HC 193726 Ed

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Supremo Tribunal Federal

EMB.DECL. NO HABEAS CORPUS 193.726 PARANÁ

RELATOR : MIN. EDSON FACHIN


EMBTE.(S) : LUIZ INACIO LULA DA SILVA
ADV.(A/S) : CRISTIANO ZANIN MARTINS E OUTRO(A/S)
EMBDO.(A/S) : SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

DECISÃO:
1. Relatório.
Trata-se de questão que agora vem de ser exposta no habeas corpus
impetrado em 3.11.2020 em favor de Luiz Inácio Lula da Silva, no qual se
aponta como ato coator o acórdão proferido pela Quinta Turma do
Superior Tribunal de Justiça nos autos do Agravo Regimental no Recurso
Especial n. 1.765.139, no ponto em que foram refutadas as alegações de
incompetência do Juízo da 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de
Curitiba para o processo e julgamento da Ação Penal n. 5046512-
94.2016.4.04.7000, indeferindo-se, por conseguinte, a pretensão de
declaração de nulidade dos atos decisórios nesta praticados.
A impetração é recente (3.11.2020), e pela vez primeira assim
apresentada originalmente em relação à ação penal em tela, suscita teses e
precedentes que, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, foram
moldando a definição da competência da 13ª Vara Federal da Subseção
Judiciária de Curitiba até o tempo presente. O tema, com efeito, diante de
situações similares julgadas pelo Tribunal, nada obstante nos quais restei
vencido, atingiu desenvolvimento que propicia, superado o ciclo de
maturação temática, análise das respectivas alegações aqui deduzidas.
Levei a efeito presentemente no último recesso (a partir de 19 de
dezembro e durante o mês de janeiro deste ano de 2021) exame dessa
matéria (posta em termos originais na impetração de novembro de 2020),
cotejando a linha evolutiva de seus contornos nesses últimos anos, e ao
começo desse período forense restou possível concluir e agora apresentar,
em sede dessa prestação jurisdicional, a resposta racional e sistemática à
impetração e suas alegações, como sustentam na inicial e petições.
Após declinar argumentos pelos quais entende viável o ajuizamento
da pretensão na via do habeas corpus, sustentam os impetrantes, em
síntese, que, nos fatos atribuídos ao ora paciente “não há correlação entre os

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desvios praticados na Petrobras e o custeio da construção do edifício ou das


reformas realizadas no tal tríplex, feitas em benefício e recebidas pelo Paciente”
(Doc. 1).
Afirmam, sob tal ponto de vista, que a hipótese se assemelha ao
entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal por
ocasião do julgamento do INQ 4.130 QO, segundo o qual a 13ª Vara
Federal da Subseção Judiciária de Curitiba seria competente apenas para
o julgamento dos fatos que vitimaram a Petrobras S/A, sendo imperativa
a observância, em relação aos demais, às regras de distribuição da
competência jurisdicional previstas no ordenamento jurídico.
Requerem a concessão da ordem de habeas corpus para declarar a
incompetência do Juízo da 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de
Curitiba e, por consequência, a nulidade dos atos decisórios proferidos na
Ação Penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000. Subsidiariamente, caso não
conhecida a impetração, postulam pela concessão da ordem de habeas
corpus ex officio, nos termos do art. 654, § 2º, do Código de Processo Penal
e do art. 193, II, do RISTF.
Adicionalmente, asseverando que elementos de informação
acostados aos autos do INQ 4.781, de Relatoria do eminente Ministro
Alexandre de Moraes; da ADPF n. 605, de Relatoria do eminente Ministro
Dias Toffoli; e da PET 8.403, de Relatoria do eminente Ministro Ricardo
Lewandowski, interessam à defesa do paciente, pugnam pela consulta
aos eminentes Ministros “sobre a possibilidade de compartilhamento do acervo
de mensagens trocadas entre os procuradores da República e o então MM. Juiz de
piso, entre outras autoridades, que digam respeito, direta ou indiretamente, ao
aqui Paciente e que estejam acauteladas nos citados feitos” (Doc. 1).
Por meio de despacho proferido em 5.11.2020 (Doc. 22),
considerando o objeto da pretensão deduzida na impetração, na qual se
aponta a divergência da jurisdição prestada pelas instâncias de origem do
entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do
INQ 4.130 QO, afetei ao Plenário a análise e deliberação do mérito do
presente habeas corpus, nos termos dos arts. 6º, II, “c”; 21, I e XI; e 22,
parágrafo único, “b”, todos do RISTF.

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Em petição protocolizada em 10.11.2020, os impetrantes opuseram


embargos de declaração em face do aludido despacho, assentando a
ocorrência de obscuridade nos fundamentos acerca da adesão do caso sob
análise às hipóteses de afetação de processos por iniciativa do relator ao
Plenário do Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 22, parágrafo
único, do RISTF.
Aduzem, no recurso integrativo, a existência de tese jurídica já
uniformizada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, razão pela qual
a resolução da questão demandaria tão somente a verificação da sua
incidência ao caso concreto.
Sustentam, ainda, que “o dever de obediência à jurisprudência
orientadora outrora firmada pelo órgão Plenário não constitui apenas um critério
uniformizador de conveniência, mas um imperativo imposto por lei” (Doc. 24, fl.
7), referindo-se ao disposto no art. 927, V, do Código de Processo Civil.
Pretendem, ao fim, o conhecimento e acolhimento dos embargos
declaratórios, atribuindo-lhes efeitos infringentes, para “reafirmar a
competência da 2ª Turma do Egrégio Supremo Tribunal Federal para conhecer e
julgar o habeas corpus em questão” (Doc. 27, fl. 13).
É o relatório. Decido.

2. Dos embargos declaratórios.

Principio destacando que o recurso integrativo volta-se contra


despacho de afetação do julgamento do presente writ ao Plenário do
Supremo Tribunal Federal, circunstância que impõe a deliberação
unipessoal da insurgência, nos termos do art. 1.024, § 2º, do Código de
Processo Civil, aplicável ao caso por força do disposto no art. 3º do
Código de Processo Penal.
No entanto, a irrecorribilidade do ato decorre de expressa previsão
legal (art. 1.001 do Código de Processo Civil) e regimental (art. 305 do
RISTF), cabendo frisar, conforme já destacado no despacho embargado,
que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento
do HC 143.333, realizado em 12.4.2018, assentou que “compete ao Relator,

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de maneira discricionária, a remessa de feitos ao Tribunal Pleno para julgamento,


pronunciamento que, a teor do art. 305, RISTF, afigura-se irrecorrível”.
Na oportunidade, assentei que inexiste impedimento de que
determinadas matérias sejam submetidas ao crivo do Tribunal Pleno.
Nada obstante o não cabimento da insurgência, impende consignar
que, de fato, a causa de pedir subjacente à pretensão deduzida nesta
impetração aborda questão cujos contornos já foram submetidos não só
ao crivo do Plenário do Supremo Tribunal Federal, por ocasião do
julgamento do INQ 4.130 QO, em 23.9.2015, mas da própria Segunda
Turma, conforme consignado pelos embargantes no Doc. 24, em diversos
procedimentos atinentes à denominada Operação Lava Jato nos quais se
deliberou, a partir do aludido precedente, sobre a competência da 13ª
Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba.
Nessa ambiência, revogo o despacho de afetação do presente habeas
corpus ao Plenário do Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 21, I,
do RISTF.

3. Do mérito do habeas corpus.

Aplico aqui o entendimento majoritário que veio se formando e


agora já se consolidou no colegiado. E o faço por respeito à maioria, sem
embargo de que restei vencido em numerosos julgamentos.
Cuidando-se de ação constitucional vocacionada à tutela do direito
de locomoção, o procedimento do habeas corpus é dotado de instrumentos
aptos à pronta neutralização ou remediação dos efeitos que emanam do
ato coator sobre a liberdade do indivíduo, restabelecendo-se, à medida
em que se revelam violadas mediante prova pré-constituída, as garantias
processuais penais que regem a responsabilização criminal no Estado de
Direito democrático.
Esse é o escopo da norma que se extrai do art. 192, caput, do RISTF, o
qual atribui ao Relator competência para denegar ou conceder a ordem
de habeas corpus, de pronto, “[Q]uando a matéria for objeto de jurisprudência
consolidada do Tribunal”.

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No presente writ, de forma inédita, ao menos no que toca à ação


penal subjacente (Ação Penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR), a defesa
técnica do paciente submete ao Supremo Tribunal Federal pretensão de
reconhecimento da incompetência da 13ª Vara Federal da Subseção
Judiciária de Curitiba para o processo e julgamento da denúncia ali
oferecida, sob a alegação de que “não há correlação entre os desvios
praticados na Petrobras e o custeio da construção do edifício ou das reformas
realizadas no tal tríplex, em tese, feitas em benefício e recebidas pelo Paciente;
nem, tampouco, vínculo inerente às imputações julgadas improcedentes” (Doc.
1, fls. 24-25).
Nessa ambiência, cumpre perscrutar, a partir do precedente firmado
pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento da
questão de ordem suscitada no INQ 4.130, os contornos jurisprudenciais
já delineados pela Segunda Turma para a definição da competência da 13ª
Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba no que toca às ações de
responsabilização criminal relacionadas à denominada “Operação Lava
Jato”.

3.1. Precedentes.

Impende aqui rememorar como veio se formando a definição da


competência.
No âmbito do Supremo Tribunal Federal, o exercício da jurisdição
sobre procedimentos penais relacionados à Operação Lava Jato teve início
com a protocolização do HC 121.918, em 31.3.2014, impetrado em favor
de Paulo Roberto Costa com o propósito de revogação da prisão
preventiva decretada pelo Juízo da 13ª Vara Federal da Subseção
Judiciária de Curitiba/PR, distribuído ao saudoso Ministro Teori
Zavascki.
A custódia cautelar foi decretada no contexto de investigação
deflagrada para a apuração de ilícitos praticados em detrimento da
Petrobras S/A, sociedade de economia mista na qual o aludido
investigado exercia o cargo de Diretor de Abastecimento, nos quais

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estariam envolvidos agentes políticos e empreiteiras dispostas ao


pagamento de vantagens indevidas para a celebração de contratos.
Desde então uma quantidade considerável de pretensões foi
deduzida nesta Corte em face de decisões proferidas pelas instâncias de
origem (Tribunal Regional Federal da 4ª Região e Superior Tribunal de
Justiça), dentre as quais destaca-se, para o deslinde do objeto da presente
impetração, os questionamentos em torno da competência da 13ª Vara
Federal da Subseção Judiciária de Curitiba.
De início, destaco a RCL 17.623, na qual, diante de notícias de
envolvimento de agente público detentor de foro por prerrogativa de
função nos fatos investigados e do desmembramento operado pelo Juízo
da 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba, o Ministro Teori
Zavascki deferiu medida liminar para determinar o sobrestamento de
todos os inquéritos e ações penais ali em trâmite, com a remessa dos
respectivos autos ao Supremo Tribunal Federal.
Na sequência, foram autuadas nesta Corte as Ações Penais de ns. 871
a 878, nas quais o saudoso Relator suscitou questão de ordem perante a
Segunda Turma que, em sessão de julgamento realizada em 10.6.2014, à
unanimidade de votos, assentou a compreensão de que o
desmembramento de investigações e ações penais envolvendo agentes
detentores de foro por prerrogativa de função, nos termos do art. 102, I,
“b” e “c”, da Constituição Federal, compete exclusivamente ao Supremo
Tribunal Federal.
A propósito:

Ementa: AÇÃO PENAL. QUESTÃO DE ORDEM.


COMPETÊNCIA POR PRERROGATIVA DE FORO.
DESMEMBRAMENTO DE INVESTIGAÇÕES E AÇÕES
PENAIS. PRERROGATIVA PRÓPRIA DA SUPREMA CORTE. 1.
O Plenário desta Suprema Corte mais de uma vez já decidiu
que ‘é de ser tido por afrontoso à competência do STF o ato da
autoridade reclamada que desmembrou o inquérito,
deslocando o julgamento do parlamentar e prosseguindo
quanto aos demais’ (Rcl 1121, Relator(a): Min. ILMAR

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GALVÃO, Tribunal Pleno, julgado em 04/05/2000, DJ 16-06-2000


PP-00032 EMENT VOL-01995-01 PP-00033). Nessa linha de
entendimento, decidiu o Plenário também que, ‘até que esta
Suprema Corte procedesse à análise devida, não cabia ao Juízo
de primeiro grau, ao deparar-se, nas investigações então
conjuntamente realizadas, com suspeitos detentores de
prerrogativa de foro - em razão das funções em que se
encontravam investidos -, determinar a cisão das investigações
e a remessa a esta Suprema Corte da apuração relativa a esses
últimos, com o que acabou por usurpar competência que não
detinha’ (Rcl 7913 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI,
Tribunal Pleno, julgado em 12/05/2011, DJe-173 DIVULG 08-09-
2011 PUBLIC 09-09-2011 EMENT VOL-02583-01 PP-00066). 2.
Por outro lado, a atual jurisprudência do STF é no sentido de
que as normas constitucionais sobre prerrogativa de foro devem
ser interpretadas restritivamente, o que determina o
desmembramento do processo criminal sempre que possível,
mantendo-se sob a jurisdição especial, em regra e segundo as
circunstâncias de cada caso, apenas o que envolva autoridades
indicadas na Constituição (Inq 3515 AgR, Relator(a): Min.
MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 13/02/2014). 3.
No caso, acolhe-se a promoção do Procurador-Geral da
República, para determinar o desmembramento dos
procedimentos em que constam indícios de envolvimento de
parlamentar federal, com a remessa dos demais à primeira
instância, aí incluídas as ações penais em andamento. (AP 871
QO, Rel.: TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em
10.6.2014)

Não houve, na ocasião, deliberação acerca da definição da


competência do Juízo da 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de
Curitiba, conforme anotado pelo saudoso Ministro Teori Zavascki em
decisão monocrática proferida nos autos da RCL 17.623 em 21.8.2014:

“Resta claro, portanto, que o tema da competência de


foro não foi apreciado pela 2ª Turma do STF, que não o fez

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pelo motivo indicado: de que se trata de tema sujeito, por


enquanto, às vias ordinárias.
(...)
No caso, a defesa pretende obter juízo exaustivo do caso,
de possível incompetência do juízo de origem, o que configura
matéria estranha ao âmbito da reclamação e que sequer foi
arguida na inicial.
Não se nega a relevância dos argumentos aduzidos
quanto ao mérito do tema, ou seja, da configuração de hipótese
de incompetência. Pelo contrário: as alegações nesse sentido
tem, em grande medida, o beneplácito do próprio Ministério
Público que oficia perante o juízo reclamado (documento
comprobatório 199). Não obstante, o que se enfatiza é que essa
matéria, ainda que relevante em seu mérito, não se comporta na
via estreita da presente reclamação” (destaquei).

A Operação Lava Jato passou, desde então, a se desenvolver de


forma concomitante perante o Supremo Tribunal Federal, em relação aos
fatos envolvendo agentes investidos nos cargos elencados no art. 102, I,
“b” e “c”, da Constituição Federal; bem como na 13ª Vara Federal da
Subseção Judiciária de Curitiba no tocante aos demais.
Cumpre anotar, nesse passo, que na PET 7.670 objetivava-se a
atribuição de efeito suspensivo ao recurso extraordinário interposto pelo
ora impetrante contra o acórdão proferido no julgamento da apelação
criminal subjacente. Nada obstante, o pedido foi julgado prejudicado em
razão da não admissão do respectivo recurso. Houve interposição de
agravo regimental no qual se aventou a incompetência da 13ª Vara
Federal, mas a defesa manifestou desistência e o tema não foi deliberado.
No prosseguimento, o avanço das investigações revelou que a
atuação dos agentes políticos e das empreiteiras não era circunscrita
apenas às contratações realizadas no âmbito da Petrobras S/A, mas
espraiada a outros órgãos públicos, sociedades de economia mista e
empresas públicas, em detrimento dos quais foi detectado semelhante
modus operandi.
Nesse contexto, nos autos do INQ 4.130, cujo objeto era a suposta

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prática de ilícitos no âmbito do Ministério do Planejamento, Orçamento e


Gestão, inicialmente distribuído por prevenção ao Ministro Teori
Zavascki, mas redistribuídos ao eminente Ministro Dias Toffoli, foi
suscitada questão de ordem, diante da irresignação manifestada pela
Procuradoria-Geral da República, para a delimitação do âmbito cognitivo
das causas penais afetas à Operação Lava Jato e a definição do juízo
competente para o prosseguimento das investigações, diante da
necessidade de desmembramento em relação aos não detentores de foro
por prerrogativa de função.
Em julgamento realizado em 23.9.2015, o Plenário do Supremo
Tribunal Federal assentou, a partir do voto proferido pelo eminente
Ministro Dias Toffoli, a ausência de “dependência recíproca entre esses fatos,
geneticamente relacionados, em tese, à gestão de empréstimos consignados no
Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, e a apuração de fraudes e
desvio de recursos no âmbito da Petrobras” (INQ 4.130 QO, Inteiro teor do
acórdão), a exigir, na definição do juízo competente para a destinação dos
procedimentos decorrentes do desmembramento, a observância ao “iter
de concretização da jurisdição” como previsto no ordenamento jurídico
em vigor.
Definiu-se, em resumo, que a prevenção do saudoso Ministro Teori
Zavascki no âmbito do Supremo Tribunal Federal, assim como a da 13ª
Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba, no contexto da
“Operação Lava Jato”, seria restrita aos fatos relacionados a ilícitos
praticados apenas em detrimento da Petrobras S/A. Veja-se:

EMENTA Questão de ordem no inquérito. Processual


Penal. Crimes relacionados ao Ministério do Planejamento,
Orçamento e Gestão. Indícios de participação de Senadora da
República em ilícito penal. Remessa dos autos ao Supremo
Tribunal Federal. Desmembramento do feito em relação a
investigados não detentores de prerrogativa de foro.
Possibilidade. Inexistência de prejuízo para a causa.
Precedentes. Prevenção de Ministro da Corte que supervisiona
as investigações de crimes relacionados à Petrobras.

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Inexistência. Ausência de conexão entre os fatos reconhecida


pela Presidência da Corte. Imbricação da matéria com o
desmembramento do feito e seus consectários. Necessidade de
seu exame para a determinação do juízo de primeiro grau
competente para processar e julgar o feito desmembrado.
Crimes de organização criminosa, lavagem de dinheiro,
falsidade ideológica e corrupção passiva. Colaboração
premiada. Delação de crimes não conexos com a investigação
primária. Equiparação ao encontro fortuito de prova. Aplicação
das regras de determinação, de modificação e de concentração
da competência. Inexistência de prevenção, pelas mesmas
razões, tanto de Ministro da Corte quanto de juízo de origem.
Crimes que, em sua maioria, se consumaram em São Paulo.
Circunstância que justifica a sua atração para a Seção Judiciária
daquele estado. Ressalva quanto à posterior apuração de outras
infrações conexas que, por força das regras do art. 78 do Código
de Processo Penal, justifiquem conclusão diversa quanto ao foro
competente. Remessa do feito desmembrado à Seção Judiciária
de São Paulo para livre distribuição, independentemente da
publicação do acórdão. Intangibilidade dos atos praticados na
origem, tendo em vista a aplicação da teoria do juízo aparente.
Precedente. 1. O Supremo Tribunal Federal assentou o
entendimento de que o desmembramento do feito em relação a
imputados que não possuam prerrogativa de foro deve ser a
regra, diante da manifesta excepcionalidade da competência
ratione muneris, ressalvadas as hipóteses em que a separação
possa causar prejuízo relevante. Precedentes. 2. Ausente
potencial e relevante prejuízo que justifique o simultaneus
processus, impõe-se o desmembramento do inquérito em
relação a todos os investigados que não detêm prerrogativa de
foro, a fim de que a investigação prossiga perante a Suprema
Corte tão somente em relação à Senadora da República. 3. A
colaboração premiada, como meio de obtenção de prova, não
constitui critério de determinação, de modificação ou de
concentração de competência. 4. A competência para processar
e julgar os crimes delatados pelo colaborador que não sejam

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conexos com os fatos objeto da investigação matriz dependerá


do local em que consumados, de sua natureza e da condição
das pessoas incriminadas (prerrogativa de foro). 5. Os
elementos de informação trazidos pelo colaborador a respeito
de crimes que não sejam conexos ao objeto da investigação
primária devem receber o mesmo tratamento conferido à
descoberta fortuita ou ao encontro fortuito de provas em outros
meios de obtenção de prova, como a busca e apreensão e a
interceptação telefônica. 6. A prevenção, essencialmente, não é
um critério primário de determinação da competência, mas sim
de sua concentração, razão por que, inicialmente, devem ser
observadas as regras ordinárias de determinação da
competência, tanto ratione loci (art. 70, CPP) quanto ratione
materiae. 7. Nos casos de infrações conexas, praticadas em
locais diversos, hão de ser observadas as regras de
determinação do foro prevalente previstas no art. 78 do Código
de Processo Penal, uma vez que a conexão e a continência
importam em unidade de processo e julgamento. 8. A
prevenção, nos termos do art. 78, II, c, do Código de Processo
Penal, constitui critério residual de aferição da competência. 9.
Não haverá prorrogação da competência do juiz processante -
alargando-a para que conheça de uma causa para a qual,
isoladamente, não seria competente -, se não estiverem
presentes i) uma das hipóteses de conexão ou de continência
(arts. 76 e 77, CPP) e ii) uma das hipóteses do art. 78, II, do
Código de Processo Penal. 10. Como já decidido pelo Supremo
Tribunal Federal, “a conexão intersubjetiva ou instrumental
decorrente do simples encontro fortuito de prova que nada tem
a ver com o objeto da investigação principal não tem o condão
de impor o unum et idem judex”. Do mesmo modo, “o simples
encontro fortuito de prova de infração que não possui relação
com o objeto da investigação em andamento não enseja o
simultaneus processus” (RHC nº 120.379/RO, Primeira Turma,
Relator o Ministro Luiz Fux, DJe de 24/10/14). 11. Ainda que o
juízo de origem, com base nos depoimentos do imputado
colaborador e nas provas por ele apresentadas, tenha decretado

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prisões cautelares e ordenado a quebra de sigilos bancário ou


fiscal e a realização de busca e apreensão ou de interceptação
telefônica, essas medidas, por si sós, não geram sua prevenção,
com base no art. 83 do Código de Processo Penal, caso devam
ser primariamente aplicadas as regras de competência do art. 70
do Código de Processo Penal (local da consumação) ou do art.
78, II, a ou b, do Código de Processo Penal (determinação do
foro prevalente, no caso de conexão ou continência). 12. Os
ilícitos em apuração nos procedimentos encaminhados pelo
juízo da 13ª Vara da Seção Judiciária do Paraná se referem,
dentre outros fatos, a repasses de valores por empresa
prestadora de serviços de informática na gestão de
empréstimos consignados de servidores federais, no âmbito
do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, com a
utilização, em tese, de notas fiscais falsas e de empresas de
fachada. 13. Não há relação de dependência entre a apuração
desses fatos e a investigação de fraudes e desvios de recursos
no âmbito da Petrobras, a afastar a existência de conexão (art.
76, CPP) e de continência (art. 77, CPP) que pudessem ensejar
o simultaneus processus, ainda que os esquemas fraudulentos
possam eventualmente ter um operador comum e destinação
semelhante (repasse de recursos a partido político ou
candidato a cargo eletivo). 14. O fato de a polícia judiciária ou o
Ministério Público Federal denominarem de “fases da operação
Lava-jato” uma sequência de investigações sobre crimes
diversos - ainda que sua gênese seja a obtenção de recursos
escusos para a obtenção de vantagens pessoais e financiamento
de partidos políticos ou candidaturas - não se sobrepõe às
normas disciplinadoras da competência. 15. Nenhum órgão
jurisdicional pode-se arvorar de juízo universal de todo e
qualquer crime relacionado a desvio de verbas para fins
político-partidários, à revelia das regras de competência. 16. A
mesma razão (inexistência de conexão) que motivou o não
reconhecimento da prevenção de Ministro da Suprema Corte
que supervisiona a investigação de crimes relacionados à
Petrobras estende-se ao juízo de primeiro grau. 17. Na

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Supremo Tribunal Federal

HC 193726 ED / PR

determinação do foro prevalente, constata-se a existência de


veementes indícios de que a suposta organização criminosa, ora
investigada, estaria radicada em São Paulo, onde também teria
sido emitida a maior parte das notas fiscais supostamente falsas
e ocorrido a maior parte das movimentações e repasses de
recursos, por meio de condutas que, em tese, poderiam tipificar
crimes de lavagem de dinheiro. 18. Ademais, a denúncia já
oferecida perante o Supremo Tribunal Federal pela
Procuradoria-Geral da República, contra investigado não
detentor de prerrogativa de foro, por infração ao art. 2º, § 1º, da
Lei nº 12.850/13, descreve que esse crime se consumou em São
Paulo (capital). 19. Considerando que o ilícito tipificado no art.
12.850/13 e a maior parte dos crimes de lavagem de dinheiro e
de falsidade ideológica se consumaram em São Paulo, justifica-
se a atração de todos eles para a Seção Judiciária do Estado de
São Paulo, ressalvada a posterior apuração de outras infrações
conexas que, por força das regras do art. 78 do Código de
Processo Penal, justifiquem conclusão diversa quanto ao foro
prevalente. 20. A questão de ordem se resolve no sentido do
desmembramento do feito, a fim de que a investigação prossiga
perante a Suprema Corte somente em relação à autoridade com
prerrogativa de foro, com a consequente remessa de cópia dos
autos à Seção Judiciária do Estado de São Paulo,
independentemente da publicação do acórdão, para livre
distribuição, preservada a validade dos atos praticados na
origem, inclusive medidas cautelares, dentre as quais a prisão
preventiva de um dos investigados, tendo em vista a aplicação
da teoria do juízo aparente (HC nº 81.260/ES, Pleno, Relator o
Ministro Sepúlveda Pertence, DJ de 19/4/02). (Inq 4130 QO, Rel.:
DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 23.9.2015 –
destaquei).

A partir de então, com o avanço das investigações e acordos de


colaboração premiada firmados por agentes envolvidos nas práticas
delituosas, os quais revelaram detalhes acerca da extensão e dos modos
de atuação do grupo criminoso organizado, não foram poucas as

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HC 193726 ED / PR

pretensões de reconhecimento da incompetência do Juízo da 13ª Vara


Federal da Subseção Judiciária de Curitiba que aportaram ao Supremo
Tribunal Federal, seja no exercício da sua competência originária –
principalmente na remessa de termos de depoimento de colaboradores
aos juízos aparentemente competentes –, seja nos inúmeros recursos e
habeas corpus aforados contra decisões proferidas pelas instâncias de
origem, precisamente como ocorre no caso sob análise.
Diante do surgimento de inúmeras situações limítrofes, sempre
tendo como paradigma o precedente firmado no INQ 4.130 QO, o
refinamento do escrutínio do tema teve ambiência predominante na
Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, Órgão Colegiado no qual
tinha assento o saudoso Ministro Teori Zavascki até o seu trágico
falecimento em 19.1.2017, relatoria que passei a exercer em decorrência da
sucessão à Sua Excelência.
Elucidativos do nível de complexidade que envolve o juízo de
imbricação entre os fatos supervenientes revelados e o objeto da
“Operação Lava Jato” – por consequência, da competência do Juízo da 13ª
Vara Federal de Curitiba –, foram os debates travados na Segunda Turma
por ocasião do julgamento da PET 6.863 AgR, de minha relatoria.
Cuidava-se de termos de depoimento prestados por colaboradores
ligados ao Grupo Odebrecht, nos quais foram relatados fatos que, de
acordo com a Procuradoria-Geral da República “configurariam ‘crimes
praticados em relação à obra Refinaria Abreu e Lima – RNEST-CONEST,
relacionados a dois contratos celebrados pela Companhia (CNO), em
consórcio com a OAS, com a Petrobrás, ambos em 19.12.2009, para: (i)
execução de serviços e fornecimentos necessários à implantação das
unidades de hidrotratamento de diesel, hidrotratamento de nafta e
geração de hidrogênio (HDT), no valor de R$ 3.190.646.503,15)’” (PET
6.863, decisão de 4.4.2017).
Diante da ausência de menção a agentes detentores de foro por
prerrogativa de função no Supremo Tribunal Federal, por força de
decisão proferida em 4.4.2017, tais termos de depoimento foram
encaminhados à 13ª Vara Federal de Curitiba, diante da notícia da

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HC 193726 ED / PR

existência de procedimento ali deflagrado para a apuração de fatos


semelhantes, conforme também à época exposto pela Procuradoria-Geral
da República.
Tal decisão foi objeto de agravo regimental interposto por um dos
implicados nos fatos relatados, ao qual a Segunda Turma, em deliberação
na qual restei vencido levada a efeito na sessão ordinária do dia 6.3.2018,
deu provimento para “declinar da competência para a Vara Criminal da
Comarca de Recife a ser definida por distribuição”, nos termos do voto
proferido pelo Ministro Gilmar Mendes, designado redator para o
acórdão, do qual destaco os seguintes excertos:

“Relembro que a competência, na investigação, é


observada de acordo com a hipótese de trabalho (fato
suspeitado), conforme bem observado no HC 81.260, Tribunal
Pleno, julgado em 14.11.2001, Rel. Min. Sepúlveda Pertence.
O Pleno interpretou restritivamente a suspeita dos feitos
ligados à Operação Lava Jato. Considerou-se que os fatos a
serem reputados conexos aos feitos em trâmite na 13ª Vara
Federal de Curitiba eram os relativos a fraudes e desvios de
recursos no âmbito da Petrobras (Inquérito QO 4.130, Rel. Min.
Dias Toffoli, julgada em 23.9.2015). Naquele caso, a conexão foi
afastada, visto que os crimes contra a administração pública
investigados teriam ocorrido em um Ministério.
A hipótese de trabalho na presente investigação é de que a
vantagem indevida foi solicitada em razão de benefícios fiscais
ligados à construção de refinaria em Pernambuco. Ainda que
ligadas a obras na Petrobras, a vítima direta é o Governo do
Estado.
Tendo isso em vista, não vejo atração da competência pela
conexão.” (PET 6.863, fl. 138).

Desfecho semelhante se constata no objeto da PET 6.727,


consubstanciado em termos de depoimentos prestados por colaboradores
também vinculados ao Grupo Odebrecht, nos quais relataram, de acordo
com o Ministério Público Federal, a “formação de ajuste de mercado em obras

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associadas à Refinaria Abreu e Lima (RNEST), em Pernambuco” (PET 6.727,


decisão de 4.4.2017).
Pelas mesmas razões (ausência de menção a agente detentor de foro
por prerrogativa de função no Supremo Tribunal Federal e conexão
indicada pela Procuradoria-Geral da República), os termos de
depoimento foram encaminhados à 13ª Vara Federal de Curitiba, o que
deu ensejo à interposição de agravo regimental por parte de um dos
implicados, insurgência desprovida pela Segunda Turma, à unanimidade
de votos, em sessão de julgamento virtual realizada entre os dias 23 e
29.6.2017.
Ainda irresignado, o agravante opôs embargos declaratórios em face
do respectivo acórdão. Após pedido de vista formulado pelo eminente
Ministro Dias Toffoli, o julgamento da insurgência integrativa foi
finalizado na sessão do dia 24.4.2018, ocasião em que a Segunda Turma,
em deliberação na qual novamente restei vencido na companhia do
Ministro Celso de Mello, determinou, de ofício, o redirecionamento dos
termos de depoimento “a uma das varas criminais da Comarca de
Recife/PE” (PET 6.727, inteiro teor, p. 2).
Confira-se:

EMENTA Embargos de declaração no agravo regimental.


Petição. Termos de colaboração. Obras de terraplanagem na
construção da RNEST (Refinaria do Nordeste). Competência do
juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba. Omissão ou contradição
no julgado embargado. Inexistência. Rejeição. Superveniência,
em hipótese similar, do julgamento da Pet nº 6.863-AgR,
fixando a competência da Justiça comum estadual de
Pernambuco (Comarca de Recife). Necessidade de aplicação da
mesma ratio decidendi. Matéria de ordem pública. Remessa, de
ofício, dos termos de depoimento dos colaboradores e de
eventual documentação correlata a uma das Varas Criminais da
Comarca de Recife/PE. Determinação que não firma, em
definitivo, a competência do juízo indicado. Investigação em
fase embrionária. Impossibilidade, em sede de cognição
sumária, de se verticalizar a análise de todos os aspectos

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concernentes à declinação de competência. 1. Nenhuma das


hipóteses autorizadoras da oposição de embargos declaratórios
(RISTF, art. 337) está configurada, já que o acórdão embargado
abordou todos os pontos colocados em debate, nos limites
necessários ao deslinde da controvérsia. 2. Os embargos de
declaração não se prestam para a rediscussão da causa. 3.
Ocorre que, após o julgamento do agravo regimental em
questão, a Segunda Turma, no julgamento da Pet nº 6.863-AgR,
Relator para o acórdão o Ministro Gilmar Mendes, em hipótese
similar, fixou a competência da Justiça comum estadual de
Pernambuco (Comarca de Recife) para conhecer de supostos
fatos criminosos descritos em termos de colaboração premiada
relativos a obras da Refinaria Abreu e Lima - RNEST-CONEST.
4. Considerando-se que a presente Pet retrata hipótese similar
àquela objeto do julgamento da Pet nº 6.863-AgR, deve
prevalecer a mesma ratio. 5. A competência absoluta é matéria
de ordem pública, razão por que, não obstante o objeto do
agravo regimental fosse a fixação da competência da Justiça
Federal de Pernambuco, nada obsta que, de ofício, se disponha
a seu respeito. 6. Como a investigação se encontra em fase
embrionária e diante da impossibilidade, em sede de cognição
sumária, de se verticalizar a análise de todos os aspectos
concernentes à declinação de competência, o encaminhamento
de termos de colaboração não firmará, em definitivo, a
competência do juízo indicado, devendo ser observadas as
regras de fixação, de modificação e de concentração de
competência, respeitando-se, assim, o princípio do juiz natural
(Inq nº 4.130/PR-QO, Pleno, de minha relatoria, DJe de 3/2/16).
7. Embargos de declaração rejeitados. Determinação, de ofício,
de remessa dos termos de colaboração premiada a uma das
varas criminais da Comarca de Recife/PE. (Pet 6727 AgR-ED,
Rel.: EDSON FACHIN, Rel. p/ Acórdão: DIAS TOFFOLI,
Segunda Turma, julgado em 24.4.2018)

Importante delimitação da competência da 13ª Vara Federal de


Curitiba veio a ser explicitada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal

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HC 193726 ED / PR

por ocasião do julgamento de agravos regimentais interpostos nos autos


dos INQ 4.327 e 4.483, finalizado em 19.12.2017. Em deliberação na qual,
neste ponto específico, restei vencido, o Tribunal definiu a competência
da Seção Judiciária do Distrito Federal para o processo e julgamento de
denúncia formulada em detrimento de agentes políticos, com atuação na
Câmara dos Deputados, filiados ao então denominado Partido do
Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), os quais formariam o núcleo
político da organização criminosa denunciada.
Por oportuno, colaciono excerto do voto proferido naquela assentada
pelo eminente Ministro Alexandre de Moraes que inaugurou, no ponto, a
divergência acolhida pela maioria dos integrantes do Tribunal:

“(...)
Entendo que há possibilidade de desmembramento, mas
há inexistência de prevenção. Não entendo que haja, nesse caso,
a prevenção citada pelo ilustre Ministro-Relator, não só pelos
autos, mas pela própria análise feita no voto de Sua Excelência,
em alguns tópicos, não há essa ligação direta da denúncia,
ofertada por organização criminosa, no 4.327, que se subsume à
questão do núcleo político de integrantes do PMDB, com
atuação na Câmara dos Deputados. Inclusive - e vários trechos
da denúncia narram esses fatos - com atuação em aprovação de
medidas provisórias, ou seja, atuação no processo legislativo
mediante paga ou mediante vantagens, algumas até, segundo a
denúncia, disfarçadas de doações eleitorais. Ou seja, são fatos -
e os principais fatos apontados pelo Procurador-Geral da
República - ocorridos no Congresso Nacional, na Câmara dos
Deputados, na articulação, como disse o Procurador-Geral da
República, ilícita, uma articulação política ilícita. Não são fatos
diretamente ligados à questão só da Lava-jato, da Petrobras, ou
seja, nós estaríamos, a meu ver, remetendo à 13ª Vara de
Curitiba fatos que não têm nenhuma ou, se têm, são relações
bem a latere do que lá se iniciou e foi julgado.” (INQ 4.327, fl.
2.207)

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HC 193726 ED / PR

Uma vez mais, a despeito da tese acusatória formulada no sentido


da revelação de única organização criminosa estruturada em diversos
núcleos (político, administrativo, econômico e financeiro), com atuação
em pluralidade de órgãos públicos, sociedades de economia mista e
empresas públicas, entendeu-se por restringir o âmbito da competência,
limitando-se o alcance da conexão instrumental, da 13ª Vara Federal da
Subseção Judiciária de Curitiba.
Colaciono, ainda, o resultado do julgamento da PET 8.090 AgR no
âmbito da 2ª Turma, ocorrido em 8.9.2020, no qual restei vencido, em que
o cerne da controvérsia cingia definir o juízo destinatário das
investigações declinadas no bojo do INQ 4.215. Tratava-se de agravo
regimental em que o recorrente se contrapunha à remessa do feito ao
Juízo da 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba/PR. Na
fundamentação do voto, assentei o contexto da investigação,
particularmente no que concerne “aos supostos atos criminosos estruturados
em uma das subsidiárias (Transpetro) integrais da aludida sociedade de economia
mista, a Petrobras Transporte S/A.”
Na oportunidade, consignei a pertinência do argumento deduzido
pela Procuradoria-Geral da República de que a hipótese criminal
investigada, “a toda evidência, associados diretamente ao esquema criminoso de
corrupção e de lavagem de dinheiro, investigado no contexto da ‘Operação Lava
Jato’ e que lesou frontalmente os cofres da PETROBRAS. Tal situação afasta, de
per se, a aplicação, ao presente caso, da regra do art. 70 do Código Penal”; e,
ainda, que parte do material resultante de colaboração premiada também
fora enviado ao referido juízo.
Nada obstante, a 2ª Turma reconheceu a competência ao processo e
julgamento da Seção Judiciária do Distrito Federal, nos termos da
compreensão vertida no voto do redator do acórdão, Ministro Gilmar
Mendes, assim ementado:

PENAL. PROCESSO PENAL. INQUÉRITO. AGRAVOS


REGIMENTAIS. DECLÍNIO DA COMPETÊNCIA DO STF
PARA A 13ª VARA FEDERAL DE CURITIBA. REAFIRMAÇÃO
DA JURISPRUDÊNCIA DA CORTE EM RELAÇÃO À

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COMPETÊNCIA DA REFERIDA VARA FEDERAL.


PRECEDENTES. FATOS RELACIONADOS À TRANSPETRO.
CRIMES SUPOSTAMENTE COMETIDOS POR
PARLAMENTARES NA CIDADE DE BRASÍLIA.
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL NO DISTRITO
FEDERAL. PROVIMENTO DOS AGRAVOS REGIMENTAIS
PARA DETERMINAÇÃO DA REMESSA DOS AUTOS AO
JUÍZO COMPETENTE, PARA SUPERVISÃO DO INQUÉRITO
E ANÁLISE SOBRE NULIDADE OU CONVALIDAÇÃO DOS
ATOS PROCESSUAIS EM CASO DE EVENTUAL
RECEBIMENTO DA DENÚNCIA.
1. O fato de a polícia judiciária ou o Ministério Público
Federal denominarem determinadas apurações como fases da
Operação Lava Jato, a partir de uma sequência de investigações
sobre crimes diversos, não se sobrepõe às normas
disciplinadoras de competência. Precedente: INQ 4.130 QO, Rel.
Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno, DJe 3.2.2016.
2. A competência não pode ser definida a partir de um
critério temático e aglutinativo de casos atribuídos
aleatoriamente pelos órgãos de persecução e julgamento, como
se tudo fizesse parte de um mesmo contexto, independente das
peculiaridades de cada situação.
3. A colaboração premiada, como meio de obtenção de
prova, não constitui critério de determinação, de modificação
ou de concentração da competência.
4. Os elementos de informação trazidos pelo colaborador a
respeito de crimes que não sejam conexos ao objeto da
investigação primária devem receber o mesmo tratamento
conferido à descoberta fortuita ou ao encontro fortuito de
provas.
5. A prevenção não é critério primário de determinação da
competência, mas sim de sua concentração, tratando-se de regra
de aplicação residual.
6. O estabelecimento de um juízo universal para a
apuração de desvios envolvendo vantagens indevidas pessoais
ou a partidos políticos viola a garantia do juiz natural.

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7. No caso em análise, as investigações deflagradas contra


os recorrentes estão relacionadas a supostos crimes cometidos
no âmbito da Transpetro. Os recorrentes exerciam mandatos
parlamentares e os alegados atos ilícitos ocorreram em Brasília.
8. Provimento dos agravos regimentais para reconhecer a
competência da Justiça Federal no Distrito Federal, com a
determinação da imediata remessa dos autos para supervisão
do inquérito e eventual manifestação sobre a nulidade ou
convalidação dos atos processuais, em caso de eventual
recebimento da denúncia pelo Juízo incompetente.

Recentemente, em 2.3.2021, concedi a ordem de habeas corpus, de


ofício, no HC 198.081, na compreensão de conferir simetria e coerência ao
que fora objeto de julgamento na PET 8.090, pois depreendi que “as
condutas atribuídas aos pacientes foram praticadas no contexto de contratações
levadas a efeito no âmbito da Transpetro S/A, o que afasta, a partir do
entendimento firmado por ocasião do julgamento da PET 8.090 AgR, a
competência da 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba”.
Como se vê, diante da pluralidade de fatos ilícitos revelados no
decorrer das investigações levadas a efeito na “Operação Lava Jato”, a
competência da 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba foi
sendo cunhada à medida em que novas circunstâncias fáticas foram
trazidas ao conhecimento do Supremo Tribunal Federal que, em
precedentes firmados pelo Tribunal Pleno ou pela Segunda Turma, sem
embargo dos posicionamentos divergentes, culminou em afirmá-la
apenas em relação aos crimes praticados direta e exclusivamente em
detrimento da Petrobras S/A.
Friso, nesse passo, essa limitação que se torna relevante ao caso
presente. Foi com essa perspectiva que, tendo recebido mais uma centena
de inquéritos, determinei a redistribuição de mais de cinco dezenas a
outros Ministros deste Tribunal, por livre distribuição.
Nesse sentido, elucidativo é o voto do eminente Ministro Gilmar
Mendes proferido nos autos da PET 8.090 AgR, designado Redator para o
Acórdão:

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HC 193726 ED / PR

“(...)
Em síntese, delimitam-se os seguintes critérios para a
definição da competência da 13ª Vara Federal de Curitiba:
(i) a colaboração premiada, como meio de obtenção de
prova, não constitui critério de determinação, de modificação
ou de concentração da competência;
(ii) os elementos de informação trazidos pelo colaborador
a respeito de crimes que não sejam conexos ao objeto da
investigação primária devem receber o mesmo tratamento
conferido à descoberta fortuita ou ao encontro fortuito de
provas;
(iii) a prevenção não é critério primário de determinação
da competência, mas sim de sua concentração, tratando-se de
regra de aplicação residual;
(iv) o estabelecimento de um juízo universal para a
apuração de desvios envolvendo vantagens indevidas pessoais
ou a partidos políticos viola a garantia do juiz natural.
Do caso concreto
No caso em análise, entendo que assiste razão aos
recorrentes.
Nesse sentido, a ausência de conexão dos crimes aqui
referidos com os delitos investigados na 13ª Vara Federal da
Seção Judiciária de Curitiba/PR já foi reconhecida inclusive pelo
Ministro Edson Fachin, relator do Inquérito 4.215, em decisão
de 1º.2.2019.
Entendo ser correta a primeira decisão proferida pelo
relator, tendo em vista que os crimes investigados estão
relacionados com fatos ocorridos na Transpetro, e não na
Petrobras, e também por terem supostamente ocorrido na
cidade de Brasília/DF”. (PET 8.090, fls. 261-262, destaques no
original)

Desse histórico, especificamente em relação aos agentes políticos que


o Ministério Público acusa de adotar modus operandi semelhante ao do ora
paciente, sobressai que o Plenário e a Segunda Turma do Supremo

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Tribunal Federal formataram arcabouço jurisprudencial de acordo com o


qual casos análogos ao tratado nestes autos fossem retirados da
competência da 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba.
Mais recentemente, com voto contrário deste Relator, a Segunda
Turma tem inclusive escrutinado as hipóteses da acusação para deslocar
os casos à Justiça Eleitoral, a exemplo do que decidido nos autos da PET
8.134, Redator para o Acórdão o Ministro Ricardo Lewandowski.
As regras de competência, ao concretizarem o princípio do juiz
natural, servem para garantir a imparcialidade da atuação jurisdicional:
respostas análogas a casos análogos. Com as recentes decisões proferidas
no âmbito do Supremo Tribunal Federal, não há como sustentar que
apenas o caso do ora paciente deva ter a jurisdição prestada pela 13ª Vara
Federal de Curitiba. No contexto da macrocorrupção política, tão
importante quanto ser imparcial é ser apartidário.

3.2. Subsunção do caso concreto aos entendimentos firmados no


âmbito do Plenário e Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal.

Cumpre assentar o ineditismo da causa de pedir sob o enfoque posto


na presente impetração.
Com efeito, embora deduzida nos autos da PET 7.841/PR, na qual a
defesa técnica do paciente buscava, para fins eleitorais, a atribuição de
efeito suspensivo ao recurso extraordinário interposto contra o acórdão
proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região por ocasião do
julgamento da Apelação Criminal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR, não
houve deliberação de mérito sobre a alegada incompetência do Juízo da
13ª Vara Federal de Curitiba, diante do reconhecimento da superveniente
prejudicialidade da pretensão.
A propósito:

Ementa: ELEITORAL. APLICAÇÃO DO ART. 26-C da LEI


COMPLEMENTAR 64/1990. PEDIDO DE EFEITO
SUSPENSIVO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO PARA
AFASTAR A INELEGIBILIDADE DO RECORRENTE.

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HC 193726 ED / PR

REALIZAÇÃO DAS ELEIÇÕES 2018. PERDA DE OBJETO DO


PEDIDO. MÉRITO DA QUESTÃO DE FUNDO TODAVIA
NÃO EXAMINADO PELO STF. RECURSO QUE SE JULGA
PREJUDICADO. I – A realização das eleições gerais de 2018
ocasionou a perda do objeto do recurso. II - Pedido que discutia
aplicação do art. 26-C da Lei Complementar 64/1990 ao
recorrente. III- Matéria que, embora não examinada pelo STF
neste feito, poderá, eventualmente, ser reapreciada nas vias
processuais apropriadas. IV – Recurso prejudicado. (Pet 7841
AgR, Rel.: EDSON FACHIN, Rel. p/ Acórdão: RICARDO
LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 18.8.2020)

Consigno, ainda, que o tema foi tangenciado no objeto do HC


165.973, por meio do qual a defesa do ora paciente se insurgiu contra o
julgamento monocrático, pelo Ministro Relator no Superior Tribunal de
Justiça, do REsp n. 1.765.139. Alegou-se, na ocasião, que o ato apontado
como coator violaria o dever de fundamentação das decisões judiciais
(art. 93, IX, da CF), bem como a ampla defesa (art. 5º, LV, da CF) e
prerrogativas da advocacia (art. 133 da CF; art. 7º, X, da Lei n. 8.906/94),
explicitando-se teses, como a vertida na presente impetração, com a
exclusiva finalidade de evidenciar a plausibilidade jurídica da pretensão.
O objeto do aludido habeas corpus foi delimitado em voto proferido
em 25.6.2019, no julgamento do agravo regimental interposto pelos
impetrantes contra decisão monocrática pela qual neguei seguimento
àquela impetração, oportunidade em que consignei:

“(...)
5. Impende assinalar, de início, que, como bem ressaltado
pela ilustre defesa técnica, as teses veiculadas no bojo do
recurso especial endereçado ao STJ não possuem seu mérito,
nesta sede processual, submetido a escrutínio do Supremo
Tribunal Federal.
A esse respeito, enfatiza a defesa (grifei), em suas razões
recursais, que ‘o enfrentamento verticalizado das questões de
direito contidas no Recurso Especial somente será apreciada

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HC 193726 ED / PR

por esta Corte – incluindo-se aí os requisitos para cognição dos


apelos extremos, comuns em sua maioria ao STJ e ao STF – quando
aqui aportar o devido Agravo em Recurso Extraordinário, que
já foi interposto no Tribunal a quo”.
Com efeito, dentre as diversas matérias articuladas pela
via do recurso especial, a defesa, a título exemplificativo,
apontou determinados temas que evidenciariam, na sua visão, a
inadequação da motivação explicitada no ato tido como coator.
Em outras palavras, não se trata, por exemplo, de aferir se
há ausência de correlação entre denúncia e sentença mas, em
verdade, verificar se o ato apontado como coator, ao inadmitir o
recurso especial, motivou adequadamente ou não a negativa de
trânsito da irresignação excepcional por meio da qual se alega
vulneração à congruência exigida pela legislação processual
penal.” (HC 165.973 AgR, Inteiro teor, fls. 24-25)

Cabe registrar, ainda, que o objeto do HC 152.752, também


impetrado em favor do ora paciente, era restrito ao questionamento da
constitucionalidade da execução da pena privativa de liberdade após a
confirmação da sentença condenatória por órgão colegiado, cujo mérito
foi deliberado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal em 5.4.2018,
oportunidade em que a ordem de habeas corpus foi denegada. Os
subsequentes embargos declaratórios defensivos foram julgados
prejudicados, considerado o julgamento de mérito das ADC 43, 44 e 54,
da relatoria do eminente Ministro Marco Aurélio.
Constata-se, portanto, a plena cognoscibilidade da pretensão
deduzida pelos impetrantes, frise-se, apenas em 3.11.2020, data em que
protocolado no Supremo Tribunal Federal o presente habeas corpus (Doc.
1).
Na exordial acusatória ofertada em desfavor do paciente e outros 7
(sete) corréus perante a 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de
Curitiba (Doc. 3), a qual deu origem à Ação Penal n. 5046512-
94.2016.4.04.7000/PR, o Ministério Público Federal lhe atribui a prática
dos crimes de corrupção passiva e lavagem de capitais, à época em que
investido no mandato de Presidente da República.

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HC 193726 ED / PR

A narrativa ministerial contextualiza as específicas imputações ao


paciente no exercício das atribuições de mandatário da chefia do Poder
Executivo da União, no qual teria comandado “a formação de um esquema
delituoso de desvio de recursos públicos destinados a enriquecer ilicitamente, bem
como, visando à perpetuação criminosa no poder, comprar apoio parlamentar e
financiar caras campanhas eleitorais” (Doc. 3, fl. 6).
Nada obstante a extensão do contexto delitivo exposto na denúncia,
no seu item 1 o Ministério Público Federal assim sintetiza a descrição dos
delitos imputados aos denunciados:

“(...)
Com efeito, em datas ainda não estabelecidas, mas
compreendidas entre 11/10/2006 e 23/01/2012, LULA, de modo
consciente e voluntário, em razão de sua função e como
responsável pela nomeação e manutenção de RENATO DE
SOUZA DUQUE [RENATO DUQUE] e PAULO ROBERTO
COSTA nas Diretorias de Serviços e Abastecimento da
PETROBRAS, solicitou, aceitou promessa e recebeu, direta e
indiretamente, para si e para outrem, inclusive por intermédio
de tais funcionários públicos, vantagens indevidas, as quais
foram de outro lado e de modo convergente oferecidas e
prometidas por LÉO PINHEIRO e AGENOR MEDEIROS,
executivos do Grupo OAS, para que estes obtivessem benefícios
para o CONSÓRCIO CONPAR, contratado pela PETROBRAS
para a execução de obras de ‘ISBL da Carteira de Gasolina e
UGHE HDT de instáveis da Carteira de Coque’ da Refinaria
Getúlio Vargas – REPAR e para o CONSÓRCIO
RNEST/CONEST, contratado pela PETROBRAS para a
implantação das UHDT’s e UGH’s da Refinaria Abreu e Lima –
RNEST, e para a implantação das UDA’s da Refinaria Abreu e
Lima – RNEST. As vantagens foram prometidas e oferecidas
por LÉO PINHEIRO e AGENOR MEDEIROS, a LULA,
RENATO DUQUE, PAULO ROBERTO COSTA e PEDRO JOSÉ
BARUSCO FILHO [PEDRO BARUSCO], para determiná-los a,
infringindo deveres legais, praticar e omitir atos de ofício no
interesse dos referidos contratos.

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HC 193726 ED / PR

(...)
LULA, de modo consciente e voluntário, no contexto das
atividades da organização criminosa abaixo exposta, em
concurso e unidade de desígnios com MARISA LETÍCIA, LÉO
PINHEIRO, PAULO GORDILHO, FÁBIO YONAMIME e
ROBERTO MOREIRA, pelo menos desde data próxima a
08/10/2009 até a presente data, dissimularam e ocultaram a
origem, a movimentação, a disposição e a propriedade de R$
2.424.990,83, provenientes dos crimes de cartel, fraude à
licitação e corrupção praticados pelos executivos da
CONSTRUTORA OAS em detrimento da Administração
Pública Federal, notadamente da PETROBRAS, conforme
descrito nesta peça, por meio: (i) da aquisição em favor de
LULA e MARISA LETÍCIA, por intermédio da OAS
EMPREENDIMENTOS, do apartamento 164-A do Condomínio
Solaris, localizado na Av. Gal. Monteiro de Barros, nº 638, em
Guarujá/SP, no valor de R$ 1.147.770,96, assim como pela
manutenção em nome da OAS EMPREENDIMENTOS do
apartamento que pertencia a LULA e MARISA LETÍCIA, pelo
menos desde data próxima a 08/10/2009 até a presente data; (ii)
do pagamento de R$ 926.228,82, entre 08/07/2014 e 18/11/2014,
pela OAS EMPREENDIMENTOS à TALLENTO
CONSTRUTORA LTDA., para efetuar as reformas estruturais e
de acabamento realizadas no imóvel para adequá-lo aos desejos
da família do ex-Presidente da República; e (iii) do pagamento
de R$ 330.991.05, entre 26/09/2014 e 11/11/2014, pela OAS
EMPREENDIMENTOS à KITCHENS COZINHAS E
DECORAÇÕES LTDA. e à FAST SHOP S.A., para custear a
aquisição de móveis de decoração e de eletrodomésticos para o
referido apartamento, adequando-o aos desejos da família do
ex-Presidente da República.
(...)
LULA, de modo consciente e voluntário, no contexto das
atividades da organização criminosa abaixo exposta, em
concurso e unidade de desígnios com LÉO PINHEIRO e
PAULO OKAMOTO, no período compreendido entre

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01/01/2011 e 16/01/2016, dissimularam a origem, a


movimentação e a disposição de R$ 1.313.747,24 provenientes
dos crimes de cartel, fraude à licitação e corrupção praticados
pelos executivos da CONSTRUTORA OAS, em detrimento da
Administração Pública Federal, notadamente da PETROBRAS,
conforme descrito nesta peça, por meio de contrato
ideologicamente falso de armazenagem de materiais de
escritório e mobiliário corporativo de propriedade da
CONSTRUTORA OAS, o qual se destinada na verdade a
armazenar bens pessoais de LULA, firmado com a empresa
GRANERO TRANSPORTES LTDA., que redundou em 61
pagamentos mensais no valor de R$ 21.536,84 cada.
Todo valor objeto da lavagem também se constitui em
vantagem indevidamente recebida por LULA, totalizando R$
3.738.738,07.” (Doc. 3, fls. 5-6, destaques no original).

Mais adiante, o Ministério Público Federal, considerada a extensão


dos malfeitos relatados, bem delimita o objeto da pretensão punitiva
estatal formulada, no caso sob análise e de forma específica, em
detrimento do ora paciente:

“(...)
11. A partir desse macrocontexto criminoso, esta denúncia
imputa a LULA, especificamente, os crimes relacionados ao
Grupo OAS [OAS] que serão a seguir detalhados, sem prejuízo
de novas acusações futuras. Dentre os procedimentos
licitatórios da PETROBRAS que foram fraudados pelas
empreiteiras cartelizadas, estão os relativos a obras da REPAR
(Refinaria Presidente Vargas, localizada em Araucária/PR) e
da RNEST (Refinaria Abreu e Lima, localizada em
Ipojuca/PE), em que a OAS foi favorecida. Nesses casos, entre
11/10/2006 e 23/01/2012, LULA, contando com a atuação de
RENATO DUQUE, PEDRO BARUSCO e PAULO ROBERTO
COSTA nas Diretorias de Serviços e Abastecimento da Estatal,
foi o responsável pela geração e pagamento de vantagens
indevidas de, pelo menos, R$ 87.624.971,26, oferecidas e

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HC 193726 ED / PR

prometidas por LÉO PINHEIRO FILHO e AGENOR


MEDEIROS, executivos da OAS, para que estes obtivessem
benefícios nas referidas obras.
12. Parte dessa propina, cerca de R$ 2.424.990,83, foi
recebida por LULA por meio de expedientes de ocultação e
dissimulação de propriedade de bens e valores, isto é, mediante
atos de lavagem de dinheiro. LULA, com a participação de sua
esposa MARISA LETÍCIA, assim como dos executivos do
Grupo OAS LÉO PINHEIRO, PAULO GORDILHO, FÁBIO
YONAMIME e ROBERTO MOREIRA, pelo menos desde data
próxima a 08/10/2009 até a presente data, recebeu o
apartamento 164-A do Condomínio Solaris, em Guarujá/SP,
personalizado e decorado com recursos provenientes dos
crimes praticados em prejuízo da Administração Pública
Federal, notadamente da PETROBRAS.
13. Outra parte dos recursos desviados, cerca de R$
1.313.747,24, foi recebida por LULA por meio de expedientes de
ocultação e dissimulação da sua disposição e propriedade, ou
seja, por meio de atos de lavagem de dinheiro. LULA, com a
participação de PAULO OKAMOTO e de LÉO PINHEIRO,
entre 01/01/2011 e 16/01/2016, recebeu indiretamente do Grupo
OAS aquele valor, por meio do pagamento, por esse grupo,
mediante a assinatura de um contrato fraudulento, de
armazenagem de bens no interesse do ex-Presidente da
República” (Doc. 3, fls. 9-10 - destaquei).

Do que se infere da narrativa acusatória, a celebração fraudulenta de


contratos entre a Petrobras S/A e o Grupo OAS, especialmente no tocante
às obras da REPAR e da RNEST, contou com a participação do ora
paciente, no exercício das funções de Presidente da República, o qual, em
contrapartida, teria sido beneficiado com os bens e valores descritos,
submetidos a processo de ocultação ou distanciamento de suas origens
ilícitas.
Tal participação, no entanto, se consubstanciaria na viabilização da
nomeação e manutenção de diretores da Petrobras S/A que se ajustaram

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aos propósitos ilícitos do grupo criminoso organizado, e que atuaram


diretamente nos procedimentos fraudulentos de contratação por parte da
aludida sociedade de economia mista, em ajustes espúrios com o
denominado “cartel de empreiteiras”.
Ocorre que a conduta atribuída ao ora paciente, qual seja, viabilizar
nomeação e manutenção de agentes que aderiram aos propósitos ilícitos
do grupo criminoso em cargos estratégicos na estrutura do Governo
Federal, não era restrita à Petrobras S/A, mas a extensa gama de órgãos
públicos em que era possível o alcance dos objetivos políticos e
financeiros espúrios, conforme narra a própria incoativa sob análise:

“30. Os esquemas revelados no ‘Mensalão’ e na ‘Operação


Lava Jato’ envolveram, dentre outros, crimes de corrupção
praticados no alto escalão da Administração Pública Federal.
Observou-se, nesses dois casos, a criação de uma estrutura que
direcionava benefícios aos que estavam no poder e aos seus
partidos.
Assim, uma nota comum dessas engrenagens delituosas
foi o seu funcionamento em benefício de LULA, não só pelas
vantagens financeiras que recebeu, mas também pela
governabilidade conquistada e pelo fortalecimento de seu
partido. Foram os partidos e os políticos que orbitaram ao redor
dele, como ele próprio, que enriqueceram e tiveram seus
projetos de poder alavancados por polpudas somas monetárias,
desequilibrando pleitos eleitorais e afetando uma face da
democracia pela disputa eleitoral com candidatos alavancados
com o financiamento a partir de recursos ilícitos.
Ambos os esquemas eram simultaneamente de governo e
partidários. LULA era a pessoa mais importante no Governo e
no partido, em benefício do qual fluíram vantagens centrais dos
crimes. Contudo, não se trata apenas de corrupção identificada
no ‘Mensalão’ e na PETROBRAS, pois, como se indicará,
brevemente, a seguir, ao longo de todos os anos em que LULA
ocupou o mais alto cargo do Poder Executivo federal, diversos
outros casos de corrupção semelhantes foram verificados.

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Desenvolvidos no âmbito da alta cúpula política do país, com o


envolvimento de diferentes partidos da base aliada do Governo
Federal, os benefícios desses esquemas convergiram, direta e
indiretamente, ao vértice comum de todos eles, no qual se
encontrava LULA.
(...)
No mesmo sentido, e conforme já destacado acima, a
formação da base aliada do Governo LULA, com a negociação
do apoio do PMDB e PP, envolveu a distribuição de outros
cargos da alta Administração Pública Federal, dentro de um
contexto em que líderes partidários comprovadamente usaram
os cargos para a arrecadação de propinas. Embora não se possa
dizer que todos os indicados, em todos os casos, arrecadaram
propina, é possível, a partir das provas, afirmar que existia
sim um sistema com esse objetivo, que abarcava seguramente
diversos cargos públicos como na PETROBRAS,
ELETRONUCLEAR, MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO e
CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, que, de fato, foram
utilizados para a arrecadação de propina para agentes e
partidos políticos.” (Doc. 3, fls. 19-20 – destaquei)

Conclui-se, portanto, que o Ministério Público Federal, à época em


que aforou a denúncia em desfavor do paciente, já tinha ciência da
extensão alcançada pelas condutas que lhe foram atribuídas, as quais
abarcaram não só a Petrobras S/A, mas outros órgãos públicos,
sociedades de economia mista e empresas públicas no âmbito das quais,
com semelhante modus operandi, foram celebradas contratações revestidas
de ilicitudes, em benefício espúrio de agentes públicos, agremiações
partidárias e empreiteiras.
Optou-se, à época, pela concentração dos feitos relacionados ao
aludido grupo criminoso no âmbito da competência da 13ª Vara Federal
da Subseção Judiciária de Curitiba, dentre os quais o caso ora sob análise.
Diante da miríade de ilicitudes evidenciadas com o avanço das
investigações, não se afigurava teratológica a invocação de causas de
modificação da competência, seja a conexão instrumental ou até mesmo a

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continência, para a aglutinação dos feitos correlatos naquele Juízo,


conforme consignado pelo eminente Ministro Gilmar Mendes em voto
proferido por ocasião do julgamento da precitada questão de ordem
suscitada no INQ 4.130:

“Senhor Presidente, temos que apreciar a competência


para supervisão de investigação oriunda da Operação Lava Jato
nesta Corte e a competência para processar e julgar
desdobramento de investigação dela decorrente em primeira
instância.
Como nós sabemos, essa não é uma questão neutra ou
meramente técnica. Em verdade, é de grande relevo. Do
contrário, nem estaria havendo essa disputa no próprio âmbito
do Tribunal Pleno. No fundo, o que se espera é que processos
saiam de Curitiba e não tenham a devida sequência em outros
lugares. É essa a expectativa. É bom que se diga em português
claro para que não iludamos ninguém.
(...)
O que temos aqui são fatos ligados por conexão e
continência, como será demonstrado neste voto. Temos diversos
crimes praticados pelo que aparenta ser uma mesma
organização criminosa, com os mesmos métodos.
(...)
A Operação Lava Jato foi iniciada para apuração de um
esquema de lavagem de ativos e, de degrau em degrau, foi
revelando uma associação criminosa que se ramifica,
praticando vários crimes, sob um comando central.
No curso das investigações, alguns dos crimes foram
suficientemente revelados para permitir o oferecimento de
denúncias. Tendo em vista que havia investigados presos, não
se poderia aguardar a conclusão completa das apurações.
No entanto, as denúncias oferecidas foram acompanhadas
de requerimento de cisão das investigações, para regular
prosseguimento quanto a fatos ainda não apurados. Ou seja, a
investigação da organização criminosa em Curitiba não foi
encerrada. Não há como falar em esgotamento daquela

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jurisdição.
Dito isso, passo à análise do que me parece ser a questão
central da determinação da competência neste caso: a reunião
dos feitos por conexão e continência.
Tanto o Regimento Interno do STF quanto o CPP usam a
conexão e a continência como causas de modificação da
competência. Dispõe o art. 69 do RI:
(...)
O CPP, por sua vez, define a conexão e a continência nos
arts. 76 e 77:
(...)
A discussão levantada até o momento refere-se à
existência de conexão probatória da presente investigação com
outras ligadas à operação Lava Jato.
Desde logo, adianto que o caso envolve não apenas a
conexão, mas principalmente a continência.
No entanto, já que a conexão ocupou a Corte até o
momento, inicio por ela.
Há conexão probatória deste caso com os casos oriundos
da 13ª Vara Federal de Curitiba (art. 76, III).
A interpretação da conexão probatória não é simples. Em
princípio, a investigação de qualquer fato pode influir na de
outro, sendo difícil prever o resultado dos inquéritos e
instruções penais. Discorrendo sobre o dispositivo do Código
de Processo Penal italiano que inspirou nossa legislação, Ugo
Aloisi constata que a norma deixa margem a certa
discricionariedade do julgador na avaliação da conexão –
ALOISI, Ugo. Manuale pratico di procedura penale. Milão:
Giufrè, 1943. p. 136.
Portanto, não existe a precisão aritmética que se tenta dar
ao tema.
O próprio Supremo Tribunal Federal já enfrentou
dificuldades com a avaliação discricionária da conexão no caso
do mensalão. Inicialmente, houve desmembramento em relação
aos denunciados sem prerrogativa de foro, tendo a Corte
reconsiderado a decisão em seguida, por não vislumbrar

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maiores benefícios na separação. Por várias vezes, cogitou-se de


cindir o feito, mas prevaleceu a manutenção do processo único.
Além disso, não se pode esquecer de que o dispositivo que
trata da conexão é da redação original do Código, do ano de
1941. Não se encarava criminalidade organizada como
fenômeno a merecer tratamento próprio pela lei e pelos
aplicadores do direito. Se há uma necessidade de atualização, é
justamente neste tema. A complexidade das investigações e
ações penais por crimes dessa ordem não estava sequer no
horizonte de previsão do legislador.
A rigor, temos de ler o texto à luz da dimensão que
assumiram as organizações criminosas. É chocante quando
vemos o quadro trazido pelo Procurador-Geral da República,
no qual nem conseguimos nos situar. Precisaríamos de um GPS
para entrar nesse emaranhado. Talvez, seja a mais complexa
organização criminosa já formada no país.
Em suma, não podemos apresentar a questão como
decisão neutra, técnica ou aritmética.
O que se apurou até o momento é que o esquema
criminoso apurado em relação à Petrobras foi replicado em
diversos outros órgãos públicos, revelando complexa
orquestração criminosa em que se reproduziu o (i) mesmo
modus operandi e estão presentes os mesmos integrantes,
rectius, os mesmos agentes criminosos, sejam eles (ii) agentes
políticos (VACCARI, DIRCEU, entre outros), (iii) agentes
públicos, (iv) operadores financeiros (v.g. MILTON
PASCOWITCH, ALEXANDRE ROMANO), e as (v) mesmas
empreiteiras.
Neste Inquérito específico, o que temos na denúncia já
formalizada é que o mesmo esquema de lavagem de dinheiro
sujo retirado da Petrobras era empregado para branquear as
propinas oriundas do Ministério do Planejamento.
Os implicados na Operação Lava Jato Milton Pascowitch e
José Adolfo Pascowitch admitiram que usavam a JAMP
ENGENHEIROS LTDA. para lavagem das propinas relativas
aos contratos da Petrobras. A mesma pessoa jurídica lavaria

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recursos no presente inquérito, oriundos do Ministério do


Planejamento.
Não há dúvida de que a lavagem de dinheiro é ligada pela
conexão teleológica com o crime a ela antecedente (art. 76, II,
CPP).
E a prova de que Milton e José Adolfo Pascowitch eram
operadores de um sistema de pagamento de propinas e
lavagem de dinheiro, tem grande potencial de influir na prova
de que ambos prestavam o mesmo serviço para outros
corruptos e corruptores.
Pelo lado dos corruptos, temos também a informação de
que ambos os esquemas convergiam para João Vaccari Neto,
tesoureiro nacional do Partido dos Trabalhadores, destinatário
das propinas pagas.
E, por ocasião da instauração do Inquérito sobre o qual
nos debruçamos, os personagens mencionados já eram
investigados ou processados, pelos mesmos fatos, perante a 13ª
Vara Federal de Curitiba.
Isso sem falar que cada uma dessas investigações se insere
num todo maior.
Estamos diante de uma investigação em que cada novo
crime descoberto permite o desdobramento em outras
investigações. A pura e simples divisão das investigações não
permitiria o acompanhamento do contexto, relegando ao
fracasso qualquer esforço sério de persecução.
É grande a responsabilidade da Corte ao fazer esta opção.
Podemos estar comprometendo a própria persecução criminal.
Não preocupa a distribuição de processos no âmbito da Corte,
mas espalhar processos para Uberaba, São Paulo, Cuiabá, a
partir do critério do local onde foi praticado um ou dois fatos,
certamente estará contribuindo para o grau de precisão que se
quer.
Não se pode negar que há liame entre os fatos
investigados em cada um dos inquéritos da Operação Lava Jato.
Sejam crimes ligados à Petrobras ou não, todos estão
inseridos no mesmo contexto. Todos parecem convergir para o

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HC 193726 ED / PR

mesmo método de governança.


(...)
Assim, as ações penais e investigações devem permanecer
reunidas perante o juízo prevento.
Reafirmo que não se trata de dizer que todos os
desdobramentos de uma investigação original devem ser
reunidos no mesmo juízo. Não discordo do ponto de vista
segundo o qual, se em uma investigação criminal, descobre-se,
de forma fortuita, prova de crimes não conexos, a prevenção
inexiste. Não é disso que se cuida neste caso. Aqui, há um liame
entre as condutas investigadas que não pode ser desprezado.
O ponto é que não interessa que tenha sido usado, como
meio para obter os fins, o Ministério do Planejamento, a
Petrobras, a Eletrobras, ou outra estatal ou órgão público
qualquer. Há uma comunhão dos meios de lavagem de
recursos. Há uma semelhança entre as condutas. Há laços
políticos entre os autores. Há um liame que não pode ser
desprezado, essencial à apuração e compreensão da verdade.
Logo, a conexão probatória está presente (art. 76, III, CPP).
Além disso, estamos um passo além da simples conexão.
O caso é de continência (art. 77, I, CPP).
O esquema em apuração na Operação Lava Jato aponta
para um método de governar: de um lado, recursos do Estado
fluiriam para forças políticas; de outro, financiariam a atividade
político-partidária e de campanhas eleitorais, a corrupção de
agentes públicos, a manutenção de base partidária fisiológica, a
compra de apoio da imprensa e de movimentos sociais e, claro,
o luxo dos atores envolvidos.
O que está ocorrendo é que, para cada uma dessas práticas
e para cada autor de determinada prática, está em andamento
um inquérito. Essa divisão serve como técnica de investigação,
mas não se pode perder de vista o todo.
O que se tem é que as práticas criminosas podem ser
reconduzidas ao mencionado método de governar, nele se
inserindo. Temos a perpetração de vários crimes graves, ligados
entre si, se protraindo no tempo. E, salvo se houver uma

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incrível coincidência quanto aos métodos de performar os


crimes, deve haver, também, uma liderança central, ainda por
ser revelada.
Em todas as investigações, temos a recondução dos fatos
aos núcleos políticos que, valendo-se dos próprios meios de
intermediação – os chamados operadores – cuidavam de
receber e lavar as propinas. Os partidos apontados como
envolvidos compunham a base aliada do Governo e, justamente
por isso, tinham influência na nomeação dos servidores
públicos em cargos chaves a se levar a efeito o esquema.
No caso específico do Partido dos Trabalhadores, detentor
da chefia do Poder Executivo federal e apontado como principal
beneficiário, as investigações convergem ao tesoureiro nacional
João Vaccari Neto, que seria responsável por fazer o dinheiro
sujo ingressar nos cofres do Partido, seja por doações
contabilizadas, seja pelo caixa dois.
Analisando o contexto, difícil deixar de trabalhar com a
hipótese de que os inúmeros implicados estão associados de
maneira estruturalmente ordenada, dividindo tarefas, com o
objetivo de obter vantagens políticas e econômicas, mediante
a prática das infrações penais investigadas.
Se é assim, estamos diante da uma organização criminosa,
nos termos da definição do art. 1º, §1º, combinado com art. 2º,
da Lei 12.850/13:
(...)
E a investigação dos coautores do crime de organização
criminosa e dos diversos crimes praticados pela organização
atrai o juízo da investigação originária, por continência (art. 77,
I, CPP).
Repito que não interessa que a organização criminosa
tenha usado, como meio de obter seus fins, a Petrobras, a
Eletrobras, o Ministério do Planejamento, ou outra estatal ou
órgão público qualquer. Se todas as condutas são reconduzidas
à mesma organização criminosa, aplica-se a regra da
continência.
Assim, não se trata de tornar um juízo prevento para

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todos os crimes graves, ou todos os casos de corrupção do país,


mas de aplicar a regra da continência a reunir processos por
crimes praticados pela mesma organização criminosa.
Esse entendimento vale tanto para o ministro prevento no
Supremo Tribunal Federal quanto para o Juízo da 13ª Vara
Federal de Curitiba e, mesmo, para todas as instâncias
intermediárias com competência sobre o caso.
(...)
Ao menos em tese, estamos tratando da mesma
organização criminosa do Petrolão.
Logo, a competência, por continência e conexão, é do
ministro Teori Zavascki. Pelos mesmos fundamentos, em
primeira instância, é da 13ª Vara Federal de Curitiba.
(...)
Portanto, voto, de forma muito convicta, pela
redistribuição do inquérito à relatoria do ministro Teori
Zavascki e pela cisão do feito em relação a Alexandre Romano e
a outros investigados sem foro originário perante esta Corte,
devendo o cindido ser encaminhado ao Juízo da 13ª Vara
Federal de Curitiba/PR.” (INQ 4.130 QO, Inteiro teor, fls. 112-
125)

Mas as conclusões de Sua Excelência, como visto, não foram


encampadas pela maioria formada no Plenário do Supremo Tribunal
Federal naquela assentada, conforme já elucidado no item anterior, o que
acarretou no detalhamento jurisprudencial dos limites da competência da
13ª Vara Federal de Curitiba no que diz respeito à reunião de feitos
motivada pela conexão instrumental.
Nesse contexto, a defesa técnica do paciente, a tempo e modo,
questionou a competência para o processo e julgamento da ação penal
subjacente perante o aludido juízo em razão da aventada conexão, tendo
provocado específica prestação jurisdicional por ocasião das alegações
finais; nos embargos declaratórios opostos em face da sentença
condenatória; nas razões do recurso de apelação interposto; assim como
nos recursos extraordinários aviados e, por fim, na presente impetração,

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ajuizada perante o Supremo Tribunal Federal, rememoro, em 3.11.2020


(Doc. 1), razão pela qual a questão não se encontra preclusa.
A atuação da defesa técnica se coaduna com a natureza relativa da
competência firmada por conexão, a qual, como é cediço, não se trata de
regra de fixação da competência, mas de sua modificação, e que admite
flexibilização, nos termos do art. 80 do Código de Processo Penal.
Sobre o tema, trago à colação as lições de Gustavo Henrique Badaró:

“A prorrogação de competência leva em conta,


basicamente, a distinção entre competência absoluta e relativa.
Necessário, porém, fazer uma ressalva terminológica. A
competência, definida seja como quantidade de jurisdição, seja
como relação de adequação legítima do juiz ao processo, não
possui graus ou intensidades distintas. Ou o juiz pode
legitimamente exercer a jurisdição em um caso concreto, ou
faltará o pressuposto processual da competência. O vício da
incompetência, este sim, pode ter graus. Há critérios distintos
de fixação de competência, com relevâncias ou finalidades
variadas, cuja violação poderá acarretar um vício mais grave ou
menos grave. Este vício ou inadequação do juiz ao processo
pode ter graus. Assim, não há competência absoluta ou relativa,
mas sim incompetência absoluta ou relativa. De acordo com a
natureza ou a espécie do critério violado, o juiz será absoluta ou
relativamente incompetente.
A chamada ‘competência absoluta’ é aquela determinada
por critérios cuja inobservância acarreta uma nulidade
insanável. Isto é, trata-se de competência que não pode ser
modificada (improrrogável). Consequentemente, por se tratar
de inobservância de regra fixada no interesse público da correta
prestação jurisdicional, a incompetência absoluta pode ser
declarada de ofício pelo juiz, em qualquer tempo ou grau de
jurisdição.
Por sua vez, a denominada competência relativa é aquela
fixada por critérios cuja inobservância acarreta uma nulidade
sanável. Em outras palavras, a competência relativa pode ser
modificada (prorrogável). Como no caso de incompetência

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relativa o critério desrespeitado foi fixado no interesse da parte,


sua inobservância somente trará prejuízo à própria parte.
Assim, apenas se houver alegação da parte prejudicada, por
meio de exceção de incompetência, o juiz poderá reconhecê-la,
sendo-lhe vedado declará-la de ofício.” (in Processo Penal [livro
eletrônico]. 6ª ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020. RB-
6.10)

No caso, restou demonstrado que as condutas atribuídas ao paciente


não foram diretamente direcionadas a contratos específicos celebrados
entre o Grupo OAS e a Petrobras S/A, constatação que, em cotejo com os
já estudados precedentes do Plenário e da Segunda Turma do Supremo
Tribunal Federal, permite a conclusão pela não configuração da conexão
que autorizaria, no caso concreto, a modificação da competência
jurisdicional.
Com efeito, o único ponto de intersecção entre os fatos narrados na
exordial acusatória e a causa atrativa da competência da 13ª Vara Federal
de Curitiba é o pertencimento do Grupo OAS ao cartel de empreiteiras
que atuava de forma ilícita – dentre outros órgãos públicos, sociedades de
economia mista e empresas públicas –, em contratações celebradas com a
Petrobras S/A.
Mas não cuida a exordial acusatória de atribuir ao paciente uma
relação de causa e efeito entre a sua atuação como Presidente da
República e determinada contratação realizada pelo Grupo OAS com a
Petrobras S/A, em decorrência da qual se tenha acertado o pagamento da
vantagem indevida.
Na estrutura delituosa delimitada pelo Ministério Público Federal,
ao paciente são atribuídas condutas condizentes com a figura central do
grupo criminoso organizado, com ampla atuação nos diversos órgãos
pelos quais se espalharam a prática de ilicitudes, sendo a Petrobras S/A
apenas um deles, conforme já demonstrado em excerto colacionado da
exordial acusatória.
O caso, portanto, não se amolda ao que veio sendo construído e já
decidido no âmbito do Plenário e da Segunda Turma do Supremo

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Tribunal Federal a respeito da competência da 13ª Vara Federal de


Curitiba, delimitada, como visto, exclusivamente aos ilícitos praticados
em detrimento da Petrobras S/A.
Nesse sentido, calha destacar, foi a conclusão exarada pela Segunda
Turma por ocasião do julgamento de agravos regimentais interpostos nos
autos da PET 6.664, destinada ao tratamento de termos de depoimento
prestados em acordos de colaboração premiada firmados por
colaboradores ligados ao Grupo Odebrecht, inicialmente remetidos à 13ª
Vara Federal de Curitiba, mas redirecionados à Seção Judiciária do
Distrito Federal por deliberação majoritária. Confira-se:

EMENTA Agravo regimental no agravo regimental na


petição. Impugnação da decisão em que se determinou a
remessa à Seção Judiciária do Paraná de cópia de termos de
depoimento colhidos no âmbito de acordo de colaboração
premiada celebrado entre o Ministério Público Federal e
integrantes do Grupo Odebrecht. Aventado bis in idem.
Alegação de que os fatos relatados coincidiriam com o objeto do
Inq nº 4.437 e do Inq. 4.430, em trâmite no Supremo Tribunal
Federal. Não ocorrência. Pretendida fixação da competência da
Seção Judiciária de São Paulo ou do Distrito Federal para
conhecer de supostos ilícitos penais noticiados nos termos de
colaboração. Plausibilidade jurídica da tese defensiva. Narrativa
que faz referência a fatos supostamente ocorridos em São Paulo
e em Brasília que, a princípio, não se relacionam com os ilícitos
ocorridos no âmbito da Petrobras, alvo de apuração na
Operação Lava a Jato, não se justificando, portanto, a
competência do Juízo de Curitiba/PR. Núcleo político que
deverá ser processado na Capital Federal, na linha de
precedentes. Agravo regimental ao qual se dá provimento tão
somente para determinar a remessa dos termos de colaboração
premiada à Seção Judiciária do Distrito Federal. Determinação
que não firma, em definitivo, a competência do juízo indicado.
Investigação em fase embrionária. Impossibilidade, em sede de
cognição sumária, de se verticalizar a análise de todos os

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aspectos concernentes à declinação de competência.


Precedentes. (Pet 6664 AgR-AgR, Rel.: EDSON FACHIN, Rel. p/
Acórdão: DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em
14.8.2018)

Elucidativos são os fundamentos declinados pelo eminente Ministro


Dias Toffoli, designado Redator para o acórdão:

“(...)
Todavia, o contexto dos autos demonstra que a narrativa
dos colaboradores faz referência a supostos fatos ocorridos em
São Paulo e em Brasília que, a princípio, não se relacionam com
os ilícitos ocorridos no âmbito da Petrobras propriamente dito,
alvo de apuração na Operação Lava a Jato, não se justificando,
portanto, a competência do Juízo de Curitiba/PR.
Por essa perspectiva, o caso, com a devida venia do
Relator, é de fixação da competência das Seções Judiciárias de
São Paulo ou do Distrito Federal.
Contudo, à luz da conclusão da Corte no julgamento
conjunto dos agravos regimentais interpostos nos autos do Inq
nº 4.327 e do Inq nº 4.483, em 19/12/17, de que o núcleo político
deveria ser processado nesta Capital Federal, o Ministro Edson
Fachin, no julgamento do Inq nº 4.325/DF, “que atribuía a
Guido Mantega suposta participação em organização
criminosa, com base em relatos das delações da Odebrecht, João
Santana e da JBS”, decidiu declinar da competência da Corte
para a Seção Judiciária do Distrito Federal.
No que se refere ao agravo regimental do Ex-Presidente
Lula, a despeito de a narrativa dos colaboradores fazer
referência a supostos fatos ocorridos em São Paulo e em
Brasília, o que, a princípio, não se relaciona com os ilícitos
ocorridos no âmbito da Petrobras propriamente dito, alvo de
apuração na Operação Lava a Jato, penso, pelas mesmas
premissas do entendimento externado no caso do agravante
Guido Mantega, que essa hipótese também é de fixação da
competência da Seção Judiciária do Distrito Federal.

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Importante frisar, por fim, nos que se refere aos


agravantes, que as investigações se encontram em fase
embrionária. Diante da impossibilidade, em sede de cognição
sumária, de se verticalizar a análise de todos os aspectos
concernentes à declinação de competência, o encaminhamento
de termos de colaboração em questão não firmará, em
definitivo, a competência do juízo indicado, devendo ser
observadas as regras de fixação, de modificação e de
concentração de competência, respeitando-se, assim, o princípio
do juiz natural (v.g. Inq nº 4.130/PRQO, Pleno, de minha
relatoria, DJe de 3/2/16).
Em face dessas considerações, rogando novamente a mais
respeitosa venia ao Relator, dou provimento aos agravos
regimentais de Guido Mantega e de Luiz Inácio Lula da Silva
para determinar o encaminhamento dos autos à Seção
Judiciária do Distrito Federal” (PET 6.664, fls. 250-251).

Considerados os precedentes sobre o tema e as razões expostas,


afigura-se impositivo, ante o que se formou como direção majoritária no
Tribunal, o reconhecimento da procedência dos argumentos declinados
pelos impetrantes para reconhecer a incompetência do Juízo da 13ª Vara
Federal as Subseção Judiciária de Curitiba ao processo e julgamento da
Ação Penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR.
Como corolário de tal conclusão, nos termos do art. 567 do Código
de Processo Penal, devem ser declarados nulos todos os atos decisórios,
inclusive o recebimento da denúncia, determinando-se a remessa dos
autos à Seção Judiciária do Distrito Federal, considerada a narrativa da
prática delitiva no exercício do mandato de Presidente da República.

4. Da verificação de constrangimento ilegal em casos análogos já


submetidos ao conhecimento do Supremo Tribunal Federal.

Encontram-se em tramitação perante o Supremo Tribunal Federal


outras ações de índole constitucional em que a defesa técnica do paciente
se insurge contra supostas ilegalidades praticadas no âmbito de outras

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ações penais também deflagradas perante a 13ª Vara Federal da Subseção


Judiciária de Curitiba.
Do conteúdo das impugnações, é possível concluir que ao paciente
também se atribui a prática de crimes de corrupção passiva e lavagem de
dinheiro nos autos das Ações Penais n. 5021365-32.2017.4.04.7000/PR (HC
174.988, Doc. 18) e 5063130-17.2018.4.04.7000/PR (RCL 33.543, Doc. 5), e
apenas lavagem de capitais nos autos da Ação Penal n. 5044305-
83.2020.4.04.7000/PR (RCL 45.325, Doc. 9), todas com tramitação perante o
aludido Juízo.
Em todos os casos, as denúncias foram estruturadas da mesma
forma daquela ofertada nos autos da Ação Penal n. 5046512-
94.2016.4.04.7000/PR, ou seja, atribuindo-lhe o papel de figura central do
grupo criminoso organizado, com ampla atuação nos diversos órgãos
pelos quais se espalharam a prática de ilicitudes, sendo a Petrobras S/A
apenas um deles.
Com efeito, de acordo com a narrativa exposta pelo Ministério
Público Federal em denúncia oferecida nos autos da Ação Penal n.
5063130-17.2018.4.04.7000/PR, na mesma espacialidade, o paciente teria
recebido do Grupo Odebrecht vantagens indevidas consistentes “em um
imóvel para a instalação do Instituto Lula”, à época avaliado em R$
12.422.000,00; bem como no “apartamento nº 121 do Residencial Hill House,
bloco 1, localizado na Avenida Francisco Prestes Maia, 1.501, São Bernardo do
Campo/SP”, avaliado em R$ 504.000,00.
Não há, contudo, o apontamento de qualquer ato praticado pelo
paciente no contexto das específicas contratações realizadas pelo Grupo
Odebrecht com a Petrobras S/A, o que afasta, por igual, a competência da
13ª Vara Federal de Curitiba ao processo e julgamento das acusações.
Idêntica omissão é constatada na denúncia oferecida nos autos da
Ação Penal n. 5021365-32.2017.4.04.7000/PR, segundo a qual o paciente
teria recebido dos Grupos OAS e Odebrecht vantagens indevidas
consubstanciadas em reformas patrocinadas em sítio, localizado no
Município de Atibaia/SP, as quais totalizaram R$ 1.020.500,00.
O mesmo ocorre com a denúncia formulada nos autos da Ação Penal

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n. 5044305-83.2020.4.04.7000/PR, em que se atribui a prática de crimes de


lavagem de capitais, consistentes em 4 (quatro) supostas doações
simuladas, realizadas pelo Grupo Odebrecht, em favor do Instituto Lula,
cada uma no valor de R$ 1.000.000,00, realizadas nos dias 16.12.2013,
31.1.2014, 5.3.2014 e 31.3.2014, totalizando a quantia de R$ 4.000.000,00.
Nesse sentido, constatada a identidade de situações jurídicas, nos
termos do art. 654, § 2º, do Código de Processo Penal, torna-se imperiosa
a extensão dos fundamentos declinados nesta decisão às demais ações
penais que tramitam em desfavor do paciente perante a 13ª Vara Federal
da Subseção Judiciária de Curitiba.

5. Dispositivo.

Ante o exposto, com fundamento no art. 192, caput, do RISTF e no


art. 654, § 2º, do Código de Processo Penal, concedo a ordem de habeas
corpus para declarar a incompetência da 13ª Vara Federal da Subseção
Judiciária de Curitiba para o processo e julgamento das Ações Penais n.
5046512-94.2016.4.04.7000/PR (Triplex do Guarujá), 5021365-
32.2017.4.04.7000/PR (Sítio de Atibaia), 5063130-17.2018.4.04.7000/PR
(sede do Instituto Lula) e 5044305-83.2020.4.04.7000/PR (doações ao
Instituto Lula), determinando a remessa dos respectivos autos à Seção
Judiciária do Distrito Federal. Declaro, como corolário e por força do
disposto no art. 567 do Código de Processo Penal, a nulidade apenas dos
atos decisórios praticados nas respectivas ações penais, inclusive os
recebimentos das denúncias, devendo o juízo competente decidir acerca
da possibilidade da convalidação dos atos instrutórios.
Considerada a extensão das nulidades ora reconhecidas, com
fundamento no art. 21, IX, do RISTF, declaro a perda do objeto das
pretensões deduzidas nos habeas corpus 164.493, 165.973, 190.943, 192.045,
193.433, 198.041, 178.596, 184.496, 174.988, 180.985, bem como nas
Reclamações 43.806, 45.948, 43.969 e 45.325.
Junte-se cópia desta decisão nos autos dos processos relacionados,
arquivando-os.

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Comunique-se a Presidência do Supremo Tribunal Federal, perante a


qual tramita o ARE 1.311.925.
Publique-se. Intime-se.
Brasília, 8 de março de 2021.

Ministro EDSON FACHIN


Relator
Documento assinado digitalmente

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