Caramelos Livro Pedagógico PDF
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Maleógica
g
Peda
Os Caramelos
Câmara Municipal de Palmela
Divisão de Património Cultural / Museu Municipal – Serviço Educativo
Ficha Técnica
Edição
Investigação/Textos
Serviço Educativo
Fotografia
Paulo Nobre
ILUSTRAÇÕES
Zé Nova
Jofra
ISBN
978-972-8497-58-3
Os Caramelos [3]
Índice
Serviço Educativo do Museu Municipal de Palmela 5
Objectivos da Maleta Pedagógica 7
Conteúdos Pedagógicos 9
O Tema 15
Tópicos de Pesquisa 17
Memórias do Habitar – Arquitectura e Vivência Caramelas 21
• Os Caramelos 22
• A Casa Caramela 29
• Construir em Terra 31
• Distribuição das Casas Caramelas 40
Construções de terra. Que futuro? 43
Bibliografia 47
Propostas de trabalho
A História Infantil “Rafael, o menino que se tornou caramelo” (anexo 1) 53
B Origem do Pinhal Novo (anexo 2) 53
C O trabalho no Museu (anexos 3 e 4) 53
D Arquitectura de Terra (anexos 5, 6 e 7) 54
E Vestuário Caramelo (anexo 8) 54
F Gastronomia Caramela (anexo 9) 55
G Jogos Tradicionais (anexo 10) 56
Serviço Educativo
do Museu Municipal
de Palmela
Visão
O Serviço Educativo desenvolve acções no âmbito da Educação Patrimonial,
visando promover a democratização do saber através do alargamento e diversi
ficação de públicos e actividades e da aposta na Qualidade, na eficiência e na
melhoria contínua.
Missão
O Serviço Educativo comunica aos diferentes públicos os conhecimentos adqui
ridos pelos investigadores, sendo o rosto mais visível do Museu Municipal; na
sua prática educa para o conhecimento, valorização e preservação do Património
Local, através de uma acção que incentiva a integração e a participação de toda a
comunidade.
É no Serviço Educativo que reside a essência do serviço público do Museu Muni
cipal.
Os Caramelos [7]
Objectivos
da Maleta
Pedagógica
Um Museu nunca pode estar só. A comunidade para a qual se destina deve ser uma
participante activa no processo museológico, que é o de investigar, informar, expor
aos sentidos, desenvolver actividades lúdico-pedagógicas.
Esta maleta pedagógica visa partilhar as actividades que o Museu Municipal
desenvolve, especificamente o projecto de investigação sobre a Cultura Caramela.
Embora a temática seja abrangente, incluindo vários sub-temas tais como o traba
lho, a alimentação, a religião ou o quotidiano, não importa aqui adensar a informa
ção, o que tornaria o documento extremamente extenso, desviando-nos do objec
tivo principal, que é o de caracterizar de uma forma geral o projecto, e determinar o
seu conteúdo mais imediato.
Este documento é um instrumento de trabalho para professores e alunos; inclui
mos um texto técnico, que ajuda a caracterizar os caramelos no tempo e no espaço,
e descreve a Casa Caramela abordando os métodos e técnicas de construção.
Salientamos a importância das construções em terra, quer numa perspectiva
histórica, quer perspectivando o futuro através do texto “Construções de Terra.
Que futuro?”.
Considerando que o trabalho na sala de aula está condicionado pelas formalidades
de cada currículo e pelo tempo de que se dispõe para trabalhar e envolver os alunos,
integramos neste dossier algumas propostas de trabalho.
[8] Os Caramelos
Por fim, fornecemos uma lista de bibliografia, para que possam, autonomamente,
aprofundar o tema.
Sempre que possível, gostaríamos de receber as vossas críticas a este instru
mento didáctico-pedagógico para o melhorarmos em futura edição.
BOM TRABALHO!
Os Caramelos [9]
conteúdos
pedagógicos
Os Caramelos [11]
Maleta Pedagógica
OS CarameloS
ÁREA DE EXPRESSÃO/COMUNICAÇÃO
〉 No domínio das expressões (ex: realização e construção de jogos tradicionais)
〉 No domínio da linguagem e abordagem da escrita (ex: percepção sobre a existência de diferenças entre
um texto escrito lido e o discurso oral fluído [entrevista])
〉 No domínio da matemática (ex: exploração de modelos geométricos a partir de diferentes habitações)
1 Adaptado de: Despacho n.º 5220/97 de 10 de Julho de 1997 (2.ª série) – Aprova as Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar.
Os Caramelos [13]
2 Adaptado de: 1.º ciclo, Áreas curriculares não disciplinares. Porto: Porto Editora. ISBN 972-0-16015-2. 2003-Livro auxiliar.
Os Caramelos [15]
O TEMA
Grande parte da história do concelho de Palmela está por contar. É natural que
assim seja pois a complexidade do assunto não permite que se adoptem posi
ções dogmáticas, nas quais a verdade é postulada como se ela própria fosse uma
evidência estática, um dado adquirido. A verdade resulta de um processo de cons
trução, como se de um grande puzzle se tratasse, onde peças, que muitas vezes não
parecem encaixar-se, vão compondo, delineando novos contornos.
Embora a abordagem cultural do concelho possa ser feita em diversas vertentes e
temáticas distintas, neste caso, iremos tratar os Caramelos. Estamos na presença
de uma população com um profundo enraizamento na localidade, tão mais impor
tante se destacarmos que esteve na base da criação de grande parte do mundo
rural do concelho, nomeadamente da freguesia que é hoje Pinhal Novo.
De forma mais ou menos académica, mais ou menos popular, foram sendo feitas
várias pesquisas sobre esta matéria. Salienta-se a importância dos Ranchos Fol
clóricos e de alguns autores, tal como António Matos Fortuna, Aníbal de Sousa,
José António Cabrita, Mário Balseiro Dias, Luís Marques, entre outros, que têm
contribuído para um maior conhecimento sobre o assunto.
É importante, também, salientar o contributo da memória oral, o que se fala de
boca em boca, o que não se deixa cair no esquecimento. Neste contexto verifi
cam‑se variações, reflexo do pensamento de cada época. Se em tempos não muito
[16] Os Caramelos
tópicos de pesquisa
Os Caramelos [19]
CarameloS
IDENTIdADE cASA CARAMELA
Morte
Festas
Movimento associativo
Religião
Trabalho
Os Caramelos [21]
Memórias do Habitar
– Arquitectura
e Vivência CaramelaS
3 In Definição elaborada pela Conferência Mundial da UNESCO sobre o Património Cultural, celebrada no
México em 1982.
[22] Os Caramelos
Os Caramelos
para tão grande tarefa, e tratando-se de um lugar desabitado, foi necessário recru
tar grande quantidade de mão-de-obra vinda de outras paragens. Estes trabalha
dores, que, nos locais de origem tinham grandes dificuldades económicas e poucas
perspectivas de futuro, viam na migração, resposta para os seus problemas.
Na Beira Litoral 4, mais propriamente na zona da gândara – local de terreno are
noso, pouco fértil – existia já o hábito de migrar para outros locais a sul do Tejo 5.
Num complexo sistema de recrutamento, José Maria dos Santos tinha “contrata
dores” que percorriam as distantes aldeias da Beira, batendo de porta em porta
para angariar possíveis trabalhadores.
Apenas com uma mala de madeira contendo duas mudas de roupa e alguns alimen
tos, os chamados “caramelos de ir-e-vir” – com o acesso facilitado desde a inau
guração da linha férrea em 1861 – vinham trabalhar para Rio Frio por temporadas,
chegando por altura da vindima e regressando à terra natal para festejar o S. João.
“Vim para cá com onze anos. Porque lá na nossa terra não havia
trabalhos. O que se trabalhava lá era só pocadinhos de terra que
4 A origem deste povo estende-se, basicamente, entre Aveiro e a zona sul de Leiria, nomeadamente: Mira,
Cantanhede, Tocha, Cadima e Pombal.
5 Embora neste artigo nos reportemos apenas ao concelho de Palmela, António Fortuna encontrou, com a data
de 1613, um registo na paróquia de S. Lourenço de Azeitão, que se refere ao baptismo de um caramelo. Também
em 1791, o desembargador Joaquim Pedro Gomes de Oliveira, natural de Azeitão, numa análise apresentada à
Academia das Ciências, observou: “... o que mostra ser muito antigo o uso que ainda actualmente existe, de vir
todos os anos estabelecer-se ali muitos homens da província da Beira que, acabados os trabalhos das vinhas,
voltam os mais deles para a sua pátria.” (Fortuna, 1997). Estes documentos revelam que a migração do povo da
beira litoral para o sul, tem origens antigas, sendo que, depois de Azeitão, foi o concelho da Moita o segundo local
de destino e posteriormente, o concelho de Palmela.
Nesta busca de melhores condições de vida, estão subjacentes os sentimentos de esperança e de crença,
pelo que Aníbal de Sousa encontrou no Círio da Carregueira (na romaria à N.ª Senhora da Atalaia) a mais antiga
expressão associativa da região, que data de 1833.
Os Caramelos [25]
cada qual tinha pra seu cultivo, pra viver, não é?, pra uma pessoa
viver. E toda a gente vinha. Eu maiormente até nem tinha grande
precisão de vir, porque eu até era filha única e acabei por vir eu sozi-
nha muito pequenina... Porque vinha o rancho, aquelas maltas, cha-
mavam as maltas, não era rancho, era as maltas de caldeira aberta
que se chamava, que era de comerem nas caldeiras.”
(Belmira Marques, 2003)
Eram tempos difíceis, em que crianças e adultos trabalhavam de sol a sol nos
diversos trabalhos agrícolas necessários ao ciclo produtivo da grande herdade.
Com uma fila de tarimbas 6 de cada lado, a “Casa da Malta” ou “malhada” era o local
onde os trabalhadores pernoitavam.
“Aqui em Rio Frio tinha o meu que era o das mulheres, e tinha dois
dos homens... Esses rapazes que já eram, parece que era de quinze
anos para cima iam pós homens, já não vinham junto com as mulhe-
res. De quinze anos pa baixo é que andavam juntos com a gente...
6 Nestas estadias sazonais que duravam 9 meses, os migrantes dormiam em pequenos estrados de madeira
cobertos por colchões de palha.
[26] Os Caramelos
nova identidade, diferente da do local de origem, mas também distinta da que até
aí existia no local de destino.
No concelho de Palmela, os caramelos são o exemplo por excelência desta forma
de apropriação do espaço. O grande fluxo migratório e a posterior ocupação do
território permitiu que se tornassem agentes de mudança e contribuíssem decisi
vamente para a construção de parte do que somos. Apesar da denominação ter
uma origem desconhecida 7, a cultura caramela tomou forma e tornou-se parte
integrante da vida e da paisagem do concelho, contribuindo não apenas com fac
7 Os migrantes só passavam a ser caramelos, no momento em que chegavam à nossa região. Nos seus relatos
dizem desconhecer completamente o que terá originado tal nome, e o mesmo sucede com os habitantes locais.
Os Caramelos [29]
A casa caramela
onde a família partilhe as emoções do dia-a-dia. Assim, a casa tem uma importante
função integradora na reconstrução da identidade, tornando-se, quando criada de
raiz ou adaptada pelo migrante, uma representação simbólica da apropriação do
território.
Estamos convictos de que podemos falar de uma arquitectura tipicamente cara-
mela, inexistente em qualquer outro local do país. É sobre este tipo de habitação
que trataremos nas linhas que se seguem, numa descrição que aborda a sua estru-
tura, forma, interior, anexos, métodos e técnicas de construção.
A casa Caramela inscreve-se no que João Cravo caracteriza ou define por estilo
Chã: simples e funcional, despida de ornamentos, fundamentalmente estrutural e
estruturante. É uma casa térrea, elementar, de planta rectangular com reduzidas
dimensões, e sobretudo, com um carácter funcional muito acentuado.
Toda a sua disposição estrutural resulta da necessidade do povo caramelo em
facilitar e simplificar as tarefas quotidianas inerentes ao acto de habitar um
espaço 8. A casa não era entendida como é hoje: um espaço de convívio, de estar
e descansar. Vivia-se na rua, os pais trabalhavam de sol a sol, as crianças que ainda
não tinham idade para labutar brincavam perto de casa esperando o regresso da
família, e os bebés acompanhavam as mães para poderem ser amamentados.
A casa era apenas utilizada para as actividades elementares como dormir, confec-
cionar as refeições e desempenhar algumas actividades necessárias ao bem estar
quotidiano, tal como costurar, secar a roupa para o dia seguinte – “Entigamente a
gente só tínhamos uma muda de roupa... E depois vinham muito suadas e muito
8 Embora as parcas condições económicas pudessem, à primeira vista, servir de justificação para este tipo
de construção simples e pobre, deparamo-nos com casas, em tudo idênticas, mas propriedade de famílias com
alguma disponibilidade financeira. A única distinção prende-se com o número e dimensão dos anexos que com-
põem a fazenda, nomeadamente a adega, que sendo muito frequente, na maior parte das casas reduzia-se a
um pequeno anexo, onde se fabricava vinho para consumo doméstico, enquanto que noutras, a sua dimensão
demonstra a importância do monte para a região.
Os Caramelos [31]
sujas, lavavam num alguidarinho ou num tanque e ó depois punham assim numas
cadeiras de volta do lume a enxugar pó outro dia levar.” (Benilde Lagarto, 2004) e
fazer a limpeza do espaço, tarefas que cabiam exclusivamente à mulher.
A própria matéria-prima traduz esta necessidade de facilitar a construção de uma
habitação que dispensava requintes: a terra.
Construir em Terra
Não eram os colonos, que, sozinhos erguiam paredes e telhados. Em cada lugar
existia pelo menos um homem que sabia a arte da construção. O “Mestre” 9 possuía
as características indispensáveis a esta profissão, porque entre outras, era cora
joso, audacioso, habilidoso e rude.
E era na Primavera, início do Verão, que os novos habitantes destas terras iniciavam
a construção das suas habitações. Nos locais determinados por José Maria dos
Santos, eram abertos grandes buracos, os “covados” ou “alagoas”, onde o Mestre,
com a colaboração dos colonos, extraía a terra. A técnica consistia em retirar o
barro ao nível abaixo da terra arável, onde, pela sua composição, tinha uma maior
plasticidade e compressibilidade, permitindo que se moldasse facilmente. Depois,
com a ajuda de uma enxada que regulava o volume de água, era amassado com os
pés, tarefa na qual as crianças também participavam sendo que, habitualmente, se
juntava à massa areia ou palha para que ganhasse maior consistência e evitasse
rachar, durante a cozedura ao sol. A massa era colocada em formas rectangulares
de madeira, o adobeiro ou adobela, com cerca de 55cm de comprimento, 40cm
de largura e 25cm de altura, e rasada na parte superior para que ficasse comple
tamente lisa e tomasse a forma de um paralelepípedo. Depois, por meio de umas
pegas laterais, era desenformada e colocada em várias fileiras, no terreno apla
nado, permanecendo a secar ao sol entre oito a quinze dias.
Os adobes já secos eram colocados nas carretas 10 e transportados para o local de
construção, onde, no ponto mais alto do terreno, se tinha iniciado a abertura dos
caboucos que, por vezes, consistia apenas numa pequena cavidade na terra.
O mestre, homem corajoso capaz de desafiar a lei da gravidade e com uma destreza
própria de quem não teme, erguia as paredes, colocando os adobes em fiadas
9 Nomes de alguns dos antigos mestres das zonas de Venda do alcaide, Palhota e Vale da Vila: José Bernardo
Cavaleiro, Angelo António da Silva Cavaleiro, Lagarto, Zé Maneta, Braço Forte.
10 Este processo podia ter a ordem inversa, pois era também comum que o barro extraído fosse imediatamente
transportado para o local de construção, sendo aí que se procedia ao “amassadoiro”.
[34] Os Caramelos
Aspecto
da disposição
dos gigantes.
Aspecto de uma
cozinha no Vale
da Vila, que
ainda mantém
os traços
tradicionais.
cabia tratar das crianças, poderia chegar mais facilmente ao berço de madeira,
colocado ao lado da cama.
É muito raro encontramos aberturas para as traseiras da casa, verificando-se
algumas vezes na cozinha, no quarto das filhas, e outras ainda, num terceiro quarto
anexado à sala, construído para as filhas e filhos que acabados de casar, aí perma
neciam junto dos pais.
Como eram famílias muito numerosas, a dimensão da habitação não permitia que
todos os elementos da família dormissem no seu interior. Assim, considerando que
as filhas tinham de ser resguardadas antes do casamento, cabia aos filhos dormirem
em anexos exteriores, como a adega ou o celeiro.
“E não tínhamos lençol. Era uma manta mais velha, é que tava lá, lá
por baixo. Quem se fosse deitar mais cedo ia buscar o saco do farelo
pá cabeceira. Era uma coisa macia (…)”
(Joaquim Cavaleiro, 2004)
Tal como o exterior, o interior era também muito sóbrio, com poucos ornamentos.
A decoração cingia-se a papel colorido – que recortado com precisão e engenho,
tomava diversos desenhos e formas, sendo depois pendurado nas paredes –, a
pequenas recordações compradas nas feiras, e figuras de santos, especialmente
da Nª Senhora da Atalaia.
A limpeza do espaço consistia em salpicar de água o pavimento que era todo de
barro, para que não levantasse pó, e em tirar as teias, por meio de um vasculho
preso a uma comprida vara de madeira, dos recantos da cobertura, que sem forro,
permitia que se dormisse a olhar as telhas. Para além destes procedimentos,
anualmente, por altura da primavera, caiavam-se as paredes exteriores para que
ficassem mais protegidas da acção da chuva, tornando ao mesmo tempos, a casa
mais bonita perante o olhar dos vizinhos.
A casa rural não é apenas o local onde se habita, ela é concebida como um instru
mento agrícola indispensável à vida campesina. À medida que os colonos iam adqui
rindo mais posses, crescia o número de anexos que serviam de suporte à economia
doméstica. Construídos imediatamente ao lado da habitação, com acesso apenas
pelo exterior, surgiam os arrumos das alfaias agrícolas indispensáveis à exploração
da sua parcela de terra, a abegoaria, onde repousavam os animais, a adega, onde
Os Caramelos [39]
Aspecto
do forno
acoplado,
de uma casa
à entrada
de Pinhal
Novo.
Casa do forno
nos Olhos
d’Água.
se fabricava vinho para consumo próprio ou para venda ao público, o celeiro, onde
se guardavam os alimentos e a salgadeira, e o forno para a cozedura do pão. Este
poderia ser acoplado às traseiras da casa ou na parede lateral da cozinha, locais
mais protegidos das intempéries, ou então, construía-se um outro anexo, denomi
nado por “casa do forno”, cujas paredes eram pintadas com oca, para que o negrume
do fumo pudesse ser dissimulado.
Para completar este cenário rural existia o poço, o tanque, a pia para os animais,
o cruveiro para o porco, o coradoiro, e na zona mais húmida do terreno, a horta, a
vinha e a ceara, imprescindíveis para a pequena economia doméstica, sendo tam
bém que, alguns dos produtos hortícolas eram vendidos pelas “caramelas” nas ruas
e feiras de Pinhal Novo, Palmela e Setúbal.
[40] Os Caramelos
12 Através das recolhas orais, verifica-se que grande parte dos namoros acontecia à escondida dos pais da ra
pariga. O casal aproveitava o caminho para o trabalho e o regresso a casa, para de forma discreta, trocar as juras
de amor. Todavia, era também comum as mulheres engravidarem ainda antes do casamento. Nestes casos, a
cerimónia (frequentemente apenas civil) era apressada para que a gravidez fosse escondida dos olhares alheios.
O casamento consistia numa festa que se realizava na casa dos pais da noiva, para a qual eram convidados os
familiares e amigos mais chegados. Os vizinhos mais próximos contentavam-se com a oferta de comida, confec
cionada propositadamente em maior quantidade por este motivo.
Mas, além de ser um momento de festa, era também um momento socialmente complexo. Ao anoitecer, na maior
parte dos casamentos, realizavam-se as ”Buzinas”, que consistiam num ritual em que um grupo de pessoas, es
condidas pela escuridão da noite, fazia barulhos ensurdecedores perto da casa onde se celebrava, gritando, com
a voz alterada para não ser reconhecida, defeitos e actos moralmente criticáveis da noiva. “Quando era o Sábado
ou ao Domingo quando havia um casamento, né?, era tantos búzios, tantos búzios ... Ó’depois apitavam: uh, uh...”
(Adélia dos Santos Ratão, 2003)
Era um momento muito angustiante e ainda hoje, as mulheres com quem falámos, mostram-se chocadas com
tal episódio.
Os Caramelos [41]
É a estas pessoas que queremos agora agradecer, por terem, pacientemente, con
tribuído com os relatos das suas vidas, para o estudo do povo e da casa caramela
e para o entendimento da importância deste património arquitectónico vernacular
na história da região.
[42] Os Caramelos
CONSTRUÇÕES
DE TERRA.
QUE FUTURO?
13 A UNESCO criou em finais de 1972 uma Convenção para a Conservação do Património Mundial, Cultural e
Natural. Esta convenção, composta por 21 países, é responsável por classificar parte do património do mundo
que, pelas suas características únicas e originais, deve ser valorizado e conservado, enquanto património de
todos nós.
Os Caramelos [47]
BIBLIOGRAFIA
Actas da 1ª Eira Folclórica da Região Caramela. Pinhal Novo: 20 e 21, Março, 1999, Rancho
Folclórico da Casa do Povo de Pinhal Novo, 1999.
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Folclórico “Os Fazendeiros” das Lagameças, 2000.
ANDRADE, Paula Maria Cruz – Pinhal Novo: movimentos migratórios dos “caramelos”,
povoamento e construção de uma identidade cultural. Pinhal Novo: Junta de Freguesia de
Pinhal Novo, “Colecção Origens e Destinos, nº 10”, 2009.
CABRITA, José António – Entre a gândara e a terra galega. Pinhal Novo: Junta de Freguesia
de Pinhal Novo, “Colecção Origens e Destinos, nº 2”, 1998.
[48] Os Caramelos
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Freguesia de Pinhal Novo, “Colecção Origens e Destinos, nº 3”, 1999.
___________________, SOUSA, Aníbal – Rio Frio, retrato de uma grande casa agrícola. Pinhal Novo:
Junta de Freguesia de Pinhal Novo, “Colecção Origens e Destinos, nº 8”, 2006.
CORREIA, Estela Conceição – O que nos dizem os Bordados. Sobre um Acervo Têxtil de
uma casa Caramela. Lisboa: ISCTE, 2007. Dissertação de Mestrado em Museologia: con
teúdos Expositivos.
DIAS, Mário Balseiro – Círios de Caramelos. Pinhal Novo: Junta de Freguesia de Pinhal Novo,
“Colecção Origens e Destinos, nº 4”, 2000.
DIAS, Jorge, GALHANO, Fernando, OLIVEIRA, Ernesto Veiga de – A Região e a Casa Ganda
resa. Porto: Impressa Portuguesa, 1959.
Horta Faial – Inventário do Património Imóvel dos Açores. Angra do Heroísmo: Instituto
Açoriano de Cultura, 2003.
JANEIRO, Carlos Alberto Reis – A casa e a migração das formas. Lisboa: Universidade
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Memórias de Pedra e Cal – Vila Franca de Xira: CM de Vila Franca de Xira, 2001.
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Cheia, 1985.
ROSENDO, Maria Teresa coord. – Memórias de Ferroviários de Pinhal Novo. Para a histó-
ria da Vila e da Comunidade Ferroviária. Palmela: Câmara Municipal de Palmela, “Colecção
Estudos e Projectos Municipais, nº 7”, 2003.
TOSTÕES, Ana, et al – Arquitectura Popular dos Açores. Lisboa: Ordem dos Arquitectos,
2000.
Audiovisual:
• Arquivo de Fontes Orais do Museu Municipal de Palmela.
ostas
Propde
lho
Traba
Os Caramelos
Os Caramelos [53]
e lenços para se protegerem das agressões do sol. As roupas eram usadas du
rante muito tempo e quando se rasgavam eram feitos remendos que tapavam os
buracos.
1. A partir das ilustrações do rapaz e rapariga caramela, recorta e cola as peças de
vestuário, vestindo-os.
2. Nesta maleta poderás ainda encontrar tecidos, botões, fechos, elásticos, linhas
e outros materiais utilizados pelas costureiras na confecção de vestuário. Encon
tras ainda vários modelos, em miniatura, de roupa de homem e mulher.
fICHAS DE AVALIAÇÃO
DA MALETA
PEDAGÓGICA
(anexos 11 e 12)
Obrigado!