Scientific American Brasil - Edição 175 - (Agosto 2017)
Scientific American Brasil - Edição 175 - (Agosto 2017)
Scientific American Brasil - Edição 175 - (Agosto 2017)
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G E Agosto 2017 | www.sciam.com.br
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10 O
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ANO 15 | no 175
R$ 19,90 | 4,90
S
MAI
A CIRURGIA QUE
CURA DIABETES
Procedimento pode
amenizar e at extinguir
doena crnica
O SUMIO
DOS VIKINGS
Estudos explicam
por que eles
abandonaram
a Groenlndia
AS TEIAS DA MEMRIA
BURACOS
NEGROS
EXPLICAM
MATRIA
ESCURA?
Gigantes csmicos
podem ser resposta
para o enigma
AS TEIAS DA
MEMRIA
EDIO N 175 - AGOSTO|2017
00175
9 771676 979006
ISSN 1676-9791
ANO 15
GENTIC A
22 Destravando o
mistrio da ELA
Mutaes recm-detectadas trazem
pistas de como a doena destri os
neurnios motores e rouba a mobi-
lidade dos doentes. Achados
podem levar a terapias medicinais
contra um mal que h muito resis-
te a tratamentos. Leonard Petru-
celli e Aaron D. Gitler
76
A R Q U E O LO G I A
28 O sumio dos vikings
da Groenlndia
Por centenas de anos a ilha foi um
posto avanado gelado, mas por
fim as colnias entraram em
colapso. Novas descobertas
elucidam esse declnio enigmtico.
A N T R T I C A
Zach Zorich R E P O R TAG E M E S PE C I A L C I DA D E S S U S T E N TV E I S
88 Desafio na neve
CINCIA MARINHA 60 Como as cidades Pesquisas brasileiras no
36 Sem rumo no mar poderiam nos salvar continente gelado permitem
A acidificao dos oceanos pode reas urbanas podem melhorar o plane- conhecer a histria do
alterar o comportamento de orga- ta, assim como a vida das pessoas, se as planeta e at acompanhar as
nismos subaquticos de maneiras projetarmos para serem mais eficientes variaes climticas em
desastrosas. Danielle L. Dixson no uso de energia, gua, alimentos e nosso pas. Mas, apesar dos
A P R E N D I Z AG E M D E M Q U I N A minerais. William McDonough bons resultados at aqui, o
40 Por uma IA mais humana 64 Explorando o lixo futuro incerto devido
A inteligncia artificial vem pas- Transformar resduos caros em recur- carncia de verbas.
sando por uma renovao desde sos valiosos pode tornar cidades alta- Martha San Juan Frana
que comeou a incorporar nosso mente eficientes. MichaelE. Webber
conhecimento sobre como as crian-
70 Trnsito inteligente
as aprendem. Alison Gopnik
Uma teia mvel de veculos dotados
NEUROCINCIA de sensores e cruzamentos
46 A rede intrincada inteligentes transformar o modo
da memria
CAPA: GETTY IMAGES ( cabea e padro de web); NESTA PGINA: GETTY IMAGES ( danarinos)
www.sciam.com.br 3
5 Carta do editor
FRUM
C I N C I A E M PAU TA
8 No podemos evitar
futuros surtos de doenas
Contudo, os Estados Unidos podem minimizar o
8 perigo com um grande fundo de emergncia de sade
9 Memria
10 Avanos
- Atlntida amaznica
- Ursos danantes
- Nascidos para ser bons pais
- O material dos sonhos
- Plantas podem ouvir?
- Segredos e mentiras
- Florestas minguantes
- Foguetes quentes
- O ajudante rob da vov
12
- Territrio desconhecido
DE SAFIOS DO COSMOS E CU DO M S
96 Livros
CINCIA EM GR FICO
98 O pico de bebs
Nascimentos culminam em dias teis
durante os turnos de trabalho diurno.
16 Mark Fischetti e Zan Armstrong
ALGUNS COLABORADORES
Leonard Petrucelli professor e Alison Gopnik professora de da Antena Espacial para Michael E. Webber vice-diretor publicados, entre outros, por
presidente do departamento de psicologia e professora associada Interferometria Laser (Lisa), do do Instituto de Energia, codiretor The Washington Post, MIT
neurocincia da Clnica Mayo em de filosofia da Universidade da Levantamento de Energia Escura e da instituio Clean Energy Technology Review e Psychology
Jacksonville, Flrida. Califrnia em Berkeley. Suas da Agncia Espacial Europeia. Incubator e professor de recursos Today. Ela tambm autora de
pesquisas focam como as crianas energticos na Universidade do Stress Less (Hudson Street Press,
Aaron D. Gitler professor pequenas aprendem sobre o Sbastien Clesse um cosmlogo Texas em Austin. Seu livro mais 2010).
associado de gentica na mundo que as cerca. belga e pesquisador de ps- recente Thirst for power: energy,
Faculdade de Medicina da doutorado da Universidade water, and human survival (Yale Clnico e cientista, Francesco
Universidade Stanford. Alcino J. Silva Professor Tcnica da Rennia do Norte- University Press, 2016). Rubino chefe do departamento
Honorrio e diretor do Centro Vestflia, em Aachen, Alemanha. de cirurgia baritrica e metablica
Zach Zorich um jornalista Integrativo de Aprendizagem e Seu trabalho abrange inflao Carlo Ratti arquiteto e engenheiro, do Kings College, de Londres, e
frilancer do Colorado. Seu mais Memria da Universidade da csmica, gravidade modificada e diretor do Senseable City Lab, no cirurgio do Hospital Kings
recente artigo para Scientific Califrnia em Los Angeles. Seu buracos negros primordiais. Clesse Instituto de Tecnologia de College. Ele membro
American descreveu como a laboratrio (www.silvalab.org) participa da misso Euclides e Massachusetts, e fundador do estdio remunerado dos conselhos
construo das pirmides de Giz estuda mecanismos de memria, colabora com o Arranjo de um de design Carlo Ratti Associati. consultivos cientficos da GI
revolucionaram a organizao assim como as causas e os Quilmetro Quadrado. Dynamics e da Fractyl,
social do Egito. tratamentos relativos a distrbios Assaf Biderman inventor, diretor companhias que desenvolvem
da memria. William McDonough um associado do Senseable City Lab, e tratamentos intestinais para
Danielle L. Dixson professora arquiteto inovador que capitaneou fundador da Superpedestrian, uma diabetes, e consultor das
assistente de polticas e cincias Juan Garca-Bellido fsico terico e o design para um desenvolvimento empresa voltada ao fabricantes de dispositivos
marinhas da Universidade de professor no Instituto de Fsica sustentvel. Ele fundador da desenvolvimento de veculos mdicos Ethicon e Medtronic.
Delaware. Ela estuda como as Terica de Madri. Sua pesquisa gira empresa William McDonough + robticos para ocupao por uma
mudanas climticas e a em torno do Universo primordial, Partners e da McDonough ou duas pessoas. David Pogue colunista-ncora da
degradao de hbitats afetam o energia escura, buracos negros e Innovation, alm de cofundador do Yahoo Tech e apresentador das
comportamento de organismos gravidade quntica. Garca-Bellido Instituto de Inovao de Produtos Thea Singer uma jornalista de minissries NOVA, na rede pblica
marinhos. membro das misses Euclides e Bero a Bero. cincia de Boston com artigos de tev PBS.
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ASSINATURAS Cartas e mensagens devem trazer o nome e o endereo do autor.
SUPERVISORA Cludia Santos Por razes de espao ou clareza, elas podero ser publicadas de
EVENTOS ASSINATURAS Simone Melo forma reduzida.
VENDAS TELEMARKETING ATIVO Cleide Orlandoni
PRESIDENTE Edimilson Cardial PUBLICIDADE
DIRETORIACarolina Martinez, Marcio Cardial OPERAES Anuncie na Scientific American e fale com o pblico mais
e Rita Martinez CONTROLADORIA Fabiana Higashi qualificado do Brasil. [email protected]
FATURAMENTO/CONTAS A RECEBER Karen Frias
ANO 15 AGOSTO DE 2017 CONTAS A PAGAR Siumara Celeste CENTRAL DE ATENDIMENTO AO LEITOR
ISSN 1676979-1 RECURSOS HUMANOS/DEPTO. PESSOAL Roberta de Lima Para informaes sobre sua assinatura, mudana de endereo,
renovao, reimpresso de boleto, solicitao de reenvio de
EDITORPablo Nogueira SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL uma publicao mensal da Editora exemplares e outros servios
EDITOR DE ARTE Cleber Estevam Segmento, sob licena de Scientific American, Inc. So Paulo (11) 3039-5666
ESTAGIRIA Marlia Fuller (web) SCIENTIFIC AMERICAN INTERNATIONAL De segunda a sexta das 8h30 s 18h,
PRODUO GRFICASidney Luiz dos Santos EDITOR IN CHIEF: Mariette DiChristina [email protected]
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Aracy Mendes da Costa, Laura Knapp, Regina Cardeal, Suzana
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Schindler (traduo)
TOPIC EDITORS: Mark Fischetti, Josch Fischman, Seth Fletcher, Gary Stix lojasegmento.com.br ou pela CENTRAL DE ATENDIMENTO AO LEITOR
investimento,
tos pblicos inflao nos prximos 20 anos. Com um agravan-
te: o ano de referncia dessa PEC 2016, quando o oramento
do MCTIC foi de R$ 7,1 bilhes o que corresponde ao oramen-
no despesa
to de 2007 em valores corrigidos.
Isso significa que vamos retroceder em uma dcada em
termos oramentrios para financiar um sistema que cres-
Nossa produo cientfica se multiplicou ceu expressivamente nos ltimos 10 anos, como mostram os
nmeros de publicaes, de alunos de doutorado, de progra-
por sete em vinte anos, mas ainda mas de ps-graduaco e de grupos de pesquisa em ativida-
carecemos de uma poltica de Estado de no pas.
Em 2006 publicamos 33.498 artigos em peridicos cientfi-
Helena B. Nader cos indexados; em 2015, foram 61.122. Esse crescimento fez com
que o Brasil subisse duas posies no ranking mundial de pro-
O financiamento da cincia, tecnologia e inovao no Brasil duo cientfica, alcanando o 13 lugar. Em 2006, nossos cur-
repleto de altos e baixos. No adquire estabilidade, o que seria sos de doutorado tinham 46.572 alunos, sendo que naquele ano
bom, nem um crescimento constante, o que seria timo, por se titularam 9.366 deles. Em 2015, os nmeros dobraram: havia
uma razo que j foi de h muito identificada: C,T&I, em nosso 102.365 alunos inscritos, e 18.625 que obtiveram o grau de dou-
pas, ainda no ganhou o status de poltica de Estado. Como se tor, respectivamente.
limitam condio de poltica de governo, esto sempre sujei- Os programas de ps-graduao passaram de 2.266 para
tas maneira peculiar com que cada governante estabelece suas 3.828. Os grupos de pesquisa, em 2006, eram 21.024 e abriga-
prioridades, e s intempries das crises econmicas. Que no vam 90.320 pesquisadores. Em 2016, esses nmeros aumenta-
tm sido raras. ram para 37.460 e 199.566, respectivamente.
Assim, temos por exemplo que, desde o incio deste sculo, Entre 1996 e 2015, nossa produo cientfica se multipli-
o Fundo Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico cou por sete, enquanto a produo cientfica mundial cresceu
(FNDCT) no sofreu contingenciamento por parte do governo 2,8 vezes. Dentre os pases do Brics, nesse perodo perdemos
federal em apenas um ano: 2010. somente para a China, cujo crescimento da produo cientfi-
Entre 2005 e 2016, os contingenciamentos do FNDCT soma- ca foi de 14,5 vezes.
ram perto de R$ 20 bilhes. Nesse mesmo perodo, valor equi- Na comparao com os demais membros do bloco, o Brasil
valente deixou de ser executado nos oramentos anuais do hoje ficou acima: a produo cientfica da ndia cresceu 5,9 vezes; a
Ministrio da Cincia, Tecnologia, Inovaes e Comunicaes da frica do Sul, 4,0; e da Rssia, 1,8. Quase empatamos com a
(MCTIC). Esse total soma R$ 40 bilhes que deixaram de ser Coreia do Sul, que multiplicou por 7,2 sua produo de cincia
investidos em C,T&I naquele perodo de 12 anos. no mesmo perodo. Para comparar com outras economias emer-
Para fazer uma comparao, o maior oramento do Minist- gentes: o Mxico cresceu 4 vezes e a Austrlia, 3,5.
rio ocorreu no ano de 2013, totalizando R$ 9,2 bilhes. Ou seja, Um aspecto a ser notado que nossa produo cientfica
os R$ 40 bilhes contingenciados entre 2005 e 2016 correspon- diversificada, sendo que em algumas reas ocupamos posi-
dem a quatro anos e meio do maior oramento do MCTIC, e isso o de destaque em termos mundiais. Vemos isso em reas tais
sem aplicar a correo da inflao. como a agronomia, a veterinria, a zoologia, a parasitologia e o
Para o ano de 2017 houve um prenncio catastrfico. Ele no campo de medicina tropical.
se confirmou porque elevamos a presso sobre o governo fede- Dizer que nossa cincia produz somente papers algo que
ral. Com isso, o MCTIC conseguiu verbas, inclusive obtidas atra- no se sustenta. Temos os exemplos exitosos, em termos globais,
vs da repatriao, para a quitao de dvidas acumuladas de do pr-sal, da agropecuria e da aeronutica para mostrar que
anos anteriores do CNPq e da Finep (formalmente chamadas de sabemos tambm transformar conhecimento cientfico e tecno-
restos a pagar) e para o pagamento dos projetos aprovados no lgico em riqueza econmica.
Edital Universal, alm de ter revertido o contingenciamento dos O que nos falta, portanto, uma poltica de Estado para
recursos para o novo anel de luz sncrotron. C,T&I. Precisamos obter o reconhecimento, pela sociedade e
Essas vitrias, mesmo que custosas, amenizam apenas pelo governo, de que os gastos em C,T&I no podem ser enten-
situaes pontuais. Estruturalmente, o financiamento a C,T&I didos como pagamentos de despesas do dia a dia, mas sim como
um problema que se agrava para alm dos contingenciamentos investimentos no futuro do pas. Coreia do Sul, Finlndia e Chi-
e inconstncias dos oramentos. na, por exemplo, fizeram essa opo e passaram a se destacar
A SBPC argumentou exaustivamente junto ao poder execu- nos ltimos anos em razo de sua economia inovadora, pujan-
tivo e ao poder legislativo, se articulou com as demais entida- te e competitiva, altamente baseada no conhecimento cientfi-
des do Sistema Nacional de C,T&I, falamos com a imprensa, co e tecnolgico.
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CINCIA EM PAUTA
O PINI O E A N LI S E S D O C O N S E L H O
D E E D ITO R E S DA S C IENTIFIC A MERIC AN
No podemos
evitar futuros
surtos de doenas
Contudo, os Estados Unidos podem
minimizar o perigo com um grande
fundo de emergncia de sade
Pelos editores
AGOS TO
1967Agricultura
eficiente 1917Protegendo
flores silvestres
O fato de a produo de alimen- Nos ltimos 15 anos, alguns
para realizar palestras ilustra-
das em escolas e faculdades.
Britton tambm ajudou a criar o Jardim
tos e fibras s ocupar 5% da fora amantes da natureza tm reali- Botnico de Nova York em 1891.
de trabalho dos EUA deve-se prin- zado, neste pas, uma sria cam-
cipalmente mecanizao da agri- panha em prol da preserva- Carros eltricos para
cultura. Outros desenvolvimen- o de nossas flores do campo transportar cargas
tos tecnolgicos fertilizantes nativas e outras plantas silves- A pronta manipulao e o rpi-
1967
qumicos, pesticidas, cruzamen- tres. De acordo com uma reviso do descarregamento de vages
to de plantas e assim por dian- desses esforos, publicada pela de carga hoje um fator extre-
te fazem contribuies essen- Sra. Elizabeth Britton no Ame- mamente importante na mobili-
ciais, mas a mecanizao ainda rican Museum Journal, algu- zao da guerra industrial, parti-
o fator mais extraordinrio. A mas das plantas que se encon- cularmente no manejo de min-
colheita e a limpeza de uma cul- tram na mais urgente necessi- rio de ferro nas docas. Um novo
tura geralmente respondem por, dade de proteo agora esto tipo de veculo empurrador de
pelo menos, metade do custo total quase extintas em muitas partes vages, projetado com o propsi-
de produo. Esta tambm , de do pas, onde no passado eram to de acelerar o descarregamen-
1917
longe, a parte mais difcil do pro- comuns. O movimento de preser- to de cargas e os prprios carros,
cesso agrcola a ser mecanizado. vao comeou em 1901 com um alm de eliminar a necessida-
Ainda assim, a mecanizao de fundo de US$ 3.000,00 destina- de de uma pequena locomoti-
colheitas tem feito tanto progres- do a esforos de pesquisa e pre- va com motor de comutao
so que, apesar do custo das mqui- servao de nossas plantas nati- mostrado na ilustrao. O ve-
nas e outros recursos tcnicos, o vas. A Sociedade de Preservao culo empurrador impulsiona-
custo de alimentos para fam- de Flores Silvestres da Amri- do por um nico cabo, que se
lias, em termos de sua porcenta- ca agora tem comits em vrias estende entre os trilhos ao lon-
gem (18%) em relao s suas ren- cidades. A verba subvenciona o go de toda a extenso da doca.
1867
das, o mais baixo do mundo. preparo de ensaios, folhetos, car- O cabo est firmemente anco-
Dados de 2015 do Departamento tazes e apresentaes de slides rado a alicerces de concreto em
de Agricultura dos EUA mostram em lanternas mgicas [precur- ambas as extremidades por meio
que a proporo do custo de ali- soras do projetor de imagens], de um dispositivo de tenso da
mentos por famlia ainda o mais mola, o que o mantm retesado.
baixo do mundo.
O leito marinho
se expande?
A hiptese de que o leito dos
1867Ensinando
odontologia
Quarenta anos atrs, cirurgi-
oceanos tem se expandido pro- es e mdicos geralmente desem-
cura explicar certos traos de penhavam a funo de extrato-
bacias ocenicas e dos continen- res de dentes sempre que alguma
tes ao supor que o material que ocasio o exigia. Em 1820, havia
ascende do interior da Terra for- apenas 30 dentistas praticantes
ma dorsais meso-ocenicas e nos EUA. Em 1850, este nme-
ento, medida que novo mate- ro havia saltado para 2.923, e atu-
rial sobe, se move para fora, dis- almente existem cerca de cinco
tanciando-se das cordilheiras. A mil. Uma faculdade para a educa-
SCIENTIFIC AMERICAN, VOL. CXVI, N 23; 9 DE JUNHO DE 1917
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AVANOS
GEOLOGIA
Atlntida
amaznica
Sedimentos sugerem que a vasta
bacia fluvial teve um passado
mido e salgado
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AVANOS
autores, Carlos Jaramillo, do Instituto Smith- grande quanto os EUA continentais, mas h
sonian de Pesquisas Tropicais, e Jaime Esco- quase 14 milhes de anos era um oceano.
bar, da Universidade do Norte, na Colmbia, As novas descobertas coincidem com
e colegas sustentam que o Mar do Caribe uma pesquisa anterior, de Carina Hoorn, da
invadiu a costa sul-americana via Venezue- Universidade de Amsterd, e da Universida-
la e Colmbia, cobrindo largas faixas da Ama- de Regional Amaznica Ikiam. Recentemen-
znia com uma lngua de gua salgada te, ela determinou a idade do rio, mas no
que avanou continente adentro. medida participou do estudo publicado em Science
que avanou, a gua perdeu profundidade e Advances. Juntas, as evidncias de incurses COM PORTAMEN TO AN IMAL
se tornou um ecossistema marinho/salobro, marinhas na Amaznia so esmagadoras e
depois uma zona transicional mida, que por
fim deu lugar terra seca. Camadas distin-
abrem o caminho para mais pesquisas sobre
como o ambiente marinho pde ter influen-
Ursos
tas nos ncleos sedimentares mostram que,
na Colmbia, os perodos de inundao dura-
ciado a evoluo da biodiversidade da regio,
diz Hoorn. Outros so mais cautelosos. Este
danantes
ram, cada um, 900 mil e 3,7 milhes de anos, artigo fornece evidncias importantes, mas Movimentos rotatrios deixam
enquanto na Amaznia ocidental se prolon- no conclusivas, diz Christopher Dick, da mensagens cheirosas nas
garam por 200 mil e 400 mil anos cada um. Universidade do Michigan, que estuda diver-
patas dos animais
Os pesquisadores tambm descrevem sificao botnica em vrias partes da Ama-
como ncleos sedimentares produziram evi- znia. Mas a maioria dos outros cenrios
H dcadas bilogos especializados em
dncias fsseis que sustentam a ocorrn- ainda possvel, mesmo com esses dados.
ursos sabem que esses animais se movem
cia dessas inundaes. Os macrofsseis mais Jaramillo e seus coautores no chegam
de um jeito engraado, que recebeu ape-
interessantes encontrados no ncleo sedi- a afirmar que as incurses de guas salinas
lidos como andar de caubi, ou apenas
mentar, de vrios centmetros de largura, na sozinhas so a causa da biodiversidade ama-
dana de urso. Muitos pesquisadores
regio colombiana de Saltarin, so um den- znica, mas acham que vrios dos gneros de
supunham o motivo disso, mas um estudo
te de tubaro, possivelmente de um tuba- plantas existentes na floresta atual poderiam
recente finalmente ofereceu pistas slidas.
ro-galha-preta ou de um tubaro-martelo e traar suas linhagens a espcies que viviam
Enquanto andam, os ursos pisam e
de uma lacraia-do-mar, um organismo mari- em florestas permanentemente inundadas.
giram seus ps vigorosamente no cho.
nho que se enterra no fundo de mares tropi- Dick discorda. De uma perspectiva botnica
s vezes, at pisam nas pegadas deixadas
cais. Encontrar um dente de tubaro em um terrestre, diz, seria difcil provar que qualquer
por outros ursdeos, depois de darem uma
ncleo to estreito significa que tem de haver diversidade de espcies existentes pudesse
boa farejada nelas. Alguns cientistas tm
muitos outros mais, e aponta para a extenso ser atribuda s inundaes.
se referido a esses rastros coletivos como
da penetrao das guas salgadas, diz Jara-
Tudo indica que o trabalho de detetive rodovias de ursos, porque elas se torna-
millo. A floresta Amaznica um sistema
sobre este poderoso rio e a floresta que ele ram bem transitadas ao longo do tempo.
muito dinmico e no to antigo quanto se
nutre ainda se prolongar consideravelmente Todo mundo suspeitava de que havia
pensava antes. Hoje, ela cobre uma rea to
CARLOS JARAMILLO ET AL., EM SCIENCE ADVANCES, VOL. 3, N 5, ARTIGO N E1601693; 3 DE MAIO DE 2017; ART WOLFE Getty Images (ursos)
no futuro. AngelaPosada-Swafford alguma coisa [nas pegadas], diz Agnies-
PGINAS ANTERIORES: INGO ARNDT Getty Images; T; ESTA PGINA: FONTE: MIOCENE FLOODING EVENTS OF WESTERN AMAZONIA,
zka Sergiel, biloga no Instituto de Con-
servao da Natureza da Academia Polo-
Primeiro evento de inundao, h cerca de 17,8 milhes de anos Segundo evento de inundao, h cerca de 13,7 milhes de anos
nesa de Cincias e coautora do estudo,
Mar do Caribe publicado em Scientific Reports. Mas nin-
gum realmente investigou. Ela e seus
colegas se perguntaram se os ursos depo-
sitam seu cheiro por meio de glndulas
Terras secas
nas solas como um meio de comunica-
Oceano Zona transicional
o. A equipe de Sergiel examinou um par
Pacco Ecossistema
de ursos-pardos e verificou que as patas
marinho/salobro
dos animais contm glndulas sudorpa-
AMRICA ras, sugerindo que suas pegadas deixam
DO SUL certo cheiro. Os pesquisadores tambm
Limite sul da
rea de estudo identificaram 26 compostos volteis dife-
400 quilmetros rentes seis deles exclusivos de machos
Pesquisadores reconstruram as histricas inundaes marinhas da floresta tropical Amaznica no suor das patas, indicando que ursos
usando ncleos de sedimentos coletados no leste da Colmbia e noroeste do Brasil. Esses mapas podem usar aromas para determinar o
mostram a extenso mxima das guas durante dois perodos de tempo distintos. A regio foi sexo de viajantes ursinos anteriores.
inundada h entre 18,1 milhes e 17,2 milhes de anos, e h entre 16,1 milhes e 12,4 milhes de Sergiel diz que as pegadas de ursos
anos, respectivamente. Em ambos os mapas, a reconstruo abaixo do limite sul da rea de estu- so como caixas de correio, embora as
do baseada em ncleos sedimentares coletados durante um estudo anterior, em 2010, mas no mensagens enviadas continuem sendo
cobre todo o perodo de tempo includo nos ncleos reunidos acima da linha pontilhada. um mistrio. Jason G. Goldman
Nascidos para
vo (Peromyscus manicula- deles, injetaram vasopressi-
tus) tm vrios parceiros. Eles na no crebro de camundon-
N EU RO CI N CI A
O material
ondas cerebrais de sujeitos adormecidos com
eletroencefalogramas de alta densidade. Eles
dos sonhos
acordavam as pessoas regularmente para
perguntar se tinham sonhado e, em caso afir-
mativo, sobre o que eram seus sonhos. Um
Zona quente no crebro que dos experimentos obteve cerca de 200 rela-
sonha janela para a conscincia tos de 32 sujeitos, e um segundo produziu
quase outros 800 de um grupo menor espe-
Dormir, talvez sonharShakespea- cialmente treinado. de sonhos, inclusive locais, rostos, e fala. Essas
re pode no ter falado exatamente sobre A equipe identificou uma zona quen- mesmas reas so ativadas na experincia
CORTESIA DE ANDRS BENDESKY E HOPI HOEKSTRA (camundongos); GETTY IMAGES (mulher adormecida)
nossas viagens noturnas, mas isso no tor- te em uma regio cortical posterior, per- de viglia. Na realidade, no tentamos pre-
na o fenmeno onrico em nada menos mis- to da parte de trs da cabea, onde ondas dizer o contedo [dos sonhos] neste estudo,
terioso. Pesquisas recentes esto expandin- cerebrais de baixa frequncia (ligadas diz Baird, mas acrescenta que esta seria uma
do nossa compreenso e produzindo insights inconscincia) diminuram e a atividade das empolgante direo potencial.
sobre o prprio estado consciente em si. ondas de alta frequncia aumentava quan- Esta abordagem representa um para-
O sono oferece cincia um jeito de estu- do as pessoas diziam que estavam sonhan- digma legal e inovador, diz Christof Koch,
dar a concincia nas suas vrias formas, de do independentemente de estarem no do Instituto Allen para Cincia Cerebral, no
sonhos vvidos inconscincia total, diz o sono REM. (Apesar da crena comum, envolvido no trabalho. Descobrir que a ati-
neurocientista Benjamin Baird. Quando os sonhos podem ocorrer tanto no sono REM, vidade associada ao ato de sonhar est mais
sujeitos de estudos cochilam, pesquisadores como no NREM, o sono de movimento no centrada na parte de trs do crebro foi sur-
conseguem isolar a experincia da conscin- rpido dos olhos.) Os achados foram des- preendente, diz, porque se acredita que o
cia da influncia confundente dos sentidos. critos em Nature Neuroscience. estado de conscincia surge em regies fron-
Numa tentativa de espiar dentro do cre- Num terceiro experimento, os cientis- toparietais. Uma limitao do estudo o
bro ao sonhar, Baird e o especialista em cons- tas predisseram com 87% de preciso se os tempo entre o despertar e o momento em
cincia Giulio Tononi, ambos na Universida- participantes estavam sonhando. Alm dis- que se comea a narrar um sonho. No fim, diz
de de Wisconsin-Madison, e seus colegas so, a atividade de ondas cerebrais em certas Koch, queremos ficar cada vez mais perto da
usaram eletrodos de escalpo para registrar as regies foi associada a contedos especficos prpria experincia em si. Tanya Lewis
www.sciam.com.br 13
AVANOS
CHINA RSSIA
N A S N OT C I AS Algumas pragas de lagartas tornaram-se resistentes a Um estudo de ossos de animais coletados
Notas
culturas geneticamente modificadas criadas justamente do stio de Berelyokh, na Repblica da Iac-
para serem txicas para elas. Mas pesquisadores tia (ou Sakha, em russo), na Sibria, indica
B I O LOGI A
o ao brao do tubo com o res e tremamente sens eis de
Florestas
comuns foram pensamentos extrarrelacio-
Ruminar informaes privadas nais (pensar num relacionamento com outra
di mais do que ocult-las
minguantes
pessoa quando j se est em um), anseios
romnticos (enquanto solteiros) e comporta-
No segredo que todos ns temos segre- mento sexual (consumo de pornografia, fan-
dos. Ocult-los pode ser emocionalmen- tasias e congneres). O grfico abaixo apre- O planeta est perdendo reas de
te desgastante, mas no pela razo que a senta uma anlise detalhada dos segredos terras prstinas que so fundamentais
maioria dos pesquisadores presumia h mui- mais comuns. para ecossistemas saudveis
to tempo. Um novo estudo redefine o pr- As pessoas disseram que, quando no
prio conceito de sigilo e oferece uma explica- interagiam com ningum, pensavam sobre Ns, humanos, deixamos nossa marca pelo
o diferente para sua conhecida associao seus segredos com uma frequncia cerca de planeta; nenhum ecossistema continua intoca-
com depresso, ansiedade e m sade. Os duas vezes maior em comparao com seus do. Mas algumas paisagens foram menos afe-
pesquisadores sugerem que manter segre- esforos para ocult-los ativamente em con- tadas. E a capacidade da Terra para proporcio-
do principalmente a inteno de escon- versas. Quanto mais frequentemente suas nar hbitats para plantas e animais, seques-
der informaes, independentemente de mentes vagavam para um segredo, mais elas trar carbono atmosfrico e regular o fluxo de
qualquer ocultao ativa ao redor de outras relataram que isso prejudicava seu bem-es- gua doce depende da extenso das regies
pessoas. E isso machuca ao nos fazer sen- tar, e menos saudveis afirmaram estar. Sur- menos afetadas. As reas onde a influncia
tir falsos, mesmo quando estamos a ss. preendentemente, o ocultamento ativo no humana ainda no aparece nos satlites so os
Michael Slepian, psiclogo na Colum- afetou em nada o bem-estar, em compa- alvos mais importantes para esforos de con-
bia Business School, e colegas recentemen- rao como suposies anteriores. Quatro servao. Usando imageamento por satlite,
te relataram seus achados num artigo on-line estudos adicionais on-line com casais produ- um grupo de pesquisadores mapeou o decl-
no Journal of Personality and Social Psycholo- ziram resultados semelhantes. Se voc pre- nio global, entre os anos 2000 e 2013, de tais
gy. Em seis estudos, eles indagaram a 1.200 cisa manter um segredo, Slepian suge- paisagens florestais intactas (IFLs, na sigla em
americanos pela internet, e a outras 312 pes- re no ficar remoendo o assunto, e passar ingls), definidas como ecossistemas floresta-
soas que faziam piqueniques no Central Park, a praticar a tcnica de meditao cha- dos ou naturalmente desprovidos de rvores,
em Nova York, sobre 38 categorias de com- mada ateno plena, ou discutir a ques- de 500 km2 ou mais. Cerca de metade da rea
portamento ou identidade que muitas vezes to proibida em fruns annimos on-line. das IFLs do mundo esto nos trpicos, e um
so mantidos em sigilo. Em cinco estudos, Matthew Hutson tero nas florestas de Amrica do Norte e Eur-
sia. Explorao madeireira, agricultura, mine-
As 10 principais categorias de coisas que mantemos em segredo
rao e incndios contriburam para sua redu-
Em segredo Em segredo de Em segredo no passado, Nunca mantido o, conforme relatado em janeiro no peridico
de todos algumas pessoas porm no mais em segredo Science Advances. O lado positivo? Paisagens
Pensamentos de enganar o parceiro que se encontram sob proteo formal, como
parques nacionais, mostraram-se mais propen-
PETER POTAPOV, EM SCIENCE ADVANCES, VOL. 3, N 1, ARTIGO N E1600821; 4 DE JANEIRO DE 2017; GETTY IMAGES (rvores)
FONTE: THE LAST FRONTIERS OF WILDERNESS: TRACKING LOSS OF INTACT FOREST LANDSCAPES FROM 2000 TO 2013,
Comportamento sexual sas a permanecer intactas. Jason G. Goldman
Ter mentido para algum
Desejos romnticos sobre algum EM NMEROS
12,8 milhes
enquanto solteiro
Violao da conana de algum
PERSONALITY AND SOCIAL PSYCHOLOGY. PUBLICADO ON-LINE EM 8 DE MAIO DE 2017
FONTE: THE EXPERIENCE OF SECRECY, MICHAEL L. SLEPIAN ET AL., EM JOURNAL OF
Quase
Indelidade no sexual (como ertar)
1 milho
Ambio ou meta
0 100 200
Nmero de participantes no estudo
300 400 500 600
65
Nmero de pases que abrigavam pelo menos uma IFL em 2000.
Ao longo de trs estudos (um subconjunto de 10), pesquisadores entrevistaram 600 parti-
cipantes sobre comportamentos secretos comuns que haviam experimentado e at que
ponto eles tinham mantido cada um escondido. O grfico mostra dados para os 10 com-
19
mero de a ses ue caro com letamente des ro idos de
IFLs daqui a 60 anos se as perdas continuarem taxa atual.
portamentos mais frequentemente mantidos em total segredo.
GETTY IMAGES (nibus espacial); AJAYAN RESEARCH GROUP Rice University (fibras)
O ajudante
rob da vov
Mquinas que entendem
indicaes sociais humanas so
promissoras para auxiliar idosos
Foguetes quentes
No final de 2016, a IBM e a Universida-
de Rice revelaram o rob multitarefa para
auxiliar idosos MERA (sigla de Multi-Pur-
Fibras parecidas com velcro poderiam ajudar a projetar pose Eldercare Robot Assistant), uma ver-
motores mais quentes para naves espaciais com destino a Marte so personalizada do rob Pepper desen-
volvido pela Soft-Bank Robotics, no Japo.
O interior dos motores de foguetes atuais cies parecem uma verso microscpica do Vel- O Pepper, um androide cor de marfim,
pode chegar a causticantes 1.6000 C calor cro. As fibras, descritas em Applied Materials & com altura aproximada de uma criana
suficiente para derreter ao. E os motores Interfaces, seriam menos propensas a escapar de sete anos, capaz de detectar e res-
do futuro precisaro ser ainda mais abrasa- do meio cermico circundante porque seus ponder a emoes humanas atravs de
dores. Motores mais quentes so mais efi- elementos crespos agarram umas s outras. dicas vocais e expresses faciais. Ele j foi
cientes em termos de queima de combus- Para produzir os fios, os pesquisadores pri- empregado como assistente gentil em
tvel, produzem mais empuxo e podem meiro criaram nanotubos de carbono encara- lojas e lares japoneses. J o MERA, pro-
transportar cargas maiores, todos fato- colados que se projetam da superfcie de SiC jetado especificamente como um com-
res fundamentais para naves espaciais des- como cachos de cabelo. Depois mergulharam panheiro domstico para os idosos, grava
tinadas a Marte e aeronaves avanadas. as fibras num p ultrafino de silcio e as aque- e analisa vdeos do rosto de uma pessoa
Buscando materiais capazes de tole- ceram, convertendo os nanotubos de carbono e calcula sinais vitais, como frequncias
rar mais calor, engenheiros tentam conce- em fibras de SiC. A equipe testou a fora das de batimentos cardacos e respirao. A
ber compsitos resistentes, duros e leves, fei- fibras encrespadas ao inseri-las num polmero tecnologia de fala do MERA, originalmen-
tos de fibras de carbeto de silcio (SiC) com transparente, elstico e flexvel, e descobriram te desenvolvida para o Watson, da IBM, lhe
uma pequena frao da largura de um fio de que esses compsitos eram quatro vezes mais permite conversar e responder a perguntas
cabelo humano, incorporadas em um mate- fortes do que os feitos com fios lisos. Engenhei- sobre sade. Ele tem tudo acondicionado
rial cermico. O carbeto de silcio pode resistir ra da Nasa e coautora do estudo, Janet Hurst em um adorvel ser individual, diz Susann
a 2.0000C a temperatura dos motores mais diz que agora quer testar as novas fibras num Keohane, fundadora do Laboratrio de Pes-
quentes almejados. Os compsitos de hoje meio cermico. Os cientistas tambm querem quisa Aging-in-Place, da IBM.
so feitos ao se sobrepor camadas de peque- produzir fibras com um revestimento encres- A roboticista Maja Matari e seus cole-
nos tapetes tecidos de fibras de SiC, preen- pado de nanotubos de nitreto de boro, porque gas na Universidade do Sul da Califrnia
chendo o espao entre eles com uma cer- ele resistente e protege as fibras da exposi- adotam uma abordagem diferente, mas
mica porosa. Mas esses compsitos podem o prejudicial a oxignio. Fibras de SiC so complementar, para criar mquinas sociais.
rachar sob as altas presses que ocorrem em resistentes na dimenso do comprimento, mas Eles projetam robs que exploram dinmi-
motores porque as fibras deslizam umas con- sob altas presses podem se romper na largu- cas sociais humanas para ajudar idosos a
tra as outras e saem da cermica. ra. Mas as novas fibras devem resistir, porque ajudarem a si mesmos. O que descobrimos
Num possvel grande avano, cientis- seus pelinhos ajudam a dissipar a tenso dis- que pessoas realmente precisam de aju-
tas da Universidade Rice e do Centro de Pes- tribuindo-a, diz Steven Suib, da Universidade da com motivao para executar tarefas
quisa Glenn, da Nasa, desenvolveram fibras de Connecticut, que no esteve envolvido na necessrias, diz ela. Ento criamos o campo
de carbeto de silcio felpudas, cujas superf- pesquisa. Prachi Patel da robtica socialmente assistiva: mquinas
CIN CIAS DA TE RR A
CORTESIA DE SOFTBANK ROBOTICS
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DESAFIOS DO COSMOS Salvador Nogueira jornalista de cincia especializado em
astronomia e astronutica. autor de oito livros, dentre eles Rumo ao
infinito: Passado e futuro da aventura humana na conquista do espao
e Extraterrestres: Onde eles esto e como a cincia tenta encontr-los.
Em 1995, um grupo do Observatrio de Genebra descobriu O mais importante que esses nmeros so suficiente-
o primeiro planeta a orbitar uma estrela de tipo solar. Mas o mente robustos para permitir estudos estatsticos sobre como
objeto chamado de 51 Pegasi b foi apenas o primeiro de um a natureza fabrica planetas. O Kepler mostrou que planetas
vagalho de exoplanetas identificados nas ltimas duas dca- rochosos como a Terra so comuns e muitos esto na zona
das. Telescpios espaciais foram construdos para encontr- habitvel regio ao redor da estrela em que o nvel de radia-
-los, e o mais prolfico deles, o Kepler, da Nasa, gerou um cat- o favorece a presena de gua lquida na superfcie. Essa
logo impressionante, cuja ltima verso foi recentemente uma parte importante do percurso que precisamos percorrer
divulgada pela agncia espacial americana. para responder pergunta: Estamos ss no Universo?.
Apontado entre 2009 e 2013 para uma pequena regio do Ainda mais importante, o Kepler permitiu que come-
cu entre as constelaes de Cisne e Lira, o Kepler concen- ssemos a distinguir rotas evolucionrias para os planetas,
trou-se em monitorar as estrelas de apenas 0,25% da abba- preenchendo o vo de conhecimento que separa os mundos
da celeste. No total, cerca de 180 mil delas estavam no cam- rochosos, como a Terra, dos menores gigantes gasosos, como
po de viso. O objetivo era detectar nelas pequenas variaes Netuno. No h exemplar intermedirio entre eles no Sistema
de brilho que indicassem a passagem de planetas sua fren- Solar, o que sempre pareceu estranho. Baseando-se nas esta-
te, algo como minieclipses. O fenmeno, porm, s observ- tsticas do Kepler, um grupo liderado por Benjamin Fulton e
vel nos sistemas cujo plano das rbitas planetrias se alinha seus colegas do Caltech, estudou os planetas que preenchem
perfeitamente com nosso ponto de vista aqui na Terra, para esse vazio. E, aparentemente, h duas populaes distintas de
permitir o trnsito frente da estrela. Planos orbitais so dis- planetas menores que Netuno.
tribudos aleatoriamente, e os cientistas do Kepler s espera- A primeira se restringe a um dimetro at 1,75 vez o ter-
vam que 5% de todos os planetas estivessem na orientao cer- restre, e compe uma categoria que podemos chamar de
ta para serem detectados. superterras. Tm composio e densidade similares ao nos-
Essa peneira torna ainda mais impressionantes os resulta- so, predominantemente rochosos, apesar do tamanho maior.
dos: nada menos que 4.034 candidatos a planetas foram acha- Conforme o dimetro passa dessa faixa, h um decrsci-
dos, dos quais 2.335 foram confirmados. Cumpriu-se assim a mo acentuado da populao de planetas, que passam a subir
espetacular predio do filsofo Giordano Bruno, que no fim novamente quando se ultrapassa o limite de 2 dimetros ter-
do sculo 16 afirmou que todas as estrelas deviam ter sis e restres. A temos uma nova classe de planetas, menos densos e
abrigar planetas ao seu redor. mais parecidos com mininetunos.
Fulton e colegas propem uma explicao evolutiva. Plane-
tas nascem de discos de gs e poeira ao redor de estrelas-mes.
Linha de montagem de planetas No princpio, so formados por ncleos rochosos e agregam
uma certa quantidade de gs hidrognio ao seu redor. Se a
Agrupe Coloque gs Calor
quantidade agregada consegue atingir pelo menos 1% de sua
Mininetunos
massa, o planeta tende a preservar esse invlucro primordial
e se torna, em termos de tamanho, no mnimo um mininetu-
no. Se a quantidade de gs fica aqum disso, a tendncia que
NASA/AMES RESEARCH CENTER/JPL-CALTECH/R. HURT
Um eclipse
solar para o
Norte do Brasil
Lua cruza o disco do Sol no dia 21,
mas fenmeno s ser total
para uma faixa que cruza os
Estados Unidos de costa a costa.
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VISIBILIDADE DOS PLANETAS N
MERCRIO
Inicialmente em Leo e depois em Sextante e
novamente Leo. Visvel ao anoitecer na direo
do pr-do-sol. Estacionrio em 12. Em conjuno
inferior com o Sol em 26.
VNUS
Visvel ao amanhecer, na direo do nascer do sol,
em Gmeos. Prximo da Lua em 19.
MARTE
Primeiro em Cncer e depois em Leo. Muito
prximo ao Sol para ser observado. Comea a ser
visvel ao amanhecer no final do ms.
JPITER
Visvel ao anoitecer, no oeste, na direo da
constelao de Virgem. Prximo da Lua em 22.
SATURNO
Em Ofico, visvel durante a primeira metade da
noite. Prximo da Lua em 3 e 30, estacionrio em 25.
URANO
Visvel a leste durante a madrugada, em Peixes.
Estacionrio em 3. Prximo da Lua em 13.
NETUNO
Em Aqurio, visvel durante toda a noite.
Prximo da Lua em 9. L
DESTAQUES DO MS
- Mximo da chuva de meteoros Perseidas
- Mercrio em conjuno inferior com o Sol.
Planeta entre o Sol e a Terra
(*) O limite das constelaes foi estabelecido pela Unio Astronmica 30 08h38 Lua no apogeu, mxima distncia da Terra
Internacional em 1930, o que permite estabelecer, com grande preciso, (404.224 km). Dimetro angular aparente 29,3'.
o instante de entrada e sada do Sol por cada uma das 13 constelaes 30 09h53 Lua passa a 4,1S de Saturno.
que so atravessadas pela trajetria anual aparente do Sol, a eclptica.
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DESTRAVA
GENTICA
MISTE O
ELA
D
A
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A
Leonard Petrucelli professor e presidente
do departamento de neurocincia da Clnica
Mayo em Jacksonville, Flrida.
Hoje mais de 6 mil pessoas so diagnosticadas por ano nos EUA vivem ainda mais. Essa minoria inclui o fsico Stephen Hawking,
com ELA, agora conhecida como a doena de Lou Gehrig nos EUA, que vive famosamente com ELA h mais de cinco dcadas. Pes-
e como uma doena neuromotora na Europa. A ELA geralmente quisas atuais sugerem que fatores relacionados ao meio ambiente
aflige pessoas entre 50 e 60 anos, mas pode comear muito mais desempenham s um pequeno papel no desencadeamento da ELA,
cedo ou mesmo quando a pessoa estiver com seus 80 anos. No in- provavelmente ao aumentar a vulnerabilidade de indivduos gene-
cio, clulas nervosas no crebro e na medula espinhal, chamadas de ticamente suscetveis. O mais intrigante que a desordem ocorre
neurnios motores, comeam a morrer. Uma vez que essas clulas principalmente de forma aleatria. Menos de 10% dos casos sur-
enviam sinais do crebro atravs da medula espinhal para os ms- gem por caractersticas genticas passadas entre geraes. Os casos
culos, sua morte provoca perda de mobilidade, destreza, fala e at restantes so classificados como no herdados, ou espordicos.
mesmo deglutio. Na maioria dos casos, as funes superiores do Na ltima dcada, sofisticadas tecnologias de sequenciamento
crebro permanecem intactas: as pessoas atingidas pela ELA so levaram a um crescimento exponencial na compreenso da biolo-
obrigadas a assistir ao falecimento de seu prprio corpo medida gia do problema. Pesquisas indicam que muitos genes diferentes,
que a doena avana de forma implacvel. Logo se tornam presas sozinhos ou em conjunto, podem aumentar a susceptibilidade de
a uma cadeira de rodas e, no final, ficam acamadas. Sem capacida- uma pessoa. Mutaes especficas foram conectadas a quase 70%
de de se comunicar, comer ou respirar por conta prpria, a maio- dos casos familiares de ELA e cerca de 10% dos espordicos. Por
ria morre por insuficincia respiratria dentro de trs a cinco anos. sua vez, esta riqueza de novos dados genticos abre vias promis-
A nica droga contra a ELA aprovada pela agncia americana que soras para o desenvolvimento de uma terapia melhor. O silencia-
controla alimentos e medicamentos, a Food and Drug Administra- mento de genes emergiu como um tratamento em potencial para
tion (FDA), o bloqueador de glutamato riluzol, que prolonga a algumas formas de ELA, e duas drogas que visam diferentes genes
sobrevivncia por uma mdia de trs meses. No h cura. defeituosos devem passar por testes clnicos este ano. Enquan-
O pioneiro neurologista francs Jean-Martin Charcot, que iden- to isso, pesquisadores identificam biomarcadores reveladores,
tificou a doena em 1869, encapsulou uma descrio a respeito dela incluindo substncias mensurveis em fluidos corporais ou ati-
em seu nome: amiotrfico significa sem alimentao muscular; vao eltrica no crebro, que poderiam levar a diagnsticos pre-
lateral refere-se a uma rea da medula espinhal onde ficam parte coces e a avaliar melhor o progresso da doena. Os biomarcado-
das clulas do neurnio motor moribundo; e esclerose o endu- res tambm podem ser teis para desenvolver outros tratamentos.
recimento ou a cicatrizao que ocorre medida que o processo de
degenerao neural se desenrola. Apesar da caracterizao direta PISTAS GENTICAS INICIAIS
de Charcot, a complexidade da ELA ainda confunde pesquisadores. Embora pessoas com ELA familiar, a maioria das quais tem 50%
Embora seja sempre fatal, por razes desconhecidas em torno de de chances de pass-la prxima gerao, sejam s uma pequena
10% dos pacientes sobrevivem por mais de 10 anos, e alguns sobre- parte dos doentes, elas desempenharam um papel extraordinrio
Estudos recentes revelaram que letras repetidas demais em uma sequncia de DNA ao longo do
cromossomo 9 so responsveis pela maioria dos casos hereditrios e de alguns casos espordicos
de ELA. Enquanto os pesquisadores desvendam o mistrio de como essas mutaes causam Impedindo
doenas, desenvolvedores de medicamentos esto testando uma molcula sinttica, que a mutao
chamada oligonucletido antissentido, ou ASO, para silenci-las.
cause problemas
Uma molcula ASO projetada para entrar em
Trs resultados problemticos uma clula e procurar pelo RNA transcrito do gene
As mutaes ocorrem em C9ORF72, a 72 fase de leitura aberta, ou regio de codificao C9ORF72 mutante, marcando esse RNA para que seja des-
de protena, do cromossomo. O RNA mensageiro defeituoso transcrito desse DNA pode trudo por uma das enzimas da prpria clula. Ensaios iminentes
prejudicar os neurnios motores de trs maneiras, indo e vindo dos ribossomos de uma vo testar essa abordagem ao infundir a molcula sinttica no sis-
clula, onde traduzido em protenas. tema nervoso de pacientes com ELA que tm a mutao C9ORF72,
via uma injeo intratecal, uma espcie de espinha dorsal reversa.
Mutao (nmero maior de que
o comum de repeties) Molcula ASO
Gene C9ORF72
DNA RNA
RNA
Ribossoma
Enzima
Protena
Protenas inteis
CENRIO 1: o excesso de repetio faz com que menos CENRIO 2: RNA contendo repeties extras transcrito a CENRIO 3: Ao invs de codificar o resultado tpico da pro-
RNA seja transcrito, levando a uma produo de muito partir do duplo sentido do gene e das fitas de DNA antisen- tena, as repeties extras no RNA so traduzidas em um
pouco da protena codificada pelo C9ORF72 e a uma tido, produzindo molculas RNA mal dobrado, que podem sortimento de protenas inteis e txicas que em potencial
perda de sua funo normal, ainda desconhecida. capturar uma variedade de RNAs e protenas. danificam o crebro e os neurnios da coluna espinhal.
para desvendar as bases genticas da doena. O primeiro vnculo tenas individuais se dobrem de maneira incorreta e depois se aglo-
gentico surgiu em 1993, a partir de estudos que identificaram uma merem. As clulas marcam essas protenas deformadas com ubi-
mutao num gene chamado SOD1 em quase 20% de casos familia- quitina, um marcador molecular que indica que elas precisam ser
res . O SOD1 codifica a enzima antioxidante superxido dismutase, removidas. Quando este sistema de eliminao celular fica sobre-
que converte a molcula altamente reativa superxido (um radical carregado, o lixo se acumula. Em pessoas com certos tipos de ELA
livre de oxignio) em formas menos prejudiciais. familiar, os neurnios motores ficam repletos com aglomerados de
Os pesquisadores de incio teorizaram que a mutao no SOD1 protenas SOD1 anormais marcadas com ubiquitina.
poderia enfraquecer as capacidades antioxidantes da enzima e Um grande avano na pesquisa ocorreu em 2006, quando os
permitir que radicais livres de oxignio danificassem os neurnios cientistas analisaram casos de ELA sem mutaes SOD1. Em qua-
motores. Um quarto de sculo depois, descobrimos, com quase se todos, descobriram que outra protena, de nome TDP-43, tam-
certeza, que no o caso. Ao contrrio, parece que essa mutao bm se aglomera nos neurnios motores. A TDP-43 pertence a uma
desencadeia o que os cientistas chamam de ganho txico de funo, classe de protenas que regulam a ao dos RNAs mensageiros
na qual a enzima faz algo alm do que normalmente deveria fazer. cpias mveis de DNA que servem de modelos para a produo das
Em particular, a nova funo leva a mudanas no formato de protenas codificadas pelas letras de DNA de um gene. A TDP-
certas protenas nos neurnios. A maioria das autpsias de pes- 43 liga-se a um RNA mensageiro, orienta seu processamento no
soas com ELA revela um padro tpico de patologia do crebro: ncleo, transporta-o para onde ele precisa ir na clula e faz outras
aglomerados de protenas acumulados nos neurnios motores. funes importantes para traduzir o RNA em uma protena. De
Para que esses neurnios funcionem de forma perfeita, os blocos alguma forma, na ELA , a TDP-43 puxada para fora do ncleo e se
de construo das protenas nas clulas devem ser reciclados de acumula no citoplasma circundante. Ela pode at agir como uma
maneira eficiente; com ELA, o sistema de reciclagem no funciona. espcie de escoadouro para puxar cpias adicionais dela mesma
Todas as protenas, incluindo as enzimas, precisam adotar medi- para o citoplasma. Os cientistas ainda precisam determinar se a
das precisas de dimenses tridimensionais quando so sintetizadas TDP-43 exibe uma perda de funo (porque retirada do ncleo)
nas clulas, para que funcionem de maneira correta. Os pesquisa- ou um ganho txico de funo (porque se acumula no citoplas-
dores descobriram que as mutaes parecem fazer com que as pro- ma), ou ambos.
Em meio busca para desvendar as causas da ELA, os pesqui- Decoding ALS: from genes to mechanism. J. Paul Taylor, Robert H. Brown, Jr., e
sadores tambm tm se esforado para identificar biomarcado- Don W. Cleveland em Nature, vol. 539, pgs. 197206; 10 de Novembro de 2016.
res que possam ajudar a avaliar o avano da doena. Por exemplo, State of play in amyotrophic lateral sclerosis genetics. Alan E. Renton, Adriano Chi e
Bryan J. Traynor em Nature Neuroscience, vol. 17, no 1, pgs. 1723; Janeiro de 2014.
esforos contnuos visam detectar as protenas repetidas anor-
mais produzidas da expanso de DNA C9ORF72 em fluidos cor-
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ARQUEOLOGIA
O SUMIO DOS
VIKINGS
DA G R OE N L N DI A
Por centenas de anos a ilha foi um posto avanado
gelado, mas por fim as colnias entraram em colapso.
Novas descobertas elucidam esse declnio enigmtico
Zach Zorich
Ilustrao de Tyler Jacobson
EM SNTESE
Depois de prosperarem por sculos, as colnias vikings resultado de uma obstinada recusa em adaptarem seus dis mudaram seus hbitos. As ltimas evidncias suge-
na Groenlndia foram misteriosamente abandonadas. costumes europeus s condies dessa terra no rtico. rem que uma interao de foras culturais e polticas no
Por muito tempo, estudiosos viram esse declnio como Mas descobertas mostram que os vikings da Gronlan- exterior levou ao seu desaparecimento.
3 4
CORTESIA DE LENNART LARSEN Museu Nacional da Dinamarca CC-BY-SA (1, 2, 4); THE TRUSTEES OF THE BRITISH MUSEUM (3)
ARTEFATOS re elam facetas da ida dos ikings na Groenlndia. Um anel e um bculo do tmulo de um bispo (1) atestam a influncia da
Igreja Catlica nas colnias. Os ikings da Groenlndia manti eram laos culturais com a Europa, compartilhando de suas modas (2) e
costumes. Mas eles tambm descobriram um nicho econmico ao adotarem novas prticas, como caa s morsas, exportando as presas
de marfim para a Europa, onde eram usadas para ornamentos, incluindo, tal ez, as famosas peas de adrez de Le is (3). Os ikings tam-
bm encontraram grupos de inutes residentes, que parecem ter esculpido imagens dos recm-chegados em madeira (4).
www.sciam.com.br 31
sociedade comeou a ganhar forma quando esses agricultores focas em larga escala logo depois de sua chegada. Os vikings pro-
levaram suas famlias para tomar posse de qualquer pedao de vavelmente caaram focas em mar aberto dos fiordes usando bar-
terra desocupada onde pudessem plantar grama para alimentar cos e redes para reunir os animais em grupos onde eram alveja-
suas ovelhas e vacas. As fazendas ficaram concentradas em duas dos pelas lanas. Eles tambm comearam a caar renas e mor-
reas no litoral ocidental da ilha: o chamado Assentamento Oci- sas. Explorar esses animais exigia caadas comunitrias por uma
dental, que ficava cerca de 800 km ao sul dos campos de caa de substancial fora de trabalho, com estreita coordenao entre o
morsas na Baa de Disko, e o Assentamento Oriental, que ficava chefe e os demais caadores. Os vikings estavam em posio favo-
mais 500 km ao sul do Assentamento Ocidental. rvel para adotar essa nova prtica, tendo trabalhado em arran-
Runas descobertas em Vatnahverfi, perto do ponto mais ao jos semelhantes nas fazendas. A organizao das fazendas forne-
sul da Groenlndia, ajudaram os arquelogos a comporem um cia a estrutura para a administrao eficaz do trabalho de caa
quadro de como eram esses assentamentos. Vatnahverfi parece e dos recursos alimentares. A caa comunitria, assim como a
ter sido uma das mais ricas reas rurais no Assentamento Orien- mudana nas prticas pecurias, tornou-se uma adaptao nica
tal. O terreno ali se estende como dedos para o oceano. Alm des- ao ambiente da Groenlndia.
sas praias estreitas e pedregosas, a grama recobre a terra, forne- Os vikings no criaram essas estratgias do nada. Suas ino-
cendo bom pasto para as ovelhas hoje, como fazia no tempo dos vaes parecem ter surgido da experincia que levaram com eles
vikings. Das antigas construes s restaram pilhas de pedras da Islndia e da Escandinvia. Ecologistas chamam esse corpo de
cobertas de musgo. Sua disposio mostra que as fazendas eram expertise de conhecimento ecolgico tradicional, a srie de com-
erguidas como outras na Escandinvia e na Islndia, com a edifi- portamentos e tecnologias que os povos aprimoraram por gera-
cao principal no centro do melhor pasto cercada por pastagens es por meio do contato com o ambiente. A caa de focas era pra-
menos desejveis e construes menores onde as pessoas podiam ticada no Mar Bltico e na Islndia, mas aquelas focas pertenciam
viver quando levavam o rebanho para pastar em diferentes luga- a uma espcie diferente das que eram caadas na Groenlndia. Os
res da fazenda. Uma equipe de escavao chefiada por Konrad vikings podem tambm ter ganhado experincia com a caa de
Smiarowski, doutorando do Hunter College, identificou 47 herda- morsas na Islndia. Nos dois casos, os colonos tiveram de adaptar
des organizadas em torno de oito fazendas em Vatnahverfi. suas tcnicas s circunstncias extraordinrias da Groenlndia.
As fazendas vikings cobriam reas to extensas que precisa- Enquanto os trabalhadores tentavam descobrir como encher
vam da construo de estruturas menores para servir de abrigos suas barrigas, a elite dos proprietrios de terras buscava meios
temporrios para o rebanho e espao para ordenhar vacas, tos- de ampliar sua influncia. Uma forma de fazer isso era construin-
quiar ovelhas e processar leite e carne. A equipe de Smiarowski do igrejas e consagrando campos para cemitrios. Os fazendei-
descobriu 86 desses abrigos nessa regio nos ltimos 12 anos. ros estavam dispersos pelo local, ento locais centrais de encontro
Essas descobertas e as de outras equipes sugerem que a comu- eram cruciais para a vida social dos assentamentos. De alguma
nidade agrria de Vatnahverfi abrigava entre 255 e 533 pessoas. forma, eles tinham de ser uma comunidade, comenta Smia-
As fazendas determinaram a hierarquia que deu as bases para rowski. As igrejas se tornaram uma maneira de reunir as pessoas
a sociedade da Groenlndia, explica Thomas McGovern, arque- para casamentos, funerais e servios regulares.
logo tambm do Hunter College que tem trabalhado em stios l As igrejas tambm tinham uma outra funo. Em 1123, a Igreja
e em outros locais no Atlntico Norte desde os anos 1970. A eli- Catlica nomeou um padre chamado Arnald como bispo da Gro-
te viking dona da terra dependia da permanncia das pessoas ali, enlndia. Ela estava comeando a olhar a Groenlndia como um
acrescenta Jette Arneborg, do Museu Nacional da Dinamarca, em recurso econmico.
Copenhague. Os proprietrios de terra, desta forma, abrigavam as Enquanto o comrcio entre a Europa e a Groenlndia aumen-
famlias dos agricultores e concediam acesso aos pastos em troca tava, os colonos independentes comearam a buscar formas de
de parte dos lucros dos produtos pecurios. As colnias prospera- melhorar essa relao. Eles solicitaram ao rei da Noruega Haakon
ram sob esse sistema, crescendo para cerca de 3 mil residentes em IV que tornasse a Groenlndia parte de seu reino. Os groenlande-
Q
seu pico por volta de 1200 a 1250, conta Arneborg. ses pagariam impostos Noruega e o rei garantiria que um navio
chamado Greenland Carrier viajaria todos os anos Groenln-
UANDO AS CONDIES CLIMTICAS PIORARAM, COMO dia para comprar e vender bens. Essas misses comerciais manti-
aconteceu logo depois da chegada dos colo- veram a Groenlndia como parte da cultura e da economia euro-
nos, os vikings da Groenlndia enfrentaram os peias. Como resultado, os vikings tinham as mesmas roupas e o
desafios de frente. Fornecer feno suficiente para mesmo tipo de pentes de duplo lado que os europeus usavam,
porcos e gado bovino durante o inverno estava Arneborg diz.
ficando difcil na Groenlndia, ento os fazendeiros mudaram a Navios mercantes como o Greenland Carrier talvez tambm
criao principalmente para ovelhas. Em locais onde a pastagem tenham transportado bens e pessoas para a Igreja Catlica. Em
era especialmente difcil, eles criavam cabras, animais que podem 1341, o bispo de Bergen, na Noruega, enviou um padre Groen-
comer quase tudo. O leite das ovelhas e das cabras substituiu o lei- lndia para fazer uma lista de igrejas locais e suas propriedades. O
te de vaca como alimento primordial em sua dieta. Eles criavam Vaticano admirava ornamentos em marfim e o bispo pode ter sido
somente uns poucos porcos e vacas, apenas para festejos e consu- encarregado de manter as linhas de abastecimento abertas entre
mo pelos ricos. a Groenlndia e o Vaticano, explica Mikkel Srensen, especialista
Como as fazendas no eram produtivas o suficiente para sus- em histria e arqueologia inute da Groenlndia na Universidade
tentar todos os colonos, as pessoas tiveram de encontrar fon- de Copenhague. Arneborg, de seu lado, acredita que a Igreja esta-
tes totalmente novas de alimentos. Os depsitos de lixo deixa- va mais interessada no dinheiro do comrcio de marfim do que no
dos pelos groenlandeses mostraram que eles comearam a caar prprio marfim. De todo jeito, os reis noruegueses controlavam o
G ROENL NDIA
REA
DE CAA
DE MORSAS
Baa de Disko
ISL NDIA
Assentamento Ocidental Assentamento Oriental ILHAS Bergen, Noruega
FARO
Vatnahver
que era praticamente a nica fonte de oferta de marfim na Euro- difceis e sabiam que os temporais ocorrem e, algumas vezes, as
pa naquele tempo. A relao parece ter sido muito lucrativa para pessoas se afogam, opina.
todos por mais de um sculo. Restos de marfim das morsas foram Contrariando as anlises de que eles ficaram presos em suas
encontrados em stios de oficinas medievais da Escandinvia at a prticas, os vikings parecem ter lidado com esses desafios de for-
Irlanda e Alemanha, mostrando que a demanda por esse material ma eficaz. Ossos achados em montes de lixo de fazendas medie-
se entendia pela Europa. vais em toda a Groenlndia indicam que eles mudaram para se
Mudanas drsticas estavam a caminho, no entanto. Anlises concentrar ainda mais estreitamente na criao de ovelhas e
de sedimentos do fundo do mar no Noroeste da Islndia mostram cabras, que so resistentes o suficiente para sobreviverem com
que, por volta de 1250, o clima comeou a entrar em uma fase cha- quantidades menores de pasto. Mesmo assim, pequenos proprie-
FONTES: ROWAN JACKSON E ANDREW DUGMORE Universidade de Edimburgo (rotas comerciais)
mada de Pequena Era do Gelo. As temperaturas caram e o siste- trios de terra lutavam para alimentar seus rebanhos. Eles tinham
ma climtico se tornou errtico. Os temporais ficaram mais fre- de se tornar arrendatrios de grandes fazendeiros ou vender suas
quentes e severos. A longa viagem ocenica entre a Islndia e a terras e descobrir um novo meio de sobrevivncia. Ento, eles se
Groenlndia se tornaria mais traioeira e teria desencorajado os tornaram arrendatrios. E isso funcionou por algum tempo.
caadores de fortuna que no queriam colocar seus navios em ris- Mas o mundo tambm mudava de formas que no envolviam
co, resume McGovern. o clima. Pode ter sido a complexa interao dessas mudanas que
Embora as colnias vikings da Groenlndia tenham dura- condenou as colnias vikings da Groenlndia.
do mais 200 anos, muitos acadmicos veem o incio da Pequena Talvez mais importante, eventos mundiais comearam a cor-
Era do Gelo como o comeo de seu fim. Relutantes ou incapazes roer seu comrcio de marfim das morsas. Guerras entre cristos
de mudar com os tempos, os assentamentos comearam a ruir, e muulmanos no Oriente Mdio tinham ajudado a Groenlndia
supem esses especialistas. a tornar-se um grande participante do comrcio de marfim. As
Mas McGovern no est convencido de que o mau tempo guerras levaram ao aumento da pirataria no Mar Mediterrneo,
tenha sido suficiente para acabar com as colnias. Nos anos 1250 que obstruram o transporte de marfim de elefantes da frica e
os groenlandeses estavam l havia muitos anos e nem sempre foi sia para a Europa. Quando o marfim de elefantes ficou mais raro
quente e aconchegante, portanto eles haviam passado por tempos e valioso na Europa, a viagem de 2.800 km para a Groenlndia em
busca do marfim das morsas transformou-se em uma opo mais populao da Europa morreu por causa da peste. A Noruega foi
lucrativa do que as rotas mais curtas, mas mais perigosas para a particularmente atingida, perdendo cerca de 60% de sua popu-
frica e sia. Quando as guerras no Oriente Mdio se atenuaram lao. O pas no enviou seus navios depois de 1369, o que impe-
e o comrcio com frica e sia foi reaberto, a Europa pode ter des- diu que os vikings vendessem suas peles e marfins de morsa, cuja
viado sua ateno da Groenlndia, diz Sren Sindbk, professor demanda j estava em declnio.
de arqueologia medieval da Universidade Aarhus, na Dinamarca. O vikings da Groenlndia tambm enfrentaram novas ameaas
Ao mesmo tempo, mudanas nas modas podem ter reduzido domsticas: invasores do Norte. Quando Erik, o Ruivo, estabeleceu
a demanda por marfim e outros artigos de luxo. O marfim passou sua fazenda, parecia que nenhum outro povo havia vivido na Gro-
de material raro e requisitado para joias e outras decoraes a des- enlndia. possvel que um grupo conhecido como paleoesquim,
prezado pelas elites a partir dos anos 1200. Essa tendncia parece ou povo de Dorset, tambm tenha habitado ali, mas teriam ficado
coincidir com uma mudana no tipo de comrcio que interessa- bem ao Norte da Baa de Disko, longe das vistas em territrio des-
va aos mercados europeus, diz McGovern. O comrcio mudou de conhecido, no que diz respeito aos vikings. Mais tarde, nos anos
bens muito prestigiados como ouro, peles e marfim para produtos 1300, um grupo inute que acadmicos denominam thule comeou
em massa de baixo valor como fardos de peixe seco e rolos de teci- a descer pelo litoral em barcos cobertos de pele chamados umiaks
do de l que a Islndia produzia. O marfim de morsa s tem valor em direo aos campos de caa de morsas dos vikings.
se as pessoas assim o disserem, afirma ele. Em contraste, peixes e Os thules se especializaram em caa s baleias, e seus umiaks
ls so alimentos e roupas para abastecer exrcitos. organizaram a sociedade thule da mesma forma que as fazendas
Essa transio marcou uma mudana fundamental no fun- organizaram os vikings. Cada umiak podia acomodar cerca de 15
cionamento da economia europeia. Os groenlandeses ficaram pessoas, e o dono do barco assumia o papel de lder, explica Sren-
presos na velha economia, observa McGovern. Os islandeses sen. Eles provavelmente estavam em misses baleeiras quando
estavam bem mais posicionados para aproveitar a expanso do encontraram os vikings caando na Baa de Disko. Um documen-
CINDY HOPKINS Alamy
comrcio de bens de massa e foi isso o que eles fizeram. to do sculo 14 intitulado Descries da Groenlndia indica que o
O surto da Peste Negra na Europa pressionou ainda mais a encontro no foi pacfico: os vikings receberam os thules com sua
economia da Groenlndia. Entre 1346 e 1353, quase um tero da tpica diplomacia, ou seja, os atacaram.
A
podem ter conquistado a Groenlndia, mas, no fim, foras do
PIORA NO CLIMA, A MUDANA NA POLTICA E NA MODA, A mundo alm de seus litorais gelados podem t-los dominado.
disseminao da peste e a chegada dos invaso-
res formaram um conjunto de problemas que os
vikings nunca tinham visto. Eles estavam em uma PA R A C O N H E C E R M A I S
situao que ia alm de seu tradicional conheci- Was It for walrus? Viking age settlement and medieval walrus ivory trade
mento ecolgico. Como resultado, os groenlandeses enfrentaram in Iceland and Greenland. Karin M. Frei et al. em World Archaeology, vol. 47, no. 3,
decises difceis sobre o que fazer para manter sua sociedade fun- pgs. 439466; 2015.
Vatnahverfi: a green and pleasant land? Palaeoecological reconstructions of
cionando. Eles dobrariam as apostas em suas estratgias testa-
environmental and land-use change. Paul M. Ledger et al. em Journal of the North
das e aprovadas, como caa comunitria, que permitiram que Atlantic, vol. especial 6, pgs. 2946; 2014.
seus ancestrais sobrevivessem ao clima rtico? Ou desenvolve- Critical transitions in nature and society. Marten Scheffer. Princeton University
riam novas adaptaes aos novos desafios que se apresentavam? Press, 2009.
Segundo Arneborg e McGovern, as evidncias arqueolgicas suge- The world of the Vikings. Richard Hall. Thames & Hudson, 2007.
rem que os groenlandeses reorientaram seus esforos para man-
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SEM
CINCIA
MARINHA
RUMO
NO
MAR
A acidificao dos oceanos pode alterar
o comportamento de organismos
subaquticos de maneiras desastrosas
Danielle L. Dixson
Mas, medida que ele se aproxima precisa atravessar uma pa- locais como os recifes de coral, onde os predadores e presas povoam
rede de bocas todos os tipos de animais, como bodies e peixes- densamente um hbitat limitado e complexo, a seleo natural fa-
-leo, se escondem entre os recifes prontos para atacar os mins- vorece fortemente espcies que se esquivam dos predadores. Qual-
culos peixes. Para navegar em segurana e com sucesso impor- quer ruptura dessa habilidade poderia ter consequncias catastr-
tante identificar os odores dos predadores e evitar ser apanhado. ficas para todo o ecossistema.
O sentido do olfato pura qumica em ao: detectar, proces- Se a gua cada vez mais cida realmente interfere no sentido
sar e responder s molculas na gua. Mesmo uma pequena mu- do olfato de peixes-palhao, ela pode tambm interferir em outros
dana na qumica ocenica poderia desestabilizar esse delicado sentidos e comportamentos. E embora nossos estudos se restrinjam
mecanismo de sobrevivncia. Os cientistas comearam a se preo- a uma espcie de peixe-palhao, o odor crtico para um nmero
cupar com o que poder acontecer quando a gua se tornar mais enorme de organismos marinhos. No mnimo, confuso e desorien-
cida, uma tendncia mundial medida que os oceanos absorvem tao poderiam significar mais um estressor sobre os peixes j de-
cada vez mais CO2 da atmosfera. Em 2010 meus colegas e eu co- safiados pelo aumento da temperatura da gua, pesca predatria e
locamos 300 larvas recm-geradas de peixe-palhao num tanque mudana de suprimento de alimentos. Alm disso, se os habitantes
com gua do mar em nosso laboratrio e as monitoramos por 11 de muitos oceanos comearem a se comportar de forma estranha,
dias. Quando injetamos o odor de um peixe amigvel, elas no re- cadeias alimentares inteiras, padres de migrao e ecossistemas
agiram. Mas, quando injetamos o cheiro de um predador (baca- podero colapsar. Embora a cincia ainda seja nova, os resultados
lhau das pedras), elas se afastaram. parecem estar se alinhando: a acidificao ocenica est confundin-
Posteriormente repetimos o experimento com 300 novas lar- do a mente dos peixes.
vas dos mesmos pais, mas dessa vez com gua mais cida que
foi ajustado para o nvel esperado em certas partes dos oceanos O DESAFIO CIDO
do planeta por volta de 2100 se as tendncias atuais se mantive- Desde a Revoluo Industrial a concentrao de CO2 da atmos-
rem. Os jovens peixes se desenvolveram normalmente, e nenhum fera aumentou de 280 partes por milho (ppm) para somente um
evitou o odor do predador. Na verdade, eles preferiram nadar na pouco mais de 400 ppm atualmente. Esse nmero seria muito
direo do odor perigoso, em vez de na gua natural. Quando maior sem os oceanos, que absorvem de 30% a 40% do CO2 envia-
introduzimos simultaneamente odores de predadores e de no do para a atmosfera. Mais CO2 dissolvido na gua do mar produz
predadores os peixes pareciam indecisos, e passaram o mesmo reaes qumicas que aumentam a acidez medida como pH bai-
tempo nadando em direo a um cheiro e ao outro. Eles podiam xo. As guas superficiais esto aproximadamente 30% mais cidas
sentir os sinais qumicos, mas no conseguiam identificar o signi- hoje que no final dos anos 1800, e se as tendncias das emisses de
ficado desses sinais. A inverso de comportamento foi surpreen- carbono atuais se mantiverem at o fim do sculo, elas podero es-
dente e preocupante. Acreditvamos que a acidificao poderia tar aproximadamente 150% mais cidas nessa poca.
afetar ligeiramente a sinalizao qumica, mas nunca o suficien- CO2 adicional na coluna de gua quebra a calcita e a aragoni-
te para induzir um peixe a nadar em direo morte iminente. ta dois minerais que so blocos de construo essenciais para as
Todos os animais cumprem trs tarefas bsicas na vida: procu- conchas e esqueletos externos de certos animais marinhos. Maris-
rar comida, se reproduzir e evitar virar alimento no processo. Em cos, ourios e plncton criados por outros pesquisadores em tan-
EM SNTESE
guas ocenicas cada vez mais cidas criadas pelas res e caranguejos criados ou expostos a gua alta- adaptar a um aumento gradativo de acidez, ou se
mudanas climticas podem estar destruindo com- mente cida podem no conseguir sentir o odor de eles so capazes de transmitir traos adaptados para
portamentos importantes que seres marinhos preci- predadores ou encontrar alimento ou podem vagar seus descendentes. Testes em recifes vulcnicos que
sam manter para sua sobrevivncia. atipicamente em locais perigosos. so naturalmente mais cidos podem fornecer algu-
Experimentos mostram que peixes-sargento, tuba- No est claro se os habitantes marinhos podem se mas respostas.
posto qumico que reduz a excitao o comportamento normal Odor tracking in sharks is reduced under future ocean acidification conditions.
recuperado depois de apenas 30 minutos. No entanto, a sensibi- Danielle L. Dixson et al. em Global Change Biology, vol. 21, No. 4, pgs. 14541462;
abril de 2015.
lidade do GABAA pode diferir entre as espcies, por isso, no est
Behavioural impairment in reef fishes caused by ocean acidification at CO2
claro se essa a causa primria das mudanas de comportamento. seeps. Philip L. Munday et al. em Nature Climate Change, vol. 4, pgs. 487492; jun-
ho de 2014.
OS PEIXES CONSEGUEM SE ADAPTAR?
D E N OSSOS A RQU I VOS
A principal pergunta que me fazem quando falo sobre a acidi-
ficao dos oceanos : quais so as chances de que a vida marinha Perigos da acidificao do oceano. Scott C. Doney; ed. 47; abril de 2006.
possa se adaptar? A natureza tem uma capacidade espantosa de
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POR UMA IA
A P R E N D I Z AG E M
DE MQUINA
MAIS HUMANA
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Alison Gopnik professora de psicologia e professora
associada de filosofia da Universidade da Califrnia
em Berkeley. Suas pesquisas focam como as crianas
pequenas aprendem sobre o mundo que as cerca.
EM SNTESE
Como crianas pequenas sabem o que sabem? Especialistas em inteligncia artificial esto estu- Duas estratgias rivais de aprendizagem de mqui-
Essa questo preocupou filsofos e psiclogos por dando os poderes do raciocnio mental de crianas na as duas competindo na tentativa de imitar o
muito tempo e agora preocupa os cientistas da em idade pr-escolar para desenvolver formas de en- que as crianas fazem naturalmente comearam a
computao. sinar mquinas sobre o mundo. transformar a IA como uma disciplina.
De cima para baixo (aprendizagem profunda) De cima para baixo (mtodos bayesianos)
Exemplos da letra A ensinam um computador Sada: pixel por pixel, Quando se usa mtodos bayesianos, um nico exemplo O sistema acionado
a distinguir padres de pixels iluminados e essa letra se parece com da letra A suficiente para recon ecer exemplos simi- com um exemplo de um novo
escuros para vrias verses da letra. Depois, o conjunto de dados lares. A mquina constri um modelo de letra a par- conceito, suficiente para sustentar
quando a mquina recebe uma nova entrada, brutos de treinamento: tir de sua prpria biblioteca interna de partes, uma srie de tarefas de sada
ela avalia se os pixels coincidem com a portanto, ela um A montando uma figura formada por um ngulo
configurao do conjunto de treinamento, agudo unido por um travesso, um A que pode
confirmando que a letra , de fato, um A. A ento ser usado para identificar vers es ligeira-
aprendizagem profunda uma mente diferentes da letra ou modific la de v rias
verso mais complexa formas.
dessa abordagem. Entrada Entrada
e irresistvel de aplicar mtodos de baixo para cima para permitir para ajud-lo a aprender coisas novas. Plato e os filsofos racio-
que os computadores caassem padres significativos nos dados. nalistas, como Descartes, acreditavam na aprendizagem de cima
Sistemas chamados conexionistas ou redes neurais se inspi- para baixo, que desempenhou um papel importante no incio da
ram na forma como os neurnios convertem padres de luz em IA. Na dcada de 2000 esses mtodos tambm foram recriados na
sua retina em representaes do mundo que os rodeia. Uma rede forma de modelagem probabilstica ou bayesiana.
RUSLAN SALAKHUTDINOV E JOSHUA B. TENENBAUM, EM SCIENCE, VOL. 350; 11 DE DEZEMBRO DE 2015 (exemplo bayesiano)
FONTE: HUMAN-LEVEL CONCEPT LEARNING THROUGH PROBABILISTIC PROGRAM INDUCTION, POR BRENDEN M. LAKE,
neural faz algo similar. Ela utiliza elementos de processamento Como os cientistas, sistemas de cima para baixo tambm come-
interconectados, semelhantes a clulas biolgicas, para transfor- am formulando hipteses abstratas e amplas sobre o mundo e
mar pixels de uma camada da rede em representaes cada vez ento pressupem como deveriam ser os dados se essas hipteses
mais abstratas um nariz ou um rosto inteiro medida que estiverem certas. Tambm como os cientistas, os sistemas ento
os dados so processados em camadas sucessivamente mais altas. revisam suas hipteses, conforme o resultado de suas previses.
As ideias sobre redes neurais passaram por uma recente revi-
talizao por causa de novas tcnicas chamadas aprendizagem NIGRIA, VIAGRA E SPAM
profunda tecnologia que agora est sendo comercializada pela Mtodos de baixo para cima so, talvez, os mais rapidamente
Google, Facebook e outras gigantes da TI. O poder sempre cres- entendidos, por isso, vamos consider-los primeiro. Imagine que
cente dos computadores o crescimento exponencial da capaci- voc tenta fazer seu computador separar mensagens importantes
dade computacional previsto pela conhecida lei de Moore tam- misturadas a todos os e-mails de spam que chegam sua caixa.
bm contribui para o novo sucesso desses sistemas. E isso ocorre preciso observar que o spam geralmente tem certas caracters-
tambm com o desenvolvimento de conjuntos de dados extrema- ticas: longa lista de destinatrios, endereo de remetente geral-
mente grandes. Com melhor capacidade de processamento e mais mente na Nigria ou na Bulgria, referncias a prmios de US$
dados para digerir, os sistemas conexionistas podem aprender 1 milho, ou talvez uma propaganda do Viagra. Mas as mensa-
com muito mais eficincia que se imaginava. gens legtimas podem parecer iguais. Voc no quer perder o aviso
Ao longo de anos, a comunidade de IA oscilou entre favorecer de que ganhou uma promoo ou recebeu um prmio acadmico.
esses tipos de solues de baixo para cima para a aprendizagem de Se voc comparar exemplos suficientes de spam com outros
mquina e abordagens alternativas de cima para baixo. As abor- tipos de e-mails, notar que s o spam tende a ter elementos que
dagens de cima para baixo alavancam o que um sistema j sabe se combinam de certas formas bvias por exemplo, Nigria, jun-
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A REDE
NEUROCINCIA
INTRINCADA
DA MEMORIA Uma revoluo tcnica fornece dicas sobre
como o crebro conecta memrias, um
processo fundamental para compreender
e organizar o mundo ao nosso redor
Alcino J. Silva
As
memrias
dependem de nossa capacidade de recordar detalhes sobre
o mundo o rosto de uma criana, um ganso, um lago. Para
transform-los em experincias reais, no entanto, o crebro
deve, de alguma forma, fundir esses elementos individuais
em um todo integrado a expresso no rosto da criana Os mecanismos fundamentais que o
crebro usa para criar essas memrias
quando ela v um bando de gansos de repente seguir voo a conectadas comeam a se revelar aps
partir de um bloco de juncos no lago. duas dcadas de pesquisa em nossos
Um senso de memria coeso tambm depende de outros laboratrios e em outros. Compreender
os processos fsicos envolvidos no entre-
fatores. Nossa sobrevivncia ao longo dos milnios tem laamento de memrias individuais far
dependido da lembrana no s da informao correta mais do que s fornecer insights sobre
digamos, um leo ou uma cobra , mas tambm de seu funcionamento cerebral. Pode um dia
ajudar a prevenir distrbios que prejudi-
contexto. Encontramos o animal durante um confronto cam nossa capacidade de unir memrias.
inesperado em um trecho isolado de savana africana ou como
parte de uma visita sem pressa ao zoolgico de San Diego? UM ACIDENTE FELIZ
Quando comeamos nossos estudos
acerca da conexo da memria, no final
A fim de evitar outros tipos de predadores em nossas vidas di- dos anos 1990, faltavam-nos as ferramentas e o conhecimento
rias, precisamos igualmente ser capazes de vincular memrias ao bsico necessrios para enfrentar este assunto. Um primeiro pas-
longo do tempo: julgar se vale a pena ir atrs de um investimento so-chave para determinar como as memrias so entrelaadas
aparentemente atraente depende da fonte que fez a recomenda- foi a nossa descoberta de um conceito chamado de alocao de
o a probidade, para exemplo, de quem a sugeriu. Uma falha memria, a percepo de que o crebro usa regras especficas para
em conectar os dois pode ter consequncias desastrosas. atribuir pedaos de informaes aprendidas para grupos discre-
O campo da neurocincia est comeando a lidar com a for- tos de neurnios em regies envolvidas na formao da memria.
ma como o crebro liga as memrias na vasta extenso do espa- O acaso teve um papel fundamental nessa descoberta. Come-
o e do tempo. At agora, a grande maioria dos estudos se con- ou com uma conversa que tive com Mike Davis, amigo e colega
PGINAS ANTERIORES: ANDREAS KUEHN Getty Images (cabea); GETTY IMAGES (padro da teia)
centrou no modo como adquirimos, armazenamos, recordamos agora na Universidade Emory, numa visita Universidade Yale
e alteramos memrias individuais. No entanto, a maioria das em 1998. Davis compartilhou as descobertas de estudos nos quais
memrias no so entidades nicas, isoladas. Ao invs dis- ele manipulou um gene conhecido como CREB para melhorar a
so, uma lembrana puxa a prxima, estabelecendo sequncias memria emocional em ratos a associao, por exemplo, entre
intrincadas de memrias que nos ajudam a prever e a compre- uma msica e um choque eltrico. Antes, meu laboratrio e outros
ender melhor o mundo nossa volta. haviam mostrado que o CREB era necessrio para a estabilizao
EM SNTESE
A pesquisa acerca da memria sofreu uma revoluo: Novas tecnologias mostraram que as memrias no A capacidade do crebro de controlar quais neur-
novas tecnologias fazem imagens da atividade de neur- so designadas aleatoriamente para neurnios em re- nios codificam quais memrias fundamental para o
nios individuais e at ativam e desligam as clulas em gies cerebrais envolvidas no processamento e no ar- fortalecimento das memrias e de sua conexo, re-
momentos precisos, permitindo que cientistas do cre- mazenamento de informaes. Em vez disso, meca- cursos que so interrompidos em muitos transtornos
bro realizem experincias que at h pouco anos acredi- nismos especficos determinam quais clulas vo neuropsiquitricos e durante o declnio cognitivo rela-
tava-se que fossem possveis apenas na fico cientfica. armazenar uma determinada memria. cionado idade.
CREB em neurnios especficos na amgdala do camundongo. Ela xes sinpticas so crticos para a formao da memria. Depois de
demonstrou que esses neurnios eram quase quatro vezes mais treinar os camundongos em uma tarefa que posteriormente evoca-
propensos a armazenar uma memria amedrontadora do que seus va memrias emocionais, ela testou a fora das conexes sinpti-
vizinhos. Em 2007, aps quase uma dcada, meu laboratrio, junto cas dos neurnios da amgdala com nveis mais elevados de CREB,
com o de Josselyn, por fim publicou evidncias de que memrias a fim de ver se eles tinham conexes mais fortes em comparao
emocionais no so aleatoriamente designadas a neurnios den- com clulas que no foram alteradas para produzir mais CREB.
tro da amgdala. Ao invs disso, as clulas aproveitadas para arma- Para isso, estimulou as sinapses dessas clulas com uma pequena
zenar essas memrias so aquelas que possuem mais da protena corrente eltrica e registrou suas reaes com pequenos eletrodos
CREB. To importante quanto isso, outros experimentos mostra- embutidos nas clulas. Como esperado, os neurnios da amgdala
ram que a CREB tem uma funo semelhante em outras regies do com mais CREB fizeram sinapses mais fortes do que outras clu-
crebro, incluindo o hipocampo e o crtex, a camada mais externa. las, um resultado consistente com a ideia de que eles eram mais
propensos a ter armazenado a memria emocional.
MUDANDO ENTRE MEMRIAS LIGADAS E DESLIGADAS Em um trabalho ainda mais recente, o laboratrio de Josselyn
Para confirmar o papel da CREB na alocao de memria, demonstrou que uma memria de uma experincia amedronta-
buscamos mtodos novos que haviam transformado o estudo da dora poderia ser armazenada em um conjunto predeterminado
memria nos ltimos anos. Essas tcnicas de laboratrio possibili- de neurnios da amgdala, ao alter-los, por engenharia genti-
taram tanto ativar quanto desligar os neurnios de fato, provo- ca, com um tipo especfico de canal de ons, que aumenta a exci-
cando ou silenciando uma memria. tabilidade desses neurnios. Os canais de ons formam poros na
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superfcie das clulas, e os especficos escolhidos por Josselyn per- intervalo de cinco horas, na esperana de que as memrias rela-
mitiram que essas clulas fossem mais facilmente ativadas. De tivas s duas cmaras estariam conectadas. Mais tarde, ela lhes
maneira similar, o laboratrio de Albert Lee, no Campus de Pes- deu um choque leve na pata na segunda cmara. Como espera-
quisa Janelia, relatou que aumentar artificialmente a excitabili- do, quando depois ela colocou os camundongos na cmara onde
dade dos neurnios do hipocampo, enquanto os animais corriam receberam o choque, eles ficaram paralisados, presumivelmente
ao redor de uma trilha, os tornava mais propensos a reagir a um por lembrarem que receberam um choque l. Camundongos ficam
determinado local na pista, resultado consistente com nossas des- paralisados como uma reao natural ao medo, porque a maioria
cobertas de que a excitabilidade tem um papel fundamental na dos predadores observa melhor as presas quando elas se movem.
determinao de quais clulas esto envolvidas no armazenamen- O resultado principal surgiu quando Cai e Shobe colocaram
to de uma memria especfica. os camundongos na cmara neutra. Nosso raciocnio era de que,
Por fim, nosso grupo e o de Josselyn, aproveitaram uma tec- se as memrias de ambas as cmaras estavam ligadas, os animais
nologia inovadora chamada optogentica, que usa luz para ativar no espao neutro seriam lembrados de terem recebido choques
e inibir neurnios. Usamos a tcnica para ativar neurnios espe- na outra cmara e, assim, ficariam paralisados em antecipao
cficos que apresentavam nveis mais elevados de CREB. Thomas e foi isso que descobrimos. Ns tambm deduzramos que seria
Rogerson e Balaji Jayaprakash, ambos ento em meu laboratrio, menos provvel que as duas memrias fossem vinculadas caso
comearam por projetar neurnios da amgdala a fim de produzi- estivessem separadas por um intervalo de sete dias. E, de fato, a
rem mais CREB e channelrhodopsin 2 (ChR2), um canal inico ati- reexposio dos animais cmara neutra depois de um perodo
vado por azul luz. Em seguida, mostramos que pode-
ramos desencadear artificialmente a lembrana de
uma memria relativa a medo em camundongos
quando usamos a luz para ativar neurnios da amg-
A previso fundamental de
dala com mais CREB, mas no aqueles com nveis
menores da protena, confirmando que a memria
nossa hiptese era que
havia sido armazenada nesses neurnios. memrias distintas, criadas
CONECTANDO
Em 2009 fui convidado a escrever um artigo
em intervalos prximos, so
sobre nossa pesquisa e aproveitei para apresen-
tar nossas idias de como as memrias so conec-
armazenadas na mesma rea
tadas ao longo do tempo. A capacidade da CREB de do crebro, em populaes
sobrepostas de neurnios.
regular quais clulas formam uma certa memria
em outras palavras, alocao de memria me
levou hiptese de que o processo poderia ser fun-
damental para a capacidade de conectar memrias
separadas, o que em meu laboratrio chamado
hiptese de alocar-para-conectar. Como a alocao de memria de tempo mais longo no os fez recordar da cmara de choque, e
ocorre num subconjunto de neurnios que tm mais CREB, que eles no se paralisaram. Em geral, com intervalos de tempo muito
so mais facilmente ativados, o processo prioriza esses neur- maiores do que um dia, as memrias permanecem desvinculadas.
nios para armazenar prontamente outra memria. Quando duas Esses achados comportamentais foram empolgantes, mas
memrias compartilham muitos dos mesmos neurnios, elas eles no testaram uma previso fundamental da hiptese de que
esto formalmente ligadas. memrias distintas, formadas em intervalos de pouco tempo, so
Assim, a ativao desses neurnios na recordao de uma das armazenadas na mesma rea do crebro, em populaes sobre-
duas memrias leva recordao da outra. O ponto fundamental postas de neurnios. Essa sobreposio fsica liga as duas mem-
dessa ideia foi a hiptese de que duas memrias mais prximas no rias, de modo que a lembrana de uma traz a outra para a mente.
tempo, ambas formadas na durao de um dia, tm mais chance
de serem vinculadas do que as separadas por perodos mais longos. VISUALIZANDO MEMRIAS
Com intervalos muito maiores do que um dia, a segunda mem- Para testar realmente a hiptese de alocar-para-conectar, seria
ria no mais se beneficia da excitabilidade desencadeada pela pri- necessrio nada menos do que conseguir ver as memrias no cre-
meira e, portanto, armazenada em uma populao diferente de bro enquanto elas estavam sendo criadas. Tcnicas para visualizar
neurnios. A limitao temporal faz sentido, porque eventos ocor- neurnios em camundongos vivos j esto em uso, mas todas exi-
ridos no perodo de um dia tm muito mais chances de ser mutua- gem que a cabea dos camundongos seja fixada em microscpios
mente relevantes do que eventos separados por uma semana. grandes, uma configurao no propcia para os testes comporta-
Escrever o artigo e descrever essas ideias me atraiu ainda mais mentais necessrios para examinar a hiptese.
para o desafio de test-las. A hiptese de alocar-para-conectar era Acho surpreendente, porm, quantas vezes na minha car-
objetiva, mas no estava claro como confirmar sua legitimidade. reira a tcnica correta surgiu quando mais precisvamos delas.
Os testes tiveram de esperar pelo tempo certo para serem feitos. Participei de um seminrio na Universidade da Califrnia dado
A situao mudou quando Denise Cai e Justin Shobe juntaram- por Mark Schnitzer, de Stanford, que descreveu um microscpio
-se ao projeto. Cai sugeriu uma ideia inteligente. Junto com Shobe, minsculo que seu laboratrio acabara de inventar, que conse-
ela exps camundongos a duas cmaras no mesmo dia, com um guia visualizar a atividade de neurnios em camundongos que
Os neurnios se
acendem quando os
camundongos
exploram o interior
de cada uma das
trs gaiolas.
IN TIME, BY DENISE J. CAI ET AL., EM NATURE, VOL. 534; 2 DE JUNHO DE 2016 ( imagens de neurnios)
expressos imediatamente aps a formao da memria, com aque- memrias. Os pesquisadores de Toronto argumentaram que, se as
DE A SHARED NEURAL ENSEMBLE LINKS DISTINCT CONTEXTUAL MEMORIES ENCODED CLOSE
les marcados pela etiqueta duradoura. Esse passo identifica no populaes de neurnios que codificam duas memrias se sobre-
apenas os neurnios ativados por um evento caso no qual um punham, aumentos nos nveis de CREB gerados pela primeira
neurnio possui uma nica etiqueta fluorescente , mas tambm memria tambm fortaleceriam uma segunda memria. Mas, ao
aqueles ativados por duas ocorrncias: o brilho das duas etiquetas. invs de expor os camundongos a diferentes lugares, como em nos-
Repetindo a mesma configurao experimental, Cai e equi- so trabalho, Josselyn treinou-os para reconhecer duas melodias. O
pe mostraram que por um intervalo mais curto, de cinco horas, a treinamento para a primeira melodia reforava a memria de uma
sobreposio entre os neurnios que codificam cada uma das duas segunda melodia se as duas sesses de treinamento ocorriam de
memrias com etiquetas duplas foi maior do que se esperaria por 1,5 a 6 horas depois, mas no aps 18 a 24 horas.
acaso. No intervalo de sete dias, a sobreposio entre duas expe- Recentemente, Kaoru Inokuchi e seus colegas da Universi-
rincias no ficou acima do nvel de acaso de modo significativo. dade de Toyama deram um passo adiante. Usaram optogenti-
Outros experimentos da equipe de Josselyn em Toronto for- ca para inativar o grupo de clulas compartilhadas por duas lem-
neceram ainda mais evidncias da validade de nossa hiptese de branas emocionais diferentes, deixando enquanto isso outras
associao de memria. O grupo dela no s fez uma verso dis- clulas inalteradas, incluindo aquelas que eram nicas para cada
tinta da experincia de marcao neuronal, como tambm achou uma das duas recordaes. A pesquisa mostrou que inativar
evidncias comportamentais independentes de ligao entre as clulas compartilhadas interrompeu a ligao entre as duas
Entender como as memrias rias para muitos dos mesmos neurnios CA1 e,
assim, restaurar a conexo da memria em camun-
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BURA
negros do
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de se encontrar e se fundir um evento com muito poucas chan- Juan Garca-Bellido fsico terico e professor no Instituto
ces de ocorrer na atual idade do Universo. Assim, razovel sus- de Fsica Terica de Madri. Sua pesquisa gira em torno do Uni-
peitar que esses buracos negros massivos tenham se formado via verso primordial, energia escura, buracos negros e gravidade
um caminho mais extico, que pode no envolver absolutamen- quntica. Garca-Bellido membro das misses Euclides e da
te estrelas. Alm da deteco de ondas gravitacionais, o Ligo pode Antena Espacial para Interferometria Laser (Lisa), do Levanta-
mento de Energia Escura e da Agncia Espacial Europeia.
ter revelado um fenmeno ainda mais surpreendente: buracos
negros que antecedem a prpria formao das estrelas.
Sbastien Clesse um cosmlogo belga e pesquisador de
Apesar de buracos negros primordiais (BNPs) como esses nun-
ps-doutorado da Universidade Tcnica da Rennia do
ca terem sido observados antes, alguns modelos tericos sugerem Norte-Vestflia, em Aachen, Alemanha. Seu trabalho abran-
que poderiam ter se formado num nmero astronmico a partir ge inflao csmica, gravidade modificada e buracos negros
do plasma denso que preenchia o Cosmos menos de um segundo primordiais. Clesse participa da misso Euclides e colabora
depois do Big Bang. Essa populao invisvel poderia ento resol- com o Arranjo de um Quilmetro Quadrado.
ver vrios dos mais notveis mistrios da cosmologia moderna. Em
particular, os BNPs poderiam constituir parte, se no toda a mat-
ria escura do Universo os 85% de matria invisvel no Univer-
so que agem como uma cola gravitacional que mantm juntas as
galxias e os aglomerados galcticos. Estudos futuros com o Ligo da Via Lctea, no acharam evidncias de que Machos formassem
e outras misses em breve testaro essas ideias, proporcionando a totalidade de nosso halo galctico. Esses resultados foram con-
uma potencial nova revoluo na nossa compreenso do Cosmos. clusivos para descartar os Machos de at dez massas solares como
os elementos bsicos da matria escura. Enquanto seguiam as pes-
A QUEDA DOS MACHOS, A ASCENSO DAS WIMPS quisas, os tericos propuseram uma alternativa: partculas massi-
Inicialmente, os buracos negros pareciam ser os candidatos vas que interagem fracamente (WIMPs, na sigla em ingls).
ideais para a matria escura porque no emitem luz. Na verda- As Wimps so previstas em certas extenses do Modelo Padro
de, junto com outros objetos escuros como planetas e ans mar- da fsica de partculas, mas permanecem, pelo menos, to vagas
rons eles constituem uma soluo proposta h muitos anos para o quanto os Machos. At agora, no foram encontradas evidncias
problema da matria escura: MACHO (acrnimo, em ingls, para de sua existncia apesar de dcadas de pesquisas com acelerado-
objetos halo massivos compactos). Encontrados tanto em halos res de partculas, detectores subterrneos e telescpios espaciais.
esfricos que circundam as galxias quanto prximos aos centros medida que resultados negativos se acumulam, alguns pesqui-
luminosos delas, os Machos criariam a fora gravitacional respon- sadores comearam a reconsiderar a hiptese dos Machos, focan-
svel pelos movimentos anmalos de estrelas e gs que os astr- do principalmente os BNPs. Mas que processo semearia tais estra-
nomos observam nas bordas mais distantes das galxias. Falando nhos objetos por todo o Universo observvel, e como podem no
simplesmente, as galxias parecem girar rpido demais para man- ter sido observados por tanto tempo?
terem-se unidas pela massa visvel de estrelas que vemos. A mat-
ria escura fornece a fora adicional necessria para evitar que as BURACOS NEGROS DO BIG BANG
galxias em rotao lancem suas estrelas pelo espao afora. Bernard Carr e Stephan Hawking propuseram a ideia dos BNPs
Se os Machos formarem a maior parte da matria escura do nos anos 1970, embora considerassem apenas buracos negros
Universo, tambm devem ser responsveis por outros efeitos. O com massas inferiores de uma montanha. Esses buracos negros
que quer que seja a matria escura, ela molda as maiores estrutu- minsculos j devem ter evaporado e desaparecido ao longo dos
ras do Universo, determinando a origem e o crescimento das gal- quase 14 bilhes de anos de vida de nosso Universo, via um proces-
xias, bem como dos aglomerados e superaglomerados de galxias. so quantomecnico descoberto por Hawking e chamado radiao
Esses objetos se fundem a partir do colapso gravitacional de gran- Hawking. Por isso, os BNPs teriam tido uma contribuio despre-
des massas de gs concentradas dentro de halos de matria escu- zvel no total atual de matria escura do Universo.
ra. Cosmlogos mapearam, com preciso, a distribuio espacial A possibilidade de BNPs massivos formarem a maior parte ou
dessas massas gasosas por meio de amplas e detalhadas anlises at toda a matria escura se assenta na ideia conhecida como infla-
de galxias e as associaram a minsculas variaes de temperatu- o csmica, criada por Alan Guth nos anos 1980. A inflao uma
ra presentes na radiao csmica de fundo em micro-ondas (CMB, fase hipottica da espantosa expanso logo aps o Big Bang. Em
na sigla em ingls) o brilho residual do Big Bang. A massa difu- 10-35 segundo, dois pontos separados por uma distncia menor que
sa de matria escura em grandes galxias e aglomerados tambm o raio atmico teriam se afastado a quatro anos-luz, uma distn-
curva o espao e distorce a luz de objetos distantes ao fundo, fen- cia comparvel das estrelas mais perto de ns. Alm disso, flutua-
meno conhecido como lente gravitacional. es qunticas minsculas foram amplificadas at escalas macros-
A hiptese dos Machos, porm, caiu em desgraa h dez anos cpicas pela rpida expanso, semeando o Cosmos em crescimen-
quando no foram vistos em observaes experimentais indiretas to com regies mais densas e menos densas de matria e energia
destinadas a provar sua existncia. Mais especificamente, os astr- onde se originaram depois todas as estruturas csmicas. Por mais
nomos os procuraram usando microlentes gravitacionais, um tipo estranho que parea, a teoria da inflao fortemente sustentada
de lente gravitacional onde um buraco negro, uma an marrom ou pela observao dessas flutuaes de densidade na CMB.
at um planeta passam diante de uma estrela ao fundo e amplifi- Em 1996, um de ns (Garca-Bellido), junto com Andrei Lin-
cam temporariamente sua luz. Pesquisas com microlentes gravita- de, da Universidade Stanford, e David Wands, da Universidade de
cionais realizadas por anos com milhes de estrelas na Grande e Portsmouth, descobriu por que a inflao formava picos agudos no
na Pequena Nuvem de Magalhes, as principais galxias satlites espectro de flutuaes de densidade no Universo primordial (veja
Os buracos negros primordiais se formam em aglomerados Ampla faixa no tamanho das utuaes
Grande
nao uma acelerao proposta para a expanso do niverso menos de resulta numa ampla faixa de massas de BNPs
Pico alto
Amplitude da utuao
um segundo depois do Big Bang poderia formar BNPs ampli cando as
utuaes u nticas at escalas imensas uando a inao terminou, essas signi ca
utuaes teriam criado perturbao de densidade ue depois formaram os mais BNPs
BNPs Flutuaes maiores e mais poderosas teriam criado os buracos negros
primordiais mais massivos e numerosos modelo inacion rio dos autores
admite um pico extenso de utuaes ampli cadas e uma faixa mais larga de
perturbaes de densidade como os formadores de buracos negros primor- Modelo de inao padro
diais aglomerados, sendo ue a massa de cada buraco negro variava de um
Pequena
cent simo a de mil ve es a massa do ol Meio milho de anos depois do Big Modelo do autor
Bang, um aglomerado poderia se estender por centenas de anos-lu e con-
ter milhes de PB s medida ue os PB s dentro desses aglomerados se Pequenas escalas Grandes escalas
fundiam, se dispersavam e eram alimentados por g s e poeira comuns, eles Tamanho da utuao
teriam controlado o crescimento de gal xias e aglomerados gal cticos
Flutuaes de densidade Tempo
Perodo
da inao
Primeiras estrelas
(10-35
segundos) (cerca de 100 milhes de
anos depois do Big Bang)
Big Bang Flutuaes de grande
Buracos negros densidade colapsam mais
s
va
Expanso acelera
ad
Radiao csmica de
fundo em micro-ondas
(cerca de 380 mil anos No primeiro
depois do Big Bang) bilho de anos
quadro acima). Isto , ns mostramos como as flutuaes qunti- so atual. Esse modelo gera uma populao de buracos negros todos
cas amplificadas pela inflao produziriam naturalmente regies de mesma massa, determinada pela quantidade de energia da
particularmente densas que poderiam colapsar para formar uma regio onde ocorre o colapso. Depois outros grupos comearam a
populao de buracos negros, menos de um segundo aps a infla- explorar essas ideias baseados em diferentes modelos de inflao.
o. Esses buracos negros deveriam se comportar como matria Em 2015, dois de ns (Clesse e Garca-Bellido) propusemos um
escura e serem predominantes no contedo de matria do Univer- cenrio similar ao de 1996, mas nesse caso as flutuaes primor-
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C I DA D E S S U S T E N TV E I S
COMO AS
CIDADES
REPORTAGEM ESPECIAL
EM SNTESE
Para serem sustentveis, as cidades deveriam ser Instalaes recm-projetadas esto desbra- Cidades positivas permitem que as pessoas
projetadas de acordo com os princpios circulares da vando e explorando esses princpios, inclusive o vivam e trabalhem nos mesmos bairros, criando
natureza, incluindo fazer uso mximo da radiao so- Parque 20|20, na Holanda, e a Base de Sustenta- grande eficincia e promovendo vidas seguras,
lar e tratar o lixo, os resduos, como um recurso. bilidade da Nasa, na Califrnia. dignas e criativas.
redes de prefeitos, municpios que capitaneou o design de ambos, tanto da rvore como o fim da vida til. Novas tecnologias, por
tambm so atores poderosos, para um desenvolvi- dos animais que comem seus exemplo, permitem que placas de circuitos
mento sustentvel. Ele
que combinam seus pontos for- frutos, depositando no solo de celulares sejam lucrativamente proces-
fundador da empresa
tes, criam agendas ambientais e William McDonough + nutrientes que a rvore absorve sadas em uma instalao limpa, onde todos
exercem uma liderana global. Partners e da McDo- e converte em crescimento. os chamados minerais de terras-raras e
Desde megacidades a cidade- nough Innovation, alm Nutrientes fluem sem parar em metais preciosos so recuperados para
zinhas, prefeitos, vereadores, de cofundador do Insti- ciclos regenerativos do tipo ber- reutilizao em novos eletrnicos.
investidores, economistas e tuto de Inovao de Pro- o a bero . Resduo equivale a Um segundo princpio-chave que
dutos Bero a Bero.
planejadores esto respondendo alimento. tudo energizado pelo Sol e, s vezes,
REPORTAGEM ESPECIAL
55%
capta, limpa e libera lentamente gua para
Populao mundial que vive em cidades: o adjacente rio Rouge de modo que susten-
ta a sade da bacia hidrogrfica. Pssaros
5 bilhes
borrelhos-de-dupla-coleira nativos volta-
ram para nidificar uma semana depois que
a obra foi concluda.
Outro modelo a Base de Sustenta-
de pessoas vivero em cidades at 2030 bilidade, o novo centro para cincia e
computao da Nasa em seu Centro de
Pesquisa Ames na Califrnia. A instalao
Cidades dos EUA Habitantes que tem o potencial de suprir todas as suas
comprometidas com utilizam nibus em necessidades de aquecimento, refrigerao
energia 100% renovvel: Curitiba, Brasil: e energia (tendo at um excedente de ener-
27 85%
gia) com fontes solares e geotrmicas, e
uma clula de combustvel com avanados
controles de gerenciamento de energia. A
gua residual tratada no local.
O premiado empreendimento Parque
hidrologia, vegetao e clima. Incorporam loco recuperam nutrientes de guas resi- 20|20 em Hoofddorp, na Holanda, outro
a histria natural e cultural. Ao combina- duais e limpam o que sobra para utilizao modelo. um conjunto de edifcios e
rem essas pistas, eles descobrem padres em cozinhas e banheiros locais. Ar fresco, espaos abertos que est sendo concludo,
para o desenvolvimento do espao. Assim, plantas florescentes e luz diurna esto por numa rea de 11,3 hectares. As pessoas po-
criam possibilidades para um crescimento toda parte. Prdios e comunidades agem dem acessar o parque por via area, trem,
positivo que sustente a vida. como sistemas de suporte vida. nibus e bicicleta. Zonas verdes, praas,
No fim, o que queremos uma cidade Partindo desta viso, podemos imaginar jardins pblicos e passarelas ao longo de
planejada que permita viver e trabalhar no comida e materiais produzidos na rea canais proporcionam uma conexo com a
mesmo bairro. Se os moradores puderem rural vizinha, criados com ferramentas comunidade ao redor. Tamanho, estrutura
desmanchar seus celulares em uma fbrica e tecnologias feitas na cidade. Esta de- e orientao de cada edifcio so otimi-
limpa, que se encaixa no ecossistema da ci- volve resduos como matria-prima que zados para captar energia e luz solar. Os
dade, no h por qu isolar esta fbrica em reabastece o sistema. Tudo se move em edifcios espalhados pelo parque integram
zonas especiais nos subrbios. Uma cidade ciclos regenerativos, da cidade ao campo, sistemas de gerenciamento de energia,
positiva elimina a necessidade de zonea- do campo cidade, em redes naturais e gua e lixo, funcionando como um nico
mento por preocupaes com atividades culturais que circulam nutrio biolgica grande organismo.
inseguras ou insalubres. Fbricas podem e tcnica o hardware e o software do
ficar em bairros residenciais limpos, geran- sculo 21. O metabolismo de uma cidade PODEMOS EXPANDIR esses sucessos
do empregos aos quais as pessoas podem viva, positiva, permite que assentamentos para cidades inteiras? A inspirao vem
chegar a p ou pedalando. Isso reduz humanos e o mundo natural prosperem de alguns lugares interessantes. Um
FONTES: THE WORLDS CITIES IN 2016: LIVRETO DE DADOS. NAES UNIDAS ( populao urbana agora e em 2030); SIERRA CLUB (cidades
bastante a necessidade de meios de trans- juntos. Se quisermos tornar as cidades Curitiba, no Brasil. Curitiba comeou a se
ECONMICA E SOCIAL DAS NAES UNIDAS PARA A SIA E O PACFICO. ONU, 2012 (taxa de utilizao de nibus em Curitiba, Brasil)
dos EUA comprometidas com energia renovvel ); LOW CARBON GREEN GROWTH ROADMAP FOR ASIA AND THE PACIFIC. COMISSO
portes locais e de viagens de lugares mais verdadeiramente sustentveis e benficas transformar sob a direo do arquiteto e
distantes ao local do trabalho, grandes des- para todos, precisamos entender isso como urbanista Jaime Lerner, prefeito trs vezes
perdcios de recursos e tempo. E se comida uma verdade literal, estratgica, presente entre os anos 1970 e 1990. No primeiro
fresca e saudvel for cultivada em telhados em todos os nossos projetos. mandato, Lerner percebeu que a cidade
de prdios por toda a cidade, como ocorre tentador formular princpios para um pobre, com centenas de milhares de habi-
na nova fbrica da Method Products, em futuro utpico. Mas cidades reais poderiam tantes, precisava de um transporte pblico
Chicago, os resduos orgnicos locais no p-los em prtica hoje? Algumas novas melhor. Como um metr ou um sistema
s podem ser um recurso para os sistemas instalaes industriais esto demonstrando ferrovirio pesado custariam muito caro,
de cultivo, mas as pessoas que trabalham como. ele pediu Volvo que construsse 270
nessas hortas de telhado tambm podem A reforma e expanso do Centro Ford nibus articulados suecos, fabricados na
viver nos arredores. Rouge em Dearborn transformou o imenso prpria cidade, o que deu empregos aos
Imagine tudo o que fazemos como complexo de produo de veculos num habitantes. A cidade contratou moradores
gestos que sustentam a vida, inspiram modelo de sustentabilidade industrial. O para construir plataformas de nibus nas
prazer e encontram harmonia com a na- plano mestre incorporou um telhado verde principais vias, de onde as pessoas podiam
tureza. Prdios funcionam como rvores; de mais de quatro hectares o corao de viajar para qualquer lugar por uma tarifa
sequestram carbono, produzem oxignio, um sistema de jardins midos, pavimen- nica. Em vez de cobrar a passagem na
destilam gua, oferecem hbitat a milhares tao porosa, sebes e biovaletas. O projeto hora de embarcar, um processo lento, Ler-
de espcies, e convertem a incidncia solar transformou um megacanteiro industrial ner fez os usurios pagarem ao entrar nas
em energia trmica e eltrica, e vendem a de 100 anos, abandonado, ambientalmente plataformas, de modo que quando o nibus
energia excedente a vizinhos. Prdios com contaminado e subutilizado, num verde- chegasse poderiam embarcar rpido, tor-
reas pantanosas e jardins botnicos in jante ecossistema de guas pluviais que nando o sistema eficiente.
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EXPLORANDO
Devido ao rpido crescimento popu-
lacional, o lixo se amontoava em ruelas e
becos, e os caminhes no podiam colet-
-lo. Lerner criou um programa para instruir
crianas a separar o lixo e depois mandou-
O LIXO
-as para casa para ensinarem suas famlias.
Em pagamento pelo lixo separado, as pes-
soas recebiam passes de nibus ou alimen-
tos frescos. De repente, todo mundo usava
o transporte em massa. Hoje, 85% dos curi-
tibanos usam nibus e 90% participam do
programa de reciclagem. A cidade recicla
70% de seus refugos, uma das maiores por-
centagens do mundo.
Esta viso inovadora continuou. Em vez
de construir uma grande biblioteca no cen-
tro da cidade, Curitiba construiu uma rede
de 50 pequenos Faris do Saber nos bair-
Transformar resduos caros
ros, para toda criana estar perto de uma em recursos valiosos pode tornar
biblioteca andando. Construtores locais eri-
giram os edifcios em cores vivas. As biblio- cidades altamente eficientes
tecas trabalham com as escolas munici-
C I DA D E S S U S T E N TV E I S
E
Imagine se Manhattan tivesse esse tipo
de viso com comida crescendo nos telha- M 20 DE DEZEMBRO DE 2015, UMA MONTANHA DE REFUGOS URBANOS DESMO-
dos de escolas e hospitais, provendo no s ronou em Shenzhen, na China, matando pelo menos 69 pessoas e des-
comida mas tambm empregos. Crianas truindo dezenas de edifcios. O desastre trouxe vida as torres de res-
poderiam separar e classificar o lixo, tirar os duos mostradas no filme infantil WALL-E, de 2008, que retratou a
REPORTAGEM ESPECIAL
plsticos, lev-lo a centros de reciclagem e horrvel, mas real ideia de que nosso lixo poderia se acumular sem
serem pagas em brinquedos. Fbricas lim- controle, expulsando-nos de nosso hbitat. Uma forma eficaz de trans-
pas transformariam os plsticos em mon- formar uma cidade existente numa urbe sustentvel, que preserve a
meros reutilizveis. Tudo abastecido por Terra em vez de arruin-la, reduzir todos os fluxos de resduos e depois usar o
energia solar, e materiais fluem em ciclos que resta como recurso. O lixo de um processo vira matria-prima para outro.
contnuos de nutrio biolgica e tcnica. Muitas pessoas migram para centros urbanos em todo o mundo, o que coloca
O que buscamos para todos o que eu cidades em uma posio privilegiada para resolver problemas globais de recursos.
chamaria de vida boa uma vida segura, Prefeitos assumem mais responsabilidade para conceber e projetar solues por-
digna e criativa. Em cidades positivas isso que so obrigados a isso, em especial em pases onde o entusiasmo nacional para
pode acontecer. Se forem projetadas e admi- lidar com questes ambientais arrefeceu. Os acordos climticos internacionais
nistradas com base neste princpio, tudo elaborados em Paris, em dezembro de 2015, tambm reconheceram um papel
melhora. Devemos insistir no direito de central para cidades. Mais de
humanidade e natureza coexistirem, unir a mil prefeitos afluram capi-
cidade e suas vizinhanas. Cidades so pro- Michael E. Webber vice-diretor tal francesa para comparti-
jetadas, mas tambm so organismos. Como do Instituto de Energia, codiretor da lhar suas promessas para redu-
Claude Lvi-Strauss destacou, cidades so instituio Clean Energy Incubator e zir emisses. Mudar os cdigos
professor de recursos energticos na
algo vivo e algo sonhado. Como criadores Universidade do Texas em Austin.
de construo e investir em efi-
de lugares vivos, no podemos deixar de nos Seu livro mais recente Thirst cincia energtica so s duas
projetar na paisagem. Mas, medida que for power: energy, water, and human iniciativas que muitos lderes
sonhamos com nossas cidades ideais, pode- survival (Yale University Press, 2016). municipais afirmaram poder
mos comear a ver mais claramente o verda- realizar muito mais rpido do
deiro carter do lugar que habitamos, o seu que governos nacionais.
esprito. Ento, ao moldarmos a natureza de Faz sentido cidades assumirem responsabilidade e adotarem medidas enrgi-
nossas cidades, estaremos criando lugares cas. Algumas, como Nova York, a Cidade do Mxico e Pequim, abrigam mais pes-
que celebram tanto a criatividade humana soas do que naes inteiras. E paisagens urbanas so lugares onde os desafios de
como um relacionamento rico e harmonio- administrarmos nossas vidas convergem de forma explosiva e concentrada. Cida-
so com a terra viva. Estaremos criando uma des podem assumir a liderana porque so capazes de ampliar e expandir rapida-
nova geografia de esperana. mente solues e porque so laboratrios vivos para melhorar a qualidade de vida
sem esgotar os recursos da Terra, poluindo 1.900 quilmetros de esgotos numa cida- MENOS MAIS
seu ar e sua gua, e prejudicando a sade de abarrotada de trs milhes de pessoas, Um lugar bvio para iniciar a reduo
humana no processo. encerrando o problema da clera. A obra do desperdcio so tubulaes de gua que
Cidades esto repletas de energia des- tambm criou os aterros fluviais que ainda vazam. Entre 10% e 40% da gua de uma
perdiada, dixido de carbono (CO2) des- existem como um componente fundamen- cidade normalmente se perdem em tubula-
perdiado, comida desperdiada, gua des- tal do ambiente urbano londrino, ao lon- es. E como o municpio limpou essa gua
perdiada, espao desperdiado e tempo go dos quais muitas pessoas passeiam. Mas e acionou bombas para bombe-la, vaza-
desperdiado. Reduzir cada fluxo de des- hoje, s eliminar os resduos com descar- mentos desperdiam energia, tambm.
perdcio e gerenci-lo como um recurso, gas de gua no basta. Depois de reduzir- O consumo de energia em si incrivel-
REPORTAGEM ESPECIAL
em vez de um custo, pode resolver mlti- mos o descarte, deveramos fechar o ciclo e mente ineficiente e desperdiador. Mais
plos problemas, criando um futuro mais usar o restante de novo. Primeiro, limite o da metade da energia consumida por uma
sustentvel para bilhes de pessoas. lixo; depois ponha-o para trabalhar. cidade liberada como calor residual de
Esse novo raciocnio comea por rede- chamins, canos de escapamentos e as par-
POLUIO COMO SOLUO finir nosso conceito de poluio. Raj Bhat- tes de trs de aquecedores, aparelhos de
Lies sobre desperdcio, lixo e resduos tarai, um engenheiro do servio municipal ar-condicionado e eletrodomsticos. Tor-
existem de sobra na histria. John Snow, de abastecimento de gua e coleta de esgo- nar todo esse equipamento mais eficiente
um mdico de Londres, deduziu que ter- to em Austin, Texas, me ensinou uma nova reduz a quantidade de energia que precisa-
rveis surtos de clera atingiram a cidade definio para poluio: recursos fora de mos produzir, distribuir e limpar.
em 1848 e 1854 porque os poos pblicos lugar. Substncias so nocivas se estiverem O lixo outro fluxo residual a ser con-
de gua estavam contaminados por esgo- no lugar errado: em nossos corpos, no ar, solidado. Os EUA geram mais de 1,8 kg de
to. Construir redes de esgotos foi uma solu- na gua. Mas no lugar certo so teis. Em resduos slidos por pessoa todos os dias.
o bvia, mas lderes polticos rejeitaram vez de mandar resduos slidos para um Apesar dos esforos para incentivar a com-
as concluses de Snow porque suas ideias aterro sanitrio e pagarmos a conta, por postagem, reciclagem ou a incinerao
no se encaixavam nas ideologias prevale- exemplo, pode-se inciner-los para gerar de parte dele, um pouco mais da metade
centes e porque as medidas foram conside- energia eltrica. E o esgoto de uma comu- ainda descartada em aterros sanitrios.
radas caras demais. Uma rejeio similar nidade de um milho de pessoas pode ser Reduzir o acondicionamento de produ-
ataca cientistas climticos atuais, que nos minerado para extrair milhes de dlares tos uma forma de diminuir esse volume,
dizem que nossos desperdcios e resduos em ouro e outros metais preciosos por ano gerando, ao mesmo tempo, outros benef-
esto nos matando, embora de um jeito para uso na produo industrial local. cios. Grandes varejistas, como o Walmart,
muito mais lento e menos direto, e que cor- Essa ideia se encaixa no conceito mais constataram que reduzir volume e tama-
rigir o problema exigir investimentos sig- amplo da chamada economia circular nho de embalagens resulta em menos
nificativos em novas infraestruturas. Snow em que as diferentes aes e processos da caminhes para o transporte e mais espao
foi depois justificado, e celebrado como sociedade se alimentam mutuamente uns nas prateleiras para expor as mercadorias.
um heri (talvez o mesmo destino aguar- aos outros de maneira sustentvel e ben- O desperdcio de comida , por si s,
de nossos cientistas de hoje), depois que fica. Simplificando, desperdcio, lixo, ou outra questo dolorosa. Apesar da fome em
GETTY IMAGES
novos lderes criaram ambiciosos proje- refugo o que temos quando nossa imagi- muitos lugares pelo mundo, os americanos
tos de obras pblicas para instalar mais de nao se esgota. descartam de 25% a 50% de seus alimentos
Autoridades esperam que os cidados os usina de tratamento de esgoto realizem o narmos as cidades inteligentes. Um parque
usem corretamente e destacam inspetores trabalho de compostagem, mas com uma industrial flexvel porque s tem alguns
municipais para verificar se os caminhes eficincia maior. ocupantes e tomadores de decises, mas
de lixo esto jogando refugos que foram Calor residual outra grande oportu- numa cidade muitas pessoas e organiza-
separados corretamente. A cidade produz nidade. Colh-lo difcil porque tempera- es tomam decises independentes sobre
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Lago Tiss
Estudo de caso:
gua gua de resfriamento usada gua no potvel
gua de superfcie
Kalundborg
industrial gua deionizada Kara/Noveren gua No parque industrial Symbiosis, em
industrial gua de superfcie
gua marinha Kalundborg, na Dinamarca, empresas
tratada
Gyproc Instalao de coordenam o fluxo de energia, gua e
Energia
saneamento e materiais entre si. Resduos ou subpro-
DONG
abastecimento dutos de uma operao so vendidos
municipal como matrias-primas para outras,
Resduos
Gipsita criando receitas e reduzindo o volume
de descarte ou os custos de materiais,
Cinzas alm de diminurem impactos
volantes Aquecimento
distrital ambientais. Cerca de 30 subs-
Resduos tncias, de gua e calor
de etanol Areia residuais a etanol, so inter-
gua da superfcie Sedimento/borra cambiadas e usadas para
Reservatrio criar enzimas, insulina,
Enxofre de gua Vapor
biogs, placas de ges-
Statiol so acartonado e
gua de
C I DA D E S S U S T E N TV E I S
energia, gua e lixo todos os dias. Integr- O epteto inteligente em si uma monitorar de perto o consumo de ener-
-los requer uma mudana cultural rumo imputao de que a maioria das cidades gia eltrica, gs natural e gua por hora do
cooperao, movida por avanos nas tec- burra. Essa acusao pega porque cida- dia, assim como o uso de aparelhos doms-
nologias inteligentes. Cidades inteligen- des repletas de lixo e desperdcio parecem ticos e industriais so um lugar bvio para
tes dependero de sensores onipresentes e operar cegamente. A Fundao Nacional comear. Sensores de trfego em tempo
computao barata, baseados em aprendi- de Cincias dos EUA acaba de lanar uma real, monitores da qualidade do ar e detec-
zado de mquina e inteligncia artificial. A iniciativa de pesquisa chamada Comunida- tores de vazamentos tambm esto mo.
combinao pode identificar ineficincias des Inteligentes & Conectadas para ajudar O consrcio Pecan Street, em Austin, est
e aprimorar operaes, reduzindo resduos cidades a usar melhor dados disponveis. colhendo dados de centenas de lares para
e custos enquanto opera automaticamente Esse nome, por sinal, indica que intelign- descobrir como um acesso a tais fluxos
FONTE: CENTRO SYMBIOSIS DA DINAMARCA www.symbiosecenter.dk
todo tipo de equipamento. cia no suficiente interconexes entre de dados poderia ajudar os consumido-
Felizmente, tornar as cidades inteligen- sistemas e pessoas importam, tambm. res a mudar seu comportamento de modo
tes um objetivo sedutor para urbanistas Cidades inteligentes dependem mui- a reduzir o consumo, enquanto, ao mesmo
que desejam acomodar mais pessoas sem to do Big Data, o vasto conjunto de dados tempo, economizam custos. Cidades como
diminuir a qualidade de vida. Na ndia, por coletados de redes de sensores e algorit- Phoenix, no Arizona, e bases militares,
exemplo, onde os problemas populacionais mos avanados amplamente difundidos como Fort Carson, no Colorado, promete-
e de sade pblica so graves, o primeiro- para obter rapidamente insights, tirar con- ram tornar-se consumidoras autossuficien-
-ministro Narendra Modi anunciou sua cluses e tomar decises sobre esses dados. tes de energia e gua, e produtoras zero-l-
inteno de converter 100 municpios de Redes conectadas ento comunicam essas quidos de resduos. Alcanar essas metas
pequeno e mdio porte em cidades inteli- anlises a equipamentos distribudos por ambiciosas exigir grande quantidade de
gentes como uma possvel soluo. toda a cidade. Medidores inteligentes para dados interconectados.
aterro sanitrio, eles podem ser incinerados socialmente inteligentes. Estudos mos-
tram que a P&D para cidades inteligen-
para gerar energia eltrica para a cidade. tes tem se concentrado mais em tecnologia
do que naquilo de que os cidados preci-
sam. Feitos do jeito errado, os benefcios de
uma cidade inteligente podem favorecer
para determinar que veculos autnomos o em relao antiga tcnica de espe- os que j tm conectividade com a inter-
compartilhados diminuiriam o nmero rar algum ligar e reclamar de que h gua net e acesso a tecnologias avanadas, o que
de carros necessrios em uma cidade em jorrando na rua. E algum dia poderemos s ampliaria a lacuna tecnolgica, alm de
uma ordem de magnitude e reduziriam as mandar robs inteligentes pelas tubula- outras divises socioeconmicas.
emisses, apesar de causarem um ligeiro es para consertar os problemas. Senso- Municpios tambm precisam ajudar
aumento na quilometragem total percorri- res de alto desempenho tambm permi- seus habitantes a se tornarem cidados
da, porque os veculos permaneceriam em tiro encontrar e prever vazamentos de mais inteligentes, porque cada indivduo
movimento. Em vez de dirigir, as pessoas gs natural antes que ocorram acidentes. toma decises de recursos toda vez que
que tm de ir e voltar do trabalho podem Tais perdas no so s ruins para o meio compra um produto ou aciona um inter-
descansar, ler e-mails, dar telefonemas ambiente e um desperdcio de recursos, ruptor. Acesso a educao e a dados ser
ou realizar outros negcios. Esse trabalho mas tambm perigosos, como vemos pelas primordial. Conectar os cidados tambm
pode criar valor econmico e encurtar as exploses que fazem manchetes em reas requer colaborao e interaes de boa
horas passadas no escritrio, permitindo com infraestruturas envelhecendo. vizinhana: parques, praas, espaos com-
CORTESIA DE SYMBIOSIS DE KALUNDBORG
chegar em casa mais cedo para jantar. difcil saber onde cidades inteligentes partilhados, escolas e centros religiosos e
Tornar nossa infraestrutura mais inte- podem surgir. Imagino que uma provvel comunitrios, todos eles antigos pilares
ligente a chave para resolver problemas candidata ser uma cidade do Centro-Oes- centrais de arranjos seculares para cidades
bsicos, como canos que vazam. Identifi- te, com um milho de pessoas ou mais, que prsperas. Quanto mais modernas e inte-
car vazamentos deveria ser fcil se hidr- precisa se reinventar porque sua economia ligentes nossas cidades se tornarem, mais
metros fossem distribudos pelo sistema foi destruda dcadas atrs. Indianpolis, poderemos precisar desses elementos do
de abastecimento para monitorar os flu- em Indiana, vem mente, em parte por- antigo mundo para nos manter unidos.
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70 Scientific American Brasil, Agosto 2017
Assaf Biderman inventor, diretor associado do Carlo Ratti arquiteto e engenheiro, diretor
Senseable City Lab e fundador da Superpedestrian, do Senseable City Lab no Instituto de
uma empresa voltada ao desenvolvimento de veculos Tecnologia de Massachusetts e fundador do
robticos para ocupao por uma ou duas pessoas. estdio de design Carlo Ratti Associati.
TRNSITO
INTELIGENTE
REPORTAGEM ESPECIAL
Uma teia mvel de veculos dotados de sensores e cruzamentos
inteligentes transformar o modo como nos deslocamos pela cidade
C I DA D E S S U S T E N TV E I S
Carlo Ratti e Assaf Biderman
C
ARROS E CIDADES TM UMA RELAo complicada. Hoje, atormentados por engarrafa-
mentos sempre maiores e ar cada vez mais poludo, tendemos a pensar nos dois
como sendo cada vez mais incompatveis. Mas no sculo 20 o carro deixou uma
das marcas mais duradouras no planejamento urbano. Como diz o arquiteto Le
Corbusier em seu livro seminal A cidade de amanh e seu planejamento, o carro
a motor... derrubou por completo nossas antigas ideias de planejamento urbano.
Quase 100 anos depois estamos num ponto de virada seme- sensores que coletam dados internos e externos para ajud-
lhante. Primeiro, espera-se que a demanda por transporte urba- -lo a funcionar de maneira segura e eficiente. Empresas, tais
no mais que dobre at 2050, o que significa que teremos de como a Waymo (derivada, agora independente, da Google),
mais que dobrar a capacidade de ruas e avenidas s para man- Cruise (adquirida pela General Motors), Otto (adquirida pela
ter os congestionamentos nos nveis de agora. Segundo, graas Uber), Zoox e nuTonomy, por exemplo, esto experimentando
rpida convergncia das tecnologias da informao e comu- com sensores adicionais que conseguem enxergar uma rua
nicao, robtica e inteligncia artificial, nossos sistemas de de um jeito muito parecido com a maneira como nossos olhos
mobilidade carros, nibus e outros esto passando por o fazem. Uma vez que voc insere essas informaes em um
grandes transformaes. E, mais uma vez, esto prestes a remo- sistema de inteligncia artificial a bordo, voc tem um veculo
delar radicalmente a paisagem urbana. plenamente autnomo, capaz de navegar por movimentadas
Veculos que se dirigem sozinhos (ou autnomos) esto grades de trnsito sem qualquer interferncia humana.
liderando a mudana. Nas ltimas dcadas, carros passaram Carros autnomos vo liberar grande parte do tempo que
dos tipos de sistemas mecnicos que Henry Ford talvez tives- passamos diariamente ao volante, e tornaro nossas ruas e
se reconhecido, para verdadeiros computadores sobre rodas. outras vias mais seguras. Eles sero elementos profundamen-
Agora, o veculo mdio est equipado com um conjunto de te transformadores no modo como nossas cidades funcionam
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medida que cada automvel se aproxima do
cruzamento, ele emite um sinal de solicitao de
acesso via Wi-Fi para o gerenciador da interseco. O
sinal, com registro de data e hora, inclui detalhes da
rota. Aqui, o carro vermelho 1 entra primeiro na zona
do sinal, sendo seguido pelo veculo laranja 2 , depois
dos carros 3 e do verde 4 .
Limite para solicitao
3 de acesso ao cruzamento
Cruzamento
Rotas
prede nidas
xas
4
REVISITING STREET INTERSECTIONS USING SLOT-BASED SYSTEMS, BY REMI TACHET
FONTES: SENSEABLE CITY LAB, INSTITUTO DE TECNOLOGIA DE MASSACHUSETTS;
Carro que se
aproxima da
zona do sinal
Distncia da traseira
Um segundo grupo, liderado pelo carro azul 5 ,
Distncia para parar se aproxima do cruzamento.
REPORTAGEM ESPECIAL
em condies de uxo livre gerenciadas de cruzamento gerenciadas de cruzamento
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Carros que viram
direita podem
urar a la
2
1
3
4 4
6
2
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mas de jeitos que ainda esto longe de mundo poderia ser atendida com ape- ficar viagens mais rpidas, menos engarra-
estarem decididos. De um lado, podemos nas 30% de seus veculos existentes. Alm famentos e impacto ambiental menor.
imaginar que mais pessoas comearo a do compartilhamento de veculos, a auto-
compartilhar esses veculos para que as nomia poderia abrir uma nova onda de SEM ESTACIONAR, SEM SEMFOROS
mquinas possam dar caronas para um viagens compartilhadas. Aplicativos como Carros autnomos no exigiro infra-
passageiro aps o outro, todo o dia. Nes- o Via, uberPOOL e o Lyft Line j permi- estrutura urbana adicional mas levaro a
se caso, nossas cidades podem funcionar tem que pessoas diferentes compartilhem outras mudanas significativas. Conside-
usando apenas uma pequena frao dos o mesmo trajeto, reduzindo custos opera- re a necessidade de estacionar. Nos EUA,
veculos hoje em servio. De outro, pode- cionais e tarifas individuais. A autonomia a infraestrutura de estacionamentos cobre
remos ter mais cenrios distpicos. Robin impulsionaria trajetos compartilhados cerca de 20.720 quilmetros quadrados,
Chase, cofundador e ex-CEO do servio ainda mais porque todas as corridas pode- rea quase to grande quanto a de Nova
de compartilhamento de veculos Zipcar, riam ser gerenciadas on-line. Em cidades, Jersey. Se mais veculos fossem compar-
escreveu sobre carros zumbis aqueles o potencial para compartilhar viagens tilhados, necessitaramos de bem menos
sem ningum dentro entupindo nos- significativo, com base em anlises realiza- lugares. Quais seriam as consequncias?
sas cidades, nossas ruas e avenidas. Sua das por nosso Senseable City Lab, no MIT. Com o tempo, vastas reas de valiosas
viso prev desemprego para motoristas Nova York, por exemplo, eminen- terras urbanas, hoje ocupadas por esta-
profissionais, perda de receita de nossa temente compartilhvel. O projeto Hub- cionamentos, poderiam ser reprojetadas
infraestrutura de transporte, e um pesa- Cab, do nosso laboratrio, reuniu dados e desenvolvidas para sustentar um novo
delo de poluio, congestionamentos e de 170 milhes de corridas de txi que espectro de funes sociais. O Park(ing)
agitao social. envolveram 13.500 txis da cidade mais Day, evento anual realizado pela primei-
Nirvana tecnolgico ou distopia urba- especificamente, as coordenadas de GPS ra vez em So Francisco, em 2005, oferece
na? Para abordar esta questo, precisa- para todos os seus pontos de embarque e ideias preliminares. Todos os anos, o even-
C I DA D E S S U S T E N TV E I S
mos investigar como veculos autnomos desembarque e os intervalos entre os dois. to desafia artistas, projetistas e cidados
poderiam alterar nossas paisagens urba- Em seguida, desenvolvemos um modelo a transformar vagas em espaos pblicos
nas e os modos como nos deslocamos
atravs delas.
ECONOMIA DE COMPARTILHAMENTO
Vastas reas urbanas poderiam
Em mdia, carros ficam ociosos 96%
do tempo. Isso os torna candidatos ideais
ser reprojetadas e desenvolvidas
para a economia compartilhada. O poten-
para sustentar funes sociais.
REPORTAGEM ESPECIAL
POTENCIAIS ARMADILHAS Cidade eficiente. Mark Fischetti; edio n 113, outubro de 2011
Veculos autnomos e compartilha-
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A E V O
BIOLOGIA
DA
D A
N
A
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O
Thea Singer uma jornalista de cincia de Boston com
artigos publicados, entre outros, por The Washington Post,
MIT Technology Review e Psychology Today. Ela tambm
autora de Stress Less (Hudson Street Press, 2010).
PGS. ANTERIORES: JEREMY JACKSON Gallery Stock; NESTA PG.: ARIJIT SEN Getty Images (1); GETTY IMAGES (2)
tes em todas as culturas ao longo da histria humana. Mas a dan- SINTA O RITMO
a rara no reino animal. E, embora umas poucas outras espcies Decompondo seus elementos bsicos, danar o ato de sentir
possam acompanhar um ritmo com o corpo, nenhuma exibe nada e prever o andamento de um ritmo externo e acompanhar o som
parecido com a complexidade da dana humana. com movimentos rtmicos do corpo. Essas aes requerem uma
Por que danar um trao humano to comum e por que grande dose de coordenao entre diferentes partes do crebro.
somos to bons nisso? Nos ltimos anos, cientistas comearam Na ltima dcada, pesquisadores no Canad, EUA e Inglater-
a identificar caractersticas do crebro e do corpo que susten- ra comearam a identificar profundas redes de clulas nervosas
tam nossa excepcional habilidade. Algumas dessas caractersti- no crebro humano que agem coordenadamente para isolar o
cas esto ligadas linguagem e locomoo ereta, dois traos ritmo de sinais auditivos externos. Quando essas redes reconhe-
EM SNTESE
A dana desempenha um papel importante em to- neurolgico denominado entrainment, ou sincroniza- bilidade de sincronizao. Mas colibris, papagaios e
das as sociedades humanas conhecidas. Sua onipre- o, pelo qual os neurnios motores que controlam um leo-marinho da Califrnia tambm demons-
sena implica uma vantagem de sobrevivncia ou os msculos se alinham com os sinais auditivos de- traram esse talento.
meramente um subproduto acidental de crebros tectados pelos neurnios sensoriais. Novas investigaes em uma srie de disciplinas re-
grandes e postura ereta? At recentemente, os pesquisadores pressupu- velam que as origens da dana so complexas e po-
A habilidade de danar depende de um processo nham que apenas os seres humanos possuam a ha- dem nunca ser completamente entendidas.
3 4 5
a cabea para cima e para baixo ao som dos Backstreet Boys, esta- que j so capazes de imitar sons. At agora, os nicos animais
va entre os pssaros estudados. E, em 2013, pesquisadores rela- conhecidos que imitam sons so humanos, colibris, papagaios, ps-
taram que uma fmea de leo-marinho da Califrnia chamada saros canoros, baleias, alguns pinpedes (mamferos aquticos), ele-
Ronan podia mover a cabea seguindo uma srie de compassos. fantes e alguns morcegos. Nossos mais prximos parentes vivos,
Humanos porm so os nicos animais que podem produzir bonobos e chimpanzs, no so aprendizes vocais, e a maior par-
os movimentos intimamente coordenados exigidos para danar te das evidncias at agora sugerem que eles no praticam sincro-
em pares ou grupos. Pssaros capazes de sincronizao movem- nizao. Embora, em um estudo, um chimpanz fmea tenha apa-
-se de forma individual e intermitente ante a msica, diz Patel. rentemente conseguido sincronizar suas batidas com um com-
Mesmo quando diversos papagaios vivem juntos num abrigo, eles passo, ela no conseguiu manter o ritmo com outros compassos.
no coordenam seus movimentos ou danam uns com os outros,. Pesquisadores tambm descobriram um bonobo fmea que pare-
cia capaz de bater em um tambor no ritmo, mas eles alertam que
JOGO DE IMITAO ela poderia estar observando o examinador em busca de sinais e
Dana no o nico atributo humano que depende de entrain- no apenas respondendo ao que estava ouvindo.
ment. Falar e cantar tambm exigem a habilidade de sincronizar Essas observaes reforam a ideia de que a imitao vocal seja
sons com movimentos fsicos especificamente, de cordas vocais um precursor necessrio para a sincronizao. Mas elas no repre-
e msculos na garganta. Rastrear os caminhos neurais envolvi- sentam uma certeza. Demonstrar sincronizao em espcies no
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humanas no fcil. Pense nos complexos duetos entre algumas na. Mas isso difere de para qu os humanos evoluram. Ns evo-
espcies de pssaros. Eles se alternam no canto mantendo o anda- lumos para andar e correr, lanar, escavar, acrescenta Lieber-
mento com preciso prevendo quando o outro vai terminar man. A seleo natural para essas habilidades permitiu que nos-
ou s reagem ao silncio do parceiro? E como se pode testar isso? sos ancestrais em particular o Homo erectus aprimorassem
O maior problema para a hiptese de Patel, no entanto, Ronan, suas habilidades de caa e coleta.
o leo-marinho que balana a cabea. Lees-marinhos no so con- H todos os tipos de adaptaes fascinantes que, acredita-
siderados aprendizes vocais, embora sejam aparentados de morsas mos, evoluram para corrermos, diz Lieberman. Os dedos dos ps
e focas, que o so. Mas, em 2013, pesquisadores da Universidade da dos humanos so muito mais curtos, por exemplo, do que os de
Califrnia mostraram que Ronan podia mover a cabea acompa- nossos antepassados. Do ponto de vista biomecnico, isso des-
nhando compassos simples e, mais tarde, seguindo msicas mais necessrio para andar, mas torna o correr mais eficiente. Os trs
complexas. Testes posteriores mostraram que ele podia manter cor- canais semicirculares do ouvido interno cresceram ao longo de
retamente o ritmo mesmo quando este acelerava ou desacelerava. milnios, permitindo que mantenhamos nosso equilbrio quan-
H vrias maneiras para explicar a aparente habilidade de do movemos a cabea, assim podemos correr com mais velocida-
Ronan. Talvez se trate somente de um leo-marinho muito talen- de e agilidade. Essas adaptaes tambm so teis para a dana.
toso a exceo que prova a regra. Ou talvez os lees-marinhos Para Lieberman, a dana pode ser um resultado coinciden-
ainda possuam o maquinrio neural para a imitao vocal e ape- te da evoluo da corrida que se provou to til que conferiu sua
nas no o utilizem mais. prpria vantagem seletiva adicional. No precisa ser uma coisa
6 7 8
talvez o processo no seja to difcil, afinal, ou evoluiu em outras da dana humana que ns tendemos a execut-la juntos. Quando
espcies por razes diferentes das dos humanos. sentimos e prevemos os movimentos uns dos outros h um dar e
receber fsico e emocional entre indivduos, sejam parceiros de tan-
UM PAPEL NA CORRIDA? go ou multides da gerao Y no embalo de Bruno Mars. Essa capa-
Diferentemente da dana de outras criaturas, a dana huma- cidade de grupo representa o que pode ser chamado de arrasta-
na vai alm do balano da cabea para incluir movimentos coor- mento social, e confere com o que mile Durkheim, que ajudou a
denados do torso e dos membros. Como a evoluo de nossa inco- criar a sociologia, denominou efervescncia coletiva, ou o senti-
mum postura ereta teria afetado nossa capacidade de danar? do de ser parte de algo maior do que si mesmo. Esse tipo de coe-
Uma ideia que ganhou ateno nos ltimos anos que a dan- so social pode ter sido valioso para atividades de sustentao da
a teria surgido de nossa capacidade de correr ao contrrio de vida como obter comida ou evitar predadores.
apenas andar sobre duas pernas. Certamente tiramos vanta- O antroplogo Edward Hagen, da Universidade do Estado de
gem de sermos bpedes para danarmos, comenta o bilogo evo- Washington Vancouver, leva a ideia um passo adiante. Ele suge-
lucionista Daniel E. Lieberman, da Universidade Harvard, que, re que msica e dana podem ter evoludo como uma forma de os
em 2004, foi coautor de um estudo de referncia publicado em grupos avaliarem uns aos outros ao buscarem formar alianas que
Nature sobre o papel da corrida de resistncia na evoluo huma- iam alm dos elos do reino. A qualidade de um grupo danando
9 10 11
entre as duas, a sociedade que danava teria uma vantagem evo- do seus crebros. Clnicos e pesquisadores tm reconhecido os
lucionria, acrescenta ele. benefcios da dana para pessoas com distrbios do movimento
Dada a falta de evidncia direta das origens da dana, cientis- como mal de Parkinson. De fato, muitas pessoas que sofrem com
tas em diversos campos se voltaram para o comportamento das os tremores, enrijecimento e dificuldades de iniciar movimentos
poucas sociedades de caadores-coletores que ainda existem em que caracterizam o Parkinson podem, ao ter aulas de dana, recu-
busca de pistas sobre nosso passado ancestral. Sua forma de vida perar parte de sua habilidade de sincronizao. Como um bene-
provavelmente o mais prximo que os antroplogos podem che- fcio adicional, as aulas ajudam a formar laos sociais que podem
gar de como eram as sociedades humanas antes da adoo disse- ter sido desfeitos pela doena.
minada da agricultura h 10 mil anos. As aulas de dana para pessoas com Parkinson no tm, eviden-
A antroploga evolucionista Camilla Power, da Universidade temente, o objetivo de descobrir a prxima Mora Godoy. Mas elas
do Leste de Londres, estuda o povo hadza, do norte da Tanznia, oferecem suas prprias transformaes. A mais antiga das ativi-
GURCAN OZTURK Getty Images (9); FRANK CARTER Getty Images (10); NIKA KRAMER Gallery Stock (11)
que tipicamente vive em acampamentos de 20 a 30 pessoas, dades humanas une corpo e mente de formas que estamos apenas
nos quais homens e mulheres so socialmente iguais. Por gera- comeando a compreender.
es, a dana ligou emocionalmente os hadza a outros grupos,
incluindo o povo bayaka, da frica Central, e o povo San, do deser-
to do Kalahari, em fices partilhadas. Participantes encenam PA R A C O N H E C E R M A I S
iniciaes, rituais de cura e relaes de gnero, entre outras coi- Rhythmic entrainment: why humans want to, fireflies cant help it, pet birds try,
sas, relata Camilla. Entre os hadza, rituais importantes de dana and sea lions have to be bribed. Margaret Wilson e Peter F. Cook em Psychonomic
incluem simulao de guerras dos sexos, em que mulheres insul- Bulletin & Review, vol. 23, n 6, pgs. 16471659; dezembro de 2016.
tam homens e esses retribuem na mesma moeda. essa dinmi- The origins of human and avian auditory-motor entrainment. Adena Schachner
em Nova Acta Leopoldina, vol. 111, n 380, pgs. 243253; 2013.
ca que fundamenta o igualitarismo, diz ela. Mulheres consolidam
Musical rhythm, linguistic rhythm, and human evolution. Aniruddh D. Patel
seu poder, mesmo desempenhando papis masculinos, incitando em Music Perception: An Interdisciplinary Journal, vol. 24, n 1, pgs. 99104;
os homens a caar em troca de carinhos mais tarde. September 2006.
H evidncias indiretas de que danas em grandes grupos tm
D E N OSSOS A RQU I VOS
ocorrido por milhares de anos. Os chamados locais de agregao
grandes reas bastante pisoteadas onde foram recuperados ins- A neurocincia da dana. Steven Brown e Lawrence M. Parsons; agosto de 2008.
trumentos musicais pr-histricos fornecem indcios de que
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D
OPERAO:
DIABETES
Cirurgia que encurta os intestinos elimina a doena; e
novas evidncias mostram que os intestinos e no s
a insulina podem ser responsveis pela enfermidade
Francesco Rubino
Q
consultor das fabricantes de dispositivos mdicos Ethicon e Medtronic.
O diabetes tipo 2 no era um deles. Operaes focam uma tambm dar pistas sobre a causa fugidia do diabetes.
dada parte do corpo, e os mdicos sabiam que o diabetes cau- Na poca, no fim dos anos 1990, tnhamos acabado de saber
sa danos a mltiplos rgos e envolve uma falha no uso eficiente que o mundo vivia uma epidemia da doena que segue at hoje. As
de um hormnio que regula a glicose no sangue, a insulina. Cla- mais recentes estimativas da Federao Internacional de Diabetes
ramente, no era algo a ser facilmente seccionado ou retirado. e da Organizao Mundial da Sade sugerem que pelo menos 415
Mas, em uma tarde do vero de 1999, minha viso sobre o milhes de pessoas no mundo tm o mal, e o nmero deve chegar
diabetes e a minha carreira se transformaram radicalmente. a 650 milhes at 2040 (90% tm diabetes tipo 2, as demais tm o
Eu tinha acabado de mudar da Itlia para Nova York para ini- tipo 1, quando o pncreas no produz insulina suficiente). Desco-
ciar o programa de uma bolsa sobre cirurgia minimamente inva- brir a causa e a cura pode salvar milhes de vidas.
siva na agora chamada Escola de Medicina Icahn no Monte Sinai. Aps uma noite insone, animado pelas possibilidades, levei a
Eu estava na biblioteca lendo sobre uma operao conhecida como ideia pela manh ao meu supervisor, Michel Gagner. Ele achou que
derivao biliopancretica quando vi algo estranho. A interveno eu estava a caminho de algo importante. Juntos, pedimos direo
destinada a pessoas severamente obesas. Ela as faz perder peso de nossa escola de medicina a realizao de um teste clnico em
ao encurtar a rota que o alimento segue pelos intestinos, evitan- humanos para ver se a cirurgia poderia ter efeitos melhores sobre
do sees que absorvem nutrientes. Muitos pacientes sofriam de o diabetes do que as terapias convencionais, mesmo em pessoas
diabetes tipo 2, que acompanha a obesidade. O que me surpreen- que no so severamente obesas. Nossa proposta foi rejeitada, no
deu, porm, foi que um ms aps a cirurgia essas pessoas apresen- s naquele momento como reiteradamente nos meses seguintes.
tavam nveis de acar no sangue totalmente normais. Elas sequer A rejeio foi desalentadora, mas talvez no surpreendente. O
haviam perdido muito peso, se alimentavam sem restries de diabetes vem sendo tratado h sculos com dietas, plulas e inje-
calorias ou acar e no tomavam nenhuma medicao para dia- es. Como a causa presumida alguma disfuno nas clulas pro-
betes. Mesmo assim, muitas seguiram sem diabetes por anos. dutoras de insulina no pncreas e na forma como o corpo lida com
Era impressionante. Como uma operao podia resolver pro- esse hormnio, operar pessoas e cortar parte do intestino como
blemas de acar no sangue em uma doena que, todos os livros- remdio deve ter soado como uma heresia e um risco insensato.
-texto diziam, crnica, progressiva e irreversvel? O diabetes pode Duas dcadas depois, a heresia comea a se tornar o senso
ser administrvel, mas no se espera que desaparea. Em busca comum. H agora dezenas de estudos com animais e pelo menos
de uma explicao, lembrei que o intestino delgado produz hor- 12 testes clnicos controlados, randomizados, envolvendo cen-
mnios que estimulam o pncreas a produzir insulina extra. A tenas de pessoas que exploraram a cirurgia desenvolvida ori-
mudana cirrgica na anatomia poderia afetar esses hormnios ginalmente para reduo de peso como tratamento para o dia-
de algum modo que restaurasse o metabolismo normal da glicose? betes tipo 2. Todos mostraram que reduzir a superfcie do trato
Ou o intestino abriga outros mecanismos da doena que a cirurgia gastrointestinal gera um efeito mais forte sobre o diabetes que
poderia corrigir? Se sim, a cirurgia poderia ser usada para tratar o qualquer outra terapia. E no s resultado da perda de peso. Em
diabetes, e saber como a interveno produzia esse efeito poderia muitos pacientes, os nveis de acar no sangue voltam aos nveis
EM SNTESE
Quarenta e cinco organizaes mdicas agora re- Diversos testes clnicos mostram que a cirurgia Resultados cirrgicos ligam o diabetes aos intesti-
comendam operaes originalmente destinadas controla o diabetes de forma melhor, mais rpida e nos. A operao pode funcionar porque altera hor-
reduo de peso como opes de tratamento pa- por perodos mais longos que medicamentos e mu- mnios, cidos biliares e bactrias dos intestinos ou
dro para diabetes tipo 2. danas na dieta. remove uma causa da doena.
Glicose
bro. Esses circuitos neurais alertam o crebro
trato gastrointestinal, se mostrou um tratamento quando os intestinos detectam a passagem de
poderoso para o diabetes tipo 2 e agora recomendada nutrientes. O crebro ento sinaliza ao fgado
Tempo
por mais de 40 associaes mdicas. Pesquisadores para suprimir a produo de glicose. Essa res-
comearam a identificar os mecanismos pelos quais uma posta melhora aps operaes de by-pass
operao pode melhorar o controle da glicose no sangue. gastrointestinal.
www.sciam.com.br 87
88 Scientific American Brasil, Agosto 2017
DESAFIO NA
ANTRTICA
NEVE
Pesquisas brasileiras no continente gelado permitem
conhecer a histria do planeta e at acompanhar as variaes
climticas em nosso pas. Mas, apesar dos bons resultados
at aqui, o futuro incerto devido carncia de verbas
Martha San Juan Frana
Os trabalhos em andamento incluem investigaes sobre a comearam as obras da nova estao, que est sendo construda
poluio atmosfrica causada pelas atividades humanas, o im- pela empresa chinesa Ceiec (Corporao Chinesa de Importaes
pacto dessa poluio sobre as espcies animais, a descoberta de e Exportaes Eletrnicas), vencedora da licitao internacional,
novos microrganismos no continente gelado e os efeitos das mu- ao custo de US$ 99,6 milhes, financiados pela Marinha do Brasil
danas climticas na Antrtica sobre o clima do sul do Brasil, en- e Ministrio da Defesa.
tre muitos outros tpicos. Um novo plano de orientao pesqui- Quando em funcionamento, a estao manter equipamen-
sa na regio recomenda que, nos prximos anos, amplie-se o foco tos de sondagem e rdio voltados para o estudo das perturba-
sobre temas que possam afetar diretamente o Brasil. Mas, embo- es da alta atmosfera e seu papel nas variaes climticas terres-
tres; medies da radiao ultravioleta solar,
tendo em vista o buraco na camada de oz-
Feita na China
Quando ficar pronta a expectativa que isso ocorra em maro de de convivncia, biblioteca e local para uso compartilhado de
2018 a nova estao Comandante Ferraz se elevar no mesmo computadores. Alm de uma rea dedicada operao e
local da antiga, na Pennsula Keller, ilha Rei George, arquiplago das manuteno da base.
Shetland do Sul. muito melhor do que a antiga, dizem os O MCTIC reps os equipamentos perdidos no incndio e fez dos
pesquisadores. Enquanto a pioneira Comandante Ferraz, de 1984, era laboratrios, voltados para pesquisas biolgicas, alm de geolgicas
um aglomerado de contineres interconectados, a nova base j foi e de contaminao ambiental, o carro-chefe da estao. Teremos
comparada jocosamente a um hotel de luxo, com o projeto um espao para processamento de amostras de microbiologia e de
arquitetnico baseado nas demandas tcnicas apresentadas pela biologia molecular para todas as reas, o que vai possibilitar a anlise
comunidade cientfica. mais rpida do material coletado, comemora a biloga Vivian
A estao de 4.500 metros quadrados contar com dois blocos. Pellizari, do Instituto Oceanogrfico da USP, coordenadora da Rede
O bloco superior abrigar camarotes para 64 pessoas at 50 MicroPolar, que estuda a diversidade microbiana e seus processos no
pesquisadores no vero antrtico e os militares da Marinha, que ambiente antrtico. A ideia que, alm de atender algumas reas
permanecem na Antrtica o ano todo. Nele tambm ficaro reas de especficas da cincia, os laboratrios possam servir a pesquisadores
servio como cozinha e refeitrio. Na parte de baixo, ficaro 14 que precisam processar amostras coletadas em outras regies
laboratrios (h outros trs mdulos externos para pesquisas), reas antrticas.
Localizao:
3 Instalao da estrutura da
cobertura e do revestimento
O jogo de armar
mos ampliando cada vez mais nossa rea geogrfica de atuao. Universidade do Maine. Este o melhor arquivo da histria cli-
Hoje, a maior parte das pesquisas feita em outras plataformas, mtica e da qumica atmosfrica que existe no planeta.
principalmente no navio polar Almirante Maximiano e depois
em acampamentos ou no mdulo Criosfera 1, ressalta. no m- MUITO ALM DA ESTAO
dulo Criosfera 1, a mais de 2,5 mil quilmetros ao sul da Estao A Antrtica tem 12,6 milhes de quilmetros quadrados quase
Comandante Ferraz, que Simes desenvolve sua pesquisa com os totalmente recobertos de gelo. rodeada pelo Oceano Austral, as
chamados testemunhos de gelo e trabalha em colaborao com a guas geladas que se formam no encontro do Atlntico, do Pac-
CAVANDO NO GELO:
pesquisador prepara retirada
de amostra. Espessura do
manto pode chegar a 1.000 m
em testemunhos de gelo antrtico, por exemplo, permitiram re- nais de que a poluio por elementos altamente txicos pode via-
construir variaes no teor dos gases do efeito estufa e da tem- jar na atmosfera por milhares de quilmetros, afirma Franciele,
peratura atmosfrica ao longo de centenas de milhares de anos, cujo estudo foi publicado na revista Atmospheric Environment.
possibilitando melhor conhecimento de oscilaes ambientais Ela explica que pesquisadores do grupo esto envolvidos no Ice
de periodicidade curta (como o El Nio e La Nia), que podem Memory, projeto da Unesco para salvar o registro ambiental de
ser mais diretamente relacionadas a variaes na composio at- geleiras que esto derretendo e que sero estocadas na Antrtida
mosfrica da Amrica do Sul, em especial da regio amaznica. e preservadas para as geraes futuras.
Hoje se sabe, como resultado de pesquisas brasileiras, que mu- Uma das dificuldades para fazer modelos mais precisos das
danas climticas na Antrtica esto deixando o clima do Rio respostas das geleiras s mudanas que ocorrem no clima o fato
Grande do Sul mais varivel, com mais extremos de frio e calor, de que no existe ainda um conjunto de informaes estatistica-
diz Simes. Os dados obtidos podem ser colocados nos modelos mente significativas sobre o que ocorre na Antrtica. Jorge Ari-
do clima no Brasil e ajudar na agricultura e na preveno de de- gony Neto, do Instituto de Oceanografia da Universidade Federal
sastres naturais. do Rio Grande (FURG) o coordenador do inventrio das gelei-
Foi ao examinar os testemunhos de gelo que a pesquisadora ras da Pennsula Antrtica, parte do Global Land Ice Measure-
Franciele Schwanck Carlos, do grupo de Simes, encontrou sinais ments from Space, projeto internacional de sensoriamento remo-
do surgimento, do auge e do ocaso da poluio por arsnio vin- to do gelo no continente. Na Pennsula Antrtica, cujas geleiras
da de minas do Chile; outros pesquisadores do grupo detectaram so menores e mais ngremes, observam-se os primeiros impac-
contaminao de urnio vinda das minas da Austrlia. So si- tos das mudanas climticas.
94 Scientific American Brasil, Agosto 2017 Fotografia: Centro Polar e Climtico da UFRGS
PRE SENA BRASILEIRA
Mais do
que uma
estao
A regio ao redor da Ilha Rei
George e o noroeste da
Pennsula Antrtica so as
reas mais estudadas pelos
brasileiros. Mas, medida
que a pesquisa se consolida,
o pas comea a explorar
tambm o interior do
continente, atravs de
expedies e da construo
de infraestrutura, como o
mdulo cientfico Criosfera 1,
que fica a apenas 670 km de
distncia do Polo Sul.
Os microrganismos antrticos, como as arqueias, os fungos e anticongelantes que ele produz e avaliar se essas propriedades
leveduras, tambm so objetos de pesquisa, por serem coloniza- podem ser usadas para diferentes fins, da indstria de alimentos
dores primrios, fornecedores de biomassa e energia nas teias ali- at a de aviao, afirma Rosa. Outro plano isolar o pigmento
mentares. A Rede MicroPolar, coordenada por Vivian Pellizari, da azul e verificar as possibilidades como corante natural e em ativi-
USP, conta com microbiologistas de diferentes instituies, com dades de fotoproteo.
foco em taxonomia, gentica e ecologia, alm da prospeco de O grupo de Rosa trabalha em colaborao com pesquisadores
compostos de origem microbiana que participam de projetos no de vrios pases em um projeto de monitoramento a longo prazo
apenas no INCT Criosfera como no INCT APA, voltado para o ar- de comunidades de musgos na rea de degelo Punta Hennequin,
quiplago das Shetland e regies adjacentes. Seu objetivo am- na Baa do Almirantado. Acredita-se que uma espcie de fungo,
pliar o conhecimento sobre a biodiversidade e os processos adap- antes aprisionado embaixo das geleiras, esteja causando uma do-
tativos desses organismos antrticos s condies extremas. ena nos musgos que pode se espalhar para outras localidades,
O grupo no estuda apenas microrganismos adaptados ao inclusive na Amrica do Sul.
frio, mas tambm presentes em vulces ativos, como na Ilha De- Os pases que mais investem na cincia do continente, inclu-
ception, nas Shetland. Os microrganismos so coletados no sedi- sive financeiramente, so os Estados Unidos, o Reino Unido, o Ja-
mento perto das geleiras, onde a temperatura negativa, e nas po e a Alemanha. Em segundo lugar viriam a China, a ndia, a
fumarolas (fissuras que emitem vapor de gua e gases), a 50 e Coreia do Sul, alm da Frana, da Noruega e da Rssia. O Brasil
100 graus C, para entender como esses organismos se adaptam estaria num terceiro grupo, com ambies de ascender ao segun-
no mesmo espao a temperaturas negativas e muito altas. Os se- do. Mas para isso no basta uma nova estao: preciso manter o
dimentos so congelados e levados para o laboratrio, onde va- volume de pesquisa. Esta uma opo que pode trazer inclusive
mos determinar a sequncia de DNAs envolvidos nesse mecanis- benefcios diplomticos, diz Simes: Precisamos realizar ativida-
mo de adaptao, diz a pesquisadora. des cientficas substanciais se quisermos conservar o status pol-
A Rede MicroPolar j deu frutos: da saiu a Rede MycoAntar, tico-diplomtico do Brasil como parte consultiva do Tratado An-
coordenada pelo bilogo Luiz Rosa, da Universidade Federal de trtico e ter direito a voz e voto nas reunies que tratam do futuro
Minas Gerais (UFMG), voltada para o estudo de fungos do con- e da conservao do continente gelado.
tinente. O grupo descreveu este ano uma nova espcie de fungo
da Antrtica, batizada de Antarctomyces pellizariae, em home-
nagem a Vivian, encontrada em amostras de neve coletadas em PA R A C O N H E C E R M A I S
ilhas prximas ao continente. O microrganismo surpreendeu por Antrtica, 2048 mudanas climticas e equilbrio global. Editora Marina Books. So
apresentar uma rara pigmentao azul, alm de resistncia a bai- Paulo, 2014
xas temperaturas. A nossa proposta entender as substncias
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CINCIA
EM GRFICO 23h
Meia-noit
e 1h
9 por minuto
22h 2h
21h
6
3h
20h
4h
A mdia
7,3 bebs nascidos
19h
O pico
por minuto
5h
18h Bebs nascidos por minuto
Coma primeiro
6h
Mais nascimentos de
todos os tipos ocorrem
de bebs
17h
7h
16h
Turno diurno
8am
Nascimentos culminam
5h
Ter
02h00min e 03h00min.
a
60 mil
bro
Boas Festas
em
)
rela
ma 25%
Outubro
o
di
Ma
e horas)
Walter Neves, Paulo Artaxo, Helena Nader, Jefferson Cardia Simes, lvaro Pereira Jr.,
Alexandra Osrio de Almeida e a presena especial de Michael Shermer, colunista da
Scientific American USA e editor da Skeptic Magazine.
SECRETARIA DE DESENVOLVIMENTO
ECONMICO, CINCIA, TECNOLOGIA E
INOVAO DO ESTADO DE SO PAULO
(SDECTI)