vida dos trabalhadores

9
Coutinho (2008) faz menção ao fato de parte significativa dessas populações ter sido, durante décadas, excluída do
direito ao voto, haja vista a proibição desse direito a pessoas não alfabetizadas.
56 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

do campo e, portanto, na viabilidade do projeto de reforma agrária no Bra-


sil.
As denominadas políticas públicas10, por conseguinte, os equipamen-
tos públicos, como, por exemplo, as escolas, fazem parte da dinâmica de
acumulação e de reprodução do capital, estando, portanto, sujeitas às cor-
relações de forças, bem como à dinâmica da luta de classes em cada
momento histórico (KOWARICK, 1979; 2000; MAUTNER, 1999).
Após numerosas reformas e iniciativas no âmbito das políticas edu-
cacionais no Brasil, questões que datam de várias décadas ou praticamente
um século continuam presentes no cenário nacional11. Algumas dessas an-
tigas questões são comumente entendidas ou apresentadas por
governantes, partidos políticos, organizações, movimentos ou coletivos de
diferentes matrizes político-ideológicas, como questões novas ou atuais,
ou seja, não se faz menção ao fato de permearem a educação escolar des-
tinada às classes trabalhadoras desde o século XIX, mesmo antes da
constituição ou da ampliação do sistema escolar estatal, com o objetivo de
massificação da educação escolar.
Como aponta Engels (2008), não havia alternativa de educação que
atendesse adequadamente aos trabalhadores, sejam as escolas dominicais
religiosas, sejam as escolas oferecidas – por força da Lei das Fábricas – por

10
Considerando-se as implicações com as categorias público e estatal (MINTO, 2005; SANFELICE, 2005b), o que
hegemonicamente são apresentadas como políticas públicas seriam, em última instância, políticas de governo ou de
Estado. Oliveira (2011, p, 329) considera que políticas de governo “[...] são aquelas que o Executivo decide num
processo elementar de formulação e implementação de determinadas medidas e programas, visando responder as
demandas da agenda política interna, ainda que envolvam escolhas complexas.” Segundo essa autora (2011, p. 329),
políticas de Estado “[...] são aquelas que envolvem mais de uma agência do Estado, passando em geral pelo
Parlamento ou por instâncias diversas de discussão, resultando em mudanças de outras normas ou disposições
preexistentes, com incidência em setores mais amplos da sociedade.”
11
Várias dessas questões não são exclusividade de países periféricos do capitalismo, ou seja, atingem, em maior ou
menor grau, também amplos setores das classes trabalhadoras de países centrais (ESTEVE, 1999; TORRES
SANTOMÉ, 2003). Entretanto, questões como índice de analfabetismo, analfabetismo funcional, evasão, níveis de
escolaridade (para além do Ensino Fundamental), entre outros, em tese, não são coerentes com a posição do Brasil
em termos de economia, de posição no ranking mundial de Produto Interno Bruto (PIB), e em termos de posição no
ranking de educação escolar, posições essas muito discrepantes, se comparadas a outros países com PIB menor ou
aproximado ao brasileiro (RODRIGUES NETO, 2012).
Cláudio Rodrigues da Silva | 57

industriais, cuja concepção de educação, tanto em termos ideológicos,


quanto em termos de qualidade do ensino, divergia da concepção de seto-
res dos movimentos sociais de trabalhadores.
Assim como reivindicavam educação laica, mas, diante da falta de al-
ternativas, recorriam a escolas dominicais religiosas, setores organizados
das classes trabalhadoras, como, por exemplo, os Movimentos sociais
mencionados, recusavam, ou seja, negavam a educação hegemônica pro-
piciada nos âmbitos religioso, fabril ou estatal. Todavia, diante da
inviabilidade, especialmente financeira, de execução ou de manutenção de
um projeto próprio de educação, trabalhadores passaram a cobrar do Es-
tado um sistema de educação escolar franqueado às massas.
Entretanto, da parte de alguns setores das classes trabalhadoras, di-
ante dessa inviabilidade, o que se pretendia era uma educação escolar
custeada pelo Estado, mas sob gestão dos trabalhadores (DAL RI, 2004;
SANFELICE, 2005a). Contudo, iniciativas de autoeducação, ainda que pon-
tuais ou incipientes, estiveram presentes em movimentos sociais de
trabalhadores desde o início do processo de formação da classe operária,
em especial após a Revolução Industrial (DAL RI, 2012; 2013; ENGELS,
2008; THOMPSON, 1987c).
Atualmente, velhas receitas, já demonstradas inócuas ou ineficazes,
são, às vezes com algumas modificações, (re)apresentadas e entendidas
como novas, eficientes e eficazes. Passados alguns séculos do Iluminismo,
a educação escolar isoladamente – ou seja, tão somente a educação escolar
–, continua a ser entendida e apresentada como panaceia para todos os
problemas conjunturais e estruturais de toda e qualquer formação social
(LOMBARDI, 2006; 2011; REIS FILHO, 1981). No entendimento de Lom-
bardi (2006, p. 4),
58 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

O discurso da educação como panacéia para todos os males é muito antigo. Ele
nasceu com a sociedade capitalista, como parte de um discurso ideológico pro-
duzido para atribuir à escola um papel central no cuidado com a infância, com
a transmissão de saberes considerados socialmente relevantes, com a forma-
ção do cidadão e com a qualificação do trabalhador. Apareceu já com essa
característica geral, abstrata, a-histórica, como se essa escola sempre tivesse
existido, cumprido um papel central no desenvolvimento e na vida dos indiví-
duos. No Brasil isso não foi diferente, pois desde o Império esse repetitivo
discurso de que ‘a educação é fundamental para...’ sempre esteve presente,
sendo acionado para justificar a diferença de desenvolvimento econômico e
social, em comparação com os chamados países desenvolvidos.

No entanto, a tese da educação escolar enquanto panaceia é um ar-


gumento falacioso.

Sabemos muito bem que a educação não tem todo esse poder de determinar
os rumos da sociedade. Reduz tudo a um aspecto, ideologicamente escamote-
ando que sem uma profunda transformação econômica, política e social, pouco
avançaremos na resolução dos graves problemas gestados pelo próprio desen-
volvimento da sociedade burguesa – como a miséria, as guerras, a destruição
do meio ambiente, o desemprego estrutural e outros. (LOMBARDI, 2006, p. 4)

O MST não adota essa abordagem; além disso, tem uma concepção
própria e diferenciada de educação e de pedagogia (DAL RI, 2004; DAL RI;
VIEITEZ, 2008). Todavia, o objetivo do MST não se restringe a propiciar a
seus integrantes – direção, militância, base e massa –, educação escolar de
qualidade, eficiente e eficaz, ou seja, que resulte ou garanta efetivo apren-
dizado dos conhecimentos técnico-científicos em conformidade com a
concepção hegemônica. A apropriação dos conhecimentos técnico-cientí-
ficos é considerada importante pelo MST, porém, não é o único nem o
objetivo maior ou final do Movimento, que dedica especial atenção à di-
mensão político-ideológica da educação. Além disso, o MST nega
Cláudio Rodrigues da Silva | 59

dialeticamente o ensino oficial (DAL RI, 2012), tanto no que se refere a


conteúdos, quanto a metodologias, além de outros aspectos curriculares.
Em linhas gerais, é nesse contexto sócio-político-econômico que o
MST é fundado e passa a atuar.

1.5 Notas sobre o MST

O MST foi fundado oficialmente em 1984 e tem como objetivo prin-


cipal a organização dos trabalhadores na luta em prol da reforma agrária
no Brasil. Entretanto, o Movimento é decorrência de um processo de ges-
tação que contou com o aporte de movimentos e lutas anteriores. “O
Movimento [...] é filho das lutas pela democratização da terra e da socie-
dade. No final da década de 1970, quando as contradições do modelo
agrícola se tornam mais intensas e sofrem com a violência de Estado, res-
surgem as ocupações de terra.” (MST, 2010, p. 9).
Conforme o Movimento (2010, p. 9),

Em setembro de 1979, centenas de agricultores ocupam as granjas Macali e


Brilhante, no Rio Grande do Sul. Em 1981, um novo acampamento surge no
mesmo estado e próximo dessas áreas: a Encruzilhada Natalino, que se tornou
símbolo da luta de resistência à ditadura militar, agregando em torno de si a
sociedade civil que exigia um regime democrático. Em todo o país, novos focos
de resistência à ditadura das armas e das terras surgiram: posseiros, arrenda-
tários, assalariados, meeiros, atingidos por barragens.

No ano de 1984, em um encontro nacional realizado no Município de


Cascavel, Estado do Paraná, trabalhadores rurais envolvidos nesse pro-
cesso de luta pela democratização da terra e da sociedade “[...] decidem
fundar um movimento camponês nacional, o MST, com três objetivos
principais: lutar pela terra, lutar pela reforma agrária e lutar por mudan-
ças sociais no país.” (MST, 2010, p. 9).
60 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

O Movimento é, na atualidade, um dos principais movimentos sociais


de trabalhadores do Brasil e da América Latina.
O MST tem importante atuação em âmbito nacional. Entretanto, atua
de diferentes formas, também, em âmbito internacional, em cooperação
com outros movimentos, como, por exemplo, a Via Campesina, da qual faz
parte. Interage com outros movimentos de trabalhadores nacionais, entre
eles, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), o Movimento das
Fábricas Ocupadas (MFO), o Movimento dos Trabalhadores Desemprega-
dos (MTD) e o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), mesmo
porque, em última instância, alguns dos principais móbeis desses Movi-
mentos estão relacionados entre si (MAURO apud RUBBO, 2012; MST,
2010).
Considerando-se que, segundo Harrison (1968), toda teoria social é
um complexo de ideias, ou seja, parte de contribuições anteriores, torna-
se pertinente identificar quais são ou foram as principais influências des-
ses Movimentos.
As Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), o Movimento de Educação
de Base (MEB) e a Comissão Pastoral da Terra (CPT) – alas progressistas
da Igreja Católica, além da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB) – tiveram importante influência, em especial nos primórdios do
processo de formação política e escolar dos quadros do MST, antes e depois
da fundação desse Movimento.
Além de componentes da ala progressista da Igreja Católica, também
participam da CPT integrantes da Igreja Protestante de Confissão Lute-
rana, que tiveram importante contribuição no apoio aos trabalhadores
rurais e suas entidades que, anos mais tarde, formariam o MST
(CALDART, 2004; STEDILE; FERNANDES, 2001; WELCH, 2009). Entre-
tanto, posteriormente, o MST passa a adotar iniciativas para ter o controle
Cláudio Rodrigues da Silva | 61

do processo educativo dos próprios integrantes (DAL RI, 2004; STEDILE;


FERNANDES, 2001).
O MST (1999; 2001c), bem como alguns de seus intelectuais
(CALDART, 1997; MAURO apud RUBBO, 2012; STEDILE; FERNANDES,
2001), em diversos momentos, reiteram que Movimento aprendeu com a
história e com as experiências dos lutadores do povo ou das classes traba-
lhadoras, tanto do passado mais remoto, quanto do passado mais recente
ou mesmo com movimentos e lideranças contemporâneas. “Foi assim que
o Movimento se fez como é: aprendendo dos lutadores que vieram antes
[...]” (MST, 2001c, p. 37). Segundo Stedile (STEDILE; FERNANDES, 2001,
p. 57), “Não inventamos nada. [...] Os que vieram antes cometeram erros
e acertos. Procuramos aprender com eles, para não cometer os mesmos
erros e repetir os acertos.”
Reconhecem, ainda, que não inventaram uma educação ou uma pe-
dagogia, ainda que tenham criado uma nova forma de lidar com as teorias
existentes (CALDART, 1997; MST, 1999; STEDILE; FERNANDES, 2001). A
Pedagogia do Movimento é do MST, porém, “Isto não quer dizer que o
MST tenha inventado uma nova pedagogia, mas ao tentar produzir uma
educação do jeito do Movimento, os Sem Terra acabaram criando um novo
jeito de lidar com as matrizes pedagógicas ou com as pedagogias já cons-
truídas ao longo da história da humanidade.” (MST, 1999, p. 6, grifos do
autor).
Entretanto, foi necessária a construção de um projeto educativo com-
binando a escolarização com preocupações mais amplas, com a formação
humana e com a capacitação de militantes. Assim, em caráter de síntese,
o MST partiu de teorias pedagógicas existentes para constituir um projeto
pedagógico e educativo próprio (MST, 2001c).
Mauro (apud RUBBO, 2012, p. 23) destaca que já no primeiro Con-
gresso do MST “[...] a ideia era aprender com os processos organizativos
62 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

de luta dos outros países.” Duma perspectiva internacional, segundo


Mauro (apud RUBBO, 2012, p. 24),

A experiência da revolução cubana, nicaraguense, e depois, mais adiante, toda


a experiência acumulada na América Latina, Revolução Mexicana, a tentativa
de reforma agrária no Peru, o processo em El Salvador, enfim, as experiências
dos anos 1980 foram muito importantes para o nosso movimento.

Já em relação às contribuições nacionais, Mauro (apud RUBBO, 2012,


p. 28) destaca que

O MST consegue conjugar os ingredientes da mística revolucionária que res-


gata a experiência nicaraguense, cubana, a própria experiência bolchevique,
conjuga com isso as experiências históricas no Brasil, as lutas pela terra, Ca-
nudos, Quilombos, Ligas Camponesas, mas também com esse outro lado da
Teologia da Libertação que foi muito importante no surgimento do nosso Mo-
vimento. E isso evidentemente é o que conforma o MST como uma espécie de
síntese. Ele não é Igrejeiro. Ele conjuga vários ingredientes, no meu modo de
ver, positivos desses amplos processos de aprendizados desenvolvidos em di-
ferentes áreas.

Conforme Stedile (STEDILE; FERNANDES, 2001, p. 38),

Outra coisa que assimilamos [...] é ter abertura para aprender com os outros.
Nunca tivemos pretensão de ser os primeiros. Não estamos inventando o fogo.
Desde as primeiras lutas, sempre houve essa vocação de querer saber onde os
outros erraram, onde acertaram. Com o objetivo de aprender, fizemos várias
conversas, seja com os remanescentes dos líderes das Ligas Camponesas, da
ULTAB, do Master, seja com a CPT.

Stedile (STEDILE; FERNANDES, 2001) diz ainda que o Movimento


sempre teve abertura para aprender com os outros, desde sua gênese,
tanto com as organizações do Brasil, quanto com as organizações
Cláudio Rodrigues da Silva | 63

camponesas da América Latina. Além de diversos outros nomes, seja do


âmbito nacional, seja do internacional, de um passado mais mediato ou
mais imediato, Stedile aponta que

[...] fomos buscar nos pensadores clássicos de várias matrizes algo que pu-
desse contribuir com nossa luta. Lemos Lenin, Marx, Engels, Mao Tsé-Tung,
Rosa Luxemburgo. De uma forma ou de outra, captamos alguma coisa de to-
dos eles. Sempre tivemos uma luta ideológica e pedagógica dentro do
movimento de combater rótulos. (STEDILE; FERNANDES, 2001, p. 60)

Entretanto, o MST não copia, nem faz transposição mecânica dessas


experiências, mas faz adequações às diferentes realidades dos assenta-
mentos ou acampamentos e, nesse processo de adequação, consegue
algum avanço ou diferenciação (BALDUÍNO, 2001; CALDART, 1997; MST,
1999; MAURO apud RUBBO, 2012; STEDILE; FERNANDES, 2001). “A prá-
tica concreta da luta pela reforma agrária nos ensinou que não se pode
copiar experiências, porque cada espaço, cada realidade local, traz novos
elementos que vão sempre se recriando a partir do conhecimento já acu-
mulado.” (STEDILE; FERNANDES, 2001, p. 59).
Em documentos do MST são citados nominalmente Che Guevara, Fi-
del Castro, Florestan Fernandes, Gramsci, José Marti, Lenin, Leonardo
Boff, Makarenko, Pistrak, Marx, Paulo Freire, entre outros. Ainda que al-
guns sejam mencionados numa epígrafe, por exemplo, esses nomes dão
indicativos das influências teóricas e também da ideologia e da visão de
mundo desse Movimento.
Quanto à educação, para o MST a democratização dos conhecimentos
técnico-científicos é considerada tão importante quanto a democratização
da terra. Por isso, o Movimento, desde seus primórdios, investe na educa-
ção dos Sem Terra e “[...] luta desde 1984 pelo acesso à educação pública,
64 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

gratuita e de qualidade em todos os níveis para as crianças, jovens e adul-


tos de acampamentos e assentamentos.” (MST, 2010, p. 23).
O MST (2010) atua em todos os níveis e em diferentes modalidades
de ensino, seja formal, seja não formal. Na Educação Básica tem escolas
próprias de Educação Infantil, as Cirandas, e de Ensino Médio. Segundo o
Movimento (2010, p. 23), “Hoje, o trabalho com educação no MST está
organizado em todo o país, desde a educação infantil à educação superior,
em várias áreas do conhecimento.”

Os nossos esforços nessa área buscam, sobretudo, alfabetizar todos os compa-


nheiros e companheiras de acampamentos e assentamentos, e a conquista de
condições reais para que todas as crianças e adolescentes estejam na escola.
Para isso, é preciso capacitar e habilitar professores para que se tornem sabe-
dores das necessidades dos estudantes. (MST, 2010, p. 23)

Já no Ensino Superior, convênio com o Governo de Cuba resultou em


vagas para Sem Terra em curso de Medicina e, com o Governo da Vene-
zuela, em curso de Agroecologia (MST, 2010).
Em decorrência de convênios com universidades públicas, realiza
cursos adequados à realidade e às necessidades dos Sem Terra especial-
mente.

Por meio de parcerias com universidade públicas, trabalhadores e trabalhado-


ras rurais do MST estudam em 50 instituições de ensino. [...] São cursos
técnicos de nível médio (como Administração de Cooperativas, Saúde Comu-
nitária, Magistério e Agroecologia), cursos superiores e especializações (como
Pedagogia, Letras, Licenciatura em Educação do Campo, Ciências Agrárias,
Agronomia, Veterinária, Direito, Geografia, História). (MST, 2010, p. 24)

Para o MST é fundamental a garantia de apropriação dos conheci-


mentos técnico-científicos referentes aos diferentes níveis de ensino não
só por seus integrantes, mas por toda a classe trabalhadora.
Cláudio Rodrigues da Silva | 65

Feita essa breve introdução sobre as conjunturas de fundação e de


atuação, bem como de dados mais elementares dos Movimentos, no capí-
tulo seguinte são apresentadas questões mais específicas sobre os projetos
de educação desses Movimentos.
Capítulo II

Projetos próprios de educação

Neste capítulo analisa-se o princípio que trata da elaboração e imple-


mentação de um projeto próprio de educação conforme as necessidades e
as ideologias dos respectivos Movimentos sociais de trabalhadores anali-
sados nesta pesquisa – MST, owenistas e cartistas.
Dal Ri (2012) defende a tese de que os owenistas têm ideologia e visão
de mundo próprias.
Sendo um socialista utópico, Owen (1967a; 1967b; 2002) faz a crítica
ao sistema capitalista. No plano mais imediato, refuta e tenta remediar
especialmente alguns desdobramentos do capitalismo industrial que mais
atingiam negativamente significativos setores das classes trabalhadoras,
especialmente os britânicos, naquele momento histórico. No plano mais
mediato, o owenismo tem por objetivo a construção de uma nova ordem,
um novo sistema mundial, sintetizado na nova visão de sociedade, conce-
bida por Owen.

Sob o sistema atual isso nunca pode ser atingido, enquanto sob o sistema ver-
dadeiro e racional, que eu estou propondo agora a você, um eterno, bom e
mais benéfico emprego e ocupação, físico e mental, pode ser fornecido facil-
mente para todos os que desejá-lo, e em breve todos vão descobrir as muitas
e grandes vantagens para si e para todos os outros que eles irão experimentar
por estarem tão ocupados. E, em consequência de que nenhuma das classes
trabalhadoras está sendo forçada a viver ociosa, uma verdadeira riqueza abun-
dante em breve estará em todo lugar. (OWEN, 1967b, p. XV)

As mudanças sociais, na concepção de Owen (1967a; 1967b), deve-


riam ocorrer gradualmente, não pela revolução ou pela violência, mas,
Cláudio Rodrigues da Silva | 67

sim, pela conciliação dos interesses das classes sociais, ou seja, do capital
e do trabalho.
A vinculação entre trabalho e educação é uma das principais caracte-
rísticas do projeto owenista, especialmente porque, conforme as
respectivas classes ou faixas etárias, todas as pessoas seriam educadas
para estarem aptas ao exercício de todas as funções previstas para o novo
mundo moral (OWEN, 1967a; 1967b; 2002).
Para que essas mudanças ou transformações fossem concretizadas,
Owen (1967a; 1967b; 2002) aposta na formação de um caráter racional na
humanidade, principalmente pela vivência das relações sociais, nos mol-
des preconizados pela nova visão de sociedade, e por intermédio da
educação e do ensino, em especial das novas gerações, ainda não afetadas
pelos maus hábitos inerentes ao caráter irracional da velha sociedade.
A razão é um dos recorrentes valores mencionados nos escritos owe-
nistas. Com menor recorrência, também está presente nos textos cartistas
e, em certa medida, com outras categorias, também no MST. Isso se deve
principalmente ao fato de que, para aqueles Movimentos, a razão seria a
forma de se buscar ou de se chegar à verdade e, assim, evitar os mitos ou
as superstições que, até então, eram utilizados para fins de explicar, justi-
ficar ou legitimar o status quo. Um exemplo bastante emblemático disso
seria a tese do direito divino dos reis (TEIXEIRA, 2002).
Todavia, ainda que atribua também alta importância à educação,
Owen (1967a; 1967b; 2002), inclusive pelas matrizes teóricas que o teriam
influenciado, em especial o empirismo, atribui alta importância às circuns-
tâncias e ao ambiente, o que demandaria, simultaneamente, alterações
reais nas condições materiais de vida e na formação econômico-social.
Assim, não teria fundamento a tese de que os utópicos, por conse-
guinte, os owenistas, teriam conseguido ou apostado em mudanças
68 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

significativas em New Lanark unicamente por intermédio da educação1. A


educação era um dos componentes do processo de transformação social e,
por isso, estava articulada ao projeto societário. A articulação coerente en-
tre teoria e prática é ressaltada recorrentemente por Owen (1967a; 1967b).
Portanto, a concepção e a implementação de um projeto próprio de
educação adequado às respectivas ideologia e visão de mundo estavam
presentes no projeto educativo owenista, em especial nos ensaios que
Owen (1967b, p. 266) escreve com objetivo principalmente de “[...] ajudar
e encaminhar as investigações de importância vital para o bem-estar do
país e da sociedade em geral.”
Para o owenismo (1967a; 1967b), a nova educação para a nova socie-
dade deveria ser colocada em prática de imediato, visando especialmente
às novas gerações – bebês e crianças –, dada a dificuldade de mudança de
mentalidade, após internalizados e sedimentados maus hábitos inerentes
à velha sociedade e decorrentes das vivências, inclusive no ambiente fami-
lial. Segundo Owen (1967b, p. 40), do atual

[...] sistema de formação não pode ser esperado pela produção de qualquer
outro do que uma população fraca em corpo e faculdades mentais, e com há-
bitos geralmente destrutivos de seus próprios confortos, do bem-estar que os
rodeia, e fortemente calculado para subjugar todos os afetos sociais.

A escola destinada às crianças cumpriria múltiplas funções, dentre


elas, colocá-las num ambiente adequado, em todos os sentidos, em especial
em termos de salubridades física e mental, onde as relações sociais fossem
pautadas pelos novos valores e, com isso, reduzir-se-ia o convívio das

1
Segundo Teixeira (2002, p. 29), “Nisso consiste exatamente a sua utopia. Deslumbrados com os avanços da ciência,
tinham uma fé inabalável na razão e na onipotência do pensamento, acreditando, por isso, que a educação e a
universalização do conhecimento científico eram o único caminho para transformar a sociedade e o homem. E, nesse
sentido, sempre que usarmos a designação ‘utópicos’, daqui para frente, ela terá esse exato sentido: projetos de
organização da sociedade, desligados da realidade política e social da época, e fé inabalável na ciência e na educação
como meios de transformação da realidade.”
Cláudio Rodrigues da Silva | 69

crianças com os hábitos da velha sociedade, além de liberar as mães para


a dedicação exclusiva ao trabalho durante esse horário, livres de preocu-
pações (OWEN, 1967a; 1967b).
A educação, pautada na racionalidade, teria como objetivo combater
“[...] os princípios irracionais pelos quais o mundo foi governado até então
[...]” e que fizeram “[...] retardar a melhoria da sociedade.” (OWEN,
1967b, p. 269).

Estes planos devem ser desenvolvidos para treinar crianças desde a mais tenra
infância em bons hábitos [...] (que, naturalmente, irão impedi-las de adquirir
hábitos da mentira e do engano). Elas devem posteriormente ser racional-
mente instruídas, e seu trabalho ser útil. Tais hábitos e educação vão
impressionar então com um desejo ardente e ativo para promover a felicidade
[...]. Elas também irão assegurar, com o menor número de exceções possíveis,
[...] saúde do corpo e paz de espírito. (OWEN, 1967b, p. 270)

Dessa forma, no projeto owenista, a concepção de humanidade não


era fragmentada, ou seja, a pessoa era vista como um ser integral, e não
de forma dissociada, corpo e mente. Portanto, a própria concepção de pes-
soa demandava uma concepção de educação correspondente.
Em suma, a concepção de educação owenista visava à formação e ao
desenvolvimento de todas as potencialidades e dimensões humanas, da
perspectiva do novo mundo moral ou da nova visão de sociedade.
Os principais valores mencionados nos textos owenistas são a ver-
dade, a racionalidade, a felicidade, o progresso, o bem, a educação e o
trabalho úteis, a união, a igualdade, a liberdade, a fraternidade, a ciência,
a paz, a sabedoria, a honestidade, a prosperidade, a caridade, o amor, a
filantropia, a coerência entre teoria e prática, a tolerância, a solidariedade,
a cooperação, o bem público ou comum (OWEN, 1967a; 1967b; 2002).
70 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Entre os conteúdos do ensino em escolas owenistas constantes em


documentos analisados estão: zoologia, mineralogia, botânica, química,
mecânica, história natural, artes, línguas, geologia, matemática, geografia,
astronomia, música, dança, canto, exercícios militares, desenho, costura,
além da leitura e da escrita, requisito para o aprendizado da maior parte
desses conhecimentos.
O Movimento cartista, como aponta Dal Ri (2012), tem também uma
ideologia e uma visão de mundo próprias, bem como uma concepção pró-
pria de educação, consoantes entre si.
Para os cartistas, a educação era uma das formas de se avançar no
sentido de concretização do principal objetivo do Movimento, qual seja, a
aprovação da Carta do Povo (FLETT, 2006; HOVELL, 1925; LOVETT;
COLLINS, 1840). Assim, a educação estava articulada a outras formas de
lutas sociais dos cartistas (DAL RI, 2013). Conforme Flett (2006, p. 103),
“Cada escola era vinculada a um projeto educacional radical específico e
através deste para objetivos políticos radicais mais amplos.” 2
Esse Movimento adotava um conceito amplo de educação, que visava
ao desenvolvimento de todas as faculdades humanas – físicas, morais, in-
telectuais, políticas, entre outras. Previa o ensino dos conteúdos escolares
e habilidades profissionais de maneira vinculada ao trabalho útil ou pro-
dutivo (DAL RI, 2013; FLETT, 2006; LOVETT; COLLINS, 1840), já que é
por intermédio do trabalho que são produzidas as riquezas e, por conse-
guinte, se pode propiciar condições de prosperidade, abundância e
felicidade para toda a humanidade (LOVETT; COLLINS, 1840).
Para o Cartismo, a educação visa “[...] infundir os princípios da ação,
da justiça e da bondade, necessários para a formação do caráter [...]”
(LOVETT; COLLINS, 1840, p. 22). Tem, ainda, por objetivo “[...] treinar a

2
Tradução livre dos textos em inglês.
Cláudio Rodrigues da Silva | 71

nova geração no conhecimento, na moralidade e no amor à liberdade.” e


propiciar “[...] o melhor treinamento físico, mental, moral e político para
as crianças, de modo a prepará-las, em força e inteligência, para desfrutar
da própria existência e propiciar a maior quantidade de benefícios para a
sociedade.” (LOVETT; COLLINS, 1840, p. 22). Portanto, assim como para
os demais Movimentos, a educação tem vinculação dialética com as dimen-
sões pessoal e coletiva.
Também para os cartistas era necessária a articulação entre teoria e
prática, bem como um ensino menos livresco e mais vivencial ou atitudi-
nal. A educação deveria ser organicamente articulada aos objetivos
políticos do Movimento, que visava ampliar a adesão especialmente das
classes trabalhadoras à Carta do Povo, com vistas a aumentar a correlação
de forças e a conseguir a aprovação das suas reivindicações pelo Parla-
mento (LOVETT; COLLINS, 1840).
A criação de associações ou escolas, além de visar à autoeducação, era
uma das formas de difusão dos objetivos, da ideologia e da visão de mundo
e, assim, contribuir para a consolidação e o crescimento do cartismo
(FLETT, 2006; HOVELL, 1925; LINTON, 1895; LOVETT; COLLINS, 1840).
Os valores recorrentes em textos relacionados a esse Movimento ou
às suas lideranças são democracia, temperança, igualdade, sobriedade,
ação, ciência, conhecimento, liberdade, verdade, justiça, moralidade, feli-
cidade, prosperidade, honestidade, benevolência, fraternidade, entre
outros (ABENDROTH, 2007; HOVELL, 1925; LINTON, 1895; LOVETT;
COLLINS, 1840).
Entre os conhecimentos ensinados em escolas cartistas constam: lei-
tura, escrita, aritmética, geografia, história natural, química, mineralogia,
geologia, botânica, tricô, costura, economia doméstica, direitos e deveres
(LOVETT; COLLINS, 1840).
72 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

O MST, segundo Dal Ri (2012), tem ideologia e visão de mundo pró-


prias e, por conseguinte, uma concepção própria de educação, consoantes
entre si.
Trata-se de visão crítica ao modo de produção capitalista, e que tem
por base a democracia, a cooperação, a solidariedade e a posse coletiva dos
meios de produção, em especial da terra (BAUER, 2009; DAL RI, 2004;
MST, 2010; STEDILE; FERNANDES, 2001).
Essas ideologia e visão de mundo constam em diferentes documentos
do Movimento (MST, 1986; 1994a; 1995; 1996; 1999; 2000; 2001a; 2001b;
2001c; 2005; 2006; 2007; 2010; 2011a) e de entidades organicamente a ele
ligadas, como, por exemplo, a Confederação das Cooperativas de Reforma
Agrária do Brasil (CONCRAB) (1995; 1996a; 1996b) e o Instituto Técnico
de Capacitação e Pesquisa da Reforma Agrária (ITERRA) (1996; 1997;
2003), em especial nos documentos relacionados à educação, temática
principal de análise desta pesquisa.
O Movimento faz, recorrentemente, menção à transformação da so-
ciedade, a uma nova ordem social, pautada pelos “[...] valores (humanistas
e socialistas) que se contrapõem aos valores (ou anti-valores) que susten-
tam a sociedade atual.” (MST, 2001c, p. 19).
O socialismo como visão de mundo consta também em textos de au-
toria ou em entrevistas de intelectuais do MST, como, por exemplo,
Caldart (1997), Stedile (1997), Stedile e Fernandes (2001) e Mauro (apud
RUBBO, 2012). Autores como, por exemplo, Bauer (2009) e Dal Ri e Vieitez
(2008), também destacam essa questão.
Entretanto, no documento denominado MST - Lutas e Conquistas
(MST, 2010) – que está entre os documentos com data de publicação mais
recente analisados nesta pesquisa – não é feita menção direta ou explícita
ao socialismo como visão de mundo, ainda que constem incisivas críticas
ao capital ou ao capitalismo.
Cláudio Rodrigues da Silva | 73

Segundo o MST (1996, p. 9), são os valores humanistas e socialistas

[...] que colocam no centro dos processos de transformação a pessoa humana


e sua liberdade, mas não como indivíduo isolado e sim como ser de relações
sociais que visem a produção e a apropriação coletiva dos bens materiais e
espirituais da humanidade, a justiça na distribuição destes bens e a igualdade
na participação de todos neste processo.3

Ainda que alguns documentos não citem nominalmente o socialismo


como modelo pretendido ou não apresentem o capitalismo como modelo
refutado, os valores, os princípios e os objetivos defendidos ou apresenta-
dos pelo Movimento, a rigor, são contra-hegemônicos e sua consecução
demandaria, em última instância, mudanças radicais em todas as dimen-
sões – econômica, política e cultural – na formação econômico-social
vigente, principalmente no modo de produção.
Mesmo as reivindicações de caráter republicano, constantes como di-
reitos fundamentais na CF/1988, não são atendidas, exceto quando o
Movimento, numa conjuntura de correlação de forças favorável, radicaliza
suas ações. Dentre os diversos exemplos de direitos sistematicamente ne-
gados ou restringidos estão a reforma agrária e a educação escolar4
(LAUREANO, 2007; MST, 2010; STEDILE; FERNANDES, 2001).
Para Dal Ri (2012), o MST tem uma concepção de educação em con-
formidade com as próprias ideologia e visão de mundo.

3
Neste excerto verifica-se consonância com apontamentos de Marx, em especial em A questão judaica (2002) e nos
Manuscritos econômico-filosóficos (2004). São levantadas questões caras tanto ao trabalho, quanto ao capital, e que
geram polêmicas, em especial entre setores do marxismo, principalmente no que se refere à igualdade, justiça,
propriedade, entre outras (ENGELS, 1877; LESSA, 2011; MÉSZÁROS, 2002a; PASUKANIS, 1972).
4
Contudo, são proposições ou reivindicações que, a rigor, parecem inviáveis de implementação de forma perene,
radical e generalizada no capitalismo, a exemplo do que ocorreu/ocorre com direitos – inclusive os denominados
direitos fundamentais – conquistados pelas classes trabalhadoras no Brasil, e a exemplo de outros direitos
conquistados no denominado estado do bem-estar social, em alguns países, mas constantemente sujeitos a ataques
do capital e a retrocessos, conforme a correlação de forças e as conjunturas. Os efeitos da intensificação da crise
econômica, entre os quais se destaca o aumento do desemprego e os retrocessos em termos de direitos, que vêm
ocorrendo em países centrais do capitalismo, em especial na Europa (BEVILAQUA, 2011; LESSA, 2011; RECH, 2011),
exemplificam essa questão.
74 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

A concepção de educação do Movimento pode ser verificada ou infe-


rida em diversos de seus documentos (MST, 1994; 1995; 1996; 1999;
2001c), bem como documentos de entidades organicamente a ele vincula-
das, como, por exemplo, a CONCRAB (1995; 1996a; 1996b) e o ITERRA
(1996; 1997).
Feita essa breve introdução a alguns dos aspectos sobre o MST, são
apresentados o que o Movimento denomina princípios filosóficos ou
pedagógicos. Num primeiro momento, serão enunciados de forma
introdutória os princípios e pedagogias do Movimento com vistas a
propiciar uma visão panorâmica. Entretanto, alguns aspectos serão
priorizados e tratados de maneira mais aprofundada em capítulos especí-
ficos com vistas a atingir os objetivos desta pesquisa. Entre esses aspectos
estão a gestão democrática, o vínculo orgânico entre ensino e trabalho
produtivo e a formação de professores, além da negação dialética da
educação oficial estatal e da constituição de uma ideologia e de uma visão
de mundo concernente à classe trabalhadora. Esses dois últimos quesitos,
ainda que constem ou possam ser inferidos nos documentos analisados,
não aparecem com o enunciado adotado nesta pesquisa. Todos esses
princípios são relacionados e coerentes entre si. Ressalta-se que educação
e pedagogia são dimensões indissociáveis, com preponderância relativa da
primeira dimensão sobre a segunda, sendo ambas pautadas pela ideologia
e visão de mundo do Movimento.
O MST tem seus princípios de educação e de pedagogia, que não são
resultados de idealizações, mas, sim, das necessidades; não são abstrações,
mas, ao invés, “[...] são o resultado de práticas realizadas, das experiências
que estamos acumulando nestes anos de trabalho.” (MST, 1996, p. 4).
O Movimento entende por princípios “[...] algumas idéias/convic-
ções/formulações que são as balizas (estacas, marcos, referências) para
Cláudio Rodrigues da Silva | 75

nosso trabalho de educação no MST. Neste sentido, eles são o começo, o


ponto de partida das ações.” (MST, 1996, p. 4).

Temos que entender estes princípios como nosso horizonte, o lugar onde que-
remos chegar enquanto transformação da educação. A sua implementação
certamente será diferenciada em cada realidade específica, dependendo do
momento histórico, da correlação de forças políticas, das pessoas com quem
trabalhamos, das alianças e parcerias que conseguimos estabelecer com o con-
junto da sociedade. (MST, 1996, p. 27)

A seguir, são apresentados primeiramente os princípios filosóficos e,


posteriormente, os princípios pedagógicos5, bem como a concepção de es-
cola do MST.
Segundo o Movimento (MST, 1996, p. 4, grifos do autor), “Os prin-
cípios filosóficos dizem respeito a nossa visão de mundo, nossas
concepções mais gerais em relação à pessoa humana, à sociedade, e ao que
entendemos que seja educação. Remetem aos objetivos mais estratégicos
do trabalho educativo no MST.”
O primeiro princípio filosófico é o da Educação para a transformação
social. O Movimento desdobra esse princípio em seis dimensões, apresen-
tadas nesta pesquisa conforme a ordem de apresentação estabelecida no
próprio documento analisado.
A primeira dimensão é a Educação de classe que, segundo o Movi-
mento (MST, 1996, p. 6),

Quer dizer uma educação que se organiza, que seleciona conteúdos, que cria
métodos na perspectiva de construir a hegemonia do projeto político das clas-
ses trabalhadoras, visando através de cada prática, em última instância, o

5
Partindo do que apontam Dal Ri e Vieitez (2008) e Luzuriaga (1963), o que o Movimento apresenta como princípios
pedagógicos estão, a rigor, mais para princípios educativos, se se considerar a Pedagogia como uma parte da ciência
que se dedica a estudar questões relacionadas ao processo de ensino-e-aprendizagem.
76 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

fortalecimento do poder popular e a formação de militantes para as organiza-


ções de trabalhadores, a começar pelo próprio MST. Trata-se de uma educação
que não esconde o seu compromisso em desenvolver a consciência de classe e
a consciência revolucionária, tanto nos educandos como nos educadores.

A segunda dimensão é a Educação massiva, pois o Movimento (MST,


1996, p. 6) defende “[...] como fundamental o direito de todos à educação,
em suas diversas formas, com especial ênfase para a escolarização.”
A terceira dimensão, Educação organicamente vinculada ao Movi-
mento Social, significa que, para o MST (1996, p. 6, grifos do autor),

[...] é fundamental todo este esforço que fazemos em cada acampamento, em


cada assentamento, em cada uma de nossas escolas, de construir uma pro-
posta de educação do MST, isto é, que se desenvolva ligada às lutas, aos
objetivos, à organicidade do MST. Porque acreditamos que é a educação do
movimento (mais do que uma educação para o movimento) que pode melhor
dar conta das suas demandas de formação, adequando-se à dinâmica de suas
necessidades e, portanto, participando mais efetivamente dos processos de
mudança.

A quarta dimensão é a Educação aberta para o mundo, que diz res-


peito ao fato de que, ao insistir numa proposta própria de educação, o
Movimento não se fecha

[...] nos limites da nossa realidade imediata ou das nossas lutas específicas.
Isto não nos levaria aos objetivos maiores de mudança. Por isso é também
característica essencial de nossa educação a preocupação com a abertura de
horizontes de nossos/nossas estudantes, de modo que pratiquem aquele velho
princípio, também filosófico, de que ‘nada do que é humano me pode ser es-
tranho’. (MST, 1996, p. 6, grifos do autor)
Cláudio Rodrigues da Silva | 77

A quinta dimensão é a Educação para a ação, que implica um imbró-


glio recorrente na história da educação e em teorias educacionais e
pedagógicas, que é a questão da relação entre prática e teoria.

Isto é, queremos preparar sujeitos capazes de intervenção e de transformação


prática (material) da realidade. Não podemos nos contentar com o desenvol-
vimento apenas da chamada ‘consciência crítica’, que é aquela onde as pessoas
conseguem denunciar/discutir sobre os problemas e suas causas, mas não
conseguem ir além disso e até se iludem que por estarem falando sobre um
determinado problema, já o estão solucionando. Se o que pretendemos é par-
ticipar dos processos de transformação social, então precisamos dar um passo
adiante. Nossa educação deve alimentar o desenvolvimento da chamada ‘cons-
ciência organizativa’, que é aquela onde as pessoas conseguem passar da
crítica à ação organizada de intervenção concreta da realidade. [...] A própria
ação tem uma dimensão educativa que nenhum estudo teórico pode substituir.
(MST, 1996, p. 7)

Enfim, a sexta dimensão é a Educação aberta para o novo, que

Quer dizer, aberta para entender e para ajudar a construir as novas relações
sociais e interpessoais que vão surgindo dos processos políticos e econômicos
mais amplos em que o MST está inserido; aberta também para trabalhar pe-
dagogicamente as contradições e os conflitos que aparecem nestes processos.
(MST, 1996, p. 7)

Outro princípio filosófico do Movimento é a Educação para o trabalho


e a cooperação. Com isso o Movimento (MST, 1996, p. 7) defende a

[...] a relação necessária que a educação e a escola devem ter com os desafios
do seu tempo histórico. No caso das práticas educacionais que acontecem no
meio rural, esta relação não pode, hoje, desconsiderar a questão da luta pela
Reforma Agrária e os desafios que coloca para a implementação de novas re-
lações sociais de produção no campo e na cidade.
78 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

O Movimento (MST, 1996, p. 8, grifos do autor) tem “[...] a formação


para a cooperação, como elemento estratégico para esta educação que visa
a construção de novas relações sociais.”
O terceiro princípio filosófico do Movimento é a Educação voltada
para as várias dimensões da pessoa humana.

O que poderíamos dizer usando uma expressão mais curta: educação onilate-
ral. A palavra onilateral vem de Marx, que usava a expressão ‘desenvolvimento
onilateral do ser humano’, para chamar a atenção de que uma práxis educativa
revolucionária deveria dar conta de reintegrar as diversas esferas da vida hu-
mana que o modo de produção capitalista prima por separar. Ou seja, uma
educação onilateral se opõe a uma educação unilateral, que se preocupa só
com um lado ou dimensão da pessoa, ou só com um lado de cada vez; só o
intelecto, ou só as habilidades manuais, ou só os aspectos morais, ou só os
políticos. (MST, 1996, p. 8, grifos do autor)

Algumas das dimensões principais que o Movimento destaca desse


princípio são: “[...] a formação político-ideológica; a formação organiza-
tiva; a formação técnico-profissional; a formação do caráter ou moral
(valores, comportamentos com as outras pessoas); a formação cultural e
estética; a formação afetiva; a formação religiosa...” (MST, 1996, p. 8).
O quarto princípio filosófico do Movimento é o da Educação com base
em valores humanistas e socialistas, pois “A educação no MST quer ajudar
na construção do novo homem e da nova mulher. Para isso é fundamental
uma formação que rompa com os valores dominantes na sociedade atual,
centrada no lucro e no individualismo desenfreados.” (MST, 1996, p. 9).
O Movimento tem uma pedagogia própria, em consonância com sua
concepção de educação.

O MST tem uma pedagogia. A pedagogia do MST é o jeito através do qual o


Movimento historicamente vem formando o sujeito social de nome Sem
Cláudio Rodrigues da Silva | 79

Terra,6 e que no dia a dia educa as pessoas que dele fazem parte. E o princípio
educativo principal desta pedagogia é o próprio movimento. (MST, 1999, p. 5,
grifos do autor).

Para o MST (MST, 1999, p. 6, grifos do autor)

Pedagogia quer dizer o jeito de conduzir a formação de um ser humano. E


quando falamos em matrizes pedagógicas estamos identificando algumas
práticas ou vivências fundamentais neste processo de humanização das
pessoas, que também chamamos de educação.

O MST denomina sua pedagogia de Pedagogia do Movimento. É


assim denominada por “[...] ter o Sem Terra como sujeito educativo e ter
o MST como sujeito da intencionalidade pedagógica sobre esta tarefa de
fazer educação.”, e também “[...] porque se desafia a perceber o
movimento do Movimento, a transformar-se transformando.” (MST,
1999, p. 6).
No entanto, como mencionado anteriormente, o Movimento ressalta
que “Isto não quer dizer que o MST tenha inventado uma nova pedagogia,
mas ao tentar produzir uma educação do jeito do Movimento, os Sem
Terra acabaram criando um novo jeito de lidar com as matrizes
pedagógicas.” (MST, 1999, p. 6).
Isso é um aspecto importante para reiterar que o Movimento não é
idealista. Suas educação e pedagogia resultam das experiências e

6 “Alguns esclarecimentos sobre a grafia do nome Sem Terra: A condição (individual) de sem (a) terra, ou seja, a
de trabalhador ou trabalhadora do campo que não possui sua terra de trabalho, é tão antiga quanto a existência da
apropriação privada deste bem natural. No Brasil, a luta pela terra e mais recentemente a atuação do MST, acabaram
criando na língua portuguesa o vocábulo sem- terra, com hífen, e com o uso do s na flexão de número (os ‘sem-
terras’), indicando uma designação social para esta condição de ausência de propriedade ou de posse da terra de
trabalho, e projetando, então, uma identidade coletiva. O MST nunca utilizou em seu nome nem o hífen, nem o s, o
que historicamente acabou produzindo um nome próprio, Sem Terra, que é também sinal de uma identidade
construída com autonomia. O uso social do nome já alterou a norma referente à flexão de número, sendo hoje já
consagrada a expressão os sem-terra. Quanto ao hífen, fica como distintivo da relação entre esta identidade coletiva
de trabalhadores e trabalhadoras da terra e o Movimento que a transformou em nome próprio, e a projeta para além
de si mesma.” (MST, 1999, p. 5, grifos do autor).
80 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

principalmente das necessidades decorrentes das condições objetivas, das


condições materiais de vida, da realidade de seres sociais concretos, em
situações reais de vida, em determinados momento histórico, modo de
produção e formação econômico-social. Esse, entre outros aspectos, é um
diferencial em relação a outras concepções de educação e de pedagogia,
que se pautam por condições e conceitos a priori, abstratos, ideais ou
pretensamente universais.
Assim como tem seus princípios filosóficos, o MST tem seus princí-
pios pedagógicos. Os princípios pedagógicos são complementares e
imbricados com os filosóficos.
Conforme o Movimento, “Os princípios pedagógicos se referem ao
jeito de fazer e de pensar a educação, para concretizar os próprios princí-
pios filosóficos.” (MST, 1996, p. 4, grifos do autor). Apresentam-se, a
seguir, os princípios pedagógicos na ordem em que constam no docu-
mento.
O primeiro princípio pedagógico é a Relação entre prática e teoria,
pois

Se queremos educar os sujeitos de um novo projeto de desenvolvimento social


para o campo, educar para a ação transformadora, isto quer dizer que preci-
samos de pessoas capazes de articular, com cada vez mais competência, teoria
e prática, prática e teoria. [quem não consegue fazer isso] [...] não consegue
dar conta dos grandes desafios que temos no contexto social de hoje, como
cidadãos e integrantes do MST. [...] consideramos superada historicamente
aquela visão de que a escola é apenas um lugar de conhecimentos teóricos que
depois, fora dela, é que serão aplicados na prática. Queremos que a prática
social dos/das estudantes seja a base do seu processo formativo, seja a matéria
prima e o destino da educação que fazemos. Queremos que o próprio curso
seja lugar privilegiado de práticas, e que o estudo e a elaboração teórica sejam
considerados práticas [...]. (MST, 1996, p. 10-11)
Cláudio Rodrigues da Silva | 81

O segundo princípio pedagógico é o da Combinação metodológica en-


tre processos de ensino e de capacitação, pois “[...] nem tudo se aprende
da mesma maneira, e nem todas as dimensões da educação podem ser
trabalhadas do mesmo jeito, ou com a mesma metodologia.” (MST, 1996,
p. 11).
O MST distingue capacitação e ensino. “No ensino, a principal carac-
terística é que o movimento do conhecimento (teoria) vem antes da ação.
Na capacitação é o contrário: a ação antecede o conhecimento sobre ela”.
(MST, 1996, p. 12, grifos do autor). O primeiro “[...] resulta em saberes
teóricos ou, poderíamos dizer simplesmente em saber.”, enquanto a capa-
citação “[...] resulta em saberes práticos ou, como temos preferido
chamar, em saber-fazer (habilidades, capacidades) e em saber-ser (com-
portamentos, atitudes, posicionamentos).” (MST, 1996, p. 12, grifos do
autor). Assim, preza pela combinação dos processos de ensino com os de
capacitação.
O terceiro princípio pedagógico tem a Realidade como base da pro-
dução do conhecimento.

A produção do conhecimento é uma das dimensões do processo educativo. En-


tão, através deste princípio estamos dizendo que é precisamos nos preocupar
em como garantir que nossos educandos/nossas educandas produzam conhe-
cimento. Conhecimento sobre o quê? Sobre a realidade. [...] A realidade é o
mundo! (MST, 1996, p. 13)

O quarto princípio pedagógico trata dos Conteúdos formativos soci-


almente úteis.

[...] não acreditamos numa pedagogia centrada nos conteúdos, ou seja, na-
quela que considera que os conteúdos são a parte mais importante do processo
educativo, sendo o seu domínio teórico a demonstração de que a pessoa está
sendo bem educada. [...] Partimos da convicção pedagógica de que os
82 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

conteúdos são instrumentos para atingir nossos objetivos, tanto os ligados ao


ensino quanto à capacitação. (MST, 1996, p. 14)

O quinto princípio pedagógico é o da Educação para o trabalho e pelo


trabalho.

Na proposta de educação do MST, o trabalho tem um valor fundamental. É o


trabalho que gera riqueza; que nos identifica como classe; e que é capaz de
construir novas relações sociais e também novas consciências, tanto coletivas
como pessoais. Quando dizemos que a nossa educação pretende criar sujeitos
de ação, temos presente que estes sujeitos são, principalmente,
TRABALHADORES. Trabalhadores/trabalhadoras militantes, portadores de
uma cultura da mudança e de um projeto de transformação. (MST, 1996, p.
15, grifos do autor)

O sexto princípio pedagógico é o que diz respeito ao Vínculo orgânico


entre processos educativos e processos políticos. Juntamente com os prin-
cípios da gestão democrática e o princípio do vínculo orgânico entre ensino
e trabalho produtivo, é um dos princípios mais elementares da educação
do Movimento, e se desdobra em seis dimensões, apresentadas, a seguir,
conforme a ordem elencada pelo Movimento (MST, 1996, p. 16).
Por processos políticos o MST entende

[...] aqueles que se referem ao modo de governar/dirigir a vida social, pública.


Envolvem as relações de poder que se estabelecem na sociedade em vista de
conservar ou de transformar o jeito em que está organizada. [...] tudo o que
fazemos é político, porque acaba tendo alguma coisa a ver com o jogo de forças
sociais que disputam o poder no conjunto da sociedade. (MST, 1996, p. 16)

O MST é enfático e reiterativo quanto à necessária vinculação entre


educação e política.
Cláudio Rodrigues da Silva | 83

A educação é sempre uma prática política, à medida que se insere dentro de


um projeto de transformação ou de conservação social. Mas durante muito
tempo se tentou acreditar que educação e política não deveriam se misturar.
Que política era coisa de político e que não deveria ‘contaminar’ as mentes e
os corações de nossas crianças e jovens. Trata-se aqui, na verdade, de uma
intencional e perversa tentativa de alienação das pessoas, para que nem pen-
sem que algo pode ser diferente na sociedade em que vivem. No caso dos/das
estudantes do MST, quando a escola nega sua relação com a política, está di-
zendo a eles/elas que reprova a sua participação no Movimento, na luta pela
Reforma Agrária, e que militância nada tem a ver com educação. Combatemos
com veemência esta posição! (MST, 1996, p. 16)

Por vínculo orgânico entre educação e política o Movimento entende


“[...] fazer a política entrar/atravessar os processos pedagógicos que acon-
tecem nas escolas, nos cursos de formação. É bem mais, então, do que
conversar sobre questões políticas.” (MST, 1996, p. 16).
Segundo o MST, isso demanda conseguir trabalhar pelo menos algu-
mas das dimensões a seguir: a) “alimentar a indignação ética diante das
situações de injustiça e de indignidade humanas.” (MST, 1996, p. 16); b)
“desenvolver atividades e estudar conteúdos intencionalmente voltados à
formação político-ideológica dos/das estudantes.” (MST, 1996, p. 16); c)
“estimular e participar junto de lutas sociais concretas dos trabalhadores
de outras categorias, como forma de educar para a solidariedade de classe”
(MST, 1996, p. 17); d) “incentivar os/as estudantes para que se organizem
e aprendam também a lutar pelos seus direitos [...]” (MST, 1996, p. 17); e)
“desenvolver processos de crítica e autocrítica coletiva e pessoal, visando
avançar na coerência entre o discurso político e a prática política” em todas
as instâncias sociais (MST, 1996, p. 17); f) “chegar a ser militante! Esta é a
meta; porque nada mais efetivo no aprendizado político do que pertencer
a uma organização.” (MST, 1996, p. 17).
84 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

O sétimo princípio pedagógico é o do Vínculo orgânico entre proces-


sos educativos e processos econômicos.

Os processos econômicos são aqueles que dizem respeito à produção, à distri-


buição e ao consumo de bens e de serviços necessários ao desenvolvimento da
vida humana em sociedade. [...] Se o que queremos, afinal, é a transformação
deste modelo, não é fugindo das relações econômicas que vamos conseguir
isso. Ao contrário, é experimentando outros tipos de relações que até podemos
descobrir como, de fato, toda a sociedade pode ser diferente. [já] que são as
relações econômicas [...] que movem as sociedades, transformam as pessoas.
(MST, 1996, p. 17)

O oitavo princípio é o do Vínculo orgânico entre educação e cultura.


O MST entende por cultura “[...] tudo aquilo que as pessoas, os grupos e
as sociedades produzem para representar ou expressar o seu jeito de viver,
de entender e de sonhar o mundo.” (MST, 1996, p. 18). Para o Movimento
(MST, 1996, p. 18), “É a cultura que permite a comunicação humana e,
portanto, permite a própria educação.” O vínculo orgânico resulta do fato
de que “A educação pode ser considerada ao mesmo tempo um processo
de produção e de socialização da cultura; pode ser ainda um processo de
transformação cultural das pessoas, dos grupos.” (MST, 1996, p. 18). O
MST aprendeu “[...] com a história, que as lutas culturais são parte impor-
tante dos processos de transformação social.” (MST, 1996, p. 19).
O nono princípio é o da Gestão democrática.

Considerar a democracia um princípio pedagógico significa dizer que, segundo


nossa proposta de educação, não basta os educandos estudarem ou discutirem
sobre ela; precisam também, e principalmente, vivenciar um espaço de parti-
cipação democrática, educando-se pela e para a democracia social. (MST, 1996,
p. 19)
Cláudio Rodrigues da Silva | 85

O décimo princípio pedagógico é o da Auto-organização dos/das es-


tudantes. Esse princípio é diretamente vinculado ao princípio anterior,
qual seja, o da gestão democrática.

A expressão estamos tomando do pedagogo russo Pistrak, para especificar o


processo de criação do coletivo de alunos/alunas numa escola. Auto-organi-
zar-se significa ter um tempo e um espaço autônomos para que se encontrem,
discutam suas questões próprias, tomem decisões, incluindo aquelas necessá-
rias para sua participação verdadeira no coletivo maior de gestão da escola.
(MST, 1996, p. 19-20)

O décimo primeiro princípio pedagógico é o da Criação de coletivos


pedagógicos e formação permanente dos educadores/das educadoras, tam-
bém diretamente vinculado ao da gestão democrática e ao da auto-
organização dos estudantes. Segundo o MST (1996, p. 21), “Sem uma co-
letividade de educadores não há verdadeiro processo educativo.”. “O
princípio do trabalho de educação através de coletivos pedagógicos está
ligado a outro princípio que é igualmente importante: quem educa tam-
bém precisa se educar continuamente.” (MST, 1996, p. 21).
O décimo segundo princípio pedagógico é o da Atitude e habilidades
de pesquisa, pois “‘Sem investigação não há direito à palavra.’” Assim,
“Pesquisa neste princípio é igual à investigação sobre uma realidade,
quer dizer, um esforço sistemático e rigoroso que se faz para entender
mais a fundo (cientificamente), aquilo que é para nós um problema. Pes-
quisar é construir a solução de um problema [...]” (MST, 1996, p. 21, grifos
do autor).
O décimo terceiro princípio pedagógico é o da Combinação entre os
processos pedagógicos coletivos e individuais. Isso significa que “[...] todos
os princípios pedagógicos que tratamos até aqui, têm como centro a pes-
soa, só que não isolada, individual, mas sim como sujeito de relações, com
86 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

outras pessoas, com coletivos, e com um determinado contexto histórico,


social.” (MST, 1996, p. 22).
A Pedagogia do Movimento é composta por diversas matrizes
pedagógicas ou pedagogias que, como o MST, estão em constante
movimento. Algumas dessas pedagogias são apresentadas a seguir.
A Pedagogia da luta social “[...] brota do aprendizado de que o que
educa os Sem Terra é o próprio movimento da luta, em suas contradições,
enfrentamentos, conquistas e derrotas.” (MST, 1999, p. 7, grifos do autor).
A Pedagogia da organização coletiva “[...] brota da raiz que nasce de
uma coletividade que descobre um passado comum e se sente artífice do
mesmo futuro.” (MST, 1999, p. 7).
A Pedagogia da terra “[...] brota da mistura do ser humano com a
terra: ela é mãe, e se somos filhos e filhas da terra, nos também somos
terra. Por isto precisamos aprender a sabedoria de trabalhar a terra, cuidar
da vida: a vida da Terra (Gaia), nossa grande mãe; a nossa vida.” (MST,
1999, p. 8, grifos do autor).
A Pedagogia do trabalho e da produção “[...] brota do valor
fundamental do trabalho que gera a produção do que é necessário para
garantir a qualidade de vida social e identifica o Sem Terra com a classe
trabalhadora.” (MST, 1999, p. 8).
A Pedagogia da cultura, que

[...] brota do modo de vida produzido e cultivado pelo Movimento, do jeito de


ser e de viver dos Sem Terra, do jeito de produzir e reproduzir a vida, da
mística, dos símbolos, dos gestos, da religiosidade, da arte... É a necessidade
da ação, com força e radicalidade distinta, que exige uma permanente reflexão
que se encarna em nova ação coletiva, rompendo com a lógica tanto do
ativismo, como de projetos sem ação. (MST, 1999, p. 9, grifos do autor)
Cláudio Rodrigues da Silva | 87

A Pedagogia da escolha “[...] brota dos múltiplos gestos e múltiplas


escolhas que as educadoras e os educandos, de que o MST, de que os seres
humanos precisam fazer a cada dia [...]” (MST, 1999, p. 9).
A Pedagogia da história “[...] brota do cultivo da memória e da
compreensão do sentido da história e da percepção de ser parte dela, não
apenas como resgate de significados, mas como algo a ser cultivado e
produzido. A memória coletiva é fundamental para a construção de uma
identidade.” (MST, 1999, p. 10).
A Pedagogia da alternância, que

[...] brota do desejo de não cortar raízes. É uma das pedagogias produzidas
em experiências de escola do campo que buscaram integrar a escola com a
família e a comunidade do educando. No nosso caso, ela permite uma troca de
conhecimentos e o fortalecimento dos laços familiares e do vínculo dos
educandos com o assentamento ou acampamento, o MST e a terra. (MST,
1999, p. 10)

A concepção de educação e de pedagogia do MST tem implicações


com a concepção de escola, já que o Movimento entende que educação é
mais que escola, portanto, inclui a escola. “Em geral, e também no caso do
MST, sempre associamos muito educação com escola. Talvez porque
vivemos num momento da história das sociedades onde uma significativa
parte da socialização (principalmente das crianças) é atribuída à escola.”
(MST, 1996, p. 4).
Segundo o Movimento (MST, 1996, p. 5), “Quando surgiu o Setor de
Educação, foi para tratar da questão das escolas de assentamento.” Res-
salta, ainda, que “[...] de certo modo o eixo continua sendo a escola, mas
num sentido bem mais abrangente do que no início.”
Diferentemente dos documentos oficiais do governo brasileiro, como,
por exemplo, a LDB/1996, que, com exceção da Educação Infantil, fazem
88 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

menção a níveis de ensino, o MST, quando se trata da própria concepção


de escola, faz referência à educação. “Estamos chamando de Escolas de
Educação Fundamental por entendermos que a palavra ‘ensino’ não dá
conta de todas as dimensões educativas que já fazem parte de nossas prá-
ticas de escola.” (MST, 1999, p. 3, grifos do autor).
Uma escola organizada da perspectiva do MST educa principalmente
por intermédio da vivência de “[...] novas relações sociais que produz e
reproduz, problematizando e propondo valores, alterando
comportamentos, desconstruindo e construindo concepções, costumes,
idéias.” (MST, 1999, p. 7-8).

Numa Escola do MST, além de garantirmos que a experiência de luta dos


educandos e de suas famílias seja incluída como conteúdo de estudo,
precisamos nos desafiar a pensar em práticas que ajudem a educar ou a
fortalecer em nossas crianças, adolescentes e jovens, a postura humana e os
valores aprendidos na luta: o inconformismo, a sensibilidade, a indignação
diante das injustiças, a contestação social, a criatividade diante das situações
difíceis, a esperança... (MST, 1999, p. 7)

Além disso, para o MST (1999, p. 8), sua escola

[...] pode ajudar a perceber a historicidade do cultivo da terra e da sociedade,


o manuseio cuidadoso da terra - natureza - para garantir mais vida, a educação
ambiental, o aprendizado da paciência de semear e colher no tempo certo, o
exercício da persistência diante dos entraves das intempéries e dos que se
julgam senhores do tempo. Mas não fará isso apenas com discurso; terá que
se desafiar a envolver os educandos e as educadoras em atividades
diretamente ligadas à terra.

O Movimento considera importante, em suas escolas,


Cláudio Rodrigues da Silva | 89

[...] resgatar os símbolos, as ferramentas de trabalho e de luta, a mística do


Movimento. E fazer do tempo de escola um tempo onde os educandos possam
refletir muito sobre as varias dimensões da sua vida, de sua família, e também
da grande família chamada Sem Terra. Fará isto não apenas através de
conversa, mas principalmente através de práticas e de exemplos que
permitam aos educandos olharem para si e para os outros. E as educadoras
estarão junto com os educandos neste fazer, alimentando a capacidade de
analisar as falhas e propor formas de superar os limites. (MST, 1999, p. 9)

Por isso, inclusive, a recorrente afirmação, em documentos do


Movimento, de que a escola cabe na educação e na pedagogia do
Movimento, mas a educação e a pedagogia do Movimento não cabem na
escola, menos ainda na escola oficial. Isso reitera a tese de Dal Ri (2012),
de que o MST nega dialeticamente a escola oficial, isto é, ou constrói suas
próprias escolas ou tenta ganhar a hegemonia político-pedagógica na
escola oficial.
No que tange aos conteúdos da educação formal, o currículo das es-
colas do MST, independentemente do nível de ensino, estão sujeitos aos
documentos legais que regulamentam essa questão, em especial aos do
Ministério da Educação. Além da ênfase dada à questão da educação do
campo7, o Movimento, sem preterir os demais conteúdos, dedica especial
atenção aos conteúdos humanísticos, especialmente à história. Estabelece
também relações entre os conteúdos e as realidades sociais das comunida-
des, adequa o ensino às suas necessidades, ideologia e visão de mundo.
Verifica-se, portanto, que a educação do Movimento tem um caráter
diferenciado, em especial quando comparada ao ensino oficial, pautado
pela ideologia e pela visão de mundo do capital.

7
Ressalta-se, no entanto, que a concepção de educação do campo do MST diverge, inclusive pelos princípios
enunciados nesta pesquisa, tanto na dimensão teórica, quanto na dimensão prática, da concepção de educação do
campo constante em documentos governamentais, bem como de concepções defendidas por determinados setores
ou movimentos sociais, ainda que o MST participe de discussões e ações conjuntamente com essas instituições ou
organizações, inclusive no que se refere à formulação ou implementação de propostas para políticas públicas.
90 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

O primeiro e principal aspecto a ser destacado é que, para o Movi-


mento, a grande escola dos Sem Terra é o próprio MST (1999, p. 5) que,
por intermédio de suas lutas, de suas atividades, enfim, de suas relações
sociais, é autoeducador.
Para o MST (1996, p. 3),

A educação precisa assumir as tarefas que lhe cabem neste processo de forta-
lecimento de nossa organicidade, de clareza do projeto político dos
trabalhadores e de construção prática da sociedade da justiça social e da dig-
nidade humana, em nosso país, em nosso continente, no mundo.

Portanto, é inerente à concepção de educação do Movimento a vincu-


lação com as lutas das classes trabalhadoras, tanto em nível nacional,
quanto internacional. Assim, é uma educação com caráter e implicações
práticos, com vistas a, articuladamente, interferir e transformar a reali-
dade.
Educação, para o MST, é um processo permanente, portanto, sempre
em movimento, de formação e transformação humanas e, por conse-
guinte, do modelo de formação econômico-social (CALDART, 1997; 2004;
MST, 1996; 1999; 2001c).

Em sentido amplo, [...] educação é um dos processos de formação da pessoa


humana [...] através do qual as pessoas se inserem numa determinada socie-
dade, transformando-se e transformando esta sociedade. [...] está sempre
ligada com um determinado projeto político e com uma concepção de mundo.
(MST, 1996, p. 5)

O MST toma a educação numa acepção ampla, para além da forma-


ção unicamente técnico-científica, não se restringindo, portanto, à
educação escolar. É uma educação que visa principalmente à formação po-
lítica e à formação de quadros (CALDART, 1997; DAL RI; VIEITEZ, 2008;
Cláudio Rodrigues da Silva | 91

STEDILE; FERNANDES, 2001). “Consideramos a educação uma das di-


mensões da formação, entendida tanto no sentido amplo da formação
humana, como no sentido mais restrito de formação de quadros para a
nossa organização e para o conjunto das lutas dos trabalhadores.” (MST,
1996, p. 5).
A concepção de educação tem implicações diretas com a concepção
de pedagogia e de escola, todas decorrentes e em consonância com a ideo-
logia e com a visão de mundo do Movimento. Ter uma concepção de
educação – no sentido lato desse termo – implica a necessidade de se cons-
tituir uma pedagogia e escolas adequadas para sua consecução.
Segundo o Movimento (1999, p. 11), sua escola é uma escola do
campo, porém,

[...] uma Escola do Campo, vinculada a um movimento de luta social pela Re-
forma Agrária no Brasil. Ela é uma escola pública, com participação da
comunidade na sua gestão e orientada pela Pedagogia do Movimento, que
como vimos, é na verdade o movimento de diversas pedagogias.

Como já ressaltado, inclusive a concepção de educação de campo do


Movimento, em última análise, diverge da concepção oficial, assim como
das defendidas por determinados setores ou movimentos sociais.
O MST tem valores que embasam suas educação e pedagogia. Entre
os principais valores, fazendo uso de palavras do próprio Movimento, es-
tão a indignação diante das injustiças e da perda da dignidade humana, o
companheirismo e a solidariedade, a igualdade combinada com o respeito
às diferenças, a direção coletiva, a divisão de tarefas, o planejamento, o
respeito às relações democráticas e éticas, a disciplina, a coletividade
combinada com a subjetividade, o respeito à natureza, a permanente
crítica e autocrítica, o espírito de sacrifício, a valorização da vida, o gosto
de ser do povo e trabalhador, o trabalho voluntário, o estudo, a esperança,
92 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

a confiança, a coerência, o compromisso, a alegria, a ternura, a felicidade,


a justiça, a democracia, entre outros (MST, 1996; 1999; 2001c).
O fato de o MST, assim como os demais Movimentos, possuir as pró-
prias ideologia, visão de mundo, concepção de educação, de pedagogia e
de escola, entre outras, resulta na necessária negação dialética do ensino
oficial, haja vista a inviabilidade de o projeto educativo do MST ser plena
e radicalmente executado e, menos ainda, de maneira generalizada nas es-
colas do Estado8.
No caso do MST, o que se visa não é a adequação de um ou outro
componente, mas de todo o currículo. Na escola estatal, essa adequação é
passível de avanços quando o MST conquista a hegemonia na gestão da
escola.
O princípio da gestão democrática é o mais estratégico para a con-
quista da hegemonia, pois, se implementado em conformidade com a
concepção de democracia do Movimento, possibilitaria, em tese, alterações
em componentes do currículo9, em suas duas dimensões, formal, real e
oculta, como, por exemplo, conteúdos, metodologias, avaliações, calendá-
rio e horários letivos, valores, princípios, organização e funcionamento,
entre outros, enfim, das relações sociais na escola e com as comunidades.
Contudo, é importante frisar que, ainda que seja um avanço a con-
quista da hegemonia na gestão da escola, trata-se de um avanço
contraditoriamente limitado para fins mais amplos e mediatos, pois, a ri-
gor, as decisões mais significativas ou importantes da educação não são de
alçada da escola, sendo concebidas em instâncias administrativas superio-
res (CAÇÃO, 1989; JAPECANGA, 2000; PARO, 1991).

8
O caso da Escola “Construindo o caminho” (SILVA; DAL RI, 2019a) exemplifica isso.
9
A importância da adequação de todo o currículo pode ser reiterada pelo próprio sentido etimológico, pois currículo
remete a percurso ou a caminho (BERTICELLI, 1999), caminho esse, na perspectiva desta pesquisa, a ser realizado
para se chegar à formação econômico-social pretendida.
Cláudio Rodrigues da Silva | 93

Tanto setores das classes hegemônicas, quanto setores das classes


trabalhadoras atribuíram alta importância aos conhecimentos técnico-ci-
entíficos (BASBAUM, 1982; ENGELS, 2008; MANACORDA, 1992; PONCE,
1981; THOMPSON, 1987c). Entretanto, nem aquelas, nem esses restringi-
ram suas ações ao âmbito da educação isoladamente (HOBSBAWM, 1977;
MORTON; TATE, 1968), como se ela por si resolvesse os problemas sociais
e levasse à conquista dos respectivos objetivos, ideologias e visões de
mundo.
A burguesia ascendeu e se mantém no poder por intermédio de um
conjunto de estratégias que inclui principalmente a violência, tanto física
(ENGELS, 2000; HOBSBAWM, 1977; 1995; 2007; MARX, 1964), quanto
pela ideologia e, ainda na atualidade, na condição de classe hegemônica,
recorre tanto aos aparelhos ideológicos, quanto aos aparelhos repressivos,
mais a estes que àqueles (ALTHUSSER, 1999; MÉSZÁROS, 2002a; 2005).
Entretanto, como ideologia e repressão são imbricadas, as diferentes
formas de violências utilizadas pelas classes hegemônicas para se mante-
rem no poder, devido a uma espécie de sofisticação da ideologia e dos
aparelhos ideológicos, são apresentadas como intervenções estritamente
necessárias para garantia da lei e da ordem, ou seja, da governabilidade
(ALTHUSSER, 1999; MÉSZÁROS, 2002a; 2005).
A legislação e o Direito, que envolvem tanto a dimensão repressiva
quanto a ideológica (ALTHUSSER, 1999), são fundamentais para esse es-
camoteamento. A recorrente e ascendente criminalização de movimentos
sociais de trabalhadores na atualidade (PINASSI, 2009; STEDILE;
FERNANDES, 2001; WELCH, 2012) exemplifica isso.
O cerceamento ou a proibição da auto-organização de movimentos
de trabalhadores que se propõem a contestar ou a lutar contra as condi-
ções de vida a que estão submetidos são constantes na história. Exemplos
disso são os cartistas, além de trabalhadores integrantes ou não de outros
94 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

movimentos sociais, recorrentemente presos, processados judicialmente,


multados, executados sumariamente nos embates com aparatos repressi-
vos, ou mesmo condenados à morte (FLETT, 2006; HOVELL, 1925;
LOVETT; COLLINS, 1840; MORTON; TATE, 1968).
Os Movimentos analisados atribuem alta importância à educação, po-
rém, necessariamente articulada às relações sociais, em especial às lutas
políticas dos movimentos e das classes trabalhadoras. Por prezarem pela
práxis, esses Movimentos, inclusive no que se refere à educação, sofrem
perseguições e restrições das classes hegemônicas, em especial por inter-
médio do aparelho do Estado (FLETT, 2006; HARRISON, 1968; LOVETT;
COLLINS, 1840; MCLAREN, [s.d.]; MORTON; TATE, 1968; OWEN, 1967a;
1967b).
Esse é um desafio atual para os movimentos de trabalhadores que
dicotomizam ou polarizam os processos de luta, dando forte ênfase ou
mesmo ficando restritos à apenas uma dimensão – econômica, política ou
cultural, que inclui a educação. Abordagens polarizadas parecem descon-
siderar a necessidade de aplicação da categoria totalidade,
desconsiderando também que as classes hegemônicas, como apontam, por
exemplo, Althusser (1999) e Mészáros (2002a; 2005), operam simultânea
e articuladamente nos âmbitos ideológico e, principalmente, repressivo.
Portanto, como apontado por Dal Ri (2012; 2013), por terem suas
próprias visões de mundo, ideologias e concepções de educação, os Movi-
mentos analisados negam dialeticamente a educação escolar hegemônica,
isto é, o ensino oficial, questão que será analisada no próximo capítulo.
Capítulo III

Negação dialética do ensino oficial

Neste capítulo analisa-se o princípio denominado negação dialética


do ensino oficial pelos Movimentos sociais de trabalhadores analisados
nesta pesquisa – MST, owenistas e cartistas.
Os owenistas, por diversos motivos, negavam dialeticamente o en-
sino propiciado às classes trabalhadoras pelas escolas existentes em
decorrência da Lei de Fábricas e pelas escolas dominicais religiosas
(OWEN, 1967a; 1967b).
Um dos motivos era a ineficácia do ensino, pois, para Owen (1967b,
p. 295), era necessário não só que se ensinasse e que se aprendesse a ler,
a escrever e a calcular, mas que se ensinasse e se aprendesse a “ler bem” e
“entender o que se lê”. Como destacam Engels (2008), Marx (1984) e Tho-
mpson (1987a; 1987b; 1987c), o ensino propiciado por aquelas iniciativas
era precário, rudimentar, ineficaz.
Owen (1967a; 1967b) destacava, ainda, que não bastava o ensino da
leitura e da escrita, pois estas são meros instrumentos para transmissão e
aquisição de outros conhecimentos. Portanto, os conhecimentos técnico-
científicos seriam meios, e não a finalidade da educação.
Em caráter emergencial ou de suplência, Owen (1967a; 1967b) co-
brou do Estado e dos industriais empenho na constituição de um sistema
nacional de instrução que tivesse vinculação com o trabalho e que fosse
franqueado aos trabalhadores, de forma a minorar as condições degradan-
tes de vida – material, intelectual e moral – a que estavam submetidos.
Dessa forma, em decorrência da importância e da necessidade da
imediata educação das classes trabalhadoras, Owen (1967a; 1967b), ao
96 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

mesmo tempo em que diverge em relação aos princípios e aos valores ine-
rentes à velha sociedade, cuja educação considera má e imprópria,
protestou contra a inexistência de um sistema nacional de educação fran-
queado às classes trabalhadoras, ainda que, inclusive por seu
conhecimento empírico, pudesse inferir antecipadamente o caráter polí-
tico-ideológico e a ineficácia – em termos de ensino de conhecimentos
técnico-científicos – da educação que provavelmente seria propiciada aos
trabalhadores pelas classes hegemônicas, num eventual sistema nacional
de ensino.
O owenismo é incisivo quanto ao caráter inconciliável da educação e
dos rudimentos do ensino propiciados, nos moldes da época, a parcelas
das classes trabalhadoras por algumas iniciativas, como, por exemplo, es-
colas das fábricas e escolas dominicais religiosas, devido à ideologia e à
visão de mundo difundidas por essas escolas (OWEN, R., 1967a; 1967b;
1968; 2002; OWEN, R. D., 1968).
A rigor, a educação concebida e executada por Owen seria inexequí-
vel, fosse nas escolas do Estado, nas dominicais religiosas ou nas escolas
das fábricas. Essa inviabilidade decorreria de diversos motivos, em espe-
cial pelo fato de nas escolas de New Lanark serem aplicados, de maneira
plena ou embrionária, os princípios enunciados nesta pesquisa.
Além disso, haveria outras especificidades relacionadas à dimensão
mais pedagógica, pois, à época, Owen adotava teorias e práticas pedagógi-
cas inovadoras e progressistas, tanto em termos de conteúdos, quanto de
metodologias. Inclusive por isso, contrariava a concepção de educação he-
gemônica, provocando reações adversas de setores mais conservadores
(OWEN, R., 1967a; 1967b; 1968; OWEN, J., 1968).
Contudo, ao mesmo tempo em que reivindica a criação de um sis-
tema de educação nacional para as classes trabalhadoras, Owen instituiu
um sistema próprio de educação, segundo ele, boa e adequada para os
Cláudio Rodrigues da Silva | 97

trabalhadores de New Lanark, dado o caráter inconciliável entre a ideolo-


gia e a visão de mundo da velha sociedade e as da nova sociedade por ele
defendidas (OWEN, 1967a; 1967b).
Ainda que Owen (1967b, p. 251) reconhecesse que seria “[...] quase
em vão uma boa educação para poucos [...]”, quando a maioria dos traba-
lhadores não recebia educação alguma ou recebia uma educação
inadequada, reconhecia a importância e a necessidade de se começar a
mudança de imediato e a partir das condições existentes.
Como ressaltado, as mudanças sociais, para Owen (1967a; 1967b),
ocorreriam de maneira gradual. Assim, sua nova visão de sociedade não
seria totalmente concretizada, de forma generalizada, imediata ou abrup-
tamente, ainda que a mudança tivesse que ser drástica ou radical.
Por isso era necessário reivindicar um sistema nacional de ensino
para remediar, imediatamente, os efeitos da falta de educação e de instru-
ção para os trabalhadores. Owen buscava parcerias, apoios e adesões –
privadas ou estatais – ao seu projeto de aldeias ou de sociedades modelo,
que prepararia o caminho para a nova sociedade, para o novo sistema
(OWEN, 1967a; 1967b).
Portanto, mesmo considerando o sistema vigente irracional e reco-
nhecendo que “[...] sob esse sistema não pode haver verdadeira civilização
[...]” (OWEN, 1967b, p. 89) e também que “[...] sob o sistema atual é im-
possível formar um homem verdadeiramente bom [...]” (OWEN, 1967b, p.
XXII), Owen entende que é possível e necessário que os preparativos e as
vantagens do novo sistema possam ser colocados em prática em conexão
ou a partir do velho sistema.
Os cartistas, conforme Dal Ri (2012), também tinham concepção de
educação e escola própria e, como os outros dois Movimentos, negavam o
ensino oficial. Essa postura dos cartistas decorre da ineficácia do ensino e,
98 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

principalmente, da ideologia e da visão de mundo veiculadas por iniciati-


vas oficiais.
De maneira autônoma e autofinanciada, os cartistas fundaram asso-
ciações ou sociedades de ensino mútuo, visando à autoeducação e, em
certa medida, também de trabalhadores não integrantes do Movimento
(ENGELS, 2008; FLETT, 2006; HOVELL, 1925; LOVETT; COLLINS, 1840).
Os cartistas eram terminantemente contrários ao controle da educa-
ção das classes trabalhadoras pelo Estado.

Várias propostas foram feitas em momentos diferentes para educar todo o


povo, nenhuma das quais tem sido nem merece ser adotada, por conta de seu
caráter sectário. É muito maléfico colocar a educação de nossos filhos nas
mãos de qualquer governo, especialmente de um irresponsável, tornando-se
uma das mais importantes tarefas das classes trabalhadoras e das classes mé-
dias tomar esse assunto em suas próprias mãos, e estabelecer um sistema justo
e liberal de educação, para que o poder de educar os próprios filhos não seja
tirado pelo ato arbitrário de um governo corrupto e excludente. (LOVETT;
COLLINS, 1840, p. 1)

O MST, no entendimento de Dal Ri (2004; 2012), nega dialeticamente


o ensino oficial, porque esse ensino não atende aos seus interesses de for-
mação técnico-científica e política.
O princípio da negação do ensino oficial pelo MST pode ser verificado
de maneira explícita ou implícita em documentos analisados (EAP1, 1997;
ITERRA, 2003; MST, 1996; 1999; 2001a; 2001b; 2005; 2006).

1
A Empresa de Assessoria Pedagógica (EAP) era vinculada ao Instituto de Educação Josué de Castro – responsável,
entre outros, pelos cursos de Técnico em Administração de Cooperativas e de Magistério. Realizava consultoria
independente, buscando contribuir para o processo de desenvolvimento da auto-organização e da responsabilidade
dos estudantes. Quando da realização de cursos “Os estudantes deveriam passar de um estágio inicial de anomia e
descontrole para um estágio de planejamento e organização final. Este processo mostrou-se, afinal, complexo e
complicado, resultando na evasão de diversos alunos. Por este motivo, a forma de gestão sofreu modificações, e hoje
toda a escola é ‘a empresa’.” A EAP foi extinta ficando essa incumbência a cargo do Setor de Educação do MST
(MENEZES NETO, 2003, p. 84).
Cláudio Rodrigues da Silva | 99

A escola que o Movimento quer precisa ser espaço de formação hu-


mana, de militantes da causa do povo. Além dos princípios educativos,
filosóficos e pedagógicos do Movimento, são necessários, entre outros que-
sitos, fazendo uso de palavras do próprio MST, a presença dos símbolos
do MST na escola, o nome da escola associado à memória da comunidade
e dos lutadores do povo, educandos com direito à palavra, professores que
planejem seu trabalho, presença da comunidade na escola, educandos em
ação e participando da condução do dia a dia da escola. São quesitos que,
comumente, conforme as diferentes realidades e conjunturas, não apenas
estão ausentes na escola estatal (MST, 2001c), mas, principalmente, são
proibidos ou combatidos pelo Estado e seus gestores (SILVA; DAL RI,
2019a).
É recorrente em textos do MST seu caráter essencialmente autoedu-
cador. “O MST é o grande educador dos Sem Terra. E o MST educa os Sem
Terra inserindo-os no movimento da história. É este movimento que vem
fazendo do trabalhador sem (a) terra um lutador do povo.” (MST, 2001c,
p. 19, grifos do autor).
Muitas das ações do Movimento, no entendimento de Dal Ri e Vieitez
(2008, p. 184, grifos dos autores), na medida em que incidem sobre os
Sem Terra, “[...] alteram a percepção, os conhecimentos e, em geral, a
consciência que eles têm do mundo. Deste modo, e segundo uma idéia de-
senvolvida por Gramsci (1976), o MST atua também como um educador
coletivo.”

Em suma, no MST, o acampamento e o assentamento são as mais importantes


escolas de organização coletiva do trabalho, descentralização político-adminis-
trativa e gestão democrática com base em democracia direta estruturada no
papel protagonista dos trabalhadores. (DAL RI; VIEITEZ, 2008, p. 189, grifos
dos autores)
100 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Portanto, o MST é o grande educador e a principal escola dos Sem


Terra, porque nenhum outro agente educacional, em especial o Estado ca-
pitalista, dará conta de educar os Sem Terra conforme a ideologia e a visão
de mundo do Movimento. Além disso,

O MST educa as pessoas que dele fazem parte à medida que as coloca como
sujeitos enraizados neste movimento da história e vivendo experiências de for-
mação humana, que são próprias do jeito da organização participar da luta de
classes, principal forma em que se apresenta o movimento da história. (MST,
2001c, p. 20)

Para Dal Ri e Vieitez (2008, p. 239), “O MST defende uma educação


de classe mesmo sob as relações capitalistas, como meio de desenvolver a
consciência de classe e revolucionária, como se pode observar pelos seus
princípios filosóficos e pela sua prática.” Segundo esses autores (2008, p.
259),

A ideologia disseminada na escola oficial procura ocultar a realidade difun-


dindo a visão de que na sociedade, embora exista estratificação social, não
existem classes antagônicas. Essa visão de mundo apresenta a sociedade como
se fosse unívoca. Dessa forma, os conceitos que sobrelevam são os de nação,
população, comunidade, pátria, universalidade do sistema escolar, entre ou-
tros.

Enquanto o MST, declaradamente, aplica, em suas atividades, em es-


pecial na educação, a categoria luta de classes, a educação escolar é
apresentada pelas classes hegemônicas como neutra ou universal. Aliás, a
tese da luta de classes é ideologicamente negada pelas classes hegemôni-
cas.

Concordamos, no geral, com essa proposição: a educação em uma sociedade


de classes só pode ser também uma educação de classe e ela não pode ser
Cláudio Rodrigues da Silva | 101

independente da política. Mas, para a burguesia, a ligação da política com a


educação, opera por meio da negação da presença da política na escola e do
ocultamento da existência das classes sociais. A presença da política na escola
e a explicitação da existência das classes sociais são elementos que contribuem
para a formação da consciência de classe dos trabalhadores. (DAL RI; VIEITEZ,
2008, p. 239)

Como o Movimento destaca, a escola estatal é resistente à participa-


ção da comunidade. Comumente as escolas no campo não trabalham da
perspectiva da Educação do Campo. Além disso, a reforma agrária e as
pedagogias do Movimento não cabem na escola estatal.
A escola, para o MST (2001c, p. 31, grifos do autor), “[...] não pode
deixar de ter uma intencionalidade específica na formação de valores.”

Valores que se contraponham à degradação humana que predomina em nossa


sociedade. No caso das escolas onde estão os Sem Terra, são especialmente os
valores dos lutadores do povo os que podem ser reforçados. Valores como:
esperança, solidariedade, confiança em si e nos outros, sensibilidade humana,
indignação diante das injustiças, capacidade de sonhar, coerência, alegria de
viver e de lutar pela vida, companheirismo, compromissos com as causas do
povo. (MST, 2001c, p. 31)

Entretanto, da perspectiva hegemônica, além da pseudo neutralidade


da educação, os valores difundidos são antagônicos aos que defende o
MST.

O MST espera de suas escolas que ajudem na educação da sensibilidade de


seus educandos para a dimensão dos valores; [...] Espera também um combate
explícito aos contravalores capitalistas desumanizadores, em especial contra o
individualismo, o egoísmo, o consumismo e a apatia social. (MST, 2001c, p. 51)

O MST (2001c, p. 51) ressalta, ainda, que “Valores têm ocupado pouco
espaço na agenda pedagógica das escolas. Costumam fazer parte do
102 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

chamado ‘currículo oculto’, geralmente programado pelo formato das re-


lações sociais e humanas hegemônicas na sociedade atual.” Valores têm
implicações práticas, pincipalmente.
Conforme Dal Ri e Vieitez (2008, p. 288, grifos dos autores),

A organização da escola não costuma ser apresentada como um fator pedagó-


gico importante. Os atores escolares normalmente vivenciam essa
organização, sem maiores reflexões ou preocupações, considerando-a um
meio para a realização dos objetivos pedagógicos propostos.

Assim, o modelo de organização e gestão da escola estatal é incompa-


tível com a concepção de educação do Movimento, que se pauta pela gestão
democrática (MST, 1996; 1999; 2001c).
A concepção de trabalho e de educação do Movimento é antagônica à
concepção do capital. “A nossa tarefa é formar seres humanos que têm
consciência de seus direitos humanos, de sua dignidade. Não podemos tra-
tar os educandos como mercadorias a serem vendidas no mercado de
trabalho. Isto é desumanizar, a eles e a nós todos.” (MST, 1996, p. 9). Po-
rém, a escola estatal trabalha conforme a perspectiva do mercado de
trabalho, enquanto o MST trabalha conforme a perspectiva do trabalho
associado (DAL RI; VIEITEZ, 2009).
Enquanto o “O MST quer educar seres humanos que também sejam
militantes da causa da transformação do mundo.” (MST, 2001c, p. 55), o
ensino oficial, coerentemente com a ideologia e com a visão de mundo he-
gemônicas, visa à naturalização e à adaptação, ou seja, a conservação do
modo de produção e da formação econômico-social vigentes.
Portanto, há um elenco de fatores que levam o Movimento a negar,
de forma dialética, a educação escolar estatal.
Um dos motivos está mais relacionado ao direito à educação escolar,
previsto na CF/1988 e regulamentado na LDB/1996, pois o Estado não
Cláudio Rodrigues da Silva | 103

cumpre a contento ou eficazmente a legislação, seja pela ineficácia do en-


sino, seja pela inexistência ou insuficiência de escolas em determinadas
regiões, em especial no campo2, mais especificamente em áreas de acam-
pamentos e de assentamentos da reforma agrária (CALDART, 1997;
STEDILE, 2012).
O problema da ineficácia do ensino envolve numerosos fatores, como,
por exemplo, a crescente precarização das condições de trabalho docente,
que acabam por impactar negativamente no processo de ensino-e-apren-
dizagem.
Há outras questões implicadas, como, por exemplo, a forma de estru-
turação, de organização e de funcionamento das escolas, conteúdos,
metodologias, entre outros pontos relacionados à dimensão mais pedagó-
gica, que, a rigor, é indissociável da concepção de educação.
Mesmo elaborando incisivas críticas ao ensino oficial, o Movimento
cobra do Estado o cumprimento do direito constitucional à educação esco-
lar. Além disso, tenta, às vezes com êxito, a ocupação de escolas estatais,
isto é, a conquista da hegemonia ou a influência na gestão dessas escolas
com vistas a implementar seu projeto de educação (CASA, 2005; DAL RI,
2004; DAL RI; VIEITEZ, 2008; MARTINS, 2004), tensionando especial-
mente o artigo 206 da CF/1988 e o Artigo 3º da LDB/1996, que preveem
a gestão democrática na escola estatal.
A falta de escolas para acampados ou assentados é uma preocupação
que data das primeiras ocupações de terras realizadas pelo Movimento
(CALDART, 1997; 2004; MST, 1996; 1999; 2001c; STEDILE; FERNANDES,
2001).

2
A questão da insuficiência e da precariedade da educação escolar estatal para as áreas rurais é um problema
histórico no Brasil, desde as primeiras políticas governamentais para essa modalidade de educação (ÁVILA, 2013;
SOUZA, 2009) até a atualidade (CALDART, 2012; FERREIRA; BRANDÃO, 2011; RIBEIRO, 2012).
104 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

A rigor, de maneira quase geral, assentamentos e, principalmente,


acampamentos, são carentes de todos ou quase todos os equipamentos pú-
blicos de uso coletivo, como, por exemplo, escolas, unidades básicas de
saúde, unidades de pronto atendimento, saneamento básico – em especial
redes de água e de esgoto, coleta de lixo –, transportes coletivos, estradas
conservadas e transitáveis, entre outros.
O registro de ausência, precariedade ou insuficiência de equipamen-
tos públicos é recorrente em documentos do Movimento ou de seus
intelectuais (CALDART, 1997; MST, 2010; STEDILE, 2012; STEDILE;
FERNANDES, 2001), assim como em textos que tratam, de alguma forma,
das condições ou da qualidade de vida – que é uma das recorrentes preo-
cupações do MST – em assentamentos ou acampamentos (DAL RI, 2004;
D’AQUINO, 2011; GOHN, 2009; NABÃO, 2011).
Não se trata de uma questão de menor importância, haja vista que,
além dos impactos negativos na qualidade de vida das pessoas assentadas
ou acampadas, isso coloca em xeque as possibilidades de êxito da reforma
agrária, pois, além de poder influenciar negativamente na produção, pode
levar a diferentes formas de abandono das terras, bem como ao êxodo para
áreas urbanas (STEDILE, 2012; STEDILE; FERNANDES, 2001; TORRES;
SILVA; MORAES, 2014), o que também pode colocar em risco a reprodu-
ção do MST, bem como de outros movimentos de trabalhadores rurais ou
do campo.
Conforme o Movimento foi crescendo e se fortalecendo, passa tam-
bém a ter necessidade de empreender ações no sentido de constituição de
escolas próprias para a formação de educadores (CALDART, 1997). Se-
gundo Jaeguer (1969, p. 3), “Todo o povo que atinge um certo grau de
desenvolvimento se sente naturalmente inclinado à prática da educação.
Ela é o princípio por meio do qual a comunidade humana conserva e trans-
mite a sua peculiaridade física e espiritual.”
Cláudio Rodrigues da Silva | 105

Acampamentos e assentamentos sem escola não fazem parte da


praxe do MST, que, para evitar que os Sem Terra, em especial os Sem Ter-
rinha, fiquem privados dos conhecimentos técnico-científicos, coloca em
ação as escolas itinerantes.

O encontro entre Movimento e Escola já faz parte da identidade do MST e se


constitui como uma das dimensões importantes da Pedagogia do Movimento.
Assentamento e acampamento sem escola, não é coisa do MST, e ser Movi-
mento, já é coisa de escola em muitos acampamentos e assentamentos. (MST,
2001c, p. 24)

Esse é um dos motivos pelos quais o Movimento tem que negar dia-
leticamente a educação oficial, pois prima pela educação política e escolar
de seus integrantes, assim, quer e tem necessidade de escolas em todos os
acampamentos e assentamentos, visando à apropriação dos conhecimen-
tos técnico-científicos pelos Sem Terra.
Por outro lado, mais especificamente a partir dos anos 1990, com a
vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) (BRASIL, 1990),
crianças e adolescentes considerados em idade escolar são obrigados a fre-
quentar regularmente a escola estatal ou escola reconhecida e autorizada
pelo Estado (BRASIL, 1996b), sob risco de tipificação de abandono intelec-
tual3, o que pode gerar sanções para as pessoas legalmente responsáveis
(BRASIL, 1990).

3
Isso suscita a seguinte problematização: o que interessa ao Estado brasileiro é a frequência, e não o efetivo
aprendizado dos conhecimentos científicos, pois diante da contumaz ineficácia do ensino, em última instância,
responsabilidade legal do Estado, não há responsabilização de governantes ou de gestores do Estado pelo abandono
intelectual de um significativo contingente de pessoas. Isso, por um lado, pode ser indício de que se trata mais de
uma questão formal, ou seja, o que interessa é o alto percentual de matrícula, de estudantes dentro da escola, de
forma que, num trocadilho a partir de Bourdieu e Champagne (1990), as pessoas não mais estejam excluídas do
interior, mas passam a estar excluídas no interior. Reforça, ainda, o quase bicentenário apontamento de Engels
(2008) de que as classes hegemônicas, por intermédio do Estado inclusive, renegam os conhecimentos científicos às
classes trabalhadoras.
106 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

O MST (1996; 1999; 2001c; 2010) não transige em relação à impor-


tância e à necessidade da educação escolar, ainda mais em se tratando de
uma formação econômico-social grafocêntrica como a da qual faz parte e
na qual atua (CALDART, 1997; STEDILE; FERNANDES, 2001). A educação
escolar, para o MST, está mais diretamente relacionada à dimensão do en-
sino dos conteúdos científicos que, em tese, oficialmente, é a função
principal da escola.
Porém, o Movimento (2001c, p. 30, grifos do autor) é incisivo quanto
ao caráter do ensino oficial e da inexequibilidade, em última instância, da
educação e da pedagogia do MST na escola oficial. “A pedagogia do movi-
mento não cabe na escola, porque o movimento da formação humana não
cabe na escola, mas a escola cabe na pedagogia do movimento.”
Como argumentado no capítulo anterior, a educação do Movimento
é baseada em valores humanistas e socialistas, tendo entre seus objetivos
a formação técnica e, principalmente, política de militantes engajados no
processo prático de transformação social. Inclusive pelo fato de o MST ado-
tar uma concepção de formação omnilateral e eminentemente política,
preza por ambos aspectos, técnico-científico e político-ideológico
(CALDART, 1997; MST, 1996; 1999; 2001c; STEDILE; FERNANDES, 2001).

Nossa proposta de educação está sendo posta em prática toda vez que nos or-
ganizarmos para lutar por uma nova escola; toda vez que reunirmos o
assentamento para tratar sobre a educação que interessa desenvolver para
nossos filhos e filhas; toda vez que um assentado ou uma assentada aprende-
rem a ler e escrever; toda vez que mais um jovem descobre o valor de
continuar estudando; toda vez que aumentamos o número de sem terra que
se formam na perspectiva de continuar a luta... toda vez que tentamos concre-
tizar estes princípios. (MST, 1996, p. 27)
Cláudio Rodrigues da Silva | 107

Portanto, não subestima ou descarta, total ou incondicionalmente,


nenhum dos aspectos, mas, ao invés, num exercício de síntese, incorpora
e eleva esses elementos. Aliás, a apropriação dos conhecimentos técnico-
científicos, em especial da leitura, da escrita e do cálculo, contraditoria-
mente é fator de humanização, numa formação econômico-social
grafocêntrica como é o caso do Brasil (CALDART, 1997; STEDILE;
FERNANDES, 2001).
A rigor, a apropriação desses conhecimentos tem sido tornada cada
vez mais uma necessidade, até mesmo para as atividades agrícolas e, prin-
cipalmente, agroindustriais, já que o manuseio de determinados insumos
e equipamentos demandam diferentes níveis e tipos de conhecimentos e
habilidades (CALDART, 2012; STEDILE, 2012; STEDILE; FERNANDES,
2001).
É necessária também a instrumentalização com vistas ao desvela-
mento ou ao entendimento dos aspectos político-ideológicos que regem a
atual formação econômico-social, bem como da ideologia e da visão de
mundo do Movimento, que usa diferentes publicações impressas ou ele-
trônicas como forma de manter os Sem Terra e outros segmentos das
classes trabalhadoras e de populações interessados informados sobre as
diretrizes e atividades do MST (MST, 2010).
A negação ocorre porque é inviável a plena implementação, de forma
generalizada, dos princípios educativos do MST na escola estatal, em es-
pecial no que se refere ao princípio do vínculo orgânico e indissociável
entre ensino e trabalho produtivo e ao princípio da gestão democrática.
Isso ocorre em todos os níveis e modalidades do ensino, inclusive na for-
mação de professores.
108 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Da perspectiva desta pesquisa, essa inviabilidade é decorrência de vá-


rios motivos. Um deles, recorrendo a Althusser (1999)4, é que a escola é o
principal aparelho ideológico do Estado. Outro motivo é que a concepção
de educação, de ensino, de trabalho, de democracia, enfim, de formação
econômico-social visada pelo Movimento é contra-hegemônica, não con-
ferindo, portanto, com a ideologia e com a visão de mundo veiculadas,
ainda que de forma dissimulada, pelo ensino oficial (DAL RI, 2004; DAL
RI; VIEITEZ, 2008).
Para Gutierrez (1983), iniciativas autogestionárias ou contra-hege-
mônicas podem até ser toleradas, dentro de determinados limites, porém,
nunca incentivadas. Ponce (1981) entende que o Estado não abdica do con-
trole da escola, assim como não pode abdicar do controle das Forças
Armadas, do Poder Judiciário, entre outros aparelhos.
Assim, em condições normais, uma instituição ou aparelho estatal,
como a escola, de maneira alguma atenta, em caráter oficial, contra a for-
mação social que a concebe. Fazendo inferências e partindo do que
apontam, por exemplo, Gutierrez (1983) e Ponce (1981), a educação pode,
como entendem Dal Ri (1997; 2004) e Mészáros (2005), ser intencional-
mente tornada uma área contraditória, na qual se pode, em alguma
medida, tentar praticar ou implementar uma concepção de educação con-
tra-hegemônica, mas, dentro do jogo institucional, em caráter de exceção,
e não como regra.

4
Althusser (1999) – bem como outros autores, como, por exemplo, Bourdieu e Passeron, Baudelot e Establet e
também Bowles e Gintis, analisados por Dal Ri (2004) – parece ser evitado ou não ser bem recebido, especialmente
na área da Pedagogia, pela abordagem incisiva que faz sobre a escola enquanto aparelho ideológico do Estado. Uma
análise rigorosa da educação escolar estatal na atualidade talvez leve à corroboração dos apontamentos de Althusser,
bem como de outros autores, o que, como aponta Dal Ri (1997; 2004), não implica concluir que a escola não possa
ser tornada um espaço de contradições e de luta pela hegemonia. É oportuno ressaltar que Althusser (1980), como
destacado no próprio livro, não pretendeu desenvolver uma teoria, mas, sim, notas para uma investigação sobre o
tema.
Cláudio Rodrigues da Silva | 109

Com base principalmente em apontamentos de Saviani (2009a) so-


bre o que ele denomina teorias crítico-reprodutivistas, autores como, por
exemplo, Althusser, Bourdieu e Passeron, Baudelot e Establet, Bowles e
Gintis, entre outros, que fazem uma abordagem mais incisiva sobre o ca-
ráter reprodutivista da escola capitalista, tais como a difusão da ideologia
dominante, a negação ou a dissimulação da luta de classes, a tese de uma
educação neutra, apolítica e universal, a meritocracia, a divisão social hie-
rárquico-vertical do trabalho, entre outras, passaram ser vistos,
especialmente por defensores da pedagogia histórico-crítica, como autores
que entendem que não há alternativas. Dessa perspectiva, aqueles autores
nem vislumbram possibilidades de trabalhar as contradições na escola,
nem propõem alternativas exequíveis, ficando restritos ao denuncismo e
ao imobilismo.
Por outro, na tentativa de se contrapor àquelas abordagens, setores
da pedagogia histórico-crítica passaram a superestimar a capacidade de
trabalhar as contradições e de provocar transformações sociais ou mesmo
a revolução, a partir da tese do desenvolvimento da consciência crítica
(DAL RI; VIEITEZ, 2008).
Analisando-se o entendimento de Mészáros (2005), parece incisiva a
abordagem que esse autor faz da educação oficial como cão de guarda do
sistema, e que a rebeldia de umas poucas pessoas, cujo papel é muito im-
portante na luta de classes, não é decorrência do ensino oficial, mas, sim,
da educação em seu sentido mais amplo, ou seja, nas contradições da vida
prática.

Os professores e alunos que se rebelam contra tal desígnio [conformidade uni-


versal] fazem-no com a munição que adquiriram tanto dos seus companheiros
rebeldes, dentro do domínio formal, quanto a partir da área mais ampla da
experiência educacional ‘desde a juventude até a velhice’. (MÉSZÁROS, 2005,
p. 56)
110 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Assim, pode-se inferir que os que se rebelam contra o sistema são a


exceção, e não a regra, exceção essa que só confirma a regra. Portanto, a
rebeldia não é graças ao ensino oficial estatal, mas, sim, apesar dele.
Segundo Scolese (2008), diversas lideranças, em especial aquelas da
gênese do MST, tinham pouca ou nenhuma escolarização. Pode-se, assim,
analisar o papel da escola oficial estatal na formação ou atuação política a
partir do próprio MST. A escolarização ou a falta dela não foi determinante
no engajamento dessas pessoas no Movimento. Contudo, é inegável que o
domínio dos conteúdos escolares pode contribuir para o processo de lutas
políticas.
Ao se analisar o entendimento de Marx (1996) sobre a questão da
educação e da legislação fabril, verifica-se a ênfase do autor no sentido de
que a educação omnilateral, postulada por movimentos de trabalhadores
à época, em especial os owenistas, só ocorreria com ascensão das classes
trabalhadoras ao poder político. Ou seja, sob o Estado capitalista, a educa-
ção seria uma educação capitalista, exceto que os trabalhadores tomassem
a seu cargo a gestão da educação.

Se a legislação fabril, como primeira concessão penosamente arrancada ao ca-


pital, só conjuga ensino elementar com trabalho fabril, não há dúvida de que
a inevitável conquista do poder político pela classe operária há de conquistar
também para o ensino teórico e prático da tecnologia seu lugar nas escolas dos
trabalhadores. Mas tampouco há dúvida de que a forma capitalista de produ-
ção e as condições econômicas dos trabalhadores que lhe correspondem estão
na contradição mais diametral com tais fermentos revolucionários e seu obje-
tivo, a superação da antiga divisão do trabalho. (MARX, 1996, p. 116)

Ribeiro (2002, p. 98), ao abordar a relação entre a formação coope-


rativa e a educação escolar, questiona sobre “[...] como fazer uma
formação omnilateral se os processos de trabalho exigem trabalhadores
Cláudio Rodrigues da Silva | 111

unilaterais, munidos apenas de um saber capaz de solucionar problemas


imediatos?” Para essa autora (2002, p. 98),

Nessa formação que se dá nos processos de luta pela conquista da terra e de


organização do trabalho cooperativo se estabelece uma relação contraditória
com a educação escolar, porque, de um lado, os agricultores dependem dos
conhecimentos básicos de leitura, escrita e cálculo para organizar e fazer fun-
cionar as cooperativas e, de outro, estes conhecimentos básicos são
insuficientes para o avanço das técnicas de produção e de organização do tra-
balho cooperado.

Refutando uma espécie de questionável otimismo de setores que


apostam unicamente na apropriação dos conhecimentos técnico-científi-
cos para fins de transformações sociais, Lessa (2011, p. 123) entende que
“Não há a menor possibilidade de as novas tecnologias colocarem empre-
sários e trabalhadores no mesmo campo quando se trata do
desenvolvimento omnilateral dos humanos [...].”
Num momento histórico em que ciência, tecnologia e educação esco-
lar ganham cada vez mais centralidade na composição orgânica do capital,
a negação dialética do ensino oficial parece pertinente, se não imprescin-
dível, pois, como destaca Luzuriaga (1963), “A educação, com efeito, não é
algo de isolado, abstrato, mas está relacionada estreitamente com a socie-
dade e cultura de cada época. Estas produzem ideais e tipos humanos que
a educação trata de realizar.”
Kuenzer (1994, p. 115-116, grifos da autora) entende que é inerente
ao ensino oficial educar conforme as divisões social e técnica do trabalho
vigentes.

Como as funções essenciais do mundo da produção originam grupos sociais


diferenciados com necessidades específicas, esses mesmos grupos criam para
si uma camada de intelectuais que serão responsáveis pela sua
112 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

homogeneidade, consciência e função nos campos econômico, social e político.


Formar esses intelectuais é função da escola, que para exercê-la definirá seu
princípio educativo a partir de demandas de cada grupo e das funções que
lhes cabe desempenhar na divisão social e técnica do trabalho. Cabe ressaltar
que o exercício destas funções não se restringe às de caráter produtivo, mas
abrangem todas as dimensões comportamentais, ideológicas e normativas que
lhe são próprias, devendo a escola elaborar sua proposta a partir destas exi-
gências.

Se se considerar que cada formação econômico-social concebe a edu-


cação formal em conformidade com as ideologia e visão de mundo
hegemônicas, não há coerência em recusar o reconhecimento de que a
educação oficial, por regra, só pode ter por finalidade a manutenção do
status quo. Conforme Calazans (1996, p. 13),

Se concordamos que é o 'capitalismo que planeja o planejamento', estaremos


anuindo que o planejamento da educação também é estabelecido a partir das
regras e relações da produção capitalista, herdando, portanto, as formas, os
fins, as capacidades e os domínios do modelo [...] do Estado.

Entretanto, com a negação dialética não se postula o descarte dos co-


nhecimentos técnico-científicos, mesmo porque, na atualidade, parte deles
é necessária, se não imprescindível, inclusive para fins de sobrevivência
imediata. Como argumentam Carvalho e Bauer (2011), “Não se pretende
aqui negar o valor que a educação assume no cotidiano dos trabalhadores,
mas sim apontar as contradições, os interesses e os limites das propostas
apresentadas, tanto pela burocracia oficial, como pelo capital.”
Iniciativas, tanto de educação formal, quanto de educação não formal,
têm ônus financeiros. Para além do monopólio e do controle do conheci-
mento, a questão do ônus financeiro é um dos fatores que resultam na não
oferta ou na restrição da massificação da educação escolar, sendo uma
Cláudio Rodrigues da Silva | 113

polêmica recorrente as polarizações mutuamente excludentes, isto é, ou


uma educação de boa qualidade para poucos ou uma educação de quali-
dade questionável para muitos ou para todos. No Brasil Republicano, mais
especificamente no Estado de São Paulo, o debate sobre o ônus financeiro
e sobre essa polarização permeou a história da educação, como demons-
tram Ávila (2013), Pereira (2011) e Souza (2012).
Essas históricas polarizações são um indício de que, no capital, nor-
malmente, a educação escolar não pode ser democrática ou unitária, pois,
segundo Dal Ri e Vieitez (2008), é um componente fundamental da lógica
meritocrática, que legitima a posição social das pessoas na sociedade de
classes.
Com o processo de mercantilização e de privatização da educação es-
colar, como apontam Aguiar (2010), Vieitez e Dal Ri (2011) e Torres
Santomé (2003), a tese de uma escola democrática ou mesmo unitária no
capital torna-se ainda mais questionável, haja vista que as escolas estatais
são tornadas cada vez mais precarizadas (MOURA, 2013), e as escolas pri-
vadas, além de serem de acesso exclusivo a quem pode ou se dispõe a pagar
pelos seus serviços, também têm a qualidade do ensino condicionada ao
valor que se dispõe ou que se pode pagar por ela, sendo essa uma regra
inerente ao sistema capitalista.
Tonus (2000) demonstra aspectos ideológicos e desdobramentos
práticos do processo de privatização, processo esse que não mais ocorre
apenas no formato clássico ou tradicional de venda ou transferência – di-
reta e declarada – do controle, do Estado para empresas ou proprietários
privados.
Os recursos do Estado são disputados, tanto entre as classes sociais,
quanto internamente a elas, isto é, entre suas frações. Os equipamentos
públicos de uso coletivo, como, por exemplo, as escolas, fazem parte da
dinâmica de acumulação do capital, estando, portanto, sujeitos a
114 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

constantes e acirradas disputas (KOWARICK, 1979; 2000). Engels (2008)


já chamava a atenção para o ínfimo percentual do orçamento estatal des-
tinado à instrução pública.
O ônus financeiro da educação escolar é um ponto importante para
análise e problematização das iniciativas educacionais, bem como da ne-
gação dialética da educação oficial pelos Movimentos analisados.
Diferentemente do contexto do MST, no contexto dos cartistas e dos owe-
nistas, o sistema estatal de educação escolar franqueado às classes
trabalhadoras ainda não estava desenvolvido.
New Lanark era um caso específico, pois Owen era industrial e, ao
mesmo tempo, um militante, um intelectual do socialismo utópico. Assim,
Owen tinha, até certo ponto e determinado momento, recursos financeiros
para assumir ou para subsidiar os custos da educação propiciada aos tra-
balhadores de New Lanark.
Já o caso dos cartistas era diferente. Para criação e manutenção de
associações ou escolas, cobravam uma taxa mínima (FLETT, 2006;
HOVELL, 1925; LOVETT; COLLINS, 1840) por necessidade material, já que
as lideranças cartistas, responsáveis pelas escolas, embora comumente
exercendo trabalhos com altas qualificações, eram trabalhadores.
No caso do MST, a situação também é diferente, mas a questão do
ônus financeiro, como nos demais Movimentos, está presente. Por um
lado, há, no Brasil atual, há um sistema de educação escolar estatal que
atende, ainda que desigualmente, o território nacional. Por outro lado, um
sistema próprio e abrangente, tanto em termos de distribuição pelo vasto
território nacional, quanto em termos de capacidade de matrículas e de
atendimento a estudantes, é inviável para um movimento social por diver-
sos motivos.
Além disso, pelo que se pode verificar nos documentos analisados, o
Movimento não tem intenção de substituir o Estado na oferta de educação
Cláudio Rodrigues da Silva | 115

escolar, pois o direito à educação pública e gratuita foi uma das conquistas
das classes trabalhadoras. O que o MST tenta é ocupar escolas estatais. O
Estado teria papel importante na efetivação dos direitos reivindicados pelo
MST (CALDART, 1997; STEDILE; FERNANDES, 2001).
Considerando-se, ainda, a correspondência necessária entre a escola,
enquanto um aparelho ideológico, e a formação econômico-social que a
concebe, em tese, seria inviável a democratização radical de todas as esco-
las no modo de produção capitalista, pois, considerando-se que a escola
oficial educa para a sociabilidade hegemônica, há incompatibilidade entre
uma educação democrática radical e este modo de produção, segundo Gu-
tierrez (1983) e Mészáros (2002a; 2005), inerentemente antidemocrático
e heterogestionário.
Porém, o MST tenta remediar os pontos mais prementes ou estraté-
gicos da educação escolar estatal para a instrumentalização dos Sem Terra
e, em alguma medida, das classes trabalhadoras, com os conhecimentos
técnico-científicos, em certa medida, necessários ou mesmo indispensá-
veis em diferentes esferas da vida social na atualidade.
Tensionando a legislação, o MST (1996; 1999; 2001c), quando ocupa
escolas, tenta adequar o currículo – conteúdos, metodologias, avaliações,
entre outros aspectos – à sua concepção de educação, portanto, a suas ide-
ologia e visão de mundo. A LDB/1996 prevê uma margem de adequação
do currículo às necessidades ou às características das próprias comunida-
des.
Entretanto, dependendo inclusive do posicionamento político-ideoló-
gico do corpo de funcionários das escolas (CALDART, 1997; DAL RI;
VIEITEZ, 2008), pode haver negativa ou resistência à adequação com vis-
tas a atender as reivindicações e à implementação dos princípios do
Movimento.
116 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

A não adequação do currículo à ideologia do MST implica submeter


os Sem Terrinha e os Sem Terra à ideologia hegemônica. Isso ressalta a
importância da gestão democrática, bem como da iniciativa do MST de
instigar e, em termos, preparar seus educandos em cursos de formação de
educadores para prestarem concursos públicos (CALDART, 1997; ITERRA,
1996; 1997) e, com isso, tentarem, oficialmente, ocupar esses cargos no
magistério oficial estatal.
O Movimento adequa não só o currículo formal, mas principalmente
o currículo oculto, implementando a gestão democrática, articulando o en-
sino ao trabalho produtivo, colocando em prática, no todo ou em parte,
elementos da sua pedagogia, como, por exemplo, a mística, a adequação
das datas comemorativas e das personalidades – a rigor, mártires ou luta-
dores do povo ou das classes trabalhadoras – homenageadas (MST, 1996;
1999; 2001c).
Considerando-se que o Movimento posiciona-se criticamente ao
modo de produção capitalista, e tem em vista o socialismo (ITERRA, 1996;
1997; MST, 1996; 1999; 2001c; 2005), o que também é reiterado por alguns
de seus intelectuais, como, por exemplo, Caldart (1997), Stedile (1997),
Stedile e Fernandes (2001) e Mauro (apud RUBBO, 2012), negar dialetica-
mente a educação escolar estatal é uma condição imprescindível para agir
coerentemente com os seus princípios, ideologia e visão de mundo. Além
disso, a negação não só é gênese como também é desdobramento dos de-
mais princípios.
Está posta, assim, a necessidade de se ocupar as escolas estatais e de
se reformar (não num sentido reformista, mas transformador) a educação
estatal, mas fazendo uso dela, de dentro da escola, ciente das contradições
e dos limites, com todos os ônus e bônus decorrentes dessa opção. Numa
analogia a partir de Mészáros (2002a), seria como ter de reformar uma
casa morando nela, ou seja, com todos os incômodos, por não haver outra
Cláudio Rodrigues da Silva | 117

casa para morar até que a reforma da primeira casa fosse concluída. Dessa
perspectiva, é inviável uma negação mecânica, ou seja, a recusa incondici-
onal e a priori da escola estatal. Entretanto, como ressalta Mészáros
(2005), a lógica do capital é incorrigível, e o capital, irreformável.
A educação escolar estatal foi decorrência de um processo
contraditório, pois, ao mesmo tempo que havia/há interesse e necessidade
desse aparelho para a constituição e a consolidação dos Estados Nacionais,
para a difusão da ideologia hegemônica e para a preparação de força de
trabalho, contraditoriamente, foi fundamental para ampliação – lenta e
gradual, em termos de obrigatoriedade, idade, anos ou níveis de ensino –
do acesso das classes trabalhadoras à escola e, em certa medida, aos co-
nhecimentos técnico-científicos. Porém, esse avanço decorre
principalmente de embates desencadeados por trabalhadores e seus
movimentos sociais, conforme a correlação de forças em cada momento
histórico (BASBAUM, 1982; DAL RI; VIEITEZ, 2008; PONCE, 1981;
SANFELICE, 2005a).
O principal marco da educação pública é a Revolução Francesa,
quando “[...] os representantes do povo transformam o tipo estatal de
educação anterior, dando origem à educação pública nacional, que se
realiza no correr do século XIX.” (LUZURIAGA, 1959, p. 2, grifos do autor).
A instituição de um sistema oficial de ensino resultou na interferência
e controle direto do Estado, por intermédio de seus governantes e gesto-
res, na educação das classes trabalhadoras, o que é entendido, por
determinados movimentos de trabalhadores, como, por exemplo, os car-
tistas, como algo problemático.
Luzuriaga (1959) entende que foi com a intervenção do Estado, em
1870, que a educação na Inglaterra foi progressivamente sendo tornada
118 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

mais democrática, ou, em outras, palavras, massificada 5. Esse ponto de


vista é corroborado por Flett (2006), que argumenta que, indubitavel-
mente, a lei de 1870 marcou uma nova era para a educação da classe
trabalhadora.
Partindo do que apontam Flett (2006) e Luzuriaga (1959), reconhece-
se a importância da intervenção do Estado para a massificação do ensino
e, por conseguinte, a franquia de seu acesso às classes trabalhadoras.
Luzuriaga (1959) entende que o Estado teve papel importante na de-
mocratização do ensino, não obstantes as crescentes intervenções do
Estado e a decrescente perda do poder de controle das classes trabalhado-
ras sobre a educação. Já no entendimento de Flett (2006, p. 20), “A
intervenção do Estado na educação resultou em algumas perdas e alguns
ganhos para a educação da classe trabalhadora.”
Da perspectiva desta pesquisa, entende-se que há significativa dife-
rença entre a massificação ou a franquia do ensino (garantia de acesso e,
possivelmente, de permanência e de apropriação dos conhecimentos téc-
nico-científicos) e o controle da participação dos processos decisórios da
escola. Assim, o que ocorreu foi a massificação, e não a democratização,
pois o controle foi cada vez mais sendo concentrado nas mãos do Estado,
como foi o caso da Inglaterra que, incialmente, contava com conselhos es-
colares eleitos – que possibilitariam alguma participação das classes
trabalhadoras nos processos decisórios acerca da educação –, conselhos
esses extintos posteriormente (LUZURIAGA, 1959). Ou seja, quanto mais
o sistema escolar estatal cresceu, menos democrático foi tornado.
O desenvolvimento da educação das classes trabalhadoras, conforme
Flett (2006, p. 21), “[...] nunca foi um processo simples e linear [...]”, mas

5
A rigor, há diferença entre democratização, que etimologicamente remete a poder decisório, e massificação do
acesso à educação. Assim, não há uma relação necessária entre massificação do acesso e democratização da educação,
Cláudio Rodrigues da Silva | 119

foi objeto de debates e embates durante todo o seu percurso, até porque,
mesmo entre setores dos próprios movimentos sociais de trabalhadores, a
temática da educação não era consensual em todos os aspectos.
Reitera-se que, já na primeira metade do século XIX, portanto, antes
da constituição de sistemas estatais para educação escolar em massa, se-
tores das classes trabalhadoras que eram contrários ao controle estatal da
educação dos trabalhadores já sustentavam uma posição enfática, qual
seja, uma educação custeada pelo Estado – que, a rigor, é sustentado com
impostos, tributos ou taxas cobrados compulsoriamente dos trabalhadores
–, porém, sob gestão das classes trabalhadoras (DAL RI, 2004; LOMBARDI,
2011; MANACORDA, 1992).
O direito à educação escolar, assim como outros direitos, é decorrên-
cia de embates intensos entre e intra classes sociais. Em torno do currículo,
há disputas de variadas ordens entre forças reacionárias, conservadoras e
progressistas6. Estão em jogo concepções de educação, de trabalho, enfim,
de formação econômico-social. Segundo Luzuriaga (1959, p. 3), “Como é
sabido, a educação pública em cada país não é um fato isolado, mas está
intimamente relacionada com a concepção do mundo e da vida
predominante em cada momento de sua história.”
Além disso, como apontado, um sistema escolar, assim como outros
direitos sociais, demanda recursos financeiros. Sabe-se que o orçamento
estatal é disputado tanto entre classes sociais quanto internamente a elas,
isto é, por suas frações, até porque os equipamentos estatais de uso cole-
tivo também fazem parte da dinâmica de acumulação do capital, portanto,
da dinâmica da luta de classes. Assim, as disputas em torno da educação
escolar especialmente tornam-se mais acirradas, principalmente quando,

6
Disputas em torno do currículo escolar não são inócuas ou desinteressadas, pois, subjacentes a cada concepção de
currículo, há, necessariamente, ideologias e visões de mundo. Um exemplo de disputa que tem ganhado algum
destaque é aquela que ocorre entre criacionismo e evolucionismo.
120 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

em decorrência dos constantes avanços tecnológicos e da importância das


tecnologias para a produção, para a produtividade e para a composição
orgânica do capital, os conhecimentos técnico-científicos são tornados
cada vez mais imprescindíveis.
Mais especificamente no Brasil, a preocupação de governantes e ges-
tores estatais com o ônus financeiro do sistema escolar perpassa a história
da educação. Avanços ocorreram muito lentamente no sentido de massifi-
cação da educação escolar estatal, bem como de melhorias nas condições
de acesso, permanência e apropriação dos conhecimentos técnico-científi-
cos pelas classes trabalhadoras de maneira massificada.
A CF/1988 é um marco em termos de conquistas de direitos pelas
classes trabalhadoras, haja vista principalmente a mobilização de signifi-
cativas parcelas dessas classes para conseguir uma correlação de forças
favorável e, assim, garantir a incorporação ou a manutenção e a transfor-
mação de reivindicações em direitos legais. Porém, vários dos avanços
conquistados ou não foram implementados ou foram revogados ou refor-
mados, implicando significativos retrocessos, como foi o caso do
dispositivo que trata da gestão democrática, entre outros (GROSSI, 1997).
Embora a gestão democrática figure na legislação, pesquisas indicam que,
por diversas razões, a escola estatal não é gerida democraticamente
(FERRARO, 2009; 2011; HOJAS, 2007; LANZA, 2010; LIMA, 2008;
OLIVEIRA, 2009; 2010; PIMPINATO, 2009; SANTANA, 2006; SANTOS,
2006; SANTOS, 2007; SERVILHA, 2008; SILVA, 2006).
Por isso a importância de se analisar a educação da perspectiva da
totalidade, tentando identificar e intervir na raiz, ou seja, nas causas, e não
nos efeitos do problema. Assim como com qualquer outro aparelho, seja
ideológico, seja repressivo, analisar e intervir na educação formal de-
manda, necessariamente, analisar e intervir no Estado, demanda
considerar as múltiplas e complexas relações, em especial com o modo de
Cláudio Rodrigues da Silva | 121

produção vigente. Daí a necessidade de lutas articuladas e simultâneas em


todas as instâncias e esferas, política, econômica e cultural (DAL RI,
VIEITEZ, 2008; DEL ROIO, 2002). As disputas por espaços e demandas
colocadas pelas classes trabalhadoras

[...] podem configurar uma sociedade civil global efetivamente antagônica à


ordem do capital, que trave uma luta de ocupação de espaços e de criação de
novas formas do viver, mas sem esquecer que a questão do Estado nacional e
das identidades coletivas continua sendo uma mediação necessária também
para a constituição do proletariado em classe global em luta pelo poder polí-
tico. Os Estados são espaços de poder que devem ser quitados ao capital, a fim
de servir de pontos de difusão de experiências sociais e culturais [...]. (DEL
ROIO, 2001, p. 70)

Como ressalta Luzuriaga (1959, p. 3), a educação pública, a rigor, es-


tatal, é um fenômeno complexo, pois é

[...] integrado por grande variedade de elementos. Entre êles figuram, além
daquela concepção geral da vida e do mundo, o regime político e social, a or-
ganização administrativa do Estado, a participação dos municípios e das
autoridades provinciais na vida pública, as ideias pedagógicas predominantes,
o grau de desenvolvimento das instituições educacionais, a maior ou menor
intervenção dos grupos profissionais, etc.

Esse conjunto de fatores “[...] faz da educação pública produto


sumamente complexo e dificulta seu estudo, quando este não se limita,
como acontece freqüentemente, a mera exposição de leis e regulamentos.”
(LUZURIAGA, 1959, p. 3). Pode-se aventar que isso, analogicamente, re-
mete aos mitos da espada de Dâmocles e da cama de Procusto. Eventuais
medidas implementadas podem ter repercussões para além do planejado
ou do esperado, além de suscitar diferentes pontos de vista, portanto, de
disputas entre e intra classes sociais. Por isso também a pertinência do
122 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

dispositivo da gestão democrática da educação, de maneira que as decisões


possam ser tomadas com a participação das classes trabalhadoras. Toda-
via, como apontado, não é o que ocorre na escola estatal.
Da perspectiva do marxismo, a negação dialética pode ser sintetizada
com o apontamento de Manacorda (1992, p. 296):

O marxismo não rejeita, mas assume todas as conquistas ideais e práticas da


burguesia no campo da instrução [...]: universalidade, laicidade, estabilidade,
gratuidade, renovação cultural, assunção da temática do trabalho, como tam-
bém a compreensão dos aspectos literário, intelectual, moral, físico, industrial
e cívico. O que o marxismo acrescenta de próprio é, além de uma dura crítica
à burguesia pela incapacidade de realizar estes seus programas, uma assunção
mais radical e consequente destas premissas e uma concepção mais orgânica
da união instrução-trabalho na perspectiva oweniana de uma formação total
de todos os homens.

Porém, como argumentado, parece incisivo, no posicionamento de


Marx (1996) em relação à educação omnilateral, o entendimento de que a
conquista dessa educação estaria condicionada à conquista do poder polí-
tico pelas classes trabalhadoras. Talvez a negação dialética marxista eleve
a questão um pouco mais que o apontado por Manacorda (1992), não fi-
cando a posição marxista restrita a criticar duramente a burguesia.
A negação dialética do ensino oficial é uma necessidade para setores
que pretendem avançar, seja no sentido da democratização da escola, seja
no sentido de democratização das relações de produção, em última instân-
cia, indissociáveis.
Os direitos conquistados pelas classes trabalhadoras estão sempre
sob risco de retrocessos (DAL RI, 1997). A negação dialética da educação
escolar estatal implica, neste momento, a necessidade de lutar por sua de-
mocratização radical, sem, no entanto, deixar de empreender ações
coordenadas em outras instâncias ou esferas sociais.
Cláudio Rodrigues da Silva | 123

Em suma, as ocupações de escolas, levadas a termo pelo MST, apesar


das inevitáveis contradições, exemplificam a negação dialética, visando e
apontando, duma perspectiva – recorrendo a expressões de Sánchez Vá-
zquez (2007) – de práxis transformadora ou revolucionária, para avanços,
ainda que embrionários, na democratização do ensino oficial e, possivel-
mente, de outras esferas sociais.
No processo de negação dialética, o Movimento, ainda que o ensino
oficial seja antagônico ao projeto educativo e à formação econômico-social
por ele visados, não realiza o descarte a priori e incondicional desse ensino,
mas tenta ocupar a escola estatal, com vistas a democratizá-la e, assim,
torná-la pública, ou seja, sob controle ou gestão dos trabalhadores.
Dal Ri e Vieitez (2008, p. 317, grifos dos autores) consideram o pro-
jeto educativo do MST “[...] uma posição política e educacional de primeira
grandeza por suas conotações sociais inclusivas, ou seja, o MST é partidá-
rio incondicional da escola pública e gratuita. Ao que devemos acrescentar
o termo de democráticas, por nosso prognóstico decorrente da análise.”
As ações empreendidas pelo MST com vistas à conquista da hegemo-
nia e ao controle de escolas estatais pelas classes trabalhadoras é um
avanço significativo, em especial quando, na atualidade, diante da preca-
riedade do ensino ou de divergências, em termos pedagógicos ou
educativos, o mais comum é que segmentos procurem soluções mais indi-
viduais ou corporativas, especialmente recorrendo-se ao ensino privado
mercantil, quando o objetivo maior se refere a conhecimentos técnico-ci-
entíficos, ou a escolas comunitárias ou confessionais, quando o objetivo
principal está mais relacionado a questões de valores ou princípios.
Capítulo IV

Gestão democrática

Neste capítulo analisa-se o princípio denominado implementação da


gestão democrática nas associações e escolas dos Movimentos sociais de
trabalhadores analisados nesta pesquisa – MST, owenistas e cartistas.
Nos documentos analisados, tanto de autoria de Robert Owen (1967a;
1967b; 1968; 2002), quanto de owenistas (OWEN, J., 1968; OWEN, R. D.,
1968) e sobre o owenismo (ALMEIDA, O., 2010; DAVIDSON, [s. d.];
DONNACHIE, 2000; 2011; DONNACHIE; HEWITT, 1999; MCLAREN,
[s.d.]; O’HAGAN, 2007; PIOZZI, 1999; TEIXEIRA, 2002), não foi identifi-
cada menção à forma como era ou seria gerida a educação escolar em New
Lanark ou no novo mundo moral owenista.
Todavia, a partir da forma como Owen (2002) previa a organização
e o governo das comunidades, podem ser feitas inferências sobre como
seria a gestão das escolas owenistas.
Para fins de definição de atividades a serem realizadas, Owen (2002)
propõe as seguintes classificações, com base na idade cronológica das pes-
soas, critério por ele considerado natural, em contraponto aos critérios
artificiais, adotados pela velha sociedade.
A primeira classe seria composta pelas pessoas até os cinco anos de
idade; a segunda, pelas pessoas entre cinco e dez; a terceira, dos dez aos
quinze; a quarta, dos quinze aos vinte; a quinta, dos vinte aos vinte e cinco;
a sexta, dos vinte e cinco aos trinta; a sétima, dos trinta aos quarenta; a
oitava, dos quarenta aos sessenta anos (OWEN, 2002).
No projeto owenista, a classe apta ao governo seria a sétima, que
compreenderia as pessoas entre trinta e quarenta anos. Essas pessoas
Cláudio Rodrigues da Silva | 125

comporiam o conselho geral, que seria responsável pela escolha de mem-


bros que formariam o comitê que dirigiria cada departamento.

Cada comunidade será governada, no departamento do interior, por um con-


selho geral, composto de todos os membros com idade entre trinta e quarenta
anos; e cada departamento será dirigido por um comitê, composto por mem-
bros do conselho geral, por ele escolhidos, segundo uma ordem a determinar,
e, no departamento exterior ou estrangeiro, por todos os membros entre qua-
renta e sessenta anos. (OWEN, 2002, p. 141, grifos do autor)

Essa classificação, considerada por Owen (2002) um critério natural,


tem como base a tese da aquisição gradual de conhecimentos e experiên-
cias. Dessa forma,

A idade da produção e da aquisição de conhecimentos práticos será da infância


aos vinte anos; de vinte a vinte e cinco, ensinar-se-á aos outros os mais eleva-
dos campos da ciência e a prática dos negócios sociais; de vinte e cinco a trinta,
ocupar-se-ão da conservação e distribuição das riquezas. Cada um será assim
preparado para tornar-se membro do comitê do governo interior e a exercer
as funções durante dez anos. (OWEN, 2002, p. 141)

Com isso, no entender de Owen (2002, p. 141), “[...] o governo nunca


envelhecerá, mas estará sempre no vigor da juventude e na força da expe-
riência.” Formulação análoga a essa é encontrada em Rousseau (1973).
Em outros termos, estaria posto, no projeto de Owen, a questão do
rodízio nas atividades, que, por sua vez, demandaria o aprendizado de to-
das as funções por todas as pessoas, pois, “Todos os membros educados
na comunidade serão chamados, aos trinta anos, a assumir responsabili-
dades no governo do interior; aos quarenta, deverão ocupar postos no
departamento exterior, até os sessenta anos; nessa idade, serão dispensa-
dos.” (OWEN, 2002, p. 141).
126 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Portanto, a participação e a contribuição nas atividades comunais, in-


clusive nas atividades de gestão, seriam uma espécie de dever tácito de
todos, conforme a idade e a capacidade. Em tese, com exceção dos casos
previstos por Owen (2002), todos seriam capazes de aprender tudo o que
fosse ensinado, o que colocaria todos na condição de participar das instân-
cias decisórias, porém, no momento adequado, de acordo com a faixa
etária prevista.
Conforme previsto por Owen (2002, p. 141), “Quando todos os mem-
bros da comunidade tiverem-se tornado capazes de tomar parte nos
deveres do conselho geral, não haverá mais escolha ou eleição de nenhum
membro do conselho.” Portanto, após esse aprendizado, todas as pessoas,
no devido tempo, segundo o critério das faixas etárias ou geracional, esta-
riam aptas e poderiam ser chamadas a exercer todas as funções nas
comunidades, inclusive gerir, entre outros departamentos ou atividades, a
educação, uma das prerrogativas do conselho geral.

Os deveres do conselho geral no interior serão governar todos os arranjos nos


limites da comunidade; organizar a produção, a distribuição, a educação; afas-
tar as circunstâncias desfavoráveis à felicidade e substituí-las pelas mais
vantajosas que sejam possível inventar ou aprender com as outras comunida-
des. (OWEN, 2002, p. 140-141)

O conselho geral teria “[...] plenos poderes em todas as coisas no de-


senvolvimento de seu governo [...]” (OWEN, 2002, p. 141). Todavia,
“Sempre que necessário, o conselho chamará em seu socorro todas as opi-
niões e talentos práticos de membros que não o integram.” Em caso de
arbitrariedades, o conselho geral pode ter seus poderes revogados por de-
cisão de uma assembleia geral convocada “[...] para examinar com calma
e paciência a conduta do conselho.” (OWEN, 2002, p.141).
Cláudio Rodrigues da Silva | 127

Entretanto, a convocação de assembleia para essa finalidade seria


prerrogativa dos que já tivessem exercido a função de conselheiros, por-
tanto, com mais de sessenta anos (OWEN, 2002). Essa assembleia geral
seria composta pelos membros da comunidade entre dezesseis e trinta
anos, colocando à margem dos processos decisórios, para essas finalida-
des, pessoas com idades abaixo dessas faixas.
Assim, o conselho geral e, por extensão, todas as áreas, inclusive a
educação e sua gestão, seria uma espécie de gerontocracia, com prepon-
derância relativa dos anciãos, chamados, em última instância, para
decidirem as questões não resolvidas pela comunidade, já que “Todas as
[...] pendências, se ocorrerem, serão amigavelmente resolvidas por deci-
são da maioria de três anciãos, membros do conselho do exterior.”
(OWEN, 2002, p. 141-142).
Como já dito, nos documentos analisados, sejam de autoria de Owen,
sejam sobre Owen, não foi identificada menção à forma como era ou seria
gerida a educação escolar em New Lanark ou no novo mundo moral owe-
nista (DONNACHIE, 2006; OWEN, 1967a, 1967b, 2002; PIOZZI, 1999).
Todavia, verifica-se que a educação se pautava pelo autogoverno, ou seja,
concebida e, na medida do possível, executada em conformidade com os
pressupostos owenistas, e não com os pressupostos hegemônicos vigentes
à época.
Até mesmo por se balizar por princípios do socialismo utópico, bem
como pelo momento histórico e estágio de organização dos trabalhadores
vinculados a esse Movimento, a educação não era ou não seria gerida
duma perspectiva democrática nos moldes dos cartistas, por exemplo. Po-
rém, se cotejada com a educação hegemônica da época, a owenista
apresentava avanços significativos, o que permite sustentar que conteria
elementos necessários ou que apontariam para uma concepção democrá-
tica de educação. Marx (1984) chama a atenção para avanços da educação
128 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

owenista, que fariam dela uma espécie de educação do futuro, mais espe-
cificamente pelo vínculo entre ensino e trabalho produtivo.
Engels (1877, p. 152-153), refutando críticas realizadas por Dühring,
então professor da Universidade de Berlin, comenta experiências owenis-
tas ressaltando sua importância para as lutas das classes trabalhadoras.

Se houvesse tido em suas mãos o seu Book of the New Moral World, não só
teria visto afirmado nele o mais definido comunismo, com o dever geral de
trabalhar e o direito de participar eqüitativamente do produto do trabalho –
equidade dentro de cada idade, como Owen salienta sempre – como também,
perfeitamente esboçado, o edifício da sociedade comunista do futuro, com os
seus planos, a sua planta e a sua perspectiva. Mas, quando o estudo das obras
pessoais dos representantes da ideologia socialista se reduz ao simples conhe-
cimento do título, ou, quando muito, de qual é o tema de alguns livros, como
é o caso do Sr. Dühring, não há outra solução senão precipitar-se em afirma-
tivas absurdas e inventadas. Owen não só pregou o ‘comunismo decidido’
como também o praticou durante cinco anos (do fim da década de 1830 ao
início da década de 1840) na colônia de Harmony Hall de Hampshire, cujo
comunismo não deixava, quanto à sua decisão, nada a desejar. Eu mesmo tive
ocasião de falar pessoalmente com várias pessoas que haviam pertencido a
essa colônia comunista experimental.

Assim, pode-se considerar que o modelo idealizado por Owen conte-


ria um gérmen democrático, pois colocaria todos, indistintamente, como
potenciais ocupantes de funções ou cargos gestores, ainda que fosse um
modelo relativamente excludente, em termos geracionais.
A gestão democrática nas associações e escolas, conforme Dal Ri
(2012), é um dos princípios educativos presentes nos cartistas.
Coerentemente com o principal móbil de luta do Movimento, qual
seja, o direito à igualdade política, portanto, à participação de todos nos
processos decisórios do Estado, os cartistas defendiam e implementaram
a gestão democrática nas suas associações e escolas. Segundo Lovett e
Cláudio Rodrigues da Silva | 129

Collins (1840, p. 15), “Todas as pessoas, homens e mulheres, [...] em


conformidade com as regras da associação, são elegíveis para se tornarem
membros [...]”. Uma vez membros e em conformidade com as regras,
podiam eleger e ser elegidos para os diversos cargos e instâncias das
associações ou das escolas.
A democracia era regra nas atividades e organizações cartistas, como,
por exemplo, encontros, convenções, assembleias, associações, escolas, en-
tre outras. Na Associação, conforme Lovett e Collins (1840, p. 15),

O presidente, o vice-presidente, o tesoureiro, o secretário e outros funcioná-


rios que possam ser necessários, serão eleitos pelo conselho geral, no primeiro
dia de suas sessões em cada ano. A eleição será feita por escrutínio, e decidida
por maioria dos votos. Todos os membros da associação [...] são elegíveis para
ocupar qualquer cargo de acordo com sua competência.

Em todas as instâncias e assuntos das associações ou escolas, as deli-


berações deveriam ocorrer em conformidade com as regras ou
regulamentos estabelecidos e aprovados democraticamente nas devidas
instâncias, sendo os integrantes dessas instâncias eleitos, direta ou indire-
tamente, por todos os membros das associações ou do Movimento.
Para Dal Ri (2012), a gestão democrática é um princípio educativo do
MST. A gestão democrática nesse Movimento também é destacada por ou-
tros autores, como, por exemplo, Bauer (2009), Caldart (1997; 2004), Dal
Ri e Vieitez (2008), Janes (1998), Kolling, Vargas e Caldart (2012), Martins
(2004) e Santos A. R. (2010).
Janes (1998, p. 120, grifos do autor) destaca, no MST, a autogestão,
uma vez que ocorre “[...] a participação de todos na gestão [...] Para isso
sendo necessária também uma educação popular autogerida, com a par-
ticipação efetiva de todos na sua gestão possibilitando assim a
consolidação de uma cultura e uma práxis autogestionária.”
130 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Conforme Dal Ri e Vieitez (2008, p. 28), esse é um dos princípios


mais importantes do MST, especialmente na educação, em todos os níveis
e modalidades, sendo as escolas “[...] geridas pelos próprios alunos [...]”.
Esse princípio consta, de forma explícita ou implícita, na maioria dos
documentos analisados, tanto do MST (1986; 1994a; 1994b; 1995; 1996;
1998; 1999; 2000; 2001a; 2001b; 2001c; 2005; 2006; 2007; 2010; 2012),
quanto de entidades organicamente a ele vinculadas, como, a Concrab
(1995; 1996a; 1996b), a EAP (1997) e o Iterra (1996; 1997; 2003). Consta
também em textos de alguns de seus intelectuais, como Caldart (1997),
Stedile e Fernandes (2001), entre outros.
Não se trata de educar para a democracia, isto é, numa dimensão
unicamente conceitual ou verbalista, mas, sim, educar na democracia pela
vivência de relações democráticas.
O Movimento (1996, p. 19) explica o que entende por democracia,
bem como o que é “A participação de todos os envolvidos no processo de
gestão”

Todos devem aprender a tomar decisões, a respeitar as decisões tomadas no


conjunto, a executar o que foi decidido, a avaliar o que está sendo feito, e a
repartir os resultados (positivos ou negativos) de cada ação coletiva. Isto é de-
mocracia! E só acontece se o coletivo organizar instâncias de participação,
desde a direção política ou o planejamento mais geral da atividade de educa-
ção, até a esfera específica do aprender e ensinar ou da relação entre quem
educa e quem é educado. (MST, 1996, p. 19, grifos nossos)

Entre os princípios mencionados nesta pesquisa, a gestão democrá-


tica é explícita e implicitamente o mais recorrente, em especial nos
documentos que tratam da educação do MST.
A reivindicação do direito à participação popular, ou seja, das classes
trabalhadoras nos processos decisórios que definem as políticas macro e
Cláudio Rodrigues da Silva | 131

os rumos do Estado também é apresentada em documentos mais abran-


gentes, nos quais o Movimento apresenta seu projeto político à sociedade,
como, por exemplo, no intitulado MST – Lutas e conquistas (MST, 2010).
Para o MST, que se entende, apresenta-se e pretende continuar a ser
e a crescer como um Movimento de massas de trabalhadores, ou seja, um
Movimento dinâmico, a gestão democrática em todas as suas instâncias,
em especial nas escolas, pode contribuir para a difusão e para o aprendi-
zado, desde tenra idade, de relações sociais democráticas. A gestão
democrática é dialeticamente uma necessidade e uma opção para o MST
estar em movimento, ser um Movimento social de massas, com a finali-
dade e com a visão de mundo pretendidas.
Conforme Dal Ri e Vieitez (2008, p. 179), “O MST possui uma estru-
tura política cuja hierarquia compreende quatro posições básicas: direção,
militância, base e massa.” Há no Movimento diversas coordenações esta-
duais, todas com estruturas idênticas, sendo o Congresso Nacional a
principal instância de poder e de decisão do MST.
Duma perspectiva mais macro, Congresso é a instância máxima do
MST, na qual ocorre a “[...] tomada de decisões do coletivo sobre o que vai
acontecer no próximo período.” (MST, 2012, p. 8). Em outras palavras,
“[...] o Congresso é um grande encontro com representação de todos os
estados em que o Movimento está organizado [...]”, quando são tomadas
as decisões que já foram discutidas por todos, em cada assentamento ou
acampamento (MST, 2012, p. 6).
Inclusive pela própria dinâmica cotidiana de trabalho dos Sem Terra,
pela dimensão continental do Brasil, entre outras variáveis, a participação
no Congresso, que ocorre a cada cinco anos e é centralizado num único
local, efetua-se por meio de delegados, responsáveis por apresentar as po-
sições debatidas e tomadas nas respectivas comunidades ou regiões (MST,
2012).
132 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

O processo eleitoral para instâncias mais amplas do MST, como a Di-


reção Nacional, acontece da seguinte maneira.

A discussão maior acontece nos estados. É lá que são discutidos os nomes,


feitas as avaliações dos que já ocupam algum cargo e analisados os possíveis
candidatos novos. É um processo mais democrático, uma vez que envolve um
número maior de pessoas nas discussões. Também é mais sério, porque pode
ser feito com um tempo maior e seguindo uma metodologia apropriada para
cada realidade regional ou orgânica. Por exemplo, é diferente fazer essa dis-
cussão num assentamento já estruturado, com cooperativas funcionando, e
num acampamento. Por último, é mais educativo tanto para quem escolhe
como para quem é indicado para o cargo, uma vez que a discussão gera um
compromisso de ambos os lados. Os nomes sugeridos irão compor a Direção
Nacional, ratificados num evento nacional que pode ser o Encontro Nacional
ou uma reunião anual da Coordenação Nacional. Não há espaço para isso nos
Congressos Nacionais. (STEDILE; FERNANDES, 2001, p. 82)

O Congresso é prova de que é possível a realização de grandes encon-


tros com a participação de massas de trabalhadores (STEDILE;
FERNANDES, 2001).
Já nas instâncias micro, como, por exemplo, as associações, as coope-
rativas e, em especial, as escolas, predomina a participação direta de todos
os segmentos da escola e da comunidade, já que o MST preza pela vincu-
lação orgânica entre ambas (MST, 1996; 1999; 2001c).
Dal Ri e Vieitez (2008, p. 180) destacam que “Nas instâncias de base
do MST, muito embora possa haver diretorias formais, as decisões são to-
madas em colegiados e assembleias.” Esses autores (2008, p. 181)
ressaltam dois pontos na organização do Movimento. O primeiro ponto é
“[...] uma organização molecular nas bases fundada no exercício da demo-
cracia direta; [...]”. O segundo ponto é “[...] uma significativa
descentralização das instâncias de tomada de decisões.”
Cláudio Rodrigues da Silva | 133

Para o MST (1999, p. 18), é necessário que a escola abra “[...] espaços
para a participação da comunidade, respeitando a sua organização e as
orientações do MST.” Para isso, são previstas diferentes instâncias de par-
ticipação nas escolas. Essas instâncias, segundo o Movimento (1999, p. 18-
19), são a Assembleia, o Conselho Escolar, as Plenárias e a Coordenação ou
Direção.
A Assembleia “Normalmente [...] é a instância máxima da gestão,
onde participam os educandos, educadoras e a comunidade [...]” (MST,
1999, p. 19). O Conselho Escolar, conforme o Movimento (1999), tem a
incumbência de acompanhar o dia a dia da escola, sendo formado por re-
presentantes dos educandos, dos educadores e da coordenação e renovado
periodicamente.
As Plenárias visam à melhoria da gestão, podendo ser convocadas
pelo Conselho Escolar para decidir sobre variadas questões que envolvem
o cotidiano da escola ou das Unidades de Produção (MST, 1999).
Já a Direção, em conformidade com o princípio da gestão democrática
do Movimento, é eleita pelos educandos, educadores e pela comunidade,
podendo ser transformada em uma Coordenação, que, segundo o princí-
pio da direção coletiva, compartilha tarefas e poder com os demais
membros da Coordenação (MST, 1999). Assim, a direção deixa de estar
centralizada na pessoa do diretor.
A auto-organização é um componente fundamental da gestão demo-
crática nas escolas do MST, em todos os níveis e modalidades de educação,
inclusive na formação de educadores. Por auto-organização o Movimento
(MST, 1999, p. 14, grifos do autor) entende

[...] o direito dos educandos se organizarem em coletivos, com tempo e espaços


próprios, para analisar e discutir as suas questões, elaborar propostas e tomar
as suas decisões em vista de participar como sujeitos da gestão democrática do
134 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

processo educativo, e da Escola como um todo. Este é um espaço de aprendi-


zado e como tal deve ser acompanhado por uma educadora que respeite a
autonomia dos educandos.

Como os outros valores e princípios do Movimento, a auto-organiza-


ção também é aprendida na vivência, na experiência.
Segundo o MST (1999, p. 14), seus “[...] educandos são crianças, ado-
lescentes e ou jovens, do campo e do MST.”, que precisam ser instigados
pelos educadores à auto-organização com autonomia.
Para que a gestão democrática ocorra conforme a concepção do Mo-
vimento, a autonomia é um componente fundamental. Autonomia é

[...] o direito dos educandos assumir posturas próprias, sem a tutela das edu-
cadoras, assumindo a responsabilidade pelas decisões tomadas. Isto implica
em tempos e espaços onde não sejam as educadoras a fazer a pauta, nem sejam
elas a coordenar, e nem mesmo participar da discussão. Seu papel é apenas o
de alertar para equívocos de análises e riscos não percebidos, em vista do
aprendizado, sem impor nem propor soluções. (MST, 1999, p. 14, grifos do au-
tor)

O coletivo também é imprescindível no processo de gestão democrá-


tica do Movimento. Segundo o MST (1999, p. 13), o coletivo é “[...] um
organismo social vivo, que possui instâncias, atribuições, responsabilida-
des, correlações e interdependência entre as partes. Se tudo isso não existe,
não existe coletivo, apenas uma aglomeração ou concentração de indiví-
duos.”
Entre os instrumentos de gestão previstos pelo Movimento (1999) es-
tão o regulamento interno, que precisa ser elaborado com a participação
de todos, o planejamento coletivo e a avaliação coletiva.
Para analisar os princípios do MST é necessária a problematização da
concepção de democracia, já que democracia, assim como outras
Cláudio Rodrigues da Silva | 135

categorias, é histórica, portanto, sujeita às condições objetivas e subjetivas,


ou seja, às interpretações que se faz de participação nos processos decisó-
rios. O Movimento (1999, p. 20) alerta que

As nossas experiências têm demonstrado que as estruturas de participação dos


educandos, professores, pais, funcionários não garantem em si o processo.
Elas precisam funcionar, e bem, para não haver deseducação. E para que isto
aconteça é preciso reflexão e também ousadia, para ir fazendo as mudanças
que a realidade indicar como necessárias.

Por isso é importante a coerência entre teoria e prática, isto é, entre


o que se pretende (ou se diz querer) formar e as providências adotadas
para se chegar a esse objetivo. Educação é processo. Uma vez internaliza-
das e sedimentadas ideologias e visões de mundo, o processo de mudança
é mais árduo e moroso.
O Movimento (1996; 1999; 2001c) chama a atenção para o currículo
oculto, veiculador de valores e ideologias, pois é uma questão à qual a es-
cola dispensa pouca ou nenhuma atenção.
Considerando-se o alto potencial educativo do currículo oculto (DAL
RI, 2004; DAL RI; VIEITEZ, 2008), isto é, das vivências nas organizações,
há que se considerar as relações sociais, as ideologias e as visões de mundo
veiculadas pelas práticas ou culturas escolares, em especial por intermédio
dos modelos de organização e de gestão da escola. “A organização e a ges-
tão da escola são elementos fundamentais de qualquer sistema de ensino,
pois, dependendo de como elas se dão, a vivência na escola pode ser mais
ou menos democrática ou não democrática.” (DAL RI; VIEITEZ, 2008, p.
223).
O MST (1999) considera que, no interior da escola especialmente, to-
das as atividades são educativas, e que todas as pessoas, que não os
educandos, são educadores. Portanto, por intermédio de atitudes, palavras
136 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

ou mesmo omissões, com intencionalidade consciente ou não, a escola


educa em conformidade com determinada teoria ou ideologia e para dada
visão de mundo. Conforme Severino (1986, p. XIV), “Todo projeto educa-
cional será necessariamente um projeto político e não há como evitá-lo.”
Considerando-se a necessária vinculação entre a educação, em espe-
cial a escolar, e a formação econômico-social que a concebe (LOMBARDI,
2011; LUZURIAGA, 1963), uma educação ou escola que vise a formação de
força de trabalho para o mercado de trabalho, comumente, adequa-se, em
conteúdo e forma, a esse objetivo. Foca majoritariamente a dimensão
homo economicus ou homo faber, desprezando, portanto, as demais di-
mensões humanas (DAL RI; VIEITEZ, 2008; NOMA; CZERNISZ, 2010;
SOUZA, 2010).
Assim, propicia uma educação unilateral, pautada pelos valores do
mercado de trabalho, entre eles, o individualismo, a competitividade, o au-
toritarismo, a especialização exacerbada, a divisão polarizada e
hierarquizada verticalmente entre trabalho intelectual e manual, entre
concepção e execução, enfim, transmite, tanto pelo currículo formal,
quanto pelo currículo oculto, a divisão social hierárquico-vertical do tra-
balho.
Portanto, numa análise a partir de uma perspectiva marxista (MARX,
1984; 2004), pode-se inferir que a educação hegemônica educa para uma
concepção de trabalho alienado e estranhado. Essa é a concepção de edu-
cação hegemônica, do capital e, como regra, propiciada pela escola estatal
(AGUIAR, 2010; DAL RI; VIEITEZ, 2008; NOMA; CZERNISZ, 2010;
SOUZA, 2010).
Em contraponto, uma educação ou uma escola que vise à formação
de trabalhadores da perspectiva do trabalho associado, e que aponte no
sentido da desalienação e do desestranhamento do trabalho, há que se ade-
quar, em conteúdo e forma, para se tornar coerente com seus objetivos.
Cláudio Rodrigues da Silva | 137

Educa para o trabalho intelectual e para o trabalho manual, de forma a


encaminhar no sentido de superação ou de ruptura com a hierarquização
vertical existente entre eles, sendo o princípio da articulação entre a edu-
cação e o trabalho produtivo importante para avanços no sentido dessa
superação ou ruptura. Educa também para comandar e para ser coman-
dado e, para isso, o princípio da gestão democrática é fundamental (DAL
RI, 2004; DAL RI; VIEITEZ, 2008). São desafios intrincados entre si e re-
conhecidos pelo próprio Movimento (MST, 1986; 1996; 1999; 2001c;
STEDILE; FERNANDES, 2001).
Por isso, inclusive, a negação da educação escolar estatal é necessária,
pois a própria forma de organização burocrática do Estado tende a blindar
seus aparelhos da influência e da participação popular (CAÇÃO, 1989;
JAPECANGA, 2000; PARO, 1991), isto é, das classes trabalhadoras nos pro-
cessos decisórios. Na burocracia também está subjacente uma concepção
de organização, estrutura social, portanto, uma ideologia e uma visão de
mundo (DAL RI; VIEITEZ, 2008; SILVA, 2004).
A gestão democrática na escola estatal, assim como em outros apare-
lhos do Estado, instâncias e áreas sociais é importante para tentativas de
avanços com vistas à participação das classes trabalhadoras nos processos
decisórios dos aparelhos do Estado. Entretanto, é um espaço de muitas
contradições e de disputas, pois, comumente, a própria abrangência ou o
nível de participação popular em canais institucionais do poder estatal cos-
tumam ser bastante restritos (SANTOS, 2007; SOUTO, 2013; SOUZA,
2010; VIGLIO; TEIXEIRA, 2007), mesmo porque são canais institucionais.
Conquista de poder pelos trabalhadores implica perda de poder para o ca-
pital.
Algumas instâncias de participação popular, como os conselhos ges-
tores, são iniciativas importantes para conhecimento e aprendizado do
funcionamento da burocracia estatal, porém, são bastante limitadas, em
138 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

termos de possibilidade de interferência das classes trabalhadoras na con-


cepção, na execução e na avaliação das políticas públicas, uma vez que a
concepção de participação nessas instâncias normalmente é consoante
com a concepção de democracia liberal (SANTOS, 2007)1.
Conhecer os limites da participação conforme os parâmetros institu-
cionais também é importante para se ter alguma dimensão da
possibilidade ou não de se conseguir transformações nas estruturas sociais
por intermédio da concepção de democracia hegemônica (STEDILE;
FERNANDES, 2001).
Com a incorporação na legislação (BRASIL, 1988; 1996b), o termo
gestão democrática foi tornado lugar comum, sendo, não raramente, as-
sociado ou entendido como apenas uma entre as possíveis modalidades de
gestão da escola, como fim em si mesma, como se o modelo de gestão e de
organização da escola não fosse educativo e como se não tivesse repercus-
sões além do círculo restrito de gestores ou, no máximo, do espaço físico
da própria escola.
Entretanto, conforme apontam Dal Ri (2013) e Dal Ri e Vieitez
(2008), nas suas origens, a gestão democrática, da perspectiva desses Mo-
vimentos de trabalhadores, é mais abrangente e complexa, não se
restringindo a uma mera técnica de administração.
Por constar na legislação e sendo a lei um consenso imposto vertical-
mente – em decorrência da correlação de forças –, ocorre de o termo ser
incorporado de maneira meramente formal nas produções discursivas, em
especial em documentos e em práticas de escolas, até porque foi tornado
um dispositivo legal. Além disso, como ressalta Demo (2011), em algumas

1
Em determinadas escolas, a dinâmica de participação e de consecução dos processos decisórios sequer aproxima-se
da concepção liberal (SILVA, 2019).
Cláudio Rodrigues da Silva | 139

circunstâncias, a adesão a determinadas teorias ou ao uso de certas termi-


nologias podem ser resultado de modismos.
Entretanto, essa incorporação pode gerar resistências, distorções e
esvaziamento do princípio da gestão democrática, seja por discordâncias,
seja por desconhecimento ou por falta de entendimento das pessoas en-
volvidas. Isso pode levar ao descrédito ou a entendimentos equivocados
sobre o princípio da gestão democrática, tanto por estudantes, quanto por
funcionários da escola, além de outros segmentos da comunidade. Assim,
este princípio seria distorcido e perderia seu potencial. Por isso também o
MST chama a atenção para os problemas dos simulacros de democracia
(CALDART, 1997; DAL RI; VIEITEZ, 2008; MST, 1986; 1996; 2001c).
A importância atribuída pelo MST à gestão democrática pode ser in-
ferida pelo fato de que, em seus cursos de formação de educadores, por
exemplo, a participação na gestão e na organização, tanto da escola,
quanto do próprio curso, em especial nos coletivos e instâncias decisórias,
é um dever, sendo essa participação objeto de avaliação, ou seja, a partici-
pação efetivamente integra o currículo dos cursos em todos os seus
componentes e dimensões, formal e oculta (CALDART, 1997; ITERRA,
1996; 1997).
Da perspectiva hegemônica, salvo exceções, em cursos de formação
de professores, de gestores e de outros cargos da escola, as pessoas não
são educadas, seja no plano do currículo formal, menos ainda no plano do
currículo oculto, para trabalhar duma perspectiva de gestão democrática
radical ou substantiva. Inclusive por isso o MST tem escola própria para
formação de seus educadores, já que, para o Movimento, gestão democrá-
tica, auto-organização e trabalho coletivo, entre outros princípios e
elementos de seu projeto educativo, são aprendidos majoritariamente na
vivência de relações sociais pautadas pelos valores e princípios visados,
articulando-se teoria e prática (MST, 1996; 1999; 2001c).
140 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Se, por um lado, a implementação da gestão democrática requer mu-


danças radicais nas atitudes dos educadores – e, para o MST, todos os que
trabalham na escola são educadores e devem ser referência para os edu-
candos (CALDART, 1997; MST, 1996; 1999; 2001c) –, por outro lado,
demanda também mudanças nas atitudes dos educandos, já que passam a
ser solidariamente responsáveis pelas decisões tomadas em coletividade.
O perfil visado pelo MST, seja de educadores, seja de educandos é diferente
do perfil visado e imperante na educação oficial, em todos os níveis e mo-
dalidades de ensino, inclusive na formação de professores.
Sendo o aprendizado uma atividade que demanda intencionalidade
de quem ensina e de quem aprende, o aprendizado da gestão democrática
demanda intencionalidade de todas as partes, ou seja, de educandos, de
educadores e do Movimento, uma vez que, nesse processo, ambos ensinam
e aprendem, em especial com os conflitos. Por isso a participação é colo-
cada como um dever (MST, 1996), tanto de educandos participarem,
quanto de educadores instigarem educandos à participação (CALDART,
1997; ITERRA, 1996; 1997; MST, 1996). Há, portanto, nesse caso, uma re-
lação dialética e recíproca entre dever e direito2 (DAL RI; VIEITEZ, 2008).
Não participar é uma forma de participação. Não decidir é uma forma
de decisão. Todas as opções têm desdobramentos. Em determinados casos,

2
Aproveita-se a premissa da participação enquanto dever no Movimento (1996) para uma problematização sobre a
tese tornada quase senso comum, especialmente na área da Pedagogia, de que direito é algo necessariamente facul-
tativo e, dessa forma, tudo o que é colocado como dever tem vinculação necessária com o autoritarismo. Não
obstantes algumas variações, comumente a frequência obrigatória à escola e o ensino obrigatório dos conteúdos do
currículo formal são apresentados e considerados democráticos, até porque se julga importante ou mesmo impres-
cindível o aprendizado desses conteúdos para o exercício da cidadania, por exemplo. Partindo dessa linha de
raciocínio, pode-se inferir que, se ensino-e-aprendizagem obrigatórios da participação nos processos decisórios da
escola são considerados autoritarismo ou mesmo se são tratados como facultativos, é porque não se considera im-
portante nem mesmo imprescindível o aprendizado da participação política, não obstante a recorrência de menções
à formação para a cidadania e para a democracia constantes em documentos de escolas, como, por exemplo, no
Projeto Político-pedagógico, e na legislação. Entretanto, no caso da negativa ou do cerceamento da participação, a
escola ensina obrigatoriamente a não participação. Isso pode fornecer elementos para inferências sobre a concepção
de participação, de cidadania e de democracia praticada ou ensinada pela escola oficial, seja pelo currículo formal,
seja pelo currículo oculto, principalmente.
Cláudio Rodrigues da Silva | 141

a recusa ou a abstenção de participação nos processos decisórios podem


levar à reiteração do status quo.
Independentemente dos motivos alegados ou alegáveis, a não parti-
cipação da maioria das pessoas abre precedentes para que lideranças ou
gestores ocupem, sem resistência, os espaços, fazendo com que as popula-
ções sejam (ou continuem a ser) colocadas à margem dos processos
decisórios, já que no poder não há vacância (MST, 1986; STEDILE;
FERNANDES, 2001).
O próprio processo de participação nas discussões e nas decisões,
bem como a vivência e as resoluções dos conflitos dele decorrentes, colo-
cam em tela e educam para outra concepção de relações sociais, nas quais
estão presentes a possibilidade e a necessidade de mudanças, bem como
os ônus e os bônus, em especial a responsabilidade pelas decisões, colo-
cando todos na condição de sujeitos históricos, tanto da própria vida,
quanto da vida da coletividade ou da comunidade (MST, 1986; 1996; 1999;
2001c; STEDILE; FERNANDES, 2001).
A participação de toda a comunidade na escola pode ajudar no pro-
cesso de ruptura ou de superação da escola enquanto uma instituição
alheia, isolada, à margem da vida social mais ampla (BRABO, 2004;
CAÇÃO, 1989; JAPECANGA, 2000; PARO, 1991). A recusa à presença e à
participação da comunidade demonstra uma concepção de escola, de ges-
tão, entre outras. O mais comum é que gestores tendam a evitar a
ingerência da comunidade nos assuntos por eles considerados internos ou
prerrogativas dos profissionais da educação. Portanto, não basta que a ges-
tão democrática conste na legislação. Fazer com que a lei seja cumprida é
outro processo, é outro desafio. Porém, partindo de Althusser (1999), a
legislação é um conjunto de leis tendencialmente coerentes entre si e, prin-
cipalmente, com a formação econômico-social que a concebe.
142 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Duma perspectiva burocrática, a presença – com real participação


nos processos decisórios – da comunidade na escola é entendida por fun-
cionários, em especial por gestores, como potencial ou efetiva interferência
na gestão da escola, portanto, ao bom andamento ou fluidez do serviço, o
que não resulta em incentivos a avanços rumo a uma escola aberta e vol-
tada para a comunidade (CAÇÃO, 1989; JAPECANGA, 2000; PARO, 1991),
que, aliás, é a principal mantenedora, via impostos, não só do aparelho
escolar, mas do Estado. Assim, reitera-se a pertinência da problematiza-
ção, em termos teórico-práticos, se a escola é pública ou estatal.
A concepção de gestão democrática do Movimento é ousada, se cote-
jada com os demais Movimentos, inclusive a ponto de incorrer em riscos
de conflitos até com parcela dos próprios integrantes3. Dentro do possível,
o MST coloca entre seus objetivos a superação ou a ruptura com as formas
de hierarquias verticais presentes nas relações sociais e que, em alguma
medida, são repercussões e repercutem principalmente nas relações de
produção. Entre essas hierarquias verticais estão as relacionadas à idade
ou geração, ao gênero ou à sexualidade, aos níveis de escolaridade ou de
formação técnico-científica, em especial a que diz respeito à dicotomia hi-
erárquico-vertical entre trabalho manual e intelectual (CALDART, 1997;
MST, 1996; 1999; 2001c; STEDILE; FERNANDES, 2001).
Essa tentativa de superação ou ruptura não ocorre sem conflitos,
pois, devido ao fato de o Movimento ser de âmbito nacional e muito hete-
rogêneo em todos os sentidos, lida com diferentes modos de vida,
tradições, hábitos, entre outros (CALDART, 1997; MST, 2001a; 2001c;
STEDILE; FERNANDES, 2001). Entre essas dimensões estão, por exemplo,
as relacionadas aos regionalismos, à cidade ou ao campo, a diferentes

3
Os cartistas e os owenistas também enfrentaram resistências por suas ousadias em relação a usos e costumes
vigentes à época.
Cláudio Rodrigues da Silva | 143

influências religiosas, tendências político-ideológicas. Entre as tradições


que desafiam o Movimento estão o machismo e o patriarcalismo, o que
torna tênue os limites entre a dimensão pública e a dimensão privada, isto
é, o que diz respeito à dinâmica do Movimento, portanto, público, e o que
diz respeito à esfera familial, portanto, privada.
Se, no que poderia ser denominado âmbito público, isto é, nas ativi-
dades do Movimento, haveria algo próximo ou que apontasse no sentido
de uma igualdade real entre todas as pessoas, no que poderia ser denomi-
nado âmbito privado, hierarquias verticais, como as relacionadas a gênero,
à idade, a papéis sociais, entre outras, tendem a prevalecer.
Segundo Pinassi (2009, p. 79), “[...] uma questão que nos parece par-
ticularmente problemática é a de que, muito embora a supressão da
opressão das mulheres seja vital à construção de uma alternativa societá-
ria, essa afirmação está muito aquém de ser unanimidade no interior do
MST.”

Ao que tudo indica, a atuação mais efetiva dos homens está voltada à realização
objetiva das questões econômicas, tendendo a arrefecer com a conquista da
terra e a formação dos assentamentos. A positividade desta conquista para o
movimento como um todo é obviamente incontestável, mas pode também se
converter numa regressividade – tendo em vista a retomada das relações hie-
rarquicamente estruturadas – sobretudo para as mulheres que experimentam,
neste processo, o retorno à antiga condição de seres submetidos à dominação
patriarcal. (PINASSI, 2009, p. 79)

Portanto, o Movimento, ao implementar em suas atividades e orga-


nizações, a gestão democrática, não obstantes as contradições, mexe com
tradições e hierarquias verticais presentes nas relações familiais, mas que
têm relações e repercussões nas instâncias sociais mais amplas. O MST
coloca, de maneira quase geral, em condições de igualdade real (e não
144 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

apenas formal), nos processos decisórios, todas as pessoas, independente-


mente da idade4, gênero/sexo, escolaridade, etnia, entre outras
diferenças5.
Como apontam Dal Ri e Vieitez (2009), iniciativas com vistas à supe-
ração ou à ruptura das hierarquias sociais verticais são comuns em OTAs.
Porém, não é um processo que ocorre sem resistências das mais variadas
ordens, inclusive internamente, mesmo porque o mais comum é que as
pessoas sejam educadas com base em valores ou tradições hegemônicos,
portanto, para sua aceitação e reprodução. Por isso a importância da vi-
vência da gestão democrática e dos conflitos delas decorrentes (BRABO,
2004; GALLO, 2004), como forma de aprendizado de novas relações soci-
ais, ideologias e visões de mundo. Nas escolas do Estado, comumente,
conflitos são entendidos e tratados como manifestações de indisciplina,
portanto, prontamente reprimidos.
Segundo Dal Ri e Vieitez (2008, p. 272),

Nas escolas oficiais, a participação política das crianças e dos jovens em movi-
mentos ou entidades políticas além de não ser incentivada é, muitas vezes,
reprimida, dado que o liberalismo dissemina a idéia de que entre educação e
política não pode haver nenhuma ligação.

4
O MST reconhece a necessidade de se considerar as diferentes faixas etárias, de forma a tornar pertinente e
compreensível o processo de participação de crianças de tenra idade (MST, 2001c). Todavia, incentiva a participação
das crianças desde tenra idade em todas as atividades do Movimento, mesmo porque, como ressaltado, na vida real
cotidiana, as crianças Sem Terrinha vivenciam todas as atividades, inclusive as lutas do Movimento, participação
essa que é uma necessidade, pois, quando das ocupações ou das desocupações, por exemplo, o mais comum é que as
crianças estejam presentes (DAL RI, 2004; DAL RI; VIEITEZ, 2008; STEDILE; FERNANDES, 2001). Cada território
tem autonomia para decidir determinados critérios de participação nos processos decisórios, em especial no que se
refere à idade mínima e temas em votação (DAL RI; VIEITEZ, 2008; SILVA; DAL RI, 2019a).
5
Assim como democracia e, por extensão, gestão democrática, o termo igualdade passou por um processo de
ressignificação, sendo hoje tornado lugar comum. Todavia, é uma questão complexa, que ainda atrai ou afasta muitos
setores sociais, que, comumente, fazem a apologia ou o descarte a priori desse tema, que carece de maiores e
constantes problematizações, pois a própria formação econômico-social é dinâmica, o que faz com que novos desafios
ou demandas sejam incorporados às relações sociais e de produção.
Cláudio Rodrigues da Silva | 145

No MST a criança não é tratada como uma não pessoa ou como uma
futura pessoa. Os princípios da gestão democrática e do vínculo entre tra-
balho produtivo e educação contribuem para isso. Dentro de seu universo
e de sua capacidade, a criança é colocada em circunstâncias para familia-
rização e aprendizado da ideologia e da visão de mundo do Movimento
(MST, 2001c).

As crianças, a partir dos sete anos de idade, participam da assembleia geral da


Cooperunião o que é mais uma das manifestações da gestão democrática e da
promoção entre o ensino e o trabalho. Elas têm direito à palavra e, ainda, po-
dem votar em alguns itens da pauta, embora de acordo com o Estatuto o
direito ao voto seja apenas dos sócios. (DAL RI; VIEITEZ, 2008, p. 294)

Outro exemplo da não infantilização das crianças é o fato de que fa-


zem parte de todas as atividades do Movimento, inclusive ocupações,
passeatas, protestos, entre outras, quando, comumente, costuma haver
riscos ou mesmo enfrentamentos com os aparelhos repressivos estatais ou
privados, com riscos à integridade física e psíquica ou mesmo riscos de
morte dos integrantes do Movimento (BAUER, 2009; DAL RI, 2004;
STEDILE; FERNANDES, 2001).
Nas mais diferentes instituições e instâncias sociais, em especial na
escola estatal, comumente crianças e adolescentes6 são colocados à mar-
gem dos processos decisórios, sob alegações, entre outras, de imaturidade,
dada a pouca idade, o que, de certa maneira, não deixa de ser uma forma
de hierarquia vertical social7. Essas hierarquias, em alguma medida,

6
Contraditoriamente, não raramente, pessoas com idade muito avançada também são colocadas na condição de
infantes, pois, associadas à senilidade, são entendidas e apresentadas como incapazes de decidir adequadamente os
rumos ou certos assuntos pertinentes à própria vida. Mesmo as mais sutis hierarquias verticais parecem formas de
subalternização ou de dominação de determinados grupos sobre outros, criando uma espécie de mosaico de pequenas
hierarquias que corroboram ou naturalizam as hierarquias verticais mais amplas.
7
Além da infantilização ou marginalização, não raramente, estudantes, independentemente de suas idades, são
tratados ora como adultos, ora como crianças, conforme as conveniências e os interesses institucionais.
146 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

corroboram para uma espécie de naturalização de outras hierarquias ver-


ticais sociais mais amplas. Fazendo uso de palavras de Munakata (2012),
ao analisar a questão do livro didático, os estudantes são sujeitos quase
sempre em elipse na educação escolar.
Ainda que algumas das hierarquias sociais verticais não sejam exclu-
sividades do capital, como as relacionadas ao machismo, ao patriarcalismo
e ao racismo (REED, 2008; TOLEDO, 2011), no sistema do capital elas as-
sumem uma configuração específica, corroborando e legitimando a forma
de estruturação deste modo de produção e desta formação econômico-so-
cial, inerentemente autoritária, hierárquico-vertical e heterogestionária.
Isso tem implicações com a divisão social hierárquico-vertical do trabalho,
por conseguinte, com a divisão entre quem concebe/manda e quem exe-
cuta/obedece.
Essas dicotomias ou polarizações não são naturais, inócuas, nem se
encerram em si mesmas. Repercutem na cultura, na política e na econo-
mia, em especial no trabalho, categoria fundante de qualquer modo de
produção ou formação econômico-social. Têm relações diretas e indiretas
com a questão da alienação e do estranhamento do trabalho.
Da perspectiva do Movimento (MST, 1986; 1996; 1999; 2001c), o
princípio da gestão democrática não se resume a um recurso didático ou a
um possível modelo de gestão, nem se restringe ao ambiente da escola.
Tem vinculações e objetivos mais amplos. Em última instância, trata-se do
processo – inclusive de aprendizagem prática, ou seja, em situação real –
de participação nas instâncias decisórias dos rumos do Estado e, por con-
seguinte, da própria vida. Portanto, tem também caráter educativo e
pedagógico (MST, 1986; STEDILE; FERNANDES, 2001).
O mesmo ocorre, por exemplo, com o trabalho como princípio edu-
cativo, que propicia um aprendizado em situação de trabalho real, não se
resumindo a espécies de simulacros de trabalho, nem mesmo apenas a
Cláudio Rodrigues da Silva | 147

uma dimensão pedagógica, isto é, apenas como uma estratégia didática


para o ensino, de forma concreta, de determinados conteúdos abstratos
(MST, 1996; 1999; 2001c).
Vários são os desafios para a implementação de uma gestão demo-
crática radical na escola, assim como em outros aparelhos do Estado. Entre
esses desafios estão as implicações teórico-práticas imbricadas entre si e
relacionadas à questão do poder (BRABO, 2004; CAÇÃO, 1989;
JAPECANGA, 2000; PARO, 1991). Além disso, os cargos de direção ou de
gestão implicam incrementos ou benefícios financeiros.
Numa categoria profissional cujos salários são cada vez mais reduzi-
dos, qualquer ascensão salarial pode ser entendida como possibilidade de
melhoria nas condições de vida. Trata-se, portanto, de uma questão de so-
brevivência ou existência física, importante fator de fragmentação e de
acirramento da concorrência entre os próprios trabalhadores, concorrên-
cia essa que, segundo Engels (2008), pode prejudicar sensivelmente a
união das classes trabalhadoras, o que, por sua vez, favorece as classes
dominantes.
Concomitantemente a isso, da perspectiva hegemônica, cargos de di-
reção ou de gestão implicam também questão de status social, ou seja,
estar ou ser gestor ou diretor é estar em posição de comando, é ter o poder
de mandar, e não a obrigação de obedecer. Ainda que relativamente ínfi-
mos, os poderes de direção ou de gestão podem implicar alguns privilégios
ou vantagens pessoais, que podem se desdobrar ou abrir possibilidades
para mais vantagens ou privilégios, simbólicos ou materiais, corporativos
ou pessoais (MST, 1986; MAURO apud RUBBO, 2012; SCOLESE, 2008).
Assim, é comum que se entenda o compartilhamento de processos decisó-
rios como perda de poder (CAÇÃO, 1989; JAPECANGA, 2000; PARO, 1991).
Nesse sentido, num raciocínio a partir das categorias carências e ne-
cessidades (MARX, 2004), os benefícios resultantes do exercício de cargos
148 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

de gestão teriam impactos em duas dimensões intrincadas entre si, quais


sejam, a das carências, mais ligadas à questão fisiológica, e a das necessi-
dades, que extrapolam o estritamente fisiológico. Teriam, assim, impactos
tanto em termos financeiros, quanto em termos de status, ambos vanta-
josos, em especial no modo de produção capitalista, segundo Mészáros
(2002a), hierárquico-vertical por essência, em que a diferença ocorre pelo
contraste, como, por exemplo, no que se refere ao poder de consumo.
Segundo Dal Ri (1997), diversos fatores influenciam na mentalidade
das pessoas, portanto, nas atitudes, como, por exemplo, fatores sociológi-
cos, psicológicos, filosóficos, podendo-se acrescentar, ainda, religiosos,
culturais, entre outros. Esse conjunto de fatores pode ter implicações com
os posicionamentos em relação, entre outros, à questão do poder, por con-
seguinte, à gestão democrática.
Além disso, uma gestão democrática, se comparada a uma gestão não
democrática, demanda outras dinâmicas (BRABO, 2004; CAÇÃO, 1989;
JAPECANGA, 2000; PARO, 1991), para a qual comumente não se prepara,
nem se incentiva as populações como um todo. Essa negativa ocorre inclu-
sive em cursos de formação profissional, já que, de maneira quase geral,
necessariamente são concebidos e executados com base no perfil deman-
dado pelo mercado de trabalho, inerentemente heterogestionário e
hierárquico-vertical. Os cursos profissionalizantes são importantes espa-
ços para difusão e internalização de ideologias e práticas. De maneira
quase geral, a visão difundida em cursos pautados pela lógica capitalista é
a imperante, qual seja, a lógica burocrática ou gerencialista, inerentemente
hierárquico-vertical.
Dessa perspectiva, a participação popular pode ser entendida como
ingerência, pois, dependendo da concepção, pode implicar compartilha-
mento de decisões ou de informações, que, em certos casos, podem,
dependendo da forma como se lida com elas, resultar em benefícios
Cláudio Rodrigues da Silva | 149

corporativos ou pessoais. Desse ponto de vista, é mais conveniente para


gestores que operam em claves conservadoras um modelo de gestão não
democrático.
Portanto, avanços no sentido de constituição de escolas democráticas
dependem de ação dos interessados em conquistar espaços para participa-
ção nos processos decisórios, já que, tanto pela lógica do Estado, quanto
por questões pessoais, são mínimas as chances de abertura voluntária ou
espontânea para participação popular, exceto quando o grupo ou pessoa
que ocupa determinados cargos de comando tenha visão de mundo con-
soante com essa postura.
Mesmo assim, essa abertura estará sujeita a retrocessos, por variados
motivos, pois, não sendo devidamente regulamentada em lei, pode ser re-
vogada a qualquer momento e, mesmo estando regulamentada, não há
garantias de sua efetivação, exceto se houver pressão suficiente para sen-
sibilizar ou convencer governantes ou gestores estatais, pois, como aponta
Demo (1999), participação é resultado de conquista e, segundo Dal Ri
(1997), no capital não há direitos garantidos indefinidamente às classes
trabalhadoras.
Já algo conquistado e, principalmente, formalizado de maneira legal,
tem maiores possibilidades de avanços. Por isso a importância de se con-
siderar a diferença entre políticas de governo e políticas de Estado
(OLIVEIRA, 2011) e, por conseguinte, de se problematizar as implicações
teórico-práticas das denominadas políticas públicas. Entretanto, a proba-
bilidade de se ficar apenas no plano da formalidade é alta. Exemplo disso
é o dispositivo legal (BRASIL, 1988; 1996b) que prevê a gestão democrática
no ensino estatal, entre outras diversas disposições legais.
Devido inclusive à inviabilidade da implementação de uma gestão de-
mocrática radical e plenamente generalizada em todas as escolas do
Estado, o Movimento nega dialeticamente o ensino oficial, sem, no
150 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

entanto, deixar de tensionar no sentido de influenciar na gestão ou, prefe-


rencialmente, conquistar a hegemonia em escolas do Estado.
Entretanto, ocupar ou democratizar a gestão da escola não é o obje-
tivo máximo ou final do Movimento, mesmo porque as políticas macro da
educação escolar não são concebidas e decididas no espaço ou pela gestão
da escola, mas, sim, em instâncias superiores, como, por exemplo, Secre-
tarias Municipais ou Estaduais de Educação e, principalmente, no
Ministério da Educação, sem desconsiderar outros Poderes e instâncias.
Pode-se inferir que o Movimento luta pela democratização da escola
e da educação escolar estatais. Nesse processo de luta, empenha-se pela
implementação da gestão democrática, pela universalização do acesso e
pela permanência, melhoria da qualidade da educação escolar em todos os
níveis, além de questões mais específicas que envolvem a Educação do
Campo, a Educação de Jovens e Adultos, a Educação Especial, entre outros
(TORRES et al, 2015).
Porém, sabe-se dos limites dessa educação sob o sistema do capital,
pois a educação oficial estatal, em última instância, tem como objetivo
principal a formação para a cidadania liberal, portanto, a reprodução da
formação econômico-social vigente.
Capítulo V

Formação dos próprios educadores

Neste capítulo analisa-se o princípio que trata da formação dos pró-


prios educadores em consonância com as visões de mundo, com as
ideologias e com as concepções de educação dos Movimentos sociais de
trabalhadores analisados nesta pesquisa – MST, owenistas e cartistas.
A formação dos próprios educadores é, conforme Dal Ri (2012), um
princípio educativo dos owenistas. Em consonância com a visão de educa-
ção que prepararia o caminho para a nova visão de sociedade, essa questão
faz parte do projeto societário e educativo owenista (OWEN, R., 1967a;
1967b; 1968; OWEN, J., 1968; OWEN, R. D., 1968).
Para que a nova educação pudesse ser operacionalizada, Owen
(1967a; 1967b) dedicou especial atenção à formação de educadores, de-
vendo ser escolhidos aqueles capacitados em termos de conhecimentos
científicos e em termos de consonância com a visão de nova sociedade.
Segundo Owen (1967b, p. 91), “[...] as crianças vão ser treinadas por pes-
soas inteligentes, possuindo apenas bons hábitos.”
Os educadores tinham por função educar as novas gerações con-
forme a moral, os valores e os princípios da nova sociedade. Assim, era
fundamental que tivessem formação científica e moral, bem como hábitos
e atitudes condizentes com os princípios educativos da nova visão de soci-
edade, em especial no que se refere à relação entre teoria e prática, entre
o individual e o coletivo, entre o conhecimento e o trabalho úteis (OWEN,
1967a; 1967b).
Owen (1967a; 1967b) discorda do ensino de conteúdos inúteis, pau-
tado pelos velhos métodos, baseados na superstição e no engano. O ensino,
152 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

tanto em termos de metodologias, quanto de conteúdos, deveria ter por


base a ciência e se valer de métodos atualizados e eficazes. Com isso, foram
proibidos os castigos corporais, prática comum à época1. As ressalvas em
relação aos professores da velha escola decorriam também da probabili-
dade de estarem sob influência de ministros das paróquias (OWEN, 1967a;
1967b).
Não bastava o ensino-e-aprendizagem da leitura, da escrita e do cál-
culo, sendo necessário que se aprendesse a calcular, a ler e a escrever bem
e, mais do que isso, entender bem o que se escreve e o que se lê, de forma
rápida e correta (OWEN, 1967a; 1967b; OWEN, R. D., 1968).
A importância de se formar os próprios educadores está relacionada
ainda com o fato de Owen (1967a; 1967b) assumir a tese de os primeiros
anos de vida serem determinantes para a formação do caráter racional e
para a aquisição de bons hábitos. Relaciona-se, também, com a ideia de
que são maiores as chances de sucesso no momento da educação do que
na tentativa de reeducação das pessoas. Por isso, considerava necessária a
adequação do ambiente e das relações sociais à nova visão de sociedade.
Owen (1967b, p. 149) relata caso de um educador que, tendo sido
educado em conformidade com os princípios da nova visão de sociedade
nas escolas da própria aldeia, teria “[...] assimilado o verdadeiro espírito
do sistema.”, estando, assim, apto e ansioso para ensinar e colocar em prá-
tica os princípios aprendidos.
No modelo previsto por Owen (2002) para os diferentes trabalhos ou
funções, a educação seria uma incumbência das pessoas da quarta classe,
entre quinze e vinte, e da quinta classe, entre vinte e vinte e cinco anos,

1
Os castigos corporais, há séculos, eram considerados uma espécie de recurso pedagógico ou complemento desse
(MANACORDA, 1992).
Cláudio Rodrigues da Silva | 153

que seriam as responsáveis inclusive pela instrução e pela gestão dessa


instância.
Não foi tarefa fácil, segundo Robert Owen (1967a; 1967b) e Robert
Dale Owen (1968), para os educadores a colocação em prática dos princí-
pios educativos da nova sociedade, devido aos hábitos da velha sociedade
que, após internalizados, demandam um processo árduo para abandoná-
los.
A formação dos próprios educadores, segundo Dal Ri (2012), é um
dos princípios inerentes ao projeto de educação dos cartistas, o que é con-
firmado pela análise de textos relacionados a esse Movimento (HOVELL,
1925; LOVETT; COLLINS, 1840).
Nas associações ou escolas, os professores deveriam ser formados e
também atuar em conformidade com os princípios do cartismo, tanto no
que se referia aos conteúdos e às metodologias de ensino, quanto aos va-
lores, aos objetivos e às ações políticas cartistas.
A constituição de escola para formação de professores foi uma das
prioridades dos cartistas. “A primeira dificuldade que teremos de superar
em nosso progresso será o ensino dos professores [...]” (LOVETT;
COLLINS, 1840, p. 46), pois esse é o elemento basilar para a constituição
e para a implementação de um sistema próprio de ensino. Flett (2006)
relata a dificuldade enfrentada por cartistas para encontrar professores
adequados, inclusive no que se refere ao que deveria ser ensinado aos
estudantes.
A formação dos professores deveria ocorrer necessariamente na
escola normal ou modelo de formação de professores dos cartistas. “O
estabelecimento (de ao menos uma) dessas escolas deve, portanto, ser um
dos primeiros objetivos da associação.” (LOVETT; COLLINS, 1840, p. 46).
Porém, para isso, um requisito básico era a disponibilidade de recursos
materiais e humanos, que demandavam recursos financeiros, uma das
154 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

dificuldades enfrentadas pels cartistas (FLETT, 2006; LOVETT; COLLINS,


1840).
Essas escolas seriam estabelecidas em distritos ou cidades em que
fosse julgado necessário, “[...] com a finalidade de instruir mestres e mes-
tras nos sistemas aprovados de treinamento físico, mental, moral e
político.” (LOVETT; COLLINS, 1840, p. 14) e de “[...] aperfeiçoar os pro-
fessores na arte de instruir adequadamente as novas gerações.” (LOVETT;
COLLINS, 1840, p. 18). Após aprovação nos exames, os professores seriam
certificados para o ensino nas escolas da Associação.
O MST, conforme Dal Ri (2012), adota ações visando formar os pró-
prios educadores em consonância com as suas ideologia, visão de mundo
e concepção de educação. Caldart (1997; 2004) e Camini (1998) também
ressaltam a ênfase dada pelo Movimento a essa questão.
Essa preocupação é reiterada pelo Movimento, que tem inclusive es-
colas próprias, além de cursos resultantes de convênios principalmente
com universidades para essa finalidade (ITERRA, 1996; 1997; 2003; MST,
1996; 1999; 2001a; 2001b; 2001c; 2006; 2010).
A formação de educadores é um ponto fulcral do projeto educativo,
pois os educadores precisam de formação adequada para que possam en-
sinar, em termos de conteúdos e de metodologias, em conformidade com
o projeto do MST, a articular educação e trabalho, a participar da gestão
democrática e da mística, entre outros (DAL RI; VIEITEZ, 2008).
A formação dos próprios intelectuais, em especial dos educadores, é
um dos aspectos mais estratégicos de qualquer projeto educativo e socie-
tário, especialmente para o MST, pois “Nunca terá futuro a organização
social que não formar os seus próprios quadros. Ninguém de fora da or-
ganização vai formar quadros para nós. Precisamos de quadros técnicos,
políticos, organizadores, profissionais de todas as áreas.” (STEDILE;
FERNANDES, 2001, p. 42-43).
Cláudio Rodrigues da Silva | 155

Para o MST (2001c, p. 33),

Ser educador é conseguir apreender a dimensão educativa das ações do Movi-


mento, fazendo delas um espelho para nossas práticas de educação. Sempre
que tivermos dúvidas sobre nosso fazer, podemos olhar para o nosso educador
maior, e que existe através de nós, de nossas práticas: o Movimento.

No caso do curso de Magistério, por exemplo, os objetivos gerais são:

A) Formar quadros para o MST.


B) Formar e titular educadores para as áreas de Reforma Agrária.
C) Prosseguir na construção da proposta pedagógica para as escolas do meio
rural, vinculadas aos desafios da luta pela Reforma Agrária em nosso país.
(ITERRA, 1997, p. 2)

Entre os objetivos específicos desse curso estão o fortalecimento da


organicidade da educação e do conjunto do MST, o cultivo de “[...] valores
humanistas e socialistas que estão na base da concepção de desenvolvi-
mento social do MST.” (ITERRA, 1997, p. 3).
As primeiras ações formais no sentido de formar seus educadores da-
tam do final da década de 1980, com a criação do Setor de Educação
(CALDART, 1997; MST, 1996; 1999; 2001c). Como atua em diferentes ní-
veis e modalidades de ensino, o Movimento possui várias frentes de
formação.
A formação de educadores do MST ocorre tanto em escolas do pró-
prio Movimento, quanto por intermédio de convênios, especialmente com
universidades públicas (MST, 2010). Porém, convênios podem apresentar
restrições no que se refere à aplicação plena e radical de seus princípios,
diferentemente de quando os cursos são integralmente concebidos e exe-
cutados pelo MST. A rigor, trata-se de uma tarefa não delegável
(CALDART, 1997; DAL RI; VIEITEZ, 2008; STEDILE; FERNANDES, 2001).
156 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Essa atividade é estratégica para o Movimento, em todos os sentidos


– político, econômico, cultural –, pois, em grande parte, a difusão e a in-
ternalização da ideologia e da visão de mundo ocorrem por intermédio da
atuação dos educadores. Entretanto, é importante reiterar que o grande
educador dos Sem Terra é o movimento do próprio Movimento, em espe-
cial pela imersão nas relações e nas lutas sociais (CALDART, 1997; MST,
1996; 1999; 2001c).

Para por em prática a pedagogia e a proposta de escola que estamos discutindo


é preciso, mais do que tudo, de uma postura pedagógica de fundo, um jeito de
ser educador, que compartilhe com os valores produzidos nesta história de
formação humana que é a história dos Sem Terra, e que se abra ao movimento
como princípio educativo, também de si mesmo. Que cuide e se deixe cuidar
pelo Movimento, ajudando a fazer da pedagogia de quem ocupa a terra, uma
arte de lavrar a vida e produzir gente. (MST, 2001c, p. 31, grifos do autor)

Dessa forma, ninguém melhor do que o MST para educar os próprios


educadores. Para ser educador do Movimento é necessário um conjunto
de características imbricadas entre si, como, por exemplo, recorrendo a
expressões do próprio MST (2001c, p. 62), ser do Movimento; ser sempre
um educando; reconhecer-se como sem terra; ter o Movimento como re-
ferência; saber-se um educador do povo; ver os educandos como seres
humanos; ser exemplo da prática de valores que libertam; estudar muito;
aprender a educar através de uma coletividade; saber construir o ambiente
educativo e fazer a escola do povo sem terra.
A necessidade de formar os próprios educadores deve-se ao fato de
que, assim como ocorre nos demais níveis e modalidades de educação es-
colar, a formação de educadores tem de estar em estreita consonância com
os princípios do Movimento, mesmo porque os educadores, a rigor, são os
principais responsáveis pela operacionalização da educação e, portanto,
Cláudio Rodrigues da Silva | 157

por uma parte do processo de difusão e de internalização da ideologia e da


visão de mundo e, por conseguinte, pela consolidação, reprodução e cres-
cimento do MST, que se entende e se apresenta como um Movimento de
massas de trabalhadores (MST, 1996; 1999; 2001c).
A função de educador, para o MST, demanda articulação entre teoria
e prática, formação técnico-científica e, principalmente, formação política,
além de identidade e compromisso políticos, ou seja, organicidade com o
Movimento (CALDART, 1997; MST, 1996; 1999; 2001c).
O critério para realizar os cursos de formação de educadores no Mo-
vimento é diferenciado, pois os candidatos a realizá-los são indicados pelas
comunidades ou instâncias do MST. “Por isto também é que no MST as
pessoas escolhidas para cursos de formação são aquelas que já têm um
certo tempo de prática dentro da organização. A lição é de que um curso
que vem para qualificar práticas tem muito mais chances de não cair no
vazio.” (MST, 2001c, p. 39).
Duma perspectiva de tentativa de ruptura ou de superação da meri-
tocracia e em consonância com o princípio da gestão democrática, a
indicação e o aval das comunidades de origem é um elemento determi-
nante para a definição das pessoas que participarão dos cursos de
formação de educadores especialmente, pois se espera que as pessoas in-
dicadas para fazer esses cursos voltem para suas comunidades para apoiá-
las, tanto no sentido técnico-científico, quanto no sentido político
(CALDART, 1997; DAL RI; VIEITEZ, 2008; STEDILE; FERNANDES, 2001).
Segundo o Movimento (1996, p. 8), “[...] educadores que não conhe-
cem a realidade (seja a próxima, seja a distante), não têm como
desenvolver um ensino que a tenha como base!” e “[...] quem vive num
assentamento não necessariamente conhece a sua realidade.” (MST, 1996,
p. 8). Assim, diferentemente da lógica estatal que utiliza como critério o
mérito acadêmico para ingresso e exercício do magistério, a lógica de
158 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

seleção do MST tem critério declaradamente político-ideológico e técnico,


em consonância com o princípio da gestão democrática (DAL RI; VIEITEZ,
2008).
A escola estatal em todos os níveis, inclusive no Ensino Superior no
qual são formados os professores para a Educação Básica, não segue ne-
nhum desses princípios e, no geral, há divergências inconciliáveis em
termos de concepção desses princípios, inclusive por serem aprendidos
principalmente pela vivência das relações sociais cotidianas do Movimento
(CALDART, 1997; MST, 1996; 1999; 2001c).
Por meio da legislação, historicamente a escola impõe condições e
restrições, tanto em termos técnico-científicos, quanto em termos ideoló-
gicos ou morais, para ingresso ou atuação na docência (VICENTINI;
LUGLI, 2009), com base nas próprias ideologias e visões de mundo.
Esses Movimentos de trabalhadores também têm seus critérios,
mesmo porque a educação, por conseguinte, a atividade docente, implica
necessariamente uma intencionalidade, um posicionamento, uma práxis –
fazendo uso de formulações de Sánchez Vázquez (2007) – transformadora
ou reiterativa, mas nunca neutra, como destaca Severino (1986).
Toda educação é veiculadora de valores, princípios, enfim, de uma
ideologia e de uma visão de mundo (TORRES, 1995; 1996; SEVERINO,
1986). Portanto, a formação de professores é uma função-chave na execu-
ção ou na implementação de um projeto educacional.
Partindo de Althusser (1999), a escola não é o único, mas é o principal
aparelho ideológico do Estado. É o único aparelho no qual, desde tenra
idade, as pessoas são, sistemática e obrigatoriamente, por força de lei
(BRASIL, 1988; 1990; 1996b), submetidas ao aprendizado da ideologia e
da ciência hegemônicas, já que, segundo Marx e Engels (1999), a ideologia
dominante é a ideologia da classe dominante e, segundo Löwy (1992) e
Demo (1988), ciência e ideologia estão imbricadas entre si.
Cláudio Rodrigues da Silva | 159

Estabelecendo relações com o princípio que trata da negação, vale


destacar algumas das principais razões, além das político-ideológicas, para
que o Movimento forme seus próprios educadores2. Ou seja, são razões de
caráter mais pedagógico, como, por exemplo, o caráter comumente urba-
nocêntrico das escolas, a precariedade da formação de professores em
termos técnico-científicos, entre outras.
Além da precarização cada vez mais acentuada inclusive dos cursos
de formação de professores, tanto em instituições estatais, quanto em ins-
tituições privadas de ensino, há ainda outro fator que, isolado ou
concomitantemente a esse, agrava a ineficácia do processo de ensino-e-
aprendizagem. Com a crescente precarização das condições de trabalho
docente, esta profissão deixa de ser atrativa (DEMO, 1992; GATTI, 2014;
MOURA, 2013), por diversos motivos e nos mais variados aspectos, o que
resulta em queda da procura por cursos de licenciaturas, bem como leva a
exonerações e a afastamentos de professores, gerando alta rotatividade ou
mesmo falta de profissionais qualificados dispostos ou interessados em
exercer essa função nas condições oferecidas na atualidade.
Isso abre precedente para que o Estado contrate profissionais não de-
vidamente preparados ou mesmo com formação técnico-científica
incompatível para a função contratada, conforme os requisitos previstos
ou estabelecidos pelo próprio Estado. Isso também pode impactar negati-
vamente na qualidade da educação escolar das classes trabalhadoras, que
continuam a sofrer o cerceamento do direito à apropriação dos conheci-
mentos técnico-científicos, embora o Ensino Fundamental esteja quase
universalizado no Brasil.

2
Além da dimensão mercantil, ou seja, a angariação de recursos financeiros com a oferta de cursos, instituições as
mais diversas e das mais variadas tendências criam ou mantêm cursos de formação de professores, e algumas têm
escolas próprias, desde a Educação Infantil até a Pós-graduação lato ou stricto sensu, visando à adequação da
educação às respectivas ideologias e visões de mundo. Exemplo disso são escolas corporativas, escolas confessionais
religiosas das mais diferentes matrizes, entre outras.
160 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Pela lógica meritocrática que, em tese, regeria o ingresso no magis-


tério público (BRASIL, 1988), quanto mais despreparado o candidato, pior
o desempenho e, portanto, a classificação nos concursos públicos, o que
possivelmente levaria os candidatos com melhores desempenhos a terem
prioridade na escolha das escolas, o que poderia levar à escolha das me-
lhores (especialmente em termos de condições de trabalho) escolas,
tendendo, com exceções, a irem trabalhar em escolas do/no campo e em
escolas mais periféricas, professores que não tiveram outra opção.
Indicadores de avaliações externas em larga escala, com o propósito
de avaliar a qualidade do ensino, aplicadas pelo Estado em nível federal,
estadual ou municipal, além de avaliações internacionais, indicam a inefi-
cácia do ensino na ampla maioria das escolas, estatais especialmente.
Dados apresentados pelo Estado de São Paulo exemplificam isso (SÃO
PAULO, 2011b; 2011c; 2011d).
Pode-se inferir que a política de crescente precarização da educação
escolar estatal (CAÇÃO, 2007; MOURA, 2013; VIEITEZ; DAL RI, 2011) pode
acabar por induzir o recurso a escolas privadas, em especial daqueles seg-
mentos que podem ou se dispõem a pagar. Além disso, há diversos fatores
político-ideológicos implicados na privatização gradual e velada da educa-
ção escolar, bem como na apresentação maniqueísta da escola estatal
como símbolo da baixa qualidade e da escola privada como símbolo da
excelência (TONUS, 2000).
Isso repercute na formação de professores, mesmo porque, no Brasil,
a educação escolar está organizada de forma sistêmica e seriada, portanto,
as lacunas de níveis anteriores de ensino tendem a repercutir nos posteri-
ores, por conseguinte, as lacunas da Educação Básica tendem a repercutir
no Ensino Superior e o ciclo tende a ser repetido indefinidamente. As po-
líticas específicas destinadas a diferentes modalidades e níveis de ensino
tendem a ser, em última instância, coerentes entre si.
Cláudio Rodrigues da Silva | 161

Para o MST (2001c, p. 30),

Há algum tempo a escola deixou de se ver como lugar de formação humana.


Não é sobre isso que a maioria dos professores têm discutido. Se a escola voltar
a se preocupar com a formação humana, passará a prestar mais atenção nos
sujeitos que a ocupam e dialogando com eles se dará conta de como pode
ajudá-los como pessoas, como sujeitos sociais.

A formação escolar, em especial a docente, tem sido cada vez mais


aligeirada e esvaziada (AGUIAR, 2012; GATTI, 2014; VELLOSO, 2012) de
determinados conteúdos ou disciplinas. Isso acaba, devido à ênfase na for-
mação pragmática para o mercado de trabalho, excluindo ou preterindo
temas tidos em alta conta pelo Movimento, como, por exemplo, os conte-
údos humanísticos, em especial a história.
Para o MST não interessam os conteúdos humanísticos da perspec-
tiva político-ideológica hegemônica, mas, sim, da perspectiva político-
ideológica do Movimento. A mística – que é a materialização, por intermé-
dio de símbolos, da memória das lutas dos trabalhadores e dos valores do
MST – exemplifica a visão diferenciada que o Movimento tem em relação
à história oficial em conformidade com o currículo do Estado (MST, 2001c;
STEDILE; FERNANDES, 2001). Com isso, colocam-se em questão os con-
teúdos pretensamente universais e a pretensiosa universalidade desses
conteúdos.
O MST (1999, p. 10) também atribui importância à questão didática,
pois “[...] de nada adianta saber muito, mas não saber ensinar. Saber en-
sinar é fundamental para atingir os objetivos políticos e econômicos do
Movimento.” Conteúdo e forma são imbricados, remetendo à articulação
coerente entre teoria e prática.
A preocupação com a formação científica dos educadores é impor-
tante, pois, historicamente, às classes trabalhadoras, o conhecimento
162 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

técnico-científico foi negado ou restrito, sendo oferecida uma educação ba-


seada predominantemente na moral hegemônica e na superstição3
(BASBAUM, 1982; ENGELS, 2008; LOVETT; COLLINS, 1840; OWEN,
1967a; 1967b), em outras palavras, uma educação mais ideológica do que
técnica ou científica4. E, mesmo quando o conhecimento científico passou
a ser necessário, principalmente para a formação da força de trabalho, são
propiciados apenas seus rudimentos5, em conformidade com a posição a
ser ocupada no processo produtivo (BASBAUM, 1982; BRAVERMAN, 1974;
DAL RI; VIEITEZ, 2008).
Movimentos de trabalhadores, como os analisados nesta pesquisa,
historicamente empenharam-se para fins de apropriação dos conhecimen-
tos técnico-científicos. A cultura autodidata, a valorização dos estudos
científicos e a autoeducação são transcendentes entre setores das classes
trabalhadoras (HOVELL, 1925; LINTON, 1895; LOVETT; COLLINS, 1840;
OWEN, 1967a; 1967b; THOMPSON, 1987a; 1987b; 1987c).
Já as classes proprietárias negaram ou restringiram o acesso das clas-
ses trabalhadoras a esses conhecimentos (BASBAUM, 1982; ENGELS,
2008; PONCE, 1981). Todavia, é importante reiterar que essas negativas
ou restrições não se devem à tese, tornada uma espécie de senso comum,
de que pela educação podem ser realizadas transformações sociais estru-
turais, até porque para se deter o controle total (hegemonia e dominância)
do aparelho escolar faz-se necessário deter o controle do Estado, cujos

3
Estudos que analisam, por exemplo, livros didáticos, demonstram equívocos e preconceitos em relação a
determinados grupos étnicos (REIS, 2008).
4
Partindo do que apontam Demo (1988) e Löwy (1992), verifica-se que se, por um lado, a ciência necessariamente
contém ideologia, por outro, na ideologia pura não há ciência.
5
Análises dos equívocos ou falhas, das mais diversas espécies, em livros didáticos (REIS, 2008) usados especialmente
por escolas estatais brasileiras, inclusive aqueles livros aprovados pelo Plano Nacional do Livro Didático (PNLD),
exemplificam a qualidade do conhecimento técnico-científico propiciado pelo Estado às classes trabalhadoras.
Cláudio Rodrigues da Silva | 163

aparelhos, sejam os ideológicos, sejam os repressivos, funcionam articula-


damente6.
Porém, se por um lado, os conhecimentos técnico-científicos não são
panaceia, por outro, também não são placebo, pois têm implicações com a
ideologia, portanto, com a manutenção do consenso, com a composição
orgânica do capital, têm vinculações diretas com a divisão social hierár-
quico-vertical do trabalho e com a meritocracia, além de demandar
recursos financeiros para execução das políticas educacionais.
Conforme apontado, pela lógica meritocrática vigente para ingresso
na carreira estatal no Brasil (BRASIL, 1988), o melhor desempenho e a
melhor classificação garantem preferência na escolha da escola para tra-
balhar. Além disso, comumente a via de ingresso no magistério oficial
estatal é por intermédio de concurso público. Dessa forma, nos seus cursos
de formação de educadores o Movimento prepara também para a realiza-
ção de concursos públicos (CALDART, 1997; ITERRA, 1996; 1997). Entre
os objetivos específicos do curso de Magistério está “Realizar atividades
específicas de preparação aos Concursos Públicos do Magistério.”
(ITERRA, 1996, p. 5; 1997, p. 3).
A preparação para concursos coloca em tela, entre outras, a possibi-
lidade de ingresso no magistério estatal e, com isso, a possibilidade de
educadores formados pelo MST e/ou em conformidade com a Pedagogia
do Movimento tornarem-se professores em escolas estatais nos assenta-
mentos, reduzindo a incidência de designação de professores não
qualificados ou contrários ao MST para trabalhar em escolas no/do campo.
A ocupação desses cargos faz parte das lutas políticas do Movimento pela

6
Exemplos mais recentes disso são revoluções ocorridas no século XX, como, por exemplo, a russa, a cubana, a
chinesa, entre outras (HOBSBAWM, 1995).
164 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

ampliação do número de professores para atuar na conquista da hegemo-


nia nas escolas.
A formação de educadores do MST, coerentemente com os seus prin-
cípios educativos, preza pela articulação entre teoria e prática visando à
formação para e no coletivo, na e para a militância política. Assim, os prin-
cípios educativos e as pedagogias do Movimento têm que perpassar, na
teoria e na prática, o curso de formação de educadores (CALDART, 1997;
2004; 2012; MST, 1996; 1999; 2001c).
Nas escolas estatais de formação de professores, exceto por força de
convênios ou com a conquista da hegemonia, certos princípios, como, por
exemplo, a gestão democrática, a vinculação entre ensino e trabalho pro-
dutivo, o trabalho coletivo, entre outros, não podem ser colocados em
prática, devido à forma de estruturação e de organização das instituições
ou dos cursos (SILVA, 2019; TORRES; FERNANDES, 2019).
No MST, mesmo as avaliações, hegemonicamente um dos principais
instrumentos de controle docente e institucional sobre os estudantes es-
pecialmente, ocorre de forma democrática e coletiva, envolvendo
educadores e educandos. A crítica e a autocrítica, portanto, a prática da
(auto)avaliação, segundo o Movimento, precisa ser uma constante, em es-
pecial no processo formativo (CALDART, 1997, ITERRA, 1996; 1997; MST,
1996; 1999; 2010), o que não é praxe em cursos convencionais de formação
de professores.
Uma parte significativa e importante da formação dos educadores do
MST ocorre pela vivência e pela participação nas relações sociais cotidia-
nas, portanto, nas lutas, na dinâmica do Movimento, a grande e principal
escola dos Sem Terra, inclusive dos próprios educadores. Porém, o Movi-
mento não dispensa a dimensão teórica da formação. Além de cursos no
âmbito da educação formal, há ainda os cursos no âmbito da educação não
Cláudio Rodrigues da Silva | 165

formal, em especial os de formação política, que permeia todas as ativida-


des do Movimento (1996; 1999; 2001c).
As instituições formadoras de professores têm um potencial real de
influência no perfil dos egressos, não só pelo currículo formal, de caráter
mais teórico, mas especialmente pelo currículo oculto (DAL RI; VIEITEZ,
2008), de caráter mais prático, mas que reflete, porém, um referencial
teórico, uma ideologia, uma visão de mundo, pois, conforme Demo (1988),
não há prática sem teoria, nem teoria sem prática. Mais especificamente
em relação ao currículo oculto, Dal Ri e Vieitez (2008, p. 289, grifos dos
autores) apontam que

A ação desse currículo incide sobre a formação dos educandos de diversos mo-
dos. Entretanto, dentre seus ensinamentos, o mais importante é aquele que
decorre de que as relações pedagógicas são réplicas, ainda que em clave esco-
lar, das relações sociais fundamentais dominantes. Desse ponto de vista, a
escola burguesa, uma organização burocrática, transmite aos alunos por meio
da vivência das relações escolares, a percepção e a visão de que as relações
burocráticas são as relações naturais e eternas da sociedade. Em uma palavra,
uma das lições ministrada na escola que decorre imediatamente da vivência
consiste na sensação e na visão de que a burocracia é a forma mais racional de
organização social, além de ser a única forma eficiente de organização do tra-
balho.

Considerando-se que a ampla maioria das instituições formadoras de


professores, inclusive por força da legislação (BRASIL, 1988; 1996b), tem
que operar na lógica hegemônica, pode-se inferir que a ampla maioria dos
professores do ensino oficial foi/é formada nos moldes hegemônicos, ou
seja, da perspectiva do capital.
A reeducação, além de mais árdua, nem sempre resulta exitosa, seja
em parte, seja na totalidade. Por isso a importância atribuída pelo MST à
166 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

educação das novas gerações desde tenra idade (MST, 1996; 1999; 2001c),
em conformidade com seus princípios.
O trabalho de desconstruir e de (re)construir sobre novas bases, a
partir de novas referências e de novas lógicas, as concepções de educação
e de trabalho, portanto, de relações sociais e de relações de produção é um
processo não raramente árduo e moroso, que envolve vários fatores, tanto
no plano mais pessoal ou individual, quanto no plano mais coletivo, o que
torna premente a necessidade da educação, em especial das novas gera-
ções e da formação dos próprios educadores (LOVETT; COLLINS, 1840;
MST, 1996; 1999; 2001c; OWEN, 1967a; 1967b).
A lógica hegemônica de formação e de trabalho docente é, não sem
contradições, pautada e reprodutora da divisão social hierárquico-vertical
do trabalho, que dicotomiza a teoria e a prática, concepção e execução, di-
cotomias essas que têm relações diretas com o trabalho alienado e
estranhado.
No entendimento de Dal Ri e Vieitez (2008, p. 289),

O fato de o trabalho pedagógico ter, ainda hoje, uma feição individual e arte-
sanal, aliado à pouca penetração que o taylorismo tem na escola, em sua
dimensão mais diretamente operacional, são propícios à visão de que as rela-
ções sociais na instituição são radicalmente diferentes daquelas do mundo da
produção. Entretanto, as características diferenciadas da escola não modificam
o fato fundamental de que a ordenação escolar está, também, presidida por
uma variante da burocracia, ou seja, um sistema de poder hierárquico inerente
à sociedade de classes que coloca alunos, professores e funcionários em uma
relação de dependência e subordinação ao capital, ainda que, no caso da escola
pública, esta subordinação ocorra pela mediação do Estado e suas estruturas.

Deter a hegemonia sobre a formação dos próprios educadores é fun-


damental para o processo de embates político-ideológicos (CALDART,
1997; DAL RI; VIEITEZ, 2008; STEDILE; FERNANDES, 2001), ainda mais
Cláudio Rodrigues da Silva | 167

na atualidade, quando, inclusive em decorrência do processo ascendente


de mercantilização (AGUIAR, 2010; BEVILAQUA, 2011; RECH, 2011;
TORRES SANTOMÉ, 2003), a educação escolar, a ciência e a tecnologia
ganham papel preponderante na divisão internacional da produção, do
trabalho e das pesquisas científicas e tecnológicas, o que tem relação com
o processo de hierarquização vertical entre países e instituições que pes-
quisam ou que ensinam, e também com o que pesquisam ou com o que
ensinam, processo esse que tem impactos na vida das classes trabalhado-
ras, em especial nas frações de menor poder aquisitivo e/ou de países
periféricos.
Assim, a posição do Movimento é coerente, pois, se os princípios, em
especial o da gestão democrática e o da articulação entre ensino e trabalho
produtivo, são aprendidos majoritariamente pela vivência ou pela prática
e, considerando-se que no ensino oficial ou hegemônico isso não ocorre,
os professores formados nessas instituições não têm condições de ensinar
o que não sabem, o que não aprenderam, o que não vivenciaram e, prin-
cipalmente, não têm condições de difundir uma visão de mundo com a
qual não compactuam.
Segundo Caldart (1997, p. 164), “[...] quem desaprendeu (ou nem
chegou a aprender) de sonhar com uma sociedade mais justa, ou de se
apaixonar por esta causa, jamais será uma Educadora e um Educador da
Reforma Agrária [...]”, portanto, do MST.
Para o MST (1996; 1999; 2001c), o educador tem de ser referência
para o educando, e ambos têm de estar em constante processo de educa-
ção, educação essa que se dá no movimento do Movimento, e em
conformidade com seus princípios.
A formação de educadores está relacionada com os demais princípios,
tendo implicações diretas e indiretas com diversos fatores sociais, envol-
vendo questões culturais, políticas, econômicas, entre outras. É um tema
168 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

recorrente na história da educação (MANACORDA, 1992; SAVIANI 2009b)


e comumente associado, de maneira isolada ou não, à ineficácia da educa-
ção escolar e frequentemente presente nas diversas legislações ou
reformas relacionadas à educação escolar.
Os indicativos são de que a formação docente continuará a ser uma
questão em pauta, a ser objeto de polêmicas, de disputas e de controles
cada vez mais intensificados e sofisticados (LOUREIRO, 2011; 2016;
VIEITEZ; DAL RI, 2011). A formação econômico-social é dinâmica, está em
movimento, portanto, a ciência e a tecnologia também, o que repercute no
currículo escolar em sua totalidade, nas suas dimensões formal e oculta,
inclusive nos cursos de formação de professores.
A formação dos próprios educadores é um ponto crucial do projeto
educativo do MST, assim como dos demais Movimentos analisados. As ini-
ciativas de formação de professores ou educadores é um quesito central,
pois, quando formados em consonância com perspectivas hegemônicas, a
tendência é de que os educandos internalizem valores, ideologias e práticas
difíceis (mas não necessariamente impossíveis) de serem abandonadas ou
mudadas.
A função de educador, em especial na educação formal, é estratégica
para qualquer projeto educativo, seja da perspectiva hegemônica, seja da
contra-hegemônica. Evidência disso é que, historicamente, foi controlada
das mais variadas maneiras, conforme a formação econômico-social, o
momento histórico, a conjuntura e, especialmente, a serviço de quem es-
taria o educador (LUZURIAGA, 1963; MANACORDA, 1992). Portanto, a
formação de educadores ou de professores é uma questão fundamental,
tanto para o capital, quanto para o trabalho.
Capítulo VI

Articulação entre ensino e trabalho produtivo

Neste capítulo analisa-se o princípio denominado articulação entre


ensino e trabalho produtivo nos Movimentos sociais de trabalhadores ana-
lisados nesta pesquisa – MST, owenistas e cartistas.
No entendimento de Dal Ri (2012), a educação escolar articulada ao
trabalho produtivo é um dos princípios educativos presentes nos owenis-
tas. Entre os princípios enunciados nesta pesquisa, este é um dos mais
recorrentes em escritos deste Movimento (OWEN, 1967a; 1967b).
Como já apontado, para o owenismo (OWEN, R., 1967a; 1967b; 1968;
OWEN, J. 1968; OWEN, R. D., 1968), a educação, desde tenra idade e em
conformidade com a nova visão de sociedade, é fundamental para a for-
mação do caráter racional demandado pelo novo sistema. Quanto mais
cedo expostas e familiarizadas com os valores e com as circunstâncias de-
sejadas, maiores as chances de êxito de educação das pessoas para o
projeto societário owenista.
Owen defende o uso da ciência e dos conhecimentos úteis para bene-
fício e para felicidade de toda a humanidade (1967a; 1967b). Além da
aritmética, da leitura e da escrita – que, no entendimento de Owen, são
meios para a transmissão e para a aquisição de conhecimentos –, uma de
suas principais preocupações era com a formação de pessoas úteis para si
mesmas, para a comunidade e para a sociedade em geral. Por isso, inclu-
sive, a importância da articulação entre trabalho produtivo e ensino.
Para meninas, por exemplo, era previsto o ensino de corte e costura
para confecção de vestuários, culinária e higiene. Para meninos, faz-se re-
ferência ao aprendizado dos exercícios militares e ao manuseio de armas
170 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

e de artes da guerra, visando prepará-los para eventual necessidade de de-


fesa do território (OWEN, 1967a; 1967b).
Educando as crianças desde tenra idade, o trabalho seria por elas en-
tendido como uma atividade agradável e natural, já que a pessoa agirá ou
será governada, no entendimento de Owen (1967a; 1967b), conforme os
hábitos adquiridos e o caráter formado durante a infância.
Owen (1967a; 1967b) considera a educação articulada ao trabalho
produtivo fundamental para a formação do novo caráter na humanidade,
pois crianças e jovens inseridos em ambientes adequados, em termos de
demanda de força física, de habilidade intelectual e em termos morais,
cresciam saudáveis em todas as dimensões, desenvolviam bons hábitos e
melhores níveis de regularidade, atenção, limpeza e subordinação no tra-
balho, além de se interessarem mais pelo aprendizado dos conhecimentos
técnico-científicos.

[...] o trabalho torna-se mais regular e a atenção a ele mais constante, na pro-
porção da importância das máquinas empregadas e, consequentemente, eles
adquirem hábitos mais regulares de vida, gostam mais de aprender a ler e
escrever e não são inferiores, em termos de conduta moral e religiosa, se com-
parados à ampla maioria da população trabalhadora da Inglaterra. (OWEN,
1967b, p. 26)

No projeto owenista era prevista uma classificação, segundo Owen


(2002), natural e racional, conforme as faixas etárias, tendo em vista a
definição das funções a serem executadas, respeitando-se as capacidades
física e intelectual relativas a cada momento da vida.
Até os cinco anos, as pessoas estariam na primeira classe, sendo pre-
vistas, entre outras atividades, exercícios regulares ao ar livre1, a

1
À época, uma preocupação bastante pertinente, se se considerar os apontamentos, entre outros, do próprio Owen
(1967a; 1967b), de Engels (2008) e de Marx (1984) sobre as condições insalubres das fábricas, das escolas das
Cláudio Rodrigues da Silva | 171

familiarização com objetos diversos, adquirindo conhecimentos exatos por


intermédio de explicações simples e claras (OWEN, 2002).

Dessa maneira construir-se-ão os fundamentos de um espírito sadio, dos bons


hábitos e de alguns conhecimentos úteis. Eles pensarão, falarão e agirão raci-
onalmente para sua idade; serão saudáveis e ativos; terão poucas fantasias,
mas muitas idéias exatas, coerentes entre si e de acordo com todos os fatos
conhecidos. (OWEN, 2002, p. 130)

Entre os cinco e os dez anos, as crianças comporiam a segunda classe.


Nessa faixa, ocorreria a vivência do trabalho como princípio educativo. Se-
gundo Owen (2002, p. 131),

[...] exercícios consistirão em ocupações de utilidade permanente, muito mais


divertidos que as brincadeiras. Seu saber se ampliará pela observação e a ma-
nipulação de objetos, e por conversas com pessoas mais experientes que eles.
Eles ajudarão nas atividades domésticas, nos jardins e oficinas, bem como em
outros empregos adequados a sua idade e suas forças.

Na terceira classe, que compreenderia as pessoas entre os dez e os


quinze anos, o trabalho se complexificaria. Elas

[...] se ocuparão da casa, do jardim e da oficina. Adquirirão conhecimentos


mais íntimos dos princípios e da prática das artes de produção de riquezas,
dos produtos do solo, das minas e da pesca; da preparação dos alimentos; da
preparação dos materiais para vestuário, construções, máquinas e ferramen-
tas. Nessas operações, serão auxiliados por todos os conhecimentos científicos
e forças mecânicas da sociedade e pelas pessoas mais velhas. As ocupações
serão reguladas de modo a aumentar sua força física e intelectual, e a contri-
buir para a saúde do corpo e do espírito. Progredirão também em todas as
ciências. (OWEN, 2002, p. 131)

fábricas, bem como das habitações de significativa parcela dos trabalhadores na Inglaterra, em especial em Londres
e outros grandes centros industriais.
172 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Entre os quinze e os vinte anos as pessoas seriam da quarta classe,


quando, no entendimento de Owen (2002, p. 131), tornar-se-iam “[...]
uma nova raça, superior em qualidades físicas, intelectuais e morais.” Es-
sas pessoas seriam muito ativas na produção e na instrução das classes
precedentes. Verifica-se, nesse excerto, alguma consonância com o apon-
tamento de Marx (1984) sobre o potencial do trabalho produtivo
articulado à instrução como forma de elevação das classes trabalhadoras.
As pessoas entre vinte e vinte e cinco anos comporiam a quinta classe,
formando “[...] a mais alta classe da produção e da instrução, das quais
serão os diretores em todos os departamentos.” (OWEN, 2002, p. 131).
Pode-se inferir que essa, portanto, seria a classe, responsável pela gestão,
entre outros, das escolas owenistas.
O indicativo da pertinência de as pessoas desta classe serem respon-
sáveis pela instrução remete ao princípio da formação dos próprios
educadores, que precisariam ser formados e agir em conformidade com os
princípios, com a ideologia e com a visão de mundo dos owenistas.
Na sexta classe estariam as pessoas dos vinte e cinco aos trinta anos,
cuja principal ocupação seria a conservação e a distribuição da riqueza.
Entre os trinta e os quarenta anos, as pessoas fariam parte da sétima
classe, encarregada do governo do interior. A oitava e última classe seria
composta por pessoas entre os quarenta e sessenta anos, cujo principal
encargo seria o governo exterior (OWEN, 2002).
O trabalho, segundo Owen (1967a; 1967b), é fator de geração de ri-
quezas e levaria à abundância da produção, resultando em prosperidade e
felicidade para toda a humanidade.
Também na educação cartista está presente a vinculação entre o en-
sino e o trabalho produtivo (DAL RI, 2012).
Cláudio Rodrigues da Silva | 173

Os cartistas prezavam pelo ensino de conhecimentos úteis, que deve-


riam ser vinculados à “[...] aplicação geral para as artes, ofícios e atividades
em que possam vir a ser envolvidos [...]”, visando a sua aplicação útil na
vida prática, tanto da perspectiva individual, quanto da coletiva (LOVETT;
COLLINS, 1840, p. 23).
Conforme Flett (2006, p. 22),

Historicamente, o conhecimento realmente útil teve um significado claro. Ele


foi usado para diferenciar as idéias da classe trabalhadora [...] das noções da
classe média de conhecimento útil, que foi alternativamente conhecido como
conhecimento realmente inútil ou conhecimento meramente útil.

No entendimento dos cartistas, “[...] devem ser ensinados os princí-


pios elementares dos ofícios mais úteis e ocupações em laboratório e
oficinas.”, sendo também necessária a existência de espaços na escola para
a prática de horticultura e de jardinagem (LOVETT; COLLINS, 1840, p.
23).
Previam o estabelecimento, conforme a possibilidade e a disponibili-
dade de recursos, de escolas industriais e agrícolas “[...] para educar,
apoiar e instruir em algum ofício ou ocupação útil as crianças órfãs da as-
sociação.” (LOVETT; COLLINS, 1840, p. 19).
No projeto cartista era previsto, por exemplo, que as escolas, entre
outros quesitos, contassem com “[...] um pequeno museu, um pequeno
laboratório e oficina geral, onde às crianças pudessem ser ensinados expe-
rimentos científicos, bem como os primeiros princípios dos ofícios mais
úteis.” (LOVETT; COLLINS, 1840, p. 14).
Se, por um lado, cartistas faziam menção, entre outros países, aos
Estados Unidos da América, como referência, em termos de avanços em
direitos políticos, por outro lado, condenavam a existência e a exploração
do trabalho escravo, pois prezavam pelo trabalho livre, recusavam o
174 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

trabalho excessivo e extenuante, que privava da fruição da vida e degra-


dava física, moral e intelectualmente os trabalhadores (LOVETT;
COLLINS, 1840).
Para Dal Ri (2012), entre os princípios educativos do MST está a ar-
ticulação entre ensino e trabalho produtivo. Isso também é apontado por
outros autores (BAUER, 2009; CALDART, 1997; 2004; DAL RI; VIEITEZ,
2008; MARTINS, 2004).
Para o MST (ITERRA, 2003; MST, 1994a; 1996; 1998; 1999; 2001a;
2001b; 2001c), a articulação entre ensino e trabalho produtivo é um dos
mais importantes princípios de seu projeto educativo. Assim como tem
concepção própria de educação, o Movimento também tem uma concep-
ção de trabalho que se diferencia da concepção hegemônica vigente, isto é,
a do capital.

As pessoas se humanizam ou se desumanizam, se educam ou se deseducam,


através do trabalho e das relações sociais que estabelecem entre si no processo
de produção material de sua existência. É talvez a dimensão da vida que mais
profundamente marca o jeito de ser de cada pessoa. No MST, os Sem Terra se
educam tentando construir um novo sentido para o trabalho do campo, novas
relações de produção e de apropriação dos resultados do trabalho, o que já
começa no acampamento, e continua depois em cada assentamento que vai
sendo conquistado. (MST, 1999, p. 8)

O MST, como já ressaltado, tem uma concepção específica de educa-


ção e de pedagogia, organicamente articulada com suas concepções de
gestão e de trabalho e com suas ideologia e visão de mundo. Dessa forma,
dada a correspondência necessária entre os princípios educativos e essas
concepções, precisa haver consonância entre a educação e a forma como
são organizadas e geridas as escolas, as associações e as entidades
Cláudio Rodrigues da Silva | 175

vinculadas ao MST, pois, como apontam Dal Ri e Vieitez (2008), o modelo


de gestão e de organização é um currículo oculto, portanto, educativo.
A articulação entre ensino e trabalho produtivo operacionaliza-se de
variadas formas, conforme as especificidades dos níveis ou das modalida-
des de ensino. Segundo o Movimento (1996, p. 15), a “Educação ligada ao
mundo do trabalho”

[...] quer dizer que nossos processos pedagógicos (e especialmente as escolas),


não podem ficar alheios às exigências cada vez mais complexas dos processos
produtivos, seja os da sociedade em geral, seja os dos assentamentos, em par-
ticular. A escola não tem como único objetivo a formação para o trabalho; mas
é um local privilegiado para também dar conta dela. E pode fazer isso tanto
selecionando conteúdos vinculados ao mundo do trabalho e da produção,
como também proporcionando e/ou acompanhando experiências de trabalho
educativo com seus estudantes.

Verifica-se, portanto, que o Movimento tem em vista uma educação


ampla e complexa, que instrumentalize para os desafios postos às classes
trabalhadoras na atualidade, principalmente no que se refere ao trabalho,
que vem demandando cada vez mais o domínio e a aplicação de conheci-
mentos técnico-científicos, haja vista o conjunto de mudanças ou de
inovações que vem sendo implementado no campo e nas atividades agrí-
colas ou rurais, em especial na agroindústria (CALDART, 2012; STEDILE,
2012; STEDILE; FERNANDES, 2001).
Também por isso o MST nega dialeticamente o ensino oficial propi-
ciado pelo Estado, uma vez que essa articulação não ocorre na escola
estatal (DAL RI, 2013; DAL RI; VIEITEZ, 2008). Além disso, a concepção
de trabalho, de educação e de gestão democrática do MST diverge da con-
cepção vigente na escola estatal.
176 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Como bem mostram os princípios pedagógicos do MST, a escola precisa ter


um estreito vínculo com o trabalho. Por isto, vários espaços de trabalho fazem
parte do processo educativo desenvolvido na escola. Ao mesmo tempo, deve
ser trabalhada a mística do trabalho e de como ele faz parte de nossa identi-
dade Sem Terra, membros da classe trabalhadora. (MST, 1999, p. 33)

O Movimento tem uma concepção de trabalho diversa da dominante,


que entende e apresenta o trabalho como sinônimo de emprego, trabalho
assalariado em uma relação de compra e venda de força de trabalho (DAL
RI; VIEITEZ, 2008). Segundo o MST (1999, p. 33), o trabalho

[...] envolve o esforço físico e mental que transforma a natureza e, ao trans-


formar a natureza, nos transforma; nos humaniza. É o trabalho que nos
diferencia dos outros seres vivos. Através dele, de forma pessoal e coletiva,
garantimos as condições objetivas de nossa qualidade de vida. O trabalhador
se deseduca e se desumaniza ao ser desapropriado, desqualificado e ou explo-
rado em seu trabalho.

Portanto, o Movimento deixa clara sua concepção de trabalho, em


consonância com a abordagem marxista, que entende o trabalho no modo
de produção capitalista como alienado e estranhado (MARX, 1984; 2004).
Conforme o MST (1999, p. 9),

Pelo trabalho o educando produz conhecimento, cria habilidades e forma sua


consciência. Em si mesmo o trabalho tem uma potencialidade pedagógica, e a
escola pode torná-lo mais plenamente educativo, à medida que ajude as pes-
soas a perceber o seu vínculo com as demais dimensões da vida humana: sua
cultura, seus valores, suas posições políticas... Por isso a nossa escola precisa
se vincular ao mundo do trabalho e se desafiar a educar também para o tra-
balho e pelo trabalho.

Uma das principais formas de articulação entre ensino e trabalho


ocorre por intermédio da pedagogia da alternância, que tem como
Cláudio Rodrigues da Silva | 177

característica principal o fato de que, durante os estudos, há momentos


específicos de alternância, quando educandos voltam às comunidades ou
aos assentamentos de origem para colocar em prática o que vêm apren-
dendo ou o que aprenderam, inclusive como forma de cooperar com as
comunidades, por intermédio da aplicação dos conhecimentos apropria-
dos nos cursos.
A pedagogia da alternância é constituída pelo tempo escola e pelo
tempo comunidade. No primeiro, os educandos “[...] têm aulas teóricas e
práticas, [...] se auto-organizam para realizar tarefas que garantam o fun-
cionamento da escola, avaliam o processo e participam do planejamento
das atividades, vivenciam e aprofundam valores [...]” (MST, 1999, p. 10-11,
grifos do autor). Já no tempo escola, os educandos “[...] realizam ativida-
des de pesquisa da sua realidade, de registro desta experiência, de práticas
que permitem a troca de conhecimento, nos vários aspectos. Este tempo
precisa ser assumido e acompanhado pela comunidade Sem Terra.” (MST,
1999, p. 11, grifos do autor), o que faz da educação do MST um projeto
eminentemente coletivo, em todas as suas fases.
A vinculação orgânica, com estreito vínculo entre escola e comuni-
dade, é recorrente e imprescindível na educação do MST. Para o
Movimento (MST, 1999, p. 10), “A Escola precisa ter a capacidade de se
voltar para a comunidade Sem Terra, sendo uma resposta para as suas
demandas.” A escola, segundo o MST, pode colaborar organicamente com
as comunidades dos assentamentos desenvolvendo atividades em áreas,
como, por exemplo, cultura, comunicação, ecologia, mística, educação de
jovens e adultos e escolarização, luta, trabalho, capacitação, serviços inter-
nos, serviços externos, entre outros.
Entre os tempos educativos inseridos na prática educacional do MST
(1999, p. 25-26), passíveis de adequação conforme as especificidades de
cada comunidade, estão o tempo aula, “[...] previsto para se trabalhar
178 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

didaticamente os conteúdos ou temas de estudo”, o tempo trabalho, que


“Visa o aprendizado através do trabalho e a compreensão da organização
do trabalho e de como se desenvolve um processo produtivo com o mer-
cado”.
Além desses, há o tempo oficina para “[...] capacitação dos educandos
em algumas atividades básicas”, o tempo esporte/lazer, destinado à “[...]
prática de esportes e jogos coletivos que venham a desenvolver valores
como a cooperação e a socialização”, o tempo estudo, para “[...] garantir
um tempo, com monitoria, para o estudo dos educandos” e o tempo mu-
tirão para “[...] contribuir com o cuidado da escola, com a valorização das
pequenas tarefas, com o embelezamento do espaço público” (MST, 1999,
p. 25-26).
Há, ainda, o tempo coletivo pedagógico, que “Visa garantir um ou
mais tempos destinados às educadoras (professoras, funcionárias, moni-
tores, voluntários).” (MST, 1999, p. 26). Este tempo é estratégico, pois
nele

[...] deve ser feita uma análise do processo educacional em andamento, plane-
jar a intencionalidade pedagógica dali para a frente, ver como melhorar o
ambiente educativo e como envolver melhor os educandos no processo, com-
binar como serão desenvolvidas as atividades pedagógicas. (MST, 1999, p. 26)

Esses tempos ajudam na demonstração de como os princípios educa-


tivos são intrincados. A implementação plena desses tempos está
vinculada especialmente aos princípios da articulação entre ensino e tra-
balho produtivo, da formação dos próprios educadores e da gestão
democrática.
Trabalho e educação são tratados de forma articulada e indissociável,
pois o próprio trabalho é considerado um dos mais elementares princípios
educativos (MST, 1999). Este princípio está relacionado também com a
Cláudio Rodrigues da Silva | 179

premissa da relação necessária entre teoria e prática, que precisa permear


o processo educativo do MST. No entanto, o Movimento ressalta: “Não te-
mos nada contra aulas expositivas. Elas também devem estar presentes
em nossa escola. O que queremos é salientar a necessidade do máximo
envolvimento dos educandos na produção do conhecimento.” (MST, 1999,
p. 42).
No entendimento do MST (2001, p. 11), “Educandos em ação, reali-
zando algo mais do que apenas ouvir a professora.” é um indício de que
“[...] já existe uma instituição sobre a dimensão pedagógica do fazer, da
atividade prática, e de que aula não é apenas discurso do professor, ou do
livro.”

As pessoas se educam nas ações porque é o movimento das ações que vai con-
formando o jeito de ser humano. As ações são produzidas através de relações
sociais [...]. Não estamos falando de qualquer ação, ou do agir pelo agir, sem
intencionalidade alguma. Estamos falando de ações que produzem obras (ma-
teriais ou espirituais) que se tornam espelho onde as pessoas podem olhar
para o que são, ou ainda querem ser; e estamos falando principalmente do
trabalho e da produção material de nossa existência. (MST, 2001c, p. 45)

Portanto, para o MST (2001c, p. 45), a educação tem que ser eminen-
temente prática, o que não implica desprezar a dimensão teórica e coletiva,
pois “Não há verdadeira educação sem ações, sem trabalho e sem obras
coletivas.” Tanto para o quesito da prática, quanto para o da coletividade,
o trabalho é fundamental, porque “Faz parte do processo educativo o en-
volvimento do educando na produção, seja no trabalho individual seja no
trabalho coletivo. Se os educandos morarem em um alojamento, o ideal é
que ele tenha uma área produtiva.” (MST, 1999, p. 47).
O Movimento (1999) recomenda a realização de atividades na área da
escola, atividades essas que não demandam altos investimentos ou
180 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

organização altamente complexa, como, por exemplo, a contribuição no


refeitório para servir a merenda, a limpeza, a arrumação ou o embeleza-
mento dos diversos ambientes internos ou externos à escola, tais como
sala de aula, corredores, pátios, banheiros, jardins.
Isso pode contribuir para avanços nos desafios que o Movimento se
coloca. Um deles é a superação ou a ruptura com a dicotomia e com a hie-
rarquização vertical entre trabalho manual e trabalho intelectual. Outro
desafio é a questão de gênero/sexualidade, que pode ter forte repercussão
especialmente nas relações (intra)familiais.
Entre os exemplos de unidades de produção que podem ser imple-
mentadas para fins de articulação entre ensino e trabalho produtivo, e que
podem contribuir tanto para os próprios educandos, quanto para as co-
munidades, estão os jardins, sejam para fins de embelezamento, sejam
para finalidades científicas, artísticas ou de produção para fins de comer-
cialização, os viveiros, para produção de mudas para reflorestamento,
produção de frutas ou de lenha, para uso ou para comercialização (MST,
1999).
Pode haver, ainda, o horto medicinal e de temperos, cuja produção
pode estar “[...] voltada para a farmácia e a cozinha da escola, as farmácias
comunitárias dos assentamentos e acampamentos e as feiras” (MST, 1999,
p. 35); a horta, para “[...] abastecimento da cozinha da escola (merenda) e
para a comercialização na feira”, além de servir para observação e estudos
científicos (MST, 1999, p. 35-36).
Outras possibilidades de unidades de produção são a criação de pe-
quenos animais, a lavoura, a área administrativa, a marcenaria, a
serralheria, a ferraria, a gráfica, o artesanato, entre outros (MST, 1999).
Porém, a instalação de unidades de produção depende, entre outras, das
condições objetivas e subjetivas de cada comunidade ou assentamento
(MST, 1999; 2001c).
Cláudio Rodrigues da Silva | 181

As oficinas têm caráter eminentemente prático, podendo atravessar


ou complementar o tempo das aulas, consistindo em “[...] tempos e espa-
ços voltados para a capacitação, ou seja, são atividades centradas no
aprendizado de habilidades (aprender a fazer), construídas pela prática di-
reta dos próprios educandos (fazendo), orientada ou monitorada por
mestres daquelas habilidades em questão” (MST, 2001c, p. 58). Exemplos
de oficinas são as de expressões culturais – dança, teatro, música, artesa-
nato –, produção, administração, informática, entre outros (MST, 1999).
A articulação entre trabalho produtivo e educação ocorre de formas
diferentes, conforme a idade, o nível e a modalidade, como, por exemplo,
se formal ou não formal, se Educação Infantil, Fundamental, de Nível Mé-
dio ou Superior, se na modalidade técnica, cooperativa, se oficina, ensino,
capacitação, entre outras especificidades do processo educativo do Movi-
mento (MST, 1996; 1999; 2001c).

Em algumas de nossas escolas isto quer dizer, por exemplo, que são as crianças
as responsáveis pela construção e manutenção do parque de brinquedos da
escola ou do acampamento, assentamento; em outras têm sido o cuidado com
a horta; em outras ainda, é a criação de um grupo de teatro para fazer apre-
sentações públicas que tragam apoio à luta pela Reforma Agrária; há também
experiência onde os educandos, junto com os educadores, assumem o trabalho
numa pequena agroindústria de doces para gerar renda extra para o coletivo.
O tipo de trabalho e de processo produtivo depende das condições objetivas de
cada local, da idade e experiências anteriores dos educandos envolvidos, e tam-
bém da criatividade do conjunto da coletividade escolar. (MST, 2001c, p. 58)

Segundo o Movimento (1999; 2001c), é preciso adequar as unidades


de produção à realidade local, seja no que se refere à infraestrutura, seja
no que se refere à decisão de cada comunidade quanto à forma de organi-
zação e gestão da produção. Porém, “Ao qualificar a produção, o saber
182 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

produzido na escola poderá repercutir na comunidade, cumprindo uma de


suas funções.” (MST, 1999, p. 34).
Outro fator que influencia na forma como ocorre a articulação, pos-
sibilitando menores ou maiores níveis de complexidade, é a infraestrutura
existente nos locais, se acampamento ou se assentamento, os tipos de pro-
dução e os níveis de avanços em termos de organização e adequação aos
princípios do Movimento (MST, 1996; 1999; 2001c; STEDILE;
FERNANDES, 2001).
Quanto mais complexa e quanto mais avançada for a produção, em
termos de adequação aos princípios do Movimento, maior será o potencial
educativo nas diferentes unidades. Isso porque nas comunidades onde há
agroindústrias, associações, cooperativas, entre outras, possibilitam aos
educandos o aprendizado de novas atividades, pois os trabalhos agrícolas
menos complexos já são comumente aprendidos no cotidiano com a pró-
pria família. Permite, ainda, a vivência e o aprendizado de relações sociais
mais complexas e dos princípios do Movimento em uma rede de relações
mais ampla, na lógica do trabalho coletivo, cooperativo, em contraponto
ao trabalho individual ou familial, o mais comum nas unidades.
Possibilitam, ainda, o aprendizado e o domínio das fases da cadeia
produtiva de determinados ramos de atividades presentes em certas uni-
dades ou comunidades do Movimento, o que pode contribuir para o
processo de desalienação e desestranhamento do trabalho, em especial
quando as instâncias e processos ocorrem em conformidade com a pers-
pectiva do trabalho associado, isto é, geridos democraticamente ou
regulados pelos próprios associados ou cooperados (DAL RI; VIEITEZ,
2008; VIEITEZ; DAL RI, 2009).
A diversificação e a verticalização da produção, visadas ou postas em
prática pelo MST em determinados assentamentos, demandam uma for-
mação ampla e atualizada, inclusive dos conhecimentos científicos e
Cláudio Rodrigues da Silva | 183

tecnológicos, já que os maquinários, os insumos, o mercado, enfim, quase


todas as relações sociais são pautadas por esses conhecimentos, tornados,
assim, necessários.
Para o MST (2001a, p. 38), a verticalização da produção contribui,
entre outros, para a cooperação e para “[...] formas mais diversificadas de
compartilhamento social.”

A cooperação, aliada à verticalização da produção com a indústria e diversi-


dade produtiva, além de proporcionar as condições objetivas para a divisão do
trabalho, estimula a multifuncionalidade das atividades dos pequenos e mé-
dios produtores rurais, dos pescadores artesanais e dos extrativistas,
integrando as diferentes funções que o meio rural deve desempenhar nas so-
ciedades contemporâneas. (MST, 2001a, p. 35)

O trabalho cooperado, dessa perspectiva, vai ao encontro de um dos


grandes desafios enfrentados pelo Movimento (MST, 1986; STEDILE;
FERNANDES, 2001). Isso porque, por um lado, o produtor isolado tende a
ter dificuldades de inserção e de sobrevivência no mercado, onde comu-
mente impera a lógica do agronegócio ou do capital. Por outro lado, ajuda
a educar para o trabalho coletivo, reduzindo as resistências à associação
ou à cooperação, uma das formas de se tentar a sobrevivência no mercado
e, ao mesmo tempo, de se afastar do trabalho alienado e estranhado e de
se avançar no sentido do trabalho associado. Reitera-se, então, a relevância
do currículo oculto (DAL RI; VIEITEZ, 2008; VIEITEZ; DAL RI, 2009).
Trata-se de uma condição fundamental para aumentar as chances de
sobrevivência ou, preferencialmente, de condições mais dignas de vida,
tanto no âmbito mais micro ou familial, quanto no âmbito mais macro,
isto é, abrangendo acampamentos ou assentamentos, já que a falta de vi-
abilidade financeira pode levar ao êxodo, ao abandono, ou mesmo ao
184 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

arrendamento das terras, entre outras práticas contrárias às propostas e à


visão do Movimento (STEDILE; FERNANDES, 2001; STEDILE, 2012).
Na concepção do Movimento, o trabalho como princípio educativo
não é um simulacro de trabalho, ou de um trabalho em situação laborato-
rial, mas, sim, de um trabalho real, que se relaciona com o mercado,
visando inclusive a geração de renda, em especial para o autossustento
financeiro da escola (DAL RI, 2004; DAL RI; VIEITEZ, 2008; 2009).
Entretanto, a aplicação da renda obtida com a venda dos produtos ou
serviços deve ser feita em conformidade com a decisão do coletivo da es-
cola que, é importante ressaltar, inclui os estudantes na condição de
participantes reais, ativos, com direito a voz e a voto. Isso tem relações
diretas com a questão da auto-organização dos estudantes e com a gestão
democrática (DAL RI; VIEITEZ, 2008; 2009).
Se, por um lado, o trabalho deve ser real e ter articulação efetiva com
o mercado, o que pode resultar em avanços em diversos sentidos, por ou-
tro lado, há riscos de, até mesmo por necessidade material, o trabalho ser
concebido, executado ou gerido predominantemente nos moldes do capi-
tal, o que contraria a proposta do Movimento.
Esse é um desafio que enfrenta não só o MST, como também algumas
OTAs (DAL RI; VIEITEZ, 2008; VIEITEZ; DAL RI, 2009). Além do potencial
do toque de Midas do capital que, como aponta Marx (1984), torna tudo
mercadoria2, os Sem Terra, por conseguinte, o Movimento, assim como a
ampla maioria das classes trabalhadoras, enfrentam dificuldades financei-
ras3 e de sobrevivência, o que os obriga a participar e a competir no

2
Ressalta-se que mercadoria é mais do que um objeto ou um produto, ou seja, é uma relação com diversas
implicações determinantes no modo de vida das pessoas de determinada formação econômico-social (MARX, 1984).
3
Ainda que reivindique recursos financeiros estatais para viabilizar a reforma agrária, os assentamentos e as escolas,
entre outros equipamentos públicos, o Movimento alega enfrentar dificuldades financeiras para a manutenção de
suas atividades, como, por exemplo, o Jornal Sem Terra (MST, 2013). Outro exemplo é a Escola Nacional “Florestan
Fernandes”, que conta com o apoio da Associação dos Amigos da Escola Nacional “Florestan Fernandes” (AAENFF)
para sua manutenção (AAENFF, 2013).
Cláudio Rodrigues da Silva | 185

mercado. O modo de produção é determinante das relações de produção e


das relações sociais como um todo. Alterações na concepção de trabalho
podem impactar todas as demais esferas sociais.
Outro desafio que se coloca ao Movimento, além de combater ou ten-
tar evitar o trabalho alienado ou estranhado, é adequar o trabalho,
portanto, a produção à sua filosofia de sustentabilidade, da perspectiva da
agroecologia4, quando, na atualidade, praticamente todas as condições do
mercado capitalista impelem à produção e ao consumo da perspectiva do
agronegócio, nos moldes do capital (MST, 2010; STEDILE, 2012).
O trabalho produtivo e a educação articulados e geridos democrati-
camente da perspectiva do trabalho associado colocam todos os envolvidos
na condição de sujeitos históricos, com maior poder relativo de decisão
sobre as próprias práticas, sobre o processo e o produto do próprio traba-
lho, o que, apesar das limitações e das contradições, apontam no sentido
do trabalho associado (DAL RI; VIEITEZ, 2008; VIEITEZ; DAL RI, 2009).
Segundo o MST (1999), a pedagogia do trabalho está relacionada com
o trabalho produtivo, que remete ao trabalho útil, tanto no plano indivi-
dual, quanto no coletivo. Entretanto, não se trata de reduzir a pessoa à
dimensão economicus ou faber, mas, ao invés, trata-se de pensar a pessoa
omnilateralmente, em sua totalidade. Evidência disso é que a dimensão lú-
dica – com intencionalidade – permeia as atividades do Movimento.

Lúdico tem a ver com jogos, brincadeiras, divertimento, recreação, lazer. Um


dos aprendizados de quem participa do MST é o de misturar a dureza da luta
pela terra e das condições de vida miserável que exigiram a entrada das pes-
soas nesta luta, com a capacidade de brincar, de se divertir, de olhar a vida de

4
Agroecologia, diferentemente do agronegócio, é pautada pelos pressupostos da sustentabilidade, tendo uma visão
de mundo subjacente a ela. No caso do MST, a perspectiva é a do trabalho associado, contrária à lógica de produção
do capital, que entende o meio ambiente, por conseguinte, a vida humana inclusive, como mercadoria. Um ponto
bastante destacado e diferenciador da agroecologia em relação ao agronegócio é o combate ao uso de agrotóxicos
(GUHUR; TONÁ, 2012; SANTOS; NOVAES, 2013).
186 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

um jeito menos carrancudo, mais ‘esportivo’. Aprender a celebrar, a conviver,


a jogar, também diante das derrotas que a dinâmica da vida de Sem Terra nos
impõe. (MST, 2001c, p. 56)

Por adotar a concepção de formação omnilateral, o Movimento atri-


bui alta importância ao lúdico, às diferentes manifestações artístico-
culturais, entre outras atividades. Segundo o MST (2001c, p. 45), “[...] não
há educação sem jogos e brincadeiras, que também podem ser constituídas
como ações coletivas, produzindo obras.” Contudo, se empenha para, em
certa medida, dar a essas atividades um sentido emancipatório, duma
perspectiva de classe social.
Assim, o Movimento faz uso de todos os espaços possíveis para di-
fundir as próprias ideologia e visão de mundo, fazendo com que suas
atividades sejam permeadas por seus valores e princípios. Mas, o capital
também faz uso de todas as instâncias e atividades para difundir e repro-
duzir as próprias ideologia e visão de mundo, inclusive, como apontam
Guareschi (2001) e Santos, A. (2010), nos entretenimentos, aparente-
mente desinteressados. Os meios de comunicação, em suas diferentes
modalidades, são aparelhos ideológicos com alto potencial na constituição
do consenso, para a manutenção da hegemonia.
Por isso é importante analisar o trabalho produtivo não apenas em
relação à dimensão mais material da vida, ou seja, das carências, mas tam-
bém em relação à dimensão das necessidades, que estariam relacionadas
a questões para além dos aspectos estritamente fisiológicos. Faz-se neces-
sário superar a lógica da já demonstrada inconsistente dicotomia entre
corpo e mente, mesmo porque uma dimensão está relacionada à outra,
num plano imediato, com preponderância da primeira sobre a segunda, já
que o corpo é condição imprescindível para a dimensão mental5.

5
Segundo Damásio (1996) trata-se de um equívoco cartesiano a dicotomia entre razão e emoção, entre corpo e mente.
Cláudio Rodrigues da Silva | 187

Porém, o Movimento enfrenta uma conjuntura extremamente desfa-


vorável, pois, além de ter de resistir à produção nos moldes do agronegócio
ou do capital, a reforma agrária não tem avançado, reduziu-se o número
de acampamentos, portanto, de ocupações, os assentamentos enfrentam
dificuldades diversas, como, por exemplo, a falta de equipamentos públi-
cos de uso coletivo, entre outras (STEDILE, 2012).
Portanto, um conjunto de fatores, cuja resolução independe do Mo-
vimento, impele famílias inteiras ou parte delas, à migração para a cidade,
em busca de emprego, de estudos, entre outros (STEDILE, 2012). Esses
fatores podem colocar em risco a capacidade de reprodução do Movi-
mento, que se apresenta e pretende continuar a ser um movimento de
massas.
Vivenciar e conhecer os desafios e as demandas de cada comunidade
é fundamental para que os educadores possam desempenhar adequada-
mente seu trabalho, em conformidade com os princípios do MST, como,
por exemplo, no que se refere à aplicação dos princípios da gestão demo-
crática e da articulação da educação ao trabalho produtivo de maneira
adequada às diferentes faixas etárias.
Segundo o MST (2001c, p. 51), “[...] é preciso que o coletivo de edu-
cadores faça uma reflexão pedagógica específica sobre como adequar estas
dimensões a cada faixa etária, de modo a se respeitar sempre o desenvol-
vimento humano dos educados.” Precisam ser considerados, ainda, os
recursos, as necessidades e as decisões das próprias comunidades.
Quanto maior o vínculo orgânico entre educadores, comunidades e
Movimento, maiores as chances de sucesso no processo de vinculação en-
tre educação e trabalho produtivo que, como ressaltado, tem caráter real
e vinculação com o mercado, não sendo, portanto, um trabalho fictício,
sem função social. A gestão democrática é fundamental para que os
188 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

trabalhadores possam deter o controle do processo e do produto do pró-


prio trabalho (DAL RI; VIEITEZ, 2008; VIEITEZ; DAL RI, 2009).
Especialmente nos próprios cursos de formação ou de aperfeiçoa-
mento de educadores, faz-se necessária a vivência dessas atividades e
princípios, pois os então educandos já são ou serão responsáveis pelo en-
sino teórico-prático desse e dos demais princípios educativos nas
diferentes iniciativas educacionais do Movimento. “O trabalho dos educan-
dos, sendo acompanhado por monitores e envolvendo os educandos em
todas as fases do processo produtivo, do planejamento até a comercializa-
ção, torna-se mais educativo.” (MST, 1999, p. 33).

Tempos e espaços para a participação dos educandos e dos educadores na re-


alização de tarefas ligadas ao funcionamento e manutenção material da escola;
e, quando possível, na criação e execução de unidades de produção mais com-
plexas, que possibilitem aprendizados também mais complexos no campo da
formação organizativa e econômica, bem como na capacitação técnica em de-
terminados tipos de trabalho. (MST, 2001c, p. 58)

Com isso o Movimento tenta também romper ou superar uma das


principais e mais básicas premissas da educação escolar hegemônica, qual
seja, a da formação de força de trabalho para o mercado de trabalho, pois
o objetivo é que esses educadores trabalhem em suas próprias comunida-
des e em consonância com o trabalho associado (DAL RI; VIEITEZ, 2008).
Para que o princípio da vinculação entre ensino e trabalho produtivo
possa ser concretizado de maneira coerente com os demais princípios do
Movimento, faz-se necessário que seja articulado ao da gestão democrá-
tica, em todas as fases da educação e do trabalho, já que a ausência da
gestão democrática em um deles implica ruptura com outros ou com o
conjunto de princípios.
Cláudio Rodrigues da Silva | 189

Segundo o MST (1996; 1999; 2001c), o trabalho como princípio edu-


cativo é importante para o processo de constituição de identidade das
classes trabalhadoras. Entender a centralidade do trabalho, bem como
suas implicações no modo de vida ou nas condições materiais de existência
é fundamental para desvelar as ideologias em torno ou subjacentes ao tra-
balho, as diferenças e as implicações de cada concepção de trabalho, bem
como seus desdobramentos no plano empírico, nas condições materiais de
vida, individual e coletiva, das classes trabalhadoras. Entender as concep-
ções de trabalho e educação, assim como seus impactos em todas as esferas
sociais, é um passo fundamental para o processo de entendimento da sua
vinculação com a sociedade de classes. Esse entendimento é importante
inclusive para fins de subsidiar as decisões das comunidades no que diz
respeito à organização e à gestão do trabalho principalmente.
O trabalho é elemento fundamental de qualquer modo de produção,
já que modo de produzir, independentemente de qual seja o modo de pro-
dução, implica trabalho. Assim, o trabalho é indispensável em qualquer
formação econômico-social. Portanto, é um elemento imprescindível para
se analisar ou para se empreender mudanças na educação, assim como em
outras áreas, pois é o modo de produção que determina a forma do traba-
lho e da educação, e não o inverso. Além disso, o trabalho alienado e
estranhado é, numa relação dialética, causa e efeito da propriedade pri-
vada dos meios de produção (MÉSZÁROS, 2002a; 2006).
Existem, na atualidade, numerosos desafios para o MST, entre eles, a
necessidade da resistência à mercantilização das relações sociais no
campo, devido ao avanço do agronegócio (MST, 2010; STEDILE, 2012). Há,
ainda, o avanço da ideologia hegemônica e, com isso, os riscos de adoção
ou da submissão ao trabalho da perspectiva capitalista, com o recurso ao
trabalho assalariado ou extenuante, próprio ou de terceiros; o uso da terra
ou a produção nos moldes ou em função do agronegócio. Por isso, é
190 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

também necessária a luta pela educação do campo, simultaneamente à


tentativa de implementação dos princípios educativos do Movimento.
Há, ainda, a falta de perspectiva de trabalho que propicie condições
dignas de vida (STEDILE, 2012; STEDILE; FERNANDES, 2001), tanto para
evitar o recurso – ativo ou passivo – ao trabalho assalariado, à migração
para os centros urbanos levando os Sem Terra a venderem a sua força de
trabalho, arrendar ou mesmo abandonar as terras, o que o MST tenta
combater, pois isso coloca em xeque seus objetivos e, também, num plano
mais imediato, a continuidade e a reprodução do Movimento.
Além disso, precisa acompanhar os desafios postos pelo avanço da
legislação sanitária, pelas exigências do mercado capitalista, como os con-
troles de qualidade – espécies de barreiras não tarifárias –, sem se afastar
dos princípios, da ideologia e da visão de mundo do Movimento. Adequar-
se ao mercado é transitar num limiar tenso entre a perspectiva da agroe-
cologia e a do agronegócio, cujas ideologias e práticas vão no sentido
contrário ao da concepção de sustentabilidade e da visão de mundo do
MST (MST, 2010; STEDILE; FERNANDES, 2001). Relacionar-se com o
mercado capitalista sem se render aos seus ditames, em especial ao traba-
lho assalariado, é um dos principais desafios das OTAs (DAL RI; VIEITEZ,
2008; VIEITEZ; DAL RI, 2009).
Outro desafio importante é a demanda de escolarização e, principal-
mente, de educação, já que, por um lado, faz-se necessária a capacitação
para o trabalho e para interação com o mercado (STEDILE, 2012), mas,
por outro, é necessária a formação político-ideológica, para que se possa
ter ciência das implicações teórico-práticas das relações sociais, das rela-
ções de produção, enfim, da concepção de trabalho adotada ou praticada
pelo MST, inclusive para que seus integrantes possam decidir os rumos do
Movimento, especialmente no que se refere à produção, por conseguinte,
ao trabalho e à educação.
Cláudio Rodrigues da Silva | 191

E, segundo o Movimento (MST, 1986; STÉDILE; FERNANDES, 2001),


um dos principais desafios é a superação da dicotomia entre trabalho ma-
nual e trabalho intelectual, da tradição camponesa do trabalho individual
e isolado, tendo como contraponto, o trabalho cooperativo que, além de
potencializar a capacidade de organização e de produção dos trabalhado-
res, contém, em si, o gérmen do trabalho associado, que aponta para uma
perspectiva de trabalho que não a do capital (DAL RI; VIEITEZ, 2008;
NOVAES, 2011; VIEITEZ; DAL RI, 2009).
A concepção de trabalho do MST é, portanto, diferente da concepção
do capital, que reduz a pessoa à dimensão econômica, ou seja, à força de
trabalho, de produtor de mercadorias, num processo de trabalho estra-
nhado e alienado. Por isso, também, a educação do MST, organicamente
vinculada ao trabalho, é essencialmente diferente da concepção de educa-
ção do capital, que visa à formação de força de trabalho para o exército
industrial de reserva ou para o mercado de trabalho ou, em termos do
próprio capital, para a empregabilidade, enquanto que a educação do MST
visa principalmente à formação pelo e para o mundo do trabalho, duma
perspectiva omnilateral, que aponta a perspectiva do trabalho associado
(DAL RI; VIEITEZ, 2008; VIEITEZ; DAL RI, 2009).
Capítulo VII

Uma visão de mundo concernente à classe trabalhadora

Neste capítulo analisa-se o princípio denominado constituição e vei-


culação de uma concepção de mundo concernente aos Movimentos sociais
de trabalhadores analisados nesta pesquisa – MST, owenistas e cartistas.
Os três Movimentos têm objetivos, ideologias e visões de mundo es-
pecíficas, o que implicou, historicamente, a necessidade de constituírem
também concepções de educação próprias.
Se, por um lado, há diferenças significativas entre os Movimentos e
as respectivas visões de mundo, por outro, há pontos em comum. O prin-
cipal ponto comum é que todos são Movimentos de trabalhadores ou que
estiveram envolvidos com setores das classes trabalhadoras. Os princípios
educativos elencados nesta pesquisa também constituem, com as devidas
especificidades, pontos comuns e transcendentes entre esses Movimentos.
De forma implícita ou explícita, ainda que com diferenças, em termos
de métodos utilizados, de formação econômico-social visada, entre outras,
pode-se inferir que, em última instância, a colocação em prática dos prin-
cípios e objetivos desses Movimentos demandaria, resultaria ou
possibilitaria transformações estruturais ou mesmo outro modo de pro-
dução, portanto, outra formação econômico-social que não a do capital.
De forma germinal, os owenistas apontaram para uma concepção pe-
culiar de organização, gestão e participação, enquanto os cartistas e o MST
adotaram o sistema democrático de eleições para a gestão de suas organi-
zações, inclusive escolas.
O projeto owenista não previa eleições gerais para as funções exis-
tentes na comunidade. Aliás, Owen (2002), seu principal ideólogo, era
Cláudio Rodrigues da Silva | 193

contrário às eleições, assim como a partidos políticos e a seitas religiosas,


por considerar que causavam dissensões entre a comunidade. Todavia, em
um documento intitulado Carta aos eleitores do bairro de Marylebone
(OWEN, 1847), admite concorrer como representante dessa localidade, ex-
pondo algumas condições.
Há várias interpretações a respeito do owenismo e da forma de con-
dução de New Lanark. O mais comum é a apresentação de Owen
principalmente como filantropo, benevolente ou paternalista (ALMEIDA,
O., 2010; DAVIDSON, [s. d.]; DONNACHIE, 2006; 2011; DONNACHIE;
HEWITT, 1999; MCLAREN, [s.d.]; O’HAGAN, 2007; PIOZZI, 1999), o que
inviabilizaria apresentá-lo como democrático. Conforme Dal Ri (2013, p.
11), “O socialismo utópico owenista acreditava que a reforma social inde-
pendia da ação política e da conquista do poder.”
Segundo Piozzi (1999), a democracia não era unanimidade entre utó-
picos. No entendimento de Donnachie e Hewitt, (1999), assim como de
MClaren ([s.d.]), Owen não era um democrata. Almeida, O. (2010) en-
tende que em New Lanark vigorou uma utopia paternalista, onde um
indivíduo ou grupo toma as decisões pelas demais pessoas ou pela maioria
da comunidade.
Por outro lado, Davidson ([s. d.]) faz menção à existência, em New
Lanark, de “[...] um conselho da aldeia eleito democraticamente com vistas
ao avanço da revolução social” owenista. Em extrato de Relatório dos Ins-
petores de Fábrica datado de 1833 (NEW LANARK, [s. d.]) consta a
existência, em New Lanark, de um fundo para assistência médica aos do-
entes confiado a cinco gestores nomeados pelos trabalhadores e quatro
pela empresa.
No entanto, ainda que Owen seja o principal ideólogo do owenismo,
esse Movimento não se restringe ao entendimento ou posicionamento de
seu fundador. No caso, por exemplo, de Orbiston, experiência owenista
194 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

levada a termo por Combe, um discípulo de Owen, por exemplo, havia


comitês eleitos pelos trabalhadores. Diante de mudanças que implicariam
em retrocesso na questão da igualdade e da cooperação, a maior parte dos
trabalhadores, insatisfeita, reagiu (DONNACHIE, 2006).
Pode-se inferir que Owen não era um adepto da democracia no sen-
tido republicano ou liberal, inclusive porque era um utópico. Porém, pelo
próprio histórico de participação no movimento cooperativista e sindical,
bem como por suas propostas, Owen era um defensor da igualdade e da
cooperação, como aponta Engels (1877). Ainda que o sistema previsto por
Owen (2002) para o novo mundo moral não fosse uma democracia, como
a dos cartistas ou a do MST, a forma proposta indica que não seria um
governo opressivo ou com autoridade absoluta sobre os membros da co-
munidade1.
Os cartistas, coerentemente com os princípios da Carta do Povo, na
qual reivindicaram direito à participação nos processos decisórios do Es-
tado, adotaram a gestão democrática nas suas atividades, organizações e
escolas. Essa participação seria tanto direta, quanto por intermédio de de-
legados, conforme as instâncias em que os assuntos fossem decididos.
Desde que em conformidade com os estatutos ou regulamentos, todas as
pessoas poderiam votar e ser votadas (DAL RI, 2013; LOVETT; COLLINS,
1840).
O MST também adota a gestão democrática em suas atividades, or-
ganizações e escolas. Isso é coerente com a visão de mundo – constante em

1
Na atualidade há países que adotam variados sistemas de governo e se apresentam ou são entendidos como
democráticos. Mészáros (2002b) problematiza o caráter democrático do sistema bipartidário adotado nos Estados
Unidos da América, país (auto)apresentado como guardião mundial da democracia (LOSURDO, 2004). Há povos
originários que não adotam categorias da Ciência Política hegemônica ocidentalocêntrica para nomear suas formas
de organização ou de governo e nem por isso é necessariamente exercida opressão sobre suas populações. Lenin
(1983) aventa que, quanto mais perfeita, mais próxima estaria a democracia de sua extinção; no entanto, pode-se
inferir que, nessa perspectiva, a extinção da democracia não implicaria autoritarismo. É uma questão que carece de
problematizações para não ficar restrita a análises lineares e nominalistas.
Cláudio Rodrigues da Silva | 195

alguns documentos (ITERRA, 1996; 1997; MST, 1996; 2001c) – do Movi-


mento, qual seja, o socialismo. O MST, ao colocar em condições de
igualdade real, no âmbito de suas atividades, todas as pessoas, ao menos
no plano programático, tenta combater hierarquias sociais verticais de di-
ferentes espécies, entre elas, geracional, sexual, racial, étnica, acadêmica,
entre outras (MST, 1986; STEDILE; FERNANDES, 2001).
A gestão democrática radical implica ganho de poder para as classes
trabalhadoras, por conseguinte, perda de poder para o capital. Se adotada
em todas as áreas e instâncias, implicaria avanços rumo ao autogoverno
da vida em todos os sentidos, o que é inconcebível com a lógica estrutural
do capital, inerentemente heterogestionário e autoritário (MÉSZÁROS,
2002a).
O princípio que trata da formação dos próprios educadores está pre-
sente nos três Movimentos analisados (LOVETT; COLLINS, 1840; MST,
1996; 1999; 2001c; OWEN, 1967a; 1967b).
Os cartistas e o MST enfatizam que a constituição de escolas próprias
para a formação dos próprios educadores em consonância com as respec-
tivas concepções de educação e visões de mundo é determinante para o
sucesso do projeto educacional e, portanto, para avanços no sentido da
conquista das reivindicações e da concretização de suas propostas mais
gerais.
Não foram identificados nos owenistas apontamentos sobre escolas
específicas para formação de professores. Porém, os educadores seriam
aqueles que passaram pela formação/educação nas próprias escolas da co-
munidade, aliadas à vivência das relações sociais pautadas na visão de
mundo do owenismo, bem como a idade adequada, conforme as classes
previstas por Owen (2002). Essa seria a formação dos educadores owenis-
tas.
196 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Os Movimentos prezam pela articulação coerente entre teoria e prá-


tica (CALDART, 1997; LOVETT; COLLINS, 1840; MST, 1996; 1999; 2001c;
OWEN, 1967a; 1967b; 2002). Consideram que os valores e os princípios
mencionados são aprendidos eminentemente na vivência de relações soci-
ais. Em condições normais, isto é, sob a gestão dos prepostos do Estado,
na escola estatal é inviável a aplicação plena e radical dos princípios men-
cionados. Não há, portanto, espaço para teorias e, menos ainda, práticas
transformadoras ou revolucionárias.
A formação dos próprios educadores é uma necessidade e um dos
primeiros passos no sentido de se negar a educação hegemônica ou estatal,
bem como no sentido de se constituir e executar o projeto de autoeducação
e, com isso, difundir e consolidar as próprias ideologias e visões de mundo,
processo esse imprescindível inclusive para a reprodução dos próprios
Movimentos2.
Os três Movimentos têm a articulação entre ensino e trabalho produ-
tivo como um princípio educativo (LOVETT; COLLINS, 1840; MST, 1996;
1999; 2001c; OWEN, 1967a; 1967b; 2002).
A defesa da relação coerente entre teoria e prática, da vivência dos
valores e dos princípios nas relações sociais cotidianas, do ensino de co-
nhecimentos úteis, do ensino relacionado à prática social e de gerar
benefícios, tanto no plano individual quanto no coletivo, perpassam a visão
de educação desses Movimentos.
Eles tiveram preocupações com a construção de espaços adequados à
prática do ensino vinculado ao trabalho e também com a formação dos
próprios educadores para operar em conformidade com essa perspectiva

2
Entretanto, nem todas as iniciativas de formação dos próprios educadores implicam negação da educação
hegemônica ou estatal no que se refere à sua essência, ou seja, ideologia, visão de mundo ou modo de produção.
Comumente o que outras iniciativas colocam em questão é a qualidade do ensino, a especificidade do currículo,
metodologias de ensino, entre outras.
Cláudio Rodrigues da Silva | 197

(LOVETT; COLLINS, 1840; MST, 1996; 1999; 2001c; OWEN, 1967a;


1967b).
Porém, entre esses Movimentos há variações na operacionalização
dos princípios (DAL RI; VIEITEZ, 2008; LOVETT; COLLINS, 1840; MST,
1996; 1999; 2001c; OWEN, 1967a; 1967b), como, por exemplo, a idade pre-
vista para iniciação no ensino e no trabalho, as condições, os espaços, os
tipos de atividades desenvolvidas. Há variações inclusive no que tange aos
direitos legal e consuetudinário, às tradições, aos tipos de organização e de
infraestruturas, à existência de espaços e de equipamentos adequados e à
própria natureza preponderante de atividades produtivas nos Movimen-
tos, como, por exemplo, se predomina o modo de vida rural ou urbano, se
as atividades são eminentemente agrícolas/rurais ou industriais, entre ou-
tros aspectos.
Diferentemente dos owenistas, que tinham uma proposta consistente
de união entre ensino e trabalho (MARX, 1984), bem como do MST, que
também acumula diversas experiências nesse sentido, Dal Ri (2013, p. 17-
18) entende que a proposta dos cartistas em relação a este princípio não
era tão desenvolvida.

Quanto à relação entre a educação e mundo do trabalho, não há na proposta


uma referência mais elaborada sobre a junção do ensino e o trabalho produ-
tivo. Os autores propõem erigir escolas industriais e agrícolas, sobretudo, para
os órfãos da Associação. Aqui parece haver uma junção da educação acadêmica
com o trabalho, já que nas escolas agrícolas os estudantes deveriam trabalhar
nas fazendas e nas indústrias, nas atividades manufatureiras. A relação entre
educação e trabalho foi mais bem desenvolvida e teorizada pelos socialistas
utópicos e pelos marxistas. No entanto, os cartistas insistem sempre no cultivo
do conhecimento útil, o conhecimento que ajudará a classe trabalhadora a lu-
tar pelos seus direitos políticos, e a ciência que vai tomando aos poucos os
processos de trabalho na fábrica.
198 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Partindo do que aponta Marx (1984; 2004), para o capital a principal


finalidade do ser humano é, numa relação dialética, produzir e, conforme
o poder aquisitivo, consumir mercadorias e, assim, garantir o ciclo que
reproduz o modo de produção vigente. Portanto, quando se faz referência
a conhecimentos úteis ou ao trabalho produtivo, é imprescindível que seja
considerada a posição de classe social, ou seja, entre outras questões, para
quem, para quê e em que condições o processo de trabalho é realizado,
assim como a forma de apropriação do produto do trabalho (DAL RI;
VIEITEZ, 2008).
Numa relação de trabalho alienado e estranhado, o processo de pro-
dução, bem como o produto do trabalho e sua apropriação são
determinados por quem detém a propriedade e o controle dos meios de
produção. Por isso a importância da gestão democrática e do autogoverno,
principalmente nos processos de trabalho e de educação (DAL RI; VIEITEZ,
2008).
O princípio da vinculação entre trabalho produtivo e ensino remete
também à tese da não fragmentação dos processos sociais. Assim, contri-
bui para a reintegração de duas das principais atividades mais nucleares
ou indispensáveis da vida humana, que é o trabalho, imprescindível para
a produção e reprodução das condições materiais necessárias à própria
vida material e espiritual, respectivamente, carências e necessidades
(MARX, 1984; 2004), e da educação, que envolve a transmissão da visão
de mundo, da ideologia e da cultura às novas gerações, inclusive dos pró-
prios processos de trabalho (BRAVERMAN, 1974; LUZURIAGA, 1963;
SEVERINO, 1986).
Aliado ao princípio da gestão democrática, o princípio da vinculação
entre trabalho e educação coloca em questão um objetivo histórico de se-
tores das classes trabalhadoras, que é a (re)tomada do controle do
processo e do produto dos próprios trabalho e educação, (re)tomada essa
Cláudio Rodrigues da Silva | 199

combatida veementemente pelas classes hegemônicas (DAL RI; VIEITEZ,


2008; MÉSZÁROS, 2002a; NOVAES, 2011).
Por serem propostas de Movimentos que, direta ou indiretamente,
postulam outras relações de produção, portanto, outras concepções de tra-
balho, de educação, de ciência e de tecnologia que não a do capital, a
educação escolar hegemônica vigente não é capaz de atender a esses re-
quisitos.
Para a consecução de uma educação em conformidade com as pers-
pectivas desses Movimentos, faz-se necessária uma formação omnilateral
e a gestão democrática, que o Estado, em consonância com os pressupos-
tos da formação econômico-social vigente, não proporciona.
Educação é processo, como demonstraram os desafios enfrentados
pelas experiências dos owenistas, dos cartistas, do socialismo histórico e a
do MST, em curso há aproximadamente três décadas.
Sendo esses princípios aprendidos majoritariamente por intermédio
da sua vivência, faz-se necessária a educação na, pela e para a concepção
de democracia postulada; faz-se necessário educar na, pela e para a con-
cepção de trabalho postulada. Requer uma formação que abranja as três
esferas – política, econômica e cultural –, que abranja corpo e mente, con-
cepção e execução, de maneira indissociável, já que na vida prática essas
dimensões não são estanques.
Deter o controle dos próprios processo e produto do trabalho de-
manda aprendizado prático e teórico simultânea e articuladamente;
demanda empenho no sentido de superação do trabalho assalariado, ou
seja, requer a não exploração do trabalho alheio, a exemplo do que ocorre
em determinadas OTAs, que, mesmo com contradições e dificuldades, co-
locam ou tentam colocar em prática novas formas de trabalho que tendem
a se distanciar do estranhamento e da alienação do trabalho (DAL RI;
VIEITEZ, 2008; VIEITEZ; DAL RI, 2009).
200 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

É importante a prática do trabalho enquanto princípio educativo3 in-


clusive para se criar a cultura do trabalho, a identidade de classe
trabalhadora, mesmo porque o trabalho, em última instância, é impres-
cindível em qualquer modo de produção4.
A perspectiva do trabalho associado, mais especificamente naquelas
OTAs mais avançadas e que adotam ou mais se aproximam de uma pers-
pectiva socialista, coloca na ordem do dia gérmens de novas relações de
trabalho e, por conseguinte, gérmens de novas relações sociais, que ten-
dem a se distanciar das hierarquias sociais verticais e do trabalho alienado
e estranhado (DAL RI; VIEITEZ; 2008; VIEITEZ; DAL RI, 2009).
No entendimento de Alaniz (2003, p. 16),

3
O capital adota o trabalho aliado ao ensino como uma forma de disciplinar e qualificar a força de trabalho. A
burguesia recorreu à alegação de viver do próprio trabalho para questionar os privilégios da nobreza e da realeza,
que viviam do trabalho alheio. A Igreja Católica também faz apologia ao trabalho – ora et labora –, já que a Bíblia é
permeada de citações apologéticas ao trabalho. O nazismo também, de certa forma, colocou o trabalho como um
princípio, quando colocou a inscrição o trabalho liberta no portal do campo de concentração de Auschwitz. O trabalho
relacionado ao ensino, bem como a ginástica ou exercícios físicos, também permeiam o currículo desde os primórdios
da educação escolar estatal no Brasil (SOUZA, 2008). Portanto, assim como os demais princípios, é necessário
questionar a concepção de trabalho, pois, em conformidade com a sua visão de mundo, o capital também tem o
trabalho alienado e estranhado aliado ao ensino como forma de disciplinar as classes trabalhadoras para a subalter-
nidade (DAL RI; VIEITEZ, 2008; SOUZA, 2010), como pode ser verificado, por exemplo, na LDB/1996. A tese da
educação para a formação de força de trabalho não é uma invenção ou fixação marxista. Pode ser verificada na
própria legislação (BRASIL, 1988; 1996b). Sem pretensão de aprofundamento nessa questão, destaca-se que em leis
e outros documentos oficiais federais e paulistas, como, por exemplo, das décadas de 1930, 1940 e 1960, a educação
escolar como formação de força de trabalho e vinculada às políticas econômicas do Estado é explícita e direta
(MORAES, 2014; SILVA, 2019), enquanto que, na legislação atual (BRASIL, 1988; 1996b), assume preponderância a
questão da cidadania aliada à questão do trabalho, uma evidência da continuidade do trabalho enquanto categoria
central, ao contrário das teses, como aponta Antunes (1997), que dão adeus ao trabalho. Além disso, verifica-se
também que, conforme o projeto político-econômico das frações de classe no poder, a educação escolar foi utilizada
inclusive como forma de evitar fluxos migratórios do campo para a cidade, com finalidades eminentemente
econômicas, como se pode verificar tanto naquelas leis, quanto em bibliografias específicas (ÁVILA, 2013; MORAES,
2019).
4
Em decorrência das significativas mudanças ocorridas nos processos de trabalho, bem como nas legislações,
tradições, usos e costumes, a questão do trabalho de crianças e adolescentes foi tornada mais complexa, porém, um
campo ainda passível de problematizações, principalmente em se tratando de um princípio educativo. Para tratar
dessa questão faz-se necessário analisar as próprias mudanças ocorridas com as categorias trabalho, educação e
infância. Owen (1967a; 1967b), que era reiterativo em relação à importância dos primeiros anos de idade para a
internalização de valores e para a formação do caráter, defendia o trabalho para crianças da segunda classe, ou seja,
dos cinco aos dez anos, decorrência talvez das próprias condições e da natureza do trabalho daquele contexto. O
posicionamento de Owen em relação à idade considerada adequada para o início do trabalho muda, em dados
momentos, o mesmo ocorrendo em relação aos estudos; a rigor, defende que a inserção nos processos regulares de
trabalho produtivo ocorra após os dez anos de idade. Fourier (1973), por exemplo, defendia a familiarização, de
maneira lúdica, com o trabalho a partir dos dois anos de idade.
Cláudio Rodrigues da Silva | 201

A autogestão é uma construção alternativa, que nega a forma de organização


capitalista. A negação da organização capitalista encontra-se nas formas pelas
quais os trabalhadores organizam essa produção, horizontalizando a estrutura
organizativa e distribuindo o poder de decisão entre os trabalhadores.

Assim, as OTAs, ao negarem a concepção de trabalho do capital, co-


locam em tela o que Marx (2004) denomina negação da negação.
Segundo Marx (2004, p. 891), “[...] o modo capitalista de produção e
de acumulação e, portanto, a propriedade privada capitalista exigem,
como condição existencial, o aniquilamento da propriedade privada base-
ada no trabalho próprio, isto é, a expropriação do trabalhador.” Porém,

[...] a produção capitalista gera sua própria negação, com a fatalidade de um


processo natural. É a negação da negação. Esta segunda negação não restabe-
lece a propriedade privada, mas a propriedade individual tendo por
fundamento a conquista da era capitalista: a cooperação e a posse comum do
solo e dos meios de produção gerados pelo próprio trabalho. (MARX, 2004, p.
877)

Assim como se valeram do legado de outros movimentos, os owenis-


tas, os cartistas e o MST também deixam seus legados, contribuindo para
a constituição e veiculação de uma ideologia e de uma visão de mundo
concernentes à classe trabalhadora.
Os owenistas colocaram em questão a necessidade e a possibilidade
de outra forma de organização social que não a do capital. Esse Movimento
de trabalhadores, assim como os cartistas, denunciaram as consequências
sociais negativas decorrentes do capitalismo. O owenismo não só propôs
como também constituiu experimentos de modelos alternativos de socie-
dade, implementando ou tentando implementar, dentro das condições
objetivas, os respectivos princípios, ideologia e visão de mundo.
202 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

O owenismo, com a experiência de New Lanark, demonstrou que


muito do que havia de negativo ou prejudicial – em termos morais, inte-
lectuais, físicos, entre outros – mais especificamente nos setores mais
precarizados das classes trabalhadoras, como, por exemplo, o denominado
lumpezinato, na Grã-Bretanha, em especial na Inglaterra, era decorrência,
em grande medida, das próprias condições materiais de vida, condições
essas inerentes ou decorrentes da formação econômico-social hegemônica
vigente.
Assim – como se pode verificar com base em dados apresentados por
Engels (2008) – o owenismo demonstrou empiricamente que várias situ-
ações poderiam ter tratamentos e desfechos diferentes do que comumente
ocorria, em termos de saúde, habitação, segurança e, principalmente, tra-
balho e educação. Talvez o limite maior ou a contradição maior tenham
sido a gestão do processo e a apropriação do produto do trabalho, que era
alheio aos trabalhadores, diferentemente do que ocorre em organizações
que se pautam pelos princípios do trabalho associado.
A concepção owenista de educação serviu de base para a concepção
marxista de formação omnilateral (DAL RI; VIEITEZ, 2008; LOMBARDI,
2011). Outro legado importante do owenismo foi sua contribuição para o
cooperativismo5, que também serviu para teorizações marxistas sobre o
trabalho, bem como serviu de subsídio para a Economia Solidária
(OLIVEIRA, 2012).
Na atualidade, há, em diversos países de diferentes continentes, ini-
ciativas baseadas nas premissas do trabalho associado, como, por
exemplo, as OTAs que, de imediato, demonstram empiricamente a

5
Há, na atualidade, diversas vertentes de cooperativismos, desde as cooperativas tradicionais ou capitalistas, que
recorrem à exploração do trabalho assalariado, até as que operam da perspectiva do trabalho associado, isto é, não
recorrem à exploração do trabalho alheio, em especial por intermédio do assalariamento (DAL RI; VIEITEZ, 2008;
VIEITEZ; DAL RI, 2009).
Cláudio Rodrigues da Silva | 203

possibilidade da eliminação da figura do patrão ou do capitalista, extin-


guindo-se, assim, o trabalho assalariado, o que pode contribuir, além de
ser condição necessária, para o processo de desalienação e de desestranha-
mento do trabalho (DAL RI; VIEITEZ, 2008; VIEITEZ; DAL RI, 2009;
VIEITEZ, 1997).
Ainda que com propósito inverso, o owenismo também contribuiu
para demonstrar empiricamente a inviabilidade de alterações estruturais
pela via da conciliação dos interesses de classes, uma premissa básica do
socialismo utópico, ainda hoje muito difundida entre diferentes setores das
classes trabalhadoras (MÉSZÁROS, 2002a; 2005; NOVAES, 2011). Em
suma, o owenismo contribui para demonstrar potencialidades e limitações
de determinadas iniciativas para fins de transformações sociais estruturais
ou de superação do capital, seja em partes ou no todo.
Os cartistas, ao reivindicarem os pontos constantes da Carta, recolo-
caram na ordem do dia a questão da igualdade de direitos políticos, dentre
os quais se destaca o sufrágio universal. Reivindicaram algo que, para
aquela época, provavelmente, era radical, ainda mais numa formação eco-
nômico-social estamental, como a Grã-Bretanha. Talvez fosse algo tão
inviável a curto ou médio prazo, que, para aumentar as chances de avan-
ços, deixaram de reivindicar o sufrágio universal, passando a reivindicar o
sufrágio censitário, que excluía as mulheres e alguns segmentos dos ho-
mens. As reivindicações da Carta do Povo não foram conquistadas durante
a existência do Movimento Cartista, mas, algumas décadas após, quase to-
das foram implementadas na Inglaterra, com exceção do ponto que faz
referência à renovação anual do Parlamento (HOVELL, 1925; MORTON;
TATE, 1968).
Em vários países de diferentes continentes o direito ao voto só foi
progressivamente assegurado para a ampla maioria das classes trabalha-
doras no decorrer do século XX, havendo ainda países em que segmentos
204 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

de populações estão excluídos desse direito. Historicamente há uma rela-


ção entre certos direitos, em especial entre direitos políticos e escolaridade,
além de propriedade (AVELAR, 2001; LOSURDO, 2004; TEXIER, 2005).
Ainda atualmente, sempre que conveniente ou necessário, em espe-
cial durante os ditos estados de exceção, o direito à participação nos
processos decisórios do Estado é um dos primeiros a serem suspensos,
restringidos ou colocados em situação de risco (MÉSZÁROS, 2002a;
2002b)6. Em situações em que as classes hegemônicas ou suas frações en-
tendem que a governabilidade está em risco, uma das primeiras e mais
comuns providências é a dissolução ou restrição do Legislativo, bem como
a suspensão ou restrição de direitos, em especial aqueles que permitem
reclamar a execução de direitos já instituídos ou reivindicar novos direitos.
Na atualidade o sufrágio universal é entendido, por setores das clas-
ses hegemônicas, como um risco potencial (LOSURDO, 2004), apesar dos
numerosos estratagemas adotados pelo capital terem reduzido ou mesmo
neutralizado o potencial do sufrágio para fins de mudanças estruturais na
formação econômico-social (MÉSZÁROS, 2002a; TEXIER, 2005).
Os cartistas apostaram na conquista do direito ao sufrágio, o que pos-
sibilitaria alterações ou reformas radicais em todas as esferas sociais e
também contribuiria para o processo de emancipação política das classes
trabalhadoras (MORTON; TATE, 1968). À época, essa era – e ainda é –
uma visão corrente e compartilhada por diferentes setores e movimentos
sociais de trabalhadores. Mesmo posteriormente e em diferentes localida-
des, esse debate continuou (LUXEMBURGO, 2007; TEXIER, 2005).
Ainda que o sufrágio universal, na atualidade, tenha seu potencial re-
duzido ou quase anulado, nas suas origens, representou o anseio de

6
Exemplo disso são as situações de golpes de Estado, como ocorreu no Brasil, em 1964 (STEDILE; FERNANDES,
2001).
Cláudio Rodrigues da Silva | 205

setores das classes trabalhadoras pela igualdade política entre as pessoas,


indistintamente e, por conseguinte, a possibilidade de todos, em condições
de igualdade, participarem dos processos decisórios que definem os rumos
da política, da economia e da cultura em determinada formação econô-
mico-social e, assim, em certa medida, decidir questões que dizem respeito
à própria vida, nas dimensões individual e coletiva.
Atualmente a questão do sufrágio requer problematizações e media-
ções mais aprofundadas, haja vista a cisão entre política e economia,
fazendo com que esta seja, em certa medida, blindada a possíveis interfe-
rências decorrentes de decisões tomadas no âmbito da democracia política,
instância na qual as classes trabalhadoras, por intermédio do sufrágio, po-
deriam participar e interferir nos processos decisórios da economia,
segundo Mészáros (2002a), ponto crucial do capital.
O MST (2010) coloca como questão central a reforma agrária. Uma
reivindicação, até certa medida, dependendo da perspectiva de análise,
pontual, mas que envolve um dos princípios basilares do capital, qual seja,
a propriedade privada dos meios de produção.
A expropriação e o controle da terra, bem como de outros meios de
produção, foi uma das formas de se impor e de se tornar dominante o
trabalho assalariado. A terra, da perspectiva capitalista, é tratada como
uma mercadoria (MST, 2010; STEDILE, 2000). Por um lado, na atuali-
dade, a terra é um dos bens mais caros e estratégicos para fins de produção
e reprodução de mercadorias, portanto, do capital. Por outro, em última
instância, a terra é literalmente a base para a concretização da ampla mai-
oria – se não de todas – das atividades e das necessidades para fins de
produção e de reprodução da vida humana, o que remete à questão da
sustentabilidade. Num modo de produção no qual tudo é tornado merca-
doria, a natureza, portanto, a vida, também é tratada da perspectiva
mercantil (MÉSZÁROS, 2002a).
206 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Concomitantemente com a reforma agrária, o MST reivindica diver-


sos outros direitos, muitos deles, já instituídos formalmente, como, por
exemplo, saúde, educação, trabalho, entre outros (LAUREANO, 2007;
MST, 2010).
A rigor, parte significativa das lutas do MST não é para instituição ou
conquista de novos direitos, mas, pela efetivação de direitos legais, de ca-
ráter eminentemente republicano, já incorporados à legislação brasileira,
principalmente na CF/1988, e que não são cumpridos ou concretizados,
seja parcial, seja totalmente, e de maneira adequada (LAUREANO, 2007;
MST, 2010).
Mesmo que, em tese, trabalhe eminentemente consoante com uma
perspectiva republicana, demandando a concretização de direitos instituí-
dos, além de lutar por novos direitos, o MST, comumente, leva suas
reivindicações às últimas consequências, tensionando ao máximo o limite
da legalidade, o que faz com que o capital, via Estado, mostre ou assuma
sua incapacidade ou indisposição de concretizar o que foi acordado dentro
das regras legais do denominado Estado Democrático de Direito
(LAUREANO, 2007; STEDILE; FERNANDES, 2001).
Com isso, ao mesmo tempo que, em determinadas situações, contri-
bui para tensionar ou alterar a correlação de forças entre capital e
trabalho, o MST contribui para algumas conquistas pelas classes trabalha-
doras e, principalmente, demonstrado a possibilidade de auto-organização
dos trabalhadores, de conquistar a implementação de antigos e a institui-
ção de novos direitos e, em alguma medida, tentar avançar no sentido de
outro modo de produção, que não o do capital.
O MST ajuda a demonstrar também os limites das lutas sociais dentro
das regras do Estado Democrático de Direito, ou seja, ajuda a demonstrar
que o capital, pelas premissas que lhe são inerentes, é incapaz de levar às
últimas consequências, de generalizar – por isso as políticas focais – e de
Cláudio Rodrigues da Silva | 207

executar plenamente as promessas realizadas por intermédio dos direitos


conquistados pelas classes trabalhadoras, exceto em circunstâncias em que
a correlação de forças obrigue o capital, via Estado, a ceder e a cumpri-los
(DAL RI, 1997; MÉSZÁROS, 2002a).
Outra contribuição importante do MST é no que se refere à organi-
zação do trabalho, articuladamente às demais formas e bandeiras de lutas
(STEDILE; FERNANDES, 2001). Ao adotar, em determinadas circunstân-
cias, a perspectiva do trabalho associado por meio do sistema
cooperativista, o Movimento contribui para avanços teórico-práticos de
questões aventadas – algumas delas, experimentadas – por diferentes ver-
tentes ou movimentos de trabalhadores, como os owenistas, os cartistas,
os marxistas, entre outros. Assim como outras OTAs, coloca em uma es-
pécie de teste prático categorias caras a movimentos contra-hegemônicos
(DAL RI; VIEITEZ; 2008; VIEITEZ; DAL RI, 2009).
Ao articular prática e teoria, o Movimento contribui para reflexões
atuais acerca de questões históricas, complexas e polêmicas, como a pro-
priedade, o trabalho, o poder, a ideologia, o direito, a liberdade, a
igualdade, entre outras categorias e questões que não foram suficiente-
mente desenvolvidas tanto no plano teórico quanto no plano empírico ou
que demandam novas problematizações.
Em alguma medida, até mesmo por primar pela práxis, o MST coloca
à prova os seus próprios pressupostos, bem como alguns pressupostos
presentes na teoria marxista, e ajuda na sua atualização, demonstrando
possíveis dificuldades, potencialidades e inconsistências.
Os Movimentos analisados têm preocupações com a relação entre
prática e teoria e, conforme as condições objetivas e subjetivas, envidam
esforços no sentido de colocar em prática os princípios defendidos, porque
consideram a práxis uma necessidade para atingirem os objetivos
208 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

propostos (LOVETT; COLLINS, 1840; MST, 1996; 1999; 2001c; OWEN,


1967a; 1967b).
Empenharam-se, também, para relacionar o móbil ou os móbeis
principais de luta com outras questões que, diante das condições objetivas,
sobressaíram-se, tornando-se mais urgentes, inclusive para a sobrevivên-
cia ou melhorias imediatas das condições materiais de vida dos
trabalhadores (LOVETT; COLLINS, 1840; MST, 1996; 1999; 2001c; OWEN,
1967a; 1967b).
Seus objetivos, lutas e reivindicações, ao mesmo tempo que têm um
caráter específico, mais relacionado ao projeto político de cada Movimento,
têm também perspectivas que extrapolam o âmbito do particular e, em
certa medida, tendem à universalidade, ou seja, tendem a abranger ou re-
presentar interesses, se não de toda a classe trabalhadora, ao menos de
ampla parcela das classes trabalhadoras, tanto em nível nacional, quanto
internacional, quando, por exemplo, colocam em tela o direito de as classes
trabalhadoras decidirem sobre questões atinentes à própria vida, quando
empreendem ações no sentido de preservação da natureza, da perspectiva
da sustentabilidade, como faz o MST atualmente.
Portanto, não só tinham/tem pretensões e potencialidades, mas luta-
ram/luta para, de alguma forma, ampliar suas abrangências e envolver
outros setores das classes trabalhadoras. Alguns dos valores e categorias
aplicadas por esses Movimentos permitem atribuir a eles um caráter ou
uma tendência universalista, isto é, que extrapola a dimensão particular
ou corporativista – decidir sobre os rumos do Estado e da própria vida,
trabalho, alimentação, terra, habitação, educação, enfim, condições de vida
no Planeta7.

7
Chama a atenção o fato de que várias das questões que têm, cada vez mais, ganhado espaço em debates, como, por
exemplo, urbanismo, poluição do ar, das águas, enfim, diversos assuntos relacionados à qualidade de vida, já eram
Cláudio Rodrigues da Silva | 209

A rigor, as questões principais – trabalho (economia), poder (política)


e terra (propriedade) –, bem como as secundárias, reivindicadas por esses
Movimentos, são, em última instância, imbricadas entre si e dizem res-
peito à toda a classe trabalhadora, e que têm ou podem ter implicações
diretas com a questão da emancipação política dessa classe e também com
a emancipação humana.
Cada Movimento tem suas especificidades e diferenças no que se re-
fere a ideologias e visões de mundo, assim como em relação a objetivos,
momentos históricos, espaços geográficos, abrangências, formas de orga-
nização, locus de atuação, atividades políticas, econômicas e culturais
desenvolvidas, entre outras. Todavia, todos atuaram simultânea e articu-
ladamente nas três esferas, estabelecendo relações entre as dimensões
micro, meso e macro da vida.
Os owenistas e os cartistas atuaram no contexto da primeira metade
do século XIX, nos primórdios do capitalismo industrial e da formação da
classe operária, num contexto de surgimento ou de crescimento de gran-
des centros urbanos (ENGELS, 2008; MORTON; TATE, 1968;
THOMPSON, 1987a).
Já o MST atua num contexto eminentemente rural, agrícola, a partir
das duas últimas décadas do século XX, numa fase bastante avançada,
tanto do capitalismo, quanto da organização de setores das classes traba-
lhadoras, em movimentos sociais principalmente. Além disso, o MST é um
Movimento em atuação.
Mas, ressalvadas essas variações, todos constituíram ideologias e vi-
sões de mundo próprias, bem como constituíram uma concepção própria
de educação, cujos princípios enunciados conferem entre si. Isso indica que

levantados por Engels (2008), na primeira metade do século XIX, quando analisou a situação da classe trabalhadora
na Inglaterra.
210 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

setores das classes trabalhadoras, independentemente das diversas dife-


renças de caráter mais particular ou corporativo, têm alguns princípios,
em certa medida, comuns e transcendentes, não somente por opção, mas
principalmente por necessidade.
Essa transcendência, por sua vez, demonstra que o capital, para além
de algumas variações conjunturais, também tem princípios e modus ope-
randi que lhe são inerentes, ou seja, transcendem, desde os primórdios do
capitalismo industrial, tratando-se, portanto, de uma característica estru-
tural do modo de produção vigente.
São princípios e objetivos antagônicos e inconciliáveis, o que remete
à categoria luta de classes, já que, por necessidade de (auto)reprodução,
ambas classes conflitam e se confrontam para conseguir a hegemonia de
suas ideologias e visões de mundo, com vistas à manutenção ou à con-
quista do poder.
Um desses princípios transcendentes do capital é o uso articulado e
simultâneo da ideologia e da violência física, por intermédio do que Al-
thusser (1999) denominou, respectivamente, aparelhos ideológicos e
aparelhos repressivos do Estado, para manter a hegemonia e a dominância
sobre a classe trabalhadora.
Dessa forma, o capital não transige em relação ao controle da educa-
ção, principalmente da escola e da educação escolar, assim como não
abdica ou não transige em relação ao controle e ao uso dos demais ou de
quaisquer outros aparelhos ideológicos ou repressivos do Estado (PONCE,
1981).
A escola, segundo Althusser (1999), é o principal aparelho ideológico
do Estado, a principal agência de difusão e de reprodução da ideologia he-
gemônica. Ainda que, cada vez mais, outros aparelhos ideológicos sejam
tornados mais complexos e se multipliquem, aumentando sua capacidade
de abrangência, em decorrência da criação e massificação das tecnologias,
Cláudio Rodrigues da Silva | 211

mesmo assim, a escola parece não ter perdido sua centralidade no que se
refere à difusão, à internalização e à reprodução da ideologia e da visão de
mundo hegemônicas. Entretanto, como aponta Dal Ri (2004), a escola é
um espaço contraditório, podendo ser tornado um locus de iniciativas con-
tra-hegemônicas, a exemplo do que faz o MST.
Além disso, a escola é a principal agência de certificação do ensino
formal, na atualidade, um dos mais elementares pré-requisitos para a de-
nominada empregabilidade. Portanto, é a agência basilar da meritocracia,
segundo Dal Ri (2004), uma das principais premissas do capital para legi-
timação dos lugares ou posições das pessoas nas hierarquias sociais
verticais, principalmente no que se refere ao lugar que se ocupa na produ-
ção, quesito que, a rigor, define a classe social a que se pertence.
Partindo do argumento de Marx e Engels (1999) de que a ideologia
dominante em determinada formação econômico-social é a ideologia da
classe dominante, pode-se inferir que a classe trabalhadora em geral não
teve e ainda não tem ideologia e visão de mundo próprias, fazendo com
que prevaleçam a ideologia e a visão de mundo daquela classe.
Mas, alguns segmentos ou movimentos sociais de trabalhadores têm
ideologias e visões de mundo, porém, em certa medida, ainda não são ge-
neralizáveis a toda a classe trabalhadora. Assim, essas ideologias e visões
de mundo não têm condições de serem tornadas hegemônicas, ainda que
contenham princípios universalizáveis, não só para a classe trabalhadora,
mas para toda a humanidade e demais dimensões da natureza em geral,
ou seja, do meio ambiente em sua totalidade, condição imprescindível para
a vida humana.
Embora muitos dos elementos das ideologias e das visões de mundo
desses Movimentos sejam comuns e possam interessar à toda a classe tra-
balhadora, outras questões mais prementes e mais particulares
sobressaem-se ou se sobrepõem àquelas que são ou seriam universais
212 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

(DAL RI, 1997; PINASSI, 2009). Isso remete ao apontamento de Engels


(2008) sobre o caráter prejudicial para a classe trabalhadora da concor-
rência entre suas frações.
Mesmo que isoladamente não seja suficiente, a ideologia é fundamen-
tal para a conquista e para a manutenção da hegemonia (MÉSZÁROS,
2004; 2006). Considerando-se que nenhum sistema ou regime se manteve
indefinidamente apenas pela força ou violência física – isto é, por intermé-
dio apenas dos aparelhos repressivos –, os aparelhos ideológicos,
conjuntamente com aqueles, são indispensáveis para a conquista ou a para
manutenção da dominância. E, no que tange à ideologia, a educação é fun-
damental e estratégica para isso (ALTHUSSER, 1999; MÉSZÁROS, 2005;
SEVERINO, 1986). Dessa forma, a educação, inclusive e especialmente a
escolar, é objeto de disputa entre classes e frações de classes.
Contrariamente às teses de que a burguesia ascendeu ao poder por
intermédio da educação, Dal Ri (1997) ressalta que a burguesia já detinha
o poder econômico, mas estava à margem do poder político. Por isso a
necessidade da ação simultânea e articulada nas três esferas, quais sejam,
na política, na economia e na cultura. A ascensão da burguesia – bem como
sua manutenção no poder – não foi pacífica (HOBSBAWM, 1970; 1977;
1995; 2007), nem pela via da educação, mas, por intermédio da luta de
classes.
Vem à tona, então, uma questão que data dos primórdios do processo
de formação da classe operária e perpassa os debates entre movimentos
de trabalhadores, que é a polêmica sobre a possibilidade ou a necessidade
de conquista ou manutenção do poder unicamente pela força moral ou
ideológica, pela força ou violência física, ou por ambas; se por reformas,
por revolução ou por ambas (ENGELS, 1982; LUXEMBURGO, 2007;
MARX; ENGELS, 1982; MORTON; TATE, 1968).
Cláudio Rodrigues da Silva | 213

Na atualidade, é possível encontrar movimentos de trabalhadores


que se pautam por alguma destas vertentes – força moral ou força física –
, bem como identificar variantes dessas vertentes dentro de um mesmo
movimento social, como, por exemplo, na Economia Solidária (DAL RI;
VIEITEZ, 2008; NOVAES, 2011).
Esses Movimentos, de alguma forma, atuaram tanto com vistas a re-
solver questões mais pontuais e imediatas, até mesmo com vistas à
sobrevivência de seus integrantes ou das classes trabalhadoras, quanto
com questões mais amplas e mais mediatas, como, por exemplo, a eman-
cipação política dessas classes, que, segundo Marx (2002), apontaria no
sentido da emancipação humana.
Em síntese, esses Movimentos colocam entre suas práticas e seus ob-
jetivos, no plano imediato e também no mediato, a esperança, a felicidade,
bem como a necessidade e a possibilidade de transformações estruturais
na ordem social vigente, e demonstram ser possível avançar nesse sentido,
em especial por intermédio da auto-organização dos trabalhadores como
movimento social. Possibilitam, com suas lutas, derrotas e vitórias, anali-
sar e enfrentar o capital a partir de outros prismas ou perspectivas, nem
como uma espécie de Davi, nem como uma espécie de Golias, nem mesmo
como algo a-histórico ou sobre-humano, feito ou controlado, recorrendo a
uma expressão de Smith (2003), por mãos ou seres invisíveis. Em outras
palavras, permitem analisar e enfrentar o capital, nem subestimando, nem
superestimando, seja a capacidade de resistência e de autorreprodução do
capital, seja a capacidade de resistência e de combate das classes trabalha-
doras.
Esses Movimentos têm, portanto, para além da dimensão particula-
rista, uma dimensão universalista, transcendental e comum. Essas
dimensões são intrincadas, dialeticamente relacionadas.
214 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Na dimensão mais particularista, podem ser incluídas questões que


dizem respeito aos integrantes dos respectivos Movimentos. A dimensão
mais universalista diz respeito a questões passíveis de extensão a outros
setores das classes trabalhadoras, a toda a classe trabalhadora ou mesmo
a toda a humanidade. O MST é praticamente universalista, pois, algumas
de suas principais bandeiras de lutas, mesmo se tomadas numa acepção
exclusivamente republicana, contemplam necessidades mais básicas e pre-
mentes da ampla maioria das classes trabalhadoras: terra, alimentação,
habitação, saúde, educação, enfim, vida. Em outras palavras, contemplam
interesses de trabalhadores sem-tudo ou sem-nada. Talvez uma ínfima
parcela das classes trabalhadoras não seja, em alguma medida, carente ou
privada de uma ou mais questões reivindicadas pelo MST. Segundo esse
Movimento,

Todo ser humano, independente do lugar onde mora neste mundo, está atin-
gido pelo projeto neoliberal, que está caracterizado principalmente pelo
fenômeno da ‘exclusão social’: uns poucos ficam dentro do sistema de um re-
lativo bem estar, a grande maioria dos homens fica fora. Vivem ‘sem’: sem
Terra, sem Teto, sem Documentos, sem Segurança Social, sem Trabalho...
(MST, 2007, p. 109)

Entretanto, paradoxalmente, talvez a ampla maioria das classes tra-


balhadoras não se sinta contemplada pelas lutas e reivindicações desse
Movimento.
Assim, esses Movimentos contribuem, fazendo uso, nesta pesquisa,
de categorias marxistas (MARX, 2002), tanto para a emancipação política
da classe trabalhadora, quanto para a emancipação humana. Se se consi-
derar a emancipação humana como uma possibilidade ou como uma
aposta, todos os Movimentos – ou então, algumas de suas frações – apos-
taram ou apostam no sentido da possibilidade ou da necessidade dessas
Cláudio Rodrigues da Silva | 215

emancipações, independentemente de mencionarem ou não essas catego-


rias.
As experiências e os movimentos anteriores a esses contribuíram
para que inclusive os Movimentos analisados olhassem retrospectiva e
prospectivamente, a partir de – fazendo uso de palavras de Chartres (apud
LE GOFF, 2010) – ombros de gigante, o que permitiu a esses Movimentos,
dentro das condições objetivas, avanços no sentido da constituição de ide-
ologias e visões de mundo e, por conseguinte, de educação próprias, que
acabam por se constituírem num ponto de partida (ou de continuidade)
para crítica e para a autocrítica de atuais e vindouros movimentos sociais
e, assim, possivelmente, conseguir avançar no sentido de constituição, di-
fusão e hegemonização de uma ideologia e de uma visão de mundo
concernente à classe trabalhadora.
Conclusão

Como enunciado, esta pesquisa teve como objetivo geral verificar os


principais princípios teórico-práticos educacionais do MST, dos owenistas
e dos cartistas e se tais princípios são comuns. Como ressaltado inicial-
mente, os princípios enunciados foram elaborados para fins desta
pesquisa, portanto, não necessariamente constam nos documentos e bibli-
ografias analisados desses Movimentos, menos ainda com as
terminologias ou categorias aplicadas nesta pesquisa.
Os objetivos específicos foram: a) verificar a forma de operacionali-
zação dos princípios educativos nas experiências educacionais levadas a
cabo pelo MST, pelos owenistas e pelos cartistas; b) proceder a um coteja-
mento entre os princípios educativos implementados pelos três
Movimentos discriminados.
Em relação aos objetivos, tanto o geral, quanto os específicos, consi-
dera-se que foram atingidos de forma satisfatória. Entretanto, no que se
refere aos objetivos específicos, não foi possível aprofundar o cotejamento,
conforme a expectativa inicial, principalmente pelo fato de que, em relação
aos owenistas e aos cartistas, há reduzida bibliografia e os textos analisa-
dos não tratam suficientemente de algumas das questões visadas nesta
pesquisa. Já em relação ao MST a situação se inverte, pois, além de relati-
vamente farto material publicado pelo próprio Movimento, há uma
quantidade significativa de pesquisas sobre seu projeto educacional.
Os dados levantados confirmam que os Movimentos têm princípios
educativos comuns e transcendentes, tese aventada por Dal Ri (2012) e
que embasa esta pesquisa, mais especificamente no que se refere aos Mo-
vimentos analisados, quais sejam o Owenismo, o Cartismo e o MST.
Cláudio Rodrigues da Silva | 217

Todavia, como apontado, há especificidades relativas a cada Movimento,


tanto em termos de concepção quanto em termos de operacionalização
desses princípios.
Esses princípios são: a) elaboração e implementação de um projeto
próprio de educação conforme as necessidades e ideologias dos respectivos
Movimentos; b) a negação dialética da educação escolar hegemônica ou
estatal; c) implementação da gestão democrática nas associações e escolas
dos Movimentos; d) ações visando formar os próprios educadores em con-
sonância com a concepção de mundo e de educação dos respectivos
Movimentos; e) articulação entre ensino e trabalho produtivo; f) constitui-
ção e veiculação de uma concepção de mundo concernente a cada
Movimento e à classe trabalhadora.
É importante reiterar que, caso se efetue uma análise restrita à di-
mensão da Pedagogia, isto é, da parte da ciência que trata do processo de
ensino-e-aprendizagem, alguns dos aspectos ressaltados como uma espé-
cie de diferencial ou de avanço nos projetos educativos desses
Movimentos, especialmente no que se refere à gestão democrática, à vin-
culação entre ensino e trabalho e à formação de professores, podem ser
entendidos como triviais ou mesmo nada originais.
Como mencionado, os cartistas e os owenistas incorporaram princi-
palmente contribuições de Lancaster e de Pestalozzi, que eram, à época,
propostas modernas, que incorporavam pressupostos científicos e ele-
mentos progressistas que iam ao encontro de necessidades educacionais
desses Movimentos, que refutavam o ensino pautado em métodos inefica-
zes, conservadores ou ultrapassados. Em alguma medida, o MST também
incorpora, em caráter de síntese, contribuições de diferentes tendências
pedagógicas. Porém, ao longo de sua trajetória, o Movimento foi delimi-
tando progressivamente o seu referencial teórico, em termos pedagógicos.
218 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Ainda que algumas teorias apresentem avanços em determinados


quesitos, se considerado o aspecto estritamente pedagógico, elas têm limi-
tes objetivos, uma vez que, em última análise, não questionam a ordem
social vigente.
Todavia, os projetos educativos desses Movimentos não se restringe
à dimensão didática ou metodológica. Assim, a vinculação entre ensino e
trabalho não tem apenas finalidade – recorrendo a uma expressão quase
paradoxal e comum na área pedagógica – de tornar concretos conteúdos
abstratos e, com isso, melhorar o processo de ensino-e-aprendizagem,
como postulam algumas abordagens pedagógicas.
Da mesma forma, a gestão democrática radical ou substantiva não é
apenas uma metodologia visando tornar a gestão da escola mais eficiente
em termos de aplicação de recursos, de desempenho em avaliações e, pos-
sivelmente, em termos de qualidade do ensino. Em última instância, além
de colocar todos na situação de sujeitos ativos e em condições de igualdade
real nas instâncias e nos processos decisórios, tem em vista também uma
educação teórica e prática que rompa com o dualismo entre quem con-
cebe/comanda e quem executa/obedece.
O diferencial desses Movimentos em relação aos princípios enuncia-
dos está para além da dimensão pedagógica, ou seja, está vinculado à
dimensão educativa. Portanto, a principal diferença está na filosofia e na
visão de mundo que embasam os seus projetos educativos.
Os princípios enunciados não são um fim em si mesmo, mas são di-
retamente imbricados com as finalidades, objetivos, ideologias e visões de
mundo desses Movimentos.
Pelo fato de os projetos educativos desses Movimentos terem vincu-
lações orgânicas com os respectivos projetos políticos, a educação tem,
necessariamente, que se pautar pela práxis. Esse é um dos principais dife-
renciais da educação desses Movimentos, em especial do MST. Uma
Cláudio Rodrigues da Silva | 219

educação, por mais radical que se apresente e por mais que faça incisivas
críticas à ordem social vigente, se não resultar em intervenções na reali-
dade, torna-se inócua, resvalando numa espécie de idealismo. Os
princípios enunciados não teriam efeito algum se não fossem colocados
em prática pelos Movimentos.
Esta pesquisa contribui no sentido de ajudar a trazer à tona, em
forma de cotejamento, alguns aspectos da atuação, em especial no campo
da educação, de Movimentos, em certa medida, considerados – fazendo
uso de palavras de Teixeira (2002) – utópicos, hereges e malditos. Ainda
que Teixeira (2002), dentre os Movimentos analisados nesta pesquisa, es-
teja fazendo referência apenas aos owenistas, pode-se cogitar a
contemplação dos cartistas e especialmente do MST nessa tríade. Maldito
porque comumente todo movimento (auto)organizado contra-hegemô-
nico de trabalhadores é assim considerado pelas classes hegemônicas.
Herege porque, além de não comungar com a ideologia e com a visão de
mundo hegemônicas, o MST não se prende a um ou outro autor ou cor-
rente teórica, mas se apropria deles conforme a própria dinâmica do
Movimento. Utópico – numa acepção científica, como apontado por Man-
nheim (1972) – porque busca uma formação econômico-social que ainda
não existe, mas que é passível de concretização.
A importância principal do MST, assim como de outros movimentos
sociais de trabalhadores, é fazer com que estes se auto-organizem e, com
isso, tenham capacidade de tensionar os limites impostos pela ordem so-
cial vigente. Isso, possibilita, por um lado, verificar que o sistema do capital
não é algo tão simples e fácil de ser superado, mas, por outro lado, possi-
bilita constatar também que o capital não é a-histórico, eterno, invencível.
Entretanto, para esse enfrentamento é necessário um projeto político-ide-
ológico que inclui necessariamente um projeto educativo organicamente
vinculado à práxis política e econômica.
220 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

Todos os Movimentos mencionados foram/são alvos de críticas de-


preciativas, ora mais, ora menos incisivas, tanto por setores das direitas,
quanto das esquerdas. No caso de setores das esquerdas, o mais comum é
encontrar críticas em relação à distância entre o enunciado/pretendido (a
teoria) e o realizado (a prática). Considerar procedentes ou não as nume-
rosas críticas é uma questão que depende das perspectivas de análise e que
foge aos objetivos desta pesquisa.
Algumas questões suscitadas no decorrer desta pesquisa são: o que
se pode aprender das atuações de cada um desses Movimentos? O que se
pode aprender do cotejamento desses Movimentos, por conseguinte, da
apreensão do percurso histórico das classes trabalhadoras em relação à
educação, em especial no que se refere aos princípios elencados?
Uma necessidade que parece se colocar às classes trabalhadoras é a
definição do papel da escola, ou seja, dos conhecimentos técnico-científi-
cos, no processo de luta pela hegemonia política, econômica e cultural.
Uma história da educação, escrita e analisada duma perspectiva das classes
trabalhadoras, parece fundamental para subsidiar decisões.

Pues bien, la historia de la educación nos sirve para orientarmos no solo sobre
el pasado, sino tambien sobre el presente, ya que éste se halla constituído em
gran parte por aquél. Por eso los estúdios históricos sobre la educación y la
pedagogia se han multiplicado em los últimos años y por eso han llegado a
constituir uma parte esencial en la enseñanza de la ciencia de la educación.
(LUZURIAGA, 1959, p. X)

Uma questão central que se coloca desde os primeiros esboços das


iniciativas ou experiências educacionais é que tipo de conhecimento, bem
como sua finalidade ou aplicação, interessa às classes trabalhadoras. Indi-
cativo disso são as históricas e atuais disputas em torno do currículo oficial.
Os owenistas e os cartistas colocaram em evidência o conhecimento útil, o
Cláudio Rodrigues da Silva | 221

que, no caso do MST, é apontado com outras palavras, porém, marcando


firmemente a posição de que os conhecimentos técnico-científicos têm
que, necessariamente, atender aos interesses e às necessidades das classes
trabalhadoras. Exemplifica essa posição, duma perspectiva mais imediata,
a defesa da Educação do Campo, além das adequações de caráter mais me-
diato e amplo, como a adequação político-ideológica do currículo.
Mais significativo ainda é que essas adequações não ficam restritas à
dimensão conceitual, ou seja, ao currículo formal, mas têm que estar em
estreita consonância com a dimensão atitudinal, isto é, com o currículo
oculto, o que potencializa os desafios e as dificuldades enfrentadas pelo
MST.
As questões relacionadas com os princípios enunciados são de ordem
coletiva, portanto, não são de alçada de uma pessoa, pequenos grupos ou
mesmo um ou outro movimento social, inclusive porque iniciativas isola-
das de experiências educacionais, como as mencionadas, tendem a ser
perseguidas, reprimidas ou mesmo extintas, seja pelas dificuldades en-
frentadas para manutenção de uma estrutura ou sistema educativo
próprio, seja pela intervenção das classes hegemônicas, em especial por
intermédio do aparelho de Estado. Todavia, não obstantes as dificuldades
ou as repressões, a história tem demonstrado que setores das classes tra-
balhadoras insistem em resistir e em implementar ações na tentativa de
constituir, difundir e fortalecer suas ideologias e visões de mundo.
Por um lado, esses princípios são comuns e transcendentes entre se-
tores das classes trabalhadoras. Por outro lado, o capital combate
veementemente tais princípios, o que indica o potencial de risco à ordem
social vigente que representa, em última instância, a auto-organização das
classes trabalhadoras no âmbito da economia, da política ou da cultura.
Esse risco torna-se maior ainda quando a atuação nessas esferas ocorre de
forma articulada e simultânea.
222 | Educação do MST, do owenismo e do cartismo britânico: princípios em comum

A educação é um campo historicamente objeto de disputas entre clas-


ses sociais e frações. Na atualidade, os conflitos e disputas aumentam,
envolvendo diferentes segmentos das classes trabalhadoras que lutam,
seja contra a privatização da educação, seja pela sua democratização.
Há indicativos de que a tendência é de que esses conflitos e disputas
continuem a crescer, devido ao caráter estratégico da educação para a ma-
nutenção, combate ou conquista da hegemonia ou do consenso, em
especial por intermédio da difusão de ideologias e visões de mundo. Isso
aponta a necessidade de aprofundamento das análises de como as disputas
em torno da educação variam, conforme os momentos históricos, a corre-
lação de forças, a matriz político-ideológica de cada movimento ou
organização de trabalhadores, entre outras. Noutras palavras, demanda
analisar como diferentes movimentos de trabalhadores agiram ou agem,
em termos de educação, em diferentes momentos históricos e correlações
de forças.
Esses estudos tornam-se ainda mais prementes, haja vista a histórica
e tendencial conflituosidade, bem como as tensões sociais envolvendo a
educação, fato que se verifica em diferentes países, em especial na América
Latina, e que há décadas é tematizado por organismos internacionais,
como, por exemplo, o Banco Mundial.
As reformas hegemônicas em curso ou pretendidas no campo da edu-
cação têm relações diretas com as alterações em curso ou previstas no
sistema produtivo e indicam que as disputas e os controles sobre o aparato
escolar tendem a ser intensificados e complexificados.
Isso indica uma tendência de que experiências educacionais das clas-
ses trabalhadoras, como, por exemplo, as levadas a termo por OTAs ou
movimentos sociais, entre eles, o MST, encontrem mais e maiores resis-
tências ou perseguições por parte das classes hegemônicas, em especial
por intermédio do aparelho de Estado, pois, como já apontado, são
Cláudio Rodrigues da Silva | 223

históricas e recorrentes a perseguição e a repressão a iniciativas, inclusive


no que se refere à educação, que sejam interpretadas como ameaças à or-
dem social vigente. Exemplo disso são os Movimentos mencionados, que
sofreram/sofre vigilância ou mesmo repressão, inclusive no que se refere
a suas atividades educacionais.
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