Sala de Leitura Ou Sala de Multimeios

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XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012

SALA DE LEITURA OU SALA DE MULTIMEIOS?


ANALISANDO AS AÇÕES DOCENTES NUM ESPAÇO QUE ARTICULA
LEITURA E MÍDIA
Bonnie Axer

O presente trabalho é um recorte de minha pesquisa de mestrado, cujo objeto de estudo


e investigação é a Sala de Leitura do município do Rio de Janeiro, um espaço dedicado
à leitura e aos usos que esta, relacionada com outras linguagens, produz. Durante minha
pesquisa, tive como objetivo entender e analisar os movimentos políticos, discursivos e
sociais que constituem a produção curricular para este espaço, mas no presente texto,
volto minha atenção para estes movimentos na configuração das funções destinadas ao
professor regente de Sala de Leitura. Pretendo então entender quem são estes
professores e que funções estes possuem a partir da ampliação da concepção de leitura,
visto que a Sala de Leitura passa a ser vivenciada como um espaço multimidiático, onde
a leitura é entendida através de diferentes suportes textuais. Busco, a partir da análise
dos documentos curriculares e de depoimentos que me foram concedidos em entrevista
com algumas professoras regentes de Sala de Leitura, problematizar a política que
determina e constitui as posições da/na Sala de Leitura, e o espaço que o seus
professores conquistaram ao longo da história. Para desenvolver tal artigo, opero com a
perspectiva de currículo enquanto construção contínua de sentidos, que me permite
encarar tal artefato não de forma engessada, mas construído continuamente,
provisoriamente de acordo com as demandas e posições presentes em tal processo.
Compreendo o currículo como espaço tempo de fronteira, (MACEDO, 2008; 2010), ou
seja, um espaço de negociação entre diferentes demandas, que disputam interesse e,
momentaneamente, paralisam posturas e discursos que são vendidos como imutáveis e
controláveis, mas que são apenas fechamentos provisórios de uma significação maior.
Desta maneira, operar com base em articulações hegemônicas contingentes me
possibilita compreender a ampliação das ações das Salas de Leitura e suas
conseqüências para o seu professor.

Palavras-chave: professor, sentidos, currículo.

1. Introdução
Este trabalho tem por objetivo fazer um histórico documental da Sala de Leitura
da Secretaria Municipal do Rio de Janeiro – SME/RJ, para perceber os espaços que seus
professores conquistaram ao longo de sua história. Volto-me então, diferentemente para
o professor regente de Sala de Leitura, afinal, quem é este professor? Venho aqui pensar
sobre a política que constitui determinadas posições da/na Sala de Leitura e para falar de
multidentidades de um espaço e de seus profissionais. Tenho profundo interesse nas
transformações curriculares, políticas e sociais que este espaço vem sofrendo ao longo
dos anos, visto que se trata de um espaço que inicialmente privilegiava a leitura de
textos literários e hoje se tornou um espaço de leitura ampla, com diferentes suportes
textuais, se configurando como um espaço de multimeios. Esta leitura ampla de falo e
que por muitas vezes irei me referir será abordada no texto seguinte.

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Considero os professores de Sala de Leitura, enquanto professores curriculistas,


desta maneira, concordo com Frangella (2008) ao dizer que estes professores (re)
significam na prática o que está proposto em documento, ou seja, estes produzem
currículo para além dos que já vem escritos. Quando estes professores entram em suas
Salas de Leitura, os mesmos dão sentido ao documento que lhes embasa e, produzem
concomitantemente sentidos outros para os currículos e para suas salas de aula. É neste
sentido que considero estes profissionais essenciais para a vivência das Salas de Leitura,
não simplesmente por serem os professores regentes daquele espaço, mas
fundamentalmente, porque de fato produzem coisas novas e (re)significam os
documentos.
Alves e Oliveira me auxiliam nesta perspectiva ao evidenciarem a necessidade
de
(...) compreender como os professores e professoras agem
cotidianamente na busca de levar os seus alunos à aprendizagem, que
elementos criam a partir de suas redes de saberes, de práticas e de
subjetividades, como criam seus fazeres e desenvolvem suas práticas
em função do que são. (Alves e Oliveira, 2002, p.94).

2. Sala de Leitura: um breve histórico curricular


Até o ano de 2009, encontrávamos no site da SME/RJ a seguinte definição para
a Sala de Leitura:
“Espaços privilegiados de desenvolvimento de práticas voltadas
para a promoção da leitura e formação do leitor na perspectiva da
leitura de mundo e para a instalação de estruturas, tecnologias e
metodologias mídia – educativas”.

Esta configuração de um espaço de multileituras traz uma visão ampliada da


leitura, visto que para a SME daquele momento, as Salas de Leitura precisavam ser
espaços de agrupamento de diferentes saberes e linguagens. Atualmente, a vivência é
outra, uma vez que a gestão (tanto da prefeitura do Rio como da SME/RJ) que iniciou
em 2009, trouxe posturas diferenciadas com o foco na leitura de textos literários e na
alfabetização, devido aos altos índices de analfabetismo que encontrou no início de sua
gestão .
As primeiras Salas de Leitura do Município do Rio de Janeiro foram
implantadas pelo Programa Especial de Educação, nos Centros Integrados de Educação
Pública (CIEP) em 1985. Tal proposta se definia de forma a não se constituir enquanto

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um depósito de livros, mas sim como um centro ativo de aprendizagem (FONSECA,


2004). Enquanto os CIEP possuíam Salas de Leitura, as escolas regulares da Rede
Municipal possuíam as chamadas Salas de Multimeios, que não existiam em todas as
escolas, não possuíam um trabalho com orientação sistematizada e se encontravam
estruturadas dentro das bibliotecas, tendo como principal objetivo dinamizar uma
prática tecnicista.
“Essa sala de multimeios ninguém sabia o que era, as escolas que
tinham era com aqueles funcionários encostados por algum motivo,
readaptadas e que eventualmente contavam uma história. Mas não
tinha um trabalho como depois eu vivenciei dentro das Salas de
Leitura do Ciep sabe?! (Depoimento de uma professora de Sala de
Leitura concedido em entrevista).

Quando as Salas de Leitura nascem no CIEP, espera-se uma leitura ampla,


aberta e dinâmica que não seja apenas suporte para realizar atividades escolares, mas
sim uma prioridade escolar. Quando esta postura simplesmente funcional da leitura é
superada, são construídos novos sentidos para a prática leitora na escola, assim como
também, para a prática docente. Como as Salas de Leitura eram originalmente uma
proposta do CIEP, o que se pretendia era totalmente diferente do que acontecia nas salas
de multimeios e nas bibliotecas escolares da época, a intenção era que a leitura tirasse o
alunado da classe popular e lhe desse acesso à cultura letrada.
Somente em 1990 (Portaria nº 12/90/E-DGE), foram implantadas as Salas de
Leitura nas escolas regulares da Rede Municipal do Rio, com uma proposta da SME/RJ
que buscava dar uma nova dimensão pedagógica ao espaço Multimeios, buscando uma
maior democratização dos meios de informação.

A finalidade pedagógica das Salas de Leitura das Unidades Escolares,


em relação ao uso conjugado dos diferentes meio de comunicação e
aplicação dessas linguagens específicas a prática educativa para
desenvolver no aluno, a capacidade de ver-julgar-agir, em interação
com a comunidade a que pertence. (Portaria nº 12/90/E-DGE em
02/05/90).

Quando há o desejo de trazer para as escolas convencionais o projeto de Sala de


Leitura, a primeira preocupação que se teve, segundo uma das professoras entrevistadas,
foi quem seria o profissional que estaria à frente da SL.

(...) as escolas que tinham suas bibliotecas, primeiro não eram


dinamizadas, eram depósito de livros, por que? Porque normalmente o
professor “que não dava certo” em sala de aula, era encostado na
biblioteca. Então além de ser um depósito de livros, era um depósito

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de professores. Então houve muita resistência para nós mexermos


nesta concepção, pois o professor da biblioteca tem que ser um dos
mais dinâmicos, aquele que vai ousar, discutir com as crianças os
temas, os livros... (Depoimento de uma professora de Sala de Leitura
concedido em entrevista).

A resolução de implantação das Salas de Leitura (nº12/90 E-DGE) prepara a sua


chegada em todas as Unidades Escolares da Rede Municipal do Rio de Janeiro e
explicita a função que tal espaço terá nas escolas, mas não menciona os professores, que
ainda neste momento são conhecidos como Encarregados de Multimeios. A Sala de
Leitura tem como objetivo, neste momento, o compromisso com a proposta de
desenvolvimento de uma política de produção/utilização de Tecnologia Educacional
oriunda da Divisão de Multimeios, além da necessidade de democratizar os meios de
comunicação e informação. As Salas de Leitura então herdam as funções, assim como
também, os professores das Salas de Multimeios. Podemos perceber que as Salas de
Leitura já começam a perder a configuração inicial que possuía no CIEP, pois agora o
objetivo não é apenas promover a leitura, mas também o acesso aos diferentes meios de
comunicação e informação. Nesse sentido, as Salas de Leitura começam a ser espaços
multimidiáticos.
Ainda que incorporada esta nova configuração das Salas de Leitura, somente
dois anos depois é que foi regulamentado pela portaria nº 37/92/EDGED, a função do
professor Regente de Sala de Leitura. A partir de então, o professor regente passa a
possuir atribuições como: responsabilidade pela organização, dinamização e mediação
dos acervos na comunidade escolar e desenvolvimento de projetos voltados para a
formação do leitor, que incorporem o uso de diferentes mídias e suas respectivas
linguagens. Para tanto o mesmo participa de cursos e capacitações oferecidas pela SME
e pela Divisão de Mídia e Educação.
Ainda em 1992, são criadas as Salas de Leitura Pólo, entendidas como “salas
pólos irradiadores para o desenvolvimento do projeto da Sala de Leitura” (Portaria nº
36/92/E-DGE –22/09/92). Para tanto, as mesmas passam a ter o seu acervo ampliado e a
dispor de equipamentos eletrônicos, além de dar suporte técnico e apoio para as demais
Salas de Leitura, chamadas a partir de agora de Salas de Leitura Satélites.
Quando chega às escolas, em 1996, a resolução que por mais tempo ficou na
base das Salas de Leitura (resolução nº 560), esta confere aos professores das Salas Pólo
a responsabilidade pela implementação da proposta dos Núcleos de Mídia Educação.
Para isso, esses profissionais precisavam ter conhecimento especializado em Gerência

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de Projetos Mídia Educativos. Sendo assim, além das atribuições apontadas em


resoluções antecedentes, o professor da Sala de Leitura passa a gerenciar os recursos de
mídia educacional, devendo orientar a discussão, com os demais professores, sobre as
práticas a serem desenvolvidas em relação aos programas veiculados pela MULTIRIO -
empresa de Multimeios da Prefeitura do Rio de Janeiro, responsável pela produção de
programas de TV, vídeos, sites, CD-ROM e publicações voltadas prioritariamente para
a Rede Municipal de Ensino do Rio de Janeiro.
Dentro desta nova configuração, passam a ser algumas das atribuições das Salas
de Leitura: promover atividades que compreendam empréstimos do acervo, orientação à
pesquisa, oficinas, exposições, feiras, concursos, sessões de vídeo com debates, rodas de
leitura, encontro com autores, produção de programas de vídeo, de rádio, jornais, sites,
tendo sempre como objetivo estimular a criatividade, o senso crítico e a produção do
conhecimento. Neste momento, as Salas de Leitura encontram-se definidas como
espaços multimidiáticos, onde a leitura e a tecnologia precisam caminhar juntas.
Assim, a concepção de leitura se alarga de tal forma, que estas a meu ver passam
voltam a ser espaços de multimeios.

“Então, assim, você acaba desvalorizando o trabalho, porque você


acaba tendo que dar conta de muita coisa. Aí a gente acaba se
perdendo um pouco, quando entrei tinha essa visão que ia dar conta de
tudo, mas hoje em dia eu amadureci. Então mesmo que você não dê
valor para o trabalho que eu estou fazendo, eu sei aonde eu quero
chegar, eu sei qual é o produto que eu quero dos meus alunos da sala
de leitura. Eu sei que quando eu desenvolvo um jornal, ele vem de
uma leitura prévia, ele vem da valorização da leitura, acho que isso a
sala de leitura não pode perder, porque o carro-chefe da sala de leitura
são os livros, todo o resto são desdobramentos.”. (Depoimento de uma
professora de Sala de Leitura concedido em entrevista).

Após dez anos da resolução de 1996, chega às escolas o fascículo de atualização


do núcleo Curricular Básico Multieducação – currículo que esteve em vigor de 1996 à
2009, mas ainda hoje tem seus sentidos permeados nas práticas da rede. Tal fascículo
foi produzido pela Divisão de Mídia e Educação em 2006 e distribuído na rede como
um documento destinado ao trabalho das Salas de Leitura, intitulado Multieducação
temas em debate: Sala de Leitura. Tal documento reconhece que as práticas leitoras
desenvolvidas na escola, são em sua maioria, reflexo do que se espera da educação, da
escola e da sociedade.

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Vale destacar que a criação deste e de outros fascículos de atualização se deu a


partir de 2001, num contexto onde o Departamento Geral de Educação realizou
consultas sistemáticas aos diferentes níveis de atuação da SME/RJ, objetivando a
Atualização do currículo Multieducação. Dentro dos muitos questionamentos que
nortearam tal processo de atualização, as Salas de Leitura foram uma das demandas que
necessitavam ser atualizadas, uma vez que não haviam sido mencionadas na primeira
Multieducação. Assim, as Salas ganham um documento que, pela primeira vez, traz para
toda a rede a proposta de trabalho das mesmas dentro das escolas da Rede Municipal do
Rio de Janeiro.
Ao ganhar seu próprio documento curricular, a Sala de Leitura ganha outras
identidades literárias (vídeo, TV, computador), que são fruto de disputas que resultaram
numa leitura vivenciada de forma ampla e que visa abarcar inúmeros discursos para a
significação de tal trabalho. As Salas de Leitura passam a dar conta de projetos dos mais
diversos, com ou sem a Leitura. Este espaço passa a ser um braço da escola, um braço
da SME e um braço da mídia, um espaço que tem que dar conta de tudo.
Neste contexto, o fascículo defende um espaço dedicado à leitura, o mesmo
tempo em que traz a promoção de leituras diversas, fazendo com que as mídias passem
a ter espaço nas Salas de Leitura. É deste modo que a Sala de leitura, a meu ver, volta a
ser um espaço de multimeios.

Você acaba tendo que ser uma pessoa com mil braços, é uma função
que se desdobra muito, porque você tem independentemente do
tamanho da escola, você tem um só professor para fazer todo o
desdobramento em várias outras funções: você passa a ser o cara da
mídia, o cara da informática e o cara da leitura, entendeu?
(Depoimento de uma professora de Sala de Leitura concedido em
entrevista).

Acredito que a concepção de leitura desenvolvida e ampliada pelo fascículo traz


uma perspectiva de leitura que muito dialoga com a intenção da própria gestão da
SME/RJ daquele momento, visto que tal visão se faz presente em outros fascículos de
atualização e nos próprios produtos da Multirio distribuídos na época. Um exemplo é a
tão conhecida série Juro que Vi, uma série de desenhos animados, produzido pela
Multirio em parceria com uma Sala de Leitura, onde alunos da escola tinham contato
com diferentes linguagens que lhes auxiliaram na construção de um desenho animado
final.

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Os professores continuam a ter a atenção da SME/RJ, que oferece cursos de


capacitação, neste momento, voltado para as diferentes mídias, assim como também é
recorrente as reuniões entre as Salas de Leitura Satélite com suas Pólos e as Pólos com
o Grupo de Trabalho Mídia e Educação da SME/RJ (GT Mídia). Mas, ainda que haja
preocupação com a formação destes profissionais e que os mesmos troquem entre si as
diferentes experiências que esta leitura ampla traz, muitos professores se sentem
perdidos, e muitas vezes, sem concordar com os encaminhamentos de suas funções.

Aqui tem mídia sim, mas não uso muito não. A mídia sempre quando
eu uso, eu penso assim: vou usar um DVD relacionado à questão da
leitura. Porque senão você acaba perdendo o foco, eu não sei se o que
eu vou falar é muito grosso ou muito forte, mas o aluno não pode
perder que o foco é o livro, entendeu? Nós professores somos os
responsáveis por isso e somos nós mesmos! Então a gente tem que ter
o pé muito no chão para saber. Para eu formar leitores, eu não posso
perder o foco dos livros e eu acho que isso é importante. (Depoimento
de uma professora de Sala de Leitura concedido em entrevista).

Em 2010 chega às Salas de Leitura uma nova resolução (SME Nº 1072), e diz
que a Sala de Leitura Pólo deve funcionar com somente um professor (interessante
mencionar que este espaço funcionou com cinco professores a partir de 1996 e em 2009
houve uma redução para três professores). É então conferido a este o professor, além de
todas as funções já apresentadas aqui, fazer o reforço escolar com os alunos que por
algum motivo, não conseguem acompanhar suas turmas. Assim, mais um documento
chega e mais uma atribuição é dada ao professor da Sala de Leitura.
Atualmente, a Sala de Leitura se mostra mais centrada em aumentar os índices
de alfabetização, e para isso mudam-se as práticas, as posturas e o trabalho da própria
Sala - que é possível ver refletido no reforço, na mudança de estrutura da sala e também
na intenção de um espaço aberto sem necessariamente com um professor atuando no
mesmo. A mim, estas mudanças refletem diretamente no que se espera de tais
professores.

(...) a direção acaba que meio que deslocando o professor, por


exemplo, quarta-feira eu não vou estar aqui, eu vou para uma reunião
e quem deveria estar lá é a coordenadora pedagógica, que não pode ir,
a diretora não pode ir, sobrou para quem? para a professora da sala de
leitura: tapa o buraco de quarta-feira, Isso acontece muito! tira o
professor de sala de leitura, ele não tem turma! (Depoimento de uma
professora de Sala de Leitura concedido em entrevista).

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Em cada momento percebo necessidades diferentes, interesses diferentes que


negociam seu espaço dentro da Sala de Leitura. Ao ser incorporada na rede, a Sala de
Leitura precisava dialogar com o que ali já existia, transforma-se em um espaço
multimidiático. Depois, consolidada, a Sala de Leitura precisa acompanhar as mudanças
na própria concepção de leitura, hoje não se lê somente livros, desta forma a Sala de
Leitura volta a ser uma sala de multimeios. E agora, o foco da gestão que entrou em
2009 é a alfabetização, a Sala então se volta para a promoção da leitura e aproveita para
fazer reforço daqueles que não acompanham suas turmas. É com esta perspectiva que
olho para a ampliação de ação dos professores de Salas de Leitura e para as formações
discursivas e provisórias que constituem o perfil do profissional que ali se faz presente.
Com todas estas e outras mudanças na própria construção curricular destes
espaços, fica inevitável interpretar todo documento curricular (aqui incluo as
resoluções) sem um fechamento engessado, mas sim (re) significado a todo o momento,
visto que entendo os textos curriculares enquanto conjuntos abertos e coletivos onde
diferentes perspectivas são sobredeterminadas e negociadas a todo instante. Neste
sentido, Macedo (2008) contribui ao dizer que os currículos trazem sentidos
historicamente partilhados pelos sujeitos, mas ao mesmo tempo, possibilitam o
lançamento de novos sentidos. “São codificações instáveis e ambíguas, que abrem
múltiplas opções de leitura para além dos, também múltiplos, endereçamentos que
propõem” (p.12).
Opero então com a perspectiva de um currículo como produção cultural,
marcada pela negociação entre discursos culturais que estão constantemente em disputa
para significar o mundo. Trata-se de um espaço de criação, uma construção contínua de
sentidos fruto das relações entre fontes resultantes de um processo híbrido e fluido
(LOPES, 2010). Penso então ser o currículo, um fluxo de culturas, de discursos, de
perspectivas, de posições, de poder, de identidades, de diferenças, de políticas, de
conhecimento e cotidianos (...), um fluxo de sentidos que não se completa, mas que está
sempre borbulhando de sentidos provisórios e incompletos que disputam entre si e que,
(re) criam-se a partir das relações dos sujeitos que estão envolvidos.
Embora eu reconheça que o currículo traga fundamentalmente um parâmetro de
condução do processo de ensino-aprendizagem, penso que este está para além de um
programa de propostas bem definidas, ou um documento onde encontramos metas e
objetivos que precisam ser aplicados em sala de aula, mas entendo que este é um
artefato histórico-social continuamente negociado. Neste sentido, penso ser o currículo

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um processo de construção de sentidos contínuo, articulado, negociado, contestado,


discursivo, ideológico, político, momentâneo.
Com esta postura fluída e flexível do currículo se mostra mais atraente e justa
com um espaço tão heterogêneo como se apresenta a Sala de leitura. Mas ainda sim
acredito ser necessário um foco mais claro e direto do que se espera de tal espaço e de
seus professores, pois pelo o que analisei e assisti, sinto uma flutuação dos sentidos de
tal espaço, o que muito influi para esta postura um tanto conflituosa do professor de
Sala de Leitura. De forma alguma estou aqui para defender um estancamento do perfil
ou identidade deste professor, mas reconheço que uma centralidade de tal perfil só tem a
contribuir para o trabalho que ali se pretende desenvolver.
Assim, embora eu reconheça que existam indicações do que se é esperado nas
Salas de leitura, e defenda uma centralidade das ações deste espaço, seus professores
produzem para além do quem vem posto em documento, uma vez que são estes peças
fundamentais para a constituição deste espaço. É neste sentido que considero os
professores de Sala de Leitura essenciais para a vivência das mesmas, não simplesmente
por serem regentes daquele ambiente, mas fundamentalmente, porque de fato produzem
coisas novas, reproduzem e produzem seus currículos.
Para lidar então com a amplitude da leitura e das intenções da Sala de Leitura, os
seus professores precisam tentar representar um conjunto de elementos que são
heterogêneos entre si. Com esta perspectiva, penso que esta amplitude da Leitura reflete
diretamente na movimentação tão intensa do perfil e do trabalho do professor de Sala de
Leitura. O acúmulo de sentidos que a sala de leitura sofre, a meu ver, muito contribui
para a multiplicidade de atribuições de seus professores.

3. Professores regentes de Sala de Leitura ou Encarregados de Multimeios?


Embora a Sala de Leitura tenha conquistado seu espaço, seu documento
curricular e o lugar de seus professores, com a quantidade de atribuições que estes
foram somando ao longo das resoluções e da união mídia e leitura, penso que estes
acabam por voltar a serem encarregados de multimeios, no sentido em que são
entendidos como dinamizadores dos multimeios da escola apenas e, não difusores da
leitura.
Como já mencionado, não foi desde o início que os professores de Sala de
Leitura foram reconhecidos como tal, no começo de sua implantação as Salas de Leitura
funcionavam com os professores readaptados e com os antigos encarregados de

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multimeios. Segundo a resolução (nº12/90 E-DGE), responsáveis pelas bibliotecas


possuíam algumas atribuições específicas, como: participar da elaboração do
planejamento Sala de Leitura, orientar professores e alunos na produção/utilização dos
Multimeios e avaliar as atividades desenvolvidas na Sala de Leitura. Somente em 1992,
com a resolução nº 37/92/E-DGE é que os professores passam a ser denominados
Professores Regentes de Sala de Leitura. Assim, a carga horária do professor de Sala de
Leitura é prevista em lei.
A partir de agora o professor de SL possui responsabilidades específicas de
organização, dinamização e mediação na comunidade escolar para a composição desses
acervos. Desta maneira, este profissional passa a ser responsável pelo desenvolvimento
de projetos voltados para a formação do leitor, que incorporem o uso e a produção de
diferentes mídias e suas respectivas linguagens (livro, revista, vídeo, jornal, rádio,
internet, entre outras), para tanto o mesmo participa de cursos e capacitações oferecidas
pela SME e pela Divisão de Mídia e Educação, além de transmitir o que foi aprendido
aos demais professores de sua escola.
Embora até então, tenham resoluções que falem dos professores, as suas
atribuições não são explicitadas, assim como eram para o professor encarregado de
multimeios. Somente em 1996, com a resolução nº560, é que suas atribuições são de
fato definidas. Esta resolução se torna fundamental por ficar em vigor por mais de dez
anos e por trazer, pela primeira vez na história documental das Salas de Leitura, as
atribuições detalhadas de ambos os professores de tal espaço: professor da Sala de
Leitura Satélite e Pólo.
Para o professor da Sala de Leitura Satélite, o documento traz atribuições como:

1- Conhecer, discutir e difundir os princípios político pedagógicos da


proposta Multieducação.
2- Gerenciar os recursos mídia educacionais, propiciando a
participação de professores e alunos num processo de produção
coletiva;
3- Organizar junto com a equipe de direção, reuniões com o grupo de
professores da escola, visando garantir a articulação do trabalho de
Sala de Leitura, com o planejamento pedagógico da Unidade Escolar.

A resolução ainda deixa clara a função bibliotecária de seus professores ao


apresentar as funções como: inventariar todo o material que chega às salas, registro e
catalogação dos livros, organização do acervo e empréstimos do mesmo. Para os
professores de sala de leitura pólo, o documento resolve além de tudo o que já foi

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mencionado atribuições de irradiação de seu trabalho e acervo para as demais salas,


como:
8- Multiplicar com as escolas que compõem seu pólo as reuniões com
a equipe da divisão de mídia-educação.

Quando a Sala de Leitura ganha em 2006 seu fascículo curricular, ganha


algumas dicas com as quais podemos ter uma noção do que era esperado para seus
professores:

Outro aspecto importante a considerar é o fato de que ensinar a ler é,


antes de tudo, ensinar a escolher. Mais do que submeter o aluno a uma
lista interminável de leituras recomendadas para o ano letivo ou a
outros rituais de leitura, obrigando-o a tornar-se leitor, a mediação do
professor poderá favorecer o encontro dos alunos com diversos textos,
de modo que possam, a partir deste exercício, selecionar o quê, como,
por que e quando querem ler. (SME/RJ, 2007, p. 13)

Ou seja, ao falar de uma Leitura ora ampla ora centrada, as Salas de Leitura
abrangem múltiplas demandas, discursos e textos, o que faz com que a mesma dialogue
com diferentes significados, produzindo aquilo que poderíamos entender como uma
multiplicidade de sentidos para um mesmo espaço, logo, um multiprofessor para este
espaço é de fato o mais apropriado. Na tentativa de articular diferentes demandas e
discursos dentro de um mesmo espaço, as Salas de Leitura acabaram tendo um
esvaziamento em sua função de incentivo à leitura em si, e a meu ver, perdem o foco de
seus professores, que ora se preocupam com as salas, e ora se preocupam com espaços
ou funções que não são de sua responsabilidade.

4. Considerações Provisórias
Pensando então sobre esta crise de identidade, penso que um multiprofessor com
multifunções facilita, por exemplo, a sua retirada de sala, visto que a meu ver, tal saída
que acaba por ser justificada pela amplitude de ações entendidas enquanto funções da
Sala de Leitura. Neste sentido, acredito que o multifoco da Sala de Leitura prejudica seu
funcionamento, assim como também, seus professores, que acabam por não serem
reconhecidos ou valorizados, pois estes acabam sendo vistos com um “faz tudo” dentro
da escola.

(...) Esse é o grande nó das salas de leitura hoje. Né!? Não é o trabalho
e cultura, não é você ter um elemento só. Na verdade não é esse o
problema. O grande problema é você hoje, é que o elemento de sala de
leitura é tapa buraco. Essa é a grande questão... porque você está

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sempre sendo requisitada pra cobrir a falta de um professor. Sempre!


Sempre! E o piro é que investem em mim, a secretaria investe em
mim, mas para que? (Depoimento de uma professora de Sala de
Leitura concedido em entrevista).

Com a entrada de novas tecnologias na escola, a Sala de Leitura busca fazer uma
discussão a respeito da mudança nos protocolos de leitura do o mundo atual, o que não
significa necessariamente a substituição de um modo de ler por outro, mas sim a
articulação e negociação entre textos e hipertextos, devidos às novas configurações
proporcionadas pelas tecnologias digitais. É deste modo que a Sala de Leitura, a meu
ver, volta a ser um espaço de multimeios.
Ao abarcar tantas leituras, será que a sala de leitura ainda é um lugar para se
encontrar um bom motivo para ler? A necessidade de articular diferentes demandas
(mídias em geral) não fez com a leitura em si se perdesse? O que podemos perceber
muito claramente nas Salas de Leitura hoje é um reflexo do que está em pauta nas
propostas educativas, o mundo da informação e da tecnologia dentro da escola, e da sala
de aula. Assim o objetivo central da Sala de Leitura se expande de tal forma, que penso
que, nem o mundo da leitura e nem o mundo da tecnologia cabem mais dentro do
mesmo espaço e que um único professor para ambas as funções não se faz ideal.

Ler o mundo e a palavra, muitos textos e muitas leituras, assim a gente


pode tirar muita leitura, compreensão e análise, muito vídeo,
computador! A gente já trabalhava com isso, com jornal e com uma
série de outras coisas, mas aí foram entrando os computadores e todos
os professores foram capacitados para mexer neles e tal, mas a Sala de
Leitura foi ficando cheia e agente sem saber o que fazer. (Depoimento
de uma professora de Sala de Leitura concedido em entrevista).

Referências Bibliográficas

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Fonte: http://www.rio.rj.gov.br/sme/

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Livro 3 - p.004569

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