Fichamento - Umberto Eco - Como Se Faz Uma Tese
Fichamento - Umberto Eco - Como Se Faz Uma Tese
Fichamento - Umberto Eco - Como Se Faz Uma Tese
DA BAHIA
FACULDADE DE DIREITO
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM DIREITO
MESTRADO
LAS GRAMACHO
Salvador
2012
Numa lese de compilao, o estudante demonstra simplesmente ter examinado criticamente a maior
parte da literatura existente (ou seja. os trabalhos publicados sobre o assunto) e ter sido capaz de
exp-la de modo claro, procurando relacionar os vrios pontos de vista, oferecendo assim uma
inteligente panormica, provavelmente til do ponto de vista informativo mesmo para um especialista
do ramo, que, sobre aquele problema particular, jamais tenha efectuado estudos aprofundados (p. 29).
Eis, pois. uma primeira advertncia: pode fazer-se uma tese de compilao ou uma lese de
investigao; uma tese de Licenciatura ou uma tese de PhD (p. 29).
Uma tese de investigao sempre mais longa, fatigante e absorvente: uma tese de compilao pode
igualmente ser longa e fatigante (existem trabalhos de compilao que levaram anos e anos) mas,
geralmente, pode ser feita em menos tempo e com menor risco (p. 29).
Em contrapartida, existem leses que pretendem ser de investigao e que, pelo contrrio, so feitas
pressa; so ms teses que irritam quem as l e que de modo nenhum servem quem as fez (p. 29).
Assim, a escolha entre tese de compilao e tese de investigao est ligada maturidade e
capacidade de trabalho do candidato (p. 29).
1.2. A quem interessa este livro
Este livro dirige-se. portanto, queles que (mesmo sem serem milionrios nem terem sua disposio
dez anos para se diplomarem aps terem viajado por todo o mundo) tm uma razovel possibilidade de
dedicar algumas horas por dia ao estudo e querem preparar uma tese que lhes d tambm uma certa
satisfao intelectual e lhes sirva depois da licenciatura (p. 31).
1.3. De que modo uma tese serve tambm para depois da licenciatura
H duas maneiras dc fazer uma tese que sirva tambm para depois da licenciatura. A primeira fazer
da tese o incio de uma investigao mais ampla que prosseguir nos anos seguintes se. evidentemente,
houver a oportunidade e a vontade para tal (p. 31).
Efetivamente, fazer uma tese significa: (1) escolher um tema preciso; (2) recolher documentos sobre
esse lema; (3) pr em ordem esses documentos: (4) reexaminar o tema cm primeira mo luz dos
documentos recolhidos; (5) dar uma forma orgnica a todas as reflexes precedentes; (6) proceder de
modo que quem l perceba o que se quer dizer e fique em condies, se for necessrio, de voltar aos
mesmos documentos para retomar o tema por sua conta (p. 32).
Fazer uma tese significa, pois. aprender a pr ordem nas prprias idias e a ordenar dados: uma
experincia de trabalho metdico; quer dizer, construir um objecto que, em princpio, sirva tambm
para outros. E deste modo no importa tanto o tema da tese quanto a experincia de trabalho que ela
comporta (p. 32).
Em ltima anlise, fazer uma lese como exercitar a memria. Temos uma boa memria cm velhos
quando a mantivemos em exerccio desde muito jovens (p. 32).
1.4. Quatro regras bvias
Nestes casos, as regras para a escolha do tema so quatro: Que o tema corresponda aos interesses do
candidato (quer esteja relacionado com o tipo de exames feitos, com as suas; leituras, com o seu
mundo poltico, cultural ou religioso): 2) Que as fontes a que recorre sejam acessveis, o que quer
dizer que estejam ao alcance material do candidato; 3) Que as fontes a que recorre sejam
manuseveis, o que quer dizer que estejam ao alcance cultural do candidato; 4) Que o quadro
metodolgico da investigao esteja ao alcance da experincia do candidato (p. 33).
(...)quem quer fazer uma tese deve fazer uma tese que seja capaz de fazer (p. 33).
II. A ESCOLHA DO TEMA
II.1. Tese monogrfica ou tese panormica?
Uma monografia o tratamento de um s lema e como tal ope-se a uma histria de, a um manual, a uma
enciclopdia. (p. 38).
Para concluir, recordemos este princpio fundamental; quanto mais se restringe o campo, melhor se
trabalha e com maior segurana. Uma tese monogrfica c prefervel a uma tese panormica. melhor
que a tese se assemelhe mais a um ensaio do que a uma histria ou a uma enciclopdia (p. 39).
II.2. Tese histrica ou tese terica?
Uma tese terica uma tese que se prope encarar um problema abstracto que pode j ter
sido ou no objecto de outras reflexes; (...) (p. 39).
Nas mos de um estudante com uma experincia cientfica necessariamente limitada, estes temas
podem dar origem a duas solues. A primeira (que c ainda a menos trgica) leva a fazer a tese
definida (no pargrafo anterior) como panormica. (...) A segunda soluo mais preocupante, dado
que o candidato presume poder resolver, em poucas pginas, o problema de Deus e da definio de
liberdade (p. 40).
(...) um bom investigador experimental no comea a controlar as reaces dos seus pacientes sem
antes ter feito pelo menos um trabalho panormico (exame dos estudos anlogos j realizados), pois de
outro modo arriscar-se-ia a descobrir o chapu de chuva, a demonstrar qualquer coisa que j havia sido
amplamente demonstrada, ou a aplicar mtodos que j se tinham revelado errneos (...) (p. 41).
II.3. Temas antigos ou temas contemporneos?
E indubitvel que o autor antigo impe uma leitura mais fatigante, uma pesquisa bibliogrfica mais
atenta (mas os ttulos esto menos dispersos e existem repertrios bibliogrficos j completos); mas se
se entende a tese como ocasio para aprender a fazer uma investigao, o autor antigo pe mais
problemas de preparao (p. 42).
Deste modo. o nico conselho que verdadeiramente poderei dar o seguinte: trabalhai sobre um
contemporneo como se fosse um antigo e sobre um antigo como se fosse um contemporneo- ser-vos mais agradvel e fareis um trabalho mais srio (p. 43).
II.4. Quanto tempo preciso para fazer uma tese?
Digamo-lo desde logo: no mais de trs anos, nem menos de seis meses (p. 43).
Quando se fala de seis meses ou trs anos, pensa-se, evidentemente, no no tempo da redaco
definitiva, que pode levar um ms ou quinze dias. consoante o mtodo com que se trabalhou: pensa
-se no lapso de tempo que medeia entre a formao da primeira idia da tese e a entrega final do
trabalho. Assim, pode haver um estudante que trabalha efectivameme na tese apenas durante um ano,
mas aproveitando as idias e as leituras que, sem saber aonde chegaria, tinha acumulado nos dois anos
precedentes (p. 44).
II.5. necessrio saber lnguas estrangeiras?
O problema principal o seguinte: preciso de escolher uma tese que no implique o conhecimento de
lnguas que no sei ou que no estou disposto a aprender. E por vezes escolhemos uma tese sem saber
os riscos que iremos correr. Entretanto, analisemos alguns casos imprescindveis:
1) No se pode fazer uma tese sobre um autor estrangeiro se este autor no for lido no original. (...).
2) No se pode fazer uma tese sobre um tema se as obras mais importantes sobre ele esto escritas
numa lngua que no conhecemos.(...)
3) No se pode fazer uma lese sobre um autor ou sobre um tema lendo apenas as obras escritas nas
lnguas que conhecemos. (...) (p. 48).
Assim, antes de estabelecer o tema de uma tese, necessrio ter a prudncia de dar uma vista de
olhos pela bibliografia existente para ter a certeza de que no h dificuldades lingsticas
significativas (p. 49).
II.6. Tese cientfica ou tese poltica?
Uma pesquisa cientfica quando responde aos seguintes requisitos:
1) A pesquisa debrua-se sobre um objecto reconhecvel e definido de tal modo que seja igualmente
reconhecvel pelos outros. (...)
2) A pesquisa deve dizer sobre este objecto coisas que no tenham j sido ditas ou rever com uma
ptica diferente coisas que j foram ditas.(...)
3) A pesquisa deve ser til aos outros.(...)
4) A pesquisa deve fornecer os elementos para a confirmao e para a rejeio das hipteses que
apresenta c. portanto, deve fornecer os elementos para uma possvel continuao pblica (p. 52/55).
Pode fazer-se uma lese poltica observando todas as regras de cientificidade necessrias (p.
55/56).
O aspecto positivo dc um mtodo cientfico que ele nunca faz perder tempo aos outros: mesmo
trabalhar na esteira de uma hiptese cientfica, para depois descobrir que necessrio refut-la.
Significa ter feito qualquer coisa dc til sob o impulso de uma proposta anterior (p. 56).
Neste sentido, v-se que no h oposio entre tese cientfica e tese poltica (p. 56).
(...) ser mais til fazer uma tese de erudio ou uma tese ligada a experincias prticas, a
empenhamentos sociais directos? (p. 56).
Ora. o risco da superficialidade apresenta-se em especial as teses de caracter poltico, por duas
razes: a) porque numa tese histrica ou filolgica existem mtodos tradicionais de investigao a que
o investigador no se pode subtrair, enquanto para trabalhos sobre fenmenos sociais cm evoluo
muitas vezes o mtodo tem dc ser inventado (por este motivo, freqentemente uma boa tese poltica
mais difcil do que uma tranqila tese histrica); b) porque muita metodologia da investigao social
americana observou os mtodos estalstico-quantitativos, produzindo estudos enormes que no
contribuem para a compreenso dos fenmenos reais e, por conseqncia, muitos jovens politizados
assumem uma atitude de desconfiana relativamente a esta sociologia que, quando muito, uma
a deciso depende da situao do estudante, que pode j conhecer bem o seu autor e decidir aprofundlo ou deparar pela primeira vez com um autor muito difcil e primeira vista incompreensvel; b) o
crculo, por si s, vicioso, dado que sem literatura crtica preliminar o texto pode ser ilegvel, mas
sem o conhecimento do texto difcil avaliar a literatura crtica (p. 123).
IV. O PLANO DE TRABALHO E A ELABORAO DE FICHAS
IV.1. O ndice como hiptese de trabalho
Uma das primeiras coisas a fazer para comear a trabalhar numa tese escrever o ttulo, a introduo
e o ndice final (...) (p. 125).
Poder objectar-se que, medida que o trabalho avanar, este ndice hipottico ter de ser
reestruturado vrias vezes e talvez mesmo assumir uma forma totalmente diversa (p. 125).
Estejamos atentos, pois. enquanto no formos capazes de escrever um ndice c uma introduo, no
estaremos seguros de ser aquela a nossa tese (p. 128).
A introduo serve tambm para estabelecer qual o centro e qual a periferia da tese (p. 129).
IV.2. Fichas e apontamentos
Qualquer pessoa pode ensinar-nos alguma coisa. Ou talvez sejamos ns que somos to esforados
que conseguimos aprender alguma coisa com quem no o em tanto como ns. Ou ento, quem parece
no valer grande coisa tem qualidades ocultas. Ou. ainda, quem no bom para Fulano pode ser bom
para Beltrano. As razes so muitas. O facto que necessrio ouvir com respeito toda a gente, sem
que isso nos dispense de pronunciar juzos de valor ou de saber que um determinado autor pensa de
modo muito diferente e ideologicamente est muito longe de ns (p. 160).
V. REDAO
V.1. A quem nos dirigimos
Digamos ento que uma tese um trabalho que, por razes do momento, apenas dirigido ao
orientador ou co-orientador. mas que de facto pressupe vir a ser lido e consultado por muitas outras
pessoas, incluindo estudiosos no directamente versados naquela disciplina (p. 161).
Faam pargrafo com freqncia (p. 166).
Escrevam tudo o que vos passar pela cabea, mas s no rascunho (p. 166).
Utilizem o orientador como cobaia (p. 166).
No se obstinem em comear no primeiro capitulo (p. 166).
No usem reticncias ou pontos de exclamao, no expliquem as ironias (p. 166).
Definam sempre um termo quando o introduzirem pela primeira vez (p. 169).
No ponham nunca o artigo antes do nome prprio (p. 170).
S se devem aportuguesar os apelidos no caso de isso ser sancionado pela tradio (p. 171).
V.3. As citaes
(...) as citaes so praticamente de dois tipos: (a) cita-se um texto sobre o qual depois nos
debruamos interpretativamente e (b) cita-se um texto para apoio da nossa interpretao (p. 171).
Regra 1 Os trechos objecto de anlise interpretativa so citados com uma extenso razovel.
Regra 2 Os textos da literatura crtica s so citados quando, com a sua autoridade, corroboram ou
confirmam uma afirmao nossa. (...)
Regra 3 A citao pressupe que se partilha a idia do autor citado, a menos que o trecho seja
precedido e seguido de expresses crticas.
Regra 4 De todas as citaes, devem ser claramente reconhecveis o autor e a fonte impressa ou
manuscrita. (...)
Regra 5 As citaes de fontes primrias so feitas, na medida do possvel, com referncia edio
crtica ou edio mais reputada: (...)
Regra 6 Quando se estuda um autor estrangeiro, as citaes devem ser na lngua original.
Regro 7 A referncia ao autor e obra deve ser clara. (...)
Regra 8 Quando uma citao no ultrapassa as duas ou trs linhas, pode inserir-se no corpo do
pargrafo, entre aspas, (...) Quando a citao mais longa, c melhor coloc-la recolhida e a um espao
(...)
Regra 9 As citaes devem ser fiis. (...)
Regra 10 Citar como testemunhar num processo (p. 171/177).
V.4. As notas de rodap