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RESUMO
Estudar a História das Instituições de Educação Infantil nos permite estabelecer relações com
a história da infância e da criança, e compreender as concepções pedagógicas que
fundamentam as propostas e práticas educacionais direcionadas para as crianças de zero a seis
anos de idade. Ao focar este conjunto de temas temos a possibilidade de compreender parte da
História da Educação Infantil no Brasil que nos revela que tanto as creches, jardins de
infância ou escolas maternais, constituíram-se como instituições de cuidado e somente,
posteriormente, como instituições de ensino. O presente artigo tem por objetivo realizar uma
reflexão e, em certa medida, traçar a História das Instituições de Educação Infantil no Brasil,
do final do século XIX até o final do século XX, procurando compreender o surgimento dos
espaços destinado ao cuidado e a educação da criança pequena. Como procedimento teórico-
metodológico adoto o uso de pesquisas bibliográficas com ênfase em autores que se ocupam
em descrever e problematizar a História da Educação Infantil. Nesta perspectiva, buscamos
compreender a origem das instituições de educação infantil, sejam eles educativos ou não-
educativos, partindo do entendimento de infância, criança, das concepções pedagógicas que
permeiam há séculos na História da Educação Mundial e Brasileira.
Palavras-chave: Criança, Infância, História da Educação Infantil, Brasil.
ABSTRACT
1
Mestranda em Educação-UFRN. E-mail: [email protected]
INTRODUÇÃO
[...] a história das instituições pré-escolares não é uma sucessão de fatos que se
somam, mas a interação de tempos, influências e temas, em que o período de
elaboração da proposta educacional assistencialista se integra aos outros
tempos da história dos homens. (KUHLMANN, 1998, p. 77)
[...] a creche, para as crianças de zero a três anos, foi vista como muito mais
do que um aperfeiçoamento das Casas de Expostos, que recebiam as crianças
abandonadas; pelo contrário, foi apresentada em substituição ou oposição a
estas, para que as mães não abandonassem suas crianças. (KUHLMANN,
1998, p. 78)
Que tarefa não é a de educar o filho de uma escrava, um ente de uma condição
nova que a lei teve de constituir sob a condição de ingênuo! Que grave
responsabilidade não assumimos conservando em nosso lar, junto de nossos
filhos, essas criaturazinhas que hoje embalamos descuidosas, para amanhã vê-
las talvez convertidas em inimigos da nossa tranqüilidade, e quiçá mesmo da
nossa honra.
das teorias de Froebel ganham espaço pelo mundo e chegaram ao Brasil com entusiasmo. Em
nosso país são criados os primeiros jardins-de-infância privados no ano de 1875 no rio de
Janeiro e anos depois, em 1877 em São Paulo. Posteriormente, foram fundados os jardins-de-
infância públicos destinados para a elite social brasileira, os quais possuíam um programa
pedagógico para o desenvolvimento educativo das crianças.
Essa dupla visão de uma educação para a classe rica e a pobre vai perpetuar durante
muito tempo na educação brasileira. Onde era defendida uma educação compensatória e
assistencialista para as classes menos favorecidas e propostas educativas para o
desenvolvimento de aprendizagens escolares para as crianças pequenas da alta sociedade.
Assim como revela Oliveira (2007)
Essa visão assistencialista na educação infantil marca o início do século XX, momento
registrado pela fundação das primeiras instituições pré-escolares com caráter assistencialista
no Brasil. Aqui diferentemente dos países europeus, foram fundadas em primeira instancia as
creches e posteriormente os jardins-de-infância. Contudo estas instituições assistencialistas
destinadas para o atendimento educacional dos filhos da classe operária brasileira, não era
considerada um direito dos trabalhadores, mas uma “dádiva” dos filantropos, reforçando a
imposição hierárquica da classe dominante na educação. De acordo com Kuhlmann (1998)
Outras instituições também foram fundadas nas décadas seguintes, como o Instituto de
Proteção e Assistência à Infância (IPAI) em 1899, a Associação das Damas da Assistência à
Infância fundada em 1908, com a finalidade de servir como apoio a IPAI, ambas na cidade do
Rio de Janeiro.
Na cidade do Rio de Janeiro, datado em 1908, foi inaugurada a creche Sra. Alfredo
Pinto, atendendo os filhos das mães domésticas. Segundo Kuhlmann (1998)
2
(Concurso de robustez infantil: “os 19 rechonchudos concorrentes”, 14/07/1907, data de aniversário do IPAI-
RJ (AAI, v.5, n.9, set. 1907, p.56)
Observamos que nessa época há uma maior propagação de instituições sociais nas
áreas da saúde, família e educação, ocasionadas devido à elaboração das leis governamentais
destinadas à infância, no início do século XX. Podemos citar como exemplo dessas medidas e
leis elaboradas para assistir as crianças carentes, a fundação de Patronatos. Estes objetivavam
na fundação de creches e jardins-de-infância, proporcionando “aos menores pobres recursos
para o aproveitamento do ensino público primário; incutir no espírito das famílias pobres os
preciosos resultados da instrução; auxiliar os Juízes de Órfãos no amparo e proteção aos
menores materialmente e moralmente abandonados; promover a proibição das vendas por
menores na escola perniciosa das ruas; (...) promove a assistência dos detentos menores;
(...).(KUHLMANN, 1998, pg. 93)
3
Asilo de Menores Abandonados, criado pelo chefe da polícia carioca, Alfredo Pinto Viera de Mello, em 1907, para o abrigo de crianças
recolhidas nas ruas do Rio de Janeiro. Administrado pela polícia até 1915, quando foi integrado ao Patronato de Menores (particular), devido
à má administração. As penas disciplinares infligidas aos menores eram “excessivas e desumanas”, segundo relato de Ataulpho de Paiva, em
Justiça e assistência, 1916. Passou, então, a ter a denominação de “Casa de Preservação”. (RIZZINI e RIZZINI, pg.19, 2004).
Mas apesar desses avanços no cuidado das crianças, existia um sentimento controverso
na sociedade brasileira em relação a essas instituições. Algumas pessoas acreditavam que era
a obrigação da mãe educar seus filhos na primeira infância, já outras defendiam a fundação de
creches para as mães trabalhadoras, entendendo que esse seria um mal necessário para as
famílias. De acordo com Kuhlmann (1998)
da saúde, previdência e assistência para sancionar essas questões. Deste modo, as creches
foram criadas para evitar epidemias, como afirma Oliveira (2007)
As poucas creches que foram criadas fora das indústrias eram instituições
filantrópicas, criadas até meados da década de 50, com o passar dos tempos passaram a
receber uma ajudar do governo para desenvolver seus trabalhos, além das quantias que
recebiam das famílias ricas como espécie de “caridade”. Essas creches possuíam um caráter
assistencialistas-protetoral, como define Oliveira (2007) “A preocupação era alimentar, cuidar
da higiene e da segurança física, sendo pouco valorizado um trabalho orientado à educação e
ao desenvolvimento intelectual e afetivo das crianças”. Essa preocupação com o cuidado do
corpo vai perpetuar por décadas nas instituições de educação infantil. Além dessa visão pelo
cultivo da saúde em crianças pequenas algumas instituições foram criadas como forma de
prevenção da criminalidade. Existia uma preocupação na sociedade em evitar a marginalidade
de crianças e adolescentes carentes. Para combater esses problemas, em 1942 foi criada a
“Casa da Criança”, pelo Departamento Nacional da Criança.
Em suma, o avanço das ciências e movimentos progressistas marcam a segunda
metade do século XIX e o início do século XX. As instituições destinadas ao cuidado das
crianças, no princípio tinham um caráter paternalista, depois assumindo uma postura mais
severa diante da população carente. Neste período as concepções assistencialistas identificam
as crianças pobres como meninos de rua, influenciando nosso olhar para a infância
abandonada.
Após a segunda metade do século XX, cresce a participação das mulheres no mercado
de trabalho ocasionado pelo avanço da urbanização e industrialização no Brasil. Mulheres que
trabalhavam em comércios, funcionárias públicas, operárias e trabalhadoras domésticas,
passam a procurar com maior intensidade as creches e parques infantis que atendiam as
crianças em período integral.
No ano de 1961, há no âmbito educacional, uma grande mudança para a educação
infantil, é aprovada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 4024/61) o qual
propunha a inclusão dos jardins-de-infância no sistema de ensino:
A educação infantil na década de 60, período dos governos militares, continuou com
sua característica assistencialista, como foi dito anteriormente, uma educação destinada às
crianças carentes para assistir suas necessidades físicas e biológicas. Neste período, as
políticas governamentais incentivavam programas emergenciais para entidades filantrópicas,
assistenciais ou de iniciativas comunitárias, onde mães cuidavam de turmas com mais de cem
crianças na pré-escola.
A educação na infância passa a ter um caráter compensatório, de princípio pensa-se
em suprir nas necessidades orgânicas, como alimentação, o cuidado com o corpo,
posteriormente, essa compensação passa a ser considerada pelas carências culturais, pois se
acreditava que o fracasso escolar estava vinculado a “pobreza”, ou seja, as crianças tinham
um rendimento mais baixo por serem “carentes de cultura”. Assim, a educação infantil
compensaria essas carências, para que quando as crianças ingressassem no ensino
fundamental seu rendimento fosse maior, desta forma, a educação infantil começa a ser vista
como uma fase preparatória para a escolarização posterior. Oliveira (2007) define bem esse
pensamento desenvolvido na década de 70,
Essa nova visão caba influenciando as propostas de trabalhos elaborados nas creches e
pré-escolas que atendiam as crianças das classes menos favorecidas. Estas propostas iam
desde a estimulação precoce ou trabalho com a alfabetização, tendo como suporte a educação
tecnicista desenvolvida na época, o qual acaba influenciando os trabalhos educativos
proporcionados nos parques infantis e escolas maternais. Essa educação era considerada uma
“educação sistematizada”, uma educação que viesse a preparar o aluno para o ensino
fundamental.
[...] é durante o regime militar, que tantos prejuízos trouxe para a sociedade e
para a educação brasileira, que se inicia esta nova fase, que terá seus marcos
de consolidação nas definições da Constituição de 1988 e na tardia Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 1996. A legislação nacional
passa a reconhecer que as creches e pré-escolas, para crianças de 0 a 6 anos,
são parte do sistema educacional, primeira etapa da educação básica.
(KUHLMANN, 2000, pg. 6)
É visível como essas mudanças ocorridas nas instituições de educação infantil não
acontecem de uma forma harmoniosa. Existia na sociedade brasileira uma concepção
diferente destinada as crianças das classes ricas e das classes pobre. Como afirma Oliveira,
2007
Nos anos 70 e boa parte dos anos 80, a Educação Infantil (que a partir dos
desdobramentos da Constituição Federal de 1988 e da LDB 9.394/96 passa a
ser entendida oficialmente como o atendimento simultâneo, complementar e
indissociável de cuidado e educação de crianças de 0 a 3 anos – em creches –
e de 4 a 6 anos – em pré-escolas) – tinha como função social apenas o cuidado
das crianças, na medida em que não era considerada escola, portanto, isenta de
educação. (JUNQUEIRA FILHO, 2004, p. 108)
REFERÊNCIAS
KUHLMANN JR, Moysés. Infância e Educação Infantil: uma abordagem histórica. Porto
Alegre, Mediação, 1998.
OLIVEIRA, Zilma Ramos de. Educação Infantil: fundamentos e métodos. 2ed. São Paulo:
Cortez, 2005.