Neuropsicologia Infância Villachan-Lyra - Almeida - Hazin
Neuropsicologia Infância Villachan-Lyra - Almeida - Hazin
Neuropsicologia Infância Villachan-Lyra - Almeida - Hazin
Algumas contribuições da
Neuropsicologia e da Psicologia do Desenvolvimento para o campo da Educação
Infantil: O papel das relações afetivas. Em V. M. R. de Vasconcellos, K. Seabra e C.
A. Piccinini (orgs). Bebês em foco: Contribuições da Psicologia do Desenvolvimento
para Educadores/Profissionais da Educação Infantil. Livro produzido pelo grupo de
Trabalho “Interações Pais-Bebê/Criança da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-
Graduação em Psicologia (ANPEPP).
Algumas contribuições da Neuropsicologia e da Psicologia do Desenvolvimento
para o campo da Educação Infantil: O papel das relações afetivas
Pompéia Villachan-Lyra
Universidade Federal Rural de Pernambuco, UFRPE, PE
[email protected]
Eliana Almeida
Núcleo de Avaliação Neuropsicológica e Acompanhamento Psicoterapêutico, NANAP
[email protected]
Izabel Hazin
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
[email protected]
importância das relações afetivas construídas nos primeiros anos de vida para o
neurológica).
uma relação de apego segura (ou insegura) no início da vida, inclusive na creche e na
Serão ainda feitas algumas sugestões de rotina e de atividades no ambiente escolar que
(dimensão biológica). Além disso, pode fazer com que ela sente-se adequadamente e
atuam nas creches, por ser esse um ambiente no qual os bebês e as crianças passam boa
sistema nervoso. Problemas que ocorrem com a gestante, tais como o uso de drogas e
liberados pela mãe em situações de stress podem entrar na circulação do feto e também
um adulto e 160 bilhões de neurônios, que irão conectar-se entre si através das sinapses,
sistema, através da morte dos neurônios excedentes (apoptose) e da poda das sinapses
em desuso (seja porque já cumpriram a tarefa para a qual estavam previstos ou porque
(sinaptogênese), bem como quais serão os neurônios que sobreviverão serão largamente
neurais, eliminando as conexões que não são usadas, tornando o funcionamento cerebral
ocorre até o final do primeiro ano de vida. Por volta dos 3 anos de idade, o cérebro já
atinge cerca de 70% do seu peso adulto e ao final dos 6 anos já tem quase o tamanho de
longo da vida que vai qualificar o seu desenvolvimento funcional. Essa plasticidade do
estímulos sociais são particularmente influenciadas pela experiência (e.g., Katz & Shatz,
1996; Knudsen, Heckman, Cameron & Shonkoff, 2006). Além disso, é importante
criança, uma vez que a maturação dos circuitos neurais ocorre em momentos diferentes,
(Black & Greenough, 1986). Por exemplo, nos primeiros meses de vida, as experiências
circuitos mais simples do cérebro (low-level circuits), enquanto que para as crianças
Developing Child, 2007). Assim, não adianta sobrecarregar o bebê ou a criança com
ressaltar ser importante que essa estimulação aconteça em meio a um contexto afetivo
esclarecer, no entanto, que um ambiente rico em estimulação não deve ser confundido
com um ambiente de sobrecarga de atividades. O excesso de atividades pode, inclusive,
Diante de tudo o que foi visto até aqui, temos que o neurodesenvolvimento
infantil não deve ser entendido como um processo contínuo e homogêneo, muito menos
endógeno, que tem o seu curso independente das experiências vividas pelo bebê e pela
sociocultural e afetivo.
escolar. Será também realizado um paralelo entre esses diferentes padrões de apego e o
construídas bem como quais serão os neurônios que sobreviverão será largamente
suas experiências? Quem são as pessoas que estarão nessa mediação? Qual a
Certamente esses ambientes serão o familiar e o escolar. Não resta dúvida de que
direito da criança e sabendo que é nesse ambiente que esta passa boa parte do seu dia, é
esse bebê e criança durante a primeira infância. Dentre outros aspectos, essa
bebê/criança, que se responsabilizam por seu cuidado e proteção. Uma das principais
criança pequena, o que se dá por meio do relacionamento que estabelecem entre si, na
rotina diária. Para interagir com seu meio social, e em particular com aquele que se
constitui como o(a) seu(sua) principal cuidador(a), o bebê usa, desde o seu nascimento,
suas capacidades sensoriais, em particular o olfato, audição, paladar e o toque. Por volta
dos dois meses de vida ocorre uma importante mudança no cérebro do bebê, mais
1998, 2003). Assim, as trocas face-a-face são intensificadas por volta dos dois meses de
acompanhada por fortes emoções que podem ser evidenciadas nas expressões faciais,
corporais.
Assim, entre si, bebê e cuidador(a) regulam suas emoções através destas trocas
contexto de interação com o bebê, é construído um senso de confiança que vai favorecer
o uso da figura de apego como uma fonte de proteção e conforto. O uso da figura
Por outro lado, quando a figura de apego não é concebida pela criança como
uma fonte de proteção e segurança (apego inseguro), este movimento exploratório pode
se constituir como um evento bastante estressor, uma vez que a criança tenderá a
perceber-se como sozinha, não podendo contar com o apoio de alguém mais experiente.
Em função disso, as relações sociais e afetivas tendem a serem vistas com cautela e
o que, por sua vez, favorecerá a construção de uma baixa autoestima. Do ponto de vista
intenso, poderá ter importantes repercussões, tornando o cérebro dessa criança mais
(Shonkoff, 2011).
& Zeanah, 1984). O período específico entre sete e quinze meses tem se mostrado um
sincronia interacional das trocas face-a-face de sorriso e vocalizações entre o bebê e sua
segundo ano de vida (Schore, 1997, 1998, 2003). Este é o período de grande
importância para o desenvolvimento das relações de apego, uma vez que será um
que uma das principais funções dos pais e profissionais envolvidos na Educação Infantil
disponível às suas necessidades, caso esta se sinta ameaçada e precise do suporte. Desta
forma, os(as) professores(as) oferecem proteção à criança quando esta está sob
uma exploração segura. A criança tende, então, a sentir-se encorajada a ousar mais em
situações concebidas como desafiadoras, uma vez que sente que pode contar com o(a)
infância. Alem disso, será durante esses anos de sua vida que a criança irá construir uma
primeira relação com o próprio ambiente escolar, podendo passar a percebê-lo como um
ambiente agradável, prazeroso e seguro, repleto de boas e memoráveis experiências, e
Diversas atividades da vida cotidiana – tais como brincar, interagir com outras crianças
afetivas positivas nas creches. Com o objetivo de contribuir nessa direção, faremos
abaixo algumas sugestões de atividades práticas que podem ser realizadas no cotidiano
criança, bem como a realidade do cotidiano das creches, passa a ser mais interessante a
Tudo isso é oportunizado pela presença de um adulto mediador que se constitua como
base importante de suporte e acolhimento. Figura esta que não superprotege mas está
Objetivo: Essa atividade tem como objetivo específico estimular o bebê a pedir ajuda
diante de uma dificuldade, mostrando a ele que existe um adulto disponível para ajuda-
chamar a sua atenção para esse objeto e colocá-lo dentro do seu campo visual, mas fora
do seu alcance. O adulto, neste caso, deixa o bebê buscar tentar pegar o objeto sem
ajudá-lo, mesmo sabendo que o bebê não vai conseguir pegá-lo sozinho. Somente diante
de um gesto do bebê que sinalize um pedido de ajuda é que esse adulto vai efetivamente
ajudá-lo.
Objetivo: Esta atividade tem por objetivo ajudar o bebê/criança a enfrentar e superar
dificuldades que se colocam em seu caminho, na busca de atingir os seus objetivos, bem
como fortalecer a confiança no adulto que lhe dará suporte na superação desses
Faixa etária: A partir de 6 meses, podendo ser usada também com crianças maiores,
coloca-se alguns obstáculos que dificulte o acesso da criança a esses brinquedos, tais
como almofadas, colchonetes, cadeiras e os próprios adultos que podem ficar no meio
do caminho. O bebê é então estimulado a buscar acesso ao brinquedo do seu interesse.
Para tanto, o bebê precisará vencer os obstáculos que se colocam no caminho para
alcançar o seu objetivo. O papel do adulto, nesse caso, é dar suporte pra que a superação
desses obstáculos seja feita de forma segura, algumas vezes ajudando a criança a subir e
nível de dificuldade para superação dos obstáculos deve ser ajustado e algumas regras
podem ser propostas como, por exemplo, ter que passar um obstáculo sem tocar nele
(nem empurrar nem pisar); ter que recolher determinados objetos que estejam no
vendados, tendo a criança que atender aos comandos dados pelo adulto (construção de
confiança). De modo geral, essa atividade pode ser organizada para ser realizada
Descrição: Se não tiver uma cabaninha pronta, pode-se criar o cenário da cabana usando
varias estratégias como, por exemplo, colocar um lençol sobre uma mesa ou sobre duas
cadeiras separadas. Com a cabana “construída”, pode-se contar uma historinha que
adulto observe como as crianças lidam com esse cenário nos seguintes aspectos: Se
com outras crianças, se depois que entram, aceitam “fechar a porta”, quanto tempo são
capazes de ficar lá dentro, como negociam a ordem de entrada na cabana, etc. Cabe ao
adulto, além de observar, mediar todo esse processo, de modo a promover a sensação de
Com objetivos dessa ordem, outras atividades podem ser pensadas, envolvendo
Considerações Finais
que a qualidade das relações sociais e afetivas estabelecidas pelo bebê e pela criança no
interação social e das relações afetivas, nem tão pouco da promoção de ambientes
sentido, há uma convergência entre o que propõe o campo das neurociências com o que
afirmação de que diversas atividades da vida cotidiana – tais como brincar, interagir
Os achados produzidos pelas neurociências nos dizem que os anos iniciais da vida de
uma criança constituem o alicerce sobre o qual se desenvolve e se consolida o seu potencial de
aprendizagem, regido pela integração dinâmica entre influências genéticas, biológicas e
neurociências precisam de educadores que apliquem seus achados no interior das salas de aula.
Por sua vez, os educadores dependem de formação específica que possibilite a compreensão e a
alcance do conhecimento produzido (Puebla & Talma, 2011). Trata-se de um grande desafio
REFERÊNCIAS
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