Lajedos Com Gravuras Na Região de Corumbá
Lajedos Com Gravuras Na Região de Corumbá
Lajedos Com Gravuras Na Região de Corumbá
MARIBEL GIRELLI
PROJETO CORUMB
Programa Arqueolgico do Mato Grosso do Sul
Participantes do Projeto
AGRADECIMENTOS
No decorrer de trs anos de pesquisa, cujo resultado apresentamos
neste trabalho, pudemos contar com a colaborao de vrias pessoas
Em primeiro lugar quero agradecer ao meu orientador Dr. Pedro Igncio Schmitz por me ter iniciado na Pesquisa arqueolgica e me ensinado tudo o que
sei sobre arqueologia, alm de acompanhar todas as etapas deste trabalho, enriquecendo-o com sugestes e facilitando-o sobremaneira.
Agradeo tambm:
A Jairo Henrique Rogge por ter feito as cpias reduzidas em campo a
montagem dos painis e oferecido as informaes sobre a geologia da rea pesquisada
A Marcus Vincius Beber, Jorge Eremites de Oliveira, Jos Lus Peixoto, Maria Eunice Jardim Schuch e Rodrigo Lavina pelas informaes prestadas e
pelas indicaes bibliogrficas.
A Fabola Andra Silva e Francisco Noeli por colaboraram com o seu
conhecimento em arqueologia e pelo emprstimo de seus livros.
A Lus Alberto Castilhos de Souza pela arte final das ilustraes a Ricardo da Silva Schmidt pelo trabalho datilogrfico e a Mrcia Fernanda dos Santos
pelas tradues dos textos em ingls.
RESUMO
A presente estudo refere-se a gravaras rupestres em quatro lajedos horizontais localizados no sop de morros, no municpio de Corumb, no Mato Grosso
do Sul. Encontram-se os mesmos na fronteira entre a vegetao chaquenha e a
floresta densa, prximas ao Pantanal, mas fora da influencia direta deste.
Busca-se, no estudo, saber como as gravaras foram produzidas, que
grafismos foram usados, qual a lgica de sua composio e qual a semelhana com
stios de outras reas. Para chegarmos a estas respostas utilizamos uma anlise
tipolgica. Depois buscamos o contexto natural e cultural dessas composies. Estas abordagens levam s seguintes concluses, sugestes e conjeturas:
Os stios de Corumb compem-se de grafismos quase que totalmente
geomtricos, principalmente crculos e sulcos curvos, produzidos por rasparem e/ou
picoteamento.
0s quatro stios possuem os mesmos elementos mnimos, mesma tcnica de produo, tamanho, suporte fsico, estruturao de painis e dos lajedos.
Os conjuntos apresentam-se organizados de duas formas: a primeira
de agrupamentos de grafismos variados e sem conexo, que podem apresentar uma
relao claramente intencional, como os agrupamentos de pisadas em fila; a segunda de longos sulcos incorporando grafismos e acompanhados de outros.
A uniformidade leva a propor que estas formaes esto ligadas a uma
mesma cultura arqueolgica, que, por excluso das outras, deve ser a dos construtores de aterros em reas alagadias. A quantidade de energia gasta na composio
destes imensos painis, a uniformidade de sua composio temtica e estrutural,
leva a propor que no se trata de construes ocasionais, mas realizaes importantes na cultura dos grupos produtores; os longos sulcos sinuosos, ligando grafismos circulares, caractersticos do ncleo central de cada um dos stios, faz conjeturar que talvez estejam representando o ambiente no qual se encontram, isto , o
emaranhado de rios, canais e lagoas, e que tenham um forte sentido ritual, ligado a
este entorno; a posio limtrofe, que ocupam entre o ambiente alagadio do pantanal e a floresta densa da encosta da morraria, limite que separa as culturas mais
importantes da rea, poderia sugerir, ainda, que os stios tambm tivessem uma
funo ligada afirmao e defesa de um territrio.
Buscando semelhanas dos stios de Corumb com os de outras reas, foram encontrados na regio do Alto Araguaia e Mdio Tocantins estruturas
semelhantes no suporte fsico, no entorno, na tcnica de confeco, na tipologia, na
organizao dos painis e dos stios, que sugerem a existncia de um complexo
estilstico maior na parte meridional da Bacia Amaznica, partilhado por culturas
arqueolgicas relativamente diferentes.
SUMRIO
RESUMO .................................................................................................................... 5
SUMRIO ................................................................................................................... 7
INTRODUCO.......................................................................................................... 12
1. O ESTUDO DE PINTURAS E GRAVURAS RUPESTRES................................... 17
2. A HISTRIA DO PROJETO CORUMBA.............................................................. 26
3. A REGIO DE CORUMBA: AMBIENTE E CULTURAS ....................................... 34
Introduo.............................................................................................................. 34
3.1. O Ambiente Fsico .......................................................................................... 35
3.2. As Culturas ..................................................................................................... 48
4. OS SITIOS DE GRAVURAS................................................................................. 61
5. O ESTUDO TIPOLOGICO DAS GRAVURAS ...................................................... 86
5.1. Procedimentos................................................................................................ 86
5.2. Os Resultados da Anlise nos stios individuais............................................. 91
5.2.1. Os Painis da Fazenda Moutinho - MS-CP-01 .................................. 91
5.2.2. Os Painis da Fazenda Salesianos - MS-CP-02 ............................... 98
5.2.3. Os Painis da Fazenda Figueirinha - MS-CP-03 ............................. 100
5.2.4. O Stio do Centro de Recuperao (CRMAP) - MS-CP-04 .............. 111
5.3. Os grafismos no conjunto dos stios ............................................................. 111
6. OUTROS SITIOS COM TIPOLOGIA SEMELHANTE......................................... 126
INTRODUCO
A presente dissertao tem por objetivo estudar as gravuras rupestres1
encontradas sobre quatro lejedos. no sop da Morraria, nos arredores de Corumb,
Mato Grosso do Sul. A investigao parte integrante do Projeto Corumb, inserido
no Programa Arqueolgico do Mato Grosso do Sul, iniciado em 1985 e executado
em convnio entre o Instituto Anchietano de Pesquisas IAP), a Universidade do Vale
do Rio dos Sinos (UNISINOS) e a Universidade Federal do Mato Grosso do Sul
(UFMS).
No Projeto Corumb os trabalhos, que deram origem documentao
existente sobre as gravaras rupestres, tema desta dissertao, foram realizados em
1990, 1991, 1992 e 1993 por uma equipe interdisciplinar, sob a coordenao do
Prof. Dr. Pedro Igncio Schmitz.
Em termos nacionais, e mesmo internacionais, ainda no existe consenso com relao ao modo de documentar e, muito menos, estudar e interpretar as
pinturas. e gravaras pr-histricas2, produzidas em superfcies rochosas.
Em Corumb, como a pesquisa fez parte de um projeto exploratrio,
em rea intocada, a documentao de campo foi realizada com tcnicas tradicionais,
sem excessiva sofisticao. Para nosso estudo recebemos a documentao completa, consistindo de cpias em plstico, desenhos, croquis, fotos coloridas e em
1
2
Gravura Rupestre: desenho gravado em rocha, podendo ser colorido ou no (Ribeiro, 1991, p.590).
Pintura Rupestre: desenho realizado sobre rocha com aplicao de pigmentos.
Stio: stio arqueolgico, o local onde se encontram vestgios de cultura do passado (op. cit.,
p.593).
4
Petroglifo: ver gravara rupestre.
5
Grafismo: unidade mnima no estudo de gravaras e pinturas rupestres, denominao usada por
Guidon (1981/82). Tambm chamado rupestrema Por Consens (1987), signo (Silva, 1992), motivo
(Consens, 1989), embora com nuances de sentido.
6
Painel: subdiviso topogrfica do stio, isolando conjuntos que parecem ter sido considerados unidades pelo homem Pr-histrico (Prous, 1989, p.12).
Complexo: conjunto de elementos, entre si associados, de duas ou mais tradies culturais (Ribeiro,
1991, p.583), ou conjunto de elementos culturais para o qual no h suficiente clareza Para atribu-lo
a uma tradio, ou para definir com ele uma nova tradio.
9
Horizonte Estilstico: conjunto de estilos que ocupam o mesmo ncleo temporal relativo em seqncias arqueolgicas que se apresentam em vrias reas geogrficas (Chmyz, 1966, p.14).
10
Estilo: conjunto de elementos ou motivos associados num Padro comum, que caracterizam um
horizonte, uma tradio ou um complexo (Ribeiro, 1991, p.583). Estilos so freqentemente definidos
como subdivises (de tradies de gravaras ou pinturas), particularmente a partir de critrios tcnicos,
enquanto nas regies mais estudadas ou mais complexas, a necessidade de chegar at um nvel
suplementar teria levado Nide Guidon a considerar variedades e Andr Prous fcies, que correspondem ao mesmo tipo de realidade (Prous, 1989, p.1Z).
Pedro Igncio Schmitz (IAP) e Altair Sales Barbosa (UCGO) e do Projeto Paran,
coordenado por Alfredo Mendona de Souza (UNESA); em Minas Gerais trabalham
as equipes de Andr Prous (UFMG) e de Ondemar F. Dias (IAB); na Bahia existem
prospeces do j mencionado Programa Arqueolgico de Gois; no Piau realizam
trabalhos sistemticos Nide Guidon e Anne-Marie Pessis (FUNDHAM); em Pernambuco trabalha a equipe de Maria Gabriela Martin Avila; nos estados do sul, onde
os stios so mais raros, h publicao de Dorath Pinto Ucha (USP) para So Paulo, Joo Alfredo Rohr (Museu do Homem do Sambaqui, Florianpolis) para Santa
Catarina; Pedro Igncio Schmitz e Jos Proenza Brochado (IAP, UFRGS) e Pedro
Augusto Mentz Ribeiro (UNISC, Santa Cruz do Sul) para o Rio Grande do Sul.
Geralmente estes pesquisadores no estudam apenas gravuras, mas
tambm pinturas, que no Nordeste, no Centro-Oeste e em parte do Sudeste so
muito abundantes, mais que as gravuras.
No existe ainda consenso com relao ao modo de documentar e,
muito menos, de estudar e interpretar esses fenmenos.
Inicialmente a documentao era feita em fotografia colorida e preto-ebranco, s vezes usando efeitos especiais (Consens, 1986) e, ao mesmo tempo, as
figuras eram copiadas em plstico transparente e os grafismos e seus conjuntos
eram mapeados, mostrando a colocao no stio e a relao de um conjunto com
outro; das gravuras s vezes se faziam moldes em gesso ou em resina especial.
Com o avano dos computadores se passaram a usar tcnicas fotogrficas que
permitem transferir a imagem diretamente para a tela do computador, possibilitando
uma manipulao mais rpida, mais complexa e mais segura.
Fcies: variao de aspectos culturais dentro de uma mesma poca, um mesmo tempo (Ribeiro,
l977, p.52). Termo usado para indicar diferenas de stios com relao ao stio-tipo.
2
Tradio: conjunto de stios de arte rupestre que apresentam temtica idntica e que tem grande
difuso territorial (Guidon, 1978/79/80, p.21). Prous (1989) descreve oito tradies para o Brasil:
Meridional, Litornea Catarinense, Geomtrica, Planalto, Nordeste, Agreste, So Francisco e
Amaznica.
3
Arte Rupestre: todas as inscries (pinturas ou gravuras) deixadas pelo homem em suportes fixos
de pedra (paredes de grutas, abrigos etc). Rupestre vem do latim rupes (rochedo) (Prous, 1989,
p.10).
mtodos para chegar aos seus reais significados. Estes significados se buscam ou
atravs de anlise de contexto (Hodder, 1991), ou de analogias gerais ou particulares. No Brasil existem algumas tentativas, com poucos resultados, de conseguir
algum significado atravs da composio dos conjuntos de signos e da globalidade
do stio e do contexto no qual se encontram os stios.
Os pesquisadores que mais se destacam na discusso metodolgica
so Anne-Marie Pessis e Nide Guidon, Andr Prous e Mrio Consens, mas entre
eles no existe consenso, nem com relao ao mtodo, nem com relao ao que
essa manipulao pode alcanar em termos de desvendar os significados.
A arte rupestre comeou a ser estudada no sculo passado e os primeiros etnlogos e pr-historiadores consideravam-na resultado de prazer puramente esttico do homem pr-histrico, teoria que ficou conhecida como a arte pela
arte.
Essa teoria se tornou insustentvel aps a descoberta de pinturas e
gravuras em locais escondidos e de difcil acesso. Alm disso, essas manifestaes
so difundidas em amplas reas geogrficas e durante muito tempo. Outro argumento contrrio teoria da arte pela arte o fato de se poder observar que os painis possuem estrutura e coerncia interna, portanto no foram feitos ao acaso.
No incio do sculo XX surge a teoria da magia da caa defendida por
Henri Breuil, onde desenhar, para o homem do paleoltico, seria um ato mgico que
o favoreceria na caa (Rippol, 1986). Esta teoria partiu de comparaes com grupos
primitivos atuais.
No Brasil, neste mesmo perodo, pesquisadores interpretaram estas
nizadas com certos animais e certos smbolos regularmente reunidos para formar
grupos significativos. De acordo com sua teoria, certos signos e certos animais (bovdeos, mos, feridas) simbolizam o princpio feminino e outros (cavalo, signos lineares) o masculino. Ambos esto dispostos em grupos de pares de significao sexual
idntica ou oposta (Leroi-Gourhan, 1983). O autor citado:
Utilizando-sle da anlise topogrfica e estatstica, demonstra que as figuras de animais no representam uma simples obsesso dos paleolticos: vem neles um significado bem
mais profundo que refletiria um modelo de sociedade. Esse
modelo refletiria uma dualidade entre masculino e feminino, 'um
sistema dualista do universo', como diz Laming-Emperaire. A
teoria sugere que de forma simblica as imagens masculinas e
femininas (que os animais representam) ocupariam pontos especficos das grutas, o que refletiria uma diviso bsica do
mundo, um dualismo universal (Seda, 1988, p. 196).
Esta teoria sofreu diversas crticas, principalmente de Conkey (1982),
que se ope ao mtodo estatstico por consider-lo muito subjetivo, e Hodder (1982)
que considera que a interpretao da arte depende de contexto scio-cultural e
histrico especfico. A abordagem estrutural, portanto, revela apenas que os grafismos no ocorrem de forma aleatria e que signos ou conjuntos de signos se dispem em associao ou oposio (Wst, 1991, p. 57).
Uma outra forma de abordagem para o estudo de arte rupestre a tipolgica, tambm usada no Brasil (cf. Prous, 1985/86, Guidon, 1975).
A noo de trao e complexo lcultural, bem como a viso
normativa da cultura, privilegiaram uma classificao taxonmica, segundo a qual se estabelecem tipos a partir de um ou mais
critrios subjetivos, independentemente das variaes dos demais atributos e do seu contexto topogrfico (...) (Wst, 1991,
p. 34).
Apesar da subjetividade, na maioria dos casos, principalmente no Brasil e Amrica (cf. Piles, 1993), no se tem elementos para se ir alm dessa aborda-
gem. A classificao tipolgica, embora no seja suficiente para se chegar ao sentido da arte, permite, quando as descries tipolgicas de stios rupestres forem sobretudo qualitativas, caracterizar e comparar facilmente entre si unidades estilsticas
ou descritivas (Prous, 1985/86, p. 213).
Outro caminho o de considerar a cultura material uma parte do sistema de informao com uso social, as unidades estilsticas estariam relacionadas a
redes de comunicao. O elevado grau de semelhana da arte parietal e da arte
mvel da Europa e Asia interpretado em termos de redes de relaes sociais
(Wst, 1991, p. 55). Essa abordagem chamada Teoria da Comunicao.
Pessis (1984) apresenta uma variante para a teoria da comunicao,
aplicando uma interpretao cinematogrfica a um material que inclui muitas cenas.
Este enfoque no traz resultados quando os grafismos so puranente geomtricos.
Segundo a pesquisadora a interpretao comporta trs nveis: o primeiro nvel de interpretao o cenogrfico, o mostrado, ou seja, o reconhecimento
permitido pelo traado das figuras fitomorfas, zoomorfas, antropomorfas, etc. O
segundo nvel o mostrado-sugerido ou hipottico, no qual a anlise centraliza-se
no reconhecimento dos ndices fornecidos pelo que mostrado. O ltimo nvel o
conjectural, onde o pesquisador faz suposies, possivelmente contestveis, mas
baseadas em fatos conhecidos.
Essa metodologia no permite penetrar na lgica interna das representaes e as desvincula das demais evidncias arqueolgicas.
Alguns pesquisadores utilizam a abordagem ecolgica. Essa abordagem apresenta uma certa diversidade terica. Autores como Williams (1979/85),
Crawford (1972), Gould (1987) e Mithen (1988) procuram explicar a arte rupestre em
relao ao sistema de abstecimento.
Usamos como exemplo o trabalho de Williams, na Guiana, onde os
grafismos, localizados nas proximidades de cachoeiras, so interpretados como
marcadores de locais onde se exploram diferentes espcies de peixes.
Mithen tenta combinar o enfoque ecolgico com a teoria da comunicao, apoiado em dados etnogrficos, sugerindo que as pinturas dos animais nas
cavernas fornecem informaes ecolgicas, citando a associao de figuras de
peixes com o veado que indicaria o outono, uma vez que este animal emigra quando
o salmo comea a pular (Wst, 1991).
Usando essa mesma abordagem, outros autores como Dracon (1988)
vem na arte rupestre uma forma de entender o mundo simblico, como uma pintura
da Africa do Sul definida como boi na chuva, que indicaria que a arte rupestre foi
empregada para reforar o poder imaginrio de um local ecologicamente favorvel e
onde se teriam praticado rituais especficos (Wst, 1991).
Outro caminho seguido nas interpretaes mais recentes o enfoque
etnoarqueolgico, que estuda as sociedades vivas sob a tica arqueolgica, investigando a arte rupestre em sociedades ainda existentes, destacando-se os trabalhos
de Crawford (1972) e Gould (1980). Nestes estudos a arte rupestre adquire um carter sagrado.
Surgiu, ainda, nos ltimos anos, uma abordagem interpretativa, chamada de arqueologia contextual, sistematizada por Ian Hodder, onde a arte rupestre
no mais tratada como um fenmeno isolado, mas em correlao com as demais
Silva, do Centro Universitrio de Trs Lagoas, UFMS, que havia sido consultado por
um fazendeiro, em cujas terras, localizadas no alto curso do rio Sucuri, se haviam
encontrado abrigos rochosos com arte rupestre. Por no ter condies de analislas, o professor Lorenz Silva recorreu aos pequisadores do Instituto Anchietano de
Pesquisas. Foi ento organizada uma sada a campo conjunta, em 1985, com o
centro universitrio de Trs Lagoas, e o Instituto Anchietano de Pesquisas. Esta
etapa foi financiada pela Universidade Federal do Mato Grosso do Sul e desenvolvida em trs fazendas nos municpios de Trs Lagoas, Parnaba e Costa Rica (Cop,
1987).
A rea foi percorrida e os stios arqueolgicos identificados, alm de
ser feito, previamente, um levantamento geolgico e ecolgico da rea. Foi tirada
uma amostra da arte rupestre e feita a documentao fotogrfica. Foram realizadas
prospeces2 em dois stios e coleta de superfcie3 em um terceiro.
Quatro reas foram, ento, escolhidas, no Estado, para o desenvolvimento do Programa, surgindo quatro projetos de pesquisa: (Ver figura 1)
Projeto A: Alto Sucuri, em Trs Lagoas, no Nordeste do Estado,
Projeto B: Campo Grande-Dourados, regio central do Estado,
Projeto C: Bela Vista, ao longo do rio Apa, no Sudoeste do Estado,
Projeto D: Corumb, vale do rio Paraguai, extremo oeste do Estado.
Os objetivos iniciais do Programa foram:
Prospeco: Trabalho de verificao das possibilidades de um ou vrios stios, para trabalhos mais
intensos, implicando em cortes experimentais (Chmyz, 1966, p. 18).
3
Coleta de superfcie: Recolhimento de material na superfcie de um stio; quando feito aleatoriamente chama-se coleta sistemtica.
(...) localizar, identificar cultural e cronologicamente e avaliar os stios arqueolgicos das reas escolhidas para a amostragem; seleclionar stios para uma etapa de pesquisa mais intensa e profunda, tendente soluo de problemas cientficos;
fazer um primeiro estudo das culturas representadas em cada
uma das reas, do ponto de vista de padro de assentamento
e arte rupestre; sugerir medidas de preservao e, sempre que
possvel, execut-las, principalmente atravs da conscientizao dos proprietrios das terras nas quais os stios esto localizados (Schmitz, 1985, p. 5).
Para alcanar esses objetivos, os mtodos e tcnicas utilizados so o
estudo das reas do ponto de vista geolgico, geomorfolgico, pedolgico, florstico,
faunstico etc., utilizando para isso imagens do satlite Landsat, trabalhos do RADAM, fotos areas, mapas e cartas. As reas devem ser percorridas buscando os
stios em ambientes variados que tero suas superfcies estudadas, coleta de informao e materiais, cortes estratigrficos4, alm de documentao da arte rupestre.
Esses dados sero sistematizados em laboratrio com anlise e descrio dos materiais recolhidos e documentados. A Universidade do Mato Grosso do Sul ficou encarregada do estudo do ambiente e ao Instituto Anchietano de Pesquisas couberam os
aspectos culturais e o treinamento especializado de pessoal (Schmitz, 1985).
O primeiro projeto executado dentro do Programa foi o Alto Sucuri,
durante os anos de 1986, 1987, 1988 e 1989.
Aps a etapa preliminar, realizada em 1985, voltou-se ao campo nos
anos seguintes. Em 1986 foi feito registro e documentao, atravs de croquis, fotografias, descrio dos achados arqueolgicos e cortes de sondagem dos stios encontrados. Foi feita tambm a coleta quadriculada5 do stio MS-PA-02 (casa de pe-
Corte estratigrfico: Escavao em pequena escala para verificao da estratigrafia, por nveis ou
camadas, de um stio arqueolgico (op. cit., p. 12).
5
Coleta quadriculada: Coleta feita por setores ou quadrculas establecidos sistematicamente para
discriminao do material.
dra). Em 1987 a arte rupestre foi documentada. No ano de 1988 foram feitos cortes
para sondagem e coleta de superfcie. Em 1989 as pinturas e gravuras foram conferidas e copiadas algumas que ainda estavam faltando, alm de ser feito um corte
estratigrfico no Bloco A2, levantamento geolgico e elaborao de um mapa geogrfico da rea, encerrando-se, assim, os trabalhos de campo do projeto.
Este projeto j est finalizado e o relatrio geral apresentado como dissertao de Mestrado em Histria, concentrao Estudos Ibero-Americanos da UNISINOS (A Ocupao do Planalto Central Brasileiro: O Nordeste do Mato Grosso do
Sul, 1994). As pinturas e gravuras da rea constituem o tema de outra dissertao
no Mestrado em Histria da PUCRS, concentrao em Arqueologia.
Os stios arqueolgicos do Alto Sucuri se constituem de abrigos6 prcermicos, com pinturas e gravuras, cuja primeira ocupao remonta a 8.400 a.C.
Os materiais lticos, a implantao dos stios e as datas se parecem
com os do resto do Planalto brasileiro, especialmente com Serranpolis, Gois.
As pinturas e os petroglifos tambm so semelhantes aos de Serranpolis.
As pinturas podem ser includas na tradio So Francisco ou na Geomtrica, ao passo que os petroglifos so da tradio Meridional, tambm denominada de Pisadas.
Abrigo: Cavidade na rocha, onde a abertura (boca) e a altura so maiores que a profundidade
(Ribeiro, 1991, p. 578).
Projeto Corumb
o segundo projeto a ser executado dentro do Programa Arqueolgico
do Mato Grosso do Sul, tendo os mesmos objetivos gerais e mtodos do Programa,
alm dos objetivos especficos que so:
Estudar a instalao do homem no Pantanal; conhecer a
instalao das sucessivas populaels indgenas pr-histricas
e coloniais nesse ecossistema.
Juntando as informaes recolhidas arqueologicamente e
as conseguidas na documentao escrita, produzir uma histria
contnua das populaes indgenas e coloniais, destacando as
diversas adaptaes conseguidas e o processo histrico que
levou no s substituio de culturas e populaes, mas
tambm dominao de umas sobre as outras (Schmitz, 1990,
p. 5).
O mtodo utilizado para alcanar esses objetivos est sendo o estudo
individualizado dos diversos ambientes e a distribuio dos stios em cada um deles
(Regio Pantaneira, Regio de Transio Chaquenha e Regio Chaquenha). Caracterizao das culturas arqueolgicas com relao tecnologia, uso das disponibilidades ambientais, organizao e padro de assentamento inferidos. Comparao
dos resultados arqueolgicos com os dados documentais sobre indgenas dos sculos XVI, XVII, XVIII e XIX, estendendo o estudo at um perodo recente (op. cit., p.
6).
As tcnicas foram: para o estudo do ambiente foram utilizados os trabalhos do FIBGE, da EMBRAPA, da UFMS e observaes de campo. Os stios foram localizados atravs de foto area com mapeamento durante os trabalhos de
campo; cortes estratigrficos para a identificao inicial e escavaes por decapa-
Decapagem: Tcnica de escavao extremamente minuciosa, por nveis naturais, que permite a
localizao dos vestgios iscronos, visando evidenciar a estrutura da ocupao (Prous, 1992, p. 29).
8
Stio-tipo: Stio caracterstico de uma determinada regio, que usado como base para a classificao dos outros stios da mesma rea ou cultura.
Bento, alm de trs stios localizados ao longo da estrada de acesso entre a Base
de Pesquisa da UFMS e a BR 262 e dois stios junto sede de pesquisa da UFMS
(Passo do Lontra) (Bitencourt, 1991).
No ano de 1992 foram feitas escavaes em vrios stios, alm da coleta, visita e reconhecimento de outros; estudo da vegetao; documentao dos
petroglifos da Fazenda Salesianos. Os petroglifos da Fazenda Figueirinha foram
conferidos e completados.
Em 1993 foram documentados novos petroglifos da Fazenda Moutinho,
foi feita coleta de superfcie e realizadas escavaes; reconhecimento e visita a
novos stios arqueolgicos da baa de Jacadigo e proximidades das Morrarias.
Nos anos de 1990 e 1991 os trabalhos de campo foram de trs semanas em cada um e nos anos de 1992 e 1993 de trinta dias cada.
H uma previso para mais dois anos de pesquisa de campo em Corumb, 1994 e 1995. Aps o trmino desse projeto sero iniciados os dois que faltam para complementar o Programa do Mato Grosso do Sul: Projeto Campo GrandeDourados e Projeto Bela Vista.
Os trabalhos de campo foram realizados pelos pesquisadores do Instituto Anchietano de Pesquisas e da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, os
quais citamos a seguir: Prof. Dr. Pedro Igncio Schmitz (coordenador), Marco Aurlio
Nadal de Masi, Ana Luisa Vietti Bitencourt, Ellen Veroneze, Marcus Vincius Beber,
Jairo Henrique Rogge, Jos Lus Peixoto, Rodrigo Lavina, Jorge Eremites de Oliveira, Anglica Bezerra de Oliveira, Srgio Wilton Izquierdo e alunos do Centro Universitrio de Corumb (CEUC).
Introduo
A rea-piloto do projeto Corumb localiza-se entre o meridiano de 57o
de longitude oeste de Greenwich e a fronteira da Bolvia e entre os paralelos de 19o
e 19o30' de latitude sul (Ver figura 2). A rea faz parte do Pantanal e encontra-se
aproximadamente no centro deste.
O Pantanal Mato-Grossense ocupa aproximadamente 140.000Km2 de
extenso, sendo parte da bacia do rio Paraguai, situada na poro central da Amrica do Sul, entre 14o e 22o de latitude sul e 58o e 66o de longitude oeste, com uma
rea de 500.000Km2, dos quais 28% pertencem Bolvia e ao Paraguai (Godoi
Filho, 1986).
O Pantanal abrange tudo quanto jaz na baixada at a altitude de 110m;
o lugar dos leitos maiores dos cursos da Bacia do Paraguai; a superfcie formada
pela coalescncia destes (Paiva, 1939, p. 32). Se, como conseqncia da temporada anual de chuvas, as guas se expandem sobre os campos e permanecem altas
durante a maior parte do ano, no perodo da seca os rios voltam, aos poucos, aos
seus leitos, deixando a plancie com a cobertura de vegetao. As caractersticas do
Pantanal o individualizam e formam uma unidade fisiogeogrfica e morfoestrutural
nica como um prolongamento das plancies chaco-pampeanas que formam as
plancies centrais sul-americanas (Moreira, 1977).
A rea do projeto Corumb no tem uma paisagem uniforme, apresentando diversidade de relevo, geologia, clima, solo, vegetao, etc. Esta diversidade possibilita a instalao de culturas tambm diversificadas.
Primeiro mostraremos como se d a diversificao fsica, depois a diversidade cultural.
Geomorfologia
Na rea do projeto podemos identificar as seguintes unidades geomorfolgicas: os Planaltos Residuais do Urucum-Amolar e as Depresses ou Fossas
Tectnicas.
Os Planaltos Residuais do Urucum-Amolar compreendem dois conjuntos de relevos residuais. O primeiro conjunto localiza-se ao sul da cidade de Corumb; corresponde poro meridional do planalto, e dele fazem parte as morrarias do
Urucum, de Santa Cruz, de So Domingos, Grande, do Rabicho e Tromba dos
Macacos, constituindo o Macio do Urucum como tradicionalmente conhecido. Ao
sul e leste deste destacam-se as morrarias do Zanetti, do Albuquerque, do Saiut,
do Aguau e do Mutum-Jacadigo (OSG - Ministrio do Exrcito, Folha SE-21-U-I-2,
1967).
O segundo conjunto corresponde poro setentrional ao norte de Corumb e abrange a serra do Amolar e as morrarias da Insua, de Novos Dourados, de
Santa Tereza e do Castelo (Franco & Pinheiro, 1982). Esse conjunto encontra-se
dentro da rea do projeto, mas fora da rea piloto.
Os planaltos apresentam altitudes que variam de 300 a 900m, chegando, em um ponto da morraria de Santa Cruz a 1065m.
Nos relevos residuais do Urucum predominam litologias do grupo Ja-
Solos
Na rea do projeto so encontrados solos variados:
O tipo Solonetz Solodizado um solo mineral profundo, com hidromorfismo acentuado e lenol fretico prximo superfcie e textura arenosa. Sobre
ele cresce vegetao chaquenha (Amaral Filho, 1986). O Vertissolo um solo mineral com alto contedo de argila, consistncia dura, pouco poroso e imperfeitamente drenado. Neste tipo de solo encontramos vegetao chaquenha e de Floresta
de Terras Baixas Estacional Decidual. O solo Glei Pouco Hmico caracterstico
de locais planos sujeitos a alagamentos peridicos, originados de sedimentos recentes do perodo Quaternrio. propcio para o desenvolvimento de vegetao
chaquenha e, se for Glei Pouco Hmico Eutrfico, para Floresta de Terras Baixas
Estacional Decidual. O Podzlico Vermelho-Amarelo Eutrfico um solo mineral
Hidrografia
A rea do projeto faz parte da bacia do Alto Paraguai; ele e seus afluentes formam o Pantanal.
O rio Paraguai e seus afluentes da margem esquerda serpenteiam vagarosamente ao longo dos 250Km de largura (sentido leste-oeste) e cerca de
500Km de comprimento (sentido norte-sul) da plancie. As guas seguem vagarosas
devido horizontalidade da superfcie e ao pequeno ndice de consolidao dos
sedimentos carreados. Isto provoca outras caractersticas, como a mobilidade dos
leitos fluviais, a coalescncia das guas dos grandes rios durante as inundaes e o
grande nmero de braos laterais que estes apresentam (Innocncio, 1977).
4 Gran Chaco: Geograficamente o Chaco est entre as mesetas do leste do continente americano e
as montanhas do oeste (Andes), abrangendo partes da Argentina, do Paraguai e da Bolvia. Os
limites naturais no coincidem com os culturais. No leste esta correspondncia existiu at o final do
sculo XVII, quando as invases dos Mbay na margem oriental do rio Paraguai anexaram para o
Chaco as terras guaranis situadas entre o rio Apa e Miranda (Reichert, 1991).
Clima
Segundo a classificao de Koppen, o clima do tipo AW - quente e
mido, com estao chuvosa no vero e estiagem no inverno. Em Corumb a precipitao baixa, com mdia anual de 972mm; a intensa radiao solar se reflete em
altas temperaturas e grande evaporao. A temperatura mdia anual de 23oC
(Amaral Filho, 1986).
Corumb est situada sob um centro de baixa presso baromtrica (no
vero), favorecendo as calmarias. As altas temperaturas so provocadas pela intensa radiao, pela posio geogrfica s margens do rio Paraguai e na proximidade
do Macio de Urucum, cujas rochas absorvem muito calor (Loureiro Lima & Fonzar,
1982). Corumb um dos locais onde a temperatura alcana as maiores mximas
do pas (42o) (Tarifa, 1986).
De abril a setembro, meses que correspondem estao seca, so
comuns os resfriamentos abaixo de 10oC, com durao de poucos dias. As tempe-
Vegetao
A vegetao na rea do projeto diversificada (Ver figura 3), devido a
fatores climticos, pedolgicos, geomorfolgicos, tambm diversificados. Segundo a
classificao de Loureiro, Lima & Fonzar (1982), ocorre nessa rea a Savana (cerrado), a Savana Estpica (vegetao chaquenha), a Floresta Estacional Semidecidual
e a Floresta Estacional Decidual. H uma extensa rea de Tenses Ecolgicas, ou
seja, zonas de contato entre vrios tipos de vegetao.
Savana: ocorre em solos arenosos com diferentes nveis de altitude,
que variam dos 700m nos plats, aos 100m nas plancies inundveis do Pantanal.
Na rea do projeto encontrada a sudeste, prximo serra da Bodoquena e nas
reas de Tenso Ecolgica. A vegetao varia de arbrea a graminide. constituda de pequenas rvores espassadas, de casca corticosa e grandes folhas, dispersas
sobre um tapete misto de gramneas e plantas lenhosas latifoliadas (Loureiro, Lima
& Fonzar, 1982).
A savana apresenta quatro formaes: Savana Arbrea Densa (cerrado), Savana Arbrea Aberta (campo cerrado), Savana Parque (parque de cerrado)
e Savana Gramneo-lenhosa (campo).
Savana Estpica (vegetao chaquenha): encontrada nas proximidades da cidade de Corumb (norte), ao longo do rio Paraguai (leste), prolongandose para o territrio boliviano. Ocorre em relevo plano, com altitudes que no ultrapassam 200m acima do nvel do mar, com exceo dos testemunhos com base
calcria que se destinguem em meio aos terrenos alagados, onde se fixam as formaes vegetais densas; em rea condicionada a longos perodos de seca e inundaes, com predomnio de solos salinos, Solonetz Solodizado, Vertissolo e outros
prximos ao rio Paraguai, como o Glei Pouco Hmico (Loureiro, Lima & Fonzar,
1982).
A Savana Estpica apresenta, tambm, quatro fisionomias: Savana
Estpica Arbrea Densa, Savana Estpica Arbrea Aberta, Savana Estpica Parque
e Savana Estpica Gramneo-lenhosa.
Floresta Estacional Semidecidual: possui decidualidade parcial nas
espcies arbreas mais altas. Apresenta duas formaes: Floresta Aluvial e Floresta
de Terras Baixas.
A Floresta Aluvial ocorre nos solos Glei Pouco Hmicos de textura m-
dia e argilosa. Apresenta dois estratos, um baixo com troncos finos e tortuosos e um
superior com rvores de 10 a 15 metros; o espao entre as rvores ocupado por
palmeiras como o acuri (Attalea sp.) e o babau (Orbignya sp.) (Loureiro, Lima &
Fonzar, 1982).
A Floresta de Terras Baixas ocorre em altitudes que no ultrapassam
os 150 metros acima do nvel do mar, em terrenos de solos dos tipos Podzlico
Vermelho-Amarelo Eutrfico e Laterita Hidromrfica Distrfica, apresentando uma
composio florstica bastante heterognea.
Floresta Estacional Decidual: assemelha-se Floresta Estacional
Semidecidual, diferenciando-se apenas no grau de decidualidade. Ocupa pequenas
reas contnuas nos Planaltos Residuais do Urucum-Amolar, Depresses do Rio
Paraguai e extremidade sul da Serra da Bodoquena. Apresenta duas formaes:
Floresta das Terras Baixas e Floresta Submontana.
A Floresta das Terras Baixas recobre as reas de superfcies pediplanadas da Depresso do Pantanal Mato-grossense em solos do tipo Brunizm Avermelhado, Vertissolo e Podzlico Vermelho-Amarelo Eutrfico. A composio florstica heterognea (Loureiro, Lima & Fonzar, 1982).
A Floresta Submontana recobre reas de superfcies pediplanadas e
formas de relevo dissecado, com solos dos tipos Podzlico Vermelho-Amarelo Eutrfico, Planossolo Distrfico e Areias Quartzosas Alicas. constituda por espcies
que alcanam at 30 metros de altura, sendo que 60% dos indivduos que compem
o estrato superior perdem as folhas ou parte delas nas pocas de seca e temperaturas mais baixas (Loureiro, Lima & Fonzar, 1982).
Areas de Tenso Ecolgica: essas reas so de caractersticas diversas. A litologia, o relevo, o clima e o solo propiciam interpenetraes (encraves)
ou misturas (ecotonos) de formaes de diferentes regies fitoecolgicas.
Na rea do projeto as Areas de Tenses Ecolgicas esto representadas pelos contatos Savana/Floresta Estacional, Savana/Savana Estpica, Savana
Estpica/Floresta Estacional.
Os contatos Savana/Floresta Estacional e Savana Estpica/Floresta
Estacional ocupam os planaltos residuais pr-cambrianos que se encontram no
interior da plancie do Pantanal e suas bordas, excetuando-se as formaes aluviais.
O contato Savana/Savana Estpica encontra-se em depresso localizada entre os rios Negro e Aquidauana, ao longo do rio Paraguai e a oeste em terrenos fronteirios com a Bolvia.
O contato Savana/Floresta Estacional ocorre principalmente nas costas
e encostas dos planaltos em solos mais lixiviados e, neste ambiente, os encraves da
Floresta Estacional se do no fundo dos vales e meias encostas nos solos mais
midos e frteis.
O contato Savana/Savana Estpica se d entre os rios Negro e Aquidauana com fisionomia campestre entremeada de tufos de vegetao arbrea com
presena marcante do carand (Copernicia sp.) junto com espcies tpicas do cerrado.
Os encraves, ao longo do rio Paraguai, foram marcados pela palmeira
carand e pelas interpenetraes dos solos salinos com Hidromrficos gleizados.
Nos encraves de savana sobre savana estpica, a savana estpica apresenta for-
Fauna
A diversidade do ambiente proporciona a oportunidade para uma fauna
tambm variada. Entre os animais terrestres mais abundantes na rea do projeto, de
acordo com Brown Jr. (1986) destacam-se: bugio (Alouata caraya), macaco-prego
(Cebus apella), anta (Tapirus terrestris), queixada (Tayassu pecari), cateto (Tayassu
tajacu), coati (Nasua nasua), tatu (Dasypodidae), ona (Panthera onca), nas matas e
aterros; veados (Mazama gouazoubira spp.), nos campos; capivara (Hydrochaerus
hidrochaerus), nos banhados.
Nos rios e lagoas encontram-se jacars (Caiman crocodilus yacare) e
muitas espcies de peixes, entre as quais destacamos, de acordo com Caravello
(1986), a trara (Erythinidae), saguiru papa-terra (Curimatidae), piavas (Anostomidae), pequiras (Cheirodontinae), lambaris (Tetragonopterinae), piranhas (Serrasal-
3.2. As Culturas
Quando nos perguntamos sobre reas e recursos que convidariam
para a instalao humana, levantamos, ao mesmo tempo, a pergunta se o ambiente
de hoje era o mesmo atravs do tempo. Certamente no era, mas a evoluo do
Pantanal ainda pouco estudada e os resultados propostos tm pouca utilidade
para nossa pesquisa.
Mesmo que a ocupao humana da rea nos parea recuar at mais
que uns 3.000 anos, o homem provavelmente pegou o ambiente em forte evoluo.
Ele se teria instalado no momento em que o ambiente oferecesse garantias suficientes para tanto.
razes longas que vo para o terreno seco e parcialmente para o mido, precisam de
luz para se desenvolver, razo por que ocupam as bordas. Quando termina a competio das rvores altas do centro, por desmatamento, os acuris invadem todo o
terreno (Schmitz, 1992).
Esses aterros so formados por material sltico-arenoso e orgnico, associado a conchas de gastrpodos, principalmente aquticos e outros materiais
arqueolgicos. Ainda no existem dataes para eles, mas possvel que as ocupaes mais antigas sejam anteriores a Cristo, ao passo que as mais recentes talvez
se tenham dado por volta do sculo XVI ou XVII.
Para a sua formao levanta-se a hiptese de que antigas populaes
indgenas teriam recolhido moluscos nos campos alagados e acumulado as conchas
em pontos arenosos que sobressaiam da enchente. Dessa forma seria possvel que
gradativamente o solo se fosse tornando favorvel flora, fauna e ao homem que,
por sua vez, deve ter voltado a ocup-los com mais intensidade e freqncia, tanto
para moradia como talvez para cultivo, de acordo com as configuraes sazonais do
ambiente (Oliveira, 1993).
Um exemplo de grupo indgena que utilizava esse tipo de ambiente so
os Guat (enquadrados no tronco lingstico Macro-G), embora no se possa afirmar que tenham sido os formadores dos aterros aqui estudados. Este grupo horticultor5 costumava habitar lagoas e ilhas da regio do Alto Paraguai, desde o norte
da cidade de Corumb, at Cceres no Mato Grosso. De acordo com os relatos do
incio da conquista os Guat so caracterizados como nmades canoeiros-
denominado grupo 3.
Na rea de transio chaquenha (tenso ecolgica) e floresta da encosta da morraria foram encontrados, at agora, 12 stios de horticultores da tradio
cermica Tupiguarani7, que, segundo Rogge e Schmitz (op. cit.), o grupo 4 de
ceramistas.
At agora foram localizados, tambm, trs stios pr-cermicos. Dois
esto junto lagoa do Jacadigo, sendo pr-cermicos nos estratos inferiores e cermicos do grupo 1 nos superiores. O terceiro, exclusivamente pr-cermico, foi
encontrado numa barranca alta do rio Paraguai.
Os quatro lajedos com petroglifos, de que nos ocupamos a seguir, encontram-se no sop da morraria em rea de tenso ecolgica.
Segundo Rogge e Schmitz (op. cit.), o primeiro grupo compreende a
cermica dos aterros das lagoas do Jacadigo e Negra e do Pantanal do Abobral
assim descritos:
Nas baas do Jacadigo e Negra existe uma dzia desses
stios, em pontos que sobressaem das guas da inundao ou
diretamente das guals das lagoas. Os estratos terrosos, medindo at 150 centmetros de espessura, contm uma grande
quantidade de gastrpodos de gua doce, sepultamentos primrios estendidos ou fletidos, alguns provavelmente secundrios (...) A mesma cermica foi encontrada em dezenas de aterros do Pantanal do Abobral, onde os estratos arqueolgicos
so totalmente cermicos e, normalmente, no ultrapassam 80
cm (Rogge e Schmitz, 1993, p. 3).
A mesma cermica foi encontrada tambm em aterros dos rios Verde,
6
Negro e Miranda.
As pricipais caractersticas dessa cermica, segundo Rogge e Schmitz
so: manufatura acordelada8; antiplstico9 de gros de quartzo predominantemente,
ocorrendo fragmentos de conchas e caco modo. A decorao variada: simples (na
maior parte), corrugada simples10 com variaes, cestaria impressa11, incisa12, vermelha, com impresso de corda13. Os vasilhames so pequenos, tipicamente utilitrios, sem refinamento. Apresenta semelhana com cermicas do Chaco argentino.
Pela instalao e disposio dos stios, os autores consideram que essas populaes seriam canoeiros, como os Guat e Paiagu.
O segundo grupo de cermica encontrada nos patamares baixos da
morraria, onde foram localizados, at o momento, trs stios, sendo
(...) um deles em patamar plano e largo junto baa de
Jacadigo, onde a cermica se distribui superficialmente at encostar na baa, onde se localiza o segundo stio; como o terreno foi, desde muito tempo, usado pelo branco no primeiro e se
acha coberto por areia no segundo, no se percebe mais uma
distribuio diferenciada dos fragmentos. O terceiro stio, tambm num largo patamar beira de um crrego de gua permanente, apresenta cermica distribuda em 13 pequenas manchas (...) Nestes stios no existem estratos de gastrpodos,
como no grupo anterior, nem outros restos perecveis, devendo
Alisado: Processo de nivelao da superfcie das peas cermicas podendo variar em grau, como
superfcie bem alisada, regular e irregular (op. cit., p. 7).
15
Roletado: Tipo de decorao que consiste em conservar roletes de confeco do vasilhame, sem
pressionar e alisar a superfcie externa (Ribeiro, 1991, p. 592).
16
Ungulado: Tipo de decorao que consiste em imprimir, com a ponta das unhas, marcas agrupadas
em diversas posies, na superfcie dos vasilhames (op. cit., p. 597).
17
Pinado: Tipo de decorao em que se imprimem marcas espaadas pela ao contratil e simultnea das pontas de unhas e dedos, em sentido oposto, na superfcie da cermica, como se fosse
beliscada (Chmyz, 1966, p. 17).
18
Serrungulado: Tipo de decorao em que a ao simultnea das pontas de unhas e dedos, em
sentido oposto, na superfcie cermica, provocam a formao de cordes em crista, afastados por
sulcos (Ribeiro, 1991, p. 592).
19
Aplicado: Tipo de decorao em que se fixa uma ou vrias tiras ou bolas de pasta, na superfcie
cermica, com efeitos de variadas formas e desenhos (op. cit., p. 579).
20
Ala: Apndice vasado, destinado suspenso do recipiente (op. cit., p. 579)
21
Boto: Apndice macio, em forma de boto.
impresso de corda e, menos, o vermelho. A ausncia de outras decoraes plsticas a distingue dos grupos anteriores. O antiplstico constitudo por gros de
quartzo e raramente concha moda. Os vasilhames so rasos. At agora no foi
encontrada semelhana desta com nenhuma outra cermica.
O quarto grupo identifica os 12 stios localizados nos patamares baixos
e altos da morraria, no interior de matas fechadas, onde foram recolhidos milhares
de fragmentos de cermica conhecida como da tradio cermica Tupiguarani, subtradio Corrugada. O material em nada se distinguiria, segundo os autores, daquele
encontrado em todo o sul do pas. O material cermico foi analisado por Rogge
(1991), que escreve que a decorao plstica de corrugado mdio e alto, corrugado-ungulado mdio, corrugado-ungulado baixo e ungulado. Em menor quantidade
apareceria o pinado, o inciso, o impresso e o pintado. As formas seriam as tradicionais e no apresentariam nenhuma influncia colonial, nem de outros grupos ceramistas.
Rogge e Schmitz (1993) concluem que a ocupao cermica do grupo
1 deve ser a mais antiga e duradoura devido ao nmero de stios e exclusividade
em todas as reas alagadias. Esses grupos, canoeiros ao que tudo indica, pricipalmente pela localizao dos stios em reas alagadas a maior parte do ano, no se
teriam fixado nos demais ambientes, como os dos patamares baixos e altos da morraria, possibilitando que outros grupos se estabelecessem na rea, entre esses o
Tupiguarani (grupo 4), que aproveitaram as reas de floresta com terrenos frteis,
propcios para a agricultura.
O grupo 2 tem apenas 3 stios. Desses, dois esto prximos do grupo
1, estando inclusive um desses sobre um dos stios do grupo 1. Isso sugere que a
ocupao do segundo grupo posterior ao primeiro. O outro stio do grupo 2 est
prximo aos stios Tupiguarani mas sem nenhuma evidncia de contato, sugerindo
que tambm no so contemporneos. O pequeno nmero de stios indica que a
ocupao foi de pouca durao. O mesmo aconteceria com o grupo 3 que, at agora, produziu um nico stio raso na mesma rea dos stios Tupiguarani, tambm sem
indcio de contato com eles.
Os autores concluem, ainda, que o grupo mais antigo teria sido o 1,
seguido do Tupiguarani (4). Os grupos 2 e 3 teriam sido mais recentes e provavelmente se teriam estabelecido na poca da conquista espanhola ou um pouco antes,
o que poder ser testado com dataes de carbono 14.
Como se pode verificar, as culturas se estabeleceram diferencialmente
nos diversos ambientes que descrevemos.
Nas reas do Pantanal (reas temporariamente alagadas) e das baas
(reas permanentementes alagadas) temos um tipo de cermica (grupo 1), que
provavelmente pertence a uma populao canoeira. Os stios pr-cermicos, devido
mesma implantao poderiam, tambm, ser de canoeiros.
Na rea de tenso ecolgica, onde a vegetao menos densa e corresponde aos patamares baixos da morraria, encontram-se os stios cermicos dos
grupos 2 e 3, que aparentam no serem canoeiros, mas populaes pedestres ou
cavaleiras, como as conhecidas dos relatos dos cronistas, sob a denominao de
Guaicur (Mbay).
De fato, um dos ramos guaicur penetrou nas terras do rio Paraguai,
oriundos do mdio Pilcomayo, e estabeleceu relao de vassalagem com os cultivadores guan (Arawak). O contato com o branco possibilitou a introduo do cavalo
na sua cultura, em princpios do sculo XVII, aumentando a sua mobilidade e o seu
poder ofensivo, com o que ampliou tambm o seu territrio.
Os petroglifos dos lajedos, na rea de tenso ecolgica, a fronteira entre os ceramistas do grupo 1 e do 4 e local de ocorrncia dos grupos 2 e 3, sem
dvida fazem parte de um ou mais desses grupos. Pelo seu tamanho, visibilidade,
estrutura de organizao, originalidade e tempo investido na sua produo, eles
devem ter desempenhado um papel importante na cultura da rea.
Nos prximos captulos descreveremos os stios e apresentaremos
nosso procedimento, depois analisaremos os petroglifos de cada stio, comparando
a rea com outras de petroglifos semelhantes e, finalmente tiraremos nossas prprias concluses.
Fonte:RADAMBRASIL
4. OS SITIOS DE GRAVURAS
Nas reas de Transio chaquenha, no sop da morraria, sobre lajedos
horizontais, foram localizados quatro stios de petroglifos nas seguintes fazendas:
Dr. Moutinho, Figueirinha, Salesianos e Santa Terezinha (CRMAP) (Ver figura 4).
Para a descrio dos stios usamos a documentao produzida pela
equipe do projeto. Pessoalmente no estivemos no campo.
Picoteamento: tcnica de abraso realizada atravs de percusso repetida de uma superfcie por
um batedor provocando seu esfarinhamento (Prous, 1992, p.77).
De propriedade dos padres salesianos, do colgio Santa Tereza, localiza-se a 17Km a sudeste de Corumb, direita da estrada da Manga, a nordeste do
morro do Urucum e a 8Km a sudeste da lagoa Negra, numa altitude de 150m.
Este stio no mencionado por Passos, nem registrado por Silimon.
Ao que tudo indica, o stio foi localizado e documentado pela primeira vez pela equipe do Instituto Anchietano de Pesquisas, em 1990.
O lajedo possui vrios quilmetros de extenso em direo morraria
do Urucum e, na altura dos petroglifos, possui aproximadamente 200m de largura.
Como os outros stios, resultou da consolidao de materiais erodidos das encostas.
Ele abrange partes uniformes e lisas e partes heterogneas e irregulares e tem pequena declividade. Os petroglifos esto nas partes mais regulares.
Sobre a laje h gramneas, cactceas e bromeliceas. A laje percorrida no sentido longitudinal por um fluxo de gua intermitente, que desemboca no
crrego Banda Alta. Na proximidade do crrego h terrenos ricos e frteis, propcios
para cultivos.
Cercando o lajedo, onde a terra mais frtil, existem rvores grandes e
restos de mata fechada.
Os petroglifos, divididos em dois painis, ambos prximos, esto bastante erodidos por meteorismo. Os grafismos so bem mais simples que os da Fazenda Moutinho e da Fazenda Figueirinha. Tambm aqui temos um painel com
sulcos sinuosos que se encontram, mas nem sempre possvel ver todas as suas
partes por estarem erodidos ou cobertos de vegetao. No outro painel existem
grafismos independentes, inclusive ps humanos em seqncia, direitos e esquer-
escoamento da gua. Inclina-se no sentido leste-oeste, ou seja, da morraria do Urucum em direo lagoa de Jacadigo. A 400 metros, em direo leste, est o crrego
das Pedras que vem da morraria e desemboca na lagoa de Jacadigo.
O lajedo s aflora em pequenas manchas no meio de uma vegetao
composta por arbustos variados, palmceas, bromeliceas e gramneas. Esta vegetao mais densa ao longo do crrego, contendo plantas de terras mais frteis
como bacuris e xixs, outras rvores grandes e restos de mata fechada, como a da
encosta vizinha.
As gravuras cobrem a maior parte dos lajedos aflorantes.
Os grafismos esto nas partes da laje em que a rocha macia e aplanada, no se encontrando onde as superfcies so irregulares ou cobertas de seixos.
Abrangem aproximadamente 990 m2 de rea gravada.
O stio se compe de trs faixas ou lajedos. As gravuras mais abundantes e preservadas esto na longa faixa do meio. Na faixa esquerda de quem
chega da BR 262 elas foram destrudas, pois ali passou o caminho dos carros que
serviam a fazenda. Na faixa direita elas ainda so abundantes mas bastante atacadas.
As gravuras foram divididas em 7 painis, por ocasio da documentao e de sua anlise. Em alguns painis eles so densos e complicados, em outros
so meros crculos ou crculos concntricos dispersos.
Na laje central, tomando como referncia a BR, temos os painis 1, 2,
3, 4 e 5, correspondendo a 820 m2 de rea gravada. Nestes painis os grafismos
so mais densos, complexos e interligados. A laje da direita, de forma sub-
retangular, tem 165 m2 gravados: o painel 7. Este painel composto por grafismos
mais simples e em menor nmero.
Na laje da esquerda, que estreita e foi usada como caminho, est o
painel 6, com 9 m2, bastante prejudicado pelo trnsito.
Grande quantidade de gravuras foi feita por raspagem. Os aprofundamentos centrais dos crculos so bastante fundos e regulares. Onde as gravaes
so mais rasas e erodidas difcil dizer se foram realizadas por raspagem ou picoteamento. As profundidades variam de poucos milmetros a mais de trs centmetros
e as larguras de 1 a 3 centmetros.
Os grafismos assemelham-se aos encontrados no stio da fazenda
Moutinho. Tambm aqui aparecem os grandes sulcos sinuosos ligando grafismos ou
acompanhados por eles. H algumas diferenas que chamam ateno: neste, os
sulcos so simples, isto , no se apresentam seguindo paralelamente, nem aparecem as longas filas sinuosas compostas por pontos. Neste stio h grandes grafismos complexos interligados, que no se encontram nos outros stios. No foi possvel classificar estes grafismos emaranhados, por no podermos determinar onde
comeam e onde termina cada um deles; apenas chamamos ateno para eles.
Prximo ao lajedo encontram-se stios cermicos do primeiro grupo,
principalmente ao longo do crrego das Pedras, que desemboca na lagoa de Jacadigo a uns 10Km de distncia.
5.1. Procedimentos
No h consenso entre os arquelogos sobre manejo e metodologia
para o estudo da arte rupestre, mas concordam que trs etapas so indispensveis:
documentao, anlise e interpretao. A forma adequada de agir em cada etapa
varia de stio para stio e conforme a regio. Deve ser levado em conta o tipo de
suporte e o material a ser documentado: pintura ou gravura (cf. Seda, 1988). Em
relao aos petroglifos de Corumb, os procedimentos foram os seguintes:
Antes da documentao foi necessria uma limpeza. Os lajedos encontram-se dentro de limites de fazendas e servem de passagem e dormitrio para o
gado. Havia uma grande quantidade de estrume acumulada, por isso os painis
foram limpos com vassouras at os sulcos ficarem bem visveis. Em pequenas partes os grafismos estavam cobertos por vegetao e foi necessrio remov-la.
Para a documentao de todo o stio da fazenda Figueirinha e parte do
painel 1 da fazenda Moutinho foi usada a tcnica padro, isto , decalque em plstico transparente para reproduzir em tamanho natural os grafismos e os painis. Os
plsticos foram fixados sobre os lajedos e os grafismos copiados com caneta hidrocor especial. A cpia foi feita e/ou confirmada em diferentes horas do dia, porque,
conforme a incidncia de raios solares e diferena de luminosidade, determinados
grafismos apresentam-se de forma diferente, alguns, inclusive, s ficam visveis
tardinha ou nas primeiras horas da manh com a sombra provocada pela inclinao
dos raios do sol.
Todo o lajedo da Salesianos, os painis 2, 3 e a maior parte do 1 da
Moutinho foram desenhados por Jairo Rogge em escala de 1:30 (Moutinho) e 1:35
(Salesianos). Esse procedimento se deve ao tamanho da rea abrangida pelos petroglifos destes stios, que tornam muito difcil a cpia em plstico.
Os petroglifos do Centro de Recuperao foram fotografados em escala.
Todos os grafismos foram tambm fotografados em cores e preto-ebranco e descritos. Os lajedos foram filmados. As filmagens e as fotos foram de
tomadas gerais dos grafismos e arredores e dos painis e grafismos detalhadamente.
A determinao dos painis foi feita para facilitar o trabalho, por ser a
rea de cada stio muito extensa e por ser impossvel copi-los em um s conjunto,
com exceo do stio do Centro de Recuperao, que possui poucos grafismos. Os
painis foram determinados pelo agrupamento das gravuras e pelos espaos vazios.
Em cada painel foi colocada uma identificao, com o nome do stio, o nmero do
painel, o sinal da juno e a distncia de outros painis do mesmo stio.
Em laboratrio os plsticos foram limpos e todos os grafismos copiados
em plstico foram reduzidos dez vezes (1:10), manualmente, em papel milimetrado,
com o objetivo de facilitar a manipulao, devido s grandes dimenses dos painis.
Aps a reduo os painis foram montados e copiados em papel vegetal com tinta
nanquim. Devido fragilidade do papel vegetal, este no muito adequado ao ma-
nuseio, s consultas e s anotaes necessrias para anlise; por isso foram feitas
cpias heliogrficas para o uso.
Os painis que no foram copiados em plstico tambm foram montados em laboratrio, transferidos para papel vegetal e deles foram feitas cpias heliogrficas como para os painis descritos acima.
As cpias foram decompostas em tipos, reunidos em quadros, necessrios para anlise de composio dos painis e do conjunto dos petroglifos de cada
stio e de toda a rea. Os quadros tipolgicos apresentam todas as formas de grafismos e suas variaes. Foram produzidos quadros de tipos para cada painel, para
cada um dos stios e para o conjunto da rea.
A separao dos grafismos para classific-los em tipos foi relativamente fcil e objetiva quando se tratava de grafismos isolados, difcil e subjetiva
quando se tratava de redes de grafismos encadeados. Nestas, foram separados os
componentes mnimos, decompondo as redes. Por exemplo, nos longos sulcos
sinuosos, encontrados em trs dos stios, foram separados os crculos, os retngulos
e outras gravuras que esto incluidas como partes essenciais nas mesmas. Agiu-se
da mesma maneira com as redes densas como a representada no painel 1 do stio
da fazenda Figueirinha.
Para compensar essa decomposio foi feita uma descrio desses
grafismos complexos, que reconstitui a totalidade dos mesmos.
Nem sempre os elementos mnimos esto dispostos aleatoriamente;
muitas vezes eles formam conjuntos, como por exemplo, as pisadas, que sero
descritas mais adiante.
de perceber se todos os stios foram construdos com os mesmos tipos e com que
freqncia estes tipos foram usados. Como existem tipos de construo simples e
tipos de construo complexa, ver em que proporo foram usados os tipos simples
e os complexos, inclusive os sulcos sinuosos e as redes de sinalaes encadeadas.
Segundo, o nmero de grafismos de cada painel em relao ao total de grafismos do
prprio stio, para ver se existem reas mais centradas e outras perifricas. Terceiro,
cada painel foi analisado separadamente dos outros do mesmo stio, calculando a
freqncia dos tipos pricipais em relao ao nmero de grafismos do painel para ver
a composio de cada um; depois cada subtipo em relao ao seu tipo principal,
para perceber a variedade de formas que um tipo bsico pode assumir num painel.
Alm desses clculos estudou-se a forma como os tipos esto dispostos dentro de cada painel, formando a sua estrutura e como os painis esto dispostos dentro do stio, formando a estrutura deste.
Em primeiro lugar faremos as descries dos painis.
Ocupa um espao contnuo entre o crrego, as casas e currais. Olhando da piscina em direo estrada da Manga, ou da morraria, ele apresenta duas
facetas: No lado esquerdo (1a) uma longa tira formada por um sulco sinuoso
acompanhado de ou incorporando grafismos; esta parte est mais prejudicada e os
grafismos esto menos claros. No lado direito (1b) as sinalaes so independentes,
mais profundas, mais bem acabadas e mais bem conservadas.
O longo sulco do lado esquerdo inicia prximo piscina e continua do
lado dos currais por aproximadamente 200 metros. Nos primeiros 50 metros o painel
bastante denso e os grafismos esto aglomerados. H cruzamento de longos
sulcos sinuosos e longas linhas formadas por depresses circulares, que tambm se
cruzam. A partir da o sulco segue por mais 70 metros, ao longo dos quais incorpora
alguns poucos grafismos, mas na maior parte segue desacompanhado. Na altura de
130 metros a partir do seu incio, o sulco se bifurca. Para a direita continuado por
uma linha de depresses circulares de aproximadamente 50 metros de comprimento, acompanhada de alguns grafismos. Para a esquerda o sulco segue mais 70 metros, acompanhado por densos conjuntos de grafismos e incorporando muitos outros.
Mais ou menos na metade do percurso desse grande sulco, direita, e
a 8 metros de distncia deste, comea um conjunto bastante denso, com grafismos
independentes, de composio um pouco diferente da do resto do painel (1b). Ele
continua em direo estrada da Manga com outros grafismos mais dispersos.
O painel 1 concentra o maior nmero de grafismos do stio (790), correspondendo a 79,31% do total, distribuidos em 1746 metros quadrados de rea.
Est localizado a uns 500m do final do longo sulco do 1a, para a esquerda.
Este painel formado por uma longa tira, que parte de uma entrada de
mato e se estende por aproximadamente 105 metros em direo estrada da Manga, ou em direo morraria, seguindo a mesma orientao do painel 1a.
Nos primeiros 20 metros, partindo da entrada de mato, h uma srie de
crculos e pequenas depresses circulares e algumas sinalaes livres e uma linha
de depresses circulares com 3 metros de comprimento que atravessada, da esquerda para a direita, por pisadas de felino em fila. Este nicho de figuras interrompido por um tufo de vegetao. 7 metros a partir de onde termina a vegetao, existe
um grafismo de 4m de comprimento por 2m de largura, a partir do qual inicia um
sulco que se bifurca em seis, seguindo todos aproximadamente paralelos por mais
ou menos 9 metros, incorporando crculos e alguns grafismos complexos. A partir
da os sulcos se juntam novamente, ficando apenas dois, que seguem quase at o
final do painel. Ao longo do percurso, estes dois sulcos so acompanhados por alguns grafismos e, de espao em espao, incorporam outros. Quase no final, nos
ltimos 10 metros, os dois sulcos se bifurcam, o da esquerda segue nessa bifurcao por mais 6 metros sem nenhum outro grafismo acompanhando; e o da direita
por 1,50 metro, acabando em um grafismo complexo.
A mais ou menos 50 metros do incio do painel, 6,5 metros direita do
sulco anterior, inicia um outro sulco de 38 metros de comprimento, que segue aproximadamente paralelo ao primeiro. Nos 24 metros iniciais este sulco s incorpora um
grafismo. Nos ltimos 14 metros aparecem alguns, mais aglomerados e o painel se
torna mais denso.
Tambm neste painel, como no primeiro, os grafismos so mais concentrados na entrada do mato e vo se dispersando medida que ele avana lajedo
adentro. Tambm a base da estrutura so os grandes sulcos.
Dos 196 grafismos que compem este painel, 107 (54,59%) so variaes de crculos e depresses circulares (tipo A); 54 (27,55%) so conjuntos de
depresses circulares (tipo B); 5 (2,55%) so retngulos ou elipses (tipo C); 3
(1,53%) so pisadas de aves (tipo D1); 21 (10,71%) so grafismos complexos (tipo
E) e 6 (3,03%) so grafismos formados por outros sulcos (tipo I).
Entre os grafismos do tipo A predominam os crculos simples, s vezes
isolados, ou ento agrupados, s vezes incorporados ao grande sulco.
Dos crculos com raios centrais, temos em maior quantidade crculos
com dois raios.
Entre os grafismos do tipo C (retngulos ou elipses) h predominncia
dos retngulos com preenchimento de linhas cruzadas.
As trs pisadas (tipo D) so de ave, havendo uma no incio e duas no
final do painel. Existem ainda 13 pisadas de felinos s vezes em conjunto ou em fila,
outras vezes isoladas, mas sempre acompanhando o sulco sinuoso. Em um determinado ponto formam uma fila que atravessa uma linha de depresses circulares.
Painel 3 (Ver tabela 2c, no Anexo)
Acompanhando o crrego a partir do trmino do painel 1 em direo
estrada da Manga, ou morraria, a 250 metros de distncia do final do 1b est o
painel 3. um pequeno nicho composto por cinco gravuras espalhadas em 18 metros quadrados. Os tamanhos dos grafismos variam de 2 a 60cm, sendo a maioria
Consideraes finais
Temos neste stio dois painis estruturados, como nos anteriores, de
duas formas: um, mais complexo, composto em funo de sulcos sinuosos e outro
composto por grafismos isolados e simples. Em ambos existe a predominncia dos
crculos.
So 224 grafismos; destes, 88,78% (199) esto concentrados no tipo
A; 6 (2,69%) so do tipo C; 11 (4,93%) so do tipo D; 5 (2,24%) do E e 3 (1,34%) do
I.
Entre as variaes de crculos predominam os crculos com uma depresso. Os retngulos em sua maioria so cortados por uma linha ou linhas paralelas, no sentido transversal. As pisadas que mais aparecem so as humanas. Dos
grafismos do tipo I, 100% (3) so sulcos que se cruzam.
O tipo C (retngulos ou elipses) s tem uma figura (0,85%); o E (grafismos complexos), 4 (3,41%) e o I (outros sulcos) possui 2 (1,70%).
Painel 3 (Ver tabela 4c, no Anexo)
Localizado a 20 metros do painel 1, em direo da lagoa de Jacadigo,
este pequeno painel, de 12 metros de extenso por 5,5 metros de largura, composto somente por grafismos independentes, predominantemente crculos e depresses circulares. Neste no existem os grandes sulcos sinuosos como no painel anterior. Foram encontrados dois pequenos sulcos, um de 80cm e outro de um metro,
que talvez tenham sido maiores e estivessem ligando grafismos e estejam destrudos, mas no h certeza. Ambos esto desacompanhados e no incorporam nenhum grafismo.
Os grafismos esto dispersos, havendo, quase no centro do painel, um
agrupamento mais denso de depresses circulares cujos dimetros variam de 5 a
25cm, predominando os de 6cm.
Temos um total de 231 grafismos, sendo 211 (91,34%) de variaes de
crculos ou depresses circulares; 4 (1,73%) de grafismos retngulares ou elpticos;
6 (2,59%) de pisadas; 6 (2,59%) so grafismos complexos e 3 (1,29%) formados por
outros sulcos.
Nos grafismos do tipo A, predominam as depresses circulares e os
crculos com uma depresso.
No tipo C (retngulos ou elipses) predominam os retngulos preenchidos por linhas cruzadas.
No tipo D, a maioria de pisadas de trs dedos e no I predominam os
em 160 metros quadrados de rea; em alguns pontos formam pequenos agrupamentos no muito densos.
So 179 grafismos, sendo que 114 (63,68%) so variaes de crculos
ou depresses circulares, principalmente crculos simples e crculos com uma depresso.
O tipo B (conjunto de depresses circulares) possui 23 grafismos
(12,84%), sendo a maioria grafismos compostos por depresses circulares, cujos
conjuntos assemelham-se a pisadas de felinos.
Os retngulos ou elipses aparecem 11 vezes (6,14% de freqncia),
com predominncia de retngulos preenchidos por linhas cruzadas.
No tipo D (pisadas) temos 8 grafismos (4,46%), principalmente pisadas
de aves.
Os grafismos complexos, 8 (4,46%) so todos do subtipo E.2. Os formados por outros sulcos so 11 (6,14%), sendo que a maioria de sulcos simples.
Existem, ainda, 2 grafismos (1,11%) do tipo F (sulcos sinuosos com ou sem crculos
nas extremidades) e 1 (0,55%) do tipo J (outras formas de combinaes de crculos
com sulcos).
A nica pisada humana deste painel forma conjunto com duas pisadas
de aves. As pisadas de felinos (10) tambm formam pequenos grupos, algumas
vezes com as pisadas de aves, outras vezes s de felinos. As demais esto espalhadas entre os outros grafismos.
Consideraes finais
Analisando os painis na sua totalidade dentro do stio, podemos ob-
servar que temos no lajedo central uma rea onde os grandes sulcos so os grafismos principais, que organizam ou emolduram esta parte central. Nas partes perifricas os sulcos sinuosos no esto presentes, destacando-se os grafismos mais simples.
Na parte central os painis so mais densos e os grafismos em maior
nmero, interligados at
ravs dos sulcos ou entre si. Os painis mais densos e com maior nmero de grafismos so o 1, o 2 e o 3, todos do lajedo central e todos estruturados a
partir dos grandes sulcos sinuosos.
H um total de 1.203 grafismos neste stio, e destes 71,40% (859) so
do tipo A (crculos ou depresses circulares). Em segundo lugar est o tipo E (grafismos complexos) com 108 (8,97%). O tipo B (conjunto de depresses circulares)
est em terceiro lugar com 6,06% (73) do total de grafismos do stio. Em seguida
vem o tipo D (pisadas) com 5,40% (65) e, logo aps, o tipo I (outros sulcos) com
3,24% (39); o J (outras formas de combinaes de crculos com sulcos) com 0,33%
(4); o F (sulcos sinuosos com ou sem crculos nas extremidades) e o H (grafismos
fechados formados por linhas sinuosas) com 0,08% (1). H tambm um grafismo
no classificado.
Em todos os painis o tipo A apresenta o maior nmero de grafismos,
com exceo do painel 6, onde o tipo A e E possuem a mesma porcentagem (40%).
H uma estrutura diferenciada entre o centro e a periferia do stio, mas
os elementos componentes so praticamente os mesmos, ou seja, os tipos se repetem variando muito pouco de um painel para outro.
de tipos; nestes stios no se encontram os tipos B (conjunto de depresses circulares), F (sulcos sinuosos com ou sem crculos nas extremidades), H (grafismos fechados formados por linhas sinuosas) e J (outras formas de combinao de crculos
com sulcos). No stio do CRMAP tambm no encontramos o tipo D (pisadas).
Os quatro stios juntos possuem 2.467 grafismos, dos quais 1.757 ou
72,22% so crculos ou depresses circulares (tipo A), 233 ou 9,44% so conjuntos
de depresses circulares (tipo B), 87 ou 3,52% so grafismos retangulares ou elpticos (tipo C), 99 ou 4,01% so pisadas (tipo D), 184 ou 7,45% so grafismos complexos (tipo E), 7 ou 0,28% so sulcos sinuosos com ou sem crculos nas extremidades
(tipo F), 3 ou 0,12% so espirais (tipo G), 4 ou 0,16% so grafismos fechados formados por linhas sinuosas (tipo H), 83 ou 3,36% so outros sulcos (tipo I), 10 ou
0,40% so outras formas de combinao de crculos com sulcos (tipo J).
O tipo A como foi exposto, est em todos os stios e sempre em maior
quantidade, com 62,29% na Moutinho, 71,40% na Figueirinha, 88,83% na Salesianos e 85,71% no CRMAP. Nos subtipos h tambm uniformidade na freqncia nos
stios, prevalecendo o A.1.1. (s crculos ou depresses circulares). Esta uniformidade e freqncia se repete em praticamente todos os painis, mas nem sempre a
quantidade de crculos sobressai visualmente.
O tipo B s encontrado na Moutinho, com 160 ou 16,14% do total do
stio e na Figueirinha com 73 ou 6,06% do stio, somando nos dois stios 233 ou
9,44%. Prevalece em ambos o subtipo B.1.
O tipo C mantm, como no tipo A, uma freqncia uniforme em todos
os stios, mas em percentagens menores, com 2,92% na Moutinho, 4,33% na Figuei-
rinha, 2,67% na Salesianos e 2,04% no CRMAP. Prevalece o subtipo C.2. (retngulos simples com preenchimentos).
O tipo D no encontrado no stio do CRMAP, e nos outros aparece
com freqncia bastante uniforme, de 2,32% na Moutinho, 5,40% na Figueirinha e
de 4,97% na Salesianos.
O tipo E encontrado em quantidade e percentagem um pouco maior
na Figueirinha, com 8,97%. Na Moutinho a freqncia de 7,06%, na Salesianos e
no CRMAP de 2,04% em cada um. O subtipo E.2. prevalece.
O tipo F encontrado na Moutinho com 0,50% e na Figueirinha com
0,16%.
O tipo G encontra-se na Moutinho com 0,10% e no CRMAP com
4,08%.
No tipo H temos 0,30% na Moutinho e 0,08% na Figueirinha, no se
encontrando nos outros dois stios.
O tipo I tambm apresenta uma freqncia bastante uniforme em todos
os stios, com 3,73% na Moutinho, 3,24% na Figueirinha, 1,33% na Salesianos e
6,12% no CRMAP. O subtipo I.1. aparece com maior freqncia.
O tipo J possui 0,60% na Moutinho e 0,33% na Figueirinha.
Podemos perceber claramente que os tipos mantm uma freqncia
bastante uniforme em todos os stios onde aparecem, com exceo do tipo B, que
possui freqncia maior no stio da Fazenda Moutinho. Portanto, em termos de grafismos usados, os stios se assemelham, havendo maior semelhana entre a Moutinho e a Figueirinha e entre Salesianos e CRMAP.
Sitios
Tipos
Moutinho
MS-CP-01
657 66,29%
160 16,14%
Salesianos
MS-CP-02
199 88,83%
Figueirinha
MS-CP-03
859 71,40%
73
6,06%
29
2,92%
2,67%
51
4,23%
23
2,32%
11
4,97%
65
5,40%
70
7,06%
2,04%
108
8,97%
0,50%
0,16%
0,10%
0,30%
37
3,73%
0,60%
REA GRAVADA
991 40,17%
1.746,14 m
42 85,71%
1,33%
NO CLAS.
TOTAL
CRMAP
MS-CP-04
224
9,07%
610,48 m
2,04%
2,04%
4,08%
TOTAL
1787 71,22%
233
9,44%
87
3,52%
99
4,01%
184
7,45%
0,28%
0,12%
0,16%
82
3,32%
0,08%
39
3,24%
0,33%
10
0,40%
0,08%
0,04%
6,12%
1203 48,76%
49
1,98%
996,73 m
20 m
2467
3.373,35 m
E.1.Grafismos complexos, formando campos fechados, preenchidos por crculos, linhas curvas ou retas
E.2.Grafismos menos complexos, s vezes abertos, compostos por crculos, ilnhas curvas ou retas
F. Sulcos sinuosos com ou sem crculos nas extremidades
G. Espirais
H. Grafismos fechados, formados por linhas sinuosas
I. Outros sulcos
I.1. Sulcos simples
I.2. Sulcos que se encontram
I.3. Sulcos que se cruzam
J. Outras formas de combinaes de crculos com sulcos
Existem ainda grandes sulcos, geralmente sinuosos, que incorporam
ou vm acompanhados de grafismos variados; as figuras neles incorporadas foram
desmembradas e classificadas dentro da tipologia acima; os sulcos foram descritos
e, apesar de formarem algo muito tpico, no foram colocados na lista acima.
Polimento: tcnica de abraso em que se esfrega uma pedra sobre a superfcie de outra com a
ajuda de um abrasivo (areia) com freqentes lavagens com gua (Prous, 1992, p.77).
2
Geomtrico: desenho que se apresenta como pontos, retas, curvas, crculos, tringulos, retngulos
etc.
3
Livre: desenho que necessita descrio formal (Mendona de Souza, 1979, p.9).
4
Simbolista: desenho que representa um objeto, animal ou humano no de forma realista, mas indicativa.
5
Linear contnuo usado aqui em oposio a linear descontnuo. O linear contnuo a linha sem
interrupo, o descontnuo o tracejado ou pontilhado.
6
Cavo: cavado ou depresso.
Mendona de Souza e outros ampliam as possibilidades de comparao com outros stios, baseados nas caractersticas deste complexo estilstico (rocha
suporte, tcnica de confeco e outras caractersticas morfolgicas j citadas). O
autor considera semelhantes, ainda, os stios encontrados no Mato Grosso do Sul
(proximidades de Corumb e da lagoa Gaba); no Par (regio de Alcobaa); na
Paraba (Ing do Bacamarte, Pedra Lavrada, Guarjo, So Joo do Cariri e Serra
Branca); no Rio Grande do Norte (So Joo do Sabuji) e na Bahia (Lajedo do Calumbi).
Correlaciona ainda, este estilo, embora com menor segurana, por no
poder aplicar anlise estatstica, aos petroglifos de Cruzeiro (Alto Tocantins), aos
dos Martrios (Alto Araguaia), aos do rio Diamantino (afluente do Araguaia) e aos de
Britnia (Alto Araguaia), todos no estado de Gois.
De nossa parte acrescentamos ainda as gravuras de Roraima (Ribeiro
e outros, 1989).
Por no haver uma documentao completa, as informaes veiculadas nos trs pargrafos anteriores se tornam duvidosas.
De nossa parte, temos elementos e material para sentirmos a semelhana com os stios do Alto Araguaia, estudados pelo Instituto Anchietano de Pesquisas. Nos trs stios do municpio de Jussara, estudados por Schmitz, Moehlecke
e Barbosa (1979), esto presentes os estilos II e III, mencionados anteriormente. Os
stios encontram-se na bacia do rio Vermelho, prximos a pequenos crregos, em
lajedos horizontais de limonita, circundados por vegetao de cerrado. Os grafismos
foram produzidos por raspagem com profundidades de 0,2 a 4,5 cm. O tamanho das
Cariap: antiplstico feito com cinza vegetal de certas plantas. Cariap A um tipo de cariap
usado nas cermicas da bacia do rio Araguaia.
Figura 25. Mapa com a Localizao das reas de Ocorrncia de Petroglifos sobre
Lagedos Horizontais no Brasil
David S. Whitley, em Socioreligious Context and Rock Art in East-Central California (1987), estuda
pinturas e gravuras em duas regies, numa das quais as pinturas compartilham os mesmos grafismos, esto agrupadas e nos espaos habitados, sugerindo estarem ligadas a rituais pblicos e coletivos, usando simbologia conhecida por todos; na outra regio as gravuras so diversificadas, pequenas, em espaos reduzidos, longe dos lugares habitados, sugerindo que esto ligadas a rituais privados e particulares, sugerindo uso de simbologia que no do domnio comum. As gravuras do Pantanal preenchem claramente as condies do primeiro caso, alm de suporem um investimento
coletivo imenso na sua produo, razo de nossa conjetura.
dos, sempre coincidem com a borda inferior da superfcie denudada, aquela parte
que est mais prxima das grandes lagoas, para onde convergem os sulcos, e onde
se concentram os grafismos independentes.
Quando pensamos nas culturas ceramistas representadas no espao,
podemos dividi-las em dois grupos: o Tupiguarani, dos matos da encosta da morraria; e os outros grupos, geralmente associados ocupao de espaos alagveis,
onde construiram seus aterros. No espao, onde esto as gravuras, encontram-se
ocupaes de ambos os grupos.
Em dois stios (MS-CP-02 e MS-CP-04) temos, encostado no lajedo,
um assentamento do segundo grupo; nos outros dois casos, assentamentos do
segundo grupo esto um pouco mais afastados. No stio MS-CP-02 temos na proximidade tambm stios Tupiguarani.
Seria difcil creditar as gravuras ao Tupiguarani, que em nenhum outro
lugar de seu imenso territrio, no Centro, Sudeste e Sul do Brasil, produziu algo
parecido. Alm disso ele se apresenta pouco numeroso, bastante recente e restrito a
pequena rea. A produo de uma massa imensa de gravuras dificilmente se coadunaria com estas circunstncias.
Pelo contrrio, os grupos ocupantes da margem das lagoas e dos diversos pantanais, desde um perodo pr-cermico, mas principalmente como ceramistas, deixaram na rea centenas de stios geralmente sob a forma de aterros. O
seu ncleo original, para a rea, parecem ter sido as lagoas e reas alagadias
entre e ao redor das morrarias.
Quando olhamos o contedo e a estrutura dos stios de gravuras nos
lgica e constituio.
Geralmente o resultado do enfoque tipolgico leva formulao de estilos ou fases e tradies estilsticas.
Com o enfoque tipolgico obtivemos os seguintes resultados:
Foi possvel estabelecer uma tipologia nica de elementos mnimos
que serve para os quatro stios, no s em termos de grafismos, mas tambm de
produo, tamanho e suporte fsico.
Com relao composio dos conjuntos de grafismos observam-se
duas formas bsicas de organizao. A primeira de agrupamentos de grafismos
variados predominantemente justapostos, sem conexo fsica entre eles; algumas
vezes se percebe que estes grafismos tm uma relao intencional, como por
exemplo as pisadas agrupadas ou enfileiradas. A segunda forma de organizao
de grafismos variados ligados por longos sulcos e acompanhados por outros.
Os trs stios grandes tm um conjunto (um deles at dois), organizado
a partir do segundo modo, e tm espaos perifricos, com a organizao do primeiro
modo. Esta diferena pe uma certa hierarquia na organizao do stio que bem
notvel. O quarto stio ocupa um lajedo pequeno e forma um s conjunto, que do
modo um.
Apesar de os elementos mnimos, a composio dos conjuntos e dos
stios seguirem as mesmas regras, nota-se uma diferena no tamanho da superfcie
coberta, na quantidade, variedade e qualidade dos grafismos presentes. Os stios
mais densos e variados poderiam ser considerados cntricos com relao a outros,
que seriam, ento, perifricos. O mais destacado entre os stios de Corumb o
BIBLIOGRAFIA CITADA
MOREIRA, Amlia Alba Nogueira. Relevo. Geografia do Brasil. Regio CentroOeste. Rio de Janeiro, IBGE, p. 1-43, 1977.
NIMER, Edmon. Clima. Geografia do Brasil. Regio Centro-Oeste. Rio de Janeiro,
IBGE, p. 35-58, 1977.
OLIVEIRA, Jorge Eremites de. Sntese da Arqueologia do Grande Chaco com Enfase aos Pantanais Mato-Grossenses. Porto Alegre, PUCRS, 1992. 51 p.
------ A Utilizao da Analogia Etnogrfica no Estudo dos Aterros da Regio Pantaneira de Corumb, MS. Trabalho apresentado na VII Reunio Cientfica da Sociedade de Arqueologia Brasileira. Joo Pessoa, 1993. 11 p.
ORIOLI, Alvaro Luiz; AMARAL FILHO, Zebino Pacheco de & OLIVEIRA, Ademir
Benedito de. Pedologia. Projeto RAMAMBRASIL. Folha SE-21-Corumb e Parte da
Folha SE-20. Rio de Janeiro, Ministrio das Minas e Energia, p. 225-328, 1982.
PAIVA, Glycon & LEINZ, Victor. Contribuio para a Geologia do Petrleo no Sudoeste do Mato Grosso. Boletim do DNPM, n. 37, 1939. 99 p.
PASSOS, Jos Afonso de Moraes Bueno. Alguns Petroglifos em Mato Grosso com
Apndice sobre outros do Paraguai e Bolvia. So Paulo, USP, 1975. 79 p. Tese de
Livre-Docncia.
PESSIS, Anne-Marie. Mtodos de Interpretao de Arte Rupestre: Anlises Preliminares por Nveis. Clio. Revista do Mestrado em Histria. Pernambuco, UFPE, Srie
Arqueologia 1, n. 6, p. 99-107, 1984.
PILES, Petter. Arte Rupestre nos Estados Unidos da Amrica. Palestra Proferida no
III Workshop sobre Manejo de Bens Culturais. Florianpolis, 1993.
PROUS, Andr. Exemplos de Anlise Rupestre Punctuais. Arquivos do Museu de
Histria Natural. Belo Horizonte, UFMG, v. 10, p. 196-224, 1985/86.
------ Arte Rupestre Brasileira: uma tentativa de classificao. Revista de PrHistria. So Paulo, USP, v. 7, p. 9-33, 1989.
------ Arqueologia Brasileira. Braslia, Editora Universitria de Braslia, 1992. 605 p.
RAMOS, A.B. Silva. Inscries e Tradies da Amrica Pr-Histrica, Especialmente
do Brasil. Rio de Janeiro, Imprensa Oficial, 1930/39. 2v.
REICHERT, Ins Caroline. Etno-Histria Chaquenha. Guaycuru e Payagu. VI Simpsio Sul-Riograndense de Arqueologia. Porto Alegre, PUCRS, p. 29-32, 1991.
RIBEIRO, Pedro A. Mentz. Manual de Introduo Arqueologia. Porto Alegre, Sulina, 1977. 63 p.
------ Arqueologia do Vale do Rio Pardo, Rio Grande do Sul, Brasil. Porto Alegre,
PUCRS, 1991. 664 p. Tese de Doutorado.
ANEXOS
Tabela 2 = Fazenda Moutinho (MS-CP-01
Tabela 3 = Fazenda Salesianos (MS-CP-02)
Tabela 4 = Fazenda Figueirinha (MS-CP-03)
Tabela 5 = Stio CRMAP (MS-CP04)
Tabela 6 = Total Geral dos Stios