Filosofiado Direitoe Contemporaneidade II
Filosofiado Direitoe Contemporaneidade II
Filosofiado Direitoe Contemporaneidade II
)
Leno Francisco Danner
O livro que o leitor tem em mãos é fruto de um trabalho coletivo levado a
efeito pelos autores que acolheram o desafio proposto pelos organizadores de
pensar a Filosofia do Direito a partir de diversos contextos e problemas, mas
que tem um, por assim dizer, núcleo comum: a contemporaneidade. É certo que
os conceitos, quando dissociados de seu necessário contexto, são nada mais do
que chavões que não cumprem a função para as quais aqueles existem: orientar
o pensamento e tornar possível a compreensão dos problemas aos quais se
buscou, ao fim e ao cabo, responder. Posto isso, o que devemos entender por
contemporâneo? A seguir, as lições de Roland Barthes no Collège de France, “[…]
contemporâneo é o intempestivo”. Trata-se, como se pode perceber, de um
conceito interessante, quase um paradoxo: se geralmente pensamos o contem-
Os organizadores
Porto Velho (RO), agosto de 2020.
Filosofia do Direito e
Contemporaneidade II
Fundação de Amparo Programa de Jus Gentium –
ao Desenvolvimento Pós-Graduação Grupo de Estudos e
das Ações Científicas em Filosofia. Pesquisas em Direito
e Tecnológicas e a Universidade Federal Internacional
Pesquisa de Rondônia
Leno Fran cis co Da n n er
Marcu s Vin íciu s Xav ier de Ol i vei ra (Orgs . )
Filosofia do Direito e
Contemporaneidade II
1ª Edição
São Carlos / S P
Editora De Cas t ro
2020
Copyright © 2020 dos autores.
DOI: 10.46383/isbn.978-65-5854-O58-8
Introdução .................... 9
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ensão dos problemas aos quais se buscou, ao fim e ao cabo, responder. Pos-
to isso, o que devemos entender por contemporâneo? A seguir, as lições de
Roland Barthes no Collège de France, “[…] contemporâneo é o intempesti-
vo”. Trata-se, como se pode perceber, de um conceito interessante, quase
um paradoxo: se geralmente pensamos o contemporâneo como aquilo que
nos é atual, no tempo e no espaço, para Barthes ele significa aquilo que é
extemporâneo, aquilo que chega atrasado e, por isso, é imprevisto, mesmo
inoportuno. Nesse sentido, todos os trabalhos aqui reunidos se preocupam
em dar respostas a problemas contemporâneos-extemporâneos da filoso-
fia jurídica, seja em sentido estrito, seja em uma interpenetração com os
demais ramos do saber humano.
Portanto, queremos agradecer a todos quanto colaboraram para o
surgimento desta coletânea e à Fundação Rondônia de Amparo ao Desen-
volvimento das Ações Científicas e Tecnológicas e à Pesquisa do Estado
de Rondônia (FAPERO), cujo financiamento permitiu a organização e a
publicação deste material.
Os organizadores
Porto Velho (RO), agosto de 2020.
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PARTE I
Filosofia e Biopolítica
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[Entrevista]: Toda filosofia é, em si, política
Edgardo Castro
Roberto Esposito
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Filosofia e Biopolítica1
Roberto Esposito
1 Trata-se da exposição feita pelo autor na Cidade de Buenos Aires, no dia 25 de setembro de 2006, por ocasião de
sua visita à Argentina. O tradutor agradece imensamente ao Professor Esposito por tê-lo autorizado traduzir e publicar
o texto de sua conferência.
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ta? Qual é essa outra cena, essa outra lógica, esse outro objeto que a filosofia
política moderna não logra expressar e, melhor ainda, tende a obscurecer?
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na segunda fase, que chega até nós de maneiras diferentes ao mesmo tem-
po em que descontínuas, a mediação vai progressivamente desaparecendo
em favor de uma superposição muito mais imediata entre política e bíos.
A importância que já no final do século XVIII adquirem, na lógica
do governo, as políticas sanitárias, demográficas e urbanas marca esta
mudança. Mas é só o primeiro passo até uma caracterização Biopolítica
que penetra todas as relações em que está organizada a sociedade. Fou-
cault analisou as diferentes etapas deste processo de governamentalização
da vida, desde o chamado poder pastoral, vinculado à prática católica da
confissão, até a Razão de Estado, até os saberes de polícia (termo com o
qual, então, se referia a todas as práticas alusivas ao bem-estar material).
A partir deste momento, por um lado, a vida (sua manutenção, seu desen-
volvimento, sua expansão) assume uma relevância política estratégica,
se converte na aposta decisiva dos conflitos políticos e, por outro lado, a
mesma política tende a configurar-se seguindo modelos biológicos e, em
particular, médicos.
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tos da vida, restituindo à morte uma vida já falecida, dando morte a uma
vida habitada e corrompida, desde sempre, pela morte. Assumiram a morte
como objeto e, ao mesmo tempo, instrumento de cura em favor da vida.
Por isto, eles sempre mantiveram o culto de seus próprios antepassados
mortos; porque, numa perspectiva Biopolítica completamente invertida
em tanatopolítica, só a morte pode tocar o papel de defender a vida em si
mesma, submetendo toda a vida ao regime da morte. O cinquenta milhões
de mortes produzidos pela Segunda Guerra Mundial constituem o resulta-
do inevitável a que deveria conduzir esta lógica.
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Magnus Dagios
Introdução
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Nos termos de Carl Schmitt, essa seria a ditadura comissária (ou de-
legada) para diferenciar da ditadura soberana. Para Schmitt, com o surgi-
mento dos Estados Absolutistas nos séculos XVI e XVII, o termo perdeu
o seu significado originário muito em função de que, naquele tempo, não
havia o interesse de se saber sobre o desenvolvimento que levou da demo-
cracia até o cesarismo. Os reis absolutistas originavam sua legitimidade da
“graça de deus”, e não do consenso popular, o que também contribuiu para
o esquecimento do significado. Mas, entre os estudiosos de teoria política
e constitucional da época encontram-se alguns casos em que o termo é en-
tendido como parte de uma teoria geral de governo, como em Maquiavel:
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A lacuna não é interna à lei, mas diz respeito à sua relação com
a realidade, à possibilidade mesma de sua aplicação. É como
se o direito contivesse uma fratura essencial entre o estabe-
lecimento da norma e sua aplicação e que, em caso extremo,
só pudesse ser preenchido pelo Estado de Exceção, ou seja,
criando-se uma área onde essa aplicação é suspensa, mas onde
a lei, enquanto tal, permanece em vigor (Ibidem, p. 49).
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Considerações Finais
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Referências
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A evolução do poder soberano no contexto europeu
- a transição para o poder moderno no Brasil
Lucimar Simon
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XVI e XIX é uma realidade histórica que chegou até nós por sucessivas
interpretações, de modo que não podemos ter pretensão de conhecê-la
como realmente foi.” (Ibidem, p. 13).
Com o passar dos anos e as transformações que ocorriam no mun-
do, não só a Colônia Portuguesa na América como várias outras colônias
europeias pelo mundo foram criando e esboçando gradativamente uma
identidade nacional. As primeiras produções identitárias relevantes sobre
o período colonial brasileiro surgem já dentro do Segundo Reinado. “A
primeira concepção efetivamente completa da formação colonial apareceu
nas décadas de 1840 e 1850, com o desenvolvimento dos estudos brasileiros
no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e a publicação da História
Geral do Brasil, de Varnhagen, em 1854.” (Ibidem, p. 13).
O poder soberano é instalado no Brasil no contexto histórico de pro-
dução de novas mentalidades advindas justamente da passagem do mundo
medieval para o moderno. O próprio pensamento europeu se confundia com
a amplitude e velocidade das transformações. O processo de passagem do
medievo para o moderno permitiu a convivência, nas mesmas épocas, tanto
do pensamento medieval quanto do pensamento moderno. “No Brasil colo-
nial, esse processo não apenas se repetiu; a mentalidade medieval e a men-
talidade moderna mesclando-se nos colonizadores; como se tornou ainda
mais complexo com a mistura de outras culturas, como as indígenas e as
negras, pertencentes a tempos culturais ainda mais diversos.” (Ibidem, p. 22).
O poder soberano que chegou ao Brasil no período colonial veio por
representação. Os primeiros portugueses que chegaram, fincaram a cruz,
hastearam a bandeira para demonstrar que naquelas terras estava presente
o poder do soberano português e da Santa Igreja. Mais tarde, ainda por meio
da representação, instalaram feitorias e enviaram expedições exploradoras.
Para o processo de colonização, o território foi dividido em capitanias he-
reditárias e entregues a homens de confiança do soberano. “As capitanias
foram doadas a donatários que, em geral, pertenciam à nobreza de serviço
já associada aos empreendimentos governamentais na Ásia.” (Ibidem, p. 68).
Esses homens podiam agir em nome do soberano: cobrar impostos
em rios e portos; tirar para si uma porcentagem no negócio do pau-brasil;
julgar os habitantes da capitania, podendo, inclusive, condenar à morte
índios, negros e homens livres pobres; conceder lotes de terras que deve-
riam ser cultivados pelos colonos. Desta forma, vemos o exercício do poder
soberano representado pelo capitão-donatário. Depois, a administração do
território foi entregue à figura do Governador-Geral, homem forte e de ex-
trema confiança do soberano. Foram três, respectivamente: Tomé de Sou-
sa, Duarte da Costa e Mem de Sá.
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Neste resumo do Brasil Colonial, vemos que após três séculos per-
manecem as características de um país de muitos contrastes e situações
extremas, com mercado incipiente, pluralidade religiosa, distintas classes
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os efeitos até que, 1831, cai, pela gangrena, o que já era esfa-
celo. Esses longos nove anos patenteiam a miséria política do
Brasil inoculado de bragantismo (Ibidem, p. 47).
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A política de D. Pedro não foi, não poderia ter sido outra coisa
que o reflexo de forças que atuavam no seio da sociedade; e pode-
mos até dizer, se tivéssemos de determinar o grau de contribuição
individual do imperador para a evolução do país, ela interveio em
proporções insignificantes, praticamente nulas.” (Ibidem, p. 100).
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Referências
AGAMBEN, Giorgio. Estado de Exceção: [Homo Sacer, II, I]. 2. ed. São
Paulo: Boitempo, 2004.
ANDERSON, Perry. Linhagens do Estado Absolutista. São Paulo: Edito-
ra Brasiliense, 1985.
BOMFIM, Manoel. O Brasil nação. Rio de Janeiro: Record, 1998.
BRASIL. [Constituição (1891)]. Constituição da República dos Estados
Unidos do Brasil: promulgada em 24 de fevereiro de 1891. Sala das Ses-
sões do Congresso Nacional Constituinte - Rio de Janeiro, 1891.
BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Bra-
sil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Brasília – Senado Federal, 2002.
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PARTE II
1 Este ensaio foi inicialmente publicado em GIL, L. Σοφοκλής/Sófocles. Ἀντιγόνη/Antígona, trad. e intr. Luis Gil,
Random House Mondadori, 1981, p. 78-89. O tradutor agradece imensamente a liberalidade dos Professores Jordi
Balló e Xavier Pérez por permitirem a tradução e publicação deste texto fabuloso.
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2 Idem. Antígonas: La travesía de un mito universal por la historia de Occidente. Barcelona: Gedisa, Barcelona, 2000.
3 O nome dessa Eurídice não deve ser confundido com o da esposa de Orfeu, mito com significado muito diferente.
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dades a que foi condenada toda a família de Édipo depois que seu pai,
Laio, cometeu um ato vergonhoso raptando o filho do rei, que o acolheu
no exílio. É característico das tragédias gregas que os heróis paguem
pela culpa dos pais. Laio morre pelas mãos de seu filho, Édipo, que se
casa com sua mãe, Jocasta, sem saber que o é. Muitos anos depois, tem
lugar o terrível reconhecimento dos fatos, que leva Édipo a arrancar seus
olhos, e Jocasta a suicidar-se. Os filhos de seu incesto, Polinices, Etéo-
cles, Antígona e Ismene encontram-se, por isso, condenados à desgra-
ça. Suas desditas dão azo a diversas tragédias. N’Os sete contra Tebas,
Ésquilo recria os acontecimentos imediatamente anteriores à tragédia
de Antígona. Despois da morte de Édipo, os dois irmãos devem compar-
tilhar o trono de Tebas, dividindo o reinado durante anos alternativos.
Etéocles, no entanto, se assenta no trono sem cedê-lo, e Polinices arma
um exército estrangeiro para invadir a cidade. Num combate corpo a
corpo, os dois irmãos morrem aos pés da muralha. Esse clímax dramá-
tico é o final d’Os sete contra Tebas e dá passo ao início de Antígona,
de Sófocles. O fio condutor dessa nova tragédia é a decisão do regente,
Creonte, de ordenar que Etéocles seja enterrado com todas as honras,
enquanto o corpo do irmão fique insepulto, algo que supõe, para a reli-
gião grega, uma tortura eterna para a alma do defunto.
Por que esse ato de violência contra a sobrinho morto? Por que essa
inflexibilidade desapiedada do governante? Há um enigma em Antígona
que cria inquietude no leitor se atende ao desenvolvimento integral da
saga. Etéocles, o defensor da cidade, traiu a ordem [el dictado] de seu pai,
Édipo, ao impedir que Polinices compartilhasse com ele o poder. Entre-
tanto, é o cadáver de Polinices que é castigado, é o irmão quem tinha direi-
to a governar o que é considerado, aos olhos do Estado, como culpado. Por
que essa condenação dos irmãos arbitrariamente desterrados?
Como a história demonstrou tantas vezes, a paz é regrada [legislada]
pelos vencedores. Sófocles não faz nada para explicar que pactos políticos
foram estabelecidos entre Etéocles e seu tio, Creonte, para considerar que
deveriam desatender às ordens de Édipo e fortalecer o reinado de um único
irmão, o que governa Tebas nesse momento. As razões de Polinices não
são ouvidas nunca, e nem mesmo Antígona as contempla em sua defesa.
Ela também aceita que o irmão rebelde tenha invadido a cidade, pois o
objetivo dela não era exculpar a ninguém, mas apelar à piedade: antepor o
irmão fraternal à decisão política.
O que prevalece no debate, então, não é se Polinices tinha ou não
razão para atacar, mas o fato de ter atentado contra a cidade, uma cidade
concebida por Creonte como espaço da ordem, como arquitetura do Es-
tado. Polinices foi contra essa ordem e, para o regente, o castigo devia ser
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A Ação Individual
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5 Na [peça] posterior de Antígona, de Eurípedes, conservada somente em fragmentos, o gosto pela humanização
sentimental característica desse outro grande trágico faz com que Hémon seja cúmplice de Antígona em todos os atos
e outorga à obra toda maior protagonismo à história amorosa de ambos.
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6 Ifigênia, filha de Agamenon, aceitou ser sacrificada por ordem dos deuses para permitir que o vento se levantasse e
os barcos de seu pai pudessem partir para Troia guerrear.
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Um gesto universal
7 Steiner (Antígonas, p. 133-134) constata a impossibilidade de estabelecer um catálogo exaustivo de obras em que
Antígona aparece, uma vez que elas se contam às centenas.
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8 Para as representações posteriores à sua estreia, Brecht suprimiu esse prólogo, substituindo-o por um breve
discurso de introdução. Brecht não queria que uma situação histórica concreta dificultasse a atualização objetiva do
público perante o conteúdo da obra. Veja-se; LASSO, J. S. De Sófocles a Brecht. Barcelona: Planeta, 1970, p. 332.
9 ARMEL, A. Antigone. Paris: Autrement, p. 63-67, 1999.
10 Estreado em 18 de setembro de 1927, o espetáculo contava com o trabalho de Picasso na decoração, Coco Chanel
no vestuário e Antonin Artaud no papel de Tirésias. Apesar de seu evidente compromisso com a liberdade e sua
esperança vanguardista, a representação desse dia de estreia foi interrompida por André Breton e o grupo surrealista,
que acusam Cocteau de pretensioso e esteticista.
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Antígona, ou o anticine
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O Velho e o Novo
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11 Consulte-se: DA ROCHA, A. C. A desobediência civil a partir de Thoreau. San Sebastían: Gakoa, 2002.
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As elegias da Terra
12 (Nota do tradutor): Preferi manter a expressão original a substituir por outra aproximada em língua portuguesa.
Segundo o Diccionario de la Lengua Española – Real Academia Española, a expressão “numantino/na” tem os
seguintes significados: a) natural de Numancia, antiga cidade da Hispânia Citerior. Essa denotação é registrada pelo
Houaiss no vocábulo “numantino”; b) pertencente ou relativo a Numância ou a seus naturais; e c) aquele que resiste
com tenacidade até o limite, geralmente em condições precárias.
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intrigas sociais e lutas pelo poder, que não se dobram jamais à inteireza
da protagonista. A imagem do tribunal masculino, autoritário, inquisi-
dor, perante uma acusada que obteria sua libertação somente se se re-
tratasse de suas afirmações é equiparável, em muitos aspectos, ao duelo
de forças entre Antígona e Creonte. Especialmente as versões de Carl
Theodor Dreyer (1928) e Robert Bresson (1962), que concentram toda sua
dramaturgia no juízo da mártir, abundam nessa retórica da confrontação
antitética entre dois poderes que não querem mover-se de suas respecti-
vas posições. Como na obra de Sófocles, faz-se visível o estranho empa-
relhamento entre uma fé santificadora e a divindade primitiva, anterior
a toda lei escrita e a todo tribunal humano que assume Antígona em sua
trajetória suicida em direção à imolação.
A influência da Joana D’Arc cinematográfica – especialmente a
de Dreyer – teve, na história do cinema, o poder de explicar a reutili-
zação dessa figuração resistente e abnegada em outro diretor dinamar-
quês, Lars von Trier. Muitos dos filmes desse autor polêmico, de vocação
transcendental e formalismo distanciador e crítico, seguem a trajetória
de heroínas obcecadas numa ética privada, impossível de ser comparti-
lhada pela comunidade em que vivem e que as leva ao martírio. Em Rom-
pendo as ondas [no Brasil: Ondas do Destino] (Breaking the waves, 1996) e
em Dançando no escuro (Dancer in the dark, 2000), a negatividade suici-
da de referidas heroínas encontra seu ápice dramático em uma bondade
transcendente, eminentemente religiosa, que lhes permite sofrer as in-
justiças e, de certa forma, reafirmar-se com elas. Existe na posta em cena
desses filmes um minimalismo expressivo solene que sabe confrontar,
por meio do emprego do primeiro plano, o intangível código da femini-
lidade incorruptível com a volubilidade de um universo autoritário e pa-
triarcal que usa a violência para compensar o que jamais consegue obter:
o acatamento dócil dessas figuras femininas. Se em Rompendo as ondas
a protagonista, contra toda a moral de uma comunidade protestante in-
transigente, se prostitui até o maltrato e à morte para acabar curando
milagrosamente seu esposo inválido, em Dançando no escuro a tragédia
se evidencia de forma mais nua pelo recurso ao juízo contra a inocente:
uma mulher imigrante que matou seu violador em defesa própria nega-
-se a confessar o que aconteceu, de fato, perante um desalmado tribunal
norte-americano. O desenlace não pode ser outro que sua condenação à
morte e sua execução, mas o que se castiga não é um assassinato, mas a
imersão suicida da heroína no silêncio santo, imóvel e obstinado, carac-
terístico de todas as Antígonas.
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Cadáveres de guerra
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Direito de resistência dos povos tradicionais
no Equador: fatores que levaram
aos protestos de 2019
Introdução
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Contexto Histórico-Político
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petróleo, levam o governo a uma nova crise ainda mais profunda. Então,
em 1988 é eleito Rodrigo Borja Cevallos, do Partido da Esquerda Demo-
crática, concorrendo com Abdalá Bucaram, tendo novamente o vencedor
adotado políticas de abertura de mercado.
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Direito de Resistência
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Ocorre que no Equador, tal como em boa parte dos países latino-ame-
ricanos, a liberdade de expressão, exercida em forma de protesto contra atos
de governo, não é bem vista. Inclusive, alguns instrumentos do ordenamento
jurídico são utilizados para reprimir o exercício desse direito fundamental,
como ocorre com o crime de desacato e a Lei nº 7.170/831 no Brasil.
Desse modo, os protestos são uma garantia da democracia quando os
mecanismos democráticos não são efetivos (Ibidem). Por isso, constituem
instrumento indispensável para o funcionamento do Estado Democrático
de Direito e não podem ser cerceados. No caso equatoriano, destaca-se a
seguinte constatação:
1 Denominada “Lei de Segurança Nacional”, define os crimes contra a segurança nacional, a ordem política e social.
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Considerações Finais
Referências
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Contractarianism and its legacy in International
Relations theories: a look from Brazil1
Gills Vilar-Lopes
Lucas Maximo
Theo Antônio R. Sant’Ana
Introduction
1 This is a translated version of: Vilar-Lopes, Gills, Lucas Maximo e Theo Antônio Sant’Ana. 2018. “O Contratualismo e
seu Legado nas Teorias de Relações Internacionais: um olhar a partir do Brasil”. Leviathan (São Paulo), nº 12 (Feb.), 89-
119. https://doi.org/10.11606/issn.2237-4485.lev.2016.143407. The authors would like to thank the Leviathan Editorial
Board for their authorization.
2 Although social contract theorists are also included in the sub-area of “classical” political theory, we prefer the
epithet “modern”, as it is precisely in the so-called Modern Age - usually dated from 1453 to 1789 - that, in fact,
such an intellectual tradition flourishes and takes a privileged place in political philosophy (BOBBIO; MATTEUCCI;
PASQUINO, 2004, p. 272).
3 The homograph term “International Relations” (IR) designates the area of knowledge whose object of study is
“international relations”. The adjective “internationalist” refers to this area; and “international”, therefore, to its object.
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Methodological Aspects
This section aims to point out what motives and works will be
analyzed based on the main objective of this work. Thus, bibliographic
research seeks to filter thinkers and their contractarian works that have
an impact on IR.
It should be borne in mind that the strict sense of contractarianism
is based on the seven authors already listed in the previous section. Thus,
the following works bring the original theories on the social contract:
8 Regarding Spinozian work, it is worth noting that his conceptual constructs stem from the adaptation to reasoning,
to the ontological conception of God and to human existence with its existential conditions, expressed mainly in the
first 15 chapters of the Theological-political treatise (1670). An analysis covering all this progression would certainly
deserve a separate work; here, only the fractions appropriate to contractarian thought are exposed, mainly pointed
out in the political part of its treaty.
9 The First Treatise of Government (1681) is a critique of Robert Filmer’s Patriarcha (1680); the Second Treatise of
Government, also dating from 1681, is an essay on the origin, limits and real ends of civil government (LOCKE, 2006, p. 35).
10 The research is carried out in PPGs in PS and IR because, within the scope of the Brazilian Federal Agency for
Support and Evaluation of Graduate Education (CAPES), both fields are part of a single Evaluation Area. The study is
based on the Brazilian case, for logistical reasons to research each lesson plan.
11 This list was prepared taking into account the CAPES 2015 assessment.
119
Leno Francisco Danner
Marcus Vinícius Xavier de Oliveira (Orgs.)
Table 1 presents the research findings, taking into account both the strict
sense of contractarianism and the selection criteria for the research sample.
PS-USP b) X X X X
PS-UFMG c) X X X
PS-UERJ d) X X X X X
PS-UFPE e) X X X
IR-PUC-Rio f)
IR - UnB
a) https://sucupira.capes.gov.br/sucupira/public/consultas/coleta/
programa/listaPrograma.jsf.
b) http://www.fflch.usp.br/dcp/assets/docs/Eunice/TeoriaPensamen-
toPolitico.pdf and http://www.fflch.usp.br/dcp/assets/docs/Eunice/
ModalidadesPensamentoPoltico.pdf
c) http://www.cienciapoliticaufmg.com.br/uploads/midia/arqui-
vo/103/Ementa_e_Programa_Prof._Fernando_Teoria_Pol_tica.pdf.
d ) http://www.iesp.uerj.br/wp-content/uploads/2015/05/Teoria-
-Pol%C3%ADtica-I.pdf;
e) http://www.iesp.uerj.br/wp-content/uploads/2015/04/Teoria-
-Pol%C3%ADtica-I3.pdf;
http://www.iesp.uerj.br/wp-content/uploads/2015/05/Teoria-
-Pol%C3%ADtica-I1.pdf; and
http://www.iesp.uerj.br/wp-content/uploads/2015/04/Teoria-
-Pol%C3%ADtica-I-.pdf.
120
Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
f) https://www.ufpe.br/politica/images/Ementas/teopol.pdf
g) http://www.iri.puc-rio.br/pos-graduacao; and offline lesson plans
from the master’s level courses of “State, Sovereignty and Moderni-
ty” and “International Relations Theory”*.
h) http://irel.unb.br/ensino-e-pesquisa/pos-graduacao;
https://www.matriculaweb.unb.br/matriculaweb/posgraduacao/cur-
riculo.aspx?cod=8559; and
https://www.matriculaweb.unb.br/matriculaweb/posgraduacao/cur-
riculo.aspx?cod=60232
As seen in Table 1 , both Althusius and Pufendorf12 are the only au-
thors who are not used by any of the sample’s PPGs. This finding is in line
with Boysen and Boucher (2010), who note the need to bridge the gap be-
tween political theory and IR theories, showing how the writings of Gro-
tius, Vattel, and Pudendorf are, for example, little-explored academically.
Another gap that draws attention is the fact that the only two IR
stricto sensu PPGs of the sample - PUC-Rio and UnB - also do not feature
even a contractarian theorist in their theoretical courses. However, it is
noteworthy that PPGs in PS, like those of UERJ and UFPE, have lines of
research in International Policy and IR, respectively, being the UERJ PPG
the only one in the sample to feature Spinoza. In addition, Hobbes, Locke
and Rousseau are, by far, the contractarians who figure most in the studied
lesson plans. At the end of the text, it will be possible to certify whether
these first findings of the research are in fact consistent with the conclu-
sion of the analysis.
As a direct reflection of Table 1 , it is justified that the works to be
analyzed here are those whose authors appear only in the research results,
that is, those of Spinoza, Hobbes, Kant, Locke and Rousseau, thus decrea-
sing from seven to five authors who may have left a contractarian legacy to
IR, as the next section seeks to reveal.
Social contract theorists argue that the genesis of society and politi-
cal power stems from a social contract or pact, i.e., from “a tacit or express
agreement between most individuals, an agreement that would signal the
end of the natural state and the beginning of the social and political state”
(BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 2004, p. 272, free translation). When
faced with broad definitions like this, attention should be paid to grouping
12 For a brief comparative analysis between Pufendorf and Hobbes, see Boysen and Boucher (2010).
121
Leno Francisco Danner
Marcus Vinícius Xavier de Oliveira (Orgs.)
political theorists so different and from such different times and places,
as if they had orientations fully converging among themselves. After all,
dealing with the “social contract tradition” it is, in reality, dealing with the
same terminology to denote the rationalization of strength and the support
of power in the consensus, elements that, par excellence, also permeate not
only the internal order of a society but also its foreign relations.
By analyzing contractarian writings, it is possible to notice a matrix
that structures the process of engendering the political state. In other wor-
ds, we see, in the production of the five authors selected here, the defense
of a method that we call pseudo tripartite for the birth of what is currently
known as the Modern State, based on the following states/stages/stages/
phases/moments:
Figure 1 presents the engineering behind the key idea of the social
contract.
13 Castan (1991, p. 27, free translation) ironically calls this “voluntary servitude”, that is, “the most incredible of the
perversions of the social bond […] that instituted the tyranny of one over all”.
14 If the civil state arises automatically with the signing of the social contract, then there are not three states or stages,
but two, being the social contract just a gray area. Hence our concern contained in the word “pseudo tripartite”.
122
Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
seeks to get rid of through a social contract constitutes a very complex on-
tological challenge. Nevertheless, each contractarian theorist has his own
idea of such moments, logically generating divergences and convergences
between them. The next two subsections aim to analyze and compare the-
se views, in order to obtain the conceptual substrate that characterizes the
mainstream of IR theories.
15 According to Spinoza (ESPINOSA, 2008, p. 241), freedom is the characteristic of allowing oneself to be guided
without reservations and solely by reason; conatus, in turn, is the potency contained in the fact that “that each
individual has a full right to everything that is in his power” (ESPINOSA, 2008, p. 234, free translation). As Chaui (1995,
p. 73) recalls, conatus, in politics, is called natural law and is preserved throughout civil state.
123
Leno Francisco Danner
Marcus Vinícius Xavier de Oliveira (Orgs.)
since, “if a power large enough for our security is not instituted, each
one will trust […] only in your own strength and ability”. Similarly to the
English thinker, Rousseau (2003) points out that, in this aspect, the pro-
perty can only be ensured by force. In turn, Locke understands property
at times as life, goods, and freedom as natural rights (MELLO, 1999, p. 85,
free translation), at times as the possession of the movable or immovable
property. Using the latter concept of property - a more strict one -, Kant
(2008, p. 9) states that certain types of possession are prohibited both in
the state of nature and in the civil state, since in the former there are no
laws external to the individual (KANT, 2008, p. 10, 15) - that is, an indivi-
dual cannot legislate over another.
One of the most notorious elements in IR theories is the discus-
sion on how the human nature of decision-makers influences the external
actions of states. In IR theory mainstream, this debate is usually placed
between defenders and opponents of Hobbes and Machiavelli, that is, of
political realism. According to Hobbes (2005), due to the inherent lack of
transparency, individuals constantly and mutually strive to assume what
will be the most reasonable and plausible attitude of their peers, thus
laying the foundations for the security dilemma, one of the most widely
used thesis in International Security Studies, as seen in the fourth section.
With a different view from Hobbes, Locke (2008, p. 39) states that human
nature is not bellicose. Rousseau (2003, p. 115) - more concerned with de-
monstrating how the state lives, and not how it acts - affirms that the pure
state of nature is foreign to the human condition and that it is only surpas-
sed when the individual recognizes his neighbor as such. Here, the reason
variable is exposed again, causing Rousseau and Spinoza to converge on
its importance in civil state. Spinoza, on the other hand, disagrees with
the other contractarian theorists approached here, stating that man is not
endowed with the interest of survival and self-preservation, but that he
is the very self-preservation force called conatus (AURÉLIO, 2008, p. 363).
Neither as pessimistic as Hobbes nor as optimistic as Locke, Spinoza’s
(ESPINOSA, 2008, p. 6-7) conception of human nature is more similar to
Rousseau’s, exemplifying that the amoral basis of human behavior can be
measured in the fact that, when frightened, man seeks superstition, which
is the great promoter of wars (ESPINOSA, 2008, p. 311).
The state of war is another very popular theme in IR theories. Re-
garding this, Hobbes (2005, p. 102) states that men compete for honor and
dignity and that the mutual similarity between them causes them to attack
even preventively - or to always be prepared to do so. Such an anarchic
pattern, which characterizes the state of war and constrains everyone, le-
ads individuals to present themselves in constant competition, in which
124
Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
their primary objective is the maintenance of their own lives. Kant (2008,
p. 10) is another contractarian theorist who agrees that the state of nature
is equivalent to a state of war since there is in it a constant threat from
hostilities. Contrary to Hobbes and Kant, Locke (2006, p. 39-40) distingui-
shes the state of nature from that of war, since the first is, according to
him, a relatively peaceful stage. Pointing man as being able to cooperate
with each other, Rousseau (2003, p. 120) - averse to Hobbes’ ideas, as Lo-
cke does - understands that the state of war between individuals comes
precisely from their passions and addictions, but not the opposite. Again,
the fourth section addresses the caricatural view of the state of nature as a
condition of war for all against all, which, centuries later, led the IR mains-
tream to tie such a state of affairs to the international political context of
the 20th century interwar periods. In turn, the Rousseaunian and Lockean
perspectives will serve as the basis for liberal theory to confront realists
with Hobbesian connotations.
After these key aspects of the state of nature are revealed, the next
attempt is to present the assumptions of the most critical moment in
contractarian theory: the transition from the state of nature to the civil
state, through a pact.
125
Leno Francisco Danner
Marcus Vinícius Xavier de Oliveira (Orgs.)
16 For Spinoza (ESPINOSA, 2008, p. 241-242), “subject” is one who is part of a society based on reason and which
follows state orders useful to the common good.
126
Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
by law, which starts to moralize subjects, making public will an end in itself
and, thus, the act of sovereignty will always be just, since it comes from the
social contract. In this way, the Rousseaunian civil state guarantees the fre-
edom of all individuals through cooperation. It is noteworthy that practically
all the IR theories overflow the issue of cooperation for the international
arena; some of them are more inclined towards the Hobbesian side; others,
for the Rousseaunian, asking whether the gains with it will be absolute or
relative for those who cooperate.
When collective natural law becomes civil, it concomitantly genera-
tes civil state – collective conatus or the sovereign - and transforms the crowd
into the very political subject that affirms the desire to govern and not to
be governed. When a new state appears, it is necessary to define its con-
tours and essence. In this sense, Hobbes (2005, p. 109) prefers the absolu-
tist monarchy - as the cover of his main work already points out -, building
a notion of sovereignty based on moral fundaments. On the other hand,
Locke defends parliamentarism, private property and civil, individual and
political rights. Meanwhile, such predispositions are better understood by
the historical context in which these seventeenth-century authors are in-
serted. For example, Locke’s England is in a conflict between the Crown
and the bourgeois Parliament. Political liberalism will only triumph over
absolutism in the late 1680s, especially with the signing of the Bill of Ri-
ghts in 1689, making England a monarchy limited by the broad powers of
parliament (MELLO, 1999, p. 82-83). In this bias, the transition to civilian
government occurs when it is not reasonable anymore for men to be jud-
ges in their own cause (LOCKE, 2006, p. 38). Faced with this, Spinoza (ES-
PINOSA, 2008, p. 239, 242) affirms that the political regime most capable
of fulfilling this desire that Locke alludes to is a democracy, since all the
others are distortions of the conatus that enable relations of domination;
accordingly, it is in the form of republican government, and not in the mo-
narchical one, that freedom can last (ESPINOSA, 2008, p. 8).
As observed so far, contractarians have their own views on the ne-
cessary and sufficient elements for the rite of passage to civil state. Table
2 presents the nuances of these visions, so that, from them, it will be
possible to find, in the next section, the main nuances surrounding the
internationalist mainstream.
127
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Marcus Vinícius Xavier de Oliveira (Orgs.)
128
Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
17 On this subject applied to the Hobbesian case, see Walker (2010, p. 170).
129
Leno Francisco Danner
Marcus Vinícius Xavier de Oliveira (Orgs.)
nal relations. In the meantime, the pluralist current is born from liberal
thought that sees in the complex interdependence between nations a way
to overcome international anarchy, such a concept being perfected and re-
formulated by Joseph Nye and Robert Keohane to be called neoliberalism,
which proclaims coexistence between international organizations and re-
gimes in a still anarchic and state-centered world. Thus, the Neo-Neo De-
bate emerges, putting neorealism and neoliberalism18 side by side. With
the fall of the Berlin Wall, new theoretical debates and currents of thought
- especially constructivism and the Copenhagen School - appear and are
in constant development.
The most interesting aspect about the construction of all this theore-
tical framework - and, therefore, what epistemologically differentiates IR
from other scientific fields, in the Bourdieusian sense - is that its most ba-
sic concepts and assumptions can be traced, in some way, to contractarian
thought. In other words, the most diverse attempts to analyze and explain
how the world really is or should be are often based on one of the aspects
presented in the pseudo tripartite scheme in Figure 1 and the concepts
identified in the third section. It is this relationship between contractarian
thought and IR theories that the next three subsections intend to unravel.
18 Some IR theories suffer from terminological imprecision. For example, Castro (2016, p. 340) claims that, in
internationalist studies, liberalism assumes different facets of nomenclature. Here are some: idealism (CASTRO,
2016, p. 46, 340; SILVA; GONÇALVES, 2010, passim), utopian liberalism (JACKSON; SØRENSEN, 2007, passim)
and liberal idealism (CASTRO, 2016, p. 326). Attention is paid to the pejorative use of liberalism, which is due to
the realist Carr (2001, p. 10-14, 21). Neorealism, on the other hand, can still be called by structural realism, with the
offensive and defensive realism strands. And neoliberalism can be spelled as institutional liberalism, institutional
liberalism or institutional liberalism.
130
Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
131
Leno Francisco Danner
Marcus Vinícius Xavier de Oliveira (Orgs.)
nal state of nature than a civil one, given that, even with states having (in a
logical sense) already, left the state of nature, the international system still
has no erga omnes laws. The combination of the ideas proposed by Hobbes
(2005) and Kant (2008) can be seen in the statement that “[the] internatio-
nal system of states is characterized by the absence of a central authority
capable of imposing and enforcing international rules and laws of a global
character” (SILVA; GONÇALVES, 2010, p. 50, free translation). Thus, the
natural law and the law of nations are associated, “because what is the law
of nature between individuals and individuals before the constitution of the
community is the law of nations, subsequently, between sovereign and so-
vereign” (HOBBES, 2005, p. 197, free translation). This relationship highli-
ghts the originality of Hobbesian thinking when observing that internatio-
nal relations operate in a moral vacuum (BOYSEN; BOUCHER, 2010, p. 90),
so feared by Kant (2008) and so denied by Rousseau (WALTZ, 2004, p. 213).
Still regarding human nature, Walker (2010, p. 177) states that the
central concern in the formulation of IR theories should be the distinc-
tion of external and internal orders, and not the search for psychological
understandings. Despite the criticism, it happens that, for him, Hobbes
is successful in transposing characteristics of that nature, from the inter-
nal (his main source of concern) to the external (a marginal concern in his
formulations), becoming, therefore, a rich source for theorists, including
those in the IR field.
For the neorealist Waltz (2004), Spinozian thinking is directed to the
line considered as pessimistic of human nature in IR and finds resonance
mainly with the classic realism in Morgenthau. Although the writings of
Spinoza and Morgenthau converge in the sense that life in society needs
to be regulated, both diverge on what generates political and social evils -
which, at the international level, can cause wars: for the first, it is the clash
between reason and passion; and, for the second, it is the man himself, for
being completely flawed (WALTZ, 2004). Having the psychological factor
as the main guide to explain human behavior, Spinoza (ESPINOSA, 2008)
emphasizes that the human being is governed by the desire for self-preser-
vation. Taking this aspect into account, Waltz (2004) considers that, in the
Spinozian perspective, the principle of self-preservation would find more
space in the idea that “every man really seeks to promote his interests,
but, unfortunately, not according to the dictates of reason” (WALTZ, 2004,
p. 31-32, free translation)19. The important work Theory of International
Politics, by Waltz (1979), emphasizes the constraints caused by the inhe-
19 Spinoza’s (ESPINOSA, 2008) and Rousseau’s (2003) contractual propositions are treated differently in Waltz
(2004), with Spinozian thinking being much more tied to the question of the system of states than to human nature,
and therefore having strong impact on Waltz (1979).
132
Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
20 An example of this maxim comes from the Cold War, when the US and the Soviet Union imitated each other’s
steps: when one of them created an international organization for defense matters, the other replicated the model;
when one tried to create an anti-missile shield system, the other did the same etc. Finally, in these cases, the structure
of the international system - anarchy and bipolarity - constrained the actions of both powers, which were taken into
account by the other powers.
133
Leno Francisco Danner
Marcus Vinícius Xavier de Oliveira (Orgs.)
berals - especially those on the neo side - this scenario can be minimized
through international cooperation.
Practically, every sovereign state has a Magna Carta (civil law sys-
tem) or a sparse set of laws and judgments (common law system) that
founds and constitutes it. Let us see this applied to the Brazilian Consti-
tution of 1988, which presents the following passages that can be related
to contractarian thinking:
• the fact that Brazil (1988, art. 1, caput) constitutes a Democratic State
of Law, that sovereignty is a foundation of that state (BRAZIL, 1988,
art. 1, I), that freedom is a substrate fundamental to build Brazilian
society21 (BRAZIL, 1988, art. 3, I) and that property is a right equally
guaranteed to all (1988, art. 5, caput);
• the realization that all power emanates from the people (BRASIL,
1988, art. 1, sole paragraph); and
• the most important for this work: the fact that Brazil (1988, art. 4, I,
III, IV, V, VI, VII, IX) is governed in its international relations by prin-
ciples such as national independence, self-determination of peoples, non-
-intervention, equality among states, defense of peace, peaceful settlement of
conflicts and cooperation among peoples for the progress of humanity.
21 It is true that this constitutional passage can be linked to the Bodinian maxim that sovereignty is “the main
foundation of the entire Republic” (BODIN, 2011, p. 197, free translation).
134
Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
their motives, such as God save the Queen, God bless America and In God we
trust. In this contractarian point of view, if the state is above its subjects/ci-
tizens and below God, then can no artificial institution order international
relations? For Walker (2010, p. 178), the problem with making analogies
like the one in the previous sentence is that they generally do not consider
the difference between individuals and states, which, under a contracta-
rian bias, are completely different actors, whether in legal status - which,
in the current language, implies the problem of sovereignty - whether on a
micro-macro scale or on the (i)mortality of the state22.
The applicability of Hobbes’ thought to international relations is
also revealed when he deals with state’s survival in an environment devoid
of a supranational Leviathan. In this way, Barnabé (2012, p. 59, free trans-
lation) comments: “actions that, within civil society, could be classified as
illegal, unjust or immoral, can be widely carried out by the government
under the justification of state preservation”.
The re-reading of Hobbes (2005) focuses on the struggle and the in-
cessant search for power, as well as on the will to accumulate it - expressed
at the moment of the signing of the social contract. It is, as already said,
based on human nature, from which realistic thinking is aligned. Accor-
ding to Bull (1981, p. 717), Morgenthau successfully systematizes the pre-
mises of international realism, within what is meant by Hobbesian tradi-
tion, although its argumentative basis, historical context and method of
analysis are different from those of 17th century English. It can be seen
that implications from a Hobbesian perspective resonate in the first two
principles of classical realism proposed by Morgenthau, when he claims
that politics and society in general are “governed by objective laws that
lay their roots in human nature” (MORGENTHAU, 2003, p. 4, free trans-
lation), putting the rationalization of interest in foreign policy in terms of
power (MORGENTHAU, 2003, p. 7).
In building the foundations of liberal individualism, Locke influen-
ces Enlightenment thinkers. Furthermore, his ideas are fundamental to
the achievement of the American Revolution, when the Declaration of In-
dependence - the great social contract, so to speak - “was drafted and the
war of liberation was fought in natural terms and the right of resistance to
support the rupture with the British colonial system” (MELLO, 1999, p. 89,
free translation). This all not to mention the Lockean contribution to the
consolidation of the parliamentary monarchy in his homeland.
Rousseau (2003) sees as disposable the perspective that human ir-
rationality is the cause of all disputes, diverging, therefore, from Spinoza
(ESPINOSA, 2008). According to Waltz (2004, p. 213), although these two
22 On this last aspect, cf. Bodin (2011, p. 197) and Bull (1981, p. 734).
135
Leno Francisco Danner
Marcus Vinícius Xavier de Oliveira (Orgs.)
contractarian thinkers agree that, in the state of nature, the instincts and
physical impulses of men prevail, Spinoza differs from Rousseau in recog-
nizing that, when the social contract is settled, men replace the instinct
for justice in their conduct.
When analyzing the thought of Spinoza, Hobbes, Kant, Locke and
Rousseau, with their respective ontological conceptions centered on re-
ason, peace, state, liberalism and democracy, they end up distinguishing
actor and system, as well as agent and structure, in post-contract framework.
These are important guidelines used even today in the analysis of inter-
national politics. To have an idea of this, Spinoza inserts the natural right
of life and the action of individuals in their natural right, reaffirming it in a
contract, by forming a structure of their own principles. However, asymme-
tric power relations are considered distortions, since the capacity of con-
forming a governmental system resides, ultimately, in the people (CHAUÍ,
1995, p. 77). Here, sovereign power is, by definition, the total communion of
society (ESPINOSA, 2008, p. 239), being the determinant of the government
system, although a tyrannical regime may be in effect, making such a sys-
tem a relevant variable for Comparative International Policy studies, in
the scope of IR, and for democratic quality, in that of PS.
23 And, as a syllogism of the pseudo tripartite scheme, the idea of social contract is also convoluted in its application
to international relations.
24 An example of this assertion can be seen in the fact that the first line of the first chapter of the book by the
neorealists Art and Waltz (1993, p. 1) characterizes international relations as being governed by international anarchy, a
great promoter of the use of force between states.
136
Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
Here, attention should be paid to the fact that Hobbes (2005) does not
conjecture a system of sovereigns - a closer correspondent than the current
international system would be -, since the mere aggregate of units and their
wills does not necessarily constitute a system (WALKER, 2010, p. 174).
As far as Locke is concerned, his thinking influences contemporary
international politics and political philosophy. For example, Bobbio (1984,
p. 41, free translation) states that, “through the principles of a pre-existing
natural right to the state, a state based on consensus, subordination of the
Executive to the Legislative, a limited power, a right to resistance - Locke
expounded the guidelines of the liberal state”. Another Lockean example
can be seen in the political liberalism that permeates the speeches and
actions of some heads of state in the early twentieth century, especially
by former US President Woodrow Wilson, whose bases are rooted in both
classic liberal thinkers as Norman Angell and contractarians as Kant, Lo-
cke and Rousseau. The latter, in turn, when placing faith in public opi-
nion - as a corollary of freedom of expression (ROUSSEAU, 2003, p. 144),
something that certainly goes against Tocquevillian - ends up synthesizing
liberal maxims that are very present until the beginning of the last cen-
tury, when, for example, the United States entered World War II, after the
national repercussions of the attacks on Pearl Harbor with the intention of
liberating the world from Nazi tyranny, or even in the 21st century, by re-
suming a revamped version of the white man’s burden, by seeking to bring
democracy to the free world.
Another issue that gains prominence in IR theories - and which con-
cerns an international civil state - is the possibility of a society of states
or an international society. But such a conception cannot be confused with
an international system, since it is precisely in this differentiation that IR
theory innovates, by producing one of its greatest corollaries: the concept
of anarchic society.
Guided by a Grotian and Rousseaunian logic, Bull (2002, p. 15-23)
differentiates international society from an international system, in the sense
that the former constitutes a group of states that, aware of certain com-
mon values and interests, are related via common rules and institutions
(BULL, 2002, p. 19). The international system, on the other hand, is “when
two or more States have sufficient contact with each other, with sufficient
reciprocal impact on their decisions, in such a way that they conduct the-
mselves, at least to some extent, as parts of a whole” (BULL, 2002, p. 15,
free translation). Therefore, an international society can also be an inter-
national system, but it is rare to find an example to the contrary. This is
seen, for example, in the purely commercial and war-oriented relationship
that European states had with Asian countries in the 16th and 19th cen-
137
Leno Francisco Danner
Marcus Vinícius Xavier de Oliveira (Orgs.)
138
Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
With regard to IR’s own vocabulary, it can be seen that some contrac-
tarians seek to define concepts that are widely used today in international
analysis and international relations studies. For example, Spinoza (ESPI-
NOSA, 2008, p. 243-244) asserts that two nations are allies when, in order
to avoid war, they commit themselves not to harm and to assist each other
when necessary; the enemy, on the other hand, can be both internal and ex-
ternal, being just a matter of recognition of the authority of a state from the
individual or the nation. Similarly, Kant (2008, p. 28) and Rousseau (2003, p.
122) seek to clarify the terms state and power, being the first employee when
dealing with the internal performance of a specific people; and the second,
when dealing with its external performance, especially in the clash betwe-
en two or more states. It should also be noted that, for Kant (2008, p. 5), the
state is not a property, but it is, in truth, the society over which only the state
can rule. Rousseau (2003, p. 53) calls war between powers the result of a clear,
constant and reciprocal disposition to destroy the enemy state.
Finally, according to Bull (2002, p. 34), Martin Wight, one of the ex-
ponents of the English School of IR, seeks in Hobbes and Kant the gene-
sis to explain two of the three traditions of Western thought from which
IR theories originate. In addition to the rationalism tradition, centered on
Hugo Grotius, there is also realism, one of a Hobbesian nature, which pro-
claims the international scene as being marked by the constant competi-
tion and distrust between states, in which cooperation is even possible,
but generates relative gains for the parts. And, on the other hand, there is
the revolutionism tradition, inclined to Kantian meanings of absolute gains
in the case of cooperation, the motivating principle of revolutionaries. Fi-
gure 2 presents these three traditions.
Figure 1 – Martin’s Wight three traditions of Western thought on IR
theories
139
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Conclusion
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Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
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Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
143
8
Genocídio Hereró e Armênio,
os genocídios esquecidos
Contextualização
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Os Armênios
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Os hererós
Os hererós são um povo bantu, que significa dizer que fazem parte
de um grupo etnolinguístico que abrange cerca de 400 subgrupos étnicos
diferentes. Os bantus habitam a Namíbia, Botsuana e Angola. Os hererós
estão localizados na Namíbia e são originariamente um povo agrícola e
pastoril. A Namíbia tem em torno de 11 a 15 grupos étnicos, e cada um
possui suas próprias tradições culturais e línguas diferentes.
Nos anos de 1884 e 1885, durante a Conferência de Berlim, cujo obje-
tivo era a divisão e delimitação do território africano entre as potências eu-
ropeias, o território que hoje conhecemos como Namíbia ficou conhecido
como Sudeste Africano Alemão. O interesse da Alemanha eram os recur-
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Reconhecimento
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152
9
Larry May e a Limitação do Leviatã
em Thomas Hobbes
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Entendo por leis civis aquelas leis que os homens são obriga-
dos a respeitar […] por serem membros de um Estado […], do
que segue que a “[…] lei, em geral, não é um conselho, mas uma
ordem. E também não é uma ordem dada por qualquer um a
qualquer um, pois é dada porque se dirige a alguém já ante-
riormente obrigado a obedecer-lhe. Quanto à lei civil, acres-
centa apenas o nome da pessoa que ordena, que é a persona
civitatis, a pessoa do Estado”. Assim, a “[…] lei civil é, para todo
súdito, constituída por aquelas regras que o Estado lhe impõe,
oralmente ou por escrito, ou por outro sinal suficiente de sua
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Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
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Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
aqui dizer nada, porque o direito das gentes e a lei da natureza são uma e
a mesma coisa.” (Ibidem, p. 278, tradução nossa).
Assim, o pensamento hobbesiano se constituirá, duplamente, na
fundamentação tanto do realismo político, que tem seu fundamento nucle-
ar no conceito de anarquia [do grego αναρχία, isto é, sem arché, que tanto
pode significar ausência de fundamento, como também ausência de ordem
(AGAMBEN, 2014)], como, e por consequência disso, das teses negacionis-
tas da juridicidade do Direito Internacional.
Para Pecequilo, com efeito, o realismo político constitui-se na teoria
das relações internacionais, que pressupõe uma dissociação absoluta entre
política e moral, pois as entende a partir dos critérios da: “[…] conquista e
manutenção do poder político” segundo “uma dinâmica própria”, na qual
“não se aplicam critérios valorativos ou morais, mas sim avaliações rela-
tivas à capacidade dos Estados “para controlar suas unidades políticas”.
(Idem, 2004, p. 116-117)
Assim, no foro das relações internacionais, não haverá cooperação,
mas equilíbrio; a conduta não será moral ou imoral, mas amoral, isto é,
eficaz. A um questionamento: por que o Estado “x” agiu de tal forma? A
resposta será: “Porque ele pôde. Porque, na aferição dos ganhos e dos pre-
juízos, os resultados se mostraram mais vantajosos”. Em síntese, o “[…]
conceito-chave do realismo político é o interesse definido em termos de
poder que determina, na prática, as prioridades e o tipo de comportamento
que um certo Estado terá no sistema internacional”.
C) Por fim, o mesmo se dá, por consequência, no plano da infirma-
ção da juridicidade do Direito Internacional. Para um de seus mais desta-
cados autores, John Austin, que foi profundamente influenciado por Ho-
bbes, a ausência de juridicidade do Direito Internacional decorre do fato
de este expressar, quando muito, uma espécie de moralidade ou usos nas
relações entre os Estados sem que essas normas e práticas tenham qual-
quer normatividade, uma vez que não expressam aquilo que o primeiro
indica como condição necessária para tanto, sua positividade, entendida
no mesmo sentido dado por Hobbes no já citado Capítulo XXVI do Le-
viatã. Para este autor, um dos precursores do juspositivismo anglo-saxão,
a positividade do direito se caracterizaria por três atributos: a) o direito
consiste em comandos (ordens, expressões de vontade) direcionados aos
integrantes de uma comunidade política independente; b) os comandos
expressam a vontade de um soberano, o qual não se submete ao direito, e
são apoiados em ameaças (sanção); e c) o soberano é alguém que é habi-
tualmente obedecido (AUSTIN, 1995, p. 13-14).
Não havendo na sociedade internacional soberano algum, o Direito
Internacional não teria o atributo da coercitividade, não podendo, portan-
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Marcus Vinícius Xavier de Oliveira (Orgs.)
to, ser considerado como direito, mas somente como a expressão de uma
moralidade (na acepção hobbesiana, lex naturalis, consideradas como re-
gras de prudência, mas destituídas de cumprimento obrigatório), ou regras
de boas condutas que vigem entre os Estados:
Vê-se que em Austin leis de honra, de moda ou das nações têm ori-
gem idêntica – estabelecimento pela opinião geral, e não por um soberano –,
que se aplicam a determinados indivíduos, mas destituídas de juridicidade,
posto não serem positivas, isto é, emanadas do soberano. Não são normas
jurídicas, mas regras morais ou usuais destituídas de coercitividade.
Pelo que vimos até o momento, a tradição que vislumbra em Hobbes
não um, mas “o” prócer do absolutismo político e da soberania absoluta
do Estado, do início do juspositivismo e, no contexto das relações interna-
cionais, entre as primeiras afirmações modernas do realismo político (na
verdade, precedido por Maquiavel), parece ser um fato incontestável.
Entretanto, como procuraremos demonstrar nas próximas linhas,
Larry May nos propõe uma interpretação bastante interessante desses
pontos e que parece, se não as infirmar, contextualizá-las de forma mais
aproximada à obra hobbesiana, mitigando, em determinados aspectos, as
teses mais radicais do cânon interpretativo.
158
Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
War Crimes and Just War (Idem, 2007), Aggression and Crimes Against Peace
(Idem, 2008) e Genocide: A Normative Account (Idem, 2010), além de outros
inúmeros livros. May é Professor Emérito da Faculdade de Filosofia da Van-
derbilt University, tendo ocupado, anteriormente, a cadeira W. Alton Jones
de Filosofia, Direito e Relações Internacionais da mesma universidade.
Em 2013, após 35 anos de trabalho, Larry May publicou, pela Oxford
University Press, o texto de sua tese de doutorado versando sobre a filoso-
fia política e jurídica de Hobbes, intitulada Limiting Leviathan: Hobbes on
Law and International Affairs, defendida na New School for Social Resear-
ch, e que teve por primeira orientadora Hannah Arendt; com a morte des-
ta em 1975, quem deu prosseguimento na orientação foi o Prof. Anthony
Quinton. (MAY, 2013)
O ponto central de Larry May, nesse livro, é o de que muito embora
o pensamento de Hobbes seja, por assim dizer, um dos cânones do pensa-
mento político e jurídico modernos, a maior parte dos autores e comenta-
dores focaram, quase que exclusivamente, nas três mais conhecidas, isto
é, De Cive, Leviathan e Behemoth, dando pouca atenção a outra obra fun-
damental, qual seja, Dialogue beetween a Philosopher and a Student of the
Common Laws of England, ocasionando aquilo que ele denominará de um
gap acerca das conexões entre direito, política e moralidade no pensa-
mento de Hobbes (Ibidem, p. 1).
Em síntese, a tese central do livro é a de que Hobbes era “[…] muito
mais restringível a limitações morais, mesmo jurídicas, para a elabora-
ção das leis […] do que ele mesmo retratou […]”, o que permitiria afastar
a ideia de que ele é a “besta negra”, bête noire, do Direito Internacional,
na medida em que ele mesmo reconhecia “[…] solid grounds for the rules
of war in international relations […]” (Ibidem, p. 1). Mas, isso somente
é possível se se considerar que Hobbes também reconhecia um grande
peso tanto à equidade como à justiça em sua filosofia jurídica, uma vez
que a equidade, tal como concebida no contexto do direito anglo-saxão,
estabelece uma série de restrições para aquilo que o soberano pode legi-
timamente fazer (Ibidem, p. 2).
Vejamos, segundo May, duas hipóteses de limitação à soberania ex-
pressamente reconhecidas por Hobbes em suas obras. A primeira versa
sobre aspecto interno; a outra, sobre as relações internacionais.
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Leno Francisco Danner
Marcus Vinícius Xavier de Oliveira (Orgs.)
desde que passíveis de serem desfrutadas por todos ou por alguns, a deter-
minar a forma e o modo de as fazer, observados, entretanto, o princípio da
equidade, que veda a distribuição desigual. O texto original é o seguinte:
E disto segue outra lei, que coisas que não podem ser divi-
didas, sejam desfrutadas em comum, se puderem ser; e se a
quantidade da coisa permitir, sem restrição; de outra forma
proporcionalmente ao número dos que têm direito. Por outro
lado, a distribuição, se desigual, é contrária à equidade (Idem,
2017, p. 138, tradução nossa).
160
Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
Um dos pontos iniciais que se buscou afirmar é que Hobbes não de-
senvolveu propriamente um trabalho autônomo sobre as relações interna-
cionais, mas, antes que tendo se utilizado dos critérios da igualdade e da
diferença, ele estabeleceu uma compreensão sobre o tema que é bastante
comum ao pensamento moderno: aquilo que tem em nível interno – um
poder central e soberano – não existe em nível internacional – a relação
entre Soberanos –, donde as duas características fundamentais: a perma-
nência do estado de natureza nas relações entre os Estados e da guerra
em potência, bem como a tese mais forte da igualdade entre os soberanos.
Ora, onde há igualdade absoluta, não há um poder central, e onde não há
poder central, não existem leis civis, mas o direito natural; onde vige o di-
reito natural, não há coercitividade, mas anomina…
Essas teses ficam mais claras quando se lê o Capítulo 29 do Leviatã,
quando Hobbes estabelece aquilo que ele denominará das “coisas que en-
fraquecem ou levam à dissolução de um Estado”. Se o Leviatã é um autôma-
to, uma pessoa, ele é dotado de corpo. Se dotado de corpo, este é passível
de ser dominado por enfermidades. Enfermidades levam ou ao enfraqueci-
mento do poder, ou à morte. Hobbes, portanto, nesse Capítulo 29, descreve
condições internas e/ou externas que poderão levar ao enfraquecimento ou
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mesmo à morte do Estado, uma vez que elas coibirão ou tornarão impossí-
vel que ele exerça a sua razão de existir: assegurar a salus publica.
São várias as causas que poderão levar à defunção do Estado, mas
conterei a discussão naquela em que ele expressamente discorre sobre as
relações entre os Estados, presente na sexta causa. Afirma ele:
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Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
Para Larry May, essas duas passagens de Hobbes nos indicam pelo
menos duas teses importantes para se compreender seu pensamento acer-
ca da limitação da soberania no contexto das relações internacionais.
O primeiro atine ao fato de que não é a mesma coisa afirmar-se que,
embora entre Estados par in parem non habet imperium vel judicium, uma vez
que todos gozam de igual soberania, que a sociedade internacional seja
caracterizada pela anomia, por um estado de perene anarquia, uma vez que
pacta sunt servanda, isto é, os tratados internacionais vigentes entre os Es-
tados devem ser cumpridos de boa-fé.
Tanto isso é verdade que o descumprimento de um tratado interna-
cional se constituía numa violação substancial ao Direito Internacional
desde os seus mais antigos registros, sendo, nesse sentido, caracterizado
como um casus belli legítimo, vale dizer, na possibilidade de o Estado
lesado buscar, por meio da guerra legítima, ressarcir-se dos danos provo-
cados pelo Estado faltoso.
Amnon Altman, em seu livro Tracing the earliest recorded concepts
of International Law, um valioso estudo sobre as regras do Direito Inter-
nacional no contexto das cidades-estados do Oriente Médio entre os anos
2500-330 a.C. – Mesopotâmia, Acádia, Babilônia etc. –, comprovou que, pe-
los fragmentos estudados, o descumprimento de um tratado internacional
constituía, de per se, em casus belli.
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Considerações finais
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Referências
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Os refugiados ambientais à luz
dos Direitos Humanos
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1 Ocasionado pelo Império Otomano, tendo em vista que temia a insurgência da população, movida por um
sentimento nacionalista, o que poderia vir a pôr fim à soberania daquele Império. O medo de perder o poder e a
soberania motivou o Império Otomano a exterminar – em um número estimado – de 800 mil a 1,8 milhão de pessoas.
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Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
deus, que se viram obrigados a sair de sua terra e a serem postos para fora
das fronteiras na busca de reconstrução de suas vidas no pós-guerra.
Diante de tamanha barbárie já vista no cenário político-mundial, a
ONU elaborou a Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados, datada
de 1951, também conhecida como Convenção de Genebra.
A Convenção de Genebra abarca uma série de tratamentos que devem
ser dados aos refugiados, que até os dias atuais são usados. A principal con-
tribuição se dá pelo princípio do non-refoulement (não devolução), ou seja,
basicamente impõe que o país que recebe um refugiado não o deve expulsar
ou devolvê-lo sob qualquer que seja a ocasião para território ou local no qual
esse possa sofrer perseguição, desde que essa não seja a sua vontade.
O compromisso global de garantir que o deslocamento e os traumas
causados pela perseguição e destruição ocorridos durante a guerra não pu-
desse mais voltar a se repetir é que potencializou a construção da Convenção
de Genebra. De outro modo, ela impunha limitações geográficas e temporais
ao conceito de refugiado, restringindo-o somente aos acontecimentos ocor-
ridos na Europa antes de 1º de janeiro de 1951. Sendo assim, qualquer outra
situação, mesmo que análoga à dos refugiados da Segunda Guerra Mundial,
não estaria acobertada, cerceando proteção jurídica ao estrangeiro que não
cumprisse ambos os requisitos, o temporal e o geográfico.
Contudo, insta frisar que os aspectos positivos da Convenção cor-
roboraram um avanço à proteção dos direitos de outros refugiados em
torno do mundo todo.
Como em tudo nesta vida, faz-se necessário se adaptar às situações
conforme a vivência dos indivíduos que integram uma sociedade. Sendo
assim, não foi diferente com a Convenção, tendo esta sofrido atualização
por meio do Protocolo de 1967 no que diz respeito à condição de refugia-
do, fazendo com que a ONU percebesse que as limitações geográficas e
temporais não mais assistiam razão dentro daquele conceito. Contudo,
mesmo com as atualizações realizadas, o Protocolo de 1967 deixou a de-
sejar em relação aos direitos políticos e civis violados por aqueles indiví-
duos, ou seja, não abarcou, nesse conceito, as pessoas que se encontravam
em situação de risco, que estavam fora da estabilidade política ou que
sofriam por questões de guerras.
Essa necessidade de proteger os refugiados se espalhou pelo globo e
resultou em alguns instrumentos que salvaguardavam esses direitos, como,
por exemplo, a Convenção da Organização da Unidade Africana – OUA,
datada de 1969, com o objetivo de diminuir a miséria daqueles refugiados2,
2 […] O termo “refugiado” aplica-se também a qualquer pessoa que, devido a uma agressão, ocupação externa,
dominação estrangeira ou acontecimentos que perturbem gravemente a ordem pública numa parte ou na totalidade
de seu país de origem ou do país de que tem nacionalidade, seja obrigada a deixar o lugar da residência habitual para
procurar refúgio noutro lugar fora de seu país de origem ou de nacionalidade.
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3 […] Considere também como refugiados as pessoas que tenham fugido dos seus países porque sua vida, segurança
ou liberdade tenham sido ameaçadas pela violência generalizada, agressão estrangeira, conflitos internos, violação
maciça dos direitos humanos ou outras circunstâncias que tenham perturbado gravemente a ordem pública.
4 Foi ratificado anos após sua criação. Tal ratificação se deu em dois movimentos: o primeiro com sua aprovação por
meio do Decreto Legislativo n° 11, de 07/07/1960; e o segundo, com sua promulgação por meio do Decreto Executivo
n° 50.215, de 28/01/1961.
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Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
ção pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados – AC-
NUR. No Brasil, a regulamentação interna dos direitos dos refugiados fica
a cargo da Lei n° 9.474/1997, que criou, ainda, o Comitê Nacional para os
Refugiados – CONARE (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2016).
O Brasil é signatário da Convenção de Genebra de 1951, bem como de
suas demais alterações. Mas, ainda que assim não fosse, o dever de prote-
ção a esses refugiados estaria resguardado de forma indireta na legislação
pátria, porque não trata necessariamente do refugiado, e sim de estrangei-
ro, mas o refugiado, ainda que não tivesse seus direitos assim especifica-
mente garantidos, ao menos os teria frente à condição de estrangeiro que
também ostenta – no art. 5º da Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988, que estabelece que brasileiros e estrangeiros gozam dos
mesmos direitos civis, ambos iguais perante a lei.
Bem, a partir desse contexto geral acerca do conceito de refugiado e
das legislações que garantem os direitos desses indivíduos tanto no âmbito
nacional quanto no internacional, necessário se faz apresentar o instituto
do Refugiado Ambiental.
Nessa perspectiva, antes de se pensar na necessidade de concessão
de um direito específico, tenha-se em mente que, na inexistência de tal, o
ser humano em situação de vulnerabilidade, como estão os que são vítimas
de catástrofes ambientais, goza de direitos próprios à sua condição.
A natureza é elemento vivo e incontrolável e, sempre que se revolta,
impõe sua força contra os seres humanos. Diversos desastres ambientais
sempre ocorreram no mundo, e a razão de ele ser como é hoje em muito se
deve ao fato dessas intempéries. Contudo, passou-se a pensar mais sobre
como as catástrofes ambientais causam vítimas e que muitos são os Esta-
dos incapazes de prestar o devido auxílio a seus nacionais afetados.
Diante disso, um estudo realizado pela ONU em 2008 calculou que
no ano de 2050 o número de refugiados ambientais chegaria a 200 milhões
de pessoas. Entretanto, em que pese soarem alarmantes tais prognósticos
e os reais e efetivos crescimentos dessa categoria, nada foi pensado no
sentido de se criar um instituto jurídico próprio para esses deslocados for-
çosos, faltante, portanto, uma resposta internacional para o impasse que se
intensificou com o tempo.
Ora, diversas são as causas ambientais que originam o deslocamento
forçado dessas pessoas, tais como: furacões, tsunâmis, terremotos, eleva-
ção do nível do mar, entre outras. São incontestes os efeitos negativos des-
sas intempéries tanto na natureza quanto na espécie humana.
Ante a ausência de previsão jurídica para o conceito de refugiado
ambiental tanto na seara da legislação internacional quanto na nacional
é que se formam as problemáticas suscitadas neste estudo. No entanto, o
referido conceito foi construído pela doutrina.
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Referências
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PARTE III
Filosofia do Direito
em seu próprio locus
11
O sentido do Direito1
Helmut Coing
I.
1 Este ensaio foi publicado no livro Forum der Rechtsphilosophie sob o título “Von Sinngehalt des Rechtes”, editado pela
Balduin Pick Verlag, Köln, 1950. A presente tradução foi feita a partir da versão em espanhol publicada no livro COING,
H. El sentido del derecho.. Tradução de Roberto Hartmann y Jose Luiz Gonzales, Cuidad de México: UNAM, 1959, p. 5-20.
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II.
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Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
nificação dos atos segundo normas, sendo, por isso, a ciência do direito
uma ciência normativa. Desde esse ponto de partida, Kelsen começa a
estabelecer o problema da específica estrutura lógica das normas jurídi-
cas. Aqui radica o ponto crítico decisivo de seu pensamento. Se o direito
tem que ver com a significação dos atos segundo normas necessárias, é
natural que surja a pergunta sobre qual seja o significado específico dessas
normas. Iniciando-se com essa pergunta, inicia-se a análise do significa-
do do direito segundo a ciência do espírito. Mas, aqui aparece em Kelsen
o dogma antes mencionado da incognoscibilidade dos significados espe-
cíficos no direito, o que bloqueia o caminho a uma análise mais ampla.
O pensamento se desvia, e a investigação da forma lógica vem a ocupar,
exclusivamente, o proscênio. É preciso, então, examinar esse dogma da
incognoscibilidade das finalidades jurídicas.
III.
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184
Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
Para isso [não], é necessário socorrer-se nos juristas da lei natural ou nos
filósofos do direito; basta uma olhada em qualquer apresentação do direito
positivo ou a uma revista jurídica. Sempre se encontrará esse critério. As-
sim disse, por exemplo, um autor tão pouco suspeito de simpatia com a lei
natural como Martin Wolff, em seu Sachenrecht, por ocasião da aplicação
do parágrafo2 281 do Código Civil alemão com respeito à demanda para a
restituição da propriedade. “A prática baseia-se hoje na essência da natu-
reza da propriedade com relação à inaplicabilidade do §281. O resultado
não é satisfatório se E, diversamente do que se espera, encontra a coisa
em poder de X, tendo então o direito a demandar a restituição por X, não
importando quão baixo seja o preço que B tenha recebido de X (segundo
o §816). Seria mais justo aplicar o §281” (grifos no original). Esse é um
exemplo entre muitos. Obviamente, é arriscado excluir um ponto de vista
na consideração do direito que frequentemente tenha um papel realmente
decisivo na prática do direito e em sua formação. Muitas regras jurídicas
simplesmente não podem ser compreendidas sem o ponto de vista da jus-
tiça, fato este que se pode lamentar ou celebrar. Esse é um fato simples e
verdadeiro que ninguém pode nem deve honradamente negar. A justiça
também é uma finalidade à qual deve servir o direito.
Tampouco é possível indicar em que consiste a essência da justi-
ça, quais as suas exigências. Veja-se simplesmente qualquer direito civil
moderno. A justiça pode se observar primeiramente na consideração de
contratos e ações não permitidos que alterem a condição da propriedade
uma vez estabilizada. O equilíbrio no contrato, a obrigação recíproca e
simultânea, as consequências de uma violação do contrato: em todas as
partes se anuncia a ideia de equiparação, da constituição de um equilíbrio.
Isso se mostra mais claramente no direito à indenização por danos e pre-
juízos. Quanta agudeza jurídica se tem empregado para definir e calcular
as consequências justas de uma violação ao direito! Por que essa agudeza
se não houvesse por detrás de tudo isso a exigência de justiça?
Contudo, a justiça não se cumpre só aqui. Também tem submetido
as suas exigências ao status quo que o direito simplesmente garante. Nisso
consiste a justiça social, que também é um estímulo à formação do direito.
A ordem jurídica não somente tem servido à consolidação de posições ad-
quiridas de poder social, como também se encontra no exemplo contrário
da nova distribuição mais justa dos bens sociais pela lei. Antes de tudo, a
justiça social tem efetuado a distribuição das cargas sociais. Os impostos
são distribuídos proporcionalmente, os danos originados da moderna téc-
2 (N.T.) Conforme informa Virgílio Afonso da Silva na introdução que ele faz à tradução do livro de Robert Alexy:
“Alerto também que, em alguns textos legais alemães, o sinal “§” é utilizado para designar algo que, no Brasil, seria
um artigo. Os exemplos mais importantes são os do Código Civil e do Código Penal”. ALEXY, R. Teoria dos direitos
fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 12.
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3 (N.T.) “Expulse a natureza a golpes de forcado, e ela voltará sempre” (HORÁCIO, Epist. Liv. I, Epist. X v. 24), apud
SILVA, A. V. de R. e (Arthur Rezende). Phrases e Curiosidades Latinas. 4. ed. Rio de Janeiro: José Bushatsky, 1952, p. 439.
4 (N.T.) “[…] a experiência eterna nos mostra que todo homem que tem poder é tentado a abusar dele […]”. Para
a melhor compreensão do raciocínio de Montesquieu, reproduzimos integralmente esta passagem: “Encontra-se a
liberdade política unicamente nos governos moderados. Porém, ela nem sempre existe nos Estados moderados: só
existe nestes últimos quando não se abusa do poder; mas, a experiência eterna nos mostra que todo homem que tem
poder é tentado a abusar dele; vai até onde encontra limites. Quem o diria! A própria virtude tem necessidades de
limites. Para que não se possa abusar do poder é preciso que, pela disposição das coisas, o poder freie o poder. Uma
constituição pode ser de tal modo que ninguém será constrangido a fazer coisas que a lei não obriga e a não fazer as
que a lei permite”. MONTESQUIEU. Do espírito das leis. v. 1, trad. José Arthur Giannotti, São Paulo: Nova Cultural,
1997, p. 200 (Coleção “Os Pensadores”).
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Avoir des droits: comment, pourquoi, lesquels?
Jean-François Kervégan
Que nous ayons des droits, voire des droits « naturels, inaliénables
et sacrés » (DDH, Préambule), c’est pour chacun de nous une évidence,
surtout lorsque nous avons, à tort ou à raison, le sentiment que certains
d’entre eux sont violés. L’enfant à qui ses parents interdisent de regarder
sa série télévisée favorite juge qu’on « n’avait pas le droit » de le priver
de cet innocent passe-temps ; un chauffeur de taxi de café considère que
c’est « son droit » de percevoir un pourboire ; un salarié licencié considère
qu’en le privant d’un emploi, on a attenté à un droit fondamental, celui de
vivre de son travail. Ces situations sont évidemment très différentes ; et
ceci montre la nécessité d’une clarification conceptuelle. Pour y parvenir,
il convient de nous interroger sur ce que c’est exactement qu’un droit ;
il nous faut aussi suspendre notre croyance au fait que les individus et
certains groupes humains (ou même d’autres vivants, voire d’autres enti-
tés) ont des droits, et ceci peut-être même « par nature ». En effet, avant
même de décider si cette assertion est fondée, il faut savoir ce que veut
dire exactement cette idée apparemment simple: avoir des droits. Alors seu-
lement, on peut se demander s’il y a des raisons fortes qui, indépendam-
ment de convictions humanistes, portent à considérer que les hommes ont
des droits, avant même de s’interroger sur le contenu des droits que nous
avons ou revendiquons d’avoir. Dans ce qui suit, après avoir tenté de pré-
ciser ce qu’est un droit et de définir ce que peut signifier avoir un droit, je
proposerai deux arguments en faveur de l’idée qu’il faut que les hommes
aient des droits. Puis, si le temps le permet, j’aborderai la question con-
troversée du contenu des droits que nous avons, ce qui pose le problème
immense de l’articulation politique des droits, c’est-à-dire, pour aller vite,
des rapports entre les droits ‘subjectifs’ et la démocratie1.
Qu’est-ce qu’un droit? Partons d’une remarque de vocabulaire.
Contrairement à la langue anglaise, le français (mais c’est aussi le cas de
l’allemand et de la plupart des langues romanes) dispose d’un seul mot,
1 Je renvoie à ce sujet aux contributions lumineuses de C. Colliot-Thélène : La démocratie sans demos, chap. 1; «
Après la souveraineté : que reste-t-il des droits subjectifs ? », Jus Politicum 1 (2009), 117-136; « L’interprétation des
droits de l’homme : enjeux politiques et théoriques », Trivium, 3/2009 (en ligne).
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2 I. Berlin, « Deux conceptions de la liberté » (1958), in Eloge de la liberté, Calmann-Lévy, 1988, p. 167-218.
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priété déjà relevée par Thomas d’Aquin lorsqu’il note que le jus est toujours
ad alterum3), que le juriste Wesley Newcombe Hohfeld, dans un article paru
en 1913 et qui a fait date, s’efforce de distinguer les différents types de droits
en définissant, pour chacun d’entre eux, son contraire et son corrélat (c’est-
-à-dire la nature de l’acte qui est requis ou appelé de la part d’autrui par
l’exercice de ce droit); un tableau (que vous avez sous les yeux) résume le
résultat de son travail4. Même s’il a fait l’objet de critiques5 et si on a pro-
posé de lui apporter certaines modifications6, ce travail classificatoire, qui
se veut purement descriptif (Hohfeld enquête sur un corpus exclusivement
formé de décisions judiciaires et, plus rarement, de commentaires académi-
ques) et qui se défend de toute intention normative, est précieux, car il met
en évidence le caractère imprécis, ou plutôt complexe, de l’expression ‘avoir
un droit’. Je vais donc m’appuyer sur lui pour tenter d’en clarifier le sens.
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On peut remarquer qu’il existe une différence entre les ‘droits’ et ‘de-
voirs’ figurant aux deux premières lignes et ceux des deux lignes suivantes.
En effet, les ‘pouvoirs’ et les ‘immunités’, ainsi que leurs corrélats, con-
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pas, pour beaucoup d’entre eux, des droits au sens strict (des claim-rights),
car il est impossible de définir une obligation positive qui leur soit corré-
lative et de déterminer à qui reviendrait cette obligation. Il en va de même
de certaines ‘créances’, de certains droits à…, qui sont des revendications
sans doute parfaitement légitimes mais qu’on peut difficilement qualifier
de droits stricto sensu, faute de pouvoir déterminer à qui elles sont op-
posables. Selon leur structure grammaticale et conceptuelle, le droit au
bonheur ou le droit à la paresse ne sont pas des ‘droits’, mais plutôt des
‘privileges’ au sens de Hohfeld : leur revendication (qu’on la juge légitime
ou non) ne signifie pas qu’autrui ou la société aurait l’obligation de me
rendre heureux ou oisif, mais plutôt qu’autrui n’a pas le droit de faire obs-
tacle à ma quête du bonheur ou du repos…
On s’aperçoit alors, en suivant cette voie et en allant au-delà de Ho-
hfeld, que l’interprétation des droits ne relève pas seulement de la séman-
tique et de la pragmatique du langage juridique ; elle engage aussi des
choix politiques. C’est ainsi que le ‘droit au travail’ peut être interprété
comme un droit strict, faisant obligation à la société de me fournir un em-
ploi ; il convient alors que la puissance publique prenne des dispositions
garantissant un emploi à chacun. Ou bien, dans une optique opposée, il
peut être compris comme une pure liberté, dont le corrélat est l’absence
de droit, de la part d’autrui, de s’opposer à ce que je travaille, même si j’ai
douze ou quatre-vingts ans.
J’espère avoir un peu clarifié, en m’appuyant sur le travail de Ho-
hfeld, ce que c’est qu’un droit : un droit est une revendication fondée sur
des raisons et dont la satisfaction génère des obligations corrélatives de
la part d’autrui, obligations qui, comme ce droit lui-même, sont de plu-
sieurs espèces. Mais l’expression ‘avoir un droit’ demande elle aussi à être
élucidée. Posons-nous, avec le philosophe Joel Feinberg7, la question sui-
vante : les femmes avaient-elles le droit de vote en 1900, disons en France
? Indéniablement, elles n’en avaient pas juridiquement le droit; mais on
est tenté de dire qu’elles l’avaient néanmoins moralement. Ceci débouche
sur un problème épineux, qui a fait couler beaucoup d’encre : existe-t-il
véritablement des droits moraux et, si oui, de quelle nature sont leurs
rapports avec les droits juridiques proprement dits8? A première vue, ce
problème semble recouper celui, très classique, des rapports entre droit
naturel et droit positif, et sa solution semble donc dépendre de l’adoption
d’un parti jusnaturaliste ou juspositiviste; le partisan du positivisme ju-
ridique dira que les femmes n’avaient pas le droit de vote en 1900, et on
7 J’emprunte l’exemple, en l’adaptant, à J. Feinberg : voir “In defense of moral rights” (1991), in Feinberg, Problems at
the roots of law, Oxford UP, 2003, p. 37 sq.
8 Voir J.-F. Kervégan, « Y a-t-il des droits moraux ? », in F. Burgat & V. Nurock (dir.), Le multinaturalisme. Mélanges à
Catherine Larrère, Editions Wildproject, 2013, p. 214-225.
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9 Bien entendu, il ne faut pas confondre la distinction théorique entre droit naturel et droit positif et la distinction
métathéorique (‘épistémologique’) entre jusnaturalisme et juspositivisme. Un juspositiviste considère que seul le droit
positif mérite le nom de droit, et que le prétendu droit naturel est une fiction (cf. la critique benthamienne des «
fictions ») ; en revanche, un jusnaturaliste ne nie évidemment pas qu’il existe du droit positif, mais soutient que sa
validité dépend de sa conformité à des principes métapositifs qui constituent ensemble le ‘droit naturel’ (ou ‘rationnel’).
10 Kant, Rechtslehre, AA VI, p. 237 ; Doctrine du droit, trad. Renaut, GF, p. 26.
11 Voir Les origines du totalitarisme, II: L’impérialisme, Gallimard (‘Quarto’), 2002, p. 591 sq. (« Les embarras suscités
par les droits de l’homme »), p. 591 sq., en partic. p. 599.
12 Voir J.-F. Kervégan, «Une défense du positivisme juridique», Annuaire de l’Institut Michel Villey, 2 (2010), p. 247-261.
13 Voir Hart, Le concept de droit, Bruxelles, Presses des Facultés Saint-Louis, 2005, Postface, p. 268 sq.
Contrairement au hard positivism défendu par ex. Par Kelsen, le soft positivism admet l’existence d’un
«recoupement partiel» entre le droit et l’éthique, donc entre la sphère des prescriptions juridiques et celle des
prescriptions (et des droits) moraux.
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perspective, dire que les femmes avaient le droit de vote en 1900 est une
expression confuse, qu’il vaut mieux éviter. Il est préférable, ici aussi, de
parler de revendication légitime, et de réserver l’usage du mot ‘droit’ aux
seuls droits effectivement reconnus et protégés par le Droit ; car la carac-
téristique d’un droit stricto sensu (d’un claim-right hohfeldien) est qu’en cas
de non-respect ou de violation de ce droit il existe des moyens de recours,
moyens dont les femmes (ou celles d’entre elles qui militaient activement
pour l’extension du droit de suffrage) étaient bel et bien privées jusqu’à ce
que la loi définissant le corps électoral change…
Cette discussion sur le sens de ce que signifie l’expression ‘avoir un
droit’ met en lumière un point important : quelle que soit la position qu’on
adopte dans le débat entre jusnaturalisme et juspositivisme, il importe de
bien distinguer un droit et une revendication, même légitime. En effet, une
revendication demande à être satisfaite, alors qu’un droit demande aussi à
être reconnu ; or cette reconnaissance suppose un contexte institutionnel
dans lequel la revendication de ce droit fasse sens. Il y a là un point qui
penche peut-être en faveur d’une conception positiviste des droits. Si le
droit de vote des femmes est un droit moral, et si les droits moraux ont une
valeur absolue (qui peut-être les distingue des droits juridiques), alors ce
droit pouvait être revendiqué non seulement par les suffragettes en 1900,
mais aussi par Antigone (même si elle n’y a pas pensé). Mais si c’est un droit
juridique (et politique), alors il est vraisemblable qu’il présuppose le contex-
te d’une société ‘démocratique’ (avec tout le flou que comporte ce terme),
qui permette à sa revendication d’avoir un sens et une légitimité. Toutefois,
il n’est pas interdit de penser qu’un ‘droit moral’ puisse être non seulement
revendiqué, mais reconnu, dès lors que certaines dispositions juridiques
institutionnelles viennent l’étayer et l’encadrer : c’est le cas de certains
droits subjectifs assez singuliers, puisque leur sujet est virtuel (au sens où
il n’est pas en mesure de le revendiquer lui-même), comme le droit des gé-
nérations futures ou celui des animaux14. Un des arguments classiques en
faveur de la reconnaissance de droits aux animaux est la distinction entre
titulaires actifs et titulaires passifs : les animaux, comme les enfants ou les
handicapés mentaux, seraient titulaires de droits, mais dans l’incapacité
de les exercer ou de les revendiquer eux-mêmes. Une objection, également
classique, consiste à dire qu’on peut parfaitement instituer des obligations
unilatérales ou asymétriques, sans les corréler à des droits : en ce sens, les
humains peuvent avoir des obligations envers des animaux sans qu’on fasse
nécessairement de ceux-ci des titulaires de droits, puisqu’ils ne sont pas en
mesure de les exercer ou de les revendiquer. On pourrait aussi, si on adopte
14 Pour une défense du droit des animaux, voir le livre classique de Peter Singer, La libération animale, Payot, 2012
; Tom Regan, Les droits des animaux, Hermann, 2012. Voir également J. Feinberg, « Le droit des animaux et des
générations futures », Philosophie, 97 (2008), p. 64-90.
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une telle définition de ce qu’est un rightholder, contester qu’il y ait des droits
des enfants stricto sensu, ou alors soutenir que ces droits ont pour titulaire
non pas l’enfant tel qu’il est hic et nunc mais, comme dirait Kant, l’humanité
qui est en lui, c’est-à-dire la personnalité humaine qu’il est appelé à devenir
; mais on rencontre alors la difficulté consistant à se représenter un sujet
virtuel de droits (et d’obligations)…
En tout état de cause, si on admet l’existence de droits moraux, il
faut se garder de les considérer comme de simples candidats au statut de
droits ‘véritables’, comme des droits juridiques in statu nascendi. Sinon, on
s’expose à la critique ravageuse faite par Jeremy Bentham de ces « fictions
» que sont à ses yeux les droits de l’homme : en effet, dit-il, les raisons
que j’ai de revendiquer quelque chose ne constituent pas un droit à cette
chose ou, selon sa formule lapidaire : hunger is not bread15. Joel Feinberg,
qui est par ailleurs un partisan résolu des droits moraux, a montré ce qu’a
d’insatisfaisant ce qu’il nomme la « ‘there ought to be a law’ theory of ri-
ghts », c’est-à-dire une conception optative des droits: proclamer un droit
moral ne peut pas signifier seulement souhaiter qu’une légitime revendi-
cation, par ex. que les femmes soient des citoyennes, devienne (un jour…)
un droit juridique16. Ou bien les droits moraux sont de véritables droits,
et ils doivent disposer d’une consistance spécifique, d’une exigibilité in-
dépendante de celle des droits juridiques qui viendront peut-être un jour
se greffer sur eux ; ou bien ce sont des revendications respectables appe-
lant peut-être une action appropriée, mais en aucune façon des droits. Ter-
tium non datur. Pour ma part, en raison des caractères qui me paraissent
devoir être conférés à des droits, à savoir qu’ils doivent être reconnus et
s’inscrire dans un contexte institutionnel, j’opte pour la 2e solution. Mais
j’admets volontiers que la question des ‘droits moraux’ n’est pas épuisée
par là, et qu’on ne peut pas considérer les droits de l’homme – puisqu’au
fond c’est de cela qu’il est question – comme de simples « manifesto-rights
», ainsi que les nomme Feinberg tout en avouant éprouver « une certaine
sympathie pour les rédacteurs de manifestes »17. Les droits proclamés dans
des manifestes – dont les paradigmes sont la Déclaration d’indépendance
des colonies américaines et la Déclaration des droits de l’homme et du
citoyen de 1789 – ont sans doute une redoutable puissance mobilisatrice
; mais ce sont de simples droits moraux, ou ce ne sont pas des droits du
tout, selon l’optique qu’on voudra adopter, tant qu’ils ne sont pas rendus
effectifs par leur constitutionnalisation. En tout cas, une chose me paraît
15 J. Bentham, L’absurdité montée sur des échasses [Examen critique de la Déclaration des droits de l’homme, art. 2],
in Cléro-Binoche, Bentham contre les droits de l’homme, PUF 2007, p. 34.
16 Feinberg, “In defense of moral rights”, p. 43-44.
17 Feinberg, “The nature and value of rights”, Journal of Value Inquiry, (1970), p. 255 (repris in Feinberg/Coleman,
Philosophy of Law, Thomson-Wadsworth, 2008, p. 355.
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certaine : s’il y a quelque chose comme des droits moraux (anté- et supra-
-juridiques), alors il ne faut pas les concevoir à l’optatif, mais à l’indicatif
: ils doivent être « des droits actuels dès l’instant où ils sont énoncés », et
engendrer en tant que tels des obligations corrélatives18.
Nous savons plus ou moins ce que c’est qu’un droit, ou plutôt ce que
sont les divers types de droits. Nous avons pris conscience d’un des problè-
mes que recouvre l’expression ‘avoir un droit’, celui de l’existence éventuelle
de droits moraux distincts des droits juridiques, donc de types de droits
qu’on n’« a » pas de la même façon. Posons-nous maintenant la question un
peu choquante : mais pourquoi faut-il que nous ayons des droits ? Une sim-
ple observation historique montre que cette question n’est pas vaine : après
tout, c’est seulement depuis une période récente que l’idée que les hommes
ont des droits, en tant que tels et non pas en raison de certains attributs
statutaires, s’est imposée comme une évidence. Je ne partage pas le point de
vue, idéologiquement satisfaisant mais historiquement hasardeux, de ceux
qui font remonter la problématique des droits de l’homme au Bill of rights de
1689, à l’acte d’habeas corpus de 1679, voire à la Grande Charte de Jean sans
Terre (1215), quand ce n’est pas à l’invocation par Antigone d’un droit supé-
rieur au droit de la cité ; en effet, c’est seulement dans les textes déclaratoi-
res de la fin du 18e siècle (dans les «manifestes» de Feinberg) qu’apparaît en
toute clarté l’idée que tous les hommes ont des droits «inaliénables», en tant
qu’ils sont « libres et égaux », c’est-à-dire égaux dans la liberté. Au demeu-
rant, sur le plan philosophique, c’est seulement dans le cadre de la pensée
moderne que l’idée de ‘droit subjectif’ a pu être conceptualisée : même si
certains en font remonter la découverte au nominalisme occamien (c’est la
thèse bien connue de Michel Villey19), cette idée ne reçoit une formulation
claire que chez Hobbes20, bien qu’on puisse en trouver une formulation hé-
sitante dans le De legibus de Suarez (livre I, chap. 2) ou chez Grotius (De jure
belli ac pacis, livre I, chap. 1 : différents sens du mot jus).
Ces rappels historiques avaient pour unique but de monter qu’il n’est
pas absurde de poser la question : pourquoi donc faut-il que les hommes
aient des droits (en général : on ne se soucie pas à ce stade du caractère
‘naturel’ ou ‘positif’ de ceux-ci) ? Hegel, en qui on ne voit pas toujours un
‘ami’ des droits humains, propose une réponse forte à cette question : seul
celui qui est susceptible d’avoir des droits – Hegel nomme cela un tel être
une personne – peut se voir imposer des obligations21. Cette réponse est
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22 Voir Durkheim, De la division du travail social, chap. VI, PUF 2007, p. 150 sq.
23 N. Luhmann, „Das Paradox der Menschenrechte und drei Formen seiner Entfaltung“, in Soziologische Aufklärung,
Bd. 6, Westdeutscher Verlag, 1995, p. 229 sq.
24 Voir Hayek, Droit, législation et liberté, t. 2 : Le mirage de la justice sociale, PUF, 1981, p. 121-127.
25 Voir Luhmann, « De la fonction des droits subjectifs », in Trivium (en ligne), 3/2009, p. 3 ; voir également
Gesellschaftsstruktur und Semantik, Bd. 2, Suhrkamp, 1981, Kap. 2 („Subjektive Rechte: Zum Umbau des
Rechtsbewusstseins für die moderne Gesellschaft“), en particulier p. 50 et 72.
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26 Voir Marx, Le Capital, l. I, trad. Lefebvre, PUF, 2006, chap. 4, p. 188 ; chap. 8, p. 303 ; chap. 13, p. 444.
27 Voir Weber, Sociologie du droit, PUF 1986, chap. 7 et 8.
28 Voir Marx, Le Capital, l. I, chap. 1, p. 82-83 ; Manuscrits de 1857-1858, ES 2011, p. 114-115. Et bien sur Lukàcs,
Geschichte und Klassenbewusstsein, chapitre sur la Verdinglichung, ainsi que l’actualisation de ce motif par A.
Honneth, La réification, Gallimard, 2007.
29 Feinberg, “The nature and value of rights”, p. 257.
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peut assujettir les citoyens à l’impôt, mais ceux-ci peuvent également bé-
néficier d’immunités en raison de telle ou telle propriété particulière. Il
n’en reste pas moins que les relations entre A et B, et par extension toutes
les relations interindividuelles, demeurent très singulières. B est obligé
de travailler pour A, mais il n’a pas le droit de réclamer une rétribution;
ceci veut dire que le versement d’un salaire est, tout comme le pourboire
que je laisse à un garçon de café, un acte de bienveillance, une libéralité.
Pourtant, le travail de B mérite incontestablement d’être rémunéré; dans
une autre société que S’ (ou S, a fortiori), on dirait qu’il en a le droit… Qu’est-
-ce qui alors, en l’absence (dans S’) d’un droit de B à exiger de A par les
voies du Droit le paiement de son labeur, peut garantir qu’il le percevra
effectivement? Uniquement, semble-t-il, le sens moral de A, sa rectitude si
l’on veut. Cela veut dire qu’en l’absence de droits ou lorsque l’accès à cer-
tains types de droits est limité, puisque telle est l’hypothèse, une vie socia-
le plus ou moins régulière ou ‘juste’ (il s’agit ici que d’une forme tout à fait
minimale de justice, correspondant à la prévisibilité des actes et de leurs
conséquences) ne sera possible que si l’on suppose à chacun une vertu le
conduisant à accomplir toutes ses obligations juridiques et morales alors
même que rien ni personne ne peut l’y contraindre.
Si on examine maintenant la proposition contraposée, on parvient
à une conclusion à première vue paradoxale : c’est précisément parce
qu’on ne peut pas supposer de A, de B ou de X qu’ils soient continuelle-
ment vertueux qu’on est dans la nécessité de leur reconnaître des droits
qu’ils puissent opposer aux conduites et aux intentions non vertueuses de
ceux avec qui la société les conduit à être en relation, de telle sorte qu’ils
soient obligés (sous peine de sanctions morales et/ou juridiques) de fournir
à leurs sociétaires les prestations auxquelles ceux-ci ont droit (fournir le
travail demandé, payer le salaire afférent). Contre la vieille idée de la so-
ciabilité naturelle (de l’homme comme zoon politikon), Bernard Mandevil-
le, l’auteur de La fable des abeilles (1714), a soutenu la thèse fameuse selon
laquelle la société est le produit non de nos vertus, mais de nos vices31. Je
dirais volontiers qu’il en va de même des droits : ils sont les contreparties
nécessaires de notre rectitude épisodique. Pourquoi donc faut-il que nous
ayons des droits ? Parce que rien ne nous autorise à nous supposer mu-
tuellement intègres, et parce qu’il faut bien que les remparts formés par
les droits (des remparts dont la géométrie peut et doit être constamment
redessinée) protègent chacun de nous des conséquences de l’absence de
vertu ou de bienveillance toujours possible d’autrui. Les droits – et je pen-
se évidemment d’abord aux droits juridiques, qui ne se restreignent pas
31 Mandeville, La fable des abeilles, trad. Carrive, Vrin, 1990. Voir le commentaire de Hayek, « Le docteur Bernard
Mandeville », in Nouveaux essais de philosophie, de science politique, d’économie et d’histoire des idées, Les Belles
Lettres, 2008, p. 361-385.
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A teoria do Direito de Habermas e o
campo do político: o direito como
médium entre sistema e mundo da vida?
Considerações Iniciais
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lução do sistema econômico não seria uma sua reprodução meramente in-
terna, calcada na exploração do trabalho pelo capital, na autovalorização
do dinheiro frente à reprodução normativa do mundo da vida, e sim, ao
contrário, uma reafirmação do mundo da vida e de sua constituição norma-
tiva em relação à própria dinâmica da autovalorização do capital e à explo-
ração do trabalho, refreando-as. Correlatamente, a ideia de uma implanta-
ção democrática e radical dos partidos políticos em suas bases significaria,
ainda como quer Habermas, um abandono de uma característica nefasta
dos partidos políticos democráticos, a saber, sua transformação dos cida-
dãos em massa de manobra política, sem qualquer outro substitutivo que
não a própria implantação de processos de democracia radical. Por isso,
na contemporaneidade, a emancipação ganha um acento eminentemente
político, como transformação política das estruturas de decisão, que deve
ser estendida para todos os âmbitos da sociedade, bem como levada a ter-
mo por processos democráticos maximamente inclusivos, consolidando a
primazia normativa do mundo da vida em relação ao desenvolvimento das
lógicas sistêmicas da economia capitalista e do Estado burocrático (HA-
BERMAS, 1986, p. 328-331; MCCARTHY, 2001, p. 298-299; WELLMER,
2001, p. 69-72; HONNETH, 2007). Em outras palavras, a modernidade en-
contraria sua redenção, sua correção e sua prossecução como democracia radical,
como uma política de base dinamizada por uma sociedade civil caracterizada
por movimentos sociais e iniciativas cidadãs críticos das instituições, que
instaurariam espaços de liberdade e de ação alternativos e espontâneos
em relação à dinâmica interna – burocrática, elitista e segmentária – das
próprias instituições, particularmente dos partidos políticos profissionais.
De volta ao institucionalismo?
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Referências
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Os conceitos de vida, de morte, de suicídio,
de pena de morte e de garantia da vida
na Filosofia do Direito de Hegel
Introdução
1 Cf. VAZ, 1995, p. 225: “[…] sobre o fundamento assegurado da leitura filológica [trabalho crítico-filológico] e da
leitura histórica, podemos tentar nos situar no nível da leitura hermenêutica [de interpretação crítica] para buscar,
aí, as razões que comprovem, para nós, a atualidade do texto hegeliano”. Afinal, “a primeira condição para nos
resolvermos a receber ou refutar as doutrinas que Hegel propõe é (sou por demais obrigado a recordar coisas que
pareciam dever subentender-se) ler os seus livros: acabando com o espetáculo, entre cômico e triste, de acusar e
injuriar um filósofo que não se conhece.” (CROCE, 1993, p. 188).
2 Todas as citações de textos de Hegel, usando as traduções em português publicadas, foram sempre comparadas
com o texto original alemão da Hegel Werke (2000), o qual, infelizmente, por questão de espaço, não citaremos. Nas
citações dos textos hegelianos sempre consta a referência, primeiro, do número do volume (Band) e, depois, da página
(Seite) de Hegel Werke, mantendo os grifos em itálico do autor. O parágrafo (§) seguido da letra A indica Anmerkung
(anotação), e o da letra Z designa Zusatz (adendo) ao caput. O texto aqui traduzido ou com tradução alterada, seja de
Hegel ou de outros autores, consta com a devida especificação de [TP] = Tradução Pessoal. Muitas vezes, faremos
ainda acréscimo de termos em alemão nas citações com o objetivo de destacá-los e/ou mostrar alterações na
tradução publicada (termos citados sempre mantendo o itálico ou não da versão original e entre colchetes [_]).
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3 Cf. HEGEL, 1995a (ECF I – § 81 Z), p. 163 [8/173]. Idem, 1995a (ECF I – § 92 Z), p. 189 [TP] [8/198]: “O vivente
morre, e de fato simplesmente porque, como tal, carrega dentro de si mesmo o gérmen da morte.” („Das Lebendige
stirbt, und zwar einfach um deswillen, weil es als solches den Keim des Todes in sich selbst trägt.“).
4 Cf. HEGEL, 1997 (ECF II – § 375 e § 375 Z) [TP] [9/535-536].
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Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
Todavia, cabe ressaltar que a morte jaz como possível, diante de to-
dos, em cada instante. Ora, na realidade pode-se retardar a morte, mas ela
não pode ser adiada para sempre. Assim sendo, todo ser vivo, a partir do
momento em que começa a viver, está, também, começando a morrer.
Outrossim, o problema da morte6 e a busca de resposta para as diver-
sas questões da vida são elementos de relevância quando se analisa a exis-
tência humana, porque são temas, também, sobre os quais as diversas reli-
giões buscam ponderar. Porém, a ansiedade pela perpetuação da existência
e a visível necessidade de alguns mecanismos de proteção diante da notável
fragilidade da vida não levaram o ser humano apenas a uma busca religiosa,
mas também promoveram o desenvolvimento das várias ciências ao longo
do tempo e da história, em que a Filosofia tem muito a contribuir. Ora, so-
bre isso, por exemplo, Vaz (1997, p. 52) afirma: “o terreno onde se demonstra
a necessidade da filosofia no seu alcance prático ou na sua significação para
a vida ou ainda, segundo a expressão do próprio Hegel num texto da época,
5 Cf. Hegel Werke; as frases de Epicuro são de: Diogenes Laertios X, § 142-143, 125 e Diogenes Laertios X, § 124-125.
Sobre isso, convém citar EPICURO, 2002, p. 1-4: “Acostuma-te à ideia de que a morte para nós não é nada, visto que
todo o bem e todo o mal residem nas sensações, e a morte é justamente a privação das sensações. A consciência clara
de que a morte não significa nada para nós proporciona a fruição da vida efêmera, sem querer acrescentar-lhe tempo
infinito e eliminando o desejo de imortalidade. Não existe nada de terrível na vida para quem está perfeitamente
convencido de que não há nada de terrível em deixar de viver. É tolo, portanto, quem diz ter medo da morte, não
porque a chegada desta lhe trará sofrimento, mas porque o aflige a própria espera: aquilo que não nos perturba
quando presente não deveria afligir-nos enquanto está sendo esperado. Então, o mais terrível de todos os males,
a morte, não significa nada para nós, justamente porque, quando estamos vivos, é a morte que não está presente;
ao contrário, quando a morte está presente, nós é que não estamos. A morte, portanto, não é nada, nem para os
vivos, nem para os mortos, já que para aqueles ela não existe, ao passo que estes não estão mais aqui. E, no entanto,
a maioria das pessoas ora foge da morte como se fosse o maior dos males, ora a deseja como descanso dos males
da vida. O sábio, porém, nem desdenha viver, nem teme deixar de viver; viver não é um fardo e não viver não é
um mal. […] Na tua opinião, será que pode existir alguém mais feliz do que o sábio, […] que se comporta de modo
absolutamente indiferente perante a morte […]?”.
6 HEGEL, 2002 (FE – Prefácio), p. 44 [TP] [3/36]: “A morte [Tod] […] é o mais terrível; e suster o que está morto [Tote]
requer a força máxima. […] Porém, a vida do espírito [das Leben des Geistes] não é a vida [Leben] que se aterroriza ante
a morte [Tode] e se conserva intacta da devastação, mas ela é a vida que suporta a morte e nela se conserva”.
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7 Cf. SILVA, 2010, p. 87: “Mas sabemos, como leitores de Hegel, que nem a ideia imediata e nem a vida orgânica
são o ápice e o acabamento do sistema. É verdade que a vida biológica é o grau mais alto a que chega a natureza,
contudo, a vida lógica é o grau mais ínfimo e imediato da ideia; o que ambas têm em comum é que serão superadas
[ou suprassumidas] pela vida do espírito. O processo da vida, diz Hegel, consiste em superar a imediatez à qual ela
ainda está presa (Cf. ECF I, § 216 Z). Diante desta afirmação, como poderíamos defender a centralidade da vida no
sistema?” Idem, cf. SILVA, 2010, p. 88: “Para concluir, gostaríamos de dizer que a vida progride e atualiza aquilo
que ela é, tanto a vida lógica como a vida biológica. Embora a ideia imediata seja a vida, ela deve ser suspensa [ou
suprassumida] pela ideia do conhecer e retornar transformada na ideia absoluta como retorno à vida. O campo de
toda a natureza orgânica segue este modelo e deve, do mesmo modo, ser suspenso [ou suprassumido] pelo espírito.
Ora, o progredir no sistema hegeliano é um movimento como o desdobrar-se da ideia que atua relacionando-se com
todos os elementos, alienando-se de si mesma sem perder-se de si. Se tomarmos a ideia de sistema apresentada na
Enciclopédia, segue-se a Ciência da Lógica, a Filosofia da Natureza e a Filosofia do Espírito.”
8 Cf. ROSENFIELD, 2008, p. 6: “[…] Hegel tenha utilizado o conceito de vida em um leque de significações que ora
nos indica a realidade biológica, ora a realidade em geral sob sua forma de existência orgânica ou sistemática, onde um
membro afeta e age sobre outro, sendo ao mesmo tempo afetado por esse processo e seu objeto, ora como categoria
lógica propriamente dita, em que se vislumbra e se apresenta um novo conceito de existência, no caso o da Ideia em
sua forma imediata.” p. 8: “Hegel nos adverte claramente da distinção entre a ideia de vida, ideia na acepção lógica, e a
vida em suas outras acepções científicas, dentre as quais a biológica, estudada na Filosofia da natureza. A ideia de vida
deve, pois, ser distinguida da vida naturalmente considerada.”
9 Adotamos a tradução de aufheben e Aufhebung por “suprassumir” e “suprassunção” a fim de destacar todo o
sentido pleno da polissemia contida na língua alemã e explorada especulativamente por Hegel para significar, ao
mesmo tempo, suprimir [sumir], conservar [assumir] e elevar [supra+assumir].
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10 Cf. FERRER, 2005, p. 131: “O conhecido dito de Kierkegaard de que Hegel, com o seu sistema, construiu um palácio
sumptuoso para ir habitar um casebre, subscreve uma concepção de sistema que hoje não mais aceitaríamos, nem em
geral, nem a propósito de Hegel. Subjaz a esta crítica uma denúncia da insuficiência do pensamento sistemático de Hegel
em relação ao conceito de vida e, mais especificamente, em primeiro lugar, da vida com aquilo que a envolve, suporta
e favorece; em segundo lugar, da vida como biografia pessoal e, por fim, também da vida na sua relação específica
com o pensar. Em particular a este último respeito, subjaz ao referido dito a concepção de que Hegel teria expulsado
a vida do sistema da filosofia como puro pensar e reduzido o pensamento filosófico a um conjunto de abstrações que
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uma mulher ou um homem não poderia habitar. A concepção, numa primeira análise, a aprofundar no que se segue, é
manifestamente falsa, posto que a vida pertence já ao pensar lógico abstrato, como categoria da Ciência da Lógica, que a
orgânica é uma parte fundamental da filosofia da natureza e que, também no plano do espírito, a vida define não só um
conceito central da antropologia como reaparece em todos os momentos do espírito.”
11 Assim, por exemplo, Hegel fala, entre outros, no Prefácio, de “esferas da vida pública” (Kreise des öffentlichen
Lebens) e, no § 157, de “vida pública” (öffentlichen Lebens), que está em relação, no § 187 A, com a “vida particular”
(partikularen Lebens), aspectos da vida do espírito; além disso, seguindo uma ordem numérica de ocorrência, no §
166 Hegel fala de “vida substancial efetiva” (wirkliches substantielles Leben), no § 170 A, de “vida social civilizada”
(geselligen gesitteten Lebens), no § 175, de “vida ética” (sittlichen Lebens), no § 203 A, de “vida errante do selvagem”
(schweifende Leben des Wilden), no § 206 A, de “vida política” (politischen Leben), no § 209 A, de “vida concreta
do Estado” (konkreten Staatsleben), no § 245, de “modo de vida regular (ordinária)” (ordentlichen Lebensweise), no
§ 247, de “vida familiar” (Familienlebens) e de “círculos limitados da vida civil-burguesa” (begrenzten Kreisen des
bürgerlichen Lebens), no § 250, de “vida familiar e natural” (Familien- und Naturlebens), no § 253 A, de “modo de
vida mais universal” (allgemeinere Lebensweise), no § 258 A, de “uma vida universal” (ein allgemeines Leben), no §
271, de “organização do Estado e o processo de sua vida orgânica” (Organisation des Staates und der Prozeß seines
organischen Lebens), no § 272 A, de “unidade viva” (lebendige Einheit), no § 273 A, de “configuração verdadeira da
vida ética” (wahrhaften Gestaltung des sittlichen Lebens) e de “vida do Estado” (Staatsleben), no § 279 A, novamente
de “vida do Estado” (Staatsleben), no § 290, de “vida civil-burguesa” (bürgerliche Leben), no § 303 A, de “a vida civil-
burguesa e a vida política” (das bürgerliche und das politische Leben), no § 305, de “vida familiar” (Familienleben),
no § 320, de “vida do Estado subsistente” (bestehenden Staatslebens), no § 345, de “vida individual e da vida do
povo” (individuellen und des Volkslebens) etc. Além disso, fala-se, no § 5 A, de “vida religiosa universal” (allgemeinen
religiösen Lebens) e, no § 134 Z, de “vida eterna” (ewige Leben), aspectos mais de sua Filosofia do Espírito Absoluto.
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12 O termo Entäusserung, normalmente traduzido por “exteriorização”, no âmbito jurídico ou do Direito Abstrato de
Hegel, é sinônimo de Veräusserung e, por isso, foi traduzido por “alheação”, de “alhear”, na medida em que significa
tornar alheio, passar para outrem o domínio ou o direito de desfazer-se, vender, alienar juridicamente. Assim, evitou-
se o uso do termo “alienação”, que foi usado exclusivamente para traduzir o termo clássico Entfremdung.
13 Etimologia de vida (alemão: Leben; inglês: life; grego: ζωή; latim: vita-, francês: vie; italiano: vita; espanhol: vida); de
morte (alemão: Tod; inglês: death; grego: θάνατος; latim: mors-, francês: mort; italiano: morte; espanhol: muerte) e, ainda,
de suicídio (alemão: Selbstmord, Selbsttötung [termos usados por Hegel], Freitod, Suizid [não usados por Hegel]; inglês:
suicide, self-murder; grego: αυτοκτονία; latim: suicidium, francês: suicide; italiano: suicídio; espanhol: suicidio).
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14 Cf. Ad § 47 – Hotho, III, 214: “Eu possuo o meu corpo orgânico de maneira natural, mas aquilo que eu tenho como
propriedade tem de ser meu só e primeiramente por minha vontade. Meu corpo, portanto, tem de tornar-se minha
propriedade por minha vontade. A minha vida, a totalidade da minha atividade orgânica só é também minha por minha
vontade. O animal não pode mutilar-se, não pode tomar-se a vida.”
15 No § 48 (2010, p. 87 [TP] [7/111]), Hegel afirma: “O corpo, na medida em que ele é ser-aí imediato, não é adequado
ao espírito; para ser um órgão volitivo e um meio animado desse, ele precisa primeiro ser tomado em posse pelo
espírito”. Depois, no § 48 A (2010, p. 87-88 [TP] [7/111]), ainda registra: “Apenas porque eu sou vivente [lebendig bin]
enquanto ser livre no corpo, não é permitido abusar desse ser-aí vivo [lebendige Dasein], fazendo dele um animal de
carga [Lasttiere]. Na medida em que eu vivo [Ich lebe], minha alma (o conceito e, mais ainda, o livre) e meu corpo não
estão separados, esse é o ser-aí da liberdade, e nele eu sinto. Por isso, apenas um entendimento sofístico, desprovido
de ideias, pode fazer a diferenciação segundo a qual a Coisa em si, a alma, não é tocada ou atacada quando o corpo é
maltratado [mißhandelt] e a existência da pessoa é submetida à violência de um outro. Eu posso retirar-me de minha
existência em mim e torná-la exterior – [eu posso] manter a sensação particular fora de mim e ser livre nas cadeias.
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lor a uma vida humana, sendo que o extremo que serve como elemento de
distinção em relação aos animais é a capacidade do ser humano de “se mu-
tilar” (sich verstümmeln) ou até mesmo de “se matar [ou se suicidar]” (sich
umbringen), de que “ele pode cometer suicídio” (er kann einen Selbstmord
begehen)16. A diferença entre o ser humano e os animais, segundo Hegel,
se dá pelo grau de consciência, de ciência, de querer, de vontade envolvida
na vida. Isto é, o fato do “animal” ou do “bicho” (Tier - Vieh) “ter” (haben)
“vida” (Leben), para o autor, não lhe dá o respectivo direito à sua vida, pois
não a quer racionalmente, mas a tem apenas de forma instintiva. A vida
humana, a fim de não ser uma vida meramente animal, requer o querer
consciente da vida e, assim, envolve o outro extremo, isto é, de não “matar”
(töten – umbringen) a própria vida, de não “se matar” (sich töten – sich um-
bringen), de não cometer “suicídio” (Selbsttötung – Selbstmord).
Todavia, é importante ressaltar que Hegel está falando da “possibi-
lidade” (Möglichkeit) ou de alguém “poder” (können) se matar ou cometer
suicídio, mas não propriamente defendendo ou estimulando a prática, ante
pelo contrário. No § 70 Z ([TP] [7/152]), inclusive, consta o seguinte:
Mas, isso é minha vontade [mein Wille]; para o outro, eu estou [ou sou] em meu corpo; sou livre para os outros, eu
sou livre apenas no ser-aí; é uma proposição idêntica (ver minha Ciência da Lógica, t. I, p. 49 s.). […]”
16 Cf. ROSENFIELD, 1998, p. 113: “O homem é um ser que pode pôr em questão a vida do espírito, isto é, ele mesmo”.
17 Cf. [zu § 71] ([TP] [7/153]): “É sempre uma representação superior – fim [Zweck] – que se opõe à vida [dem Leben
entgegensetzt] – vinculação à moralidade – no suicídio [Selbstmord] – ideia superior, na qual me faço de juiz [Richter].”
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Eu sou o senhor da minha vida [Ich bin Herr über mein Leben]
– assim como todos os outros [jeder andere ebensogut] – Hobbes:
cada um pode matar o outro [jeder kann den andern umbrin-
gen], – por isso, todos os seres humanos são iguais [gleich] – Eu
tenho sozinho o verdadeiro julgamento – cada um se faz um jul-
gamento sobre se eu mereço viver [ob ich verdiene zu leben] […].
18 Nos registros de H. G. Hotho das Lições sobre Filosofia do Direito de 1822/23 ([TP] p. 260) consta: “O ser humano
[…] não tem o direito de negar ele mesmo esse direito; ele não tem o direito de se matar [Der Mensch… hat kein Recht
dies Recht selbst zu negieren; er hat kein Recht sich zu tödten]. Nos registros de K. G. V. Griesheim das Lições sobre
Filosofia do Direito de 1824/25 ([TP] p. 242) consta: […] questão sobre o direito do ser humano em vista do suicídio
[Frage auf das Recht des Menschen in Ansehung des Selbstmordes] […] isso é uma ilicitude [Unrecht], o ser humano não
tem nenhum direito de se matar [der Mensch hat kein Recht sich selbst umzubringen]. Nas Lições sobre a Filosofia da
Religião ([TP] [16/123], consta: “Eu posso de fato me matar [Ich kann mich zwar umbringen]; mas isso é a liberdade de
abstrair do meu ser-aí [Dasein]. Eu sou: no eu já está contido o sou [Ich bin: im Ich ist schon das Bin enthalten]”.
19 Cf. [zu § 70] ([TP] [7/151]): “[…] Quando o ser humano desce nessa profundeza – traz sua vida [sein Leben]
em sua amplitude para a comparação, o confronto e o questionamento, – com isso intervém a exigência de que
ele também desça à profundeza de seu espírito – antes que julgue que esta vida não tem valor [dies Leben hat
keinen Wert]. – Se não existe nada nele pelo qual poderia se dar um valor [Wert], – é que ele está num degrau
inferior da sua consciência ética […]”.
20 Cf. § 408 Z da Enciclopédia – HEGEL, 2005, p. 161 [TP] [10/175-176]: “Pode ser considerada como a loucura
mais indeterminada [unbestimmtesten Narrheit] o tédio-de-viver [ou o desgosto-da-vida] [Lebensüberdruß],
quando não é ocasionado pela perda de pessoas amadas, dignas de respeito, e [pela perda] de relações éticas.
O desgosto da vida indeterminado e infundado [unbestimmte, grundlose Ekel am Leben] não é uma indiferença
quanto à vida [Gleichgültigkeit gegen dasselbe] – pois, neste caso, se suporta a vida [erträgt man das Leben] – mas,
antes, a incapacidade de suportar a vida [Unfähigkeit, es zu ertragen], um oscilar para lá e para cá, entre a atração
e a rejeição a respeito de tudo que pertence à efetividade; um estar-cativo [Gebanntsein] na representação fixa
da repulsa da vida [Widerlichkeit des Lebens] e, ao mesmo tempo, um aspirar por ir além [Hinausstreben] dessa
representação. Dessa relutância [Widerwillen] – surgida sem qualquer fundamento racional [vernünftigen Grund] –
contra a efetividade, como também de outras maneiras de loucura [Narrheit], os ingleses são sobremodo afetados;
talvez porque nessa nação o ser-obstinado [Verstocktsein] na particularidade subjetiva é tão predominante.
Aquele tédio-de-viver [Lebensüberdruß] aparece nos ingleses sobretudo como melancolia [Melancholie], como
esse cismar persistente – que não chega à vitalidade [Lebendigkeit] do pensar e do agir – do espírito sobre sua
representação infeliz. Não raramente, desse estado-de-alma desenvolve-se um impulso irresistível ao suicídio
[ein unbezwingbarer Trieb zum Selbstmord]; às vezes, esse impulso [Trieb] apenas se pode anular arrancando o
totalmente desesperado [Verzweiflungsvolle] violentamente de si mesmo. Conta-se, por exemplo, que um inglês,
quando tinha em mente afogar-se [sich… ersäufen] no Tâmisa, foi assaltado por bandidos: defendeu-se o melhor
possível e, de repente, devido ao sentimento que despertou do valor da vida [Werte des Lebens], perdeu todos os
pensamentos suicidas [alle selbstmörderischen Gedanken]. Um outro inglês, que se enforcara [sich gehenkt hatte],
quando seu criado o livrou cortando a corda, recobrou não só o gosto [ou a afeição] pela vida [Neigung zum Leben],
mas também a doença da avareza, pois, ao demitir o criado, descontou-lhe dois pences, porque ele cortou a corda
do enforcamento [fraglichen Strick] sem a ordem do seu senhor.”
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Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
21 Hegel, por exemplo, registra que “ele [Hobbes] considera este estado [de natureza] em seu verdadeiro sentido[;]
ele não é o palavreado vazio de um estado naturalmente bom; é muito mais o estado animal” (HEGEL, Vorlesungen
über die Geschichte der Philosophie (Lições sobre a História da Filosofia) [TP] [20/226]). Para o autor, Hobbes
demonstrou que, no estado de natureza, “o ser humano se comporta segundo sua naturalidade”, a saber, que “ele
se comporta segundo os desejos, as inclinações etc.” (Idem [TP] [20/227]). Trata-se de aspecto que Hegel reitera em
praticamente todas as suas obras em que fala sobre a natureza humana, mas sem citar sempre Hobbes. Mas, antes
disso, Hegel fala da “igualdade natural” dos seres humanos, citando literalmente Hobbes, que usa a mesma expressão.
No caso, a passagem hegeliana afirma: “Os seres humanos, apesar da total desigualdade de forças, possuem, porém,
também uma igualdade natural”; isto ele [Hobbes] mostra a partir de um fundamento particular, a saber, porque “cada
um pode matar o outro” [“jeder den anderen umbringen kann”], qualquer um pode [exercer] a violência extrema sobre
o outro. “Qualquer um pode [exercer] este [ato] supremo” [De cive, c. 1, § 3, p. 4]. Sua igualdade vem, assim, não
da maior força, não é fundamentada, como nos tempos modernos, na liberdade do espírito, na igual dignidade, na
autonomia, porém na igual fraqueza dos homens; qualquer um é um fraco frente ao outro.” (Ibidem [TP] [20/226]).
Hegel ainda afirma o seguinte: “A partir disso, ele [Hobbes] tira então a consequência de que o ser humano precisa
sair do estado de natureza (e tali statu exeundum). Isto é correto” (Ibidem [TP] [20/22]). No caso, cita-se novamente
Hobbes, a saber, “De Cive, c. 1, §§ 12-14” e “Leviatã, c. 13”. De fato, nas duas passagens, fala-se da “guerra de todos
contra todos” e declara-se, ainda, que “podemos deixar este estado [de natureza]”. Portanto, Hobbes afirma que
convém ‘sair de tal situação’, do ‘estado de natureza’. Trata-se, pois, de um aspecto hobbesiano que Hegel reitera em
praticamente todas as suas obras ao falar da natureza humana, mas sem citar sempre Hobbes. Sobre isso, na Filosofia
do Direito, Hegel fala da necessidade do ser humano desenvolver sua “segunda natureza” (§ 4 e § 151), isto é, a sua
“natureza do espírito” (§ 4 A), não ficar nos meros “desejos e impulsos” (§ 5, § 11), nas meras “inclinações” (§ 11). Para
ele, convém “converter [ou transformar] a primeira natureza em segunda natureza espiritual”, pois “a primeira natureza
do homem é seu ser imediato, animal” (§ 151 Z [TP] [7/300]). Além disso, no § 93 A, Hegel afirma que a “naturalidade
é um ato de violência, ou é apenas um estado de natureza, – estado de violência em geral existente” (HEGEL, 2010,
p. 118 [7/179]). No § 187 A, ainda critica as “representações de inocência do estado de natureza”, que, segundo ele,
inclusive, “mostram desconhecimento da natureza do espírito” (Idem, p. 196 [7/349]). No § 194 A, ele acrescenta: “A
representação, segundo a qual o homem viveria em liberdade no que diz respeito a seus carecimentos, num pretenso
estado de natureza, em que ele teria apenas pretensos carecimentos naturais simples e utilizaria para sua satisfação
apenas meios que uma natureza contingente lhe proveria imediatamente […] – é uma opinião falsa.” (Ibidem, p. 196
[7/349]). Enfim, no § 200 A, Hegel afirma inclusive que a sociedade civil-burguesa “conserva o resto do estado
de natureza”, tanto na “particularidade natural” quanto na “arbitrária” (Ibidem, p. 198 [7/353]). Com isso, em suma,
podemos ver que são várias as passagens, todas com evidente viés hobbesiano, mostrando a influência de Hobbes em
Hegel, sobretudo falando sobre o correto conceito de “natureza humana”, ressaltando que “é preciso sair” do mero
“estado de natureza”, aspecto que, apesar de envolver diferenças, deve ser devidamente registrado e reconhecido.
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22 Traduzimos unrecht e Unrecht (lichkeit) por “ilícito” e “ilicitude”, pois se trata do que é “não direito”, “contrário ao
direito”. Assim, para distinguir, traduzimos ungerecht e Ungerechtigkeit por “injusto” e “injustiça”.
23 É importante e essencial registrar a diferença terminológica e conceitual em Hegel entre “servidão” (Knechtschaft)
e escravidão (Sklaverei), sendo “servo” (Knecht) algo distinto de “escravo” (Sklave).
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24 No [zu § 57] ([TP] [7/124-125]), ainda consta: “[…] A escravidão [Sklaverei] é algo histórico – isto é, ela incide,
pertence a uma situação anterior ao direito [einen Zustand vor dem Rechte] – é relativa – Toda essa situação
não deve ser [soll nicht sein] […]. – Quando se diz que a escravidão [Sklaverei] é em si e para si ilicitude [Unrecht]
–, é totalmente correto [ganz richtig]. Necessidade do Estado. – Mas o que é direito objetivo é essencialmente,
igualmente, um direito subjetivo para si, isto é, ele não é uma pedra, algo exterior, apenas sólido, porém que ele
é a vontade do espírito [Wille des Geistes], – do espírito universal [allgemeinen Geistes], da cultura universal
[allgemeinen Bildung]. A ilicitude [Unrecht] é, assim, o em si e para si, isto é, ela é a própria autoconsciência
universal – não querer ser um escravo, mas ainda querer um senhor [nicht ein Sklave – noch ein Herr sein zu
wollen]; – nenhum senhor, nenhum escravo [kein Herr, kein Sklave], – mas, igualmente, nenhum escravo, nenhum
senhor [kein Sklave, kein Herr]. – Não é [da] culpa [Schuld] deste ou daquele indivíduo – destes ou daqueles, que
eles são escravos [Sklaven] – mas de todos, do todo”.
25 Hegel afirma que “o saber-se dessa liberdade” (ECF (III), 1995, p. 284: § 488 [10/306] „das Sichwissen dieser
Freiheit“) nem sempre é algo efetivo ou envolve efetividade. Por isso, como ele bem afirma, é algo que precisa ser
reconhecido e deve se fazer valer e reconhecer efetivamente: “O ser humano é, segundo a existência imediata, em
si mesmo algo natural, externo a seu conceito; é apenas pela formação de seu corpo e de seu espírito próprios,
essencialmente pelo fato de que sua autoconsciência se apreende como livre, que ele toma posse de si e se torna
propriedade de si mesmo e em relação aos outros. Esse tomar posse é, ao contrário, igualmente o pôr na efetividade
o que ele é segundo seu conceito (enquanto uma possibilidade, faculdade, disposição)” (2010, § 57, p. 93: 7/122-123).
Porém, uma liberdade efetiva requer a atividade da própria pessoa, pois de nada serve ser, em si ou por essência,
livre, mas é preciso, ainda, vir a ser efetivamente ou para si livre. Não basta, para Hegel, que o indivíduo tome apenas
consciência de sua autonomia formal, de sua liberdade enquanto possibilidade, faculdade ou disposição, mas cabe
também efetivar tal potencialidade. Inclusive, no § 382 da Enciclopédia, ele ressalta que “a essência do espírito é
formalmente a liberdade” (ECF (III), 1995, § 382, p. 23: 10/25 „Das Wesen des Geistes ist […] formell die Freiheit“),
porém, “em sua imediatez, o espírito só é livre em si segundo o conceito e a possibilidade, não ainda segundo a
efetividade”; ou seja, “a liberdade efetiva, assim, não é algo essente de modo imediato no espírito, mas algo a ser
produzido por sua atividade” (ECF (III), 1995, § 382 Z, p. 24: 10/27). Logo, para Hegel, não basta só ter formalmente
tal potência, mas ela precisa vir a ser de forma efetiva: “Se o saber da Ideia – isto é, do saber dos homens de que sua
essência [Wesen], meta [ou fim – Zweck] e objeto [Gegenstand] é a liberdade – for especulativo, essa Ideia mesma
como tal é a efetividade dos homens”: assim, “não a ideia que eles têm [haben], porém a ideia que eles são [sind]” (ECF
(III), 1995, § 482 A, p. 275-276: 10/302). No caso, o autor usa o verbo ter, de algo em si, e o verbo ser, de algo para si.
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Ora, sobre isso, no § 175, Hegel (2010, p. 182 [7/327]) até afirma: “As
crianças [Kinder] são em si livres [sind an sich Freie], e a vida [das Leben] é
apenas o ser-aí imediato dessa liberdade, por isso elas não pertencem a
outros nem aos pais enquanto Coisas26”. Ora, nenhum ser humano pode ou
deve ser considerado uma mera “Coisa [Sache]” ou “coisa [Ding]”, nem mes-
mo as crianças, apesar de ainda não estarem na “maioridade” (Volljährigkeit
ou Mündigkeit [versus menoridade = Unmündigkeit]), ou na “personalidade
livre” (freie Persönlichkeit), com sua devida “autonomia” (Selbständigkeit
ou Autonomie ou autodeterminação = Selbstbestimmung [versus hetero-
nomia = Unselbständigkeit ou Heteronomie]); enfim, conforme também o
já citado § 175, é tarefa “elevar as crianças desde a imediatidade natural,
em que se encontram originalmente, até a autonomia e a personalidade
livre”; pois, segundo o § 177 (2010, p. 184 [7/330]): “A dissolução27 ética [sit-
tliche Auflösung] da família consiste em que as crianças, educadas [erzo-
gen] para a personalidade livre [freien Persönlichkeit], sejam reconhecidas
[anerkannt] na maioridade [Volljährigkeit] […]”.
26 Sache é traduzido por Coisa (com maiúscula) versus o termo Ding, que é traduzido por coisa (com minúscula).
27 Lembrando que existe, segundo Hegel, o processo de “dissolução ética da família” (sittliche Auflösung der Familie
– § 177) mediante a constituição constante de novas famílias ou novos lares/casais; o de “dissolução natural da família”
(natürliche Auflösung der Familie – § 178) mediante a eventual morte dos seus membros; e, também, o de dissolução
‘jurídica’ do casal mediante “o separar do casamento” (die Ehe scheiden – § 176), isto é, o “divórcio” (Ehescheidung).
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Beccaria [Dei delitti e delle pene [Dos delitos e das penas], Livor-
no, 1764], como se sabe, negou ao Estado o direito à pena de
morte [das Recht zur Todesstrafe] pela razão [ou fundamento
– Grunde] de que não se podia presumir [präsumiert] que es-
teja contido no contrato social [gesellschaftlichen Vertrage] o
consentimento dos indivíduos [Einwilligung der Individuen]
de se deixar matar [sich töten zu lassen][;] antes, tem de ser
admitido o contrário. Porém, o Estado não é de modo algum
um contrato (ver § 75), nem a sua essência substancial é incon-
dicionalmente a proteção e a garantia da vida e da proprieda-
de dos indivíduos [der Schutz und die Sicherung des Leben und
Eigentums der Individuen] enquanto singulares, antes ele é o
superior, que reivindica [nimmt] também essa vida e essa pro-
priedade mesmas [dieses Leben und Eigentum selbst] e exige
[fordert] seu sacrifício [Aufopferung]. – Além disso, não é ape-
nas o conceito de crime, o racional em si e para si, com ou sem
consentimento [mit oder ohne Einwilligung] dos indivíduos
singulares, que o Estado tem de fazer valer, porém também a
racionalidade formal, o querer do indivíduo singular, que reside
na ação do criminoso. Que a pena [Strafe] seja aí considerada
como contendo seu próprio direito, nisso o criminoso [Verbre-
cher] é honrado [geehrt] como um ser racional [Vernünftiges].
– Essa honra [Ehre] não lhe compete quando o conceito e a me-
dida de sua pena [Begriff und der Maßstab seiner Strafe] não
são tomados de seu ato mesmo; – tampouco lhe compete quan-
do é considerado somente como um animal nocivo [schädli-
ches Tier], que tem de ser tornado inofensivo [unschädlich], ou
quando se visa à intimidação e à correção [Abschreckung und
Besserung]. – Além disso, considerado o modo de existência da
justiça [Weise der Existenz der Gerechtigkeit], a forma [Form]
que ela tem no Estado, a saber, enquanto pena [Strafe], não é de
toda maneira a única forma [einzige Form], e o Estado não é o
pressuposto que condiciona a justiça em si.
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Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
28 Joseph II, ou José II (Viena, 13.03.1741 – Viena, 20.02.1790) foi o Imperador Romano-Germânico e Arquiduque da
Áustria de 1765 até sua morte, em 1790, além de ser Rei da Hungria, Croácia e Boêmia a partir de 1780.
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29 Lembrando que, em Hegel, o poder judiciário, ou a chamada “Administração do Direito” (Rechtspflege), §§ 209-229,
inclusive o “Tribunal” (Gericht), §§ 219-229, é parte da “Sociedade Civil-Burguesa” (bürgerliche Gesellschaft), e não
propriamente um dos poderes do Estado.
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Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
30 Sobre isso, convém ver, também, o § 211 A (2010, p. 204-205 [7/362]), em que se afirma: “É uma ilusão [crer] que
eles [os direitos consuetudinários], pela sua forma de serem enquanto hábitos, devem ter a vantagem de ter passado
à vida [ins Leben übergegangen zu sein] (– fala-se hoje em dia, sobretudo, com mais frequência, precisamente da
vida e da passagem à vida [vom Leben und vom Übergehen ins Leben], em que se versa na matéria mais morta e nos
pensamentos mais mortos [wo man in dem totesten Stoffe und in den totesten Gedanken versiert] –), pois as leis
vigentes [geltenden Gesetze] numa nação, por terem sido escritas e compiladas, não cessam de ser seus hábitos.
31 Sicherung pode ser traduzido por “garantia, segurança, proteção, consolidação”.
32 Cf. “[…] o Estado não é de modo algum um contrato (ver § 75), nem a sua essência substancial é incondicionalmente
a proteção e a garantia da vida e da propriedade dos indivíduos [der Schutz und die Sicherung des Leben und Eigentums
der Individuen] enquanto singulares; antes, ele é o superior que reivindica, também, essa vida e essa propriedade mesmas
[dieses Leben und Eigentum selbst] e exige seu sacrifício [Aufopferung].” (HEGEL, 2010, p. 123 [7/190]).
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33 Sobre isso, Kervégan (Nota 2, 1998, p. 204 [TP]) afirma: “Desconhecido do direito romano, o jus necessitatis (direito
de necessidade, ou de emergência) foi teorizado pelos canonistas medievais e, desde então, faz parte das ações
ordinárias da cultura jurídica ocidental; em particular, a tradição tomista o absolutizou. A defesa do jus necessitatis
aqui produzida por Hegel é destinada principalmente a contrariar o argumento kantiano segundo o qual este “alegado
direito” repousa sobre uma confusão danosa entre direito e ética; ora, “não há necessidade de tornar legal aquilo que
é injusto [ilícito]” ([KANT,] Doutrina do Direito, p. 110).”
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34 Sobre isso, Kervégan (Nota 3, 1998, p. 204 [TP]) afirma: “die Wohltat der Kompetenz; este termo é o equivalente
alemão do vocábulo latino benificium competentiae. Este é o “favor especial de amenizar uma condenação [de uma
pessoa] apenas no limite dos seus recursos” […]”.
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35 Traduzimos Gesinnung por “disposição espiritual”, pois tradutores como J.-F. Kervégan, B. Bourgeois e A. Kaan a
traduziram por “disposition-d’esprit”, o que consideramos mais apropriado e preciso do que “disposición interior”, de
J. L. Vermal; “disposição de ânimo”, de M. L. Müller, etc. Ora, trata-se não de mera “disposição”, mas que é espiritual.
36 Sobre isso, ver o § 151 (2010, p. 171 [7/301]): “Mas, na identidade simples com a efetividade dos indivíduos, o
ético [Sittliche] aparece como modo de ação universal [allgemeine Handlungsweise] deles – como costume [Sitte], – o
hábito [Gewohnheit] deles como uma segunda natureza [zweite Natur], que é posta no lugar da vontade primeira
meramente natural [ersten bloß natürlichen Willens], e são a alma, a significação e a efetividade que penetram seu
ser-aí, o espírito vivo e presente [lebendige und vorhandene Geist] enquanto mundo, cuja substância somente
assim é como espírito [Geist].” E, ainda, o § 151 Z ([TP] [7/302]): “O ser humano morre [stirbt] também por hábito
[Gewohnheit], ou seja, quando se habituou [eingewöhnt] completamente na vida [Leben], se torna espiritual e
fisicamente monótono [geistig und physisch stumpf], e a oposição entre consciência subjetiva e atividade espiritual
desaparece, porque o ser humano apenas é ativo se não conseguiu algo e quer produzir e se fazer valer em vinculação
a ele. Quando isso é consumado [vollbracht], a atividade [Tätigkeit] e a vitalidade [Lebendigkeit] desaparecem, e a falta
de interesse [Interesselosigkeit], que surge, é a morte espiritual ou física [geistiger oder physischer Tod].”
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Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
[…] o Estado também tem uma doutrina, visto que suas insti-
tuições e o que, em geral, vale para ele a respeito do direito, da
constituição etc. estão essencialmente enquanto lei na forma
do pensamento, e visto que ele não é nenhum mecanismo, po-
rém a vida racional da liberdade autoconsciente [das vernünfti-
ge Leben der selbstbewußten Freiheit], o sistema do mundo ético
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nach innen), falando, entre outros, no § 322, da “relação [de um Estado in-
dividual] com outros Estados” (Verhältnis zu anderen Staaten), o que pode
levar, segundo o § 323 (2010, p. 297 [7/491]), a “eventos contingentes, que
vêm de fora” (zufälligen Begebenheiten, die von außen kommen), o que pode
se tornar um “momento próprio supremo” (höchstes eigenes Moment), que
“enquanto força absoluta [absolute Macht] contra todo singular e particular
[gegen alles Einzelne und Besondere], contra a vida, a propriedade e os seus
direitos [gegen das Leben, Eigentum und dessen Rechte], assim como contra
os demais círculos, traz a nulidade destes ao ser-aí e à consciência”. Trata-
-se da possibilidade da guerra versus da paz, que citamos aqui apenas no
sentido de apresentar e analisar a questão da vida e da morte, em especial
o aspecto da segurança da vida. Por exemplo, sobre isso, no § 324 (2010, p.
297 [7/491]), Hegel afirma:
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37 HEGEL. Sobre as Maneiras Científicas de Tratar o Direito Natural [Über die wissenschaftlichen Behandlungsarten
des Naturrechts], de 1802, Ed. Suhrkamp, vol. 2, p. 482. Traduzido para o português por Agemir Bavaresco e Sérgio
Christino [São Paulo: Edições Loyola, 2007, p. 84].
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38 § 324 Z ([TP] [7/492-493]: “Na paz [Im Frieden], a vida civil-burguesa [bürgerliche Leben] se expande mais, todas
as esferas se encasulam e, no longo prazo, os seres humanos estagnam como pântanos; a sua particularidade torna-
se sempre mais fixa e se ossifica. Mas, faz parte da saúde [Gesundheit] a unidade do corpo, e, quando as partes em
si mesmas endurecem, a morte [Tod] está aí. Paz perpétua [Ewiger Friede] foi frequentemente exigida [gefordert]
como um ideal [ein Ideal] do qual a humanidade precisaria se aproximar [zugehen müsse]. Kant propôs, assim, uma
coligação de príncipes que deveria arbitrar [schlichten sollte] os conflitos dos Estados [streitigkeiten der Staaten], e
a Santa Aliança tinha a intenção de ser aproximadamente um tal instituto. Só que o Estado é um indivíduo e, na
individualidade, a negação [Negation] está essencialmente contida. Ainda que, portanto, um certo número de
Estados se constitua numa família, esta associação, enquanto individualidade, tem de criar uma oposição e engendrar
um inimigo. Não só os povos saem revigorados das guerras, mas as nações, que estão em discórdia dentro de si,
alcançam com a guerra externa a tranquilidade interna. Certamente, pela guerra advém insegurança na propriedade
[Unsicherheit ins Eigentum], mas essa insegurança real nada mais é do que o movimento, o qual é necessário.”
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Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
de pôr sua vida em jogo [jenen Mut, das Leben daran zu set-
zen]. – O princípio do mundo moderno, o pensamento e o uni-
versal, deram à valentia [Tapferkeit] uma figura superior de
que sua externação parece ser mais mecânica e não aparece
como um atuar dessa pessoa particular, porém apenas enquan-
to membro de um todo, – igualmente de que ela não é mais
dirigida contra as pessoas singulares, porém contra um todo
hostil em geral, com isso a coragem pessoal [persönliche Mut]
não aparece como pessoal. Por isso, esse princípio inventou a
arma de fogo [Feuergewehr], e uma invenção contingente dessa
arma não transformou a mera figura pessoal da valentia numa
figura mais abstrata.
39 Sobre isso, ver: KONZEN, 2019: Os conceitos hegelianos e kantianos de Direito Estatal Externo, de Direito dos
Povos ou Direito das Gentes ou Direito Internacional, de Guerra e de Paz.
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40 Sobre isso, inclusive, no § 338 Z ([TP] [7/502]), afirma-se: “As guerras mais recentes são, por isso, conduzidas
mais humanamente, e as pessoas não se defrontam com ódio entre si” (Die neueren Kriege werden daher menschlich
geführt, und die Person ist nicht in Haß der Person gegenüber). Além disso, no § 339 (2010, p. 305 [7/501]), consta:
“[…] o comportamento recíproco [dos Estados] na guerra [im Kriege] (por exemplo, que se façam prisioneiros) e o que,
na paz [im Frieden] um Estado concede aos súditos [Angehörigen] de outro [em matéria] de direitos para o comércio
privado etc., isso repousa principalmente nos costumes das nações [Sitten der Nationen] enquanto universalidade
interna da conduta que se mantém em todas as relações.”
41 § 340 (2010, p. 305-306 [7/503]): “Na relação dos Estados uns frente aos outros, porque estão aí como particulares,
entra o jogo extremamente móvel da particularidade interna das paixões, dos interesses, dos fins, dos talentos e das
virtudes, da violência, do ilícito e dos vícios, assim como o da contingência externa nas maiores dimensões do fenômeno,
– um jogo no qual a totalidade ética mesma, a autonomia do Estado está exposta à contingência [Zufälligkeit]. Os
princípios dos espíritos dos povos [Volksgeister], por causa de sua particularidade, em que eles têm sua efetividade
objetiva e sua autoconsciência enquanto indivíduos existentes são, em geral, delimitados, e seus destinos e seus atos,
em sua relação uns aos outros, são a dialética fenomênica da finitude [erscheinende Dialektik der Endlichkeit] desses
espíritos a partir da qual o espírito universal [der allgemeine Geist], o espírito do mundo [der Geist der Welt] produz-
se tanto como indelimitado quanto é ele que exerce neles seu direito, – e seu direito é o mais elevado de todos, – na
história mundial [der Weltgeschichte], enquanto tribunal do mundo [als dem Weltgerichte].”
42 Cf. Bavaresco e Velasco, 2013, p. 55: “Hegel comenta a proposta kantiana de organizar uma liga de Estados com a
finalidade de resolver os conflitos e arbitrar litígios, evitando a decisão pela guerra. Porém, esses acordos repousariam
em razões morais, religiosas ou outras, ou seja, ‘sempre na vontade soberana particular’. A conclusão é que os
contratos ou tratados entre os Estados permanecem contingentes.”
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Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
dos indivíduos [Sicherung des Lebens und Eigentums der Individuen]”; isso
não é algo incondicional, absoluto. Entre outros, isso depende se estamos
falando “da vida individual e [ou] da vida do povo [des individuellen und
des Volkslebens]”, cf. § 345, da “vida do Estado [Staatsleben]”, cf. § 279 A
e § 290 etc., sendo o pior, segundo Hegel, a “morte da vida ética [den Tod
des sittlichen Lebens]”, cf. § 35743.
Contudo, Hegel procura, sim, “a garantia da vida e da propriedade
[die Sicherung des Lebens und Eigentums]” e, sobre isso, convém citar um
trecho das Lições sobre a Estética ([TP] [13/242]):
Enfim, Hegel busca promover a liberdade e, para tal, precisa ter vida,
e não morte; contudo, não é qualquer vida, meramente natural, animal,
mas precisa ser propriamente, antes, vida espiritual, suprassumida, em
vista de um fim racional, ético.
Considerações Finais
43 Cf. Inwood, 1997: Dicionário Hegel, termos “morte e imortalidade”, p. 283-287. Entre outros, consta: “A morte era
um tema de interesse vital na Alemanha de Hegel. […] Em seus primeiros escritos, a tendência de Hegel foi para colocar
em contraste a morte (Tod) e os mortos (das Tote) com a vida e os vivos […]. Em FE, E e IFR, Hegel considera que a
morte e os ritos a ela associados conferem uma significativa universalidade à vida terrena do indivíduo morto. […] morte
vazia, sem sentido, é a apropriada para os indivíduos simples que a ela sucumbem. […] o medo dessa morte, a “senhora
absoluta”, possibilita o restabelecimento de uma ordem diferenciada […]. A morte é suprassumida na vida. Hegel estava
especialmente interessado nas dramáticas mortes de grandes homens. […] Hegel estava principalmente interessado
nas mortes do Cristo e de Sócrates. […] Hegel antecede Nietzsche ao dizer “Deus está morto” […] acrescenta que a
sobrevivência de Deus à morte é a “morte da morte”. […] No entender de Hegel, conflito e OPOSIÇÃO são requeridos
para manter os seres humanos vivos e despertos: a AUTOCONSCIÊNCIA emerge do conflito; os homens morrem
quando se tornam demasiado satisfeitos com o seu meio ambiente; as nações morrem quando se mostram relutantes
em fazer a GUERRA; e a paz perpétua entre Estados significaria a morte do ESTADO. […]”.
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sível ver alguns aspectos questionáveis, mas também vários aspectos atu-
ais e pertinentes. Destaca-se, sobretudo, em Hegel a questão do “valor da
vida” (Werte des Lebens) e de que não existe “um direito” (ein Recht) de
alguém “se matar” (sich Töten), isto é, de que ninguém “pode” ou a nin-
guém “é permitido” (darf) “tirar de si mesmo a vida” (sich selbst das Leben
nehmen), pois, como consta, “o ser humano não tem nenhum direito de se
matar” (der Mensch hat kein Recht sich selbst umzubringen).
Ora, em resumo, para Hegel, nas relações éticas, no âmbito da “vida
ética” ou da “eticidade”, o indivíduo é “membro”, isto é, suas ações estão
em “relação”, “vinculação” ou “articulação” com as dos outros (isto é, são
públicas [com outros membros ou cidadãos] ou não meramente privadas) e,
assim, suas ações não são apenas subjetivas, mas também objetivas ou in-
tersubjetivas. Inclusive, em Hegel, todo “indivíduo” é: 1º, “pessoa”; 2º, “su-
jeito”; e 3º, “membro” de uma “família”, de uma “sociedade civil-burguesa”
e de um “Estado”, neste enquanto “cidadão”. Isso tudo se forma, ainda,
a partir do “espírito do [de um] povo”, do “espírito do tempo” e também
do “espírito do mundo”. Além disso, para Hegel, ele envolve [ou deveria
envolver] uma “disposição espiritual ética”, que é de “amor” no âmbito do
“casamento” ou da família; de “honra”, de “retidão”, de “associação corpo-
rativa”, na “corporação” ou na sociedade civil-burguesa; e de “disposição
de espírito política”, de “patriotismo” no âmbito do Estado. Enfim, assim,
as “ações” dos indivíduos enquanto “pessoas” jurídicas ou legais, “sujei-
tos” morais e “membros” ou “cidadãos” éticos não são mais engendradas
pela mera arbitrariedade subjetiva ou pelo mero temor a um senhor ou
superior qualquer enquanto autoridade suprema, mas, sim, engendradas
propriamente pela sua razão ou racionalidade, envolvendo saber e querer
próprios44 enquanto manifestação de uma vida ética.
Em suma, os conceitos de Hegel de “vida” (Leben) e de “morte” (Tod)
são importantes e com vários aspectos atuais para tentar compreender
melhor nossa atualidade. Conhecer mais e melhor esse pensador clássico
moderno, em especial sua Filosofia do Direito, certamente permite trazer
para a nossa contemporaneidade mais luzes, que nos guiem a encontrar os
melhores caminhos para impedir, ao máximo, por exemplo, o “se matar”
(sich töten – sich umbringen) e/ou o “suicídio” (Selbsttötung – Selbstmord),
promovendo, antes, a “garantia da vida” (Sicherung des Leben), o “valor da
vida” (Werte des Lebens), enfim, a “vida humana” (Menschenleben).
44 Respectivamente: Sittlichkeit; Glied, Mitglied; Verhältnis; Beziehung; Gliederung; Person; Subjekt; Glied; Familie;
bürgerliche Gesellschaft; Staat; Bürger; Volksgeist – der Geist eines Volkes; Zeitgeist – den Geist der Zeit; Weltgeist
– Geist der Welt; sittliche Gesinnung; Liebe; Ehe; Ehre; Rechtschaffenheit; Genossenschaft; Korporation; politische
Gesinnung; Patriotismus; Handlungen; Personen; Subjekten; Glieden; Bürgern.
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Referências
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15
O ensino domiciliar (homeschooling): um exame
do Recurso Extraordinário nº 888.815 a partir
das divergências pontuadas por Ronald Dworkin
na obra O Império do Direito
Introdução
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1 Anotações e citações realizadas na ocasião da audiência pública em 2013, na Câmara dos Deputados.
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garantia à educação, ainda que não formal (escolar). Além disso, é preciso
lembrar que esse modelo não destaca, no todo, os parâmetros curricula-
res, havendo, sim, em boa parte dos casos, no Brasil, um descontentamen-
to com a educação pública ofertada.
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Considerações finais
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tampouco limita seu caráter teleológico, sendo utilizado apenas para fins
econômicos. Como é dever da família prover a educação e sendo este uma
relação de poder-dever, recai na primeira a autonomia para optar pela mo-
dalidade de ensino que lhe convencionar. A questão tormentosa é da falta
de regulamentação do homeschooling.
No parecer, a linha argumentativa que perpassa a Declaração Uni-
versal do Direitos Humanos (DUDH) relativa aos pais, afirma que estes
têm o direito de estabelecer o gênero de educação que será fornecido a seus
filhos. O reforço da ONU ressalta a liberdade de escolha do tipo de educa-
ção oferecida às crianças (se em uma escola convencional, ou se em casa,
pelos pais). O Pacto de San José (art. 12.4) – a Convenção Americana de
Direitos Humanos – afirma que os pais têm o direito que os filhos recebam
a educação religiosa e moral que esteja de acordo com as convicções dos
progenitores. Além disso, esse documento pautou-se em um entendimento
recente proveniente da própria corte, de que os tratados internacionais
de direitos humanos têm status de supralegalidade, significando que eles
estão abaixo da constituição, mas acima da legislação infraconstitucional.
Desse modo, as regras da LDB e do ECA não se aplicam quando da
opção da família pelo modelo de educação domiciliar, pois elas, especifi-
camente, estão amparadas tanto na Constituição quanto nas normas inter-
nacionais de direitos humanos.
Em que pese que a corte tenha entendimento contrário à do Relator
pelo não reconhecimento do ensino domiciliar, são necessários mais deba-
tes, e não apenas algumas audiências públicas direcionadas somente para
o cumprimento da lei. Deve-se, sim, dar mais atenção ao novo paradigma
de relacionamento público-privado, sendo necessários maiores entendi-
mentos entre escola e família e todos os que possam formalizar uma par-
ceria destinada a promover a educação domiciliar no Brasil. Outrossim,
esses pontos de vista devem convergir à ideia de não se valer desse modelo
educacional apenas como forma de conhecimento desse movimento social
e pedagógico, o homeschooling, mas também de saber qual será essa nova
oferta pedagógica aos pais que dele necessitarem.
Por fim, extrai-se desta pesquisa que o RE nº 888.815 da relatoria em
questão trata do princípio da liberdade, que deverá ser considerado, não
havendo, portanto, proibição na escolha do tipo de ensino. O que há é, sim,
a falta de previsão legal dessa permissão. Consequentemente, observa-se
que as divergências teorizadas por Dworkin quanto ao direito perpassam
o viés do fato, do direito e da moral, relacionando-se, também, à política
e à fidelidade. A questão do direito se depara com preposições jurídicas,
empíricas e teóricas, mas, caso elas não se apliquem, mas sim o direito
como questão de fato (concretude), verifica-se a existência de divergências
280
Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
teóricas sobre este, ou seja, nesse caso se dá pelo olhar ou o viés do parecer
do relator. Este apresentou um engajamento em uma divergência teórica
sobre o direito, com os demais atores (partes, procuradores, ministros) di-
vergindo quanto à natureza daquele em relação ao verdadeiro significado
do texto jurídico. Desse modo, esses atores discordam sobre a solução do
caso concreto, mas não por divergirem quanto às questões de fato, e sim
quanto à norma jurídica que resulta do texto em análise.
Aqui não se diz respeito, portanto, à questão de se aplicar ou de se
afastar a lei, mas de como interpretá-la neste RE nº 888.815 ou quanto à sua
aplicação na teoria de legislação mais adequada.
No caso homeschooling, entendemos que as divergências não envol-
veram alegações de moralidade, política, fidelidade ou reforma do direito,
ou seja, não seriam debate dos desacordos sobre como o direito deveria
ser; seriam, na verdade, divergências sobre como ele é, ou seja, desacordos
acerca do critério jurídico de validade apenas no que se refere ao critério
que a norma deve satisfazer para ser considerada juridicamente válida.
Referências
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16
Kelsen e a negação da dualidade ideológica entre
o Direito e o Estado: breves delineamentos
Leonam Liziero
Introdução
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1 BILLIER, J.-C.; MARYIOLI, A. História da Filosofia do Direito. Tradadução de Maurício de Andrade. Barueri:
Manole, 2005. p. 195.
2 KELSEN, H. Reine Rechtslehre. 2 Aufl. Tübingen: Mohr Siebeck, 2013, p. 161.
284
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6 “Those normative orders that are designated as states are characterized precisely by the fact that their territorial
spheres of validity are limited”. (Ibidem, p. 208).
7 ______. Teoria Geral do Direito e do Estado. Tradução de Luiz Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2005, p.
279.
8 Ibidem, p. 208.
9 “If it is assumed that international law is valid only as part of national law, it is necessary to distinguish between
the norms of a national legal order which are international law and norms of the national law which have not this
character and thus are national law in a narrower and specific sense of the term (not comprising international law).
Then it is the spheres of validity of the national law in this narrower sense which are determined by international law
(as part of the national law in a wider sense of the term).” (Ibidem, p. 206).
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13 Ibidem, p. 522.
14 KELSEN, H. Reine Rechtslehre…, p. 144. Do original em alemão: “Die Grundnorm bezieht sich nur auf eine
Verfassung, die durch einen gesetzgebenden Akt oder Gewohnheit tatsächlich gesetzt wird und· die wirksam ist. Eine
Verfassung ist wirksam, wenn die ihr gemäß gesetzten Normen im großen und ganzen angewendet und befolgt warden”.
15 ______. Teoria Geral do Direito e do Estado. Tradução de Luiz Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2005, p. 168.
16 ______. Reine Rechtslehre…. p. 336.
17 ______. Teoria Geral do Direito e do Estado. Tradução de Luiz Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p. 174.
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18 Ibidem, p. 522-523.
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19 Ibidem, p. 464.
20 ______. Reine Rechtslehre…. p. 25.
21 Ibidem, p. 34.
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22 Ibidem, p. 561.
23 Ibidem, p. 390. Do original em alemão: “Wenn sie als die Staaten verbindliche Rechtsnormen gedeutet werden, so
darum, weil eine Grundnorm vorausgesetzt wird, die die Staatengewohnheit als rechtserzeugenden Tatbestand einsetzt”.
24 Ibidem, p. 391. Do original em alemão: “wenn man die Grundnorm voraussetzt, die die Staatengewohnheit als
normerzeugenden Tatbestand einsetzt, welchen Inhalt immer die so erzeugten Normen haben mögen”.
25 Ibidem, p. 560. Do original em alemão: “als die vorausgesetzte Grundnorm des Völkerrechts eine Norm gelten, die
die durch das gegenseitige Verhalten der Staaten konstituierte Gewohnheit als rechtserzeugenden Tatbestand einsetzt”.
26 ______. Teoria Geral do Direito e do Estado. p. 525.
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Considerações finais
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Referências
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Constitucionalismo excluyente y su necesaria
relectura para la inclusión1
Introducción
1 El presente ensayo consolida discusiones realizadas en las clases de las asignaturas de Historia Constitucional y
Teoría del Estado y de la Constitución del Master en Derecho Constitucional de la Universidad de Sevilla, de manera
que se registra el agradecimiento a los profesores Doctores Bartolomé Clavero Salvador, Sebastián Martín Martín y
Blanca Rodriguez Ruíz por las discusiones y contribuciones.
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5 The Royal Proclamation – October 7, 1763. By the King. A Proclamation George R. Disponível: https://avalon.law.
yale.edu/18th_century/proc1763.asp. Acceso en 15 mayo 2020.
6 Blackstone’s Commentaries on de Laws of England. Disponible en: https://avalon.law.yale.edu/subject_menus/
blackstone.asp. Acceso en 16 mayo 2020.
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no facto también son los mismos que pasaran a componer el Estado, incluso
como manera de garantizar estabilidad y seguridad al Estado.
Tal Estado Moderno, con la marca de la despersonalización del po-
der y objetivación de los criterios de su legitimación, incluso bajo el impe-
rio de la ley, pasó a destacarse como Estado de Derecho, concebido como
un Estado que actúa conforme reglas preestablecidas en un Estado Liberal
y por medio de códigos; todo, sin embargo, en traducción a valores morales
predominantes en la sociedad, o sea, valores económicos, patriarcales y
discriminatorios vigentes.
Como destaca Clavero, los Estados se formaban mediante Consti-
tuciones, con naturaleza normativa superior que conformaba el sistema
político de acuerdo con las presunciones culturales europeas y predijo de-
rechos/libertades y poderes/instituciones11. En sus palabras:
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13 Bartolomé Clavero; No distinction shall be made: sujeto sin derechos y enemigo sin garantías en la Declaración
Universal de Naciones Unidas, 1945-1966; Quaderni Fiorentini: per la storia del pensiero giurido moderno; I diritti dei
nemici; 38; tomo II; 2009.
14 Sebastián Martín. Derechos sociales y procesos constituyentes (1931, 1978, ¿2016?); Gaceta sindical; p. 54.
15 Sebastián Martín; 2017; p. 337.
16 Aláez Corral, Benito; 2017; p. 46.
17 Aláez Corral, Benito; 2017; p. 48.
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27 Habermas, Jürgen; Facticidad y validez: sobre el Derecho y el Estado democrático de derecho en términos de
teoría del discurso.
28 Habermas, Jürgen; Facticidad y validez: sobre el Derecho y el Estado democrático de derecho en términos de
teoría del discurso.
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Referencias
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A importância do conceito de Estado de
Natureza dentro das teorias contratualistas
de Hobbes, Locke e Rousseau
Junior Rangel
Paulo Roberto Konzen
Introdução
1 “Denominamos contratualismo a concepção segundo a qual o Estado é o produto da decisão racional dos homens
destinada a resolver os conflitos gerados pelo seu instinto antissocial ou para solucionar os problemas advindos da
convivência. O contrato, assim compreendido, é um ato de lógica política, consistindo numa decisão deliberada e
racional. Os principais contratualistas, considerados clássicos, na teoria do Estado são: Thomas Hobbes, John Locke e
Jean-Jacques Rousseau.” (DIAS, 2013, p. 66).
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2 Em ordem cronológica: “Tractatus opticus” (1644), “Elementos da lei natural e política” (1650), “De Corpore” (1655),
“De Homine” (1658). A obra chamada De Cive (1642) traz alguns elementos sobre a natureza humana, completando
uma trilogia associada aos dois últimos; mas, esta, porém, trata mais sobre organização política.
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O mecanismo
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3 É uma parte da teoria hobbesiana que se alinha com o mecanicismo ao tecer a ideia de que o homem é um
“mecanismo em movimento” e que tende naturalmente a continuar em movimento rumo à conservação da vida,
usando todos os meios possíveis para tal fim.
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4 “A multidão é, para Hobbes, inerente ao “estado de natureza”; portanto, aquilo que precede à instituição do
“corpo político”. Mas, esse distante antecedente pode reaparecer como uma “restauração” que pretende fazer-se valer
nas crises que sabem sacudir a soberania estatal. Antes do Estado, eram os muitos; depois da instauração do Estado,
foi o povo – Uno, dotado de uma única vontade”. (VIRNO; GÓMEZ, 2003, p. 5).
5 Commonwealth é a definição de Hobbes para Estado (República ou monarquia, embora seja clara a preferência
desta última por parte do filósofo). A tradução mais aceita para o termo seria “comunidade”, porém, no Leviatã, isso
deve ser entendido como o corpo artificial formado quando a multidão, por sua vontade, se torna povo e “disso
necessariamente resulta que é o Estado, a Commonwealth o verdadeiro detentor da soberania”. (MIRANDA, 2013,
p. 136). Conforme vemos, a atual concepção de Estado vem, em boa parte, da comunidade apresentada por Hobbes.
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Por fim, a fonte que calcula a situação mediada pelas paixões é a ra-
zão, que no Leviatã é apresentada como cálculo cuja fórmula é a soma e a
subtração de conceitos para chegar às consequências. Logo, é a razão que
identifica, por meio do que se tem de experiência acumulada (prudência) e
de palavras aprendidas (linguagem), os elementos para o silogismo. Sobre
isso, no Leviatã, Hobbes (2003, p. 39-40) afirma:
Portanto, Hobbes cuida para definir bem o que é razão, pois esta é
importante em seu jusnaturalismo, e mais ainda para formar o arcabou-
ço por meio do qual os indivíduos sairiam do dito estado de natureza. É
interessante, ainda, expor que a razão não é um elemento inato, nem há
conceitos inatos dentro do que é racional, pois inato em Hobbes são ape-
nas alguns apetites. Assim, vemos que somente a prudência tem alguma
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Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
Que todo homem deve se esforçar pela paz, na medida em que te-
nha esperança de a conseguir, e caso não a consiga pode procurar e
usar todas as ajudas e vantagens da guerra. A primeira parte desta
regra encerra a primeira e fundamental lei de natureza, isto é,
procurar a paz, e segui-la. A segunda encerra a súmula do direito
de natureza, isto é, por todos os meios que pudermos, defendermo-
-nos a nós mesmos (HOBBES, 2003, p. 113).
6 Há debates sobre qual seria o número exato de leis naturais apresentadas no Leviatã; admite-se aqui que são
dezenove, embora na passagem final do Capítulo XV Hobbes disserta que: “São estas as leis de natureza, que ditam
a paz como meio de conservação das multidões humanas, e as únicas que dizem respeito à doutrina da sociedade
civil. Há outras coisas que contribuem para a destruição dos indivíduos, como a embriaguez e outras formas de
intemperança, as quais portanto também podem ser contadas entre aquelas coisas que a lei de natureza proíbe.”
(HOBBES, 2003, p. 135). Tal afirmação abre intepretação de que podem existir várias leis ainda que não estão
contadas. Mas, isso é irrelevante para o raciocínio aqui apresentado.
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Com isso, o cálculo que a razão faz é simples, pois, postas as premis-
sas acima citadas, o mecanicismo manobra em direção à única operação
possível, a saber, a divisão, nesse caso, dos poderes individuais – tudo isso
na tentativa de criar um poder comum e superior que possa, como me-
canismo artificial, criar leis baseadas nas naturais, que freiem os corpos
naturais, haja vista que, no próprio Leviatã, está registrado que os corpos
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Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
Assim sendo, percebe-se que o ser humano usa uma associação, pois
o mecanicismo (movimento) está associado à ideia de observação (paixões
+ razão interpretativa) a fim de identificar as leis de natureza. Daí a impor-
tância da relação entre razão e paixões em Hobbes; afinal, apenas fazendo
o discernimento das leis naturais é que o ser humano pode calcular a ne-
cessidade da lei positiva e do Estado que as gera.
Tendo visto Hobbes, a seguir iremos apresentar e analisar o pensa-
mento de Locke.
7 Existe uma corrente de pensadores que classificam Locke como o pai do empirismo, ou ainda pai do empirismo
britânico. Entretanto, outra corrente entende a teoria mecanicista hobbesiana como a primeira categoria de
empirismo. Consideramos, aqui, Locke como o idealizador do empirismo demonstrado em sua obra Ensaio acerca do
entendimento humano, de 1689.
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Se não existe lei natural, não existiriam nem virtude, nem vício,
nem a recompensa pelo bem, nem a punição pelo mal: onde
não existe lei, não existe falta, nenhuma culpa. Tudo depende-
ria do arbítrio humano, como não haveria nada que exigisse a
ação de obediente, parece que o homem não estaria obrigado a
nada, a não ser àquilo que que a utilidade ou o prazer pudesse
recomendar, ou aquilo que um impulso cego e desregrado pu-
desse por acaso se agarrar (LOCKE, 2007, p. 109).
8 “Desta forma, é possível definir o Direito Natural como uma doutrina jurídica que defende que o direito positivo
deve ser objeto de uma valoração que tem como referência um sistema superior de normas ou de princípios (direito
ideal) que lhe condicionam a validade.” (BEDIN, 2014, p. 246).
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9 “Como para guardar os homens dos intentos de um criminoso, que, tendo renunciado à razão, e à regra e à medida
comuns a todos os homens por Deus aos homens, pela violência injusta e carnificina por ele cometidas contra outrem,
declarou guerra contra toda a humanidade e, portanto, pode ser destruído como um leão ou um tigre, um desses
animais selvagens com os quais os homens não podem ter sociedade ou segurança.” (Idem, 1998, p. 389).
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Assim, o ser humano tem dois deveres elencados pela razão e pelos
sentidos: um para com sua vida, liberdade e posses, pois dessas coisas de-
pendem sua autopreservação. E o segundo está para além da preservação
de sua vida, que é o dever de proteger o resto da humanidade. Portanto, o
poder de legislar está implícito no ser humano desde que a luz da razão
lhe demonstrou os regulamentos, ou seja, pela razão os indivíduos têm a
prerrogativa de “legislar” dentro do estado de natureza, que, apesar de ter
leis fixadas, carece de detalhamento.
A prerrogativa de executar a lei natural cabe também ao indivíduo
no estado de natureza, de forma que os poderes legislativo e executivo são
atributos racionais e prerrogativas da razão. Essas faculdades dão as luzes
para esse governo autônomo. Assim, os indivíduos têm responsabilidade
em tal condição de se governar a si mesmos, inclusive na execução daque-
les que eventualmente desobedecerem a tal lei.
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10 Interpretação da passagem de Discurso sobre origem da desigualdade entre os homens, no qual Rousseau
disserta: “os únicos bens que [o homem natural] conhece no universo são nutrição, uma fêmea e repouso.”
(ROUSSEAU, 2001, p. 58).
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11 Esta expressão é uma descrição estereotipada dos povos indígenas, oriunda da literatura, durante a Modernidade
europeia, a partir da socialização com as populações nativas da América; enfim, apesar de já existir desde o século XVI,
é com Rousseau que o conceito ganha popularidade.
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da razão e tem como uma das poucas e simples paixões o amor a si. Portan-
to, o estado de natureza de Rousseau, de certa maneira, concerne à teoria
hobbesiana de que o estado natural não é positivo para o desenvolvimento
humano e o avanço das tecnologias, por exemplo, ao afirmar que, apesar
de o estado civil nos privar “de muitas vantagens concedidas pela natureza,
[o homem] ganha outras de igual importância: suas faculdades se exercem
e se desenvolvem, suas ideias se alargam, seus sentimentos se enobrecem,
toda sua alma se eleva” (ROUSSEAU, 2006, p. 26). No Leviatã, vemos algo
parecido com isso quando Hobbes afirma que o ser humano fora da socie-
dade civil tem uma vida pobre, emburrecida e curta12.
12 “Numa tal situação não há lugar para a indústria, pois seu fruto é incerto; consequentemente, não há
cultivo da terra, nem navegação, nem uso das mercadorias que podem ser importadas pelo mar; não há
construções confortáveis, nem instrumentos para mover e remover as coisas que precisam de grande força; não
há conhecimento da face da Terra, nem cômputo do tempo, nem artes, nem letras; não há sociedade; e o que é
pior do que tudo, um constante temor e perigo de morte violenta. E a vida do homem é solitária, pobre, sórdida,
embrutecida e curta.” (HOBBES, 2003, p. 109).
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Considerações finais
13 “A sociedade […] consistiu apenas em algumas convenções gerais que todos os particulares se comprometiam em
observar e das quais a comunidade se tornava fiadora perante cada um deles.” (ROUSSEAU, 1999, p. 225).
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Referências
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Desenvolvimento moral: fim
último de todo ser racional
Vicente E. R. Marçal
Introdução
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“we may say that a good will alone can be good in itself, or
can be an absolute or unconditioned good. […] All Kant me-
ans is that a good will alone must be good in whatever con-
text it may be found. It is not good as means to one end and
bad as means to another. It is not good if somebody happens
to want it and bad if he doesn’t. Its goodness is not conditio-
ned by its relation to a context or to an end or to a desire.”
(PATON, 1970, p. 34).2
1 Sobre a tradução que assumimos, de “einguter Wille”, ver a nota 1 da tese de doutoramento do prof. Delamar José
Volpato Dutra, intitulada “A reformulação discursiva da moral kantiana”, 1997, p. 23.
2 “podemos dizer que a vontade boa somente poder ser boa em si mesma, ou pode ser boa absoluta ou
incondicionalmente. […] todo o pensar de Kant é que a vontade boa, sozinha, deve ser boa em qualquer contexto
em que se encontre. Não pode ser boa como meio para um determinado fim e má como meio para outro. Não é boa
quando alguém quer que seja e má caso assim o queira. Sua bondade não está condicionada por sua relação com um
fim, um contexto ou um desejo” (PATON, 1970, p. 34, tradução nossa).
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Dutra alerta para o fato de tal conceito ser mal compreendido pela
razão humana vulgar, por esta ter uma “má compreensão da intenção da
natureza” (DUTRA, 2002, p. 24). Ou seja, compreender a felicidade como
sendo o fim último do ser humano, nas determinações da natureza, levan-
do a razão humana vulgar a considerar que a utilidade da vontade poderia
ter um valor em si mesma, além do valor intrínseco da Vontade Boa.
Dutra aponta para os argumentos que Kant utiliza na Fundamenta-
ção para apresentar que a natureza foi sábia o suficiente na distribuição
dos dons naturais de cada espécie, pois “consideramos as disposições na-
turais dum ser organizado, isto é, dum ser constituído em ordem a um fim
que é a vida, aceitamos como princípio que nele se não encontra nenhum
órgão que não seja o mais conveniente e adequado à finalidade a que se
destina.” (KANT, 1980, p. 110).
E se o télos da humanidade fosse a busca pela felicidade, nada mais
justo do que deixá-lo somente com seu instinto, pois este está melhor pre-
parado para alcançar tal fim. Entretanto, é uma má compreensão da nature-
za, pois sua intenção foi a de nos dar a razão por soberana da nossa vontade,
sendo errônea a compreensão de que o fim da humanidade é a felicidade,
pois “The true function of reason on its practical side must be to produce
a will good not as a means to something else such as happiness, but good
absolutely and in itself.” (PATON, 1970, p. 44).3 Tal compreensão se dá prin-
cipalmente pelo fato de a felicidade ser extremamente contingente, ou seja,
“é um conceito tão vacilante, que se uma natureza estivesse a ele submeti-
do, não admitiria nenhuma lei universal” (DUTRA, 2002, p. 26).
Kant aponta para o fato de que tal uso da razão não nos torna felizes,
mas dignos da felicidade, pois o “mérito a ser feliz é a qualidade de uma
pessoa fundada no próprio querer do sujeito, em conformidade com a qual
uma razão legisladora universal (tanto da natureza como do livre querer) se
harmoniza com todos os fins desta pessoa”. (KANT, 2002, p.61).4
Compreende Kant que o cumprimento da obrigação moral gera a
felicidade plena, pois sua fundamentação está na solidez da lei racional,
e não nas efemeridades e contingências que o instinto apresenta na busca
pela felicidade. Assim, segundo Dutra, a felicidade “não será mais tratada
[por Kant] como causa da moralidade, mas como uma das suas consequên-
cias. Ou seja, a moralidade é deslocada da noção de felicidade e estatuída
como sua condição de possibilidade” (DUTRA, 2002, p. 26), age-se com o
intuito de se merecer a felicidade e, desse modo, a Vontade Boa torna-se
a condição para a felicidade, e o agir moralmente nos torna dignos desta.
3 “A verdadeira função da razão em seu lado prático deve ser a de produzir uma boa vontade não como um meio a
algo mais tal como a felicidade, mas boa absolutamente e em si mesma.” (PATON, 1970, p. 44, tradução nossa).
4 Sobre a expressão corrente: “Isto pode ser correto na teoria, mas nada vale na prática”.
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Desse modo, podemos concluir com Dutra (2002) que a Vontade Boa
é o acatamento subjetivo da lei moral. Ou seja, toda ação moral só tem va-
lor moral se motivada pela lei moral, tornando-se condição subjetiva desta,
pois “o valor moral da ação deverá ser definido pela motivação da lei, e não
pelo interesse empírico” (DUTRA, 2002, p. 28).
Uma ação praticada por dever tem o seu valor moral, não no
propósito que com ela se quer atingir, mas na máxima que a
determina; não depende, portanto, da realidade do objeto da
ação, mas somente do princípio do querer segundo o qual a
ação, abstraindo de todos os objetos da faculdade de desejar,
foi praticada (KANT, 1980, p. 114).
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Kant se indaga qual deve ser essa lei que determina a vontade mes-
mo sem se saber o que esperar dela, de forma que a vontade possa ser tida
como boa absolutamente e sem restrição. Kant assim nos responde:
Uma vez que despojei a vontade de todos os estímulos que lhe
poderiam advir da obediência a qualquer lei, nada mais resta do
que a conformidade a uma lei universal das ações em geral que
possa servir de único princípio à vontade, isto é: devo proceder
sempre de maneira que eu possa querer também que a minha
máxima se torne uma lei universal. (KANT, 1980, p. 115).
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5 “Nós fazemos a lei que obedecemos. A vontade não é simplesmente sujeita à lei: ela é tão sujeita à lei quanto deve
ser considerada sua autora.” (PATON, 1970, p. 180, tradução nossa).
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Desse modo, podemos ver que Kant compreende o Direito como ge-
rador de uma ação externa que une dois arbítrios, ou seja “a soma das
condições sob as quais a escolha de alguém pode ser unida à escolha de
outrem de acordo com uma lei universal de liberdade” (KANT, 2003, p. 76).
Essa característica é a que torna o Direito uma instância moralizadora,
pois com a coação que lhe é própria, conduz o ser humano a uma ação, que,
6 Sobre a expressão corrente: “Isto pode ser correcto na teoria, mas nada vale na prática”.
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[...]a relação jurídica pode ser instituída somente entre dois se-
res humanos, ou seja, entre seres que se encontram numa rela-
ção de limitação recíproca da própria liberdade externa. Kant
está bem consciente dessa natureza peculiar da experiência
jurídica e chega à definição da relação jurídica como relação
de direito-dever entre seres humanos (BOBBIO, 2000, p. 99).
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Para isso, o homem precisa ter uma vida longa a fim de apren-
der a fazer uso pleno de todas as suas disposições naturais;
ou seja, se a natureza concedeu-lhe somente um curto tempo
de vida (como efetivamente aconteceu), ela necessita de uma
série talvez infinita de gerações que transmitam umas às ou-
tras as suas luzes para finalmente conduzir, em nossa espécie,
o germe da natureza àquele grau de desenvolvimento que é
completamente adequado ao seu propósito (KANT, 2003, p. 6).
Considerações finais
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O que é justiça?
Christian Iber
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1. Onde quer que se levante uma crítica em nossa sociedade, ela ocor-
re em nome da justiça, cuja ausência é sentida. Muitos empregados acham
injustas as renumerações exorbitantes dos gestores. A maioria dos quadros
executivos tomam essa reclamação por injusta, porque eles, de fato, seriam
os responsáveis pela economia expressa no lucro das empresas; que eles,
portanto, merecem a remuneração que recebem. Pessoas idosas avaliam os
cortes nas pensões que recebem do governo como uma injustiça, porque elas
se veem enganadas com relação ao rendimento do trabalho realizado ao lon-
go da sua vida e de suas contribuições aos fundos de pensões. Muitos jovens
tomam esses cortes por um imperativo da justiça, porque o Estado lhes pede
sempre descontos maiores da sua renda para a aposentadoria dos idosos. No
Brasil, a classe média se queixa de que é injusto que ela tenha que suportar
todo o imposto do Estado e, então, o dinheiro é gasto em programas sociais
para os pobres, enquanto nas favelas os pobres lamentam que na distribui-
ção da renda eles sejam os últimos a serem considerados.
2. Se, então, críticos que se veem prejudicados nos seus interesses se
tornam praticamente ativos e levantam exigências, isso se sucede de novo
em nome da justiça que deveria ser imposta. As classes menos favoreci-
das são fortemente penalizadas com a ocorrência da crise financeira, os
grandes escapam relativamente ilesos – assim os sindicatos e os grupos de
esquerda os veem e se manifestam a favor de uma redistribuição, quer di-
zer, por uma distribuição honesta dos ônus entre pobres e ricos. De modo
algum se ambiciona alguma vantagem a mais. Em vez disso, negocia-se o
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equilíbrio adequado das perdas que se está disposto a admitir. A justiça pare-
ce, portanto, estar acima do próprio interesse: o próprio prejuízo se torna
tolerável quando o prejuízo alheio é aumentado um pouco.
3. Isso já é esquisito: o que para uma pessoa é justo, para outra é in-
justo, e a boca do povo sabe, também, que a efetivação da justiça se iguala
à quadratura do círculo: “Fazer justiça a todos os homens é uma arte que
ninguém alcança”. Todos querem o mesmo, a justiça, e, todavia, eles estão
incessantemente em um litígio a esse respeito, isto é, sobre aquilo que
constitui o conteúdo da justiça. O que torna a justiça tão flexível, a tal
ponto que ela preste à legitimação de objetivos tão diversos, quando não
opostos? O que a torna tão atrativa se, de fato, todos se zangam com isso,
isto é, com aquilo que a constitui? Em todo caso, vale dizer: prende-se na
justiça como princípio válido. Ninguém chega a pensar que se não se pode
entrar em comum acordo sobre a justiça, que se tente, então, com a injus-
tiça. A injustiça ninguém quer.
4. Antecipado seja o seguinte: a justiça é uma representação moral
a respeito do que cabe legitimamente a cada um em nossa sociedade, que
tem sua base real no direito, com o qual o Estado organiza a sociedade
capitalista da concorrência com seus interesses opostos. O conteúdo da
justiça e sua finalidade é a autolimitação dos interesses opostos, para que
eles possam subsistir conjuntamente. Que isso apenas pode ser o ideal ir-
realizável em uma sociedade da concorrência parece ser indeclinável.
5. Mas, não se deveria de forma alguma gastar a energia com a ques-
tão de como se chega a uma justiça proveitosa a todos. A própria justiça é
um erro, e precisamente também um erro nocivo, no qual é muito melhor
não se envolver, porque a igualdade de tratamento de indivíduos diferentes
é sempre uma desigualdade de tratamento.
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Marcus Vinícius Xavier de Oliveira (Orgs.)
forma nenhuma sua comparação. Eles não são compatíveis uns com os ou-
tros. Como deve ser comparada uma hora de lição de um professor de So-
ciologia com uma hora de trabalho do trabalhador da Volkswagen (VW)?
Essas são atividades que não têm nenhum denominador comum. O único
comum efetivo delas é a forma-preço do seu rendimento. E quem defende a
ideia de igualdade de retribuição de mérito supõe, para cada desempenho,
um rendimento de dinheiro que deve justificá-lo.
A justificação da posição de que a renda corresponde ao desempe-
nho apresentado tem a lógica de um preconceito: algo diferente do desem-
penho não é, de modo algum, levado em consideração naquilo que fun-
damenta o rendimento de dinheiro. O professor universitário recebe R$
6.000,00 por mês; o trabalhador; R$ 2.000,00 para sua atividade. Então, o
desempenho do professor tem que valer três vezes mais do que o do tra-
balhador. O desempenho deve fundamentar o rendimento. A repreensão
sobre as remunerações demasiadamente altas dos gestores não desvirtua
esse princípio da justiça, mas o confirma.
Quando se trata do discurso da igualdade de retribuição de mérito,
tem-se sempre a aparência de um silogismo. Na verdade, não é inferido
de forma nenhuma do desempenho o rendimento de dinheiro, mas sim do
rendimento de dinheiro o desempenho que está por trás do rendimento.
Diz-se que o rendimento triplo do professor é condizente com um desem-
penho triplo. Isso é uma representação incorreta da igualdade de retribui-
ção de mérito. Ela não resiste, assim afirmo, a uma prova nem um segundo.
Esclareçamos o problema em dois casos distintos: (i) no salário dos
trabalhadores; e (ii) na remuneração dos gestores. Para o trabalhador é
dito que o desempenho corresponde à renda. Contudo, na verdade, para
o trabalhador é o inverso: o desempenho é a pressuposição do pagamento
do salário. Ele apenas recebe, em geral, seu salário se já prestou o serviço
para o empreendimento, portanto no fim do mês. Isso se afirma também
como exigência franca – justamente na crise se diz: agora significa de-
sempenhar mais por um salário menor. Nesse caso, a economia se põe
novamente em movimento etc. O crescimento capitalista do dinheiro se
baseia no desempenho, e precisamente vale o princípio de que para o má-
ximo possível de desempenho seja pago o menor salário possível. Nessa
disparidade entre o desempenho do trabalhador e seu salário pago se
baseia o lucro do empreendimento.
A forma do salário não invalida essa afirmação. Paga-se ao traba-
lhador por uma hora de trabalho; por exemplo, R$ 10,00. Mas, pagar con-
forme as horas trabalhadas não é o mesmo que remunerar o desempenho
do trabalho de uma hora. O trabalhador recebe R$ 10,00 por hora, o que
quer dizer R$ 80,00 a diária. Nessa multiplicação, a mensuração de tempo
366
Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
é, com efeito, objetiva. Mas, os R$ 10,00 que o trabalhador recebe por hora
estão relacionados com o rendimento do empreendimento. A equiparação
60 minutos = R$ 10,00 não é nenhuma lei objetiva, mas reside no cálculo do
empreendedor que quer, com isso, auferir um lucro. A objetividade da re-
numeração do trabalhador reside no cálculo do empreendedor, com o qual
o trabalhador nada tem a ver. No cálculo do empreendedor, o trabalhador
não tem nenhuma competência.
Entretanto, a representação da justiça do salário se conserva contun-
dentemente. Remete-se à hierarquia do salário. Há um escalonamento do sa-
lário, uma diferenciação do salário. Mas, por que exatamente isso existe? Do
desempenho do trabalhador, o empreendedor quer tirar mais rendimento de
dinheiro do que ele remunera. Por que existem diferenças de salário? Isso
tem sua origem no fato de que as empresas competem por forças de trabalho
qualificadas pagando salários mais elevados. Elas pagam, então, por exem-
plo, prêmios não inclusivos na convenção coletiva. A partir disso, o progres-
so tecnológico avança nas empresas, o que torna algumas delas supérfluas
em qualificação das forças de trabalho. À racionalização da produção nas
empresas está associada uma desqualificação das forças de trabalho, o que
tem por consequência uma desvalorização do trabalho. E, com isso, a situa-
ção dos salários elevados tem de novo um retrocesso, já que as empresas são
capazes de pagar salários menores mesmo para trabalhadores qualificados.
No capitalismo, vale o seguinte paradoxo na hierarquia do salário:
aqueles que fazem o trabalho mais pesado e mais difícil ganham muito me-
nos. Por quê? Porque é mais fácil obter forças de trabalho simples. Que os
sindicatos se reportem à hierarquia produzida pelos empreendedores de
modo afirmativo não torna a coisa melhor. Com o reconhecimento sindical
da hierarquia do salário, esta tem definitivamente subsistência. Assim os
sindicatos consideram a hierarquia do salário na seguinte frase: ao perfil
de exigência do trabalho corresponde um salário determinado.
Tomemos o outro extremo, a remuneração de gestores. Também aqui
vale o princípio: o desempenho determina a renda. Também aqui a equipa-
ração não está correta. O trabalhador ganha em um ano R$ 20.000,00. Um
gerente top de uma grande empresa ganha R$ 2.000.000,00 [dois milhões]
em um ano. Um gerente ganha, portanto, cem vezes mais do que um tra-
balhador normal. Isso é um tal aumento exponencial, que mesmo também
os gestores consideram como anormal. Não obstante, há também aqui a
tentativa de deduzir esse aumento exponencial na remuneração tirada do
desempenho. Pode-se ler nos jornais de que forma isso se dá.
Também a jornada de trabalho de um gerente tem meramente 24
horas. É a força a medida que fundamenta a diferença? O emprego de um
gerente é cem vezes maior do que o de um trabalhador normal? O gestor
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é cem vezes melhor formado? Ele sabe cem vezes mais do que o trabalha-
dor? O trabalhador na VW sabe lidar com o ferro de soldar. O gerente não
sabe lidar com o ferro de soldar. O trabalhador e o gestor dispõem de áreas
de conhecimento díspares, que não são comparáveis entre si. A indicação
sobre a formação não leva a um fim. O fim que prevalece é a responsabi-
lidade. O gerente tem responsabilidade sobre mil homens, conforme se
diz. Levemos isso a sério. A enfermeira no hospital tem, todavia, também
responsabilidade sobre muitos homens, mas ela não ganha nada compará-
vel ao gestor. Os políticos também têm responsabilidade por milhões de
homens, mas não ganham o múltiplo do gestor.
Do já discutido resulta o seguinte: a partir do desempenho não se
deixa deduzir a remuneração do gestor. A fundamentação verdadeira para
a remuneração do gestor é a seguinte: o que é renumerado ao gestor é sua
função para o capital. Com a organização da exploração do trabalho, ele
cuida para que o movimento multibilionário da empresa se realize.
Resumindo: nem os trabalhadores, nem os gestores são pagos por
seu desempenho real, mas por seu desempenho ligado ao capital. Nesse
aspecto, encerra-se uma diferença. O desempenho de trabalho do traba-
lhador é a fonte para o lucro do empreendedor. O desempenho do gestor
consiste em tornar o salário do trabalhador a fonte do lucro. Isso é seu
desempenho para o capital. Ele organiza a exploração dos trabalhadores
para o capital. Para isso ele recebe, nas vendas do empreendimento, a sua
parte com alguns milhões.
Nem nos trabalhadores, nem nos gestores se deixa aplicar a repre-
sentação da igualdade de retribuição de mérito. O que essa representação,
contudo, desempenha, não é sem significado. O pensamento da justiça
com seu erro consegue transformar as posições opostas do gestor e do tra-
balhador em uma comunhão. Justifica-se uma oposição, uma hierarquia
da remuneração como se ela fosse uma coisa comunitária. Faz-se de conta
que a sociedade de classes é um exercício de colaboração. Se assim fosse,
então as diferenças do ordenado seriam absurdas. Necessárias são ambas
as atividades, a do trabalhador e daquele que organiza o trabalho. Mas, dis-
so não se conclui que eles tenham que ser remunerados de modo diferente.
Aqueles que veem segundo o ponto de vista da justiça não têm uma
atitude meramente contemplativa da sociedade, mas se tornam ativos,
também, na prática. Eles não consideram tudo isso, assim, a fim de justifi-
car algo, mas a justiça é, também, um título de apelação para as exigências
dos prejudicados. Descobre-se tanta quantidade de injustiça. Por exemplo,
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Filosofia do Direito e Contemporaneidade II
exige-se um salário igual para trabalhos iguais, como para homens e mu-
lheres que fazem o mesmo trabalho. Em nome da igualdade de retribuição
de mérito é exigido um reajuste do salário.
Para isso gostaria de dizer o seguinte: reportar-se à justiça é um ca-
minho inteiramente ruim se se pretende fazer algo para a melhoria de suas
condições materiais. Mas por quê? Aquele que reclama por justiça o faz,
primeiramente, porque ele se vê prejudicado em seu interesse. Faltam-lhe
meios. Para ele e suas necessidades, os meios dos quais ele dispõe são insu-
ficientes. Mas, ao mesmo tempo, ele desvia do ponto de vista do interesse
prejudicado se ele compara os seus meios com os dos outros. A diferença
dos meios em comparação a outros se torna critério.
E, então, não é mais lamentada a própria perda, mas a desvantagem,
a desvantagem em comparação a outros. Esse é um argumento perigoso.
Pois, se eu tiro de qualquer forma algo do outro, então deixa de existir o
fundamento da minha queixa. Isso não é apenas uma reflexão teórica da-
queles que exigem, mas também o método com o qual os empreendedores
enfrentam aqueles que protestam. Se em nome da justiça é exigido mais
dinheiro, vem a retaliação: em outro lugar se ganha ainda menos. Logo,
vocês têm que se contentar com aquilo que vocês recebem.
Imagine-se uma sorveteria na qual uma família com duas crianças
compra sorvete: uma criança tem uma bola de sorvete; a outra, duas. Ago-
ra é dito: isso é injusto, porque uma das crianças tem mais. Isso é um mau
argumento, porque talvez, de fato, para a outra criança uma bola de sorvete
seja suficiente, mas talvez pudessem ser oportunas, também, três bolas de
sorvete. Justiça é um procedimento ruim em que se faz justiça às neces-
sidades e interesses dos homens. Quem atua em nome da justiça nunca
alcança efetivamente um patamar de êxito.
A comprovação de que meu diagnóstico é verdadeiro está na repre-
sentação da distribuição equitativa. Na Alemanha e em outros países, todo
ano há o relatório oficial da pobreza e da riqueza do governo. Nesse rela-
tório, lamenta-se que a disparidade entre ricos e pobres aumenta por aí
afora. É efetivamente verdadeiro que a disparidade entre ricos e pobres
“aumenta por aí afora”? A disparidade entre ricos e pobres “aumenta”. As
frestas das portas do céu aumentam, e começa a chover. Isso é uma cir-
cunstância à qual se está, de fato, exposto.
Mas, não se está puramente exposto à disparidade entre ricos e po-
bres; ela nasce da ação e precisamente da contabilidade dos empreendi-
mentos capitalistas, que aumentam o seu êxito ao depauperarem outros
que eles deixam trabalhar para si. Aqueles, cuja avaliação parte do aumen-
to da disparidade entre ricos e pobres, separam a situação de sua causa.
Essa separação entre a situação e a causa tem consequências. Em nenhuma
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1 Ibidem, p. 31.
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2 Ibidem, p. 32.
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3 O panorama aproveitável e crítico sobre as teorias atuais da justiça dão: DAHME, H. J.; WOHLFAHRT, N. Ungleich
gerecht? Kritik moderner Gerechtigkeitsdiskurse und ihrer theoretischen Grundlagen [Desigual justo? Crítica aos
discursos modernos e contemporâneos da justiça e seus fundamentos teóricos]. Hamburg: VSA Verlag, 2012.
4 Cf. FRASER, N.; HONNETH, A. Umverteilung oder Anerkennung? Eine politisch-philosophische Kontroverse
[Redistribuição ou reconhecimento? Uma controvérsia político-filosófica]. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 2003, p. 7.
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5 A moral, diz Marx, é a “comunidade ilusória” da sociedade burguesa. KARL, M.; FRIEDRICH, E. Die deutsche
Ideologie [A ideologia alemã]. In: MEW 3, p. 33.
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Referências
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Vaza Jato, a modernidade e a correlação entre
direito e política: o direito ainda como médium
entre sistema e mundo da vida?1
Considerações iniciais
1 Uma primeira versão desse texto foi publicada em Veritas, Porto Alegre, v. 65, p. 34729-34747, 2020.
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2 Cf.: https://theintercept.com/2019/06/12/chat-sergio-moro-deltan-dallagnol-lavajato/
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3 Cf.: https://theintercept.com/2019/06/12/chat-sergio-moro-deltan-dallagnol-lavajato/
4 Cf.: https://theintercept.com/2019/06/09/dallagnol-duvidas-triplex-lula-telegram-petrobras/
5 Cf.: https://theintercept.com/2019/06/18/lava-jato-fingiu-investigar-fhc-apenas-para-criar-percepcao-publica-de-
imparcialidade-mas-moro-repreendeu-melindra-alguem-cujo-apoio-e-importante/
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pelos confrontos sociais em torno das normas, das práticas e dos modelos
sociais vinculantes a uma coletividade plural. A filosofia política e a Fi-
losofia do Direito contemporâneas, portanto, nos ensinam que o fascis-
mo somente pode ser evitado pela afirmação da centralidade do Estado
Democrático de Direito enquanto o núcleo, o instrumento e o caminho
basilares da dinâmica de constituição, de disputa e de consenso em uma
sociedade democrática e por ela; e, assim, de que são os operadores do di-
reito que assumem um inultrapassável protagonismo social e institucional
em termos de guardiães e de promotores das “regras do jogo” (Norberto
Bobbio), garantindo a segurança jurídica necessária e afirmando sempre
os valores jurídico-constitucionais definidores dessa mesma estabilidade
jurídica e institucional. Quando esses operadores se politizam, o direito é
instrumentalizado e se transforma em política, permitindo a hegemonia
do fascismo e, com sua (do Estado Democrático de Direito) fragilização,
concomitantemente ao ativismo judicial enquanto partido político e mes-
sianismo moral, abre espaço para o totalitarismo. Aliás, gostaríamos de
esclarecer brevemente o sentido dos termos fascismo e totalitarismo den-
tro de um contexto democrático. Por fascismo entendemos a utilização de
bases pré-políticas (biologia e teologia) como fundamento tanto da po-
lítica quanto do direito. É importante mencionar aqui esse qualificativo:
o fascismo não compreende apenas a política enquanto dependente de
fundamentos pré-políticos e a-históricos, mas também o próprio direito. Por
totalitarismo entendemos a aplicação prático-política dessa perspectiva
fascista sempre que efetivamente um partido e governantes autoritários
tomam (e mesmo populistas) o poder e, contando com a aceitação tácita
ou implícita do judiciário e com o apoio direto do lumpemproletariado
(no nosso caso, inclusive, de camadas médias e altas da sociedade), utili-
zam as instituições estatais – e, em particular, a polícia e a inteligência de
Estado – contra a oposição política em geral.
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to, consideram que, quanto mais imparcial, impessoal, neutro e formal forem
os argumentos, as decisões e a atuação dos sujeitos institucionalizados
próprios ao âmbito do sistema social direito/justiça e ao âmbito do sistema
social Estado (incluindo-se, aqui, executivo e legislativo), mais a cultura
democrática é solidificada e maturada, mais ela se torna não egocêntrica
e não etnocêntrica, isto é, independentemente das fundamentações essen-
cialistas e naturalizadas e sobreposta a elas; quanto mais imparcialidade,
impessoalidade, neutralidade e formalismo em termos das instituições e
dos sujeitos próprios à esfera das instituições direito e política, mais os
cidadãos e as cidadãs, assim como os grupos sociais em geral, perceberão
que as instituições estão autonomizadas no que tange aos vieses político-
-ideológicos particulares e, por conseguinte, mais esses cidadãos, essas ci-
dadãs e esses grupos sociais afirmarão tais instituições, assim como agirão
nessa perspectiva não egocêntrica e não etnocêntrica. O grau de confiança
e de aceitação por parte dos/as cidadãos/ãs e dos diferentes grupos sociais,
relativamente às instituições público-políticas – direito e política, no nos-
so caso – e de sua separação, autonomização e sobreposição às perspecti-
vas essencialistas e naturalizadas próprias à sociedade civil, inclusive no
que se refere à própria separação entre direito e política, é proporcional,
portanto, ao grau de imparcialidade, de impessoalidade, de neutralidade
e de formalismo metodológico-axiológico das fundamentações essencia-
listas e naturalizadas e por parte destas, dos sujeitos institucionalizados
próprios aos sistemas sociais direito e política e por parte destes.
Com isso, quanto mais imparcialidade, impessoalidade, neutralida-
de e formalismo existirem por parte do sistema social direito, mais os/ãs
cidadãos/ãs e os diferentes grupos sociais perceberão o sentido impessoal,
inclusivo, participativo e igualitário do poder público e, aqui, a prerrogativa
absoluta e o caráter fundamentalmente democrático da constituição e do
Estado Democrático de Direito nela fundado e por ela dinamizado. Quanto
mais imparcialidade, impessoalidade, neutralidade e formalismo por par-
te desse mesmo Estado Democrático de Direito, mais os/as cidadãos/ãs e
os grupos sociais colocarão bem fundo dentro de seus armários privados,
escuros e empoeirados tendências fascistas, totalitárias e massificadoras,
vistas como quinquilharias velhas e imprestáveis de um passado odioso a
ser no mínimo escondido no mais profundo do porão ou desse armário da
consciência fascista (e, no máximo, combatido social, política e institucio-
nalmente por todos) e, por conseguinte, menos esses/as cidadãos/ãs e gru-
pos sociais estarão dispostos a publicamente confundirem, associarem ou
correlacionarem direito e política, política como direito, direito como políti-
ca. Dito de outra forma, o fato de o direito ser independente de fundamen-
tações essencialistas e naturalizadas, ou, para utilizar um termo de John
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Referências
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Da teoria à práxis? Axel Honneth e as lutas por
reconhecimento na teoria política contemporânea
1 Praticamente todos os principais autores que se apropriam do conceito de “reconhecimento” remetem a essa
configuração comum, ou seja, são conscientes de que as lutas por reconhecimento se referem tanto à pluralidade
cultural quanto ao fim das “grandes narrativas”. Cf., principalmente, Young (1990); Taylor (2000); Habermas (2002);
Honneth (2003); Fraser (2001); Benhabib (2002). Para uma recente exposição de conjunto em relação à atualidade e
transformações do conceito, Cf. Honneth (2013) e Honneth e Stahl (2013).
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2 Sobre o “sofrimento”, que, ao ser diagnosticado, aponta para sua superação prática, Cf. Honneth (2007).
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3 Foi também buscando tal ancoramento no “social” que Honneth enfrentou os debates no quadro das “teorias
da justiça”. A tentativa de Honneth de vincular teorias da justiça e análise social, explicitamente iniciada em 2007a,
tem como pano de fundo as investigações da questão da justiça a partir de “sentimentos morais de injustiça”. Com
isso, ele pretende deixar de lado concepções “construtivistas” (tais quais a de John Rawls) e desenvolver uma
“reconstrução normativa” na qual princípios de justiça sejam engendrados de interações sociais e de instituições
características de nossa “eticidade democrática”. Em seu mais recente livro, Honneth desenvolve o projeto de uma
“reconstrução normativa” como fundamento de uma teoria crítica da justiça. Cf. Honneth (2011). Ele apoia essa
possibilidade de ancorar a justificação crítica e normativa da teoria na experiência prática dos sujeitos, principalmente
nos trabalhos de Thompson (1991); Moore (1987); Miller (2001). Para localizar a novidade da “reconstrução normativa”
na obra de Honneth, cf. Nobre (2013).
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5 Mudanças importantes na obra de Honneth ocorreram nesse ínterim. De um lado, ele tentou elaborar, com a
teoria do reconhecimento, uma concepção adequada de “práxis social” que fosse capaz de abarcar comportamentos
patológicos sem os pressupostos da psicologia moral (Idem, 2005; 2010). Para uma análise a respeito dessa questão,
ver também Melo (2013c). De outro lado, assumiu mais abertamente que a “reconstrução normativa” permitiria um
ancoramento social da crítica em termos objetivos. Suas tentativas peculiares de fundamentação de uma “teoria da
justiça” tomam esse caminho. Cf. Honneth (2007; 2011).
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III
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6 Isso significa aceitar um tipo de fundamentação nos termos inaugurados por Jürgen Habermas (não produtivista,
não economicista) e seguido por muitos teóricos críticos depois dele, especialmente Honneth. Contudo, este oscila
entre estratégias “antropológicas”, “sociológicas” e “psicológicas” de fundamentação. Cf. Melo (2013c). Recentemente,
porém, Honneth apontou, sem maiores detalhes, para a necessidade atual da teoria crítica em desconfiar de saídas
economicistas e se debruçar sobre dimensões mais “políticas”. Cf. Honneth (2013).
7 Um tipo de problema que o próprio Honneth nunca conseguiu resolver. Cf. Honneth (2010).
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Referências
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Honneth: Reconhecimento, liberdade e justiça. São Paulo: Saraiva, 2013c.
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Reconstrução Normativa e Socialidade da Razão:
notas sobre a discussão contemporânea em torno
da noção hegeliana de reconhecimento
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1 Aproveitando a aproximação proposta por Hegel entre sua radicalização não representacionalista da crítica kantiana
ao empirismo e o conceito de liberdade, lembramos que, numa célebre sentença no Naturrechtsaufsatz, Hegel sustenta
que “uma liberdade para a qual houvesse algo realmente exterior e estranho não é nenhuma liberdade: a essência dela e
sua definição formal é, justamente, que nada há de absolutamente exterior.” (Ibidem, p. 476). A solução hegeliana para a
cisão representacionalista entre forma e conteúdo é a visualização dialética de sua originária coabitação.
2 “Se na consideração [da liberdade] se fica no arbítrio, no fato de que o homem possa fazer isto ou aquilo, isso é,
sem dúvida, a sua liberdade, porém se tomamos firmemente em consideração que o conteúdo é dado, então o homem
será por ele determinado e, nessa perspectiva, precisamente, não é mais livre.” (Ibidem, p. 67).
3 Entendo por essa expressão aquela perspectiva por meio da qual Honneth procura ver, na Filosofia do Direito
de Hegel, uma conexão entre teoria da justiça e teoria crítica da sociedade. Trata-se de pensar uma teoria da justiça
cujo programa esteja centrado na proteção daqueles tecidos sociais, potencialmente incorporados nas práticas
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6 Pinkard entende que a autoconsciência se torna, “ao menos minimamente [,] a assunção de uma posição no ‘espaço
de social’” (Idem, 1996, p. 7), isto é, o criticismo para avaliação de motivos elencados nas práticas sociais de fornecer
razões (Reason-giving). Sendo assim, segundo Pinkard, “o fornecimento de razões… é ele mesmo uma prática social que
atua no âmbito de uma forma determinada de “espaço social”, permitindo alguns tipos de inferência e falhando em
permitir outras” (Ibidem, p. 8). Eis por que, sendo uma consideração reflexiva e autoconsciente dos padrões e normas que
reivindicam legitimidade, “todas estas formas de autoconsciência têm uma estrutura mediada (isto é, inferencial).” (Ibidem,
p. 8) Do ponto de vista histórico-filosófico, a tese de uma alegada “socialidade da razão”, a qual pretende que esteja em
curso, na Fenomenologia, “uma teoria normativa do agir racional de indivíduos ocupando posições no interior de um
“espaço social” compartilhado e governado por regras” (REDDING, 2007, p. 14), representa uma estreita relação entre o
idealismo alemão (Kant, Fichte e Hegel) e a “pragmática linguística” surgida com o último Wittgenstein.
7 (PINKARD, 1996, p. 46). Segundo Brandom, a seção “consciência” da Fenomenologia do Espírito tem por
objetivo primordial investigar e começar a tornar explícito o que é implícito na ideia dos fornecimentos imediatos
dos sentidos enquanto possuindo conteúdo determinado. Nesse programa, a tese mais abrangente de Hegel seria
que a determinabilidade do conteúdo exige mediação (Vermittlung), o que Brandom interpreta como equivalendo à
articulação inferencial. Um dos principais objetivos de Hegel nessa passagem é “desdobrar os compromissos implícitos
nas concepções holistas de conteúdo e reunir as matérias-primas necessárias à explicação do mesmo.” (BRANDOM,
2002, p. 187). Nesse sentido, “não se pode entender as relações de incompatibilidade objetiva que articula a estrutura
conceitual relacional em virtude da qual o mundo é determinado, a não ser que se entendam os processos e práticas
constituindo o reconhecimento (acknowledgment) da incompatibilidade subjetiva dos compromissos que são, por meio
disso, tratados como representações de tal mundo.” (Ibidem, p. 193).
8 Eis aí o fundamento da tese da “socialidade da razão”: “Nós nos afastamos da figura representacionalista do
conhecimento para a ideia de atividades socialmente situadas de fornecimento de razões (reason-giving). Nós nos
afastamos, então, da figura de nós mesmos como “sujeitos” representando o mundo para uma compreensão de nós
mesmos como participantes em várias práticas sociais historicamente determinadas.” (PINKARD, 1996, p. 44).
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9 No início das Investigações Filosóficas, Wittgenstein vincula uma das diretrizes da “visão agostiniana da linguagem”
segundo a qual “sentenças são combinações de nomes”, a decorrências emblemáticas. A única função da linguagem
seria representar a realidade, as palavras se refeririam aos objetos e as frases descreveriam suas concatenações (Idem,
1984, 1, p. 237), uma defesa da função puramente descritiva das sentenças, de uma ênfase na função representacional
ou descritivista da linguagem (Ibidem, p. 250).
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10 Em Sofrimento de Indeterminação, Honneth é enfático ao afirmar que, embora esteja operando, em sua
reatualização de Hegel, com ressalvas em relação ao conceito substancialista de estado e à estruturação lógico-
especulativa da Filosofia do Direito (Idem, 2007, p. 50) – e, em última instância, com o conceito ontológico de
espírito –, apropria-se da compreensão da sociedade moderna por trás do conceito de espírito objetivo, o qual, “sob
a desconsideração de sua vinculação com o conjunto do sistema hegeliano, me parece conter a tese de que toda a
realidade social possui uma estrutura racional.” (Idem, 2007, p. 51).
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11 Uma das melhores caracterizações do problema da “reconstrução normativa” em Axel Honneth pode ser
encontrada num recente texto de Marcos Nobre, intitulado “Reconstrução em Dois Níveis”. Nesse texto, Nobre
mostra com enorme acurácia o significado do “paradigma crítico reconstrutivo” para a tradição da teoria crítica da
sociedade, evidenciando sua origem habermasiana e a forma diferenciada pela qual Honneth o desenvolve e
modifica ao longo os anos 1990, 2000 e 2010. Se, do ponto de vista da teoria crítica, Nobre detecta, a partir do
resgate do desenvolvimento proposto por Honneth para o modelo crítico reconstrutivo, a necessidade de que ele
seja desdobrado em dois níveis; do ponto de vista da avaliação da relação de Honneth à filosofia hegeliana, Nobre se
acha claramente orientado pela tese de que, “do ponto de vista da teoria crítica, um enorme pensador como Hegel
é ainda pré-crítico, no sentido que “crítica” adquiriu a partir de Marx. Apoiar-se na filosofia hegeliana, portanto, para
reconstruir experiências de liberdade social contemporâneas só tem sentido crítico se uma operação reconstrutiva
inaugural da própria tradição da teoria crítica já tiver sido realizada e puder orientar uma reconstrução de “segundo
nível” de Hegel.” (NOBRE In: MELLO, 2015, p. 50). Na medida em que toma esta posição com respeito à relação entre
Hegel e a reconstrução normativa, fica mais fácil entender por que Nobre endossa, mais fortemente do que Honneth,
a ideia de que as premissas da reconstrução normativa, às quais fiz referência acima, perfazem, como diz Nobre, uma
“estratégia de esquiva” (Ibidem, p. 43) em relação às premissas idealistas ligadas à metafísica hegeliana do espírito.
Para Nobre, mais até do que para Honneth, a reconstrução normativa em Hegel fica atrelada a uma reconstrução do
existente limitada pela racionalidade previamente estruturada do conceito, o qual põe, por assim dizer, os limites de
uma formação histórica racional (Ibidem, p. 44).
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12 Pippin tem uma compreensão muito instigante dessa “racionalidade objetiva da ordem social, a ordem que
incorpora à pretensão a autoridade normativa de uma maneira consistente com a única origem possível de tal
autoridade: agentes livres, racionalmente autodeterminantes em relações inevitáveis de reconhecimento
recíproco.” (Idem, 2008, p. 236).
13 “A dialética superior do conceito não consiste em produzir e apreender a determinação meramente como barreira
e como contrário, mas, sim, em produzir e apreender a partir dela o conteúdo e o resultado positivos, enquanto
por essa via, unicamente, a dialética é desenvolvimento e progredir imanente… / Considerar algo racionalmente não
significa acrescentar de fora uma razão ao objeto e, por este intermédio, elaborá-lo, senão que o objeto é por si
mesmo racional; aqui é o espírito na sua liberdade, o ápice da razão autoconsciente, que se dá efetividade e se gera
como mundo existente; a ciência tem somente a tarefa de trazer à consciência esse trabalho próprio da razão da
coisa.” (HEGEL, op. cit., v. 7, p. 83/84).
14 “Compreender uma frase significa compreender uma linguagem. Compreender uma linguagem significa dominar
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uma técnica.” (Idem, 1984, p. 199). A compreensão de frases é ligada, aqui, ao engajamento apropriado nas práticas
que tornam significativo determinado signo, nas práticas de seu uso, as quais são incorporadas em formas de
vida socioculturais. Compreender uma linguagem, isto é, a diversidade do entrelaçamento entre os elementos
linguísticos e as práticas compartilhadas é adquirir competências que habilitam à participação nestas atividades
regradas. Na linha dessa aproximação, Pippin entende o conceito hegeliano de espírito ou de “ordem normativa”
como “uma questão “lógica” ou categorial sobre o natural e o normativo, ou tal como Sellars primeiro o formulou,
o espaço das causas e o espaço das razões… É também verdade, portanto, que Hegel pensa os conceitos e normas
funcionalmente, em termos kantianos, como predicados de juízos possíveis, e então vai mais longe do que Kant ao
ligar toda possível compreensão do conteúdo conceitual e normativo ao uso efetivo nos limites de uma comunidade
linguística, orientada sensivelmente por normas ou pela emissão de juízos. Em outras palavras, enquanto a teoria
mais fundamental das categorias em Hegel é uma teoria da normatividade (normas para tornar o mundo inteligível
e para agir corretamente), não é uma teoria simplesmente formal, prescritiva. Conteúdo conceitual é compreendido
como fixado pelo uso efetivo, de maneira que não há nenhuma separação “ser/dever-ser”… essa interpretação
requer, em última instância, que a natureza da autoridade de tais coerções normativas e ideais seja autolegislada…
sob essas premissas, exercer a autoridade normativa em geral é compreendido enfaticamente como a expressão
de intenção no espaço público e social, funcionando como [norma] que autoriza somente se há um contexto social
suficientemente harmonioso e dotado de sentido, capaz de responder, de maneira correta, a possíveis desafios
apresentados a uma tal autoridade.” (PIPPIN, op. cit., p. 236).
15 Uma consideração da diferença entre moralidade e eticidade em termos da imbricação entre “intersubjetividade” e
“objetividade” (PIPPIN, op. cit., p. 262) facilita a percepção do pragmatismo ético. A “normatividade inerente às nossas
práticas de conhecimento e ação é irredutível, e a relação entre natureza e espírito, entre causalidade e normatividade,
deixa-se descrever de forma apropriada somente desde o interior dessas práticas.” (QUANTE, 2004, p. 13). Assim,
diretrizes como a “crítica de Hegel ao formalismo e ao ceticismo ético, sua defesa de um realismo ético com respeito
a práticas sociais e sua adesão a uma concepção de ética materialmente enriquecida”, bem como a ideia de que “as
práticas sociais são fundacionais”, são “traços fundamentais de um pragmatismo ético.” (Ibidem, p. 10/11) Para Quante,
“a tese hegeliana acerca da superação da moralidade na eticidade é para ser interpretada não de um ponto de vista da
teoria da validade… mas da perspectiva de uma teoria da fundamentação… toda argumentação moral tem de se apoiar
sobre premissas éticas pressupostas.” (Idem, 2011, p. 287) Nesse sentido, a “superação da moralidade na eticidade” se
deixaria ler como uma “estratégia pragmatista de fundamentação”. (Idem, op. cit., p. 293).
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que é antes ela que tem de tomar dele a sua verdade, e a partir
dele corrigir-se e reconhecer-se (sich aus ihm zu berichtigen und
zu erkennen).” (Ibidem, p. 31).
Com efeito, defende Hegel, para além (ou justamente pelo fato) de a
progressão categorial na Filosofia do Direito ocorrer em ritmo dialético,
a tese de que tenha como solo um conceito cuja necessidade em si e para
si já foi demonstrada como objetividade espiritual apropriada à moderni-
dade inviabiliza a linearidade de uma simples aplicação da estruturação
lógica do conceito ao âmbito jurídico. Ao contrário, justamente porque
o direito é o próprio conceito em seu tensionamento entre processos de
justificação e quadros institucionais com eles (possivelmente) condizen-
tes, a progressão categorial da Filosofia do Direito envolve sempre a de-
monstração do caráter verdadeiro da representação enquanto conteúdo
a partir da elevação dela, sobretudo em sua estruturação linguística, ao
conceito, isto é, à interpenetração dos processos de justificação da nor-
matividade e das práticas linguisticamente estruturadas e compartilha-
das nas formas de vida modernas. “Aqui, é preciso pressupor, a partir da
lógica filosófica, em que consiste o procedimento científico da Filosofia.”
(Ibidem, p. 31). Assim, a démarche dialética da ciência filosófica do direito,
que faz do caráter revolucionário dos processos de modernização – com-
preendidos no bojo de uma conexão imanente entre práticas e justifica-
ção – o cerne da Filosofia do Direito, consiste em deslindar a interpene-
tração da autocertificação e do quando institucional, da indeterminidade
e da determinação, da infinitude e da finitude. “A ideia mestra, que anima
e estrutura a lógica e a metafísica de Hegel, é sua maneira de desenvolver,
de acordo com o modelo de autoridade recíproca e responsabilidade cujo
paradigma é o reconhecimento recíproco, o insight de Kant-Rousseau
acerca do tipo fundamental de normatividade baseada na autonomia.”
(BRANDOM, op. cit., p. 234).
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16 Honneth se pergunta “como seriam constituídos os princípios da justiça decididos pelos membros da sociedade,
sob a condição de que eles vissem a efetivação de sua liberdade como dependente da efetivação da liberdade dos
outros”, abandonando, assim, tal como Hegel, o ponto de partida centrado em um individualismo metódico e adotando
“o conceito comunicativo de liberdade individual” (Ibidem).
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PARTE IV
Fernando Danner
Ádna Rosiene de Araújo Parente
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do bom governo que Alcibíades deve ocupar-se consigo mesmo. Diz ele:
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essa nova realidade, na qual ainda não foram formados, que é a atividade
política. O “ocupar-se consigo” inscreve-se, nesse momento, não como uma
necessidade de ‘governar os outros’, mas, ao contrário, como uma necessi-
dade de ‘ser governado’. É preciso, portanto, “ocupar-se consigo para poder
governar, e ocupar-se consigo na medida em que não se foi suficiente e con-
venientemente governado” (Ibidem, p. 57); (c) a questão da ignorância, isto
é, ignorância ao mesmo tempo das coisas que deveria saber e ignorância de
si mesmo enquanto sequer sabe que as ignora. Alcibíades acreditava saber
facilmente responder à questão proposta por Sócrates sobre o significado da
expressão bom governo da cidade, afirmando que era o que assegurava a con-
córdia entre os cidadãos. E, quando perguntado sobre no que consistia essa
concórdia, ele se desespera, mostrando que não sabia em que ela consistia e
ignorava que não sabia. Por isso, é preciso que ele se ocupe consigo mesmo,
é preciso que Alcibíades tome-se a si mesmo aos próprios cuidados.
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A gestão escolar perante a violência
na escola pública de Porto Velho
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Esse poder disciplinar definido por Foucault parece que aos poucos
perde sua força ou se deforma em suas consequências. A violência escolar
presenciada na atualidade mostra que os regimes disciplinares moldados a
partir do século XVIII, e, dentre eles, a escola, enfrenta uma crise, que, por
um lado, diminui o seu poder de disciplina, enquanto ao mesmo tempo o
indivíduo perde os parâmetros valorativos necessários para a sua socializa-
ção. A violência escolar tem a dupla ocorrência de que a disciplina excessiva
pode ser instigadora de violência antissistêmica, e a de que o indivíduo lar-
gado à própria sorte se torna incapaz de ter o autocontrole esperado pela so-
ciedade contemporânea como cidadão apto para os desafios estabelecidos.
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tori (2007) verificou, em uma pesquisa, que crianças que sofreram algum
tipo de espancamento se tornaram precocemente agressivas para com os
outros, principalmente com os mais fracos (irmãos menores, conhecidos
mais jovens, animais, idosos etc.) (Ibidem, p. 45).
Já a autora Silva (2010) discorre que os jovens violentos podem ser
de ambos os sexos. Eles possuem, em sua personalidade, características
de desrespeito e maldade. Além disso, na maior parte das vezes, esse as-
pecto de ser mau está ligado a um perigoso poder de liderança, que é
obtido por meio da força, ou até mesmo pelo assédio psicológico sobre a
outra pessoa (Ibidem, p. 43).
No âmbito da psicologia, a autora Meira (2012) esclarece dois tipos
de transtorno que podem levar jovens a ter atitudes agressivas no ambien-
te escolar; a saber, o primeiro deles é o TDAH, que é uma sigla para Trans-
torno do Déficit de Atenção com Hiperatividade, caracterizado como um
transtorno neurobiológico, de causas genéticas, que aparece na infância
e frequentemente acompanha o indivíduo por toda sua vida. Dessa for-
ma, indivíduos portadores desse transtorno tipicamente fazem comentá-
rios inoportunos, interrompem demais os outros, se metem em assuntos
alheios, agarram objetos dos outros, pegam coisas que não deveriam to-
car. A impulsividade pode levar a acidentes e ao envolvimento em ativida-
des potencialmente perigosas, sem consideração quanto às suas possíveis
consequências. Ademais, os jovens que têm esse transtorno normalmen-
te cometem atos violentos por não conseguirem controlar seus impulsos.
O segundo tipo de desordem é o TOD, sigla para Transtorno Opositivo-
-Desafiador, que causa, na maioria das vezes, comportamentos, em porta-
dores desse distúrbio, que vão contra as regras que a instituição escolar
apresenta. A característica essencial do TOD é um padrão recorrente de
comportamento negativista, desafiador, desobediente e hostil para com fi-
guras de autoridade, que persiste por pelo menos seis meses. O jovem com
esse transtorno perde facilmente o controle, e as coisas seguem do jeito
que eles desejam. Isso é válido para uma atitude agressiva, pois o jovem se
opõe a outro e, daí, há a geração de violência. (MEIRA, 2012, p. 137.)
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A escola está sujeita a sofrer com suas remediações, pois ela está in-
serida numa coletividade social, o bairro. Mas, deve-se verificar suas ime-
diações, para, assim, evitar algum tipo de influência de drogas e bebidas
aos alunos. A parceria com a Patrulha Escolar é importante nesse caso.
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Esse ponto é essencial, pois ele contém inúmeras dicas para se con-
trolar, coibir e combater a violência dentro da escola. As sugestões são:
inserção da presença familiar na escola; formação de equipe de profissio-
nais; atuação da Patrulha Escolar; realização de palestras; educação dos
alunos diante de seus direitos e deveres; promoção de medidas educacio-
nais; orientação às vítimas e atendimento delas; solicitação, aos agresso-
res, para que se retirem da escola; diálogo com os alunos; fornecimento
de mais atenção a eles; entre outras. Além disso, é preciso que haja a for-
mação de uma equipe de alunos e professores preparados para trabalhar
a conscientização entre os alunos por meio de cartazes, textos, panfletos
e muitas outras maneiras de se levar ao outro a atitude dialogal, para se
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Depois vem a física, que, dentre ela, estão os socos e insultos, e, em terceiro
lugar, está a material, com o roubo de objetos. Quem sofre mais violência
na escola são as meninas e elas são as que mais cometem violência contra
outros colegas. Quando ocorre algum tipo de violência, seja esta em re-
lação a um aluno de posse de armas ou drogas, a maioria dos alunos tem
coragem de denunciá-los à Equipe Gestora, sendo os meninos os que mais
possuem a audácia para realizar a denúncia.
Os gestores e os professores confirmam os dados anteriores, alegan-
do que são os alunos que mais cometem violência escolar. No entanto, al-
guns professores também a cometem, mas este problema é mais fácil de
ser solucionado. A escola não possui estrutura adequada para combater a
violência. Além disso, a solução mais viável para resolver esse problema
está no apoio da Patrulha Escolar, que ajuda na maioria das vezes.
O significado de violência escolar foi caracterizado pelos entrevistados
como sendo um comportamento capaz de causar dano físico ou moral inten-
cional ao outro. Nessa categoria, estão o preconceito, a injustiça, o desamor
ao próximo, a extinção da estrutura familiar, o uso do bullying, a ausência
de respeito e as drogas. O entorno da escola possui ambientes que propor-
cionam a violência. Foram abstraídas algumas sugestões para preveni-la e
combatê-la, a saber: formação de equipe preparada na escola; envolvimento
da família na escola; realização de palestras sobre assuntos pertinentes aos
fatos; presença da Patrulha Escolar com mais frequência; oferecimento de
cursos educacionais, bem como de profissionais qualificados; expulsão de
alunos rebeldes; estabelecimento de uma escola mais rígida em termos dis-
ciplinares; atuação fiscalizadora da Equipe Gestora; promoção de diálogo
entre as partes; execução de projetos educativos; entre outras.
Por todos esses aspectos, entendemos que a violência traz, em si,
uma complexidade fenomenal e que deve ser tratada com relação aos fatos
e de forma primordial na busca de soluções para o problema, haja vista que
há uma necessidade de abranger mais a pesquisa com referência à violên-
cia nas escolas públicas de Porto Velho. Isso se dá pela necessidade de se
entendê-la e de procurar saber o que os órgãos competentes estão fazendo
para encontrar meios de atuação diante dela.
Referências
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1 O GLOBO. Ataque seria evitado se professor estivesse armado, diz Major Olímpio. O Globo,
Rio de Janeiro, p. 1-2, 13 mar. 2019. Disponível em: https://oglobo.globo.com/brasil/ataque-seriaevitado-se-professor-
estivesse-armado-diz-major-olimpio-23518634. Acesso em: 14 abr. 2019.
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gent Pepper’s Lonely Hearts Club Band”, dos Beatles, em convergência com
as energias revolucionárias da juventude dos anos de 1967 e 1968.
É também de 1977 a canção “Heroes”, de David Bowie, que inspira o
título do livro. No entanto, Bifo destaca, citando obra de Hito Steyerl:
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2 Uma tese similar, que relaciona a formação do novo pano de fundo tecnológico e a quebra do
espaço transicional a desencadear a “desafetação” pode ser encontrada, por exemplo, em
Stiegler (2013) e (2008).
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3 Outros importantes livros, alguns posteriores ao de Angela Nagle, exploraram a relação entre
a cultura da deep web com a emergência da alt-right e os massacres em questão. Por questão
de foco, deixa-se para outros ensaios sua análise. Ver, por exemplo, Neiwert (2017), Grossberg
(2018), Beran (2019) e Stern (2019).
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sas terras. Sabe aquele seu amigo de crazy eyes, cara de virjão,
que reclama das feministas radicais e gosta de publicar coisas
sobre Vikings, as Cruzadas ou o Império Romano? Cuidado,
ele pode ser um alt-righter (MARQUES, 2016).
Referências
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BERARDI, Franco ‘Bifo’. After the future. Trad. Arianna Bove et al. New
York: AK Press, 2011.
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London/New York: Verso, 2017.
______. Heroes: mass murder and suicide. London/New York: Verso, 2015.
______. La fábrica de la infelicidad: nuevas formas de trabajo y mo-
vimiento global. Trad. Manuel Hendrikson e Patricia Leatxe. Madrid:
Traficantes de Sueños, 2003.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil Platôs: capitalismo e esquizo-
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de 28 mar.2019. Disponível em: https://www.extraclasse.org.br/movimen-
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