Métodos de Investigação em Psicologia Comunitária

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Mé todos de investigaçã o em psicologia comunitá ria

Angelina Lucas Benate1

Estudante de psicologia educacional, UniRovuma

1. Nota introdutória

A Psicologia Comunitária surge em meados da década de 60, no decurso de um período de


grandes transformações, não somente na área da Saúde Mental, mas também na sociedade
em geral. Colocaram-se novas questões relacionadas com os problemas sociais, acrescidas
de um ritmo de mudança acelerado e abrangente o que levou a que, metodologias até aí
utilizadas para a compreensão dos fenómenos sociais, se tornassem inadequadas. Sua
origem remonta, por um lado à psiquiatria social e preventiva, à dinâmica e psicoterapia de
grupos, práticas "psi" que conceituavam uma origem social a seus objectos de estudo. Por
outro lado, psicólogos sociais, após os decisivos acontecimentos de Maio de 1968, na
França e Itália, passaram a colocar em questão a neutralidade dos pesquisadores centrados
no modelo empírico-analítico, dando início à assim chamada "crise"da Psicologia Social.

2. Psicologia comunitária

Segundo GÓIS (1993) a psicologia comunitária se define como uma área da psicologia
social que estuda a actividade do psiquismo decorrente do modo de vida do
lugar/comunidade; estuda o sistema de relações e representações, identidade, níveis de
consciência, identificação e pertinência dos indivíduos ao lugar/comunidade e aos grupos
comunitários. A psicologia comunitária passou a ser associada com a psicologia social
devido a comunhão de objectivos e convergência de métodos e técnicas, originando assim
a psicologia social e comunitária.

2.1. Métodos de investigação

A psicologia comunitária não se distancia muito da psicologia ou outras ciências sociais no


que diz respeito aos métodos de investigação, porem existem algumas especificidades e
particularidades no momento de execução desses métodos. As formas pelas quais eles se
empregam, a adequação, os seus objectivos também diferem-se com outras ciências.
2.1.1. Método de observação

É quando o psicólogo comunitário apenas observa um comportamento social ou consulta


arquivos os quais contém informações que possam ser utilizadas em seu estudo. Às vezes o
pesquisador interage directamente com as pessoas que estão sendo investigados, outras
vezes a investigação é feita de fora, ou seja, os observados não sabem que alguém os
observa.

A principal vantagem desse método é que o fenómeno social é observado no ambiente


natural em que se desenrola. Sua desvantagem é que é um processo mais descritivos que
explicativos, ou seja, não permitem que se estabeleçam relações de causa e efeito tão
claramente como nos métodos experimentais.

2.1.2. Método Comparativo

Investiga indivíduos, classes, fenómenos ou fatos a fim de ressaltar as semelhanças ou


diferenças entre eles. Permite o estudo comparativo de grandes grupos sociais, separados
pelo tempo e espaço (GIL, 2010). “Realiza comparações com a finalidade de verificar
similitudes e explicar divergências [...] é usando tanto para comparações de grupos no
presente e no passado, ou entre os existentes e os do passado [...]”, assim, como, entre
sociedade de iguais ou diferentes estágios de desenvolvimento (MARCONI; LAKATOS,
2001, p. 92).

2.1.3. Método correlacional

Esse método permite a obtenção de medidas de duas ou mais variáveis e no


estabelecimento da relação existente entre elas. As vantagens do estudo correlacional são,
principalmente, as que permitem o estudo de situações onde uma intervenção experimental
seria inadequada ou impossível; permitem a colecta de grandes quantidades de
informações; utilizam métodos estatísticos de fácil aplicação; seus resultados são
facilmente comunicáveis e de fácil entendimento.

2.1.4. Método ex-post-facto

Em poucas palavras, o que define essa modalidade desta pesquisa é que o “experimento” é
realizado após o fato. Com este método o pesquisador não tem controlo directo das
variáveis independentes, pois suas manifestações já aconteceram e por natureza não são
manipuláveis. Sendo assim, os fatos são espontâneos e não provocados pelo pesquisador
(GIL, 2010).

2.1.5. Método dialéctico

Esse método está relacionado ao materialismo dialéctico, inicialmente fundamentado na


concepção de Hegel, em que admite-se a hegemonia das ideias sobre a matéria e depois
revisto por Marx e Engels que admitiram a hegemonia da matéria em relação às ideias.
Trata-se de um método de interpretação da realidade que apresenta três princípios: unidade
dos opostos, quantidade e qualidade e negação da negação. Esse método permite uma
interpretação dinâmica e totalizante da realidade, alega que os fatos sociais não podem ser
entendidos e considerados isoladamente, mas com base no contexto social, político,
económico e cultural (GIL, 2010). Na visão de MARCONI e LAKATOS (2003), quatro
leis fundamentam o método dialéctico:

Acção recíproca: as coisas são analisadas na qualidade de objectos em movimentos que


não estão acabados, mas em transformação, desenvolvimento, o fim de um processo é o
começo de outro. As coisas são inter-dependentes uma das outras, a natureza e sociedade
são compostas de objectos e fenómenos ligados entre si, condicionando-se reciprocamente.
Mudança dialéctica: é a negação da negação, pois, ao negar uma coisa iniciasse a
transformação das coisas em seu contrário. Inicialmente se tem uma tese que é negada, na
sequência aparece antítese que também é negada, como resultado da negação da tese e da
antítese se obtém a síntese.

2.1.6. Método de levantamento ou survey

Este método caracteriza-se pela interrogação directa das pessoas cujo comportamento se
deseja conhecer. Basicamente, procede-se a solicitação de informações a um grupo
significativo de pessoas acerca do problema estudado para em seguida, mediante análise
quantitativa, obter as conclusões correspondentes dos dados colectados. (GIL, 2010, p. 55).

O levantamento pode ocorrer de duas formas:

Censo: quando é colectado informações de todos os integrantes do universo da pesquisa,


geralmente é desenvolvido por governos ou instituições que visam conhecer informações
gerais da população, tais como renda familiar, faixa etária, nível de escolaridade entre
outros;
Amostragem: quando não são pesquisados todos os integrantes da população estudada e
por meio de procedimentos estatísticos selecciona-se uma amostra significativa do
universo ou população. O levantamento não exige aprofundamento sobre objecto ou
fenómeno estudado, é recorrente em pesquisas descritivas que visam conhecer opiniões e
atitudes (preferência eleitoral, comportamento do consumidor), são contra-indicados no
estudo de problemas referentes às estruturas sociais complexas (GIL, 2010).

2.1.7. Método hipotético-dedutivo

Esse método é fundamentado nas críticas que Popper fez em relação ao método indutivo e
está presente na obra A Lógica da investigação científica (1935). O princípio do referido
método consiste na formulação de hipóteses que serão testadas para serem aceitas ou
refutadas (GIL, 2010). As hipóteses são suposições, possíveis respostas que merecem ser
comprovadas. O autor explica que quando os conhecimentos disponíveis sobre
determinado assunto são insuficientes para a explicação de um fenómeno, surge o
problema. Para tentar explicar a dificuldade expressa no problema, são formuladas
conjecturas ou hipóteses. Das hipóteses formuladas, deduzem-se consequências que
deverão testadas ou falseadas. Falsear significa tentar tornar falsas as consequências
deduzidas das hipóteses. Enquanto no método dedutivo procura-se a todo custo confirmar a
hipótese, no método Hipotético-dedutivo, ao contrário, procuram-se evidências empíricas
para derrubá-la. (GIL, 2010, p. 12).

2.2. Pesquisa participante

É desenvolvida com base nas interacções entre pesquisador e membros das situações
investigadas, mas não requer acção planejada. Seu diferencial está na emancipação das
pessoas ou comunidades que a realizam (GIL, 2010). O autor explica que nesse modelo

a população não é considerada passiva e sua planificação e condução não ficam a cargo de
pesquisadores profissionais. A selecção dos problemas a serem estudados não emerge da
simples decisão dos pesquisadores, mas da própria população envolvida, que os discute
com os especialistas apropriados. (GIL, 2010, p. 43).

Nessa modalidade de pesquisa, o ideal é promover a participação de todos e emergir na


cultura e no universo dos sujeitos da pesquisa. Além disso, a pesquisa participativa
valoriza a experiência profissional tanto dos pesquisadores como pesquisados o que
possibilita aplicação prática da temática investigada.

Portanto, a pesquisa participante é uma pesquisa que o pesquisador entra em contacto com
os pesquisados e interage entre eles. Essa interacção visa resolver problemas encontrados
durante o processo da pesquisa participante. Alguns autores podem considerar a pesquisa
participante como uma busca plena pelo conhecimento. Como objectivo de promover a
participação social para os benefícios dos participantes da investigação. Esse tipo de
pesquisa não possui planificação anterior, essa pesquisa só será construída junto aos
participantes da pesquisa. Só deverá ser auxiliado para escolher as bases teóricas das
pesquisas e na elaboração do cronograma das actividades.

Algumas características são fundamentais para definir uma pesquisa participante. Entre
eles podemos listar o processo de conhecer e agir, o controle da população no processo, o
processo de cunho colectivo entre outras.

2.3. Técnicas de investigação, analise e interpretação de dados

Para poder tratar os dados colhidos, faz-se necessário pautar por certos instrumentos que
permitem a análise e interpretação. Devido a avanços tecnológicos, hoje em dia as ciências
sociais pautam pelo uso de softwares programados simplesmente para o tratamento de
dados de pesquisas sociais, a psicologia comunitária não se exclui desse avanço.

Conforme retratado por GIL (2010), até a segunda metade do século XIX o estudo do
homem e da sociedade esteve com os teólogos e filósofos; e, a partir desse período, com
motivação tanto política quanto pelo avanço tecnológico, os estudos acerca do homem e da
sociedade aproximaram-se do delineamento utilizado nas ciências da natureza. A partir
dessa concepção científica, fundamentada no Positivismo, o conhecimento científico, tanto
da natureza quanto da sociedade, segue um delineamento quantitativo, que é objetivo, que
não pode ser influenciado pelo pesquisador, que repousa na experimentação e que supõe a
existência de leis que determinam a ocorrência dos fatos.

Conquanto, é também retratado por GIL (2010) que esse modelo proposto para as ciências
sociais passou a ser questionado por suas limitações no estudo do homem e da sociedade.
Não obstante, este mesmo autor relata que tal limitação não deve significar a não pretensão
de estudar cientificamente o homem e a sociedade, e sim, reconhecer que os objectos das
ciências humanas e sociais são diferentes dos das ciências físicas e biológicas e identificar
nas primeiras as dificuldades em relação à objectividade, à quantificação, à
experimentação e à generalização.

2.3.1. Softwares de análise e interpretação de dados


(i) Qualiquantisoft

O Qualiquantisoft é um software desenvolvido pelos autores na USP, em parceria com a


Sales & Paschoal Informática, com o objectivo de facilitar a realização de pesquisas
qualiquantitativas nas quais é utilizada a técnica do Discurso do Sujeito Colectivo.

Enquanto recurso de informática foi idealizado com o objectivo maior de servir de


instrumento para que os pesquisadores possam realizar com mais segurança, eficiência e
alcance pesquisas qualitativas que comportem uma massa maior de depoimentos. Pelas
suas peculiaridades, o QualiQuantiSoft representa um avanço importante nas pesquisas
sociais na medida em que permite uma sensível agilização nas tarefas mecânicas da
pesquisa e também porque permite relacionar intimamente as dimensões qualitativa e
quantitativa deste tipo de pesquisa, associando pensamentos, crenças, valores,
representações, às características objectivas dos portadores destas representações, tais
como sexo, idade, grau de instrução, renda entre outros. https://www.scielo.br/scielo.php?
pid=S010407072019000100508&script=sci_arttext&tlng=pt.

(ii) Spss

O Statistical Pacage of the Social Science (SPSS) é um software de analise e interpretacao


de dados mais utilizado em pesquisas sociais. Neste software podem ser analisados dados
de pesquisas qualitativas assim como quantitativas. O SPSS nao so faz analise dos dados
mais tambem dos instrumentos utilizados para recolha dos dados. Neste, ele analisa
aconsistencia interna, a confiabilidade, validade entre outros elementos.

(iii) Atlas.ti

Atlas.ti, que é um programa que facilita a análise de dados qualitativos, os quais são
frequentemente utilizados em pesquisas na área de ciências sociais. O programa facilita a
análise mais sistemática de dados oriundos de discussões feitas em grupos focais,
entrevistas abertas que tenham seguido um roteiro de tópicos e diversos outros tipos de
dados, inclusive os que estão em formato de áudio, figuras e vídeos.
https://brasil.campusvirtualsp.org/node/180896

(iv) Alceste

Alceste é um software de análise de dados textuais ou textual estatístico. O programa


desenvolvido foi concebido originalmente por Max Reinert do Centro nacional de
investigação científica (CNRS) na França no laboratório de Jean-Paul Benzécri. Agora é
colocada no mercado pela sociedade IMAGE. O seu uso foi distribuído na área de ciências
humanas e sociais incluindo os trabalhos da psicologia social desde a década de 1990
dentro do laboratório de psicologia social da l'Ecole des hautes études en sciences sociales.
(CAMARGO, 2015).

(v) Nvivo

O NVivo2 trabalha com o conceito de projecto. As fontes de informação do projeto, assim


como os dados gerados durante o processo de análise, como categorias de informações, são
armazenadas em um banco de dados (BRINGER; JOHNSTON; BRACKNRIDGE,
2006). Um projecto pode ser salvo e armazenado em meios de transporte, como pen-drive
e CD ou, ainda, enviado por e-mail, como qualquer arquivo. O pesquisador pode criar suas
pastas pessoais e estruturar a organização de seus arquivos, que podem ser de diferentes
formatos de texto, imagem ou som.

2.3.2. Grupos Focais

MORGAN (1997) define grupos focais como uma técnica de pesquisa que colecta dados
por meio das interacções grupais ao se discutir um tópico especial sugerido pelo
pesquisador. Como técnica, ocupa uma posição intermediária entre a observação
participante e as entrevistas em profundidade. Pode ser caracterizada também como um
recurso para compreender o processo de construção das percepções, atitudes e
representações sociais de grupos humanos.

2.3.3. Análise de conteúdo

Apesar da definição ampla e dos vários modos de operacionalização, a AC parece estar


associada, entre as pesquisas nacionais, ao modelo proposto por BARDIN (1977/2010).
Segundo a autora, o trabalho da análise de conteúdo se define por regras lógicas de
organização, categorização e tratamento de dados quantitativos ou qualitativos. Tais regras
estão presentes ao longo de um processo de preparação, de elaboração e de relato de
resultados. Bardin refere-se a seis técnicas de AC, a saber: análise categorial, análise de
avaliação, análise de enunciação, análise de expressão, análise das relações e análise do
discurso. Nesse universo, sua aplicação, embora variável, orienta-se por duas premissas: 1)
organização das análises pelas características do material e 2) condução da análise
conforme os objectivos traçados na pesquisa

Considerações finais

A psicologia comunitária compreende uma área da psicologia preocupada em


perceber o comportamento comunitário de indivíduos inseridos em uma sociedade.
Actualmente ela serve para poder resolver os problemas comunitários de natureza
psicológica (pensamento colectivo), dai a necessidade de associar-se a psicologia social.
Nesta ordem, seus procedimentos de pesquisa no campo variam consoante o objectivo,
problemática, condições de natureza social, económica entre outras. Para todos os casos
uma técnica considerada indispensável é observação inerente a pesquisa participante. Isso
porque assim o pesquisador ira vivenciar de perto os pressupostos que norteiam o
problema em causa. Sua recolha de dados pode ser feita sub vários instrumentos. Por fim a
analise e interpretação actualmente é feita mediante certos softwares já programados com
uma vasta gama de janelas que possibilitam várias análises.

Referências bibliográficas

ANDRADE, M. M. de. Introdução à metodologia do trabalho científico: elaboração de


trabalhos na graduação. 4. ed. São Paulo: Atlas, 1999.

BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977.

BRINGER, J. D.; JOHNSTON, L. H.; BRACKNRIDGE, C. H. Using computer-assisted


qualitative data analysis software to develop a grounded theory project. Field Methods, v.
18, n. 3, p. 245-266, 2006.

CAMPOS, Regina Helena de Freitas (orgs). Psicologia Social Comunitária: da


solidariedade á autonomia. 15ª Ed. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2009.
GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2010a.

______. Como elaborar projectos de pesquisa. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2010b.

GÓIS, Cézar Wagner de Lima. Noções de psicologia comunitária, Fortaleza, Edições


UFC, 1993.

GOMES, Antônio Maspoli de Araujo Gomes. Psicologia Comunitária: Uma abordagem


Conceitual. São Paulo, 1999.

MARCONI, M. de A.; LAKATOS, E. M. Fundamentos de metodologia científica. 5. ed.


São Paulo: Atlas, 2003.

MORGAN, D. Focus group as qualitative research. Qualitative Research Methods Series.


16. London: Sage Publications . 1997.

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