A Concepção de Psyché em Jung e No Romantismo Alemão
A Concepção de Psyché em Jung e No Romantismo Alemão
A Concepção de Psyché em Jung e No Romantismo Alemão
A psych um daqueles
conceitos que envolve tamanha complexidade, que devemos ter muito cuidado ao tratar dela, a fim
de no nos enredarmos na trama dos conceitos que usamos para descrever esse grande enigma.
Por quanto sejam imprecisos, as palavras, as imagens e os conceitos so os nossos nicos
recursos.
Falamos de alma como algo que no exigisse maiores indagaes. Esse conceito faz parte da
nossa linguagem cotidiana, como algo muito natural e, na psicologia, alma palavra recorrente, mas
nela, toma vrios significados.
Alma ou psych so conceitos que sofreram constantes transformaes na histria do pensamento
e, apesar de estarmos familiarizados com a palavra alma ou psych, seu conceito no to bvio
assim. O conceito de alma um conceito extremamente complexo, que junto com os conceitos do
Uno e do Ser, um dos vrtices absolutos da Filosofia Antiga, e que permanece sendo at hoje no
pensamento filosfico e no pensamento psicolgico.
Portanto, de fato do que estamos falando quando dizemos psych na psicologia em geral e mais
especificamente na psicologia junguiana?
A anlise da noo de psych na psicologia junguiana demanda uma rigorosa delimitao do objeto
em exame, pois devemos partir da problemtica central colocada por sua metapsicologia, a saber:
quais so os pressupostos filosficos adequados para argumentar conceitualmente os problemas da
sua metapsicologia, e qual seu pressuposto filosfico concernente psych, j que o mergulho de
Jung num vasto oceano de erudio filosfica, coloca o risco de desviarmos da questo central.
Segundo nossa leitura h dois momentos decisivos na histria do pensamento ocidental que
marcaram a viso de mundo no Ocidente. Ao nosso ver, esses dois momentos esto ligados ao
incio e ao fim da Metafsica e, portanto, concepo de alma, de homem, do cosmos e do divino.
Abordaremos rapidamente esses dois momentos, sem nos aprofundarmos neles, com o propsito
de marcar a importncia deles para o sentido da existncia humana, e para inserir a viso de alma
de Jung num contexto histrico filosfico.
Historicamente, no que diz respeito alma, foi Plato quem concebeu o conceito ontolgico de
psych ou alma, no pensamento da Filosofia Ocidental. Nos meados do sc. IV aC. Plato funda, o
que ser denominado por Aristteles, posteriormente, de Metafsica, que a cincia do ser
enquanto ser.
A alma foi pensada por Plato como substncia, como um ser em si, produto da ao mimtica do
Demiurgo ou o Nos, assim como o entendemos, que contemplando as Idias as mistura formando,
assim a Alma do Mundo. E ser pela intermediao da Alma do Mundo e pela ao do Nos que a
matria ser ordenada, pois, a matria, como descreve Plato no Timeu, uma espcie de
existncia desordenada, errtica e catica. Assim, pela ao demirgica, que unindo a Alma do
Mundo essa existncia errtica, forma o corpo do mundo ou o Cosmos.
Como podemos ler em Plato no Timeu em 30 a,b,c :
Desejando a divindade que tudo fosse bom, estreme de defeitos, e, na medida em que
isso estava em suas mos, tomou a massa das coisas visveis, desprovida de repouso e
quietude, mas movimentando-se desordenadamente e sem medida, f-la passar da
desordem para ordem [...] Depois de madura reflexo, concluiu que partindo de coisas
visveis por natureza, jamais poderia surgir um todo privado de Nos (inteligncia) que
fosse mais belo que um Todo inteligente. E, por outra parte, que o entendimento no pode
produzir-se em nenhuma coisa, se a separa da alma. De acordo com essa reflexes, ps o
(Nos) entendimento na alma, a alma no corpo, e modelou o Cosmos(...). Assim, pois, (...)
h que dizer que o mundo realmente um ser vivo, provido de alma e de entendimento
(Nos) e que foi feito pela Providencia divina. (Prnoia).( Plato, 1993.)
A fabricao da Alma do Mundo pelo Nos (Demiurgo), semelhana das Idias, ou do mundo
inteligvel, segundo nossa interpretao, quer mostrar que alma nela mesma, possui uma
intencionalidade, inteligncia e movimento prprios e, portanto, ela que imprime a ordem do
mundo. Para Plato, portanto, o cosmos um organismo vivo, inteligente, dotado
intencionalidade e movimento prprios.
Desde ento, a alma compreendida como uma substncia de origem divina, feita imagem das
Idias pelo Demiurgo. A alma a oculta e misteriosa realidade subjacente ao todo existente.
Essa conotao fez dela o pilar de sustentao da Metafsica ocidental, sendo o conceito grego de
psich o eixo em torno do qual se construiu todo o discurso da Filosofia, at a crtica do
conhecimento efetuada por Kant, e o conseqente fim da Metafsica, acompanhada do empirismo e
do materialismo psicofsico.
O desenvolvimento das civilizaes antigas at o florescimento do classicismo helenstico marcou a
grande odissia do desenvolvimento da conscincia do homem, decisivo para o futuro da cultura
ocidental. A Filosofia greco-romana instalou, ao longo das idades, a imagem do homem ideal
fundada na concepo de alma enquanto participante do divino.
No entanto, essa viso de mundo e de homem sofreu uma mudana radical no sculo XVIII. Como
nos diz Gusdorf:
O sculo VXIII europeu caracterizado pelo enfraquecimento da ontologia, e pela
eutansia da teologia[...] .O homem das Luzes perdeu sua segurana transcendente, aquela
consistncia substancial que dava equilbrio ao tipo humano da idade precedente. (Gusdorf,
1993, p.9)
Como pronunciou o empirista ingls David Hume, contemporneo de Kant, no seu Tratado da
Natureza humana de 1734:
Ns no temos alguma idia de uma substncia, (Hume, in Gusdorf, 1993, p.9) referindo-se alma
como substncia como pensara a metafsica clssica.
J antes dele, Locke, outro empirista ingls, tambm havia comparado a alma humana uma
pgina em branco, no seu Ensaio filosfico concernente ao entendimento humano (1690).
E. Kant, ele mesmo chamou de revoluo copernicana, a revoluo que ele empreendeu no
pensamento filosfico. Na Crtica da Razo Pura (1781), Kant ir averiguar se a metafsica
possvel, e, evidentemente, dir que no, j que segundo ele, a metafsica ilude as condies
indispensveis de todo conhecimento possvel. Conforme Kant, a metafsica pretendia que a Razo
tivesse a possibilidade de conhecer no os fenmenos, mas as coisas em si mesmas. O que para
ele impossvel, porque o nico nvel de realidade possvel de conhecimento, o sensvel, ou seja,
aquilo que se d a conhecer ao sujeito, e que captado pelos rgos dos sentidos, ou, ento, os
objetos que se do a conhecer s categorias a priori da Razo, como a essencialidade, a
causalidade, a unidade, a pluralidade, a ao recproca, a totalidade. Portanto, a Alma, o Cosmos e
Deus, so impossveis de ser conhecidos, j que no so objetos sensveis, e se so pensados, no
passam de iluses.
Kant teve como tarefa mostrar, como na relao do conhecimento, aquilo que chamamos de ser em
si, um ser objeto, um ser para ser conhecido, ou melhor, um ser posto logicamente pelo sujeito
pensante ou cognoscente, mas no em si, nem por si, como uma realidade transcendente.
Assim, pois, Kant marca um novo perodo da Filosofia, um perodo que comeara com Descartes, e
fora concludo com Kant: o perodo do idealismo transcendental, e o fim da Metafsica.
Kant refutou a doutrina Metafsica clssica da alma como substncia simples e imortal, e a
possibilidade dela ser conhecida racionalmente, pois, para ele, a alma um numeno, um puro
pensvel, um incognocvel. Sobre a alma no podemos predicar nada, j que a alma no pode ser
objeto de conhecimento, pois no fenmeno dado na experincia, isto , no tempo e no espao,
que onde se d a apreenso dos fenmenos anmicos. Portanto, a nica coisa que obtemos so
os fenmenos que so inerentes apenas ao sujeito, que de um lado vivncia de um eu, e do outro
lado, vivncia de uma coisa.
No entanto, com Kant a alma como tabula rasa, pensada pelos empiristas, ganhou um X dentro
dela, uma capacidade de sntese e de apreenso daquilo que captamos pela sensibilidade. Esse
X interior, o sujeito transcendental, no entanto, para Kant no se trata da alma compreendida pela
Metafsica como substncia. Para Kant, substncia no passa de um predicado, de um juzo, que
como tal, compete ao uso transcendental da Razo. O eu penso de Kant, tambm no se identifica
com o res cogitans cartesiano, pois longe est de ser substncia. Para Kant o eu penso em sua
individualidade universal, um X que s pode ser conhecido atravs dos pensamentos que so
seus predicados e dos quais, parte esses, no podemos ter o menor conceito. O Eu penso
kantiano no funo da alma, mas funo da mente: suprema funo unificadora da Razo, a
condio ltima da possibilidade do conhecimento, a unidade da autoconscincia que no uma
substncia, mas um transcendental, ou seja, pura espontaneidade da unificao do mltiplo. A
identidade do Eu penso como unidade transcendental do sujeito cognoscente exclui, por
conseqncia, a possibilidade que a Metafsica seja cincia. Portanto, a alma substncia-substrato
de toda receptividade, um incognocvel.
O eu transcendental de Kant, suporte do conhecimento terico dentro do limite do paradigma
fsico-matemtico, sujeito do saber, centro dos julgamentos vlidos aos limites do entendimento, no
nada mais que um X. Nas palavras de Kant:
Por esse eu, por esse ele ou por esse aquilo (a coisa) que pensa, nada mais se
representa alm de um sujeito transcendental dos pensamentos = X, que apenas se
conhece pelos seus pensamentos, que so seus predicados e do qual no podemos ter,
isoladamente, o menor conceito. (Kant,1997, p.330)
Kant introduz na caixa craniana, compreendida pelos empiristas com tabula rasa um eu a priori,
contudo, esse eu transcendental um X. Esse X a priori , que funda a possibilidade do conhecer,
uma forma lingstica, da qual nada se tem a declarar.
Kant, portanto, substitui o problema metafsico da arch da realidade, da misteriosa e oculta
estrutura da realidade vivente, a alma, reenviando esse princpio a outro fundamento, Razo ela
mesma. Com isso Kant marca o fim da Metafsica clssica, da compreenso da alma como
substncia, e consagra o Eu penso como funo transcendental.
Portanto, a partir dessa colocao de Kant, a psicologia que no quiser se ver destituda de seu
objeto metafsico ltimo, ou seja, a alma, dever desconfiar dessa crena racionalista, e admitir
que o homem um ser imerso numa natureza carregada de smbolos, de linguagem cifrada, de
afees e paixes, com finalidade, inteligncia e movimento prprios, como pensou a tradio
filosfica, e como fizeram os pensadores romnticos, e como o caso da psicologia analtica, como
pretendemos demonstrar.
Quanto ao Cosmo ou o mundo, para Kant deixa de ser um organismo inteligente ou um Zon
notikon (animal inteligente) , como disse Plato, j que para Kant, como podemos ler:
Qualquer matria animada move-se apenas pelo fato de que ela move algo de outro em uma
direo oposta e vice-versa. Todos as movimentos no mundo so explicados pelas foras da
natureza. Eles no nascem portanto nem sobrenaturalmente, nem por um esprito. (Rx40, Rx43, p.
262). (Kant, in Lebrum, 2002, p.330)
Segundo a interpretao de Grard Lebrum em, Kant e o Fim da Metafsica, esse trecho assim
compreendido:
Compreendamos: ( o movimento) apenas enquanto obedece lei da ao e da reao e
tambm lei da inrcia . ( Lebrum, 2002, p.330)
Ainda citando Adickes, Lebrum acrescenta o comentrio desse:
A matria animada no merece nenhum lugar especial em relao matria inanimada, no
que concerne aos primeiros princpios do movimento. Essas afirmaes proclamam a
impossibilidade de qualquer causalidade exercida por um princpio imaterial, e tornam
absurdo o fato orgnico tal como Kant sempre o definiu.( Lebrum,2002, p.330)
Para Kant aceitar o ponto de vista da Metafsica sobre um Cosmos orgnico, inteligente e dotado
de finalidade prpria, um desses conceitos ilusrios que se faz para a descrio da realidade, mas
do qual no podemos tirar nenhuma concluso. A metafsica, aqui novamente comete a falha
essencial de querer conhecer o incognocvel. Como nos diz Kant:
Somos levados pelo menos fundada suspeita de que as idias cosmolgicas e com elas
todas as afirmaes sofsticas em conflito umas com as outras tero, possivelmente, por
fundamento um conceito vazio e puramente imaginrio da maneira como o objeto dessas
idias nos dado, e tal suspeita pode j conduzir-nos ao caminho certo que nos far
descobrir a iluso que durante tanto tempo nos extraviou. (A 490 B518) . (Kant, 1997,
p.436).
importante ressaltar, segundo nossa viso, que apesar do fato da metafsica da alma ter sido
substituda, pela prestidigitao do intelecto ao longo do sculo XVIII e XIX, por uma metafsica da
Razo, pois, s se inverteu astuciosamente o fundamento anmico pela Razo, as conseqncias,
dessa inverso, foram revolucionrias para a viso de mundo. Pois, a verdade passou a ser
somente a verdade epistemolgica (Kant), ou empiricamente comprovada (Empirismo), a realidade
passou a ser somente a pretensa realidade dos fatos e, portanto, qualquer interioridade invisvel at
hoje, no passa de fantasmagoria. Sendo assim, o homem se viu e se v desligado do seu
fundamento ontolgico. Portanto, sua individualidade se apresentou e se apresenta a ele mesmo
como problemtica, j que seu ntimo no lhe prope nada mais do que iluso, por isso ter que se
ater somente a exterioridade e ordem dos fatos, devendo esquecer as utopias metafsicas e as
suas vs consolaes.
At nos dias de hoje, para as psicologias racionalistas, blasfemo pensar que a alma quem
ordena o corpo, atribuindo a ela uma substancialidade, ao invs de pensar que o quimismo
glandular que engendra a alma, sendo essa ltima um epifenmeno da matria, dos instintos e das
pulses. Pensar, ainda hoje, como a tradio metafsica pensou o homem, como possuidor de uma
alma substancial de natureza divina e, portanto, imortal, uma heresia ou uma presuno
intelectual, pois, ultrapassar os limites da razo e do empiricamente verificvel.
Por isso, o que temos hoje so as psicologias sem alma, so as psicologias da conscincia,
porque, apesar da alma ser, para essas psicologias, a expresso dos processos do substrato
material e fsico, esses processos tm a qualidade de conscincia. Como? No sabemos. Mas, se
assim no fosse, no poderamos falar, ao menos, em alma ou psych Portanto, para elas alma
igual conscincia, no melhor dos casos, porque sobre o rtulo de Psicologia, que seria o estudo da
alma, tambm se compreende: apenas comportamentos mensurveis, percepes empiricamente
comprovadas , e etc. A Psicologia, portanto, para se tornar cientfica, teve que amputar a alma.
No entanto, a descoberta do lado noturno da natureza da alma, pelo Romantismo alemo, aceita
pela histria das idias como a verdadeira descoberta do inconsciente, reafirmada e altamente
elaborada, posteriormente, por Jung, com a noo de inconsciente coletivo ou psique objetiva,
afetou a tendncia dominante da Filosofia Iluminista, isto , reergueu a soberania da alma humana,
devolvendo-lhe seu lugar privilegiado, seu estatuto ontolgico.
O movimento romntico do final do sculo XVIII e incio do sculo XIX assinalou um momento
decisivo na filosofia europia e, como dizem alguns autores, foi um movimento contra-iluminista. Os
romnticos contestaram as correntes racionalistas e empiristas do pensamento ps- Renascena.
Para eles, o ser humano no se reduz apenas clara razo, ao contrrio, o ser humano, na sua
unidade encarnada, um complexo de luz e sombra e de matria e esprito.
Como nos diz Schelling, filsofo romntico que sintetizou as idias do Romantismo:
Sem escurido antecedente no existiria qualquer realidade da criatura. As trevas so a sua
herana necessria. Somente Deus __ Ele mesmo existente__ habita a pura luz, pois
somente ele por si mesmo.(Schelling,1991, p.40) Ou ainda: O nascimento nascimento
da escurido para a luz.(Schelling,1991, p.41)
Essa escurido antecedente, chamada por Schelling de Ungrund, cuja traduo literal dessa palavra
grega abismo ou sem fundo, exprime a unidade de uma diferenciao incessante, exprime o
mundo em perptuo devir, sendo por isso, seu conceito vivo.
O objetivo do movimento romntico foi pr em evidncia o Organismo total da Natureza, no seio do
qual se desenvolvem o homem e todos os organismos particulares, como revelao do Uno, em
sua multiplicidade.
O real pensado como Organismo compreendido como um Todo preexistente s suas partes,
dotado de sentido e movimento prprios.
Para os romnticos o mundo retoma a sua antiga concepo, isto , passa a ser compreendido
como uma totalidade viva e orgnica. Essa a sua tnica diferencial, pois, at mesmo a
compreenso mecanicista do mundo pensou a relao entre a parte e o todo, embora de maneira
formal, isto , como produto do pensamento ou da Razo.
Ao contrrio, para os romnticos a Totalidade, esse grande organismo ou sistema vivo que
Cosmos, e sua viso, um princpio vital ou ontolgico, e no um produto lgico do pensamento.
Ele abrange o sentido grego de thes ...isto , uma projeo, uma idia, uma viso pela mente
(Nos)... (Murachco, H.G.,1996, p.75). Ou seja: o verdadeiro sistema no pode ser inventado,
pode apenas ser encontrado enquanto um sistema em si; a saber, no entendimento divino, j
existente.(Schelling, in Schuback, 1997, p.130).
Do seu modo, o Romantismo retomou a antiga concepo da Alma do Mundo tentando restaurar a
tradio milenar do Cosmos esttico-religioso. O Romantismo:
... rompe com a concepo restritiva do paradigma fsico-matemtico e remete o homem
no centro do universo humano.[...] Uma viso csmica se situa na origem de cada uma de
das Sehnen que diz o querer voltar e retornar. A Nostalgia diz, em grego, a dor que se
sente por buscar o retorno e no encontr-lo. ( Schuback, 1997, p.188.)
Ainda nas palavras de Schelling com relao nostalgia, lemos:
Em correspondncia nostalgia, tomada no sentido do primeiro fundamento obscuro e da
primeira pulso da existncia de deus, gerar-se, no prprio deus, uma representao
reflexiva e interior. Por ela deus vislumbra a si mesmo numa imagem semelhante, medida
que esta representao no pode possuir nenhum outro objeto a no ser deus.[...] Esta
representao , ao mesmo tempo, o entendimento a palavra desta nostalgia.
(Schelling,1991, p.41)
O fundamento da existncia nostalgia originria, e, enquanto nostalgia originria, pulso de
existncia, e, assim pulso de palavra, busca do nome.( Schuback, 1991, p.190) Isto foi tambm o
que Jung chamou de funo religiosa ou instinto de individuao. Cito Jung:
... demonstro que a alma possui uma funo religiosa natural, [...] reafirmo que a tarefa
mais nobre de toda a educao (do adulto) a de transpor para a conscincia o arqutipo
da imagem de Deus... (Jung,1993, CW 12, prg.14). Ou
ainda:
... a auto-realizao (a individuao) no outra coisa em linguagem metafsica e religiosa,
do que encarnao divina (no homem).(Jung,1993, CW11, prg.233)
Essa nova compreenso ontolgica do homem, que incluiu o Ungrund (abismo), assim denominado
pelos romnticos, como fundamento do ser, e, o que em linguagem psicolgica chamamos de
inconsciente ou psique objetiva, fez com que o homem romntico se compreendesse de maneira
mais total, ou seja, como sombra e luz, e, por isso, no pretendeu dominar totalmente sua vida, j
que percebeu que essa, em parte, escapava-lhe ao controle.
Desse fundo misterioso dessa realidade substancial, Jung fornecer provas da sua presena e de
sua ao significativa e factvel, atravs numerosssimas descries e exaustivos estudos
comparados de mitologia, de motivos religiosos, de sonhos e delrios.
Atravs desses estudos comparados, Jung pode demonstrar a existncia de um fundamento
anmico universal de todo ser humano, ao qual deu o nome de inconsciente coletivo. Recolhemos
algumas passagens, na obra de Jung, onde a dimenso ontolgica do inconsciente fica evidenciada.
Citando Jung, podemos ler que o inconsciente coletivo :
... de maneira inesperada, um espao sem limite, pleno de uma indeterminao espantosa,
que parece no ter nem interior nem exterior, nem alto nem baixo, nem aqui nem l, nem
meu nem teu, nem bem nem mal. o mundo da gua onde paira, suspenso, tudo o que
vivente, onde comea o reino do simptico, alma de tudo o que vive, onde eu sou
inseparvel disso ou daquilo, onde eu sinto o outro em mim e onde o outro me sente
enquanto sendo eu. (grifo nosso)
O inconsciente coletivo tudo salvo um sistema pessoal fechado, uma objetividade vasta
como o mundo e aberta ao mundo inteiro.(grifo nosso) [...] L, no inconsciente coletivo, eu
estou ligado ao mundo numa ligao to mais imediata... ( Jung, 1993, CW 9, Part I, prg.4546)
Esse trecho mostra a viva idia que o inconsciente coletivo muito mais que um legado histrico,
como nos primeiros escritos Jung havia salientado, ou apenas a somatria da experincia da
humanidade, seu legado filogentico. O inconsciente coletivo de que Jung trata aqui o de um
organismo vivente, atual e vibrante, que o fundamento de toda existncia. Jung nos transmite aqui
Jung, C.G. (1993). Psychology and Religion: West and East. CW 11. Princenton: Pricenton Univerty
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Jung, C.G. (1993). Psychology and Alchemy. CW 12.Princenton: Pricenton Univerty Press.
Kant, Immanuel.(1997). Crtica da Razo Pura. Trad. J. Manuela Pinto dos Santos e Alexandre
Fradique Morujo. Lisboa: Ed. Fund. Calouste Gulbenkian.
Kirk, G.S., Raven, J.E., Schofield, M. (1994). Os Filsofos Pr-Socrticos. Trad. Carlos Alberto Louro
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Paulo: Ed. Martins Fontes.
Murachco, H.G.(1996) A noo de Thos. Revista HYPNOS, Vol. 1. So Paulo: EDUC Palas
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Schelling, F.W. (1991). A Essncia da Liberdade Humana. Trad. Mrcia C. de S Cavalcante.
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Schuback, Marcia de S Cavalcante. (1997). O Comeo de Deus. Petrpolis, RJ: Vozes.
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