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CURSO
l c
7 O Canto Novo
de uma Raça
Pré-Modernismo e Modernismo
Raymundo Netto

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Realização
Passando a régua no século XIX, no
Brasil, Canções românticas (1878), de Al-

1.
berto de Oliveira – apesar do título –,
marca o início do Parnasianismo, que
recebeu adesões, como Olavo Bilac, Rai-
mundo Correia, Alberto de Oliveira e Vi-
DO RIGOR cente de Carvalho, embora, numa atitude
irreverente, diz Bilac, que viria a ser o seu
DA DISCIPLINA expoente maior no país: “No Brasil nunca
houve Parnasianismo. O que há entre nós
ÀS VAIAS atualmente é a febre da Perfeição, a bata-
ualquer aluno do en- lha sagrada da Forma, em serviço da Ideia
sino médio em Litera- e da Concepção. [...] Nenhum dos poetas
tura já ouviu falar em da nova geração quer fazer do verso um
Parnasianismo. Possí- instrumento sem vida; nenhum deles quer
vel saber também que transformar a Musa num belo cadáver. O
dois autores franceses, que eles não querem é que a Vênus grega
Théophile Gautier e seja coxa e desajeitada e faça caretas em
Leconte de Lisle, lan- vez de sorrir” (CASTELLO, 1999, v.1, p. 299)
çaram O Parnaso con- O certo é que a estética parnasiana, mes-
temporâneo (1866), uma mo sem adotar a objetividade da escola fran-
antologia de poemas na cesa – o “amordaçamento das emoções”,
qual predominava uma como se refere Ivan Junqueira –, abraçou o
reação antirromântica, ou seja, que procura- cuidado com a criação dos versos perfeitos
va resgatar a visão de arte como sinônimo (gramática e métrica), a manutenção do rit-
de beleza formal alcançada por meio de mo, a escolha intransigente das rimas e o
trabalho cuidadoso e detalhista – comba- olhar voltado para a antiguidade clássica.
tiam o sentimentalismo excessivo dos poe- O Simbolismo, levando em considera-
tas românticos que, criam, haviam abando- ção as obras de Cruz e Sousa de 1893 como
nado os rigores formais na sua composição, marco da escola no país, chegaria apenas
comprometendo a sua qualidade artística. quinze anos depois, com fria recepção do
Alguns desses poetas do “Parnaso” europeu público, ao contrário de sua antecessora.
se destacariam, mais tarde, no Simbolismo. É nesse ponto que Sânzio de Azevedo
nos chama a atenção para uma singula-
Parnaso ridade na historiografia da Literatura Cea-
SABATINA
Montanha grega, rense. No Ceará, o Simbolismo nos chega
morada de Apolo
antes do Parnasianismo, pois como vi-
e das musas
inspiradoras mos no módulo anterior, ele viria no vapor,
dos artistas. Théophile Gautier, além de poeta diretamente de Portugal, com influência de
era um excelente contista, seguidor Antônio Nobre, e não de Cruz e Sousa ou de
de E.T.A Hoffmann. Sua profana “A outros anteriores a ele no Brasil.
morte amorosa” é um dos contos Aqui, ainda no século XIX, quando o
fantásticos mais encontrados em Simbolismo já figurava em, pelo menos, Lí-
antologias do gênero. Gautier vio Barreto (Dolentes) e Lopes Filho (Phan-
afirmava que “a arte não existe para tos), Álvaro Martins publica, em 1903, o
a humanidade, para a sociedade ou soneto “A aranha”, “manifestação verdadei-
para a moral, mas para si mesma”. ramente inaugural da arte marmórea entre

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SABATINA MALACA
Sugestões de leitura: Bilac vê estrelas
CHETAS
(Companha das Letras, 2000), romance
Emílio de Menezes fez publicar, na
de Ruy Castro, misto de ficção e
revista Fon-Fon (RJ), um soneto de
realidade; Roteiro da poesia brasileira:
Júlio Maciel (“Aeternum Vale”), que foi
parnasianismo (Global, 2006) e Alberto
estampado com destaque e em página
de Oliveira (série Essencial da ABL, 2011),
inteira, acompanhado de um bilhete
ambos de Sânzio de Azevedo.”
elogioso do consagrado parnasiano,
que afirmava, a respeito do jovem
poeta cearense: ‘Júlio Maciel, dos
CONFEITOS poetas novos, é, sem contestação,
um dos melhores pela emoção, pelo
contorno do verso e pela justa, sóbria e
Muitos autores apontam Fanfarras
precisa feição de sua vernaculidade.’”
(1882), de Teófilo Dias, como a estreia
(AZEVEDO, 1976, 316)
do Parnasianismo brasileiro. Contudo,
Péricles Eugênio da Silva Ramos,
em sua Poesia simbolista, caracteriza
a obra como precursora não do
Parnasianismo, mas do Simbolismo,
critério também aceito por Sânzio de
Azevedo em sua historiografia.

nós [cearenses]” (AZEVEDO, 1976, p.287).


Entretanto, mesmo com tal aracnídea poe-
sia, de “parnasiano puro” Martins nos deixa-
ria somente este soneto. Entre alguns nomes
do Parnasianismo cearense: Antônio Sales
(especialmente em Poesias e Minha terra),
o pernambucano Alf. Castro (considerado
por Azevedo o iniciador do Parnasianis-
mo no Ceará, principalmente no inédito
Ocaso em fogo), Júlio Maciel (que Azevedo
assim enquadra: “Sua feição definitiva é a de
poeta parnasiano, com notas simbolistas,
mas compôs versos à moda futurista, sob o
pseudônimo de ‘Lúcio Várzea’”), Cruz Filho
(parnasiano, mas com matizes românticos
e simbolistas), Carlos Gondim, Otacílio de
Azevedo (seu poema “Carro de bois” seria
premiado em concurso lançado pela revista
Ilustração Brasileira (RJ) e mereceu desta-
que na História da Literatura Cearense, de
Dolor Barreira) e Mário Linhares.

CURSO literatura cearense 99


A seguir, dois exemplos de sonetos
parnasianos:
Há uma ressurreição no Sertão rudo.
Uma ressurreição! – Verde e risonho MALACA
Aos pinchos, pela sombra, indolente e moroso,
É o vale, verde a serra, é verde tudo
Em que os meus olhos, deslumbrado, ponho. CHETAS
O batráquio estacou do fundo poço à borda,
Bruto alcantil de aspecto mau, desnudo
E um momento quedou, como quem se recorda, Álvaro Martins, o “Alvarins” do Liberta-
Surpreso ante a visão do poço silencioso... Esvão de terra, ríspido e tristonho,
– Agora têm branduras de veludo, dor, é um dos fundadores da Padaria Es-
Ao fundo, onde do céu, que de nuvens se borda, Verdes agora os vejo, como em sonho! piritual e, saindo da primeira, do Centro
Reflexa a imagem vê – pelo céu luminoso Literário. Chegou a publicar no Rio de
Vê da Lua pairar o áureo disco radioso: Em cisma, a sós, contemplo verde liana, janeiro, ao lado de José do Patrocínio.
E o disforme animal de júbilo transborda... Verde, tão verde, com carícia humana
As ruínas afagando a uma tapera.
Sua obra de estreia é Os pescadores da
Um momento quedou, mudo e perplexo. Ao centro Taíba (1895), já no Centro Literário.
A tentá-lo, a ilusão do astro de ouro flutua, E na contemplação que me não cansa,
E o monstro eis que se arroja, a súbitas, lá dentro... Sinto quão doce és tu, cor da Esperança,

E a água convulsionou-se, em círculos ondeantes,


– Até nos olhos de quem nada espera...
Júlio Maciel, “Verde”. BOLACHINHAS
Num naufrágio de luz, em que perece a Lua,
Dissolvida em rubis, topázios e diamantes.
A importância de Alf. Castro reside
Cruz Filho, “A ilusão do sapo”. não somente na qualidade de sua po-
esia, mas também e principalmente no
fato de situar-se no mais genuíno e
puro Parnasianismo, no sentido fran-
cês do termo, o que é raro na literatura
nacional. (AZEVEDO, 1976, 301)

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2.
PRÉ-MODERNISMO
BOLACHINHAS
Leão de Vasconcelos, em 1933,
é apresentado em La Revista
Americana de Buenos Aires como
E A LINHA DO EQUADOR “o renovador do lirismo brasileiro”
e, em 1935, foi eleito, segundo a
Eu sei que tudo é como o fumo leve: Alfredo Bosi, a respeito da questão, em seu Revista Brasileira nº 8, “o maior poeta
Foge: mas, porque a vida seja breve, Pré-Modernismo, admite que o termo pode moço do Brasil”. Seus poemas são
Há sempre um dia mais para quem ama. ser entendido em 2 sentidos que nem sempre traduzidos em diversos países.
Mário da Silveira, em Coroa de rosas e de coincidem: (1) dando ao prefixo “pré” uma
espinhos (1921). conotação meramente temporal de ante-
rioridade; e (2) dando ao mesmo elemento
um sentido forte de precedência temática e
BOLACHINHAS
uita gente discute o que formal em relação à literatura modernista. O termo “Pré-Modernismo” foi criado
afinal é o Pré-Moder- Assim, no Brasil, Euclides da Cunha, pelo crítico Alceu Amoroso Lima
nismo. Eu mesmo sem- Lima Barreto, Monteiro Lobato, Graça (o Tristão de Ataíde), em Contribuição
pre tive a impressão de Aranha, o inclassificável e enigmático fe- à história do Modernismo (1939).
ser “pré” ou “pós”, assim nômeno Augusto dos Anjos, entre outros,
como “para”, algo indefi- foram devidamente enquadrados como
nível, indeterminado, ou “pré-modernistas”. Provavelmente entre 1920 e 1921, es-
mesmo de menor impor- Sânzio de Azevedo, ao referir-se a esta creveu o poema “Laus Purissimae”, “canto-
tância. Ou seja, o que vem “fase de transição” nos apresenta dois re- -novo dedicado ao Mediterrâneo, ‘o grande
“antes” (pré), depois (pós) presentantes: Mário da Silveira (1899- mar sempre novo’, produção que seria uma
ou “ao lado” (para) de. É como a linha imagi- 1921) e Leão de Vasconcelos (1898-1965). antecipação de Raul de Leoni” (ALENCAR,
nária do Equador: concretamente não exis- Deixemos o Leão sossegado e vamos 1984, p.30), composto não somente de ver-
te, mas todo mundo sabe onde fica. fazer um breve comentário sobre o “eter- sos polimétricos, mas de versos livres, ali-
Devido a grandes mudanças sociais da namente jovem” Mário. Pelo que se sabe, nhando-se aos pressupostos modernistas,
época, o foco e os interesses da produção Mário da Silveira, de origem humilde, tinha razão única pela qual figura neste espaço.
literária eram diversos e, por vezes, diver- um excelente cabedal cultural e erudito, Já em Fortaleza, em 1921, em praça públi-
gentes, o que é percebido nas característi- devido à leitura intensa dos clássicos. Pes- ca, é covardemente assassinado. O motivo:
cas estéticas das publicações no período. simista em sua condição de poeta e huma- passional! Amou além da cota. Nas vestes,
E justamente por não existir um critério no, em 1916, publicou No silêncio da noite “não havia única moeda, mas um soneto...”
estético que reúna e defina a produção (fragmentos), dedicado a Carlos Gondim história tantas vezes repetida. A obra Coroa
denominada pré-modernista, nem mes- e Luiz de Castro, que trazia a epígrafe de de rosas e de espinhos seria então publicada
mo que a classifique como escola literária Álvares de Azevedo: “O passado é um tú- por amigos, em tiragem de 500 exemplares,
(reunia realistas, parnasianos, simbolistas mulo”. Em 1919, realizou a conferência “A prefaciada por Antônio Sales.
e algumas antecipações modernistas), al- eterna emotividade helênica”, na Casa de Azevedo, em análise da produção de Sil-
guns autores definem esse “período de Juvenal Galeno – na época, ainda “Salão”. veira, afirma que “como a poesia de Raul de
transição” baseados em um princípio cro- Em breve passagem no Rio de Janeiro, atuou Leoni, a sua é ao mesmo tempo clássica e
nológico. Daí, são consideradas obras pré- como secretário de João do Rio n’A Pátria, renovadora” e “[...] o poeta já começava a li-
-modernistas, aquelas que nos chegaram cultivando amizade com Raul de Leoni (au- bertar-se não somente do metro regular, mas
depois de 1902, data de publicação de Os tor de Luz mediterrânea, de 1921, cuja anto- também do poema polimétrico, por muitos
sertões, de Euclides da Cunha, até 1922, logia de poemas – pela Global/2002 – é pre- erroneamente chamado de poema em verso
ano da Semana de Arte Moderna, marco faciada e organizada pelo cearense Pedro livre. ‘Laus Purissimae’ [...] em seu prenúncio
do Modernismo brasileiro. Lyra) e Ronald de Carvalho. de Modernismo, pende muito mais para

CURSO literatura cearense 101


Polimétricos

BOLACHINHAS Formado por


versos de
várias medidas:
heptassílabos,
Coroa de Rosas e de Espinhos só teria octossílabos,
uma segunda edição quase 90 anos alexandrinos etc.
depois, sob a coordenação do autor
deste fascículo, na época, na Secult/CE. Lastro
Base sólida
que legitima ou
Simbolismo do que para outra qualquer es- autoriza alguma
coisa; fundamento.
tética” (AZEVEDO, 1976, p.369-370).
Talvez a juventude eloquente – morreu
aos 21 anos –, o linguajar e o conhecimen-
to clássico dessem um charme especial
ao rapaz que, ao ser convidado para uma
palestra do Grêmio Literário Paula Ney,
recusou-se, justificando a nocividade
desses grêmios literários, pois que deles
surgiam poetas, comprovando o estado
de sua própria maldição.
Embora a estrutura (forma) do referido Física, a psicanálise, os conflitos entre paí-
poema tenda à renovadora, a temática e os ses, tudo isso e algo mais gerava um turbi-
motivos estão bem distantes do que viria a lhão de novas ideias e uma grande agitação,
ser o lastro dos modernistas puros, diga- especialmente dos grupos denominados
mos assim, nem daqueles do “Sul” nem do vanguardas que, de uma forma ou de ou-
“Norte”, como veremos a seguir. tra, criavam novas referências, renovando o
olhar sobre as linguagens artísticas, muitas
vezes de forma agressiva, desafiadora e/ou

3.
iconoclasta. Ser vanguarda seria antecipar
novos caminhos, prenunciar bases e crité-
rios estéticos para este mundo “em transfor-
mação”. Daí, é nesse contexto que surgiriam
os europeus Futurismo, Dadaísmo, Cubismo,
AVANT-GARDE Expressionismo, Surrealismo e seus respecti-
vos e chocantes manifestos.
MODERNISTA Para resumir o que nos interessa: “A prin-
assagem de séculos. Os no- cipal herança das vanguardas europeias
vos tempos assistiam ao sur- para a Literatura Brasileira [...] é o impulso
gimento de um cenário artísti- de (1) destruir os modelos arcaicos, (2)
co dinâmico, criativo e diverso desafiar o gosto estabelecido e (3) propor
– para alguns, assustador e de um olhar inovador ao mundo” (ABAURRE;
extremo mau-gosto. O avanço PONTARA, 2005, p.504), ou seja, ruptura e
tecnológico (a “Era da Eletrici- transformação seriam as palavras de or-
dade”, o cinema, o telefone, o dem para a fase heroica – como dizia Mário
telégrafo sem fio, o automó- de Andrade – da primeira geração moder-
vel, o avião...), a revolução na nista, que é o objeto deste módulo.

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4.
MODERNISMO
MALACA
CHETAS
Edigar de Alencar (1901-1993), cultor
de vasta obra em diversos gêneros,
NA PENUMBRA desde adolescente frequentou grêmios
stávamos cansados dos parnasia- artísticos e literários e escrevia para
nos brilhantes e bem arrumados, periódicos como A Jandaia, Fênix e
dos versos esculturais e lantejou- Fortaleza. Em 1925, lançou a revista
lantes, de poesia eloquente, cheia literária Fanfarra (propriedade de
de estardalhaço, de cores e luzes. Jorge C. Garcia e Jeová Rosa), que teria
[...] O governo Serpa [Justinia- um projeto gráfico avançado para os
no de] estimulava as atividades poucos recursos que possuía. Em 1926,
mentais, inclusive fazendo reviver embarcou para o Rio de Janeiro, onde
a velha Academia Cearense, por residiria até o fim de sua vida.
tantos anos silente. A fundação de
grêmios literários; as rodinhas de livraria e
as reuniões vesperais no Café Riché (já nos Pregões de vendedores, crepúsculos enevo-
seus últimos meses); as tertúlias improvisa- ados pela neblina. Estaçõezinhas modestas
das do Art-Noveau fronteiro [ambos, frente a de subúrbios. Portões fechados a cadeado,
frente numa das esquinas da praça do Fer- parques desertos, arrabaldes ermos. Elegias
reira]; as perspectivas das festas e comemo- e baladas, mas tudo bem do terra a terra,
rações do Primeiro Centenário da Indepen- do cotidiano humilde de São Paulo, sem
dência, tudo isso contribuía para o clima de imagens atrevidas, sem rutilâncias e sem
efervescência mental, de agitação intelec- delírios. Tudo isso, pela força contrastan-
tual. Havia, na verdade, vibração e até mes- te, comovia a gente moça da Terra do Sol.”
mo alegria naquela quadra ridente e buli- (ALENCAR, 1984, p. 30-31)
çosa da capital cearense. Processava-se um A tela acima, pintada por Edigar de
surto de renovação na vida da cidade com Alencar, sobrinho do poeta, pintor e modi-
pouco mais de 70 mil habitantes. [...] Foi nheiro Raimundo Ramos Filho (1871-1916),
nesse ambiente de calor e exaltação que o o “Ramos Cotoco”, nos mostra uma Fortale-
livro delicado e delicioso de Ribeiro Couto za Belle Époque (1860-1930) – momento de
[refere-se a O jardim das confidências, sua aformoseamento da cidade, do deslumbre
obra de estreia, em 1921] aportou à capital com a sensação cinematográfica de pro-
cearense, acendendo entusiasmos na moci- gresso provinciano – que antecede à Sema-
dade. [...] A temática do poeta santista era na de Arte Moderna de 1922.
outra novidade. Não mais fidalgas e castelãs No mesmo texto em que Edigar expõe o
e sim raparigas doentes de bairros pobres fascínio da mocidade cearense pela poéti-
transformadas pelo poeta em princesinhas ca, denominada penumbrista, de Ribei-
sem coroa. Estudantes enfermos. Lâmpa- ro Couto – que para variar teria entre suas
das morrentes. Alcovas sombrias, quase obras mais conhecidas o romance Cabocla,
solitárias, tresandando a tristeza e remédio. após ser novela de TV –, diz que ela impac-

CURSO literatura cearense 103


SABATINA
A coletânea Os novos do Ceará no
Primeiro Centenário da Independência,
organizada pelo jornalista Aldo Prado,
é a tácita (ou não) manifestação
de protesto de uma nova geração
deixada de fora da coletânea A poesia
cearense no Centenário, organizada
por Sales Campos.

taria alguns jovens poetas e intelectuais dos


meios literários e jornalísticos, membros de
agremiações e comerciários. Entre os poe-
tas, Jáder de Carvalho, Leão de Vascon-
celos e o próprio Edigar de Alencar que,
em 1922, nas coletâneas A poesia cearense
no Centenário e em Os novos do Ceará no
Primeiro Centenário da Independência, pu-
blicariam “manifestações penumbristas”.
E o que seria esse tal penumbrismo,
que não era, sabemos, uma escola literária?
O próprio Couto, em 1957, em carta a Rodri-
go Octávio Filho, diria:
“um certo jeito, um tom, um clima de ex-
pressão poética [...] a incorporação da MALACA
vida vivida, a rua, os quintais, o quarto
do estudante Batista, as pombas voando
CHETAS
quando passa o trem do subúrbio, a mu-
lher do bar (Milonguita), o amigo que em No Ceará desse período, entre os
segredo ama a irmã do amigo e na cara do maiores opositores do penumbrismo
outro revê a amada, o pudor das aspira- e do futurismo, Antônio Sales, o
ções obscuras, a mãe fatigada que espera
o filho boêmio altas horas da noite, o ru-
mesmo da Padaria Espiritual, que
mor de passos na rua deserta, enfim a vida publicaria no Correio do Ceará uma
de toda gente, a dignidade do cotidiano série de poemetos irônicos e críticas
autêntico, natural, humano, sem nenhu- sob o pseudônimo “Artúnio Vales”,
ma ênfase e nenhuma oratória.” o poeta Cruz Filho, Sales Campos,
Referia-se, ao final, à sua oposição ao Leonardo Mota, Antônio Furtado e
Parnasianismo. Elias Malmann, entre outros. Edigar
Com a criação da revista Fanfarra, de For- de Alencar, que escrevia para A
taleza, em 1925, Edigar usaria o veículo para Jandaia, respondia as críticas dos
promover também os versos de influência ri- desafetos com outras, sob a máscara
beirocoutiana, assim como poesias “à feição dos pseudônimos “Zefo Turista” e
de Guilherme de Almeida”, referindo-se aqui “Melpiche da Noite”.
ao livro Raça, do poeta, publicado em 1925.

104 FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE


Passada a fase de alvoroço, provocado pela
Semana de Arte Moderna, começou-se a
formar uma lenta consciência do Movi-
mento. O impacto de ideias de vanguarda
lançou os intelectuais em posições novas.
Consequentemente, verificou-se, em vá-
rios setores, um abandono gradativo dos
princípios, que sujeitavam letras e artes aos
moldes formais da época. Iniciou-se um ci-
clo diferente para a conquista da expressão
própria, em ruptura com o conformismo
acadêmico. A evolução era inevitável. Com
ela, desenvolveram-se formas embrionárias
de um Renascimento brasileiro. Um espíri-
to jovem alastrou-se, com entusiasmo, por
vários recantos do país, sob o impulso de
ritmos construtivos. Foi um ponto de partida

5.
para escritores e artistas irem se buscando,
aos poucos, com uma nova compreensão
do momento. Embora não tivesse exercido
uma influência imediata, o Movimento for-
mou, gradualmente, e com um alcance cole-
E O MODERNISMO tivo, um conjunto de ideias básicas, coeren-
tes com a realidade brasileira” (BOPP, 2012).
FOI? NÃO FOI? Observamos que esse movimento inspi-
ão nos deteremos no que rado pelas ideias europeias e que queria, 100
vastamente encontra- anos depois, proclamar a sua “independên-
mos nos compêndios de cia” dos valores estrangeiros – aparente con-
Literatura Brasileira, que tradição – faria uma forte campanha, espe-
afirmam ser esta primei- cialmente por meio de artigos em jornais
ra geração, a do “espírito (tinham bastante acesso a eles), lançamen-
destruidor” do Modernis- to de revistas e manifestos – entre eles,
mo, a eclodir nos salões em 1928, o “Manifesto da Antropofagia”, que
do Teatro Municipal de mais impactaria no Ceará –, além de excur-
São Paulo, apoiada con- sões de militantes, como Raul Bopp e Gui-
fortável, econômica e so- lherme de Almeida, aos demais estados.
cialmente pela elite paulista: a Semana de Guilherme de Almeida (1890-1969), um
Arte Moderna de 1922. dos “semanistas” e maiores divulgadores do
Mas, vá lá, onde é que nós entramos nis- Modernismo, e que viria a ser, anos depois, o
so? Pois bem, o escritor gaúcho Raul Bopp primeiro modernista a ingressar na Aca-
(1898-1984), que jovem já havia fundado demia Brasileira de letras, em 1925, percor-
periódicos no Rio Grande do Sul, não esta- reu algumas capitais brasileiras, como Porto
va em São Paulo durante a Semana – que Alegre, Recife e Fortaleza, em conferência,
ele denominava “reação modernista” ou a princípio, a convite do jornalista, escritor
“insurreição literária de 22” –, mas no Rio e advogado pernambucano Joaquim Ino-
de Janeiro, o que fez com que acompa- josa, principal divulgador do Modernismo
nhasse os seus acontecimentos a distância, – dizia-se “Futurismo” – nas terras nordes-
assim como também nos seus reflexos em tinas. Inojosa conta que após o seu primei-
outros estados brasileiros. Conta-nos: ro encontro com os “semanistas”, recebeu

CURSO literatura cearense 105


“luvas para desafio: livros e exemplares da registrou o poeta Filgueiras Lima), era edita-
Klaxon – a senha da renovação” (INOJOSA, BOLACHINHAS do, pela Tipografia Urânia, a mesma que iria
editar, em 1930, O quinze, de Rachel de Quei-
1969, P.44). Neroaldo Pontes de Azevedo diz
roz, O Canto novo da raça, um livrinho mais
que após esse encontro “seu comportamen- horizontal do que vertical, sem numeração
Mesmo sendo considerada marco do
to é o de um convertido, logo ungido após- nas suas 40 páginas. Tinha nada menos do
modernismo cearense, a segunda
tolo, predestinado a pregar entre os ‘gentios’ que quatro autores: Jáder de Carvalho,
edição de O canto novo da raça só seria Sidney Netto, Franklin Nascimento e Mo-
a mensagem do ‘credo novo’” (AZEVEDO,
lançada 83 anos depois, organizada zart Firmeza (Pereira Júnior). Na capa, a
1996, p.42). Havia publicado em outubro de
por Raymundo Netto e publicada pela dedicatória, não a Guilherme de Almeida, o
1922, em A Tarde, o artigo “Que é Futurismo”,
Secretaria da Cultura do Estado do arauto paulista da nova estética, mas a um
iniciando a grande peleja “passadistas versus poeta do Rio de Janeiro: ‘Homenagem a Ro-
Ceará, gestão do prof. Auto Filho, com
futuristas”, frequente até 1924. Como veículo nald de Carvalho’” (AZEVEDO, 2012).
apresentação de Sânzio de Azevedo,
de divulgação da nova corrente, utilizava a Baseado em outra afirmativa de Azevedo
ilustrações de Audifax Rios e acréscimo
revista Mauriceia, por ele dirigida, conflitando – “ o Modernismo na terra de Alencar, apesar
da “Biografia Perdida” de Franklin
com o Centro Regionalista do Nordeste e de precedido por notas de surdina penum-
Nascimento, por Raymundo Netto.
os seus defensores. Mais tarde, em 1924, pu- brista, vai explodir mesmo é em clangores de
blicaria também a plaquete A Arte Moderna, forte telurismo” – sendo Jáder de Carva-
que, acredita Neroaldo, seria a responsável restringir-se. Por esse modo o Nordeste
lho o mais telúrico dos autores da obra.
em divulgar o modernismo no Nordeste, absorvia o movimento moderno no que ele
Em “Modernismo”, um de seus poemas
além de propagar o que se passava no Norte- tinha de mais sério. Queríamos ser do Brasil
do livro, um exemplo de “poema-piada”:
-Nordeste para os demais estados brasileiros. sendo cada vez mais da Paraíba, do Reci-
Em Recife, em 1925, em sua conferência, fe, de Alagoas, do Ceará” (REGO, 1957, p.50). Teu cabelo à Rodolfo,
Almeida se contrapunha ao regionalismo, Percebemos que esses embates entre as tuas olheiras românticas,
realidades do Sul-Sudeste e do Norte-Nordes- teus quadris inquietos e atordoadores
provocando o seu maior defensor, o escri-
teus seios bico-de-pássaro
tor, jornalista, ensaísta e sociólogo Gilberto te, além da temática regionalista, não é de hoje. – dão-me a ideia cabal deste século ultra-
Freyre (1900-1987), que publicaria, em re- O fato é que Guilherme de Almeida veio -chique.
presália ao “Almeida crítico” – pois o “Almei- a Fortaleza e foi acolhido pelo jornalista Gil-
berto Câmara em sua casa, na rua da Escadi- Ontem, quando deixavas o cinema.
da poeta” tinha seu valor –, no Diário de Per-
– o colo nu,
nambuco, o artigo “A Propósito de Guilherme nha, hoje Travessa Baturité, sede da Casa de
os braços nus,
de Almeida”, no qual dizia que o conceito Cultura Christiano Câmara, a mesma que a perna escandalosamente nua,
de tradição do poeta era o de um “tristonho abrigaria mais tarde o escultor paulista Hum- eu tive a súbita impressão de que,
peso-morto”, e que ele não distinguia “o re- berto Cozzo, responsável pelo monumento na bolsa de ouro a te pender da mão,
gionalismo à Jeca Tatu, caricaturesco e arre- de Centenário de José de Alencar (1929), que vinha, (de precavida que és!)
– o teu vestido.
vesado, do regionalismo que é apenas uma é, de acordo com o artista plástico Roberto
forma mais direta, mais sincera, mais prática, Galvão, “marco simbólico embrionário das (Jáder de Carvalho, 1927)
mais viva de ser brasileiro.” novas manifestações plásticas em Fortaleza”.
Também o paraibano José Lins do Proferiu sua palestra “A revelação do
Rego (1901-1957), que acreditava que o Brasil pela poesia moderna” no Theatro
bom romancista é aquele que consegue José de Alencar, publicada na íntegra pela
conferir universalidade à sua terra, e Ceará Illustrado, revista criada em 1924, sob
que combatia o ideário da Semana da Arte a direção do jornalista e poeta baiano De- Poema-Piada
Moderna, negando-a enquanto “expres- mócrito Rocha (1888-1943). Textos curtos que
são centralizadora de um movimento Sobre a influência dessa visita, diz Sân- desencadeiam efeitos
de âmbito nacional” (CHAGURI, 2008), zio de Azevedo: humorísticos por meio
de trocadilhos ou jogos
comenta que o principal objetivo do regio- Tenha ou não a pregação de Guilherme de verbais. Muito utilizado
nalismo nordestino era “transformar o chão Almeida repercutido na intelectualidade entre modernistas,
do Nordeste: de Pernambuco, num pedaço cearense, o certo é que dois anos depois, em especialmente por
1927 (e não 1928, como equivocadamente
de mundo. Era expandir-se ao invés de Oswald de Andrade.

106 FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE


SABATINA Sidney Netto, embora tenha um papel
destacado no Modernismo cearense, seus MALACA
Guilherme de Almeida é um dos
poemas guardavam mais “traços românti-
cos e simbolistas”.
CHETAS
fundadores da revista Klaxon (também Franklin Nascimento, em sua produ-
ção, se localiza bem em sua época, citando (1) Jáder de Carvalho é um dos
dos anúncios da “Lacta”), criador do
o maxixe e o charleston, lutas de classe – era maiores poetas de sua geração e um
projeto gráfico de sua capa e da capa
admirador ferrenho de Luís Carlos Prestes dos nomes mais lembrados e estudados
da primeira edição de Pauliceia des-
– (“à noveau-riche”, “cantarolava a Interna- atualmente. Fundou jornais, publicou
vairada, de Mário de Andrade.
cional!”), os avanços tecnológicos e a ins- poemas, ensaios e romances; (2)
piração de um Manifesto Futurista – na sua Sidney Netto publicou ainda muitos
ligação com a velocidade e automóveis (“mil livros, mesmo quando imerso em sua
fios elétricos”,“com teus autos chispantes, boemia; (3) Franklin Nascimento,
senhoris, de mistura/com fordzinhos pernal- apesar de ter poemas publicados
tas”, “bombas de gasolina”, “antenas de tua em vários periódicos locais e até em
primeira estação radiográfica”, “à luz dessas outros estados, como a Revista de
minúsculas lâmpadas ½ watt”, “moléculas Antropofagia, após o casamento, em
de aço da machino-factura”, entre outros. 1933, afastou-se do meio literário; (4)
Sem dúvida, “Em louvor da princesa do ver- Mozart Firmeza publicaria ainda livros
de mar...” é a sua melhor contribuição à obra. de crônicas e poesia. No Rio, cursou
Mozart Firmeza (Pereira Júnior), um Escola de Belas-Artes. Mais tarde,
dos autores, tem uma particularidade: além atuaria em jornais como crítico de arte.
de escritor, era pintor – e irmão de pintor,
no caso, de Nilo Firmeza, o “Estrigas”. Escre-
via “Mozart Firmeza”; pintava o seu pseudô- BOLACHINHAS
nimo “Pereira Júnior”.
Sânzio de Azevedo detecta nos poemas Em 26 de abril de 1928, o jornal O
de Firmeza, além da preocupação social, a POVO anunciava: “Na vitrine da Casa
dicção mais próxima do penumbrismo. Almeida, acha-se em exposição uma
Como todos os bons modernistas da- original tela a óleo de Pereira Júnior,
quele período, ou mesmo em um futuro, em que o apreciado artista retrata o
seja no Ceará ou em qualquer outra parte nosso colega de imprensa Mozart
do país, percebemos uma pluralidade de Firmeza – que não é outro senão
orientações e mesmo de contradições, o próprio Pereira Junior. O referido
alguns com maior “pureza modernista” ou trabalho prima pelo exotismo com que
que ainda trariam notas neoparnasianas, foram lançadas as tintas em chocante
pós-simbolistas, em resumo, “passadistas”. disposição futurista, pouco conheci-
Bom mesmo e necessário para um estudo da em nossa capital” (GALVÃO, 2008).
crítico e reflexivo em literatura é mergulhar
na obra, nadar na onda desses versos que
engatinhavam naquela que nos chegava em O
canto novo da raça, que, como aponta Azeve-
do, “é o legítimo iniciador do Modernismo
no Ceará” e, assim, tornando-se, como obser-
va Assis Brasil, “um dos primeiros estados a
tomar conhecimento da Semana de Arte Mo-
derna de 22, deflagrada em São Paulo”.

CURSO literatura cearense 107


6. BOLACHINHAS
de Queluz”, e a inseriu em seu jornal, assim
como fez com o jovem Paulo Sarasate,
que viria a ser seu braço direito para tudo –
e futuramente, seu genro. Conta Rachel de Queiroz de seu primeiro
MARACAJÁ NÃO Daí, Sânzio de Azevedo nos dizer que
“Percorrendo-se as páginas d’O POVO de
encontro com o diretor literário d’O
Ceará: “Demócrito, que já era a esse
É PARA TODO 1928 e 1929 [os dois primeiros anos do pe-
riódico], veem-se desfilar os nomes dos
tempo o padrinho, o irmão mais
velho, o companheiro diário e o crítico
MUNDO, NÃO! mais destacados poetas [cearenses] do mo- condescendente de quase todos os
O modernismo que eu entendo é esse vimento na época: Mário de Andrade (do aprendizes de literatura e de jornalismo,
que nós fazemos: modernismo nacional, Norte), Filgueiras Lima, Edigar de Alencar, em Fortaleza – também me agregou
saturado de tudo quanto é nosso, original,
Heitor Marçal, Sidney Netto, Rachel de Quei- à sua comunidade de discípulos,
roz, Mozart Firmeza (Pereira Júnior), Franklin imediatamente após essa apresentação”.
sugestivo, impressionante... Querem saber?
Nascimento, Jáder de Carvalho, Martins
Se eu continuasse a dizer o que penso do
d’Alvarez, Silveira Filho, Lúcio Várzea (pseu-
modernismo não acabaria mais...
dônimo de Júlio Maciel) e tantos outros servirem de meio de divulgação da pro-
Demócrito Rocha, O POVO vanguardistas de então.” Entre esses nomes, dução literária e artística de seus colabo-
(13 de junho de 1929). havia outro, o de “Antônio Garrido”, na ver- radores. Elas demarcavam um espaço
dade o pseudônimo de Demócrito, que não privilegiado de sociabilidade entre os
m 7 de janeiro de 1928, o baiano assinava poesia com seu nome oficial. jovens renovadores da arte, legitimando
Demócrito Rocha, ex-diretor li- Ainda em 1928, em O POVO, a estreia a coautoralidade, o coletivo, facilitando o
terário d’O Ceará, após uma surra da seção “Modernistas e Passadistas”, para livre trânsito de suas ideias.
de policiais no centro da cidade, a não sarapantar ninguém, provavelmente Não é de estranhar que diante da efer-
mando do govenador que estava a exemplo de Inojosa – “Passadistas versus vescência cultural (usando um termo bem
bastante impressionado com a sin- Futuristas” – que existiu de 1922 a 1924. Na passadista), do interesse de tantos e da
ceridade do jornalista, decidiu fun- coluna, também modernistas de outros cen- agitação da Antropofagia – que em maio
dar o seu próprio jornal: O POVO. tros, como Guilherme de Almeida, Ascenso de 1928 havia lançado a sua revista, em “1ª
O periódico é hoje o mais antigo Ferreira (muito festejado no Ceará), Ronald dentição” –, Demócrito não viesse com o
em exercício no Ceará, sendo nele de Carvalho, Pagu, Álvaro Moreyra, Jorge de empreendimento de sua própria revista
encartados os fascículos de nosso “curso- Lima, Cassiano Ricardo, Jacó Pim Pim (pseu- modernista. E assim sairia de um forno
-movimento” Literatura Cearense. dônimo de Raul Bopp), Abguar Bastos, Mário (não de Padaria), em 7 de abril de 1929, um
Vamos agora explicar o porquê de o poeta de Andrade, Ribeiro Couto, entre outros. domingo, o suplemento literário Maracajá:
Filgueiras Lima afirmar ser esse jornalista “a Na obra O Modernismo na poesia cearen- folha modernista do Ceará, em referência ao
coluna mestra do Modernismo no Ceará”. se: primeiros tempos, Azevedo traz conside- felídeo encontrado com mais frequência na
Demócrito, como falamos anteriormen- rações sobre alguns autores que figuravam região Amazônica e cujo nome é originário
te, havia criado a Revista Illustrada, a mes- na coluna e destacava Heitor Marçal como da língua tupi. Na primeira página, a mar-
ma que o próprio editor distribuía pessoal- o mais comprometido com o Modernismo, ca produzida a partir do clichê em madeira
mente nas praças e cafés e que divulgou e “notadamente a vertente regionalista”. de umburana de juazeiro feito pelo artista
contribuiu na promoção da excursão de Nasciam e morriam várias revistas que R. Moreira. A sua redação ficaria a cargo de
Guilherme de Almeida em Fortaleza. Como propagavam a bandeira modernista – mes- Antônio Garrido (Demócrito), Paulo Sara-
jornalista atento e telegrafista, acompa- mo quando ainda traziam contribuições sate e Mário de Andrade (do Norte).
nhava os movimentos que aconteciam não de “cunho tradicional” –, como a Klaxon E é Sarasate que nos revela a origem do
somente nos estados do “Sul” do país, mas (1922-1923), Belém Nova (1923-1929), Es- título da revista: “Maracajá, cujo nome de-
nos vizinhos do Siará Grande. Era também tética (1924-1925), Terra Roxa e Outras Ter- sentranhei das matas nordestinas, com ple-
poeta, amava a literatura, um ser gregário, ras (1926), Verde (1927-1928), Festa (1927- no assentimento de Demócrito Rocha, para
criador do banco da Opinião Pública. 1928 – 1ª fase), A Revista (1925-1926)... Elas com ele batizar a publicação modernista do
Havia descoberto o talento de Rachel de papocavam de todos os cantos do país e Ceará. [...] Com a minha cooperação, a de
Queiroz, quando ainda adolescente “Rita tinham objetivos maiores do que apenas Mário de Andrade (do Norte) – inteligência

108 FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE


vivíssima, capaz de largos voos e toda sorte
de aventuras nos horizontes do pensamen-
abrangendo sobremaneira as demais ar-
tes. Haveria então um segundo movimento, SABATINA
to – Demócrito Rocha, instituindo Maraca- também na década de 1940, que coincidiria
já, teve o mérito de sacudir, através do ‘gato e, em nosso caso, até se emparelharia como Em 1921, enquanto víamos
bravio’, o ambiente literário local, impulsio- um “despertar das artes”. Mas esta é uma modernistas que divulgavam o
nando com maiores energias o movimento história CLÃdestina, que fica para o próximo Futurismo, por outro lado, os
que, em 1928, atingira o seu clímax no Rio módulo. Continuemos! regionalistas defendiam uma nova
e em São Paulo e já se refletia no país. [...] Rachel de Queiroz, uma das colabora- escrita, uma nova sensibilidade
Foi um marco notável, que os intelectuais doras da revista – que se lançaria ao mundo, estética – que não desconsiderava a
do Sul saudaram com entusiasmo, mas não posteriormente, como uma de nossas maio- tradição – com o olhar voltado para o
passou disso” (SARASATE, 1968). res romancistas –, relatou: “Destinava-se o nacional, tanto quanto para o regional.
E haveria algum modelo em especial, al- Maracajá a pregar o modernismo pelas terras
guma outra revista além das citadas que os nordestinas, e nele todos nós desferimos
influenciasse nessa decisão? Sim, pelo que voo [...] Sei que tivemos a glória insigne de
vimos, não pensar em publicar uma é nos ver lidos e comentados por alguns dos
que seria difícil, mas para baldear o core- grandes do Rio e São Paulo, para nós, então,
to, trazemos essa informação do nosso Má- as duas metades inacessíveis do Paraíso.”
rio de Andrade, que, em Cipó de Fogo, em
1931, publicaria sua carta a Teodoro Cabral,
explicando: “O nosso primeiro movimento,
com Maracajá, foi um avanço para a derru-
bada. Nós vivíamos, da Bahia ao Amazonas,
sem um surto de progresso mental, no ter-
reno literário. Na poesia, de um modo par-
ticular, santo Deus! Ainda se perpetravam
sonetos! Arco & Flexa, em São Salvador, foi,
se não me engano, a nossa principal su-
gestão. Quando nos veio Arco & Flexa, Ma-
racajá se fez. Este, o primeiro movimento”.
E por falar em Salvador, adiantamos
que, da mesma forma que lá aconteceu,
no Ceará o primeiro movimento modernis-
ta surgiu em torno da literatura local, não

SABATINA
A revista baiana Arco & Flexa teve
rápida duração (1928-1929). Seu
diretor era Pinto de Aguiar e a
redação era na casa do diretor.
As edições variavam entre 66 a 77
páginas. A escolha do título, claro,
afirmava um caráter de nacionalismo
brasileiro: o índio, sempre ele. Um
de seus maiores e mais articulados
colaboradores foi Carlos Chiacchio.
Não temos dúvida de que o espírito da Um dos periódicos nos quais mais per-
BOLACHINHAS turma da Maracajá seria o mesmo prati- cebemos esse movimento é o A Manhã (RJ).
cado pela Padaria Espiritual e, mais tarde, Inclusive é nele que encontramos a carta que
Raul Bopp seria o responsável pela pelo grupo CLÃ: apresentar a produção li- Antônio Sales – reconhecido articulador e
sugestão do título “Abaporu” (antropó- terária do Ceará para todo o Brasil e até “mestre-sala” da literatura cearense – envia
fago) à obra de Tarsila do Amaral e pelo ao exterior. Por vezes, até com os mesmos a Raul Bopp, pedindo para não ser mais in-
apelido “Pagu”, pelo qual se tornaria exageros ou utilizando o tom gracejador termediador dos recados entre os “antropo-
conhecida a jornalista Patrícia Galvão, dos “tempos heroicos”, como esse texto de fagistas paulistas” e os “canibais cearenses”,
a “musa dos modernistas”. Carlos “Garrido” em Maracajá nº 2: e que se entendessem diretamente com eles,
Drummond de Andrade dizia ser Cobra “cuja fera simbólica, o Maracajá, tem sua
O primeiro número de Maracajá foi espalha-
Norato (1931) “possivelmente o mais do por todo o globo e até por fora do referi-
toca na redação d’O POVO, à rua Barão do
brasileiro de todos os poemas brasilei- do asteroide. A esta hora, qualquer habitan- Rio Branco, 239. E abro os braços com o de-
ros, escritos em qualquer tempo.” te de Marte já estará fazendo antropofagia. sejo de abraçá-los, mas realmente para não
Vocês lá do Sul que escreveram sobre o ser engolido”. Esse mesmo texto seria publi-
gato selvagem do Nordeste, toquem nos cado no Diário de S. Paulo, quando acolhia a
ossos. Isso!
2ª dentição da Revista da Antropofagia.
Nós estamos ligados por um sentimento
único – o da voracidade. Sim, Raul Bopp, autor de Cobra Norato,
Juntemo-nos para comer tudo o que deva seria uma espécie de “embaixador do Mo-
ser comido no Brasil. dernismo de lá” por aqui, assim como em
Demócrito Rocha (assinando “Antônio Gar- outros estados. Ele mesmo explica a sua
rido”) Maracajá nº 2, em 20 de maio de 1929. atuação na época:

De fato, em nossas pesquisas, encontra- A minha participação, foi mais no sentido de


mos várias citações, artigos, notas sobre o divulgação da revista [da Antropofagia],
de estabelecer contatos, solicitar matérias,
lançamento da Maracajá cearense: O Globo colaborações, realizar um trabalho editorial.
(RJ), Correio Paulistano (SP), Diário Carioca A revista era uma espécie de cartão de visita
(RJ), Diário de S. Paulo (SP), Diário da Tarde para todo o intelectual do Brasil. Era uma coi-
(PR), Diário de Notícias (RS), Movimento Bra- sa nova, moderna, radical, ousada, diferente
sileiro (RJ), O Jornal (RJ), Revista da Antropo- do que se publicava na época. Nosso público
era muito restrito e contávamos ainda com
fagia (SP), entre outros.
problemas de distribuição. (BOPP, 2012)

Bopp enviaria uma carta para Heitor


Marçal sobre o “movimento renovador”,
anunciando: “O Maracajá foi um dia de festa
por aqui [Rio de Janeiro e São Paulo]. Man-
da coisas do Garrido, do Mário de lá, para
correr uma carreira com o daqui. Turf. E o
Franklin Nascimento? Mande prosa. Prosa

110 FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE


BOLACHINHAS Acreditem: a Maracajá, mesmo com todo
esse alvoroço, em um ano que a Bolsa de Va-
BIBLIOGRAFIA
lores “crackou”, resultando na crise econômi- ABAURRE, M.L.M; PONTARA, M. Literatura
Brasileira: tempos, leitores e leituras.
Em 17 de agosto de 1929, O POVO ca mundial, e sendo o papel jornal calibrado São Paulo: Moderna, 2006.
anunciava uma edição especial de pelo dólar, “guardou as garras” ainda na se-
ALENCAR, Edigar de. Variações em tom
Maracajá. Nessa edição, os modernistas gunda edição, de 26 de maio de 1929. menor: letras cearenses. Fortaleza,
escreveriam poemas em homenagem às Provavelmente inconformados com esse Edições UFC-Proed, 1984.
misses eleitas no concurso do Gazeta de fim, alguns dos colaboradores da Maracajá AZEVEDO, Sânzio de. Aspectos da
Notícias. Além dos poemas, a edição se- decidiriam resistir criando um novo veículo: Literatura Cearense. Fortaleza: Edições
ria enriquecida por clichês com imagens O Cipó de Fogo, lançado independente- UFC-Proed, 1982.
das senhorinhas participantes do torneio mente de qualquer jornal, em 27 de setem- AZEVEDO, Sânzio de. Literatura
Cearense. Fortaleza: ACL, 1976.
de beleza. A 3ª edição da Maracajá não bro de 1931, com direção “por enquanto e
saiu, mas a ideia de Mário de Andrade se para efeitos gerais” de Mário de Andrade AZEVEDO, Sânzio de. O Modernismo na
Poesia Cearense: primeiros tempos. 2ª ed.
concretizou em outro veículo. – assinando sem o habitual (do Norte) – e Fortaleza: Edições Demócrito Rocha, 2012.
anunciando: “Cipó de Fogo circula em todo
AZEVEDO, Sânzio de. Roteiro da poesia
mundo civilizado, consequentemente será brasileira: parnasianismo. São Paulo:
irreverente, Pau. Isso agora é uma espécie pouco lido no Ceará”. Global, 2006.
de termidor antropofágico. Pau em tudo, na O periódico, cuja linha de frente trazia, BOPP, Raul. Movimentos modernistas
alta burguesia das letras. [...] A gente aqui além de Mário, João Jacques e Heitor Mar- no Brasil (1922-1928). Rio de Janeiro:
não conhece nada do Norte.” (Maracajá nº 2) çal, e que garantia ter a colaboração de to- José Olympio, 2012.
E assim, Bopp, que assinaria em algu- dos os modernistas cearenses, sem exceção, BOPP, Raul. Vida e morte da
mas revistas sob pseudônimo “Jacó Pim só chegou a ter o primeiro número, pro- Antropofagia. 2ª ed. Rio de Janeiro: José
Olympio, 2012.
Pim”, entre todos os modernistas, foi o que vavelmente por “caquexia pecuniária”, como
CARVALHO, J; SIDNEY NETTO; FIRMEZA,
mais teve relações com os modernis- tantos até hoje. Mário, em alguns anos, seria
M; NASCIMENTO, F. O canto novo da
tas de cá, publicando inclusive no jornal O um dos maiores incentivadores da criação raça. Fortaleza: Secult/CE, 2010.
POVO (não necessariamente literatura) e em do movimento que resultaria no CLÃ. CASTELLO, José A. A Literatura
Maracajá, correspondendo-se com a reda- Brasileira: origens e unidades. São
ção por anos, mesmo quando fora do país, Paulo: Edusp, 1999.
além de angariar contribuições cearenses
e publicá-las na Revista da Antropofagia, e,
CONCLUSÃO CHAGURI, Mariana Miggiolaro. O Recife
dos Anos 20: regionalismo, modernismo
possivelmente, entre outros periódicos. Isso, Você, caro(a) cursista, deve estar sentindo a e José Lins do Rego. In: 32º Encontro
falta de comentários sobre o conteúdo des- Anual da Anpocs, Caxambu, Minas
a distância, pois só esteve no Ceará em 2 Gerais, 2008.
momentos. O primeiro em 1921, quando ses dois periódicos, Maracajá e Cipó de Fogo.
COLARES, O. Lembrados e esquecidos IV:
não tinha contato com nenhum deles, e, ra- Curioso(a), quer saber quem colaborou nes- ensaios sobre literatura cearense. Fortaleza:
pidamente, em 22 de junho de 1931, ou seja, sas raras edições e o que escreveu, como es- Imprensa Universitária do Ceará, 1979.
dois anos após o fim da revista cearense, creveu... Não é verdade? Isso nos deixa mui- GALVÃO, Roberto. A Escola Invisível:
em almoço no restaurante Beira-Mar, “cerca- to felizes, mas o espaço é curto e mais feliz artes plásticas em Fortaleza (1928-1958).
do de bons amigos da turma de Maracajá”. ainda você ficará ao saber que poderá matar a Fortaleza: Quadricolor Editora, 2008.
Irônico é que, enquanto a Agência de No- sua curiosidade diretamente na FONTE. Sim, INOJOSA, Joaquim. O movimento
na Biblioteca Virtual do AVA, você poderá modernista em Pernambuco. Vol. 1. Rio
tícias do poeta cearense Américo Facó, para
de Janeiro: Gráfica Guanabara, 1969.
quem Raul Bopp trabalhava, era uma espécie lê-los e relê-los, analisá-los, do jeitinho que sa-
íram e com o mesmo impacto dos leitores dos REGO, José Lins do. Presença do
de central que reunia os intelectuais antropó- Nordeste na Literatura Brasileira. Rio
fagos, como Oswald de Andrade a proclamar a anos 29 e 31. Já pensou? Fica com a gente! de Janeiro: MEC, 1957.
sua revolução caraíba – “Tupi or not tupi thats “Negrada do Maracajá, [...] Vocês são uns SARASATE, Paulo. O Rio Jaguaribe é
is the question” –, no Ceará, era na redação de bichos! Publicar uma folha modernista uma Artéria Aberta. Fortaleza: Livraria
O POVO que nossos modernistas se vestiam nesse Ceará mole e bambo é coragem Freitas Bastos, 1968.
em cocares, se armavam de maracás e plane- como todos os diachos”. Edigar de Alen- SILVEIRA, Mário da. Coroa de rosas e de
javam mudar o mundo. Em especial: Paulo car, O POVO (20.5.1929). espinhos. Fortaleza: Secult/CE, 2010.
Sarasate e Mário de Andrade (do Norte).

CURSO literatura cearense 111


AUTOR
Este curso é parte integrante do programa
Circuito de Artes e Juventudes 2019, Pronac nº 190198,
processo nº 01400.000464/2019-94, em parceria com a
Raymundo Netto Secretaria Especial da Cultura do Ministério da Cidadania.

É jornalista, escritor, editor e produtor cultural. FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA (FDR)


Autor de obras literárias premiadas em diversos João Dummar Neto Presidente
gêneros. É cronista convidado do caderno André Avelino de Azevedo Diretor Administrativo-Financeiro
“Vida & Arte” do jornal O POVO desde 2007. Marcos Tardin Gerente Geral
Raymundo Netto Gerente Editorial e de Projetos
Foi coeditor das revistas CAOS Portátil, 
Aurelino Freitas, Emanuela Fernandes
Para Mamíferos e curador da Maracajá (2019). e Fabrícia Góis Analistas de Projetos
Atuou como coordenador de Políticas do Livro
UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE (UANE)
e de Acervos da Secult/CE, responsável pela curadoria Viviane Pereira Gerente Pedagógica
e edição das suas coleções (2008-2011) – compostas, Marisa Ferreira Coordenadora de Cursos
especialmente, por obras esgotadas ou inéditas Joel Bruno Designer Educacional
da Literatura Cearense –, curador da IX Bienal CURSO LITERATURA CEARENSE
Internacional do Livro do Ceará, redator e elaborador Raymundo Netto Coordenador Geral,
do Prêmio Literário para Autor(a) Cearense Editorial e Estabelecimento de Texto
e um dos coordenadores da I Feira do Livro do Ceará Lílian Martins Coordenadora de Conteúdo
Emanuela Fernandes Assistente Editorial
em Cabo Verde. Coordena e executa diversos projetos
Amaurício Cortez Editor de Design e Projeto Gráfico
na área da educação e cultura e é gerente editorial Miqueias Mesquita Diagramador
e de projetos da Fundação Demócrito Rocha. Carlus Campos Ilustrador
Mantém o blog AlmanaCULTURA desde 2009. Luísa Duavy Produtora

ISBN: 978-65-86094-22-0 (Coleção)

ILUSTRADOR
ISBN: 978-65-86094-18-3 (Fascículo 7)

Carlus Campos
Artista gráfico, pintor e gravador, começou a carreira
em 1987 como ilustrador no jornal O POVO. Na
construção do seu trabalho, aborda várias técnicas
como: xilogravura, pintura, infogravura, aquarelas
Todos os direitos desta edição reservados à:
e desenho. Ilustrou revistas nacionais importantes Fundação Demócrito Rocha
como a Caros Amigos e a Bravo. Dentro da produção Av. Aguanambi, 282/A - Joaquim Távora
gráfica ganhou prêmios em salões de Recife, CEP: 60.055-402 - Fortaleza-Ceará
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