Teoria Crítica Da Empresa Ivanildo Figueiredo
Teoria Crítica Da Empresa Ivanildo Figueiredo
Teoria Crítica Da Empresa Ivanildo Figueiredo
Teoria crtica da
empresa
2015
Figueiredo, Ivanildo
Teoria crtica da empresa / Ivanildo de Figueiredo Andrade de Oliveira Filho
Recife, 2015.
Bibliografia
1. Direito Civil Legislao Brasil; 2. Direito Comercial - Brasil
3. Empresas Leis e legislao Brasil; I. Ttulo
2015
Ivanildo Figueiredo
Prefcio
Sumrio
Apresentao ............................................................................................
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23
27
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38
43
49
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66
66
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79
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100
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141
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150
163
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287
287
297
305
313
320
329
329
339
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361
367
373
377
203
212
239
246
267
273
377
387
390
393
395
399
402
409
Referncias ...............................................................................................
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Apresentao
Decreto 3.708/1919.
Decreto-Lei 2.627/1940, depois substitudo pela Lei 6.404/1976.
3 Decreto-Lei 7.661/1945, substitudo pela Lei 11.101/2005.
4 Lei 4.595/1964, Lei 4.728/1965 e Lei 6.385/1976.
5 Lei 4.726/1965, reformulada pela Lei 8.934/1994.
6 Lei Complementar 123/2006, atualizada pela Leis Complementares 128/2008 e 147/2014.
7 Lei 5.772/1971, atualizada pela Lei 9.279/1996.
8 Lei 8.078/1990.
9 Lei 8.884/1994, revista pela Lei 12.529/2011.
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Introduo
As antinomias do direito de empresa no Cdigo Civil
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Um dos mais famosos estudos analticos da empresa no direito comercial, sob a perspectiva dos
seus mltiplos ngulos, encontra-se no clebre ensaio intitulado Perfis da Empresa, de Alberto
Asquini. Nesse estudo, Asquini analisa a empresa como um fenmeno jurdico-econmico polidrico,
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que somente pode ser compreendida se estudada sob quatro perfis: perfil subjetivo, a empresa na
perspectiva do empresrio; perfil funcional, a empresa como atividade empresarial; perfil patrimonial
ou objetivo, a empresa como patrimnio aziendal e como estabelecimento; e perfil corporativo, a
empresa como instituio humana hierarquicamente estruturada, como adiante ser explorado neste
trabalho. (Alberto Asquini, Perfis da Empresa, traduo de Fbio Konder Comparato, Revista de
Direito Mercantil, Industrial, Econmico e Financeiro RDM, So Paulo, RT, n 104, outubro/dezembro
1996, p. 109/126).
11 Em passagem clssica, Fbio Konder Comparato assim destacou a grande importncia da empresa
na sociedade contempornea: Se se quiser indicar uma instituio social que, pela sua influncia,
dinamismo e poder de transformao, sirva como exemplo explicativo e definidor da civilizao
contempornea, a escolha indubitvel: essa instituio a empresa. dela que depende,
diretamente, a subsistncia da maior parte da populao ativa deste pas, pela organizao do trabalho
assalariado. das empresas que provm a grande maioria dos bens e servios consumidos pelo povo,
e delas que o Estado retira a parcela maior de suas receitas fiscais. em torno da empresa, ademais,
que gravitam vrios agentes econmicos no assalariados, como os investidores de capital, os
fornecedores, os prestadores de servios. (A Reforma da Empresa, Revista de Direito Mercantil,
Industrial, Econmico e Financeiro RDM, So Paulo, Revista dos Tribunais, n 50, abril/junho 1983,
p. 55).
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Adam Smith, A Riqueza das Naes, So Paulo, Abril Cultural, 1983, vol. I, p. 57.
Adam Smith, A Riqueza das Naes, cit. p. 57.
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Sobre a importncia da empresa no mbito do seu desenvolvimento histrico, observa Arnoldo Wald:
A evoluo da empresa constitui, na realidade, um elemento bsico para a compreenso do mundo
contemporneo. Do mesmo modo que, no passado, tivemos a famlia patriarcal, a parquia, o Municpio
e as corporaes profissionais, que caracterizaram um determinado tipo de sociedade, a empresa ,
hoje, a clula fundamental da economia de mercado. J se disse, alis, que a criao da empresa
moderna representa, na histria da humanidade, uma mudana de civilizao to importante quanto o
fim do estado paleoltico, ou seja o momento em que o homem deixou de viver exclusivamente da caa
para se dedicar agricultura, abandonando o nomadismo para se fixar na terra. Arnoldo Wald,
Comentrios ao novo Cdigo Civil - Livro II Do Direito de Empresa, Vol. XIV, Slvio de Figueiredo
Teixeira, Coordenador, Rio de Janeiro, Forense, 2005, p.9/10.
15 Karl Marx, Para a crtica da economia poltica, So Paulo, Abril Cultural, 1982, p. 70.
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16 Ao destacar a importncia histrica da empresa como base fundamental do direito comercial e das
transformaes progressivamente introduzidas na sociedade contempornea, em razo da evoluo
da economia, at alcanar o estgio atual, Waldirio Bulgarelli observava que o fulcro bsico gerador
de todas as transformaes ocorridas e em devir a empresa, tipo de instituio econmica que,
gerada embrionariamente no bojo da Revoluo Industrial, ampliou-se desmensuradamente at
dominar o panorama da economia atual (A Teoria Jurdica da Empresa, So Paulo, Revista dos
Tribunais, 1985, p. 2-3).
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Entre os anos de 1914, com a ecloso da primeira guerra mundial (1914-1918), passando pelo ano
de 1917, com a revoluo dos sovietes na Rssia, at o ano de 1945, quando terminou a Segunda
Grande Guerra (1939-1945), o mundo esteve submetido a um intervalo de mais de trinta anos de
instabilidade poltica e social, que interferiu, fortemente, na atividade econmica. Subordinada ao
conflito das ideologias, a atividade econmica mundial estava influenciada e direcionada, de modo
dominante, por todo esse perodo histrico, para atender s necessidades da indstria de material
blico e dos fornecedores de matrias-primas e materiais estratgicos. As guerras da Coria (19501953) e do Vietn (1955-1975) mantiveram, at a queda do Muro de Berlim (1989), o antagonismo
ideolgico entre capitalismo e socialismo, entre liberdade de empresa e dirigismo estatal.
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Partindo
dessa
orientao,
pesquisa
ora
desenvolvida
explora,
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conceito de empresrio;
estabelecimento comercial ou empresarial;
obrigaes e contratos empresariais;
direito societrio: princpios gerais; sociedade empresria; a nova
sociedade limitada.
Com efeito, em relao ao seu objeto, este trabalho pode parecer, primeira
vista, bastante amplo e ambguo quanto ao seu contedo e extenso da proposta
investigativa, por abranger praticamente todas as normas do Cdigo Civil de 2002 que
tratam do direito de empresa. Todavia, tal amplitude inicialmente necessria, diante
da viso dominante da empresa como fenmeno econmico-social, regulado pelo
21
direito sob diversos enfoques de contedo, do modo como exposto por Alberto Asquini
no seu histrico ensaio intitulado Os perfis da empresa.19
Em termos metodolgicos, a empresa pode e deve ser investigada em razo
da matria comercial afeta execuo do seu objeto, assim como da forma jurdica
que ela adota, atravs da sua organizao como empresa individual ou sociedade
empresria. A empresa compreende, ao mesmo tempo, como objeto de investigao
cientfica, tanto forma como matria, que se encontram indissoluvelmente
relacionadas entre si. A forma o modo pelo qual a empresa organizada para a
consecuo dos seus fins econmicos. A forma da empresa varivel, podendo ser
definida a partir da figura do empresrio individual, ou adotar a espcie de sociedade
limitada, at atingir o pice estrutural da organizao da empresa, representada pela
sociedade annima, construo mxima da cincia do direito e da dogmtica jurdica
no campo do direito comercial. Atravs da sua forma juridicamente definida, que a
empresa viabiliza e realiza o seu objeto, como instrumento do exerccio da sua funo
econmica. A matria o contedo da atividade empresarial, da experincia emprica
mercantil, que se manifesta no modo como a empresa desempenha sua funo
produtiva, determinada a partir dos princpios e normas constitucionais que regulam a
organizao econmica, tal como contido, especificamente, nos artigos 170 a 174 da
Constituio de 1988.
Reconhecendo que a disciplina jurdica da atividade empresarial tem o seu
fundamento superior de validade nas normas da Constituio positiva, este estudo,
alm de adotar uma postura crtica diante do novo direito de empresa, dever tambm
interpretar as disposies desse regime a partir das normas e princpios
constitucionais.
E,
assim,
trabalho
deve
seguir
viso
terica
do
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que se pode objetivamente constatar nesse novo regime jurdico, diante da tentativa
do legislador de suprimir o carter mercantil da empresa, o qual sempre foi corolrio
ou pressuposto natural, determinante da atividade empresarial e do comrcio.
O estudo aqui delineado, portanto, destina-se a atingir objetivos especficos
situados no mbito da hermenutica e da anlise das normas jurdicas que regulam a
atividade empresarial, constantes do Cdigo Civil de 2002 e da legislao comercial
extravagante. Nesse contexto, este trabalho ir tomar, como pressuposto inicial, a
anlise do processo de transio do regime do comerciante e dos atos de comrcio,
sob a tica da dogmtica mercantil tradicional, para o regime do empresrio e do
direito de empresa.
Considerando o mbito da pesquisa cientfica, esta investigao deve ir mais
alm, na medida em que pretende demonstrar a evidente incompatibilidade e as
contradies presentes entre o regime normativo do direito comercial, consolidado em
nossa dogmtica jurdica, na doutrina e na jurisprudncia do nosso pas, em
comparao com as disposies constantes do regime do direito de empresa
introduzido, de modo artificial, pelo Cdigo Civil de 2002.
Adotando tal concepo, este livro no tem, por bvio, a pretenso de comentar
e analisar cada uma das disposies do Cdigo Civil que regulam o direito de empresa
(artigos 966 a 1.195). A proposta de pesquisa e investigao dogmtica destina-se,
precisamente, a apontar as incongruncias, distores e incompatibilidades
intrassistemticas do atual e vigente regime normativo, frente s demais normas do
direito comercial ou empresarial que, em muito maior profuso e quantidade,
continuaro a regular a atividade econmica no mbito do nosso ordenamento de
direito positivo.
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Captulo 1
A empresa como objeto do direito comercial
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Walter Alvares, Curso de Direito Comercial, Belo Horizonte, Sugestes Literrias, 6 edio, 1982,
p. 64.
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25 Marx, na sua anlise crtica do capitalismo, observou que a economia representa a superestrutura
sobre a qual repousam todas as demais estruturas sociais, sejam estas de natureza religiosa, poltica,
jurdica ou cultural. A economia, na verdade, dita e influencia o comportamento humano, isto desde o
momento em que qualquer pessoa necessita de um mnimo de patrimnio, de bens e de rendimentos
para viver. (Para a crtica da economia poltica, cit., p. 70).
26 Adam Smith, A Riqueza das Naes, cit., p. 58.
27 Adam Smith, A Riqueza das Naes, cit., p. 58.
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atravs das pessoas que desempenhavam essa atividade, no apenas como modo
de exerccio de uma profisso, mas com a finalidade de entesouramento e
enriquecimento.
E assim, a humanidade seguiu o seu caminho, por sculos e sculos, fazendo
com que o dinheiro assumisse, cada vez mais, um papel determinante na formao
das classes sociais, engendrando a diviso entre ricos e pobres, entre possudos e
despossudos, entre naes poderosas e povos marginalizados.
Mesmo quando uma sociedade pretensamente mais evoluda alcanou o
estgio ideolgico da coletivizao dos meios de produo, no regime comunista dos
sovietes, a partir da Revoluo Russa de 1917, o dinheiro (rublo) permaneceu sendo
o nico meio de troca e medida de valor utilizado para as relaes comerciais e de
subsistncia na economia socialista. Ou seja, o comrcio no desapareceu na Rssia
comunista, apenas a figura do proprietrio da riqueza privada ou capitalista, foi
substitudo pelo Estado como detentor dos meios de produo.
No regime econmico capitalista, dominado pela economia monetria,
podemos constatar que esse fenmeno influenciou e moldou o modo de organizao
da sociedade atravs de todos os tempos, e a justificao ontolgica para a existncia
do dinheiro sempre esteve historicamente vinculada ao comrcio, s relaes de troca
de bens e mercadorias demandadas pelas pessoas, independentemente do grau de
evoluo do processo civilizatrio.
O fenmeno econmico, determinante na formao das estruturas sociais,
sempre se vinculou, primeiramente, ao mercador, depois ao comerciante, at chegar
empresa, como agente e principal ente responsvel pela atividade comercial. Aps
a revoluo comercial burguesa de fins do sculo XVI, os banqueiros e mercadores,
do final da Idade Mdia, assumiram posio dominante na sociedade, na condio de
membros representativos das principais operaes e negcios mercantis destinados
satisfao das necessidades de consumo das pessoas e acumulao de capitais
por parte daqueles que a exploravam.
Sob a perspectiva analtica, a concepo da empresa existe desde a origem do
ciclo econmico nas civilizaes mais antigas. Assim, por exemplo, a regra ancestral
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34
Paul Rehme, Historia Universal del Derecho Mercantil, op. cit., p. 128.
Segundo Paula Forgioni, dois eram os tipos de normas que disciplinavam a atividade das
corporaes de ofcio, em um bvio contexto de pluralidade de ordenamentos jurdicos: as primeiras,
os estatutos das corporaes, ordenamentos jurdicos completos, como se ver, e que eram colocados
pelos comerciantes ou artesos para disciplinar sua prpria atividade. O outro sistema era aquele da
Comuna medieval, que procurava regular a atividade das corporaes, fazendo-a, na maioria das
vezes, pelo controle dos estatutos e imposio de algumas normas de conduta obrigatrias para seus
membros. (Os fundamentos do antitruste, cit., p. 40/41).
36 Ensina Tullio Ascarelli que objetivamente, a competncia da magistratura comercial era limitada aos
negcios mercantis e queles conexos, isto , compra para revenda e s sucessivas revendas, os
negcios bancrios e de cmbio, mas tambm aqueles que com os precedentes fossem conexos.
(Corso di Diritto Commerciale Introduzione e Teoria dellImpresa, Milano, Giufr, 3 edizione,
1962, p.7-8).
37 Descrevendo as funes e atividades estatutariamente determinadas, de um modo geral, para as
corporaes de mercadores no perodo do Renascimento europeu, Alfredo Rocco afirma: Vrias eram
as funes das corporaes: elas organizavam e presidiam as feiras e os mercados; mandavam
cnsules para o estrangeiro para proteger os scios, assistiam-lhe quando fossem atingidos por
infortnios ou doenas, tutelavam a segurana das comunicaes e, por fim, funo importantssima,
dirimiam as questes que pudessem surgir entre os scios. (Princpios de Direito Comercial,
Campinas, LZN, 2003, p. 16).
38 Joo Eunpio Borges, Curso de Direito Comercial Terrestre, cit., p. 27.
39 Rubens Requio, Curso de Direito Comercial, So Paulo, Saraiva, 25 ed., 2003, vol. 1, p. 10.
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Paul Rehme, Historia Universal del Derecho Mercantil, cit., p. 119; no mesmo sentido, Marcelo
Castrogiovanni, Lex Mercatoria, in Revista Electronica de Derecho Comercial, www.derechocomercial.com, 14/09/2013.
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43
Nelson Saldanha, Sociologia do Direito, So Paulo, Revista dos Tribunais, 2 edio, 1980, p. 164165.
44 Alfredo Rocco, Princpios de Direito Comercial, cit., p. 14.
45 Alfredo Rocco, cit., p. 16.
46 Alfredo Rocco, cit., p. 28.
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Colocando em discusso o problema da legitimao dos usos e costumes como fonte do Direito
Comercial, Requio opina: Os comercialistas, em conseqncia do reconhecimento dos usos e
costumes como fontes do Direito Comercial, formularam teoria para estabelecer os princpios que
asseguram legitimidade sua aplicao. Na linguagem corrente, como observa o Prof. Lagarde, no
se faz distino, inclusive na jurisprudncia francesa, entre as expresses usos e costumes. Alguns
autores, todavia, procuram distingu-las, vendo nos costumes uma regra mais imperativa do que os
usos, os quais seriam simplesmente convencionais. (Curso de Direito Comercial, cit., vol. 1, p. 29).
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Lei n 12.376/2010.
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isso
mesmo,
esse
perodo
foi
historicamente
denominado
de
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Sobre as caractersticas da aliana entre o Estado e a burguesia mercantil ascendente nessa fase
inicial do mercantilismo, comenta Carmen Alborch Bataller: No obstante, el Estado (la monarqua) no
se limitar simplemente a concederles el monopolio de explotacin, sino que tambin interviene en la
financiacin de las empresas. Podramos decir que se lleva a cabo una alianza entre la monarqua y la
burguesa, alianza perfectamente explicable dado que con el feudalismo la monarqua se debilita
enormemente. (El derecho de voto del acionista, Madrid, Editorial Tecnos, 1977, p. 38).
58 Alfredo Lamy Filho e Jos Luiz Bulhes Pedreira, A Lei das S.A., Rio de Janeiro, Renovar, 1992, p.
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Ana Paula Martins do Amaral assim comenta a respeito dessa transio entre o direito corporativo e
o direito estatal na regulao da atividade mercantil: No entanto, mesmo com a prevalncia do Estado
nacional, que sujeitava os contraentes ao direito interno, o comrcio internacional no perderia suas
caractersticas. Segundo as regras elaboradas pela Escola Estatutria, a vontade continuaria a ser
elemento fundamental dos contratos mercantis. Se se tornou defeso s partes a aplicao de uma lex
mercatoria, a autonomia da vontade prevalecia, permitindo s partes a escolha de um estatuto que
regulasse os atos entre comerciantes nos contratos internacionais. (Lex Mercatoria e Autonomia da
Vontade, Revista Eletrnica Jus Navigandi, http://jus.com.br/artigos/6262/lex-mercatoria-e-autonomiada-vontade, p.4, 28/04/2012).
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Max Weber (1864-1920) foi o formulador de uma das mais completas anlises
cientficas da atividade econmica na perspectiva sociolgica. Na advertncia inicial
ao captulo da sua principal obra, Economia e Sociedade, intitulada As categorias
sociolgicas fundamentais da vida econmica, ele observava que esse captulo no
tem por finalidade tratar de uma teoria econmica, mas de definir alguns conceitos
frequentemente usados nestes ltimos tempos e de fixar certas relaes sociolgicas
elementares dentro da vida econmica.64
Dentre os conceitos abordados por Weber nesse captulo, encontra-se a
caracterizao da empresa como atividade organizada destinada ao desempenho de
um fim econmico. O estudo sociolgico da empresa situa-se, assim, em um contexto
restrito, em que a principal preocupao de Weber foi o de apresentar categorias
fundamentais bem mais amplas, como a gesto pelas classes de associaes
econmicas, a organizao do mercado, os meios de cmbio e pagamento, o clculo
do capital, a produo e a distribuio econmica dos servios, o modo de apropriao
dos meios de produo e o conceito e forma do comrcio.
A empresa considerada como um dos elementos instrumentais da atividade
econmica, e essa atividade econmica no tem que ser vista, em si mesma, como
necessariamente uma ao social, mas como um modo de exerccio do que Weber
define inicialmente como poder de disposio.65
A partir da ideia de poder de disposio, que tem referibilidade a bens e a
tudo que possa ser valorado qualitativa e quantitativamente, Weber diferencia a
economia, no sentido macro, como sendo um processo de gesto econmica, que
geralmente cabe ao Estado, do que ele denomina explorao econmica, que se
64
Max Weber, Economia y Sociedad, Mxico, Editora Fondo de Cultura Economica, 2 ed., 2004, p.
46.
65 Max Weber, Economia y Sociedad, cit. p. 46.
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Por empresa (Betrieb) debe entenderse una accin que persigue fines de una determinada clase de
un modo continuo. Y por asociacin de empresa (Betriebverband) una sociedad con un cuadro
administrativo continuamente activo en la prosecucin de determinados fines. Max Weber, Economia
y Sociedad, cit. p. 42.
67 Max Weber, cit. p. 55.
68 Max Weber, Economia y Sociedad, cit. p. 65.
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atividade econmica, em que a busca pelo acmulo de riquezas confere esse carter
instrumental e utilitrio ao exerccio da empresa.
Todavia, nem todo processo de acumulao de capital est diretamente
relacionado com a atividade empresarial. Weber tambm diferencia a aplicao do
dinheiro em inverses especulativas, que seriam prprias da explorao econmica,
dos recursos poupados pelo Estado e pelas pessoas, que ele denomina de
hacienda. Em traduo literal, hacienda significaria fazenda, no sentido financeiro,
no no agrrio ou de mercadoria (tecido). O contedo mais prximo que podemos
adotar para hacienda o conceito de acervo patrimonial, uma vez que Weber
compreende na sua definio de hacienda tanto os bens obtidos para uso prprio,
como a renda e o patrimnio de uma entidade, de pessoa ou de uma associao. 69
Em certo momento, Weber considera que o conceito de empresa
corresponderia ao entendimento corrente somente quando se destaca expressamente
a orientao para o clculo do capital, na maioria das vezes suposto como evidente,
para indicar com isso que nem toda inteno de lucro como tal inerente idia de
empresa, mas apenas quando essa inteno lucrativa orientada pelo clculo do
capital.70 Ele quer com isso explicar que o clculo do capital necessrio para a
determinao dos benefcios (lucros) e das perdas (prejuzos) segundo a linguagem
racionalista empresarial, e que o mesmo entendimento no se aplica no caso dos
ganhos e rendimentos de um escritor, de um advogado, de um professor ou de um
empregado assalariado, que no esto orientados por esse clculo determinista da
lucratividade.
Diante da realidade social, em que existem pessoas e grupos buscando a
satisfao de suas necessidades de consumo e de bens, e assim ampliar o seu acervo
patrimonial, as empresas se viabilizam no desempenho da atividade econmica
apenas enquanto forem eficientes e lucrativas. E assim, Weber define como
explorao lucrativa mercantil a essa classe de atividades desempenhadas pelas
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Max Weber, A tica protestante e o esprito do capitalismo, So Paulo, Companhia das Letras,
2004, p. 58-60.
75 Max Weber, A tica protestante e o esprito do capitalismo, cit. p. 60.
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Fbio Konder Comparato assim se refere, ao transcrever as razes do Manifesto Comunista escrito
por Karl Marx e Friedrich Engels em 1848: vertiginosa transformao das tcnicas de produo e
distribuio, o capitalismo acrescentou uma profunda alterao na vida tica dos povos (...) e nesse
contexto a burguesia exerceu uma funo eminentemente revolucionria, ao destruir todas as relaes
sociais de carter feudal ou patriarcal, s deixando subsistir entre os indivduos o vnculo do puro e
simples interesse, o frio pagamento vista. Em suma, ela dissolveu a dignidade da pessoa humana
no valor de troca, e em lugar das inmeras franquias, garantidas e bem adquiridas, introduziu uma
liberdade nica e sem escrpulos: o livre comrcio. (tica Direito, moral e religio no mundo
moderno, So Paulo, Companhia das Letras, 2006, p. 417).
78 Adela Cortina, tica de la empresa, Madrid, Editorial Trotta, 5 edio, 2000, p. 33.
50
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Sob o aspecto tico, explica Adela Cortina, El capitalismo supuso tambin um cambio em la forma
de relacionar-se los hombres entre s, porque la expansin del mercado destroz la sociedad
tradicional. Em este nuevo tipo de sociedad ya no bastava la regulacin tica de las relaciones
personales para ordenar la vida, y era la primera formacin econmica y social que no necesitaba como
soporte uma uma regulacin directamente fundamentada en el Dis de las religiones, sino que podia
defender su dinmica autnoma como si se tratara de la racionalidad econmico-social moderna.
(tica de la empresa, cit., p. 52).
80 Adam Smith, A Riqueza das Naes, vol. II, cit., p. 147.
81 A Rainha Vitria (1819-1901), aps a morte prematura do seu esposo, o Prncipe Alberto de SaxeCoburgo Gotha (1819-1861), abdicou de qualquer interferncia na poltica externa do Reino Unido, que
passou a ser conduzida, nos anos do pice do imperialismo ingls, por Primeiros Ministros do partido
conservador, como Benjamim Disraeli (1804-1881) e William Gladstone (1809-1898).
51
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82
Fbio Konder Comparato, tica Direito, moral e religio no mundo moderno, cit. p. 419.
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(Standard Oil, Chevron, Gulf, Mobil e Texaco), uma inglesa (British Petroleum-BP) e
uma anglo-holandesa (Shell).83 Essas empresas dominaram o mercado mundial de
extrao, refino, transporte e distribuio de petrleo e derivados de 1920 a 1973,
quando ocorreu o primeiro choque do petrleo. Com o primeiro choque do petrleo,
os pases produtores e exportadores, atravs da sua organizao, a Organizao dos
Pases Exportadores de Petrleo - OPEP, dominada pelos pases rabes nos quais
estavam localizadas as maiores jazidas, retomaram o controle da explorao das suas
reservas, da oferta e da fixao do preo do barril de petrleo.
At o final da dcada de 1970, os Estados ainda exerciam certo controle e
dirigismo sobre a atividade econmica, resultante do processo intervencionista que se
repetiu ao fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Ocorreu, a partir da
necessidade de reconstruo da Europa, o ressurgimento do welfare state, ou Estado
de bem estar social, que teve incio na Inglaterra, ao final da Primeira Guerra Mundial
(1914-1918). No welfare state, o Estado assumia funes sociais consideradas, pela
legislao, como relevantes, a nvel de educao, sade, seguro social, transportes e
habitao. Alm de atuar com polticas sociais de servio pblico e outras
compensatrias da misria, o Estado, ele prprio, desempenhava, atravs de
empresas estatais, atividades econmicas, principalmente nos setores considerados
estratgicos.84
O Estado de bem-estar social (welfare state) pode ser considerado como a face
generosa do capitalismo, merecedor de certo contedo de eticidade. Ao mesmo tempo
em que realiza a produo de bens, gera empregos, distribui (bem ou mal), a renda,
e o trabalhador tem assegurado seus direitos sociais essenciais, a escola dos seus
83
Anthony Sampson, The Seven Sisters: The Great Oil Companies and the World They Shaped,
New York, Viking Press, 1975, passim.
84 Essa situao jurdico-poltica de interveno do Estado na economia, veio a ser descrita e explicada
por Vital Moreira nos seguintes termos, sob a tica da doutrina socialista: Reconhecida definitivamente
a incapacidade da economia para se regular a si mesma, em absorver ou neutralizar os conflitos que a
dilaceram, em corresponder s exigncias que lhe so feitas por uma sociedade que reclama o
aproveitamento integral das suas potencialidades, reconhecida essa situao, sobre o Estado que
vem impender a execuo de papis que at a lhe estavam defesos. o Estado que vem reclamar-se
de principal responsvel pelo curso da economia, instituindo todo um quadro institucional em que ele
se move, controlando-o, dirigindo-o ou dedicando-se diretamente produo econmica. (A ordem
jurdica do capitalismo, Coimbra, Editorial Centelha, 1978, p. 55-56).
53
Ivanildo Figueiredo
filhos, hospital de qualidade para atender sua famlia, transporte subsidiado e uma
velhice amparada na seguridade.
Esse ciclo do welfare state comeou a desaparecer graas a uma aliana
conservadora entre os Estados Unidos, no governo Ronald Reagan (1911-2004), e a
Inglaterra, com Margareth Thatcher (1925-2013) como Primeira Ministra, a partir de
1980, quando as exigncias do mercado estavam conflitando com o excesso de
ingerncia do Estado na economia, como defendido pelo novo liberalismo econmico
da Escola de Chicago, com base nas teorias de Friedrich Hayek (1899-1992) e Milton
Friedman (1912-2006).
A segunda grande onda da reforma do sistema econmico mundial,
denominada globalizao, inicia-se, precisamente, com o primeiro choque do petrleo,
em 1973, em que as matrizes energticas comeam a ser modificadas, e os avanos
das telecomunicaes e da informtica reduzem as distncias comerciais. O
capitalismo torna-se ainda mais racional, diante do aumento da competio e do
ingresso de novas empresas no mercado vindas do Oriente, em especial do Japo,
China, Coria, Indonsia e Singapura, desenvolvendo produtos com alto grau de
tecnologia e a um custo menor do que aqueles disponveis nos Estados Unidos e
Europa.
Encerra-se a era do capitalismo clssico, ainda que denominado por muitos de
capitalismo selvagem, em que os grandes empresrios e financistas faziam questo
de demonstrar seu poderio econmico, exercendo grande influncia perante o
governo dos seus pases e, principalmente, sobre o governo dos pases perifricos e
subdesenvolvidos.85
A doutrina neoliberal que orientou ideologicamente o atual processo de
globalizao tinha e ainda tem na diminuio das atividades do Estado um dos seus
85 Considera tambm Fbio Konder Comparato, que na poca do capitalismo clssico, os grandes
capites de indstria conheciam perfeitamente a tcnica de fabricao que empregavam, e
orgulhavam-se dos produtos de suas fbricas. Hoje, os controladores de uma macro-empresa industrial
s conhecem os nmeros do balano e da conta de resultado. Eles ignoram tudo da tcnica da
produo, e so incapazes de dizer, com preciso, quais os produtos de sua empresa. (tica Direito,
moral e religio no mundo moderno, cit. p. 416).
54
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86
Segundo Comparato, uma das principais medidas aplicadas progressivamente no mundo todo, com
grande reforo de argumentao ideolgica, desde o incio da segunda vaga de globalizao, foi o
enfraquecimento dos poderes de direo econmica nos Estados mais pobres, com a adoo de
polticas denominadas, no jargo financeiro internacional, de programas de ajuste (tica Direito,
moral e religio no mundo moderno, cit. p. 424).
87 Na viso de Celso Furtado, o processo atual de globalizao a que assistimos desarticula a ao
sincrnica dessas foras que garantiram no passado o dinamismo dos sistemas econmicos nacionais.
Quanto mais as empresas se globalizam, quando mais escapam da ao reguladora do Estado, mais
tendem a se apoiar nos mercados externos para crescer. Ao mesmo tempo, as iniciativas dos
empresrios tendem a fugir do controle das instncias polticas. Voltamos, assim, ao modelo do
capitalismo original, cuja dinmica se baseava nas exportaes e nos investimentos no estrangeiro.
(O capitalismo global, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 2 edio, 1998, p. 29).
88 O jusfilsofo Joo Maurcio Adeodato, ao analisar as teorias da dependncia econmica no mundo
contemporneo, esclarece: A questo de se os pases perifricos, uma vez que se abstraiam suas
caractersticas histricas e especficas, podem ver nos pases do primeiro mundo as linhas gerais de
seu desenvolvimento futuro no dispe de qualquer dado emprico para ser respondida
afirmativamente. Ao contrrio, parece corresponder a uma forma de organizao social muito complexa
e sem similar na Histria. O subdesenvolvimento no consiste em simples estgio nesta ou naquela
direo. Em que pesem suas ambigidades e divergncias, as chamadas teorias da dependncia
tiveram o mrito de retirar a nfase da tricotomia pases subdesenvolvidos, em desenvolvimento e
desenvolvidos, invertendo as teorias da modernizao e argumentando que a existncia do
subdesenvolvimento consiste em uma conseqncia e uma condio para a manuteno do centro
desenvolvido. (tica e Retrica Para uma Teoria da Dogmtica Jurdica, So Paulo, Saraiva, 2
edio, 2006, p. 78).
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90
Fbio Konder Comparato, tica Direito, moral e religio no mundo moderno, cit., p. 425.
Fbio Konder Comparato, tica Direito, moral e religio no mundo moderno, cit., p. 427.
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91
Fbio Konder Comparato, tica Direito, moral e religio no mundo moderno, cit., p. 427.
As conferncias de Bretton Woods (New Hampshire, Estados Unidos) estabeleceram, no ms de
julho de 1944, as regras para as relaes comerciais e financeiras entre os pases mais industrializados
do mundo diante da proximidade do fim da Segunda Grande Guerra. O sistema Bretton Woods foi o
primeiro exemplo, na histria mundial, de uma ordem monetria totalmente negociada, tendo como
objetivo governar as relaes monetrias entre Naes-Estado independentes, dando origem ao Banco
Mundial e ao Fundo Monetrio Internacional FMI.
92
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93
Ao final do sculo XX, o fenmeno da globalizao, ainda desconhecido da maioria das pessoas,
assim revelava-se exteriormente e era explicado pelos cientistas econmicos: A globalizao constitui
ao mesmo tempo uma tendncia dominante neste fim de sculo, e uma dinmica diferenciada. Um
excelente exemplo nos dado pela dimenso da especulao financeira. A circulao financeira
internacional ultrapassa, em 1995, o trilho de dlares por dia, para uma base de trocas efetivas de
bens e servios da ordem de 20 a 25 bilhes, o que significa trocas 40 vezes maiores do que as que
seriam necessrias para cobrir atividades econmicas reais. Esta ampliao dramtica da especulao
financeira literalmente carregada pelas novas tecnologias: a integrao dos espaos mundiais de
comunicao, via satlites e fibras ticas, e a capacidade de tratamento instantneo de informao em
gigantescas quantidades com a informtica, levou a uma grande dianteira, na globalizao, de um setor
cuja matria prima - a informao - particularmente fluida, e que dispe de amplos recursos para
financiar os equipamentos mais modernos. (Ladislau Dowbor, Da Globalizao ao Poder Local: a
Nova Hierarquia dos Espaos. Pesquisa e Debate, PUC-SP, vol. 7, nmero 1 (8), 1996, in
http://dowbor.org/5espaco.asp, 15/05/2011).
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94
George Soros, A crise do capitalismo, Rio de Janeiro, Campus, 2 edio, 1999, p. 155.
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uma das principais causas para o aumento da concentrao de riquezas nos pases
desenvolvidos. As empresas transnacionais no financeiras tambm se aproveitam
desse movimento, e aplicam suas reservas em investimentos especulativos nos
mercados e bolsas dos pases perifricos.
Para a reduo dos seus custos de produo, a principal estratgia que passou
a ser adotada por vrias empresas transnacionais, especialmente nos setores
automotivo, eletroeletrnico e de confeces, consistiu em transferir as suas plantas
industriais para pases da sia e da Amrica do Sul, onde encontrava mo de obra
barata e condies favorecidas para a exportao de seus produtos. Esse processo
de terceirizao e transferncia do processo de industrializao para pases
perifricos vem a ser definido como estratgia de outsourcing.
O caso da companhia norte-americana de material esportivo Nike dos mais
emblemticos. Essa empresa explorava, no ano de 2005, apenas trs fbricas
instaladas nos Estados Unidos (nos estados do Oregon, Tennessee e North Carolina),
gerando 26 mil empregos. Ao mesmo tempo, ela controlava mais de vinte fbricas
localizadas em pases do terceiro mundo, como na China, Tailndia, Malsia, Vietnam
e at no Paquisto, que empregam, aproximadamente, 650 mil trabalhadores.95 Desse
modo, verifica-se que os postos de trabalho explorados em pases perifricos e
subdesenvolvidos so vinte e cinco vezes superiores, em grau absoluto,
comparativamente ao pas sede dessa empresa transnacional.
Seja no campo financeiro, como no campo da produo industrial, a economia
globalizada segue a lgica das oportunidades de mercado, em que as regras do
comrcio internacional so ditadas pelas estratgias de negcios das empresas
transnacionais, que agem atravs de seus estabelecimentos e filiais localizados nos
pases em desenvolvimento como verdadeiras zonas francas para a realizao de
operaes em escala mundial.
Ainda no incio do perodo de globalizao da economia, o historiador ingls
Eric Hobsbawn afirmava que estamos vivendo no presente uma curiosa combinao
de tecnologia do final do sculo XX com o livre comrcio do sculo XIX e com o
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96
Eric Hobsbawn, Naes e Nacionalismo, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1991, p. 17.
Dentro dessa perspectiva, Olea e Flores definem a globalizao do seguinte modo: Por globalizacin
entendemos el proceso en que se generaliza la intercomunicacin entre economas, sociedades y
culturas, donde se desarrollan y aplican las tecnologas de la comunicacin y la informtica, junto con
los acuerdos entre los Estados para facilitar todo tipo de intercambios, especialmente de orden
econmico: desregulaciones, eliminacin de barreras arancelarias y otros impedimentos a una mayor
interrelacin econmica entre pueblos y Estados. (Victor Flores Olea e Abelardo Maria Flores, Crtica
de la Globalidad Dominacin y Liberacin en Nuestro Tiempo, Mxico, Fondo de Cultura, 2000,
p. 11.
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Irineu Strenger, Direito do comrcio internacional e lex mercatoria, So Paulo: LTR Editora, 1996,
p. 78.
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A expanso e liberalizao das relaes internacionais de comrcio foram viabilizadas, desse modo,
graas revoluo tecnolgica da informtica e das telecomunicaes, sem a qual essa poltica
expansionista no seria concretamente possvel, no entender de Octvio Ianni: Esta pode ser
considerada uma das caractersticas mais notveis da globalizao do capitalismo: as tcnicas
eletrnicas, compreendendo a microeletrnica, a automao, a robtica e a informtica, em suas redes
e vias de alcance global, intensificam e generalizam as capacidades dos processos de trabalho e
produo. No mesmo curso da disperso geogrfica das fbricas, usinas, montadoras e zonas francas,
simultaneamente nova diviso internacional do trabalho e produo, intensificam-se e generalizamse as tecnologias destinadas a potenciar a capacidade produtiva de todas as formas sociais de
trabalho. (Teoria da Globalizao, Rio de Janeiro, Civilizao Brasileira, 2004, p. 195).
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Adolf A. Berle Jr. e Gardiner C. Means, Societ per azioni e propriet privata, Torino, Giulio
Einaudi Editore, 1966, p. 8-9. Edio em ingls The Modern Corporation and Private Property, New
Brunswick and London, Transaction Publishers, edio original 1932, Tenth printing, 2009.
101 Para Arnoldo Wald, A viso realista do mundo contemporneo considera que no h mais como
distinguir o econmico do social, pois ambos os interesses se encontram e se compatibilizam na
empresa, ncleo central da produo e da criao da riqueza, que deve beneficiar tanto o empresrio
como os empregados e a prpria sociedade de consumo. No h mais dvida que so os lucros de
hoje que, desde logo, asseguram a sobrevivncia da empresa e a melhoria dos salrios e que ensejam
a criao dos empregos de amanh. (Comentrios ao Novo Cdigo Civil - Livro II Direito de
Empresa, cit., p. 2).
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Captulo 2
Codificao e descodificao do direito privado
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e no
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Em seus fundamentos de justificao, na sua reduo filosfica, a doutrina, segundo Mario Viora,
assim procura explicar as premissas que orientaram o processo de codificao, luz dos princpios do
direito natural: Sono note le premesse da cui partiva la Scuola del Diritto naturale. In rapida sintesi si
possono riepilogare cos: luomo, originariamente, nello stato di natura, fu subietto di um numero
determinato di diritti. A un certo punto luomo stesso, per superare gli incovenienti e i danni propri dello
stato di natura si era fatto uomo cilvile e poltico, aveva creato cio lo Stato, e per ottenere ci aveva
dovuto abdicare ad alcuni dei suoi diritti innati in favore di esso. Ma in seguito era accaduto che lo Stato
invadesse la sfera dei diritti individuali, violando cos il patto originale di costituzione della societ, in
virt del quale avevano consentito a sacrificare soltanto quei diritti proprii che erano incompatibili con la
sussistenza dello Stato. Era tuttavia desiderabile che la sfera dei diritti dello Stato fosse ricondotta all
primitiva estensione. Ad ottenere ci era necessrio, secondo gli insignamenti della Scuola, una dplice
opera, e cio la proclamzione di nuovi statuti e la codificazione civile: nei primi si sarebbero precisati i
diritti dello Stato, nella seconda i diritti degli individui. (Consolidazioni e Codificazioni Contributo
alla storia della codificazione, Torino, G. Giappichelli, 3 edio, 1967, p. 32-33).
109 Emmanuel Kant, Metafsica dos Costumes, Doutrina do Direito, So Paulo, cone Editora, 2004, p.
55.
110 Kant, Metafsica dos Costumes, Doutrina do Direito, cit., p. 60.
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Mario E. Viora, Consolidazioni e Codificazioni Contributo alla storia della codificazione, cit.,
p. 47.
112 Friedrich Karl Von Savigny, apud Washington de Barros Monteiro, Curso de Direito Civil, Parte
Geral, vol. 1, So Paulo, Saraiva, 39 edio, 2003, p. 47.
113 O fato que o projeto foi redigido h quase 30 anos (a comisso foi constituda em maio de 1969)
e a sua aprovao representar impressionante retrocesso poltico, social e jurdico. Do ponto de vista
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deste trabalho tem por finalidade principal questionar as razes e justificativas que
levaram o legislador a inserir no novo Cdigo Civil um ttulo relativo ao direito de
empresa, campo de regulao das atividades econmicas que, em virtude da
dinamicidade do mercado e das operaes mercantis, jamais deveria ter sido objeto
de codificao pela legislao civilista. Essa tentativa de unificao do direito das
obrigaes e, parcialmente, do direito societrio, revela-se contraditria com a
experincia acumulada no sistema de direito positivo brasileiro, que desde muito
tempo lanou o vetusto Cdigo Comercial de 1850 s prateleiras poeirentas do
desuso, e a legislao mercantil supletiva, paralela e no codificada, estava
demonstrando-se satisfatria e mais compatvel com as necessidades de regulao
da atividade econmica.
O principal erro do legislador brasileiro foi o de tentar reproduzir, no nosso pas,
no sculo XXI, a experincia do Cdigo Civil Italiano de 1942, de inspirao totalitria,
sancionado pelo ditador Benito Mussolini (1880-1945), aliado da Alemanha nazista de
Adolf Hitler (1889-1945). Esse diploma fascista inseriu o regime do direito de empresa
na estrutura do Cdigo Civil com a nica finalidade de ampliar o controle estatal sobre
as atividades produtivas,114 considerando, inclusive, que a atividade da empresa e do
empresrio estava inserida como modo de exerccio do trabalho.115
A partir da colocao do tema e da anlise da questo da codificao versus
descodificao, incluindo a investigao do longo processo legislativo que gerou a Lei
10.406/2002, o presente captulo tem como objetivo contribuir para as discusses em
voga sobre as conseqncias da reforma do direito privado brasileiro, e dos
problemas que resultaram da imposio artificial do regime do direito de empresa pelo
Cdigo Civil de 2002.
poltico, a redao do projeto precede a consolidao de processo histrico identificado, nos anos 70,
justamente com a era da descodificao. Vale dizer, uma codificao no surge por acaso. Expressa
momento de unificao poltica e ideolgica de um povo, fazendo prevalecer o conjunto de regras que
a sintetiza. Assim foi no sculo XIX, aps a Revoluo Francesa, assim se deu na Europa do psguerra, com a derrubada dos governos totalitrios. (O velho projeto de um revelho Cdigo Civil, in
Temas de Direito Civil, Renovar, Rio de Janeiro, 3 edio, 2004, p. 499-500).
114 Analisando exatamente este aspecto, Paula Forgioni afirma que a noo da empresa que acaba
positivada no Codice Civile brota em contexto fascista, sendo concebida como um dos principais
instrumentos do intervencionismo estatal. (A evoluo do direito comercial brasileiro: Da
mercancia ao mercado, So Paulo, Revista dos Tribunais, 2 edio, 2012, p. 49).
115 Cdigo Civil Italiano de 1942 - Livro V Del Lavoro, artigos 2.060 a 2.246.
72
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116 Apesar de ter sido autor de um dos anteprojetos do Cdigo Civil, Orlando Gomes, tal como na
clebre retratao de Vivante, modificou a sua opinio, e assim externou sua posio: A substituio
global de um novo Cdigo Civil atualmente um anacronismo tanto mais gritante quanto se limite,
mantendo a orientao filosfica e ideolgica do cdigo a ser abrogado, a enunciar praticamente os
mesmos comandos jurdicos com leves alteraes, quase sempre para pior, e com intencional excluso
de institutos e solues normativas que j integram a legislao especial e abundante que as mutaes
sociais determinaram e continuam a motivar. (O problema da codificao, Revista da Academia
Brasileira de Letras Jurdicas, Rio de Janeiro, ano I, n 1, 1984. p.12-13).
73
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117
Sobre o projeto do cdigo, Miguel Reale afirmou: No se diga que nossa poca pouco propcia
obra codificadora, tantas e tamanhas so as foras que atuam neste mundo em contnua
transformao, pois, a prevalecer tal entendimento, s restaria ao jurista o papel melanclico de
acompanhar passivamente o processo histrico, limitando-se a interferir, intermitentemente, com leis
esparsas e extravagantes. Ao contrrio do que se assoalha, a codificao, como uma das expresses
mximas da cultura de um povo, no constitui balano ou arremate de batalhas vencidas, mas pode e
deve ser instrumento de afirmao de valores nas pocas de crise. (Exposio de Motivos do
Projeto do Cdigo Civil, Dirio do Congresso Nacional, Seo I, Suplemento B, 13.06.1975, p. 108).
118 Discorrendo sobre a questo temporal das normas codificadas, Joseli Lima Magalhes pondera: As
normas jurdicas, e aqui se incluem as normas codificadas, especificamente, tendem a refletir ideias de
fatos consumados no passado, que, por um motivo ou por outro, ganharam valorao por parte dos
legisladores. Estes, no desiderato de elaborar leis, no so capazes de acompanhar o desenvolvimento
temporal dos fatos sociais, os quais normalmente continuam a se desenrolar, no s porque as relaes
jurdicas mudam de enfoque, mas tambm por ser da natureza humana o caminho para o
aperfeioamento, ainda que causem considerveis prejuzo vida presente nas tomadas de
posicionamentos. Isto explica a moderna tcnica legislativa de imprimir atualizao das normas
jurdicas procedimentos mais geis, como que amenizando a conexo presente entre a realidade social
e a lei, o que poder, contudo, causar embarao e instabilidade na sociedade. (Da Recodificao do
Direito Civil Brasileiro, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2006, p. 97-98).
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Matria
Cdigo de guas
Loteamento de terrenos e promessa de compra e venda
Desapropriao de imveis por utilidade pblica
Regime especial dos bens pblicos
Estatuto da mulher casada
Desapropriao de imveis por interesse social
Sistema Financeiro da Habitao
Estatuto da Terra
Condomnio e incorporaes imobilirias
Contratos de seguro
Ao de alimentos
Alienao fiduciria em garantia
Sociedades cooperativas
Lei de registros pblicos
Lei do divrcio
Parcelamento do solo urbano
Usucapio especial
Requisitos das escrituras pblicas
Estatuto da criana e do adolescente
Cdigo de defesa do consumidor
Locao de imveis urbanos
Alienao fiduciria de imveis
Direitos autorais
Planos e seguros privados de sade
Estatuto da Cidade
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Natalino Irti, Let della decodificazione, Milano, Giuffr, 4 ed., 1999, p. 72.
Orlando Gomes considera, com base nas lies de Natalino Irti, os microssistemas jurdicos como
pequenos universos legislativos, uma legislao setorial dotada de lgica prpria e ditada para
institutos isolados ou para uma classe de relaes, formando uma cadeia florescente margem do
cdigo a multiplicar derrogaes implcitas (O problema da codificao, cit. p.17).
121 Natalino Irti, Let della decodificazione, cit., p. 10.
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bsicas para o exerccio do comrcio, e somente foi revogado pelo Cdigo Civil de
2002.
Principalmente a partir do final da Segunda Grande Guerra (1939-1945),
perodo que Irti considera o incio da era da descodificao, o Cdigo Comercial de
1850 foi sendo derrogado por diversas leis especiais, que tambm se caracterizam
como microssistemas mercantis.
No direito positivo brasileiro, ao longo dos anos que se seguiram ao Cdigo
Comercial de 1850, cabe destacar como mais relevantes as seguintes leis supletivas
e microssistemas normativos que foram introduzidos no nosso ordenamento jurdico
a partir do sculo XX, destinados atualizao da legislao comercial diante das
novas formas e modalidades de execuo das atividades econmicas privadas:
Legislao
Decreto 916/1890
Decreto 1.102/1903
Decreto 2.044/1908
Decreto 3.708/1919
Decreto 22.626/1933
Lei 4.594/1964
Lei 4.595/1964
Lei 4.728/1965
Lei 4.886/1965
Lei 5.474/1968
Lei 6.024/1974
Lei 6.099/1974
Lei 6.385/1976
Lei 6.404/1976
Lei 6.729/1979
Lei 6.840/1980
Lei 7.357/1985
Lei 8.884/1994
Lei 8.934/1994
Lei 8.955/1994
Lei 9.279/1996
Lei 9.492/1967
Lei 9.841/1999
Lei 10.076/2004
Lei 11.101/2005
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Matria
Registro de firmas ou razes comerciais
Empresas de armazns gerais
Letra de cmbio e nota promissria
Sociedades por quotas de responsabilidade limitada
Lei da usura
Corretor de seguros
Reforma bancria
Mercado de capitais e bolsas de valores
Representao comercial autnoma
Duplicatas
Interveno e liquidao extrajudicial
Arrendamento mercantil (leasing)
Mercado de valores mobilirios
Sociedades por aes
Concesso comercial
Ttulos de crdito comercial
Cheque
Defesa da concorrncia 126
Registro pblico de empresas mercantis
Franquia empresarial
Propriedade industrial
Protesto cambial
Estatuto da microempresa 127
Ttulos de crdito agropecurios
Recuperao de empresas e falncias
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comum com o direito civil, cuja aplicao s relaes comerciais sempre foi
analogicamente residual. Os microssistemas ou micrordenamentos que passaram a
ser disciplinados em leis especiais, retiram seu fundamento de validade diretamente
da Constituio, e se sobrepem legislao codificada, no em razo dessa relao
de supra ordenao normativa, mas porque regulam hipteses particulares que no
so tratadas com tal especificidade pela norma codificada. Entre a norma geral e a
norma especial, prevalecer, sempre, a norma especial, porque esta foi criada para
disciplinar relaes jurdicas determinadas e detalhadamente regradas.
As relaes comerciais sempre foram reguladas, ao logo dos sculos, a partir
de suas prprias normas. E antes de recorrer ao direito civil para completar, por
analogia, as suas lacunas, valeram-se mais da integrao hermenutica, com recurso
aos usos e costumes mercantis, estes moldados pela secular experincia mercantil.
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Waldemar Ferreira, Tratado de Direito Mercantil Brasileiro, vol. 1, Rio de Janeiro, Freitas Bastos,
2 edio, 1948, p. 123.
137 Nos ltimos anos, est sendo observado um crescente processo de especializao da jurisdio
comercial. Essa especializao hoje se faz presente nos Estados do Rio de Janeiro, So Paulo e Minas
Gerais, onde foram criadas varas especializadas, que passaram a deter competncia privativa em
matria empresarial e de recuperao de empresas e falncias. Pesquisa recentemente aplicada pelo
editor-chefe da Review of Economic Development, Public Policy and Law, Ivan Csar Ribeiro (FEAUSP), constatou que apenas 21 % das decises judiciais originrias de processos em varas
empresariais do Rio de Janeiro, entre os anos de 2004 e 2006, foram modificadas pelo Tribunal de
Justia, contra um percentual de 37,5 % das decises proferidas por juzes sem especializao, que
foram reformadas pelo rgo superior. Varas empresariais reduzem chances de decises serem
reformadas, http://www.bovespa.com.br/Investidor/Juridico, 20/02/2010.
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Decreto Legislativo 538/2012 do Congresso Nacional - Aprovou o texto da Conveno das Naes
Unidas sobre Contratos de Compra e Venda Internacional de Mercadorias, estabelecida em Viena, em
11 de abril de 1980, no mbito da Comisso das Naes Unidas para o Direito Mercantil Internacional.
139 A respeito dessa questo, Miguel Reale reconheceu: Embora tentado pela idia da unificao do
Direito Privado, compreendi que era necessrio manter a autonomia do Direito Comercial, mas
injetando-lhe a idia-fora da livre empresa, visto no ser mais o comrcio a atividade econmica
dominante, em concorrncia com as poderosas criaes das indstrias e dos servios de toda ordem.
(Estudos preliminares do Cdigo Civil, So Paulo, Revista dos Tribunais, 2003, p. 55).
140 Rubens Requio, Curso de Direito Comercial, cit., vol. 1, p. 21.
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Ren David, Os Grandes Sistemas do Direito Contemporneo, So Paulo, Martins Fontes, 2002,
p. 126.
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Para Calixto Salomo Filho, a sociedade annima a organizao societria capitalista mais
sofisticada, razo pela qual demonstra-se vlido e coerente considerar que o prprio sistema
econmico capitalista sempre estar caracterizado por sua natureza mercantil, assim como a empresa.
(Teoria crtico-estruturalista do Direito Comercial, So Paulo, Marcial Pons, 2015, p. 125).
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A partir da vigncia do Cdigo Civil de 2002, dvidas foram mais uma vez
levantadas pela doutrina acerca da possvel extino do direito comercial como
disciplina jurdica de regulao da atividade empresarial. Desde o Cdigo Civil italiano
de 1942, discute-se a respeito do problema da autonomia do direito comercial, como
questo metodolgica determinante na fixao das linhas dominantes de investigao
cientfica nesse campo.145
Contudo, partindo da prpria disciplina constitucional na esfera da competncia
legislativa, cabe considerar que o art. 22, inciso I, da Constituio de 1988, vem a
reconhecer, dogmaticamente, o direito comercial como disciplina jurdica autnoma,
dotada de contedo normativo especfico.
Para a determinao preliminar do objeto dominantemente mercantil, que
continua a ser regulado pela legislao comercial supletiva especial, cabe destacar,
alm de todos os tipos de contratos mercantis no disciplinados no Cdigo Civil de
2002, as matrias referentes s sociedades annimas (Lei 6.404/1976), propriedade
industrial (Lei 9.279/1996), e tambm legislao falimentar (Lei 11.101/2005).
De modo bastante elucidativo, Rubens Requio considerava que ser ilusria
a unificao do direito obrigacional se permanecer a falncia como instituto
especificamente mercantil.146 Esta simples observao, agora mais ainda reforada
com a vigncia da lei de recuperao de empresas e falncias (Lei 11.101/2005), que
manteve a natureza estritamente mercantil do procedimento falimentar, evidencia que
o direito comercial no perdeu a sua autonomia cientfica e normativa em decorrncia
do Cdigo de 2002.
145
146
89
Ivanildo Figueiredo
147
Joaqun Garrigues, Tratado de Derecho Mercantil, Madrid, Revista de Derecho Mercantil, 1947,
tomo I, p. 25.
148 J. X. Carvalho de Mendona, Tratado de Direito Comercial Brasileiro, cit., p. 23.
149 J. X. Carvalho de Mendona, cit., p. 23.
150 Francesco Ferrara Junior e Francesco Corsi, Gli Imprenditori e Le Societ, Milano, Giuffr, 13
edizione, 2006, p. 19.
151 Manifestando opinio contrria unificao do direito privado na Itlia, Alfredo Rocco assim
considerava: Acreditamos, portanto, na existncia de princpios gerais do direito comercial, ou seja, de
normas gerais aplicveis a todo o campo do direito comercial e s a ele, e acreditamos, outrossim, em
que o direito comercial, apesar de sua inegvel fragmentao, se preste a um estudo orgnico e
sistemtico e, em conseqncia, possa o seu conhecimento dar lugar a uma cincia autnoma a
cincia do direito comercial. Somos, portanto, pela conexo e no pela confuso, entre a cincia do
direito civil e a do direito comercial. (Princpios de Direito Comercial, cit., p. 91).
90
Ivanildo Figueiredo
152
153
91
Ivanildo Figueiredo
O direito comercial, segundo Paulo Roberto Arnoldi, apoiado nas lies de Fran
Martins, caracteriza-se pela simplicidade das suas frmulas, pela internacionalidade
de suas regras e institutos, pela rapidez de sua aplicao, pela elasticidade dos seus
princpios e pela necessria onerosidade de suas operaes,154 de modo que tais
caractersticas so inteiramente diferentes daquelas que observamos no direito civil
solene, formal, de regras e princpios estticos, em que suas relaes nem sempre
so onerosas.
Para Rubens Requio, o direito comercial se diferencia do direito civil em razo
de seus traos peculiares, relacionados ao cosmopolitismo, individualismo,
onerosidade, informalismo, fragmentarismo e solidariedade presumida.155
As operaes das empresas caracterizam-se como negcios em massa,
principalmente sob a modalidade da compra e venda mercantil, e se realizam de modo
repetitivo, despidas de maior rigorismo formal.156 Qualquer compra e venda comercial
vista realiza-se de modo quase instantneo, pela entrega da mercadoria contra o
pagamento do preo. A prova do contrato resume-se a uma nota fiscal, recibo ou
extrato de carto de dbito ou crdito, atestando a quitao.
A diferenciao entre o modo de execuo das atividades comerciais e dos
negcios civis flagrante e bvia a partir de qualquer critrio de observao,
exatamente por conta dos elementos dominantes da profissionalidade, da
especialidade, da onerosidade e da competitividade econmica nas relaes
mercantis.157
154 Paulo Roberto Colombo Arnoldi, Teoria Geral do Direito Comercial, So Paulo, Saraiva, 1998, p.
17.
155 Rubens Requio, Curso de Direito Comercial, vol. 1, cit., p. 31.
156 No tocante ao modo de execuo dos negcios mercantis, Waldemar Ferreira considera que a
simplicidade na forma e rapidez nas operaes constituem, em suma, predicado do comrcio; e esse
o esprito animador do direito mercantil, de tal modo que estaria fora do comrcio o negociante que
imprimisse aos seus atos e contratos formalismo de tabelio e no sentisse a intensidade da vida
mercantil contempornea. (Tratado de Direito Mercantil Brasileiro, vol. I, A histria e a doutrina
do direito mercantil, Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 2 edio, 1948, p. 125).
157 Toda e qualquer organizao empresarial deve estar dotada, como requisito essencial de
funcionamento e sobrevivncia no regime concorrencial, de estruturas organizacionais aptas
implementao de estratgias comerciais ou industriais compatveis com as demandas do mercado.
Sensvel a essa realidade, Oscar Barreto Filho esclarece: No so apenas as diferenas de estrutura,
de critrios de pesquisa e de mtodo que devem ser consideradas, em relao ao tema da autonomia
do Direito Comercial. Pode at acontecer que, formalmente, no haja uma diferena estrutural entre
92
Ivanildo Figueiredo
93
Ivanildo Figueiredo
Direito comercial
Mtodo indutivo
Normas dinmicas
ndole inovadora
Carter informal
Prtica de atos em massa
Onerosidade inerente
Regulao interna e internacional
160
Paulo Roberto Colombo Arnoldi, Teoria Geral do Direito Comercial, cit., p. 41.
94
essas
distines
apontadas
pela
doutrina
dominante
como
161 O direito comercial o nico ramo do direito que dispe, ainda que de escassa aplicao, de
procedimento prprio de positivao de prticas mercantis na esfera da jurisdio administrativa das
Juntas Comerciais, denominado de assentamento de usos e prticas mercantis (Lei n 8.934/1994, art.
8, inciso VI; Decreto 1.800/1996, art. 87), procedimento este que confirma a predominncia do mtodo
indutivo na formao das normas comerciais.
162 A Primeira Jornada de Direito Civil do Conselho da Justia Federal, realizada em 2012, aprovou o
enunciado 75, esclarecendo que A disciplina de matria mercantil no novo Cdigo Civil no afeta a
autonomia do Direito Comercial.
95
propsito,
cabe
observar
que,
assim
denominada
teoria
da
163 Sergio Campinho justifica a autonomia do Direito Comercial assim considerando: A uma, porque a
Constituio Federal de 1988, ao dispor sobre as matrias de competncia privativa da Unio, ainda
se refere autonomamente ao Direito Comercial (art. 22, I). A duas, porque a autonomia didtica e
cientfica no vem afetada pelo tratamento em um nico diploma legal. A trs, porque a adoo da
teoria da empresa no compromete essa autonomia, na medida em que ao empresrio o exerccio
empresarial da atividade econmica se aplica toda legislao relativa atividade mercantil no
revogada (Cdigo Civil, art. 2.037). (O Direito de Empresa luz do novo Cdigo Civil, Rio de
Janeiro, Renovar, 4 ed., 2004, p. 6).
164 Miguel Reale manifestou-se expressamente sobre a autonomia do direito comercial com as
seguintes palavras: indispensvel ponderar que o novo Cdigo Civil no abrange todo o Direito
Privado, mas to somente as questes que emergem da unidade do direito das obrigaes, como o
caso das normas relativas atividade empresarial, permanecendo, pois, intocvel o direito comercial
com a respectiva legislao especial. (Discurso na cerimnia de sano do novo Cdigo Civil no
Palcio do Planalto, em 10/01/2002, http://www.miguelreale.com.br, 25/02/2007).
165 Pietro Perlingieri, Perfis do Direito Civil Introduo ao Direito Civil Constitucional, Rio de
Janeiro, Renovar, 2 edio, 2002, p. 6.
96
Ivanildo Figueiredo
e essas relaes passam a ter como fonte formal a prpria norma constitucional,
fundamento superior de validade do sistema de direito positivo.166
Desse aspecto decorre o sentido da perda da centralidade do Cdigo Civil, que
deixou de ser o estatuto dos direitos individuais personalssimos e da propriedade,
para se posicionar como norma de segundo grau, que deve manter estreita
compatibilidade com a lei fundamental do sistema, subordinado matria
constitucional.
A Constituio, na teoria positivista de Hans Kelsen, representa um princpio
supremo determinando a ordem estatal inteira e a essncia da comunidade
constituda por essa ordem, e como quer que seja ela definida, a Constituio
sempre o fundamento do Estado, a base da ordem jurdica que se quer apreender.167
Partindo, ainda, da idia de Kelsen da estrutura hierarquizada do ordenamento jurdico
como uma pirmide, em cujo pice localiza-se a Constituio positiva, todos os ramos
do direito possuem um nico e superior fundamento de validade, e a vigncia e
aplicabilidade de suas normas deriva dessa relao de suprainfra ordenao, da
norma superior para a norma inferior, na abordagem categorial do jusfilsofo Lourival
Vilanova, da Escola de Direito do Recife.168
No direito positivo brasileiro, a Constituio da Repblica de 1988 elevou
categoria de norma constitucional diversos princpios e institutos de garantia dos
direitos da personalidade, da dignidade da pessoa humana, da funo social da
propriedade e dos contratos e de proteo da famlia, que so tpicas relaes e
situaes jurdicas de direito privado. Nesse sentido, considera Gustavo Tepedino
que, diante do novo texto constitucional, foroso parece ser para o intrprete
166
Na viso de Gustavo Tepedino, O ocaso das codificaes, visualizado entre ns j pelo saudoso
Professor Orlando Gomes, coincide com a absoro, pelo texto constitucional, do papel de reunificao
do sistema, temperando, com seus princpios e normas hierarquicamente superiores, as presses
setoriais manifestadas nas diversas leis infraconstitucionais. (O velho Projeto de um Revelho Cdigo
Civil, in Temas de Direito Civil, cit., p. 500).
167 Hans Kelsen, Jurisdio Constitucional, So Paulo, Martins Fontes, 2003, p. 130.
168 Lourival Vilanova aprofunda, partindo das lies de Kelsen, o significado do princpio da continuidade
normativa no interior do sistema jurdico, esclarecendo que uma proposio normativa s pertence ao
sistema se podemos reconduzi-la proposio fundamental do sistema, e de tal modo que cada
norma provm de outra norma e cada norma d lugar, ao se aplicar realidade, a outra norma, para
assim situar a homogeneidade do sistema de direito positivo no processo de produo de normas
jurdicas a partir de um nico fundamento de validade. (As estruturas lgicas e o sistema do direito
positivo, So Paulo, Revista dos Tribunais, 1977, p. 108-109).
97
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169
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171 A Lei n 12.529/2011 define a atual estrutura do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrncia SBDC, tendo como rgo superior o Conselho Administrativo de Defesa Econmica CADE,
estabelecendo as normas de direito regulatrio relativas preveno e represso s infraes contra
a ordem econmica (CF, art. 173, 4).
172 No caso do direito civil e das normas civis codificadas, Gustavo Tepedino assim considera a respeito
da necessidade de se recorrer, em carter preliminar, disciplina constitucional, para fins de
interpretao e aplicao das normas inferiores na regulao das relaes privadas: Da a
imprescindibilidade da utilizao direta e imediata das normas constitucionais nas relaes jurdicas
privadas, sobretudo quando proliferam clusulas gerais e conceitos indeterminados, prprios da atual
tcnica legislativa. Do ponto de vista subjetivo, a norma constitucional fixa os limites de atuao
valorativa do intrprete. Do ponto de vista objetivo, reformula os modelos normativos
infraconstitucionais utilizados pelo intrprete, construindo-os segundo a axiolgica constitucional. (O
novo e o velho Direito Civil, in Temas de Direito Civil, Tomo II, Rio de Janeiro, Renovar, 2006, p.
401).
99
fica
superada,
considerando
predominncia
da
fundamentao
100
Ivanildo Figueiredo
Captulo 3
A concepo da empresa no Cdigo Civil de 2002
O Cdigo Civil de 2002, como aqui exposto, introduziu uma nova e diferente
concepo na normatizao da atividade empresarial no Brasil, atravs do sistema do
direito de empresa, em substituio ao antigo regime do comerciante e dos atos de
comrcio, que eram disciplinados pelo vetusto e ultrapassado Cdigo de Comrcio do
Imprio, de 1850.
A partir da anlise da disposio e do contedo das normas do Cdigo Civil de
2002, em comparao com o Cdigo Civil de 1916, constatamos que a principal
inovao do Cdigo, a mais radical das mudanas, refere-se introduo desse novo
livro, o Livro II, intitulado Do Direito de Empresa. Isto porque todos os demais livros
e ttulos do Cdigo de 2002 reproduzem, fielmente, o contedo e os institutos
tradicionais do sistema civil codificado e do diploma revogado (Parte Geral, Direito das
Obrigaes, Direito das Coisas, Direito de Famlia e Direito das Sucesses), da forma
como foi moldado desde as Institutas de Justiniano, em 533 DC.173
173
Flavius Petrus Sabbatius Justinianus, Institutas do Imperador Justiniano, Bauru, Edipro, 2001.
101
Ivanildo Figueiredo
174 Gustavo Tepedino, Crise de fontes normativas e tcnica legislativa na parte geral do Cdigo
Civil de 2002, cit., p. 6.
175 A referncia socializao das relaes patrimoniais consta, por exemplo, no art. 421 do Cdigo,
ao se referir funo social do contrato, assim como no pargrafo nico do art. 1.228, que trata da
funo social da propriedade.
102
Ivanildo Figueiredo
176
103
Ivanildo Figueiredo
Com efeito, o Cdigo de 1942 da Itlia foi moldado sob distinta base
deontolgica, formado noutra realidade histrica, ideolgica e scioeconmica, e que
se revela, como adiante demonstrar-se-, totalmente inapropriado para reger as
atividades empresariais no ordenamento jurdico brasileiro, especialmente no sculo
XXI, em plena era tecnolgica, da globalizao e da internacionalizao dos
mercados. A transposio do Cdigo italiano de 1942 para o Cdigo Civil de 2002 no
observou, como concluso bvia, elementar, a evoluo histrica do direito comercial
brasileiro e as caractersticas da atividade econmica no Brasil e no mundo
globalizado e interconectado em tempo real, totalmente diverso da realidade de outra
poca e de outra cultura, em franca oposio aos princpios factuais que deveriam ser
respeitados, como assim ensinava Ascarelli.177
Esse Cdigo Civil italiano de 1942 foi promulgado em um perodo marcado pelo
maior conflito blico da histria da civilizao humana em todos os tempos, a Segunda
Guerra Mundial, iniciada pela poltica expansionista da Alemanha nazista, e apoiada
pelos dois outros pases do Eixo, a Itlia e o Japo. Na Itlia dominada pelo regime
do ditador Benito Mussolini desde 1923, o Cdigo Civil de 1942 teve como objetivo
principal reunir e unificar, em um nico diploma legislativo, todas as atividades
econmicas desempenhadas pelas pessoas, sociedades e entes privados. A ideia
dominante era que, a partir dessa unificao normativa totalitria, todas as pessoas
acentuar o esgarar dos valores da disciplina, como tambm privou a ordem jurdica nacional do
regramento adequado para o atual estgio de evoluo da nossa economia, fortemente integrada ao
processo de globalizao. A unificao legislativa foi um erro. preciso corrig-lo, o quanto antes. (O
futuro do direito comercial, So Paulo, Saraiva, 2011, p. 8).
177 Comentando a respeito do desenvolvimento histrico do direito comercial, Tullio Ascarelli assim
considerava: Fica claro que a especialidade do direito comercial no deriva da especialidade da
matria regulada, mas da emerso em determinados setores, de exigncias e valores de carter geral
e, como tal, suscetveis, no desenvolvimento histrico, de uma aplicao geral. No so as exigncias
tcnicas inerentes ao comrcio, indstria, produo, e por a afora, que necessariamente
determinam normas especiais, porque, se assim fosse, o direito estaria fora da histria, ou inserido
numa histria separada. O direito, e portanto tambm o direito comercial, no pode ser compreendido
fora da histria e a sua especialidade no pode ser posta em relao com exigncias tcnicas
imutveis, mas com o desenvolvimento histrico da nossa experincia jurdica, que vem
gradativamente afirmando por isso primeiramente em campos determinados novos princpios,
depois suscetveis de aplicaes mais gerais, justamente porque o direito no obedece no seu
desenvolvimento a preordenadas simetrias sistemticas, mas necessidade e conscincia dos
homens, cujas relaes regula, no ordenamento da convivncia social. (O desenvolvimento histrico
do Direito Comercial e o significado da unificao do Direito Privado, cit., p. 242).
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Ivanildo Figueiredo
Observa Renan Lotufo, quanto inspirao do Cdigo Italiano de 1942: O Cdigo Italiano de 1942
foi elaborado no perodo do fascismo de Mussolini, portanto, um Cdigo voltado para a produtividade,
para a produo em larga medida, mas sem qualquer referncia ao valor fundamental do ser humano.
O centro de toda aquela necessidade social, de toda aquela doutrina elaborada se deu no Projeto de
Cdigo Italiano, transformando tudo quanto possvel em regras produtividade. Tudo girava em torno
da produtividade em benefcio do Estado. (Da oportunidade da Codificao Civil e a Constituio,
em O Novo Cdigo Civil e a Constituio, Porto Alegre, Livraria do Advogado Editora, 2006, p. 17).
179 Cdigo Civil Italiano de 1942 - Libro Quinto (V), arts. 2.060 a 2.642.
180 As posies mutantes de Vivante sobre a dicotomia entre direito civil e direito comercial so assim
explanadas, com inigualvel didtica, por Paula Forgioni: No final do sculo XIX, acentua-se a crena
em que no mais se justificaria a existncia de um direito especial para os comerciantes. Na Itlia,
como sabido por todos, Vivante causa furor ao defender a tese da unificao do direito privado, em
aula inaugural da Faculdade de Direito de Bolonha, no ano de 1892. No haveria diferenas; no
haveria dicotomia. Vivante assim alinhavava a controvrsia: (I) a autonomia do direito comercial manterse-ia mais pela tradio do que pelas boas razes; (II) a dicotomia causaria danos de ndole social e
jurdica - pessoas que no so comerciantes ficam sujeitas s suas regras, feitas para os comerciantes
- e (III) prejuzos para o progresso cientfico, pois os comercialistas no estudariam as regras gerais.
Os "improvisados jurisconsultos" falariam, a toda hora, em contratos sui generis. No entanto, na 5
edio de seu Trattato di Diritto Commerciale, Vivante chega concluso de que a unificao do direito
privado no seria aconselhvel porque: (I) direito civil e direito comercial guardam profundas diferenas
de mtodos. Enquanto o direito comercial vale-se do mtodo indutivo (i.e., conclui-se a regra com base
nos fatos - a concluso mais geral do que a premissa), o direito civil lana mo daquele dedutivo
(partindo da premissa geral e chegando concluso individual); (II) o direito comercial de ndole
cosmopolita, que decorre do prprio comrcio; ao mesmo tempo em que (III) regula os negcios de
massa, que dariam origem a institutos tpicos do direito comercial (ttulos de crdito, circulao, portador
de boa-f etc.). Neste mesmo escrito, resta clara a principal diferena entre o direito civil e o direito
comercial: esprito diverso, "spirito di speculazione. (A interpretao dos negcios empresariais no
novo Cdigo Civil Brasileiro, Revista de Direito Mercantil Industrial, Econmico e Financeiro, So
Paulo, RT, v. 42, 2003, p. 26).
105
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Na opinio de Francesco Ferrara Junior, a empresa significa, essencialmente, o ente comercial por
excelncia, que deve ser regulada por regime prprio, como organizao mercantil: Commercio non
soltanto lo scambio, bens lorganizzazione per lo scambio. Non si ha vero commercio ladove manchi
limpresa o, rispettivamente, lazienda. (Gli Imprenditori e Le Societ, cit., p. 13).
182 Lorenzo Mossa, I problemi fondamentali del diritto commerciale, 1926, apud Francesco Ferrara
Junior, Gli Imprenditori e Le Societ, cit., p. 12.
183 Francesco Ferrara Junior, Gli Imprenditori e Le Societ, cit., p. 13.
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185
Fbio Ulhoa Coelho, Curso de Direito Comercial, Direito de Empresa, cit., p. 37; Gustavo
Tepedino, O novo e o velho Direito Civil, in Temas de Direito Civil, Tomo II, Rio de Janeiro, Renovar,
2006, p. 401; Rachel Sztajn, Teoria Jurdica da Empresa, So Paulo, Atlas, 2004, p. 9.
186 A propsito dos problemas que resultaram e esto resultando da insero do direito de empresa
pelo Cdigo Civil de 2002, Wilges Bruscato registra: As particularidades que envolvem a atividade
empresarial demonstram os inconvenientes da regulao do direito de empresa pelo Cdigo Civil, ainda
que seja uma tcnica possvel, devido unificao do sistema das obrigaes, j que muitas vezes no
atenta para as caractersticas que revestem as obrigaes mercantis e pode, com isso, trazer
desvantagens econmicas que tero reflexos negativos para a sociedade. O direito empresarial vem
sendo construdo ao longo do tempo de acordo com os ditames dos fatos que se prope a regular,
como qualquer outro ramo do Direito. Embora do Direito seja uno, acaba se subdividindo em vrios
ramos autnomos, como ressaltado, em especial, pelas especificidades de cada campo da vida
humana e social. Da a importncia do critrio cientfico de autonomia de uma rea do Direito. (Os
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189 A expresso comercializao do direito civil, como observado por Oscar Barreto Filho, foi pela
primeira vez empregada pelo jurista alemo Gabriel Riesser, e divulgada - e assim passou a ser mais
intensamente referida - a partir da obra de Georges Ripert, Trait Elementaire de Droit Commercial.
(Teoria do Estabelecimento Comercial, cit., p. 8). Na viso de Tullio Ascarelli, o direito das
obrigaes comercializa-se, segundo a frase de um grande comercialista, e isto a tal ponto que, quando
(como tambm aconteceu em alguns pases, por exemplo o Brasil) o Cdigo Civil posterior ao
Comercial, no Civil e no no Comercial que encontramos aqueles princpios que determinam os atos
propriamente comerciais. (O desenvolvimento histrico do Direito Comercial e o significado da
unificao do Direito Privado, cit., p. 241).
190 Considera Cssio Cavalli, a partir das lies de Hernani Estrela, que enquanto o direito civil
comercializava-se, o direito comercial transmudava-se internamente em sua estrutura e funo, se
esse fenmeno tinha como consequncia, de to profunda transformao, cada vez mais se tornam
fundidos no quadro amplo do direito privado os dois ramos, civil e comercial, e tambm mais confusas
se tornam as fronteiras de um e outro. (Direito Comercial: passado, presente e futuro, Rio de
Janeiro, Elsevier, FGV, 2012, p. 92).
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191 No mbito do direito das obrigaes, na viso de Ren David, o direito civil comercializou-se em
todos os pases economicamente desenvolvidos, a tal ponto que poucas regras ainda existem em que
as obrigaes comerciais sejam tratadas diferentemente das obrigaes civis, sendo que esse
fenmeno, em parte, decorreu das codificaes nacionais, que fizeram perder, por um lado, ao direito
comercial, o carter internacional que outrora o distinguia profundamente do direito civil. (Os Grandes
Sistemas do Direito Contemporneo, cit., p. 97/98).
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Art. 2.200 Societ - Sono soggette all'obbligo dell'iscrizione nel registro delle
imprese le societ costituite secondo uno dei tipi regolati nei Capitolo III e seguenti
del Titolo V e le societ cooperative (2511 e seguenti), anche se non esercitano
un'attivit commerciale.192
192
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centrada na figura do comerciante, pessoa fsica, tal como originrio dos estatutos das
corporaes de mercadores, sendo o direito comercial um direito de classe, formado
no seio da prtica mercantil.194
Com a codificao do direito mercantil, positivada no Cdigo Comercial da
Frana de 1807, a teoria subjetivista do mercador foi substituda pela concepo
objetivista fundada na teoria dos atos de comrcio. Para essa concepo objetivista,
o direito comercial tem por objeto regular a matria comercial, e esta determinada
por aquilo que a legislao define como sendo de natureza mercantil. Nesse sentido,
Rubens Requio afirma que a lei comercial que determina o que seja matria
comercial,195 definio esta que resultaria da simples aplicao de conceitos
dogmticos pela cincia do direito.
Na tentativa de explicar o fenmeno do comrcio na sua complexidade
imanente, vrias foram as teorias elaboradas para definir a matria comercial. Para
Alfredo Rocco, por exemplo, a atividade comercial compreenderia, como elemento
unitrio, a idia de interposio na troca,196 ou seja, deve ser considerada comercial
toda atividade econmica em que exista relao jurdica de intermediao econmica,
tendo como objeto uma mercadoria.
Contudo, somente essa concepo objetivista da comercialidade no se
demonstrava suficiente o bastante para explicar o fenmeno mercantil. A necessidade
de complementao recproca e conceitual entre a concepo subjetivista do
comerciante e a concepo objetivista dos atos de comrcio levou o comercialista
francs Jean Escarra a afirmar que o direito comercial , ao mesmo tempo, o direito
dos comerciantes e dos atos comrcio.197
Desconsiderando toda essa construo histrica sobre os elementos materiais
que definem o contedo do direito mercantil, o Cdigo Civil de 2002 ignorou qualquer
vestgio de comercialidade no momento de definir os conceitos de empresrio (art.
966), de sociedade empresria (art. 982) e de estabelecimento (art. 1.142), abstendo-
194
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198
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117
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118
deste
termo,
reunem-se
compe-se
trs
fatores,
em
unidade
207 Miguel Reale, Exposio de Motivos do Projeto do Cdigo Civil, Dirio do Congresso Nacional,
op. cit., p. 119.
208 Cdigo Civil de 1916, Art. 1.363. Celebram contrato de sociedade as pessoas, que mutuamente se
obrigam a combinar seus esforos ou recursos, para lograr fins comuns.
209 Cdigo Civil de 2002, Art. 1.059. Os scios sero obrigados reposio dos lucros e das quantias
retiradas, a qualquer ttulo, ainda que autorizados pelo contrato, quando tais lucros ou quantia se
distriburem com prejuzo do capital.
119
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liberais,
como
mdicos,
engenheiros,
arquitetos,
contadores,
121
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210
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211 Ao analisar esta disposio do Cdigo, Waldirio Bulgarelli observa: Estas referncias, a mercantil
e industrial, tambm encontradas na parte do penhor (art. 1.462), e a civil e comercial, esto a
demonstrar que o Projeto no se livrou de todo da orientao do autor da parte sobre a Atividade
Negocial, de expungir as expresses civis e mercantis, substituindo-as por empresarial ou negocial. A
falta de coerncia, neste aspecto, que parece encontrar explicao no fato de terem sido outros os
autores dessas partes do Projeto, demonstrativo tambm de quanto continua viva a tradicional diviso
entre civil e comercial e como sero necessrios muitos esforos e tempo para a absoro da nova
realidade (A Teoria Jurdica da Empresa, cit., p. 402).
124
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O Cdigo Civil tambm veio dispor, de modo expresso, no captulo dos direitos
reais de garantia, sobre as modalidades do penhor industrial e penhor mercantil, que
so prprios da atividade comercial (art. 1.447). Essa norma estabelece modalidade
especfica de garantia pignoratcia com base em modelos ou figuras totalmente
ultrapassadas.212 A referncia, nessa norma, indstria do sal como susceptvel de
penhor mercantil demonstra, sem dvida, evidente descompasso tecnolgico na
redao da norma. O legislador continuou apegado a frmulas histricas ainda
prevalentes no sculo XIX. Independente das hipteses superadas previstas no art.
1.447 do Cdigo Civil quanto ao objeto da garantia real, o penhor mercantil j era
regulado no Cdigo Comercial de 1850 (arts. 271 a 279). O Cdigo de 2002 limitouse a reproduzir tais disposies histricas, em evidente descompasso com a realidade
presente.
Na parte do direito das sucesses, o Cdigo Civil admite a lavratura de
testamentos especiais, no seu art. 1.889, ao fazer meno possibilidade de
declaraes de ltima vontade do testador que se encontrar a bordo de aeronave
comercial, ou seja, sob o domnio especial de um representante de empresa area
comercial. Nessa situao excepcional, o comandante da aeronave poder delegar,
em situao de perigo, a outro tripulante, a responsabilidade de, eventualmente,
promover a lavratura de testamento de pessoa a bordo, estando esta pessoa
vinculada a uma relao comercial de transporte.
As remisses normativas anotadas e referenciadas neste ponto demonstram
que o legislador do Cdigo de 2002, seja por falta de consistncia lgica, seja por
equvoco na devida compatibilizao e harmonizao das normas que compem os
diversos livros, ttulos e captulos da nova legislao codificada, reconhece a
existncia de atividades mercantis especializadas, nos diversos campos do direito, em
contradio com a tentativa de supresso da natureza comercial das atividades
desempenhadas pelas empresas. O cdigo contm, como visto, um aglomerado de
disposies assistemticas e incoerentes, formando uma verdadeira colcha de
212
Cdigo Civil de 2002 - Art. 1.447. Podem ser objeto de penhor mquinas, aparelhos, materiais,
instrumentos, instalados e em funcionamento, com os acessrios ou sem eles; animais, utilizados na
indstria; sal e bens destinados explorao das salinas; produtos de suinocultura, animais destinados
industrializao de carnes e derivados; matrias-primas e produtos industrializados.
125
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213
126
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128
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Cempre,
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/
cadastroempresa/2011/ default_xls_ empresa.shtm, 24/04/2014.
219
BRASIL, IBGE - Estatstica do Cadastro Central de Empresas Cempre,
ftp://ftp.ibge.gov.br/Economia_ Cadastro_de_Empresas/2011/cempre2011.pdf, 24/04/2014.
220
BRASIL, IBGE Estatstica do Cadastro Central de Empresas Cempre,
ftp://ftp.ibge.gov.br/Economia_ Cadastro_de_Empresas/2011/cempre2011.pdf, 24/04/2014.
221
BRASIL, IBGE Estatstica do Cadastro Central de Empresas Cempre,
ftp://ftp.ibge.gov.br/Economia_ Cadastro_de_Empresas/2011/cempre2011.pdf, 24/04/2014.
129
Ivanildo Figueiredo
222 Waldemar Ferreira considerava que alm do ofcio medianeiro e profissional, mister se torna o seu
exerccio habitual com o intuito do lucro, por parte do intermedirio. Sendo o comrcio funo social,
constitui-se por srie contnua e renovada de negcios. Quem pratica ato medianeiro espordico,
mesmo com intuito de lucro, sem firme propsito de repeti-lo habitualmente, organicamente, no faz o
comrcio, nem no sentido geral, nem no particular. (Tratado de Direito Mercantil Brasileiro - Teoria
dos Atos de Comrcio, cit., p. 32).
130
Ivanildo Figueiredo
uma vez que o Cdigo Civil pretendeu estabelecer, em carter dogmtico e impositivo,
regras e disposies gerais para regulao das sociedades de fins econmicos, mas
isto sem considerar as peculiaridades e caractersticas das empresas na atual
realidade de mercado.
No campo das sociedades empresrias, o Cdigo Civil de 2002, ao revogar o
Decreto 3.708/1919, que regulava as sociedades por quotas de responsabilidade
limitada, instituiu um regime complexo e burocrtico que passou a disciplinar esse tipo
societrio, que representa a quase totalidade das empresas organizadas sob a forma
de sociedade, a partir do Cdigo de 2002 simplesmente denominada sociedade
limitada.223
Com efeito, a antiga sociedade por quotas de responsabilidade limitada sempre
foi considerada modelo adequado, satisfatrio, de organizao societria em razo de
sua simplicidade e pelo fato de assegurar aos scios a garantia da limitao da
responsabilidade em razo do passivo e das dvidas da sociedade e ampla liberdade
de dispor sobre o contedo do contrato social. Essas eram e sempre foram as
principais vantagens da sociedade por quotas.
O Decreto 3.708/1919, por ser uma lei que apenas estabelecia normas bsicas
para a regulao desse tipo societrio, deixava para a esfera volitiva e de autonomia
da vontade dos scios a determinao das regras pelas quais a sociedade deveria se
reger, como lei interna prpria e peculiar aos interesses particulares das pessoas que
a integravam.
Mas o Cdigo Civil de 2002, contrariando todas as experincias de regulao
da sociedade por quotas no direito comparado, passou a estabelecer um regime de
223
DREI
(http://drei.smpe.gov.br//
assuntos/estatisticas/ranking-das-juntas-comerciais-constituicao-alteracao-e-extincao-de-empresas,
22/04/2014), que sucedeu o DNRC, no contm dados sobre o tipo de sociedades constitudas
segundo os dados das Juntas Comerciais, no obstante o art. 1, inciso II, da Lei 8.934/1994 estabelea
que uma das finalidades do Sistema Nacional de Registro de Empresas Mercantis SINREM seja o de
cadastrar as empresas nacionais e estrangeiras em funcionamento no Pas e manter atualizadas as
informaes pertinentes.
131
maior complexidade para a disciplina desse tipo societrio, criando uma srie de
novas exigncias e limitando, de modo acentuado, a esfera da liberdade de
contratao entre os scios.
A terceira grande contradio decorre do problema de que o Cdigo de 2002,
na tentativa de unificar o direito das obrigaes, procurou abarcar, em sua ampla
generalizao civilista, uma srie de contratos comerciais que somente aplicam-se,
usualmente, s atividades mercantis, ao passo em que deixou de tratar de vrias
outras espcies de contratos, tpicos e atpicos, que so amplamente utilizados na
prtica das atividades comerciais exercidas pelas empresas.
Nessa esfera dos contratos mercantis, pretendeu inicialmente o Cdigo Civil de
2002 promover a unificao dos principais tipos de contratos em espcie, aplicveis
s relaes de contedo econmico (artigos 481 a 853). Todavia, a dualidade de
regime jurdico na esfera contratual permanecer patente e evidente diante da imensa
gama de contratos mercantis, tpicos e atpicos, que continuaro a fazer parte da
dinmica negocial das empresas, regulados por leis especficas, a exemplo dos
contratos financeiros e bancrios, dos contratos de bolsa de valores e mercadorias,
representao comercial autnoma, concesso comercial de veculos automotores,
arrendamento mercantil, franquia empresarial, bem como de outros tipos contratuais
no mbito das atividades de transporte e de seguros.
Em face da normatividade essencialmente mercantil desses contratos
regulados pela legislao extravagante ao Cdigo Civil, a tentativa, mesmo que
limitada,
de
unificao
do
direito
contratual,
apresenta-se
incompleta
132
Ivanildo Figueiredo
133
assim
procurou,
por
limitao
metodolgica
ou
mesmo
No tocante ao nome empresarial, o Cdigo Civil de 2002 basicamente limitouse a atualizar algumas normas constantes do Decreto 916, de 24/10/1890, que criou
o registro de firmas ou razes comerciais. Esse decreto, do incio da Repblica, foi
parcialmente revogado pela Lei 4.726/1965, que por sua vez foi revogada pela Lei
8.934/1994, ambas regulando o Registro do Comrcio. O Decreto 916/1890 ainda
vigorava em disposies residuais que no foram revogadas, restando praticamente
quase sem aplicabilidade. Apesar do Decreto 916/1890, no plano do direito positivo,
no mais vigorar, o Cdigo de 2002 tratou de repristinar algumas de suas normas com
a finalidade de disciplinar o nome das empresas, mas baseado em critrios superados
e divorciados da realidade comercial contempornea.
134
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135
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Decreto 916/1890
Cdigo Civil 2002
Art. 9. Cessando o exerccio do comrcio, Art. 1.168. A inscrio do nome empresarial
dissolvida e liquidada uma sociedade, a ser cancelada, a requerimento de qualquer
inscrio da firma ser cancelada.
interessado, quando cessar o exerccio da
atividade para que foi adotado, ou quando
ultimar-se a liquidao da sociedade que o
inscreveu.
Art. 10. O emprego ou uso ilegal de firma Art. 1.167. Cabe ao prejudicado, a qualquer
registrada ou inscrita dar direito ao dono tempo, ao para anular a inscrio do nome
de exigir a proibio desse uso e a empresarial feita com violao da lei ou do
indenizao por perdas e danos, alm da contrato.
ao criminal que no caso couber.
Arnoldo Wald, Comentrios ao novo Cdigo Civil, vol. XIV, cit., p. 783.
136
Ivanildo Figueiredo
regime de jurisdio estadual das juntas comerciais, enquanto a proteo das marcas
submete-se ao sistema nacional tutelado sob a regncia da Lei da Propriedade
Industrial (Lei 9.279/1996). Diante dessa jurisdio diferenciada, conflitos entre nomes
empresariais registrados nas Juntas Comerciais, com competncia limitada ao
respectivo Estado da Federao, e marcas registradas perante o Instituto Nacional da
Propriedade Industrial INPI, continuaro sendo objeto de repetidas demandas
judiciais, nas quais, invariavelmente, discute-se a prevalncia da marca sobre o nome
empresarial.225
Outro problema que o Cdigo de 2002 reintroduziu no direito positivo brasileiro,
e que j estava pacificado na doutrina e na jurisprudncia, diz respeito possibilidade
de alienao do nome empresarial. Pelo art. 1.164 do Cdigo Civil, o nome
empresarial no pode ser objeto de alienao, no distinguindo o legislador, para esse
efeito, entre a firma e a denominao. Ora, a doutrina j havia resolvido esse
problema, reconhecendo a possibilidade de alienao do nome empresarial,
especialmente quando formado como denominao ou nome de fantasia, com base
na teoria do direito patrimonial de Clvis Bevilacqua, em contraposio teoria do
direito pessoal defendida por Pontes de Miranda.
225
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232
No ms de setembro de 1940, quase toda a Europa ocidental encontrava-se subjugada pelo exrcito
alemo, governado pela ideologia nazista, que ocupava a Frana, Holanda, Blgica, Dinamarca e
Noruega, ao mesmo tempo em que se travava nos cus a Batalha da Inglaterra. A Itlia, a Espanha e
Portugal eram dominados por governos fascistas. Esse era o conturbado ambiente em que foi
outorgado, por decreto, o diploma regulatrio das sociedades annimas no Brasil.
142
Ivanildo Figueiredo
controle sobre suas atividades em territrio nacional.233 Mesmo que superada, quase
meio sculo depois, essa situao de crise blica e ideolgica entre as naes, e que
exigia, naquele momento, um controle governamental sobre as empresas
estrangeiras, caracterizado, mesmo, por componentes de xenofobia, o Cdigo Civil
de 2002 passou a reproduzir, de modo quase literal, as mesmas normas elaboradas
para aquela realidade pretrita totalmente convulsionada.
No quadro comparativo abaixo, essa concluso pode ser verificada com base
na confrontao de algumas das normas correspondentes entre si, para caracterizar
a quase absoluta identidade na redao dos dispositivos legais:
Decreto-Lei 2.627/1940
Art. 59. A sociedade annima ou
companhia que dependa de autorizao do
Governo para funcionar, reger-se- por
esta lei, sem prejuzo do que estabelecer a
lei especial.
Art. 59. Pargrafo nico. A competncia
para a autorizao sempre do Governo
Federal.
Art. 60. So nacionais as sociedades
organizadas na conformidade da lei
brasileira e que tm no pas a sede de sua
administrao
Art. 60. Pargrafo nico. Quando a lei
exigir que todos os acionistas ou certo
nmero deles sejam brasileiros, as aes
da companhia ou sociedade annima
revestiro a forma nominativa. Na sede da
sociedade ficar arquivada uma cpia
autntica do documento comprobatrio da
nacionalidade.
Art. 63. As sociedades annimas ou
companhias nacionais, que dependem de
autorizao do Governo para funcionar,
no podero constituir-se sem prvia
autorizao, quando seus fundadores
pretenderem recorrer a subscrio pblica
para a formao do capital.
233
Sobre a presena de empresas alems no Brasil durante o conflito da Segunda Guerra Mundial, as
acusaes de espionagem e a atuao do Governo Federal, Stanley E. Hilton, Sustica sobre o Brasil
A Histria da Espionagem Alem no Brasil, Rio de Janeiro, Civilizao Brasileira, 1977, passim.
143
Ivanildo Figueiredo
Decreto-Lei 2.627/1940
Art. 64. As sociedades annimas ou
companhias estrangeiras, qualquer que
seja o seu objeto, no podem, sem
autorizao do Governo Federal, funcionar
no pas, por si mesmas, ou por filiais,
sucursais, agncias, ou estabelecimentos
que as representem, podendo, todavia,
ressalvados os casos expressos em lei, ser
acionistas de sociedade annima brasileira
(art. 60).
Art. 66. As sociedades annimas
estrangeiras funcionaro no territrio
nacional com a mesma denominao que
tiverem no seu pas de origem, podendo,
entretanto, acrescentar as palavras do
Brasil ou para o Brasil.
Art. 67. As sociedades annimas
estrangeiras, autorizadas a funcionar, so
obrigadas a ter, permanentemente,
representante no Brasil, com plenos
poderes para tratar de quaisquer questes
e resolv-las definitivamente, podendo ser
demandado e receber citao inicial pela
sociedade.
Art. 68. As sociedades annimas
estrangeiras autorizadas a funcionar
ficaro sujeitas s leis e aos tribunais
brasileiros quanto aos atos ou operaes
que praticarem no Brasil.
144
Ivanildo Figueiredo
Ainda que o Cdigo Civil de 2002 tenha sido concebido sob ntida orientao
conservadora, como aquela prevalente durante o regime militar vigente no nosso Pas
(1964-1985), e conduzido por um jurista tambm conservador, como era assim
considerado o Professor Miguel Reale, no justificvel que normas concebidas sob
uma situao totalmente diversa, continuem a prevalecer, ainda que sob nova capa
de aparente legitimidade, incorporadas a um Cdigo em pleno sculo XXI.
As normas que disciplinam a situao das sociedades nacionais e estrangeiras
dependentes de autorizao, como constantes do Cdigo de 2002 evidenciam, de
modo evidente, conclusivo, a total defasagem histrica e ideolgica do Cdigo Civil,
cabendo, neste ponto, reconhecer que o legislador comportou-se displicentemente,
comodamente, alinhado a uma concepo ultrapassada, sem nenhuma preocupao
com os fatores histricos que modificaram a situao das atividades das empresas
estrangeiras na atual era de globalizao dos mercados.
A Constituio Federal de 1988 estabeleceu um conceito prprio para a
empresa brasileira, diferenciado do conceito de empresa brasileira de capital nacional,
distino essa constante do atual art. 1.126 do Cdigo Civil. A empresa brasileira,
segundo o art. 171, inciso I, da Constituio de 1988, era considerada como sendo
aquela constituda sob as leis brasileiras, com sede e administrao no Pas. Dentro
dessa definio enquadravam-se tanto as empresas controladas por brasileiros, como
as empresas constitudas sob nossas leis, mas controladas por acionistas
domiciliados no exterior, como o caso das empresas transnacionais. O inciso II
desse mesmo art. 171 da Constituio considerava como empresa brasileira de
capital nacional aquela cujo controle efetivo esteja em carter permanente sob a
titularidade direta ou indireta de pessoas fsicas domiciliadas e residentes no Pas.
Seguindo a tendncia neoliberal da economia, resultante do processo de
globalizao econmica, o art. 171 da Carta de 1988 foi revogado, integralmente, pela
Emenda Constitucional n 6, de 1995. Desse modo, a Constituio eliminou do nosso
ordenamento jurdico, a partir dessa emenda, qualquer distino entre empresa
nacional e empresa brasileira de capital nacional, em razo dos controladores
estarem, ou no, domiciliados no Brasil.
145
tratamento
diferenciado
entre
empresa
brasileira
empresa
234
146
Ivanildo Figueiredo
Uma das partes do livro do Direito de Empresa que foi objeto de crticas pela
doutrina especializada, tanto da rea jurdica como tambm entre os profissionais das
cincias contbeis, aquela que regula a escriturao e a contabilidade da empresa,
constante no Captulo IV, do Ttulo IV, relativo aos institutos complementares (artigos
1.179 a 1.195).
A doutrina considerou que no caberia a um cdigo dispor sobre matria
contbil a nvel to detalhado, assunto inerente legislao supletiva, prpria de
normas inferiores ou regulamentares de natureza empresarial e contbil.236 Outras
crticas foram feitas vista da desatualizao do Cdigo de 2002, que no incorporou
as modificaes introduzidas na legislao contbil desde a Lei 6.404/1976 (arts. 175
a 188).237
Como regulado no antigo Cdigo Comercial de 1850, este determinava, logo
aps definir comerciante e suas caractersticas, as obrigaes comuns a todos os que
exerciam o comrcio (artigos 10 a 20). Tais prescries limitavam-se a estabelecer as
obrigaes que todo comerciante deveria atender para a regularidade da sua situao
jurdica: manter uma contabilidade regular, levantar balano anual do ativo e passivo
e conservar os livros contbeis. Essas normas descreviam, ainda, os requisitos
intrnsecos e extrnsecos que deveriam ser observados na escriturao dos livros
contbeis.
O Cdigo Civil de 2002, ao normatizar os procedimentos da escriturao
contbil das empresas, realizou mera compilao das normas e dos procedimentos
contbeis constantes do Decreto-Lei 305/1967 e do Decreto-Lei 486/1969, os quais,
236
Mario Cozza, Novo Cdigo Civil: Do Direito de Empresa, Porto Alegre, Sntese, 2002.
Ludio Camargo Fabretti, Direito de Empresa no novo Cdigo Civil, So Paulo, Atlas, 2003, p.
77.
237
147
Ivanildo Figueiredo
por sua vez, no passam de simples atualizao dos artigos do Cdigo Comercial de
1850. Nada ou quase nada inovou, portanto, sobre a matria.
Em termos gerais, a disciplina do Cdigo de 2002 estabelece a obrigatoriedade
de todo empresrio ou sociedade empresria adotar sistema uniforme de
contabilidade, com base na escriturao do livro dirio, e de levantar, a cada ano, um
balano patrimonial representativo da posio do ativo e do passivo da empresa.
A contabilidade compreende o sistema de lanamento e registro dos fatos
econmicos capazes de modificar a situao patrimonial da empresa. De modo
resumido, a contabilidade o sistema de informao que controla o patrimnio de
uma entidade.238 A contabilidade representa, portanto, o sistema de registro dos fatos
patrimoniais, enquanto a escriturao o mtodo de lanamento desses registros nos
livros prprios.
Ao final de cada exerccio social, a empresa obrigada a elaborar as suas
demonstraes financeiras, as quais devero exprimir com clareza a situao do
patrimnio da companhia na data do trmino do exerccio social (posio esttica) e
as mutaes patrimoniais ocorridas no exerccio ento findo (posio dinmica).239
Apesar da Lei 6.404/1976 referir-se s sociedades por aes, disciplinando seu
regime jurdico prprio, as normas relativas contabilidade e demonstraes
financeiras das companhias (artigos 175 a 188), so aplicveis aos demais tipos
societrios, a partir dos princpios de contabilidade geralmente aceitos (Lei
6.404/1976, art. 177).240
Cabe ressaltar que a denominao escriturao revela-se defasada e
inapropriada para disciplinar os conceitos e procedimentos contbeis das empresas
na atualidade. Desde a Lei 6.404/1976, os resultados da contabilidade passaram a
ser denominados demonstraes financeiras, conceito mais largo, abrangente e
adequado para definir o sistema de clculo e expresso do desempenho financeiro,
econmico e patrimonial das empresas.241 Outra crtica que deve ser posta neste ponto
238
Clvis Luis Padoveze, Manual de Contabilidade Bsica, So Paulo, Atlas, 5 edio, 2004, p. 29.
Modesto Carvalhosa e Nilton Latorraca, Comentrios Lei de Sociedades Annimas, vol. 3, So
Paulo, Saraiva, 1997, p. 554.
240 Jos Edwaldo Tavares Borba, Direito Societrio, Rio de Janeiro, Renovar, 5 edio, 1999, p. 404.
241 A expresso escriturao revela-se imprpria e defasada porque, dentro desse captulo, esto no
s a escriturao mas tambm as demonstraes contbeis, sendo que o mais correto o que faz a
239
148
Ivanildo Figueiredo
que um Cdigo Civil, diploma que contm normas gerais, no deveria descer s
mincias dos procedimentos da contabilidade e da escriturao mercantil. Assim, se
o Cdigo de 2002 teve como objetivo importar conceitos e procedimentos detalhados
de contabilidade empresarial, os quais somente caberiam na legislao especial, de
outro lado incorreu em grave atecnia, ao confundir o procedimento da escriturao
com o conceito mais amplo de contabilidade.242
De modo abrangente, o sistema contbil deve ser adotado por qualquer tipo de
entidade que possua patrimnio prprio, no sendo exclusivo das sociedades
empresrias. Uma fundao ou associao de fins no econmicos dever, da
mesma maneira que as sociedades empresrias, manter uma estrutura contbil e um
regime de escriturao apto a registrar as suas variaes patrimoniais. Contudo, o
Cdigo de 2002 apenas se refere, vagamente, sem qualquer detalhamento,
competncia da assemblia geral das associaes no econmicas para a aprovao
das contas dos seus administradores (art. 59, inciso III). Nenhum sistema contbil
especfico regulou o Cdigo no que tange s associaes e fundaes, quando, por
uma questo de coerncia, deveria ter assim disciplinado, ainda que fosse para
mandar aplicar, por analogia, no que coubesse, as normas contbeis das sociedades
empresrias.
Ao especificar um regime contbil necessrio e obrigatrio, apenas, ao
empresrio e s sociedades empresrias, o Cdigo de 2002 revela a sua preocupao
de abarcar, nas suas normas, institutos especficos da legislao mercantil, ao passo
que deixou de estabelecer os procedimentos contbeis que devem ser, igualmente,
observados pelas demais formas associativas corporativas, assim como nas
fundaes de direito privado (art. 62).
Na disciplina da contabilidade da empresa, o Cdigo de 2002 no apresenta,
como visto, nada de novo. Pelo contrrio. Ele reproduz, com outras palavras, textos
do Cdigo Comercial de 1850 e do Decreto-Lei 486/1969. A base referencial desse
captulo, tambm, remonta ao Cdigo Civil italiano de 1942, que nos seus artigos
Lei das S/A ao cham-lo de Exerccio Social e Demonstraes Financeiras (Eliseu Martins,
Atrocidades Contbeis no Novo Cdigo Civil, Boletim SIA Sistema de Informaes da Associao
Brasileira de Companhias Abertas - ABRASCA, Rio de Janeiro, n 612, 23/09/2002, p. 5).
242 Amador Paes de Almeida, Direito de Empresa no Cdigo Civil, So Paulo, Saraiva, 2004, p. 236.
149
2.214 a 2.221 trata da escriturao contbil (Delle scritture contabili), e nos artigos
2.423 a 2.435 dispe sobre a obrigao e critrios de elaborao do balano
patrimonial (Del bilancio).243
Alm da inadequao na regulao desses procedimentos contbeis de
natureza estritamente mercantil, o Cdigo Civil desce a um nvel de detalhamento
absolutamente desnecessrio. Por exemplo, assim verifica-se no art. 1.187, que trata
dos critrios de avaliao dos bens da empresa na
elaborao do inventrio
243 Mrio Srgio Milani, Da escriturao no novo Cdigo Civil, So Paulo, Juarez de Oliveira, 2004,
p. 8.
244 Cdigo Civil de 2002 - Art. 1.187. Na coleta dos elementos para o inventrio sero observados os
critrios de avaliao a seguir determinados: (...) II - os valores mobilirios, matria-prima, bens
destinados alienao, ou que constituem produtos ou artigos da indstria ou comrcio da empresa,
podem ser estimados pelo custo de aquisio ou de fabricao, ou pelo preo corrente, sempre que
este for inferior ao preo de custo, e quando o preo corrente ou venal estiver acima do valor do custo
de aquisio, ou fabricao, e os bens forem avaliados pelo preo corrente, a diferena entre este e o
preo de custo no ser levada em conta para a distribuio de lucros, nem para as percentagens
referentes a fundos de reserva. O art. 183 da Lei 6.404/1976, ao dispor sobre situao contbil
equivalente prevista nesse art. 1.187, prescreve: Art. 183. No balano, os elementos do ativo sero
avaliados segundo os seguintes critrios: (...) II - os direitos que tiverem por objeto mercadorias e
produtos do comrcio da companhia, assim como matrias-primas, produtos em fabricao e bens em
almoxarifado, pelo custo de aquisio ou produo, deduzido de proviso para ajust-lo ao valor de
mercado, quando este for inferior.
150
Ivanildo Figueiredo
Captulo 4
Conceitos fundamentais do direito de empresa
Srgio Campinho, O direito de empresa luz do novo Cdigo Civil, op. cit., p. 13.
Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, So Paulo, Revista dos
Tribunais, 4 edio, 1983, Tomo XV, p. 355.
246
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Ivanildo Figueiredo
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249 Empresa a atividade econmica organizada para a produo ou circulao de bens ou servios.
Sendo uma atividade, a empresa no tem a natureza jurdica de sujeito de direito nem de coisa. Em
outros termos, no se confunde com o empresrio (sujeito) nem com o estabelecimento empresarial
(coisa). (Fbio Ulhoa Coelho, Curso de Direito Comercial, vol. 1, cit., p. 32/33).
250 Tullio Ascarelli, Iniciao ao Estudo do Direito Mercantil, Sorocaba, Minelli, 2007, p. 365.
251 Fbio Ulhoa Coelho, Curso de Direito Comercial, vol. 1, cit., p. 32/33.
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255
O Cdigo Comercial francs de 1807 (art. 632) considerava como ato de comrcio toute entreprise
de manufactures, de commission, de transport par terre ou par eau, e tambm toute entreprise de
fornitures, dagence, bureau daffaires, tablissements de ventes lencan, de spetacles publics.
256 Waldemar Ferreira, Tratado de Direito Mercantil Brasileiro, vol. II, Teoria dos Atos de Comrcio,
cit., 191.
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257
Charles Lyon-Caen, & Louis Renault, Manuel de Droit Commercial, Paris, Librairie Gnrale de
Droit et de Jurisprudence, 11 editin, 1913, p. 35.
258 Somente para compreender a funo unificadora dos institutos comercialistas que a empresa e
inversamente, tambm o empresrio que exercita a atividade executa, bastar por um momento
repensar a circunstncia de que, no Cdigo de Comrcio abrogado, a empresa era somente um ato de
comrcio ao lado dos outros atos elencados no artigo 3 e vinha, por isso, concebida no sob um perfil
da atividade, mas sob aquele da modalidade de exerccio do ato, enquanto hoje a empresa identificase com a atividade desenvolvida pelo empresrio com certas caractersticas, e, por isso, s so
discutidos os problemas de qualificao dessa atividade. (Vincenzo Buonocore, LImpresa - Trattato
di Diritto Commerciale, cit., p. 50).
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Cdigo Comercial de 1850 - Art. 4 - Ningum reputado comerciante para efeito de gozar da
proteo que este Cdigo liberaliza em favor do comrcio, sem que se tenha matriculado em algum
dos Tribunais do Comrcio do Imprio, e faa da mercancia profisso habitual. (...) Art. 9. O exerccio
efetivo do comrcio para todos os efeitos legais presume-se comear desde a data da publicao da
matrcula.
289 No regime inicial do Cdigo de 1850, a matrcula dos comerciantes era formalizada perante os
Tribunais de Comrcio do Imprio, localizados no Rio de Janeiro, Bahia, Pernambuco e Maranho, e
nas Conservatrias do Comrcio em algumas das cidades nas Provncias, como Rio Grande, Santos e
Parnaba. Com a extino desses Tribunais e sua unificao com a justia comum, em 1875, o registro
dos comerciantes passou a ser realizado pelas Juntas Comerciais. Posteriormente, face o Decreto 916,
de 1890, o regime de matrcula foi abolido e substitudo pelo registro facultativo da firma nas Juntas
Comerciais. Com a proclamao da Repblica, e a partir da organizao dos Estados da Federao,
cada um dos Estados passou a deter competncia para organizar as juntas e inspetorias comerciais,
reservando a Constituio de 1934, desde ento, a competncia privativa da Unio para legislar sobre
matria de registro do comrcio. (Waldemar Ferreira, Tratado de Direito Mercantil Brasileiro, vol. III,
cit., p. 36/37).
290 Regulamento 737/1850 - Art. 17. Suscitando-se questo no Juzo Comercial sobre a profisso
habitual do comerciante matriculado (art. 4 Codigo), ser a contestao decidida vista de atestados
do Tribunal do Comrcio sob informao da Praa, e contra esse atestado inadmissvel qualquer
prova ou contestao. Art. 18. Contestando-se a qualidade do comerciante no matriculado, ser a
contestao decidida conforme as regras gerais de prova.
164
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291
J. X. Carvalho de Mendona, Tratado de Direito Comercial Brasileiro, vol. II, cit., p. 23.
J. X. Carvalho de Mendona, Tratado de Direito Comercial Brasileiro, vol. II, cit., p. 16/22.
293 No sistema alemo o exerccio do comrcio classificado em seis grupos de atividades, conforme
as caractersticas da explorao: 1) Musskaufleute neste grupo principal se enquadram aqueles que
exercem atividade tpica mercantil, de comrcio, indstria, bancos e de transportes, sempre obrigados
ao registro; 2) Sollkaufleute diz respeito queles que no desempenham uma atividade comercial,
mas que adotam uma estrutura organizacional prpria do comerciante; 3) Kannkaufleute refere-se ao
exerccio de atividade rural, e assim no mercantil, mas que em virtude das caractersticas comerciais
das suas operaes podem ser qualificados como comerciantes; 4) Vollkaufleute categoria reservada
aos que exercem atividade mercantil de modo amplo; 5) Minderkaufleute compreende os pequenos
comerciantes e artesos que adotam um modo simples de organizao mercantil; 6) Formkaufleute
so os comerciantes assim qualificados apenas em razo de adotar uma forma mercantil para
explorao de atividade no considerada materialmente como de natureza comercial. (Walter Alvares,
Curso de Direito Comercial, cit., p. 100/101).
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Cdigo Comercial da Frana de 1807 Art. 632. La loi rpute actes de commerce tout achat de
denres et marchandise pour les revendre soit en nature, soit aprs les avoir travailles et mises en
oeuvres, ou mme pour en louer simplement lusage; - toute entreprise de manufactures, de comission,
de transport par terre ou par eau; - toute entreprise de fournitures, dagences, bureaux daffaires,
tablissements de ventes a lencan, de spectacles publics; - toute les operations de banques publiques;
- toutes obligations entre ngocians, marchands et banquiers; - entre toutes personnes, les lettres de
change, ou remises dargent faites de place en place.; Traduo livre: A lei considera atos de comrcio
Todas as compras de gneros e mercadorias para revenda ou em espcie, ou aps ter sido
processada, ou mesmo apenas para alugar o uso; - Toda empresa de fbrica, de comisso, de
transporte por terra ou por gua; - Toda empresa de fornecimento, agncias, escritrios comerciais,
vendas por leilo e de espetculos pblicos; - Todas as operaes de bancos pblicos; - Todas as
obrigaes entre os comerciantes, mercadores e banqueiros; - Entre todas as pessoas, as letras de
cmbio, ou o dinheiro para remessa de um lugar para outro.
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302
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referentes diretamente ao exerccio normal da indstria mercantil, como tpicos atos de mercancia,
como a compra e venda mercantil, operaes bancrias, as manufaturas e empresas de fbrica, de
expedio, consignao e transporte de mercadorias; b) atos de comrcio por dependncia ou
conexo, so aqueles praticados por comerciantes, derivados de atos ilcitos por efeito ou por
dependncia do exerccio do comrcio, como as aes de responsabilidade civil; c) atos de comrcio
por fora ou autoridade de lei, so assim considerados comerciais porque a lei assim quis, assim
determinou, independente de ser praticado por comerciante ou no, como as operaes com ttulos
de crdito. (Tratado de Direito Comercial Brasileiro, vol. I, cit., p. 455; 460; 514; 521).
306 Alfredo Rocco, Princpios de Direito Comercial, cit., p. 193.
307 Alfredo Rocco, Princpios de Direito Comercial, cit., p. 190.
171
Mercado
Mercadoria
Mercancia
Mercante
Mercantil
Mercador
O mercado, ideia que hoje representa a reunio das empresas no espao mundial, fsico, virtual ou
internacional, era antigamente caracterizado como um local especfico, onde os mercadores reuniamse, luz do dia, na praa principal da cidade, para, ali, oferecer seus produtos e comercializar suas
mercadorias, para o pblico em geral e para outros mercadores varejistas ou retalhistas. O objeto
central dessas relaes econmicas concentrava-se na mercadoria, bem mvel por excelncia, como
produto ou bem passvel de troca no ambiente de mercado. O exerccio dessa atividade de oferta e
venda de mercadorias, no mercado, compreende a mercancia, funo de troca com carter profissional,
e cujo conjunto de operaes possui carter ou natureza mercantil. Os auxiliares dos mercadores no
exerccio da funo mercantil, eram designados como agentes auxiliares mercantes, como
denominao caracterstica, por exemplo, da marinha mercante.
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315
Fbio Ulhoa Coelho, Curso de Direito Comercial, vol. 1, cit., pg. 64.
Fbio Ulhoa Coelho, Curso de Direito Comercial, vol. 2, cit., pg. 24.
317 Observa Fbio Ulhoa Coelho que a pessoa jurdica empresria cotidianamente denominada
empresa, e os seus scios so chamados empresrios. Em termos tcnicos, contudo, empresa a
atividade, e no a pessoa que a explora; e empresrio no o scio da sociedade empresarial, mas a
prpria sociedade. necessrio, assim, acentuar, de modo enftico, que o integrante de uma
sociedade empresria (o scio) no empresrio; no est, por conseguinte, sujeito s normas que
definem os direitos e deveres do empresrio. (Curso de Direito Comercial, vol. 1, cit., p. 78/79).
318 Sob a concepo estritamente tecnicista, no seria ento correto afirmar: Antonio Ermrio de
Moraes foi um grande empresrio brasileiro. Mas o empresrio, nesse conceito restritivo, seria a
sociedade (S.A. Indstrias Votorantim) que ele controlava e representava. No seria tambm correto
dizer: Steve Jobs foi um empresrio visionrio, mas sim a Apple Corporation uma empresria
visionria. No mnimo, tal interpretao soa contraditria e carente de lgica para a compreenso leiga
daquelas pessoas, scios controladores ou dirigentes, que fazem a empresa: o prprio empresrio.
Bastante apropriada era a opinio do jurista suo Walther Munzinger, que elaborou o projeto de Cdigo
Comercial da Sua de 1864, quando este afirmava que as disposies da lei comercial no devem
ser para o comerciante hierglifos somente decifrveis sob o dedo do jurisconsulto. (Motifs du project
de code de commerce suisse, apud Carvalho de Mendona, Tratado de Direito Comercial
Brasileiro, vol. I, cit. p. 429).
319 Apenas em sentido estrito, a empresa, como atividade, no se confunde com a sociedade, que
representa a forma da empresa. Esses conceitos so tecnicamente diferentes, na medida em que a
empresa somente existe quando estiver, de fato, desempenhando o seu objeto mercantil a partir do
capital aplicado. Como adverte Srgio Campinho, poder existir sociedade sem empresa, ainda que
seu objeto compreenda atividade prpria de empresrio, bastando, para isso, que seus atos
constitutivos sejam inscritos na Junta Comercial sem, de fato, entrar em atividade, deixando de exercer
a explorao do objeto. (O Direito de Empresa luz do novo Cdigo Civil, cit., p. 14). No mesmo
sentido, Rubens Requio, ao considerar que, apesar de formalmente constituda, enquanto a sociedade
estiver inativa, a empresa no surge. (Curso de Direito Comercial, vol. 1, cit., p. 61).
316
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O comerciante, para o direito portugus, desde essa poca, portanto, pode ser
tanto a pessoa natural como a pessoa jurdica. De acordo com os comentrios de
Antonio Menezes Cordeiro a esse dispositivo, as sociedades que tenham por objeto
a prtica de atos comerciais assumem uma das formas tipificadas no Cdigo de
Sociedades Comerciais (CSC) e so comerciantes.320
No seu sempre citado ensaio Perfis da Empresa, Alberto Asquini entendia que,
a partir da anlise do art. 2.082 do Cdigo Civil italiano, empresrio quem exerce,
isto , o sujeito de direito (pessoa fsica ou jurdica, pessoa jurdica privada ou pblica)
que exerce em nome prprio atividade econmica organizada.321 Assim, a pessoa
jurdica seria, ela mesma, a empresria, como sujeito de direito, representada por
seus rgos sociais dirigentes, integrados por pessoas fsicas. E so essas pessoas
fsicas, naturais, de carne e osso, aquelas que decidem, coordenam e respondem,
de fato e concretamente, pela sociedade comercial.
Da anlise desse dispositivo constante do art. 2.082 do Cdigo de 1942, bem
como de outros que o seguem, no possvel extrair, diretamente, a afirmao de
que o empresrio, alm de ser caracterizado como pessoa fsica ou natural, tambm
definido como pessoa jurdica. Contudo, em sentido diverso, o art. 2.086 do Cdigo
Civil italiano enuncia, ao tratar da direo e da hierarquia na empresa, que
L'imprenditore il capo dell'impresa e da lui dipendono gerarchicamente i suoi
collaboratori.322 Bem, cada empresa, sob tal orientao, somente pode ter uma
cabea, um nico chefe dirigente (capo). Dessa norma expressa, decorre a concluso
de que no pode ser cabea ou chefe da empresa, no sentido exato da expresso, a
320
Antonio Menezes Cordeiro, Direito Comercial, Coimbra, Almedina, 3 edio, 2012, p. 276.
Alberto Asquini, Perfis da Empresa, cit., p. 114.
322 Cdigo Civil da Itlia de 1942 Art. 2.086. O empresrio o cabea da empresa, e dele dependem
hierarquicamente os seus colaboradores.
321
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pessoa jurdica, criao artificial do direito, ainda que considerada, para determinados
efeitos, ente equiparado pessoa natural.
A pessoa jurdica, como assim exposta na teoria clssica de Savigny, era
considerada como fico do direito, criao artificial do Estado, ele mesmo uma
pessoa jurdica por excelncia.323 A pessoa jurdica consiste em uma fico jurdica
porque somente existe por determinao da lei e dentro dos limites por ela fixados.324
Como fico do direito, a pessoa jurdica no tem existncia concreta, como o
ser humano, por isso uma pessoa moral, incorprea, no dizer de Bevilaqua.325 No
direito romano, apenas a pessoa podia ser sujeito de direito, aplicando-se,
especialmente no direito penal, o brocardo societas delinquere non potest.326
A doutrina sempre considerou, todavia, a partir da lei, em alguns casos, e da
interpretao extensiva, em outros, que comerciante ou empresrio tanto pode ser a
pessoa fsica (firma individual) como a pessoa jurdica (sociedade comercial ou
empresria). Em sentido geral, como afirma Fbio Ulhoa Coelho, o empresrio uma
pessoa, e essa pessoa pode ser tanto a fsica, que emprega seu dinheiro e organiza
a empresa individualmente, como a jurdica, nascida da unio de esforos de seus
integrantes.327
323
Clvis Bevilaqua, Teoria Geral do Direito Civil, Rio de Janeiro, Francisco Alves, 7 edio, 1955,
p. 172.
324 Friederich Karl Von Savigny, Droit Romain, 85, apud Clvis Bevilaqua, Teoria Geral do Direito
Civil, cit., p. 154.
325 Sobre a ideia de pessoa jurdica, pontifica Clvis: Assim, naturalmente, se constituem dois gneros
de pessoas: as corpreas ou fsicas e as morais ou jurdicas. Umas e outras so igualmente reais; a
distino est em que umas so dotadas, naturalmente, de razo, ao passo que, s outras, a
racionalidade parcialmente adquirida, mediante um arranjo especial do homem; umas recebem o seu
organismo da prpria natureza, ao passo que as outras conseguem a forma orgnica, porque as
penetra a natureza humana. (...) A pessoa jurdica no um homem fictcio mas pessoa real criada
pela ordem jurdica. A noo de pessoa mais extensa do que a de homem. (Teoria Geral do Direito
Civil, cit., p. 170).
326 A sociedade, no direito romano clssico, no era pessoa de direito porque existia apenas em razo
e vinculada vontade de seus scios. Institutas de Justiniano: Livro Terceiro - Ttulo XXV, Da
Sociedade: A sociedade dura enquanto os scios permanecerem de acordo; no momento em que um
deles a renunciar, a sociedade se dissolve ( 4); A sociedade se dissolve tambm no caso de morte
do scio, pois aquele que celebra uma sociedade escolhe para si uma determinada pessoa. ( 5).
(Flavius Petrus Sabbatius Justinianus, Institutas do Imperador Justiniano, cit., p. 174).
327 Fbio Ulhoa Coelho, Curso de Direito Comercial, vol. 1, cit., p. 78.
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340 Destacando que somente a pessoa natural exerce a sua vontade, e no a pessoa jurdica atravs
da qual a vontade da pessoa fsica se manifesta, Jos de Oliveira Ascenso esclarece: No tem
interesse a teoria orgnica de Gierke, para quem a pessoa colectiva seria um organismo real, com
vontade e outros atributos. Unidade orgnica so s os seres vivos. A pessoa colectiva uma unidade
de ordem ou de relao, s apreensvel no plano intelectual. Direito Civil Teoria Geral, vol. 1,
Coimbra, Coimbra Editora, 2 edio, 2000, p. 229.
341 Eis porque me parece impossvel referir a subjetividade da atividade a quem no seja sujeito dos
atos dos quais resulta a mesma atividade, e sujeito (juridicamente) dos atos (dos quais resulta a
atividade) aquele que, com base nesses, adquire direitos e assume obrigaes, independentemente
da iniciativa (que, por exemplo, poder vir do representante e no do representado, embora sendo o
representado quem adquire direitos e assume obrigaes), ou tambm do risco econmico (que, no
caso concreto, poder ser de outrem). (Tullio Ascarelli, O empresrio, cit., p. 185).
342 Tullio Ascarelli, O empresrio, cit., p. 185.
343 Tullio Ascarelli, O empresrio, cit., p. 186.
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Sentido lato
Aspecto formal denominao legal
Sociedade empresria
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c)
f)
345
Srgio Campinho, O direito de empresa luz do novo Cdigo Civil, cit., p. 15.
Fbio Ulhoa Coelho, Curso de Direito Comercial, vol. 1, cit., p. 90/91.
347 Fbio Konder Comparato, Direito Empresarial, So Paulo, Saraiva, 1995, p. 17.
348 Rubens Requio, Curso de Direito Comercial, vol. 1, cit., p. 76.
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tambm a fonte primria para o seu sustento e da sua famlia. A profisso importa na
dedicao exclusiva ou quase exclusiva a uma atividade, com carter de habitualidade
e permanncia.352
Para o exerccio do comrcio, faz-se necessrio um grau elementar de
conhecimentos e habilidades especficas. Com efeito, a lei no exige do empresrio
um grau de instruo mnimo, por no se tratar de profisso tcnica ou cientfica
regulamentada. No sendo profisso regulamentada, seu exerccio livre e acessvel
a qualquer pessoa. O enquadramento do empresrio como profissional resulta,
todavia, do exerccio regular e formal da atividade empresarial, conforme assim venha
a ser reconhecido e conferido pela Junta Comercial, rgo tambm responsvel pela
expedio da carteira de exerccio profissional.353
A funo refere-se atividade em si, realizao de atos prprios e concretos
dirigidos a determinado fim, executados pelo empresrio, por si e por seus prepostos
e colaboradores escolhidos, orientados e remunerados por ele, como titular da
empresa.
A atividade compreende a execuo constante, repetida e especializada de
uma srie de atos e negcios de contedo e efeitos jurdicos, dentro da esfera
profissional do empresrio que a realiza. Enquanto o empresrio dispuser de recursos
produtivos e utilizar seu capital na execuo do seu objeto, podemos afirmar que
existe empresa, como ente dinmico. Esgotadas as fontes de recursos e cessada a
atividade de aplicao e reproduo do capital, a empresa tende, inevitavelmente, a
desaparecer.
A natureza da atividade do empresrio econmica, ou seja, rene de modo
simultneo a produtividade, a onerosidade e a lucratividade como elementos prprios,
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bens
servios,
necessrios
ao
ciclo
desenvolvimentista,
de
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Na decomposio dos elementos extrados do art. 2.082 do Cdigo italiano de 1942, Francesco
Ferrara Junior e Francesco Corsi destacam como caractersticas essenciais na definio de
empresrio: a) o exerccio de atividade econmica com a finalidade de produo ou circulao (troca)
de bens ou de servios; b) que essa atividade seja organizada; e c) desempenhada de modo
profissional. (Gli Imprenditori e Le Societ, cit., p. 28). Do mesmo modo que Ferrara Junior e Corsi
comentaram com base no Cdigo italiano de 1942 (art. 2.082), Sylvio Marcondes Machado, relator do
livro do direito de empresa do Cdigo Civil de 2002, repetia que, no conceito do art. 966 do Cdigo
Civil, conjugam-se esses trs elementos para formar a noo de empresrio: Em primeiro lugar, tratase de atividade econmica, isto , atividade referente criao de riquezas, bens ou servios. A
economicidade da atividade est na criao de riquezas; de modo que aquele que profissionalmente
exerce qualquer atividade, que no seja econmica ou no seja atividade de produo de riquezas,
no empresrio. Em segundo lugar, esta atividade deve ser organizada, isto , atividade em que se
coordenam e se organizam os fatores da produo: trabalho, natureza, capital. a conjugao desses
fatores, para produo de bens ou de servios, que constitui a atividade considerada organizada.
Finalmente, ela uma atividade profissional: Considera-se empresrio quem exerce
profissionalmente..., isto , a habitualidade da prtica da atividade, a sistemtica dessa atividade e
que, por ser profissional, tem implcito que exercida em nome prprio e com nimo de lucro. Essas
duas ideias esto implcitas na profissionalidade do empresrio. (Questes de direito mercantil, So
Paulo, Saraiva, 1977, p. 10/11).
358 Giuseppe Auletta e Niccol Salanitro, Diritto Commerciale, Milano, Giuffr, 14 ed., 2003, p. 4-7.
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Enunciados das Jornadas de Direito Civil do Conselho da Justia Federal - Enunciado 198 - Art.
967: A inscrio do empresrio na Junta Comercial no requisito para a sua caracterizao,
admitindo-se o exerccio da empresa sem tal providncia. O empresrio irregular rene os requisitos
do art. 966, sujeitando-se s normas do Cdigo Civil e da legislao comercial, salvo naquilo em que
forem incompatveis com a sua condio ou diante de expressa disposio em contrrio. Enunciado
199 Art. 967: A inscrio do empresrio ou sociedade empresria requisito delineador de sua
regularidade, e no de sua caracterizao.
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Segundo Jos Ignacio Romero, sociedade irregular aquela que pertencendo a um dos tipos
previstos em lei, tem um vcio de forma, e sociedade de fato aquela que simplesmente existe como
tal, mas carece absolutamente de instrumentalizao: de fato. (Sociedades irregulares y de hecho,
Buenos Aires, Depalma, 1982, p. 77/78).
367 No que tange sociedade comercial ou empresria, a natureza do registro de empresa diferente
do comerciante ou empresrio individual, porque aquele tem natureza constitutiva para a criao da
pessoa jurdica societria (CC, art. 45), e no carter estritamente declaratrio. A sociedade empresria
que no registrar seu contrato social na Junta Comercial fica caracterizada e regulada como sociedade
em comum, modelo transitrio, de acordo com o artigo 986 do Cdigo Civil: Enquanto no inscritos os
atos constitutivos, reger-se- a sociedade, exceto por aes em organizao, pelo disposto neste
Captulo, observadas, subsidiariamente e no que com ele forem compatveis, as normas da sociedade
simples.
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368
Supremo Tribunal Federal - STF, 1 Turma, RE 37.099/SP, Relator Ministro Cndido Motta Filho,
julgado em 27/01/1958, RTJ n 5, p. 222/223.
369 O registro tem efeito declaratrio e no constitutivo, visto que apenas declara a condio de
empresrio individual, tornando-a regular, pois a qualidade de empresrio requer a prtica efetiva da
atividade empresarial, que a caracterstica primordial de sua profisso. O registro declara a qualidade
de empresrio (RTJ, 5:222) por gerar presuno juris tantum de que o empresrio exerce,
regularmente, a atividade empresarial. (Maria Helena Diniz, Curso de Direito Civil Brasileiro
Direito de Empresa, So Paulo, Saraiva, 2008, p. 85).
370 A inscrio dos empresrios comerciais no registro de empresa tem uma funo de publicidade
declaratria, no sentido de que a inscrio tem uma eficcia positiva e uma eficcia negativa. A primeira
opera em vantagem dos empresrios, porquanto a ignorncia dos fatos, dos quais a lei prescreve a
inscrio, no pode ser oposta pelos terceiros a partir do momento em que a inscrio ocorrer. A
eficcia negativa opera ao contrrio, em prejuzo dos empresrios, porquanto se no esto inscritos os
fatos dos quais a lei exige a inscrio, esses no podem ser opostos a terceiros, a menos que os
empresrios provem que aqueles tenham tido igualmente conhecimento. (Giuseppe Auletta e Niccol
Salanitro, Diritto Commerciale, cit. p. 24).
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371
Lei 8.934/1994 Dispe sobre o Registro Pblico de Empresas Mercantis e Atividades Afins - art.
1, inciso I; art. 32, inciso II.
372 Para os atos jurdicos serem oponveis a terceiros, a lei dispe de instrumentos idneos de
publicidade como a transcrio e a maior razo para a satisfao desta exigncia surge para a
empresa, cuja atividade, sendo institucionalmente destinada ao mercado, , por esse motivo, fonte de
uma densa rede de relaes com terceiros. Para a empresa, de fato, essa exigncia dupla: para a
empresa comunicar as suas atividades a todos aqueles que entram em contato com ela, os terceiros fornecedores, clientes, credores para que estes fiquem protegidos por meio da informao sobre os
acontecimentos mais importante desde o nascimento da empresa. Para atingir estes objetivos, o
legislador de 42 intituiu o registro das empresas, em que, em nome da concepo ento vigente,
ordenou que se inscrevessem dentro de trinta dias da aquisio da categoria de empresrio, todos os
empresrios comerciais, pessoas fsicas e sujeitos diversos das pessoas fsicas, e outros, de acordo
com as regras que regem a matria (artigos 2.196, 1, 2.200 e 2.201), e que nesse registro tambm
fossem anotados os acontecimentos da vida da empresa, como a localizao, o objeto, seus auxiliares
ou prepostos, e todas as modificaes desses elementos, at a cessao da empresa (Art 2.196., 1,
2.197, 2.198, 2.206). Vincenzo Buonocore, Istituzioni di Diritto Commerciale, cit., p. 58.
373 Tullio Ascarelli, Iniciao ao Estudo do Direito Mercantil, cit., p. 312/313.
374 Tullio Ascarelli, cit., p. 313.
375 Tullio Ascarelli, cit., p. 313.
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Apesar da obrigatoriedade prevista no art. 967, Arnoldo Wald entende que a sano para a
irregularidade do exerccio da atividade empresarial, assim como ocorria no comerciante regular, deve
ser buscada na rea comercial, isto , retirando do empresrio irregular o direito a alguns privilgios
oriundos da sua condio de empresrio, como aqueles relativos falncia ou responsabilidade
patrimonial, por exemplo. (Comentrios ao novo Cdigo Civil - Livro II Do Direito de Empresa,
Vol. XIV, cit., p. 9/10). Para Fbio Ulhoa Coelho, A falta de registro na Junta Comercial importa,
tambm, a aplicao de sanes de natureza fiscal e administrativa, como, por exemplo, a
impossibilidade de inscrio no Cadastro Nacional de Pessoas Jurdicas (CNPJ), nos cadastros das
Fazendas Pblicas Estaduais e Municipais, no Instituto Nacional do Seguro Social INSS, alm de
dar ensejo incidncia de multa pela inobservncia de obrigao tributria instrumental, ficando a
atividade do empresrio sem registro restrita ao universo da economia informal. (Curso de Direito
Comercial, vol. 1, cit., p. 98-90).
377 Calixto Salomo Filho, A fattispecie empresrio no novo Cdigo Civil, em Princpios do Novo
Cdigo Civil Brasileiro e outros temas Homenagem a Tullio Ascarelli, Antonio Junqueira de
Azevedo, Heleno Taveira Torres e Paulo Carbone, Coordenadores, So Paulo, Quartier Latin, 2008, p.
121.
378 Calixto Salomo Filho, A fattispecie empresrio no novo Cdigo Civil, cit., p. 121.
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383
Francesco Ferrara Junior e Francesco Corsi, Gli Imprenditori e Le Societ, cit., p. 92.
Cdigo Civil 2002 - Art. 45. Comea a existncia legal das pessoas jurdicas de direito privado com
a inscrio do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessrio, de autorizao ou
aprovao do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alteraes por que passar o ato
constitutivo.
385 Nelson Eizirik, A Lei das S/A comentada, vol. 1, So Paulo, Quartier Latin, 2011, p. 547.
386 Precisamente por isso o problema diverso para as sociedades e as cooperativas nas que a
realizao ou no da publicidade tem uma importncia particular. A publicidade tem s vezes (v. arts.
2.332 e 2.519) carter constitutivo, outras vezes (arts. 2.297, 2.300, 2.436) declarativo; esta se aplica
a todas as cooperativas assim como a todas as sociedades que adotem um dos tipos de sociedade
mercantil, mesmo que (como vimos, tambm possvel: art. 2.249) cooperativas ou sociedades tenham
por objeto uma atividade civil (v. arts. 2.136 e 2.200). Tullio Ascarelli, Iniciao ao Estudo do Direito
Mercantil, cit., p. 316).
387 Ao de Execuo. Pessoa natural executada. Possibilidade de os atos executrios recarem sobre
o patrimnio do empresrio individual. Mesma pessoa. Patrimnio comum. A pessoa natural, que
tambm empresrio individual, registra sua firma individual para fins de regularizao do exerccio
profissional da atividade econmica organizada. O registro do empresrio individual no lhe confere
384
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do estabelecimento, ou dos direitos de uso ou de gozo a ele inerentes, tem como objetivo estabelecer
a presuno do conhecimento por terceiros e o incio da aquisio e da prescrio dos direitos, inclusive
no que respeita aos arts. 1.146, 1.148 e 1.149. Modesto Carvalhosa, Comentrios ao Cdigo Civil
Parte Especial Do Direito de Empresa, vol. 13, Antonio Junqueira de Azevedo, coord., So Paulo,
Saraiva, 2003, p. 639.
391 Calixto Salomo Filho, A fattispecie empresrio no novo Cdigo Civil, cit., p. 121.
392 Recuperao judicial. Requerimento por produtores rurais em atividade por prazo superior quele
de 2 (dois) anos exigido pelo artigo 48, caput, da Lei n 11.101/2005, integrantes de grupo econmico
na condio de empresrios individuais respaldados pelos artigos 966 e 971 do Cdigo Civil e/ou de
scios das sociedades coautoras. Legitimidade reconhecida. Irrelevncia da alegada proximidade entre
as datas de ajuizamento do feito e das prvias inscries dos produtores rurais como empresrios
individuais na Junta Comercial do Estado de So Paulo. Firme entendimento jurisprudencial no sentido
de que a regularidade da atividade empresarial pelo binio mnimo estabelecido no supramencionado
dispositivo legal deve ser aferida pela constatao da manuteno e continuidade de seu exerccio, e
no a partir da prova da existncia de registro do empresrio ou ente empresarial por aquele lapso
temporal. Manuteno do deferimento do processamento da demanda. Agravo de instrumento
desprovido. (Tribunal de Justia do Estado de So Paulo TJSP, 2 Cmara Reservada de Direito
Empresarial, Agravo de Instrumento n 2037064-59.2013.8.26.0000 - Cafelndia, Relator
Desembargador Jos Reynaldo, DJe 23/09/2014). Em sentido diametralmente oposto, o entendimento
do Superior Tribunal de Justia: Recuperao judicial. Comprovao da condio de empresrio por
mais de 2 anos. Necessidade de juntada de documento comprobatrio de registro comercial.
Documento substancial. Insuficincia da invocao de exerccio profissional. Insuficincia de registro
realizado 55 dias aps o ajuizamento. Possibilidade ou no de recuperao de empresrio rural no
enfrentada no julgamento. 1. O deferimento da recuperao judicial pressupe a comprovao
documental da qualidade de empresrio, mediante a juntada com a petio inicial, ou em prazo
concedido nos termos do CPC 284, de certido de inscrio na Junta Comercial, realizada antes do
ingresso do pedido em Juzo, comprovando o exerccio das atividades por mais de dois anos,
inadmissvel a inscrio posterior ao ajuizamento. No enfrentada, no julgamento, questo relativa s
condies de admissibilidade ou no de pedido de recuperao judicial rural. 2. Recurso Especial
199
como
empresrio
concomitantemente,
ambos
somente
os
requisitos
empresrio
regular,
caracterizadores
que
dessa
satisfaz,
condio
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Art. 2238 Rinvio - Se l'esercizio della professione costituisce elemento di un'attivit organizzata in
forma d'impresa, si applicano anche le disposizioni del Titolo II (2082 e seguenti). In ogni caso, se
l'esercente una professione intellettuale impiega sostituti o ausiliari, si applicano le disposizioni delle
Sezioni II, III e IV del Capo I del Titolo II (2094 e seguenti).
395 A empresa tem por conta uma atividade profissional de carter organizativo, diretamente dirigido a
um escopo econmico e implicando sucessivas relaes com intermedirios e consumidores; no
trabalho autnomo, se tem, ao invs, uma atividade sobretudo executiva, desenvolvida pessoalmente
pelo prestador da obra e cujo resultado estado previamente objeto de um contrato estipulado com o
comitente. (Giuseppe Ferri e Luisa Riva-Sanseverino, Comentario del Codice Civile Del Lavoro,
Art. 2188-2246, a cura di Antonio Scialoja e Giuseppe Branca, Bologna, Zanichelli Editore, 1972, p.
247).
201
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396
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prestando um servio resultante da sua atividade intelectual, e por isso no empresrio. Entretanto,
se ele organiza fatores de produo, isto , une capital, trabalho de outros mdicos, enfermeiros,
ajudantes, etc., e se utiliza de imvel e equipamentos para a instalao de um hospital, ento o hospital
empresa e o dono ou titular desse hospital, seja pessoa fsica, seja pessoa jurdica, ser considerado
empresrio, porque est, realmente, organizando os fatores de produo, para produzir servios.
(Sylvio Marcondes Machado, Questes de Direito Mercantil, cit., p. 11).
401 Constituio Federal Art. 197. So de relevncia pblica as aes e servios de sade, cabendo
ao Poder Pblico dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentao, fiscalizao e controle, devendo
sua execuo ser feita diretamente ou atravs de terceiros e, tambm, por pessoa fsica ou jurdica de
direito privado.
402 Segundo Giuseppe Ferri e Luisa Riva-Sanseverino, a nfase vem recair no sobre o trabalho do
profissional liberal, mas sim sobre a organizao de uma verdadeira e prpria empresa, e como tal
organizao no deve ser considerada meramente instrumental diante da atividade pessoal do
profissional. Neste sentido se verifica a hiptese do professor que dirige uma escola privada, do
farmacutico que se encontra ao mesmo tempo como cabea de uma empresa comercial, do mdico
que desenvolve a sua prpria atividade em uma casa de sade por ele gerida. (Comentario del Codice
Civile Del Lavoro, cit., p. 248).
403 Processual civil e tributrio. Imposto sobre servios de qualquer natureza - ISS. Base de clculo.
Tratamento diferenciado conferido aos profissionais liberais e s sociedades uniprofissionais. Artigo 9,
1 e 3, do Decreto-Lei 406/68. Norma no revogada pela Lei Complementar 116/2003. Precedentes.
Empresrio individual ou sociedade empresria. Inaplicabilidade. Precedentes da primeira seo.
Exerccio de profisso intelectual como elemento de empresa. Configurao. 1. A Primeira Seo
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204
adotar o modelo de responsabilidade limitada (EIRELI, CC, art. 980-A), o tipo mais
apropriado para a constituio de pequenas organizaes, especialmente quando o
empresrio no pretenda dividir com outras pessoas o lucro ou resultado da atividade
econmica.
A sociedade empresria, anteriormente denominada sociedade comercial ou
mercantil, representa a forma de exerccio coletivo da atividade empresarial, quando
duas ou mais pessoas renem capital, visando determinada explorao econmica.405
A sociedade uma espcie de contrato colaborativo entre scios, dotada do requisito
da pluripessoalidade, e que pode adotar tipos diferenciados, de acordo com a vontade
e o interesse das pessoas que a constituem. No direito positivo brasileiro, qualquer
tipo societrio pode ser criado a partir da reunio de duas ou mais pessoas, fsicas ou
jurdicas, no importando seja ela sociedade limitada, annima ou qualquer outro tipo
societrio. Basta satisfazer o requisito da pluripessoalidade, sendo integrada por dois
ou mais scios (CC, art. 1.033, IV).
A sociedade empresria no possui vontade prpria, vez que se manifesta
organicamente, pelos seus rgos de representao, atravs de pessoas naturais,
dirigentes ou prepostos das pessoas jurdicas que dela fazem parte. No detendo
vontade prpria, mas derivada, inconcebvel admitir que uma entidade ideal possa
ser capaz de organizar, sem a participao dos membros que a integram, os
elementos necessrios ao exerccio da empresa. Neste ponto, revela-se insupervel
contradio
terminolgica,
pela
impossibilidade
de
tornar
racionalmente
405
Conforme o conceito legal constante do art. 981 do Cdigo Civil de 2002, Celebram contrato de
sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou servios, para o
exerccio de atividade econmica e a partilha, entre si, dos resultados. Esse conceito difere do conceito
doutrinrio, tal como formulado por Fran Martins, apenas no que se refere questo do lucro,
considerando que, na concepo doutrinria, a sociedade comercial a entidade resultante de um
acordo de duas ou mais pessoas, que se comprometem a reunir capital e trabalho para a realizao de
operaes com fim lucrativo. (Curso de Direito Comercial, vol. 2, cit., p. 207).
205
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406
206
outra metade desses entes, o que revela peculiar equilbrio entre as formas
empresariais adotadas no Brasil.409
A partir desses nmeros, constata-se que metade das empresas brasileiras so
organizadas como sociedades comerciais ou empresrias, dedicadas ao exerccio
coletivo de atividade mercantil, assim caracterizadas a partir do seu registro na Junta
Comercial.
organizao
empresarial
sob
forma
societria
assume,
sociedade
comercial,
agora
denominada
empresria,
constitui-se,
geralmente, atravs de contrato, razo pela qual a sua disciplina jurdica foi inserida
no Cdigo Civil de 2002, como modalidade derivada do direito obrigacional unificado.
A forma contratual do ato constitutivo, apesar de referida genericamente no art. 981
do Cdigo, prpria das sociedades de pessoas, em que o vnculo personalssimo
decorrente da affectio societatis o preponderante na relao entre os scios. Esse
contrato definido na doutrina de Ascarelli como um contrato plurilateral, em que
todas as partes esto vinculadas a um escopo ou objetivo comum, sem a presena
de interesses contrastantes.410 Assim ocorre, em princpio, nas sociedades limitadas
e nos tipos societrios antigos e em desuso, como a sociedade em nome coletivo e a
sociedade em comandita simples.
409
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411
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tal como assim reconhecido na prpria Lei das Sociedades por Aes (Lei
6.404/1976).412
Mas, seja por meio da sociedade annima, seja atravs da sociedade limitada,
o exerccio da empresa desempenhado coletivamente, pelos acionistas e scios que
a integram e controlam. De acordo com a concepo do Cdigo Civil de 2002, a
empresariedade seria exercida e titularizada pela prpria sociedade, que assim
passou a ser denominada como sociedade empresria, e no pelos seus scios ou
acionistas. Essa idia tanto contraditria entre os elementos do conceito, porque o
qualificativo correto deveria ser sociedade empresarial, assim como quando atribui
prpria sociedade existncia independente de seus membros, como se a sociedade
empresria existisse por si mesma, com iniciativa e vontade prprias.
O Cdigo de 2002 no apresenta uma definio para sociedade empresria.
Todavia, o seu art. 982 remete o intrprete para a atividade dessa sociedade como
prpria daquela desempenhada pelo empresrio, ou seja, de produo ou circulao
de bens ou de servios.413 A sociedade empresria, na concepo do juristalegislador, confunde-se com a prpria empresa.414
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O Cdigo Civil Italiano, embora fundando toda a organizao jurdica da empresa sobre a figura do
imprenditore, ainda manteve absolutamente intocado esse esquema, em completo divrcio com a
realidade econmica. Reconheceu como empresrio o que exerce, profissionalmente, uma atividade
econmica organizada, com o fito de produzir ou trocar bens ou servios (art. 2.082). Atribuiu-lhe a
posio de chefe da empresa, comandando hierarquicamente seus colaboradores (art. 2.086). Tais
atributos, escusa lembr-lo, s podem existir no homem, no na pessoa jurdica. Tratando-se de
sociedades no personalizadas, ainda possvel dizer que todos os scios so empresrios. Mas, no
caso das companhias, mesmo os no-kelsenianos percebem que a ideia de um sociedade empresria
constitui evidente abuso de retrica. (A reforma da empresa, cit., p. 68).
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Objeto da atividade;
g) Regime de constituio;
h) Vnculo pessoal;
i)
Durao;
j)
Nacionalidade;
k) Territorialidade;
l)
m) Relao de participao;
n) Relao de concorrncia;
o) Origem do capital;
p) Objeto ou forma especial.
Dos critrios diferenciadores referidos acima, quase nenhum deles tratado ou
regulado no Cdigo Civil de 2002. E nele tampouco caberiam. A maior parte dos
aspectos tipolgicos ou de taxonomia das empresas encontra-se prevista na
legislao comercial extravagante, no codificada. Apesar da preocupao do
legislador do Cdigo em abranger, do modo mais amplo possvel, o instituto da
empresa, essa regulao restrita no leva em considerao suas particularidades
concretas, assim como essa gama de caractersticas variadas, que faz com que a
empresa se apresente atravs de mltiplos tipos, modelos e formas diferentes na
realidade econmica.
De acordo com os critrios de classificao aqui propostos, a tipologia da
empresa pode ser desenvolvida a partir do seguinte desdobramento, contendo, cada
uma, o respectivo embasamento normativo, doutrinrio ou jurisprudencial:
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427
A subsidiria integral uma companhia unipessoal que somente pode ser constituda por sociedade
annima brasileira. De acordo com a Exposio de Motivos do Projeto que resultou na Lei 6.404/1976,
conforme anotado por Modesto Carvalhosa, a possibilidade de ser constituda uma subsidiria integral
d juridicidade ao fato dirio, a que se vem constrangidas as companhias, de usar homens de palha
para subscreverem algumas aes, em cumprimento ao requisito formal de nmero mnimo de
acionistas. Todavia, para Carvalhosa, o motivo da larga adoo do instituto no est baseada no falso
quadro acionrio, mas na suplantao, a partir dos anos 30, da viso da companhia como contrato,
para erig-lo como instituto. (...) A pluralidade de scios , pois, fruto do superado contratualismo como
expreso da reunio de capitais. J o acionista nico fruto do institucionalismo, que se funda na
empresa e no mais no contrato. (Comentrios Lei de Sociedades Annimas, vol. 4, tomo 2, So
Paulo, Saraiva, 4 edio, 2002, p. 116-117). A figura da sociedade unipessoal foi duramente criticada
e assim contestada por Trajano de Miranda Valverde: Com absoluta falta de senso, sugeriu-se a
possibilidade de se constituir sociedade annima com um nico subscritor ou acionista. Gente que ouve
cantar o galo, mas no sabe onde. Nenhuma lei consagra, ou poder consagrar, essa monstruosidade
jurdica indivduo-sociedade. Nem mesmo a lei alem de 1937, a mais revolucionria de todas, dada
a orientao poltica da Alemanha nacional-socialista ousou admitir essa anomalia (vide Quassowsky,
Aktiengesetz, 1937, p. 225). Aqui, porm, sob o calor dos trpicos, tudo se funde, at o bom senso.
(Sociedades por aes, vol. 1, Rio de Janeiro, Forense, 3 edio, 1959, p. 261).
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429
A sociedade regularmente constituda pode tornar-se irregular, seja por continuar a sua atividade
aps iniciada a dissoluo (Cdigo Civil, art. 1.036), seja pela aplicao da desconsiderao da pessoa
jurdica, como assim entende a jurisprudncia: Sociedade limitada. Pleito de desconsiderao da
personalidade jurdica. Notcia de dissoluo irregular. Responsabilidade dos scios. Agravo provido.
A constatao de que a sociedade executada foi dissolvida irregularmente autoriza o reconhecimento
da responsabilidade ilimitada dos seus scios, a permitir a incidncia da penhora sobre seus bens
pessoais. (TJSP, 31 Cmara de Direito Privado, Agravo de Instrumento n 204514-12.2013.8.26.00 So Paulo, Relator Desembargador Antonio Rigolin, julgado em 17/12/2013).
430 O regime especial das micro e pequenas empresas est fundamentado, em primeiro plano, no
princpio instrumental do inciso IX do art. 170 da Constituio Federal, segundo o qual a ordem
econmica deve assegurar tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constitudas
sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administrao no Pas. Esse princpio novamente
referido e detalhado no art. 179 da Lei Maior: A Unio, os Estados, o Distrito Federal e os Municpios
dispensaro s microempresas e s empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento
jurdico diferenciado, visando a incentiv-las pela simplificao de suas obrigaes administrativas,
tributrias, previdencirias e creditcias, ou pela eliminao ou reduo destas por meio de lei.
Segundo Eros Roberto Grau, o princpio do art. 170, inciso IX, est parcialmente reproduzido no
preceito inscrito no art. 179, razo pela qual um complementa o outro no sentido de definir um regime
prprio, diferenciado, para as pequenas empresas. (A ordem econmica na Constituio de 1988,
So Paulo, Malheiros, 16 edio, 2012, p. 254). O Cdigo Civil de 2002 reproduz essa norma
programtica da Constituio, mas restrita ao procedimento de registro na Junta Comercial, ao dispor
no art. 970: A lei assegurar tratamento favorecido, diferenciado e simplificado ao empresrio rural e
ao pequeno empresrio, quanto inscrio e aos efeitos da decorrentes. O regime especial da
microempresa e da empresa de pequeno porte est regulado, hoje, pelas Leis Complementares
123/2006, 128/2008, 139/2011 e 147/2014, normas de contedo dominantemente de direito tributrio,
e no comercial.
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funo social,431 estas podem ser classificadas do modo seguinte, inclusive por fora
de lei:
1) microempreendedor individual (MEI): o menor tipo de empresrio regular assim
definido por lei, adotando, sempre, a forma de empresrio individual (CC, artigos
966 e 970), enquadrado nessa condio caso tenha auferido receita bruta anual no
valor de at R$ 60.000,00, e seja optante do Regime Especial Unificado de
Arrecadao de Tributos e Contribuies devidos pelas Microempresas e Empresas
de Pequeno Porte - Simples Nacional (Lei Complementar 123/2006, art. 18-A, com
a redao das Leis Complementares 128/2008; 139/2011 e 147/2014);
2) microempresa (ME): constituda sob qualquer forma de empresa, como empresrio
individual, EIRELI ou sociedade empresria ou comercial, que tenha auferido
receita bruta anual igual ou inferior a R$ 360.000,00 (Lei Complementar 123/2006,
art. 3, inciso I);
3) empresa de pequeno porte (EPP): empresa que pode ser constituda como firma
individual, EIRELI ou sociedade empresria, com receita bruta anual superior a R$
360.000,00 e igual ou inferior a R$ 3.600.000,00 (Lei Complementar 123/2006, art.
3, inciso II);
4) empresa de mdio porte: no possui enquadramento legal, sendo considerada,
apenas para fins estatsticos e para avaliao de capacidade financeira pelos
bancos432 e institutos de pesquisa,433 como aquela que, no sendo microempresa
ou empresa de pequeno porte, conta com mais de 50 e menos de 250 empregados;
431
A classificao das empresas de acordo com seu porte ou tamanho, medido pela sua receita bruta
ou nmero de empregados, pode resultar em tratamento jurdico diferenciado, seja da forma
expressamente determinada em lei, como no caso do regime das micro e pequenas empresas, seja
considerando o desequilbrio ou desigualdade entre agentes econmicos, e as relaes de
dependncia ou subordinao entre empresas. Para Vincenzo Buonocore, a distino entre pequena
empresa e grande empresa resulta, em primeiro aspecto, de um carter que ele define como
empresarialidade, em que a diferena entre as empresas decorre do fator organizacional ou gerencial:
Na realidade, o primeiro e talvez determinante dado que necessitamos ter em conta o ensinamento
que vem de outra disciplinas, no mbito das quais a distino das empresas com base no critrio
dimensional responde, antes de tudo, s exigncias que podemos definir, de modo amplo, como
empresarialidade (aziendalistiche), que parte da contabilidade para terminar na gesto compreendida
por um todo, ou mais precisamente, das diferenas existentes entre uma pequena e uma grande
empresa no que se refere ao modo de assegurar os recursos e de administrar a empresa. (LImpresa
- Trattato di Diritto Commerciale, cit., p. 576).
432 Para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social BNDES, instituio financeira
pblica federal, mdias empresas so aquelas com receita operacional bruta anual superior a R$
16.000.000,00 e inferior ou igual a R$ 300.000.000,00; grandes empresas so aquelas com receita
operacional bruta anual superior a R$ 300.000.000,00. (Circular BNDES n 11/2010, de 05/03/2010).
433 De acordo com a Fundao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica IBGE, a anlise de porte
das empresas do CEMPRE adota como referncia as faixas de pessoal ocupado total definidas pela
Oficina Estatstica da Comunidade Europeia - Eurostat (Statistical Office of the European Communities)
e pela Organizao das Naes Unidas ONU, na Recomendao 2003/361/CE, de 20 de maio de
2003, da Comisso das Comunidades Europeias. De acordo com esta definio, microempresas so
as empresas com at 9 pessoas ocupadas; empresas pequenas so as que possuem de 10 a 49
pessoas ocupadas; empresas mdias, de 50 a 249 pessoas; e empresas grandes possuem 250 ou
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5) empresa de grande porte: aquela definida, para fins estatsticos, como tendo
mais de 250 empregados; todavia, para efeito de auditoria externa e publicao das
demonstraes financeiras (Lei 11.638/2007, art. 3) considerada de grande porte
a sociedade ou conjunto de sociedades, sob controle comum, que tiver, no exerccio
social, ativo total superior a R$ 240.000.000,00 ou receita bruta anual superior a R$
300.000.000,00.
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de atos de empresas industriais que elaboram a matria prima para conseguir, mediante reunies,
separaes ou transformaes, cousas de valor (manufatura). Assim, essas empresas, em virtude dos
atos que as formam e de acordo com as exigncias do mercado, constituem a verdadeira indstria de
produo, no obstante se achar de ordinrio aliada operao fundamental do comrcio, compra e
venda; pode-se classifica-la ao lado da indstria comercial propriamente dita, destinada distribuio
das mercadorias. (Tratado de Direito Comercial Brasileiro, vol. I, cit. p. 495-496).
438 No Brasil, as cinco principais atividades industriais, segundo o IBGE, com maior participao nas
receitas brutas das empresas fabris responderam por, aproximadamente, 56,1% do total das receitas
brutas no ano de 2009 da indstria nacional. Os maiores setores so de fabricao de produtos
alimentcios, fabricao de veculos automotores, indstria petrolfera, fabricao de produtos qumicos
e de metalurgia. (IBGE Fundao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica, Pesquisa Industrial,
Rio de Janeiro, v. 28, n 1, 2009, p. 29).
439 O direito industrial, na definio de Fbio Ulhoa Coelho, a diviso do direito comercial que protege
os interesses dos inventores, designers e empresrios em relao s invenes, modelo de utilidade,
desenho industrial e marcas. (Curso de Direito Comercial, vol. 1, cit., p. 153).
440 As atividades bancrias e financeiras so reguladas e estudadas no ramo especial do direito
comercial, denominado direito bancrio, o qual, na opinio de Waldrio Bulgarelli, trata-se de uma rea
de especializao do direito das obrigaes mercantis, na qual tambm est inserido o direito bolsstico
(ou burstil), relativo s operaes das bolsas de valores. (Direito Comercial, cit., p. 21-22).
441 Lei 4.595/1964 - Art. 17. Consideram-se instituies financeiras, para os efeitos da legislao em
vigor, as pessoas jurdicas pblicas ou privadas, que tenham como atividade principal ou acessria a
coleta, intermediao ou aplicao de recursos financeiros prprios ou de terceiros, em moeda nacional
ou estrangeira, e a custdia de valor de propriedade de terceiros. Art. 18 (...) 1 Alm dos
estabelecimentos bancrios oficiais ou privados, das sociedades de crdito, financiamento e
investimentos, das caixas econmicas e das cooperativas de crdito ou a seo de crdito das
cooperativas que a tenham, tambm se subordinam s disposies e disciplina desta lei no que for
aplicvel, as bolsas de valores, companhias de seguros e de capitalizao, as sociedades que efetuam
distribuio de prmios em imveis, mercadorias ou dinheiro, mediante sorteio de ttulos de sua
emisso ou por qualquer forma, e as pessoas fsicas ou jurdicas que exeram, por conta prpria ou de
terceiros, atividade relacionada com a compra e venda de aes e outros quaisquer ttulos, realizando
nos mercados financeiros e de capitais operaes ou servios de natureza dos executados pelas
instituies financeiras.
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forma de empresrio (CC, art. 966) ou sociedade empresria (CC, art. 982) em
todas as modalidades de servios.
8) empresa de tecnologia: graas revoluo da tecnologia e da informtica, ocorrida
no quarto final do sculo XX, novos tipos de atividades econmicas vem sendo
constantemente desenvolvidas, em especial na indstria dos computadores, de
sistemas e equipamentos de conectividade, nas redes de dados e de
telecomunicaes; assim, as empresas de tecnologia, desenvolvedoras de
equipamentos, programas de computador, aplicativos ou softwares (Lei
9.609/1998), passaram a constituir categoria especializada, inovadora, diante dos
critrios tradicionais de classificao das atividades empresariais referidos na lei.446
9) empresa de construo civil: a construo civil, como do prprio sobrenome
infere-se, no consistia em atividade comercial, sendo regulada pelas normas do
contrato de empreitada do Cdigo Civil de 1916, at ser assim comercializada por
fora de lei: So comerciais as empresas de construo (Lei 4.068/1962, art. 1);
especialmente a partir da Lei 4.591/1964, que disciplina o condomnio, a construo
e incorporao imobiliria, as empresas desse setor passaram a ser classificadas
como indstria da construo civil, e os imveis edificados, especialmente em obras
privadas, dirigidas ao mercado imobilirio, so enquadrados como bens comerciais,
ou seja, como mercadorias.447
10) empresa de comrcio exterior: nesse segmento situam-se as empresas
especializadas em realizar ou facilitar as operaes entre empresas nacionais e
estrangeiras; em geral, a empresa de comrcio exterior dedica-se exportao de
produtos fabricados no pas por empresas industriais, devendo adotar a forma de
sociedade annima (Decreto-Lei 1.248/1972, art. 2) para usufruir os benefcios
446 So exemplos de empresas de tecnologia as desenvolvedoras de programas de computador e
softwares, como Microsoft, Google, Mozilla, Adobe e Symantec. Essas empresas transnacionais
desenvolvem e colocam disposio dos usurios, via programas com download pago ou gratuito,
sistemas e aplicativos profissionais, educacionais, de entretenimento, gerados para realizar uma srie
de tarefas e funes. As empresas de tecnologia tambm respondem pelo desenvolvimento de
produtos e equipamentos de hardware, a exemplo da Apple, IBM, Intel e Hewlett-Packard (HP), como
segmento especial da indstria com caractersticas diferenciadas, inclusive porque exploram
intensivamente os recursos da Internet e da rede World Wide Web (www).
447 Tributrio. Cofins. Venda de imveis. LC n 70/91. Alterao do texto constitucional pela EC n
20/98. No incidncia. Redefinio da matria pela Primeira Seo. 1. Em vrios julgamentos emiti
pronunciamento no sentido de que a COFINS incide sobre o faturamento de empresas que,
habitualmente, negociam com imveis, em face de: a) o imvel ser um bem suscetvel de transao
comercial, pelo que se insere no conceito de mercadoria; b) as empresas construtoras de imveis
efetuam negcios jurdicos com tais bens, de modo habitual, os quais constituem mercadorias que so
oferecidas aos clientes compradores; c) a Lei n 4.068, de 09.06.62, determina que as empresas de
construo de imveis possuem natureza comercial, sendo-lhes facultada a emisso de duplicatas; d)
a Lei n 4.591, de 16.12.64, define como comerciais as atividades negociais praticadas pelo
"incorporador, pessoa fsica ou jurdica, proprietrio ou no, promotor ou no da construo, que aliene
total ou parcialmente imvel ainda em construo, e do vendedor, proprietrio ou no, que
habitualmente aliene o prdio, decorrente de obra j concluda, ou terreno fora do regime condominial,
sendo que o que caracteriza esses atos como mercantis, em ambos os casos, e o que diferencia dos
atos de natureza simplesmente civil, a atividade empresarial com o intuito de lucro" (Oswaldo Othon
de Pontes Saraiva Filho, ob. j citada). (STJ, 1 Turma, REsp 439.417-SC, Relator Ministro Jos
Delgado, DJ 23/09/2002).
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fiscais concedidos pela legislao; a empresa de comrcio exterior pode estruturarse como trading company, para realizar operaes de importao e exportao de
mercadorias de outras empresas.448
11) empresa de diverses pblicas: as atividades de espetculos pblicos sempre
foram consideradas de natureza comercial, pelo seu modo de explorao de
eventos oferecidos para o pblico, como o teatro, cinema, o circo, os parques de
diverses; nesse segmento enquadram-se as empresas de espetculos artsticos,
musicais, cinematogrficos, circenses e esportivos; desde que a atividade de
diverso seja aberta ao pblico, que tem acesso mediante pagamento de ingresso,
ela caracteriza-se como comercial ou empresarial.449
12) empresa extrativista: aquela que est organizada para a explorao dos
recursos naturais e produo extrativa animal, vegetal e mineral; em determinados
casos, ela pode at ser considerada como empresa rural,450 mas se ela no for
constituda como tal, particularmente nas reas da pesca e da minerao, integra
segmento especial, do setor primrio da economia.
13) empresa rural: a atividade rural, em princpio, determinante da estrita separao
entre os campos do direito civil e do direito comercial, no qualificada como
mercantil; a legislao admite, todavia, a adoo da forma comercial na explorao
das atividades rurais, agrcolas ou pecurias, inclusive conforme a redao do art.
971 do Cdigo Civil.451 O prprio conceito de empresa rural, constante da Lei
4.504/1964 (Estatuto da Terra), qualificava a explorao econmica da propriedade
rural, agrcola ou pecuria, independentemente da sua constituio formal no
448
O regime da empresa comercial exportadora est regulado no Decreto-Lei 1.248/1972, e nos artigos
247 a 253 da Portaria SECEX n 23/2011 da Secretaria de Comrcio Exterior do Ministrio do
Desenvolvimento, Indstria e Comrcio Exterior. A Portaria n 438, de 26 de maio de 1992, do Ministrio
da Fazenda, regula a concesso do Registro Especial a Empresas Comerciais Exportadoras, assim
prescrevendo: Art. 2. permitido Empresa Comercial Exportadora adquirir e exportar qualquer
mercadoria de produo nacional, importar para comercializar no mercado interno, ou reexportar
mercadorias estrangeiras, atendidas as normas estabelecidas no Regulamento Aduaneiro, aprovado
pelo Decreto n 91.030, de 5 de maro de 1985, e demais legislao pertinente.
449 Na lio de Carvalho de Mendona, as operaes das empresas de espetculos pblicos devem
ser consideradas como exerccio da indstria tendo por objeto, recrear ou divertir o pblico mediante
paga, visando benefcios pecunirios: teatros, circos, sales de concertos ou festivais, salas de
conferncia, cinematgrafos, hipdromos, veldromos, etc. As empresas constitudas para a realizao
desses fins, qualquer que seja o gnero de diverses permitidas e a forma da organizao, so sujeitas
s disposies do Cdigo Comercial e leis complementares. So, portanto, comerciantes os
respectivos empresrios. (Tratado de Direito Comercial Brasileiro, vol. I, cit. p. 503).
450 Agravo de instrumento. Recurso de Revista. No-provimento. Prescrio rurcola (...) Cenibra
Florestal. Empresa Extrativista. Atividade Rural. O entendimento jurisprudencial deste Tribunal no
sentido de que a empresa extrativista de madeira pertence ao ramo rural, caso da prpria Cenibra, em
que os precedentes reconhecem a sua qualidade de empregadora rural por explorar atividade
agroeconmica, ou seja, plantio e explorao de madeira. Agravo de instrumento a que se nega
provimento. (Tribunal Superior do Trabalho, 5 Turma, AIRR 4271900332002503 427190033.2002.5.03.0900, Relatora Ministra Ktia Magalhes Arruda, DJ 19/09/2008).
451 Cdigo Civil de 2002 Art. 971. O empresrio, cuja atividade rural constitua sua principal profisso,
pode, observadas as formalidades de que tratam o art. 968 e seus pargrafos, requerer inscrio no
Registro Pblico de Empresas Mercantis da respectiva sede, caso em que, depois de inscrito, ficar
equiparado, para todos os efeitos, ao empresrio sujeito a registro.
224
Ivanildo Figueiredo
452
De acordo com o art. 4 da Lei 4.504/1964, a empresa rural assim definida: Empresa Rural o
empreendimento de pessoa fsica ou jurdica, pblica ou privada, que explore econmica e
racionalmente imvel rural, dentro de condio de rendimento econmico da regio em que se situe e
que explore rea mnima agricultvel do imvel segundo padres fixados, pblica e previamente, pelo
Poder Executivo. Para esse fim, equiparam-se s reas cultivadas, as pastagens, as matas naturais e
artificiais e as reas ocupadas com benfeitorias.
453 Lei 11.076/2004, que dispe sobre o Certificado de Depsito Agropecurio CDA, o Warrant
Agropecurio WA, o Certificado de Direitos Creditrios do Agronegcio CDCA, a Letra de Crdito
do Agronegcio LCA e o Certificado de Recebveis do Agronegcio CRA. Os ttulos de crdito do
agronegcio so aqueles vinculados a direitos creditrios originrios de negcios realizados entre
produtores rurais, ou suas cooperativas, e terceiros, inclusive financiamentos ou emprstimos,
relacionados com a produo, comercializao, beneficiamento ou industrializao de produtos ou
insumos agropecurios ou de mquinas e implementos utilizados na atividade agropecuria. (Lei
11.076/2004, art. 23).
454 Para Eros Roberto Grau, o preceito inscrito no pargrafo nico do art. 170, que se tem enfatizado,
na afirmao de que reiteraria, consolidando, o carter liberal da ordem econmica na Constituio de
1988, tem relevncia normativa menor. Pois certo que postulao primria da liberdade de iniciativa
econmica (...) a garantia da legalidade: liberdade de iniciativa econmica liberdade pblica
precisamente ao expressar no sujeio a qualquer restrio estatal seno em virtude de lei. O que
esse preceito pretende introduzir no plano constitucional to-somente a sujeio ao princpio da
legalidade em termos absolutos e no, meramente, ao princpio da legalidade em termos relativos
(art. 5, II) da imposio, pelo Estado, de autorizao para o exerccio de qualquer atividade
econmica. (A ordem econmica na Constituio de 1988, cit., p. 205).
225
Ivanildo Figueiredo
O princpio da livre iniciativa garantido constitucionalmente (art. 170, pargrafo nico). Todavia,
existem atividades cujo exerccio afeta o interesse pblico. Assim, por exemplo, a atividade de
intermediao financeira ou aquelas que tenham em vista a sade ou a educao. Por tal razo, tendo
em vista os interesses desenvolvidos, estas atividades somente podem ser exercidas por quem o Poder
Pblico considere suficientemente habilitado. Da a necessidade da autorizao para funcionar.
Destarte, o Poder Pblico exerce uma superviso constante, a priori, verificando se o titular da atividade
preenche os requisitos necessrios para o seu exerccio, sem o que no concedida a autorizao;
durante o seu exerccio, de molde a que no se afaste dos requisitos para a concesso da autorizao,
sob pena de cassao; a posteriori, disciplinando o modo pelo qual ter lugar a extino do titular da
atividade, como ocorre no regime de liquidao extrajudicial (Lei 6.024/74) das instituies financeiras.
(Vera Helena de Mello Franco, Manual de Direito Comercial, vol. 1, cit., p. 51-52).
456 Na opinio de Gladston Mamede e Eduarda Cotta Mamede, a empresa familiar compreende a
sociedade empresria, cujas quotas ou aes estejam sob o controle de uma famlia, podendo ser
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227
Ivanildo Figueiredo
empresa executada, tendo em vista que a empresa eminentemente familiar. Recurso especial
improvido. (STJ, 2 Turma, REsp 1.024.394/RS, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 14/03/2008,
LEXSTJ, vol. 225, p. 232).
461 Cdigo Civil de 2002 Art. 977. Faculta-se aos cnjuges contratar sociedade, entre si ou com
terceiros, desde que no tenham casado no regime da comunho universal de bens, ou no da
separao obrigatria.
228
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No caso da estabilidade do vnculo entre a sociedade e seus scios, estas podem ser classificadas,
segundo Fbio Ulhoa Coelho, em sociedades empresrias de vnculo estvel e sociedades
empresrias de vnculo instvel, dependendo da possibilidade do scio desligar-se da sociedade, a
qualquer tempo, por sua livre e espontnea vontade. A sociedade ser de vnculo estvel quando o
direito de retirada ou de recesso seja de carter excepcional, somente admitido em determinadas
situaes legalmente previstas (Lei 6.404/1976, art. 137). Ser de vnculo instvel a sociedade quando
o scio possa se retirar a sociedade a qualquer tempo mediante o reembolso de seu capital. (Curso
de Direito Comercial, vol. 2, cit., p. 45-46).
463 No caso da empresa individual de responsabilidade limitada EIRELI, por ser um tipo diferente,
equiparado pessoa jurdica (CC, art. 44, inciso VI), mais prximo da sociedade unipessoal, e como o
art. 980-A, 6 do Cdigo Civil prescreve que se aplicam a elas, no que couber, as regras previstas
para as sociedades limitadas, o ato constitutivo deve declarar o prazo de durao: Instruo
Normativa DREI n 10/2013, do Departamento de Registro de Empresas e Integrao - Anexo V
Manual de Registro da EIRELI - 1.2.20 - Prazo de durao da empresa - Dever ser indicada a data de
trmino do prazo da EIRELI, quando o mesmo for determinado, ou declarado que o prazo
indeterminado.
464 Como exemplo desse tipo diferenciado, Egberto Lacerda Teixeira considerava sub-espcie da
sociedade por prazo determinado aquela constituda para fim ou obra certa, que entra em dissoluo,
pleno jure, com o trmino da empresa ou operao projetada, tal como ocorre, hoje, nas sociedades
de propsito especfico - SPE (Das Sociedades por Quotas de Responsabilidade Limitada,
atualizado por Syllas Tozzini e Renato Berger, So Paulo, Quartier Latin, 2 edio, 2007, p. 359).
229
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465
A redao original da Constituio Federal de 1988, assim estabelecia a diferena entre empresa
brasileira e empresa brasileira de capital nacional: Art. 171. So consideradas: I - empresa brasileira
a constituda sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e administrao no Pas; II - empresa
brasileira de capital nacional aquela cujo controle efetivo esteja em carter permanente sob a
titularidade direta ou indireta de pessoas fsicas domiciliadas e residentes no Pas ou de entidades de
direito pblico interno, entendendo-se por controle efetivo da empresa a titularidade da maioria de seu
capital votante e o exerccio, de fato e de direito, do poder decisrio para gerir suas atividades. No
obstante esse dispositivo tenha sido totalmente revogado pela Emenda Constitucional n 6, de 1995, o
Cdigo Civil de 2002 manteve essa diferenciao: Art. 1.126. nacional a sociedade organizada de
conformidade com a lei brasileira e que tenha no Pas a sede de sua administrao.
466 Cdigo Civil de 2002, art. 1.126.
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467
A companhia poder emitir, alm de aes do capital social, partes beneficirias, debntures e bnus
de subscrio (Lei 6.404/1976, artigos 46, 52 e 75), bem como notas promissrias comerciais,
denominadas commercial paper (Instrues Normativas CVM 134/1990, 292/1998 e 480/2009).
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232
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Considera Paula Forgioni que o agente econmico detentor de posio dominante no se restringe
s empresas e grupos empresariais formalmente considerados, abrangendo, nessa definio, os assim
denominados grupos de fato, porque estes incluem no apenas aqueles constitudos por sociedades
controladora e controlada, mas tambm refere-se a aglutinaes derivadas de comunho de interesses
contratual, ainda que no formalizada. (Os fundamentos do antitruste, cit., p. 281).
471 Para Calixto Salomo Filho, a teoria do monoplio no se aplica exclusivamente quelas empresas
que detm 100% do mercado, mas, tambm, quelas situaes em que um dos produtores detm
parcela substancial do mercado (por hiptese, mais de 50%) e seus concorrentes so todos
atomizados, de tal forma que nenhum deles tem qualquer influncia sobre o preo de mercado. Essas
situaes so, em linhas gerais, idnticas em suas consequncias ao monoplio stricto sensu. (Direito
concorrencial As estruturas, So Paulo, Malheiros, 3 edio, 2007, p. 144).
472 O cartel, segundo Paula Forgioni, caracteriza-se como sendo o acordo horizontal celebrado entre
empresas concorrentes (que atuam, pois, no mesmo mercado relevante geogrfico e material) e que
visam neutralizar a concorrncia existente entre elas. (Os fundamentos do antitruste, cit., p. 326).
Na Lei 12.529/2011, o cartel tipificado dentre as infraes da ordem econmica: Art. 36, 3 - I acordar, combinar, manipular ou ajustar com concorrente, sob qualquer forma: a) os preos de bens
ou servios ofertados individualmente; b) a produo ou a comercializao de uma quantidade restrita
233
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propsito especfico para adjudicar, em pagamento dos crditos, os ativos do devedor. A Lei
Complementar 123/2006, a partir da redao da Lei Complementar 128/2008, incluiu a SPE como tipo
societrio de apoio s pequenas empresas: Art. 56. As microempresas ou as empresas de pequeno
porte podero realizar negcios de compra e venda de bens e servios para os mercados nacional e
internacional, por meio de sociedade de propsito especfico, nos termos e condies estabelecidos
pelo Poder Executivo federal.
474 A sociedade de garantia solidria foi criada pela Lei 9.841/1999, antigo Estatuto da Micro Empresa
e da Empresa de Pequeno Porte, assim caracterizada: Art. 25. autorizada a constituio de
Sociedade de Garantia Solidria, constituda sob a forma de sociedade annima, para a concesso de
garantia a seus scios participantes, mediante a celebrao de contratos. Pargrafo nico. A sociedade
de garantia solidria ser constituda de scios participantes e scios investidores: I - os scios
participantes sero, exclusivamente, microempresas e empresas de pequeno porte com, no mnimo,
dez participantes e participao mxima individual de dez por cento do capital social; II - os scios
investidores sero pessoas fsicas ou jurdicas, que efetuaro aporte de capital na sociedade, com o
objetivo exclusivo de auferir rendimentos, no podendo sua participao, em conjunto, exceder a
quarenta e nove por cento do capital social. Apesar da Lei 9.841/1999 ter sido revogada pela Lei
Complementar 123/2006, esta continua a fazer meno a esse tipo especial de sociedade como
possvel de ser constituda, tendo como objetivo social a defesa exclusiva dos interesses econmicos
das microempresas e empresas de pequeno porte (art. 3, 5).
475 No entendimento de Fbio Ulhoa Coelho as offshore companies so sociedades empresrias
constitudas e estabelecidas em pas estrangeiro. No so necessariamente fraudulentas, mas podem
servir, como todas as demais sociedades, de instrumento para fraudes ou abusos. (Curso de Direito
Comercial, vol. 2, cit. p. 68).
476 A tcnica de joint venture, esclarece U.W. Rasmussen, mais aplicvel nas estratgias de
transnacionalizao de grupos multinacionais, que tentam evitar os riscos polticos e econmicos de
investimentos em subsidirias ou filiais no exterior. (...) Empresas multinacionais participam com
investimentos intangveis e tangveis em empresas brasileiras e vice-versa, empresas brasileiras
participam em fuses com empresas estrangeiras em mercados ultramar. Por outro lado, as tcnicas
do joint venture servem a empresas holding e/ou grupos econmicos para executar estratgias de
horizontalizao, verticalizao, pr-integrao, retro-integrao e transnacionalizao. (Holdings e
joint ventures: uma anlise transnacional de consolidaes e fuses empresariais, So Paulo,
Aduaneiras, 1988, p. 131-132).
235
Ivanildo Figueiredo
Como pode ser aqui constatado, aps exaustiva e qui cansativa enumerao e definio dos tipos, subtipos e modalidades de empresas, o fenmeno
empresarial multifacetado, compreende formas diversas, modelos prprios,
especializados, apropriados e adaptados segundo cada modo de explorao da
atividade mercantil. Nesse contexto altamente diversificado, a normatividade
generalista do Cdigo Civil de 2002 no se enquadra. Pelo contrrio, dela diverge,
radicalmente. Com base na anlise dessa tipologia empresarial, vlido reconhecer
a absoluta incapacidade da legislao civilista para apreender e regular, em sua
amplitude, as formas e modalidades comerciais. A empresa genrica tratada pelo
Cdigo Civil no representa, sequer, sombra da empresa comercial no mundo real.
O Cdigo Civil define a forma bsica da empresa na figura do empresrio
individual (art. 966), e o seu exerccio pluripersonalizado atravs da sociedade
empresria (art. 982). Na concepo codificada, todavia, somente existiria e assim
seria reconhecida a empresa regular, isto , aquela que adquire essa condio a partir
da sua inscrio obrigatria no registro de empresas mercantis (art. 967). O Cdigo
de 2002 apenas se refere empresa irregular, ou seja, ao exerccio de atividade
econmica atravs de uma empresa sem registro na Junta Comercial, quando trata
da sociedade em comum (arts. 986 a 990). De acordo com o Cdigo Civil, a sociedade
em comum um tipo transitrio de relao societria, que se destina legalizao
posterior, quando do registro dos seus atos constitutivos. Todavia, no que tange ao
477
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478 Segundo as estatsticas da Fundao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica - IBGE, no ano
de 2010 existiam, no Brasil, 5,1 milhes de empresas, entre comerciais, industriais e de servios, em
situao de regularidade formal (IBGE - Estatstica do Cadastro Central de Empresas CEMPRE; ftp://
ftp.ibge.gov.br/Economia_Cadastro_de_Empresas/2011/tabelas_pdf/tab1.pdf; 04/04/2014). Apenas na
rea urbana das mdias e grandes cidades e suas regies metropolitanas, o IBGE identificou, na ltima
pesquisa, aplicada ainda no ano de 2003, a presena de mais de 10 milhes de pequenas empresas
informais ou irregulares. (IBGE Pesquisa Economia Informal Urbana 2003, http://www.ibge.gov.br/
home/estatistica/economia/ecinf/2003/comentario.pdf; 18/09/2013). Ou seja, das aproximadamente 15
milhes de empresas brasileiras, dois teros delas so empresas irregulares, situam-se margem da
formalidade, mas desempenham atividade econmica da mesma maneira prtica que as empresas
regulares. Apesar da economia informal no representar, proporcionalmente, o mesmo volume de
negcios em termos de patrimnio e de circulao de riquezas, a sua importncia para a ocupao de
grande contingente populacional significativa, e deveria merecer uma regulao mnima, ao menos o
seu reconhecimento, pelo sistema de direito positivo, como atividade econmica, para efeitos,
principalmente, de incentivar e facilitar a sua incluso na economia formal.
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Berardino Libonati, Diritto Commerciale Impresa e societ, Milano, Giuffr, 2005, p. 13/14.
No se tratar, seno em pouqussimas passagens, do exercente individual da atividade econmica
de produo ou circulao de bens ou servios, porque esta figura, na verdade, no possui presena
relevante na economia. (Curso de Direito Comercial, vol. 1, cit., p. 79).
481 BRASIL, Servio Brasileiro de Apoio s Micro e Pequenas Empresas SEBRAE - Unidade de
Gesto Estratgica UGE, Participao das Micro e Pequenas Empresas na Economia Brasileira,
Braslia, Julho 2014.
482 BRASIL, Departamento Nacional do Registro do Comrcio (DNRC) Constituio de empresas
por tipo jurdico Brasil 1985-2005, http://www.dnrc.gov.br, 23/10/2012.
483 Aos empresrios individuais sobram os negcios rudimentares e marginais, muitas vezes
ambulantes. Dedicam-se a atividades como varejo de produtos estrangeiros adquiridos em zonas
francas (sacoleiros), confeco de bijuterias, de doces para restaurantes e bufs, quiosques de
miudezas em locais pblicos, bancas de frutas ou pastelarias em feiras semanais, etc. (Manual de
Direito Comercial, So Paulo, Saraiva, 23 edio, 2011, p. 39).
480
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484
Lei 6.404/1976 Art. 220. A transformao a operao pela qual a sociedade passa,
independentemente de dissoluo e liquidao, de um tipo para outro. Pargrafo nico. A
transformao obedecer aos preceitos que regulam a constituio e o registro do tipo a ser adotado
pela sociedade.
485 Modesto Carvalhosa, Comentrios Lei de Sociedades Annimas, So Paulo, Saraiva, 4 edio,
vol. 4, tomo I, 2002, p. 183.
486 Lei 6.404/1976, Art. 117. O acionista controlador responde pelos danos causados por atos
praticados com abuso de poder. 1 So modalidades de exerccio abusivo de poder: (...); c) promover
alterao estatutria, emisso de valores mobilirios ou adoo de polticas ou decises que no
tenham por fim o interesse da companhia e visem a causar prejuzo a acionistas minoritrios, aos que
trabalham na empresa ou aos investidores em valores mobilirios emitidos pela companhia;
487 Flavio Dezzani, Piero Pisoni e Luigi Puddu, Fusioni, scissioni, trasformazioni e conferimenti,
Milano, Giuffr, 1995, p. 505.
488 Fbio Ulhoa Coelho, Curso de Direito Comercial, vol. 2, cit., p. 512.
489 Cdigo Civil Art. 1.113. O ato de transformao independe de dissoluo ou liquidao da
sociedade, e obedecer aos preceitos reguladores da constituio e inscrio prprios do tipo em que
vai converter-se.
490 Fbio Ulhoa Coelho, Curso de Direito Comercial, vol. 2, cit., p. 512.
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Ivanildo Figueiredo
no altera a pessoa jurdica como pessoa de direito, como ente coletivo, nos seus
aspectos fundamentais, em especial quanto ao requisito da pluripessoalidade. No
alterava, vez que essa base tradicional veio a ser conceitual e dogmaticamente
subvertida pela Lei Complementar 128/2008.
A Lei Complementar 128/2008 teve como finalidade atualizar o regime jurdico
da microempresa e da empresa de pequeno porte, regulado na Lei Complementar
123/2006. Todavia, ainda que sendo assunto de interesse correlato s empresas
menores, a Lei Complementar 128/2008 modificou os artigos 968 e 1.033 Cdigo Civil,
para possibilitar a converso da firma individual em sociedade empresria e viceversa, de sociedade empresria em firma individual.491 Essa converso representa, na
verdade, nova hiptese de transformao lato sensu, e no apenas simplificao de
procedimento de registro na junta comercial, para que a empresa possa aproveitar o
nmero de inscrio no CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoas Jurdicas).492
Com efeito, foi incorporado ao art. 968 do Cdigo Civil, que trata da inscrio
do empresrio individual no registro de empresas, um pargrafo terceiro, de espectro
bem mais abrangente. De acordo com a remisso expressa aos artigos 1.113 a 1.115
do Cdigo Civil, que se referem ao ato de transformao em si, essa converso da
forma da empresa, de firma individual para sociedade empresria, resulta de
491
Cdigo Civil Art. 968. A inscrio do empresrio far-se- mediante requerimento que contenha:
(...) 3. Caso venha a admitir scios, o empresrio individual poder solicitar ao Registro Pblico de
Empresas Mercantis a transformao de seu registro de empresrio para registro de sociedade
empresria, observado, no que couber, o disposto nos arts. 1.113 a 1.115 deste Cdigo. Art. 1.033.
Dissolve-se a sociedade quando ocorrer: (...) IV - a falta de pluralidade de scios, no reconstituda no
prazo de cento e oitenta dias; (...) Pargrafo nico. No se aplica o disposto no inciso IV caso o scio
remanescente, inclusive na hiptese de concentrao de todas as cotas da sociedade sob sua
titularidade, requeira no Registro Pblico de Empresas Mercantis a transformao do registro da
sociedade para empresrio individual, observado, no que couber, o disposto nos arts. 1.113 a 1.115
deste Cdigo.
492 Na opinio de Fbio Ulhoa Coelho, no caso dos artigos 968 e 1.033 do Cdigo Civil, a partir da
redao da Lei Complementar 128/2008, a lei apenas est garantindo a simplificao dos
procedimentos administrativos e fiscais, ao permitir que o empresrio individual aproveite seu CNPJ na
sociedade que constitui com seus scios. (Curso de Direito Comercial, vol. 2, cit., p. 513). No mesmo
equvoco conceitural e metodolgico incorrem as teses discutidas nas Jornadas de Direito Civil do
Conselho da Justia Federal: o Enunciado 465 igualmente diferenciou a transformao de registro da
transformao societria: A transformao de registro prevista no art. 968, 3, e no art. 1.033,
pargrafo nico, do Cdigo Civil no se confunde com a figura da transformao de pessoa jurdica.
O Enunciado 483 tambm refere-se operao de transformao de registro, admitindo, inclusive,
contraditoriamente ao esprito das companhias, classificadas como sociedades de capital e
institucionais, e no de pessoas e contratuais, a converso de sociedade annima em empresa
individual: Admite-se a transformao do registro da sociedade annima, na hiptese do art. 206, I, d,
da Lei n 6.404/1976, em empresrio individual ou e mpresa individual de responsabilidade limitada.
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Lei 6.404/1966 Art. 206. Dissolve-se a companhia: I - de pleno direito: (...) d) pela existncia de 1
(um) nico acionista, verificada em assemblia-geral ordinria, se o mnimo de 2 (dois) no for
reconstitudo at do ano seguinte, ressalvado o disposto no artigo 251;
501 Lei 6.404/1976, Art. 251. A companhia pode ser constituda, mediante escritura pblica, tendo como
nico acionista sociedade brasileira.
502 Decreto-Lei 200/1967, Art. 5 - II Empresa Pblica - a entidade dotada de personalidade jurdica
de direito privado, com patrimnio prprio e capital exclusivo da Unio, criado por lei para a explorao
de atividade econmica que o Govrno seja levado a exercer por fora de contingncia ou de
convenincia administrativa podendo revestir-se de qualquer das formas admitidas em
direito. (Redao do Decreto-Lei n 900, de 1969).
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O Cdigo Comercial de 1850 adotava como pressuposto lgico que a responsabilidade do scio era
pessoal e, por isso mesmo, ilimitada: Art. 329. As obrigaes dos scios comeam da data do contrato,
ou da poca nele designada; e acabam depois que, dissolvida a sociedade, se acham satisfeitas e
extintas todas as responsabilidades sociais. Carvalho de Mendona observara que o Cdigo de 1850
sequer reconhecia as sociedades comerciais como pessoas jurdicas, para efeitos de separao
patrimonial: Os legisladores de 1850, no tendo a concepo das pessoas jurdicas, como atualmente
a estabelece a doutrina, no podiam assim considerar as sociedades de comrcio. Nenhum artigo do
Cdigo lhes reconheceu a personalidade; ao contrrio, parece que muitos a contestam. (Vejam-se,
para exemplos, os textos dos arts. 313 e 315). (Tratado de Direito Comercial Brasileiro, vol. III, Rio
de Janeiro, Freitas Bastos, 5 edio, 1954, p. 80-81).
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Ao comeo, e durante muitos sculos, a comenda ostentava natureza contratual, como operao
isolada do comrcio de mar. Capitalista, que ficava em terra (o comendator, socius stans), ministrava
dinheiro, mercadorias e at mesmo o navio, ao empresrio (o accomanditarius, tractator, portitor ou
portator), a fim de que este negociasse alm-mar, com intuito de lucro e partilha do ganho. (Tratado
de Direito Comercial, vol. 3, O Estatuto da Sociedade de Pessoas, So Paulo, Saraiva, 1961, p.
212).
508 Waldemar Ferreira, Tratado de Direito Comercial, vol. 3, O Estatuto da Sociedade de Pessoas,
cit., p. 213.
509 Nesse sentido, Waldemar Ferreira esclarecia: Ento, a necessidade de defesa desse capital, como
garantia dos credores sociais contra os ataques dos credores particulares dos scios, fez sentir a
convenincia de tornar pblica, com o registro na corporao ou na comuna, a existncia da sociedade,
a medida das quotas conferidas pelos scios, a firma ou razo social, tornando indispensvel
contabilidade distinta das operaes sociais. (Tratado de Direito Comercial, vol. 3, O Estatuto da
Sociedade de Pessoas, cit., p. 213).
510 Manual das Sociedades Annimas, So Paulo, Atlas, 3 edio, 1994, p. 59.
511 Essas companhias surgiram estreitamente ligadas ao Estado, que as privilegiava, por meio do
sistema do octroi, com a personalidade jurdica plena, o reconhecimento do patrimnio autnomo e
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dois tipos de scios: os principais e os secundrios. Em regra, conferia-lhes o Estado inmeros outros
privilgios, em relao sua atuao nas Colnias. (Waldirio Bulgarelli, Manual das Sociedades
Annimas, cit., p. 60). Observa Tullio Ascarelli que nas companhias coloniais j se delineam os
caractersticos fundamentais hoje peculiares da sociedade annima e que a distinguem entre as vrias
espcies de sociedades: responsabilidade limitada dos scios e diviso do capital em aes, isto ,
possibilidade de serem, as participaes dos vrios scios, corporizadas em ttulos facilmente
circulveis; a pessoa do scio , destarte, indiferente caracterizao jurdica da sociedade.
(Problemas das sociedades annimas e Direito Comparado, cit., p. 336).
512 Waldirio Bulgarelli, Manual das Sociedades Annimas, cit., p. 60.
513 A despeito das crises, o desenvolvimento das sociedades annimas que aos poucos se
estenderam a novos campos (o seguro, o banco, os transportes, a indstria e o comrcio)
acompanhou o desenvolvimento econmico moderno. A sociedade annima foi elaborando aos poucos
sua disciplina: determinou-se a distino entre os acionistas e os vrios rgos sociais e as funes
destes; o conceito de um exerccio social e da repartio peridica dos lucros; foram-se introduzindo
as aes ao portador; foram-se precisando o conceito e os caracteres da responsabilidade limitada, e
elaborando e precisando o conceito de capital social. A partir de toda especializao desse aparato
jurdico, a sociedade annima passa a apresentar-se como o instrumento tpico da grande empresa
capitalstica e, com efeito, surgiu e se desenvolveu com este sistema econmico e em relao s suas
exigncias. (Tullio Ascerelli, Problemas das sociedades annimas e Direito Comparado, cit., p.
338-339).
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Fbio Ulhoa Coelho esclarece que a criao da sociedade limitada bastante recente em relao
aos tipos societrios histricos, como as sociedades em nome coletivo, em comandita e por aes, e
decorre da iniciativa de parlamentares, para atender ao interesse de pequenos e mdios
empreendedores, que queriam beneficiar-se, na explorao de atividade econmica, da limitao da
responsabilidade tpica das annimas, mas sem atender s complexas formalidades destas, nem se
sujeitar prvia autorizao governamental. (Curso de Direito Comercial, vol. 2, cit. p. 394).
515 Sentiu-se desde muito, na Alemanha, necessidade de criar forma societria em que se limitassem
os riscos dos scios a soma determinada, por quantia previamente estabelecida, do mesmo modo que
na sociedade annima, mas que, por outro lado, se rodeasse de maior simplicidade em suas
constituio de desenvolvimento, de modo, e a observao de Karl Heinsheimer, que servisse a
empresas da ao restrita ou de carter provisrio, especialmente as empresas de famlia. (Waldemar
Ferreira, Tratado de Direito Comercial, vol. 3, O Estatuto da Sociedade de Pessoas, cit., p. 388).
516 Reproduzindo o modelo da sociedade por quotas de responsabilidade limitada regulado na lei alem,
praticamente todas as naes do mundo passaram a adotar esse regime societrio para as pequenas
e mdias empresas: Portugal (1901); ustria (1906); Brasil (1919); Chile (1923); Frana (1925); Hungria
(1929); Argentina (1932); Uruguai (1933); Mxico (1934); Blgica (1935); Sua (1936); Itlia (1942).
517 Tratado de Direito Comercial, vol. 3, O Estatuto da Sociedade de Pessoas, cit., p. 388-389.
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A respeito dessa simulao societria, Tullio Ascarelli observara: Considera-se, por exemplo, a
sociedade por aes com um nico scio meio indireto para exercer, com responsabilidade limitada,
um comrcio individual: imaginaria societas, dir-se-ia, em linguagem romana. frequente o caso de
sociedades que, embora constituda por vrias pessoas, so, no entanto, substancialmente dominadas
por uma s, visando proporcionar a esta a possibilidade de exercer o comrcio com responsabilidade
limitada. As demais pessoas que intervm no ato constitutivo so normalmente amigos complacentes
(o advogado que redigiu a ata, parentes, etc.), que, com frequncia, logo aps a constituio da
sociedade, cedem as prprias aes ao nico scio e cuja participao , de qualquer forma, irrisria
e motivada por amizade. (Problemas das sociedades annimas e Direito Comparado, cit., p. 130).
Na prtica empresarial, segundo Wilges Bruscato, essas sociedades imaginrias so tambm
conhecidas por sociedade aparente, ficcional, de favor ou simulada. (Empresrio Individual de
Responsabilidade Limitada, So Paulo, Quartier Latin, 2005. P. 26).
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A sociedade unipessoal foi assim criada, sucessivamente, na Dinamarca (1976), Alemanha (1980),
Frana (1985), Holanda (1986) e Blgica (1987). A Comunidade Europeia, atravs da Diretiva 667, de
1989, props a constituio de sociedades unipessoais de responsabilidade limitada, com base nos
seguintes argumentos e disposies bsicas: Considerando que conveniente prever a criao de um
instrumento jurdico que permita a limitao da responsabilidade do empresrio individual, em toda a
Comunidade, sem prejuzo das legislaes dos Estados-membros que, em casos excepcionais,
impem a responsabilidade desse empresrio relativamente s obrigaes da empresa; (...) Art. 2.
Item 1. A sociedade pode ter um scio nico no momento da sua constituio, bem como por fora da
reunio de todas as partes sociais numa nica pessoa (sociedade unipessoal). (...) Art. 4. O scio
nico exerce os poderes atribudos assembleia geral de scios. (...) Art. 7. Um Estado-membro pode
decidir no permitir a existncia de sociedades unipessoais no caso de a sua legislao prever a
possibilidade de o empresrio individual constituir uma empresa de responsabilidade limitada com um
patrimnio afecto a uma determinada actividade desde que, no que se refere a essas empresas, se
prevejam garantias equivalentes s impostas pela presente directiva bem como pelas outras
disposies comunitrias aplicveis s sociedades referidas no artigo 1.
529 Dispositivo vetado na Lei Complementar 123/2006 - Do Empreendedor Individual de
Responsabilidade Limitada - Art. 69. Relativamente ao empresrio enquadrado como microempresa
ou empresa de pequeno porte nos termos desta Lei Complementar, aquele somente responder pelas
dvidas empresariais com os bens e direitos vinculados atividade empresarial, exceto nos casos de
desvio de finalidade, de confuso patrimonial e obrigaes trabalhistas, em que a responsabilidade
ser integral.
530 O Cdigo de 2002 prev, apenas, uma hiptese excepcional, de segregao patrimonial, para
permitir a continuidade ou sucesso na empresa por pessoa incapaz: Art. 974. Poder o incapaz, por
meio de representante ou devidamente assistido, continuar a empresa antes exercida por ele enquanto
capaz, por seus pais ou pelo autor de herana. (...) 2o No ficam sujeitos ao resultado da empresa os
bens que o incapaz j possua, ao tempo da sucesso ou da interdio, desde que estranhos ao acervo
daquela, devendo tais fatos constar do alvar que conceder a autorizao.
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Na sua tese de ctedra, Sylvio Marcondes Machado adota a concepo objetiva do patrimnio de
afetao, situando a empresa individual na categoria dos objetos de direito, por exigir o melhor desvlo
na elaborao das normas adequadas constituio do patrimnio separado. (Limitao da
responsabilidade de comerciante individual, So Paulo, Max Limonad, 1956, p. 286).
532 Foi assim que, depois de algumas tentativas legislativas frustradas e com aproximadamente 30
(trinta) anos de atraso em comparao realidade de diversos pases da famlia romano-germnica,
s com o advento da Lei n 12.441, de 11 de julho de 2011, o direito ptrio finalmente concebeu a sua
prpria e singular estrutura jurdica para limitar a responsabilidade de entes unipessoais exercentes de
atividades econmicas. (Erasmo Valado Azevedo e Novaes Frana e Marcelo Vieira Von Adamek,
Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (Lei n 12.441/2011) Anotaes, em
Sociedade Limitada Contempornea, cit., p. 43).
533 A Lei 12.441/2011 teve sua origem no Projeto de Lei 4.605/2009, apresentado pelo Deputado
Marcos Montes Cordeiro (DEM-MG), inicialmente para inserir a empresa individual de responsabilidade
limitada no ttulo das sociedades, para incluso do art. 985-A. O deslocamento da matria para o ttulo
do empresrio individual, assim como a sugesto para incluso da EIRELI como pessoa jurdica de
direito privado, alterando o art. 44 do Cdigo Civil e a fixao de um capital mnimo, decorreram de
emendas do relator na Comisso de Constituio e Justia, Deputado Marcelo Itagiba (PSDB-RJ). A
principal motivao e justificativa do projeto de lei consistia na necessidade de fulminar com costume
(sic) de constituir sociedades limitadas com o enfoque nico de proteger o patrimnio pessoal do
verdadeiro e nico empreendedor e, para isto, era induzido a admitir um scio apenas para ter o
patrimnio pessoal protegido por eventuais dvidas derivadas da atividade econmica. (Paulo
Leonardo Vilela Cardoso, O empresrio de responsabilidade limitada, cit., p. 70-71).
534
Cdigo Civil de 2002 Art. 980-A. A empresa individual de responsabilidade limitada ser
constituda por uma nica pessoa titular da totalidade do capital social, devidamente integralizado, que
no ser inferior a 100 (cem) vezes o maior salrio-mnimo vigente no Pas. 1 O nome empresarial
dever ser formado pela incluso da expresso "EIRELI" aps a firma ou a denominao social da
empresa individual de responsabilidade limitada. 2 A pessoa natural que constituir empresa individual
de responsabilidade limitada somente poder figurar em uma nica empresa dessa modalidade. 3 A
empresa individual de responsabilidade limitada tambm poder resultar da concentrao das quotas
de outra modalidade societria num nico scio, independentemente das razes que motivaram tal
concentrao. 4 (VETADO). 5 Poder ser atribuda empresa individual de responsabilidade
limitada constituda para a prestao de servios de qualquer natureza a remunerao decorrente da
cesso de direitos patrimoniais de autor ou de imagem, nome, marca ou voz de que seja detentor o
titular da pessoa jurdica, vinculados atividade profissional. 6 Aplicam-se empresa individual de
responsabilidade limitada, no que couber, as regras previstas para as sociedades limitadas.
535 Na opinio de Fbio Ulhoa Coelho, a EIRELI, como instituto jurdico, seria, simplesmente, o nome
juris dado, no Brasil, sociedade limitada unipessoal (Curso de Direito Comercial, vol. 1, 18 edio,
2014, p. 127). Essa concluso ele justifica pela incluso da EIRELI como pessoa jurdica de direito
privado, bem como pela sua regulao subsidiria nas normas das sociedades limitadas.
536 Alfredo de Assis Gonalves Neto observa que na lei brasileira afora a questo da convenincia de
se adotar a limitao da responsabilidade do comerciante ou empresrio individual, verificou-se a
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art. 44 do Cdigo Civil foi alterado pela Lei 12.441/2011 para inserir, entre as pessoas
jurdicas de direito privado, a EIRELI. Nesse modelo hbrido, a lei brasileira ficou mais
prxima do estabelecimento individual de responsabilidade limitada EIRL, de
Portugal, o qual se encontra em franco desuso,537 do que da forma da sociedade
unipessoal, que passou a ser adotada e hoje predomina em Portugal desde o DecretoLei 257, de 1997, assim como em quase todos os pases europeus.
Esse modelo indefinido da EIRELI levou alguns autores, a exemplo de Carlos
Henrique Abro, a confundir o capital mnimo com o limite da responsabilidade do
empreendedor individual, de modo tal que o patrimnio de afetao estaria
subordinado ao capital social integralizado desde o incio da constituio do negcio,
ao teto de 100 salrios-mnimos.538 Assim, o limite da responsabilidade do empresrio
ficaria representado pelo capital mnimo, e as dvidas que ultrapassarem esse teto no
estariam vinculadas aos efeitos da limitao, respondendo o empresrio titular da
EIRELI, ilimitadamente, pelo passivo excedente a 100 salrios-mnimos. Tal
entendimento, todavia, no dever prosperar, porque inexiste, na lei, qualquer
previso nesse sentido.
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539 Saliente-se, a propsito, que a fixao pelo legislador de um valor mnimo ao capital vem na
contramo de uma tendncia de supresso dessa exigncia legal. Esta tendncia foi, inclusive, adotada
pela Lei de S/A, que em sua exposio de motivos j esclarecia que embora muitas das pequenas
companhias existentes no Pas pudessem ser organizadas como sociedades por quotas de
responsabilidade limitada, no h interesse em limitar arbitrariamente a utilizao de forma de
companhia. (Prefcio obra de Paulo Leonardo Vilela Cardoso, O empresrio de responsabilidade
limitada, cit., p. 14).
540 Alfredo de Assis Gonalves Neto, Direito de empresa, cit., p. 134.
541 Paulo Leonardo Vilela Cardoso, O empresrio de responsabilidade limitada, cit., p. 77. Cabe
observar que, na lei portuguesa reguladora do Estabelecimento Individual de Responsabilidade
Limitada - EIRL, criado pelo Decreto-Lei 248, de 1986, com a ltima atualizao do Decreto-Lei 08, de
2007, no qual a lei brasileira, ao que parece, procurou se espelhar, foi definido o capital mnimo no
montante de 5.000,00, para a constituio da EIRL em Portugal. No Brasil, exige-se, hoje, para a
constituio da EIRELI, capital superior a mais de quatro vezes o capital exigido em Portugal.
542 Visando reduzir o capital exigido da EIRELI, de 100 para 50 salrios-mnimos, tramita na Cmara
dos Deputados o Projeto de Lei 2.468/2011; o autor do projeto, Deputado Carlos Bezerra (PMDB-MT),
prope a reduo do capital mnimo exigido pela regra atual, so R$ 62,2 mil, o que cairia pela
metade baseado no argumento do professor Cssio Cavalli, da Escola de Direito da Fundao Getlio
Vargas (FGV Direito Rio). Cavalli ressalta que 100 salrios mnimos superam o valor dos ativos
empregados para a organizao da maioria das pequenas empresas. No de se esperar, por
exemplo, que o proprietrio de um carrinho de cachorro quente empregue mais de R$ 50 mil como
capital social, afirma. O professor acrescenta, a ttulo de comparao, que com R$ 3 mil possvel
constituir uma sociedade limitada, pois no h valor mnimo exigido. (Cmara Notcias, Economia,
17/01/2012, http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/economia/207859).
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543
Lei 4.595/1964 - Art. 4 Compete ao Conselho Monetrio Nacional, segundo diretrizes estabelecidas
pelo Presidente da Repblica: (...) XIII - Delimitar, com periodicidade no inferior a dois anos o capital
mnimo das instituies financeiras privadas, levando em conta sua natureza, bem como a localizao
de suas sedes e agncias ou filiais;
544 Normas de exigncia ou fixao de capital mnimo: companhias financeiras e bancrias (Lei
4.595/1964, art. 4, XIII; Resoluo do Banco Central 2.099/1994; Regulamento Bacen, Anexo II, art.
1, com a redao das Resolues 2.607/1999 e 3.334/2005; Resoluo 2.828/2001, art. 5; Resoluo
3.334/2005, art. 9; Resoluo 3.426/2006, art. 5; Resoluo 3.567/2008, art. 4, I); companhias de
seguro privado (Decreto-Lei 73/1966, art. 32, VI; Resoluo CNSP 316/2014); sociedades de planos
de assistncia e seguros privados de sade (Lei 9.656/1998, art. 35-A, IV).
545 No entender de Paulo Roberto Bastos Pedro, a exigncia de capital mnimo seria, inclusive,
inconstitucional, pois trata o empresrio individual de responsabilidade limitada de maneira diferente
dos demais empresrios que, de modo livre, fixam o valor do capital social. (Curso de Direito
Empresarial, So Paulo, Revista dos Tribunais, 2011, p. 48).
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jurdica possa constituir mais de uma EIRELI, por se tratar de ente formado por vrias
outras pessoas, fsicas ou jurdicas.
Em suporte a essa interpretao ampliativa, de admitir que a EIRELI possa ser
constituda por pessoa jurdica, o 6 do mesmo art. 980-A do Cdigo Civil estabelece
que aplicam-se EIRELI, no que couber, as regras previstas para as sociedades
limitadas. No mbito do regime jurdico da sociedade limitada (CC, arts. 1.052 a
1.087), no existe qualquer norma que restrinja, limite ou proba uma pessoa jurdica
de ser scia ou participar dos rgos de administrao da sociedade. No existindo
vedao expressa para a participao de pessoa jurdica na sociedade limitada, como
scia ou administradora, essa faculdade de participao deveria ser naturalmente
estendida EIRELI, e no vedada, como assim, de modo equivocado, o rgo do
registro de empresas regulamentou. 554
Parte da doutrina entende, em consonncia com as instrues normativas do
DNRC/DREI e com o Enunciado n 468 da Jornada de Direito Civil, que a EIRELI
somente pode ser constituda por pessoa fsica ou natural.555 Todavia, de modo
esclarecedor, Erasmo Valado de Frana e Marcelo Von Adamek consideram que tal
restrio no encontra justificao plausvel, nem lgica, nem dogmtica, inclusive
porque, em todos os pases da Europa, no mbito da Diretiva n 667, de 1989, a
554 A respeito dessa questo controversa da pessoa jurdica como titular da EIRELI, fazendo citao de
outros doutrinadores, Leslie Amendolara comenta: A Junta Comercial no permite o registro de EIRELI
como pessoa jurdica, com fundamento na interpretao contrria dada lei pelo Departamento
Nacional do Registro do Comrcio, rgo a que esto subordinadas as juntas. O advogado, expresidente da Junta Comercial de So Paulo, Armando Rovai, tem se posicionado reiteradamente
favorvel EIRELI pessoa jurdica, afirmando que ao DNRC dever apenas caber a superviso e
coordenao da execuo dos servios de registro pblico a cargo das Juntas Comerciais, deixando
entrever, como assinala mais frente, que se trata de reflexo do indevido e equivocado controle
material dos atos societrios que deveria ser exercido unicamente pelo Poder Judicirio (Jornal
Empresa e Negcios). O professor e consultor jurdico Jorge Lobo defende tambm a tese da
permisso de a EIRELI ser constituda por pessoa jurdica, afirmando textualmente: A incorreta
exegese do DNRC , ademais, repelida pelo elemento histrico, porquanto o Projeto de Lei 4.605/09
que se transformou na Lei 12.441/11 dispunha, inspirado nas legislaes do Chile, Peru, Paraguai (...)
textualmente: A EIRELI ser constituda por um nico scio, pessoa natural. (Jornal Valor). Ocorre
que a proposta foi alterada no Congresso, com a supresso do vocbulo natural, concluindo Jorge
Lobo, no mesmo texto: a pessoa natural e a pessoa jurdica podem fundar uma EIRELI.
(Transformao de tipos societrios em empresa individual de responsabilidade limitada, em
Pedro Anan Junior e Marcelo Magalhes Peixoto, Coordenadores, Empresa Individual de
Responsabilidade Limitada Aspectos econmicos e legais, So Paulo, MP Editora, 2012, p. 137138).
555 Carlos Henrique Abro Empresa individual, cit., p. 10; Alfredo de Assis Gonalves Neto, Direito
de empresa Comentrios aos artigos 966 a 1.195 do Cdigo Civil, cit., p. 128-130.
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sociedade unipessoal pode ter como nico scio instituidor tanto uma pessoa fsica
como uma pessoa jurdica.556
Atravs do Enunciado n 469, a Jornada de Direito Civil do Conselho da Justia
Federal - CJF, no que tange s suas caractersticas, entendeu que a empresa
individual de responsabilidade limitada (EIRELI) no sociedade, mas novo ente
jurdico personificado. A 1 Jornada de Direito Comercial, tambm promovida pelo
CJF,557 chegou a concluso semelhante, ao aprovar o Enunciado n 3, com a seguinte
redao: A Empresa Individual de Responsabilidade Limitada EIRELI no
sociedade unipessoal, mas um novo ente, distinto da pessoa do empresrio e da
sociedade empresria.
Preliminarmente, sob interpretao topogrfica estrita, a EIRELI no
configuraria sociedade porque sua disciplina jurdica no est localizada na parte
referente s sociedades no Cdigo Civil (artigos 981 e seguintes), mas sim no ttulo
que regula o empresrio individual (art. 980-A). Vale lembrar que, no projeto de lei
originrio, as disposies relativas EIRELI foram propostas dentro do ttulo das
sociedades (art. 985-A).558 Logo, diante da indeciso do legislador, tal critrio no se
demonstra til para a definio da natureza da EIRELI.
De acordo com a concluso dos enunciados doutrinrios acima citados, a
EIRELI seria um terceiro ente, um tertium genus, pois no caracterizaria nem
empresrio individual, nem sociedade, mas modalidade hbrida. Por determinao
expressa da lei, foroso reconhecer que a EIRELI uma pessoa jurdica, por
definio legal, no por mera equiparao. A partir do momento em que a Lei
12.441/2011 modificou o art. 44 do Cdigo Civil para nele incluir, como pessoa jurdica
de direito privado, a empresa individual de responsabilidade limitada,559 ao invs de
556
Ainda que a EIRELI tenha sido idealmente concebida para estruturar pequenos negcios (algo que,
pela exigncia de capital mnimo elevado, perdeu-se nas boas intenes do legislador), nada obsta a
que tambm venha a ser utilizada para os mais diversos fins, inclusive por mdias e grandes empresas.
Exatamente da mesma forma como ocorre no exterior. Empresa Individual de Responsabilidade
Limitada (Lei n 12.441/2011) Anotaes, em Sociedade Limitada Contempornea, cit., p. 50-51.
557 1 Jornada de Direito Comercial do Conselho da Justia Federal, ver em http://www.cjf.jus.br/cjf/
CEJ-Coedi/jornadas-cej/LIVRETO%20-20I%20JORNADA%20DE%20DIREITO%20COMERCIAL.pdf.
558 Paulo Leonardo Vilela Cardoso, O empresrio de responsabilidade limitada, cit., p. 70.
559 Cdigo Civil de 2002 Art. 44. So pessoas jurdicas de direito privado: I - as associaes; II - as
sociedades; III - as fundaes; IV - as organizaes religiosas; (Includo pela Lei 10.825/2003); V - os
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contudo, foi vetado quando da sano da Lei 12.441/2011,560 sob o argumento, pfio,
de que a expresso em qualquer situao poderia gerar divergncias quanto
aplicao das hipteses gerais de desconsiderao da personalidade jurdica,
previstas no art. 50 do Cdigo Civil. Para preencher o vcuo legislativo resultante do
veto aposto ao 4 do art. 980-A, o Enunciado 470 da Jornada de Direito Civil do CJF
assim prescreveu, reproduzindo, quase que literalmente, o dispositivo vetado: O
patrimnio da empresa individual de responsabilidade limitada responder pelas
dvidas da pessoa jurdica, no se confundindo com o patrimnio da pessoa natural
que a constitui, sem prejuzo da aplicao do instituto da desconsiderao da
personalidade jurdica.
Por bvio, o principal efeito resultante da aquisio da personalidade jurdica
o da separao patrimonial.561 Os demais efeitos decorrentes do registro da pessoa
jurdica (CC, art. 46), como denominao, objeto, foro e representao, so
secundrios. Com o nascimento da pessoa jurdica, esta passa a existir com
patrimnio prprio, segregado, distinto do patrimnio dos seus membros. Se a
responsabilidade dos scios instituidores limitada ou ilimitada, isso outra questo.
No caso da EIRELI, mesmo diante do regime jurdico e dos efeitos inerentes
criao das pessoas jurdicas, a lei ainda buscou reforar, inutilmente, em vo, esse
carter da segregao do patrimnio da empresa do patrimnio particular do
empresrio instituidor. Ora, se a EIRELI surge como pessoa jurdica formal, assim
definida pela lei (CC, art. 44, VI), no poderiam remanescer quaisquer dvidas quanto
aos efeitos da separao patrimonial. O dispositivo vetado (CC, art. 980-A, 4),
efetivamente, teve como resultado ou efeito, a representao da metfora constante
do adgio popular chover no molhado. Mesmo assim, a Presidenta da Repblica,
mal assessorada pelos seus jurisconsultos, resolveu vetar essa norma, veto este que,
560
Cdigo Civil, art. 980-A (redao da Lei 12.441/2011) Dispositivo vetado 4 Somente o
patrimnio social da empresa responder pelas dvidas da empresa individual de responsabilidade
limitada, no se confundindo em qualquer situao com o patrimnio da pessoa natural que a constitui,
conforme descrito em sua declarao anual de bens entregue ao rgo competente.
561 Sobre essa questo do principal efeito da personifizao, Jos de Oliveira Ascenso enfatiza: O
primeiro aspecto est ligado autonomia patrimonial. H bens (os em comunho) que respondem
particularmente por certas dvidas. Cria-se por isso um patrimnio autnomo, como vimos; e, como
esse patrimnio autnomo pertence a vrias pessoas simultaneamente, designa-se patrimnio
colectivo. Porm, segundo certos autores, como Carnelutti, para haver personalidade colectiva basta
justamente a autonomia patrimonial. Temos aqui uma concepo minimalista da personalidade
jurdica. (Direito Civil Teoria Geral, cit., p. 252).
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562
No dizer da Carlos Henrique Abro, no se cuida de sociedade com nico scio, mas empresa de
um empreendedor. Empresa Individual EIRELI, cit., p. 4.
563 vista das disposies do art. 980-A do Cdigo Civil, Alfredo de Assis Gonalves Neto conceitua a
EIRELI como agente econmico personificado, constitudo por ato unilateral de uma pessoa natural,
mediante aporte de um patrimnio mnimo, ou mediante converso de uma socidade unipessoal com
patrimnio lquido mnimo para o fim de exercer atividade prpria de empresrio. Direito de empresa
Comentrios aos artigos 966 a 1.195 do Cdigo Civil, cit., p. 125.
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O Cdigo italiano de 1942, fonte de inspirao do nosso Cdigo de 2002, contm normas especiais
que definem o pequeno empresrio, assim caracterizado no art. 2.083: Sono piccoli imprenditori i
coltivatori diretti del fondo (1647, 2139), gli artigiani, i piccoli commercianti e coloro che esercitano
un'attivit professionale organizzata prevalentemente con il lavoro proprio e dei componenti della
famiglia (2.202, 2.214, 2.221). Ao pequeno empresrio no se aplicam as regras que determinam
obrigaes especficas aos demais empresrios, como a inscrio no registro de empresas (art. 2.202),
a dispensa da escriturao contbil (art. 2.214) e a no sujeio falncia (art. 2.221).
565 CC, Art. 970. A lei assegurar tratamento favorecido, diferenciado e simplificado ao empresrio
rural e ao pequeno empresrio, quanto inscrio e aos efeitos da decorrentes.
566 Constituio Federal Art. 170. A ordem econmica, fundada na valorizao do trabalho humano
e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existncia digna, conforme os ditames da justia
social, observados os seguintes princpios: (...) IX - tratamento favorecido para as empresas de
pequeno porte constitudas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administrao no Pas.
Art. 179. A Unio, os Estados, o Distrito Federal e os Municpios dispensaro s microempresas e s
empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurdico diferenciado, visando a
incentiv-las pela simplificao de suas obrigaes administrativas, tributrias, previdencirias e
creditcias, ou pela eliminao ou reduo destas por meio de lei.
268
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desenvolvimento empresarial (art. 1). Esse diploma pioneiro foi revogado pela Lei
8.864/1994, que regulamentou o art. 179 da Constituio Federal, passando a
estabelecer regimes especficos e diferenciados para a microempresa (ME) e para a
empresa de pequeno porte (EPP), assim classificadas em razo do seu faturamento
e com enquadramento formalizado perante a Junta Comercial.
A Lei 8.864/1994, por sua vez, foi revogada e substituda pela Lei 9.841/1999,
que praticamente manteve o mesmo regime anterior, com pequenas modificaes,
mas que teve como finalidade principal adaptar o regime jurdico da microempresa e
da empresa de pequeno porte nova sistemtica fiscal de pagamento de impostos e
contribuies institudo pela Lei 9.317/1996, denominado SIMPLES (Sistema
Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuies das Microempresas e
Empresas de Pequeno Porte).
A partir da Lei 9.841/1999,567 o regime de regulao da microempresa e da
empresa de pequeno porte passa a ter carter dominantemente tributrio, relegando
para segundo plano outros incentivos de ordem creditcia, comercial, trabalhista,
previdenciria e de desburocratizao dos procedimentos no registro de empresas.
A Lei 9.841/1999 vigorou por sete anos, sendo integralmente revogada pela Lei
Complementar 123/2006.568 Somente em algumas poucas disposies normativas, a
567
Lei 9.841/1999 Art. 1o Nos termos dos arts. 170 e 179 da Constituio Federal, assegurado s
microempresas e s empresas de pequeno porte tratamento jurdico diferenciado e simplificado nos
campos administrativo, tributrio, previdencirio, trabalhista, creditcio e de desenvolvimento
empresarial, em conformidade com o que dispe esta Lei e a Lei no 9.317, de 5 de dezembro de 1996,
e alteraes posteriores. Pargrafo nico. O tratamento jurdico simplificado e favorecido, estabelecido
nesta Lei, visa facilitar a constituio e o funcionamento da microempresa e da empresa de pequeno
porte, de modo a assegurar o fortalecimento de sua participao no processo de desenvolvimento
econmico e social.
568 A preocupo maior da Lei Complementar 123/2006, atualizada pela Lei Complementar 128/2008 e
depois pela Lei Complementar 147/2014, foi estabelecer um regime especial de tributao para as
microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP), como previsto no seu art. 1, o qual
estabelece que as normas gerais aplicveis a essas empresas instituem um tratamento diferenciado
especialmente no que se refere apurao e recolhimento dos impostos e contribuies da Unio,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municpios, mediante regime nico de arrecadao, inclusive
obrigaes acessrias. De acordo com o art. 3 da Lei Complementar 123/2006, atualizada pela Lei
Complementar 147/2014, consideram-se microempresas e empresas de pequeno porte a sociedade
empresria, a sociedade simples e o empresrio, do modo como previsto no Cdigo Civil de 2002,
desde que registrados perante a Junta Comercial, sendo que, para efeitos de definio e
enquadramento legal, a microempresa aquela que aufere uma receita bruta anual igual ou inferior a
R$ 360.000,00, ou R$ 30.000,00 por ms, enquanto a empresa de pequeno porte ser assim
considerada aquela com receita bruta anual entre R$ 360.000,01 e R$ 3.600.000,00 (art. 3), ou com
faturamento mdio mensal acima de R$ 30.000,00, e inferior a R$ 300.000,00. Acima desse valor de
269
exigncias
procedimentos
para
enquadramento
legal
das
270
Ivanildo Figueiredo
572
271
Ivanildo Figueiredo
As mdias e grandes empresas, no Brasil, em nmeros absolutos, resumemse, apenas, a 23.652 organizaes (0,5 %), apesar da representatividade econmica,
na medida que participam com aproximadamente 80 % da gerao de riquezas,
aferida pelo Produto Interno Bruto - PIB. Na sua relao de participao na economia
brasileira, as microempresas e as empresas de pequeno porte, formais ou regulares,
respondem por cerca de 20 % do PIB, pela ocupao de 57,2 % dos trabalhadores e
por 26 % da massa salarial distribuda.573
Portanto, apesar de quase que totalmente omitida pelas normas genricas do
Cdigo Civil de 2002, as microempresas e empresas de pequeno porte so
disciplinadas, de modo bastante especfico, pela legislao infraconstitucional,
regulamentadora do art. 179 da Constituio da Repblica. Importante observar que
o sistema de registro simplificado, destinado criao e formalizao das pequenas
empresas, denominado de Rede Nacional para a Simplificao do Registro e da
Legalizao de Empresas e Negcios - REDESIM, foi includo e assim referido no
Cdigo Civil, a partir da modificao do seu art. 968, que trata do registro do
empresrio na Junta Comercial.574
As microempresas (ME), as empresas de pequeno porte (EPP) e o
microempreendedor individual (MEI), para fins de registro nas Juntas Comerciais,
devem obter o reconhecimento da sua regularidade jurdica na REDESIM.575 Essa
573
272
Ivanildo Figueiredo
273
da
atividade
econmica.
Mantendo
orientao
dominante
da
576
Jos Xavier Carvalho de Mendona, Tratado de Direito Comercial Brasileiro, vol. V, parte I, Rio
de Janeiro, Freitas Bastos, 5 edio, 1955, p. 15; Oscar Barreto Filho, Teoria do estabelecimento
comercial, cit., p. 75.
577 Cdigo Comercial de 1850 Art. 1. Podem commerciar no Brasil: 1. Todas as pessoas que, na
conformidade das Leis deste Imperio, se acharem na livre administrao de suas pessoas e bens, e
no forem expressamente prohibidas neste Codigo. 2. Os menores legitimamente emancipados. 3. Os
filhos-familias que tiverem mais de dezoito annos de idade, com autorisao dos paes, provada por
escriptura publica. O filho maior de vinte e hum annos, que for associado ao commercio do pae, e o
que com sua approvao, provada por escripto, levantar algum estabelecimento commercial, ser
reputado emancipado e maior para todos os effeitos legaes nas negociaes mercantis.
578 Como sinnima de estabelecimento comercial podemos adotar a expresso negcio comercial,
empregada na Lei n 2.024, de 17 de dezembro de 1908, arts. 2, n. 7, 78, 157 et passim, no Regul. n
738, de 1850, art. 15, e no Decreto n 848, de 11 de outubro de 1890, art. 191, letra g. O Cdigo
Comercial, no art. 301, alude casa de comrcio, no mesmo sentido. Aquela expresso equivale ao
negotium ou negotiatio do direito romano, ao fonds de commerce do direito francs e belga, a azienda
commerciale do direito italiano, ao Geschaeft ou Hendelsgeschaeft do direito alemo e austraco, ao
goodwill of a trade do direito ingls e norte-americano. Cada um desses direitos trata do instituto sob o
ponto de vista, no diremos absolutamente diferente, mas peculiar s suas instituies e tradies.
(J.X. Carvalho de Mendona, Tratado de Direito Comercial Brasileiro, vol. V, parte I, cit., p. 16-17).
274
Ivanildo Figueiredo
Desde que foi regulado, pela primeira vez, em uma norma positiva, no ano de
1898, na Frana, o estabelecimento recebeu a denominao de fundo de comrcio
(fonds de commerce). Essa expresso revela que a organizao da empresa sempre
esteve caracterizada, intrinsecamente, por sua natureza comercial ou mercantil. Na
Itlia, o estabelecimento foi definido, de modo mais sinttico, como azienda
commerciale ou patrimonio aziendale. Na Inglaterra, a figura do estabelecimento
consagrou-se sob a denominao goodwill of a trade, que expressa, por si s, a idia
de uma entidade mercantil. Na Espanha, a organizao dos elementos da empresa
veio a ser designada como hacienda ou establecimiento comercial, expresso
incorporada no direito portugus como estabelecimento comercial e assim tambm
adotada pela doutrina brasileira.
A idia de estabelecimento comercial decorre do modo como o empresrio
organiza os fatores de produo e os recursos necessrios explorao da atividade
econmica.579 A partir do momento em que o empresrio integraliza o capital na
empresa, ele ir estruturar o seu negcio, escolher o local que constituir sua base
fsica de atuao, passando, ento, a adquirir bens, maquinrio, equipamentos,
matrias primas e mercadorias para revenda, organizando e dispondo dos recursos
necessrios execuo do objeto da empresa, contratando empregados, enfim,
alocar e ordenar os meios para o exerccio da empresa. O estabelecimento comercial
restar configurado no momento em que esses recursos estiverem racionalmente
organizados para o cumprimento da funo econmica da empresa.
579 Na lio de Oscar Barreto Filho, o estabelecimento comercial define-se a partir de trs elementos
ou fatores: capital, trabalho e organizao: No sentido econmico, o patrimnio comercial, tanto da
pessoa fsica quanto da pessoa jurdica, se constitui, inicialmente, pelo capital, que, de ordinrio,
representado por dinheiro. Mas, para a consecuo do objetivo econmico, faz-se mister aplicar o
capital em bens adequados ao exerccio do comrcio (mquinas, matrias-primas, mercadorias, etc.).
Da transformao do capital num complexo de bens apropriados para o exerccio da atividade mercantil
resulta o estabelecimento comercial. No suficiente, contudo, o elemento esttico, representado pelo
capital, para formar o estabelecimento comercial, como unidade econmica. Faz-se mister juntar-lhe o
elemento dinmico, representado pelo trabalho, que se converte em servios, por sua vez adequados
aos objetivos que se tem em mira alcanar. Esses bens (oriundos do capital) e servios (provenientes
do trabalho) so conjugados em funo do fim colimado, e a surge o elemento estrutural: a
organizao. (...) combinao desses trs elementos ou fatores capital, trabalho e organizao
que servem ao comerciante para o exerccio de sua atividade produtiva que se denomina, em
economia, de estabelecimento comercial. Este se apresenta, sob o ponto de vista econmico, como
um organismo unitrio resultante da organizao concreta dos fatores de produo dirigida para uma
determinada atividade produtiva. (Teoria do estabelecimento comercial, cit., p. 62/63).
275
Ivanildo Figueiredo
A nica diferena entre esses dois conceitos que o Cdigo Civil brasileiro
atribui a organizao do complexo de bens do estabelecimento ao empresrio e
igualmente sociedade empresria. A expresso sociedade empresria criao do
580 O estabelecimento empresarial, assim explica Fbio Ulhoa Coelho, representa elemento
indissocivel empresa, de tal modo que no existe como iniciar a explorao de qualquer atividade
empresarial, sem a organizao de um estabelecimento, podendo ser considerado como uma
propriedade com caractersticas singulares, dependendo do modo como o empresrio ir organizar e
agregar os fatores de produo para a explorao do negcio. (Curso de Direito Comercial, vol. 1,
cit. P. 112-113).
276
Ivanildo Figueiredo
581
J.X. Carvalho de Mendona, Tratado de Direito Comercial Brasileiro, vol. V, parte I, cit., p. 15.
Oscar Barreto Filho, Teoria do estabelecimento comercial, cit., p. 75.
583 J.X. Carvalho de Mendona, Tratado de Direito Comercial Brasileiro, vol. V, parte I, cit., p. 23.
582
277
Ivanildo Figueiredo
584 Considera Oscar Barreto Filho que o exerccio de atividade econmica organizada pelo empresrio
pressupe, necessariamente, uma base econmica, ou seja, um complexo de bens que constituem o
instrumento e, de certo modo, o objeto de seu trabalho, de tal modo que pode-se dizer que o
estabelecimento representa a projeo patrimonial da empresa, ou, com preciso maior, o organismo
tcnico-econmico, por cujo intermdio se realiza a coordenao dos fatores de produo pela qual a
empresa atua e se desenvolve (Teoria do estabelecimento comercial, cit., p. 115-116).
585 Oscar Barreto Filho, Teoria do estabelecimento comercial, cit., p. 169.
586 Oscar Barreto Filho, Teoria do estabelecimento comercial, cit., p. 173.
278
Ivanildo Figueiredo
587
Segundo Oscar Barreto Filho, uma das mais clssicas definies de aviamento foi elaborada pelo
Juiz Joseph Story (1779-1845), da Suprema Corte dos Estados Unidos, que assim a ele se referiu:
Aviamento a vantagem ou proveito que adquirido por um estabelecimento alm do mero valor do
capital, aes, fundos ou bens nele empregados, em conseqncia do geral apoio e estmulo pblico
que ele recebe de clientes constantes ou habituais, por motivo de sua localizao ou fama, reputao
de percia ou abundncia, pontualidade, ou de outras circunstncias acidentais ou necessidades, ou
ainda de antigas parcialidades ou preconceitos (Teoria do estabelecimento comercial, cit., p. 175).
279
Ivanildo Figueiredo
280
Ivanildo Figueiredo
Logo em seguida, o art. 1.144 exemplifica, como negcios jurdicos que podem
ser realizados no mbito do estabelecimento, a alienao, usufruto ou
arrendamento.
A alienao ou trespasse do estabelecimento significa a venda integral da
empresa ou de alguma instalao fabril ou comercial destacada, que passa ao
controle ou subordinao de outra empresa. O trespasse a modalidade mais comum
de negcio jurdico tendo por objeto o estabelecimento. O trespasse no deve ser
confundido com a alienao do controle societrio ou com outras operaes
societrias em que a transmisso da propriedade da empresa realiza-se mediante a
venda das quotas ou aes, e no de um patrimnio separado ou cindido. Nos casos
de alienao de controle, de incorporao (Lei 6.404/1976, art. 227) ou de fuso (Lei
6.404/1976, art. 228), o objeto do negcio jurdico so os prprios ttulos
representativos do capital, e no o patrimnio segregado e contabilizado.
No trespasse, a empresa alienante do estabelecimento continuar existindo,
salvo se vier a transferir a totalidade do patrimnio cindido. Com efeito, o objeto do
negcio jurdico, na alienao do estabelecimento, so parcelas do patrimnio
281
Ivanildo Figueiredo
cindidas e transferidas para outra empresa. Assim encontra-se previsto, por exemplo,
na Lei de Recuperao de Empresas e Falncia (Lei 11.101/2005, art. 50, VII), ao
contemplar a hiptese de trespasse do estabelecimento como um dos meios ou
estratgias que podem ser adotados pelo plano de recuperao visando o
saneamento da empresa em crise.
Atravs do usufruto do estabelecimento, o titular da empresa transfere a outra
pessoa, fsica ou jurdica, o direito de percepo dos frutos, rendimentos ou lucros
gerados pela explorao comercial, mantendo todavia, no seu domnio patrimonial, a
nua propriedade do capital da empresa individual ou das quotas ou aes da
sociedade comercial.
O arrendamento empresarial representa a cesso temporria dos direitos de
explorao dos resultados do estabelecimento, mediante a celebrao de um contrato
entre o arrendador (empresrio ou scio controlador) e o arrendatrio (novo
explorador da empresa), em que o arrendatrio passar a administrar e gerenciar a
empresa durante um certo perodo de tempo, dividindo com o arrendador os lucros da
atividade, ou pagando a este um valor previamente determinado no contrato.
Alm dos negcios jurdicos expressamente relacionados no art. 1.144 do
Cdigo Civil, o estabelecimento e seus bens unitariamente considerados, podem ser
objeto, ainda, de penhor industrial ou mercantil (art. 1.447), de anticrese (art. 1.506),
de ciso patrimonial (Lei 6.404/76, art. 229) ou de penhora judicial do seu faturamento
(Cdigo de Processo Civil de 1973, art. 655, VII; Novo Cdigo de Processo Civil de
2015, art. 837).
Dependendo da natureza do problema ou da criatividade dos operadores do
direito, diversos outros negcios jurdicos podem ser realizados tendo o
estabelecimento como objeto.
Na anlise da disciplina do estabelecimento comercial no Cdigo de 2002,
Fbio Tokars revela a sua decepo com a preocupao do legislador em conceber o
estabelecimento muito mais como instrumento de interesse dos credores do que com
a prpria configurao conceitual do estabelecimento como modo de organizao dos
282
Ivanildo Figueiredo
fatores de produo e dos direitos imateriais dele resultantes.591 Isto porque os artigos
1.145 e 1.146 definem as regras de proteo dos interesses dos credores no caso de
alienao ou trespasse do estabelecimento, antes mesmo de caracterizar a projeo
desses direitos sob a perspectiva patrimonial.
De acordo com o disposto no art. 1.145 do Cdigo Civil, se no trespasse do
estabelecimento, ao empresrio vendedor no restarem bens suficientes para solver
o seu passivo, a eficcia da alienao do estabelecimento depende do pagamento de
todos os credores, ou do consentimento destes, de modo expresso ou tcito, em trinta
dias a partir de sua notificao. Essa regra exige a concordncia da unanimidade dos
credores para a validade da alienao do estabelecimento, reproduzindo norma que
igulamente consta na Lei de Recuperao de Empresas e Falncia (Lei 11.101/2005,
art. 129, VI). Esse requisito, de quase impossvel aplicabilidade, diante da
necessidade da aceitao da totalidade ou unanimidade dos credores para a validade
do trespasse do estabelecimento, revela evidente antinomia diante da tendncia
evolutiva recente do direito comercial, que passou a mover o seu foco antes centrado
apenas no interesse dos credores, para a necessidade de preservao da empresa e
para o cumprimento da sua funo social.592
Na legislao comercial extravagante, como na parte disciplinada pela Lei de
Recuperao de Empresas e Falncia (Lei 11.101/2005), a alienao do
estabelecimento comercial vem a ser considerada como uma das principais
estratgias para a superao da crise patrimonial da empresa, e assim se observa em
alguns de seus dispositivos.593 O Cdigo Civil de 2002 no seguiu essa tendncia
591
283
Ivanildo Figueiredo
evolutiva, na medida em que coloca sob suspeio os negcios que tenham por objeto
a alienao do estabelecimento.
Ocorrendo a alienao do estabelecimento, o art. 1.146 do Cdigo prescreve
que o adquirente do estabelecimento responde pelo pagamento dos dbitos
anteriores transferncia, desde que regularmente contabilizados, continuando o
devedor primitivo solidariamente obrigado pelo prazo de um ano, a partir, quanto aos
crditos vencidos, da publicao, e, quanto aos outros, da data do vencimento.594
Desse modo, na alienao do estabelecimento, instaura-se uma situao de
insegurana jurdica para o adquirente, que ficar como devedor solidrio pelas
dvidas da empresa existentes no momento da alienao, ainda que a esse passivo
no tenha dado causa.595
A redao do art. 1.146 do Cdigo Civil caracteriza, na opinio de Fbio Tokars,
evidente absurdo jurdico, decorrente da confuso entre sujeito e objeto de direito, e
que gera dificuldades prticas de aplicao nas operaes de alienao do
estabelecimento, instaurando um estado de regulamentao imprpria, que impede
materialmente a realizao do negcio por empresrios que sejam previamente
informados quanto aos possveis efeitos jurdicos do negcio, e que, desta forma,
nega o princpio da preservao da empresa.596
Como resultante desse princpio de preservao da empresa, que tem como
fundamento um princpio constitucional superior, o da funo social da empresa (CF,
art. 170, III), no regime falimentar, no caso de alienao de ativos representados pelo
prprio estabelecimento empresarial, ocorrendo a alienao da empresa como um
todo, o objeto da alienao estar livre de qualquer nus e no haver sucesso do
594
284
que
passivo
do
estabelecimento
alienado
fica
sendo
de
285
Ivanildo Figueiredo
pela clientela que, em condies normais, realiza negcios com aquela casa
comercial.
No Cdigo italiano de 1942, essa obrigao especfica na alienao do
estabelecimento foi denominada de proibio de concorrncia, expressa em seu art.
2.557:
Art. 2.557 - Divieto di concorrenza - Chi aliena l'azienda deve astenersi,
per il periodo di cinque anni dal trasferimento, dall'iniziare una nuova impresa che per
l'oggetto, l'ubicazione o altre circostanze sia idonea a sviare la clientela dell'azienda
ceduta (2.125, 2.596).
597
286
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598
287
Captulo 5
A unificao do direito das obrigaes
unicidade
da
estrutura
obrigacional implica,
necessariamente,
no
599
600
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601
Na lio de Mario Rotondi, obligare quer dizer ligar com cordas, e solvere liberar das cordas, dos
vnculos, das correntes, do vnculo estreito de sujeio do devedor que somente extinto com a
satisfao do credor diante do adimplemento da prestao correspondente. (Instituciones de Derecho
Privado, cit., p. 310).
602 Na sua acepo mais ampla, ensina Roberto de Ruggiero, a obrigao exprime qualquer espcie
de vnculo ou de sujeio da pessoa, qualquer que seja a sua fonte ou contedo, nela se podendo
englobar qualquer obrigao que seja ditada pela moral, convenincia, honra, usos sociais, por outro
lado qualquer obrigao imposta pelas normas jurdicas, sejam elas de direito pblico ou privado, mas
no seu sentido jurdico, considera-se obrigao somente as que nascem de relaes entre pessoas,
tm um contedo patrimonial e implicam para uma pessoa o dever de fazer a outra uma prestao e,
para essa segunda pessoa, a faculdade de a exigir da primeira(Instituies de Direito Civil, vol. 3,
Campinas, Bookseller, 1 edio, 1999, p. 33-34).
603 Cdigo Civil Art. 481.Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir
o domnio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preo em dinheiro.
604 Paulo Luiz Netto Lobo, Teoria Geral das Obrigaes, So Paulo, Saraiva, 2005, p. 21.
289
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605
Segundo Pietro Perlingieri, a obrigao configura-se cada vez mais como uma relao de
cooperao. E tal fato importa em uma mudana radical de perspectiva de leitura da disciplina das
obrigaes; esta ltima no deve ser considerada o estatuto do credor; a cooperao, e um
determinado modo de ser, substitui a subordinao e o credor se torna titular de obrigaes genricas
ou especficas de cooperao ao adimplemento do devedor (Perfis do Direito Civil Introduo ao
Direito Civil Constitucional, Rio de Janeiro, Renovar, 2 edio, 2002, p. 212).
606 Roberto de Ruggiero, Instituies de Direito Civil, cit., p. 37.
607 Lei 8.078/1990 Art. 3. Fornecedor toda pess oa fsica ou jurdica, pblica ou privada, nacional
ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produo,
290
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291
Ivanildo Figueiredo
(arts. 428 a 440), que eram na sua base originrias do direito civil, com normas
limitadas ao pagamento, novao e compensao nos contratos comerciais.
No Cdigo Comercial, a denominada obrigao mercantil confundia-se com o
prprio contrato. No existia um regime obrigacional amplo para os negcios
mercantis, tal como posteriormente foi institudo pelo Cdigo Civil de 1916. O Cdigo
Civil passou, a partir de ento, a disciplinar as categorias e institutos fundamentais do
direito das obrigaes, como as suas modalidades denticas bsicas (dar, fazer e no
fazer), as obrigaes alternativas, divisibilidade e indivisibilidade, solidariedade,
transmisso das obrigaes, pagamento, novao, sub-rogao, dao em
pagamento, efeitos da inexecuo, a mora, as perdas e danos, os juros, e, por fim, a
clusula penal.
necessrio afirmar, neste ponto, que o direito das obrigaes no se
encontrava regulado no Cdigo Comercial, e as referncias existncia da obrigao
mercantil, em alguns artigos, no importava no reconhecimento da existncia de um
direito obrigacional comercial, instituidor de regime diferenciado do regime geral do
direito privado. O que o Cdigo Comercial de 1850 regulava eram normas genricas
de obrigaes e tipos especficos de contratos mercantis, praticados por
comerciantes, que tinham por objeto bens mveis, e que eram executados e
interpretados no que for mais conforme boa-f, e ao verdadeiro esprito e natureza
do contrato. (art. 131, item 1).
Os contratos mercantis, estes sim, sempre mereceram tratamento prprio,
especfico e adaptado s peculiaridades dos negcios comerciais. A simplicidade e a
agilidade das frmulas dos contratos mercantis exigiam, e ainda continuam a exigir,
sem embargo, tratamento diferenciado daquelas aplicadas aos contratos civis entre
particulares, ou seja, daqueles que no exercem, com profissionalidade, uma
atividade especulativa e de risco.
Observa Paulo Lobo, ao comentar o Cdigo Civil de 2002, que as normas
jurdicas estabelecidas nos arts. 233 a 420 do Cdigo aplicam-se a todas as relaes
jurdicas obrigacionais, assim as negociais como as extranegociais, de natureza civil
ou mercantil, previstas no referido Cdigo ou na legislao especial. Essas mesmas
292
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609
Paulo Luiz Netto Lbo, Teoria Geral das Obrigaes, cit., p. 20.
Teoria Geral das Obrigaes Responsabilidade Civil, So Paulo, Atlas, 10 edio, 2004, p.
26-27.
610
293
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294
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613
295
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Por exemplo, no caso de uma empresa que tem por objeto a fabricao e
comercializao de calados, esta realiza negcios de compra de matrias primas,
como o couro, produzido por um cortume, alm de outros insumos, como pregos
adquiridos de uma empresa metalrgica, a cola de uma indstria qumica e a borracha
dos solados fornecida por uma fbrica de produtos sintticos, para em seguida
submeter esses insumos a um processo de industrializao. Essa empresa no vende
diretamente os calados produzidos aos consumidores, mas realiza a distribuio dos
seus produtos atravs de outras empresas atacadistas e varejistas ou por
representantes comerciais. Nessa situao tpica, o objeto das relaes contratuais
assume natureza estritamente mercantil, seja na aquisio de insumos de outras
empresas comerciais, seja na venda dos produtos industrializados a empresas
distribuidoras, varejistas ou representantes, tambm comerciais. As caractersticas
dessas operaes empresariais revestem-se de uma especificidade que no pode ser,
de modo algum, enquadrada na generalidade dos contratos civis, celebrados entre
particulares, que geralmente tm por objeto uma coisa fora do comrcio e tampouco
visam o lucro.
Os negcios comerciais so planejados, concebidos e implementados a partir
de um desiderato lucrativo, em que a racionalidade contbil orienta e determina o
contedo e os objetivos buscados nas relaes contratuais. Todo contrato empresarial
visa, necessariamente o lucro, ou seja, nas palavras de Paula Forgioni, tem o escopo
de lucro.614 As estratgias mercadolgicas para a oferta dos produtos no mercado, os
modelos negociais adotados pelas empresas, a organizao dos seus sistemas
administrativos, a estruturao de processos industriais, a persecuo constante de
resultados econmicos, a cotao das aes das companhias abertas nas bolsas de
valores, todos esses elementos, totalmente ausentes nas relaes de Direito Civil,
614
Nos contratos empresariais, ambos [ou todos] os polos so movidos pela busca do lucro, tm sua
atividade toda ela voltada para a perseguio de vantagem econmica. (...) Talvez a onerosidade
seja o atributo dos contratos mercantis mais destacado pela doutrina, que sempre os encarou como
forma de obter proveito econmico. A empresa no atua no mercado por outra razo ltima que no a
obteno de lucro; assim, pode-se legitimamente supor que a celebrao dos contratos
interempresariais d-se porque todas as partes acreditam que seus interesses esto sendo satisfeitos.
O fim lucrativo a caracterstica fundamental a partir do qual se desdobram as demais peculiaridades
dos negcios mercantis. (Paula Andrea Forgioni, Teoria geral dos contratos empresariais, So
Paulo, Revista dos Tribunais, 2010, p. 56/57).
296
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615
Paula Andrea Forgioni, Teoria geral dos contratos empresariais, cit., p. 41.
Salvatore Monticelli e Giacomo Porcelli, I contratti dellImpresa, Turim, G. Giappichelli Editore,
2006, p. 1.
617 Waldirio Bulgarelli, Tratado de Direito Empresarial, op. cit., p. 15.
616
297
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298
Cdigo de 2002
Cdigo de 1916
(artigos)
(artigos)
481 a 532
533
534 a 537
538 a 564
565 a 578
579 a 585
586 a 592
593 a 609
610 a 626
627 a 652
653 a 692
693 a 709
710 a 721
722 a 729
730 a 756
757 a 802
1.122 a 1.163
1.164
Sem previso
1.165 a 1.187
1.188 a 1.215
1.248 a 1.255
1.256 a 1.264
1.216 a 1.236
1.237 a 1.247
1.265 a 1.287
1.288 a 1.330
Sem previso
Sem previso
Sem previso
Sem previso
1.432 a 1.476
299
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618 Apesar de ser recebido como destacada evoluo em matria contratual, o princpio da boa-f, tal
como consta do art. 422 do Cdigo Civil se releva limitado porque, como observa Gustavo Tepedino,
sequer cogita do dever de boa-f na fase ps-contratual, e essa omisso representa um ponto
gravssimo uma vez que, na prtica, os juzes vinham aplicando a boa-f objetiva nas relaes
contratuais de maneira ampla, e sero tolhidos com a entrada em vigor do novo Cdigo Civil (O Novo
Cdigo Civil: duro golpe na recente experincia constitucional brasileira, in Temas de Direito
Civil, Tomo II, cit., p. 359).
300
contratuais
constantes
do
Cdigo
Civil
de
1916,
fundadas,
619
Paulo Lbo, Princpios contratuais, in A teoria do contrato e o novo Cdigo Civil, Paulo Lbo e
Eduardo Messias Gonalves de Lyra Junior, Coordenadores, Recife, Nossa Livraria, 2003, p. 15.
620 Paulo Lbo, Princpios contratuais, in A teoria do contrato e o novo Cdigo Civil, cit., p. 12.
621 Paulo Lbo, Princpios contratuais, cit., p. 22.
301
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622
302
Ivanildo Figueiredo
625
Gustavo Tepedino, As relaes de consumo e a nova teoria contratual, Temas de Direito Civil,
cit., p. 220.
626 Nesse sentido, explica Gustavo Tepedino: Nos dias de hoje, a necessidade de se dar efetividade
plena s clusulas gerais faz-se tanto urgente na medida em que se afigura praticamente impossvel
ao direito regular o conjunto de situaes negociais que floresce na vida contempornea, cujos avanos
tecnolgicos surpreendem at mesmo o legislador mais frentico e obcecado pela autalidade. (As
relaes de consumo e a nova teoria contratual, Temas de Direito Civil, cit., p. 226).
303
Ivanildo Figueiredo
627
Pietro Perlingieri, Perfis do Direito Civil Introduo ao Direito Civil Constitucional, cit., p. 6.
Teresa Negreiros, Teoria do Contrato: novos paradigmas, Rio de Janeiro, Renovar, 2 edio,
2006, p. 299.
628
304
Ivanildo Figueiredo
Tendncias modernas
Enfoque contenudstico
Abordagem dinmica
Cooperao
Coletivismo
Abordagem voltada para a pessoa
629
305
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306
Ivanildo Figueiredo
A doutrina, com base nas lies de Carvalho de Mendona, passou a inserir no objeto da compra e
venda mercantil as operaes com bens imveis, considerando que a excluso dos imveis do conceito
de mercadoria no mais se justificava nos tempos atuais, em especial porque os imveis podem ser
objeto de negcios especulativos realizados em carter profissional, por empresas construtoras e
incorporadoras que perseguem o lucro, caracterstica marcante das atividades mercantis. O simples
fato do imvel no ser passvel de circulao fsica no descaracterizaria, pois, a sua natureza como
mercadoria, tal como assim tambm consideram Joo Eunpio Borges, Waldirio Bulgarelli e Fran
Martins. No direito positivo brasileiro, a Lei 4.068/1962, expressamente esclareceu no seu art. 1, que
So comerciais as empresas de construo, atribuindo, desse modo, natureza mercantil s atividades
imobilirias por estas efetuadas. Mas tambm em razo da forma, uma vez que as empresas do setor
imobilirio so constitudas como sociedades comerciais e registradas perante a Junta Comercial,
essas empresas ficam submetidas legislao mercantil e os negcios de compra e venda de imveis
restam caracterizados como atos empresariais.
307
Ivanildo Figueiredo
633
308
Ivanildo Figueiredo
comrcio, isto porque, o contrato ser comercial quando for firmado por comerciante
no exerccio da sua profisso.634
O elemento subjetivo destacado por Bulgarelli perfeitamente adaptvel e
compatvel com a teoria da empresa, podendo ser caracterizada como mercantil a
compra e venda na qual um dos contratantes seja uma empresa, e esse contrato
esteja vinculado ao exerccio do objeto da atividade empresarial. De acordo com o
Cdigo Civil, constitui objeto da empresa o exerccio de atividade econmica
organizada destinada produo ou circulao de bens ou de servios. A compra e
venda mercantil tanto pode, baseada nesse conceito legal, ser caracterizada no plano
da empresa industrial que produz para vender, como da empresa comercial que
compra a mercadoria produzida para revender ou para alugar o seu uso.
Em complemento caracterizao da comercialidade da compra e venda, o
fato dessas operaes serem realizadas de modo repetitivo, em massa, com carter
habitual e profissional, consistindo, inclusive, no objeto da empresa, que somente
existe para promover tais negcios, isto demonstra que os contratos celebrados pelas
empresas apresentam aspectos diferenciadores de uma simples compra e venda civil,
celebrada entre particulares.
Assim, se uma pessoa oferece, atravs de um anncio de classificados
publicado em jornal, o seu automvel para venda, e outra pessoa particular, no
comerciante, negocia e contrata a compra desse bem, para uso prprio, essa
transao pode ser satisfatria e suficientemente regida pelo modelo genrico da
compra e venda civil.
Situao inteiramente diversa ocorre quando uma empresa industrial realiza a
transformao de matrias-primas em produtos finais, para colocao no mercado
atravs de uma rede de distribuio, e ambas as partes envolvidas na relao so
empresas cujo objeto a realizao de negcios profissionais com escopo lucrativo.
A empresa distribuidora adquire as mercadorias com a nica finalidade de revenda, e
no para uso ou consumo prprio.
634
309
Ivanildo Figueiredo
Resulta claro, lgico, que os exemplos acima citados no podem ser regulados
por normas idnticas, se a causa e a finalidade do negcio so totalmente distintos. A
diversidade de situao fctica exige um tratamento diferenciado, no podendo uma
operao profissional ser regulada da mesma maneira que um negcio particular
isolado.635
No sistema do Cdigo Civil italiano de 1942, o qual foi reproduzido no Cdigo
Civil de 2002, ocorreu, como j referido, a supresso da distino entre contrato civil
e contrato comercial.636 Todavia, com o passar dos anos, como observado por
Vincenzo Buonocore, a doutrina italiana veio progressivamente a admitir a existncia
de uma nova categoria de contratos comerciais, que foram ento denominados de
contratos de empresa ou contratos empresariais.637 Para Buonocore, a configurao
dos contratos empresariais como categoria foi defendida por vrios autores, com base
na individuao de uma srie de atos, tanto previstos no Cdigo Civil como fora do
Cdigo, ou mesmo extranormativos, e que, diante de suas peculiaridades, conferem
unitareidade e homogeneidade a vrias figuras negociais compreendidas nas
atividades das empresas.638
No mbito especfico dos contratos de troca e da compra e venda mercantil,
segundo Buonocore, diversos fatores contriburam para a especializao dos
contratos empresariais, entre os quais, em particular, as crescentes exigncias da
contratao, as mutaes das tcnicas de colocao dos produtos no mercado e os
novos sistemas de integrao industrial e comercial, que passaram a determinar um
processo dplice: de um lado, a fragmentao do contrato de venda em mltiplos
subtipos e variveis, e de outro lado, a diferenciao dos novos tipos negociais.639
635
No mesmo sentido, Paula Castello Miguel considera que no h como tratar de forma idntica os
contratos firmados por pessoas comuns, a fim de regular uma ou outra relao obrigacional, com os
contratos firmados entre empresrios no exerccio de sua atividade econmica. (Contratos entre
empresas, cit., p. 67).
636 Observa Paula Forgioni, com a acuidade que lhe peculiar, que premidos pela influncia do Codice
Civile e pela centralidade do conceito de empresrio, os doutrinadores abrigam os contratos
interempresariais e os consumeristas na mesma categoria (contratti dellimpresa ou contratti
commerciali), ainda que reconhecendo as diferenas entre eles. (Teoria geral dos contratos
empresariais, cit., p. 42).
637 Vincenzo Buonocore, et alli, Istituzioni di Diritto Commerciale, Torino, G. Giappichelli, 6 edizione,
2006, p. 499.
638 Vincenzo Buonocore, et alli, cit., p. 500.
639 Vincenzo Buonocore, et alli, cit., p. 516.
310
Mesmo
que
reconhecida
tendncia
contempornea
de
311
Ivanildo Figueiredo
640
Paula Andrea Forgioni, Teoria geral dos contratos empresariais, cit., p. 31.
De acordo com Fbio Ulhoa Coelho, pode-se afirmar que, entre empresrios iguais isto , com
recursos para entabular negociaes devidamente informados sobre a exata extenso dos direitos e
obrigaes em contratao -, aplica-se o regime cvel; entre empresrios desiguais, aplicam-se as
normas especificamente editadas para o contrato (p. ex. as das leis sobre representao comercial) ou
o regime do direito do consumidor (na hiptese de empresrio consumidor ou vulnervel). Por isso, na
sua opinio, submetem-se ao direito do consumidor, caracterizado pelas normas cogentes sobre as
obrigaes das partes, os contratos entre empresrios em que um deles consumidor (figura como
destinatrio final, sob o ponto de vista econmico e no fsico, da mercadoria ou servio) ou se encontra
em situao anloga de consumidor (vulnerabilidade econmica, social ou cultural). (Curso de
Direito Comercial, vol. 3, cit., p. 35-37).
642 A doutrina consumerista, todavia, representada por Cludia Lima Marques, recusa que seja
considerado consumidor o profissional empresrio, qualquer que seja o seu porte, pois a finalidade do
641
312
Alguns
contratos
estritamente
mercantis
ou
empresariais,
como
Cdigo de Defesa do Consumidor tutelar de maneira especial um grupo da sociedade que mais
vulnervel, e quanto mais especfico e restrito for o campo de aplicao das normas de proteo do
consumidor, ficar assegurado um nvel mais alto de proteo para estes, pois a jurisprudncia ser
construda em casos, onde o consumidor era realmente a parte mais fraca da relao de consumo e
no sobre casos em que profissionais-consumidores reclamam mais benesses do que o Direito
Comercial j lhes concede. (Contratos no Cdigo de Defesa do Consumidor, So Paulo, Revista
dos Tribunais, 4 edio, 2002, p. 254).
643 Paula Andrea Forgioni, Contrato de distribuio, So Paulo, Revista dos Tribunais, 2005, p. 344345.
644 Paula Andrea Forgioni, Contrato de distribuio, cit., p. 347.
313
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645
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Legislao comercial
Cdigo 2002
(artigos)
534 a 537
693 a 709
710 a 721
710 a 721
Sem previso
Sem previso
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646
316
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647 Na opinio de Claude Champaud, o contrato de concesso comercial define-se como [U]ma
conveno pela qual um comerciante, denominado concessionrio, pe sua empresa de distribuio a
servio de um comerciante ou industrial, denominado concedente, para assegurar, com exclusividade
sobre um territrio determinado, durante um perodo limitado e sob a vigilncia do concedente, a
distribuio dos produtos cujo monoplio de revenda lhe assegurado. (La concession
commerciale, in Revue Trimestrielle du Droit Commerciale, n 24, Paris, 1963, p. 471, traduo livre).
648 A relao contratual constituda entre o concedente e o concessionrio extrapola, todavia, o mbito
da relatividade dos efeitos desse vnculo, isto porque incide sobre a livre vontade das partes, um regime
legal que estabelece regras protetivas em favor do concessionrio, tal como observado por Carlos
Alberto Senatore: Contm assim a concesso comercial uma normativa complexa das relaes entre
concedente e concessionrios, que se manifesta sob uma srie de pactos que atingem no s as suas
relaes bilaterais como tambm a prpria rede. Esses pactos se referem s partes, ao objeto da
concesso, ao preo, remunerao do concessionrio, exclusividade, durao do contrato, sendo
ainda freqente pactos especiais que contm manifestaes mais ou menos amplas de um domnio da
empresa concedente sobre a concessionria, tais como a clusula de imposio do preo de revenda,
a clusula de quotas, de estoques, etc., chegando mesmo a coarctar de tal maneira a livre atuao do
concessionrio que este no pode dispor a seu livre arbtrio dos benefcios que resultam de sua
explorao mercantil. (A concesso comercial entre produtores e distribuidores de veculos
automotores de via terrestre no Brasil, in Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econmico e
Financeiro, So Paulo, Editora RT, Nova Srie, n 36, Outubro/Dezembro 1979, p. 110).
649 Bernard Buisson, Michel Lagger e Bernard du Granrut, tude sur le contrat de concession
exclusive, Paris, Sirrey, 1968, p. 8.
317
Ivanildo Figueiredo
Segundo Fran Martins, franquia o contrato que liga uma pessoa a uma
empresa, para que esta, mediante condies especiais, conceda primeira o direito
de comercializar marcas ou produtos de sua propriedade sem que, contudo, a essas
estejam ligadas por vnculo de subordinao.651 Orlando Gomes tambm destaca o
carter exclusivamente empresarial do contrato de franquia, ao defin-lo como sendo
a operao pela qual um empresrio concede a outro o direito de usar a marca de
produto seu com assistncia tcnica para a sua comercializao, recebendo, em
troca, determinada remunerao.652
650
Na verdade, como tambm anotam os doutrinadores, o contrato entre as partes assume aspecto
puramente formal, porquanto o concedente, determinando e controlando toda a atividade do
concessionrio, em suas compras, preos de mercadorias, estoques, margem de comercializao,
reas de atuao e demais atos de sua operao, estabelece uma subordinao econmica sob
aparncia de uma independncia jurdica (Jean Treard, Revue Trimestralle du Droit Commercial,
Paris, 1972, n 3, apud Nvio Terra, Contrato de concesso comercial margem de
comercializao, Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econmico e Financeiro, So Paulo, Editora
RT, Nova Srie, n 71, 1988, op. cit., p. 97).
651 Contratos e obrigaes comerciais, cit., p. 244.
652 Contratos, atualizado por Humberto Theodoro Junior, Rio de Janeiro, Forense, 21 edio, 2000,
p. 467.
318
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320
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De acordo com o art. 4 da Lei 8.078/90, foi instituda por essa lei a Poltica Nacional de Relaes
de Consumo, tendo por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito sua
dignidade, sade e segurana, a proteo de seus interesses econmicos, a melhoria da sua qualidade
de vida, bem como a transferncia e harmonia das relaes de consumo.
321
Ivanildo Figueiredo
654 A relao contratual de consumo aquela que se constitui entre um consumidor, considerado este
como toda pessoa fsica ou jurdica que adquire ou utiliza produto ou servio como destinatrio final
(Lei 8.078/90, art. 2), e um fornecedor de bens ou servios, definido pela lei como pessoa fsica ou
jurdica, pblica ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que
desenvolvem atividade de produo, montagem, criao, construo, transformao, importao,
exportao, distribuio ou comercializao de produtos ou prestao de servios (art. 3).
322
Ivanildo Figueiredo
Estando esse contrato tipificado em uma lei especial, como disciplinado na lei
de concesso comercial de veculos automotores (Lei 6.729/1979), e estabelecendo
essa mesma lei que esse contrato comercial, por esse motivo no se deve recusar
o enquadramendo desse negcio jurdico como um contrato empresarial.
Seguindo essa ordem de raciocnio, Fbio Ulhoa Coelho entende, de modo
acertado e coerente que, em matria contratual, o regime jurdico aplicvel passou a
variar segundo o contrato vinculasse empresrio a empresrio (direito comercial),
empresrio a no empresrio (direito do consumidor) ou no empresrio a no
empresrio (direito civil).655
No mesmo sentido, Paula Castello Miguel reconhece a existncia desses trs
regimes contratuais diferenciados, o de tutela dos consumidores, o de direito civil e o
de direito empresarial.656 Na esfera dos contratos celebrados pelas empresas, deve
ser ainda aceita a distino entre os contratos empresariais, como sendo aqueles
firmados por empresrios, no se levando em conta o outro plo da relao
contratual, e os contratos interempresariais, que so aqueles em que, nos dois plos
da relao jurdica, esto presentes duas empresas.657
Tambm Waldirio Bulgarelli adota esse critrio de classificao, entendendo
que os contratos das empresas subdividem-se em empresariais e interempresariais,
tendo em conta que esto destinados aos negcios das empresas entre si e a destas
com no-empresrios.658 Segundo, ainda, Bulgarelli, sero sempre empresariais, por
pressupor a participao de uma empresa, os contratos de arrendamento mercantil
ou leasing, de alienao fiduciria em garantia, a locao mercantil, a compra e venda
mercantil entre empresas, o seguro e o carto de crdito, no vnculo entre o
comerciante e a empresa administradora do carto.659
655
323
Ivanildo Figueiredo
Os contratos interempresariais, alm de celebrados entre empresas, destinamse ao atendimento de uma funo econmica, cumprem a finalidade de regular
relaes estritas de carter profissional, e assim devem ser classificados como
categoria distinta dos contratos civis e dos contratos aplicveis s relaes de
consumo.
Mesmo contrariando a diretriz unificadora do Cdigo Civil de 2002, a doutrina
recusa essa generalizao tecnicista e inapropriada em face da realidade de mercado,
como assim considera a crtica de Salvatore Monticelli, ao observar que, sob o regime
original do Cdigo italiano de 1942, a expresso contrato comercial esteve por
dcadas banida do lxico jurdico, ainda que para efeitos meramente descritivos.660
Contudo, na atualidade, a expresso contratos empresariais voltou a ser
adotada pela doutrina, a partir da teimosia de alguns autores, diz Salvatore Monticelli,
que defendem a legitimidade e a utilidade de se considerar os contratos empresariais
como uma categoria especfica. A designao de contrato empresarial refere-se,
exclusivamente, segundo Monticelli, aos contratos nos quais uma das partes
caracterizada pelo status de empresa ou empresrio e o contrato estipulado como
funo instrumental do exerccio da empresa.661
Observa Monticelli que, a partir do incio da dcada de 80 do sculo passado,
profundas mudanas foram sendo introduzidas na legislao italiana, em
consequncia da recepo das diretrizes comunitrias da Unio Europia, e assim a
figura tradicional e a disciplina dos contratos empresariais, progressivamente, se
afastou do modelo codificado. Ao largo da legislao codificada, foram nascendo
vrios microssistemas contendo a disciplina de tipos especficos e de classes de
contratos, razo pela qual o Cdigo perdeu a sua centralidade. E esse fenmeno
legislativo no apenas assume propores de relevncia, incidindo de maneira
significativa em todos os setores da vida econmica, mas, sobretudo, denota-se pela
finalidade de regulao do mercado, delineando uma ordem de maior eficincia e
660
661
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664 Marcia Mallmann Lippert, A empresa no Cdigo Civil Elemento de unificao do Direito
Privado, So Paulo, Revista dos Tribunais, 2003, p. 154.
665 De acordo com o entendimento dessa doutrina minoritria, o Cdigo Civil de 2002 teria revogado o
regime dos atos de comrcio, sendo este substitudo pelo ato empresarial, e assim, se o ato comercial
no mais existe e o Direito Comercial o direito dos atos de comrcio, necessariamente a concluso
lgica que o Direito Comercial tampouco existe (Marcia Mallmann Lippert, A empresa no Cdigo
Civil Elemento de unificao do Direito Privado, cit., p. 156).
329
Ivanildo Figueiredo
Captulo 6
A unificao parcial do direito societrio
Como anteriormente observado, o Projeto do Cdigo das Obrigaes de 1965 regulava todos os
tipos societrios de direito privado, inclusive a sociedade por aes, a partir da perspectiva do contrato
de sociedade como uma das modalidades obrigacionais.
330
Ivanildo Figueiredo
integradas por pessoas, mas cuja existncia depende da vontade dos seus scios,
que podem livremente extinguir a sociedade. As associaes civis, por seu turno,
apesar de estar enquadradas no primeiro nvel classificatrio das pessoas jurdicas,
reguladas nos termos dos artigos 44 a 52 do Cdigo Civil, so dotadas de autonomia
funcional, do mesmo modo que as fundaes, e caso sejam extintas, o patrimnio da
entidade reverte para outra pessoa jurdica com a mesma finalidade. As pessoas
jurdicas, de modo geral, esto assim classificadas no direito positivo brasileiro:
Classificao das pessoas jurdicas
Direito Pblico
Pessoas jurdicas
Direito Privado
Associaes
Pessoas de direito privado
Sociedades
Fundaes
As sociedades so formas contratuais destinadas ao exerccio de atividade
econmica, podendo ser assim classificadas, a partir do novo critrio definido pelo
Cdigo Civil de 2002:
Classificao das sociedades
Sociedade em comum
No Personificadas
Sociedade em conta de
participao
Sociedades
Sociedade simples
Personificadas
Sociedade empresria
667
A EIRELI, criao da Lei 12.441/2011, no foi includa, aqui, como pessoa jurdica, por tratar-se de
modalidade artificial, no representando a configurao caracterstica de uma pessoa jurdica.
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668
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1) Sociedade simples
2) Sociedade em nome coletivo
3) Sociedade em comandita simples
4) Sociedade limitada
5) Sociedade annima
6) Sociedade em comandita por aes
7) Sociedade cooperativa
997 a 1.038
1.039 a 1.044
1.045 a 1.051
1.052 a 1.087
1.088 e 1.089 Lei 6404/1976
1.090 a 1.092 Lei 6404/1976
1.093 a 1.096 Lei 5764/1971
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674
675
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676
Exemplo de sociedade civil que no pode adotar forma empresarial a sociedade de advogados,
por vedao expressa do Estatuto da Advocacia - Lei 8.906/1994 Art. 16: No so admitidas a
registro, nem podem funcionar, as sociedades de advogados que apresentem forma ou caractersticas
mercantis, que adotem denominao de fantasia, que realizem atividades estranhas advocacia, que
incluam scio no inscrito como advogado ou totalmente proibido de advogar.
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678
Geraldo de Oliveira Santos Neves, Cdigo Civil Brasileiro de 2002 Principais alteraes,
Curitiba, Juru Editora, 2003, p. 149.
679 Raquel Sztajn, Teoria Jurdica da Empresa, cit., p. 145.
339
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A sociedade simples, sob uma perspectiva inicial, pode ser considerada como
a sucessora ou substituta da antiga sociedade civil. Ela tem por finalidade servir para
o exerccio de atividades relacionadas com objeto no mercantil, destinando-se a
profisses intelectuais, de natureza cientfica, literria ou artstica (art. 966, pargrafo
nico), bem como de outras atividades que no se caracterizem como comerciais.
Dentro do esprito do Cdigo Civil de 2002, a sociedade simples representa o
tipo bsico de sociedade, compreendendo na sua estrutura e relaes as normas
gerais do direito societrio. Origina-se o modelo da sociedade simples do Cdigo de
Obrigaes da Sua (1881), ideia posteriormente adotada, com outra configurao,
de modo inovador, pelo Cdigo Civil Italiano (1942).680
O art. 530 do Cdigo de Obrigaes da Sua enuncia que A sociedade uma
sociedade simples (...) quando ela no oferece caractersticos distintivos das outras
sociedades reguladas pela lei. Portanto, a sociedade simples uma espcie de
sociedade genrica, modelo bsico de sociedade, que assim se caracteriza se no for
constituda sob outra forma societria prevista na legislao.681
Em termos gerais, pondera Vera Helena de Mello Franco:
O fundamento da criao da sociedade simples no modelo de 1942 residiu, pura e
simplesmente, na necessidade de criar uma sociedade civil apta ao exerccio de
atividades econmicas, posto que impedia de se valer das formas societrias
680 Para Francesco Galgano, La societ semplice , como tipo de societ, una invenzione del Codice
Civile italiano del 1942: essa non ha precedenti nella nostra tradizione legislativa, n trova riscontro in
corrispondenti figura di altre legislazioni (Diritto Privato, Padova, CEDAM, 5 edio, 1988, p. 657).
681 Na opinio de J.A. Penalva Santos, a sociedade simples constitui o prottipo de sociedade de
pessoas, e as suas normas, alm de disciplinar o exerccio coletivo de uma empresa no comercial,
oferecem uma regulamentao aplicvel a todas as sociedades de pessoas, comerciais ou no
(Comentrios ao Cdigo Civil Brasileiro Do Direito de Empresa, vol. IX, cit., p. 171).
340
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341
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simples dever ser, na prtica, muito mais apropriada para regular esse tipo especfico
de sociedade, como a nova modalidade de sociedade civil, tal como se verificou na
experincia italiana.
O Cdigo Civil de 2002 no definiu a sociedade simples. Estabelece, de modo
formalista, que a sociedade simples constitui-se mediante contrato escrito, particular
ou pblico (art. 997). Tambm no tratou o Cdigo de especificar o seu objeto, sendo
este determinado de modo residual, por excluso, porque ser simples a sociedade
que no exera atividade prpria de empresrio (art. 982), sendo que, conforme a
norma, independentemente de seu objeto, considera-se empresria a sociedade por
aes; e, simples, a cooperativa (art. 982, pargrafo nico).688
Esse critrio de configurao da natureza da sociedade contm um duplo
equvoco. Em primeiro lugar, a sociedade por aes no espcie societria, mas
uma categoria de sociedade mercantil que compreende duas espcies, a sociedade
annima e a sociedade em comandita por aes. Assim empresria a espcie
societria, e no a categoria ou gnero. Em segundo lugar, a cooperativa somente
qualificada como sociedade simples por uma necessidade do legislador de impor o
seu critrio de neutralidade quanto ao carter civil ou comercial da empresa, por
recusar a adjetivao do objeto da atividade econmica. A sociedade cooperativa no
pode ser uma sociedade simples porque um tipo especfico de sociedade civil, como
assim define o art. 4 da Lei 5.764/1971: As cooperativas so sociedades de pessoas,
com forma e natureza jurdica prprias, de natureza civil, no sujeitas a falncia,
constitudas para prestar servios aos associados.
gerais, para serem aplicados aos outros tipos de sociedade. (...) Em sntese, no h nenhuma razo
de ordem cientfica, nem tcnica, nem prtica, para se transladar para o Direito brasileiro, ou novo tipo,
ou nova nomenclatura de sociedade civil. Ao contrrio do Direito italiano e do suo o Direito brasileiro
j tem modernamente muito bem constituda a sua prpria teoria das sociedades (Estudo crtico ao
Projeto de Cdigo Civil, in Aspectos Modernos de Direito Comercial, Estudos e Pareceres, So
Paulo, Saraiva, 2 edio, 1988, p. 234-235).
688 A respeito da ausncia de um conceito especfico para a sociedade simples no Cdigo Civil, Mnica
Gusmo considera que esse artigo 982 (apesar dela se referir, de modo equivocado, ao art. 983) um
primor de obviedade quando diz que a sociedade empresria aquela que exerce atividade tpica de
empresrio. Trata-se de um conceito tautolgico pois define pelo indefinido. Na parte final, obriga o
intrprete a garimpar o conceito, por excluso, isto , sem ainda saber exatamente o que se entende
por sociedade empresria, o intrprete se v na contingncia de entender que todas as outras so
simples... (Curso de Direito Empresarial, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 5 edio, 2007, p. 126).
342
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689
A sociedade empresria pode assim adotar os seguintes tipos societrios: a) sociedade em nome
coletivo; b) sociedade em comandita simples; c) sociedade limitada; d) sociedade annima; ou e)
sociedade em comandita por aes.
690 Art. 2.249. Tipos de sociedade - As socidades que tenham por objeto o exerccio de uma atividade
comercial (2195) devem ser constitudas segundo um dos tipos regulados no Captulo III e seguintes
deste Ttulo. As sociedades que tenham por objeto o exerccio de uma atividade diferente, so regidas
pelas disposies da sociedade simples, a menos que os scios tenham desejado constituir a
sociedade segundo um dos outros tipos regulados no Captulo III e seguintes deste Ttulo.
691 Na direta conceituao adotada pela doutrina italiana, a sociedade simples tem necessariamente
por objeto o exerccio de uma atividade no comercial e o tipo normal para essa atividade, e
geralmente constituda para as atividades agrcolas, artesanais e aquelas relacionadas s profisses
intelectuais (Francesco Ferrara Jr., Gli Imprenditori e Le Societ, cit., p. 265).
692 Giuseppe Auletta e Niccol Salanitro, Diritto Commerciale, cit., p. 106.
343
O Cdigo Civil de 2002 nem definiu a sociedade simples nem esclareceu que
ela seria um tipo societrio aplicvel s atividades econmicas no comerciais. Diante
da opo pela desmercantilizao das sociedades comerciais, o legislador brasileiro,
tambm neste ponto, obriga o intrprete a elaborar o seu prprio conceito de
sociedade simples, quando seria muito mais fcil e objetivo, continuar adotando o
modelo da sociedade civil, instituto bastante desenvolvido, de conceito claro e mais
afeto nossa cultura e histria jurdica.
A antiga sociedade civil era facilmente identificada, na sua denominao, pela
adoo da abreviatura S/C. Apesar do Cdigo de 2002 nada estipular sobre a
identificao da sociedade simples a partir da sua denominao, dever ser
empregada, como j vem sendo, a abreviatura S/S para esse fim.693
A sociedade simples pode adotar configurao empresarial, se constituda
como sociedade limitada, em nome coletivo, em comandita simples ou em comandita
por aes (art. 983). Todavia, o fato de adotar configurao empresarial no
transforma a sociedade simples em empresria. Ela permanece vinculada ao regime
que lhe prprio, a sua constituio deve ser formalizada mediante o seu registro em
Cartrio de Registro Civil das Pessoas Jurdicas, mas assume esse tipo peculiar
algumas
caractersticas
da
sociedade
por
quotas,
como
limitao
da
693 Essa abreviao S/S possui uma histrica conotao negativa, de triste memria, por lembrar a
organizao militar do Partido Nazista da Alemanha (Schutzstaffel) durante a Segunda Guerra Mundial
(1939-1945), a qual se atribui a prtica de crimes hediondos cometidos com o extermnio sistemtico
de judeus e de outras raas consideradas, pelos seguidores de Adolf Hitler, inferiores ao padro ariano
da raa pura. Revela-se impondervel e contraditrio, por exemplo, que uma sociedade simples
integrada por scios de origem judaica venha a reproduzir, na sua denominao, uma sigla que lembre
essa nefasta organizao nazista.
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694
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696 Na Inglaterra, quase mesma poca, ao final do sculo XIX, observa Jos Waldecy Lucena, os
pequenos e mdios comerciantes ingleses, procurando fugir s dificuldades e nus prprios da criao
das sociedades annimas, e no querendo se submeter responsabilidade ilimitada das sociedades
de pessoas (partnerships), criaram, consoante o autorizava o direito costumeiro (common law),
sociedades diferentes das sociedades annimas, em cuja forma de constituio introduziram profundas
modificaes, e a essas sociedades o uso deu o nome de private companies. (Das sociedades
limitadas, Rio de Janeiro, Renovar, 5 edio, 2003, p. 7).
347
Ivanildo Figueiredo
O modelo precedente das sociedades por quotas foi objeto de crticas por parte
de alguns doutrinadores em virtude de um certo laconismo do seu texto, ou seja, pelo
fato do Decreto 3.708/1919 conter apenas 19 artigos, e assim regular, de modo
bastante sinttico, as sociedades por quotas de responsabilidade limitada.697 Contudo,
na opinio de Modesto Carvalhosa, esse laconismo da lei acabou por se tornar o
grande fator responsvel pelo sucesso da sociedade limitada, pois lhe imprimiu
grande flexibilidade, permitindo que a autonomia privada, no caso concreto, moldasse
a sociedade segundo os interesses dos scios, por meio do contrato social.698
O modelo imposto pelo Cdigo de 2002 s sociedades limitadas reduziu, de
modo acentuado, a liberdade de contratar. Enquanto a legislao anterior da
sociedade limitada, consubstanciada no Decreto 3.708/1919, regulava o regime legal
da sociedade por quotas de responsabilidade limitada em 19 artigos, deixando para
os scios um alto grau de liberdade para dispor, no contrato social, sobre o contedo
bsico das relaes jurdicas que deveriam prevalecer em cada sociedade, o Cdigo
Civil de 2002 contm 35 artigos (arts. 1.052 a 1.087) com diversos pargrafos e
incisos, que compreendem, na verdade, 74 normas que, obrigatoriamente, devem ser
observadas na regulao da sociedade limitada e assim previstas e incorporadas ao
seu contrato social. A ampliao do nmero de normas de regulao da sociedade
limitada foi notada e tambm criticada por Carlos Henrique Abro, que considera esse
novo regime, imposto pelo Cdigo Civil de 2002, verdadeiro retrocesso.699
Um dos motivos pelos quais o Decreto 3.708/1919 teve longa vida, resultava
do fato de que, apesar de seus defeitos tcnicos, ele estabelecia um regime bsico
de definio e regulao da sociedade de responsabilidade limitada nos seus poucos
artigos, e deixava que os scios, atravs do contrato, estipulassem da maneira que
697
Na opinio de Egberto Lacerda Teixeira, um dos principais crticos do regime do Decreto 3.708/1919,
diante das omisses existentes, no devem os juristas levar ao exagero comodista de ver o Decreto
3.708 como o suporte ideal para a vida das sociedades limitadas no Brasil. (Sociedades Limitadas e
Annimas no Direito Brasileiro, So Paulo, Saraiva, 1987, p. 2).
698 Modesto Carvalhosa, Comentrios ao Cdigo Civil Parte Especial Do Direito de Empresa,
vol. 13, Antonio Junqueira Azevedo, coord., So Paulo, Saraiva, 2003, p. 4.
699 Segundo Carlos Henrique Abro, aqui repousa a unanimidade da crtica, houve retrocesso, a uma
pela demora na tramitao de quase trs dcadas, a duas pelo encarecimento e custo na constituio
de uma limitada e por derradeiro sua emblemtica percepo de sociedade simples ou indicativa
prevista de annima, o que levou a quase dobrar o nmero de artigos em relao ao revogado Diploma
3.708/19. (Nelson Abro, Sociedades Limitadas, atualizado por Carlos Henrique Abro, So Paulo,
Saraiva, 2005, 9 edio, p. 25).
348
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700
Nesse sentido, opina Waldirio Bulgarelli: Essa lei, como j frisamos bastante sucinta, apesar das
crticas que mereceu e ainda recebe de muitos autores, serviu como uma luva pequena e mdia
empresa brasileira, e continua a sua marcha com grande sucesso, embora gere, como natural, uma
srie de problemas, os quais, porm, via de regra, vm sendo resolvidos sem maiores dificuldades pela
nossa jurisprudncia. (Sociedades Comerciais, cit., p. 121).
701 Na opinio de Fbio Ulhoa Coelho, atualmente, a utilidade do conceito de affectio societatis
pequena. Serve de referncia ao desfazimento do vnculo societrio, por desentenfimento entre os
scios, no tocante conduo dos negcios sociais, repartio dos sucessos ou responsabilizao
pelos fracassos da empresa. Quando se diz ter ocorrido a quebra da affectio, isso significa que os
scios no mais esto motivados o suficiente para manterem os laos societrios que haviam
estabelecido. (A sociedade limitada no novo Cdigo Civil, So Paulo, Saraiva, 2003, p. 33).
702 Direito Societrio, Rio de Janeiro, Renovar, 5 edio, 1999, p. 76.
703 Fbio Ulhoa Coelho, todavia, alinha-se com a posio de Fran Martins para afirmar que A Lei das
Limitadas de 1919 era sucinta, o que lhe valeu, at mesmo, crticas severssimas de tecnlogos do
direito societrio (Martins, 1960:317). Nela encontravam-se regras relativas formao do nome
empresarial, proibio de scio de indstria, responsabilidade dos scios pelas obrigaes sociais,
responsabilidade do scio-gerente, delegao de poderes de gerncia, retirada do scio dissidente,
responsabilidade dos scios por deliberaes contrrias lei ou ao contrato social e algumas outras
de eficcia nenhuma. Como se pode perceber dessa pequena lista, grande parte das relaes internas
e externas da sociedade limitada no se encontrava disciplinada na lei de 1919, o que despertava a
questo doutrinria acerca do arcabouo legislativo aplicvel a esse tipo de sociedade empresria.
(Curso de Direito Comercial, vol. 2, cit., p. 395).
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Matria
Ato constitutivo
Responsabilidade
dos scios
Responsabilidade
dos scios
Nome empresarial
Regime jurdico
Capital social
Cesso das quotas
Deliberaes dos
scios
Administrao da
sociedade
Administrao da
sociedade
Balano patrimonial
Conselho Fiscal
Direito de recesso
Excluso de scio
Dissoluo da
sociedade
Caractersticas
A sociedade limitada constitui-se mediante contrato social,
adquirindo personalidade jurdica com o arquivamento do seu
ato constitutivo na Junta Comercial.
A responsabilidade dos scios limitada ou restrita ao valor das
suas quotas respectivas no capital social.
Enquanto o capital da sociedade no for integralizado, os scios
respondem solidariamente pela integralizao.
O nome empresarial deve ser formado atravs de firma social ou
de denominao, sendo agora obrigatria a designao do
objeto da empresa na denominao, vedada a sua alienao.
Aplicam-se, supletivamente, na regulao da sociedade limitada,
as normas que regem a sociedade simples.
O capital social divide-se em quotas, iguais ou desiguais,
podendo ser integralizado em dinheiro ou em bens suscetveis
de avaliao em dinheiro.
O scio pode ceder as suas quotas a outro scio sem
necessidade de consentimento dos demais, bem como a terceiro
estranho, se no houver oposio de scios que representem
1/4 do capital social.
Os scios devem deliberar atravs de Assemblia ou Reunio
de Quotistas, previamente convocadas, com o registro de suas
decises em atas.
A administrao da sociedade limitada pode ser atribuda a scio
ou a terceiro, desde que autorizado pelo contrato social
A destituio de scio administrador designado pelo contrato
depende da aprovao de scios que representem 2/3 do capital
social.
Os administradores so obrigados a elaborar, anualmente, o
inventrio dos bens, o balano patrimonial e o balano de
resultado econmico da sociedade, para prestao de contas
aos demais scios.
A sociedade pode instituir um Conselho Fiscal, com a atribuio
de fiscalizar os atos dos administradores.
O scio que discordar da alterao do contrato social, ou de
operao de fuso ou incorporao decidida pela maioria dos
scios, tem o direito de retirar-se da sociedade, apurados os
seus haveres em balano especial.
Os scios que representem mais da metade do capital social
podem decidir pela excluso compulsria do scio que esteja
colocando em risco a continuidade da empresa.
A sociedade limitada dissolve-se pelas mesmas causas
aplicveis s sociedades simples.
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1.055); b) a participao proporcional dos scios nos lucros e nas perdas resultantes
da explorao da atividade empresarial (art. 997, VII); e c) a cooperao ativa dos
scios para o alcance dos fins comuns, vinculados entre si pelo elemento da affectio
societatis (art. 981).
Atravs do contrato social, os contratantes interessados estipulam as
condies e regras que iro definir e caracterizar a sociedade em processo de criao,
devendo constar do contrato as clusulas bsicas ou essenciais relacionadas no art.
997 do novo Cdigo Civil.
O contrato social deve regular quatro nveis de relaes jurdicas, aqui definidas
como relaes jurdicas societrias, que so as seguintes, segundo esquema
desenvolvido por Egberto Lacerda Teixeira:706
1) Relaes dos scios entre si Derivam dos direitos e das obrigaes assumidas
por cada scio em face das normas do contrato social, em particular no que tange
formao do capital, nomeao dos administradores, distribuio dos lucros, ingresso
e retirada de scios e dissoluo total ou parcial da sociedade.
2) Relaes dos scios com a sociedade Importam, em primeiro lugar, na obrigao
de cada scio de integralizar o capital em favor da sociedade, seguindo os demais
deveres perante a empresa, como o dever de lealdade e de contribuir para a execuo
do seu objeto; as relaes dos scios com a sociedade assumem ora uma posio
credora, ora uma posio devedora, dependendo da obrigao devida, como no caso
da distribuio de lucros, em que os scios so credores, ou no caso da integralizao
do capital, em que os scios so devedores perante a sociedade.
3) Relaes da sociedade com terceiros Naturalmente, na execuo do seu objeto
social, a sociedade mantm relaes com terceiros, como seus clientes, fornecedores,
instituies financeiras, empregados e perante o prprio Estado e suas entidades da
administrao indireta. Nestas hipteses, a sociedade contrata em seu prprio nome,
enquanto tais obrigaes estejam vinculadas realizao do seu objeto.
706
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Regra de inovao
1.062
1.063
1.065
1.066
1.066, 2
1.073, I
1.078
1.081 a 1.084
1.085
2.031
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711
Nesse grupo de comentaristas axiologicamente neutros encontram-se autores como Amador Paes
de Almeida, Celso Marcelo de Oliveira, Amrico Luis Martins da Silva, Ricardo Negro, Osmar Brina
Corra-Lima, Rodrigo Prado Marques e Edmar Oliveira Andrade Filho.
712 Egberto Lacerda Teixeira, As sociedades limitadas e o Projeto do Novo Cdigo Civil Brasileiro,
Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econmico e Financeiro RDM, So Paulo, Revista dos
Tribunais, n 55, julho/setembro 1984, p. 162.
359
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sim a liberdade de contratao entre os scios, que constitua um dos maiores mritos
do Decreto 3.708/1919.
Alm das contradies e indefinies de natureza conceitual, o novo regime da
sociedade de responsabilidade limitada revela-se inadequado para regular o principal
tipo societrio de empresa existente em nosso pas, considerando que a orientao
dada a esse tipo societrio, no Cdigo Civil de 2002, partiu do equivocado pressuposto
de que as suas normas devem ser dirigidas para regular as organizaes empresariais
de maior porte, em que a legislao deve estar preocupada com a proteo dos scios
minoritrios, tal como ocorre na lei das sociedades annimas.
Esse novo regime societrio esqueceu e desconsiderou, ao revs, que as
pequenas e mdias empresas constituem a esmagadora maioria das sociedades
limitadas, e que as sociedades de grande porte que se organizam como de
responsabilidade limitada, em termos quantitativos, representam exceo na prtica
comercial.713 Em razo dessa regulao minuciosa, detalhista, a sociedade de
responsabilidade limitada no mais se demonstra adequada para a organizao das
micro e pequenas empresas, considerando que o legislador somente tratou desse tipo
societrio estando voltado para as empresas de maior porte e para a proteo dos
acionistas minoritrios, como destacado na Exposio de Motivos do projeto.
E entre as diversas normas do novo Cdigo Civil de regulao da sociedade
limitada, observamos que vrias esto voltadas para a proteo dos scios
minoritrios, como aquelas que possibilitam a criao de Conselho Fiscal (art. 1.066),
o rgido quorum de deliberao nas reunies ou assemblias de cotistas (art. 1.076)
e do procedimento para excluso do scio dissidente (art. 1.085). Essa preocupao
com os scios minoritrios tpica da organizao das grandes empresas, em que os
713
Essa orientao equivocada consta da Exposio de Motivos em que o Professor Miguel Reale
procurou explicar as modificaes na disciplina desse tipo societrio: Minucioso tratamento
dispensado sociedade limitada, destinada a desempenhar funo cada vez mais relevante no setor
empresarial, sobretudo em virtude das transformaes por que vm passando as sociedades
annimas, a ponto de requererem estas a edio de lei especial, por sua direta vinculao com a poltica
financeira do Pas. Nessa linha de idias, foi revista a matria, prevendo-se a constituio de entidades
de maior porte do que as atualmente existentes, facultando-se-lhe a constituio de rgos
complementares da administrao, como o Conselho Fiscal, com responsabilidades expressas, sendo
fixados com mais amplitude os poderes da assemblia de scios. (Exposio de Motivos do Projeto
do Cdigo Civil, Dirio do Congresso Nacional, Seo I, Suplemento B, 13/06/1975, p. 120).
360
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714 Para Jos Waldecy Lucena, imposta a inevitvel comparao entre o Decreto n 3.708/19 e o novo
Cdigo, h de se concluir que, se foi aquele acoimado de atcnico e falto de regras indispensveis,
este, embora dotado de tecnicidade, no deixar de profligado como extremamente burocratizante da
constituio e funcionamento das sociedades limitadas, assim eliminando uma das vantagens que
levaram criao e ampla aceitao desse tipo societrio. (Das sociedades limitadas, cit., p. 31).
715 As sociedades limitadas e o Projeto do Novo Cdigo Civil Brasileiro, cit., p. 164.
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716
Paulo Penalva Santos, Comentrios ao Cdigo Civil Brasileiro Do Direito de Empresa, vol. IX,
cit., p. 322.
363
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estrutura societria, que entendemos ser reprovvel tal escolha legislativa.718 Para
evitar a transferncia de quotas sem o consentimento dos demais scios, dever
existir no contrato expressa estipulao quanto ao exerccio do direito de preferncia.
Todavia, se os scios se opuserem alienao das quotas a terceiros, assim entende
Modesto Carvalhosa, ficaro obrigados a adquirir essas quotas pelo preo e
condies pr-acordados entre o scio cedente e o terceiro pretendente.719
Outra demonstrao da opo do legislador em estruturar as sociedades
limitadas como modelo mais apropriado para as mdias e grandes empresas, reside
na previso da possibilidade de criao de conselho fiscal (arts. 1.066 a 1.070). Com
efeito, o conselho fiscal um rgo societrio prprio para as sociedades integradas
por um grande nmero de scios ou acionistas, como assim exigido pela Lei das
Sociedades Annimas (Lei 6.404/1976, arts. 161 a 165). O conselho fiscal tem como
principal funo o exame e aprovao das contas anuais dos administradores,
elaborando o parecer respectivo que ser levado para apreciao da assemblia geral
de acionistas. Sendo rgo de fiscalizao, ele existe no interesse e para a proteo
dos acionistas minoritrios.
Ainda que o conselho fiscal seja um rgo de constituio facultativa (art.
1.066), no existe justificativa para a sua criao e funcionamento em uma sociedade
limitada, a no ser no caso de uma sociedade composta por centenas ou milhares de
scios, contudo, nesse caso, o modelo mais adequado para a sua organizao ser
o da sociedade annima. Por esse motivo, o Cdigo Civil italiano de 1942 no prev,
nem mesmo facultativamente, a constituio de conselho fiscal na sociedade de
responsabilidade limitada.
Exemplo tambm evidente da restrio liberdade de contratar e de gesto
da sociedade de responsabilidade limitada, a exigncia de quorum elevado para as
deliberaes societrias, que devem ser, agora, tomadas em reunies ou assemblia
de scios.
718
719
Comentrios ao novo Cdigo Civil - Livro II Direito de Empresa, vol. XIV, cit., p. 380-381.
Comentrios ao Cdigo Civil Parte Especial Do Direito de Empresa, vol. 13, cit., p. 87.
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Nos termos dos artigos 1.061, 1.063, 1 e 1.076 do Cdigo Civil, so previstos
os seguintes quoruns mnimos para as deliberaes dos scios:
Quorum
Unanimidade dos scios
3/4 do capital social
2/3 do capital social
Maioria do capital social
Matria
Designao de administradores no scios quando o
capital no estiver totalmente integralizado.
a) Modificao do contrato social;
b) Incorporao, fuso ou dissoluo da sociedade.
a) Designao de administrador no scio;
b) Destituio de scio administrador nomeado no
contrato social.
a) Designao dos administradores;
b) Destituio dos administradores;
c) Remunerao dos administradores;
d) Pedido de recuperao judicial.
Demais casos previstos na lei ou no contrato social.
Visando corrigir essa exigncia absurda para aprovao de qualquer matria, o prprio Relator final
do projeto, Deputado Ricardo Fiza, diante da avalanche de crticas da doutrina, apresentou um projeto
de lei (PL 7.160/2002) propondo a reduo do quorum mnimo obrigatrio para a maioria do capital
social. Em razo do falecimento do Deputado Ricardo Fiza, e no sendo reapresentado, esse projeto
de lei foi arquivado em 2008.
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No que se refere ao regime jurdico dominante nesse tipo societrio, o art. 1.053
do Cdigo Civil prescreve que A sociedade limitada rege-se, nas omisses deste
Captulo, pelas normas das sociedades simples, mas o contrato social poder prever
a regncia supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade annima.
Essa disposio normativa apresenta uma grave contradio, por recusar, em
princpio, a natureza da sociedade de responsabilidade limitada como sociedade
empresria, empurrando-a para a proximidade do regime aplicvel s sociedade
simples. Todavia, a sociedade limitada deve ser considerada como uma sociedade
empresria, por desempenhar atividade mercantil, e a regulao supletiva do seu
contrato deveria ser atravs da Lei das Sociedades Annimas e no das normas da
sociedade simples, como previa, alis, o art. 18 do Decreto 3.708/1919.721
Como elemento conclusivo do conceito da sociedade por quotas, destaca-se a
responsabilidade limitada dos scios que integram a sociedade, em que cada scio
tem a sua responsabilidade restrita ao valor de suas quotas respectivas no capital da
sociedade, o que prprio das sociedades mercantis, e no da sociedade simples.
A sociedade limitada sempre foi considerada pela doutrina como uma
sociedade de pessoas. Na sociedade de pessoas, existe uma forte vinculao pessoal
entre os scios e encontra-se nela presente, na maioria dos casos, o elemento
personalssimo denominado affectio societatis. O elemento da affectio societatis
implica em uma relao de confiana e aceitao recproca entre todos os scios que
integram a sociedade, representado pela inteno dos scios de envidar seus
esforos para a consecuo do objeto comum.722
721
Decreto 3708/1919 Art. 18. Sero observadas quanto s sociedades por quotas, de
responsabilidade limitada, no que no for regulado no estatuto social, e na parte applicavel, as
disposies da lei das sociedades anonymas.
722 Waldirio Bulgarelli, Sociedades Comerciais, cit., p. 39.
368
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723
Caractersticas como
sociedade de capital
Responsabilidade limitada dos scios.
Uso de denominao na formao do nome
empresarial.
A sociedade no se dissolve pela morte ou
retirada de scio.
No existe a obrigatoriedade de ser scio para
exercer funo de administrao.
369
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724
Comentrios ao novo Cdigo Civil - Livro II Direito de Empresa, vol. XIV, cit., p. 304.
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725
373
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727
Geraldo de Oliveira Santos Neves, Cdigo Civil Brasileiro de 2002 Principais alteraes, cit.,
p. 116.
728 A permanncia de normas de regulao das sociedades em nome coletivo e em comandita simples,
tipos superados desde o incio do sculo XX e que caram em total desuso, demonstra, sob o aspecto
societrio, a defasagem normativa dessa disciplina no Cdigo Civil de 2002.
374
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Rodrigo Prado Marques, Sociedades limitadas no Brasil, So Paulo, Editora Juarez de Oliveira,
2006, p. 57.
730 Divergindo apenas quanto reunio, em um mesmo cdigo, da disciplina integral do direito
societrio, Jos Waldecy Lucena opina: H de se concluir, de conseguinte, que o legislador brasileiro
estaria em harmonia com o pensar deste incio de sculo, destes novos tempos de globalizao
(mondialisation), se tivesse retirado do novo Cdigo Civil todo o Direito Societrio ali disciplinado, e que
passaria a ser objeto de um corpo legislativo em separado, isto , de um microssistema parte,
integrado pela Lei de Sociedade Annima, que o prprio Cdigo j excluiu, e pela disciplina de todos
os demais tipos societrios, qualquer que seja seu objeto, seja empresarial (comercial), seja noempresarial (civil), contanto que tenha uma finalidade econmica. (Das sociedades limitadas, cit., p.
37).
375
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731
Esta situao bastante comum verifica-se nas sociedades familiares, em que o scio majoritrio
detentor de 99 % do capital, e o scio minoritrio possui mera participao residual, apenas para
conferir, de modo artificial, carter societrio empresa para limitao da responsabilidade.
376
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(Lei 6.404/1976, art. 176), bem como para o enquadramento das micro e pequenas
empresas (Lei Complementar 123/2006).
O Cdigo Civil de 2002, contudo, no contm qualquer parmetro classificatrio
ou determinante, com base em critrios objetivos, para a definio do tipo societrio
que deve ser adotado pelos scios ou acionistas na constituio de qualquer
empresa.732 Para o direito positivo brasileiro, sendo satisfeito, apenas, o requisito da
pluripessoalidade, com a presena de dois ou mais scios, qualquer empresa pode
ser constituda e estruturada como sociedade limitada ou como sociedade annima,
independentemente do porte, do volume de negcios ou do capital social. E essa
ausncia de critrio, destarte, faz com que a legislao societria brasileira
permanea atrelada a modelos e estruturas superadas, que no foram discutidas ou
sequer questionadas em todo o longo processo legislativo de elaborao do Cdigo
Civil de 2002.
Espera-se, portanto, em sntese final, que o regime da sociedade de
responsabilidade limitada no Cdigo Civil de 2002 tenha existncia breve, para que
os seus graves defeitos de origem sejam corrigidos, que uma nova legislao
societria venha a substituir um regime que j nasceu velho, arcaico, e que se
demonstra mais preocupado com a afirmao de concepes filosficas pessoais e
com as idiossincrasias dos seus criadores, do que com a praticidade e utilidade que
deveriam predominar nas normas jurdicas societrias, principalmente no mbito das
atividades das empresas comerciais.
Com a proposta de projeto de um novo Cdigo Comercial, como ser explorado
no captulo seguinte, aguarda-se a reconfigurao necessria da sociedade de
responsabilidade limitada, para que ela retorne ao seu modelo simplificado e
adaptvel, tanto para servir constituio e organizao de empresas de pequeno
porte, como para atender s exigncias de estruturao jurdica das empresas
maiores.
732
Somente a partir da Lei 12.441/2011, que introduziu o art. 980-A no Cdigo Civil para assim criar a
figura esdrxula e indefinida da Empresa Individual de Responsabilidade Limitada EIRELI, com capital
obrigatrio de 100 salrios mnimos, a legislao brasileira passou a estabelecer um patamar de capital
integralizado para a constituio desse tipo de empresa. Ver seo 4.7 do Captulo 4 acima.
377
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Captulo 7
A renovao do direito comercial
733
Lei 6.404/1976 - Art. 2, 1. Qualquer que seja o objeto, a companhia mercantil e se rege pelas
leis e usos do comrcio.
378
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734
379
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735
A dignidade do Direito Mercantil, Revista de Direito Bancrio e do Mercado de Capitais, RDB, vol.
6, set.dez/1999, So Paulo, RT, 1999, p. 304.
736 Apesar dessa lio de Oscar Barreto Filho haver sido proferida em uma aula magna de abertura dos
cursos jurdicos da Faculdade do Largo de So Francisco, no longnquo ano de 1973, ele j antevia a
necessidade da legislao separar a figura do empresrio individualista da instituio empresa,
destacando trs ordens de fenmenos econmico-sociais que se traduzem em impulsos evolutivos no
sentido de modificar a estrutura jurdica da empresa, organizada sob a forma de sociedade annima:
a) a progressiva separao entre a propriedade e a gesto da empresa, que se observa principalmente
no quadro das grandes companhias; b) a gradativa afirmao de um direito de co-gesto atribudo aos
colaboradores da empresa, de modo a limitar a liberdade dos proprietrios dos meios de produo (v.
Franois Bloch, LAin, Pour une reforme de lentreprise, 1963); c) a elaborao do conceito da funo
social da propriedade empresarial, acarretando no s restries, mas tambm deveres positivos para
com a coletividade por parte dos proprietrios. Estas atitudes traduzem, em sntese, na atribuio aos
empresrios de maior conscincia de sua responsabilidade social, perante seus colaboradores e a
coletividade qual destinam seus produtos. (A dignidade do Direito Mercantil, cit., p. 304-305).
737 Perfis da Empresa, cit., p. 109/126.
738 Constituio Federal, art. 170, inciso III.
380
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empresa, quando esse espao ainda continua sendo ocupado pelas antigas figuras
do comerciante e da sociedade comercial.
O primeiro problema decorrente da introduo artificial do regime do direito de
empresa no nosso sistema de direito positivo, , portanto, de ordem ontolgica,
referente prpria conceituao da empresa, e caracterizao da sua natureza
como ente mercantil. O Cdigo de 2002, apesar de erigir a empresa categoria
fundamental do sistema, resume sua compreenso a um conceito meramente
funcional, de atividade de produo e circulao de bens e de servios, conceito
indireto, extrado da norma que define o empresrio (art. 966).
A empresa no vem a ser definida como sujeito de mercado ou agente
econmico, que a sua real imagem exterior, do modo como as pessoas assim
apreendem na sua representao externa. O conceito legal de empresa, resultante da
frmula do legislador do Cdigo de 1942 na Itlia fascista, reduzido atividade de
produo e circulao de bens e de servios, demonstra-se insuficiente e contraditrio
para exprimir o seu significado concreto, econmico, social e jurdico, em completo
divrcio com a realidade econmica, nas palavras de Fbio Konder Comparato.739
A doutrina, apesar dessa evidente limitao conceitual, insiste em referir-se
empresa meramente como atividade, e no no seu sentido subjetivo, de ente
econmico. Alguns autores, inclusive Fbio Ulhoa Coelho, defendem a vinculao
estrita s definies positivistas, ao qualificar juridicamente o empresrio individual e
a sociedade empresria, recusando tratar, cientificamente, esses agentes no seu
sentido genrico como empresa, por exemplo, como em alguns casos quando a lei
assim dirige-se aos destinatrios das suas normas na legislao de recuperao de
empresas e falncia.740
739
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mesmo como uma atividade revestida de duas caractersticas singulares: econmica e organizada.
(Comentrios Lei de Falncias e de recuperao de empresas, cit., p. 38).
741 LImpresa - Trattato di Diritto Commerciale, cit., p. 49.
742 Corso di Diritto Commerciale, cit., p. 36.
743 A dignidade do Direito Mercantil, cit., p. 304.
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744
Lei 8.934/1994 - Art. 1 O Registro Pblico de Empresas Mercantis e Atividades Afins, subordinado
s normas gerais prescritas nesta lei, ser exercido em todo o territrio nacional, de forma sistmica,
por rgos federais e estaduais, com as seguintes finalidades: I - dar garantia, publicidade,
autenticidade, segurana e eficcia aos atos jurdicos das empresas mercantis, submetidos a registro
na forma desta lei; II - cadastrar as empresas nacionais e estrangeiras em funcionamento no Pas e
manter atualizadas as informaes pertinentes; III - proceder matrcula dos agentes auxiliares do
comrcio, bem como ao seu cancelamento. Art. 2 Os atos das firmas mercantis individuais e das
sociedades mercantis sero arquivados no Registro Pblico de Empresas Mercantis e Atividades Afins,
independentemente de seu objeto, salvo as excees previstas em lei.
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745
A redao do art. 2.031 do Cdigo Civil de 2002 foi sucessivamente modificada pelas seguintes
normas: Lei n 10.825, de 22.12.2003 inseriu um pargrafo nico no art. 2.031 para excluir as
organizaes religiosas e partidos polticos da exigncia de modificao dos seus estatutos sociais; Lei
n 10.838, de 30.01.2004 Nova redao do Art. 2.031: As associaes, sociedades e fundaes,
constitudas na forma das leis anteriores, tero o prazo de 2 (dois) anos para se adaptar s disposies
deste Cdigo, a partir de sua vigncia igual prazo concedido aos empresrios; Medida Provisria n
234, de 10.01.2005 Nova redao do Art. 2.031: As associaes, sociedades e fundaes,
constitudas na forma das leis anteriores, bem assim os empresrios, devero se adaptar s
disposies deste Cdigo at 11 de janeiro de 2006"; Lei n 11.227, de 28.06.2005 - Nova redao do
Art. 2.031: As associaes, sociedades e fundaes, constitudas na forma das leis anteriores, bem
como os empresrios, devero se adaptar s disposies deste Cdigo at 11 de janeiro de 2007.
746 A Instruo Normativa do DNRC 92, de 04/12/2002, veio a exigir a converso do nome de todas as
firmas individuais existentes no Pas, apenas para mudana na caracterizao do tipo de empresa: Art.
4o. As Firmas Mercantis Individuais, que a partir de 11 de janeiro de 2003 passam a ter a denominao
de empresrios, tm at 10 de janeiro de 2004 para se adaptarem s disposies da Lei
no 10.406/2002, devendo promover, no mbito do Registro Pblico de Empresas Mercantis, o
arquivamento de Requerimento de Empresrio e demais instrumentos determinados por aquela Lei.
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comercial por excelncia, passaram a ser objeto de estudo tanto nas cadeiras de
direito civil, como nas disciplinas de direito empresarial ou comercial.
Todavia, os contratos empresariais ou mercantis seguem uma metodologia
prpria, porque so contratos em cadeia e executados em massa, que no se esgotam
na relao contratual entre duas pessoas, como acontece, por exemplo, com uma
compra e venda civil. A metodologia interdisciplinar dos contratos mercantis, que
esto sempre interagindo com questes econmicas, tecnolgicas, administrativas,
mercadolgicas, tributrias, trabalhistas, exige uma abordagem cientfica bem mais
ampla nos cursos de direito.
No campo didtico-pedaggico, o direito comercial no desapareceu dos
currculos acadmicos. A matria comercial no foi, sem embargo, simplesmente
incorporada ao direito civil. Tamanha heresia cientfica jamais poderia ter sido
cometida. Mas, na grande maioria das faculdades de direito, a partir do Cdigo de
2002, a denominao da disciplina foi alterada para direito de empresa ou direito
empresarial. Em matrias como sociedades annimas e falncia, todavia, a disciplina
comercial permaneceu intocada em seus princpios e fundamentos dogmticos.
Na opinio de Ivo Waisberg, o direito comercial possui caractersticas especiais
e prprias, podendo ser definido como o direito do mercado, o direito que representa
o suporte jurdico do capitalismo.751 O sistema produtivo e as relaes econmicas
so apreendidos e assim objeto de regulao pelo direito comercial, como direito
especializado. Essa especializao exige um tratamento metodolgico e cientfico
separado do direito privado comum, das relaes em que o carter patrimonialista e
econmico no possui referibilidade profissional, permanente, relacionado com a
cadeia produtiva, com os atos em massa da atividade comercial.
751
O direito comercial o ramo do Direito que se desenvolveu e deu suporte ao meio de produo
capitalista. Em outras palavras, o surgimento de uma subrea do direito privado voltada
fundamentalmente para viabilizar a relao entre os comerciantes inicialmente e, mais tarde, entre os
agentes econmicos de produo, incluindo a indstria e o que veio a se constituir economicamente
como empresa, foi pea vital para o progresso do capitalismo. inegvel a relao entre o tipo
especfico de meio de produo e o surgimento do direito comercial. (O Projeto de Lei n 1.572/2011
e a Autonomia do Direito Comercial, em Fbio Ulhoa Coelho, Tiago Asfor Rocha Lima e Marcelo
Guedes Nunes, org., Reflexes sobre o projeto de Cdigo Comercial, So Paulo, Saraiva, 2013, p.
69).
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segundo nos parece, no pressupe um novo Cdigo Comercial, o qual no tinha sido reclamado
por ningum at agora, e seguramente no ser alcanado pelo projeto que ora tramita no
Congresso Nacional. (Erasmo Vallado Azevedo e Novaes Frana, O projeto do Cdigo
Comercial, Migalhas, Revista Eletrnica, http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI146663,61044O+projeto+do+Codigo+Comercial, 22/07/2014).
758 Natalino Irti, Let della decodificazione, cit., p. 22.
759 Fbio Konder Comparato, Projeto de Cdigo Civil, em Ensaios e pareceres de Direito
Empresarial, cit., p. 545.
760 Propus um cdigo que pudesse servir de instrumento ao inadivel recoser dos esgarados valores
do direito comercial. Para tanto, tem que ser um cdigo com forte acento principiolgico, que enuncie,
no direito positivo, os princpios do direito comercial. Sendo algo indito, em todo o mundo, um Cdigo
Comercial assim caracterizado, entendi que a forma mais direta e eficaz para apresentao da proposta
seria por meio de uma minuta. (Princpios do direito comercial, com anotaes ao projeto de
Cdigo Comercial, cit., p. 22).
761 BRASIL, Cmara dos Deputados, Projeto de Lei 1.572/2011, apresentado pelo Deputado Vicente
Cndido (PT/SP).
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Alfredo de Assis Gonalves Neto, Arnoldo Wald, Bruno Dantas, Cleantho de Moura Rizzo Neto,
Clvis Cunha da Gama Malcher Filho, Daniel Beltro de Rossiter Correia, Eduardo Montenegro Serur,
Felipe Lckmann Fabro, Jairo Saddi, Marcelo Guedes Nunes, Mrcio Souza Guimares, Newton de
Lucca, Osmar Brina Corra Lima, Paulo de Moraes Penalva Santos, Ricardo Lupion Garcia, Tiago Asfor
Rocha Lima e Uinie Caminha.
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Na definio de Fbio Ulhoa Coelho, Os princpios jurdicos so regras de conduta, como todas as
demais normas componentes do ordenamento vigente num pas. Caracteriza-os a extensa proporo
de seu mbito de incidncia, de modo a servirem de elementos informadores da interpretao das
demais normas jurdicas e soluo de lacunas. (Princpios do direito comercial, com anotaes
ao projeto de Cdigo Comercial, cit., p. 13).
767 Do direito tributrio, a argumentao por princpios disseminou-se para o direito constitucional,
administrativo, previdencirio, processual civil e, enfim, dominou todo o campo publicista. (Fbio Ulhoa
Coelho) Princpios do direito comercial, com anotaes ao projeto de Cdigo Comercial, cit., p.
15.
768 CF, Art. 170. A ordem econmica, fundada na valorizao do trabalho humano e na livre iniciativa,
tem por fim assegurar a todos existncia digna, conforme os ditames da justia social, observados os
seguintes princpios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - funo social da propriedade;
IV - livre concorrncia; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante
tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e servios e de seus processos
de elaborao e prestao; VII - reduo das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno
emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constitudas sob as leis
brasileiras e que tenham sua sede e administrao no Pas. Pargrafo nico. assegurado a todos o
livre exerccio de qualquer atividade econmica, independentemente de autorizao de rgos
pblicos, salvo nos casos previstos em lei.
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784
Princpios do direito comercial, com anotaes ao projeto de Cdigo Comercial, cit., p. 16.
Princpios do direito comercial, com anotaes ao projeto de Cdigo Comercial, cit., p. 14.
786 Fbio Ulhoa Coelho, Princpios do direito comercial, com anotaes ao projeto de Cdigo
Comercial, cit., p. 13.
787 Erasmo Vallado Azevedo e Novaes Frana, O projeto do Cdigo Comercial Um arremedo
de projeto de lei, Migalhas Revista Eletrnica, http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI154743,
51045- O+projeto+de+Codigo+ Comercial+um+arremedo+de+projeto+de+lei, 22/07/2014.
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PLS 487/2013 - Art. 380 - 2. No que no for regulado por este Cdigo, aplica-se s obrigaes
dos empresrios o Cdigo Civil (Lei n 10.406, de 10 de janeiro de 2002). 3. O Cdigo de Defesa do
Consumidor (Lei n 8.078, de 11 de setembro de 1990) no aplicvel s obrigaes dos empresrios.
789 Ignorando as especificidades do direito comercial, e seus princpios prprios, a unificao legislativa
acabou no somente contribuindo enormemente para acentuar o esgarar dos valores da disciplina,
como tambm privou a ordem jurdica nacional do regramento adequado para o atual estgio de
evoluo da nossa economia, fortemente integrada ao processo de globalizao. A unificao
legislativa foi um erro. preciso corrig-lo, o quanto antes. (Fbio Ulhoa Coelho, O futuro do direito
comercial, cit., p. 8).
790 O futuro do direito comercial, cit., p. 7.
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normativo especfico para a regulao da empresa, ele deve ser um regime novo,
voltado para o mercado, e no para o individualismo que prevalecia poca que o
direito comercial era um direito eminentemente corporativista.
Por essa razo, os mais eminentes e experientes juristas do Brasil, a exemplo
de Arnoldo Wald, defendem a aprovao do projeto de novo Cdigo Comercial,791 para
que seja restaurado e viabilizado um sistema moderno de regulao da empresa,
coerente com o crescimento do pas e com a sua insero no mundo globalizado.
Na justificao e fundamentao da necessidade de implantao do novo
Cdigo Comercial, Fbio Ulhoa Coelho entende que uma vez assentado que a
segurana jurdica resultante da reduo da imprevisibilidade das decises judiciais
aproveitaria a toda economia brasileira (a todos os brasileiros, por conseguinte),
impe-se a indagao: Como aumentar a previsibilidade das decises judiciais
atinentes s relaes entre os empresrios?792 Para isso, Fbio Ulhoa Coelho
considera que precisamos mudar o foco e mostrar o quanto a proteo desse
interesse privado dos scios corresponde proteo de interesses metaindividuais da
coletividade, ao limitar os riscos e, portanto, contribuir para o barateamento dos
produtos e servios oferecidos ao mercado consumidor.793
Sem embargo, existe, efetivamente, uma necessidade do Brasil, de ajustar o
arcabouo legislativo ao seu novo momento econmico,794 para reduzir o grau de
litigiosidade presente no sistema jurdico brasileiro, e assim diminuir e tornar
previsveis os custos das transaes, ao contrrio de opinies contrrias e refratrias
reconstruo do nosso sistema normativo, sob a base de um falso laissez-faire, que
791
Em tese, vrias solues legislativas poderiam ser adotadas, abrangendo desde a reviso do
Cdigo Civil at a elaborao de vrios microssistemas, tratando das diversas matrias do direito
empresarial. Mas a aprovao de um novo Cdigo Comercial ou Empresarial nos parece o caminho
mais lgico ou eficaz. o que explica a boa acolhida da oportuna sugesto de um novo Cdigo
Comercial ou Empresarial, como direito especial, ao lado do nosso Cdigo Civil, que continuaria sendo
o diploma de direito comum. Teremos, assim, ao lado das normas gerais do cidado (Cdigo Civil),
regras especiais de proteo ao consumidor (Cdigo de Defesa do Consumidor) e ao empregado (CLT)
e outras, tratando da estrutura e funcionamento da empresa e dos contratos empresariais (Cdigo
Comercial), dando maior coerncia e segurana ao sistema jurdico e adequando-o s necessidades
do sculo XXI, com uma viso do presente e do futuro. (O Cdigo Civil e o Projeto de Cdigo
Comercial, em Fbio Ulhoa Coelho, Tiago Asfor Rocha Lima e Marcelo Guedes Nunes, org.,
Reflexes sobre o projeto de Cdigo Comercial, So Paulo, Saraiva, 2013, p. 30).
792 Princpios do direito comercial, com anotaes ao projeto de Cdigo Comercial, cit., p. 18.
793 O futuro do direito comercial, cit., p. 8.
794 Princpios do direito comercial, com anotaes ao projeto de Cdigo Comercial, cit., p. 11.
401
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795
Em trabalho patrocinado pelo Insper, e desprovido de qualquer base cientfica confivel, elaborado
pela economista Luciana Yeung, esta aduz que a aprovao de um projeto de Cdigo Comercial
representaria um enorme custo de R$ 182 bilhes para o Pas, custo esse que seria suportado pelas
empresas brasileiras e estrangeiras com negcios no Brasil, em razo da suposta insegurana jurdica
decorrente dessa inovao legislativa. Esse estudo parte de uma falsa, seno inapropriada premissa,
ao considerar, para clculo dos impactos do novo Cdigo Comercial, ou como parmetro de
comparao a Lei 11.101/2005, a chamada Nova Lei das Falncias. Trata-se de uma lei que
igualmente atingiu as empresas, mas de dimenso menor, com apenas 201 artigos, e sendo mais
pontual. Essa base de comparao demonstra-se absolutamente inconsistente, impertinente e
inadequada. No se pode comparar um novo sistema de direito comercial, baseado em princpios e
normas que visam, exatamente, tornar mais claras e objetivas essas mesmas normas e princpios dos
sujeitos do processo e de elaborao dos contratos e de relaes mercantis, com uma lei que tem por
natureza imanente, restrita, a litigiosidade entre credores e uma empresa devedora inadimplente, objeto
de sua regulao (Lei 11.101/2005). A comparao ou utilizao, tomando como base de anlise, para
alcanar essa concluso absurda quanto ao suposto ou projetado custo da litigiosidade, referente a um
novo Cdigo Comercial, a partir de uma lei de insolvncia, demonstrao evidente, cabal, de que
essa pesquisadora, de direito e matria jurdica, conhece muito pouco, ou quase nada. Sobre esse
estudo carente de qualquer rigor cientfico e consistncia jurdica, ver Luciana Yeung, Medindo os
Impactos do PL 1.572 da Cmara dos Deputados, ou do PL 487 do Senado Federal, que propem
o Novo Cdigo Comercial Brasileiro, Insper, Maio 2014, http://www.insper.edu.br/noticias/codigocomercial-pode-gerar-perdas-de-r-182-bi-diz-estudo/, 12/05/2015).
402
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Captulo 8
Do direito comercial ao direito empresarial
796
403
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Com base nas fontes investigadas, este estudo analtico procurou destacar as
principais antinomias presentes no regime do direito de empresa disciplinado nas
normas do Cdigo Civil de 2002, principalmente para demonstrar a ausncia de
critrios lgicos para a imposio desse regime estranho normatividade histrica e
prtica mercantil prevalentes em nossa realidade econmica.797 No plano de
investigao terica, o presente trabalho demonstrou que o direito comercial
representa um complexo de normas que regula especial categoria de relaes
privadas, complexo de normas que, colocando-se no mesmo plano das outras normas
contidas no Cdigo Civil, destas se diferencia pela especialidade da matria regulada,
isto em relao ao contedo, no do ponto de vista estritamente formal.798
A comercialidade ou a mercantilidade do ato econmico deve ser juridicamente
considerada, isto para que as atividades empresariais sejam diferenciadas das demais
atividades econmicas no empresariais ou civis. Essa diferenciao necessria
para que o especfico objeto do ato ou negcio seja legalmente determinado, e assim
se possa definir:
a) a incidncia e aplicao das normas de Direito Comercial na regulao de atos e
negcios jurdicos de natureza econmica, em face da legislao supletiva especial e
extravagante ao Cdigo Civil;
b) a determinao da natureza mercantil da empresa para a caracterizao da sua
jurisdio administrativa de competncia do Registro Pblico de Empresas Mercantis,
funo exercida pelas Juntas Comerciais, nos termos da Lei n 8.934/1994;
c) a sujeio das empresas mercantis aos processos de recuperao e de falncia,
segundo o regime da Lei n 11.101/2005;
d) a competncia da jurisdio comercial especializada que vem sendo implantada em
alguns Estados, com a criao de Varas Empresariais, para julgamento de processos
de natureza mercantil e de obrigaes derivadas de contratos comerciais no sujeitos
ao regime especial de defesa do consumidor.
797
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799
Francesco Galgano considera que, no mbito do direito privado, o particularismo do direito comercial
estar sempre representando pelo economismo, como valor histrico determinante nas relaes da
empresa (Lex Mercatoria, cit., p. 13).
800 Tratado de Direito Empresarial, cit., p. 248.
405
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restrito
ao
mbito
da
doutrina
comercial
especializada.
Os
801 As principais obras e manuais de Direito Civil editadas no Brasil, a partir do Cdigo de 2002, no
tratam do livro do Direito de Empresa, conforme se observa nos seguintes autores civilistas: Caio Mrio
da Silva Pereira, Instituies de Direito Civil, atualizado por Maria Celina Bodin de Moraes e outros,
Rio de Janeiro, Forense, 21 edio, 2005; Washington de Barros Monteiro, Curso de Direito Civil,
atualizado por Carlos Alberto Dabus Maluf, So Paulo, Saraiva, 33 edio, 2007; Silvio Rodrigues,
Direito Civil, So Paulo, Saraiva, 34 edio, 2003; Maria Helena Diniz, Curso de Direito Civil,
Saraiva, So Paulo, 24 edio, 1977; Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil, So Paulo, Atlas, 7 edio,
2007; Carlos Roberto Gonalves Gonalves, Direito Civil Brasileiro, So Paulo, Saraiva, 4 edio,
2004; Paulo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Novo Curso de Direito Civil, So Paulo,
Saraiva, 7 edio, 2006; Roberto Senise Lisboa, Manual de Direito Civil, So Paulo, Revista dos
Tribunais, 3 edio, 2004.
802 Os artigos 966 a 1.195 do livro do Direito de Empresa foram objeto de comentrios em trabalhos de
maior porte e profundidade, como em: Arnoldo Wald, Comentrios ao Novo Cdigo Civil - Livro II
Direito de Empresa, vol. XIV, Rio de Janeiro, Forense, 2005; Modesto Carvalhosa, Comentrios ao
Cdigo Civil, vol. 13, So Paulo, Saraiva, 2003; Newton de Lucca e outros, Comentrios ao Cdigo
Civil Brasileiro, vol. IX, Rio deJaneiro, Forense-FADISP, 2005.
407
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Jarbas Andrade Macchioni, Novos Fundamentos do Direito Comercial sob o Cdigo Civil de
2002, in Direito Empresarial Contemporneo, Adalberto Simo Filho e Newton De Lucca, org., So
Paulo, Juarez de Oliveira, 2 Edio, 2004, p. 361.
408
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804
Ricardo Luis Lorenzetti, Fundamentos do Direito Privado, So Paulo, Revista dos Tribunais, 1998,
p. 47.
805 o inegvel envelhecimento do que j nasceu passado, pois foi parido de costas para o presente.
Outro horizonte, inquietante e interrogativo, bate s portas cerradas do sistema. O medievo que
emoldura os institutos do status quo se mostra em pnico pois, medida que o civilismo pretensamente
neutro se assimilou ao servilismo burocrata doutrinrio e jurisprudencial, no conseguiu disfarar que
no corresponde aos fatos e s situaes que brotam da realidade contempornea. (Luiz Edson
Fachin, Teoria Crtica do Direito Civil luz do novo Cdigo Civil Brasileiro, Rio de Janeiro,
Renovar, 2 edio, 2003, p. 11).
409
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Apndice
O longo processo legislativo do Cdigo Civil de 2002
Miguel Reale, Exposio de Motivos do Projeto do Cdigo Civil, Dirio do Congresso Nacional,
I, Suplemento B, 13.06.1975, p. 107.
807 Estados Unidos do Brasil, Comisso de Estudos Legislativos do Ministrio da Justia e Negcios
Interiores, Projeto de Cdigo das Obrigaes, Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1965.
808 Miguel Reale, Exposio de Motivos do Projeto do Cdigo Civil, cit., p. 109.
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feira, 13, do ms de junho do ano de 1975, quando iniciou a sua tramitao na Cmara
dos Deputados sob a forma do Projeto de Lei n 634/1975.
Desde a sua recepo na Cmara dos Deputados, o projeto do novo Cdigo
Civil foi relegado a segundo plano, e pouca ateno mereceu dos parlamentares.809
Tanto assim que, aps o encerramento do prazo para apresentao de emendas, em
26/09/1975, o projeto permaneceu paralisado por quase oito anos, sem qualquer
procedimento de discusso, at o ms de abril de 1983. E, nesse perodo, diante da
paralisao do projeto por longo tempo, o Deputado Fernando Coelho (MDB-PE) veio,
inclusive, a requerer, em 13/06/1979, perante a Mesa da Cmara, o arquivamento do
projeto do Cdigo Civil e a dissoluo da Comisso Especial constituda para a sua
apreciao. O argumento para o arquivamento do projeto do Cdigo Civil era de que
ele se apresentava defasado diante da nova realidade poltica e social brasileira,
principalmente por ser resultado de proposta encaminhada ao Congresso Nacional
sob os auspcios de um governo ditatorial.
Apenas no ms de junho de 1983, foram retomadas as discusses do projeto
do Cdigo Civil na Cmara dos Deputados, agora sob a coordenao do Deputado
Ernani Styro (PDS-PB), seu novo relator. Aps a anlise e breve discusso das
emendas apresentadas no ano de 1975, a Cmara dos Deputados aprovou, na
sesso realizada em 09/05/1984, a redao do projeto do novo Cdigo Civil, sendo o
projeto ento enviado ao Senado Federal.
No Senado da Repblica, o projeto do Cdigo Civil tomou o nmero 118/1984,
sendo designado como Relator Geral o Senador Murilo Badar (PDS-MG). De 1984
a 1989, ou seja, por mais de 5 anos, o projeto permaneceu sem nenhum andamento
no Senado, e apenas em 24/08/1989 a Comisso Temporria destinada sua
809
No incio da tramitao do Projeto do Cdigo Civil na Cmara dos Deputados, apesar do pouco
interesse demonstrado pelos parlamentares no encaminhamento do projeto, a Comisso Especial da
Cmara dos Deputados realizou uma srie de palestras e conferncias com os membros da Comisso
Revisora e Elaboradora do Cdigo Civil e com os principais juristas do pas, havendo participado dessas
sesses: Miguel Reale (05/08/1975), Caio Mrio da Silva Pereira e Ebert Vianna Chamoun
(06/08/1975), Clvis do Couto e Silva (07/08/1975), Alfredo Lamy Filho e Jos Luis Bulhes Pedreira
(12/08/1975), Rubens Requio (13/08/1975), Torquato Castro (14/08/1975), Jos Carlos Moreira Alves
(19/08/1975), Fbio Konder Comparato (21/08/1975), Philomeno Joaquim Da Costa (03/09/1975) e
Egberto Lacerda Teixeira (04/09/1975); http://www2.camara.gov.br/proposicoes/PL63475.
411
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810
O Deputado Ricardo Fiza (1939-2005), que exercia mandato na Cmara desde o ano de 1970, foi
um dos mais influentes deputados conservadores integrantes do chamado Centro durante a
Assembleia Constituinte (1986-1988). Ele teve a sua imagem poltica bastante abalada por haver
integrado o Governo deposto de Fernando Collor de Mello (1989-1992) como Ministro da Ao Social,
alm de quase ter perdido o mandato, envolvido em denncias no chamado escndalo dos Anes do
Oramento do Congresso Nacional (1992-1994). Como estratgia para recuperar seu prestgio,
tambm em razo de sua formao jurdica e profundo conhecedor do processo legislativo, aproveitou
essa oportunidade mpar para assumir a funo de Relator-Geral no perodo final de tramitao do
Projeto do Cdigo Civil na Cmara dos Deputados, conseguindo superar as resistncias e fazer aprovar
o novo Cdigo Civil, sancionado como a Lei 11.406, em 10 de janeiro de 2002.
412
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811
O Relator-Geral do projeto nessa etapa final, Deputado Ricardo Fiza, assim se pronunciou sobre
o trabalho realizado nessa fase: A despeito de seus ponderveis e slidos argumentos, a corrente
contrria codificao e favorvel a reformas parciais opo j vencida, na medida em que a
aprovao do projeto de reforma total terminou consagrando a tese prevalecente, tanto pela Cmara
quanto pelo Senado. Constitucional e regimentalmente portanto, nosso dever se circunscreveu
manifestao relativa s 331 emendas do Senado ao texto acolhido por esta Casa e s adequaes
constitucionais e legais do texto, dentro dos limites fixados pela Resoluo 01/2000 do Congresso
Nacional. (Relatrio Final ao Projeto de Lei 634/1975, Comisso Especial da Cmara dos
Deputados, in http://www.camara.gov.br/sileg/integras/303077.htm).
812 Dos 230 artigos do Livro do Direito de Empresa, o parecer final do Relator Deputado Ricardo Fiza
introduziu modificaes em 35 disposies normativas, constantes dos seguintes artigos: Art. 967; Art.
968, 1; Art. 969 e pargrafo nico; Art. 971; Art. 976; Art. 979; Art. 980; Art. 984; Art. 990; Art. 1.011,
1; Art. 1.013 e 1; Art. 1.014; Art. 1.052; Art. 1.058; Art. 1.059; Art. 1.061; Art. 1.066, 2; Art. 1.075,
2; Art. 1.084, 3; Art. 1.085, pargrafo nico; Art. 1.088; Art. 1.093; Denominao do Captulo VIII
e art. 1.097; Art. 1.098, inciso I; Art. 1.099; Art. 1.129; Art. 1.144; Art. 1.150; Denominao do Captulo
II e Art. 1.155; Art. 1.164; Art. 1.167; Art. 1.168; Art. 1.174 e pargrafo nico; Art. 1.181; Art. 1.192,
pargrafo nico.
813 A Comisso Especial aprovou, sem qualquer modificao e por unanimidade, o parecer final do
Relator Deputado Ricardo Fiza, o qual introduziu um total de 59 emendas, alterando a redao do
projeto originrio do Senado Federal, sendo essas emendas numeradas de 01 a 03, 14, 85, 135, 136,
160 a 164, 167, 168, 170, 178 a 180, 182 a 184, 187, 188, 190, 193, 195, 196, 198 a 200, 202, 204,
207 A 210, 213, 215, 217, 219, 222 a 225, 227 a 230, 232 a 234, 243, 245, 249 a 251, 273, 274, 278,
283, 297 e 300 (Resoluo 01/2000-CN), o que demonstra que o Relator Geral, nessa fase final, deteve
poderes
para
alterar,
de
modo
significativo,
vrios
artigos
do
projeto
(http://www2.camara.gov.br/proposicoes).
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Desde 31/01/2007, os Projetos de Lei 6.960/2002 e 7.160/2002 foram arquivados por despacho da
Mesa da Cmara dos Deputados, conforme informao em http://www2.camara.gov.br/proposicoes.
816 Orlando Gomes, O problema da codificao, cit., p. 17.
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