Explicando A Filosofia Com A Arte

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Copyright © 2004, Charles Feitosa

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CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE.


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ.

F336e Feitosa, Charles, 1965-


Explicando a filosofia com arte / Charles Feitosa. - Rio
de Janeiro : Nova Fronteira, 2011.
200p. : 28 cm

ISBN 978-85-209-2756-4

1. Filosofia. 2. Filosofia - História. 3. Arte e filosofia. I.


Título.

CDD: 109
CDU: 1(09)

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Sumário
Explicando o inexplicável .......................7

5
A Arte de Pensar a Arte
1. O Senso e o Sensível ..............................110
1 2. A Verdade na Arte .................................115
Um Olhar Diferente 3. A Utilidade da Arte ..............................120
1. Mora na Filosofia .....................................12 4. O Efeito Purificador ...............................123
2. Disposição para a Vertigem ....................16 5. O Fim da Estética ..................................127
3. Imagens do Filósofo ................................20 6. Beleza é Fundamental? ........................131
4. Arte de Criar Conceitos ...........................24 7. Para Além do Belo e do Feio ................136
5. Um Olhar Diferente .................................27
6. A Filosofia como Pensamento Concreto ..32
6
7. Pensar é Viajar .........................................35
E o Amor, Então,
Também Acaba?
1. A Força das Paixões ...............................140
2 2. O Tédio ..................................................143
Adeus ao Real 3. Pensando o Amor .................................147
1. Grandes Aventuras .................................40 4. O Amor a Serviço da Razão ..................150
2. Teorias Fundamentais do Real ...............44 5. O Mito da Unidade Originária .............153
3. Vantagens e Desvantagens do Realismo 6. E o Amor, Então, Também Acaba? ......158
e do Relativismo ......................................49 7. A Fertilidade dos Mortais ......................160
4. Adeus ao Real ..........................................56

7
3 Pensamentos Mortais
A Ciência Pensa? 1. A Gente Morre .......................................166
1. Tecnofobia................................................62 2. O Medo da Morte ..................................170
2. Filosofia e Ciência: Ligações perigosas ...66 3. A Atitude Soberana ...............................172
3. A Ciência Moderna ..................................69 4. A Morte do Outro e a Minha Morte....175
4. Teorias Alternativas sobre a Ciência .......73 5. A Comunidade dos Mortais ..................176
5. A Ciência Pensa? ......................................79 6. Somente os Singulares se Sentem
Responsáveis ..........................................181
7. Alegria de Viver .....................................183
4
Em Torno da Natureza
1. Pequena História da Ideia de Natureza...84
2. Da Utopia ao Enigma .............................87
3. A Sabedoria dos Animais .......................90 Por Enquanto é Só,
4. Quem Tem Medo do Corpo? ...................97 Pessoal ................................189
5. Ninguém Está a Salvo e Ninguém Bibliografia ...............................................193
Está Perdido ..........................................101 Crédito das Ilustrações .........................197

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Segundo Nietzsche, a tarefa da filosofia é:
“Ver a Ciência sob a ótica do artista,
mas a arte sob a ótica da vida…”
O Nascimento da Tragédia (1871)

Aos meus amigos, alunos e mestres,


na filosofia, na arte e na vida.

Agradeço a Sheila Kaplan


pelo convite para a realização deste livro
e a Carlos Guimarães Martins
pelas valiosas e implacáveis críticas.

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Explicando o
Inexplicável
É mais fácil começar dizendo o que esse
livro não é. Em primeiro lugar, Explicando
a Filosofia com Arte não pretende ser um
manual, no qual conceitos são entregues de
um jeito tão mastigado que já não têm mais
nenhuma densidade e nenhum sabor. Espera-
-se, ao contrário, que o leitor use os próprios dentes
e se esforce para digerir por si próprio as ideias e
os argumentos expostos. Além disso, o livro não foi
concebido como uma enciclopédia, no sentido de uma
apresentação panorâmica, em ordem alfabética, da
soma de todos os autores, todas as obras e escolas da
filosofia. Diversos nomes importantes estão ausentes,
outros são mencionados diversas vezes. O texto
é, na verdade, uma seleção estratégica de alguns
problemas filosóficos, entre muitos possíveis.
Explicando a Filosofia com Arte também não segue
uma ordem cronológica. Sabemos que a história da
filosofia é a “nossa própria história”; afinal, somos
o resultado de um longo processo de errâncias.
Sabemos também que qualquer reflexão sobre
os problemas mais urgentes e atuais da nossa
sociedade permanecerá sempre impotente se não
levar em conta suas origens. A história da filosofia
pode, entretanto, funcionar como uma intimidação,
tolhendo nossa capacidade de pensar criativamente.
Por isso, o caminho que se segue coloca a prioridade
nos temas e recorre à história sempre

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em segunda instância. Isso significa que o texto


não percorre um trajeto linear, mas se desenvolve
em um ziguezague de épocas e autores, imitando
os movimentos alternados (slalom), que skatistas ou
surfistas realizam com suas pranchas para avançar
mais rapidamente no asfalto ou no mar.
Finalmente, a proposta de explicar a filosofia
por meio da arte não se restringe a usar as coisas
belas apenas como ilustração ou adorno. Em vez
disso, busca-se combinar a ótica do filósofo com a
do artista até que se contaminem reciprocamente.
São as imagens da pintura, da poesia, da dança
ou do cinema que às vezes guiam os conceitos,
permitindo assim que se levantem questões para as
quais não há respostas prontas, instigando-nos a
pensar. A parceria entre filosofia e arte torna
possível tratar com alegria e leveza alguns
temas importantes e complexos da cultura e
da existência, tais como o sentido da realidade, o
lugar da ciência na sociedade, as interpretações do
corpo e da natureza, a relação entre arte e verdade, a
transitoriedade do amor e a inevitabilidade da morte.
Assim como a meta de todo artista é tornar real o
impossível, ao criar e recriar mundos por meio de cores,
sons ou palavras, este livro também busca explicar o
inexplicável. A filosofia não pode ser esclarecida de
dentro para fora nem apreendida de fora para dentro.
O único jeito de se aproximar do pensamento é na
prática. Diz um antigo provérbio que “não é possível
aprender a nadar sem se aventurar à água”. Considere
então a presente obra como um empurrão para dentro
das águas, ora frias e turvas, ora claras e quentes, do
oceano da filosofia. Que o banho seja revitalizante!

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Buscando o Impossível
(1928), de René Magritte
(1898-1967).

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1
Um
Olhar
Diferente

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1. MORA NA FILOSOFIA
Este título foi tirado de um famoso samba do
compositor popular brasileiro Monsueto (1924-1973):
“Mora na filosofia…/ pra que rimar amor e dor?”
(Mora na Filosofia, 1953). “Mora na filosofia” é uma
expressão de apelo e quer dizer: preste atenção nessa
ideia, porque ela nos faz pensar.

Mafalda, personagem dos O que é filosofia? Não é uma pergunta fácil.


quadrinhos do cartunista Boa parte das obras dos filósofos é dedicada a
argentino Quino (1932-), é responder a essa questão, e cada um tem uma
uma menina bem-informada
interpretação diferente. O objetivo deste livro é
e contestadora, que faz
constantemente perguntas mostrar, gradativamente e com a ajuda da arte,
difíceis sobre ética, política e o que está em jogo quando fazemos filosofia. A
cultura para seus pais. primeira indicação vem da etimologia — o estudo
da origem e da evolução das palavras. A expressão
filosofia vem de uma associação dos termos gregos
philia (amor, amizade) e sophia (sabedoria) e significa
literalmente “amor pelo saber”. O termo exige,
portanto, certo cuidado: o filósofo não é um sábio
— aquele que se sente cheio de certezas —, mas sim
alguém constantemente à procura do conhecimento.
Pelo relato tradicional, Pitágoras teria sido o
primeiro a usar a palavra “filosofia”. Na era mais
arcaica (V-IV a.C.), o termo sophia designava um tipo
de saber que incluía conotações mais práticas,

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ligado tanto ao artesanato como ao comportamento


ético. Somente mais tarde (a partir do século III d.C.),
é que o termo ganhou um aspecto mais teórico,
ligado à atividade intelectual e abstrata.
Pouco se sabe sobre a vida e obra de Pitágoras
(c. 580-496 a.C), que não deixou nenhum documento
escrito. Seus principais interesses eram a matemática,
a astronomia e a música. Diógenes Laertius (III d.C.),
autor da mais antiga história da filosofia ainda
preservada (escrita em 220 d.C.), fez o seguinte
comentário sobre o pensador:
“Pitágoras comparava a
vida com uma festa, em que
alguns vão para competir
pelos prêmios, outros
comparecem para fazer
negócios, mas os melhores
vão como observadores. Os
primeiros revelam-se como
almas escravas, ávidas de
fama ou lucro, enquanto
os últimos se apresentam
como amantes da sabedoria
[filósofos]” (Vida e Opiniões de
Filósofos, p. 114).

Observe como a luz, no quadro


O Filósofo Pitagórico (1762), do pintor
veneziano Pietro Longhi (1702-1785),
parece emanar do próprio livro,
como se de suas páginas brotasse a
sabedoria que vai iluminar a face dos
que a desejam.

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Filosofia (1509-1511), afresco de Rafael (1483-1520).

As cores do vestido representam os quatro elementos: vermelho (fogo), azul (ar), verde (água) e
marrom-dourado (terra). Na mão da mulher que representa a filosofia há dois livros, um sobre
a natureza e outro sobre a moral. Os querubins carregam placas com a inscrição de inspiração
aristotélica Causarum Cognitio [Conheça por meio das causas], ou seja, conheça por meio das
perguntas “Por quê?”, “Como?”, “Para quê?” e “De que é feito?”.

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