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Unicamp: Universidade Estadual de Campinas

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS

PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOCIÊNCIAS
UNICAMP
ÁREA DE EDUCAÇÃO APLICADA ÀS
GEOCIÊNCIAS

RACHEL PINHEIRO

AS HISTÓRIAS DA COMISSÃO CIENTÍFICA DE EXPLORAÇÃO (1856) NA


CORRESPONDÊNCIA DE GUILHERME SCHÜCH DE CAPANEMA.

Dissertação apresentada ao Instituto de


Geociências como parte dos requisitos para
obtenção do título de Mestre em Geociências, na
Área de Educação Aplicada às Geociências.

Orientadora: Prof. Ora. Maria Margaret Lopes ;.~.;' u 'f.i_~~ , 'p~'


0 c;;.:_.:;:_-,I:·-~~~--! {· >"; (>,~!~T.i::.-::._:-;r,; ,'.
cm .J.}; O bi2oo ';)_
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CAMPINAS- SÃO PAULO
Junho -2002

i IJNICAMP
UNICAMP BIBLIOTECA CENTRAL
N~CPO-----

FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA


~( 8 1J) ;2GS3"1 t BIBLIOTECA DO IG- UNICAMP

Pinheiro, Rachel
P655h As histórias da Comissão Científica de Exploração (1856) nas cartas de
Guilherme Schüch de Capanema I Rachel Pinheiro.- Campinas,SP.:
[s.n.], 2002.

Orientadora: Maria Margaret Lopes


Dissertação (mestrado) Universidade Estadual de Campinas, Instituto
de Geociências.

1. Capanema, Guilherme de 1824-1906. 2. História Natural-


Brasil. 3. Expedições Científicas- Brasil- Séc. XIX. 4. Ceará-
descrições e Viagens. I. Lopes, Maria Margaret. II. Universidade
Estadual de Campinas, Instituto de Geociências III. Título.

ii
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS

PÓS - GRADUAÇÃO EM GEOCIÊNCIAS


UNICAMP
ÁREA DE EDUCAÇÃO APLICADA ÀS
GEOCIÊNCIAS

AUTORA: RACHEL PINHEIRO

AS HISTÓRIAS DA COMISSÃO CIENTiFICA DE EXPLORAÇÃO (1856) NA


CORRESPONDtNCIA DE GUILHERME SCHÜCH DE CAPANEMA

Orientadora: Prof. Ora. Maria Margaret Lopes

Aprovada em m o ç, I RQD .;L


EXAMINADORES:
Profa. Ora. Maria Margaret Lopes
Profa. Ora. Magali Romero Sá
Profa. Ora Regina C. E. Gualtieri

Campinas, 28 de junho de 2002.

iii
Âo meu avô 1Jemé:5io;

_A minha mãe, !:Ieonora

iv
AGRADECIMENTOS

O que pode ser mais importante neste processo do que a família? Agradeço
a minha mãe, irmã e à Amanda, pela paciência e convivência.
E falando em paciência, agradeço especialmente à Margaret, que soube
entender as diferenças dos nossos ritmos e me construir neste trabalho de modo
muito competente.
Às Professoras Sílvia Figueirôa e Regina Gualtieri, pela atenção e
sugestões dadas no meu exame de qualificação.
Aos meus colegas do DGAE, por dividirem comigo esta experiência, e as
secretárias Ângela e Valdirene (o que seria deste Instituto sem vocês?).
Aos funcionários dos arquivos do Rio de Janeiro, pela boa vontade e
atenção prestada e ao Renato Abdalla, por me salvarem um moment:> de sufoco.
Ao Jefinho, lgor, Sávio e meu pai, por .me abrigarem no Rio e pela
descontração ao final de cada dia.
À Dorothy e Dona Olinda, por cuidarem de mim com muito carinho, assim
como a Renata, Paula, Michele, Victor, Diva, Bethânia e Chico.

v
"eu fiz com que o povo que a tomara
por sonho tornasse a acreditar nela".
Guilherme Schüch de Capanema, em carta escrita para Antônio
Gonçalves Dias em 1210111858, falando da Comissão Científica de
Exploração, da qual os dois faziam parte (Anais da Biblioteca Nacional
(1971, 174).

vi
SUMÁRIO
DEDICATÓRIA ..................................................................................................................IV

AGRADECIMENTOS ••.•..•.........••••••••.•....•....••••••••••••••........•.•••••••••••••••..•••......•••••••••••.•..•••••v

EPÍGRAFE ••••••••••....•...••••••••••••••••.•.••.•.•••••••••••.•.••.•.•.•••••••••••••••••••.....•.•••••••••••••••.•••••••••••••.. VI

RESUMO •...•...••••••••••...........••••••••••••••......•.•••••••••..•......••••••••••••••••••.•..••.•.••••••••••••.••.•..•.••••••• x

ABSTRACT ••••••.•.......•.••••••••...••••••••...•.•••••.•••••••.•...•.•••••.••••••••••.•••.•..•..••••••••••••••••••..••.••.••••• XI

INTRODUÇÃO ..•...•••••••••••••••••••..•..•.•••••••••••••..••.•••••.•••••••••••••.•..••••.•..•.•••••••••••....••••• 1

APRESENTAÇÃO DO TEMA: ....•••.••••••••••••.....•••.••••••.•••..•••..•.....•...••.••.••••••.••••••••••.......••••••.•••.• 1

AS HISTÓRIAS DA HISTÓRIA NATURAL E A CULTURA CIENTÍFICA ............................................. 2

CAPÍTULO 1: AS VIAGENS CIENTÍFICAS E SEUS ELEMENTOS •••••••••••••..•..•••• 6

1.1. 0 PREPARO DA VIAGEM CIENTÍFICA: .•••••••.•.•..••.••••••••••••••..•......•..•••••••••••••••••••••••••••••••••• 8

1.2. A VIAGEM PELO TERRITÓRIO •••..•.••.••.•••••••••••••.••.•..•••.••••••••••••••••.•.•.•.•••••..•...••••••••••••••.• 16

1.3. 0 TRABALHO APÓS O CAMPO: •••••••..•..••.••.••••••••••..•••.••..••••..••••••••••••.••••.•••••.••••••••••••••••• 18

CAPITULO 2: A COMISSÃO CIENTÍFICA DE EXPLORAÇÃO ........................... 20

2.1. A COMISSÃO DO CEARÁ E AS INSTITUIÇÕES CIENTÍFICAS DO SÉCULO XIX: ELOS PESSOAIS

E INSTITUCIONAIS ••.••....•••••••••••••••••...•.••.•••...••••••••••••••••.•..•••...•.•••••••••••••••••••••••.•..•.•••••• 22

2.1.1. 0 MUSEU NACIONAL COMO PALCO DA EMERGENTE COMUNIDADE CIENTÍFICA

BRASILEIRA..•.••.•.•••••••••••••••••••••••.•..••••••••••••••••••..•.•••••••••••••••••••••••••••••••••••••••.•.•.•••.•••••• 23

2.1.2. 0 IHGB, O MUSEU NACIONAL E A SOCIEDADE VELOSIANA: ELOS ENTRE A ILUSTRAÇÃO

E A CONSTRUÇÃO DA CIÊNCIA NACIONAL ••••••.•••..•••••••••••••••••••••••••.•.••••....••••••••••••••••••••• 34

2.2. As INSTRUÇÕES DE VIAGEM DA COMISSÃO CIENTÍFICA ................................................ 47

2.2.1. As INSTRUÇÕES DA SEÇÃO GEOLÓGICA E MINERALÓGICA •••.••.••.......•.••••....•.•••••••••••. 49

2.2.2. INSTRUÇÕES DA SEÇÃO BoTÂNICA ..••••••••••••••••••••••••••.•••..•••.•.••••••••••••••••••••..•..••.•••••• 65

2.2.3. As INSTRUÇÕES DA SEÇÃO ZOOLÓGICA .••••••..••••••••••••••••••...•.•..••..••••.....••••••••••••••.•••. 67

2.2.4. As INSTRUÇÕES DA SEÇÃO ASTRONÓMICA E GEOGRÁFICA....................................... 77

2.2.5. AS INSTRUÇÕES DE SEÇÃO ETNOGRÁFICA E NARRATIVA DA VIAGEM ••••••••••••.•••••••••.•. 80

2.3. 0 DESTINO DA COMISSÃO CIENTíFICA ••••.••••••.••.••••••••••••••••••...•..•..•..•••.••....•.•••••••••••••••. 81

2.4. A PARTIDA DA COMISSÃO CIENTÍFICA ••••••.••....•...•..••..••••.•..••••••••••.••.•...•••••...••.•.•..••••••• 88

vi i
2.5. A ATUAÇÃO NO CEARÁ•••••••••••••••••••••••••.•••.••.•.••.••••••.•.••.•••••••.••.•.••.•••.••••••••.••.•.•.••••.•..• 91

2.5.1. 0 RELATÓRIO DA SEÇÃO BOTÂNICA•••••••••••••••.•••••••••••••••••••••••••••••••••••••••..•••••••••••••••• 92

2.5.2. 0 RELATÓRIO DA SEÇÃO GEOLÓGICA E MINERALÓGICA ........................................... 97


2.5.3. 0 RELATÓRIO DA SEÇÃO ZOOLÓGICA ••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••• 114

2.6. Os CAMELOS E AS BORBOLETAS •••••••••.•••••.•••••••.•.•..•.••••.•••••••.•••••.••.••••••••••••••••.•.•.••••.. 122

2.7. 0 RETORNO DA CoMISSÃO CIENTÍFICA: RESULTADOS CONCRETOS••••••••••••••••••••••••••••• 125

CAPÍTULO 3: AS CORRESPONDÊNCIAS DE CAPANEMA •••••••••••••••••••••••••••••• 130

3.1. A CIÊNCIA NA CORRESPONDÊNCIA: LIVROS E INSTRUMENTOS PARA A VIAGEM E A PRÁTICA

CIENTÍFICA NO CEARÁ••••••••••••••••••••••••••••••.•••••••.•••.•.••••••••••••••••.•••••••••.••••..••••.••••.•••••.• 136

3.2. 0 RETORNO À CORTE: TRABALHOS A SEREM CONCLUÍDOS ......................................... 149

3.4. 0 DESENVOLVIMENTO DAS RELAÇÕES ENTRE CAPANEMA E OUTROS PERSONAGENS


LIGADOS À COMISSÃO CIENTÍF/CA•••••.•••••••••.••.•••.••.••••••.••••••••••••.••.•••••••.••••••••.••.•..•••••..• 155

3.3. AS RELAÇÕES POLÍTICAS DE CAPANEMA •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••• 169

CONSIDERAÇÕES FINAIS ••••••••.••.•.•••.•••.•.•••••••.••..••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••• 178

BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................181

1. FONTES PRIMÁRIAS •••••••••••••••.••••••••••••••••••••••••••••.••••••••••••••••••••••..•••••.•..•.••••••.•...••••••••••• 181

2. BIBLIOGRAFIA CITADA ••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••.••••.•••••••••••..•.••....••..••.•••••••••••••••••••••••• 182

ANEXO 1 •••••••••.•.••••.••••.••.•.•••••..•..••••.•.•...•••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••• 189

ÍNDICE DAS FIGURAS

FIGURA 2.1: VENDEDORES DE PEIXE. IMAGEM ELABORADA PELO PINTOR

DA COMISSÃO CIENTÍFICA, JOSÉ DOS REIS CARVALHO (MUSEU D. JOÃO VI,

ESCOLA DE BELAS ARTES -RJ) ................................................................................. 75

v iii
FIGURA 2.2: MtRACRODRUON URUNDEUVA. ILUSTRAÇÃO DE FREIRE ALLEMÃO
INTEGRANTE DO 1° FOLHETO DE BOTÂNICA (TRABALHOS DA COMISSÃO
CIENTÍFICA, 1862).....................................................•....:.......... ,... :................ ;............. 101

FIGURA 2.3: JUSSIAEA FLUCTUANS. ILUSTRAÇÃO DE FREIRE ALLEMÃO


INTEGRANTE DO 2° FOLHETO DE BOTÂNICA (TRABALHOS DA COMISSÃO
CIENTÍFICA, 1862)........................................................................................................103

FIGURA 2.4: LuCUMA MINUTIFLORA. ILUSTRAÇÃO DE FREIRE ALLEMÃO


INTEGRANTE DO 3° FOLHETO DE BOTÂNICA (TRABALHOS DA COMISSÃO
CIENTÍFICA, 1862)........................................................................................................105

FIGURA 3.1: MAPA DAS CORRESPONDÊNCIAS QUE FORAM LEVANTADAS,


TROCADAS ENTRE OS NATURALISTAS DA COMISSÃO CIENTÍFICA ..................... 133

IX
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS/
INSTITUTO .DE GEOCIÊNCIAS

PÓS- GRADUAÇÃO EM GEOCIÊNCIAS


ÁREA DE EDUCAÇÃO APLICADA ÀS
GEOCIÊNCIAS
UNICAMP

AS HISTÓRIAS DA COMISSÃO CIENTÍFICA DE EXPLORAÇÃO (1856)


NA CORRESPONDÊNCIA DE GUILHERME SCHÜCH DE CAPANEMA

RESUMO

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

Rachei Pinheiro
A presente Dissertação tem como objetivo destacar as histórias da
Comissão Científica de Exploração presentes nas cartas do mineralogista
Guilherme SchOch de Capanema - diretor da Seção Geológica e Mineralógica da
referida Comissão. Para tanto, tomamos as correspondências trocadas entre os
naturalistas integrantes da Comissão como nossa principal fonte de análise, e não
apenas como um material complementar a outras fontes. Trabalhando no âmbito
da cultura das Viagens Científicas, e baseando-nos nas correspondências de
Capanema, identificamos na Comissão os elementos culturais, políticos e sociais
presentes nas Viagens Científicas ocorridas até então.

X
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS/
INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS

PÓS - GRADUAÇÃO EM GEOCIÊNCIAS


ÁREA DE EDUCAÇÃO APLICADA ÀS
GEOCIÊNCIAS
UNICAMP

THE HISTORIES OF THE COMISSÃO CIENTÍFICA DE EXPLORAÇÃO


(1856) lN THE LETTERS OF GUILHERME SCHÜCH DE CAPANEMA

ABSTRACT

Rachel Pinheiro
This study aims at exploring the histories of the Comissão Científica de
Exploração in the letters of Guilherme SchOch de Capanema - Director of the
Geology and Mineralogy Section of the Commission. So, we worked on the letters
exchanged among the Commission naturalist' analysis, and we didn't use these
documents as complementary sources. Working on the culture of the Scientific
Traveis, and based on Capanema's letters, we could identify in the Commission
the set of cultural, politicai and social elements present in scientific traveis.

xi
INTRODUÇÃO

Apresentação do tema:

Este trabalho pretende apresentar as histórias da Comissão Científica de


Exploração - conhecida também, entre outros nomes, como Comissão do Ceará,
ou apenas Científica, como era chamada pelos seus integrantes -, contadas
através do meu olhar sobre a correspondência do naturalista participante da
Comissão, Guilherme Schüch de Capanema, Diretor da Seção Geológica e
Mineralógica da citada Comissão. Criada em 1856, a Científica teve como
principal missão organizar uma Viagem Científica de exploração para trazer para o
Museu Nacional (1818) e o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro- IHGB
(1838), no Rio de Janeiro, informações sobre a história natural das províncias do
norte e nordeste do Brasil, consideradas pelos contemporâneos do período como
as menos conhecidas do país. Composta exclusivamente por naturalistas
nacionais, a Comissão Científica centrou seus trabalhos principalmente na
província do Ceará, onde permaneceu por dois anos, retornando ao Rio de
Janeiro em 1861.
Não podemos falar em Comissão Científica sem fazer menção à obra do
historiador cearense Renato Braga, História da Comissão Científica de
Exploração, publicada em 1962. Braga, em sua extensa narrativa histórica, conta
fatos e histórias sobre a Comissão do Ceará, e apresenta um levantamento de
documentos referentes ao assunto que é fundamental como ponto de partida para
a realização de estudos sobre este tema.
Partindo da obra de Braga, ao resgatar as fontes documentais1 nas
bibliotecas e arquivos do Rio de Janeiro, deparei-me com documentos inéditos,
que não foram explorados até então2 . Alguns foram citados por Braga, como é o
caso do Zig-zag da Seção Geológica da Comissão Científica do Norte, composto
por uma série de artigos publicados no jornal Diário do Rio de Janeiro, escritos por

1
A relação dos documentos levantados e suas localizações nos arquivos encontra-se no Anexo I
desta dissertação.

1
Guilherme Schüch de Capanema, personagem central nas histórias da Comissão,
como veremos ao longo desta dissertação. Nos Zig-zags, o naturalista incorpora o
personagem Manoel Francisco de Carvalho, que seria ajudante da Seção
Geológica e Mineralógica da Comissão e narrador dos episódios contidos nos Zig-
zags. Outro exemplo de documento praticamente não explorado
sistematicamente, e sobre o qual privilegiamos centrar nossas análises, é a
correspondência entre os membros integrantes da Comissão Científica. De tão
numerosas e ricas em informações, estas cartas mereceram uma análise a parte
no presente estudo, e acabaram por mostrar outras visões sobre o desenrolar da
Comissão Científica, revelando suas várias histórias, que igualmente às contadas
pelos documentos oficiais utilizados por Braga, também são 'verdadeiras', e por
vezes, bem mais 'pitorescas'.

As histórias da história natural e a cultura científica

Na prática da história das ciências, a correspondência representa uma fonte


legítima, um importante material de apoio para o melhor entendimento sobre os
fatos que envolveram e nortearam a prática de naturalistas do passado. Nas
cartas, estão presentes elementos que nos auxiliam a situar o naturalista em seu
contexto cultural/científico. Tal aspecto toma relevância se tomarmos as palavras
de Pestre (1996: 20), que considera o homem da ciência:

aculturado num conjunto de práticas, de técnicas, de


habilidades manuais, de conhecimentos materiais e sociais,
ele é parte intrínseca de uma comunidade, de um grupo, de
uma escola, de uma tradição, de um país, de uma época.

Tais práticas, habilidades e conhecimentos, de tão presentes na


correspondência trocada entre os naturalistas da Comissão Científica, nos
levaram a usar as cartas não apenas como um material de apoio, mas sim como
as fontes principais no Capítulo 3 da presente dissertação. Além disso, é preciso

2
Entre esses documentos inéditos, destacam-se também as imagens, que nesta Dissertação
utilizamos apenas algumas como ilustrações especificas. A localização do acervo iconográfico da Comissão
Cientifica nos foi indicada pela Profa. Lorelay Brilhante Kury, a quem agradeço.

2
considerar que, até mesmo na obra de Braga (op.cit.), as correspondências não
foram exploradas a fundo.
Voltando à citação de Pestre, no caso do Brasil de meados do século XIX,
os homens que detinham as práticas, habilidades e técnicas que envolviam a
história natural da época, compunham uma comunidade científica que estava se
consolidando (Lopes, 1997), e esta comunidade abrigava grupos e escolas que se
diferenciavam pelas filiações sociais e intelectuais, formando redes de convívio,
cujas intersecções podem ser compostas por relações pessoais, profissionais,
familiares, e até mesmo por instituições. Partindo disto, partilhamos as palavras de
Jardine & Spary (1996: 8), no que diz respeito à pesquisa sobre a história das
ciências naturais:

Mais do que apresentar a história do conhecimento da


natureza como fruto de indivíduos isolados, trabalhando sob
o domínio único da mente, nós desejamos elaborar um
quadro onde a história natural seja um produto de grupos de
pessoas, objetos naturais, instituições, coleções e finanças,
ligados por uma série de práticas3 .

Em outras palavras, os naturalistas componentes destes grupos constituíam


e mantinham as suas existências através de hábitos sociais, estratégias,
convenções e regras, definidas pela cultura científica de sua época. É a prática
científica inserida e produzida por seu contexto cultural, político e social.
A influência do contexto cultural do naturalista na prática científica de
campo4 foi sistematizada por Jardine (et ali, 1995), que editou um livro cuja
proposta foi a de ilustrar a diversidade cultural da História Natural ao longo dos
séculos. Para estes autores, a História Natural é o produto de grupos de pessoas,
interessadas em diversos objetos de estudo, apoiadas em instituições e órgãos
financiadores. Imprescindível também para a produção da História Natural,
entendida como uma prática social, são as diversas habilidades que a envolvem,
desde as técnicas de coleta e preparo de objetos naturais até a capacidade de

3
Salvo indicações, as traduções mencionadas no texto foram feRas por mim.
4
Esta análise, no contexto do laboratório, foi feita por Shapin (1988).

3
transmissão de informações para gerações futuras, usando uma linguagem
própria, comum entre os cientistas de cada época.
Kuklick e Kohler (1996: 2) vão um pouco mais além. Estes autores
diferenciaram a influência da 'bagagem cultural' pertencente aos homens da
ciência nas atividades científicas realizadas no laboratório e no campo, postulando
que os cientistas partem das suas reservas culturais, literárias e visuais, para
interpretar as suas observações.
As reservas culturais estão presentes em outros espaços de prática da
História Natural. Os espaços diferentes apresentam modos diferentes de ação e
observação do naturalista (Outram, 1996). Porém, no campo, além das suas
próprias cargas culturais, devemos atentar para outra influência que o naturalista
sofre, fruto do fato de que, no campo, o saber científico invariavelmente convive
com outros saberes. Esta afirmação é justificada por Kuklick e Kohler (op.cit.), que
argumentam que a prática de campo envolve personagens que residem no local e
detêm informações sobre caça, pesca, natureza, entre outras que são utilizadas
pelos naturalistas. Sendo assim, a interação cultural é intensa e, na maioria dos
casos, recíproca. Além disto, os autores atentam que o turista e o naturalista
podem, na prática de campo, coexistirem em uma só pessoa, e desta forma
convivem práticas culturais diferentes em um mesmo personagem.
Sobre este aspecto, Vessuri (1999: 16) coloca que

a falta relativa de controle no trabalho de campo, em


contraste com o trabalho de laboratório, adquire especial
significado quando o investigador está no estrangeiro porque
nessas condições controla muito menos elementos do que se
fosse um investigador nativo.

Tal idéia é reforçada por Lopes (2001), ao destacar o caráter público do


campo, que permite o trânsito de olhares amadores entre o olhar científico. As
fronteiras entre o tradicional amador e o profissional não são até hoje muito
definidas em determinadas situações nas atividades de campo. Como é o caso
das Viagens Científicas de exploração, e incluo aqui, a Viagem realizada pela
Comissão do Ceará. A heterogeneidade cultural, presente neste caso, é reforçada

4
pela falta de conhecimento sobre as províncias nas quais os naturalistas da
Comissão Científica desenvolveram seus trabalhos, consideradas por eles
próprios as menos conhecidas do país, como já foi mencionado. Tais atividades
foram desenvolvidas no Ceará por naturalistas que preenchiam o papel de
cientistas, de turistas, e até mesmo estrangeiros, dada a distância cultural
existente entre a corte e a província do Ceará em nieados do século XIX.
A análise do aspecto cultural nas atividades científicas justifica o uso de
documentos particulares na história das ciências naturais, pois, assim como
Vessuri (1999), postulo que existe uma intimidade entre a vida e a obra de um
naturalista, que no conjunto de suas ações o pessoal e o profissional aparecem de
modo não dissociado, e nenhum documento escrito expressa melhor esta
proximidade do que as correspondências pessoais.
Partindo do exposto acima, o Capítulo I dessa Dissertação trata da cultura
científica das Viagens exploratórias. Mapear e definir certos aspectos e
componentes destas viagens é fundamental para localizar a Comissão do Ceará
no contexto político, científico e cultural do Rio de Janeiro e do Brasil em meados
do século XIX.
Caminhando para o Capítulo 11, será exposta a história mais conhecida da
Comissão, divulgada na historiografia, um panorama geral e a narrativa da
sucessão dos fatos que envolveram a Científica, que será útil como base para o
entendimento do Capítulo III, onde consideramos as correspondências pessoais
trocadas entre os naturalistas da Comissão Científica como principal fonte de
análise, tendo como eixo central a rede de contatos tecida por Guilherme de
Capanema em suas cartas.

5
CAPÍTULO 1: AS VIAGENS CIENTÍFICAS E SEUS
ELEMENTOS

Os séculos XVIII e XIX também podem ser caracterizados de um modo


geral, do ponto de vista científico, pelo movimento de naturalistas viajantes (Leite,
1995). O domínio da natureza, favorecido pelas Viagens Científicas, aparece
como uma medida civilizatória neste momento, em que a natureza e a sua história
ocupam um lugar privilegiado na cultura européia. Por trás da busca de um
domínio, existia uma ideologia utilitarista, que século XIX a dentro, predominou
nas Viagens Científicas, onde a natureza era visada para o favorecimento do ser
humano (Kury, 2001).
Dentro deste espírito, Portugal, mais especificamente Domingos Vandelli,
Diretor do Museu d'Ajuda, professor da Universidade de Coimbra e integrante da
Academia Real de Ciências, organizou grande número de viajantes- seus alunos-
para explorar as colônias portuguesas, através das Viagens Filosóficas. Com
estas Viagens, Vandelli projetava o levantamento quantitativo e qualitativo dos
elementos naturais e artificiais das colônias, e o mais importante, reunir os objetos
coletados para compor um acervo museológico, inserindo Portugal no rol dos
países que abrigavam a ciência moderna.
Uma dessas Viagens mais famosas, a de Alexandre Rodrigues Ferreira,
veio à Amazônia brasileira no final do século XVIII 5. Uma outra Viagem elaborada
por Vandelli, e como veremos apresenta fortes elos com a Comissão Científica,
levou o naturalista João da Silva Feijó para as Ilhas de Cabo Verde.
Posteriormente, Feijó viria para o Brasil, mais especificamente para a Capitania do
Ceará, onde realizaria levantamentos sobre a história natural do local, e escreveria
diversas memórias, que seriam retomadas pelos naturalistas da Comissão do
Ceará quase meio século depois (Lopes; Pinheiro, 2000).

5
Há uma vasta literatura sobre Alexandre Rodrigues Ferreira e sua Viagem Filosófica. Para mais
informações, consultar Rlho (1939), Simon (1983), Pataca (2001), entre outros.

6
O movimento de naturalistas estrangeiros no Brasil intensificou-se com a
vinda da família real em 1808 para o território brasileiro. Desde a sua vinda para o
Brasil, a corte portuguesa estimulou as Viagens de naturalistas estrangeiros, de
modo que este período chegou a ser chamado de o novo descobrimento do Brasil
(Holanda, 1993: 13). A exemplo do que aconteceu com as colônias espanholas
(Bourguet, 1997), a participação de brasileiros em tais explorações era reduzida.
Os naturalistas nacionais contribuíam em um trabalho conjunto com os
estrangeiros, que nem sempre ganhava relevância.
Apesar de muito numerosas, as Viagens Científicas que foram realizadas
do século ilustrado em diante, em geral, apresentaram certos elementos em
comum, que nos permitem categorizá-los e analisá-los separadamente.
Em uma esfera mais geral, podemos dizer que as Viagens Científicas
apresentavam uma fase preparatória, um segundo momento constituído pela
viagem em si e, por último, o trabalho posterior às atividades de campo, no qual os
naturalistas sistematizava os dados recolhidos em suas explorações.
Nestes três momentos, uma literatura de Viagens característica está
presente. Lisboa (1997: 34), baseada em Bender, usa uma definição ampla de
literatura de viagem, científica ou não, que se restringe apenas à condição de
retratar o deslocamento físico do autor pelo espaço geográfico, por tempo
determinado, e a transformação do objeto observado em narrativa. Os textos
variam de acordo com o momento histórico e a carga de subjetividade do autor,
possuidor de um olhar próprio. No caso dos relatos de viagem do século ilustrado
por exemplo, a narrativa, escrita por pessoas com formação ampla, inclusive em
História Natural, se apresenta de modo abrangente dentro desta área, servindo
como fonte para várias modalidades das ciências empíricas (Neuber, apud Lisboa,
op.cit.).
Ao longo do século XVIII e século XIX, as viagens de um modo geral
ganharam forte especialização, e consequentemente isso se refletiu na literatura
de viagens produzida neste período. Assim, as memórias, os relatos, os diários e
as Instruções de Viagem apresentam algumas transformações e continuidades no
decorrer da passagem do século XVIII ao XIX.

7
Lisboa (op.cit.: 34) postula que

Diferenças que, demarcadas pelas condições históricas e


pela dimensão subjetiva dos autores, dificultam em parte
qualquer definição muito rigorosa do gênero [de literatura de
viagens]. Suas manifestações caminham entre a crónica, a
epístola, o romance, a poesia, o diário e o relato científico,
acrescentado não raramente do correspondente iconográfico.

Dentre estas várias categorias de literatura de viagens elencadas por


Lisboa, destaco o corpo documental composto pela correspondência entre os
naturalistas. Nas cartas, assuntos pessoais e profissionais aparecem associados,
revelando aspectos da Viagem Científica realizada por esses naturalistas que
dificilmente estão presentes nas outras manifestações literárias.

1.1. O preparo da Viagem Científica:

Ao se planejar uma Viagem Científica, em um primeiro momento, é


necessário escolher o seu destino, levando em conta os objetivos da viagem. No
caso específico dos séculos XVIII e XIX, o destino da Viagem dos europeus foi
quase sempre as colónias, que representavam terras distantes e desconhecidas,
contendo natureza e povos exóticos, e o mais importante, com potencial de
exploração. Porém, esta busca por terras desconhecidas vai além do espírito
aventureiro do viajante, alcançando principalmente razões práticas, como o
diagnóstico das riquezas dessas colónias. Usando as palavras de Bourguet
(op.cit.: 212), não existe exploração sem uma forma de dominação, e é por isso
que precisamos mapear os motivos políticos e económicos que amparam a
Viagem Científica.
Além do interesse pelo potencial das colónias, existia também o interesse
por parte de naturalistas e do governo de explorar melhor também sua terra natal,
o que justifica, por exemplo, Portugal do século XVIII, ter elaborado um
Compêndio de observações, publicado em 1783, destinado a instruir pessoas

8
interessadas em História Natural para observar as potencialidades do Reino de
Portugal.
Sendo assim, os ·motivos para a realização de uma Viagem Científica eram
variados. Existiam interesses tanto pessoais, dos próprios naturalistas viajantes,
como os interesses do Estado, que financiava as viagens.
Da parte dos naturalistas, havia uma certa curiosidade, atração para
conhecer terras exóticas, contendo uma natureza diferente da conhecida pelo
naturalista, que pode ser traduzida por interesse científico de pesquisa. Havia
também a busca pela aventura, além da consolidação de suas carreiras como
naturalistas. Como tudo tem seu preço, as Viagens, as vezes de tão longas e
distantes, causavam grande desgaste físico e mental no naturalista (Bourguet,
1997), de modo que um estudo sobre este tema é enriquecido com a presença da
análise de elementos pessoais dos exploradores, como sua correspondência ou
diário de viagem.
Da parte do poder público, os interesses giravam em torno de relações
diplomáticas, desenvolvimento científico e o levantamento de recursos {Lisboa,
op.cit.). Raminelli {2000: 27) coloca que

A viagem teria finalidades e resultados planejados, metas a


serem cumpridas. Nem sempre era fruto de interesses
individuais. Os viajantes guiavam-se por políticas estatais e
científicas, além de receberem financiamento e instruções de
viagem.

Dentro deste aspectos estatais e científicos, ao final do século XVIII, a


busca por riquezas e recursos naturais em geral tinha como um de seus objetivos
abastecer os museus de coleções, além de sustentar a indústria emergente com
matéria prima. No caso luso-brasileiro, a proposta não poderia ser diferente, como
mostra Dias {1968: 112):

A publicação de memórias [científicas, resultantes das


viagens], patrocinadas pela Coroa, sobretudo a partir de
1770, é fruto de uma política consciente e preocupada em

9
fomentar a produção de matérias-primas para a
industrialização em Portugal.

Como fica evidente no fragmento acima, a busca pela descoberta da ordem


natural, de um sistema universal de classificação (Larsen, 1996), em meados do
século XVIII, foi aos poucos emergindo e convivendo com razões mais
pragmáticas, em um momento que o conceito de utilidade consistia um dos eixos
centrais da prática científica. Tal característica está também presente na ciência
no século XIX a dentro, e por que não estendermos este aspecto até a ciência da
atualidade?
Dando continuidade ao preparo da Viagem, uma vez definido um destino e
esclarecidos os motivos e seus objetivos, é necessário um planejamento que
envolve, entre outras coisas, a aquisição de materiais, como livros e instrumentos,
o que nos remete a um outro aspecto presente nas Viagens, que diz respeito ao
órgão patrocinador e o amparo institucional para a realização das explorações.
No caso do Brasil do século XIX, as Viagens Científicas encontravam no
Governo Imperial o apoio financeiro necessário, desde que estas Viagens
estivessem de acordo com os interesses da nação, definidos por seus dirigentes.
Relacionado a isto, Figueirôa (1992: 71) explica o envolvimento de instituições
como o IHGB nas investigações em História Natural:

O projeto ilustrado do IHGB pressupunha a conquista do


estado avançado de civilização, atingível a partir do saber
científico e do resgate e purificação dos fatos da história
pátria.

Sobre este aspecto, Lopes (op.cit.: 135) expressa a ligação entre as


investigações em História Natural e sua contribuição para o crescimento do país, e
como os membros do IHGB incluíram a ciência no plano de construção de uma
nação civilizada:

Na verdade as Ciências Naturais constituíram parte


intrínseca do projeto do IHGB, que visava atingir graus
avançados de civilização para o país, mediante a

10
investigação de todos os aspectos da História do Brasil,
incluída a parte da sua História Natural .

Além do status das Ciências Naturais no projeto da busca pela


modernização, o amparo de instituições, como o IHGB, o Museu Nacional e a
Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional (SAIN) fundada em 1827, para as
Viagens Científicas é justificável também, pela presença dos viajantes em cargos
importantes de direção destas instituições.
A compra de livros, instrumentos e outros equipamentos compõe um
aspecto interessante nesta fase de preparo das Viagens. Os livros, na sua maioria
eram manuais de identificação e classificação dos objetos naturais, ou seja,
tinham o conteúdo de apoio para as práticas de campo. Os materiais e
equipamentos eram para auxiliar na coleta, tanto de dados como de objetos
naturais, e na fixação do material que seria coletado. As especificações sobre
quais instrumentos comprar e como usá-los encontravam-se nas Instruções de
Viagem, que serão comentadas adiante.
Os equipamentos de campo não apresentaram muitas variações ao longo
do desenvolvimento das práticas de campo. Para as atividades referentes à
Geologia, incluindo aqui a Mineralogia e a Paleontologia, eram adquiridos martelos
de diferentes pesos e tamanhos, facas, vidros e caixas de madeira para
acondicionamento das amostras. Para a Botânica, eram necessárias facas e
tesouras de jardim, papel, papelão e cordas para prensar as plantas que seriam
coletadas e vidros para sementes, frutos, fungos e musgos. Na área da Zoologia,
também eram necessárias facas, principalmente para retirar animais marinhos
grudados em pedras e insetos em troncos de árvores. Era necessário também
uma ferramenta para cavar areia e solo, alfinetes, puçás de vários modelos e
frasco matador, para matar insetos. Em relação aos vertebrados, o material
necessário era composto de líquidos de fixação, vidros, equipamento de captura e
instrumentos para a taxidermia (Larsen, op.cit.).
Uma outra categoria de material necessário para praticamente todos os
ramos da história natural citados acima são os artefatos para o registro visual dos
objetos naturais, o que antes do advento e popularização da fotografia, era

11
realizado através de desenhos manuais. Nas palavras de Drouin (1998: 151), um
desenhador (.. .) é essencial em qualquer expedição científica. Por outro lado,
algumas modalidades dehtro da História Natural, como taxonomia vegetal por
exemplo, não sofreram mudanças significativas em relação ao método de registro
visual por conseqüência do surgimento da fotografia, continuando o desenho a
mão livre o modo mais usado.
A equipe que realizaria uma Viagem também apresenta algumas
características. A figura do viajante-naturalista, por exemplo, representava a
ligação entre as colónias e os museus, hortos e jardins botânicos das metrópoles
(Kury, op.cit.). Além disso, mais do que um aventureiro que parte para o
desconhecido, o viajante carrega uma missão pré-definida e com um destino
conhecido. O explorador sabia o que estava indo procurar antes de sua partida
(Bourguet, op.cit.). Em outras palavras, seus integrantes carregavam um
conhecimento prévio das circunstâncias da prática viagem.
Os naturalistas geralmente abrangiam um vasto conhecimento de diferentes
vertentes da História Natural em suas formações profissionais. Um ponto que
merece menção se refere aos estudos antropológicos, que estavam vinculados à
Zoologia até meados do século XIX, e portanto não deixavam de representar uma
vertente da História Natural.
As condições do regresso do naturalista também são dignas de atenção. Ao
longo do século XVIII, foram inúmeras as viagens sem regresso. Eram comuns
naufrágios, mortes por doenças ou por disputa com povos de outra cultura. De tão
longas as viagens e precárias as condições de envio de correspondências, muitas
vezes o naturalista era conservado em um estado de ignorância em relação à
situação política da sua terra natal.
Ao regressar, este naturalista poderia encontrar, por exemplo, a sua nação
em guerra, ao invés de uma recepção de boas vindas. O regresso da Viagem
Científica longa pode conter ainda outras surpresas desagradáveis, como a
dificuldade de interpretação do trabalho do naturalista, tão importante e nobre no
momento da partida, e que por vezes perde o sentido após os anos de ausência e
distância (Bourguet, op.cit.). Como veremos no Capítulo 11, algo semelhante

12
aconteceu com a Comissão Científica, que no momento de sua criação detinha
apoio popular, porém na ocasião de seu regresso, apresentaria sua história de
modo controverso.
A escolha dos nomes dos naturalistas envolvia também fatores sociais e
políticos, além dos científicos e profissionais. Geralmente, estas pessoas faziam
parte do cenário político de seu país, ou melhor dizendo, compunham as elites
dirigentes, e alguns destes escolhidos não apresentavam uma carreira de
naturalista consolidada, o que só aconteceria após o retorno da Viagem, quando
os dados recolhidos renderiam trabalhos científicos.
Além dos naturalistas, a equipe de Viagem era composta de ajudantes,
técnicos e homens responsáveis pelo registro iconográfico.
A literatura presente no preparo das Viagens Científicas é composta por
Instruções de Viagens e correspondências trocadas nesta fase. Através das cartas
e ofícios, podemos constatar as negociações que envolvem a escolha dos nomes
dos naturalistas integrantes da Viagem, o seu destino e outras particularidades,
além das encomendas de equipamentos e livros.
As Instruções de Viagem apresentam outros diversos aspectos históricos. A
demanda por Instruções de Viagem tornou-se evidente no século XVIII, devido à
ausência de sistematicidade das observações feitas pelos naturalistas nas
expedições. Tentou-se excluir o fator subjetivo do olhar do naturalista, que tornava
pessoal o relato de viagem, deixando-o vulnerável à interpretações diversas, corno
conseqüência de uma padronização que as instruções passaram a exigir,
tornando o mais homogêneo possível o olhar do naturalista (Kury, 1998). Em
outras palavras, as Instruções buscavam, acima de tudo, diminuir a tensão entre o
sujeito observador e o objeto observado.
Busca esta presente nas primeiras Instruções de Viagens, escritas por
Henrique André Nordblad, aluno de Linneo, em 1759, lnstructio peregrinatoris
(Brigola, 2000), onde há descrições das qualidades necessárias aos viajantes do
ponto de vista físico e intelectual (Bilbao, 1991), em uma tentativa de
homogeneizar o próprio naturalista. As Instruções de Nordblad, de certa forma,
foram base para muitas das Instruções de Viagem que surgiram posteriormente.

13
As características que o naturalista deveria possuir continuaram presentes em
Instruções posteriores, como é o caso por exemplo do Compêndio de
observações... , publicado por José Antônio de Sá em 1783, em Portugal.
Trocando em miúdos, o naturalista deveria apresentar um conjunto de qualidades,
que englobariam por exemplo condições de saúde, que o capacitaria à realizar
exercícios físicos, além de um rigor intelectual amplo e conhecimento profundo do
Latim, para a classificação das espécies (Larsen, op.cit.).
Acima de tudo, as Instruções de Viagem eram instrumentos de controle
essenciais para a produção do conhecimento científico da época, pois tomavam
possível o acompanhamento das Viagens de dentro dos gabinetes europeus. Por
conseqüência, apresentavam forte visão centralizadora das ciências, pois definiam
qual o conhecimento que deveria ser produzido, e até o que e como determinado
objeto científico deveria ser observado. Elaboradas nos museus de História
Natural, as Instruções orientavam sobre quais os produtos naturais e industriais a
serem recolhidos e como deveriam ser preparados, os locais a serem percorridos,
as observações etnográficas que deveriam ser feitas, a produção de diários de
viagem e desenhos, enfim, abordavam todo o instrumental teórico e prático das
Viagens. Além disso, o surgimento das Instruções permitiu também colocar em
evidência o trabalho preparatório da Viagem, anterior ao campo, ampliando a
visão do naturalista viajante somente como homem de campo, como veremos a
seguir.
Em meados do século XVIII, Portugal, acompanhando todo o movimento da
Filosofia Natural da época, delineou as estratégias das suas Viagens de
exploração. Entre outras medidas tomadas envolvendo este processo, foram
traduzidas e adaptadas Instruções para as Viagens. Sinalizada pela reforma da
Universidade de Coimbra (1772), a adesão de Portugal às ciências modernas, que
incluíam a Filosofia Natural, consolidaria um novo contexto político institucional.
Instituições como a Academia de Ciências (1779) e o Real Museu e Jardim
Botânico da Ajuda, em Lisboa tornaram-se centrais na implementação dos
projetas de catalogação geral das condições naturais e econômicas de Portugal e
suas colônia (Cardoso, 1991).

14
No ano de 1781, os naturalistas do Real Museu de Ajuda redigiram o
Método de recolher, preparar, remeter, e conservar os produtos naturais seguindo
do plano, que tem concebido, e publicado alguns naturalistas, para o uso dos
curiosos que visitam os sertões, e costas do mar (Aimaça, 1993), Instruções que
permaneceram manuscritas. Em muitos pontos, este manuscrito coincide com as
Breves instruções aos correspondentes da Academia das ciências de Lisboa
sobre as remessas dos produtos, e notícias pertencentes a Historia da Natureza,
para formar um Museu Nacíonaf, preparadas pela Academia de Ciências de
Lisboa.
Estas Instruções acima citadas abrigavam o objetivo de buscar produtos do
Reino de Portugal e de suas colônias para a formação de um Museu Nacional,
bem como o adiantamento das artes, Comércio, Manufaturas e todos os mais
ramos da Economía 7, e continham uma tabela explicativa de como deveria ser
elaborado um diário de campo, reforçando a idéia de padronização do olhar do
naturalista. De um modo geral, as Viagens Filosóficas da segunda metade do
século XVIII, organizadas por Domingos Vandelli, seguiram as Breves Instruções,
ou adaptações próximas (Pataca, 2001).
As Breves Instruções foram usadas também como modelo para a
elaboração, no Museu Nacional do Rio de Janeiro, das instruções luso-brasileiras
do século XIX, inclusive a Instrução para os viajantes e empregados nas colónias
sobre a maneira de colher, conservar e remeter os objetos de historia naturaf.
Estas Instruções concretizaram o ideal de funcionamento e organização do Museu
Nacional (Lopes, op.cit.), criado em 1818 no Rio de Janeiro, como será discutido
adiante.
Como gênero literário, a autoria e o público das Instruções eram
determinantes das suas particularidades. Por exemplo, as Breves Instruções,
usadas no século XVIII, foram elaboradas por diversos naturalistas da época,

6
Lisboa: Regia Oficina Tipográfica (1781).
7
Breves Instruções, 1781: 3-4. Agradeço à Ennelinda Pataca por me ceder este material
8
Arranjada pela administração do Real Museu de História Natural de Paris, traduzida do original
francês impresso em 1818, aumentada em notas das instruções aos correspondentes da Academia Real das
Ciências de Lisboa, impressas em 1781, e precedida de algumas reflexões sobre a história natural do Brasil e
estabelecimento do Museu e Jardim Botânico na corte do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Impressão Régia,
1819.

15
dirigidas para os correspondentes da Academia de Ciências de Lisboa que se
encontravam nas colónias portuguesas, não necessariamente versados em
História Natural. Isto fez com que se éonfigurasse um texto detalhado e minucioso
nas orientações sobre métodos e técnicas de observar, coletar, preparar e remeter
produtos de história natural para a metrópole. Já as Instruções usadas na
Comissão Científica apresentam outras particularidades e características, cujos
detalhes serão vistos no próximo Capítulo.

Terminada esta fase de preparo, a Viagem Científica em si pode enfim se


realizar.

1.2. A Viagem pelo território.

Um primeiro aspecto relacionado ao deslocamento no território,


característico da Viagem, diz respeito ao transporte utilizado. O meio de transporte
dos viajantes dos séculos XVIII e XIX na maior parte das vezes era o navio. Esta
informação, mais do que óbvia, ganha especial interesse se pensarmos que estes
navios representavam verdadeiras bibliotecas e laboratórios. Dentro deles
encontrávamos

instrumentos de medição e observação, aparelhos para


análises químicas, microscópios para examinar minerais,
plantas e animais e uma biblioteca contendo relatos de
viagem, mapas, catálogos classificatórios de fauna e flora
(Lisboa, op.cit.: 36).

Além disso, os navios carregavam as Instruções de Viagens, todo o


material para coleta e conservação dos objetos naturais e a equipe de viajantes.
Outro componente desta fase da Viagem é a literatura produzida. A
literatura da Viagem propriamente dita engloba os diários de campo, e como não
poderia deixar de ser, as correspondências.
Os diários são um material importante de análise dentro da literatura de
Viagens. Como bem coloca Bourguet (op.cit.: 230-231):

16
Cheios de apreciações e de observações sábias, de
pormenores, de datas e de lugares, estes diários são um
primeiro trabalho de registro, o mais isento e completo
possível, e, todavia, constituem já o primeiro critério de
seleção do conjunto dos fatos e das experiências do dia.

Os diários são mais completos em informações e detalhes do que se


comparados com os relatórios de Viagem ou publicações posteriores ao retorno
do naturalista, pois esta literatura posterior passa por um processo de triagem de
seu conteúdo, para que estes documentos preencham alguns requisitos de uma
literatura científica objetiva. Já os diários, mais do que os relatórios e menos do
que as correspondências, deixam claro as localizações do relato de Viagem no
espaço e no tempo, delimitando a distância entre o autor e o leitor, tornando claro
que ambos pertencem a quadros culturais diferentes (Torodov, 1999).
Tão ricas quanto os diários de Viagem são as correspondências dos
naturalistas. Sejam elas pessoais ou oficiais, as cartas contêm uma massa de
detalhes muito valiosos. É possível, por exemplo, traçar as conexões entre os
indivíduos através do grau de formalidade com que estes personagens se tratam
(Outram, 1980). Dentro de estudos de caso específicos, as correspondências
mostram os bastidores da história conhecida, revelando uma outra história por
vezes mais palpitante do que as palavras oficiais revelam.
Durante uma Viagem Científica, é comum a troca de correspondências
entre o empregado e o empregador. Estas cartas, além dos fatos sobre a missão
desempenhada pelo naturalista, comumente contém dizeres pessoais e
informações adicionais muito ricas. No outro extremo, as correspondências
pessoais também trazem informações sobre o dia a dia e as atividades do
naturalista durante a sua Viagem Científica.

Após a fase do deslocamento no território, a Viagem Científica também


apresenta um trabalho pós atividade de campo característico, que veremos a
seguir.

17
1.3. O trabalho após o campo:

Ao retornar da Viagem de Exploração, o naturalista trabalha sobre os seus


dados e objetos naturais recolhidos durante o seu desiocamemto, produzindo uma
literatura específica, composta de memórias, relatórios e correspondências. Além
disso, naturalistas e técnicos permaneceriam envolvidos com o preparo da
coleção recém chegada, que inclui os processos de fixação, organização e
catalogação do que foi coletado. Como coloca Drouin (op.cit.: 155):

Viagens e coleções aparecem assim como dois pólos da


História Natural. Contudo, entre estes dois pólos, nada se
passaria se não tivesse havido o trabalho de nomear e de
classificar todos os espécimes fornecidos.

Esta ligação entre a Viagem e as coleções é essencial para a produção de


um saber sobre o vivo (idem). O acervo de um Museu de História Natural abriga
pelo menos dois objetivos: o de exposição ao público e o da pesquisa científica.
No que diz respeito aos estudos envolvendo as coleções, Restrepo (1993)
destaca, por exemplo, o desenvolvimento de remédios originados de plantas
trazidas das Viagens para os Museus. No ramo zoológico, temos os estudos de
Anatomia Comparada, e na Mineralogia, as análises químicas, entre outras
atividades possíveis de serem realizadas usando o material coletado.
Geralmente, esta terceira fase da Viagem Científica é a mais duradoura. Os
naturalistas trabalhariam com os objetos trazidos muitas vezes até o resto de suas
vidas. Como foi o caso de Alexander von Humboldt. Nascido em 1769, Humboldt
embarcou para a Venezuela em 1799 em companhia de La Condamine. Realizou
excursões por diversos pontos da América do Sul, voltando para Paris em 1804.
Uma Viagem Científica de cinco anos rendeu uma exposição de plantas no Jardin
desPlantes, e a fama adquirida pelo naturalista de "enciclopédia ambulante". A
enciclopédia não se restringiria apenas à fama: Humboldt produziu uma obra de
trinta volumes versando sobre a sua Viagem, que foram escritos entre os anos de
1805 e 1825 (Pratt, 1997).

18
Outro exemplo de naturalista que trabalharia até o fim da vida com os
resultados de sua Viagem é Johann Emanuel Pohl9 . Pohl veio para o Brasil em
1817, permanecendo aqui por mais de quatro anos. Ao regressar, entre os anos
de 1827 a 1831, elaborou a Plantarum Brasiliae ícones et descriptiones, contendo
a descrição de pelo menos quatro mil espécies de plantas. Este material viria
compor o Real Museu Brasileiro em Viena, e as duplicatas foram distribuídas para
diversos Museus europeus. Pohl faleceu em 1834, poucos anos após o seu
retorno à pátria e a publicação de sua principal obra (Ferri, 1976).

Terminada esta breve caracterização das Viagens Científicas, partiremos


agora para os fatos e histórias que envolveram a Comissão do Ceará, presente na
historiografia, caracterizando seus integrantes, Instituições que a ampararam,
atuação e resultados.

9
Doutor em medicina pela Universidade de Praga, desenvolveu intensos estudos sobre a flora da
Bohemia (Ferri, 1976).

19
CAPITULO 2: A COMISSÃO CIENTÍFICA DE EXPLORAÇÃO

Em 1856, na Sessão Ordinária de 30 de maio do IHGB, com a presença de


Sua Majestade o Imperador D. Pedro 11, o naturalista Manoel Ferreira Lagos
finalizou a leitura de sua análise, redigida no ano anterior, sobre a Viagem do
Conde Francis de Castelneau pelo interior do Brasil. No olhar de Lagos,
Castelneau cometeu numerosos erros, inventou fatos e até mesmo mentiu no livro
de sua Viagem (Figueirôa, 1996). O descontentamento em relação ao retrato do
Brasil feito por estrangeiros incomodava os personagens que compunham o
quadro científico nacional, como veremos adiante. Logo em seguida, na mesma
reunião, Ferreira Lagos oficializa uma proposta para se organizar uma Comissão
que seria responsável por uma viagem de exploração ao interior do Brasil, para
ser realizada exclusivamente por naturalistas brasileiros, e representaria a
primeira iniciativa do gênero:

Propomos que o IHGB se dirija ao governo imperial pedindo-


lhe haja de nomear uma comissão de engenheiros e de
naturalistas nacionais para explorar algumas das
províncias menos conhecidas do Brasil, com a obrigação de
formarem também para o Museu Nacional uma coleção de
produtos dos reinos orgânico e inorgânico, e de tudo quanto
possa servir de prova do estado de civilização, indústria,
usos e costumes dos nossos indígenas (grifos meus) 10.

As províncias referenciadas acima eram as províncias do norte e nordeste


brasileiro. A proposta foi aprovada no mesmo dia. Na reunião de 13 de junho do
mesmo ano, o ministro do Império Sr. Visconde de Sapucahy, encaminhou o ofício
anunciando que o governo acolheu a proposta, compenetrado das vantagens que
podem resultar dos trabalhos da referida comissão11, e encarrega o IHGB de
indicar os nomes das pessoas habilitadas para desempenhar as funções da

10
RIHGB (1856: 12). Agradeço à Prof. Silvia Figueirõa por me ceder o material do Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro.
11
RIHGB (1856: 18).

20
Comissão. Estava formada então a Imperial Comissão Científica, também
chamada de Comissão Exploradora das Províncias do Norte, chamada pelos seus
integrantes apenas como Científica. Posteriormente, ficou também conhecida
como Comissão do Ceará, e pejorativamente como Comissão Defloradora e das
Borboletas.
A Científica organizou-se em cinco seções, que abrangiam cinco áreas
específicas da história natural. Manoel Ferreira Lagos, o porta-voz da proposta,
assumiu o posto de diretor da Seção Zoológica da recém criada Comissão. As
outras quatro Seções eram as seguintes: Botânica; Geológica e Mineralógica;
Astronómica e Geográfica; e Etnográfica e Narrativa da Viagem; dirigidas por
Francisco Freire Allemão, Guilherme Schüch de Capanema, Giacomo Raja
Gabaglia e Antônio Gonçalves Dias respectivamente. Cada diretor de Seção ficou
encarregado de escrever as Instruções de Viagem da sua própria seção. Porém,
as Instruções da Seção Astronómica e Geográfica e Etnográfica e Narrativa da
Viagem foram excepcionalmente redigidas pelo conselheiro Cândido Batista de
Oliveira e Manoel de Araújo Porto Alegre respectivamente, pois os diretores de
ambas as Seções, Raja Gabaglia e Gonçalves Dias, encontravam-se fora do país.
Além disso, foram redigidas Instruções gerais para a Comissão Científica pelo
Ministro do Império Sérgio Teixeira de Macedo (Braga, op.cit.). Aproveitando a
permanência de Gonçalves Dias e Raja Gabaglia na Europa, ambos foram
encarregados da compra de instrumentos e livros que seriam úteis à Comissão
Científica. Francisco Freire Allemão, além de encarregado da Seção Botânica,
também ocupou o cargo de Presidente da Comissão.
Além dos diretores das Seções, a Comissão Científica contava ainda com a
presença do pintor formado na Escola de Belas Artes e condiscípulo de Manuel de
Araújo Porto Alegre, José Reis de Carvalho, e adjuntos para cada Seção. Eram os
adjuntos Manuel Freire Allemão- sobrinho de Francisco Freire Allemão, também
chamado de Freirinha; João Martins da Silva Coutinho - que viria a ser o guia e
conselheiro da expedição de Agassiz ao Amazonas após retornar das atividades
da Comissão Científica, onde colaborou com Guilherme de Capanema na Seção
Geológica; João Pedro e Lucas Antônio Vila-Real - naturalistas preparadores que

uNICAMP
21 BIBLIOTECA CENTRAL
- - - ' : f - - · - - · · · ..... - -
conservaram os animais coletados pela Seção Zoológica; Capitão Agostinho
Victor de Borja Castro e os Primeiros Tenentes Antônio Alves dos Santos Sousa,
Francisco Carlos Lassance Cunha, João Soares Pinto, Caetano de Brito de Sousa
Gaioso e Basílio Antônio de Siqueira Barbedo - todos componentes da Seção
Astronômica e Geográfica, a mais numerosa das cinco; e Francisco de Assis
Azevedo Guimarães- requisitado por Gonçalves Dias após o início das atividades
da Comissão Científica.

2.1. A Comissão do Ceará e as instituições científicas do século XIX:


elos pessoais e institucionais

No período de 1840 a 1870 (Dantes, 1988), instituições científicas imperiais


como o Museu Nacional e o IHGB ganharam relevância no quadro científico
nacional, assim como refletiram diretamente o ideal do progresso brasileiro. E
como veremos adiante, este processo é coincidente à implantação dos dois
primeiros regulamentos do Museu Nacional. Esta instituição, juntamente com o
IHGB, a Sociedade Velosiana e a Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional,
seria o pólo aglutinador de tal processo. A SAIN, por exemplo, buscava
impulsionar o desenvolvimento do Brasil através de uma indústria nacional que
empregasse mão de obra livre e assalariada, e para tanto, seria necessário um
conhecimento sobre os usos das riquezas naturais brasileiras.
Assim, tem-se no século XIX a emergência de uma comunidade científica,
estabelecendo redes de apoio para as crescentes atividades científicas,
juntamente com os interesses do Estado e de particulares. Estes elementos
integram conjuntamente o processo de institucionalização das ciências no Brasil.
No sentido de aprofundar a sua compreensão, cabe aqui fazer um breve
mapeamento destas redes, que não se apresentam de modo único, mas sim
compostas de várias filiações políticas e intelectuais, que se intercomunicam e se
complementam, estabelecendo elos políticos, científicos e pessoais entre os
integrantes da Comissão Científica e outros personagens do quadro científico e
político nacional. Vejamos agora como as principais instituições envolvidas com a
Científica se integram nessas redes.

22
2.1.1. O Museu Nacional como palco da emergente Comunidade
Científica brasileira
Os fortes laços entre o contexto da criação da Comissão Científica e o
Museu Nacional do Rio de Janeiro são explícitos. Já na fala de Ferreira Lagos,
durante a proposta de formação da Comissão Científica, o objetivo de coletar os
produtos naturais e artificiais para abastecer o Museu Nacional é destacado.
O Museu Nacional foi criado em 1818. A sua construção está diretamente
relacionada a vinda da família real para o Brasil. Dentro da periodização
relacionada à dinâmica de funcionamento do Museu Nacional construída por
Lopes (op.cit.), a fase do Museu Nacional de maior interesse para o presente
assunto se estende de 1842 a 1870, período que abriga a iniciativa, idealização e
atuação da Comissão Científica. A autora localiza neste período também a
consolidação de urna comunidade científica brasileira, e como veremos, o Museu
Nacional estava pondo em prática o seu novo ideal de funcionamento. Como bem
coloca Sá (2001: 900):

A afirmação da comunidade científica brasileira começou a


se definir a partir de movimentos liderados por alguns doutos
cientistas que, pressionando por uma política mais agressiva
do governo em relação à reformulação das instituições
científicas e ao apoio a cientistas nacionais, criaram um
cenário propício ao desenvolvimento de velhas e novas
disciplinas ligadas às ciências e à formação de especialistas
brasileiros que se tomaria referência mundial.

Como veremos a frente, Capanema seria um desses especialistas. Na


realidade, tais planos de projeção de uma carreira internacional faria parte dos
objetivos dos demais naturalistas da Comissão, sendo que ela própria seria peça
fundamental de todo o processo.
Do ponto de vista político, lglésias (1976) localiza nos anos iniciais da fase
do Museu Nacional citada acima o preparo para a mais longa fase da história

23
politica brasileira, que é o segundo reinado. Este momento, segundo o autor, seria
caracterizado pelo amadurecimento do poder imperial, já que em 1848 os
conservadores sobem plenamente ao poder, sob a presidência de Pedro de
Araújo Lima (Visconde de Olinda), após 5 anos de domínio dos liberais.
Durante esta fase, o Museu Nacional possuiu quatro diretores: Custódio
Alves Serrão (1842-1847), Frederico Leopoldo César Burlamaque (1847-1866),
Francisco Freire Allemão (1866-1874) e Ladislau de Sousa Melo Neto (1875-
1893), sendo que os três últimos contaram com a indicação direta do governo para
assumir o cargo. Estes personagens colocaram em prática o novo ideal de
funcionamento do Museu Nacional, iniciado com o então novo regulamento de 03
de fevereiro de 1842 (Lopes, op.cit.). Mais diretamente relacionados a Comissão
estão Burlamaque, diretor do Museu na época da formação da mesma, e Freire
Allemão, que como já foi visto, foi presidente da Científica e coordenou seus
trabalhos que abrangiam a botânica. Além destes, veremos que vários integrantes
da Científica apresentaram laços institucionais com o Museu Nacional, ou antes,
ou após suas atividades.
O regulamento de 1842 dividiu o Museu em quatro seções: 1a) Anatomia
Comparada e Zoologia; 2a) Botânica, Agricultura e Artes Mecânicas; 3a)
Mineralogia, Geologia e Ciências Físicas e 4a) Numismática e Artes Liberais,
Arqueologia, Usos e Costumes das Nações Modernas. Além disso, estipulou que
cada seção teria um Diretor responsável, e de acordo com a necessidade adjuntos
e ajudantes. Estes seriam cargos oficiais do Museu com salários, juntamente
como os cargos de Diretor Geral e Secretário.
O novo ideal de funcionamento presente no regulamento de 1842 buscava
tornar o Museu Nacional um espaço privilegiado para a articulação do olhar dos
naturalistas, como eram os museus europeus. Na prática, buscou-se por
diferentes meios a formação de um acervo de objetos naturais, principalmente
brasileiros, pois segundo vários naturalistas estrangeiros que visitaram o Museu, e
mesmo naturalistas nacionais, a falta de objetos que demonstrassem a variedade
natural do Brasil consistia uma grande deficiência do Museu. Este foi exatamente

24
um dos argumentos usados na proposta da Comissão. Além disso, as coleções já
existentes eram consideradas pelos mesmos em mal estado de conservação.
Esta foi a opinião do Conde de Castelnau, em 1844, do botãnico inglês
Gardner, em 1846, e daquele que seria o Diretor do Museu de História Natural de
Buenos Aires a partir de 1862, Hermann Burmeister, em 1850 na ocasião de suas
visitas à Instituição (Lopes, 1993).
Foram tomadas várias iniciativas para aprimorar o funcionamento do Museu
e melhorar as suas coleções. Dentre elas, a contratação de viajantes estrangeiros,
a formação de comissões temporárias, como a Comissão Científica de
Exploração, o intercâmbio com outros museus do Brasil e do mundo, e até ordens
oficiais para os Presidentes das províncias remeterem objetos de história natural
de suas províncias para o Museu, além da contratação de técnicos e homens da
ciência especializados na conservação, classificação e reclassificação dos
objetos, já que as normas conceituais de classificação estavam em constante
modificação em meados do século XIX. Com estas medidas, buscava-se suprir as
necessidades do Museu citadas anteriormente: aumentar e conservar melhor as
coleções, sendo prioritária a criação de um acervo com objetos nacionais. A
importância de tais objetos seria evidenciada na primeira Exposição científica
organizada no Museu, em 1861, justamente com o material trazido pela Comissão
do Ceará.
As relações entre o Museu Nacional e outras instituições científicas e de
ensino também são numerosas, e interferiram diretamente na implantação do seu
novo ideal de funcionamento. Uma de suas salas era ocupada pela Sociedade
Auxiliadora da Indústria Nacional e pelo Instituto Fluminense de Agricultura. As
salas e coleções também eram usadas para cursos ministrados por professores
da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, Escola Central, Escola de Medicina,
Imperial Colégio Pedro 11, entre outras instituições.
Em relação aos intercâmbios internacionais, o Museu Nacional neste
período trocou informações e material com o Instituto Escola Teórico - Prático
d'Agricultura, da Quinta Normal de Santiago do Chile. Também foi remetido ao
longo do século material para o Uruguai, Estados Unidos, Alemanha e França

25
(Lopes, 1997, op.cit.). Na segunda metade do século XIX, o Museu Nacional
realizou exposições nacionais, à moda dos museus europeus, e se integrou na
dinâmica das exposições universais, muito em voga nas instituições européias da
época.
Os elos institucionais entre a Comissão Científica de Exploração e o Museu
Nacional são explícitos no histórico profissional de alguns de seus integrantes.
Mas estes também conviviam dentro de outros espaços institucionais que não o
Museu Nacional, além de apresentarem ligações sociais entre si. Vejamos então
quem eram os naturalistas e quais as instituições que corporificavam os elos entre
a Comissão Científica e o Museu Nacional, usando como ponto de partida uma
breve biografia de um personagem central na história da Científica, e suas
comunicações com o restante da rede que envolveu a Comissão:
Guilherme Schüch de Capanema (1824- 1906) ocupou o cargo de Diretor
Adjunto da Seção de Geologia e Mineralogia do Museu Nacional a partir do ano de
1849 até 1876. Frederico Burlamaque, presidente do Museu Nacional no momento
da formação da Comissão Científica, era amigo íntimo de Guilherme de
Capanema. Ambos tinham interesses em mineralogia, e Lopes (op.cit.) afirma que
durante a diretoria geral de Burlamaque (1847-1866) no Museu, que coincidiu com
a gestão de Capanema como responsável pela Seção de Geologia e Mineralogia
na Instituição, esta apresentou o seu momento mais dinâmico até então na história
do Museu Nacional. Capanema, por influência e pedido de Burlamaque, iria à
Bahia no seu trajeto para o Ceará estudar terrenos que possivelmente continham
potencial mineralógico de acordo com algumas amostras da região existentes na
coleção do Museu Nacional.
Além da amizade com Burlamaque, Guilherme de Capanema tinha laços
familiares com Manoel de Araújo Porto Alegre 12, autor das Instruções da Seção
Etnográfica e Narrativa da Viagem da Comissão Científica, como já mencionado, e
diretor da Seção de Numismática e Artes Liberais, Arqueologia, Usos e Costumes

26
das Nações Modernas do Museu Nacional entre 1854 e 1859 e cunhado de
Capanema. Porto Alegre e Capanema mantinham intensa correspondência,
inclusive muitas cartas tratavam sobre assuntos pessoais relacionados a Antônio
Gonçalves Dias, com quem ambos mantinham grande amizade. Dias também era
professor de latim no Colégio Pedro 11 e padrinho de Henriqueta, filha de
Capanema.
As amizades de Guilherme de Capanema atingiam os mais altos cargos
sociais e políticos dentro da corte. Filho de Roque Schüch de Capanema,
bibliotecário e conservador do gabinete de História Natural da Imperatriz
Leopoldina, Guilherme foi amigo de infância do Imperador Pedro 11.
Capanema nasceu em Minas Gerais, estudou na Bergakademie Freiberg,
centro referencial em Mineralogia da época e famosa pela atuação de Abraham
Gottlob Werner13 (1749-1817). De volta ao Brasil, doutorou-se em Ciências
Físicas e Matemáticas pela Escola Militar do Rio de Janeiro, instituição que
manteve laços com o Museu Nacional nas suas atividades educacionais, inclusive
após tomar-se Escola Politécnica. Capanema foi também sócio muito ativo do
IHGB, instituição que sempre contou com o apoio decisivo de seu amigo, o
Imperador. Em 1858, foi engenheiro chefe da estrada de ferro que ligaria Niterói a
Campos. Após chefiar a Seção de Geologia da Comissão Científica em 1856, foi
diretor geral dos Telégrafos Elétricos e recebeu as mais altas condecorações do
Império, como as da Ordem da Rosa, Major Honorário Titular do Exército,
Conselheiro do Imperador, além da Ordem de Cristo (Lopes 1997, op.cit.;
Figueirôa, 1997):

Sabes que vão finalmente ser recompensados os meus


serviços de uma maneira condigna? Lembrou-se o I. de me
dar o hábito de Cristo. Opõe-se a isso o Ministro, veremos no

12
Manoel de Araújo Porto Alegre (1806 -1879), que foi também diretor da Academia de Belas-Artes
entre 1854 e 1857, foi aluno de Debret e o acompanhou a Europa em 1831, onde idealizou e editou o
periódico Niterói -revista brasiliense de ciências, letras e arles (Pinassi, 1998), juntamente com Gonçalves de
Magalhães e Sales Torres-Homem. Editou também a MineNa Brasiliense e a Guanabara. Foi também lente
substituto de desenho da Escola Militar, vereador suplente na Câmara Municipal da Corte, cônsul geral na
Saxónia e representante da Legação de Lisboa, onde faleceu (Lopes, op.cit.).
13
Werner publicou em 1786 o livro Breve classif'teação e descrição das rochas, onde difundiu o termo
geognosia fundado por ele. Suas teorias iniciaram a separação entre geologia causal e geologia histórica
(Laudan, 1987; Gohau, 1987).

27
Em 1862 fundou uma sociedade de engenheiros, que viria a ser o Instituto
Politécnico Brasileiro, da qual foi presidente, e Raja Gabaglia, chefe da Seção
Astronómica da Comissão Científica, foi primeiro secretário, como está relatado
em correspondência a Dias:

Eu não sei se já te mandei dizer que tive a honra de ser o


fundador de uma Sociedade de Engenheiros de que por hora
sou Presidente, tenho por Vice -Presidente o Bellegardi e
por 1° Secretário Giacomo Raja Gabaglia! Estou adquirindo
popularidade, e preciso dela, senão mo"o de caçoadas do
governo da minha terra 15•

Como pode ser visto, Capanema faz parte de uma geração de naturalistas
brasileiros do século XIX que exerceu intensa atividade científica e social.
Apresentou na sessão ordinária do IHGB de 24 de novembro de 1854 o artigo
Quais as tradições ou vestigios geológicos que nos levam à certeza de ter havido
terremotos no Brasil, publicado no tomo XXII da Revista do IHGB de 1859. Propôs
em 1850, junto com Francisco Freire Allemão, a criação da Sociedade Velosiana,
objetivando aumentar os estudos sobre a História Natural do Brasil, sendo diretor
da Comissão Permanente de Mineralogia da Sociedade.
Em 1858, escreveu as Apostilas de Mineralogia destinadas ao ensino. Em
1865, portanto na época de penmanência da expedição de Louis Agassiz no Brasil,
Capanema ministrou uma lição popular, com o título Decomposição dos Penedos
no Brasil, de linguagem fácil. O objetivo de Capanema era divulgar a sua opinião
contrária à ocorrência de glaciação nos primórdios do Brasil, cujo defensor era o
próprio Agassiz. Segundo a interpretação de Capanema, o que Agassiz julgou ser
produto da glaciação, nada mais era do que ação do intemperismo na
decomposição do terreno. Capanema chegou a comparar o processo de
cristalização com o endurecimento de uma calda de açúcar para facilitar a

14
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (op.ctt.: 317). Carta n• 266 para Dias. S/1, 07/04/1864.
15
Capanema, in: Anais da Biblioteca Nacional (op.cit: 273). Carta n° 226 para Dias. Rio de Janeiro,
25/11/1862.

28
compreensão pelo público leigo. A partir de 1874, Capanema parece se dedicar
exclusivamente à Diretoria da Repartição Geral dos Telégrafos, que havia
assumido em meados da década de 60 (Figueirôa, 1997, op.cit.). Também
realizou estudos envolvidos com a Sociedade Velosiana e identificou a presença
de cádmio pela primeira vez no Brasil, em amostras de sulfureto de zinco
originárias do Ceará e depositadas no Museu Nacional, além de descrever um
novo gênero vegetal. Capanema publicou estes seus estudos no periódico
Guanabara.
A Sociedade Velosiana, fundada em 1850, representou a construção de
outro espaço de sociabilidade científica entre os naturalistas integrantes da
Comissão do Ceará. Foi também uma das instituições científicas que apresentou
fortes laços com o Museu Nacional e tem especial importância no presente
estudo. Suas reuniões aconteciam nas salas do Museu por autorização do
governo, desde a criação da Sociedade em 1850. Dos quinze sócios iniciais da
Sociedade Velosiana, alguns nomes já foram citados neste estudo, como
Francisco Freire Allemão, Guilherme de Capanema, Frederico Burlamaque e
Custódio Alves Serrão16 .
O naturalista Francisco Freire Allemão foi seu grande idealizador e
presidente, e pretendia reunir periodicamente naturalistas com uma certa
experiência para discutir assuntos exclusivamente relacionados à história natural,
bem como a organização interna da Sociedade. A criação da Sociedade
representa o início de uma separação institucional entre a História Natural e as
outras ciências, como a História e a Geografia. Em outras palavras, a ciência
começaria a funcionar em áreas especializadas, o que também pode ser
interpretado como um aspecto importante no surgimento e consolidação de uma
comunidade científica (Figueirôa, 1997, op.cit.; Lopes, 1997, op.cit.). Os
integrantes da Sociedade Velosiana encontravam-se periodicamente para discutir
as atividades científicas realizadas por eles ou por algum outro naturalista, fosse
ele nacional ou não.

16
Os outros sócios iniciais eram Cândido de Azeredo Coutinho, Alexandre Antônio Vandelli, Luis
Riedel, Bernardo José de Serpa Brandão, Emílio Joaquim da Silva Maia, Teodoro Descourtilz, Antônio Manuel
de Melo e Inácio José Mafia, mais três adjuntos.

29
As dificuldades da existência da Sociedade Velosiana foram retratadas por
Francisco Feire Allemão, em um discurso proferido por ele em 1872, na ocasião
da tentativa de fazer renascer a Sociedade:

As primeiras reuniões foram concorridas e afervoradas, e


nelas se apresentaram alguns trabalhos; mas não tardou
muito que se zelo entrasse a arrefecer e a transpirar o vício
que nos inquinava, com o que a minha simplicidade não
contava; era não sei se ciúmes, se malquerenças, se
desconfianças entre alguns dos sócios; se com razão ou sem
ela não seP.

As malquerenças e ciúmes são em parte esclarecidas por Allemão logo


adiante, quando o naturalista fala dos impasses que nortearam a Velosiana, desde
a escolha de seu nome. A princípio, a homenagem ao botânico Frei Velloso não
foi bem aceita por um dos membros, o mesmo que entrou a tramar um meio de
acabar com a Sociedade, e aliciando mais outros que já preocupados, se
prestaram contentes, criou outra associação, revestiu-a com tanta pompa pode,
sendo seu intento anular a Velosiana desfalcando-a de seus cooperadores 18• Este
membro era Guilherme de Capanema, que em 1856 se desvencilhou da
Sociedade Velosiana e criou a Sociedade Palestra Científica, que de certa forma
se apresentava de modo progressista, em contraponto à visão tradicional presente
na Sociedade Velosiana. Enquanto os membros da Palestra Científica se
dedicariam às ciências físicas e matemática, pretendendo alcançar o
desenvolvimento de técnicas para promover a indústria brasileira, a Velosiana
buscaria um resgate dos naturalistas brasileiros do passado, além de um maior
conhecimento sobre a História Natural do Brasil. Talvez tenha sido esta diferença
da concepção de ciência o motivo central da disparidade entre os dois
naturalistas, Guilherme de Capanema e Freire Allemão (Lopes, 1997, op.cit.).
A Sociedade Velosiana ainda não mereceu estudos mais aprofundados. A
produção literária dos naturalistas, relacionada à Velosiana, foi publicada entre

17
Coleção Freire Allemão: Biblioteca Nacional, 1-28-9-80.
18
Coleção Freire Allemão: Biblioteca Nacional, 1-28-9-80.

30
1851 e 1855 no periódico Guanabara, revista artística, científica e literária, ainda
não estudado sistematicamente, que teve Manoel de Araújo Porto Alegre como
um de seus editores. O fim da Velosiana também não está esclarecido na
historiografia. Figueirôa (1997, op.cit.) atribui à criação da Comissão Científica de
Exploração, em 1856, como um possível fato que possa ter levado a Sociedade a
se desfazer, já que parte significativa dos seus membros estariam envolvido nos
trabalhos da Comissão Científica, e posteriormente se ausentariam do Rio de
Janeiro na Expedição para o Ceará.
Como foi o caso de Francisco Freire Allemão de Cisneiros, nascido em
1797 no Rio de Janeiro. Em 1822 iniciou seus estudos na Escola Anatômica,
Cirúrgica e Médica do Rio, para em 1829 começar os seus estudos em botânica
na Faculdade de Medicina de Paris, recebendo o título de Doutor em Medicina.
Como Guilherme de Capanema, Freire Allemão também era amigo pessoal do
Imperador, tanto que foi professor das princesas e médico da Casa Imperial. Foi
condecorado com a Ordem da Rosa, e como Cavalheiro de Cristo e da Ordem de
Francisco I de Nápoles.
A partir de 1833, tornou-se lente de Botânica da Faculdade de Medicina do
Rio de Janeiro, e em 1858, lente proprietário da cadeira de Botânica na ocasião da
reforma da Escola Militar em Escola Central, recebendo o título de major. No
momento da criação da Sociedade Velosiana e da Comissão Científica, Freire
Allemão já passava dos 50 anos de idade, e contava com um certo prestígio e
experiência dentro do quadro científico nacional e internacional. Por isso, além de
ter sido nomeado para o cargo de diretor da Seção Botânica da Comissão
Científica, ainda ocupou o cargo de presidente da mesma. Atualmente, Freire
Allemão é considerado um dos maiores botânicos brasileiros.
Em 1866, após a realização das atividades da Comissão Científica, Freire
Allemão foi nomeado Diretor do Museu Nacional, por indicação di reta do governo,
onde permaneceu até sua morte, em 1874 (Lopes, 1997, op.cit.; Altomani, 1998).
Freire Allemão escreveu sobre sistemática, fitologia, histologia e fisiologia
vegetal. Também deixou dez volumes de manuscritos inéditos, contendo diversos
desenhos. Apresentou nove memórias sobre plantas brasileiras na Sociedade

31
Velosiana só no ano de 1851. Sua Seção dentro da Comissão Científica foi uma
das mais dinâmicas, tendo produzido um longo relatório contendo vasta
iconografia, publicado no livro Trabalhos da Comissão Científica, em 1862.
Juntamente com Custódio Alves Serrão, Ladislau Neto e Saldanha da Gama,
Freire Allemão organizou o catálogo referente às plantas brasileiras que
integraram a segunda exposição universal, realizada em Paris no ano de 1866.
A participação de Freire Allemão e Capanema em cargos oficiais no Museu
Nacional nos remete a mais um elo que compõe a rede que está sendo descrita.
Manoel Ferreira Lagos (1816-1871), além de apresentar ligações com os dois
naturalistas por ser o chefe da Seção Zoológica da Comissão Científica, também
ocupou cargo de chefia no Museu Nacional.
Nascido no Rio de Janeiro, Lagos formou-se em Medicina nesta mesma
cidade. Após a realização das atividades da Comissão Científica, Lagos ficaria
responsável pela biblioteca de livros de ciências naturais do Museu Nacional, a
qual havia sido incrementada com a adição dos livros adquiridos pela Comissão,
chegando a quase 2000 exemplares. Logo após, foi nomeado diretor da Primeira
Seção de Zoologia e Anatomia Comparada do Museu Nacional, entre 1866, ano
em quem completou o catálogo da biblioteca, e 1871 (Lopes, 1993, op.cit.).
Anteriormente, Lagos já ocupava o cargo de adjunto da mesma seção. De certa
forma, estes dados mostram que sua carreira como naturalista ganhou força
através da Comissão Científica, já que de adjunto, tornou-se diretor da Seção do
Museu na qual trabalhava.
Lagos foi também secretário perpétuo do IHGB, tornando-se posteriormente
3° vice-presidente do mesmo instituto, além de ser oficial arquivista da Secretaria
dos Negócios Estrangeiros (Lopes, 1997, op.cit.). Segundo Braga (op.cit.), Ferreira
Lagos contava com a confiança de todos os ministros, por sua personalidade
altamente diplomática.
Ao retornar de suas atividades, Lagos esteve a frente da primeira
Exposição Nacional realizada no Museu Nacional em 1861, sobre a qual
falaremos adiante, o que também pode ter influenciado na sua promoção a Diretor
na mesma instituição.

32
A rede que entrelaça a comunidade científica no Brasil se estende com os
elos entre Lagos e Gonçalves Dias, chefe da Seção Etnográfica e Narrativa da
Viagem dentro da Comissão Científica: os dois trabalharam na mesma época na
Secretaria dos Negócios Estrangeiros.
Professor de História e Latim do Imperial Colégio Pedro 11, no Rio de
Janeiro, Gonçalves Dias ficou largamente conhecido como o responsável pela
explosão do indianismo no Brasil, mais intensamente presente no livro Ottimos
Cantos, publicado em 1951, e como criador da poesia nacional, adquirindo
também a competência de etnógrafo e lingüista (Sousa, 1976) após a Comissão
Científica.
Nascido em 1° de agosto de 1823, Gonçalves Dias estudou latim, francês e
filosofia. Em 1838, com apenas 16 anos incompletos, se dirigiu à Portugal para
freqüentar o curso de jurisprudência da Universidade de Coimbra, onde se tornou
bacharel em 1844. Em 1846, já no Rio de Janeiro, publicou seu primeiro livro de
poesias, Primeiros Cantos, e em 1848, publicou Segundos Cantos19 .
Apresentou no IHGB algumas memórias, dentre elas a mais importante,
considerada pelo próprio autor, Brasil e Oceania, onde comparou os caracteres
físicos, morais e intelectuais dos indígenas destas duas porções de mundo,
considerados no tempo da descoberta para deduzir destas comparações qual
deles oferecia mais probabilidade à civilização20.
Resta-nos apenas um chefe de Seção da Comissão Científica para ser
integrado à rede: Giacomo Raja Gabaglia. Este personagem apresenta elos com
Capanema, pois também foi formado na Escola Militar, além de ter sido primeiro
secretário da sociedade de engenheiros fundada por Capanema em 1862.
Giacomo Raja Gabaglia bacharelou-se em matemática no ano de 1853, após já ter
se tornado 2° tenente e nomeado lente substituto da Academia da Marinha. Na
ocasião da proposta da Comissão Científica em 1856, Raja Gabaglia estava na
Europa estudando hidráulica aplicada a portos e canais. Mesmo estando longe, o
IHGB o nomeou para diretor da Seção Astronômica e Geográfica da Comissão
Científica.

33
2.1.2. O IHGB, o Museu Nacional e a Sociedade Velosiana: elos entre a
ilustração e a construção da ciência nacional

A ciência brasileira do século XIX carrega uma característica marcante,


principalmente nas atividades científicas desenvolvidas entre 1820 e 1870, que é a
busca da especificidade nacional, algo que identifique e peculiarize a nação
brasileira frente às nações européias, que no caso seria a natureza brasileira e a
riqueza de seus recursos (Kury, 1998, op.cit.). Segundo Lisboa, a natureza
brasileira encantava praticamente todos os naturalistas viajantes europeus. Além
de encantar, a natureza simbolizava diversos aspectos:

(. ..)no relato desses viajantes a temática da 'natureza' não é


apenas 'fonte de emoções', mas também um meio para
compreender, interpretar e criar uma imagem de Brasil
(Lisboa, op.cit.: 23- Grifos da autora).

Lopes (1993, op.cit.) localiza por volta de 1840 uma tentativa de ruptura
com a concepção antiga de funcionamento e papel dos Museus de História
Natural, concomitantemente com a consolidação do Estado Imperial Brasileiro.
Temos então, no âmbito tanto da ciência quanto da política, uma busca por novas
formas de ação e pensamento, para que então o Brasil, mesmo que seguindo os
modelos europeus, se diferenciasse e assumisse uma identidade política e
científica própria.
Neste contexto, dentro da prática científica, havia uma necessidade de
compreensão, interpretação e construção da imagem do Brasil prioritariamente
pelos olhos de naturalistas nacionais, que até então não haviam participado
efetivamente da criação da imagem do Brasil tecida pelos naturalistas
estrangeiros. Esta imagem, segundo o contemporâneo do período Gonçalves
Dias, nem sempre adequava-se à 'verdade' quando feita por estrangeiros. Ele
explicita a sua indignação na Parte Histórica do livro Trabalhos da Comissão
Científica, como mostra o trecho a seguir:

19
Apontamentos (notas auto-bio-bibliográficas) (Biblioteca Nacional -livros raros: 80, 3, 34 n° 3).
20
Apontamentos (notas auto-bio-bibliográficas) (Biblioteca Nacional -livros raros: 80, 3, 34 n° 3).

34
Precisamos estudar o Brasil nos autores estrangeiros,
consultamos suas cartas marítimas até na nossa navegação
de· cabotagem, e mesmo na apreciação política dos
acontecimentos remotos ou recentes da nossa história o
estrangeiro como que tem, e leva a palma ao nacional, bem
que as mais das vezes escreva sob as inspirações deste
último. Contudo, nem sempre aqueles, conquanto dedicados
a ciência, conquanto por amor dela se hajam sujeitados a
longas peregrinações e a fadigosas viagens tinham bastante
retidão e senso crítico para nos julgarem sem prevenção, ou
firmeza para se não deixarem levar de informações alheias
da verdade, ou das primeiras impressões, que disparatavam
com os hábitos adquiridos e as suas idéias já formada!i 1•

A formação da Comissão Científica está intimamente relacionada ao


exposto acima por Gonçalves Dias. Este pensamento corrente explica a razão da
Comissão Científica ser composta somente por naturalistas nacionais, proposição
essa explícita desde o início de sua formação.
Unindo a idéia do progresso pela industrialização e a necessidade de um
conhecimento maior da natureza brasileira, tem-se no século XIX uma ciência
voltada para o crescimento da indústria brasileira, tendo como base de
alimentação desta indústria a natureza tropical, única e rica, e uma das grandes
responsáveis por um futuro promissor da nação. Suprir o Museu Nacional com
produtos brasileiros, significava também diagnosticar o potencial das riquezas
naturais brasileiras, para impulsionar o processo de industrialização no Brasil. Este
objetivo está muito presente nas instruções da Comissão Científica,
particularmente nas Instruções da Seção Geológica e Mineralógica de Guilherme
de Capanema, como veremos mais adiante. Além disso o Museu melhor
abastecido se adequaria para a realização das práticas científicas presentes nos
Museus europeus.

21
Dias, in: Trabalhos da Comissão Científica (op.cit.: VIII).

35
O inovador, descrito acima, e o tradicional conviviam dentro da Comissão
Científica. Buscar as tradições faria parte do futuro que se pretendia construir. Ao
mesmo tempo que em que estes naturalistas buscaram firmar uma ciência
nacional, praticada por nacionais e definindo a identidade nacional, eles
realizaram resgates da história natural do final do século XVIII, e muitos destes
resgates influenciaram diretamente nas atividades da Comissão.
Neste sentido, tem importância especial para os naturalistas da Comissão
Científica as Viagens Filosóficas portuguesas. Ambas, considerando os diferentes
contextos de suas épocas, visavam realizar o inventário dos recursos de seus
territórios para o seu melhor aproveitamento.
As Viagens Filosóficas, coordenadas por Domingos Vandelli, assim como
faria explicitamente a Comissão Científica, também carregavam os objetivos de
abastecer um Museu Nacional. Este aspecto, juntamente com o fato de Portugal,
no final do século XVIII, estar consolidando seu processo de adesão às ciências
modernas, e o Brasil de meados do século XIX apresentar uma emergente
comunidade científica, faz com que existam algumas continuidades entre os dois
momento acima expostos. Os elos concretos entre os naturalistas da Comissão
Científica e os filósofos naturais ilustrados aparecem sob a forma de alguns
resgates textuais e metodológicos realizados pelos científicos brasileiros do século
XIX.
Domingos Vandelli, médico italiano, foi contratado durante a administração
pombalina afim de ensinar a Filosofia Natural na Universidade de Coimbra, assim
como conhecer e explorar os produtos naturais de Portugal e suas colônias. Este
naturalista tinha um vasto projeto de elaboração de uma História Natural das
Colónias, coordenado pela Academia Real das Ciências e apoiado na criação do
Real Museu e Jardim Botânico de Ajuda, em Lisboa. Para abastecer esta
instituição com produtos naturais e artificiais e coletar informações sobre a história
natural das colônias, Vandelli elabora as Viagens Filosóficas. Em 1783, partiram de
Lisboa os componentes das Viagens Filosóficas: o naturalista Manoel Gaivão da
Silva, o jardineiro José da Costa e o riscador Antônio Gomes para Moçambique; o
naturalista José Joaquim da Silva, o desenhador José Antônio e o naturalista e

36
desenhador Ângelo Donati para Angola; o naturalista João da Silva Feijó para as
Ilhas de Cabo Verde; e a comitiva de Alexandre Rodrigues Ferreira para o Pará.
Comandada pelo naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira, a Viagem
Filosófica pelas capitanias do Grão Pará, Rio Negro, Mato Grosso e Cuiabá (1783-
1792) foi reflexo de um novo contexto sócio-cultural, formado por uma emergente
comunidade científica luso-brasileira. O trabalho do naturalista foi complementado
pela elaboração de desenhos por José Joaquim Freire e Joaquim José Codina,
assim como pela preparação dos espécimes pelo Jardineiro Agostinho do Cabo. A
Viagem Filosófica de Ferreira deixou como frutos uma vasta iconografia e
memórias que permaneceram manuscritas (Pataca, op.cit.).
Destas memórias, 48 textos manuscritos de Alexandre, versando sobre
vários temas relacionados à Filosofia Natural, pertenciam à Coleção Lagosiana no
catálogo de Alfredo do Vale Cabral (1876, 1877, 1878), composta por papéis
pessoais de Manoel Ferreira Lagos, diretor da Seção Zoológica da Comissão
Científica, o que evidencia um interesse explícito de Lagos pelos trabalhos de
Alexandre Rodrigues Ferreira. Um dos manuscritos pertencia à viúva de Ferreira
Lagos, e foi posteriormente doado à Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, onde
se encontra atualmente.
Francisco Freire Allemão, presidente da Comissão Científica também
buscou inspiração na produção de Alexandre Rodrigues Ferreira, homenageando
este filósofo naturalista com o nome de uma planta, descrita por Freire Allemão:
Ferreirea spectabi/is, popularmente conhecida como Sucupira Amarela ou
Guaiçara Macaniba Amarela, cuja madeira é usada para carpintaria, tacos e
dormentes.
Porém, quanto aos elos de continuidade entre a Comissão Científica e os
naturalistas do século XVIII, um nome se destaca: João da Silva Feijó, que
também foi integrante das Viagens Filosóficas, e influenciou de modo mais direto a
Comissão Científica por ter feito até então o trabalho mais completo sobre a
história natural do Ceará, como veremos agora22 .

22
Urna primeira versão desse resgate e da atuação de Feijó no Ceará está para ser publicada por
Pinheiro e Lopes.

37
João da Silva Feijó nasceu em 1760, em Guaratiba, Capitania do Rio de
Janeiro. Faleceu em 10 de março de 1824. Como parte integrante de uma elite
nascida na colónia, Feijó graduou-se pela Universidade de Coimbra, tomando-se
bacharel em matemática. Lecionou Botânica em Lisboa. Feijó foi integrante do
grupo de alunos de Domingos Vandelli, e mereceu senão poucas e incompletas
menções no amplo estudo de Simon (op.cit.) sobre as expedições científicas
portuguesas no Ultramar. Segundo o autor, aparentemente sem maiores
informações, Feijó, que partira antes do final de 1782 para uma relativa
obscuridade em Cabo Verde em sua variada carreira de químico, oficial militar e
professor, eventualmente teria retornado ao Rio de Janeiro. A atuação do
naturalista João da Silva Feijó em Cabo Verde, já foi considerada em alguns
aspectos por Guedes (1997), mas muito pouco ainda se tratou de seus trabalhos
desenvolvidos por quinze anos na então Capitania do Ceará Menor atenção ainda
recebeu até agora o resgate dos trabalhos do naturalista Feijó pelos integrantes
da Comissão Científica de Exploração.
Feijó, antes de partir para Cabo Verde, teria examinado a mina de carvão
de pedra de Buarcos em companhia de Alexandre Rodrigues Ferreira. Já em
Cabo Verde, secretariou o governo da ilha de São Tiago, sobre a qual escreveu
um ensaio, publicado nas Memórias económicas da Academia Real das Ciências
de Lisboa (Barroso, 1962; Braga, op.cit.).
Mas foi em 1799 que aconteceu a vinda do naturalista João da Silva Feijó
para o Brasil, mais especificamente para a atual província do Ceará. A obra deste
naturalista, como veremos, apresenta estreitos laços com a Comissão Científica,
especialmente com Francisco Freire Alemão e Guilherme SchOch de Capanema.
A vinda de Feijó para o solo brasileiro aconteceu no mesmo ano da
elevação do Ceará à condição de capitania independente de Pernambuco. Feijó
foi designado para o posto de sargento mór das milícias, conforme o documento
de sua nomeação de 25/02/1799, e vinha de Portugal incumbido de tratar vários
assuntos da História Natural do Ceará, como mostra um fragmento do ofício
transcrito abaixo:

Dona Maria da Graça de Deus, Rainha de Portugal e dos

38
Algarves (. ..) faço saber aos que esta minha carta patente
virem. Que eu hei por bem fazer mercê a João da Silva Feijó
da Patente de Sargento Mór de Milícias da Capitania do
Ceará, para onde deve partir, incumbido de vários objetos de
história Naturaf3.

Em outubro de 1799, Feijó chegou ao Ceará, onde permaneceu por cerca


de quinze anos. Nesta capitania, Feijó foi encarregado, entre outras coisas, do
mapeamento e da organização da exploração de salitre, em diversas regiões,
tendo construído pelo menos dois laboratórios para extração do produto, que
funcionaram entre 1800 e 1805, sendo o primeiro situado no sítio de Tatajuba,
que, segundo o próprio Feijó, tratava-se de uma mina muito fecunda.
Ao longo de sua permanência no Ceará o naturalista redigiu diversas
memórias, resultantes de suas investigações sobre salitre, ouro, ferro, gado, além
de seus trabalhos botânicos.
Em 1810, publicou no Rio de Janeiro o "Preâmbulo ao ensaio filosófico e
político sobre a capitania do Ceara para servir à sua história geral". E data de
1811 a "Memória económica sobre a raça do gado lanígero da capitania do Ceara,
com os meios de organizar os seus rebanhos por princípios rurais, aperfeiçoar a
espécie atual das suas ovelhas e conduzir- se ao tratamento delas e das suas lãs
em utilidade geral do comércio do Brasil e prosperidade da mesma capitania".
Feijó escreveu ainda, em 1814, a "Memória sobre as minas de ferro do Cangati ao
Choró na capitania do Ceará", que juntamente com a "Memória sobre as minas de
ouro do Ceará e a Coleção descritiva das plantas da capitania", permaneceu
inédita durante anos. É de autoria de Feijó também a "Carta topográfica do Ceará
da mina do Salpetra, descoberta no sítio de Tatajuba, na distância de 55/éguas da
vila da Fortaleza" e a "Carta demonstrativa da capitania do Ceará para servir à sua
história geral".
Acusado de envolvimento nos movimentos independentistas do nordeste
brasileiro, Feijó - que também já havia sido acusado de participação política

23
Doe. n° 1: Patente de João da Silva Feijó no posto de Sargento Mór das Millcias da Capitania do
Ceará, incumbido de vários objetos de História Natural. in Nobre (1978: 177).

39
contrária aos interesses do Estado em Cabo Verde - deixou o Ceará e retornou ao
Rio de Janeiro, onde se apresentava como lente de Historia Natural na Real e
Imperial Academia Militar do Rio de Janeiro, em 1818, vindo a ministrar aulas
práticas versando sobre História Nacional uma vez por semana no Museu
Nacional24 .
Como seus trabalhos abrangeram o amplo espectro da História Natural da
época é possível encontrar, por exemplo, em suas considerações sobre as antigas
lavras de ouro da Mangabeira, os registos de coleções de petrificações de peixes
e anfíbios, que estando inteiramente convertidos em cristal spatozo contrariavam
as idéias comuns entre os naturalistas de então de que jamais se poderiam
petrificar as partes moles e musculares dos animais. Sua correspondência com O.
Rodrigo de Souza Coutinho e autoridades locais, informa também sobre seus
envios de coleções para o Jardim Botânico da Ajuda e Jardim Botânico de Berlim.
Pelo volume de informações sobre a História Natural e a economia do
Ceará, as obras de Feijó são consideradas umas das mais completas da época,
sendo ele eleito por Braga (op.cit.) como o melhor conhecedor da capitania do
Ceará de sua época. Estes trabalhos de Feijó foram retomados pelos membros da
Comissão Científica no final da década de 1850, e os conhecimentos por ele
produzidos permaneceram de tal maneira válidos, que foram referência para as
investigações em ciências naturais após passados mais de 30 anos de sua morte.
Sobre o interesse por Feijó e suas Memórias, dentre os membros da
Comissão Científica de Exploração, merecem destaque Francisco Freire Allemão
e Guilherme de Capanema, por estes dois naturalistas claramente encontrarem
inspiração nas suas obras sobre a capitania do Ceará de João da Silva Feijó para
a realização dos seus trabalhos no contexto da Comissão Científica (Lopes;
Pinheiro, op.cit.).
Os interesses de Freire Allemão pela botânica cearense datam desde pelo
menos 1847, época da qual existem cartas que documentam a atenção de Freire
Allemão pelo trabalho do naturalista Feijó. Allemão e Emílio Joaquim da Silva

24
Doe. Mus. Nac. 11, pasta 1. Agradeço à Prof. Maria Margaret Lopes por me emprestar seus
documentos referentes ao Museu Nacional.

40
Maia25 , em 1847, recuperaram26 e organizaram para posterior publicação alguns
manuscritos de Feijó, que compõem hoje a Coleção descritiva das plantas da
capitania do Ceará, até então inédita.
Não só os trabalhos botânicos de Feijó foram resgatados pela Comissão
Científica. Suas Memórias sobre a mina de ferro do Cangatí, suas considerações
sobre vulcanismo, sobre os principais minerais da região seriam avaliados,
contestados ou confirmados por Capanema, também membro da Comissão.
Capanema faz menção direta ao naturalista Feijó no Relatório das atividades da
Seção Geológica e Mineralógica:

Fizemos uma excursão ao Canindé, e fomos ver os


depósitos de ferro junto à serra das Guaribas nas margens
do rio Cangatí, de que falara Feijó em 1814; encontramos
realmente esta rica mineira, de todo desprezada 27.

A obra referenciada por Capanema no trecho acima é a Memória sobre as


minas de ferro do Cangati ao Chorá na capitania do Ceará, de autoria de Feijó.
Esta Memória permaneceu inédita até 1863, ano em que o livro Ensaio estatístico
da província do Ceará foi publicado, trazendo alguns trecho da Memória de Feijó.
Concluímos então que Capanema tinha conhecimento da existência desta
Memória anteriormente à sua publicação parcial.
Um forte indício deste fato é a presença de uma cópia manuscrita da
Memória sobre as minas de ferro do Cangati ao Xoró na capitania do Ceará na
íntegra, que encontrei na ocasião do levantamento de fontes primárias para o
presente trabalho, entre os documentos pessoais de Capanema, contidos na
Coleção Guilherme de Capanema, em fase final de organização, nos arquivos do
Museu Histórico Nacional do Rio de Janeiro. O manuscrito original desta memória
de Feijó encontra-se atualmente na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro.

25
Silva Maia também representa um elo importante na rede institucional da história natural. Ele foi
sócio-fundador do IHGB, da SAIN, Sociedade Velosiana, entre outras instituições. Foi professor do Colégio
Pedro 11, Diretor da Seção de Zoologia do Museu Nacional, posteriormente escolhido como secretário e diretor
interino desta instituição. (Lopes, 1997, op.cit.).
26
Segundo Nobre (op.cit.), os manuscritos de Feijó estariam sendo usados para embalar produtos de
uma confeitaria do Rio de Janeiro, chamando a atenção de Silva Maia ao freqüentar o estabelelcimento.
27
Capanerna, in: Trabalhos da Comissão Científica, op.cit.: CXXIV-CXXV

41
As Memórias sobre Mineralogia de Feijó, ganham menção ainda nas
palavras de Antônio Gonçalves Dias, chefe da Seção Etnográfica e Narrativa da
Viagem na Comissão Científica. Ao escrever o Proêmio, contido no Trabalhos da
Comissão Científica (op.cit.: 11), Gonçalves Dias fala na crença de que o solo do
nordeste brasileiro seria o mais metalífero de todo o Brasil, e a metrópole o
acreditara, nomeando no reinado da Senhora O. Maria I o naturalista Feijó para
examinar as suas minas e tratar de explorar algumas de/as.
O Ensaio filosófico, e político sobre a Capitania do Ceará, escrito por Feijó
em 1808, continuaria sendo a referência para os estudos geográficos e geológicos
da região, aos quais se somariam às investigações da Comissão Científica no livro
Ensaio estatístico da Província do Ceará, escrito por Thomás Pompeu de Souza
Brasil em 1863. O Senador Pompeu tinha grande prestígio na sociedade grande
quantidade de dados recolhidos pela Comissão Científica e por Feijó, sendo mais
cearense, nos meios políticos, científicos e religiosos28 . Em seu livro, Brasil usa
um elo concreto entre os ilustrados do final do século XVIII e os naturalistas de
meados do século XIX. Brasil menciona os estudos de Feijó, que na ocasião
haviam sido ou não confirmados durante o trabalho da Comissão Científica.
A Sociedade Velosiana de Freire Alemão apresenta também ligações fortes
com o passado das investigações em História Natural no Brasil. Posteriormente a
algumas reuniões acontecidas, a Sociedade Ve/osiana atentou também para
aspectos históricos brasileiros, criando algumas linhas novas de investigação.
Foram elas: catalogar cronologicamente todos os artigos sobre a história natural
do Brasil, tanto nacionais como estrangeiros, assim como avaliar criticamente tais
obras, escrever sobre as tentativas de formação de instituições científicas no
Brasil, como museus e hortos, e elaborar biografias dos naturalistas brasileiros.
Em discurso proferido por Freire Allemão em 1872, já citado neste trabalho, na
ocasião da tentativa de fazer renascer a Sociedade, Allemão faz uma breve
retrospectiva histórica, explicitando quais teriam sido alguns dos objetivos da
Sociedade:

42
ter o cuidado de indagar dos jornais estrangeiros tudo o que
houver de novo da ciência; informar-se do que se passa
pelas províncias que tenha relação com as ciências naturais,
ou pelos jornais, ou vocalmente; enfim investigar as obras e
escritos antigos sobre o Brasil, tudo o que se achar por aí
perdido e esquecido, para com estas informações porem-se
ao fato das coisas do país e oferecer uma discussão
proveitosa29 •

Sob o ponto de vista de Lopes (1997, op.cit.), o trecho acima mostra que a
Velosiana buscava estabelecer uma tradição científica brasileira. Busca esta
presente inclusive na escolha do nome da Sociedade, que resgatou e
homenageou um importante botânico ilustrado brasileiro, Frei José Mariano da
Conceição Veloso, autor da Flora Fluminensis.
Figueirôa (1997: 92, op.cit.) vê na concepção da Sociedade um forte cunho
nativista, pois ela se propunha a inventariar tudo o que já fora escrito sobre o
Brasil, levantar sua história institucional do ponto de vista das ciências aqui
desenvolvidas e delimitar o espaço do que era 'nativo' e do que era 'de fora' no
meio ambiente (grifos da autora).
Este objetivo também era buscado no IHGB, mas diferentemente da
Velosiana, o Instituto não tratava apenas de assuntos ligados à História Natural. O
IHGB está bem mais presente na historiografia brasileira do que o Museu Nacional
e a Sociedade Velosiana. Porém, dentro da historiografia dedicada às ciências no
Brasil, o IHGB foi pouco contemplado, frente ao favorecimento da pesquisa
histórica e literária (Figueirôa, 1997, op.cit.).
O IHGB foi fundado em 1838, e desde o seu início a instituição buscou
investigar as questões que se relacionavam com o passado da nacionalidade
brasileira (Filho, 1962) e inspirando-se nas nações européias, conquistar o seu

28
Thomaz Pompeo de Sousa Brasil foi presbítero secular, bacharel em Ciências Sociais e Jurídicas,
professor de Geografia e História do Uceo do Ceará, deputado da Assembléia Geral Legislativa. sócio
correspondente do Instituto Histórico e Geográfico do Rio de Janeiro, do da Bahia , do de Pernambuco e de
outras sociedades literárias (Brasil, 1997; Neto, 1997).
29
Coleção Freire Allemão: Biblioteca Nacional, 1-28-9-80.

43
reconhecimento. Sob este ponto de vista, Squeff (1998: 209) sintetiza, em uma
visão retrospectiva, o papel do IHGB:

concebendo a história brasileira. como p~lco de atuação de


um estado forte e centralizador, o Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro teve como tarefa delinear a identidade
da nação [brasileira] recém criada.

A autora acima citada parece estar em concordância com trabalhos


anteriores, como o de Guimarães (1988) e Figueirôa (1992, op.cit.). Na prática,
estes ideais do IHGB seriam alcançados da seguinte forma:

o Instituto, ao mesmo tempo em que construía e glorificava


heróis nacionais, também se ocupava da investigação do
habitat natural onde florescem tais personagens.

Definir a nação Brasil, um perfil que lhe garantisse identidade própria e


continuadora do processo de civilização iniciado por Portugal, era a proposta
ideológica em curso, e o dever dos letrados em torno do IHGB. Nas palavras de
Guimarães (op.cit.: 7), buscava-se integrar o velho e o novo, de forma que as
rupturas fossem evitadas.
Igualmente ao Museu Nacional, o IHGB procurou seus objetivos
incorporando membros honorários estrangeiros e nacionais, e intercambiando
intensamente publicações e documentos com outras instituições. Também foram
incentivadas as Viagens de exploração pelas províncias do interior do Brasil, como
aquela organizada pelo Cônego Benigno José de Carvalho e Cunha, cuja proposta
data de 1841, que teria como objetivo principal realizar um levantamento de dados
sobre a cultura baiana, porém sem deixar de lado as investigações práticas sobre
agricultura e riquezas minerais. Foi o caso também da Comissão Científica de
Exploração. Esta ligação entre o IHGB e expedições científicas é muito bem
colocada por Guimarães (op.cit.: 19):

A diversidade de interesses possíveis de serem atendidos


por expedições científicas desta natureza, poderiam explicar
por que num momento específico de construção de um

44
projeto nacional, tais viagens obtiveram apoio de uma
instituição cultural como o IHGB e , em última análise, do
próprio Estado, que termina por financiá-las.

A História Natural é parte integrante e essencial da história geral do país, já


que a construção do nacional assentava suas raízes na base física do território
(Figueirôa, 1997: 81, op.cit.). Em todo caso, fica clara a relação financeira e
intelectual entre o Governo Imperial e as expedições científicas da época,
reforçada por Manoel de Araújo Porto Alegre, ardoroso defensor das estreitas
relações entre a monarquia e os letrados, autor das Instruções da Seção
Etnográfica da Comissão Científica, sócio do lnstitut Historique de Paris, e um dos
primeiros sócios do IHGB (Guimarães, op.cit.).
Lopes (1997: 132, op.cit.) também mostra de modo claro as relações entre
a história natural e o IHGB:

Entendemos que esses ainda poucos integrantes da


comunidade emergente de estudiosos do país,
especialmente dedicados à História Natural, consideravam
as ciências que forjavam como um ramo de conhecimento já
instituído entre nós, que tinha história para ser contada e que
lhes cabia estabelecer sua tradição. Nos moldes do IHGB,
que criava a história oficial do país, eles se propunham
também à tarefa de sistematizar a história da natureza do
país e de suas próprias contribuições para ela.

Neste trecho, Lopes está referindo-se aos sócios da Sociedade Velosiana,


que assim como mantinham laços fortes com o Museu Nacional, estavam ligados
ao IHGB por vários elos. Alguns deles representados por letrados que atuavam
nos três palcos, como por exemplo Freire Allemão, Guilherme de Capanema,
Frederico Burlamaque e Silva Maia. Outros elos eram Institucionais, como a
própria Comissão Científica ou a Sociedade Auxiliadora da Indústria NacionaL
Os nacionais atuantes nestas instituições compunham um grupo de homens
letrados, que acumulavam várias funções sociais simultaneamente, como artes,

45
política e ciências. Nas palavras de Figueirôa os cientistas que atuaram no Brasil,
de igual modo que no restante da América Latina, foram ao mesmo tempo
religiosos, funcionários públicos, diretores de repartições públicas, militares,
membros de associações diversas, escritores e até literatos (Figueirôa, 1998:
120).
Esta elite letrada era composta por alguns nomes, que talvez por serem em
número reduzido, estavam a frente de uma série de iniciativas, tanto científicas,
quanto administrativas e políticas. Eram, como definiu Mattos (1990}, os dirigentes
e construtores do Império. No âmbito das ciências naturais, estes dirigentes
iniciavam uma tradição científica que se traduziu na formação de uma comunidade
científica, como já nos referimos.
A proposta da formação da Comissão Científica foi feita em uma das
reuniões do IHGB. Isto torna mais evidente a proposta política da Comissão.
Assistida e apoiada pelo Imperador Pedro 11, a formação da Comissão Científica
encontrou no Instituto o modo de viabilizar a sua existência oficial. Os objetivos da
Comissão coincidiam com os do IHGB, de levantar informações de caráter
estratégico sobre a história natural do Brasil e promover um 'auto-conhecimento'
do território nacional, inclusive no âmbito histórico e cultural. Este era o papel da
Seção Etnográfica e Narrativa da Viagem, dirigida por Gonçalves Dias. Como bem
explicitou o poeta:

Se é de boa filosofia que o homem se conheça a si próprio, é


de melhor política que qualquer país trate de conhecer os
seus recursos para saber o que possui, de os catalogar para
saber onde existem, e de os aquilatar para saber quanto
valem30.

Dias, por sua vez, já estava envolvido em uma outra Comissão com objetivo
de inventariar a história do Brasil. Em 1856, no momento da formação da
Comissão Científica, Gonçalves Dias estava na Europa, para onde partira em
1854, a fim de levantar documentos que versassem sobre a história do Brasil nas
bibliotecas e arquivos europeus. Foi nesta época também que Dias editou em

46
Leipzig o Dicionário da Língua Tupi, assunto muito presente em correspondências
entre ele e o lmperador1 .

Era também intenção da Comissão Científica contribuir para a incorporação


das províncias menos conhecidas do Brasil ao Império, ou seja, integrar
politicamente o território brasileiro. Para tanto, era necessário um maior
conhecimento sobre estas terras.

Através do exposto acima, podemos ver que os homens da ciência


brasileira do século XIX interrelacionavam-se tanto institucionalmente como em
nível pessoal. Estas duas versões de relações se apresentam de modo paralelo,
se completam, e ajudam a entender algumas questões que margeiam o episódio
da Comissão Científica na História das Ciências no Brasil.

2.2. As Instruções de Viagem da Comissão Científica

A respeito da nossa Comissão, estão se limando as


Instruções, vai tudo com quanto sacramento é possívef2. No
mais, esmera-te para nada te faltar, pois serás responsável
pela tua Seção, e como o Governo se mostra disposto a
fornecer tudo quanto se precisa, não temos tangente33.

O fragmento acima pertence a cartas escritas por Capanema à Gonçalves


Dias. Como pode ser visto, as Instruções de Viagem, a esta altura, estavam sendo
elaboradas, e a Comissão contava com pleno apoio, segundo Capanema. Os
diretores de cada uma das cinco Seções da Comissão Científica redigiam as
Instruções de Viagem para as próprias Seções, exceto Raja Gabaglia e Gonçalves
Dias, pois estes estavam fora do país, o que já mencionamos.

30
Dias in Trabalhos da Comissão Científica (op.cit.: IX).
31
Anais da Biblioteca Nacional (1964, vol. 84).
32
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971:88, op.cit.). Carta n° 67 para Dias. s/1,
04/12/1856.
33
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 113, op.cit.). Carta no 91 para Dias. orianda,
24/02/1857.

47
A autoria destas Instruções contribuiu para que elas apresentassem certas
particularidades, como um texto pouco rico em detalhes técnicos, que seriam
muito bem conhecidos pelos naturalistas. Quando necessário, os mesmos
lançavam mão da consulta a manuais já prontos, como mostra Lagos, chefe da
Seção Zoológica:

Não será muito avaliar em um quarto a perda resultante do


mal método com que são preparados e acondicionados os
objetos de história natural. A 'Instrução' arranjada pela
administração do museu de Paris, para os viajantes e
empregados nas colónias (. ..) servirá de excelente guia34.

Estas Instruções referenciadas por Ferreira Lagos são as que foram


traduzidas e adaptadas por naturalistas do Museu Nacional em 1819. Como já
citamos, alguns trechos das Breves lnstruções... (op.cit.), preparadas por
naturalistas da Academia de Ciências de Lisboa, estão literalmente transcritos nas
Instruções do Museu Nacional, representando mais uma categoria resgatada do
período ilustrado.
Além de não conter detalhes técnicos, as Instruções da Comissão Científica
carregavam a responsabilidade de delimitar os objetivos concretos de cada Seção,
como muito bem expressa Raja Gabaglia, em uma correspondência para
Gonçalves Dias:

Revolví por cá os destroços dos jornais (.. .), nada achei


sobre minhas instruções ou dos colegas!... Dizem que são
colossais e saberia o que ajuntam? - Ouvi: Nenhum dos
membros da Comissão é capaz de as executar. Em geral, se
duvida do êxito. (. ..) Qual será a nossa defesa, quando se
nos disser: Foram vocês que apresentaram as própria
instruções, cortaram e amoldaram a bel prazer e
determinaram os limites de suas forças; cabe-nos uma
responsabilidade moral infinita, quer em presença de nossos

34
Lagos. ín RIHGB (1856: 59. op.cít.).

48
contemporâneos quer essencialmente no juízo de nossos
vindouros35.

Como pode-se ver, no caso específico das instruções das Seções da


Comissão Científica, elas continham o poder de validar a importância e defimir as
fronteiras da atuaçâo de cada Seçâo. Estão igualmente presentes nestas
Instruções os resultados esperados que cada diretor de Seção da Comissão
Científica teria que apresentar perante a sociedade política e científica.
Além das Instruções específicas para cada Seçâo, a Comissão também
seguia Instruções gerais, redigidas pelo ministro Sérgio Teixeira de Macedo. Estas
Instruções continham principalmente informações de caráter estatutário, como a
definição dos limites das tomadas de decisão entre o presidente da Comissão,
Freire Allemão, e os outros membros, ou a postura que os presidentes das
províncias exploradas deveriam ter frente à Comissão. Todas as Instruções foram
publicadas na Revista do IHGB, em 1856, e no livro Trabalhos da Comissão
Científica, em 1862.
Entendemos que as Instruções da Comissão Científica merecem análises a
parte, o que será feito a seguir, onde privilegiamos a análise das Instruções da
Seção Geológica, dirigida por nosso principal personagem: Capanema.
Apropriando-se das palavras de Lopes (1996: 54), um olhar atento às Instruções
permite visualizar aspectos das compreensões que os diretores do Museu
Nacional e das principais instituições científicas da Corte tinham sobre suas
ciências, bem como alguns de seus interesses de estudo. Comentaremos
brevemente as Instruções de cada Seçâo, dando maior destaque àquelas da
Seção Geológica, que temos maior interesse.

2.2.1. As Instruções da Seção Geológica e Mineralógica

Dividida em treze itens, Capanema basicamente propõe nas suas


Instruções da Seção Geológica e Mineralógica o estudo do terreno através da
mineralogia, pretendendo com isso diagnosticar o potencial da região no que diz

35
Gabaglia. in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 103-104. op.cit.). Carta n° 83 para Dias. Londres.
07/02/1857.

49
respeito à exploração de recursos minerais. Aliado a isso, propõe coletar dados
geológicos e mineralógicos para a confecção de um mapa geológico da região.
No primeiro item das Instruções da Seção Geológica e Mineralógica,
Capanema sugere maior atenção para a procura de indivíduos perfeitos, tendo em
vista estabelecer a sene mais completa possível das combinações
36
cristalográficas . A procura por indivíduos perfeitos diz respeito ao hábito dos
cristais e às suas formas regulares, que permitem a classificação mineral, e
consequentemente o seu reconhecimento.
A classificação mineral sofreu várias modificações desde a sua
sistematização por Georgius Agrícola (1494-1555). O modelo de classificação de
Agrícola permaneceu relativamente estável por um século e meio, pois como seus
predecessores e sucessores, Agrícola, em termos gerais, baseava-se nas reações
que os minerais apresentavam quando expostos ao calor e à água (Laudan,
op.cit.). A esta altura do século XIX e com o advento da Química, muitas
discussões sobre classificação mineral já haviam ocorrido. No caso de Capanema,
a procura por indivíduos perfeitos nos remete ao modelo de René-Just Haüy,
criado em 1784, fortemente baseado na estrutura externa do mineral e no critério
da regularidade das formas geométricas para o seu reconhecimento (Figueirôa,
1997 op.cit.; Laudan, op.cit.). Além disso, Haüy já havia sido usado por outros
naturalistas anteriores a Capanema, como foi o caso de José Bonifácio de
Andrada e Silva (1763-1819) 37 em seus trabalhos práticos de mineração no âmbito
do seu cargo de Intendente das Minas no início do século XIX (Varela, 2001 ).
O resgate do nome de Haüy ganha importância no presente estudo, porque
de certa forma, seu sistema classificatório serviu como base para praticamente
todos os outros que foram desenvolvidos posteriormente, e seu uso por
naturalistas nacionais do início do século XIX, nos permite constatar que houve no
Brasil uma discussão, paralela a que acontecia na Europa, sobre os métodos de
classificação mineral e suas transformações.

36
Capanema, in: RIHGB (1856: 44, op.cit.).
37
Amplamente conhecido como o 'patriarca da independência', Bonifácio também apresentava um
perfil de naturalista, que, apesar de menos aparente, era indissociável do seu perfil de homem público e
estadista. Vale lembrar que o modelo de Haüy era usado por este naturalista em complemento com outros
sistemas de classificação. Para mais detalhes, ver Varela (2001).

50
Estas discussões estão documentadas na carreira de Capanema desde
pelo menos o contexto da criação da Sociedade Velosiana, em 1850. Na ocasião
da criação da Velosiana, Capanema teria sugerido a adoção de uma nomenclatura
mineral invariável, adquirindo a simpatia de Frederico Leopoldo Burlamaque pela
sua proposta, como mostra o documento abaixo:

Concordando na conveniência de adotar-se para uso da


Seção de Mineralogia desta Sociedade um sistema uniforme
tanto para a classificação mineralógica como de
nomenclatura química, sou de parecer que siga a
terminologia e método de classificação que se acha na última
edição de 1844, da mineralogia de Dufréno? e o método
cristalográfico e de notações [do mineralogista alemão] K. F.
Naumann. Quanto à nomenclatura química, dou preferência
à de Berzelius por ser a mais simples, a menos sujeita às
variações muitas vezes caprichosas de certos autores mais
modemos39•

O sistema de classificação de Jons Jacob Berzelius (1779-1848) era


baseado na quantidade de sílica presente, usando o sistema de eletrólise para
quantificar o elemento em cada mineral, postulando ter a sílica propriedades
eletronegativas (Oidroyd, 1996).
Este tipo de debate estava presente entre os naturalistas brasileiros,
incluindo Guilherme de Capanema, que por sua vez mantinha-se informado sobre
as discussões que ocorriam na Europa40 . Capanema, assim como outros
naturalistas contemporâneos seus, acompanhavam as discussões sobre ciência
presentes nos periódicos europeus.

38
Autor da carta geológica da França, juntamente com De Beaumont (Oliveira; Leonardos, 1978).
39
Documentos do Museu Nacional de 1851, pasta 4, apud Lopes (1997:30, op.cit.).
40
Secord (1986) coloca que apesar da geologia ganhar novos rumos definidores no velho mundo na
primeira metade do século XIX, a Inglaterra continuou a priorizar os debates sobre o processo de formação
dos estratos e a sua relação com o tempo geológico, assim como a nomenclatura e classificação mineral,
tendo em vista a grande influência da controvérsia do Devoniano exercida sobre os homens da ciência nesta
época.

51
Dando continuidade a análise das Instruções da Seção Geológica da
Comissão, além da preocupação com a identificação e classificação dos minerais,
Capanema, ainda no primeiro item das Instruções atenta para os minerais isolados
e a causa que os teria separado de sua matriz. Para completar esta observação,
no item 11 Capanema reforça que esses minerais isolados poderiam ser indícios de
reservas nas proximidades, sendo função da sua Seção fazer o possível para
localizar a sua fonte de origem. Atenção especial seria dada, nas palavras de
Capanema, para os minerais como indícios de formação útil, principalmente
metalífera, [e uma vez localizados], serão as pesquisas continuadas até que se
encontre o tronco donde partiram41 •
Após reconhecer e localizar os depósitos metalíferos, o próximo passo seria
determinar a viabilidade de exploração económica da reserva. Sendo assim
Capanema no item III instrui a observação de:

(...) quaisquer circunstâncias que possam ter influência sobre


a sua minera/idade. Entre estas apontaremos as forças
motrizes disponíveis, a quantidade e qualidade de
combustível que se encontre nas vizinhanças, distancias dos
centros de população ou dos portos mais próximos, e meios
de comunicação deve-se também atender ao
abastecimento de mantimentos, que é uma das questões que
mais poderão influir sobre a explorabilidade de uma mina42.

Finalizando este item, Capanema cita os recursos minerais mais


importantes. Todos, sem exceção, compõem matéria prima para indústria e
construção civil.
As tradições locais compõem um interessante ponto em comum nas
práticas das Viagens exploratórias, sendo uma característica das várias Instruções
de Viagem. Desde pelo menos o século XVIII, os membros das expedições eram
instruídos para fazer uso das lendas e tradições das populações nativas para

41
Capanema, in: RIHGB (1856: 45. op.cit.).
42
Idem nota 41.

52
conseguirem informações sobre a História Natural local. Nas Breves Instruções,
que como vimos foi base para as Instruções de Viagem brasileiras, este aspecto
aparece da seguinte forma:

[deve-se observar] o modo de fazerem [a população local] as


suas caças e pescas; as plantas de que se servem para
sustento, vestido, remédios, tintas; os animais que
empregam no trabalho, e em outros serviços domésticos; os
minerais que extraem da terra, os usos a que os aplicam, e o
modo de os reduzir a esses mesmos usos; a perfeição ou
imperfeição das artes, manufaturas, e de todo o gênero de
indústria, e comércio, que houver no país43.

Freire Allemão, como já foi visto, também ressaltou a importância do


conhecimento tradicional nas suas Instruções Da mesma forma, Capanema nas
Instruções de sua Seção explicita o seguinte:

Também devem ser atendidas as tradições reinantes nas


diversas localidades sobre existência de minerais, porque
alguma lenda de ouro encantado, terrenos exalando cheiro
sulfuroso, estouros subterrâneos podem conduzir à
descoberta de minas de pirites em circunstâncias favoráveis
para suprir de enxofre e de ácido sulfúrico, ou de pedra ume,
os nossos mercados, que hoje com dificuldade são
fornecidos pelo estrangeiro, e trazem em dependência muita
industria de grande vantagem44 •

Neste trecho específico, no âmbito da Geologia e Mineralogia, Capanema


refere-se a dois pontos principais: terrenos conhecidos pela população que exalam
cheiro sulfuroso e estouros subterrâneos. Ambos estão relacionados com a
presença de enxofre, largamente usado na fabricação de pólvora e na produção
industrial.

43
Breves Instruções (op.cit.).
44
Idem nota 41.

53
O enxofre representa aqui um mineral altamente estratégico. Em meados
do século XIX, a quantidade de ácido sulfúrico produzida por uma nação era
relacionada com o seu grau de civilização, como mostra Silva Maia (1808- 1859)
em um artigo francês apresentado na Academia Imperial de Medicina em 1830
(Kury, 1998, op.cit.). Até recentemente, o ácido sulfúrico, considerado um mineral
estratégico, ainda é usado como indicador da produção industrial de um país,
como nos mostra Abreu (1973: 34-35):

Seu composto mais importante [do enxofre], industrialmente


falando, é o ácido sulfúrico, chamado o 'pão da indústria',
cujo consumo é tido como indicador do desenvolvimento
industrial de uma nação. É difícil encontrar um produto
industrial no qual o enxofre não tenha interferido nalguma
fase do processo de fabricação (grifos do autor).

Ainda neste item das Instruções, outro aspecto pode ser ressaltado, que
são os estouros subterrâneos presentes, referenciados também na Memória sobre
o ferro do Cangati, de João da Silva Feijó, cujo fragmentos foram publicados na
obra já mencionada Ensaio Estatístico da Província do Ceará de Thomas Pompeo
de Souza Brasil, o Senador Pompeu, quando a Memória ainda era inédita. Um
destes fragmentos versa justamente sobre os estouros subterrâneos:

Vendo-se de tempo em tempo, particularmente depois das


primeiras chuvas, de seu interior [das cavernas subterrâneas]
estrondosos estampidos, pasmosos rugidos, o que os
moradores atribuem a existência de minerais auríferos (Feijó,
apud Brasil, 1997: 153-153).

Os estouros subterrâneos eram comumente associados pelos naturalistas a


terrenos vulcânicos, novamente relacionados à presença de enxofre, talvez
contendo mineralizações de pirita, usualmente confundida com ouro pelos
moradores locais. Tal relação faz parte da cultura científica pelo menos desde o
século XVII, quando vestígios de erupção vulcânica eram considerados indícios de
terramotos passados. Além disso, a presença de vulcões poderia significar que o

54
terreno era rico em salitre, betume e metais diversos, sempre sofrendo ação
intensa do fogo (Carvalho, 1987).
Vulcões e terremotos apresentam uma ligação entre as obras de
Capanema e Feijó, tendo o primeiro escrito a Memória sobre a última erupção
vulcânica da Ilha do Fogo, e o último Quais as tradições ou vestígios geológicos
que nos levam à certeza de ter havido terremotos no Brasil.
Um último aspecto a ser ressaltado no trecho das Instruções transcrito
acima diz respeito à indústria. Fica clara nas palavras de Capanema a ligação
entre os interesses da indústria brasileira e as atividades da Seção Geológica na
Comissão Científica.
A questão do progresso da indústria brasileira está muito presente em
vários outros trechos das Instruções de Capanema. Percebe-se a busca pela
independência da indústria no Brasil. Independência no que diz respeito ao
suprimento de matéria prima, e principalmente independência tecnológica, na
tentativa de diminuir as importações. Vale lembrar, que a concepção de indústria
na época abrangia também trabalhos manuais, que envolviam transformação de
algum material em bem de consumo, como o artesanato ou seja, era uma
definição relativamente ampla.
O elo entre a Comissão Científica e a busca pelo progresso da indústria
brasileira é evidente na figura de Frederico Burlamaque. A esta altura do século
XIX, Burlamaque ocupava ambos os cargos de direção do Museu Nacional e
secretário honorário e perpétuo e presidente da Seção de Agricultura da SAIN
(Lopes, 1997, op.cit.). E como vimos anteriormente, este naturalista mantinha
intensas relações profissionais com Capanema nesta época. Em conseqüência
disto, podemos evidenciar alguns dos ideais da SAIN nas presentes Instruções.

Dando continuidade ao item IV das Instruções da Seção Geológica,


Capanema destaca que

Importa com especial cuidado todos os rios, lagos, e terrenos


salgados com vistas de achar salitre (de potassa ou soda),
borax, soda, sal de Glauber, caparrosa, sal amoníaco, etc,

55
que valha a pena exportar, sendo próximo as costas; ou sal
comum, indispensável para o uso da população e para
sustento do gado, sendo no interior" 5.

O salitre, essencial para o fabrico de pólvora, usado também na


alimentação, representa um mineral que, no Ceará, recebia a atenção de
naturalistas desde pelo menos o final do século XVIII, como já mencionamos. Feijó
havia sido incumbido de tratar sobre vários assuntos da História Natural do Ceará,
mais especificamente realizar o mapeamento e a organização da exploração de
salitre na província (Nogueira, 1888). Como podemos perceber, a busca pelo
salitre já era preocupação do governo desde o início do século XIX, e desde
então, a Província do Ceará apresentava um possível potencial em relação ao
salitre.
Nos itens V e VI das Instruções da Seção Geológica, Capanema finaliza a
sua exposição sobre a atividade de diagnóstico do potencial de recursos minerais
da região, chamando a atenção para as minas pré-existentes à chegada da
Comissão Científica, ainda ativas ou abandonadas:

No caso de existir mineração ativa nos lugares que tem de


ser visitados, ou exploração metalúrgica, serão estudados
minuciosamente os processos em uso, estabelecida a
relação entre produto e forças consumidas, indicando-se os
defeitos existentes e os melhoramentos aplicáveis4fl.

Sobre as minas abandonadas, Capanema propõe o estudo sobre

as causas desse abandono, se dependem do


empobrecimento do solo, ou de falta de gente habilitada para
continuar, casos freqüentes na província de Minas, S. João
de Ipanema, e se estudará quanto for possível a história
desses estabelecimentos e a possibilidade de sua
reanimação, fazendo um cálculo aproximado da produção

45
Capanema, in: RIHGB, (1856: 45-46, op.cit.).
46
Capanema, in: RIHGB, (1856: 46, op.c~.).

56
que prometiam para o futuro47•

57
Um ponto de destaque neste trecho diz respeito ao conhecimento sobre a
realidade da mineração brasileira por Capanema. Além disso, ainda neste trecho,
mais uma vez aparece explicitamente a intenção de exploração dos recursos
minerais da província que iria ser estudada.
A partir do item VIl das Instruções da Seção Geológica, Capanema volta a
sua atenção para o recolhimento de dados com o intuito de se fazer um mapa
geológico da região. Dividido em 8 parágrafos, o item VIl das Instruções traz as
recomendações sobre o estudo geognóstico. Convém lembrar que o termo
geognose, usado aqui por Capanema, é de criação de Abraham Gottlob Wemer
(1749 -1817), e se define como:

(...) parte da mineralogia que nos familiariza intimamente


com a terra sólida, com suas relações com os corpos
naturais que a rodeiam e que são familiares para nós, e
também, especialmente, com as circunstâncias das suas
formações externa e interna e os minerais que a compõe de
acordo com as suas diferenças e formações (Laudan, 1987,:
89, op.cit. Tradução minha).

O uso do termo aqui reflete a formação de Capanema na Escola de


Freiberg, onde Wemer foi professor e formou vários discípulos, fazendo com que a
palavra geognosia se tomasse de uso corrente na época. Capanema pretende
claramente nesses oito parágrafos recolher informações para elaborar a história
geológica e confeccionar um mapa geológico da região. Para tanto, é
recomendada a identificação da rocha, quais agentes intempéricos mudaram sua
conformação, se foram lentos como água ou violentos como terremotos48, a
vegetação primária que a rocha abriga, o que se relaciona diretamente com o
material decomposto sobre ela e, idade relativa, usando a presença de fósseis
como indício:

Não se deve perder de vista a procura de fósseis de qualquer


natureza que sejam, principalmente foraminíferos e

58
infusórios, que muitas vezes representam um papel tão
importante na petrografia de um país, além de
caracterizarem perfeitamente as formações em que são
encontradas49

Antes usados apenas em estudos de sistemática, desde o final do século


XVIII os fósseis passaram a ser utilizados estratigraficamente, como indicação
para diferenciar dentro de uma cronologia estratos geologicamente iguais,
aparecendo como uma informação adicional nos mapas geológicos europeus. Os
terrenos com presença de foraminíferos podem ser indícios de recursos
energéticos.
A preocupação pelo mapeamento do território50 , e consequentemente dos
seus recursos minerais é explícita nas Instruções da Seção Geológica:

(. ..) devem ser delineadas com cuidado as seções


importantes do terreno, os contornos das montanhas, o maior
número de perfis. Rochas de aspecto característico serão
fotografadas, e também se fará um nivelamento geológico, e
um mapa, no qual se procurará marcar, com a maior
exatidão que as circunstâncias permitam, os limites das
diferentes formações, e os diversos jazigos e betas que neles
se descubram, ficando a cargo da Seção Astronómica
fornecer as determinações geodésicas que se tomarem
necessárias51 .

Além da intenção da elaboração de um mapa geológico, este trecho das


Instruções de Capanema traz referências sobre a fotografia, que substituindo o
trabalho do pintor paisagista nas atividades de campo na História Natural, entraria
como principal meio de registro visual dos perfis e paisagens nas Viagens de
exploração. Introduzida no Brasil na primeira metade do século XIX por Hércules
Florence, a fotografia facilitou o registro iconográfico na história natural, pois
reduziu o peso e quantidade de material necessário para tal registro (Monteiro,

59
2001). Discutiremos à frente os interesses de Capanema pela fotografia e seus
processos.
Outro ponto digno de destaque é a influência de fatores adversos típicos do
trabalho de campo nas atividades científicas. Quando Capanema coloca que os
dados deveriam ser coletados com a maior exatidão que as circunstâncias
permitam, nos mostra que a determinação das atividades pelas condições do
campo já era considerada por Capanema.
Um último aspecto a ser ressaltado neste fragmento das Instruções da
Seção Geológica diz respeito a idéia prévia de colaboração entre as diferentes
Seções da Comissão Científica.
Finalizada a parte geológica/mineralógica propriamente dita nas Instruções
da Seção Geológica, do item VIII em diante aparecem as recomendações em
relação aos estudos do solo e da agricultura. Capanema fala sobre a necessidade
de se recolher amostras de solo, juntamente com a vegetação correspondente.
Destas amostras, após experimentos, poderiam surgir respostas quanto a
melhoria da agricultura da região, inclusive através da sistematização do uso de
fertilizantes. Como explicita Capanema:

Acompanharão as ditas amostras [de solo] uma porção de


tronco, folhas e frutos dos vegetais que eles de preferencia
produzem, afim de que se possa analisar as suas cinzas, e
determinar à priori, à vista de uma vegetação, quais
elementos se deverão adicionar ao solo para produzir outra
qualquer que se intente, servindo dest'arte o estudo
geológico do país de guia ao agrônomo que procure cultiva -
los2.

Para melhor entender o papel da agricultura dentro do quadro nacional e no


contexto da Comissão, recorro a uma carta anónima destinada a Capanema,
recebida e publicada pelo IHGB, na ocasião da discussão das Instruções das
cinco Seções, contendo algumas reflexões sobre o trabalho da Seção Geológica.
A carta começa propondo uma análise económica sobre a produção dos
solos e comércio interno e externo de produtos agrícolas das províncias do

60
interior, dando inicialmente especial atenção à Província do Maranhão, onde
existiam fazendas produzindo gêneros agrícolas apenas para uso interno. O autor
anónimo propõe que a Comissão Científica deveria

Mostrar o mais aproximadamente o possível prejuízo que


sofrem as rendas da nação nas atuais circunstâncias, em
que os proprietários d'essas fazendas apenas produzem a
quantidade necessária para o seu consumo, privando não só
as e/asses não agricultoras dos benefícios do solo, como
também privando o país da sua primeira fonte de riqueza e
da prosperidade de seus habitantes53

No trecho acima, destaco pelo menos dois pontos que podem nos ajudar a
entender o contexto cultural da criação da Comissão. Um deles é a condenação
da agricultura de subsistência, a favor da produção em larga escala, favorecendo
o comércio dentro e, principalmente fora do Brasil, de gêneros agrícolas. Um
segundo ponto diz respeito ao cunho progressista da carta, buscando a riqueza e
prosperidade através do aumento do consumo dos gêneros agrícolas e do
aprimoramento da indústria local. O autor anónimo continua:

(. ..) e quando se conhecesse que existe equilíbrio entre as


forças produtivas e o consumo, a Comissão, penetrando as
causas de um tal aniquilamento, estudaria os meios mais
eficazes para remover esse estado de improsperidade do
distrito 54.

A proposta contida aqui é a de um estudo de mercado, de modo a otimizar


a produção e o consumo. Ao invés de uma supervalorização apenas da
agricultura, podemos ver o outro lado, que é suprir a indústria nacional de matéria
prima e aumentar as exportações. A agricultura por si só não representaria mais a
principal riqueza do país, mas continuaria fazendo parte do projeto de
modernização da indústria nacional.
Dando continuidade às Instruções da Seção Geológica, a partir do item IX,
Capanema passa a tratar da problemática da seca. Caberia à Seção Geológica

61
investigar a presença de água subterrânea e as possibilidades da construção de
poços artesianos. Aproveitando o processo de abertura do poço, Capanema
chama a atenção para se observar

as camadas sobrepostas do terreno, como também para


determinar a sua temperatura em diversas profundidades e
achar a que distancia da superfície é invariável o grau do
termômetro, e a rapidez com que o solo aquece e esfria55 •

Este trecho refere-se explicitamente à estratigrafia e às medidas de grau


geotérmico, também indicadores de idades de terreno. A relação entre as
diferentes temperaturas nas diferentes profundidades do globo terrestre e a idade
das diferentes camadas era usada desde Georges Buffon (1707-1788) (Rudwick,
1985). A discussão e o aprimoramento desta base de raciocínio para estimar a
idade relativa da Terra prolongou-se pelo menos até a descoberta da
radioatividade, em 1903, por Pierre Curie. O debate envolveu grandes nomes da
geologia européia, apresentando-se mais intensamente na segunda metade do
século XIX (Gould, 1983). Com base nisto, podemos ver que o uso da temperatura
terrestre no estudo da idade dos terrenos era extremamente atual para
Capanema, mostrando o quanto o naturalista brasileiro mantinha-se informado
sobre as discussões no velho mundo.
A questão da seca, presente nas Instruções da Seção Geológica, também
apareceu na carta anônima dirigida para Capanema, referenciada anteriormente:

Extensões de terreno outr'ora cobertas de ricos vegetais


acham - se hoje mudadas em áridos desertos sem o menor
vestígio de água!... Pois bem, esse mal será ou não
remediável? 55.

Cabia à Comissão Científica a resposta a esta questão. Pelo menos estas


eram as expectativas do autor da carta. Em outras palavras, a seca nos sertões do
Brasil já representava um problema concreto, carente de soluções, sendo razão
de preocupação para os naturalistas nacionais.

62
Dando continuidade as suas Instruções, Capanema nos itens IX e X chama
atenção para o recolhimento de amostras de água para posterior investigação
química de seu gases, sais e matéria orgânica e inorgânica, para o estudo sobre
possíveis usos medicinais destas águas.
Nos itens XI e XII, Capanema trata da erosão eólica e marítima, prevendo a
formação de bancos de areia. Ele se justifica, mostrando a importância desse tipo
de estudo:

É conveniente estudar com cuidado a formação de bancos


em rios e no mar pelas áreas transportadas pelo vento.
Acontece que em alguns lugares pequenas lagoas,
bebedouro de gado, são às vezes completamente
obstruídas, elevando - se no seu lugar um cômodo d'arêa, e
sendo este por sua vez removido deixa uma planície seca,
expondo assim as criações à sede57•

A formação de bancos de areia, além de levar a uma possível


desertificação do território, interfere também no planejamento da construção de
portos, o que nos parece ter sido um problema determinante para o Ceará do
século XIX.
Posteriormente, Capanema refere-se ao estudo de Hardy sobre o plantio de
árvores, que impediria o transporte de material pelos ventos e faria sombra para
que pudesse crescer nova vegetação no local e assim impedir a formação de
novos desertos. Esta solução para evitar a desertificação de alguns territórios
parece ser referência entre os naturalistas da época. Como é o caso do autor da
carta anónima para Capanema, já citada anteriormente:

O plantio de árvores, ao menos no alto das montanhas,


bastará [para evitar a seca]?/ e, neste caso, que espécies de
árvores se plantarão de preferencia, e em quanto tempo
germinarão ou medrarão? São estas outras questões de não
menor interesse que deve ocupar a atenção da Comissão58

63
Esta relação entre o plantio de árvores e terrenos secos aparece também
no livro de Tomas Pompeu de Souza Brasil, que como já vimos, foi um
personagem de destaque no quadro político-científico cearense:

Pela seca, além da ação dos raios perpendiculares do sol


sobre um terreno desguarnecido de árvores verdes, o que
eleva a temperatura pela reflexão, acrescem os incêndios
nos campos, que contribuem para ressecar a atmosfera
(Brasil, op.cit.: 56-57).

As secas estão diretamente relacionadas ao bom desenvolvimento da


agricultura e da criação de gado. Sobre a seca no Ceará, Capanema publicou pelo
menos dois trabalhos posteriores às atividades da Comissão Científica, onde ele
não apresenta soluções para amenizar a seca, e sim modos de se aproveitar a
falta de chuvas e diminuir as suas conseqüências negativas (Capanema, s/d).
Passando a diante nas Instruções da Seção Geológica, Capanema coloca a
necessidade de quantificar e qualificar a matéria orgânica e inorgânica contida nas
águas para possibilitar o cálculo do volume de terra carregado pelos rios
estudados. Relacionado a esta atividade, Capanema completa:

Atenta a dificuldade de obter essas informações em número


suficiente, ou em circunstâncias sempre propícias, o
resultado necessariamente só será uma aproximação a
verdade, cujos limites se irão se estreitando com o andar dos
tempos; porém mesmo assim inexato, pode fornecer muitos
dados de grande utilidade a engenharia59

Novamente, Capanema mostra-se ciente de que as condições do trabalho


de campo podem alterar as atividades científicas de sua Seção e os resultados
buscados.
E finalmente, finalizando a análise das Instruções de Capanema, o último
item das Instruções, o item XIII, atenta para a análise de lagoas ricas em material
vegetal, na intenção de achar linhito ou turfa para combustível. A grande
importância na procura de fósseis combustíveis, que mais de uma vez aparecem

64
nas Instruções de Capanema, foi diagnosticada por Lopes (1997: 49, op.cit.), ao
falar sobre a atividade da Seção Geológica do Museu Nacional, quando este
estava sob direção de· Burlamaque. Lopes afirma que o principal interesse do
governo continuou sendo a análise dos produtos minerais e particularmente de
combustíveis fósseis, para o que, a julgar pelo volume de documentos, o museu
foi de grande utilidade. Na obra da mesma autora, encontra-se a informação que
as primeiras amostras, que possivelmente conteriam carvão, vindas do Ceará
datam de 1830. Aliado a isto, no ano da partida da Comissão, em 1859, achou-se
petróleo nos Estados Unidos, o que aumentou o interesse pela descoberta de tais
combustíveis no Ceará, e no Brasil como um todo.

Passaremos agora a uma breve exposição do conteúdo das demais


Instruções.

2.2.2. Instruções da Seção Botânica

Francisco Freire Allemão dividiu os objetivos de sua Seção em duas partes


principais. A primeira trataria

do estudo dos vegetais silvestres, particularmente o das


árvores que fornecem madeiras de construção, resinas,
óleos, gomas, ou outro qualquer produto útil; e o das plantas
que possam aproveitar na medicina e na indústria 60.

Neste fragmento das Instruções está fortemente presente o caráter utilitário


das investigações botânicas da Comissão. Para atingir os objetivos desta primeira
parte, o trabalho de campo se centraria na coleta de partes diferenciadas das
plantas e seus produtos, tais como amostras de resinas e madeira. O material
coletado serviria para a elaboração de um ervário e para análises químicas,
quando houvesse suspeita de uso medicinal da planta. Os frutos seriam
encaminhados para tentativa de semeadura futura. Além disso, havia o objetivo
implícito nas Instruções de se coletar tudo em quantidade suficiente para ser
distribuído pelos museus nacionais, e mesmo estrangeiros61 .

65
A população local serviria como fonte de informação sobre os nomes e usos
tradicionais de cada vegetal, podendo ainda ser instruída para posterior coleta de
material, se no momento da passagem da Seção Botânica não fosse possível
realizar tal tarefa. Tais intenções de coleta nos remete ao exposto no Capítulo I
desta dissertação, onde foi tratado, entre outras coisas, do trabalho após as
atividades de campo, que englobaria nomear, classificar e catalogar os objetos,
para então constituir uma coleção.
Também incluso na primeira parte dos objetivos estaria o estudo da
Geografia Botânica:

Em cada localidade notará as espécies que naturalmente ali


vegetam, com o fim de concorrer para o delineamento da
geografia botânica 62•

No rastro das Viagens de Humboldt, a Geografia Botânica e a Geografia


Zoológica formam um dos caminhos principais que os naturalistas percorrem em
meados do século XIX. O trecho acima transcrito, evidencia que Allemão estava
interessado em mapear a distribuição dos vegetais no território, preocupação esta
presente desde o final do século XVIII, que acompanharia o processo de
valorização das peculiaridades da natureza brasileira. Para o desenvolvimento da
Geografia Botânica, as Instruções chamam a atenção sobre a observação do
relevo, clima e ocorrência de vegetação primária e secundária.
O surgimento desta área de conhecimento fez com que se definisse o
conceito de Região Botânica por volta de 1820 de Augustin Pyrame de Candolle,
que seriam espaços que contivessem uma flora particular, definida por suas
características físicas (Drouin, op.cit.). Veremos mais adiante, que ao elaborar o
Relatório das Atividades da Seção Botânica, Allemão faz uso de tal termo
O segundo objetivo colocado por Allemão englobaria

O estudo dos vegetais cultivados, e o sistema de cultivo


adotado no país; notando a qualidade das terras, as
influências atmosféricas, e quantos outros acidentes forem
benéficos ou nocivos à lavoura 63

66
É impossível não notar ao longo das Instruções da Seção Botânica a
intenção da exploração dos recursos vegetais e do solo, que aparece explícita nas
palavras de Allemão.

De modo geral, as Instruções elaboradas por Allemão são pouco


detalhadas, e não chegam a completar duas páginas da Revista do Instituto.
Porém abrangem grande parte das atividades de campo relacionadas ao estudo
dos vegetais observadas até a atualidade, o que mostra objetividade. Passaremos
agora a tratar das Instruções da Seção Zoológica.

2.2.3. As Instruções da Seção Zoológica

As Instruções da Seção Zoológica, escritas por Manoel Ferreira Lagos,


apresentam-se de modo longo e detalhado, e igualmente as da Seção Geológica,
as Instruções de Lagos também foram divididas em itens.
Já no primeiro item, Lagos declara que a importância dos estudos
zoológicos localiza-se nas utilidades e proveitos que os animais apresentam:

A Zoologia não se limita a uma descrição simples e rigorosa


dos animais distribuídos sobre a superfície do globo terrestre;
(...) ela ocupa-se também, e é o mais essencial, do proveito
que as artes, a medicina e a economia doméstica podem tirar
das numerosas legiões de viventes que povoam o ar, a água
e a terra. Concebe-se assim quão imenso é o domínio deste
ramo da história natural, e as vantagens que resultam do seu
estudo, entendido como deve sef4.

Neste primeiro trecho, percebemos que Lagos concebe a Zoologia como


uma ciência útil e aplicada, mas não deixa de dar importância para o lado da
sistemática, incluindo as várias classificações da época, presentes na história
natural. Em relação a isto, nas próprias palavras de Lagos, os animais devem ser
considerados

como objetos de História Natural, e deste modo classificados

67
segundo algum sistema particular; ou estatisticamente como
manancial de riqueza, e apreciados segundo a sua
importância. Interessa que sejam estudados de ambas as
maneiras, o que compete ao membro da Expedição
Científica encarregado da parte Zoológica 65.

Seguindo o que parece ser um padrão nas diversas Instruções, Lagos em


suas Instruções da Seção Zoológica atenta para a importância de se recolher
dados referentes ao conhecimento tradicional e popular, colocando que o
integrante responsável da Seção Zoológica

terá portanto a obrigação de descrever exatamente todas as


espécies de animais que encontrar, vertebrados ou
invertebrados, com seus nomes vulgares e sinonímia dos
científicos, descriminando os exóticos dos indígenas66•

Mais adiante, Ferreira Lagos indica o método de classificação zoológica de


Georges Cuvier (1769-1832), e dedica maior atenção para os animais menos
conhecidos:

Quanto ao [animais] pertencentes à fauna do país,


averiguará o seu habitat peculiar, e a sua abundância ou
escassez, distinguindo com maior atenção os animais
imperfeitamente descritos, ou de todo ignotos, dos que já são
conhecidos, e assinando àqueles pelos seus caracteres os
lugares que lhes cabem no sistema geral de Cuvier, ou outro
preferido segundo a e/asse respectiva 67•

Desconfiamos que existe uma predileção de Lagos pela classificação de


Cuvier, pois este naturalista é citado pelo chefe da Seção Zoológica inúmeras
vezes. Continuando com as Instruções da Seção Zoológica, Lagos coloca a
questão do maior interesse geral que o homem possui em relação aos mamíferos,
à moda de Buffon, pela proximidade destes animais ao homem, tanto cotidiana
quanto taxonomicamente. Porém, Lagos delimita a atuação de sua Seção:

Ficará porém o diretor da Seção Zoológica dispensado de

68
tratar da antropologia, visto estar privativamente sob a
responsabilidade de outro membro a parte etnográfica dos
trabalhos da Comissão Científica 58

De acordo com as palavras de Lagos, não podemos, afirmar que a fronteira


entre os estudos sobre os homens e os estudos sobre os animais estaria
completamente delimitada na Comissão, ou se apenas houve uma separação de
trabalhos de fundo organizacional. A necessidade de tal esclarecimento nas
Instruções talvez derive do fato que na organização das ciências naturais, a
Antropologia se apresentava associada à Zoologia no final do século XVIII e início
do XIX. Bilbao (op.cit.) localiza o nascimento da antropologia fisica em meados do
século XVIII, apesar de o termo 'antropologia' começar a se difundir somente no
início do século XIX. Foi neste século também que se iniciou a separação entre
antropologia física e social.
Em seguida, Lagos inicia seus comentários em relação a aspectos
importantes no estudo de campo dos mamíferos. Afirma que os grandes
quadrúpedes já eram bem conhecidos, porém os pequenos ainda não haviam sido
catalogados na sua totalidade. E então, completa:

Importa averiguar os seus atos, as condições exteriores que


se ligam a sua existência, e a influência que exercem sobre
eles69.

No trecho acima, Lagos coloca em voga o estudo das relações entre o meio
e o indivíduo. Este tipo de investigação, no contexto das Instruções da Seção
Zoológica, está diretamente ligada com a intenção do uso dos animais pelo
homem. Como bem afirma Lagos:

Mas entre todas as noções que se procurar adquirir,


merecem primazia, por importantíssimas, as que se referem
aos serviços que os quadrúpedes podem prestar, pois é a
e/asse de animais que permite as mais numerosas
aplicações às nossas necessidades, de uns nos utilizamos
enquanto vivem, de outros só depois de mortos, e de muitos

69
tanto vivos quanto mortos70•

Existe portanto a clara intenção de exploração da fauna da província a ser


estudada. Vale lembra que 'quadrúpede' é um termo tipicamente não lineano, cuja
manutenção foi preferida por Buffon. Porém, Lagos, ao que nos parece, usa os
termos 'mamífero" e 'quadrúpedes' de forma indiferenciada.
Dando continuidade, Lagos parte para os aspectos pertinentes ao estudo
das aves:

Descrevendo fielmente as aves de todas as ordens, não se


olvidará de registrar quanto for relativo a seus hábitos,
sustento, reprodução, nidificação, incubação e criação da
progenitura 71 •

Adiante, comenta sobre as dificuldades da nomenclatura dentro da


ornitologia, devido às diferenças morfológicas evidentes entre macho e fêmea de
uma mesma espécie, ou até mesmo entre indivíduos jovens e adultos, que
comumente recebem classificações diferentes. Para minimizar este aspecto,
Lagos instrui que se deve

reunir de cada uma [das espécies], o que nem sempre será


fácil, o macho, a fêmea, e de ambos o novo, o adulto e o
velho. (...) é conveniente remeter, sendo possível, os ninhos
e ovos pertencentes a cada uma, que são objetos um pouco
desprezados nos museus, e todavia tão interessantes para o
ornitologista como as mesmas aves72.

Assim como Capanema em suas Instruções, Lagos mostra-se ciente das


dificuldades existentes no trabalho de campo, que por vezes impede a coleta ideal
dos objetos de estudo. E não poderia deixar de comentar:

A economia rural, as artes e o fasto põem em contribuição e


tiram grande partido de numerosas aves: é isto um assunto
merecedor de toda a ponderação para o comércio 73•

70
Finalizando a parte do estudo das aves, Ferreira Lagos segue adiante com
a ictiologia, que teria por fim

o conhecimento completo dos peixes, animais muito


variados, e também dignos em tudo de chamar a atenção do
naturalista: diversidade de famílias abrangendo grande
número de espécies, muitas das quais, a par dos mamíferos
e das aves, nos abastecem de preciosas matérias
empregadas nas artes e na farmácia (...), certas nações se
alimentam quase exclusivamente de peixes 74•

Igualmente aos mamíferos e aves, os peixes também receberam destaque


pelas suas utilidades para o homem. Em seguida, Lagos ressalta que

nunca haverá demasia de esforços tendentes ao progresso


da ictíologia. As razões expandida acresce a não menos
atendível de achar-se o Museu Nacional mui pobre neste
ramo, e por isso convém formar uma boa coleção de
peixes 75.

A intenção de coletar material para o Museu Nacional, evidente inclusive no


momento da proposta da Comissão, aparece então explicita no trecho acima das
Instruções da Seção Zoológica. Mais adiante, Lagos coloca comentários sobre a
classificação dos peixes, assim como o fez com os mamíferos e as aves,citando
como referência os magníficos trabalhos de Lacêpéde, de Müller, e [novamente] a
obra monumental de Cuvier6• Recomenda ainda que o trabalho de coleta deverá
ser realizado juntamente com os pescadores locais. Sobre estes trabalhadores,
Lagos completa:

Tomar-se-á também indispensável entreter uma


correspondência regular com pescadores de diversas
paragens, principalmente das mais piscosas, dando-lhes as
convenientes instruções e pagando com generosidade
qualquer espécie desconhecida que apanhem 77•

71
Atenta ainda para as observações que devem ser feitas acerca do estado e
organização das pescarias, desenhando, descrevendo, recolhendo amostras de
instrumentos e estudando as técnicas usadas, e se necessário, tornando a
pescaria mais produtiva. A Figura 2.1 mostra o pescador em sua prática de
trabalho.
Lagos parte então para o que ele considera a quarta e última classe dos
vertebrados, composta pelos répteis, os quais dividiu em Cheloneos, Saureos,
Batrichios e Ophidios. Inicia esta parte das Instruções comentando sobre a
necessidade de reconhecer, dassificar e nomear as cobras brasileiras, usando
também informações da cultura local, quanto aos nomes e potencial do veneno
dos ofídios. Quanto a isto, Lagos coloca:

Não se julgue futilidade o conhecimento dessas tradições


teratológicas que a crença popular, sempre ávida do
maravilhoso, vai transmitindo de boca em boca; arquivadas,
quando mais não seja servirão de tema para a poesia
brasileira 78•

E completa citando a fascinação que as cobras causam no homem,


referenciando a obra Erpetologia gerai/, de Dumeril e Bibron, que considerava até
então a mais acurada publicação sobre répteis 79 .
Passando então para os invertebrados, o naturalista divide este vasto grupo
em moluscos, crustáceos, aracnídeos, miriápodes, insetos, anelídeos e zoofitos.
Importância maior foi dada para os insetos nas Instruções da Seção Zoológica, e
Lagos se justifica:

A entomologia, segundo o pensar de muitos, não é uma


ciência frívola, não é própria para satisfazer uma vã
curiosidade, mas sim utilíssima e digna de ocupar os mais
sérios espíritos80.

Quanto a utilidade dos insetos, Lagos coloca alguns exemplos de usos em


indústria da conchonilha, e dos lepdópteros que produzem fios de seda. Caberia à
Seção Zoológica estudar a quantidade e qualidade deste produto, assim como as

72
influências do ambiente no nascimento e desenvolvimento desses insetos. E
depois completa:

O verdadeiro bicho da seda ('Bombix mori', L.) não é o único


inseto que produz tão preciosa matéria, como se sabe: o Dr.
Chavannes publicou em 1855 o resultado de suas
indagações sobre diversas espécies de 'Satumias', entre as
quais distingue a 'S. aurora' e 'S. aethra'; a primeira muito
comum nos arrebaldes desta cidade, e a segunda na Bahia,
fornecendo aquela uma porção de seda sete vezes mais
considerável que a 'Bombix mori' ou do 'Cynthia"81 .

Neste trecho, podemos ver que Lagos mantinha-se atualizado sobre as


publicações sobre a Zoologia brasileira, e novamente é explícita a intenção de
exploração dos recursos naturais. Logo em seguida, o naturalista destaca um
outro grupo de insetos, os Himenópteros, principalmente as abelhas, por
produzirem mel e cera. E completa:

Na ordem dos Hemipteros existem diversos insetos do


gêreno 'Coccus', que também produzem ceras, das quais
apareceram várias amostras na grande exposição geral da
França, remetidas da China82•

Aqui podemos ver que Lagos acompanhava os eventos científicos que


ocorriam na Europa, destacando a importância das grandes exposições como
modo de difundir as descobertas de cada área de conhecimento. Como veremos,
Lagos organizaria a primeira grande exposição do Museu Nacional, a Exposição
da Indústria Cearense.
Finalizando o estudo dos insetos nas suas Instruções, Lagos chama a
atenção não só para o uso industrial desses animais, mas também no controle de
doenças, além de pragas na agricultura.
Em um segundo momento, o naturalista atenta para questões que norteiam
o trabalho de campo na área da Zoologia, que são igualmente importantes. A
primeira delas diz respeito ao número de exemplares a serem recolhidos, que, se

73
possível, seria o suficiente para depositar no Museu Nacional, em outros museus
brasileiros e, trocar com museus estrangeiros.
Uma segunda questão levantada por Lagos tràta da preparação· e fixação
dos animais coletados. O naturalista resgata neste momento de suas Instruções a
Instrução arranjada pelo Museu de Paris, e traduzida por profissionais do Museu
Nacional, e o Manual do naturalista preparador, de Boitard, que seriam obras
referenciais para o bom preparo do material coletado. Sobre este tema, Lagos
ressalta a importância da confecção de desenhos fieis às cores, sobretudo
fazendo uso de uma escala cromática, para evitar que os desenhos pequem pelo
lado do falso colorido, como se observa principalmente na e/asse dos insetos83.
Uma terceira questão levantada versa sobre a importância da coleta e do
bom acondicionamento de ossadas e vísceras. Os ossos, segundo Lagos, teriam
papel fundamental na paleontologia, que na época começou a confrontar os ossos
das gerações perdidas com os das existentes em nossos dias84 . Nas vísceras, se
deveria procurar os caracteres genéricos e específicos dos animais, segundo
ensina o imortal Cuviel5.
A seguir, Lagos trata do envio de animais vivos para a Corte, e a devida
instrução que deveria ser dada sobre o tratamento destes animais durante a
viagem. Sobre o destino dos exemplares vivos, Lagos coloca:

Quando o governo imperial não possa ainda realizar a idéia


do digno diretor do Jardim Botânico, o conselheiro Candido
Batista de Oliveira, de criar naquele estabelecimento um
parque zoológico, à imitação dos existentes em outras
nações cultas (. ..), serão esses animais oferecidos à
Sociedade Imperial Zoológica de Aclimatação fundada em
Paris, ou a algum outro núcleo do mesmo gênero, lucrando
assim a ciência e a humanidade86.

74
Figura 2.1: Vendedores de peixe. Imagem elaborada pelo pintor da Comissão
Científica, José dos Reis Carvalho (Museu D. João VI, Escola de Belas Artes-
RJ)s3_

83
Agradeço a Prof. Ora. Lorelay Brilhante Kury pela indicação da localização do acervo iconográfico
da Comissão Científica.

75
Tanto neste fragmento das Instruções, como no que Lagos fala em troca de
exemplares zoológicos com museus estrangeiros, vemos explícitas algumas
medidas tomadas pelos diretores do Museu Nacional para a implantação do seu
novo ideal de funcionamento (Lopes, 1997, op.cit.), já discutido no presente
trabalho.
E por último, Lagos destaca a questão do diário de campo, colocando que

são tantos os objetos de que vai ficando sobrecarregada a


memória de um viajante observador, que não deve contar
sempre com ela, por mais feliz que a tenha 88.

A seguir, veremos as Instruções da Seção Astronómica e Geográfica.

2.2.4. As Instruções da Seção Astronômica e Geográfica.

As Instruções da Seção Astronómica e Geográfica foram redigidas em três


itens principais pelo Conselheiro Cândido Batista de Oliveira. O primeiro deles
divide as atividades desta Seção em duas classes. A primeira trataria das
observações astronómicas e topográficas, assim como a localização geográfica
dos locais de interesse. A segunda classe de atividades compreenderia os
trabalhos de mera investigação, que interessarem imediatamente à física geral do
globo89 , numa menção à terminologia de Humboldt, e a observação de aspectos
relacionados à Geografia e Astronomia para elaborar sugestões de melhoria do
território que viria a ser explorado.
O segundo item contém as especificações dos trabalhos da primeira classe
de atividades. Relacionado à primeira classe, inicialmente a Seção Geográfica,
aproveitando um possível deslocamento pelo mar, determinaria a localização
geográfica das cidades litorâneas e seus portos. Consta nas Instruções desta
Seção, que tal determinação geográfica seria feita através de medições do
meridiano e da latitude, usando para tanto observações astronómicas, como a
declinação das estrelas e os períodos lunares. É interessante notar que o Pão de

77
Açúcar, situado no Rio de Janeiro, seria usado como meridiano referência nas
Instruções, juntamente com mais dois outros pontos que seriam definidos no
campo, durante as atividades.
Para marcar os locais determinados, as Instruções aconselham que se siga
um método um tanto interessante:

na profundidade de cinco palmos, se enterrará uma garrafa


de vidro comum, fechada hermeticamente ao maçarico,
depois de ser nela depositada uma nota escrita, contendo a
expressão numérica da latitude e longitude observadas, a
variação local da agulha magnética de declinação, a
temperatura e pressão barométrica médias do dia da
observação90.

Tanto nas travessias marítimas quanto nas terrestres, a Seção Astronómica


deveria marcar e determinar geograficamente os locais, de modo que tais
determinações possam aproveitar para o futuro a construção da carta geral do
lmpério91, ou seja, existia o objetivo explícito da elaboração de um mapa
geográfico.
Dando continuidade, as Instruções indicam a preferência pelos pontos
situados nas margens dos lagos e rios para a determinação geográfica, dando
maior atenção aos situados nas confluências dos rios e no encontro destes rios
com o oceano. Seria observado também certos aspectos, como fluxo e curso,
pretendendo assim diagnosticar a sua navegabilidade.
Também faria parte das atividades da primeira classe as observações
meteorológicas, incluindo aqui a detecção das temperaturas média e máxima
locais, medindo-as diariamente as nove da manhã e as três da tarde.
Finalizando este segundo item, as Instruções chamam a devida atenção
para o diário de campo:

78
O chefe da Seção Astronómica encarregará um dos seus
adjuntos de descrever, em um livro apropriado para servir de
jornal das operaçôes a seu cargo, cada um dos trabalhos
executados, com a devida regularidade 92•

Partindo para o terceiro e último item, as Instruções da Seção Astronómica


tratam das atividades da Segunda classe, também chamadas pelo autor das
Instruções de Trabalhos de Investigação.
Além de vários estudos comparativos sobre pressão e umidade do ar nas
diferentes temperaturas, os trabalhos da segunda classe envolvem atividades
conjuntas com a Seção Geológica, como demonstra o trecho adiante:

Convirá que a Seção Astronómica, de acordo com a Seção


Geológica, faça (. ..) os precisos exames de sondagem, a fim
de descobrir os indícios que possam servir de guia para
tentar-se oportunamente a abertura de um poço artesiano93•
Adiante, as Instruções citam informações sobre poços abertos
recentemente no continente africano, que deveriam servir de exemplo para a
abertura de poços artesianos no Brasil, principalmente pelo bom fornecimento de
água.
Finalizando as Instruções da Seção Astronómica e Geográfica, seria
atividade desta Seção o estudo sobre a abertura de vias de comunicação, tanto
terrestre quanto aquáticas, para promover o desenvolvimento do interior da
província que viria a ser explorada, e no caso desta parte das presentes
Instruções, tal província é explicitamente representada pelo Ceará:

A Seção Astronómica fará (...) um estudo acurado sobre a


conveniência e praticabilidade da abertura de comunicações
fáceis entre os centros de produção do interior da província
do Ceará e os seus portos94

79
E, finalmente, comentaremos sobre as Instruções da Seção Etnográfica.

2.2.5. As Instruções de Seção Etnográfica e Narrativa da Viagem

As Instruções da Seção Etnográfica, redigidas por Manoel de Araújo Porto


Alegre, foram elaboradas em dezesseis itens.
Já no início, as Instruções propõem que fossem feitos estudos sobre a
distinção das raças humanas, usando como base a organização física, o caráter
intelectual e moral, as línguas e as tradições históricas95 de cada povo,
principalmente os indígenas, postulando que estes elementos diversos não
[tinham] ainda sido estudados, sobretudo relativamente aos indígenas do Brasif6 •
Segundo o próprio Porto Alegre, tais estudos seriam a base da etnologia que seria
desenvolvida pela Seção Etnográfica, buscando com isso, chamar o homem
genuinamente americano (... ) a compartilhar os bens da civilização, e
voluntariamente prestar-se à comunhão brasileira97• Veremos adiante, que
paralelamente a isso, existia um interesse na cooptação da mão de obra indígena.
Dando continuidade, as Instruções chamam a atenção para o importante
papel dos desenhos na etnologia, que deveriam ser elaborados de perfil e face,
tanto do homem quanto da mulher. Para os estudos comparativos propostos entre
o indígena selvagem, o indígena civilizado e o homem civilizado, além dos
desenhos, seria necessário, segundo Porto Alegre, tirar grande número de
medidas corporais, tanto angulares quanto de comprimento, buscando averiguar a
teoria de Camper, onde a abertura do ângulo craniano seria proporcional à
inteligência.
As Instruções da Seção Etnográfica atentam também para a observação da
postura, força e gesto dos índios, tanto durante o trabalho como no lazer,
buscando assim diferenciar o indivíduo ocioso do trabalhador.
Além do estudo do físico, as Instruções propõem também o estudo da
linguagem, gramática e vocabulário dos indígenas, também de seus costumes na
vida familiar, educação, nas diferentes fases de desenvolvimento, observando
seus cantos, rituais, objetos ornamentais e de trabalho.

80
Em relação ao conhecimento indígena, as Instruções atentam para as suas
estratégias e meios relacionados principalmente à medicina, orientação espacial,
produção agrícola e seus usos industriais. Também propõe o estudo de sua
religião, crenças e superstições. Neste ponto das Instruções, é explícita a intenção
conhecer para dominar, atraindo para a indústria tantos braços perdidos98.
Finalizando a parte etnográfica, Porto Alegre nas Instruções coloca a
importância do recolhimento de utensílios, instrumentos musicais, armas e
ornatos, assim como tudo que possa servir de prova da indústria, usos e costumes
dos indígenas99•
As Instruções referentes à narrativa da Viagem chamam a atenção para
alguns aspectos importantes de serem observados diariamente, como
curiosidades, tanto dos indígenas como dos membros da Comissão Científica em
geral, comércio, indústria e dados estatísticos da província que seria explorada,
além de obter cópias dos documentos que a Seção julgasse importantes para o
melhor entendimento da história e geografia brasileiras.

Uma vez redigidas as Instruções de Viagem, a Comissão Científica


organizou, em 1859, a exploração das províncias menos conhecidas do norte,
pretendendo assim cumprir os seus objetivos já discutidos e expostos nas
Instruções de Viagem.

2.3. O destino da Comissão Científica:

Com a missão de realizar a construção do nacional assentado na base


física do território (Figueirôa, 1997: 81, op.cit.), projeto absorvido da concepção
dos intelectuais do IHGB e da SAIN, tornou-se necessário conhecer as províncias
menos conhecidas do Brasil, ou seja, as do norte e nordeste. Como sintetiza
Guimarães, a SAIN e posteriormente o IHGB idealizavam integrar as diferentes
regiões do Brasil de forma a viabilizar efetivamente a existência de uma totalidade
'Brasil' (Guimarães, 1998: 8, op.cit., grifo do autor).

81
Esta concepção de integração do território encontrava legitimação em
setores da elite letrada brasileira, como expressa o trecho a seguir extraído de um
jornal da época:

Estranhas umas às outras, falta às nossas províncias a força


do laço moral, o nexo de nacionalidade expontânea que
poderia prender estreitamente os habitadores desta imensa
peça, que a natureza abarcou com os dois maiores rios do
universo. (...) Uma história geral e completa do Brasil resta a
compor, e se até aqui nem nos era permitido a esperança de
que tão cedo fosse satisfeito esse 'desideratum', hoje assim
não acontece, depois da fundação do Instituto Histórico,
cujas importantíssimas pesquisas no nosso passado deixam
esperar, que esta ilustre corporação se dê à tarefa de
escrever a história nacional100

Quando vamos apanhar insetos no Ceará?, perguntas tu 101 . Este é um


trecho extraído de uma correspondência pessoal entre Ferreira Lagos e
Gonçalves Dias. Quem escreveu foi Lagos em resposta da carta de Gonçalves
Dias, recebida por ele em 13 de setembro de 1856. Segundo Braga (op.cit.), a
escolha da província do Ceará como destino da Comissão Científica se deu no
início de 1857, posterior às correspondências referenciadas acima.
Mas a informação de Renato Braga é coerente com o que Gonçalves Dias
escreveu no proêmio do Trabalhos da Comissão Científica, relatando algumas
particularidades da preparação para a saída da Comissão do Rio de Janeiro, pois
os agentes do governo imperial, encarregados das compras do material
indispensável para o transporte e estudos da Comissão Científica, [tinham que se
preparar] para a dupla eventualidade de uma expedição por terra e por água102•
Ainda segundo Gonçalves Dias, apesar de o destino da Comissão desde o
início apontar para a região norte, na ocasião da apresentação das Instruções de
Viagem não se sabia ao certo quais as províncias específicas que iriam ser
exploradas, e muito menos o ponto de partida da Expedição. Tão vaga era essa
informação, que bem poucos puderam supor haver de ser a cidade de Fortaleza o

82
porto do desembarque da Comissão Científica, e a província do Ceará aquela pela
qual haveriam de estrear103 . Mas existem indícios, tanto nas Instruções como em
correspondências pessoais entre os membros da Comissão Científica, de que a
província do Ceará já era uma candidata forte, pelo menos mais forte do que quis
mostrar Gonçalves Dias e estabeleceu Braga (op.cit.), para tornar-se sede dos
trabalhos da Comissão Científica.
De acordo com o exposto por Dias, as Instruções de Viagem das cinco
seções foram redigidas 104 e publicadas anteriormente à escolha oficial do ponto de
partida da Comissão Científica e do local exato do desenvolvimento de seus
trabalhos.
As Instruções da Seção Astronômica e Geográfica por um lado contêm
indícios de que o destino da Comissão Científica não era conhecido. O
conselheiro Cândido Baptista de Oliveira, o autor das referidas Instruções, refere-
se à província em que deverá encetar os seus trabalhos regulares, ou à província
onde houver de fiXar-se temporariamente a Comissão Exploradora 105 . Por outro
lado, em outros dois trechos, a província do Ceará é especificamente mencionada:

O extenso e acessível 'plateau' que coroa o cimo da serra do


Araripe, na província do Ceará, no termo da comarca do
Crato, oferecerá à Seção Astronômica as mais favoráveis
condições talvez para levar a efeito os estudos comparativos
acima indicados 106.

Do citado acima, podemos extrair que havia, senão uma definição, mas
uma predileção para os trabalhos da Seção Astronômica e Geográfica serem
desenvolvidos na região da província do Ceará.
Já no trecho a seguir das mesmas Instruções, o Ceará aparece como rota
certa e obrigatória, não apenas para a Seção Astronômica, mas para a Comissão
Científica inteira:

Achando-se a Comissão Exploradora na província do Ceará,


a qual sofre periodicamente o flagelo de secas

83
devastadoras,.(...) a seção Astronómica fará um estudo
acurado sobre a conveniência e praticabilidade da abertura
de comunicações fáceis entre os centros de produção do
interior da província do Ceará e os seus portos 107.

Em complemento a este trecho das Instruções da Seção Astronômica e


Geográfica, as Instruções da Seção Geológica e Mineralógica fazem referência à
resolução dos problemas da seca, famosos na província do Ceará. Esta é a única
informação contida nas Instruções da Seção Geológica que nos indica uma
preferência pela região dos sertões província do Ceará para o destino da
Comissão Científica.
Se as pistas que apontariam para o Ceará são escassas nas Instruções da
Seção Geológica e Mineralógica, estas são muito presentes na carta anônima já
mencionada, dirigida a Guilherme de Capanema, publicada ainda em 1856 no
jornal O Fluminense. A carta continha algumas reflexões sobre o que planejavam
ser as atividades da Seção Geológica e Mineralógica da Comissão, explicitadas
nas Instruções da mesma Seção. A carta inicialmente trata de assuntos referentes
à da província do Maranhão, fundamentalmente os problemas desta província em
relação ao cultivo e comércio de produtos agrícolas.
Em seguida, o conteúdo da carta anônima atenta para os problemas da
seca na província do Ceará, assim como para o aprimoramento dos estudos sobre
a melhoria do solo e introdução de culturas vegetais novas na região. Isso pode
ser um indício de que possivelmente havia um interesse por parte de alguns
setores da elite brasileira de que a Comissão Científica se dirigisse
especificamente à província do Ceará.
Já as Instruções da Seção Etnográfica e Narrativa da Viagem tratam quase
que na sua totalidade de estudos etnográficos sobre os índios. E se ressaltarmos
que a população de Fortaleza em meados do século XIX apresentava apenas 10%
de escravos, na maioria mulheres (Braga, op.cit) e os outros 90% eram compostos
de homens brancos, indígenas e seus descendentes, desta fonma, apesar de a
província do Ceará não ser mencionada nas Instruções da Seção Etnográfica, ela
representava um terreno fértil para os trabalhos desta Seção. Aliado a isto, havia

84
um interesse em integrar as populações indígenas aos mercados de trabalho e
consumo, em uma tentativa de desenvolver a indústria brasileira. Esta intenção foi
explicitada nas Instruções da mesma Seção:

É igualmente de grande utilidade indagar qual a opinião em


que eles [os índios] nos tem, quais suas queixas de receios
fundamentais, para estudar os meios de remover este
obstáculo com o fim de chamar a indústria tantos braços
perdidos, e diminuir o número de inimigos intemos 108.

Além disso, relacionado à população indígena do século XIX, Alegre (1989)


coloca a busca por uma cultura autenticamente nacional, e a recuperação das
tradições populares como uma necessidade da época, tanto para definir a
identidade cultural brasileira, como para documentar uma cultura que era
considerada em vias de extinção pelas próprias Instruções. Cultura esta que não
poderia ser representada pela cultura negra africana, e a quantidade reduzida de
escravos na população de Fortaleza tornaria aquela região propícia para o
desenvolvimento das atividades da Seção Etnográfica.
As Instruções das Seções Botânica e Zoológica não contêm referências
diretas ou indiretas à província alguma.
Fora o explicitado nas Instruções de Viagem das cinco Seções da
Comissão Científica, um outro interesse pela Capitania do Ceará pode ser
encontrado na suposta riqueza do solo daquela província. A procura por tais
riquezas aparece em documentos desde pelo menos 1649, quando os holandeses
tentaram a extração de prata na região por cinco anos. A procura pelo metal durou
cerca de vinte anos, se considerarmos o nordeste em sua totalidade (Braga,
op.cit.).
Aliado a isto, em 1741 algumas amostras minerais do Ceará foram
remetidas para análise em Lisboa. Dando continuidade a essas investigações por
carta régia de 11 de outubro de 1742, Antônio Giz de Araújo, Manoel Fernandes
Lesada e João Baptista Rodrigues receberam permissão para mandarem vir da
Alemanha 5 mestres e oficiais de fundir e separar metais para trabalharem nas
minas de ouro do Ceará (Studart, 2001 ). Dentre os resultados desta investigação,

85
estava o funcionamento de minas de ouro e prata em São José dos Cariris e na
Serra de Uruburetama, assim como de salitre em Pilão Arcado e Salinas de cima,
distrito da Nova Vila do Rio Grande. Em 12 de setembro de 1758, uma ordem
régia recomendaria a interrupção de todos os trabalhos de exploração de minas
da Capitania, locais que o naturalista Feijó percorreria ao chegar no Ceará em fins
do século XVIII.
Acreditamos que a escolha do destino da Comissão Científica- o Ceará-,
tenha sido influenciada também por essas iniciativas pioneiras e suas
sistematizações pelas obras de Feijó, dado o interesse de Freire Allemão
previamente despertado por tais obras e por aquela província, e o importante
papel de Allemão dentro da Comissão Científica, já que além de diretor da Seção
de Botânica, ocupava juntamente o cargo de Presidente da Comissão109. A obra
de Feijó - Coleção Descritiva das plantas da Capitania do Ceará -, sistematizada
por Freire Allemão possivelmente entre os anos de 1803-1805 e em parte
recuperada por Silva Maia, como já foi citado, seria um guia para os trabalhos
botânicos no Ceará.
Se não são muito precisos os motivos da escolha da província do Ceará,
Gonçalves Dias justifica tal escolha a posteriori com um argumento de peso, que
aparece no Proêmio do Trabalhos da Comissão Científica (op.cit.: VIII) publicado
em 1862:

(.. .) a opinião de que existiam grandes depósitos de metais


preciosos no Ceará corria incontroversa; e essa opinião
fortalecia - se com existirem no Museu Nacional amostras,
colhidas naquela Província, de galena de chumbo, e uma
delas argentífera, de sulfuretos de antimónio e de zinco, de
molibdato de chumbo, de ouro, cobre e ferro, além de salitre,
soda, potassa, pedra - ume, caparrosa e xistos betuminosos.
Pareceu portanto, e era acertado, verificar - se de uma vez
por todas o que nisso haveria de real.

Como já foi citado, as memórias mineralógicas de João da Silva Feijó eram


conhecidas pelos membros da Comissão Científica, e traziam consigo a

86
informação que o solo da província do Ceará tinha potencial de riqueza,
principalmente ferro e salitre. Alguns autores, como Alegre (op.cit.: 207-208),
afirmam categoricamente que a presença de metais preciosos foi a razão
fundamental da escolha do Ceará como província a ser explorada. Porém tal
afirmação merece estudos complementares, já que o próprio Gonçalves Dias ao
considerar este aspecto, após um levantamento histórico, cita de forma crítica as
origens da crença sobre a suposta riqueza da província:

A obra de um escritor de princípios deste século [XIX], que


não mereceu e mal merecia as honras da impressão, mas
que existe no opulento arquivo do Instituto Histórico
Brasileiro, mais talvez do que nenhuma outra causa
concorreu para propagar-se aquela opinião entre os
cearenses e passar deles a todos os brasileiros. O autor,
filho do Ceará, não soube achar nenhum outro meio de
engrandecer a sua terra senão anunciando pomposamente
ricas minas, indícios de tesouros ocultos e curiosidades
maravilhosas: coisas facilmente críveis, porque eram mais
próprias para ferir a imaginação do povo, do que para
convencer a razão do homem refletido 110.

O autor filho do Ceará, a quem Gonçalves Dias se refere, é o Padre


Francisco Telles de Menezes Lima, segundo o próprio Dias. Tais boatos, somados
ao interesse pelas obras de Feijó, se seguirmos Gonçalves Dias, só foram dignos
de atenção após serem reforçados pela presença no Museu Nacional de amostras
de minerais vindas do Ceará. O Museu continha também amostras provenientes
da Bahia e do Maranhão, sob a responsabilidade de análise de Capanema. Estas
respectivas amostras fizeram com que Capanema, antes de iniciar as suas
atividades no Ceará, permanecesse alguns dias na Bahia a procura das supostas
riquezas minerais.
Com o material levantado até agora, não podemos ter certeza quanto ao
momento da escolha da província do Ceará para os trabalhos da Comissão
Científica, e tão pouco elencar de modo preciso as influências para tal escolha.

87
Podemos porém ter claro que o Ceará era uma província considerada fértil para as
ciências naturais pelos próprios naturalistas, com uma história oficial ligada às
ciências desde o Brasil colonial, e que a escolha pot esta província de maneira
alguma foi neutra, já que, de acordo com o exposto, podemos dizer que havia
interesses pessoais e profissionais para se realizar uma expedição científica no
Ceará.

2.4. A partida da Comissão Científica

Ao contrário do que planejou Raja Gabaglia, e de certa forma alguns dos


setores das elites brasileiras, decorreu um longo tempo entre a proposta da
criação da Comissão em maio de 1856 e a sua partida em 1859. Tal demora foi
atribuída por Braga (op.cit.) à presença do Marques de Olinda no ministério. Esta
idéia é explicitada em trechos de correspondência de Capanema para G. Dias, em
12 de novembro de 1857:

Já recebeste as minhas lamentações da vez passada agora


digo-te em todo o segredo que será uma imprevidência de
nossa parte partir para o Sertão enquanto Olinda for ministro.
(. ..) Ora supõem tu que o velho Marquês quando estivermos
lá no interior se lembra de repente que os Cofres públicos
não suportam tal expedição sem mais nem mais nos
suspendam (...) pensa e reflete bem e maduramente nessas
circunstancias e demorem as encomendas a que esta nas
mãos do Gabaglia, sobretudo assim ganhamos tempo e
iremos quando Deus nos favorecer(. ..) 111•

Capanema acreditando então que Olinda fosse desconsiderar a Comissão,


fez o que pôde para adiar a saída da expedição. E o que estava ao seu alcance
era atrasar o retorno de Gonçalves Dias e Raja Gabaglia para o Brasil, apesar das
ordens oficiais para que eles não deixassem de retornar antes do final de 1858.
Capanema alcançou seus objetivos com sucesso:

88
Agora a respeito de nossa Comissão já terás lido o meu
relatório ao Instituto [IHGB] a respeito dela, eu fiz com que o
povo que a tomara por sonho tomasse a acreditar nela, mas
tão bem ficou concebendo a causa das demoras, que o
governo terá o cuidado de prolongar (...) 112

No fragmento acima, Capanema está se referindo ao relatório lido na


sessão do IHGB de 4 de dezembro de 1857. Perante o IHGB, Capanema justificou
a demora pela espera dos instrumentos, como aparece neste trecho de seu
relatório:

Os instrumentos geodésicos são hoje a causa da demora da


partida da expedição; foram prometidos para meado de
fevereiro próximo futuro e duvidamos que a promessa seja
cumprida: temos prática neste assunto e conhecemos a
grande dificuldade que há em obter bons instrumentos de
construtores acreditados, que não os deixam sair de suas
oficinas sem os haver antes conscienciosamente verificado e
corrigido e determinado com a maior exatidão os coeficientes
das quantidades constantes com que se tem de entrar em
cálculo tendo por argumento as observações113•

Gonçalves Dias e Gabaglia, seguiram a risco as recomendações de


Capanema: o Marquês de Olinda foi substituído por Visconde de Abaeté em 12 de
dezembro de 1858, Gabaglia desembarcou no Brasil juntamente com alguns livros
e equipamentos nos primeiros dias de 1859, e a expedição partiu do Rio de
Janeiro para a capitania do Ceará em 26 de janeiro do mesmo ano. Capanema,
envolvido com o projeto da construção da estrada de ferro de Niterói a Campos,
só partiu a 9 de maio do mesmo ano.
A subida do Marquês de Olinda no ministério acontecera em um momento
em que lglésias (op.cit.) localiza em sua periodização política o primeiro surto
brasileiro de realizações materiais significativas. No início da década de 50, o
gosto pelos empreendimentos materiais seria evidenciado nos discursos políticos

89
e nos jornais. Fala-se muito em elevação da receita e sobre o espírito empresarial,
embutido em propostas como a navegação no Rio Amazonas, São Francisco e a
iluminação a gás no Rio de Janeiro.
A crença no futuro do país proveria de uma transformação baseada no
desenvolvimento material, impulsionado dentro da admiração imperial pelas
novidades das técnicas. A década de 50 seria um ponto de referência na história
da construção de um Brasil mais rico e firme, segundo a concepção de riqueza
dominante do período, representado, como já vimos, pelo advento da indústria,
fosse ela agrícola, manual ou siderúrgica. lglésias completa que este objetivo
único seria um dos grandes responsáveis pela breve e aparente conciliação entre
liberais e conservadores, trazendo consigo uma unidade na política brasileira. Esta
conciliação teve o seu fim oficial com a queda do Marques de Olinda da sua
segunda presidência no ministério, em 1858.
Em 1857, ainda dentro do período discutido acima, lglésias situa a vasta
discussão sobre os altos preços dos gêneros alimentícios, principalmente os da
agricultura, reflexo do desenvolvimento das máquinas agrícolas dos países
estrangeiros e a alta evasão da mão de obra escrava, que preferencialmente na
época se concentraria nas cidades e vilas, compondo uma classe de
consumidores e prestando serviço às famílias. Além disso, a mão de obra escrava
que restava na agricultura estaria em sua maioria nas grandes lavouras de café,
açúcar e algodão. Em linhas gerais, como conseqüência de uma economia
fortemente apoiada no desenvolvimento agrícola, o fruto deste debate foi a criação
do Ministério da Agricultura, em 1860.
Tais aspectos reforçam a idéia de que a Comissão do Ceará faria parte de
um plano político de crescimento da nação. O apoio dado à Científica por parte do
governo imperial, e consequentemente a importância para a carreira dos
naturalistas envolvidos está presente na fala de Freire Allemão, em 3 de dezembro
de 1858:

Cabe-me o grato dever de comunicar-vos que a comissão


tem encontrado da parte do governo imperial o mais decidido
apoio, e a mais ampla liberalidade. Resta que ela se faça

90
digna da nossa confiança, e de tão alta proteção. Neste
ponto só posso assegurar-vos que cada um de seus
membros vai animado do mais ardente desejo de bem servir
a ciência e ao país114.

2.5. A atuação no Ceará

A Comissão retornou ao Rio de Janeiro em 1861, tendo passado mais de


dois anos no Ceará e nas províncias vizinhas. Braga (op.cit.: 106) declara que a
Comissão viveu e se foi quase sem deixar traços de sua existência, não passou
de um belo plano frustrado em suas esperanças. O historiador lglésias segue o
mesmo pensamento, colocando que a Comissão retomou a corte sem haver
cumprido senão pequena parte do seu vasto programa (lglésias, op.cit.: 434).

Pinto (1955: 113) afirma que ficou para a Zoologia pouco mais que o breve
relatório do Dr. Manoel Ferreira Lagos, vindo à luz nos Trabalhos da Comissão
Científica de Exploração, e uma série de exemplares, na sua maioria ornitológicos,
e ainda em parte conservados no Museu Nacional. Ferri (1995) não cita resultado
algum das atividades durante a Comissão, apenas destaca os nomes de Freire
Allemão e Capanema, como sendo personagens importantes na ciência brasileira
da época. Franco (1991), ao publicar sobre a história da mineralogia e da
petrografia no Brasil, apesar de mencionar o nome de Capanema, nem se quer
cita a existência da Científica.
Acredito que a historiografia não apurou de modo crítico a atuação da
Comissão no norte brasileiro, assim como seus resultados concretos e benefícios
para o Museu Nacional. Vejamos então, o que os relatórios dos integrantes da
Comissão nos revelam sobre a sua atuação no nordeste brasileiro.

91
2.5.1. O relatório da Seção Botânica

O relatório da Seção Botânica, escrito por Manoel Freire Allemão e


Francisco Freire Allemão 115, foi publicado no Trabalhos da Comissão Científica de
1862, dividido em 3 partes.
A primeira delas diz respeito ao itinerário seguido por esta Seção,
descrevendo as suas várias excursões ao interior e às serras cearenses. Nos
primeiros meses, as Seções foram forçadas a permanecer em Fortaleza e seus
arredores a espera dos animais de carga. Neste ínterim, a Seção Botânica
realizou excursões pelas serras próximas à Capital, dentre elas a Serra da
Aratanha, estudando sua flora e fazendo coletas, como demonstra o fragmento
abaixo:

A Seção Botânica fez várias subidas à Serra da Aratanha, e


a outras de menor importância. Era tempo da florescência, e
pudemos colher bons exemplares de grande número de
espécies, os quais convenientemente preparados foram
metidos em caixas de folha de Flandres, soldadas e
revestidas de madeira 116•

Como pode ser percebido, esta parte do Relatório da Seção Botânica não
se restringe apenas ao caminho percorrido, e sim apresenta informações
complementares sobre o trabalho de campo realizado em cada ponto do território,
que vão desde as práticas de fixação e conservação das coletas, informando-nos
sobre as técnicas utilizadas, como aparece no trecho acima, até detalhes sobre os
transportes utilizados e contratempos sofridos pela Seção durante o trajeto:

Em 8 de maço, separando-me dos meus companheiros, parti


daquela cidade [Crato], entregando-me a todas as
contingências do inverno em estado de saúde mal seguro.
(. ..) Com uma viagem de 70 a 80 léguas, feita a pequenas
jornadas, por péssimos caminhos, passando por rios então
caudalosos, apanhando copiosos chuveiros, cheguei todavia

92
quase restabelecido. Qual é a salubridade daqueles
sertões!117

Além disso, a primeira parte do Relatório também contém algumas breves


descrições biogeográficas das paisagens dos locais percorridos:

Enfim, são amplas as margens do Jaguaribe, num trato de 25


léguas mais ou menos, cobertas de verdadeiras florestas de
camaúbas, que sempre verdes alegram aquelas paragens118•

A primeira excursão pelo interior do Ceará durou de agosto de 1859 até


agosto de 1860, quando esta Seção retomou a Fortaleza. Durante este trajeto, a
Seção Botânica contou com a companhia de Manoel Ferreira Lagos, chefe da
Seção Zoológica. Já a segunda entrada no sertão, agora em direção à Serra
Grande, iniciou-se em setembro de 1860, sendo percorrida apenas pela Seção
Botânica, pois segundo Freire Allemão, esta se achava primeiro que as outras em
circunstâncias de empreender a viagem, [e] saiu ela só da cidade de Fortaleza no
dia 9 de outubro de 1860119•
Freire Allemão, não se contendo somente nas observações botânicas,
escreveu também em seu Relatório informações sobre a hidrografia dos lugares
por onde passou:

O que no lpú há digno de ver-se é a cascata, que ali forma o


pequeno rio Puçaba, que, lancando-se do tope da serra,
quando engrossado pelas chuvas, dá um pano de água
estreito, mas de 600 palmos de altura; agora porém que o
vimos em tempo seco 120.

Neste trecho, os relatos científicos-descritivos se fundem com observações


de um naturalista-turista, que indica em seu texto uma paisagem bonita, digna de
se ver.
Esta Segunda excursão terminou em 3 de março de 1860. A Seção
Botânica, enquanto esperava pelas outras Seções na capital da província do
Ceará, realizou mais algumas pequenas excursões pelas serras próximas a

93
Fortaleza, embarcando em 13 de julho para o Rio de Janeiro. Allemão termina
esta parte do Relatório da Seção Botânica com a seguinte frase:

Antes de deixar esta parte corre-me o dever de manifestar


que por toda a província fomos bem aceitos. Na choupana do
pobre tivemos abrigo hospitaleiro; na habitação do rico
acolhimento franco e cordial; e na administração, desde os
altos funcionários até empregados suba/temos todo o auxílio
oficial; e particularmente, aqui falo por mim, obséquios e
atenções, de que me confesso penhorado121

Ao que nos parece, ou pelo menos, ao que nos fez parecer, Freire Allemão
não teve maiores problemas com as elites cearenses, como, veremos adiante,
aconteceu com Guilherme de Capanema e Gonçalves Dias durante suas
atividades.
A Segunda parte do Relatório da Seção Botânica trata sobre a vegetação
do Ceará propriamente dita. Freire Allemão dividiu a provincia em três Regiões
Botânicas, como ele mesmo delimitou: litoral, serras e sertões, as quais, segundo
o naturalista, apresentam as suas diferenças de flora devido a composições
mineralógicas do solo, relevos, latitudes, alturas e freqüências de chuvas distintos.
Allemão completa ainda que, em relação às águas, o Ceará não tem um só rio que
valha esse nome 122, mostrando com este comentário que os recursos hidricos
cearenses são o grande fator limitante para a sua vegetação.
A seguir, Freire Allemão faz uma breve caracterização sobre a flora
encontrada nas regiões serranas, compostas, segundo Allemão, por montanhas
granitico-argilosas, humidecidas por fontes perenes123, o que fazia com que estas
regiões apresentassem uma cobertura pomposa, sempre verde, com árvores
grandes, semelhantes às da flora fluminense. A seguir, Allemão lista as principais
espécies contidas nesta região. Ainda dentro das serras, Allemão distingue uma
sub-região botânica, que abrange os entornas das montanhas, com solo rico em
nutrientes vindos das encostas, e novamente apresenta os nomes das espécies
contidas nesta sub-região. De modo geral, Freire Allemão, sem deixar de

94
mencionar o caráter de utilidade da vegetação, caracterizou a região das serras da
seguinte forma:

São estes bosques das serras, e de seus contornos, cheios


de excelentes madeiras de construção, os que constituem o
que chamo 'região das serras'124•

A seguir, Freire Allemão estabelece em seu relatório a flora da que seria a


maior região botânica do Ceará, a região do sertão. Esta vegetação, segundo o
naturalista, é composta por árvores de pequenas dimensões, que perdem mas
folhas nos tempos mais secos, igualmente ao que acontece nos países frios,
secam, porém não chegam a morrer. Após listar as espécies nas quais este
fenômeno ocorre, Freire Allemão cita outras espécies que aparecem no meio das
primeiras, que se caracterizam por sua estatura mais alta e madeira boa para
construção.
E finalizando esta Segunda parte do Relatório da Seção Botânica, Freire
Allemão comenta sobre a vegetação da região do litoral. Segundo Allemão, a
vegetação característica destes locais é de baixa estatura e escassa, citando as
espécies e as principais famílias de plantas que ocorrem nesta Região Botânica.
E assim termina:

De todas estas plantas e árvores de construção, e muito


mais, que não foram aqui mencionadas, se colheram ramos
com flor e fruta, e se tiraram amostras da madeira; das mais
importantes se fizeram desenhos e descrições 125•

Cumprindo assim o que foi proposto nas Instruções da Seção Botânica em


1856.
A terceira parte conteria as Considerações gerais sobre a agricultura e seus
produtos industriais. Nestas páginas, Allemão fez um mapeamento dos principais
cultivos da província do Ceará, indicando as regiões, épocas do ano, técnicas de
cultivo e qualidade e quantidade de cada uma das produções agrícolas. Em
relação às técnicas de cultivo, não sem certa crítica, Allemão afirma que

Não precisa dizer-se que o modo de cultivação destas

95
plantas é de simplicidade primitiva. Neste caso, toda a
ciência agronômica dos nossos lavradores cifra-se no
conhecimento empírico dos terrenos, onde vem melhor tal ou
tal planta, e do tempo apropriado a sua semeadura126.

As plantas comumente usadas na alimentação da população cearense


apontadas por Allemão seriam mandioca, milho, arroz, feijão, abóbora, banana,
inhame e coco. Também destaca na cultura pomareira outras dezessete espécies,
algumas delas trazendo o nome pelo qual são conhecidas no Rio de Janeiro,
como é o caso do cajazeiro cearense, que origina a fruta conhecida na corte como
cajá-mirim.
Em seguida, Freire Allemão comenta sobre a horticultura, e como esta
prática seria inconstante no Ceará:

o cearense, principalmente o do sertão, é essencialmente


carnívoro, como são todos os povos criadores. Nas melhores
mesas do Ceará se vê pouca hortaliça, e poucos guisados de
ervas 127•

Após fazer uma brevíssima exposição sobre a cultura de flores no Ceará,


Freire Allemão parte para a Cultura das plantas que dão produtos industriais e
mercantis, que são cana-de-açúcar, algodão, café, fumo, carnaúbas, entre outros,
e termina a parte que tratou sobre os cultivos com otimismo, colocando que

Basta o que tão incompleta e sumariamente acabo de expor


para ver-se quanto só em vegetais tem de elementos de
prosperidade e de riqueza a província do Ceará 128•

Concluindo o relatório da Seção Botânica, Freire Allemão coloca que no


total foram coletados doze mil exemplares de ramos secos, porém ainda faltaria
uma caixa de coletas que não havia chegado até o momento na corte, e que até o
momento, já havia organizado tais exemplares em cento e dez famílias. Após o
processo de classificação, Freire Allemão explicita que havia a intenção de
publicar o Catálogo sistemático das plantas colhidas no Ceará pela Comissão
Científica.

96
Porém, pouco mais de seis meses depois da publicação do seu relatório em
dezembro de 1861, Allemão lança um primeiro folheto contendo a sistemática,
principais características e ilustraÇões das plantas que até então já estavam
organizadas, lançando um segundo folheto em abril de 1864. Um terceiro saiu em
fevereiro de 1866. Todos contendo inúmeros desenho das espécies, além de suas
descrições (Figuras 3.1, 3.2 e 3.3). Ainda em dezembro de 1862, Manoel Freire
Allemão publicou Considerações sobre as plantas medicinais da flora cearence.
Todas estas obras foram anexadas ao livro Trabalhos da Comissão Científica.
Porém, sua morte súbita em 14 de maio de 1863 o impediu que desse
continuidade aos seus escritos, como comunica Capanema ao seu amigo
Gonçalves Dias:

Remato com uma triste nova, um acontecimento que nos


afligiu muito e veio prejudicar gravemente a Comissão
Científica, foi a morte repentina do nosso bom Freirinha, eu
me achava doente na ocasião, ocultaram-me a notícia,
porém o Imperador, para manifestar o seu sentimento,
escreveu-me e tive que sabê-lo por aí, perdeu o país uma de
suas mais belas inteligências; e eu um companheiro de
trabalho, é coisa que se não toma a encontrar129•

Terminado o Relatório da Seção Botânica, partiremos agora para uma


breve exposição do Relatório redigido por Guilherme de Capanema.

2.5.2. O relatório da Seção Geológica e Mineralógica

Capanema inicia o Relatório da Seção Geológica colocando que se


demorou na Bahia por ter recebido ordens de Frederico Leopoldo Burlamaque, na
época Diretor do Museu Nacional, para que examinasse alguns pontos daquela
província. Com o auxílo de guias locais, Capanema conta ter se dirigido a um
depósito de manganês, onde achou este mineral disposto em veios bastante
espessos, explicitando logo que o manganês tinha alto valor de mercado, sendo
importante a descoberta de locais onde poderia ser explorado. Observou ainda

97
reservas de pirita em alguns pontos da região, vindo a concluir que na Bahia
ser{iam] ainda descobertos preciosos jazigos metalíferos 130.
Em seguida, Capanema conta em seu Relatório da Seção Geológica, que
excursionou até Santo Antônio do Catu, para verificar a possível existência de
cobre, mineral presente em amostras do Museu Nacional provindas daquela
região, porém não encontrando o menor vestígio de cobre 131 •
Realizando observações na Ilha de ltaparica, Capanema detectou um
levantamento da costa, que segundo o naturalista, chegaria a aproximadamente
nove palmos. No mesmo local, encontrou cristais de pirita e galena.
Os problemas existentes nas Viagens Científicas da época não deixaram de
existir na viagem da Comissão Científica. Estes também foram relatados por
Capanema, na ocasião em que o chefe da Seção Geológica procurava
diagnosticar a possível presença de carvão:

Outro produto curioso daquele lugar [no rio Camamú, ainda


na Bahia], e mesmo de alguma importância, se existir em
grandes quantidades, é uma argila muito porosa, amarelenta,
embebida de betume. Não procedí a esse exame por falta de
transporte na ocasião, e a viagem a remo debaixo das
chuvas, que continuavam, não quis aventurar132•

A importância conferida ao betume por Capanema se dá por suas


propriedades como combustível.
Saindo da Bahia, já em Pernambuco, Capanema examina indícios de
atividade vulcânica em Fernando de Noronha, e assim como o já mencionado
João da Silva Feijó, relacionou-os com terremotos:

encontrei em diversos lugares lavas, que se me disse serem


provenientes do lastro de navios que voltavam da ilha de
Fernando de Noronha; é o único ponto vulcânico do Brasil de
que há notícia vaga dada por Darwin, e creio que estão em
relação com ele os terremotos que se tem manifestado por
diversas vezes nas costas fronteiras do Rio Grande do Norte

98
e do Ceará 133.

Em seguida, Capanema comenta sobre a falta de estrutura para um estudo


mais adequado sobe o assunto citado acima, que englobaria também. um exame
sobre vulcões submarinos:

Eu quis estudar esta questão com todo o cuidado, e para


isso aguardava a canhoneira que tinha sido prometida à
Comissão para os trabalhos hidrográficos; eu contava com
ela por ter visto a ordem em que se mandava por a nossa
disposição, porém até hoje não tivemos notícia dela, donde
resultaram inconvenientes graves 134.

Através do trecho acima, podemos ver que, apesar de a Comissão ter sido
acusada em relação à gastos excessivos, as condições para a realização dos

99
trabalhos ainda não eram as ideais. O trecho acima do Relatório da Seção
Geológica evidencia também a presença de tópicos científicos convivendo com
assuntos relacionados aos apoios, ou à falta deles, recebidos pela Científica.
Dando continuidade as suas atividades na Viagem, Capanema na Paraíba
afirma ter observado a presença de calcário argiloso, com potencial para uso
industrial. Em relação a isso, Capanema escreveu:

Na Paraíba aproveitei as poucas horas de demora do vapor


para ver as pedreiras da cidade; achei ali marga, que poderia
ser empregada para fabrico de cimento hidráulico, que hoje
importamos da Europa 135.

A intenção de promover a independência da indústria brasileira, vista nas


Instruções de Viagem da Seção Geológica, aparece novamente no Relatório da
mesma Seção. E, igualmente presente nas Instruções e no Relatório, está o uso
de fósseis para a dedução da idade geológica dos terrenos:

um crinóide pessimamente conservado me faz supor que


aquela rocha pertence a formação cretácea, ainda até então
desconhecida naquelas paragens [Paraíba] 136•

Tal afirmativa confirma a informação dada por Braga (op.cit.), que


Capanema teria sido o primeiro a identificar uma formação cretácea na Paraíba.
Além das observações pioneiras na Paraíba, Braga coloca também o pioneirismo
de Capanema sobre o diagnóstico de betume nos arredores do rio Camamú,
comentada anteriormente neste trabalho.
Finalmente chegando ao Ceará em junho de 1859, Capanema encontrou
Coutinho, adjunto da Seção Geológica, que já havia feito excursões nas
montanhas próximas a capital Recife. A primeira tarefa de Capanema foi verificar
a presença de prata que teria sido lavrada pelos holandeses, segundo contavam
os moradores da região. Porém, de acordo com Capanema, não foi encontrado
nenhum indício do metal.
Em agosto do mesmo ano, as Seções Geológica e Etnográfica seguiram
juntas para o interior do Ceará. Capanema observou a geologia da Serra da

100
Figura 2.2: Miracrodruon urundeuva. Ilustração de Freire Allemão
integrante do 1° Folheto de Botânica (Trabalhos da Comissão
Científica, op.cit.).

101
Figura 2.3: Jussiaea f/uctunas. Ilustração de Freire Allemão integrante do 2°
Folheto de Botânica (Trabalhos da Comissão Científica, op.cit.).

103
Figura 2.4: Lucuma minutiflora. Ilustração de Freire Allemão integrante
do 3° Folheto de Botânica (Trabalhos da Comissão Científica, op.cit.).

105
Aratanha, onde detectou a presença de granito, e próximo a sua fronteira
com a serra de ltatinga, havia dolomita (carbonato de cálcio e magnésio) e
turmalina, que, segundo o naturalista, já havia sido confundida com carvão de
pedra.
Ainda nesta região, Capanema relata ter contraído erisipela, que retardou a
continuação dos trabalhos da Seção Geológica.
Quando foi possível continuar, Capanema se dirigiu para o Acarape, onde
observou a presença de mármore:

Examinei as formações calcáreas da vizinhança, sobretudo o


Frade no Cantagalo: ali acham-se alguns penhascos de
alvíssimo mármore granular, que se pode prestar para
estatuária e ornatos: não acontece isso com toda a massa de
rochedos, que são mais ou menos salpicados de cristais
amarelentos esverdeados de gramatito, o que não impede o
seu emprego como excelente cal para construções 137.

Novamente aparecem ligações entre as Instruções de Viagem da Seção


Geológica e o relatório. A busca de matéria prima para a indústria brasileira de
construção civil é evidenciada no item III das Instruções escritas por Capanema.
Dando continuidade ao seu relatório, Capanema faz menção a já citada
Memória sobre o ferro, de Feijó:

Fizemos uma excursão ao Canindé, e fomos ver os


depósitos de ferro junto à serra das Guaribas nas margens
do rio Cangatí, de que falara Feijó em 1814; encontramos
realmente esta rica mineira, de todo desprezada 138.

Em seguida, comenta sobre a exploração de ferro na região:

O ferro consumido no interior do Ceará, do Piauí e de


Pernambuco, é todo inglês e muitas vezes de péssima
qualidade, transportado a duzentas e mais léguas em costas
de animais; em conseqüência disto propus ao governo
Imperial que mandasse ensinar àquele povo o meio de

107
aproveitar a mineira de ferro para obter materia/139•

E sobre tal proposta, o jornal O Cearense coloca

A Comissão Científica propôs ao Governo que se ensinasse


ao povo o meio de tirar proveito dessas minas, produzindo
com seus diminutos recursos e com o seu trabalho o ferro de
que carecesse para seu consumo. Parece porém que a
proposta não chegou ao Rio de Janeiro 140!

O trecho acima sugere o descaso do Governo em relação a proposta de


Capanema, o que poderia estar relacionado com a imagem controversa adquirida
pela Comissão como um todo no momento de seu retorno ao Rio de Janeiro.
Sobre este aspecto, trataremos mais adiante ainda neste Capítulo.
Ao deslocar-se pelos sertões cearenses, Capanema registrou o mesmo
fenômeno observado por Freire Allemão em seu Relatório da Seção Botãnica: a
senescência foliar completa das plantas, o que Capanema traduziu como: toda
planta dorme sem folhas, sem um vestígio de verdura, toda força vegetativa (...)
na mais perfeita quietação 141 •
E como havia proposto no item IX das Instruções de Viagem da Seção
Geológica, Capanema retoma no relatório o problema da seca, sobre o qual
escreveu dois ensaios, como veremos posteriormente:

As secas no norte são úteis debaixo de todos os pontos de


vista; não são e/as a causa das grandes calamidades, mas a
imprevidência da gente, que não sabe tirar proveito da
abundante produção de seu solo que as secas perpetuam
(...). t questão que apresentarei em ocasião oportuna
devidamente desenvolvida 142 .

Ao sair da área mais seca, Capanema, seguindo orientações da população


local, verificou a possível presença de estanho:

Fomos a uma pedra donde minava estanho todos os anos,


segundo se dizia(.. .). Supus que minaria alguma amalgama,
porém no lugar não havia o menor sinal disso. Contudo em

108
alguns pedaços de rocha havia fragmentos que tem aspecto
de mineral estanífero; só a análise poderá solver a dúvida 143.

Em seguida, Capanema narra a procura de chumbo na região de


Quixeramobim, onde encontrou grafite impura em abundância.
Dando continuidade as suas investigações, a Seção Geológica, como teria
proposto nas Instruções, Capanema atentou para as possibilidades de construção
de poços artesianos:

Procurei por toda a parte se haveria possibilidade de furar


com proveito o terreno para haver água, porém todos os
pontos da província que visitei se negam a isso (. ..). As
camadas da lbiapaba mergulham para o Piauí; só lá portanto
é que poderá haver alguma probabilidade de se poder brocar
com vantagem algum poço artesiano; depende isso porém
ainda de exame do terreno 144 .

Em seguida, Capanema escreve em seu Relatório as descrições geológicas


realizadas no trajeto para o sul da província do Ceará, em direção ao Crato, por
onde encontrou amianto e observou a mudança do terreno de granítico para
arenoso. Neste ponto, Capanema registra oficialmente a participação de
Gonçalves Dias nas observações geológicas:

para baixo seguem-se outros psamitos, nos quais o Dr.


Gonçalves Dias encontrou madeira petrificada perto de S.
Pedro, a duas léguas da vila de Milagres 145•

Dando continuidade ao Relatório, Capanema trata da erosão e do


transporte de detritos para os rios cearenses, mais um ponto citado nas Instruções
da Seção Geológica.
Posteriormente, Capanema descreve a descoberta de um terreno repleto de
fósseis, alguns deles já citados em literatura por naturalistas europeus, e outros,
como transmitiu Capanema, inéditos:

No Brejinho encontrei aqueles ictiolitos que Agassiz

109
classificou, pertencentes à formação Cretácea (. ..). Não
param só nisso os nossos achados, ainda uma porção de
coprólitos, ossadas talvez de sáurios, dentes de peixes, e
uma planta de folhas imbricadas atrotaxites, que até hoje não
se conheciam, tiramos do mesmo lugar146•

Logo em seguida, o naturalista faz uma crítica em relação ao estado da


ciência no Brasil, mais especificamente à falta de conhecimento dos naturalistas
brasileiros sobre a própria terra, idéia esta imbricada na concepção da Comissão
Científica, como já foi visto. Além disso, Capanema também responde à cobrança
da descoberta de minas e diamantes no Ceará pela científica:

Era pois uma rica colheita científica [de fósseis] que eu tinha
adiante de mim, e com prazer eu me atiraria a ela, pois creio
que bons trabalhos científicos feitos no país e por filhos da
terra dariam crédito ao Brasil, manifestando a sua tendência
ao progresso, e um pouco de bom nome compensaria bem o
não se descobrirem minas de ouro e diamantes, que além
disso no Ceará talvez trariam, nas condições atuais, males
em vez de benefício; a província não pode cuidar em
mineração enquanto deixar perder os seus grandes recursos
para alimentação 147.

Em seguida, fica claro que a crítica feita por Capanema seria direcionada
contra o governo, que, segundo o naturalista, a esta altura já havia diminuído o
orçamento para a Comissão:

Não me foi possível executar esses trabalhos, que teriam


seguramente um belo resultado; mas um conjunto de
circunstâncias e imprevistos forçou-me a uma retirada a
marchas forçadas (. ..). Da corte escreviam-nos além disso
que se ia tratar da nossa retirada. À vista de tudo isso
supúnhamos que se tratava de um adiantamento da
Comissão, e nós teríamos de contrair empenhos para os

110
quais não estávamos autorizados se quiséssemos nos
demorar; (. ..) tratamos de regressar para a capital da
província com a maior brevidade, porque as sobras do nosso
orçamento não davam margem para demoras 148•

Durante o regresso a Fortaleza, Capanema detectou uma informação


equivocada sobre a geologia do Brasil, feita por outro naturalista:

examinamos o que [o botânico inglês] Gardner declarara


serem restos de penedo de greda, no que se enganou, pois
não é senão tabatinga ou silicato de alumínio 149•

E continuando a sua crítica sobre a busca de metais preciosos no Ceará,


Capanema completa:

Em S. Pedro não tivemos tempo de ir pesquisar o lugar onde


se encontrara por acaso uma porção de zinco, ao qual se
não ligou importância por não ser prata! Também não
pudemos ir aos rochedos de gesso fibroso, que tem
importância científica e prática 150.

E, novamente, Capanema descreve algumas dificuldades sofridas pela


Seção Geológica, e que não deixam de estar presentes nas Viagens Científicas
em geral:

o rio das Piranhas, que estava quase seco na véspera, tinha


tomado água durante a noite e ainda continuava; o lugar da
passagem costumava dar vão, eu dei esporas ao cavalo, e
apenas tinha dado um passo foi-se com o cavaleiro para o
meio de uma corrente forte (...), porém não calculávamos
com o triste desengano que nos aguardava. Na cabeça da
comarca de Souza, os únicos gêneros alimentícios que os
comissários do governo encontraram a venda foram
bacalhau podre, um queijo fóssil, e uma lata de sardinhas
que nos foi vendida por especial favor151 !

111
Apesar de tempestades, escassez de alimento, tanto para os cavalos
quanto para os naturalistas, falta de dinheiro, Capanema em seu regresso à
capital continuaria a fazer observações geológicas, e as relatou no Relatório de
sua Seção, principalmente as que dizem respeito ao movimento das areias e ao
levantamento do litoral, pois estes fenômenos interferem diretamente na
construção e localização de portos e ancoradouros.
O porto de Fortaleza , naquela época, já seria famoso por seus problemas.
Capanema os referencia nas suas Instruções da Seção Geológica, no Relatório, e
também em correspondência para Dias:

Agora mesmo parto para lguape enquanto não vem o


cruzeiro, vou ver se colijo por lá algum documento, além dos
que já possuo bastante arenosos, sobre o levantamento do
litoral, é o pesadelo que anda bulindo com os nossos portos,
e ainda nenhum dos engenheiros que andam aqui
caluniando este pobre porto cearense deram com este
pagode, benza-os Deus, e ilumine-lhes o juízo 152•

O pesadelo dos portos está diretamente relacionado com a diminuição da


profundidade causada pelo acúmulo de matéria, e como já foi mencionado, faria
parte das atividades da Seção Geológica o estudo sobre este assunto.
Durante alguns meses, a Seção Geológica ficou a mercê da espera de uma
definição do governo Imperial em relação ao destino da Comissão, principalmente
no que diz respeito à liberação de verbas. Este impasse findou com o envio de
uma tabela orçamentária para o Presidente da Comissão, Freire Allemão. Sobre
estas novas medidas tomadas pelo governo, Capanema comenta em seu
Relatório:

A tabela foi confeccionada sem se atender às exigências do


serviço, marcou-se o número de serventes que devíamos ter,
era muito insuficiente; marcaram-se os jornais que eles
deviam perceber, eram exagerados; marcou-se quanto os
cavalos devia, gastar diariamente, coisa que variava de um

112
modo extraordinário , segundo as localidades 153•

Por julgar a tabela equivocada, Capanema escreve no Relatório da Seção


Geológica a resolução de retomar a Comissão à corte, a fim de apresentar seus
resultados parciais e definir com mais clareza os caminhos que seriam percorridos
pela Científica. Sendo assim, Capanema relata que, com medo de perder o
material coletado, as fotografias tiradas e suas anotações no trajeto por terra,
principalmente por ter fresco na memória a já relatada travessia do rio das
Piranhas, enviou estes materiais por via fluvial. Posteriormente, em seu Relatório,
o próprio naturalista esclarece o destino destes seus trabalhos, e completa as
críticas em relação à tabela:

Quando cheguei a Fortaleza, supus já encontra-/os , e recebi


pouco tempo depois a notícia que tinham naufragado: pedi
logo providências, e a presidência mandou sem demora uma
jangada a ver se podia salvar alguma coisa, esta porém
também soçobrou, foi preciso ir outra, que nada conseguiu,
segundo parece. Para mim, foi o mais fatal resultado da
referida tabela 154•

Posteriormente, narra mais alguns inconvenientes causados pela tabela


orçamentária do governo durante o regresso:

Passamos S. Benedito, Vila Nova, descemos pelo /pu; o


lugar onde se tinha tirado as galenas argentíferas estava
cheio d'água, não pude arriscar-me ao esgotamento porque
a tabela não consignava margem para isso, nem fui estudar
as minas de ouro do Juré e de Santa Maria pelo mesmo
motivo 155.

Em seguida, cita novamente a participação de Gonçalves Dias em nas


atividades da Seção Geológica, narrando ter recebido algumas amostras da Serra
de lbiapaba mandadas pelo escritor, e recomenda ao Instituto que estimulasse
novos estudos geológicos naquela região, por se tratar de um terreno muito fértil,
segundo Capanema. E assim finaliza o seu relatório.

113
Partiremos agora para uma breve exposição sobre o conteúdo do relatório
da Seção Zoológica, dirigida por Ferreira Lagos.

2.5.3. O relatório da Seção Zoológica

Ferreira Lagos dá início ao seu Relatório da Seção Zoológica com um breve


histórico sobre a Comissão Científica, abrangendo a sua nomeação para chefe de
Seção e o retorno da Comissão, citando a sua apresentação e a de seus
companheiros de viagem no IHGB em 15 de dezembro de 1857.
Em seu Relatório, Lagos comenta sobre duas críticas que a Comissão
recebera, e responde a elas. A primeira diz respeito ao suposto excesso de livros
comprados para os trabalhos da Científica. Lagos, então, faria uso das palavras
de Capanema para a sua resposta, o qual citou inúmeras obras indispensáveis ao
desenvolvimento das atividades no Ceará, e que deixaram de ser compradas,
apesar de não constarem nas bibliotecas públicas e nem no IHGB, por existirem
alguns exemplares de particulares em território brasileiro, dos quais os naturalistas
fizeram uso. E justifica a necessidade da compra de séries completas de
periódicos:

pois nelas se acham inserias numerosas memórias de


importância sobre a geografia e história natural do Brasil, e
cumpre que a Comissão esteja em dia com esses trabalhos
para não dar o triste espetáculo de isolamento científico e
ignorância do que se tem escrito sobre o próprio país156 .

A segunda crítica recebida pela Comissão diz respeito ao material


comprado, que também seria excessivo. Lagos contrapõe esta colocação da
seguinte forma:

Tanto prova-se ainda não ter havido superabundância nos


preparativos, que depois de estar no Ceará, a Comissão
requisitou da corte vários objetos cuja falta reconhecera 157.

114
Feitos tais comentários, Ferreira Lagos finalmente parte para seus relatos
sobre as atividades da Seção Zoológica no Ceará. O naturalista coloca que desde
os primeiros dias na Capital Fortaleza iniciara os estudos sobre a fauna local, a
coleta de exemplares animais e a reunião de informações importantes junto aos
cearenses, sobretudo com os pescadores.
Em relação à pesca, Lagos inicia uma breve caracterização desta atividade,
informando que a jangada era muito usada por ser a única embarcação que
suportaria os mares bravios da região. Outro artifício usado pelos pescadores
seriam as redes de arrastões predatórios, já proibidas pelas leis municipais da
época, que segundo Lagos, igualmente já desrespeitadas.
Em seguida, Lagos descreve os diferentes tipos de jangadas, suas
dimensões, materiais usados em sua construção, etc, e também atenta para os
aparatos levados pelos pescadores em suas atividades, que, como foi observado
pelo naturalista, as vezes teria duração de mais de uma semana em alto mar. Na
falta de conhecimentos relacionados à bússola, de acordo com as informações
coletadas por Lagos, os pescadores usavam os ventos, sol e a via-láctea para
definirem suas direções, tendo em vista o longo tempo de permanência no mar.
Dando continuidade ao Relatório, Lagos, mesmo sem fazer referência direta
a acusação alguma, acaba por responder outra crítica que pesou sobre a
Comissão Científica como um todo: a esperança da descoberta de minas ricas e
lucrativas em território cearense, bem como critica a administração e o poder
público local:

a maior parte dos habitantes exultou de prazer, sonhando


logo com a descoberta de minas de diamantes e de quantos
metais preciosos se conhecem, apesar de possuírem já três
ricas minas inesgotáveis(...), e todavia não as lavram
proveitosamente, talvez por falta de quem lhes abra os olhos,
dê impulso e direção conveniente ao trabalho: falo da
agricultura, criação do gado e pescaria 158•

115
E lamenta que o fomento para a pesca no Ceará provenha de particulares e
não do Governo, e além de tudo as jangadas pagam imposto, e se cobra dízimo
do peixe 159 •
Em seguida, Lagos faz uma breve descrição sobre os peixes da costa
cearense, afirmando que alguns deles são das mesmas espécies encontradas no
litoral do Rio de Janeiro, porém apresentando modificações morfológicas
evidentes, e que são inúmeras as espécies distintas às da corte. E completa:

Na distribuição dos animais marinhos sucede o mesmo que


na das espécies teffestres: cada região cria os seus, e tem
uma fauna ictiológica especial. Em idênticas condições
climatológicas e atmosféricas vivem espécies análogas;
porém raras vezes são em tudo iguais, e oferecem quase
sempre um tipo particular 60.

Ainda sobre este aspecto, Lagos no relatório da Seção Zoológica enumera


os fatores bióticos e abióticos que influenciam na distribuição dos peixes ao longo
da costa, e acrescenta que os mesmos fatores interferem nas populações de
conchas.
Finalizando seus escritos sobre a fauna marinha, Ferreira Lagos conta que,
além dos estudos e observações zoológica, fez também anotações sobre os
contos e histórias contados pelos pescadores. E comenta:

Quando algum pescador veterano, encanecido no ofício,


começa a narrar, os circunstantes atónitos e boquiabertos
lhes prestam atenção igual a do Árabe do deserto escutando
os prodígios da 'Lâmpada maravilhosa'. Estas legendas
fornecerão sem dúvida amplo e novo assunto ao exímio
cantor das 'Brasilianas' 161 •

Acreditamos que, no trecho acima, Lagos estaria se referindo ao chefe da


Seção Etnográfica, Gonçalves Dias.
Passando agora a escrever sobre a fauna terrestre, Lagos conta que os
mamíferos terrestres de médio e grande porte nos parâmetros brasileiros quase

116
não foram vistos, apesar de o povo cearense afirmar que até a algum tempo atrás
estes eram abundantes. Segundo Lagos, alguns poucos exemplares de
mamíferos foram capturados vivos, coerentemente com o proposto nas Instruções
de Viagem da Seção Zoológica, a fim de suprir um Jardim Zoológico que, na
época, era idealizado pelo Conselheiro Cândido Batista de Oliveira. No total,
Lagos conta que realizou

a reunião de mais de cem animais, entre quadrúpedes, aves


e répteis; e receando entrega-los a indivíduos que deles
pouco cuidassem, tencionava conduzi-los pessoalmente
quando regressássemos 162 .

E nos conta sobre estes animais:

Com bastante dor, a vista de tanto trabalho perdido como


deram, os vi ir morrendo sucessivamente durante a viagem,
e alguns mesmo depois de chegarem à capital, de maneira
que poucos restaram 163.

Lagos completa que os animais mortos foram doados ao Museu Nacional, e


os que sobreviveram, por falta de um lugar público apropriado, foram destinados à
chácara do Comendador Antônio José Souto, que possuía um Zoológico
particular.
Apesar de os mamíferos de grande porte não terem sido encontrados,
segundo Lagos, foram abundantes os pequenos roedores e outros mamíferos
menores. Sendo assim, o zoólogo em seu Relatório enumera algumas das
espécies mais freqüentes, dentre elas os micos, furões, cotias, entre outros,
sempre citando ambos os nomes vulgar e científico, além dos roedores. Quanto
ao estudo desses animais, Lagos comenta:

A História dos pequenos mamíferos apresenta grandes


dificuldades, e se acha muito atrasada dos outros ramos da
Zoologia, mesmo quanto às espécies da Europa 164•

Dando continuidade ao Relatório da Seção Zoológica, Ferreira Lagos passa


a tratar sobre a criação de gado no Ceará. Ele inicia sua exposição sobre este

117
tema com uma crítica, tanto ao estado da pecuária no local, e, novamente, quanto
ao atraso de certos ramos da Zoologia na província:

Sendo o ceará uma província cujo ramo mais importante de


indústria consiste na criação do gado, é de lastimar que
ainda ali esteja tão atrasada a zootecnia, conhecimento dos
animais aplicado às necessidades do homem 165.

Para a melhora na criação de gado do Ceará, Lagos propõe, entre outras


coisas, a inserção de gados de raças superiores, para que, através de cruzamento
com os animais existentes na província, seja possível a melhoria destes animais.
Uma outra proposta interessante feita por Lagos seria a contratação de
estrangeiros especialistas em doenças do gado. Sobre a melhoria da pecuária
cearense, Lagos afirma em seu Relatório que este seria um assunto sobre o qual
trataria posteriormente em uma Memória, talvez por inspiração da já mencionada
Memória económica sobre a raça do gado lanígero da capitania do Ceara, de João
da Silva Feijó.
Encerrando a sua análise sobre a pecuária cearense, Ferreira Lagos parte
então a tratar dos pássaros da província. Segundo Lagos, o número de espécies é
reduzida, porém, em contrapartida, há abundância de indivíduos. Sobre as coletas
ornitológicas, preparação, conservação e montagem dos indivíduos, Lagos
comenta:

Excede a quatro mil o número de exemplares de aves que


trouxe a Seção Zoológica, todos preparados de maneira tal
que nada deixam a desejar (. ..), e muitos mesmo já
montados perfeitamente em diversas posições estudadas do
natural. Quase dois terços das espécies não existiam no
Museu Nacional, apesar de as haver aqui e em outras
províncias, de onde se deduz que foi um bom encremento da
sua coleção ornitológica, que aliás não é das mais pobres166•

As aves trazidas do Ceará foram uma das grandes atrações da Exposição


da Indústria Cearense, realizada no Museu Nacional em 1861, da qual trataremos

118
adiante, e confirmaremos a afirmação acima sobre as técnicas de preparo e
fixação dos exemplares ornitológicos, que foram as melhores da época.
Já narrando sobre os répteis, Lagos dá continuidade em seu Relatório:

Na e/asse dos répteis não foi a Seção Zoológica menos feliz,


pois conseguiu oitenta e tantas espécies, e algumas bem
curiosas pertencentes aos sáurios e ofídios 167.

Posteriormente, Lagos comenta sobre algumas lendas e histórias sobre


ataques de cascavéis ao homem, e sobre como tradicionalmente as picadas desta
cobra são tratadas com diversas ervas e cachaça, e completa que

Superstições populares idênticas encontram-se por toda a


parte, até nos países mais civilizados, e neste ponto
nenhuma nação pode rir de outra168.

Após os répteis, Lagos passa a tratar sobre a entomologia em seu Relatório


da Seção Zoológica. A coleta de indivíduos realizada pela Seção, segundo Lagos,
chegou a mais de doze mil insetos, que chegaram em perfeitíssimo estado de
conservação 169 . Os himenópteros (abelhas e vespas) ganharam destaque pelo
alto número de indivíduos. No caso das abelhas, além dos insetos foram coletadas
amostras de mel e cera, alguns com propriedades medicinais conhecidas na
época, produtos que também fizeram sucesso na Exposição da Indústria
Cearense, como veremos. Sobre a apicultura, Lagos comenta:

Uma monografia das abelhas do Brasil será trabalho curioso


e de importância, não só para a ciência, mas igualmente para
o comércio, pois a bela cera de muitas, além de satisfazer o
consumo do país, libertando-nos do imposto que anualmente
pagamos ao estrangeiro, pode-se-ia tomar ao mesmo tempo
um gênero de súbita exportação 170.

Em seguida, Lagos comenta sobre alguns insetos de uso medicinal,


igualmente as sanguessugas, dentro do que o naturalista chamou de zoologia
médica.

119
Finalizando, Lagos assegura que este relatório trataria apenas brevemente
das suas atividades no Ceará, e que outros trabalhos viriam, tanto no âmbito da
Zoologia como fora dele:

fique igualmente o Instituto prevenido de que tomei também


notas sobre vários assuntos alheios ao estudo de que fui
incumbido, os quais reduzidos a pequenas memórias irei
oportunamente lendo nas nossas sessões; assim como vos
apresentarei outrossim o itinerário minucioso da Seção
Zoológica 171 .

Com a exposição do conteúdo dos relatórios destas três Seções, estamos


enfatizando aqui a atuação da Comissão Científica no Ceará, pouco evidenciada
pela historiografia até então. Braga (op.cit.: 48), por exemplo, declara que, durante
os primeiros seis meses de atividades no norte, nos quais vimos a Científica estar
se preparando para adentrar o interior, os dias se iam decorrendo entre trabalhos
de pouca profundidade e o ritmo lento porém aliciante da terra. Estes trabalhos,
considerados pelo autor de pouca profundidade, foram essenciais para um
inventário completo sobre a história natural do Ceará, pois nesses primeiros seis
meses, os naturalistas estudaram a fauna e a flora de grande parte do litoral.
Lagos, fez seus estudos sobre a prática da pescaria e os peixes, além de realizar
inúmeras coletas. Quanto à Seção Botânica, os estudos sobre as plantas
litorâneas ganharia importância tal que comporiam um sub-grupo na classificação
geral da fauna do Ceará elaborada por Freire Allemão.
Em relação à Seção Geológica, quase nada podemos falar sobre esses
primeiros meses, pois Capanema, como já foi visto, embarcou para o norte quatro
meses após a partida da Comissão, iniciando seus trabalhos posteriormente.
Capanema apenas cita brevemente no Relatório algumas atividades
172
desenvolvidas pelo seu adjunto, João Martins Coutinho :

Em junho apartei ao Ceará, onde o adjunto à minha Seção, o


Capitão João Martins da Silva Coutinho, já tinha procedido

120
escavações em diversos lugares para estudar a natureza do
solo; e também já tinha feito excursões às montanhas
próximas à capital; infelizmente não pode desenvolver toda a
sua atividade, pois esteve dois meses doente 173.

Sobre as duas grandes excursões ao interior da província, na obra de


Braga (op.cit.: 58-59), pouco ou quase nada aparece em relação à prática de
campo dos naturalistas. O autor se limita a narrar os obstáculos políticos e
administrativos enfrentados pela Comissão, destacando tão somente os
contratempos:

Tanto na primeira como na Segunda grande viagem [ao


interior da província], os exploradores não cobriram o
itinerário previsto. Por falta de oportuna distribuição de
créditos, viram-se constrangidos a retomar na primeira e
atrasar a partida da segunda.

Efetivamente sobre a prática de campo, o autor apenas cita que, no


momento descrito acima,

Lagos entreteve-se com os habitantes do [Rio] Mucuripe,


recolhendo as lendas, os hábitos de pesca e colecionando as
espécies piscículas. Capanem a (. ..) andou a estudar as
coffentes marinhas, o movimento das areias e a geologia do
Mucuripe e da Baffa do Pacoti.

Além de marginalizar as atividades relacionadas à história natural


realizadas pelos homens da Comissão, a historiografia ressaltou alguns aspectos
sobre ela, que foram em parte responsáveis pela sua idéia histórica de fracasso
científico. Veremos algumas de suas anedotas, muito presentes nas poucas obras
que citam a sua existência.

121
2.6. Os camelos e as borboletas

Vários foram os nomes e apelidos pejorativos presenteados à Científica.


Um deles, deve-se a um suposto comportamento boêmio de alguns membros da
Comissão, pregado pela historiografia, e evidenciado em alguns dos documentos,
inclusive correspondências 174• Ferreira Lagos, Gonçalves Dias, José dos Reis
Carvalho e Capanema, por exemplo, seriam os principais responsáveis pelo
apelido de Comissão Defloradora contraído pela Científica.
Um episódio em especial marca a passagem dos naturalistas pela Província
do Ceará. Tais fatos estão relatados em um Relatório, assinado pelo Investigador,
cuja identidade nos é desconhecida, datado de 14 de setembro de 1865:

Logo pois que ele [Capanema] se lhes reuniu, apossou-se do


deplorável Gonçalves Dias, que de mais tempo se deixara
fascinar e dirigir por ele, e como este dois foram mais outros
para uma casa onde Capanema estabeleceu logo uma orgia
continuada, escandalosa e pública, que injuriou e
175
envergonhou a população daquela capital .

Capanema é apontado em tal Relatório como o mentor de uma festa


boêmia, seduzindo homens considerados sérios de bom comportamento pelo
Investigador. É o caso do funcionário do tesouro André Cursino Benjamim:

mal pensava o honrado homem que seria recebido no auge


da orgia, à sobremesa de um jantar, ao tinido dos copos, ao
alarido de gritos e palavras obscenas, de torpes gestos e
liberdades de uma porção de meretrizes associadas aos
infames deboches 176•

Tais atos, segundo o documento, refletiriam diretamente na aceitação dos


naturalistas pela população de Fortaleza. No Relatório está presente um
depoimento de uma senhora que os chama de moleques. O Investigador cita
ainda o mal comportamento de Capanema perante as moças da cidade de
Fortaleza:

Enquanto esteve na capital ele [Capanema], e os

122
companheiros das orgias, formando um grupo, vestidos
indecentemente com calças largas chamadas bombachas,
de jaquetas, chinelos e chapéus de palha, percorriam as ruas
mais públicas, e se alguma moça encontravam a janela,
faziam-lhe provocações, e dirigiam-lhes gracejos tão
atrevidos como impudicos 177•

Por não conhecermos a identidade do Investigador, não podemos dizer com


exatidão se o Relatório seria um ataque político e pessoal dirigido à Capanema, e
muito menos descartar esta possibilidade. Obviamente, temos que considerar
também a possibilidade de tais fatos terem ocorrido tal qual relatado pelo
Investigador.
Outro apelido presenteado à Científica seria o de Comissão das Borboletas,
de criação do Senador Luís Dantas de Barros Leite (Braga, op.cit.). Este nome
traria a idéia pejorativa de gastos desnecessário de dinheiro público somente para
apanhar borboletas no Ceará. O Senador Dantas é citado com freqüência nos Zig-
zags escritos por Capanema (Manoel Francisco de Carvalho):

Minhas obrigações são variadas; (. ..) cavar terra para ver o


que há lá por dentro; mas não até o centro, como quer um tal
de Dantas que me dizem ser um tal de senador178. Aproveito
a ocasião das eleições e conto-lhe o que por cá se passou.
Eu não votei porque meu companheiro Xavier me declarou
categoricamente que gente puramente científica não se mete
em política, e é por isso que um tal Sr. Dantas não a pode
tragar. Disseram-me que esse sujeito é o pai da pátria.
Credo!

A ironia nas palavras de Capanema ao falar do Senador Dantas nos passa


a idéia de diferenças existentes entre eles, políticas ou pessoais, que originariam
179
os ataques de Dantas à Comissão, que se estenderiam por anos •

O episódio da tentativa de aclimatação de camelos no Ceará também viria


compor anedotas sobre a Comissão na historiografia. Capanema, amparando-se

123
em experiências bem sucedidas da Sociedade Zoológica de Aclimatação de Paris
no sentido de introduzir camelos não nativos em regiões áridas, idealizou a vinda
desses animais para o nordeste brasileiro. Os camelos seriam usados para
transporte de materiais e mantimentos que acompanhariam a Comissão, o que era
coerente, levando em conta o estado precário das vias de comunicação terrestre
naquela região, e mesmo a falta de água e alimento para os animais comumente
usados, como bois e cavalos.
Foram doados pela Sociedade de Aclimatação quatorze camelos, quatro
machos e dez fêmeas, e providenciados quatro homens com experiência no
cuidado desses animais, que chegariam a Fortaleza em 24 de julho de 1859
(Braga, op.cit.). Os animais se reproduziram, alcançando o número de vinte
indivíduos 180 . Em 1863, estavam reduzidos a apenas três, por conseqüência de
uma doença já conhecida nas outras tentativas de aclimatação desses animais
(Vila, 2000). Os camelos que sobreviveram permaneceriam na fazenda do Coronel
181
Francisco Fidelis Barroso, por indicação da SAIN, até a morte .

Um último contratempo ocorrido com a Comissão, mais especificamente


com a Seção Geológica foi o naufrágio do Palpite, a embarcação pela qual
Capanema mandara as anotações, fotos e amostras, produtos das atividades de
sua Seção. No já citado Relatório de 1865, de autoria do Investigador anônimo, o
episódio aparece da seguinte maneira:

Com a vida engolfada em tão asqueroso lodaçal de vícios,


era absolutamente impossível que ele [Capanema] pudesse
ocupar-se no menor trabalho científico(.. .). Mas ele remediou
semelhante falta e mesmo com ela lucrou, como se vai ver.
Partiu a fazer sua excursão pelo interior (.. .). Na volta
comprou um barquinho velho e desconjuntado chamado
=Palpite= (que palpite!!!) (.. .). O Palpite, porém, sem respeitar
uma carga de tanto valor, abriu-se no decurso da viagem em
um rio manso, tendo a correnteza a seu favor (. ..). pensem
os críticos como quiserem; os livros e os instrumentos estão
seguros; e a perda dos trabalhos está justificada com uma

124
das mais palmares demonstrações 182.

Ou seja, o Investigador estaria colocando claramente que o naufrágio da


embarcação teria sido um golpe de Capanema para justificar a suposta falta de
resultados obtidos durante as atividades de sua Seção no Ceará. Por outro lado,
Capanema narra o naufrágio e a perda do material para seu amigo Gonçalves
Dias em correspondência pessoal:

Creio que esta te achará já de volta, não te escrevo mais


porque a notícia do naufrágio tomou-me completamente
besta, ando apatetado 183.

Dado o grau de amizade destes dois integrantes da Comissão, concluímos


que o naufrágio possivelmente ocorreu, pois Capanema não esconderia a verdade
para Dias em uma carta pessoal, ou seja, em um documento que não seria lido
por ninguém além de Dias. Com o material disponível no momento, é impossível
concluir se houve ou não tal façanha.

Partiremos para outros aspectos que envolveram o retorno da Comissão


Científica à corte.

2.7. O retomo da Comissão Científica: resultados concretos.

Em meados de 1861, os trabalhos das Seções Botânica e Zoológica


estavam chegando ao fim, como aparece na correspondência de Capanema para
Gonçalves Dias de 14 de abril de 1861:

O Conselheiro [AIIemão] declarou que tinha concluído a


botânica da província. O feliz colega [Lagos] declarou que
quanto à Zoologia a sabia de cor e salteado, estava pronto a
partir em fins de julho (../ 84 .

O Governo Imperial já apresentava cortes no financiamento através da já


citada tabela de gastos, que entraria em vigor a partir de fevereiro do mesmo ano.
Capanema faz referências negativas à esta tabela em várias correspondências

125
pessoais e no relatório das atividades da Seção Geológica e Mineralógica. Em
correspondência a Dias, por exemplo, o naturalista contou sobre a proposta de
unir forças contra os possíveis ataques do Governo:

Declarei que no Rio deveríamos ser solidários, formar liga


forte contra os ataques do governo, fui aplaudido
unanimemente e a alegria desvaneceu as sombras que
pousavam nas feições do infeliz irmão, o feliz fez uma cara
de macaco quando avista banana 185•

O infeliz e o feliz irmão são os nomes satíricos usados por Capanema para
designar Gabaglia e Lagos respectivamente, como veremos melhor no Capítulo 3.
Além da declaração de alguns dos integrantes da Comissão sobre o fim dos
trabalhos no Ceará, o naturalista coloca em correspondência a Dias algumas
outras razões para o retorno da Científica ao Rio de Janeiro:

Tempo é que nos retiremos, pois isto anda muito podre:


disseram e não sei quem que Pompeu é quem mais nos
mete as botas, inclusive em mim, e vejo que o Conselheiro,
Freirinha, Gabaglia, Soares e Barbedo estão crentes
nisso 186•

Estariam portanto acontecendo intrigas que abrangiam os integrantes da


Comissão e um importante personagem local, Tomas Pompeu de Souza Brasil.
Infelizmente, Capanema não entrou em maiores detalhes sobre o assunto. O
trecho abaixo nos dá indícios de que Manoel Freire Allemão, o Freirinha, seria o
principal envolvido em tais problemas:

A Comissão embarcou sem o menor aparato, até o Pompeu


que quis vir comigo até a bordo impedi-o, porque queixaram-
se muito dele os colegas, em primeiro plano o Freirinha, que
o não poupa, dizendo que ele é o principal detrator da
Comissão, mas só no Rio ficou de me dar as provas, estou
curioso de ver isso 187•

126
Nos anos posteriores, entre 1864 a 1870, a situação estria voltada para a
Guerra do Paraguai, o que causou gastos do orçamento público, e acabou por
prejudicar o financiamento das ciências como um todo no Brasil, diminuindo
inclusive a verba repassada para o Museu Nacional. Politicamente, o ano de 1868
lembra a queda da terceira e última presidência Gabinete de Zacarias de Góis,
evidenciando uma profunda crise ministerial, já antecipando o fim da monarquia no
Brasil (lglésias, op.cit.), o que afetaria diretamente a Comissão.
Quanto aos resultados concretos e imediatos da Científica, vinculado à
Comissão, além das Instruções de Viagens relativa às atividades da sua seção e o
seu relatório da expedição, Capanema produziu alguns artigos sobre a seca: As
secas do Ceará 188, Apontamentos sobre a seca do Ceará 189 e A seca no norte190,
usando como dados as informações recolhidas durante a Expedição. Redigiu
também, entre os anos de 1860 e 1862, sob o pseudónimo de Manoel Francisco
de Carvalho, o já mencionado Zig-zag da Seção Geológica da Comissão
Científica, onde Capanema conta aspectos importantes do dia a dia dos
naturalistas na Comissão, e dá ainda informações adicionais sobre a política
cearense. Relacionado à cultura cearense, Capanema contribuiu com os
Apontamentos acerca das bebidas fermentadas, usadas pelos indígenas do Ceará
(Braga, op.cit.).
A Seção Botânica, além das Instruções, o Relatório e os três folhetos sobre
a flora cearense já expostos no presente trabalho, produziu também as
Considerações sobre as plantas medicinais, escrito por Manoel Freire Allemão.
Ferreira Lagos escreveu Observações de costumes... 191 , contendo um
capítulo sobre a Linguagem popular do Ceará, que, segundo Braga (op.cit.), trata-
se da primeira contribuição literária ao folclore cearense.
Gabaglia escreveu sobre o problema dos portos marítimos de Fortaleza,
publicados no Correio Mercantil, além da monografia A questão das secas na
Província do Ceará (Braga, op.cit.).
Gonçalves Dias se ateve em escrever o Proêmio e a Parte Histórica dos
Trabalhos da Comissão Científica (op.cit.), largamente referenciado neste
trabalho.

127
Além da produção literária descrita acima, a existência da Comissão
Científica rendeu para o Museu Nacional e para a comunidade científica como um
todo grande quantidade de material botânico e zoológico (tendo em vista que as
amostras geológicas afundaram com o iate Palpite), além de instrumentos, livros e
vasta literatura originada dos trabalhos da Comissão. Lopes (1996, op.cit.) afirma
que as amostras da Seção Botânica constituíram a maior contribuição do gênero
já recebida pelo Museu Nacional até então. O mesmo é evidenciado por Pacheco
(1995) em relação à coleção das aves trazidas por Ferreira Lagos, além de
dispensar elogios às técnicas de taxidermização, já que, em 1983, a coleção
ornitológica de Lagos continuaria em bom estado de conservação. Braga (op.cit.)
também chama a atenção para a perfeição na fixação dos pássaros da Seção
Zoológica, que, juntamente com outros produtos, foi atração de destaque na
Exposição da Indústria Cearense.
Contrariando algumas expectativas de encontrar enormes riquezas
minerais, a Comissão Científica entre outras coisas reuniu um bom volume de
material informativo para ser base dos estudos sobre a História Natural do Brasil
(Barroso, op.cit.). Sobre a primeira Seção do IHGB que os integrantes da
Comissão Científica participaram após o retorno, Capanema escreveu à Dias que

Já fomos a uma sessão do Instituto; não faze idéia como foi


concorrida, afluiu povo como pedra para ver os bichos do
mato que vinham do norte (alguns até suporiam que era
Sibéria) ou queriam admirar os enormes diamantes e as
massas de ouro que trazíamos. O nosso Presidente, com
suave e branda voz, anunciou que tínhamos chegado e que
apresentaríamos quanto antes um relatório (...). Nessa
ocasião [a primeira sessão do Instituto] é que eu queria o
amigo Gabag/ia por Presidente, ele começaria pela
expedição dos argonautas e metodicamente iria indo até
acabar conosco, provando que as dificuldades que
superamos ninguém até hoje as teve de ver 92.

128
Finalizando o Segundo Capítulo, partiremos para o Capítulo 3, onde
trabalho mais intensamente com a correspondência de Guilherme de Capanema,
e as histórias sobre a Cómissão Científica presentes nestas ricas fontes.

129
CAPÍTULO 3: AS CORRESPONDÊNCIAS DE CAPANEMA

Longe de conterem apenas informações do plano pessoal, as


correspondências compõem um rico material de análise na História das Ciências.
Quase sempre os assuntos sobre as atividades profissionais aparecem
conjuntamente com informações sobre a vida e o cotidiano de quem escreve.
Além disso, a maneira como tais temas são abordados nas correspondências nos
permite observar a reputação atribuída aos indivíduos por seus contemporâneos.
A forma de tratamento contida nas correspondências torna possível o
mapeamento de conexões que refletem as afiliações intelectuais e políticas dentro
dos grupos de profissionais. Sendo assim, adotamos as palavras de Outram
(op.cit.), que considera a correspondência merecedora de uma investigação mais
sofisticada, tomando as cartas como o objeto em si de investigação, e não apenas
um complemento do restante da documentação usualmente utilizada.
No caso específico deste estudo sobre a Comissão Científica, no momento
do levantamento das fontes documentais, a correspondência entre seus membros
·mostrou-se surpreendentemente abundante. Tais fontes também apontaram para
um personagem especial entre os integrantes da Comissão, pelo seu poder de
articulação. Este personagem é Guilherme de Capanema, diretor da Seção
Geológica, cuja influência , tanto política quanto científica, atuou de forma decisiva
ao longo da existência da Comissão Científica, chegando por vezes a levar o
Governo Imperial a mudar ordens oficiais, como veremos.
A atuação decisiva de Guilherme de Capanema na Comissão Científica
apresenta-se de modo muito rico em sua correspondência. Paralelamente à
história oficial contada pela historiografia, Capanema escreve detalhadamente
fatos e pensamentos que revelam outras histórias até hoje não contadas pelos
documentos do Império ou das Instituições ligadas à Comissão.
Dentre as correspondências levantadas, as trocadas entre Guilherme de
Capanema e Gonçalves Dias ganham maior destaque, pela intensidade da
amizade existente entre os dois, e o importante papel histórico dos escritos de

130
Dias, por ele ter sido um famoso literato brasileiro. Isto fez com que Gonçalves
Dias merecesse dois volumes dos Anais da Biblioteca Nacional: o volume 84
contém sua correspondência ativa e o 91 é composto por sua correspondência
passiva.
Entre as correspondências presentes no volume 84, 46 cartas são dirigidas
a Guilherme de Capanema, entre os anos de 1856 a 1864, justamente o período
da criação da Comissão e a permanência desses personagens no Ceará. Das
restantes da mesma obra, 25 são destinadas ao Imperador D. Pedro 11, 15 a
Manoel de Araújo Porto Alegre e 12 a Francisco Freire Allemão, entre outros.
Em contrapartida, no volume 91 dos Anais, Capanema é o remetente de 45
cartas a Gonçalves Dias, que foram enviadas neste mesmo período. Além destas,
a presente obra contém 14 do Professor Glasl, que veremos ter desempenhado
importante papel nos preparativos da Viagem da Comissão, 10 de Porto Alegre, 6
de Raja Gabaglia, 2 de Francisco Freire Allemão e 1 de João Martins da Silva
Coutinho.
Outro bloco de correspondências que merece destaque são as 52 cartas
levantadas, escritas por Manoel de Araújo Porto Alegre para Capanema, entre os
anos de 1858 a 1868, localizadas principalmente nos arquivos do IHGB e no
Museu Imperial de Petrópolis, não publicadas e em sua maioria manuscritas.
Já a Coleção Freire Allemão da Biblioteca Nacional -detalhada no ANEXO
1 desta Dissertação, no que se refere à Comissão Científica, contém quatro cartas
escritas por Allemão dirigidas a Guilherme de Capanema, duas a Gabaglia e uma
para Gonçalves Dias. A correspondência passiva do Conselheiro Allemão é
composta por dez cartas de Capanema, nove de Gabaglia, cinco de Ferreira
Lagos e uma de João Martins da Silva Coutinho, adjunto da Seção Geológica,
entre outras, e um ofício manuscrito do Marquês de Olinda.
Foram levantadas ainda, nos arquivos do IHGB, Biblioteca Nacional e do
Museu Imperial, dentro do período de 1856 a 1868, cinco cartas de D. Pedro 11,
quatro de Coutinho, uma de Gabaglia e uma de Tomas Pompeu de Souza Brasil,
todas dirigidas a Guilherme de Capanema, além de dois ofícios manuscritos do

131
Marquês de Olinda e um de Porto Alegre, tratando de assuntos referentes à
Comissão Científica.
Especificamente nó caso de Capanema, as cartas ganham uma importância
histórica maior pelos acontecimentos. Como já é fato conhecido, os resultados e
observações feitas por Capanema durante a Comissão foram a pique junto com o
Palpite. Dado este fato, oficialmente, relacionado as suas atividades científicas
nos sertões, nos restou para análise apenas o Relatório da Seção Geológica e
Mineralógica, dois artigos versando sobre as secas do Ceará e alguns
apontamentos geológicos publicados no Diário do Rio de Janeiro, como ressalta
Braga (op.cit.). O próprio Capanema, relatando o fato a seu amigo Dias, explicita
as suas perdas por conseqüência do naufrágio:

Ontem recebi a notícia que 13 ou 15 volumes que eu tinha


mandado embarcar na Granje foram a pique. [Perdeu-se]
geologia de toda parte percorrida da província, observações
astronómicas feitas desde o princípio até ali, observações
meteorológicas e detenninações de altura (. ..), 420 páginas
com aquela minha letra (. ..). Perderam o seu valor as minhas
coleções geológicas; restam-me apenas como úteis
apontamentos algumas cartas escritas a Pompeu e a outros,
assim como Manoel Francisco, que já anda em tira número
500193 .

O personagem Manoel Francisco citado neste trecho e mencionado no


Capítulo 11 desta Dissertação, é o pseudônimo usado por Capanema ao escrever
os Zig-zags da Seção Geológica, que, segundo o próprio autor, no momento do
naufrágio, já se apresentavam em mais de 500 tiras. Como pode ser visto, as
cartas e os Zig-zags são apontados pelo próprio Capanema como fontes eficazes
de análise sobre as suas atividades científicas no Ceará, mesmo que tais
atividades conceitualmente se restrinjam, pelo autor da carta, apenas às práticas

193
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 335, op.cit.). Carta n° 281 para Dias. Fortaleza,
13/04/1861.

132
Gabaglia

-----1!> De 1 a 5 cartas Destinatário

t
Remetente

de campo. Em meados do ano de 1861, Capanema começara a ter problemas nas


publicações de Manoel Francisco, como demonstra o trecho abaixo:

Do Manoel Francisco só se publicou uma pequena porção,


eu não quis continuar porque no 'Diário' fizeram-me pagar
composição papel e tiragem por inteiro, de modo que
enchiam as suas colunas a minha custa, suspendi a remessa
porque não estava pelos autos194.

Sendo assim, as cartas constituem, neste caso, a categoria de documento


mais apropriada para realizar o estudo sobre a atividade científica de Capanema
na Comissão. Para melhor entendermos o dinamismo do conteúdo destas cartas,

194
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 235, op.cit.). Carta n° 194 para Dias. Pacatuba,
28/05/1861.

133
a Figura 3.1 representa visualmente a rede de correspondências que foram
levantadas entre os naturalistas da Comissão, e outros personagens que estavam
diretamente relacionados à ela.
De qualquer forma, as práticas em história natural, no conceito mais amplo
de Jardine e Spary (1996), presentes nas correspondências de Capanema,
compõem um importante objeto de estudo, principalmente se levarmos em conta a
perda de documentos relativos ao trabalho de campo da Seção Geológica por
conseqüência do naufrágio do Palpite. Sendo assim, este capítulo apresenta-se
centrado na análise da correspondência de Capanema, nunca ainda analisada em
seus detalhes. O recorte escolhido para o presente trabalho, como não poderia
deixar de ser, foi a presença de assuntos relacionados com a Comissão Científica
nas cartas pessoais de nosso personagem, o que contribuiria para um melhor
entendimento sobre a História Natural da época.

135
A sistematização da correspondência nos levou a elencar certas categorias,
de modo a organizar a exposição do resultado do trabalho realizado sobre tal
material. Então, vejamos cada um desses itens.

3.1. A ciência na correspondência: livros e instrumentos para a viagem


e a prática cientifica no Ceará.

As cartas entre Guilherme de Capanema e Gonçalves Dias que tratam da


compra de instrumentos e livros para a Comissão Científica datam do início de
1856 até meados de 1858, quando Gonçalves Dias volta da Europa ao Brasil.
Nestas cartas, Capanema orienta Dias sobre quais obras e instrumentos
deveriam ser comprados, seus títulos e especificações técnicas, onde e com quem
a compra deveria ser feita. Em suma, ficou evidente na leitura das cartas trocadas
entre estes dois personagens que Capanema representou um contato
fundamental com o velho mundo para a aquisição do que era necessário para que
a Comissão pudesse iniciar viagem. O naturalista marcou a sua participação
desde a elaboração da lista de obras e instrumentos, até a remessa de dinheiro á
Europa para que as compras fossem feitas.
O papel de porta-voz das encomendas exercido por Capanema se torna
explícito no trecho abaixo, retirado da correspondência de Capanema para
Gonçalves Dias de 23 de fevereiro de 1857:

Amanhã tenho que te escrever uma carta oficial se quiseres


para te dar umas instruções para compra de vidros,
instrumentos, etc. Isto é, faço as cartas de encomenda para
tu encaminhares e mandares fazer os pagamentos 195

Esta carta oficial a qual Capanema se refere, foi mandada a Gonçalves


Dias a 24 de fevereiro do mesmo ano, recomendando nomes de livrarias e
pessoas para Dias efetivar as compras:

O que for obra alemã, podes te dirigir à livraria Perthes

195
Capanema, in: Anais da Biblioteca Nacional (1971: 111, op.cit.). Carta n° 90 para Dias. Orianda,
23/02/1857.

136
Besser & Mauke, em Hamburgo, que já tem costume de
mandar livros para cá, e por intermédio deles vem as
remessas da Academia de Ciências de Viena para o Instituto
[IHGB], (... ) no mesmo caso estão em Londres Sotheran &
Willis, Great Tower Street 96 .

Este trecho mostra que a experiência e o envolvimento de Capanema na


compra de livros estrangeiros é anterior à criação da Comissão Científica, talvez
fruto da sua familiaridade com os meios europeus desde quando iniciou seus
estudos sobre mineralogia na Escola de Freiberg.
Um nome presente constantemente nas cartas que tratam sobre a compra
de livros é o de Brockhaus, outro contato fundamental na Europa para o preparo
da biblioteca que seria usada pela da Comissão Científica. No trecho abaixo,
escrito por Gonçalves Dias, vemos que o IHGB adotaria Brockhaus em cargo
oficial:

Acabo neste momento de receber uma carta do Brockhaus.


Decididamente crio que fiz bem em me dirigir a ele para a
compra dos livros, e o Instituto ainda melhor em o nomear
seu livreiro 197.

Posteriormente, o próprio Gonçalves Dias, em carta para D. Pedro 11,


justifica a aprovação pela escolha do livreiro pelo IHGB:

Assim, por exemplo, a relação suplementar dos livros que


Perthes e Besses, ex-livreiros do Instituto, calculavam em
7,500 francos, Brockhaus os dará pelo terço desta quantia-
isto é -2,600 francos 198•

Além da aquisição dos livros, Capanema e Gonçalves Dias também


cuidaram da compra de instrumentos para a Comissão, os quais na sua maioria

196
Capanema, in: Anais da Biblioteca Nacional (1971: 112). Carta n° 91 para Dias. Orianda,
24/02/1857.
197
Dias, in: Anais da Biblioteca Nacional (1964: 228). Carta n° 134 para Capanema, Paris,
03/09/1857.
198
Dias, in: Anais da Biblioteca Nacional (1964: 232, op.cit.). Carta n° 137 para D. Pedro 11, Desdre,
04/11/1857.

137
seriam usados pela Seção Astronômica e Geográfica de Raja Gabaglia, como
aparece ainda na mesma carta de Capanema. No mesmo trecho, surge outro
personagem, o Professor Glasl, que veremos ter importância especial no que diz
respeito à compra de tais instrumentos:

(. ..) vai uma carta para o Professor Glasl em Viena, que tem
de encomendar um planímetro, um nível de algibeira, dois
telescópios e tem de se entender com os diretores das
Seções do Museu para lhe mandarem vir os vidros 199•

O Professor Glasl desempenhou papel fundamental na compra dos


instrumentos para a Comissão. Em linhas gerais, podemos dizer que a experiência
e os contatos de Glasl, juntamente com a amizade de Gonçalves Dias, possibilitou
que Capanema cumprisse sua função de realizar as compras na Europa. Isto fica
evidente em carta de 11 de agosto de 1857. em que Glasl escreve para Gonçalves
Dias que o número de vidros [encomendados para a Seção Zoológica] é por
demais reduzido (segundo minha opinião/00, fazendo com que Capanema
encomendasse mais vidros na correspondência para Dias de 14 de setembro do
mesmo ano.
As portas abertas por Glasl para Capanema, e consequentemente para a
Comissão, foram explicitadas pelo próprio professor em carta a Gonçalves Dias de
3 de dezembro de 1857:

Para mim foi realmente uma felicidade que foram aceitas e


executadas pelas partes interessadas as encomendas feitas
na última carta de nosso amigo Capanema. Só o posso
atribuir à circunstância favorável de terem os filhos de nossos
mecânicos, ópticos, etc em Viena, todos sido discípulos
mewf01

199
Capanema, in: Anais da Biblioteca Nacional (1971: 112, op.cit). Carta n° 91 para Dias, Orianda,
24/02/1857.
200
Glasl, in: Anais da Biblioteca Nacional (1971: 140, op.cit.). Carta n° 119 para Dias, Waering,
11/08/1857.
201
Glasl, in: Anais da Biblioteca Nacional, (1971: 165, op.cit.). Carta n° 136 para Dias, Viena,
03/12/1857.

138
De certa forma, Capanema contava não só com os contatos de Glasl, mas
também com a competência e conhecimento do Professor sobre História Natural,
como está documentado na correspondência de Glasl para Dias, de 24 de agosto
de 1857:

Capanema pediu-me que lhe escrevesse detalhadamente


com referência ao modo de conservar os animais nos vidros,
bem como ao transporte dos mesmo$102.

O professor Glasl também colaborou com a Comissão através da


articulação entre ele e instituições científicas, como aparece no fragmento abaixo
da carta de Dias para D. Pedro 11:

Nos últimos caixotes, contendo objetos para uso da


Comissão de Exploração, remetidos de Viena, vão alguns
instrumentos de que o Instituto Geológico da Áustria faz
presente à Comissão Brasileira(...). não sei quem os manda,
e só que a remessa é feita pelo Dr. Glasl, condiscípulo do Dr.
Capanema203•

Nota-se também a intenção de Dias em fazer chegar ao conhecimento do


Imperador que Capanema estaria intimamente envolvido com a realização de tais
doações.
No total, foram 14 cartas para Gonçalves Dias remetidas pelo Professor
Glasl, presentes no volume 91 dos Anais da Biblioteca Nacional, entre junho de
1857 e meados de 1858. Através destas correspondências, podemos perceber
que a articulação entre esses três personagens, Capanema, Dias e Glasl,
evidenciada em suas correspondências, foi fundamental para o bom preparo da
viagem que seria realizada pela Comissão Científica.
A aquisição de material para fotografia compõe um outro assunto muito
presente nas correspondências entre Capanema e Dias:

202
Glasl. in: Anais da Biblioteca Nacional, (1971: 145, op.cit.). Carta n° 122 para Dias, Viena,
2410811857.
203
Dias, in: Anais da Biblioteca Nacional (1964: 235, op.cit.). Carta n° 140 para D. Pedro 11, Desdre,
0310211858.

139
Na Alemanha publicaram-se uma porção de compêndios de
fotografia há três anos, a esta parte encomenda tudo;
encomenda os dois aparelhos [fotográficos], traz vidros
bastantes (doze de cada tamanho), mas em porção traz
gelatina, porque para ela se passa todos os positivos e
negativos, e conservam-se em muito pequeno espaço, numa
já experimentei o negócio e vai muito bem. Não te esqueças
de aprender com o Leguay, olha que tu és o nosso fotógrafo,
tens de ensinar aos outro:l04.

Interesses pessoais e profissionais pela fotografia são encontrados juntos


nas correspondências. O trecho a seguir exemplifica muito bem esta colocação:

Manda-me pelo próximo paquete alguns frascos de bom


colódio para eu me divertir em quanto não vamos, vê o
colódio de Bertsch, e que progressos fez esse cometa com a
fotografia microscópica que o Instituto tanto elogiou. Vai da
minha parte a M Geoffroy S. 1 Hilaire e pede-lhe que te
apresente o Rosseau do Jardim das plantas e dos bichos o
qual fotografou e gravou animais, isto é um ramo útil para
nó:los_

Mais uma vez, aparecem nas correspondências as importantes relações


cultivadas por Capanema na Europa, e o conhecimento e participação nas
atividades científicas realizadas por lá, além do interesse em manter-se
atualizado. Outros fragmentos de correspondência mostram o domínio sobre as
técnicas de fotografia exercido por Capanema:

Com albumina seca fiz experiências fotográficas, estava


sensibilizada a dois dias, e 'c'est tres bon'. Eu hoje estou um
grande fotógrafo, mas sem essas receitas de Omies,

204
Capanema, in: Anais da Biblioteca Nacional (1971: 150, op.cit.). Carta no 125 para Dias, Rio de
Janeiro, 14/10/1857.
205
Capanema, in: Anais da Biblioteca Nacional (1971: 156, op.cit.). Carta n° 130 para Dias. Rio de
Janeiro, 12/11/1857.

140
Monchtorens, Legrags. É do doutor Silva que se presta ao
nosso clima e aos nossos hábitos (. ..). Quero ainda fazer
uma experiência que me falta, manda-me meia dúzia de
garrafinhas de colódio sensível de Bertsch, quero ver se
serve ou se é pulha 'comme tous les autreseos

Um outro aspecto importante que pode ser ressaltado no trecho acima seria
a adaptação das técnicas estrangeiras para a realidade nacional. Dentre as várias
receitas de 'Omies', 'Legrags' e outros, é justamente a de 'Silva' que melhor serviu
frente as condições climáticas brasileiras. Além disso, mesmo a técnica brasileira
ainda apresentaria a possibilidade de ser aprimorada pelos experimentos de
Capanema.
A fotografia coloca em voga um tema de suma importância inserido dos
estudos sobre a história da História Natural, que é o papel das imagens no
trabalho de campo, classificadas por Lisboa (op.cit.) dentro do amplo conceito do
que pode ser considerado literatura de Viagem. Apesar de não conterem as
palavras propriamente ditas na iconografia de uma Viagem Científica, existe forte
correlação entre texto e imagem presente na História Natural, já mais uma vez
constatada por Rudwick (op.cit.), Figueirôa (1997, op.cit.), e recentemente por
Pataca (op.cit.) no caso da Viagem Filosófica de Alexandre Rodrigues Ferreira.
Prosseguindo com as análises das cartas, já iniciadas as suas atividades no
Ceará, Capanema narra á Gonçalves Dias as suas atividades com a máquina
fotográfica:

Estou aqui pela Pacatuba desfrutando o Vila Real, dele se


obtém poses magníficas para um livrinho a modo de
Michelet. Além disso, já fotografei o diabo, vou ao aracape
buscar mais notas e tirar as vistas das cachoeiras e
parabuçara207.

206
Capanema, in: Anais da Biblioteca Nacional (1971: 174, op.cit.). Carta n° 143 para Dias. sn,
10/1857.
207
Capanema, in: Anais da Biblioteca Nacional (1971: 235, op.cit.). Carta no 194 para Dias. Pacatuba,
28/05/1861.

141
A necessidade da importação do material de revelação fotográfica é
justificada por Capanema em correspondência, reforçando o fato que o naturalista
tinha bom conhecimento sobre as técnicas que envolviam a fotografia na época:

Traz muito catódio e sobretudo em vidros pequenos bem


cheios, porque aqui custa muito a faze-lo bom; o éter
acidifica com facilidade e o catódio que se prepara com ele
perde a sensibilidade208.

Segundo atestam as correspondências de Capanema, o naturalista teria


fotografado inúmeras paisagens durante as suas atividades no Ceará, porém tais
fotos teriam afundado com o Palpite.
Questões sobre a agricultura compõem um tópico igualmente presente nas
cartas entre Capanema e Gonçalves Dias:

Recebi a 'Química Agrícola' traduzida por Henriques, não é o


mesmo que eu traduzi, foi um novo apêndice baseado em
descomposturas aos governos, já vês donde veio a minha
simpatia209•

Como foi proposto pelas Instruções da Seção Geológica, Capanema


realizaria estudos sobre os melhoramentos da agricultura. Não se atendo apenas
às análises do solo, e como bom engenheiro, o naturalista realizou observações
sobre os maquinários usados na lavoura e suas potencialidades:

A máquina do Justa despolpa, tocada só por um menino, 10


alqueires por dia com descanso -(1 alqueire por hora com as
paradas, continuadamente 1 alqueire em 314 de hora), dois
homens carregam o tal aparelho para qualquer ponto, e nisso
há grande vantagem 210.

208
Capanema. in: Anais da Biblioteca Nadonal (1971: 156, op.cit.). Carta n° 130 para Dias. Rio de
Janeiro, 12/11/1857.
209
Capanema, in: Anais da Biblioteca Nadonal (1971: 218, op.cit.). Carta n° 184 para Dias. Lagoa
Funda, 31/101860.
°
21
Capanema, in: Anais da Biblioteca Nadonal (1971: 219, op.cit.). Carta n° 185 para Dias. Ceará,
set,out/1860.

142
Além de estudar o potencial de trabalho das máquinas, Capanema também
faria propostas sobre a política de produção destas máquinas junto ao poder
público. Relacionado a isto, escreveu para Dias:

Quando se propõe ao Governo que mande fazer uma oficina


de máquinas agrícolas para as vender a preço de custo ou
abaixo dele, contanto que o estabelecimento sirva de escola
para qualquer bicho careta que os fazendeiros queiram
mandar para aprender a fazer sua ferramenta, é-se
escamecido211 !

Além destas questões técnicas e políticas relacionadas a agricultura, e suas


investigações acerca da fotografia, a Botânica também representa uma área de
conhecimento igualmente presente na vida do naturalista. Como já foi visto no
Capítulo 11, pelo menos desde a criação da Sociedade Velosiana, Capanema
estaria envolvido com o estudo das plantas. Após o início das atividades no Ceará,
notamos a presença constante de assuntos relacionados à algas e plantas
medicinais em sua correspondência:

Se fosse agora com meu microscópio ao Pará, seguramente


não poderia estudar alga amazónica, porque os
espermatozoos já as terão desfocado. A propósito desse
sujeito, sabes tu que eu já enchi um álbum com espécies de
água doce e que já vou em n° 103? E isso desde Sobral? Há
muita coisa bonita e muita coisa nova. Em morfologia já
achei tão bem matéria para dar um valente sopapo nos
mestralhões lá das Europas que se meteram a nos querer
dar regras212•

A coleta de algas referida acima foi realizada durante a permanência no


Ceará, porém nada consta nas Instruções da Seção Geológica sobre estudos
destas plantas. Esta atividade realizada por Capanema representaria então um

211
Idem nota 209.
212
Capanema, in: Anais da Biblioteca Nacional (1971: 238, op.cit.). Carta n° 195 para Dias. Fortaleza,
02/07/1861.

143
estudo voluntário, talvez por interesse pessoal. O trecho acima mostra também
que o naturalista detinha conhecimento de morfologia das plantas aquáticas, e
saberia como encontrá-las, coletá-las e classificá-las, e segundo ele mesmo, tão
bem ou até melhor que os especialistas europeus.
Suas pesquisas continuariam:

Eu depois de resignado dos meus males, comecei a


trabalhar um pouco mais, ando com minhas algas as voltas e
tenho pelo menos 100 espécies, e alguns gêneros novos(. ..).
Faze tu idéia se eu tivesse andado com tais disposições
desde que eu saí do Ceará, por onde não andaria eu todo
tempo que estivesse na Pacatuba, Baturité, lcó e capital,
teria quadruplicado esse número213•

Um segundo momento em que Capanema estaria realizando pesquisas


sobre plantas seria na ocasião do retorno da Comissão à corte, quando estaria
empenhado nos também nos estudos sobre plantas medicinais:

Eu, enquanto espero decisão sobre nosso procedimento


científico, fui logo tomando posse da minha cadeira na escola
e dos telégrafos elétricos. Fora disso, estou pondo em ordem
meu laboratório para recomeçar a minha química e fazer
drogas e especulação, que não custa dinheiro e que pode
render alguns cobres. Para isso, ajuda-me tu, toma nota de
quanta erva encontrares que sirva de remédio, ou que tenha
outra qualquer aplicação, se puderes, manda-me amostras
quanto não, encarregue ao Coutinho. 214.

No fragmento acima, além dos estudos citados acima, também está


presente a preocupação de Capanema em relação ao dinheiro. Mais adiante,

213
Capanema, in: Anais da Biblioteca Nacional (1971: 242, op.cit.). Carta no 196 para Dias.
Pernambuco, 17/07/1861.
214
Capanema, in: Anais da Biblioteca Nacional (1971: 244, op.cit.). Carta n° 198 para Dias. Rio de
Janeiro, 06/08/1861.

144
veremos que tal questão aparece constantemente na correspondência entre os
dois amigos.
O intercâmbio de produtos naturais entre Capanema e Gonçalves Dias nos
parece freqüente, estando presente em mais de uma carta. Dias, ainda no norte
do país, remeteria e receberia plantas e sementes para o Rio de Janeiro, onde
Capanema realizaria seus estudos:

Não vão agora as sementes de hortaliças porque semeei


algumas e nasceram pessimamente, estou em experiência
de outras, se forem boas, te remeteref1 5.

E sem deixar o tom satírico de lado, o mineralogista continuaria narrando a


Gonçalves Dias a sua prática científica:

[Estou a] caminho para ltaipu, onde vou entreter-me com


algas, ouriços, zoófitos, anelídeos e que são umas criaturas
que não ofendem nem escandalizam a cristão, eles tem isso
de superior aos homens, vou pois afogar alguns bocados de
ódios e zangas216.

Novamente podemos notar que Capanema passeia pelas diversas áreas de


conhecimento da história natural. Desta vez, ele mostra o seu envolvimento com a
Zoologia de invertebrados, além das algas. Na ocasião da correspondência acima,
Gonçalves Dias estaria de volta à Europa, e Capanema, aproveitando a estadia do
amigo, continuando a solicitar a troca de materiais de estudo:

Vai me visitar o Sr. Dr. Ludwig Rabenhorst, olha para a cara


dele a veres se ele é coisa que preste, e pergunta-lhe se ele
quer fazer troca de algas de lá que não vem nas coleções
que ele distribui ('Aigen mitteleuropas? e que eu possuo com
ostras de cá que estou descrevendo217.

215
Capanema, in: Anais da Biblioteca Nacional (1971: 255, op.cn.). Carta n° 211 para Dias. Rio de
Janeiro, 22/04/1862.
216
Capanema, in: Anais da Biblioteca Nacional (1971: 265, op.cn.). Carta n° 220 para Dias. Rio de
Janeiro, 05/09/1862.
217
Capanema, in: Anais da Biblioteca Nacional (1971: 272, op.m.). Carta n° 226 para Dias. Rio de
Janeiro, 25/11 1862.

145
Por ocasião de uma enfermidade nos pulmões em meados de 1863,
seguindo orientação médica, Capanema se dirigiu para a região de São Paulo,
tendo por lá a oportunidade de dar continuidade aos estudo com as plantas:

A botânica progride, já tenho 350 espécies, e achei um


expediente magnífico para ganhar tempo, meti as moças a
secar plantas, e coitadas, engolem essa bucha com
paciência, quando o tempo me prende em casa, vivo
agarrado ao microscópio218•

Durante a permanência na região de São Paulo, Capanema realizou


também observações de caráter astronómico e geográfico, reforçando a idéia da
versatilidade em suas práticas científicas:

Minha ocupação é regular cronômetro, fazer observações


barométricas, magnéticas e de lua para longitudes, quando
vou a excurções, levo pasta que vem cheia, e quando voltar
levarei bonito hervário, já tenho 267 espécies empacotadas e
cerca de 40 a 50 na prensa. Daqui vou a ribeira do lguape
por ela acima ver as minas de chumbo do lporanga, voltarei
por aqui para ir a Porto Feliz e ao /tu fotografar o salto do
Tietê 219.

De volta aos preparativos da Comissão Científica, Capanema também se


envolveria com os preparativos da Seção Etnográfica de Gonçalves Dias. O
naturalista teria elaborado uma lista de instrumentos de medidas que iriam ser
usadas pela referida seção. Como podemos ver, Capanema cuidou da compra de
livros e demais materiais para a Científica como um todo, provando mais uma vez
ser peça importante dentro da Comissão.
Sobre este aspecto, devemos ter em mente que os outros integrantes da
Comissão responsáveis pelas Seções também participaram de modo ativo no

218
Capanema, in: Anais da Biblioteca Nacional (1971: 305, op.cit.). Carta n° 256 para Dias. S. J. do
Ipanema 12/10/1863.
219
Capanema, in: Anais da Biblioteca Nacional (1971: 302, op.cil.). Carta n° 253 para Dias. S. J. do
Ipanema, 06/10/1863.

146
preparo para as suas atividades. É o que demonstra o fragmento abaixo, escrito
por Gonçalves Dias:

Um cefalômetro que vem na relação das compras é para


minha comissão? Comprei um Craniômetro e creio que tudo
vem a dar no mesmo, pois que nada pode medir o cérebro,
senão por dedução. A capacidade do crânio deve estar em
relação com a quantidade de matéria cerebral nos indivíduos
da mesma espécie. 220.

Do mesmo modo que Capanema estaria envolvido com assuntos


relacionados com as outras Seções, Dias freqüentemente se aventurava no ramo
da Geologia, como mostra o fragmento de uma carta de Capanema sobre a
descrição de um mineral elaborada por Dias:

Recebi a rede que me mandaste e as pedras, agradeço-te


uma coisa e outra, estas principalmente: o teu carvão de
codó está muito longe disso, é um lenhito muito embebido de
sílica e argila, coisa curiosa, e a pedra superposta tem uns
vestígios de fósseis, foi pena que não procuraste algo
perfeito que me habilitasse a fixar a formação 221 .

E através do trecho abaixo escrito por Dias, podemos ver que suas
descrições seriam satisfatórias, completas o suficiente para possibilitar os
naturalistas a reconhecerem o mineral:

É uma amostra que hoje me deram, e lá vou a ver se


descubro mel de pau. Mais denso do que a água, arde com
dificuldade, ao maçarico sem fumaça nem cheiro: cor preta,
lustrosa, com brilho metálico. Pela minha descrição, o
Coutinho julgou que poderia ser Turmalina semelhante a
uma que achaste no Ceará. Já vês que sou forte nas

220
Dias. in: Anais da Biblioteca Nacional (1964: 227, op.cit.). Carta n° 134 para Capanema, Paris,
03/09/1857.
221
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 335, op.cit.). Carta n° 281 para Dias. Fortaleza,
13/0411861.

147
descrições! Depois que a viu ficou perplexo; mas, pendendo
para o carvão. E se há carvão, entre o Solimões e Rio
Negro?! com transporte facílimo para as margens de ambos
- com o Madeira à porta ... Que dizes tu? Estou desconfiado
de tanta fortuna=!

No trecho acima também pode ser evidenciada a idéia de exploração de


recursos, presente em vários outros escritos relacionados a Comissão. A
qualificação de Dias para recolher dados geológicos faria com que Capanema
freqüentemente requisitasse informações, principalmente tendo em vista que no
ano de 1861, todos os integrantes da Comissão retornaram à Corte, exceto Dias,
o que possibilitou que o chefe da Seção Geológica continuasse a se informar
sobre os minerais do Norte do Brasil. Os pedidos de Capanema estão presentes
nas correspondências, como exemplifica o fragmento abaixo:

eu me encarrego de te imortalizar, e podes fazer um


benefício ao teu país ou a algum outro; vejo que andas em
progresso, já que me falas em maçarico etc. Vê se
descobres nas rochas arenosas por lá alguma folha, algum
bicho concha, que petrificado é necessário isso para fiXar
formação 223•

Nota-se no trecho acima o tom de brincadeira de Capanema com Dias,


além dos elogios de progresso na habilidade de Dias para recolher informações
geológicas.

Após tratar da ciência propriamente dita na correspondência entre


Capanema e Gonçalves Dias, veremos o que estes documentos nos contam sobre
o retorno da Comissão à Corte, a recepção de seus integrantes e a continuidade
dos trabalhos.

= Dias, in: Anais da Biblioteca Nacional (1964: 292, op.cit.). Carta n° 189 para Capanema, Manaus,
25/05/1861.
223
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 239-240, op.cit.). Carta n° 195 para Dias.
Fortaleza, 02/07/1861.

148
3.2. O retomo à Corte: trabalhos a serem concluídos.
Como já foi citado, em julho de 1861, os integrantes da Comissão Científica
retornaram à Corte, exceto Gonçalves Dias, que permaneceria percorrendo a
região norte.
De acordo com as correspondências, as discussões envolvendo a volta ao
Rio de Janeiro iniciaram em meados de março de 1861. Capanema, em reunião
com os demais integrantes, proporia o retorno para viabilizar a discussão sobre
novos rumos que seriam tomados pelos naturalistas em relação à Comissão.
Sobre este aspecto, trataremos com mais detalhes no próximo item.
Diante desta situação, e estando Gonçalves Dias nos arredores de Manaus,
Capanema chamaria pelo amigo, e como acontece freqüentemente, o
mineralogista usou de piadas e bom humor:

Eu te espero para irmos juntos apresentar os nossos


respeitos ao Governo Imperial, eu para o cumprimentar tenho
coprólitos, isto é, fósseis, tu, como te ocupas de entes do
período atual, deves tê-los mais frescos, S. Ex. as apreciarão
sobremaneira as nossas adequadas oferendas, vem poi:l24•

E critica os resultados que seriam apresentados pelos companheiros,


supondo estarem, ele e Dias, em melhor situação:

A vista da boa inteligência da Comissão, eu fiZ Comissão a


parte, tenho escrito sobre tudo nesta vida, alguns
companheiros deram o cavaco, mas é culpa própria. No que
eu nunca tinha me metido foi em coisas da tua Seção,
comecei depois da tua partida, foi tarde, tive pouco tempo e
não estava preparado (. ..). Em etnografia não achavas nada
por aqui, não é tanto assim: ainda há poucos dias houve um
samba em S. Antônio e a meia noite formou-se roda,

224
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 251, op.cit.). Carta n° 206 para Dias. Lagoa
Funda, 03105/1861.

149
chocalhou o maracá e foi ecoar pela Aratanha (...) que só os
primeiros raios de sol fizeram emudecef25•

Na mesma correspondência, Capanema conta ao amigo as dificuldades


financeiras que a sua Seção estaria passando na Comissão, fruto da distribuição
de dinheiro ditada na já mencionada Tabela Orçamentária:

O novo Governo creio que está disposto a nos tratar bem,


pois existe aqui dinheiro, ordem para ir de 1° de julho em
diante, - a forma porém não é conveniente, devemos muda-
la, preparar-nos de outra maneira, reduzir enormemente as
despesa!l26.

Apesar do pedido de Capanema, Gonçalves Dias não retornaria à Corte


juntamente com os outros integrantes da Comissão, e recebe notícias de
Capanema sobre a data de retomo da Científica ao Rio de Janeiro:

Agora, alguma coisa quanto a esta desgraçada Comissão,


como sabes, o sábio governo imperial (...) anuiu sabiamente
ao nosso pedido para irmos a Corte olhar para cara dele
como boi olha para palácio. (. ..) nós a tínhamos pedido,
devíamos estar preparados a seguir no mesmo vapor que a
trouxe, mas como o Gabaglia tinha de casar, e Lagos a
assistir a esse pagode, ficou para o dia 28 (.. .), bastou isso
para ser plausibilíssimo motivo para esperarmos pelo
Cruzeiro que nos deve levar a salvamento no dia 13 coffente.
Pergunto eu quem é mais pedaço d'asno, o Governo se não
nos larga um valente foguete? ou nós que tanto mangamos
com el~ 7 ?

225
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 234, op.cit.). Carta n° 194 para Dias. Pacatuba,
28/05/1861.
226
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 236, op.cit.). Carta n° 194 para Dias. Pacatuba,
28/05/1861.
227
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 239, op.cit.). Carta n° 195 para Dias. Fortaleza,
02/07/1861.

150
No trecho acima, Capanema mostra uma suposta falta de seriedade de
seus companheiros em relação às ordens Imperiais, e condena a passividade do
Governo frente a tal situação.
Uma vez de volta ao Rio de Janeiro, Capanema narra ao amigo Dias o
encontro com o Ministro do Império, em uma reunião repleta de desencontros,
onde se discutiriam o andamento dos trabalhos resultantes das atividades da
Comissão:

Só na semana passada é que conseguimos ter conferência


com o Sr. Ministro do Império que foi maravilhosamente
pontual na hora, em que conseqüência de uma lição que lhe
demos, mandou-nos chamar para a primeira conferência,
esperamos duas horas, e quando ele veio, não nos
encontrou, estava porém lá teu sogro, que era suficiente para
entretê-lo. Decidiu-se que fizéssemos propostas do que
precisávamos para elaborar nossos trabalhos. Tu estás
contemplado em serviço efetivo228.

Nas palavras de Capanema, é possível notar também que ele efetivamente


estaria cuidando dos interesses de Dias dentro da Comissão.
Ainda se referindo aos resultados da Científica, Capanema comenta sobre
as estampas da Seção Etnográfica que estariam sendo elaboradas. Os
encarregados para tal tarefa seriam os irmãos Fleiuss, e o naturalista estaria com
planos de remeter os desenhos à Dias para que este iniciasse a obra que trataria
da Seção Etnográfica:

Agora a negócios da científica: já estão desenhados muitos


objetos de cavalo, eu vou te mandar para lá escreveres o
texto. As nossas dificuldades continuam as mesmas229. (.. .)
estão prontas 30 estampas tuas, tudo de armamento, as

228
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 248, op.cit.). Carta n° 203 para Dias. Rio de
Janeiro, 11/09/1861.
229
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 258, op.cit.). Carta n° 214 para Dias. sll,
07/08/1862.

151
outras coisinhas consumirão mais 30, vê lá se te queixa~3fJ.
Eu só tenho prontas as estampas para a minha primeira
memória texto, eles não pilham sem mé pagar os três meses
de gratificação vencida, e sem me darem o preparador que
231
em março requisitei. .

Tais estampas integraram a Exposição Antropológica, realizada em 1882


por Ladislau Neto (Lopes, 1997, op.cit.). Podemos perceber no fragmento acima
que, apesar das estampas estarem sendo elaboradas, a Comissão estaria
enfrentando alguns obstáculos para levar adiante os seus estudos.
Apesar disto, existem indícios nas cartas escritas por Capanema que algum
apoio era dado, pois, na ocasião da estada de Dias novamente na Europa, o
naturalista continuaria a fazer encomendas relativas à Comissão Científica:

Diz a ele [Brockhaus] que me remeta por paquete (. ..) as


continuações das obras periódicas remetidas à Comissão232.
Perguntaste que tal saiu o aparelho fotográfico que
encomendei em Viena, a prova da sua bondade é que aí vai
uma carta para o Dietzler fazer outro igual, de 3 polegadas,
com lente para paisagens (ortoscópica), se o dinheiro que aí
vai chegar, manda fazer dois aparelhos para tirar vistas e
retratos stereoscópicos, cada um de duas objetivas
combinadas233•

Ainda sobre os livros, Capanema comenta com Dias das ordens oficiais
recebidas para completar a biblioteca da Comissão Científica, biblioteca esta que,
como já mencionamos, se tornaria uma contribuição significativa para o Museu
Nacional:

23
° Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 264, op.cít.). Carta no 217 para Dias. Rio de
Janeiro, 24/08/1862.
231
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 269, op.cít.). Carta n° 223 para Dias. s/1,
08/10/1862.
232
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 277, op.cít.). Carta n° 229 para Dias. Rio de
Janeiro, 08/12/1862.
233
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 279, op.cít.). Carta n° 230 para Dias. Rio de
Janeiro, 24/01/1863.

152
Os livros que encomendei por ordem do governo para a
Comissão já se devem estar encaixotando, a lista foi de 9 de
abril, eu mandei-lhe dizer que remetesse conta de junho e
inclusive mesmo aqueles que ele {Brockhaus] só poderá
fornecer mais tarde, a fim de esgotarmos a verba existente,
assim ficamos com boa biblioteca234 • Recebemos ordem de
organizar a lista das obras que ainda carecemos para
completar a biblioteca da Comissão Científica, creio que é
coisa que se quer embutir ao orçamento235.

Aproveitando esta segunda fase da estada de Gonçalves Dias na Europa,


Capanema solicita ao amigo que procure documentos acerca de uma mina que
ouviu falar nos arredores de Sorocaba, onde o naturalista estava por
recomendação médica:

Tive notícia de uma mina de prata que já fora lavrada ao


tempo dos afonsinhos pelo governo português, como eu não
podia caminhar, mandei medir o poço, esgotos, galerias,
colher amostras, com efeito houve muito trabalho feito, e nas
cascalheiras encontraram-se pedaços de matriz com
minérios de cobre e chumbo contendo prata. ltapeva chama-
se o lugar(.. .), procura lá em Lisboa nos arquivos o que há a
respeito, o negócio é interessante. Vê se achas por lá
determinações de longitude e latitude, sobretudo se achas os
dados de observação236.

As minas de ferro de Sorocaba eram inspecionadas pelo Governo


português pelo menos desde meados da chegada da família real no Brasil. Tanto

234
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 242, op.cit.). Carta n° 230 para Dias. Rio de
Janeiro, 25105/1863.
235
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 282, op.cit.). Carta n° 234 para Dias. Rio de
Janeiro, 07/02/1863.
236
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 310, op.cit.). Carta no 260 para Dias. Rio de
Janeiro, 23/01/1864.

153
que já em 1810, foi criada a Real Fábrica de Ferro na Fazenda Ipanema. Havia,
desde esta época, um esforço do Governo em promover a siderurgia no Brasil.
Sinal disto foi que, em 1808, criou-se a Real Fábrica de Ferro em Minas Gerais, e
mineralogistas empregados da Corte teriam recebido a missão de examinar minas
de ferro e carvão no Rio Grande do Sul e Bahia. Também foram solicitados
técnicos estrangeiros, principalmente da Alemanha, a fim de sistematizar a
mineração e siderurgia no Brasil do início do século XIX (Figueirôa, 1997, op.cit.).
Dando continuidade a viagem de Capanema pela região de São Paulo, o
naturalista realizou também estudos sobre as algas, além de ter estado atento às
questões ligadas a mineralogia. Abaixo estão indícios de que Capanema pretendia
publicar algo sobre as algas, juntamente com conselhos para que Dias escrevesse
também os resultados de seus estudos no Ceará:

vê se fazes texto nos bocados para que se publiquem


folhetos, eu vou dar conta dos meus relatórios do Ipanema
para depois dar um folheto da Científica, vê lá se me auxilias,
os deputados e o governo estão rolando zangados porque só
há estampai237•

Veremos mais adiante no presente Capítulo, que a necessidade de


publicações sistemáticas relacionadas aos trabalhos da Comissão é um assunto
muito presente na correspondência entre Capanema e Gonçalves Dias.

Com o exposto até agora, podemos inferir alguns aspectos sobre as


relações entre Capanema e outros integrantes da Comissão Científica. A seguir,
trataremos deste tema com maiores detalhes, por entendermos, com base em
Jardine (op.cit.), que as relações pessoais entre os naturalistas também são parte
integrante das suas práticas científicas. Como foi mencionado na Introdução do
presente estudo, fazer ciência envolve várias habilidades, e uma delas seria a
habilidade de construir relações sociais viabilizadoras das próprias atividades
científicas.

237
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 316, op.cit.). Carta n° 264 para Dias. Rio de
Janeiro, 21/04/1864.

154
3.3. O desenvolvimento das relações entre Capanema e outros personagens
ligados à Comissão Científica

Capanema e Gonçalves Dias cultivavam uma amizade íntima, como já foi


mencionado. Podemos supor então que estes dois personagens trocavam
informações sobre as suas relações com outros membros da Comissão,
informações estas que não apareceriam na correspondência mantida entre outras
pessoas menos próximas. Veremos neste item do presente Capítulo a opinião de
Capanema sobre vários aspectos relativos a outros integrantes da Comissão
Científica, e comprovaremos a intimidade e preocupação de Capanema em
relação ao seu amigo Gonçalves Dias. A intimidade existente entre eles é tema
constante na correspondência de Capanema, como veremos adiante.
Se por um lado existia simpatia entre o mineralogista e Dias, por outro,
Capanema tinha total consciência de que manter boas relações com ele não era
fácil:

Não te posso dar novas do que vai por aqui, pois logo que
cheguei nos primeiros 4 dias, fui visitado por meus
numerosos amigos, três por junto! Ora, já vês que sou
homem o mais estimado deste mundo238. Estou me
convencendo de que sou um indivíduo horrorosamente
antipático, só para ti e para aquele bom Freirinha é que não a
tinham ainda encontrado tal propriedade239•

Um integrante da Comissão sempre presente nas cartas de Capanema


para Dias é Raja Gabaglia, geralmente citado por Capanema como o infeliz
colega, como aparece no fragmento abaixo:

O Gabaglia quer 9 ajudantes que ainda não pediu, quer


primeiro fazer-lhes a sua profissão de fé, segue daí que será

238
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 172-310, op.cit.). Carta n° 260 para Dias. Rio
de Janeiro, 23101/1864.
239
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 172-315, op.cit.). Carta n° 263 para Dias. Rio
de Janeiro, 08/02/1864.

155
preciso arrebanhá-los em Curitiba, Mato Grosso, Rio Grande,
etc. em quanto tempo é que se reunirão esses sujeitinhos?
logo que chegue o nosso infeliz colega~40

Capanema, neste trecho, demonstra preocupação com um possível atraso


na partida da Comissão, causada pela demora de Gabaglia, o infeliz colega, em
reunir a equipe para a sua Seção Astronómica. A esta altura, o Marquês de Olinda
não havia assumido o ministério, e Capanema neste momento ainda não
apresentava a preocupação de adiar a saída da Comissão do Rio de Janeiro,
como exposto no segundo capítulo do presente trabalho.
Em outra correspondência trocada com Dias, já em meados de 1861,
quando Dias se encontrava em território amazónico, Capanema volta a ter
problemas com Gabaglia. Depois de uma reunião para decidir o andamento futuro
dos trabalhos da Comissão, Capanema relata a Gonçalves Dias a participação do
infeliz colega:

Enfim com sonora voz fez atroar os ares o infeliz colega! (. ..)
supunha que viríamos para cá como irmãos, viajaríamos
como irmãos, comeríamos e beberíamos como irmãos (. ..), tu
sabes de que maneira estrambótica o jovem infeliz colega
procedeu comigo quando em mandei-lhe pedir uns dados da
Pacatuba/241

E então relata o ocorrido:

Quando eu me ofereci para lhe determinar as posições


geográficas, ele rejeitou o que devia aceitar como vindo do
céu, dizendo que só ele mesmo é que devia fazer isso,
julgava-me o infeliz irmão incapaz, em todos os seus
procedimentos científicos ele envolvia mistério para comigo,

240
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 172-173, op.cit.). Carta n° 143 para Dias. s/1,
10/1857.
241
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 228, op.cit.). Carta n° 193 para Dias. Ceará,
14/04/1857.

156
como quer que ele fosse irmão'f242

A colaboração entre as Seções de Capanema e Gabaglia já estava prevista


nas Instruções de Viagem da Seção Geológica. Porém, tal colaboração não foi
praticada por Gabaglia, que, segundo Capanema, não o julgava competente para
exercer algumas funções. Porém, na opinião de Capanema presente na carta, era
Gabaglia quem apresentaria deficiências na prática científica:

Para não dar gostinho ao irmão feliz, não admiti discussão,


mas ainda irei pó-lo em apuros e mostrar-lhes que era um
menino cheio de ventos que não conhecia os rudimentos do
seu serviço, e para não dar mostras disso fugia de toda
coadjuvação. Nunca esperei tal proceder do infeliz irmão,
noivo em sobra/, proprietário nos altos da lbiapaba, lente,
capitão cavalheiro de Aviz 243.

Como menciona Capanema neste trecho, Gabaglia havia conhecido sua


futura esposa durante as atividades da Comissão no Ceará, vindo a se casar em
meados de julho de 1861.
Assim como Gabaglia, Lagos, o chefe da Seção Zoológica, também
aparece freqüentemente nas cartas escritas por Capanema. Logo no início das
atividades de campo da Comissão, Capanema declarou em correspondência que
Lagos deve estar arrependido de se ter metido em tais lençóis244 , baseado nos
primeiros relatos sobre a chegada da Científica no Ceará, contados por Dias. Na
ocasião desta carta, Capanema estava no Rio de Janeiro, envolvido com a
construção da estrada de ferro, como já foi mencionado anteriormente. Sobre a
partida da Comissão do Rio de Janeiro, Capanema comenta:

Houve maffecos que se divertiram em dizer que a minha


separação de vocês significava morte da Comissão, não sou
eu o assassino, mas o comportamento do nosso 'mui

242
Idem nota 240.
243
Idem nota 240.
244
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 203, op.cit.). Carta n° 171 para Dias. Rio de
Janeiro, 06/02/1859.

157
ingenioso hidalgo y caballero' 245.

O caballero referido no trecho acima é o próprio Ferreira Lagos, como fica


explícito no trecho a seguir retirado de outra correspondência:

O Lagos, o mais clássico sujeito que se pode dar o Numa, e


eu já o temos feito cair na esparrela, como pinto pateta (.. .).
só num passeio a Maranguape, eu fi-lo trepar serra -vemo-lo
cadavérico, obriguei-o a apear-se e apanhar insetos, depois
meti-o a escrever ângulos que eu ia tomando, ele com os pés
delicados dentro de um lodaçal! Aquele zoólogo é uma
pérola, havendo bons companheiros como ele não se
precisaria ir ao teatro para assistir 'vaudeville': o cavalo dele
já está batizado, é o Rocinante, e o pobre bicho quadra
perfeitamente com a descrição de Cervantes, o cavaleiro da
magra figura, com o chapéu do Chile de 300$ tão bem deixa
de parecer-se com 'e/ ingenioso hidalgo' 246•

Podemos perceber que Capanema, no fragmento acima, refere-se a


Ferreira Lagos em um completo tom de deboche, fazendo uma analogia entre
Lagos e Don Quixote. Porém, mais relevante do que perceber suas brincadeiras
contidas na carta, é notar que Capanema nos revela aspectos da prática científica
de campo, onde Lagos ocupou o papel de seu ajudante em algumas atividades,
na ocasião em que as Seções Geológica e Zoológica se deslocavam juntas pela
Capitania do Ceará.
O deboche e a sátira sobre o chefe da Seção Zoológica aparecem na
correspondência entre Capanema e Dias desde pelo menos início de 1859,
quando Capanema comenta que

[O Lagos] continua a ser a pedra d'escândalo da Comissão.


O Oiapoque trouxe anedotas dele famosas, que leva a

245
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 172-173, op.cit.). Carta n° 193 para Dias.
Ceará, 14/04/1857.
248
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 207-208, op.cit.). Carta n° 184 para Dias. Lagoa
Funda, 31/1011860.

158
namorar em vez de trabalhar, e isso com escândalo, outras
acusações abundam e não vá ele nos levar a câmara, há
deputadinho que nos tem vontade247.

Neste trecho, igualmente ao fragmento anterior, Capanema coloca


juntamente aspectos pessoais e científicos, destacando em tom de reprovação o
suposto descaso de Lagos em relação as suas próprias atividades científicas, já
que este troca o trabalho pelo namoro. Além disso, fica explícito no fragmento
acima, que a Comissão Científica como um todo apresenta inimigos políticos, que
seriam favorecidos pela má conduta de um de seus membros.
Já podemos notar que comumente o deboche e a sátira estão presentes na
correspondência de Capanema juntamente com importantes informações sobre a
política e a ciência.
Mais adiante, Capanema continua a brincadeira:

Diga a ele [Lagos], para sua consolação que as fêmeas do


Rio vão para o Norte a procura dele, a Vitória e uma
francesa, cujo nome esqueci cá, estão na Bahia, a Salchicha
e a Etelvina em Pernambuco, quando ganharem quanto
baste para a passagem vão ao Ceará248.

Em outra correspondência, aparecem mais relatos em tom de deboche


sobre a 'parceria' entre Lagos e Capanema:

Até Santa Quitéria levei o feliz colega [Lagos] a trote largo, a


bazófia dele não permitia que ele se declare fraco, tu sabes
que ele tem propriedade de cachorro de não suar, mas
botava palmo de língua de fora e esbugalhava os olhos249.

247
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 206, op.cit.). Carta n° 174 para Dias. Bahia,
11/03/1859.
248
Idem nota 246.
249
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 227, op.cit.). Carta n° 193 para Dias. Ceará,
14/04/1861.

159
Prosseguindo com seu relatos ao amigo, Capanema fez referência,
novamente satírica, sobre as atividades de coletas dos produtos da indústria local,
realizadas por Lagos:

Mas em Santa Quitéria abandonou-me o feliz colega, teve


que voltar a Sobral onde ia em serviço da Seção reunir uns
produtos de mamíferos, como redes, bicos, labirintos, etc.
ficou de vir logo - e vinha. Foi preciso mandarmos um
portador arranca-lo de lá, e chegou estafado em véspera de
vapor (.. .i50•

O olhar de Capanema sobre a ocasião descrita acima, parece dizer que


Lagos, ao 'abandoná-lo', livrou-se do pesado trabalho como seu ajudante. Tal
idéia está mais presente em outros fragmentos de correspondência, onde
Capanema claramente duvida da competência profissional do chefe da Seção
Zoológica, os quais serão tratados mais adiante.
Vale lembrar que a Exposição da Indústria Cearense realizada em 1861 no
Museu Nacional, na qual integraram os objetos coletados referenciados na carta
de Capanema com certo desdém, foi largamente elogiada pelos jornais da época
(Braga, op.cit.). Tal Exposição foi a primeira exibição aos moldes das exposições
européias, e inspirou a realização da Exposição Nacional preparatória para a
Exposição Universal de Londres, em 1862 (Lopes, 1997, op.cit.), apresentando
então grande importância histórica e científica.
Sobre os pássaros que integraram a Exposição, O Cearense declara que

Os pássaros montados provam a habilidade dos


preparadores da Seção Zoológica (.. .). Não se deve admirar
só a perfeição com que se acham montados esses objetos,
muitos dentre eles estão em posições diversas, que revelam
o tino do observador para pode-los estudar e reproduzi?51 .

250
Idem nota 248.
251
O Cearense, de 04/10/1861, apud Braga (op.cit.: 116).

160
Na mesma matéria, ainda falando sobre a Exposição, é esclarecido um
conceito fundamental para o presente trabalho, já mencionado no Capítulo 11, que
envolve a idéia de indústria da época:

Repetiremos ainda uma vez que a maior parte dos produtos


da exposição não representa indústria porque ainda não
criaram mercado. Muitos só se fazem para uso particular;
tem eles porém um grande merecimento que é provar a
existência dos principais elementos par a criação de
indústrias 252.

Existia, portanto, a relação clara entre indústria e demanda dos produtos.


Em alguns outros momentos, Capanema demonstra as suas diferenças
com Lagos de forma mais séria, sem o uso das brincadeiras e ironias tão comuns
em sua correspondência. É o caso do fragmento abaixo:

O feliz irmão fez esperteza para nos roubar, eu diria passar,


porque quando nos reunir-mos no Rio para ajuste de contas,
teremos com que nos vingar, e podemos combinar em
tomarmos contas uns aos outros (. ..). O que é que ele
transportou com 24 cavalos? Ele foi a causa da Comissão
esbandalhar-se, mas nos pagará. O feliz colega disse a
minha vista com um desplante admirável que já tinha coleção
completa de todos os pássaros do Ceará, faltavam-lhe
apenas três espécies253t

Vale retomar que a Coleção Ornitológica, coletada por Ferreira Lagos no


Ceará, teria recebido inúmeros elogios, principalmente relacionados às técnicas
de fixação usadas pela sua equipe, como foi comenado no Capítulo 11. Fica claro
no fragmento acima que, apesar disso, Capanema não acredita no sucesso da
Seção Zoológica da Comissão. De certa forma, baseado no trecho acima,
podemos entender que Capanema coloca em prova a afirmação de Lagos de ter

252
O Cearense, de 04/10/1861, apud Braga (op.cit.: 127-128).
253
Capanerna, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 230-231, op.cit.). Carta n° 193 para Dias.
Fortaleza, 14104/1861.

161
realizado por completo pelo menos um dos objetivos da Seção Zoológica. Fica
claro também que na opinião de Capanema, os gastos feitos pela Seção de Lagos
contribuíram para que a Comissão Científica fosse vista como um consumo
desnecessário do dinheiro público, como quis fazer acreditar o literato Melo Morais
e o Senador Antônio Luiz Dantas (Braga, op.cit.). Este último teve seu nome
mencionado inúmeras vezes nos Zig-zags de Capanema:

minhas obrigações são variadas; em quartel carregar pedras


que os meus amos quebram, cavar terra para ver o que há lá
por dentro; mas não pensem os caros leitores que faço
buraco até o centro, como quer um tal de Dantas que me
dizem ser senador(. ..). Eu espero pode-los servir melhor a
medida que for aumentando a esfera dos meus
conhecimentos, e não se admirem se por acaso eu der
cópias de mim quando voltar do centro (da província e não
da terra, onde por força nos quer meter cabeça abaixo o Sr.
Dantai!54.

Voltando às críticas de Capanema em relação a Lagos, o mineralogista, no


fragmento abaixo, ataca explicitamente a Exposição da Indústria Cearense:

O Lagos vai fazer exposição de todas as coisas curiosas que


trouxe e que comprovem o estado florescente da indústria
cearense, ele talvez leve algumas observações pelas ventas,
porque eu dei para escrever e continuaref55.

Em outras palavras, Capanema, nesta ocasião, pretendia criticar por escrito


a Exposição que iria acontecer. No fragmento seguinte, podemos ver que o
próprio Lagos pedira para que Capanema escrevesse algo público sobre a
Exposição:

Mestre Lagos (. ..) arranjou uma exposição de todas as suas

254
Zig-zag da Seção Geológica da Comissão Científica do Norte. Diário do Rio de Janeiro de
11/09/1860.
255
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 244. op.cit.). Carta n° 198 para Dias. Rio de
Janeiro, 6/08/1861.

162
rendas, redes e bicos que trouxera do Ceará; pediu-me que
dissesse alguma coisa, fi-lo nos diários de 7 e 9 de
setembro256.

Porém, no trecho a seguir, podemos ver que Capanema não foi tão duro em
suas críticas como afirmou anteriormente que seria, e se justifica para Gonçalves
Dias:

Porque algumas pessoas apreciarão aquilo como o mais


relevante serviço (como aconteceu}, era preciso chamar a
atenção, porque era preciso falar na Comissão, porque hoje
conheço que a guerra que nos tem feito não nos deve
ofender. Não acharás neste Rio de Janeiro 20 pessoas que
compreendam o que é exploração científica, se tivéssemos
sempre mandado correspondência para os jornais, ninguém
nos seria contrário (. ..)257•

Para Capanema, a falta de conhecimento do público em geral sobre


Viagens exploratórias e sobre a sua própria Viagem, assim como a ausência de
publicações sistemáticas sobre as atividades no Ceará, contribuíram para que a
Comissão tivesse uma repercussão negativa. Sob este ponto de vista, um
integrante da Científica condenar á incompetência um outro integrante tornaria
pior a opinião pública relativa a Comissão. Porém, dentro do grupo de homens da
ciência, Lagos seria 'desmascarado' brevemente:

É preciso dar-lhe [ao Lagos] impulso, pois enquanto ai na


sua desfilada, entretém o papalvo, quando cair morto, nós
entramos na arena com os nossos trabalhos sérios. Ele está
se esgotando e não tarda a cair58 .

256
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 248, op.cil.). Carta n° 203 para Dias. Rio de
Janeiro, 11/10/1861.
257
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 248-249, op.cit.). Carta n° 203 para Dias. Rio
de Janeiro, 11/10/1861.
258
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 249, op.cit.). Carta no 203 para Dias. Rio de
Janeiro, 11/10/1861.

163
Além de Lagos, Gabaglia também colaborou com o desgaste da Comissão
na opinião de Capanema:

Mas enfim, é Comissão brasileira, que se o governo tivesse


juízo tinha a convocado para o Rio de Janeiro a fim de
combinar o melhor modo de continuar, com isso se teriam
extirpado os dois te"íveis cancros que ela tem: Zoologia e
Astronomia, Seções que se caracterizam pela reserva a mais
rigorosa, fogem de ouvir conselhos de quem lhes poderia
dar, e se houvesse fundo de amizade, embora depois não
fizessem caso259.

A esta altura, duas das Seções, a Botânica e a Zoológica, já haviam


declarado ter chegado ao fim de suas atividades no Ceará, como relatou
Capanema em correspondência para Dias:

O Conselheiro declarou que tinha concluído a Botânica da


província. O feliz colega declarou que quanto a Zoologia, a
sabia de cor e salteado260.

Mas como Capanema ainda tinha o que fazer como todos os diabos261 ,
resolveu então propor

que se oficiasse ao governo para que [fossem] todos


chamados a corte afim de se resolver a nova forma que a
Comissão deveria seguir, visto ela não poder continuar no
mesmo pé, pois que duas Seções declaram ter esgotado as
suas competentes matérias262.

Concluindo então que

O trabalho do Lagos valerá talvez em rigor 25% da despesa

259
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 335, op.cit.). Carta n° 281 para Dias. Fortaleza,
13/04/1861.
260
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 227, op.cit.). Carta n° 193 para Dias. Fortaleza,
14/04/1861.
261
Idem nota 260.
262
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 228, op.cit.). Carta n° 193 para Dias. Fortaleza,
14/04/1861.

164
que ele tem feito, Gabag/ia, segundo o que eu tenho podido
coligir, valerá 10%, e creio que sou generoso -portanto tu e o
conselheiro tem que salvar a honra científica do BrasiP63.

Retornar ao Rio de Janeiro após dois anos da partida da Comissão,


significava naquele momento, colocar tudo em pratos limpos e 'desinfetar' a
Comissão de seus integrantes que, na opinião de Capanema, a manchavam com
trabalhos cientificamente fracos. Com a Comissão 'limpa', Capanema poderia
continuar com as suas atividades de campo na província do Ceará. Ficou claro
nos fragmentos acima, que Capanema considera Ferreira Lagos e Gabaglia
cientificamente inferiores a ele, ou, em outras palavras, Capanema não estava
muito certo quanto a competência destes dois colegas em relação as suas
atividades.
Em relação a Lagos, Capanema chega até a levantar suspeita de que o
Chefe da Seção Zoológica faria autopromoção usando alguns dos frutos da Seção
etnográfica:

Agora arruma-te lá, eu tinha empenho que a coisa se fizesse


e o Lagos tão bem já surrupiou aos Fleiuss um exemplar
para mostrar o quanto a Comissão tem trabalhado, tu verás
que daqui a pouco todo o Rio de Janeiro acredita que Lagos
pintou e desenhou todas aquelas coisas bonitas, e afinal
dizem que ele foi ao Amazonas e é um grande homerrf-64•

Os irmãos Fleiuss, mencionados no fragmento acima, foram os


responsáveis pela produção iconográfica dos caboclos, suas armas e costumes,
como já foi exposto, e Lagos, teria usado uma destas estampas para demonstrar a
produção científica da Comissão, com a suposta intenção de mostrar a produção
própria.

263
Capanema. in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 335, op.cit.). Carta n° 281 para Dias. Fortaleza,
13/04/1861.
264
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 276, op.cit.). Carta n° 229 para Dias. Rio de
Janeiro, 08/12/1862.

165
Como podemos concluir, Capanema foi extremamente crítico com alguns
integrantes da Comissão em relação às suas capacidades científicas. Porém
paralelamente às críticas de Capanema, podemos notar que os trabalhos de tais
naturalistas teriam algum reconhecimento na época, evidenciado no livro de
Tomás Pompeu Brasil, que teria usado dados referentes à astronomia da
província do Ceará, coletados por Gabáglia, e a grande repercussão obtida pela
Exposição de Lagos no Museu Nacional.
Em relação a Gonçalves Dias, Capanema possuía uma opinião diferente.
Além de não colocar em dúvida a competência profissional de Dias, Capanema dá
amostras explícitas de profunda amizade pelo poeta em sua correspondência. O
fragmento abaixo demonstra esta afirmação:

Tu tens muito talento, muitíssima inteligência, um espírito de


combinação e de observação raro, e grande massa de
conhecimentos, tudo isso não se acha nas praias, como na
Europa se conta que acontece com os torrões de ovos cá
entre nós265.

Principalmente após o retomo da Comissão Científica para o Rio de


Janeiro, quando Gonçalves Dias permaneceu na Amazônia, ao que nos parece,
Capanema assumiu alguns aspectos pessoais e financeiros de Dias, como
aparece no fragmento abaixo:

Digo-te agora que precisas muito e muito de tutor, e fizeste


muito mal em me deixares, não sei se sou mais velho que tu,
quando não seja, tenho outro ascendente irrecusável, sou
maior do que tu, já acabei de crescer e tu ainda não266.

Os cuidados de Capanema em relação a Dias aparecem na


correspondência trocada entre eles desde pelo menos desde a estada do poeta na
Europa, na ocasião das compras para a Comissão Científica. Existem indícios nas
cartas que Capanema teria sido o principal responsável pela venda de algumas

265
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional {1971: 231, op.cit.). Carta n° 194 para Dias. Pacatuba,
28/05/1861.
266
Idem nota 264.

166
obras literárias de Dias impressas na Europa na mesma época, como mostra o
trecho abaixo:

Dou-te parte que saíram da Alfândega no dia 5 do corrente


os teus livros (. .. ). O preço que lhe arrumei foi 6$000, e até
ontem tinham vendido no 'Mercantil' 150 exemplares (.. .). Na
marcha que o negócio vai, espero até o paquete seguinte
poder dar-te a notícia dos 500 vendidos, isto é, as tuas
despesas todas pagas e ainda dinheiro de sobrcf67 .

Ou então, neste outro fragmento:

Os teus 'Timbiras268 ' foram recebidos(. ..). Concordamos em


vende-los por 2$000, e mesmo assim não afluem
compradores como acontece ao '[Primeiros] Cantos', muitos
dizem que não compram por ainda não estar acabado269 .

Ainda no âmbito financeiro, Capanema tratava também sobre assuntos


relacionados ao emprego de Gonçalves Dias na Secretaria dos Negócios
Estrangeiros:

Posso te ir arranjando mais dinheiro, que não te deve fazer


muita falta, porque o governo resolveu pagar-te pela
Secretaria dos Estrangeiros, já que a Comissão Científica
tem de entrar em maré de economias270 •

Com esta grande afinidade presente entre os dois, Capanema proporia uma
maior aproximação entre as Seções Geológica e Etnográfica durante as atividades
da Comissão:

Vem comigo, iremos juntos, porque fomos os únicos que


representamos papel de irmãos, como queria o infeliz

267
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 149-150, op.cit.). Carta n° 127 para Dias. Rio
de Janeiro, 14/09/1857.
268
O livro Timbiras é composto de quatro cantos, sendo que o primeiro, redigido em 1847, foi
publicado apenas em 1857.
269
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 174, op.cit.). Carta n° 144 para Dias. Praia
Grande, 12/01/1858.

167
colegé/71 . Não preciso te repetir que disponhas de mim em
tudo quanto estiver ao meu alcance, eu estou cada dia vendo
que diabo de coisa é essa a que se chama amigos, há
pessoas a que hoje só posso fazer boa cara forçado, que me
inspiram repugnância, a ti deve acontecer o mesmif72.

Capanema dá conselhos a Dias até mesmo em assuntos muito pessoais,


como em seu casamento:

Agora deixa dar-te um conselho de amigo e sério, acaba com


O.[ona] O.[límpia] uma vez por todas, toma um passo
decisivo e livra-te de mais tormentos. Ela que se supôs viúva,
que o continue a sel73•

O trecho acima apresenta ligação direto com os boatos sobre a suposta


morte de Gonçalves Dias em meados de 1861. Capanema teria condenado certas
posições tomadas por Olímpia Dias em relação a participação sobre as vendas do
livro de Gonçalves Dias, na ocasião do falso falecimento do poeta.
Para finalizar os comentários de ordem pessoal sobre os integrantes da
Comissão Científica, os fragmentos seguintes dizem respeito a Manoel Freire
Allemão, por quem Capanema, como podemos ver, nutria simpatia e acreditava
em sua competência científica:

O Freirinha vai trabalhando com afinco, estuda como gente,


vai ser uma de nossas ilustrações274•

Dada a admiração de Manoel Freire Allemão por Capanema, após a sua


morte, o mineralogista expressa ao amigo Dias as suas lamentações:

e todos os dias me faz nascer novas saudades do Freirinha,

27
° Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 261, op.cit.). Carta n° 217 para Dias. Praia
Grande, 24/08/1862.
271
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 228, op.cit.). Carta n° 193 para Dias. Fortaleza,
14/04/1862.
272
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 258, op.cit.). Carta n° 214 para Dias. S/1,
07/08/1862.
273
Idem nota 271.
274
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 269, op.cit.). Carta n° 223 para Dias. S/1,
08/10/1862.

168
era amigo e companheiro, sobre essa matéria o único com o
qual se podia conversar, não fazes idéia que terrível
sentimento de abandono é esse quando se tem trabalho sem
viva alma que o compreendé/ 75•

No próximo item, expomos alguns trechos de correspondências que


evidenciam as relações entre Capanema e outros personagens em que se
destacam as considerações de ordem política, e a interferência destas relações no
dia a dia da Comissão Científica.

3.4. As relações políticas de Capanema

Amigo de infância do Imperador, Capanema cresceu em meio aos setores


da elite brasileira. Estudou na Escola de Freiberg, instituição que era referência
em mineralogia na época, como já foi mencionado neste trabalho. Estes são
alguns dos fatores que nos ajudam a entender o papel de articulador político no
âmbito científico exercido por Capanema. E igualmente aos outros aspectos da
vida e obra do naturalista aqui apresentados, esta articulação também está
presente na correspondência trocada com Dias. Foi o caso, por exemplo, do
atraso provocado por Capanema na partida da Comissão Científica, apresentado
no Capítulo 2 desta dissertação.
Aspectos da relação entre o mineralogista e o Imperador aparecem no
trecho abaixo, escrito em meados de 1853, quando Capanema se tornaria
professor particular das filhas do Imperador:

O nosso monarca teima como paulista que eu leve uma hora


inteira, duas vezes por semana, a expor mineralogia e
geologia a suas augustas filhas 276.

275
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 305, op.cit.). Carta n° 256 para Dias. S. J. do
Ipanema 12110/1862.
276
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 294, op.cit.). Carta n° 245 para Dias. Engenho
Novo, 08/07/1863.

169
Ainda dentro dos contatos cultivados por Capanema, o mineralogista narrou
para Dias sobre o seu encontro com a Expedição Austríaca, com a qual travou
relações diplomáticas:

Tu receberás novas nossas pelos elogios que nos devem


fazer os membros da expedição austríaca que por aqui
passou, e que tratamos o melhor possívef!77•

De certa forma, Capanema estaria mantendo contatos que poderiam ser


úteis futuramente para a Comissão e para as suas atividades científicas. Do
mesmo modo, Capanema procurou cativar os freqUentadores do IHGB e sua área
de influência nas elites da Corte:

Agora a respeito de nossa Comissão, já terás lido o meu


relatório ao Instituto a respeito dela, eu fiz com que o povo
que a tomara por sonho tomasse a acreditar nela278.

A amizade entre Capanema e Pedro 11 não bastaria para garantir o apoio do


Governo Imperial a todas as atividades que envolviam Capanema. Ora o Governo
se mostrava favorável:

O caminho de ferro tem o Governo pela proa, já assestei as


minhas baterias neste sentido e tenho pronto um artiguinho
que acabei hoje, é brando já se sabe, o forte fica para
depois279 . Hoje temos que tratar da nossa Comissão, e leva-
la avante, o Governo tem boa vontade, clama unicamente
contra desperdícios, no que tem razão, e vejo que cada dia
mais: esperava achar apetrechos de caça no Ceará e tu me
dizes que não prestam! Isso é abominável. Os comissários
de Paris mostraram a melhor harmonia do mundo, a eles
compete salvar a honra própria que está empenhada nessa

277
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 151, op.cit.). Carta n" 125 para Dias. Rio de
Janeiro, 14/09/1857.
278
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 174, op.cit.). Carta n" 145 para Dias. Río de
Janeiro, 12/01/1858.
279
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 202, op.cit.). Carta n° 171 para Dias. Rio de
Janeiro, 06/02/1859.

170
Comissão e a do BrasiP80.

Neste trecho, além de explicitar o apoio do Governo Imperial naquele


momento, Capanema referencia também os Comissários de Paris, que a esta
altura estariam envolvidos com a Comissão na experiência de aclimatação dos
camelos que chegariam no Ceará alguns meses depois, como já foi relatado.
Ainda no fragmento acima, Capanema referencia o seu trabalho na estrada
de ferro que estaria sendo construída. Sobre este assunto, o naturalista escreve a
Dias:

Isso [a estrada de ferro] creio que me dará melhores cobres


que a nossa excussão tupi. Quanto a glória, o nosso papalvo
me chamará de homem imenso por ter feito um caminho de
ferro, enquanto se eu descobrir no Ceará que a formação
cretácea é mais antiga que a carbonífera o que poria o
Instituto de França de pernas para o ar, aqui me chamariam
de toleirão281 .

Podemos notar que, na concepção de Capanema, a Geologia do Brasil não


seria tão valorizada pelo Governo, e pelo público em geral, quanto na Europa. De
acordo com as palavras de Capanema, não haveria nem se quer o
reconhecimento merecido de um grande feito científico.
Mas em outros momentos, o apoio do poder público à Científica, na visão
do naturalista, não era muito certo:

Sobre a expedição dos argonautas, que tem a repelir o pior


dragão que é o govemif82•

E Capanema também faria as suas críticas às facções do Governo e aos


grupos de dirigentes:

o governo aceita tudo quanto propomos para continuação do


280
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 206, op.cít.). Carta n° 174 para Dias. Bahia,
11/03/1859.
281
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 174, op.cít.). Carta n° 144 para Dias. Rio de
Janeiro, 12/01/1858.
282
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 202, op.cít.). Carta no 170 para Dias. Rio de
Janeiro, 21/01/1859.

171
serviço para publicação. Mas as ordens nos não vieram as
mãos, e enquanto as secretarias pertencerem a família dos
quelônios, isso não admira, portanto não perco a
paciência 283. Já sabes? Vou divertir o Instituto lendo-lhe
alguns capítulos do Manoel Francisco, o primeiro será sobre
caboclos da Serra Grande, estabelecendo paralelo entre eles
e o povo alemão (.. .), depois provarei que mais porco que o
caboclo são os fidalgos da sociedade escolhida do mundo
das luzes, que comem miolo de tripa de narceja e carniça!
Tudo isso irá imprimir na 'Revista Brasileira' que já está com
dores de parto284•

Em outros momentos, Capanema incentivaria Dias a entrar efetivamente


para o quadro político nacional, se candidatando a Deputado:
Trabalha pois como gente, escreve, fala, resmunga,
descompões, etc. é de toda necessidade que saias
deputado, asseguro-te que Manoel Francisco te sustentará
como gente (...). Adeus, faz-te deputado e vamos embora
atravessar esses Goiases e Minas, toma coragem e sê
gente, quanto mais se não faça, colhem-se dados para sovar
o Governo ao vivo, e argumentar com fatos285.

No fragmento abaixo, Capanema esclarece parcialmente seus objetivos ao


apoiar Gonçalves Dias:

Do Maranhão as notícias te são muito favoráveis, trabalha,


porque tu como deputado podes dar o exemplo em como um
cidadão representante pode ser útil a sua província, e além
disso, temos uns projetas de lavoura que é preciso um

283
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 250, op.cit). Carta n° 205 para Dias. Rio de
Janeiro, 03/11/1861.
284
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 266, op.cit). Carta n° 220 para Dias. Rio de
Janeiro, 05/09/1862.
285
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 217-218, op.cit). Carta n° 184 para Dias. Lagoa
Funda, 31/10/1860.

172
cometa como tu na câmara para por em andamento, sabes
que estou pronto para te ajudar até com a pena aquém e
além mar se for preciso286•

O naturalista chegaria a expor a sua intenção em entrar no meio político


cearense:

isso por cá vai bonito, partido liberal está montado e os


nossos homens d'Estado saquaremas vão conspirar na
Europa(. ..). Temos eleições novas e eu pedi ao Pompeu que
me fizesse centro de um círculo287.

E conta sobre a resposta de Pompeu:

ele disse-me redondamente que havia gente demais (...).


Perguntei ao Saldanha que era diretor do clube central, que
fez os deputados no Império, se eu lhes servia, a resposta foi
negativa, já vês que duas notabilidades políticas me não
acham com as habilitações para legislador. Talvez que se eu
me sujeitasse a ser Padre que/é, e fosse de porta em porta a
pedir: camaradinha, me dá um votinho, que alcançasse
alguma coisa 288.

Mas mesmo assim, Capanema insistiria na idéia:

A primeira coisa que faço é propor-me a senatoria, onde irei


fazer companhia a Pompeu e ao impossível Otôni! E então
conta tão bem tu comigo, terás a minha proteção em alta
escala, o menos que te farei é bispo, e quando fores mitrado,
verás como te virão lamber os pés289•

286
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 219, op.cit.). Carta n° 185 para Dias. Ceará,
set. ou ouV1860.
287
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 289, op.cit.). Carta n° 242 para Dias. Rio de
Janeiro, 25/05/1863.
288
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 302, op.cit.). Carta n° 253 para Dias. S. J. do
Ipanema 06/10/1863.
289
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 309, op.cit.). Carta n° 260 para Dias. Rio de
Janeiro, 23/01/1864.

173
Apesar da afirmação acima, Capanema não levou adiante seus planos de
se eleger, e como já foi comentado neste trabalho, o naturalista se dedicaria a
chefia do setor de telegrafia brasileira até o seu falecimento, em 1906.
Dando continuidade as análises, passaremos para um outro ponto: como foi
citado anteriormente, a preocupação com o sustento é assunto constante na
correspondência de Capanema. Após o retorno ao Rio de Janeiro, os naturalistas
assumiriam novamente os seus cargos de origem, porém não deixariam de
receber encargos relacionados à Comissão, já que estariam elaborando os
trabalhos referentes às suas atividades. É o que consta no fragmento abaixo:

Mas apesar da tabela [orçamentária], os nossos vencimentos


ficam os mesmos, e talvez melhores, porque não se falou em
bulir com os nossos ordenados de respeitáveis empregados
públicos, se além de tudo quiserem mangar conosco, não
lhes daremos trabalho enquanto não formos embolsados de
tudo quanto possam ficar devendo290.

O fragmento abaixo mostra que Capanema, na ausência de Dias, cuidaria


de seus interesses financeiros:

O Lagos foi mal ouvido pelo Olinda, que supôs que ele se
contentava com os 4:000$ da secretaria, aquele declara que
quer 6, eu sustentei a pretensão para que te igualassem a
ela, creio que não haverá dúvida a esse respeito291 .

Ferreira Lagos e Gonçalves Dias eram colegas na Secretaria dos Negócios


Estrangeiros na época, e Capanema estaria apoiando o complemento salarial de
Lagos a fim de conseguir o mesmo benefício para seu amigo Dias. E assumindo o
papel de tutor do poeta, o naturalista conta a Dias os procedimentos que havia
tomado para prove-lo de seus vencimentos:

Já combinei porém na Secretaria do Império com o Dr. Neto

290
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 217, op.cil.). Carta n° 184 para Dias. Lagoa
Funda, 31/1011860.
291
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 266, op.cit.). Carta n° 220 para Dias. Rio de
Janeiro, 05/09/1862.

174
Machado a fazer um ofício ao Freire Allemão que tu estás
trabalhando, visto eu ter te mandado as estampas da
caboclaria, que estão se acabando, e no entretánto te não
pagam, verás como te dão dinheiro 292.

No fragmento abaixo, Capanema narra a Dias que Lagos teria conseguido


os vencimentos que requisitou:

Mestre Lagos declarou tão categoricamente quanto lhe era


possível que com menos de 2:000$ adicionais aos 4:000$ do
seu lugar na Secretaria ele não podia comprometer-se a
vadiar a expensas do governo, creio que é piamente
acreditado, no que por isso será servido, o que como bom
colega cabe-te a ti igualmente o cálculo, que em matemática
existe a seguinte equação: 2+4=6. Ergo, já ficas affanjado293•

Até pelo menos meados de 1863, Capanema ainda estaria cuidado dos
assuntos financeiros de Dias, como atesta o trecho abaixo:

Já há ordem de se te pagar os vencimentos da Comissão, se


foi expedida não sei, porque estive doente, tratarei disso logo
que sai,.m.

Capanema comenta também sobre a sua própria situação financeira com


relação à Comissão, e satiricamente comenta também sobre o espaço ocupado
pela Científica no Museu Nacional:

Nossa Comissão vai falá, eu em vencimentos fui equiparado


ao Lagos, ora muito bem. Aquele nosso cubículo do museu
está bem bonito, hoje todo pintado, todo lavado, e vai levar
umas trapeiras com vidro de espelhos, é negócio mesmo de

292
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 336, op.cit.). Carta n° 282 para Dias. Rio de
Janeiro, 25/11/1862.
293
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 263, op.cit.). Carta n° 218 para Dias. Rio de
Janeiro, 24/09/1862.
294
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 288, op.cit.). Carta n° 242 para Dias. Rio de
Janeiro, 25/0511863.

175
luxo 295•

O trecho abaixo reforça a idéia que a questão financeira seria um ponto de


preocupação para Capanema, que estaria interessado em ir para a Europa, porém
temia perder o espaço de atuação durante a sua ausência:

Eu tinha agora uma excelente ocasião de ir a Europa


comprar armamento, não me apresento porém porque tenho
medo do meu governo, posso perder interesses aqui, o que
me não convém. Eu só iria com contrato. Quanto a Comissão
Científica, ela lucraria com minha ida a Paris ou a Londres'l96.

O armamento citado por Capanema estaria relacionado à Guerra do


Paraguai. Tal conflito, como Capanema afirma abaixo, influenciou de modo direto
nas atividades da Comissão:

Eu não sei o que farão da Científica, porque o Governo não


terá dinheiro, ele vai gastar somas fabulosas'l 97 .

Apesar da crise, o naturalista ainda consideraria interessante o trabalho


para o Governo. E o que aparece no fragmento seguinte, onde Capanema, de
modo extremamente crítico, coloca que as decisões do Império seriam
manipuláveis, e aconselha Dias a continuar trabalhando para o Governo:

Esse nosso governo é um manequim d'engonço que vai pelo


jeito que se lhe dá, se algum sujeito leva coice, é porque se
colocou ao pé do rabo e não junto ao focinho onde há
cabresto (. ..), segue meu conselho, aproveita o governo
quanto puderes, isso ao menos te ajuda a trabalhar e o país
lucra, de modo que tua consciência fica /ivre 298.

295
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 273, op.cít.). Carta n° 226 para Dias. Rio de
Janeiro, 02111/1862.
296
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 279, op.cít). Carta n° 230 para Dias. Rio de
Janeiro, 24/01/1863.
297
Capanerna, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 282, op.cít). Carta n° 234 para Dias. Rio de
Janeiro, 07/0211863.
298
Capanema, in Anais da Biblioteca Nacional (1971: 276, op.cít). Carta n° 229 para Dias. Rio de
Janeiro, 08/1211862.

176
Talvez o trabalho para o Governo não fosse uma das opções do naturalista,
mas sim, a única delas, pelo menos no que diz respeito aos planos de
continuidade da Comissão Científica.

Da Expedição, ficaram muitos dados que não haviam sido trabalhados,


havia muito ainda o que se publicar, e dificuldades de receber os salários. Parte
dos motivos da falta de publicações foi justificada por Capanema em
correspondência (ver nota 290). Porém, o fato de não existir uma vasta publicação
dos integrantes da Comissão, de forma alguma tira o seu mérito e a sua
importância na História Natural do Brasil. Se não originaram colações de livros ou
tratados científicos, os naturalistas realizaram a Exposição da Indústria Cearense,
nos deixaram seus relatos nas cartas, e como foi brevemente visto neste Capítulo,
estes homens fizeram ciência, e merecem ser estudados, conhecidos e
reconhecidos.

177
CONSIDERAÇÕES FINAIS

A historiografia sistematicamente ignorou as contribuições da Comissão


Científica para a História da História Natural brasileira no século XIX. Ao que nos
parece, o fato de seus resultados não alcançarem as expectativas criadas na
época, e as histórias controversas que envolveram os naturalistas integrantes da
Científica acabaram camuflando outros aspectos importantes relacionados a
Comissão, como por exemplo, o seu pioneirismo nos diversos aspectos
comentados nessa Dissertação e o papel que ela desempenhou na consolidação
da carreira dos naturalistas que a integraram.
Em um momento em que uma comunidade científica estava se formando, a
Comissão foi um elemento fundamental neste processo, pois a exemplo dos
caminhos seguidos pela ciência nos países europeus, os naturalistas brasileiros
também necessitavam de uma Viagem de exploração científica, que comportasse
todos os elementos das outras Viagens, categorizados no Capítulo 1: nossa
Comissão passou pelo processo da escolha do seu destino, com todas as suas
implicações e discussões, levando-se em conta os objetivos da Viagem. Nesse
caso, o Ceará simbolizaria a terra estrangeira e desconhecida das Viagens
européias.
Do mesmo modo ocorrido com as outras Viagens Científicas, a motivação
para a realização da Comissão também envolveu interesses políticos e
económicos, além dos interesses pessoais de reconhecimento profissional ou
simplesmente fazer ciência, como muito bem nos mostraram as cartas de
Capanema, revelando-se a correspondências um dos eficazes instrumentos de
consolidação dessa comunidade científica. Também presentes nas
correspondências estão os interesses do Governo Imperial na realização de uma
Viagem Científica naquele momento. Sendo assim, igualmente às Viagens
européias, a Comissão também foi guiada por políticas de Estado, evidenciadas
tanto nas cartas de Capanema como nas Instruções de Viagem. Abastecer o

178
Museu Nacional também foi mais um ponto em comum entre os objetivos das
várias Viagens e da Científica.
A compra de livros, instrumentos e materiais para as atividades científicas é
processo obrigatório no preparo de uma Viagem. No caso da Comissão, os
manuais adquiridos e os fabricantes de instrumentos contratados contavam com
grande prestígio do ponto de vista dos naturalistas integrantes da Científica.
Possivelmente eram os mesmos usados nas Viagens européias, constituindo mais
um aspecto em comum.
Os diversos naturalistas também apresentavam condições semelhantes em
relação às Viagens: os integrantes da Comissão partiram para a expedição com
objetivos pré-definidos, sabendo o que iriam procurar, como iriam proceder e
conscientes dos imprevistos possíveis impostos em qualquer atividade de campo.
Tal aspecto, como foi discutido no Capítulo I, também estaria presente na prática
dos naturalistas viajantes europeus. Intimamente ligadas a isso estão as
Instruções de Viagens, presentes em todas a Viagens Científicas da época,
inclusive na realizada pela Comissão. As Instruções usadas na Científica,
apresentaram características comuns com as outras Instruções de Viagens
usadas nas Viagens européias: definiam qual o tipo de conhecimento científico
que deveria ser produzido, qual objeto merecia o olhar do naturalista e que modo
deveriam ser abordados, de forma a adquirir o 'status' de ciência nas atividades
que iriam ser desenvolvidas, e conseguir resultados considerados legítimos no
mundo científico.
Finalmente a partida: a mesma ansiedade presente nos naturalistas
europeus estaria presente nos integrantes da Comissão. Acompanhar o trabalho
de carregar para a embarcação todo o material para iniciar a Viagem foi tarefa de
todo naturalista viajante. Dadas as dificuldades de transporte e correio da época,
nada poderia ser esquecido.
Comuns a todas a atividades científicas de campo, os imprevistos e
dificuldades, como excesso de chuva ou falta dela, e até mesmo doenças,
também estiveram presentes nas atividades da Comissão. Largamente
referenciadas nas cartas de Capanema e nos Relatórios das diversas Seções, tais

179
adversidades constituem mais um aspecto comum entre as Viagens européias e a
nossa Comissão. Até mesmo os naufrágios, como o do late Palpite, também
seriam elementos comuns constituintes das Viagens Científicas, como foi o caso,
por exemplo, dos naufrágios da famosa Viagem de Lapérouse.
Resgatamos ainda a consideração de Bourguet (op.cit.) sobre as Viagens
Científicas em geral: o tempo decorrido entre a partida e o regresso dos
naturalistas a sua pátria, poderia causar dificuldades de interpretação dos
resultados dos seus trabalhos. No caso da Comissão, algo semelhante aconteceu:
por inúmeros motivos, expostos ao longo da Dissertação e presentes na
correspondência de Capanema (ver nota 257), os trabalhos dos naturalistas,
considerados relevantes no momento da partida para o Ceará, já não despertaram
tanto a atenção na ocasião do retomo da Científica para o Rio de Janeiro.
As cartas de Capanema também nos mostraram o trabalho realizado por
nossos naturalistas após o retomo da Viagem. A Seção Botânica, por exemplo,
realizou as atividades de identificação e classificação das espécies coletadas e
fixadas durante a Viagem, produzindo inclusive manuais sobre plantas medicinais.
A Seção Zoológica realizou uma importante exposição com os produtos recolhidos
no Ceará. Estas duas Seções foram responsáveis por um crescimento significativo
do acervo de produtos nativos do Museu Nacional.
Possuidora de todos os elementos comuns às Viagens Científicas, a
Comissão do Ceará merece ser abordada e considerada como tal, de modo a
ocupar seu lugar de destaque na historiografia das ciências no país, com seus
estudos desvinculados das controvérsias relacionadas a ela.
Essa pesquisa nos intriduziu no mundo das correspondências dos
naturalistas brasileiros de meados do século XIX. Existe ainda muito a ser
decifrado no material reunido nesta Dissertação, e o mais importante, muitos
documentos inéditos, nunca trabalhado anteriormente, que ainda podem nos
revelar outras histórias 'pitorescas', como as contidas neste trabalho.

180
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188
ANEXO 1

Relação do material levantado nos Arquivos do Rio de Janeiro.

Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro do Rio de Janeiro


Documentos de Capanema:
1. Lata 274-pasta 9: Carta de Capanema ao Conselheiro Saraiva pedindo-lhe
perdão da grosseria que com o mesmo praticara (17/11/1881).
2. DL 699.17: Carta de Barão de Capanema colocando à disposição do IHGB
alguns exemplares dos estudos sobre a questão de limites do brasil com a argentina
(28/04/1893).
3. Lata 174-doc. 2: Carta do Barão de Capanema a F. A. de Menezes Doria
comunicando o início da construção de linhas telegráficas de Parnaíba a Terezina e
recomendando um amigo que, proposto para um lugar de médico, não fora atendido pelo
antecessor do Cons. Doria por ser liberal )15/06/1889).
4. Lata 742-pasta 19: Carta do Barão de Capanema ao Dr. César Augusto
Marques, remetendo o parecer sobre o Cel. Cunha Júnior (18/11/1891).
5. Lata 419-pasta 30: Cartas (2) do B. de Capanema a Benjamim Franklin Ramiz
Gaivão sobre oferta da Bookhaus, de Leipzig, de psospectos e livros científicos; e
enviando o busto do falecido B. de Santo Ângelo para figurar na Exposição da Biblioteca
Nacional (1879 e 1881).
6. Lata 435-pasta56: Cartas do Dr. Gustavo Dodz ao Cons. Luiz Antônio Vieira da
Silva queixando-se da injustiça e do não reconhecimento, pelo B. de Capanema, dos
serviços por ele prestados, por ocasião da inauguração das linhas telegráficas em
Terezina, atribuindo a intrigas a atitude de seu superior e pedindo proteção para não vir a
ser destituído de seu cargo (1885).
7. Lata 686-pasta 23: Circular (cópia xerox) do 1° Secret. Do IHGB Henri Raffend
ao Barão de Capanema solicitando que envie o mais rápido possível notas biobráficas
que lhe sejam concernentes, a fim de completar-se a matrícula dos membros da
associação.
8. Lata 482-doc. 8: Discurssos proferidos por ocasião da seca no Ceará sobre o
aproveitamento do auxílio dado pelo governo. Artigo de Capanema com medidas
preventivas para a seca. Artigos da lei 586 e de 09/09/1850 referentes a calamidades
[1845-78 (recortes de jornal)].
9. Lata 319-pasta 37: Ofício da Câmara Municipal da Vila de Cananéia remetendo
do Dir. Geral dos Telégrafos o marco ou padrão de pedra encontrado na ponta do
ltacuruçal (1880).
10. Lata 328-doc. 30: Ofício de Henrique Ambauer Schuttel ao Dr. Capanema
descrevendo o itinerário de Cruz AHa a Campo Novo (RS) (30/09/1867-Spp).
11. Lata 5-doc. 12: Ofício do Pres. Da Câm. Municipal de Cananéia, Laurindo José
de Almeida, ao Dr. Capanema, sobre a entrega do marco de pedra ao IHGB (04/11/1880).
12. Lata 563-pasta 3: Resumo das observações orais feitas por Capanema,
membro da Comissão Científica, sobre os índios do Ceará e seu descendentes (1863).
13. Lata 3-doc. 9: Breve exposição dos trabalhos da Secção Geológica da
Comossão Científica, datada deSta. Cruz no Ceará (24/11/1860).
14. DL 467.3: Carta de A. G. Dias a Capanema sobre o resultado das explorações
geológicas que vem fazendo na província (?) (Incompleta), s/1, s/d.

18g
15. DL 712.46: Carta de Capanema a Henrique de Beaurepaire-Rohan
manifestando-se sobre o trabalho recebido e sugerindo exigir maiores informações no
tocante à constituição geológica, sambaquis, estudos da costa e rios; sobre a lavoura,
criação, sistema de viação; estudo científico das riquezas naturais, tudo em relação ao
Brasil (s/1, s/d).
16. DL 141.98: Ofício de Capanema ao 1° Secret. Do IHGB, José Ribeiro de Souza
Fontes, devolvendo 6 pareceres da Comissão de Geografia (não acompanha pareceres)
(04/08/1876).
17. Lata 311-doc. 15: Carta do B. de Capanema ao Secret. Do IHGB contestando
afirmativa sobre inscrição fenícia na Paraíba do Sul (2 fls) (21/11/1872).
18. Lata 351-doc. 37: Carta do B. de Capanema ao Gen. Paulo Barbosa da Silva
descrevendo a vida em Paris e a parte do Brasil na Exposição Universal de Paris (1855).
19. Lata 216-doc. 50: Cópias de cartas com atribuição anônima a Capanema
dirigidas aparentemente a Dias, em linguagem bastante íntima, comentando a
organização da Comissão Científica a ser mandada ao Ceará.
20. Lata 355-docs. 19, 20, 21, 22 e 23: Cartas de Manuel de Araújo Porto Alegre a
seu cunhado Capanema (1859-1874).
21. Lata 686-pasta 22: Cartas (2) do 1o Secret. Do IHGB, Manuel de A. Porto
Alegre, a Capanema, solicitando um resumo biográfico para a nova matrícula dos sócios e
pedindo entregue ao portador os livros do IHGB que estão em seu poder (02 e
03/03/1857).
22. Lata 92-doc. 27: Informações e documentos acerca da demarcação de limites
do Brasil com a Guiana lngleza pelos Drs. Capanema e L. A. Cunha Mattos (RJ,
21/08/1857).
23. Lata 216-doc. 41: Instruções (cópia) do Min. Dos Negócios do Império (ass.
Marques de Olinda) a Capanema sobre as providências a tomar para o aproveitamento do
oferecido pela Imperial Soe. Zoológica da França, tentar a introdução de dromedários no
Brasil (RJ, jul-ago, 1857).
24. Lata 333-doc. 24: Ofício de Capanema ao Secret. Do IHGB sobra a admissão
de sócios (05/11/1878).
25. Lata 427-doc. 14: Ofício (reservado) de José Francisco Diana, Min. Do
Negócios Estrangeiros, enviando a Afonso Celso de Assis Figueiredo, pres. Do Cons. de
Ministros, o trabalho de Capanema sobre os limites do Brasil com a Argentina.
"Complemento ao contra-memorandum brasileiro." Acompanha o trabalho (1889).
26. Lata 436-doc. 10: Ofícios e cartas do Barão de Nogueira da Gama ao Dr.
Perdigão Malheiro consultando-o sobre assuntos da Mordomia da Casa Imperial:
escritura de quitação de dívidas solicitada por Capanema, etc (1872-1878).
27. Lata 209-doc. 29: Relatório do investigador que, por parte de alguns membros
da comissão científica enviada ao Ceará, apurou os escândalos e desmandos ali
provocados por Capanema e outros (entre os quais Dias); anexo 1 exemplar no 56 do
periódico "Pedro 11", de Fortaleza, contemporâneo dos acontecimentos, com 1 artigo sobre
o mesmo assunto (RJ, 14/09/1865).
Iconografia (Capanema):
1. 194.6.2 no 5-retrato (iniciador da fabricação de papel no Brasil).
2.1F96
3. IL 1.23 - retrato
4. Lt 353-pasta 68: IC
5. lP 360-foto em grupo
6. 95, 7, 17-IC retrato
7. 135, 4, 16-IC retrato
8. IL 6.138-último retrato, 5 dias antes da morte (21/07/1908).

190
Documentos de Freire Allemão:
1. L113-doc. 1: Biografia e apreciação dos trabalhos do botânico brasileiro, por
José de Saldanha da Gama (s/1, s/d-75fls). Publicado na revista trimestral (?) de 1875,
tomo38.
2. L 311-doc. 61: Carta de Allemão despedindo-se do IHGB pois está acometido
de grava doença sem esperança de restabelecimento (s/1, janeiro de 1873).
3. L310-doc. 40: Carta do Dr. Emílio Joaquim da Silva Maia, Cândido B. Caetano e
Allemão ao presidente do IHGB, pedindo abrigar a Sociedade Vellosiana no seu edifício
(Rio, 1 de julho de 1853).
4. Lata 574-pasta 17: Carta de Allemão ao Dr. Joaquim Manuel de Macedo,
explicando as razões pelas quais ainda não apresentou o seu trabalho sobre as principais
plantas aclimatadas no Brasil.
5. Lata 16-doc. 2: Descrição de várias plantas por Allemão (RJ, 1850 a 1854, 14
fls).
6. Lata 48-doc. 20: Exercícios botânicos: considerações sobre a structura e uzos
de alguns pelos e orgãos analogos (Rio, 1851-1857, 10 fls). Ilegível.
7. Lata 119-doc. 8: O jequitibá da Serra de San'anna. Brasiliana dedicada ao Dr.
Allemão por M. de Araújo Porto Alegre (S. Pedro, 14/12/1845).
8. Lata 353-pasta 50: 1° centenário de morte do cientista brasileiro Francisco
Freire Allemão. Estado do Paraná, Secret. De Educação e Cultura. Curitiba, 1974.
9. Lata 574-pasta 12: Proposta de Allemão: pedir aos Presidentes das províncias
informações sobre tribos indígenas e florestas; que haja uma arca fechada com 2 chaves
para guarda de notícias históricas contemporâneas.
Documentos da Comissão Científica:
1. Lata 216-doc. 50: Cartas (cópias) com atribuição anónima a Capanema,
dirigidas aparentemente a Dias, em linguagem bastante íntima, comentando a
organização da Comissão Científica a ser mandada ao Ceará pelo govemo Imperial (P.
Grande, Rio, Bahia, Ceará, 1858/61-Col. Marques de Olinda).
Documentos sobre o Ceará:
1. Lata 317-doc. 7: Memória sobre a Capitania do Ceará pelo sargento-mor João
da Silva Feijó, naturalista (livro manuscrito).
2. Lata 480-doc. 14: Jomais do Ceará. cópia fotográfica das primeiras páginas dos
jomais: O Cearense e outros.
3. Lata 512-doc. 14: Relação dos presidentes do Ceará, de 1824 a 1916, pelo
Barão de Studart.
4. Lata 317-doc. 13: Lista dos presidentes do Ceará (do 1° ao 42°) com notícias
biográficas pelo Dr. Paulino Nogueira (recortes de jomal). Col. Alencar Araripe.
Documentos sobre Feijó:
1. Lata 73Q-pasta 9: Artigos de Gustavo Barroso: O Sobradinho do naturalista
Feijó. 1953-1957, s/d-5 does. Oferta do IBGE.
2. Lata 51Q-pasta 35: Carta de Tomás Pompeu de Souza Brasil oferecendo ao
IHGB a Memória escrita em 1814 pelo naturalista Feijó. Copiei a mão.
Documentos de Gonçalves Dias:
1. Lata 177-doc. 82: Carta de Dias agradecendo ao Instituto a indicação de seu
nome para figurar como membro da Comissão Científica (Desdre, 04/01/1857).
2. Lata 177-doc. 69: Carta de Dias enviando um manuscrito, o "Roteiro da Viagem
do Pará até a última povoação do Rio Negro" (Pará, 10/09/1851).
3. Lata 142-doc. 119: Carta do Dr. Cláudio Luiz da Costa ao Cônego Joaquim
Caetano Femandes Pinheiro, desculpando-se por não comparecer à Sessão do IHGB,
por ter lido nos jomais o falecimento do seu genro (25/07/1862).

191
4. Lata 222-doc. 45: Carta Imperial nomeando Dias para a seção etnográfica da
Comissão (Palácio do Rio de Janeiro, 07/03/1857).
5. Lata 467-pasta 17: Cartas a Dias. 21 pastas contendo 112cartas, 1852-64. Col
A. H. Leal.
6. Lata 48-doc. 11: Exposição Universal em Paris. Relatório da Com missão e do
commissário brasileiro (Paris, 21/01/1856).
7. Lata 467-pasta 7: Relatório do Dr. Dias, membro da Comissão de Exposição
nomeada pelo presidente da província (Ceará?).
8. 133, 7, 5-6: gav. 7: Guanabara. Revista mensal artística scientífica e literária.
Rio de Janeiro, Typ da Emp-Dous de Dezembro-de Paula Brito, 1851-1855, 2 vols. (20 x
12), tomos I e 11.

Arquivo Nacional do Rio de Janeiro


Brasil. Ministério do Império
Ministro João de Almeida Pereira Filho.
Relatório do anno de 1859 apresentado a Assembléia Geral Legislativa na 4•
sessão da 10• legislatura (publicado em 1860).

Brasil. Ministério do Império


Ministro José Antônio Saraiva.
Relatório do anno de 1860 apresentado a Assembléia Geral Legislativa na 1•
sessão da 11• legislatura (publicado em 1861).

Brasil. Ministério do Império


Ministro José Ildefonso de Souza Ramos.
Relatório do anno de 1861 apresentado a Assembléia Geral Legislativa na 2•
sessão da 11 • legislatura (publicado em 1862).

Brasil. Ministério do Império


Ministro Pedro de Araújo Lima.
Relatório do anno de 1863 apresentado a Assembléia Geral Legislativa na 1•
sessão da 12• legislatura (publicado em 1864).

Brasil. Ministério do Império


Ministro José Bonifácio.
Relatório do anno de 1864 apresentado a Assembléia Geral Legislativa na 2•
sessão da 12• legislatura (publicado em 1865).

Brasil. Ministério do Império


Ministro José Liberato Barroso.
Relatório do anno de 1864 apresentado a Assembléia Geral Legislativa na 3•
sessão da 12• legislatura (publicado em 1865).

Brasil. Ministério do Império


Ministro Pedro de Araújo Lima.
Relatório do anno de 1865 apresentado a Assembléia Geral Legislativa na 4•
sessão da 12• legislatura (publicado em 1866).

Brasil. Ministério do Império


Ministro José Joaquim Fernandes Torres.

192
Relatório do anno de 1866 apresentado a Assembléia Geral Legislativa na 1•
sessão da 13" legislatura (publicado em 1867).

Relatório de 1° de julho de 1858 do Presidente Silveira de Sousa da província do


Ceará

Relatório de 1° de julho de 1859 do Presidente Silveira de Sousa da província do


Ceará.

Relatório de 21 de novembro de 1859 do Presidente Nunes Gonçalves da


província do Ceará.

Relatório de 1° de julho de 1861 do Presidente Duarte de Azevedo da província do


Ceará

Relatório de 12 de fevereiro de 1862 do Duarte de Azevedo da província do Ceará.

Relatório de 1° de outubro de 1862 do Presidente Cunha Figueiredo Júnior da


província do Ceará.

Relatório de 9 de outubro de 1863 do Presidente Cunha Figueiredo Júnior da


província do Ceará.

Relatório de 1° de outubro de 1864 do Presidente Rodrigues Pereira da província


do Ceará

Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro


77, 3, 9 n° 2 (livros raros): Breve notícia sobre a colleção das madeiras do Brasil,
apresentada na exposição internacional de 1867. RJ, typ nac, 1867-32p Nome de
algumas madeiras, descrição e localização.

RIHGB, vol. 45, 11 (1950, pp. 351-361): Questões propostas sobre alguns
vocábulos da língua geral braziliana.

Coleção Freire Allemão (manuscritos da biblioteca):


Documento comunicando a concessão do título de sócio da Sociedade Filomática
Fluminense (12/01/1839)
Diploma de membro honorário passado pela Academia Filomática (8/09/1847).
Diploma de sócio efetivo da Sociedade Velosiana do Rio de Janeiro (11/10/1850).
Artigo publicado em "A Nação" de 27/08/1853: "Dr. Francisco Freire Allemão".
Severa censura de Allemão ao autor do artigo (2/09/1853).
"Notícia sobre a minha vida": autobiografia (02/1851)

Correspondência ativa:
Américo de Urzedo.
Emílio Joaquim da Silva Maia (13/01/1851).
Capanema (18/11/1851 ).
Paula Brito.
Dr. Silveira (RJ, 4/05/1852).
Custódio de Abreu (Senna, 30/11/1852).
Destinatário ignorado (6/11/1853).

193
Emílio Joaquim da Silva Maia (14/12/1853).
Francisco Antônio, irmãos Marques (RJ. 14/06/1854)
Capanema (Porangaba, 15/03/1855).
Emílio Joaquim da Silva Maia (5/06/1857).
Diretor da Escola Central (11/1858).
Relatório ao Ministro dos Negócios do Império sobre os primeiros trabalhos da
Seção Botânica da Comissão (Fortaleza, 31/07/1859).
XXXXXX. Aracatí, 11/09/1859 +rascunho e 8/08.
Destinatário não mencionado (lcó, 20/10/1859).
Relatório ao Ministro João de Almeida Ferreira sobre a Seção Botânica
(20/02/1860)
Destinatário não mencionado (Fortaleza, 3/05/1860).
Gonçalves Dias tratando de assuntos da Comissão (Fortaleza, 5/1 0/1860).
Gabáglia
Ofício para João de Almeida falando da dificuldade de por em prática a nova tabela
da Comissão (Sobrai, 10/01/1861).
João Pereira (Ceará, 13/04/1861 ).
Ministro e Secretário dos Negócios do Império (Ceará, 13/0411861 ).
Ministro Imperial (Fortaleza, 23/05/1861).
Tomás Pompeu de Sousa Brasil (31/1011861).
Frederico Burlamaqui (12/11/1861).
José lldefanso de Sousa Ramos (RJ. 15111/61).
Ministro dos Negócios do Império (1861).
Domingos Machado Homem de Gusmão.
Capanema (RJ. 26/07/1862).
Marques de Olinda (26/07/1862).
Ministro do Império (RJ. 26/07/1862).
Marques de Olinda (16/10/1862).
Gabáglia e Francisco Xairer Lopes de Araújo (1862).
Capanema (27/03/1865).
Michele Temere (1865).
John Miers (incompleta).
Manoel de Araújo (Porto Alegre, 1869).

Correspondência passiva:
Manoel de Araújo (Desdra, 6/06/1856).
Dürer, H. (Barra Mansa, 17/10/1857).
Burlamaqui e Marques de Abrantes (RJ. 21/11/1858).
Ofício de Sérgio Teixeira ao Presidente da Comissão estipulando a quantia
destinada a comedoria dos chefes de seção e adjuntos (19/05/1859).
Ofício de Capanema ao Presidente da Comissão propondo uma colaboração mais
estreita entre os membros da Comissão (Fortaleza, 27/07/1859).
João Franklin de Lima (Ceará, 10/09/1859).
Incompleta e sem assinatura (RJ. 12/09/1859).
Antônio Joaquim de Oliveira (Ceará, 26/09/1859).
Roberto Correia de Almeida e Silva (lcó, 4/1 0/1859).
Antônio Joaquim de Oliveira (Ceará, 25/09/1859).
Antônio Joaquim de Oliveira (Ceará, 11/01/1860).
Ofício de Gabáglia ao Presidente da Comissão com o relatório que enviara ao
ministério sobre os trabalhos da Seção de Astronomia e Geografia. (S. Benedito, Serra
Grande. 15/02/1860).

194
Antônio Joaquim de Oliveira (Ceará, 5/04/1860).
Antônio Freire Allemão (20/04/1860).
Francisco Carlos L. Cunha (Russas, 26/04/1860).
Joaquim Antônio Gerreiro Lima (RJ. 21/07/1860).
Gabaglia (Sobrai, 20/0711860).
Antônio Joaquim de Oliveira (Ceará, 28/07/1860).
Henrique Beaurpaire Rohan (RJ. 21/09/1860).
Ofício de João de Almeida Pereira Filho ao Presidente da Comissão com cópia da
tabela de vencimento do pessoa da Comissão (RJ. 10/10/1860).
Gabaglia (Lago Grande, 10/10/1860).
Antônio Joaquim de Oliveira (Ceará, 16/10/1860).
Capanema (Fortaleza, 17/10/1860).
Coutinho (12/12/1860).
Antônio Joaquim de Oliveira (Ceará, 12/12/1860).
Antônio Joaquim de Oliveira (Ceará, 19/01/1861).
Antônio Joaquim de Oliveira (Ceará, 12/02/1861).
Capanema (Sobrai, 14/02/1861).
João de Almeida Pereira Filho (RJ. 19/02/1861).
Antônio Joaquim de Oliveira (Ceará, 24/02/1861 ).
Capanema (Manguarape, 22/03/1861).
Gabaglia (21/04/1861 ).
Gabaglia (Fortaleza, 1/05/1861).
Antônio Joaquim de Oliveira (Ceará, 31/05/1861).
Antônio Joaquim de Oliveira (Ceará,9/05/1861).
Antônio Joaquim de Oliveira (Ceará, 17/05/1861).
Capanema (Pacatuba, 31/05/1861).
Gabaglia (24/06/1861 ).
Capanema (Ceará, 16/07/1861).
Ofício de Gabaglia ao Presidente da Comissão tratando da frequencia do pessoal
lotado na Seção de Astronomia e Geografia (RJ. 26/09/1861 ).
Gabaglia (Vapor Paraná, 30/09/1861).
Tomás Pompeu de Sousa Brasil (Fortaleza, 20/09/1861).
João Franklin de Lima (Engenho Monguba, 17/10/1861).
Capanema (15/11/1861).
Capanema indagando sobre a possibilidade de se prosseguir com as escavações
que eram feitas no Ceará (RJ. 28/06/1862).
Ofício do Marques de Olinda ao Presidente da Comissão autorizando a
continuação das escavações de Capanema (RJ. 13/0811862).
Manuel Ferreira Lagos (14/1111863).
Lagos (RJ. 10/09/1864).
Lagos (RJ. 27/10/1864).
Burlamaqui dando conta de providências tomadas no Museu Nacional (31/12/1866)
Capanema (28/09/1867).
Ladislau Neto (Museu Nacional, 30/06/1868).
Manuel Freire Alemão.
Capanema (29/06).
Gabaglia.
Capanema.
Capanema.
Ministro dos Negócios do Império (RJ. 11/10/1864).
Ferreira Lagos.

195
Inácio José Mota.
Tomas Pompeu de Sousa Brasil (12/05).
Inácio José Mota (RJ. 23/05/1851).
Lagos (RJ. 1/01/1859).
Determinação de Sérgio Feisceira de Macedo às autoridades para prestar todas as
facilidades aos membros da Comissão (Palácio do RJ. 25/01/1859).
Ofício a Antônio de Oliveira (RJ. 24/11/1863).

Escritos e notas:
Notas sobre o precário estado do vapor em que a Comissão deveria regressar ao
RJ (Fortaleza, 29/06/1861 ).
Observações a respeito do caráter de alguns membros da Comissão (Ceará).
Correio Mercantil (notícias sobre a Comissão). Crato, 09/02/1860).
Relatório da Seção Botânica da Comissão (RJ. 04/12/1861).
Notícias sobre os naturalistas Joaquim Veloso de Miranda e José Mariano da
Conceição Veloso, 1849.
Notas sobre o naturalista Manoel A. Gamara, 1848.
Notas biográficas sobre a botânico Frei Leandro do Sacramento, 1848-53.
Notas sobre o naturalista Antônio Correia de Lacerda colhidas em conversa com
José Joaquim Rodrigues Lopes (Engenho Velho, 1/07/1850)
Notas sobre o botânico Frei José Mariano da C Veloso (RJ. 1851-53).
Notas sobre o naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira (RJ. 12/05/1853).
Notas sobre Monevidéu e Buenos Aires em conversa com o Sr. Candido Ferreira
Sousa (Petrópolis, 20/03/1856).
Notas sobre a obra de João Barbosa Rodrigues sobre orquídeas (07/1860).
Discurso pronunciado na Sociedade Velosiana (RJ.).
Notas sobre um naturalista brasileiro.
Extrato de uma carta de Martius a Ladislau Neto.
Notas sobre o botânico Arruda Câmara e padre João Ribeiro Montenegro.
Sugestões sobre a maneira mais coerente de se publicar os trabalhos da
Comissão.

80, 3, 34 n° 3 (livros raros): Apontamentos, notas auto bibliográficas - 5 f. mss20


cm. Encadernado com outras obras (1921).
11-285, 4, 9: Coleção factícia de cartas de Dias
1-ô, 5, 10: Cartas de Capanema à Claudio Luis da Costa, em que alude a vida
sentimental e ao estado de saúde de Dias.
1-28, 1O, 9: "Planta descoberta e descrita pelo Capanema''-frase escrita com a
letra de alemão ao lado de um desenho.
1-ô, 5, 3: Extratos (4) de cartas de M. de A. Porto Alegre a seu cunhado Capanema
(cópias datilografadas).
1-28, 25, 12: manuscritos: "Memória sobre Mineraes de Ferro do Cangati do Xorô
na Capitania do Ceará. ..". 24/10/1814. Cópia 12p-col. Martins.
1-ô, 4, 5 ou 3: Papéis do Ministério do Império, referentes à Comissão.
1-5, 4, 3: Cartas, avisos e ofícios versando sobre os seguintes temas relativos à
Comissão. 27 does., 38 p. Dentre os documentos, há alguns dirigidos ao Dr. Capanema e
assinados pelo M. de Olinda.
1-5, 14, 9: Cartas de Allemão, Presidente da Comissão, versando sobre
ocorrências desagradáveis com os membros da comissão em lcó. 3 doe, 6p. 28/04/1860,
30/12/1861.

196
1-5, 13, 10: "A Comissão Científica de 1859". Artigo de Sílvio Fróes de Abreu,
impresso na Rev. Trim. do Ceará, t. 33, p. 198-207, imp 10p.
"Memória sobre a ultima erupção vulcanica do Pico da Ilha do Fogo, sucedida em
24/01/1785". O Patriota, 2• subscrição, n° 5, XI. 1813 (23-32).
"Ensaio político sobre as Ilhas de Cabo Verde para servir de plano para a História
Philosóphica das mesmas". O Patriota, 38 subscrição, n° 3, V-VI. 1813 (29-54).
"Memória sobre a Capitania do Ceará". O Patriota, 3• subscrição, n° 1, 1-11. 1813
(46-62).

Museu Nacional do Rio de Janeiro:


633.15 F866: "Annomalias na inflorescência de milho Zea mahiz".(1859) Revista
Brasileira III, 1860, p. 8-7.
580.84 F866: Desenhos a lápis, originais do autor. "Por minha morte, deve este
livro entrar para a bibliotheca do Museu Nacional. 15 desenhos".

Pasta 3 (1845-1850)
136. nomeação de Guilherme Schuch de Capanema para Diretor Adjunto da Seção
de Mineralogia, Geologia e C. Físicas do Museu Nacional.
157. estatutos da Sociedade Vellosiana.
Pasta 5 (1855-1857)
18. ministro encaminha amostras do Maranhão
19. ministro exige cópia de relatórios de análise de minerais vindos da Bahia.
20. ministro remete amostras vindas da Bahia. Acompanha relatório de
encarregado da exploração.
27. ministro remete material arqueológico vindo da Bahia (fóssil).
33. ministro pede análise de amostra mineral (nafta, petróleo), proveniente da
Bahia. Acompanha relatório.
90. ministro envia e pede informações sobre mineral vindo da Bahia (manganês).
Acompanha relató.io.
102. relatório anual de atividades (1856).
103. relatório financeiro.
115. ministro encaminha caixotes com amostras de terrenos vindos de Santa
Catarina cumprindo pedido de Capanema.
124. sobre remessa de caixotes contendo amostras de terreno de Santa Catarina.
134. ministro envia amostras de terrenos para exame pelo Dr. Capanema.
145. relatório anual de trabalhos (1857).
146. relatório financeiro
Pasta 6 (1858-1861)
8. ministro envia provisoriamente para o Museu objetos da Comissão Científica.
1O. carta ao Diretor do Museu oferecendo fósseis encontrados no Ceará.
13. ministro envia ao Museu livros importados para a Comissão Científica.
17. sobre recepção de livros da Comissão Científica no Museu.
19. ministro envia amostra de mineral para análise da Bahia.
39. ministro pede análise de amostras de minerais vindas da Bahia.
43. ministro pede análise de amostras de minerais e do relatório que as
acompanhou, enviadas da Bahia.
55. ministro encaminha amostras de turfa vindas da Bahia.
59. ministro pede parecer do Diretor do Museu sobre proposta de melhoramento
para a agricultura, feita por Capanema.
61. resposta do Diretor do Museu sobre proposta para melhoramento da
agricultura.

197
77. ministro remete carta do naturalista francês Richard sobre introdução de
camelos no Brasil.
78. resposta do Diretor do Museu da carta recebida do naturalista francês.
129. ministro manda receber 46 caixões com objetos de mineralogia e bitânica
coligidos pela Comissão Científica, no Ceará.
Pasta 7 (1862-1865)
10. ministro nomeia Diretor do Museu e Capanema, para proceder análise de
mineral de São Paulo.
13. ministro nomeia Guilherme de Capanema, para proceder análise de mineral de
Mato Grosso.
15. ministro nomeia Diretor do Museu e Capanema, para proceder análise de
mineral de Mato Grosso.
16. ministro pede informações sobre projeto para agricultura, feito por Guilherme
de Capanema.
23.0 ministro envia caixote com fósseis do Sergipe. Inclui cópia do ofício do
remetente.
38. sobre possibilidade do Museu dispor de sala para abrigar coleções zoológicas
e botânicas, feitas pela Comissão Científica.
46. relatório anual das atividades de 1862.
50. ministro remete resposta de consulta de Guilherme de Capanema, sobre
amostras de enxofre e salitre do Rio Grande do Norte.
51. resposta sobre amostras de enxofre e salitre do Rio Grande do Norte.
65. ministro pede providências para liberar salas do Museu, com fim de receber
objetos da Comissão Científica.
77. suspende temporariamente alocação de objetos da Comissão Científica, para
salas do Museu.
78. sobre livros da Comissão Científica.
84. relatório do Museu para 1863.
Pasta 8 (1866-1869)
7. nomeação de Allemão para Diretor do Museu e da Seção de Mineralogia,
Geologia e C. Físicas.
34. ministro pede ao Presidente da Comissão Científica de Exploração o envio de
relatório para ser apresentado na Assembléia Legislativa.
90. resultado da análise feita em pedra enviada de Goiás, por Guilherme de
Capanema.
159. relação das madeiras do Ceará.
166. envio das amostras de minerais do Ceará, enviadas pelo Engenheiro F. A.
Pimenta Bueno.
167. relação das amostras enviadas (doe. 166).

Museu Histórico Nacional do Rio de Janeiro:


GS crp 90- carta de Porto Alegre com comentários de ordem pessoal.
GS crp 103- carta de Lagos com comentários de ordem pessoal, menciona os
seguintes nomes: P. Alegre, Souza Franco, Souza Ribeiro, Duarte (caso do Duarte) e
Maia. Em 28 de junho de 1857.
GS crp 144- carta de Henrique Guilherme Fernando Halfeld cumprimentando o
destinatário, por este ser membro da Comissão Científica de Exploração. Em seguida, faz
um breve histórico de sua carreira no ramo da mineração, justificando os serviços
prestados ao país e defendendo-se das acusações e calúnias feitas pelo seu genro
Honório Pereira de Azevedo Coutinho. Aconselha Capanema a fazer provisões de

198
alimentos e de medicamentos para a sua viagem ao Ceará Ountamente com a Comissão).
Juiz de Fora, 6 de março de 1859.
GS crp 169- carta de Halfeld com comentários de fundo político. Juiz de Fora, 22
de dezembro de 1858.
GS pi 6- apontamentos sobre "Seca do Ceará" pelo Dr. Guilherme Schuch de
Capanema, Rio de Janeiro, Tip. Nac. 1878.
GS pi 10.1/2- comentário sobre a notícia publicada no Jornal do Commércío "O
Ceará no presente e no futuro", escrito por Capanema (?). s/1, s/d.
GS pí 17.1/10- relatório de Capanema (aparentemente incompleto) acerca de sua
estadia no Ceará (04/12/1861).
GS pi 18.1/16- artigo de Capanema intitulado "A seca no norte", publicado no
Jornal do Commércio. S/d.
GS pi 28- cópia de Memória sobre minerais de ferro do Cangati do Xoró na
Capitania do Ceará, escrita por Feijó 24 de outubro de 1814.
GS do 8- carta imperial nomeando-o para a Seção Geológica e Mineralógica da
Comissão Científica. 07/março/1857.
GS cl 6- recibo de venda de 1 daccharímetro optico com balaça e mas pertences à
Comissão Científica de Exploração, por Antônio Maria de Mascarenhas. Rio de Janeiro,
20/07/1859.
GS cl 7- recibo de compras de um marcador de tempo para observações
astronómicas, efetuada pela Comissão Científica de Exploração, à Antônio Maria de
Mascarenhas. Rio de Janeiro, 04/04/1860.
GS ic 1- retrato branco e preto de um homem jovem de pé, Capanema (?). s/1, s/d.

Museu Imperial de Petrópolis


MFN:03805
00001 - SIEMENS HALSKE. Berlim. 1-DIF-06.09.1853-Sie.is: Instruções, em
alemão, para o manejo de um aparelho de telégrafo. Berlim, 06/09/1853.
MFN:03806
00002- LEROY, André. 1-DIF-1855/1856-Ler.c 1-3: Cartas (3) em francês de André
Leroy a Guilherme SchOch de Capanema - Fazendo recomendação acerca das mudas de
plantas que enviava. Angers, 15/12/1855, 30/01 e 05/02/1856. Anexo: Relação de plantas.
MFN:03807
00003 - VEIGA, Eugênio Aprígio da. 1-DIF-30.08.1856-Vei.c: Carta de Eugênio
Aprígio da Veiga ao barão de Capanema - Sobre o fornecimento de esteios de madeira
para uma linha telegráfica. Rio de Janeiro, 20/08/1856.
MFN:03808
00004 - ALBUQUERQUE, Antônio Francisco. 1-DIF-09.11.1856-Aib.c de Paula
Cavalcanti de, visconde de ALBUQUERQUE: Carta do visconde de Albuquerque a
Guilherme SchOch de Capanema - Dizendo que suas terras estavam arrendadas a
pessoa que se prontificou em reedificá-las - Lamentando que o solicitado por Capanema
chegasse depois do compromisso assumido - Garantindo-lhe primazia no caso de vender
a propriedade. Armação [Niterói], 09/11/1856.
MFN:03809
00005 - CAPANEMA, Guilherme SchOch de. 1-DIF-01.05.1857-Cap.c Barão de
Capanema: Carta sem indicação de remetente a Guilherme SchOch de Capanema -
Solicitando o pagamento de uma letra vencida, da qual era endossante - Enviando
relação dos vencimentos de letras em seu poder. Rio de Janeiro, 01/05/1857.
MFN:03810

199
00006 - BUZELIN, Antônio. 1-DIF-13.05.1857-Buz.c: Carta de Antônio Buzelin a
Guilherme Schüch de Capanema - Referindo-se à liquidação de uma hipoteca. Ouro
Preto, 13/0511857.
MFN:03811
00007 - CAPANEMA, Guilherme Schüch de. 1-DIF-21.08.1857-Cap.c Barão de
Capanema: Carta com assinatura ilegível, dirigida a Capanema - Comunicando que
estava à disposição do destinatário, uma máquina de moer açúcar, mediante o
pagamento de estipulada quantia. Bahia, 21/08/1857.
MFN:03812
00008- CAPANEMA, Guilherme Schüch de. 1-DIF-14.10.1857-Cap.c 1-2 Barão de
Capanema: Cartas (2) de Guilherme Schüch de Capanema a Augusto Delamare -
Pedindo que enviasse notícias diariamente dos trabalhos efetuados na fábrica de papel -
Indagando sobre fornecimento e pagamento de papel na Paraíba. Petrópolis, Fragoso,
Estrela, 14/10 e 19/10/1857.
MFN:03813
00009- CARDOSO, Francisco José. 1-DIF-29.12.1857-Car.o: Ofício de Francisco
José Cardoso a Guilherme Schüch de Capanema - Solicitando que na qualidade de
engenheiro-chefe da estrada de ferro Niterói-Campos, procedesse a um reconhecimento
e planos de construção da mesma - Assinam também: barão de São Gonçalo e José
Duarte Gaivão. Rio de Janeiro, 29112/1857.
MFN:03814
00010- ARAÚJO, Manuel Luís de. 1-DIF-08.01.1858-Ara.c: Carta de Manuel Luís
de Araújo a Guilherme Schüch de Capanema. Bahia, 08/01/1858.
MFN:03815
00011 - CAPANEMA, Guilherme Schüch de. 1-DIF-09.02.1858-Cap.c Barão de
Capanema: Carta assinada por P. de A Lisboa ao barão de Capanema - Solicitando o
parecer ao requerimento que tratava da utilização dos resíduos animais. Rio de Janeiro,
09/02/1858.
MFN:03816
00012 -1-DIF-12.04.1858-Do: Documento em logogrifo. Monte Formoso,
12/04/1858.
MFN:03817:
00013- LIMA, Pedro de Araújo, 1-DIF-15.11.1858-Lim.o Marquês de Olinda: Ofício
do ministro do Império, Pedro de Araújo Lima, marquês de Olinda, ao marquês de
Abrantes - Dizendo enviar amostras de sal amargo, cedidas pelo cônsul geral do Brasil
em Angola, para ser informada sua utilidade pela Sociedade Auxiliadora da Indústria
Nacional. Rio de Janeiro, 15/11/1858.
MFN:03818
00014 - DIAS, Antônio Gonçalves. 1-DIF-1859/1862-Dia.c 1-9: Cartas (9) de
Antônio Gonçalves Dias a Guilherme Schüch de Capanema - Dando conta das pesquisas
que vinha realizando como membro da comissão da científica encarregada de explorar as
riquezas do solo brasileiro. Ceará, Maranhão, Manaus, Paris, 14/04/1859 a 1862 e uma
sem data.
MFN:03819
00015- BRASIL, Tomás Pompeu de. 1-DIF-28.11.1860-Bra.c Sousa, padre: Carta
do padre Tomás Brasil a Matias José Pacheco - Pedindo informações para atender a
uma solicitação de Capanema, sobre a influência do vento para o transporte de areias.
Fortaleza, 28/12/1860. No mesmo documento há a resposta do destinatário.
MFN:03820
00016- COUTINHO, O. 1-DIF-28.11.1860-Cou.c 1-4: Cartas (4) de O. Coutinho a
Guilherme Schüch de Capanema, barão de Capanema - Sobre as pesquisas realizadas

200
no Norte, como membro da comissão científica de exploração. Ceará, Manaus, 28/11 e
11/12/1860 e 26/04 e 11/06/1861.
MFN:03821
00017 - BRASIL, Tomás Pompeu de. 1-DIF-03..12.1860-Bra.c Sousa, padre: Carta
do padre Tomás Brasil a Guilherme Schüch de Capanema, barão de Capanema - Sobre
possível desordem no Crato, após a morte do juiz de paz José Romão, segundo diziam,
por envenenamento. Fortaleza, 03/12/1860. Anexo: Bilhete de Guilherme Schüch de
Capanema a Tomás Pompeu de Sousa Braeil.
MFN:03822
00018 - CAPANEMA, Guilherme Schüch de. 1-DIF-12.06.1861-Cap.c Barão de
Capanema: Carta (rascunho) de Guilherme Schüch de Capanema, barão de Capanema,
a d. Pedro 11, imperador do Brasil - Referindo-se à moléstia que o acometia - Sugerindo
que o imperador consultasse seus médicos se o mal era ou não contagioso, uma vez que
iria lecionar mineralogia às princesas. 12/06/1861.
MFN:03823
00019 - GABAGLIA, Giacomo Raja. 1-DIF-22.06.1861-Gab.c: Carta de Giacomo
Raja Gabaglia a Guilherme Schüch de Capanema. Fortaleza, 22/06/1861.
MFN:03824
00020 - PEDRO 11, imperador do Brasil. 11-DIF-1 0.11.1862-PII.B.d: Decreto
nomeando Guilherme Schüch de Capanema para membro do conselho fiscal do Imperial
Instituto Fluminense de Agricultura. Rio de Janeiro, 10/11/1862.
MFN:03825
00021 - PEDRO 11, imperador do Brasil, 1-DIF-1862/1864-PII.B.c 1-8: Cartas e
memorandos (8) a Guilherme Schüch de Capanema - Referindo-se à sessão da diretoria
do Instituto de Agricultura - Sobre as aulas de mineralogia às princesas - Sobre a criação
de uma fazenda-escola, por intermédio do Instituto Agrícola - Indagando se poderia
utilizar as idéias de Capanema sem revelar a sua origem. 11/07/1862; 22/03 e
17/05/1863; 01/02 e 08/0511864. Na carta de 22/03/1863, há quesitos acerca da proposta
de Langsdorff para três escolas: para pequenos lavradores, proprietários etc. e ainda
texto em alemão.Acompanha uma sobrecarta com anotações no verso.
MFN:03826
00022 - Instituto Histórico e Geográfico. 1-DIF-1863-Ins.rb Brasileiro. Rio de
Janeiro: Recibo do pagamento efetuado por Guilherme Schüch de Capanema, como
sócio do I.H.G.B. 1863.
MFN:03827
00023 - ALBUQUERQUE, Cândido A. D. 1-DIF-[1863]-Aib.c: Carta de Cândido
Albuquerque a Guilherme Schüch de Capanema. [1863].
MFN:03828
00024- PORTO ALEGRE, Manuel de. 1-DIF-1863/68-Por.c 1-16 Araújo, barão de
Santo Ângelo: Cartas (16) do barão de Santo Ângelo a Guilherme S. de Capanema -
Dizendo enviar um exemplar de sua obra "Brasilianas", para o imperador - Sobre sua
transferência do consulado da Alemanha para o de Paris - Referindo-se à exposição em
Paris e aos participantes estrangeiros - Destacando a colaboração de Lages para o
brilhantismo da parte brasileira - Criticando as legações de Paris e Londres - Prometendo
enviar impressos referentes a fios e cabos elétricos - Falando de suas dificuldades
financeiras. Dresden, Lisboa, 20/08/1863 a 13/05/1868.
MFN:03829
00025 - NOGUEIRA, Batista Caetano de Almeida. 1-DIF-16.04.1866-Nog.c: Carta
de Batista Caetano Nogueira a Guilherme Capanema - Dando conta do andamento dos
trabalhos realizados em Parati, Mangaratiba etc. na qualidade de vice-diretor da
Repartição Geral dos Telégrafos. Rio de Janeiro, 16/04/1866.

201
MFN:03830
00026- DENIS, Jean Ferdinand. 1-DIF-24.08.1866-Den.c: Carta (em francês) de
Jean F. Denis a Guilherme Schüch de Capanema- Fazendo referências ao volume que o
destinatário lhe enviou - Apresentando sugestões para o problema da seca no Ceará -
Referindo-se ao falecimento de Marques Lisboa. Paris, 24/08/1866.
MFN:03831
00027 - FERRAZ, Luís Pedreira do. 1-DIF-1866/1868-Fer.c 1-22. Couto, visconde
do Bom Retiro: Cartas (22) do visconde do Bom Retiro, presidente do Imperial Instituto de
Agricultura, a Guilherme S. de Capanema -Sobre a cultura e pesquisa da cana de açúcar
e do envio de amostras de mudas de cana imperial para a Sociedade de Aclimação de
Paris - Sobre entendimentos que tivera com o Dr. Glasl, diretor do Jardim Botânico do Rio
de Janeiro acerca da distribuição de mudas - Dizendo que concordava com o preço
estipulado para a baunilha, palmeiras - Instando para que o dr. Glasl preparasse seus
trabalhos de pesquisa sobre os produtos que obtivera de certas plantas a fim de serem
publicados - Sobre certos estudos anatômicos de canas doentes. Rio de Janeiro,
20/01/1866 a 27/11/1868 e uma sem data. Anexo Telegrama do visconde do Bom Retiro a
Capanema.
MFN:03832
00028- RYLANDS, Brothers. 1-DIF-30.03.1867-Ryl.c: Carta (em inglês) dirigida a
Guilherme Schüch de Capanema, diretor da Repartição Geral dos Telégrafos - Enviando
orçamento e especificações para o fornecimento de material telegráfico. Warrington,
30/03/1867.
MFN:03833
00029 - VASCONCELOS, Mariano Alves de. 1-DIF-13.04.1867-Vas.c: Carta de
Mariano Alves de Vaconcelos a Guilherme Schüch de Capanema - Dizendo enviar
amostras de cristais encontrados em S. Fidélis e, Muramente, enviaria amostras de
minerais- Referindo-se à linha telegráfica de Campos. Macaé, 13/04/1867.
MFN:03834
00030- MACEDO, Joaquim Manuel de. 1-DIF-07.07.1867-Mac.c 1-2: Cartas (2) de
Joaquim de Macedo a Guilherme Schüch de Capanema - Solicitando um emprego de
guarda na linha telegráfica de Porto das Caixas para Luís Custódio da Costa - Indagando
sobre a estrada de ferro Pedro 11. ltaboraí, 07/07/1867 e 05/02/1872.
MFN:03835
00031 - CAPANEMA, Guilherme Schüch. 1-DIF-14.08.1867-Cap.bi de, barão de
Capanema: Bilhete sem assinatura, dirigido a Guilherme Schüch de Capanema - lguape,
14/08/1867.
MFN:03836
00032 - PORTO ALEGRE, Manuel de Araújo. 1-DIF-13.05.1868-Por.c Barão de
Santo Ângelo: Carta do barão de Santo Ângelo a Joaquim Manuel de Macedo - Dizendo
que lutava com grande dificuldade para manter-se com sua família em Lisboa, onde
exercia o cargo de cônsul do Brasil - Que era muito estimado pelo rei e por dom
Fernando, que o fizeram vice-presidente da Sociedade Propagadora das Belas Artes, cujo
presidente era o marquês de Sousa Holstein. Lisboa, 13/05/1868.
MFN:03837
00033 - MONTEIRO, Cândido Borges. 1-DIF-05.08.1872-Mon.c Visconde de ltaúna:
Carta (reservada) do ministro da Agricultura, Cândido B. Monteiro, a Guilherme S. de
Capanema - Para que no pagamento da repartição que dirigia [Telégrafos] fosse usado
maior número de níquel e bronze, para dar pronto curso à grande quantidade depositada
na Casa da Moeda. Rio de Janeiro, 05/08/1872.
MFN:03839

202
00034 - TERESA CRISTINA, imperatriz do Brasil. -DIF-1874/1888-TC.B.c 1-54:
Cartas (54) de d. Teresa Cristina, imperatriz do Brasil, a Maria Cândida de Araújo Viana
Figueiredo, dama da imperatriz - Correspondência familiar. Petrópolis, Rio de Janeiro e
Cannes, 30/01/1874 a 03/12/1888.
MFN:03839
00035 - RODRIGUES, João Barbosa. 1-DIF-06.02.188[6]-Rod.c: Carta de João
Barbosa Rodrigues a Guilherme S. de Capanema - Referindo-se a estudos sobre
botânica.Rodeio/[RJ],06/02/188[6].
MFN:03840
00036 - ALEMÃO, Francisco Freire. 1-DIF-s/d-Aie.bi: Bilhete de Francisco Freire
Alemão a Guilherme Capanema. Sem data.
MFN:03841
00037 - CAPANEMA, Guilherme Schüch de. 1-DIF-s/d-Cap.c Barão de Capanema:
Carta sem assinatura, dirigida ao barão de Capanema. Sem data.
MFN:03842
00038 -OLIVEIRA, J. J. 1-DIF-s/d-Oii.c: Carta de J. J. Oliveira a Guilherme S. de
Capanema - Sobre a vinda ao Brasil de um astrônomo do Observatório de Paris. Sem
data.
MFN:03843
00039 - OLIVEIRA, João Alfredo Correia de. 1-DIF-s/d-Oii.bi: Bilhete de João
Alfredo de Oliveira a Teodoro - Sobre as vagas existentes no internato do Colégio de
Pedro 11. Sem data.
MFN:03844
000401-DIF-s/d-Do: Documento (rascunho)- Trata-se de uma sátira. Sem data.
MFN:03845
000411-DIF-s/d-Rç: Relação de correspondência. Sem data.
MFN:02058
SANTOS, João da Cruz e, barão de URUCUÍ. I-DPP-30.10.1884-San.c1-3-C.P.III:
Cartas (3) de João da Cruz e Santos, barão de Urucui, dando noticias da atuação do
partido liberal na campanha eleitoral, ressaltando que seus candidatos estavam
prejudicados pelo apoio dado ao projeto governamental relativo aos escravos -
Mencionando seu desagrado quanto à atitude do professor interino de francês do Liceu
daquela cidade que conseguira adiamento do concurso para preenchimento da càtedra, o
que viria a prejudicar um parente seu candidato à mesma -Agradecendo a recomendação
feita ao barão de Capanema e ao dr. Borges da Fonseca, juiz de Direito de Oeiras -
Congratulando-se pela vitória do partido na província. Teresina, 30/10, 28/11 e 30/12/884.
A Carta de 30/12 está também assinada pelos seguintes membros do partido
liberal: Joaquim Dias de Santana, A[ugusto] Colin da Silva Rios, Cândido de Holanda
C[os]ta Freire, José Joaquim Avelino e Mariano Gil de Cast[el]o Br[an]co.
CAPANEMA, Guilherme Schüch de, barão de 1-DPP-09.02.1889-Cap.c1-3 (Livro
N°. 16)
CAPANEMA: Cartas (3) de Guilherme Schüch de Capanema, barão de Capanema,
a João Lustosa da Cunha Paranaguá, marquês de Paranaguá - Contendo dados e
informações sobre a questão de limites com a república Argentina. Rio de Janeiro, 09/02,
27/09 e 09/10/1889. As de 09/02 e 09/10 trazem a nota "confidencial".
MFN:02951
00018- CAPANEMA, Guilherme Schüch. 1-DAS-1894/1904-Cap.c 1-109 de, Barão
de Capanema: Cartas, cartões e bilhetes (109) a Miguel Arrojado Ribeiro Lisboa -
Encarregando-o de adquirir terras no Pará, pedindo discriminação das condições de valor
de Timbopeba quanto a matas, terras, cultura e mineração - Que fora eleito como um dos
diretores da Guruopy Gold Mines Ltda - Extração de pirita, sobre as possibilidades de

203
reduzi-la a pó; negociações com as minas de Gurupi - Solicitando relatório minucioso
comparativo de Gurupi, Minas e Goiás, a fim de remetê-lo a Londres - Solicitando a
descrição da formação aurífera de Gurupi - Que fora nomeado representante da Siemens
Brothers de Londres no Brasil (fornecedora de material telegráfico), pelo delegado da
mesma, que estava interessado nas minas sul-africanas; recomendando a Lisboa que
fizesse comparações em seu relatório e sobre a impressão do mesmo, lembrou a Lauro
Sodré a possibilidade de ser realizada pelo Museu Paranaense - De risco que corriam se
no Pará tiverem conhecimento das riquezas das minas, antes definitivamente demarcadas
e adquiridos mais terrenos - Solicitando cópia do mapa geral de Viseu e Gurupi, com as
indicações das minas, que remeteria para Londres - Preocupando-se com o propósito dos
americanos em ocupar terras do Brasil, desejosos de expansão territorial - Comentando
os estudos e empreendidos por seus filhos, Otávio, que desejava aperfeiçoar-se em
química e Leopoldo que o contrariava, uma vez que ocupara-se com análises de vidros
ferruginosos, quando o desejo de Capanema era que se firmasse em análise orgânica e
depois seguisse um curso prático de vinificação e preparação dos respectivos fermentos
puros pela propagação da cultura da videira no Brasil - Dando notícias das transações
entaboladas com outros países no campo exploratório da cultura e da mineralogia em
solo brasileiro - Referindo-se insistentemente ao risco que corriam em perder a concessão
de prazos mineralógicos - Pedindo relatórios e exposições a fim de recorrer ao congresso
do Pará - Autorizando Miguel Lisboa a efetuar estudos da riqueza mineral na fazenda de
Timbopeba, de propriedade de Capanema - Refere-se ainda às providências que
deveriam tomar acerca da caducidade da concessão exploratória - Solicitando relatório
completo dos trabalhos realizados, incluindo mapas levantados e os obstáculos que
Lisboa encontrou na Europa devido ao descrédito do Pará, etc. - Recomendando a
Siemens, no que necessitava para fins telegráficos e cabos submarinos. 1804 a 1904.
Anexo: Carta de Otávio Capanema ao dr. Lisboa, em nome de seu pai, barão de
Capanema, trecho em alemão. Rio de Janeiro, 13/07/1889; carta em alemão.
MFN:02953
00021 - CAPANEMA, Guilherme SchOch de. 1-DAS-27.01.1896-Cap.c Barão de
Capanema: Carta de Guilherme SchOch de Capanema a Joaquim Miguel Ribeiro Lisboa -
Dando notícias dos negócios que vinha realizando com os ingleses, relativamente à
mineralogia. Rio de Janeiro, 27/01/1896.
MFN:02955
00022- BOCAIUVA, Quintino Ferreira. 1-DAS-26.10.1901-Boc.c de Sousa: Carta
de Quintino Ferreira de Sousa Bocaiúva ao barão de Capanema - Sobre papéis relativos
aos terrenos requeridos pelo destinatário cujos domínios ainda não foram regularizados;
aconselhando-o a dirigir-se ao dr. Arrojado Lisboa. Petrópolis., 26/10/1901. No mesmo
documento há um despacho deste último.
MFN:04232
00097 - ORLEANS, Gastão de. 1-AMI-19.12.1888-0rl.c conde d'EU: Carta do
conde d'Eu ao barão de Capanema. Petrópolis, 19/12/1888.
MFN:11785
MARTIUS, Carlos Frederico Filipe von, DMI-2: Carta de Carlos Frederico Filipe von
Martius, secretário da Real Academia de Ciências da Baviera, a Manuel de Araújo Porto
Alegre, barão de Santo Ângelo, cônsul na Prússia e Saxónia - Agradecendo as
expressões de gratidão que lhe professara - Dizendo merecedor da simpatia dos
brasileiros, pois ainda se vê rodeado de trabalhos relativos ao Brasil e que se sente meio
brasileiro - Aceitando sua oferta de ajudá-lo com conselhos na sua tarefa de ilustrador do
Brasil - Dizendo ter gostado de saber que Guilherme SchOch de Capanema era seu
cunhado e que lera, com interesse, suas obras, por ele enviadas - Informando que
remetera a Capanema o fascículo da Flora Brasiliensis - Solicitando materiais mais

204
recentes para a construção de um mapa geográfico do Império para servir de base para
ilustração, fltogeográficas e geográficas, que deviam acompanhar a Flora Brasiliensis -
Pedindo indicar Capabema para manter relações com a academia. Munique, 18/02/1862.
Maço 102- Doe. 5005: Carta de Guilherme [Schüch] a seu pai [Roque Schüch)-
Dando notícias - Dizendo que a análise dos minerais não estava concluída devido ao
atraso no recebimento - Falando a respeito do avanço em seus estudos e de suas
pretensões. Viena, 14/05/1843.
Maço 103- Doe. 5047: Petição (impressa) de Roque Schüch à Assembléia Geral
Legislativa - Solicitando a concessão de duas loterias para capacita-lo 2 consertar sua
fábrica de ferro e possibilitá-lo a dar andamento em suas pesquisas das minas de metais
já descobertas. Quinta da Boa Vista, 16/0611841.
Maço 103 - Doe. 5062: Carta de Guilherme Schüch a Paulo Barbosa da Silva -
Dando notícias- Comentando sobre os cursos que está fazendo. Viena, 18/12/1841.
Maço 105- Doe. 5114: Carta de Guilherme Schüch a d. Pedro 11, imperador do
Brasil - Congratulando-o pela passagem do seu aniversário - Fazendo comentários a
respeito de seus estudos. Viena, 02/12/1842.
Maço 106 - Doe. 5131: Cartas (4) de Guilherme Schüch a d. Pedro 11, imperador
do Brasil - Relatando sobre seus estudos no Instituto Politécnico - Comentando sobre a
aparição de um cometa e dizendo que os astrónomos de Viena lamentaram não ter
recebido nenhuma observação da América do Sul onde o cometa foi mais visível -
Dizendo que Lomonosoff [ministro russo] trouxera do Brasil uma amostra da pedra
elástica onde se achavam embutidos diamantes bem cristalizados. Viena, 21/02/, 25/05,
08/08 e 02/12/1843.
Anexos 2: Cartas de Guilherme Schüch a seu pai [Roque Schüch)- Dando notícias
- Falando de seus estudos - Dizendo que as notícias nocivas do Império do Brasil já
foram desmentidas- Remetendo a biografia de João Natterer. Viena, 02 e 25/07/1843.
Maço 107- Doe. 5175: Cartas (2) de João Diogo Sturz, cônsul geral na Prússia, a
José Paulino Soares e Sousa, ministro de Estrangeiros. 05 e 19/02/1844. A de 05/02 traz
a nota "Reservada e Parti~•.Jiar" e a de 19/02 a de "Reservada". Anexo: Memória sobre
"Admissão dos açúcares Brasil ao mercado da Inglaterra e questão da escravatura.
Documento em mau estado de conservação.
Maço 109- Doe. 5336: Cartas (3) de Guilherme Schüch a d. Pedro 11, imperador
do Brasil - Agradecendo os meios concedidos para sua viagem de férias - Falando sobre
seus estudos - Pedindo permissão para passar um ano na Academia Montanística de
Freiberg - Relatando a sua presença na Academia de Minas em Freiberg - Fazendo
comentários de suas viagens. Viena, 20/04 e 02/08/1846 e Freiberg, 15/11/1846.
Maço 110- Doe. 5416: Cartas (4) de Guilherme Schüch a d. Pedro 11, imperador
do Brasil -Comentando sobre sua viagem geológica na Franconia - Falando sobre seus
estudos e suas viagens. Viena, 2801, Unterlaitterbach, 25/06, Zabrze, 14/08 e Munique,
15/12/1847.

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