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Sumrio
1.
A OBRA..................................................................................................... 14
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5. Exerccios............................................................................................ 28
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3. O AUTOR
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Bibliografia
1939 Magma, poemas
1946 Sagarana, contos e novelas regionalistas
1947 Com o vaqueiro Mariano
1956 Corpo de baile, novelas (publicado em trs volumes: Manuelzo e Miguilim,
No Urubuquaqu no Pinhm e Noites do serto)
1956 Grande serto: veredas, romance
1962 Primeiras estrias, contos
1967 Tutameia: terceiras estrias, contos
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4. A OBRA
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1. O BURRINHO PEDRS
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3. SARAPALHA
A narrativa de Sarapalha se desenvolve em um povoado, tomado pela
maleita (sezo), s margens do rio Par. Como consequncia, uma parte das
pessoas morreu e a outra abandonou o lugar: os primeiros para o cemitrio, os
outros por a afora, por este mundo de Deus.
Numa fazenda em runas e deserta, ficaram dois caboclos (primo Argemiro
e primo Ribeiro), uma velha negra chamada Ceio e um cachorro (Jil).
aqui, perto do vau da Sarapalha: tem uma fazenda, denegrida e desmantelada;
uma cerca de pedra-seca, do tempo de escravos; um rego murcho, um moinho parado;
um cedro alto, na frente da casa; e, l dentro, uma negra, j velha, que capina e cozinha o
feijo. Tudo mato, crescendo sem regra; mas, em volta da enorme morada, ps de milho
levantam espigas, no chiqueiro, no curral e no eirado, como se a roa se tivesse encolhido,
para ficar mais ao alcance da mo.
E tem tambm dois homens sentados, juntinhos, num casco de cocho emborcado,
cabisbaixos, quentando-se ao sol.
(...) O sol cresce, amadurece. Mas eles esto esperando a febre, mais o tremor.
Primo Ribeiro parece um defunto sarro de amarelo na cara chupada, olhos sujos,
desbrilhados, e as mos pendulando, compondo o equilbrio, sempre a escorar dos lados
a bambeza do corpo. Mos moles, sem firmeza, que deixam cair tudo quanto ele queira
pegar. Baba, baba, cospe, cospe, fincando o queixo no peito; e trouxe c para fora a
caixinha de remdio, a cornicha de p e mais o cobertor.
O seu inchou mais, Primo Argemiro?
Olha aqui como que est... E o seu, Primo?
Hoje est mais alto.
Inda di muito?
Melhorou.
da passarinha. No vo esquerdo, abaixo das costelas, os baos jamais cessam
de aumentar. E todos os dias eles verificam qual foi o que passou frente.
espera do avano da doena em si mesmo, primo Ribeiro conta sua triste
e trgica histria ao primo Argemiro: sua esposa (que era sua prima Lusa) fugira
com um boiadeiro, abandonando-o.
Argemiro, que amava a mulher do primo, revela seu sentimento e o desejo
de ter fugido com ela. Ribeiro expulsa-o dali e Argemiro sai perambulando
procura de um lugar para ser consumido pela doena que o ataca.
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4. O DUELO
Turbio Todo descobre que sua mulher o traa com o ex-militar Cassiano
Gomes. A infidelidade amorosa motivou o duelo (que no houve) entre o marido
enganado e o ex-militar.
Mas, por essa altura, Turbio Todo teria direito de queixar-se to-s da sua falta de
saber-viver; porque avisara mulher que no viria dormir em casa, tencionando chegar at
ao pesqueiro das Quatorze-Cruzes e pernoitar em casa do primo Lucrcio, no Dcmo.
Mudara de ideia, sem contra-aviso esposa; bem feito!: veio encontr-la em pleno (com
perdo da palavra, mas verdica a narrativa) em pleno adultrio, no mais doce, dado e
descuidoso, dos idlios fraudulentos.
Felizmente que os culpados no o pressentiram. Turbio Todo costumava chegar
com um mnimo de turbulncia; ouviu vozes e espiou por uma fisga da porta; a luz da
lamparina, l dentro, o ajudando, viu. Mas no fez nada. E no fez, porque o outro, era o
Cassiano Gomes, ex-anspeada do 1 peloto da 2 companhia do 5 Batalho de Infantaria
da Fora Pblica, onde as gentes aprendiam a manejar, por msica, o ZB tchecoslovaco e
at as metralhadoras pesadas Hotchkiss; e era, portanto, muito homem para lhe acertar um
balao na testa, mesmo estando assim em sumarssima indumentria e fosse a distncia
para duzentos metros, com o alvo mal iluminado e em movimento.
Turbio Todo vinga-se de sua humilhao, metendo uma bala na nuca de
seu desonrador. No entanto, a vtima da emboscada o irmo (Levindo Gomes)
de Cassiano Gomes. Inicia-se, ento, uma longa peleja: Turbio fugindo e Cassiano perseguindo-o.
Passam-se meses. Turbio vai para So Paulo e Cassiano retorna para sua
casa (Vista Alegre) e para a mulher do perseguido para descansar.
Recomea uma nova perseguio e o ex-militar (adoentado do corao)
acaba por falecer em um povoado, onde, beira da morte, contrata os servios
de um caboclo (Timpim Vinte-e-Um) para dar fim vida de Turbio Todo.
Turbio, sabendo da morte de Cassiano, retorna para o arraial acompanhado pelo franzino Timpim Vinte-e-Um, que o liquida com uma garrucha de
dois canos.
5. MINHA GENTE
O conto Minha Gente narrado em primeira pessoa.
O protagonista-narrador relata a temporada que vai passar na fazenda
(Saco-do-Sumidouro interior de Minas) de seu tio Emlio.
Quando vim, nessa viagem, ficar uns tempos na fazenda do meu tio Emlio,
no era a primeira vez. J sabia que das moitas de beira de estrada trafegam para a
roupa da gente umas bolas de centenas de carrapatinhos, de disperso rpida, picadas
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Sagarana
milmalditas e difcil catao; que a fruta mal madura da cagaiteira, comida com sol
quente, tonteia como cachaa; que no valia a pena pedir e nem querer tomar beijos
s primas; que uma cilha bem apertada poupa dissabor na caminhada; que parar
sombra da aroeirinha ficar com o corpo empipocado de coceira vermelha; que, quando um cavalo comea a parecer mais comprido, que o arreio est saindo para trs,
com o respectivo cavaleiro; e, assim, longe outras coisas. Mas muitas mais outras eu
ainda tinha que aprender.
Ao desembarcar do trem, o narrador esperado por Santana (inspetor escolar) e por Jos Malvino (roceiro da fazenda), que o acompanham at a fazenda
de seu tio. Durante o caminho at a fazenda, Malvino fala da vida e dos costumes
mineiros e de aspectos da natureza daquela regio.
Na fazenda, reencontra seu tio Emlio (envolvido com a poltica) e sua
prima Maria Irma (seu amor de infncia).
O narrador relata os pormenores da poltica de seu tio e se empenha para
conquistar o amor de Maria Irma, que se mantm reservada e misteriosa.
Numa pescaria com Bento Porfrio (empregado da fazenda e amante da
de-Lourdes), o narrador presencia o assassinato de Bento pelo marido trado
(Xando Cabaa). Tal acontecimento no interfere na rotina da fazenda.
A narrativa entrecortada por histrias: a do vaqueiro que provocara os
marimbondos e a do moleque Nicanor.
Tio Emlio (partido Joo-de-Barro) vence as eleies. Maria Irma fica noiva
de Ramiro Gouvia (dos Gouvias da fazenda da Brejaba, no Todo-Fim-E-Bom)
e apresenta Armanda ao narrador, que acaba se casando com ela antes do casamento de sua prima com Ramiro.
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6. SO MARCOS
Narrado tambm em primeira pessoa, a histria se passa no povoado
chamado Calango-Frito.
O narrador (Iz ou Jos), homem que no acredita em feitiaria, todos
os domingos, quando se embrenha pela mata das Trs guas para caar e
observar a natureza, ao passar pela casa de Joo Mangol (feiticeiro de fama),
costuma provoc-lo.
Nh Rita (cozinheira de Iz) sempre o adverte (Se o senhor no aceita, rei
no seu; mas abusar no deve-de).
E eu abusava, todos os domingos, porque, para ir domingar no mato das Trs
guas, o melhor atalho renteava o terreirinho de frente da cafua do Mangol, de quem
eu zombava j por prtica. Com isso eu me crescia, mais mandando, e o preto at que se
ria, acho que achando mesmo graa em mim.
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7. CORPO FECHADO
Enquanto bebem cerveja, o narrador (mdico de Laginha) vai entrevistando Manuel Ful (valento manso e decorativo) e ouvindo as histrias que
este conta sobre os ciganos que havia enganado, sobre a sua rivalidade com
o feiticeiro Antonio das Pedras e sobre os valentes daquela regio: Jos Boi,
Desidrio Cabaa, Adejalma (Dej), Miligo e Targino. Destes, apenas resta o
temvel Targino, que, com seu bando, ousou comer carne e beber cachaa na
frente da igreja numa sexta-feira da Paixo.
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Sagarana
No raiva, no seu doutor: gastura... Esse-um maligno e est at excomungado... Ele de uma turma de gente sem-que-fazer, que comeram carne e beberam cachaa na frente da igreja, em sexta-feira da Paixo, s pra pirraar o padre e
experimentar a pacincia de Deus... Eles todos j foram castigados: o Roque se afogou
numa gua rasinha de enxurrada... ele estava de chifre cheio... Gervsio sumiu no
mundo, sem deixar rasto... Laurindo, a mulher mesma torou a cabea dele com um
machado, uma noite... foi em janeiro do ano passado... Camilo Matias acabou com
mal-de-lzaro... S quem est sobrando mesmo o Targino. E o castigo demora, mas
no falta...
Mas, nesta sobrana , ele quem vai castigando os outros, por conta prpria,
Manuel Ful...
Deixa ele, seu doutor... Pra cavalo ruim, Deus bambeia a rdea... Um dia ele
encontra outro mais grosso... Eu j estou vendo o diabo, com defunto na cacunda!...
Esse sujeitinho ainda vai ter de danar de ceroula, seu doutor! Isto aqui terra de
gente brava.
Em meio conversa, surge no bar o valento Targino, que avisa Manuel
Ful que vai passar a noite antes do casamento com a noiva dele (Das Dor).
Manuel Ful fica desesperado, pois Targino domina o lugarejo.
Surge ento Antonico das Pedras-guas (que tinha alma de paj e era
curandeiro-feiticeiro), que prope um trato a Manuel Ful: ele fecharia o corpo
deste em troca de sua mula Beija-Flor.
Man Ful aceita e, de corpo fechado, mata o bandido Targino apenas
com uma faquinha.
O casamento acontece e Man Ful assume o posto de valento daquelas
bandas.
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8. CONVERSA DE BOIS
A histria, narrada por Manuel Timborna, tem incio na encruzilhada de
Ibiva e procura demonstrar que boi fala o tempo todo.
Os protagonistas bovinos (Buscap e Namorado, Capito e Brabagato,
Danador e Brilhante, Realejo e Canind) formam quatro parelhas que puxam
um carro de boi carregado de rapaduras e de um defunto.
Sobre o carro de boi vo tambm Agenor Soronho (o carreador), Tiozinho
(guia dos bois e filho do defunto) e a viva (amante de Soronho).
Enquanto andam, a conversa dos oito bois intercala-se com a fala dos
humanos.
Tiozinho visto pelos bois como o-bezerro-de-homem-que-caminhasempre-na-frente-dos-bois; enquanto o perverso Agenor o-homem-do-paucomprido-com-o-marimbondo-na-ponta.
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Sagarana
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Muitos capangas so mortos por suas mos, mas encontra sua hora e vez
no duelo com Joozinho Bem-Bem. Ambos morrem.
Muitas so as peculiaridades literrias que fizeram de Guimares Rosa
um dos mais consagrados representantes da literatura brasileira. Em Sagarana,
podemos destacar algumas delas.
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Linguagem
Quanto linguagem, observa-se a preocupao de Guimares Rosa de
reproduzir a fala do homem do serto. A retomada do regionalismo em Guimares no se detm simples incorporao de termos populares. O resgate desse
tema enriquecido pela inveno lingustica que o autor faz criando palavras,
reinventando-as e fazendo associaes inesperadas.
A linguagem adotada pelo autor a da fala de suas personagens (que
tambm so narradores). So elas que falam, mas ele que escreve.
Com o intuito de imitar o falar regional e suas peculiaridades, percebe-se,
na obra do autor, uma oralidade escrita cuja leitura oferece certa dificuldade. No
entanto, vale ressalvar a existncia de uma linguagem mais erudita em Sagarana,
quando o escritor narra, ou seja, quando no quer registrar as singularidades da
fala sertaneja ou a linguagem popular. o que podemos observar, mais especificamente, no conto So Marcos.
Entre outros recursos lingusticos que Guimares Rosa utiliza para expressar a natureza popular da linguagem do serto, destaca-se a metfora: Estou
como ovo depois de dzia (para dizer que est sobrando); Durou o prazo de
se capar um gato (para dizer que a ao foi rpida).
H de se lembrar tambm o uso frequente das reticncias e de frases entrecortadas que, alm de garantir ao texto maior expressividade oral, tambm
expressam a interrupo do pensamento. o que se v, por exemplo, no conto
A volta do marido prdigo:
Ah, que honra, mas que minha honra, senhor Doutor Secretrio do Interior...
Entrar nesta cafua, que menos merc e mais recebe...Esteja vontade! Se execute! Aqui
o senhor vs... J jantaram, diacho...
Alm das tcnicas descritas acima, o autor utiliza ainda certos aspectos
auditivos e visuais, que acabam por dar carter potico sua prosa, como as
onomatopeias: A boiada entra no beco: Tchou! Tchou! Tchou!(para tanger o
gado); Prrr-tic-tic-tic! (para chamar as galinhas); o ritmo e as aliteraes (repetio de um dado fonema) vistos, por exemplo, no conto O burrinho pedrs, no
qual a narrao da caminhada da boiada intercalada por quadrinhas populares
cantadas pelos vaqueiros:
Boi bem bravo, bate baixo, bota baba, boi berrando...Dana doido, d de duro, d
de dentro, d direito...Vai, vem, volta, vem na vara, vai no volta, vai varando...
Todo passarinhdo mato
tem seu pio diferente.
Cantiga de amor doido
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Sagarana
Regionalismo
O resgate do regionalismo na obra de Guimares Rosa reflete uma das
caractersticas que mais individualizam seu trabalho.
Embora aproveite o cenrio sertanejo mineiro e suas expresses tpicas
populares (Estou como ovo depois de dzia, Suspiro de vaca no arranca
estaca, no nas pintas da vaca que se mede o leite e a espuma), sua obra
surpreende em virtude da originalidade da linguagem e da indagao a respeito
das questes fundamentais do homem (amor e dio, vida e morte, violncia,
cimes, mito e razo, a existncia ou no de Deus e do diabo etc.).
Nesse sentido, os contos de Sagarana (repletos de interpretaes subjetivas,
espiritualistas e filosficas) devem ser compreendidos de forma mais profunda,
pois as histrias dos personagens, aparentemente apenas sertanejos de Minas,
ultrapassam os limites do regionalismo e alcanam as questes de valor eterno e universal. No conto Conversa de bois, observam-se, por exemplo, as reflexes sobre
o poder e a fraqueza; o sentimentalismo dos temas de amor e da solido so resgatados em Sarapalha e Minha gente; ainda em So Marcos, Minha gente
e Corpo fechado evidencia-se o universo fantstico de Guimares Rosa.
O conceito de serto ampliado, passando a refletir a imagem do mundo e
a contemplao metafsica que o autor tem da existncia e de seus problemas.
Por esses motivos, considera-se a obra de Guimares Rosa como a expresso
do regionalismo universalizante.
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Tcnica Narrativa
Com relao tcnica narrativa, Sagarana rene contos ora narrados em
primeira pessoa ora em terceira pessoa.
Quando narrados em primeira pessoa, os contos (So Marcos, Minha
gente e Corpo fechado) apresentam um contedo temtico que gira em
torno de supersties e feitiarias, fato que evidencia o misticismo e o universo
fantstico e fantasioso de Guimares Rosa.
Nos contos em terceira pessoa (O burrinho pedrs, A volta do marido
prdigo, Sarapalha, Duelo, Conversa de bois e A hora e vez de Augusto
Matraga), observa-se a oniscincia do narrador e ainda a alternncia de focos
narrativos, presente, por exemplo, em Duelo, no qual uma clarineta fanhosa e
meio fraca e uma tuba solene e penetrante so associadas aos personagens Turbio
e Cassiano, respectivamente.
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Personagens
As personagens de Sagarana so os bichos, as crianas, os loucos, os bbados, os homens rudes e simples que vivem situaes de conflito, de superao
e de converso. Ao longo do enredo, desenrolam-se problemas que fazem as
personagens lidar com situaes que extrapolam o limite do real. Da a possibilidade de interpretarmos tais histrias como parbolas e alegorias.
Nesse sentido que se pode entender a temtica de contos como, por
exemplo, O burrinho pedrs e Conversa de bois, que tratam da superao
da fraqueza que se converte em fora; a histria de redeno e espiritualidade
presente no conto A hora e vez de Augusto Matraga; a esperteza de Maria Irma
no conto Minha gente e de Lalino Salthiel (o heri gaiato) em A volta do
marido prdigo; o enfoque da solido e da falta de esperana em Sarapalha,
entre tantos outros.
A nomeao das personagens remete ainda a outro aspecto do estilo de
Guimares Rosa que evidencia o gosto popular de dar apelidos s pessoas.
Tal recurso permite que o autor revele, por meio de apelidos e distores
dos nomes prprios, a personalidade e o carter de cada personagem: Manuel
Ful, Timpim, Turbio Todo, Tio da Thereza, Joozinho Bem-Bem, Lalino Salthiel, Badu, Valo Venncio.
Esse recurso aproveitado tambm com os animais, que, por receberem
nome, adquirem identidade, diferindo-se uns dos outros: o burrinho Sete-deOuros; os bois falantes de Conversa de bois: Rodapio, Brabagato, Buscap,
Namorado, Capito, Danador, Brilhante, Realejo, Canind; os cavalos e guas
de Corpo fechado: Beija-Flor, Ventarola, Furta-Moa etc.
Os animais, metaforizados em gente, exercem grande importncia nas
estrias de Sagarana e, por isso, devem ser analisados detidamente.
Paisagens e descries
Ao descrever o serto mineiro, Guimares Rosa impressiona o leitor com
uma infinidade de minuciosas descries de paisagens, pessoas, animais, fazendas de gado etc.
Em muitos contos de Sagarana, o tema da viagem e do deslocamento
espacial, alm de ser portador de significados ligados mudana interna do
homem, presta-se tambm descrio da paisagem, medida que o caminho
percorrido.
A amplido cultural de Guimares Rosa permite que ele indique com preciso as expresses populares da regio, alm dos nomes de plantas e animais.
No conto Minha gente h, por exemplo, enumerao das criaes que vivem
no galinheiro: ...havia suras , transilvnias, nanicas, topetudas, caludas; e gui26
Sagarana
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E levava boa matalotagem (...) Mas cumpria com a lista, porque eu no podia deixar
o povo saber que eu entrava no mato, e l passava o dia inteiro, s para ver uma mudinha
de cambu a medrar da terra de-dentro de um buraco no tronco de um camboat; para
assistir carga frontal das formigas-cabaas contra a pelugem farpada e eletrificada de
uma tatarana lana-chamas; para namorar o namoro dos guaxes, pousados nos ramos
compridos da aroeira; para saber ao certo se o meu-xar joo-de-barro fecharia mesmo
a sua olaria, guardando o descanso domingueiro; para apostar sozinho, no concurso de
salto--vara entre os gafanhotos verdes e os gafanhes cinzentos; para estudar o treino
de concentrao do jaburu acromeglico; e para rir-me, glria das aranhas-dgua, que
vo corre-correndo, pernilongando sobre a casca de gua do poo, pensando que aquilo
mesmo cho para se andar em cima.
Alm dessas descries com nfase no sentido da viso, h tambm, nesse
mesmo conto, o trabalho com os referentes olfativos (alhum para expressar o
bodum do pau-dalho) e auditivos (meus olhos o ouvem), o que enriquece
a estrutura da narrativa.
Nesse sentido, pode-se dizer que o texto passa a ser captado tanto pelo
intelecto quanto pelos sentidos.
Outro exemplo expressivo encontra-se no conto Conversa de bois, no qual
o autor, por meio de uma infinidade de elementos descritivos, faz um registro
cinematogrfico de um antigo carro de boi e dos bois que o movem.
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Vinha triste, mas batia as alpercatinhas, porque, a dois palmos da sua cabea,
avanavam os belfos babosos dos bois da guia Buscap, biamarelo, desdescendo entre
mos a grossa barbela plissada, e Namorado, caracu sapiranga, castanho vinagre tocado
a vermelho que, a cada momento, armavam modo de querer chifrar e pisar.
Segue-seguindo, a ativa junta do p-da-guia: Capito, salmilhado, mais em branco
que em amarelo, dando a direita a Brabagato, mirim-malhado de branco e de preto: meio
chitado, meio chumbado, assim cardim. Ambos maiores do que os da junta da guia.
Observa-se tambm que, de modo geral, as descries em Sagarana so
entrecortadas por frases curtas, sendo, na maioria das vezes, frases nominais.
Esse outro aspecto do estilo rosiano recebe a denominao de sintaxe telegrfica
ou pontilhista.
o que se observa na passagem de Minha gente, destacada logo abaixo:
Uma porteira. Mais porteira. Os currais. Vultos de vacas, debandando. A varanda
grande. Luzes. Chegamos. Apear.
5. Exerccios
1.
O conjunto de contos de Joo Guimares Rosa
publicado em 1946 aparece sob o ttulo:
a) Corpo de baile.
b) Sagarana.
c) Primeiras estrias.
d) Estas estrias.
e) Grande serto: veredas.
2. Fuvest-SP
Joo Guimares Rosa, em Sagarana, permite ao leitor observar que:
a) explora o folclrico do serto.
b) em episdios muitas vezes palpitantes, surpreende a realidade nos mais leves
pormenores e trabalha a linguagem com esmero.
c) limita-se ao quadro do regionalismo brasileiro.
d) muito sutil na apresentao do cotidiano banal do jaguno.
e) intimista hermtico.
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3. PUCCamp-SP
O trecho mostrado representa a seguinte possibilidade entre os caminhos da
literatura contempornea:
a) fico regionalista, em que se reelabora o gnero e se revaloriza um universo
cultural localizado.
b) narrativa de cunho jornalstico, em que a linguagem comunicativa retoma e
reinterpreta fatos da histria recente.
c) fico de natureza politizante, em que se dramatizam as condies de classes
entre os protagonistas.
d) prosa intimista, psicologizante, em que o narrador expe e analisa os movimentos da conscincia reflexiva.
e) prosa de experimentao formal, em que a pesquisa lingustica torna secundria a trama narrativa.
4. PUCCamp-SP
Liga-se a esse trecho de Guimares Rosa a seguinte afirmao:
a) um exemplo de crise da fala narrativa, dissolvendo-se a histria num estilo
indagador e metafsico.
b) uma arte marcada pelo grotesco, pela deformao, que coloca em cena tipos
humanos refinadamente exticos.
c) O autor recolheu lendas de interesse folclrico e as reconta de modo documental, isento e objetivo.
d) Um universo rude e um plano mstico se cruzam com frequncia em sua obra,
fundindo-se um no outro.
e) A misria arrasta as personagens para a desesperana, revelando-se ainda na
pobreza de sua expresso verbal.
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5. PUCCamp-SP
Sobre A hora e vez de Augusto Matraga, incorreto afirmar:
a) Depois de apanhar at quase morrer, Nh Augusto passa a viver uma vida de
penitncias e duros trabalhos, na tentativa de, pelo esforo do corpo, purificar
a alma, comportamento tpico de mrtires e santos.
b) Nh Augusto volta a sentir a seduo da violncia quando se depara com o
bando de Seu Joozinho Bem-Bem, mas resiste, ainda que a duras penas, para
no comprometer seu plano de salvao.
c) No duelo final com Seu Joozinho Bem-Bem, percebe-se como, em determinados momentos, as intenes e desejos mais egostas podem se transformar
em instrumentos de redeno do egosmo e doao de si mesmo: Nh Augusto faz o bem (ao salvar a famlia do velho da vingana de Seu Joozinho
Bem-Bem) o que garantiria a salvao de sua alma por meio da violncia
destruidora que sempre o fascinou.
d) Os jagunos no conto de Guimares Rosa so irracionais, arbitrrios e praticam a
violncia nica e exclusivamente para satisfazer seus impulsos sanguinrios.
e) A transformao de Nh Augusto depois da surra pode ser interpretada como
uma morte para a vida de maldades e um renascimento para a vida devota e
contrita. Neste sentido, pode ser compreendida simbolicamente como parte
de um rito de passagem, como o batismo cristo.
6. UEL-PR
Assinale a alternativa correta sobre o conto O burrinho pedrs.
a) O burrinho era corajoso e ousado.
b) O burrinho era esperto e prudente.
c) O burrinho era teimoso e valente.
d) O burrinho era decidido e ousado.
e) O burrinho era experiente e tranquilo.
7. UEL-PR
Assinale a alternativa correta.
A hora e vez de Augusto Matraga :
a) um romance de Jos Lins do Rego, de fundo autobiogrfico, no qual narrada
a decadncia de um engenho de acar no sculo XIX.
b) um conto de Graciliano Ramos em que se narram as aventuras de um burocrata em busca de afirmao social.
c) um romance de Guimares Rosa, narrado em primeira pessoa, no qual o
narrador-personagem relata a sua vida aventurosa de cangaceiro.
d) um conto de Guimares Rosa, narrado em terceira pessoa, que relata a queda
e a redeno de um fazendeiro. As componentes bsicas do mundo sertanejo
so a violncia e o misticismo. a unio desses dois elementos que permite
a redeno de Matraga.
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8. UEL-PR
Assinale a alternativa correta.
a) A obra de Joo Guimares Rosa Sagarana uma forma interiorizada de representao ficcional, privilegiada pela vivncia psicolgica e, pelo fluxo de
conscincia desencadeado por um acontecimento fictcio.
b) uma obra modernista, que critica e denuncia o preconceito racial e a minoria
excluda.
c) A obra no apresenta situaes de conflito entre seus personagens.
d) A obra Sagarana do gnero conto. Guimares Rosa, com esta obra, abriu
uma nova perspectiva para o regionalismo, revalorizando a linguagem e a
universalizao do regional.
e) A obra retrata fielmente o ciclo da cana-de-acar.
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9. UEL-PR
Assinale a alternativa correta.
a) Augusto Matraga um fazendeiro valento, extremamente prepotente, que
nunca trabalhou e decadente nas finanas e na poltica, desrespeitando a
todos, inclusive esposa e filhos.
b) A trajetria de Augusto Matraga marcada pela bondade, pelo amor ao prximo e pela solidariedade que o acompanha at o fim da vida.
c) A hora e a vez de Augusto Matraga foram consagradas quando ele escapou
com vida das mos do major Consilva.
d) Joo Guimares Rosa, em Sagarana, no registra detalhes do serto nem focaliza
o homem com seus fragmentos e valores, deixando transparecer somente a
crtica social e de costumes.
e) Dionra, esposa de Augusto Matraga, suporta sua opresso, submetendo-se
a ele como esposa fiel at o fim de sua vida.
10. UEL-PR modificado
Assinale a alternativa correta.
a) Em O burrinho pedrs, a temtica contempla o fanatismo e a violncia numa
luta ideolgica.
b) Em Sarapalha, fala-se do confronto entre jagunos no serto nordestino.
c) A hora e vez de Augusto Matraga tematiza o amor romntico, potico e
telrico.
d) O lema de vida de Augusto Matraga era a frase dita pelo padre: cada um tem
a sua hora e a sua vez, voc h de ter a sua.
e) Em Sarapalha, o humor e a ironia se fazem presentes com muita frequncia.
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11. UEL-PR
Assinale a alternativa incorreta.
a) Em Sarapalha, a epidemia de malria faz o povo tremer e delirar numa
fragilidade dolorosa.
b) Os delrios da febre em suas alucinaes no afetam primo Ribeiro, que tem
o corpo fechado pela negra Ceio.
c) Argemiro, em sua pureza, depois de muito se punir, resolve confessar que
tambm sentira-se atrado por Lusa, mas era um amor platnico, sem um
mnimo de manifestao.
d) Primo Ribeiro est derrotado pela doena fsica e morre de forma lenta, psicologicamente abalado com a partida da esposa, que preferiu um boiadeiro a ele.
e) Argemiro expulso pelo primo Ribeiro e parte com extremo pesar, pagando
caro por sua honestidade e sinceridade.
12. Fuvest-SP
O romance narrado na primeira pessoa, em monlogo ininterrupto, por Riobaldo, velho
fazendeiro do norte de Minas, antigo jaguno, que conta a sua vida e a sua angstia.
A. Candido e J. A. Castello
13.
Sobre Guimares Rosa, podemos afirmar que:
a) foi autor regionalista, seguindo a linha do regionalismo romntico.
b) inovou sobretudo nos temas, explorando tipos inditos.
c) escreveu obra poltica de contestao sociedade de consumo.
d) sua obra se revela intimista com razes surrealistas.
e) inovou sobretudo o aspecto lingustico, revelando trabalho criativo na explorao do potencial da lngua.
GABARITO
1. B
2. B
3. A
4. D
5. D
6. E
7. D
8. D
9. A
10. D
11. B
12. D
13. E
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