A Igreja e A Comunhão - Apostila
A Igreja e A Comunhão - Apostila
A Igreja e A Comunhão - Apostila
6. Consequências do Isolamento
“Quem ama a solidão não ama a liberdade” (Clarice Lispector).
A solidão aprisiona e sufoca. Por vezes pode vir com uma roupagem de proteção ou
talvez de fuga. Mas na verdade quem se deixa agarrar por ela sente-se cada vez mais só
e sozinho, preso em si mesmo à procura da porta que nunca encontrará até o dia que
sozinho ficar. A solidão tem seu brilho, mas é preciso olhar pelo lado certo e medir o
tempo certo para não deixar que ela se embrenhe pelas entranhas e não se possa mais
libertar.
A solidão é reprovada por Deus, desde as primeiras páginas da Bíblia. A célebre e
contundente conversa de Deus continua ecoando na existência humana: “não é bom que
o homem esteja só” (Gn. 2:18). Deus criou o ser humano para se relacionar. Isso faz parte
da própria essência do Criador pois Deus é Trino. Por isso, Deus criou dois gêneros em
vez de um só e os chamou macho e fêmea e deixou leis que deveria regular a relação
entre um ser humano e outro. O ser humano é um ser social. A solidão nos leva para uma
vida centrada em nós mesmos, para um modo de viver onde as nossas preocupações são
limitadas pelas nossas vontades. A solidão tem a “força” de nos isolar. Muitas vezes a
solidão se torna uma camisa de força, de onde não conseguimos sair. A solidão nos
aprisiona sem que percebamos. Há vários tipos de solidão. Solidão de pessoas e solidão
de amor e afeto. A solidão pode ser um estado interior, uma ausência existencial. As
atitudes solitárias devem ser banidas do nosso modo de viver. A solidão nos afasta das
pessoas e distancia-nos de Deus.
A conversão é a transformação do “eu” solitário num “nós” comunitário. É o
chamado para sermos amigos de Deus e dos nossos irmãos. As parábolas e imagens do
reino glorioso de Cristo sempre envolvem mesas fartas, festas, multidão de todas as
línguas, tribos, raças e nações; Paulo nos fala de uma nova família, um corpo; João nos
fala de um rebanho e de uma cidade - essas imagens revelam que o reino de Deus é o
lugar onde as pessoas se encontram na comunhão festiva com Cristo. As imagens
bíblicas de banquete, mesa farta cheia de amigos, nos ajudam a refletir melhor sobre o
significado da comunhão e da amizade.
Porém, para muitos, a igreja não tem sido este lugar; pelo contrário, tem sido um lugar de
desilusão, frustração e solidão. Um lugar de mágoas, ressentimentos e traições. Sei que
existem aqueles que se sentem acolhidos e amados em suas comunidades, mas esta não
é a regra geral. No entanto, mesmo os que se sentem bem nem sempre experimentam
uma verdadeira comunhão de amizade e amor.
Cristo fez amizades ao ponto de ter amigos mais chegados. No jardim do Getsémani, por
exemplo, Jesus chamou os seus três amigos mais chegados (Pedro, Tiago e João), para
orar com ele. O momento era de extrema aflição pois nosso mestre, estava para ser
entregue à morte por nossos pecados e queria ser consolado e animado por seus amigos
queridos. De facto, como escreveu Salomão, há amigos mais chegados que irmãos (Pv.
18:24). Todos nós precisamos de amizades, Deus não nos fez para ficarmos sozinhos
A solidão é uma ausência de relacionamentos que mina nossa espiritualidade. O
cristianismo é a resposta de Deus para um mundo que valoriza o indivíduo solitário e não
o coletivo. A comunhão com os irmãos revela também nossa comunhão com Deus.
Enquanto a solidão nos leva para um “canto” (seja ele um lugar físico ou existencial) e
ficamos ali nesse “lugar” pensando em nós, a comunhão nos aproxima e nos coloca em
contato. Uma das expressões mais usadas no Novo Testamento, no contexto da igreja é
“uns aos outros”. Isso revela que as igrejas que celebram Jesus Cristo como Senhor e
Salvador devem valorizar o “outro”. Não podemos ser felizes e completos como igreja
sem pessoas (sem o “outro”). O cristianismo é uma expressão de amor coletivo. Amor
mútuo. Amor envolvente. O cristianismo é a manifestação do testemunho de amor entre
os cristãos, a despeito de suas diferenças e diversidade, a fim de que, os de fora creiam
que Jesus Cristo é o Messias enviado por Deus.
O solitário busca o seu próprio interesse e insurge-se contra a verdadeira
sabedoria...(Pv. 18:1). O isolamento pode ser fatal para sua alma. Quem se esconde e se
isola para manter uma identidade secreta, para praticar coisas inconvenientes e ainda
conservar a sua reputação diante das pessoas dá sinais de grande insensatez. Não
somos aquilo que aparentamos em público. Nossa verdadeira identidade é aquela que se
expressa diante do espelho. De nada adianta colocar uma máscara bonita em público se,
no recesso, quando fechamos as cortinas, mostramos uma terrível carranca. De nada
vale os aplausos dos homens por nossas virtudes se no íntimo estamos povoados pela
impureza. É absolutamente inútil sermos aprovados pelos homens e reprovados por
Deus.
O solitário que se esconde para encobrir os seus pecados insurge-se contra a
verdadeira sabedoria. Aquele que tranca a porta do quarto para ver coisas vergonhosas
esquece-se que, para Deus, luz e trevas são a mesma coisa. Aqueles que se afastam da
família e procuram os guetos mais escondidos para se refestelarem no pecado com a
intenção de permanecerem incógnitos, cobrem-se a si mesmos de opróbrio e deixam a
família cheia de vergonha. Devemos viver na luz. Somos a carta de Cristo. Devemos
refletir o Caráter de Cristo.
Fomos chamados para participar, não somente crer. Todos nós somos chamados
para participar, não somente crer. A partir do momento em que passamos a fazer parte da
família de Deus, não estamos mais por conta própria, mas devemos participar junto à
comunidade. Mesmo no mais perfeito e imaculado ambiente do Éden, Deus disse: “Não é
bom que o homem esteja só” (Gn. 5:14). Fomos criados para viver em comunidade,
moldados para o companheirismo e formados para uma família; e nenhum de nós pode
cumprir os propósitos de Deus sozinho e sem ajuda. Sem alguém que lhe faça
companhia, o homem não pode viver plenamente a condição de ser humano, por isso
devemos estar atentos às inúmeras vezes que a Palavra de Deus usa a expressão: “uns
aos outros”.
Embora nosso relacionamento com Cristo seja pessoal, Deus nunca quis que fosse
particular. Não existe “cristão autónomo”, e é por isso que, como cristão, eu preciso de
me esforçar para integrar as outras pessoas dentro do Corpo de Cristo, pois o desejo de
autonomia em relação a Deus é um terrível caminho e um grande engodo para um
cristão. A Bíblia diz que fomos ajuntados, reunidos, juntamente edificados, juntamente
tornados membros, juntamente feitos herdeiros, combinados, mantidos juntos e que
seremos juntamente arrebatados. Seguir a Cristo inclui integrar, não apenas acreditar:
somos membros do corpo de Cristo – a Igreja. Para o Apóstolo Paulo, ser “membro” da
Igreja significava ser um órgão vital de um corpo vivo, parte indispensável e
interconectada (Rm. 12:4, 5 e 1 Co. 12:12-27).
Não fomos feitos para viver como cavaleiros solitários; ao contrário, somos feitos
para pertencer a família de Deus e ser membros de seu corpo. Portanto, o batismo
não é somente um símbolo de salvação, mas é também de comunhão. Não significa
somente uma vida em Jesus, mas também a visualização da integração de uma pessoa
dentro do corpo de cristo. Quando um novo crente é batizado, a igreja pode dizer: “Assim
já não sois estrangeiros, nem forasteiros, mas concidadãos dos santos e da família de
Deus” (Ef. 2:19). A igreja existe para proporcionar comunhão aos crentes.
Fomos criados para uma função específica, mas perderemos esse propósito
maravilhoso se deixarmos de congregar (ter comunhão) por um motivo ou outro. Se
um órgão é de alguma forma desligado do corpo, ele murcha e morre. Ele não pode existir
por si mesmo, nem nós (Ef. 4:16). É por isso, que o primeiro sintoma de declínio espiritual
é normalmente o comparecimento irregular (isolamento) aos cultos e a outras reuniões.
Sempre que nos tornamos descuidados com a igreja, todo o resto começa a desmoronar.
Ouça a voz de Deus. Fuja da solidão e corra para os braços de Deus e converse com ele.
Fazer parte da igreja ajuda a desenvolver os “músculos espirituais” (Cl. 2:19).
Somente quando nos colocamos como membros com a plena participação nas atividades
da igreja é que adquirimos resistência contra toda a investida do diabo e desenvolvemos
músculos espirituais, ou seja, não seremos atingidos por qualquer tempestade, mas
teremos a nossa segurança em Deus, teremos a convicção de que unidos em Cristo
somos verdadeiramente mais do que vencedores. Quando estamos unidos temos a
consciência de que as nossas obrigações são mútuas, portanto, temos “responsabilidades
familiares” conforme aquilo que Deus espera que cumpramos na igreja local. Veja o
enfoque de Warren, 2003, p. 117: “Precisamos mais do que a Bíblia para crescer,
precisamos de outros crentes. Crescemos mais fortes e mais rapidamente aprendendo
uns com os outros e sendo responsáveis uns pelos outros. Quando os outros
compartilham o que Deus está ensinando, também aprendemos a progredir”.
O isolamento é o contrário da comunhão, é a escassez ou ausência dos
relacionamentos. O isolamento produz a falácia. É fácil nos enganarmos pensando que
somos maduros quando não há ninguém para nos contestar. O cristão não deve viver no
isolamento, porque ele traz sérias consequências, afetando sua vida em vários aspetos:
apaga o amor, obstrui a visão do Reino de Deus, enfraquece emocional e espiritualmente,
inibe o crescimento, não promove a libertação e a cura, gera religiosidade, sentimento de
superioridade, divisão no Corpo e morte. A verdadeira maturidade se manifesta nos
relacionamentos. Precisamos mais do que a Bíblia para crescer; precisamos de outros
crentes.
Por isso, só estando em comunhão é que poderemos praticar o amor de Deus, mostrando
o quanto nos desenvolvemos na fé, amando e sendo amados. O não ser amado é triste,
mas o não amar é uma tragédia! Quando assim fazemos, mesmo que encontremos
tristeza no trato com as pessoas, ficaremos tranquilos por saber que nada nos faltará.
Afinal de Contas o Senhor é o nosso pastor.
Deus tem um propósito a realizar, mas ele precisa que o homem esteja disposto a ter
comunhão, para que se estabeleça a Sua vontade aqui na Terra, está é a função da
comunhão, preparar um caminho para que Deus realize Sua vontade, assim como uma
locomotiva necessita dos trilhos para andar, Deus necessita da comunhão do homem
para levar adiante a Sua vontade, sendo assim o homem deve fazer com que a sua
vontade seja unida com a vontade de Deus para que se estabeleçam seus desígnios.
c) A Comunhão Com os Irmãos é a Base do Nosso Testemunho no Mundo.
Se vivermos em fidelidade, em amor que gera a comunhão, daremos o eloquente
testemunho de obediência e fidelidade que o mundo precisa, e o Senhor, a cada dia,
ajuntará outros que, como nós, experimentarão a imensa alegria de ter Jesus como o
centro de suas vidas.
Em João 13:34-35 o Senhor nos afirma que assim como Ele nos amou, também nós
devemos nos amar uns aos outros, porque se tivermos amor uns pelos outros, todos
saberão que somos Seus discípulos.
A comunhão entre os discípulos na igreja primitiva era muita forte: “perseveravam na
comunhão; perseveravam unânimes todos os dias; comiam juntos com alegria e singeleza
de coração; era um o coração e a alma da multidão dos que criam”. Não é de admirar,
pois, que “todos os dias acrescentava o Senhor à igreja aqueles que se haviam de salvar”
(At. 2:42, 46, 47; 4: 32). Não foi Ele que pediu ao Pai: “Para que todos sejam um, como
Tu, ó Pai, o és em Mim, e Eu em Ti; que também eles sejam um em Nós, para que o
mundo creia que Tu Me enviaste” (Jo. 17:21)?
A comunhão era tão íntima que se podiam estimular uns aos outros e, até, admoestarem-
se uns aos outros! E toda a igreja tinha o cuidado de que ninguém da comunhão se
privasse da graça de Deus (Hb. 10:24, 25; 12:15)! Além de sermos testemunhas do
Senhor através da nossa vida na palavra e no exemplo, as Escrituras indicam que
também devíamos ser testemunhas nas obras.
Quando efetivamente testemunharmos que há comunhão entre nós (unidade e amor), o
mundo será confrontado com uma realidade divina inquestionável, a presença do Deus
vivo na Terra, entre os homens. A ausência de comunhão tem sido um grande
impedimento para a evangelização.
Como falar do amor de Deus e da importância da Igreja para o perdido, se não
mostramos os efeitos deste amor em nossas vidas? Como falar do amor de Jesus, que
nos transforma para melhor, se o testemunho conjugal e familiar denuncia justamente o
contrário? Que autoridade teria alguém contra o reino das trevas e para pregar o Reino de
Deus, se pela ausência de comunhão com os irmãos demonstra que não vive na luz?
Como é que alguém pode pregar o Evangelho de Jesus que liberta, cura e transforma, se
ainda vive em cadeias infernais como ódio, rancor, amargura, discórdia e divisão? Como
dizer que o Senhor pode transformar um casamento, se pela falta de comunhão conjugal
o próprio casamento é um inferno?
Nestes dias conturbados, em que a nossa cultura assume formas cada vez mais
distanciadas dos valores do reino de Deus, precisamos de nos abrir para vivermos a
autêntica comunhão cristã na família e na Igreja, não só nas grandes celebrações de
domingo, mas no dia-a-dia; necessitamos de pedir ao Senhor sabedoria e discernimento
para dar testemunho da sua verdade com firmeza e convicção, não nos conformando com
o presente século, mas transformando-nos pela renovação das nossas mentes. O homem
é feito para a sociedade, e os cristãos, para a comunhão dos santos. Mas, para isso é
preciso humildade, é preciso saber ceder, é preciso saber abrir mão, é preciso saber
construir com cada tijolo de pensamento que é oferecido e que em nada prejudica o
objetivo do Reino.
A Comunhão é a resposta para o sucesso da obra do Senhor. Portanto, que não
percamos a oportunidade de estarmos juntos, de mãos dadas, cooperando, incentivando
e amando em Cristo Jesus. Que o Espírito Santo nos ajude a viver a autêntica comunhão
cristã.