Apostila Teologia Bíblica Do NT (Sinóticos e João)

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SUMÁRIO

CONTEXTO HISTÓRICO E COMPOSIÇÃO DO NOVO TESTAMENTO ------------- 02


A Preparação Hebraica ----------------------------------------------------------------------------- 02
A Preparação Grega -------------------------------------------------------------------------------- 04
A Preparação Romana ------------------------------------------------------------------------------ 05
A Palestina no Primeiro Século ------------------------------------------------------------------- 05
A Composição do Novo Testamento ------------------------------------------------------------- 07
OS EVANGELHOS SINÓPTICOS -------------------------------------------------------------- 10
A etapa de tradições orais: a crítica da forma --------------------------------------------------- 12
A etapa de fontes escritas: a crítica das fontes (o problema sinótico) ----------------------- 12
A Etapa de composição: A Crítica da Redação ------------------------------------------------- 13
MATEUS -------------------------------------------------------------------------------------------- 15
MARCOS -------------------------------------------------------------------------------------------- 19
LUCAS ----------------------------------------------------------------------------------------------- 23
JOÃO ------------------------------------------------------------------------------------------------- 32
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ----------------------------------------------------------- 36
Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 2

TEOLOGIA DO NT – SINÓTICOS E JOÃO1

CONTEXTO HISTÓRICO 2 E COMPOSIÇÃO DO NOVO TESTAMENTO

O mundo neotestamentário era ativo e estimulante. Todos os caminhos levavam a Roma,


os Césares dominavam a maior parte do mundo habitado e, em uma pequena cidade da Palestina,
nasceu alguém que mudaria o mundo! Depois do período em que Cristo viveu nesta terra, surge a
igreja cristã, primeiramente como um grupo reduzido de homens e mulheres, e se expande,
passando a reunir grande multidão de pessoas. Os livros do Novo Testamento foram escritos para
instruir os cristãos de congregações locais e informá-los a respeito da vida e dos ensinos de
Cristo. No entanto, esses fatos não ocorreram repentinamente. Foram o resultado de uma
preparação realizada pelo próprio Deus: "... vindo, porém, a plenitude do tempo, Deus enviou
seu Filho" (Gl 4.4) ou seja ―a vinda de Cristo ao mundo foi perfeitamente programada‖3. Nos
anos que precederam a vinda de Cristo, o Senhor transmitia a sua palavra por intermédio de
homens que influenciaram a vida cotidiana dos povos do mundo de então. Muitos desses povos
tiveram um papel importante na era pré-cristã. Entre os três mais importantes estão os hebreus e
sua religião, os gregos e sua língua e os romanos e sua organização político-social.

A Preparação Hebraica

Escolhidos por Deus como "reino de sacerdotes e nação santa" (Ex 19.6), o povo de
Israel tinha uma posição privilegiada. Os hebreus deveriam ser os mensageiros do Senhor para as
nações a sua volta. No entanto, eles fracassaram! Por causa da contínua desobediência e do
degradante pecado da idolatria, o julgamento de Deus lhes sobreveio de forma derradeira. No
ano 587 a.C, Nabucodonosor levou o povo para o cativeiro na Babilônia.

Desse centro de escravidão, aos poucos eles foram espalhados pelo mundo antigo. Esse
evento importantíssimo, chamado Grande Dispersão, trouxe consequências sobre o povo hebreu.
No entanto, à medida que se dispersavam e aonde quer que fossem muitos deles deixaram claro
serem adoradores do único Deus verdadeiro: Jeová. Dois aspectos em particular — o

1
Material retirado de DUNNETT, Walter M. Panorama do Novo Testamento. São Paulo : Vida Nova, 2005. Com
adaptações.
2
Para maiores informações sobre o mundo do NT, os cinco primeiros capítulos de: TENNEY, Merril C. Tempos do
Novo Testamento: entendendo o mundo do primeiro século. Rio de Janeiro : CPAD, 2010.
3
BARNETT, John D. (ed). Conheça o Novo Testamento. [Guia do professor] V. 1. São José dos Campos : Cristã
Evangélica, 2014, p.7.

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 3

monoteísmo (crença em um único Deus) e a Lei de Deus — faziam com que o povo hebreu se
destacasse em meio às sociedades pagãs.

Nos anos seguintes o caminho já havia sido preparado para o nascimento de Cristo e para
que os apóstolos levassem adiante a sua pregação. As palavras, as ideias e a mensagem em si não
eram totalmente novas. As pessoas não apenas as tinham ouvido, como também já as tinham
lido. O Antigo Testamento hebraico foi traduzido para o grego, na cidade de Alexandria, no
Egito, entre 250 e 150 a.C. Como na época o grego era a língua usada, essa tradução, chamada
Septuaginta (que significa "os setenta"), possibilitou o ensino do Antigo Testamento a todos os
que sabiam ler.

Durante o segundo século a.C, surgiram entre os judeus as principais seitas (ou facções).
Quando lemos os livros históricos do Novo Testamento (os evangelhos e Atos), percebemos que,
constantemente, é feita menção dos fariseus e saduceus. Os primeiros formavam o grupo mais
numeroso e ―mais rígido do judaísmo, e seu nome derivava do verbo hebraico parash (‗separar‘),
caracterizando a sua estrita exclusividade‖4, composto predominantemente por estudiosos e
mestres do Antigo Testamento. Já os saduceus ―... representavam uma fração menor que a dos
fariseus, porém eram influentes por causa de sua posição‖5 - eram líderes políticos e autoridades,
incluindo os sacerdotes e os principais oficiais do Sinédrio em Jerusalém. Esse grupo era
constituído de setenta membros mais o sumo sacerdote.

A ortodoxia dos fariseus nos impressiona. Eles defendiam firmemente o caráter sagrado
de todo o Antigo Testamento, criam na ressurreição e no juízo do último dia e afirmavam existir
anjos e espíritos. Os saduceus, por sua vez, negavam essas doutrinas (At 23.6-8). No entanto,
geralmente era o primeiro grupo que recebia a desaprovação de Jesus, por meio de seus ensinos,
não por deixarem de manter sua ortodoxia, mas por enfatizarem aspectos menos importantes e
negligenciarem os princípios fundamentais da lei (Mt 23.23, 24).

O Templo

O primitivo templo Salomão foi destruído quando Jerusalém fora saqueada e incendiada
pelas tropas de Nabucodonosor em 586 a.C. O segundo templo construído durante a restauração
e mencionado por Ageu e Zacarias, profetas desse período, começou por 537 a.C. e foi acabado,
depois de muitos atrasos, em 516 a.C. (Ed 6.13-15). Herodes empreendeu a reconstrução desse
templo, no décimo ano de seu reinado (20-19 a.C.)

4
TENNNEY, op. cit., p. 105.
5
TENNEY, idem, p.109.

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O templo era o principal centro de culto de Jerusalém. Jesus, e, mais tarde, seus apóstolos
ensinavam e pregavam dentro de seus átrios. Tão tardiamente como em 56 d.C., a igreja de
Jerusalém ainda tinha homens que faziam votos no templo (At 21.23-26), e que estavam
intimamente ligados às suas ordenanças legais. Só com o crescimento das igrejas gentílicas
cessou a ligação do templo com o cristianismo.6

As sinagogas

A perda temporária do templo, durante o exílio deu azo a um crescente estudo e


observância da lei (a Torá), do Antigo Testamento, e ao estabelecimento das sinagogas como
uma instituição. A sinagoga era mais do que um mero centro de adoração religiosa a cada
sábado. Durante os dias úteis da semana ela se tornava em centro de administração de justiça, de
reuniões políticas, de serviços fúnebres, de educação de jovens judeus, e de estudos do Antigo
Testamento.7

A Preparação Grega

Uma língua e um mundo! Essa era a ambição do jovem Alexandre, filho do rei Filipe da
Macedônia, mais de trezentos anos antes do nascimento de Cristo. Ele conseguiu realizar muitos
de seus planos entre os anos 334 e 323 a.C. Invadindo o mundo antigo como um relâmpago que
cruza o céu, Alexandre logo conquistou grande parte dos territórios povoados. Para fundamentar
suas vitórias, estabeleceu o idioma grego como a língua franca, o idioma comum, e a cultura
grega como o padrão para o pensamento e a conduta de vida. Após sua morte prematura, seu
vasto império se desintegrou rapidamente, mas os resultados de suas conquistas perduraram por
bastante tempo.

Qual a relação desses acontecimentos do terceiro século com o advento do cristianismo e


do Novo Testamento? Eles ofereceram um meio de expressão sem paralelos para a mensagem
cristã. Os apóstolos pregavam basicamente em grego, e os autores do Novo Testamento usaram
essa língua para registrar seus escritos, pois, na época, esse era o idioma comum do mundo.
Usando o vocabulário vigente em seus dias, aqueles autores acrescentaram significado novo às
palavras, de maneira a transmitir a mensagem de vida espiritual para seus leitores. Como

6
TENNEY, Merril C.; DUNNETT, Walter M. O Novo Testamento sua origem e análise. São Paulo : Shedd,
2008, p. 99, 100.
7
GUNDRY, Robert H. Panorama do Novo Testamento. 2. ed. São Paulo : Vida nova, 1999, p. 43, 46.

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exemplo, podemos citar termos importantes, como Cristo, redimir, resgate, igreja, sabedoria e
palavra.

A Preparação Romana

Acima de tudo, Roma se destacava por seu apego à lei e à ordem. O mundo conhecido
fora transformado num vasto império, estendendo-se desde a porção ocidental do mar
Mediterrâneo até o rio Eufrates, no Oriente Próximo. Esse amplo território era administrado de
maneira eficiente por meio de províncias e distritos, e supervisionado de perto por governadores.

Pela providência divina e sob vários aspectos, os romanos prepararam o mundo para a
chegada do cristianismo.

Primeiro, a ênfase na lei e na ordem, apoiada por um poderio militar superior, trouxe paz
durante o reinado de César Augusto. Foi nessa época, como diz Lucas, o historiador, que Maria
deu à luz seu primeiro filho (Le 2.1-7), no vilarejo de Belém, província romana da Judéia.

Em segundo lugar, o sistema viário romano contribuiu grandemente para tornar as


viagens mais fáceis e seguras por todo o império. As estradas eram bem pavimentadas, possuíam
boa drenagem e, geralmente, eram patrulhadas por soldados. Paulo utilizou estradas importantes
como a Via Ignácia, que cruzava a Acaia e a Macedônia, e a Via Ápia, que levava a Roma.

O terceiro fator importante, embora de caráter negativo, era a gritante degeneração da


moralidade e da religião e o profundo anelo por redenção que se percebia entre os povos da bacia
do Mediterrâneo. Eles haviam perdido a fé nos deuses da antiguidade. A religião estatal era
muito formal e rígida para satisfazer os desejos das pessoas. De maneira semelhante, as correntes
filosóficas daqueles dias careciam de um vigor genuíno e fracassavam em despertar o interesse
dos cidadãos comuns. Tanto no Leste como no Oeste, surgiram as chamadas "religiões de
mistério", na tentativa de oferecer salvação pessoal, comunhão com os deuses e rituais secretos.

Nesse cenário, surgiu o cristianismo proclamando salvação, perdão e paz. Enfocando a


vida, a morte e a ressurreição de Jesus Cristo, o cristianismo apresentava a resposta para a
necessidade espiritual e para o vazio moral da humanidade.

A Palestina no Primeiro Século

A principal família a governar a Palestina foi a dinastia herodiana, nos anos do despontar
da era cristã. Os romanos escolheram Herodes, o Grande, como rei dos judeus, e ele governou de

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37 a 4 a.C. Seu reinado foi marcado por intrigas e derramamento de sangue, incluindo o
incidente da matança dos bebês, registrado em Mateus 2.

Dos filhos de Herodes, o que mais é mencionado nos evangelhos é Herodes Antipas, que
governou de 4 a.C. a 39 d.C. como tetrarca da Galileia e da Peréia. Foi esse Herodes que João
Batista acusou de ter se casado irregularmente com sua cunhada, Herodias. Essa acusação custou
a vida do profeta (Mt 14.1-12). Jesus se referiu a Herodes como "essa raposa" (Le 13.32), e foi
ele quem tomou parte no julgamento de Cristo em Jerusalém (Le 23.7-12).

Herodes Agripa I, filho de Aristóbulo e neto de Herodes, o Grande, sucedeu Antipas e


governou sobre a Galileia, Samaria e Judéia. Seu reinado, de 34 a 44 d.C, foi abreviado por sua
morte repentina. O capítulo 12 de Atos registra que ele mandou assassinar Tiago, filho de
Zebedeu, e ordenou o encarceramento de Pedro. O capítulo traz, também, a descrição da morte
desse rei (v. 21-23).

O último membro da família a reinar foi Herodes Agripa II (50-100 d.C). O seu nome é
mencionado nos capítulos 25 e 26 de Atos, ao longo da narrativa do julgamento de Paulo perante
Festo, em Cesareia. Juntamente com Festo, Herodes Agripa II pronunciou um veredicto de
absolvição de Paulo (26.31, 32).

No que diz respeito aos registros neotestamentários, a figura que mais se destacou entre
os procuradores romanos da Judéia no primeiro século foi Pôncio Pilatos (26-36 d.C). Por causa
de sua participação no julgamento de Cristo, e por condená-lo, embora repetidas vezes o tenha
considerado inocente (Jo 18.38—19.6), Pilatos alcançou incomum notoriedade na história.
Pouco tempo depois da morte de Cristo, Pilatos foi deposto por Tibério, por haver ordenado um
ataque aos samaritanos, e recebeu ordens de comparecer diante do imperador (36 d.C). Não
sabemos exatamente o que aconteceu a Pilatos depois desse encontro.

Em meio a essas circunstâncias políticas, os judeus eram governados pelo próprio sumo
sacerdote e sua coorte no grande Sinédrio em Jerusalém8. Três sumos sacerdotes são
mencionados no Novo Testamento. Anás, o sumo sacerdote emérito, era sogro de Caifás, o sumo

8
Sinédrio significa assembleia. O Sinédrio era uma assembleia religiosa judaica do tempo de Jesus. Os membros do
Sinédrio governavam e julgavam o povo judeu de acordo com a Lei de Moisés e as tradições judaicas. Jesus foi
julgado pelo Sinédrio antes de ser crucificado.
O Sinédrio era composto por 71 líderes importantes na sociedade, que conheciam as leis judaicas. Eles se reuniam
em Jerusalém para tomar decisões e julgar crimes religiosos. O chefe do Sinédrio era o sumo-sacerdote, o líder de
todos os sacerdotes do templo.
No tempo de Jesus, os judeus viviam debaixo do domínio romano. Além das leis do império romano, os judeus
obedeciam às leis de Moisés, que estão no Velho Testamento, e às regras da tradição. O Sinédrio apenas julgava os
crimes contra as leis judaicas. Disponível em: https://www.respostas.com.br/o-que-significa-sinedrio/. Acesso em:
28-03-2019.

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 7

sacerdote atuante na época do julgamento de Cristo (Jo 18.13). Ananias é mencionado em Atos
23.2.

A vida religiosa dos judeus girava em torno do templo em Jerusalém. Essa estrutura,
chamada "templo de Herodes", estava sendo concluída nos dias em que Cristo viveu (v. Jo 2.20).
Os outros edifícios anteriores foram os templos de Salomão e de Zorobabel, e eram o símbolo da
esperança e das aspirações religiosas do povo. De longe e de perto as pessoas vinham para
adorar, oferecer sacrifícios e observar as festas religiosas dos judeus, principalmente a Páscoa, o
Pentecostes e a Festa dos Tabernáculos.

Paralelamente com a vida religiosa no templo, estava a sinagoga. Esta era um substituto
do templo, sobretudo para todos os que moravam distante de Jerusalém. Havia várias delas, até
mesmo na cidade santa. Elas eram, primeiramente, lugares para ensino e oração frequentados por
judeus e prosélitos gentios. Ali, as Escrituras eram lidas, comentava-se sobre as passagens e,
durante vários momentos do culto, faziam-se orações. Tanto Jesus como os cristãos primitivos
frequentavam a sinagoga (Le 4.16-30; At 13.14ss; 26.11).

Para o judeu, o Antigo Testamento era o livro de Deus. Deus é único, a Lei é a revelação
de sua vontade e ele controla toda a vida. Nesse tempo, predominava a atmosfera de expectativa
de que Deus interviria e salvaria seu povo (Le 2.25). Isso aconteceu com o nascimento de Cristo.
Ele veio a um mundo preparado — na "plenitude do tempo". O Novo Testamento complementa
o Antigo, dá-lhe sequência e completa o registro da revelação divina, esclarecendo para judeus,
gentios e a igreja as verdades eternas do Deus vivo.

A Composição do Novo Testamento

O Novo Testamento contém vinte e sete livros. Podemos classificá-los em três grupos
principais, com base em suas características literárias.

Divisão cronológica

Muitos estudiosos afirmam que Tiago é o livro mais antigo do Novo Testamento, tendo
sido registrado por volta de 45 d.C.9 A despeito da questão da data de registro de Tiago, é
praticamente certo que algumas cartas de Paulo representam os primeiros registros escritos da
igreja primitiva. Alguns afirmam que a carta aos gálatas foi redigida em 47/48 d.C. As epístolas
9
Outros datam a epístola como posterior, por volta de 62 d.C. Se a primeira data estiver correta, o período constituiu
um lapso de apenas quinze anos depois da morte de Cristo.

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aos tessalonicenses datam do início do ministério missionário de Paulo, registradas em Corinto


antes ou durante a época de Gálio (v. At 18.12-17; 1 Ts 3.1-10), o que significaria 50 ou 51 d.C.
Esses escritos mais antigos nos oferecem uma perspectiva "dos bastidores" do caráter da
mensagem cristã e dos próprios crentes. Nesse aspecto, passagens tais como Gálatas 1.6-2.21;
6.11-17; 1 Tessalonicenses 1.2-10; 2.13-16 e 2Tessalonicenses 2.1-12; 3.6-15 são de especial
importância.

Em contraste com esses escritos, os escritos dos apóstolos João foram os últimos a serem
registrados. De acordo com a tradição, e por indícios encontrados nos próprios livros, as obras de
João fazem menção a problemas enfrentados pela igreja, próximo ao fim do primeiro século.
Seus principais escritos lidam basicamente com a doutrina da salvação. O evangelho de João
trata da natureza da salvação; sua primeira epístola discorre sobre a segurança da salvação; e
Apocalipse revela a consumação da salvação.

Divisão literária

Embora as divisões literárias do Novo Testamento não sigam a ordem cronológica, elas
refletem a sequência lógica do plano de Deus. Primeiro, os evangelhos e Atos constituem a base
histórica necessária à compreensão e apreciação devida dos escritos posteriores. Nesse sentido,
os relatos da vida de Cristo e da origem da igreja são essenciais. Precisamos conhecer a história
de seu fundador antes de analisar a superestrutura que para ela foi estabelecida. A igreja foi
"[edificada] sobre o fundamento dos apóstolos e profetas, sendo ele mesmo, Cristo Jesus, a pedra
angular" (Ef 2.20).

Mateus — Apresenta "Jesus Cristo, Rei dos judeus". Esse livro registra o cumprimento de
muitas profecias veterotestamentárias por meio da chegada do Messias. Enfatiza o ensino de
Cristo.

Marcos — Apresenta Jesus como "o Servo do Senhor". Ele aparece realizando a obra do Pai;
Marcos enfatiza principalmente a obra redentora de Cristo.

Lucas — Descreve Jesus como o "Filho do homem", o representante perfeito da humanidade.


Ele deu a vida para "buscar e salvar o perdido" (19.10). Esse evangelho enfatiza o amor e a graça
de Cristo.

João — Apresenta Jesus como o "Filho de Deus", a Palavra eterna que veio revelar o Criador à
humanidade. Esse evangelho enfatiza a relação de Cristo com as pessoas ao seu redor, o contato

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que mudou a vida daqueles que o conheceram. Por acreditarem verdadeiramente que Jesus é
Filho de Deus, as pessoas recebiam a vida eterna.

Atos — É a continuação do evangelho de Lucas e apresenta o Cristo ressuscitado operando por


intermédio de seus apóstolos, que receberam o poder do Espírito Santo. A origem da igreja, o
corpo de Cristo, e sua expansão até "aos confins da terra", é o tema desse primeiro relato
histórico-eclesiástico.

As epístolas do Novo Testamento apresentam a interpretação da pessoa e da obra de


Cristo e aplicam seus ensinamentos à vida dos crentes.

Harmonia do ministério de Jesus

Evangelho Período de Período do ministério público Período de Período de


preparação sofrimento triunfo
Início Término

Mateus 1.1 - 4.16 4.17 - 16.20 16.21 - 26.2 26.3 - 27.66 28.1-20

Marcos 1.1 - 13 1.14 - 8.30 8.31 - 13.37 14.1 - 15.47 16.1-20

Lucas 1.1 - 4.13 4.14 - 9.21 9.22 - 21.38 22.1 - 23.56 24.1-53

João 1.1 - 34 1.35 - 6.71 7.1 - 12.50 13.1 - 19.42 20.1 - 21.25

A maioria dessas epístolas, pelo menos treze delas, é da autoria do apóstolo Paulo.
Muitas delas foram redigidas em forma de carta. Das vinte e uma, todas trazem o nome do autor,
exceto a remetida aos hebreus e as três epístolas de João.

Nove dos escritos paulinos foram enviados a igrejas e quatro foram endereçados a
pessoas em particular. A maioria deles trata de problemas existentes nas igrejas (Efésios é uma
exceção). Alguns apresentam um tom bastante pessoal (Filipenses e 2 Coríntios); outros
aparentara ser mais formais, quase como uma tese científica, e em suas divisões principais
(excluindo-se a introdução pessoal e a conclusão) trazem um tom bastante impessoal. Romanos
provavelmente é o exemplo mais notável. Além disso, as cartas de Paulo apresentam uma grande
variedade de conteúdo e fazem um excelente equilíbrio entre assuntos doutrinários e práticos.

As epístolas remanescentes, embora procedentes de vários autores, podem ser


convenientemente agrupadas sob duas categorias principais. Algumas lidam sobretudo com o
sofrimento (Hebreus, Tiago e 1 Pedro), enquanto o restante trata dos falsos ensinos (2 Pedro, 1, 2

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 10

e 3 João e Judas). Esses dois problemas se tornavam cada vez mais sérios a medida que o
primeiro século se desenrolava. Primeiramente, a perseguição veio por parte dos oponentes
judeus e, mais tarde, pelo governo romano (depois de 64 d.C). Jesus 'havia advertido seus
seguidores com relação ao surgimento de falsos cristos e de falsos profetas (Mt 24.24), e Paulo
disse basicamente o mesmo para os presbíteros efésios (At 20.29, 30). Na época em que João
escreveu suas cartas, os gnósticos (mestres que afirmavam possuir um conhecimento filosófico-
religioso superior) eram como uma praga no meio da igreja. As epístolas de João foram uma
resposta para aquele erro doutrinário.

Por último, há o conhecido escrito profético do Novo Testamento, Apocalipse (do grego
"revelação", "desvelar") de Jesus Cristo. Como a profecia de Daniel no Antigo Testamento, esse
livro lida em grande parte com o julgamento de Deus nos últimos dias sobre "os que habitam na
terra". Em Apocalipse, percebemos a descrição do clímax da redenção. Nas palavras de Paulo, o
propósito de Deus era de "fazer convergir nele [...] todas as coisas" (Ef 1.10). Isso se cumpriu.
João disse: "O reino do mundo se tornou de nosso Senhor e do seu Cristo, e ele reinará pelos
séculos dos séculos" (Ap 11.15). E assim o Novo Testamento chegou até nós. "Havendo Deus,
outrora, falado, muitas vezes e de multas maneiras, aos pais, pelos profetas, nestes últimos dias,
nos falou pelo Filho" (Hb 1.1, 2).

OS EVANGELHOS SINÓTICOS

Os três primeiros evangelhos foram pela primeira vez chamados ―evangelhos sinóticos‖
por J. J. Griesbach, um estudioso da Bíblia de nacionalidade alemã, no final do século XVIII. O
adjetivo ―sinótico‖ vem do grego synopsis, que significa ―ver em conjunto‖. Griesbach escolheu
a palavra devido ao alto grau de semelhanças entre Mateus, Marcos e Lucas em suas
apresentações do ministério de Jesus. Essas semelhanças, que envolvem estrutura, conteúdo e
enfoque, são visíveis mesmo ao leitor desatento. Elas servem não apenas para unir os três
primeiros evangelhos, mas também para separá-los do evangelho de João.

A primeira pergunta que se nos apresenta, antes de começar o estudo dos Evangelhos é
esta: por que há quatro Evangelhos? Por que não são dois, três ou apenas um? Isto pode ser
explicado facilmente, pelo fato de ter havido, nos tempos apostólicos, quatro classes
representativas do povo – judeus, romanos, gregos e um corpo tomado das três classes – a Igreja.
Cada um dos evangelistas escreveu para uma dessas classes, adaptando-se ao seu caráter, às suas
necessidades e ideais.

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 11

Mateus, sabendo que os judeus aguardavam ansiosos a vinda do Messias prometido no


Antigo Testamento, apresenta Jesus como o Messias. Lucas, escrevendo para um povo culto, os
gregos, cujo ideal era o homem perfeito, fez com que o seu livro focalizasse a pessoa de Cristo
como a expressão desse ideal. Marcos escreveu aos romanos, um povo cujo ideal era o poder e o
serviço, e ele descreveu Cristo como o Conquistador Poderoso. João tinha em mente as
necessidades dos cristãos de todas as nações e assim apresenta as verdades mais profundas do
Evangelho, entre as quais, mencionamos os ensinos acerca da divindade de Cristo e do Espírito
Santo. O referido princípio de adaptação foi mencionado por Paulo em 1 Coríntios 9.19-21, e foi
ilustrado em seu ministério entre os judeus e gentios aos gregos em 17:22-31). Esta adaptação é
uma nítida indicação de um desígnio divino nos quatro Evangelhos.

Quanto a isto, devemos lembrar-nos de que a mensagem dos Evangelhos se dirige à


humanidade em geral, sendo os homens os mesmos em todas as épocas.

Os fatos anteriores revelam mais uma razão para a existência de quatro Evangelhos, a
saber: um Evangelho só não teria sido suficiente para apresentar os vários aspectos da
personalidade de Cristo. Cada um dos evangelistas o vê sob um aspecto diferente. Mateus
apresenta-o como Rei, Marcos como Conquistador e Servo, Lucas como o Filho do Homem e
João como o Filho de Deus. Esta visão de Cristo é como a visão de um grande edifício – só um
lado pode ser visto de cada vez.

Os primeiros três Evangelhos são chamados sinóticos, porque fornecem uma ―sinopse‖
(vista geral) dos mesmos acontecimentos e têm um plano comum. O Evangelho de João foi
escrito em base inteiramente diferente dos outros três.

Os pontos de diferença entre os Sinóticos e o Evangelho de João são os seguintes:

1. Os Sinóticos contêm uma mensagem evangélica para os homens não espirituais; o de


João contém uma mensagem espiritual para os cristãos.

2. Nos três vemos o seu ministério na Galileia, mas no quarto vemos, de modo especial,
o seu ministério na Judéia.

3. Nos três sobressai mais a sua vida pública, ao passo que no quarto é revelada a sua
vida particular.

4. Nos três impressiona a sua humanidade real e perfeita; no quarto, sua divindade
impressionante e verdadeira.

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 12

A etapa de tradições orais: a crítica da forma

No curso da investigação das origens dos evangelhos, surgiram ao longo dos últimos 200
anos vários enfoques, diversos e distintos, cada um deles enfatizando aspectos ou etapas
diferentes do problema. Em particular, três enfoques deram contribuições distintas e relevantes
para o problema das origens e desenvolvimento dos evangelhos: a crítica da forma
(Formgeschichte), que concentra a atenção no período de transmissão oral; a crítica das fontes,
que focaliza a maneira como unidades literárias diferentes foram reunidas para constituir os
evangelhos; e a crítica da redação (Redaktionsgeschichte), que focaliza as contribuições literárias
e teológicas dos autores dos evangelhos. Esses métodos correspondem, de modo geral, às três
etapas que Lucas menciona em sua introdução. Eles, contudo, não são mutuamente exclusivos;
na atualidade, a maioria dos críticos emprega simultaneamente todos os três no que se
convencionou chamar de análise da tradição ou crítica da tradição (Traditionsgeschichte).

Principiamos com a crítica da forma porque, embora surgida somente depois do auge da
crítica das fontes, ela se concentra na etapa mais remota do processo de formação dos
evangelhos: a etapa oral. Esse foi o período anterior à existência de quaisquer relatos escritos de
maior importância sobre a vida e o ensino de Jesus, período durante o qual foram transmitidas
oralmente as informações que formaram nossos evangelhos.

A etapa de fontes escritas: a crítica das fontes (o problema sinótico)

A crítica das fontes dedica-se à investigação dessa etapa escrita na produção dos
evangelhos. Ela faz e procura responder a seguinte pergunta: Que fontes escritas, se é que houve,
os evangelistas empregaram na compilação de seus evangelhos?

Parágrafos Mateus Marcos Lucas

Jesus e Belzebu 12.22-37 3.20-30 11.14-28


O Sinal de Jonas 12.38-45 - 11.29-32
A Mãe e os Irmãos de Jesus 12.46-50 3.31-35 8.19-21
Parábola do Semeador 13.1-9 4.1-9 8.4-8
A Razão das Parábolas 13.10-17 4.10-12 8.9-10
Interpretação da Parábola do Semeador 13.18-23 4.13-20 8.11-15
Parábola do Joio 13.24-30 - -
Lâmpada no Velador - 4.21-25 8.16-18

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 13

Parábola da Semente Que Cresce Misteriosamente - 4.26-29 -


Parábola do Grão de Mostarda 13.31-32 4.30-34 -
Parábola do Fermento 13.33 - -
Jesus Fala por Parábolas 13.34-35 - -
Interpretação da Parábola do Joio 13.36-43 - -
Parábola do Tesouro Escondido 13.44 - -
Parábola da Pérola 13.45-46 - -
Parábola da Rede 13.47-50 - -
O Pai de Família 13.51-52 - -
Jesus Acalma a Tempestade 8.18,23-27 4.35-41 8.22-25
A Cura do Endemoninhado Gadareno 8.28-34 5.1-20 8.26-39
Ressurreição da Filha de Jairo/Cura de uma mulher 9.18-26 5.21-43 8.40-56
Rejeição em Nazaré 13.53-58 6.1-6a 4.16-30
O Envio dos Doze 10.1-15 6.6b-13 9.1-6
Decapitação de João Batista 14.1-12 6.14-29 [9.,7-9]
A Multiplicação dos Pães 14.13-21 6.30-44 9.10-17
Caminhada sobre as Águas 14.22-36 6.45-56 -

A Etapa de composição: A Crítica da Redação

Descrição. A crítica da redação procura descrever os objetivos teológicos dos


evangelistas ao analisar a maneira como empregam suas fontes. É assim que, sem negar a
necessidade de os críticos da forma estudarem as tradições orais ou a necessidade de os críticos
das fontes investigarem as fontes escritas, os críticos da redação insistem em que se deve
reconhecer o devido papel dos evangelistas como autores: pessoas que, por mais dependentes
que fossem de fontes e tradições, com criatividade e propósitos moldaram essa tradição numa
unidade literária com teologia própria. O trabalho dos evangelistas não foi simplesmente reunir
tradições e fontes e então costurá-las lado a lado. Eles acrescentaram modificações próprias
àquelas tradições e, com isso, deram ênfases específicas à história da vida de Jesus. A crítica da
redação é, portanto, um método de estudo dos evangelhos e inclui cinco elementos básicos.

1. A crítica da redação faz distinção entre tradição e redação. Nesse sentido, ―tradição‖ é
tudo – desde longas fontes escritas até breves relatos e declarações transmitidos oralmente – que
o evangelista tinha diante de si ao escrever seu evangelho. ―Redação‖ refere-se ao processo de
modificar tal tradição à medida que o evangelho era de fato escrito.

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 14

a) Os dados que escolheram incluir e excluir. Isso indica que Mateus tinha um grande
interesse em informar à igreja de sua época sobre o relacionamento de Jesus com a lei, ao passo
que Lucas não tinha tal interesse.

b) Disposição dos dados. Com base na tabela acima, pode-se ver que Mateus diverge de
Marcos e Lucas na colocação de três relatos significativos de milagres: a tempestade aquietada
(8.18, 23-27), a curado do(s) endemoninhado(s) gadareno(s) (8.28-34) e as duas histórias
entremeadas da ressurreição da filha de Jairo e da cura da mulher com hemorragia (9.18-26).
Visto que Marcos provavelmente é para Mateus a principal fonte acerca desses acontecimentos,
é evidente que Mateus escolheu colocá-los numa sequência diferente.

c) As “costuras” que o evangelista utiliza para juntar suas tradições. Essas transições,
ou costuras, frequentemente revelam preocupações importantes do autor. Mateus, por exemplo,
alterna ensinos e narrativas de modo muito eficaz e assinala a transição ao final de sermões com
uma fórmula repetida: ―Quando Jesus acabou de proferir estas palavras‖ (7.28, 19.1; veja
também 11.1; 13.53; 26.1).

d) Acréscimos aos dados. No relato que apresenta sobre o ministério de cura de Jesus e
sobre a chamada dos Doze (6.12-19), que parece depender de Marcos 2.7-18, Lucas menciona o
fato, não registrado em Marcos, de que Jesus ―retirou-se para o monte a fim de orar, e passou a
noite orando a Deus‘ (6.12). Aqui encontramos talvez indícios de uma preocupação lucana.

Avaliação. Popularidade não é garantida de que algo seja certo. Como acontece com
qualquer outro método, devemos proceder a um exame crítico da crítica da redação antes de
endossá-la como método de estudo dos evangelhos. Começamos com cinco críticas à disciplina.

1. Para ser válida, a crítica da redação depende de nossa capacidade de fazer distinção
entre tradição e redação.

2. Muitas vezes, os críticos da redação pressupõem que todas as modificações que um


evangelista faz em sua tradição têm motivação teológica.

3. Às vezes, os críticos da redação equiparam as ―ênfases redacionais‖ à teologia do


evangelista. O que se identifica como redação mostra-nos aquilo que, num evangelho específico,
se distingue de suas fontes ou dos outros evangelhos.

4. A identificação do contexto de um evangelho em particular, tomando-se por base a


teologia do autor, é frequentemente bem mais específica do que as informações possam tolerar.

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 15

5. Frequentemente, a crítica da redação é praticada de um modo que questiona a


fidedignidade histórica das informações dos evangelhos. O problema não se restringe tanto ao
fato de que a crítica da redação procura demonstrar a natureza não histórica das modificações
introduzidas pelos evangelistas, mas que muitos críticos da redação pressupõem que os
evangelistas não teriam tido praticamente nenhuma preocupação com a fidedignidade histórica.

MATEUS

O tema central deste Evangelho é Jesus, o Rei Messias. Mateus, escrevendo aos judeus e
conhecendo as suas grandes esperanças, apresenta Jesus como o único que cumpre as Escrituras
do Antigo Testamento com relação ao Messias. Por meio de numerosas citações do Antigo
Testamento ele mostra o que o Messias deve ser. Expõe o reino dos céus prometido no Antigo
Testamento (11:13), proclamado por João Batista e Jesus (3:2; 4:17), representado agora pela
Igreja (16:18, 19), e triunfante na Segunda vinda de Jesus (25:31, 34).

Autor. Uma tradição digna de confiança atribui a Mateus a autoria deste livro. E foi
escrito para toda a humanidade em geral, mas para os judeus em particular. A intenção de dirigir-
se primeiramente ao judeu, vê-se pelos seguintes fatos:

1. O grande número de citações do Antigo Testamento – há cerca de 60 dessas. Alguém


que prega aos judeus deve provar a sua doutrina pelas Escrituras antigas. Mateus faz dessas
citações a verdadeira base do seu Evangelho.

2. As primeiras palavras do livro ―Livro da genealogia de Jesus Cristo, filho de Davi,


filho de Abraão‖, sugerem imediatamente ao judeu os dois pactos que contêm promessas do
Messias – o davídico e o abraânico (2 Samuel 7:8-16; Gênesis 12:1-3).

3. A ausência geral de explicações dos costumes judaicos demonstra que o evangelista


escreveu a um povo familiarizado com esses costumes.

Conteúdo

I. A vinda do Messias (1:1–4:11).

II. O ministério do Messias (4:12 – 16:12).

III. A reivindicação do Messias (16.13 – 23:39).

IV. O sacrifício do Messias (caps. 24 – 27).

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 16

V. O triunfo do Messias (cap.. 28).

I. A Vinda do Messias (1:1 – 4:11)

1. Genealogia (1:1-17).

2. Nascimento (1:18-25).

3. Os magos (2:1-12).

4. A fuga para o Egito e o regresso (2:13-32).

5. O batismo de Jesus (cap. 3).

6. A tentação de Jesus (4:1-11).

II. O Ministério do Messias (4:12 – 16:12)

1. Ponto de partida do ministério; primeiros discípulos; primeiras obras (4:12-25).

2. As leis do reino do Messias – O Sermão do Monte (caps. 5–7)

3. O poder do Messias manifestado sobre a enfermidade, a natureza, os demônios e a


morte (8:1 – 9:35).

4. A missão dos doze apóstolos (9:36–11:1).

5. A pergunta de João Batista (11:2-30).

6. Oposição dos fariseus (12:1-45).

7. Ensino por parábolas (cap. 13).

8. A oposição de Herodes; a alimentação de 5.000 (cap. 14).

9. A oposição dos líderes da Judéia e Galileia (15:1–16:12).

Podemos considerar os seus milagres como símbolos do seu poder salvador.

1. Seu poder sobre as enfermidades simbolizava o seu poder sobre o pecado.

2. Seu poder sobre os demônios era um símbolo da queda completa do reino de Satanás.

3. Seu poder sobre a morte revela-o como aquele que vivificará todos os mortos.

4. Seu poder sobre a natureza demonstra como ele libertará o mundo da maldição.

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 17

III. A Reivindicação do Messias (16.13–23:39)

1. Sua declaração aos discípulos (16:13–20:28).

2. Sua declaração à nação (20:29–23:39).

Até aqui Jesus não tem correspondido ao ideal do povo acerca do Messias, pois, em vez
de proclamar um reino temporal, proclamou um reino espiritual. E, embora o povo não o tenha
aceito como Messias, contudo considerou-o como um grande profeta (16.13).

As reivindicações de Jesus foram rejeitadas pela nação representada pelos chefes (21:15,
23, 32, 45, 46; 22:15-40). Depois disso predisse, em parábolas, a rejeição da nação judaica por
Deus e a recepção dos gentios por ele (as parábolas dos lavradores maus e das bodas). O capítulo
23 marca a ruptura final de Jesus com os chefes religiosos, e sua lamentação sobre Jerusalém.

IV. O Sacrifício do Messias (caps. 24–27)

1. Discurso referente à Segunda vinda de Cristo (24:1-41).

2. Os juízos que se realizarão ao tempo da segunda vinda (21:42 – 25:46).

3. A traição, a prisão e o julgamento de Jesus (cap. 26).

4. A crucificação (cap. 27).

A profecia de Isaías concernente ao Messias sofredor (Isaías 53) encontra o seu


cumprimento nos capítulos 26 e 27.

V. O Triunfo do Messias (cap. 28)

O Evangelho de Mateus chega a uma feliz consumação na ressurreição do Messias dentre


os mortos. Todo o poder lhe é dado no céu e na terra; por este motivo tem o poder de enviar os
seus seguidores por todo o mundo com a mensagem da salvação.

Contribuições de Mateus

Devido aos fortes vínculos entre os evangelhos sinóticos, a contribuição feita por um
deve ser avaliada à luz da contribuição feita por todos os três. Se Mateus desaparecesse
repentinamente, grande parte de seu conteúdo ainda seria encontrada, mais ou menos intacto, em

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 18

Marcos e Lucas. Nesse sentido não se pode dizer que Mateus ofereça o mesmo tipo de
contribuição independente que, por exemplo, Hebreus ou Apocalipse fazem.

Mas os evangelhos sinóticos como um todo proporciona uma contribuição insubstituível.


Ao lado de João, eles constituem o testemunho basilar acerca da pessoa, ministério, ensino,
paixão e ressurreição de Jesus, o Messias.

1. Mateus preserva, nos discursos já enumerados, os grandes blocos de ensinos de Jesus.


É indubitável que esse foi um dos principais motivos para esse evangelho ser tão popular na
igreja primitiva. Qualquer que tenha sido o modo como vieram a ser preservado dessa forma, não
pode haver sombra de dúvida de que a igreja estaria grandemente empobrecida sem o Sermão da
montanha, a lista de parábolas registradas por Mateus, sua versão do discurso escatológico, e
assim por diante.

2. Mateus complementa os outros evangelhos, particularmente Lucas, ao oferecer um


relato alternativo da concepção virginal de Jesus, apresentado a partir da perspectiva de José.
Com exceção dos acontecimentos da narrativa do nascimento dos quais não há outro registro
(e.g., a visita dos magos, a fuga para o Egito), todo o relato tem fortes vínculos com a revelação
anterior encontrada naquilo que agora chamamos de Antigo Testamento.

3. Num sentido mais geral, o uso que Mateus faz do Antigo Testamento é particularmente
rico e complexo. A peculiaridade que mais salta à vista é o número de citações do Antigo
Testamento (entre 10 a 14, de acordo com diferentes estimativas) encontradas apenas em Mateus
e introduzidas com uma fórmula de cumprimento caracterizada por uma forma passiva de
(―cumprir‖).

4. Da mesma forma, o tratamento dispensado por Mateus à lei é especialmente sugestivo.


Embora muitos pensem que Mateus interiorize a lei, radicalize-a, subordine-a ao mandamento do
amor, torne absolutas apenas suas dimensões morais ou trate-a (ao estilo paulino) como um
preceptor que conduz as pessoas a Cristo, é melhor utilizar a própria classificação de Mateus:
Jesus vem para ―cumprir‖ a lei (5.17). Da forma como Mateus o usa, o verbo pressupõe que
mesmo a própria lei desempenha uma função teológica e profética.

5. O evangelho de Mateus serve de base não apenas quando se olha atrás para as
Escrituras da antiga aliança, mas também quando se olha adiante para aquilo que a igreja veio a
ser. Os debates posteriores sobre o relacionamento entre Israel e a igreja têm grande parte da sua
gênese em Mateus, João, Romanos e Hebreus. No que diz respeito a Mateus, boa parte desse
debate tem focalizado o tratamento que ele dispensa aos líderes judeus.

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 19

6. Por fim, no retrato que Mateus pinta de Jesus – retrato que certamente é o âmago de
seu evangelho – existem nuanças que lhes são exclusivas. Nesse aspecto é importante tornar a
dizer que grande parte daquilo que é central no pensamento de Mateus não é exclusivo de
Mateus: não é apenas em Mateus que Jesus é o Cristo, o Filho de Davi, o Filho de Deus, o Filho
do Homem, o Servo do Senhor, e assim por diante. Ele também pode fazê-lo ao introduzir títulos
que os outros evangelistas não mencionam, como quando ele insiste em que Jesus é Emanuel,
―Deus conosco‖(1.23).

MARCOS

Escrito para um povo militar (os romanos), o Evangelho de Marcos fornece uma breve
narrativa da campanha de três anos do Capitão de nossa salvação, dirigida e terminada em prol
da libertação de nossas almas e a derrota de Satanás, pelas obras de Cristo e seus sofrimentos,
morte, ressurreição e triunfo final. Nesta narrativa Jesus é apresentado como o Conquistador
poderoso.

Autor. Marcos era filho de Maria, uma mulher de Jerusalém, cuja casa estava aberta para
os cristãos primitivos (Atos 12:12). Ele acompanhou Paulo e Barnabé na sua primeira viagem
missionária. A expectação dos perigos que ameaçavam este pequeno grupo ao viajar pelas
regiões desconhecidas, parece tê-lo enfraquecido de tal maneira que voltou a Jerusalém (Atos
13:13). Mais tarde, a proposta de Barnabé de levá-lo consigo na segunda viagem provocou uma
contenda entre ele e Paulo. O apóstolo, considerando a questão sob o ponto de vista do bom
senso, pensou que fosse melhor não levar com eles um que tinha sido ―desertor‖. Barnabé, cheio
de compaixão pensou que Marcos deveria ter uma oportunidade de justificar-se a si mesmo e
assim se separou de Paulo, levando consigo Marcos para Chipre (Atos 15:36-41). João Marcos
justificou a confiança de Barnabé, porque relatos posteriores demonstram que foi bem sucedido
no ministério. Pedro mencionou-o favoravelmente (1 Pedro 5:13) e Paulo modificou a sua
opinião a respeito dele até ao ponto de escrever: ―Toma contigo a Marcos e traze-o, pois me é
útil para o ministério‖ (2 Timóteo 4:11).

O testemunho abundante dos chamados Pais da Igreja torna bastante claro que Marcos
acompanhou Pedro a Roma como seu intérprete e que compilou este Evangelho, aproveitando as
pregações de Pedro. Seu nome romano – Marcos – parece indicar que foi educado nos círculos
romanos. Estes fatos tornaram-no particularmente ideal para escrever um Evangelho aos
romanos.

Os seguintes fatos indicam que este Evangelho é particularmente adaptado aos romanos.
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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 20

1. O estilo resumido do Evangelho, a descrição viva de cenas animadas e movimentadas


revelam que é peculiarmente destinado a um povo tão ativo e enérgico como eram os romanos. A
característica principal deste livro é a repetição constante das palavras ―logo‖ ou
―imediatamente‖ e ―em seguida‖, proporcionando a ideia de atividades e prontidão militar. Um
escritor disse que o estilo de Marcos se parece com o usado por Júlio César na história de
algumas das suas campanhas.

2. O dinheiro é mencionado em moeda romana.

3. Emprega-se a divisão do tempo dos romanos.

4. Explicam-se os costumes hebraicos (7:3,4). Isto demonstra, pelo menos, que o livro foi
escrito para os gentios.

5. Praticamente não há referências às profecias do Antigo Testamento depois do capítulo


1. Os romanos, que não estivessem familiarizados com essas Escrituras, mui provavelmente não
as teriam compreendido.

Sendo que o Evangelho de Marcos contém a mesma matéria de Mateus (embora


diferentemente agrupada) não daremos um esboço extenso.

Tendo em mente o fato de que Marcos está descrevendo Cristo como o Conquistador
poderoso, percorramos todo o Evangelho para ver a realização deste pensamento.

Antes de tudo, Marcos descreve a vinda do grande Conquistador registrando:

1. Seu nome e sua proclamação (1:1-8).

2. Sua vitória inicial sobre Satanás (1:9-13).

3. A primeira proclamação de seu reino (1:14-20).

4. Suas primeiras obras de poder (1:21–2:12).

Ele descreve o conflito do Rei poderoso, exibindo-o como:

1. Alistando súditos para o seu reino–apóstolos, publicanos e pecadores, enfermos e


necessitados (2:13–3:35).

2. Explicando o desenvolvimento do seu reino (4:1-34).

3. Conquistando a natureza, os demônios, a enfermidade e a morte (4:35–5:43).

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 21

4. Sofrendo a oposição do povo (6:1-6), de Herodes (6:14-29) e dos escribas e fariseus


(7:1-23; 8:10-21).

Ele exibe o Conquistador reivindicando o seu direito ao reino de poder e apresenta-o:

1. Ensinando aos seus seguidores como se ganha a vitória no seu reino – por meio do
sofrimento e da morte (8:31-38; 10:28-45).

2. Reivindicando o seu direito ao reino, em Jerusalém, com sua entrada triunfal (11:1-
11); pela purificação do templo (11:15-19); pela derrota dos chefes que duvidavam da sua
autoridade (11:27 – 12:44) e pela profecia da sua Segunda vinda em glória (13:1-37).

Marcos demonstra como Cristo prepara o estabelecimento do seu reino por meio de:

1. Preparando-se para a morte (14:1-72).

2. Entregando-se à morte (15:1-47).

Finalmente, ele mostra Jesus assumindo o reino (espiritual):

1. Pela conquista da morte (16:1-14).

2. Pelo envio dos seus seguidores a proclamar o seu triunfo (16:15-20).

O estudo do Evangelho de Marcos revelará os seguintes fatos: 1) sua exiguidade – é o


mais breve dos Evangelhos; 2) os atos de Jesus são enfatizados mais que seus discursos; 3) a
introdução é sucinta, consistindo de um só versículo; 4) palavras tais como ―imediatamente‖ e
―logo‖ são encontradas por todo livro. Estes fatos são uma indicação da natureza do evangelho
ora em estudo.

Marcos é o ―Evangelho da Ação‖, mostrando Jesus como o Servo do Senhor, labutando


incansavelmente na esfera da redenção do homem. A mensagem, ou tema, do livro, pode ser
resumida com as palavras de 10.45: ―Porque o Filho do homem também não veio para ser
servido, mais para servir e dar a sua vida em resgate de muitos‖.

Dentre os quatro Evangelhos, Marcos é o relato mais conciso do ―princípio do Evangelho


de Jesus Cristo, Filho de Deus‖ (1.1). Embora o autor não se identifique pelo nome no livro (o
mesmo ocorre nos demais Evangelhos), o testemunho primitivo e unânime da igreja é que João

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 22

Marcos foi quem o escreveu. Ele foi criado em Jerusalém e pertenceu à primeira geração de
cristãos (At 12.12). Teve a oportunidade ímpar de colaborar no ministério de três apóstolos:
Paulo (At 13.1-13; Cl 4.10; Fm 24), Barnabé (At 15.39) e Pedro (1 Pe 5.13). Segundo Papias (c.
de 130 d. C.) e outros pais eclesiásticos do século II, Marcos obteve o conteúdo do seu
Evangelho através da sua associação com Pedro, escreveu-o em Roma e destinou-o aos crentes
de Roma. Embora seja incerta a data específica da escrita do Evangelho segundo Marcos, a
maioria dos estudiosos o coloca nos fins da década de 50 d. C., ou na década de 60; é possível
que seja o primeiro dos quatro Evangelhos a ser escrito.

Na década 60-70 d. C., os crentes de Roma eram tratados cruelmente pelo povo e muitos
foram torturados e mortos pelo imperador romano, Nero. Sua intenção era fortalecer os alicerces
da fé dos crentes romanos e, se necessário fosse, inspirá-los a sofrer fielmente em prol do
evangelho, oferecendo-lhes como modelo a vida, o sofrimento, a morte e a ressurreição de Jesus
seu Senhor.

Marcos apresenta Jesus como o Filho de Deus e o Messias, o Servo Sofredor. O momento
culminante do livro é o episódio de Cesaréia de Filipo, seguido da transfiguração (8.27–9.10),
onde tanto a identidade de Jesus, quanto a sua dolorosa missão plenamente reveladas aos seus
doze discípulos. A primeira metade de Marcos focaliza em primeiro plano os estupendos
milagres de Jesus e a sua autoridade sobre doenças e demônios, como sinais de que o reino de
Deus está próximo. Há numerosas referências em todo o livro de Marcos ao sofrimento como o
preço do discipulado (e.g., 3.21, 22, 30; 8.34-38; 10.30, 33, 34, 45; 13. 8, 11-13).

Características Especiais

Quatro características distinguem o Evangelho segundo Marcos: (1) Sendo um


Evangelho de ação, ele enfatiza mais aquilo que Jesus fez, do que suas palavras. Daí, Marcos
registrar dezoito milagres de Jesus, mas somente quatro das suas parábolas. (2) Como um
Evangelho aos romanos, ele explica os costumes judaicos, omite todas as genealogias judaicas, a
narrativa do nascimento de Jesus, traduz as palavras aramaicas e emprega termos latinos. (3)
Marcos inicia seu Evangelho de modo repentino, e descreve os eventos da vida de Jesus de modo
sucinto e rápido, introduzindo os episódios mediante o advérbio grego que corresponde a
―imediatamente‖ (42 vezes no original). (4) Como um Evangelho vigoroso, Marcos descreve os
eventos da vida de Jesus, de modo sucinto e vívido, com a perícia pitoresca de um gênio
literário.
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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 23

A contribuição de Marcos

Atos 10 Marcos

―evangelho‖(v. 36) ―princípio do evangelho‖ (1.1)

―Deus ungiu a Jesus de Nazaré com Espírito a vinda do Espírito sobre Jesus (1.10)
Santo‖ (v. 38)

―tendo começado desde a Galileia‖ (v. 37) o ministério na Galileia (1.16–8.26)

―[Jesus] andou por toda parte, fazendo o bem e o ministério de Jesus concentra-se em
curando a todos os oprimidos do diabo‖ (v. 38) curas e expulsões de demônios

―nós somos testemunhas de tudo o que ele o ministério em Jerusalém (caps. 11-
fez[...] em Jerusalém‖ (v. 39) 14)

―ao Qual também tiraram a vida, pendurando-o Destaque à morte de Cristo (cap. 15)
no madeiro‖ (v. 39)

―ele ressuscitou, não está mais aqui‖


―a este ressuscitou Deus no terceiro dia‖ (v. 40) (16.6)

LUCAS

O Evangelho segundo Lucas apresenta-nos uma narrativa histórica que expõe Jesus
Cristo como o perfeito Homem Divino. Lucas escreveu especialmente para o povo grego cuja
missão era melhorar o homem, moral, intelectual e fisicamente, e cujo ideal era o homem
perfeito. Assim como os judeus fracassaram em obter a salvação por meio da Lei e das
cerimônias, da mesma maneira os gregos fracassaram em obtê-la mediante a cultura e filosofia.
Lucas, para satisfazer a necessidade dos gregos, apresenta Jesus como o perfeito Homem Divino,
o representante, o Salvador da humanidade.

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 24

Autor: Lucas, um companheiro do apóstolo Paulo (Colossenses 4:14; Filemon 24; 2


Timóteo 4:11). Os escritores cristãos dos primeiros séculos nos dizem que Lucas escreveu o
Evangelho que leva se nome e que, substancialmente, era o mesmo que ele e Paulo pregaram
entre os gregos; e que foi produzido e publicado entre o povo grego.

O Evangelho de Lucas é dirigido aos gregos em particular. O Dr. Gregory afirma ser ele
ideal para os gregos por vários motivos.

1. Pelas qualificações do autor. Acredita-se que Lucas foi um grego de grande instrução,
como indica o seu estilo e o fato de ser ele médico.

2. Pelo arranjo da obra. É este Evangelho a história mais metódica das palavras e das
obras de Jesus. A leitura cuidadosa revela passagens escritas por um pensador a um povo
filosófico e dado à meditação.

3. Pelo estilo. O Evangelho de Lucas exerce peculiar atração por sua eloquência poética.
Note os cânticos reproduzidos no primeiro capítulo. Por todo o Evangelho encontramos os
discursos de Jesus em contraste direto com o Evangelho de Marcos que acentuou as obras de
Jesus em vez de as suas doutrinas.

4. Pelas suas omissões. Partes distintamente judaicas foram omitidas. Pouco ou nada se
diz acerca das profecias do Antigo Testamento.

Conteúdo

I. Introdução (1:1-4).

II. Advento do Homem Divino (1:5–4:13).

III. O ministério de Jesus na Galileia (4:14–9:50).

IV. Seu ministério da Peréia (9:51–19:28).

V. Sua crucificação e ressurreição (19:29 – 24:53).

Lucas contém muitos fatos e discursos que se encontram em Mateus e Marcos.


Trataremos, portanto, somente dos detalhes que não se encontram nos outros Evangelhos.

Como era costume entre os historiadores romanos, Lucas começa o seu Evangelho com
um prefácio. Ele diz que muitos homens da sua época tinham tentado escrever a narração do
ministério de Cristo (v. 1). Evidentemente não satisfeito com essas tentativas, empreende a obra

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 25

de escrever um relato ordenado da vida do Senhor. Declara as suas qualificações para a obra, a
saber, o fato de ter recebido suas informações de testemunhas oculares (v. 2), e por ter perfeito
conhecimento dos dados da vida e do ministério do Senhor desde o princípio (v. 3). Dedica em
seguida o seu Evangelho a Teófilo com a finalidade de confirmar a sua fé (v. 4).

I. Advento do Homem Divino (1:5–4:13)

Sob este título estudaremos os seguintes detalhes, que não se encontram nos outros
Evangelhos:

1. A anunciação do nascimento de João Batista (1:5-25).

2. A anunciação a Maria do nascimento de Jesus (1:26-38).

3. A visita de Maria a Isabel (1:39-55).

4. O nascimento e a infância de João Batista (1:56-80).

5. A viagem a Belém (2:1-7).

6. A mensagem dos anjos (2:8-20).

7. A circuncisão de Jesus e a sua apresentação no templo (2:21-39).

8. A infância de Jesus (2:40-52).

9. A genealogia de Jesus (3:23-38).

Lucas começa a sua narração com um acontecimento que não se encontra nos outros
Evangelhos – a anunciação do nascimento de João Batista.

O evangelho de Lucas é o livro mais longo do Novo Testamento e inclui boa quantidade
de informações não encontradas em outros textos. Podemos perceber algo do movimento que
Lucas discerniu se examinarmos as cinco principais seções de seu relato.

Primórdios cristãos (1.1- 4.13). Depois de um breve prefácio (1.1-4), Lucas traz uma
seção exclusiva que trata sobre a primeira infância de João Batista e de Jesus. Ele nos conta que
o anjo Gabriel predisse o nascimento de João Batista (1.5-25) e o de Jesus (1.26-38). Ele escreve
sobre uma visita que Maria fez a Isabel (1.39-45) e traz o texto do cântico de Maria (1.46-56).
Seguem-se o nascimento de João Batista e como lhe foi dado o nome (1.57-66) e depois vem o
cântico de Zacarias (1.67.80). Ele passa então ao nascimento de Jesus, junto com a história dos
anjos e pastores (2.1-20), à apresentação do menino Jesus no templo (2.21-40) e a única história

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 26

que temos sobre Jesus adolescente (2.41-52). Em seguida vêm o ministério de João Batista (3.1-
20) e o batismo de Jesus por João (3.21-22), a genealogia de Jesus (3.23-38) e a narrativa da
tentação (4.1-13).

Jesus na Galileia (4.14-9.50). O ministério público de Jesus na Galileia começa com seu
sermão em Nazaré (4.14-30) e com histórias de suas curas (4.31-41) e de uma viagem de
pregação (4.42-44). Ele opera uma pesca miraculosa, que termina com o chamado a Simão para
pescar homens (5.1-11), e depois um leproso (5.12-16) e um paralítico (5.17-26). Ele chama Levi
(5.27-32) e responde a uma pergunta sobre o jejum (5.33-39). O uso correto do Sábado (6.1-11)
e o chamado dos Doze (6.12-16) são apresentados em seguida. Depois vêm o Sermão da
Planície, com seus importantes ensinos sobre o amor (6.17-49), a cura do escravo do centurião
(7.1-10) e ressurreição do filho de uma viúva em Naim (7.11-17). Seguem-se perguntas feitas
por João Batista (7.18-35) e a unção de Jesus por uma pecadora (7.36-50). Lucas passa a falar de
mulheres que ajudaram Jesus (8.1-3) e a narrar a parábola do semeador (8.4-15), após o que ele
apresenta o ensino sobre a candeia que não se pode ocultar (8.16-18) e sobre a mãe e irmãos de
Jesus (8.19-21). Em seguida Jesus acalma a tempestade (8.22-25), e cura o endemoninhado
geraseno (8.26-39), seguido do relato entrelaçado da cura da mulher com hemorragia e da
ressurreição da filha de Jairo (8.40-56). No capítulo 9 temos a missão dos Doze (9. 1-6), a
perplexidade de Herodes (9.7-9), a multiplicação dos pães para os cinco mil (9.10-17), o
reconhecimento de que Jesus é o Cristo e as consequências disso para o discipulado (9.18-27), a
transfiguração (9.28-36), a cura do menino que tinha um espírito maligno (9.37-45) e ensino
sobre o discipulado (9.46-50).

A viagem de Jesus a Jerusalém (9.51–19.44). Nessa longa seção sobre a viagem de Jesus
da Galileia para Jerusalém, não é fácil seguir o curso da viagem ou identificar, na maioria dos
trechos da narrativa, exatamente em que ponto da viagem Jesus se encontra. Parece que Lucas
está mais preocupado em ressaltar o tema-enredo da viagem do que em apresentar locais exatos.
Com isso ele está ressaltando que Jesus deslocou-se o tempo todo para a frente em sua jornada
para Jerusalém a fim de consumar a obra que viera realizar na terra. A seção principia com mais
lições sobre o discipulado (9.51-62) e com Jesus enviando 72 pregadores às cidades que ele
estava em vias de visitar e com a reação diante do relatório deles (10.1-24). Segue a parábola do
bom samaritano (10.25-37), depois Jesus visita o lar de Marta e Maria (10.38-42). Lucas passa
para a oração dominical (11.1-4) e o ensino sobre a oração (11.5.13). Um trecho importante
sobre espíritos malignos deixa claro que Jesus é forte demais para os poderes do mal (11.14-26),
após o que há uma longa seção em que Jesus ensina o povo e em que advertências,
encorajamento, preocupação, vigilância e divisões atraem a atenção (11.27–12.59). Ressalta-se o

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 27

arrependimento (13.1-9) antes de Jesus curar uma mulher aleijada numa sinagoga num dia de
Sábado (13.10-17). Há ensinos sobre o reino de Deus (13.18-30) e um lamento por Jerusalém
(13.31-35). Há ensino interessante por ocasião de uma refeição na casa de um fariseu
proeminente, incluindo a parábola da grande ceia (14.16-24) e uma declaração sobre o preço do
discipulado (14.25-350. Lucas apresenta a seguir três parábolas, sobre a ovelha perdida, a moeda
perdida e o filho perdido (15.1-32), outra sobre o mordomo infiel (16.1-9) e mais ensino, na sua
maior parte sobre o dinheiro, que inclui a parábola sobre o rico e Lázaro (16.10-31). Há ensino
sobre o serviço (17.1-10), a cura de dez leprosos (17.11-19), a vinda do reino de Deus (17.20-37)
e duas parábolas sobre a oração (18.1-14). Lucas conta acerca de pais que levaram os filhos a
Jesus (18.15-17) e a história do governante jovem e rico (18.18-30). Jesus profetiza sua paixão
(18.31-34), e Lucas passa a contar dois acontecimentos ocorridos em Jericó e vizinhanças: a cura
de um mendigo cego (18.35-43) e a visita de Jesus a Zaqueu (19.1-10). Ele narra a parábola das
minas (19.11-26) e a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém (19.27-44).

Jesus em Jerusalém (19.45–21.38). Esta seção trata daquilo que Jesus fez e ensinou em
Jerusalém. Lucas relata a purificação do templo (19.45-46) e o ensino de Jesus (19.47-48),
também sobre sua autoridade (20.1.8). À parábola dos maus arrendatários (20.19-44) e uma
advertência sobre os mestres da lei (20.45-47). Lucas nos conta sobre a oferta da viúva (21.1-4) e
passa para o discurso escatológico de Jesus (21.5-36). A seção termina com mais ensino no
templo (21.37-38).

A crucificação e ressurreição de Jesus (22.1-24.53). Lucas principia sua narrativa da


crucificação com Jesus sendo traído por Judas (22.1-6) e passa para a última ceia e o ensino
subsequente no cenáculo (22.7-38). Ele fala da agonia e oração de Jesus (22.39-46) e de sua
prisão (22.47-54). Em seguida vem as negações de Jesus por Pedro e as zombarias dos soldados
(22.55-65), e depois vemos Jesus perante o Sinédrio (22.66-71), Pilatos (23.1-5) e Herodes
(23.6-12. Jesus é condenado (23.13-25), crucificado (23.26-49) e por fim sepultado por José de
Arimatéia (23.50-56). A narrativa da ressurreição começa com dois homens com roupas
resplandecentes que contam às mulheres que Jesus ressuscitou (24.1-11) e com Pedro junto ao
túmulo (24.12). Há um lindo relato sobre um aparecimento de Jesus a dois discípulos que
caminhavam para Emaús (24.13-35), relato que é seguido por seu aparecimento aos discípulos
(24.36-49). Lucas termina seu evangelho com um breve relato da ascensão (24.50.53).

Lucas é o único evangelista a registrar alguns dos acontecimentos da infância de Jesus.


Ele o faz acentuar a sua natureza humana – a fim de apresentá-lo como a ―descendência de
mulher‖ (Gênesis 3:15). Ele deseja mostrar que Jesus, embora sendo Filho de Deus, cresceu de

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 28

maneira natural (2:40, 52). Registra a visita de Jesus a Jerusalém para demonstrar que Jesus,
desde pequeno, teve conhecimento de sua missão divina (2:49).

Lucas, como Mateus, dá uma genealogia de Jesus. Mas após um exame pode-se ver que
divergem. Mateus traça a descendência de Jesus pelo filho de Davi, Salomão (Mateus 1:6);
Lucas, por Natã, filho de Davi (Lucas 3:31).

II. O Ministério de Jesus na Galileia (4:14–9:50)

Esta seção contém os seguintes detalhes que só Lucas registra:

1. A primeira rejeição em Nazaré (4:14-30).

2. A pesca milagrosa (5:1-11).

3. A ressurreição do filho da viúva (7:11-18).

4. A unção de Jesus por uma mulher pecadora (7:36-50).

5. As mulheres que ministraram ao Senhor (8:1-3).

6. Zelo sem conhecimento repreendido (9:49, 50).

Os versículos 14 e 32 do capítulo 4 registram a primeira rejeição de Jesus em Nazaré.

III. Seu Ministério na Peréia (9:51–9:28)

Nesta seção notamos os seguintes detalhes mencionados só por Lucas:

1. A rejeição de Jesus pelos samaritanos (9:51-56).

2. A missão dos setenta (10:1-24).

3. O Bom Samaritano (10:25-37).

4. Marta e Maria (10:38-42).

5. A parábola do rico insensato (12:13-21).

6. Uma lição sobre o arrependimento (13:1-10).

7. A cura da mulher enferma (13:11-17).

8. Discurso sobre a porta estreita (13:23-30).

9. A admoestação de Herodes (13:31-35).

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 29

10. A cura do homem hidrópico (14:1-6).

11. A verdadeira hospitalidade e a parábola da grande ceia (14:12-24).

12. Discurso sobre o assunto de calcular as despesas (14:25-35).

13. Parábola da graça e admoestação (caps. 15, 16).

14. Uma lição sobre a fé (17:1-10).

15. Os dez leprosos (17:11-19).

16. Parábolas do juiz injusto e do fariseu e o publicano (18:1-14).

17. A conversão de Zaqueu (19:1-10).

18. Parábola das minas (19:11-28).

Podemos ver o preconceito dos samaritanos contra os judeus na sua recusa de receber
Jesus, porque o seu rosto era como o de quem ia para Jerusalém. João e Tiago, os ―filhos do
Trovão‖ (Marcos 3:17), em espírito demasiado zeloso, desejam imitar o exemplo de Elias,
fazendo com que desça fogo do céu.

Os versículos 38 a 42 do capítulo 10, proporcionam-nos alguns conhecimentos da vida


social de Jesus, descrevendo duas das pessoas mais íntimas – Marta e Maria. É interessante
mencionar aqui que Lucas no seu Evangelho salienta o ministério das mulheres (veja também
Lucas 1:26-55; 2:36; 8:1-3).

O Evangelho de Lucas é o Evangelho da humanidade. Na sua escolha das parábolas


salienta o amor de Deus para com toda a humanidade. É interessante ver como salienta o amor
de Jesus para com os samaritanos – um povo odiado e desprezado pelos judeus (veja 9:52-56;
10:25-37).

IV. Sua Crucificação e Ressurreição (19:29–24:53)

Aqui tomaremos nota dos seguintes detalhes peculiares a Lucas:

1. Cristo chorando sobre Jerusalém (19:41-44).

2. Os discípulos disputam posições mais elevadas (22:24-30).

3. Admoestação a Pedro (22:31-34).

4. Instruções aos discípulos (22:35-38).

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 30

5. Jesus perante Herodes (23:8-12).

6. A lamentação das mulheres de Jerusalém (23:27-31).

7. O ladrão arrependido (23:39-43).

8. A viagem para Emaús (24:13-35).

9. A ordem de permanecer em Jerusalém (24:49).

Mateus nos informa que os dois ladrões que foram crucificados com Cristo o injuriaram.
Lucas acrescenta mais um detalhe e diz que um deles se arrependeu. Eles representam com
relação a Cristo, duas classes da humanidade.

Lucas termina o seu Evangelho com a ordem de Jesus aos seus discípulos de
permanecerem em Jerusalém, e a sua ascensão. O registro dos acontecimentos repetidos no
primeiro capítulo do livro de Atos, foi escrito pelo mesmo autor.

Características Especiais

São oito as características principais do Evangelho segundo Lucas. (1) Seu amplo alcance
no registro dos eventos na vida de Jesus, desde a anunciação do seu nascimento até a sua
ascensão. (2) A qualidade excepcional do seu estilo literário, empregando um vocabulário rico e
escrito com um domínio excelente da língua grega. (3) O alcance universal do Evangelho – que
Jesus veio para salvar a todos: judeus e gentios igualmente. (4) Ele salienta a solicitude de Jesus
para com os necessitados, inclusive mulheres, crianças, os pobres e os socialmente
marginalizados. (5) Sua ênfase na vida de oração de Jesus e nos seus ensinos a respeito da
oração. (6) O notável título de Jesus neste Evangelho, a saber: ―Filho do Homem‖. (7) Seu
enfoque sobre a alegria que caracteriza aqueles que aceitam a Jesus e a sua mensagem. (8) Sua
ênfase na importância e proeminência do Espírito Santo na vida de Jesus e do seu povo (e.g.,
1.15,41,67; 2.25-27; 4.1,14,18; 10.21; 12.12; 24.49).

A contribuição de Lucas

Devemos a Lucas uma boa parte das informações que temos sobre Jesus. Os seus dois
primeiros capítulos, por exemplo, nos contam quase tudo o que sabemos a respeito do
nascimento de João Batista e a maior parte do que sabemos sobre o nascimento e infância de
Jesus. Só ele registra a pesca milagrosa e o efeito que ela teve em Pedro (5.1-11), a unção de
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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 31

Jesus por uma pecadora (7.36-50), as mulheres que ajudavam Jesus (8.1-3), a rejeição de Jesus
por alguns samaritanos (9.51-56), a missão dos setenta (10.1-12, 17-20), a visita de Jesus a
Marta e Maria (10.38-42), o ensino sobre o arrependimento (13.1-5), a cura de uma mulher
aleijada (13.10-17), o ensino de Jesus sobre Herodes (13.31-33), o homem hidrópico (14.1-6), o
convite a um banquete (14.7-14), o ensino de Jesus sobre servos inúteis (17.7-10), a cura de dez
leprosos (17.11-19), Zaqueu (19.1-10), o lamento por Jerusalém (19.41.44), as palavras sobre
duas espadas (22.35-38), Jesus perante Herodes (23.6-12), as palavras às filhas de Jerusalém
(23.27-31), três das ―palavras‖ ditas da cruz (23.34, 43, 46) e todo o trecho sobre a ressurreição
após o anúncio às mulheres junto ao túmulo (24.12-53). Diversas parábolas acham-se apenas
nesse evangelho: o bom samaritano (10.25-37), o amigo à meia noite (11.5-8), a figueira estéril
(13.6-9), a ovelha perdida, a moeda perdida e o filho perdido (15.1-32), o mordomo infiel (16.1-
9), o rico e Lázaro (16.19-31), o juiz injusto (18.1-8) e o fariseu e o publicano (18.9-14).

Lucas tem muito a dizer sobre salvação; ele é o teólogo da Heilsgeschichte, a ligação
entre a salvação e os eventos históricos. Para Lucas é uma ideia nova e significativa ver a
salvação divina manifestada na vida, morte, ressurreição e ascensão de Jesus e também na vida
diária da igreja. Ele situa firmemente o seu relato no contexto da História secular (2.1-2; 3.1) e
vê Deus agindo em tudo o que Jesus disse e fez. Foi em Jesus que Deus operou a salvação para
os pecadores.

Fica claro que Lucas tinha um profundo interesse pelo fato de que Jesus veio salvar
pecadores, e ele registra contatos com pessoas pecadoras que chocaram os cidadãos respeitáveis
de sua época.

É a Lucas que devemos a preservação de alguns dos grandes cânticos cristãos, como os
de Maria (1.46-55), Zacarias (1.68-79) e Simeão (2.29-32). Lucas apresenta mais ocorrências de
palavras que falam de regozijo (o verbo chairein e o substantivo chara do que qualquer outro
livro do Novo Testamento. Frequentemente encontramos pessoas regozijando-se, ou dando
glória a Deus, ou louvando-o (e.g., 1.14, 44, 47; 2.20; 7.16; 10.21; 13.13). Lucas fala de riso
(6.21), de um exuberante pulo de alegria (6.23), da alegria do encontro de Zaqueu com Jesus
(19.6), da alegria de encontrar aquilo que estava perdido (15.6-7, 9-10), de festas (15.23,32) e
muito mais. Não pode haver dúvida de que o cristianismo que Lucas conhecia era algo
maravilhosamente alegre.

Lucas tem uma maneira própria de deixar claro que a cruz é central. Vemos isso na
estrutura deste evangelho, com o espaço dedicado à narrativa da paixão e a seus prenúncios.

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 32

Para Lucas basta o fato de que Deus salva por intermédio da obra de Cristo; ele não entra
em detalhes sobre como isso acontece.

JOÃO

À semelhança dos demais evangelhos canônicos, o de João propõe-se a contar a história


das origens, ministério, morte e ressurreição de Jesus. Como aqueles, ele não tem o objetivo de
ser neutro. O evangelista propõe-se produzir fé (20.30-31) e com este objetivo e as necessidades
de seus leitores em mente, ele dá forma ao seu testemunho.

O Evangelho segundo João é ímpar entre os quatro Evangelhos. Relata muitos fatos do
ministério de Jesus na Judéia e em Jerusalém que não se acham nos Sinóticos, e revelam mais a
fundo o mistério da sua pessoa. O autor identificar-se indiretamente como o discípulo ―a quem
Jesus amava‘ (13.23; 19.26; 20.2; 21.7, 20). O testemunho dos primórdios do cristianismo, bem
como a evidência interna deste Evangelho, evidenciam João, o filho de Zebedeu, como o autor.
João foi um dos doze apóstolos originais de Cristo, e também um dos três mais chegados a Ele
(Pedro, Tiago e João).

Segundo testemunho muito antigos, os presbíteros da igreja da Ásia Menor pediram ao


venerável ancião e apóstolo João, residente em Éfeso, que escrevesse este ―Evangelho espiritual‖
para contestar e refutar uma perigosa heresia concernente à natureza, pessoa e deidade de Jesus,
propagada por um certo judeu de nome Cerinto. O Evangelho segundo João continua sendo para
a igreja uma grandiosa exposição teológica da ―Verdade‖, como a temos personalizada em Jesus
Cristo.

João deixa claro o propósito de seu Evangelho, em 20.31, a saber: ―para que creiais que
Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome‖. Alguns
manuscritos gregos deste Evangelho apresentam, nesta passagem, formas verbais distintas para
―crer‖. Uns contêm o aoristo subjuntivo (―para que comecem a crer‖); outros contêm o presente
do subjuntivo (―para que continuem crendo‖). No primeiro caso, João teria escrito para
convencer os incrédulos a crer em Jesus Cristo e serem salvos. No segundo caso, João teria
escrito para consolidar os fundamentos da fé de modo que os crentes continuassem firmes,
apesar dos falsos ensinos de então, e assim terem plena comunhão com o Pai e o Filho (cf.17.3).
Estes dois propósitos são vistos no Evangelho segundo João. Contudo, o peso de Evangelho no
seu todo favorece o segundo caso como sendo o propósito predominante.

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 33

O quarto Evangelho apresenta evidências cuidadosamente selecionadas no sentido de


Jesus ser o Messias de Israel e o Filho encarnado (não adotado) de Deus. As evidências
comprobatórias incluem: (1) sete sinais (2.1-11; 4.46-54; 5.2-18; 6.1-15; 6.16-21; 9.1-41; 11.1-
46) e sete sermões (3.1-21; 4.4-42; 5.19-47; 6.22-59; 7.37-44; 8.12-30; 10.1-21), pelos quais
Jesus revelou claramente sua verdadeira identidade; (2) sete declarações ―Eu sou‖ (6.35; 8.12;
10.7; 10.11; 11.25; 14.6; 15.1) mediante as quais Jesus revelou figuradamente aquilo que Ele é
como redentor da raça humana; e (3) a ressurreição corpórea de Jesus como o sinal supremo e a
prova máxima de que Ele é o ―Cristo, o Filho de Deus‖ (20.31).

João contém duas divisões principais. (1) Os caps. 1–12 tratam da encarnação e do
ministério público de Jesus. Apesar dos sete sinais convincentes de Jesus, dos seus sete
grandiosos sermões e das suas sete majestosas declarações ―Eu sou‖, os judeus o rejeitaram
como seu Messias. (2) Uma vez rejeitado pelo Israel do antigo pacto, Jesus passou (13-21) a
considerar seus discípulos como o núcleo do novo concerto (i.e., a igreja que Ele fundou). Estes
capítulos incluem a última ceia de Jesus (13), seus últimos sermões (14-16) e sua oração final
com seus discípulos (17). O novo concerto se iniciou e se estabeleceu pela sua morte (18,19) e
ressurreição (20,21).

Características Especiais

Oito características ou ênfase principais destacam o Evangelho segundo João. (1) Jesus
como ―o Filho de Deus‖. Do prólogo do Evangelho, com sua sublime declaração: ―vimos a sua
glória‖ (1.14), até à sua conclusão na confissão de Tomé: ―Senhor meu, e Deus meu!‖ (20.28),
Jesus é Deus, o Filho encarnado. (2) A palavra ―crer‖ ocorre 98 vezes, equivalente a receber a
Cristo (1.12). Ao mesmo tempo, esse ―crer‖ requer do crente uma total dedicação a Ele, e não
apenas uma atitude mental. (3) ―Vida eterna‖ em João é um conceito-chave, referindo-se não
tanto a uma existência sem fim, mas à nova qualidade de vida que provém da nossa união com
Cristo, a qual resulta tanto na libertação da escravidão do pecado e dos demônios, como um
nosso crescimento contínuo no conhecimento de Deus e na comunhão com Ele. (4) Encontro de
pessoas com Jesus. Temos neste Evangelho 27 desses encontros individuais assinalados. (5) O
ministério do Espírito Santo é o Espírito da verdade, e a Palavra de Deus é a verdade. A verdade
liberta (8.32); purifica (15.3). Ela é a antítese da natureza e atividade de Satanás (8.44-47,51). (7)
A importância do número sete neste Evangelho: sete sinais, sete sermões e sete declarações ―Eu
sou‖ dão testemunho de quem Jesus é (cf. a proeminência do número ―sete‖ no livro de

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 34

Apocalipse, do mesmo autor). (8) o emprego doutras palavras de destaque como: ―luz‖,
―palavra‖, ―carne‖, ―amor‖, ―testemunho‖, ―conhecer‖, ―trevas‖ e ―mundo‖.

O Evangelho de João é um acervo de testemunhos que provam que Jesus é o Cristo, o


Filho do Deus vivo. Foi escrito com a finalidade de promover a vida espiritual da Igreja. Contém
a substância da pregação de João à Igreja, as verdades espirituais que ele recebera do Senhor. O
propósito de João neste Evangelho é apresentar Cristo a todos os cristãos como o Verbo
encarnado de Deus.

A contribuição de João

Entre as mais importantes contribuições de João encontram-se:

1) Em comparação com os relatos sinóticos, João acrescenta um elemento tridimensional


ao quadro que podemos ter de Jesus e seu ministério, morte e ressurreição.

2) A apresentação que João faz de quem Jesus é está no cerne de tudo que é distintivo
desse evangelho. A perfeição da obediência de Jesus e a natureza incondicional de sua
dependência tornam-se, portanto, as esferas em que Jesus revela nada menos do que as palavras e
obras de Deus.

3) Apesar da forte ênfase em Jesus como aquele que revela o seu Pai, a salvação não vem
(como no gnosticismo) meramente por intermédio da revelação. A obra de João é um evangelho:
todo o andamento da trama é em direção da cruz e da ressurreição. A cruz não é um simples
momento revelador. É a morte do pastor por suas ovelhas (Jo. 10), o sacrifício de uma pessoa por
sua nação (Jo. 11), a vida que é dada em favor do mundo (Jo. 6), a vitória do Cordeiro de Deus
(Jo. 1), o triunfo do Filho obediente que, como consequência, lega sua vida, sua paz, sua alegria,
seu Espírito (Jo. 14-16).

4) A ênfase distintiva que João dá à escatologia está ligada ao uso que faz do tema da
―hora‖ (às vezes traduzido por ―tempo‖ na NVI: e.g., 7.6). Todos os mais importantes escritores
do Novo Testamento demonstram, em suas respectivas obras, a tensão de tentar simultaneamente
(1) expressar a maravilhosa verdade de que no ministério, morte, ressurreição e exaltação de
Jesus os ―últimos dias‖ prometidos por Deus já chegaram e (2) insistir em que a plenitude da
esperança ainda há de chegar. Autores diferentes revelam a tensão de diferentes maneiras. Em
João ―vem a hora, e já chegou‖ (4.23; 5.25); Jesus legou sua paz, mas neste mundo teremos
problemas (16.33).

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 35

5) Conquanto o ensino de João sobre o Espírito Santo tenha semelhanças importantes


com ênfase sinóticas (e.g., cf. Jo. 3.34 e Lc 4.14-21), existem numerosos elementos que lhe são
peculiares.

Mas, em última análise, a fé gira em torno da eleição soberana pelo Filho (15.16), de
fazer parte da dádiva do Pai ao Filho (6.37-44). Essa verdade acha-se no âmago de um livro que
é decididamente evangelístico.

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Teologia Bíblica do NT – Sinóticos e João 36

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CARSON, D. A.; MOO, Douglas J.; MORRIS, Leon. Introdução ao Novo Testamento. São
Paulo: ed. Vida Nova, 1997.

DUNNETT, Walter M. Panorama do Novo Testamento. São Paulo : Vida Nova, 2005.

GUNDRY, Robert H. Panorama do Novo Testamento. 2. ed. São Paulo : Vida nova, 1999.

PEARLMAN, Myer. Mateus. Rio de Janeiro, RJ: CPAD, 1995.

PEARLMAN, Myer. Marcos. Rio de Janeiro, RJ: CPAD, 1995.

PEARLMAN, Myer. Lucas. Rio de Janeiro, RJ: CPAD, 1995.

PEARLMAN, Myer. Através da Bíblia. Rio de Janeiro, RJ: CPAD, 1995.

TENNEY, Merril C. Tempos do Novo Testamento: entendendo o mundo do primeiro século.


Rio de Janeiro: CPAD, 2010.

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