Elásticos Ortodônticos
Elásticos Ortodônticos
Elásticos Ortodônticos
Resumo
A evolução e a melhoria dos materiais as propriedades dos elásticos usados em
elásticos aumentaram em muito sua apli- Ortodontia: os de borracha e os sintéticos.
cabilidade nos tratamentos ortodônticos Serão abordadas as vantagens, desvanta-
em diversas situações, como: na simplifi- gens, indicações e limitações quanto ao
cação da fixação dos arcos aos bráquetes seu uso, de forma a orientar os profissio-
em substituição às ligaduras metálicas, na nais da área e estudantes de pós-gradua-
retração de dentes, no fechamento de es- ção em Ortodontia, facilitando sua seleção
paços, auxiliares em aparelhos extrabucais e utilização. Além disso, serão sugeridas al-
e em alguns tipos de mecânicas ortodôn- gumas aplicações clínicas mais freqüentes
ticas. Desta forma, o objetivo deste artigo dos elásticos em Ortodontia, bem como os
é apresentar uma revisão sobre os tipos e aspectos biomecânicos mais relevantes.
Figura 3 - Elástico sintético usado como auxiliar na mecânica segmentada de Figura 4 - Esquema biomecânico bidimensional das forças e momentos pre-
retração e intrusão simultânea de incisivos. sentes na técnica segmentada de retração e intrusão simultânea de incisivos.
Figura 5 - Exemplo clínico de binário utilizado para correção de giroversão do Figura 6 - Esquema biomecânico bidimensional: os elásticos geram forças
2º pré-molar inferior direito. opostas, de mesma magnitude, co-planares e não colineares, por isso, são anu-
ladas, restando somente o momento do binário.
Além disso, o tracionamento de dentes inclusos com o auxílio de arcos auxiliares como o sliding-jig, que potencializa o efeito de
de elásticos associados à placa de acrílico removível ou aparelhos distalização nos molares superiores (Fig. 10).
fixos apresenta-se muito favorável e de grande aplicação clínica São indicados no tratamento da má oclusão de classe II, com o
(Fig. 7). Quando se utilizam aparelhos removíveis, Cabrera et al.7 intuito de exercer uma força distal nos dentes superiores e mesial no
indicam uma força de 100-150 g, com a vantagem da utilização de arco inferior (Fig. 9). Entretanto, essas forças geralmente não são pa-
ancoragem dentomucosuportada. ralelas ao plano oclusal, resultando em componentes verticais e hori-
zontais de força, que dependerão da localização e da distância entre os
2. Elásticos de classe II pontos de fixação dos elásticos (Fig. 9). Quanto maior for essa distância
Caracterizam-se por apoiarem-se na região do canino superior ântero-posterior, a componente vertical de força poderá ser menor e a
a um molar inferior, podendo ser o primeiro ou o segundo (Fig. componente horizontal será maior. Dessa forma, a extensão do canino
8). Podem ser fixados em ganchos presos no fio, ou diretamente superior até o segundo molar inferior pode minimizar os efeitos extru-
nos dentes, por meio de ganchos presentes em acessórios como sivos e potencializar a componente horizontal da mecânica aplicada15.
bráquetes e tubos, ou em fios amarrados no bráquete que servirão Com referência à magnitude de força, Cabrera et al.7 indicam a utiliza-
de locais para fixação dos elásticos. Uma alternativa é a utilização ção de 200-250 g na mecânica com elástico de classe II.
Figura 8 - Exemplo da utilização clínica do elástico de Classe II. Figura 9 - Esquema biomecânico bidimensional: as setas azuis representam as
resultantes da força, enquanto as vermelhas, a decomposição da força.
Philippe15 sugeriu que, além da análise mecânica, faz-se ne- A Figura 11 ilustra uma situação clínica na qual o paciente utilizou
cessária uma análise individual de cada paciente, de acordo com elástico de classe II do lado direito. Como a linha de ação da força
o padrão muscular e o crescimento esquelético. Segundo o au- dispensada pelo elástico passa distante do centro de resistência dos
tor, o elástico de classe II tradicional está mais indicado em casos molares, momentos de força serão criados, gerando uma tendência
de paciente com classe II moderada e dimensão vertical normal, de rotação para mesial e de inclinação para lingual (Fig. 12).
utilizando-se um fio o mais rígido possível no arco superior para Vale salientar que esse tipo de efeito colateral não ocorre apenas
controle dos efeitos indesejados. Isso é necessário para anular um nos molares, mas em todos os dentes que sirvam de apoio aos elásticos,
componente vertical de força que tende a extruir os incisivos su- pois a linha de ação da força sempre vai passar distante do centro de
periores e os molares inferiores, o que resultaria na inclinação do resistência dos dentes.
plano oclusal para baixo e para frente. Para minimizar esses efeitos indesejados, podem ser utilizados arcos
O mesmo autor15 contra-indica esse tipo de elástico em pa- pesados como os retangulares, arcos com stops justos aos acessórios
cientes classe II, divisão 1 e face curta (padrão hipodivergente) dos molares, arcos com dobras de pré-ativação, arcos linguais ou palati-
e em classe II, divisão 2 com mordida profunda devido ao efeito nos ou outro recurso biomecânico que irá contrapor esses efeitos.
indesejado no plano oclusal, no giro da mandíbula e na extrusão
dos dentes anteriores superiores. Da mesma forma, contra-indi- 3. Elásticos de classe III
ca em paciente classe II com face longa (padrão hiperdivergente), Caracterizam-se por serem posicionados da região do canino
pois a extrusão dos molares inferiores causaria um giro horário da inferior a um molar superior (Fig. 13). A principal indicação é no
mandíbula, prejudicando o aspecto facial convexo e aumentando a tratamento da má oclusão de classe III, porém, algumas mecânicas
altura facial anterior inferior. ortodônticas os aplicam nas más oclusões de classe I ou II durante
Na verdade, o uso de elásticos não deve ser dispensado de- a retração dos dentes anteriores inferiores como um recurso au-
vido aos efeitos indesejados que provocam. Deve-se, na verdade, xiliar de ancoragem no arco inferior, enquanto no arco superior
compreender os efeitos favoráveis, de acordo com o planejamen- favorecem a movimentação mesial dos dentes posteriores.
to do caso, e associar outros recursos na mecânica utilizada que Esse tipo de elástico também apresenta componentes verticais
possam contrapor as forças indesejadas associadas aos elásticos. e horizontais na maxila e na mandíbula (Fig. 14). No arco superior,
Dessa forma, não só os efeitos dentários, mas também os efeitos há extrusão e mesialização nos molares, enquanto no arco inferior
faciais, podem ser equilibrados e resultados mais favoráveis podem há força de extrusão no segmento anterior e de movimento distal
ser alcançados. nos caninos. Devido aos momentos criados por esse sistema de for-
Um efeito colateral dos elásticos de classe II comumente encon- ça, no plano oclusal, há um levantamento na região anterior. Além
trado na clínica ortodôntica é o giro mesial dos molares inferiores. disso, a mandíbula gira no sentido horário, levando o mento para
Figura 11 - Exemplo do efeito colateral de giro mesial do molar inferior direito Figura 12 - Esquema biomecânico bidimensional: a seta azul ilustra a linha de
frente a utilização clínica do elástico de Classe II. ação da força do elástico, enquanto a vermelha mostra o momento criado pela
força que passa distante do centro de resistência do dente.
Figura 13 - Exemplo da utilização clínica do elástico de Classe III. Figura 14 - Esquema biomecânico bidimensional: as setas azuis representam
as resultantes da força enquanto as vermelhas, a decomposição da força.
baixo e para trás e aumentando a altura facial anterior inferior. Por anterior dos arcos dentários7 e, nesse caso, é conhecido como elás-
isso, em casos de mordida aberta esquelética, é contra-indicado. tico tipo swing (Fig. 20). Sua principal indicação é a correção dos
É importante lembrar que a força gerada pelos elásticos de desvios de linhas médias inferior e superior.
classe III também criará momentos indesejados, semelhante aos A utilização clínica deve ser feita com cautela devido aos efei-
descritos anteriormente, pois passarão distante do centro de resis- tos que este tipo de combinação de elásticos provoca. Burstone6
tência dos dentes de apoio. Dessa forma, deve-se analisar individu- enfatizou que este efeito é um movimento em massa no qual todo
almente cada caso e selecionar os recursos clínicos mais indicados o arco é rotacionado ao redor de seu centro de resistência. Este tipo
para minimizar esses efeitos colaterais. de movimento é difícil de controlar e de ser alcançado, podendo
causar desarmonias entre os arcos e mordida cruzada.
4. Elásticos triangulares de classe II ou III A avaliação da Figura 21 mostra que, além da presença das
Esses tipos de elásticos acrescentam um ponto de fixação em forças extrusivas, forças laterais também são criadas. Por isso, de-
um dos arcos. Nos de classe II, o elástico localiza-se do canino vem-se utilizar arcos mais rígidos para evitar os movimentos de
superior, a um molar inferior e outro dente inferior mais anterior inclinação das unidades e minimizar os efeitos colaterais.
(canino ou pré-molar) (Fig. 15). Já nos casos de classe III, localiza-
se do canino inferior a um molar superior e outro dente superior 6. Elásticos verticais em “box” e de intercuspidação
de localização mais anterior (canino ou pré-molar) (Fig. 17). A sua Localizam-se em pontos do arco superior e inferior, agindo com
melhor indicação seria para otimizar a intercuspidação durante as forças de extrusão e contração. Quando utilizados na região ante-
fases de finalização dos casos. rior, de forma a favorecer a relação vertical entre os dentes antago-
Essa distribuição acrescenta um componente vertical no seg- nistas, são também chamados de elásticos em “box” (Figs. 22 e 23).
mento anterior nos casos de classe II ou III, além de potencializar Vale lembrar que estes dispositivos criam forças que passam longe
a tendência extrusiva nos dentes de suporte (Figs. 16 e 18). Devido do centro de resistência dos dentes e, por isso, geram momentos
ao componente vertical, é contra-indicado em casos de mordida que tendem a inclinar os dentes anteriores para lingual, diminuin-
aberta esquelética. do, consequentemente, o perímetro do arco (Fig. 23).
Quando usados na correção da mordida aberta dentária ante-
5. Elásticos para correção da linha média rior, é fundamental ressaltar que se a mordida aberta é esquelética,
Esse tipo de elástico combina o posicionamento de elástico de os incisivos já se encontram extruídos devido a uma compensação
classe II de um lado (canino superior a um molar inferior) e de classe dentária que ocorre12,20. Dessa forma, na maioria das vezes, os veto-
III no lado oposto (canino inferior a um molar superior) (Fig. 19). res predominantemente verticais gerados por este tipo de elástico
Outro recurso é posicionar o elástico obliquamente na região contra-indicariam o seu uso.
Figura 15 - Exemplo da utilização clínica do elástico triangular de Classe II. Figura 16 - Esquema biomecânico bidimensional: as setas azuis representam
as resultantes da força, enquanto as vermelhas, a decomposição da força.
Figura 17 - Exemplo da utilização clínica do elástico triangular de Classe III. Figura 18 - Esquema biomecânico bidimensional: as setas azuis representam
as resultantes da força, enquanto as vermelhas, a decomposição da força.
Os elásticos verticais também são comumente utilizados na Como descrito anteriormente, devido à componente vertical de
região posterior para melhorar a intercuspidação e auxiliar na fi- força, em casos de mordida aberta esquelética, esse elásticos estão
nalização dos tratamentos ortodônticos, quando são chamados de contra-indicados.
elásticos de intercuspidação (Fig. 24).
8. Elásticos para correção de mordida cruzada posterior
7. Elásticos “Sanfonados” Localizados na face lingual dos dentes inferiores e na vestibu-
Localizados em pontos eqüidistantes do arco superior e inferior, lar dos superiores ou o inverso, de acordo com o tipo de mordida
agindo com forças de contração e extrusão (Fig. 25). Indicados na cruzada posterior apresentado (Fig. 26). Permitem a movimentação
finalização para melhor intercuspidação dentária na presença de recíproca dos dentes inferiores e superiores em sentidos opostos
espaços entre dentes vizinhos e seus antagonistas e também em vestíbulo-lingualmente, sendo sua ação de extrusão e mudança na
fase pós-cirúrgica de tratamentos orto-cirúrgicos. inclinação axial dos dentes.
Figura 19 - A,B) Exemplo da combinação de elástico de Classe II no lado direito e Classe III no lado esquerdo para correção de linha média dentária.
Figura 20 - Elástico tipo swing para correção de linha média dentária. Figura 21 - Esquema biomecânico bidimensional: as setas azuis representam
as resultantes da força, enquanto as vermelhas, a decomposição da força.
A análise da Figura 27 mostra que, como as forças são geradas das. Os elásticos sintéticos usados como ligaduras elásticas apre-
distantes do centro de resistência dos molares, inclinações dentá- sentam problemas de higienização bucal, pois o acúmulo de placa
rias ocorrem. Por isso, sua principal indicação é para correção da ao redor do bráquete é maior do que com as ligaduras metálicas.
mordida cruzada dentária posterior, principalmente as unitárias. Além disso, devido à pigmentação e alteração de cor que os elas-
tômeros sofrem no meio bucal, muitos fabricantes acrescentam
9) Elásticos auxiliares de aparelhos extrabucais cores para mascaramento desse efeito, especialmente pigmentos
Algumas de suas aplicações são como auxiliares de aparelhos metálicos. Entretanto, isso reduz a força e a elasticidade do ma-
extrabucais, máscaras faciais para tração reversa da maxila e men- terial. Vale ressaltar ainda que a variação de cores dos elásticos
toneiras, fornecendo a força necessária para a ação destes apare- comercializados é também um incentivo durante o tratamento,
lhos (Fig. 28). especialmente para pacientes mais jovens21.
Os elásticos usados na retração de caninos apresentam grande
LIMITAÇÕES E DESVANTAGENS vantagem pela facilidade de manipulação do operador, conforto ao
Os elásticos ortodônticos apresentam algumas limitações que paciente e por apresentarem baixo custo. Entretanto, quando com-
não impedem a sua aplicação clínica, mas que devem ser conheci- parados à retração de dentes com molas de NiTi (níquel-titânio),
Figura 24 - Elástico de intercuspidação utilizado na região de caninos. Figura 25 - Elásticos “sanfonados” posicionados do segundo pré-molar do
lado direito ao segundo pré-molar do lado esquerdo.
Figura 26 - Elástico para correção de mordida cruzada dentária posterior, na região de 1º molar
permanente.
A B
Figura 28 - Elásticos de borracha usados como auxiliares em aparelhos extra-bucais: A) máscara facial e B) arco
extrabucal.
mostram-se inferiores em alguns aspectos. Sonis18, comparando que a causa principal e mais freqüente das reabsorções dentárias
o fechamento de áreas de extração com molas fechadas de NiTi, na população ocidental é a movimentação dentária induzida, sen-
calibradas em 150 g de força, com áreas fechadas usando elásticos do que a reabsorção severa e importante acomete cerca de 10%
3/16”, calibrados em 180 g, concluíram que as molas de NiTi per- das pessoas submetidas a tratamentos ortodônticos. Acrescentou
mitiram um índice de movimento dentário quase duas vezes mais que, entre os fatores favorecedores da maior freqüência de reab-
rápido que os elásticos convencionais. Da mesma forma, Samuels, sorções dentárias, encontra-se o uso de elásticos intermaxilares.
Rudge e Mair17 verificaram que as molas de NiTi permitem um ín- Dessa forma, para a prevenção da ocorrência de reabsorções den-
dice de fechamento de espaço maior que os módulos de elásticos tárias durante o tratamento ortodôntico, deve-se, se possível, não
sintéticos. Clinicamente, não houve diferença na posição dentária utilizar os elásticos intermaxilares.
entre os dois sistemas e não houve evidência de desconforto ao Da mesma maneira, Brezniak e Wasserstein5 associaram o uso
paciente com as molas de NiTi. de elásticos intermaxilares nos tratamentos ortodônticos com a
O’reilly, Rinchuse e Close14 realizaram um estudo longitudinal ocorrência de reabsorção radicular, o que foi verificado no estudo
prospectivo para avaliar se pacientes tratados ortodonticamente sub- de Linge e Linge13, onde ocorreu mais reabsorção radicular no lado
metidos à extração e ao uso de elásticos intermaxilares de classe II de utilização de elásticos intermaxilares.
apresentavam maior incidência de sinais e sintomas de disfunções
temporomandibulares (DTM). Os resultados indicaram que há uma CONSIDERAÇÕES FINAIS
interação do tempo de tratamento com dor à palpação. Além dis- Com o avanço tecnológico e desenvolvimento dos materiais
so, os pacientes não tratados não apresentaram mudanças ao longo dentários, os elásticos utilizados em Ortodontia tiveram suas pro-
do tempo observado, enquanto os pacientes testados mudaram de priedades avaliadas e melhoradas, de forma a aumentar sua aplica-
uma situação sem dor para uma situação com dor. Entretanto, apenas bilidade como auxiliares durante os tratamentos ortodônticos.
40% desse grupo relataram dor moderada, enquanto os 60% restan- O ortodontista deve compreender as propriedades dos elásticos
tes apresentaram ausência de dor. Dessa forma, o tratamento não foi de borracha e sintéticos, bem como suas limitações e riscos, alcan-
causador de DTM, mas, talvez, a percepção de dor pelo grupo experi- çando resultados mais satisfatórios nos tratamentos executados.
mental tenha sido diferente da do grupo controle devido à movimen- Foram apresentadas as principais aplicações clínicas e aspectos
tação dentária e mudança na propiocepção por alteração na oclusão. biomecânicos dos elásticos, cabendo ao profissional selecionar a
O uso de elásticos intermaxilares também tem sido associado à opção mais adequada para cada paciente, individualizando, com
ocorrência de reabsorções radiculares externas. Consolaro8 afirmou isso, as diversas situações clínicas.
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Lívia B. Loriato
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