07 Formação-De-Professores
07 Formação-De-Professores
07 Formação-De-Professores
BIBLIOGRAFIA ............................................................................................... 38
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1 PSICOLOGIA EDUCACIONAL E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES
Fonte: knoow.net
Essa formulação pode ser explicada da seguinte forma: toda disciplina científica
é, em síntese, uma combinação de problemas, teorias e metodologias. Na Psicologia
Educacional podem ser facilmente identificados estes três componentes, com notável
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coerência. Os problemas são educacionais; as pesquisas e a produção focalizam
problemas significativos da educação. Problemas como: ensino de...; processos
cognitivos e afetivos na aprendizagem escolar, incluindo aí os da motivação
(motivação é considerada problema de ponta em educação), otimização da
aprendizagem dos alunos, estratégias de aprendizagem, aprendizagem
autorregulada, autoconceito, crenças e conhecimentos prévios de alunos e
professores, níveis de desenvolvimento do aluno etc. Em todos esses esforços, a
Psicologia Educacional tem como sua primeira finalidade a compreensão e a melhoria
da educação, particularmente no contexto escolar, em sala de aula. Em outras
palavras, essa disciplina busca descobrir problemas, situá-los, defini-los e
compreendê-los, sinalizando soluções práticas.
Em Psicologia Educacional, quase que para cada tópico, existe ao menos uma
teoria. No conjunto, contam-se muitas teorias, cada qual com suas limitações, mas
que representam preciosos marcos com os quais se atingem certos objetivos com
algum nível de compreensão dos conteúdos e dos resultados de pesquisas. Mesmo
que admitamos a proposição de K. Lewin de que nada é mais prático do que uma boa
teoria, é sua relação com a prática que mais nos preocupa. É em relação a esse
conceito de aplicabilidade que eu pretendo mostrar mais adiante as principais
tendências contemporâneas, identificadas nos trabalhos de especialistas na área.
Mas falta um último esclarecimento acerca do terceiro componente, que é a
metodologia. A Psicologia Educacional segue os parâmetros de rigor científico como
qualquer ciência social. Como sempre, em suas pesquisas, ela busca assegurar o
controle das variáveis, através de um delineamento adequado, com a garantia de que
as provas são válidas e consistentes, tem cuidado com evitar mal-entendidos
conceituais e de interpretação dos resultados. Além de experimentos de laboratório,
aplica delineamentos quase-experimentais; em pesquisas que utilizam instrumentos
do tipo de auto relato, hoje adota-se o coeficiente alpha de Cronbach para levantar o
grau de consistência interna entre os itens, ao lado de técnicas de análise fatorial,
para a identificação dos fatores subjacentes aos diferentes itens; além disso, tornam-
se mais frequentes os estudos de meta-análise; por exemplo, há um estudo de meta-
análise que analisou todo um conjunto de estudos sobre o uso de recompensas
externas e revelou-nos o que esses diversos estudos, com diversas metodologias,
critérios etc. concluíram sobre os efeitos das recompensas externas para a motivação
intrínseca dos alunos. O aprofundamento veio a seguir, com estudos críticos acerca
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dessa meta-análise. E assim progride esse campo da psicologia como verdadeira
ciência.
Além disso, os conceitos de validade e fidedignidade moveram-se da estatística
para a interpretação das evidências. Ainda são muito valorizadas as pesquisas de
avaliação quantitativa, mas hoje utilizam-se cada vez mais métodos qualitativos
inovadores, derivados da antropologia e da etnografia. Um detalhe quanto às pessoas
envolvidas em pesquisa: agora quem lida com metodologia deve também entender
dos aspectos substantivos; daí, não pode mais ocorrer como antes, em que os
metodólogos não compreendiam os aspectos substantivos e apenas davam respostas
a questões de natureza quantitativa. Hoje, as questões substantivas são as que mais
contam numa pesquisa, e uma metodologia adequada deve ater-se a essas questões
bem específicas (Calfee e Berliner, 1996). Prevê-se, inclusive, segundo esses
autores, que num futuro próximo os pesquisadores da área precisarão dominar mais
técnicas de pesquisa do que antes, algumas das quais se acham apenas em seu início
ou ainda em fase de desenvolvimento.
Em síntese, esse é o quadro que revela o status científico definido da Psicologia
Educacional. Nós não precisamos mais ter a preocupação de provar para quem quer
que seja que Psicologia Educacional é tão ciência como qualquer outra área da
Psicologia. A questão que mais nos atinge e interessa, porém, é esta: em que sentido
ela serve para a prática de sala de aula ou, mais amplamente, para a tarefa educadora
do professor na escola? Em outras palavras, como se conceitua sua natureza de
ciência aplicada?
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los na sua atuação em sala de aula. Um professor de Psicologia Educacional
raciocinaria desta forma: eu domino, apoiado nos livros-texto, um conjunto de
informações de psicologia, que vou passar p'ara os alunos de licenciatura. Por
suposto, tais conhecimentos lhes serão úteis no ensino que irão desenvolver de suas
matérias. Dou exemplos práticos, ilustro, e minha missão está cumprida. Eis aí a
concretização da metáfora do fundamento, que foi, de fato, utilizada e aceita ao longo
deste século, praticamente sem questionamentos, até os anos 70. Constava dos
textos e se refletia, em geral, na produção científica da área.
Fonte: psicoativo.com
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linha de pensamento considerada progressista, moderna. A origem dessa tendência
é atribuída a Judd e a Thorndike. Assim, tudo o que se pensava sobre fenômenos
como aprendizagem, motivação, desenvolvimento, avaliação etc., basicamente,
moldava-se pela linguagem que os psicólogos inventaram para descrever as
condições experimentais que eles estudaram. Consequentemente, aí não havia lugar
para intercâmbio com um Dewey, por exemplo, por ser considerado porta-voz de
conceitos mais filosóficos do que científicos. Paradoxalmente, desenvolveu-se com
isso a imagem de uma forma de extremismo, denominado de psicologização da
educação: a psicologia educacional não seria apenas um fundamento, mas o
elemento único para a preparação do professor, trazendo consigo os padrões
substantivos e metodológicos para toda investigação educacional relevante.
Aquela separação da prática e dos que praticam, nos primeiros tempos, ia mais
longe, carregando um certo menosprezo por aquilo que significava prática ou a
pedagogia em sala de aula, em geral consideradas não-científicas. O alvo principal
dessa discriminação foram os praticantes da educação, professoras em geral,
estabelecendo-se até uma separação física de prédios. Em Chicago, Judd isolou do
seu departamento de psicologia o setor de formação de professores(as), em parte
porque ele acreditava que essa separação contribuiria para assegurar o status
científico da psicologia: uma unidade institucional composta sobretudo por mulheres,
provavelmente, não granjearia muito prestígio na academia.
Coisas daquela época, em boa parte já superadas. O que pode ainda estar
persistindo na área é a crença na ideia de psicologia educacional como fundamento
da educação, uma ideia que os psicólogos educacionais, na sua maioria, estão
abandonando. Por que motivo? Segundo Calfee e Berliner (1996), considerar a
educação apenas como um campo em que se pratica psicologia, ou uma oportunidade
em que se aplica o conhecimento científico psicológico, elaborado em outro contexto,
deixa de enxergar ao menos duas características da disciplina de psicologia
educacional: a primeira é que, ao longo deste século, os psicólogos educacionais
desenvolveram uma compreensão mais aprofundada da natureza da tarefa
educacional. Ou seja, identificaram nessa tarefa uma grande variedade e
complexidade de componentes, com diversos fatores em interação, do que uma
pesquisa descontextualizada não poderia dar conta. A título de exemplo, houve
consideráveis avanços na compreensão dos efeitos das diferentes tarefas de ensino;
quanto aos níveis de processamento da informação por parte dos alunos e sua
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dependência de aspectos do ensino, enquanto percebidos pelo aluno; e sobre as
peculiaridades da motivação no contexto de uma sala de aula (não é um contexto
igual ao das empresas, dos esportes, artes etc.). Tais descobertas representam
respostas a problemas educacionais autênticos que foram assumidos para pesquisa.
Fonte: www.minutopsicologia.com.br
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Ilustrando esse aproveitamento da sabedoria da prática, com um exemplo que
envolve o conceito de bom ensino ou ensino eficaz, obtido a partir da observação de
professores reais. Existem professores com desempenho de alta qualidade em suas
funções: os alunos aprendem, produzem e estão satisfeitos e entusiasmados com a
disciplina, próximos da motivação intrínseca por ela. Tais professores reais foram
entrevistados e observados em sua atuação em classe, e foi possível descrever seus
comportamentos específicos em classe e identificar seu corpo de conhecimentos,
objetivos, crenças e expectativas, além de outras variáveis pessoais que ajudaram a
psicologia educacional a depurar o conceito do que seja bom ensino ou de professor
competente, para cuja formação a disciplina pretende contribuir. Foi nesse contexto
que se desenvolveu a categorização de professores em: experientes (experts), em
oposição a outros, de formação mais recente, principiantes, novatos ou noviços. Seu
modo de enfrentar uma situação, por exemplo, de um aluno-problema varia
consideravelmente. O professor expert não é que saiba mais do que um principiante;
seu conhecimento é qualitativamente diferente, porque integra os diversos aspectos
teóricos entre si e com a prática, enquanto que o principiante faz apelo a um ou outro
princípio ou solução, desconectadamente e de modo não-crítico: o aluno
indisciplinado simplesmente é mandado para a direção. Segundo diversos autores,
poucos chegam ao estágio de expert. Uma publicação periódica, Advances in
Research on Teaching, tem relatado pesquisas que descrevem professoras reais
dessa categoria, como M. Lampert, da área de matemática.
Em suma, podemos já concluir que tornar-se um psicólogo educacional
significa hoje aprender tudo sobre a vida nas escolas. Estabelecer conexões com a
prática é tarefa essencial de um psicólogo educacional, inclusive para que as
perspectivas teóricas e metodológicas da disciplina possam subsequentemente ser
usadas de modo sensível e humano a serviço daqueles que trabalham nos contextos
escolares.
Além dessas duas razões que os autores aduzem para que não se considere a
Psicologia Educacional apenas como fundamento da educação, há uma outra
consideração a fazer. Segundo Anderson e seus colegas (1996), se nós
considerássemos a psicologia educacional apenas como um fundamento da
educação, as tarefas dos alunos, nessa disciplina tratada como fundamento, poderiam
consistir em leituras, prestar atenção nas aulas, fazer provas, redigir textos - tudo para
demonstrar que ocorreu uma assimilação de fatos, conceitos, princípios, teorias, e que
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tudo isso poderá ser um dia utilizado. A suposição básica é esta: as diversas teorias
e princípios seriam apresentados e aprendidos como um corpo de conhecimentos,
sem a consideração do contexto, esperando-se que ocorra, posteriormente, a devida
aplicação às diversas situações. Se este for o pressuposto, aquelas tarefas parecem
razoáveis, adequadas. Elas cumprem o objetivo de transmissão de um corpo de
conhecimentos a partir de uma fonte (o professor ou o texto) para um aprendiz que o
reproduza. Esse ponto de vista merece ser examinado mais de perto, porque
contempla as tarefas dos alunos, cruciais para a aprendizagem e para as
transferências dessa aprendizagem para situações novas, por ocasião do seu ensino
de uma certa disciplina.
Há pelo menos dois problemas nesse modo assim descrito de se trabalhar
Psicologia Educacional na formação dos futuros professores. O primeiro problema
consiste num falso suposto: que, tendo aprendido as teorias psicológicas, os
princípios gerais, o futuro professor em sua sala de aula, faria aplicações adequadas
aos inúmeros casos e situações de sua disciplina. Pense-se em aplicações de teorias
cognitivistas de aprendizagem, teorias de motivação e assim por diante. O fato é que
os professores não fazem essa aplicação. Primeiro, porque eles mesmos dizem que
não sabem como aplicar. Muitos tentam, e acabam acertando após várias tentativas
e erros; mas há outros que nessas tentativas adotam aplicações baseadas em
inferências viesadas, à revelia da teoria, o que poderá resultar apenas na repetição
de práticas anteriores, ou em reutilizar suas crenças pessoais, suas teorias pessoais,
quanto àquele tópico de ensino. Muitos fazem inferências de particular para particular:
tal estratégia funcionou naquela ocasião, com aquele aluno, aquela turma, logo, pode
funcionar com esta outra turma, este outro aluno. O que ele acaba praticando é aquilo
que acredita que funciona, ignorando que praticamente cada aluno, cada caso, cada
turma tem especificidades que não se repetem.
Mas a raiz mais profunda desse problema está, em parte, na própria natureza
das teorias. Em primeiro lugar, a relação entre teoria e aplicação não é linear simples.
Já foi demonstrado que práticas tanto saudáveis como espúrias podem derivar
igualmente de propostas teóricas falsas. Logo, não se pode arguir pela verdade de
uma proposta teórica simplesmente porque sua aplicação prática funciona. Por outro
lado, uma mesma prática pode reportar-se a posições teóricas diversas: a
aprendizagem por descoberta pode ser decorrência válida da teoria de Piaget, da de
Vygotsky e da Skinneriana; no entanto, estas duas últimas posições são, em outros
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aspectos, incompatíveis com a teoria psicogenética. As práticas escolares
montessorianas são também compatíveis com Piaget, embora suas teorias sejam
bem diferentes. Assim, mesmos métodos de ensino podem ser compatíveis com
diferentes pressupostos psicológicos. Portanto, não há uma correlação unívoca e
necessária entre certa teoria e aplicações práticas.
Fonte: www.montessori.nsw.edu.au
Além disso, as teorias são, por natureza, genéricas, não-específicas, por não
contemplarem explicitamente a infinidade de casos potencialmente abarcados por ela
e nem, a cada situação, darem conta das suas inúmeras peculiaridades. Isto é, há
uma considerável distância entre qualquer teoria e a situação real de qualquer sala de
aula, em função dos inúmeros componentes que tornam essa situação muito
complexa e imprevisível, em que os eventos se sucedem rapidamente, às vezes ao
mesmo tempo. Os professores precisam preparar-se para essa complexidade e para
um alto grau de incertezas. Tal preparação exige algo mais do que simplesmente
tomar conhecimento das teorias e dos princípios psicológicos. Esse tipo de
fundamento não é suficiente, porque não se pode esperar que possam aproveitar
delas em sua prática. Há cerca de 100 anos, William James, escrevendo para
professores, dissuadiu-os a que buscassem diretamente na psicologia, ciência da
mente, programas definidos, esquemas e métodos de ensino. Estas últimas coisas
pertencem ao domínio da arte e dependem da genial idade de cada professor. Para
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ele, a psicologia é de caráter mais proscritivo, dizendo o que não se deve fazer, mais
do que o que se deve fazer, ou seja, não é prescritiva. O que permanece verdadeiro
dessa aula de William James é que, para se aplicar na prática o conjunto de
conhecimentos teóricos da psicologia, é preciso adquirir algo mais do que esses
conhecimentos teóricos.
Em síntese, se a Psicologia Educacional não pode ser considerada como
fundamento para a prática do ensino pelos motivos expostos, como se pode então
descrever sua função da formação dos futuros professores? De que modo ela deve
ser tratada nos cursos de licenciatura?
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Fonte: fundacaotelefonica.org.br
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parte desses alunos, mas esperam que o professor lhes forneça uma receita, uma
solução ad hoc que, ao lhes ser fornecida, muitas vezes é seguida de desinteresse
pelo restante da matéria.
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Shuell (1996a), em artigo recente, sugere que todo professor de uma matéria
específica deve ser capaz de levantar, pelo menos, questões como estas:
• Que tipos de problemas ou necessidades (emocionais, sociais,
desenvolvimentais) meus alunos estariam tendo? Até que ponto o ambiente do lar ou
necessidades especiais deles estariam afetando suas auto percepções e o seu
rendimento na escola? E como eu poderia ajudá-los nessa questão?
• Quais são os conhecimentos prévios para esta matéria, suas crenças, seus
sentimentos quanto ao tópico que precisariam aprender ou desenvolver, em termos
de conhecimentos ou habilidades?
• Até que ponto esta classe é semelhante e em que aspectos é diferente das
demais? Em quanto isso afeta meu ensino, exigindo adaptações, e quais?
• É hora de fazer avaliação? Qual e como? Com que cuidados?
• Que teoria de aprendizagem (construtivista, operante...) é mais relevante para
o conhecimento, a compreensão, a habilidade que os alunos estão buscando adquirir?
Por quê?
• E que tipos de tarefas devo dar aos alunos que, com mais probabilidade,
promoverão as atividades mentais necessárias e desperte a motivação desejada, em
direção aos objetivos pretendidos?
Dar uma solução adequada a cada uma dessas questões exige, além de uma
competência quanto ao conteúdo específico de sua própria matéria, um bom
conhecimento desses tópicos de psicologia educacional. Mas exige ainda um outro
tipo de competência, que tem muito de criatividade, engenhosidade e experiência e
que cobra sobretudo muito trabalho. Ensinar é também questão de técnica. No seu
dia-a-dia, o professor de qualquer disciplina terá que dar respostas online, em tempo
real, fazer julgamentos profissionais, empregar uma espécie de raciocínio clínico, e
cumprir uma série de funções como a de criar uma tarefa nova e adequada, explicar,
dar apoio, motivar, não dar a resposta certa... O grande objetivo é que, um dia, ele
possa atingir o nível de professor expert, que descrevemos anteriormente; que ele se
torne um experiente adaptador, um participante na comunidade de busca, que chegue
a compreender os fenômenos, suas origens, seus componentes e, sobretudo, saiba
que cursos de ação se podem tomar, de modo criativo, personalizado, adaptado a
cada caso.
Para isso, a disciplina de psicologia educacional deve ser desenvolvida com a
característica de real utilidade para o desenvolvimento dessas habilidades; e os
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alunos devem perceber, sentir essa possibilidade de utilização e preparar-se
devidamente para essa utilização. O que fazer para que isso aconteça?
Voltando ao trabalho daquele grupo de pesquisadores, citados (Anderson et al.,
1995), podem ser extraídas duas sugestões ou propostas prioritárias, e que incidem
sobre como trabalhar os conteúdos atualizados de Psicologia Educacional com alunos
de licenciatura. A ideia básica consiste em que, no decorrer da disciplina de Psicologia
Educacional, se adotem pelo menos estas duas grandes estratégias: uma relativa às
crenças e conhecimentos prévios dos alunos de licenciatura e outra, quanto à ligação
com a vida real de sala de aula que irão enfrentar.
I. Que os alunos de Psicologia Educacional possam revelar suas crenças e
conhecimentos prévios acerca dos tópicos dessa disciplina. Todo aluno entra para o
curso de formação de professores com determinadas crenças sobre aquela matéria,
sobre aprendizagem, motivação, sobre aluno, sobre ensino etc. Às vezes, são crenças
muito bem estabelecidas e que formam redes de itens interligados, e alimentadas por
experiências pessoais e interações com colegas. Neste caso, são altamente
resistentes a mudanças. O pior é que, segundo pesquisas, tais crenças funcionam
como filtros, que comprometem ou até bloqueiam a compreensão de novas
informações, mesmo quando estas, ao contrário das crenças, têm sólida base
científica. Em relação a ensino e aprendizagem, fortes crenças se formam
exclusivamente com a própria experiência enquanto alunos, Crenças do tipo: que
aprender consiste em assimilar um conteúdo, e que ensinar é transmitir; que
motivação o aluno já deve trazer de casa, e o professor pouco pode fazer; que há
alunos que simplesmente não são capazes de aprender. Tais alunos entram para a
disciplina de Psicologia Educacional com essas crenças e dela saem com as mesmas
crenças intactas. A sugestão de todos os especialistas na área é que não se pode
trabalhar adequadamente qualquer conteúdo, a menos que se levem em conta tais
crenças; e que, a seguir, elas se transformem ou se abandonem, quando necessário.
Esse processo começa com procedimentos que façam os alunos exporem suas
crenças pessoais. Existem diversas maneiras pelas quais os professores podem
consegui-lo: através de simulações, narrativas de seus modos de agir, redação com
comentários, ou da própria fala e de ações. Um modo que pode ser posto em prática
é delinear tarefas que exijam que os alunos expliquem abertamente a argumentação
e as teorias subjacentes a suas ações e decisões. Eles serão, em seguida, expostos
a pontos de vista contrários, extraídos das teorias ou de resultados de pesquisas, do
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que resultará um conflito cognitivo. Quando isso ocorrer, desde que naquele contexto
todas as ideias sejam respeitadas e os indivíduos encorajados a expressar e a revisar
publicamente seu modo de pensar, essa expressão pública pode propiciar o
desenvolvimento pessoal do conhecimento. De que valeria expor os alunos a toda
sorte de novos conteúdos, teorias, princípios - literatura atualizada - se eles se
mantiverem refratários a essas ideias novas, em função de crenças concorrentes? Daí
ser imperiosa essa primeira providência de natureza psicológica, que deverá ser
retomada praticamente a cada novo grande tópico que se focalize na disciplina.
II. Boa parte das tarefas (não necessariamente todas), destinadas a fazer os
alunos trabalharem conteúdos de Psicologia Educacional, deve ter a característica de
autenticidade, e essas tarefas devem também representar tanto quanto possível a
complexidade da situação de ensino. Trata-se aqui das tarefas ou atividades mediante
as quais os nossos alunos irão aprender. Há uma linha de pesquisas que forneceu
resultados segundo os quais na escola os alunos não aprendem adequadamente um
conjunto generalizável de conhecimentos, de modo alheio ao contexto em que será
utilizado. Neste sentido, são hoje frequentemente adotadas por muitos autores
expressões como "cognição situada", "aprendizagem autêntica", em oposição a uma
aprendizagem escolar puramente acadêmica, descomprometida em relação às
situações de contexto real, nas quais se deveriam usar aqueles conhecimentos e
habilidades. No caso dos futuros professores, o contexto dos conteúdos de psicologia
é sua sala de aula, uma determinada disciplina, com aquela turma (cada turma tem
um perfil todo próprio). Se o objetivo é propiciar conhecimento útil sobre ideias
importantes de psicologia, deve-se fazer os alunos trabalharem aquelas ideias numa
variedade de situações, ajudando-os a ver o que é semelhante e o que é diferente nas
situações, e como a utilização das ideias chave varia conforme a situação. Desta
forma, os conhecimentos teóricos assumem o que se pode chamar de validade
ecológica. A repetição da experiência com as ideias em situações diferentes cria uma
compreensão mais rica e mais estável dessas ideias, com maior probabilidade de
serem disponíveis em situações não-familiares e mesmo complexas que possam
ocorrer no futuro. Em suma, a qualidade das aprendizagens de psicologia dependerá
acentuadamente dessas pistas e do apoio cognitivo inerentes aos contextos e às
atividades (Shuell, 1996b).
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Fonte: www.entretantoeducacao.com.br
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apresentada a outros colegas. Não é seminário. E o objetivo explicitado não é o de
treinar a prática de ensino para os alunos adquirirem proficiência, mas sim para
praticarem a relação entre determinado tópico teórico de psicologia e sua aplicação
ao ensinarem sua matéria específica, como seria a de proporcionar diversas formas
de feedback, após uma performance oral de alunos numa situação de arguição. Se o
aluno constrói os conhecimentos por meio de ações sobre esse objeto, e de forma
socializada, tais atividades de aplicação otimizam sua aprendizagem de psicologia.
Aqui no Brasil, constatamos um paradoxo no treinamento dos alunos de licenciatura:
as disciplinas de Prática de Ensino ou Didática raramente (ou nunca) exploram tópicos
já vistos de Psicologia, aplicando-os de modo prático. Algum conhecimento de
psicologia sequer é mencionado. Isto porque os próprios professores dessas
disciplinas não são tão atualizados e podem mesmo ter prevenção contra a psicologia.
E por outro lado, os profissionais da psicologia educacional, ficam apenas com os
aspectos teóricos, evitando entrar em exercícios práticos. Daí resulta um considerável
espaço vazio que, além de tornar essa disciplina alvo de críticas por ser
exclusivamente teórica, o aluno não aprende como traduzir aqueles princípios para a
realidade do ensino de suas matérias específicas.
Em poucas palavras, acolhendo sugestão de Collins, citado por Shuell (l996b),
nas aulas de Psicologia Educacional os alunos devem: (a) aprender as condições em
que se aplicam aqueles conhecimentos; (b) serem expostos a situações que propiciem
invenção, criatividade; (c) enxergar as implicações do que estão aprendendo; e (d)
terem conhecimento das estruturas de contexto apropriado para seu uso.
Como se pode facilmente concluir, uma vantagem apreciável de tal método de
trabalho é que ele faz desenvolver o tipo de professor que Schõn denomina de
professor reflexivo - aquele que pensa sobre seu trabalho, analisa suas soluções,
inventa, é intelectualmente curioso, o que, de resto, supõe que ele seja socialmente
comprometido e até apaixonado pela sua função e que não se contente com soluções
pré-programadas. Ao longo do tempo, irá mesmo surgir uma compreensão
progressivamente melhor das teorias e princípios psicológicos, em seus meandros e
detalhes, em função dessa vida de estudo, de reflexão e de aplicações. Um professor
competente, expert, é aquele que integra os diversos conhecimentos entre si, sabe
fazer o processo vertical de integração entre teoria e prática, resultado de uma
existência devotada apaixonadamente a seu trabalho.
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Há uma providência adicional a ser tomada, que pode facilitar a implementação
dessas propostas metodológicas. Segundo alguns autores, um dos grandes
obstáculos ao desenvolvimento, nos futuros professores, do hábito da reflexão sobre
o próprio ensino é o isolacionismo do professor de Psicologia Educacional, tanto em
relação a seus colegas como em relação aos professores das demais disciplinas
pedagógicas nas licenciaturas. Resultados melhores se conseguiriam, inclusive em
termos de crescimento e desenvolvimento pessoais, com a socialização das
experiências, conhecimentos e ideias de todo esse corpo de formadores, o que se
reconhece ser uma tarefa custosa e exigente.
Fonte: info.geekie.com.br
Mas, por outro lado, pode-se supor que nenhum professor de Psicologia
Educacional aceita a estagnação, ou o continuísmo de práticas obsoletas. Verifica-se
em toda parte uma inquietação e até um desconforto diante do modo frágil como são
formados os futuros professores. Para sairmos desse estado, cada um de nós,
professores de Psicologia Educacional, deve propor para si próprio atingir grandes
metas, as mais altas possível, em relação aos alunos das licenciaturas: trabalhar com
os melhores autores; com o melhor método de ensino contextualizado; com a mais
elevada crença de que podemos formar professores altamente competentes,
justamente por haverem desenvolvido uma perspectiva psicológica útil em nossa
disciplina.
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2 CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA ESCOLAR PARA A FORMAÇÃO DE
PROFESSORES
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implicados na produção do fracasso escolar deixam de ser considerados (PATTO,
1996). Sendo assim, tais teorias psicológicas, como expressão do discurso
competente, aceito como verdade e que dissimula a dominação social sob a carapaça
de cientificidade (CHAUÍ, 1981), disseminam seus conhecimentos – no sentido de
conhecimento instituído, ou seja, como pensamento cristalizado, avesso à
interrogação – que abrangem o meio acadêmico e o senso comum (estabelecendo-
se entre ambos uma relação de mútua influência) e são reproduzidos por profissionais
da Educação e da Saúde. Como porta-vozes desse discurso naturalizante, por meio
do qual as adversidades do processo de escolarização são reduzidas a fatores
centrados no indivíduo, tais profissionais atribuem a origem do fracasso escolar a
questões de ordem genética (ligadas à raça, ao talento pessoal, à capacidade
intelectual ou a disfunções orgânicas), bem como relativas ao ambiente familiar ou à
condição socioeconômica dos alunos, seguindo os preceitos ditados pelas teorias
racistas, da aptidão natural, organicista, ambientalista ou, ainda, da carência cultural
(PATTO, 1984, 1996, 1997, 2005).
Fonte: soumamae.com.br
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crítica, esse foco de análise desloca-se da centralidade do indivíduo abstrato para a
reflexão sobre o processo de escolarização, compreendido em sua complexidade, de
modo a abranger, além de aspectos sociais, políticos e institucionais, as relações
entre os sujeitos que constituem e são constituídas na vida diária escolar,
concebendo-se o sujeito como um ser histórico, produto e produtor das relações
sociais e da sociedade. Neste sentido, as questões escolares são investigadas no
contexto do processo educacional brasileiro, analisando-se o modo como essas
condições objetivas se concretizam no dia a dia escolar (e suas implicações para a
escolarização), bem como a especificidade da vida escolar desse sujeito.
Considerar elementos sociais, políticos e institucionais envolvidos no processo
de escolarização implica contextualizá-lo na sociedade capitalista brasileira vigente,
alicerçada na divisão de classes e na exploração, situando no bojo de seu sistema
educacional o secular descaso do Estado em investir na Educação pública de
qualidade; associados a tal descaso encontram-se, por exemplo, uma política
educacional pautada pela dualidade do ensino e precarização da infraestrutura das
escolas (de instalações físicas, material didático, concentração de grande número de
alunos por sala) e das condições de trabalho de seus funcionários – burocratização,
baixa remuneração, sobrecarga de trabalho, falta de participação na tomada de
decisões, falta de tempo e condições para efetivação do planejamento das atividades
pedagógicas ou discussão, reflexão e estudo (PATTO, 1997). Tais elementos
compõem uma ampla gama de condições objetivas, que traçam o cenário da realidade
escolar concreta e heterogênea, efetivando-se de modo genuíno em cada instituição
e produzindo efeitos na vida diária escolar e nas relações entre os sujeitos que a
constituem.
Nesse contexto, o direcionamento do olhar para as relações entre os sujeitos
no dia a dia escolar – concebidos como sujeitos históricos cujas ações tecem a trama
da vida cotidiana na instituição escolar, atravessada pelo poder estatal e pela
diversidade de suas apropriações por parte dos protagonistas dessa história escolar
(PATTO, 1993) – expressa a tentativa de superação do reducionismo subjacente tanto
ao psicologismo (centrado no indivíduo abstraído) quanto ao sociologismo (relativo à
tendência de se focar a análise de questões escolares em aspectos macroestruturais).
Esta dimensão relacional abrange a compreensão da história escolar, dos
sentimentos e representações que delineiam a experiência escolar, das implicações
das condições objetivas do processo de escolarização na vida dos sujeitos e da rede
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de relações que o configuram. Tal rede de relações é dinâmica e contraditória, o que
possibilita tanto a reprodução quanto a problematização de determinados
mecanismos de opressão e desumanização que a constituem; sendo assim, imersas
na cotidianidade propícia à alienação, ideologia e preconceitos – Heller (2000) –, as
relações entre esses sujeitos expressam sua repetição e ruptura, resignação e
resistência, enquanto se compactua (com) e se confronta a produção dos problemas
de escolarização.
Estas relações são atravessadas por valores, concepções e representações
socialmente difundidos, que orientam as práticas escolares e ações dos sujeitos, bem
como por sentimentos vivenciados na experiência escolar, em um cenário
hegemonicamente marcado pela humilhação e opressão, subjacentes às relações de
poder instituídas na conjuntura social vigente alicerçada na divisão de classes. Assim
como as condições objetivas da escolarização nessa conjuntura se concretizam de
modo específico em cada instituição escolar, as relações entre os sujeitos não são
homogêneas, portanto, o acesso à singularidade da experiência escolar e dessas
relações envolve a compreensão das especificidades da vida diária escolar, com
atenção à versão de seus protagonistas.
Fonte: pt.pngtree.com
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que configuram a cotidianidade que está na base do processo de escolarização das
escolas públicas brasileiras e em que se delineiam as relações entre os participantes
do contexto escolar. No cotidiano escolar, em que vigoram o preconceito e o
reducionismo de questões sociais ao âmbito individual (expresso por meio da
reprodução de tradicionais explicações psicológicas sobre o fracasso escolar, pelo
processo de medicalização da Educação ou da patologização da queixa escolar), a
origem de problemas escolares decorrentes de uma complexidade de fatores
envolvidos no processo de escolarização é reduzida a aspectos centrados no
indivíduo, o que traz implicações para a vida dos sujeitos e para sua experiência
escolar. Dentre alguns destes efeitos na vida escolar encontram-se, por exemplo, a
culpabilização de alunos, pais ou professores pelo fracasso escolar, a incitação de
estereótipos relativos a alunos de classes populares e disseminação de rótulos
atribuídos aos tidos como portadores de problemas de aprendizagem, a identificação
dos alunos estigmatizados com o não saber ou com a condição de doentes e
incapazes, a sensação de impotência, a humilhação e a exclusão.
A compreensão das relações entre os sujeitos da vida diária escolar implica,
então, uma aproximação à experiência singular desses sujeitos e à sua história
escolar (de modo a contemplar suas próprias versões sobre essa história), situando-
se essa rede de relações na complexidade de fatores implicados no processo de
escolarização, dentre os quais se encontram aspectos referentes ao funcionamento
institucional e à política educacional (MACHADO E SOUZA, 1997).
26
Aguiar, 2000), esses profissionais acabam não sendo preparados para lidar com as
questões acima apresentadas.
Para que possamos contextualizar esse processo em sua totalidade, faz-se
necessário pensar a formação de professores a partir das demandas que emergiram
com o desenvolvimento da sociedade industrial. Esta impôs um novo ritmo
socioeconômico e político na divisão social do trabalho baseado na racionalização,
serialização e especialização. A partir dela, a escola, juntamente com as demais
instituições sociais, assume o papel de disciplinadora frente ao desenvolvimento
industrial (Rocha, 2000).
Os valores funcionais presentes na história pedagógica corroboram esse
tecnicismo presente na educação. Segundo Rocha (2000), são eles:
a) respeito ao eruditismo e às verdades universais, pressupondo hierarquia e
estrutura unilateral por meio da retificação do papel do professor como aquele que
ensina e dos educandos como os que aprendem;
b) linearidade nos processos de aprendizagem - apontando para a
uniformidade no desenvolvimento, ou seja, uma evolução contínua, progressiva,
estabelecida previamente nas teorias a serem alcançadas por todos;
c) constituição do especialista que analisa o processo e elabora as teorias, que
devem ser aplicadas pelos técnicos (professores) na prática (sendo que o psicólogo
ocupa aqui um lugar central) e;
d) priorização do desenvolvimento cognitivo (visto como suporte de qualificação
e ascensão na sociedade) em detrimento do desenvolvimento da pessoa na totalidade
(Rocha, 2000). A autora também destaca que a configuração da escola e os valores
que a constituem contribuem para a prevalência do homem da moral, reprodutor de
práticas homogeneizantes, em detrimento do homem da ética, voltado à criação.
Acredita-se que esses valores funcionais da escola contribuem para a
predominância de concepções de fracasso escolar que Souza (2004) denomina de
medicalizantes e culpabilizantes do sujeito. Para a autora, essas concepções refletem
uma visão de mundo que explica a realidade a partir de estruturas psíquicas e nega
as determinações das relações culturais e institucionais sobre o psiquismo,
encobrindo as arbitrariedades, os estereótipos e preconceitos de que as crianças das
classes populares são vítimas no processo educacional e social. Acredita-se que o
trabalho do psicólogo com formação continuada de professores deve contribuir para
o enfrentamento dessa visão reducionista que se reproduz na escola por meio da
27
emergência de um olhar processual e voltado a multiplicidade de elementos que
produzem o fracasso escolar.
No que se refere especificamente à questão do fracasso escolar, autores como
Ribeiro e Andrade (2006), Sigolo e Lollato (2001), Zago (1998) e Patto (1997),
evidenciam que este é significado predominantemente pela escola como
consequência de dificuldades do aluno e de sua família. Esse dado apontado pelos
autores, que evidencia o quanto que a escola tem produzido uma relação assimétrica
com a família, bem como a dificuldade de esta instituição considerar que suas práticas
podem também produzir fracasso escolar (Ribeiro e Andrade, 2006), precisa ser
considerado no processo de formação de professores.
É importante destacar que esse processo de homogeneização, decorrente dos
valores funcionais reproduzidos na escola (Rocha, 2000), tem sido identificado
inclusive em propostas de formação de professores. Altenfelder (2006), em pesquisa
realizada com a finalidade de avaliar o processo de formação de professoras
promovido pela secretaria de educação de um município da Grande São Paulo
identificou que os encontros são elaborados a priori, ou seja, sem a realização de um
trabalho que identifique as dificuldades vivenciadas no cotidiano da sala de aula e sem
a devida participação dos professores em seu planejamento. A autora destaca, a partir
do relato das professoras entrevistadas, que da participação nesses encontros
emergem sentimentos como os de “sentir-se perdida”, “vazio” bem como a dificuldade
de colocar os conhecimentos lá apresentados em prática. Ou seja
28
apresentadas pelo mundo global no qual está em jogo o processo de exclusão/
inclusão social perversa (Sawaia, 2002).
Fonte: asar-src.kz
29
Em pesquisa realizada pela autora junto a um grupo de professores em
processo de formação havia dois anos, a autora identificou que havia uma grande
dificuldade de os professores compreenderem suas práticas de forma crítica e à luz
da teoria (era comum explicações ancoradas nos juízos de valor presentes no senso
comum). O desejo de serem tecnicamente competentes também foi uma constante
em seus discursos, além de a dificuldade relacionada à exposição do não saber,
principalmente diante dos alunos.
Souza (2009), a partir da análise de pesquisas acerca da formação de
professores, constatou que os cursos oferecidos a esses profissionais deixam de
contemplar aspectos fundamentais à formação de um profissional preparado para dar
conta de atender às demandas atuais presentes na educação. Isso contribui para que
os professores não encontrem espaço para emergência da pessoa professor, pois
estão inseridos em condições que lhes impõem a luta pela sobrevivência, o que
dificulta o pensamento reflexivo e o posicionamento como ser de desejo e volição.
Facci (2009), ao problematizar o processo de formação continuada de
professores, ancorada no pensamento de Marx e Engels, destaca que o professor
está cada vez mais alijado do processo pedagógico e que, ao trabalhar com formação
de professores, o psicólogo precisa considerar esse fato. A autora destaca que é
possível afirmar que, “hoje, o professor está excluído da escola, ele não tem mais
conseguido desempenhar sua função social: ensinar” (2009, p. 115).
Com base em estudos na área da formação de professores, Facci (2009)
destaca que a literatura em torno desse tema tem se amparado, na atualidade, na
Teoria do Professor Reflexivo e na Pedagogia das Competências. Segundo a autora,
ambas as perspectivas desvalorizam o trabalho do professor, uma vez que dão grande
ênfase a prática, à experimentação, deixando de lado o conhecimento teórico
historicamente produzido, o qual a autora destaca que deve ser utilizado como
ferramenta para entender e significar a prática atual do professor. Embora a autora
corrobore a ideia de que a prática e a reflexão são elementos importantes, defende
que sem a teorização eles não auxiliam o professor a ter uma posição ativa,
consciente e crítica na sala de aula. Meira (2003), no que se refere à atuação do
psicólogo escolar na formação de professores, destaca que esse profissional deve
possibilitar o acesso a conhecimentos psicológicos que possam contribuir para a
elaboração de propostas que resultem em melhorias da prática e do processo de
ensino aprendizagem. Baseada em Franco e Montenegro, a autora destaca que “a
30
psicologia pode constituir-se em um elemento importante na definição de conteúdo,
currículos e sistemáticas de avaliação, desde que seja capaz de contribuir para a
compreensão do psiquismo humano em uma perspectiva histórico-dialética” (2003, p.
32).
Baseada na Psicologia Histórico-Cultural, Facci (2009) destaca que no
processo de formação de professores é relevante que se aborde os conhecimentos
científicos que auxiliam o professor a promover o aprendizado e o desenvolvimento
das Funções Psicológicas Superiores. Além disso, outros temas podem ser
abordados, sempre observando as necessidades dos professores, entre eles:
fracasso escolar e queixas escolares, periodização do desenvolvimento humano,
indisciplina, violência na escola, brincadeira na educação infantil, afetividade e
aprendizagem. Quanto à compreensão que a autora possui sobre o professor, este
Fonte: pt.slideshare.net
31
3.1 A psicologia histórico-cultural no seu diálogo com a pedagogia histórico-
crítica
32
(Vygotski, 1987, p. 18). Indo nesta direção, Rego (2002), também a partir das reflexões
da psicologia vygotskiana, destaca que bons professores são aqueles que conseguem
realizar uma boa mediação pedagógica, atuando na zona de desenvolvimento
proximal dos alunos e fazendo avançar seu desenvolvimento por meio da formação
conceitual.
Em síntese, Vygotski oferece contribuições importantes para o trabalho de
formação de professores, sendo que essas serão sistematizadas no tópico adiante. A
Pedagogia Histórico-Crítica também apresenta importantes contribuições para a
atuação do psicólogo no trabalho de formação continuada de professores. Meira
(2000; 2003) aponta três pressupostos fundamentais dessa teoria, a saber: a
compreensão da relação educação e sociedade a partir do processo de produção e
reprodução do capital; a necessidade de compreensão das múltiplas determinações
da realidade educacional, já que ela é socialmente construída em função do real
existente em suas contradições, e; a retomada da importância social da educação
enquanto instância fundamental no processo de socialização do conhecimento
historicamente acumulado. A autora ressalta que esse último aspecto possibilita a
garantia da reapropriação do conhecimento historicamente acumulado do qual a
classe trabalhadora é historicamente desapropriada, ou seja, “por diferentes
medicações, a educação no espaço que lhe é próprio, pode cumprir sua função
política emergindo como um instrumento de luta e conscientização (Meira, 2000, p.
47).
Portanto, a partir da Pedagogia Histórico-Crítica, a escola tem o papel de
contribuir com a apropriação do legado cultural da humanidade, buscando a
superação desses conhecimentos e a transformação social. Destarte, para Saviani
(apud Facci, 2009, p. 109), “a escola existe para propiciar a aquisição dos
instrumentos que possibilitam o acesso ao saber elaborado (ciência), bem como o
próprio acesso aos rudimentos desse saber”.
Portanto, a Psicologia Histórico-Cultural, no diálogo com a Pedagogia Histórico-
Crítica, possui importantes subsídios teórico-metodológicos para a formação
continuada de professores. Elencá-los e sistematizá-los para formação docente pode
contribuir para o planejamento de propostas de formação docente que se fundem
nessa perspectiva.
33
3.2 Algumas contribuições para a formação de professores
Fonte: www.aesa-cesa.br
34
Diante das reflexões apresentadas ao longo do texto, neste momento,
sistematizar-se-ão possíveis contribuições teórico-metodológicas da psicologia
escolar no processo de formação de professores. Dentre uma infinidade de ações, o
psicólogo poderá:
1) Mediar processos de apropriação e reflexão sobre as leis e políticas públicas
educacionais existentes. As principais leis e políticas norteadoras da educação
brasileira hoje são a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº
9.394/1996), os Parâmetros Curriculares Nacionais e políticas específicas como a
Política Nacional de Educação Especial. (Martinez, 2007, 2010). Há necessidade que
os educadores não só as conheçam, mas também possam refletir criticamente sobre
sua construção e seus compromissos.
2) Construir espaços de reflexão, discussão e criação de formas de proceder
em relação às dificuldades vivenciadas no cotidiano escolar, de modo que os
professores possam construir juntos estratégias de enfrentamento das dificuldades
cotidianas (Altenfender, 2006; Aguiar, 2000). Acredita-se que esses espaços voltados
a intersubjetividade possam favorecendo o desenvolvimento da sensibilidade, da
imaginação e da criação visando o desenvolvimento de novas formas de pensar, sentir
e agir no exercício docente (Almeida, 2002, Molon, 2006, Zanella e Molon, 2007).
3) Mediar processos de apropriação e reflexão crítica sobre as várias
concepções de aprendizagem e desenvolvimento humano (Meira, 2003, Facci, 2009;
Laroca, 2002), valorizando as diferenças epistemológicas e evidenciando as
contradições conceituais e metodológicas que lhe são inerentes. Considerando que
as concepções seguidas pelos docentes são mediadoras das práticas deles em sala
de aula, a relação delas com o processo de ensino-aprendizagem deve ser
problematizada, relacionando-as com os desafios encontrados pelo professor no
cotidiano da sala de aula.
4) Contribuir com a subversão dos discursos hegemônicos que estabelecem
um padrão “ideal” de aluno – ancorado nos valores da classe dominante e legitimado
em muitas teorias pedagógicas -, e também um “jeito” ideal de ser professor (aquele
que consegue disciplinar seus alunos dentro de um padrão preestabelecido) (Patto,
2000, Meira, 2007, 2003 e 2000; Sawaya, 2002; Rocha, 2000). Segundo Sawaya
(2002), esses discursos são, segundo a autora, estruturantes das práticas
pedagógicas, pois servem de critérios de seleção dos alunos por classe, definem as
35
relações que o professor estabelece com seus alunos, as formas de avaliação do
desempenho escolar, além de possivelmente culminares em aos de violência mútua.
5) Oferecer espaços de escuta do professor, de suas práticas, sua concepção
de trabalho, sua inserção na instituição, nos quais ele possa se apropriar de sua
história e, nesse processo, reconstruir-se, reinventar-se (Altenfender, 2006Sawaya,
2002, Laroca, 2000 e Aguiar, 2000). De acordo com Sawaya (2002), à escuta ao
professor, de suas práticas, da significação sobre o trabalho, os alunos e sua inserção
na instituição escolar, possibilita seu auto-conhecimento, bem como o conhecimento
do seu aluno, em suas capacidades e necessidades. Também possibilita implicá-los
no compromisso com o aluno-sujeito em suas especificidades bem como o
reconhecimento, neste espaço intersubjetivo, de práticas de sucesso realizadas por
seus pares.
6) Rever, juntamente com os professores, as concepções do fracasso escolar
e demais questões presentes no âmbito escolar (Patto, 2000; Martinez, 2010, Sawaya,
2002). Patto (1984) mostra que até final da década de setenta, havia o predomínio de
concepções pautadas nas diferencias individuais (QI) e na teoria da carência cultural.
Essas concepções, de acordo com a autora, isentavam as relações institucionais
ocorridas o interior da escola como também produtoras do fracasso escolar. Diante
disso, é necessário fornecer subsídios teórico-metodológicos para que os professores
ampliem a percepção sobre essa questão de modo que estes percebem o papel das
relações institucionais na produção do fracasso escolar. (Molon, 2006, Zanella e
Molon, 2007), e que construam formas de promover o sucesso dos seus educandos.
7) Reconstruir a valorização do papel social do professor, haja vista que há um
processo de desqualificação social de sua função e de que este contribui para mediar
o modo com que se relaciona com seu fazer (Codo, 2000).
8) Direcionar o trabalho de formação continuada de professores com base nos
objetivos identificados a posteriori, ou seja, a partir das necessidades dos
participantes (Altenfender, 2006; Almeida, 2002). Almeida (2002) aponta que a
investigação das necessidades de formação junto aos professores pode subsidiar um
trabalho que vá ao encontro das principais problemáticas por eles vivenciadas no
cotidiano escolar.
Diante das diferentes contribuições, propõe-se que a Psicologia Escolar
contribua no processo de formação de professores por meio do resgate do processo
de constituição dos professores como sujeitos, mediando processos em que estes
36
possam se apropriar de suas histórias e reconstruírem seu fazer em direção ao devir.
Para tanto, os trabalhos de formação de professores devem enfocar não apenas o
aspecto racional, mas também ampliar a sensibilidade, da imaginação e da criação
(Molon, 2006). Ela deve sair do campo coercitivo, dos padrões estáticos
fundamentados em concepções normatizadoras, para abrir-se para o espaço da ética
e da criatividade (Alves e Sass, 2004). Desta forma, é possível contribuir não somente
com a potencialização dos professores, mas de todos os sujeitos envolvidos no
processo educativo.
Por fim, destaca-se que o trabalho do psicólogo escolar na formação de
professores deve ter como foco também a humanização dos alunos e professores
(Facci, 2009). Essa humanização se torna possível quando a escola cumpre seu papel
social que é o de garantir o processo de apropriação dos conhecimentos
historicamente produzidos e o desenvolvimento do pensamento crítico.
37
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