Socialização PDF
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Resumo:
O ser humano não se torna espontaneamente um ser social com competências
sociais efetivas. É preciso que as novas gerações, que asseguram a reprodução da
sociedade, interiorizem as disposições que as humanizam, tornando-as indivíduos
sociais. A socialização é este processo que se desenrola durante toda a infância e
adolescência por meio das práticas e das experiências vividas, não se limitando de
modo algum a um simples treinamento realizado pelas instituições especializadas.
Nas sociedades contemporâneas, as experiências vividas pela criança tendem a se
caracterizar, entre outros aspectos: pela confusão entre a vida privada e a vida pública;
pela obnubilação das fronteiras entre o mundo adulto e o mundo infantil; por uma
maior reflexividade; e por um fosso tecnológico entre as gerações que subverte a
relação tradicional entre o adulto que sabe e a criança que não sabe. Este artigo
representa uma tentativa de síntese dos diferentes conceitos relativos à socialização
em algumas das principais correntes da Sociologia. Trata-se de uma reflexão não
exaustiva que pretende trazer uma modesta contribuição para compreender os últimos
avanços da Sociologia da Infância, realizados com base na crítica ao conceito de
socialização. Tal reflexão se inscreve num trabalho mais amplo que tem como eixo
teórico o papel desempenhado pelas diferentes mídias no processo de socialização.
Palavras-chave: Crianças-Aspectos sociais. Socialização.
entre pares que caracterizam muitos jovens de hoje (turmas, clubes, etc.).
A televisão aparece como uma concorrente importante, constituindo, com
as outras mídias, uma espécie de escola paralela que contribui ao
questionamento da legitimidade da escola (seus conteúdos e seus métodos)
como instância que detinha um quase monopólio da transmissão do saber:
a escola não é mais o único lugar onde se aprende. Este tema é recorrente
em muitos estudos e não cabe retomá-lo aqui (BELLONI, 2001;
PORCHER, 1974).
Os parágrafos que se seguem representam uma tentativa de síntese
dos diferentes conceitos relativos à socialização em algumas das principais
correntes da Sociologia. Trata-se de uma reflexão não exaustiva que pretende
trazer uma modesta contribuição para compreender os últimos avanços
da Sociologia da Infância, considerada como novo subcampo que tem
estado no centro das discussões no campo da Educação e que vem se
construindo a partir da crítica ao conceito de socialização (SIROTA,
2006; MONTANDON, 2006; JAMES; PROUT, 1997; PROUT, 2005).
Cabe lembrar que as reflexões aqui apresentadas fazem parte de um
trabalho bem mais amplo sobre as relações entre crianças e mídias, que
venho desenvolvendo desde os anos 1980, tendo como eixo teórico o
papel desempenhado pelas diferentes mídias no processo de
socialização.
Corsaro (2005), para tomar o exemplo de um dos autores mais
conhecidos desta crítica, pretende substituir o conceito de socialização por
seu conceito de “reprodução interpretativa”, inspirado, principalmente, nas
idéias de G. H. Mead e E. Goffman. Segundo Corsaro (2005), as crianças
se apropriam criativamente da informação vinda do adulto para criar suas
próprias culturas de pares. Esta reinterpretação dos conteúdos culturais
constitui o núcleo central do processo de desenvolvimento da criança,
concebido como a construção de uma cultura específica, sendo o foco da
Sociologia da Infância. Sem pretender esgotar o assunto, mas apenas dar
início à polêmica, cabe lembrar que, embora a criança seja, sem dúvida,
um ator ativo e criativo em seu processo de socialização, não se pode
minimizar ou praticamente ignorar, como faz Corsaro (2005), a ação
sistemática e objetiva das instâncias de socialização, institucionais ou não.
Dentre elas, não posso deixar de enfatizar as técnicas de comunicação (ou
mídias) que impregnam com uma força extraordinária as culturas infantis.
nós, ela faz parte de nosso ser mais interior. Este autor insiste na evidência
de que é preciso considerar a interiorização para compreender o fato incrível
de que a maioria dos controles externos funcionem a maior parte do
tempo para os indivíduos de uma sociedade. Não somente a sociedade
controla nossos movimentos, mas ela modela nossa identidade, nossos
pensamentos e nossas emoções. “As estruturas sociais se tornam as estruturas
de nossa consciência. A sociedade não pára na superfície de nossa pele, ela
nos penetra tanto quanto ela nos envolve” (BERGER, 2006, p.160).
Segundo Berger, cuja proposta de inspiração fenomenologista tenta escapar
deste determinismo, “[...] é com nossa colaboração que somos jogados
no cativeiro”. Numa obra dos anos 1960 (A construção social da realidade),
Berger e Luckmann (2006) propõem a integração das abordagens de
Durkheim e Mead, num encontro um tanto improvável que tenta explicar
a dialética da relação entre indivíduo e sociedade. Tal integração foi mais
tarde retomada e aprofundada por outros autores, notadamente por
Habermas. Neste livro, os autores propõem, inspirando-se em Mead, uma
distinção entre dois momentos do processo de socialização: de um lado,
uma socialização primária, própria à infância e graças à qual um indivíduo
se torna um membro da sociedade e que acaba quando o conceito de
“outro generalizado” estiver construído; e, de outro lado, um conjunto
ininterrupto de socializações secundárias, pelas quais os indivíduos de todas as
idades, em sociedades complexas (altamente diferenciadas), interiorizam
papéis, normas e representações diversas que lhes permitem se tornar atores
em setores diferentes e situações novas. Berger e Luckmann (2006) elaboram
uma concepção dinâmica de ator, sujeito a processos de socialização
múltiplos e contraditórios, nunca acabados, porque inacabáveis, e se
desenvolvendo ao longo de toda a vida, e não apenas na infância. Assim,
sem colocar em questão os elementos constitutivos do indivíduo adquiridos
na infância (socialização primária), os autores chamam a atenção para o
caráter dinâmico e não determinado da socialização, e para as
possibilidades de transformações identitárias ao longo da existência humana
(BERGER; LUCKMANN, 2006). No entanto, esta abordagem (que se
inscreve na tradição da fenomenologia), ao construir a vida social a partir
das consciências subjetivas, subestima o peso da objetividade da vida social
na “construção da realidade”: o fato de que, uma vez objetivados, os
fatos sociais adquirem uma vida própria independente da vontade dos
Referências
ARENDT, H. La crise de la culture. Paris: Gallimard, 1972.
BELLONI, M. L. O que é mídia-educação. Campinas: Autores Associados,
2001.
BELLONI, M. L. O papel da televisão no processo de socialização. Brasília,
Texto para discussão. Departamento de Sociologia, UnB, 1992.
Mimeografado.
BERGER, P. Invitation à la Sociologie. Paris: La Découverte, 2006.
BERGER, P.; LUCKMANN,Th. La construction sociale de la réalité. Paris:
Armand Colin, 2006.
BOLLIET. D.; SCHMITT, J. P. La Socialisation. Paris: Bréal, 2002.
BOURDIEU, P. Esquisse d’une théorie de la pratique. Paris: Mouton-Bordas,
1971.
Abstract: Resumen:
Human beings do not spontaneously El ser humano no se torna
become social beings with effective social espontáneamente un ser social con
competencies. It is necessary for the new competencias sociales efectivas. Es
generations that assure the reproduction preciso que las nuevas generaciones, que
of society to interiorize the dispositions aseguran la reproducción de la sociedad,
that humanize them, making them social interioricen las disposiciones para
tornarlos individuos sociales. La
individuals. Socialization is this process
socialización es este proceso que se
that develops throughout childhood and
desarrolla durante toda la infancia y la
adolescence by means of practices and
adolescencia por medio de las prácticas y
lived experiences. It is in no way limited de las experiencias vividas, y no se limita
to a simple training conducted by a simples entrenamientos realizado por
specialized institutions. In contemporary las instituciones especializadas. En la
societies, the experiences of children tend sociedad contemporánea, las experiencias
to characterize the confusion between vividas por los niños y niñas tienen una
private and public life and the the tendencia de caracterizarse, entre otros
obnubilation of borders between the aspectos, por la confusión entre la vida
adult and children’s worlds; by a greater privada y la vida pública; por la confusión
reflexivity and by a technological gap de las fronteras entre el mundo adulto y
between generations that subverts the el mundo infantil; por una mayor
traditional relationship between the adult reflexividad y por un espacio tecnológico
who knows from the child who does entre las generaciones que subvierte la
relación tradicional entre el adulto que
not. This article represents an attempt to
sabe y el niño y la niña que no sabe. Este
synthesize the different concepts related
artículo presenta una tentativa de síntesis
to socialization in some of the main
de los diferentes conceptos relativos a la
currents of sociology. socialización en algunas de las principales
It involves a non-exhaustive reflex that corrientes de la sociología. Se trata de una
intends to offer a modest contribution reflexión no exhaustiva que pretende
to understanding the latest advances in traer una modesta contribución para
the sociology of infancy. This is based comprender los últimos avanzos de la
on a criticism of the concept of sociología de la infancia, realizados a partir
socialization. This analysis is inscribed de la crítica al concepto de socialización.
in a broader work, the theoretical focus Tal reflexión se inscribe en un trabajo
of which is the role performed by the más amplio que tiene como eje teórico el
media in the socialization process. papel desempeñado por los diferentes
medios de comunicación [mídias] en el
Key words: Children social aspects. proceso de socialización.
Socialization.
Palabras-clave: Niños y niñas - aspectos
sociales. Socialización.