Jornal Ô Catarina #91
Jornal Ô Catarina #91
Jornal Ô Catarina #91
EXPEDIENTE
Eduardo Pinho Moreira
Secretário de Estado de Turismo, Cultura e Esporte
Tufi Michreff Neto
Presidente
Ozeas Mafra Filho
Diretora de Difusão Artística
Mary Garcia
Diretor de Patrimônio Cultural
Halley Filipouski
Diretor de Administração
EDITORIAL
Jorge Henrique Carneiro Frydberg
Consultor Jurídico
Rodrigo Goeldner Capella
Consultor de Projetos Especiais
Moacir Iguatemi da Silveira Neto
Assistente da Presidência
Sidneya Gaspar de Oliveira
Assessor de Comunicação
Raquel Santi
Gerente Operacional
Joel Costa Jr.
Gerente de Administração, Finanças e Contabilidade
Antônio Ubiratan de Alencastro
Gerente de Logística e Eventos Culturais / Projetos
Ivan Carlos Schmidt Filho
Gerente de Logística e Eventos Culturais / Marketing
Melissa Rodrigues
Gerente de Patrimônio Cultural
Diego Rossi Fermo
Gerente de Pesquisa e Tombamento
Ana Paula G. L. da Silveira
Gerente das Oficinas de Arte
Aline Zanella Bordignon
Administrador do Museu de Arte de Santa Catarina
Susana Bianchini
Administradora do Museu da Imagem e do Som
Ana Ligia Becker
Administradora do Museu Histórico de Santa Catarina
Vanessa Borovsky
Administrador da Casa dos Açores Museu Etnográfico
Valmir Martins Pereira
Composição em Azul Administradora da Casa de Campo do Governador Hercílio Luz
Cianotipia Karoline Käufer Schvambach
Administradora do Teatro Álvaro de Carvalho
Eliza Docena
Administradora da Biblioteca Pública do Estado de Santa Catarina
A vida começa aos 40? Patrícia Karla Firmino
Administradora do Centro Integrado de Cultura
Há quem diga, afirme e jure de pé junto que sim. E assim es- Alizandra Oliveira
peramos que seja. Administradora da Escolinha de Arte
Alessandra Ghisi Zapelini
Responsável pela Casa da Alfândega
A Fundação Catarinense de Cultura (FCC) está completando Adriana Aparecida de Brito
40 anos. São quatro décadas de uma viagem que subiu mon-
tanhas, nadou por rios, surfou em ondas, atravessou desertos
Ô CATARINA! 91
e ainda tem um longo caminho a trilhar.
Novembro de 2018
E páginas de um livro em branco para escrever. Editor / Moacir Iguatemi da Silveira Neto
Assistente Editorial - Jornalista / Raquel Santi
Conselho Editorial / Mary Garcia, Moacir Iguatemi da Silveira Neto,
É nesse espírito comemorativo, com uma esperança que Raquel Santi, Sidneya Gaspar de Oliveira
Colaboradores desta edição / Marisa Naspolini, Emanoel Pereira, Thiago Mattes,
toca o céu, que a FCC chega a edição de número 91 do jor- Simone Gutjahr, Tatiana Cobbett, Rosa Maria Tesser, Elke Siedler, Luiza Lins,
nal Ô Catarina. Nas páginas desta publicação, o leitor poderá Márcio H. Martins, Osvaldo Domingos Ferreira, Fernando Lindote, Susana Bianchini.
conferir textos sobre cinema, música, teatro, literatura e outras Capa / Obra de Tharciana Goulart - Memória em Azul (Cianotipia)
Ilustrações / Susano Correia e Tharciana Goulart
artes. Tem fotografia, conto e poesia. Tem pintura, dança e Revisora / Denize Gonzaga
alegria. Tem também a tristeza por aqueles que se foram e, Projeto Gráfico e Diagramação / Moysés Lavagnoli
quem sabe, a gente encontre um dia. Tiragem / 3 mil exemplares
Entre em contato:
Não poderíamos deixar de registrar os 70 anos do Museu de Fundação Catarinense de Cultura
Av. Governador Irineu Bornhausen, 5600.
Arte de Santa Catarina, o MASC. Nem o aniversário do maior Agronômica – CEP: 88025-202
poeta catarinense: Cruz e Sousa. Florianópolis – Santa Catarina
E-mail / [email protected]
Fone / (48) 3664-2680
E pra completar, a prata da casa. O leitor poderá conhecer um Site / www.cultura.sc.gov.br/ocatarina
pouco sobre um dos espaços culturais mais jovens adminis-
trados pela FCC: a Biblioteca de Arte e Cultura, que fica no Os textos assinados são de
responsabilidade dos autores.
Centro Integrado de Cultura (CIC), em Florianópolis. Também
damos início a uma série de textos que revelam alguns talen-
tos de colaboradores da casa.
favorito
de (muitas) outras paragens, vinha passar as
férias em Floripa, fugindo do monótono e in-
sosso verão chuvoso de Brasília. Ficava hos-
pedada no apartamento dos meus avós, nos
arredores da Praça dos Bombeiros, e conse-
guia circular à noite, em plena adolescência,
sem maiores preocupações e inquietações
Por Marisa Naspolini ligadas à segurança, à violência e a outros
dramas contemporâneos. Nesta época, já ti-
nha sido “contaminada” pelo vírus do teatro e
aproveitava as férias sem pai nem mãe para
conhecer um pouco da vida cultural da minha
cidade natal, para onde eu voltaria em breve.
Eram tempos de Vida, Aroeira, Sol da Terra,
Vagão, Dizzy, Galheta, andanças pela Beira-
-mar... A bem da verdade, antes do Marcelo,
eu conheci o Maurício, o primeiro dos Muniz
que cruzou a minha vida. Depois, um/a a
um/a, fui conhecendo os demais integrantes
da icônica família que me marcou por moti-
vos distintos e em tempos variados.
Aquele show do Grupo Engenho encan-
tou a minha geração. Lembro que fui assistir
com minha prima Nice, que na infância havia
sido minha parceira, com todos os primos,
nas brincadeiras de boi de mamão. Tínha-
mos um boi completo, construído pelo vô
brincante Oswy, artesão e ex-dono de uma
fábrica de brinquedos de madeira. Nós duas
nos revezávamos na função da Maricota e
do Pai Mateus e, com os demais, invadíamos
os quintais das casas de amigos e parentes
para dançar o boi e passar o chapéu. Era lin-
do aquilo, uma alegria sem fim! Os jardins da
atual Macarronada Italiana foram palco de
vários dos nossos folguedos, lá pelos anos de
1970. Ao ouvir “Eu vou botá meu boi na rua”,
cantado e tocado com um vigor extraordiná-
rio, era impossível a gente não se comover
com aquela revisitação das nossas histórias,
brincadeiras e memórias. Além disso, a po-
tência musical do grupo ampliava – e muito
– os lugares de alcance de tudo o que se rela-
cionava com a “cultura local”.
Sempre gostei de estar no mundo e culti-
var certo nomadismo e, por muitos anos, não
dei muita importância a essas coisas de valori-
zar as raízes. Isso foi mudando quando resolvi
empreender um projeto, intitulado “América”,
que incluía um espetáculo inspirado na história
do meu bisavô paterno. O espetáculo circulou,
emocionou, deu o que falar e acabou servindo
de ponte para um convite que recebi no iní-
cio de 1996, o qual aceitei de forma despre-
tensiosa, mas responsável. Um grupo de em-
presários e gestores ligados ao turismo, sob a
liderança de Fernando Marcondes de Mattos,
queria criar um evento próprio de Floripa, uma
Bruxa da Ilha
Grafite sobre papel
3
espécie de Oktoberfest local. Tinham um nome para ele: Festival do Tivemos ainda uma terceira parceria criativa. Em Mágicos Nave-
Mar. Mas Fernando, na contramão da maior parte dos organizado- gadores, que se inspirava nas obras literárias e plásticas de Cas-
res, fazia questão de criar um espetáculo original que falasse sobre caes e de Meyer Filho. Marcelo pôde aliar seu talento para com-
a história e a cultura da cidade, só com artistas locais, envolvendo posições densas e profundas (que já tinha gerado obras-primas,
canto, música, dança e o que mais fosse possível. Todos achavam como Praia Brava, composta para Catharina) ao humor. A cena ci-
uma loucura. Ninguém iria ver. Melhor seria contratar uma banda nematográfica de abertura do espetáculo, com barcos conduzidos
pop nacional – Cidade Negra, Skank, qualquer uma dessas que en- por marujos e navegadores atravessando o palco, ganhava uma
chia estádio – e garantir público para o festival. Além disso, certa- dimensão épica sob sua conduta musical e uma iluminação primo-
mente a cidade não contava com artistas de nível para tamanho de- rosa. Por outro lado, a cena de guerra entre soldados portugueses
safio. Mas Fernando bateu o pé e me “encomendou” um espetáculo e espanhóis, com uma visão clownesca das batalhas produzidas
musical que já nascia com expectativa elevada. Encarei o desafio pelo Tratado de Tordesilhas, ganhava um tom leve e cômico com
como uma provocação pessoal: era uma questão de honra mostrar a música marcada pelo bom humor. Devo admitir que a relação
que a cidade tinha talentos de sobra e pesquisadores de peso para entre o diretor Osvaldo Gabrieli e o diretor musical Marcelo nem
dar conta do recado. Tínhamos apenas dois meses até a estreia de sempre foi harmônica. A diferença nos ritmos criativos (e bioló-
algo que ainda não tinha sequer embrião. Era preciso formar uma gicos) volta e meia demandava minha intervenção para manter o
equipe ágil, talentosa e sincronizada em tempo recorde. processo fluindo. Mas novamente o resultado foi arrebatador e a
Catharina, uma ópera da Ilha foi gestada a muitas mãos, e o contribuição do Marcelo não se deu somente na área musical, mas
Marcelo teve mais que duas nesse balaio. Além de exímio musicista também por intermédio do seu profundo conhecimento das coisas
e compositor talentoso, ele tinha profundo conhecimento dos “cau- e dos “causos” ilhéus, o que trazia um componente cósmico, trans-
sos” e das histórias da ilha, já que era discípulo de Cascaes e de- cendental a tudo o que passasse por suas mãos.
fensor ferrenho da cultura local. Mas nosso espetáculo tinha que Marcelo era muitos. Às vezes se revelava um menino carente,
ter ares contemporâneos, precisava unir tradição e contemporanei- ansioso para encontrar quem o escutasse com atenção e sem pres-
dade, segundo os padrões e as demandas da época. O time não sa, quem ouvisse seus lamentos e compreendesse suas susceti-
era fraco: Bebel Orofino, Lau Santos, Rafael Pereira Oliveira, Sylvio bilidades, que se traduziam com frequência em alta sensibilidade
Mantovani, Alejandro Ahmed, Fernando Torres (o Cebola, que de- musical. Outras vezes, agia como um lobo feroz, com uma língua
pois foi substituído pelo Jefferson Bittencourt), José Alfredo Beirão, ferina, defendendo as políticas para a cultura e as tradições popu-
Marcelo Muniz e eu, além de um grupo enorme de bailarinos (Cena lares que tanto tentou proteger e manter. Mas preservava sempre o
11), músicos, atores, cantores e um trio de senhoras cantadoras de coração doce e generoso, e o olhar curioso.
ratoeira do Canto da Lagoa. Marcelo compôs uma dúzia de músicas Quando comemorei quarenta anos, minha mãe estava muito
em poucas semanas, arranjou, ensaiou e esteve à frente do grupo doente, quase partindo. Fiz uma festa em família, uma espécie de
de músicos durante as seis apresentações da primeira versão, que despedida festiva, e convidei o Marcelo para tocar. Ele era o único
aconteceu em maio de 1996 (há exatamente 22 anos), e das várias “forasteiro”, de fora do contexto familiar. A festa aconteceu em uma
versões apresentadas ao longo dos três anos seguintes. noite estrelada, na Praia Brava, e ele me presenteou com sua Praia
Nos inúmeros e esgotantes ensaios feitos a toque de caixa, Brava ao piano, em um momento que me marcou de forma bastan-
Marcelo estava quase sempre atrasado, atrapalhado com tantos te significativa. Poucos meses depois, ele repetiu a dose tocando
instrumentos e cheio de ideias novas e “causos” curiosos para con- na missa de sétimo dia da minha mãe, como que selando esse nos-
tar. Suas piadas também tinham lugar garantido antes de dar iní- so encontro de almas. Quando o Marcelo faleceu, soube que havia
cio a qualquer rotina de trabalho. A logística desse processo era passado suas últimas noites dividindo o quarto com meu tio, irmão
complicada. Vários grupos criavam e ensaiavam ao mesmo tempo dela, que estava internado no mesmo hospital. A coincidência me
em locais distintos, e nós, do núcleo de criação, circulávamos pelos golpeou em cheio. Continuo me perguntando que recado foi esse
grupos fazendo a ponte, transportando músicas, imagens, sons e que recebi tardiamente.
ideias, de modo a dar alguma coesão àquele emaranhado criativo. Nos últimos tempos, ele andava dando cada vez mais vazão à
O resultado superou todas as expectativas, e o espetáculo marcou sua verve bruxólica, intuitiva, cosmovisionária, fazendo jus ao lega-
época pela forma peculiar com que uniu a pesquisa sobre as tradi- do que herdou dos bruxos ilhéus. Não era raro ouvi-lo falar sobre
ções a uma estética e linguagem contemporâneas, mas principal- outras dimensões ou sobre o desapego necessário a quem está de
mente por ter revelado à cidade um grupo de artistas comprome- partida. Sabemos que a perda precoce da filha lhe causava muito
tido e com talento de sobra. sofrimento e, de alguma forma, alimentava seu pendor para a in-
Catharina permaneceu em repertório por dois anos, época em trospecção; no entanto, não o impediu de se dedicar com afinco ao
que convivemos intensamente, e depois foi transformada em uma seu último projeto artístico, que teremos o prazer de apreciar em
versão pocket, chamada de Imaginária Ilha Catarina, que nos pos- breve, a produção solo Fogo no Rebojo, que contou com a partici-
sibilitou apresentar com mais frequência e participar da Expo 98, pação de alguns de seus principais parceiros musicais.
em Lisboa, cujo tema versava sobre “Os oceanos: um patrimônio Quando o Marcelo faleceu, liguei para minha amiga Bebel
para o futuro”, com o propósito de comemorar os 500 anos dos Orofino, e ela me disse, com afeto e tristeza, que eu integro o grupo
“descobrimentos” portugueses. Para Marcelo, participar daquele de viúvas dele, do qual ela certamente também faz parte. Creio que
trabalho era uma dádiva. Ele falava com prazer sobre a importância somos muitas viúvas do Marcelo: amigas, irmãs, amantes, admira-
do espetáculo naquele momento histórico. Ele era um entusiasta da doras, fãs confessas, parceiras artísticas... Marcelo partiu, mas nos
Catharina e, até recentemente, sempre que nos encontrávamos, in- deixou um legado fantástico, sonoro, espiritual, afetivo, imagético.
sistia para que retomássemos o projeto com uma versão atualizada Que o fogo sagitariano deste Mago singular continue nos aquecen-
do trabalho. do até o próximo encontro!
4
Do surf para a música: as ondas que inspiram
Por Emanuel de Souza Pereira compositores, e a música se tornou primordial sino médio, mais especificamente na Escola
na minha vida. Desde o início tocamos sempre Paschoal Apóstolo, mesmo tocando no Café
com liberdade total para improvisar e criar, de de La Musique (Jurerê Internacional) nos fins
uma maneira que ela fluísse naturalmente para de semana. Neste mesmo ano, comecei a es-
novos caminhos e que o público pudesse ser tudar música na Universidade do Estado de
levado por essas ondas sonoras. Foi então que, Santa Catarina (Udesc). Em 2010, passei no
antes da virada do milênio, gravamos nosso concurso da Fundação Catarinense de Cultura
primeiro CD, intitulado Em Improviso. (FCC) e, em 2012, fui convidado a retomar o
No início dos anos 2000, toda a Família Pa- projeto TAC 6 e Meia, que nos anos de 1980 e
padu se mudou para Florianópolis. Era chegada 1990 tinha o objetivo de promover, semanal-
a hora de cursarmos uma faculdade. Com em- mente, espetáculos de música, dança e teatro.
penho, eu e meus irmãos passamos no vestibu- Foi com base nesse conceito que surgiu o TAC
lar da Universidade Federal de Santa Catarina 7:30 (atual TAC 8 em Ponto), um projeto que
(UFSC). Na Ilha, um dos primeiros lugares que deu tão certo que em 2014 foi ampliado para o
tocamos foi no antigo Café Matisse, no Centro CIC 8:30 – Grandes Encontros.
Integrado de Cultura (CIC). E assim rapidamen- Em suma, trabalhar com eventos musicais
te fomos descobertos pela galera mais antena- como esses é a realização de um antigo sonho
Eu nasci em Ubatuba (SP), capital do surf. Sen- da da Ilha, pois éramos uma banda “cult”, di- desde a época em que eu participava como ar-
do assim, desde cedo eu já me dedicava a esse ferente de tudo o que rolava na cena cultural. tista em projetos semelhantes e uma grande
esporte. Entretanto, por ser filho do lendário Tocamos em todos os principais bares, parques satisfação, principalmente por poder acompa-
músico Dudu do Banjo, essa incipiente carreira e espaços culturais, assim como em grandes nhar o desenvolvimento da música catarinense,
não resistiu à verdade vocação para a música. eventos, casamentos e festivais. Nossa carreira das carreiras dos artistas e oportunizar apre-
Foi quando, nos anos de 1990, o papai Dudu, prosperava, tanto que diversas reportagens e sentações e encontros de grandes talentos da
ao ver que eu, meu irmão, Ícaro, e minha irmã, matérias foram feitas sobre a Família Papadu, música no estado.
Francisca, já estávamos seguindo o mesmo sobre o “Rei do Banjo”. Chegamos até a ser
caminho na música, logo formou uma banda convidados para a campanha de fim de ano
de família. Nessa ocasião, minha mãe, sempre de uma empresa de comunicação, ao lado de
muito participativa, nomeou o grupo de Banda grandes personalidades catarinenses. Enfim, • Emanuel Pereira é servidor efetivo da
Papadu. Florianópolis nos acolheu muito bem. Fundação Catarinense de Cultura (FCC) e
A partir desse momento eu passei a estu- Depois de me formar em 2008, cheguei a coordena os projetos TAC 8 em Ponto
dar obras de grandes guitarristas, baixistas e ministrar a disciplina de sociologia para o en- e CIC 8:30 – Grandes Encontros •
O rock Tudo começou quando fomos convidados e Como mais uma opção de apresentar nosso
Com o desejo de divulgar o trabalho, em vocalista Alex Turner, da banda Arctic Mon-
2017, lançamos um single chamado Desper- keys, que sintetiza o sentimento de que o rock
tador, que foi gravado e produzido em Belo está sempre presente e pode ser recriado por
Horizonte/MG por Fábio Della Giustina, ex-in- novos grupos ao redor do mundo: “o rock sim-
tegrante da Banda Aerocirco. Esse foi o pon- plesmente não vai embora. Ele pode hibernar
to de partida para a formação da banda, que de tempos em tempos, afundar no pântano [...]
possui mais dois integrantes, Bernardo Lajús mas ele sempre está lá, bem próximo, pronto
(guitarra) e Heyder Lentz (baixo) e, logo, para para voltar pelo lodo e entrar quebrando o teto
o início dos shows. Um ano depois, mais ama- de vidro, melhor do que nunca.”
durecidos, participamos do encerramento da Com esse espírito, queremos ter nossas his-
6ª Semana do Rock Catarinense, evento orga- tórias partilhadas por meio de nossa música,
Eu faço parte da banda Stella Folks, que sur- nizado pelo produtor Geraldo Borges que con- para todo o nosso povo. Porque acreditamos
giu em novembro de 2016. A Stella toca rock. tou com 46 shows, três documentários e três que o que é feito genuinamente, como o rock,
Somos inspirados pelos Beatles, Oasis, Rolling rodas de conversa e cujo objetivo é fortalecer fica pra sempre!
Stones e Arctic Monkeys, além de bandas na- o movimento autoral na cidade e discutir o fu-
cionais, como Legião Urbana, Barão Vermelho, turo de bandas e músicos. • Thiago Mates é hostess do
Centro Integrado de Cultura (CIC) e
e de extintas bandas de Floripa, como Aerocir-
membro da banda Stella Folks •
co, Samambaia e Tijuquera.
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Música & História
No século XVIII já existiam, na Vila de Nossa foi um dos mais prolíficos músicos de Des-
Senhora de Desterro, músicos que atuavam terro e que exerceu atividades como com-
em diferentes setores da sociedade, tanto no positor, regente, organista, instrumentista
âmbito profano quanto no âmbito sacro. Um e professor de música. Filho de Genoveva
dos espaços para a atuação desses músicos Francisca de Souza e do Padre Domingos
era proporcionado pelas irmandades e or- Francisco de Souza Coutinho, estudou com
dens terceiras, que realizavam uma série de Francisco Luiz do Livramento e Francisco de
eventos relacionados ao calendário religioso Souza Fagundes. Dividiu sua atuação pro-
e outros comemorativos, de cunho político e fissional entre cargos públicos e as ativi-
social. Essas associações foram instituídas dades de músico e provedor da Irmandade
na Ilha de Santa Catarina por meio dos imi- do Senhor Jesus dos Passos (1845-1849),
grantes portugueses, algumas ainda no sé- além de Irmão Ministro da Ordem Terceira,
culo XVIII, como a Venerável Ordem Terceira tendo sido eleito em 1855.
de São Francisco da Penitência, instalada em Coutinho iniciou sua atividade como pro-
1745; a Irmandade de Nossa Senhora do Ro- fessor de música em 1833; no ano de 1850,
sário dos Pretos, posteriormente Nossa Se- fundou a Sociedade Philarmônica, que tam-
nhora do Rosário e São Benedito, de 1750; bém dirigiu, e da qual, em algumas ocasiões,
e a Irmandade do Senhor Jesus dos Passos, participou como pianista, acompanhando
instituída em 1765. A documentação dessas cantoras.
instituições apresenta informações relevan- Em seu ofício como músico, atuou em
tes sobre a prática musical na cidade desde festividades, missas e procissões: na Ordem
as primeiras décadas de sua fundação. Terceira, foi músico entre 1830 e 1844, assim
Embora houvesse diversas associações como organista nas missas de domingo, em
religiosas em Desterro, durante esse período, 1834. De 1830 a 1837 e, em 1840, fez parte
foram evidenciadas apenas três delas, que, da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos.
além de serem as mais antigas, são as poucas Segundo Cabral (1951), compôs pe-
que ainda preservam em seus arquivos a do- ças sacras como um Te Deum, uma Missa
cumentação da época. Os dados obtidos com do Santíssimo Sacramento, Semana Santa,
base nessas fontes foram comparados a ou- Missa de Réquiem e alguns hinos — entre
tros documentos e revelam aspectos da vida eles, a melodia do Hymno Catharinense, o
musical em Desterro nos séculos XVIII e XIX. Hymno a suas Magestades Imperiaes e o
Considerando essas informações, surgem Hino à Virgem Nossa Senhora das Dores,
alguns questionamentos, quais sejam: Quem mencionado pel’O Cruzeiro do Sul como
eram esses músicos? Que atuação tiveram “composição poética do [...] Manoel de Araú-
no âmbito musical sacro e sociocultural de jo Porto-Alegre, e musical do [...] Comenda-
Desterro? Quais são as fontes documentais dor João Francisco de Souza Coutinho” (14
sobre a vida e a atuação desses músicos nes- abr. 1859).
se contexto? De sua produção, foram encontrados o
Nos acervos consultados, foi possível co- Hymno Catharinense, o Hymno a suas Ma-
letar informações sobre os mestres de capela, gestades Imperiaes, que até o momento não
referenciados frequentemente na documen- havia sido mencionado pela historiografia —
tação durante a segunda metade do século e o Te Deum em Do Maior.
XVIII e a primeira década do século XIX. Este último representa, até então, a pro-
Dentre os vários músicos que atuaram dução musical do repertório sacro composto
nesses espaços, um deles se destacou: em Desterro na primeira metade do século
João Francisco de Souza Coutinho (Des- XIX, e nos permite mais concretamente ter
terro, 29/03/1804 – idem, 11/09/1869). A uma noção de como era a música escrita na-
bibliografia disponível aponta que Coutinho quele período.
Fotos: Márcio H. Martins
Com data não especificada, esta obra foi localizada no acervo do cordas de uma orquestra, instrumentos de sopro (flauta, clarinete,
Museu da Inconfidência de Ouro Preto-MG, tendo sido escrita no sé- cornetim, trombone, oficleide) e percussão (bumbo), sendo que estes
culo XIX. Seu manuscrito apresenta apenas uma referência de que dois últimos grupos são característicos da instrumentação de bandas
ele teria sido “reformado pelo autor em 19 de junho de 1861, na do século XIX.
cidade de Desterro”, e copiado, possivelmente, no Rio de Janeiro, em É pertinente considerar que Coutinho tenha escrito para essa
1891, por Francisco Flores, como indica o frontispício abaixo. formação instrumental, pois eram os instrumentos que teria à dis-
posição em Desterro no momento da composição.
Frontispício do Te Deum de João Em se tratando da formação vocal, é curioso mencionar a ausência
F. S. Coutinho, anterior a 1861. de contraltos na peça, o que leva a questionar o motivo. Uma hipóte-
Fonte: Coleção Francisco Curt Lan- se a se considerar é que, da mesma forma que Coutinho usou vários
ge, Acervo de Documentos Musi- instrumentos, porque eram os que estavam disponíveis na banda
cais de Ouro Preto. (com exceção das cordas), o compositor não deveria ter à disposição
um coro completo para isso. Os jornais se referem como sendo um
Uma hipótese é que esta “coro dos empregados públicos e oficiais da Guarda Nacional”, ou
obra teria sido composta para seja, deviam ser homens em sua maioria (ou até mesmo na totalida-
a visita de D. Pedro II a Dester- de) — essa suposição também reforça a hipótese de que se trataria
ro, em 1845. Notícias descritas da mesma obra. Tais informações levam a outros questionamentos,
pelo jornal O Relator Cathari- tais como: quem seriam as sopranos? Talvez crianças?
nense (18 de outubro de 1845), De um amplo ponto de vista, e em função da época em que foi
criado exclusivamente para dar cobertura à vinda de D. Pedro II, re- composto, poder-se-ia mencionar que este Te Deum calha, aproxi-
latam sua chegada em 12 de outubro de 1845, mencionando que madamente, com o momento em que a atuação dos músicos e a prá-
um “solene Te Deum”, de autoria do compositor desterrense João tica musical se ampliavam a outros contextos de maneira mais evi-
Francisco de Souza Coutinho, foi “dignamente executado pelo Coro dente, expandindo do âmbito sacro e atingindo ambientes profanos,
de distintos empregados públicos, e oficiais da Guarda Nacional” ao fato revelado por meio de publicações dos jornais.
chegarem à Matriz desterrense. Embora tenham surgido outros espaços para a atuação dos mú-
A obra é dividida em 22 seções, para coro e solistas, e conjun- sicos, a priori, esse fato parece não ter afetado a prática musical efe-
to instrumental, e apresenta uma combinação de instrumentos de tuada nas associações religiosas.
8
Entrevista
9
Memória
Momentos
do conflito
Imagens da Guerra do Contestado
10
As fotos apresentadas retratam um dos momentos mais mar-
cantes da história de Santa Catarina: a Guerra do Contestado.
São imagens produzidas pelo fotógrafo Claro Gustavo Jansson,
que ficou conhecido como o “fotógrafo do Contestado”.
11
FCC quatro décadas
Arte e Cultura
em páginas
abertas
Aberta ao público desde agosto de 2017, a Biblioteca de Arte e Cul- Além da Curadoria de Coleções, também foi iniciado o projeto
tura da Fundação Catarinense de Cultura (FCC) oferece ao público “Uma Leitura Puxa Outra”, no qual são convidadas personalidades da
um acervo especializado em artes visuais, cinema, música, teatro, cultura para falar sobre suas referências literárias. Trata-se de uma
dança, patrimônio cultural, arquitetura e fotografia. Atualmente, são entrevista gravada e disponibilizada no site artecultura.inf.br.
aproximadamente duas mil obras distribuídas nas prateleiras desse Também foram programadas oficinas abertas ao público em geral
espaço cultural. sobre uma metodologia de organização de coleções, contado histó-
Por ser um acervo internacional muito especializado, com obras rias por meio dos artefatos e registrando a memória social. “A ideia
diferenciadas e apenas um exemplar por título, não é possível retirar é ampliar estas parcerias, para termos outros cursos e oficinas na
os livros. Mas eles estão disponíveis para consulta local. Vale destacar biblioteca. Temos um acervo riquíssimo que pode ser usado como
que o espaço possui obras que foram selecionadas pelo corpo técni- base; o que falta é pessoal que queira e goste de trabalhar com arte e
co da Diretoria de Difusão Artística da FCC especialmente para essa ensinar. Vale destacar que esse projeto só foi possível com a parceria
biblioteca. Elas foram compradas com recursos do Edital ProCultura de voluntários”, destaca Esni.
de Estímulo às Artes Visuais da Funarte e, aos poucos, o conjunto vai
crescendo com o auxílio de doações. A criação
“A ideia nasceu em um café da tarde com Cléber Teixeira. Três
anos depois e após muitas e muitas conversas e consultas, ao des-
Foto: Márcio H. Martins
12
Artes Cênicas
perspectiva
atravessada por contrassensos. Sendo assim,
depara-se, comumente, com os seguintes
comentários: não gostei, pois não entendi
contemporânea
nada; não captei a mensagem do espetáculo;
isso é coisa de louco. Diante disso, o desafio
está posto: como pensar possíveis modos de
recepção artística?
Dança
Linoleogravura
13
Compreende-se que dança cênica estabelece uma comunicação
entre obra e público. Mas opera diferentemente de modelos de
linguagens verbais baseados na produção de uma mensagem a ser
recebida por alguém. As artes do corpo estabelecem um diálogo
ético-estético com o público, geram uma experiência cognitiva
diferenciada, organizada sob outras lógicas de enunciação de ideias
e propostas.
De fato, a linguagem da dança opera por diversos símbolos (gestos,
movimentos corporais, música, silêncio, figurino, objetos cênicos, luz,
entre outros). As diferentes vias de acesso à aproximação de uma
dança causam a conexão e articulação particular de informações
socioculturais daqueles que assistem à obra artística. Isto é, uma
dança é capaz de gerar uma pluralidade de interpretações, diversas
atribuições de significados, uma vez que cada espectador constrói
relações segundo suas vivências e experiências de vida, sua
subjetividade individual e coletiva. Nesse aspecto, o espectador é
sujeito ativo na construção de sentidos.
A artista plástica Isis Ferreira Gasparini, por esse viés, defende
14
Cinema
O audiovisual é uma importante ferramen- A realização de uma mostra desta rele- a Mostra de Cinema Infantil tem investido
ta educativa que, quando trabalhado desde vância não teria sido possível sem o apoio cada vez mais na capacitação de produtores
a infância, pode oferecer uma grande contri- do Governo do Estado de Santa Catarina, e realizadores locais, por meio dos fóruns e
buição à construção de uma sociedade mais por meio de editais e de leis de incentivo, e encontros que já acontecem dentro do festi-
justa e igualitária. Por isso, valorizar e investir a confiança de empresas privadas e estatais val. Com foco nesse setor, realizamos no mês
nas nossas crianças é também cuidar da so- que desde o começo desta trajetória têm se de outubro o encontro de Mercado e Conteú-
ciedade, o que acaba por desenhar um futuro empenhado em concretizar esse projeto, o do de Ficção, Animação e Games. O objetivo
com pessoas economicamente produtivas e que confirma a importância de mecanismos foi reforçar o potencial das indústrias de ani-
pensantes. Por isso a importância de um fes- de apoio e incentivo para o fomento à produ- mação e games de Santa Catarina e consoli-
tival dedicado à infância. ção e à promoção de iniciativas culturais. dar a vocação de Florianópolis na produção
Ao chegar à sua 17ª edição, a Mostra de Importantes para a cadeia produtiva, polí- de conteúdo para a infância. É um incentivo
Cinema Infantil — realizada em duas etapas, ticas culturais de ação afirmativa como estas da mostra para formar e capacitar o mercado
que somaram 17 dias de programação gra- fomentam o mercado e servem de estímulo e construir, com os estados do Paraná e do
tuita e inclusiva — recebeu cerca de 20 mil às empresas e ao desenvolvimento da indús- Rio Grande do Sul, uma indústria criativa de
pessoas, número que nos faz cada vez mais tria tecnológica. Isso pode ser constatado no nível internacional.
reafirmar o nosso compromisso com as crian- estado de Santa Catarina, que reúne pelo me- Com isso, esperamos também contribuir
ças, dando voz à sua pluralidade e às suas di- nos 10 importantes produtoras de animação para que Santa Catarina tenha mão de obra
ferenças. Ao longo de todos esses anos, exi- e 20 produtoras de ficção, além de faculda- qualificada para acompanhar esse crescimen-
bimos mais de mil filmes protagonizados por des de cinema e outras iniciativas, como es- to e desejamos que essas produções ultra-
crianças e ampliamos, a cada edição, o olhar colas e empresas especializadas em games, passem o uso da linguagem audiovisual como
e a programação para o público adulto. Afi- revelando um nicho em expansão quando o mercadoria, provocando uma reflexão crítica
nal, é também com essa plateia, formada por assunto é produção de animação e games. nos produtores, nos realizadores e no público,
mães, pais, educadores, produtores e realiza- Sendo assim, atenta à capacitação de até porque esse assunto não se esgota aqui.
dores, que devemos dialogar. realizadores locais e ao fomento da produção, Ele merece ser visto e debatido por todos!
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Teatro
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Poesia
Rascunho a
Cruz e Sousa
Osvaldo Domingos Ferreira
Poeta
cisne negro
príncipe de tudo que é principal
corpo onde o poema habita
hábito de não ser banal
trissípulo de todas as estações
discípulo de si
arauto do inusitado
de ti pouco ainda foi dito
do pouco que foi notado
estrela do infinito
canto para ser encantado
Natureza morte
Têmpera sobre papel
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Personalidades
Sem Janga
Fernando Lindote
Artista plástico
Janga
Menina com gato no colo
No dia 18 de agosto, Santa Catarina per- exposições, crítica, divulgação e promoção Recentemente Janga foi curador da expo-
deu o artista João Otávio Neves Filho, nasci- da arte catarinense - em especial - de Floria- sição “Pléticos – Espaço, Geometria e Cons-
do em Florianópolis em 1946. nópolis. Foi o idealizador da galeria de artes trução”, em homenagem ao artista croata,
Janga, como era conhecido, teve forte li- Casa Açoriana: Artes e Tramoias Ilhoas, em radicado em Santa Catarina, Sílvio Pléticos,
gação com a arte e a cultura, com vasto currí- 1985, em Santo Antônio de Lisboa. Também no Museu de Arte de Santa Catarina (MASC).
culo no campo das artes visuais, curadoria de foi membro do Conselho Estadual de Cultura.
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Museus
Os 70 anos
do MASC
O Museu de Arte de Santa Catarina (MASC)
Susana Bianchini
Administradora do MASC
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Luiz Henrique Schwanke (Joinville-SC, 1951-1992)
S/título 1987 - da série Carrancas
Técnica mista
Acervo MASC
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