Como Se Faz Um Poeta
Como Se Faz Um Poeta
Como Se Faz Um Poeta
Como se faz um
poeta
“Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intacta.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
Convive com os poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência, se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consuma
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas do chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço.
Excertos de Carta a Um Jovem Poeta de Rainer Maria Rilke, Coisas de Ler Edições:
“Não escreva poemas de amor: evite de início aquelas formas demasiado fáceis e os
lugares comuns; são os mais difíceis...”
“E, mesmo que se encontrasse numa prisão, cujas paredes impedissem que qualquer
som do mundo chegasse aos seus sentidos – não teria ainda a sua infância, esse bem
precioso, essa caixa de tesouro das memórias? Volte a sua atenção para ela.”
Um
1. Escreve estrofes cujos versos contenham as mesmas palavras ordenadas de maneira
diferente e/ou organizadas de acordo com diferentes sinais de pontuação.
A chave
A chave da porta
Sempre a mesma chave...
A chave da porta?
Na porta!
Havia
Havia
Uma palavra no escuro.
Minúscula. Ignorada.
Martelava no escuro.
Martelava no chão da água
Do fundo do tempo,
martelava.
Contra o muro.
Lápis
cor vida risco
palavra
3
O.................................................
B................................................
J................................................
E................................................
C................................................
T................................................
O................................................
S................................................
4. Liponímia - Escreve o poema sem utilizar uma palavra previamente definida, que neste
caso será um objecto.
Livro
5. Inventário – inventaria objectos, o que te permitirá dizer/ escrever o que se pensa, mas
habitualmente se cala..
O inventário pode ser constituído por:
- objectos que apetece meter no bolso
- objectos que apetece deitar no caixote do lixo
- objectos caros
- objectos muito baratos
- objectos meramente decorativos
- objectos com uma função específica(cortar, escrever, limpar, pintar, etc)
6. Adivinha – selecciona um objecto. Olha para ele como se fosse a primeira vez e anota a sua
forma, cor, grau de dureza, peso, etc. Tenta associar essas características a outras realidades
e descreve-as recorrendo a comparações ou metáforas. Constrói agora o teu texto em
verso. Como sabes grande parte das adivinhas são em verso.
4
Frutos
8. Som ou Letra imposta – escrever um texto utilizando o maior número possível de vezes:
- uma ou mais letras
- um mesmo som, ainda que com grafias diferentes.
Ana Hatherly
5
6
Capital
Capital
Casas, carros, casas, casos.
Capital
Encarcerada.
No meio do caminho tinha uma pedra
Colos, calos, cuspo, caspa. tinha uma pedra no meio do caminho
Cautos,castas. Calvos, cabras. tinha uma pedra
Casos, casos...Carros, casas... no meio do caminho tinha uma pedra.
Capital
Acumulado. Nunca me esquecerei desse
acontecimento
E capuzes. E capotas. na vida de minhas retinas tão fatigadas.
E que pêsames! Que passos!
Em que pensas? Como passas?
Capitães. E capatazes. Nunca me esquecerei que no meio do
caminho
E cartazes. Que patadas! tinha uma pedra
E que chaves! Cofres, caixas... tinha uma pedra no meio do caminho
Capital no meio do caminho tinha uma pedra.
acautelado.
Carlos Drummond de Andrade
Cascos, coxas, queixos, cornos.
Os capazes. Os capados.
Corpos. Corvos. Copos, copos.
Capital,
oh! capital,
Capital
decapitada!
David Mourão-Ferreira