Epistemologia Freudiana
Epistemologia Freudiana
Epistemologia Freudiana
Rafael Raffaelli
Editor
Profa. Dra. Luzinete Simões Minella
Conselho Editorial
Prof. Dr. Rafael Raffaelli
Prof. Dr. Héctor Ricardo Leis
Profa. Dra. Júlia Silvia Guivant
Prof. Dr. Luiz Fernando Scheibe
Profa. Dra. Miriam Grossi
Prof. Dr. Selvino José Assmann
Editores Assistentes
Cláudia Hausman Silveira
José Eliézer Mikosz
Silmara Cimbalista
Secretária Executiva
Liana Bergmann
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Rafael Raffaelli*
RESUMO
ABSTRACT
*
Professor Titular do Departamento de Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)
Doutor em Psicologia Clínica pela PUC/SP.
Endereço para publicação e correspondência: Rua Aracuã, 351 – Pantanal – Florianópolis – SC – 88040-310
Tel: (48)9962-8892 – Fax: (48)3233-3247 E-mail: [email protected]
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1. INTRODUÇÃO
Essa era a Esfinge de seu tempo e Sigmund Freud (1856-1939) foi seu
Édipo, seu decifrador. Contudo, essa clínica inovadora situava-se nos limites da
medicina de sua época, pois supunha sempre uma etiologia de fundo físico-
técnica da hipnose foi sem dúvida um avanço para a época e, embora encarada
com reserva no meio médico, ela ocupava com vantagem o lugar das abordagens
2. QUESTÕES EPISTEMOLÓGICAS
“reviravolta da psicologia”:
“preconceitos metafísicos”?
pelo filósofo alemão Johann Friedrich Herbart (1776-1841) no início do século XIX.
considerados por ele como uma interação de representações, que poderiam ser
calculadas tendo por base a sua dinâmica, tal como na física se calcula a
excitação. Dessa forma, ele supõe duas dinâmicas psíquicas, uma consciente e
“cálculo mental” tenha se mostrado inviável – embora essa tese tenha influenciado
Fechner e mais tarde ecoe em Kurt Lewin, com referência à topologia matemática
pp.102-105).
Freud, embora ele mesmo não tenha reconhecido isso. (Gay, 1989, p.44;
Fechner (1801-1887), que fundou a psicofísica por volta de 1860, de quem Freud
Strachey, in Freud, 1925, p.75n). Freud chega mesmo a afirmar que sempre se
mostrou “receptivo às idéias de G.T.Fechner” e que seguiu suas idéias “em muitos
percebida pelos sujeitos entre distâncias e pesos não era atribuível aos objetos,
1978, pp.121-125)
A própria formação médica a que Freud foi submetido – em que pese seu
contato com Brentano – veio a reforçar sua visão de que a única maneira de se
fazer ciência era por meio da metodologia das ciências da natureza. Tendo
a partir de 1877, ele tomou contato com as idéias do grupo denominado Escola de
Medicina de Helmholtz. Esse grupo formado por Brücke, Hermann von Helmholtz
por divisa que “além das forças físico-químicas comuns, não há outras forças
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obra - de uma “força física” agindo no interior dos organismos vivos à sua
1953/1989, pp.51-54)
Freud a esse respeito foi o contato que teve com o caso “Anna O.” – cognome de
clínico depois descrito nos Estudos Sobre a Histeria (Studien über Hysterie), que
ambos redigiram em 1895. Atendida por Breuer entre 1880 e 1882, o relato de seu
com Jean Martin Charcot (1825-1893) por ocasião do seu estágio no hospital
Salpêtrière. Breuer nunca veio a aceitar as teses de Freud sobre a etiologia sexual
das neuroses, o que acabou por conduzir ao esfriamento da ligação entre os dois.
Charcot de súbito irrompeu com grande animação: "Mais, dans des cas pareils,
c'est toujours la chose génitale, toujours... toujours...toujours", e cruzou os braços
sobre o estômago, abraçando-se a si mesmo e pulando para cima e para baixo na
ponta dos pés várias vezes com a animação que lhe era característica. Sei que
por um momento fiquei quase paralisado de assombro e disse para mim mesmo:
"mas se ele sabe disso, por que não diz nunca?". Mas a impressão logo foi
esquecida; a anatomia do cérebro e a indução experimental de paralisias
histéricas absorviam todo o meu interesse. (Freud, 1914a/1987, p.24)
limitação do trabalho de seu mentor parisiense, Freud parece propugnar por uma
Outro personagem cujas idéias vieram a exercer influência sobre Freud foi
lhe plagiado a idéia. Ao que Freud teria respondido: “E, se ele me deu a
etiologia sexual da histeria: “qualquer que seja o caso e qualquer que seja o
“Não acredito mais na minha neurótica [teoria das neuroses]. (...) O pai, sem
excluir o meu, tinha que ser acusado de pervertido. (...) Certamente, essas
(Carta 71), Freud levanta, pela primeira vez, a questão edipiana: “Descobri,
também em meu próprio caso, [o fenômeno de] me apaixonar por mamãe e ter
obra, cuja demonstração teórica mais acabada se produz nos Três Ensaios Sobre
infantil irá atrair críticas acérrimas: “Poucos dos achados da psicanálise tiveram
do próprio Freud?
reducionista.
entre psicanálise e química. Desse modo, levando a idéia freudiana ao seu limite,
“coisa em si” (noumenon) da filosofia de Kant, aquilo que não pode ser
Eu creio de fato no acaso exterior (real), mas não creio no acaso interior (psíquico)
[Ich glaube zwar na aüsseren (realen) Zuffall, aber nicht na innere (psychische)
Zufälligkeit]. (...) São duas as diferenças entre mim e o supersticioso: primeiro, ele
projeta para fora uma motivação que eu procuro dentro; segundo, ele interpreta
mediante um acontecimento o acaso cuja origem atribuo a um pensamento. Mas o
oculto para ele corresponde ao que para mim é inconsciente, e é comum a nós dois
a compulsão a não encarar o acaso como acaso, mas a interpretá-lo. (Freud,
1905/1987, pp.223-224)
Vale dizer que Freud nunca supôs a psicanálise como uma disciplina
tornaria o "elo" entre a psiquiatria e os demais ramos das ciências mentais (Freud,
seus últimos trabalhos retoma a idéia de uma psicologia autônoma frente à ciência
ciências humanas.
3. CONCLUSÃO
muito tarde em minha vida. Nietzsche (...) por muito tempo foi evitado por mim,
pp.75-76). Jung também atesta: “Freud disse-me que nunca lera Nietzsche”.
campo das ciências da natureza, mas ainda não formalmente inclusas nas
ciências humanas.
posteriores: "psychoanalysis has much more in common with astrology than with
the genuine sciences" (Grünbaum, 1979, p.132), quer dizer, a psicanálise seria
que a psicanálise não necessita "ser reconhecida como ciência diante de algum
mais que Freud para romper o charme do fato e para reconhecer o império do
1969/1978, p.125)
para as ciências humanas em geral. E foi por essa senda que algumas das
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
publicado em 1893).
publicado em 1926).
GAY, P. (1989). Freud: Uma vida para o nosso tempo. (D.Bottmann, Trad.). São
131-141.
Italia.
WATSON, R.I. (1978). The great psychologists. Nova York: J.B. Lippincott.