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Modelos de entendimento do processo de emagrecimento

Prof. Dr. Tony Meireles dos Santos

Resumo A tendncia de aumento da massa corporal que v em se delineando nos ltimos tempos tem motiv ado o surgimento de div ersas estratgias de emagrecimento. A recomendao de uma ativ idade aerbia de baixa intensidade e longa durao, com o objetiv o de maximizar o metabolismo das gorduras, um dos exemplos das estratgias criadas pelos profissionais da rea de sade, muitas v ezes sem fundamentao cientfica adequada. Com o intuito de confrontar as estratgias comumente praticadas, foram criadas duas categorias de procedimentos, denominadas neste documento como Modelo Matemtico e Modelo Metablico. A primeira engloba as condutas que tm por finalidade promov er um balano energtico negativ o e a segunda, promov er um aumento do metabolismo das gorduras. Os objetiv os do presente documento foram: a) discutir os pressupostos conceituais que fundamentam as duas categorias ora definidas e estabelecer suas sustentaes tericas; e b) apresentar as estratgias de orientao da ativ idade fsica com base no modelo matemtico. Pde-se concluir que os pressupostos tericos que fundamentam as prticas baseadas no Modelo Metablico so carentes de ev idncias cientficas que a sustentem, sendo recomendado para orientao de programas de emagrecimento as condutas e pressupostos relacionados ao Modelo Matemtico. Unitermos: Emagrecimento. Prescrio de exerccio. Metabolismo. A bstract The body weight gain tendency that has been being delineated lately has been motiv ating the appearance of strategies for weight reduction. The recommendation of a low intensity and long duration aerobic activ ity , with the aim of maximizing fat metabolism is one of the strategies created by health professionals but they lack scientific back ground. In order to confront the commonly used strategies, two categories of procedures were created, named in this paper as Mathematical Model and Metabolic Model. The first model includes the procedures related to the promotion of a deficit in energy balance and the second one includes the procedures related to the increase of fat metabolism. The objectiv es of the present paper were: a) to discuss the conceptual basis that supports both categories and to establish its theoretical support; b) to present the strategies to prescribing exercises based on the Mathematical Model. It could be concluded that the theoretical basis behind the Metabolic Model lack scientific ev idences, thus it's recommended the prescription of the procedures and ideas related to the Mathematical Model in order to achiev e weight loss. Keywords: Weight loss. Exercise prescription. Metabolism. http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Ao 12 - N 112 - Septiembre de 2007 1/1

Introduo
O excesso de massa corporal e a obesidade, normalmente estabelecidos a partir do ndice de massa corporal (IMC - massa em quilos dividida pela estatura em metros ao quadrado), maior ou igual a 25 e 30 kg.m-2 respectivamente, tem aumentado nos ltimos anos de forma alarmante, a ponto de serem classificados como epidemia (FLEGAL, 1999). Ao contrrio do que muitos podem pensar, tal problema no acomete somente a sociedade Norte Americana. O mesmo estudo demonstrou que a tendncia de ganho de massa corporal mundial, atingindo pases com diferentes nveis scio-econmicos, inclusive o Brasil. Estudos transversais, realizados regularmente nos EUA, tm demonstrado uma clara tendncia de crescimento das taxas de obesidade e sobrepeso. Entre 1960 e 1962, cerca de 48% dos homens e 39 % das mulheres apresentavam excesso de massa corporal (IMC > 25 kg.m-2). Entre 1988 e 1994, registrou-se um crescimento alarmante, quando o sobrepeso atingia 59 % dos homens e 50 % das mulheres, significando um crescimento de 22,9 % e 28,2 %, respectivamente (USDHHS, 1998). Especificamente em relao a obesidade (IMC > 30 kg.m-2), sobre a qual diversas evidncias demonstram clara agresso sade e qualidade de vida em sade, observou-se uma prevalncia de 34 % da populao adulta Norte Americana (KUCZMARSKI et al., 1994). Segundo as metas populacionais de sade traadas pelo Healthy People 2000, esperava-se que no ano dois mil esta prevalncia estivesse em torno de 20 % (NCHS, 1997). Ao contrrio das expectativas, os valores vm crescendo. Como resultado deste crescimento da populao com excesso de massa, cresce paralelamente o nmero de servios para esse pblico. Evidncias disso podem ser encontradas no alto nmero de especialistas em perda de massa, constantes lanamentos de dietas da moda, produtos milagrosos, centros de tratamento (Spas e centros de atividade fsica), apelos televisivos, entre outros. Parece ser a rea de emagrecimento um dos mais novos mistrios da era moderna, direcionando a ateno de diversos segmentos da sociedade para este tpico, que por sua vez paga um preo elevado pela alta prevalncia de obesidade. As conseqncias para a sade do indivduo que apresenta excesso de gordura parecem estar bem estabelecidas. Problemas como coronariopatia, hipertenso arterial sistmica, diabetes mellitus tipo II, alteraes plasmticas de lipdeos, litase biliar, gota, cncer, distrbios psico-sociais, osteoartrite, sedentarismo entre outros, j foram amplamente relacionados obesidade (USDHHS, 1998).

Em ltima anlise, a conseqncia de todos esses problemas relacionados ao excesso de gordura um aumento considervel nas taxas de mortalidade e morbidez, alm de um considervel custo econmico, tanto para o governo, quanto para os indivduos acometidos. Com a finalidade de contornar esta situao, pode-se observar a grande variedade de procedimentos para a perda de massa, fato este que j era de se esperar visto o quo rentvel esse mercado de atuao. Em relao ao entendimento do processo de emagrecimento, o discurso dos profissionais de sade tem como paradigma duas grandes correntes de recomendao para o emagrecimento, at ento no documentadas e/ou declaradas formalmente: uma baseada na matemtica energtica entre o que gasto e o que ingerido; e a outra que visa maximizar o metabolismo das gorduras. O objetivo deste documento foi discutir os pressupostos conceituais que fundamentam as duas categorias de procedimentos ora definidos e estabelecer suas sustentaes tericas, possibilitando assim, a partir de uma compreenso mais abrangente do assunto, mais chances de sucesso no processo de orientao para a perda de massa. O desenvolvimento do texto focalizou os motivos e justificativas que levam os profissionais a recomendar certos tipos de estratgias a fim de atingir as metas de emagrecimento. A presente reviso visou, ainda, apresentar as estratgias de orientao da atividade fsica com base no modelo matemtico, i.e. utilizando o dispndio energtico das atividades e suas relaes com o emagrecimento. Modelos tericos de entendimento do emagrecimento Apesar de jamais terem sido definidos na literatura nacional ou internacional, os discursos dos profissionais de sade referentes s causas do emagrecimento podem ser divididos em duas categorias: de um lado, uma corrente que acredita na associao entre uma dieta balanceada e a necessidade de uma restrio energtica adequada para a diminuio da gordura corporal e, do outro, defensores das idias relativas importncia da maximizao da utilizao das gorduras como fonte primria de energia para o metabolismo energtico. A princpio, parecem os dois modelos tratar do mesmo assunto, contudo suas fundamentaes contm importantes diferenas. Numa anlise emprica, no baseada em achados ou relatos cientficos, os profissionais que atuam direta ou indiretamente no processo de perda de massa tm suas idias enraizadas em uma das duas correntes. No incomum, ainda, profissionais que se valem das duas correntes para justificar suas condutas. No se tem informao sobre a origem dessa dicotomizao conceitual, contudo pode-se observar claramente sua existncia no discurso dos profissionais que atuam na rea de emagrecimento, em especial os de atividade fsica. Por tal discusso se tratar de mais uma taxionomia relacionada ao metabolismo energtico, para fins didticos, tais correntes foram aqui definidas como Modelo Metablico e Modelo Matemtico de entendimento do processo de emagrecimento, cujas caractersticas encontram-se no Quadro 1.

Infelizmente, o processo de classificao leva muitas vezes a um extremismo. Algumas condutas profissionais se valem de princpios caractersticos aos dois modelos apresentados, contudo tal atitude parece estar desvinculada de qualquer pressuposto. Pode-se considerar, ento, tal conduta como uma no adeso fiel a um dos modelos ora categorizados, que pode ser fruto de uma baixa fundamentao terica, ou ainda de uma confuso de princpios. Enquadram-se nesta situao aquelas recomendaes que por um lado prezam uma dieta balanceada hipocalrica (modelo matemtico) e por outro lado preconizam uma atividade aerbia de baixa intensidade e longa durao com o intuito de se consumir mais gordura (modelo metablico). Na verdade, esta confuso de princpios , provavelmente, a mais observvel entre os profissionais que atuam na orientao para a perda de massa. Consideraes sobre o modelo metablico Os organismos vivos dependem das reaes de transformao de energia para sua subsistncia. Os intercmbios na natureza entre as manifestaes de energia (qumica, eltrica, trmica, radioativa, luminosa e mecnica) garantem aos animais a capacidade de viver, se locomover, manterem-se aquecidos etc. Os seres humanos, entre outros animais, possuem as vias aerbia e anaerbia de transformao de energia, sendo esta segunda subdividida em ltica e altica. Para que haja a converso energtica necessria aos processos vitais do organismo, as trs vias interagem entre si num processo contnuo. De acordo com as condies da atividade, ora um sistema se sobressai, ora outro.

No existe uma ordem preestabelecida de solicitao dos sistemas, contudo, pelas nossas caractersticas fisiolgicas, o sistema aerbio o responsvel principal pelo equilbrio dos outros dois sistemas. Sua capacidade de transformao de energia, sob condies de esforo de baixa intensidade, quase ilimitada, sendo esta via tambm a nica com a capacidade de metabolizao de todos os substratos energticos. Enquanto a via anaerbia altica utiliza somente o sistema dos fosfagnios (ATP - CP), e a anaerbia ltica somente a glicose, o sistema aerbio capaz de utilizar os trs macronutrientes normalmente ingeridos numa dieta diria balanceada: carboidratos, gorduras e protenas (MCARDLE et al., 2001). Vale ressaltar ainda que o sistema aerbio o responsvel pela ressntese da fosfocreatina durante o perodo de recuperao ou diminuio da carga de trabalho, e ainda pela metabolizao de aproximadamente 70 % de todo lactato formado durante o exerccio (POWERS & HOWLEY, 2004). Alm daquilo que ingerido diariamente e fica disponvel para utilizao a partir dos processos digestivos, os organismos possuem um considervel estoque destes nutrientes, sendo o principal a gordura subcutnea, como mostra a Tabela 1.

Os mecanismos de ajuste que determinam qual dos substratos prioritariamente metabolizado so bastante complexos. Essa seleo fruto de uma interao entre diversos fatores que direcionam os processos metablicos para o substrato mais adequado situao imposta. Apesar de atualmente se conhecer muito mais sobre a participao das protenas (aminocidos) no metabolismo aerbio, sua colaborao percentual direta no processo continua sendo, na maioria das vezes, desprezvel. Estima-se em aproximadamente 2 % nas atividades com durao menor que uma hora e entre 5 a 15 % ao final de uma atividade com aproximadamente trs a cinco horas (POWERS & HOWLEY, 2004). Os carboidratos e, principalmente, as gorduras (na forma de cidos graxos livres - AGL's) que garantem combustvel suficiente s necessidades dirias do organismo. Segundo strand & Rodahl (1992), a utilizao da fonte energtica determinada pelos seguintes fatores de natureza bioqumica e fisiolgica: a. Ingesto de Carboidratos: uma ingesto alta de carboidratos determina um direcionamento do metabolismo para este substrato, basicamente pela ao da insulina que secretada quando os nveis glicmicos se elevam e pela sua ao inibidora sobre a enzima lipase hormnio sensvel, que faz a mobilizao dos triglicerdeos estocados nos adipcitos; b. Nveis Plasmticos de AGL's: a disponibilidade plasmtica de cidos graxos livres tambm determinante para a taxa de utilizao das gorduras. A regulao dos nveis plasmticos de AGL durante a atividade fsica depende da ao da adrenalina (hormnio que atua na mobilizao da gordura acumulada); nveis sangneos de lactato (que inibem a mobilizao dos AGL's pela lipase); e concentraes do hormnio de crescimento; c. Nveis de Cortisol Plasmticos: hormnio secretado pelo crtex adrenal durante atividade fsica e mental que cataboliza os aminocidos formando glicose. Atua tambm na mobilizao de AGL a partir do tecido adiposo e impede a entrada da glicose na clula, obrigando a utilizao das gorduras como fonte de energia; d. Ingesto de Cafena: a ingesto de cafena, na forma de caf normal, direciona o metabolismo para os AGL's economizando assim as reservas de glicognio. Em uma excelente reviso sobre o assunto, POWERS & HOWLEY (2004) descreveram os diversos fatores que determinam o direcionamento do metabolismo para a via glicoltica ou lipoltica a partir do volume e intensidade das atividades fsicas realizadas. a. Intensidade do Exerccio: um dos fatores principais no direcionamento do substrato energtico a ser metabolizado. Pela maior complexidade das reaes, o metabolismo lipdico necessita de uma intensidade de exerccio mais branda. Em atividades abaixo de 30 % do consumo mximo de oxignio (VO2mx), praticamente todo o ATP ressintetizado provm do metabolismo lipdico, fato este que se altera a uma intensidade de aproximadamente 70 % do VO2mx, onde a maior parte da energia liberada para a ressntese do ATP passa a ser fornecida pelo metabolismo dos carboidratos. Entre as intensidades de 30 e 70 %, na medida em que o

exerccio vai se tornando cada vez mais intenso, vai ocorrendo progressivamente uma mudana de predominncia das gorduras para os carboidratos (Figura 1a). Evidncias sugerem que dois fatores principais estariam relacionados a esta alterao (GOLLNICK et al., 1986; BROOKS & MERCIER, 1994 & TURCOTTE et al., 1995): o primeiro fator estaria relacionado ao recrutamento das fibras de contrao rpida em intensidades de exerccio mais elevadas. Tais fibras possuem uma menor reserva de triglicerdeos e uma menor capacidade de metabolizar as gorduras associada a uma maior capacidade de utilizao dos carboidratos; o segundo fator estaria relacionado a secreo de adrenalina e noradrenalina, que aumentam sua concentrao na corrente sangnea medida que a intensidade do exerccio se eleva. Tal alterao leva a um aumento do metabolismo glicoltico e, consequentemente, a um aumento das concentraes de lactato. O lactato, por sua vez, inibe a ao da lipase, enzima responsvel pela hidrlise dos triglicerdeos em glicerol e AGL, diminuindo assim a oferta desse substrato para o metabolismo, levando a glicose posio de combustvel principal. b. Durao da Atividade: medida que a atividade aumenta de durao, vai ocorrendo um direcionamento do metabolismo para as gorduras (Figura 1b). Os fatores que regulam tal fenmeno esto relacionados, provavelmente, s variveis que controlam a taxa de oxidao das gorduras (liplise), mais especificamente ao dos hormnios adrenalina, noradrenalina e glucagon (HOLLOSZY, 1990). Outro fator importante diz respeito ao hormnio insulina. medida que a atividade realizada se estende por diversos minutos, os nveis sangneos das catecolaminas se elevam, promovendo assim uma maior liberao de AGL na corrente sangnea, aumentando o metabolismo das gorduras. A insulina, como j comentado, inibidora do processo, tende a diminuir em exerccios de longa durao, favorecendo ainda mais o metabolismo das gorduras.

As evidncias da literatura so bastante claras em afirmar quais os determinantes para o metabolismo ser direcionado para a via lipdica ou glicdica. Tal concluso no est aqui sendo questionada, porm a extrapolao de que esta via deva ser aquela utilizada na prescrio de exerccio para emagrecimento que est sendo discutida. De acordo com as evidncias sobre os determinantes para o metabolismo lipdico, compreensvel que a utilizao dos exerccios aerbios de baixa intensidade e longa durao, entre outras medidas que maximizem o metabolismo das gorduras, sejam adotadas (Quadro 2). De forma aparentemente muito simplista e causal, comeou-se a supor que a nica maneira de metabolizar a energia estocada em excesso no corpo humano na forma de gordura seria priorizando, durante a atividade fsica, a via aerbia. Apesar de atrativa, essa afirmativa carece de experimentos cientficos que a sustente. Mesmo considerando a importncia da intensidade do trabalho no direcionamento do substrato utilizado, Romijn et al. (1993) demonstraram que altas intensidades de exerccio, apesar de propiciarem uma participao percentual menor das gorduras como fonte energtica, no cmputo final, i.e. levando-se em considerao uma menor participao percentual numa maior intensidade, propiciam a utilizao de gorduras em quantidades semelhantes quelas utilizadas em atividades de menor intensidade (Figura 2).

Numa comparao simulada entre duas intensidades de exerccio com durao de 30 min, uma a 50 % do VO2mx e outra a 75 %, Wilmore & Costill (1994) demonstraram no existir diferena entre a quantidade de calorias gastas a partir das gorduras, apesar da intensidade da segunda atividade propiciar uma participao percentual deste substrato menor que na primeira situao (Tabela 2). A compreenso deste conceito passa anteriormente pelo entendimento da monitorao do substrato utilizado. Utilizando um sistema de anlise de gases expirados, que possibilite a determinao do consumo de oxignio (VO2) e da produo de gs carbnico (VCO2), possvel determinar a quantidade percentual de mobilizao de gorduras e carboidratos. A varivel que possibilita essa visualizao o quociente respiratrio (QR), determinado como demonstrado abaixo.

Dependendo do valor observado numa determinada atividade, possvel estabelecer qual a colaborao percentual das gorduras e carboidratos como substrato energtico. Para uma mobilizao plena de gordura, necessrio que o QR esteja em 0,7 e para os carboidratos em 1,0. Mais detalhes sobre o entendimento deste conceito podem ser esclarecidos em livros bsicos de fisiologia do exerccio e/ou nutrio.

Como pode ser observado na Tabela 2, a modificao do QR proporcionado pelo aumento da intensidade da atividade resultou numa mesma mobilizao das gorduras nos dois exemplos apresentados, apesar de uma menor participao percentual deste substrato a 75 % do VO2mx. Com base nas evidncias de Romijn et al. (1993) e Wilmore & Costill (1994), parece no existir fundamentao que apoie a principal justificativa das teorias que defendem a orientao de atividades de baixa intensidade com o intuito de otimizar o metabolismo das gorduras. Como demonstrado, intensidades mais altas propiciam uma participao percentual menor das gorduras, porm quando o total gasto observado, essa diferena desaparece.

Consideraes sobre o Modelo Matemtico Do outro lado da discusso apresentada at o momento, esto as evidncias sobre as calorias ingeridas nas refeies e gastas durante diferentes tipos de atividades de lazer, laborativas e no repouso. Citando a primeira lei da termodinmica, a que prega que nenhuma energia criada, e sim transformada, os alimentos ingeridos possuem energia, os organismos estocam essa energia ingerida (principalmente na forma de carboidratos e gordura) e as atividades dirias despendem energia. Pela caracterstica de cada stio de armazenamento de energia (Tabela 1), as gorduras assumem um papel fundamental no que se refere manuteno das energias ingeridas e no gastas. A Caloria ou, mais precisamente, a quilocaloria (kcal), foi uma das unidades adotadas pelos especialistas com o intuito de traduzir o quanto de energia est contida em cada alimento, ou ainda quanto seria necessrio para desempenhar uma determinada tarefa. Uma kcal seria a energia necessria para aquecer um litro de gua em 1 C (POWERS & HOWLEY, 2004). Numa viso tradicional, o excesso de massa ou o emagrecimento, seriam conseqncias de um desequilbrio na balana energtica (ingesto vs. dispndio) positivo ou negativo, respectivamente. Nesta viso, o ganho de massa se daria por um aumento na ingesto energtica associada a uma diminuio ou baixo gasto energtico, levando a um acmulo de energia pelo organismo, que, como j comentado, utilizaria a gordura subcutnea como via de estoque. Um quilo de gordura estocada eqivale a aproximadamente 7.700 kcal (ACSM, 2000). Isso significa que um acmulo dirio de 400 kcal, seja por falta de uma atividade fsica regular ou pelo excesso de alimentos ingeridos, levaria a um aumento de massa de 1,58 Kg em um ms. Apesar dessa estimativa estar matematicamente correta, o organismo dispe de mecanismos para que oscilaes extremas no aconteam num curto espao de tempo. Como exemplo, pode-se citar um clssico estudo de Benedict e colaboradores de 1919 (citados por POWERS & HOWLEY, 2004), onde foi demonstrado um aumento do metabolismo de repouso quando indivduos eram submetidos a uma dieta hipercalrica. Desta forma, possvel que uma grande oscilao energtica alimentar gere apenas um pequeno aumento nos estoques energticos humanos. Mais recentemente, POWERS & HOWLEY (2004) apresentaram um modelo ligeiramente mais elaborado para o entendimento da balana energtica. Segundo estes autores, pelos diversos recursos que o organismo dispe para compensar a balana energtica em situaes de desequilbrio, o termo "taxa de mudana das reservas de energia" deve ser priorizado. Neste entendimento, as modificaes que ocorrem no organismo, incluindo as modificaes do metabolismo de repouso, digesto e utilizao dos alimentos e as alteraes hormonais, estariam sendo consideradas. Para mais detalhes, sugere-se a leitura do texto original. As calorias ingeridas proveniente dos alimentos podem ser facilmente determinadas se forem conhecidas as quantidades relativas de lipdeos, protdeos e glicdeos. Para cada grama de lipdeo, tem-se o total de 9 kcal, sendo que para os demais nutrientes, apenas 4 kcal. O clculo do valor energtico de um determinado alimento pode ser estimado a partir da computao parcial das calorias de cada nutriente e a sua conseqente soma, totalizando o valor energtico do alimento. Atualmente, os rtulos dos produtos industrializados j contm, na maioria das vezes, o valor total das calorias. De acordo com o objetivo, deve-se fazer uma adequao das calorias ingeridas s necessrias para uma rotina diria. O ideal para o desenvolvimento de um plano alimentar com essas bases a consulta a um profissional da rea de nutrio, que garantir no somente uma dieta hipocalrica, como tambm o balanceamento dos macro e micronutrientes. Vale salientar que as gorduras ingeridas na dieta, quando comparadas aos carboidratos e protenas, apresentam mais que o dobro das calorias. Provavelmente por esse motivo, tem-se priorizado uma dieta hipolipdica para fins de emagrecimento, primeiro por facilitar a diminuio das calorias ingeridas na alimentao, e segundo por ser consideravelmente complicado atingir as calorias adequadas para o emagrecimento se a dieta possuir uma grande contribuio por parte das gorduras. Evidncias ainda sugerem que uma alta taxa de gorduras na dieta em relao aos carboidratos est associada a uma maior incidncia de obesidade (MILLER, 1991), sem contar os maiores riscos para o desenvolvimento de doena arterial coronariana que alguns tipos de lipdeos podem proporcionar. H alguns anos, Jequier (1993) introduziu a idia de que uma das causas do aumento de massa seria um excesso de gordura na alimentao. Segundo este autor, um desequilbrio entre as gorduras ingeridas e as gastas levaria a um acmulo de gordura corporal, principalmente nos estoques subcutneos. Numa situao de balano energtico positivo a partir dos carboidratos e protenas, o organismo aumentaria seu metabolismo para utilizar essa energia em excesso nas suas funes biolgicas (sntese tecidual, transporte de nutrientes, estocagem de carboidratos ou liberao de energia para as atividades). J a gordura em excesso seria prontamente estocada na forma de triglicerdeos no tecido

adiposo. Autores como Scott Powers e seus colaboradores parecem corroborar com essa teoria. Para prescrio de exerccios com base nas calorias a serem gastas, pode-se utilizar a relao existente de 5 kcal despendidas para cada litro de oxignio consumido (ACSM, 2000). Se forem conhecidas as exigncias metablicas da atividade desempenhada, pode-se estimar o total de calorias gastas. Se para um indivduo de 80 kg, caminhar a 4 km.h-1 eqivale a um dispndio energtico de aproximadamente 4,1 kcal.min-1, a partir de simples clculos matemticos pode-se saber qual o gasto em trinta minutos de atividade, ou mesmo de quantas sesses seriam necessrias para que este indivduo perdesse um determinado excesso de calorias acumulado na forma de gordura. Para este fim, trs possibilidades podem ser utilizadas: a. utilizao das equaes do American College of Sports Medicine (ACSM) para o clculo do consumo de oxignio em diferentes atividades (Quadro 3); b. medida direta do consumo de oxignio; e c. utilizao de tabelas que contenham os valores dos equivalentes metablicos (MET) (AINSWORTH et al., 1993 e AINSWORTH et al., 2000).

O clculo do consumo de oxignio por minuto, e consequentemente das calorias gastas, pode ser realizado pelas equaes do ACSM quando os trabalhos em esteira, pista, bicicleta ergomtrica ou banco forem utilizados (Quadro 3). A partir da determinao do consumo de oxignio da atividade, que preferencialmente dever ser realizada numa condio de steady state, pode-se converter o resultado em calorias, ou a partir de um determinado gasto objetivado, pode-se determinar o ritmo de corrida ou a carga de trabalho numa bicicleta. Com algumas adaptaes, pode-se adequar a medida direta do consumo de oxignio em diferentes atividades, desde as cclicas at as acclicas. Para as atividades acclicas em que a medida direta do consumo de oxignio no estiver disponvel, pode-se utilizar as tabelas de METs, uma vez que atualmente dispe-se de uma variedade bastante ampla de atividades. Um MET eqivale ao consumo de oxignio de 3,5 mL.kg-1.min-1 e expressa, em teoria, o metabolismo de repouso de um indivduo. A converso de MET para kcal pode ser realizada a partir da frmula sugerida pelo ACSM (ACSM, 2000):

Um indivduo realizando uma atividade de 6 METs e que tenha 70 Kg de massa corporal teria um gasto de 7,35 kcal.min-1 (6 METs x 70Kg x 3,5 200 = 7,35 kcal.min-1). Em todos os casos, a orientao de exerccios dever ter suas calorias computadas e a estimativa de perda de massa deve utilizar a relao de 7.700 kcal para cada quilo de gordura a ser perdido. Segundo o prprio ACSM (ACSM, 2000), a programao de perda de massa no deveria exceder 1 kg por semana ou o equivalente a um dficit energtico semanal de 7.700 kcal, incluindo a restrio alimentar e o dispndio com atividade fsica. Pela diversidade de fatores que atuam e influenciam o processo de perda ponderal, parece presuno atribuir ao gasto energtico proporcionado pela atividade fsica os mritos exclusivos pela reduo da massa corporal. Sabe-se claramente que apesar de importante, esse gasto apenas um dos seis benefcios proporcionados pelo exerccio no processo de emagrecimento (Quadro 4) (ACSM, 2001). Mais detalhes sobre este tpico podero ser obtidos na obra original. Cabe, porm, alguns comentrios sobre dois destes tpicos: a manuteno ou aumento do metabolismo de repouso e o aumento da auto estima, ambos proporcionados pela prtica regular de atividade fsica.

Uma das conseqncias indesejveis do processo de perda de massa a reduo do metabolismo de repouso, que em alguns casos pode chegar a 20 % (ACSM, 2001). Sendo considerada como uma defesa do organismo no sentido de preservar energia numa situao de privao, i.e. balano energtico negativo, os seres humanos passam a gastar menos calorias em repouso do que gastariam se estivessem numa dieta adequada do ponto de vista energtico. Levando em considerao que aproximadamente 70 % das calorias gastas durante um dia so provenientes deste metabolismo, uma reduo de 100 a 200 kcal por dia eqivaleria a uma resistncia do organismo a perder aproximadamente 90 a 180 g de gordura em uma semana ou 395 a 790 g de gordura por ms. Olhando para os mesmos dados de outra maneira e utilizando o mesmo exemplo de gasto energtico em atividade j apresentado neste documento (caminhada a 4 km.h-1 para um indivduo de 80 kg), esses valores representariam uma atividade diria de 24 a 48 min. A atividade fsica regular possibilita a manuteno do metabolismo de repouso, parecendo ser essa adaptao aguda e no crnica (BULLOUGH, 1995). Isto significa que se o treinamento regular for interrompido, haver uma imediata diminuio do metabolismo de repouso. Seu aumento acima dos nveis normais est associado a um aumento da massa corporal magra que por sua vez , na maioria das vezes, conseqncia de um treinamento de fora. Como as cargas iniciais para este tipo de treinamento em sedentrios so mais baixas que as indicadas para um trabalho de hipertrofia e a progresso do trabalho geralmente mais lenta, o aumento do metabolismo de repouso retarda a aparecer. O segundo tpico a ser destacado se refere ao aumento da auto-estima, constantemente mencionado como um dos importantes benefcios da prtica regular de exerccios (USDHHS, 1996). A partir da adoo de um estilo de vida ativo, comumente relatada a modificao de auto percepo e bem estar que os indivduos passam a experimentar. Tal mudana tende a influenciar por completo a forma de encarar a vida e conseqentemente os hbitos deletrios sade, como por exemplo, uma dieta desequilibrada, tabagismo etc. Sendo assim, muitas vezes comum que uma dieta hipocalrica, com menor quantidade de lipdeos e monossacardeos, seja adotada quase que naturalmente, favorecendo assim um aumento do dficit energtico total e consequentemente do emagrecimento. Tal aspecto tem sido muitas vezes negligenciado quando os benefcios da atividade fsica so considerados, apesar de sua importante colaborao. Se um indivduo deixa simplesmente de ingerir uma lata de refrigerante (350 mL - 135 kcal) por dia, tal reduo energtica representaria ao final de um ms a 0,53 kg de gordura corporal. Com base nas argumentaes apresentadas, vale perguntar como se daria a perda de gordura com base no modelo matemtico? Como j mencionado, o organismo estoca energia principalmente na forma de gordura. Numa situao de privao energtica, como por exemplo, a que ocorre durante uma dieta, as calorias ingeridas durante o dia no seriam suficientes para atender a todas as necessidades orgnicas. Nesta situao, os estoques de gordura passariam a ser requisitados em pequenas quantidades dirias. Se esta situao permanecer por vrios dias, semanas ou meses, o somatrio dos pequenos gastos resultaria numa significativa diminuio da gordura corporal. Nesse sentido, o tipo de atividade realizada no faria a menor importncia para o emagrecimento. As calorias gastas durante a atividade, independentemente se provindas dos carboidratos ou lipdeos, levariam o dispndio energtico dirio a uma situao superior alcanada pela ingesto, forando o organismo a utilizar suas reservas. Como a modificao da balana energtica incluiu a atividade fsica, a diminuio do metabolismo de repouso seria evitada, favorecendo o processo de perda de massa. Pela linha de discusso traada at o momento, os exerccios anaerbios alticos ou lticos seriam perfeitamente orientados, desde que considerado o maior risco de leso e uma menor chance de aderncia prtica de atividade fsica devido sua alta intensidade. O gasto energtico dessas atividades, dependendo da durao e da intensidade, pode se igualar ou at ultrapassar os alcanados em atividades tipicamente aerbias, uma vez que o consumo de oxignio ps-exerccio passa a contribuir consideravelmente para aumentar as calorias gastas. Para mais detalhes sobre o custo energtico de diferentes atividades, sugere-se a publicao de Ainsworth et al. (1993). Em relao ao consumo de oxignio ps exerccio, os livros de McArdle et al. (2001), Powers & Howley (2004) e Wilmore & Costill (1994), entre outros, apresentam o assunto de forma bastante completa. Concluses e recomendaes As evidncias so bastante claras no que se refere aos fatores que determinam o metabolismo das gorduras ou dos carboidratos. Talvez tamanha clareza tenha levado inmeros profissionais a concluir erroneamente que o

direcionamento do metabolismo para as gorduras seria a nica forma de promover o emagrecimento. Autores como strand & Rodahl (1992), McArdle et al., (2001), Pollock & Wilmore (1993), Powers & Howley (2004) e o prprio ACSM (ACSM, 1983, 1993, 2001a, 2001b e 2000) no fazem nenhuma meno importncia de condutas relacionadas ao Modelo Metablico. Wilmore & Costill (1994) indicaram o aparecimento, em meados da dcada de 80, de grupos de profissionais da fisiologia do exerccio com recomendaes para o processo de emagrecimento relacionadas ao modelo metablico. Em seu livro, Powers & Dodd (1997) citam dois trabalhos relacionados a esse tipo de conduta. Apesar de inmeros autores com considervel prestgio nem tocarem neste assunto, no Brasil, foi marcante o impacto desse modelo nas aes para perda de massa e orientao da atividade fsica. As evidncias aqui apresentadas no sugerem um tipo de exerccio diferente do tradicionalmente prescrito para perda de massa. Independente da teoria utilizada como paradigma, um trabalho de baixa intensidade e longa durao o recomendado, mas no com a inteno de metabolizar as gorduras, e sim por proporcionar, provavelmente, um maior prazer, maior chance de manuteno do cliente ao programa (aderncia) e alcanar um gasto energtico adequado (aproximadamente 300 a 500 kcal por sesso) (ACSM, 1983, 2000 e 2001b). Tambm recomendao do ACSM a realizao de exerccios contra resistncia e de flexibilidade, de preferncia nos moldes do ltimo posicionamento dessa entidade sobre quantidade e qualidade de exerccios para adultos saudveis (ACSM, 1998). Quanto s recomendaes para prescrio de atividade fsica, algumas consideraes importantes se fazem necessrias: a. deve-se priorizar o prazer e o bem estar. A associao entre exerccio e sofrimento provavelmente um dos principais desmotivadores para a prtica de atividade fsica. O conceito no pain no gain, que traduzindo significa sem dor sem ganho, deve ser abolido; b. deve ser abolida, tambm, a recomendao para durao da atividade de no mnimo 20-30 min com a inteno de maximizar o metabolismo lipdico. Qualquer exerccio gasta energia, logo, qualquer exerccio melhor que nenhum exerccio. A idia de um limiar mnimo de trabalho para aquisio dos resultados mais um desmotivador para a prtica de exerccios fsicos. Pela disseminao dessa idia, diversos indivduos provavelmente evitam o incio de uma atividade fsica, ou por que no se adequam s atividades tradicionalmente prescritas, ou por no se julgarem aptos o suficiente para realizarem, ou ainda por j terem fracassado em tentativas anteriores; c. com base no gasto energtico, no faz a menor diferena que a atividade seja contnua ou intervalada. Isso permite que indivduos mal condicionados, ao invs de terem que enfrentar os maantes 40 min contnuos numa bicicleta, possam realizar quatro sries de 10 min, totalizando os mesmos 40 min e consequentemente o mesmo gasto energtico. Segundo o ACSM (ACSM, 1998), os estmulos fracionados deveriam ter no mnimo 8 min de durao. d. a modificao do estilo de vida, i.e. andar mais a p e menos de carro, usar mais as escadas etc., so importantes coadjuvantes para o sucesso do programa; e e. importncia especial deve ser dada motivao para o programa. A modificao de hbitos de vida um desafio para os especialistas e para os prprios interessados. Os programas de interveno devem ter suas tcnicas de mudana de comportamento baseadas nas teorias Transteortica, Social Cognitiva e Preveno ao Esquecimento (ACSM, 2001), uma vez que muito j se sabe sobre os fatores determinantes para a manuteno ou abandono de determinados hbitos de vida. O uso de objetivos a curto e mdio prazo, alm do monitoramento do emagrecimento atravs de avaliaes peridicas, tambm deveriam ser implementados. Agradecimentos
A o Prof. Edmundo Vieites Nov aes, por apresentar os princpios aqui discutidos de forma clara e direta, direcionando os pensamentos para as idias ora apresentadas. professora Marta Inez Rodrigues Pereira, pela sua constante colaborao em meus trabalhos e em especial pela rev iso deste documento. Vanessa Priss, Gabriela Dunshe, Conrado Ramos, Cassio Jody Kok ubo e Cludia Meirelles, por terem participado na rev iso deste documento com v aliosas sugestes. A o amigo Leonardo Ribeiro, pelos ajustes finais para publicao.

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WILMORE, J.H. & COSTILL, D.L. Physiology of sport and exercise. Human Kinetics, Champaign, IL, 2nd ed, 2004. Outros artigos em Portugus Recomienda este sitio

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