AP Artes Cenicas 1ano 2013
AP Artes Cenicas 1ano 2013
AP Artes Cenicas 1ano 2013
Estudante: _________________________________________________________________________________________
1 Srie/Turma: _____________________________________________
N D I C E
Noes de Arte e Teatro ...................................................................................................................... 03
Elementos da Linguagem Cnica ........................................................................................................ 06
Os Espaos no Teatro .......................................................................................................................... 09
Gneros Literrios Dramticos ............................................................................................................ 10
A Funo Social do Teatro .................................................................................................................. 11
A Origem do Teatro no Ocidente ........................................................................................................ 14
O Teatro Romano ................................................................................................................................. 19
O Teatro Medieval ............................................................................................................................... 26
A Commedia dellArte ......................................................................................................................... 31
O Teatro Jesutico ................................................................................................................................ 35
Cultura Popular .................................................................................................................................... 37
"O teatro um meio muito eficaz de educar o pblico;
mas quem faz teatro educativo encontra-se
sempre sem pblico para poder educar."
(Enrique Jardiel Poncela)
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas -1 ANO - EM 3
Noes de Arte e Teatro
Conceitos de Arte e Teatro
Arte Atividade que supe a criao de sensaes ou de
estados de esprito de carter esttico.
Teatro A palavra teatro abrange ao menos duas acepes
fundamentais: o imvel em que se realizam espetculos e
uma arte especfica, transmitida ao pblico por intermdio
do ator.
O primeiro significado, na linguagem corrente, liga-
se ideia de edifcio, um edifcio de caractersticas especiais,
dotado basicamente de plateia e palco. Quando se diz:
Vamos ao teatro pensa-se de imediato na sada de casa
para assistir, num recinto prprio, a uma representao, feita
por atores, bailarinos ou mimos. Teatro implica a presena
fsica de um artista, que se exibe para uma audincia. O
cinema j subentende a imagem, substituindo a figura
humana real. No teatro, pblico e ator esto um em face do
outro, durante o desenrolar do espetculo.
a arte da representao, por atores e para um
pblico, de um texto escrito ou improvisado. Para isso,
utilizam-se cenrios, figurino, iluminao, som, etc.
Jogo Teatral a improvisao, se assemelha
brincadeira de criana, pois se estabelece os personagens e
se brinca livremente, utilizando o ldico com recursos de
criao.
Contexto situao na qual se insere a pea (contexto
histrico, social, poltico, etc.)
Conflito Uma pea de teatro no feita sem conflitos,
isto , situaes em que posies antagnicas em relao a
determinado assunto so colocadas frente-a-frente. A pea
uma sucesso de conflitos que podem, ou no, serem
resolvidos, conforme a vontade do autor.
Funes da Arte
Primeira funo cognitiva, ou pedaggica, da arte:
apresentar-nos eventos pertinentes esfera dos sentimentos,
que no so acessveis ao pensamento discursivo. Atravs da
arte somos levados a conhecer nossas experincias vividas,
que escapam linearidade da linguagem. Quando, na
experincia esttica, meus sentimentos entram em
consonncia (ou so despertados) por aqueles concretizados
na obra, minha ateno se focaliza naquilo que sinto. A
lgica suspensa, e eu vivo meus sentimentos, sem tentar
traduzi-los em palavras.
Numa civilizao onde cada vez so mais estritos os
espaos destinados imaginao, onde o racionalismo
elegeu o realismo como norma de ao e onde at mesmo
o prazer deve ser comprado, a arte pode constituir-se num
elemento libertador. Justamente por negar a supremacia do
conhecimento exato, quantificvel, em favor da lgica do
corao. Por guardar em si um convite para que a
imaginao atue, em favor da vida dos sentimentos.
At aqui consideramos estes dois fatores pedaggicos da
arte: a livre atuao da imaginao e o conhecimento dos
nossos sentimentos, que ela possibilita. H que se considerar,
por outro lado, que a arte no apenas permite que conhea-
mos nossos sentimentos, mas tambm propicia o seu
desenvolvimento, a sua educao - fato este a ser assinalado
como o terceiro fator educativo da arte.
Como ento podem ser desenvolvidos e educados os
sentimentos? Da mesma forma que o pensamento lgico,
racional, se aprimora com a utilizao constante de smbolos
lgicos, os sentimentos se refinam pela convivncia com os
smbolos da arte.
Quanto mais o contato com a arte, maior a bagagem
simblica para representar e, consequentemente,
compreender as mincias do sentimento. Ao saber como
expressar, ou saber onde (em quais obras) encontrar
expressos os meus sentimentos, possuo uma guia seguro para
desvel-los e entend-los.
A obra de arte aberta, significa que o sentido expresso
por ela se completa atravs da atuao do espectador. Ou
seja: a obra de arte, no transmitindo um significado
explcito, mas expressando um campo geral de sentidos,
possibilita ao espectador a sua compreenso (fruio)
segundo os seus prprios sentimentos.
A obra de arte deve apoderar-se da plateia
no atravs da identificao passiva, mas atravs de um
apelo razo que requeira ao e deciso. As normas
que fixam as relaes entre os homens ho de ser
tratadas no drama como temporrias e imperfeitas, mas
de maneira que o espectador seja levado a pensar no
curso da pea e incitado a formular um julgamento,
afinal, quanto ao que viu...
(S. Brecht.)
Uma vertente pedaggica da arte diz respeito
oportunidade que ela nos fornece para sentir e vivenciar
aquilo que, de uma forma ou de outra, impossvel
experimentar na vida cotidiana. E isto a base para que se
possa compreender as experincias vividas por outros
homens. Quando no cinema, sinto as emoes do alpinista,
quando, no teatro, sinto o drama dos migrantes, ou ainda
frente tela de Goya, sinto o horror em face do peloto de
fuzilamento, descubro meus sentimentos frente a situaes
(ainda) no vividas por mim, que no me so acessveis no
meu dia-a-dia.
Cada cultura possui uma forma prpria de sentir um
determinado sentimento bsico, comum a todos os seus
membros; tal sentimento caracteriza o que chamamos de
personalidade de base ou personalidade cultural. E
ainda, as culturas civilizadas so histricas, ou seja,
modificam-se no tempo, alterando seus sentimentos, sentidos
e construes. Pois bem: neste contexto, a arte caracteriza-se
por exprimir - em relao s questes da existncia humana -
os sentimentos da cultura e da poca em que foi produzida.
Aquilo se nomeia como o estilo de um dado perodo
histrico. a utilizao de determinadas formas de
expresso, ou de determinados cdigos, pautados no
sentimento da poca.
Conhecendo a arte e a cultura de meu tempo,
adquiro os fundamentos que me permitem uma concomitante
compreenso do sentido vivido aqui e agora. E mais:
conhecendo a arte pretrita da cultura onde vivo, posso vir a
compreender as transformaes operadas no seu modo de
sentir e entender a vida ao longo da histria, at os meus
dias.
Em termos interculturais a arte tambm apresenta
um importante elemento pedaggico. Na medida em que nos
dado experienciar a produo artstica de outras culturas, a
compreenso dos sentidos desconhecidos torna-se mais fcil.
Isso porque, atravs da arte, pode-se participar dos
NOES DE ARTE E TEATRO
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas - 1 ANO - EM 4
elementos do sentimento que fundam a cultura estrangeira
em questo, o que o primeiro passo para que (a partir de
nossa viso de mundo) se interpretem os seus sentidos
explcitos.
Porm, h que se ressaltar, que, dada sua (quase)
universalidade, a arte tem se mostrado como um meio eficaz
para a invaso cultural. Atravs dela torna-se mais fcil
moldar os sentimentos da cultura invadida, para que sinta e
interprete o mundo segundo os padres dos invasores.
Quando um povo abandona seus padres estticos em favor
de padres estrangeiros - brotados de condies diversas de
vida - deixa de sentir com clareza. Perde-se em smbolos que
no lhe so totalmente expressivos, acabando por produzir
uma arte amorfa, inexpressiva e sem vida. Acabando por
produzir uma arte que corrompe seus prprios sentimentos,
ocultando-os, mais que desvelando-os.
Por fim, deve-se considerar o elemento utpico
envolvido na criao artstica. A utopia diz sempre respeito
proposio daquilo que (ainda) no existe. Constitui-se em
elemento importante dentro de uma sociedade na medida em
que significa um projeto, um desejo de transformao, que
permite dirigir o olhar dos outros para direes at ento
insuspeitadas.
Funes do Teatro
Cada sociedade possui padres dramticos prprios.
Folguedos populares, canes festivas e danas folclricas,
espetculos de variedades, feiras e circos, carnavais e bailes
de fantasia, so todos partes de nossa herana dramtica.
Outros aspectos sociais esto relacionados. O uso
teraputico do teatro na psicologia ou Psicodrama, o uso
educacional do teatro para o desenvolvimento pessoal e
social e como mtodo para conhecimento intelectual - estes
so apenas alguns.
O Psicodrama trabalha com sonhos, sensibilizao
corporal, dramatizaes de situaes do dia-a-dia,
construo de histrias pessoais e familiares, etc., sendo
possvel o indivduo tomar conscincia de como vem agindo
no meio social em que vive, como tambm, sentir como
visto por esse meio. Pode, ento, promover as mudanas
desejadas de comportamentos, adquirindo maior confiana e
segurana. Para o Psicodrama, toda ao interao por
meio de papeis. Assume-se, no decorrer da vida, papeis para
cada situao enfrentada: Pai, Me, Filho, Chefe,
Empregado, Marido, Esposa, Professora, Aluno, Amigo,
Forte, Sensvel, etc. Uma das maneiras de compreender a si
mesmo e ao outro procurar entender a forma de
comportamento assumido em cada papel.
Para que fazer teatro e como faz-lo? Dentro de
uma expresso dramtica popular, ou seja, entendendo que
todo indivduo, independente do seu nvel e instruo e da
camada social na qual se insere, deve ter condies de
praticar essa atividade com a finalidade de expressar-se e de
criar. Ao desenvolver atividades de expresso artstica,
baseadas no jogo infantil, no se pretende formar artistas,
mas um ser espontneo, vivo, dinmico, capaz de
exteriorizar seus pensamentos, sentimentos e sensaes e de
utilizar diversas formas de linguagens. O objetivo das
atividades formar um ser social, apto a construir
gradualmente sua prpria escala de valores e desenvolver
seu senso esttico.
Uma das caractersticas que diferencia os homens
dos animais sua capacidade de representar mentalmente
objetos ou situaes na ausncia desses. Esse processo
denomina-se simbolizao. Imitando, criando ou
recriando, o aluno descobre seus dois mundos, o interior e o
exterior. do encontro desses dois mundos que nasce a
expresso.
Deve-se trabalhar em primeiro lugar o
relacionamento social, pois, melhor relacionados, os alunos
se tornaro mais espontneos e juntos podero imaginar
situaes com novas linguagens. Nesta etapa passaro a
observar o mundo e os outros e procuraro perceber tudo em
seus menores detalhes.
Quando criado um clima de liberdade em sala de
aula, o aluno expressa seus sentimentos e sensaes sem
medo de censura.
A autoexpresso envolve espontaneidade, e esta s
se manifesta num clima de liberdade e profundo respeito
pela personalidade da criana e do adolescente. Toda
atividade dramtica dever sensibilizar o aluno para a
descoberta de si prprio, do outro e do meio ambiente.
Trabalhar com atividades dramticas numa sala de
aula significa um tempo longo e paciente, que permita ao
aluno atravessar, tranquilamente, a ponte que separa o sonho
da criana, da realidade social que aguarda o adolescente.
A Expresso Espontnea
O papel do educador, neste ponto de partida,
consiste em criar o clima, o ambiente, por que so as
circunstncias que permitiro que essa expresso se
manifeste, quer se trate de indivduo ou de grupo.
indispensvel, com efeito, que toda expresso
espontnea seja seguida de uma reflexo a seu respeito,
reflexo que permita analis-la, aprofundar os seus dados e,
atravs de uma srie de tomadas de conscincia, trazer tona
alienaes que pesam sobre o indivduo: alienaes
congnitas, carncias de ser, mas tambm alienaes
sociais, econmicas, polticas, culturais.
A Prefcio da Histria do Teatro
A representao teatral desenvolveu-se na Grcia,
no sculo VII a.C., a partir de rituais religiosos em honra ao
deus Dionsio. No sculo VI a.C., quando surge o texto
escrito para teatro, o grego Tspis cria a funo de ator, ao
sair do coro (pessoas que narram e comentam a ao) e
dizer que est representando Dionsio. Em Roma, os
primeiros jogos cnicos datam de 364 a.C. A primeira pea,
traduzida do grego, representada em 240 a.C. Imita o
repertrio grego, misturando palavras e canto.
Apesar do teatro escrito no modelo grego-romano
ser vetado pela Igreja Catlica, a manifestao teatral
sobrevive no incio do perodo medieval com as companhias
itinerantes de acrobatas, jograis e menestris. A partir do
sculo X d.C., a Igreja o adapta pregao catlica e s
cerimnias religiosas. Dramas litrgicos so encenados pelo
clero dentro das igrejas.
NOES DE ARTE E TEATRO
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas -1 ANO - EM 5
Depois desenvolvem-se outras formas mas, como
Milagres (sobre a vida dos santos), Mistrios (discutem a f
e misturam temas religiosos com profanos) e Moralidades
(questionam comportamentos). As encenaes passam a ser
ao ar livre por volta do sculo XII e chegam a durar vrios
dias. Aos poucos, os espectadores assumem papeis de atores,
conferindo s apresentaes um tom popular. H intensa
atividade teatral na Itlia, Frana, Espanha, Alemanha e
Inglaterra. Uma das primeiras obras independentes da
liturgia a francesa Le Jeu d'Adam (1170). Nessa poca,
em geral, os textos eram annimos.
No sculo XIII, surgem os autos na Espanha, peas
alegricas que tratam de temas religiosos em palcos
provisrios. H a proibio pela Igreja de misturar temas
religiosos e profanos - processo que se consolida no fim do
sculo XIV e tem como efeito o surgimento das comdias
medievais totalmente profanas, entremeadas de canes.
Uma pea importante Farsa do Mestre Pierre Pathelim,
do sculo XIV, que apresenta advogados e juzes como
trapalhes sem carter. Esses textos ainda so annimos. Na
Frana, a primeira sala permanente de teatro aberta em
Paris, no incio do sculo XV. A primeira companhia
profissional da Inglaterra surge em 1493.
Fonte Bibliogrfica:
Apostila do PAS Artes Cnicas Editora
Universitria de Braslia, 1 Ano.
Apostila do PAS Artes Visuais e Artes Cnicas
Editora Exato: 2005/2006, 1 Ano.
Sites consultados:
Psicodrama. Disponvel em <http://www.
saskiapsicodrama.com.br/depressao/>
NOES DE ARTE E TEATRO
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Apostila Artes Cnicas - 1 ANO - EM 6
Elementos da Linguagem Cnica
Cenografia
O termo cenografia (skenographie, que composto
de sken, cena, e graphein, escrever, desenhar, pintar,
colorir) se encontra nos textos gregos. Servia para designar
certos embelezamentos da cena. Algum tempo depois
encontrado nos textos em latim: scenographia. Era usado
provavelmente para definir no desenho uma noo de
profundidade. No Renascimento os textos de Vitruvio foram
traduzidos, e o termo cenografia passou a ser usado para
designar os traos em perspectiva e principalmente, os traos
em perspectiva do cenrio no espetculo teatral.
A cenografia existe desde que existe o espetculo
teatral na Grcia Antiga, mas em cada poca teve um
significado diferente, dependendo da proposta do espetculo
teatral. O teatro , como toda arte, intimamente relacionado
com o meio social onde surge, e ser definido conforme o
pensamento de cada poca. Assim o teatro e a cenografia da
Grcia Antiga so diferentes dos de Roma, na Idade Mdia,
do Renascimento e do Barroco.
A cenografia tem dois objetivos bsicos: contribuir
para a compreenso da pea por parte do pblico e criar,
atravs de materiais e efeitos cnicos, o ambiente e a
atmosfera bsicos da pea. Para ajudar a compreenso, o
cenrio pode definir a poca e o lugar da ao, atravs das
formas e das cores. O cenrio cria tambm a atmosfera
adequada e enfatiza as ideias mais importantes da pea.
Ao construir um cenrio, o cengrafo utiliza
diversos elementos cnicos bsicos. Esses elementos podem
apoiar-se no cho ou ficar suspensos no teto do palco. Os
tetos dos palcos geralmente so equipados com uma srie de
traves cruzadas, chamada urdimento, que se destina a
suspender elementos cenogrficos.
Os elementos suspensos compreendem
as bambolinas, os teles, as pernas e as rotundas. As
bambolinas so cortinas curtas de pano preto ou lona pintada,
suspensas paralelamente boca de cena. Impedem que o
pblico veja o teto do palco e, quando pintadas e recortadas,
podem dar a impresso de copas de rvores, por exemplo. Os
teles so grandes painis de lona que podem cobrir o fundo
do palco em toda a sua extenso. Na parte de cima e de
baixo, os teles so presos a varas de madeiras que os
mantm esticados. Em geral os teles so pintados. As
pernas so cortinas estreitas colocadas de cada lado do palco,
paralelamente boca de cena, para esconder as coxias, ou
seja, o espao lateral do palco que no deve ser visto pelo
pblico. A rotunda uma cortina geralmente preta que pode
ser suspensa em uma armao semicircular ou reta e que
serve para esconder o fundo do palco.
Depois de construdo, o cenrio montado no palco.
Quando a pea possui um cenrio nico, essa montagem
definitiva. Quando, porm, a pea requer vrios cenrios,
preciso prever mudanas rpidas e silenciosas.
Iluminao
Seria muito difcil apresentar um estudo completo
sobre a iluminao de uma pea. matria essencialmente
prtica e que exige exemplos prticos para ser compreendida.
A iluminao do palco requer bom senso;
sensibilidade, conhecimento rudimentar do valor das cores e
noes de artes plsticas.
So requisitos exigidos do diretor, iluminador da
pea ou pessoa que planeja a iluminao da cena e no do
que executa ou monta a aparelhagem tcnico-eltrica. Este
ltimo pode ser apenas um eletricista especializado em
teatro.
A tcnica da iluminao relativamente nova,
nasceu com a luz eltrica. Antes as velas e depois os bicos de
gs mantinham a cena iluminada fracamente, e tinham o
inconveniente de conservar o palco sempre no mesmo grau
de claridade.
No sculo XVI, quando surgiram os teatros em
recintos fechados, surgiu tambm a necessidade de iluminar
a cena com luz artificial.
No teatro grego e romano, as representaes eram
realizadas ao ar livre, durante o dia. Em seus teatros imensos,
somente luz do sol poder-se-ia realizar os festivais
dramticos, porquanto seria impossvel realiz-las com a
iluminao da poca. Mesmo durante o esplendor do teatro
grego e romano, com sua maquinaria complicadssima, seus
autores e atores magnficos, no era conhecida a iluminao
artificial da cena.
Chegando Idade Mdia, o teatro conheceu nova
vida, tendo recuperado o lugar que, finda a poca greco-
romana, havia perdido. Na Idade Mdia, como na poca
Clssica, os espetculos eram realizados ao ar livre e os
mistrios e farsas eram representados, nas portas das igrejas
os primeiros, e os segundos em tablados armados em praa
pblica.
Quando o teatro passou a ter um local prprio para
os espetculos surgiu a iluminao artificial, pois as salas
fechadas no tinham luz suficiente para que o pblico
apreciasse o desenrolar das cenas.
O palco e a sala da poca tinham uma construo
toda especial, e na ribalta que se colocavam as velas de
cena, protegidas, na parte visvel pelo pblico, por uma p de
metal.
Depois das velas de cera, j no incio do sculo
XVIII, vieram as velas de sebo, mais resistentes e que
demoravam mais para se extingui. Somente quase um sculo
depois surgiram as lmpadas a leo que, de modo geral,
trouxeram para a iluminao do palco uma poca deveras
importante. E assim desapareceram as velas da cena. Porm
as lmpadas a leo duraram at meados de 1820, quando a
iluminao a bico de gs trouxe ao palco nova fisionomia.
Essa nova maneira de clarear a cena trouxe luminosidade at
ento desconhecida e era possvel dar ao ambiente cnico
maior ou menor intensidade de luz, podendo-se, ento,
diferenciar o dia e a noite.
Todavia, com o gs os perigos de incndio eram
grandes e mesmo o calor na sala e no palco tornava as
representaes, nos dias mais quentes, insuportveis. Surge,
ento, a iluminao eltrica j nas ltimas dcadas do sculo
XIX.
Os benefcios que a luz eltrica trouxe para o teatro
so realmente notveis. claro que inicialmente apenas uma
ou duas qualidades de lmpadas eram utilizadas, e mesmo os
teatros no possuam os quadros eltricos de hoje. Com o
decorrer do tempo a aparelhagem eltrica foi-se
aperfeioando e o nmero de circuitos dentro de uma
aparelhagem especial foi se desenvolvendo, bem como a
indstria de refletores e lmpadas, resultando no que hoje
podemos ver e utilizar.
ELEMENTOS DA LINGUAGEM CNICA
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Lmpadas, renques de luz, refletores tanges,
paneles, e projetores fornecem encenao o mundo de
cores e ambientes, para melhor compreenso psicolgica e
esttica da pea.
A iluminao da cena tem importncia substancial
na encenao de qualquer pea. Podemos deixar uma pea
sem iluminao prpria, todavia, sua estrutura perde muito
de seu valor. A iluminao classificada em geral e
especfica.
A iluminao geral aquela para a qual no existem
normas prprias nem exige estudos pr-determinados das
cenas da pea. a iluminao que estamos acostumados a
ver nos palcos de teatro de comdia. No existe a
preocupao de dar pea ambientes caractersticos,
salientando uma ou outra passagem do texto. Na iluminao
geral o palco iluminado inteiramente, com todas as luzes da
ribalta, dos refletores, das gambiarras, etc., permanecendo
durante a representao toda um nico ambiente de luz.
No quer dizer que este gnero de iluminao seja
pobre, s vezes o , quando o diretor no possui imaginao,
outras vezes a prpria pea no exige mais.
A iluminao especfica um pouco mais
complexa; prpria de determinadas peas, e feita
exclusivamente para dar uma certa caracterstica ao texto, e
criar ambiente psicolgico para o espectador. Suas principais
caractersticas so: quantidade, cor e distribuio.
Entendemos por quantidade a intensidade com que o
palco iluminado. necessrio controlar o nmero de
refletores e lmpadas usadas para a iluminao, pois no
possvel dar a uma cena que se passa no campo, durante dia
de sol, uma iluminao fraca, com cores escuras. Cada
ambiente tem sua quantidade prpria de luz. Outro ponto a
quantidade de cores usadas, que deve ser comedida para no
provocar confuso no espectador, ao invs de lhe dar prazer.
No podemos tambm criar inmeras mutaes, dando
pea aquilo que ela no exige.
Devemos nos preocupar sempre com a quantidade
de luz sob o ponto de vista teatral e no em relao vida
real.
A cor um fator importante e uma das principais
propriedades da iluminao. a cor que distingue os vrios
elementos da cena. Para quem pretende estudar a iluminao
cnica necessrio o conhecimento das cores e sua teoria,
bem como seu valor e simbolismo.
A distribuio das luzes na cena outro fator que
exige critrio e clculo. No podemos exagerar ou restringir
sua distribuio, tanto no que se refere ao nmero de
projetores ou s vrias cores usadas. Para a distribuio das
luzes exige-se perfeito conhecimento da evoluo dos atores,
sua indumentria, do cenrio e, principalmente do valor de
cada cena e sua significao no contedo da pea; boa
distribuio de focos permite ao pblico apreciar a
encenao, na sua parte pictrica, em todos os detalhes.
Verificamos que uma distribuio equilibrada de luzes forma
um quadro harmnico e verdadeiro.
Ao colocar os focos em cena, teremos que iluminar
primeiro os atores e no os cenrios; estes so iluminados
apenas quando a encenao o exige e, em geral, a
distribuio dos refletores feito do alto, justamente para no
provocar sombras prejudiciais.
Abaixo as caractersticas dos principais aparelhos
utilizados na iluminao cnica:
Tango - linha de lmpadas presas a uma caixa em
sentido vertical, para fornecer luz pelos lados da cena;
Panelo - caixa de luz com lmpada de alta voltagem,
que serve para iluminar as entradas, fundos de janelas e
cenas abertas;
Projetores e refletores - focos de luz dirigida, de alta
voltagem, que iluminam determinadas reas,
permanecendo s escuras as outras partes do palco;
Mosquitos e "spot-lights" - focos de luz dirigida, de
menor intensidade que os refletores, mas com as mesmas
propriedades, apesar de serem de tamanho menor.
Sonoplastia
A sonoplastia preenche duas funes bsicas:
contribui para definir o clima e o tipo do espetculo e ajuda
na narrativa da histria. Quando bem integrados no conjunto
da pea, os efeitos sonoros desempenham um papel
importante. A sonoplastia compreende a msica, rudos
diversos e efeitos. O som produzido durante um espetculo
pode ser obtido ao vivo ou atravs de gravaes.
Figurino
As diversas reformas sofridas pelo cenrio foram
acompanhadas de perto pela indumentria (figurinos). Antes
do sculo XIX havia por certo roupas magnficas, mas que
nada significavam quanto poca em que a pea se
desenvolvia. Os personagens de uma tragdia grega eram
vestidos ao gosto do dia em que era representada a pea. No
havia preocupao de escolher a vestimenta do personagem
de acordo com a poca, o carter da obra e as linhas do
cenrio.
Grandes auxiliares da indumentria foram as artes
plsticas e depois a fotografia. Por intermdio delas poder-
se-ia estudar e analisar as cores ou linhas dos costumes de
cada poca.
A fico permitiu sempre que a indumentria teatral
gozasse de grande liberdade, afastando-se deliberadamente
dos modelos realistas. A estilizao das mscaras, das tnicas
e dos coturnos da tragdia grega transformava o ator numa
figura escultural, e a comdia, embora mais simples, recorria
tambm ao fantstico. Os figurinos tm as mesmas
funes bsicas dos cenrios. Ajudam a compreenso por
parte do pblico e expressam a atmosfera dominante da pea
e das vrias cenas. Os figurinos ajudam a identificar a poca,
o local em que se passa a ao e a determinar ambientes
especficos. Sugerem a hora do dia, a estao do ano, a
situao que est sendo vivida pelos personagens e informam
sobre esses ltimos: sua idade, ocupao, personalidade e
status econmico e social.
O figurinista estuda a pea e a seguir discute com o
diretor, o cengrafo e os atores principais, para ver se suas
ideias coincidem com a concepo dos demais. Desenha
ento croquis coloridos e acrescenta-lhes amostras de
tecidos. Os figurinos aprovados so confeccionados.
ELEMENTOS DA LINGUAGEM CNICA
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Apostila Artes Cnicas - 1 ANO - EM 8
Maquiagem
A maquiagem muito importante para a
caracterizao das personagens. Um rosto pode indicar a
idade, o estado de sade, a ocupao e a personalidade
bsica de uma personagem. A maquiagem serve tambm
para restaurar a cor e a forma do rosto sob a luz forte dos
refletores. A maquiagem pode ser normal ou teatral.
A normal no altera os traos do ator. A teatral, ao contrrio,
pode transformar sua aparncia. A maquiagem pode recorrer
apenas pintura ou ainda a acessrios postios, como
barbas, bigode, narizes ou cicatrizes falsas.
Adereos
So objetos que no so cenrio nem figurino e
fazem parte da caracterizao do personagem (um leque,
uma arma, uma coroa, brincos, etc.).
Interpretao
O ator meio essencial da encenao, dela fazendo
parte integrante. Todos os outros elementos poderiam ser
dispensados, menos o ator.
Para o ator dar vida personagem e praticar a ao,
ele necessita basicamente de dois elementos: a voz e o seu
corpo. So estes os seus instrumentos de trabalho. Para que
o ator possa expressar seus sentimentos, emoes e ideias
plateia, ou seja, para que a comunicao entre o pblico e o
artista seja completa, ele necessita estar com seus
instrumentos em perfeitas condies. Para isto, o ator
deve se exercitar constantemente, como um atleta que treina
diariamente para participar de uma olimpada. Lembrando
que os exerccios de teatro so especficos, com objetivos
bem definidos, envolvendo exerccios para as cordas vocais,
msculos faciais, equilbrio, domnio das emoes do corpo,
entre outros.
Ter domnio de suas emoes e ser dotado de
sensibilidade e criatividade no basta. O corpo do ator deve
ser uma membrana sensitiva, um receptor e condutor das
mensagens emotivas que vierem do seu interior para serem
expressas para o exterior.
A verdadeira tarefa do ator interpretar a vida em
todas as suas facetas e profundidade, e no copiar a
aparncia exterior da vida, tendo uma viso estereotipada. O
artista autntico dotado de capacidade de ver e vivenciar
coisas que para outras pessoas so obscuras e passam
imperceptveis. Para tanto, deve repudiar o materialismo
que atrai a frieza e sufoca a imaginao. Deve ser antes de
tudo uma pessoa aberta s coisas novas e um ser criativo e
dinmico.
Cada objeto, movimento, ator, figurino maquiagem,
enfim, tudo o que est em cena tem que ter uma funo, por
menor que seja. Nem que sirva apenas para dizer um
personagem vaidoso, por exemplo. Caso contrrio, se
alguma coisa, por menor que seja, no tiver uma funo,
dever ser eliminada.
Fonte Bibliogrfica:
Apostila do PAS Artes Visuais e Artes Cnicas
Editora Exato: 2005/2006, 1 Ano.
ELEMENTOS DA LINGUAGEM CNICA
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas -1 ANO - EM 9
Os Espaos no Teatro
Se o ator o elemento fundamental no teatro, ele
no poderia existir sem um espao onde se desenvolver.
Podemos definir o teatro como um espao em que esto
juntos os que olham e os que so olhados, e a cena como o
espao dos corpos em movimento.
Podemos classificar os espaos do teatro em: espao
teatral, espao cnico e espao dramtico.
O espao teatral concreto, delimitado e
tridimensional. Compreende todo o espao dos atores e
espectadores, definindo certa relao entre eles. Os cdigos
que nele interferem so mltiplos; o que figura em cena
feito da mesma matria que o resto do mundo: a imagem
teatral de um homem um homem. O espao teatral um
espao de jogo, definido por uma prtica fsica; ele o lugar
dos corpos dos atores. a imitao de um lugar do mundo,
jogando com a presena de objetos e de personagens reais e,
ao mesmo tempo, com uma cpia ilusionista do real. um
local de mltiplos mistrios, encantamentos e descobertas.
O espao cnico o espao definido em funo de
uma encenao teatral; o local prprio aos atores, ou seja, o
palco, onde pode-se construir sonhos, o imaginrio; o lugar
cnico esse espao enquanto materialmente definido. Em
alguns momentos do espetculo o espao dos espectadores
pode se transformar em palco, ou seja, em espao cnico.
Bastando, para isso, que os atores se dirigam fisicamente
plateia. Ao ser definido, o espao cnico dever conter todos
os itens necessrios para o desenvolvimento do espetculo
em questo: a boca de cena, o proscnio, as coxias, o
urdimento, os refletores, etc.
O espao dramtico a construo imaginria,
criada pelo espectador. uma abstrao: compreende no
somente os signos da representao, mas toda a espacialidade
virtual do texto, inclusive o que previsto como fora de
cena.
Fonte Bibliogrfica:
Grupo Tempo. Espao e Teatro. Disponvel em
<http://www.grupotempo.com.br/tex_ubersfeld.html>
OS EPAOS NO TEATRO
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas - 1 ANO - EM 10
Gneros Literrios Dramticos
A escrita teatral pertence ao gnero literrio
dramtico, caracterizado por falas, aes e rubricas. Este
gnero tem uma caracterstica particular que o distingue dos
gneros pico e lrico: feito para ser colocado em cena.
Logo o teatro compreende duas dimenses: a palavra escrita
e a encenao. A diviso dos gneros dramticos est
diretamente ligada ao modo como o pblico percebe as aes
representadas.
Esses gneros so classificados como tragdia,
comdia e drama.
Tragdia - uma forma dramtica, que se
caracteriza pela sua seriedade e dignidade, frequentemente
envolvendo um conflito entre uma personagem e algum
poder de instncia maior, como a lei, os deuses, o destino ou
a sociedade. Aristteles descreve a tragdia como imitao
de uma ao completa e elevada, em uma linguagem que tem
ritmo, harmonia e canto. Afirma que suas partes se
constituem de passagens em versos recitados e cantados, e
nela atuam os personagens diretamente, no havendo relato
indireto. Por isso, chamada (assim como a comdia) de
drama. Sua funo provocar por meio da paixo e do temor
expurgao ou purificao dos sentimentos (catarse). A
tragdia clssica deve cumprir ainda segundo Aristteles, trs
condies: possuir personagens de elevada condio (heris,
reis, deuses); ser contada em linguagem elevada e digna de
ter um final triste, com a destruio ou loucura de um ou
vrios personagens sacrificados por seu orgulho ao tentar se
rebelar contra as foras do destino. Um bom exemplo do
estilo trgico pea Antgone:
Antgone - Sim, porque no foi Jpiter que a
promulgou; e a Justia, a deusa que habita com as
divindades subterrneas, jamais estabeleceu tal decreto
entre os humanos; nem eu creio que teu dito tenha fora
bastante para conferir a um mortal o poder de infringir as
leis divinas, que nunca foram escritas, mas so
irrevogveis; no existem a partir de ontem, ou de hoje;
so eternas, sim! E ningum sabe desde quando vigoram!
- Tais decretos, eu, que no temo o poder de homem
algum, posso violar sem que por isso me venham a punir
os deuses! Que vou morrer, eu bem sei: inevitvel; e
morreria mesmo sem a tua proclamao. E, se morrer
antes do meu tempo, isso ser, para mim, uma vantagem,
devo diz-lo! Quem vive, como eu, no meio de to
lutuosas desgraas, que perde com a morte? Assim, a
sorte que me reservas um mal que no se deve levar em
conta; muito mais grave teria sido admitir que o filho de
minha me jazesse sem sepultura; tudo o mais me
indiferente! Se te parece que cometi um ato de demncia,
talvez mais louco seja quem me acusa de loucura!
(Fragmento da pea: Antgone, de Sfocles)
Comdia - o uso de humor nas artes cnicas. Tambm
pode significar um espetculo que recorre intensivamente ao
humor. De forma geral, comdia o que engraado, que
faz rir. difcil analisar, cientificamente, o que faz uma
pessoa rir ou o que engraado ou no. Mas uma
caracterstica reconhecida da comdia que ela uma
diverso intensamente pessoal. Para rir de um fato
necessrio (re)conhecer (rever, tornar a conhecer) o fato
como parte de um valor humano - os homens comuns - a tal
ponto que ele deixa de ser mitolgico, ameaador e passa a
ser banal, corriqueiro, usual e pode-se, portanto rir dele. As
pessoas com frequncia no conseguem achar as mesmas
coisas engraadas, mas quando o fazem isso pode ajudar a
criar laos poderosos. Segundo Molire, dramaturgo francs,
fazer rir mais difcil do que fazer chorar. Um bom exemplo
de uma comdia a pea O Juiz de Paz da Roa:
Escrivo, lendo - Diz Incio Jos, natural desta freguesia
e casado com Josefa Joaquina, sua mulher na face da
Igreja, que precisa que Vossa Senhoria mande a Gregrio
degradado para fora da terra, pois teve o atrevimento de
dar uma umbigada em sua mulher, na encruzilhada do
Pau-Grande, que quase a fez abortar, tal umbigada fez
cair a dita sua mulher de pernas para o ar. Portanto pede
a Vossa Senhoria mande o dito Gregrio degradado para
Angola. E.R.M.
(Fragmento da pea: O juiz de paz da roa, de Martins Pena)
Drama burgus ou drama moderno formulao
teatral surgida no sculo XIX, e que tem este nome para no
ser confundido com outros gneros dramticos. Seus
principais traos so a liberdade de expresso, a eventual
mistura entre o srio e o cmico e o estudo do homem
burgus em seus conflitos familiares e sociais, dentro de uma
tica realista. Entre os representantes mais significativos
dessa tendncia encontramos o noruegus, Henrik Ibsen, com
Casa de bonecas e O inimigo do povo, e o russo Anton
Tchecov, com Tio Vnia e O jardim das cerejeiras. Um
bom exemplo de um drama a pea As Trs Irms:
Olga: Faz hoje um ano exato que morreu nosso pai, dia 5
de maio, dia da sua santa Irina. Fazia muito frio e
nevava. Eu pensava que no iria sobreviver, e voc
desmaiada, estava estendida aqui no cho como um
cadver. Porm, j passou um ano e podemos record-lo
de corao leve, voc j se veste de branco e tem o rosto
iluminado. (o relgio bate doze horas). Tambm o relgio
bateu. (Pausa) Lembro-me, quando levaram nosso pai
tocava uma banda militar e o cemitrio disparou-se uma
salva de tiros. Ele era um general, um general de brigada,
e mesmo assim havia pouca gente. Talvez por causa da
chuva. Chovia forte e tambm nevava.
(Fragmento da pea As Trs Irms, de Anton Tchecov).
Fonte Bibliogrfica:
PENA, Martins. Trs Peas de Martins Pena. So
Paulo: Ciranda Cultural Editora e Distribuidora Ltda.
2007. Coleo Clssicos da Literatura.
Sfocles squilo. Rei dipo, Antgone, Prometeu
Acorrentado Tragdias Gregas. Traduo de J. B.
Melo e Souza. 20 ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 2000.
Clssicos de Bolso.
TCHEKHOV, Anton. As Trs Irms. Traduo de
Maria Jacintha. Abril Cultura. 1976. Coleo Teatro
Vivo.
Sites consultados:
Wikipdia, a Enciclopdia Livre. Tragdia. Disponvel
e<http://pt.wikipedia.org/wiki/Trag%C3% A9dia>
Wikipdia, a Enciclopdia Livre. Comdia. Disponvel
em http://pt.wikipedia.org/wiki/Com%C3 %A9dia>
Gnero Dramtico parte II. Disponvel em
<http://educaterra.terra.com.br/literatura/temadomes/200
3/04/16/000.htm>
GNEROS LITERRIOS DRAMTICOS
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas -1 ANO - EM 11
A Funo Social do Teatro
A funo social da arte
Ao longo dos tempos, percebe-se a criao de
diferentes produes artsticas construdas nas mais diversas
prticas e relaes sociais. Essas criaes revelam a histria
scio-cultural da humanidade, alm de expressar, refletir e
interpretar a realidade a partir do trabalho criativo do
homem, o qual expe diversas vises de mundo.
A arte cria mundos com novos significados para o
homem, significados afastados do real; faz com que o
homem na procura de um mundo mais justo e mais
compreensvel fique perto dela. O homem deseja ser mais do
que apenas ele mesmo. Deseja ser um homem total, ansiando
uma plenitude de vida que lhe burlada pela
individualidade e todas as suas limitaes. O homem anseia
por absorver o mundo que o circunda, quer integr-lo a si,
quer unir na arte o seu eu limitado, com uma existncia
humana coletiva e por tornar social a sua individualidade. A
arte um meio indispensvel para a unio do indivduo como
um todo, reflete a infinita capacidade humana para a
associao, para a circulao de experincias e ideias.
Ao produzir uma obra de arte, o homem a faz de
uma forma altamente consciente e racional e no de modo
algum atravessando um estado embriagante ou afastado da
realidade. As contradies dialticas so inerentes arte, pois
ela no s precisa derivar de uma intensa experincia da
realidade, como tambm precisa ser construda, precisa
tomar forma atravs da objetividade.
Durante a apreciao de uma obra de arte, os laos
da vida so temporariamente desfeitos, pois a arte nos leva a
um mundo diferente da realidade, e este agradvel e
passageiro mundo artstico, constitui precisamente a natureza
do divertimento, a natureza daquele prazer que encontramos
at nos trabalhos trgicos. Ao analisarmos o teatro militante
de Bertolt Brecht, percebemos nele a sua dialtica, intrnseca
na arte do fazer teatral, pois o homem deve ir ao teatro no s
para se divertir ou para se enlevar, deve chegar a refletir
frente aquilo que esta assistindo. Deve, por um processo
orgnico, nascer nele uma natureza crtica, capaz de se
confrontar com o que est vendo e se perguntar como essa
situao pode ser mudada e chegar a desenvolver um senso
de opinio e luta.
A razo de ser da arte nunca permanece
inteiramente a mesma. A funo da arte, numa sociedade em
que a luta de classes se agua, difere, em muitos aspectos, da
funo original da arte. No entanto, em relao s situaes
sociais diferentes, h um aspecto na arte que expressa uma
verdade permanente. E esse aspecto, que nos possibilita
comovermo-nos com as pinturas pr-histricas das cavernas
e com antiqussimas canes. verdade que a funo
essencial da arte para uma classe destinada a transformar o
mundo no a de fazer mgica, e sim a de esclarecer e
incitar ao. Mas igualmente verdade que um resduo
mgico na arte no pode ser inteiramente eliminado, j que
sem este resduo, que surge da sua natureza original a arte
deixa de ser arte. A arte necessria para que o homem se
torne capaz de conhecer e mudar o mundo. Entretanto, a arte
tambm necessria em virtude da magia que lhe inerente.
A funo social do teatro grego
Dos rituais primitivos e religiosos realizados na
antiga Grcia, surgiu a aventura efmera que atravessaria os
sculos: o Teatro. Organizado e formalizado pelos gregos
para o espao cnico, o teatro at hoje, essencialmente, a
arte que trata sobre o homem e a mulher e suas relaes com
o mundo e todos os acontecimentos que os cercam.
Os gregos so at os dias de hoje, para o ocidente,
uma grande referncia, tanto do ponto de vista artstico
quanto do ponto de vista filosfico. Foram eles que criaram,
dentro do universo artstico, a Tragdia Grega, que fala
sempre sobre realidades e mitos. As histrias das tragdias
sempre eram conhecidas de todos, falava de heris
legendrios, em luta com o austero e implacvel destino; e
dos deuses, sempre participantes no sentido de recompensar
a coragem e punir a rebeldia. E assim, a partir da forma
comportamental do heri diante das imposies do destino,
organizava-se a ao dramtica.
O teatro grego teve como caracterstica principal ser
um teatro cvico, sobretudo a tragdia, um teatro como define
Barthes que era sociedade restrita e mundial.
O teatro apresentado na Grcia, por mais grandiosos
que tenha sido na sua forma espetacular e na sua concepo
social, estava num contexto de uma democracia que no dava
conta de uma parcela da populao tambm, como os
metecos, os escravos. E mesmo assim, enquanto uns podiam
assistir aos espetculos, outros trabalhavam para eles. No
entanto a participao, tanto de um lado quanto de outro, era
sempre consciente de uma atitude poltica.
Enquanto os gregos estavam fazendo arte, tambm
faziam atos de poltica e de educao, no no sentido banal
que estas palavras tm ganhado a cada dia na
contemporaneidade, muito menos no sentido poltico
partidrio. Era uma atitude nata, de quem ocupava o seu
lugar civil, de quem ocupava no apenas um lugar na
assembleia, mas sim, de quem tinha a responsabilidade civil
nos seus atos do cotidiano coletivo.
Os espetculos gregos sempre foram de cunho
popular, no apenas porque eram apresentados ao ar livre
como, especialmente, congregavam toda a populao, sem
delimitao de classes. Os artistas de ento, contratados do
Estado, cumpriam uma funo educativa, como intrpretes
de um estado de esprito coletivo: a democracia.
A funo social do teatro no final do sculo XX e
incio do sculo XXI
Segundo Gil Vicente atravs do riso se aprende a
moral. O teatro brasileiro do final do sculo XX e incio do
sculo XXI parece tambm apresentar este elemento em suas
comdias onde, descrevendo a situao poltica do pas, o
dramaturgo coloca de maneira caricata e consequentemente
cmica, um personagem mau carter envolvido em situaes
de corrupo e explorao da ignorncia do povo.
interessante observar que este tipo de espetculo hoje est
vinculado ao mero entretenimento, consumido justamente
por essa parcela da sociedade que atacada por esse retrato
moralizante, pois raramente ela percebe as nuances que
permeiam esses textos de riso fcil.
A FUNO SOCIAL DO TEATRO
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas - 1 ANO - EM 12
Boa parte do teatro atual no revela mais as
questes de ordem social. O teatro hoje est envolto por uma
camada de anestsicos que visam falar do homem e seus
conflitos interiores. E as obras das tragdias gregas
ultrapassaram os sculos justamente por no se aterem a falar
dos psicologismos das personagens, evitando assim, que o
teatro se afastasse do censo de coletivo original.
Os espetculos na atualidade por uma questo de
ordem econmica, e de esvaziamento cultural, esto cada vez
mais reduzidos no que diz respeito ao elenco. Assim, ao
longo da histria, o que era para os gregos o personagem
principal: o coro, composto, por muitos, hoje, muitas vezes,
apenas um ator em o palco nu, e uma plateia reduzida aos
pequenos espaos de pequenas salas. Da mesma forma como
o coro foi se reduzindo, os espetculos tambm o foram, e
todo o contexto que o cerca. Assim, das grandes festas
Dionisacas em que estava envolto o antigo teatro Grego,
nosso teatro agora est envolto de si mesmo e das suas
coisas.
Na sociedade atual, onde o artista passa pela
dificuldade de fazer o espetculo, pois a prpria sociedade j
se transformou em algo espetacular, fica cada vez mais difcil
fazer teatro de uma forma que este tenha o peso de uma
responsabilidade com a transformao social, uma vez que o
prprio dramaturgo se v na dificuldade de uma
compreenso mais ampla da sociedade na qual est inserido.
Para tentar ser mais direto e eficiente e fazer com
que sua mensagem crtica seja realmente absorvida, o teatro
tem que transpor uma srie de obstculos censores que
impedem a difuso das novas ideias que poderiam abalar o
status quo. Na Frana, por exemplo, tentava-se, atravs do
teatro, disseminar as novas ideias feministas e a defesa do
divrcio. No teatro brasileiro do fim do sculo XX, as novas
ideias, no so to novas assim. Falamos de lutas de classes,
de opresso, de fome e misria. Mas, o novo est em
incorporar esses temas, antes restritos a conversas fechadas e
eruditas, nos textos teatrais, est em fazer o brasileiro se
acostumar a ir ao teatro no s para rir de situaes
cotidianas, nem chorar com a grande atriz, mas sim para
pensar, refletir sobre sua realidade, para apontar solues e
caminhos nas questes em que h falta de debates na
sociedade.
Tanto o dramaturgo como o encenador de hoje
precisam ficar passveis de uma transformao muito grande,
e zelar ao mximo por sua formao integral como homens e
mulheres pertencentes a esse mundo, tanto aquele que se
encontra na periferia, quanto nos grandes centros. No no
sentido de fazer um teatro grego, que era o teatro e a cidade,
mas tentar enfrentar sua formao como a nica coisa capaz
de modificar seu ato, e a construo do seu objeto
espetacular, quando o indivduo se transforma, todo seu
contexto se modifica.
Cuidar da formao no deixar permisso para
colonizao, no permitir a aculturao. Zelar por formao
criar espaos reais de liberdade, construir identidade e,
acima de tudo, estar preparado para viver novos tempos e,
quem sabe, criar tempos melhores ou pelo menos mais
esperanosos.
O papel social que o teatro cumpre inegvel,
sobretudo quando se tratam de peas cujo pblico atingiu
nmeros altos.
Podemos dizer que a funo social do teatro ser
sempre a de refletir a sociedade tal como um espelho. Parece
que o nmero de peas em cartaz que tratam dos
relacionamentos afetivos de uma forma geral tende a
continuar alto.
O teatro na Ditadura
Na poca da Ditadura, o Brasil no estava nos
jornais. A mdia impressa e televisiva no podia dizer o que
estava acontecendo, era censurada pelo governo militar.
Assim, grupos como o Teatro Oficina, o Teatro Opinio e o
Teatro de Arena exerciam uma resistncia feroz e corajosa
expondo em cena o Brasil que a imprensa no podia
divulgar. Ia-se ao teatro para se unir a essa atitude de
resistncia, para ver a verdade, para ver a realidade brasileira
que estava apenas nos palcos, nos filmes e na MPB da
poca, mesmo que disfarada em metforas de fcil
compreenso para todos, posto que estavam todos
irmanados na mesma luta e soterrados pela mesma represso.
O povo brasileiro oprimido, o grito de liberdade, a
indignao, isso as pessoas s encontravam no teatro e os
estudantes, a classe mdia, os intelectuais brasileiros da
poca estavam todos l, vendo o Brasil que no podia ser
visto em outros lugares, discutindo as questes que eram
censuradas nos meios de comunicao de massa.
Nos dias de hoje vivemos uma situao exatamente
inversa. A realidade brasileira est estampada todos os dias
na capa dos jornais. Nossos polticos, nossa corrupo, nossa
violncia, nossa misria, tudo est exposto em fotos coloridas
e manchetes de jornais. Estamos submetidos a uma grande
exposio permanente, atravs dos jornais, das revistas, da
TV, do rdio, etc.
A est talvez o que mais fortemente diferencia a
funo social do teatro brasileiro contemporneo do que era
feito na poca da Ditadura: nos anos 60/70 ia-se ao teatro
para ver o Brasil que no podia ser visto. Hoje, no h mais
censura e a imprensa expe continuamente a realidade e as
questes de nosso pas; portanto, no se vai e no se quer ir
ao teatro para ver o Brasil! As pessoas esto saturadas de
Robertos Jeffersons, de escndalos, de CPIs, de violncia
urbana, de desigualdades sociais... Quando se vai ao teatro
hoje, o que menos se quer se deparar com a denncia ou a
discusso acerca destas iniquidades.
A pea-didtica
Em uma pea-didtica busca-se a participao do
espectador, como ator e co-autor do prprio texto. Sem
pretender ensinar um contedo pronto e acabado. Trata-se
da construo dialtica de um espao esttico
essencialmente coletivo para a trans-criao de motivos-
geradores, da ao cnica prxis poltica: a serem
experimentados, questionados, criticados. Trata-se de uma
apresentao onde espectadores e atores participam, ativa e
conjuntamente, na construo de um conhecimento
histrico-cultural dos temas abordados. Trata-se, enfim, de
uma estrutura formal que, enquanto mtodo de trabalho,
prima pela unidade na diversidade.
A FUNO SOCIAL DO TEATRO
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas -1 ANO - EM 13
Augusto Boal e a sua forma teatral
Augusto Boal foi um dramaturgo, diretor e terico
de teatro carioca. Atravs de seu teatro buscou lutar contra
todas as formas de opresso e sempre a favor dos explorados
e oprimidos. Criou um teatro de cunho poltico, libertrio e
transformador. No perodo em que a Ditadura Militar
reprimiu com maior fora a voz do povo e de seus
representantes, nos diferentes mbitos sociais, Boal aliou-se
a educadores e intelectuais da Amrica Latina, dispostos a
desenvolverem uma tomada de conscincia dos oprimidos, a
comear pelo projeto de alfabetizao, ALFIN Programa
de Alfabetizao Integral, no Peru, na dcada de 70.
Sua forma teatral denominada de Teatro do
Oprimido um mtodo esttico que rene exerccios, jogos e
tcnicas teatrais que objetivam a desmecanizao fsica e
intelectual de seus praticantes e a democratizao do teatro.
O Teatro do Oprimido, de acordo com o prprio
Boal, pretende transformar o espectador, que assume uma
forma passiva diante do teatro aristotlico, com o recurso da
quarta parede, em sujeito atuante, transformador da ao
dramtica que lhe apresentada, de forma que ele mesmo, o
espectador, passe a protagonista e transformador da ao
dramtica.
Dentro do Teatro do Oprimido existe uma figura
muito importante para o desenvolvimento da cena junto aos
espectadores, ou seja, o Curinga. O Curinga um ator
responsvel em desempenhar diferentes papis nesta prtica
teatral, pode substituir o protagonista nos impedimentos,
assume papel de diretor cnico, passa a fomentador das
questes, enfim, assume diferentes funes de acordo com a
dinmica da improvisao. Dentre as diversas tcnicas do
Teatro do Oprimido encontram-se:
O Teatro-Jornal foi uma forma de ao teatral
desenvolvida por Boal. Esta tcnica pretende que se
transforme quaisquer notcias de jornal, ou qualquer outro
material sem propsito dramtico, em cenas ou aes
teatrais.
O Teatro-Imagem tem a inteno de ensaiar uma
transformao da realidade atravs da imagem corporal e
com o uso de um tema problema.
O Teatro-Frum uma tcnica em que os atores
representam uma cena at a apresentao do problema, e em
seguida propem aos espectadores que mostrem, por meio da
ao cnica, solues para o ento problema apresentado.
O Teatro Invisvel, a representao de uma
cena diante de pessoas que no sabem que esto sendo
espectadoras da ao dramtica, e precisa acontecer num
ambiente diferente do teatral, o mais dentro do cotidiano das
pessoas.
O teatro para Augusto Boal e Bertolt Brecht
O apelo manipulao das emoes, em Boal e
Brecht, substitudo pelo predomnio do recurso razo,
sem nunca perder de vista o humor e, at mesmo, a
aproximao afetiva, enquanto instrumentos de interpretao
crtica (e transformao revolucionria) do que ali
representado. Alm da necessidade de expressar-se poltica
(e didaticamente) atravs da linguagem teatral, a proposta
procura evidenciar tambm a necessidade de uma (relativa)
autonomia esttica na produo artstica: deve continuar
plenamente teatral e, enquanto tal, divertir o pblico. Nas
palavras de Brecht, conciliar a preocupao esttica com a
inquietude poltica, sem nunca submeter uma outra, mas,
justamente, encontrando um novo e surpreendente
significado para ambas. Em tal universo esttico-social,
contudo, a aproximao entre arte e vida adquire uma
impostao programtica cuja potica exige a derivao de
um futuro em aberto. A funo social da arte no se reduz a
reproduzir a sociedade de seu tempo. O principal objetivo,
quer pelo contedo, quer pela forma, trata-se de desempenhar
um papel transformador a um s tempo cultural e poltico, ou
seja, a arte e a revoluo.
Fonte Bibliogrfica:
BOAL, Augusto. Arco-ris do Desejo. Rio de Janeiro:
Civilizao Brasileira, 1996.
COSTA, In Camargo. Brecht e o Teatro pico
(Ciclo de Palestras Dilogos com Brecht). So Paulo,
2005.
HAUSER, A. Histria Social da Arte e da Literatura.
So Paulo: Martins Fontes, 1995.
WOLFF, J. A Produo Social da Arte. Rio de Janeiro:
Zahar, 1982.
Sites Consultados:
ALONSO. Luis Alberto. Oco Teatro Laboratrio.
Disponvel em <http://oco
teatrolaboratorio.arteblog.com.br/29723/A-Funcao-
Social-da-Arte/>
O Teatro do Oprimido. Disponvel em
<http://www.infoescola.com/artes-cenicas/teatro-do-
oprimido/>
O Teatro do Oprimido. Disponvel em
<http://www.cultura.gov.br/programas_e_acoes/cultura_
viva/noticias/index.php?p=27182&more=1&c=1&pb=1
>
A FUNO SOCIAL DO TEATRO
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas - 1 ANO - EM 14
A Origem do Teatro no Ocidente
A histria do teatro europeu comea aos ps da
Acrpole, em Atenas, na Grcia. A tica o bero de uma
forma de arte dramtica cujos valores estticos e criativos
no perderam nada da sua eficcia depois de um perodo de
2.500 anos. Suas origens encontram-se nas aes recprocas
de dar e receber que, em todos os tempos e lugares, prendem
os homens aos deuses e os deuses ao homem: elas esto nos
rituais de sacrifcio, dana e culto. Para a Grcia homrica
isso significava os sagrados festivais bquicos, mendicos,
em homenagem a Dioniso, o deus do vinho, da vegetao e
do crescimento, da procriao e da vida exuberante. Os
festivais rurais da prensagem do vinho, em dezembro, e as
festas das flores de Atenas, em fevereiro e maro, eram
dedicados a ele. As orgias desenfreadas dos vinhateiros
ticos honravam-no, assim como as vozes alternadas dos
ditirambos e das canes bquicas atenienses. Quando os
ritos dionisacos se desenvolveram e resultaram na tragdia e
na comdia, ele se tornou o deus do teatro.
Dioniso, a encarnao da embriaguez e do arrebata-
mento, o esprito selvagem do contraste, a contradio
exttica da bem-aventurana e do horror. Ele a fonte da
sensualidade e da crueldade, da vida procriadora e da destru-
io letal. Essa dupla natureza do deus, um atributo mitolgi-
co, encontrou expresso fundamental na tragdia grega.
O teatro uma obra de arte social e comunal; nunca
isso foi mais verdadeiro do que na Grcia antiga. Em
nenhum outro lugar, portanto, pde alcanar tanta
importncia como na Grcia. A multido reunida no teatron
no era meramente espectadora, mas participante, no sentido
mais literal. O pblico participava ativamente do ritual
teatral, religioso, inseria-se na esfera dos deuses e
compartilhava o conhecimento das grandes conexes
mitolgicas.
Portanto, para o ocidente, a origem do teatro est
ligada aos mitos gregos arcaicos e religio grega. A
mitologia grega formada por numerosos deuses imortais e
antropomrficos, isto , que tm a forma e o temperamento
humano; os deuses antropomorfizados amam, odeiam,
perseguem, discutem, sentem cime, so vingativos, traem,
mentem como as pessoas comuns. Existem vrias geraes e
famlias divinas na mitologia grega.
Na histria do pensamento humano o mito surge
como uma tentativa de explicao, compreenso e controle
do mundo. atravs do mito que o homem primitivo tenta
compreender os fenmenos da natureza, atribuindo-lhes uma
origem divina. A palavra mitologia est ligada a um conjunto
de narrativas da vida, das aventuras, viagens, afetos e
desafetos dos mitos, dos deuses, dos heris.
A etimologia grega de teatro d ao vocbulo o
sentido de miradouro, lugar de onde se v. O edifcio
autnomo, de fins idnticos quele que se chama hoje teatro,
se denominava odeion, auditrio. Na terminologia dos
logradouros cnicos da Grcia, teatron correspondia
plateia, anteposta orquestra e envolvendo-a como trs
lados de um trapzio ou um semicrculo. No se dissocia da
palavra teatro a ideia de viso.
Ler teatro, ou melhor, literatura dramtica, no abarca todo o
fenmeno compreendido por essa arte. nele indispensvel
que o pblico veja algo, no caso o ator, que define a
especificidade do teatro.
Dioniso - do Mito ao Teatro
Dioniso, deus da vegetao e do vinho, era
homenageado pelos primitivos habitantes da Grcia, atravs
de procisses que procuram relembrar toda a sua vida. Estes
cortejos reuniam toda a populao e eram realizados na
poca da colheita da uva, como uma forma de agradecimento
pela abundncia da vegetao. O homem primitivo
acreditava que esta homenagem ao deus garantiria sempre
uma colheita abundante.
Nestas procisses dionisacas contava-se a histria
de Dioniso, de uma forma semelhante s procisses da
Semana Santa crist, onde a vida, paixo, morte e
ressurreio de Jesus Cristo so relembradas.
Estas procisses fazem parte de uma tradio muito
antiga dos povos primitivos gregos, e aos poucos, ao longo
de centenas de anos, vo se organizando melhor, e
adquirindo contornos mais definidos. Ento, o que
inicialmente era um bando de gente cantando e danando,
com o passar do tempo vai se transformando em grandiosas
representaes da vida do deus, que reunia toda a
comunidade, em diferentes coros cantados, com os
participantes vestidos de bodes (Dioniso transformado),
ninfas (ou bacantes) e stiros (metade homem/metade
animal). O coro se divide em semicoros que passam a
dialogar entre si. Estes semicoros passam a ter um lder - o
corifeu.
Porm, mesmo com todas estas inovaes, a histria
do deus continuava sendo narrada na terceira pessoa, com
muito respeito e distanciamento. At que em 534 a.C., um
corifeu chamado Tspis, resolve encarnar o personagem
Dioniso, e transforma a narrao em um discurso proferido
na primeira pessoa:
_ Eu sou Dioniso - diz Tspis, considerado historicamente
como o primeiro ator.
Conta-se que Slon, famoso legislador grego, assistindo
nova proposta de Tspis, perguntou-lhe se ele no se
envergonhava de mentir, fingindo ser algum que de fato no
era. Ao que Tspis respondeu:
_ Mas eu estou apenas brincando.
Por ter esse carter de brincadeira, o incio de sua
histria, o ator foi chamado de hypocrits (hipcrita) ou
aquele que finge ser algum que no .
Quem Dioniso?
Dos amores de Zeus e Persfone (amante de Zeus)
nasce o primeiro Dioniso, o preferido do pai e destinado a
suced-lo no governo do mundo. Para proteger o filho dos
cimes de sua esposa Hera, Zeus o entrega aos cuidados de
Apolo, que o esconde.
Hera, mesmo assim, descobre o paradeiro do jovem
Deus e encarrega os Tits de mat-lo. Os Tits esquartejam
Dioniso, cozinham seus pedaos e, os comem. Zeus, muito
aborrecido, fulmina os Tits e de suas cinzas nascem os
homens. Fato que explica os dois lados existentes nos seres
humanos - o bem e o mal. A nossa parte titnica a matriz
do mal, mas como os Tits haviam comido os pedaos de
Dioniso, possumos tambm algo de bom.
Porm, os deuses so imortais e Dioniso no morre -
ele renasce transformado. Como? Uma outra amante de Zeus,
a humana Smele, salva-lhe o corao que ainda palpitava e
engole-o tomando-se grvida do 2 Dioniso.
A ORIGEM DO TEATRO NO OCIDENTE
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Apostila Artes Cnicas -1 ANO - EM 15
Hera, no entanto, continua vigilante e ao ter
conhecimento das relaes amorosas de Smele com o
esposo, resolve elimin-la. Hera se transforma em ama de
Smele e a aconselha a pedir ao amante que se apresente em
todo o seu esplendor. Zeus se apresenta com seus raios e
troves. O palcio de Smele se incendeia e ela morre
carbonizada.
O feto, o futuro Dioniso 2, salvo por Zeus que o
retira do ventre da amante e o guarda em sua coxa at que se
complete a gestao normal. Aps o nascimento, temendo
nova vingana de Hera, Zeus transforma o filho em bode e
ele levado para o Monte Nisa, onde fica aos cuidados das
ninfas e dos stiros. L, no Monte Nisa, havia uma vasta
vegetao de videiras. Quando Dioniso, j adolescente,
espreme as frutinhas da uva e bebe seu suco em companhia
dos stiros (metade homem metade animal) e das ninfas
(princpio feminino) criado o vinho. Embriagados,
comeam a danar e cantar.
Dioniso visitando um poeta cmico. Relevo em mrmore do sculo I d.C.,
posterior a um original mais antigo, talvez do sculo II a.C. Observe-se,
direita, o cortejo de stiros do Deus. Dioniso, envelhecido, est
aparentemente bbado. Abaixo do poeta, em uma plataforma,
quatro mscaras. In GREEN, R. e HANDLEY, E.
Images of the Greek Theatre. London
A tragdia
A tragdia grega parte da concepo grega do
equilbrio, harmonia e simetria e defende que cada pessoa
tem um mtron, uma medida ideal. Quando algum
ultrapassava seu mtron, seja acima ou abaixo dele, estaria
tentando se equiparar aos deuses e receberia por parte deles a
cegueira da razo. Uma vez cego, esse algum acabaria por
ultrapassar sua medida inmeras vezes at que casse em si,
prestes a conhecer um destino do qual no pudesse escapar.
Como ensinou Aristteles, a tragdia no era vista
com pessimismo pelos gregos, e sim como educativa. Tinha
a funo de ensinar as pessoas a buscar a sua medida ideal,
no pendendo para nenhum dos extremos de sua prpria
personalidade. Para ele, a funo principal da tragdia era a
catarse, descrita por ele como o processo de reconhecer a si
mesmo como num espelho e ao mesmo tempo se afastar do
reflexo, como que observando a sua vida de fora. Tal
processo permitiria que as pessoas lidassem com problemas
no resolvidos e refletissem no seu dia-a-dia, exteriorizando
suas emoes e internalizando pensamentos racionais. A
reflexo oriunda da catarse permitiria o crescimento do
indivduo que conhecia os limites de seu mtron. A catarse
ocorreria quando o heri passasse da felicidade para a
infelicidade por errar o alvo, saindo da sua medida ideal.
Os preparativos dos concursos dramticos, onde as
tragdias concorriam, eram responsabilidade do arconte, que,
na condio de mais alto oficial do Estado, decidia tanto as
questes artsticas quanto organizacionais. As tragdias
inscritas no concurso eram submetidas a ele, que selecionava
trs tetralogias que competiriam no agon, concurso do qual
apenas uma sairia como vencedora. Finalmente, o arconte
indicava a cada poeta um corega, algum cidado ateniense
rico que pudesse financiar um espetculo, cobrindo no
apenas os custos de ensaiar e vestir o coro, mas tambm os
horrios do diretor do coro (corus didascalus) e os custos
com a manuteno de todos os envolvidos.
Ter ajudado alguma tetralogia trgica a vencer como
seu corega era um dos mais altos mritos que um homem
poderia conseguir na competio das artes. O prmio
concedido era uma coroa de louros e uma quantia em
dinheiro nada desprezvel (como compensao pelos gastos
anteriores), e a imortalidade nos arquivos do Estado.
Inicialmente, o poeta era o seu prprio corega,
diretor do coro e ator principal. Tanto squilo quanto
Eurpedes apareceram frequentemente no palco. Sfocles
atuou em suas prprias peas apenas duas vezes quando
jovem.
Embora mais tarde, no perodo helenstico, fosse
perfeitamente possvel que se remontasse uma pea
apresentada anteriormente, os concursos dramticos do
sculo V a.C. exigiam novas obras a cada festival. As
Grandes Dionisacas, em maro, eram a princpio reservadas
exclusivamente para a tragdia, enquanto os escritores de
comdias competiam nas Leneias, em janeiro. Porm, na
poca de Aristfanes, os dois tipos de peas eram
qualificveis para ambos os festivais.
Ao entrar no auditrio, cada espectador recebia um
pequeno ingresso de metal (symbolon), com o nmero do as-
sento gravado. No precisava pagar nada. Nas fileiras mais
baixas, logo na frente, lugares de honra (proedria) esperavam
o sacerdote de Dioniso, as autoridades e convidados
especiais. Ali tambm ficavam os juzes, os coregas e os
autores. Uma seo separada era reservada aos homens
jovens (efebos), e as mulheres sentavam-se nas fileiras mais
acima.
Vestido com o branco ritual, o pblico chegava em
grande nmero s primeiras horas da manh e comeava a
ocupar as fileiras semicirculares, terraceadas, do teatro. Ao
lado dos cidados livres, tambm era permitida a presena de
escravos, na medida em que seus amos lhes dessem licena.
A aprovao era indicada por salvas de palmas, e o
desagrado, por batidas com os ps ou assobios.
A condio necessria para essa experincia
comunitria era a magnfica acstica do teatro ao ar livre da
Antiguidade. O menor sussurro era levado aos assentos mais
distantes. Por sua vez, a mscara geralmente feita de linho
revestido de estuque, prensada em moldes de terracota
amplificava o poder da voz, conferindo tanto ao rosto como
s palavras um efeito distanciador.
As exigncias cenogrficas de squilo ainda eram
bastante modestas. Estruturas simples e rsticas de madeira,
decorados com panos coloridos, serviam de montanhas,
casas, palcios, acampamentos ou muros de cidade. Essas
construes de madeira, que tambm abrigavam um camarim
para os atores, so a origem do termo skene (cabana ou
barraca), que se manteve, desde esses expedientes primitivos,
A ORIGEM DO TEATRO NO OCIDENTE
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Apostila Artes Cnicas - 1 ANO - EM 16
atravs da suntuosa arquitetura da skene do teatro helenstico
e romano, at o conceito atual de cena.
Foi squilo quem introduziu as mscaras de planos
largos e solenes. O traje do ator trgico consistia geralmente
no quton, tnica jnica ou drica, usada no Grcia antiga e
um manto, e do caracterstico cothurnus, uma bota alta com
cadaro e sola grossa. Com Sfocles, a qualidade arcaica,
linear, da mscara comeou a suavizar-se. Os olhos e a boca,
bem como a cor e a estrutura da peruca eram usados para
indicar a idade e o tipo da personagem representada. Com a
maior individualizao das mscaras, Eurpedes exigia,
tambm, contrastes impactantes entre vestimentas e
ambientes.
A mquina voadora era um elemento cnico de
surpresa. Um dispositivo mecnico que vinha em auxlio do
poeta quando este precisava resolver um conflito humano
aparentemente insolvel por intermdio do pronunciamento
divino vindo de cima. Consistia em um guindaste que fazia
descer uma cesta do teto do teatro. Nesta cesta, sentava-se o
deus ou o heri. O fato de o deus ex machina (o deus
descido da mquina) ter se tornado imprescindvel a
Eurpedes explica-se pelo esprito de suas tragdias. Porm,
antes desse ponto ser atingido, outro dispositivo cnico
essencial para a tragdia, entrou em ao: o eciclema, uma
pequena plataforma rolante e quase sempre elevada, sobre a
qual um cenrio era movido desde as portas de uma casa ou
palcio. O eciclema traz vista todas as atrocidades que
foram perpetradas por trs da cena: o assassinato de uma
me, irmo ou criana. Exibe o sangue, o terror e o desespero
de um mundo despedaado, como na Orestada, em
Agamenon, Hiplito e em Medeia.
Eventualmente, o teto da prpria skene era usado,
como em Pesagem das Almas, de squilo, ou em A Paz,
de Aristfanes. Como, naturalmente, eram os deuses que em
geral apareciam em alturas etreas, essa plataforma no teto
tornou-se conhecida na Grcia como theologeion, o lugar de
onde os deuses falam.
A mquina voadora, o eciclema e o theologeion
pressupunham um edifcio teatral firmemente construdo, co-
mo o que se desenvolveu em Atenas no final do sculo V
a.C., baseado em projetos que remontavam a Pricles.
Os Tragedigrafos
Muitas das tragdias escritas se perderam e na
atualidade so trs os Tragediogrfos conhecidos e
considerados importantes: squilo, Sfocles e Eurpedes.
squilo - (525 a 456 aC aproximadamente)
Principal Texto: Prometeu Acorrentado. Tema Principal
que tratava: Contava fatos sobre os Deuses e os Mitos. Ele
morreu com uma tartarugada na cabea enquanto andava pela
praia.
a squilo que a tragdia grega antiga deve a
perfeio artstica e formal, que permaneceria um padro
para todo o futuro. Como seu pai pertencesse nobreza
proprietria de terras de Elusis, squilo tinha acesso direto
vida cultural de Atenas.
squilo ganhou os louros da vitria agon teatral so-
mente aps diversas tentativas. Sabe-se que ele comeou a
competir na Grande Dionisaca em 500 a.C. com tetralogias,
a unidade obrigatria de trs tragdias e uma pea satrica
concludente. Toda a sua obra anterior a 472 a.C., quando Os
Persas foi encenada pela primeira vez, est perdida. De
acordo com cronistas antigos, squilo escreveu ao todo
noventa tragdias; destas, setenta e nove ttulos chegaram at
ns, mas dentre eles conservaram-se apenas sete peas.
Os componentes dramticos da tragdia arcaica
eram um prlogo que explicava a histria prvia, o cntico
de entrada do coro, o relato dos mensageiros na trgica
virada do destino e o lamento das vtimas. squilo seguia
essa estrutura.
Sfocles - (496 a 406 a.C aproximadamente)
Principal Texto: dipo Rei. Sfocles escreveu verdadeiras
odes democracia, pregando abertamente que somente ela
poderia aproximar os homens dos deuses. Para ele, o homem
s encontraria sua medida na vida pblica, atuando na plis,
por intermdio da democracia ateniense.
Quatro anos depois de ter ganhado o prmio com
Os Persas, squilo enfrentou pela primeira vez, no
concurso anual de tragdias, um rival cuja fama estava
crescendo meteoricamente: Sfocles, ento com vinte e nove
anos de idade, filho de uma rica famlia ateniense, que ainda
menino liderara o coro de jovens nas celebraes de vitria
aps a batalha de Salamina.
Os dois rivais inscreveram suas tetralogias para a
Dionisaca de 468 a.C. Ambas foram aceitas e apresentadas.
squilo obteve um succs destime, mas o prmio coube a
Sfocles, trinta anos mais novo. Os dois poetas eram amigos,
e at o momento em que squilo deixou Atenas, dividiram
igualmente os louros da tragdia. Sfocles ganhou dezoito
prmios dramticos. Dos cento e vinte trs dramas que
escreveu, apenas sete tragdias e os restos de uma stira
chegaram at ns.
Os deuses submetem o rebelde ao sofrimento sem
sada. Amontoam sobre ele tamanha carga que apenas no
tormento consegue ele preservar a sua dignidade. O homem
tem conscincia dessa ameaa, mas por suas aes fora os
deuses a ir at os extremos. Para o homem de Sfocles, o
sofrimento a dura, mas enobrecedora escola do Conhece-
te a ti mesmo.
A ORIGEM DO TEATRO NO OCIDENTE
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Apostila Artes Cnicas -1 ANO - EM 17
Eurpedes - (484 a 406 a.C aproximadamente)
Principal Texto: As Troianas. Eurpedes dizia que o
corao feminino era um abismo que podia ser preenchido
com o poder do amor ou o poder do dio. visto por muitos
como o primeiro psiclogo, pois se dedicava ao estudo das
emoes na alma humana, principalmente nas mulheres.
Aristteles o chamou de o maior dos trgicos, porque suas
obras conduziam a uma reflexo - catarse - que os demais
trgicos no conseguiam. Numa sociedade patriarcal e
machista, Eurpedes enfatizava a mulher e como ela poderia
fazer grandes coisas quando apaixonada ou tomada de dio.
Defendia que o amor e o dio eram os responsveis pelo
afastamento da medida de cada um. Podemos destacar
Medeia e Ifignia em ulis como duas peas de
Eurpedes nas quais os sentimentos e emoes so levados
flor da pele.
Eurpedes, filho de um proprietrio de terras, nasceu
em Salamina e foi instrudo pelos sofistas de Atenas.
Em contradio com a doutrina socrtica de que o
conhecimento expresso diretamente na ao, Eurpedes
concede a suas personagens o direito de hesitar, de duvidar.
Descortina toda a extenso dos instintos e paixes, das
intrigas e conspiraes. Sua minuciosa explorao dos pontos
fracos na tradio mitolgica lhe valeu agudas crticas de
seus contemporneos. Acusaram-no de atesmo e da
perverso sofista dos conceitos morais e ticos. De suas
setenta e oito tragdias (das quais restam dezessete e uma
stira) apenas quatro lhe valeram um prmio enquanto estava
vivo, sendo a primeira delas As Peliades, em 455 a.C.
A Comdia
A comdia grega, ao contrrio da tragdia, no tem
um ponto culminante, mas dois. O primeiro se deve a Arist-
fanes, e acompanha o cimo da tragdia nas ltimas dcadas
dos grandes trgicos Sfocles e Eurpedes; o segundo pico da
comdia grega ocorreu no perodo helenstico com
Menandro, que novamente deu a ela importncia histrica. A
comdia sempre foi uma forma de arte intelectual e formal
independente. Deixando de lado as peas satricas, nenhum
dos poetas trgicos da Grcia aventurou-se na comdia, co-
mo nenhum dos poetas cmicos escreveu uma tragdia.
A origem da comdia, de acordo com a Potica de
Aristteles, reside nas cerimnias flicas e canes que, em
sua poca, eram ainda comuns em muitas cidades. A palavra
comdia derivada dos komos, orgias noturnas nas quais
os cavalheiros da sociedade tica se despojavam de toda a
sua dignidade por alguns dias, em nome de Dioniso, e
saciavam toda a sua sede de bebida, dana e amor. O grande
festival dos komasts era celebrado em janeiro (mais tarde a
poca do concurso de comdias) nas Leneias, um tipo
ruidoso de carnaval que no dispensava a palhaada grosseira
e o humor licencioso.
A comdia tica antiga um precursor brilhante
daquilo que viria a ser, muitos anos depois, caricatura
poltica, charivari e cabar. Nenhum poltico, funcionrio ou
colega autor estava a salvo de seus ataques. At mesmo os
esplndidos novos edifcios de Pricles foram motivos de
escrnio.
Pouco se sabe sobre a formao e a vida de
Aristfanes. Parece ter nascido por volto de 445 a.C. e ter
vindo do demos tico de Cidatena. Viveu em Atenas durante
toda a sua vida criativa, ou seja, da poca em que escreveu
sua primeira pea, Os Banqueteadores (427), at o ano em
que escreveu a ltima, A Riqueza (Plutus, 388). Das
quarenta comdias que sabemos terem sido compostas por
ele, conservaram-se apenas onze.
Os espetculos da Comdia Antiga aconteciam no e-
difcio teatral, com suas paredes de madeira pintadas e pai-
neis de tecido, enquanto o coro, como na tragdia clssica,
ficava na orchestra. Para cenas de transporte areo, usava-
se o teto da skenee.
As mscaras da Comdia Antiga vo desde as
Grotescas cabeas de animais at os retratos caricaturais.
Com a morte de Aristfanes, a era de ouro da com-
dia poltica antiga chegou ao fim. Os prprios historiadores
da literatura na Antiguidade j haviam percebido quo
grande era o declive entre as comdias de Aristfanes e as de
seus sucessores, e traaram uma ntida linha divisria,
atribuindo tudo o que veio depois de Aristfanes, at o
reinado de Alexandre, o Grande, a uma nova categoria - a
Comdia Mdia (mese).
Flautista e coro fantasiado, representando cavaleiros e seus cavalos, motivo
que reaparece mais tarde em Os Cavaleiros, de Aristfanes. Vaso figurado,
em negro (Berlim, Staatliche Museen). In BERTHOLD, M. Histria
Mundial do Teatro, So Paulo: Perspectiva, 2001, fig. 2, p. 122.
A comdia agora se retirava das alturas da stira
poltica para o menos arriscado campo da vida cotidiana. Em
vez de deuses, generais, filsofos e de chefes de governo, ela
satirizava pequenos funcionrios gabolas, cidados bem de
vida, peixeiros, cortess famosas e alcoviteiros. A Comdia
Mdia no apresentou nenhuma inovao, no que diz
respeito a tcnicas cnicas e cenografia.
Das plancies artsticas da Comdia Mdia, no final
do sculo IV a.C., ergueu-se de novo um mestre: Menandro.
Ele assinala um segundo pice, da comdia da Antiguidade: a
nea (nova comdia), cuja fora reside na caracterizao, na
motivao das mudanas internas, na avaliao cuidadosa do
bem e do mal, do certo e do errado. Menandro, filho de uma
rica famlia ateniense, que nasceu por volta de 343 a.C.,
moldava carteres, e partia dos carteres como portadores da
ao. A personagem, conforme ele diz em sua comdia A
Arbitragem, o fator essencial no desenvolvimento humano
e, portanto tambm no curso da ao.
O coro, que j na Comdia Mdia havia sido posto
de lado, desapareceu completamente nas obras de Menandro.
Como os atores no mais entravam vindos da orquestra, a
forma do palco foi alterada. As cenas mais importantes eram
agora apresentadas no logeion, uma plataforma diante da
skene de dois andares. A comdia de caracteres, com suas in-
trigas e nuanas individuais de dilogo, exigia a atuao con-
junta mais concentrada dos atores, bem como um contato
mais estreito entre o palco e a plateia. Menandro foi o nico
dos grandes dramaturgos da Antiguidade que viveu para ver
o teatro de Dioniso terminado.
A ORIGEM DO TEATRO NO OCIDENTE
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Apostila Artes Cnicas - 1 ANO - EM 18
O Mimo
Desde tempos imemoriais, bandos de saltimbancos
vagavam pelas terras da Grcia e do Oriente. Danarinos,
acrobatas e malabaristas, flautistas e contadores de histrias
apresentavam-se em mercados e cortes, diante de campone-
ses e prncipes, entre acampamentos de guerra e mesas de
banquete. arte pura unia-se o grotesco, a imitao de tipos
e a caricatura de homens e animais, de seus movimentos e
gestos.
O gracejo verbal, somado a essas proezas sem pala-
vras, fsicas, levou s primeiras e breves cenas improvisadas.
Era o incio do mimo primitivo. Seu alvo era a imitao fiel
natureza de tipos autenticamente vivos, ou, num sentido
mais amplo, a arte da autotransformao, da mmesis.
O mimo (mimus) prestava ateno no povo
annimo, comum, que vivia sombra dos grandes, e nos
trapaceiros, velhacos e ladres, estalajadeiros, alcoviteiras e
cortess. Cada regio supria o mimo de suas prprias figuras
caractersticas e conceitos locais.
O mimo desenvolveu-se originalmente na Siclia.
Era uma farsa burlesca rstica, qual Sfron deu forma
literria pela primeira vez por volta de 430 a.C. Suas
personagens so pessoas comuns e, no sentido mais amplo da
mmese, animais antropomrficos.
A arte do mimo no foi impedida por barreiras geo-
grficas. Do sul da Itlia, caminhou em direo ao norte com
os atores ambulantes e, onde quer que fosse, assimilava todo
o tipo de atos histrinicos populares, farsescos e mais ou me-
nos improvisados.
O palco clssico da Antiguidade exclura as
mulheres, mas o mimo deu ampla oportunidade exibio do
charme e do talento femininos.
A maioria dos textos dos mimos era em prosa, mas
alguns, os chamados mimeidoi, eram cantados - os
precursores dos coplas de music-hall. Seu repertrio de tipos
o mesmo que Filogelo usou certa vez para suas pilhrias e,
ao lado de doutores, charlates, adivinhos e mendigos, seu
alvo predileto de zombaria era o bobo de Abdera, ou Sidon
ou alguma outra cidade dos tolos.
Somente na poca helenstica o mimo grego teve a-
cesso ao palco dos grandes teatros pblicos. A Grcia nunca
concedeu a ele a importncia que ganharia sob os imperado-
res em Roma e Bizncio.
O Palco grego
Os estudos no atualizados continuam a apresentar
como padro do edifcio cnico, na Grcia, o Teatro de
Epidauro, construdo no sc. IV a.C. pelo arquiteto Policleto.
Pesquisas recentes, comunicadas pelo arquelogo Carlo Anti,
do conta de que o teatron (plateia), na poca de squilo,
tinha a forma Trapezoidal, e o palco ficava do lado maior.
Assim era o Teatro de Siracusa, do qual se conservam
indicaes mais seguras. A construo era de madeira, em
muitos casos, provisria, procurando as encostas que
formavam envolvimento natural, inclusive para propiciar boa
acstica.
A forma que chegou at ns como representativa da
soluo grega ideal o Teatro de Epidauro, muito posterior
fase urea de tragdia. Construdo de pedra, no formava
uma unidade arquitetnica, porque suas trs partes
fundamentais eram isoladas. O pblico se concentrava no
teatron, verdadeiras arquibancadas em semicrculos
concntricos de 270 graus. No centro, ficava a orquestra,
onde evolua o coro e, segundo alguns tericos, ocorria
tambm a representao dos atores. Ao fundo, fechando as
duas extremidades do teatron, situava-se a skene, que
reproduzia normalmente um palcio real. Diante da skene
colocava-se o proskenion, palco propriamente dito, destinado
segundo alguns ao desempenho dos atores e, para isso, ligado
orquestra por escadas de madeira. As entradas do coro, nas
passagens das extremidades do teatron, denominavam-se
parodoi. As amplas dimenses da plateia no dificultavam a
catarse trgica, porque a disposio volta da orquestra
aquecia o espetculo.
Teatro de Epidauro - Grcia
Fonte Bibliogrfica:
BERTHOLD, Margot. Histria Mundial do Teatro. So
Paulo: Perspectiva, 2000.
A ORIGEM DO TEATRO NO OCIDENTE
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O Teatro Romano
1. Introduo
O imprio romano foi um Estado militar. Antes de
Augusto, os romanos eram guerreiros, depois de Augusto,
governaram o mundo. O caminho desde a legendria
fundao da Cidade das Sete Colinas em 753 a.C. at o
imprio mundial romano uma sucesso de guerras de
conquista e, ao mesmo tempo, a legitimao de um
nacionalismo fundamentado, desde os primrdios, no poder
da autoridade.
At mesmo os deuses estavam sujeitos aos ditames
do Estado. A localizao de seus principais santurios no
era determinada pela tradio, mas pela res publica. Antes
das legies romanas capturarem uma cidade inimiga, seus
deuses eram requisitados numa cerimnia religiosa, a
evocatio (chamado), para que abandonassem as cidades
sitiadas e se mudassem para Roma, onde poderiam contar
com templos mais grandiosos e maior respeito. Desse modo,
o santurio de Diana foi deslocado da cidade latina de Arcia
para o Aventino, e a Juno Regina dos etruscos foi
recolocada no Capitlio, vinda de Veio. Da mesma forma,
Minerva, uma sucessora da Palas Atena grega venerada na
cidade etrusca de Falrio, chegou a Roma, onde se juntou a
Jpter e Juno como o terceiro membro da mais alta trade de
deuses romanos na colina do Capitlio. Roma ainda hoje a
recorda, na Igreja de Santa Maria sopra Minerva, edificada
sculo VIII.
Os Ludi Romani, as mais primitivas das festividades
religiosas oficiais onde se apresentavam espetculos, tambm
eram consagrados trade Jpiter, Juno e Minerva. Como
disse Ccero, o segredo da dominao romana residia em
nossa piedade, nossos costumes religiosos e em nossa sbia
crena em que o esprito dos deuses governa todas as coisas.
A religio do Estado havia se apossado da
hierarquia dos deuses olmpicos da Grcia, com poucas
mudanas de nomes, mas nenhuma modificao maior de
carter. s margens do Tibre, como sombra da Acrpole
em Atenas, Tlia, a musa da comdia, e Eutrpia, a musa da
flauta e do coro trgico, eram as deusas padroeiras do teatro.
O teatro de Roma fundamentava-se no mote poltico
panem et circenses - po e circo - que os estadistas astutos
tm sempre tentado seguir.
Tanto em suas caractersticas dramticas quanto
arquitetnicas, o teatro romano herdeiro do grego. Como
antes, em Atenas, esta era divide-se em um perodo de
atividade dramtico-literria e em outro, no qual as geraes
seguintes esforaram-se para criar uma moldura arquitetnica
digna. No que diz respeito ao florescimento da literatura
dramtica de Roma, este perodo corresponde aos sculos III
e II a.C., quando prosperaram as peas histricas e as
comdias (em palcos temporrios de madeira), e, no tocante
ao perodo ureo da glorificao arquitetural da ideia de
teatro, os sculos I e II d.C.
Teatro Romano
Panorama do teatro de Mrida
Teatro Romano
O anfiteatro no pertencia aos poetas. Servia de
palco aos jogos de gladiadores e s lutas de animais, para
combates navais, espetculos acrobticos e de variedades.
Quando a perseguio aos cristos se iniciou com
Domiciano, o sangue humano correu aos borbotes no
Coliseu, no mesmo local onde multides de cinquenta mil
pessoas aplaudiam os atletas campees ou os atores de
mimos e de pantomimas. Seu teatro era o espelho do
imperium romanum - para melhor ou para pior, e era muito
mais um show business organizado do que um lugar
dedicado s artes.
2. Os Ludi Romani, o Teatro da Res Pblica
Durante a mesma dcada em que Aristteles
descreveu a ento inteiramente desenvolvida tragdia grega,
Roma assistia a seus primeiros ludi scaenici (jogos cnicos),
modestos espetculos de mimo de uma troupe etrusca. Estes
incluam danas e canes, acompanhadas de flauta, e
tambm invocaes religiosas dos deuses no esprito da
misteriosa e sobrenatural f dos etruscos, que outrora haviam
dominado Roma. Nessa poca, a preocupao dos atores e da
plateia era aplacar os poderes da vida e da morte, j que se
estava no ano de 364 a.C. e a peste se alastrava pelo pas.
O TEATRO ROMANO
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Apostila Artes Cnicas - 1 ANO - EM 20
Desde o mais remoto incio, a habilidade poltica de
Roma se expressou no oferecimento, aos povos
conquistados, da oportunidade de promover seus talentos e
manter boas relaes com seus prprios deuses. Os romanos
anexaram a propriedade espiritual, tanto quanto a terrena,
daqueles que conquistaram, juntamente com o direito de
exibi-la em pblico, para o prazer de todos e para maior
glria da repblica. Dessa forma, o teatro romano tambm
era um instrumento de poder do Estado, dirigido pelas
autoridades. Assim como em Atenas a arte da tragdia e da
comdia desenvolvia-se a partir do programa das festividades
das Dionisacas e das Lenias, Roma tambm procurou
organizar a arte do drama, com base no programa de suas
festividades.
A moldura externa dada foram os Ludi Romani,
institudos em 387 a.C. e desde ento celebrados anualmente
em setembro, com quatro dias de espetculos teatrais. Mais
tarde, instituram-se outros jogos dedicados aos deuses (ludi),
tais como os Ludi Plebeii em novembro, os Ludi Cereales e
Megalenses (em homenagem me dos deuses) em abril, e
os Ludi Apoilinares, em julho.
Essas celebraes festivas deviam muito famlia
dos Cipies, que ajudaram a fortalecer o renome mundial de
Roma no apenas em assuntos militares, mas tambm
culturais. Nos sculos III e II a.C., os Cipies praticaram a
espcie de patronato das artes que, mais tarde, na poca de
Augusto, seria associada ao nome do nobre Mecenas.
Os romanos, na verdade, devem seu primeiro
dramaturgo - Lvio Andrnico, cidade de Tarento, uma das
maiores e mais ricas das antigas colnias gregas no sul da
Itlia. Lvio Andrnico foi trazido a Roma, como escravo,
para a rica casa dos Lvios. Graas a seu dom da Linguagem,
o jovem grego logo foi promovido de professor particular a
conselheiro educacional e cultural.
Em 240 a.C., Lvio Andrnico escreveu suas
primeiras adaptaes de peas gregas. Uma tragdia e uma
comdia foram representadas, nas quais o prprio Lvio An-
drnico participou como ator, cantor e encenador, na melhor
tradio ateniense.
O exemplo de Lvio Andrnico logo trouxe cena o
primeiro dramaturgo latino, Gneu Nvio, da Campnia, que
se apresentou com obras prprias, pela primeira vez, nos
Ludi Romani, cinco anos mais tarde.
Nvio foi o criador do drama romano, a fabula praetexta
(assim nomeada por causa da vestimenta oficial dos preteres,
os mais altos funcionrios e servidores da Repblica, que
eram seus personagens e heris centrais).
A glorificao dramtica da histria de Roma por
Nvio, especialmente em Romulus sua pea mais famosa -
que retrata a lendria fundao de Roma - trouxe grandes
honrarias ao autor. Ele, porm, arriscou todas elas com suas
comdias, nas quais se aventurava no campo das polmicas
locais e, fiel ao exemplo de Aristfanes, atacava os polticos
e nobres de sua poca.
Mas Roma no era Atenas. Os homens do Senado no eram
como Clon, que se contentara em retaliar com uma boa
surra a desrespeitosa franqueza de Aristfanes. Nvio teve de
pagar caro pela militncia expressa em suas comdias. Foi
preso e exilado, e morreu por volta de 201 a.C. em Utica, o
velho centro comercial fencio.
Em 204 a.C., o terceiro pioneiro do teatro romano
surgiu na capital: Quinto Enio de Rudia, na Calbria, ento
com trinta e cinco anos. Obteve fama com sua obra mais
importante, um epos nacional intitulado Anais, e tambm
por suas adaptaes de tragdias e comdias gregas para o
pblico romano.
Escreveu, segundo o modelo de Eurpedes, peas
como Aquiles e Alexandre, alm de outra sobre o tema das
Eumnidas. nio, teve o cuidado de evitar assuntos
controversos durante toda a sua vida. Era popular tanto junto
ao povo quanto aos aristocratas. Sua escolha de temas
dramticos mostra o quo prudentemente ele mantinha sua
posio no cabo-de-guerra da existncia de um favorito.
Sempre escolhia assuntos que, em geral com algum aspecto
didtico, podiam ser suavemente transpostos para a viso de
mundo racional dos romanos.
O sculo II a.C. gerou uma rica safra de produes
dramticas, ao longo da linha da fbula praetexta e da
adaptao de temas gregos. No domnio da tragdia, a
corrente de escritores, iniciada por Quinto nio, passa pelo
seu sobrinho e discpulo M. Pacvio, por Lcio cio e vai
at Asnio Plio, o ator considerado digno do coturno (a
bota alta da tragdia grega, agora possivelmente com uma
sola que a elevava algumas polegadas), na poca do
imperador Augusto, chegando por fim, na era crist, a Aneu
Sneca cujas nove tragdias remanescentes, entretanto, no
foram jamais encenadas no palco da Roma antiga.
3. Comdia Romana
Embora a tragdia e a comdia hajam iniciado
juntas sua carreira nos palcos de Roma e originalmente
tenham sido escritas pelos mesmos autores, Tlia logo
comeou a se emancipar. O primeiro grande poeta cmico de
Roma alimentou a comdia romana no apenas com a sua
prpria obra, mas tambm com a influncia revigorante do
mimo folclrico popular.
Plauto (c. 254-184 a.C.), nascido em Sarsina, no
era um homem de muito estudo, mas conta-se que no
decorrer de uma juventude cheia de aventuras ele
perambulou pelo pas com uma troupe atelana.
Deixando para trs o despretensioso repertrio de
sua experincia teatral anterior, Plauto aterrou com um salto
na literatura mundial. Os modelos dramticos de suas
comdias foram as obras da Comdia Nova tica,
especialmente as de Menandro.
Plauto possua suficiente prtica teatral para
selecionar as cenas mais eficazes de seus modelos. Ao faz-
lo, no hesitava em encaixar os temas de vrias peas, se isso
ajudasse a realar o efeito. Trabalhou no menos com percia
do que com sorte no princpio da contaminao, em que
seria igualado, uma gerao mais tarde, por Terncio - o
segundo grande poeta cmico romano.
Personagens cmicas, identidades trocadas, intriga e
sentimentalismo burgus alimentam o mecanismo que
conduz harmoniosamente suas comdias. A insero de
canes com acompanhamento musical (cantica) confere a
elas um toque de opereta. Plauto fez muito sucesso com suas
primeiras trs comdias, que foram representadas quando ele
tinha aproximadamente cinquenta anos. As datas registradas
de suas estreias so 204 a.C. (Miles Gloriosus), 201
(Cistellaria), 200 (Stichus) e 191 (Pseudolus).
Ao todo, vinte peas completas de Plauto subsistem.
Elas refletem no apenas o repertrio de enredos e
personagens da Comdia Nova tica, mas, a mentalidade de
seu autor e do pblico para o qual escrevia. Elas tambm se
tornaram a fonte inesgotvel da comdia europeia. O
O TEATRO ROMANO
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas -1 ANO - EM 21
Anphitruo, de Plauto sobrevive no Anfitrio de Molire e no
de Kleist, alm das verses modernas de Jean Anouilh e
Peter Hacks; os Menaechmi (Os Gmeos) ganharam segunda
imortalidade na Comdia dos Erros de Shakespeare. Em
Aulularia (O Pote de Ouro ou Comdia da Panela), Plauto
criou um prottipo de avareza ingnua, que Molire, em O
Avarento, mais tarde envolveu no brilhante manto da haute
comdie francesa.
Publius Terentius Afer, hoje mais conhecido como
Terncio (c. 190-159 a.C.), o segundo dos grandes poetas c-
micos de Roma, chegou capital vindo de Cartago. Brbaro
de nascimento, foi trazido a Roma como escravo, da mesma
forma que Lvio Andrnico. Seu senhor reconheceu os
talentos do jovem e o emancipou. No crculo de Cipio
Africano Menor, ele encontrou amistoso reconhecimento e
apoio.
Suas seis comdias traem j nos ttulos aquilo que
Terncio buscava - o estudo de carter: o de um auto--
atormentador em Aquele que castiga a si prprio, o de um
parasita em o Formio, o de uma sogra em Hecira e o de um
eunuco em Eunuchus. Todas as seis peas de Terncio
pertencem ao perodo entre 166 a.C. quando ele estreou com
ndria nos Ludi Megalenses e 159 a.C., no presumvel de
sua morte.
Enquanto Plauto prestava ateno conversa do
povo e se apoiava fortemente no contraste entre ricos e
pobres para suas situaes cmicas, Terncio procurava
imitar o discurso cultivado da nobreza romana.
O refinamento urbano e perfeio formal de seus
dilogos, as personagens cuidadosamente desenhadas e seu
desenvolvimento no curso da ao eram as coisas que
Terncio desejava ver apreciadas com a devida ateno. Se-
guia meticulosamente os modelos gregos. Tanto Terncio
como Plauto, contaminavam suas obras com duas ou at
trs peas j existentes. Os hbeis entrecruzamentos de
pessoas reconhecidas ou confundidas, perdidas e de novo
encontradas, no tornava fcil para o espectador descobrir a
intrincada tecitura da ao. O Eunuco, por exemplo, baseia-
se em duas comdias de Menandro, e Os Adelfos numa
comdia de Menandro e numa de Dfilos.
As comdias de Terncio, entretanto, vivem no
teatro do mundo. Suas finezas dramatrgicas, cena de escuta
bisbilhoteira, tticas de ocultao e revelao de personagens
e motivos tornaram-se exemplares. Hrotsvitha von
Gandersheim, Shakespeare, Tirso de Molina e Lope de Vega,
e os dramaturgos clssicos franceses e alemes adotaram as
tcnicas de Terncio. Em sua Dramaturgia de Hamburgo,
Lessing, o dramaturgo alemo do sculo XVIII, discute, em
considervel extenso, os mritos de Terncio e sua
influncia no teatro posterior.
Plauto, com sua experincia atelana atrs de si,
tomou parte pessoalmente na encenao de suas comdias.
Terncio, porm, teve bastante sorte de encontrar um
produtor influente, que levou todas as suas peas: o diretor
teatral Lcio Ambivius Trpio.
Relevo em mrmore, com uma cena tpica da Comdia Nova: um pai furioso
vai ao encontro do filho, que retorna de um banquete amparado por um
escravo (Npoles, Museo Nazionale).
4. Do Tablado de Madeira ao Edifcio Cnico
O teatro romano cresceu sobre o tablado de madeira
dos atores ambulantes da farsa popular. Durante dois sculos,
o palco no foi nada mais do que uma estrutura temporria,
erguido por pouco tempo para uma ocasio e desmontada de
novo. Embora os dramaturgos romanos tenham alcanado
rapidamente seus modelos gregos, pelo menos em termos
quantitativos de sua produo, as condies externas do tea-
tro ficavam muito atrs, obviamente no nas questes organi-
zacionais, nas quais os romanos foram sempre mestres, mas
no plano de fundo arquitetural para o espetculo.
A responsabilidade pelo teatro em Roma cabia aos
curule aediles, dois altos oficiais, que no incio eram sempre
patrcios, embora mais tarde o cargo tenha sido aberto a
plebeus. Encarregavam-se do policiamento, da arquitetura e
das obras de construo, da superviso de edifcios e vias p-
blicas e respondiam pelo decurso harmonioso dos jogos, os
ludi e os circenses.
Os edis (homens pblicos) pagavam um subsdio
pblico ao diretor do teatro (dominus gregis) para cobrir as
despesas com atores e indumentria. Inicialmente, o palco
em si dava poucas despesas. Consistia em uma plataforma
retangular de madeira, cerca de um metro acima do cho,
cujo acesso era feito por escadas de madeira laterais e com
uma cortina que o delimitava ao fundo.
Lvio Andrnico e seus contemporneos e
sucessores tinham de arranjar-se com esses recursos
primitivos; os atores, porm, precisavam ser tanto mais
talentosos e versteis. No usavam mscaras e se distinguiam
apenas pelas perucas, especialmente em papeis femininos.
Era importante que suas vozes fossem claras e tivessem bom
alcance.
O pblico ficava em semicrculo ao redor da
plataforma. At 150 a.C., pelo menos, ainda era proibido
sentar-se durante um espetculo teatral. Quando Cipio
Africano Menor sugeriu que poderiam ser colocadas cadeiras
para os senadores e funcionrios do Estado, a proposta desse
privilgio irritou o povo.
O TEATRO ROMANO
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas - 1 ANO - EM 22
Gradualmente, o palco primitivo foi se tornando
mais bem adaptado s necessidades da arte dramtica.
Primeiramente, a cortina de fundo (siparium), deu lugar a um
galpo de madeira, que servia de camarim para os atores. Na
frente do palco, onde por fim a scaenae frons romana tomaria
o lugar da skene grega, uma estrutura de madeira coberta,
com paredes laterais, foi desenvolvida na poca de Plauto
para atender s exigncias cnicas. Trs portas davam acesso
ao palco frontal por uma parede de madeira - uma central
(porta regia) e outras duas laterais, num nvel mais baixo
(portae hospitaliae); mais tarde, foram acrescentadas outras
duas entradas. Esse expediente permitia aos atores entrar em
cena vindos de cinco casas, soluo essencial para as cenas
de rua de Plauto e Terncio. Quanto menor era o palco, mais
prximas umas das outras ficavam as portas.
Como o palco era montado prximo ao circus e
muitas vezes tinha de competir com corridas de bigas,
lutadores, danarinas e gladiadores, isto implicava amide
pesadas frustraes para os poetas.
Cinco anos aps a morte de Terncio, em 155 a.C.,
o censor Cssio Longino construiu o primeiro teatro com
colunas decorando a scaenae frons, mas, depois de
terminados os ludi, elas foram derrubadas por ordem do
Senado. O mesmo aconteceu com a carssima estrutura de
madeira erguida em 145 a.C., por Lcio Mmio, para suas
peas triunfais; este teatro completo foi o primeiro a ter
assentos para os espectadores, mas foi demolido aps o final
dos jogos.
Mesmo tardiamente, em 58 a.C., o edil Emilio
Scauro teve de curvar-se lei que proibia a construo de
teatros permanentes. Ele havia construdo um grandioso
edifcio, com trezentos e sessenta colunas e um auditrio que
abrigava oitenta mil pessoas; porm, como os edifcios
anteriores, teve de ser demolido.
O pano de boca que hoje faz parte de qualquer teatro
do mundo, foi discretamente introduzido no ano 56 a.C. em
Roma.
5. O Teatro na Roma Imperial
O primeiro teatro de pedra romano deve sua
sobrevivncia a um ardil. Foi construdo por Pompeu, aliado
e posteriormente adversrio de Jlio Csar. Pompeu se
impressionara muito com os teatros gregos durante suas
vrias campanhas martimas e terrestres. Durante seu
consulado em 55 a.C., obteve permisso das autoridades em
Roma para edificar um teatro de pedra. Usando de uma
inteligente estratgia, ele afastou o perigo do teatro ser
demolido depois dos jogos: acima da ltima fileira do
anfiteatro semicircular, ergueu um templo para Vnus
Victrix, a deusa da vitria. Os assentos de pedra eram o lance
de escadas que levavam ao santurio.
Pompeu venceu, e assim Roma teve o seu primeiro
teatro permanente, situado na extremidade sul do Campus
Martius (ainda possvel ver suas runas junto ao Palazzo
Pio). Reconstrues mostram que sua planta tornou-se,
subsequentemente, caracterstica da construo do teatro
romano. A parede do palco decorada com colunas e o
auditrio, de formato semicircular, dividido em fileiras por
dois grandes corredores e em sees em forma de cunha por
escadas radiais ascendentes. No alto, o auditrio era fechado
por uma galeria colunada e ornamentada com esttuas.
Teatro de Pompeu
Dominando todo o teatro como uma igreja medieval
fortificada, erguem-se as ngremes empenas do templo de
Vnus Victrix. A presena dos deuses, que no teatro de
Dioniso em Atenas havia sido a condio de um culto
religioso, tornou-se um pretexto diplomtico no teatro de
Pompeu, em Roma.
Nessa poca, as celebraes dos Ludi Romani
estendiam-se por quinze ou dezesseis dias. Por ordem de
Csar, Brutos viajou a Npoles a fim de recrutar artistas
dionisacos para os espetculos teatrais greco-romanos que
aconteceriam em todos os distritos urbanos de Roma. Antes
de ser morto aos ps da esttua de Pompeu no ano de 44 a.C.,
Jlio Csar autorizara a construo de um novo teatro de
pedra, abaixo do Capitlio, nas proximidades do Tibre.
O edifcio foi terminado no reinado de Augusto e,
em 13 a.C., dedicado memria de seu Jovem sobrinho,
Marcelo. Pouco tempo antes, os romanos haviam
testemunhado a inaugurao de mais um teatro de pedra,
construdo por Lcio Cornlio Balbo, amigo de Pompeu.
Teatro de Marcelo
Montanhas que explodem, erupes vulcnicas e
palcios que desabam sempre foram efeitos cnicos
populares. Numa fabula togata de Lcio Afrnio, chamada
Casa em Chamas, uma casa realmente foi incendiada no
palco. O espetculo recebeu aplausos entusisticos, e,
ironicamente, o imperador Nero assistiu sentado em seu
lugar de honra apenas alguns anos antes de assistir ao
incndio da cidade do alto de seu palcio.
O TEATRO ROMANO
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas -1 ANO - EM 23
6. O Anfiteatro: Po e Circo
Os dois traos caractersticos do Imprio Romano,
tanto em questes de arte quanto de organizao, eram a
sntese e o exagero, que podem tambm ser encontrados nas
formas especficas do teatro romano. O drama sozinho no
oferecia campo suficiente para a exibio do poder e
esplendor. O teatro da Roma imperial queria impressionar.
Na verdade, ele precisava impressionar num imprio que
abrangia desde o extremo norte da Germnia at as costas da
frica e a sia Menor. Onde quer que as legies romanas
pisassem, eram seguidas por jogos que forneciam
diverses e sensaes de todo tipo, para manter a moral nas
fileiras romanas e entre os povos conquistados.
O Coliseu - o mais grandioso teatro dos imperadores
flavianos - teve dois predecessores bastante dspares. Um
deles foi o anfiteatro de Pompia, construdo por volta de 80
a.C., mas que ainda no dispunha de nenhuma sala
subterrnea para abrigar as jaulas de animais ou a maquinaria
para erguer feras, cenrios e acessrios. O segundo foi uma
curiosidade teatral, erguida por Escribnio Crio em Roma,
em 52 a.C., para os funerais de seu pai, presumivelmente por
ordem de Csar. Consistia em dois teatros semicirculares de
madeira, situados de costas um para o outro. Pela manh, era
apresentada uma pea diferente em cada palco, tarde, os
dois teatros eram virados para que, juntos, formassem um
anfiteatro. Em sua arena fechada, apresentavam-se lutas de
gladiadores, como segunda parte do espetculo. O milagre
tcnico, segundo se conta, era realizado sem que os
espectadores dos dois auditrios precisassem deixar seus
lugares.
O Coliseu, primeiramente conhecido como
Anfiteatro Flaviano, foi erguido no local que Nero
incendiara, no declive que ele havia enchido com gua, a fim
de formar o lago em cuja margem construra seu palcio, a
Casa Dourada. A construo do Coliseu foi iniciada em 72
d.C., pelo sucessor de Nero, o imperador F1aviano
Vespasiano, e terminada em 80 d.C. Nas cerimnias
inaugurais do novo Anfiteatro Flaviano, que se estenderam
por cem dias, aproximadamente cinquenta mil pessoas
lotaram o auditrio para as lutas de gladiadores e o
aulamento e matana de animais. Cinco mil animais selva-
gens foram mortos nessa ocasio.
Coliseu Romano
Coliseu Romano
A construo externa se ergue em quatro poderosos
pavimentos, com colunas de estilo drico, jnico e corntio,
alternadamente; dentro, quatro galerias acomodavam os
espectadores. Alm do camarote imperial, num podium
elevado, na primeira galeria ficavam os lugares de honra dos
senadores e oficiais, sacerdotes e vestais. A segunda galeria
acomodava a nobreza e os oficiais, a terceira os patrcios
romanos, e a quarta galeria, os plebeus. Parece tambm ter
havido uma colunata reservada s mulheres.
O auditrio podia ser coberto por toldos de linho, a
fim de proteg-lo contra o sol e a chuva. Ao longo da cornija
superior dos muros externos encontram-se, a intervalos
breves e regulares, suportes nos quais se encaixavam os
duzentos e quarenta mastros que sustentavam os toldos,
iados por marinheiros da esquadra imperial. Embaixo da
arena ficavam os tneis com as celas para as jaulas dos
animais, maquinaria para o manejo de decoraes e
mudanas de cenrio, como tambm os encanamentos
necessrios para inundar a arena quando os espetculos de
batalhas navais (nau-machiae) estavam no programa.
Nenhum drama de qualquer mrito literrio foi
jamais apresentado no Coliseu. Seus muros abrigaram tudo o
que correspondia ao show e ao espetculo no sentido mais
amplo da palavra. Na poca de Augusto, a nfase na
programao teatral j havia passado to radicalmente do
drama falado para o show de variedades que atores atelanos,
mimos e atores de pantomima tinham pouco a temer na
competio com atores dramticos. Esquetes curtos,
palhaadas, canes do tipo music-hall,, revistas, acrobacias,
intermezzi aquticos, nmeros equestres e espetculos com
animais eram montados para divertir um pblico que vinha
ao teatro com nenhuma outra qualificao que no fosse a de
ser consumidor.
Sob o governo de Domiciano, o sangue cristo
correu no anfiteatro. Nessa poca, os romanos no queriam
ter nenhuma experincia intelectual marcante no teatro.
Queriam o show. Aplaudiam aqueles que tentavam ganhar
popularidade no anfiteatro com grupos espetaculares de
artistas, belos animais, solistas espirituosos, msicos e
bufes. A popularidade de um novo cnsul crescia ou decaa
com os espetculos teatrais que organizava ao tomar posse
do cargo na poca do Ano Novo.
O TEATRO ROMANO
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas - 1 ANO - EM 24
O drama romano exaurira sua eficcia teatral com
Plauto e Terncio. As comdias e tragdias de seus
sucessores eram artigos vlidos apenas para o dia, ou, como
nas obras de Sneca, se achavam distantes do gosto de um
pblico inteiramente sintonizado com corridas de bigas,
jogos na arena, incitamento de animais e bufes.
Mas o declnio do poder imperial romano havia
diminudo o brilho do seu teatro. Embora a Igreja crist
tivesse repetidamente reprovado o povo por negligenciar os
altares e adorar o teatro.
Salviano, provavelmente nascido em Trier, acusava
seus conterrneos de haver pedido ao imperador que
restabelecesse os jogos de circo como o melhor remdio
para a cidade arruinada:
Eu acreditava que, na derrota, haveis perdido
apenas vossos bens e posses, mas eu no sabia que haveis
perdido tambm vosso juzo e bom senso. teatro que
quereis, circo que exigis do governo?
7. A Fbula Atelana
O declnio do drama romano e a extino da
comdia abriram as portas do teatro estatal romano para uma
espcie rstica de farsa conhecida como fbula atelana. J
no sculo II a.C., os atores da farsa popular da cidade oscana
de Atela, na Campnia, haviam se encaminhado em bandos,
para o norte, na direo de Roma. rusticidade de suas
mscaras grotescas correspondia robusta irreverncia de
seus dilogos improvisados. Seu repertrio modesto se a-
poiava em meia dzia de tipos, como o malicioso Maccus,
que compensava seu desajeitamento com uma afiada astcia;
o rolio e simplrio Bucco, sempre derrotado; o bondoso Ve-
lho Pappus, cuja senilidade era objeto das mais crueis
mordacidades; e o filsofo gluto e corcunda Dossenus, alvo
favorito das gozaes dos camponeses iletrados.
Os atores atelanos, aos quais se juntaram mais tarde
tambm os intrpretes romanos profissionais, tinham sua pr-
pria funo nos festivais de teatro estatais. Como as peas
satricas da Grcia, davam um final cmico, grotesco s
apresentaes de peas histricas srias e s tragdias nos
Ludi Romani, uma retaguarda alegre, conforme coloca um
dos escoliastas de Juvenal, para ajudar os espectadores a
secar as lgrimas. As atelanas tiveram seu perodo ureo no
sculo I a.C., quando os dramaturgos romanos Pompnio e
Nvio resolveram dar forma mtrica farsa rstica e repleta
de obscenidades. Embora haja sobrevivido tragdia e
comdia, a farsa atelana perdeu terreno para o mimus na
poca dos ltimos imperadores.
8. Mimo e Pantomima
Ao contrrio dos atores atelanos, os mimos romanos
no usavam mscaras. O mimo no necessitava de nada mais
do que de si prprio, sua versatilidade e sua arte da imitao
em resumo, de sua mimesis. Mesmo o discurso era apenas
um acessrio. Saniones, careteiros, era como os romanos
chamavam os mimos, um apelido que parece ter sobrevivido
no Zanni, o folgazo da Commedia dellArte. Pode haver
algo mais ridculo do que o Sannio, disse Ccero
depreciativamente, que ri com a boca, o rosto, os gestos
zombeteiros, com a voz, e at mesmo com todo o seu corpo.
Mimo no papel de encantador de serpentes,
com guizos na roupa. Marfim romano tardio.
Era a essa arte de rir e provocar o riso que o mimo
devia a sua popularidade em Roma. Nos Ludi Romani, ele
tinha permisso para estender sua cortina branca atravs da
cena e apresentar suas pilhrias nos intervalos entre as
tragdias e as comdias. A partir de 173 a.C., os Ludi
Florales, um festival de primavera que durava vrios dias,
tornaram-se uma ocasio para a arte teatral ntima. O mimo
foi, desde o princpio, o nico gnero teatral em que a
participao da mulher no era um tabu. A mima e danarina
que exibia sua flexibilidade acrobtica na Florlia, que podia
- e tinha de poder - atrever-se a homenagear a deusa da natu-
reza em flor despindo suas vestes, a irm de todas aquelas
que tm exercido o atemporal ofcio de agradar aos homens.
Os mimos representavam beira da estrada, na are-
na, numa plataforma de tbuas ou na scaenae frons do teatro.
Usavam as roupas comuns dos homens e mulheres das ruas -
farrapos, como os das pessoas que representavam, como eles
prprios o eram - ou seda e brocados, quando conseguiam os
favores de algum patrono rico. O bobo vestia uma roupa de
retalhos coloridos, como a usada pelo Arlequim, e um
chapu pontudo. O mimo usava apenas uma sandlia leve
nos ps, que diferia do cothurnus do ator trgico e do socuts
do comediante.
Em sua poca, o mimo e a pantomima, seguros da
proteo imperial, superaram todas as outras formas teatrais.
Dois homens de classes e origens completamente diferentes
salientaram-se em Roma como escritores de textos para o
mimo: o nobre Dcimo Labrio e o ator Pblio Siro.
O diretor e ator principal de uma troupe de atores e
atrizes de mimos era chamado de archimimus. Era ele quem
supervisionava a pea e determinava seu desenvolvimento, se
ela seguiria um texto literrio ou se seria improvisada. A
improvisao exigia um equilbrio muito preciso no fio
afiado da palavra, especialmente na poca dos imperadores e
das competies por seus favores.
A arte do teatro havia se transformado na habilidade
do intrprete. Foi deixada ao critrio do ator individual.
Aproximava-se a grande era das pantomimas. A pantomima
foi a estrela teatral das resplandecentes festividades do Egito
sob o governo dos Ptolomeus, e a favorita dos Csares e do
povo romano.
Quando o imperador Augusto baniu de Roma o pan-
tomimo Pilades, houve tamanho protesto popular que ele foi
obrigado a logo revogar a sentena e cham-lo de volta do
exlio. Pilades era grego, oriundo da Alcia, na sia Menor.
Especializou-se na pantomima trgica. Seu papel mais
brilhante era o de Agamenon. Foi graas a Pilades que, a
partir de 22 a.C., as pantomimas passaram regularmente a ter
O TEATRO ROMANO
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas -1 ANO - EM 25
o acompanhamento musical de uma orquestra de muitos
instrumentos.
Um astro da pantomima podia, entretanto, perder
sua popularidade da noite para o dia. A roleta do aplauso e da
fama podia trazer o triunfo ou o aniquilamento. Quando Nero
se deu conta de que o pantomimo e danarino Pris, o Velho,
seu favorito e confidente ntimo, era mais popular junto ao
pblico do que ele prprio, mandou decapit-lo sem cerim-
nias.
A arte da pantomima universal. Sua linguagem
sem palavras fala aos olhos. por isso que a arte da
pantomima se espalhou de Roma para todas as regies do
imprio.
Atriz da pantomima romana tardia segurando uma mscara trifacial.
Relevo em marfim de trier, sculo IV d.C. (Berlim, Staatliche Museen).
Atores e atrizes de mimo foram celebrados e
cortejados. Mais tarde, porm, tambm eles ficaram sujeitos
maldio da Igreja Crist nascente. O presbtero cartagins
Tertuliano, o combativo oponente de todas as perversidades
pags do mundo corrompido, negou tanto ao mimo quanto
pantomima qualquer direito redeno crist em seu livro
De spectaculis. E em 305 d.C, dez anos antes do
reconhecimento do cristianismo como a religio oficial do
Estado romano, o Snodo provincial de lberis (Elvira), em
Granada, declarou: Se os mimos e pantomimas desejam se
tornar cristos, devero primeiramente abandonar sua
profisso.
9. Mimo Cristolgico
A severidade com a qual a Igreja Crist se ops a to-
das as formas de spectaulum por mil anos - at criar uma no-
va forma de teatro prpria - baseou-se em circunstncias
histricas bastante reais. Desde seus primeiros dias, o cristia-
nismo no havia sido apenas perseguido pelos imperadores
romanos, mas ridicularizado pelos mimos, no palco.
Uma religio cujo Redentor sofrera, sem reclamar, a
morte mais desonrosa, destinada aos criminosos comuns, es-
tava de qualquer maneira destinada ao escrnio da popula-
o, j que no era protegida pelo Estado. O mimo adulava
igualmente os governantes e o povo. O que podia ser mais
tentador do que incorporar a figura do cristo lista de
tipos tradicionais? O mimo no fazia diferena entre parodiar
os deuses antigos e expor ao ridculo os seguidores de uma
nova f. O batismo, com seu cerimonial caracterstico, que
expressava de forma visvel a converso ao cristianismo, era
um tema. Parodiava-se aquilo que no se conseguia entender.
Zombava-se daquilo que, em outros aspectos, estava alm da
compreenso da massa.
Sob o reinado do imperador Flvio Domiciano, o
primeiro a derramar sangue cristo no Coliseu, ocorreu o se-
guinte incidente: o imperador julgou que a costumeira
representao do mimo do chefe dos bandidos, Laureolus,
que era crucificado no final, estava fraca demais. Ele
ordenou ento que o papel ttulo fosse dado a um criminoso
condenado. A pea terminou em horrvel seriedade;
Domiciano fez com que o crucificado fosse despedaado por
animais selvagens.
Um singular registro pictrico, descoberto nas
paredes de uma casa na Colina Palatina, fornece provas das
conexes entre o mimo e o martrio, o ridculo e a f. Essa
garatuja primitiva, que data do sculo II ou III, representa a
pardia de uma crucificao. Uma figura com mscara de
asno est na cruz, esquerda um homem ergue seu brao
numa saudao, e abaixo se l a inscrio: Alexamenos
adora seu Deus.
BERTHOLD, M. Histria Mundial do Teatro.
So Paulo: Perspectiva, 2000.
Cabe conjecturar que era um escravo a quem os ou-
tros ridicularizavam por ser cristo. A mscara do asno, sm-
bolo da stira cmica desde a mais primitiva Antiguidade,
sugere que o graffito seja baseado num mimo cristolgico, no
qual o intrprete de Cristo tenha tido que usar uma mscara
como smbolo evidente de escrnio.
Alguns mimos zombadores convertiam-se nova f.
Em 275, o mimo Porfrio tornou-se cristo convertido em
Cesrcia, na Capadcia, e o mesmo se diz do mimo Ardlio,
um ano mais tarde, tambm em alguma cidade da sia
Menor. O caso mais famoso dessas converses foi o do ator
Gensio, que se converteu em Roma no ano de 303, no
reinado de Diocleciano e na poca das mais severas e cruis
perseguies aos cristos. Gensio foi vtima dessa
perseguio, e a Igreja fez dele o santo padroeiro dos atores.
Mas os mimos se apegavam obstinadamente a temas
cristolgicos, como comprovam decises dos conclios da
Igreja que, j no decorrer do segundo milnio aps a expan-
so do cristianismo no mundo ocidental, proibia que os
mimos entrassem no palco como padres, monges ou freiras.
O mimus como uma linha que vai dos primrdios
da Antiguidade, atravs de Roma e Sizncio, at a Idade
Mdia. Era to familiar ao homem da rua quanto ao erudito
em sua mesa de estudo.
Fonte Bibliogrfica:
BERTHOLD, Margot. Histria Mundial do Teatro.
So Paulo: Perspectiva, 2000.
O TEATRO ROMANO
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas - 1 ANO - EM 26
O Teatro Medieval
Introduo
A Idade Mdia foi um perodo entre os sculos V e
XV d.C. Tambm conhecido como a Idade das Trevas, por
causa da estagnao cultural da sociedade (fato contestado
por alguns historiadores). A Igreja monopolizava toda e
qualquer manifestao de pensamento, como por exemplo, a
literatura; a filosofia; a cincia e as artes. O teatro era
utilizado como instrumento da Igreja para arrebanhar fiis e
para catequizar o povo. As peas eram de cunho religioso ou
profano. Satirizavam o catequtico, o Cristianismo, ou eram
instrumento de propaganda destes, mas sempre sobre o
mesmo tema: a religiosidade.
Era subdividido em trs fases: Alta Idade Mdia,
Plena Idade Mdia e Baixa Idade Mdia. As primeiras
manifestaes teatrais ocorreram na Plena Idade Mdia,
seguidas de um grande florescimento na Baixa Idade Mdia.
A sociedade feudal, rigidamente estratificada, compreende
uma aristocracia, formada pela unio da nobreza e do clero, e
o Terceiro Estado, representado por servos e camponeses
livres e, posteriormente, pela burguesia. No pice do sistema
de dominao encontra-se a Igreja Catlica. Para manter o
statu quo ela descobre o teatro como fator capaz de
disseminar sua ideologia de obedincia e submisso aos
valores estatudos. Por esse motivo, o teatro popular,
dirige-se a todas as camadas do povo (e no classe
dominante), transformando-se no lugar privilegiado do
desejo de ensinar inerente arte medieval, presente no teatro
religioso, no cmico e at na poesia narrativa, nos fabliaux.
Mas, quando o clero no pode mais controlar as energias
sociais que se lhe contrapem e que se intrometem na
representao teatral, ele probe ento a representao dos
mistrios (sculo XVI).
Na Alta Idade Mdia, a Igreja havia vetado
igualmente, como manifestao pag e fator de dissoluo
dos costumes, o remanescente teatro latino que j havia
declinado com o final do Imprio Romano. O aparecimento
do teatro religioso, no sculo XII, coincide com um
ressurgimento dos clssicos latinos em alguns centros, como
as escolas de Fleury-sur-Loire, em textos mais destinados
leitura do que encenao. Porm antes disso, em torno do
ano 1000, a freira sax Hroswitha produz os primeiros
dramas edificantes, onde mistura Teologia com Terncio e
Sneca.
Podemos fazer, no mnimo, uma diviso em duas -
reas, nas quais se desenvolvem, paralelamente, dois
conjuntos de manifestaes culturais e espetaculares,
correspondentes a dois tipos distintos de concepo do
mundo. Por um lado, temos o universo religioso e, por outro,
a cultura popular carnavalesca. Esses dois campos vo se
juntar na parte final da Idade Mdia. Mas, durante sculos,
suas manifestaes mantm-se afastadas, ainda que correndo
paralelas e sendo vivenciadas pelos mesmos homens. O
medievo experimenta as duas sensaes de mundo: a devoto-
religiosa e a profano-carnavalesca. Ainda que o faa em
momentos claramente diferenciados.
Inicialmente as peas eram encenadas dentro da
prpria Igreja, tendo, como uma espcie de ator, o padre.
A vida cotidiana impregnada pela piedade e pelo
temor a Deus, bem como pela imposio das regras e
convenes de uma sociedade altamente normatizada. Mas a
vida dos momentos especiais que se instauram na festa
popular, nas feiras ou praas dos mercados uma vida livre
entre iguais, alegre, permissiva e audaciosa. Ao
relacionarmos teatro medieval e catolicismo, estamos apenas
parcialmente corretos. Os aspectos ligados simbologia
crist e ao rito catlico juntam-se a vrios outros, cujo gnese
se localiza no campo da cultura popular. Territrio este que
o dos bufes, dos charlates de feira, dos histries, dos
pelotiqueiros, dos anes, dos exibidores de defeitos fsicos e
de habilidades extraordinrias como a dos contorcionistas.
Trata-se de toda uma sobrevivncia cultural pag ou profana.
O teatro medieval deriva do rito religioso (a missa
crist), do mesmo modo como, na Antiguidade, a tragdia
grega. Ele se formou aos poucos, e surge da liturgia, isto ,
da dramatizao do texto da Bblia lido durante o ofcio
divino.
O ponto de partida o canto antifonado,
estabelecido pelo Papa Gregrio (sculo VI), alternando
solista e coro, e difundido pelos beneditinos. No sculo IX, o
monge Tutilon, da comunidade sua de St. Gall cria
parfrases do texto sagrado - os tropos - dilogos que
dramatizam o encontro das Santas Mulheres com o anjo, na
sepultura de Jesus. Eram executados, sobretudo no ofcio da
Ressurreio (Pscoa) e no dos Pastores (Natal). Esta cena
inicial vai sendo ampliada e enriquecida, ocupando mais
tempo que a fundamental.
As Trs Marias visitam o tmulo do Senhor no Domingo de Pscoa
e so recebidas pelo Anjo. esquerda, os guardas adormecidos. Miniatura
do Benedictional de St. Ethelwold, Escola de Winchester, c. 970
(Coleo do Duque de Devonshire).
A liturgia catlica transforma as cerimnias
religiosas em diferentes modalidades dramticas, nos
diversos pases da Europa. A missa, no simbolismo de que
est impregnada, contm vrios elementos espetaculares e
dramticos. O padre interpreta o ato do culto como uma
narrao ou representao simblica de vida, paixo, morte e
ressurreio de Jesus. O celebrante do culto, em seus
paramentos suntuosos, transforma a hstia e o vinho em
corpo e sangue de Cristo. A elevao da hstia representa a
suspenso do corpo na cruz. A quebra da hstia simboliza os
ferimentos de Cristo. A comunho o sepultamento.
Esses esboos de representao do origem a um
drama litrgico, que permanece ligado ao ritual da missa,
cantado em latim e mantido a cargo do sacerdote. Essas
representaes tendem a ser faladas nas lnguas locais, na
medida em que vai crescendo a necessidade de entendimento
e de participao das populaes, simultaneamente devotas
divindade e encantadas pelo luxo progressivo dos acessrios
da missa e dos paramentos sacerdotais.
O TEATRO MEDIEVAL
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas -1 ANO - EM 27
bom ressaltar que a religio no era um
espetculo, por conta das encenaes, mas o teatro que veio
auxiliar a religio.
Considere-se que, a partir do sculo XI, a Igreja
vive um grande enriquecimento. Ento, sobram ouro e cores
vistosas nas roupas dos clrigos e nos acessrios da missa.
Isso j devia produzir encantamento e atrao. Seria natural
que, a partir de determinado instante, as populaes se
interessassem, cada vez mais vivamente, por aqueles dramas,
quisessem entend-los e at participar deles. Este movimento
coerente com a devoo e o fervor religioso.
Como a Igreja tinha o controle da sociedade, todas
as outras instituies de poder estavam a seu servio e a
ajudavam a controlar a sociedade e as criaes artsticas.
Havia censura de ordem religiosa, judiciria e poltica. A
adoo dos idiomas locais aumenta o entusiasmo coletivo em
relao s representaes. O pblico cada vez maior. Uma
srie de episdios paralelos narrao bblica comea a ser
inseridos.
O elemento cmico-burlesco passa a integrar as re-
presentaes, que tendem a se deslocar do interior para os
prticos e os ptios das igrejas, libertando-se da liturgia. Os
atores deixam de ser os sacerdotes. Ou, pelo menos, passa a
ser necessrio um outro tipo de intrprete para certos perso-
nagens, como os diabos, e para as passagens cmicas e li-
cenciosas. No perodo no se construiu edifcio teatral
prprio.
Este percurso vai desembocar, ao final da Idade M-
dia, nos grandes espetculos dos mistrios e dos milagres,
das farsas e das moralidades apresentadas nas praas. Mas a
apresentao de peas devotas ou burlescas nos palcios, nos
conventos ou nos colgios no deixa de ocorrer. Na rua, o te-
atro assistido, muitas vezes, por milhares de pessoas.
Essa assistncia ainda no constitui o pblico como
o entendemos hoje. No uma audincia puramente
consumidora, distante dos esforos de produo. Trata-se de
um teatro que no apenas assistido, mas feito pelo pblico.
A cidade inteira, atravs das corporaes de artesos e de co-
merciantes ajuda a construir e financiar o espetculo.
Os atores, na sua maioria, no so profissionais. So
estudantes ou clrigos e fazem parte de determinadas
associaes chamadas confrarias, que se responsabilizam
pela representao.
Os nicos atores profissionais da Idade Mdia eram
os saltimbancos, que realizavam, desde sempre, suas
exibies, a maior parte das vezes, individuais, nas feiras e
nas praas. Os artistas ambulantes, os bobos, os bufes e os
histries de toda ordem tambm eram mobilizados,
principalmente para as representaes das partes cmicas e
burlescas, das cenas licenciosas e grotescas, das diabruras
que faziam a festa do homem medieval, durante a
apresentao dos mistrios.
Surgem aos poucos vrios textos em latim, de autores
annimos, representados por padres, ou clrigos no coro das igrejas.
O Sponsus (sculo XI ou primeira metade do sculo XII), parbola
sobre as virgens loucas e as virgens sbias, o mais antigo texto que
mistura o latim com uma lngua popular (o francs). O primeiro texto
inteiramente em lngua popular (francs) o Jeu d'Adam (Auto ou
Mistrio de Ado), feito por um clrigo annimo do sculo XII, em
dialeto anglo-normando, em dilogos com versos cantados e
recitados, mas mantendo o latim nas indicaes cnicas. J exige
cenrio prprio, o que implica numa representao fora do prdio do
templo.
A dramatizao crescente:
1. O ritual da missa enriquecido por reflexes sobre o
texto bblico, comentrios lrico-picos e responsrios.
2. Aos poucos deste coro se destacam os personagens que
vo ilustrar o texto do Evangelho, numa transio da
atitude narrativa para a teatral.
3. Quando estes quadros se acentuam, e o drama
litrgico no mais apresentado por clrigos, na igreja
ou no claustro, e sim por cidados da cidade, a pea
sai da igreja e deixa de ser um prolongamento do ofcio
religioso. O espetculo torna-se semilitrgico e vai para
o adro ou prtico da igreja. Ao separar-se da liturgia
conquista as lnguas nacionais, abandonando o latim.
4. Mais tarde, a ao j no se limita mais as cenas de
Pscoa e do Natal, mas apresenta-se a vida de Jesus,
com numerosas estaes. Os temas das Escrituras vo
sendo alargados e enriquecidos, sempre com muito
realismo. O que leva ao cmico e ao profano. No
entanto, esta hiptese contestada pelos que defendem a
autonomia do teatro cmico/profano. Para estes, ele
surge independentemente da Igreja, graas ao
desenvolvimento da burguesia e incorporao de
artistas populares tradicionais e, em seu apogeu, vai
influenciar o teatro litrgico/religioso, intrometendo-se
nele.
5. Na fase final a encenao feita nas praas e com
cenrios complexos.
Os palcos eram extremamente largos e
comportavam vrios cenrios. Os dois tipos de palco mais
comuns eram, por um lado, os carros que se sucediam,
parando um depois do outro, para a representao das
diferentes partes do espetculo, e, por outro, o longo palco
simultneo das manses, que eram espcies de estaes, por
onde passavam os personagens do drama apresentado.
A cena simultnea podia ter at cinquenta metros de
extenso e era disposta de modo a que todos os lugares da
ao, todos os elementos da cenografia se encontrassem jus-
tapostos, antecipadamente, diante do pblico.
Os cenrios eram diversificados; contavam com tru-
ques tcnicos e tambm com maquinarias que permitiam
tanto o deslocamento areo de anjos, como o surgimento de
demnios, saindo de alapes.
No se tratava de representar, realisticamente, as per-
sonagens, como se elas estivessem diante de ns,
vivenciando um determinado conflito, com toda a carga de
emoo verdadeira que isso acarreta.
Caractersticas Gerais
1. O teatro medieval eminentemente pico: deseja narrar
tudo, desde a Criao do Mundo at o Juzo Final. No
entanto, inicialmente, at o sculo XIV, nos mistrios,
no se mostra toda a histria do mundo, mas s partes,
em peas do Natal e da Pscoa, conforme a liturgia. J
no caso dos milagres, conta-se a vida do Santo desde o
seu nascimento.
2. Por esse motivo, h uma ruptura, ou melhor, ignorncia
total das regras teatrais da Antiguidade. Assim,
desconhecem-se as unidades de lugar, tempo e ao,
pois, para ilustrar a vontade de Deus, o lugar o
universo Cristo (Terra, Cu, Inferno), o tempo agora
O TEATRO MEDIEVAL
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas - 1 ANO - EM 28
sempiterno da histria da humanidade e a ao, sempre
repetida, a queda do homem e sua salvao, ou seja, a
Histria Sagrada.
3. Alm disso, numa viso prpria do cristianismo
medieval, h misturas de tons e de estilos, fundindo-se
os contrrios: elevado e popular; excelso e rude; sublime
e humilde; passado, presente e futuro. Desse modo, o
teatro se ope antiga retrica pr-conizadora da
separao dos estilos, porque ele se baseia em categorias
tico-teolgicas e no esttico-estilsticas. Por isso, a
conexo entre os eventos s pode ser compreendida pela
ligao vertical com a Providncia divina. Da a impor-
tncia da interpretao figural.
4. Para difundir as verdades da f, o objeto da mais alta
importncia e sublimidade deve-se converter num
acontecimento da realidade mais simples e quotidiana.
Por esse motivo um tema elevado - o pecado original -
deve ser tratado num estilo simples e baixo, na lngua do
povo e no seu nvel de compreenso, com realismo
(essencial na arte crist medieval, j aparecendo antes do
sculo XII). No entanto, tal realismo no repele
anacronismos, desde que ligados ao catolicismo. Isto
porque Ado j conhece a Redeno futura. O realismo
do teatro medieval popular se contrape fantasia e ao
irrealismo da literatura feudal da Corte. Alis os
excessos, realistas, especialmente grotescos e farsescos,
introduzidos no drama religioso atravs da farsa,
possivelmente por influncia da tradio subliterria do
mimo, foram condenados pela Reforma (1548).
5. Outra caracterstica do teatro medieval o fato de ele se
basear na oposio litrgica X profano, e no na do
trgico X cmico. Isto porque as duas ltimas categorias
esto presentes na dramatizao religiosa: o trgico
repousa na viso do homem decado e o cmico se
intromete a partir do prprio realismo.
6. O apogeu do teatro medieval situa-se entre os sculos
XIII e XV, iniciando-se na Frana. As primeiras peas,
surgidas a partir do sculo XII, tm ainda o nome
genrico de jeux, autos, s se diferenciando e se
multiplicando os tipos a partir do final da Guerra dos
Cem Anos. Aos poucos os autores saem do anonimato,
com a adoo das lnguas nacionais, bem como vo
surgindo as grandes colees de peas religiosas, como
os 42 Miracles de Notre Dame (sculo XIV) e os
volumes de Les Mystres du Vieil Testament (sculo
XV), na Frana, ao passo que a Inglaterra contribui com
os 48 Miracles Plays de York (1350/1440) e as 32 peas
do ciclo Wakefield ( 1450), tambm chamadas
Towneley Plays, dentre as quais duas famosas
Shephherds Plays para o Natal.
Contribuies do Teatro da Idade Mdia
Tcnicas de encenaes desenvolvidas pelos atores;
Tcnicas de cenrio, iluminao e sonoplastia;
Riqueza de figurino e maquiagem;
Autos (ex.: de Natal, de Pscoa), representados at os
dias de hoje.
Farsa
Era um quadro curto sobre uma cena cotidiana, cari-
caturada. Tinha a inteno de imitar a realidade, exagerando
para torn-la mais sensvel.
Muitas farsas podiam ser representadas por um s ator. Os
temas eram grotescos e abusados: maridos corneados,
espancamentos, roubos, etc.
Teatro Profano
O profano a stira ao divino. Associa-se em
grande parte ao cmico. No aparece como forma
independente antes do sculo XIII, no se sabe de onde
provm, aumenta sua influncia quando a encenao sai da
igreja. Nas praas e nas feiras, os jograis-mmicos
profissionais exploram a literatura oral, recitam, cantam,
executam monlogos dramticos e mmicas dialogadas,
imitando tipos (o louco, o bbado, o tolo), tornando-se assim
herdeiros e transmissores da antiga tradio latina. As
companhias desta modalidade teatral buscavam a
contraveno no s nos seus temas, mas tambm com a
presena de mulheres em seu elenco e com maneiras
diferentes de se apresentar: cantando, danando e, s vezes,
at se despindo.
Mistrios, Milagres e Moralidades
Mistrio
Reconstitua passagens da Bblia. No se trata de
um dogma no qual a Igreja se apia, mas de histrias de
Natal, Assuno, Ressurreio, etc.
No Mistrio entrava tudo: o bom e o falso, o srio e
o burlesco, o verdico e o lendrio. Tinha como finalidade
edificar a alma, mas tambm distrair o pblico, no havendo
respeito verossimilhana. Os papeis femininos eram
representados por homens.
Sua apresentao, em seu apogeu, comovia uma ci-
dade inteira, que pagava para assistir vrios ciclos de
apresentaes que duravam at quarenta dias para dar
continuidade a uma histria.
Foi o apogeu do teatro medieval quanto perfeio
dos meios empregados e a decadncia quanto ao seu valor
literrio.
Estrutura do Espetculo:
Prlogo: explicao do que iria ocorrer;
A pea em si: em versos (346 a 61.908 versos); No era
dividida em atos e cenas, mas em jornadas, que podiam
durar um dia inteiro, com pausa apenas para as refeies.
Eplogo ou Prlogo final: que resumia os aconte-
cimentos e convidava os espectadores a voltarem. No
sobreviveu s guerras religiosas e crise econmica.
Outras causas de sua morte foram a ordem moral (o
sarcasmo, a intimidade do divino com o profano) e a
ordem tcnica (no se adaptou aos novos tempos, sendo
morto pelas ideias modernas).
Milagre
uma pea de durao bem mais curta que o
mistrio. Baseado na vida dos santos. a encenao de uma
interveno de um santo ou da Virgem Maria. Produz-se
geralmente em favor de uma personagem repugnante sogra
que matou o genro; religiosas que abandonam o convento,
O TEATRO MEDIEVAL
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas -1 ANO - EM 29
etc. A inteno mostrar que no h crime, por maior que
seja, que no possa ser redimido pela f.
O Milagre era estritamente ligado religio, mas
tratado livremente, comportando sempre um sermo
encaixado no curso da ao. Era escrito em versos, variando
seu comprimento de 1.000 a 3.000 versos.
Aproximadamente quarenta milagres chegaram aos
nossos dias. Desapareceu no decorrer do sculo XVI, sendo
conservado apenas na Espanha.
Moralidade
um gnero ora grave ora alegre, que era represen-
tado mediante alegorias. Provam uma verdade de ordem mo-
ral, fazendo dialogar personagens alegricos.
Tinha inteno didtica: ensinar algo. Quando seu
objetivo era religioso distinguiam-se dos mistrios porque
moralizavam em vez de contar.
COMENTRIO A RESPEITO DE TODOMUNDO,
MORALIDADE INGLESA DE FINS DO SCULO XV.
Deus envia a Morte em busca da personagem-ttulo,
que representa todos os homens. Quer dizer, Todomundo
uma entidade simblica e coletiva. As personagens so
alegricas e abstratas: Boas Companhias, Parentes, Boas
Aes, Beleza, etc. Devido a um carter esquemtico, a ao
se assemelha a uma demonstrao. Logo que se depara com a
Morte, Todomundo tenta modificar a disposio de sua inter-
locutora. Ela quer lev-lo a prestar contas diante de Deus. Ele
quer permanecer nesta vida. O conflito, entretanto, no se
instaura, j que muito rapidamente conhecemos o resultado.
A Morte no muda sua deciso de levar Todomundo consigo.
O surgimento de novas personagens na cena no
exige ao que o justifique. Cada ocorrncia no a
continuidade da que lhe antecede. O carter simblico, entre
pico e lrico, dispensa os elos explicativos, permitindo
brechas, saltos surpreendentes e aparies as mais
inverossmeis que se possa imaginar. H uma liberdade
formal que o teatro puramente dramtico no poderia
explorar.
A Morte, aps o aviso a Todomundo, afasta-se para
que ele se prepare para a partida. Inquieto, Todomundo tenta
encontrar quem o acompanhe na viagem. Vemos, ento, uma
espcie de desfile de figuras que, sucessivamente, se apresen-
tam e s quais Todomundo tenta convencer a segui-lo. Antes
de saberem que seguiro com a Morte, todos so solcitos e
amveis com Todomundo, abandonando-o logo que
descobrem de que viagem se trata. Imediatamente partida
de um interlocutor, surge um outro e a ao recomea do
mesmo ponto e no mesmo sentido. Essa repetio do mesmo
gesto insinua uma paralisia do tempo.
A apario abrupta das personagens pode ter um
rendimento cmico. Aps frustrar-se na tentativa de ganhar a
companhia dos Amigos, dos Parentes e da Riqueza, Todo-
mundo resolve apelar s Boas Aes. Minhas Boas Aes,
onde estais?. Essa busca que poderia gerar todo um percurso
dramtico no chega a se constituir. Imediatamente pergun-
ta, as Boas Aes respondem que esto ali, cadas e aprisio-
nadas no cho, devido impiedade e aos pecados do
interlocutor.
cmica a tolice de algum que no sabe do
paradeiro de alguma coisa, que est ali, a seus ps. A
imediatidade da rplica das Boas Aes implica um
dinamismo vibrante. Esse dinamismo , entretanto, distinto
do que se daria com o desdobramento do tempo dramtico de
uma procura, na qual a personagem, provavelmente, se
depararia com uma srie de obstculos at, finalmente,
encontrar as Boas Aes. H, na imobilidade que se pode
detectar em Todomundo, um dinamismo especfico que a
sustenta.
Existe um elenco pequeno de temas nas peas
medievais. Entre eles, muito comum o da morte como
castigo ou prestao de contas, em Todomundo ela se
aproxima.
A mensagem de Todomundo um alerta. Afirma
que a vida terreno transitria e que no retomaremos a ela.
Mas a estrutura da ao, como j vimos, de crculos e
voltas repetidas. Podemos dizer que existem informaes
diretas e indiretas.
Se h uma univocidade nos contedos religiosos sob
a forma de lio moral, a composio de personagens, como
o Diabo, e a estrutura geral da pea estabelecem certas ambi-
guidades nos efeitos sobre o pblico.
Imagens:
Ciclo espanhol da Paixo, cuja riqueza narrativa rivaliza com a das cenas
dos autos da Paixo. Acima, o beijo de Judas e os soldados levando Jesus.
Ao centro, o Glgota com a crucificao e os ladres; abaixo, a descida da
cruz; esquerda, Judas enforca-se numa rvore. Pgina em miniatura em
uma Bblia Sacra de vila, c. 1100 (Madri, Biblioteca Nacional).
Boca do Inferno de uma pea mitolgica barroca, apresentada num carro
alegrico do Prstito dos Deuses em Dresden, 1695, com a participao da
corte. Esboo para gravao em cobre (Dresden, Kupferschkabinett).
O TEATRO MEDIEVAL
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas - 1 ANO - EM 30
Grande ecce homo. Gravao em cobre de Lucas van Leyden, 1510.
Representao do Teatro Medieval
Auto de mistrio, representando o martrio de Santa Apolnia. direita, o
magister ludens envergando uma longa batina e segurando na mo esquerda
o libreto aberto e na direita a batuta de regente. Ao fundo, o Cu com uma
escada encostada e dois anjos sentados nos degraus mais altos; direita,
Boca do Inferno povoada de demnios. Miniatura de Jean Fouquet, c. 1460,
para o Livro das Horas de tienne Chevalier
(Chantilly, Muse Conde).
Palco de rua francs, c. 1540. Desenho
(Ms. 126, Cambrai, Bibliothque Municipale ).
Fontes Bibliogrficas:
BERTHOLD, Margot. Histria Mundial do Teatro.
So Paulo: Perspectiva, 2000.
Revista Tempo Brasileiro. Lgia Vassalo. Impresso nas
Oficinas da Folha Carioca Editora LTDA, Janeiro-
Maro de 1983.
O TEATRO MEDIEVAL
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas -1 ANO - EM 31
A Commedia dellArte
Introduo
As companhias de commedia dell'arte comearam a
se formar na segunda metade do sculo XVI, na Itlia; atingi-
ram o auge de popularidade e prestgio no sculo XVII, e en-
traram em declnio a partir do sculo XVIII. Como gnero de
teatro, a commedia dell'arte atravessou quase trs sculos e
vrios pases da Europa, exercendo fascnio e influncia em
diversos dramaturgos, encenadores e atores. Shakespeare,
Lope de Vega, Molire, Meyerhold, Dario Fo, dentre outros.
Este longo percurso no tempo e no espao e a cons-
tante necessidade profissional de adequao aos gostos e
costumes de diferentes plateias fizeram com que a commedia
dell'arte no s exercesse, mas tambm sofresse diversas in-
fluncias. Sua histria , portanto, a de suas contnuas trans-
formaes.
A denominao commedia dell'arte, s tardiamente
(sculo XVIII) atribuda a esta forma de teatro, assinala o
profissionalismo como um de seus elementos definidores. O
termo arte no deve ser entendido na sua acepo moderna,
vinculada a um conceito puramente esttico. Arte, no
italiano antigo, significava ofcio, mister, profisso. A
designao commedia dell'arte indica, portanto, um tipo de
habilidade especial, ou seja, capacidade e talentos
especficos para determinado trabalho ou funo. Destaca-se,
a, outra faceta da realidade daqueles cmicos. De fato, os
atores deste gnero, em sua grande maioria, eram tambm
acrobatas, bailarinos, cantores e msicos. A profisso exigia,
portanto, um rigoroso treinamento tcnico e demandava
habilidades fsicas - corporais e/ou vocais - especficas.
As Trupes
A Itlia, precursora do desenvolvimento capitalista
no Ocidente, atravessa, no sculo XVI, uma grave crise
econmica e social, que se intensifica a partir da segunda
dcada. A invaso da pennsula pela Frana e pela Espanha,
o saque de Roma em 1527 e a febre de especulao
financeira provocam o desemprego, a runa de diversas
atividades, a desagregao de determinados grupos sociais e,
consequentemente, o surgimento de novos pobres. neste
contexto de instabilidade poltica e econmica, que so
formadas as primeiras trupes, nascidas da necessidade de
sobrevivncia de pessoas de origens e formaes diversas.
Essa crise econmica, responsvel pela
decomposio de certos grupos sociais, originou tambm a
constituio de novas categorias profissionais e a ampliao
e diversificao do mercado de especializaes artsticas.
Este processo de transformao propiciou o aparecimento
das atrizes, ou seja, a chegada das mulheres aos palcos, uma
das inovaes da commedia dell'arte.
As trupes faziam apresentaes no s em feiras e
praas pblicas, onde tablados de madeira armados sobre
cavaletes de pau transformavam-se em palcos, mas tambm
nos teatros das cortes, a convite de nobres e prncipes.
A dramaturgia dos cmicos dell'arte nasce do ofcio
de representar daqueles atores itinerantes, que se
especializavam numa determinada personagem e a
interpretavam durante toda a vida, confundia-se, de certo
modo, com suas prprias trajetrias pessoais.
Embora as companhias tivessem vasto repertrio,
que abarcava os diferentes gneros e gostos teatrais da poca,
um certo tipo de representao, em especial, tornou-se um de
suas mais notrias e propagadas caractersticas. Tratava-se da
representao baseada em um roteiro, um esqueleto de ao,
denominado scenario ou canovccio, a partir do qual os
atores improvisavam. Estes roteiros, geralmente afixados
nos forros dos cenrios ou nos bastidores do palco,
indicavam apenas as personagens que participariam de cada
cena e a sequncia de acontecimentos que nela teria lugar. O
restante ficava por conta dos atores.
As trupes costumavam agrupar em mdia de oito a
doze atores, e estruturavam-se, fundamentalmente, a partir de
seus papeis, ou seja, personagens-tipo que constituam o
ncleo dinmico das companhias e tambm o seu ponto de
equilbrio. Os papeis fixavam os limites entre a expanso das
especializaes individuais dos atores e a harmonia coletiva.
As companhias fizeram sucesso, e muitas vezes
fortuna, na Itlia e em outros pases europeus, na Frana eles
alcanaram um enorme e especial prestgio, chegando,
inclusive, a ocupar as mais importantes salas de espetculo
daquele pas. Na Frana, onde era conhecida como comedie
italienne, teve um desenvolvimento autnomo, e constituiu
uma histria parte dentro da histria do gnero.
Os Personagens-Tipo
De modo geral, nas companhias, os papeis distribu-
am-se da seguinte forma:
a parte dos velhos (os pais e patres);
a parte dos servos, tambm chamados de Zanni, uma
abreviao do nome Giovanni, muito comum e popular
na Itlia;
a parte dos enamorados.
Os papeis organizavam-se quase sempre em duplas:
os velhos eram o Pantaleo e o Doutor;
os servos, Brighela e Arlequim (primeiro e segundo
Zanni).
Arlequim
A COMMEDIA DELLARTE
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas - 1 ANO - EM 32
Pantaleo
Os enamorados (amorosos e amorosas) eram os
papeis srios e os atores que os interpretavam no usavam
mscaras. Alis, as atrizes nunca representavam com
mscara, nem quando interpretavam as amorosas (Flvia,
Lavnia, Isabela, Rosalba, etc.), nem quando interpretavam as
criadas ou soubrettes (Esmeraldina, Franceschina, Co-
lombina, etc.).
Um outro personagem, o Capito, soldado fanfarro,
que fingia bravura e se fazia passar pelo que no era, tambm
poderia fazer a parte do segundo ou terceiro enamorado, s
que um enamorado bufo, ridculo, escarnecido pelas mu-
lheres. Por ser um personagem cmico, era representado com
mscara.
O uso da mscara marca fundamental, tanto assim,
que ela tambm foi chamada de commedia delle maschere.
Diferentemente das mscaras do teatro grego, essas no
expressavam dor nem alegria. Eram meias-mscaras
inexpressivas, que deixavam a descoberto a boca e a parte
inferior do rosto dos atores. Suas funes primordiais eram
provocar a imediata identificao das personagens pelo
pblico, preservar a tradio dessas personagens e destacar o
virtuosismo corporal dos atores, pois era atravs da
inclinao, ritmo e movimentos do corpo que as personagens
manifestavam os diferentes sentimentos e estados de esprito.
Mscara da Commedia dell'Arte
Os atores desenvolviam e aprimoravam a sua arte
nos limites entre a liberdade criadora e rigorosa disciplina e
preparao tcnica exigidas por este tipo de representao.
A diversidade de dialetos na Itlia do sculo XVI foi
um elemento a mais na configurao das personagens. Cada
uma delas, conforme sua origem, caracterstica e tipo social
que representava, falava um determinado dialeto.
Colombina
Pantaleo, mercador, comerciante avaro, falava o
veneziano, pois Veneza era uma das cidades mais
desenvolvidas em termos de comrcio.
O Doutor, mdico ou advogado, apreciador das
frases empoladas e das citaes em latim, em suma, uma
caricatura do falso sbio, falava o dialeto bolons, porque em
Bolonha ficava a mais antiga e importante universidade
italiana.
Os dois Zanni falavam, geralmente, o bergamasco,
dialeto de Brgamo, uma regio pobre da Itlia.
O Capito, soldado metido a conquistador de mulhe-
res, contador de vantagens e mentiras, falava com sotaque
espanhol, numa aluso clara e crtica aos soldados espanhis
que invadiram a Itlia e ali permaneceram por algum tempo.
Os amorosos e amorosas falavam toscano,
considerado o dialeto mais nobre entre todos.
O Doutor vestia-se todo de negro, Pantaleo de
preto e vermelho; Brighela de branco e verde; Arlequim
usava a famosa roupa de losangos coloridos que alguns
estudiosos da commedia dell'arte associam imagem de
retalhos remendados, dada a condio social representada por
esta personagem.
Dottore
A COMMEDIA DELLARTE
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Apostila Artes Cnicas -1 ANO - EM 33
Pantaleo
Fratelino
Scaramouche
Pulcinella
Os Atores
Alguns atores, por sua beleza ou talento,
conquistaram grande fama e fortuna, porm isto no se
generalizou, pois muitos relatos nos trazem duras realidades
s quais os atores se submetiam, chegando, s vezes, a
representar em troca de alimento.
Isabela Andreine, que emprestou o seu nome a
personagem que interpretava, o que era raro acontecer, unia
talento, beleza e cultura, e tornou-se uma das atrizes mais
famosas de seu tempo. Isabela pertencia a vrias academias e
era uma latinista renomada. Sua morte, em Lyon, foi um
acontecimento que repercutiu em toda a Europa. Francesco
Adreine, marido de Isabela, era poeta e falava francs,
eslavo, turco e grego. Francesco foi tambm o criador e
intrprete de um famoso personagem: Capito Spavento.
Flamnia Riccoboni tambm era versada em diversas lnguas;
Diana Ponti, alm de atriz, era poetisa famosa. A commedia
dell'arte no se constituiu apenas de proezas atlticas e de
puro gesto, mas sim de habilidades diversas.
O Improviso
O improviso no era pura espontaneidade, nem
exatamente uma criao de momento. Improvisar significava
recombinar elementos de uma estrutura que, apesar de
mvel, apresentava uma organizao interna at certo ponto
rigorosa.
Alm disso, por interpretarem sempre os mesmos
personagens, os atores, na verdade, estudavam e ensaiavam
os seus papeis durante toda a vida. O chamado improviso
era fruto, portanto, de um slido treinamento. Pode-se dizer
que a improvisao na commedia dellarte diz respeito,
muito mais, utilizao de uma espcie de tcnica de
montagem (de gestos, falas reaes etc.) do que,
propriamente, uma inveno de ltima hora.
Os Lazzi
Os Lazzi tinham, efetivamente, a funo de
interligar as cenas e preencher os espaos e tempos vazios,
eventualmente gerados pela representao improvisada.
O Texto
Esse teatro nasce impulsionado pelo surgimento de
uma nova atividade e categoria profissional, e mesmo no
tendo se desenvolvido a partir do f1orescimento de uma
dramaturgia especfica, pensada em termos estritamente
literrios, a commedia dell'arte no deixou de produzir textos
e de reformar, atravs do cotidiano cnico, a dramaturgia
existente. Tanto assim que influenciou alguns dos mais
A COMMEDIA DELLARTE
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas - 1 ANO - EM 34
importantes dramaturgos dos sculos XVI, XVII e XVIII.
No se pode dizer, portanto, que essa forma teatral
tenha sido, efetivamente, um teatro sem texto. Foi, isso
sim, um gnero de teatro que atribuiu outra funo e
dimenso ao texto, diferentes daquelas que predominam na
histria do teatro ocidental. Do mesmo modo, no se pode
dizer que tenha sido um teatro do improviso, tal como
entendemos esta palavra hoje, nem um teatro de puro
gesto, embora as palavras, frases de efeito e citaes
adquiram, algumas vezes, na commedia dell'arte, o valor de
gestos.
Fonte Bibliogrfica:
NUEZ, Carlinda Fragale Pate. O Teatro Atravs da
Histria: O Teatro Brasileiro. Introduo: Tnia Brando.
Rio de Janeiro: Centro Cultural Banco do Brasil, Entourage
Produes Artsticas, 1994. 1v.
Apostila do PAS Artes Visuais e Artes Cnicas Editora
Exato: 2 Ano.
A COMMEDIA DELLARTE
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Apostila Artes Cnicas -1 ANO - EM 35
O Teatro Jesutico
Introduo
O teatro foi uma ferramenta bastante utilizada pelos
padres da Companhia de Jesus no mbito pedaggico. Tanto
na Europa quanto no Brasil, os padres escreviam peas de
teatro que auxiliavam no somente na instruo de seus
alunos, mas tambm no ensinamento dos dogmas catlicos.
O uso do teatro como uma ferramenta didtica datado do
sculo XVI. Esse foi o perodo que inaugurou o uso do teatro
nas escolas jesuticas na Europa e no Brasil, destacando-se o
perodo entre as peas produzidas no Brasil-Colnia pelo
padre Jos de Anchieta, que juntamente com outros escritos
desse jesuta, inauguraram a literatura em terras brasileiras.
Ao se compreender a atuao dos padres jesutas,
possvel se compreender tambm parte da histria da
educao. No caso das colnias, os padres jesutas
sistematizaram o ensino e atuaram junto aos ndios com uma
misso civilizadora, que inclua os ensinamentos cristos, no
caso catlicos, por meio da catequese, mas tambm fazia
parte de um projeto maior: o projeto colonizador dos pases
europeus. Mais que instruir os indgenas, era importante
educ-los para conviver naquela nova sociedade que se
configurava, em um contexto mercantilista.
A Companhia de Jesus
A Companhia de Jesus, Ordem fundada por Incio
de Loyola em 1539, e aprovada pela bula papal Regimini
Militantis Ecclesiae no ano de 1540, foi importante no
contexto da chamada Contra Reforma Catlica. Um dos
objetivos da nova Ordem era impedir o avano protestante,
como tambm conquistar novos fiis. Nesse sentido, o
contexto dos descobrimentos e das Grandes Navegaes,
possibilitou que a Companhia de Jesus, juntamente com o
tribunal da Santa Inquisio, fosse uma importante arma da
Igreja Catlica na Contra-Reforma.
Os padres jesutas atuaram como confessores de reis
e prncipes, diplomatas, pregadores e principalmente
educadores; este ltimo foi sem dvida, o papel mais
importante que os jesutas exerceram, e tambm o que lhes
rendeu mais frutos.
Como haviam se colocado inteiramente a servio da
Igreja, compreenderam facilmente que seria atravs da
educao, especialmente de lideranas, que poderiam ajudar
a Igreja a reconquistar gradualmente grande parte dos pases
e naes que haviam aderido ou estavam aderindo s novas
doutrinas. (SCHIMITZ, Egdio, 1994, p. 129)
Pouco tempo aps a fundao da Ordem, inmeras
instituies de ensino foram fundadas pelos jesutas, tanto na
Europa quanto nas colnias onde havia misses jesuticas. Os
padres da Companhia de Jesus foram os primeiros a
sistematizar o ensino no chamado Novo Mundo. As misses
foram possveis nas terras recm-descobertas, uma vez que
os primeiros pases colonizadores eram pases catlicos:
Portugal e Espanha, o que alimentou a veia missionria da
Ordem devido unio entre Estado e igreja catlica, unio
esta, denominada Padroado. Como Ordem oficial da
empreitada colonial tanto portuguesa quanto espanhola, os
padres jesutas catequizaram os ndios, conquistando, desta
maneira, novos fiis para a igreja catlica, ento defasada
devido adeso de alguns pases ao protestantismo. Alm da
catequese dos ndios, coube aos padres jesutas tambm
instruir os filhos dos colonos, e cuidar para que os colonos
que estavam em terras to distantes da Europa no se
desviassem dos dogmas catlicos.
Tanto nos colgios europeus quanto nas colnias,
os jesutas utilizaram, ainda que com objetivos diferentes, um
importante recurso para a catequizao e instruo: o teatro.
Com a finalidade no somente de entretenimento, nas mos
dos padres jesutas o teatro assumiu um carter didtico,
sendo utilizado constantemente no ano escolar jesutico
como importante instrumento pedaggico.
O teatro como ferramenta didtica
O teatro foi um recurso muito utilizado pelos padres
da Companhia de Jesus, principalmente com intuito
catequtico. Na Europa, no Brasil, ou em qualquer outra
parte do mundo onde houvesse um colgio jesutico, temos
referncias quanto utilizao do teatro enquanto
instrumento pedaggico. No podemos atribuir ao trabalho
educacional jesutico, a introduo do teatro no espao
escolar como recurso didtico, uma vez que os jesutas no
inventaram o drama escolar, mas o cultivaram num nvel
alto por um longo perodo de tempo, como afirma OMalley.
O drama escolar, portanto, j era utilizado, mas foi nos
colgios jesuticos em todo o mundo que o mesmo alcanou
grandes propores, sendo adotado como recurso para o
processo de aprendizagem.
Havia uma rgida regulamentao para escrever e
apresentar peas de teatro nos colgios jesuticos. Apesar das
normas rgidas muitas peas eram representadas e esperadas
com entusiasmo: Duas ou mesmo trs peas por ano eram
produzidas regularmente em alguns colgios durante o sculo
XVI. (O MALLEY, 2004, p. 350). Isto nos mostra a
coerncia interna e a rigidez hierrquica da prpria ordem, e
que havia uma regra maior que regulamentava o ensino,
inclusive a escrita dos textos que seriam utilizados nos
colgios, fossem eles excertos de textos clssicos ou mesmo
peas de teatro.
O teatro jesutico no Brasil
Jos de Anchieta, que chegou ao pas em 1553, foi o
primeiro a escrever peas teatrais no Brasil. Os prprios
ndios, alunos das escolas criadas pela ordem, que
interpretavam as peas escritas em portugus, espanhol, latim
e tupi.
Uma caracterstica inconfundvel dos textos de
Anchieta a unio dos temas nativos e cristos,
representados nas peas por personagens indgenas e por
santos da igreja catlica. Tal unio conseguia atrair ainda
O TEATRO JESUTICO
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas - 1 ANO - EM 36
mais o pblico-alvo de Anchieta, que eram os ndios,
inclusive com a participao dos mesmos nas representaes.
As apresentaes eram realizadas em igrejas,
colgios ou ao ar livre. E os elementos cenogrficos eram
bastante desenvolvidos para a poca.
A partir do sculo XVII e ao longo de grande parte
do sculo XVIII, o teatro jesutico comea a se tornar
escasso, no entanto com a colnia desenvolvendo atividades
econmicas que produziam alguns centros de riqueza, o
teatro passou a fazer parte das atividades cvicas e religiosas.
Alm da capital, Salvador, o Rio de Janeiro e reas de
minerao de ouro, como Vila Rica e Cuiab, contavam com
montagens em festas em que tambm havia cavalhadas,
celebraes de santos e atos oficiais. As ruas, as igrejas e as
casas de autoridades eram os palcos dessas encenaes
totalmente amadoras. Todos interpretavam: padres, freiras,
ndios, escravos alforriados, portugueses recm-chegados,
jovens brasileiros e, dependendo da ocasio, prostitutas.
Verses portuguesas de peas francesas, de
tragdias clssicas, de peras italianas e comdias e dramas
portugueses, entravam no circuito de teatro amador da
colnia. Mas o repertrio barroco espanhol, com obras de
Caldern de La Barca, Lope de Vega e Antonio de Sols, era
a grande sensao.
Padre Anchieta
Jos de Anchieta nasceu
em famlia rica, numa
das sete ilhas Canrias,
de onde avistava os
navios que se abasteciam
no porto de Tenerife para
seguir rumo ao Oriente
ou ao Novo Mundo. O
pai era um nobre basco, e
a me, uma judia
conversa. Aos 14 anos, foi estudar em Coimbra (Portugal).
Sentia a vocao religiosa e, em 1551, foi admitido como
novio no colgio jesuta da Universidade de Coimbra.
Em 1553, com 19 anos, foi convidado a vir para o
Brasil como missionrio, acompanhando Duarte da Costa, o
segundo governador-geral nomeado pela Coroa. No incio de
1554, chegou a So Vicente, a primeira vila fundada no
Brasil por Martim Afonso de Sousa. L, teve o primeiro
contato com os ndios.
No mesmo ano, junto com o jesuta portugus
Manuel da Nbrega, subiu a serra do Mar at o planalto que
os ndios denominavam Piratininga, ao longo do rio Tiet. Os
dois missionrios estabeleceram um pequeno colgio e, em
25 de janeiro de 1554, celebrou-se ali a primeira missa.
Anchieta comeou o trabalho de converso, batismo e
catequese.
Para os ndios, foi mdico, sacerdote e educador:
cuidava do corpo, da alma e da mente. Na catequese, usava o
teatro e a poesia, tornando a aprendizagem um processo
prazeroso. Ensinou latim aos ndios, aprendeu tupi-guarani
com eles e (seguindo a tradio missionria, que mandava
assimilar e registrar os idiomas) escreveu a Arte da
Gramtica da Lngua Mais Falada na Costa do Brasil,
publicada em Coimbra em 1595.
O colgio de So Paulo de Piratininga, como era
chamado, logo expandiu seu ncleo. Mas, ao longo do litoral
de So Paulo, Rio de Janeiro e Esprito Santo, as tribos
formaram uma aliana (conhecida como Confederao dos
Tamoios) que atacou So Paulo diversas vezes entre 1562 e
1564.
Anchieta e Nbrega tiveram um conflito com
Duarte da Costa e decidiram iniciar as negociaes de paz
com os tamoios em Iperoig (hoje Ubatuba). Anchieta,
falando tupi-guarani e viajando por toda aquela costa, foi
crucial para ganhar a confiana dos ndios e, aps muitos
incidentes, estabeleceu-se a paz entre tamoios, tupinambs e
portugueses. Nessa poca, Anchieta escreveu o Poema em
Louvor Virgem Maria, com 5.732 versos, alguns dos quais
traados nas areias das praias.
Em 1565, entrou com Estcio de S na baa de
Guanabara, onde estabeleceram os fundamentos do que viria
a ser a cidade de So Sebastio do Rio de Janeiro. Dali,
Anchieta seguiu para Salvador, onde foi ordenado sacerdote.
Por ocasio dessa viagem, novamente pisou em terras
capixabas. Em 1567, voltou para o Rio e para So Vicente.
Nessa ltima, permaneceu dez anos, quando foi nomeado
provincial (supervisor) dos jesutas no Brasil.
Em 1585, fundou a aldeia de Guaraparim (hoje
Guarapari), no Esprito Santo. Morreu aos 63 anos em
Reritiba, atual Anchieta. Os ndios levaram seu corpo numa
viagem de 80 quilmetros at Vitria, onde foi sepultado.
Anchieta, chamado o Apstolo do Brasil, foi
beatificado em 22 de junho de 1980 pelo Papa Joo
Paulo II.
Fonte Bibliogrfica:
ARNAUT DE TOLEDO, C. A.; RUCKSTADTER, F.
M. M. A filosofia educacional dos jesutas nas
Cartas do Pe. Jos de Anchieta. In: Acta
Scientiarum, Maring, vol. 25, 2003, p. 257-265.
HESSEL, L.; RAEDERS, G. O Teatro Jesutico no
Brasil. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 1972.
MELO, A. M. M. Teatro Jesutico em Portugal no
Sculo XVI. Lisboa: Fundao Calouste Gulbenkian,
2004.
O MALLEY, J. W. Os Primeiros Jesutas. So
Leopoldo: UNISINOS; Bauru: Edusc, 2004.
PRADO, D. de A. Teatro de Anchieta a Alencar. So
Paulo: Perspectiva, 1993.
Revista Bravo. Para entender o teatro Brasileiro,
Dbora Pinto (pgs. 9 e 10)
SCHMITZ, E. Os Jesutas e a Educao: a filosofia
educacional da Companhia de Jesus. So Leopoldo:
Unisinos, 1994.
Sites consultados:
Czar de Alencar Arnaut de Toledo, Flvio Massami
Martins Ruckstadter e Vanessa Campos Mariano
Ruckstadter. O Teatro Jesutico na Europa e no Brasil
no Sculo XVI. Disponvel em
<http://www.histedbr.fae.unicamp.br/navegando/artigos
_frames/artigo_031.html>
UOL Educao. Jos de Anchieta. Disponvel em
http://educacao.uol.com.br/biografias/jose-de-
anchieta.jhtm
O TEATRO JESUTICO
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas -1 ANO - EM 37
A Cultura Popular
Significado de Cultura
A palavra Cultura provm do latim medieval
significando cultivo da terra. Do verbo latino original
colo que igual a cultivar, que juntando a cultum, forma
a palavra cultura. (SANTOS, 1999, p. 01).
Antropologicamente sabemos que a cultura o
conjunto de experincias humanas adquiridas pelo contato
social e acumuladas pelos povos atravs do tempo. (Idem)
Ainda remetendo ao conceito antropolgico do
termo cultura, Bosi encontra a seguinte explicao:
(....) imaginrio do povo formalizado de tantos modos
diversos, que vo desde o rito indgena ao candombl, do
samba-de-roda festa do Divino, das Assembleias
Pentecostais tenda de umbanda, sem esquecer as
manifestaes de piedade do catolicismo que compreende
estilos rsticos e estilos cultos de expresso (BOSI, 1996, p.
323).
No se pode limitar o pensamento em relao
cultura, apenas como manifestao cultural, tem-se que
pensar como parte da trajetria da raa humana, como a
marca deixada do homem e da mulher na histria do mundo.
Uma vez que o ato que gera a cultura a criao, a inveno,
a transformao. E trabalhar com a cultura trabalhar com a
revoluo do prprio corpo e pensamento, no tempo e no
espao, a todo instante, trabalhando o momento de crtica e
de construo, de continuidade e percepo. Porque a cultura
faz com que o indivduo se olhe no espelho e se reconhea
como o prximo, como o outro, como o diferente, como o
igual, como o negro e o branco, trabalhando nas mltiplas
possibilidades.
A cultura, por seu turno, traduz sempre algo que
conecta criador e criatura. Logo, um poeta escreve um verso
assim como um legislador formula uma lei. No intuito de
exteriorizar, verbalizar, desenhar traos culturais, cuja matiz
ideolgico pode se aproximar mais deste ou daquele
segmento pensante do todo social. Sem nunca, entretanto,
despojar-se completamente de vnculos viscerais de afinidade
com o aglomerado populacional no qual (ou para o qual)
forjado.
Conceito de Cultura Popular
Um conceito simples e direto diz que Cultura
Popular o conjunto de experincias adquiridas, imaginadas,
criadas e recriadas pela maioria, contemplando suas
tradies, costumes, modos, valores, crenas, folguedos,
expresses artsticas, ideias, aes do cotidiano e
conhecimentos. (SANTOS, 1999, p. 03).
Segundo Bosi:
Cultura popular implica modos de viver: o alimento, o
vesturio, a relao homem-mulher, a habitao, os hbitos
de limpeza, as prticas de cura, as relaes de parentesco, a
diviso das tarefas durante a jornada e, simultaneamente, as
crenas, os cantos, as danas, os jogos, a caa, a pesca, o
fumo, a bebida, os provrbios, os modos de cumprimentar, as
palavras tabus, os eufemismos, o modo de olhar, o modo de
sentar, o modo de visitar e ser visitado, as romarias, as
promessas, as festas do padroeiro, o modo de criar galinha e
porco, os modos de plantar feijo, milho e mandioca, o
conhecimento do tempo, o modo de rir e de chorar, de agredir
e de consolar... (BOSI, 1996, p. 324).
A Cultura Popular tambm pode ser definida como
qualquer manifestao cultural (dana, msica, festas,
literatura, folclore, arte, etc.) em que o povo produz e participa
de forma ativa. As manifestaes culturais de um povo so as
razes de uma nao, a sua marca e traz consigo as
histrias e lendas do seu passado, conscientizando as pessoas
do caminho traado at chegarmos aos dias atuais. Um povo
que preserva sua cultura sabe direcionar o caminho a ser
traado e possui identidade prpria.
O conceito dessa forma de cultura recente. Est
relacionado ao processo de urbanizao que ocorre a partir
do sculo XVIII. Esta cultura divulgada pelo Romantismo,
ocupou no imaginrio da burguesia oitocentista, as memrias
de uma sociedade que estava a desaparecer. Aparece
retratada, nesse imaginrio, uma cultura feita por
camponeses. Smbolo de um povo idealizado, puro e feliz na
sua ignorncia.
A imagem deste povo identifica-se aos olhos dos
romnticos com o esprito nacional. Os seus costumes, seus
usos, romances e cantares do origem a um novo conceito de
Folclore, expresso deste saber ancestral preservada pelo
povo.
Essa forma cultural aparece sempre ligada ao povo,
s classes excludas socialmente, s classes dominadas.
Vemos que ela no est ligada ao conhecimento cientfico, ao
contrrio, ela est relacionada ao conhecimento espontneo,
ao senso comum.
Bosi afirma:
A Cultura Popular pertence, tradicionalmente, aos estratos
mais pobres, o que no impede o fato de seu aproveitamento
pela Cultura de Massas e pela Cultura Erudita, as quais
podem assumir ares popularescos ou populistas em virtude da
sua flexibilidade e da sua carncia de razes. (BOSI, 1996, p.
326).
Ao contrrio da cultura de elite, a cultura popular
surge das tradies e costumes e transmitida de gerao para
gerao, principalmente, de forma oral.
Popular, segundo o Aurlio, guarda cinco possveis
variantes, sem que, entretanto, nenhuma delas lhe esgote o
contedo em definitivo. Vejamos:
Do, ou prprio do povo;
Feito para o povo;
Agradvel ao povo, que tem as simpatias dele;
Democrtico;
Vulgar, trivial, ordinrio, plebeu.
Infere-se que o adjetivo popular, quando adotado em
parceria com o vocbulo cultura restringe, aparentemente, o
teor desta, toldando-lhe a prpria abordagem conceitual. Em
outras palavras, podemos situar cultura popular apenas como
uma cultura relacionada ao povo. A palavra povo, por sua
vez, possui diversas implicaes ideolgicas. Pode-se
compreender povo como nao e at mesmo, como querem
alguns, como sinnimo de plebe ou simplesmente multido.
O mais importante na arte popular o prprio
artista, e no o objeto produzido. Um homem/artista do povo,
do meio rural ou das periferias das grandes cidades. Isso nos
leva a crer que este tipo de arte sempre contempornea a
seu tempo.
A CULTURA POPULAR
COLGIO JK
Apostila Artes Cnicas - 1 ANO - EM 38
O artista popular no se preocupa em expor suas
obras em lugares prestigiados. A melhor galeria de arte para
esse artista, o meio do povo. Locais de grande circulao.
Esse artista realmente vai onde o povo estar.
O conceito desse tipo de cultura revela-se hoje
limitado no sentido de descrever a prpria realidade social
dos campos. sabido que as comunidades rurais esto
impregnadas de valores prprios da cultura de massas, sem
terem abandonado por completo as suas referncias culturais.
Isto nos leva a identificar uma cultura intermediria em fase
de rpida integrao na cultura de massas.
Esta cultura frequentemente fragmentada em
mltiplas manifestaes: a arte, o teatro, o folclore, a msica,
a arquitetura, as festas e romarias, a culinria, a poesia, os
jogos e os divertimentos.
O artista popular tira sua inspirao de
acontecimentos locais, o que nos mostra que a arte popular
regional. E por isso, bastante afetada pela Cultura de
Massas, que atinge a todas as regies igualmente e procura
homogeneiz-la.
Sabemos que esta cultura conservadora e
inovadora. Ela tanto ligada tradio, como incorpora
novos elementos culturais.
Muitas vezes a utilizao de elementos modernos
pela Cultura Popular, a transformao de algumas festas
tradicionais em espetculos para turistas ou a
comercializao de produtos da arte popular so, na verdade,
modos de preservar a Cultura Popular a qualquer custo e
de seus produtores terem um maior alcance do que o pequeno
grupo de que fazem parte.
Para Peter Burke o termo cultura nos fala de uma
ampliao do conceito em tempos mais ou menos recentes.
Segundo o historiador, at o sculo XVIII, o termo cultura
tendia a referir-se apenas arte, literatura e msica.
Os estudos sobre folclore e cultura popular no
Brasil, se iniciam na segunda metade do sculo XIX, sob os
auspcios da construo de uma identidade nacional.
O Brasil, pas integrado perifericamente no sistema
capitalista internacional, tardou um pouco a discutir a
questo nacional e s ento no sculo XIX, que se inicia a
busca do carter e da identidade nacional.
Preservar a cultura popular preservar a identidade
do povo. deixar para geraes futuras caractersticas de um
povo que viveu e escreveu sua histria na pgina da vida.
Fonte Bibliogrfica:
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A CULTURA POPULAR