O Senhor Do Impossível - Lloyd John Ogilvie PDF

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Lloyd John Ogilvie

DO IMPOSSÍVEL

1
ISBN 0-8297-1701-3
Categoria: Devocionial
Traduzido do srcinal em inglês: Lord of the Impossible
Copyright © 1984 by Abingdon Press copyright © 1988 by Editora Vida
Impressão, 1989 Impressão, 1991
Todos os direitos reservados na língua portuguesa por Editora Vida, Deerfield, Florida 33442-
8134 - E. U. A.
Capa: Hector Lozano

PARA EILEEN ROACH OGILVIE Nora Irmã em Cristo Amiga na fé E para quem as
impossibilidades são um prelúdio para as maravilhosas possibilidades de Deus

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ÍNDICE
Prefácio
1. Nada é impossível
Abraão
2. O lutador obstinado
Jacó
3. Deixe Deus ser Deus
José
4. O Senhor jamais esquece
Moisés, o homem de Deus
5. O Senhor do impossível
Moisés, o libertador
6. Graça renovada
Moisés, o líder
7. O milagre fundamental
Moisés e a presença de Deus
8. Mais tarde Israel na fronteira de Canaã
9. Molhando os nossos pés
Josué atravessa o Jordão!
10. Seis chaves para desvendar o impossível
Gideão
11. Uma questão de lealdade
Rute
12. Ebenézer
Samuel
13. Retardando a ação do impossível
Saul, um rei obstinado
14. Uma pessoa segundo o coração de Deus
Davi
15. Fogo saído das cinzas
Elias
16. A luta pelo poder
Jonas
6 O Senhor do Impossível
17. A solidão de Deus
Oséias
18. Nova a cada manhã
Jeremias
19. Um quarto homem no fogo
Sadraque,
20. QuandoMesaque e Abede-Nego
nada mais dá certo
Ezequiel

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PREFÁCIO
Fato curioso acerca dos heróis é que nem sempre demonstraram o mesmo
tipo de entusiasmo. Coragem a convicção, associados, os capacitaram a realizar
feitos espetaculares, que a história mais tarde registrou como heroísmo. Era vital
que executassem esses atos. Uma criativa compulsão ditava as ações de homens
e mulheres dinâmicos, os quais honramos como nossos heróis bíblicos. De um
encontro misterioso com Deus surgia o impulso para tentar o impossível. O
segredo
que elesdoeram
podere de
doDeus
que ao alcance ser
deveriam delese achava-se na perigosa
realizar por confluência
convocação do
divina. Fé!
Maravilhas se realizavam mediante o dom da fé.
A fé incorre em risco. A fé não é real se não exige risco. Uma disposição ao
risco era tudo o que Deus pedia deles. Quanto maior fosse o risco, tanto maior
seria o poder de fé concedido. E aqueles que ousaram tentar o impossível
encontraram a verdade que liberta, da qual tanto carecemos para os enormes
desafios da vida. Esses heróis constataram que o Criador e Sustentador do
Universo é o Senhor do impossível!
Em cada etapa da dramática história de Israel há um personagem central,
por meio do qual Deus procurou conduzir adiante o seu povo, numa
demonstração de que se tratava do seu povo escolhido. E muito honesto o relato
bíblico acerca de seus heróis. Eles eram falíveis, pessoas humanamente
inadequadas e cientes de que a obra de Deus realizada pelo poder dele produz os
resultados que ele espera.
Neste livro quero ajudar os leitores, através dessas pessoas, a ter um
encontro com o Senhor do impossível. Selecionei alguns dos muitos fiéis e
obedientes heróis da fé, com o propósito de vê-los no contexto da época em que
viveram, e de descobrir, através deles, o que o Senhor ensinou ao seu povo.
Meu intuito é apresentar mais que uma série de perfis de personalidades.
Antes, através destas, desejo confrontar as dores e as esperanças que nos
envolvem hoje. Usei uma aproximação tópica — textual — e expositiva. Cada
capítulo é uma explanação dos textos bíblicos mais salientes acerca de cada
personagem, a fim de descobrir o que Deus esteve tentando comunicar acerca
desses seus servos e o que isso significa para nós atualmente. Enfocaremos os
mesmos problemas também confrontados e vividos a fundo por essas figuras do
Antigo Testamento.
A fim de apreciar as condições de vida desses heróis à luz dos problemas
atuais, pedi à minha congregação de Hollywood e aos telespectadores do
programa "Deixe Deus Amar Você", que partilhassem comigo os maiores desafios
de suas vidas. Organizei esses desafios em categorias e conservei-os em mente,
enquanto buscava as passagens bíblicas que destacavam o poder sobrenatural do
Senhor do impossível.
Um estudo amplo e detalhado de como Deus chamou e preparou seu povo
para realizar o que eles sozinhos não podiam, revela o poder que está à nossa
disposição. É o desejo do Senhor de nos surpreender com o que ele pode realizar,
se ousarmos nos arriscar a aceitar o seu dom de fé e a deixar os resultados com
ele.
Cada capítulo deste livro conduz ao Calvário e à intervenção final do
Senhor do impossível. O Senhor de Abraão, Jacó, José, Moisés, Josué, Gideão,
Rute, grandes reis e incisivos profetas, foi o Senhor da encarnação, da cruz, de
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um túmulo vazio e do nascimento do novo Israel no Pentecoste. Deparar-se com
os heróis do Antigo Testamento é encontrar-se, de um modo novo, com o Salvador
do Novo Testamento.
Qualquer que tenha sido a descoberta deles do sobrenatural, não passa de
um prelúdio comparado com a revelação final do Senhor do impossível vivendo
entre nós. Por maiores que esses homens e mulheres se tornaram graças à
mediação de Deus, sua grandeza nada mais é que um vislumbre da nova criação
ao nosso alcance.
Minha maior dificuldade, ao escrever este livro, foi limitar o número de
personagens. Era necessário escolher entre uma descrição sucinta de muitos
deles ou um estudo mais profundo de algumas figuras típicas. Tive de omitir
muitos de meus heróis favoritos do período de centenas de anos que vai de
Abraão a Ezequiel. Meu interesse foi concentrar-me no Senhor do impossível e no
seu poder de intervenção acessível na atualidade. Esse poder se tornou a medida
final de quem seria incluído entre os precursores da aventura da fé.
Assim como todos os meus livros anteriores, também este visa, com
esmero, atender às necessidades das pessoas hoje em dia. Meu compromisso ao
ouvir as pessoas com atenção e, então, a Deus, quando ele se expressa através da
Bíblia, reflete-se no estilo e propósito deste livro.
Todos nós nos defrontamos com impossibilidades. A vida traz os seus
problemas e perplexidades, para os quais parece não haver saída. Pessoas
exigentes e oportunidades enormes fazem frente a todos nós. Quando a vida nos
desafia e declaramos: "Ora, isso é impossível", precisamos fazer da liberadora
afirmação do anjo de Deus o nosso lema: "Para Deus nada é impossível".
Encontrar o Senhor do impossível nas páginas do Antigo Testamento, em pessoas
humanas e vulneráveis, porém corajosas, renovou o meu próprio "todas as coisas
são possíveis para Deus", e dispus-me a correr o risco. Minha oração é que esta
renovação também aconteça ao leitor.
Sou muito grato a minha assistente administrativa, Jeri Gonzalez, por
datilografar o manuscrito, aprontando-o para o prelo. Sua comunhão com Deus e
sua experiência com ele como o Senhor do impossível fez do projeto uma fonte de
muitas conversas de incentivo mútuo.
E a você agora, caro leitor, companheiro de aventura e parceiro na fé,
confio este livro na esperança de que ele o ajude a crer com ousadia que "as
coisas que são impossíveis aos homens são possíveis a Deus".

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CAPÍTULO UM

NADA É IMPOSSÍVEL
Abraão
O que você está empreendendo que não possa concluir sem uma mediação
do Senhor? Há anos venho fazendo essa pergunta a mim mesmo e aos outros.
Muitos de nós passamos a vida dentro dos estreitos limites de nossos talentos e
capacidade. Tomamos o maior cuidado para comprimir e manter todas as coisas
sob o nosso controle. Na realidade, não precisamos de Deus. Nosso temor ao risco
nos mantém longe do que não podemos dominar ou realizar com nossa própria
habilidade.
Embora estejamos cercados de problemas, desafios e oportunidades,
dedicamo-nos somente às coisas inevitáveis. Nossa visão do futuro é quase
sempre baseada no que podemos realizar com os nossos próprios recursos e
experiências. Quando oramos, pedimos a Deus o seu poder a fim de realizarmos o
que achamos melhor. Ele se mostra sensível e misericordioso e o nosso
cristianismo entra nos moldes de nossas possibilidades auto-determinadas.
Partilhei esses pensamentos com a minha congregação certa manhã de
domingo. Então, ao final do culto, estendemos o período de oração. Pedi que cada
um meditasse essas questões em vários níveis da vida. Orientei-os no sentido de
que as orações refletissem o poder ilimitado de Deus. O que faríamos se
estivéssemos certos de que o Senhor interviria em nosso auxílio? O que
estávamos evitando ao afirmar: "Ora, isto é impossível"? Onde havíamos evitado
um envolvimento com o que nos parecia impossível realizar sozinhos? Pedi que os
irmãos pensassem na pessoa intolerável, no relacionamento problemático, na
limitação, na enfermidade, na crise, ou no encargo, por segurança mantidos à
distância. Depois nos atrevemos a pedir a Deus um quadro mental de como
viveríamos se estivéssemos certos de que ele liberaria o mesmo poder revelado na
vida de nossos heróis bíblicos, na ressurreição de Jesus e no livro de Atos.
Para eliminar os obstáculos à nossa percepção do possível, lemos João
14:12-14: "Em verdade, em verdade vos digo que aquele que crê em mim, fará
também as obras que eu faço, e outras maiores fará, porque eu vou para junto do
Pai. E tudo quanto pedirdes em meu nome, isso farei, a fim de que o Pai seja
glorificado no Filho. Se me pedirdes alguma coisa em meu nome, eu o farei."
No final da oração, o ambiente no santuário era de intensa vibração.
Tínhamos recebido o mesmo poder para amar, perdoar, curar, reconciliar e
aceitar a nossa cruz de obediência? Sim! E mais do que isso. Fomos chamados
para realizar aquilo que Jesus de Nazaré não pôde antes da crucificação, da
ressurreição e do Pentecoste: conduzir as pessoas até ele como o Senhor vivo e
triunfante! Para quem, em nossas vidas, precisamos despender tempo e atenção
sacrificial a fim de comunicar o amor de Jesus? Que oportunidades de servir à
nossa comunidade socialmente enferma estamos com sutileza a evitar? Que
metas o Senhor deseja que busquemos para nossa família, nosso trabalho, nossa
igreja, mesmo com o risco de perder nossa segurança?
Depois desse inventário cortante, pedi que as pessoas estendessem as
mãos abertas. Nelas colocamos a pessoa, a situação, o problema, ou a ação,
objeto de nossas orações. O que deveríamos ser, realizar ou obter, que era
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impossível sem o seu poder e mediação? Então, quando todos estavam prontos,
erguemos aquelas impossibilidades em esperançosa rendição. Observando a
congregação, vi mãos levantarem-se, a princípio devagar, depois com vigor, até
que quase todos estavam com os braços erguidos e as mãos abertas, liberando
suas impossibilidades a Deus. O hino oficial chegou a estremecer as vigas de
sustentação do teto.
Ainda mais empolgante que o culto foi a mudança nas pessoas e em nossa
igreja. As cartas e as conversas das semanas seguintes relatavam coisas
surpreendentes. Muitos jamais haviam tido uma visão da vontade de Deus,
impossível de realizar sem o auxílio divino. Porém, agora, mediante essa nova
visão e a disposição de aventurar-se ao impossível, Deus concedeu cura, poder
sobrenatural, ajuste de relacionamentos, reconciliação de casais, mudanças de
emprego, evangelização pessoal e projetos missionários na comunidade. Uma
mini-experiência do Pentecoste teve início quando as pessoas ousaram arriscar-se
a fazer o que apenas sob a mediação do Senhor seria possível. Essas pessoas
constataram que o Senhor supre as suas necessidades e as orienta nas suas
impossibilidades.
Com o objetivo de reciclar o fluxo de poder do Senhor a cada semana, os
anciãos da igreja colocam-se à disposição das pessoas após os cultos de
adoração. Eles partilham, em pequenos grupos, suas impossibilidades com
outros irmãos. Esses anciãos tomaram--se líderes de confiança no estímulo a
seus companheiros de aventura.
Quando os crentes percebem que uma chamada vem de mãos dadas com o
discipulado sacrificial, de repente todo o programa da igreja assume um novo
propósito e significado. As atividades de comunhão, educação e adoração tornam-
se parte da preparação para o ministério.
Quanto mais vivo a aventura da fé e partilho com outros em profundidade o
que estão descobrindo acerca de Deus, mais sou possuído desta convicção: o
Senhor nos ama e se importa mais com nossos interesses que nós mesmos. Ele é
o Senhor das intervenções radicais. Em tempo e a tempo, ele invade os nossos
problemas e as nossas perplexidades com poder sobrenatural. Há ocasiões em
que ele de fato nos conduz a desafios e oportunidades, a fim de nos maravilhar
com o que ele é capaz de fazer com as nossas impossibilidades.
O que essa aventura da fé significa para você? Você já pediu a Deus que o
ajude a encarar, sem receio, o risco de aventurar-se em algo por ele revelado?
Isso é importante. Deus opera o impossível por meio de uma intervenção radical
naquilo que ele orientou. Mantenha isso em mente. Tudo o que eu afirmo neste
livro fará mais sentido se diante de nós conservarmos a nossa impossibilidade
orientada por Deus enquanto estudamos os personagens do Antigo Testamento,
pois deles podemos aprender o que descobriram em suas circunstâncias, acerca
do Senhor do impossível. Eles nos ajudarão a perceber o poder divino nas nossas
próprias
Emcircunstâncias.
um dos seus livros, Oswald Chambers diz que nossas impossibilidades
"fornecem uma plataforma na qual o seu [de Deus] grande poder e graça se
manifestam. Ele não apenas nos libertará, mas, ao fazê-lo, nos dará uma lição
que jamais esqueceremos, e à qual nos volveremos com alegria. Jamais
agradeceremos a Deus o bastante por ter feito exatamente o que prometeu."

Abraão constatou esse interessante fato em sua crescente amizade com


Deus. Na Bíblia, esse precursor da aventura da fé recebe distinta honra: "Abraão,
teu amigo" (2 Crônicas 20:7). Deus mesmo sustenta esta afirmação através do
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profeta Isaías: "Abraão, meu amigo" (Isaías 41:8). Tiago resumiu o
desenvolvimento daquela amizade nestes termos: "Ora, Abraão creu em Deus, e
isso lhe foi imputado para justiça"; e: "Foi chamado amigo de Deus" (Tiago 2:23).
Abraão não obteve facilmente sua amizade com Deus, a qual só
conquistada através de repetidas provas da intervenção divina. Tudo o que ele
intentou fazer contribuiu para levá-lo a afirmar: "O Senhor provera". Através das
provas, Abraão tornou-se um herói da fé que sobressai a todos os outros do
Antigo Testamento. O segredo de sua vida foi o dom da fé, recebido do Senhor.
Ele se destaca pelos riscos que assumiu e pela seqüência de intervenções divinas
em sua vida.
A vida heróica de Abraão pode ser dividida em três fases: a chamada à fé, a
realização da fé, e a prova definitiva dessa fé. A fase principal é a terceira, mas os
eventos das outras ajudam-nos a compreender e a avaliar a ousada afirmação: "O
Senhor provera". E a certeza do patriarca na experiência mais angustiante de sua
amizade com Deus.
A chamada à fé ocorreu quando Abrão era conhecido como o filho de Terá e
vivia no meio do povo semítico que migrou e se estabeleceu em Ur, uma
civilização muito avançada do Norte da Mesopotâmia. Uma gama variada de
deuses e cultos aos ídolos saturava o politeísmo sumeriano da região e da época:
um problema que se evidencia com freqüência nesse período limiar da história do
povo de Deus. Por algum tempo esses bons semitas sincretizaram o seu Deus da
criação, do dilúvio e de Noé com os deuses locais — o deus da lua em particular.
Comprova-se tal fato no nome de Terá, que em hebraico tem relação com a
palavra "lua". Esta pode ser a razão por que o Senhor o desprendeu, bem como a
sua família, dos laços daquela civilização próspera e sofisticada. Deus provocou
um sentimento de desconforto em Terá que o induziu a partir de Ur com seu filho
Abrão, a esposa deste, Sarai, e Ló, sobrinho de Abrão, impelindo-os em direção à
terra de Canaã. Viajaram ao longo do vale do Eufrates até Harã.
Em Harã, anos mais tarde, o mesmo Deus que orientou Terá a mudar-se de
Ur apareceu em revelação direta a Abrão, deixando-o em pânico. O Senhor tinha
grandes planos para Abrão, e este talvez vivesse toda uma vida de amizade com
Deus antes de perceber que o Senhor proveria para cada passo do caminho. "Sai
da tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai, e vai para a terra que te
mostrarei" (Gênesis 12:1). Os riscos que o Senhor nos desafia a assumir são
sempre para o nosso bem, mesmo que pareçam assustadores. O Senhor
prossegue: "De ti farei uma grande nação, e te abençoarei, e te engrandecerei o
nome. Sê tu uma bênção: abençoarei os que te abençoarem, e amaldiçoarei os
que te amaldiçoarem; em ti serão benditas todas as famílias da terra (Gênesis
12:2-3).
É uma promessa e tanto, mas agir baseado nela exigia risco. Nela e
somente nela, Abrão se apoiava. Assim, apesar da pouca orientação que possuía,
ele partiu,
Muitos anose foram
nos anos seguintes
necessários conheceu
para que Abrãoa amizade e a fidelidade
amadurecesse de Deus.
nessa amizade —
confiasse nela, mediante a prova da sua realidade em épocas de dúvida e
desespero.
Após a morte de Terá, Abrão deixou a segurança de Harâ e seguiu para
Canaã. Os altares que construiu ao longo do percurso falam da sua crescente fé
em Deus, a qual o capacitava a assumir novos riscos. Contudo, quando uma
escassez de víveres atingiu Canaã, ele se dirigiu mais além, ao sul, para o Egito.
Aí Abrão revelou o outro lado de sua personalidade — o lado tímido que reagia
contra o risco, que não confiava. No Egito, Abrão ordenou a Sarai que dissesse
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ser sua irmã — uma mentira decorrente da sua falta de fé na promessa de Deus.
Sarai era linda, e Abrão temia que os egípcios, para ficarem com ela, o matassem.
O próprio faraó atraído pelo encanto de Sarai, conduziu-a ao seu lar e conferiu
honras a Abrão, que supunha ser irmão dela. Mas o Senhor tinha outros planos.
Enviou pragas contra faraó e toda a sua casa, até que a verdade viesse à tona.
Abrão quase frustrou o plano de Deus de torná-lo o pai de uma grande nação. Por
pouco ele e Sarai não escaparam com vida.
A realização da fé, o segundo ato do drama de Abrão que logo seria Abraão,
surgiu quando o Senhor o tirou do Egito e o levou para Canaã. O Senhor
manifestou-se a ele em seu primeiro acampamento e lembrou-lhe as bênçãos,
comprovadas em gado, ouro e prata, e mostrou-lhe a terra prometida a ele e à
sua posteridade.
"Ergue os olhos e olha desde onde estás para o norte, para o sul, para o
oriente e para o ocidente; porque toda essa terra que vês, eu ta darei, a ti e à tua
descendência, para sempre. Farei a tua descendência como o pó da terra; de
maneira que se alguém puder contar o pó da terra, então se contará também a
tua descendência" (Gênesis 13:14-16).
A seguir, o Senhor mandou que Abrão fizesse algo estranho: "Levanta-te,
percorre essa terra no seu comprimento e na sua largura; porque eu ta darei"
(Gênesis 13:17). Com o propósito de desenvolver em Abrão a ousadia de um
aventureiro, o Senhor tinha de ajudá-lo a apossar-se da realidade do
aparentemente impossível. Deu-lhe não apenas uma visão, mas também fê-lo
guiar-se por ela até que dela se apossasse por completo.
Da mesma forma Deus age comigo e com você. Primeiro, ele nos dá o sonho
impossível, depois nos ajuda a ver um quadro desse sonho já em nosso poder, e
em seguida, através de nossa imaginação, ele nos ajuda com persistência a
formar uma imagem da realidade. Qual é o seu sonho?
Abrão edificou um altar para agradecer ao Senhor e mostrar-lhe a sua fé.
Como podemos demonstrar ao mesmo Senhor do impossível que cremos?
A segunda fase encerra-se com a prova da bênção do Senhor sobre Abrão.
Não apenas ele derrotou o rei de Sodoma na batalha, mas Melquisedeque, rei de
Salém e também sacerdote do Senhor, saiu-lhe ao encontro para celebrar com
pão e vinho a sua vitória. Com bastante expressividade, ele abençoa a Abrão:
"Bendito seja Abrão pelo Deus Altíssimo, que possui os céus e a terra; e bendito
seja o Deus Altíssimo, que entregou os teus adversários nas tuas mãos" (Gênesis
14:19-20). Talvez fosse confortador para Abrão ouvir da parte de um ser humano
a mesma promessa que repetidas vezes ouvira de Deus. O vínculo de amizade
entre ele e o Senhor tomava-se cada vez mais forte e estável.
Excelente! Pois na terceira fase dar-se-á o maior teste dessa amizade,
conforme veremos. Abrão encontrava-se num dilema. A promessa de Deus
anunciava que ele teria inúmeros descendentes, porém Sarai era estéril. Como
poderia
nascidosser
empai
suadecasa?
multidões sem vez
Não. Em um disso
filho?oSeria o herdeiro
Senhor prometeuuma dos
Abrãomeninos
o que
parecia impossível. Ele e Sarai teriam um filho. Abrão achou muito difícil
acreditar em tal coisa. Sua idade já atingia a casa dos cem anos e a de Sarai a
dos noventa! Foi então que o Senhor providenciou-lhe um presente, que é dado
com liberalidade a todos os que ousam arriscar-se — o dom da fé. Mostrou-lhe as
estrelas do céu e ordenou-lhe que as contasse. "Será assim a tua posteridade".
A seguir vem o versículo 6 do capítulo 15 do Gênesis, um dos mais
importantes do Antigo Testamento. "Ele creu no Senhor, e Isso lhe foi imputado
para justiça". Abrão recebeu de Deus a única coisa de que este se agrada e nos
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une a ele, e que ele anseia se libere de nosso interior. E só pela fé — não por
obras ou expressão de nossa bondade própria — que se estabelece e se mantém
um correto relacionamento com Deus. Mais tarde essa questão se tornou crucial,
tanto para a igreja primitiva quanto para a Reforma. Como nos unimos a Deus?
Pela fé somente. E o que Deus deseja de nós ele implanta em nosso íntimo. Fé é
um dom.
Abrão precisou de uma renovação constante desse dom enquanto travava
uma luta interior com a promessa impossível, em termos humanos, de um filho.
O Senhor proveu no passado, mas como poderia uma mulher de noventa anos
gerar um filho? Depois dessa promessa bem auspiciosa, Sarai insistiu com Abrão
a que engravidasse Hagar, sua serva egípcia. Outra vez expõe-se a dificuldade de
nosso herói em acreditar na espantosa promessa de Deus. "E Abrão anuiu ao
conselho de Sarai" (Gênesis 16:2b). Um erro lamentável que relegou Abrão e Sarai
a um estado de desconcerto com a vontade pessoal de Deus por algum tempo.
Ismael nasceu da relação não abençoada de Abrão e Hagar. Como sempre
se constata na revelação clara e gradual do Senhor do impossível, alguns de
nossos heróis tiveram de se contentar com o segundo lugar porque não souberam
esperar pelo primeiro, pelo melhor que Deus tinha para eles. Contudo, o Senhor
jamais se esquece de quem escolheu, nem volta atrás em suas promessas.
O Senhor reconduz Abrão ao "ponto zero". Uma vez mais ele faz a sua
promessa, e desta vez dá novos nomes a Abrão e Sarai. Abrão será Abraão, pai de
multidões, e Sarai será Sara, mãe de nações. Além da nova visão sugerida pelos
novos nomes, o Senhor, a fim de encorajar novamente a Abraão, adota um nome
definitivo para si mesmo: El Shaddai, Deus Todo-poderoso — aquele que detém
todo o poder. Como se tudo isso não bastasse, o poderoso El Shaddai propõe uma
aliança e promete abençoar a Abraão e a sua posteridade para sempre. A garantia
dessa bênção é um filho que se chamaria Isaque.
E qual foi a reação de Abraão? Ele riu! E mais tarde Sara também riu, ao
saber da promessa impossível, isso magoou o Amigo. Era desejo de Deus que eles
rissem com ele em puro deleite e alegria pelo que ele estava prestes a fazer, e não
dele ou de sua promessa. Não é de surpreender que ele insistisse na mesma
tecla. Há humor no coração de Deus que suscita em nós riso de espanto, não de
zombaria. Lute com Deus até apropriar-se de suas promessas, mas jamais ria
dele! Ele é um Amigo bom demais para isso.
Quando Isaque nasceu, Sara aprendera a sua lição. Assim se expressou em
louvor e gratidão: "Deus me deu motivo de riso; e todo aquele que ouvir isso, vai
rir-se juntamente comigo. . . Quem teria dito a Abraão que Sara amamentaria um
filho? pois na sua velhice lhe dei um filho" (Gênesis 21:6-7). Quem, senão Deus, o
Senhor do impossível!
Isaque tomou-se um rapaz vistoso e estimado. Seus pais nutriam um
profundo amor por ele, não apenas por terem finalmente um filho, mas porque
agora
alegriaos
e atermos da aliança
esperança se era
de Abraão; cumpririam. Isaque era mais que o orgulho, a
a sua vida!
Agora, entre no coração de Abraão e veja o pânico do patriarca quando o
Senhor lhe pediu o impossível como prova de sua fé. Podemos sentir as
punhaladas de dor em cada palavra da ordem do Senhor: "Toma teu filho, tem
único filho, Isaque, a quem amas, e vai-te à terra de Moriá; oferece-o ali em
holocausto, sobre um dos montes, que eu te mostrarei" (Gênesis 22:2). O que
significava essa ordem? A angústia de Abraão era inexplicável. "Por quê, Deus?
Por quê?" ele deve ter clamado, sentindo-se completamente arrasado. "Meu filho,
Deus? Como se cumprirá sem Isaque a tua promessa de que eu serei o pai de
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multidões?" Nenhum pedido pode ser pior. Nada pode parecer mais horrendo.
Já tentei meditar nessas perguntas vindas do íntimo da alma de Abraão.
Sentei-me na Cúpula da Rocha, em Jerusalém, abaixo da qual está o monte
Moriá, e perguntei a mim mesmo por que Deus pediu isso de Abraão. Alguns
dizem que o próprio Abraão inventou a idéia pelo fato de os sacrifícios de crianças
moabitas serem a suprema expressão de obediência aos deuses. Mas se o Deus
verdadeiro era tão bom, para que apaziguá-lo com um sacrifício pagão?
Além disso, se a ordem divina fosse apenas o produto da imaginação de
Abraão para a sua autojustificação, o que pensar das outras vezes que Deus
conversou com ele? Não! a ordem para oferecer Isaque era real — uma prova
definitiva da fé que Abraão possuía em Deus.
Restava saber se Isaque era uma dádiva de Deus ou uma posse de Abraão.
Como ocorre a muitos de nós, teria Abraão permitido que seu orgulho por Isaque
empanasse seu louvor a Deus? Há uma diferença sutil entre "tudo o que eu sou e
possuo é dádiva de Deus" e "tudo o que eu sou e possuo é meu — pertence a mim
e a Deus — e nesta ordem".
Todos nós incidimos nesse tipo de orgulho auto-gratificante. Damos
demasiada importância ao que realizamos para Deus com nossas forças,
esquecidos de que não podemos sequer respirar um sopro de ar sem a bênção de
Deus a cada momento.
Penso nas épocas de crise, em que tive de abrir mão do governo de minha
família, ou profissão, ou futuro, e me vi forçado a perceber que eles não são
meus, mas um encargo, um dom de Deus. Doença, dificuldades,
desapontamentos despertaram-me para o fato de que não posso me apoderar com
avareza das dádivas da vida. Com o passar dos anos de amizade com Deus, vi-me
obrigado a entregar os pontos, uma rendição decisiva à idéia tola de que eu
possuía alguma coisa por causa de meu direito ou trabalho árduo.
O ponto em questão é: Quem ou o que é o seu Isaque? Quem em sua vida
disputa com Deus o primeiro lugar? O que você possui ou realizou que disputa
com Deus o significado de sua vida? E freqüente, durante uma crise,
percebermos que Deus não recebe de nós a máxima lealdade ou energia na vida
diária. Falsos deuses não são apenas ídolos nos campos ou templos de uma
antiga época paga; eles invadem nossos lares, identificam-se em diplomas nas
paredes de nossos escritórios e estabelecem-se nos alvos e planos de nossa auto-
gerada autoridade sobre nosso destino.
Mas devemos aprofundar-nos a fim de perceber o que Deus pretendia ao
conduzir Abraão por essa prova cruciante. Fé é risco. É a crença de que Deus
provera, a confiança inabalável de que ele nos dará, no momento certo,
exatamente aquilo de que precisaremos em tempos difíceis. Foi esse tipo de fé que
Deus deu a Abraão. A importância dessa história para nós está em que Deus deu
a Abraão mais que um desafio; deu-lhe a certeza de que ele não negaria o seu
pacto.
Eterna.Deus foi até ao fundo com Abraão e o levou à sólida segurança da Rocha
Com o coração e mente, imagine-se escalando o monte Moriá em
companhia de Abraão e Isaque. O rapaz gostava de estar com o pai e estava
encantado em ir com ele a um sacrifício. Mas atente para a preocupação com o
cordeiro para o sacrifício, que se transforma em pânico enquanto eles, com
dificuldade, caminham mais adiante morro acima. — Meu pai! — disse Isaque. —
"Eis o fogo e a lenha, mas onde está o cordeiro para o holocausto?" (Gênesis
22:7). Isaque confiava em seu pai, porém Abraão confiava em Deus ainda mais, e
responde comovido: — "Deus provera para si, meu filho, o cordeiro para o
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holocausto" (Gênesis 22:8). E persistiam na caminhada sem que a pergunta real
de Isaque obtivesse resposta. Certamente ele estava a par dos sacrifícios de
crianças praticados naquela área. "Podia ser? Não Abraão, meu pai!"
Atreva-se a imaginar o que se passou entre pai e filho quando alcançaram o
topo do Moriá, e Abraão em silêncio, quase compulsivamente, edificando o altar,
preparando a lenha, e então começando a amarrar o filho. Sinta o íntimo de
Abraão, quando os seus olhos se deparam com os olhos incrédulos de Isaque. E
então o momento fatal se aproxima. Antes que o fogo fosse aceso, Abraão retira a
faca para imolar o filho. No momento que ele estava para enfiar a faca no peito de
Isaque, o Senhor clama: "Abraão, Abraão!"
Nem um segundo a mais, nem um segundo a menos. As palavras
intervieram a tempo e com precisão! E então disse Deus: "Não estendas a mão
sobre o rapaz, e nada lhe faças; pois agora sei que temes a Deus, porquanto não
me negaste o filho, o teu único filho" (Gênesis 22:12). Abraão havia assumido o
risco máximo e Deu? foi fiel à sua promessa.
A pintura de Rembrandt desta intervenção dramática retrata a notável
verdade. Quando Abraão está prestes a enfiar a faca, ergue os olhos em resposta
ã chamada interceptora de Deus. É de puro realismo o lançar da faca ao ar com
toda a força. Abraão aguardava a voz, e quando a ouve, arremessa a faca para
longe com um triunfante: "Eu sabia que virias! eu sabia que proverias uma
saída!" Rembrandt retratou um misto de pavor, assombro e certeza na face de
Abraão. Comovo-me ao pensar que Rembrandt serviu-se do mesmo modelo para a
face de Abraão, ao retratar o pai na pintura do filho pródigo quando este
retornava. O coração amoroso de Deus mostra-se patente em ambos.

Após o momento da extrema intervenção, Abraão olhou por cima dos


ombros e notou atrás de si, entre os arbustos, um carneiro preso pelos chifres.
De fato, Deus havia provido! Ali estava o sacrifício substitutivo. Depois de sentir a
angústia de Abraão, deixe agora a sua imaginação captar a alegria dele. Ele
ofereceu o carneiro em vez do filho, e chamou o lugar: "YHWH Jireh", que
significa: "O Senhor provera". Estas palavras, transformadas em metáfora da
intervenção majestosa de Deus, têm sido repetidas pelas gerações seguintes em
épocas de dificuldades, e carregadas à frente de exércitos e procissões.
A história familiar de Gênesis 22 reluz como um diamante, ao expor novos
raios de verdade cada vez que a meditamos. Jamais nos cansamos dela, não
apenas porque o drama nos prende a atenção, mas também porque exprime a
nossa mais profunda necessidade de confiar em Deus em ocasiões de risco e nos
reanima com as oportunas intervenções divinas.
Acima de tudo, nossa atenção se volta para outro monte não muito distante
do Moriá — o Calvário. Ali Deus fez o que era na realidade impossível. Ele deu o
seu próprio Filho como sacrifício pelos pecados de todos os povos, em todas as
gerações. O que ele não
para que pudéssemos exigiu de
conhecer Abraão,
o seu exigiu
supremo de esiperdão.
amor mesmo, oferecendo Jesus
Senti um arrepio terrível ao descer o monte Moriá em direção do Jardim do
Sepulcro, nas cercanias do túmulo vazio, e ao seguir até à rocha irregular que
assume a forma de um crânio — o Gólgota. Visitas a locais históricos podem
parecer sentimentais, mas não se revivemos no coração e mente o que aí
aconteceu. Deus é o mesmo — ontem, hoje e amanhã. Ele é o Senhor do
impossível — Moriá e Calvário. Havia uma cruz no coração de Deus quando ele
interveio com Abraão e curou a síndrome do pecado através do sacrifício de Jesus
Cristo na cruz. E o mesmo coração em forma de cruz está batendo por você e por
12
mim. Ele nos ama com extremo ardor e veio para que pudéssemos saber que
somos o seu povo amado e querido.
Aprendemos três coisas importantes com Abraão acerca do Senhor do
impossível. As três estão intrinsecamente entrelaçadas numa grande promessa
que nos ajuda a viver agora e para sempre.
A primeira é que o Senhor criou a mim e a você para sermos amigos dele.
Esta convicção não é irreverente. Na verdade, ela gera a reverência. Ele veio em
Jesus Cristo para estabelecer uma profunda amizade conosco e revelou esse
desejo mediante um amor incansável consumado na cruz. Tendo como base essa
amizade, podemos buscar sua direção, arriscar-nos, e conhecer sua presença
permanente conosco. Quando contemplamos a face de Deus em Cristo,
percebemos nela afirmação, aceitação, apoio ilimitado e amor infindo. Enquanto
olhamos para ele, maravilhados e gratos, ele nos lembra que a sua amizade não
se fia em nossa eficiência e perfeição. "Ninguém tem maior amor do que este: de
dar alguém a própria vida em favor dos seus amigos. Vós sois meus amigos, se
fazeis o que eu vos mando. Já não vos chamo servos, porque o servo não sabe o
que faz o seu senhor; mas tenho-vos chamado amigos" (João 15:1315). Coloque-
se no lugar de Abraão e ouça o Senhor dizer: "Abraão, meu amigo".
A segunda coisa que Abraão nos ensinou é que a essência da fé é risco.
Podemos atrever-nos ao risco, ao sabermos que o Senhor ama o nosso "Isaque"
mais que nós mesmos. Foi essa a descoberta espantosa de Abraão. Ao pormos o
Moriá e o Calvário sob foco, podemos ver o nosso Isaque de uma perspectiva
completamente diferente. Deus é por nós e não contra nós. Ele não deseja um
sacrifício religioso de nosso Isaque, mas uma rendição total de nossa vontade
obstinada, seja quem for ou o que quer que se tenha tomado o nosso Isaque.
Pense nas pessoas que se transformam na extensão do seu ego — cujo sucesso
produz em você um falso orgulho ou cujo fracasso lhe parte o coração. Ou
considere aquilo que você mais aprecia, ou seja, saúde, reputação, posição ou
planos para o futuro. E então medite nas oportunidades que podem ter--se
transformado em obsessões. O emprego, uma causa, a igreja, ou uma
responsabilidade que se tenha transformado na paixão de sua vida. Nosso Isaque
é aquela pessoa ou coisa que lance uma ponte sobre o espaço vazio entre os
nossos sonhos mais acariciados e nosso desejo de vê-los realizados. A aventura
da amizade com Deus baseia-se em nossa renúncia ao domínio daquilo que
jamais nos coube dominar. Entregamos o que não é nosso a fim de ganhar o que
não podemos perder. Abraão deu a Deus o seu Isaque, seu futuro e seu destino
de pai de multidões. Em troca, o Senhor doou Isaque como um presente e uma
garantia de que amava o rapaz e acreditava no futuro de Abraão mais que o
próprio Abraão.
Pode acontecer o mesmo com você e comigo. Mas não sem a terceira coisa
que aprendemos com Abraão. O legado de visão ampla e liberal que o grande
herói
fé na da fé nos deixou
intervenção foi a fiei
de Deus. Nãoconvicção de que
seria possível o Senhor
suportar a provera.
provaçãoEra real a sua
cruciante, a
menos que ele já possuísse aquela fé. Quando confiamos o nosso Isaque ao
Senhor, podemos estar certos de que ele há de prover uma rota de escape através
de nossas dificuldades. Podemos enfrentar qualquer coisa porque em Jesus
Cristo as temos sublimadas em sua intensidade na cruz. O Senhor da
intervenção radical assumiu a completa responsabilidade de nosso pecado,
fracasso e rebelião. Cristo é o carneiro entre os arbustos, o Cordeiro de Deus que
tira o pecado do mundo. Deus não apenas permitiu que Jesus levasse o pecado
sobre si mesmo, mas também ressuscitou a seu Filho dentre os mortos como
13
nosso Senhor triunfante sobre a morte e o mal. Não é preciso que sacrifiquemos a
nós mesmos ou ao nosso Isaque para obter o seu favor. Ele já tomou a ambos de
nossas mãos. Agora estamos livres para aguardar com prazer o mesmo poder que
intervém em tudo o que lhe confiamos.
E o que podemos fazer em resposta? Dar-lhe completo domínio de nossa
vida, nosso Isaque e nosso futuro. E, como expressão da sinceridade da nossa fé,
arriscar-nos ao impossível sob a orientação dele. Agite a bandeira "O Senhor
provera!" nas trincheiras de seu coração. E ele provera — esteja certo disso.

14
CAPITULO DOIS
0 LUTADOR OBSTINADO
Jacó
Todos nós carecemos dela com desespero. É aquela grande necessidade de
todos nós. Nascemos por causa dela e não há alegria que dure sem ela. Ela é para
a alma o que o oxigênio é para os pulmões e a proteína para o corpo. Ela é a
única fonte de segurança espiritual e saúde psicológica, a base da confiança e da
auto-estima. Com ela nos tomamos livres e atraentes; sem ela somos tímidos e
obstinados. Ela é o que as pessoas mais esperam de nós, porém não a podemos
dar enquanto não a recebemos. Quando não a recebemos de nossos pais, por lhes
ter sido negada, despendemos o resto de nossas vidas a exigi-la ou tentando
merecê-la. Contudo, nenhum ser humano pode satisfazer ao nosso ardente desejo
por ela. Ela é o bem mais precioso da vida.
Que é esse bem tão ansiado, esse poder dinâmico? A bênção. Cada um de
nós necessita ser abençoado, sentir-se abençoado e por sua vez se tornar um
comunicador de bênçãos.
Uma das palavras mais mal interpretadas e mal empregadas é bênção.
Significa mais que prosperidade ou bens, sucesso ou realização. Dos remotos
tempos bíblicos até agora, a bênção de Deus é a plena certeza de que a ele
pertencemos, de que ele se deleita em nós e de que ele nos escolheu como o alvo
de seu ilimitado amor. Ser uma pessoa abençoada é conhecer, sentir e
comprazer--se na firme promessa de Deus, na sua aceitação e aprovação. É a
experiência de ser escolhida e estimada, valorizada e apreciada. Uma pessoa
abençoada pode dizer, nas palavras de Karl Barth: "Deus é por mim!" com quatro
auspiciosas ênfases: Deus é por mim! Deus é por mim! Deus é por mim! Deus é
por mim!
Este capítulo é para aqueles que precisam sentir essa bênção, que não
conseguem permitir que Deus os abençoe e que são, muitas vezes, mesquinhos
para com os outros com a bênção que receberam. É para pessoas como eu e você.
O mistério da vida está em resistirmos ao que necessitamos e em desejarmos
muitas outras coisas. Assim é que muitos se sentem não abençoados nesta di-
mensão mais profunda. Alguma coisa em nós impede a entrada das riquezas das
bênçãos divinas. Muitos dos que possuem dons e talentos, oportunidades e
sucesso material ainda se sentem não abençoados.
O que significa isso? A síndrome misteriosa da vida consiste em
recusarmos a bênção se não nos sentimos abençoados. Se os pais e outras
pessoas mais achegadas em nossos anos de crescimento retiveram de nós a
bênção, recusaram dar-nos afirmação, aprovação e a plena certeza de sermos
especiais,
que muitos,acharemos
embora difícil permitir
possuindo uma quecompreensão
Deus nos abençoe. Esta da
intelectual é a fé
razão por
e uma
confiança sólida em Deus, não sentem o amor divino ou não se apegam a um
relacionamento pessoal e familiar com Deus. Se a bênção da afirmação foi
recusada em termos humanos, será difícil a sua aceitação em termos divinos.
Minha tese é que as pessoas que se sentem não abençoadas se tornam
obstinadas. Quanto mais elas se sentem não abençoadas, mais desenvolvem, sem
perceber, uma obstinação para manter o autocontrole e guardar-se de ser
magoadas. Ocorre exatamente o oposto com as pessoas abençoadas. As pessoas
que se sentem afirmadas e amadas são flexíveis, receptivas e dispostas. Mas as
15
não abençoadas se tornam lutadoras obstinadas. Elas se esforçam por obter a
bênção de outros, expressa em aprovação e estima, mas amiúde questionam a
bênção dos outros e, acima de tudo, resistem à bênção de Deus. Lutar e resistir
se torna uma tática de sobrevivência.
A vontade é uma função muito importante de nossa natureza. É um dom
de Deus que visa à complementação de sentimentos e convicções. A vontade
aciona as decisões, quanto ao que desejamos e ao que pensamos ser melhor. Com
ela conduzimos as nossas vidas. A obstinação é uma distorção do dom da
vontade. Ela busca o domínio do comportamento, e, para esse fim, faz com que
manipulemos os outros e nos tornemos intratáveis. As pessoas obstinadas devem
estar no controle. Eles se tornam competitivas e combativas. Em cada situação a
pergunta é: "Quem é o responsável aqui?", o que leva a concluir que desejam ser
responsáveis e fazer tudo o que for necessário para assegurar que o sejam.
Com o tempo, os lutadores obstinados se arrojam em luta com Deus. Ele
então travará combate conosco até que possamos declarar: "Seja feita a tua
vontade". Ele nos deixará imobilizados até que finalmente reclamemos a bênção,
que ele está mais disposto a dar do que nós a pedir. Ele não ultrapassará o limite
de nossa obstinação, mas disporá as circunstâncias da vida, levando-nos ao
ponto de reconhecermos que a necessidade de afirmar nosso valor e importância,
comparada com a fome de srcem divina, não passa de um pequeno desejo que só
ele pode satisfazer. Foi exatamente isso o que ele fez por Jacó.
Jacó, filho de Isaque, de vontade forte, impaciente, inseguro e não
abençoado, faz que nos vejamos com espanto no espelho. O lutador obstinado em
mim estende a mão ao lutador obstinado em você e juntos vamos nos identificar
com o nosso patriarca-modelo. A Bíblia é muito honesta acerca da luta de Jacó
para ser abençoado. Ótimo! Um estudo em profundidade dele nos auxilia a
identificar nossas lutas e a perceber o que Deus pode fazer com elas. A vida do
Jacó forma um perfil clássico de alguém cuja infância não abençoada deu srcem
a uma obstinação que dificulta a bênção divina. Sua vida seguia na direção de
um choque da sua vontade com a de Deus. Como me agrada mencionar o maior
combate corpo-a-corpo da história ocorrido certa madrugada no Jaboque (vau do
Jordão), quando Jacó passava por uma enorme crise e o Senhor batalhou
fisicamente com ele. Podemos apreciar as implicações dessa luta para nós hoje,
analisando as suas causas e o seu resultado. Na história de Jacó vemos o
sentimento da falta da bênção, o que acontece quando permitimos que Deus nos
abençoe, e a bênção que podemos ser para os outros logo que nos sentimos
abençoados.
Jacó e seu irmão gêmeo Esaú eram filhos de Isaque e Rebeca. O primeiro a
nascer foi Esaú, mas com apenas segundos de diferença, pois Jacó saiu do útero
agarrado ao calcanhar do irmão. Foi aí que seu nome teve srcem. "Jacó" quer
dizer: "Alguém que toma pelo calcanhar", "agarrador de calcanhar" ou
"suplantador". Desdedo
caçador, um homem o campo.
início Esaú foi o Isaque,
Tal como favorito ele
de gostava
seu pai.daEle veio ada
emoção sercaça,
um
da liberdade da aventura e do sabor da carne de animais selvagens. Jacó era o
favorito de Rebeca. Dizem as Escrituras que ele era um jovem pacato, que morava
em tendas. Já me perguntei muitas vezes se Esaú se sentia livre em seu espírito
para vaguear buscando agradar ao seu pai, pelo fato deste manifestar--lhe
afirmação enquanto Jacó, nas imediações do lar, ansiava recebê-la. A rivalidade
entre os dois filhos srcinava-se do conflito de vontades dos pais. Isaque e
Rebeca, por não se amarem o suficiente, não amaram de igual modo os dois
rapazes. O ambiente psicológico da família era de competição pela supremacia.
16
No lar em que o marido e a esposa contendem entre si, a família inteira perde. O
favoritismo de um pai por um filho, em geral vem de um casamento muito
instável.
O ponto em questão na família de Isaque era qual dos dois filhos teria o
direito maior — o direito de primogenitura. Nos tempos bíblicos dava-se ao
primeiro que nascesse o direito de receber a propriedade e o governo da casa, por
ocasião da morte do pai. Mas, de semelhante importância espiritual era a bênção
do pai sobre todos os filhos. Essa dádiva preciosa de aprovação, afirmação e amor
dava a cada filho um senso de identidade e importância para toda a vida. O
intenso anseio de Rebeca não era simplesmente que Jacó fosse abençoado, mas
que ele obtivesse o direito à primogenitura. Ela inculcou sua compulsão em Jacó
de tal modo que ele se aliou a ela para obter esse direito quando o que ele
realmente desejava era a bênção de Isaque. Esaú pouco se importava com a
primogenitura, porque ele achava que já tinha a bênção de Isaque.
Um incidente demonstra a constante rivalidade dos irmãos. Certo dia, Esaú
chegou faminto dos campos após um dia árduo de trabalho. Jacó cozinhava um
ensopado e Esaú, com impetuosidade juvenil, exigiu uma porção dele, dizendo
que morreria se não comesse imediatamente!
Jacó desejava tanto o direito de primogenitura que ele poderia morrer!
"Vende-me primeiro o teu direito de primogenitura", disse a Esaú. A atitude de
indiferença de Esaú para com a primogenitura se depreende da sua resposta:
"Estou a ponto de morrer; de que me aproveitará o direito de primogenitura?"
Assim Esaú vendeu o direito e recebeu o cozinhado de lentilhas. A barganha
revela a natureza obstinada de Jacó e seus esforços para obter auto-estima e
segurança.
A trama se intensificou algum tempo mais tarde, quando Isaque percebeu
que estava às portas da morte. Chamou Esaú à sua tenda I pediu que ele saísse a
caçar e trouxesse carne para um prato saboroso. "E traze-ma para que eu coma,
e te abençoe antes que eu morra', (Gênesis 27:4). O primogênito saiu ao campo,
mas Rebeca estivera ouvindo através das finas paredes da tenda. O momento que
ela tanto esperava havia chegado! Rápida como um raio ela corre para Jacó,
ordena-lhe que mate uma ovelha, prepare o prato saboroso que seu pai desejava
e receba a bênção e o direito de primogenitura prometidos a Esaú. Jacó alega que
sua pele é lisa e que Esaú é cabeludo. Seu pai ao tocá-lo, reconheceria logo que
não se tratava de Esaú. Rebeca havia preparado um plano para essa
circunstância. Manda que Jacó vista as roupas de Esaú e cubra o pescoço e as
mãos com pele de cabra, de modo que Isaque seja enganado.
O plano dos dois teve êxito. Isaque comeu uma suntuosa refeição e, depois
que suas suspeitas foram desfeitas por meio dos disfarces de Jacó, o abençoou e
deu-lhe o direito de primogenitura. O teor da preciosa bênção nos auxilia a
compreender por que era um galardão e tanto:
DeusSirvam-te
de mosto. te dê do orvalho
povos, edonações
céu, e te
dareverenciem:
exuberância sê
da senhor
terra, ede
fartura de trigo ee
teus irmãos,
os frutos de tua mãe se encurvem a ti: maldito seja o que te amaldiçoar, e aben-
çoado o que te abençoar" (Gênesis 27:28-29).
Que grande bênção! Examinando-a percebemos que ela contém a afirmação
que cada filho busca. Por que os dois filhos não podiam receber a mesma bênção?
Não era esse o costume da época. Contudo, o resquício de favoritismo tem
causado e ainda causa rivalidades entre os filhos. A síndrome: "ele ama a você
mais do que a mim" ainda está em circulação.
Quando Esaú retornou a casa, soube do que sua mãe e o irmão haviam
17
feito, e rogou a Isaque uma bênção. "Acaso tens uma única bênção, meu pai?
Abençoa-me, também a mim, meu pai", clamou ele com a dor da rejeição.
Achamos difícil compreender a severidade de Isaque para com o destino de Esaú.
Seria a cólera por ter sido enganado pela esposa que o tornou tão intratável?
Contudo, o que ele predisse para Esaú se cumpriu.
"Longe dos lugares férteis da terra será a tua habitação, e sem orvalho que
cai do alto. Viverás da tua espada, e servirás a teu irmão; quando, porém, te
libertares, sacudirás o seu jugo da tua cerviz" (Gênesis 27:39-40).
Assim, um ressentimento profundo tomou conta de Esaú, provocando um
clima de rivalidade, ódio e inveja entre os dois irmãos. Esaú planejou matar o
irmão tão logo Isaque viesse a falecer.
Coube a Deus tirar Jacó dessa complicada trama de vontades em conflito e
levá-lo a um lugar onde pudesse permitir que Deus o abençoasse. E fascinante
ver como Deus usou o temor de Rebeca de que Jacó se casasse com uma das
mulheres locais, bem como a angústia dela sobre o que Esaú poderia fazer ao
irmão. A idéia de Rebeca (era dela mesmo?) consistia em enviar Jacó a Labão, seu
irmão. Segundo nos parece, ela apresentou o plano a Isaque, pois este despediu
Jacó com a sua "bênção" para Padã-Arã, onde morava Labão. Em muitas decisões
como esta no Antigo Testamento, o que parece uma escolha humana lógica é, na
verdade, o mais íntimo propósito do Senhor.
Jacó partiu para a terra de Labão sentindo-se não abençoado como sempre.
Ele estava derrotado e amargurado. Embora Isaque o houvesse abençoado, estava
cônscio de que era uma bênção obtida através de fraude, que não podia satisfazer
ao seu anseio de afirmação. E como qualquer amor forçado, que deixa tanto o que
dá como o que recebe vazios. Jacó foi lançado ao mundo sem o sentimento de que
seu pai tinha prazer nele, e com a sensação de ter sido um joguete nas mãos de
sua mãe obstinada. Deixou o lar ávido pelos importantes nutrientes de caráter
que constituem a estima e a autoconfiança. Tudo o que possuía era a lembrança
do que tinha feito a Esaú e de como seus pais falharam em dar-lhe segurança
íntima. O resultado foi um homem de conduta ardilosa e manipuladora,
empedernido em sua determinação de viver por sua própria astúcia e resolução.
Tomou-se naquele tipo de pessoa que diz: "Se há algo a ser feito é minha
obrigação fazê-lo por minha própria conta" — uma pessoa que confia em si
mesma e está pronta a aceitar qualquer incumbência. Com toda a certeza, Isaque
e Rebeca instruíram-no a respeito do Deus de seu avô e de todas as promessas
que deveriam ser suas como descendente de Abraão, mas o condicionamento
psicológico da família era de uma contradição tão descarada que foi difícil a Jacó
acreditar nessas promessas. Ele possuía fé intelectual em Deus, mas uma
indiferença envolvia o seu coração sensível e não abençoado. A ferida na mente
de Jacó cicatrizava-se agora mediante os efeitos de sua obstinação.
A síndrome de Jacó. Em todas as gerações as pessoas vêm sofrendo desse
mal
modoem níveis variados.
cuidadoso, mas se Émanifesta
notório em
de alguns; em outros
formas sutis; acha-se
em outros encoberto
ainda, de
esse mal
aparece numa conduta arrogante. Não me surpreendo mais quando, num
inesperado momento de franqueza pessoal, alguém aparentando segurança
confessa que quando pequeno seus pais lhe negaram afirmação ou que se sentiu
rejeitado por outros, resultando disso uma vida inteira de esforço pela aprovação.
Os pais, a família e os heróis dos impressionáveis anos de nosso crescimento têm
tanto o poder de dar como o de estorvar a bênção da afirmação. Quando ela é
estorvada ou irrefletidamente mal expressa por um doador em potencial, porém
inseguro e não abençoado, passamos à idade adulta com uma dualidade: Uma
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superfície polida mantida por uma vontade forte, e uma ansiedade interior por
aprovação e afirmação. Atravessamos a vida à procura de um pai, mãe, irmã ou
irmão mais velho substituto, ou de uma autoridade que nos diga, afinal, que
estamos OK.
Durante minhas viagens ao Oriente Médio em preparação para este livro,
encontrei um ilustre professor de Chicago. Passava o seu verão em busca de um
propósito e significado na vida. Nossos caminhos se cruzaram várias vezes em
locais arqueológicos no Egito e em Israel. Certa tarde iniciamos uma conversa,
que chegou a ser longa e profunda. Ele era de formação católica romana. Detalhe
insignificante. Bem que poderia ser presbiteriano, fundamentalista ou
pentecostal. De todos eles tenho ouvido a mesma lamúria — e muito mais. E
surpreendente como viajantes conversam acerca de sentimentos pessoais com
outros viajantes, na suposição e esperança de que jamais venham a se encontrar
de novo.
O homem não era capaz de lembrar se os pais alguma vez lhe disseram que
o amava. Na época em que ele mais precisava do pai, este faleceu; e a mãe até
hoje se esconde atrás da evasiva: "Não sou a pessoa certa para falar dos meus
sentimentos." O jovem erudito possui uma ficha distinta, tanto em formação
como em profissão. Mas dote algum pode preencher o vazio interior.
Suponho que sentisse a necessidade de contar a alguém sobre sua última
visita à mãe inválida, antes de começar a sua peregrinação. Ele lhe havia
suplicado por uma confissão de que o amava.

Afinal, ela atalhou: "Por que você se sente obrigado a insistir nesse ponto?
Sempre o amei. Meus atos deveriam ter-lhe assegurado isso!" Em seguida ela
passou um sabão nesse homem já realizado como se ele ainda fosse um colegial,
mostrando-lhe como devia viver a sua vida e como estava deixando de lado a sua
mãe. A atitude dela apagava a pequena afirmação que havia dado ao filho. O
homem estava sofrendo. Ele precisava ser abençoado.
O nosso ministério de televisão atrai centenas de cartas de telespectadores
todas as semanas. Muitas são expressões explícitas ou implícitas da insegurança
em relação a Deus, a outras pessoas e a si mesmos. Certa mulher inteligente,
atraente e muito talentosa não era muito diferente do homem que acabei de
descrever. Todos pensavam isso a seu respeito, exceto uma pessoa — ela mesma.
Seu pai não lhe havia dado a afirmação sadia que toda menina precisa para
começar a sentir a alegria de ser mulher. Sua mãe era um complexo nervoso de
repressões e temores. A escola dominical havia sido um reembasamento da
disciplina materna, e a igreja uma religião institucional de "não faça isso, não
faça aquilo". Após ter--se formado na faculdade, a mulher casou-se com um
homem distinto e amável, que nutria sentimentos profundos de amor, nos quais
ela achava difícil confiar. Agora, após uma sucessão de bebês e distrações

a si própria. pela primeira vez essa mulher tem uma oportunidade de conhecer-se
domésticas,
Certo dia, ao achar-se sozinha em casa, ligou a televisão e levou o nosso
programa para dentro do sossego de seu lar. A mensagem daquele programa
aludia ao amor ilimitado de Deus por nós em Jesus Cristo. O convite para
responder por carta deu-lhe a oportunidade de expressar sentimentos sepultados
há anos. A sétima página da carta não provinha de uma queixosa compulsiva,
ranzinza ou neurótica. Antes, uma pessoa amável escrevia para perguntar o que
fazer quando não se sente amável, quando todos os sentimentos interiores acerca
de si mesma resistem à possibilidade de permitir que Deus ou alguém mais a
19
ame. Que resposta você daria? O que você teria para oferecer-lhe de sua própria
experiência de vida, como o segredo da auto-estima? Como seria ela capaz de
experimentar realmente a satisfação de ser uma pessoa abençoada?
Apresentei estas histórias verídicas não porque sejam invulgares, mas por
simbolizarem o sentimento de tantas outras pessoas. Elas estão em toda a parte.
Talvez uma delas retrate o seu sofrimento com a síndrome de Jacó.

O Senhor tinha grandes planos para Jacó. Por isso, tão logo o levou para
longe da aceitação limitada de Isaque e do domínio de Rebeca, ele começou a
moldar o homem a fim de tomá-lo no que deveria ser. O Senhor sabia que o que
Jacó mais ansiava era a sua bênção.
A caminho de Padã-Arã Jacó certa noite sonhou com uma escada firmada
na terra, e que se estendia até o céu, na qual os anjos de Deus subiam e desciam.
A mensagem era clara: a glória de Deus descia até Jacó e este era elevado à
presença do Senhor, introduzido ao esplendor da glória de Deus. O de que o
jovem obstinado precisava era da plenitude de Deus para encher o seu vazio. No
sonho, o Senhor assegurava-lhe um direito de primogenitura mais importante —
de recebedor das promessas dadas a Abraão e a Isaque.
"Eu sou o Senhor, Deus de Abraão, teu pai, e Deus de Isaque. A terra em
que agora estás deitado, eu ta darei, a ti, e à tua descendência. A tua
descendência será como o pó da terra; estender-te-ás para o Ocidente e para o
Oriente, para o Norte, e para o Sul. Em ti e na tua descendência serão
abençoadas todas as famílias da terra. Eis que eu estou contigo, e te guardarei
por onde quer que fores, e te farei voltar a esta terra, porque te não desampararei,
até cumprir eu aquilo de que te hei referido" (Gênesis 28:13-15).
A reação de Jacó ao despertar-se revela por que o Senhor teve de arrancá-lo
das garras de Rebeca e da situação abençoada-não-abençoada que ele tinha na
casa de Isaque. O temor se apossou dele. "Na verdade o Senhor está neste lugar;
e eu não o sabia. . . Quão temível é este lugar! É a casa de Deus, a porta dos
céus" (Gênesis 28:16-17). Jacó não esperava encontrar-se com o Senhor sob as
estrelas em Luz. Aparentemente, em casa ele nutria pouca ou nenhuma fé. Não
sabia que precisava dela até ter de encarar a vida sozinho. O Senhor, para quem
todas as coisas são possíveis, sempre tem de conduzir as pessoas sagazes, de
vontade forte, a um lugar de solidão frente ao impossível, de modo que possa re-
velar-lhes o seu poder.
O sonho de Jacó emocionou-o profundamente. Ele erigiu um altar e o
chamou de Betel, que quer dizer "Casa de Deus". Quando se pôs a refletir sobre a
espantosa promessa de Deus, ele fez um voto de dar um décimo de tudo quanto o
Senhor lhe desse. Com toda a certeza, ele havia recebido de Abraão a idéia do
dízimo, por intermédio de seu pai Isaque. Jacó começava a sentir os primeiros
sintomas da sensação de ser abençoado.
Percebem-se
embusteiro esses sinais
dos maiores! Rebecaemhavia
seu recebido
encontro esse
com traço
Labão.familiar
Seu tiodeeramodo
um
natural. Se a achamos manipuladora, Labão era pior. Mas Jacó trabalhou árdua
e honestamente para ele. Apaixonou-se por Raquel, filha de Labão. Verdadeiro à
sua maneira, Labão não ofereceu salário, mas pediu que Jacó fizesse uma
proposta. Jacó ofereceu-se para trabalhar sete anos pela mão de Raquel. Labão
aceitou, mas não gostou da idéia de a filha mais jovem, Raquel, se casar antes de
Lia, a irmã mais velha. Jacó deu um duro pela mão de Raquel. "Serviu Jacó sete
anos; e estes lhe pareceram como poucos dias, pelo muito que a amava" (Gênesis
29:20). Uma nova qualidade de homem vinha à superfície. É freqüente Deus
20
introduzir na nossa vida um exemplo assustador do tipo de pessoa que somos
propensos a ser, de modo que possamos mudar o nosso curso. Labão e Jacó
eram sangue do mesmo sangue, mas os desígnios de Deus eram muito diferentes
para o caráter de Jacó.
Completados os sete anos, Jacó exigiu sua amada Raquel. Labão ofereceu
um festa de casamento e, tarde da noite, enviou Lia para a tenda de Jacó, em
lugar de Raquel. A festa deve ter tido bebedeira mais que suficiente, pois Jacó
não percebeu a troca até de manhã, com o casamento já consumado. Estranha
ironia — reminiscências da fraude que realizara no intento de obter o direito de
primogenitura.
Jacó ficou furioso. Labão, o embusteiro, manobrara melhor que Jacó, o
manipulador. Labão convenceu-o a trabalhar outra semana, antes que ele
pudesse se casar com Raquel, isto é, trabalhar mais outros sete anos para
mantê-la, e seis anos mais! Esses treze anos foram prósperos e produtivos, mas
não sem conflitos entre as mulheres da sua vida. Raquel e Lia estavam sempre
lutando pelas afeições de Jacó. Para Raquel, isso era um tanto difícil, pois foi
estéril durante os primeiros anos de casamento, enquanto Lia deu a Jacó seis
filhos e uma filha. Esse fato impeliu Raquel a ter dois filhos por intermédio da
criada que deu a Jacó. Sem querer ser sobrepujada, Lia, numa época em que
parou de conceber por algum tempo, deu a Jacó sua criada para mais dois filhos.
Com estes, eram dez. Por fim, Raquel teve José que se tomou o filho favorito do
pai. Jacó deu a José toda a atenção que seu pai Isaque lhe negara e que quase o
arruinou quando rapaz, conforme veremos no capítulo seguinte. Com o tempo,
Raquel morreu ao dar à luz o seu segundo filho, Benjamim.
Completados os longos vinte anos, Jacó sentia-se intranqüilo. Havia um
assunto não terminado em seu coração. Não fora capaz de esquecer o que havia
feito a Esaú, e ansiava por retornar ao lar. Não foi fácil fugir de Labão, que a essa
altura havia constatado que a grande prosperidade de Jacó devia-se à bênção do
Senhor. Labão não desistiria de tudo sem luta. Outra vez tentou enganar a Jacó.
O acordo deles consistia em que Jacó viesse a possuir todas as ovelhas malhadas
e salpicadas e negras entre os cordeiros, e os malhados e salpicados entre as
cabras. Labão maquinou outra trapaça. Tomou todos os cordeiros e as cabras
que pertenciam a Jacó e ocultou-os em algum lugar a três dias de jornada dali.
Assim Jacó teve de partir do nada novamente, mas desta vez com algo mais que a
sua astúcia contra a de Labão. O Senhor era com ele, e Jacó sabia disso. Quando
ele acasalou os cordeiros, nasceram malhados e salpicados. A estes acasalou o
rebanho forte e os separou de Labão. Quando ele contou a Raquel o que
acontecera, deu a Deus a glória. O Jacó obstinado aprendia que com Deus todas
as coisas são possíveis. Ele estava pronto a obedecer à voz do Senhor, quando
este lhe ordenou que retomasse à terra de seus pais e deu--lhe a segurança de
que estaria com ele.
E assim,
prosperidade Jacó,
e força suas esposas,
deixaram filhos,
secretamente gado,
a terra rebanhos,
de Labão. comLabão
Quando grande
os
alcançou, a trégua para negociação entre os dois homens só foi possível por
causa de outra intervenção do Senhor. Labão recebeu um aviso de Deus para que
fosse justo ao negociar com Jacó, e o deixasse ir. Não foi a astúcia ou a vontade
quem ganhou a vitória. Na verdade, o Senhor era com Jacó. Deus o estava
preparando para um encontro muito decisivo, não apenas com Esaú, mas com
ele próprio. Como haveremos de constatar com muitas pessoas importantes, um
rompimento com a vontade própria tornou-se o ponto de partida para a formação
da pessoa que Deus tinha em mente. Seria improvável que Jacó estivesse
21
preparado para o que Deus lhe reservara em sua viagem de volta ao lar, se ele
não tivesse suportado as provações e sido forçado a perceber que o Senhor — não
sua garra, tutano ou astucia — tornou possível os triunfos.
Livre de Labão, Jacó podia agora dedicar-se à próxima tarefa, que tanto
temia. Ao pensar no encontro com Esaú, o pânico se apoderou dele e trouxe-lhe à
memória recordações do que havia feito a seu irmão, bem como todas as
sensações que sentira, quando criança, de não ser abençoado. Outra vez o velho
manipulador vem à tona. Por alguns momentos ele cedeu à antiga natureza em
vez de exercer sua nova fé no Deus que se revelara tão capaz de lidar com o
impossível. Jacó enviou mensageiros adiante para garantir a Esaú que dispunha
de enormes rebanhos para partilhar.
Em qualquer de nós, a transformação espiritual se dá com lentidão. Havia
dentro de um Jacó obstinado duas naturezas em conflito, uma nova e outra
velha. Ao ir até onde foi com o plano de preparar um presente espetacular para
Esaú, demonstra que Jacó ainda preferia depender mais de meios manipuladores
que de Deus. Instruiu Jacó a seus enviados de paz: "Falareis desta maneira a
Esaú, quando vos encontrardes com ele. . . 'Eis que o teu servo Jacó vem vindo
atrás de nós'". Em seguida ele expõe sua cuidadosa estratégia: "Eu o aplacarei
com o presente que me antecede, depois o verei; porventura me aceitará a
presença" (Gênesis 32:19-20). Aí está de novo. Aceitação. Jacó tinha necessitado
da aceitação de Esaú toda a sua vida. O que ele não percebia era que apenas
Deus era capaz de dar-lhe esse presente precioso. Quando aceitamos a dádiva da
aceitação de Deus, ficamos isentos de reclamá-la ou de manipular pessoas para
assegurar o seu fluxo. E é exatamente isso o que aconteceu a Jacó na noite do
seu encontro com Esaú.
O que é lutar com Deus? É uma luta com o passado e uma batalha que há
de decidir quem vai assumir o governo no futuro. O Senhor deseja tornar-nos
dispostos a ser, e dispostos a buscar e fazer a sua vontade mediante a força dele
para os resultados que ele espera. Uma combinação de medo, culpa e uma vida
de astúcia manipuladora opunha-se à presença e ao poder de Deus na vida de
Jacó. Você sabe como é isso? Você já reviveu o passado, com cada fracasso a
desfilar diante dos olhos da sua mente? Você já levantou no meio da noite em
estado de pânico e se ajoelhou perante o Senhor, perturbado pela preocupação?
Então saiba, como eu já sei, o que é ter o Senhor a batalhar pelo domínio de sua
vontade até que você permita que ele perdoe o passado e assuma o governo do
futuro.
E vivido o relato de Gênesis 32:24-32 desta batalha pelo coração de Jacó. A
Escritura informa que um homem entrou em luta corporal com Jacó durante
toda a noite. Alguns comentaristas propõem que o conflito interior de Jacó era tão
grande que ele se manifestou em um sonho, no qual lutava com um "homem".
Mas o próprio testemunho de Jacó e o nome que ele deu ao vau de Jaboque nos
apresenta a verdade
Deus", e disse: real. face
"Vi a Deus Chamou elee oa lugar
a face, minhadevida
Peniel, que significa
foi salva". "a facesua
Na realidade, de
nova vida só estava no princípio. Quando a noite decisiva do encontro chegou ao
final, Jacó tinha a coxa aleijada. G. Campbell Morgan foi muito espirituoso ao
intitular assim essa experiência: "Aleijado para ser rei", uma descrição apro-
priada. Jacó não permitiu que o Senhor se fosse, até que este o abençoasse. Esta
era a sua maior necessidade desde a infância. A reação do Senhor foi dar-lhe um
novo nome. Não mais Jacó, o suplantador, mas agora Israel, que quer dizer "Deus
luta". Esta é a saída para o novo homem emergir do velho Jacó. Deus teria de
lutar e sempre lutaria com, por e a favor dele e de seus descendentes.
22
E de surpreender que Jacó, agora Israel, pergunte pelo nome daquele com
quem ele lutara. "Dize, rogo-te, como te chamas?" A resposta do Senhor foi uma
pergunta que pôs fim a todas as indagações de Israel. "Por que perguntas pelo
meu nome?" Por quê, deveras! Depois de todas as vezes que Deus se interpôs a
seu favor e falou com ele, já devia saber. Mas a obstinação não tem apenas um
pavio curto, mas também uma memória curta. E Jacó desejava se certificar. Ele
sabia que esse era o encontro decisivo de sua vida e não queria que ele passasse
deixando-o não abençoado de novo. Deus era a única pessoa que Jacó não podia
manipular. Ele deu a bênção pela qual Jacó ansiava, porque é sua natureza
abençoar. Jacó nada fez para merecê-la ou ganhá-la. Na realidade, por toda a sua
vida até aquela noite auspiciosa ele já havia feito tudo o que podia para negá-la.
Agora ele tinha uma coxeadura que o faria lembrar que Deus não apenas tocara a
sua coxa, mas também o mais íntimo de seu coração.
A manhã trouxe consigo o princípio de uma nova vida. Deparamo-nos com
um Jacó totalmente novo, agora chamado Israel. Após aquela noite, seu novo
nome o lembrava que Deus havia lutado com ele e agora lutaria por ele. O
manipulador obstinado se tomara disposto a ser moldado pelo Pai eterno.
Daquele dia em diante percebemos compaixão, bondade, sinceridade e receptivi-
dade em Israel. Ele já não tinha que se empenhar para ser amado. Ele havia
recebido a bênção.
Quando a luta chegou ao fim e o sol da manhã ergueu o véu da noite, Israel
levantou os olhos e viu que Esaú se aproximava. A Escritura não menciona
nenhum espasmo de pânico em Israel dessa vez. A luta com o Senhor havia
efetuado uma transformação. Israel permitira que Deus o abençoasse e, por
conseguinte, sentia-se livre para receber a bênção de Esaú. E uma cena de
ternura. Esaú, com graça notável, correu ao encontro de Israel e atirou-se ao seu
pescoço, beijando o irmão, e as lágrimas escorriam de ambos. Em seguida, Israel
disse algo que revela a expressão de um coração abençoado: "Vi o teu rosto como
se tivesse contemplado o semblante de Deus; e te agradaste de mim" (Gênesis
33:10).
O que tudo isso significa para mim e para você? Três coisas importantes.
Primeiro, todos os nossos esforços para ganhar e obter a bênção de outros jamais
hão de preencher o nosso vazio interior em forma de Deus. Somente a afirmação
de Deus pode construir uma segurança duradoura. Omesmo Deus que lutou com
Jacó e o transformou em Israel é o Deus que abençou o mundo em Jesus Cristo.
Este viveu, ensinou, morreu, ressurgiu e, no Pentecoste, retornou na pessoa do
Espírito Santo, com poder de habitar em nós de modo que pudéssemos nos tomar
parte do novo Israel, o próprio povo do Senhor, perdoado, amado e abençoado.
A segunda coisa que Jacó tem para nos ensinar é que, se persistirmos,
Deus nos dará um novo nome que significará a nova pessoa que ele pretende que
sejamos. Que característica traduz o oposto do que você era antes de permitir que
o Senhor
frente, o abençoasse?
imagine a pessoa Se a longa
que noite de
você deseja embate
ser, com Deus
se já está ainda está
de antemão à sua
seguro da
afirmação e aceitação de Deus. Em seguida, permita que o Senhor lhe dê um
novo nome. No que me diz respeito, uma pessoa cuja insegurança de meninice
desenvolveu uma resolução obstinada de vencer pelo esforço humano e
manipulação, meu nome seria "Lloyd, o indefeso, afirmado". Não preciso mais
estar na defensiva. E você?

Finalmente, uma pessoa afirmada se toma uma pessoa afirma-dora.


Rompemos o ciclo humano de amor reservado e nos tornamos amantes generosos
23
dos não abençoados do mundo. E, desde que a experiência psicológica da maior
parte das pessoas as tem deixado com uma necessidade desatinada de afirmação,
podemos nos importar com elas e falar-lhes da única bênção que satisfaz
permanece e dura. O inventário a seguir determina até que ponto você permitiu
que Deus o abençoasse.
1. Existe em você a sensação permanente e profunda de ter a estima de
Deus como uma pessoa especial a serviço dele?
2. Você já aceitou o seu perdão e amor libertador em Cristo?
3. Você possui a segurança de que nada do que você possa fazer impedirá
a Deus de continuar a amá-lo?
4. Você já avaliou os prós e os contras de sua infância e aceitou o que seus
pais e pessoas mais achegadas fizeram ou não fizeram por você?
5. Você é capaz de abandonar o passado e permitir que Deus o abençoe
agora e no futuro?
6. Você está disposto a permitir que a bênção da afirmação de Deus o
torne um afirmador, alguém abençoado para ser uma bênção?
7. Você é capaz de subjugar a sua vontade e permitir que Deus o faça
disposto a estar disposto para fazer a vontade dele como um afirmador?
8. Você vai perguntar a Deus quem ele colocou em sua agenda para que
receba de você uma bênção?
9. Você está disposto a se entregar a essas pessoas — a empregar tempo,
energia e recursos para ajudá-las a certificarem-se de seu amor e da graça de
Deus?
10. Você vai aceitar o novo nome que Deus tem para você — ao se
concentrar em seu novo propósito e poder para transformar-se na pessoa que
deve ser? Se você disse sim a estas perguntas, você não é mais um lutador
obstinado contra Deus, mas um Israel por quem Deus lutará, a quem abençoará
e continuará a abençoar por toda a vida — agora e para sempre.

24
CAPÍTULO TRÊS
DEIXE DEUS SER DEUS
José
É desconcertante ver como a vida torna algumas pessoas tristes e outras
graciosas. Duas pessoas podem atravessar o mesmo vale de circunstâncias
desanimadoras. Uma sai com ressentimento e desânimo, a outra com renovado
vigor e alegria. Para alguns, a tragédia os edifica; mas para outros, os desmorona.
AlgunsOcrescem; outrosa murcham.
que acontece Por quê?
nossos sonhos pode nos tomar rudes ou afá-veis. Todos
nós possuímos planos, esperanças e perspectivas para a vida. Raras vezes eles
chegam a se concretizar do modo exato como antecipamos. Não obstante, alguns
superam os contratempos na realização de seus sonhos certos de que Deus está
elaborando um plano mais importante, enquanto outros imobilizam-se pela
derrota, mergulham em amarga auto-incriminação ou culpam as pessoas ao seu
redor pelas desigualdades da vida. O ponto em questão é: como você procede
quando as circunstâncias parecem se opor aos seus sonhos mais acalentados?
Ou, como uma mulher perguntou indignada: "O que você faz quando a vida lhe
dá um duro golpe?"
Veja o que acontece a alguns de nós. Deus nos chama para ser sonhadores.
Ele deseja dar-nos uma visão do que a vida pode ser. Em seguida, mediante a
nossa oração perseverante, ele nos oferece uma chamada especial que se ajuste
com perfeição aos talentos que nos concedeu e aos dons espirituais que nos
confiará. Forma--se em nossa mente um quadro de nosso destino. Sua chamada
ressoa em nossa alma. Firmamos um compromisso de seguir o Mestre até às
aventuras mais sublimes. E, então, as circunstâncias adversas se levantam qual
nevoeiro a nos separar do calor e do esplendor do sol. O que aconteceu? Deus
inverteu a sua orientação?
Era nosso sonho apenas auto-engrandecimento?
Uma das lições mais difíceis e de maior desafio na escola da obediência e
da fé, é que o Deus que concede o sonho também prepara o sonhador para
concretizá-lo. O que atravessamos quando nos movemos em direção aos alvos
que Deus nos dá, foi idealizado com perfeição para formar grandes pessoas,
capazes de lidar com um grande sonho. Esta é a importante verdade que José
tem para nos ensinar.
Faça um presente a si mesmo. Leia os capítulos trinta e sete até o
cinqüenta de Gênesis. Conheça um dos mais notáveis sonhadores do Antigo
Testamento. O homem afável com quem nos deparamos ao final do relato não
poderia ter apreciado ou se apropriado de seu sonho sem atravessar o vale das
vicissitudes. Enquanto acompanhamos a peregrinação de José, vemos cinco
poderosas diretrizes para sonhadores desapontados.
A primeira é: Deixe Deus ser Deus de seus sonhos. José, um jovem de
dezessete anos, era o filho favorito de Jacó. O patriarca criou o rapaz com um
sentimento de que ele era especial e querido, e lhe deu um senso de destino. A
sua fé foi bem alicerçada no que aprendeu dos encontros de seu pai com Deus.
Mas a infância de Jacó afetou a educação de José. Como acontece na maioria dos
casos, o que se nega ao pai este prodigaliza no filho. O esforço de Jacó para obter
a bênção de Isaque tornou-o solícito demais em abençoar José. O resultado foi a
rivalidade com seus irmãos. José possuía confiança própria, mas era uma
25
segurança próxima à arrogância. O favoritismo de Jacó chegou ao cúmulo de dar
a José uma longa túnica, com a qual ele andava nos arredores, orgulhoso feito
um pavão. Ela simbolizava a aristocracia e a isenção de trabalho árduo. A túnica
inflamava o ciúme dos irmãos de José.
Nem José nem seus irmãos estavam preparados para o sonho que ele teve
certa noite. Sua família e ele atavam feixes no campo. Em dado momento, um
feixe se pôs de pé e os outros se curvavam diante dele. O feixe era José! Como se
isto não bastasse, o sonho vinha acompanhado de outro com o mesmo impacto: o
Sol, a Lua e onze estrelas se curvavam ao sonhador. Para um rapaz de dezessete
anos, este é um sonho envaidecedor. A proteção do pai e a falta dos rigores da
disciplina e do trabalho árduo deixaram-no mal preparado para lidar com o
sonho. Faltou-lhe a humildade para refletir em silêncio no seu coração. Em vez
disso, ele contou o sonho a toda a família. Jacó censurou o filho, mas o sonho já
tinha causado dano ao ego conturbado de seus irmãos. A sorte fora lançada e
uma coisa terrível estava para acontecer.
Esse fato se deu no vale de Dota. Jacó enviara José para supervisionar os
irmãos no trabalho de pastorear os rebanhos. Quando estes notaram que José se
aproximava, a ira e o ciúme de longo tempo subiram-lhes à cabeça: "Vem lá o tal
sonhador!", diziam com desdém. "Vinde, pois, agora, matemo-lo, e lancemo--lo
numa destas cisternas; e diremos: Um animal selvagem o comeu; e vejamos em
que lhe darão os sonhos!" (Gênesis 37:1920).
Somente a intervenção de Rubem (quem colocou a idéia em sua mente?)
salvou a José. "Não derrameis sangue; lançai-o nesta cisterna que está no
deserto, e não ponhais mão sobre ele" (Gênesis 37:22). Assim eles lançaram mão
da linda túnica talar de mangas compridas e a rasgaram, e a José lançaram num
poço de boca estreita e fundo largo. Enquanto José gritava, suplicando por so-
corro, os irmãos comiam pão. Nada, senão o próprio homicídio poderia ter
expressado melhor o sentimento deles. Uma refeição para celebrar a morte de um
irmão!
Mas os desígnios de Deus eram outros. Uma caravana de ismaelitas que ia
de Gileade para o Egito se aproximava enquanto os irmãos saboreavam a
refeição. Ah! a singular estratégia de um Deus capaz de fazer descobertas felizes!
Agora, Judá alia-se a Rubem em sua advertência. "De que nos aproveita matar o
nosso irmão e esconder-lhe o sangue? Vinde, vendamo-lo aos ismaelitas; não
ponhamos sobre ele a nossa mão, pois é nosso irmão e nossa carne" (Gênesis
37:26-27). José foi vendido por vinte ciclos de prata e levado para o Egito. Seus
irmãos pegaram a túnica repugnante, molharam-na em sangue de bode e foram a
Jacó com a mentira de que seu amado filho estava morto.
Você poderia esperar uma série de circunstâncias mais adequadas para
contradizer um sonho? Penetre na mente de José levado embora, preso com
correias às costas de um camelo. Sinta o que ele sentiu ao agachar-se
cautelosamente em volta
Passe a viver através da fogueira
de noites doeacampamento
de solidão dos
dias exaustivos, daismaelitas
perspectivaà de
noite.
um
rapaz de dezessete anos, assustado, só e com saudades de casa. E, contudo, o
primeiro passo da preparação do sonhador para o cumprimento do seu sonho
havia começado. Grandes coisas Deus reservara para José.

A arrogância devia ceder ao caráter, a autoconfiança à dependência e


confiança em Deus apenas. Nada havia de acontecer com José que o Senhor não
usasse para torná-lo num útil instrumento.
Deixar Deus ser Deus de nossos sonhos é reconhecê-lo como a fonte da
26
visão para a nossa vida. A essência é o louvor e não o orgulho. Tudo o que temos
e somos são uma dádiva dele. Não podemos interpretar nossa chamada como
superioridade. Ela exige responsabilidade e obediência. Quando Deus dá uma
esperança e uma expectativa, estas devem ser-lhe devolvidas para que a seu
tempo, e segundo o seu plano se realizem. José interpretou mal o seu sonho. Ele
seria abençoado para que pudesse ser uma bênção. Após a comunicação do
sonho, convinha que se seguisse a transformação do sonhador. Essa
transformação jamais poderia acontecer em meio à complexa trama de
favoritismo do pai e rivalidade dos irmãos. Deus cerra e abre portas. Ele sabe o
que faz.
Algo aconteceu a José no caminho para o Egito. Não poderia ser o homem
de fé em que se tornou sem essa transformação. Toda a obstinação herdada de
Jacó estava-se acabando. É surpreendente como cada geração deve aprender por
si mesma. A única coisa que Jacó não havia sido capaz de partilhar ao filho era
que, na luta com o Senhor, o Senhor sempre vence.
Isso nos leva à segunda parte da história de José e à outra verdade que
podemos aprender com ele — Deixe Deus ser Deus quando as circunstâncias
parecem contestar o seu sonho. José foi vendido a Potifar, comandante da guarda
pessoal de Faraó. Embora jovem, José alcançou poder e prosperidade e ficou
encarregado de toda a casa do oficial egípcio e de tudo o que tinha. A história,
neste ponto, podia ter chegado ao fim; se a família de José soubesse, com toda a
certeza se curvaria à sua posição. Mais uma vez as circunstâncias pareciam
contra o sonhador. Ele foi preso sob falsa acusação. Contudo, o relato nos diz
muito do que acontecia à fé que José tinha. Por causa de sua lealdade a Potifar e
submissão a Deus, ele recusou as propostas sexuais da esposa de Potifar. "Como,
pois, cometeria eu tamanha maldade, e pecaria contra Deus?" (Gênesis 39:9).
Quão diferente do rapaz comodista que observamos alguns anos anteriores. O
Senhor era a segurança e o centro de sua vida. Uma fé infantil se transformara
em autenticidade e integridade varonis. Nenhuma circunstância seria capaz de
contradizer esse fato. Mas sua moralidade centrada em Deus custou-lhe caro.
Levou-o à prisão. O Salmo 105:18 nos informa que seus pés foram posto em
ferros. Mas Deus usou essa experiência para pôr ferro em sua alma. José
aprendeu que não achamos a Deus nas circunstâncias; nós é que o trazemos às
nossas circunstâncias. A graça de Deus é maior que a aflição da vida.
Uma heresia que engana e confunde a muitos diz que quanto mais
crescemos na graça de Deus mais fáceis as coisas se tornam. Por isso quando nos
deparamos com provações, nosso primeiro pensamento é: Deus está me punindo.
Ou então supomos que, se orássemos mais, as circunstâncias não frustrariam os
nossos sonhos. Esse pensamento não se coaduna com a vida dos grandes
homens e mulheres do Antigo Testamento, com a vida e mensagem de Jesus
Cristo, nem com os santos, mártires e fiéis seguidores do Mestre. Precisamos ser
mais
fáceis,duros
mas em
por nossa
vidas maneira de pensar.
capacitadas Nossa
por Deus, queoração não deve
se tornam ser por
grandes pelavidas
sua
graça. Algumas dificuldades são, sim, o resultado de rebelião e desobediência,
mas se confessarmos a nossa falta poderemos então prosseguir para as questões
elevadas que ampliem e abram os nossos corações o bastante para conter o
Espírito de Deus.
As épocas em que mais tenho amadurecido e sido moldado na pessoa que
Deus pretende que eu seja, têm sido de desafios e contratempos que exigem pura
dependência. Quando mais me senti só, encontrei um Amigo que jamais esquece
ou abandona. Eis um exemplo recente: Quando lancei um programa nacional de
27
televisão, as necessidades financeiras foram tão grandes que o futuro desse
ministério estava em jogo. Uma noite, foi tal a minha preocupação que não podia
dormir. O orgulho me impedia de levar as necessidades ao conhecimento dos
telespectadores. Não desejava pedir donativos nem dar a impressão de que tais
ofertas fossem um requisito da amizade que partilhávamos no programa. No
entanto, sem uma significativa arrecadação de fundos eu não poderia continuar.
"Que posso fazer, Senhor?" perguntei repetidas vezes durante a longa noite em
luta com o problema. "Você deve confiar em mim e contar aos telespectadores a
urgente necessidade", o Senhor parecia responder. "Porei a resposta nos corações
deles."
Até essa altura, o ministério pela televisão era algo que eu tentava realizar
para o Senhor. Agora, percebia que o ministério pertencia a ele e não a mim. Eu
tinha de abrir mão de seu futuro. Cumpria-se o inverso do velho ditado: "o
Senhor dá, o Senhor tira". Neste caso, o Senhor parecia tirar e dar de volta. Nas
semanas que se seguiram à renúncia do futuro do ministério, engoli o meu
orgulho e pedi a ajuda das pessoas. A resposta veio esmagadora. Não apenas
ficou assegurado o futuro do programa, mas os fundos permitiram uma grande
expansão. Tornou-se possível, como conseqüência, a estruturação do programa
para toda uma rede nacional.
Após essa crise, senti nova liberdade a respeito do programa. O pânico se
foi. Em seu lugar surgiu uma firme confiança, não em minha habilidade de
manter o programa no ar, mas na providência do Senhor. Seus planos estavam
acima do que eu ousava imaginar. Eu tinha de ceder.
Tive a mesma experiência no casamento. Alguns anos atrás, quando minha
esposa e eu discutíamos por questões insignificantes, constatei que o rompimento
em nossa comunhão resultava de minha própria insegurança, manifestada em
forma de controle. Novamente aqui tive de clamar: "Senhor, ajuda-me! Não posso
com isso sozinho. Transforma o meu casamento, mostrando-me o tipo de marido
que preciso ser para minha esposa." Esse foi o início de minha cura, que resultou
numa nova vida de felicidade e romance no meu casamento.
A mesma coisa tem acontecido com freqüência nos relacionamentos difíceis
decorrentes de minha posição de líder. Quando chegam as crises, e elas vêm para
todos, volto-me para o Senhor em busca de solução e conforto. Então com
paciência ele me revela o que fazer e abre o caminho para a solução
humanamente impossível.
Ao longo da jornada da vida, como é natural, já tive oásis de descanso e
gratidão, pausas para a renovação de forças e rejuvenescimento. Mas essas
épocas de espera, após a renúncia dos cru-ciantes problemas, têm sido de
crescimento. E para você?
A grandeza no Espírito surge da confiança e da antecipação. Quando
realmente cremos que o Senhor está no comando, podemos descansar na certeza
de queredor.
nosso seus planos prosseguem através do que está acontecendo conosco e ao
Certa frase repete-se por todo o relato das provações de José: "Mas o
Senhor era com José". Substitua o nome de José pelo seu próprio. O Senhor é
com você. Podemos assumir qualquer coisa com base nesse conhecimento. Mark
Twain, com seu característico humor, falou da constância da irregularidade: "Não
espere que a vida se estabeleça numa suave regularidade antes de crer que Deus
está com você, pois você terá uma longa espera e não perceberá a verdade de que
a realização do seu sonho não é metade da aventura, mas a própria aventura!"
A capacidade de José para a liderança, mais seu caráter e personalidade
28
compelidores e cheios de Deus, atraíram o carcereiro. Uma vez mais ele subiu ao
poder, dessa vez como encarregado de todo o cárcere! Deus possui senso de
humor, não é verdade?
Se José não tivesse sido lançado na prisão não teria encontrado os desleais
padeiro e copeiro de Faraó. Estamos falando de circunstâncias contraditórias.
Que lhe parecem essas situações preparadas por Deus para nos compelir ao
sonho que ele nos deu? Tanto o padeiro como o copeiro tiveram sonhos. O sonho
estratégico arranjado por Deus foi o do copeiro. Em seu sonho havia uma videira
com três ramos que produziam uvas. Ele tomava o copo de Faraó, espremia nele
as uvas e dava o vinho a Faraó. José, o sonhador de Deus, num instante fez a
interpretação: em três dias o copeiro seria solto e voltaria a servir a Faraó. E
aconteceu. Agora, dois anos mais tarde, o copeiro se achava numa posição
decisiva para se lembrar do talentoso e enigmático hebreu que encontrara na
prisão, pois Faraó teve um sonho estratégico nos planos de Deus para o Egito,
para José e, com o tempo, para o nascimento da nação hebraica.
Faraó sonhou com sete vacas magras e sete gordas. As magras devoravam
as gordas. E a este sonho seguia-se outro de sete espigas cheias e boas, que
cresciam de uma só haste, acompanhadas de sete espigas mirradas e crestadas
do vento oriental. "Qual o significado disso?" desejava saber Faraó. Os sonhos
desafiavam os poderes de interpretação dos magos do soberano. Ah, o humor de
Deus! O copeiro lembrou-se de José e mencionou-o a Faraó. Concedida a
audiência, José informou a Faraó que não possuía poderes de interpretação de
sonhos, mas servia a um Deus poderoso. José aprendera uma dura lição através
do sofrimento. O que vemos diante de Faraó é um homem dependente de Deus,
que permitira que Deus fosse o Senhor de seus próprios sonhos. A arrogância dos
anos anteriores se fora, deixando em seu lugar a humildade que apenas o
sofrimento é capaz de produzir.
Lembra-se da interpretação que ele deu ao sonho de Faraó? 0 Egito teria
sete anos de prosperidade, seguidos de sete anos de escassez. A inteligência
elevada que Deus concedeu a José é aproveitada para dar a Faraó conselho muito
importante: nos anos de prosperidade, preparar-se para os anos de escassez,
enchendo os celeiros. Faraó ficou tão surpreso com o discernimento de José e
com a aplicação prática, que o fez primeiro-ministro, vice-gover-nador de todo o
Egito, segundo no poder! Na realidade, não o segundo apenas em relação a Faraó
— o Senhor do Universo vinha em primeiro lugar na vida de José.
Gostaria de salientar o que Deus está tentando nos transmitir nesse ponto
da história de José. Ele não apenas nos dá sonhos e nos prepara para vivê-los,
mas a outros também concede sonhos que se ajustem aos nossos e nos levem
para a frente, cumprindo assim os seus propósitos para a nossa vida. O Senhor
está sempre pronto a desdobrar as necessidades de uma pessoa a fim de cumprir
seus propósitos
nos ajudar. em outra.
Algumas Pense nas
eram amigas, pessoas
outras que
hostis. chegaram
Mas na hora
Deus a todas certa para
usou.
Chegamos, assim, à terceira grande descoberta em nosso estudo da vida de
José — deixe Deus ser Deus nos sucessos da vida.A crescente grandeza de José
se manifestava não somente no modo como suportava as dificuldades, mas em
como lidava com o sucesso. Em nenhuma época, no relato de sua magistral
liderança do Egito, ele usou o poder para o seu próprio engrandecimento. Serviu
a Deus ao servir o Egito, como se sua tarefa fosse nomeação divina. Construiu
celeiros e os preparou para os tempos de fome. Ao fazer isso, ele salvou ao Egito e
a todos os povos circunvizinhos nos anos de escassez.
29
Deus dá sucesso espiritual aos que lhe dão a glória. Não devemos ter
aversão ao sucesso mais que às dificuldades. Há épocas de triunfo, bem como de
turbulência na vida cristã. Podemos agradecer ambos a Deus. Eficiência na vida
cristã, reconhecimento e ascensão na liderança são boas ocasiões para adoração
e confiança mais profundas.
Deus havia preparado um homem e agora estava pronto para usá-lo em
sua estratégia de criar um povo escolhido. Ele levaria Jacó e sua família para o
Egito, não somente a fim de livrá-los da fome, mas a fim de desenvolver através
deles uma nação digna da terra prometida, e distinta como seu povo.
A fome que atingiu o Egito também devorou Canaã. Jacó foi forçado a
enviar seus filhos ao Egito em busca de trigo. O temor de que algum mal lhes
sobreviesse fê-lo reter o filho mais jovem, Benjamim, único remanescente de sua
amada Raquel. Isso nos leva ao ponto seguinte, no qual se desenrola a parte final
do sonho de José, e também a outro discernimento — deixe Deus ser Deus sobre
os fracassos dos que frustraram os sonhos que ele lhe deu.
Em sua primeira viagem ao Egito para comprar comida, os irmãos de José
não o reconheceram. Haviam decorridos mais de vinte anos desde que o viram
pela última vez, e além disso ele se vestia como egípcio. Imagine o misto de
sentimentos que se apossou de José ao avistar seus irmãos — os mesmos que no
auge do ódio e ciúme venderam-no aos ismaelitas! Ele tinha poder para executá-
los imediatamente, torturá-los até que admitissem o crime que cometeram, abalá-
los ao revelar sua identidade naquele instante. Em vez disso, ele expressa imensa
bondade, porém acompanhada de um pouco de humor e intriga. A provação que
José impôs a seus irmãos, antes de se dar a conhecer, está de acordo com al-
gumas leis espirituais muito básicas e profundas de relacionamento e
reconciliação. Quando permitimos que Deus seja Deus dos pecados de outras
pessoas contra nós, devemos servir de mediador do perdão de uma maneira
adequada e aceitável. Isso não é fácil, como se percebe pela forma como José
tratou seus irmãos. Era preciso que eles reconhecessem o seu próprio pecado
antes que José pudesse oferecer-lhes o perdão. Esse processo o feriu mais que a
seus irmãos.
Ao acusá-los de espiões, José colocou seus irmãos na defensiva. A história
que contaram, protestando inocência e repetindo a mesma mentira acerca de
José, partiu o coração deste. O temor deles era tanto que não puderam captar a
nuance de ternura na voz do irmão, quando indagou: "Vosso pai ainda vive?"
"Nós, teus servos, somos doze irmãos, filhos de um homem na terra de Canaã; o
mais novo está hoje com nosso pai, outro já não existe". Já não existe! É bem
provável que José se sentisse tentado a se revelar e confrontar seus irmãos com a
verdade. Mas o momento ainda não havia chegado.
"E como já vos disse: sois espiões" — e acrescentou: — "Nisto sereis
provados: pela vida de Faraó, daqui não saireis, sem que primeiro venha o vosso
irmão maismanteria
Deus que novo!" Após lançá-los
um deles na prisão
na cadeia por três
enquanto os dias,
outrosJosé jurou-lhes
fossem a Canaãpor
e
trouxessem seu irmão mais novo.
O desafio teve o impacto que José pretendia: a fria repressão da culpa,
encoberta com camadas de mentira através dos anos, fendia-se de alto a baixo.
Sentiram-se forçados a conferenciar entre si acerca do pecado deles contra José.
E estranho como as crises de uma nova situação trazem de volta uma culpa não
solucionada. Ao atentar para a auto-incriminação deles, José tem de retirar-se
para chorar. Contudo, ele não revelou a sua verdadeira identidade. Uma ferida
tão profunda não se curaria com fáceis e baratas ofertas de perdão. Haja vista
30
que José não amoleceu: manteve Simeão e enviou os nove irmãos a caminho de
Canaã, com suas sacolas cheias de trigo. E mais: por ordem secreta,
desconhecida deles, o dinheiro que pagaram pelo trigo fora devolvido. Quando
abriram o saco e viram o dinheiro, manifestaram novamente o sentimento de
culpa. Em vez de satisfação, apoderou-se deles o temor e indagaram: "Que é isto
que Deus fez a nós?"
Jacó, ao saber que Simeão fora mantido como refém, foi acometido pela dor
e recusou-se a aceder ao pedido do governador do Egito. Mas a fome piorou
deixando-lhe pouca escolha. Finalmente, decidiu enviar os filhos de volta ao
Egito, levando Benjamim. O risco, para Jacó, era perder todos os herdeiros. O
que aconteceria às promessas feitas a Abraão e Isaque? O que ele não sabia era
que a promessa estava a cumprir-se em sua renúncia, agravada pela dor de ver
todos os seus filhos retornando ao Egito.
José foi brando em sua estratégia por ocasião do segundo encontro com
seus irmãos. Ele os cumprimentou de maneira calorosa e, comovido, chorou na
presença de Benjamim. Simeão foi solto da prisão e celebrou-se uma grande
festa. Gênesis 43:32-34 capta o drama encenado por José. O lugar de José era
em uma mesa separada, com os egípcios. Para seus irmãos, dispuseram a mesa
com todo o aparato segundo a ordem de nascimento: o mais velho no lugar de
honra. Não admira que os irmãos se entreolhassem com espanto. Somente
alguém que conhecia a família poderia ter planejado isso! Quem seria esse
misterioso vice-governador do Egito? Mas ainda não chegara o momento da
revelação. Os irmãos não estavam prontos.

Uma vez mais José os enviou de volta e, novamente, tomou providências


para um novo encontro a caminho de casa. Seu próprio copo de prata fora oculto
no saco de Benjamim. Depois que os irmãos seguiam satisfeitos o seu caminho,
enviou José os seus servos para os deter e acusá-los do furto. Os irmãos
alegaram inocência. Quando os sacos foram revistados, acharam o copo no de
Benjamim. Eles rasgaram as suas vestes — um antigo gesto hebraico de total
desespero e indignação — e quase tiveram um colapso nervoso.
Levados de volta à presença de José, prostraram-se em terra e repetiram a
mesma cena do ambíguo relacionamento que tiveram com ele como vice-
governador. Judá fez um fervoroso apelo para que não culpassem a Benjamim e o
detivessem no Egito. Se voltassem sem Benjamim, Jacó, seu pobre pai, não
poderia suportar a dor. Judá se dispôs a tomar o lugar do irmão. Foi a descrição
do pesar de Jacó e a nobre oferta de Judá que, por fim, abriu completamente o
coração de José. A prova de amor pelo pai e pelo irmão, que tanto lhes faltava na
época em que estivera com eles, era o que ele estava esperando.
José deu ordens para que todos, exceto seus irmãos, se retirassem. Então,
todo o amor e a solidão reprimidos para com sua família se sublimaram em
lágrimas e choros
Escrituras, tão altos que
as exclamações com toda
tantaa emoção
casa dosdeegípcios
dor comoouviu. Poucasde
do clamor são, nasa
José
seus irmãos: "Eu sou José; vive ainda meu pai?" (Gênesis 45:3). Ao ficarem
espantados ao ponto de perderem a fala, José fez que se aproximassem para
constatar que o vice-governador, na verdade, era o irmão que haviam vendido
como escravo.
Vendo a culpa estampada na face deles, José suplicou-lhes que não se
contristassem ou se indignassem consigo mesmos, mas percebessem que Deus
tinha utilizado para bem o mal que haviam cometido. Atente para as suas
palavras: "Deus me enviou adiante de vós, para conservar vossa sucessão na
31
terra, e para vos preservar a vida por um grande livramento. Assim não fostes vós
que me enviastes para cá, e, sim, Deus" (Gênesis 45:7-8). Quando os irmãos
estavam preparados, José concedeu o perdão que havia contido em seu coração.
Este, porém, foi dado com a consciência de que Deus usa o pior para produzir o
melhor.
Dessa vez os irmãos partiram com provisões completas. A missão deles era
trazer Jacó e a família para o Egito. Se o encontro de José com seus irmãos foi
triste e emocionante, seu reencontro com o pai haveria de ser o de maior ternura
e alegria do Antigo Testamento. São bem vivas as cores com que a Escritura
pincela José correndo em sua carruagem, indo ter com seu pai. No momento que
os dois se encontraram, José abraçou a Jacó "e chorou assim longo tempo". José
atravessara uma angústia incrível, esperando por esse momento. Ele confiou em
Deus quando tudo parecia impossível. O Senhor do impossível teve a palavra
final.
Após a morte de Jacó, os irmãos vieram a José com as derradeiras palavras
de instrução do pai: que deveriam buscar o perdão de José. Tal perdão já havia
sido concedido, mas o velho e sábio Jacó sabia que os irmãos deviam fazer uma
confissão mais clara. A reação a essa confissão tem ressoado através dos tempos
como uma das mais belas explicações da providência divina. O sonho de José,
segundo o qual seus irmãos se curvariam diante dele, era apenas o invólucro de
um propósito muito mais importante: o plano de Deus. Deus usaria José como
um instrumento estratégico na realização desse plano, e também como uma
bênção para a sua família.
Assim é conosco. Precisamos dar mais importância aos sonhos e visões de
nossa vida. Nossa vocação é parte de um plano maior que não pode falhar. Por
conseguinte, podemos lidar com os outros de forma mais carinhosa e perdoadora.
Todas as coisas que José teve de suportar o capacitaram a declarar: "Não temais;
acaso estou eu em lugar de Deus? Vós, na verdade, incitastes o mal contra mim;
porém Deus o tornou em bem, para fazer, como vedes agora, que se conserve
muita gente em vida. Não temais, pois; eu vos sustentarei a vós outros e a vossos
filhos. Assim os consolou, e lhes falou ao coração" (Gênesis 50:19-21).
Em retrospecto, José foi capaz de fazer essa declaração. Se pudermos
também olhar para trás e aplicar essa mesma declaração ao que nos aconteceu,
então ela se tomará, em meio à frustração e aos problemas que nos assaltam,
nosso lema, nossa missão, e sólida base de esperança para o futuro. Deus usará
a vida, as pessoas e as circunstâncias a fim de apressar a realização do sonho
que tem para nós.
A história de José nos leva a uma introspecção sincera e sugere-nos fazer
um inventário. Os conflitos da vida porventura aproximam-nos da confiança de
José na providência divina? Além disso, tem-nos essa convicção transformado em
pessoas perdoadoras e agradáveis? Quando percebemos o carinho com que Deus
nos
menostrata, ao outros?
pelos mover-nos
Ele para
usoufrente
a cruzem direção
para ao nosso
nos dar sonho,de
a esperança podemos fazer
que além de
nossos alvos terrenos temos um destino eterno. E daquela cruz de graça
mediadora um, maior que José, disse: "Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que
fazem".
Um último princípio abrange todos os anteriores — Deixe Deus ser Deus do
futuro, enquanto ele executa o seu propósito maior na história. Quando José
expirava, fez uma formidável declaração que ressalta sua confiança inabalável em
Deus. "Eu morro; porém Deus certamente vos visitará, e vos fará subir desta
terra para a terra que jurou dar a Abraão, a Isaque e a Jacó. . . Certamente Deus
32
vos visitará, e fareis transportar os meus ossos daqui" (Gênesis 50:24-25). Na
morte, José tinha tanta confiança no cuidado de Deus como ele tivera durante
todos os anos aflitivos da sua vida. Seu sonho pessoal se tornou parte do plano
de Deus para o nascimento futuro de Israel como uma nação.
José podia morrer sabendo que nada inverteria a estratégia irrevogável,
imutável e impulsionadora de Deus. Podia tirar da mente a preocupação sobre o
futuro, porque ele aprendera que Deus é digno de plena confiança. As sessenta e
seis pessoas que Jacó levou para o Egito, além de José, sua esposa e dois filhos,
perfaziam setenta. Quatrocentos e trinta anos mais tarde Israel deixaria o Egito
com mais de dois milhões. Deus tinha um plano.
José é lembrado como um dos maiores homens da história porque permitiu
que Deus fosse o Deus de seus sonhos. Ele tornou-se melhor apesar de tudo, em
vez de amargo por causa de tudo. E quanto a nós? A vida nos torna azedos ou
amáveis? A prova de sermos amáveis é podermos afirmar com José: "Atentem
para a vida, meus amigos. Ouçam-me os que vêem os outros como inimigos. O
que no momento parece mal, Deus tomará em bem. Eu vou guardar o meu
sonho!"

33
CAPÍTULO QUATRO
0 SENHOR JAMAIS ESQUECE
Moisés, Homem de Deus
Quando pensamos que não há para onde ir, Deus está prestes a fazer e seu
grande lance. O que muitas vezes julgamos ser o pior, nada mais é que a última
etapa da preparação para o melhor. Nosso desespero é o prelúdio para o
nascimento da esperança genuína. O que nos parece o fim não passa de uma
pausa para um novo começo.
E esta a poderosa mensagem do primeiro capítulo de Êxodo. No momento
dramático em que os hebreus estavam prestes a sucumbir, Deus preparava a
Moisés. Os dois últimos versículos do capítulo 2 de Êxodo servem de um ponto de
exclamação, que acompanha com detalhes cruciantes o sofrimento de Israel em
cativeiro no Egito, o nascimento de Moisés, seu crescimento e identificação com o
seu povo. "Ouvindo Deus o seu gemido, lembrou-se da sua aliança com Abraão,
com Isaque e com Jacó. E viu Deus os filhos de Israel, e atentou para a sua
condição" (Êxodo 2:24-25).
O Senhor jamais se esquece de nós. As circunstâncias podem levar à
conclusão humana e limitada de que Deus se esqueceu de nós, ou de que ele
sofreu um lapso de memória acerca de nossa condição pessoal ou das
perplexidades de seu povo como um todo. Mas o Êxodo nos revela que, no exato
momento em que nos desesperamos, Deus prepara uma saída. Sempre acima do
que nos parece possível, acima do alcance de nossas maiores expectativas, Deus
opera. O mesmo Deus que fez uma aliança com seu amigo Abraão, que lutou com
o obstinado Jacó, que tornou a amargura de José em amabilidade, é também o
Senhor que encontra uma saída para Moisés e libera o Êxodo. Deus não se
esqueceu de seu povo no Egito. Quando pensavam que tudo havia acabado para
eles, o Senhor preparava tanto a libertação como um libertador, que se tornaria o
homem mais poderoso do Antigo Testamento.
O povo de Israel estava no Egito havia cerca de trezentos e cinqüenta anos
quando Moisés nasceu. Depois da morte de José, a situação do povo foi aos
poucos mudando para pior: de honrados convidados chegaram à condição de
escravos. O Faraó que havia confiado a José tão grande poder e dignidade teve
como sucessores soberanos menos magnânimos, que temiam o crescimento do
povo hebreu, como agora era chamado. Temiam que, no caso de uma guerra, os
hebreus passassem para o lado do inimigo. As parteiras receberam ordens para
matar os recém-nascidos do sexo masculino, mas quando isso não deu resultado,
Faraó ordenou que os meninos hebreus fossem jogados ao Nilo. Ao mesmo tempo
em que aumentavam a produção de tijolos, para que templos e cidades al-
cançassem esplendor
palha que antes lhes cada vez maior,Aosvida
era fornecida. egípcios obrigavam
se tornou os judeus
intolerável. a ajuntar
Cada a
novo rei
aumentava a exigência e designava capatazes cada vez mais cruéis para afligir o
povo. Todavia, quanto mais os israelitas eram afligidos, tanto mais se
multiplicavam. E no auge do seu sofrimento, nasceu um menino a um casal da
linhagem de Levi, o qual deveria tomar-se poderoso profeta do Senhor do
impossível!
O relato do nascimento e crescimento de Moisés nos é tão familiar que a
maravilhosa verdade de como Deus nos prepara para o que ele tem para nós pode
passar despercebida. A história de como sua mãe sobrepujou em astúcia a Faraó,
34
salvando o menino, contém um toque de humor. Ela conseguiu ocultá-lo por três
meses cheios de horror. Imagine a apreensão dela a cada passo que se aproxi-
mava. A qualquer momento o belo menino poderia ser arrancado de seus braços e
morto perante seus olhos!
Logo, a tarefa de ocultá-lo tomou-se muito perigosa. Acredito que o Senhor
lhe deu o brilhante plano de deitá-lo num cesto de vime recoberto de piche e
breu, e colocá-lo no Nilo, no exato lugar onde ela sabia que a filha de Faraó viria
banhar-se. Vocês sabem o que aconteceu. A princesa achou a criança, sentiu-se
movida a salvar-lhe a vida e decidiu levá-la para o palácio. Mas quem iria
amamentá-la? Aqui está o humor. Miriã, a irmã do bebê, encontrava-se nas
proximidades com uma solução prática. Por que não chamar uma das mulheres
hebréias para amamentar a criança? A filha de Faraó concordou. E quem foi
chamada? A própria mãe da criança. Creio que Deus sorriu naquele dia! Ele
estava operando o seu plano. Deram à criança o nome de Moisés, que significa
"retirado das águas". Um nome apropriado para alguém que Deus, em tempo
oportuno, usaria para tirar o seu povo das altas ondas de perseguição e
sofrimento. Enquanto o povo gemia, Deus estava agindo!
Na casa de Faraó, Moisés teve o melhor de dois mundos. Ele foi criado com
a herança hebréia, do próprio peito e colo de sua mãe. Sua mãe adotiva lhe deu o
mais excelente treinamento na educação e cultura egípcia. Desde que a sucessão
ao trono sempre procedia da filha mais velha de Faraó, Moisés destinava-se a ser
príncipe e sucessor de Faraó. Isso significava que ele deveria receber educação
acadêmica, militar e de liderança que o preparariam para governar todo o Egito.
O luxo e esplendor do Egito estavam a seu comando, como o filho privilegiado da
filha de Faraó. Mas todos esses preparativos seriam úteis para um propósito
maior!
A fim de apreciar o Egito no qual Moisés foi criado, passei boa parte de um
verão velejando pelo Nilo. Visitas aos antigos templos de Luxor e Carnaque, ao
Vale dos Reis, Kom Ombo, Aswan e a outros lugares deram-me a sensação do
esplendor do Egito do tempo de Moisés. Impressionaram-me a mitologia dos
deuses do Egito antigo e a ênfase à adoração de Rá, o deus-sol. Os rituais de
coroação dos Faraós, pintados nas paredes dos templos, me impressionaram pelo
elevado poder que aguardava o filho adotivo da filha de Faraó. Enquanto olhava
os pilares dos templos e os obeliscos gigantescos, comentava com o meu guia
muito versado sobre o assunto, que para a construção e o levantamento foram
necessários, com certeza, milhares de operários. Ele esquivou-se de uma resposta
direta por causa das implicações da minha observação. Muitos dos templos foram
construídos durante os quatrocentos anos ou mais da escravidão hebréia. Essa
escravidão vai do século dezesseis ao treze e inclui os projetos de construção de
Hatshepsut, no século quinze, e Ramessés II, no século treze. Talvez os hebreus
tivessem sido forçados a confeccionar mais do que tijolos!
Toda essa
treinamento investigação
e educação aumentou
de Moisés, minha conscientização
e ajudou-me a compreenderda sua
grandeza do
agitação
quando o Espírito de Deus levou-o a indagar acerca de sua verdadeira srcem. E
bem possível que o treinamento de sua mãe tivesse tido uma influência
duradoura. Talvez alguém lhe sussurrasse a verdade quando era já homem feito.
Ou foi um toque do Espírito que o despertou para o fato de que talvez ele não
fosse um egípcio, mas um hebreu? Possivelmente uma ou a combinação de todas
as três coisas. Não sabemos. O que sabemos, na verdade, é que a mais profunda
fidelidade do futuro Faraó cristalizou-se de forma decisiva quando este completou
quarenta anos. Certo dia, saiu Moisés em direção a uma área de escravos em
35
Gósen e viu um feitor egípcio surrando um dos escravos. Tomado de ira e
indignação, ele matou o egípcio. Pensou que ninguém tivesse observado o seu
ato, mas a espantosa notícia correu rápido entre os hebreus e por fim chegou ao
conhecimento de Faraó. A sorte estava lançada: nada mais restava a fazer senão
fugir para o deserto de Midiã a fim de salvar a vida.
Essa fuga também fazia parte do plano de Deus. Ele fez que Moisés
deixasse a corte de Faraó a fim de prepará-lo para ser o libertador de Israel.
Sabemos que ele permaneceu no deserto quarenta anos. Todo esse tempo ele
esteve sob a influência de Jetro, um sacerdote midianita que adorava ao Senhor.
Moisés se casou com Zípora, filha de Jetro, e teve dois filhos, Gérson e Eliezer.
Como pastor do rebanho de Jetro, Moisés aprendeu acerca da vida no deserto,
tomou conhecimento das rotas de viagem e das fontes de água. Deus o preparava
para a tarefa que estava pela frente.
Mais importante que tudo isso era que o Senhor estava preparando um
homem para confiar nele completamente. Horas intermináveis de silêncio nas
vastidões do ermo substituíram a vida suntuosa da corte de Faraó. Toda a
autoconfiança teria de ser escoada gradativamente. A dependência da inteligência
e habilidade humanas, enraizada no treinamento egípcio para as responsabili-
dades de sucessor de Faraó, tinha de ser redirecionada para uma nova
dependência — a de Deus. Moisés esvaziou-se do orgulho, de modo que pudesse
começar a fazer as perguntas certas.
Quando nos colocamos no lugar de Moisés, durante esse longo período no
deserto, começamos a perceber as perguntas que, por certo, devem ter rolado em
sua mente na ânsia de uma resposta. Quem era esse Deus de seu povo? Ele
havia herdado de sua mãe hebréia certo senso intuitivo do poder de Deus. Talvez
o contato com os hebreus tivesse ajudado a aumentar essa conscientização. E
bem possível que Jetro o tivesse levado a conhecer, pelo nome de El Shaddai, o
Deus Todo-poderoso. Mas isso, por certo, levantou outras perguntas. Se esse
Deus é Todo-poderoso e se ele firmou uma aliança com o seu povo através de
Abraão, por que não faz alguma coisa para ajudar o seu povo que definha no
Egito? Sem dúvida, Moisés pôs-se a refletir sobre isso através dos anos, enquanto
cuidava dos rebanhos do seu sogro. Ele sabia acerca de Deus, mas não conhecia
a Deus. E a resposta a essa necessidade foi a parte final da preparação do
solitário pastor para ser o libertador de seu povo. Outro dia vi um velho amigo.
— Como vai você? — perguntei, sem contar com a resposta que ele me deu.
— Não muito bem, obrigado!
Com certeza, minha expressão facial foi de alarme, porque ele prosseguiu
dizendo que passava por algumas provações, as quais diminuíam a sua confiança
na promessa de que Deus se importa conosco e faz alguma coisa para ajudar-
nos.
— Por tudo que já passei vi-me forçado a admitir que não conheço a Deus

muito
dele — bem. De fato,
concluiu quero saber se ele é Todo--poderoso quando necessitamos
o amigo.
Foi essa a pergunta de Moisés em Midiã. O de que meu amigo precisava era
o de que Moisés precisava — um encontro genuíno com Deus.
Foi isso o que aconteceu naquele dia decisivo, pouco antes do final da
permanência de Moisés no deserto. Enquanto cuidava dos rebanhos junto ao
monte Horebe, assustou-se com uma sarça em chamas, a qual não se consumia.
Moisés observava com atenção. Certamente ele já tinha visto a combustão
espontânea, efeito dos raios solares nos arbustos secos. Mas a sarça parecia
queimar-se e não se consumir. Estando ele em pé, petrificado diante da visão
36
assustadora, soou uma voz de dentro da sarça: "Moisés! Moisés!" Moisés era gago
nessa época de sua vida. Estou certo de que sua reação foi gaguejar. "Eis-me
aqui". O Senhor havia captado sua atenção!
O que nos pode surpreender ao ponto de deixar nossos pés pregados no
chão — ou melhor ainda — nos colocar de joelhos, em total atenção? Às vezes é
preciso uma catástrofe ou uma bênção alarmante. As sarças ardentes de Deus
estão ao nosso redor — maravilhas naturais nas quais sua assinatura apresenta
tons fortes e brilhantes. Pessoas através das quais ele resplandece em chamas de
amor. Problemas cruciantes nos quais ele é a nossa única esperança. O tempo no
deserto, de espera e indagações, é sempre recompensado com uma sarça ardente
especialmente adaptada às nossas necessidades. O que poderia surpreendê-lo?
Neste instante, enquanto lê, o Senhor está a chamá-lo pelo nome através dessa
sarça. Você consegue ouvi-lo? Então responda com prontidão: "Eis--me aqui!"
Não deixe para ouvir mais tarde o que o Senhor tem para dizer agora. Mostre que
você confia nele, precisa dele e da sua presença.
Em resposta à abertura atenciosa e reverente de Moisés, o Senhor revelou
sua natureza essencial. Ele alcançara o íntimo de Moisés nos anos de silêncio e
agora poderia expor sua natureza real a ele. Ele era o Deus de Abraão, de Isaque
e de Jacó. Ele tinha escutado o gemido de seu povo e estava pronto para libertá-
lo. Moisés devia ser o agente dessa libertação. O confronto com o Senhor agora se
transforma em consternação. "Como, Senhor, como?" Moisés conhecia o poderio
militar de Faraó e de sua dependência dos escravos hebreus para a expansão
contínua da grandeza do Egito. Para Moisés, o mais impossível de supor-se, era
que fosse ele capaz de tirar o povo de Israel do Egito.
Ponha-se no lugar de Moisés. Qual a possibilidade mais inimaginável que o
Senhor poderia sugerir-lhe? Descreva-a. Mas note que o desafio para Moisés era
realizar exatamente o que estívera em sua mente todos aqueles anos no deserto.
Por que Deus não fazia alguma coisa acerca da situação do seu povo? Agora
vinha a resposta. O próprio Moisés seria aquele através de quem sua própria
oração seria respondida. Um encontro real com Deus sempre nos inclui na
resposta. O que desejamos que Deus faça para nós, ele deseja realizar através de
nós.
E respondemos com medo e trepidação: "Quem sou eu? Como poderia
realizar tal coisa?" Não podemos. Mas com o Senhor ao nosso lado, de que mais
precisamos? Que mais desejamos por garantia? Precisamos exatamente do que
Moisés precisava: conhecer a natureza verdadeira do Deus que estaria com ele.
Quando informado de que ele deveria ir até ao povo e declarar que o Deus de seus
pais o havia enviado, ele protestou: "Eles me perguntarão qual o nome do Deus
que deu essa ordem impossível. O que lhes direi a eles?" Então o Deus da sarça
ardente deu a Moisés uma dádiva que o animaria através dos futuros anos de
perigo. "EU SOU O QUE SOU". O Senhor emprega o verbo hebraico causativo ser
no coisas
as O Criador de tudo, que causou o aparecimento de todas as coisas, fará
futuro.acontecerem.
Através dos anos, intérpretes eruditos vêm apresentando várias traduções.
Como já escrevi em outro lugar, minha convicção é que o verbo hebraico ser no
futuro, significa: "Farei acontecer", ou: "Farei com que aconteça o que faço
acontecer". Veja o meu livro, A Sarça Ainda Arde. O Verbo, que tem poder para
mudar toda a criação, operará sua estratégia na história e em nossas vidas pes-
soais. Ele é todo-poderoso, onisciente e todo-amor, e, portanto, será o Deus que
torna todas as coisas possíveis, acima do que consideramos impossível. Moisés
encontrou o Senhor do impossível!
37
O novo nome pelo qual Deus se fez conhecer a Moisés é Hayah, do verbo
ser, que se traduziu por YHWH, ou Yahweh — o Senhor. Em anos posteriores,
esse nome tornou-se tão sagrado para os hebreus que era proibido enunciá-lo. A
palavra Adonai, o Senhor, passou a ser usada como sinônimo de Deus. Mas para
Moisés, EU SOU era um toque de clarim à esperança e à ação. Deus não era
apenas o El Shaddai distante, o Deus poderoso das montanhas, mas o Deus que
faria acontecer o que parecia impossível.
O Senhor não havia esquecido! Ele esperava para levar Moisés ao ponto em
que este aceitasse a espantosa verdade de que Deus era capaz de fazer qualquer
coisa que desejasse. Enquanto o povo definhava no Egito, pensando que Deus o
havia esquecido, a libertação tinha início no deserto!
É-nos difícil imaginar Moisés questionando acerca de como Deus o usaria
para tirar o seu povo do Egito. Mas antes que nos tomemos demasiadamente
críticos, lembremo-nos das muitas vezes que chegamos a argumentar com Deus
sobre suas promessas e orientação. As perguntas de Moisés são as mesmas que a
maioria de nós faz todas as vezes que EU SOU se oferece para realizar milagres.
Desejamos examinar cada aspecto de como ele os fará.
"E o que pode acontecer se eles não acreditarem em mim?" inquiriu Moisés.
O verdadeiro problema era que Moisés ainda não cria. Ele transferiu ao povo seus
receios mais íntimos. Por isso o Senhor ordenou-lhe que atirasse a vara ao chão
— ela transformou--se numa serpente. A seguir, o Senhor ordenou-lhe que a
tomasse pela cauda. Moisés havia desenvolvido um sadio temor às serpentes no
deserto, imagine o seu temor ao obedecer a essa ordem! Ao apanhá-la, a serpente
se transformou em vara novamente. Só que agora era a vara de Deus.
O sinal seguinte foi igualmente assombroso. "Mete agora tua mão no peito,
Moisés", ordenou o Senhor. Ao fazê-lo, sua mão estava leprosa. A lepra era a
doença mais repugnante e temível da época. "Torna a meter tua mão no peito,
Moisés", retorquiu o Senhor. E ela voltou a ficar sã. De que mais o futuro
libertador precisava? Esse sinal não seria suficiente para você? Tenha cuidado
com sua resposta. E quanto aos sinais do poder de Deus que rejeitamos como
insuficientes?
Moisés levantou outra questão. Como já vimos antes, nessa época ele era
gago. Como reuniria o povo e enfrentaria a Faraó? Por causa dessa falta de fé,
creio que o Senhor deixou de providenciar o melhor que tinha para ele. E óbvio
que o EU SOU, que prometeu fazer as coisas acontecerem, poderia soltar a língua
de Moisés. Na verdade, há evidências de que isso tenho ocorrido mais tarde. Mas,
por ora, o Senhor dispôs-se a usar Arão, irmão de Moisés, como o porta-voz do
libertador. Muitas vezes perdemos o melhor de Deus porque argumentamos
demais. Sua vontade permissível substitui sua vontade perfeita por causa da
nossa dúvida. Já lhe aconteceu isso?
Mas o inovador EU SOU, que faz as coisas acontecerem apesar de nós,
sempre tem uma
aceita como estratégia
somos. secundária
Mais tarde Moiséspara o cumprimento
falou em nome de da suacom
Iavé obra. Ele nose
clareza
poder. O Senhor nunca desiste!
Moisés regressou ao Egito com as palavras do Senhor ressoando em seu
coração. Sua tarefa era humanamente impossível, mas ele havia tido um
encontro real com o Senhor do impossível.
Voltemos ao início deste capítulo para não perdermos a admirável
mensagem de que o Senhor jamais se esquece de nós. Ele ouve, esteja certo
disso. E quando menos esperarmos, ou merecermos, ou termos coragem de
acreditar, ele vem a nós e assegura-nos da libertação. O que pensávamos ser o
38
fim, não passava do começo. Não estamos no fim porque Deus ainda não
terminou sua obra em nós! Na verdade, ele nos prepara para um Êxodo. E por
isso que devemos prosseguir com a sarça ardente em nossos calcanhares e sua
radiante e viva segurança em nossos corações. A prova infalível de que tivemos
uma experiência da sarça ardente é que o fogo saltou para dentro de nós e
incendiou os gravetos secos da nossa desesperança. Podemos entrar em nosso
Egito como homens e mulheres movidos por uma coragem centrada no EU SOU.
Deus jamais nos abandona, ele nunca se vai
Assim, conte com a sua presença na escuridão e na alvorada.
Creia somente, creia somente;
Todas as coisas são possíveis, creia somente;
Todas as coisas são possíveis, creia somente!
Paul Rader

39
CAPÍTULO CINCO
0 SENHOR DO IMPOSSÍVEL
Moisés, o Libertador
Moisés partiu de Midiã para o Egito com ordens claras. A idéia de um êxodo
não era produto de auto-engrandecimento ou de uma necessidade pelo
espetacular. Moisés não recebeu a estratégia completa do Êxodo. O que ele tinha
era uma visão e um primeiro passo. Tudo o que devia fazer era dizer ao povo que
EU SOU, Iavé, o havia enviado. Deus tinha ouvido a súplica do seu povo e iria
levá-los do Egito para uma terra prometida. Moisés deveria se dirigir a Faraó com
uma ordem do Senhor: "Deixa ir o meu povo!"
Isso era o bastante para começar. É raro o Senhor nos revelar mais do que
precisamos para a obediência diária. Realizar a tarefa de hoje é abrir caminho
para a revelação de amanhã.
Não devemos esperar aplausos em nossa tentativa audaciosa do impossível.
É por demais arriscado agir sob a influência de outras pessoas. O progresso
sempre passa por cima das costas enrijecidas dos cautelosos e obstinados.
Moisés teve de aprender a confiar totalmente em Deus.O povo não acolheu com
entusiasmo a direção do Senhor, e Faraó endureceu o coração à idéia de deixar ir
a sua força escrava. Mas o Senhor estava em ação. Ele arranjou as cir-
cunstâncias. O povo suplicou a Deus por libertação, e quando esta veio,
resistiram a seu nomeado libertador. Espantoso! O Egito tinha de se tornar
insuportável por completo antes que aceitassem a possibilidade do que parecia
impossível. A escravidão em que se encontravam era mais profunda do que a
imposta pelos egípcios: era a escravidão ao medo.
A disputa de Moisés com Faraó não foi menos formidável. O desprezo que o
soberano tinha por Moisés era um misto de ódio virulento e competição. Minha
teoria é que esse Faraó foi o que subiu ao trono destinado a Moisés. Talvez se
tivessem conhecido na juventude. Êxodo 2:23 informa que o Faraó pai da mãe
egípcia de Moisés morreu "muitos dias depois", um longo período após a fuga de
Moisés para Midiã. O Faraó com quem Moisés disputava devia saber da deserção
deste e desejava vencer a batalha que se seguiu. O que Faraó não aceitou, até
que fosse tarde demais, era que sua disputa não era com Moisés, mas com Iavé.
As pragas, especialmente a última, na qual o anjo da morte tirou a vida dos
primogênitos egípcios, foram demais para ele.
Podemos aprender muito acerca do Senhor do impossível nos eventos
dramáticos do êxodo do Egito. Deus concedeu a Moisés e ao povo uma prova
segura de orientação numa nuvem de dia e numa coluna de fogo de noite. E
Moisés conduziu o povo com obediência. Quando a nuvem avançava, ele
mandava
Consta naso Escrituras
povo seguir;
quequando ela triunfante
a procissão parava, eles
dosacampavam e aguardavam.
israelitas para fora do Egito
compreendia seiscentos homens a pé, além de mulheres e crianças. Se
calcularmos em torno de cinco pessoas para cada família, o número total
alcançaria a significativa casa dos dois milhões. De particular importância para a
nossa consideração é a rota pela qual o Senhor os conduziu. Para evitar uma
guerra com os filisteus, o Senhor não os levou direto a Canaã pelas rotas
comerciais que passavam através das terra deles. Disse Deus a Moisés: "Para que
porventura o povo não se arrependa, vendo a guerra, e retornem ao Egito." Além
disso, o Senhor queria preparar o povo a fim de demonstrar o seu poder, de modo
40
que jamais se esquecessem. Moisés teve a sarça ardente; agora o povo precisava
de uma experiência do mesmo teor.
O salmista captou a urgência dessa necessidade, ao meditar na segurança
dupla que o Senhor providenciou: "O Senhor faz justiça, e julga todos os
oprimidos. Manifestou os seus caminhos a Moisés, e os seus feitos, aos filhos de
Israel" (Salmo 103:67). A sarça ardente revelara a Moisés a natureza poderosa do
EU SOU, Iavé, que faria as coisas acontecerem apesar das circunstâncias
humanas. Naquele momento era necessária uma manifestação de poder para
provar, acima de qualquer dúvida, que Deus estava com o povo e que Moisés era
o seu líder escolhido.
Um estudo cuidadoso do caminho pelo qual o Senhor guiou o povo
proporciona um quadro esclarecedor e fascinante. Êxodo 12:37 relata que Deus
os conduziu de Ramessés, ao norte do delta do Nilo, até o sul de Sucote. Ali eles
observaram o dia da Páscoa em celebração do livramento do Egito e em
lembrança de que o anjo da morte passou por cima das casas dos hebreus na
décima praga. Ainda não estavam muito longe, pois Sucote ficava no centro de
Gósen, onde alguns haviam servido como escravos. Êxodo 13:20 indica que o
Senhor a seguir levou o povo de Sucote novamente para o sul até Etã, que fica no
lado norte dos Lagos Amargos; a leste desses lagos fica o deserto de Sur. De fato,
eles se encontravam no deserto, além de Etã, quando Deus deu a Moisés uma
surpreendente instrução: "Fala aos filhos de Israel que retrocedam e se acampem
defronte de Pi-Hairote, entre Migdol e o mar, diante de Baal-Zefom; em frente dele
vos acampareis junto ao mar" (Êxodo 14:2). O povo deveria voltar para o norte, e
em seguida para o oeste, de volta ao Egito. O Senhor deu a Moisés o motivo mais
profundo para esse estranho retrocesso. "Então Faraó dirá dos filhos de Israel:
Estão desorientados na terra, o deserto os encerrou. Endurecerei o coração de
Faraó, para que os persiga, e serei glorificado em Faraó e em todo o seu exército;
e saberão os egípcios que eu sou o Senhor" (Êxodo 14:3-4). E também o saberia o
povo de Israel! O Senhor estava prestes a realizar um milagre que se tomaria um
sinal de seu poder para todas as gerações.
Estudei os mapas do Egito antigo e da narrativa bíblica, em particular
Êxodo 14:2 e 9, tentando identificar o que aconteceu. Visitas ao local me
ajudaram a fazer um quadro mental do acontecido, embora o canal de Suez tenha
mudado radicalmente a topografia. Meu postulado é que os israelitas receberam
instrução de voltar ao Egito, rodeando o que naquela época eram os Lagos
Amargos, indo para o sul, em direção de Pi-Hairote, uma das campinas a oeste
dos lagos; daí para Migdol, uma torre e um posto avançado das tropas egípcias.
Baal-Zefom era um deus egípcio adorado numa cadeia de montanhas na costa
ocidental, onde hoje fica o Golfo de Suez.
Os israelitas estavam cercados pelas montanhas de um lado, a guarnição
de Migdol do outro e as extremidades do lado norte do mar Vermelho. Então
entraram
movendo-seematravés
pânico,das
ao campinas
avistaremdaa única
nuvemárea
de aberta.
pó das Ocarruagens de Faraó,
povo fora apanhado
numa armadilha. Uma impossibilidade. Um "beco-sem-saída". E o Senhor os
havia conduzido para lá!

Imagine a situação: Moisés não podia ir para o sul por causa das
montanhas, ou para o oeste por causa da aproximação de Faraó, ou para o norte
por causa da guarnição de Migdol, ou para o leste por causa do mar. Êxodo 14:9-
10 torna vivida a situação dos israelitas. "Perseguiram-nos os egípcios, todos os
cavalos e carros de Faraó, e os seus cavalarianos e o seu exército, e os
41
alcançaram acampados junto ao mar, perto de Pi-Hairote, defronte de Baal--
Zefom. E, chegando Faraó, os filhos de Israel levantaram os olhos, e eis que os
egípcios vinham atrás deles, e temeram muito; então os filhos de Israel clamaram
ao Senhor."
A análise que os israelitas fizeram da situação baseava-se no potencial
humano, não no poder divino. Não eram capazes de perceber o que Deus estava
fazendo. Em cinco dias eles haviam-se esquecido das pragas, da intervenção de
Deus e da libertação do Egito.
Achei útil dividir essa seção do Êxodo nos diversos segmentos de diálogo: o
que o povo disse a Moisés; o que Moisés disse ao povo; o que Moisés disse ao
Senhor; e o que o Senhor disse a Moisés, em preparação para a realização da
grande revelação do seu poder como o Senhor do impossível.
O que o povo disse a Moisés é típico da análise humana do impossível."Será
por não haver sepulcros no Egito, que nos tiraste de lá, para que morramos neste
deserto? Por que nos trataste assim, fazendo-nos sair do Egito? Não é isto o que
te dissemos no Egito: Deixa-nos, para que sirvamos aos egípcios? pois melhor nos
fora servir aos egípcios do que morrermos no deserto" (Êxodo 14:11-12). É fácil
ficar espantado com a falta de gratidão. Note a transferência da culpa causada
pelo medo — é tudo culpa de Moisés. Por que nos meteu nesta enrascada? O povo
clamava por confirmação de que a decisão de deixar o Egito fora correta,
realmente dirigida por Iavé e que ele viria em seu auxílio.
Nesse momento percebemos a grandeza de Moisés começar a emergir. Por
estar seguro do EU SOU da sarça ardente, ele não precisa se pôr na defensiva.
Ele não desce ao nível do povo para argumentar ou defender a sua liderança. Sua
experiência com Deus o tomou gracioso em vez de amargo. As pessoas fazem o
que fazem por causa do que são. São incapazes de mudar seu comportamento até
que Deus lhes cure o medo. Moisés era sustido pela percepção • de que Deus
providenciara o beco-sem-saída, mas que daria um escape!
O que Moisés disse ao povo e o que Deus disse a todos eles, dá-nos cinco
pontos básicos sobre o que fazer diante do impossível. Note as cinco formas
verbais de Êxodo 14:13-15. Elas nos revelam primeiramente o natural, a reação
humana ante o impossível; a seguir, o que Deus deseja que façamos e sejamos
quando nos defrontamos com o impossível, e, por fim, o que ele pode fazer com o
impossível, se confiarmos nele. Moisés disse ao povo tomado de pânico: "Não
temais: aquietai-vos e vede o livramento do Senhor que hoje vos fará; porque aos
egípcios, que hoje vedes, nunca mais os tomareis a ver. O Senhor pelejará por
vós, e vós vos calareis." Em seguida, o Senhor disse a Moisés: "Por que clamas a
mim? Dize aos filhos de Israel que marchem."
Aqui está a receita contra a perplexidade: (1) Não temais, (2) aquietai-vos,
(3) vede o livramento do Senhor, (4) calai-vos, (5) marchai. Esses verbos formam
um antídoto para a ansiedade! Sei disso, através de anos em confronto com
impossibilidades. O que escrevo
A primeira instrução aqui jáao
de Moisés provei
povoeévivi.
Não temais. A única maneira de
nos livrarmos do medo é conscientizar-nos da companhia de Deus. Ele se
encarrega da impossibilidade. E não apenas isso: Deus muitas vezes a permite
para o nosso crescimento e sua glória. Com freqüência censuramos as pessoas
por causa do mal e culpamos a vida pelo que nos está fazendo. Crescemos na
graça quando acreditamos que nada nos pode acontecer sem a permissão divina.
Com esse firme pensamento podemos pedir a Deus seu poder e intervenção.
O mesmo canal de nossas emoções através do qual o medo flui, pode ser o
leito fluvial para a confiança e a obediência em amor. O medo não está muito
42
longe da fé. Quando abandonamos o medo, expressando nosso sentimento a
Deus, permitimos que a fé expulse o medo. Diga a Deus: "Estou com medo. Não
posso compreender o que estás fazendo comigo! Mas sei que estás no controle e
que nada hás de permitir que não me leve para uma comunhão mais profunda
contigo. O que dás ou tiras é para que eu possa vir a conhecer-te melhor." Essa é
a oração de coragem numa situação impossível.
É tolice afirmar que jamais teremos medo de novo. Isso significa reduzir os
desafios da vida de modo que não nos deparemos com aquilo que não podemos
resolver por nós mesmos. Normalmente, o medo é a nossa primeira reação em
face da impossibilidade. Não o receie. Ele nos lembra que estamos vivos, que
somos humanos. Assim como a dor, o medo é um grito para Deus — um prelúdio
à fé. Não teríamos necessidade de Deus se não tentássemos algo além de nossa
capacidade. 0 medo é uma reação negativa ante a realidade, a qual deve ser
substituída por fé positiva. Fé é dom. Somente Deus pode concedê-lo. E ele o
oferece aos que possuem ousadia bastante para se atrever a necessitar desse
dom. Mas, se é dado, como podemos recebê-lo? Essa pergunta nos leva ao se-
gundo verbo.
Aquietai-vos! O medo nos deixa frenéticos. A tendência é correr em todas as
direções para escapar ao perigo. Em vez disso, aquietai--vos. Em épocas de medo
não devemos tomar decisões cruciais nem fazer mudanças. Primeiro, permita que
Deus o aquiete até que você esteja novamente certo de sua presença e do que ele
afirmou que iria fazer, e, à luz dessa circunstância, o que ele deseja que você
faça. Necessitamos de perspectiva divina renovada acerca da impossibilidade.
Vede o livramento do Senhor. Isso é expectativa firmada na promessa. Deus
assegurou a Moisés que faria um grande milagre. Moisés, portanto, estava na
expectativa. As palavras hebraicas aqui possuem um sentido tanto retrospectivo
como perspectivo. Ver a salvação do Senhor é olhar para o que o ele já fez no
passado, e para o que ele promete fazer no futuro. Moisés traz à lembrança do
povo as obras espetaculares de Deus, como uma base suficiente para confiarem a
ele o problema presente. Cada milagre em nossas vidas é uma preparação para
maior confiança no futuro. Mas nós os esquecemos com tanta rapidez! O povo de
Israel havia substituído a paz interior pelo pânico. Eles avistaram o mar, à sua
frente, aparentemente impossível, e os exércitos do Faraó atrás. Olharam ao
norte, ao sul, ao leste e ao oeste, mas não olharam para cima — para Deus e a
sua fidelidade!
Deus já fez tanto por mim e você. Estamos do lado de cá do Calvário e do
sepulcro aberto, e contudo queremos saber se Deus pode fazer alguma coisa
acerca da impossibilidade que ele determinou para nos levar a uma comunhão
mais íntima com ele. A ordem de ver a salvação do Senhor apresenta profundas
implicações. No Antigo Testamento, salvação significava segurança, livramento,
desembaraço do sofrimento. No Novo Testamento, através de Jesus Cristo,
significa perdão,
a vida reconciliação,
abundante agora eaceitação, unidade
na eternidade. O que vale a energia dissipada em
pânico à luz da salvação? As únicas coisas que nos podem fazer mal são as que
recusamos apresentar a Deus. Aquietai-vos e vede o que ele fará, porque
pertencemos a ele mediante a salvação. Somos seus amados.
A seguir, calai-vos. Essa ordem indica que Deus pelejará por nós. A
instrução de Moisés era que se mantivessem quietos, enquanto o Senhor lutava
na batalha. Não devemos intrometer-nos em sua maneira de agir! Não raro, em
conflitos, ficamos na defensiva com elaboradas explicações de auto-justificação.
Ou insistimos em dizer a última palavra ou caímos na batalha que o Senhor está
43
vencendo por nós. Imagine o que teria acontecido naquele dia se, ao invés de
esperar em Deus, os israelitas decidissem lutar com Faraó! A nação hebréia já
não existiria. Sem dúvida, há um tempo certo para uma confrontação justa, mas
somente sob a direção e a oportunidade de Deus. Mais tarde os israelitas
cooperaram com o Senhor em muitas batalhas. Mas, desta vez, os egípcios
estavam medindo forças com Deus e não com Israel. Eles eram problema de Deus
e este exibiria seu poder diante do seu povo.
Há um tempo para ficarmos quietos, atentos, e observarmos Deus lutando
a batalha por nós. Algumas das nossas batalhas perdidas jamais foram
ordenadas para nós, ou então eram muito especiais e nelas o Senhor desejou
lutar por nós. Só em silêncio somos capazes de saber a diferença.
Há um tempo certo para agir, mas só podemos conhecê-lo em completo
silêncio. E essa é a palavra final dessa passagem bíblica: Marchai! Ela nos revela
muito acerca de Moisés e de Deus.
Moisés mostrou coragem e ousadia diante do povo. Dentro de si ele
também tremia com a crise que se avolumava. Sua eficiente instrução militar
calculava o movimento e o poderio dos exércitos de Faraó. Moisés olhou para os
seus homens mal preparados e desordenados. Depois olhou para Deus. Sua
oração não foi registrada. De experiências semelhantes em nossas próprias vidas,
podemos pô-la nestas palavras: "Senhor, o que desejas que eu faça? O povo está
em pânico. O temor deles me influencia cada vez mais. Deus, ajuda-me!"
A resposta do Senhor é surpreendente. Ele não se impressiona com a
oração de Moisés. "Por que clamas a mim? Dize aos filhos de Israel que
marchem". Seguir em frente! Mas, Senhor, por que caminho? Estamos bloqueados
por todos os lados!. Estava Deus a provar Moisés? E pouco provável. Na verdade,
ensinava-o que tanto a direção quanto o poder são dados no momento certo.
Nunca adiantado ou atrasado. A forma específica da visão há de ser revelada. O
único movimento da alma é seguir em frente.
Era hora de o Senhor dizer a Moisés como e em que caminho seguir em
frente. Ao povo era ordenado o que deviam fazer mediante a fé; a Moisés, o que
devia fazer em obediência. E Deus assegurou-lhe o que faria em resposta. A vara
de Moisés, que se tornara a vara de Deus, veio a ser um instrumento de poder
magnífico. Determinou o Senhor: "E tu, levanta a tua vara, estende a mão sobre o
mar e divide-o, para que os filhos de Israel passem pelo meio do mar em seco. Eis
que endurecerei o coração dos egípcios para que vos sigam e entrem nele; serei
glorificado em Faraó e em todo o seu exército, nos seus carros e nos seus cava-
leiros" (Êxodo 14:16-17).
A nuvem que havia conduzido o povo a esse lugar de impossibilidade agora
passou para trás deles, separando-os dos egípcios que avançavam com rapidez. A
proteção do Senhor ocultou-os de Faraó por um dia e uma noite. Isso deve ter
sido muito penoso para Faraó, um adorador do deus-sol. As letras do meio de seu
título,
que Rá"ra", indicam
estava dandoser
asele um descendente
ordens naquele dia.divino desse
Iavé, que fezdeus.
o Sol,Mas alguém
estava maior
dando luz
espiritual para guiar o seu povo.
A Escritura dá a entender que isso aconteceu na noite em que Moisés foi
persuadido a seguir as instruções misteriosas do Senhor. "Então Moisés estendeu
a mão sobre o mar, e o Senhor, por um forte vento oriental que soprou toda
aquela noite, fez retirar-se o mar, que se tornou terra seca, e as águas foram
divididas. Os filhos de Israel entraram pelo meio do mar em seco; e as águas lhes
foram qual muro à sua direita e à sua esquerda" (Êxodo 14:21-22).
Os mapas do Egito, anteriores à construção do canal de Suez, mostram
44
uma porção superior do mar dos Juncos, que estendia para o sudoeste. Um vento
oriental da força descrita na Escritura o dividiria, de fato. Uma península perto
de Baal-Zefom em forma de dedo, entrava no mar. Proponho que foi esse o lugar
de srcem da passagem que se estendia ao sudoeste até a outra margem. Era
fundo o bastante para que o mar partido se assemelhasse a paredes, e comprido
o bastante para que os exércitos de Faraó caíssem na armadilha quando o mar se
juntasse.
Vocês sabem o que aconteceu. Mas não permitam que a familiaridade
abrande o impacto. Quando a nuvem de proteção que ocultara Moisés e os
israelitas se levantou, eles estavam bem no meio do mar, próximos da outra
margem. Faraó estava tomado de compulsão e ira cega. Ele bem que poderia ter
esperado e tomado a rota mais longa ao redor do mar. Em vez disso, ordenou que
suas tropas e carruagens entrassem na passagem, tal era a sua confiança
arrogante de que Rã era maior que Iavé. Sua confiança foi contraditada quando o
fundo do mar, que se endurecera por ação milagrosa para os hebreus, tornou-se
macio novamente e cedia às rodas das carruagens.
Quando o exército se encontrava completamente dentro da passagem,
Moisés recebeu ordens claras: "Estende a mão sobre o mar, para que as águas se
voltem sobre os egípcios, sobre os seus carros e sobre os seus cavalarianos"
(Êxodo 14:26). Aconteceu, na íntegra, como o Senhor prometeu. As águas
retornaram e o exército se afogou. O Senhor do impossível salvara o povo de
Israel. "E viu Israel o grande poder que o Senhor exercitara contra os egípcios; e o
povo temeu ao Senhor, e confiaram no Senhor, e em Moisés, seu servo" (Êxodo
14:31).
Iavé, aquele que seria o que seria, o Todo-poderoso criador de tudo, fez o
que prometeu a Moisés — fazer as coisas acontecerem! Deveras! Assim como a
sarça ardente fez com que Moisés se movesse, assim também a divisão do mar
Vermelho despertou Israel para crer que o que Moisés afirmou acerca de Deus era
verdade. Israel foi introduzido no Egito como um povo nômade e desorganizado.
Ao sair de lá, era uma nação através da divisão do mar, e este passou a ser o
símbolo do que Deus pode fazer com as impossibilidades. Nada seria impossível
agora.
O mesmo Deus, que realizou o impossível ao abrir o mar, é o Senhor que
veio e viveu entre nós. Jesus Cristo, ao declarar quem era — Iavé conosco, usou
com ousadia as palavras EU SOU! E o Calvário foi o lugar onde ele partiu as
águas da morte, de modo que pudéssemos atravessar para a vida eterna. Todo o
poder de Deus repousava em Jesus Cristo e esse mesmo poder está à nossa
disposição através de sua presença viva, e sempre presente! Nós temos mais que
uma sarça ardente, mais que uma abertura do mar, mais que alguma lembrança.
O tempo e a recordação se desvanecem, porém o Senhor é o mesmo ontem, hoje e
amanhã. Temos o mesmo amor libertador que abençoou Israel, livrou-nos da es-
cravidão do pecado,
meio de uma cruz, de da
umculpa, davazio
túmulo dúvida
e dointerior e da condenação
poder permanente — tudo por
do Pentecoste!
Empilhe o impossível contra isso! Amontoe as coisas que o impeliram para
um beco-sem-saída e então devolva a Deus tudo o que o faz gritar bem alto:
"Impossível!" Ele está com você. É o raiar do dia. A noite é passada. Estenda a
sua vara, a cruz, sobre o seu mar impossível. As águas se abrirão!

45
CAPÍTULO SEIS
GRAÇA RENOVADA Moisés,
o Líder
Ao cumprimentar uma amiga com um costumeiro "Como vai?" sua face se
anuviou de preocupação e ela respondeu tensa e sinistra: "Irei bem, se tão-
somente conseguir chegar ao final do dia!"
Minha resposta a surpreendeu! "Querida amiga", disse-lhe com compaixão,
"hoje é tudo o que você deve agüentar. Na verdade, hoje é tudo o que você tem!"
Isso a fez rir e afrouxar os problemas daquele dia. A seguir fiz-lhe uma
pergunta a que eu preciso responder para mim mesmo nos dias em que as
tensões se avolumam: "O influxo equivale à vazão?" Ela sabia o que eu queria
dizer, e confessou que havia entrado na batalha daquele dia sem passar algum
tempo com Deus em busca de poder e direção. O melhor que podia fazer era
suportar as provações do dia e aguardar o amanhã. Em seguida, atrevi-me .1
pedir-lhe algo que eu gostaria que meus amigos me pedissem quando me
tornasse sinistro. Incentivei-a a partilhar comigo as pressões e me ofereci para
orar com ela. Para meu espanto, ela demonstrou boa vontade. Perguntamos a
Deus o que ele desejava dela naquele dia e pedimos que lhe desse uma proporção
igual do seu poder para o que ela deveria fazer. Você acertou. Muito mais que
apenas suportar o dia, ela viveu de maneira triunfante, cheia de poder.
A minha mais difícil descoberta acerca da vida abundante foi esta: viver um
dia de cada vez e receber a graça renovada do Senhor para cada dia. Deus, em
sua
viverbondade, dispôs
o presente com oa poder
vida em
da compartimentos diários,
sua presença. Mas de modo
isso não é fácil que podemos
de ouvir nem
de lembrar.
E a verdade mais importante que Deus ensinou a Moisés e a seu povo
durante os primeiros poucos meses no deserto, depois que atravessaram o mar
Vermelho. Esse é o período que vai da entrada no deserto até ao Sinai, onde
receberam os Dez Mandamentos e contemplaram a glória de Deus. Foi uma época
em que o Senhor do impossível ensinou a Moisés e ao seu povo a respeito de sua
graça ilimitada para satisfazer às necessidades diárias. Em todas as crises o
Senhor levantou Moisés como um grande líder, e seu povo como uma grande
nação.
O povo estava mal preparado para os rigores do deserto. A areia e a pedra
calcária transformaram-se em forno sob o sol escaldante. Logo, a água e a comida
chegaram ao fim. Quarenta e cinco dias no deserto e já estavam esfaimados e
encarquilhados. A água de suas bolsas de couro, que apanharam no oásis de
Elim ao longo do caminho, havia acabado. O gado trazido do Egito havia sido
abatido e comido. Os lábios estavam ressequidos e a fome corroía--lhes os
estômagos.
Uma vez mais criticaram a Moisés por separá-los das panelas de carne e do
pão do Egito, e a murmuração deles crescia numa rebelião ameaçadora. Imagine
dois milhões de pessoas cheias de desprezo e ódio, exteriorizando
descontentamento, execrações e vaias! Não mais entoavam louvores
acompanhados de tamborins e címbalos, haviam feito um mês e meio atrás, ao
celebrarem a vitória do Senhor sobre os egípcios. Agora havia impaciência mis-
turada com pânico. A falta de fé tem memória curta. O medo do futuro produz o
46
esquecimento fácil das bênçãos passadas. O povo se tornava inquieto e rebelde. O
que Moisés podia fazer? A única coisa que ele sabia fazer era clamar a Deus.
"Iavé, o que desejas que eu faça?" O que o Senhor lhe disse dá-nos o segredo de
como ele deseja cuidar de nós. Levando-se em consideração as circunstâncias do
deserto assolador, sua promessa foi espantosa.
O Senhor prometeu enviar carne à tarde e pão pela manhã. E aconteceu tal
como ele disse a Moisés que faria. Veja o quadro com os olhos da mente. Ao final
do dia, enquanto o sol escarlate se punha no horizonte, o povo, fraco de fome, se
arrastava para um local de descanso. Sem esperanças, eles se preparavam para
mais uma noite de luta com a angústia da fome, com as gargantas ressequidas, o
que torna difícil dormir.
A princípio, somente alguns a viram. Em seguida, toda a multidão estava
de pé, com os olhos fixos na estranha nuvem escura que aparecia no horizonte e
se movia em sua direção. Logo ouviram um som espantoso. Trinado de
codornizes! Um enorme bando de codornizes voava direto para eles. Seria isso
possível? Sim! Em instantes, como se tentassem desesperadamente percorrer
mais um trecho da sua estabelecida jornada, os pássaros voaram baixo e caíram
exaustos aos pés dos atônitos hebreus. As codornizes, fracas, podiam ser
apanhadas com facilidade. O povo mais que depressa preparou-se para assá-las
em fogueiras. Enquanto a carne chiava ao fogo, a gordura inflamava as chamas
com estalidos e centenas de faíscas enchiam de pontos luminosos a escuridão do
deserto. Comeram com avidez, e mais uma vez cantaram louvores a Deus. Agora
podiam dormir.
As pesquisas sobre os hábitos migratórios de codornizes no Oriente Médio
tornam o milagre da provisão bem mais emocionante. A cada outono, os pássaros
voam da Europa central para a Turquia, onde se preparam para a travessia do
Mediterrâneo. Atravessam o mar com um único e rápido vôo. Ao se aproximarem
da terra eles diminuem a altitude, mas mantêm alta velocidade. Tão logo
alcançam o litoral, pousam exaustos e completamente esgotados. Por horas ficam
sem se mover, enquanto recuperam as forças. Durante anos, os beduínos que
viviam próximos do litoral recolhiam a presa fácil. Recentemente passou-se uma
lei proibindo pegar codornizes em armadilhas.
O fato espantoso acerca do relato bíblico da provisão das codornizes é que
as aves devem ter voado até o deserto do Sinai, onde se tomaram a fonte de
sobrevivência para os hebreus famintos. Como foi que as codornizes continuaram
a voar bem mais além de sua já exaustiva jornada aérea? Somente o Senhor que
as criou teria sido capaz de estimulá-las a prosseguir, como a bênção dele para o
seu povo em necessidade.
Despertando o povo pela manhã, ficou assombrado com outra evidência do
cuidado amoroso do Senhor. Por toda a terra havia uma substância semelhante a
semente de coentro, fina como a geada; de cor amarela e aparência resinosa,
semelhante ao bdélio. "maná".
que vem o vocábulo O povo clamou:
Quando"Manhu!", que significa:
eles o provaram, sabia"Que é isto?"
a mel ou aEóleo
daí
fresco. Descobriram que podiam moê-lo, socá-lo, e, depois de cozido, transformá-
lo em bolos.
Moisés se apressou a dizer ao povo que o Senhor lhes providenciara pão
dos céus. E também instruiu com todo o cuidado acerca do que o Senhor lhe
havia dito a respeito do maná. Este lhes seria dado a cada manhã. Eles deviam
colher apenas o suficiente para cada dia e para dois dias na véspera do sábado.
Sempre que o povo tentava guardar mais de uma provisão diária, exceto por
ocasião do sábado, o maná se tornava rançoso e cheio de bichos. A mensagem era
47
clara: o Senhor proveria diariamente. Eles teriam de aceitar a sua bênção
renovada a cada dia. O maná não ficaria velho.
A mesma verdade se aplica a nós. Há graça renovada para cada novo dia.
Não podemos viver da inspiração de ontem. À medida que o Senhor nos dá cada
novo dia, ele nos mostra o caminho. Antigas experiências de sua graça não são
suficientes para hoje. Carecemos, a cada dia, de nova direção e novo poder.
Quando oramos e estudamos as Escrituras a cada manhã, o Senhor nos dá
exatamente o necessário para aquele dia. Precisamos renunciar a temores,
frustrações, problemas e perplexidades, e confiar nele completamente. Ele nos
concederá poder, discernimento, sabedoria e plena comunhão com ele.
Moisés e o povo tiveram de aprender isso através da peregrinação no
deserto. E Deus foi fiel. Quanto mais penetravam no deserto, tanto mais tinham
de confiar nele a cada passo do caminho. Não demorou muito para que os
amalequitas, descendentes de Esaú e parentes próximos dos israelitas, os
atacassem. O receio de perder seus pastos para as tribos invasoras os tornava
ferozes em seus ataques. Os israelitas não estavam preparados para a guerra. O
Senhor havia lutado por eles no mar Vermelho, mas agora eles tinham de
aprender a lutar com a ajuda divina. Ele deu a Moisés a fórmula. Tudo o que ele
tinha de fazer era erguer no ar sua vara santa, e os exércitos de Israel
prevaleceriam. A mesma vara que abriu o mar Vermelho era o símbolo, escolhido
pelo Senhor, de sua presença na batalha. Mas o povo precisava cooperar com o
Senhor e uns com os outros. Deus os ensinou que deviam depender uns dos
outros e apoiar-se mutuamente para que a sua bênção pudesse fluir.
Enquanto Moisés erguia a sua vara, Israel vencia; mas quando ele abaixava
os braços, os soldados de Amaleque venciam. Como a batalha se estendeu por
longo tempo, Moisés não agüentou manter a sua vara erguida. Ele percebeu que
dependia não só de Deus, mas também de Arão e de Hur. Estes se dispuseram a
manter seus braços levantados, enquanto Josué conduzia o exército israelita à
vitória. Moisés aprendeu que ser grande é estar disposto a receber força dos
outros, da mesma maneira como a recebia do Senhor.
Jamais nos coube realizar algo sozinhos. Precisamos uns dos outros para
vencer as batalhas da vida. Nosso ministério mútuo requer oração e
envolvimento. O Senhor determinou que suas bênçãos serão liberadas quando
orarmos. Ele deseja que seus filhos se identifiquem como família, na qualidade de
irmãos e irmãs em sua família eterna. Essa é a razão por que muitas vezes ele
retém o que tem de melhor, até orarmos por suas intervenções. Eu não poderia
chegar ao fim do dia sem o conhecimento de que as pessoas, através de suas
orações, estão erguendo os meus braços na batalha. Mas a oração deve ser
completada com o envolvimento com as pessoas e com suas lutas. Arão e Hur
levantaram os braços de Moisés, e Josué lutou como o general do exército. Todos
foram indispensáveis à vitória. E também o somos nós. A chave é buscar a
orientação
deseja que de Deus para
façamos para expressar
saber quem ele amor.
o seu colocouA em nossaé do
batalha agenda e o mas
Senhor, que ele
ele
prefere vencer através de nossa cooperação. Moisés tinha de descobrir isso
repetidas vezes.
Esses dois eventos, ocorridos entre a travessia do mar e a chegada ao
monte Sinai, nos ensinam muito a respeito do Senhor do impossível e do modo
como ele opera em nossas vidas. Ele concede a sua graça em porções diárias e
precisamos uns dos outros para nos apropriarmos de seu poder.
Toda manhã de domingo, os presbíteros de minha igreja se reúnem em meu
escritório para orarmos juntos. Um pouco antes da oração, um deles pergunta:
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"Lloyd, de que você precisa hoje?" A pergunta focaliza a bênção, em particular, de
que eu preciso nesse domingo. Fico espantado diante da mudança que se opera
nas minhas necessidades. O que foi necessário no domingo anterior pode não ser
a necessidade do domingo seguinte. Às vezes preciso de forças físicas após uma
semana exaustiva. Outras vezes preciso confessar problemas que me incomodam,
ou então necessito de coragem e segurança para expor as Escrituras segundo as
descobertas de minha própria vida. Depois que especifico a graça renovada de
que necessito, os presbíteros começam a orar. Eles conversam com Deus de um
modo franco e espontâneo. Não se trata de um simples e comum pedido:
"Abençoe o culto, Senhor", mas, pelo contrário, uma intercessão direta por uma
necessidade específica. Dessa forma, antes e durante a pregação, os presbíteros
erguem os meus braços.
Sempre que recebo um cumprimento após um sermão, e as pessoas dizem
como o Senhor respondeu às suas necessidades, apresso-me em explicar que a
honra se deve à ordem de Arão e de Hur, constituída dos presbíteros que oram e
que são fiéis ao clamar pelo melhor que Deus tem a cada domingo. A pergunta
que me fazem é aquela que necessito ouvir não só no domingo, mas também
todos os dias da semana. De um modo mais incisivo é a pergunta que o Senhor
me faz toda manhã, quando começo minhas orações para aquele dia.
Ao escrever este capítulo acerca da graça renovada e da interdependência
na família de Deus, vi-me forçado de novo a enfrentar uma fraqueza na minha
vida. Detesto admitir fraquezas! Gostaria de poder viver a vida cristã para o
Senhor, mas não pelo seu poder. E gostaria de poder ficar livre da necessidade de
constantes orações. Meu condicionamento, quando criança, deu grande
prioridade à autoconfiança e à independência. Quando adolescente, meu trei-
namento foi para liderar, não para ser liderado. Por anos, depois que me tornei
ministro do evangelho, sentia que seria um mau exemplo se admitisse minhas
próprias necessidades. Quando faço um retrospecto de todo o poder que o Senhor
me ofereceu e de todo o estímulo que as pessoas me deram aos quais resisti por
causa do orgulho, fico alarmado com o que perdi. Sou grato ao Senhor por me
ajudar a acabar com essa falsa independência.
Um dia, em minha primeira congregação, minhas forças se acabaram.
Exausto ao extremo física, emocional e espiritualmente, clamei ao Senhor por
forças. Sua resposta espantou-me. "Diga aos presbíteros de sua igreja como você
se sente e peça-lhes que orem com você." Não foi fácil obedecer a essa ordem.
Revelar minha fraqueza? O que pensariam eles? Perderiam a confiança que
tinham em mim? A necessidade era tão grande que pus essas questões de lado e
contei aos presbíteros o quanto eu precisava deles. A reação deles foi
surpreendente. Sentiram que eu os amava e confiava neles. Não mais mantidos à
distância, eles se puseram a organizar um estudo bíblico semanal, um encontro
de oração e participação, além das reuniões administrativas. Ao admitir minha
necessidade, eles se
eles me amassem, sentiram livres
tomaram-se para falar
receptivos acerca
ao meu amordas suas. Ao permitir
e liderança. A tensãoque
de
ser perfeito se desfez. Um autêntico avivamento fluiu através da reunião e
marcou o início de um despertamento espiritual na igreja inteira.
Mediante aquela nova liberdade, descobri o segredo da exposição dinâmica
da Escritura. Além de erudição cuidadosa, ousei ser pessoal acerca de minha
própria peregrinação. O ímpeto de cada mensagem era exemplificado não só por
citações de eruditos, mas também pelo que eu experimentara ou precisava
experimentar. Isso revolucionou a minha pregação, que se tomou um diálogo com
o meu povo. Jamais me esquecerei da reação de um homem: "O que aconteceu a
49
você? Já não o sinto pregando para mim. Você deu-me entrada em seu coração e
agora somos companheiros de uma grande aventura." Isso aconteceu anos atrás,
mas o que descobri continua a ser uma fonte de alegria no contato com as
pessoas. Sem dúvida, em certas ocasiões sou de difícil tato e me recolho à minha
vida privada. Mas não por muito tempo. Agora sei quando tal acontece e percebo
que bloqueei a graça renovada de Deus e a ajuda de outros. A aflição de tentar
ser adequado me impele de volta à oração e comunhão sincera com os outros.
O Senhor do impossível deseja que descubramos o que ele ensinou ao povo
de Israel. Como mencionei no início deste capítulo, tudo o que temos é o dia de
hoje. Nosso desafio é vivê-lo como se fosse o nosso último dia, e vivê-lo em toda a
plenitude. O Senhor nos oferece graça renovada para as nossas necessidades
específicas, e amigos fiéis que continuem a nos incentivar. Conte a ele a sua
necessidade. Peça aos outros que intercedam por você. Não dependa da
inspiração de ontem ou do discernimento da última semana. O novo maná está à
sua disposição, e Arão e Hur estão ao seu lado.

50
CAPÍTULO SETE
0 MILAGRE FUNDAMENTAL
Moisés e a Presença de Deus
Morando no Sul da Califórnia ouço, com freqüência, as pessoas declarar:
"Vou até às montanhas para fugir de tudo isso!" A maioria, contudo, descobre que
o único problema que não pode deixar no vale são eles próprios. A razão de
alguns se sentirem renovados após um período de quietude e descanso nas
montanhas é prioridades
necessidades, que deram eao SenhorRetornam
objetivos. a oportunidade para
ao vale da lidar
vida comcom
novoas suase
poder
propósito.
Recentemente, um membro da minha igreja aplicou o conceito "ir às
montanhas para fugir de tudo isso" de um modo bem diferente. Disse ele: "Vou às
montanhas por alguns dias, não para escapar da vida, mas para apreciar de
modo mais satisfatório as coisas maravilhosas que vêm acontecendo na minha
vida." Esse homem é um grande guerreiro da oração, e, não muito tempo atrás,
ele recebeu, através de suas orações, uma sucessão de milagres pela intervenção
de Deus nas vidas das pessoas. Foi-lhe confiado o dom de curar as mágoas
dessas pessoas. Não decorreu muito tempo até que se visse sem fôlego em seu
ministério de distribuir a bênção do Senhor. Através da oração ele administrou
cura a problemas de relacionamento, físico e psicológico. Ele partilhou um
discernimento importante: "O tempo que eu preciso para ficar em silêncio não é
logo após o fracasso e a fadiga, mas após o sucesso. Sou tentado a esquecer-me
de onde ele vem. Aprendi que as épocas mais positivas no ministério com as
pessoas são um prelúdio para uma experiência mais profunda com o Senhor em
minha própria vida."
Em essência, isso é o que o Senhor desejava fazer com Moisés. O líder
vinha sendo submetido a desafios exigentes e exaustivos.

Também fora testemunha de intervenções espetaculares do Senhor do


impossível. O livramento dos israelitas do Egito, a abertura extraordinária do
mar, a vinda das codornizes e do maná e a vitória contra os amalequitas — tudo
isso o deixou meio tonto de admiração e espanto. A maior impossibilidade se
estendia à frente. Corria entre o povo um adágio segundo o qual ninguém jamais
viu a Deus e viveu. Agora, depois de demonstrar o que podia fazer, Deus queria
revelar-se ainda mais a Moisés. Com esse intento, ele conduziu o libertador ao
monte Sinai para uma libertação de sua própria alma. O Senhor sabia que a
necessidade mais premente de Moisés não era de um milagre, mas do milagre
fundamental — conhecê-lo em pessoa.
Em preparação para escrever este livro perguntei a um grupo de pessoas o
que criam fosse o maior milagre do Senhor do impossível em suas vidas. Um
homem declarou confiante, em alto e bom som, com brilho em sua face: "Não há
dúvida em minha mente", disse ele, e acrescentou: "O maior milagre para mim é
que eu posso conhecê-lo. Qualquer coisa mais que ele faça em minhas
impossibilidades é uma recompensa extra. Só em poder conversar com o Senhor
do Universo, experimentar o seu amor e ser guiado por ele, é maravilha suficiente
para mim. Pode parecer impossível, mas acontece todo o dia!" Tantas pessoas
anseiam por essa alegria. Por quê?
Não podemos conhecer a Deus até que ele decida revelar-se. Reclusos em
51
nós mesmos, nossas mentes se fecham, nossas vontades ficam cativas e nossas
emoções impedidas. Somente quando ele se aproxima de nós é que desejamos ir a
ele. O desejo de conhecer a Deus é o seu presente. Fazendo um retrospecto da
minha conversão, vejo que foi dele a iniciativa, do início ao fim. Hoje, depois de
tantos anos, posso afirmar com sinceridade que ele sempre foi o iniciador. Ele
principia a oração estimulando o desejo de orar. Sinto ânsia de conhecer a sua
vontade porque ele tem pronta direção para me dar. Sinto a expectativa de suas
intervenções porque ele está pronto a conceder discernimento, sabedoria ou a
solução de algum problema. E, em tudo isso, o próprio Senhor é o seu melhor
presente. Desejar conhecer a Deus pelo que ele é e não pelo que desejamos dele, é
preparação para a comunhão com ele para a qual nascemos.
Esse é o presente que o Senhor quis dar a Moisés e ao povo de Israel no
Sinai. Ele convidou o libertador a subir ao mais alto da montanha. A cada etapa
da subida Moisés aprendia mais acerca do misterioso lave, cujo poder se
manifestara de maneira tão espetacular em sua vida. O Senhor revelou sua
santidade nas densas trevas da nuvem, no fogo, nos relâmpagos e nos trovões.
Em seguida, mostrou sua justiça ao dar ao povo os Dez Mandamentos, como
base de um relacionamento correto com ele e entre eles. Sua compaixão pela nova
nação, ainda inexperiente em noções fundamentais de saúde, asseio e na
gerência da vida, se manifestava através de regulamentos específicos para o viver
diário. Em encontros repetidos com Moisés, o Senhor deu ao povo festas nas
quais pudessem expressar sua gratidão a ele como fonte de prosperidade na terra
prometida. Deus ensinou o povo a expiar com sacrifícios os pecados deles e a
edificar um tabernáculo onde ele pudesse ser adorado. A seguir, ele empenhou
sua perene fidelidade ã aliança, prometendo-lhes ser o seu Deus e abençoá-los
como seu povo. Contudo, Moisés ansiava conhecer melhor a Deus, de maneira
mais pessoal.
Enquanto Moisés estava na montanha e era conduzido a um conhecimento
mais profundo acerca de Deus, o povo pecava ao forjar e adorar um bezerro de
ouro. Moisés aprendeu, na experiência, o significado de uma palavra: expiação. O
Senhor fez uso dela ao tratar das ofertas de sacrifício que o povo devia apresentar
pelos pecados. Num momento de angústia cruciante pelo que o povo havia feito,
Moisés ofereceu-se a si mesmo como sacrifício pelo pecado do povo. O Senhor não
se impressionou com a sua oferta, pois ele mesmo, o Senhor, iria lidar com o
pecado do povo. A tarefa de Moisés era conduzi-los e não ser um sacrifício substi-
tutivo. Seu amor não era suficiente. Somente Deus poderia expiar a idolatria
deles.
Esses foram meses tempestuosos, nos quais Moisés chegou a uma
compreensão mais clara e gradual de seu Deus. Quando o líder estava preparado,
o Senhor mostrou-lhe mais de si mesmo. "Falava o Senhor a Moisés face a face,
como qualquer fala a seu amigo" (Êxodo 33:11). Quando o Senhor disse a Moisés
que era hora
começou de deixar Seu
a inquietar-se. o Sinai e partir
desejo para Canaã,
de conhecer a Deusaera
terra
maiorprometida, ele
e ele temia
deixar a montanha. Isso resultou numa oração cuja resposta veio a ser uma das
maiores revelações da natureza do Senhor do impossível. O que aconteceu traz
tremendas implicações para nós hoje. O Senhor deseja dar-nos o que deu a
Moisés, isto é, a garantia da sua presença e a dádiva da sua glória.
À semelhança de muitas de nossas orações, Moisés conversou com Deus
até que soubesse o que desejava dizer-lhe. Ele começou com uma queixa: "Tu me
dizes: Faze subir este povo, porém, não me deste saber a quem hás de enviar
comigo; contudo disseste: Conheço-te pelo teu nome, também achaste graça aos
52
meus olhos. Agora, pois, se achei graça aos teus olhos, rogo-te que me faças
saber neste momento o teu caminho, para que eu te conheça, e ache graça aos
teus olhos; e considera que esta nação é teu povo" (Êxodo 33:12-13).
Chegara o momento sublime. O Senhor havia dado a Moisés a liberdade de
abrir-lhe o coração de par em par. Note como ele passou das reclamações ao
desejo da comunhão. O Senhor permitiu que ele se aprofundasse em cada pedido.
Moisés desejava conhecer ao seu Deus. Possuímos o mesmo anseio. Queremos
derrubar todas as barreiras que levantamos a fim de deixar que Deus nos
conheça como somos. Mas também ansiámos conhecê-lo tal como ele é.
A resposta do Senhor é uma das maiores promessas do Antigo Testamento.
Muitos, através dos séculos, têm arriscado nela as suas vidas; mártires têm
enfrentado a morte com ela em seus lábios, e os angustiados têm-se agarrado a
ela como a sua única esperança. O Senhor declarou: "A minha presença irá
contigo, e eu te darei descanso" (Êxodo 33:14). Minha presença! Presença no
hebraico quer dizer "face". A face do Senhor com o seu olhar vigilante não
abandonaria o seu povo. Ele estaria com eles.
Moisés respondeu de uma maneira muito humana: "Se a tua presença não
vai comigo, não nos faças subir deste lugar. Pois como se há de saber que
achamos graça aos teus olhos, eu e o teu povo? não é porventura, em andares
conosco, de maneira que somos separados, eu e o teu povo, de todos os povos da
terra?" (Êxodo 33:15-16). A compreensão de Moisés acerca de seu Deus se alar-
gava. Ele não era somente uma divindade local do Sinai. Moisés e o povo podiam
partir e fazer jus às promessas do Senhor como um presente para o futuro deles.
Nada tem significado sem Deus. Nenhum lugar é seguro ou satisfatório sem ele.
Agora Moisés não só conhecia o poder, a santidade, a justiça, a compaixão e o
perdão de Iave, mas também estava convencido da sua onipresença.

Por longo tempo Moisés ocultara o seu desejo mais profundo, que os meses
no Sinai só serviram para tornar mais agudo e acentuado. Desejava contá-lo a
Deus, mas faltava-lhe coragem. Quando o Senhor garantiu-lhe a sua presença,
disse conhecê-lo pelo nome e que achara graça nele, Moisés ousou expressar o
anseio do seu coração, o qual vinha crescendo desde a sarça ardente: "Rogo-te
que me mostres a tua glória".
"Glória" no hebraico é cabod. Quando usada para descrever uma pessoa,
significava sua riqueza, estatura, posição social, valor e poder. O que desejava
Moisés ao pedir para ver a glória de Deus? Desejava ver a presença de Deus em
uma manifestação física? Não, mais que isso. O que ele pedia era um encontro e
uma experiência com a natureza real de Deus. De certo modo, ele declarava: "Se-
nhor, desejo conhecer-te melhor, amar-te pelo que és, concretizar uma intimidade
de coração-a-coração." Audácia? Blasfêmia? O Senhor mesmo havia instigado e
iniciado o desejo, e isso nos dá a mais preciosa de todas as lições. Deus não só
deseja
cultuemosnose conhecer, mas deseja
adoremos como também
nosso Deus. Esseque nós o por
é o motivo conheçamos,
que ele nosamemos,
criou. À
luz de tudo isso, nossa oração mais profunda deve ser: "Senhor, mostra-nos a tua
glória!" Você já pediu para ver a glória de Deus? É o sinal certo de que ele vem
trabalhando em nós para nos conduzir à entrada do santo dos santos, em seu
próprio coração. Há um vazio no coração de Deus que somente você e eu
podemos preencher. Ele anela que voltemos para casa e o aceitemos, como a
Alguém mais importante que qualquer pessoa ou coisa.
Ao responder ao espantoso pedido de Moisés, o Senhor indica o que quer
dizer por sua glória: "Farei passar toda a minha bondade diante de ti, e te
53
proclamarei o nome do Senhor; terei misericórdia de quem eu tiver misericórdia,
e me compadecerei de quem eu me compadecer" (Êxodo 33:19). Aí está. A
natureza essencial de Deus é bondade, poder capacitador e graça.
A palavra "bondade" no hebraico significa "constância" e "coerência".
Bondade é a natureza fidedigna, confiável e imutável de Deus; a mesma ontem,
hoje e eternamente. Em um mundo de mudanças, podemos contar com um Deus
que é o que disse ser. Sua mente não flutua à nossa volta. Essa bondade se
expressa na coerência de seu caráter. Seu nome é o seu caráter. E este se revela
em seu poder para criar e recriar. Seu nome é Iavé, que, conforme já aprendemos,
significa ser ele o poder fundamental do Universo. Mas poder para quê? Esta
pergunta nos leva a outra palavra que o Senhor empregou para definir sua glória.
"Terei misericórdia". Misericórdia é o amor eterno, ilimitado e imutável de Deus.
Não depende de nosso desempenho nem é estimulado por nossa suficiência. Nós
não a merecemos e não podemos conquistá-la. Deus ama porque é amor. Sua
misericórdia é o que ele faz para nos alcançar, perdoar e justificar.
Nossas mentes saltam de Moisés para Jesus, do Sinai para o Calvário.
Cristo é a glória de Deus que podemos ver, contemplar, experimentar e receber.
Tudo o que Deus esclareceu a Moisés acerca da sua glória se manifesta em
Cristo. Paulo expressou essa verdade com sublime retórica, que jamais cessa de
enlevar a nossa alma: "De trevas resplandecerá luz —, ele mesmo resplandeceu
em nossos corações, para iluminação do conhecimento da glória de Deus na face
de Cristo" (2 Coríntios 4:6). O apóstolo fez esta afirmação doxológica após
descrever a experiência que Moisés teve da glória de Deus no Sinai. Moisés
contemplou a glória do Senhor e, ao retornar ao povo, cobriu sua face com um
véu. O véu foi necessário porque o brilho da face de Moisés, produzido pela con-
templação do Senhor, se desvanecia. Paulo desejava que os primeiros cristãos
percebessem que Cristo é a glória inextinguível de Deus continuamente com eles.
Ele disse aos colossenses: "Cristo em vós, a esperança da glória" (1:27). Não
somente contemplamos a Cristo; ele vem para dentro de nós. A bondade, o poder
e a graça do Senhor são implantados em nosso íntimo. Tornamo-nos semelhantes
a nosso Senhor!
Agora o pedido de Moisés: "mostra-me a tua glória" assume profundas
implicações. O Senhor não somente promete ir conosco, mas também deseja viver
dentro de nós. Pode tal coisa acontecer? Agora você percebe por que conhecer ao
Senhor é, na verdade, a maior impossibilidade da vida — exceto quando ele nos
escolhe, nos chama, nos condiciona com uma fome e sede dele.
Para tornar possível esse conhecimento, ele próprio veio como mediador.
Fale das impossibilidades! Foi com elas que ele se defrontou no mundo caído,
hostil e rebelde. Somente uma expiação universal poderia consumar a
reconciliação do homem com Deus. Foi o mesmo poder revelado nos milagres de
Cristo e esclarecido em sua mensagem que derrotou na cruz a morte e todo o
poder do mal
Impossível? Sim,na cruz.
mas Esse do
o Senhor poder ressuscitou
impossível a além
o fez! E, Jesusdisso,
dentre os mortos.
o mesmo poder
voltou para encher os dispostos seguidores de Jesus no cenáculo. Nasceu a igreja
e uma nova humanidade. Com o poder de habitar nas pessoas, o Senhor as
regenerou e as transformou em novas criaturas, capacitando-as a realizar o que
ele fez como Cristo encarnado, e assombrou o mundo com o resplendor da sua
glória na face dos apóstolos. E o que aconteceu então pode acontecer a mim e a
você. Quando fazemos a oração de Moisés: "Mostra-me a tua glória!", o Senhor
nos dá mais que uma visão de um Senhor distante que se desvanece. Ela é um
convite para que o Senhor da glória estabeleça residência dentro de nós.
54
Muitas de nossas conversas acerca das impossibilidades da vida enfocam
os problemas e as perplexidades como imperfeição humana. Porém, quando
seguimos Moisés até ao Sinai, abre-se diante de nós uma nova perspectiva. Para
ser exato, precisamos, não de uma intervenção em nossos problemas, mas de
uma efusão do Senhor do impossível em nossa pessoa interior. Moisés recebeu a
promessa de que o Senhor estaria com ele; nós temos a promessa de que ele fará
de nós o seu lar. Não é ali ao lado, acima, ao redor, mas dentro!
Apresentei essa promessa com detalhes porque ela alarga a nossa
compreensão de que o mesmo Senhor que interveio nas necessidades do povo de
Israel é aquele que desfez as impossibilidades do pecado, da morte e da recriação
da natureza humana, quando viveu entre nós como o Cristo. Cada evento
prenuncia a derrota final do impossível.
Ficamos a imaginar por que reivindicamos tão pouco da glória que nos é
oferecida. Continuamos a lutar mediante nossas próprias energias. E por isso que
podemos nos identificar com a relutância de Israel em crer que a presença do
Senhor estaria com eles. Conhecemos bem mais que eles da glória de Deus.
Ainda assim, receamos reivindicar a sua oferta de poder. No próximo capítulo
atentaremos para as causas mais profundas desse medo.

55
CAPÍTULO OITO
MAIS TARDE
Israel na Fronteira de Canãa
Um amigo meu termina cada telefonema com um abrupto: "Ok, certo. . .
mais tarde!", e desliga. Estava eu, outro dia, engalfinhado com alguns problemas
que envolviam toda a minha alma nas minhas orações, e por isso pedia, como
resposta, uma renovada dedicação ao Senhor. De repente, a frase surgiu em
minha mente.
Senhor me haviaDesejava
colocado.terminar a oração
Meu impulso era eadiar
fugirasdadecisões
difícil situação emSenhor:
e dizer ao que o
"Mais tarde!"
A menos que eu esteja enganado, cada um de nós se encontra em luta com
alguma decisão ou resposta que nos inclina a desejar pôr um fim ao nosso
diálogo com o Senhor mediante um: "Mais tarde, Senhor, muito mais tarde!" Qual
é a sua luta? Que desafio você vem adiando? Que promessa você vem adiando
cumprir? Que oportunidade tem você arquivado para o dia seguinte, que deveria
ser aproveitada hoje?
"Mais tarde" era uma expressão que Agostinho usava constantemente,
enquanto mantinha Deus longe de si. "E quando vós, de todos os modos,
mostráveis a mim a veracidade de vossas palavras, eu, convencido pela verdade,
nada tinha com que responder, a não ser com aquelas palavras monótonas e
sonolentas: 'logo, logo', 'depois', 'deixe-me apenas por um pouco'". Identificamo-
nos com Agostinho. Temos frito o mesmo em relação ã decisão básica de
deixarmos Deus nos amar e dirigir nossas vidas, e também em milhares de
outras coisas que sabemos ser da sua vontade. Porém, mais perigoso que tudo,
dizemos "mais tarde" para o Senhor quando ele finalmente nos abre uma
oportunidade pela qual temos orado há muito. Recuamos, com freqüência,
receosos de agarrar o presente que ele nos oferece e pelo qual temos orado.

Mark Twain deu um conselho que aceitamos sem pestanejar: "Nunca deixe
para amanhã o que você pode deixar para depois de amanhã". Esse é um
conselho perigoso. Sabemos disso. Contudo, todos nós o aplicamos, quase como
uma doutrina, adiando até algum distante amanhã as urgentes oportunidades
que o Senhor nos oferece.
A esse tipo de vida chama-se de procrastinação. "Procrastinação" vem de
duas raízes latinas: pro, que significa "para adiante"; e eras, que significa
"amanhã". Procrastinar é prorrogar para amanhã o que o Senhor deseja realizar
hoje — agora! E o ladrão do tempo que rouba hoje a liberdade e enche de
frustração o amanhã. Hesídio estava certo: "O homem que procrastina está
sempre em luta com a ruína". E Erasmo foi ainda mais incisivo: "A procrastinação
traz perda, atraso e perigo". Acima de tudo, a procrastinação impede a realização
das promessas de Deus. O estranho mistério de nossa natureza obstinada
consiste em resistirmos às promessas de vida abundante — paz, alegria e bênção
— ao adiar, para um futuro distante, a decisão ou ação que Deus programou
para hoje. E muitas vezes o fazemos com razões belamente formuladas e com
sutis evasivas. Mas uma frase resume a nossa atitude: Mais tardei
Foi essa a doença que acometeu o povo de Israel em proporções virulentas
durante os catorze meses do êxodo. Três meses da saída do Egito levaram-nos ao
deserto do Sinai. Aí, durante nove meses, o Senhor deu-lhes os Dez
56
Mandamentos, as instruções para a construção do tabernáculo e o sistema de
sacrifício. Então disse o Senhor: "Tempo bastante haveis estado neste monte"
(Deuteronômio 1:6). De acordo com Números 10:11, foi no vigésimo dia do se-
gundo mês do segundo ano, depois de deixarem o Egito, que a nuvem se moveu
dali, convocando o povo para avançar e tomar posse de Canaã, a terra prometida.
Foram conduzidos para o norte até o deserto de Para, em Cades, nos limites de
Canaã. Ali o Senhor disse a Moisés que enviasse doze homens para espiar a terra.
A ordem não era determinar a possibilidade ou não de invadir a terra, mas
assegurar ao povo que as promessas, que vinham soando em seus corações havia
catorze meses, em breve se tornariam realidade. "Envia homens que espiem a
terra de Canaã, que eu hei de dar aos filhos de Israel (Números 13:2), era a
favorável reafirmação que o Senhor fazia de sua promessa. O propósito do
reconhecimento era encorajar o povo.

Moisés não procrastinou. Selecionou doze homens fortes e valorosos, um de


cada tribo, e os enviou ao Neguebe, a parte rochosa no Sul da Palestina, uma
região montanhosa. Demoraram-se quarenta dias em sua missão. Ao retomarem,
deram dois diferentes relatórios de seu reconhecimento. O relatório da maioria
era negativo e estava impregnado de temor e pânico. O relatório da minoria, dado
por Calebe e Josué, era corajoso e ousado. Calebe atrai a nossa atenção e
admiração quando diz: "Eia! subamos, e possuamos a terra, porque certamente
prevaleceremos contra ela" (Números 13:30). Admiramos sua prontidão, ousadia
e intrepidez. Ele mereceu um dos mais honrosos elogios que o Senhor já deu a
uma pessoa: "Porém o meu servo Calebe, visto que nele houve outro espírito, e
perseverou em seguir-me, eu o farei entrar na terra que espiou, e a sua
descendência a possuirá" (Números 14:24). O espírito de Calebe estava cheio do
Espírito do Senhor e ele seguia ao Senhor sem discussão. Mais tarde, Josué fez
um retrospecto da carreira de Calebe, e fez soar a mesma nota de louvor: "Visto
que perseverara em seguir ao Senhor Deus de Israel" (Josué 14:14).
É lamentável que o relatório de Calebe, que representava a minoria, não
tivesse saído vencedor. A exposição da maioria temerosa atraiu a atenção do
povo. Eles adiaram a aceitação da promessa de Deus. O capítulo treze de
Números apresenta quatro coisas perturbadoras acerca da causa e da cura da
doença espiritual da procrastinação. Elas alargam a nossa compreensão desse
evento estratégico na experiência das pessoas com o Senhor do impossível. O
relato adquire um cunho pessoal, pois a terra prometida de bênçãos antecipadas
de nosso Senhor só será nossa se ousarmos avançar e possuí-la.
Em primeiro lugar, procrastinar é questionar no escuro o que Deus prometeu
em claro. A promessa do Senhor não havia mudado enquanto o povo esteve
acampado na fronteira da bênção. No silêncio da oração, o Senhor afirmava a
Moisés e ao povo, repetidas vezes, que ele seria fiel em dar-lhes a terra prometida.
O relato dos
prometido dezentrar
para espiasnanegou a veracidade
sua posse. dessa promessa
Eles deixaram o Senhor,e oignorou o poder
fator primário,
fora da equação da vitória. Sim, a terra manava leite e mel, como o Senhor e
Moisés haviam dito. Mas havia grandes perigos. O povo que ali vivia era forte, e
as cidades fortificadas. E o mais assustador de tudo é que haviam visto os filhos
de Enaque, "o povo do pescoço", assim chamado por causa de seus pescoços
longos e proporções gigantescas. Esses foram os antecessores de Golias,
mercenários dos amalequitas e mais tarde dos filisteus. "É muito arriscado e por
demais perigoso; as chances estão contra nós", disseram os dez furtivos espias. E
prosseguiram a apresentar fatos de enregelar o sangue, confirmando a
57
procrastinação de Israel: "A terra, pelo meio da qual passamos a espiar, é terra
que devora os seus moradores; e todo o povo que vimos nela são homens de
grande estatura" (Números 13:32).
A procrastinação é, geralmente, a alternativa preferida do covarde. Todos
sabemos disso. Quando ignoramos a presença e o poder do Senhor na análise de
um desafio, o pânico nos atinge e adiamos uma ação ou decisão importante. O
que Deus esclareceu na luz, questionamos na escuridão. Coragem é o temor que
fez suas orações. Procrastinação é o temor que esqueceu o prometido nas
orações.
Duvidar do que sabemos ser a vontade de Deus é um grande mal. Ele é o
mesmo ontem, hoje e amanhã. O Senhor nunca volta atrás em sua palavra. Ele
não muda a sua estratégia nem remove o seu poder de cumpri-la. Nosso Deus
deseja dar-nos poder permanente quando as coisas ficam difíceis. Certo escritor
traçou o perfil de um editor bem conhecido, ao declarar: "Ele vivia no extremo da
preocupação e do trabalho". Que posição imprópria em relação à vida! Deus,
trabalho, disposição e esperança ficariam bem melhor. Qual o nosso endereço?
Quais os ingredientes de vida para nós? Eu gostaria de viver na esquina da fé, da
esperança e do amor. E você? Cristo não é só a verdade e a vida para nós. Ele é
também o caminho! Ele nos conduz à nossa terra prometida de vida abundante
agora, e de vida eterna para sempre. Agora é o momento de começar a seguir o
Caminho. Não amanhã. William Temple, certa vez, afirmou acerca do Caminho:
"Não é necessário procurarmos o seu ponto de partida. Ele começa onde
estamos!"
A procrastinação nos deixa em ponto morto. Ela nos imobiliza enquanto
tentamos parar a vida por algum tempo. Mas a vida segue o seu curso, passando
pelo procrastinador, deixando-o com sonhos e esperanças não realizados. Em sua
base, procrastinação é pecado, como disse R. E. C. Brown: "A recusa de controlar
o que pode ser controlado e a tentativa de controlar o que não pode ser contro-
lado".

A segunda coisa que este relato nos diz é que as coisas se transformam no
que aparentam. Os israelitas usaram a capacidade dada por Deus de imaginação
para formar um quadro do pior. O epitáfio da morte da coragem deles foi expresso
nas palavras da maioria: "E éramos aos nossos próprios olhos como gafanhotos, e
assim também o éramos aos seus olhos" (Números 13:33). A imagem que eles
faziam dos filhos de Enaque era distorcida e a imagem que tinham de si mesmos
era depreciativa. Os israelitas se tomaram no que eles pareciam aos seus próprios
olhos: gafanhotos impotentes e insuficientes! Esse foi o modo de agir e reagir
deles. O medo nos torna gafanhotos primeiro aos nossos próprios olhos e em
seguida aos olhos dos outros. Nathaniel Hawthome escreveu: "Que outro
calabouço é tão escuro quanto o nosso próprio coração! Que carcereira tão
implacável
Deusquanto
desejanós mesmos!"
dar-nos uma auto-imagem criativa, que inclua todos os
talentos e habilidades que ele tem para nós, mais o poder do seu Espírito e mais
um quadro de nós mesmos realizando o que ele nos deu para realizar. Com essa
imagem podemos ser mais que vencedores. Paulo constatou essa verdade. Ele
não disse: "Posso fazer todas as coisas para Cristo ', mas sim: "Posso todas as
coisas por meio daquele que me fortalece!" E nós também. Faça um quadro
mental do desafio que você é tentado a adiar. Veja a si próprio no grosso da
batalha, equipado com vigor sobre-humano. Agora, mantenha esse quadro. Nós
somos gigantes!
58
Terceiro, considere a infecção contagiosa da procrastinação.O medo dos dez
espias apelou para o medo da nação inteira. Espalhou-se por todo o Israel,
deixando a nação prostrada. Quando você e eu damos um passo atrás em vez de
enfrentarmos a vida de cabeça erguida, espalhamos essa disposição de espírito
para o atraso de familiares, amigos e companheiros de aventura em Cristo.
Precisamos de Calebe como nosso exemplo à medida que levamos os outros a
perseverar. O que o Senhor orienta, ele prove.
O que decidimos e realizamos hoje afetará, de forma radical, a ousadia
espiritual ou a falta dela em outros. Eles nos observam e estão atentos o tempo
todo! Conversei com um jovem cujo pai dera um passo atrás no difícil desafio de
confiar em Deus e salvar seu casamento. Ele evitava o confronto e a cura. Em vez
de resolver os problemas, ele aceitou o fácil caminho de ter um caso com outra
mulher. As exortações de seu filho para que evitasse um relacionamento amoroso
com outra mulher foram impetuosamente rejeitadas. Declarou o filho: "Meu pai
se pôs de pé para rebater a bola a favor de sua vida, mas quando não conseguiu
rebater e marcou um ponto contra, ele deixou o campo. Com alguma coragem ele
poderia ter acertado as coisas entre ele e minha mãe. Em vez disso, ele tirou o
corpo fora. Agora, não sei em quem acreditar ou em quem confiar. Não quero ser
simplista. Nem todo divórcio significa tirar o corpo fora. Mas para ele foi. Ele
demorou tanto tempo para acertar as coisas que perdeu a coragem."
Mesmo que as circunstâncias variem, isso acontece a todos nós. Atrasar
uma decisão ou não decidir é desastroso. Naturalmente, há tempos de espera
quando ficamos atentos às ordens de Deus para avançar. Essa é uma época
criativa e necessária. Não é procrastinação esperar até obter sinais claros do
Senhor antes de agir. Procrastinação é a relutância em pôr em ação que ele já
tornou abundantemente claro. De novo, Mark Twain: "Não é tanto o que não
compreendo na Bíblia que me incomoda; é o que compreendo e falho em
obedecer". Podemos começar com amor, perdão e afirmação. A maioria tem pouca
dúvida acerca das disciplinas do discipulado. E nas áreas escuras das decisões
da vida, o Senhor afirma que dará toda a orientação para agirmos de acordo com
o seu horário. É uma lei espiritual que devemos pôr em ação hoje, qualquer que
seja a orientação que tivermos, se desejamos mais amanhãs.
A quarta verdade do relato da procrastinação de Israel é que podemos
perder o melhor de Deus dizendo: "Mais tarde!" Por esperar tempo demasiado
podemos perder a capacidade de dizer "Agora!" O povo de Israel disse "Não!" não
apenas às promessas de Deus, mas também ao seu líder. Sua culpa levou-os à
sedição contra Moisés. Mesmo depois de catorze meses de todas as evidências dos
milagres de Deus e de sua provisão, eles desejaram voltar para o Egito! É difícil
de acreditar. Ou não é? Quando a procrastinação é alimentada em nosso banco
de memória como os únicos dados para as exigências da vida, o computador dos
tecidos do nosso cérebro não pode dar uma resposta que não seja: "Mais tarde".
Como
maioria resultado, a jamais
procrastinadora maior parte
viu a da geração
terra de Israel
prometida. queforçados
Foram seguiu oarelato da
vaguear
outros trinta e oito anos no deserto, até que Calebe e Josué oferecessem de novo
a Israel uma oportunidade de entrar na terra e possuí-la. Muitos cristãos vivem
num deserto, sem espírito de aventura, impotentes e frios, sem a plenitude do
poder de Cristo, porque sempre dão um passo atrás nos desafios em que
poderiam obter sucesso apenas com a sua presença. Ficamos contentes com
substitutos.
Desejo concluir esse capítulo com algumas perguntas a que preciso
responder. O que eu faria hoje se soubesse que o sucesso, de acordo com os
59
padrões de Deus, está assegurado? O que tentaria se estivesse certo de que o
Senhor está comigo, infundindo-me sabedoria, amor, coragem e ousadia? Que
passo de crescimento pessoal na fé você tem adiado? Que perdão precisa oferecer
a pessoas ou receber delas em sua vida? Quem precisa de seu amor e segurança
hoje, tanto em palavras como em ações? Se este fosse o seu último dia, o que
você faria? (Ao responder a estas perguntas, faça-o por escrito).
Vamos unir-nos ao relatório da minoria. Com Calebe, vamos entrar e
possuir nossa terra prometida, afirmando: "Eia! subamos, e possuamos a terra,
porque certamente prevaleceremos contra ela" (Números 13:30).
Mais tarde? Não! Agora!

60
CAPÍTULO NOVE
MOLHANDO OS NOSSOS PÉS
Josué Atravessa o Jordão!
Ao responder às perguntas com as quais concluí o capítulo anterior, senti-
me impelido à ação. Nada sei a respeito do leitor, mas as respostas que escrevi
encorajaram-me a avançar. Percebeu você como suas respostas positivas
ampliaram sua visão do Senhor do impossível? De repente, percebemos que o
Senhor
seguida nos mostra o caminho,
convoca-nos a darmos nos oferece passo.
o primeiro o seu poder, promete
E quase como nos ajudar
se ele e em
esperasse
para ter certeza de que realmente desejamos receber as respostas às orações que
fazemos. É tão grande o seu amor que ele deseja que cooperemos com ele na
realização da sua vontade para nós.
Esse é o ponto saliente deste capítulo. Nosso estudo do desenrolar desse
drama da revelação do Senhor, no tocante ao seu poder para o povo de Israel,
leva-nos à margem do Jordão. O povo, depois de peregrinar no deserto por trinta
e oito anos, adiando o desafio de entrar e possuir a terra que o Senhor lhes havia
preparado, havia chegado à fronteira da terra prometida. E para pôr fim ao
período de evasivas e dar início ao movimento para a frente, o Senhor convocou
um homem chamado Josué. Quando Deus deseja realizar o seu propósito em
nós, ele cria em nós o desejo de avançar e a seguir revela os passos específicos.
Josué, sucessor de Moisés, assume com autoridade o centro do livro que
leva o seu nome. O Senhor, através de Moisés, vinha treinando-o com todo o

cuidado epara
conflitos a invasão por
preocupações, e ocupação
vitórias e de Canaã. Ele
vicissitudes. passara
Josué ouviracom Moisés epor
as orações as
mensagens do grande libertador. Ele conhecia os vales dos fracassos e os picos
dos sucessos. Com Moisés, ele fora testado até ao ponto máximo de resistência,
através de um povo murmurador, rebelde e obstinado. Josué se tornou um
homem de Deus experimentado, um general brilhante e um crente fiel na
realização do impossível mediante o poder do Senhor. Ele partilhou do amargo
desapontamento de Moisés quando o povo não deu atenção a Calebe e a sua
admoestação de possuir a terra prometida. Agora, após trinta e oito longos e
cruciantes anos de vida nômade, Josué estava decidido a seguir a estratégia de
Deus para atravessar o Jordão. Selecionei este episódio na liderança de Josué
porque ele nos diz como fazer do futuro um amigo.
Depois de passar um longo tempo com Deus, Josué anunciou ao povo:
"Santificai-vos, porque amanhã o Senhor fará maravilhas no meio de vós" (Josué
3:5). Podemos imaginar o efeito eletrizante dessa chamada sobre o povo abatido e
desencorajado. Trinta e oito anos de peregrinação haviam cobrado o seu preço
sobre a expectativa. Como pessoas esgotadas, o amanhã não passava de mais um
dia.
Como você se sente acerca de seu amanhã, do futuro? Você está na
expectativa? Um sinal certo de que você está em comunhão com o Deus vivo é
acreditar no futuro mais que no passado.
Josué prometeu um amanhã cheio de maravilhas para os israelitas
encarquilhados pelo sol. Devido ao excesso de uso, a palavra maravilhoso se
tornou muito comum. Mas precisamos redefinir e reivindicar o seu verdadeiro
significado. Ela significa "repleto de maravilha". É uma combinação de surpresa,
61
temor e deleite. É a nossa reação às intervenções felizes de Deus. Um amanhã
maravilhoso é aquele no qual Deus nos surpreende com o desprendimento de seu
poder em face dos desafios, à primeira vista impossíveis.
Há uma terra prometida a alcançar num amanhã cheio de esplendor. Para
os israelitas era Canaã, — uma terra em que viveriam sob sua providência, seu
poder e sua provisão. Canaã os identificava como o povo escolhido, chamado e
querido por Iavé. Nossa terra prometida é essa e muito mais ainda. É uma
combinação de todas as bênçãos de Deus, da vida abundante em Cristo e da
plenitude de seu Espírito em nós. É a alegria de viver com Cristo uma nova vida,
a solução de impossibilidades há tanto tempo suportadas, e a realização de nosso
potencial. Sob essa luz, um amanhã maravilhoso é aquele em que reclamamos
mais de nossa terra prometida.
Mas o Jordão corre entre nós e nossas esperanças mais acalentadas — o
rio das perplexidades da vida. O terceiro e quarto capítulos de Josué nos dão
uma estratégia para atravessar esse rio. Eles nos falam das promessas de Deus, e
de como devemos responder a elas; do que Deus nos manda fazer e como fazê-lo,
e de como Deus usa a nossa cooperação e como devemos louvá-lo.
As maravilhas de Deus para um amanhã diferente requerem a consagração
do povo. Algumas traduções da ordem de Josué empregam a palavra consagrar.
Tanto consagrar como santificar são boas traduções do hebraico. Alguns eruditos
afirmam que ela vem da raiz que significa "lapidar", enquanto outros sugerem
"ficar alegres". Um e outro significado da raiz são aspectos do que está implícito
em ser santo, pertencer a Deus. A base latina de ambas, consagração e
santificação, traz implícito o significado "santo". O povo de Israel devia lapidar-se
a si mesmo do passado e de qualquer coisa que impedisse a sua absoluta
devoção. Deviam "alegrar-se" ao perceber outra vez que pertenciam a Deus e que
este os levaria à terra prometida. Para nós, significa nos desligarmos do passado,
que retém a nossa capacidade de imaginar o que Deus pode fazer. Hoje pode
haver alegria antecipada pela futura realização de Deus, tal como descrita em
nossa imaginação. Muitos esperam tão pouco e ficam desapontados quando o
recebem!
Era necessária a consagração do povo, porque o que o Senhor estava
prestes a fazer por eles exigia sua cooperação, confiança e coragem. Josué
partilhou com o povo a estratégia que o Senhor lhe deu. Ele selecionou um
sacerdote de cada tribo para levar a Arca da Aliança adiante do povo. A promessa
era que, quando as solas dos pés dos sacerdotes tocassem o Jordão, teria início a
maravilha da separação das águas. O leito do rio se secaria e todo o Israel
atravessaria de pé enxuto. As águas do Jordão eram particularmente altas na
época da colheita, quando o fluxo regular do rio (cerca de quinze metros de
largura) transbordava, alagando até a área mais ampla ao longo das margens.
Que o Foi
ímpeto
um de toda aquela
desafio, água seriapara
especialmente refreado, era uma promessa
os sacerdotes e tanto!
que levavam a Arca.
Imagine a coragem que deles se exigia. O Senhor do impossível decidira fazer com
que o milagre dependesse dos sacerdotes molharem os seus pés.
Ponha-se no lugar de um desses sacerdotes quando, bem cedo de manhã,
você coloca a Arca aos ombros e desce em direção do rio transbordante. Agora
sinta o estranho misto de pânico e promessa em seu coração ao aproximar-se o
momento da decisão. Um passo mais e seu pé tocará a água. Sempre imaginei
que a necessária coragem para aquele passo proveio da própria Arca, mas havia
nesse passo uma boa dose de ousadia e sangue frio. No interior da Arca estavam
62
as tábuas dos Dez Mandamentos, que falam da vontade de Deus, e em cima
estava o propiciatório, que lembra o perdão, o amor expiatório de Iave. Sem
dúvida, aqueles sacerdotes reivindicaram tanto o pacto dos mandamentos como a
misericórdia do Senhor, quando consideraram o espantoso passo de fé. Não havia
como voltar atrás. Deus e o povo dependiam deles. E assim os doze, com a Arca
aos ombros entraram na água. Tinham feito a sua parte.
Nada aconteceu! Pelo menos de imediato nada aconteceu que pudessem
notar. O relato de Josué 3:16 é muito conciso ao dizer que foi "mui longe da
cidade Adão, que fica ao lado de Zaretã", que "pararam-se as águas, que vinham
de cima; levantaram-se num montão". Os mapas históricos mostram que isso
ocorreu a trinta quilômetros de distância. Os sacerdotes tiveram de permanecer
em pé dentro da água — esperar, confiar, orar — enquanto pouco a pouco o
refluxo das águas, a trinta quilômetros de distância, secasse o leito do rio.
Suponho que eles tenham entrado nas águas até a altura dos pescoços, na
expectativa de um milagre instantâneo, como na divisão do mar Vermelho,
quando Moisés tocou a água com sua vara. Nada disso. Deus é srcinal em cada
uma de suas intervenções.
Sem dúvida, Josué se encontrava nas fortes correntezas, a encorajar os
sacerdotes a que permanecessem firmes e esperassem no Senhor. Com os olhos
da mente, capte a expressão do rosto deles quando a água começou a diminuir
pouco a pouco, até chegar abaixo da cintura, depois do joelho, por fim do
tornozelo e, logo a seguir, o leito do rio estava seco. O Senhor havia sido fiel à sua
promessa. "Afinal de contas, você estava certo, Josué!"
Muitas das maravilhas que Deus deseja realizar em nossos amanhãs
exigirão essa crise de espera para o seu cumprimento. Oque teria acontecido se
aqueles sacerdotes tivessem saído da água, dizendo: "Olha só Josué, não
funcionou!" É preciso que Deus nos dê tanto a coragem para arriscar como a
paciência para esperar pelo seu tempo oportuno. Precisamos de pés jubilantes
enquanto esperamos, sabendo que Deus é fiel.
Mas esse não foi o fim da prova de resistência daqueles sacerdotes. Eles
teriam de permanecer no meio do leito até que todos os milhares de israelitas
tivessem atravessado. Quando o rio começaria a fluir de novo? Só Deus sabia, e
ele era digno da confiança deles.
A história registra dois outros casos em que o Jordão foi de uma forma
similar represado no mesmo lugar. Um ocorreu em 7 de dezembro de 1267,
quando, devido a um desabamento das margens do Jordão, as águas foram
represadas por dez horas. Em 1927 um fenômeno semelhante durou vinte e uma
horas e meia. As margens altas e secas de marga, sem a proteção da turfa e
devido à ação das fortes correntezas nas camadas subterrâneas, se desabaram e
as águas foram contidas pela represa natural. Algumas pessoas acham que foi
isso o que aconteceu na época de Josué, dando a entender que não foi milagre
algum. Mas é apreciso
cumprimento também perguntar
uma promessa. Se foi um por que aconteceu
terremoto naquele
que causou dia e das
o colapso em
margens do rio, quem estava por trás do terremoto? Não podemos explicar a
maravilha do horário e das circunstâncias. Precisamos reivindicar a palavra
coincidência. Para mim, significa que dois incidentes ao mesmo tempo produzem
um efeito além da compreensão. Ou, como alguém advertiu: "Pare de orar e as
coincidências param de acontecer!" Foi Deus quem deteve o Jordão, quaisquer
que fossem as circunstâncias naturais que ele usou.
Josué jamais teria questionado essa verdade, ainda que tivesse podido ir
até Adão e visto o milagre. Ele estava muito ocupado em atravessar as pessoas
63
para se preocupar com esse tipo de comprovação. Quando a pessoa é alvo de um
milagre, não fica a analisá-lo. Josué estava tão envolvido no milagre de Deus que
só poderia louvá-lo e ajudar Israel a lembrar-se do que Deus estava a realizar.
Isso nos leva ao término de um grande dia. Precisamos saber como concluir
um maravilhoso amanhã. O Senhor mandou Josué selecionar doze homens
dentre as doze tribos. Enquanto os sacerdotes permaneciam firmes, com a arca,
esses homens deviam tirar doze pedras do leito do rio e levá-las para o outro lado,
como um memorial do milagre de Deus. Estimulados pela coragem de Josué e
pela fidelidade dos sacerdotes no meio do Jordão, os doze homens atravessaram o
rio. As pedras se tomaram algo muito querido como um memorial do poder e da
providência de Deus.
Mas isso não foi tudo. A resistência dos sacerdotes foi testada um pouco
mais, pois Josué levantou doze pedras no meio do Jordão, no lugar em que,
parados, sustentaram a Arca. Ele não conseguia louvar a Deus o suficiente pelo
que ele tinha feito. Ação de graças no final de um dia de maravilhas, torna-o o
primeiro numa sucessão de amanhãs maravilhosos. O livro de Josué está repleto
de vitórias desse general, orientadas pelo Espírito. A confrontação com o inimigo,
a batalha de Jerico, a invasão que se seguiu e a posse da terra foram o resultado
da capacidade de Josué de dar a Deus toda a glória.
E quanto a mim e a você — nosso amanhã, nossa terra prometida? Há
algum Jordão no caminho? O primeiro passo é o mais difícil. Devemos molhar os
pés. Por que estão eles tantas vezes secos e sujos com a poeira da relutância?
Entre no seu Jordão! Neste momento, vamos esperar pela parada das águas?
Deus é fiel. Ele decidiu fazer com que seu milagre dependesse dos sacerdotes,
mas certamente eles não poderiam realizá-lo sozinhos. Quem está dependendo de
que eu ou você fiquemos parados no Jordão, a fim de passar à terra prometida?

64
CAPÍTULO DEZ
SEIS CHAVES PARA DESVENDAR
O IMPOSSÍVEL
Gideão
Nos últimos anos tenho tido o privilégio de fazer a oração de abertura do
encontro anual da Fundação Filantrópica de Los Angeles. Essa instituição confere
a pessoas importantes e realmente de projeção o Prêmio Americano de Distinção.
Tem sido um prazer encontrar e conhecer pessoas às quais tenho admirado de
longe, muitas delas possuidoras de profunda fé vivida com heroísmo. Antes de
um desses encontros, alguém disse algo que eu jamais esquecerei.
"Por favor, não me idealize nem me sentimentalize. Se realizei alguma coisa
digna de admiração, foi por causa da grandeza de Deus. Ele tomou uma pessoa
comum e fez coisas extraordinárias."
Uma pessoa comum que fez coisas extraordinárias! Pode-se dizer o mesmo
de todos os heróis da fé. E tão confortante como desafiador descobrir as pessoas
comuns atrás das realizações extraordinárias. Somos confortados ao
descobrirmos que essas pessoas enfrentaram as mesmas lutas e imperfeições que
todos nós enfrentamos. Mas, também, somos desafiados a perceber que a causa
da sua grandeza é o que Deus realizou nelas e através delas. Não poderia Deus
fazer o mesmo conosco se estivéssemos dispostos?
Admiramos os amigos que parecem viver a vida abundante com toda a
ousadia. Ansiamos ser como eles. Então, quanto mais chegamos a conhecê-los,
mais
mesmas surpresos ficamos
dificuldades com a sua
emocionais humanidade.
e físicas Constatamos
que todos quepenetrarmos
sentimos. Ao sentem as
em suas personalidades, vemos os mesmos traços da fragilidade humana,
comuns a todos os homens. Contudo, eles realizam coisas extraordinárias. Por
quê?
Alguns anos atrás vivi uma parábola que estrondeou essa verdade em
minha alma. Fui apanhado num furacão enquanto me encontrava numa pequena
ilha. Passada a tempestade, percebi que uma tábua, arrancada de um velho
edifício, penetrara cinco centímetros numa parede de concreto. Ao tirá-la da
parede, notei que não passava de um velho pedaço de madeira, já surrado pelo
tempo. Contudo, sob a velocidade e propulsão violenta do vento, ele havia
penetrado a parede de concreto. Grandes pessoas são como essa tábua. Seu
poder e proeza não têm explicação, a não ser que foram impelidas pelo Espírito de
Deus. E nossa pergunta é: "Qual o segredo para receber e experimentar esse
poder?"
A honestidade da Bíblia acerca de seus heróis nos dá uma resposta
esperançosa. Ela nos informa da inaptidão e impotência das pessoas comuns
que, pelo poder de Deus, realizaram coisas extraordinárias. Somos tentados a
pensar nelas como tendo inteligência superior e talentos espetaculares
empregados para a glória de Deus. Nada disso! Foram pessoas apanhadas pelo
Espírito do Senhor, capacitadas para lutar com o impossível, e que receberam a
graça de ser grandes.
Gideão é um exemplo bíblico clássico de uma pessoa comum, mediante a
qual Deus realizou coisas extraordinárias. Um estudo de sua biografia em Juizes,
capítulos seis a oito, revela seis chaves que desvendam o impossível. O exame de
65
cada uma delas nos dá tanto uma progressão para uma análise de sua vida,
quanto uma compreensão aprofundada dos ingredientes básicos da grandeza,
comuns à maioria dos gigantes espirituais da história. E, mais importante de
tudo: essas chaves se encontram à disposição de todos nós.
A primeira é uma chamada inegável dada a uma pessoa que enfrenta
circunstâncias insustentáveis. O Gideão que encontramos em Juizes 6 destrói a
ilusão de que alguns não são qualificados para a grandeza, Nenhum perfil
biográfico nas Escrituras tem início com uma exposição mais honesta de
inadequação e frustração. Encontramos o jovem Gideão num pequeno vale, às
escondidas, malhando o trigo de uma colheita escassa. Podemos imaginar o seu
medo, vigiando à sua volta com ansiedade, isso nos diz muito acerca do homem e
sua época. Ele não malhava o seu trigo num lugar visível, por causa do perigo
dos saqueadores midianitas.
Israel conheceu pouca paz desde que entrou na Terra Prometida. Como
povo nômade, mal treinados para uma vida agrária, os israelitas tentaram
aprender os métodos agrícolas, e ter-se-iam saído bem não fosse um erro fatal, e
a invasão persistente dos midianitas e amalequitas. Para se certificarem do
sucesso agrícola, adotaram um sincretismo descarado. Edificaram em seus
campos santuários a Baal e a Astarote, envolvendo-se na religião pagã da terra. O
culto a Iavé era misturado com os rituais de fertilidade. A prosperidade deles era
de curta duração. As forças devastadoras de Midiã e Amaleque, na época da
colheita, assolavam a terra, levando o fruto de sua árdua labuta, juntamente com
seu gado e outros bens. Tais invasões continuavam implacáveis. Israel jamais
estava fora de perigo.
Não é de admirar que Gideão malhasse o trigo em um lagar! Se os
midianitas o encontrassem, ele perderia tanto o trigo como a vida. Olhe para a
face dele, cheia de ira e angústia. Não há nada mais desestimulante do que saber
que, quanto mais você trabalha, mais corre perigo. De nada valeu a adoração dos
baalins. Mas onde estava Iavé, o Deus que opera maravilhas, que guiou o povo à
Terra Prometida? Era isso o que Gideão e todo o Israel desejavam saber. O que
deviam lembrar, porém, é que o Senhor jamais aceitaria um segundo lugar —
nem mesmo um lugar igual — a qualquer outro deus.
Contudo, o Senhor não abandonou o seu povo. Numa época de desalento
nacional, ele estava pronto para outro grande lance a favor de Israel. E Gideão
seria a peça-chave de sua estratégia. Nada, na constituição natural de Gideão, o
tornava um candidato ao heroísmo, e isso faz sua história tão significativa, pois o
que aconteceu a ele pode acontecer a nós.
O Senhor interrompeu Gideão em Ofra com uma saudação que deve tê-lo
deixado aturdido: "O Senhor é contigo, homem valente." Nada poderia estar mais
longe da imagem que Gideão tinha de si mesmo. Na verdade não era, de modo
algum, uma afirmação de Gideão. A Septuaginta é muito mais fiel ao srcinal: "O
Senhor
poderoso,é contigo, sim,O opoderoso
é contigo". Senhor de
emcoragem",
coragem éouIavé,
"O Senhor, que éA valente
não Gideão. e
visitação
divina lembrava a Gideão a grandeza de Deus.
Essa apresentação levou a uma pergunta óbvia. Atente para o impertinente
"se" e o "por quê" da fraqueza. "Ai, senhor meu, se o Senhor é conosco, por que
nos sobreveio tudo isto? e que é feito de todas as suas maravilhas que nossos
pais nos contaram, dizendo: Não nos fez o Senhor subir do Egito? Porém, agora o
Senhor nos desamparou, e nos entregou nas mãos dos midianitas" (Juizes 6:13).
Note a lamentosa consternação. E tudo culpa do Senhor. Nenhuma confissão de
apostasia, nem procura do que ele e Israel teriam feito para trazer a calamidade
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sobre si mesmos. Muitas vezes nossas dúvidas e indagações, exigindo que o
Senhor nos preste contas de suas ações, expressam quão distantes estamos da
comunhão com ele.
"Então se virou o Senhor para ele". O que havia nesse olhar? Indignação
pela apostasia de Gideão? Cólera pela sua obstinação? Seriam justificáveis tanto
uma quanto a outra. Pelo contrário, Deus olhou não para o homem frágil, mas
para o homem de fé em que se tornaria. Quanta bondade de Deus em não aceitar
a nossa queixa a respeito de sua providência! Em vez disso, ele nos chama para
mudar as muitas coisas que afligem tanto a nós como à nossa época. Gideão
recebe uma chamada irrecusável na sua circunstância insustentável. "Vai nessa
tua força, e livra a Israel da mão dos midianitas; porventura não te enviei eu?"
(Juizes 6:14). O homem improvável, cheio de descrença e dúvida, responde como
a maioria de nós o faz hoje, com o conhecimento de nossas fraquezas e da
injustiça do mundo: "Ai, senhor meu, com que livrarei a Israel? Eis que a minha
família é a mais pobre em Manasses, e eu o menor na casa de meu pai" (Juizes
6:15). A resposta do Senhor era tudo o de que Gideão precisava: "Já que eu estou
contigo, ferirás os midianitas como se fossem um só homem" (Juizes 6:16).
Gideão reage a essa tremenda promessa pedindo um sinal. A Escritura
deliberadamente expõe a modéstia desse jovem, ao perguntar: "Se agora achei
mercê diante de teus olhos, dá-me um sinal que és tu, Senhor, que me falas"
(Juizes 6:17). Gideão determinou os requisitos do sinal. Ele preparou uma
refeição de um cabrito e pães não levedados e os colocou sobre uma rocha. O
Senhor, sempre pronto a satisfazer à necessidade de segurança de seus heróis em
perspectiva, consumiu esses alimentos com fogo surgido da rocha. Gideão, certo
de que fora o Senhor que lhe havia falado, temeu morrer por ter tido um encontro
face a face com Deus. Mas, para Gideão, o Senhor reservara vida e vitória. Disse
ele: "Paz seja contigo! Não temas! Não morrerás!' (Juizes 6:23). Com temor e
assombro o líder eleito construiu um altar e o chamou "Jeová Shalom". O Senhor
é paz.
Estranho. A palavra para o novo e transformador relacionamento de Gideão
com Deus era paz. Alguém, chamado para a guerra, conhecia tanto a paz de Deus
como a paz com Deus. A paz do Senhor nos prepara para combater qualquer
coisa em nós, em nossos relacionamentos ou ambientes que privem outros de
paz. A paz interior nos capacita a viver sem medo em meio ao conflito. Para
Gideão significava favor, afirmação e bênção, mas para nós significa algo muito
mais profundo, mediante a reconciliação por Cristo. A batalha em nosso íntimo
está acabada por causa do amor perdoador da cruz, e agora podemos nos tornar
pacificadores. O preço dessa transformação geralmente é alto. Muitas vezes
significa fazer frente aos inimigos da paz, os quais perturbam a nós e aos outros.
Deus dá-nos a sua paz a fim de podermos continuar com ele em luta destemida
pela paz durante toda a vida.
A segunda
obediência chave
constante. para
Ele nãodesvendar o impossível
poderia fazer é: Gideão
nada acerca foi chamado
da apostasia a uma
de Israel até
que ele mesmo limpasse o seu quintal. Literalmente. Havia um santuário de Baal
nos campos de sua própria família! A primeira ordem que o Senhor deu a Gideão,
antes que este pudesse liderar Israel, foi tomar dez homens e dois bois e,
deliberadamente, derrubar e despedaçar o ídolo. Em seguida, ele devia pegar a
madeira do santuário de Astarote, construir um altar a Deus e sobre ele sacrificar
um boi de sete anos. Uma ordem e tanto! Especialmente quando ele sabia que tal
ato de obediência ao Senhor traria, com certeza, ameaças à sua vida da parte de
seus vizinhos, por demais apagados à adoração do ídolo. O futuro de sua nação
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pendia na balança. O Senhor não poderia abençoar a Gideão com a vitória
enquanto não soubesse que ele lhe obedeceria sem discussão. A obediência de
Gideão foi completa: ele derrubou o ídolo e sacrificou o boi para a glória de Deus,
exatamente como o Senhor lhe ordenara.
Façamos uma pausa na história de Gideão e examinemos o desenrolar de
nossa própria história. Qual é, em nossa vida, o ídolo competitivo? Que pessoa,
posição, bens, plano ou propósito impedem uma obediência completa? Todos nós
veneramos divindades secundárias que perturbam ou debilitam nossa vida cristã,
e depois perguntamo-nos por que temos pouco poder, discernimento ou ousadia.
A causa de nosso fracasso é a de nossa fidelidade dividida entre o Deus
verdadeiro e um deus que nós mesmos confeccionamos ou recebemos como
produto de nossa cultura. Os israelitas temiam uma dependência total de Deus.
Quantas vezes cremos em Deus, mas nos apoiamos na segurança de nossos
bens, nossas realizações, nossa auto-imagem ou na aprovação de outros. De onde
você extrai a sua segurança? Pare a leitura e faça um inventário incisivo.
Uma das melhores maneiras de fazer esse exame é considerar o que você
teria de dispensar se vivesse apenas na dependência de Deus. Que perda
despedaçaria a sua segurança? De que, ou de quem você depende para o
significado ou felicidade da vida, além de Deus? Ao fazer esse inventário,
defronto-me com meu sistema de segurança que exige algo mais que Deus. Faz-
me dolorosamente consciente de quão importantes são para mim o sucesso e a
afirmação. Todos nós temos necessidade de levar a cabo os nossos alvos —
mesmo que, às vezes, usemos pessoas e coisas para alcançá-los. O perigo é que
eles se transformam em deuses falsos. Nosso deus é tudo aquilo que domina o
nosso pensamento e exige a nossa fidelidade com a exclusão de obediência
absoluta a Deus. Qual é o baal do seu quintal?
Esse tipo de sinceridade geralmente não é popular. Ela desperta a ira e a
indignação de sincretistas à nossa volta. No caso de Gideão, punha a sua vida em
perigo. Quando os homens da cidade de Gideão perceberam o que ele tinha feito,
reuniram uma turba de linchamento e se dirigiram ao pai dele, Joás, com a
exigência: "Leva para fora o teu filho, para que morra; pois derribou o altar de
Baal, e cortou o poste-ídolo, que estava junto dele" (Juizes 6:30).
Agora testemunhamos o poder da influência ousada e destemida. A
obediência de Gideão ao Senhor atiçou as chamas da fidelidade de Joás. A
fidelidade de seu filho abriu-lhe os olhos para a sua própria evasiva. Joás deveria
constar na lista de nossos heróis. Se seu pai não tivesse enfrentado a multidão
enfurecida, Gideão não teria sobrevivido para fazer a vontade do Senhor. Ouça a
sua recém--achada coragem e lealdade: "Contendereis vós por Baal? livrá-lo--eis
vós? Qualquer que por ele contender ainda este manhã será morto. Se é deus,
que por si mesmo contenda; pois derribaram o seu altar" (Juizes 6:31). Então ele
fez algo notável que expressava a confiança e a admiração que tinha pelo filho.
Deu a Gideão
contenda". Eleumviu novo nome: Jerubaal,
a transformação quefilho.
do seu significa: "Que Baal
O homem por sitrouxe
no rapaz mesmoà
superfície o homem no pai. Era como se ele dissesse: "Meu filho Gideão é uma
nova pessoa. Alguma coisa lhe aconteceu. Baal não é nosso deus. Ele não tem
poder sobre o meu filho. Vocês não devem contender com Gideão. Se Baal tem
algum poder, deixe-o usá-lo contra Gideão". Nada aconteceu. Gideão, agora
Jerubaal, tinha derrotado o inimigo espiritual do povo.
Há uma grande necessidade da coragem de Joás em nossos dias, em
pessoas dispostas a assumir o custo do discipulado obediente. Mesmo desafiado
pela fé dos filhos, cabe aos pais a grande responsabilidade de confirmar neles os
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primeiros estímulos da chamada de Deus. Do mesmo modo, precisamos apoiar os
que fizeram um compromisso sem reservas com o Senhor. Todos nós precisamos
de pessoas que se interponham entre nós e os amigos negativos, críticos e
ameaçadores, ou mesmo companheiros alarmados por ousarmos colocar a Deus
em primeiro lugar em nossa vida. Quem é o Joás em sua vida? Para quem você
precisa ser um Joás?
Gideão desmascarou o inimigo dentro de Israel. Agora ele enfrentava o de
fora. Os midianitas e amalequitas, cujo exército contava cento e trinta e cinco mil
homens fortemente armados no vale de Jezreel, oprimiam e exploravam sem
piedade os empobrecidos israelitas. Era preciso fazer alguma coisa. Gideão era o
eleito de Deus para a ocasião, mas faltava-lhe poder. Nesse momento ele
descobriu a terceira chave para realizar a tarefa impossível de libertar o seu povo
do opressor estrangeiro. Uma tarefa impossível preparou-o para receber poder
ilimitado. "Então o Espírito do Senhor revestiu a Gideão, o qual tocou a rebate"
(Juizes 6:34). A tradução do hebraico que mais se aproxima do srcinal é: "O
Espírito do Senhor revestiu-se de Gideão". Uma imagem poderosa. O Espírito
encheu o homem assustado e inadequado. A personalidade de Gideão, bem como
a sua humanidade, se tornaram a vestimenta de Deus! Talentos naturais foram
aumentados ao máximo, dons extraordinários, acrescentados. A fé substituiu o
medo, a coragem suplantou o comprometimento, e o carisma fluiu através de sua
personalidade.
Até essa altura a conversão de Gideão fora uma reação humana a um
chamado divino. Mas agora ele se tornava o leito para o fluxo do Espírito do Deus
que o chamara. Ao tocar a trombeta, ele convocou Israel às armas. Desse ponto
em diante testemunhamos o que Deus pode fazer com uma pessoa possuída pelo
seu Espírito. O homem indeciso, preocupado e tímido, que encontramos no lagar
triturando o grão em secreto, está agora cheio de vigor e inspiração. Suas queixas
foram substituídas por entusiasmo e vitalidade. O Deus de valor estava fazendo
dele um homem de valor.
A reação das tribos de Israel ao chamado de Gideão é surpreendente.
Estariam tão cansados da opressão que seguiriam prontamente a qualquer
liderança? Ou teria sido o ato corajoso de Gideão ao desmascarar a impotência de
Baal? Há algo mais. Foi Deus quem suscitou os exércitos israelitas. Foi ele quem
lhes despertou o desejo de sair de debaixo do calcanhar dos invasores pagãos.
Esta é uma lição que os líderes cristãos precisam ter em mente. A reação das
pessoas à nossa liderança é induzida por Deus. A força por trás de todo o
movimento de Gideão é o Senhor. Por que então milhares de israelitas se uniriam
ao filho mais jovem da menor das tribos? A experiência de Gideão não nos dá o
luxo de pensar que pouco ou nada acontece quando conduzimos outros numa
causa de verdade e justiça.
O quarto segredo nos fala tanto de Deus quanto de Gideão. Também nos
revela um Gideão
segurança. pensamento confortador
precisava de mais acerca de nossa
confirmação de queprópria necessidade
o Senhor, de
que o havia
orientado até esse ponto, desejava que ele combatesse os invasores. Por que essa
confirmação após sua chamada, conversão, consagração e revestimento do
Espírito de Deus? Para muitos intérpretes, Gideão, ao pedir mais um sinal,
ofendia ao que Deus já lhe havia dito. Nada disso. A Escritura salienta que
Gideão dependeu do Senhor a cada passo do caminho. A quarta chave para
desvendar o impossível é uma resposta inquestionável à súplica por orientação.
Deus não nos dá apenas um chamado, mas também a confirmação clara ao longo
do caminho.
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A prova do velo mostra-nos que Deus não se detém enquanto não
estivermos seguros. Do que você precisa para convencer-se de que a orientação
recebida do Senhor está certa? Para Gideão essa certeza levou-o, não no lagar
oculto, mas ao ar livre, a orar corajosamente ao Senhor (Juizes 6:36) — evidência
de um ousado novo homem. Disse ele ao Senhor, uma noite, que poria uma
porção de lã na eira. Se, pela manhã, o orvalho estivesse apenas na lã e o chão
em volta, seco, então Deus libertaria Israel por meio dele, como havia prometido.
Talvez Gideão não tenha dormido muito bem aquela noite, falando com os seus
botões acerca do que encontraria pela manhã. Quando se levantou, achou a
resposta de Deus: a lã estava tão cheia de orvalho que, ao espremê-la encheu
uma taça de água. Depois, para ter toda a certeza, ele inverteu o teste: "Rogo-te
que mais esta vez faça eu a prova com a lã: que só a lã esteja seca, e na terra ao
redor haja orvalho." Deus foi fiel ao teste: pela manhã a lã estava completamente
seca, e o chão estava coberto de orvalho. Quão bondoso é Deus!
Vemos ao nosso redor provas de respostas às nossas orações. Vemos as
evidências do amor de Deus. Mas nas ocasiões especiais de desafio e perigo, ele
concede um dom especial para nos convencer da sua presença conosco. Ele usa a
Escritura, os amigos, e os eventos para nos convencer se uma direção em
particular está certa ou errada. Contudo, jamais haverá substitutos para períodos
de meditação profunda no recesso da oração. O Senhor usa as influências e os
eventos externos somente para confirmar o que nos diz em nossas orações.
Lembre-se que Gideão, até essa altura, não conhecia a Deus muito bem. Quanto
a nós, ele nos guia segundo nosso nível de crescimento. O que importa é sermos
objetivos ao falar-lhe dos desafios que temos de vencer para a sua glória. Apre-
sentemos a necessidade e esperemos nele com a certeza de que ele usará nossas
mentes, nossos sentimentos e sensibilidades para nos conscientizar da sua
vontade. Gideão recusou-se a cometer o erro de se apoiar em sua própria força.
Deus honrou a sua necessidade de segurança. Ele não fará menos por nós.
Deste lado do Calvário, há muitas coisas claras quanto ao que devemos ser
ou realizar. O desejo do Senhor para nós não é ambíguo. Se seguirmos o Mestre
com entusiasmo, conforme os princípios básicos do discipulado — buscando
primeiro o seu reino e a sua justiça — estaremos abertos à sua orientação
específica. O segredo é a vontade. Quando desejarmos fazer a sua vontade, tal
como ele prometeu, nós a conheceremos (João 7:17). Espalhe a sua incerteza na
presença dele. O que você acha que deve fazer cumpre o que ele disse na
Escritura? Fará bem a todos os interessados? É uma expressão do seu amor?
Dar-nos-á uma mais profunda comunhão com ele? Fará com que o reino de Deus
se estenda? Se pudermos responder afirmativamente a essas perguntas,
deixaremos a dúvida de lado. Aquele que criou o mundo e ressuscitou a Cristo
dentre os mortos, não pode comunicar sua vontade às nossas mentes e corações
abertos? É claro que pode.
A seguinte
não segue e quinta
o padrão chave para
característico dasdesvendar o impossível
demais.Esta é umadas
é a mais difícil estratégia
chaves. que
Os
caminhos de Deus não são os nossos caminhos. Planejamos, armamos as
estratégias e dispomos o potencial humano para realizar a obra de Deus. O
Senhor não deixou Gideão cair nessa armadilha. Quando os exércitos de Israel se
reuniram no monte Gilboa, Gideão contou os seus soldados — trinta e dois mil ao
todo. Em seguida ele olhou de um extremo ao outro, da fonte de Harode no sopé
do monte através do vale de Jezreel até os midianitas e os amalequitas
acampados ao pé do outeiro de More — cento e trinta e cinco mil. A proporção era
de quatro para um. "Eis uma oportunidade de lutar com a ajuda do Senhor",
70
pensou Gideão.
Compreenda o espanto do líder quando o Senhor mandou que ele reduzisse
as fileiras! Ele devia submeter o recém-reunido exército a duas provas. A primeira
era recitar as palavras prescritas nas leis para a guerra, dadas pelo Senhor a
Moisés: "Qual o homem medroso e de coração tímido? Vá, tome-se para sua casa,
para que o coração de seus irmãos se não derreta como o seu coração"
(Deuteronômio 20:8). Embora Gideão não imaginasse como enfrentar o inimigo
sem os seus trinta e dois mil homens, ele obedeceu ao Senhor e disse: "Quem for
tímido e medroso, volte, e retire--se". Vinte e dois mil voltaram para as suas
casas!
Esmoreceu o ânimo de Gideão ao olhar para os dez mil restantes e depois
para o acampamento do inimigo? Sem dúvida, mas ele reuniu sua coragem e deu
início aos preparativos. Contudo, o Senhor não havia ainda dado o caso por
encerrado! Mandou que Gideão realizasse mais uma prova. Ele devia mandar o
seu exército descer às águas. O rio corria entre o exército agora reduzido e as
imensas forças de Midiã, de modo que os soldados israelenses pensaram que o
estavam atravessando para a guerra. Isso é importante para compreendermos a
prova do Senhor. Enquanto os soldados atravessavam o rio, alguns pararam,
tiraram a armadura, puseram de lado as suas armas, ajoelharam-se e lamberam
a água com a língua. Outros, firmes à liderança de Gideão e não tirando os olho
dele nem do inimigo, lamberam a água levando a mão à boca. O Senhor disse a
Gideão que somente aqueles que levaram a mão à boca estavam preparados para
lutar. Eles atravessaram o rio sem ao menos parar para satisfazer às suas
necessidades. O número dos que não passaram na prova foi nove mil e
setecentos. Restaram a Gideão trezentos homens!
O Senhor sabia o que estava fazendo. Ele queria somente os que pudessem
seguir a Gideão com disposição, obediência e fidelidade. Os que pensavam mais
na satisfação de suas próprias necessidades foram tirados do exército. O Senhor
queria um grupo de homens ousados, vigilantes e totalmente dedicados. Mas
havia uma razão mais profunda para a redução dos soldados: a vitória
pertenceria a Deus e ao seu poder. Nosso Deus se deleita em nos surpreender
com o que pode fazer com algumas pessoas que confiam nele completamente, que
põem o conforto e o orgulho pessoal de lado.
Se desejamos viver uma vida com os dons das possibilidades de Deus,
devemos usar os seus métodos e revestir-nos de seu poder. Em virtude de nossa
timidez, apoiamo-nos em talentos, habilidades e poder humanos, os quais muitas
vezes nos atrapalham. Deus tem de romper esses laços antes de dar-nos o que
tem de melhor para nós. Colocá-lo em primeiro lugar em nossa vida, buscar os
alvos de seu reino, viver de seus recursos e na expectativa de suas intervenções, e
receber o poder de seu Espírito — eis o único modo de viver uma vida realmente
vitoriosa.

isso, oASenhor
últimadeu
chave para desvendar
a Gideão uma visão odaimpossível é a da
vitória. Antes coragem
batalhainabalável Para
ele mostrou a
Gideão que não havia dúvida acerca de seu êxito. Gideão recebeu a permissão de
provar o doce sabor do cumprimento da vontade do Senhor antes de qualquer
batalha. Eis como o Senhor o preparou para reivindicar o triunfo e seguir em
frente com coragem e louvor pelo que o Senhor iria realizar. Gideão recebeu
ordens de entrar à noite e furtivamente, com Pura, no acampamento de Midiã.
Podemos imaginar o quadro dos dois homens descendo o terreno rochoso do
monte Gilboa, atravessando o vale e subindo o outeiro de More. Conseguiram
passar pelas sentinelas e se agacharam ao lado de uma das tendas negras, onde
71
ouviram dois midianitas conversando. Um deles contava um sonho apavorante,
no qual um pão de cevada veio rodando contra o arraial e deu de encontro à
tenda do comandante, de maneira que esta se virou de cima para baixo. A
interpretação que o outro soldado deu ao sonho foi um presente especial do
Senhor a Gideão. "Não é isto outra coisa, senão a espada de Gideão filho de Joás,
homem israelita", disse o intérprete do sonho. "Nas mãos dele entregou Deus os
midianitas e todo este arraial" (Juizes 7:14).
Quão bondoso foi Deus ao encorajar Gideão, mostrando-lhe que os
midianitas o conheciam e temiam o seu poder crescente em Israel, e que a vitória
estava assegurada! Confortam-nos os persistentes esforços do Senhor para
fortalecer a confiança de Gideão. O resultado foi que Gideão pôde agradecer a
Deus, antecipadamente, a libertação de Israel.
Agradecer a Deus de antemão o que ele prometeu fazer, permite--nos
imaginar como será receber a promessa que eliminará a impossibilidade em
nossa vida. Isso exige oração, atenção cuidadosa e consciência das mensagens
que ele nos envia através das pessoas e das circunstâncias inesperadas. Uma vez
que a imagem da vitória esteja bem fixa em nossa mente, a solução dos
problemas ou o sucesso dos projetos que ele nos deu, tudo pode ser levado a cabo
com coragem.
Ao retornar a seus trezentos homens, Gideão estava pronto para dar o
brado de guerra: "Levantai-vos, porque o Senhor entregou o arraial dos
midianitas nas vossas mãos" (Juizes 7:15). A vitória era um fato consumado.
O plano de ataque de Gideão foi brilhante. Estou certo de que os trezentos
soldados questionaram a sanidade dele, quando o ouviram pela primeira vez.
Mas, como tudo na preparação deles para a batalha vinha sendo estranho e
misterioso, seguiram as ordens sem discutir. Gideão deu a cada um deles uma
trombeta para segurar em uma mão e uma tocha para segurar na outra. Cada
tocha era colocada dentro de um cântaro. "Olhai para mim e fazei como eu fizer.
Chegando eu às imediações do arraial, como fizer eu, assim fareis. Quando eu
tocar a trombeta, e todos os que comigo estiverem, então vós também tocareis a
vossa ao redor de todo o arraial, e direis: Pelo Senhor e por Gideão!" (Juizes 7:17-
18). Com um plano de ataque assim tão simples a orientá-los, os israelitas se
puseram em marcha rumo a Midiã.
Na vigília da meia-noite, os trezentos homens cercaram o acampamento
inimigo. Ao sinal de Gideão, quebraram os cântaros, expondo as tochas, e
tocaram as trombetas. E com voz triunfante, bradaram: "Espada pelo Senhor e
por Gideão!" A única espada que eles tinham era a coragem dada pelo Senhor.
Os midianitas e os amalequitas se despertaram do sono ao som assustador
de trombetas e clamores de batalha. Saíram das tendas brandindo espadas, e,
confusos na escuridão, começaram a atacar e a matar uns aos outros. Mas note a
parte do Senhor: "O Senhor tomou a espada de um contra o outro, e isto em todo
o arraial".
uns Dos cento
aos outros, e trinta
pensando queeestavam
cinco mil homens, cento
combatendo e vinte
a Gideão mil se
e seus mataram
homens. Os
outros quinze mil fugiram, ao perceberem o que estava acontecendo. Foi uma
vitória completa do Senhor para Gideão e Israel. E todo o louvor foi dado ao
Senhor do impossível, que triunfara uma vez mais!
Esse relato revela a natureza real da coragem cristã. E a coragem do
Senhor, não a coragem para o Senhor. Na qualidade de povo chamado e escolhido
por Deus, recebemos nossa coragem da visão de seu envolvimento em nossas
crises e aflições. Então, adquirimos a imagem certa do que ele fará e seguimos em
frente crendo que, o que ele prometeu, cumprirá a seu modo e em tempo
72
oportuno. Nossa única espada é o Senhor! A oração é a chave. Quando levamos
ao Senhor as nossas impossibilidades e nada escondemos, recebemos confiança
para avançar. Quanto mais dependemos dele, mais nossa coragem aumenta. Não
necessitamos de justificar nossas ações, ficar na defensiva ou bater em retirada.
Mais uma vez, como aprendemos com os heróis até agora estudados, se
estivermos dispostos a reconhecer a Deus e a dar-lhe a glória, não haverá limites
para as bênçãos que receberemos.
Em conclusão, a história de Gideão é um misto de grandeza e fracasso.
Uma vez mais as Escrituras são honestas, de modo que podemos nos identificar
com os seus personagens.
Gideão é muito bom para os homens que não passaram na prova do
Senhor, antes da batalha, e foram excluídos do conflito. Ele os chama de volta
para perseguir os quinze mil midianitas e amalequitas restantes. O inspirado
líder conhecia a natureza humana: aqueles que não participaram da batalha
ficariam enciumados e mais tarde hostis a ele. Gideão permitiu que eles
partilhassem da glória. Até mesmo os homens de Efraim, que não foram avisados
da primeira chamada, tiveram ótima acolhida. Porém argumentaram revoltados:
"Que é isto que nos fizeste, que não nos chamaste, quando foste pelejar contra os
midianitas?" (Juizes 8:2). É até certo ponto surpreendente o fato de dizerem que
não sabiam. Como alguém em Israel poderia deixar de saber? Como o restante do
povo, também sofriam a mesma opressão. E por certo sabiam que Gideão fora
chamado para conduzir Israel contra os invasores. No entanto, ficaram fora da
batalha e se queixaram. Há pessoas assim em todas as épocas. Esperam até que
a batalha termine e então se queixam de não terem recebido um convite por
escrito para se alistarem, embora soubessem que a batalha também lhes
pertencia. Você já se encontrou com pessoas assim? Já foi uma delas?
E tentador denunciar a evasiva dos efraimitas, mas Gideão não o fez. O
Espírito do Senhor ainda pulsava através dele, quando lhes disse: "Que mais fiz
eu agora do que vós? Não são porventura os rabiscos de Efraim melhores do que
a vindima de Abiezer? Que pude eu fazer comparável com o que fizestes?" Foi
então que a ira da casa de Efraim se abrandou. Quando o Senhor nos dá a vitória
em alguma situação à primeira vista impossível, ele nos infunde de certa dose
especial de humildade, a fim de darmos carinhosa atenção aos que podem não vir
a partilhar de nosso triunfo. Isso também faz parte de dar a glória a Deus.
Quando Israel quis que Gideão se tornasse o seu rei e reinasse sobre o
povo, ele recusou: "Não dominarei sobre vós, nem tão pouco meu filho dominará
sobre vós; o Senhor vos dominará" (Juizes 8:23). Ele não estava disposto a tomar
o lugar que pertencia a Deus. Ele sabia que, se realizara alguma coisa digna do
louvor do povo, era somente devido ao poder do Senhor em sua vida. A Deus deu
ele a honra do primeiro lugar em sua vida e nada menos que isso desejava para
Israel.

um fimFicamos a indagar
tão lastimável. então
Perto docomo é que
fim do a vida
oitavo espetacular
capítulo de Gideão
dos Juizes, veio aum
ele comete ter
pecado de idolatria que ameaça o registro de sua coragem nas páginas da
história. Não desejava ser rei e governar no lugar de Deus, mas pediu ao povo
argolas de ouro do despojo. Desejava Gideão essas argolas como uma lembrança,
um troféu, um símbolo? Talvez. Mas o povo deu-lhe não apenas uma, mas todas
as argolas tiradas de todos os midianitas e amalequitas mortos. No total, cento e
trinta e cinco mil argolas! O presente pesava mil e setecentos ciclos de ouro. E foi
acrescido dos ornamentos, pendentes e colares.

73
Foi nessa altura que Gideão se desviou. Do ouro ele fez uma estola
sacerdotal, a veste superior do sacerdote. Deve ter sido uma estola magnífica, de
ouro e jóias. Não se diz que Gideão a tenha vestido, o que o teria elevado à
posição de sacerdote. Mas ele a colocou em Ofra, sua cidade natal. Em Juizes
8:27 lemos: "E todo o Israel se prostituiu ali após dela; a qual veio a ser um laço a
Gideão e à sua casa". Está implícito que a estola sacerdotal se tomou um
santuário de adoração, memorial das grandes coisas que Gideão fizera ao
derrotar Midiã e Amaleque. Ele concentrava a atenção do povo no que Deus havia
feito no passado, sem que se preocupassem com o que Deus faria no futuro.
Gideão vivia da glória dos feitos heróicos do passado. Ele tomou para si a glória
que antes teve todo o cuidado de atribuir a Deus. O povo o tomou por ideal e se
esqueceu do Deus que ganhara a vitória sobre o inimigo. À medida que se
contava a história da sua grandeza a sua impotência foi ficando de lado. Agora o
clamor de Israel era: "Por Gideão e pelo Senhor". Tornou-se uma armadilha em
seu relacionamento com Deus. Ele tropeçou no auto-engrandecimento. O
santuário a Baal, que ele com tanto zelo removera, estava de volta de outra
forma.
Isso pode acontecer e de fato acontece conosco. Quando as pressões que
nos forçaram a depender de Deus são aliviadas, nos esquecemos de quem nos
tirou da confusão. As orações de agradecimento são substituídas por histórias
intennináveis do que nós realizamos. O passado se toma mais estimulante que o
futuro, a herança, mais preciosa que a esperança.
E, contudo, a história de Gideão permanece. Ela nos incita à ousadia e nos
previne do que pode acontecer se tirarmos nossos olhos do Senhor. Acima de
tudo, a vida de Gideão, até o fim, demonstra que as bênçãos já recebidas do
Senhor do impossível nada são comparadas com o que ele fará com as
impossibilidades dos dias que se aproximam. O que o Senhor realizou nos dá as
chaves para desvendar as impossibilidades de hoje e de todos os nossos
amanhãs.

Reputações são desrespeitadas por críticas depreciativas e sem escrúpulos.


A lealdade parece ter sido lançada fora desta "geração do eu". Quem se importa?
Estudei, no verão passado, como os antigos obeliscos gigantes foram
deslocados das pedreiras ao longo do Nilo. Perfuravam o granito ao longo da
porção a ser escavada, enchiam os buracos com madeira e em seguida os
saturavam de água. Ao se dilatar, a madeira forçava a clivagem gigantesca, que
se desprendia, e por fim fazia romper as compridas colunas monolíticas,
quadradas e levemente afiladas. Naquela época, estas colunas eram levadas de
barcaças rio abaixo, até Luxor, onde eram erigidas como parte dos templos. O
que me fascinou e me deu uma nova parábola foi a expansão da madeira que
causava a clivagem. Os buracos são como nossas atitudes desonestas, e a
madeira
clivagem nossas palavras
entre amigos, ferinase emulheres,
maridos carentes pais
de amor. Emcidadãos
e filhos, nossa sociedade, a
e Governo,
líderes a liderados, á o resultado da deslealdade que hoje se expande até rachar a
base de nossa vida.
Quando percebemos ao nosso redor os relacionamentos desgastados e
rompidos, somos forçados a reconhecer que o mal está ganhando algumas
batalhas decisivas. Nada se afigura como motivo mais importante para um
rompimento que a deslealdade — para com Deus e uns para com os outros. Deus
vai vencer a batalha final sem dúvida alguma, mas, enquanto isso, a
insegurança, a desconfiança, o desestímulo mútuo e as criticas depreciativas
74
estão levando a vitória. Desde o início do tempo, o máximo de Deus vem sendo
reduzido ao mínimo pela estratégia de deslealdade engendrada por Satanás.
Perdemos a possibilidade de grandeza oferecida pelo Senhor do impossível
quando nosso coração não reproduz a mesma lealdade de seu coração.
Recapitulemos nosso retrato do Senhor do impossível. Temos enfocado as
suas intervenções poderosas em momentos decisivos da história primitiva do seu
povo. Os heróis que examinamos são distinguidos pelo que o Senhor fez neles e
através deles. Em cada caso, o herói real é o próprio Senhor. Assim sendo,
enquanto a narrativa bíblica prossegue o seu curso, ela passa de relatos do seu
poder para uma revelação mais profunda da sua natureza. Depa-ramo-nos com
um Deus que não é apenas poderoso, mas também amoroso. Por trás de suas
intervenções para salvar o seu povo em epocas de crise, encontra-se um atributo
essencial da sua natureza. Ele é leal para com seu povo chamado e escolhido.
O livro de Rute chama nossa atenção para o valor da lealdade, e
maravilhoso como esse pequeno livro, com os seus oitenta e Cinco versículos,
teve um lugar reservado no cânon do Antigo Tes-tamento. Alguns eruditos
propõem que, embora sua história tenha ocorrido no período dos Juizes, entre
Josué e Samuel, ele foi escrito no reino de Davi para honrar à sua linhagem. A
menção de Davi no final do livro indica sua srcem, sem dúvida, como durante ou
após o reino davídico. Outros argumentam que a história de Rute loi registrada
no período pós-exílio, como um antídoto ao exclu-sivismo e ao preconceito
gritantes. A intenção do autor pode ter sido fazer um contraste da lealdade de um
estrangeiro com a deslealdade de Israel antes e durante o exílio. A maioria das
autoridades concorda, contudo, que a mensagem central do livro é a lealdade de
Deus, a qual ele anseia reproduzir em seu povo. Em cada período da história, o
povo de Deus tem sido tentado a ser desleal ao pacto divino e ao compromisso de
partilhar a sua bondade com todo o povo. Noemi nos mostra o poder da lealdade
em nosso testemunho. Rute exemplifica o que pode acontecer a uma pessoa que
expressa a fidelidade de Deus numa pessoa fiel. Contradiz-se o exclusivismo e
celebra-se o amor inclusivo.
Rute foi imortalizada como uma das mulheres mais importantes (ia Bíblia
por uma declaração de lealdade intensamente poética, fraseada com perfeição e
harmonia, feita à sua sogra, Noemi. É uma declaração bem conhecida, citada com
freqüência acerca da fidelidade imorredoura, que tem suportado a prova do
tempo na literatura por expressar um compromisso de lealdade que todos
ansiamos receber daqueles a quem amamos.
Rute e Noemi partilhavam um pesar comum. Ambas perderam o marido.
Noemi liberou Rute da responsabilidade de permanecer em sua companhia e de
cuidar dela. A resposta de rute encontra--se nos versículos dezesseis e dezessete
do capítulo primeiro do pequeno livro do Antigo Testamento que leva o seu nome.
Você precisa ouvir uma expressão de lealdade como essa? Prove-a nos recantos
famintos
para que de lealdade
te deixe, do obrigue
e me seu próprio
a nãocoração. Rute
seguir-te; disseaonde
porque a Noemi:
quer"Não
que me instes
fores, irei
eu, e onde quer que pousares, ali pousarei eu; o teu povo é o meu povo, o teu
Deus é o meu Deus. Onde quer que morreres, morrerei eu, e aí serei sepultada;
faça-me o Senhor o que bem lhe aprouver, se outra coisa que não seja a morte me
separar de ti".
Um exame do passado nos ajudará a compreender todo o impacto dessa
declaração. Anos antes, Noemi e seu marido, Elimeleque, partiram de Belém de
Judá por causa de uma fome na terra. Em companhia dos seus filhos, Malom e
Quiliom, viajaram para a terra de Moabe em busca de comida. Embora não fosse
75
fácil para esses hebreus habitarem numa terra onde o culto ao deus Camos
incluía sacrifícios humanos, eles permaneceram fiéis a Iavé. Ao falecer
Elimeleque, o coração de Noemi foi acometido pela dor. Porém, ela preencheu o
seu vazio com a preocupação por seus filhos e suas esposas moabitas. Malom
casou-se com Rute e Quiliom com Orfa. Todos viviam juntos debaixo da atenção
leal e cuidadosa de Noemi. Ela amava suas noras moabitas como a suas próprias
filhas, com dedicação incansável. Então a tragédia os surpreendeu novamente.
Ambos os filhos, Malom e Quiliom, morreram, e as três mulheres ficaram viúvas.
Essa dor adicional compeliu o coração de Noemi de volta a Belém. A prosperidade
retornara a sua terra natal e ela ansiava por voltar ao lar. Seu cuidado caloroso e
bondoso para com as noras fez com que ambas se prontificassem a acompanhá-
la. As três viúvas partiram para Belém.
Numa encruzilhada, já próximo de Judá, Noemi parou e ofereceu liberdade
a Rute e Orfa. Noemi desejava que as duas se sentissem livres para regressar a
Moabe, liberadas do cuidado de uma velha mulher, pois em Judá seria difícil,
como estrangeiras, encontrar marido. Além de poderem ser vítimas de
preconceito, a preocupação delas com a sogra poderia diminuir-lhes as chances
de um novo começo. Noemi suplicou-lhes que voltassem. Orfa concordou, mas
chorava enquanto partia. Rute, contudo, não seria dissuadida da determinação
de recompensar a lealdade de Noemi. As duas mulheres continuaram a jornada e
se estabeleceram em Belém. Ali, Rute recebeu, como prêmio de sua lealdade, o
respeito das pessoas da cidade e o casamento com Boaz, um próspero fazendeiro
e parente de seu falecido marido. O fruto de seu amor com Boaz foi um bonito
filho a quem chamaram Obede. A espantosa providência de Deus é que Obede foi
o pai de Jessé e este o pai de Davi. A genealogia da graça, assim iniciada, levou
mais tarde ao nascimento de Jesus Cristo da linhagem de Davi! A leal Rute é
mencionada na galeria de honra dos antepassados do Salvador (Mateus 1). Uma
mulher moabita, convertida a Iavé, tornou-se parte da aliança e predecessora do
Filho de Deus! O Senhor do impossível aceitou a lealdade como parte da sua
preparação para a encarnação.
Há três coisas importantes acerca da lealdade que Rute nos ensina, e cada
uma delas é extremamente necessária para a nossa vida e para a sociedade.
A primeira é que não pode haver lealdade sem liberdade.De modo oposto,
não pode haver a liberdade sem lealdade. Noemi deu a Rute o presente da
liberdade, para que ela pudesse escolher ser ou não leal.
Para nós, a liberdade e a lealdade são gêmeas siamesas, nascidas da madre
da graça. Elas dependem uma da outra. Uma não pode florescer sem a outra. O
inegável paradoxo da vida é que não podemos ser leais até que nos sintamos
livres; mas, sem lealdade, nossa liberdade fica sem direção. A lealdade leva ao
máximo a nossa realização de interdependência.
Nossa época dá grande importância à liberdade individual. Liberdade de
repressões,
quer que nos de deixe
regras"numa
e regulamentos,
boa", está de
ok.restrições a opiniões
"Faça o que lhe dere otradições. O quee
maior prazer
felicidade!" é o clamor da liberdade atual. Ostenta-se uma meia-verdade como a
verdade fundamental.
Não ouvimos falar muito de lealdade hoje em dia. Mas ela é o fio dourado
com que se tece a verdadeira liberdade. Sem ela, a roupagem de nosso caráter se
enfraquece e perde o estilo. A lealdade envolve a liberdade em compromissos
duradouros, coerência liberadora e constância amorosa.
O Senhor nos concede imensa liberdade a fim de sermos leais a ele. Ele nos
chamou, escolheu e cuidou de nós com amor fiel. Todavia, ele sabe que não pode
76
haver amor recíproco sem liberdade. Essa verdade impregnou a mensagem de
Jesus. Ele apresentou os dois lados do paradoxo. Ele veio para libertar a
humanidade do pecado, do egoísmo e do egocentrismo. Porém, chamou os que
aceitavam a libertação para a lealdade do disci-pulado. Somente aqueles que, por
lealdade, colocam o Salvador e a sua cruz em primeiro lugar, seguindo-o em
obediência absoluta, podem crescer na realização de seu dom da liberdade. A
cruz de Cristo granjeou-nos a liberdade; a nossa lealdade em levar a nossa cruz
nos dará a vida liberada.
O apóstolo Paulo chegou a essa conclusão. Para ele, o preço da liberdade
duradoura foi o custo do discipulado. Jamais se cansou de pregar e escrever
acerca da liberdade do cristão alcançada no Calvário. Mas, raras vezes a
mencionou sem se referir ao crescimento em lealdade, dele próprio e de outros.
Seu toque de trombeta da liberdade cristã em 1 Coríntios 3:21-23 contém duas
notas: "Por que tudo é vosso. . . seja o mundo, seja a vida, seja a morte, sejam as
coisas presentes, sejam as futuras, tudo é vosso, e vós de Cristo, e Cristo de
Deus". Tudo é nosso — isso é liberdade; pertencemos a Cristo — isso é lealdade.
O importante não é o número de coisas que possuímos, mas a quem
pertencemos. Na verdade, pertencer a Cristo nos dá tudo o que a fé cristã oferece.
Á mensagem aos gálatas proclama a mesma verdade. "Para a liberdade foi
que Cristo nos libertou. Permanecei, pois, firmes e não vos submetais de novo a
jugo de escravidão" (Gálatas 5:1). Os gálatas foram tentados a fazer mau uso da
liberdade, ao voltar para a escravidão de antigos legalismos, em vez da lealdade a
Cristo. Aquele que chamou a si mesmo de "servo de Cristo" acautelou--os acerca
do mau uso da liberdade. Por ser ele servo de Cristo, estava livre em Cristo.
A mesma verdade se aplica a nós. E a nossa lealdade que nos preserva a
liberdade. Se pertencemos a Cristo, tudo o que ele oferece nos pertence. Quando
somos leais a ele e ao povo que ele nos dá para amar e cuidar, tornamo-nos
pessoas realmente livres.
O motivo disso encontra-se na segunda coisa que o livro de Rute nos
ensina. Lealdade é o que Deus oferece e deseja em troca.No Salmo 101, versículo
1, Davi diz: "Cantarei a bondade e a justiça; a ti, Senhor, cantarei." Foi o amor
ilimitado, inexorável e coerente do Deus da aliança que fez que Davi desejasse
cantar. Em sua lealdade a Saul ele reproduz a lealdade do Senhor, apesar do
ciúme e temor do rei para com ele. Essa lealdade está clara no que ele disse aos
homens de Jabes-Gileade, que foram fiéis a Saul até o fim: "Benditos do Senhor
sejais vós, por esta humanidade para com vosso senhor, para com Saul, pois o
sepultastes!" (2 Samuel 2:5). Davi é lembrado por suas lealdades — a Saul, a
seus filhos, que muitas vezes se rebelaram, a suas tropas, que lutaram valo-
rosamente com ele, e a seus amigos que o decepcionaram. Mesmo no grande
fracasso da sua vida, o Senhor o trouxe de volta, quando contrito e arrependido
ele se lembrou da lealdade do Senhor.

com eleA sabedoria de Salomão,


e no seu anseio de serfilho
leal de Davi, baseou-se
a Deus. Provérbiosna lealdade
está de lealdade
cheio de Deus parae
fidelidade. "Não te desamparem a benignidade e a fidelidade; ata-as ao teu
pescoço, escreve-as nas tábuas do teu coração. E acharás graça e boa
compreensão diante de Deus e dos homens" (Provérbios 3:3-4). "O que torna
agradável o homem é a sua misericórdia" (Provérbios 19:22).
Por todas as Escrituras, lealdade a Deus significa colocá-lo em primeiro
lugar, renunciar a qualquer outro falso deus e demonstrar aos outros a fidelidade
do Senhor para conosco.
Isso nos leva à terceira mensagem importante de Rute. Lealdade é o vínculo
77
que une a família de Deus. O Senhor do impossível retém suas bênçãos até que
expressemos sua lealdade em nossos relacionamentos. A cruz é o exemplo do
extremo a que a lealdade deve ir. É através das lentes do Calvário que podemos
ver um ao outro e dizer o que Deus nos diz: "Não o deixarei! Você pertence a mim;
não renunciarei a você nem o deixarei partir."
Mais uma pausa para reflexão: Quem precisa saber disso? De quem você
precisa ouvir ou sentir isso?
As recompensas da lealdade são inerentes a ela. Lealdade é a própria
recompensa, porque ela satisfaz a uma necessidade dada por Deus. Ele nos criou
para si mesmo e para um profundo relacionamento uns com os outros.
Cumprimos o nosso destino quando somos leais. Tornamo-nos como nosso Deus.
Tudo o que aconteceu a Rute — as bênçãos que recebeu e a felicidade que
experimentou — foi por ela se ter sujeitado à lei espiritual da lealdade.
Talvez você esteja dizendo: "Espere um pouco, Lloyd. O que fazemos
quando as pessoas nos desapontam ou fazem essas coisas indignas da nossa
lealdade?" isso nos compele a examinar mais a fundo os ingredientes da
verdadeira lealdade. A fidelidade deve ser demonstrada juntamente com a
honestidade, a franqueza, a exortação e o ânimo. Quando as pessoas fazem
coisas que ferem nossa lealdade, precisamos amá-las o bastante para partilhar
com elas a nossa percepção do que está errado. A lealdade não é cega. Antes, vê a
pessoa através dos olhos do amor — o que ela é e pode ser. A franqueza é, sem
dúvida, necessária a uma lealdade saudável. Deslealdade é fazer comentários
acerca de uma pessoa em vez de ir diretamente a essa pessoa, objeto de tais
comentários. Prometi a Deus, anos atrás, que jamais diria algo acerca de uma
pessoa que já não tivesse dito a ela própria, ou que não fosse capaz de dizer--Ihe
dentro de vinte e quatro horas. Tenho quebrado essa promessa, o que me forçou
a buscar o perdão e fazer restituição. Todavia, o esforço por cumprir essa
promessa tem cimentado relacionamentos de mútua confiança. Todos nós
precisamos de pessoas que nos aconselhem ou nos critiquem. Aqueles que nos
contam um fuxico, por certo vão fuxicar a nosso respeito. Devemos conversar
com Deus acerca das coisas que nos incomodam no tocante às pessoas, e depois
conversar diretamente com as pessoas na perspectiva dessas orações.
E se elas em vez de nos ouvir, continuarem magoando-se e destruindo-se a
si mesmas e aos outros? Permaneçamos leais! Lealdade não é aprovação. É a
ação de um tipo de amor que dá, perdoa e ama apesar de tudo. A lealdade não
nega o certo nem desculpa a irresponsabilidade. Na verdade, por causa da
lealdade não podemos permanecer alheios nem fingir que não percebemos o com-
portamento que destruirá essas pessoas. Comprometer-se com a lealdade
significa envolvimento coerente no esforço de ajudar os outros a descobrir e fazer
a vontade de Deus. Isso não é fácil e exige esforço incansável. Todos nós temos
falhado repetidas vezes em ajudar as pessoas a expressar o seu potencial.
Esse éExortar
ã lealdade. o motivo de a exortação
é descobrir e oreais
os alvos estímulo serem elementos
das pessoas tão essenciais
e estimulá-las a atingi-
los. Estimular é aproximar-nos delas e incentivá-las. Ter amigos que partilham de
nossos sonhos e desejam o melhor que Deus tem para nós é provar um pouco do
céu. Mas ter amigos assim requer que sejamos esse tipo de amigo. Wil-liam
James disse: "O princípio mais profundo na natureza humana é o anseio de ser
amado." Só Deus pode satisfazer a esse desejo. Não há sentimento de apreço mais
profundo por uma pessoa do que compreendê-la. Isso significa conhecer tanto
suas esperanças como também suas mágoas, e ser um incentivador leal
enquanto elas correm em direção de seus alvos.
78
Boaz conferiu a Rute honra e reconhecimento por causa da sua lealdade.
Excelência é ser tudo o que Deus deseja que sejamos. E o ponto de partida é a
nossa aceitação de sua lealdade, expressa numa lealdade imorredoura a ele, a
qual florescerá em lealdade duradoura para com as pessoas de nossa vida.

79
CAPÍTULO DOZE
EBENÉZER
Samuel
Faz algum tempo, um grupo de seminaristas me visitou para conversar
sobre pregação. Um deles fez uma pergunta muito pessoal: "Na hora de se
levantar para pregar, o que passa pela sua mente ao olhar para a congregação? O
que sente quando olha para as faces das pessoas?" Ao responder, percebi que

penso e sinto
compaixão, o mesmo quando inicio um capítulo de um livro: identificação,
amor.
Os meus leitores se transformam numa única pessoa diante dos meus
olhos. Mediante o dom do discernimento vejo abaixo da superfície. O que me
escreveram, o que confidenciaram em conversas particulares ou tornaram
público em debates, tudo isso forma uma única voz que estrondeia, em minha
mente e alma, a necessidade real das pessoas. De repente, sinto-me ferido com as
suas feridas, sofro com as suas dores, espero com as suas esperanças, e desejo
ser corajoso em seus desafios. Ao mesmo tempo, devo ser honesto acerca de uma
profunda ansiedade: que o que escrevo faça diferença.
E isso é especialmente verdadeiro à medida que escrevo este capítulo. Meu
desejo é que ele seja uma separação significativa, um intervalo abençoado entre o
passado e o futuro. Ouvindo o pulsar das esperanças e mágoas das pessoas,
estou consciente de que muitos precisam de curar suas recordações. Precisamos
desprender--nos do passado e avançar para o futuro como pessoas livres. O
propósito deste capítulo é ajudar o leitor a dar início a um novo passado. E ele
começa agora mesmo. A maneira como lidamos com as lembranças que nos
perseguem ou embaraçam é que vai determinar que tipo de episódio passado
vamos reviver hoje.
Três pressuposições reforçam o que desejo dizer: (1) Se não
experimentarmos a cura do passado, iremos repeti-lo; (2) sem a cicatrização das
lembranças, nada aprendemos do passado; e (3) a única maneira de mudar o
passado é reconhecê-lo e em seguida renunciá-lo.
Somos tentados a lidar com o passado usando maneiras impróprias. O
remorso é uma delas. Muitos de nós o sentimos. Fazemos um retrospecto de
nossas ações ou omissões, e a dor oculta do remorso pulsa dentro de nós. "Por
que agi daquela maneira?" "Por que permiti que aquelas palavras escapassem da
minha boca?" indagamos. Por algum tempo, em minhas orações matutinas, pedia
ao Senhor que colocasse um freio na minha língua. Anseio reagir ao movimento
de seu Espírito, antes de abrir a boca. Você se sente assim? Naturalmente que
sim. E quanto aos resíduos de remorsos cuidadosamente acumulados e ainda
não solucionados? Fracassos, tolices, erros, oportunidades mal empregadas. E
dizemos a nós mesmos: "Que direito tenho de ser feliz com lembranças desse
tipo?"
Outros sentem pesar pelo passado. Embora não tão profundo como o
remorso, o pesar também perturba a felicidade presente. "Se ao menos eu
pudesse fazer aquilo de novo!", confessamos. As faces das pessoas que ferimos,
negligenciamos ou maltratamos desfilam em nossa mente.
Ainda outros sentem aguda recriminação, ao tomar o passado em suas
próprias mãos e assumir a responsabilidade do castigo. Criticamos os outros pelo
que fizeram ou deixaram de fazer, ou, o que é pior, recusamo-nos a perdoar o que
80
alguém nos fez. A lembrança se infecciona como uma farpa em nossa alma.
Tomamos o controle de nossa parte do Universo e exigimos a abdicação de Deus,
o único que pode nos absolver, ou aos outros pelo que fizemos ou fomos.
Ainda outros usam a renúncia. Sem purificar o passado , fazemos firmes
promessas de agir de maneira diferente no futuro. Tentamos fechar a porta sobre
o que já fomos, mas só conseguimos calar os dragões da memória. De vez em
quando eles despertam em nossa consciência e ensaiam retomar a antiga cena
numa nova situação. A renúncia de nossas lembranças parece muito espiritual. A
única coisa errada é que ela não dá certo.
Na verdade, nenhuma dessas maneiras de lidar como o passado funciona.
Só há um jeito de curar as recordações: É regozijar-nos com o passado! Você leu
direito. Regozijar-nos. Seja o que for que nos leve a regozijar com o que aconteceu
a nós e à nossa volta, inclusive as lembranças mais dolorosas, esta é a única
forma de encontrar alívio. Significa voltar ao passado e superar, em comunhão
com o Mestre, o que dissemos ou fizemos a alguém ou o que foi dito e feito a nós.
Quando o ouvimos perdoar, a nós e aos outros, somos então capazes de perdoar
a nós mesmos e aos outros. Então podemos regozijar-nos com o que aprendemos,
permitir que escorra o pus da ferida e se cicatrize a carne nua da memória, agora
purificada. O Senhor nada desperdiça e tudo faz para aproximar--nos mais a si e
uns aos outros.
Foi isso o que Samuel fez por Israel. Samuel foi o profeta mais importante
desde Moisés, e também o último juiz de Israel. Prestamos um grande desserviço
à memória desse grande homem, lembrando-nos dele como alguém que, embora
relutante, aceitou a reivindicação de Israel por um rei, e ungiu a Saul e mais
tarde a Davi. Seu melhor momento como servo especial de Deus se deu antes
desses eventos. No final do período dos juizes, ele se projeta como aquele que
cura lembranças, ao ajudar Israel a se arrepender e a regozijar-se com os
fracassos do passado. Samuel preparou Israel para uma nova era, forçando-o a
abandonar as lembranças das derrotas. Através dele entramos na posse de uma
palavra que é agora a senha para o poder de Deus que cura as recordações:
Ebenézer!
Em hebraico, "Ebenézer" significa "a pedra de ajuda". Samuel a usou numa
época de vitória sobre os filisteus. Ele colocou uma enorme pedra entre Mispa a
Sem, e a chamou Ebenézer, ao declarar: ' 'Até aqui nos ajudou o Senhor''. Ele
tomava uma recordação amarga, de anos de derrota, e a substituía por um
memorial, uma pedra de gratidão. Através dos séculos, o vocábulo se associou
tanto com a oração de Samuel: "Até aqui nos ajudou o Senhor", que o significado
passou a ser quase sinônimo. Israel se transformou pela purificação de
recordações dolorosas mediante novas lembranças de louvor. Samuel tomou-se
um dos grandes do Antigo Testamento porque fez de seu caráter um exemplo,
ensinando a Israel a verdade liberadora do relacionamento inseparável entre a
gratidão e a grandeza.
Alguns parágrafos de acontecimentos passados delineiam as implicações da
liderança de Samuel para a nossa vida hoje. O grande profeta e juiz de Israel
assumiu a liderança no período turbulento perto do final da colonização de
Canaã e do início da monarquia hebréia. Ele nasceu no declínio do período dos
juizes, quando Israel caiu de joelhos, não em adoração a Iavé, mas diante da
humilhante derrota imposta pelos filisteus. O capítulo um de 1 Samuel revela que
o profeta era um presente de Deus em resposta às orações insistentes de sua
mãe. Ao dedicar Ana o filho ao Senhor na presença do sacerdote Eli, disse: "Por
este menino orava eu; e o Senhor me concedeu a petição, que eu lhe fizera. Pelo
81
que também o trago como devolvido ao Senhor, por todos os dias que viver" (1
Samuel 1:27-28). Na oração de louvor que se segue, podemos perceber porque a
gratidão se tornou a fonte da grandeza do filho de Ana nos anos posteriores. O
rapaz assimilava bem a sua lição aos cuidados de uma mãe agradecida. A atitude
de gratidão de Samuel permitiu a Deus usá-lo num dos períodos de maior
ingratidão de Israel.
Ana deixou seu filho com Eli, para que o auxiliasse na ministração dos atos
sacerdotais diante do Senhor. Foi ali que Samuel captou a sua chamada do
Senhor. Em uma época em que a palavra do Senhor era rara e as visões pouco
freqüentes, ele chamou a Samuel pelo nome (1 Samuel 3:1). Primeiro, o jovem
pensou que era Eli a chamá-lo. Ele não conhecia o Senhor. Após chamadas
repetidas e depois do conselho de Eli de que se ele ouvisse de novo a chamada
provavelmente seria da parte do Senhor, deu-se o encontro decisivo. "Samuel!
Samuel!", chamou o Senhor. Samuel respondeu com as palavras que lhe ensinara
Eli. Elas haveriam de se transformar na essência do poder do futuro líder: "Fala,
Senhor, porque o teu servo ouve" (1 Samuel 3:9). O Senhor disse ao jovem
Samuel que estava para fazer uma grande coisa em Israel. Teria início com o
julgamento da casa de Eli, por causa dos pecados que seus filhos cometeram ao
tomar a oferta de sacrifício do povo e usá-la para satisfazer a si mesmos. No dia
seguinte, Eli insistiu com Samuel a que lhe contasse o que o Senhor lhe havia
dito. Foi um instante de verdade com sérias repercussões para o velho sacerdote,
que fora indulgente para com seus filhos. Eli confirmou que Samuel era profeta
do Senhor. Daquele dia em diante todo o povo de Israel passou a respeitá-lo como
tal. Posteriores revelações do Senhor vieram fortalecê-lo como profeta sobre o
povo.
Seguem-se, então, três capítulos que nem mencionam Samuel.

Mas o que aconteceu em Israel naqueles anos compôs o cenário para o


melhor momento do profeta. Os exércitos de Israel foram derrotados num local
chamado Ebenézer. Logo em seguida os fi-listeus capturaram a Arca da Aliança,
símbolo da presença do Senhor. Eli morreu e sua nora expressou o estado de
espírito de todo o Israel ao chamar a seu filho recém-nascido de Icabode, que
quer dizer: "Foi-se a glória de Israel." Suas palavras manifestavam a lastimosa
condição do povo de Deus: "Foi-se a glória de Israel, pois foi tomada a arca de
Deus" (1 Samuel 4:21).
Mas Deus foi fiel à sua aliança. Embora seu povo amado e escolhido
persistisse no culto a Baal e a Astarote, acrescido de um vago compromisso com
ele, Deus não desistiu dele. A captura da Arca só trouxe problemas aos filisteus.
A história nos lega um fato irônico: os israelitas adotaram os deuses dos filisteus
e falharam; os filisteus tentaram obter o poder de Iavé mediante a Arca e
falharam! Dentro daquela Arca achava-se a razão do fracasso: as tábuas dos
mandamentos, que iniciavam:
Israel nem as nações inimigas "Não terás zombar
poderiam outros deuses
de Iavé!diante de mim".
Por fim, Nem
os filisteus
clamaram: "Livremo-nos dessa Arca!" E ela foi devolvida a Israel. A devolução da
Arca causou uma reação inesperada no povo de Deus. Em vez de júbilo e
folguedos, houve um arrependimento nacional.
O povo se dirigiu a Samuel para pedir-lhe que oferecesse um sacrifício que
expressasse a lamentação deles e o seu anseio pelo poder de Deus. Samuel foi
categórico em dizer-lhes que o Senhor só os abençoaria se todos os ídolos de Baal
e de Astarote fossem removidos. Lembrando-se do tom incisivo de Gideão acerca
do culto pagão, Samuel sabia que o primeiro passo para um reavi-vamento em
82
Israel era varrer da terra os ídolos e falsos deuses. A cura de nossas lembranças
sempre começa com uma volta decisiva ao Curador.
O profeta levou o povo a Mispa, onde os dirigiu em adoração a Iavé. A
notícia de que o povo de Israel se ajuntara chegou aos filisteus, que decidiram
atacar. Quando os israelitas perceberam a aproximação dos filisteus, entraram
em pânico e apelaram a Samuel para que clamasse ao Senhor por socorro. Tudo
por que passara Samuel o havia preparado para esse momento. Uma geração
inteira havia vivido e lutado sem testemunhar uma intervenção marcante do
Senhor do impossível. A percepção do pecado de sincretismo e a impossibilidade
de enfrentar o poderio militar dos invasores tornaram-nos receptivos ao que Deus
sempre estivera pronto a dar -lhes. Samuel sacrificou um cordeiro. Em resposta,
o Senhor apareceu na forma de uma violenta tempestade sobre os filisteus, que
fugiram atemorizados. Israel aproveitou para atacar, expulsando-os até Bete-Car.
O povo sabia que o Senhor vencera a batalha. A vitória do Senhor havia
confirmado a contrição do povo.
Depois de ganhar a batalha, Samuel, em gratidão a Deus, construiu um
altar e o chamou Ebenézer, a pedra da recordação. Diante de todo o povo ele
disse: "Até aqui nos ajudou o Senhor." Ana teria ficado satisfeita, pois sua
gratidão se tornou o poder da grandeza de seu filho. O agradecimento nos prepara
para um futuro triunfante.
Todos nós precisamos dar graças pelo que passou e pelo que virá. A
expressão "até aqui" implica em reflexão e reconsagração. Duas coisas se
salientam neste episódio central da vida de Samuel para a nossa atual
peregrinação.
A primeira é que a nossa capacidade de recordação, dada por Deus, deve
ser enchida com a sua graça e com a nossa gratidão para compensar as
severidades de nossos fracassos. Quanta sensibilidade da parte de Samuel ao
chamar de Ebenézer o seu altar de louvor! Anos atrás, os israelitas gemeram de
dor pela derrota no local conhecido por Ebenézer. Não lhes seria possível
esquecer essa derrota até que formassem uma nova imagem deles próprios, como
um povo vitorioso e abençoado.
Isso possui tremendas implicações para nós. Todas as lembranças
inquietantes devem ser trazidas à superfície mediante o poder transformador do
Espírito Santo. Enquanto o Espírito não colocar novas memórias em nossa
mente, em substituição às que nos enfraquecem, transformar-nos-emos nas
derrotas do passado. Nosso Ebenézer é o local de descanso para a gratidão no
meio das fortes correntes de nossa experiência. Somos forçados a louvar e a dizer:
"Até aqui nos ajudou o Senhor." Podemos reconhecer os fracassos com o perdão
do Senhor, e em seguida nos despojarmos deles, regozijando-nos com o que
aprendemos.
Todos nós experimentamos o poder das memórias ruins em momentos
quando
de voltamenos esperamos.
a percepção Uma face
de nossa faltafamiliar ou umaou
de coragem série
os de circunstâncias
resultados traz
de algum
compromisso. Revivemos toda a sujeira de nossas imperfeições. Então o Senhor
começa a nos en-sinar através do que já passamos. Jesus nos lembra que apenas
Aqueles que foram perdoados muito possuem muito amor (Lucas 7:47). E, então
podemos dizer: "Ebenézer! Até aqui me ajudou o Senhor!"
A segunda coisa que aprendemos com o Ebenézer de Samuel é que o
Senhor é o grande curador de recordações. Ele sabe que não podemos agarrar o
presente nem nos entregar ao futuro enquanto as recordações enfraquecedoras
do passado não forem apagadas. Samuel ajudou Israel a lidar com o passado e a
83
prosseguir para o desafio do futuro.
A expressão até aqui denota esse futuro. Ela não sugere que o povo de
Israel já o tivesse alcançado, mas que o Deus que os trouxe ate ali reservava-lhes
um futuro empolgante.
Que recordações do passado ainda o perseguem e embaraçam? Ha
recordações de mágoas que recebemos e infligimos. Pessoas de nosso passado
remoto começam a surgir em nossa mente. Os demônios da culpa reprimida
espreitam em nosso baú de recordações. Mas há, também, lembranças de
triunfos, as quais, por acedermos à tentação, reivindicamos como realização
nossa. O orgulho nos invade e nos distancia do louvor. Precisamos de um
Ebenézer a lembrar-nos que foi o Senhor que nos trouxe até aqui, e não nossa
inteligência ou habilidade.
Paulo conhecia a essência do Ebenézer que sempre se repete. "Irmãos,
quanto a mim, não julgo havê-lo alcançado; mas uma coisa faço: esquecendo-me
das coisas que para trás ficam e avançando para as que diante de mim estão,
prossigo para o alvo, para o prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo
Jesus" (Filipenses 3: 13-14). Jamais chegamos à perfeição. Esta vida não pode
conter tudo o que nosso Senhor preparou, e por isso precisamos da eternidade.
Spurgeon captou a dinâmica da expressão até aqui, quando afirmou:
A expressão. . . aponta para algo mais além. Pois quando alguém chega a
certo limite e escreve "até aqui", ele não está ainda no fim; há ainda um longo
caminho a ser percorrido. Mais provações, mais lutas, mais vitórias; e então a
doença, a idade avançada, a debilidade física, a morte. Agora chegou ao fim? Não!
Há mais ainda — despertar à semelhança de Cristo, tronos, harpas, canções,
salmos, vestes brancas, a face de Jesus, a comunidade dos santos, a glória de
Deus, a plenitude da eternidade, a infinidade de alegria. Oh, tenha bom ânimo,
crente, e com grata confiança edifique o seu "Ebenézer".
Nossa confiança é que o Senhor, que até aqui nos tem ajudado, há de
acompanhar-nos através de toda a nossa jornada! John Newton conhecia essa
verdade. Cristo redimiu a sua vida, libertou-o do orgulho e da petulância e
concedeu-lhe uma experiência tal de seu amor que ele pôde dar ao mundo muitos
hinos de louvor, entre eles "Maravilhosa Graça". De traficante de escravos tornou-
se ministro do evangelho e uma testemunha agradável e descontraída da
liberdade de Cristo.
O epitáfio colocado em seu túmulo sintetiza o que Deus pode fazer quando
começamos um novo passado:

JOHN NEWTON, ministro


Outrora ateu e libertino
Traficante de escravos da África:
Foi pela rica graça de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo,
Preservado,
E chamado arestaurado,
pregar a féperdoado
Que antes lutou tanto para destruir.

Só Cristo pode lidar com as nossas lembranças. Ele persiste conosco até
que nos regozijemos. Para cada erro ou fracasso, ou para cada ação
enfraquecedora ou destrutiva contra nós, o perdão é o único caminho para a
liberdade que nos conduz ao futuro. Se tentarmos julgar ou expiar por nós
mesmos e pelos outros, tropeçamos, e o passado fica trancado como fogo em
nossos ossos. Samuel Johnson costumava dizer: "O sábio se apressa a perdoar,
pois conhece o real valor do tempo". Só podemos obter a saúde interior através do
84
perdão — e este é a única coisa que não podemos dar enquanto não o recebemos.
Perdoar aos outros é o sublime resultado de perdoar-nos a nós mesmos como
perdoados pela cruz.
Lembro-me de passar por um cemitério algum tempo atrás e notar uma
lápide. A palavra "perdoado" estava gravada no centro do mármore, e ao fundo
estava o nome de um líder cristão pioneiro naquela cidade. "Perdoado" é o segredo
de um novo passado.
O Novo Testamento contém o Ebenézer de todas as épocas. E a pedra sobre
o túmulo de Cristo no jardim de José de Arimatéia. foi colocada na porta do
sepulcro onde depositaram o corpo sagrado do Salvador. Mas Deus teve a palavra
final. Ele removeu a pedra e ressuscitou a Jesus dentre os mortos. Ele expiou na
cruz todas as nossas recordações. Elas foram sepultadas com Cristo. Agora, a
pedra entre nós e o futuro está removida, e uma nova
vida pode começar. Como Paulo declara: "Fomos, pois, sepultados com ele
na morte pelo batismo; para que, como Cristo foi ressuscitado dentre os mortos
pela glória do Pai, assim também andemos nos em novidade de vida" (Romanos
6:4). Ebenézer! Até aqui nos conduziu o Senhor — até aqui nos ajudou o Senhor.
A estátua que Miguel Ângelo esculpiu de Davi e Golias, atualmente em um
jardim de Florença, Itália, foi feita de um pedaço de mármore que outro artista
havia rejeitado e jogado fora. Isso é o que Deus faz com o nosso passado. O que
rejeitamos, ele transforma um algo de beleza duradoura. Ele nos dá poder para
regozijarmos com a nova pessoa que ele esculpiu das experiências infelizes de
nossos dias passados. Nossa atenção, agora, pode concentrar-se no que será, em
vez de no que tem sido. Deus afirma: "Dos seus pecados jamais me lembrarei"
(Jeremias 31:34). E dizemos com o salmista: "Não te lembres dos pecados de
minha juventude." Porque o povo de Israel se arrependeu e confiou em Deus pela
vitória cm suas batalhas, um antigo Ebenézer de derrota humilhante se
transformou num novo Ebenézer de humilde deleite.
O "até aqui" de Deus implica na promessa de "daqui em diante". Samuel
experimentou essa verdade. O resto de sua vida foi uma luta com a exigência de
Israel por um rei, em vez de firmar-se na confiança em Deus somente. Ele viu seu
povo aceitar a vontade provisional de Deus por recusar a vontade perfeita desse
mesmo Deus. Ele viveu através dos erros de Saul e encontrou a Davi um rei
"segundo o coração de Deus". Os dias turbulentos dos últimos anos da vida de
Samuel tiveram muitos Ebenézeres. Mas o que ele disse em sua primeira resposta
ao chamado do Senhor permaneceu como a doutrina de sua vida. "Fala, porque o
teu servo ouve." O profeta ouviu com toda atenção e respondeu com
expressividade. "E julgou Samuel todos os dias de sua vida a Israel" (1 Samuel
7:15).
Robert Robinson imortaliza o Ebenézer de Samuel e ajuda-nos a reclamar o
nosso no hino "Fonte Tu de Toda Bênção".

Cá meu Ebenézer ergo,


Pois Jesus me socorreu;
E, por sua graça, espero Transportar-me para o céu.

Qualquer de nós que tenha erguido um Ebenézer de cura das recordações,


e da alegria de antecipar o futuro, sabe que já voltou para o lar. Os problemas da
vida ou o poder da morte não nos podem assaltar. Bem-vindo ao lar, agora e para
sempre. Ebenézer.

85
CAPÍTULO TREZE
RETARDANDO A AÇÃO DO IMPOSSÍVEL
Saul, um Rei Obstinado
Até aqui, em nossa consideração do Senhor do impossível, vimos os
exemplos do que ele pôde fazer nas vidas dos que cooperaram com ele. Agora,
devemos ser tão honestos quanto a Bíblia no que diz respeito à nossa espantosa
capacidade de limitar o poder do Senhor em nossas vidas. Há ocasiões em que
nossas atitudes e ações claramente indicam que nada queremos com Deus. O
que mais assusta é que às vezes ele nos dá o que queremos.
Deus, embora todo-poderoso, nos deu a capacidade de aceitar ou rejeitar
suas intervenções em nossas impossibilidades. Recebemos tanto a vontade
quanto a liberdade de escolha. Esse é o nosso potencial. Deus nos deu a
habilidade de discernir e de fazer a sua vontade. Quando a fazemos, coisas
admiráveis acontecem. Mas podemos também recusar suas propostas de amor e
terminar com o mínimo, em vez de com o máximo que ele almeja para nós. E esse
é o nosso problema.
Um dia desses, conversava eu por telefone com um velho amigo. Ele havia
restringido o Senhor em todas as situações, e dito um não à orientação divina.
Agora ele se encontrava numa confusão, conseqüência natural de uma série de
escolhas contrárias ao que ele sabia ser correto. Quando seu casamento se tomou
monótono, ele, em vez de procurar ajuda, permitiu que uma paixão louca por
outra mulher chegasse a um caso amoroso, que acabou por destruir tanto o seu
casamento como o da amante. Sem desejar de fato continuar casado, ele
exteriorizou sua frustração mediante ações que não deixaram à esposa outra
escolha, senão pedir o divórcio. Quando sua vida profissional foi por água abaixo,
ele começou a indagar por que Deus permitira tudo isso. Senti-me levado a
retrucar: "Não é isso o que você desejava?" Seus verdadeiros desejos se tornaram
realidade.
A mesma coisa, só que num contexto diferente, aconteceu a uma mulher
que resistia constantemente à afeição do marido. Ele veio me consultar acerca do
que fazer. Sugeri-lhe que parasse de aca-ricia-la e conversar com ela por algum
tempo. Algumas semanas mais tarde a esposa veio me consultar. "O que
aconteceu com meu marido?" perguntou-me zangada. Quando ela descreveu a
frieza com que ele a tratava, perguntei: "Não era isso o que você vinha pedindo, de
mil maneiras, que ele fizesse?" Ao perceber isso, ela assustou-se e encarou o
problema mais profundo da manipulação mediante o afeto que dava ou negava.
Um diácono desabafou a triste história do que acontecia em sua igreja. Não
havia vitalidade,
perguntas crescimento,
incisivas entusiasmo.
acerca da dinâmica realEle
da censurava o pastor.
situação revelou umaAlgumas
luta de
poder entre ele e o pastor. A conversa revelou que o homem vinha desfazendo
todo o esforço do pastor para reavivar a igreja. Agora, com a igreja dividida ele
solicitou que o pastor entregasse o cargo. "Por que Deus não interfere e reaviva a
nossa igreja?" perguntou ele. "E isso o que você realmente deseja?" respondi.
"Parece que você tem desejado justamente o oposto, e obtido os seus desejos."
Recentemente, ao término de uma reunião, uma mulher me deteve para
conversar. Ela estava preocupada com o fato de Deus não ter respondido a suas
orações. Quanto mais falávamos sobre seu caso, tanto mais me tornava cônscio
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de incidentes específicos nos quais ela rejeitava as respostas de Deus devido à
sua religião, que dava ênfase à auto-justificação. Ela achava difícil entregar suas
necessidades a Deus, temendo perder o controle de sua vida. "Você deseja
realmente que Deus responda às suas orações?" perguntei. O seu sim soou como
um não. Ela tinha dado a Deus a agenda dela. Na realidade, ele tentava fazer com
que ela vivesse pela agenda dele. Quando ela resistia, por algum tempo Deus
permitia o mais profundo desejo dela, implícito nas entrelinhas de suas orações.
Ele lhe deu a liberdade de viver a sua própria vida. E alarmante refletir que, em
algumas ocasiões, Deus nos dá o que realmente desejamos! Mesmo quando
perdemos o seu melhor para nós, ele espera abençoar-nos até que busquemos de
todo coração a sua vontade. Essa mulher teve de sofrer muitos desgostos até que,
afinal, rendesse sua vontade ao Senhor.
Esses exemplos são alarmantes. Mais alarmante ainda é saber que uma
multidão de membros da igreja são apanhados na sín-drome de necessitar das
intervenções de Deus e resistir a elas. camuflamos a nossa obstinação com uma
fachada de religiosidade. As vezes nos ocupamos no trabalho de Deus e não o
desejamos de verdade. De milhares de maneiras adiamos as suas intervenções
em nossos problemas. Persistimos em controlar as pessoas e as situações,
rejeitamos a orientação que exige mudança de comportamento, e continuamos
com padrões que intensificam as próprias dificuldades acerca das quais oramos.
É possível entrarmos para o Cristianismo sem ao menos entregar nossa
vontade ao Senhor. Nossa vida pode se limitar ao que podemos fazer mediante a
nossa própria força, sem ele. A oração pode se tornar vazia. É possível nossas
igrejas se transformarem numa série de cultos e atividades que jamais nos levem
a um decisivo encontro com o Deus vivo. A vida que realmente desejamos é a que
obtemos!
Duro demais? Talvez. E, não obstante, essa possibilidade levou--me a
alguns dos diálogos mais honestos que jamais tive com as pessoas. Muitos têm
sido forçados a perceber que os problemas mais graves são causados pela falta de
um relacionamento íntimo com Deus. Sinto-me feliz em dizer que o choque de
constatar que suas palavras e ações traíam uma resistência obstinada a Deus,
por fim os levou a uma genuína experiência de seu amor e poder.
Essa análise moderna, de uma das necessidades mais prementes de muitos
cristãos, prepara o cenário para nosso exame de Saul, o primeiro rei de Israel. O
propósito deste capítulo é mais que estudar o seu caráter. Ele tem aplicações
repetidas para a vida atual. Saul mostra-nos um lado que muitos de nós
precisamos encarar e pedir poder para mudar. Em Saul vemos a aterradora
possibilidade de dizer não a Deus por tanto tempo que perdemos o desejo de dizer
sim. Podemos ver o que acontece quando sempre damos as costas às
aproximações do Senhor. A vida de Saul é um exemplo vivido da verdade
perturbadora
realmente nãode que podemos
queria a Deus! receber o que desejamos. E, em análise final, Saul
Em 1 Samuel 9, encontramos Saul pela primeira vez. De saída,
defrontamo-nos com o seu misto de promessas e problemas, vantagens e
desvantagens, forças e lutas. Saul possuía excelentes antecedentes familiares. Ele
era filho de Quis, herdeiro de uma tradição de coragem da pequena tribo de
Benjamim. Consta que ele era "moço, e tão belo que entre os filhos de Israel não
havia outro mais belo do que ele; desde os ombros para cima sobressaía a todo o
povo" (1 Samuel 9:2). Essa explanação da sua estatura física contrasta-se com o
que sugere a história que vem a seguir:
87
Quis mandou que Saul e um servo fossem procurar algumas jumentas
extraviadas. Procuraram por muito tempo e chegaram A terra de Zufe, onde
Samuel morava. Saul decidiu que a busca era inútil. O servo, não Saul, deu a
seguinte sugestão: "Nesta cidade há um homem de Deus, e é muito estimado;
tudo quanto ele diz, sucede: vamo-nos agora lá; mostrar-nos-á, porventura, o
caminho que devemos seguir" (1 Samuel 9:6). Deduzimos deste versículo que
Saul nada sabia acerca de Samuel ou das grandes questões que Israel
enfrentava. Como seria possível um jovem, com o potencial de liderar a nação
contra seus inimigos, não conhecer o profeta de Deus do momento?
O encontro com Samuel revelou mais que o modo de encontrar as
jumentas. Nele, o profeta anunciou a Saul o que o Senhor lhe havia dito. O filho
de Quis deveria reinar sobre o povo de Deus e comandar os seus exércitos na
incessante batalha contra os filisteus. Samuel ungiu a Saul e deu-lhe instruções
misteriosas. Ele devia seguir para casa, pois no caminho encontraria dois
homens que lhe dariam o relato da recuperação das jumentas. Mais além, ele en-
contraria três homens a caminho de Betel, onde sacrificariam, os quais lhe
dariam bolos de pão, que ele devia receber. Logo a seguir, Saul encontraria um
grupo de profetas. "O Espírito do Senhor se apossará de ti, e profetizarás com
eles, e tu serás mudado em outro homem" (1 Samuel 10:6). Para Saul, isso deve
ter soado um tanto místico e estranho. Tudo o que desejava era encontrar as
suas jumentas. Agora, via-se recrutado pelo Senhor para ser rei de Israel e
general dos seus exércitos. Não há registro de uma resposta da parte de Saul. A
instrução final de Samuel era mais desconcertante que as outras. No futuro, Saul
devia ir a Gilgal onde o profeta ofereceria holocaustos e apresentaria ofertas
pacíficas a Deus. As ordens eram que Saul aguardasse ali sete dias, e então
Samuel lhe diria o que fazer. A hierarquia do comando estava claramente es-
tabelecida: o Senhor, seu profeta e o rei designado. Samuel tinha plena certeza de
que este rei o manteria informado de tudo. Se Israel exigia um rei, este cumpriria
as ordens do profeta.

Quando Saul deixou Samuel, experimentou um movimento dinâmico do


Espírito do Senhor dentro dele. Era uma confirmação de tudo o que o profeta lhe
revelara. A informação que temos é que Deus deu-lhe um novo coração, isto é, ele
foi dotado de uma nova disposição, de uma abertura para com o Senhor, de um
desejo de servi-lo e de uma certeza de sua chamada. Outrora, os anseios e a
disposição de Saul consistiam em preocupar-se consigo mesmo e com suas
responsabilidades domésticas. Não há referência alguma de que ele tenha tido
uma experiência prévia com o Senhor, algum interesse nele, em suas bênçãos ou
na situação do povo.
A caminho de casa, tudo o que Samuel disse aconteceu. De tudo, 0 mais
importante foi seu encontro com o grupo de profetas, o qual lhe deu uma nova
experiência com o Senhor.
enchia do Espírito Como
do Senhor. Elehavia recebido
se uniu um novoo coração,
aos profetas, Saul pelo
que resultou, agoraque
se
se presume, numa combinação de elocução profética, louvor extático e canto exu-
berante. E o mais significativo foi o espanto de seus compatriotas, atônitos, a
comentarem uns com os outros: "Que é isso que sucedeu ao filho de Quis?
Também Saul entre os profetas?" (1 Samuel 10:11). Essa indagação realça ainda
mais a falta de religiosidade na vida de Saul.
E para Saul, o que tudo isso significava? Sabemos que quando ele
encontrou seu tio e este inquiriu acerca das jumentas, ele relatou seu encontro
com Samuel. O tio, sem dúvida cônscio da experiência de Saul com os profetas, e
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muito interessado no que havia acontecido quando ele esteve com Samuel, pediu-
lhe: "Conta-me, peço--te, que é o que vos disse Samuel?" A resposta veio cheia de
reservas e estranhas precauções. Nada disse de sua chamada, de sua unção para
ser rei ou do novo coração que o Senhor lhe deu e vivificou com o seu Espírito.
Alguns podem interpretar a ação de Saul como humildade. Entretanto, eu
gostaria de conhecer a real sensação de Saul acerca da sua experiência ou da
urgência da sua chamada para conduzir os exércitos de Israel contra o inimigo.
Evidência posterior a esse respeito vem à tona quando Samuel reuniu o
povo de Israel em Mispa. Uma vez mais o povo pediu um rei que reinasse sobre
eles. Com relutância, Samuel, seguindo a orientação do Senhor de dar-lhes um
rei, anunciou que este seria escolhido da tribo de Benjamim. E então, para
surpresa de todos, declarou que Saul, filho de Quis, havia sido escolhido rei. Mas
ninguém conseguia encontrá-lo em parte alguma. Na verdade, o -vistoso Saul
estava escondido entre a bagagem! O próprio Senhor disse onde encontrar o rei.
Correram e o levaram a Samuel. Estando ele no meio do povo, era o mais alto e
sobressaía a todo o povo do ombro para cima. A aprovação de Samuel parecia
contradizer a óbvia relutância de Saul. "Vedes a quem o Senhor escolheu? Pois
em todo o povo não há nenhum semelhante a ele". E o povo exultou em ter
finalmente um rei, e exclamaram: "Viva o rei!" Mas outros disseram: "Como
poderá este homem salvar-nos?"
O relato do chamado de Saul expõe os problemas essenciais que o
acompanharam por toda a vida. Ele tinha grande estatura, mas pequeno caráter.
Ele era qual uma torre acima de todo o povo e, contudo, se acovardava diante do
desafio de liderá-los. Ele recebera poder do Senhor para uma causa que não lhe
prendia, sequer, a atenção e o interesse. Pessoas como essas podem ser
perigosas. Elas fazem o que se requer delas por motivos errados. Não possuem
rigidez de caráter. O plano e os propósitos do Senhor se desvirtuam na
necessidade que têm de reconhecimento e engrandecimento. Saul, em vez de
realizar a obra de Deus pelo poder de Deus, ele a realiza para a sua própria
glória.
No princípio de sua carreira militar, Saul demonstrou sair-se de forma
espetacular. O Espírito do Senhor não só o abençoou nas batalhas, mas também
deu-lhe uma atitude magnânima para com aqueles que zombaram da sua
coroação.
Dois anos mais tarde, Saul cometeu o primeiro de vários erros fatais que
deram início à sua queda. Antes de uma batalha, em vez de esperar por Samuel,
que ofereceria o sacrifício, Saul assumiu a direção, fazendo-o ele próprio. As
ordens do profeta eram que ele esperasse sete dias. Como Samuel não
aparecesse, Saul apresentou o sacrifício sozinho. O problema era de obediência
ao que o Senhor havia ordenado através do profeta. Quando Samuel chegou e in-
quiriu: "Que fizeste?" Saul se desculpou, acusou o povo e expressou sua
impaciência.
de autoridadeEle havia
entre usurpado
profeta a autoridade
e rei no cumprimentodo das
profeta e recusado
ordens de Deus.oAequilíbrio
resposta
de Samuel foi devastadora: "Procedeste nesciamente em não guardar o
mandamento que o Senhor teu Deus te ordenou; pois teria agora o Senhor
confirmado o teu reino sobre Israel para sempre. Já agora não subsistirá o teu
reino. O Senhor buscou para si um homem que lhe agrada, e já lhe ordenou que
seja príncipe sobre o seu povo, por enquanto não guardaste o que o Senhor te
ordenou" (11 Samuel 13:13 - 14).
Podemos imaginar o pânico do coração de Saul. Ele relutara em ser rei.
Então, quando a aprovação do povo e o sabor do poder começaram a preencher o
89
seu vazio interior, ele se tornou dominador e impetuoso. Porque o Senhor e os
seus mandamentos não eram a paixão da sua vida, ele persistia na
desobediência. O medo de perder a sua nova glória apenas intensificou sua
compulsiva determinação.
Mas não vamos ser muito duros com Saul. Ele sempre reconhecia que o
poder do Senhor é que lhe dava a vitória nas batalhas que travava. Ele erigia
altares para honrar a Iavé. Mas a mudança fatal se efetuara. Sua chamada devia-
se tanto à sua fraqueza como ao seu vigor, de modo que o povo ficasse espantado
com o que Deus, não Saul, podia fazer. O que acontecia com Saul era que,
apenas para seu próprio intento e propósitos, ele desejava o poder de Deus. Saul
jamais parecia manter um relacionamento de confiança com 0 Senhor, de modo
que pudesse entregar cada passo à estratégia divina. Embora constituído rei sob
condições muito claras, ele sempre se opunha à autoridade de Deus e à distinta
posição de Samuel como porta-voz do Senhor. Por não manter uma comunhão
com o Senhor, ele reagia contra o inimigo sem um plano de batalha voltado para
os objetivos de Deus.
A mesma coisa nos pode acontecer quando desejamos que Deus siga os
nossos planos, em vez de seguirmos os dele. É possível desejarmos o miraculoso
poder de Deus a fim de conseguir coisas para nós, e ao mesmo tempo impedirmos
que ele nos torne íntegros e consolidados no firme fundamento de seu amor e
aceitação. Deus nos quer, mas não exatamente para o que podemos fazer para
ele. Quando ele nos possui através da constante entrega de nossos desafios
diários, então o impossível acontece a nós e aos que estão à nossa volta.
Mas, com demasiada freqüência, à semelhança de Saul, nos tornamos
pessoas que reagem, ao invés de pessoas que agem. Partimos de um problema
para outro, clamando: "Senhor, tira-me desta!", em vez de: "Senhor, ajuda-me
através disto e do que vier segundo os teus alvos para mim." O poder do Senhor é
para seus propósitos, e não uma muleta em que nos apoiemos enquanto
vencemos um problema e nos preparamos para outro.
Muitos dos problemas de Saul eram auto-induzidos. Percebemos uma
autonegação crescente, chegando à beira da autodestruição Esse tipo de
distúrbio emocional faz, normalmente, que nos tornemos intratáveis, colocando
os outros em dificuldades. Por não crermos que Deus nos ama, começamos a
pensar que os outros também estão contra nós. Serve como exemplo na vida de
Saul o relacionamento dele com seu filho Jônatas. Um dia, Saul ordenou que
nenhum de seus soldados se alimentasse até o anoitecer. Quando ele deu a
ordem, Jônatas não se achava presente, pois em local distante lutava com os
filisteus. Depois de conquistar um segmento das forças inimigas, Jônatas tornou
a juntar-se às principais forças de Israel. Numa área da floresta, encontrou mel
que gotejava de uma colméia. Por desconhecer as ordens do pai, mergulhou a sua
vara no mel para se recuperar da batalha. A notícia de sua aparente
desobediência
filho. Quando achegou ao rei, e aeste,
sorte apontou culpairado, decidiu lançar
de Jônatas, sortes entreà ele
Saul condenou-o e seu
morte. E
estranho que Saul ordenasse a proibição na ausência de Jônatas, que, portanto,
não podia ter conhecimento dela. Alguns propõem que Saul, com essa ordem,
criou uma situação sem saída para o seu filho. Jônatas era um soldado muito
atraente e valoroso. Suas vitórias na batalha traziam--lhe grande aclamação.
Estaria Saul com ciúmes? Somente a objeção do povo salvou o rapaz.
Quando o Senhor deixa de ser a nossa segurança, somos tentados a expor-
nos à mágoa e a romper relacionamentos. Por estarmos fora do fluxo da graça
para os nossos fracassos, sem ao menos refletir criamos circunstâncias nas quais
90
somos punidos. Nós nos voltamos até mesmo contra as pessoas mais achegadas.
Quanto mais expressiva é a pessoa que nos fere, tanto mais dolorosa é a angústia
que daí resulta. Quando quebramos nosso relacionamento com o Senhor, como o
nosso único juiz, e, por conseqüência, nossa única fonte de perdão, planejamos
para que a vida e as pessoas reforcem os maus sentimentos que temos por nós
mesmos. Quando nos sentimos mal acerca de nós mesmos, é fácil criarmos
situações em que as pessoas concordem com a nossa auto-estima negativa.
Isso esclarece, mais adiante, por que Saul, sob forte compulsão, fazia
conscientemente aquilo que o colocaria em dificuldades com Samuel. O rei não
tinha segurança de sua própria autoridade e, portanto, tinha de pôr à prova a
autoridade de Samuel repetidas vezes. Na verdade, ele forçava a mão de Deus,
como quando saiu para guerrear os amalequitas. Por meio de Samuel, o Senhor
deu ordens claras para que não tomasse nem despojo nem prisioneiros. A ordem
parece cruel, mas deve ser compreendida no contexto desse período histórico. O
ponto em discussão, no presente estudo de Saul, é que ele não obedeceu às
ordens. Ele tomou a Agague, rei dos amalequitas, bem como o espólio, o melhor
das ovelhas, dos bois, e dos cordeiros "e o melhor que havia, e não os quiseram
destruir totalmente; porém a toda coisa vil e desprezível destruíram" (1 Samuel
15:9). Se a motivação de Saul tivesse sido a compaixão, o caso seria bem
diferente. Em vez disso, ele não fora capaz de seguir as ordens, de maneira que
teve de criar uma situação que prejudicaria ainda mais o seu relacionamento com
Deus. Quando não desejamos realmente a autoridade de Deus sobre nós, insisti-
mos em repetir aquelas coisas que abusam da sua paciência. Da mesma forma
que fazemos com que as pessoas se tornem nossas Inimigas, assim também nos
portamos ao resistirmos a Deus. Se não o conhecemos como um amigo, muitas
vezes o projetamos na mente como um inimigo. Acabamos pensando que Deus
está contra nós, em vez de a nosso favor.
A neurose espiritual de Saul revelou-se numa visível arrogância quando,
logo após sua vitória sobre Agague, foi ao monte Carmelo e levantou um
monumento, não para Iavé, mas para si mesmo! Quando Samuel tomou
conhecimento do fato, sua dor pela desobediência de Saul transformou-se em
indignação santa. O encontro do profeta com o rei nos momentos subseqüentes é
cheio de drama e pesar. Ao cumprimentar Saul o profeta, suas palavras traíam o
quanto ele se afastara da realidade. "Bendito sejas tu do Senhor; executei as
palavras do Senhor" (1 Samuel 15:13). Mas Samuel, ao ouvir o balido das ovelhas
do despojo proibido, disse: "Que balido, pois, de ovelhas é este nos meus ouvidos,
e o mugido de bois que ouço?" (1 Samuel 15:14). A resposta de Saul é absurda.
Ocultando o fato de haver construído um altar para si mesmo, ele protestou
haver tomado o melhor das ovelhas e dos bois a fim de os oferecer ao Senhor em
sacrifício. A resposta de Samuel é incisiva. Ela expõe o problema real de Saul — a
insegurança, que ele jamais permitiu ao Senhor curar. "Porventura, sendo tu
pequeno
o Senhor aos teus olhos,
rei sobre não
ele?" (1 foste por
Samuel cabeça
15:17). das tribos
O problema dede Israel,
Saul era eque
nãoembora
te ungiu
ele
fosse o mais alto em Israel, ele era pequeno a seus próprios olhos. Tornar-se rei
jamais curou a ferida aberta de seu caráter. O julgamento de Samuel atingiu o
âmago de seu problema. Em resposta ao protesto piedoso de Saul, de que havia
tomado o despojo para o sacrificar ao Senhor, mesmo que através da deso-
bediência, Samuel declarou: "Tem porventura o Senhor tanto prazer em
holocaustos e sacrifícios quanto em que se obedeça à sua palavra? Eis que o
obedecer é melhor do que o sacrificar, e o atender melhor do que a gordura de
carneiros. Porque a rebelião é como o pecado de feitiçaria e a obstinação é como a
91
idolatria e culto a ídolo do lar. Visto que rejeitaste a palavra do Senhor, ele
também te rejeitou a ti, para que não sejas rei" (1 Samuel 15:22-23).
Essa repreensão levou Saul a cair de joelhos. Ele suplicou por perdão, por
outra oportunidade e pela aprovação de Samuel para com ele diante dos anciãos
de Israel. O profeta não ofereceu graça de mão beijada. Saul rejeitara ao Senhor e
o Senhor deu-lhe o que suas ações diziam ser o seu verdadeiro desejo. Samuel
disse-lhe que, por causa de sua rejeição do Senhor, o Senhor o rejeitara como rei
sobre Israel. O reino seria transferido a outro. Quando Samuel se virou para
partir, Saul se agarrou à orla de seu manto, suplicando-lhe que ficasse e o
perdoasse. E tocante como o profeta ajudou Saul a adorar ao Senhor outra vez,
demonstrando perdoá-lo como pessoa, porém ele perdera a oportunidade de ser
rei. Esse chamado seria oferecido a outro. Saul resistira tempo demasiado ao
Senhor. O Senhor não podia mais usá-lo.
Chocante? Sim. Deus perdoa, mas nosso pecado pode nos custar a posição,
os relacionamentos ou o status que prezamos. Não nos atrevemos a generalizar a
maneira como o Senhor tratou a Saul nem aplicá-la a toda pessoa em
dificuldades por recusar-se obstinadamente a fazer a vontade de Deus. Ele é de
uma srcinalidade sem limites na forma como nos trata. A mensagem aqui é que,
se insistentemente não desejarmos a autoridade divina sobre nós, podemos
tornar-nos não usáveis. Nossa rebelião pode enfraquecer nosso caráter ao ponto
de nos tornarmos incapazes de grandes responsabilidades. Deus tanto amou a
Saul que não o quis na posição de rei, pois isso pioraria a sua neurose. Na
verdade, Saul não desejara ser rei e muito menos o tipo de rei de que o Senhor
precisava. Sem dúvida, Saul teria sido um grande rei se percebesse que suas
imperfeições não eram desvantagens, mas uma oportunidade para permitir que o
Senhor realizasse suas obras através dele, um homem imperfeito. Essa é a chave.
Quando confessamos nossas necessidades ao Senhor, ele glorifica a si mesmo ao
realizar, cm nós, o que de outra forma seria impossível. Ele se deleita nisso.
Quando, porém, nossa insegurança nos torna obstinados e empedernidos,
negamos ao Senhor a glória de usar a nossa humanidade como um leito para o
fluxo do seu poder. A relutância de Saul em confiar no Senhor, manifesta através
da rebelião, finalmente resultou em ações intoleráveis. Saul, na verdade, não
aceitou a si mesmo como rei. Eventualmente, o Senhor concordou comele!
Saul continuou no posto de rei sem a bênção de Deus. Isso não significa
que o Senhor não o havia perdoado ou deixado de amá-lo. O Senhor dava
andamento ao seu propósito de preparar um novo rei. Sua escolha foi um jovem
pastor de ovelhas, que amava ao Senhor de todo o coração. Davi, filho de Jessé. É
interessante notar que desta vez o Senhor escolheu um homem que o conhecia,
amava-o e confiava nele, antes de ser chamado para ser rei.
A esta altura, não posso deixar de abrir um parêntese, como historiador
bíblico. Não seria a vontade máxima do Senhor para Saul que este servisse com
grandeza alicerçada
de sua morte, em sua graça,
fosse sucedido através
por Davi? de um
Penso quelongo
sim. reinado,
O tipo dee rei
então,
quepróximo
Saul se
tornou não era o que Deus pretendia. Saul rejeitou o melhor de Deus. Mas o seu
melhor para Israel não poderia ser impedido ou sacrificado no altar do ego
distorcido de Saul. Nós podemos retardar o plano providencial do Senhor, mas
não o podemos impedir.
Saul passou o resto da vida em defensiva manipulação. O perdão de Deus
naquele dia em Gilgal com Samuel não o havia mudado. Ele resistia ao amor do
Senhor em cada circunstância. Os últimos capítulos de sua vida foram cheios de
intriga, discussões, suspeita e ciúme.
92
Davi se tomou o escudeiro de Saul e permaneceu fiel ao rei durante toda a
vida dele. Temos, mais adiante, uma evidência do egoísmo de Saul quando Davi
abateu Golias. Lembramo-nos bem da história, mas se meditarmos no incidente
teremos um discernimento mais profundo do que Saul sentia. As forças filistéias
e as israelitas se alinharam para a batalha. O orgulho dos filisteus era um
descendente de Enaque, de quase dois metros e meio de altura Esse guerreiro
sobressaía a todos os filisteus e, de armadura completa, era uma visão aterradora
para os israelitas. Destes escarneceu ele com um terrível desafio: "Para que sais
formando-vos em linha de batalha? Não sou eu filisteu e vós servos de Saul?
Escolhei dentro vós um homem que desça contra mim. Se ele puder pelejar
comigo, e me ferir, seremos vossos servos; porém, se eu o vencer, e o ferir, então
sereis nossos servos, e nos servireis" (1 Samuel 17:8-9).
O pânico tomou conta das forças israelitas. Davi aceitou o desafio, e, com
apenas uma funda e uma pedra, matou o gigante filisteu. A questão permanece:
por que o homem mais alto de Israel, Saul, não aceitou o desafio em nome do
Senhor e do povo? Ele permitiu que um jovem corresse o risco. E, depois da
vitória de Davi, o desconfiado Saul perguntou: "De quem és filho, jovem?" Suspei-
tava ele que a profecia de Samuel significava que o Senhor escolheria um de seus
patrícios para rei?
As suspeitas de Saul se aprofundaram e se transformaram em ciúme
quando Davi se tomou um poderoso guerreiro. O povo não ajudava. Espantados
pela bravura de Davi, fizeram dele o seu herói. Depois de uma grande batalha, as
mulheres cantaram em antífona: "Saul feriu os seus milhares, porém Davi os
seus dez milhares" (1 Samuel 18:7). Era o início do último capítulo da deposição
de Saul. Ele fez de Davi um inimigo e um criminoso procurado, com um alto
preço por sua cabeça. Saul tinha um problema consigo mesmo o qual se fixava
em Davi! Sua ira e ciúme crescentes, por fim, romperam seus últimos elos com a
realidade. Blasfemou ao consultar uma médium, agiu com irracionalidade e por
fim suicidou--se lançando-se sobre a sua própria espada no monte Gilboa. Saul
procedia desta maneira, passo a passo, ano após ano, enquanto seu ódio por si
mesmo crescia em proporções monumentais. Seu último ato despótico foi tirar a
sua própria vida.
Saul impedira o acontecimento impossível em sua vida e, por algum tempo,
em Israel. Sua história pode parecer não ter uma aplicação para nós hoje. Ao
escrever este capítulo, fui movido profundamente a pensar a respeito de nosso
espantoso poder de dizer não ao máximo de Deus. Contudo, ele também levou-me
de novo à cruz, à ressurreição e ao poder do Pentecoste. Cristo morreu por aquela
parte de mim e de você que, obstinadamente, o rejeita. Ele nos livrou da síndrome
da justificação própria que leva ao ódio de nos mesmos. Sua ressurreição nos
oferece o poder da regeneração. Podemos nos tornar novas criaturas que desejem
fazer a vontade de Deus. E quando o seu Espírito nos invade, e o vazio é
substituído
feita." pelo seu poder, podemos dizer: "Não a minha vontade, mas a tua seja
De repente descobrimos o que queremos que o Senhor faça por nós, e
podemos dizer. "Senhor, quero realmente a ti, e anseio ser uma pessoa obediente.
Perdoa-me os desejos superficiais de controle próprio e olha somente para o meu
desejo mais profundo de conhecer-te e amar-te."
E então, na calma, nosso desejo de orar se torna um presente dele. Talvez
não tenhamos tanto poder para limitar o impossível quanto pensávamos. Será
que a transformação de nossos desejos de querer fazer a sua vontade é uma das
maiores impossibilidades que ele realiza em nós todos os dias, neste instante?
93
Creio que sim. E desejo essa transformação acima de tudo.

94
CAPÍTULO QUATORZE
UMA PESSOA SEGUNDO 0
CORAÇÃO DE DEUS
Davi
O segredo de receber o poder do Senhor do impossível é um coração aberto
e receptivo. Davi exemplifica esse segredo. Ele foi chamado o maior santo e
também o maior pecador do Antigo Testamento. Talvez seja por isso que o
amamos tanto. Admiramos a sua força e compreendemos a sua fraqueza. Nosso
coração se eleva com o seu em seus salmos de louvor, e identificamos nossa
própria falibilidade em sua confissão e contrição.
A vida de Davi é um ingrediente essencial para nossa compreensão do
Senhor do impossível, porque nela percebemos o que Deus pode fazer com
aqueles que a ele se entregam como canais de seu poder, e buscam o seu perdão
nos fracassos.
Incluí Davi em nossa consideração dos heróis do Antigo Testamento porque
ele contradiz o mito de que o vigor humano, ou a perfeição, são condições para
experimentar o poder desafiador do Senhor.
Davi era um homem segundo o coração de Deus. "Achei a Davi, o filho de
Jessé", disse o Senhor, "um homem segundo o meu coração, que fará a minha
vontade". Esse espantoso elogio afirma que Deus tem um coração, e que o
segredo de nossa vida abundante é receber o seu coração em nossos corações.
As palavras-chave são coração e segundo. A psicologia hebraica considera o
coração como interior
E a dimensão a sede da
damente e da vontade,
personalidade junto
humana. comestranho
Seria todas asàemoções físicas.
visão hebréia a
plenitude da personalidade, tal como a concebemos hoje, separando o intelecto
da emoção.

O que queremos dizer quando falamos do coração de Deus? O coração dele


é a sua natureza essencial: sua inteligência, mais o seu amor e bondade e mais a
sua vontade soberana. A maior maravilha do ser humano é que podemos pensar
os seus pensamentos, receber e expressar o seu amor e desejar a sua vontade. A
capacidade de nosso coração corresponde de forma sublime à do coração de
Deus.
A palavra segundo une o coração de Deus ao nosso. Significa: que vem logo
depois, que corresponde a, em busca de, moldado em semelhança a, e em
completa harmonia com. Quando um escultor toma a argila e esculpe um busto
"segundo" a nossa imagem, ou um pintor pinta um quadro "segundo" a nossa
aparência, assim também um coração segundo o coração de Deus é um em que o
coração de Deus é reproduzido — intelectual, emocional e volitivamente. Davi tem
a honra de ser um dos maiores homens do Antigo Testamento, porque ele ansiava
pelo coração de Deus. Do segundo rei de Israel descobrimos o propósito básico da
vida: ser pessoas segundo o coração de Deus. Acima de tudo, aprendemos que o
mais profundo desejo do Senhor é o de sermos argila nas suas mãos, para que
nos molde, como o Oleiro, segundo a sua imagem — com os seus pensamentos em
nosso cérebro, com o seu Espírito em nossas emoções e com a sua vontade em
nossa vontade, de modo que possamos seguir a sua orientação.
Primeiro, vemos Davi como o jovem pastor. Que viu Deus viu nesse rapaz
95
que cuidava das ovelhas de seu pai, que o identificou como o rei de Israel em
potencial? O Salmo 23 reflete a humildade de Davi na sua confiança em Deus,
como supremo pastor de sua vida . Nesse precioso salmo Davi expressou a fé que
lhe deu coragem como rapaz. Deus era todo-suficiente para Davi. Ele era o seu
protetor, provedor e propósito. O que Davi procurava ser para o seu rebanho,
Deus era para ele. O Senhor era o seu amigo e companheiro. A qualidade de fé
sem reservas que Deus desejava, mais que qualquer outra coisa em seu povo, tão
carente na natureza rebelde de Saul, ele a encontrou num jovem pastor nas
colinas de Judá. A maneira como Davi encarava o perigo, em completa de-
pendência de Deus, convenceu o Senhor de que aqui estava um rapaz, logo a se
tornar homem, que poderia enfrentar os perigos que sempre afligiam a Israel. A
mente de Davi era receptiva, suas emoções sinceras e espontâneas, sua vontade
pronta a obedecer.

Se ele podia enfrentar e derrotar os leões e lobos que atacavam o seu


rebanho, ao confiar no Senhor, como o seu Pastor, então ele podia também, como
homem de Deus, derrotar os inimigos de Israel. Davi era um homem cativado por
Deus, que desejava agradar e servir a seu Senhor mais que qualquer outra coisa.
A chamada de Davi e sua unção por Samuel põe um ponto de exclamação
na qualidade de coração que Deus desejava no novo rei. Os filhos mais velhos de
Jessé, todos exemplares e formidáveis, foram submetidos à inspeção cuidadosa
de Samuel. Enquanto ele avaliava cada um como um rei em potencial, o Senhor o
advertia: "Não atentes para a sua aparência, nem para a sua altura, porque o
rejeitei, porque o Senhor não vê como vê o homem. O homem vê o exterior, porém
o Senhor, o coração" (1 Samuel 16:7). Depois de examinar os sete filhos de Jessé,
o profeta foi categórico ao afirmar: "O Senhor não escolheu a estes". Em seguida,
perguntou: "Acabaram-se os teus filhos?" Jessé, nem por um instante, pensou em
seu filho mais moço como candidato a rei. "Ainda falta o mais moço, que está
apascentando as ovelhas". Samuel pediu que Davi fosse trazido à sua presença.
A descrição do jovem pastor na presença de Samuel salienta a
manifestação exterior de seu coração. "Era ele ruivo, de belos olhos e boa
aparência". Enquanto Samuel estudava a face de Davi, o Senhor falou de sua
escolha em voz de comando: "Levanta-te, e unge-o, pois este é ele". E assim, o
idoso profeta tomou do seu chifre de azeite e ungiu a Davi, enquanto seus irmãos
e seu pai observavam estupefatos. O Espírito do Senhor se apossou de Davi, e
daquele dia em diante Deus confiou o seu coração ao coração pronto e receptivo
do jovem pastor.
Deus está à procura dessa qualidade de coração em mim e em você. Em
cada época de crise, ele busca uma pessoa cujo coração deseja o seu coração. O
marcante no chamado de Davi é que ele não via a si mesmo como o futuro líder
de Israel, o qual precisaria da ajuda de Deus para realizar a sua auto-imagem de
grandeza.
colocamos Ele
Deusansiava pelo coração
em primeiro lugar emdenossas
Deus vidas,
e Deus elefez o resto.
pode Quando
nos usar. Não
devemos buscar a Deus para realizar os nossos propósitos. Amemos a Deus pelo
que ele é, não pelo que possa fazer por nós. Nossa idéia do que ele seria capaz de
realizar através de nós, está normalmente longe da verdade. Um autêntico
chamado vem sempre seguido de surpresa e mistério. Somos responsáveis
somente pelo que está em nosso coração, mente, emoções e vontade. Comece aí e
deixe os resultados com Deus!
A unção de Davi, significando a infusão do coração de Deus no seu, é
importante. Ao ver o que aconteceu como resultado da vida de Davi, desejo saber
96
se é possível obter essa mesma infusão hoje. Creio que sim. O Senhor do
impossível está disposto a nos ungir hoje mesmo com o seu Santo Espírito.
Quando desejamos a Deus de todo o coração, ele nos concede dons especiais
muito além do talento humano. Qualquer indivíduo que tenha aceitado o amor de
Deus e o perdão de Jesus Cristo, e abriu o seu coração, sem reservas, numa
entrega incondicional, é um candidato, tanto à tarefa humanamente impossível
como à suficiência de poder sobrenatural — sabedoria para o intelecto, cura e
desprendimento das emoções, determinação apaixonada de conhecer e fazer a
vontade de Deus. Agora mesmo, neste instante, Deus está dizendo de mim e de
você: "Levanta-te, e unge-o, pois este é ele".
Vemos o poder da unção de Davi em sua coragem, como o escudeiro de
Saul. Como notamos no capítulo anterior, Davi nada temia em sua confrontação
com Golias. Há alguma coisa terrível acerca do jovem que se apresenta destemido
diante do gigante. Sua simples funda e cinco pedras parecem insignificantes
comparadas ao tamanho de Golias, e sua espada e armadura fora de proporções.
E, contudo, o poder do Senhor, mais a coragem e o arrojo de Davi, obtiveram a
vitória. O autor de Primeiro Samuel toma o maior cuidado em pintar um quadro
informativo da impossibilidade da situação. A precisão de Davi em acertar na
testa do gigante resultará de anos de prática, mas somente a unção do Senhor
poderia ter adicionado a força balística e a exatidão para que aquela pedra
atingisse fatalmente o alvo. A vitória sobre os filisteus naquele dia assegurou a
Davi que o Senhor estava, realmente, com ele. Também convenceu a Israel. O
jovem foi impulsionado a uma popularidade e poder imediatos.
É assim que Deus opera. Depois de achar um coração segundo o seu
coração, ele concede dons especiais, e, a seguir, um exemplo claro do que ele
pode fazer com esse coração e com as impossibilidades dessa pessoa. Ele deseja
que todos nós estejamos seguros da sua presença.
Os anos de Davi na corte de Saul amadureceram o seu coração ungido. As
convicções de sua mente controlavam a expressão de suas emoções. À
semelhança de sua antecedente Rute, seu coração cheio de Deus é leal e fiel. Há
um desprendimento atraente em Davi, quando este procura servir ao rei. Em
nenhum momento ele é visto a lutar por uma posição ou poder. Mesmo quando o
desordenado Saul se via possuído de paranóia, Davi permanecia firmemente em
submissão. Davi se surpreende com o ciúme e competição de Saul. Suas atitudes
estão permeadas de inocência. Quando Saul o expulsa como um proscrito, Davi
busca um relacionamento ainda mais profundo com o coração de Deus, a fim de
entender e suportar a rejeição e a hostilidade. Seus salmos expressam os
pensamentos e os sentimentos de seu coração nesse período, revelando sua total
dependência de Deus. Ele experimentava Deus na vitória e o conhecia
profundamente nas vicissitudes. Freqüentemente, depois do primeiro rubor do
sucesso resultante de sua unção, Deus nos manda dificuldades que nos impelem
a umaDurante
mais íntima
essecomunhão
período de de coraçãoDavi
angústia, paraexibia
coração.
outras características dignas
de admiração e imitação. Ele desprendia um calor pessoal em seus
relacionamentos com os outros. Sua amizade com Jônatas, filho de Saul, tomou-
os mais chegados que irmãos. O coração de Deus em nosso coração produz uma
vitalidade robusta, compreensiva em nossos relacionamentos. Quando em nosso
coração mora o coração de Deus, somos atraentes, carinhosos, e ansiámos por
fazer amizades duradouras. "A alma de Jônatas se ligou com a de Davi; e Jônatas
o amou, como à sua própria alma" (1 Samuel 18:1). Porque Davi possuía o
coração de Deus, havia espaço para um amigo.
97
Essa mesma qualidade de calor e fidelidade a seus amigos ganhou, para
Davi, um grupo de homens que se comprometeu a ficar com ele durante seus
anos de exílio. Davi era o tipo de pessoa que exercia uma atração magnética nas
pessoas. Ele era fiel, bondoso e atencioso. Seus companheiros estavam dispostos
a viver e morrer por ele. A razão era que o Espírito de Deus se estendia através de
Davi e dava e eles um senso de afirmação e auto-estima. Quando apreciamos a
pessoa que somos, por causa do Espírito de Deus em nós, outros nos apreciarão
e se deleitarão em nossa companhia.
Vemos mais das profundezas do coração de Davi quando observamos sua
lealdade a Saul, mesmo depois das repetidas tentativas do ciumento monarca de
matá-lo. Quando Davi tem a oportunidade de matar o rei, ele se recusa. E depois
de Saul morrer pela sua própria espada, Davi sofre essa dor, e elogia os soldados
que arriscaram a vida para enterrar o rei.
Depois que Davi é constituído rei de Israel, percebemos outro aspecto de
seu caráter. O primeiro ato do rei após a unificação do reino, ao derrotar os
inimigos internos e externos, é trazer a Arca da Aliança para Jerusalém. Ele é
visto em campo aberto à frente da procissão que leva a Arca, dançando com
entusiasmo e louvor. Davi era um homem de emoção imensa. Suas convicções
intelectuais acerca de Deus liberavam a sua expressão emocional. "Davi dançava
com todas as suas forças diante do Senhor" (2 Samuel 6:14). Um coração cheio
do coração de Deus se sente livre tanto para glorificar como para se deleitar em
Deus. Não havia rigidez no relacionamento de Davi com Deus. Ele podia
expressar a tristeza de sua solidão e temor ao Senhor, mas também podia dançar
com fervor incontido. Quando amamos a Deus de todo o coração, podemos, sem
constrangimento, expressar nossas emoções a ele, e então, aos outros. Ele deseja
que lhe sejamos sinceros. Tanto no vale do desespero como nos picos da alegria,
podemos dar vazão aos nossos sentimentos.
A liberdade e o entusiasmo de Davi em expressar o seu louvor estão em
contraste com a reserva e o desprezo de sua esposa Mical. Ela sentia aversão à
falta de decoro religioso do rei diante da Arca de Deus. Sua vergonha era
resultado da sua própria falta de desprendimento. Mical era como o seu pai Saul.
Sua energia emocional não se orientava pelas firmes convicções acerca da graça e
soberania de Deus. Pouco havia em sua mente do amor e da bondade de Deus, e,
portanto, sua capacidade de deleite emocional era muito pequena. Q que ela não
podia expressar, ridicularizava em Davi.
Estamos cercados de Micals, pessoas cujas mentes estão famintas pela
verdade liberadora de Deus e cujas emoções estão tolhidas pela má nutrição de
uma fé ardorosa. A convicção da graça de Deus resulta numa expressão de
alegria que não podemos conter. A tragédia da religião é que ela produz mais
Micais que Davis. Sinto--me sempre grato quando minha congregação sacode o
templo entoando um dos grandes e históricos hinos, ou se sente livre para bater o
pé enquanto
e bater canta um
palmas, hino quando
chorar moderno.profundamente
Louvo a Deus pelas pessoas que
comovidas, podemcom
e falar rir
entusiasmo acerca do que Deus tem leito em suas vidas. Um coração que nunca
sentiu a presença de Deus na dor ou na tristeza, raras vezes expressará o seu
deleite em adoração e louvor.
As chamas do Espírito de Deus em nosso coração nos deixarão radiantes e
cheios de fervor. Resta-nos saber: Somos mais parecidos com Davi, dançando
diante da Arca, ou com Mical, possuída de reservas e críticas corrosivas?
Um amigo meu fala de uma igreja evangélica a que freqüenta, a qual
perdeu sua alegria em legalismo fanático. Ele ouvia as pessoas falando acerca de
98
"nascer de novo" e pensava que estavam confessando estarem "entediadas de
novo". Pode ser que ele estivesse transferindo suas atitudes, ou sua capacidade
de audição; mas, na realidade, salienta a falta de vivacidade, prazer e carisma de
muitos cristãos que agem como se fossem "entediados de novo".
Davi nada tinha de enfadonho. Seu coração vivaz estava cheio de adoração
exuberante, tanto em épocas de alegria como de desapontamento. Nenhum
exame do coração de Davi pode ignorar a maneira como ele recebeu a rejeição do
Senhor ao seu grandioso plano de construir-lhe uma casa. "Olha, eu moro em
casa de cedros, e a arca de Deus se acha numa tenda" (2 Samuel 7:2). Davi man-
dou que o profeta Nata pedisse a orientação do Senhor. Isso é crucial. Davi,
diferentemente de Saul, honrou a posição e o poder do profeta designado por
Deus na terra. O coração do rei era guiado pelo Senhor, e, portanto, Davi reinava
em Israel em cooperação com o profeta do Senhor. A resposta do Senhor por
intermédio de Nata não foi a que o rei esperava. Não seria ele quem construiria
uma casa para o Senhor. Sinta o coração de Davi responder nesta oração de
fidelidade e obediência. Recebemos um vislumbre das profundezas do seu leal
coração:
"Agora, pois, ó Senhor Deus, quanto a esta palavra que disseste acerca de
teu servo e acerca da sua casa, confirma-a para sempre, e faze como falaste. Seja
para sempre engrandecido o teu nome, e diga-se: O Senhor dos Exércitos é Deus
sobre Israel; e a casa de Davi teu servo será estabelecida diante de ti. Pois tu, ó
Senhor dos Exércitos, Deus de Israel, fizeste ao teu servo esta revelação, dizendo:
Edificar-te-ei casa. Por isso o teu servo se animou para fazer-te esta oração.
Agora, pois, ó Senhor Deus, tu mesmo és Deus, e as tuas palavras são verdade, e
tens prometido a teu servo este bem. Sê, pois, agora servido de abençoar a casa
do teu servo, a fim de permanecer para sempre diante de ti, pois, tu, ó Senhor
Deus, o disseste; e com a tua bênção será para sempre bendita a casa do teu
servo" (2 Samuel 7:25-29).
Agora, podemos entender por que Deus chamou a Davi um homem
segundo o seu coração, que faria toda a sua vontade. Há ocasiões quando nosso
coração deve se associar de novo com o coração de Deus. Há ocasiões em que o
que desejamos fazer para Deus não é o seu plano para nós. Para Davi, construir
um templo para adoração de Deus parecia lógico, natural e magnânimo. Pense
nos planos que temos desejado executar para Deus. Pareciam tão corretos, mas
não eram o melhor de Deus. Ele possui um plano especial e singular para cada
um de nós. Quando ele diz sim a uma estratégia e não a outra, somos desafiados
a obedecer-lhe. A tarefa de construir o templo se destinaria a Salomão e não a
Davi. E a oração de Davi orienta a compreensão intelectual, a reação emocional e
a obediência volitiva de nosso coração, quando Deus fecha uma porta e abre
outra.
Como — perguntamos — poderia o mesmo Davi que fez esta oração e
outras
esposa semelhantes
de Urias, um registradas nossoldados?
dos seus fiéis salmos, cometer adultério
A maneira comseBate-Seba,
como Davi arrependeua
do seu pecado demonstra que ele tinha um coração segundo o coração de Deus.
Não é necessário repetir os detalhes lamentáveis do adultério, ou o ardil
subseqüente que culminou com a morte de Urias. O que importa é como Deus
lidou com Davi. Ele enviou Nata para desmascarar o rei. Habilidoso com as
parábolas, Nata apontou a espada da verdade para a consciência de Davi, antes
que ele soubesse o que se passava. Ao dizer: "Tu és o homem!", Nata cravou a
espada. O coração de Davi se quebrantou ao perceber agora, que havia partido o
coração de Deus. Sua oração de arrependimento no Salmo 51 revela uma nova
99
profundidade do seu caráter. Nosso pecado e fracasso podem ser diferentes dos
de Davi, mas, ao sermos confrontados com a sua realidade, podemos também
ficar horrorizados com a apostasia de nosso coração. Creio que foi a afirmação de
Nata do perdão de Deus que capacitou Davi a fazer esta oração de anelo pela
retidão para com Deus:
"Compadece-te de mim, ó Deus, segundo a tua benignidade; e, segundo a
multidão das tuas misericórdias, apaga as minhas transgressões. Lava-me
completamente da minha iniqüidade, e purifica-me do meu pecado. Pois eu
conheço as minhas transgressões, e o meu pecado está sempre diante de mim.
Pequei contra ti, contra ti somente, e fiz o que é mal perante os teus olhos, de
maneira que serás tido por justo no teu falar e puro no teu julgar. . . Cria em
mim, ó Deus, um coração puro, e renova dentro em mim um espírito inabalável.
Não me repulses da tua presença, nem me retires o teu Santo Espírito. Restitui-
me a alegria da tua salvação, e sustenta-me com um espírito voluntário. Então
ensinarei aos transgressores os teus caminhos, e os pecadores se converterão a
ti" (Salmo 51:1-4, 10-13).
Pessoas de grande coração têm experimentado a angústia diante de seus
pecados, ao fazer esta oração. O fato é que Deus atenta para o desejo mais
profundo de nossos corações, mais profundo que os desejos mal orientados que
nos colocaram em dificuldades. É seu propósito levar-nos à nossa verdadeira
pessoa interior, que anseia reconciliar-se com ele. Ele nos mostra a deslealdade, o
egoísmo ou a paixão que nos levou ao pecado. Depois, nos ajuda tanto a assumir
o pecado como a livrar-nos dele, no clima abençoado do seu perdão.
Não se esqueça do terror do coração de Davi, quando suplica a Deus para
que não retire dele o seu Santo Espírito. Ele sabia que o segredo de sua liderança
e habilidade era a unção de Deus. Ele havia testemunhado o que aconteceu a
Saul quando o Espírito se separou dele. Mais que qualquer coisa, Davi precisava
da presença perdoadora de Deus. Ele não tentou apresentar desculpas por seu
pecado ou oferecer sacrifícios. Tudo o que restava a Davi para oferecer a Deus era
um coração quebrantado e contato.
Freqüentemente, quando consideramos um coração segundo o coração de
Deus, pensamos numa vida perfeita e imaculada, e de moral impecável na
conduta social. Nada disso. É tanto no sucesso quanto no fracasso que nosso
coração se abre. E o coração de Deus é perfeitamente suscetível à nossa
necessidade. Sempre que nos arrependemos verdadeiramente do nosso pecado, o
seu coração está aberto e pronto para receber-nos. Comove-me sempre o fato de
que Davi jamais se esqueceu da bondade de Deus para com ele. Na verdade, ele
deu o nome de Nata a um dos seus filhos (1 Crônicas 3:5), em memória da
bondade de Deus ao expor o seu pecado e perdoá-lo. A memória do coração de
Davi estava curada.
Gostaria que a história de Davi tivesse um final do tipo "E foram felizes
para sempre".
com nossos Mais Os
heróis. umaúltimos
vez as dias
Escrituras
de Davidemonstram suadehonestidade
foram cheios para
guerra, conflito,
incesto, rivalidade entre irmãos e intensa angústia por seu filho rebelde, Absalão.
Da mesma forma que Davi magoou a Deus, assim também o coração de Davi
estremeceu por sua família.
Absalão possuía o carisma do pai, mas não o seu coração. Ele era
simpático e talentoso como Davi, mas não buscava nem seguia a orientação do
Senhor. Davi amava a Absalão e lamentava que seu filho não tivesse um coração
semelhante ao seu. Quando Amnom violentou sua irmã Tamar, Absalão fez
justiça com as próprias mãos. Ele armou em segredo uma cilada de morte para
100
Amnom e fugiu. Davi chorou amargamente por causa de Absalão. Ele se viu
forçado a perceber o mais íntimo recesso do coração de Deus, enquanto tentava
equilibrar justiça e misericórdia. Por fim, mediante sugestão de seu general
Joabe, através de uma mulher sábia de Técoa, ele se convenceu de que a
misericórdia para Absalão era mais importante que o seu desterro.
Absalão deu pouca prova de gratidão. Ele estava de todo entregue à cobiça
do poder e, finalmente, conduziu uma insurreição contra Davi. Com os
dissidentes, levantou um temível exército. Davi foi forçado a fugir de Jerusalém. A
luta de Absalão pelo poder causou divisão e intranqüilidade em todo o Israel. No
final, Davi teve de fazer a coisa mais dolorosa da sua vida: enviar seu exército
contra o próprio filho. Joabe sabiamente preveniu a Davi que não fosse com eles.
Bom conselho. Davi não poderia ter feito o que Joabe tinha de fazer. Prendendo-
se os longos cabelos de Absalão nos galhos de um enorme carvalho, Joabe o
matou. Quando a notícia chegou a Davi, a dor esmagou-lhe o coração. "Meu filho
Absalão, meu filho, meu filho Absalão! Quem me dera que eu morrera por ti,
Absalão, meu filho, meu filho!" (2 Samuel 18:33).
Davi não culpou a Deus pela morte do filho. Ele sabia haver falhado em
revelar o seu coração a Absalão. Sua dor era um misto turbulento de perda e de
fracasso como pai.
A vida prega duros golpes aos nossos corações. Os desapontamentos com
as pessoas que amamos são os que mais nos fazem sofrer. Talvez alguém que
você ame esteja a dar-lhe o mesmo motivo para o lamento, como Absalão deu a
Davi. Ou talvez algum amigo de sua confiança voltou-se contra você. O que fazer
quando todos os esforços para ajudar uma pessoa amada são repelidos e
rejeitados? É aí que você e eu precisamos, mais que tudo, de um coração segundo
o coração de Deus. Nossa dor nos impele para o coração divino. Não há outro
refúgio! E aí ele espera para nos ajudar. Quando oramos de coração para coração
podemos contar-lhe nossa angústia e receber o seu amor e paciência. Um dos
maiores milagres do Senhor do impossível é a cicatrização de corações partidos.
Já experimentei esse milagre muitas vezes. Quando meu coração está
repleto da dor do desapontamento e da frustração, sei que somente uma
experiência renovada do coração do Senhor pode dar-me forças. Ele está atento
enquanto desabafo meus sentimentos. Depois, em resposta, ele me ajuda a
sentir-me como uma pessoa segundo o seu coração. Ele me induz a uma análise
profunda da causa real do problema. Então, peço-lhe que me mostre que atitudes
devo tomar. Em minha imaginação ele revela um quadro do tipo da pessoa que
devo ser com o seu coração. E, o mais importante, ele me dá o dom da fé para
confiar nele no que diz respeito ao futuro de alguém. Aparece-me um quadro
daquela pessoa cheia do amor divino. Essa imagem rompe o laço da preocupação.
Logo, sinto o coração de Deus fluindo através do meu, o que resulta num desejo
renovado de não desistir. Quando penso na paciência do Senhor para comigo,
sinto-me
para essa investido
pessoa a de uma nova
expressão disposição
de amor para
que tens orar:
sido para"Senhor, ajuda-me
mim". Como a ser
resultado,
recebo um novo coração.
Buscar um coração segundo o de Deus não é fácil. Significa desistir de
nossos julgamentos, da necessidade de estarmos certos e dos sentimentos de
mágoa. Essa renúncia exige a renovação diária — e às vezes a cada hora — de
nossos corações com o coração de Deus. E depois de fazermos tudo, somos
forçados a deixar os resultados com Deus e esperar. E enquanto esperamos, ele
nos lembra de nosso propósito básico e novamente nos põe a trabalhar em sua
obra. Quando sentimos que falhamos miseravelmente, ele nos encoraja para um
101
novo desafio.
Assim Deus fez com Davi. O Senhor deu-lhe, mais uma vez, o vigor e a
coragem para ser o líder de que seu povo precisava. O reino precisava de
unificação e restauração. Somente um rei forte poderia unificá-lo. Davi teve de
perceber que o seu propósito fundamental era conhecer e executar a vontade de
Deus. Ele era mais do que seus fracassos. Ele era o homem de Deus com um
futuro. E a confiança que o Senhor tinha nele, apesar de tudo, tornou-se o
antídoto para a sua dor. Davi passou o resto da vida em guerra com os inimigos
de Israel, buscando consolidar e unir a nação, e infundir liderança dinâmica no
reino que estava sendo preparado para Salomão. Até o fim, o coração de Davi foi
moldado à semelhança do coração de Deus.
Israel jamais se esqueceu do rei-pastor. Davi se tornou a personificação de
Israel, e os profetas, muito tempo após a sua morte, esperavam ansiosamente o
Messias que nasceria de sua linhagem e semelhança. E quando Jesus veio, na
plenitude dos tempos, muitos o chamaram de filho de Davi. Através dele
descobrimos o significado real do que é ser uma pessoa segundo o coração de
Deus. Jesus Cristo veio como o coração de Deus encarnado. João compreendeu
esse maravilhoso mistério: "Ninguém jamais viu a Deus: o Deus unigênito, que
está no seio do Pai, é quem o revelou" (João 1:18). Nossa busca em conhecer o
coração de Deus está agora completa. Podemos contemplar a sua glória e coroá-lo
como nosso Senhor.
Agora temos a revelação clara e incontestável do significado de uma pessoa
segundo o coração de Deus. Quanto mais conhecemos a Cristo, tanto mais
experimentamos o coração de Deus. Quanto mais profundo for o nosso
relacionamento com ele, tanto mais de seu caráter será transplantado em nós. O
coração de Deus, cheio de graça e de verdade, que habitou entre nós, revelou
como ele é e o que ele deseja que sejamos. Ele nos ensinou o que significa abrir
sem reservas o nosso coração e colocar nele, em primeiro lugar, a pessoa de
Deus. Do princípio ao fim do seu ensino, ele revelou que os nossos corações são o
verdadeiro tesouro. O impacto total do ensino de Jesus é que o repositório
divinamente criado para o tesouro do Espírito é o nosso coração. Jesus foi à cruz
a fim de abrir os nossos corações e prepará-los para receber a sua presença
ressurreta! Foi o que aconteceu no Pentecoste, quando seus seguidores ficaram
cheios de seu Espírito.
Assim, para nós hoje, uma pessoa segundo o coração de Deus o alguém
cuja mente, emoções e vontade estão cheios do Cristo vivo. Quando ele é o nosso
propósito, paixão e poder, somos ungidos com o seu Espírito e crescemos à sua
semelhança de glória em glória. Experimentamos em medida sempre crescente o
que o Senhor do impossível reservou para nós. Esta vida não passa de pequena
fração daquela na eternidade, na qual os nossos corações e o dele se tornam um.
A beleza singela do hino que aprendi quando me tornei crente jamais
deixou meu
está aflito oucoração. Apresento-o ou
alegre, quebrantado emjubilante,
oração todos os ou
dorido dias. Quando eu
triunfante, meu coração
canto:

Em meu coração,
Em meu coração,
Vem hoje entrar, ó Cristo;
Vem hoje entrar, sim, vem morar,
Em meu coração, ó Cristo.
Harry D. Clarke E ele vem — e entra!

102
CAPÍTULO QUINZE
FOGO SAÍDO DAS CINZAS
Elias
Meu amigo estava muito desanimado. Atendendo ao apelo da esposa e do
pastor, ele foi a um retiro de homens de negócios numa área de lazer nas
montanhas, onde o assunto que eu apresentava era esgotamento físico e nervoso.
Após uma das reuniões noturnas, ele e eu nos sentamos sozinhos numa cabana,
diante de uma lareira em chamas, e conversamos até tarde da noite.
O homem era crente, mas uma série de desapontamentos lançaram-no no
poço do desânimo. Ele falou de uma dor penetrante e que não desaparecia. O
ambiente tenso onde trabalhava estava acabando com ele. Ele estava física e
emocionalmente exausto de trabalhar horas seguidas num serviço que muito
exigia dele. Uma combinação de perfeccionismo, comprometimento em excesso
com o trabalho e retidão de caráter haviam produzido uma alta ansiedade e
desapontamento com o seu próprio desempenho e com o dos outros.
"Ninguém se interessa tanto como eu. . . ninguém trabalha tanto como eu. .
. ninguém é tão responsável como eu", dizia sombriamente. Isso o forçava a
trabalhar ainda mais, com pouco resultado. Suas defesas caíram por terra e seu
mau humor veio à tona, deixando-o despreparado para as crises que o atingiram.
Ficou chocado ao perceber que seus superiores não apreciavam seus esforços
heróicos, próximos do martírio.
E as coisas não corriam melhores em casa. Por consumir a maior parte de
sua energia no trabalho, ele tinha pouco tempo ou pouca paciência para com as
necessidades da esposa e dos filhos. O mínimo que podiam fazer, dizia ele, era
reconhecer que todo o seu esforço visava a mantê-los livres de problemas em
casa. As crises da família o surpreendiam sem disposição e capacidade para
enfrentá-las. Exercício, recreação a repouso haviam sido sacrificado» no altar da pressão
do trabalho. Ao mesmo tempo, ele se sentia incapaz de dizer não a outras
responsabilidades, o que acentuava a sua síndrome de desânimo. Ultimamente seu
casamento vinha sofrendo um desgaste emocional que afetava sua vida familiar ao
extremo, por causa das mesmas atitudes críticas no trabalho. Noites de insônia e sem
descanso estavam acabando com ele. O mundo inteiro estava nos seus ombros, pensava.
Nisso tudo, ele levava a si mesmo a sério demais, e não levava a Deus suficientemente a
sério.
Enquanto conversávamos, o fogo da lareira diminuiu até chegar às brasas e
depois se extinguiu, deixando a grelha cheia de cinzas. "Minha vida agora é como aquele
monte de cinzas", disse ele com desânimo. "Tudo queimado." Depois, disse alguma coisa
que denotava a profundidade de sua dor. "Se Deus se importa, como pôde permitir que
isso acontecesse comigo?" Agora, até mesmo Deus era um inimigo, sob o mesmo juízo
que eleAssegurei-lhe
havia feito de seus companheiros
que Deus de trabalho
não estava contra eele
suae família.
que ele poderia ajudá-lo a
reordenar as suas prioridades e fazer com que sua vida se normalizasse. Conversamos
acerca de sua fé. Embora ele tivesse sido ativo como membro e diácono de sua igreja,
jamais confiara a vida a Deus. Ele cria em Deus, mas não experimentara o alívio de
entregar-lhe a si mesmo e a todas as áreas de sua vida ao seu senhorio, o que explicava
a imensa falta de liberdade e de uma saudável auto-aceitação, que o compelia para alvos
suspeitos jamais entregues a Deus. Falamos da grande diferença entre trabalhar para
alcançar nossos alvos para Deus, e o de permitir que Deus trabalhe em nós na realização
dos planos que tem para nós.
Em seguida, conversamos sobre o que ele poderia fazer para redescobrir um novo
103
romance e deleite em seu casamento. O Senhor estava lá a orientar-nos acerca do que
seria necessário. E as crianças? Elas precisavam muitíssimo dele. Ele teria de desistir de
sua indiferença, da fuga de suas funções de pai, e permitir que Deus o libertasse, a fim
de não transferir aos filhos o seu perfeccionismo. As crianças precisavam de estímulo e
afirmação, a fim de ser tudo o que poderiam ser.
Ao final dessa análise detalhada de sua vida, pedi-lhe que imaginasse um quadro
de si mesmo livre do desânimo e vivendo sob o fluxo da graça e da aceitação. Que
tipo de descanso, refrigério e libertação das críticas receberia? O que aconteceria
se ele amasse a si mesmo tanto quanto Deus o amava? Que atitudes orientariam
seus relacionamentos? Como ordenaria as prioridades da sua vida como homem
de Deus, comprometido a receber e comunicar esperança e visão?

dor doEra o momento


desânimo dele. de orar.
Deus Propus
haveria de que pedíssemos
mostrar-lhe ao Senhor
o caminho que curasse
e encorajá-lo a
a dar
os passos específicos para um nova qualidade de vida.
Enquanto orávamos, alguns pedaços de lenha entre as cinzas da lareira
começaram a arder. Ao ouvir o seu estalido, levantamos os olhos. "Percebe?" —
comentei— "Deus pode fazer com que o fogo surja das cinzas!"
A fim de tornar mais íntimas as implicações daquela parábola, tomei
algumas toras de pinho e pedi a meu novo amigo que as marcasse, como se cada
uma delas fosse um passo exigido por seu novo compromisso. Enquanto, em
espírito de oração, ele colocava cada uma das toras nas chamas que tremeluziam
em meio às faíscas que saltavam das cinzas, o fogo começou a ficar mais intenso,
até mesmo mais forte do que no início da conversa, bem antes do anoitecer.
"Deus não só pode fazer com que o fogo surja das cinzas", declarei. "Ele pode usar
os gravetos de nossa rendição e disposição de espírito para nos inflamar outra vez
de nova alegria e coragem." O homem sorriu de alívio e depois se retirou para a
primeira noite completa de sono e descanso, que havia muito tempo não
desfrutava.
Mantive contato mais de perto com o meu novo amigo nos meses que se
seguiram àquele momento decisivo de sua vida. Ele traçara o tipo de pessoa que
desejava ser, ao assumir os passos específicos que tinha de dar. Junto com a
esposa, ele escreveu por extenso os elementos essenciais de um novo estilo de
vida, e a cada dia ele os lê como parte de sua oração matutina e estudo
devocional. A cada semana o casal examina com honestidade o seu progresso. Ele
se uniu a um pequeno grupo de homens de negócios que se reúnem todas as
semanas para discutir como lidar com a tensão e orar uns pelos outros. Ele se
considera responsável pela conservação de suas novas prioridades. Q Senhor do
impossível está transformando a sua vida. Meu amigo descobriu o segredo de
permitir que o Senhor alimente o fogo que surge das cinzas.
Desânimo. Todos nós o experimentamos às vezes. Alguns raras vezes se
vêem livres desse mal-estar espiritual. Este capítulo se aplica a três tipos de
pessoas. Há aquelas que sofrem da enfermidade espiritual do desânimo agora
mesmo, enquanto lêem. Outras, conheceram esse vírus da debilidade da alma no
passado e sabem que estão mal preparadas para o próximo ataque. Outras,
ainda, estão muito preocupadas pelos entes queridos ou amigos imobilizados pelo
desânimo e anseiam ajudá-los. Sei, de experiência, que os três grupos estão
presentes no auditório cada vez que prego. Ao conversar com pessoas que lêem os
meus livros, constato que os mesmos grupos estão entre os meus leitores. E com
profundo amor e preocupação por todos que desejo enfrentar as causas e as
curas da dor enfraquecedora do desânimo.
Mais uma vez fico espantado com a maneira prática da Bíblia nos ajudar a
achar as respostas. Elias, o profeta, é um caso clássico de desânimo. O que lhe
104
aconteceu e o que Deus fez para curá-lo deixam bem clara a maneira como somos
levados ao esgotamento total. E a história do que o Senhor pode fazer para que o
fogo surja das cinzas.
Elias era um tesbita de Gileade, uma região ao norte da Palestina, ao leste
do Jordão. Deus o chamou para ser profeta numa época de crise em Israel,
durante o reinado de Acabe. Este rei fraco e vacilante casara-se com Jezabel,
uma estrangeira, natural de Tiro. Ela trouxe consigo os sacerdotes e a adoração
de Baal e Astarote. Sua paixão na vida era a supressão do culto a Iave e o
estabelecimento da adoração de Baal como religião nacional. O problema do
sincretismo, que consideramos em capítulos anteriores, tornou--se mais sério que
antes. Só que agora havia uma diferença assustadora. A rainha não promovia
uma mistura de religiões, mas o culto exclusivo a Baal como deus em Israel.
No momento mais tenebroso da apostasia, o Senhor enviou Elias para
enfrentar o rei. O nome do profeta significa a sua missão: Iave é Deus. Elias
apresentou suas credenciais e surpreendeu a Acabe com um julgamento severo:
"Tão certo como vive o Senhor, Deus de Israel, perante cuja face estou, nem
orvalho nem chuva haverá nestes anos segundo a minha palavra" (1 Reis 17:1).
Com isso, ele deixou o rei a ponderar quem, na verdade, era Deus em Israel. E
teve início uma longa seca, como predisse Elias.

Nos meses seguintes o Senhor preparou Elias para uma batalha decisiva
com a enfermidade espiritual que se abatera sobre o seu povo. Ele o enviou ao
leste do Jordão, onde constatou que o Senhor poderia satisfazer a todas as suas
necessidades. Ele foi alimentado por corvos que lhe traziam pão e carne. Em
seguida, foi conduzido a Sarepta, uma cidade de Sidom, onde ficou sob os
cuidados de uma viúva. O Senhor multiplicou milagrosamente os escassos re-
cursos da mulher, de modo que ela pôde alimentar o profeta. Depois, como
confirmação da mão do Senhor sobre ele, Elias recebeu poder para curar o filho
dessa viúva e trazê-lo de volta à vida. O Senhor desejava que seu profeta tivesse
certeza do seu poder. Uma vez que nada pode acontecer através de nós que não
tenha sido demonstrado em nós, o Senhor preparava Elias para confiar ple-
namente no poder do Senhor do impossível. Ele devia se apresentar de novo a
Acabe e combater os profetas de Baal e Astarote até o fim.
Elias retornou à presença de Acabe com um desafio que poria fim à questão
de quem era Deus em Israel. "Agora, pois, manda ajuntar a mim todo o Israel no
monte Carmelo, como também os quatrocentos e cinqüenta profetas de Baal, e os
quatrocentos profetas do poste-ídolo, que comem da mesa de Jezabel" (1 Reis
18:19). Acabe aceitou o desafio e convocou todo o Israel ao monte Carmelo.
Quando o povo e os sacerdotes estrangeiros e o profeta se reuniram na
montanha, Elias estrondeou a sua mensagem: "Até quando coxeareis entre dois
pensamentos? Se o Senhor é Deus, segui-o; se é Baal, segui-o" (1 Reis 18:21). O
povo concordou, dizendo:
A batalha tinha "É boa esta
começado. Os palavra".
profetas de Baal clamaram durante todo o
dia: "Ah! Baal, responde-nos!", mas nenhum fogo desceu sobre o altar deles.
Depois de zombar da impotência deles e do silêncio de Baal, Elias preparou o seu
altar de um modo que somente o Senhor do impossível poderia enviar o fogo. Ele
ordenou ao povo que derramasse doze barris de água sobre o altar de Iave. A
água correu das bordas do altar e encheu a valeta ao redor dele. Então, ao
anoitecer, Elias orou: "O Senhor, Deus de Abraão, de Isaque e de Israel, fique
hoje sabido que tu és Deus em Israel, e que eu sou teu servo, e que segundo a
tua palavra fiz todas estas coisas. Responde-me, Senhor, responde-me, para que
105
este povo saiba que tu, Senhor, és Deus, e que a ti fizeste retroceder o coração
deles" (1 Reis 18:36-37). E fogo caiu sobre o altar, consumindo o boi, a lenha e
sorvendo a água da valeta. Deus e Elias venceram. O povo se convenceu. "O
Senhor é Deus! O Senhor é Deus!", clamaram, prostrando-se em terra.
Essa batalha teria sido mais que suficiente para exaurir os recursos
espirituais de Elias. Mas ele estava funcionando em alta velocidade. O fogo do
altar não era suficiente para ele. Com compulsão frenética ele liderou o povo na
matança dos profetas de Baal e Astarote junto ao ribeiro de Quisom.
Depois, foi o momento de orar por chuva. Despendendo energia sobre-
humana, Elias colocou a cabeça entre os joelhos e derramou tudo o que lhe ia no
íntimo em oração por chuva, para acabar com a seca. Depois de algum tempo,
finalmente, uma nuvem apareceu no horizonte sobre o mar. Logo o céu escureceu
com nuvens e uma chuva pesada caiu sobre a terra. O Senhor respondera no-
vamente.
Quando Acabe viu a chuva cair, achou que era hora de voltar e contar a
Jezabel as coisas espantosas a que havia testemunhado. Ele aparelhou a sua
carruagem e a conduziu velozmente através da chuva. Podemos apenas imaginar
o seu assombro quando ele viu Elias correndo ao lado e depois adiante de sua
carruagem com vigor inacreditável. O profeta do Senhor corria mais rápido que a
carruagem de Acabe!
No final daquele dia espetacular e cheio de acontecimentos, Elias estava
exausto. Ele havia despendido todos os seus recursos físicos e espirituais no
trabalho do Senhor. Não restava nada. O fogo do Senhor descera sobre o altar,
mas o fogo de Elias se apagara. Psicologicamente, ele não estava preparado para
a mais cruciante prova de sua resistência, que ainda viria.
Jezabel ficou furiosa quando Acabe contou-lhe acerca da matança dos seus
profetas no Carmelo. Ela enviou a Elias uma mensagem amarga e ameaçadora:
"Façam-me os deuses como lhes aprouver se amanhã a estas horas não fizer eu à
tua vida como fizeste a cada um deles" (1 Reis 19:2).
Em outra ocasião qualquer Elias teria recebido essa mensagem sem o
mínimo receio. Mas, depois de tudo por que havia passado, despendendo tudo o
que tinha dentro de si em sua batalha pelo Senhor, a mensagem o abateu com
desânimo insuportável. Ele pensava que no monte Carmelo se dera a batalha
final com o mal. Jezabel a viu como uma escaramuça. E Elias conheceu uma
emoção que ele jamais experimentara antes. Estava com medo. O poderoso
profeta corria para salvar a vida. Com cinzas de amargura na alma, de correu em
direção do sul, para Berseba, e daí para o deserto. Quando não pôde correr mais
por causa da completa exaustão, ele se sentou debaixo de um zimbro e suplicou a
Deus que o deixasse morrer. A descida em espiral da dúvida íntima para o
desapontamento, e deste para o desânimo, atingiu o fundo, o desespero. "Basta" ,
disse ele, "toma agora, ó Senhor, a minha alma, pois não sou melhor do que
meus pais".
Esgotamento total. Os componentes do que eu chamo de "Complexo de
Elias" são dignos de análise, porque podem acontecer a todos nós. Há cinco
fatores que contribuíram para o desânimo e a depressão de Elias.
O primeiro é que ele estava completamente exausto. Não há exaustão tão
perigosa quanto a que vem de nos esforçarmos demais por causas justas. Elias
tinha despendido suas energias por Iavé, em vez de ter sido um canal do seu
poder. Deus respondeu com fogo sobre o altar e chuva dos céus, mas Elias
achava que a demonstração dependia de sua pregação e persistência. Ele não
percebeu o quanto lhe custara restabelecer Deus como Senhor em Israel.
106
Segundo, Elias era ingênuo. Simplesmente, ele acreditava que a derrota de
quatrocentos e cinqüenta profetas acabaria com a ameaça do mal em Israel.
Contudo, ele tinha apenas tocado a ponta do iceberg. A sua batalha de "uma-vez-
por-todas" tinha sido apenas um início. Mas ele estava cansado demais para
perceber esse fato, e a ameaça de Jezabel era tudo o que faltava. Quando estamos
abatidos, basta um pequeno aborrecimento para derrotar-nos. Também nós às
vezes supomos que a realização de alguma tarefa para o Senhor vai dar cabo da
batalha. Em contraste com generais como Napoleão e Washington, que jamais
foram tão perigosos quanto depois da derrota, Elias e muitos de nós somos
extremamente vulneráveis após uma vitória que nos esvazie de todos os nossos
recursos humanos.
Quase todo dia converso com cristãos que se esgotaram completamente no
trabalho de Deus. São pastores, diáconos e professores, membros da igreja e
pessoas ativas em boas causas. Nossa atividade ardorosa para Deus pode ser a
mais perigosa ameaça ao nosso relacionamento com ele, se preferimos trabalhar
mediante nossos próprios esforços em vez de no fluxo de seu Espírito. A mudança
de uma dependência dele para o esforço próprio e auto-justificante é sutil. Nosso
trabalho para Deus pode resultar numa fonte de orgulho e extensão de nossos
próprios egos.
Vejo isso acontecer de três maneiras. Há aqueles que surgem com boas
idéias, que, embora dignas, não foram enviadas pelo Senhor. Esperamos que ele
nos confirme e nos dê vigor a fim de estarmos preparados para o que
determinamos ser a sua vontade. A segunda maneira é muito mais frustrante.
Buscamos a vontade de Deus, sentimo-nos guiados para tomar uma direção em
particular, e, então, disparamos ã frente do seu tempo e da sua estratégia.
Perdemos contato com Deus quando a tarefa se torna mais importante que ele!
isso ocorre quando redobramos nossos esforços para assegurar o sucesso,
tomamo-nos críticos de outros que não partilham de nosso compromisso e visão
e, por fim, fazemos com que nossa impaciência se volte contra nós mesmos. A
terceira é a mais difícil de romper. Acontece quando confundimos o nosso valor
com o nosso desempenho. Sempre que somos tentados a assumir que somos
amados por Deus pelo que fazemos e não pelo que somos, sobrecarregamos
nossas vidas além do que podemos suportar. O fogo do Espírito vai-se apagando
até se extinguir totalmente.
O próximo aspecto do complexo de Elias se relaciona bem de perto com o
anterior: perfeccionismo. O profeta expressou esse narcótico intoxicante ao
afirmar: "Pois não sou melhor do que meus pais". Quem é que disse que ele tinha
de ser? O Senhor o chamou para a tarefa que lhe foi dada, não para comparar-se
com alguém mais. O significado bíblico de ser perfeito é executar a finalidade ou o
propósito para o qual nascemos. Perfeccionismo é algo muito diferente. É o nosso
esforço de levar tudo ao máximo com nossas próprias forças. Jamais nos
contentamos com odesejava
dos outros. Elias que temos, e estamos
sobrepujar a sempre intranqüilos com
seus predecessores e a as realizações
todos ao seu
redor. Ele perdeu o contato com a sua humanidade e permitiu que o precioso
dom da vulnerabilidade se tomasse ineficaz para comunicar-lhe a graça de Deus.
Muitos de nós conhecemos aquilo por que ele passou. Desejamos tambem
estabelecer padrões e vivê-los de forma irrepreensível. O erro está em nos
conduzirmos à luz do desempenho dos outros, em vez de seguirmos a orientação
divina. Mas quando é que o suficiente é suficiente? Em poucas ocasiões. E aí
esgotamos as nossas forças pressionando-nos a nós mesmos em direção a uma
imagem que jamais se realiza.
107
O perfeccionismo leva ao isolamento. Este é o fator seguinte que
percebemos no desanimado Elias. No monte Carmelo ele declarou com altivez:
"Só eu fiquei dos profetas do Senhor". Ele se esqueceu de que Obadias ocultara
uns cem profetas do Senhor (1 Reis 18:4), e por certo havia outros. Nem todo o
povo se deixou enganar por Jezabel. Muitos joelhos não se haviam dobrado
diante de Baal. Mas Elias não podia perceber tal coisa por estar por demais
possuído de seus próprios e apaixonados esforços pela causa. Quando suas
forças minguaram e Jezabel o ameaçou, tudo o que pôde dizer foi: "e eu fiquei só,
e procuram tirar-me a vida". Com orgulho ferido, ele abandonou até mesmo o seu
fiel servo. Como não havia ninguém que partilhasse sua dor, ele não tinha com
quem conversar sobre o seu desânimo. O solitário ficou sozinho para fazer o seu
vôo ao poço sem fundo da auto-condenação.
Uma das principais causas do esgotamento é o isolamento, nossa
obstinada independência. Todos nós precisamos de pessoas que nos ajudem a
perceber que o que sentimos agora elas já sentiram antes. O desânimo
aprofunda-se mediante a falsa idéia de que ninguém mais sente como sentimos.
Há poder de cura nas palavras de um amigo: "Sei como você se sente; já estive
lá!" E a encarnação, inclusive, vista de um modo mais sublime, expressa a
capacidade definitiva do Senhor de compreender os problemas alheios. Não há
nada que não possamos suportar que o Senhor já não tenha enfrentado como o
nosso Emanuel. Deus conhece, compreende e se importa!
Por fim, o desânimo de Elias chegou ao fundo quando ele considerou a
futilidade do futuro. Ele estava tão amarrado a si mesmo que tomou a mensagem
sarcástica de Jezabel como um motivo para fechar as cortinas da história. Por
que tentar? Que esperanças poderia alimentar? Ele havia perdido a visão da
soberania de Deus. E o mais importante, ele havia desistido do significado de seu
nome: Iavé é Deus. Na realidade, Elias era o deus de Elias.
O que Deus pode fazer com um desânimo como o de Elias? O que ele fez foi
exatamente o que está pronto a fazer por nós. Fico entusiasmado ao constatar
que, como havia cinco elementos no complexo do profeta, havia também cinco
maneiras de Deus lidar com Elias. A cura do nosso desânimo está em todas elas.
O primeiro remédio foi colocar o exausto guerreiro do Senhor para dormir.
Psicologicamente, ele se achava por demais cansado para raciocinar ou receber
nova esperança. Há ocasiões em que é essencial a restauração de nossas forças
físicas. O primeiro passo para sairmos do desânimo é amar-nos a nós mesmos o
bastante para reorganizar nossas vidas de modo a dormirmos o suficiente,
passarmos horas em lazer, em exercícios e atividades à parte de qualquer
programação. O problema, contudo, é que quando estamos deprimidos pensamos
que se redobrarmos nossos esforços sairemos dessa situação angustiosa. Essa é
a razão de precisarmos de amigos que reconheçam os sinais denunciadores de
que estamos a ponto de estourar e nos ajudem a deixar o Universo com Deus,
enquanto recobramos
bastante para sentir nossas
fome. Aenergias.
batalha Aododespertar, Elias estava
monte Carmelo racional
vencera a suao
resistência. Ele precisava de comida. O Senhor satisfez à sua necessidade.
"Levanta-te e come", foi a simples ordem. O profeta comeu e bebeu dos pães e da
água providenciados, e caiu no sono novamente. Deus, que nos conhece melhor
que nós mesmos, prove exatamente o necessário para dar prosseguimento à
nossa vida.
Quando Elias estava descansado, o Senhor ordenou-lhe que prosseguisse
para o monte Horebe. O lugar onde Moisés se encontrou com Deus e recebeu os
Dez Mandamentos devia ser o lugar da cura. Quando Elias chegou, o Senhor fez-
108
lhe uma pergunta muito estranha: "Que fazes aqui, Elias?" Por que a pergunta, se
o próprio Senhor tinha enviado o profeta? Por uma boa razão: para ajudar o
profeta a conscientizar-se do que lhe acontecia e despertar seus verdadeiros
sentimentos. A reação de Elias refletiu essa conscientização. Ele repetiu toda a
situação que motivara o seu desânimo. "Tenho sido zeloso pelo Senhor, Deus dos
exércitos, porque os filhos de Israel deixaram a tua aliança, derribaram os teus
altares, e mataram os teus profetas à espada; e eu fiquei só, e procuram tirar-me
a vida". Tendo Elias focalizado seus sentimentos e idéias, o Senhor podia começar
a lidar com a causa mais profunda do desânimo do profeta.

O Senhor faz isso comigo e com você. O que você faz aqui? O que causou
essa situação? Como aconteceu? A pergunta a Elias era uma expressão de
profundo amor. O Senhor não o estava censurando pelo desânimo; ele
simplesmente pedia um relato das circunstâncias e de seus sentimentos. Um
meio infalível de cura para o nosso desânimo é nos desabafarmos perante o
Senhor acerca de como nos sentimos em termos exatos e das causas da nossa
condição. O Senhor deseja fazer-nos essas mesmas perguntas tema e
incisivamente. Quando somos desafiados a apresentar a causa de como
chegamos ao nosso desânimo, estamos no início do caminho de volta à saúde.
Deus não argumentou com Elias a respeito da culpa que este transferiu aos
outros. Sua resposta foi o próximo passo para a cura. Ele mandou Elias
apresentar-se diante dele na montanha. A maior necessidade do profeta era
renascer em seu relacionamento com o Senhor. Ele precisava de uma
demonstração do poder divino, de uma reafirmação de que, apesar de tudo, o
Senhor ainda estava no controle. Foi isso exatamente o que aconteceu. Primeiro,
houve um vento impetuoso que fendia os montes e despedaçava as penhas em
volta do profeta. Depois, um terremoto fez a terra tremer debaixo dos pés de
Elias. Finalmente, uma chama saltou para fora da encosta da montanha. O
profeta ficou abalado e horrorizado diante das manifestações físicas da presença
de Iavé. Porém, mais importante que o vento, o terremoto e o fogo foi a
experiência interior da graça no coração de Elias. O Espírito do Senhor falou-lhe
em tom baixo e calmo — um sussurro suave — que trouxe calma e segurança. As
demonstrações externas de poder estavam unidas a uma manifestação interior de
amor e ânimo. O vento de Deus apagou a tensão da auto-justificação. O
terremoto no coração de Elias o ajudou a passar do antigo fundamento do
perfeccionismo para o novo fundamento de ser amado e aceito como era. O fogo
de Deus extinguiu por completo a palha miúda do desespero e realimentou a
chama da boa disposição para o serviço no coração de Elias. O mais dinâmico
dom de Deus para o desanimado é acender uma nova chama de esperança para o
futuro. O entusiasmo retoma; a empolgação pelo Senhor e sua causa se inflamam
de novo. O fogo do Senhor é para pessoas completamente esgotadas!
A instruções
deu-lhe cura final do desânimofortalecendo
específicas, de Elias foi afazê-lo voltardoaoprofeta
segurança trabalho. O Senhor
de que Deus
não desistira de Israel ou do desdobramento do drama da história. Ele recebeu
ordens para ungir seu sucessor. A obra de Elias teria prosseguimento! Em
seguida, ele devia ungir a Hazael rei da Síria, e a Jeú, rei de Israel. O Senhor
tinha planos para o seu povo escolhido. Elias não tinha de carregar o mundo
sobre os ombros sozinho. Para esclarecer isso ao profeta, o Senhor informou-o
acerca de sete mil pessoas que haviam permanecido fiéis e não haviam adorado a
Baal. O isolamento de Elias foi curado pelo conhecimento humilde e enaltecedor
de que ele não era o único homem fiel a Deus em Israel.
109
O que Deus fez por Elias ele pode fazer por nós. Se as cinzas do desânimo
estão latentes em seu coração, esteja certo de que Deus pode acender uma
chama e vai fazê-lo. Ele não desistiu de nós. Portanto, não estamos acabados.
Preste atenção ao vento. Sinta o terremoto de seu poder. Sinta o calor do novo
fogo. E o mais importante: fique atento, pois o Senhor falará. Você ouve a sua
voz? Ele diz: "Eu amo você. Jamais desistirei de você. Temos trabalho para
realizar juntos. Você já não precisa trabalhar para mim. Deixe que eu faça o meu
trabalho através de você! Ainda sou o Senhor do impossível."

110
CAPÍTULO DEZESSEIS
A LUTA PELO PODER
Jonas
Ouve-se muito falar de lutas pelo poder no momento atual. A batalha
interminável pelo domínio e autoridade contínua em cada nível da vida. Quem
manda aqui? Quem dá as ordens? Quem está no controle? A disputa pelo poder
permeia a nossa existência.
As notícias jamais nos permitem esquecer a luta pela liderança do mundo
entre a Rússia e os Estados Unidos. Há uma constante manipulação pelo poder
no governo local e nacional. As companhias manobram para conseguir vantagens
sobre os competidores, na luta pelo primeiro lugar. As pessoas lutam por
posições mais elevadas e mais reconhecimento, passando por cima umas das
outras, como degraus de uma escada que as levem ao topo. Todos desejam ser
chefe de alguma coisa — do almoxarifado até às salas dos executivos. Na igreja
cristã infelizmente, não é muito diferente. As denominações competem por
superioridade estatística. Líderes de igrejas disputam a popularidade. Dentro das
congregações, os santos se conduzem quase sempre de modo nada santo, na
tentativa de obter, conservar e assegurar a sua posição em alguma pista de
corrida nos negócios do reino. As famílias não estão isentas dessa luta. Maridos e
esposas competem pelo controle um do outro de maneiras sutis e abertas. O
predomínio é determinado tanto pelo que se dá como pelo que se tira. As crianças
são apanhadas nas situações sem saída da rivalidade entre irmãos e aprendem,
em tenra idade, a como manipular os pais. As amizades freqüentemente se
limitam pela síndrome superioridade-subserviência. A vida é uma luta pelo poder.
Mas a maior luta de todas se trava entre nós e Deus. Deus assumiu o risco
mais temível da história ao confiar o livre-arbítrio à humanidade. Sua intenção
era deixar-nos livres para decidirmos a receber ou rejeitar o poder de seu amor.
Com o poder de nossa vontade, somos capazes de dizer sim ou não a Deus.
Jamais escapamos | pergunta: Quem está no controle de minha vida? A pergunta
está diante de nós quando somos desafiados a começar a vida crista; devemos
responder a ela a cada dia, à medida que enfrentamos cada oportunidade ou
perplexidade. Desejar fazer de Deus o Senhor de nossas vidas e seguir a sua
orientação não é fácil. Quase sempre resistimos. Muitas vezes achamos que
sabemos o que é melhor, e colocamos em dúvida a sua direção. Perdemos a sua
bênção numa batalha de vontades. A luta decisiva pelo poder está em nossos
corações.
E. Stanley Jones disse: "A vida é ou terrivelmente simples ou simplesmente
terrível". A diferença está em recebermos ou rejeitarmos o que Deus tem para
nós.
canalPrecisamos desesperadamente
de seu fluxo de seuluta
ao engajar Deus numa poder,
pelomas muitas vezes obstruímos o
poder.
Um telespectador fez-me uma pergunta que focaliza o problema. "O que
desejo saber", escreveu ele, "é como cooperar com o melhor que Deus tem para a
minha vida. Estou cansado de lutar com ele. Desejo conhecer a vontade de Deus
e trabalhar com ele, não contra ele." Este capítulo é a minha resposta a essa
indagação.
Temos considerado o poder do Senhor do impossível. Agora, voltemos a
nossa atenção para a luta pelo poder que se trava quando, por causa de nossos
preconceitos e críticas, julgamos impossível realizar o que ele nos orientou,
111
embora perfeitamente praticável. Perdoar àqueles que julgamos imperdoáveis,
aceitar o inaceitável, amar a nossos inimigos — são desafios que encontram uma
resistência obstinada em nossos corações. Dizemos não, e a luta pelo poder
continua!
O profeta Jonas é um exemplo típico de uma pessoa em luta com Deus pelo
poder. O nome deste profeta significa "pombo". "Gavião" teria captado melhor o
seu caráter combativo. Jonas era de Gate-Hefer, no território de Zebulom, hoje
conhecido como Galiléia. Ele profetizou durante o reinado de Jeroboão II. A refe-
rência histórica a Jonas em 2 Reis 14:25 evidencia o seu fervor nacionalista.
Jeroboão "restabeleceu os termos de Israel, desde a entrada de Hamate até ao
mar da planície, segundo a palavra do Senhor, Deus de Israel, a qual falara por
intermédio de seu servo Jonas, filho de Amitai o profeta, o qual era de Gate-
Hefer". Foi algum tempo depois desse trabalho que Jonas começou a sua luta
com Deus, motivado pelo ódio que nutria para com o arquiinimigo de Israel, a
Assíria. A instrução do Senhor foi bem clara quanto a ida de Jonas a Nínive, a
capital dos assírios, para pregar o juízo. A luta do profeta com essa ordem é o
assunto do pequeno livro que leva o seu nome. A luta foi registrada mais tarde
como a base de uma mensagem perturbadora contra o exclusivismo.
A história de Jonas confronta-nos com uma batalha de vontades, a qual
muitos de nós experimentamos hoje em dia. Jonas personifica a maneira de
questionarmos a orientação divina e resistirmos ao que, no mais íntimo de nosso
coração, sabemos ser a sua vontade para nós. Somos um Jonas que sempre acha
difícil dizer sim ao melhor que Deus tem para nós.
Vou recontar a história dinâmica e familiar de Jonas, dispondo de
esclarecimentos pouco familiares, aplicáveis às nossas lutas com Deus pelo
poder. Ao preparar-nos para o que o Senhor quer dizer--nos, gostaria que, com os
olhos da mente, nos concentrássemos nas pessoas que achamos mais difíceis de
amar. No vídeo de sua consciência, ponha em cena as faces das pessoas, os tipos
e grupos de pessoas que você mais critica e reprova. Pense naqueles que você
deprecia, esperando jamais encontrar, acerca de quem você pode dizer: "Nunca
mais vê-los de novo é ainda cedo demais", ou: "Seja o que for que lhes aconteça, é
menos do que merecem!" Essas são as pessoas que se tornaram inimigas em sua
mente por causa do que fazem, dizem ou acreditam. Deus pode ter algumas
ordens a respeito dessas pessoas para nós, que hão de nos desafiar a uma luta
pelo poder acerca de sua vontade.
Foi o que aconteceu a Jonas. "Veio a palavra do Senhor a Jonas, filho de
Amitai, dizendo: Dispõe-te, vai à grande cidade de Nínive, e clama contra ela,
porque a sua malícia subiu até mim" (Jonas 1:1-2).
"Nínive, Senhor? Deve estar brincando! A capital dos assírios? O centro de
poder do pior inimigo de Israel?" A luta pelo poder começava. Jonas poderia
concordar com a perversidade e pecado de Nínive. Mas que lhe importava? Iavé
era o Deus
se os exclusivo
ninivitas dos hebreus.
respondessem A Palestina
e se era o seuEssa
arrependessem? reino.era
O que aconteceria
a essência da
resistência de Jonas. A última coisa que desejava era tomar-se responsável pela
salvação de seus inimigos. Ele não iria! O resto do livro de Jonas registra as fugas
do relutante missionário. Gosto de chamá-lo de o mensageiro mais rebelde do
Antigo Testamento, Podemos vê-lo a correr de Deus, a correr para Deus a fim de
salvar sua vida, e a correr com Deus por um breve período de sucesso profético e
depois correr adiante de Deus, cheio de ira e preconceito. Cada parte enfoca a
base da progressão da curta história biográfica de Jonas.
Quando a surpreendente revelação da vontade de Deus atingiu o coração
112
nacionalista e exclusivista de Jonas, ele pediu a demissão. Começou por fugir para
bem longe. Ele já havia trabalhado para o Senhor, mas não estava disposto a
trabalhar com ele. Nínive estava situada a noroeste, na margem leste do rio Tigre,
ao norte da confluência do rio com o Zab Superior. Escavações de suas paredes,
de treze quilômetros de circunferência, apontam uma cidade de amplas
dimensões. Os antigos hebreus realmente pensavam em Nínive como uma
associação de cidades que incluía Cala, trinta quilômetros ao sul; Resen, entre
Cala e Nínive, e Reobote-Ir, que significa: "Lugares espaçosos da cidade". Para
Jonas, Nínive significava o centro do poder assírio — de onde os imperadores
sedentos de sangue planejavam a destruição de Israel. Ele não iria! Em vez de ir,
fugiu para Jope. Pagou a passagem, embarcou num navio e partiu para Társis,
uma sossegada vila pesqueira no litoral da Espanha. Tendo recebido ordens para
ir para o noroeste, Jonas foi para o oeste. Nínive e Társis. Duas cidades em
direções opostas, cada uma significando algo muito diferente para Jonas. Nínive
era a síntese de tudo o que ele fora ensinado a odiar. Esse temido inimigo de
Israel era sinônimo de destruição e derramamento de sangue. Para Jonas, era
uma cidade dominada pelo pecado, paga, idolatra e em expansão, e nada poderia
ser mais repugnante que ir lá e pregar arrependimento.
A atitude de Jonas refletia o narcisismo de Israel. Amor próprio e orgulho
distorcido excluíam a possibilidade de esse povo escolhido ser um agente de
reconciliação para a salvação do mundo inteiro. À semelhança de Narciso, da
mitologia grega, Jonas sofria da doença da contemplação de sua própria imagem.
Ele estava comprometido com a exclusividade e o separatismo. Não havia espaço
em seu coração preconceituoso para seus inimigos. Na realidade, também não
havia espaço para Deus. Ao correr, Jonas pensava poder fugir de Iavé. Ele tinha
um conceito afunilado da Providência — de que o poder e domínio de Deus se
limitassem à Palestina e ao povo de sua aliança.
Társis era o lugar mais longínquo a que Jonas podia fugir da presença de
Deus. A pequena e sossegada vila simbolizava escape e libertação da chamada e
da presença divina. Apenas algumas semanas de jornada o colocariam no
anonimato. Ele fugia da realidade de Iavé no afã de evitar qualquer
responsabilidade. E, o mais importante, Jonas esperava pôr um fim à luta pelo
poder.
Muitos têm suas próprias Nínives e Társis. Nínive é a cidade da obediência
e da confrontação; Társis é um lugar de fuga e evasiva. Nossa Nínive é a revelação
inegável da vontade de Deus para nós, focalizada em pessoas, oportunidades,
problemas ou perplexidades. Tudo o que nossas críticas transformaram em nosso
inimigo, pode ser a nossa Nínive. Alguns são simples. Nínive pode ser simples-
mente a exortação do Senhor à qual ignoramos, uma obediência que exige mais
do que estamos prontos a dar. Seja o que for, Nínive é a chamada de Deus a soar
em nossos corações para servi-lo, para sermos a sua pessoa escolhida e dar-lhe o
primeiro lugarpara
A fuga em nossas
a nossavidas.
Társis pode acontecer em nossas almas bem antes de
seguirmos fisicamente para uma Jope, ou embarcarmos num navio para a
Espanha. Alguns estão fugindo de Deus sem jamais sair do local. Podemos estar
fugindo quando preenchemos nossa vida com boas coisas, de modo que não
deixamos tempo para Deus, quer para atender a um trabalho específico, quer
para lidar com pessoas que ele colocou em nossa agenda. Alguns estão fugindo
em muitas direções, mas não sob a direção de Deus.
Em uma conferência, anos atrás, pedi a um grupo de cristãos que
identificasse a Nínive deles. Para a maioria, não significava ir a algum lugar, mas
113
ser o povo fiel de Deus onde estavam e expressar amor, perdão e reconciliação
aos outros. Certo homem confessou: "Gastei a maior parte da minha vida fugindo
de Deus! Ele tem-me seguido há anos. Creio nele e freqüento a igreja
regularmente. Na verdade, sou muito ativo como líder e colaborador. As pessoas
pensam em mim como um 'bom' cristão. Mas, por dentro, venho tentando
esquivar-me à sua vontade. Levo uma vida de frenética atividade, mas estou
correndo na direção errada." Anos atrás, o Senhor tocou suas atitudes e pediu
certas mudanças. Ele ainda foge do impacto desse encontro. Társis pode estar
dentro de nossas próprias almas!
Não perca a implicação alarmante da chamada que pôs Jonas a fugir de
Deus. Quando nos tornamos cristãos, Deus inicia a trans-formação de nossa
preocupação narcisista. Ele procura colocar-nos no assunto central do reino,
fazer com que nos movamos com ele ao amar pessoas e expressar-lhes o que ele
tem feito em nós. Não há vôos solitários. Não podemos agarrar a Deus como uma
posse particular, para que nos ajude a levar até ao fim os nossos alvos. Ele nos
pôs em mira para surpresas inesperadas com pessoas improváveis, e com
desafios não antecipados.
Jonas apostou a sua vida na falsa idéia de que poderia fugir da presença de
Deus. E perdeu. Em Jope, ele embarcou num navio para Társis e imediatamente
anestesiou o coração rebelde com o sono. Ele se esqueceu de que Iavé é Senhor
da terra e do mar. A vastidão do Mediterrâneo estava tanto sob a providência de
Deus como a sua amada Gate-Hefer. Os ventos começaram a soprar e o mar se
agitou. O capitão do navio e sua tripulação foram tomados pelo pânico. Os
deuses estavam irados, pensavam — zangados com alguém no navio. Lançaram
sortes para descobrir o culpado, e estas caíram sobre Jonas. "Quem é você? Qual
é a sua ocupação? De onde veio?" perguntaram. Jonas respondeu-lhes que era
um hebreu e pertencia ao Deus de Israel. Então confessou que estava fugindo da
presença de seu Deus. Os marinheiros suplicaram a Jonas para que orasse ao
seu Deus, e todos se uniram numa fervorosa oração por segurança, mas nada
adiantou. Finalmente, Jonas pediu que o lançassem ao mar. Os marinheiros
tentaram tudo antes de atenderem ao estranho pedido. O masoquismo está muito
perto do narcisismo. Quando não podemos construir o nosso mundo em tomo de
nós mesmos, com freqüência esperamos e às vezes assumimos a
responsabilidade de castigar-nos a nós mesmos.
Você sabe o que aconteceu. Jonas foi lançado ao mar e a tempestade
amainou. Deus foi o autor da tempestade e ele desejava prosseguir com o capítulo
seguinte da sua luta pela vontade de Jonas. A intervenção do "grande peixe", ou
baleia, lembra-nos que os pensamentos de Deus para nós são "de paz, e não de
mal, para vos dar o fim que desejais" (Jeremias 29:11). O segundo capítulo de
Jonas revela que, no ventre do peixe, Jonas correu em espírito para Deus. A
excelente oração que fez, cheia de citações dos salmos e ditos de Israel,
expressam a redescoberta
em livrar aqueles de Jonas
que, em sua da onipresença
angustia, de Iavé
se voltam para ele. e de sua boa vontade
Todos nós conhecemos ocasiões de desespero, nas quais clamamos: —
Deus, me ajude, por favor! — quando caímos prostrados sobre os nossos rostos,
enquanto fugíamos dele. Criamos muita confusão. A vida caiu sobre nós. O
Senhor, de quem estávamos tentando escapar, torna-se a nossa única esperança.
Não merecemos a sua intervenção ou uma segunda oportunidade, mas nada
resta a fazer, senão clamar por sua ajuda.
Não devemos ser simplistas acerca da dificuldade. Há ocasiões em que o
problema indica que estamos sendo fiéis e enfrentando o mal. Outras vezes, o
114
problema aparece em nosso caminho sem a mínima explicação ou propósito.
Indagamos por que não estamos isentos de dificuldade. Então, geralmente depois
de perplexidade frustrante, olhamos para o passado e percebemos que através
dela crescemos na graça de Deus. Há, também, ocasiões em que o problema é um
som de alarme que nos leva a correr de volta para Deus, fazendo-nos questionar o
propósito e a prioridade de nossas vidas. Às vezes, quando as coisas se
desmoronam, percebemos que o propósito jamais foi permanecerem intatas.
Estávamos forçando alguma coisa de nossa própria vontade obstinada.
Para Jonas, a corrida na direção de Deus pedindo ajuda exigia uma nova
teologia e uma atitude transformada. Ele não poderia escapar da presença de
Deus. Não havia lugar para onde correr, que Deus não estivesse lá esperando por
ele.
Quando Jonas foi cuspido na praia, Deus estava pronto para retornar ao
plano zero. O Senhor não alterou a sua ordem. O rebelde profeta se humilhou e
começou a jornada para Nínive. Por um breve período ele correu com o seu
Senhor. Os resultados foram alarmantes e terríveis. Ao chegar a Nínive, recebeu
uma mensagem de acordo com o seu coração censurador. Mas ele não tinha idéia
do arrependimento e reavivamento que imediatamente produziria. O colérico
hebreu caminhou com largas passadas pelas ruas da capital assíria, bradando
condenação com clareza indiscutível: "Ainda quarenta dias, e Nínive será
subvertida".
Podemos imaginar que as pessoas tenham perguntado: "Quem diz tal
coisa?" Jonas falou-lhes acerca do julgamento de Iavé sobre o pecado de suas
vidas e sobre a iniqüidade de Nínive. Lendo nas entrelinhas do relato do terceiro
capítulo, percebemos a poderosa atividade do Espírito de Deus na metrópole
pagã. Quando o rei de Nínive ouviu a mensagem, ele conduziu um movimento
nacional de arrependimento. A cidade inteira cingiu-se de panos de saco e cinzas
de contrição e angústia.
O que se segue é um ato duplo de arrependimento, que nos impele mais a
fundo em nossa compreensão do Senhor do impossível. O povo se arrependeu, e
Deus também! "Viu Deus o que fizeram, como se converteram do seu mau
caminho: e Deus se arrependeu do mal que tinha dito lhes faria, e não o fez"
(Jonas 3:10). Usa-se a mesma palavra para o arrependimento do povo e o de
Deus. O Senhor mudou de idéia em resposta à confissão do povo. Isso é muito
importante para nós. Deus é contra o pecado, mas é por nós. Não podemos fugir
de diante de sua face de retidão e justiça. O julgamento do pecado é a separação
de Deus, agora e para sempre. Mas, no momento em que nos voltamos para ele,
ele nos recebe com graça e perdão. E um novo começo!
Jonas suspeitava dessa verdade o tempo todo, e foi essa a razão de não
desejar obedecer à ordem do Senhor para ir a Nínive. Agora, o corredor que
correu com Deus tão eficazmente proclamando a sua palavra a Nínive, corria bem
à frente dele,
arrependeu do revoltado.
julgamento.PorA que
luta estava irado?
pelo poder Porque
havia Deus, graciosamente,
recomeçado a todo o vapor. se
O
que Jonas menos desejava era que Nínive alcançasse perdão, pois tal
arrependimento significava que ele teria de mudar de atitude para com os seus
inimigos. Ele estava mais comprometido com os seus juízos negativos e com seu
mau humor do que com Deus. A sua "oração", se é que podemos chamá-la assim,
expressa o estado de seu coração vingativo. "Ah! Senhor não foi isso o que eu
disse, estando ainda na minha terra? Por isso me adiantei, fugindo para Társis,
pois sabia que és Deus clemente, e misericordioso, tardio em irar-se e grande em
benignidade, e que te arrependes do mal" (Jonas 4:2).
115
Jonas não era capaz de desistir da luta pelo poder. Ele continuou a lutar
até o último e fatal assalto, no qual questionava a natureza e o propósito de
Deus. Ele preferia morrer a desistir. Estamos às vezes tão comprometidos com
nossas predições acerca de pessoas e situações que nos desagradam, que nem
mesmo a mente de Deus pode mudar as nossas mentes! É fácil empenharmos na
destruição de pessoas e situações, de tal modo que a força destrutiva se volta
contra nós mesmos. O fato de nosso ego assegurar o fracasso de alguma coisa ou
alguém produz resultados assustadores. O comentário: "Veja só, eu não disse?"
ou "Eu estava certo o tempo todo!" é sinal claro de que estamos correndo adiante
de Deus e alimentando nossa ira. Você já sentiu uma satisfação interior quando
alguém de quem você não gosta satisfaz às suas piores expectativas? Você já se
sentiu surpreendido pelo seu próprio deleite quando um concorrente fracassou de
acordo com o seu prognóstico? Muitas de nossas lutas pelo poder com as pessoas
são uma extensão de nossa luta pelo poder com Deus.
Quando Deus passa por nosso negativismo e abençoa a outros, o que
podemos fazer? Jonas tinha duas opções: unir-se ao povo de Nínive, confessando
o seu próprio pecado, ou tomar em suas próprias mãos o julgamento de si
mesmo. A batalha final de vontades com Deus surge quando bancamos Deus de
nosso próprio destino com auto-condenação. Jonas desejava morrer porque não
podia fazer que Deus marchasse segundo o seu ritmo. Alguns são mais sutis:
eliminam a pessoa especial que são em morte lenta através da ira dirigida para
dentro, contra si mesmos.
Jonas estava correndo adiante de Deus ao se sentar a leste de Nínive,
contemplando do alto a cidade e esperando a sua destruição. O sol escaldante e
os ventos quentes, como de uma estufa, atingiam a sua cabeça, excedidos apenas
pelo forno da ira que rugia em sua alma. Uma vez mais o Senhor tentou alcançá-
lo com cuidado e amor. Ele fez uma planta enorme crescer e tapar o sol. Isso
satisfez ao interesse próprio e narcisista do profeta. Mas não por muito tempo. O
Senhor queria curar o coração turbulento de Jonas, e enviou um verme que
atacou a planta, fazendo-a murchar. O propósito de Deus era lembrar ao profeta
que ele, o Senhor, da mesma forma como dá suas bênçãos as tira, caso elas não
tragam os corações para ele. O Senhor é bondoso em sua luta final pela vontade
de Jonas. A expressão: "É razoável essa tua ira?" é uma maneira bondosa de
perguntar quem de fato tem o direito de ficar zangado. Se houvesse justificação
de alguma ira, era o Senhor quem tinha o direito de irar-se com o seu profeta
petulante. Em vez disso, ele persistiu em oferecer compaixão. Mas é difícil parar
alguém que corre velozmente adiante do Senhor e tenta dizer-lhe, ao mesmo
tempo, como dirigir o Universo. O livro de Jonas termina abruptamente. O que
aconteceu ao profeta? Não sabemos. Talvez isso seja bom. Podemos escrever o
final nós mesmos. Como gostaríamos que o livro terminasse? Ou, mais em
particular, como desejamos que a nossa própria história termine? Esteja certo de
que, numa As
ele vença. lutapalavras
com Deus pelodepoder,
finais Deus aaúnica
Jonasmaneira de ganhar
são cheias é permitir
de graça, a qual que
ele
anseia que o profeta partilhe. "E não hei de eu ter compaixão da grande cidade de
Nínive em que há mais de cento e vinte mil pessoas, que não sabem discernir
entre a mão direita e a mão esquerda?" (Jonas 4:11). O de que Nínive precisava,
Jonas precisava ainda mais. Seu julgamento, resultando em ira, procedia da falta
de percepção de que ele também devia ser julgado por Deus. O perdão de Deus
para ele devia ter produzido a preciosa compaixão de que ele tanto carecia. O
livro de Jonas termina de repente, sem essa importante reação da parte do
relutante profeta.
116
A história da luta de Jonas com Deus pelo poder inquieta-nos como
indivíduos e como igreja. Deus está fazendo algo grandioso no mundo.
Exclusivismo e julgamento são luxo que não devemos ter. O mesmo Deus que
lutou com Jonas e com seu povo Israel, a fim de fazê-los amar a todos os povos,
veio ao mundo no "maior do que Jonas" —Jesus Cristo — para revelar sua
compaixão e graça. Quando renunciamos à nossa luta pelo poder e aceitamos o
perdão de Deus e seu poder capacitador em Cristo, podemos correr com ele para
a nossa Nínive.
O segredo da vida abundante é que quando sabemos que possuímos poder,
a luta pelo poder termina. Uma experiência do poder de Cristo, que habita em
nós, liberta-nos da luta pelo poder com ele ou com outras pessoas. E quando
percebemos que o seu poder que nos foi dado tem o propósito de conhecermos e
fazermos a sua vontade, então as nossas lutas se convertem numa paz sublime.
Sabemos que somos amados e aceitos. Já não temos necessidade de lutar por
vantagem nem competir por autoridade. Todo o poder no céu e na terra é nosso!
Uma surpresa final para a nossa consideração de Jonas não provém da
Escritura, mas do quadro de Miguel Ângelo no teto da Capela Sistina. De todos os
profetas, apóstolos e patriarcas retratados pelo grande artista, nenhum apresenta
um semblante mais radiante do que o de Jonas! Miguel Ângelo sabia de algo que
não sabemos? Ou quem sabe desejasse que o profeta conhecesse a graça a que
tanto resistiu? Talvez imaginasse que Jonas desistiu da luta pelo poder e se
tornou um comunicador do amor, em vez da ira.
O mais emocionante é que podemos pintar o próprio semblante no teto de
hoje e na eternidade. A luta pelo poder pode terminar, e um fluxo da bondade e
do poder de Deus pode começar dentro e através de nós. O retrato não está
terminado. Seu último capítulo ainda não foi escrito. Louve a Deus por isso!

117
CAPÍTULO DEZESSETE
A SOLIDÃO DE DEUS
Oséias
Você já pensou na solidão de Deus? Falamos tanto de sua glória e poder.
Não deixemos de atentar para a solidão de seu coração. Podemos nos identificar
com essa solidão de nossa própria experiência.
Há um tipo de solidão que é mais do que a ausência de outras pessoas. É o
anseio de que as coisas estejam bem entre nós e aqueles a quem amamos.
Relacionamentos rompidos causam a nossa mais cruciante solidão. Podemos
estar em companhia de alguém e não termos comunhão com essa pessoa. A
distância entre as pessoas é mais que geográfica; é psicológica, srcinada da
quebra das relações. As pessoas, com freqüência, conversam comigo acerca da
solidão que sentem no casamento, na família ou nas amizades.
Há uma dor na separação que advém de sonhos não partilhados,
intimidade não experimentada e sentimentos mais profundos não
correspondidos. Erich Fromm disse: "A necessidade mais profunda do homem é a
de superar a sua separação, de deixar a prisão da solidão." Deixar essa prisão e
construir pontes em lugar de paredes não é sempre fácil. Especialmente quando
as pessoas que amamos fazem coisas que necessitam de nosso julgamento, e
quando temos de encontrar maneiras aprimoradas e criativas de auxiliá-las a
atingir o seu potencial máximo.
Todos nós já sentimos a solidão do interesse profundo, que não podemos
expressar por causa da resistência de outra pessoa. Quando percebemos alguém
que amamos fazendo uma embrulhada de sua vida, ANSI
aámos estender a mão para ajudar, sem, contudo, nos opormos à liberdade
da pessoa nem a privarmos da fibra de caráter que cresce através da dificuldade.
Nossa tentação como cônjuges, pais, irmãos, irmãs e amigos é assumir a
responsabilidade. Queremos resolver tudo, aliviar as dificuldades e dirigir a vida
das pessoas com mais eficácia que pensamos que elas podem.
Lembro-me de estar de pé na linha lateral de um campo de futebol,
enquanto um dos meus filhos era o goleiro do time da casa. O time visitante não
o deixava em paz. Embora ele fizesse o possível para não perder a calma por
causa do aborrecimento persistente e das decisões injustas do juiz, o conflito
terminou numa luta corporal entre meu filho e os valentões do time adversário.
Quando não pude mais ficar ali observando meu filho ser maltratado, dei o
primeiro passo para intervir. Um amigo me agarrou pelo ombro: "Não faça isso! O
rapaz deve lutar suas próprias batalhas. Não entre, se você deseja que ele se
torne um homem." Bom conselho, mas doloroso! Há uma solidão de querer
ajudarAíuma
ficopessoa amada
a pensar num eamigo
saberprofundamente
que é melhor não interferir. acerca da vida sem
preocupado
direção de alguém que ele amava muito. Ele tentou ajudar, mas o seu interesse
foi repelido. "Que posso fazer?" clamou. "Quando tento admoestá-lo no que é
certo, ele se afasta de mim. Ele está decidido a destruir a sua vida. Sempre que
ofereço conselhos prudentes ou um suave corretivo, é como se escavasse entre
nós um abismo cada vez maior. É doloroso vê-lo despejar sua vida num bueiro,
mas os esforços para ajudar têm prejudicado o nosso relacionamento. Sinto-me
solitário. Não posso alcançá-lo!"
E então considero a solidão e alienação que uma esposa sentia pelo marido.
118
Ela desejava confortá-lo em seus problemas, mas não podia tolerar o estilo de
vida dele, que corria rápido em direção ao fracasso. Ela se sentia sozinha em sua
dor. E me disse que tudo o que dizia era interpretado como interferência. Ela está
confinada a um cárcere de solidão, por causa das suas ajuizadas opiniões que ele
precisa ouvir, mas com a percepção de que quanto mais tenta desenredar os
valores e os objetivos distorcidos de seu marido, tanto mais ele se distancia.
O coração de cada pai pode identificar-se com essa solidão. Um homem me
contou que está chocado porque seu filho não partilha sua fé e seus bons
propósitos. Ele sente a desgraça de ter falhado em comunicar amor. "Amo muito
o meu filho", disse ele, "mas como posso comunicar-lhe esse amor sem afirmar as
coisas que ele está fazendo e que sei vão arruinar-lhe a vida? Sinto-me preso nas
minhas próprias convicções, às quais não posso renunciar, mas não posso viver a
vida de meu filho por ele. O que posso fazer? Sinto--me sozinho sem a amizade
que uma vez tive com ele."
Quando nos simpatizamos com essas pessoas e sentimos semelhante
frustração, estamos nos aproximando das profundezas do coração de Deus. O
problema dele com você e eu, da mesma forma que com milhões de seu povo, não
é diferente. E o relacionamento complexo de justiça e graça. Ele nos criou para si
mesmo e para o companheirismo espiritual de conhecê-lo, amá-lo, e permitir que
ele nos ame. Mas a luta que observamos em Jacó e em Jonas está em todos nós.
Fazemos coisas que magoam o coração de Deus. Com freqüência estamos
decididos a voltar-lhe as costas e fazer as coisas a nosso modo. Não é sempre que
o pomos em primeiro lugar. Buscamos coisas que ele não nos destinou.
Adoramos falsos deuses erigidos pelo nosso orgulho. Resistimos à sua orientação
e fechamos o fluxo de seu amor remediador.
Como conseqüência, nossos relacionamentos com os outros estão-se
fragmentando pela falta de amor perdoador e de bondoso encorajamento.
Quebramos os mandamentos divinos e o mandamento essencial do amor. O que
pode ele fazer conosco?
Às vezes, resistências imperceptíveis ou ruidosas à sua vontade para nós
deixam-nos incômodos em sua presença. A oração se torna menos íntima, depois
formal e finalmente sem efeito. Tentamos usar Deus para satisfazer a nossa
agenda e desejos egoístas. O que desejamos, muitas vezes, não é o melhor para
nós. Esquivamo-nos de ser honestos com ele ao elaborar teorias bem sutis acerca
de orações não respondidas. Deixamo-nos levar ao sabor das ondas. Uma
saudade de Deus se desenvolve em nossas almas. Mas não podemos ir para casa
em razão do que temos sido ou por causa de nossos argumentos presunçosos,
levantados contra o Todo-poderoso pelo modo como falhou em satisfazer às
nossas expectativas. Nossa falta de amor-próprio criativo não permite que Deus
preencha o nosso vazio. Suportamos o afastamento por causa das condições que
impomos. Os outros, o destino, as circunstâncias, inclusive o próprio Deus, a
culpa é de busca
liberdade, todos uma
— pensamos.
maneira deE Deus, que não
tornar-nos nos rejeita
dispostos obliterando
a estarmos nossa
dispostos.
Como resultado de nossa independência motivada pela culpa, Deus fica solitário.
Solitário pelo enlevo da reconciliação, da intimidade para a qual fomos criados.

Muitos de nós não conseguimos nos identificar com a solidão do coração de


Deus, até que a experimentamos com alguém que amamos. É um dom
magnificente da Providência, quando nos simpatizamos de repente com a solidão
de Deus por nós. Sintonizamos a sua angústia quando sentimos o doloroso
desinteresse e a resistência doentia de alguém que amamos, e que tem provocado
119
tanto a nossa indignação como a nossa preocupação quando tudo fizemos para
ajudar. Quando uma pessoa que amamos profundamente nos mantém à
distância e resiste ao nosso desejo de ajudar, temos a oportunidade sagrada de
saber como Deus lida com a solidão em relação a nós.
Pensamos no céu como felicidade duradoura, e ditosa alegria. Certamente
há louvor incessante de anjos, arcanjos e santos de todos os tempos, ao redor do
trono de Deus. E Deus fica satisfeito. Mas eu acho que o coração de Deus está
sempre voltado para o arrogante planeta Terra, para seus filhos, por quem ele
anseia com amor paternal — por você e por mim. A atenção principal de Deus é
para com o povo que se diz dele, mas o nega com orgulho rebelde; que não
pretende conhecê-lo, mas finge que sim. Pense nessa dolorosa solidão, quando as
pessoas que você ama sofrem pela própria obstinação e você nada pode fazer,
senão observar. Sinta o que Deus sente quando você chega à conclusão de que
julgá-las só vai afastá-las de você. Identifique-se com o problema de Deus quando
você sabe que a cortesia barata ou a aprovação solícita, de valor baixo, só farão
de você um co-conspirador na ruína de alguém. Tudo o que você pode fazer é
esperar. E no que diz respeito à pessoa, resta a dor. Solidão!
O profeta Oséias, através de seu próprio casamento, descobriu a solidão de
Deus. Sua esposa o deixou para ser uma prostituta nas orgias sexuais do culto a
Baal. O que podia ele fazer? Ele não podia perdoar-lhe o sacrilégio, e de sua
condenação veio a expulsão dela para bem longe. Então, por inspiração divina,
ele percebeu o espantoso paralelo entre a sua angústia por causa de sua esposa e
o desapontamento de Deus por causa de seu povo. No momento mais dramático
de sua crise pessoal, o profeta estava pronto para falar a verdade a Israel com
amor. Dizem alguns que uma má esposa fez um bom profeta. Talvez. Mas, de
uma maneira mais profunda, Oséias se afasta da proclamação profética geral
porque usa sua vida e experiência como mensagem. Em certo sentido, Deus
escreveu o roteiro da dor de Oséias e a seguir pregou sua mensagem através do
profeta!
Tal como Copérnico, que nos levou a perceber a verdade da cosmologia,
Oséias levou o povo à descoberta espiritual da verdadeira natureza do perdão de
Deus e de seu amor inexorável. A sua profecia do julgamento de Deus estava
unida à mensagem de sua experiência da graça de Deus. Da sua experiência com
Gômer, sua esposa, e da solidão que sentia por causa do pecado dela, Oséias
captou o pulsar contínuo da aspiração de Deus por seu povo. A mensagem do
Senhor a Efraim — nome que associava todas as tribos de Israel com o povo de
Deus — era uma combinação do equilíbrio delicado entre o julgamento correto e o
anseio profundo de restabelecer uma nova e perfeita comunhão entre ele e seus
filhos rebeldes. A mensagem que Oséias escreveu e comunicou ao reino do Norte,
entre os anos 750 e 725 a.C, saiu ardente do caldeirão de suas dificuldades
familiares. O que ele proclamou era muito mais que uma transferência de sua
luta a Deus.
separação de Oséias
Gômer,não passou
e então de pela dordisse:
súbito de sua solidão
"Isso porDeus
é como causadeve
do pecado e
se sentir
acerca de Efraim." Pelo contrário, na profundeza da comunhão com Deus, o
profeta recebia uma nova verdade acerca da natureza divina e a orientação de
como reconciliar-se com a esposa. Logo depois ele anuncia, com urgência pessoal,
a sua profecia ao povo de Deus.
O que Deus disse a Oséias e este, como profeta, transmitiu a Israel, é digno
de um livro. Para os nossos propósitos aqui, podemos chegar à essência do livro
de Oséias considerando a orientação de Deus para o profeta a respeito de Gômer,
no terceiro capítulo, e então decifrando o dilema do amor genuíno com duas
120
passagens, uma do quarto e outra do décimo primeiro capítulo.
Primeiro, Deus revela o seu amor ilimitado em graça insondável.Sinta com
Oséias a perplexidade do que fazer acerca de Gômer. Para um hebreu, nenhum
pecado poderia ter sido mais desprezível do que a adoração de Baal. Gômer fora
atraída aos rituais de fertilidade pagã de fornicação no culto a Baal, e então se
tornou uma escrava do culto. A coisa mais acertada a fazer era julgá-la e
esquecê-la. Mas a separação resultava na angústia inexplicável da solidão. Seu
coração ansiava pela esposa desafeiçoada. Então Deus mandou que ele fizesse
algo que parecia contradizer toda a decência e integridade. "Disse-me o Senhor:
Vai outra vez, ama uma mulher, amada de seu amigo, e adúltera, como o Senhor
ama os filhos de Israel, embora eles olhem para outros deuses" (Oséias 3:1).
Atente para o emprego da palavra amor. É como se o Senhor estivesse dizendo:
"Você ama sua esposa, agora vá e a ame com um amor mais profundo, como o
que eu tenho por Israel."
O que o Senhor queria dizer? Somos tentados a ser simplistas. Deus
sempre perdoa — esse é o negócio dele — dizemos, e assim podemos nos
esquecer de nossas normas e oferecer perdão. Nada disso! O restante do livro de
Oséias revela o alto custo desse perdão. Quanto mais fundo Oséias penetrava no
coração de Deus, mais percebia que Deus compreendia a luta que ele teria de
enfrentar para reconciliar-se com a esposa.
Isso nos leva ao que parece ser um paradoxo insolúvel: o amor de Deus
versus o seu juízo. O quarto capítulo declara o juízo divino sobre o seu povo:
"Efraim está entregue aos ídolos; é deixá-lo" (Oséias 4:17). Isso soa como o fim da
paciência de Deus. Uma parte da solidão de Deus é que em certas ocasiões, em
virtude de sublime sabedoria, ele deve nos deixar. Ele nos ama tanto que se
recusa a fazer um curativo na ferida do pecado com uma graça barata.
Todos nós conhecemos o sentimento de abandono da parte de Deus. Há
dias, semanas, às vezes meses, quando sentimos que ele está ausente, e seu
cuidado não existe. Ele se torna uma lembrança nublada de dias melhores.
Davi conhecia esse sentimento. Leia o Salmo 13 e capte a frustração de um
homem que indaga onde Deus está: "Até quando, Senhor? Esquecer-te-ás de mim
para sempre? Até quando ocultarás de mim o teu rosto? Até quando estarei eu
relutando dentro em minha alma, com tristeza no coração cada dia? Até quando
se erguerá contra mim o meu inimigo?" (Salmo 13:1-2). Não estamos isentos do
que a maioria dos grandes santos sentiram muitas vezes em suas vidas.
Afirmamos com Isaías: "Verdadeiramente, tu és um Deus que ocultas a ti
mesmo". Oramos, e nossas orações parecem retornar sem resposta. Nenhum
sinal de seu cuidado amoroso; nenhum sussurro de sua orientação; nenhum som
em nossas almas. Ele nos deixa a sós com nossa rebelião, como um pai a lidar
com o acesso de raiva do filho. Desejamos que ele nos afaste dessa situação e nos
impeça de macular nossa dignidade. Como um criminoso assustado que deixa
pistas,
queremosescrevendo
que Deusnointervenha.
local de seus
Nada,crimes:
exceto "Alguém meOu,
o silêncio! detenha,
na dorpor
de favor!",
nossos
erros auto-infligidos, ansiamos pelos braços de um pai que nos assegure que
tudo está bem, que realmente não fez diferença nenhuma. Silêncio de novo. Ou,
oramos pedindo respostas rápidas para problemas que levamos anos a criar, e
petulantemente batemos os pés no chão: "Deus, onde está você?" Aonde Deus vai
quando precisamos dele? Dizemos com o profeta: "Até quando, Senhor, clamarei
eu, e tu não me escutaras?" (Habacuque 1:2). A pergunta feita na frivolidade de
nossos esforços por fazer que Deus obedeça às nossas ordens, deve ser
respondida nas profundezas de nossa solidão, que é igual à sua solidão por nós!
121
Esse é o outro lado da solidão. Deus conhece a solidão profunda, enquanto
espera que cheguemos ao fim de nossos recursos. Quão fácil seria reduzir o
tempo na fornalha ardente, o qual é necessário para criar pessoas realmente
temperadas! Ele nos ama demais para fazer isso. Descobrimos, no capítulo onze,
o triste preço que a solidão de Deus lhe custa.
Oséias revela o coração de Deus quando ele parece mais distante,
inalcançável. Atente para o que Deus declarou acerca de Efraim. O mesmo se
aplica a mim e a você, e às pessoas que tanto amamos: "Todavia, eu ensinei a
andar a Efraim; tomei-os nos meus braços mas não atinaram que eu os curava.
Atraí-os com cordas humanas, com laços de amor. . . Como te deixaria, ó Efraim?
Como te entregaria, ó Israel? Como te faria como a Admá? Como fazer-te um
Zeboim? Meu coração está comovido dentro em mim, as minhas compaixões à
uma se acendem. Não executarei o furor da minha ira; não tornarei para destruir
a Efraim" (Oséias 11:3-4a, 8-9a). O aparente desinteresse de Deus é
contrabalançado pelo seu envolvimento compassivo. Ele não pode revelar-se de
outra maneira; sua graça perdoadora é muito maior do que seu justo juízo.
No relato de Oséias temos um quadro de Deus com as mãos presas,
mordendo os lábios em restrição auto-imposta, tudo para não invadir as nossas
vidas e recusar-nos o privilégio de crescer através de nossos erros. Em seguida,
vemos seus braços estendidos enquanto ele corre em nossa direção. O severo
olhar de desagrado é substituído por um compassivo sorriso de aceitação, quando
esboçamos a menor inclinação para dar as costas ao pecado e correr em sua
direção. Deus sente-se solitário por mim e por você. Ele nos deseja de volta ao
seu coração, onde é o nosso lugar!
Quando ouvimos Deus dizer-nos: "Não posso deixá-lo ir!", podemos declarar
(e enfatizar) aos outros: "Porque Deus jamais me deixará ir, eu jamais o deixarei
ir." Todos nós, em nossas vidas, precisamos de pessoas cujo amor possua essa
qualidade de paciência capaz de transmitir-nos afirmação e segurança. Elas
ganharam o direito de estar ao nosso lado quando nos atracamos com a vida e
não obtivemos o máximo desejado. Podemos abrir-lhes o nosso coração, sabendo
que elas não esmagarão a tenra planta do desejo de melhorar. Elas não nos
destruirão com censura severa nem extravasarão sobre nós sua impaciência
consigo mesmas. Pacientemente, elas esperarão até que estejamos receptivos e
intensifiquemos o nosso desejo de mudar.
Então, de repente compreendemos. Se precisamos dessas pessoas em
nossa vida, assim também devemos ser para aqueles cujas vidas Deus nos
confiou. Quando pedimos que Deus nos ajude a saber o que fazer e o que dizer,
sua orientação não é diferente da que deu a Oséias. Devemos nos dirigir à pessoa
a quem amamos, ser o amor de Deus para ela, e, depois, confessar-lhe a nossa
solidão e o nosso anseio de ser útil. O verdadeiro amor, que é mais que uma troca
comercial ou uma recompensa, fará com que a pessoa deseje mudar. Se
pudermos, ao exemplo
breve o nosso lado de outros, ser os
alcançará a pessoa que ansiamos que os outros sejam, em
seus objetivos.
Isso não é simples nem fácil. Opiniões condenatórias a críticas exacerbadas
revelam muito de nossa tendência natural. Mas essa não tem sido a atitude de
Deus para conosco, e nossa expressão de amor genuíno jamais pode ser menor.
A cruz é o único lugar onde o amor pode nascer e ser nutrido. O Calvário
revela plenamente o mesmo amor solitário que Oséias experimentou e depois
liberou. Juízo do pecado, sim, mas também amor inextinguível, que expõe o
verdadeiro e eterno coração de Deus. "Não posso deixá-lo ir, porque o amo muito.
Sinto solidão por você!" Que nossa resposta seja permitir que seu amor encha os
122
nossos corações solitários, e que estes, depois, revelem esse amor às pessoas que
ele colocou em nosso caminho.

123
CAPITULO DEZOITO
NOVA A CADA MANHÃ
Jeremias
Muitas das cartas que recebo revelam a necessidade de esperança. A cada
semana centenas de pessoas me informam, de muitas maneiras, que sua
esperança está a acabar-se. A carta de certo homem, contudo, era especialmente
aguda e comovente:

"Perdi toda
despedaçar-se. Umaa boa
esperança!" escreveu era
parte do problema ele. culpa
"Um minha,
ano atrás
masaoutras
vida pareceu
pessoas
também tinham culpa. Nada parecia dar certo. Amigos me diziam que as coisas
estavam tão ruins que não poderiam ficar piores. Bem, elas pioraram! Assim, pedi
que Deus entrasse e acertasse as coisas. O que faz você quando pede a Deus que
realize algum milagre e, em lugar disso, obtém mais problemas? Como se pode ter
esperanças quando pede ajuda a Deus e nada acontece?"
Que resposta você daria a esse homem? Ele precisava de algo mais do que
palavras bonitas como conselho. A vida o havia levado ao limiar de uma
descoberta importante. Não quis que essa descoberta se perdesse, dizendo-lhe
que aguardasse mais tempo e reunisse mais coragem para esperar. Ele havia
perdido sua esperança utilitária e autogerada e estava prestes a receber a dádiva
da esperança infundida por Deus.
Quando conversamos face a face, disse-lhe algo que o assustou e o deixou
perplexo:
— Você é uma pessoa muito abençoada.
— Uma o quê? — retrucou angustiado. — Como você pode dizer uma coisa
dessas depois de tudo o que me aconteceu? Perdi as esperanças, e tudo o que
você faz é parabenizar-me?
Pelo menos consegui a atenção dele para o que tinha a dizer, e, pela graça
de Deus, ele' demonstrou receptividade.
— Não é possível produzir esperança autêntica. O que você perdeu foi seu
senso de expectativa e seu ardente desejo. Você não perdeu a esperança. A
verdadeira esperança não é uma capacidade produzida por meios humanos e
adquirida mediante atitudes corretas ou pensamentos positivos. A esperança é
um dom que se relaciona de um modo inseparável e inexplicável com o Doador
Você precisa de Deus muito mais que das respostas dele a seus problemas.
Quando experimentamos um relacionamento íntimo com ele, a esperança será
um dos mais agradáveis subprodutos. A esperança duradoura não é um
ocasional anseio para que Deus atue em nosso favor. Antes, é uma inabalável
confiança de que ele é a nossa vida, agora e para sempre, e que nem a vida nem a
morte pode separar-nos dele.
Sou agradecido porque, na tarde que conversamos, esse homem
desesperançado recebeu esperança ao reconhecer a Deus, realmente, como o
Senhor da sua vida. Ele estabeleceu a ordem das coisas: o Reino de Deus, a
comunhão com Deus e a disposição de realizar a vontade de Deus. Nos dias que
se seguiram, o dom da verdadeira esperança começou a crescer.
A descoberta mais dolorosa que já fiz, e que devo redescobrir mais e mais
vezes, é que a esperança é a faculdade de fazer, acidentalmente, descobertas
felizes. Ficaremos desapontados se buscarmos a esperança como um fim em si
mesma. A esperança dinâmica vem de algo ou de alguém fundamentalmente
124
confiável. Nenhum amigo e nenhuma pessoa amada, nenhum líder e nenhuma
instituição pode ser a fonte da esperança. Essas pessoas ou coisas jamais tiveram
esse propósito. Pessoas, causas, movimentos, partidos — ou o fraco desejo de que
em dado momento as coisas vão dar certo — sempre nos decepcionam.
"Há esperança?" E o que muitos perguntam hoje, unindo-se ao coro de
outros cuja expectativa está imersa no vazio. Quando contemplo minha
congregação a cada semana, vejo a pergunta escrita nas faces de centenas de
pessoas. Amor e honestidade devem responder sim e não. Não, não há esperança
no pedido que fazemos a Deus; sim, há esperança no que Deus deseja ser em nós
e realizar por nosso intermédio.
Há três níveis de esperança. Os dois primeiros são fac-símiles, o terceiro é
confiável. Todos nós temos um anseio interior pelo progresso, pelo sucesso e pelo
cumprimento de nossos sonhos e planos mais acalentados. Algumas pessoas, que
esperam ansiosas pelo melhor, têm sido abençoadas com uma disposição
radiante. Mesmo as mais positivas das pessoas, quando enfrentam problemas e
perplexidades, são forçadas a pedir ajuda a Deus a fim de resolver as coisas de
acordo com a pressuposição delas. Mas é quando ele não satisfaz às nossas
expectativas, ou não marcha conforme o nosso ritmo, que somos abençoados com
a crise de desejar Deus por Deus, e não pelo que ele realiza como cumpridor de
nossos planos. É neste nível mais elevado que nasce a esperança.
A transição turbulenta de uma esperança utilitária para a esperança real é
a história da vida de Jeremias. Ele é conhecido como o "profeta chorão". Na
verdade, a palavra jeremiada, que significa "história de lamentos",
"desapontamento" ou "desânimo", decorre de uma compreensão superficial da
vida e do ministério de Jeremias. Na realidade, o profeta se tornou um homem de
profunda esperança.
Mas ele não experimentou esse tipo de esperança logo no início, ou com
facilidade. Foi o presente de anos posteriores, quando as orações pareciam sem
respostas, quando o seu anseio pelo povo não se cumprira, e quando já se achava
exaurido por completo. Esta é a razão por que é tão importante uma consideração
de Jeremias para o nosso tempo. As experiências dele nos quarenta anos de seu
ministério profético no Reino do Sul, sua liderança até a conquista e destruição
de Jerusalém por Babilônia em 586 a.C, e os dias lastimosos que se seguiram
com o exílio de seus compatriotas, forjaram um homem que apela à nossa
condição. Jeremias não vivia na superfície do mar turbulento da história da
Judá; ele foi um mergulhador que desceu às profundezas e apareceu com uma
pérola genuína posta à prova. Ele recebeu o dom da esperança verdadeira e
partilhou o segredo.
O capítulo três de Lamentações descreve a descida de Jeremias às
profundezas e a sua ascensão à sublime esperança. O livro de Jeremias foi escrito
após a destruição de Jerusalém e o início do exílio. É uma compilação de
elegíadas. O título do livro
é Ekah, literalmente, "Ah,e acomo?"
primeira
oupalavra
"Ai de do primeiro
mim!" Os capítulo em hebraico
manuscritos antigos
traziam uma síntese inicial explicando o título e o conteúdo. "E aconteceu que,
depois que Israel foi levado em cativeiro e Jerusalém foi destruída, Jeremias
sentou-se a chorar e pranteou esta lamentação sobre Jerusalém, dizendo. . ." E o
que ele disse está cheio de pesar e por fim de indignação, que se aproxima da
blasfêmia, acerca da providência divina. Como pôde Deus permitir tal coisa? O
povo havia pecado, sim. É bem verdade que se haviam feito de surdos para as
advertências mais ardentes do profeta. O povo escolhido adotou falsos deuses e
aliados políticos incrédulos e desobedientes, sem dúvida. Mas Jeremias havia
125
orado durante todo esse tempo. Deus não atentou para suas orações? Não se
importou?
A pergunta angustiosa, enfocada em especial no capítulo quatorze,
versículo 8, permeia o livro de Jeremias: "O Esperança de Israel, e Redentor seu
no tempo da angústia, por que serias como estrangeiro na terra? Como viandante
que se desvia para passar a noite?" Jeremias poderia aceitar o juízo de Deus com
respeito à apostasia de seu povo, como havia predito, bem como confirmar a
permissão de Deus para a queda de Jerusalém e o exílio dos seus mais honrados
cidadãos — mas desde que tudo isso fosse sem angústia e sofrimento tão terrível,
com uma pergunta séria acerca da extensão do castigo de Deus. Foi então que
Jeremias clamou em alta voz por amparo pessoal, a fim de suportar a sua dor,
como abandonado e esquecido. Imaginava que estivesse do lado do Senhor
através da angústia que seu povo experimentava, mas tudo o que obteve em troca
desse mesmo povo que tentou ajudar foi rejeição, ódio e hostilidade.
Os primeiros dezoito versículos do capítulo três de Lamentações captam a
presença da esperança utilitária. O sofrimento do povo não conduziu ao fim que
Jeremias esperava. Nem os meios nem o fim pareciam benéficos. Do mesmo modo
como muitos só se satisfazem com a esperança de que Deus venha cumprir a sua
visão, Jeremias chegou a duvidar da intervenção divina. As imagens que emprega
para explicar o seu empenho assumem realismo surpreendente. Jeremias tinha
visto aflição, mas era a vara da ira de Deus que ele questionava. Sentia-se
sozinho na escuridão da aparente rejeição do Todo-poderoso. Deus não apreciara
seus esforços por tantos anos? Aprisionado, ele sentia-se sozinho e abandonado.
Quando orava, parecia não haver resposta. "Ainda quando clamo e grito, ele não
admite a minha oração. Fechou os meus caminhos com pedras lavadas, fez
tortuosas as minhas veredas. Fez-se-me como urso à espreita, um leão de
emboscada. Desviou os meus caminhos, e me fez em pedaços; deixou-me
assolado" (Lamentações 3:8-11). Observe os pronomes de petulância. "Minhas
veredas"; "meus caminhos". A esperança dele, de que Deus atenderia ao seu
chamado, engolfava a sua alma. O ridículo e a zombaria do povo nada era
comparado ao silêncio de Deus. O lamento de Jeremias atinge o ponto mais alto
com o clamor: "Já pereceu a minha glória, como também a minha esperança no
Senhor" (Lamentações 3:18). Ele estava próximo do ponto de ruptura. Ele estava
sendo quebrantado para experimentar a esperança verdadeira.
Repetidas vezes o profeta retornava ao que tinha acontecido. Ele fazia mau
uso da memória para enfocar de novo todos os seus desapontamentos. Deus se
lembrava? Sim, Jeremias! "Lembra-te da minha aflição e do meu pranto, do
absinto e do veneno. Minha alma continuamente os recorda e se abate dentro em
mim" (Lamentações 3:19-20).
Então, de repente, um raio da verdade penetrou no calabouço da memória
de Jeremias. Ao alcançar bem o fundo, ele se agarrou a uma lembrança que
transformou
conseguiu o odomseu da
complexo de consternações.
esperança. Naso profundezas
E o Doador era dom. "Dissodo
eudesespero, ele
me recordo,
portanto tenho esperança." O "Ah, como?" de Jeremias se transforma em: "Ah, eis
a esperança!"
E tão freqüente ouvirmos e repetirmos as infundadas palavras: "Ah, eis a
esperança!" Jeremias faz essa declaração com algo mais que o fino e desgastado
fio do desejo. O impacto dos próximos seis versículos denotam a importância da
percepção estimulante de "Eis a esperança, deveras!"
O profeta emerge de sua noite escura com três grandes convicções que
levam a uma experiência liberadora de esperança inabalável.
126
A primeira baseia-se nos atos passados de Deus. "As misericórdias do
Senhor não têm fim" (v. 22a). A tradução alternativa do hebraico é: "As
misericórdias do Senhor são a causa de não sermos consumidos". Jeremias
estava agarrado à convicção de que o julgamento de Deus vinha de par com a
possibilidade de um novo começo. O exílio do povo era na verdade menos do que
eles mereciam. Eles podiam ter sido totalmente extintos. Já me indaguei muitas
vezes se as palavras de Deus para os exilados, enviadas através de Jeremias,
tornaram-se em segurança pessoal para o profeta quando ele chorava por
Jerusalém e seu povo. "Eu é que sei que pensamentos tenho a vosso respeito, diz
o Senhor; pensa mentos de paz, e não de mal, para vos dar o fim que desejais"
(Jeremias 29:11). Deus não havia completado a sua obra com o seu povo ou com
seu profeta. Ele tinha planos. O que Jeremias pensava ser o fim, na verdade era
um ponto-e-vírgula na preparação de um novo começo — e tudo por causa da
paciência de Deus.
Nosso processo de cura começa quando pensamos que toda esperança se
foi, e então nos lembramos de como Deus tem sido perseverante conosco, apesar
de nossa rebelião e resistência. Por causa de Deus, "o que poderia ter sido" toma-
se numa base para o louvor e para os primeiros estímulos da esperança. Quando
medito no passado de minha vida e considero o que poderia ter acontecido se
Deus não me tivesse guiado pelos vales, fico muito mais disposto a confiar-lhe o
meu futuro. A contemplação de sua misericórdia prepara-me para uma esperança
maior que o pensamento cheio de desejos. Pense nos momentos em que você foi
poupado dos resultados de decisões erradas, resistência à orientação de Deus e
recusas clamorosas em fazer a sua vontade.
Em seguida, Jeremias lembrou-se das compaixões do Senhor que nunca
falham. "Pois suas compaixões nunca falham". Os atos passados de Deus se
expressam em seu perdão e em seu desejo de congraçar-nos a ele. Deus não volta
atrás em sua palavra. O que ele disse a Josué aplica-se a nós também: "Assim
serei contigo: não te deixarei nem te desampararei" (Josué 1:5). Muito daquilo
que nos faz perder a esperança resulta de nossas próprias palavras e ações, bem
como de outras pessoas. Desejamos saber por que Deus não provoca um curto-
circuito em nossa liberdade humana e constrói um mundo melhor. E, contudo,
suas compaixões persistem e ele usa até mesmo os nossos erros para o nosso
crescimento e para a sua glória.
Quando nos lembramos das suas misericórdias passadas, nossa disposição
em assumir uma visão diferente do futuro começa a crescer. O que mais importa,
realmente?
E conhecemos muito mais das compaixões de Deus do que Jeremias.
Olhamos para a encarnação, a cruz, a ressurreição e o Pentecoste. Deus não
desiste. Cristo foi misericórdia encarnada em seu ministério, graça imerecida em
sua morte e fonte de verdadeira esperança na sua ressurreição. Os atos
poderosos de Deusda
invade, o Senhor dispersam
criação ea desesperança. Ele é o Senhor
da história humana. A cruz que
e o intervém, que
túmulo vazio
lembram-nos que Deus pode usar o pior para realizar o melhor. Cristo derrotou o
poder do pecado na cruz e a morte na manhã da Páscoa. Nossa magra esperança
é substituída por uma esperança viva.
Pedro passou pela mesma transição. Suas esperanças estavam fixas no fato
de que Jesus de Nazaré realizaria o que Pedro supunha que ele devia realizar. O
Calvário destruiu sua esperança utilitária. O Senhor vivo da ressurreição partiu
as correntes das esperanças terrestres e abriu o céu e a vida abundante para o
apóstolo. Preste atenção à sua palavra estimulante para a igreja primitiva, que se
127
havia desviado ao usar Cristo como um meio de realização de suas esperanças
temporárias, felizmente malogradas no sofrimento: "Bendito o Deus e Pai de
nosso Senhor Jesus Cristo que, segundo a sua muita misericórdia, nos regenerou
para uma viva esperança mediante a ressurreição de Jesus Cristo dentre os
mortos, para uma herança incorruptível, sem mácula, imarcescível, reservada
nos céus para vós outros, que sois guardados pelo poder de Deus, mediante a fé,
para salvação preparada para revelar-se no último tempo" (1 Pedro 1:3-5). A
ressurreição de Cristo é a base de nosso crescimento na esperança.
E não apenas a ressurreição de Cristo, mas também a nossa! A esperança
nasce quando morrem as nossas falsas esperanças de fazer com que o Senhor
obedeça às nossas ordens. Somos crucificados na morte da esperança temporária
e ressuscitados para a esperança eterna. Estamos vivos para sempre mediante o
nascer de novo. O céu começou. Nada pode destruir esse acontecimento. A
compaixão de Deus nos salvou do desespero — com nós mesmos, com os outros e
com o mundo.
Mas essa experiência tem de ser atualizada, renovada, repetida a cada dia.
Jeremias descobria que as misericórdias de Deus eram novas a cada dia. Sua
antecipação da paciência e do perdão de Deus o levou à fidelidade do Senhor.
"Renovam-se a cada manhã; grande é a tua fidelidade" (Lamentações 3:23). A
esperança renasce dia a dia, a todo momento, em cada desafio e crise; a cada
intervenção, quando a ressurreição acontece de novo dentro e ao redor de nós. As
misericórdias de Deus não apenas se renovam a cada manhã, elas transformam
as noites em dias.

Essa é a razão, a julgar de nossa perspectiva deste lado do Pen-tecoste,


pela qual a invasão do Espírito de Cristo com o batismo de seu Espírito é tão
importante. Sua mente ficou conturbada o apegou-se novamente à constância e
coerência de Deus. Uma época de desesperança não deveria nos compelir, em
vão, a uma busca da esperança, mas a uma busca de Deus. E então ficamos
espantados ao perceber que até mesmo o desejo de seguir ao Senhor está
associado à sua dinâmica procura por nós. Mesmo a percepção de novas
misericórdias é um dom do Senhor. Ele nos capacita a apreciar a maravilha de
seus avanços diários em nossa vazia expectação. Ele nos proporciona o dia e
mostra o caminho. Então podemos cantar:
Tu és fiel Senhor, meu Pai celeste; Pleno poder a teus filhos darás; Nunca
mudaste, tu nunca faltaste; Tal como eras, tu sempre serás. Tu és fiel Senhor, tu
és fiel Senhor Dia após dia, com bênçãos sem fim; Tua mercê me sustenta e me
guarda Tu és fiel, Senhor, fiel a mim!
Jeremias elevou-se cada vez mais da auto-condenação e das críticas para
uma percepção bem mais importante que a sua desesperança. Ele lembrou-se de
Deus e da bondade divina, apesar de tudo o que ele e Israel haviam feito e sido.
Mas essa
importante introspecção
acerca apenas
da esperança. preparou o profeta
Experimentamos para a genuína
a esperança descoberta
em mais
união
com o próprio Deus. A fonte sublime da esperança está na comunhão constante
com o Senhor que nos criou para si mesmo, e que, conforme a sua integridade,
deve desfazer toda fonte competitiva de esperança. "A minha porção é o Senhor,
diz a minha alma, portanto esperarei nele" (Lamentações 3:24).
Chegamos, com Jeremias, ao Santo dos Santos: o coração de Deus. Nada
mais pode nos dar esperança duradoura.
Para aumentar o impacto dessa descoberta, faz-se necessário um
conhecimento do conceito do Senhor como nossa porção. Quando se dividiu a
128
terra prometida entre as tribos de Israel, a tribo de Levi não recebeu nenhuma
herança. Essa tribo estava distribuída entre as outras, e cada uma era
responsável pela conservação da parte deles e da dos levitas, que ficariam
responsáveis pela manutenção do santuário e das obrigações sacerdotais. O
Senhor prometeu que, em vez de terra, ele seria a porção dos levitas. Jeremias se
apropria da linguagem e do conceito. O Senhor, não a segurança, a prosperidade,
a preservação de Jerusalém ou a sua própria dignidade e reputação, seria a
porção do profeta. A perda da terra de Judá estava no coração sensível do
pregador. Jerusalém estava vazia da glória passada. O que sobrava? Deus!
Somente ele era a porção de Jeremias. E esperança. A recém-achada intimidade
florescia na esperança.
Jeremias havia mudado. Em vez de desejar a esperança do Senhor, ele quis
experimentar a esperança no Senhor. A esperança insuficiente fora substituída
por uma esperança ativa e inextinguível.
O mais espantoso é que o Senhor permitirá o que for preciso para levar-nos
a crer que somente ele é a nossa porção. Ele não nos envia problemas, pois não
precisa enviá-los. Há já bastante em volta, nesta criação decaída. Mas quando as
tragédias, as perdas e a dor chegarem, quebrantando os nossos corações, e as
coisas não saírem como planejamos, podemos ainda experimentar a esperança.
Jeremias desejava partilhar suas experiências. A voz profética nele se
desprendeu novamente, mas agora com a amabilidade do Senhor que ele
encontrara, não superficial, mas na profundidade de um encontro decisivo. O que
ele tem a dizer agora procede da vitória sobre a desesperança. Ele havia servido a
Deus, ficado em silêncio, e Deus concedeu-lhe esperança. Deus proporcionou-lhe
uma experiência de seu Espírito.
"Bom é o Senhor para os que esperam por ele, para a alma que o busca;
bom é aguardar a salvação do Senhor, e isso em silêncio" (Lamentações 3:25-26).
Um dos principais temas da carta do apóstolo Paulo aos Romanos, é a
transição turbulenta da falsa para a verdadeira esperança. Ao desenvolver sua
tese, ele toma Abraão como exemplo. Abraão, "esperando contra a esperança,
creu, para vir a ser pai de muitas nações" (Romanos 4:18a). Como constatamos
em nosso estudo de Abraão, ele recebeu o dom da esperança quando suas
próprias esperanças malograram. A verdadeira esperança deve sempre combater
a esperança de srcem humana.

Em Romanos 5, Paulo continua a informar-nos acerca da esperança


verdadeira na comunhão com Deus: "Justificados, pois, mediante a fé, tenhamos
paz com Deus, por meio de nosso Senhor Jesus Cristo; por intermédio de quem
obtivemos igualmente acesso, pela fé, a esta graça na qual estamos firmes; e
gloriemo-nos na esperança da glória de Deus. E não somente isto, mas também
nos gloriemos nas próprias tribulações, sabendo que a tribulação produz
perseverança;
esperança nãoe confunde,
a perseverança,
porqueexperiência;
o amor de e aDeus
experiência, esperança.
é derramado Ora, a
em nossos
corações pelo Espírito Santo, que nos foi outorgado" (Romanos 5:1-5). O amor de
Deus, mais a fé, é igual à esperança. É uma esperança que não nos desaponta,
tão estável e segura quanto o próprio Deus.
Passemos, agora, ao passo seguinte do crescimento na esperança. Em
Romanos 8, Paulo trata do poder da esperança com relação ao futuro. "Porque na
esperança fomos salvos. Ora, esperança que se vê não é esperança, pois o que
alguém vê, como o espera?" (v. 24). A verdadeira esperança nos auxilia nos
problemas e decisões do dia-a-dia. Paulo declara que o Espírito de Deus conhece
129
nossos corações, concedendo-nos aquilo que ousamos desejar através da
esperança, como parte do plano de Deus para nós. "E aquele que sonda os
corações sabe qual é a mente do Espírito, porque segundo a vontade de Deus é
que ele intercede pelos santos." Em outras palavras, recebemos orientação de
como esperar e pelo que esperar na vontade de Deus para nós. Quando oramos
pelo que Deus está disposto e pronto a dar, nossas esperanças não são a projeção
de nossos sonhos e desejos, mas a realização do plano divino. Quando ele é a
nossa esperança, temos o desejo de executar a sua vontade revelada. E podemos
esperar com confiança, sabendo "que todas as coisas cooperam para o bem
daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu
propósito" (Romanos 8:28). Isso é esperança!
A esperança e o Espírito de Deus são um. Quando estamos cheios do
Espírito, temos esperança. Quando obstruímos o fluxo do Espírito e exigimos que
o seu poder execute nossos planos, a esperança diminui e desaparece. É este o
efeito da palavra final de Paulo acerca da esperança para os cristãos em Roma: "E
o Deus da esperança vos encha de todo o gozo e paz no vosso crer, para que
sejais ricos de esperança no poder do Espírito Santo"(Romanos 15:13).

Paulo lembra aos efésios que eles, antes da conversão, estavam


abandonados "não tendo esperança, e sem Deus no mundo" (Efésios 2:12). Viver
sem Deus no mundo é, afinal, enfrentar a desesperança.
Mas o sublime discernimento do apóstolo está em sua carta aos
Colossenses, que revela o mistério da esperança: "Cristo em vós, a esperança da
glória" (Colossenses 1:27). Aí está de novo: a nossa esperança procede do Espírito
de Cristo. A glória de ser recriado ã semelhança de Cristo e viver com ele para
sempre é a esperança que nos impulsiona para a frente, numa vida sem morte, a
qual nada pode anular.
Seja o que for que a vida nos dê ou nos tire, é uma bênção se rompe o laço
da esperança utilitária que sempre nos desaponta, a fim de podermos
experimentar uma esperança tão certa quanto o próprio Senhor. A esperança que
Jeremias encontrou nova a cada manhã, é nossa a cada momento, pois o Senhor
não é apenas a nossa porção — ele é o nosso poder, poder para esperar!

130
CAPÍTULO DEZENOVE
UM QUARTO HOMEM NO FOGO
Sodraque, Mesaque e Abede-Nego
Um amigo meu estava enfrentando uma operação de vida ou morte. Certa
noite, antes da cirurgia, sua esposa tentou encorajá-lo com algumas palavras de
conforto. "Tudo vai dar certo", disse ela com ternura, "você vai ficar bom."
Depois que ela saiu do quarto, suas palavras ficaram revolvendo--se na
mente do meu amigo. Em dado momento, durante a longa noite de espera, ele
sentiu uma profunda calma interior e disse a si mesmo: "E mesmo se não der,
vou ficar bom!" Ele encarou a realidade de que talvez pudesse não sobreviver. E,
contudo, sabia que nada — nem a doença, nem a dor, nem a própria morte —
poderia separá-lo do cuidado amoroso e bondoso de Deus. Naquele momento de
crise ele conheceu uma segurança eterna e ficou convencido de pertencer a Deus,
sobrevivesse ou não à operação.
A verdadeira liberdade é mais que simples respostas às orações pelo que
desejamos ou pensamos ser melhor para nós. Não haverá permanente livramento
de nossa ansiedade, enquanto não formos capazes de afirmar: Mesmo se não der
certo, como planejamos ou esperamos, alcançaremos vitória maior. Estamos vivos
para sempre. Nada nesta vida nos pode derrotar.
Grande parte de nossa fé depende de conseguirmos que Deus realize certas
coisas, das quais nos consideramos necessitados. Medimos a nossa fé pelas
respostas às nossas petições. Permanecemos fiéis quando há um fluxo constante
de milagres a nosso favor, mas quando enfrentamos reveses ou longos períodos
de espera pelas respostas à oração, achamos que alguma coisa está errada. Às
vezes, questionamos até mesmo a fidelidade de Deus.
A história de Sadraque, Mesaque e Abede-Nego apresenta-nos o quarto
Homem na fornalha ardente mediante quatro expressões de fé. Durante o exílio
babilônico, os três amigos de Daniel super visores administrativos do povo de
Deus, foram fiéis a Iavé e jamais adoraram os deuses babilônicos. Quando
Nabucodonosor erigiu uma imagem de ouro de quase trinta metros de altura e
quase três de largura, na província de Babilônia, eles não a adoraram. A notícia
dessa desobediência deixou o rei tão furioso que ele ordenou que trouxessem os
três hebreus à sua presença. "É verdade, ó Sadraque, Mesaque e Abede-Nego, que
vós não servis a meus deuses nem adorais a imagem de ouro que levantei? Agora,
pois, estai dispostos e, quando ouvirdes o som da trombeta, do pífaro, da citara,
da harpa, do saltério, da gaita de foles, prostrai-vos e adorai a imagem que fiz;
porém, se não a adorardes sereis no mesmo instante lançados na fornalha de
fogo ardente. E quem é o deus que vos poderá livrar das minhas mãos?" (Daniel
3:14-15).
A resposta dos corajosos hebreus foi cheia de confiança e ousadia: "O
Nabucodonosor, quanto a isto não necessitamos de te responder. Se o nosso
Deus, a quem servimos quer livrar-nos, ele nos livrará da fornalha de fogo
ardente, e das tuas mãos, ó rei" (Daniel 3:16-17). A declaração deles, mais
adiante, expressa o segredo da sua ousadia: "Se não, fica sabendo, ó rei, que não
serviremos a teus deuses, nem adoraremos a imagem de ouro que levantaste" (v.
18).
"Se não!" Duas palavras com as quais podemos enfrentar qualquer coisa. A
fé que Sadraque, Mesaque e Abede-Nego possuíam não dependia do livramento,
131
mas baseava-se no conhecimento de que Deus cuidaria deles, não obstante a
fornalha. Só teremos vida abundante quando pudermos proferir essas palavras.
Os três hebreus não poderiam ser coagidos ou intimidados. Eles não adorariam a
nenhum deus, exceto Iavé. Nem esperavam que Iavé se curvasse para eles! Nada
havia de submissão permutada. Eles não confiavam em Deus para abrir-lhes o
caminho, mas para um caminho através de qualquer provação e sobre qualquer
provação.
Não há poder real na vida cristã até podermos declarar "se não". Estas são
palavras de rendição que proporcionam vigor duradouro e revelam uma
maturidade incapaz de insistir em que Deus marche segundo as nossas ordens.
Jamais entregaremos realmente um problema a Deus enquanto não pudermos
fazê-lo com a confiança de um "se não".
Perturbador? Sim! Mas sublimemente libertador. Todos temos lutas que
exigem o poder e a ajuda de Deus. Muitos vivem no nível da fé que faz um pedido
e espera uma resposta. Quando nos deparamos com uma oração aparentemente
não respondida, sentimo-nos esquecidos e desanimados. No entanto, é então que
temos uma abençoada oportunidade de crescer. Quando olhamos além da
resposta interesseira e vemos que Deus tem planos ainda melhores, descobrimos
uma paz que "ultrapassa o entendimento".
É de surpreender a coragem dos companheiros de Daniel. Porém, sabemos
muito mais acerca de Deus e de seu poder hoje do que eles então. Podemos
permanecer de pé com uma ousadia iluminada. Através de Jesus Cristo
possuímos "uma herança incorruptível, sem mácula, imarcescível, reservada nos
céus. . ." (1 Pedro 1:4). Todas as nossas orações devem descansar na perspectiva
da vitória de Cristo sobre o mal e a morte. A luz dessa fé podemos abrir mão de
nossas necessidades, certos de que Deus sabe o que é fundamentalmente melhor
para nós. Mesmo que ele não responda como gostaríamos, esse fato pode ser
apenas uma vírgula no triunfante relato de nossa aventura cristã, cuja vitória
final é certa.
Assim, a primeira coisa que aprendemos de Sadraque, Mesaque e Abede-
Nego é enfrentar a fornalha. E na fornalha que nossa obediência enfrenta as
chamas do mal no mundo. Alguns arranjam problemas por razões erradas como
orgulho, obstinação e arrogância. Os três hebreus estavam em apuros por não se
curvarem diante de uma imagem pagã. Também à nossa volta se levantam
deuses falsos, e alguns de nós enfrentam uma fornalha de dificuldades por não se
curvarem diante deles. Há imagens de ouro em nossa sociedade, a exigirem a
nossa adoração: materialismo, sucesso, poder ou popularidade. Quando
recusamos a nos curvar diante delas, podemos sofrer a rejeição e as críticas. Para
outros, a fornalha pode ser sofrimento físico ou problemas emocionais. Quando a
vida nos desaponta, somos tentados a adorar uma imagem de frustração e
futilidade.
A fornalha
abandonou. mais
Ela arde ardente,
como contudo,
resultado é aadoração
da nossa sensaçãodede
umquedeusDeus nos
que nós
mesmos esculpimos — um deus que obedeça a nossas ordens e atenda a nossos
pedidos. Ele é terreno, não celestial; um rapaz de recados, não o Soberano eterno
de toda a criação. Mas Deus não quer estar em nossa agenda; ele nos quer na
dele!
Com freqüência, as pessoas de nosso círculo de amizade não ajudam.
Quando oramos e não obtemos resposta, declaram: "Deve haver algo errado com
você! Algo deve estar errado em sua vida espiritual, se você pede e não recebe
exatamente o que pediu." Essa capciosa sugestão induz-nos a erigir uma imagem
132
de ouro pagã: nós mesmos. Devemos tornar-nos adequados e perfeitos para que
Deus ouça e aceite nossas orações. Como conseqüência, quando enfrentamos as
fornalhas da vida, duvidamos de nós próprios e também de Deus.
Enfrentar a nossa fornalha significa nos atracarmos com a realidade. Sejam
quais forem os problemas — perplexidades, doenças, desapontamentos nas
relações humanas — podemos enfrentá-los de frente, seguros de que, mesmo que
Deus não nos livre deles de acordo com os nossos desejos, ele nos ajudará
através deles. Enfrentamos a fornalha quando a entregamos à sábia providência
de Deus e confiamos nele para que nos fortaleça e nos coloque além dela.
Quando estou com pessoas que enfrentam a fornalha das dificuldades da
vida, tento demonstrar-lhes compreensão enquanto vivem o processo de entregar
suas necessidades com um confiante "se não". Esse processo força-as a colocar
as coisas em perspectiva. O problema não é tudo na vida. Elas pertencem a Deus
e estão vivas para sempre, seja qual for o resultado do problema. Regularmente,
visito pessoas hospitalizadas, que podem não melhorar. Em cada caso, ajudo-as a
prosseguirem com a investigação do que lhes acontecerá se as orações pela sua
recuperação não forem atendidas. Onde estarão elas depois? Quando a segurança
da infalível graça de Deus é mais importante que a resposta secundária da cura
imediata, nada mais importa. Elas recebem a liberdade para afirmar com Paulo:
"Porque, se vivemos, para o Senhor vivemos; se morremos, para o Senhor
morremos. Quer, pois, vivamos quer morramos, somos do Senhor" (Romanos
14:8). É estimulante que o momento da renúncia seja freqüentemente o princípio
da cura ou da solução de um problema difícil.
Perguntaram a Lutero onde ele estaria ao enfrentar os furiosos bispos, os
cardeais e o Papa na Dieta de Worms. Sua resposta vale para todas as fornalhas
da vida que tivermos de enfrentar: "Naquele momento, como agora, estarei nas
mãos do Deus Todo-poderoso!"
A segunda coisa que aprendemos de Sadraque, Mesaque e Abede-Nego é
entrar em nossa fornalha e deixar os resultados com o Senhor. Quando
Nabucodonosor ouviu a ousada declaração acerca do cuidado de Deus, ele se
encheu de ira. Contorcendo-se de raiva, ele ordenou que o fogo fosse aquecido a
uma temperatura sete vezes maior que a de costume. Os três hebreus foram
atados em suas próprias vestes a fim de não se moverem ou pôr-se de pé. Depois
foram atirados na fornalha ardente. Mas as chamas não podiam com o fulgor da
fé em suas faces. Eles confiavam em Deus, quer por livramento, quer por vigor a
fim de suportar a dor das chamas.
Façamos essa declaração e deixemos os resultados com Deus. Não somos
responsáveis pelos resultados; somos responsáveis pela obediência. A sarcástica
pergunta dirigida a Jó: "Jó ama a Deus por nada?" podemos responder com
firmeza: "Amamos a Deus por Deus!" Não afirmamos mais: "Deus, se tu fizeres
isto por mim, farei isto por ti", ou: "Deixarei de fazer isto ou aquilo, se prometeres
fazer
mãos."isto por mim!" Que possamos afirmar: "Senhor, deixo os resultados em tuas
Essa foi a confiança de Sadraque, Mesaque e Abede-Nego, com resultados
espantosos para eles e surpreendentes para o rei. Nabucodonosor olhou para a
fornalha e viu os três hebreus andando no meio do fogo, sem nenhum dano, o
que nos leva ao terceiro aspecto da história. Quando enfrentamos a nossa
fornalha e deixamos os resultados com Deus, podemos estar certos de sua pre-
sença conosco no fogo. Nabucodonosor não viu apenas os três homens livres, mas
também um quarto homem entre eles. "Vejo quatro homens soltos, que andam
passeando dentro do fogo, sem nenhum dano; e o aspecto do quarto é semelhante
133
a um filho dos deuses" (Daniel 3:25). O Senhor estava com eles no fogo. Ele é o
quarto Homem no fogo!
O Senhor sempre atende à oração. Quando a resposta não é a que
desejamos ou a que pedimos, ele nos dá um presente bem melhor — ele próprio.
A encarnação é a sublime segurança de que ele suporta o fogo conosco. Deus
viveu entre nós em Jesus Cristo e passou pelas chamas de nossa humanidade
por nós, a fim de que pudéssemos ter a certeza de que ele jamais se ausenta
quando precisamos dele. Ele está conosco agora. Com ele ao nosso lado, podemos
suportar nossa fornalha ardente. Foi o quarto Homem no fogo que impediu
Sadraque, Mesaque e Abede-Nego de serem queimados. E interessante que
Nabucodonosor tenha reconhecido a quarta Pessoa no fogo como um ser divino,
declarando que o seu aspecto era semelhante a um filho dos deuses. Sabemos
que esse Homem não era outro senão o Verbo, o Filho de Deus, que mais tarde
veio como Jesus de Nazaré — Emanuel — Deus conosco. Note que ele não
extinguiu o fogo nem tirou os três homens da fornalha.
Quando estamos dispostos a confiar na sua providência, o Senhor intervém
a tempo e no seu tempo. Quando entramos na fornalha, os resultados ficam a
critério do seu plano e horário, e sua intervenção convencerá os outros do poder
que ele tem.
Depois do livramento dos hebreus, o rei deu glória a Deus. Atente para o
que ele disse aos oficiais da corte: "Bendito seja o Deus de Sadraque, Mesaque e
Abede-Nego, que enviou o seu anjo, e livrou os seus servos, que confiaram nele,
pois não quiseram cumprir a palavra do rei, preferindo entregar os seus corpos, a
servirem e adorarem a qualquer outro deus, senão ao seu Deus. Portanto faço um
decreto, pelo qual todo o povo, nação e língua que disser blasfêmia contra o Deus
de Sadraque, Mesaque e Abede-Nego, seja despedaçado, e as suas casas sejam
feitas em monturo; porque não há outro Deus que possa livrar como este" (Daniel
3:28-29).
Partindo de quem, momentos antes, desejava a morte dos três hebreus,
esta é uma declaração e tanto! Foi preciso um acontecimento extraordinário na
vida do rei para mudar-lhe a atitude com relação ao povo de Deus, cruelmente
deportado para Babilônia. Era preciso fazer algo para reassegurar ao povo que o
poder de Iavé não se limitava a Jerusalém e à terra prometida. O que aconteceu
na fornalha ardente transformou, não apenas o rei, mas também o povo hebreu.
Deus realmente estava no comando! A intervenção divina abalou toda a terra,
desviando a atenção de todos dos deuses pagãos para o verdadeiro Deus, e
infundindo coragem e esperança no povo cativo.
Sadraque, Mesaque e Abede-Nego foram soltos e receberam propriedades
na província de Babilônia. O rei reconheceu a coragem deles, cujo testemunho
levou-o, e a seus presidentes, a adorarem o Deus Altíssimo. O povo de Deus,
exilado por causa da sua apostasia, evangeliza os seus captores. De fato, Deus
tem a Não
última palavra!
perca a mensagem principal dessa história. Os três hebreus fiéis não
podiam prever os resultados da sua obediência ao Senhor.
Teria sido uma boa história se eles soubessem, de antemão, o que Deus
faria. É uma excelente história porque eles não sabiam. A confiança deles não
dependia do livramento, de acordo com os critérios humanos.
Por último, aprendemos de Sadraque, Mesaque e Abede-Nego que não há
limite para o que Deus fará se dermos a ele a glória.A obediência deles resultou
em glória para Deus. E freqüente desejarmos passar por provações, desde que
sejamos reconhecidos pela nossa galhardia. Não foi assim com os três que
134
encontraram o quarto Homem no fogo. A presença do Senhor na fornalha não
passou de uma etapa de um plano maior. Os três saem do cenário, mas a glória
do Senhor permanece. Nosso futuro poder da oração depende de darmos ao
Senhor a glória por tudo o que aconteceu no passado.
Há pessoas que observam o que está acontecendo com você e comigo. Uma
delas pode ser a que causou os nossos problemas. O que nossas provações fazem
conosco e o que Deus faz em nós por causa delas, tocarão poderosamente a vida
dessas pessoas. Como resultado, elas não devem ficar impressionadas conosco, e,
sim, atemorizadas pelo que Deus fez com as nossas circunstâncias entregues a
ele. Nosso testemunho deve ser que somente Deus poderia ter feito o que fez, e
que mesmo que tivesse feito de modo diferente, ainda confiaríamos nele.
De nossos estudos dos heróis e heroínas do Antigo Testamento, um tema
constante se nos afigura. O Senhor do impossível chamou a todos para se
arriscarem, e nenhum deles sabia como a provação ou o desafio terminaria. Eles
não buscaram heroísmo; tão-somente obedeceram a Deus e confiaram nele para
que o Senhor realizasse os seus propósitos através deles.
Em vista do que temos considerado, cabe aqui uma pergunta pessoal.
Estamos dispostos a abrir mão dos temores do que nos possa acontecer? Cada
um de nós enfrenta algum tipo de desafio para ser obediente a Deus em
circunstâncias difíceis. Os falsos deuses estão todos ao nosso redor, tentando
curvar-nos diante deles na busca de soluções fáceis, sem dor nem frustração. O
mais tentador de todos é o deus "quebra-galho", o qual moldamos de nossos
desejos de manipular a Deus. Mas uma oportunidade sagrada e abençoada está
diante de nós. "O mundo, meu Deus é capaz de me livrar da fornalha de fogo
ardente, e de me libertar das muletas. Mas, mesmo que não o faça, não vou servir
aos teus deuses!" Se pudermos proclamar nossa independência de outros deuses,
então poderemos levar nossas necessidades ao único Deus verdadeiro.
Quando proferimos e enfatizamos as duas palavras no fogo — "Se não" —, o
quarto Homem fará muito mais do que esperamos — e de um modo
incomparavelmente melhor.

135
CAPÍTULO VINTE
QUANDO TUDO 0 MAIS FALHA
Ezequiel
Em um restaurante onde de vez em quando almoço, notei um anúncio
interessante: "Dieta de último recurso". O jogo de palavras atraiu a minha
atenção, mas foi a frase explicativa, abaixo do título, que prendeu o meu
interesse. As palavras me intrigaram e permaneceram em minha mente por
muitos dias. "Uma dieta é de último recurso quando tudo o mais falhou".
Você entendeu bem. Comecei a imaginar uma dieta espiritual que
pudéssemos seguir quando nada mais desse certo. Você já conheceu alguma
época em sua vida quando nada parecia dar certo? Alguma área de sua vida? Um
relacionamento ou uma responsabilidade? Algum problema que resiste à solução
ou ao desafio, com o qual você parece não poder lidar? Já ficou abatido ao ponto
de se desiludir da vida como um todo? O que faz você quando nada dá certo,
quando os melhores esforços e os maiores dispêndios de energia somente
parecem piorar a situação?
Alguns experimentam esse tipo de fracasso em épocas de doença. Outros o
sentem com pessoas a quem buscam amar ou ajudar. Outros o sofrem nos seus
empregos ou nos seus casamentos. Ainda outros conhecem a frustração ao tentar
renovar suas igrejas. Todos nós já o sentimos em tarefas que pesam muito em
nossos corações. O que você pode fazer quando nada dá certo?
Foi numa época em que nada dava certo que Deus nomeou Ezequiel profeta
para o seu povo. Ele nasceu por volta de 621 a.C. Os primeiros vinte e sete anos
de sua vida ele os viveu através do declínio político e espiritual de Judá e
Jerusalém. Ele viu o templo perder a sua glória, ao ser despojado de ornamentos
e acessórios, num último esforço para afastar a derrota, pagando tributo. O pro-
feta testemunhou a ascensão e a queda de quatro reis. Os babilônios assumiram
o domínio do mundo e fizeram de Judá um estado vassalo. Finalmente, por volta
de 597, Ezequiel foi levado para a Babilônia juntamente com o rei Jeoaquim e
outros cidadãos distintos, como príncipes e artesãos.
No primeiro ano de exílio, Ezequiel observou o povo de Deus e condoeu-se
de sua triste condição espiritual. As notícias desanimadoras de Jerusalém
intensificavam a angústia deles.
A vida na Babilônia não era tão ruim quanto havia sido para os cativos do
Reino do Norte, ao tempo do império assírio, os quais perderam a sua identidade
e se espalharam. Os babilônios permitiram que os judeus vivessem em
comunidades e desenvolvessem uma aparência de existência normal. Mas os
altivos hebreus não conseguiam esquecer a sua derrota e humilhação. Para eles,
a ProvidênciaEles
Jerusalém. e a sesoberania
sentiamdesozinhos
Deus se elimitavam à Terra
abandonados na Prometida
Babilônia.e A
a
universalidade e a onipotência de Deus não constavam de sua teologia. Estar fora
da Palestina era estar longe do Senhor. O ridículo e o escárnio de seus captores
somente aumentavam a angústia deles. O Salmo 137:16 expressa o seu
desânimo, bem como a sua compreensão limitada do Senhor de toda a criação:
Às margens dos rios de Babilônia nós nos assentávamos e chorávamos,
lembrando-nos de Sião. Nos salgueiros que lá havia pendurávamos as nossas
harpas, pois aqueles que nos levaram cativos nos pediam canções, e os nossos
opressores, que fôssemos alegres, dizendo: Entoai-nos algum dos cânticos de
136
Sião. Como, porém, haveríamos de entoar o canto do Senhor na terra estranha?
Se eu de ti me esquecer, ó Jerusalém, que se resseque a minha mão direita.
Apegue-se-me a língua ao paladar, se me não lembrar de ti, se não preferir eu
Jerusalém à minha maior alegria.
Se não podemos cantar a canção do Senhor na terra estrangeira e estranha
da adversidade, as possibilidades de podermos cantá-la não existem! Mas todos
nós já passamos por épocas em que nossa canção de louvor se apega à garganta
como um osso atravessado, e não temos alegria sequer para cantar. Parece faltar
a melodia da vida e nenhuma disposição sentimos para cantar, porque nada deu
certo. Foi numa época de abatimento, sem canção, que Deus levantou a Ezequiel
com uma nova canção. E a canção de esperança que ele ensinou ao povo de Deus
em terra estranha foi a primeira que lhe ensinou o Senhor. O que Deus desejava
para o seu povo, ele primeiro produziu em seu profeta.
A chamada de Ezequiel continha três admoestações estimulantes. A
primeira, era que ele permanecesse firme, de modo que Deus pudesse falar-lhe.
Era como se o Senhor ordenasse: "Atenção!" e Ezequiel tivesse de se apresentar
com um pronto: "Sim, senhor!" O Senhor desejava de seu profeta completa
atenção, pés firmes, prontos para se mover com fidelidade. "Filho do homem, põe-
te em pé, e falarei contigo!" A segunda admoestação era acompanhada de um
dom. O Espírito do Senhor penetrou na alma esvaziada de Ezequiel, quando lhe
disse: "Tu lhes dirás as minhas palavras." E para que a ordem se cumprisse, o
profeta recebeu um rolo da Palavra de Deus. A terceira ordem, foi: "Tu, ó filho do
homem, ouve o que eu te digo, não te insurjas como a casa rebelde; abre a boca,
e come o que eu te dou." O rolo foi dado a Ezequiel com um urgente: "Filho do
homem, come o que achares; come este rolo, vai e fala à casa de Israel" (Ezequiel
2:1, 7, 8; 3:1).
Há uma dieta de último recurso, sem dúvida! Levante-se, mova-se, coma e
digira a Palavra de Deus. Quando nada mais dá certo, é isso precisamente o que o
Senhor faz por nós. Ele atrai a nossa atenção, dá-nos um desafio para que
dependamos somente de seu Espírito para o nosso sustento, e nos alimenta com
a sua orientação, enquanto mastigamos e digerimos as suas palavras de
estímulo. O tema central da Bíblia é a ressurreição, poder de soerguimento, inato
ao Senhor do impossível. Ele pode tomar pessoas mortas, igrejas mortas,
casamentos mortos, amizades mortas, projetos mortos, e ressuscitá-los para uma
nova vida mediante a efusão de seu Espírito! Foi essa a mensagem esperançosa e
liberadora de Ezequiel ao povo de Deus, através dos vinte anos de seu ministério
na Babilônia a partir de 592 a.C.
Naquele tempo ele permaneceu com o povo à medida que uma esperança
após outra se desfazia. Ele anunciou a verdade decisiva acerca da tomada e
destruição de Jerusalém. Quando a cidade caiu em 586 a.C, ele teve uma visão
do que Deus era capaz de fazer por seu povo, que pensava que nada mais daria
certo.
acercaEzequiel se tornoudivina,
da onipresença o profeta
quedase
glória
faz de Deus.
sentir noSua mensagem
meio de seu básica
povo Pera
ara
ressuscitá-lo. Para o povo de Deus, Ezequiel era um ponto decisivo, a marcar a
inversão do fluxo de pensamento e expectativa da morte para a vida. Ele era um
profeta do poder ressuscitador de Deus.
A poderosa mensagem restauradora de Ezequiel baseava-se numa
promessa e numa visão, registradas para nós nos capítulos 26 e 27 de sua
profecia. O prelúdio para a visão era uma grande esperança. Ao profeta, o Senhor
assegurou que levaria o seu povo do exílio para Jerusalém, mas eles não seriam o
mesmo povo tirados da sua terra natal. Para todos eles o exílio seria como
137
humilhação e morte. E das sepulturas do fracasso e da apostasia, Deus ressus-
citaria um novo povo. Ele lhes daria um novo coração e colocaria o seu Espírito
dentro deles — outra garantia de uma dieta de último recurso, quando nada mais
dava certo. A promessa do Senhor é a de que todos nós precisamos: "Dar-vos-ei
coração novo, e porei dentro em vós espírito novo; tirarei de vós o coração de
pedra e vos darei coração de carne. Porei dentro em vós o meu Espírito, e farei
que andeis nos meus estatutos, guardeis os meus juízos e os observeis.
Habitareis na terra que eu dei a vossos pais; vós sereis o meu povo, e eu serei o
vosso Deus" (Ezequiel 36:26-28).
Então o Senhor deu a Ezequiel uma revelação de como isso aconteceria. Ele
se apoderou do profeta e deu-lhe a visão do vale de ossos secos.
Os hebreus exilados tinham um provérbio que permeava a conversação
deles: "Nossos ossos se secaram, e pereceu a nossa esperança. Estamos de todo
exterminados". Fico a imaginar se este provérbio se revolvia na mente de
Ezequiel. Além disso, havia o rumor, proveniente de Jerusalém, de que numa
batalha final, a carne dos guerreiros abatidos havia sido esfolada, e os seus ossos
deixados a secar ao sol escaldante. Mas, por certo, a influência mais forte era a
percepção do desalento espiritual do seu povo. Eles se tornaram os mortos entre
os vivos. Deus desejava que Ezequiel testemunhasse como ele os faria reviver
dentre os mortos!
Afirma a Bíblia que o profeta foi arrebatado pelo Espírito. Sentiu--se fora de
si, viu a condição real de seus irmãos judeus e viu também o que Deus estava
prestes a realizar. O que Deus lhe revelou deve ser compreendido no contexto da
interpretação após a visão. "Filho do homem, estes ossos são toda a casa de
Israel" (Ezequiel 37:11). E eles podem ser os nossos também e de nossa igreja!

O Espírito do Senhor mostrou a Ezequiel o vale dos ossos secos e o fez


andar no meio deles. Os ossos estavam espalhados, des-conjuntados e bem
secos. Então, semelhante à pergunta feita a Elias: "Que fazes aqui?", o Senhor fez
uma pergunta expressiva a Ezequiel, não por desconhecer a resposta, mas por
desejar que o profeta dos israelitas espiritualmente mortos conhecesse a sua res-
posta. "Filho do homem, acaso poderão reviver estes ossos?" Note como o Senhor
se aproveita do provérbio de desespero que circulava entre o povo: "Os nossos
ossos se secaram". Ele desejava saber se o profeta acreditava que eles pudessem
reviver. Ezequiel respondeu com humildade e realismo, de par com temor e
espanto: "Senhor Deus, tu o sabes" (37:3). Era uma resposta de rendição e
franqueza, como se dissesse: "Ó Senhor, eles não podem viver sem ti. Somente tu
podes trazê-los à vida!"
Ezequiel recebeu ordens para profetizar aos ossos secos e dizer: "Ossos
secos, ouvi a palavra do Senhor. . . Eis que farei entrar o espírito em vós, e
vivereis. Porei tendões sobre vós, farei crescer carne sobre vós, sobre vós
estenderei pele, e37:4-6).
Senhor" (Ezequiel porei em vós o espírito, e vivereis. E sabereis que eu sou o
Ezequiel seguiu as ordens e fez como o Senhor lhe disse. Enquanto
profetizava, houve um ruído estrepitoso, e os ossos começaram a se ajuntar, cada
osso à sua junta correspondente. Então os tendões cresceram por cima deles,
seguidos de carne e pele. O resultado foi um vale de corpos mortos, faltando
apenas a respiração que os trouxessem à vida plena de novo. Para esse fim, o
Senhor instruiu a Ezequiel que ordenasse a volta da respiração aos corpos
mortos. Tendo ele feito isso, os corpos voltaram à vida e se puseram em pé como
um grande e expressivo exército. Uma ressurreição dos mortos acontecera!
138
O Senhor foi rápido em apresentar à mente de Ezequiel as implicações da
visão.
"Filho do homem, estes ossos são toda a casa de Israel. Eis que dizem: Os
nossos ossos se secaram, e pereceu a nossa esperança; estamos de todo
exterminados. Portanto profetiza, e dize-lhes: Assim diz o Senhor Deus: Eis que
abrirei as vossas sepulturas, e vos farei sair delas, ó povo meu, e vos trarei à
terra de Israel. Sabereis que eu sou o Senhor, quando eu abrir as vossas
sepulturas, e vos fizer sair delas, ó povo meu. Porei em vós o meu Espírito, e
vivereis, e vos estabelecerei na vossa própria terra. Então sabereis que eu, o
Senhor, disse isto, e o fiz, diz o Senhor" (Ezequiel 37:11-14).
Duas coisas importantes essa visão nos revela, quando pensamos que nada
mais dá certo. A primeira é: reconheça os ossos! O Senhor desejava que não
houvesse ambigüidade acerca do significado da visão. Os ossos eram Israel. O
significado para nós é que também podemos estar espiritualmente mortos,
enquanto fisicamente vivos. Estamos entre os mortos-vivos sempre que nossa
capacidade para a esperança se acaba, sempre que o nosso amor por Deus e
pelos outros começa a esfriar-se e se torna superficial, e sempre que a nossa fé se
restringe a um hábito e um dever monótono. Nossa finalidade é a de ser vibrantes
e radiantes. Reconheçamos os ossos da monotonia, da aparência triste e da falta
de alegria. Não há nada mais ineficiente do que a religiosidade que perdeu o
entusiasmo e a atração. Se não estamos entusiasmados com a vida, nossas vidas
estão entre os ossos secos — fragmentadas e espalhadas. E o Senhor afirma:
"Você está morto, seco, vazio, mortalmente triste. Mas eu vou dar-lhe nova vida!"
Muitas vezes a igreja é como Israel no exílio. Quando a fé e a vida estão
separadas, a repetição familiar e irrefletida de ritos e rituais pode tornar-se
enfadonha e sem atrativos. Verdades estimulantes podem ser enunciadas com
uma piedade sem alegria, que erra o alvo das necessidades reais do povo.
Pretensos resultados são atribuídos a organizações, programas e prédios, nos
quais depositamos nossa confiança.
Quanto mais falo com líderes e membros da igreja atual, mais convencido
fico de que a nossa maior necessidade é reconhecer os ossos do nosso
institucionalismo morto. Nada deu certo! Devemos admitir, como indivíduos e
como um corpo, nossa necessidade da ressurreição diária e do sopro do Espírito
Santo para nos encher. Há ciclos de morte e ressurreição nas vidas dos crentes
como indivíduos, assim como nas igrejas. Quando apreciamos o nosso passado
mais que o nosso futuro, começamos a morrer. A experiência de Deus no passado
jamais pode substituir o que ele anseia ser para nós agora e no futuro.
Já passei por experiências repetidas de ter de reconhecer os ossos de
minha própria indiferença espiritual. Quando as coisas secundárias bloqueiam a
intimidade com o Senhor, começo a morrer. Quando fico chocado pela percepção
de que me juntei ao vale dos ossos secos entre a multidão de enfadonhos líderes
da igreja,
passou devo
pela com sinceridade
experiência admitir esses
do reavivamento, ossos.
quando o Cada igreja
Espírito do a que servi
Senhor nos
conduziu ao arrependimento do nosso comodismo ou da resistência às novas
direções que ele esteve tentando nos dar. Tivemos de reconhecer os ossos de
programas que não mais davam certo, costumes que se perpetuaram no passado
mas não ajudaram ou resolveram os conflitos íntimos das pessoas, ou o
exclusivismo embutido que falhou em cumprir a ordem do Senhor de alcançar
aqueles que não o conhecem e não o amam. O Senhor quebranta as igrejas bem
como as pessoas. Ele permite que elas cheguem ao ponto em que nada mais dá
certo! Ele nos faz a pergunta que fez a Ezequiel: "Acaso poderão reviver estes
139
ossos?"
Antes de responder, devemos admitir que são eles os nossos ossos. Deus
não nos pede que generalizemos acerca dos ossos mortos de nossas igrejas. Ele
deseja mais que teorias intermináveis e técnicas engenhosas de renovação da
igreja. Precisamos de muito mais que um novo programa de evangelização ou de
levantamento de fundos, ou de atividades para os membros. Devemos reconhecer
os ossos. "Senhor, estamos mortos. Mortos em comparação com o que desejas da
tua igreja. Enfadonhos, comparados com o Cristianismo contagioso que
percebemos nas páginas de Atos. Desejamos voltar à vida. Mais vivos que jamais
fomos antes. Ansiamos ser um centro de nova vida, pregação dinâmica,
conversões, uma comunidade amorosa, aberta para a compreensão, alcance e
acolhimento, onde as pessoas são amadas e livres para viver a vida abundante."
Reconhecer os ossos, oração que jamais voltará sem resposta. A ressurreição da
igreja pode acontecer e acontecerá. Os ossos vão ganhar vida!
A ressurreição espiritual exige uma combinação da franqueza com o desejo
de viver no mais alto nível para o Senhor. Deve começar com o pastor e os
oficiais. Depois, quando eles confessarem os ossos mortos de seus esforços, Deus
dá início a uma ressurreição neles individualmente e em conjunto. As coisas
pelas quais ansiamos em nossas igrejas não podem ser realizadas apenas
mediante o esforço humano.
Somente Deus pode dar entusiasmo e vida à pregação de sua Palavra. Ele é
o único que pode capacitar as pessoas à reação. Ele é o agente da conversão e a
fonte da dádiva da fé. Ele traz as pessoas para uma igreja que está viva. Ele
inspira líderes a desenvolverem uma qualidade de programa que realmente
satisfaça às necessidades das pessoas.
Não há nada pior do que gastar nossas energias tentando ser bons
membros de igreja. Mas no momento em que o povo de Deus franqueia os seus
corações a ele e uns aos outros, ele dá direção inovadora, que os mais inteligentes
não são capazes de produzir. Ele gera uma prontidão e uma responsabilidade em
seu povo, que é nada menos que um milagre.
A maioria de nós é tão orgulhosa e auto-justificadora que evita a todo o
custo a experiência de reconhecer os ossos. Na verdade, a percepção do que está
morto em nós ou em nossas igrejas é um sinal de grande maturidade. A única
coisa pior que o próprio fracasso, é o fracasso em admiti-lo e em permitir que
Deus conceda o dom da ressurreição. Quando nos recusamos, Deus precisa
achar um meio de nos revelar o quanto estamos mortos. Seus métodos muitas
vezes são dolorosos e alarmantes. Para Israel foi necessário o exílio. Mas Deus
estava pronto para começar novamente com o seu povo, no momento em que se
arrependessem. Quando nada mais dá certo, a pergunta mais importante é: "Por
que nada deu certo?"
As críticas de outras pessoas de nada adiantam. Os "se apenas", apontados
para
vida. os amigos,assevera:
O Senhor ou entes "Admita
queridososouossos
líderes, nãosão
— eles ajudam
seus!"a Aí
experimentar
é quando osaossos
nova
obtêm tendões, carne e pele. A ressurreição não está muito longe.
A segunda coisa que descobrimos na visão de Ezequiel relaciona--se bem
de perto com a primeira. Depois que admitimos os ossos devemos repudiá-los. O
Senhor deu a Ezequiel um quadro vivido do que ia acontecer, antes de pedir-lhe
que profetizasse.
A dieta espiritual de Deus para Israel e para nós é um novo espírito e um
novo coração, que sejam capazes de receber e conter o seu próprio Espírito
doador da vida. Os ossos foram ligados. Os esqueletos receberam nervos e carne,
140
mas não houve vida até o Senhor assoprar-lhes o seu Espírito. Quando nada sai
certo, o Senhor nos dá tanto um novo espírito quanto o seu Espírito. Sempre me
intrigou o fato de sua promessa a Israel ser um novo espírito humano capaz de
receber o Espírito Santo. Minha interpretação é que nosso novo espírito seja uma
nova disposição, uma atitude diferente, uma perspectiva liberada. Quando
Ezequiel recebeu ordens para profetizar aos ossos, recebeu um novo espírito de
expectativa e antecipação de que aquilo que o Senhor prometeu poderia
acontecer. Deus prepara os nossos corações através da confrontação, confissão e
confirmação de seu amor, antes que haja uma prontidão de nossa parte para
receber o seu Espírito. Seu Espírito é o autor da preparação e do enchimento
interior. Rendição completa é o prelúdio para a ressurreição dos ossos mortos de
nossos sonhos desfeitos e alvos não alcançados.
O segredo da vida nova e abundante nos é oferecido por meio da morte e
ressurreição de Cristo, e do poder do Espírito Santo. Ele morreu para que
pudéssemos ser perdoados, e ressuscitou para que a morte não mais seja nossa
inimiga. Ele retorna a cada um de nós para ser a fonte de nossa ressurreição
pessoal. "Eu sou a ressurreição e a vida", revelou-nos ele. Não apenas ele nos
oferece a promessa de uma nova vida para os nossos ossos mortos em nosso
auto-imposto exílio espiritual, mas também oferece o poder para torná-la
realidade. Nossa esperança não se baseia apenas na ressurreição dele, mas no
fato de que nós mesmos ressuscitamos para uma nova vida que jamais findará. A
ressurreição para uma vida cheia do seu Espírito promete a regeneração de nosso
caráter e de todo o nosso ser. Não só ele nos arranca das nossas sepulturas de
impotência, mas também nos dá o poder para viver com liberdade e alegria, como
novas pessoas.
Os discípulos não poderiam sobreviver sem o Pentecoste. Nem o podemos
nós. O fato de os discípulos terem convivido com Jesus durante os três anos de
seu ministério, fez deles as pessoas novas e poderosas que transformaram o
mundo. O período entre a ressurreição e o Pentecoste foi como um vale de ossos
secos. O que trouxe aqueles discípulos esgotados à vida foi o derramamento do
Espírito Santo. O que aconteceu aos ossos secos na visão de Eze-quiel foi um
prelúdio ao que aconteceu na Páscoa e no Pentecoste.
Quando leio essa história, vejo que o renascimento espiritual sempre
começa com pessoas que admitem os ossos e depois os repudiam através da
experiência do arrependimento e da aceitação do poder do Senhor. O momento
em que vivemos é mais emocionante porque Deus permitiu a tantos de seu povo,
leigos e ministros, testemunharem o fracasso de seus planos e programas,
esgotaram-se o esforço, a habilidade e a inteligência humanos. Mas logo em
seguida ao arrependimento vem a ressurreição, e depois desta a regeneração. Os
ossos mortos retornam à vida!
Se você se encontra em uma dessas ocasiões em que nada está dando
certo, agradeça-a
o substituirá Deus.
por um Se você
coração desente
carneque
— está friocaloroso
aberto, o seu coração, creia que
e receptivo. VocêDeus
está
pronto para receber o sopro da vida, o Espírito do próprio Senhor.
Recentemente, uma jovem viúva veio consultar-me. Seu marido havia
morrido alguns anos antes, mas ela não permitiu a si mesma sentir tristeza e
atravessar a dor da perda. Em vez disso, ela encheu a vida de atividades.
Entretanto, ela começou a perceber uma frieza crescente dentro de si, a qual
mantinha as pessoas à distância. Logo se sentiu como que rejeitada por Deus.
Era-lhe difícil orar. "Meu coração é como uma laje fria", disse ela, começando a
chorar. "Sinto-me morta por dentro. Já tentei de tudo e nada parece dar certo."
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Depois de um longo período de soluços, a jovem mulher estava pronta para
aceitar o que Deus esteve tentando dar-lhe o tempo todo. Ao reconhecer e admitir
o seu entorpecimento emocional e espiritual, permitiu que Deus colocasse um
"coração de carne" no lugar de seu "coração de pedra". Nós oramos, e o Espírito
Santo invadiu o seu ser por completo — mente, emoção, vontade, corpo — de
modo que ela abandonou o vale dos ossos secos. Aquela tarde marcou o início de
uma vida movida pelo poder do Espírito, que a libertou para viver e amar
novamente. Quando nada mais deu certo, ela aceitou a dieta do último recurso. A
mesma coisa pode acontecer comigo e com você.

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