Didática
Didática
Didática
Didática
e aprendizagem, levantando reflexões sobre a não neutralidade do fazer educativo.
O campo de estudo da didática propicia a reflexão sobre concepções e práticas
realizadas nas escolas e possibilita rever e superar encaminhamentos que não
contribuem com o sucesso dos alunos.
Nesse viés, esta obra permite ao futuro professor analisar as práticas pedagógicas Regiane Laura Loureiro
e propor planejamentos e estratégias que corroborem com a visão de sujeito que se
Didática
deseja formar: cidadãos reflexivos, críticos e autônomos.
Com base em uma pedagogia crítica, de processos de ensino que garantam o
direito à aprendizagem, são propostos, além dos métodos de ensino e de estratégias
a serem utilizadas pelos docentes, encaminhamentos didático-pedagógicos que
consideram cada um dos estudantes em sua integralidade.
facebook.com/iesdebrasil
58083 9 788538 764113
Didática
Apresentação 7
Gabarito 105
Apresentação
Esta obra discute como a didática pode contribuir para os processos de ensino e
aprendizagem, levantando reflexões sobre a não neutralidade do fazer educativo. O campo de
estudo da didática vai além dos métodos de ensino e de estratégias utilizadas pelos docentes,
propicia a reflexão de concepções e práticas realizadas nas escolas e possibilita rever e superar
encaminhamentos que não contribuem com o sucesso dos alunos.
A didática não apenas prepara o professor para atuar em sala de aula, ela também lhe
possibilita inter-relacionar suas ações à visão de sujeito, de homem, de aprendizagem, de ensino e
de sociedade que se deseja, buscando coerência entre concepções e processos de ensino.
No segundo capítulo, tratamos das tendências pedagógicas ou teorias do ensino, além das
concepções de ensino e de aprendizagem. Autores que defendem uma visão emancipatória e
reflexiva sobre os processos educativos serão nosso fundamento.
Com base em uma pedagogia crítica, de processos de ensino que corroboram com a garantia
do direito à aprendizagem, nesta obra são trazidos encaminhamentos didático-pedagógicos que
consideram cada um dos estudantes em sua integralidade.
Bons estudos!
1
A sociedade, a escola e a didática
Neste capítulo, situaremos a didática para além dos métodos e das técnicas de ensino,
refletindo sobre a visão difundida no senso comum, que entende que, por exemplo, determinado
professor não tem didática, ou ainda que aquela professora tinha um jeito diferente de passar o
conteúdo, de modo que todos aprendiam.
Para ampliar e aprofundar o assunto, discutiremos o que é, afinal, a didática, contextuali-
zando-a como uma área da pedagogia com objeto de estudo próprio: os processos de ensino.
Enfatizaremos a não neutralidade desse fazer pedagógico, trazendo um histórico da construção
desse campo de estudo, relacionando-o à visão de sociedade, de homem, de sujeito, de escola e de
ensino e aprendizagem de acordo com o contexto político, econômico e social da época.
Para isso, além de destacarmos alguns fatos históricos da sociedade brasileira, traremos
pensadores com seus ideários para discutirmos como o campo da didática foi se construindo e
influenciando os processos de ensino no Brasil.
Com a finalidade de realizar uma síntese dessas reflexões, trataremos da importância
de o professor realizar questionamentos sobre a sua própria prática, pois estes contribuem
para a compreensão da não neutralidade do fazer pedagógico. As perguntas, fundamentadas
em Libâneo (2002), permitem ao docente o entendimento da necessidade de se realizar
encaminhamentos pedagógicos que contribuam para a construção de uma escola e de uma
sociedade efetivamente democráticas.
Assim, neste capítulo buscaremos responder às seguintes questões: o que ensinar? Para que
ensinar? Quem ensina? Para quem se ensina? Como ensinar? Sob que condições se ensina?
campo da didática. Portanto, essa área proporciona ao professor conhecimentos teóricos e práticos
que o incentivam a não utilizar métodos e técnicas sem intenção, pois a didática diz respeito às
intervenções pedagógicas do professor realizadas de modo a considerar qual sujeito se deseja
formar para a sociedade.
Nesse sentido, quando o professor se debruça sobre os conhecimentos da didática para
realizar seu planejamento e as mediações necessárias para que os estudantes aprendam, é necessário
que também se insira nos campos da história da educação, da filosofia, da psicologia educacional
e da sociologia, entre outros saberes da pedagogia e de outras ciências, como economia, direito e
biologia. A Figura 1 ilustra isso.
Figura 1 – Didática e outras disciplinas da área da pedagogia
Currículo e
Planejamento
Sociologia Didática
Educacional
Pedagogia
História da Psicologia
Educação Educacional
Filosofia Biologia
Educacional Educacional
Assim, as intervenções pedagógicas do professor se tornam mais conscientes, uma vez que
as mediações realizadas com os estudantes são feitas de modo a considerar quem são eles, quais
seus interesses, seus pontos de vista e seus contextos, levando em conta também de que forma
atingir esse público, o que deve ser ensinado e em quanto tempo será ensinado.
Como afirma Libâneo (2006), muitas pessoas acreditam que, para ser professor, basta a
pessoa “levar jeito” ou ter um dom, porém isso não é verídico, pois a formação profissional docente
requer estudo teórico e também muita prática, o que permite se articular com as exigências da
sociedade em formar sujeitos em sua dimensão cognitiva, mas também nos aspectos físico-motor,
social, emocional, artístico e espiritual.
Se desejamos formar cidadãos em sua integralidade, precisamos também formar professores
que busquem em si mesmos essa integralidade, relacionando teoria e prática em um movimento
dialético entre agir-refletir-agir. Nesse viés, a didática orienta os professores a agir com base
em situações concretas, na busca pela consolidação das aprendizagens de todos os estudantes
(LIBÂNEO, 2002).
Na didática voltada à formação para a cidadania e para as lutas democráticas, o docente busca
estratégias metodológicas que sejam coerentes com essa concepção. Nesse sentido, ao organizar o
trabalho pedagógico, lança mão de encaminhamentos que promovam a aprendizagem de todos
os estudantes, acompanhando o processo de construção do conhecimento de cada um deles. Para
aqueles que não atingiram os objetivos a serem consolidados no período planejado, o professor
retoma as suas estratégias, revê suas ações e organiza atividades desafiadoras considerando as
individualidades, a fim de que nenhum estudante seja excluído do seu direito de aprender.
A didática, portanto, tem um papel fundamental na luta contra o fracasso escolar, pois a
permanência do estudante e seu sucesso têm uma intrínseca relação com a forma como os objetivos
educacionais são delineados e com as concepções dispostas no PPP.
Exemplo:
No PPP de uma escola, verificou-se que havia uma concepção de
aprendizagem voltada à discriminação daqueles que tinham menor
poder aquisitivo. Ao ser observada tal situação, houve um retorno para
a escola sobre a inconstitucionalidade desse aspecto considerando que
isso afetava o direito de todos os estudantes. A escola precisou rever
o documento, no entanto, após algum tempo, verificaram-se casos de
estudantes que estavam sendo reprovados, mesmo tendo condições de
serem aprovados, com o discurso de que determinadas famílias não
eram merecedoras da aprovação.
12 Didática
educacional era fundamentada na catequização dos indígenas, mas, segundo Veiga (2011), para a
elite colonial havia uma educação de outro tipo, voltada para o ensino geral e enciclopédico.
Na Ratio studiorum, as verificações avaliativas eram realizadas por provas escritas e orais, nas
quais os alunos deveriam demonstrar o que aprenderam (VEIGA, 2011). A metodologia explícita
no plano continha o trinômio: estudar, repetir e disputar.
Em 17591, o Marquês de Pombal (primeiro-ministro de Portugal de 1750 a 1777) expulsou
os jesuítas do Brasil, com o objetivo de abolir o domínio desses religiosos sobre os indígenas,
principalmente nas fronteiras do país (MACIEL; NETO, 2006).
Pombal pretendia que os indígenas libertos da escravidão e do domínio dos religiosos se
miscigenassem e fossem utilizados na mão de obra do Brasil Colônia. Com ideias iluministas,
o marquês estabeleceu, com base no Alvará de 28 de junho de 1759,
total destruição da organização da educação jesuítica e sua metodologia de
ensino, tanto no Brasil quanto em Portugal; instituição de aulas de gramática
latina, de grego e de retórica; criação do cargo de “diretor de estudos” –
pretendia-se que fosse um órgão administrativo de orientação e fiscalização do
ensino; introdução das aulas régias – aulas isoladas que substituíram o curso
secundário de humanidades criado pelos jesuítas; realização de concurso para
escolha de professores para ministrarem as aulas régias; aprovação e instituição
das aulas de comércio. (MACIEL; NETO, 2006, p. 470)
Assim, com ideias iluministas, que se difundiam por toda a Europa, o marquês acreditava que
a educação exigia um novo homem que poderia ser formado apenas por intermédio da educação.
E esta deveria ser laica, ou seja, livre dos pensamentos religiosos, tanto que instituiu professores
régios, que eram pagos com honorários vindos da Coroa portuguesa, ocorrendo pela primeira vez
uma educação custeada pelo Estado.
Quanto aos métodos utilizados, o marquês pretendia substituir aqueles tradicionais de
ensino, instituindo os que considerassem a formação desse novo homem que utilizava a razão para
resolver as questões do cotidiano. No entanto, conforme Maciel e Neto (2006), a reforma foi mais
no conteúdo do que no método, e continuavam as formas de ensinar por meio da memorização e
da repetição.
Em meados de 1870, suprime-se o ensino religioso confessional das escolas públicas do
Brasil, após a reforma de Benjamin Constant, sob a influência do positivismo2, definindo-se
assim a laicidade3 das escolas públicas. Segundo Zanatta (2005), essa reforma utilizava-se
do método intuitivo, inspirado em Pestalozzi (1746-1827). Esse educador, nascido na Suíça,
retomou os pressupostos defendidos por Rousseau (1712-1778), que tinham a educação como
processo, considerando que seria o contato da criança com o mundo o que despertaria suas
potencialidades naturais.
Outra preocupação colocada por Pestalozzi em seu método era o de aprender fazendo,
pois era a atividade que levaria ao desenvolvimento das habilidades cognitivas e físicas. Para o
educador, era necessário o contato dos alunos com os objetos, precedendo o uso de figuras para
que ocorresse a aprendizagem.
Conforme Veiga (2011), o professor era o centro dos processos de ensino e de aprendizagem
e o responsável por transmitir o conhecimento enciclopédico aos estudantes.
Essa concepção de ensino tradicional seguia os passos delineados pelo educador alemão
Johann Friedrich Herbart (1776-1841), que entendia o estudante como uma tábula rasa e delegava
ao professor o governo, a instrução e a disciplina (VEIGA, 2011).
No governo, o professor agiria para controlar a agitação natural das crianças, formando-as
para o mundo adulto e possibilitando a instrução, esta é o foco da educação e é por meio dela que o
docente verifica qual é o interesse dos estudantes. Grande importância também é dada à disciplina,
que ensina os estudantes a permanecerem no caminho da virtude e da moral. É uma escola com
disciplina e métodos de ensino rígidos.
Para Herbart, o aluno é um ser passivo que apenas recebe as informações do professor.
A didática centra-se no intelecto e é fundamentada em regras lógicas, instrucionais. Ao estudante
cabe o silêncio e por meio da disciplina se mantém a atenção ao conteúdo transmitido (VEIGA, 2011).
De acordo com Marzari (2011), no final da década de 1930 a disciplina de didática começa a
ser ministrada em cursos de formação de professores, constituída, ainda, de métodos e técnicas de
ensino descolados de outras discussões sobre contextos históricos, políticos e econômicos, como
se houvesse neutralidade na ação pedagógica.
Entre 1930 e 1945, houve um cenário de mudanças no campo educacional brasileiro
decorrente da reorganização dos aspectos econômico e político do país. Após a Revolução de 1930,
liderada por Getúlio Vargas, que permaneceu no poder até 1954, é criado o Ministério da Educação
e da Saúde Pública e em 1931 é implantada a Reforma Francisco Campos.
É na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo que se tem
a didática como disciplina em cursos de graduação, cujo foco era a qualificação do ensino
(MARZARI 2011).
O discurso liberal escolanovista começa a chegar ao Brasil em meados de 1920, mas é em
1932, no Manifesto da Escola Nova, que esse movimento se consolida. Na Escola Nova, diferente
da escola tradicional, cujo foco era o professor, o centro é o estudante. Essa bandeira também foi
levantada pelo Manifesto dos Pioneiros, de Lourenço Filho, Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo
e outros.
Nesse manifesto, a educação científica é estabelecida como método, fundamentando-se em
Pestalozzi, Froebel, Dewey, entre outros educadores que defendiam a expansão do ensino público,
a laicidade e a valorização do estudante como centro do processo educativo.
Segundo Gadotti (1996), na Escola Nova a aprendizagem deveria ser ativa, pois assim a
criança aprenderia a aprender. Nessa pedagogia, a didática ocorre pela ação do estudante e não pela
instrução, como na escola tradicional.
A sociedade, a escola e a didática 15
Conforme Veiga (2011), a maior dificuldade da Escola Nova foi a não consideração da
realidade e da influência econômica, política e histórica nos processos educativos, pois para essa
pedagogia os problemas e as dificuldades da escola deveriam ser sanados por ela mesma, visto que
os desafios a serem enfrentados eram técnicos.
De 1945 a 1960, a economia brasileira passou por uma fase de aceleração advinda da
substituição das importações e da inserção do capital internacional no país. O modelo político
esteve fundamentado nos pressupostos democráticos e era crescente a participação da população
na sociedade. Mesmo nesse contexto, a didática perdeu espaço e foi introduzida a disciplina de
Prática de Ensino, que tinha uma concepção menos abrangente dos processos (VEIGA, 2011).
No período posterior a 1964, os rumos políticos do país se alteraram. Buscava-se a aceleração
do crescimento econômico e a educação tinha um papel fundamental nesse processo. Nesse viés, o
tecnicismo assumido pelo grupo militar e burocrático foi instaurado como concepção de trabalho
(VEIGA, 2011).
Assim, a pedagogia tecnicista via a didática sob a perspectiva ingênua de que os métodos
e as técnicas utilizados no contexto educacional eram neutros. Diante dessa concepção, o mais
importante eram os planos, os objetivos instrucionais. O professor era considerado um mero
executor do que já tinha sido previamente determinado.
Na década de 1980, instala-se a Nova República e com ela a ascensão do governo civil ao
poder, pondo fim ao governo militar. A luta pela democracia atinge todas as instâncias da sociedade,
inclusive a escola.
A partir da Constituição de 1988 e da LDB n. 9.394/1996, garante-se ao cidadão brasileiro o
direito não apenas à matrícula em uma escola, mas também a nela permanecer.
Nesse contexto, a didática contribui para que o professor se politize, não reproduza métodos
e técnicas em sala de aula desvinculados de contextos. Procura-se refletir sobre os contextos
histórico, político e culturais da sociedade, da comunidade educativa e dos estudantes, buscando
analisar as contradições de forma dialética, ou seja, a escola é influenciada pela sociedade, mas
também a influencia (SAVIANI, 2007).
Já a contemporaneidade, segundo Gadotti (2013), é marcada pelo projeto neoliberal, que
se consolida nacional e internacionalmente, ampliando a exclusão social e cultural. O centro da
política neoliberal é o mercado e a não interferência do Estado na economia, assim, abre-se mão de
um projeto social transformador para formar um sujeito para o mercado de trabalho.
A escola, nessa concepção, forma o homem com competências para se adequar ao mercado
e não para o trabalho. A didática, nesse contexto, não é reflexiva, mas reproduz métodos e técnicas
empresariais que visam à qualidade total e não à qualidade educacional dos processos de ensino e
de aprendizagem. De acordo com Veiga (2011), essa didática prepara para o fazer, para o executar,
e não para que o sujeito questione a ordem vigente.
Na atualidade, várias são as concepções e também vários os encaminhamentos que decorrem
dos modos de se conceber a educação, o sujeito, o estudante, os métodos de ensino e as formas de
aprender. Logo, a didática comprometida com a transformação social, segundo Candau (2012),
16 Didática
Libâneo (2002) sintetiza os propósitos da didática por meio de perguntas, as quais trazem
elementos para a compreensão do que essa disciplina significa para a formação do professor,
conforme exposto na Figura 2.
Figura 2 – Categorias do objeto de estudo da didática
Sob que
condições se O que ensinar?
ensina?
Didática
Para quem
se ensina?
Exemplo:
O professor verifica que no PPP de sua escola a concepção de formação
humana busca a integralidade do sujeito. Nesse sentido, ao propor
atividades para o desenvolvimento da habilidade compreensão leitora,
referente à língua portuguesa, ele deve decidir de que forma organizará
em seu planejamento estratégias a fim de que o estudante realize leituras
não apenas fluentes, mas que vão além do texto lido. Para desenvolver
a habilidade, que é direito de aprendizagem do estudante, o professor
tem a possibilidade de não apenas utilizar os conteúdos referentes ao
componente curricular de Língua Portuguesa, mas de relacionar outros
saberes e outras leituras referentes a outras linguagens e outras áreas
do conhecimento.
Dessa forma, a didática proporciona ao docente uma leitura ampliada dos contextos de
aprendizagem, não limitando os processos de ensino a uma suposta neutralidade e ao uso de
métodos e técnicas. O que não quer dizer que o professor não lance mão de múltiplas estratégias
que contribuam para a consolidação da aprendizagem dos estudantes.
Considerações finais
Em síntese, o campo da didática é o ensino, porém, este não se resume a estratégias
metodológicas e técnicas isoladas de um contexto histórico, cultural e econômico.
Assim, quando o professor organiza seu planejamento de ensino e seu plano de aula (que
trataremos nos próximos capítulos) e escolhe os melhores caminhos para a consolidação dos
processos de aprendizagem, não está isolado das ideologias, dos conflitos, das tensões e dos
propósitos da sociedade em que está inserido.
Quando ciente de que seus encaminhamentos metodológicos podem coadunar ou não
na formação de sujeitos autônomos, críticos e partícipes da vida em sociedade, o professor tem
mais condições de escolher as melhores formas de ensinar os conteúdos aos quais os estudantes
têm direito.
Nesse sentido, não há neutralidade na ação do professor e no campo da didática,
considerando que a ação de ensinar se faz com algum propósito, pois a escola é lugar de planejar,
de aprender, de partilhar conhecimentos, de interagir, de questionar e de contribuir para a
formação de sujeitos integrais.
A sociedade, a escola e a didática 19
• O NOME da rosa. Direção: Jean Jacques Annaud. Produção: Bernd Eichinger. Intérpretes:
Sean Conery, F. Murray Abraham, Cristian Slater. 1986. 130 min. son., color.
O filme retrata como na Idade Média a busca pelo conhecimento e a sua difusão passavam
obrigatoriamente pela Igreja católica. Detentora de muitos livros, a ordem religiosa decidia
quais deveriam ser de acesso aos monges e quais que eram proibidos.
• A SOCIEDADE dos poetas mortos. Direção: Peter Weir. Produção: Tom Schulman.
Intérpretes: Robin Williams, Robert Sean Leonard, Ethan Hawke. 1989. 128 min. son., color.
Atividades
1. Por meio da figura a seguir, explicite como estas questões ilustradas podem contribuir para
a compreensão do professor sobre o campo de estudos e de atuação da didática.
Para que
ensinar?
Didática
Como Quem
ensinar? ensina?
Para quem
se ensina?
3. Segundo Veiga (2011), na concepção de que o aluno é um ser passivo que apenas
recebe informações, tendo como centro o intelecto, a didática será fundamentada em
regras, lógicas e instruções. Nessa forma de ensino, cabe ao estudante o silêncio, que se
consegue por meio da disciplina e da atenção ao conteúdo a ser transmitido. Discorra
sobre a concepção de homem, sociedade e sujeito da aprendizagem que se deseja formar,
analisando se as práticas educativas presentes nessas formas de ensinar ainda são uma
realidade nas escolas brasileiras.
Referências
CANDAU, Vera Maria. A didática e a formação de educadores – da exaltação à negação: a busca da relevância.
In: CANDAU, Vera Maria (org.). A didática em questão. Rio de Janeiro: Vozes, 2012.
FERRARI, Márcio. Ovide Decroly, o primeiro a tratar o saber de forma única. Revista Nova Escola, 2008.
Disponível em: https://novaescola.org.br/conteudo/1851/ovide-decroly-o-primeiro-a-tratar-o-saber-de-
forma-unica. Acesso em: 16 mar. 2019.
GADOTTI, Moacir. História das ideias pedagógicas. São Paulo: Ática, 1996.
LIBÂNEO, José Carlos. Didática: velhos e novos temas. Goiânia: Edição do autor, 2002.
MACIEL, Lizete Shizue Bomura; NETO, Alexandre Shigunov. A educação brasileira no período pombalino:
uma análise histórica das reformas pombalinas do ensino. Educação e Pesquisa, São Paulo, v.32, n.3, p. 465-
476, set./dez. 2006. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ep/v32n3/a03v32n3.pdf. Acesso em: 16 mar.
2019.
A sociedade, a escola e a didática 21
MARZARI, Marilene. A didática na formação de professores no Brasil. Revista Instrumento. Juiz de Fora,
v. 13, n. 2, jul./dez. 2011. Disponível em: http://ojs2.ufjf.emnuvens.com.br/revistainstrumento/article/
view/18723/9837. Acesso em: 10 maio 2019.
VEIGA, Ilma Passos Alencastro. Didática: uma retrospectiva histórica. In: VEIGA, Ilma Passos Alencastro
(org.). Repensando a didática. São Paulo: Papirus, 2011.
ZANATTA, Beatriz Aparecida. O método intuitivo e a percepção sensorial como legado de Pestalozzi para
a geografia escolar. Cad. Cedes. Campinas, vol. 25, n. 66, p. 165-184, maio/ago. 2005. Disponível em: http://
www.scielo.br/pdf/ccedes/v25n66/a03v2566.pdf. Acesso em: 13 maio 2019.
2
Tendências pedagógicas e a
construção do conhecimento
1 O direito à educação exige a intervenção do Estado em políticas equânimes, pois, assim como saúde, previdência
social, proteção à infância, é um direito fundamental do ser humano. Nas políticas de equidade, busca-se intervir para que
aquele que não tem igualdade de condições tenha seus direitos garantidos.
Tendências pedagógicas e a construção do conhecimento 25
Questões norteadoras
Para que ensino?
Há estudantes que não aprenderam? Diante desse diagnóstico, o que fazer para que
todos aprendam, sem culpar o estudante e seu contexto familiar, social etc.?
A forma como estou realizando minha prática contribui para que o estudante aprenda?
Essas tendências que veremos a seguir não são apresentadas nas ações educacionais de forma
pura, mas se intercruzam em alguns momentos e se distanciam em outros (LIBÂNEO, 1992).
2 Laissez-faire é uma expressão francesa que significa “deixar fazer, deixar passar”, utilizada no século XVIII para
defender o livre comércio, sem taxas alfandegárias.
28 Didática
A pedagogia liberal tem a função de preparar os indivíduos para essa sociedade, não
buscando encaminhamentos metodológicos em que o conhecimento científico, histórico e cultural
sejam alicerce para a criticidade. Ao contrário, os alunos são preparados para ocupar lugares
meritocracia: predeterminados na sociedade. Há ênfase na igualdade de oportunidades, porém a meritocracia
estabelece uma
inter-relação entre
subsidia esse discurso. Se o aluno não conseguiu aprender, é porque não se esforçou, não porque
mérito e poder.
não lhe foram dadas as condições para a aprendizagem.
Pensemos em uma educação fundamentada no princípio da meritocracia. Ela defenderá
que as crianças têm sempre as mesmas oportunidades, sejam elas de famílias que as negligenciem
ou pertencentes a famílias presentes em sua educação, que garantam sua matrícula e frequência
na escola e contribuam para seu desenvolvimento pleno. Nessa visão, não são consideradas as
condições de suprimento das necessidades básicas dos estudantes, tampouco a marginalização e a
exclusão já existentes na sociedade.
Segundo Valle e Ruschel (2010), a palavra meritocracia é composta da junção entre mérito +
cracia (que significa governo), assim, o termo refere-se, essencialmente, à hierarquia social, política
e burocrática justificada nas lutas individuais.
As pedagogias liberais se baseiam na meritocracia, pressupondo que nem todos são capazes
de aprender, pois acreditam na responsabilidade de cada um por suas próprias conquistas. Se o
indivíduo não conseguir, a culpa é exclusivamente dele.
Segundo Libâneo (2013), são quatro as tendências pedagógicas que se fundamentam nesse
princípio, as quais explicitaremos a seguir.
Professor: facilitador,
ajuda o estudante a Aprender é modificar Técnicas de
Tendência organizar-se. Deve as próprias sensibilização, tendo
Adequação do
liberal “ausentar-se” das percepções. O aluno em vista melhorias
indivíduo à vida em
renovada não interferências. aprende o que estiver no relacionamento
sociedade.
diretiva Estudante: deve ter relacionado a essas pessoal e na vida em
motivação intrínseca percepções. sociedade.
para aprender.
Não há diretividade,
assim, o professor É na vivência em
Gera transformação é um orientador, se grupos que os
Tendência Atividades
nos estudantes, mistura ao grupo estudantes aprendem
progressista em grupos e
tornando-os de estudantes para e podem utilizar o que
libertária assembleias.
autogestionários. refletir sobre as aprenderam em novas
temáticas escolhidas situações.
para os debates.
Parte-se da prática
social, identificam-
É na escola em que
se os problemas,
há apropriação dos
instrumentalizam-se
saberes sistematizados
os sujeitos de forma
(ciência).
teórica e prática.
A educação tem
O aluno, com sua Posteriormente
papel transformador
experiência imediata, vem a etapa da
social. A escola é
Tendência Professor: mediador. confronta seus catarse, que é a
contextualizada
progressista Estudante: saberes com os compreensão do
historicamente e tem
crítico- participante do conhecimentos problema com uma
consciência dos seus
social dos processo de sistematizados, o que nova forma de vê-lo.
condicionantes,
conteúdos aprendizagem. causa ruptura com Por último, temos a
por meio dos
os saberes pouco etapa denominada
conteúdos
elaborados. de prática social,
instrumentaliza os
em que o estudante
sujeitos para uma
volta ao ponto
participação ativa
inicial, porém
em uma sociedade
tem condições
democrática.
instrumentais de
mudar a realidade.
Fonte: Elaborado pela autora com base em Libâneo, 1992 e Luckesi, 1994.
Como pudemos observar, as pedagogias progressistas trazem uma perspectiva crítica sobre
as questões sócio-políticas; já as tendências liberais trazem em seu cerne a reprodução, objetivam
formar um sujeito que se adeque às realidades sociais em nome de uma pretensa neutralidade e da
negação das ideologias presentes na sociedade.
Com o intuito de aprofundar essa discussão, refletiremos sobre como as tendências
pedagógicas progressistas podem contribuir para a construção de uma escola em que professores
e estudantes dialoguem, em que o professor realize mediações no processo de construção
de conhecimento, de forma que os estudantes superem o conhecimento do senso comum e se
Tendências pedagógicas e a construção do conhecimento 31
apropriem do conhecimento científico. As pedagogias progressistas vão apontar também para uma
relação de sala de aula em que a ética, o respeito às diferenças, a inclusão, a participação e o direito
à aprendizagem se consolidem de forma a buscar uma gestão democrática em todos os segmentos
da sociedade, inclusive na escola.
Vale ressaltar que a gestão democrática não equivale a realizar o que se deseja, mas diante
da legislação vigente, do PPP da escola, do regimento escolar e do compromisso com uma escola
de qualidade, organizar propostas e encaminhamentos que garantam aos estudantes condições de
serem conscientes de seus direitos e deveres.
Exemplo:
Um professor de Ciências percebe que os estudantes não separam o lixo
na escola. Decide, então, promover discussões sobre sustentabilidade.
Organiza, para isso, um projeto envolvendo todos os estudantes e outros
professores. Eles pesquisam em sites científicos, o professor traz notícias
sobre o tema. No jornal da escola, os estudantes publicam entrevistas
com moradores mais antigos da comunidade, que falam como era o
rio próximo da escola antes de ter sido contaminado. Os estudantes
aprendem sobre reciclagem e levam panfletos para casa. Nesses panfletos
produzidos por eles, há a intenção de contar aos responsáveis sobre a
importância de reciclar. A pedagoga, com o apoio da equipe gestora,
organiza um ciclo de minipalestras sobre esse tema. Os estudantes vão
até uma usina de reciclagem para observar o processo de separação e
transformação dos materiais e fazem entrevistas. Nos murais da escola,
são expostas produções dos estudantes sobre as aprendizagens realizadas.
Eles passam a separar lixo na escola e em casa, incentivando as famílias
a fazerem o mesmo.
32 Didática
Nesse exemplo, podemos observar que quando o estudante não apenas tem acesso a
informações, mas de fato aprende, ele agirá conscientemente, utilizando esses saberes em
seu cotidiano e provando que houve superação de um saber de senso comum, espontâneo.
Dessa forma, apropria-se do conhecimento elaborado e sistematizado (científico).
A tendência progressista crítico-social dos conteúdos, que se fundamenta no materialismo
histórico-dialético de Marx3 (1818-1883), utiliza-se da dialética para compreensão e atuação nos
processos educacionais.
No método dialético (Figura 1), defendido por Saviani (2009), o professor terá os seguintes
passos para concretizar, com a ressalva de que eles não seguem uma ordem, podendo o docente ir e
vir pelos passos até que o estudante tenha domínio do saber científico e historicamente acumulado
pela humanidade.
Figura 1 – Passos do método dialético
Prática social:
ponto de partida
Prática social:
Problematização
ponto de chegada
Professor
mediador do
processo educativo
Catarse Instrumentalização
3 Karl Marx foi um filósofo, sociólogo, jornalista e estudioso das teorias econômicas. Suas teorias versam sobre
história, filosofia, economia e sociologia.
Tendências pedagógicas e a construção do conhecimento 33
Exemplo:
Um professor de 5º ano verifica que, conforme o currículo da escola, ele
precisa trabalhar com o conteúdo rios. O docente observa que próximo à
escola há um rio poluído. Se fosse um professor fundamentado em uma
tendência liberal tecnicista, ele abriria o livro didático, em determinada
página, as crianças também poderiam utilizar alguma tecnologia para
memorizar o conteúdo e posteriormente seria proposto um exercício
de fixação. Já um professor que embasa suas ações em tendências
progressistas, como a pedagogia histórico-crítica, problematizaria a
situação do rio, coletaria (com instrumentos próprios) amostras desse
rio, faria a análise dessas amostras, buscaria a história do rio, como
ele era antes de ser poluído, o que o levou ao atual estado e por quê.
Traria textos científicos para os estudantes, incentivaria a pesquisa,
poderia realizar entrevistas com antigos moradores e, em conjunto com
a comunidade educativa, buscaria possíveis soluções.
As demais tendências progressistas também podem inspirar ações para a prática docente,
pois se desejamos formar um sujeito crítico, reflexivo e atuante na vida em sociedade, buscando a
superação das desigualdades, necessitamos construir pedagogias que, no cotidiano escolar, tragam
esse resultado.
Dessa forma, quando o professor se remete à tendência pedagógica progressista libertadora,
ele tem condições de buscar a superação de uma “educação bancária”, que, conforme Freire (1996),
não considera os saberes dos educandos, “depositando neles os saberes” em forma de exercícios de
repetição, seguindo prescrições.
O professor, em uma concepção libertadora, segundo Freire (1996), não compreende os
sujeitos como seres vazios de saberes, mas será problematizador dos contextos sociais, questionando
a realidade social por meio do diálogo e da análise do objeto do conhecimento. Assim, o educador se
modifica enquanto educa, pois “os homens educam-se em comunhão, mediatizados pelo mundo”
(FREIRE, 1996, p. 63).
A tendência progressista libertária, fundamentada em Célestin Freinet4 (1896-1966),
é uma pedagogia antiautoritária, que questiona as estruturas do sistema e os mecanismos
institucionais burocráticos. Segundo Luckesi (1994), a aprendizagem ocorre com o agrupamento
dos estudantes em organizações como assembleias, reuniões, conselhos, grêmios estudantis etc.
Embasado nessa tendência, o professor, na defesa de uma escola pública gratuita e de
qualidade, poderá levar ao colegiado escolar reflexões sobre a necessidade de organizar com a
comunidade educativa mecanismos em que haja participação dos estudantes, possibilitando-lhes
ter voz na organização e nas decisões da escola.
Ao não dar ênfase às tendências libertárias, não queremos dizer que não há elementos
que possam ser úteis ao trabalho docente, como na tendência liberal tecnicista, que se utiliza de
técnicas e de recursos tecnológicos para subsidiar sua ação pedagógica. Essa pedagogia se utilizava
desses mecanismos de forma acrítica. Porém, quando um professor tem seus pressupostos voltados
à formação humana na sua integralidade, utilizará esses recursos de forma a contribuir para a
construção do conhecimento científico de forma reflexiva.
4 Célestin Freinet foi um educador francês que acreditava ser necessário transformar a escola por dentro, por meio da
cooperação e da interação entre professor e estudante. Para o educador, o objetivo da educação era transformar o meio
e emancipar o sujeito.
Tendências pedagógicas e a construção do conhecimento 35
Segundo Libâneo (2006), a escola da atualidade tem muitos desafios, dentre eles repensar
os processos de ensino e de aprendizagem na sociedade do conhecimento. Os estudantes têm
múltiplas informações, têm acesso às tecnologias digitais, porém, sem a mediação do professor,
os pressupostos da tendência liberal tecnicista continuarão em voga.
Assim, não basta aos professores possibilitarem o acesso a novas tecnologias, é necessário
superar paradigmas que ainda vigoram em nossas escolas. Caso contrário, o professor pode
incentivar os estudantes a utilizar um tablet em sala de aula, mas para as mesmas atividades de
cópia de informação.
O pedagogo, em uma perspectiva pedagógica progressista, assume o compromisso com o
coletivo escolar de exercer sua função na organização do trabalho pedagógico, buscando garantir
o alcance do conhecimento científico a todos os estudantes. Assim, se esse profissional verifica
que há professores distanciados desse compromisso, sua função é encontrar estratégias para que
o planejamento, bem como seus encaminhamentos em sala de aula e as inter-relações com os
estudantes e com os demais profissionais da escola, estejam de acordo com o previsto na proposta
pedagógica da instituição.
Segundo Libâneo (2006), nada mais pode ser improvisado na escola, todas as ações
precisam estar de acordo com o PPP da instituição educativa e os pressupostos ali sistematizados.
Nesse sentido, todas as ações realizadas estão inter-relacionadas ao currículo escolar. Assim,
se o coletivo escolar estiver fortalecido, o pedagogo não buscará de forma individualizada soluções
para as tensões que ocorrem no cotidiano escolar, mas com a comunidade educativa encontrará
estratégias que visem à consolidação do direito à educação.
O pedagogo, enquanto intelectual comprometido com esse direito e com a construção de
uma sociedade efetivamente democrática, viabilizará na escola articulações que promovam o
trabalho coletivo, no qual todos os envolvidos busquem a melhoria do ambiente educacional tendo
em vista a aprendizagem significativa dos estudantes. Para exemplificar essa questão, citamos uma
situação vivenciada em certa escola.
Exemplo:
O pedagogo notou que a professora estava trabalhando conforme
descrito no currículo: habitação na Grécia Antiga. A educadora,
em determinado dia, usou os livros didáticos para explorar o tema,
as crianças desenharam e falaram sobre o assunto. De repente, os
alunos começaram a fugir desesperadamente. O motivo: viram seus
móveis sendo jogados para fora de suas casas, construídas em local
irregular. No dia seguinte, a professora continuaria com a matéria
que foi interrompida. No entanto, refletiu-se sobre a melhor forma de
possibilitar o acesso ao conhecimento histórico, sem perder de vista a
realidade social dos estudantes. Assim, o planejamento foi reelaborado
Tendências pedagógicas e a construção do conhecimento 37
Considerações finais
Ao refletirmos sobre a função social da escola de garantir o direito à aprendizagem e ao
nos posicionarmos na defesa dos pressupostos democráticos como condição para o trabalho
pedagógico, objetivando a formação integral dos estudantes, precisamos nos remeter aos
pressupostos das tendências pedagógicas progressistas, pois são elas que nos fundamentam para
sermos profissionais crítico-reflexivos e assim buscarmos uma prática pedagógica que esteja em
consonância com o PPP da escola em que atuamos.
As formas como o trabalho pedagógico na escola é organizado e colocado em ação pelos
diferentes profissionais que lá atuam (professores, pedagogos, coordenadores pedagógicos, diretores,
entre outros) são fundamentadas em tendências pedagógicas, mesmo que esses profissionais não
se posicionem ou se digam neutros.
Dessa maneira, explícita ou implicitamente, há concepções pedagógicas que balizam o
trabalho educativo e, quando há o discurso da neutralidade, o profissional constrói o seu fazer
pedagógico sob o pressuposto das tendências pedagógicas liberais, que não assumem, segundo
Libâneo (2006), um compromisso com a transformação da sociedade, defendendo apenas a
adaptação dos indivíduos a ela.
Assim, se desejamos formar para a autonomia, para a reflexão e para a busca de uma
sociedade mais igualitária, necessitamos nos debruçar sobre as tendências pedagógicas e rever
continuamente a nossa prática educativa à luz das teorias.
38 Didática
Atividades
1. Para Saviani (2009), a práxis educativa não apenas deve relacionar teoria e prática, mas é a
atividade humana que transforma a sociedade. Como o professor que busca fundamentar
suas ações nessa perspectiva pode organizar seu planejamento?
Referências
BECKER, Fernando. Modelos pedagógicos e modelos epistemológicos. In: BECKER, Fernando. Educação e
construção do conhecimento. Porto Alegre: Artmed, 2003.
BRASIL. Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 16 jul.
1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8069.htm. Acesso em: 22 mar. 2019.
GASPARIN, João Luiz. Uma didática para a pedagogia histórico-crítica. São Paulo: Autores Associados, 2009.
Tendências pedagógicas e a construção do conhecimento 39
LIBÂNEO, José Carlos. Democratização da escola pública: a pedagogia crítico-social dos conteúdos. São
Paulo: Loyola, 1992.
LIBÂNEO, José Carlos. Organização e gestão da escola: teoria e prática. São Paulo: Heccus, 2013.
PERES, Claudio Afonso; SILVA, João Carlos. Educação e liberalismo: O público e o privado no ensino
superior em questão. Revista HISTEDBR On-line: Unicamp, 2006. Disponível em: http://www.histedbr.
fe.unicamp.br/acer_histedbr/seminario/seminario7/TRABALHOS/C/Claudio%20afonso%20peres.pdf.
Acesso em: 23 mar. 2019.
VALLE, Ione; RUSCHEL, Valle Elizete. Política educacional brasileira e catarinense (1934-1996): uma
inspiração meritocrática. Revista Eletrónica de Investigación y Docência, v. 3, p. 73-92, 2010. Disponível em:
https://revistaselectronicas.ujaen.es/index.php/reid/article/viewFile/1162/984. Acesso em: 23 mar. 2019.
3
Planejar para quem?
Avaliação Elaboração
Concretização
Observa-se que o planejamento deve ser dinâmico. Se o professor avaliar que sua organização
pedagógica não está atingindo os objetivos propostos, terá de redimensionar o trabalho. Portanto,
não se avalia apenas a aprendizagem do estudante, mas sobretudo o ensino realizado pelo professor.
O processo de autoavaliação é, pois, fundamental para que os objetivos educacionais propostos
sejam concretizados.
Um dos elementos essenciais para a concretização dos objetivos educacionais propostos no
planejamento é a efetivação de atividades significativas aos estudantes, que promovam reflexão e
desafios considerando a heterogeneidade da turma. Em cada turma há estudantes que aprendem
em ritmos e de formas diferenciadas, cabendo à escola organizar tempos e espaços que contemplem
todos, uma vez que todos são capazes de aprender. Isso não significa que o professor deva fazer
um planejamento para cada estudante. Precisa, porém, considerar cada um deles e suas diferentes
formas de aprender.
As pessoas são únicas e, mesmo que fosse possível criar de forma artificial uma turma
com conhecimentos semelhantes e, portanto, homogênea, pouco tempo depois as diferenças
apareceriam:
é inevitável encontrarmos heterogeneidade nos níveis de conhecimento dos
estudantes, não só no primeiro ciclo, como em todas as etapas da escolarização.
Exatamente porque as pessoas humanas são únicas, mesmo que criássemos,
artificialmente, uma turma de alfabetizandos começando o ano letivo com
níveis de conhecimento muito semelhantes (no que diz respeito à língua escrita
e à sua notação), pouco tempo depois iríamos nos defrontar com a visível
diferenciação nos conhecimentos agregados por aqueles estudantes, na mesma
área de linguagem. (CURITIBA, 2018, p. 7)
Planejar para quem? 43
Estratégias diversificadas utilizadas pelo professor para Organização de um grupo de estudantes com o mesmo
contemplar uma turma em relação à apresentação e ao nível de conhecimento.
aprofundamento do conteúdo.
Atividades que, de diferentes maneiras, abordam o O professor personaliza um jogo para os estudantes
mesmo conteúdo. para atender a necessidades específicas.
Como vimos nos capítulos anteriores, ao tratar da história da didática e das tendências
pedagógicas, observamos que não há neutralidade no fazer pedagógico. Dessa forma, se temos uma
concepção humanista de educação e, portanto, de formação humana, a qual defende a integralidade
do sujeito, ao organizar um planejamento precisamos considerar tais questões.
Nessa concepção, a escola buscará formar o sujeito não apenas na dimensão cognitiva,
mas também nas dimensões afetiva, físico-motora, ética, social, lúdica, estética, entre outras,
conforme apresentado na Figura 2.
Figura 2 – Dimensões de um sujeito integral
Dimensão
cognitiva
Dimensão Dimensão
lúdica social
Sujeito
integral
Dimensão Dimensão
estética afetiva
Dimensão
ética
Para a criança, o seu tempo vivido não é fragmentado em grades horárias e o conhecimento
dividido em aulas de cinquenta minutos não lhe faz sentido. Assim, se a escola busca formar para
a integralidade do sujeito, necessita buscar planejamentos em que a curiosidade, a imaginação,
o desafio, a criatividade e o diálogo sejam suas premissas.
Esse tempo continuum é o tempo relacionado à vida dos estudantes, em que não há a
preocupação em vencer os conteúdos previstos para determinados períodos ou com o número de
componentes curriculares a serem aprendidos. Nesse sentido, Moll (2013) ressalta a importância
de aproximar o tempo do relógio, dos cronogramas e dos calendários escolares aos tempos de
vida dos estudantes, pois a escola precisa cumprir esse tempo institucional – regido culturalmente
pela sociedade e pela legislação –, mas não pode perder de vista sua finalidade e o público a que
se destina. Para colocar essa concepção em prática no cotidiano escolar, é preciso:
• considerar quem são os estudantes para os quais ensinamos;
• elaborar planejamentos que considerem os diferentes tempos de aprendizagem;
• contextualizar os conhecimentos a serem ensinados, de forma que os estudantes se sintam
desafiados a aprender;
• planejar atividades diferenciadas e diversificadas;
• avaliar o planejamento e, se necessário, replanejar;
• considerar os espaços educativos como elementos curriculares a serem planejados e
mediados na organização do planejamento;
• observar os estudantes e com eles dialogar, não se posicionando de forma autoritária.
Outras ações podem ser sugeridas a fim de efetivar uma proposta que escute e observe
quem são os sujeitos da educação. É essa reflexão que traremos a você na próxima seção, na qual
trataremos dos desafios do professor na construção do conhecimento com os estudantes.
De acordo com Ferreira e Souza (2018), do jornal O Globo, houve uma queda no número
de matrículas no ensino fundamental, que, segundo os estatísticos do Ministério de Educação
e Cultura (MEC) entrevistados, é explicada pela mudança no perfil demográfico da população,
ou seja, há menos estudantes ingressando na etapa. Para o MEC, o ensino fundamental está
universalizado em 99%, o que traz à educação brasileira outros desafios: o direito à matrícula
está quase consolidado, necessitamos conquistar a efetivação do direito à aprendizagem.
Ao pensarmos na qualidade dos processos de ensino ofertados a esses estudantes, ainda
temos muito a conquistar em nosso país. Nós, educadores, precisamos compreender que a escola
da nossa infância, com suas concepções, metodologias e formas de ensino fundamentadas em
pressupostos tradicionais, em que o controle, a disciplina, o silêncio e o exercício de repetição e de
memorização eram imperativos já não mais funciona.
Conforme Arroyo (2009), é necessário quebrar a imagem que temos da infância e de nossa
postura profissional, pois muitas vezes repetimos uma imagem romantizada da docência: somos
aqueles que regam a plantinha do conhecimento ou que moldam as massinhas em transformação.
Os estudantes seriam as plantinhas, sensíveis, quietinhas e prontas para serem cuidadas.
Essa imagem, segundo o autor, não mais define a infância nem a adolescência.
Diante desses conflitos, para Arroyo (2009) há um mal-estar fecundo, pois, ao enfrentá-
-los, podem-se construir novas configurações para docentes e discentes: estudantes reais, com
seus tempos de vida, com suas vivências e com suas culturas. Sim, os estudantes têm cultura!
E elas são múltiplas! Relatamos, a seguir, uma experiência com formação continuada de professores.
Exemplo:
Recebemos um convite para falar a docentes sobre indisciplina na escola.
A queixa era de que os estudantes não prestavam atenção, não faziam
tarefas e não se comportavam. Refletimos com os profissionais sobre o
PPP da escola, levantando questões relativas a planejamento, currículo e
avaliação. No início, indignação: “Como assim? Não há fórmulas mágicas
nem receitas de contenção de estudantes?” Esperavam um milagre, uma
apostila, o que não houve. Precisamos olhar para a realidade, realizar
diagnósticos sobre a comunidade local e a comunidade educativa,
traçar objetivos, metas, questionando-nos: qual a nossa função
diante desse diagnóstico? O planejamento se faz após uma avaliação
diagnóstica. A indignação deu lugar à reflexão sobre os tempos e os
espaços organizados e mediados para aprendizagem. O saldo final foi
positivo: após a discussão coletiva, compreendeu-se que cabe à escola
oferecer estratégias organizacionais sem fundamentar-se em pedagogias
tradicionais: silêncio, atividades repetitivas, contenção e culpabilização
dos estudantes.
Planejar para quem? 47
Conforme Arroyo (2009), é necessário trazer os estudantes para o centro do nosso olhar e
superar a imagem de alguém que está pronto a obedecer, dócil e que se não fizer a atividade estará
pronto a aguardar uma punição. Se o professor ainda tiver essa concepção, os conflitos em sala
de aula serão maiores. O estudante da atualidade já não aceita mais um professor disciplinador,
autoritário e que exige silêncio absoluto.
O silêncio, em uma perspectiva progressista, ocorrerá de acordo com as propostas do
professor: haverá os momentos de pesquisa, que vão exigir silêncio, e os momentos de trabalho em
grupo, quando ocorrerá diálogo e movimento do estudante.
Como podemos superar esse imaginário e cumprir nossa função diante do desafio de
garantir o direito à aprendizagem?
Arroyo (2009) ressalta que há escolas que vêm encontrando possibilidades variadas de se
aproximar de imagens mais reais de quem sejam seus alunos: oficinas, dias de encontro, comunidade
na escola, entre outras. O importante é mudar o olhar, pois só assim a didática muda também.
Hoje, conforme Libâneo (2013), é necessário que os professores eduquem para o diálogo e
para a democracia, considerando a heterogeneidade das turmas e possibilitando encaminhamentos
didático-pedagógicos que privilegiem as diferenças entre os estudantes e suas múltiplas culturas e
formas de aprender.
Luckesi (1994) discute a função do professor na práxis pedagógica. Para o autor, ele é o
mediador entre a cultura elaborada pela humanidade (saber científico) e o estudante (que tem
saberes também). O docente deve, então, ser capacitado a compreender sua própria realidade,
a sociedade em que vive, suas contradições e injustiças e suas possibilidades de transformação.
Ainda segundo Luckesi (1994), além de dominar os conhecimentos científicos a serem
ensinados aos estudantes, o professor necessita ter compromisso político, caso contrário, ao
realizar os encaminhamentos metodológicos, ele se limitará a reproduzir o conhecimento já posto
sem relacioná-lo aos contextos históricos e sociais. Assim, o professor tem o desafio de buscar
permanentemente a competência teórica e a competência técnica.
Cabe, ainda, destacar a importância da mediação do professor, fundamentada na teoria de
Vygotsky (1991), conforme esquematizado na Figura 3.
Figura 3 – Importância da mediação do professor
Mediação
ZDR ZDP
Para o teórico, a aprendizagem começa muito antes de a criança frequentar a escola. Logo,
quando o professor planeja algo a ser trabalhado, esse saber já tem uma história prévia. Vygotsky
(1991) explica que o professor, ao ensinar as operações matemáticas, muitas vezes não considera
que a criança teve experiências com elas sem que houvesse uma sistematização: ao brincar com os
colegas ou ao realizar uma compra com a família, por exemplo. O professor realizará intervenções
para que o estudante ultrapasse o conhecimento vivencial de senso comum, rumo a um
saber científico.
Outro ponto relevante da teoria de Vygotsky (1991) refere-se à função da escola.
Segundo ele, um ensino direcionado para o que a criança já sabe é ineficaz, pois não a faz
avançar. Assim, um bom ensino se adianta ao desenvolvimento, uma vez que a aprendizagem
gera desenvolvimento. Cabe ao professor organizar situações estratégicas para que o estudante
se desenvolva continuamente.
Exemplo:
O professor verifica que na Base Nacional Comum Curricular (BNCC)
os estudantes de 2º ano devem estar alfabetizados. Diante dessa
determinação do documento, o docente organiza um ambiente educativo
propício à alfabetização e ao letramento. Assim, realiza avaliações
diagnósticas para verificar quem ainda não consolidou as aprendizagens
necessárias para o ano em curso e organiza estratégias a fim de que
todos continuem avançando no processo de apropriação da leitura e da
escrita. Realizando essas ações técnico-pedagógicas, o professor também
não pode deixar de lado o vínculo com seus estudantes, a alegria da
convivência, da descoberta e da dialogicidade, apregoada por Freire
(1996). Na gestão de sala de aula em que há esse vínculo professor-aluno,
os saberes advindos dos estudantes serão considerados.
Vasconcellos (2011) também chama atenção para a necessidade de o professor criar vínculos
com os estudantes, tendo em vista que o processo de ensino-aprendizagem é um encontro que gera
crescimento para ambos, já que ao ensinar, o professor também aprende. Empático e sensível à
realidade dos estudantes, o docente buscará colocar em prática um currículo emancipador.
Sem essa postura, o professor tenderá a agir de forma autoritária e atribuirá a não
aprendizagem dos estudantes à falta de atenção, a problemas de saúde, à estrutura familiar,
entre outras explicações de senso comum que desconsideram o sujeito. Na Figura 4, a seguir,
podemos observar diferenças entre professores autoritários e professores com autoridade
pedagógica.
Figura 4 – Autoritarismo x Autoridade do professor
Stokkete/Shutterstock
wavebreakmedia/Shutterstock
×
Fonte: Elaborada pela autora.
50 Didática
Conhecimento
na ação
Professor
pesquisador
e reflexivo
Reflexão Reflexão
sobre a na ação
reflexão na ação
Nesse viés proposto por Schön, o professor necessita gerir a sala de aula com conhecimento
sobre a ação pedagógica, assim como deve ter conhecimento da especificidade do componente
curricular a ser ensinado. Para alfabetizar os estudantes, além de conhecer teorias sobre
alfabetização e letramento, necessita saber como colocar esses saberes em prática, construindo
um ambiente alfabetizador propício à aprendizagem e considerando aquilo que os alunos
já sabem.
Planejar para quem? 51
Considerações finais
O professor, quando pautado por concepções progressistas em educação, não apenas
organiza seu planejamento, com propostas desafiadoras e problematizadoras, mas interage com os
estudantes de modo que a dialogicidade esteja presente em todos os seus encaminhamentos.
Interagindo com os estudantes, reconhece-os como sujeitos da aprendizagem, que não
apenas assimilam o conhecimento, mas o transformam e o relacionam à vida em sociedade.
Para propiciar essa ação sobre o objeto do conhecimento, o professor necessita pautar-se em
ações reflexivas, que, segundo Schön (1992), ocorrem em três momentos: conhecimento na ação,
reflexão sobre a ação e reflexão sobre a reflexão na ação, permitindo ao docente uma gestão de sala
de aula que ultrapasse o fazer técnico.
• MOLL, Jaqueline (org.). Os tempos da vida nos tempos da escola: construindo possibilidades.
Porto Alegre: Penso, 2013.
Este livro, organizado por Jaqueline Moll, propõe-se a debater e refletir sobre possibilidades
de se considerar os tempos de vida dos estudantes na organização pedagógica da escola.
A obra reúne a produção de diferentes educadores que investigaram possíveis caminhos a
serem trilhados, tendo em vista a consolidação da educação integral no país.
52 Didática
• ALIKE. 2017. 1 vídeo (8 min). Publicado pelo canal MindEduca. Disponível em: https://
www.youtube.com/watch?v=UATPH44jRSw. Acesso em: 7 maio 2019.
O filme retrata a necessária sensibilidade e interação para educar uma criança. Paste,
um menino alegre que gosta de desenhar e de ouvir música, quer mostrar ao pai Copi o
que aprende e o que faz. Porém, o pai, envolvido nas obrigações no dia a dia, preocupa-
-se em fazer o filho seguir regras, sem interação e sem reflexão, o que torna Paste uma
criança triste.
Atividades
1. Como o professor pode organizar seu planejamento pautando-se na teoria da zona de
desenvolvimento proximal de Vygotsky?
2. Por meio dos aprendizados adquiridos com a leitura deste capítulo, contra-argumente a
seguinte afirmação: “leva jeito para ensinar, nasceu com o dom!”
Referências
ARROYO, Miguel G. Imagens quebradas: trajetórias e tempos de alunos e mestres. Petrópolis: Vozes, 2009.
CANDAU, Vera Maria Ferrão; KOFF, Adélia Maria Nehme Simão. A didática hoje: reinventado caminhos.
Educação e Realidade, Porto Alegre, v. 40, n. 2, p. 329-348, abr./jun. 2015. Disponível em: http://www.scielo.
br/pdf/edreal/v40n2/2175-6236-edreal-46058.pdf. Acesso em 1 maio 2019.
CURITIBA. Secretaria Municipal de Educação. Integrando saberes: aproximação entre Língua Portuguesa e
Matemática. Curitiba: SME, 2018.
FERREIRA, Paula; SOUZA, André. Censo escolar 2017: cai o número de matrículas da educação básica.
O Globo, 31 jan. 2018. Disponível em: https://oglobo.globo.com/sociedade/educacao/censo-escolar-2017-
cai-numero-de-matriculas-na-educacao-basica-22347576. Acesso em: 29 mar. 2019.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra,
1996.
HOFFMANN, Jussara. Avaliar para promover: as setas do caminho. Porto Alegre: Mediação, 2005.
LIBÂNEO, José Carlos. Organização e gestão da escola: teoria e prática. São Paulo: Heccus, 2013.
MOLL, Jaqueline (org.). Os tempos da vida nos tempos da escola. In: MOLL, Jaqueline. Os tempos da vida
nos tempos da escola: construindo possibilidades. Porto Alegre: Penso, 2013.
SCHÖN, Donald. Formar professores como profissionais reflexivos. In: NÓVOA, António. (org.). Os
professores e a sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992.
VASCONCELLOS, Celso dos S. Currículo: a atividade humana como princípio educativo. São Paulo:
Libertad, 2011.
Segundo Luckesi (2018), a avaliação da aprendizagem não pode mais ser a tirana, se
desenvolvida em uma perspectiva acolhedora, trará dados para os profissionais da escola
reorganizarem o trabalho pedagógico. Se o estudante não aprendeu, avalia-se também o ensino,
as estratégias, os encaminhamentos e a organização do ambiente educativo, a fim de retomar o
planejamento e as ações dele decorrentes.
O autor destaca a diferença entre avaliação e verificação. Enquanto a avaliação direciona-se
para o futuro, para a mediação do professor e com vistas à aprendizagem, na verificação há apenas
constatação de como o estudante está naquele determinado momento.
Um dos equívocos mais comuns no processo de ensino e de aprendizagem é deixar a avaliação
apenas para o final de um conteúdo trabalhado. Nessa perspectiva, o planejamento é realizado
somente no início e a avaliação ao término do trabalho, como se não houvesse possibilidade de
retomadas no meio desse caminho. No processo de execução do planejamento, se o professor
percebe que seus encaminhamentos não estão surtindo os efeitos desejados, ele deve retomar seu
trabalho; caso contrário, a tendência é culpar o estudante por não ter aprendido.
Para Freitas et al. (2009), o ato avaliativo dentro de sala de aula deve estar inter-relacionado
ao Projeto Político Pedagógico da escola. Se a instituição se pauta por uma visão emancipatória
de sujeito da aprendizagem, a avaliação não pode ser classificatória. Essa relação pode ser vista na
Figura 1 a seguir.
Avaliação da aprendizagem: possibilidades de reorganização do planejamento 55
Ao observar essa correlação, reforçamos a necessidade de coerência entre o que está disposto
no PPP da escola e o que se coloca em prática nos processos de ensino e de aprendizagem. Dessa
forma, se no PPP da escola consta que o estudante é aquele que aprende de forma ativa, o professor
é mediador, a avaliação da aprendizagem é formativa, diagnóstica e processual, cabe ao professor
realizar encaminhamentos pedagógicos coerentes com o que o documento maior da escola afirma.
Caso se verifique que o professor está agindo de forma contrária ao direito à aprendizagem dos
estudantes, cabe à equipe gestora redirecioná-lo para que se fundamente no PPP da unidade
educativa.
A avaliação escolar é um meio e não um fim em si mesma; está delimitada por
uma determinada teoria e por uma determinada prática pedagógica. Ela não
ocorre num vazio conceitual, mas está dimensionada por um modelo teórico
de sociedade, de homem, de educação e, consequentemente, de ensino e de
aprendizagem, expresso na teoria e na prática pedagógica (CALDEIRA, 1997,
p. 122).
Dessa forma, está ao alcance do professor desenvolver uma postura avaliativa condizente com
a proposta educativa que supere a classificação e o rótulo. Ao propor avaliações em uma perspectiva
emancipatória, o professor concretiza as diferentes funções da avaliação da aprendizagem.
• Avaliação diagnóstica: ocorre não apenas no início do ano letivo, mas em diferentes
momentos, para que o professor avalie se o seu planejamento tem atingido os estudantes.
Considera o conhecimento prévio destes, que se deve levar em conta nos encaminhamentos
pedagógicos a serem realizados, tendo em vista o avanço na construção do conhecimento.
Realizam-se diagnósticos para que seja possível a mediação e, assim, o avanço do estudante
e não a sua reprovação. O foco é a aprendizagem, superando a mera verificação.
56 Didática
Quando nos propomos a elencar esses elementos na organização dos portfólios, não estamos
afirmando que são passos a serem seguidos. O que esperamos é criar instrumentos de registro
de avaliação que permitam ao professor e ao estudante se autoavaliarem. O estudante avalia seu
percurso de aprendizagem e o professor, seu processo de ensino.
É importante destacar que uma avaliação por meio de portfólios não exclui outras formas de
registro de acompanhamento da aprendizagem do estudante, como fichas avaliativas de observação
e cadernos de registro do professor, imagens, filmagens, autoavaliação do estudante, avaliação do
que este produz em seu caderno, entre outros.
É claro que todos esses elementos podem compor o portfólio, porém, como esse é um
instrumento que pressupõe certa autonomia, cabe aos envolvidos no processo educativo analisar
se ele cumpre sua função como avaliação processual e formativa. Se percebem que essa avaliação
não alcança os propósitos de consolidar a concepção emancipatória, é necessário revê-la.
O portfólio é um instrumento que possibilita visualizar as aprendizagens. Caso o docente
ainda esteja apegado a notas ou a médias escolares, é um meio de ele sensibilizar o olhar para as
diferentes estratégias que os estudantes elaboram ao resolver uma situação-problema ou mesmo
reconhecer seus “erros”.
Olhar o erro dos estudantes de forma reflexiva desencadeia um questionamento a respeito
dos processos de ensino, o que possibilita ao professor rever suas estratégias didáticas, de modo
que haja avanços nos processos de aprendizagem (HOFFMANN, 1991).
Utiliza-se de diagnósticos para intervir e mediar no O diagnóstico existe para classificar os estudantes.
processo de aprendizagem.
Princípios: solidariedade, empatia, justiça, equidade, Princípios: julgamento, exclusão, cobrança e controle.
igualdade de condições e qualidade pedagógica.
O estudante realiza ações sobre o objeto do O estudante objetiva notas para passar de ano. Reproduz
conhecimento com vistas à aprendizagem. o que foi transmitido pelo professor.
Fonte: Elaborado pela autora com base em Hoffmann, 2001 e Perrenoud, 1999.
60 Didática
Considerações finais
A avaliação da aprendizagem não é algo meramente técnico, exigindo do professor apenas
o domínio na organização de questões avaliativas ou de outros instrumentos de verificação do que
foi ensinado. Ao contrário, na avaliação não há neutralidade em seus procedimentos nem mesmo
no que a fundamenta.
Ao organizar atividades avaliativas que produzem informações sobre o percurso de
aprendizagem dos estudantes, o professor, fundamentado em uma concepção emancipatória,
organizará ou realimentará seu planejamento tendo em vista a aprendizagem de todos.
Nesse sentido, a avaliação não serve para classificar, julgar ou determinar o destino dos
estudantes. A avaliação mediadora, como afirma Hoffmann (1991), pressupõe acompanhar, rever,
retomar e intervir para que todos os estudantes avancem.
Com vistas a sugerir possibilidades de trajetórias aos docentes adeptos dessa concepção
inclusiva, reafirmamos a necessidade de se planejar a avaliação, os instrumentos de avaliação e
os instrumentos de registro de avaliação, como o portfólio. Por meio da construção de portfólios,
todos os envolvidos no processo de ensino e de aprendizagem podem refletir sobre suas ações:
o professor sobre a organização e a efetivação do seu trabalho e o estudante sobre o registro do que
já conquistou em suas aprendizagens e do que ainda precisa atingir.
Atividades
1. Diferencie os níveis de avaliação educacional, trazendo reflexões sobre como eles se
inter-relacionam.
Referências
AFONSO, Almerindo Janela. Avaliação em educação: perspectivas de emancipação social ou regulação
gestionária? In: AFONSO, Almerindo Janela et al. Avaliação na educação. Pinhais: Editora Melo, 2007.
FREITAS, Luiz Carlos de et al. Avaliação educacional: caminhando pela contramão. Petrópolis: Vozes, 2009.
HOFFMANN, Jussara Maria Lerch. Avaliação: mito e desafio – uma perspectiva construtivista. Educação e
Realidade, Porto Alegre, 1991.
LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação em educação: questões epistemológicas e práticas. São Paulo: Cortez,
2018.
PERRENOUD, Phillipe. Avaliação: da excelência à regularização das aprendizagens: entre duas lógicas. Porto
Alegre: Artmed, 1999.
SHORES, Elizabeth; GRACE, Cathy. Manual de portfólio: um guia passo a passo para o professor. Porto
Alegre: Artmed, 2001.
62 Didática
VILLAS BOAS, Benigna Maria de Freitas. O portfólio no curso de Pedagogia: ampliando o diálogo entre
professor e aluno. Educação e Sociedade, Campinas, vol. 26, n. 90, p. 291-306, jan./abr. 2005. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/es/v26n90/a13v2690.pdf. Acesso em: 6 abr. 2019.
ZÍLIO, Cátia. Uma proposta para (re)significar a avaliação na formação de professores. Cinted – UFRGS.
Novas Tecnologias na Educação, v. 8, n. 3, p. 1-9, dez. 2010. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/renote/
article/download/18089/10665. Acesso em: 6 abr. 2019.
5
Projeto Político Pedagógico e os processos
de ensino e de aprendizagem
direitos e deveres de forma reflexiva, você deve organizar sua ação pedagógica de modo que eles
possam vivenciar a democracia no cotidiano da instituição.
Não há coerência no PPP quando a escola se considera democrática e tem o objetivo de
formar para o exercício da criticidade, mas, em sala de aula, o professor não realiza as mediações
necessárias com vistas ao avanço dos processos de aprendizagem.
Segundo Luckesi (1994, p. 55), nessa pedagogia, os conteúdos e os procedimentos didáticos
não têm “nenhuma relação com o cotidiano do aluno e muito menos com as realidades sociais. É a
predominância da palavra do professor, das regras impostas”.
Kramer (1997) propõe questionamentos na análise do PPP a serem colocados em prática
pela comunidade educativa a fim de superar relações autoritárias no espaço escolar.
• O PPP tem um diagnóstico que possibilita aos envolvidos no processo educacional
analisá-lo e propor ações para compreender a realidade local e agir sobre ela?
• Esse diagnóstico permite aos professores inter-relacionar o planejamento educacional e
o currículo a ser trabalhado com os estudantes, considerando a comunidade em que a
escola está inserida?
• Há compromisso com a democratização do acesso, da permanência e das aprendizagens
dos estudantes?
• Quem são as crianças, os adolescentes, os jovens e os adultos da comunidade escolar e
como são considerados no PPP da escola?
• Há uma concepção de ensino e de aprendizagem que leve em conta os diferentes
tempos de aprendizagem dos estudantes de modo a garantir a mediação necessária ao
desenvolvimento de cada um?
• Desde a entrada dos estudantes na escola, como ocorre a consolidação do PPP?
Há acolhimento ou frieza? Há diálogo ou silêncio?
• Como são os encaminhamentos metodológicos dos professores e sua relação com os
estudantes?
• Quais são as estratégias que a escola utiliza a fim de assegurar as condições necessárias
para que todos aprendam?
• Como são organizados os tempos e os espaços escolares? O tempo é qualificado ou os
estudantes ficam imóveis o dia todo, realizando exercícios sem significado? Os espaços de
sala de aula são utilizados para contemplar diferentes propostas de trabalho do professor,
organizando os estudantes de acordo com o objetivo a ser alcançado (individual, dupla,
trio etc.)?
Como se pode perceber, o PPP é um instrumento de máxima importância para construir a
identidade da escola. Além de registrar as concepções de homem, sociedade, escola, aprendizagem
e ensino, traz possibilidades de a comunidade educativa colocar em prática o que foi discutido,
decidido e sistematizado pelo coletivo escolar.
Projeto Político Pedagógico e os processos de ensino e de aprendizagem 65
Sensibilização da comunidade
Análise do contexto educacional e da
educativa e compreensão da
comunidade educativa.
importância do PPP.
Levantamento de referencial
Sistematização do PPP, concretização
teórico, estudo coletivo, definição de
das propostas expressas pelo coletivo.
concepções e propostas.
É relevante que a equipe gestora da escola sensibilize toda a comunidade educativa para
a importância da participação coletiva no PPP. Dessa forma, o documento será resultado do
envolvimento, da discussão, do estudo e do planejamento não apenas de uma equipe diretiva,
mas também de professores, pais/responsáveis, pedagogos, funcionários e estudantes.
Os envolvidos na elaboração do PPP devem produzir um diagnóstico do contexto
socioeconômico da comunidade educativa por meio da aplicação de questionários.
Esse diagnóstico permite identificar como a função social da escola vem sendo vivenciada pelos
estudantes e percebida pelas famílias e pelos profissionais da escola. Deve-se, também, averiguar
qual é a formação acadêmica das famílias/responsáveis e dos profissionais da escola, com isso, é
possível identificar quais são os recursos financeiros da unidade educativa, como é o seu ambiente
educacional e quais são as características do seu entorno.
Essencial também é a análise dos processos educacionais da escola pela comunidade
educativa, considerando dados advindos das matrículas, da evasão escolar, das reprovações e do
acompanhamento das avaliações de aprendizagem realizadas, assim como da avaliação institucional
e das avaliações em larga escala (como Saeb, por exemplo).
Desenvolvendo processos de ensino e de aprendizagem fundamentados em concepções
críticas, as quais permitem aos envolvidos no processo educativo engajarem-se em prol de uma
escola democrática, a comunidade educativa necessita de pressupostos teóricos que possam
responder aos questionamentos e aos desafios propostos no diagnóstico.
Conforme Kramer (1997), toda proposta é situada em determinado contexto e traz seus
valores, seus objetivos e suas ideologias, não havendo neutralidade. Logo, é necessário haver uma
base teórica que sustente a prática educativa de modo a garantir o direito à aprendizagem.
66 Didática
Cabe destacar que a escola é o espaço formal para o acesso dos estudantes aos saberes
socialmente construídos e, dessa forma, ao serem definidos os marcos teóricos que devem constar
no PPP, estes precisam proporcionar aos professores, aos pedagogos e à equipe gestora subsídios
para atuarem em prol da garantia das aprendizagens dos educandos.
Planejamento tendo em vista os conhecimentos a que O professor considera os saberes que os estudantes têm
os estudantes têm direito. e manifestam sobre o conhecimento que será trabalhado
na escola.
Garantia de que o PPP está sendo consultado e O PPP é vivenciado por professores e estudantes. Se no
colocado em prática nos propósitos educativos. documento está sistematizada a necessidade de diálogo,
não há um clima de obediência dentro de sala de aula,
mas de respeito e de construção do conhecimento.
Avaliação da aprendizagem utilizando-se de diferentes A avaliação, como afirma Hoffmann (2014), ocorre
instrumentos de registro de avaliação e variados na perspectiva da mediação, quando se observam
momentos de verificação. os caminhos de construção das aprendizagens dos
estudantes, a fim de que o professor possa intervir,
retomar e replanejar.
Fonte: Elaborado pela autora.
Dessa forma, uma escola que se envolve no sucesso dos estudantes busca construir um
ambiente acolhedor, compreendendo cada sujeito da aprendizagem como capaz, como um ser
humano único, com suas subjetividades, potencialidades e necessidades educativas.
Hoffmann (2014) chama atenção para a necessidade de o professor observar as diferenças
individuais dos estudantes, sem tentar homogeneizar a turma em seus encaminhamentos, buscando
responder ao desafio de pensar projetos educativos que vão ao encontro do que cada estudante
precisa para avançar no processo de aprendizagem.
Assim, a fim de efetivar o sucesso da escola em uma perspectiva democrática, podemos
delinear uma proposta de trabalho com base nas concepções presentes no PPP, conforme a Figura 2.
Figura 2 – Articulação entre o PPP e os processos de ensino e de aprendizagem
Organização de propostas
que levem em conta os saberes dos
estudantes e considerem o professor
um mediador.
Quando o professor ouve, observa e considera quem são os estudantes e suas aprendizagens
anteriores, proporciona-lhes condições de revisitar os saberes que já possuem e os desafia
a reelaborar, enriquecer e compreender a realidade de forma mais elaborada, consolidando
aprendizagens. Assim, cabe ao professor organizar encaminhamentos didáticos de modo que os
estudantes explicitem seus saberes anteriores e possam reorganizá-los, conferindo a esses novos
saberes mais ordenação.
Mauri (2009) considera que, para que esse movimento de reelaboração seja progressivo,
é importante que o professor preste atenção ao que se denomina como “erro” dos estudantes.
Se esses “erros” forem analisados pelo docente, mostrarão as estratégias utilizadas pelos alunos
para responderem aos desafios. Dessa forma, podem-se organizar outros encaminhamentos
metodológicos que levem os alunos a aplicarem o conhecimento de modo mais bem-sucedido e,
assim, consolidar aprendizagens.
então, a ganhar, segundo Carvalho (2015), certo grau de autonomia nas decisões nos âmbitos
pedagógico, administrativo e financeiro, contando com a participação da comunidade educativa
nessas decisões. Os estabelecimentos de ensino passam, com isso, a ter a incumbência de
elaborar e cumprir o seu PPP, conforme o art. 12, respeitando as normas da lei.
O Plano Nacional de Educação (PNE) de 2001 estabeleceu metas a serem implementadas
em relação à gestão democrática. Da mesma forma, o PNE (2014-2024), define, em seu art. 2º,
inciso VII, a promoção desse princípio como uma diretriz. Na meta n.º 19 do PNE (2014-2024),
há diferentes estratégias que visam consolidar esse princípio nas escolas públicas do país, da qual
destacamos a 19.6, que versa sobre a necessidade de se incentivar a participação da comunidade
educativa na elaboração e na execução dos PPPs e dos currículos.
Quando trazemos essa breve retrospectiva histórica da instituição da gestão democrática no
ensino público do país e, mais especificamente, a participação de toda a comunidade educativa na
elaboração do PPP, objetivamos reafirmar que, mesmo com todo esse respaldo legal para exercer
a democracia, ainda temos o desafio de superar a visão desse documento como algo meramente
burocrático.
O PPP, como afirma Vasconcellos (2002), é instrumento teórico-metodológico para a atuação
na realidade educativa, tendo como pressuposto o compromisso coletivo com a emancipação
humana, pautada no acesso ao conhecimento científico dos estudantes, superando os saberes de
senso comum.
Um PPP burocrático servirá apenas para a normatização da escola. Não haverá participação
genuína das diferentes pessoas que fazem parte da comunidade educativa, mas somente uma
pseudoparticipação, isto é, os envolvidos no processo educacional são chamados para reuniões
apenas para validar o que já foi decidido pela equipe diretiva anteriormente.
Exemplo:
No PPP está explícito que os estudantes aprendem de forma ativa,
participativa e o professor é o mediador no processo de construção do
conhecimento. O Conselho de Escola é chamado para decidir sobre uma
verba recebida. Os participantes têm dúvida de como aplicá-la: se em
um passeio para os estudantes de 5º ano, que irão para outra escola no
ano seguinte; ou investir na biblioteca, cujos livros estão deteriorados.
Embora os estudantes do 5º ano tenham o direito de visitar os diferentes
espaços da cidade, essa decisão implicaria retirar destes e dos demais
alunos o acesso a uma biblioteca com um acervo de qualidade.
O Conselho de Escola decidiu, então, que a escola optaria pelo
investimento na biblioteca.
Projeto Político Pedagógico e os processos de ensino e de aprendizagem 71
Diferentes teóricos, como Vasconcellos (2002), Veiga (2003) e Kramer (1997), defendem que
o PPP deve contextualizar a realidade local, contendo diagnóstico que possibilite à comunidade
educativa intervir coletiva e intencionalmente nessa realidade, de modo a contribuir para a
melhoria da qualidade educacional. Por isso, não se tomam decisões democraticamente com base
em decisões individuais.
O PPP, como afirma Kramer (1997), não é um lugar, é um caminho. É flexível, sendo
necessário retomá-lo, revisitá-lo e realimentá-lo constantemente, uma vez que nas discussões,
estudos e decisões coletivas pode-se verificar a necessidade de se fazer modificações que atendam
aos objetivos da comunidade educativa.
Gerir uma escola com base em seu PPP rompe com uma visão fragmentada de conhecimento,
pois assim podem-se valorizar os saberes da comunidade educativa a fim de possibilitar aos
estudantes o acesso ao conhecimento científico, propiciando a vivência de um currículo
democrático.
A Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017) –, documento homologado em 22
de dezembro de 2017, no que se refere à educação infantil e ao ensino fundamental, e em 14 de
dezembro de 2018, no que concerne ao ensino médio – traz, para todas as escolas do país, públicas
e particulares, a normatização para se trabalhar e garantir o ensino dos conhecimentos essenciais
a todos os estudantes. Conforme o próprio documento, a BNCC se insere como referência para a
elaboração dos PPPs e dos currículos dos sistemas de ensino e das escolas, estabelecendo os pontos
de chegada para os estudantes. A relação entre os três documentos é apresentada na Figura 3.
Figura 3 – A BNCC, os currículos e os PPPs
BNCC
Adequação dos
currículos
Adequação dos
PPPs
10 competências
Ensino
Educação infantil Ensino médio
fundamental
10 competências
10 competências
consolidadas
Os currículos dos sistemas de ensino e os PPPs das escolas devem ser atualizados até 2020,
segundo a BNCC, considerando as indicações para o trabalho com os direitos de aprendizagem
presentes no documento. Assim, tem-se com a BNCC um patamar comum a todos os estudantes e
escolas brasileiras, enquanto os currículos e os PPPs são múltiplos.
• BNCC: documento normativo para todas as escolas que ofertam educação básica no país,
no qual constam as aprendizagens essenciais a que todos os estudantes têm direito. É a
referência para a elaboração ou reelaboração dos currículos e dos PPPs (BRASIL, 2017).
• Currículo: conforme Moreira e Candau (2007), é o coração da escola. Nele se concentram
as relações entre educação e sociedade. Nessa concepção, currículo não é apenas um
documento com a indicação dos conteúdos a serem trabalhados em cada ano letivo, mas,
sobretudo, um dispositivo em que há um campo de disputa sobre que tipo de sujeito
que se deseja formar em determinada sociedade. Para formar esse sujeito, há não só
conhecimentos que são considerados essenciais, como também formas de se ensinar esses
saberes, de se avaliar, de utilizar os livros didáticos, de formar professores e, sobretudo,
de políticas públicas a serem seguidas. Não há neutralidade no campo curricular, pois
sempre haverá interesses: formar para o mercado de trabalho (que é instável e excludente)
ou formar integralmente (para a emancipação humana e para a democracia). As teorias
críticas e pós-críticas de currículo defendem a importância de valorizar não somente a
cultura produzida no campo das diferentes ciências, mas também as múltiplas culturas
dos diferentes sujeitos pertencentes à comunidade educativa.
• PPP: como afirma Vasconcellos (2002), é o plano global da escola. Em uma perspectiva
emancipatória e democrática, deve-se considerar a realidade local para avançar no
processo de construção do conhecimento com os estudantes. É instrumento teórico-
Projeto Político Pedagógico e os processos de ensino e de aprendizagem 73
Quanto à reelaboração dos PPPs, tendo-se em vista a BNCC, será necessário considerar
não só os conhecimentos essenciais descritos nesse documento, como também as habilidades
específicas que são desenvolvidas de acordo com cada componente curricular e as dez
habilidades gerais.
Ao realizar essa adequação, não se pode perder de vista o direito de serem incluídos,
no currículo local, elementos da cultura da própria escola e da região em que ela está inserida.
Também se destaca que, ao se optar por uma concepção de currículo crítico e/ou pós-crítico,
haverá no cotidiano escolar a defesa de uma escola pública gratuita e de qualidade para todos;
logo, o princípio é democrático e inclusivo.
Considerações finais
O PPP fundamentado na emancipação é um projeto de vivência da democracia e, dessa
forma, não está fechado para as sugestões da comunidade educativa, para a inovação nas formas
de ensinar e para os saberes que os estudantes já detêm.
Nessa perspectiva, os professores e os demais profissionais da escola necessitam considerar
a realidade local e o que consta no PPP para planejar ações que contribuam para a melhoria da
qualidade educacional.
O PPP construído de forma participativa evidencia a identidade da comunidade educativa
e envolve todos na busca por uma escola inclusiva que cumpra sua função social de assegurar o
direito à aprendizagem.
A BNCC é um documento normativo para os sistemas de ensino e escolas que ofertam
educação básica. Com base nela, os currículos e os PPPs devem ser adequados, garantindo
os saberes essenciais que constam no documento. Assim, enquanto a BNCC dispõe sobre os
conhecimentos e as habilidades que todos os estudantes devem desenvolver, os currículos e
os PPPs trazem as especificidades locais a serem consideradas no fazer pedagógico.
• QUANDO SINTO que já sei. Direção: Antonio Sagrado, Raul Perez e Anderson Lima.
Despertar Filmes, 2014. (78 min).
O documentário aborda as possibilidades que escolas brasileiras encontraram de efetivar
propostas inovadoras na educação. Conta com o depoimento de estudantes, familiares,
professores e diretores sobre como concretizaram experiências educacionais que
romperam com o modelo tradicional de ensino.
Atividades
1. A partir da ilustração, descreva como se dá o processo de elaboração do PPP e a sua efetivação
em uma perspectiva democrática.
Sensibilização da comunidade
Análise do contexto educacional e da
educativa e compreensão da
comunidade educativa.
importância do PPP.
Levantamento de referencial
Sistematização do PPP, concretização
teórico, estudo coletivo, definição de
das propostas expressas pelo coletivo.
concepções e propostas.
2. Diferencie BNCC, currículo e PPP e descreva como as escolas deverão atualizar seus PPPs
diante da BNCC.
Referências
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União, Poder
Legislativo, Brasília, DF, 5 out. 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/
ConstituicaoCompilado.htm. Acesso em: 14 abr. 2019.
BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF,
23 dez. 1996. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm. Acesso em: 14 abr. 2019.
BRASIL. Ministério de Educação/Secretaria de Educação Básica. In: MOREIRA, Antônio Flávio; CANDAU,
Vera Maria Ferrão. Indagações sobre o currículo: currículo, conhecimento e cultural. Brasília: Ministério da
Educação, 2007. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/indag3.pdf. Acesso em:
13 abr. 2019.
BRASIL. Lei n. 13.005, de 25 de junho de 2014. Diário Oficial da União, Poder legislativo, Brasília, DF, 26 jun.
2014. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L13005.htm. Acesso
em: 14 abr. 2019.
BRASIL. Ministério da Educação. Resolução CNE/CP, de 22 de dezembro de 2017. Disponível em: http://
basenacionalcomum.mec.gov.br/images/historico/RESOLUCAOCNE_CP222DEDEZEMBRODE2017.pdf.
Acesso em: 14 abr. 2019.
CARVALHO, Jeferson Luís Marinho de. PNE (Plano Nacional de Educação) 2014-2024: A gestão democrática
na educação se faz presente? Holos, ano 31, v. 8. Disponível em: http://www2.ifrn.edu.br/ojs/index.php/
HOLOS/article/view/3355. Acesso em: 1 maio 2019.
FORMOSINHO, Júlia Oliveira. ARAUJO, Sara Barros. Escutar as vozes das crianças como meio de (re)
construção de conhecimentos acerca da infância: algumas implicações metodológicas. In: FORMOSINHO,
Júlia Oliveira (org.). A escola vista pelas crianças. Porto: Porto Editora, 2008.
HOFFMANN, Jussara. Avaliação mediadora: uma prática em construção da pré-escola à universidade. Porto
Alegre: Mediação, 2014.
KRAMER, Sonia. Propostas pedagógicas ou curriculares: subsídios para uma leitura crítica. Educação e
Sociedade, ano XVIII, n. 60, dez. 1997. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/es/v18n60/v18n60a1. Acesso
em: 11 abr. 2019.
MAURI, Teresa. O que faz com que o aluno e a aluna aprendam os conteúdos escolares. In: COLL, César
et al. O construtivismo na sala de aula. São Paulo: Ática, 2009.
SILVA, Luiz Etevaldo. O sentido e significado sociológico de emancipação. Revista e-Curriculum, São Paulo.
n. 11, v. 3, set./dez. 2013. Disponível em: https://revistas.pucsp.br/index.php/curriculum/article/view/8924.
Acesso em: 12 abr. 2019.
VEIGA, Ilma Passos Alencastro. Inovações e projeto político-pedagógico: uma relação regulatória ou
emancipatória? Cad. Cedes, Campinas. v. 23, n. 61, p. 267-281, dez. 2003. Disponível em: http://www.scielo.
br/pdf/ccedes/v23n61/a02v2361.pdf. Acesso em: 12 abr. 2019.
6
Elementos constitutivos do planejamento
Para Vasconcellos (1992), Gandin (1994), Gesser (2011) e Libâneo (2006), há diferentes
níveis de planejamento, cada um com sua especificidade, porém há inter-relação entre eles,
como mostra o Quadro 1.
Quadro 1 – Níveis de planejamento nos processos educacionais
Planejameno de ensino
Planejameno educacional Planejameno institucional
e plano de aula
Diz respeito ao planejamento dos Está relacionado à organização do Envolve a racionalização dos
sistemas de ensino: nacional, PPP da escola, que é construído de saberes a serem ensinados aos
estadual e municipal. acordo com o princípio democrático, estudantes. No planejamento de
coletivamente, com a participação ensino, com base no currículo e
dos diferentes segmentos da no PPP da escola, seleciona-se o
comunidade educativa. O plano de que será ensinado por período de
ação da escola elaborado anualmente tempo estabelecido pelo regimento
necessita estar articulado ao PPP da unidade (bimestral, trimestral,
da instituição. semestral ou anual). Já no plano de
aula, há o detalhamento do que será
trabalhado.
Fonte: Elaborado pela autora com base em Vasconcellos, 1992; Gandin, 1994; Gesser, 2011 e Libâneo, 2006.
Exemplo:
No PPP de uma escola, há uma concepção de ensino e de aprendizagem
a ser efetivada pela comunidade educativa. Na avaliação institucional
realizada, verificou-se que a avaliação da aprendizagem é praticada
Elementos constitutivos do planejamento 79
Para melhor visualizar o que cabe ao planejamento de ensino e ao plano aula, sistematizamos
o Quadro 2, que traz elementos constitutivos de ambos, explicitando suas diferenças.
Quadro 2 – Elementos constitutivos do planejamento de ensino e do plano de aula
Metodologia: é a forma como o professor encaminhará o Metodologia: o professor detalha as formas como
trabalho. Ele registra a metodologia, mas sem detalhá-la. trabalhará o conhecimento a ser apreendido pelos
estudantes, sistematizando passo a passo seus
encaminhamentos e estratégias.
Avaliação da aprendizagem: o professor prevê como a Avaliação da aprendizagem: o professor registra como
avaliação formativa, cumulativa e diagnóstica acontecerá. avaliará a apreensão do conhecimento pelo estudante,
Descreve elementos para a análise do processo de em consonância com o PPP e com o plano de ensino.
aprendizagem. Aqui, o registro pode ser mais amplo, pois Por exemplo: análise do portfólio do estudante;
no plano de aula registram-se as especificidades. prova; trabalho em grupo; organização do caderno do
estudante para verificar o que ele aprendeu sobre o
conhecimento trabalhado.
conteúdos trabalhados no contexto escolar e eles devem ouvir o professor, pois este é o responsável
pela organização dos desafios, problematizações e demais estratégias para que os estudantes
evoluam em suas aprendizagens.
Para Freire (2005), as pessoas são seres inacabados e, assim, sempre estão aprendendo umas
com as outras. Dessa forma, o professor que dialoga com os estudantes aprende novas formas
de ensinar e entende o que eles pensam sobre o desafio proposto. Nesse viés, o planejamento é
necessário, sem se perder de vista a construção de um ambiente propício às aprendizagens.
Quando, portanto, reiteramos a importância do planejamento e sua eficácia, não estamos
defendendo uma concepção pedagógica tecnicista, cujo foco era a formação de mão de obra
para o mercado de trabalho e cujas estratégias e encaminhamentos metodológicos previstos no
planejamento não propunham reflexões críticas sobre o conhecimento trabalhado em sala de aula.
O que importava era que o conteúdo fosse transmitido e o planejamento cumprido, havendo uma
suposta neutralidade do planejamento e dos métodos de ensino.
Atualmente, não podemos deixar de defender a necessidade do planejamento no contexto
escolar, de modo a organizar o trabalho educativo do professor e garantir que os conhecimentos a
que os estudantes têm direito lhes sejam acessíveis. Porém, ao colocar em prática o plano de aula,
o professor precisa considerar a integralidade do estudante, suas dimensões cognitiva, afetiva,
física, espiritual, histórica, artística, entre outras, pois fazê-lo não é propor ao estudante cópias do
livro didático, ou deixá-lo quatro horas diárias sentado sem permitir que dialogue com os colegas.
Os estudantes aprendem também uns com os outros.
Assim, superamos a concepção de uma suposta neutralidade do planejamento, pois ele
deve ser organizado em função da aprendizagem dos estudantes. Além disso, o professor deve
questionar os conhecimentos, levando os estudantes a perceberem a historicidade e o contexto da
produção científica. Conforme Saviani (1989), os conhecimentos necessitam ser reavaliados diante
das realidades sociais e do avanço da ciência.
Defendemos, portanto, as pedagogias sociocríticas, ou seja, aquelas em que, segundo
Libâneo, Oliveira e Toschi (2012), a escola se posiciona contra as desigualdades sociais e
econômicas e busca encontrar metodologias e encaminhamentos que assegurem a todos os
estudantes o acesso aos conhecimentos científicos. Conforme esses autores, quando o professor
realiza o planejamento de ensino e de aula fundamentado nessas tendências pedagógicas,
precisa incorporar as discussões sobre o meio ambiente, os problemas da vida urbana e o
respeito às diferenças culturais entre os sujeitos, combatendo toda forma de preconceito e
discriminação.
Tendo em vista a consolidação das dez competências gerais propostas na BNCC que
permearão o trabalho com os conhecimentos essenciais dos diferentes componentes curriculares e
áreas do conhecimento, é notório que, para planejar, o professor considere como essas competências
serão trabalhadas no cotidiano de sala de aula.
Os conhecimentos essenciais, segundo a BNCC (BRASIL, 2018), referem-se ao conjunto
de saberes organizados, de forma progressiva, que todos os estudantes devem dominar até o final
da educação básica. Assim, a todos os discentes do país, da educação infantil ao ensino médio,
deve-se assegurar o direito à aprendizagem, respeitadas as especificidades de cada região e de
cada escola.
Em outras palavras, é necessário que todas as escolas trabalhem com os conhecimentos
essenciais previstos na BNCC e considerem no seu fazer pedagógico os conhecimentos advindos
de cada cultura local para organizar seus planejamentos, haja vista que o processo de ensino e de
aprendizagem não ocorre de forma transmissiva ou por acúmulo de conhecimentos.
A BNCC elucida a organização dos conhecimentos e assegura o que deve ser trabalhado
em todo o país. Com base nesse direcionamento, os sistemas de ensino organizam seus currículos
formais. De modo articulado, as escolas reelaboram o seu PPP. Neste, considera-se o diagnóstico
sobre a comunidade educativa e elencam-se os elementos para a organização dos planejamentos
de ensino e de aula.
Para formulá-los, o professor deve ter em vista os conhecimentos essenciais a serem
trabalhados pelo estudante, as avaliações diagnósticas e o PPP da escola, que contemplará as
concepções de ensino e de aprendizagem definidas no seu coletivo, como podemos observar na
Figura 1 a seguir.
Figura 1 – BNCC, PPP, currículos, planejamentos de ensino e plano de aula
BNCC
Currículos organizados
pelos sistemas de ensino
Planejamento
de ensino
Plano de aula
Por meio dessa análise, podemos concluir que o trabalho do professor não é isolado em
uma sala de aula, mas articulado a uma concepção de sujeito que se deseja formar. Ciente dos
propósitos de formação humana, o professor, ao organizar seu planejamento, pode se posicionar
em prol de uma organização com vistas à formação de sujeitos autônomos, reflexivos e críticos,
coerentemente com o que está previsto no PPP da escola em que trabalha.
Assim, ao trabalhar com um conhecimento essencial a que o estudante tem direito,
o professor o faz sem desconsiderar os saberes que ele já tem e sem se omitir de sua função de
mediador no processo de ensino e de aprendizagem. Esse docente deve, então, organizar-se por
meio de um planejamento que valorize a formação humana integral. O que significa isso?
Exemplo:
Ao planejar, o professor organiza tempos e espaços que levam em
conta quem são os estudantes e sua fase de desenvolvimento. Se são
alunos da educação infantil, a interação e a brincadeira devem se fazer
presentes, pois é por meio destas que eles aprendem, desenvolvem-se e
se socializam. Dessa forma, ao sistematizar um planejamento de ensino
e de aula, o docente precisa pensar: por quanto tempo as crianças estarão
envolvidas nessa proposta? Qual é o espaço disponível para realizá-la?
Como organizar o espaço para a atividade? Os materiais são adequados
à faixa etária? Será preciso repetir essa proposta em outro momento
ou apenas uma vez será suficiente para os alunos compreenderem a
atividade e, além disso, aprenderem sobre o conhecimento envolvido
na atividade?
Com esse exemplo, não queremos dizer que apenas na educação infantil a interação e a
brincadeira devem ser contempladas. Nossa intenção é propor ao professor questionar o seu
planejamento, de modo que este não se torne linear ou um mero preenchimento burocrático,
esquecendo-se de quem são os seus estudantes.
Planejar não é uma ação fria e neutra, mas ocorre com base nas concepções de ensino e
de aprendizagem. Se o professor, por exemplo, acredita que o sujeito não tem nenhum saber
e que deve dominar as habilidades previstas na BNCC, certamente organizará atividades de
treino, sem reflexão crítica sobre o conhecimento a ser ensinado. Ao contrário, se o profissional
se fundamenta em uma concepção sociocrítica, organizará seu planejamento e colocará em
prática, de modo contextualizado, os conhecimentos essenciais determinados na BNCC, além de
selecionar metodologias e organizar tempos e espaços adequados à aprendizagem dos estudantes,
sem desmerecer os saberes que estes já possuem sobre o mundo.
Em uma concepção sociocrítica de educação, o planejamento do professor não é uma
ação solitária. Prevê a participação de outros docentes e da equipe gestora, que colaboram
com as discussões sobre os processos de ensino e de aprendizagem; as metodologias de ensino;
84 Didática
Exemplo:
Vamos tomar como exemplo a 10ª competência: “agir pessoal e
coletivamente com autonomia, responsabilidade, flexibilidade, resiliência
e determinação, tomando decisões com base em princípios éticos,
democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários” (BRASIL, 2018, p. 10).
Essa competência deve perpassar o planejamento de ensino e de aula do
professor, caso isso não aconteça, o estudante não saberá agir de acordo
com o que ela objetiva. Além disso, o professor deve ter essa competência
ou não proporcionará vivências no ambiente educativo de forma a
desenvolvê-la no estudante. Por isso, é importante haver reflexões sobre as
necessárias competências do professor para que estas sejam desenvolvidas
nos alunos.
Dessa forma, a relação entre teoria e prática deve estar presente no trabalho docente.
Se desejamos formar para a integralidade, precisamos buscar essa integralidade em nossas ações e
na dialogicidade com os estudantes.
Como afirma Freire (2005), o ser humano é um ser da práxis, logo, pode refletir sobre seus
fazeres e, caso perceba que não há coerência entre o que afirma e o que pratica, tem condições
de rever sua trajetória e redirecioná-la. Assim, um professor, quando se autoavalia e verifica
distanciamento entre o que ensina e o que concretiza em suas ações, tem capacidade de transformar
seu fazer pedagógico como também a si mesmo, enquanto sujeito que pensa sobre sua prática e
sobre sua própria formação, com autonomia e responsabilidade para modificar-se.
Considerações finais
Planejar é próprio dos seres humanos. Se planejamos, podemos, em vez de agir ao acaso,
prever os passos de nossas ações e, com isso, avaliar se tomamos acertadamente nossas decisões ou
não. Ao sistematizar o planejamento, não precisamos esperar o final de sua execução para realizar
avaliações, podemos fazê-las ao longo do percurso.
Elementos constitutivos do planejamento 85
• NENHUM a menos. Direção: Zhang Yimou. China: China Film Group Corporation,
1999 (106 min.).
O filme retrata o drama de uma menina chinesa de 13 anos que é convidada a substituir
seu professor, pois este precisa se ausentar das aulas para cuidar de sua mãe doente.
Determinada a cumprir o desafio de ser professora, a menina não pode deixar nenhum
estudante desistir. Como ainda é muito jovem, muitas vezes ela age como se não fosse a
docente e tem dificuldades em assumir uma postura de autoridade diante dos alunos.
Atividades
1. Explicite a diferença entre a flexibilização da ação docente diante do planejamento e o
improviso do professor sem compromisso com a organização desse documento.
BNCC
Adequação dos
currículos
Adequação dos
PPPs
Fonte: Elaborada pela autora com base em Vasconcellos, 1992; Gandin, 1994; Gesser, 2011 e Libâneo (2006).
Referências
BRASIL. Ministério da Educação. As 10 competências gerais da BNCC. Disponível em: http://
basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_AS_DEZ_COMPETENCIAS.mp4. Acesso em: 21 abr. 2019.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular: educação é a base. 2018. Disponível em:
http://download.basenacionalcomum.mec.gov.br/. Acesso em: 21 abr. 2019.
FERREIRA, Francisco Whitaker. Planejamento sim e não: um modo de agir num mundo em permanente
mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.
Elementos constitutivos do planejamento 87
LIBÂNEO, José Carlos; OLIVEIRA, João Ferreia; TOSCHI, Mirza Seabra. Educação escolar: políticas,
estrutura e organização. São Paulo: Cortez, 2012.
SILVA, Andréa Villela Mafra da. A pedagogia tecnicista e a organização do sistema de ensino brasileiro.
Revista HISTEDBR On-line, Campinas. n. 70, p. 197-209, dez. 2016. Disponível em: https://www.researchgate.
net/publication/316901276_A_pedagogia_tecnicista_e_a_organizacao_do_sistema_de_ensino_brasileiro.
Acesso em: 20 abr. 2019.
SAVIANI, Dermeval. Educação: do senso comum à consciência filosófica. São Paulo: Cortez, 1989.
Para Becker (1993), o produto desse tipo de encaminhamento metodológico será alguém
que abre mão do seu direito de pensar; é a morte da crítica, da criatividade e da curiosidade.
Para que pensar, se tudo já está pronto? Para que saber como funciona a sociedade? Para que
saber de onde vem o conhecimento se apenas quero estudar para arrumar um emprego? A
subserviência está decretada.
De acordo com Saviani (2013), na pedagogia tradicional o centro do fazer educativo
é o intelecto, prescindindo de todas as outras dimensões humanas. O conhecimento é passado
como verdade absoluta, professor e estudante não interagem com os saberes científicos, pois
estes têm uma suposta neutralidade. Ao professor, cabe transmiti-los; aos alunos, memorizá-los
sem reflexão.
Assim, o conhecimento seria ensinado ao estudante, mas o questionamento, a reflexão,
a historicidade dos saberes científicos não seriam explicitados.
Reflexões sobre métodos de ensino 91
Exemplo:
Em uma aula de Matemática tradicional, uma professora ensinaria
o sistema de numeração decimal (SND) de forma transmissiva, sem
reflexão, propondo aos estudantes que cobrissem os pontilhados para
aprender o traçado dos números, ligassem o número à quantidade,
escrevessem do número um ao dez e assim por diante. Se o currículo
do primeiro ano previsse que os estudantes dominassem, até o final
do ano letivo, os números de um a cem, esse encaminhamento se
repetiria, os estudantes estariam sentados sempre um atrás do outro
e o professor proporia atividades de cópia dos números, de completar
com sucessor e antecessor para reforçar o conteúdo, entre outras. Já um
professor fundamentado em uma proposta crítica, cujo objetivo é formar
sujeitos que refletem sobre o contexto social em que estão inseridos,
primeiramente buscaria ensinar de forma prática e concreta a base 10,
que é o fundamento do SND, para não reproduzir com os estudantes
a forma como obteve esse conhecimento. Também reconheceria que
esse sistema foi elaborado e sistematizado pela humanidade, e mesmo
a Matemática, uma ciência exata, seria contextualizada historicamente.
Dessa forma, poderia iniciar seu planejamento contando a história dos
números e estimulando os estudantes a contarem nos dedos e fazerem
a inter-relação com a vida em sociedade. Os jogos e a problematização
estariam presentes, partindo do pressuposto de que todos são capazes
de aprender. Como a avaliação é processual e diagnóstica, o professor
observaria, no decorrer do ano, o avanço dos estudantes no processo de
construção do conhecimento. Diante da dificuldade de algum estudante,
haveria a necessidade de reelaboração do planejamento e de elaboração
de novas estratégias, de modo que se consolidassem as aprendizagens
necessárias para aquele ano letivo.
o que corrobora com um fazer educativo que não considera as diferenças entre os estudantes e
suas diversas formas de aprender. Dessa maneira, se há estudantes que não atingem os objetivos
propostos pela escola, há culpabilização desses sujeitos, o que acaba impedindo a busca por
estratégias que venham possibilitar a aprendizagem a que todos têm direito.
A corrente pedagógica renovada, também chamada de Escola Nova, surgida na Europa e
nos Estados Unidos no século XIX, toma força no Brasil entre as décadas de 1920 e 1930, fazendo
severas críticas à escola tradicional e principalmente a seus métodos de ensino. Para seus
defensores, essa escola não ensinava a pensar, mas apenas a copiar (GADOTTI, 1996).
Essa corrente pedagógica teve como marco o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova,
um documento elaborado por 26 educadores, como Anísio Teixeira (1900-1971), Fernando de
Azevedo (1894-1974), Lourenço Filho (1897-1970), entre outros nomes da educação nacional.
Esse documento oferecia novas diretrizes para a educação do Brasil e defendia a adaptação da
escola à nova fase de desenvolvimento produtivo do país (GADOTTI, 1996).
Defendia-se que a escola não deveria ser privilégio de alguns, mas ser de acesso a todos, e,
portanto, laica, gratuita e obrigatória. Nesse sentido, houve avanços na concepção de uma escola
democrática.
No entanto, Saviani (2013) denomina a pedagogia da Escola Nova de pedagogia
da existência, para o autor, essa tendência tira o foco dos conteúdos escolares e, portanto,
do conhecimento científico, trazendo para o cerne da escola o aprender a aprender. Segundo
Saviani, essa concepção privilegia o individualismo e a meritocracia. Se o sujeito não for ativo, não
buscar aprender, não realizar as atividades propostas e não se esforçar, ele não aprenderá, pois o
professor é apenas um facilitador. A metodologia de uma escola que fundamentasse suas ações na
pedagogia da Escola Nova teria as seguintes características:
• Métodos ativos: os estudantes têm autonomia para descobrir os conhecimentos ‒
trabalhos em grupo, dinâmicas e pesquisas.
• Tem como base o pragmatismo: aprender fazendo.
• O professor é o facilitador: o ambiente educativo é planejado pelo professor, porém o
estudante tem autonomia para nele agir.
• O estudante aprende de acordo com seus interesses: precisa ter experiências por meio
das atividades propostas pelo professor.
É preciso frisar que entre 1964 e 1985 o Brasil passava pela ditadura militar. Nesse contexto,
os objetivos educacionais voltavam-se para a formação de um homem produtivo e eficiente,
mas que não questionasse, fosse subordinado à ideologia dominante (SAVIANI, 2013).
A pedagogia tecnicista, que segundo Saviani (2013) também é tradicional, valorizava
os objetivos instrucionais, os recursos audiovisuais, a produtividade do estudante, as técnicas
e os manuais. O professor era aquele que aplicava atividades sem refletir ou discutir com os
estudantes. O que se priorizava era o saber fazer, não o saber pensar sobre o conhecimento.
Reflexões sobre métodos de ensino 93
Para Masseto (2006), é necessário que o professor incentive a participação ativa dos
estudantes no processo de aprendizagem e, para isso, deve planejar situações em que haja interação,
assim como a pesquisa, o debate e o diálogo, sem abrir mão da ética, do respeito às outras opiniões
e ao outro, da historicidade, da criticidade e da sensibilidade.
Se o objetivo é a formação integral do sujeito, considerando-o em todas as suas dimensões,
como apontam Guará (2006), Moll (2008) e Coelho (2009), não se podem negar ao estudante
possibilidades de frequentar uma escola construída e ressignificada tendo em vista uma perspectiva
emancipadora e reflexiva. Algumas dessas dimensões podem ser percebidas na figura seguinte,
mas não se limitam a estas. O que queremos destacar é a inter-relação entre essas dimensões, pois
o ser humano é integral.
Figura 1 – Dimensões humanas e o processo de aprendizagem
Criativa
Lúdica Sociocultural
Aluno
Fisico-motora
Estética
Cognitiva Ética
Fonte: Elaborada pela autora com base em Guará, 2006; Moll, 2008 e Coelho, 2009.
1 O nível de desenvolvimento proximal (ZDP), segundo Vygotsky (2010), é a distância entre a zona de desenvolvimento
real (ZDR) e a zona de desenvolvimento potencial. É na ZDP que o professor mediador deve atuar, pois, ao fazê-lo, o
estudante consolida aprendizagens: o que fazia antes com auxílio, o que revela o seu potencial (com auxílio), passa a
fazer com autonomia (ZDR).
100 Didática
Em uma concepção tradicional de ensino, o espaço é É considerado elemento curricular e, portanto, em uma
inflexível. Não é modificável de acordo com a proposta concepção crítica, possibilita aos educadores planejá-lo
de trabalho realizada pelo professor. de acordo com os objetivos educacionais.
Considerações finais
As metodologias de ensino selecionadas pelo professor para colocar em prática o planeja-
mento de ensino e de aula revelam as suas concepções de ensino e de aprendizagem.
Dessa forma, é de máxima importância que os profissionais da escola busquem superar as
concepções relacionadas às teorias pedagógicas tradicionais, pois elas consideram o professor como
um transmissor de conhecimentos e o estudante como alguém que não tem conhecimento algum.
Reflexões sobre métodos de ensino 101
O professor precisa saber o que vai ensinar, dominando o conteúdo e as metodologias, para
que possa intervir no processo de construção de conhecimento, o que lhe confere autoridade em
sala de aula. No entanto, a autoridade não pode ser confundida com o autoritarismo, pois este não
auxilia o desenvolvimento da autonomia dos estudantes, a criticidade, a ética, a reflexão sobre o
contexto histórico e cultural e a consolidação da democracia.
A autoridade do professor lhe concede legitimidade na gestão de sala de aula. Assim, mesmo
que a metodologia escolhida tenha o objetivo de instigar e fomentar o diálogo, a pesquisa e o
debate, isso não lhe tira de sua função de mediador no processo de aprendizagem dos estudantes;
ao contrário, esse papel é consolidado. Autoridade tem a ver com admiração; já o autoritarismo,
com submissão.
Que sejamos professores que conquistem a autoridade em sala de aula, pois assim seremos
referências positivas para nossos estudantes.
Atividades
1. De que forma o professor que se fundamenta na teoria da zona de desenvolvimento proximal
pode realizar seu trabalho pedagógico?
Referências
BECKER, Fernando. A epistemologia do professor: o cotidiano da escola. Petrópolis: Vozes, 1993.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular: educação é a base. 2018. Disponível em:
http://download.basenacionalcomum.mec.gov.br/. Acesso em: 2 maio 2019.
COELHO, Lígia Martha C. da Costa. História(s) da educação integral. Em Aberto, Brasília, v. 22, n. 80, p.
83-96, abr. 2009. Disponível em: http://emaberto.inep.gov.br/index.php/emaberto/article/view/2222/2189.
Acesso em: 2 maio 2019.
GADOTTI, Moacir. História das ideias pedagógicas. São Paulo: Ática, 1996.
FORNEIRO, Lina Iglésias. A organização dos espaços na educação infantil. In: ZABALZA, Miguel A.
Qualidade em educação infantil. Porto Alegre: Artmed, 2008.
FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.
GUARÁ, Isa. É imprescindível educar integralmente. Cadernos Cenpec, n. 2, p.15-24, 2006. Disponível em:
http://cadernos.cenpec.org.br/cadernos/index.php/cadernos/article/view/168. Acesso em: 2 maio 2019.
KISHIMOTO, Tizuko Morchida (org.). Jogo, brinquedo, brincadeira e educação. São Paulo: Cortez, 2008.
LEONTIEV, Alexei. Os princípios psicológicos da brincadeira pré-escolar. In: VYGOTSKY, Lev S. Linguagem,
desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: Ícone, 2010.
MASSETO, Marcos T. Mediação pedagógica e o uso da tecnologia. In: MORAN, José Manuel; MASSETO,
Marcos T.; BEHRENS, Maria Aparecida. Novas tecnologias e mediação pedagógica. São Paulo: Papirus, 2006.
MOLL, Jaqueline. Conceitos e pressupostos: o que queremos dizer quando falamos de educação integral? In:
BRASIL. Ministério da Educação. Salto para o futuro: Educação Integral, 2008. Disponível em: http://www.
ufrgs.br/projetossociais/Biblioteca/4_TV_Escola_Educacao_Integral.pdf. Acesso em: 2 maio 2019.
MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoletti. Ensino: as abordagens do processo. São Paulo: EPU, 2003.
SAVIANI, Dermeval. Teorias pedagógicas contra-hegemônicas no Brasil. Foz do Iguaçu, Revista Ideação, v. 10,
n. 2, p. 11-28, 2008. Disponível em: http://e-revista.unioeste.br/index.php/ideacao/article/view/4465/3387.
Acesso em: 11 maio 2019.
SAVIANI, Dermeval. Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações. São Paulo: Cortez, 2013.
TEMPOS Modernos. Direção: Charles Chaplin. Estados Unidos: Continental, 1936. 87 min.
VYGOTSKY, Lev. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. 11. ed. São Paulo: Ícone, 2010.
3. Nessa concepção, o sujeito da aprendizagem é visto como alguém sem voz ativa no processo
de aquisição do conhecimento, uma tábula rasa, e cabe ao professor depositar o conteúdo a
ser apreendido. Se o estudante não aprender, é culpabilizado. A culpa pode recair sobre seu
comportamento desatencioso, sobre seu contexto familiar, sobre a situação econômica da
família, entre outras formas de justificar a não aprendizagem. Assim, tem-se uma didática
que se fundamenta na meritocracia, pois aprenderão apenas aqueles que se esforçam,
que têm condições para assimilar o conhecimento, que têm famílias que os incentivem
etc. Os que não se adequam ao que a escola tem para oferecer são excluídos. A sociedade
que se deseja nessa concepção, embora o discurso propagado seja, por vezes, em prol da
emancipação, é a sociedade que marginaliza os menos favorecidos, aquela que incentiva a
competitividade, que propõe a pseudoparticipação como forma de mascarar a democracia
prevista na legislação.
Essa didática instrucional e tradicional ainda está presente nas escolas brasileiras, que em
seus PPPs anunciam uma concepção mais avançada de ensino e de aprendizagem, no entanto,
ainda trazem em muitas de suas ações pedagógicas vestígios de uma escola que deseja a
disciplina, o silêncio absoluto, vencer o conteúdo sem considerar se houve aprendizagem.
A didática reflexiva permite ao professor rever esses encaminhamentos, proporcionando-
-lhe condições de se autoavaliar e avaliar os processos pedagógicos dos demais membros
do colegiado, a fim de que a escola – como determina a legislação vigente – seja de fato
democrática.
Prática social:
ponto de partida
Prática social:
Problematização
ponto de chegada
Professor
mediador do
processo educativo
Catarse Instrumentalização
2. Como afirma Paulo Freire (1996), para ser professor e ensinar é necessário rigorosidade
metódica, organizar o ensino de maneira que o estudante sinta-se instigado a saber mais,
a questionar, a comparar, a superar seus conhecimentos advindos de outros grupos sociais.
Para o autor, ensinar não pode se distanciar da pesquisa, pois como aguçar a curiosidade
dos estudantes para que procurem outras formas de chegar à mesma resposta, que não
se contentem com respostas prontas, se o professor também não exercer a “curiosidade
epistemológica” (FREIRE, 1996)? É a superação da visão ingênua sobre o conhecimento,
sobre a sociedade, sobre o ensino e sobre a aprendizagem. Outro ponto fundamental para
contra-argumentar a afirmação é a necessidade de o professor ser um profissional reflexivo.
Essa reflexão, segundo Schön (1992), deve ocorrer de forma articulada e contínua, por meio
do conhecimento sobre a prática, da reflexão sobre a prática e da reflexão sobre a reflexão
na ação.
3. Para ensinar determinado conhecimento aos estudantes, objetivando que todos aprendam,
o professor precisa realizar um planejamento que considere os diferentes ritmos de
aprendizagem dos estudantes e as diferentes formas de aprender. Assim, quando o
professor tem compromisso com um PPP emancipador, buscará diversificar as atividades.
Tornará o conhecimento trabalhado em sala atrativo a todos: jogos, materiais didáticos,
brincadeiras, leituras de textos são algumas estratégias de que o professor pode lançar mão
para que todos se sintam desafiados. Já nas atividades diferenciadas, o professor realiza
o planejamento de forma personalizada, pensando na dificuldade do estudante ou como
ele se sente desafiado. Se o estudante já consolidou seus conhecimentos antes dos demais,
o professor deve diagnosticar em que momento da aprendizagem ele está e propor novos
desafios e problematizações, para que possa continuar avançando.
Gabarito 109
2. O professor tem mais possibilidades de registrar o avanço dos estudantes e replanejar a partir
da elaboração de portfólios que demonstram o percurso dos discentes. Esse instrumento
de registro permite superar a visão de que o professor seja o “examinador” e o estudante,
o “examinado”. Com esse instrumento de registro, o estudante tem condições de refletir
sobre seu próprio processo de aprendizagem, verificando o quanto já avançou e o quanto
ainda precisa superar para consolidar conhecimentos. Professor e estudante podem
comparar as primeiras atividades com as últimas, analisando o resultado do trabalho
de ambos. Dessa forma, é necessário desconstruir posturas autoritárias e verticalizadas
de avaliação da aprendizagem, em que o professor espera que o estudante responda
exatamente o que ele ensinou.
2. BNCC: documento normativo para todas as escolas que ofertam educação básica no país,
no qual constam as aprendizagens essenciais a que todos os estudantes têm direito. É a
referência para a elaboração ou reelaboração dos currículos e dos PPPs (BRASIL, 2017).
3.
3.
Didática
e aprendizagem, levantando reflexões sobre a não neutralidade do fazer educativo.
O campo de estudo da didática propicia a reflexão sobre concepções e práticas
realizadas nas escolas e possibilita rever e superar encaminhamentos que não
contribuem com o sucesso dos alunos.
Nesse viés, esta obra permite ao futuro professor analisar as práticas pedagógicas Regiane Laura Loureiro
e propor planejamentos e estratégias que corroborem com a visão de sujeito que se
Didática
deseja formar: cidadãos reflexivos, críticos e autônomos.
Com base em uma pedagogia crítica, de processos de ensino que garantam o
direito à aprendizagem, são propostos, além dos métodos de ensino e de estratégias
a serem utilizadas pelos docentes, encaminhamentos didático-pedagógicos que
consideram cada um dos estudantes em sua integralidade.
facebook.com/iesdebrasil
58083 9 788538 764113