Ufop Materia
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31 de julho de 2017
Sumário
1. Representação Numérica 3
1.1. Sistemas Numéricos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4
1.2. Conversão entre bases . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
1.3. Conjunto de Cantor e a Base Ternária . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
1.4. Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10
3. Divisibilidade 22
3.1. Critérios de divisibilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
3.2. Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
3.3. Decomposição em primos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32
3.4. Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
3.5. MDC e MMC . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
3.6. Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45
4. Equações Diofantinas 47
4.1. Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50
5. Congruências 51
5.1. Classes de equivalência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54
5.2. Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56
5.3. Alguns teoremas importantes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57
5.4. Teorema Chinês do Resto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63
5.5. Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65
6. Polinômios 67
6.1. Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67
2
CAPÍTULO 1
Representação Numérica
Antes de mais nada, vamos entender o que seja representar. Desde os nossos primeiros
ensinamentos, somos instruídos a encurtar palavras ou usar símbolos para expressar
ideias. Observe as imagens abaixo:
Certamente você já viu essas imagens. A figura (1.1) é uma placa de transito que
representa universalmente que você não pode estacionar seu veículo. Já a segunda figura,
representa a conexão bluetooth, bem conhecida para quem usa smartphones nos dias
atuais. Veja que tais figuras cumprem bem seu proposito.
Já em matemática, temos vários exemplos desse tipo de síntese. Se, por exemplo,
escrevemos S1 , em praticamente todos os livros de geometria plana, representa a região do
plano onde todos os pontos equidistam de um ponto fixado, ou simplesmente chamamos
de circunferência.
Dito isto, podemos agora falar sobre representação numérica. Deste nossa formação
inicial, somos ensinados a usar o sistema decimal. A rigor, este sistema é chamado
Hindu-Arábico e admite os símbolos ( ou dígitos):
{0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9} (1.1)
Este é o sistema que usamos no dia a dia e já sabemos que ele é posicional, ou seja,
603 6= 306. Além disso, podemos escrever como potencias de 10 usando os simbolos de
(1.1):
2017 = 2 · 103 + 0 · 102 + 1 · 101 + 7 · 100
3
1. Representação Numérica
{0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, A, B, C, D, E, F} (1.3)
(Am Am−1 . . . A1 A0 )µ
4
1. Representação Numérica
Exemplo 1.1.
Agora, vamos aprender a converter um número numa base s para r. Para este fim,
separaremos em 3 situação que completam todas as situações.
Caso 1: (s < r = 10) Este o caso mais simples pois basta usar a equação (1.4). Por exemplo,
10102 = 1 · 23 + 0 · 22 + 1 · 21 + 0 · 20
= 10
Caso 2: (10 = s < r) Para converter um numero natural n na base r aplicaremos divisões
sucessivas. Por exemplo, vamos converte 17 na base 2. Aplicando tal método, ao
final ( quando obtermos o primeiro quociente 0) obteremos os símbolos na base
binária seguindo a mesma direção da seta abaixo.
17 2
1 8 2
0 4 2
0 2 2
0 1 2
1 0
Caso 3: (10 6= s e r 6= 10) Por fim, temos duas bases quaisquer e queremos converter um
numero ns em nr . Neste caso, usaremos os casos anteriores da seguinte forma:
ns → n10 → nr
Observação 1.1. A conversão de um numero fracionário qualquer (r ∈ (0, 1)) para uma
base b também é possível. O procedimento é simples:
5
1. Representação Numérica
3. O processo é repetido até que se obtenha a parte fracionária nula ou até observar um
padrão repetitivo.
• 0.375 · 2 = 0.750
• 0.750 · 2 = 1.500
• 0.500 · 2 = 1.000
George Cantor (1845-1918) foi o criador da teoria dos conjuntos, que foi uma grande
contribuição para matemática moderna. Seu trabalho tinha o foco nos conjuntos infinitos
(ou não-enumeráveis) de comprimentos diferentes. Um de seus trabalhos é o famoso
conjunto que leva seu sobrenome(C).
O C é um subconjunto do intervalo [0, 1], construído da seguinte forma: Dado o intervalo
[0, 1], o qual denotaremos por I0 , divide-se I0 em três partes iguais e remova o terço médio,
restando duas partes cujo a união delas e dada por I1 , ou seja,
1 2
I1 = 0, ∪ ,1 .
3 3
∞
\
C= In . (1.5)
n=1
†
Este conjunto um tanto diferente é não-vazio e não-enumerável (Cf. [1]).
6
1. Representação Numérica
Portanto, temos uma relação bem definida de todos os pontos do intervalo [0, 1] com
a base ternária. Em particular, podemos também descrever os pontos do conjunto de
Cantor (C). Diferente do que a intuição pode ti levar, existem muito mais pontos além
dos extremos de cada intervalos subtraído. Além disso, conforme a construção de C, todo
elemento deste conjunto tem expressão na base ternária formada por apenas 0 e/ou 2.
Note que o contrário não é verdade, ou seja, um elemento cuja expressão na base 3 tem
um ou mais elementos 1 não quer dizer que tal elemento não pertence a C.
(0.100000 . . .)3
Para verificar se nossas expressões estão corretas, vamos converter ambas representa-
7
1. Representação Numérica
X 1 ∞
0
• (0.02222 . . .)3 = 1
+2·
3 3i
i=2
1
= 2· 32
1
1−
3
1
=
3
X 1 ∞
1
• (0.100000 . . .)3 = + 0 ·
31 3i
i=2
1
=
3
0 1
0 1/3 2/3 1
Figura 1.5.:
Já sabíamos que 1/3 ∈ C pois todos os extremos dos intervalos em cada passo da
construção não são retirados. Além disso, com a representação acima, mesmo tal ponto
tendo uma representação com digito 1, o que importa é sua escrita com dígitos 0 e 2.
0.25 · 3 = 0.75
0.75 · 3 = 2.25
0.25 · 3 = 0.75
0.75 · 3 = 2.25
8
1. Representação Numérica
Logo, 1/4 ∈ C.
9
1. Representação Numérica
1.4. Exercícios
c) (1011111000110101)2 , base 4.
d) (687805)9 , base 7.
e) (677504)8 , base 5.
f) 0.8, base 2.
g) 0.3125, base 2.
2. Escreva 2/3 de duas formas distintas na base 3. Podemos dizer que 2/3 ∈ C?
4. Repita o processo feito na imagem (1.5) e exiba uma ilustração da posição de (0.002)3 .
n
= 0, d25d25d25...
810
10
CAPÍTULO 2
Os assuntos deste capitulo são indissociáveis quando estamos falando do conjunto dos
números naturais ( N ). Isto por que eles seguem a intuição que todos temos em exemplos
mais simples. Veja os seguintes subconjuntos dos naturais abaixo:
A = {2, 4, 6, . . .}
B = {1, 3, 5, . . .}
s 6 x, ∀x ∈ S. (2.1)
Com este axioma∗ podemos provas alguns resultados interessantes. A seguir, vamos ver
dois exemplos iniciais.
Exemplo 2.1. Mostre que não existe n ∈ N tal que 0 < n < 1.
Vamos provar tal fato usando o axioma (2.1). Suponha, por absurdo, existe um m ∈ N
com m ∈ (0, 1). Considere o conjunto
Pela afirmação prévia, X 6= ∅. Pelo axioma (2.1), o conjunto X possui um menor elemento,
∗
Axioma é uma afirmação matemática aceita sem provas.
11
2. Axioma da Boa Ordenação e PIM
digamos r ∈ X. Como
0<r<1
temos que
0 < r2 < r < 1
O que obtemos? Acabamos que encontrar outro elemento de X menor que r que já era o
menor elemento. Esse absurdo venho da hipótese que X é não-vazio. Portanto, X = ∅ e
nossa afirmação é verdadeira.
√
Agora, vamos mostrar algo bem conhecido: 2 não é racional.
√
Exemplo 2.2. Mostre que 2 6∈ Q.
Suponha que tal afirmação seja falsa, ou seja, existem a, b ∈ N, sem fatores em comum,
tal que
√ a
2=
b
Agora, considere o conjunto
√ √
X = {n 2 | n, n 2 ∈ N}
√
Pela afirmação que fizemos para 2, temos que a ∈ X e segue que X 6= ∅. Pelo axioma
(2.1), existe um menor elemento que denotaremos por j. Como j ∈ X, existe k ∈ N tal que
√
j=k 2
√ √ √
(j − k) 2 = j 2 − k 2
√
= j 2−j
√
= j( 2 − 1) > 0
√
Dai, (j − k) 2 ∈ X . Porém,
√ √ √
(j − k) 2 = j 2 − k 2
√
= 2k − k 2
√
= k(2 − 2)
√
< k 2=j
√
Mas isto não pode acontecer pois j já é o menor elemento de X. Portanto, 2 6∈ Q.
Nesses dois exemplos, percebemos um padrão: o conjunto X! Este conjunto representa
12
2. Axioma da Boa Ordenação e PIM
X = {n ∈ N |P(n) é falso.}
2. Assuma que X 6= ∅;
a2 + b 2 a2 + b 2
Exemplo 2.3. Se a, b ∈ N tais que ∈ N então é quadrado perfeito.
1 + ab 1 + ab
a2 + b 2
Deixaremos ao leitor verificar que a = b implica k = 1. Suponha que não
1 + ab
quadrado perfeito. Defina
a2 + b 2
X = max(a, b)|k = não é quadrado perfeito
1 + ab
Sem problemas podemos supor que a < b ( o outro caso, a > b, é análogo). Nesta situação,
max(a, b) = b. Por hipótese, X 6= ∅. Pelo axioma (2.1) existe um menor elemento que o
denotaremos por b1 . Observe que
a2 + b2
k=
1 + ab
nos dá a equação polinomial
b2 − (ka)b + a2 − k = 0 (2.2)
que possui duas raízes sendo b1 uma delas pois b1 ∈ X. Seja b2 a outra raiz. As relações
das raízes de (2.2) nos dizem que
• b1 + b2 = ka
• b1 b2 = a2 − k
13
2. Axioma da Boa Ordenação e PIM
a2 − k b2 − k
b2 = < 1 < b1
b1 b1
Exemplo 2.4. Todo número natural pode ser escrito com um produto finito de números
primos.
Suponha que X 6= ∅. Seja n o menor elemento de X. Note que n não é primo pois do
contrário ele seria um produto com apenas um elemento de primos. Desde modo, n = ab
com a, b < n. Dai, a, b 6∈ X e portanto podem ser escritos como produto finito de primos,
ou seja,
Y
s
a = pi
i=1
Yt
b = qi
i=1
Y
s Y
t
! !
n= pi qi
i=1 i=1
Isto implica que n é um produto finito de primos, o que é um absurdo pois n ∈ X. Portanto,
X = ∅ e a afirmação é verdadeira.
14
2. Axioma da Boa Ordenação e PIM
Este caso, sintetiza a ideia por trás do principio de indução. Iremos provar tal principio
através do axioma (2.1). Deixaremos ao leitor provar que o contrário também possível, ou
seja, admitir o principio como verdade e dele provar o axioma (Cf. exercício 7). Em outras
palavras, acabamos de "provar"que:
Teorema 2.2. (Princípio da indução) Seja S um subconjunto de N que possui duas proprie-
dades:
1. 1 ∈ S.
Então S = N.
1. P(1) é verdadeiro.
15
2. Axioma da Boa Ordenação e PIM
Corolario 2.1 (Segunda Versão). Seja n0 ∈ N e P(n) uma afirmação indexada para todo
n > n0 . Suponha que:
1. P(n0 ) é verdadeiro.
1. 1 ∈ S.
Então S = N.
Agora, para fixar a ideia iremos provas diversas afirmações usando indução matemática.
33n+3 − 26n − 27
é múltiplo de 169, ∀ n ∈ N.
Para usar o principio de indução na demonstração afirmação, temos que verificar se
para n = 1 é verdadeiro. Ora, para este caso temos que 36 − 26 − 27 = 676 = 169 · 4 é
claramente múltiplo de 169.
Assuma que seja verdadeiro para n − 1 (hipótese de indução), n > 1, ou seja,
16
2. Axioma da Boa Ordenação e PIM
√ 2 √
(1 + 2) + (1 − 2)2 = 6
√ √ √
(1 + 2)2 − (1 − 2)2 = 4 2
√ 2(n−1) √
(1 + 2) + (1 − 2)2(n−1) = 2k
√ √ √
(1 + 2)2(n−1) − (1 − 2)2(n−1) = a 2
√ 2n √ √ √ √ √
(1 + 2) + (1 − 2)2n = (1 + 2)2 (1 + 2)2(n−1) + (1 − 2)2 (1 − 2)2(n−1)
√ √ √ √
= (3 + 2 2)(1 + 2)2(n−1) + (3 − 2 2)(1 − 2)2(n−1)
√ √
= 3 · 2k + 2 2(a 2)
= 2(3k + 2a)
√ 2n √ √
(1 + 2) − (1 − 2)2n = (3a + 4k) 2.
Exemplo 2.7. Um número inteiro n será chamado de bom se pode ser escrito
n = a1 + a2 + · · · + an
1 1 1
+ + ··· + =1
a1 a2 an
Dado a informação que 33 e 73 são bons, prove que todo n > 33 é bom.
Considere a seguinte afirmação P(n):
A informação nos diz que P(33) é verdadeiro. Antes de seguir, vamos provar a seguinte
afirmação:
17
2. Axioma da Boa Ordenação e PIM
1 1 1 1 1
+ + ··· + + + =1
2a1 2a2 2an 4 4
e
2n + 9 = 2a1 + 2a2 + · · · + 2an + 3 + 6
1 1 1 1 1
+ + ··· + + + =1
2a1 2a2 2an 3 6
Portanto, se n ∈ N é bom então 2n + 8 e 2n + 9 são bons. Agora, voltando a afirmação
P(n), acabamos que mostrar que P(n + 1) é verdadeiro sempre que P(n) o for. Portanto a
afirmação P(n) é verdadeiro para n > 33.
para todo n ∈ N.
Para n = 1, trivialmente é verdadeiro (deixamos o leitor verificar isso!). Assuma que seja
verdadeiro para n > 1. Daí,
X
n+1
= 1 + 2 + · · · + n + (n + 1)
i=1
n(n + 1)
= + (n + 1)
2
n(n + 1) + 2n + 2
=
2
n2 + n + 2n + 2
=
2
n2 + 3n + 2
=
2
(n + 1)(n + 2)
=
2
Observação 2.1. Deve-se ter cuidado ao usar o principio de indução pois podemos acabar
provando afirmação que não verdadeira (veja exercício 11). Sempre recomendamos verificar
se sua afirmação é verdadeira para alguns valores iniciais.
• a0 = 8
18
2. Axioma da Boa Ordenação e PIM
• a1 = 10
P(n) : an = 7 + 3n .
Note que, claramente, P(0) e P(1) são verdadeiro. Vamos supor verdadeiro para n > 1.
Segue então que
19
2. Axioma da Boa Ordenação e PIM
2.3. Exercícios
X
n
(2i − 1) = n2 .
i=1
X
n
(2i − 1) = n2 .
i=1
7. Assuma que o principio de indução é verdadeiro, ou seja, tome ele como um axioma.
Prove que o axioma de boa ordenação.
20
2. Axioma da Boa Ordenação e PIM
idade, por hipótese de indução. Desde que a2 está em cada um destes grupos, segue
que todas as k + 1 pessoas a1 , a2 , . . . , ak+1 têm a mesma idade.
X
n
Mostre que Fi = Fn+2 − 1.
i=1
n
7
13. Com a mesma notação anterior, mostre que Fn < .
4
X
n
14. Ainda sobre (Fn ), Mostre que (Fi )2 = Fn Fn+1 .
i=1
• x1 = 1
• x2 = 2
1
• xn+2 = (xn+1 + xn ), ∀n ∈ N
2
Prove que 1 6 xn 6 2, ∀n ∈ N.
2
17. Demonstre que 3n−1 < 2n , ∀n ∈ N.
21
CAPÍTULO 3
Divisibilidade
Neste capítulo, iremos desenvolver as noções básicas sobre divisibilidade, além de forma-
lizar resultados conhecidos desde o ensino médio como alguns critérios de divisibilidade.
Finalizaremos este capitulo com o teorema fundamental da aritmética e vários resultados
acerca dos números primos.
b=k·a (3.1)
a ) Se a | b e b | c então a | c.
c ) n | n, ∀n 6= 0.
f ) 1|n, ∀n.
g ) n|0, ∀n.
22
3. Divisibilidade
b = k1 a
c = k2 b
(n + 1) | (n2 + 1).
Se a | (b + c) e a | b então a | c.
b + c = k1 a
b = k2 a
Agora, vamos tratar uma situação bem comum na teoria dos números: a - b. O teorema
a seguir nos permitir generalizar a ideia do começo desse capitulo.
com 0 6 r < b.
23
3. Divisibilidade
Evidentemente que X 6= ∅ pois 1 ∈ X. Pelo axioma (2.1), existe menor elemento que
denotaremos por r = a − bq ∈ X. Se r = 0 então b | a e não temos mais nada a fazer.
Suponha que 0 < r. Temos que provar que r < b. Suponha que não, ou seja, r > b. Isto
nos permite observar que
a − b(q + 1) = a − bq − b
> r−b
> 0
a − b(q + 1) 6 a − bq
= r
Mas isso não pode ocorrer pois r é o menor elemento de X, Portanto, r < b. Para provar
a unicidade, vamos supor que existam dois pares que atendem as condições e no final
concluiremos que são os mesmos. De fato, seja q1 e r1 inteiros que atendem (3.2). Dai
temos que:
bq + r = bq1 + r1
b(q − q1 ) = r1 − r
Podemos dizer que b | (r1 − r). Porém, como 0 > |r1 − r| < b segue então que r1 − r = 0,
ou melhor, r1 = r. Dai temos também que q1 = q.
Mesma ideia se fosse n = 3, teríamos 3 conjunto: 1) dos restos 0, 2) dos restos 1 e 3) dos
restos 2.
Aqui vamos convencionar que ao falar que o resto da divisão de m por n e r, simplesmente
falaremos que m é da forma
m = nq + r
24
3. Divisibilidade
Nesta ideia, quando, por exemplo, olhamos a divisão por 4, podemos dizer que os números
são de uma das 4 formas:
• 4k • 4k + 1 • 4k + 2 • 4k + 3
Exemplo 3.3. Seja r o resto quando 1059, 1417 e 2312 são divididos por d > 1. Encontre o
valor de d − r.
Pelo algoritmo da divisão, temos que
1059 = dq1 + r
1417 = dq2 + r
2312 = dq3 + r
Daí,
Logo, d = 179. Com isto, podemos voltar na informação 1059 = 179q1 + r para obter que
r = 164 e obtemos que d − r = 15.
Exemplo 3.4. Mostre que existem infinitos n ∈ N tais que 24 | (n2 + 23).
Usando a mesma estrategia já usada aqui, podemos escrever
n2 + 23 = (n2 − 1) + 24
= (n + 1)(n − 1) + 24
• Se n = 4k então n2 = 4(4k2 ).
• Se n = 4k + 3 então n2 = 4(4k2 + 6k + 2) + 1.
25
3. Divisibilidade
p2 − 1 = 12k(3k ± 1)
Desde que k(3k ± 1) é par ( verifique isso!!!) temos que nosso resultado imediatamente.
O conceito de número primo era conhecido desde 300B.C e alguns propriedades deste
era sabido. A primeira grande afirmação, na minha opinião, é sobre a infinitude deles.
Euclides de Alexandria no seu clássico livro Elementos provou que existem infinitos
números. A seguir, enunciamos e provamos da mesma forma que Euclides o fez.
pl | n
26
3. Divisibilidade
Y
n
Por outro lado, como pl | pi , teremos que pl | 1, o que é impossível acontecer. Logo,
i=1
encontramos um número primo que não está na lista inicial. Concluímos que não pode
existir um número finito de números primos.
ab = kp
a = pq + r
com 0 < r < p. Diante disto, temos que p | (bpq + br). Como, claramente, p | (bpq),
segue que p | (br). Se p | r então r > p, o que não pode ocorrer. Logo p | b.
Na pratica do dia a dia, é sempre útil ter certos atalhos para não precisar usar o algoritmo
da divisão para saber se o dado número é divisível por outro. Nesta seção abordaremos os
alguns critérios de divisibilidade. Será útil usarmos a representação na base 10 que vimos
em (1.4):
f) Considere n > 100. Então 8 | n se, e somente se, 8(| 100a2 + 10a1 + a0 )
i) Considere n > 11. Então 11 | n se, e somente se, 11 | (a0 −a1 +a2 −a3 +· · ·+an (−1)n ).
Demonstração.
27
3. Divisibilidade
segue então
3 | n ⇔ 3 | (an + an−1 + · · · + a1 + a0 )
4 | n ⇔ 4 | (10a1 + a0 )
n = 2k1
e
n = 3k2
n = 2 · 3k3 = 6k3
8 | n ⇔ 8 | (100a2 + 10a1 + a0 )
10 | n ⇔ 10 | a0
28
3. Divisibilidade
i) Deixamos o leitor verificar∗ que 10k pode ser escrito da forma 11q + (−1)k . Dai,
Logo,
11 | n ⇔ 11 | (a0 − a1 + a2 − a3 + · · · + an (−1)n ).
∗
101 = 11 − 1, 100 = 11 · 9 + 1, 1000 = 11 ∗ 91 − 1
29
3. Divisibilidade
3.2. Exercícios
ra 6 b 6 (r + 1)a.
8. Prove que existem infini Todo número natural pode ser escrito com um produto finito
de números primos.tos primos da forma 6k + 5.
Mn = n(n2 − 1)(3n + 2)
é múltiplo de 24.
16. Mostre que se x > −1 é um número real e n > 1 é um inteiro então (1 + x)n > 1 + nx.
†
Use a identidade de Sophie Germain.
30
3. Divisibilidade
X
n
ai
i=1
an+1 =
n+1
Determine a2017 .
18. Encontre o resto que deixa 2001 · 2002 · 2003 · 2004 + 20052 quando é dividido por 7;
31
3. Divisibilidade
Considere o número 1332. Pelas regras de divisibilidade, sabemos que é divisível por
2., ou seja, 1332 = 2 · 666. Ainda é possível, dado que 666 é divisível por 6, escrever
1332 = 2 · 2 · 3 · 111. Continuando o processo, sabendo que 3 | 111, temos finalmente que
1332 = 22 · 33 · 37.
Porém já sabíamos que isso é possível pois em no exemplo 2.4 foi provado. A seguir,
daremos outra prova do mesmo fato.
Lema 3.1. Todo número natural pode ser escrito com um produto finito de números primos.
Demonstração. Seja n inN. Se n for primo, nada a fazer. Agora, assuma que n é composto
e seja q1 seu menor divisor. Pelo teorema 3.2, sabemos que q1 é número primo. Segue
que podemos escrever, para algum n1 ∈ N com 1 < n1 < n,
n = q1 · n1
n = q1 · q2 · n2
Continuando o argumento, teremos ao final de n etapas uma cadeia n > n1 > n2 > · · · > 1
e
n = q1 · q2 · · · qs .
Assim como fizemos no exemplo ilustrativo no inicio desta seção, podemos rearrumar
esses primos que obtemos e escrever
n = pa a2 as
1 · p2 · · · ps ,
1
(3.4)
32
3. Divisibilidade
Demonstração. Suponha que n ∈ N possa ser escrito de formas tipo (3.4), ou seja,
n = pa a2 as
1 · p2 · · · ps
1
= qb b2 bm
1 · q2 · · · qs
1
pa as b1 −a1
2 · · · ps = q1
2
· qb bm
2 · · · qs
2
a
Logo p1 | p2 2 · · · pa
s , oq eu não pode acontecer pois p1 não está nesse produto. Portanto,
s
não se pode ter a1 < b1 . Análogo argumento para a1 > b1 . Assim, a1 = b1 . Similarmente,
mostramos que ai = bi para i ∈ {1, 2, · · · m}.
Exemplo 3.10. Encontre todos os números que são formados 4 algarismos da forma aabb
e sejam quadrados perfeitos.
O número aabb ser quadrado perfeito é o mesmo que :
n2 = aabb
= 1000a + 100a + 10b + b
= 1100a + 11b
= 11(100a + b)
= 11(99a + a + b)
Observe que 11 | (n · n) e como 11 é primo temos que 11 | n e portanto 112 | n2 . Pelo TFA,
temos que 11 | (99a + a + b). Desde que 11 | 99a segue que 11 | (a + b).
Devemos lembrar que a, b ∈ {0, 1, 2, . . . , 9}. Porém, como queremos um número de 4
algarismos, a 6= 0. Além disso a + b > 18 e como 11 | (a + b), temos que a + b = 11.
Também não podemos ter a = 1 ou b = 1. Por outro lado, n2 tem como restos possíveis
{0, 1, 4, 5, 6, 9}, temos que
b ∈ {4, 5, 6, 9}
• b = 4 e a = 7 7→ 7744 = 882 é quadrado perfeito.
33
3. Divisibilidade
Caso 1 Caso 2
2 2
n −1=3 n −1=p
n2 + 1 = p n2 + 1 = 3
Exemplo 3.12. Mostre que não existe um primo cujo dobro seja igual a um quadrado
perfeito menos 1.
Temos que mostrar que não existe primo p tal que 2p = n2 − 1. Do contrário,
2p = n2 − 1 = (n + 1)(n − 1)
Daí,
Caso 1 Caso 2
n−1=2 n−1=p
n+1=p n+1=2
Exemplo 3.14. Prove que existe apenas um n ∈ N tal que 28 + 211 + 2n é um quadrado
perfeito.
Seja n ∈ N tal que 28 + 211 + 2n = k2 . Daí, 482 + 2n = k2 e portanto k2 − 482 = 2n .
Logo
2n = (k + 48)(k − 48)
Pelo TFA,
k + 48 = 2s
k − 48 = 2t
34
3. Divisibilidade
35
3. Divisibilidade
3.4. Exercícios
3. Seja η um número natural. Prove que a divisão de η2 por 6 nunca deixa resto 2.
c) Se um primo p | a + b então p | a e p | b.
‡
Use a divisão por 3 em p.
36
3. Divisibilidade
A definição de máximo divisor comum, ou simplesmente MDC, foi definido pela primeira
vez no Livro VII de Os elementos que Euclides.
Definição 3.3 (MDC). Dados dois inteiros a e b, não simultaneamente nulos, dizemos que
um inteiro d é o máximo divisor comum de a e b, que escrevemos d = mdc(a, b), se:
1. d | a e d | b
Teorema 3.5. Se
a = pa a2 ak b1 b2 bs
1 · p2 · · · pk q 1 · q 2 · · · q s
1
d = pγ γ2 γk
1 · p2 · · · pk
1
ai − γi > 0
ci − γi > 0
λ1 = p1ai −γ1 · pa
2
2 −γ2
· · · pa
k
k −γk
37
3. Divisibilidade
a = (qb b2 bs
1 · q 2 · · · q s · λ1 ) · d
1
b = (rd d2 dl
1 · r2 · · · rl · λ2 ) · d
1
e que
mdc(221, 91) = mdc(91, 39) = 13.
O que vimos no exemplo anterior não é um caso particular. Além do método que o
teorema acima mostra, existe um outro via algoritmo da divisão que pode ser útil em
situações que temos número grande cuja decomposição pode ser complicada.
Demonstração. Denote por d = mdc(a, b). Queremos mostrar que d = mdc(b, r). De
fato,
Teorema 3.6. Sejam a e b naturais não nulos, com a > b. Dividindo sucessivamente,
38
3. Divisibilidade
obtemos:
Portanto mdc(a, b) = rn , ou seja, é o ultimo resto não nulo após as divisões sucessivas.
Claro que se r1 = 0 então mdc(a, b) = b.
Demonstração. Primeiro, observe que se a = bq então mdc(a, b) = b > 0 e não tem mais
nada a prova. No caso geral, a prova pode ser feita usando o principio de indução sobre
a quantidade de passos na divisão sucessiva com o lema acima. Deixaremos a cargo do
leitor finalizar a prova.
Exemplo 3.17. Usando o método acima, determine que mdc(1508, 422) = 26.
No exemplo (3.16), vimos que 13 = mdc(221, 91) e além disso atende a relação
13 = (−2)221 · 1 + (5) · 91
Claro que podemos nos perguntar se isso é sempre possível, ou seja, se d = mdc(a, b)
então existem inteiros x0 , y0 tais que
d = ax0 + by0 ?
Para nossa alegria, este fato foi provado por um francês chamado Étienne Bézout
(1730–1783) que se baseou no trabalho de outro francês, Claude Gaspard Bachet de
Méziriac (1581–1638).
É (muito) fácil ver que X 6= ∅. Pelo axioma da boa ordenação, existem λ = ax0 + by0 ∈ X
39
3. Divisibilidade
menor elemento. Agora, basta mostrar que λ = d. Para mostrar que λ | a, vamos supor
que não, ou seja, existem q, r ∈ Z tal que
a = λq + r
r = a − λq
= a − ax0 − by0
= a(1 − x0 ) + b(−y0 )
o que nos leva a conclusão que r ∈ X, porém isto é um absurdo com o fato de r < λ e λ é o
menor elemento de X. Logo, λ | a. Com o mesmo argumento mostramos que λ | b. Por fim,
seja c ∈ N tal que c | a e c | b. Então, existem l1 , l2 tais que
a = l1 c
e
b = l2 c
ax0 = l1 x0 c
by0 = l2 y0 c
λ = ax0 + by0
= l1 x0 c + l2 y0 c
= (l1 x0 + l2 y0 )c
⇒ c|λ
Com este teorema podemos provar diversas propriedades do mdc, as quais listamos
algumas a seguir:
1. Se a | bc e mdc(a, b) = 1 então a | c.
a b
2. Se mdc(a, b) = d então mdc , = 1.
d d
40
3. Divisibilidade
Demonstração.
bc = ak
ax0 + by0 = 1.
c = acx0 + bcy0
= ax0 + aky0
= a(x0 + ky0 )
Portanto a | c.
d = ax + by
Daí
a b
1= +
d d
a b
Se λ = mdc , , então como
d d
λ | (a/d)
e
λ | (b/d)
3. Denote por d1 = mdc(ca, cb) e d2 = mdc(a, b). Vamos mostrar que d1 | cd2 e
cd2 | d1 .
• Como d2 | a e d2 | b temos que cd2 | ca e cd2 | cb e portanto d1 | cd2 .
41
3. Divisibilidade
d | (2a + b) · x0 + (a + 2b) · y0
Até o momento somente falamos dos divisores comuns de dois naturais não nulos. E
quanto aos múltiplos? Será que dá pra falar sobre múltiplos comuns? A resposta é sim e
faremos isso a partir de agora.
Definição 3.4 (MMC). Dados dois natural a e b, não nulos, dizemos que um natural m é o
mínimo múltiplo comum de a e b, que escrevemos m = mmc(a, b), se:
1. a | m e b | m.
O próximo teorema é a versão análoga a que fizemos para calcular o mdc, cuja a prova
é a mesma encontrada em [2].
Teorema 3.8. Se
a = pα α2 αk
1 · p2 · · · pk
1
42
3. Divisibilidade
F(221)
F(754)
2,29 13 17
525 = 31 · 52 · 71
1001 = 71 · 111 · 131
200 = 23 · 52
Portanto,
mmc(525, 1001, 200) = 23 · 31 · 52 · 71 · 111 · 131
a b
Demonstração. Seja d = mdc(a, b). Como d | a e d | b temos que e são inteiros e por
d d
consequência
ab
m :=
d
também o é. Vamos mostrar que m = mmc(a, b). De fato,
a
m = ·b
d
b
= ·a
d
43
3. Divisibilidade
c = ak1
e
c = b = k2
d = ax + by
Dai,
cd = cax + cby
= bk2 ax + ak1 by
= ab(k2 x + k1 y)
ab
que podemos escrever c = (k2 x + k1 y) = m(k2 x + k1 y), ou seja, m | c.
d
Portanto m = mmc(a, b).
Exemplo 3.22. Determine dois naturais a, b tais que a + b = 120 e mmc(a, b) = 144.
Vamos listar todos os divisores de 144, os quais são
É fácil ver que 48 + 72 = 120. Além disso, como mdc(72, 48) = 24, temos que
44
3. Divisibilidade
3.6. Exercícios
I) Se a | (b + c) então a | b ou a | c.
21n + 4
7. Prove que a fração é irredutível para todo n ∈ N.
14n + 3
8. Seja a, b ∈ N tais que mdc(a, b) = 1. Mostre que mdc(a + b, a2 − ab + b2 ) é 1 ou 3.
1 1
14. Sendo + é natural, onde a, b são naturais, mostre que a = b. Além disso,
a b
conclua que a = 1 ou a = 2.
45
3. Divisibilidade
16. Encontre todos os d ∈ N tais que d | (n2 + 1) e d | ((n + 1)2 + 1), para todo n ∈ N.
19. Seja n um número natural tal que mdc(n, 6) = 1. Mostre que n2 − 1 é múltiplo por
12.
46
CAPÍTULO 4
Equações Diofantinas
a qual foi estudada anos depois por Pierre Fermat (1606-1665) e provada por completo
apenas em 1995 por Andrew Wiles’s, o conhecido ultimo teorema de Fermat.
Neste capitulo, focaremos nosso estudo nas equações diofantinas lineares, a saber,
equações do tipo
ax + by = c (4.1)
O que queremos porém é saber se podemos determinar uma forma de saber todas as
soluções destas equações.
Já vimos que 13 = mdc(221, 91). Facilmente podemos escrever
Antes de mais nada, não esqueça, as soluções que queremos são inteiras.
23x + 29y = 1.
47
4. Equações Diofantinas
29 = 23 · 1 + 6
23 = 6 · 3 + 5
6 = 5·1+1
1 = 6−5·1
5 = 23 − 6 · 3
6 = 29 − 23 · 1
Portanto,
1 = 6−5·1
= 6 − (23 − 6 · 3) · 1
= 4 · 6 − 23 · 1
= 4 · (29 − 23 · 1) − 23 · 1
= 4 · 29- 5 · 23
e uma solução é x = −5 e y = 4.
23x + 29y = 1.
x = −5 + 29t
y = 4 + 23t
O que vamos provar que na verdade, este é a forma de achar todas as soluções das
diofantinas lineares.
48
4. Equações Diofantinas
b
x = x0 + t
d
a
y = y0 − t
d
com t ∈ Z.
b a
Demonstração. Claro que se (x0 , y0 ) é solução então x = x0 + t e y = y0 − t são
d d
soluções ainda.
O que nos falta provar é que qualquer outra solução é dessa forma. Seja (x 0 , y 0 ) outra
solução da diofantina. Segue então que
a(x 0 − x0 ) = b(y 0 − y0 ).
a 0 b
(x − x0 ) = − (y 0 − y0 ). (4.3)
d d
a b 0 a b a
Podemos dizer que (y − y0 ) . Como mdc , = 1 então | (y 0 − y0 ). Logo
d d d d d
existe t ∈ Z tal que
a
y 0 − y0 = t
d
ou seja,
a
y 0 = y0 + t
d
Voltando em (4.3), temos que
a 0 b a
(x − x0 ) = − · t · .
d d d
ou seja,
a
x 0 = x0 − t
d
49
4. Equações Diofantinas
4.1. Exercícios
a) 24x + 25y = 18
b) 3456x + 246y = 44
c) 1998x + 2000y = 33
d) 59x + 27y = 20
e) 7854x + 3315y = 41
2. Minha mãe pagou R$ 2, 78 por algumas bananas e ovos. Se cada banana custa
R$ 0, 69 cada ovo custa R$ 0, 35, quantos ovos e quantas bananas ela pagou?
50
CAPÍTULO 5
Congruências
Boa parte dos conceitos que iremos abordar deve-se a Gauss com seu trabalho Disquisi-
tiones Arithmeticae em 1801. No fundo, o cerne do estudo baseia no algoritmo da divisão
de Euclides.
Primeiro, precisamos dá uma definição para o termo que leva o nome do capitulo.
1. Reflexiva: a ≡m a.
2. Transitiva: Se a ≡m b e b ≡m d então a ≡m d.
3. Simétrica: Se a ≡m b então b ≡m a.
Mais a frente voltaremos a usar esta proposição para definir classes de equivalências.
Alguns propriedades operacionais são válidas via congruência as quais sintetizamos.
1. a + c ≡m b + d
2. a − c ≡m b − d
51
5. Congruências
3. ac ≡m bd
4. ak ≡m bk
a = b + k1 m
c = d + k2 m
e
ac = bd + mk3
Para item (4), basta aplicar o principio de indução sobre k, onde pra k = 1 é justamente o
item (3)
32n+1 ≡7 2n · 3
2n+2 ≡7 2n · 4
52
5. Congruências
Exemplo 5.6. Prove que não existem inteiros tais que x2 − 5y2 = 2.
Caso haja inteiros x e y, teremos que
x2 = 5y2 + 2
O que diz que x2 ≡5 2, ou seja, 2 seria um quadrado perfeito módulo 5, absurdo. Logo
não existem tais inteiros.
22225555 ≡7 35555
55552222 ≡7 42222
Por lado, 35555 ≡7 (35 )1111 . Como 35 ≡7 5, tem-se 35555 ≡7 51111 . De forma semelhante,
obtemos que
42222 ≡7 (42 )1111 ≡7 −51111
53
5. Congruências
Nos primórdios do nosso ensino ( e já visto nestas notas), somos ensinado que dados
n ∈ Z, este só pode ser par ou impar. Bem, isto é tão simples que podemos mudar a
escrita de par ou impar para 0 ou 1. Em outras palavras, podemos dizer que oa pares
são os número que quando divididos por 2 deixam resto 0 e de alguma modo os impares
deixam resto 1 sob a mesma divisão. Assim, o fizemos foi decompor todo os inteiros (Z)
em dois conjuntos que denotaremos por 0 e 1 tal que
Z=0∪1
sendo
0 := {números pares}
e
1 := {números impares}
Com isso em mente, reduzimos nossos cálculos no conjunto {0, 1}. Em álgebra, o que
acabamos de fazer foi separar os inteiros em classes . Mesmo sem dá uma definição para
o que seja classe, no exemplo acima sabemos o que eles são.
Fixemos m ∈ N. Dado 0 6 x ∈ Z, chamaremos de classe do x ao conjunto dos números
que deixam resto x na divisão por m, ou seja,
x = {x + k · m; k ∈ Z} (5.1)
c = x + k1 m
e
d = x + k2 m
Isto quer dizer que c ≡m x e x ≡m d e portanto c ≡m d. Nesse sentido, obtemos que não
importa o representante da classe.
O que devemos ter em mente nessas operações ( que pode ser pensado na operação na
barra!!!) é: se y = x + k1 m então, modulo m, temos que y = x.
É interessante notar que modulo m, temos apenas m possibilidades de classe, as quais
os seus representantes são os mesmos valores do possíveis restos na divisão por m. O
54
5. Congruências
conjunto com todas essas classes será denotado por∗ Zm , além disso:
Zm = {0, 1, . . . , m − 1} (5.2)
• (Adição) a ⊕ b := a + b
• (Produto) a ⊗ b := a · b
Exemplo 5.8. Considerando o Z3 faça duas planilhas com as operações. Uma contendo
todas as somas possíveis e outra com o produto.
Sintetizamos tais operações abaixo, lembrando que Z3 = {0, 1, 2}.
⊕ 0 1 2 ⊗ 0 1 2
0 0 1 2 0 0 0 0
1 1 2 0 1 0 1 2
2 2 0 1 2 0 2 1
x⊕s=0
Denotaremos s = −x.
x⊗p=1
Denotaremos p = (x)−1 .
∗
Este conjunto na verdade é um anel, mas não iremos falar sobre esse assunto nestas notas.
55
5. Congruências
Corolario 5.1. Em Zp , com p primo, todo elemento não nulo tem inverso multiplicativo.
5.2. Exercícios
a) 3x ≡5 2 c) 7x ≡10 4 e) 3x ≡10 0
b) 4x + 3 ≡5 4 d) 2x + 1 ≡7 2 f) 5x ≡11 7
a) n = 8 c) n = 15 e) n = 31
b) n = 11 d) n = 21 f) n = 12
a) n = 6 b) n = 11
7
8. Encontre o digito das unidades de 77 .
56
5. Congruências
Nesta seção iremos estudar três principais resultados envolvendo congruências, que
são:
2. Teorema de Wilson
3. Teorema de Euler
O primeiro deles tem um nome já conhecido e comentado neste trabalho. Pode até ser
chamado de pequeno para diferenciar do teorema enunciado por Fermat mas provado
somente em 1995 por Andrew Wiles, mas tem um uso recorrente em diversos exercícios
com congruências.
ap−1 ≡p 1 (5.3)
Demonstração. De fato, sendo p primo e p - a, temos que mdc(p, a) = 1. Isto nos diz que
a ∈ Zp tem inverso multiplicativo. Agora vamos o seguinte conjunto
Note que se ra = sa então, como a tem inverso, temos que r = s. Disto, nós temos
que cada elemento deve ser congruência a {1, 2, . . . , p − 1} pois tanto o conjunto X e este
elementos são os invertíveis em Zp . Portanto,
(1 · a)(2 · a) · · · (p − 1) ≡p 1 · 2 · · · · (p − 1)
ou melhor,
(1 · 2 · · · · (p − 1)) · ap−1 ≡p (1 · 2 · · · · (p − 1))
Como mdc(p, n) = 1 para todo 1 < n < p temos que (1 · 2 · · · · (p − 1)) possui inverso em
Zp e então
ap−1 ≡p 1
ap ≡ p a (5.4)
57
5. Congruências
Demonstração. Basta observar que só temos duas possibilidade que ocorrem excludente-
mente:
• p|a
Neste caso, segue que a ≡p 0 e claro que ap ≡p 0 ≡p a.
• p-a
Agora, usando o teorema anterior, sabemos que
ap−1 ≡p 1
ap ≡ p a
Exemplo 5.12. Seja a1 = 4 e an = 4an−1 para n > 1. Determine o resto de a100 quando
divido por 7.
Neste exemplo temos o primo 7 em destaque e o inteiro 4. Usando o teorema anterior
para obter que
4 6 ≡7 1
4 n ≡6 X
onde temos que determine esse tal X. Deixamos ao leitor provar por indução matemática
que
4 n ≡6 4
Isto no diz que existe z ∈ Z tal que 4n = 4 + 6z. Juntando todas as informações, temos
que
a100 = 4a99
= 44+6z
= 44 · (46 )z
≡7 4
58
5. Congruências
Pelo teorema, temos que 216 ≡17 1. Como 100000 = 6250 · 16, temos que 2100000 =
(216 )6250 ≡17 1. Portanto o resto procurado é 1.
O proximo importante teorema foi conjecturado pela primeira vez pelo matematico
americano Edward Waring em Meditationes Algebraicae (1770; “Thoughts on Algebra”),
onde ele credita tal resultado ao ingles John Wilson. A primeira prova foi feita por Lagrange
em 1771 e sua reciproca também é verdadeira.
(p − 1)! ≡p −1 (5.5)
Dai,
1 · 2 · 3 · · · · p − 2 · p − 1 = p − 1 = −1
6 ≡5 1
7 ≡5 2
8 ≡5 3
9 ≡5 4
59
5. Congruências
Em outras palavras, φ(n) conta quantos naturais existem entre 1 e n que são coprimos
com n.
1. n = 2
Temos apenas {1, 2} e apenas mdc(1, 2) = 1. Logo φ(2) = 1.
2. n = 6
Temos apenas {1, 2, 3, 4, 5, 6} e apenas mdc(1, 6) = 1 e mdc(5, 6) = 1. Logo φ(6) = 2.
Em particular, o pequeno teorema de Fermat pode ser escrito via função de Euler:
aφ(p) ≡p 1
Esta função foi introduzida por Euler em meados dos nos 1700 mas foi estabelecida o
simbolo φ por Silvester em 1892.
Demonstração. Desde que p e q são primos, qualquer número que não seja co-primo com
pq deve necessariamente se múltiplo de p ou q. Além disso, temos exatamente q números
múltiplos de p e p números múltiplos de q. Portanto, temos p + q − 1 números que não
são co-primos com pq. Logo,
Demonstração. De fato, basta notar que em [0, pk ), temos apenas 1/p deste números são
divisíveis por p. Logo
pk
φ(pk ) = pk − = pk − pk−1
p
60
5. Congruências
a a a a
Lema 5.5. Se n = p1 1 p2 2 · · · par 1 2 ar
r ∈ N então φ(n) = φ(p1 )φ(p2 ) · · · φ(pr ).
a a
Lema 5.6. Em particular,se n = p1 1 p2 2 · · · pa
r ∈ N então
r
1 1 1
φ(n) = n 1 − 1− ··· 1 −
p1 p2 pr
1. n = 100
2. n = 8
3. n = 7
4. n = 40
5. n = 60
e o reduzido é
{1, 3, 5, 7}
61
5. Congruências
Demonstração. Primeiro, observe que a sequencia ar1 , ar2 , . . . , arφ(m) tem φ(m) elemen-
tos e devemos mostrar que:
Para mostra que são co-primos, note que como mdc(a, m) = 1 e mdc(ri , m) = 1 então
pelo teorema de Bezout temos que mdc(ari , m) = 1.
Por outro lado, se ari ≡m arj então ri ≡m rj pois a tem inverso em Zm . Como
r1 , r2 , . . . , rφ(m) é um sistema reduzido, temos que i = j.
Nosso ultimo importante teorema generaliza o pequeno teorema de Fermat, usando para
isso a função φ.
aφ(m) ≡m 1 (5.7)
Demonstração. Pela proposição anterior, temos que ar1 , ar2 , . . . , ar{ φ(m)} é um sistema
reduzido de resíduo sempre que r1 , r2 , . . . , rφ(m) seja um sistema reduzido também. Isto
implica dizer que cada ari é congruente a algum rj com 1 6 j 6 φ(m). Logo
Como cada ri é co-primo com m, ou seja, mdc(ri , m) = 1, pelo teorema de Bezout temos
que
Y
φ(m)
mdc ri , m = 1
i=1
Y
φ(m)
Nos permite dizer que ri é invertível em modulo m. Portanto,
i=1
aφ(m) ≡m 1
62
5. Congruências
Portanto, 31000 = (340 )25 ≡100 1, ou seja, os dígitos finais são 01. .
1000
Exemplo 5.19. os últimos dois digito de 77 .
Devemos fazer a divisão por 100 neste caso. Dai, 740 ≡100 1. Em contrapartida, como
temos que 71000 ≡40 (716 )62 (78 ) ≡40 (716 )62 (74 )2 ≡40 (716 )62 (72 )4 ≡40 (716 )62 . Agora,
como φ(40) = 16, temos que
(716 ) ≡40 1
1000
Segue então que 71000 = 1 + 40t para algum t ∈ Z. Portanto, 77 = 7 · (740 )t ≡100 7 e
assim os últimos dígitos são 07.
O teorema desta seção tem esse nome devido tal resultado ser conhecido dos chineses
ja na antiguidade.
a1 x ≡ m 1 c1
a2 x ≡ m 2 c2
a3 x ≡ m 3 c3
..
.
ar x ≡mr cr
Y
r
possui única solução modulo m = mi .
i=1
63
5. Congruências
Segue que yi tem inverso em Zmi , ou seja, existe ybi tal que
yi ybi ≡mi 1
x = b 1 y1 y c2 + · · · + br yr y
c1 + b2 y2 y cr
ai x = ai b 1 y 1 y c2 + · · · + ai br yr y
c1 + ai b2 y2 y cr
≡ mi ai bi yi ybi
≡ mi ai b i
≡ mi ci
para todo 1 6 i 6 r.
Resta ainda mostra que tal solução é única. Com efeito, seja x∗ outra solução do sistema.
Segue que x∗ ≡mi x para todo 1 6 i 6 r, ou seja, mi | (x − x∗ ). Como mdc(mi , mj ) = 1,
para i 6= j temos que
MMC(m1 , m2 , . . . , mr ) = m1 m2 . . . , mr
Portanto, m1 m2 . . . , mr | (x − x∗ ), ou seja, x ≡m x∗ .
x ≡5 1
x ≡7 2
x ≡11 3
1. y1 = 7 · 11, y2 = 5 · 11 e y3 = 5 · 7
2. b1 = 1, b2 = 2 e b3 = 3.
3. y
c1 = 3, y
c2 = 6 e y
c3 = 6
64
5. Congruências
5.5. Exercícios
5. Encontre o resto de
6. Mostrar que se p1 , p2 são primos tais que p2 = p1 +2 com p1 > 3 então p1 +p2 ≡12 0.
2(p − 3)! ≡p −1
a) ap + (p − 1)!a ≡p 0
b) ap (p − 1)! + a ≡p 0
a) n = 30
b) n = 2017
65
5. Congruências
c) n = 68
d) n = 99
e) n = 625
f) n = 1089
16. Determine os últimos dois dígitos de a1001 , sendo a1 = 7 e an+1 = 7an−1 para
n > 1.
a) 5x ≡7 3 c) 15x ≡25 9
b) 13x ≡29 14 d) 5x ≡9 20
a) b) c)
x ≡3 2 2x ≡5 1 x ≡11 7
x ≡4 3 3x ≡7 2 3x ≡13 5
x ≡5 4 5x ≡11 7 7x ≡5 4
x ≡6 5
66
CAPÍTULO 6
Polinômios
6.1. Exercícios
1. Mostre que não existe polinômio f(x) ∈ R[x] tal que (f(x))2 = x3 + x + 1.
6. Sejam f(x), g(x), h(x) ∈ K[x] tais que f(x) | h(x), g(x) | h(x), f(x) e g(x) são co-
primos. Então f(x)g(x) | h(x).
9. Determine m e n reais para que g(x) = 2x4 + 3x3 + mx2 − nx − 3 seja divisível por
x2 − 2x + 3.
67
6. Polinômios
c) mmc(f(x), g(x))
x+1 A B
13. Encontre todos os valores de A e B de forma que 2
= + .
x −x x x−1
14. Mostre, por indução, que xn − 1 é divisível por x − 1 para todo n > 1 e x 6= 1.
17.
18.
19.
20.
21.
22.
23.
24.
25.
68
Referências Bibliográficas
[1] R.G. Bartle and D.R. Sherbert. Introduction to real analysis. John Wiley & Sons Canada,
Limited, 2000.
[2] J.P. de Oliveira Santos. Introduçao à teoria dos números. Coleçao Matemática Univer-
siária. Instituto de Matemática Pura e Aplicada, 2011.
[3] K.I.M. Oliveira and A.J.C Fernandez. Iniciação a Matemática: um curso com problemas
e soluções. Sociedade Brasileira de Matemática, 2012.
69
APÊNDICE A
Capitulo 1
211 +1·210 +1·29 +0·28 +0·27 + Após esta conversão iremos con-
6 5 4 3 2
0·2 +1·2 +1·2 +0·2 +1·2 +0· verter o número 48693 que está
1 0 −1 −2 −3
2 +0·2 +0·2 +1·2 +1·2 + na base decimal para base quarta,
−4 −5 −6 −7
0·2 +1·2 +1·2 +1·2 +0· para realizarmos essa conversão
−8 −9 −10 −11
2 +1·2 +1·2 +0·2 efetuaremos divisões sucessivas
= 32768 + 0 + 8192 +4096 + até que o quociente seja menor
2048 + 1024 + 512 + 0 + 0 + 0 que o divisor. Dessa forma o re-
+ 32 + 16 + 0 + 4 0 + 0 + 0 + sultado obtido será (23320311)4 .
1 + 0,25 + 0,125 + 0 + 0,03125 d) (687805)9 , base 7.
+ 0,015628 + 0,0078125 + 0 + Para fazer essa conversão, preci-
0,001953125 + 0,0009765625 samos efetuar primeiro a conver-
+ 0 = 48693,4326171875 ' são da base nona (9) para base
(48693, 4326)10 decimal (10).
c) (1011111000110101, 01101110110)2 , 6 · 95 + 8 · 94 + 7 · 93 + 8 · 92 +
70
A. Dicas dos exercicios.
Capitulo 2
71