A Joia Das Filhas de Maria - Gemma Galgani - 1918
A Joia Das Filhas de Maria - Gemma Galgani - 1918
A Joia Das Filhas de Maria - Gemma Galgani - 1918
NASCIDA
F a l l e c i d a em
V E R D A D E I R OR E T R A T OD AS E R V AD ED E U S GT&LI^&LJCLX
DE M ARO DE 1878,
11 de A b r i l de 1903.
EM
12
L u c c a no dia
Quisera (pie o meu corao no palpitasse, no vivesse, no suspirasse shio por Jesus. Dilate-se sempre o santo reino do amor de Jesus, afim i/c que todos o amem.
(PALAVRAS DE G EMMA GALGANI.)
1
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mt. -
CONFERNCIAS
sobre as virtixd.es, as praticas religiosas, os x t a s e s e o espirito da serva de Deus
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t Emmanuel
EPISCOPUS
IV
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' B T E M P E R A N D O aos desejos lares e de virtuosos aspiraes n'uma uma bella de brochura alma, distincta algumas
de
sacerdotes s Collegio,
secu-
conferencias
Semeador, vespertino catholico de Macei, depois de terem sido pronunciadas nas reunies da Pia Unio das F i l h a s de M a r i a . Alm d'est motivo, resolvi dar a estampa estas c o n f e r e n c i a s , destitudas de todo o mrito litterario, primeiro para promover a gloria de e irradiou na a u r o r a do que a aragem da do espirito dos D e u s , segundo para edificar o prximo, e emfim para tornar conhecida venerada u m a piedosssima donzella cuja santidade sculo X X , como uma fulgente estrella no anil do firmamento. Q u i z e r a propagar o culto de uma s e r v a de D e u s e do corao a d o r n a r a m , c u j a vida foi um a s s o m b r o favores divinos, e dncia de Gemma e graa bafejou logo na meninice, que os mais brilhantes dotes que m o r r e u na flor dos a n n o s em odor Galgani, muito embora faa falta de
um portento
santidade.
N u n c a tive a inteno de verter em vernculo a vida e a c o r r e s p o n bibliotheca da leitura donzella christ. E s t a falta c tanto mais para lamentar, quanto c certo que a seria s u m m a m e n t e edificante e proveitosa. No posso aspirar a esta lacuna por maior que seja. De ba vontade deixo esta to linda quo cidade um pallido esboo invejvel tarefa a uma penna adestrada e genuinamente portugueza; pretendo apenas dar publidas bellissimas virtudes que lhe a d o r n a r a m a santa alma anglica, e reproduzir os traos m a i s salientes d'est perfil de summamente svmpathica. no sul do Deus, da s e r v a de P r a z a ao co que tantas almas piedosas, no norte como B r a s i l , que a n c i o s a s anhelam pela publicao da vida preencher
.site"-
no sejam frustradas na sua expectativa e encontrem a satisfaco pela qual suspiram, n'estas paginas, apezar de todas as suas imperfeies. O livro da Imitao de Christo no e perfeito debaixo do ponto de vista litterario; o estylo simples, sem ornato, e por vezes incorrecto, mas nem por isso deixam de consderal-o como o mais bello de quantos escriptos tm sahido da penna do homem, porque eleva a alma e, derramando celestial unco, encanta e consola o leitor. Dizem que esse ureo livro tem convertido, consolado e enxugado lagrimas a tantas almas em numero egual s letras que possue. Por minha parte, me daria por muito bem pago, se o meu trabalho desforme e imperfeito illuminasse e consolasse uma s alma. Nosso Senhor, apparecendo a Santa Gertrudes, prometteu abenoarlhe os escriptos, concedendo uma tal virtude a cada uma de suas palavras, que penetrasse no corao do leitor e lhe infundisse uma celeste unco, cheia de suavidade. Desejaria que Nosso Senhor, pela intercesso da Me do Bello Amor, ligasse a mesma virtude s palavras e s cartas da serva de Deus Gemma Galgani, perfeita imitadora e emula da illustre Virgem Santa Gertrudes, mestra da vida interior, e doutora da vida mystica, de maneira que estas palavras, gravando-se profundamente no corao do leitor ou da leitora, nelle derramassem o cheiroso blsamo da consolao e o inebriante nectar da santa alegria e do gozo espiritual. No ha pessoa piedosa que no estime a leitura espiritual. No ha congreganista a lhe desconhecer a utilidade que, consoante bella expresso de So Leonardo, a irm collaa da orao. O bom livro, dizem os sbios, o melhor amigo e o mais fiel companheiro do homem, com o qual se pode conversar a todo instante, e cuja convivncia nunca aborrece. Se verdade que a companhia dos homens de bem exerce uma feliz influencia sobre ns, outrotanto se pode dizer da leitura de um bom livro. D'ahi se v a necessidade da boa escolha; ora, entre os livros que podem exercer influencia salutar, a vida dos santos dos melhores. O poeta Sardi o exprimiu por meio de um aplogo encantador: Andava passeando, diz elle, e vi aos ps uma folha secca, exhalando um cheiro suave; apanho-a e respiro-lhe deliciosamente o perfume. u que exhalas to doce aroma, pergunto, s a rosa? No, respondeu-me, no sou a rosa, mas vivi algum tempo #0 meio das suas folhas; d'ahi me vem o perfume que exhalo. Assim tambm a congreganista que ficar em companhia de Gemma Galgani, pela leitura assidua d'est livrinho, ha de embeber-se na fragrncia mystica de suas florescentes virtudes. Sou muito grato a todos aquelles que me auxiliaram, de todo corao agradeo-lhes a fineza. To numerosos so que no posso nomeal-os todos, mas nem por isso me esquecerei dos favores de que lhes sou devedor. Dizem que um celebre pintor, perfeito cavalheiro, de alta educao, fez o retrato de uma princeza imperial, e lhe cobrou, por paga, apenas um sorriso ! Assim tambm supplico a amvel serva de Deus que volva os olhos meigos e extticos do alto do co para aquelles que cooperaram, generosa e gentilmente, para o retrato de suas egrgias virtudes-e sorria-lhes, testmunhando-Ihes' assim a complacncia. . . . . . . . - " - * :
VI
Agradeo, outrosim, aos illustres editores que se esmeraram em offerecer ao publico um volume mimoso, que faz honra casa, e mereceria os louvores do escriptor John Ruskin, o Petronio moderno, arbitro da elegncia, que tanto recommendava aos editores dessem uma forma artstica e attrahente aos livros, pedindo tambm, com instancia, aos leitores tivessem cuidado em conservai-os em perfeito estado. Servi-me para a c o m p o s i o d'estas conferencias do livro Leben der Jungfrau und Dienerin Goltes GEMMA G A L O A N I pelo revmo. Frei Leo Schlegei, da Ordem de Cister. Este livro foi impresso em Saarlouis (Alsacia) c j est na sua sexta edio. Com a licena do autor, gentilmente concedida, servi-me lambem das notas biographicas que sahiram no Mensageiro do Apostolado, no anno de 1914. O livrinho destinado s almas de f esclarecida e de piedade abrasada, s associadas e zeladoras do Apostolado da Orao, e mormente s Filhas de Maria, almas de escol, de virtudes acrysoladas, s quaes a Igreja arranca este brado que transformou a humanidade: Gredimus charUati quam habet Deus in nolris ( S . Joo), cremos que Deus nos ama. u e m no tiver a f viva, quem no conformar sua vida aos preceitos d'esta mesma f, no leia este livro, porque no o comprehender, consoante ao parecer do piedoso autor da Imitao de Chrisfo :
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De Christo as phrases no entende ; S o m e n t e as aprecia quem por norma Tem d'elle a vida, e d'outra forma Viver na terra no pretende. Eis o conceito do Padre Bougaud, historiador da Beata Margarida Maria, illustre Virgem de Paray-le-Monial, a quem Jesus revelou as riquezas do seu divino Corao: Quem no crer no infinito amor de Deus ao homem, no presepe, na cruz, na santa Eucharistia, no abra este livro. Ficaria admirado e qui escandalizado, Sim, os homens cujo corao acanhado no sabe o que o amor divino, aquelles que passam diante da cruz abanando a cabea, que olham para o altar com um sorriso de escarneo, no leiam este livro, porque no o comprehendero.
* *
Em obedincia aos decretos de Urbano V I I I , submetto-me, complela c perfeitamente, ao juizo infallivel da Igreja no que diz respeito a alguns factos maravilhosos que occorrer possam n'este livrinho, acreditando n'elles somente humanamente falando. Outrosim, dando o nome de santa ou de venervel a Gemma Galgani, fao-o no mesmo sentido, sem querer prevenir o juizo infallivel, mas desejando me conformar em tudo aos ensinamentos da Igreja que recebeu de Nosso Senhor o magistrio supremo. So ] o s da Lage, 12 de Maro de 1918, quadragsimo anniversario do nascimento de Gemma.
O Autor.
VII
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PRIMEIRA
CONFERENCIA.
UEM vae a Londres, no podo deixar de visitar a fortaleza vetusta, chamada a eni cujos subterrneos esto guardados os thesonros da coroa, alm de muitas outras curiosidades preciosas para antiqurios. Alli podem ser contempladas, amontoadas em ricos e vastos escrnios, illuminados por luz elctrica, as mais preciosas jias do mundo, cujo esplendor deslumbra a vista.
Tower,
V-so a coroa real crivada de opalas do rei dos Anglosaxes, Santo Eduardo o Confessor; diademas e collares rutilantes da rainha Elisabeth; uma multido de sceptros de marfim cravejados de brilhantes e mais insgnias esplendidas da realeza, formando a rica herana de muitas geraes de soberanos e rainhas, que se succederam sobre o throno dos Reinos-Unidos da Inglaterra. A Igreja catholica tem tambm uma collecQo de jias, mais brilhantes do que as gemmas do famoso museu margem brumosa do Tamisa, por mais bel las que sejam: a assembla gloriosa das almas santas cujo claro alegra o co e a terra.
Mais alva que o leite na, nvea brancura, Refulge a phalange de eleitos, Senhor, Marfim incrustado excede em candura, E vence a formosa, saphyra em fulgor. O vidente de Pathmos, transportado pelo espirito de Deus sobre uma alta montanha, viu a Jerusalm Nova,
transparente como um erystal, descer do co bella, adornada como uma esposa ataviada espera do esposo. Seu lustre era semelhante a uma pedra preciosa, como pedra de jaspe; os alicerces, de pedrarias raras; suas doze portas, ornadas de prolas de inestimvel valor. A cidade mesma era de Ouro puro, brilhante como o erystal. A Jerusalm Nova, to bella e to deslumbrante, symboliza a Igreja Santa, Oatholiea, Apostlica, Romana. As jias representam as almas santas, que haviam de illustrar a mesma Igreja, no correr tios sculos, desde os doze Apstolos figurados pelas doze portas, at as almas santas do sculo XX da era christ em que estamos. Tenciono focalizar uma d'estas jias que rebrilham nos muros da Nova Jerusalm; tenciono determinar-lhe o quilate de santidade, e examinar-lhe todas as facetas. Semelhante ao joalheiro, que abre o escrnio, pe em plena luz ante os olhos do comprador o artstico adorno, aponta-lhe a belleza, exalta-lho o valor, para provocar a admirao e o enthusiasmo; assim quero, com a graa de Deus, expor vista das Filhas de Maria, uma d'estas jias que projectou sobre o mundo o doce brilho da virtude e da santidade. Esta joia foi encontrada no anno da graa de 1878 na Itlia, mina riqussima e inesgottavel de santidade, a qual, depois de ter illustrado a Igreja por sua trajectria to rpida quo brilhante, Nosso Senhor engastou no seu throno j irizado por tantos diamantes. A serva de Deus que pretendo propor como modelo de perfeio, por um desgnio da Providencia, recebeu no baptismo o nome significativo, suggestivo e predestinado " de Gemma que em latim, na lngua de Dante c suas congneres, significa <-joia. Apreciava ella este lindo nome que concretizava a seus olhos um vasto programma, executado fiel e religiosamente, merecendo ser, pela pratica de virtudes aerysoladas que a distinguiram, a joia de Jesus e a joia das Filhas de Maria. - Embora tudo seja admirvel na vida dos santos, consoante sentena dos mestres da vida espiritual, nem por
isso tudo imitavel; porque almas ha a quem Nosso Senhor conduz por vias extraordinrias e prodigaliza dons oxtra-communs. Assim, na vida milagrosa d'esta serva de Deus, nem tudo imitavel, ainda que tudo seja admirvel; porque, semelhante a um brilhante, sua santidade lanava, s vezes, raios faiscantes que offuscavam a vista, ainda que, por outras virtudes menos sublimes, Gemma de Jesus torne-se perfeitamente imitavel, sendo tambm uma esmeralda, cuja cr verde e suave jamais canc o olhar. Alm de comparar Gemma de Jesus a uma joia preciosa* inspirando-me da poesia dos livros sagrados (muito superior poesia dos livros profanos e das fices da mythologia pag), tenciono destacar algumas pedras preciosas que embellezavam os fundamentos dos muros da Nova Jerusalm, bem como algumas pedras preciosas que se achavam engastadas no paramento chamado racional, do summo sacerdote Aaro, e comparal-as s principaes virtudes que adornaram a bellissima alma de Gemma Galgani, doce esposa de Jesus. Piedosas congreganistas, espelhae-vos nesta alma de escol, transparente e pura como a gotta de orvalho que amanhece sobre as flores do vosso jardim, em que podeis vr o reflexo fugitivo das sete cores do ris, como no melhor dos prismas. Mirae-vos no crystalino espelho (festa alma, estudando e analyzando as bellas virtudes que praticou, vivendo como vs, no meio dos perigos do mundo cheio de enganos e desvarios, voando entre as chammas das paixes, das torpezas, dos crimes, dos delictos, e de todas as baixezas sem tostar nem queimar as azas da devoo. Oxal que estas singelas conferencias sobre as virtudes que Gemma praticou durante os poucos annos que viveu no rebolio do mundo como vs, possa estimular-vos a progredir na santidade e na pratica de todas as virtudes, no perfeito cumprimento de todos os deveres de vosso estado e, sobretudo, na devoo para com a Virgem Santissima de quem sois filhas dedicadas. Praza aos cos que estas simples praticas tambm derramem em vossas almas a consolao, afim de confortar-vos nas agruras da vida presente, suavizando os vossos tormentos e maguas.
Que possaes, como o Propheta Rei, correr velozes no caminho estreito dos mandamentos, tendo o corao dilatado por uma santa e corajosa alegria. D'esta maneira tornar-vos-eis dignas emulas de Gemma Galgani, que foi vossa irm no Corao de Jesus e de Maria. Assim, tornar-vos-eis dignas imitadoras d'aquella, cujo curto viver foi um harmonioso hymno de amor e de virtude. Com as companheiras da Esposa dos Cantares, dizei:
T r a h e me, post te c u r r e m u s in odorem unguentorum t u o r u m .
Leva-me. Correremos aps ti ao cheiro dos teus blsamos. As Filhas de Maria que sigam, satisfeitas e alegres, os vestgios odorferos de Gemma Galgam, perfumados por tantos egrgios e amveis dotes espirituaes. As almas piedosas que corram, ao alcance do rastro luminoso que esta tenra menina, como um astro do firmamento, deixou na sua passagem por este triste ermo.
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v e r m i c u l a t a s argnteo. Cant. I - I O .
SsiM como os collares rutilantes que adornavam o pescoo da Esposa dos Cantares, eram de ouro fino marchetados de lentejoilas de prata, assim tambm a graa symbolizada pelo ouro, e a natureza pela prata, uniram-se para fazer de Gemma uni acabado modelo de perfeio. Estudemos e analysemos a infncia da nossa heroina e encontraremos n'ella signaos de prematura santidade e de predicados precoces que causam admirao.
Quem est a par da historia universal nota que os grandes gnios, os artistas que se celebrizaram nas artes, musica, litteratura, pintura, foram de uma grande precocidade. Muitos santos tambm, que se assignalaram por egrgias virtudes, foram logo notveis na meninice e distinguiram-se pela santidade assombrosa no verdor dos annos. Em compensao, diversos (Testes santos que foram favorecidos de precocidade maravilhosa, tiveram curta vida, como sejam vSo Luiz Gonzaga, Santo Estanislao Kostka, So Joo Berchmans. Nos tempos modernos, temos uma triade graciosa: soror Thereza, do Menino Deus de Lisieux, soror Elisabeth da Trindade de Dijon, ambos carmelitas francezas, e Gemma Galgani. Estas trs flores de santidade desabrocharam, antecipando as leis da natureza e as normas geraes da graa, e foram transplantadas, depois de poucos annos de vida, para o bello jardim do co. Estas almas santas ouviram os conselhos de So Joo da Cruz quando disse : E? de alta importunera que a ulmo se exera ao amor divino, de maneira que, consumindo-sc rapidamente, no pare n'esta terra, sino chegue ligeira a, ver a Deus face <t face. Estas trs almas dos tempos modernos passaram n'este mundo como uma chamma e como o incenso que se consome no fogo. (Eccles. 50. 9.) Estas trs almas entraram na lia prematuramente e, com passos agigantados, atiraram-se rapidamente ao alvo que o Christo. (Philipp. 3.) Com vinte e cinco annos de idade puderam dizei' como So Paulo: Pelejei uma boa peleja, acabei a minha, carreira ... Est-me reservada a coroa da justia. . . . (Timoth. I I . ) Assim Gemma Galgani, ainda muito criana, j era um primor de virtude. Ou sino vejamos. Com dois annos, comeou a frequentar uma aula particular, mantida por duas distinctas senhoras e, n'esta idade,
antes.que lhe madrugassem n'aima os primeiros lampejos da razo, era sensata, reflectida e comedida. A tenra menina, aos cinco annos, j estava bem adiantada nos estudos primrios e na doutrina, lia perfeitamente o officio de Nossa Senhora, e sabia decoradas todas as mais oraes. Aos sete Gemma, suspirava pelo co e no se afastava de sua me quando lhe falava das delicias do paraso. To grande desejo de morrer tinha para ver Jesus e ir ao co, que seu confessor se viu na obrigao de lhe prohibir que pedisse a morte. Que anhelos prematuros n u m a criana! que primor de piedade! N'essa idade Gemma se confessava a mido. D. Aurlia, sua piedosa me, desempenhava pessoalmente a bella misso de catechista na sua famlia, ensinando a cada filhinho em particular as oraes e os actos prprios da confisso. A ba me chorava de enternecimento ao ver Gemma fazer o exame de conscincia com muita applicao, rezando com anglico fervor. N'esta mesma idade, Gemma recebeu o sacramento da Confirmao das mos de D. Chilardi, na baslica de S. Michle in Foro. Gemma na sua infncia era de uma innocencia exemplar. Poderamos contar exemplos frizantes, para pr em relevo a candura de Gemma; limitamo-nos porm a mencionar os seguintes. Ainda muito criana, ficava triste quando o pae, que lhe queria muito bem, a sentava nos joelhos e a acariciava paternalmente. No quero ser tocada por ningum, dizia, um pouco agastada, nem por meu prprio pae. Assim a serva de Deus tinha, no verdor dos annos, a intuio precoce do pudor, este bello sentimento de honesta vergonha, causada pela apprehenso do mal. Semelhante sensitiva que recolhe, pudicamente, as ptalas ao menor contacto, a castssima serva de Deus tremia diante de todo o contacto humano. Nenhuma criana a vencia em recato e em modstia.
A menor sombra do mal a fazia tremer; a menor palavra menos conveniente a fazia corar; uma companhia mundana a fazia fugir, tanto lhe parecia innato o amor da pureza com o horror ao vicio deshonesto. Nenhuma criana teve jamais (a no ser as santas canonizadas) uma percepo to ntida, to prematura, e to instinctiva da virtude anglica, prenuncio de uma santidade extraordinria. A purissima menina sabia, sem que ningum lhe tivesse dito que o lyrio murcha sendo manuzeado. Disse Jean Jaques Rousseau, no seu livro Emile sobre a educao, que as crianas so naturalmente orgulhosas e invejosas, Gemma, porm, no era assim. Vendo que seu pae a preferia aos outros irmos, levava isto muito a mal e protestava que no queria nem merecia esta distinco. A humilde criana era tambm muito resignada vontade de Deus. Tendo entisicado d. Aurlia, o medico, temendo o perigo do contagio, aconselhou ao pae que retirasse os filhos de casa. Gemma foi obrigada a se apartar da me to querida, indo para So Gennaro, casa de uma sua tia. Ali recebeu o telegramma fatal dando-lhe noticia do fallecimento prematuro d'esta me to estremecida. Supportou este primeiro golpe cruel com serenidade digna de uma criana to santa, embora que fosse muito acima das foras naturaes n'esta idade precoce. Aos nove annos, Gemma pediu, com muita instancia, para fazer a sua primeira communho. No era uso ento dar a communho to cedo. O immortal Pontfice que devia publicar a Encyclica Quam singularie restabelecer assim a antiga disciplina da Igreja, obrigando os fieis a commungarem desde a idade de discreo, era ento simples bispo de Mantua e no pensava sequer alcanar as culminancias das dignidades ecclesiasticas, nem suspeitava que havia de ser chamado um dia O Papa da Primeira Communho.
Primeira Commuiihao
F u l c i t e me floribus, stipate malis, quia amore langueo. C a n t . 2, S. me
A piedosa menina suspirava como a Esposa dos Cantares: Acudi-me com. cnforttivos de flores, trazei-me fruetos que me confortem, porque morro de amor. ' Gemma suspirava e gemia pelo fructo bemdito do seio immaculado de Maria Santssima. Pae-medizia, o meu Jesus e vereis como serei ba, e no commetterei mais peccado. I)ae-m'o que sinto partir-se o meu corao e j no supporto mais esta ausncia. Seu confessor, Mons. Volpi, depois bispo de Arezzo, achando-a perfeitamente preparada para este acto importante da vida christ, e no tiro e, na vsquerendo vl-a pera do grande morrer de pena, dia, enviou a persuadiu ao sr. seu pae uma Galgani que percartinha nos semittisse queguintes termos: rida filhinha fa Querido Pazer a primeira peie, comm unho. Amanh vou A virgemzinha fazer a minha internou-se no primeira, comCollegio das irnt unho. Para ms de S. Zita, mim este dia durante oito dias, ser de suprema para fazer o refelicidade. Escrevo-te estas mal traadas linhas, porque te quero muito bem. Reza por mim* para que, quando chegar Jesus pela primeira vez, me encontre bem preparada, em compensao de tantos benefcios que d'elle tenho recebido. Peo-tc perdo tambm pela, minha desobedincia e mais faltas que te causaram, talvez, algum desgosto. Perdoa, pa/pae querido, e esquece. Lana tua, benam sobre tua filha que te ama.
ta
Gemma.
Deixemos a ditosa menina contar os gozos ineffaveis d'est dia, 16 de Junho de 1887, domingo immediato festa do Corao de Jesus, dia em que no collegio se celebrava, com grande pompa, a festa externa do divino Corao. Chegou, finalmente, a manh do domingo. Esto satisfeitos os meus anhelos. Meu Padre, o que se passou n'aquelle momento entre mim e Jesus, no sei expressal-o. Jesus deu-se a sentir fortemente a minha alma. Comprehendi ento como as delicias do co em nada se parecem com as da terra. Senti-me tomada do desejo de tornar mais e mais continua a minha unio com Deus, separando-me do mundo para viver no recolhimento. Meu Padre, adeus. Gemma de Jesus. De hoje em diante, o desejo ardente de possuir a Deus e de lhe agradar em tudo perfeitamente, ser a nica paixo d'esta santa creatura. No mais se apagou d'esta alma primorosa, a lembrana da primeira communho. Todos os annos at a sua morte, Gemma recordava este dia e relembrava as doces e puras consolaes que ento lograra. Vejamos os admirveis sentimentos, que a animava no verdor dos annos, e admiremos as celestes aspiraes deste espirito seraphico, expressas n'uma carta que escreveu a seu director espiritual. Meu Padre, ignoro si estaes a par de que o dia do Corao de Jesus tambm o dia da minha festa, o anniversario da minha primeira communho. Ilontem passei um dia de paraiso; estive sempre com Jesus, falei sempre de Jesus, fui feliz e chorei aos ps de Jesus. O recolhimento interior foi tal, que me conservo ainda intimamente unida com o meu caro Jesus. O' frios pensamentos d'est mundo, afastae-vos de mim! Quero estar com Jesus e s com Elie. N'uma outra carta a ba menina escrevi! : Meu Padre, hontem experimentei as alegrias do bello dia da minha primeira communho. Mas, de que serve gozal-as por um s dia, si podemos depois gozal-as para sempre ? Foi o dia em que senti o meu corao mais acceso no amor de Jesus. Quanto serei feliz, quando, com Jesus
no peito, puder exclamar: O' meu Deus, o vosso Corao meu corao! Antes de saliir do convento onde fez o retiro e onde fruiu to grandes consolaes espirituaes, a serva de Deus escreveu as seguintes resolues: 1. Quero confessar-me e eommungar cada mez como se fosse a ultima vez da minha vida. 2. Farei a minha visita ao SS. Sacramento, -principalmente quando estiver afflicta. 3. Prcparar-me-ei com uma mortificao para as festas de Nossa Senhora e todas as noites pedirei a benam da Me do Co. 4. Lembrar-me-ei sempre da presena de Deus. 5. Cada vez que ouvir soar as horas, direi a orao jaculatria: Meu Deus, misericrdia. Gemma ia continuar a escrever, quando foi interrompida por uma I r m que lhe disse se contentasse com estas cinco resolues. Bemdito e louvado sejaes, oh Deus de bondade, que prevenistes esta- criana milagrosa com as beneams de vossa doura, e to cedo pnzestes sobre a sua cabea uma coroa de pedras preciosas, symbolo dos signaes de prematura santidade. Grande ser a sua gloria na vossa salvao: gloria e grande formosura poreis sobre cila. Exaltae-vos, Senhor, no vosso poder, e louvaremos as vossas m aravilhas. Ditosa criana quem foi dado a conhecer, em verdes annos, os mysteris do reino de Deus, que tantas pessoas adiantadas na idade ignoram! Ditosa criana a quem Deus revelou to cedo as douras do man celeste! * A grande graa da primeira communho fervorosa ser, na vida de Gemma Galgani, o primeiro elo da longa cadeia de favores mysticos, e das graas de devoo de que sua alma de escol ser inundada. Nosso Senhor no se communica a todos igualmente; a uns diz cousas communs, a outros ensina cousas particulares.
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Descobre-se a uns brandamente, envolto em sombras e figuras, revela a outros seus mysteris no meio de um vivo esplendor; finalmente, Jesus distribue a cada um seus dons segundo lhe apraz. (Imit. ) Mil vezes felizes so as Filhas de Maria que, com o leite materno, beberam a piedade e o amor de Deus e consagraram a Nossa Senhora as primcias da vida. Felizes, si nos verdes annos foram bafejadas pela aragem benfica do Espirito Santo e illuminadas pelas luzes da f. Felizes, si offereceram a Deus e Virgem Santssima os primeiros sentimentos, as primeiras impresses de sua alma em flor. Felizes as Filhas de Maria, si Nosso Senhor lhes imprimir, nas almas de criana como na cera flexivel, sua imagem, que jamais apagar, porque as graas prematuras so o preludio de muitas outras, como disse o psalmista, ibun de virtute in virtutem : a passos gigantescos trilharo o caminho da santidade. A piedade sincera na infncia tambm o penhor da perseverana final. Exerce teipsum ad pietatem, escreve S. Paulo ao seu querido discipulo Timotheo : Exerce-te em obras de piedade. A piedade para tudo util, porque tem a promessa da vida presente e da que ha de vir. Pietas ad omnia utilis est. Felizes si, como Gemma, as Filhas de Maria fizeram a primeira communho com fervor e piedade, e no se esquecem d'est bello dia, festejando o anniversario com jubilo. Felizes, mil vezes, si commungam a mido, e vo pressurosas assentar-se sagrada mesa do banquete divino, onde Jesus d-se a comer, e communica as riquezas de suas graas. Vinde, Filhas de Maria, a exemplo de Gemma, com soffreguido e com alegria, haurir as aguas vivas que brotam do peito do Salvador. Vossa alma ento ser como um jardim copioso, frequentemente regado e abundantemente orvalhado, no qual a flora mystica de perfumes delicados nunca ha de faltar, assim como se deu com a alma de Gemma. Eritque anima eorum quasi hortus irriguus disse Jeremias o vidente.
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3:
Alli florescer a aucena da innocencia. Alli desabrochar a rubra rosa do bello amor. Alli, escondida no musgo, a violeta da humildade derr a m a r seu subtil perfume. Alli vicejar o lirio de delicado aroma da integridade virginal. Alli cobrir-se- de flores o jasmim cheiroso da devoo. Alli amadre-silva da simplicidade enfeitar, com seus ramos odorferos, as janelas e as grades, por onde o Esposo divino da alma santa introduz a vista. *AUi a alma do justo crescer como a haste delgada e esbelta da majestosa palmeira. Justus ut palma florebit. Alli os saborosos fructos, isto , as obras de caridade, de misericrdia, de zelo, amadurecero antes do tempo marcado pela natureza como, nas estufas, ha uvas sazonadas e morangos deliciosos na estao em que a neve cobre do manto immaculo a natureza adormecida e estril. A benfica influencia da primeira communho bem feita e da sua renovao frequente, no se limita ao individuo seno estende-se famlia e qui a uma nao inteira. Permitti-me citar o exemplo frisante da Irlandia. Si a Ilha dos Santos a terra mais casta do mundo, como o provam cabalmente as estatsticas, devemol-o, disse um padre irlandez, a Jesus Hstia que os meninos recebem com um fervor extraordinrio, e cuja aco salutar se prolonga na idade critica. Vi esta ilha bemdita emergir como uma bella esmeralda do Oceano Atlntico, com os prados verdejantes, matizados de engraadas flores. Apezar da latitude, o clima relativamente ameno e a natureza bella, porque as correntes quentes, que passam atravz do golfo do Mexico, banham-lhe as praias. Assim tambm, apezar de perseguies seculares, mo grado s difficuldades politicas, a gerao actual traz impresso, na alma herica, o cunho do espirito mystico e claustral de So Patuicio ; conserva intacto o deposito da f, e se ufana de uma alta e impolluta moralidade. E' o milagre da primeira communho bem feita e muitas vezes renovada com devoo. E a aco benfica d'est goulf stream que, passando atravz do Corao Eucharistico de Jesus, derrete o gelo, torna florescente as mais ingratas regies, e fecunda as terras por estreis que sejam.
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[. VUS* A -* I
TERCEIRA
CONFERENCIA.
ma Rainha do Go um terno affiecto e inexcedivel amor. Com doce confiana chamava-lhe: *La cara mamma mia. Com effeito, privada da me terrestre, na idade de oito annos, a piedosa menina tomou a Santssima Virgem por me, tornando-se uma filha amante e devotada. Quanto quero bem a minha Me! dizia ella. Maria, o sabe; e depois, Jesus quem m'a deu e me disse que
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a amasse muito. Que seria de mim si a no tivesse tido? Ella me tem sempre auxiliado nas minhas angustias espirituaes, preservou-me de muitos perigos, livrou-me das mos do demnio que sempre me molestava, deseidpou-me junto a, Jesus quando peeeava, e o aplacou quando o movia ira pela minha vida, ensinando-me a conhecel-o e amal-o. Ah minha querida Me, sempre, sempre te hei de amar. Gemma tinha continuadamente estas e semelhantes expresses na bocca ; era o assumpto de muitas das suas cartas. E' inutil accrescentar que Maria Santssima recompensava magnificamente to filial amor, apparecendo a mido em pessoa, e consolando a sua filha nas contrariedades e afflices. . Ouamos de que maneira a serva de Deus" conta as apparies de Nossa Senhora: Quem poder imaginar que esta noite me tenha vindo visitar minha Me querida! Que felicidade durante estes momentos! Que doura n'aquelles bellos instantes! Maria Santssima me tomou nos braos e me acariciou. Oh quanto bella a Me celestial! A Rainha do Co me perguntou: Verdadeiramente me amas e a mim s? Respondi-lhe: Ha outro algum a quem amo antes de tudo e primeiro que tudo. Maria, simulando ignorar de quem eu estava faiando, insistiu na pergunta, dizendo : E quem ? E' o eleito de meu corao, pelo qual estou prompta a sacrificar tudo, at a propria vida. Elle se parece muito com minha Senhora; tem a mesma cr de cabellos. A Me celeste continuou a no se dar por entendida e disse-me: Minha filha, de quem falas? Minha Senhora, repliquei, ento no entendeis? No comprehendeis que falo de Jesus? e d'elle s? N'este instante, a Virgem me lanou um olhar de infinita ternura e, sorrindo, apertou-me nos braos maternos, dizendo: Ama a Jesus, sim, ama-o muito. Uma outra vez, Nossa Senhora tornou a apparecer sua dilecta filha.
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Estava descanando, conta Gemma, porm no dormia; quando vi approximar-se de mim uma Senhora, esbelta, de formosura sobrehumana, cercada de viva luz. Veiu abraar-me, tom ando-me ao collo. Foi to grande a delicia sentida, que julguei morrer de prazer. Disse-me que vinha buscar meu ramo de flores. V. Rev. comprehende isto? . Minha Me deu-me muitos conselhos estimulando-me pratica das virtudes; recommendando-me que fosse sempre humilde e obediente. Finalmente, com muita ao desappasaudade e terecer, dissenho ardente me que medesejo de torlhorasse nar a vel-a. cada vez Era d'esta mais e me maneira, por adiantasse taes favores, na santidapor tantas de. douras, que N. Senhora Oh, quo recompenbella misava o amor nha Me do Co! terno e a Desde que dedicao de tive a dita de Gemma. contemplarFilhas de lhe o lindo Maria, a rosto, fiquei exemplo da
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serva de Jesus, amae a vossa gloriosa Padroeira, a Virgem Tmmaculada de Lourdes, de quem vestis a formosa libr branco-azul, tal qual ella appareceu na gruta de Massabielle feliz Bernadette Soubirous. Embora parea um disparate encarecer o amor a Maria Santissima quellas que se gloriam de se chamar suas filhas, permitti aconselhar-vos que procureis adquirir uma devoo solida para com ella. Imitae o exemplo de Gemma, que pedia aos sraphins lhe emprestassem os ardores para amar Me celeste como merece.
No imiteis o mo exemplo de algumas pessoas, cuja devoo falsa ou mal entendida, que trazem o nome de Maria na bocca sem tel-o no corao. Algumas ha, infelizmente, que ostentam a fita azul da congregao na. igreja e nas procisses, e no se envergonham de comparecerem a reunies mundanas, trajando segundo os ltimos figurinos do Louvre. Tenham as Filhas de Maria conscincia de sua dignidade e dos graves deveres que to bello titulo impe. Assim como a filha de paes fidalgos e de alta linhagem no pode, sem desdouro de seu brazo, divertir-se na choupana do morador, e confundir-se com a plebe, assim tambm a Filha de Maria, que tem foros de nobreza, no deve sahir de sua casa a no ser como a rainha santa de Portugal, para exercer as obras de misericrdia, corporaes e espirituaes. Esta rainha exemplar, em lugar de dar festas e organizar bailes como soem fazer as princezas vaidosas, tratava dos enfermos no hospital, beij ando-lhes as feridas como si fossem as chagas de Jesus. Santa Izabel, vivendo embora n'um palcio real, cercada dos prazeres requintados de uma corte, estava compenetrada das palavras de S. Thiago: A religio pura e sem macula aos olhos de Deus consiste n'isto: em visitar os orphams e as viuvas nas suas afflices e em se conservar isento da corrupo deste sculo (1-27). A Virgem Maria chora sobre suas filhas traidoras que procuram as delicias do mundo e se entregam s festas, aos prazeres, aos divertimentos mundanos, como chorava no Monte Salette, quando appareceu a Maximino Giraud e a Melania Mathieu, acabrunhada de tristeza e com os olhos arrazadas de lagrimas. Lembrem-se do bello dia em que, prostradas aos ps da Virgem Immaculada, juraram observar o regulamento da Pia Unio e evitar o contagio mundano. Tragam na memoria o delicioso momento em que se consagraram Virgem Santissima. No faltem aos seus juramentos. Si vossa Me, Filhas de Maria, vos falasse como falava a Gemma e vos perguntasse: Vs me amaes?
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podereis responder-lhe com verdade : Sim ; eu vos amo com todas as veras do meu corao? Havia em Roma sete sacerdotizas que deviam manter, dia e noite, o fogo sagrado no altar da deusa Vesta, e por isso se chamavam vestaes. Viviam as vestaes isoladas no templo, guardando a castidade, sujeitas a uma rigorosa disciplina. Levavam, n'uma palavra, uma vida muito privada. Os maiores castigos eram reservados que profanasse o fogo sagrado ou o deixasse apagar. Enterrada viva, expiava n'um tumulo a leviandade por uma morte horrorosa. As vestaes, rarssimas vezes, sahiam em publico ao lado dos Cezares, quando estes, com grande pompa, subiam ao Capitlio a sacrificar aos falsos deuses. Vestiam uma roupa talar bem ampla e de muitas pregas e tinham a cabea coberta por espesso vo. Acabada a solemnidade, recebiam as homenagens da multido, recolhendo-se, em seguida, ao templo. Mais felizes mil vezes e mais favorecidas da graa do que as vestaes da Roma pag, so as Filhas de Maria que devem manter, dia e noite, a chamma da lmpada sagrada. Ora, o azeite que alimenta a l m p a d a o fundo sentimento de devoo. Virgem prudente ha de ser a Filha de Maria que trouxer o azeite comsigo, porque a luz no se ha de apagar e ella ir ao encontro do divino Esposo celebrar, com alegria, as bodas do Cordeiro. Loucas, muito loucas, ho de ser as que no tm uma devoo solida e verdadeira, porque n o p e r s e v e r a r o no bem, e o divino Esposo ha de fechar-lhes a porta, dizendo; .Em verdade vos digo que vos no conheo. Lede, estudae o Evangelho; n'elle encontrareis bellas parbolas referentes a vosso estado; segui as mximas evanglicas, d'onde manam, como da sua nascente, as virtudes christs que renovaram a face da terra. Lembrae-vos das bodas de Can. Maria Santssima l estava com seu divino Filho. L operou Jesus o primeiro milagre, a pedido de sua Me. Por seu exemplo, vossa Me espiritual vos .ensina a praticar a modstia e a caridade nas reunies e na sociedade; por seu exemplo, Maria Santssima vos ensina a maneira de comportar-vos nas festas,
para as quaes vos convidarem com a licena dos vossos paes. Congreganistas, pedi ao Senhor que vos livre das loucuras do mundo, e vos preserve para sempre das vaidades e das illuses do sculo, dos ardis do demnio, da frouxido e da tibieza, pela poderosa intercesso da Virgem Santssima. Assim como a hera, symbolo da fidelidade, abraa-se, fortemente, ao carvalho e sobe-lhe por graciosas espiraes pelo tronco, desafiando o vendaval, apezar da sua fraqueza, assim tambm a Filha de Maria se ha de abraar sua Me que forte como um exercito bem disciplinado no campo da. batalha, sicut acies ordinata. L-se, na mythologia, que um dia houve uma lucta porfiada entre Hercules, filho de Jpiter, que habitava o Empyreo, e o gigante Anteu, que diziam ser filho da Terra. Hercules debalde pelejava com o gigante e j desesperava poder vencel-o, quando, por sua felicidade, viu que Anteu recuperava novas foras cada vez que tocava a Me Terra. Ento o deus celeste soergueu o inimigo nos musculosos braos para tirar-lhe o meio de recobrar alento, e o estrangulou com facilidade. Seja-me licito comparar o here da lenda ao demnio pelejando com as almas consagradas a Maria Santssima. Attendei, oh Filhas de Maria, em conservar-vos sempre estreitamente unidas vossa Me celeste e, por maiores esforos que faa vosso adversrio, nunca vos ha de vencer no combate renhido, emquanto unidas estiverdes a Maria Santssima. O vosso inimigo ardiloso, como o here lendrio, se empenhar em arrancar-vos ao seio de vossa Me; no deixeis que o consiga, afim de no lhe cahirdes nas garras. Sede devotssimas de Maria Santssima, e no vos esqueaes de que a devoo para com a Rainha do Oo um signal de predestinao. Um servo de Maria no perecer jamais, disse So Bernardo. Cada dia a Filha de Maria ha de louvar a Me celestial, como o disse o piedoso rei So Casimiro: Omni die dic Mariae Mea laudes anima.
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Cada dia a piedosa congreganista meditar nos mysteris da vida da Me de Deus e far a leitura espiritual n'um livro que trate de sua devoo. Cada dia deve progredir nas praticas de piedade para com a celestial padroeira. To numerosas so as modalidades d'esta bella devoo, to complexo o culto prestado a Maria, que nunca poder causar tdio. Numerosos so os titulos dados pela Igreja Virgem Santssima, s na sua ladainha contam-se quarenta e oito a fornecerem matria copiosa de meditao variada e interessante. Venerae o Corao immaculado de Maria; venerae as suas sete dores, symbolisadas por sete espadas; venerae os sete amores, symbolisados pelas sete rosas que o cingem. Nossa Senhora amou a Deus: 1. com o amor de complacncia, 2. com o amor de benevolncia, 3. com o amor de reconhecimento, 4. com o amor de desejo, 5. com o amor de amizade, 6. com o amor de compaixo, 7. com o amor de esposa espiritual. Lembrae-vos, congreganistas, da bella sentena de Santo Agostinho: De Maria nunquam satis. No podereis nunca louvar bastante vossa Me, n o podereis jamais amal-a como merece. Dizem os santos que Maria Santssima, a Me do bello amor e da doce esperana, ha de coroar com as prprias mos os servos que lhe tiverem promovido o culto, construdo uma igreja em sua honra, ou escripto um livro para lhe propagar a devoo, e, finalmente, a todos os que se tiverem esmerado em tornal-a conhecida, venerada e amada. Esforae-vos por merecer esta dita singular, para que, um dia, a Rainha das Virgens possa dar-vos com as prprias mos a coroa da immortalidade, como fez sua fiel servaGemma Galgani, esta verdadeira Filha de Maria.
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. A - prola, das T 7 I r t u L d . e s
pureza
O reino do co semelhante a um homem negociante qtie busca boas prolas e, tendo achado uma de grande valor, vae vender tudo o que possue e a compra.
prola, a rainha das jias encontrase no fundo do mar, dentro d'uma concha bivalva, agarrada aos rochedos ; os pescadores, para apanhal-a, empregam ingentes esforos e arriscam, muitas vezes, a prpria vida. Assim a rara e bella rainha das virtudes est guardada por duas outras: a modstia e a mortificao que, semelhantes s duas valvas da concha, encerram esse thesouro da alma enrista.
A pureza, semelhante concha, esconde-se e foge dos olhares indiscretos. Como as duas valvas da concha fornecem industria a madreprola, substancia nacarada, prpria incrustao dos objectos de arte, tambm as duas guardas da pureza enfeitam e fortificam a alma. E, como as duas valvas da concha adherem to fortemente, que preciso muito trabalho para separal-as e tirar o thesouro que encerram, tambm a modstia e a mortificao guardam, cautelosamente, a pureza. A modstia modera certas pequenas paixes, externas e desregradas. Prescreve, portanto, regras aos olhos, lngua, a todos os membros, quanto d e c n c i a e aos movimentos. Esta virtude no consiste to somente na composio exterior, deve proceder da composio interior da alma. E' necessrio que seja muito cara Filha de Maria, como foi cara a Gemma. Entre muitos outros favores e dons extraordinrios, Nosso Senhor concedeu a sua fiel serva a graa de um perfeito desapego das creaturas, de um profundo desprezo das vaidades e de um domnio soberano sobre todos os seus sentidos. Gemma no vestir nunca se sujeitou tyrannia da moda e, por isso, pode servir de modelo a algumas Filhas de Maria, porque poucas ha que lhe no sejam escravas, affectadas no vestir e amantes de adornos. Estas taes no se lembram da palavra de S. Paulo: Seja conhecida a vossa modstia de todos os homens, porque Deus est perto. O vesturio de Gemma era o mais simples e modesto possvel. Durante toda a vida vestiu preto, sem enfeite algum, apezar dos motejos e da perseguio das prprias irms, que, muitas vezes, lhe exprobravam a excessiva modstia. O preto dizia-he o que o preto da batina diz ao padre: que a vida christ deve ser uma vida de sacrifcios, de mortificao, de renuncia, de abnegao, de luto e de morte ao mundo. Verdadeiramente, Gemma foi uma joia, foi um onyx, esta pedra fina de um preto resplandecente.
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O Padre Germano refere a este propsito o seguinte: No anno de 1895, Gemma recebeu de um primo um lindo relgio com o respectivo trancelim, bem como uma cruz, tudo de ouro de lei. Em considerao pessoa unicamente, e n o por vaidade, quiz adornar-se, pelo menos uma vez na vida, e sahiu levando o mimo. Ao voltar para casa, encontrou o anjo da guarda com o rosto irado que lhe disse: Uma esposa de Christo no deve ter outro adorno a no ser os espinhos e a cruz . Gemma cahiu de joelhos soluando e, derramando rios de lagrimas, exclamou: O/t Jesus, perdo! Por amor de Vs e somente para Vos agradar, prometto renunciar para todo o sempre vaidade e aos atavios, e juro nunca mais pensar riessas misrias nem falar ri essas frivolidades. Levantando-se, arremessou ao cho a rica dadiva, bem como um anel que trazia no dedo desde menina, e pisou aos ps esses objectos de luxo. Gemma foi fiel sua promessa, e nunca mais lembrouse de ataviar-se. Eis ahi uma bella aco. A modstia suppe a mortificao, outra valva da concha que encerra e guarda o thesouro da pureza. Esta virtude affecta todos os sentidos: a vista, o gosto, o olfacto, e tambm o andar. A mortificao possvel a todos, inoffensiva, e no esgotta as foras. E' praticvel em todos os logares, sagrados e profanos, em todo o tempo, de dia ou de noite. Tendo lido na vida dos santos que estes conservaram a virtude anglica custa de grandes mortificaes corporaes e, sabendo que os que so de Christo crucificaro a prpria carne com os seus vicios e concupiscncias, ao exemplo de S. Paulo, Gemma, como verdadeira penitente, castigava o corpo innocente com tanto rigor, usando disciplinas enlaadas de pregos agudos, que acontecia cahir no cho desmaiada. Por muitas vezes, os confessores foram obrigados a prohibir ou, pelo menos, a moderar to excessivas maceraes. Vejamos os santos que engenhosos foram em descobrir o que contrariasse sensualidade. Vejamos como Gemma foi mortificada em tudo.
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Diz o autor da sua biographia que os olhos da serva de Deus s eram vistos com clareza, quando estava em xtase; fora destes momentos baixava-os com pudor. Os olhos so as janellas da alma, por onde entra o ladro, si por acaso as encontra abertas. Gemma sabia que a vista inclinada para o cho eleva o corao a Deus (S. Bernardo). Quanto ao gosto, Gemma havia alcanado do Senhor, por instancias repetidas, a graa de no sentir prazer algum na comida. O alimento que tomava era to pouco, que todos ficavam admirados. Tambm era muito franzina e pequena, parecendo mais nova do que realmente era. De formas graciosas e bem proporcionadas, a serva de Deus era muito attrahente, distincta, e cheia de encantos como uma delicada flor da primavera. Era to mortificada, que se privava do odor das flores e nunca usou extractos aromticos e perfumes, perigosos incentivos da voluptuosidade. A santa donzella mortificava a lingua e, um dia, chorou muito aos ps de Jesus, porque, durante uma visita, prestou atteno e tomou parte em conversas que lhe pareciam um tanto mundanas e frvolas. Emfim, sua vida foi de tal modo mortificada, que era verdadeiramente um modelo da pureza de costumes. Em razo de se achar enferma, com frequncia e gravidade, era chamado o medico, cujas visitas eram-lhe um verdadeiro martyrio. Ao vel-a assim to meticulosa em deixar-se tocar, um medico tomou-a por fantica e tola, procurando convencel-a de mudar de proceder; mas Gemma, com rara eloquncia, fel-o calar, desfazendo-lhe os argumentos, um por um, com grande admirao de quantos presenciavam o facto. N'uma outra occasio, no quiz ser chloroformizada, por um admirvel sentimento de pudor, supportando, heroicamente, os tormentos de uma cruel operao na espinha dorsal. O recato que Gemma patenteava em publico, andando pelas ruas, chamava a atteno de todos; sua modstia fez exclamar a um empregado da casa de sua tia, que a acompanhava em suas sabidas : S ha no mundo nona Gemino.
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Um dia, conta-nos o Padre Germano, um primo do Gemma, devendo sahir a eavallo, pediu-lhe o favor de buscai um objecto de que se tinha esquecido. A serva de Deus annuiu ao desejo do cavalleiro e este, para corresponder a tanta gentio cunho partileza, lembroucular de sua se de aearivida espiricial-a. Debrutual : a gentimm leza para com ado sobre a sella, j esteno prximo e dia o brao em uma energia sua d i r e c o . indmita para Gemma, porepellir as derm, adivimonstraes nhando-lhe o de amizade, i n t e n t o , repor mais innopelliu com tal centes que fosfora a mo do sem. primo, que este Este exemperdeu o equiplo a i n d a lbrio e cahiu. mais admirEste rasgo nos vel pela tenra mostra todo o idade, pois G e m m a era caracter de ento uma meGemma, pronina de sete vando que era Reproducco de um quadro das Cataannos. um anjo de cumbas, representando Santa Igncz, com o vestido recamado de jias. E' prprio pureza, e tambm revelando das virgens , diz S. Ambrsio, temer toda a conversa e contacto humano, e fugir das oceasies perigosas . Sabendo que o menor hlito e m b a a um espelho, Gemma evitava, com o mximo cuidado, o contagio que lhe pudesse offuscar o brilho da innocencia. Sciente de que trazia a virtude n'um vaso quebradio e que no podia conservar a continncia, como disse Salomo, sem o auxilio de Deus, todos os dias orava n'esta inteno. Sua me que tora uma excellente educadora, lhe tinha aconselhado a rezar, todos os dias, trs Ave-Marias, afim de conservar illibada a candura. A santa menina nunca deixou passar
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um dia, sem fazer estas oraes, e nunca omittiu, at a morte, a piedosa pratica ensinada por sua me. Prostrada perante a imagem da Immaculada, de mos postas, dizia: O minha Me, no consintaes que perca a minha innocencia ; recorro a vossa proteco e me colloco debaixo de vosso manto materno. Gnardae minha pureza para que possa agradar a Jesus cada vez mais. Em conferencias subsequentes, quando desdobrar aos vossos olhos as virtudes de constncia maravilhosa e invicta pacincia que adornava a bellissima alma da serva de Deus, tereis o ensejo de admirar, mais uma vez, a alvura d'esta alma de arminho. Graas valiosa proteco da Virgem das virgens, Gemma Galgani, longe de resvalar na voragem tenebrosa do vicio, foi adquirindo uma pureza cada vez mais radiosa. Vereis de que maneira Gemma venceu, forte e corajosamente, os assaltos repetidos e violentos do espirito das trevas, vereis como olla foi insensivel aos attractivos do mundo e aos brados alliciadores de pessoas mundanas e dissolutas. A Virgem Maria que sempre ouve as preces fervorosas de suas filhas, preservou Gemma de toda a queda e a livrou de todo o labu. A pureza da serva de Deus foi toda prova; e seu odor embalsamou a nossa pobre terra, no s allegoricamente falando, mas no sentido real. De facto, cousa maravilhosa!attestaram as pessoas de sua intimidade que a serva de Deus exhalava uma suavssima fragrncia, mesmo nas longas e penosas doenas. Era o perfume da pureza d'esse corpo innocente que parecia crystal. Sabe-se, pelos attestados de seus confessores e directores de conscincia, que Gemma nunca manchou a veste nupcial da graa, nem por um salpico sequer da lama do peccado, e que sua alma voou para o co, pura e innocente, tal qual tinha sahido da pia baptismal. Espectculo grandioso e arrebatador ver-se uma alma entrar triumphante no reino da gloria, adornada com a mais bella flor do admirvel jardim de Deus, uma alma em que resplandece a pureza do corao.
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Tendo-se apresentado um partido vantajoso, sua tia Helena lembrou-se de transmittir o pedido a Gemma, no suspeitando que j tivesse escolhido o caminho do co que o Verbo incarnado escolheu para sua bemaventurada Me. Penalizada, desgostosa, ferida no intimo d'alma, deixou incontinente a casa da tia e voltou para Lucca, preferindo a penria e as privaes do lar paterno ao bem-estar e luxo da casa hospitaleira onde soffrera tamanha decepo! Esta santssima alma, illuminada pelo Espirito Santo, comprehendera a superioridade da virgindade sobre qualquer outro estado. Conhecia a felicidade que havia em no 1er no mundo outra affeio alm da nica que, em vez de terminar com a vida, renasce no co com a immortalidade e a gloria. Gemma suspirava pela unio divina no paraiso e anhelava, com todas as potencias de sua aima, a ventura d'aquellas virgens, cujo nico amor verdura em logar de murchar como os amores do mundo, e se expande, se aperfeioa, se completa na eternidade. (Cardeal Wiseman.) Lembrem-se as Filhas de Maria das palavras da Imitao de Christo : Tem o homem duas azas com que se levanta acima das cousas terrenas : a simplicidade e a pureza. A simplicidade busca a Deus, a pureza o abraa e n'elle se compraz. No se esqueam da palavra de Nosso Senhor no monte das bemaventuranas : Bemavenluvados os limpos de corao, porque vero a Deus. Para alcanar esta bemaventurana, a exemplo de Gemma, a Filha de Maria recorra quella a quem a Escriptura chama a Aucena Immaculada dos valles, a quem jamais o peccado manchou. Disse o poeta portuguez Campo Santo : Frias que podem Da avernal caterva Contra almas puras Que Maria assiste? Quem chama a Virgem Com devota prece Forte resiste ! Nas occasies perigosas, nas reunies mundanas, lembrae-vos, congreganistas, das palavras que Gemma, vosso modelo, este anjo em carne, tinha nos lbios:
Jesus no est aqui, fujamos pois/ A Esposa dos Cantares, diz piedoso autor, tem as mos destillando myrrha que preserva da corrupo; seus lbios so fitas de escarlate purpreo, signal do pejo nas palavras; seus olhares so de pomba, em razo da brancura; seu nariz est entre os cedros do Libano, madeira incorruptivel. Tal deve ser a alma devota. Tal deve ser a alma da Filha de Maria, fiel imitadora da castissima donzella que se chamava Gemma Galgani, em que rebrilhou, em suaves esplendores, a rainha das virtudes, a prola da pureza do corao. Sejam o ramilhete espiritual d'essa conferencia as palavras da Imitao: Para erguer nossa, alma, presa Da terra as cousas to rasas, Temos lodos duas azas: Simplicidade e pureza. So Boaventura, o douto cardeal franciscano, comparou tambm as virtudes que devem adornar a alma enrista s azas do Seraphim que appareceu ao seu bemaventurado Pae, S. Francisco de Assis. Depois de contemplarmos a radiosa pureza, esta aza direita que erguia ao co a serva de Deus, Gemma Galgani, na conferencia seguinte, consideraremos a maravilhosa simplicidade, a aza esquerda, que levava s alturas do paraiso esta alma de arminho, esta castissima donzella.
Sobre o tumulo de Gemma, coberto de inscripes, pedidos, aces de graas por benefcios alcanados, destacase a seguinte prece: Querida Gemma, ajuda-me a desterrar os mos pensamentos que me perseguem . Piedosas Filhas de Maria! nas vossas difficuldades espirituaes, nas vossas lutas contra o poder das trevas, chamae pelo nome de Gemma Galgani, porque doce, querido de Deus e dos anjos e, ao mesmo tempo, terrvel, fazendo tremer aos demnios, que tantas vezes foram vencidos pela serva de Deus. Collocae o retrato da castissima Donzella de Lucca no vosso Manual o no vosso oratrio;
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invocae, com f e confiana, seu nome bemdito, nas horas trabalhosas, porque tem a virtude particular de, como muitas pessoas experimentaram, afugentar Satanaz e os espritos malignos que, embora repellidos com energia, nem por isso deixam de tentar os christos e perseguir de preferencia as almas piedosas. Embora Gemma ainda no esteja elevada sobre os altares, e seja prohibido render-lhe um culto publico, pode sei invocada nas preces particulares, desde que a causa de sua canonizao j foi introduzida em Roma, o que se deu cinco annos apenas depois de sua preciosa morte. Oh Filhas de Maria, supplicae, pois, a esta virgem prudente para que, do alto do co, vos auxilie a guardar a bella flor da innocencia, de maneira que, a seu exemplo, possaes, na hora da morte, levar nas mos o lyrio da castidade illibada. Si Deus vos chama ao estado conjugal,porque as Filhas de Maria podem escolher o estado que mais lhes convier,no matrimonio mesmo, podereis praticar muitas virtudes excelsas, e sobretudo a fidelidade conjugal. Comtudo lembrae-vos que o Esj)oso dos Cantares se apresenta entre as aucenas.
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Seja Gemma, que mereceu o bello appellido de Virgem de Lncca por suas acrisoladas virtudes, a vossa protectora e advogada! Si a bemaventurada Anna de Paredes, uma das mais puras glorias da America do Sul, mereceu o bello titulo de Aucena de Quito, cidade do Equador, onde morreu na idade de vinte e seis annos, nossa Gemma merece tambm o appellido de Flor de Lucca pela fragrncia de suas virtudes. Imitae, pois, o exemplo de ambas, de modo que possaes dizer com o apostolo das gentes: Bnus odor Christi sunms! Conta-se, na Odyssa, que alguns homens, companheiros de Ulysses, embrenharam-se nos bosques de uma ilha, levando uma vida material, semelhante a dos animaes. Quando foi hora de levantar ferro, estes homens cabelludos, de longas barbas e unhas crescidas, declararam ao here da lenda que tinham resolvido trocar uma vida cheia de perigos e trabalhos por uma vida carnal como a dos animaes da selva. A Filha de Maria no pode imitar o mo exemplo representado pela fico potica de Homero. Pelo
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Gemma Galgani.
contrario, a congreganista deve levar uma vida semelhante a dos habitantes do co, brilhar como uma prola pela pureza dos costumes, afim de no parecer com os mundanos que S. Paulo estigmatizou por uma expresso enrgica, chamando-os homines animales, que no comprehendem as douras e delicias da vida espiritual e sobrenatural. To cara a Deus a pureza, que lhe est promettida uma bemaventurana privilegiada. So as almas virginaes que, vestidas de luz como de uma estola branca, cobertas de myrtos sempre florescentes, coroadas de gloria e de honra, triumpham eternamente, cantam junto ao throno de Deus, diante do Cordeiro immaculado, os hymnos melodiosos da victoria e os cnticos perennes da suprema alegria. A serva de Deus, nas suas idas igreja e nos seus passeios, acotovelava-se com os mundanos que trazem, estampado na fronte, o negro ferrete de todos os vicios. Ella ouvia os gritos de alegria e de volpia dos que, coroados de rosas, sentam-se ao banquete da vida e bebem, ao som de uma musica lasciva, a taa inebriante do prazer. Seu corao, comtudo, longe de se deixar amollecer pelo. espectculo perigosssimo d'essas loucuras, cada vez mais, se fortalecia e progredia na virtude. Congregnistas, imitae este bello exemplo! Acabando esta conferencia que vae muito longa, peovos ainda me permittaes exclamar com o autor inspirado da Sabedoria: Oh quo bella a gerao casta, cujo brilho to suave! Tem a estima cie Deus e dos homens! Oh quo bella e admirvel a Congregao das Filhas de Maria, vencedora das artimanhas do demnio e das mil seduces do mundo. Quo bella a Pia Unio, cujos membros se elevam acima dos sentidos, acima das affeies terrestres e carnaes, e vivem uma vida semelhante a dos anjos no co; porque mereceram a amizade de Deus e a estima dos homens ! Quani pulehra est. casta generatio eum claritate. Quo bella no co a coroa de Gemma, em que rebrilha a prola das virtudes!
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QUINTA C O N F E R E N C I A .
O cr 37-3 tal. -A. simplicidade de O-emma O-al^anl.
E t l u m e n ejus simile lapidi pretioso tamquam lapidis j a s p i d i s , sicut crystallum. Apoc. 22.
O seu lustro c semelhante, a ama pedra preciosa, como a pedra de jaspe, d maneira do crystal.
crystal, esta substancia mineral t r a n s p a r e n t e que, naturalmente, toma linhas symetricas e formas geomtricas, encontra-se nas cavernas do subsolo. Por sua transparncia pode symbolisar a simplicidade e a sinceridade, virtudes evanglicas, tantas vezes elogiadas por Nosso Senhor. A alma de Gemma era um puro crystal transparente e luminoso, porque era de uma simplicidade e de uma ingenuidade encantadoras.
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Pode-se dizer que esta virtude era o caracterstico da serva de Deus, o fundo de sua natureza. A simplicidade resplandecia-lhe em todo o ser, principalmente nos olhos que, alem de serem muito vivos, retratavam a belleza interior de sua alma ingnua. Gemma era simples, em tudo: simples no vestir, no andar, no falar, no proceder, simples finalmente em todo o ser, de sorte que se tornou uma menina summamente sympathioa e amvel. A candura infantil lhe concedia um no sei que de attrahente, conquistando-lhe a estima das mestras, a amizade das collegas e a viva sympathia das pessoas que com elia se relacionavam. Diz o autor de sua vida que no se distinguia das outras moas, nem por um porte affectado, nem por uma modstia disfarada. Na igreja se comportava perfeitamente, testemunhando um respeito e um procedimento raros, sem todavia chamar a atteno de quem quer que fosse, por uma posio singular, ou por gemidos ou suspiros. Com o mximo cuidado Gemma escondia o segredo do Rei e os dons sublimes de que era favorecida; por isso na igreja nunca rezava de modo affectado que attrahisse os olhares; encobria o dom das lagrimas que o Senhor lhe tinha concedido com abundncia. Quando ardorosamente meditava e a santa compunco lhe chegava ao extremo, a serva de Deus se contentava em inclinar-se e cobrir o rosto com as mos, escondendo assim as lagrimas ardentes que, sem cessar, lhe corriam dos olhos. Por fora nada transpirava; tudo se passava na intimidade entre Deus e sua alma. As pessoas visinhas nem de leve suspeitavam que alli, bem perto, estivesse uma grande santa. Ningum pensava que Gemma, abysmada em sublimes contemplaes, semelhante a Moyss sobre o monte Iloreb, falava com Nosso Senhor e recebia communicaes celestes. Ningum imaginava que esta joven to simples, rezando perante o S.S. Sacramento, fosse transportada em espirito s regies celestiaes e ouvisse palavras mysteriosas que a, lingua humana incapaz de reproduzir. Sua prpria companheira
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ignorava as revelaes e as vises que tinha n'este momento. Para abafar os ardores do amor divino que lhe abrazava o corao, Gemma fazia esforos sobrehumanos a ponto de, como ella mesma confessou, ter s vezes febre. Um dia, depois da santa communho, o fervor chegou a seu auge, e, no podendo mais se conter, Gemma teve
uma longa syncope. Muito penalizada, a serva de Deus falou docemente ao divino Esposo de sua alma, que no permittisse jamais renovar-se tal accidente, que moderasse as chammas de caridade durante a aco de graas, afim de nunca mais repetir-se um deliquio que pudesse patentear o excesso de sua devoo, e trahir o ardor das chammas que lhe incendiava o corao. A serva de Deus era cheia de candura para com Deus, para com os anjos e os santos que lhe appareciam a mido; falava com o anjo da guarda, com uma simplicidade que encantava. A' noite, quando ia se recolher, tomava-lhe a benam como uma filha bem comportada toma ao pae querido. A's vezes pedia ao anjo que a persignasse na fronte e velasse cabeceira de sua cama. Quando acordava e o enxergava no logar de vigia, sorria-lhe amavelmente, sem comtudo lhe prestar muita atteno, porque tinha pressa em ir igreja fazer a meditao e ouvir a santa missa. Nas sextas-feiras, passados os xtases, durante os quaes soffria os tormentos da Paixo, banhava o rosto cheio de sangue, lavava as mos afim de fazer desapparecer os vestgios dos estygmas, e voltava aos seus, risonha e alegre, a conversar, a brincar com as crianas de D. Ceclia Giannini, como si nada tivesse acontecido. Oh santa simplicidade! Aos seus olhos, estas manifestaes sobrenaturaes no passavam de cousas muito simples. Era to cndida e to ingnua, que nunca se lembrou sequer de perguntar a si prpria o que tudo aquillo significava. Que admirvel candura a d'esta menina, nunca se impressionando em presena de graas extraordinrias! Qual a pessoa que, em seu logar no teria duvidas e no diria comsigo: Ser isto um favor de Deus, um acontecimento milagrosoV ou uma astcia do demnio? um effeito da illuso? Em abono da verdade convm confessar que, em certas occasies excepeionaes, sua grande humildade perturbava-se, principalmente quando notava a perplexidade e a duvida visivelmente estampadas no semblante dos parentes e conhecidos. Todavia, o vivo desejo de se con-
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formar, humilde e simplesmente, com o modo de ver e de pensar do pae espiritual a quem tudo confessava, traziamlhe, immediatamente, o socego de espirito. A serva de Deus era de igual candura nas relaes sociaes. N'ella no havia a sombra de hypocrisia ou de falsidade; n'ella no havia fingimento algum. Como a Esposa dos Cantares podia dizer: Sou a flor dos campos. Sabe-se, com effeito, que, n'estes nossos tempos modernos, chegou-se a falsificar tudo, at as flores. O horticultor parisiense Vilmorin, graas a certos processos scientificos de seleco e de enxertadura, que por signal foram inventados por um frade, grande amigo das flores, o abbade Mendel, transforma as obras de Deus, mudando a cr das flores, augmentando-lhes o numero das ptalas, dando-lhes um cheiro diffrente, alcanando emfim plantas de odores compostos e de matizes desconhecidos. Gemma no era uma d'essas flores de estufa, falsificadas e artificiosas, com corollas dobradas; no, era a verdadeira flor dos campos, simples como a rosa brava, de ptalas singelas, que adorna a gruta de Masabielle, na q u a l a Virgem de Lourdes appareceu a Bernadette. Sem ser grosseira nas relaes sociaes, e sem transgredir jamais as regras da civilidade e da ba educao, Gemma n o poude acostumar-se nunca civilidade requintada, que n o outra cousa sino a duplicidade imposta pelas chamadas convenincias sociaes. A serva de Deus era singela no falar, franca e sincera; nunca disse uma d'estas inverdades, embora innocentes, que so o patrimnio da diplomacia e da pragmtica. To natural era-lhe a -sinceridade, que parecia uma criana ingnua, lastimando do fundo do corao a hypocrisia dos mundanos. Conhecendo perfeitamente a lingua franceza, no devia ignorar os versos do hymno que se canta no retiro: Tout ri est que vanit, Mensonge, fragilit, .... , Dans, tous ces objects divers, Qri offre nos regards V Univers. Tous ces brillants dehors, cette pompe,
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Ces biens, ces trsors, tout nous trompe, Tout nous blouit, Mais tout nous chappe et nous fuit! No ha siiio vaidade, Engano, fragilidade, Embora seja diverso O quanto apresenta o universo. Todo esse brilho vo, esse encanto Que nos prende assim tanto e tanto , . E que nos seduz Breve, breve em p se reduz. Disse o naturalista Buffon que, pelo estylo, se pode formar conceito sobre algum: Le style c'est l'homme, o homem se retrata no estylo. Pode se julgar pelo estylo de Gemma, estylo simples, correcto e fluente, o natural simples e bom da serva de Deus. O Padre Germano enfeixou n'uni bello volume um grande numero de cartas que Gemma escreveu a diversas pessoas, sobre assumptos exclusivamente espirituaes. As cartas que escreveu ao seu director tm o cunho inconfundvel da sinceridade; o estylo no pomposo, mas de grande naturalidade e de uma candura que enleva. Gemma no usa nas correspondncias introduces emphaticas e ocas, nem to pouco protestos patheticos de estima, que a moda introduziu no estylo epistolar moderno ; suas cartas tem a conciso e os bons moldes de Cicero. Attesta o director de sua conscincia que lhe era um verdadeiro prazer guiar uma alma to simples, to ingnua e despretenciosa, expressando-se com uma sinceridade de criana sem rodeios nem subterfgios. Ningum julgue, entretanto, que esta virtude fosse, da parte de Gemma, o effeito da rusticidade ou da tolice, commum s pessoas pouco illustradas; no, a nossa santa era dotada de uma intelligencia viva e perspicaz. Tinha um gnio alegre e expansivo, sendo, ii'uma palavra, uma menina dotada das mais bellas qualidades, a par de uma primorosa educao. Muitas pessoas piedosas recorriam-lhe s luzes e pediam-lhe os conselhos. Gemma escutava-as com atteno e respondia-lhes com a maior simplicidade e franqueza,
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conquistando, d'est modo, a sympathia e gratido de quantos a procuravam em suas duvidas o necessidades espirituaes. A sinceridade infantil era, portanto, o fructo de uma virtude acrisolada, e a consequncia das convices religiosas. Sabia que a simplicidade agrada a Deus que gosta de falar s almas simples, aos olhos do qual a astcia uma abominao. Jesus podia dizer de Gemma o que disse de Nathanael: Eis aqui um verdadeiro Israelita em quem no ha dolo. ; Mirem-se n'este espelho de puro crystal as Filhas de Maria, e vejam si, por ventura, encontram em suas almas a negra mancha da astcia, que tanto desagrada a Nosso Senhor. Quantas vezes o meigo Salvador n o vituperou a hypocrisia dos phariseus! Ai de vs, dizia elle, que sois semelhantes s catacumbas caiadas por fora e pelo exterior parecem lindas aos olhos, e encerram, todavia, no interior ossos corrodos e podrido. Si no fordes simples e innocentes como as crianas, no entrareis no reino do co. No temaes, Filhas de Maria, os motejos d mundo, que ridiculariza a simplicidade do justo. O mundo cheio de enganos e preconceitos, tristes fructos da cegueira, quando chega ao paroxysmo da paixo ou ao cume da ignorncia, no trepida em querer permutar os peores vicios em bellas virtudes, diz o Papa S. Gregorio. Este doutor da Igreja, um dos melhores moralistas, que bem conhecia as chagas asquerosas corroedoras da sociedade, explanou perfeitamente as palavras de Job : Diridetur justi siniplicitas, zomba-se da simplicidade do justo. As verdadeiras noes so intervertidas, os nomes de virtudes e de vicios so trocados, voluntariamente. Os vicios so considerados como predicados. A' duplicidade d-se o bello nome de sabedoria, astcia o nome honroso de civilidade e mentira o de urbanidade.
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Aos olhos do mundo a simplicidade uma loucura, a ingenuidade uma tolice, emquanto a duplicidade e hypocrisia so virtudes sociaes.
Os meninos aprendem esta philosophia errnea.nas escolas, e pagam aos mestres e sophistas que ensinam taes monstruosidades. Os falsos sbios dotados de tal sciencia, deturpadora do sentido das palavras e adulteradora da verdade, so cheios de orgulho e desprezam os mais. No vos deixeis enganar pelos preconceitos humanos, , e tantos outros sophismas de que Job se queixava ha tres mil annos atraz. No vos deixeis illudir pelo espirito perverso do mundo, que Nosso Senhor tantas vezes reprovou com energia. Escutae o sbio conselho de S. Francisco de Salles: Seja a, vossa linguagem sincera, lhana, ingnua e fiel; guardae-vos da duplicidade, porque o Espirito Santo no habita rium corao fingido e dobrado. (Sap. 5.) A prudncia mundana e carnal pertence aos filhos do sculo, mas os filhos da luz caminham sem rodeios nem dissimulao. O ministro Talleyrand repetia aos diplomatas, seus collegas, esta phrase machiavelica: A palavra foi dada ao homem para dissimular o pensamento. Que horror! So Thiago nos ensina a sabedoria verdadeira, quando nos diz que devemos falar sem disfarce e com franqueza: sim, sim, e no, no. Dizei com o propheta-rei: Senhor, ponde guarda em minha bocca e uma porta que cerre meus lbios, afim de que meu corao no lenha palavras maliciosas para desculpar o peccado. Dizei cada dia esta curta orao da Tmitao de Christo: Na singeleza do meu corao, offereo-me hoje a Vs para vos servir, Senhor; perpetuamente^ vos obedecer e me immolar a vossa gloria. No seja a Filha de Maria, semelhante a esphynge lendria, o monstro mythologico, que tinha cabea de mulher e devorava os viajantes que no adivinhassem os enigmas que lhes propunha. No rosto da Filha de Maria, deve resplandecer a simplicidade e innocencia que agrada a Deus e aos homens. Attendei Verdade eterna que vos diz: Sede simples, como a pomba. > Si os teus :olhos forem simples, todo o teu ser estar na luz.
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Sede cndidas a exemplo de Gemma que tinha sempre um sorriso franco nos lbios. Sejam vossas palavras a pura expresso dos vossos pensamentos. Andae perante o Senhor na simplicidade de vosso corao e na singeleza de vosso espirito. Praza ao co que possaes dizer como Santa Agueda: Ingnua, sum e de spectabili genere,sou ingnua e de clara estirpe. Sirvam estas palavras da gloriosa martyr de ramilhete espiritual a esta conferencia. Oh quo bella a singeleza no servio de Deus! A industria moderna imita com tanta perfeio as jias, e produz brilhantes falsos com tanta pericia, que, s vezes, os prprios ourives se enganam. Filhas de Maria, desprezae as virtudes falsificadas e baratas, ornae as vossas almas de jias verdadeiras e caras. Adquiri a simplicidade, o crystal de rocha genuno, de limpidez perfeita; rejeitae a hypocrisia que n o passa de um simples vidro talhado de facetas enganadoras e de falso brilho. Esforae-vos por adquirir, em continua diligencia, a simplicidade evanglica, copiando, em vossas almas, a candura e simplicidade de Gemma, vosso perfeito modelo.
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SEXTA
CONFERENCIA,
ao girasol que volve a corolla estrellada segundo a direco do astro-rei, Gemma que mereceu ser chamada a flor de Lucca como Santa Rosa, a gloriosa padroeira do Peru, foi a flor de Lima, voltava de dia para o tabernculo a mente e o corao, e de noite quando acordava, o que lhe acontecia muitas vezes, segundo o pedido do rei David, levantava as mos innocentes na direco do sacrrio e
EMELHANTE
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bemdizia ao Senhor de Sio. Parece que Deus tenha suscitado a sua fiel serva para exemplo de venerao ao Santssimo Sacramento, n'este tempo moderno em que a caridade esfriou e tanta falta se est sentindo da verdadeira piedade. A piedosa menina, illuminada pelas luzes do Espirito Santo, chamava a Eucharistia a escola celeste. O professor, dizia ella, Jesus. A sala de estudos o cenculo, e a lio o Corpo e o Sangue do Salvador. Chamava a communho o paraso de Jesus. Sahindo de casa, apressada, dizia a quem lhe perguntava para onde ia: Vou a Jesus. O pobre Jesus est s e ningum pensa ri elle. Estas e outras expresses so verdadeiras palhetas de ouro, lapilli limpidissimi, como diriam os escriptores romanos. Todas as tardes, dirigia-se, a passos rpidos, igreja para fazer a visita ao Santssimo Sacramento. Uma vez chegada aos ps do altar, adorava com profundo respeito o Corao Eucharistico, que palpita no sacrrio; os olhos fitavam o tabernculo, onde reside Jesus Sacramentado; o semblante se lhe transfigurava; doces lagrimas lhe deslizavam pelas faces, de maneira que, n'esta immobilidade e posio exttica, Gemma parecia um anjo em adorao. Como o psalmista, podia exclamar: Quo amveis so os teus tabernculos, Senhor dos exrcitos ! A minha alma suspira e desfallece pelos trios do Senhor; o meu corao e a minha carne se regosijaram no Deus vivo. Ainda o passarinho acha casa para si, e a rola ninho para collocar os filhinhos, (a minha morada so) os teus altares, Senhor dos exrcitos, liei meu e Deus meu. Bemaventurados, Senhor, os que moram na tua casa; pelos sculos dos sculos te louvaro. Bemaventurado o varo que de ti espera soccorro, que.dispz elevaes no seu corao, ri este valle de lagrimas, no logar que Deus destinou para si. Porque o legislador lhe dar a sua benam, ir de virtude em virtude; ser visto o Deus dos deuses em Sio. Senhor Deus dos exrcitos, attende a minha orao: volta-me os teus ouvidos, Deus de Jacob.
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; Porque melhor um dia nos teus trios do que milhares (em palcios reaes). Escolhi estar abatida na casa do meu Deus a morar nas tendas dos peccadores. Porque Deus ama a- Misericrdia e a verdade: o Senhor dar d a graa e a gloria.
!
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No privar de bens aquelles que andem em innoeencia. Senhor dos exrcitos, bemaventurado o homem que em ti espera. A adorao se prolongava principalmente na quinta feira, por occasio da Hora Santa, que era a devoo predilecta da serva de Deus. Era a hora mysteriosa em que as trevas crepusculares enchem o templo silencioso, hora do lusco-fusco. A luz da lmpada dourada, em frente do Santssimo, scintillava e, de instante em instante, illuminava a abobada, as cornijas e os frizos pintados. A alma de Gemma, como a luz bruxoleante da lmpada, consumia-se nos ardores do amor divino. Do seu corao abrazado em celestes chammas sahiam centelhas como estas: Jesus, alma de minha alma, hstia santa, eis-me em vossa presena! Aqui estou. Abri-me o vosso Corao, Jesus, para, nelle depositar todos os meus affeclos! Abrime, Jesus, o vosso Corao! Ah, encontrei, Jesus, a vossa habitao, habitues na alma que haveis creado vossa imagem, na alma que vos ama e vos deseja. Quisera que o meu corao no palpitasse, no vivesse, no suspirasse sino por Jesus . . . Muitas veses estive a considerar si haveria na terra um objecto, a que pudesse dirigir os affectos; porm, no acho nenhum, nem na terra nem no co, a no ser somente o meu amado Jesus. Todavia, tantas vezes entreguei-me s insulsas dissipaes da terra! Oh quantos os que se perdem pelas vaidades do mundo! So loucos deveras. Si pensassem em Jesus, Jesus lhes mudaria os coraes, affectos, sentimentos, snsjriros; e si experimentassem, um s instante, a. consolao que se prova em estar com Jesus, aposto que no se aventurariam mais a perdel-o .... Meu Deus, meu Jesus, meu Salvador!... Quisera sempre arder, quizera por Vs sempre palpitar, quisera viver, quisera morrer de puro amor... suspiro pelo momento de atirar-me aos braos do meu Jesus... santo amor, me inflamma! santo amor, me inflamma! Tudo me enfada, tudo me penalisa; no ha
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objecto que deseje neste mundo; somente suspiro pelo amor celeste. . . somente a eile amo. O santo amor, inflamma-me, outra, cousa, no quero de ti. Quisera emfi/m que, aps a minha morte, todos dissessem : Gemina foi uma victima de amor e morreu victima de amor, afim de que todos amassem a Jesus . .. No quero que ningum me exceda no amor de Jesus-. Dilate-se sempre o santo reino do amor de Jesus, afim de que todos o amem perfeitamente. Disso o psalmista: Cahiu do meu corao, com grande mpeto, uma palavra ba, eruetavit cor meum verbum bonum. (Ps. 44.) A graa se derramou nos teus lbios >. (Idem.) Com effeito, fala a bocca de que o corao est cheio. Os bellissimos affectos que acabo de transcrever, brotaram do corao amante de Gemma como jorram da fonte crystallina os arroios, com doce murmrio, a correr entre alvos seixos. Corao de Gemma, purssima fonte de admirveis affectos! corao to semelhante ao Corao de -Jesus! Assim como do th uri bulo sae o fumo do incenso em cheiro agradvel sicut virgueta fumi, ex aromatibus, assim do corao de Gemma brota a orao de fragrncia suavssima. corao de Gemma, thuribulo de ouro! Como em certos paizes, dimanam do interior da terra jactos intermittentes de agua quente, assim tambm do corao de Gemma fluem, com impetuosidade, aspiraes ardentes. 0 corao de Gemma, todo abrazado de amor! corao to semelhante ao Corao de Jesus! corao de Gemma, a teu exemplo possa nosso pobre corao inflammar-se na orao perante o Santssimo Sacramento, e tornar-se semelhante ao Corao de Jesus! Dizia Gemma a mido: No comprehendo como quantos se acham em presena de Jesus Sacramentado e no ardem. Parece-me que
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algum que fique, pelo menos um quarto de hora, em adorao diante do tabernculo, deve ser reduzido a cinzas. Ao escrever a uma amiga, accrescentava: Vamos a Jesus, perante o seu tabernculo, alli quero encontral-a ; amanh, perto do Corao Eucharistico, cheio de ternura, alli conversaremos, alli Jesus nos abenoar, no falte ao convite ! To viva era a f desta piedosssima menina que, para ella, os mais profundos mysteris eram, para bem dizer, realidades visveis e palpveis, sem estarem envolvidas de sombra e vos como se nos apresentam. A vista penetrante da simplicidade e da pureza, avivada ainda por luzes e irradiaes sobrehumanas, chegava at o fundo do mystcrio ineffavel da Santssima Eucharistia; seu olhar agudo penetrava as profundezas d'est oceano de amor sem limites, descobrindo n'elle thesouros invisveis aos nossos olhos. No verdade que, quando queremos adorar o Deus encoberto dos altares, devemos fazer appello a todas as potencias de nossa alma e s virtudes theologaes para crermos, adorarmos e recolhermos nosso espirito frio e distrahido? Quem de ns no experimentou esta laboriosa applicao? A Gemma, porm, bastava prostrar-se perante Jesus sacramentado para que, immediata e espontaneamente, o percebesse, com todo seu ser, descoberto e sem vo, sobre o altar. Seu corao percebia Jesus Hstia, sua alma o contemplava. Os sentidos de seu corpo distinguiam perfeitamente todo seu ser, o corpo e a alma, e ficavam em jubiloso extase de amor, em presena d'esta dulcssima majestade. Cabiam as barreiras do tempo e do espao, e Gemma sentia-se transportada aos confins da existncia, at o seio do Infindo. Todos os seus affectos eram concentrados n'este santurio amabilissimo, onde a divina humanidade palpita em unio harmoniosa com a pobre creatura. A devoo do Santssimo Sacramento muito complexa e pode ser encarada sob diversos pontos de vista. A luz solar que apresenta somente uma cor, se decompe em sete cores bem distinctes, quando refractada pelo prisma de crystal, ou por uma nuvem; assim tambm
o Santssimo Sacramento, examinado pelo prisma da f, offerece alma devota sete aspectos e sete pontos de meditao. Ou sino vejamos: 1. o sacrifcio incruento e memorial da Paixo do Senhor ; 2. a communho sacramental; 3. o viatico; 4. a presena real no tabernculo; 5. a exposio privada ou solemne na procisso e na benam ; 6. a communho espiritual ; 7. a santa mesa, trao de unio entre os fieis. Pode-se examinar a sagrada hstia por outras faoes; quiz apenas apontar as principaes. Temos analysado a devoo de Gemma Galgani, ao Corao Eucharistico de Jesus, verdadeira e realmente presente no Sacramento dos nossos altares, temol-a contemplado, semelhante a um d'esses chrubins de ouro, que estendiam as azas largamente abertas por sobre a arca do testemunho, em attitude de profunda adorao; resta-nos considerar a sua piedade e seu fervor na recepo sacramental do Po anglico. E' na communho que o amor divino chegou a seu apogeu, e na unio sacramental que a devoo da serva de Deus chegava tambm ao seu auge. Suspirava pela communho, a ponto de sentir as ancis de uma verdadeira fome do P o consagrado. Seu corao amantssimo vibrava de anhelos de comer o man celeste; como os Israelitas do deserto, madrugava para ir colher este alimento saboroso que cae do co como um precioso orvalho. Depois da communho sagrada, o profundo paroxysmo do sentimento devoto, o antegosto da gloria futura, cedia logo a um transbordamento de affectos, mal represados pela majestade divina, como os filhos em presena de um pae amado que chega em casa depois de longa ausncia, rompem todos os diques de respeito e do livre curso s emoes tumultuarias que sua chegada fez nascer.
Semelhante ao apostolo predilecto, S. Joo, Gemma descanava a cabea ardente sobre o peito de Jesus. Este apostolo revelou a S. Gertrudes que, na ultima ceia, reclinado sobre o peito do Salvador, ouviu as palpitaes harmoniosas do Corao divino, cuja doce melodia lhe penetrava at a medulla da alma. Tambm a serva de Jesus escutava os batimentos do Corao amantssimo humanado e sacramentado. Por sua vez, Jesus o doce Esposo da alma pura, estava verdadeira e realmente presente no peito de Gemma como n'um throno de gloria, cercado cie cem anjos, e derramava, em torrentes de luz, a fora, a vida sobrenatural e os dons mais preciosos sobre a alma bemaventurada d'esta filha da terra que aspirava ao co! Desde muito criana, Gemma commungava tres vezes por semana, e o teria feito mais a mido, si o confessor o tivesse permittido. Pouco tempo depois de deixar a escola primaria, comeou a fazer a communho quotidiana que nunca mais havia de interromper at o dia de sua morte. O divino Kedemptor achava as suas complacncias nas communhes fervorosas de sua serva. En? paga d'esta devoo, cumulava-a de benefcios espirituaes e de muitos favores sobrenaturaes. Gemma soboreava esse Po divino que encerra todos os sabores mais finos: Omne detectamentum in se habentem. Com a ingenuidade que lhe era peculiar, confessou que a doura saboreada no era somente espiritual, mas tambm material. A's vezes a sagrada hstia se lhe derretia na bocca como um favo de mel; outras vezes sentia o gosto de sangue cheiroso como o nctar. Rev. Padre, dizia ella, si Deus continuar assim a me favorecer com estas graas sobrenaturaes, no tardarei em morrer de amor.- Lemos na vida de S. Estanislo Kostka que, sendo impossibilitado pela doena de ir pessoalmente igreja para commungar, Deus mandou um anjo administrar-lhe este admirvel sacramento. Parece que Nosso Senhor fez a mesma merc sua fiel serva. Uma testemunha ocular conta o seguinte: Na manh da sexta-feira, o corpo de Gemma apresentava um aspecto horrvel. Parecia todo uma
chaga. A mystica donzella tinha experimentado, milagrosamente, e pela primeira vez, a flagellao de Nosso Senhor. Por isso no consenti que se levantasse. A menina obedeceu de ba vontade e preparou-se para fazer a communho espiritual. E logo ficou absorta em Deus, tendo um xtase. Vi como levantou as mos, segundo tinha o costume de fazer quando ia commungar. Seu rosto transfigurou-se. De repente abriu a bocca, pz a lngua sobre o lbio inferior e a retirou incontinente, fazendo em seguida a aco de graas, sem todavia recuperar os sentidos. Possa a serva de Deus servir de exemplo e de estimulo, a todas as Filhas de Maria na devoo ao Santssimo Sacramento, que deve occupar a primazia nas devoes. Possa o exemplo de Gemma animal-as recepo frequente o quotidiana da Santa Eucharistia, satisfazendo assim o ardente desejo de Nosso Senhor. Santa Thereza, na sua explicao da quarta petio do Padre Nosso, diz que jamais se convencer de que Jesus Christo quando ensinou a rezar esta bella orao, pudesse falar apenas do po material, necessrio ao alimento do corpo. N'isso a illustre Virgem de Avila que mereceu o titulo de Doutora da Igreja por sua rara sciencia, est de accordo com muitos theologos e mestres da vida espiritual. No Evangelho de So Matheus l-se: Panem nostrum supersubstantialem, o po nosso, que sobre toda a substancia, nos dae hoje. Segundo este evangelista parece bem que Nosso Senhor refere-se ao Po consagrado, na divina Eucharistia, que serve de alimento s almas. 'Nosso Senhor, acerescenta a seraphica reformadora do Carmo, sem duvida alguma, ensinando a dizer o po nosso de cada dia nos dae hoje, falava da communho quotidiana. Mil vezes ditosa a Filha de Maria, a congreganista fiel e devota que comprehende e adora a bondade de um Deus escondido e anniquilado entre as brancas ptalas das aucenas eucharisticas, para alli ser encontrado e colhido como verdadeiro nctar divino, pela alma devota que por ella suspira, como suspira o cervo sequioso pelo frescor da fonte. Vinde a mim, exclama Jesus, vinde a mim todos vs que tendes fome e sede inextinguvel da felicidade, e eu vos tornarei satisfeitos .
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Feliz a Filha de Maria que ouviu a voz do Papa Pio X, de santa memoria, incitando, com tanta instancia, os christos a commungarem quotidianamente. Este santo Pontfice, para facilitar a recepo frequente deu novas normas, e exigiu apenas duas condies para se poder commungar todos os dias: 1. estar livre de peccado mortal; 2. " ter uma inteno recta. Por este decreto, portanto, ficaram abrogados e annullados os ensinos dados anteriormente, que exigiam, para a communho frequente, a iseno de peccados veniaes e do apego aos mesmos. Quem est n'estas condies pode fazer todos os dias a communho, no tendo peccado grave e possuindo a recta inteno, isto , recebendo o Santssimo Sacramento por piedade e no por motivos humanos, como sejam a vaidade, o habito, o desejo de alcanar louvores ou favores. Si a Filha de Maria conhecesse o dom de Deus, diariamente iria soffrega, a exemplo de Gemma, commungar com devoo. Para alcanar esta preciosa graa, a Filha de Maria tem que recorrer a Maria Santssima, como fazia Gemma. Esta Me celeste achava tambm as complacncias nas communhes da sua querida filha e a acompanhava visivelmente mesa eucharistica. Ah que delicia/ exclama Gemma, quanto bello commungar em companhia da Virgem Tm maculada,' Segui, pois, o exemplo de Gemma, e embora no sejaes dignas de ver com os olhos vossa Me do Co, ella vos acompanhar ao banquete divino, si lhe pedirdes este favor. Assim por Maria ireis a Jesus, segundo a divisa de um grande devoto da Virgem Maria, o Bemaventurado Luiz Grignion de Montfort, ad Jesum per Mariam. Alm da preparao immediata que deve preceder a communho, cuidae, Filhas de Maria, em praticar as virtudes proprias do vosso estado, sobretudo a pureza, afim de tornar-vos menos indignas da communho diria. Diz a Escriptura Sagrada que os pes do tabernculo, postos sobre a meza dourada da proposio, s podiam ser dados em comida quelles que tinham guardado continncia. Que pureza no ser necessria a quem pretenda comei' o
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F o dos anjos, do qual os pes da proposio eram apenas a sombra e a figura! As Filhas de Maria, para desaggravar a Jesus da tibieza de tantos homens ingratos, devem tambm fazer a communho reparadora. Conta-se no livro chamado Legende dore da Alsacia que um judeu roubou a rica custodia da Capella de Nossa Senhora das trs Espigas e, chegado matta, lanou no cho a sagrada hstia. Um enxame de abelhas veiu logo voando e em pouco tempo fez, de alva cera, ao redor da hstia consagrada, uma linda custodia. Semelhante quellas abelhas diligentes, as devotas Filhas de Maria consolem o Corao eucharistico dos attentados e sacrilgios dos mos christos e dos herejes, offerecendo-se, a exemplo de Gemma, como victimas expiatrias pelos crimes dos homens. A's congreganistas compete praticar e propagar a communho diria que , como diz o piedoso Monsenhor de Sgur, o preservativo suave e poderoso do espirito de f, de orao e de recolhimento interior, de desapego christo, da santa pureza, da humildade, da mansido e da pacincia. A communho frequente o foco do zelo, do fervor, do amor Santissima Virgem, da dedicao ao Papa e Igreja, da caridade para com os pobres, a alegria da penitencia e do sacrifcio; finalmente a communho diria o segredo da paz da conscincia, a vida e o sustentculo do christianismo inteiro. Adoremos, pois, veneremos este sacramento, que , consoante bella expresso de S. Bernardo, o amor dos amores da parte de Deus. Isto j no foi amar, diz um orador portuguez, foi derramar sobre ns todas as opulncias, todas as riquezas, todo o thesouro de brilhantes de seu incomparvel escrinio. Escutae a voz que sae do tabernculo; todos os dias, Nosso Senhor vos repete as palavras da Escriptura : Minha filha, d-me leu corao. Qusivi qui simul eontristaretur. .. Consolante/m qusivi.Procurei quem partilhasse meu soffrimento, procurei quem me consolasse. Dizem que o pintor Battoni, executor do artstico quadro do Corao de Jesus da igreja do Ges em Eoraa, tomou por modelo um d'estes numerosos mendigos que pedem esmolas porta das basilicas romanas.
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O artista, que era um christo fervoroso, quiz fazer entender, por este symbolo tocante, que Jesus o mendigo de amor! Jesus representado n'esse quadro bem conhecido com uma attitude expressiva de supplicante: a mo esquerda apresenta o Corao, a palma da dextra est aberta e estende-se para ns como para mendigar. Qual a Filha de Maria que negue satisfazer o pedido de to amvel mendigo ? Attendam as Filhas de Maria em propagar a devoo ao Divinissimo Sacramento que to cara foi a Gemma, e em formar a guarda de honra do amoroso prisioneiro dos nossos tabernculos. Louvado, adorado, amado seja, a todo momento, o Divinissimo e Santssimo Sacramento. Amen.
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STIMA C O N F E R E N C I A .
U m a ametliysta. O espirito de orao e a uiiio com Z D e i x s d . e 0-em.m.a G-algani.
A terceira ordem das finas pedrarias que b r i l h a v a m no racional pontifical do gro-sacerdote, destacava-se a amethysta, bel la p e d r a roxa, que ainda hoje brilha engastada no annel do Bispo. A amethysta uma pedra mystica e espiritual, que pode symbolisar o espirito de orao, visto que o distinctivo do Antistite, o homem de orao por excellencia e cuja funco, como a do summo sacerdote da antiga lei, presidir reunio dos fieis na casa de orao.
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Gemma tinha recebido, com abundncia, a plenitude do espirito de orao de que fala Isaias: Effundam super domum Israel spiritum preeum. Ella foi uma alma que renovou, nos tempos modernos, os prodgios da alta contemplao dos tempos medievaes de S. Gertrudes e de S. Mechtildes, elevando-se, por vezes, s alturas vertiginosas de S. Thereza, a illustre Virgem de Avila. O frade Giovanni de Fiesole, pintor toscano e conterrneo de Gemma de Jesus, representava, na tela, com tanta perfeio os anjos, dando-lhes to bello colorido, que mereceu o appellido de Fra Angelica, o pintor dos Anjos. O artista, que era tambm um santo, frequentemente via-se arrebatado, pela contemplao, ao throno de Deus, cercado pelos nove coros dos anjos. Ento, tomando o pincel, representava o que tinha visto no co, mostrando uma multido de anjos, uns tocando instrumentos, outros sustentando thuribulos, esses eram ceroferarios, aquelles, acolythos ou diconos. Gemma pertencia aos anjos thuriferarios, anjo carnal, que, sem cessar, balouava o thuribulo perfumado, d'onde se escapavam as nuvens do odorfero incenso de suas oraes. Ineensum istud a te benedictum, ascendat ad te, Domine, et descendeu super nos misericrdia tua. Diz o vidente de Pathmos, que o incenso queimado nos thuribulos dos anjos so as oraes dos santos, as quaes sobem, em volutas odorferas, at o throno do Altssimo. A Igreja catholica conservou to gracioso symbolismo em sua sublime liturgia e ceremonias tocantes. Falando do espirito de orao que animava Gemma, escusado dizer no querer alludir orao vocal commum s pessoas pouco adiantadas na santidade, nem to pouco orao machinal commum s pessoas ignorantes, em que os lbios desempenham a principal funeo. D'essas pessoas Nosso Senhor diz que tm o nome de Deus nos lbios, emquanto o corao est, muito longe. Pretendo tratar da orao verdadeira, isto , da contemplao e da meditao; n'uma palavra, quero falar da orao ideal que deve ser uma elevao da mente a Deus ou, como disse o meigo S. Francisco de Salles, a effuso de uma alma illuminada pelo co .
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Este santo, explicando ura dia a doura da orao e sua natureza a alguns meninos do catecismo, contou-lhes, com a graa inimitvel que lhe era peculiar, como nossos primeiros paes no paraiso terreal conversavam familiarmente com Deus. Um dos meninos, ao ouvir a historia exclamou enthusiasmado: A h ! que pena no ser mais assim! Gostaria tanto de falar com Deus!.. . como devia ser bom e agradvel entretermo-nos com E l i e ! Esta espontnea reflexo agradou ao santo pela ingenuidade, e respondeu incontinente: Consola-te, pois, embora pelo peccado tenhamos perdido o paraiso terrestre, no perdemos por isso o bom Deus. Elie est junto de ns e a toda hora nos licito conversar com Elie na orao. Desculpem-me os leitores esta .longa citao, pela apparencia, desviando-me do assumpto de que estou tratando. Voltando, pois, ao espirito de orao que animava Gemma de Jesus, pode-se affirmar que era tal qual o concebera S. Francisco de Salles. Desde muito criana, nascera n'ella o attractivo irresistvel pela orao e pela meditao, o que a tornou uma das grandes contemplativas dos tempos modernos. A serva de Deus entregava-se meditao continua e ininterrupta, ao passo que as suas oraes vocaes eram muito resumidas, embora fervorosssimas, limitando-se ao santo rosrio e ao officio de Nossa Senhora, segundo o louvvel costume das famlias catholicas em que se conservaram intactas as tradies religiosas. Fora d'estas oraes approvadas pela igreja, e enriquecidas de numerosas indulgncias, no fazia outras nem durante a santa missa nem durante a exposio do Santssimo Sacramento. Com ingenuidade dizia ao confessor: Nunca pude me acostumar a ler as oraes dos formulrios, no encontro n'ellas alimento para minha alma e a recitao d'estas preces me cana, portanto invento minhas oraes e rezo como me possvel. Que sublime orao, que elevada meditao no fazia esta alma enamorada das bellezas celestiaes! Milhares de vezes por dia desabafava o corao em jaculatrias que, como settas inflammadas e amorosas, iam cravar-se, deliciosamente, no sagrado Corao de Jesus.
A serva de Deus, mil vezes por dia, suspirava e pedia a Deus o precioso dom das lagrimas, dizendo com o psalmista : Senhor, do po de lagrimas nutri-me, Outro no quero ter, E em grande copia, lagrimas, ouvi-me, Senhor, dae-me a beber.
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Sabe-se que Gemma recebeu este dom precioso das lagrimas e da compunco ; seus olhos estavam, quasi sempre, orvalhados de lagrimas; com a voz embargada pelo choro, dizia com o propheta real : Que me resta para appelecer no co, e que posso amar na terra sino a Vs, Deus meu, Minha carne e meti corao desfallecem ; Deus de minha alma, sede minha herana por toda a eternidade. Cem vezes por dia, a serva de Deus repetia, amorosamente, suas jaculatrias favoritas acompanhadas de copioso pranto : Jesus, Deus do meu corao ! Jesus, meu doce amor ! terra, quo vil e miservel s perante meus olhos ! O Pae amoroso, a ti s perteno. Pae amoroso, s quero viver comtigo, s comtigo ! (3 cruz amabilissima do meu Redemptor quanto te amo ! Jesus, quando te verei face a face V Quando Gemma se achava sosinha, suspirava assim em altas vozes ; quando se achava em companhia de outras pessoas, muitas vezes levantava os olhos extticos para o co e murmurava baixinho alguma jaculatria. Diz o autor da vida de Gemma que, em arrebatamentos, repetia, mil vezes por dia, as aspiraes espalhadas nos livros sagrados, principalmente nos psalmos inspirados de David que constituem uma opulenta mina dos mais bellos affectos compostos pelo espirito humano, sendo o repertrio das mais empolgantes preces que a lingua humana tenha exhalado. O propheta-rei, illuminado pelo espirito divino, descortinando o futuro, cantou n'estes hymnos admirveis os
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mysterios, as graas, os sacramentos cia nova lei; as glorias e os soffrimentos de Jesus, de que era uma das mais bellas figuras. O piedoso rei, animado do Espirito Santo, ordenou que se cantassem estes psalmos com alegria, e, muitas vezes,
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elle prprio os cantava ao som da sua harpa maviosa e vibrante, alternando os versos, com milhares de cantores e com acompanhamento de eytharas melodiosas que vibravam as filhas de Sio. Gemma escolhia os psalmos que mais se amoldavam s disposies de seu espirito, e ao estado de sua alma. Seu corao, mais vibratil do que a harpa dos helnicos, resoava no santurio ao sopro da inspirao divina e enlevava o corao do Rei dos reis, por suas harmonias. Nos arroubos da alegria, nos xtases do amor, entoava os esplendidos versos que o rei David cantava quando, cheio de jubilo, danava diante da arca do testamento de Sio: Cantae ao Senho?' um cntico novo! (07.) Celebrae a Deus; cantae e saltae de prazer! Entrae em sua presena com alvoroo de alegria! (82.) Alegrei-me riisto que me foi dito: A' casa de Deus iremos ! (121.) Bemdirei ao Senhor em todo o tempo. (33.) Minha alma, bemdize ao Senhor! Senhor, Deus meu, tens te engrandecido de gloria, e de formosura teus vestidos. (103.) Bemdize, minha alma, ao Senhor, e todas as minhas potencias bemdigam-lhc o santo nome! (102.) Louvae ao Senhor porque c bom! Bemdito seja o Senhor de Israel; pelos sculos dos sculos, dir todo o povo: Assim seja! (105.) Na tribulao e na tristeza, a alma de Gemma chorava e gemia, derramando as lagrimas na presena do Senhor, repetindo threnos enternecidos, essas expresses pezarosas e saudosas, esses cantares cheios de melancolia que o rei David, perseguido e trahido pelo prprio filho, cantava na terra do exilio, ao som abafado e plangente da harpa: Senhor, ouve minha, orao, e chegue a ti meu clamor! (101.) No apartes teu rosto de mim no dia da tribulao, inclina para mim teus ouvidos! Fui ceifado como o feno, o meu corao seccou de dCrr. Com minha voz clamei ao Senhor. (16.) No dia da minha tristeza proverei a Deus! Recusou consolar-se a minha alma!
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Ouve, Senhor, minha orao! (38.) Vede minha afflico ! Vede minhas lagrimas! No te cales, porque vivo neste desterro, como um peregrino e como um estrangeiro. Clamei ao Senhor, derramei na sua presena a minha orao. Exponho diante d'elle a, minha tribulao ! Os psalmos messinicos inspiravam a Gemma as mais bellas meditaes sobre as glorias e os soffrimentos do doce Redemptor. Com que enlevo dizia : Tu es sacerdos i/n ternum secundum ordineni Melehisedech. (109.) Com que gosto recitava o verso prophetico que annuncia o poder do Juiz universal : Judicabit in nationibus. A serva de Deus que, tantas vezes, meditava os mysterios dolorosos do divino Salvador, gostava de 1er o psalmo vinte e um que narra, com dons mil annos de antecedncia, os martyrios do futuro Redemptor: Traspassaram-me as mos e os ps, contaram-me lodos os ossos ! Quando a alma de Gemma compungida e pezarosa, se mergulhava n'um mar de tristeza, pelas offensas feitas divina Majestade, encontrava, nos psalmos de penitencia, os mais bellos affectos, os mais enternecidos desaggravos, e a expresso apaixonada da mais viva dor: Senhor, no me reprehendas em leu furor ! ( 6. ) No me castigues em tua- ira. Passei o dia em gemidos, todas as noites regarei o leito com minhas lagrimas. Estou afflieta e abatida. Meu corao geme de dor e suspira sem cessar. Miserere mei Deus, secundum magnam misericordiam tuant. ( 60.) Quando o corao amante e sensivel de Gemma vibrava de doce esperana na bondade divina, e firme confiana em sua misericrdia, encontrava, nos hymnos reaes, mil motivos de doce consolao e de filial abandono: Jubilei, porque o Senhor ouviu-me a voz e inclinou para mim seu ouvido. O Senhor vela, sobre os pequenos. (114.)
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Livrou minha alma, da morte. Enxugou as lagrimas dos meus olhos e preservou-me os ps de quedeis. Emquanto puder, louvarei ao Senlior. (145.) Emquanto puder, cantarei com fervor! O Senhor protege os orphants, a viuva, e o estrangeiro. Em todos os sculos reinar em Sio ! Em vs, Senlior, esperei, nunca serei confundida,! Na hora angustiosa da tentao, a serva de Deus achava mil oraes jaculatrias, mil invocaes que se lhe adaptavam ao estado da alma perseguida pelos demnios como um cervo a que persegue a matilha dos ces e afflicta como o passarinho que o caador quer enlaar. O meu soccorro vem do Senhor, que fez o co e a, terra. No permitte que vacille o teu p nem dormite aquelle que me guarda. ( 120.) O Senhor << tua proteco, elle est na tua mo direita ! O Senhor te guarda de todo o mal, Elle guarda a tua porta de entrada e a da sahida desde agora e para sempre. Deus meu, no Vos aparteis de mim, e no abandoneis com. ira vossa serva ! (70.) Eu disse, Senhor, compadece-te de mim, cura a minha alma! (40.) Os meus inimigos falaram contra mim; contra mim urdiam males. Nisto conheci que me querias bem, vendo que o inimigo no se alegrar sobre mim; porque tu me tomaste sob tua proteco por causa de minha, innoceneia e me fortificaste para sempre. Que bellas oraes! Que sublimes preces! Que aspiraes inflammadas! Que suspiros enternecedores! Todo o dia Gemma entoava os hymnos inspirados de David, o maior poeta lyrico de Israel que, em sublimes arroubos, convidava todas as obras do Altssimo a unir suas vozes sua para louval-O e cantar sua gloria perenne.
Louvae desde os c o s ao Senhor, Louvae-0 nas sublimes alturas, Entoando cnticos de louvor! Louvem n'0 todas as creaturas!
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Louvae-O, sol, lua, estrellas, Tempestades, abvsmos e montes! Louvae-O, arvores fructiferas, Vs, drages, rios, mares e fontes! Louvae-O, todos os habitantes do c o , Os reis da terra, todos os povos! Louvem-n'0 mancebos e donzellas ! Louvem-n'0 velhos e m o o s !
Ainda que os idiomas modernos no possam traduzir a majestade, a fora e a graa da lingua hebraica, em que foram escriptos os psalmos, todavia, a alma piedosa encontra n'elles, como oneontrava Gemma Galgani, um alimento saboroso, substancial e variado. Era d'esta maneira que o cherubim terrestre atiava o immenso incndio do divino amor que lhe abrazava o corao em chammas de caridade. Oraes bem diffcrentes das nossas, que so feitas seguindo a rotina, e vasadas sempre nos mesmos moldes, com tdio e qui com deplorvel frieza. Que pena, digo de relance, que tantas pessoas desconheam as preces l i trgicas, e no saibam apreciar-lhes a belleza sobrehumana ! Que pena que no comprehendam o officio divino, porque sentiriam as mil douras que experimentava S. Agostinho, ouvindo cantar os psalmos davidicos e se inundando em suavidades, ficando-lhe os olhos arrazados de doces lagrimas, como o testifica no seu livro das confisses! A orao exige o recolhimento. Uma alma distraiu da, entregue dissipao, nunca ser uma alma contemplativa como foi a de Gemma.
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To grande era-lhe o recolhimento, to unida vivia com Deus, que sua orao nunca era interrompida, cumprindo risca o preceito do Senhor: Opor lei sem/ter orcirc. Nada podia distrahir esta alma da sua meditao, nem as oceupaes domesticas, nem as conversas no seio da famlia, nem os passeios na rua movimentada. Mesmo sentada mesa de jantar, Gemma no perdia o fio de sua orao fervorosa; alimentando-se,elevava-se, suavemente, s alturas do paraiso. Jantando, um dia, o Padre Germano em casa de Dona Ceclia, me adoptiva de Gemma, notou que esta, ao mesmo
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femma Galgani.
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tempo que se alimentava, parecia toda transfigurada, immersa em profunda meditao, c no prestava atteno palestra animada dos hospedes illustres. Seu corpo estava mesa, seu espirito, porm, enlevado pela contemplao, conversava com os espritos bemaventurados nas alturas celestiaes. Seu olhar inspirado e exttico parecia fitar algum espectculo maravilhoso. Inesperadamente, o sacerdote chamou-lhe a atteno e a reprehendeu com certa aspereza, fazendo-lhe ver a inconvenincia de se entregar meditao n'aquella hora e n'aquelle logar. Voltando a si, a pobre moa estremeceu e envergonhada escondeu o rosto nas mos. Com muita razo, pode se applicar a esta donzella sobrenatural as palavras de -S. Paulo: Conversatio nostra in cwlis est. O espirito de orao nem to pouco a abandonava de noite. Adormecia, tendo nas mos um crucifixo; seu somno, porm, era muito leve e interrompido por frequentes viglias. Logo que acordava, beijava, devotamente, a sagrada imagem do Senhor e reatava o fio da meditao, no ponto em que tinha deixado. Gemma podia dizer com a Esposa dos Cantares : Ego dormio,sed cor meum vigilai,eu durmo e meu corao vela. A piedosa menina tinha recebido o dom rarssimo de no ser incommodada pelas distraces. Este dom no deixa de ser um privilegio invejvel e concedido a poucos santos. Em passos rpidos, Gemma subia os degraos da escada mystica da orao meditada. Com facilidade passava da meditao mais sublime contemplao dos mysterios. A's vezes uma claridade mysteriosa lhe deslumbrava a vista a ponto de cegal-a. D'esta via illuminativa a serva de Deus passava via unitiva, como a chamam os theologos da escola asctica, que consiste na unio perfeita e estvel do Summo Bem. Unida estreitamente Divindade, a terra desapparecia-lhe por completo dos affectos ou pensamentos. Semelhante ao iman que, irresistivelmente, attrae, pela fora magntica que lhe particular, os objectos prximos, assim a Divindade attrahia a alma exttica de Gemma,
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absorvendo-lhe todas as potencias e o uso dos sentidos exteriores. To fortemente lhe eram concentradas as potencias d'alma, que chegava a inutilizar e anniquilar as foras corporaes. N'uma outra conferencia, falar-se- do estado exttico, dos arrebatamentos, e dos mysticos desponsorios que constituem os ltimos degros da escada mystica na contemplaoBem que a serva de Deus gostasse de sondar todos os mysterios da f e fosse arrebatada na contemplao da belleza sem par e da grandeza infinita de Deus, de preferencia elevava-se em espirito ao cume do Golgotha e meditava sobre o mysterio de nossa redempo, media, tanto quanto uma mortal creatura o pode, a grandeza, a altura, e a profundidade de amor de um Deus crucificado, como o anjo do Apocalypse media com uma vara de ouro a altura, a largura e a profundidade do templo da Nova Jerusalm. Que lindos os vos desta alma privilegiada! Que sublime orao ! . . . Gemma G a l g a n i conheceu as delicias ineffaveis da orao; as douras da meditao inundavam-lhe a alma piedosa. Em verdade, ella podia dizer: Quam magna multitudo dulcedinis tuce, Domine, abscondisti timentibus te, quo copiosa a doura que o Senhor reserva quelles que o temem/ (Ps. HO.) Quo infelizes so os christos remissos e ti bios que nunca experimentaram as alegrias que proporciona a orao ! Quo infelizes so os christos que nunca choraram aos ps do tabernculo e desconhecem os gozos celestes dique se enchem as almas que sabem rezar com fervor e devoo! Trabalhem as Filhas de Maria com todo o empenho por adquirir o espirito de orao; tenham em grande conta a meditao. Prouvera a Deus que todas se compenetrassem da necessidade da meditao. Quantas ha, infeliz num te, que no conhecem o A-B-G da orao verdadeira. Oxal todas recebessem a effuso do espirito de orao de que fala Isaias. Derramarei sobre a casa de Israel o espirito de orao, que a fina flor da religio e da f. Evitem a orao machinal e inconsciente, feita sem pensar e sem inteno. Evitem rezar como rezava Anna, a me de Samuel, cuja orao fez acreditar ao summo sacerdote Heli que
cila estava bria. Rezando o tero, nunca se esqueam de meditar nos mysterios do rosrio, tantas vezes recommendados pelo Papa L e o X I I I , de gloriosa memoria. Acostumem-se a recitar e a repetir, a cada Ave Maria, o mysterio proposto e marcado a cada dezena. Filhas de Maria, rezae como rezava vosso modelo. Gemma de Jesus era uma d'aquellas Ovantes do primeiro sculo, representadas nas paredes das Catacumbas romanas, ajoelhadas, cobertas de um amplo manto branco, de braos estendidos para o co em posio supplicante. Evitae as distraces voluntrias. Imitae o exemplo de S. Bernardo que, quando chegava no limiar da capella, voltando-se antes de entrar, falava com os prprios pensamentos, dizendo: Vocs agora fiquem fora e esperem que eu volte. A exemplo de Gemma, aprendei a dispensar os formulrios. Uzar muitos livros de devoo no convm, sendo o melhor o Manual do ehristo do Padre Goffin, porque contem a traduco das oraes litrgicas e as preces da Igreja. Pedi ao Senhor o dom da contemplao, de maneira que, semelhante pomba, vos eleveis, sobre as azas da meditao, s paragens sobranceiras, onde habita Deus, afim de contemplal-o face a face. Pedi ao Senhor vos conceda o dom das lagrimas e a santa compunco,de maneira que possaes chorar, em presena de Jesus sacramentado, a vossa ingratido e as vossas infidelidades. Derramae, perante o tabernculo, lagrimas de puro amor, manifestando abrazado desejo de reparar as culpas dos homens, e desaggravar, por vosso pranto, o Corao eucharistico de Jesus, to attribulado por nossos crimes. A venervel serva de Deus, Gemma, foi uma alma eminentemente contemplativa. Congreganistas, esforae-vos por ser tambm almas contemplativas. Na companhia de Gemma; subi a escada mystica que viu Jacob em sonho, cujo topo se apoiava no co e pela qual os anjos subiam e desciam sem cessar. Subi s alturas ethereas, e voltae a esta terra transfiguradas a derramar o bom odor de Jesus Christo, a brilhar pelo bom exemplo e pela pratica das virtudes prprias de vosso estado.
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OITAVA
CONFERENCIA.
Os alicerces do muro da cidade celeste eram ornados de Ioda a qualidade de pedras. O segundo alicerce era de saphira.
UERENDO comparar Gemma de Jesus a uma pedra preciosa, logo nos acode ao pensamento a saphira, pedra de lindo azul que nos pode dar uma ida adequada da sua profunda humildade. O co e o mar so duas immensas saphiras: este, por seu abysmo insondvel, pode symbolisar a baixeza da creatura, aquelle nos fala da grandeza incomparvel do Creador.
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A saphira formava o segundo fundamento do muro da Nova Jerusalm. A humildade um dos alicerces da virtude. O azul uma das cores do arco-iris, a humildade uma das principaes virtudes que resplandeciam na alma de Gemma. Analysemos e estudemos a humildade da serva de Deus na sua vida. A uma Irm de Caridade que lhe perguntava qual a virtude que lhe parecia mais agradvel a Deus, Gemma respondeu com vivacidade: A humildade 6 o alicerce de todas as virtudes. Seu director de conscincia, sacerdote muito illustrado e de uma experincia consummada na discreo dos espirites, cuja sciencia theologica era louvada pelos Summos Pontfices, sciente de ser a humildade a pedra de toque da verdadeira santidade, submetteu sua dirigida a duras provaes e penosas humilhaes, das quaes, porm, ella sahiu victoriosa, demonstrando cabalmente que sua humildade era toda prova. A humildade, como bem sabeis, uma virtude moral que se adquire por uma vigilncia continua e um combate incessante. Por esta razo pertence categoria das virtudes moraes adquiridas, como as denominam os theoiogos, e no das virtudes infusas, como sejam as theologaes, que Deus infunde em nossas almas no baptismo sem nenhum trabalho de nossa parte. Gemma adquiriu esta virtude por actos repetidos e por combates incessantes, desde a primeira infncia. Como j dissemos alhures, era uma menina prendada, dotada de uma bella intelligencia. Nas aulas primaria e secundaria, foi um prodigio, a ponto de causar admirao s mestras e pasmar as condiscpulas mais velhas. Assim graas a esta viva intelligencia, ajudada por um assduo trabalho, que tudo vence, conquistava, nos exames do fim de anno, os melhores prmios e a medalha de ouro, na doutrina, concedida somente a quem tinha nota ptima durante todo o anno. Bem disse o pbilosopho Sneca, professor do imperador Nero: Labor improbus omnia vineit.
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Bordava tambm maravilhosamente e fazia, com perfeio, todos os trabalhos de crochet e de agulhas. To modesta e to humilde era, entretanto, que lhe custava muito receber os signaes de distinco to merecidos, e expor em publico os trabalhos. No collegio das I r m s de Santa Zita, aprendeu a falar francez perfeitamente, a desenhar e a pintar, porm nunca falava francez com receio de salientar-se, nem fez nunca uma pintura, pelo mesmo motivo. Dotada igualmente de uma voz maviosa e muito entoada, Gemma no cantava nunca, salvo na igreja. No santurio, no receava patentear o talento musical, quer para glorificar o Creador e exaltar-lhe a grandeza, quer para cantar os louvores de Maria Santssima e publicarlhe a gloria e a formosura. Gemma, ao exemplo das moas da Itlia, cantava com muito sentimento; sua voz doce e, ao mesmo tempo, vibrante, commovia aos ouvintes, chegando-lhes at o fundo do corao e tocando-lhes as fibras mais intimas. Gemma entoava os hymnos n'essa harmoniosa lngua italiana, cuja doura sem par desperta na alma a mais viva emoo, o que, graas suavidade sem igual, torna-se digna de, consoante ao conceito de Carlos V, ser falada pelos prprios anjos no paraso. Gom que expresso communicativa, Gemma modulava as estrophes que se seguem, o corao a transbordar de doce emoo, n u m xtase de amor, com os olhos marejados de lagrimas: Maria, la bella. rosa, manto egiglio de purit; Portate emia anima, n'el cielo giviso Per godere una eternit. Alem d'estes dons naturaes, parece que Gemma possua tambm a scieiicia infusa, como a chamam os theologos, pois, para limitarmo-nos a um nico exemplo, ella lia, comprehendia e traduzia os livros de S.* Agostinho e, em particular, seus Solilquios, sem nunca ter aprendido o latim. Ningum, portanto, acredite que Gemma era uma menina tola, como ella mesma costumava dizer; mas escondia
os talentos com muito cuidado, para no se expor tentao da vangloria. A serva de Deus era de um temperamento vivo. Filha da Itlia, sentia estuar-lhe nas veias o quente sangue latino, e mostrava, na vida sem refolhos, a physionomia de sua raa sympathica, em que a belleza plstica e a actividade febril se irmanam. A ternura e sensibilidade de Gemma eram extremas, soffrendo por qualquer falta de considerao e desabrochando, qual delicada flor, menor prova de affecto. Havia n'ella uma altivez natural que devia tornar-lhe insupportavel a humiliao, por pequena que fosse. Gom aquella sua natureza violenta, e o engenho perspicaz que a avantajava as demais, teria sido de um gnio insupportavel, si no tivesse combatido a inclinao predominante e vencido o amor prprio. Tal era a violncia que fazia indole prpria, que chegou a modificar o natural vivo e o temperamento ardente, a ponto de parecer bem diversa do que era por natureza. Assim como o horticultor corta a copa frondosa do zambujeiro e n'elle insere um ramo da boa oliveira, assim tambm Gemma enxertou, na sua natureza inclinada ao orgulho e ao desejo de dominar, a humildade, a brandura e a submisso de seu bom Jesus, tornando-se assim, uma oliveira ba e frtil: sicut oliva fructifera in domo Dei. Por modstia e humildade, occultava os favores celestes e as graas extraordinrias, com o mesmo cuidado com que encobria os dotes naturaes. Custava-lhe muito falar de seu interior e, com a mxima repugnncia respondia a pessoas indiscretas, que pretendiam saber algo de suas vises e apparies. A humillima serva de Deus usava da mesma reserva para com seu director, manifestando-lhe o bello interior unicamente por obedincia. Nas suas correspondncias avultavam, continuamente, as seguintes expresses: Escrevo por obedincia; digo isto, porque V. Rvma. o ordenou. Si V. Rvma. no o mandasse expressamente, nunca falaria dJaquillo , etc. etc.
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O director desejando conhecer as graas concedidas a esta alma de escol, viu-se obrigado a lanar mo de um innocente ardil. Escreveu a Gemma: Sciente de que s uma grande peccadora e de que na tua vida tens commettido muitos peccados, acho bom que faas uma confisso geral, porm muito circumstanciada e minuciosa, sem omittir cousa alguma, e narrando todos os pormenores, porque assim ficarei mais habilitado para conduzir tua alma peccadora, pois saberei com quem estou tratando, e ser-me- fcil dirigir-te na vereda da virtude. Gemma sentiu divel averso, primeiro uma *p porque se via certa r e p u g n n na obrigao de cia, em face do 1 falar de si, porque lhe era pem quanto, para US dido, mas finalprovar, por exmente consen- i 4 emplo, sua grantiu. Pedindo a de ingratido assistncia de j& para com Deus, seu anjo da naturalmente guarda, pz era obrigada a mos obra e manifestar os fez uma narra- 9 grandes beneo extensa e 9 A serva Se Deus Anna Ca- | <>S que d'elle minuciosa. Teve W tharina Emmerich, celebre j| havia recebido. que luctar con- * estygmatizaDa Oa Allemanha. | tra uma inexce- 9 esse o fim que
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o director tinha em mira pelo estratagema de que usara. N'um tempo relativamente curto, Gemma encheu cem paginas, consignando as apparies, as vises, bem como as tentaes diablicas, finalmente todas as particularidades que se referiam sua vida espiritual e ao seu adiantamento, desde os primeiros fulgores da razo. Graas a estas memorias, conhecemos diversos xtases que no tiveram testemunhas, como seja o xtase maravilhoso que a Virgem de Liicca teve no mez de Setembro de 1901, quando foi levada pelos ares at as alturas de um crucifixo, que se achava na parede de uma sala, e l ficou suspensa, como ajoelhada sobre uma nuvem.
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Sabemos outrosim, por estas notas que a humilde serva de Deus escreveu por obedincia e com tanta repugnncia, de que maneira ella foi perseguida por Satanaz. Apparecendo-lhe sob forma visvel, o demnio dizia: Tu s uma tola, porque adoras um criminoso, pregado na cruz. No vs como elle te maltrata e te prega na sua cruz tambm, para te fazer soffrer? - O demnio esforava-se por subtrahir a serva de Deus sabia direco do padre espiritual e empregava, para alcanar este fim, todos os meios. Vendo, entretanto, que Gemma no perdia por isso a confiana no seu director e continuava a lhe escrever e lhe pedir conselhos, Satanaz investia contra ella, com furor inaudito, arrancava-lhe a caneta da mo, rasgava o papel, puxava pelos cabellos a pobresinha, para tiral-a da mesinha onde estava sentada, com tanta violncia, que, no raras vezes, punhados de cabellos lhe ficavam nas mos horrorosas. Ao sahir o demnio bramia: Guerra, guerra a teu pae espiritual, at que morras! Xo satisfeito com estas ameaas e estes combates, o demnio enfurecido roubou o relatrio que a serva de Deus acabava de escrever, por ordem do director de sua conscincia, tirando-o escondido da gaveta, onde D. Ceclia o guardara cautelosamente. Deram parte d'esta nova maldade de Satanaz ao director que se achava em Isola. Este lembrou-se de pronunciar o exorcismo sobre o demnio, perto do tumulo do bemaventurado Gabriel Possenti, portanto distancia de mais de ()00 kilometros de Lucca. O manuscripto, mesma hora, foi collocado na gaveta, porm enegrecido de fumaa, chamuscado e quasi inutilizado pelo fogo. Embora a serva de Deus apreciasse seu lindo nome de Gemma de Jesus e uma das suas professoras lhe repetisse a mido: Gemma, lembra-te de ser uma linda joia. de Jesus, ella poucas cartas firmara com esse nome que, na sua humildade, achava um tanto pretencioso. A humilliriia donzella variava muito a firma, subscrevendo-se:La povera Gemma. La /uivem Gemma de Jesus.- - Gemma de Jesus!
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Pela reproduco typographica de uma de suas cartas, v-se que a calligraphia perfeita e a lettra bonita e simples. Aprendei, Filhas de Maria, pelo exemplo de Gemma de Jesus, portento de humildade, a apreciar e praticar esta sublime virtude, to cara ao Corao de Jesus! Nada deA eis temer tanto, como o que atraza vosso adiantamento espiritual, o orgulho. Diz a Imitao de Christo :
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Que te aproveita da Trindade Sabia, e altamente disputar, Si, por ausncia da. humildade, Certo lhe vaes desagradar? Por certo, melhor o rstico humilde que serve a Deus na simplicidade de seu corao, que o soberbo philosopho, deixando de conhecer a si mesmo para estudar o curso dos astros. As Filhas de Maria que leiam a mido a Imitao de Christo, e encontraro conceitos breves e sbios conselhos, pelo que diz respeito humildade. Admirae a saphira, a pedra fina que significa a humildade, engastada na coroa immortal d'aquella que deve ser a vossa mestra nas virtudes. Semelhante modesta violeta que teme os raios do sol e floresce sombra das outras flores, derramando suave odor, Gemma floresceu escondida no bello jardim de Nossa Senhora, edificando a todos por sua cndida modstia e rara humildade. Combatei, Congreganistas, combatei o amor prprio, este verme asqueroso, que corroe os melhores fruetos da virtude; guerreae a vangloria, essa peste detestvel, esse mal terrvel que vos aparta da gloria eterna e despoja das graas divinas. Desde que algum se compraz em si mesmo, desagrada a Deus; logo que aspira aos louvores humanos, perde a verdadeira virtude. Meditae sem cessar as palavras da Imitao de Christo : Proeurae ser desconhecidos, alegrae-vos, quando ningum fizer caso de vs.
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Lembrae-vos das palavras do Espirito Santo: Deus resiste aos soberbos e d sua graa aos humildes. A nivea alvura do vestido da Virgem de Lourdes significa a pureza, a faixa azul symbolisa a humildade; vosso traje a libr das congreganistas. Praticae estas duas virtudes caractersticas de vossa Me c de Gemma, vosso modelo! No digam de vs o que um Bispo disse da Madre Angelica Arnauld, abbadessa do mosteiro de Port Royai, que era um anjo de pureza e um demnio de soberba/ Fugi a ostentao, a singularidade e a presumpeo. No ambicioneis as dignidades na Pia Unio, antes esforae-vos por edificar vossas companheiras pela submisso e obedincia. Si fordes devotas, occultae os thesouros da piedade, e no vos desvaneaes de serdes melhores que as outras, encobrindo as consolaes sensveis debaixo do manto da humildade. Scle humildes, afim de que Nosso Senhor possa recompensar-vos um dia, e exaltar-vos no paraso, conforme sua promessa de elevar a quem se tiver humilhado na terra; seja vossa humildade uma virtude sobrenatural, praticada por motivos sobrenaturaes, com o auxilio da graa divina que, certamente, no vos ha de faltar, e dizei a mido esta bella invocao: Jesus, manso e humilde de corao, fazei meu corao semelhante ao vosso/ A quem perguntai' onde Gemma Galgani encontrou esta bella saphira da humildade que lhe rebrilha na coroa immortal, pode se responder, sem hesitao, que foi no sagrado orao de Jesus, que encerra riquezas superiores aos famosos thesouros de Golgonda. E' neste mesmo Corao, rico para, todos os que o invocam, que as Filhas de Maria devem procurar a bella virtude da humildade, para assim imitarem a humillima Virgem de Lucca.
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NONA C O N F E R E N C I A .
Vises e xtases de O-emma, Signaes e e f f e i t o s m . a , r a - v I l l i . o s o s d.o a m o r d e IDe-ULS. S p o n s a Olxrlsti.
Apparuitque ei Dominus in flamma ignis de medio rubi et videbat quod rubus arderet, et non combureretur. Bxod. 3 . 3 .
E o Senhor appareceu a Moyss 11uma ekamrna de fogo que sahia do meio de uma sara, e Moyss via que a sara ardia, sem se consumir.
L M das frequentes apparies do Anjo tutelar de sua alma, a serva de Deus recebia tambm a visita de outros anjos e santos do co, em particular do bemaventurado Gabriel Possenti, religioso passionista, das almas do purgatrio, e de Nossa Senhora. J falei d'essas maravilhosas apparies no logar respectivo; quero apenas mencionar a viso de Jesus crucificado, que succedeu na quinta-feira maior do anno de 1899.
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Gemma estava atacada de um grave incommodo, no obstante, era to fiel ao exercido da Hora santa, que no quiz perder a hora de adorao, e o Corao de Jesus, nunca se deixando vencer em generosidade, soube recompensai-a por um favor singular. Deixemol-a narrar o memorvel acontecimento: Fiz o exerccio da /Tora santa, apezar de grande fraqueza, porque havia feito a promessa de no omittil-a. Senti-me tomada de viva contrio das minhas infidelidades. Tal foi a compuneo, que soffri um verdadeiro martyrio. No meio d*esta dr indizvel, me ficou um consolo: era de poder chorar. Passei assim a hora inteira a rezar o a soluar. Cessou o penar c sobreveiu-me intenso recolhimento de espirito, fiquei como fora de mim; as foras physicas me abandonaram por completo. Com muito trabalho, pude me erguer e fechar a porta. Onde estava? Em presena visvel do meu querido Jesus crucificado, derramando sangue que brotava em borbulhes das cinco chagas e de todo o corpo sagrado! Esta vista aterrorizou-me. Baixei incontinenti os olhos; to perturbada estava e to acanhada, que no me atrevi a levantar a vista e contemplar meu Senhor crucificado. Persignei-me, rezei, e o socego voltou-me ao espirito. Em seguida, prostrei-me, a face contra a terra, e fiquei assim por muito tempo em adorao. As chagas do meu amado Kedemptor imprimiram-se-me to profundamente no corao e no espirito, que nunca mais se apagaram. A estes fervores vinham unir-se outras consolaes divinas. Lemos, na epistola de S. Paulo aos Corinthios, a relao minuciosa de suas revelaes: Si importa que algum se glorie, o que na verdade no convm, descerei agora s vises c revelaes. Conheo um homem em Christo que, quatorze annos lia, foi arrebatado (si foi no corpo no sei, ou si fora do corpo tambm no sei), at ao terceiro co e ouviu l, palavras secretas, que no possvel a um homem referir. A exemplo do Apostolo das gentes, Gemma de Jesus foi arrebatada, muitssimas vezes, ao co; seus xtases eram
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frequentes, quotidianos para bem dizer. Nas quintas e sextas-feiras, porm, tornavam-se mais prolongadas, privando-a inteiramente do movimento e do uso dos sentidos. N'estes dias, o espirito de Gemma era enlevado pela meditao da dolorosa Paixo e transportado n'uma intensa contemplao ao cume do Calvrio. N'este estado exttico, completamente fora de si, no percebia mais nada do que se passava em redor. De mos postas e com os olhos abertos e immoveis, fitava um objecto invisvel para os outros. Gemma sen- p" nem a dor mais tia-se attrahiaguda. Podiam da irresistivelferil-a na camente manbea com uma so de Deus ; a g u l h a , queinenhuma lnmai-lhe as gua, quer humos com as mana, quer anchammas de glica, p o d e r uma vela : a tuexprimir j ado ficava insenmais o que alli svel como uma gozava, ouvia estatua. e via. Nada haN'este estado, via que pudessua natural forse tiral-a d'est mozura transfienlevo maravigurava-se n'ulhoso, nem o ma belleza somaior ruido L . _ _ _ _ ^ J brehumana, o rosto de perfeito oval mudava-se em foco de luz como a aurora nascente; as feies, j muito harmoniosas, tornavam-se bellissimas ; os olhos, pelo brilho intenso, pareciam dois carbnculos que despediam chispas, de maneira que no se parecia a uma creatura humana, mas a um seraphim descido do co. A's vezes, dos lbios sabiam-lhe suspiros e palavras como centelhas abrazadas. O Jesus, dizia Gemma n'um extase, 6 Jesus, quando ouo lembrar leu nome, minha alma se eleva. S teu nome, Jesus, me acalma a dar.
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Tenho desprendido meu corao da. terra e collocado eut ti. Jesus, minha alma suspira e se eleva, ao ver-se enriquecida com tantos e to contnuos favores, quizera poder pagal-os convenientemente com obras hericas. O Jesus, esta minha alma miservel, por estar unida a este pobre corpo, no pode voar a ti, porm bate as azas, para. se avizinhar de ti at que alcance a, unio comtigo. Gemma exclamava: Sinto cadeias a, me prenderem com tanta fora, que no posso me soltar das mesmas. Deixa-me a liberdade, 6 Jesus, quero amar-te sobre todas as cousas e procurar-te em, todo o tempo. Assim como os que esto possudos de um amor natural, quasi sempre tm todos os pensamentos empregados n'elle, o corao cheio de aftecto, a bocca cheia de louvores, para o ser amado, no encontrando arvores em cuja casca no escrevam os ardores que experimentam, assim tambm os que amam a Deus no podem deixar de meditar n'EUe, suspirar por Elie, querendo, si possvel fosse, gravar, no peito de todos, o sagrado nome de Jesus. (S. Francisco.) N'estas conferencias propuz-me estudar as virtudes mais salientes da serva de Deus, no pretendo estenderme demasiadamente na analyse das trs virtudes theologaes que rebrilham, como outras tantas pedras preciosas, na vida milagrosa de Gemma de Jesus. Nas conferencias passadas, tratando, por exemplo, da devoo ao Santssimo Sacramento, falei da f viva que animava a Gemma. Em outra conferencia sobre o espirito de orao e da devoo s almas do Purgatrio ha de ver-se a esperana inabalvel que experimentava. O assumpto da presente conferencia ser o effeito maravilhoso da caridade, a terceira e, como diz S. Paulo, a mais sublime das virtudes theologaes. No mister repetir que Gemma Galgani primava por uma caridade abrazadora, digna de um seraphim. Assim como o astro do dia communica a luz e o calor aos planetas e aos satellites que, por sua vez, illuminam o firmamento de branda luz, assim tambm o Sol da Justia,
o sagrado Corao, o foco da luz eterna, transmittiu ao corao de Gemma umas fascas luminosas de sua immensa raridade, que se tornou em fragoa de amor. Parece-nos que poucos santos levaram to longe o amor apaixonado ao divino Esposo das almas. Como na forja o metal se abraza e flammeja, assim tambm o corao de Gemma, abysmado na fornalha de eterna caridade, incendiava-se e dardejava raios luminosos. corao de Gemma, corao consumido das fiammas do divino amor, corao to semelhante ao Corao de Jesus! Em baixo da mitra de aro, summo sacerdote, havia uma lamina de ouro finssimo, em que resplandecia o nome de Deus, gravado em alto relevo com pedras preciosas. Gemma gravou o nome de seu Amado no corao. O corao de Gemma, corao de puro crystal em que flammeja, em lettras de fogo, o dulcssimo nome de Jesus. N'um outro xtase, alcanou Gemma a converso de um grande peccador. Sentada na cama, com os olhos voltados a uma porta do quarto onde lhe apparecera o Senhor, dizia: Pois que, 6 Jesus, aqui vieste, supplico-te- pelo meu peccador. Filho teu, meu irmo. Salva-o, Jesus! e o nomeou. Jesus parecia no querer ouvir as peties de sua serva, porm ella, resoluta como quem quer a todo custo vencer, sem perder o animo, exclamou: Porque hoje no me queres ouvir, Jesus? Fizeste tanto e tanto por uma s alma, e no queres salvar aquella? Ah Jesus, salva-a!> A tudo o Senhor oppunha a justia divina. E n t o , avivando-se cada vez mais, acerescentou: No exijo a tua justia, mas a tua, misericrdia,. Sim, Jesus, procura aquelle peccador, toca-lhe o corao! Ahi o Senhor comeou a manifestar, um por um, os peccados d'aquelle infeliz. Deixando cahir os braos, a pobre filha soltou um profundo suspiro, como quem perde a esperana de vencer. Mas, logo recobrando animo, disse: J sei, Jesus, que tantas e tantas elle te tem feito, mas no fiz tambm eu? e comtudo com migo usas de misericrdia! Sei quanto elle te fez chorar, porm reste momento.
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no deves pensar nos seus peccados, mas no sangue que por elle derramaste. Trimnph.a, 6 Jesus, eu t'o peo por caridade. O Senhor permanecia inflexvel e Gemma continuava na porfia, apresentando novo motivo na argumentao que lhe occorria mente. Sim, comeou a dizer, sei que sou peccador a, no mereo ser ouvida. Mas, eis quem poder, interceder pelo meu peccador: a, tua prpria, Me que por elle ora. Agora dize que no, tua Me! No o podes: Responde-me, Jesus, que salvaste o meu peccador. Gemma alcanara a converso e, cheia de alegria, exclamou: Venceste, Jesus, has de triumphar sempre assim ! Pouco tempo depois, um senhor veiu em busca do padre director, pedindo que o ouvisse em confisso. Era o peccador que Gemma nomeara no xtase. Quantos milagres no opera a orao! O amor divino accendia no corao de Gemma verdadeiras chammas materiaes como tem acontecido em diversos santos. Seu corao, s vezes, era uma fornalha de brazas ardentes, uma fragoa de amor. O confessor, para se convencer da veracidade do effeito maravilhoso do divino amor, mandou a T). Ceclia observar o phenomeuo extraordinrio, e de facto- oh milagre! o fogo, com seus ardores, chegou a queimar a pelle de Gemma que ficou toscada em toda a superfcie do lado esquerdo e enrugada, como se tivesse sido queimada pelo fogo material. Ha uns oito dias, escreveu ella, sinto no peito uma queimadura tal, que no aguento mais; s o gelo poderia acalmar este fogo que me toma o appetite e me ameaa de morte. Entretanto, o tormento que lhe causava este fogo era temperado por um gozo delicioso e interior. N'um xtase, exclamou a Virgem de Lucca: Ardes em chammas, como eu tambm,, Senhor, dr, amor, 6 felicidade, 6 doce fogo, suaves chammas!
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E Gemma no queria trocar a dor lancinante que sentia, por preo algum, nem mesmo por todos os thesouros do mundo. Si um homem der, diz a Escriptura, todas as riquezas de sua easa pelo amor, as desprezar como si no tivesse dado nada. Todas as aguas juntas no poderiam jamais extinguir as chammas do incndio que devoravam o corao de ^lemma, nem todos os rios juntos poderiam afogar-lhe a caridade, (Cant. dos Cant.) As pessoas piedosas e instrudas no estranharo estes phenomenos communs a muitos santos e santas. Quem lhes leu a vida hem se lembra que muitos sentiam um verdadeiro incndio no corao. 0 fogo que abrazava o peito da amante de Jesus era to real que, quando se lhe approximava o thermometro, o mercrio, rpida e immediatamente, subia, no podendo pois ser isto effeito de uma febre ordinria. Alm do fogo acceso pelo amor divino que queimava litteralmente, o corao da serva de Deus, nos trs ltimos annos de sua vida, lhe comeou a bater com uma violncia inaudita. A quem perguntava pela causa d'estas palpitaes inslitas, nossa Gemma respondia: Jesus to grande e o meu corao to estreito que no pode eabel-o, por isso move-se tanto. Elie mesmo tem que dilatal-o para o comportar. De facto, o corao de Gemma dilatou-se tanto que fez erguer trs costellas, formando ellas um angulo agudo, como testemunhas oculares e insuspeitas o affirmaram. Este mesmo phenomeno appareceu em S. Felippe Nery, como se pode 1er na vida d'est santo que pedia a Deus suspendesse as torrentes do seu amor ou ampliasse a capacidade de seu peito para contel-as. Deus admirvel nos seus santos. Finalmente, quiz rematar to assignalados favores e coroar a obra por uma graa singularissima. Durante annos o Senhor acrizolava esta alma privilegiada, provando-a por mil maneiras; tinha chegado a
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hora de recompensar tantos actos hericos de invicta pacincia. O cordeiro immaculado, Jesus, o divino Esposo das almas castas, quiz celebrar, antecipadamente, as bodas espirituaes com esta alma cie escol, concedendo-lhe o mais sublime galardo a que uma creatura possa aspirar, bem como o ultimo degrau da escada mystica que consiste na unio perfeita com a Divindade, consoante os ensinamentos de S. Joo Clmaco e dos mestres da vida espiritual. Um dia, Nosso Senhor appareceu a sua fiel discpula sob a forma de um gracioso menino nos braos de sua santssima Me. Nossa Senhora tirou um annel do dedo do seu divino Filho e o passou ao dedo de Gemma. Assim como Nosso Senhor, apparecendo a Santa Rosa de Lima, disse-lhe: Rosa do meu corao, quero que sejas minha esposa espiritual, assim tambm escolheu Gemma para celebrar com ella as npcias mysticas. D'ora avante a humilde virgem de Lucca, ao exemplo de S. Gertrudes, S. Magdalena de Pazzi, S. Mechtildes, S. Thereza de Jesus, S. Rosa de Lima, B. Maria Anna de Paredes, B. Margarida Maria Alacoque, S. Catharina de Sonna e diversas outras santas, teve o direito de chamar-se esposa de Christo, a quem era unida estreitamente, pelos laos indissolveis da unio mystica. Como S. Ignez, Gemma de Jesus podia exclamar em verdade: Aquelle a quem consagrei os meus affectos me deu um annel e me adornou de bellas gemmas; ornou-me o peito e os braos de preciosssimos adornos e pz nas minhas orelhas brincos de prolas sem rivaes. Sim, amo a Jesus que tem uma me virgem a cuja casa hei de i r ; a Elie somente consagro meus votos, a Elie somente jurei dedicao eterna. Seu amor casto, suas caricias so puras, suas esposas sabem morrer sem quebrar a f que lhe juraram. Desde esse dia, feliz entre todos,Gemma comeou uma nova vida; todo o ser lhe respirava um no sei que de celestial que impressionava as pessoas de casa. Meu Padre, escrevia ella, meu corao uma victima da caridade, dentro em pouco morrerei de amor. No vos parece, Filhas de Maria, que, n'esta santa dos tempos modernos, o Senhor fez reviver as virtudes e os prodigios dos primeiros christos?
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Estes recebiam visivelmente o Espirito Santo pela imposio das mos; muitos falavam diversas lnguas, prophetizavam, obrigavam o demnio a sahir dos corpos dos possessos e faziam mais outros milagres. Foi dito pelo propheta Joel: Derramarei meu espirito sobre toda a came, e prophelizaro vossos filhos e vossas filhas. Os vossos mancebos ho de ter vises e vossos ancios, sonhos maravilhosos. Certamente n.aqnelles dias mostrarei prodgios no co e signaes na terra, sangue e fogo, vapor de fumo! Nas primeiras eras da religio catholica, diz um doutor da Igreja, taes milagres eram necessrios como necessrio s plantas novas o orvalho. Uma vez, porm, que a Igreja se arraigara bem no solo e, semelhante a uma arvore gigantesca, cobrira com a frondosa copa o mundo inteiro, cessaram tambm os milagres, as apparies e as vises. Estas manifestaes sobrenaturaes, porm, nunca desapparecem inteiramente. No correr dos sculos, o Senhor, mais de uma voz, quiz manifestai* o seu poder; digam-no os numerosos thaumaturgos como S. Antonio, digam-no os S. Paulo da Cruz, J o o Baptista Vianney, cura d'Ars, e outros muitos que tiveram apparies sobrenaturaes. Digam-no os milhares de pessoas que foram curadas milagrosamente em Lourdes, n'esta nova piscina de Silo, onde sc renovam as scenas bblicas da Galila, do tempo de Nosso Senhor. Leiam a vida de S. Juliana de Falconieri que na hora da morte commungou milagrosamente; de S. Clara; cie S. Angela, a grande exttica; de S. Vernica capuchinha, a estigmatizada; de S. Juliana de Lige, favorecida da viso de Jesus na santa Eucharistia; de S. Brigida que recebeu tantas revelaes maravilhosas; de S. Catharina de Ricci a que N. Senhora deu o annel de esposa ; de S. Clara da Cruz, celebre por suas prophecias e extases. Leiam a vida dos santos, a cada pagina encontraro milagres semelhantes. Gemma Galgani foi uma d'estas almas rarssimas e felicssimas que Deus, segundo a elevada doutrina de S.
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Paulo, conheceu na sua prescincia e predestinou para serem conformes imagem do seu Filho, para que Elie seja o primognito entre muitos irmos; as que chamou, a estas tambm, justificou-, e as que justificou, lambem glorificou. (Rom. 8.) Louvemos, pois, e glorifiquemos o Omnipotente, que se dignou glorificar, n'esta terra, a sua fiel serva, concedendo-lhe, entre muitas graas estupendas, o gozo anticipado da viso beatifica, que enche de alegria e de jubilo os bemaventurados no co! Gemma Galgam, durante estes momentos felizes de gozo celeste, podia dizer com o psalmista: Meu espirito e minha carne se regozijaram, todo o meu ser vibrou de enthusiasmo, spiritus meus et caro mea jubilaverunt. O dr. X., medico escriptor de Chermont Ferrand, no seu bello livro Les estigmatiss, descreve a vida prodigiosa de muitas pessoas de ambos os sexos que foram favorecidas pelos signaes visveis da Paixo de Nosso Senhor e pelas revelaes; sendo um bom numero d'ellas santos canonizados. Este livro sahiu luz em 1885, anuo em que Gemma Galgani foi chrisniada, com a idade de sete annos. O autor que conheci pessoalmente, pae de um piedoso sacerdote, provvel haver j morrido, pois, n'esse tempo, era um homem de seus sessenta annos, e talvez no alcanasse os ltimos annos de Gemma Galgani, cuja vida mystica formaria um appendice ao formoso livro, deveras interessante, quer pela vasta erudio, quer pelo espirito de f e pelos surtos de piedade que lhe animam as paginas. Permitti accrescentar o seguinte critrio que pode servir de concluso e de ramilhete espiritual: Si as revelaes e as apparies celestes so, relativamente, raras em nosso sculo material, isto devido, primeiro, ao peccado original que nos priva da presena familiar de Deus; segundo, s imperfeies que nos afastam da Divindade. Os que se approximarem do ideal da santidade, approximam-se tambm do co e do mundo sobrenatural. O
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homem possue em si o sentimento innato da divindade, e tem nostalgia do infinito. Vhomme est un dieu tombe qui se souvieiit des eieux! disse um autor francez, o homem um Deus cahido que tem saudade do co. Quem nos dera soubssemos elevar-nos, em surtos arrojados, acima da terra, pelas azas da. f, a estas regies puras e sobranceiras do mundo espiritual, semelhantes ao condor dos Andes que se eleva acima das nuvens e, n'um vo possante, fixa o sol, como si tivesse a aspirao a banhar-se n'esse oceano de chammas, qual a mariposa da lmpada immensa do dia. Deixemos a vida terrestre, os sentimentos terra a terra sem nobreza e sem ideal, levantemos os olhos ao co! Contemplemos Nosso Senhor na sua ascenso de que a guia a figura allegorica, como disse S. Mximo. Sigamol-o! Ha de guiar-nos para os astros, ha de ser a vereda, o alvo dos nossos coraes! Tu dux ad ostra et semita, Metei nostris cordibus. Jesus ha de ser nossa consolao, ha de enxugar nossas lagrimas, e ha de constituir nossa doce recompensa no santo paraiso. Sis laerimarum gaudium, Sis dulee vitat prajniumf Amen.
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V t . ,I/
Vl.lV
http://alexandriacatolica.blogspot.com
DECIMA
CONFERENCIA.
-A. i m p r e s s o milagrosa das cinco cliag'as de Nosso Senlior na carne vlrg:iaa.al de Gemma Galgani.
Ego meo enim Stigmata J e s u in corpore (Gal. 6.)
porto.
ANDO Jesus, a quem a Igreja chama a Coroa das Virgens, une-se por npcias mysticas a uma alma de escol, e sella esta unio mysteriosa, pela entrega do symbolico annel, nunca deixa de gravar, sobre o corao e sobre o brao da esposa espiritual, seu signal sangrento; na alliana mystica, o divino Esposo engasta um rubi rutilante, uma gotta de seu sangue precioso.
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Gemma, a Virgem escolhida para ser a esposa de Jesus, no havia de fazer excepo a esta regra. Dissera a Esposa dos Cantares: Gomo um sello peme sobre teu corao, corno um sello pe-me sobre teu brao. 0 amor forte quanto a morte, suas lmpadas so de fogo e de amor. Quatro annos antes de morrer, a serva de Deus recebeu, na sua carne, a impresso visivel das cinco chagas do Senhor. Com toda a verdade a nossa santa poude exclamar como S. Paulo: "Ningum mais me moleste, porque trago, em meu corpo, os estigmas de Jesus. * Devemos ponderar, porm, que S. Paulo falava talvez no sentido figurado e empregava apenas uma metaphora; ao passo que a impresso das chagas do Senhor no corpo de Gemma foi visivel e real, como foi visivel e real a impresso das cinco chagas na carne de S. Francisco de Assis e de S. Catharina de Senna, bem como em diversos outros santos e mais pessoas de escol; no somente na idade media sino nos tempos modernos, e no meiado do sculo passado em Luiza Lataud, na Blgica, e em Anna Catharina Emmerich, na Allemanha. S. Boaventura, com a unco que lhe era peculiar e n'uma linguagem elevada, narrou a historia do prodigio estupendo e inaudito no corpo do seraphico patriarcha. Deixemos Gemma contar este extraordinrio acontecimento, porque a penna trepida em escrever taes maravilhas e to assignalados favores, como devia trepidar a penna de S. Boaventura escrevendo a vida milagrosa do seu pae espiritual. Na vspera da festa do Corao de Jesus, logo depois da communho, o Senhor me fez conhecer que, na tarde do mesmo dia, havia de receber uma graa singular. D'isto dei logo aviso ao director e, tendo d'elle recebido nova absolvio dos meus peccados, cheia de paz, voltei para casa. Chegara a tarde e logo senti uma grande dor dos meus peccados, mas to forte que nunca mais tive igual; quasi morri. Em seguida, observei que se reconcentravam as potencias de minha alma. O entendimento s via os peccados ; a memoria m'os lembrava todos, ao passo que me fazia ver os tormentos que, para me
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salvar, padecera Jesus; a vontade m'os fazia detestar, com a firme promessa de querer tudo soffrer para expial-os. Ao recolhimento sobrevem logo a suspenso dos sentidos e achei-me ento na presena de minha Me celestial, que tinha direita o anjo da guarda. Este mandou-me fazer o acto de contrio. Apenas o terminara, minha Me me dirigiu a palavra, assim: Filha, em nome de Jesus, te sejam remittidos os peccados. E proseguiu dizendo: Jeto, com elle sus, meu Fime cobriu. lho, muito te N'esse instanquer e deseja te, appareceu conceder-te Jesus, tendo uma graa; todas as chas a b e r s torgas a b e r t a s , nar-te d i g n a sem d'ellas d ' e l l a ? Na correr sanm i n h a misgue; eram ria no soube como chanique responmas de fogo. der. Eu, N'um s mocontinuou a mento, aquelSantssima las chammas Virgem, serei chegaram a tua Me, mostocar-me nas trar-te-s vermos, nos ps, dadeira no c o r a o . Corao e Jesus, filha? E Parecia-me triturado de dr por causa dos nossos n'isto, estenmorrer, e tecrimes. Tende piedade de ns ! dendo o manria cahido no
cho, si minha Me, que ainda continuava a cobrir-me com seu manto, n o me sustentasse. Passei assim n'aquella posio varias horas, mas, depois que minha Me me beijou na fronte, tudo desappareceu e me achei prostrada em terra, de joelhos, sentindo, nas mos, nos ps e no corao,, dores ainda mais fortes. Levantei-me com o auxilio do meu anjo da guarda e pude deitar-me. Eram chagas verdadeiras, diz a sua me adoptiva! Ditosa Gemma! Ella poude exclamar como S. Paulo:
Nunca, Deus permitia que eu me glorie sino na Cruz de Nosso Senhor Jesus, porque o mundo est crucificado para mim, e eu crucificado para o mundo. Dizia S. Boaventura que, quando o seraphico S. Francisco desceu do monte Alverne trazendo impressas, em sua carne, as marcas visiveis de Ohristo, e ornado das cinco chagas, grande foi sua perplexidade e, lembrando-se das palavras da Escriptura : E' bom, esconder o segredo do rei, o humilde patriarcha empregou os maiores esforos para occultar este phenomeno inaudito e nunca visto. Gemma, por sua vez, ficou tambm muito perturbada e, cheia de angustias, cobriu as mos com luvas para ir egreja; perplexa por no saber o que significassem aquelles signaes, pensou primeiro, com simplicidade infantil, fosse aquillo cousa commum s pessoas consagradas pelo voto de virgindade, e por isso ia perguntando a uma e outra pessoa si haviam notado feridas ou rasges nas suas mos e ps. Coitada, ningum a comprehendia. Entretanto o sangue continuava a correr das chagas pelo que se via obrigada a manifestar a sua tia o que lhe havia acontecido, dizendo: Vede, tia, o que me fez Jesus! Era no mez de Junho de 1899. A serva de Deus manifestou tambm o phenomeno ao seu confessor, Mons. Volpi, e ao director de sua conscincia, o P. Germano da Ordem dos Passionistas. Desde este dia, repetia-se o prodgio cada semana, da tarde da quinta-feira at a tarde da sexta-feira. N'este dia, comeavam a apparecer umas manchas avermelhadas que se transformavam, em curto espao, em vivas chagas. Outras vezes, os estigmas appareciam subitamente, como si os membros da exttica tivessem sido perfurados por golpes violentos, e ento a pobre martyr contorcia-se toda e tremia pela violncia da dor. O sangue que brotava com abundncia cessava na sexta-feira, a carne se restringia e, ao domingo, apenas viam-se os vestgios que ficavam das feridas cicatrizadas. Assim, nossa Gemma no era to somente um lyrio de innocencia ; era tambm uma das passifloras, de cr arroxeada, que conheceis pelo vocbulo vulgar da flor do maracuj, cujos estmes formam os trs cravos e outros
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emblemas da Paixo, e chama-se por isso martyrio ou passiflora. Dois annos durou este prodgio, at que fosse feita a prohibio pelo director. Afora estes signaes visveis das chagas, a exemplo de Anna Catharina Emmerich e outras estigmatizadas, a serva de Deus tornou-se participante dos outros padecimentos do martyr do Golgotha. Semelhante a Jesus, na sua cruel agonia, Gemma suou sangue diversas vezes, sobretudo quando ouvia blasphemar o santo nome de Deus. To grande era a dr que lhe causavam as offensas divina Majestade, que ficava como fora de si, e o sangue lhe brotava dos poros. Depois de ter suado sangue, nosso Salvador foi cruelmente flagellado em casa de Pilatos. A serva de Deus, principalmente nas sextas-feiras do mez de Maro de 1901, sentia todos os effeitos da dolorosa flagellao. Ella propria escreve, n'esta data, ao padre espiritual : Sexta-feira, pelas duas horas, Jesus me fez sentir um pequeno toque. Meu Padre, estou coberta de chagas que me fazem padecer um pouco. Viva Jesus! D. Ceclia, a me adoptiva, foi testemunha ocular do extase em que Gemma foi flagellada por mos invisveis. A pobresinha parecia soffrer horrivelmente e, de vez em quando, exclamava: So estes teus golpes, Jesus? Cada sexta-feira, as feridas tornavam-se mais visveis e, no fim da quaresma, algumas chagas tinham um centmetro de profundidade. Depois da cruel flagellao, os soldados, tecendo de espinhos agudos uma coroa, puzeram-n'os sobre a cabea de Jesus. (S. Matheus). Para ser completamente participante dos martyrios do Bom Jesus dos Passos, faltava-lhe a coroa de espinhos e esta lhe foi concedida n'um extase, como S. Catharina de Senna, pelo divino Redemptor. Oh santa coroa de Jesus! Qual o christo que no se honraria em ver a sua fronte cingida pela coroa de espinhos? Gemma Galgani, que tinha uma terna devoo para com a santa coroa de Jesus, anhelava esta ventura.
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Esta tarde (l) de Julho de 1900), escreve a serva de Deus, pude recolher-me: entreguei-me meditao, como o fao sempre na quinta-feira; de repente pareceu-me que estava em presena do Senhor dos Passos. Como podia eu contemplar meu bom Jesus soffrendo tanto sem consolal-o? Por isto despertou-se em mim um ardentssimo desejo de soffrer tambm com Jesus e, com muita instancia, suppliquei me concedesse este favor. Fui logo ouvida. O Senhor approximou-se de mim e, tirando de sua cabea o doloroso diadema, collocou-o na minha e o calcou com suas divinas mos. Instantes dolorosos foram esses, comtudo to deliciosos que no sei dizer! Passei assim uma hora com Jesus. A coroao mystica no foi o effeito da imaginao de Gemma, mas foi real, porque, no mesmo instante, appareceram no somente na fronte, sino na cabea toda, debaixo dos cabellos, pontos triangulares, das quaes corria o sangue. Isto confirma o parecer de diversos autores ascticos e contemplativos, que gozaram da segunda vista, como a chamam os theologos mysticos, os quaes affirmam que a coroa de espinhos cobria a cabea inteira, e no cingia to somente a fronte como se pensa no geral e como os artistas representam, erradamente, a cabea de Nosso Senhor na cruz. Embora os evangelistas no falem da ferida no hombro esquerdo de Jesus, causado pelo peso da cruz, S. Thereza e muitas outras contemplativas a veneravam. No hombro de Gemma, appareceu tambm este signal e tanta doia que a serva de Deus, quando estava andando, instinctivamente inclinava-se para o lado esquerdo. Finalmente, para completar este quadro triste e tocante, Gemma de Jesus, nas sextas-feiras, era a imagem acabada do Christo, e a copia fiel do Homem das Dores. O sangue lhe brotava da fronte e descia pelo rosto abaixo; cada cabello apresentava uma gotta vermelha, como affirmou uma testemunha ocular. Seu aspecto fazia realmente pena e, ao vel-a, todos choravam; um corao de pedra se teria commovido. Ella dizia: No choreis. Jesus o Homem das Dares, vir doloriim, e eu tambm quero ser a Filha das Dores.
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Todos estes signaes maravilhosos, para obedecer ao seu director, teve Gemma que pedir ao Senhor lh'os retirasse, permittindo que cessassem aquellas manifestaes externas. Gemma, entretanto, no deixou de soffrer as mesmas dores, pois que o sangue que correra servia-lhe de allivio, emquanto agora, o corao, pela fora com que batia, forando os vasos sanguneos, a fazia derramar vivo sangue pela bocca. Gemma, porm, se alegrava com isso, e dizia: Jesus, dar-te-ei as minhas mos e ps, mais no posso, porque me foi prohibido. Em compensao toma meu pobre corao, este sim, to posso dar. Eu to cedo, 6 Jesus. Soffro muito por isto, mas a obedincia vale mais do que a viclima. E' excusado dizer que muitas pessoas, dignas de f, presenciaram estas manifestaes extra-communs; alm de Mons. Volpi, seu confessor ordinrio, actual bispo de Arezzo, conta-se o P. Germano, confessor extraordinrio e director espiritual que mereceu elogios rasgados do summo Pontfice, Mons. Pedro Paulo Moreschini, ento missionrio apostlico e visitador de diversas dioceses da Itlia e, agora, arcebispo de Camerino. Este prelado, vendo o sangue correr das chagas de Gemma, disse: Digitus Dei est hic, aqui est bem visvel o dedo de Deus. Para n o errar n u m assumpto de tal importncia e de immensa responsabilidade, o P. Germano lanou mo de todos os recursos da sciencia e da experincia na direco das almas, para provar o espirito de Gemma, consoante s palavras de S. Paulo: Probate spiritum si ei Deo est. Durante cinco annos, submetteu sua dirigida a um minucioso e rigoroso exame sob o trplice aspecto physiologico, moral e asctico, at se convencer de que o espirito de Gemma realmente era o espirito de Deus; e que no somente o seu estado era normal como de perfeito accordo com os princpios da razo, da f, e da theologia mystica. Quem pode pr em duvida as affirmaes de pessoas de critrio e de grandes responsabilidades? de personagens altamente collocadas na Igreja?
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A sciencia orgulhosa, cuja fallencia Brunetiere, da academia franceza, proclamou n'uma retumbante conferencia que echoou pelo mundo alm, jamais ha de explicar taes factos sobrenaturaes, nem to pouco as curas milagrosas de Lourdes. No se pode negar factos. Nem as negativas systematicas dos atheus, nem a risota e os motejos dos impios podem abalar nossa f no sobrenatural e nossa crena nas manifestaes celestes, embora incomprehensiveis. A Igreja venera a impresso das chagas no corpo de S. Francisco e instituiu, em commemorao d'est facto milagroso, uma solemnidade especial que se celebra a 17 de Setembro. A mesma Igreja festeja tambm a transfixo do corao de S. Thereza, pelas settas inflammadas de um Seraphim. No queremos, entretanto, obrigar ningum a acreditar nos prodigios que acabamos de narrar, como se fossem um dogma da f, logo que a Igreja ainda no se pronunciou sobre taes manifestaes sobrenaturaes. Esperamos, serena e confiadamente, a deciso infallivel, no dia em que a mesma Igreja glorificar a humilde Gemma, insere vendo-lhe o nome no catalogo dos santos. Por emquanto peamos esta graa a Nosso Senhor, semelhantes ao propliota Dailiol que, por ser um homem de desejos ardentes, abreviou os dias da vinda do Senhor, Salvador do inundo. Assim, por nossos suspiros, pelas aspiraes continuas, pelas preces fervorosas, podemos encurtar os dias que nos separam da glorificao de Gemma Galgani, a odorante flor do paraiso. Prostrados aos ps do altar da Rainha das Virgens, levantemos as nossas mos supplices ao co e rezemos para que, em breve, a aurola dos bemaventurados refulja na fronte to pura de Gemma de Jesus. Todavia, sem querer prevenir o juizo da Igreja, nossa Me e Guia, fundando-nos na relao de pessoas insuspeitas, no testemunho irrecusvel de ecclesiasticos, de prelados e de pessoas tementes a Deus, podemos acreditar, humanamente falando, n'estas manifestaes sobrenaturaes que so do domnio do mysticismo. O Senhor dignou-se conduzir a sua fiel serva pelos caminhos extraordinrios, e, prodigalizando suas graas, concedeu-lhe favores excepcionaes.
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No convm sondar estes abysmos perscrutar estes mysterios ineffaveis. Filhas de Maria, sede devotas da Virgem das Dres; com ella subi ao Golgotha, a meditar na sagrada Paixo do Senhor. A exemplo de Gemma, transportae-vos em espirito ao Calvrio e contemplae Jesus crucificado. Fazei a mido a Via Sacra, exerccio to piedoso e to enriquecido de indulgncias. Ajoelhadas ao p da cruz, dizei a Maria: Santa Maria, isto vos peo, Fiquem em meu peito bem impressas As chagas do crucifixo. Em unio com Gemma, vosso modelo, fazei toda quintafeira o exerccio da Hora-santa, pratica to recommendada por Nosso Senhor. Falando B. Margarida Maria Alacoque, Nosso Senhor lhe disse: Todas as noites de quinta para sextafeira, ficars prostrada commigo durante uma hora com a face contra a terra, e recitars cinco Padre-Nossos e cinco Ave-Marias, com cinco actos de adorao, tanto para aplacar a ira divina, pedindo misericrdia pelos peccadores, como para suavizar e honrar, d'algum modo, a amargura que senti quando os meus apstolos me abandonaram e me constrangeram a reprehendel-os por no terem podido velar uma hora commigo. Terminando esta conferencia, deixae-me accrescentar uma palavra ainda sobre os favores espirituaes da serva de Deus. Estes favores sendo, como disse alhures, graas grtis datce, isto , concedidas a uma alma sem cooperao de sua parte e sem considerao aos seus mritos, no so necessrias e nem unicamente a prova de sua santidade. S. Joo Baptista de quem Nosso Senhor proclamou a eminente santidade no operou um milagre sequer; pelo menos no consta nenhum. S. Vicente de Paulo fez pouqussimos milagres, ao passo que, na vida de Anna Catharina Emmerich, escripta pelo poeta allemo Brentano, bem como na vida de Luiza Lataud da Blgica, lm-se prodgios estupendos.
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Gemma Galgani.
As duas estigmatizadas tornaram-se justamente celebres, esta por seus extases e aquella por suas vises. Os extases no so virtudes, disse o mellifluo S. Francisco de Salles na Introduco vida devota, mas recompensas que Deus d pelas virtudes, ou, para melhor dizer, so amostras das felicidades da vida futura que, s vezes, se concedem aos mortaes para fazel-os desejar as peas inteiras que esto l- no alto do co. O mesmo santo recommenda a sua cara Philotha que n o deseje vises e extases, porque ha grande perigo de vaidade e de illuso em semelhantes graas. Finalmente refiro um bello conceito de S. Bernardo: A santidade no consiste em fazer cousas portentosas, mas em fazer todas as cousas, por mais communs que. sejam, de um modo no commum, isto , perfeito. Quero allegar ainda alguns conceitos do piedoso Padre Fber que synthetizam a doutrina dos doutores da Egreja acerca da predestinao, este insondvel mysterio : Os santos diffrent muito uns dos outros e todavia lodos se assemelham. Mas hajam ou no obrado milagres, tenham ou no feito mortificaes corporaes excessivas, como S. Bernardo que, no fim da sua vida, pediu perdo ao seu corpo de tel-o to maltratado pelas penitencias, c certo que todos se assignalam por um caracter que os distingue dos que no so santos. O que nos deveria encher de alegria, que os principaes caracteres da sua santidade esto ao nosso alcance, podendo aproveitarmo-nos d'elles quando quizermos, sem fazer milagres espantosos, e sem ter apparies como as teve Gemma Galgani. Nosso Senhor predestina algumas almas a uma santidade maior, concedendo-lhes graas extraordinrias, manifestando-se-lhes de uma maneira visvel e palpvel; porm, a graa sensivel e o milagre nem sempre so os nicos critrios de santidade. Portanto, ningum deve pretender ir alm dos limites da graa que Deus lhe concede. N'uma palavra, assim conclue o jjiedoso e douto oratoriano inglez, embora os santos diffiram entre si em muitas cousas, assemelham-se em trs pontos principaes, a saber: 1) o zelo pela gloria de Deus, 2) a susceptibilidade pelos interesses de Jesus, 3) uma viva solicitude pela salvao das almas. Na prxima conferencia, trataremos este assumpto to interessante e estudaremos, minuciosamente, a virtude de zelo da serva de Deus, Gemma Galgani.
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DECIMA P R I M E I R A C O N F E R E N C I A .
U m a l i z i c L a ag^ata.O z e l o p e l a salvao d a s a l m a s .
Zeliis domus tuae comedit me.
( Psalmo.)
o riqussimo ornamento pontifcio, todo recamado de pedrarias e jias raras, que cobria o peito do summo sacerdote, quando entrava no santurio para desempenhar as sagradas fmices, brilhava a gata, pedra custosa de peregrina belleza e encantadora polyehromia. Depois de estudar e examinar as virtudes de Gemma de Jesus e de comparal-a a outras tantas pedras preciosas, resta-nos estudar os reflexos diversos da gata, que pode significar o zelo, porque esta virtude tem diversos aspectos.
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Em toda a obra grande e bella, diz um autor portuguez, quer seja da natureza, quer da arte, quer da graa, ha sempre o duplo reverbero do Creador: unidade do reflexo de um Deus simplicssimo e variedade do reflexo de um Deus infinito. Esta dupla feio pertence s grandes obras da virtude e do apostolado no mundo. S. Paulo explica esta verdade, clara e exactamente, na sua epistola aos Gorinthios: Ha diversidade de operaes sobrenaturaes, mas no ha sino um espirito que opera em todos. O Senhor que favoreceu a sua fiel serva Gemma com tantas e to prodigiosas graas espirituaes, como os dons de prophecias, do discernimento dos espritos, o conhecimento das lnguas, pediu-lhe a collaborao na grande obra da Redempo, como a pede a todos os christos e principalmente s Filhas de Maria, embora no precise da mesma de forma alguma. O Senhor pediu a Gemma o concurso na converso dos peccadores e os suffragos pelo descano eterno das almas do Purgatrio. Deixemos que ella conte de que maneira recebeu do co esta sublime misso de trabalhar pela converso dos peccadores, u i m a appario maravilhosa, que se revestiu de uma certa solemnidade e que se parece muito com a appario de Paray-le-Monial, quando Jesus manifestou a B. Margarida Maria de Alacoque as riquezas de seu Corao sagrado: Um dia, depois da communho, Jesus me interrogou: Minha filha, tu me amas? Que devia dizer? Meu corao ento respondeu affirmativamente, pulsando com violncia. Si me amas, continuou o Senhor, fars o que peo e desejo de ti, e, proseguindo n'um tom que trahia profunda emoo, accreseentou: Quanta ingratido e quanta maldade se encontram sobre a terra! Os peccadores no se emendam, empedernidos continuam a me offender; as almas fracas e covardes no se contem; incapazes de fazer o mnimo esforo para vencer as tentaes, miseravelmente caem nos laos do demnio e no resistem aos attractivos da concupiscncia; as almas vencidas entregam-se ao desespero, emquanto a indiffcrena, vae augmentando cada, vez mais;
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finalmente no ha quem pense. Comtudo no deixo de prodigalizar minhas graas a todos. Doa Igreja, com abundncia, a vida e a luz, e ao seu chefe, a sabedoria e o animo; dou aos ministros dos altares e a todos os que trabalham para a salvao das almas, fortaleza e coragem; aos que fiis seguem minhas pegadas, dou cha/mal-os ao a perseveaprisco d<> rana e a bom Pastor. constncia; Ora, que aos justos, lucro tiro de graas ditantos esforversas e os Que gamltiplas. nho com tantos trabaNo me lhos? que esqueo dos corresponpeeeadores : minha luz dncia, envae procucontro por rai-os nos tantas tentaesconderijos tivas amorosombrios, sas ? Que onde se occollaborao cu/tam; emda parte prego os das creatumaiores esras humaVerdadeiro retrato do Crucifixo, diforos para nas que tanante do qual orava a serva de Deus, COmmOVel-OSj '^Gemma Galgani. to amei e convertel-os e " tanto amo? Ningum leva em conta o amor air azado de meu corao, cheio de piedade! Os homens ingratos se esquecem de mim e me traam como se fosse um estranho que nada tivesse feito em seu favor, ou que nunca os tivesse amado! Meu corao est afflietissimo. Estou abandonado nas igrejas, ficando sosinho no tabernculo, dia, e noite. Muitos dos que vm me visitar, em lugar de me consolar como devem, cmgmentam-me ainda mais a tristeza, porque so levados a minha presena por motivos humanos! Alguns at me deshonram pela falta de respeito, e profa-
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nam a igreja, que a easa onde resido saeramentalmente, conversando e distraliindo-se. Conheo lambem muitos que, semelhantes a Judas, fazem communhes sacrlegas, recebendo-me indignamente, com hypocrisia detestvel. Jesus ia prosoguir nas amorosas queixas, porm no pude me conter e exclamei a chorar: Basta, meu bom Jesus; no posso mais.' Gemma poz, immediatamente, mos obra, e, com um incendido zelo, tratou de desempenhar a honrosa misso de medianeira que o Senhor lhe confiou n'essa memorvel circumstancia. Offereceu primeiro os soffrimentos, physicos e moraes, as mortificaes que no foram poucas, afim de, como diz S. Paulo, completar em sua carne, o que faltou na Paixo de Nosso Senhor. Em seguida offereceu o prprio sangue na mesma inteno. Para consolar o divino (.'orao, consagrou-se como hstia de pureza em holocausto e, para desaggravar a ingratido dos peccadores, deu a Jesus as ultimas gottas do seu sangue virginal. O sangue brotava com abundncia dos cinco estigmas maravilhosos e, s vezes, do corpo todo, at dos olhos innocentes. Em confirmao d'est sentimento, narra o biographo que, um dia, Gemma, ao voltar da igreja, ouviu um de seus empregados, furibundo e cheio de raiva por uma desgraa que lhe succdera, vomitar horrorosa blasphemia. Ao ouvil-o, a pobre menina estremeceu, quiz reprehendel-o, porm faltaram-lhe as foras e cahiu desmaiada; o corao, entretanto, batia-lhe com violncia extrema no peito e, incapaz de resistir fora que o opprimia, comeou a expellir sangue com tal vehemencia, que este, atravessando a pelle, chegou a sahir pelos poros em forma de suor, banhandolhe os vestidos e mesmo o cho. Passado o delquio, levantou-se e, sem perceber o que lhe succdera, commovida ainda pela profunda afflico que sentira, voltou aos seus. Sahiu-lhe ao encontro primeiramente a tia que, admirando-lhe a pallidez extrema da face e o sangue que corria, sem poder imaginai" o que se passara, perguntou-lhe o motivo d'esse phenomeno. Em seguida, pensando que se
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tivesse aoitado com flagellos e instrumentos de penitencia, comeou a censural-a com aspereza. A humilde virgem, vendo-se descoberta, enrubeceu e tentou occultar tudo, mas no o poude e teve cie confessar, ingenuamente, que aquillo era effeito das blasphemias que pouco antes ouvira. Commovida a tia e procurando dissimular, interrogou-a: No tens por ventura ouvido, outras vezes, blasphemar n'esta infeliz cidade? Ao que a pobre Gemma continuando a gemer, respondeu: No a primeira vez; sempre, porm, que no me dado fugir ou pelo menos distrahir-me, experimento este phenomeno . Eis como Jesus se mirava em sua serva: Jesus soffre com as blasphemias e eu soffro com elle no meu, corao; o sangue me jorra das veias. Poderia acrescentar que, outra vez, o seu sentimento, ainda foi mais profundo, e a violncia da dor fel-a chorar verdadeiras lagrimas de sangue. Este phenomeno, nico na historia e na vida dos santos, repetia-se frequentemente, desde que Gemma attingiu os cumes da perfeita caridade e do puro amor. Muitas pessoas observaram o facto extraordinrio, vendo o sangue brotar-lhe dos olhos innocentissimos e coagular-se no rosto, de maneira a ser preciso raspal-o. Gemma deu, portanto, o sangue das mos, o sangue dos ps e do peito, o sangue dos olhos a ponto de esgotal-o, para desaggravar o divino Esposo das irreverncias e dos crimes dos homens ! Que far ainda a delicada joven para satisfazer aos desejos do Senhor e para desempenhar a nobilssima misso de que fora incumbida? Desobrigar-se- de seu compromisso, com um zelo abrazado, orando sem cessar pelos peccadores e levantando ao co as mos supplices. Gemma descobrira o segredo de abrandar a justia divina por supplicas incessantes, por jaculatrias inflammadas, por lagrimas e suspiros de amor. Aplacava a ira de Deus, advogando a causa dos pobres peccadores, com rara eloquncia, e alcanando-lhes a graa da converso.
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Saber-se-, no dia d juizo, o numero de peccadores que arrancou das garras do demnio. Quando a ira e o enfado se apoderavam do rei Saul, nos diz a Eseriptura sagrada, David, seu pagem, que era um harpista excellente, pegava de seu instrumento predilecto, e os sons harmoniosos serenavam o rei e acalmavam-lhe a clera. Embalado por estas ondas musicaes da harpa encantadoras, Saul esquecia-se das ameaas e da ira. Assim tambm o corao de Gemma, semelhante harpa vibrante de David, cantava os hymnos de amor e de rep a r a o ; aplacava a justa ira de Deus Padre, Rei dos reis, e detinha o brao vingador prestes a castigar o mundo peccaminoso. Nosso Senhor, que achou no corao de S. Gertrudes, conforme o que se l na orao d'esta santa, uma manso alegre, desfructou tambm suas complacncias no corao da reparadora perfeita, Gemma Galgani. A propsito seja-me licito referir umas palavras do Padre F b e r : Praza ao co que volte a esta terra S. Gertrudes para tornar a ser o que foi, na idade mdia, a prophetiza e a doutora da vida interior! (Tudo por Jesus.) O voto do piedoso oratoriano de Londres, o digno filho de S. Felippe Nery. parece ter sido ouvido em parte. Embora no se possa estabelecer parallelo entre a nossa heroina e S. Gertrudes que foi o assombro de seoulo X I I I , a ldima gloria da illustre Ordem de S. Bento, e um dos mais bellos flores da Allemanha, comtudo pode-se dizer que, a exemplo de Eliseu, herdando de seu bemaventurado pae Elias o duplo espirito, Gemma Galgani herdou da grande illuminada de Eisleben e abbadessa benedictina, o espirito de orao e reparao, juntamente com todos os dons da vida interior. Por mil actos de desaggravo, a serva de Deus, de dia e de noite, suppria a negra ingratido dos homens, e consolava o divinssimo Corao de Jesus. Piedosa Vernica, enxugava a face de Jesus, coberta da lama dos peccados. Como o bondoso Simo Oyrineu, com padecia-se de Jesus e ajudava-o a levar a cruz, sobre a qual pezam os crimes de toda a humanidade.
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Amorosa Magdalena, prostrava-se aos ps rasgados do divino Salvador, banhando-os com seu pranto, consolando a divina victima ultrajada pelas blasphemias. Filha de Sio compadecida, seguia as pisadas sangrentas do Redemptor, abafando, com palavras de ternura, cada uma das injurias, cobrindo, com um osculo, cada uma das bofetadas. Como a Virgem Maria, depois de receber nos braos o corpo de Jesus despregado da cruz, Gemma arrancava os espinhos cruis da cabea de Jesus, derramando rios de lagrimas. Piedosa Maria Salom, entre soluos e ternos gemidos, ungia, com os mais preciosos blsamos, o corpo chagado e ensanguentado do seu divino Salvador, victima dos peccadores e, por suas oraes continuas e fervorosssimas, a serva de Deus interpunha a sua intercesso valiosa aos peccados dos ingratos. Nas preces de Gemma, havia como uma escala de supplicas que o evangelista aponta: Petitepedi! qurite -proeuraef pulsate batei d porta! Interessada vivia constantemente por uma ou outra alma desvairada. 'Lembra-te, dizia ella a Jesus, '(resta ou d'aqtiella, quero vel-a salva eoinmigo ! Supplica prudente e ao mesmo tempo efficaz! Muitas vezes, interpunha a doce supplicante a intercesso de Maria Santssima, o refugio dos peccadores, cujo poder experimentava a mido. Um dia, Nossa Senhora lhe appareceu, acabrunhada de tristeza, e lhe communicou que estava resolvida a abandonar um peccador, pelo qual se tinha interessado. Gemma exclamou commovida: Que ests dizendo, minha Me? queres abandonar essa alma? Por ventura no pertence a Jesus? Teu Filho no derramou sangue por ella? No, mil vezes n o ; vae, minha Me, e abranda o Corao de Jesus ! Abandonar uma, alma! esta expresso traspassava, como uma setta, a alma de Gemma. Ouvindo-a, ficava como exasperada. O director empregou-a tambm, unicamente para
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provar a sua zelosa dirigida e conheceu a que ponto estas palavras a torturavam. Um dia, declarou-lhe que ia deixar uma alma que julgava renitente. No diga isso! Ai, ai, padre mo, exclamou ella commovida, para que desanimar assim? Nem sei como- V. Rvma. pode pensar n'isso. Mande chamar esta pessoa, diga-lhe toda a verdade, francamente, use de condescendncia, como usa commigo, que fui peor do que ella. Tome cuidado, caso no seja possivel falar-lhe, escreva, ameaando-a com os castigos divinos, si no se emenda. No accrescento mais nada: faa tudo, tudo. Recommendaram s oraes de Gemma um peccador empedernido, irmo de uma piedosa e distincta senhora. Immediatamente, a serva de Deus rezou pela converso do culpado, arrebatada n'um xtase. O Senhor declarou, sem duvida para proval-a, que no conhecia aquelle peccador. Gomo, Jesus? no o conheces? Por ventura no ser tambm um filho teu? Em seguida, Gemma, desanimada, dirigiu-se Santssima Virgem. Esta chorava o no respondia. Invocou ento o B. Gabriel, que tambm no ligou importncia a sua orao. Sem perder coragem, redobrou de fervor e de oraes. Entretanto confessou com singeleza: Este homem deve ser um peccador renitente e obstinado em vista de que o Senhor declara que nem o conhece; a Virgem Maria limita-se a chorar e o B. Gabriel fica mudo! Gemma rezou assim durante um anno com admirvel perseverana, quando, um dia, voltando da igreja,exclamou: Est salvo! Perguntaram-lhe de quem falava, e ella respondeu: Do irmo d'aquella senhora. De facto, n'essa mesma hora que pronunciava estas palavras, o referido homem morria reconciliado com Deus, beijando a mo do sacerdote e recommendando-se-lhe s oraes. O ultimo peccador, por quem Gemma se interessou, foi um senhor de Lucca, celebre na cidade por sua obstinao e que Gemma, entretanto, no conhecera pessoalmente.
Rezou durante muito tempo, e fez esforos sobrehumanos para alcanar a converso e a salvao d'esta alma to digna de compaixo. J estava prostrada pela doena que a levou ao tumulo, mas continuava o apostolado da orao. No dia de quinta-feira maior, converteu-se o referido peccador e, dois dias depois, Gemma voou para o co, empunhando esta nova palma de victoria; foi a ultima converso que alcanou. O demnio, naturalmente enfurecido pelo inexcedivel zelo da piedosa joven, que lhe arrancava assim as victimas, rangia os dentes de clera. A mido apparecia-lhe sob a figura da besta-fera; os olhos lanaram chispas; fazia-lhe ameaas assustadoras. No me importa que trabalhes para ti, dizia elle, faze o que quizeres, toma cuidado, porm, de n o fazeres nada em prol dos peccadores, porque n'este caso me p a g a r s muito caro! Outra vez, Satanaz,tornando-se manhoso sob a mascara da hypocrisia e, apparecendo-lhe sob a figura do anjo da luz, dizia: Tu mesma s uma grande peccadora, carregada de innumeros crimes. Para que te importas com a vida alheia? Ora, toda a tua vida seria insufficiente para chorar teus crimes e reparal-os pela penitencia. Para que ento choras os peccados dos outros? V que tua propria alma est em perigo. Bonito lucro! Ganhar a alma dos outros e perder a propria ! Este ardil diablico, entretanto, no conseguiu ef feitoOuviram-n'a a falar com Jesus n'um extase: Queres saber, doce Jesus, quem foi que me prohibiu rezar pelos peccadores? Foi o demnio. Toma conta das pobres almas desvairadas, eu t'as recommendo. Ensina-me a amar e desenvolver ainda mais zelo, e assim lucrar muitas d'ellas. Gemma rezava, em particular, pelas almas inimigas. Esta pomba sem fel vingava-se d'esta maneira d'aquelles que lhe queriam mal. Retribue-lhes, dizia, o bem pelo mal que me querem fazer, Jesus! Amanh offereeerei a santa communho n'esta inteno. Elles talvez pensem em me offender, entretanto eu os amo sinceramente.
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Assim que a piedosa joven praticava a caridade para com o prximo. Visto que, n'este humilde esboo, no se apresentou a oceasio, mu grado nosso, de estudar a bella virtude da caridade que, como pedra preciosa, brilhar eternamente na coroa immortal de Gemma, estimamos immenso, no obstante, citar este exemplo bellissimo de amor do prximo. Sirva de incentivo s Filhas de Maria para pagarem o mal com o bem, perdoando de corao aos inimigos e rezando por elles. Gemma de Jesus, alm das supplicas incessantes pela converso dos peccadores, exercia o fecundssimo apostolado, dando bons conselhos, ensinando aos ignorantes, reprehendendo, com humildade, prudncia e doura, aos que erravam e, encarregando-se, da parte de Jesus, de censurar e, s vezes, de ameaar com castigos a quem merecia. A exemplo de Tobias do Antigo Testamento, levava as consolaes e admoestaes, cheias de caridade, a todos, animando-os a praticarem a religio n'este desterro. Ponderem as Filhas de Maria que o zelo no exclusivamente uma virtude apostlica e sacerdotal. O padre, na verdade, est collocado sobre o candelabro como uma luz que ha de irradiar para todos os cantos da casa do pae de famlia, tal a razo da sua existncia, tal a sua misso. Os simples fiis, entretanto, podem e devem tambm exercer o zelo na esphera embora estreita, em que a Providencia os collocou Existe um erro inveterado em certa classe da sociedade que affirma a obrigao do zelo ser apenas um conselho de perfeio, e a nada obriga em conscincia. No se lembram os illudidos que a obrigao do zelo pela salvao das almas um preceito divino que obriga a todos na medida de suas foras: Diliges proximum, tuum sieut te ipsum, amars teu prximo como a ti mesmo. Os antigos romanos davam uma coroa de louros feita de ouro a quem salvasse um homem da morte imminente; Nosso Senhor, mais generoso, concede uma coroa immortal a quem salva as almas. Disse muito bem S. Agostinho: Qui non zelai non amai. Aquelle que no tem zelo no se pode ufanar de amar a Deus e ao prximo como a si mesmo.
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Leiam a vida dos santos, e vero de que maneira humildes virgens, animadas pelo zelo das almas, fizeram prodgios. S. Christina, uma pobre escrava, pelas suas oraes fervorosas, alcanou a sade da rainha da Ibria, no quarto sculo da ra enrista, converteu em seguida o rei d'esse paiz e, finalmente, toda a nao hespanhola. Dizem de S. Thereza de Jesus que, sem sahir do convento, converteu um numero maior de almas de que seu contemporneo e patricio, S. Francisco Xavier, o grande apostolo do Japo. E' o prodgio da orao. Filhas de Maria, rezae pela converso dos peccadores, lembradas de que podeis converter mais almas do que um padre, porque, afinal de contas, quem converte os peccadores a graa e no o sacerdote. Prouvera a Deus que cada uma de vs possa dizer: O zelo da casa de Deus me devora e me abraza. Prouvera a Deus que, na vossa coroa immortal, brilhe, durante toda a eternidade, a pedra preciosa da linda agatha, symbolo do zelo. Nosso Senhor serviu-se, mais de uma vez, da sua zelosa serva para transmittir mensagens e recados. Uma vez escreveu ao director: O Senhor manda-me, em seu nome, superiora de um convento para dizer-lhe que no resista e caso se obstine e no queira obedecer aos superiores, ser severamente castigada. Ai d'ella si no se emenda e no tira proveito d'esta ultima admoestao! A um prelado que lhe perguntou si desempenhava bem o mnus pastoral, disse: V. Excia. deve usar de maior prudncia nos negcios, e de mais doura para com os inferiores, a no ser assim, no satisfar a ningum. A singela joven, allumiada pelo Espirito Santo, se expressava com toda a modstia, embora com muita franqueza, e no melindrava a ningum. Afim de desempenhar melhor o sublime cargo do medianeira e mensageira de Deus, Gemma recebeu, alm dos outros dons sobrenaturaes, o dom do discernimento dos espritos bem como o da prophecia, como provou em diversas oceasies. Para citar um exemplo e afim de abreviar esta conferencia que j vae longa, quero apenas mencionar a prota ta
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phecia do estabelecimento de um mosteiro de religiosos passionistas na cidade de Lucca, facto que se realizou dois annos depois de sua morte, em cireumstancias imprevistas e maravilhosas. Por este espirito prophetieo, vem apparecer-se com S. Rosa de Viterbo que tambm annunciou seria recebida, depois de sua morte, no mosteiro das Pilhas de S. Francisco de Assis, como de facto aconteceu. No tardar o dia em que as Filhas de S. Paulo da Oriiz, g u a r d a r o e honraro, na sua capella, os restos mortaes de Gemma, considerando-a no s como uma irm, sino como fundadora e madre. Gontemplae, Congreganistas, a serva de Deus, a Filha de Maria modelar; esforae-vos por imital-a na vida apostlica ! Alliaram-se n'ella a vida contemplativa de Maria Magdalena e a activa de Martha. Estudae-lhe o santo e curto peregrinar pela terra, todo empregado em obras de fecundo apostolado ! Esta alma, embora toda embebida de sobrenatural e de mysticismo, nem por isso deixou de servir a Deus, como diligente abelha, com trabalhos incessantes, em prol das almas que se perdem e com obras de caridade para com o prximo: Famula tua, Domine, quasi apis tibi argumentosa cleservit. (Officio de S. Cecilia.) Uma congreganista no deve desperdiar o tempo e as foras, nem entregar-se a ociosidade que turva e empana o brilho da agatha que symbolisa o zelo. Oada uma modele as aces pelo exemplo dos santos. Filhas de Maria, para serdes dignas d'est nome, assiste-vos a obrigao de desdobrar a actividade. Movidas pelo zelo ardente, trabalhae pela converso dos peccadores, trabalhae com afinco pela maior gloria de Deus e de Maria Santssima, tanto mais que a necessidade do zelo se faz sentir mais fortemente do que nunca. Oxal se propaguem e se desenvolvam as obras do zelo apostlico, de maneira que breve se estabelea o reino de Deus na sociedade moderna: Advenial regnum tuttm.
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DECIMA SEGUNDA C O N F E R E N C I A .
Uma esmeralda. - Q desapego.obed i n c i a de Gemma G r S L l g r s m i Et posuit in eo g e m m a r u m ordines quatuor : in primo v e r s u s m a ragdus. ( E x o d . 39.)
M a primeira fileira do racional do pontfice da antiga lei, e nos alicerces do templo de Jerusalm, brilhava, modestamente, a esmeralda com seus reflexos verdes. Esta joia pouco procurada e ainda menos estimada, embora seja rara porque no se impe por um brilho fascinante; assim pode symlisar o desapego, virtude pouco prezada pelos homens.
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O desapego no deixa de ser, entretanto, uma virtude bsica da santidade, como a esmeralda era uma das pedras fundamentaes do templo da Nova Jerusalm, descripta por S. Joo Evangelista. Desde muito criana, Gemma nutria o desejo de seguir a Jesus, pelo desprendimento total das creaturas e imital-o, na pobreza, na abnegao, no admirvel desapego dos bens terrestres, n'uma palavra, queria ser santa; era este seu t nico anhelo, sua continua aspirao. Por intuio, Gemma comprehendeu que o caminho da santidade no outro sino o caminho da cruz. Por inspirao divina sabia, apezar da tenra idade, que deve seguir a Jesus quem se dispe a ser santo, levando a cruz s costas e renunciando completamente no s a todas as cousas creadas, mas ainda ao prprio sentir e querer. D'esta maneira, ia Gemma galgando os degros da santidade, attingindo, em breve, o cume da perfeio. O desejo de ser santa pelo desapego, era a nota dominante de seus sentimentos, de seus affectos, de todos os seus pensamentos e desejos. Nas operas de Verdi, e em todas as obras musicaes, nota-se bem uma aria principal que volta sempre e guia as outras, sendo por isso que os allemes a chamam Leitmotif. Assim tambm na vida de nossa heroina que foi um hymno de celestes harmonias, volta sempre o mesmo motivo: o desejo de ser santa pela pobreza voluntria, pelo desprezo das commodidades e dos bens da, terra. O desprendimento total, o espirito de sacrificio, o desapego do mundo para chegar perfeio, tornou-se uma espcie de santa mania, que alis S. Paulo chama a loucura da, cruz. Para alcanar este nobre fim, to ardentemente desejado, desde os verdes annos, esforava-se por desviar o corao das creaturas, renunciar prpria vontade e seguir a Jesus na vereda ngreme do desprendimento e do desapego total. Desde pequena, Gemma trilhou a estrada real da santa cruz que conduz ao paraso, e nunca a estrada larga, alcatifada de rosas que vae dar no inferno.
Compenetrada das palavras de S. Paulo: No temos aqui morada permanente, considerava-se como uma desterrada, uma estranha, uma peregrina n'este valle de lagrimas. Tendo a morada no co, olhava as cousas terrenas de passagem, como o viajante, no alto mar, olha para as ilhas que se approximam e se afastam; nada via no inundo que pudesse merecer-lhe a affeio. Nunca se apegou s cousas fugazes d'esta vida transitria, nem lhes creou amor, nem se deixou captivar por seu falso brilho. A alma de Gemma, enamorada somente das cousas celestes, no podia achar paz e socego no meio do mundo, onde tudo lhe causava aborrecimento. Dizia ella: No mundo tudo me aborrece, tudo me pesa, nada desejo a no ser amar a Deus. Desabafo-me o mais que posso com aspiraes jaculatrias; assim passo os tristes dias. Nosso Senhor podia dizer de Gemma o que disse dos seus discipulos, na ultima ceia: Pae, estes vivem no mundo, mas no pertencem ao mundo. (S. Joo.) Creatura alguma embaraava esta santa alma e a prendia nos vos para o co. Como o real propheta suspirava: Quem me dera as azas da pomba para voar ao logar do meu descano! Orph de me com idade de oito annos; orph de pae poucos annos depois, privada, portanto, do doee aconchego do lar domestico, passou a curta e dolorosa vida em casa de parentes e conhecidos; primeiro, em casa de suas tias, depois em casa de uma bemfeitora, senhora muito distincta, e, finalmente, falleceu n'uma casinha que esta piedosa senhora alugou para ella na visinhana. Embora as tias fossem muito boas para to piedosa sobrinha, a pobrezinha nunca teve os commodos da casa paterna por muito pobre que fosse, e soffreu como soffre o passarinho implume, lanado pela fria do vendaval a sacudir-lhe o ramo, fora do tpido ninho. Achou, entretanto, um socego relativo em casa de D. Giannini que a adoptou e amou como filha e a quem dava Gemma o nome de tia; porque em sua casa gozava d'uma certa liberdade e podia se entregar, vontade, s
suas meditaes, tendo seu quartinho separado, emquanto, na casa paterna e em casa das tias, os irmos e at pessoas estranhas a espreitavam pelo buraco da fechadura, afim de vl-a e surprehendel-a em xtase. Esta curiosidade inconveniente causava-lhe no pequenos desgostos. Em casa de D. Ceclia Giannini, a modesta menina dispensava creados, no querem (o que pessoa alguma lhe arranjasse o singelo quartinho, mostrando-se antes attenciosa, obsequiosa e servial para com todos. Ao chegar uma visita,-retirava-se discretamente da sala, deixando sua tia tratar do objecto da visita, sem nunca se intrometter em negcios que no lhe diziam respeito. To grande era o desprendimento de Gemma, que nem prpria vida era apegada e estava sempre prompta a dal-a, afim de prolongar a alheia. Xote-se de passagem o seguinte rasgo de renuncia de si mesma e de generosidade para com o prximo. Quando uma pessoa de suas relaes estava a morrer, a caritativa e herica menina pedia logo ao padre espiritual a licena de ceder alguns annos da prpria existncia. Sua morte na flor da mocidade foi o resultado d'estas trocas to generosas quo admirveis. Pode-se dizer como Thomaz de Kempis: Quem descobrir, pois, o A erdadeiro pobre de espirito desapegado do amor das creaturas?!... Prola preciosa que necessrio buscar at as extremidades da terra. Ainda que o homem d por ella tudo quanto possue, cousa alguma d. Esta santa menina praticava tambm a bella e rara virtude do desapego em relao ao director da sua alma, a quem seu confessor ordinrio, Mons. Volpi, a havia confiado, para melhor dirigil-a nos caminhos extraordinrios e no alto mysticismo em que tinha entrado.
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Este distincto sacerdote, religioso passionista, no residia em Lucca, e a direco fazia-se por correspondncia. Gemma no se queixava da raridade das visitas do director, nem murmurava da demora em lhe responder as cartas.
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Progredia assim, eada vez mais, nas virtudes, vivendo sem vontade propria, sem amor prprio, despojando-se de tudo para ser toda de Jesus. Por isto foi sempre obediente aos seus superiores, visto que tinha morrido n'ella o amor desordenado e excessivo de si mesmo. Sua obedincia ao director espiritual era a toda a prova, sacrificando at as consolaes celestes, para obedecer s ordens dos superiores ecclesiasticos. Com o intuito de conhecer at onde chegava a sua obedincia, prohibiu-lhe, uma vez, o director, prestar atteno ao divino Esposo de sua alma. Ora, um dia, appareceulhe o Senhor dos Passos, todo ferido, convidando-a para beijar-lhe as chagas. Gemma, lembrada da prohibio do director, desatou a chorar. Firme, porm, no propsito de obedecer, custasse o que custasse, ficou immovel. N'esse instante, notou que os sagrados estigmas appareeiam-lhe nas proprias mos, d'onde o sangue comeou a brotar. Logo que observei isto, disse ella, levantei-me, retirei-me, abandonei meu divino Salvador, obedeci ao meu director e fiquei alegre. Caro sacrifcio ! Oh bella e admirvel obedincia.! O confessor, receando que os soffrimentos mysticos que padecia, nas quintas e nas sextas-feiras, chegassem a offender-lhe a sade, prohibiu-Ih'os, terminantemente, em nome da santa obedincia. Oh milagre! o divino causador d'estes martyrios respeitou as ordens do seu ministro e as dores cessaram por completo. A serva de Deus, embora o sacrificio lhe custasse muito, ficou satisfeita. Cara obedien*^Mfo * ' * ouviram-na %>Xlmg exclamar n'um exc a
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&9 * !
tase, cara obedincia que me roubas as douras do amor divino! anciosa espero a hora em que possa te abraar. Soffrendo muito do estmago nos ltimos perodos da doena que a levou para o tumulo, era incapaz de supportar a mais leve comida. O director ordenou-lhe que se alimentasse a despeito do incommodo; ella obedeceu e, cousa maravilhosa! o alimento no lhe fez mal. Bem disse a Sabedoria: O homem obediente cantara victorias. Gemma, tambm muito obediente e submissa a suas tias, cheia de deferncia para com as outras pessoas da casa, era, para bem dizer, a serva humilde de todos, prompta sempre a obedecer ao menor aceno. Quando estava a rezar na igreja, ou fazendo a aco de graas depois da communho, bastava que a companheira desse o signal da partida, para levantar-se e sahir s pressas. Muitos outros exemplos poderia citar em abono da cega obedincia e da simplicidade infantil de Gemma. Seja-me licito referir o ultimo. Quando no podia conciliar o somno, devido s conversas da sala visinha, bastava Cecilia dizer: Dorme, Gemma, precisas de descano! e immediatamente a serva de Deus fechava os olhos e adormecia placidamente. Aprendei, Filhas de Maria, a exemplo de Gemma, a considerar-vos como hospedes sobre a terra, a quem nada interessam os negcios do mundo! aprendei a morrer para o inundo, porque tudo ri cite vaidade e afflico de espirito, excepto amar e servir a Deus! Aprendei a desapegar-vos da vossa vontade e a renunciar a todas as creaturas, afim de gozar da verdadeira liberdade dos filhos de Deus! Pedi ao Senhor quebre os grilhes que vfts prendem a esta terra miservel, como dizia o psalmista: Diripuisti vincula mea, afim de puderdes, livremente e sem peias, offerecer o sacrifcio de louvor e invocar o santo nome! Pedi ao Senhor vos tire da casa da servido do Egypto, para vos conduzir Terra da Promisso, onde mana o leite e o mel! Combatei, sem cessar e com denodo, o amor prprio excessivo, para viver na sujeio e na perfeita obedincia!
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Dae esmolas de vossos bens, si tiverdes muito; si tiverdes pouco, procurae repartir de ba vontade esse pouco! Si fordes pobres, santificae a pobreza pela resignao e pacincia, lembrando-vos de que o indigente mais semelhante a Jesus, o divino Mestre, que disse: As raposas tm uma toca onde descanar, e o Filho do homem no tem uma pedra onde repousar a cabeea, Lembrae-vos da pobreza de Gemma, que poude dizer, com toda a verdade, com o propheta-rei : Eu sott pobre e s no mundo. S. Francisco tinha um to ardente amor pobreza voluntria por elle abraada, que chegou ao ponto de chamal-a sua esposa muito amada. Por isso mereceu receber a alcunha de poverello de Assisi o pobrezinho de Assis. Gemma, graas ao desapego e ao desprendimento completo, merece tambm o glorioso epitheto de poverella de Lucca. Como dissemos alhures, ella costumava firmar suas cartas assim: La povera Gemma, Si, a exemplo de Gemma, no tiverdes paes nem casa, e si fordes obrigadas a comer, na casa de outrem, o po amargo da caridade, lembrae-vos da primeira das bemaventuranas : Bemaventurados os pobres de espirito, porque d'elles o reino do co. Si fordes favorecidas dos bens d'esta terra, n o lhes tenhaes apego, porque, alm de s e transitrios e vos . de nada servem para a eternidade. O santo bispo Edmundo disse ao vaidoso Imperador Anastcio, por occasio de uma festa magnifica, na qual a corte compareceu, ostentando grandes galas: Este mesmo manto de purpura bordado a ouro, j o vi nos hombros de dois antecessores, e este annel incrustado de brilhantes por quantas mos no tem passado! . . . Estas jias que Vossa Majestade recebeu dos outros no o seguiro depois da morte, mas p a s s a r o aos descendentes e successorew do throno imperial. O que ficar a virtude e a piedade. Ilc purpura post mortem non sequitur, sed pistas et habitus virtulum. Convm, entretanto, no esquecer que mais fcil desapegar-se dos bens terrestres do que da propria vontade, pela perfeita obedincia, pela humildade e submisso aos superiores.
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Si queres ser perfeito, vende tudo o que tens, d aos pobres, e ters no eo um thesouro, depois vem e segue-me. Si queres ser meu discpulo, renuncia a ti mesmo. So palavras de Nosso Senhor. Depois de haver tudo abandonado, A si mesmo mister abandonar; Sahir de si, de todo conformado, Sem do amor prprio nada conservar! (Imit.) Com effeito, diversos philosophos da Grcia, desprezaram as riquezas e abraaram a pobreza voluntria, andando maltrapilhos e descalos. Faltavam-lhes, porm, a rectido da inteno, os motivos sobrenaturaes; e afinal, como confessa Plato, estes philosophos eram humildes por um requinte de soberba, e pobres voluntrios por vangloria. Prova bem esta justa assero o exemplo de Digenes que, vivendo como um co n'uma barrica remendada, lanou para fora o caneco, objecto nico que possua, por ter visto um menino beber na fonte com o concavo da m o ; entretanto, era muito altivo e vaidoso, respondendo com atrevimento ao rei Alexandre que tinha vindo, de propsito, visital-o, attrahido pela fama de seu desprendimento. Filhas de Maria, procurae, nas paginas do Evangelho e na vida dos santos, a verdadeira sabedoria! Santificae a pobreza, santificae a riqueza, no vos apegando aos bens que esta pode proporcionar, e supportando, com pacincia e resignao, os incommodos d'aquella! Qualquer que seja o vosso estado, ou ricas ou pobres, como os pssaros de arribao que, s vezes, vm voando das regies sertanejas para as nossas mattas, e voltam depressa, com saudades dos ninhos longinquos, tende sempre as azas abertas, promptas a voar para os eternos tabernculos!
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DECIMA T E R C E I R A
CONFERENCIA.
Bem que de amor desfallea, Quero a ferida que padeo, E beijo a setta do amor. Bemditas de Deus as frechas, Que introduzem pelas brechas A paixo de amor com dor !
(Beata Margarida M a r i a . )
diamante , incontestavelmente, o rei das pedras preciosas, j pelo brilho coruscante, j por sua consistncia admirvel. To duro este puro carvo erystalizado, que risca todos os corpos e por nenhum outro riscado; s pode ser polido por seu prprio p, o que constituc o trabalho da lapidao. Pelo seu fulgor e raridade, o diamante torna-se um objecto de adorno, digno de uma rainha, mas serve tambm aos joalheiros
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para lapidar as outras pedras finas. Por isso attinge um preo fabuloso, conforme os quilates e a perfeio das facetas. O regente, por exemplo, um brilhante que faz parte da coroa real em Frana, cujo valor de quatro milhes de francos. Por ser o corpo mais resistente que se conhea na natureza, o diamante pode significar a fortaleza, a terceira das virtudes cardeaes, e sobre as quaes deve assentar-se todo o edifcio da santidade; uma virtude bem rara e de valor inestimvel. Gemma de Jesus patenteou, no correr da curta existncia, uma fortaleza d'alma inabalvel e uma firmeza de espirito tal, que foi realmente um diamante de primeira agua. Foi uma menina forte e corajosa nas doenas, nas tribulaes, na pobreza, nas tentaes, supportando, com o herosmo de uma virtude estica, as numerosas provaes que atravessou. Desde criana, a alma da serva de Deus retemperava-se pelos combates, e adquiria esta firmeza de caracter, esta 1'ijeza de princpios, esta intransigncia que no se presta a nenhuma concesso. Gemma de Jesus nunca se adaptou a nenhuma concordata imposta pelos inimigos de sua alma, nunca transigiu com o dever. Por estes predicados to raros entre as pessoas do sexo frgil, a nossa heroina torna-se merecedora dos nossos louvores. Admiram-se estas virtudes nos apstolos, nos martyres, que no tremeram perante os algozes, nem trepidaram perante a morte horrorosa, sellando com o sangue, que jorrava em borbulhes de suas feridas, a profisso de sua f. Admiramos a virtude de fortaleza no martyrio de S. gnez que, no desabrochar da vida, foi ceifada como uma tenra flor pela espada do algoz: S. Ignez pela innocencia assemelhava-se a um cordeiro sem mancha e, por sua fortaleza, o modelo da Pia Unio. E' na sua basilica, uma das mais bellas da cidade eterna, via Nomentana, que funcciona a Pia Unio chamada a Primaria e qual devem aggregar-se as Pias Unies do universo, para lucrar as indulgncias.
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Comtudo pode-se admirar tambm a fortaleza d'alma nos confessores e nas virgens que, resistindo com denodo aos inimigos d'alma, venceram o mundo, o demnio e a carne e, si no alcanaram a palma do martyrio sangrento conseguiram a Victoria sobre as paixes da natureza corrompida, sobre as tentaes dos anjos decahidos, sobre as seduces mltiplas do sculo depravado. Gemma praticou esta virtude, infelizmente to rara n'estes nossos tempos em que imperam a molleza e a baixeza de cade uma nracter. Sua dole ba, vida foi amvel, cheia de pertencia contradicclasse dos es, de sanguneos amarguras, e affeclivos e era dotade dores da de granagudas, que de sensibisupportou lidade; esta com uma natureza, fora admiporm, affervel sem que nunca ctuosa e desfalleaffavel, vicesse, desda de carinhos e seanimasse, denta de desespeiro B. Gabriel a Virgem Dolorosa, olorlg estudante passionista,que apparecia muitas veamar, adrasse. ' ' ' curou de uma doena mortal. ^ quiriu peA serva ^ ^ las lutas de Deus era
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uma forte tempera e firmeza rarssima. Gemma no era sentimental. Nada lhe abalou a constncia no soffrimento physico ou moral. Quem l a vida da santa donzella fica impressionado pela multido dos offrimentos que formam, para bem dizer, a trama de sua vida. Assim como na manufactura das tapearias gobelinas, admiradas nas cathedraes de Frana, os artistas carregam de sombras os contornos e entrelaam fios pretos para matizar o desenho e tornar mais salientes o colorido das
flores e a alvura dos rostos, tambm o divino tecelo sombreou a existncia de Gemma, para tornar mais saliente a alvura de sua alma. Dizia o imperador Tito que perdia o dia em que no tivera ensejo de fazer o bem. Com certa analogia, dizia Gemma que perdia o dia em que no soffria. Passei alguns dias sem soffrer, escreve ella ao seu director, e fiquei contrariada, porque, quando chega a noite, no tenho que offerecer a Jesus. Nosso Senhor alis, por continuas provas, habilitou-a a soffrer muito, e dilatou-lhe o corao, afim de que n'elle coubesse um oceano de amarguras. Muito moa ainda e sem experincia, a pobre menina foi obrigada a substituir a lembrada me e tomar a seu cargo os cuidados da casa. Os tempos eram ruins, os homens mos e os negcios pssimos. As grandes despezas, occasionadas pelas doenas e pelas mortes na famlia, e mais outras desgraas, pouco a pouco, foram consumindo o patrimnio domestico. Muitos abusaram da ba f do pae de Gemma, que era um homem de bem e tinha adquirido uma fortuna regular n'uma pharmacia. Finalmente veiu a runa mais depressa do que se esperava. Os credores mandaram pr em leilo a casa, a pharmacia, a moblia e todos os outros bens do desditoso sr. Galgani. Tudo arrematou-se em hasta publica, vendo-se a famlia na obrigao de dispersar-se, para no se consumir na misria. O pobre pae no sobreviveu muito tempo tamanha desgraa; adoeceu e morreu. Com a mesma serenidade e com a mesma fora moral, supportou nossa heroina este segundo golpe. Jesus lhe tinha prohibido perder tempo em choros inteis, e ella passou o dia rezando, resignada com a vontade de Deus que, n'esse instante, tomou como pae exclusivo. Como Job, inabalvel com a perda dos bens e da famlia, no perdeu a confiana em Deus na enfermidade que o accommetteu, assim Gemma, semelhante ao prototypo da pacincia, foi de uma fortaleza modelar n'tima cruel doena que a prostrou durante um anno, e a levou s portas da morte. Nosso Senhor quiz lapidar esta alma bemdita, e gravar-lhe sua divina imagem. Em Amsterdam, nas officinas
de lapidao, vm-se os operrios talhando, cortando e polindo os brilhantes, riscando linhas symetricas, alisando as facetas, gravando figuras geomtricas, dando-lhes emfim o lustre admirvel de um espelho. O diamante assim lapidado durante annos, alcana um preo q u d r u p l o e, engastado n'uma alliana, brilha, como a estrella d'alva, no mostrurio da capital da Ilollanda, emprio dos diamantes do Transvaal. Quem ser capaz de avaliar os thesouros de graas que a santa martyr amontoou por sua fortaleza? Quem ser capaz de medir os progressos gigantescos no caminho da perfeio, durante este anuo de lapidaoV S Deus o sabe! Por diversas vezes, Gemma viu-se entregue ao escalpello do cirurgio, tolerando com coragem os martyrios de operao dolorosa sem querer ser chloroformizada. A serva de Deus edificava a quantos a visitavam, por sua resignao e pacincia, agradecendo com um doce sorriso s pessoas que lhe expressavam compaixo pelas suas dores. Quando lhe acontecia soltar um gemido arrancado pelo soffrimento, logo fitava os olhos arrazados de lagrimas na imagem do crucifixo, pedindo a Jesus perdo por este signal de fraqueza. To grande era-lhe a serenidade e confiana em Deus, que as I r m s enfermeiras traziam as novias, para se edificarem pelo exemplo maravilhoso d'esta serenidade e pelo tocante espectculo da fortaleza de animo. A pobre Gemma, embora sofrendo horrivelmente, dizia religiosa com um sorriso: Carssima Irm, soffro muito, mas n o quero me queixar, tenho thesouros de pacincia. A doena, porm, fazia progressos assustadores, at que emfim os mdicos perderam toda a esperana de salvar a pobre enferma. A 2 de Fevereiro, escreve Gemma, recebi a santa communho em viatico e esperei pelo momento de unir-me a .lesus para sempre. Os mdicos, pensando que no ouvia mais nada, disseram alto que no amanheceria. Viva Jesus! Entretanto Gemma no devia morrer d'esta doena cruel; soara a hora da recompensa da cura milagrosa. Deixemol-a contar este episodio tocante e maravilhoso de sua vida. Na famlia, rezava-se muito por meu restabelecimento, faziam-se novenas e triduos aos santos. Por minha parte,
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ficava bastante indifferente; s doces palavras que brotavam da divina bocca de Nosso Senhor me consolavam e me alentavam. Um dia veiu visitar-me uma das minhas antigas professoras, para me ver pela ultima vez. Adeus, at outra vista no co! disse ella. Deveras, eu estava muito mal. Ella me aconselhou, entretanto, a fazer uma novena B. Margarida Maria, discpula dilecta do Sagrado Corao. Comeou-se a novena no dia 23 de Fevereiro. Na noite seguinte, ouvi o roar de contas de um rosrio, senti que uma mo pousava sobre minha testa, e percebi, distincta e claramente, uma voz rezar nove Padre-Nossos e outras tantas Ave-Marias e Gloria Patri. Estava to enfraquecida, que nem pude responder s oraes. Ouvi a mesma voz perguntar-me: Gemma, queres ser curada? Cada noite reza em honra do Corao de Jesus; no desanimes, tem confiana! Antes de acabar-se a novena, voltarei e rezaremos juntos. Era o P>. Gabriel Possenti, clrigo estudante da Congregao dos passionistas, beatificado em 1908, ao qual o Santo Padre Pio X chamava o S. Luiz Gonzaga dos tempos modernos, e cuja vida milagrosa eu tinha lido com grande interesse. De facto, o beato voltava cada noite e juntos rezvamos as oraes cia novena em honra do Sagrado Corao de Jesus e da B. Margarida Maria Alacoque. No ultimo dia, que cahia na primeira sexta-feira do mez de Maro, mandei chamar o confessor e recebi a santa communho, porque comprehendi que estava nas ultimas. O Senhor me fez a mesma pergunta: Minha filha, desejas ficar baV To grande era minha perturbao que no pude responder sino mentalmente: Como quizeres, meu bom Jesus. Fez-se o milagre; de repente senti-me perfeitamente curada. Duas horas depois levantei-me da cama, onde estava y>rostrada havia um anno, completamente restabelecida e satisfeitssima. Minhas irms e todas as pessoas choraram de alegria ao ver-me curada. Meu contentamento tambm no foi menor, no somente pela graa assignalada, sino pela grande merc que Jesus me fez de considerar-me como sua filha. N'essa mesma manh, com effeito, Nosso Senhor me dissera: ' M i n h a filha, muitos outros favores
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ho de seguir ao que te acabo de fazer; nunca te abandonarei e hei de ser para ti um pae amoroso em substituio do que perdeste, e tua me ser aquella, e apontou a imagem de Nossa Senhora das Dores. Filhas de Maria, no admirvel a fortaleza de Gemma? Quem ser capaz de aquilatar os mritos d'esta tenra menina, durante sua mocidade que foi uma continua e dolorosa via sacra? No maravilhosa a sua virtude diamantina? Eis ahi o vosso modelo, mirae-vos n'este diamante mais limpido do que um espelho e vede si, nas vossas provaes, sois fortes, corajosas, constantes e perseverantes. Etymologicamente falando, diamante em grego quer dizer indomvel. Gemma foi verdadeiramente um diamante de primeira agua. Procurae, a seu exemplo, tornar-vos indomveis nas provas! No sigaes o pssimo exemplo das almas pusillanimes, que pretendem sentar-se mesa do banquete com Jesus, mas no querem seguil-o pela rua da amargura. Viriliter agite et confortetiir cor vestrum! vos diz o psalmista. No obstante a fragilidade de vosso sexo, mo grado a inexperincia de vossa idade, tende um animo varonil; sede fortes na f, e indomveis na virtude! Lembrae-vos de tantas donzellas que se assignalaram por um valor assombroso, como a padroeira de Paris, da qual fala o poeta: Quando o rei dos hunos, do Senhor o flagello, Reduzir a cinzas toda a Europa quiz, Foi uma pastora, com seu ar singelo, Santa Genoveva, que salvou Paris. (Afforno Celso.) Uma outra, tenra pastorinha, a doce filha de Lorena, Joanna d'Arc, que Pio X beatificou, chefiou os exrcitos de Frana, levou o pusillanime rei Carlos V I I a Reims, para ser sagrado e, em mil batalhas encarniadas, venceu os inimigos. Feita prisioneira e condemnada injustamente por um tribunal iniquo a ser queimada viva, a heroina subiu o cadafalso sem desfallecimento. Emquanto os rolos de fumaa a envolviam toda, emquanto as labaredas queimavam-lhe os membros innocentes, a gloriosa martyr, com os olhos extticos levantados ao co, proclamava, em altas
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vozes, a sua innocencia e, entre os estalos sinistros da fogueira, ouviram-n'a pronunciar os dulcssimos nomes de Jesus e de Maria. Deus no vos ha de chamar palma do martyrio, como a Virgem d'Orlans, mas pode ser que vos chame ao martyrio da pureza de que fala S. Jeronymo. Herico foi o martyr, ao qual se refere o santo doutor que, amarrado n/uma fofa cama, com fitas de seda, n'um ambiente tpido e perfumado, cercado de blandcias e requintados prazeres, com fora sobrehumana resistiu ao aguilho da carne, a todos os estmulos sensuaes, a todas as caricias, e permaneceu firme no propsito de vencer. Este martyr por ventura no precisou de uma fortaleza herica para resistir a tantos attractivos? Si o Senhor no vos exigir semelhante prova talvez acima de vossas foras, si no estiverdes promptas a morrer antes de perder a innocencia, a exemplo de S. Casimiro, rei da Polnia, pelo menos imitae o exemplo da serva de Deus, Gemma Galgani: sede fortes e corajosas na adversidade como diz a Imitao: Pelo amor de Deus deves, de bom grado, lucta aturar : trabalhos, dores, tentaes, vexames, necessidades, molstias e enfados, exprobraes, malvolos rumores, injurias, anciedades, humiliaes, castigos, desprezos e perigos. Estas cousas ajudam a virtude; provam de modo rude, porm aperfeioam o soldado de Jesus, fabricando-lhe a coroa do co, cheia de luz. Deixae Jesus desaggregar da gonga o diamante bruto que vossa alma, e lapidal-o em mil facetas radiosas! A gonga representa as inclinaes viciosas, as imperfeies, os defeitos provenientes do gnio e do caracter, dos quaes as pessoas piedosas no so isentas. Deixae Jesus brunir" vossa alma, para lhe dar um brilho incomparvel ! Supportae as dores acerbas, si Deus for servido mandai-as para provar-vos a constncia! Pedi ao Espirito Santo o dom de fortaleza que vos habilite a soffrer, resignadas e pacientes, os soffrimentos physicos bem como as penas moraes. Este dom to raro, como o diamante natural, merece ser procurado com os mesmos
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esforos empregados pelos bandeirantes a devassarem os sertes bravios no interior do Brasil, vossa estremecida ptria. Conta-se na historia dos tempos coloniaes que estes hericos aventureiros encontravam, s vezes, pedras preciosas e diamantes nas mos das crianas indgenas que lhes serviam de brinquedo, trocando-as por miudezas insignificantes, porque os gentios lhes desconheciam o immenso valor. D'esta maneira tm as Filhas de Maria nas mos thesouros inestimveis nos mritos que podem adquir i r pela firmeza nas tribulaes, pela pacincia nas cruzes. Lembrem-se do bello exemplo de S. Tzabel de Hungria que, depois de ter sido expulsa do seu reino, mandou cantar um Te-Deum, na primeira igreja que encontrou no caminho do desterro. Esta santa princeza sabia que um Te-Deum na tribulao mais valor tem do que mil Deo gratias na prosperidade. Emfini, no se esqueam das palavras de Nosso Senhor: O reino do eo padece violncia e s os que fizerem fora ho de arrebatal-o. Sirva esta mxima evanglica de ramilhete d'esta meditao. Praza ao co que o diamante que symbolisa a fora da alma, seja um bello floro da vossa coroa no paraso, visto que esta pedra preciosssima de innumeros quilates rebrilha radiosa no diadema da Virgem do Lucca.
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T r s jias d o paraso, G-emxna G-algani, Soror Isabel da Trindade e Soror Thereza do Menino Jesus.
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Esta trade bemdita incarna e personifica a belleza m o r a l da perfeio evanglica. A cada uma
podem
se applicr as palavras do autor dos P r o v r b i o s : 'Muitas donzellas accumularam riquezas, tuas tu as excedeste todas. A graa enganadora e v a formosura. A mulher que teme a Deus que ser louvada!
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DECIMA
QUARTA
CONFERENCIA.
tuis.
(Psalmo.)
Deus mandou aos anjos que tenham cuidado de ti, que te guardem em. todos os teus caminhos.
U A L outra S. Francisca Romana, S. Coleta de Corbia e algumas almas privilegiadas, Gemma de Jesus via, com os olhos mortaes, ;i seu Anjo da Guarda e, alm de suas visitas quasi quotidianas, recebia, frequentemente, visitas de outros anjos.
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A serva de Deus conversava com o Anjo, como si fosse um amigo, tocando-o como si fosse uma pessoa vivente n'este mundo.
Gemma de Jesus, em companhia do Anjo Custodio rezava, louvava a Deus, psalmodiava, ambos porfiando, s vezes, em quem mais alto gritava: Viva Jesus! Jesus, dizia ella, no me deixou sosinha, fez com que meu Anjo cia Guarda estivesse sempre commigo. Si alguma vez fr m, no te zangues, Anjo querido, pois te quero bem, e desejo ser grata e obediente. Na meditao, o Anjo lhe servia de mestre e guia, descobrindo os mysterios profundos da religio. Quando Gemma meditava sobre a paixo de Christo, por exemplo, dizia-lhe: V, minha filha, quanto Jesus soffreu e padeceu pelos homens ingratos ! V as chagas sangrentas, considera cada uma em particular! Foi o immenso amor que as abriu. Pondera agora e tira a concluso : Quo feio e grave o peccaclo que exigiu tamanha expiao! O Anjo e Gemma cantavam juntos os psalmos de David, o Officio de Nossa Senhora, alternando os versos, como duas ou mais pessoas, quando rezam o Officio. Gemma via to claramente seu Anjo como Tobias Filho viu seu companheiro de viagem, que no era sino o Archanjo Raphal. O Anjo da Guarda reprehendia sua protegida, quando o julgava conveniente, dava-lhe bons conselhos, ensinavalhe a ser ba e humilde. Caro Anjo da Guarda! dizia ella, como eu o amo! A's vezes me reprehende com severidade, quando o mereo; esta severidade, porm, no me desagrada. N'estes ltimos tempos, ralhou commigo por diversas vezes no dia; comtudo, quero-lhe muito. Um dia, o Anjo disse a sua tutelada com voz repassada de amor e ternura : Pobre criana, s to dbil, que n o podes dispensar-me o auxilio e a proteco. Quanta pacincia devo ter comtigo! Sim, serei o teu guia e companheiro. No sabes, que o piedoso Jesus foi quem me confiou a tua guarda V O mensageiro celeste se encarregava de transmittir ao co os recados de Gemma, e levava, s vezes, as cartas ao director de sua conscincia e a outras pessoas. Gemma falava com o Anjo Custodio com uma simplicidade encantadora e uma confiana infantil.
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Querido Anjo, dize-me, supplicava ella, porque o padre espiritual no quiz me ouvir hoje, pela m a n h ? Outra vez perguntava pelo director espiritual que demorava em responder-lhe as cartas. Interrogava Gemma: Dize-me, Anjo de Deus, Jesus estar satisfeito commigo? Que devo fazer para lhe agradar ? Quando uma pessoa pedia um conselho serva de Deus, ella se dirigia primeiro ao seu Anjo da Guarda e este lhe ^ ^ ^ ^ ^ ^ ^ ^ ^ ^ ^ ^ ^ ^ car o corasuggeria o i j | o d o infej | liz, para lhe que havia conceder a de r e s p o n - || der. graa de Empenha- m ? ) uma converI so sincera da na con- < j Il e de um arverso de fj rependium pecca- fj {| mento perd o r empe- < I feito. dernido, a 1 O Anjo, serva de ffl por sua vez Deus perII a m o l d a v a guntava ao W se a esta Airjo si sa- % i l simplicidabia o tempo t\ e o dia em f\ j| de, responque o divino % ] dendo a tola j Salvador 1 ~^-- ':'S"-~<}'~ -;}:' <'-~ $ das as perhavia de to- '" guntas ingnuas de sua protegida, e lhe prestava mil servios, no s nas necessidades espirituaes como tambm nas precises materiaes. Para comprehender o alcance d'esse dom e ter uma ida exacta d'esse favor celeste, faz-se mister 1er o bello livro de Tobias, do antigo Testamento. O archanjo Raphal fez-se companheiro fiel do joven timido e inexperiente, lvrou-o do perigo imminente de ser engulido por um peixe monstruoso, na margem do rio Tigre; arranjou-lhe um ptimo casamento; tirou de Sara o demnio que a atormentava; foi cobrar pessoalmente uma
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antiga divida que Gabelo devia a seu pae; curou este da cegueira, finalmente cumulou a todos de benefcios inapreciveis. Um dia, o director, para provar a obedincia e a humildade de sua dirigida, prohibiu-lhe permanecer em conversao com o Anjo Custodio e usar para com elle de tanta familiaridade. Logo que o Anjo appareceu, dizendo: Deus te salve! Deus te abenoe, alma querida que Deus confiou a minha g u a r d a ! Gemma protestou com toda a simplicidade: Anjo querido, preciso teres pacincia; o padre quer que eu proceda para comtigo com maior reserva em nossas relaes. Anjo santo, ouve-me, vae-te embora, no manches as mos commigo; vae ter com outra alma que saiba prezar melhor os dons de Deus! Bemaventurada Gemma que teve a dita de ver com os olhos carnaes o que vemos apenas com os olhos da f! A serva de Deus via, muitas vezes, como seu Anjo da Guarda, ao chegar, estendia as azas irisadas sobre ella, em signal de proteco, e a confortava, visivelmente, nas terrveis luctas com as potencias infernaes. Uma vez, o Anjo da Guarda apresentou a Gemma duas coroas, uma de espinhos agudos, e outra de lirios, dizendolhe que escolhesse. Quero a coroa do meu bom Jesus, respondeu ella sem demora, s esta que me agrada. O Anjo entregou a coroa de espinhos a Gemma que, recebendo-a com viva alegria, a apertou contra o peito e a cobriu de sculos, exclamando: Deus, mil vezes obrigada! Viva Jesus e seu presente! Viva a cruz do meu doce Salvador' Finalmente pode-se dizer que o Anjo era para Gemma um segundo Jesus. Era o conselheiro assduo, o consolador incanavel, o confidente de todas as horas. A elle Gemma abria o corao virginal, descobrindo-lhe os segredos mais ntimos da alma. No dava um passo sem primeiro combinar com o celeste companheiro, no resolvia nenhum negocio sem tel-o primeiro consultado. O Anjo era o consolador de sua alma angustiada, o conselheiro habitual nas suas duvidas e inquietaes de conscincia. Sem ser escrupulosa, Gemma no deixava de ter alguns receios, e era muito minuciosa e cuidadosa em seguir os dictames da conscincia. Uma s palavra do Anjo
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Custodio dissipava-lhe as angustias, resolvia-lhe os casos de conscincia e trazia-lhe paz e socego. Mil vezes feliz a alma que goza de semelhante privilegio! Bemaventurada Gemma, a quem Deus concedeu um favor to assignalado e to admirvel g r a a ! Pode-se-lhe applicar o que Moyss cantou no bello hymno Audite cceli. Realmente, o Anjo da Guarda foi para sua protegida o que foi Deus para o povo de Israel: Foi mestre, foi guia, Na rida via, Na vasta solido, Foi seguro basto, Livrava-o dos abrolhos Como a menina dos olhos. A guia esvoaa Ao redor cio ninho, A voar tambm provoca E anima o filhinho: O Anjo abre as azas irisadas E leva s alturas azuladas. Ao exemplo de Gemma, as Filhas de Maria devem homenagem constante de respeito, de confiana, de gratido e de amor ao Anjo da Guarda. Veneremos-lhe a presena embora invisvel, e agradeamos-lhe a vigilncia e mais servios preciosos que nos presta. Amemos, disse S. Bernardo, amemos os Anjos tutelares que, depois de nos proteger e amparar na presente vicia, viro a ser nossos companheiros e coherdeiros na gloria. D'esta maneira nos ser dado, um dia, cantar com elles os louvores de Deus, conforme disse o psalmista: In eonspeelu angeloruni psallam libi. Por sua vez, os Anjos Custdios nos g u a r d a r o de todos os males: O Anjo do Senhor andar a roda dos que temem, o Senhor os livrar. (Ps. 33.) O grande missionrio, Padre Lefvre, da Companhia de Jesus, tinha o costume de saudar os anjos, protectores das parochias e das dioceses, onde ia pregar, attribuindoJhes o bom xito do seu apostolado, bem como uma proteco visivel nas terrveis luctas contra os herejes.
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S. Francisco de Salles ordenou um santo seminarista que tinha o privilegio de ver a seu Anjo de Guarda. Antes de lhe ser conferida a ordem de presbytero, o Anjo Custodio andava sempre na frente do piedoso moo, depois da ordenao, porm, passou a seguil-o, explicando ao tutelado que assim fazia por causa da dignidade sacerdotal que, sob certos pontos de vista, superior dos anjos. Quanto vale a proteco do anjo experimentaram Agar e Ismael no deserto, Lo th em Sodoma, Isaac no monte Moria, os tres moos de Babylonia na fornalha ardente, Daniel no fosso dos lees, S. Pedro na priso. Si no houvesse tantos exemplos, no antigo e no novo Testamento, si no houvesse tantos casos anlogos ao assumpto de que se trata, na vida dos santos, e si finalmente no tivssemos uma testemunha irrefragavel na prpria serva de Deus, podamos duvidar da veracidade d'estas apparies. Os escriptos, porm, de Gemma Galgani, os relatrios que escreveu por ordem do padre espiritual, respiram to grande humildade, to verdadeira sinceridade, e tanto esquecimento de si, que no se pode conceber a mais leve duvida. A Igreja, nossa Me e Mestra, ha de declaral-os dignas de credito, no dia em que exaltar a humilde serva de Deus, dando-lhe o titulo de Bemaventurada. Por nossas preces fervorosas, podemos apressar este dia feliz. Por emquanto veneremos os santos Anjos Custdios que contemplam, no co, a face do Padre Eterno. Escutemos a voz do Senhor, dizendo aos Israelitas do deserto: Enviarei o meu anjo que v adiante de ti e te guarde pelo caminho. Respeita-o e ouve-lhe a voz! V que no o desprezes, porque no te perdoar quando peccares, e fala em meu nome. Si lhe ouvires a voz, e fizeres tudo o que te digo, serei inimigo dos teus inimigos e affligirei os que te affligirem. A Filha de Maria faa o exame de conscincia sobre este ponto da vida espiritual; veja si tem respeitado a presena do Anjo da Guarda; si lhe tem ouvido a voz, sendo-lhe grata, obediente, confiante; si no tem deixado de invocar o Anjo Custodio de manh ao acordar, e noite ao recolher-se; si tem imitado Gemma Galgani na tenra devoo para com o Anjo da Guarda.
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DECIMA
Um
QUINTA
CONFERENCIA.
nas
topzio.constncia tentaes.
cor amarella do topzio, pedra fina e transparente, brilhando sobre o ornamento pontifical de Aaro, semelhante cr do ouro, rei dos metaes. A gloriosa bandeira brasileira , em parte, amarella, para lembrar as jazidas de ouro de Minas Geraes! Disse o poeta: Auriverde pendo da minha terra, que a brisa do Brasil beija e balana. Este precioso metal encontra-se, entretanto, raras vezes, em perfeito estado. Em geral acha-se misturado com outros
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e mesmo com mineraes, como sejam pedras, rochas, areias; mister, portanto, triturar este minrio aurfero, laval-o em forte correnteza d'agua e, finalmente, fundil-o no cadinho, para separal-o da liga e acrysolal-o. No Brasil, no Transwal, na Califrnia, ha altos fornos destinados fabricao do ouro, construidos pelos homens atormentados pela fome do ouro, como diziam os antigos: sacra auri fams. Affirma a Escriptura, comparando a alma com o ouro, que aquella deve passar pela agua e pelo fogo, afim de purificar-se de toda a impureza do peccado e, d'esta maneira, chegar ao co, purificada e immaculada. O fogo prova o ouro, e a tentao o justo, diz a Imitao de Christo. Nosso Senhor quiz expor ao crysol abrazador da tentao a alma de Gemma, queimando-a, afim de tornal-a uma joia de virtudes acrysoladas, como o hbil ourives passa na chamma a joia para avivar-lhe o brilho! Sino, estudemos a vida de Gemma, cheia de tentaes e provaes; vejamos as chammas pelas quaes passou, para purificar-se e tornar-se agradvel aos olhos de Deus. Diz S. Pedro, na sua epistola: Sede sbrios e vigiae, porque o demnio, vosso adversrio, anda ao redor de vs como um leo que ruge, buscando tragar-vos ; sede fortes na, f e resisti-lhe. E outro maior disse: Vigiae e oraepara no cahirdes em tentao . N'este texto, o principe dos apstolos compara Satanaz a uma fera cruel, perseguindo as almas justas. Assim que Gemma de Jesus foi perseguida pelo inimigo da salvao e tentada sobremodo, mas Satanaz (e esta a caracterstica das tentaes de Gemma) no se contentava de molestal-a com seus ardis, de tental-a por pensamentos ou inspiraes, mas apparecia-lhe sob a figura visvel de uma besta-fera. A's vezes, o demnio transformava-se n'um co hydrophobo, rugindo e uivando, como si quizesse fazer-lhe violncia, ameaando tragal-a. E' incrvel o que fazia Satanaz, para incommodar e molestar a sua innocente victima. As tentaes de Gemma tem grande semelhana com as de S. Anto eremita, a quem os demnios appareciam sob a figura de animaes bravios, de macacos, ou de cortezans, danando quadrilhas lascivas. Parecem-se tambm com as tentaes horrveis de S. Catharina de Senna a quem o
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demnio assaltava sob a forma visvel de animal feroz. O quartinho de Gemma parecia um inferno; choviam as pancadas sobre a pobre donzella que, s vezes, era tirada da cama pelos cabellos, com violncia, arrastada pelo cho, e cruelmente batida com cordas nodosas. Acalmava-se o barulho por um instante, quando a agua benta era empregada, augmentando, porm, logo depois, com uma fria verdadeiramente diablica. Uma Irm de Caridade que presenciou estas dolorosas scenas, disse: Aquelle monstro ainda mata nossa pobre Gemma. Um dia de terror, ompallideque a serva ceu, levande Deus letou os vantava-se olhos e as da mesa, mos ao appareceuco e, danlhe Lucifer do de reno corredor pente uma da casa, sob carreira, a figura de afim de esuma fera, capar s rugindo garras do como um monstro, leo, quefugiu na rendo fadireco da zer-lhe viohorta e foi lncia. A precipitarcasta virse n'uma gem, cheia cacimba, cheia d'agua gelada, depois de ter feito o signal da cruz. A pobre martyr teria morrido afogada, si mo invisvel no a tivesse, milagrosamente, tirado d'est perigo mortal. Durante os terrveis combates contra os espritos malignos, a serva de Deus fechava os olhos para n o ver as horrorosas figuras que se lhe apresentavam, e tapava os ouvidos para no ouvir os nomes abominveis com que Belzebub a chamava; tomava entre as mos a imagem de Nosso Senhor, invocando a Virgem Iminaculada, seu Anjo da Guarda e todos os santos da corte celestial. Com a
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graa de Deus, aps um combate que durava, s vezes, horas, via-se livre das tentaes. O socego e a paz voltavam como volta a bonana depois da tempestade. Demos graas a Deus, dizia ella, as cousas andaram bem hoje, Nosso Senhor deve estar satisfeito. O divino Salvador, apparecendo a sua fiel serva, depois da peleja, a consolava e a animava. Logo que vi meu Jesus, escreve ao seu director, perguntei-lhe onde tinha ficado durante a hora da tentao. Jesus respondeu: Minha filha, no estava longe, estava dentro do teu corao ! Pelo pouco que transcrevemos, pode julgar-se que a vida trabalhosa de Gemma era semelhante a de S. Paulo, tantas vezes gemendo nas terrveis tentaes soffridas. Para que a grandeza das revelaes, escreve o apostolo, no me ensoberbecesse, permittiu Deus que sentisse o estimulo da carne, que Satanaz me esbofeteasse, pelo que roguei, tres vezes, ao Senhor se apartasse de mim; ento me disse: Basta-te a minha graa, porque a virtude se aperfeioa na enfermidade. Que bello exemplo de constncia e de resistncia s tentaes nos d Gemma, e quantas lies! Pode-se applicar a esta alma to provada, exposta a tantos perigos, as palavras do archanjo Raphael a Tobias. Porque era agradvel a Deus, foi necessrio que a tentao viesse provarlhe a firmeza; porque era santa, favorecida de innumeras e espantosas graas, era necessrio que passasse pelas chammas ardentes do cadinho das afflices, afim de que, purificada de toda a ferrugem do peccado, fosse uma verdadeira joia. Ningum ignora que o exemplo dos santos um dos melhores estmulos da virtude e da santidade. Os Romanos acertadamente diziam: Exempla fraJnint. Quantos emulos e imitadores no teve S. Luiz Gonzaga nos collegios dos jesutas e no mundo inteiro! S o Omnipotente que contou as estrellas do arrebol, lhes sabe o numero. Oxal o bello exemplo de Gemma possa estimular o zelo das Filhas de Maria para a prpria santificao, e excitar-lhes o animo, porque ensinam os mestres da vida
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asctica que o desanimo a causa frequente e ordinria do atrazo espiritual. Si istw et Illa',, quare non et vos? dizia S. Agostinho. Si estas e aquellas jovens delicadas, cercadas de todas as delicias, resistiram com tanto denodo aos tyrannos, porque tambm no podereis fazer o mesmo com o auxilio da graa? Servhido-me da idntica e sublime exhortao que o santo Bispo de Hippona dirigia s suas contemporneas, digo: Si Gemma, vosso modelo, poude resistir aos embustes do demnio, porque tambm o n o podereis com a graa de Deus? Tnspice e fae secundum exemplar/ Estudae a vida edificante de Gemma, ponderae-lhe a virtude de fortaleza e imitae o exemplo to bello que deixou! Lembrae-vos que o verdadeiro signal da virtude solida combater os desordenados movimentos da alma e desprezar as suggestes do demnio. No vos deixeis perturbar pelos phantasmas inslitos que vos agitam a imaginao, nem vos admireis si, depois de terdes sido arrebatadas pela contemplao ao paraso, tornardes a recahir nos miserveis pensamentos que, de ordinrio, occupam a vossa alma. imputae a Satanaz os pensamentos torpes e criminosos. Dizei: Vae-te embora d'aqui, espirito immundo! muito perverso deves ser para me trazeres ao espirito semelhantes torpezas! Lembrae-vos das palavras consoladoras de S. Paulo: Deus proporciona a graa conforme a fora da tentao. Deus fiel e no permitte que sejaes tentados mais do que pode a, vossa, fora; antes far que lenhaes vantagem da mesma tentao para a puderdes sustentar.
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Lembrae-yos tambm d'estas outras palavras animadoras : No ser coroado sino o que tiver legitimamente combatido. Ditoso, pois, o homem que supporta a tentao, porque, depois de ter combatido e de ter sido provado, receber a coroa da vida que Deus prometteu aos que o amam. Peiejae como um valoroso soldado, abraando,principalmente e sobretudo, o escudo da f, e apagareis todos os dardos inflammados do espirito maligno. Tomae a armadura de Deus, para resistir no dia mo da tentao. Oonservae-vos firmes, vestidas da couraa da justia, tomae o capacete da salvao e a espada do espirito, orando em todo o tempo.
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Si, alguma vez, cahirdes por fraqueza, tornae a entrar no combate ainda com mais valor que d'antes. Marco Aurelio, imperador romano, em sua autobiographia conta de que maneira, graas aos bons conselhos de sua av, combatia, na adolescncia, as tentaes, principalmente as que eram contrarias aos bons costumes. Este prncipe, vivendo nas trevas do paganismo deificador do vicio, divinizador do crime, povoador do Olympo de personagens lendrias pouco recommendaveis, vislumbrou a belleza da virtude e as vantagens da continncia. Quanto mais vs, Filhas de Maria, deveis apreciar a santidade, a integridade de vossa alma e combater os embustes diablicos, cercadas como sois de tantas luzes e guiadas por tantos exemplos. Pelo amor de Deus, deveis soffrer de bom grado todas as adversidades, trabalhos, dores, tentaes, humilhaes, reprehenses, censuras e affrontas. Estes so os degros por onde se sobe perfeio; so os brilhantes que o r n a r o vossa coroa no co. Bem sabeis, o parreiral que no foi, cuidadosa e frequentemente, podado no d uvas, produzindo apenas ramos inteis e estreis. Deixae, pois, o divino horticultor podar-vos a alma pelo soffrimento, para produzirdes fructos sazonados de santa pacincia: A prova da vossa f, diz S. Thiago, produza pacincia, e a pacincia deve ser perfeita nas obras, afim de que sejaes perfeitos. Congreganistas, dizei de todo o corao com um piedoso autor: Dae-nos, Senhor, a graa especial de amar vossos divinos conselhos; dae-nos fortaleza para os guardar como mandamentos vossos; fazei que no tenhamos maior dita do que vos sermos sempre fieis e zelosas em imitar o exemplo dos santos. Ainda que no seja mister explicar em que mina a serva de Deus achou o bello topzio da constncia, direi todavia que a encontrou na mina inesgotvel do Calvrio, ao p da cruz do Salvador. Tantas virtudes superiores natureza humana nasciam-lhe do amor apaixonado de Jesus crucificado, o martyr do Golgotha. Este amor principiou no bero, foi cultivado com esmero no collo materno, cresceu com a idade e chegou ao apogeu.
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crucifixo de Gemma Galgam, diante do qual orava, foste o doce confidente de suas penas! crucifixo, foste o nico amor, a nica esperana, nica consolao e nica fora d'esta bella alma! crucifixo de Gemma Galgani, regado por tantas lagrimas ardentes, foste a testemunha muda de luctas, de choros, de gemidos enternecidos, mas testemunha de muitas victorias tambm ! O crucifixo de Gemma, foste a fonte de alegria na desconsolao, o arrimo da fraqueza, a porta da salvao, o refugio d'esta alma to perseguida pelo inimigo infernal! O crucifixo, tantas vezes coberto pelos sculos amorosos d'esta innocentissima donzella, perdoa nossa inconstncia e nossa infidelidade, pois que sustentaste a fraqueza de Gemma, e tanto heroismo lhe inspiraste! O crucifixo querido, divino Consolado)'! por tuas chagas, por teu peito traspassado, suavisa minhas magoas, balsamisa minhas dores, como tantas vezes mitigaste as penas de tua serva Gemma! O crucifixo, chamado cie Carlos Quinto, esculpido no marfim por um artista desconhecido, tem uma particularidade singular. O sagrado rosto do Redemptor, visto pelo lado direito, exprime a dor immensa, infinita de um Deushomem morrendo, e pelo lado esquerdo, mostra-se alegre, sorridente. Bella imagem; symbolismo profundo da vida humana, mixto de alegrias e de dores! B^lla expresso da vida de -Jesus que soffre contente, porque, pelo soffrimento, agrada aoPae celeste, cumpre a sua misso o salva as almas. O poeta francez chama ao p do crucifixo as almas atormentadas : Vous qui pleurez, venez Jsus, car il pleure. Vous qui souffrez, venez Jsus, car il gurit. Vous qui tremblez, venez Jsus, car il sourit. Vous qui passez, venez Jsus, car il demeure.
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Vs que chmes, vinde a Jesus, porque Elle chora. Vs que soffreis, vinde a Jesus, porque Elle cura. Vs que temeis, vinde a Jesus, porque Elie sorri. Vs que passaes, vinde a Jesus, porque Elie permanece. Filhas de Maria, imitae o bel lo exemplo de Gemma Galgani! Toda manh, prostradas diante do vosso crucifixo, hauri constncia, fora e coragem nas contrariedades inevitveis d'essa vossa vida. Pedi a Jesus vos mergulhe em seu precioso sangue. As aguas do Styx tornavam invulnervel o que n'elias se banhava; o sangue de Jesus far mais do que isso, ser vossa defesa, vossa couraa e vossa salvao. In hoc salutis halneo, qui se lavai, miindabitur, canta a Igreja no hymno do precioso sangue. Quem se mergulhar n'este banho de salvao, purifica-se. Toda noite, tornae a prostrar-vos diante de vosso crucifixo, beijaeos ps sangrentos de Jesus ! Chorae vossas quedas, vossa pusillanimidade, vossa covardia ; pedi perdo; falae a Jesus, contae-lhe as vossas penas, confiae-lhe as magoas de vosso corao, os tormentos de vossa alma, as vossas tristezas, temores, incertezas e suspeitas ! Si fordes feridas, na luta com o demnio, levantae vossos olhos para o crucifixo, tendo a f dos Israelitas, quando encaravam a serpente de bronze que Moyss levantara no deserto, e sereis curadas das dentadas envenenadas da serpente infernal. Oxal possaes dizer com o piedoso Padre Didon: O Christo minha nica paixo! Oxal possaes encontrar tambm no cume do Golgotha o thesouro da constncia, o lindo topzio cr de ouro em fuso. Oxal, esta pedra preciosa e allegorica da virtude da constncia, rebrilhando no diadema immortal de Gemma Galgani, possa, um dia, adornar com o seu resplendor a vossa coroa no co. Amen.
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ESTA penltima conferencia sobre as virtudes e devoes da serva de Deus resta-nos contemplar a ultima pedra refulgente que rebrilha no diadema de Gemma, o crysolito que resplandecia no racional do summo Pontfice Aaro, nas fmices sagradas. D'esta pedra preciosa desprendem-se lampejos de chamma; o chrysolito, nas trevas, lana fascas; por esta razo, pode representar as chammas do Purgatrio, que acrysola as almas bemditas dos defuntos.
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Esta pedra rara pode symbolisai' tambm a devoo de Gemma para com estas almas, esposas de Ghristo desterradas, que padecem, cheias de saudades, no fogo vingador, cuja ardncia no tem igual. Gemma de Jesus, sobre ser uma martyr do amor de Deus e uma alma reparadora em altissimo g r o de perfeio, quiz ainda sacrificar-se pelas almas prisioneiras que, como saras em combusto, soffrem cruelmente no logar expiatrio. A serva de Deus, illustrada como era e illuminada pelas luzes sobrenaturaes, conhecia a doutrina g e n u n a da Igreja catholica acerca do P u r g a t r i o . Sabia bem que a devoo pelas almas bemditas d'esse logar de expiao , sem exaggero, uma espcie de centro a que v o convergir todas as devoes, permittindo-nos, mais que todas as outras, o desempenho de nossos deveres para com Deus, visto que uma devoo toda de amor. De facto, segundo o ensino cio Padre F b e r , piedoso e douto oratoriano de Londres que to bellas paginas escreveu sobre este assumpto . interessante, esta devoo glorifica a Deus, consola a SS. Virgem, alegra os anjos e os santos do paraso. Nenhuma d'essas almas pesarosas e padecentes recebe o menor allivio de soffrimentos, sem que Deus encontre logo augmente de gloria. Nenhuma arrancada s chammas expiatrias sem que Deus seja consideravelmente glorificado. Elle coroa e remata seus dons na alma que lhe to cara e deixa de soffrer. A devoo nossa santa Me comprehendicla na devoo s almas dos defuntos, porque honramos n'ella a Me de Misericrdia, a Rainha do Purgatrio, que tanto interesse tem de ver sahir do captiveiro para entrar na gloria eterna as almas que padecem. A serva de Deus n o ignorava tambm que os santos anjos se satisfazem com a devoo s almas, pois contribue para fazel-as occupai* os thronos vagos entre seus coros, preenchendo os vcuos deixados pela queda de Lucifer e dos anjos rebeldes e decahidos. Demais, muitos tm interesse pessoal no P u r g a t r i o . Milhares ou talvez milhes foram encarregados da guarda d'essas almas, e sua misso no est concluda, emquanto ellas no estiverem no co.
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Milhares tm ahi clientes que, durante a vida, os honraram com um culto especial. Orar, portanto, pelas almas do P u r g a t r i o a maior alegria que possamos proporcionar aos espritos bemaventurados do paraso. Esta devoo, finalmente, alegra os santos do co, porque cada alma que, pelos nossos suffragios, sae do captivoiro do fogo, augmenta-lhes o numero e aformoseia-lhes as fileiras gloriosas. A serva de Deus podia ainda considerar esta devoo sob outro ponto de vista. De facto, envolve o pleno exerccio das tres virtudes theologaes: f, esperana e caridade, fontes sobrenaturaes que alimentam em ns a vida espiritual. Exerce a f, convidando os homens no s a fixarem-se n'um mundo invisvel, mas ainda a trabalharem para esse mundo com tanta convico, como si o tivessem vista. Eleva nossa f na communicao dos santos, e robustecenos a crena no valor inestimvel das indulgncias e dos outros suffragios, principalmente no santo sacrifcio da missa. A esperana torna-se mais firme por esta devoo, a caridade se abraza, porque, si damos s almas dos mortos as prprias satisfaces em vez de guardal-as para ns, praticamos um herico acto de esperana. VEntregamo-nos, sem reserva, misericrdia divina e d'ella esperamos tudo. Damos a nossa esmola e lanamo-nos aos braos de Deus. A caridade, por esta devoo, alteia-se, imitando a do prprio Deus. E' um acto de amor centuplicado quotidianamente; um acto de amor a Jesus, porque cada orao feita pelas almas exalta a abundncia de sua redempo, glorifica-lhe a sangue precioso e povoa o co. Por estas razes, a devoo pelas almas afflictas do Purgatrio foi notvel na maior parte dos santos. S. Thomaz de Aquino, o doutor anglico, ensina que a caridade incompleta, si no enlaa os mortos com os vivos. No obstante, Deus parece haver suscitado alguns santos, para fazerem de sua vida um sacrifcio perpetuo
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Gemma Galgani.
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em favor das almas. Gemma est neste caso. Ningum se a d m i r a r de que uma alma como a sua, toda embebida do sobrenatural, favorecida de dons especiaes e de vises, enriquecida, agraciada de favores celestes, vivendo em communicao intima e continua com os bemaventurados habitantes da Jerusalm celeste, n o vivesse tambm em comm u n h o intima e estreita com as almas desterradas que, como pombas dolentes, choram na terra do exilio. Ningum comprehendia e apreciava melhor o dogma consolador da communicao dos santos, nem dizia com mais fervor: Credo in sanetorum commimionem. Ningum gostava mais de abysmar-se, meditando, n'essa mysteriosa unio da igreja militante com a igreja triumphante e a igreja padecente que, segundo a bellissima expresso de Joseph de Maistre, se auxiliam mutuamente e clo-se as mos como trs irms carssimas. Ningum descia mais vezes pelo espirito s profundezas das masmorras, para consolar as almas detidas no lago de fogo. Ningum comprehendia melhor as palavras do psalmista: Misericrdia et veritas obviaverunt sibi. No Purgatrio, encontram-se a misericrdia e a verdade que, p r i meira vista, deviam excluir-se: Justifia et pax osculatce sunt. No logar da expiao, a justia e a paz beijaram-se e vivem abraadas, segundo a interpretao dos santos Padres, porque as almas dos defuntos soffrem, resignadas e esperanosas, o castigo da divina justia. Ningum penetrava mais no symbolismo tocante da commemorao dos finados, no dia seguinte Festa de Todos os Santos, cuja instituio agradecemos piedade de S. Odilon, no decimo sculo. Gemma G al gani, toda embebida do sobrenatural, comprehendia melhor do que ningum, a sublime lembrana do santo abbade de Cluny, to devoto das almas do P u r g a t r i o , de mostrar, por este modo, a unio que existe entre todos os filhos da Igreja verdadeira. Depois de ter celebrado a Victoria dos que triumpham no co, S. Odilon quiz que seus religiosos se compadecessem tambm dos soffrimentos dos justos que gemem na priso de fogo, interessando em favor d'elles os santos que so os amigos de Deus e lhes rogando para interceder por elles.
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A Igreja, que todos os dias orava pelos defuntos, approvou esta santa pratica da celebre abbadia benedictina da Frana, no dia 2 de Novembro, e chamou em auxilio das almas desventuradas todos os fieis que combatem n'este mundo; pedindo-lhes, outrosim, que applicassem s almas, em virtude da communicao dos santos, o fructo das suas boas obras unidas aos infinitos merecimentos de Jesus Christo.
A exemplo da Irm Josephina de S. Tgnez, religiosa de S. Agostinho, da Irm Francisca de Pamplona, de Maria Dionysia de Martignat da Ordem da Visitao, Gemma parece que no viveu sino para auxiliar as almas soffredoras. Estava-lhes sempre em communicao intima e constante e, assim como rezava sempre por um peccador determinado at alcanar-lhe a converso, tambm offerecia as supplicas incessantes por uma alma determinada at conseguir-lhe o livramento. A serva de Deus offerecia os trabalhos, os soffrimentos, as doenas e os suffragios pelas almas abandonadas. Quando se sentia impotente, interpunha a intercesso da Bemaventurada Virgem Maria e dizia:
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Me, acode aos padecentes, Abre-lhes o seio amoroso, De Christo o sangue precioso Resgate j esses crentes, Maria! O co acceitava-lhe a generosa offerta e as almas sentiam, de dia em dia, diminuirem-lhe os tormentos. Uma I r m passionista, fallecida, havia poucos dias, no convento de Corneto, appareceu-lhe acabrunhada de tristeza, pedindo-lhe o auxilio, porque soffria horrorosamente Gemma, enternecida pela triste appario e profundamente, commovida, n o poupou esforos para alcanar-lhe o prompto allivio. No descanou, multiplicando as preces, derramando rios de lagrimas, porfiando com o Divino Salvador, fazendo supplicas Me de Misericrdia, lucrando numerosas indulgncias, n'uma palavra, parecia n o ter outra preoccupao. Durou dezeseis dias a santa^peleja, no fim dos quaes conseguiu o que to ardentemente almejara: a justia divina deu-se por satisfeita e a alma viu-se livre * das penas. Gemma narrou ela prpria esse facto: A's duas horas e meia da manh, a SS. Virgem me avisou que a hora da salvao estava prxima. De facto, pouco tempo depois, appareceu a I r m Maria Thereza, no traje de passionista, em companhia do Anjo da Guarda e de Jesus. Que differena entre as duas apparies! Veiu a mim, cheia de alegria, com o sorriso nos lbios, e disse-me: A g o r a estou verdadeiramente feliz, vou para o p a r a s o gozar para sempre das delicias celestes. Em seguida, fez com a mo signaes de despedida e accrescentou: Adeus! e voou logo para os eternos tabernculos, s tres horas da m a d r u g a d a . Os artistas catholicos representaram nas telas, por um tocante symbolismo, a virtude dp precioso sangue que se derrama pelos vivos e pelos defuntos, todo o dia, sobre nossos altares. Perto da cruz do Redemptor, vm-se os anjos, esforando-se por chegar, quanto possivel, um clice s chagas sangrentas de Jesus, para n o perder uma s gotta e despejal-o sobre o abysmo de chammas onde penam as pobres almas.
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Gemma Galgani foi um d'estes anjos compassivos que recolhem o sangue de Jesus, durante a santa missa, lucrando numerosas indulgncias e despejando o clice cheio de suffragios refrigerantes sobre o fogo, como um fresco orvalho, para acalmar-lhe o grande ardor e consolar as almas. A exemplo de Gemma, as congreganistas, que devem abraar as devoes approvadas pela Igreja, esforcem-se por adquirir tambm uma devoo solida para com as almas do Purgatrio. No devem passar nenhum dia da vida sem rezar pelas almas to necessitadas, consagrando o mez de Novembro, que lhes votado, em obter-lhes o descano eterno, fazendo os piedosos exerccios prescriptos, quer publicamente na Igreja, quer particularmente no seio de suas famlias. Rezem em particular pelo descano eterno de suas irms da Pia Unio e pelas almas que foram devotas SS. Virgem. Escutemos gemidos enternecidos d'-estas almas que suspiram como o propheta: Ai de mim que, ha tanto, vivo peregrinando em terras estrangeiras; como vae longe meu exlio! Meu Deus, quando chegar a hora, em que possa contemplar a vossa, formosura infinita, e ver-vos face a face? Ouvi, Congreganistas, as vossas irms gritando do fundo do abysmo. Vede como estendem para vs as mos supplices do meio das chammas. Escutae-lhes a voz chorosa que, do fundo do abysmo, clama por vs: Tende compaixo de mim, pelo menos vs que fostes minhas amigas, porque a mo do Senhor me castigou. Dizei:
Com as tristes almas, Bom Jesus, usae Das misericrdias De Deus, vosso Pae! Suppra o vosso sangue, Precioso e santo, O dever das almas Que padecem t a n t o ! Transportae-as logo, Sem mais dilao, Para os tabernculos Da Santa S i o !
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As Filhas de Maria sejam devotas de Nossa Senhora do Carmo e revistam-se do santo escapulrio que a mesma gloriosa Senhora deu a S. Simo Stock. O propheta Malachias compara Jesus Christo purificando as almas no P u r g a t r i o a um homem que funde e refina a prata na fornalha e apura o ouro no crysol . Como o fogo que derrete os metaes, assim o Senhor ha de acrysolar os filhos de L e v i E t purgabit filio Levi e eolabit eos quasi aurum e quasi argentum. A Virgem do Carmo, compadecida dos tormentos das pobres almas, atormentadas pela justia rigorosa de Deus, entregou ao piedoso carmelita inglez este santo habito, dizendo-lhe: In quo quis moriens ternnm non patietur incendiuin.Quem. -morrer revestido d'est santo habito ver-se- livre do incndio eterno. Alm d'est privilegio, a mesma Virgem bondosa prometteu livrar das chammas do Purgatrio, quanto antes, as almas que, durante a vida, entraram na confraria do escapulrio e cumpriram com as obrigaes impostas. As Filhas de Maria venerem esta gloriosa Virgem do Monte Carmelo, radiosa Rainha do Purgatrio, como diz S. Bernardino, o devotssimo servo de Maria Santssima: ('tique in regia) purgotori'/ dominium tenet: Virgo Maria. Sim, tambm no reino lugubre das chammas purificadoras, Maria empunha o sceptro da realeza, crivado de chrysoli.os fulgurantes. No posso deixar de apontar uma outra vantagem da devoo s almas do Purgatrio. J vos falei da resignao com que Gemma Galgani supportou os golpes repetidos da morte em sua familia. A serva de Deus, graas f esclarecida que tinha, dizia com S. Agostinho, cujas obras lia, falando da morte de sua me querida, S. Mnica: *Non ego floribus tumulum ejus aspergam, sed spiritum ejus Christi odore perfundam. No me satisfao espargindo flores sobre seu tumulo; prefiro, com as preces e o sacrifcio, impregnar-lhe a alma do suavssimo odor de Jesus Christo. Assim a ba congreganista, devota das almas dos padecentes, consola-se pelo espirito de f que nos d foras para o sacrifcio, por maior que seja. Disse Jesus a Gemma que no perdesse o tempo em choros inuteis.Deus no vos pede, talvez, esta virtude herica,
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apenas quer que santifiqueis as lagrimas; porque chorar um allivio; pede que vos conserveis calmas na dr e no vos excedaes na tristeza; como acontece aos que n o tm esperana, consoante s palavras de S. Paulo: qui speni non habent. Em ministrio de quasi vinte e cinco annos, em diversos paizes, notei que a exploso da dor tanto mais ruidosa na occasio dos enterros, quanto mais fraca a virtude de religio. O espirito de f abafa os gemidos da saudade. Verifiquei tambm que o pesar mais sincero, mais profundo, e mais durvel nos que menos ruidosamente choram. Medite a Filha de Maria nas palavras consoladoras do prefacio dos defuntos: Fidelibus vita mutatur, non tollitur. Os fieis, pela morte, no perdem a vida, mas trocam-na por outra melhor. Et dissoluta, terrestri hujus habitationis domo, ailerna, in cadis habifatio comparatur. A alma do bom christo adquire um togar na manso celeste em compensao do corjw terrestre em que habitava. Encaremos, pois, a morte pelo prisma da f e consolemo-nos mutuamente nas saudades. Praza ao co que o ehrysolito, pedra rara e formosa, cujos fulgores flammejantes symbolisam a devoo terna pelas almas, resplandea, um dia, na coroa das Filhas de Maria como fulgura no diadema immortal da serva de Deus, Gemma Galgani.
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DECIMA STIMA C O N F E R E N C I A .
santa morte de Gemma O a l g a m . ! .
Adjuro vos, f i l i a J e r u s a l e m , si i n veneritis dilectum meum, ut nuntietis ei quia amore langueo. (Cant. V . )
Eu vos conjuro, filhas de Jerusalm, que, si encontrardes o meu amado, lhe faaes saber que estou enferma de amor.
- S E , no livro I I I dos Heis, que Salomo edificou um templo em Jerusalm, empregando, n'essa grandidiosa obra, militares de operrios e gastando sete annos. O bellissimo \ HHBSBHHS? / cdiicio foi lodo construdo de pedras lavradas e esquadrinhadas. As paredes e o tecto eram revestidos, interiormente, de madeiras de cedro douradas, em que estavam esculpidos cherubins, palmas e grinaldas de flores; at o pavimento era forrado de lami-
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nas de ouro fino. O rei fez appello aos melhores artistas, para esculpirem, em alto relevo, aucenas e pomos de r o m s nos capiteis e nos frisos. Os utenslios do culto, os castiaes, os thuribulos, as lmpadas, tudo era de ouro finssimo. Assim que o Rei dos reis, de quem Salomo foi apenas a figura prophetica, quiz construir, no corao de Gemma, sua fiel serva, uma morada digna de sua majestade, gastando vinte e cinco annos n'essa obra prima. O celeste artista, armado do martello da dr e do formo da tribulao, a golpes repetidos, lavrou e esquadrinhou as pedras de cantaria e m r m o r e d'esse edifcio espiritual, cortando, sem misericrdia, os defeitos e imperfeies. Armando-se, em seguida, do buril da doena, esculpiu as paredes, fazendo profundos entalhos, revestindo finalmente as figuras de alto relevo de laminas de ouro. Gemma n o contrariou, queixando-se, a obra santificadora, embora dolorosssima, de Nosso Senhor. ( iomo o santo Bispo de 1 lippona, o eximio doutor da Igreja, prostrado no leito da dr, exclamava: Hic ure, kie .teceu, h/c non parcas, ut in wternum parcas, nossa Gemma dizia: Queimae, Senhor, n'esta terra, cortae n'este valle de lagrimas, no me poupeis, mas poupae-me na eternidade! Scicnte de que Deus castiga a quem ama, esta alma Io sobrenatural, conhecedora do alto preo das adversidades, beijava a mo que, com tanta dureza, a tratava. Com o Apostolo das gentes, Gemma s queria glorificar-se na cruz de Jesus Christo e nas proprias cruzes. Durante os sete annos que o rei Salomo gastou na obra maravilhosa do templo, no se ouviu uma pancada siquer, porque as pedras tinham sido lavradas de encaixe. Assim tambm o Senhor acabou a sua esplendida morada, no corao da Virgem de Lucca, com um trabalho silencioso, lento, invisvel, mysterioso. O templo est prompto, est ornado de ricas alfaias, n'uma palavra, tornou-se uma joia. Quando Salomo fez a dedicao do templo que acabara de construir, uma nuvem encheu o s a n t u r i o : era o signal da presena gloriosa da divina Majestade. Por semelhante modo, Jesus, depois de aformosear a alma de Gemma, viveu n'ella pelo espirito cie sua santidade, pela plenitude
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de seu poder, pela perfeio de suas vias, pela verdade de suas virtudes, pela communho de seus niystcrios, pelo dominio sobre qualquer potencia inimiga no seu espirito, para a maior gloria de seu Pae eterno. Gemma admirvel, agora entoas o hymno de despedida do sacerdote, ancio piedoso que recebeu nos braos venerveis Jesus, na apresentao do templo: Agora, Senhor, despede a tua serva em paz. () Gemma, mais de uma vez, recebeste nos braos o Menino Jesus. Acabaste a carreira mortal, morrers na
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flor dos annos, to cheia, porm, de merecimentos como si tivesses percorrido uma longa carreira. Em poucos annos, ccumulste mais mritos do que o homem encanecido no servio de Deus. Gonsummatus in brevi explevit tmpora multa. Vinde, anjos do co, cortae o fio tnue que prende terra a existncia d'essa innocente donzella! Vinde colher no pomar sagrado da Igreja, o fructo precoce, sazonado pelos ardores do sol da justia! Ante frum hujus virginis frequentat -i to bis dulcia cantica drama lis. Anjos do co,
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afinae as cytharas harmoniosas e, com as vozes mais suaves, cantae, ao p cio leito (Festa virgem, o doce hymno do Esposo dos Cantares: -Levanta-te, apressa-te, amiga minha, e vem! J passou o inverno, j se foram as chuvas, j cessaram as catadupas, appareceram as flores em nossa, terra! As vinhas em flor lanaram o perfume. Levanta-te, amiga minha, e vem! Vem, Esposa, de Christo, receber a coroa que o Senhor te preparou desde a eternidade! Antes de morrer, Gemma, que se havia offerecido ao Senhor como victima reparadora pelos profanadores do SS. Sacramento, tinha ainda que soffrer bastante. Quiz cumprir at o fim, at o ultimo suspiro, a sua misso. Havia de beber o clice do soffrimento at as fezes, como Jesus no jardim das Oliveiras. Com uma voz repassada de tristeza e dr, tinha-lhe dito Jesus: Preciso, em particular, de uma victima de expiao e r e p a r a o pelos peccados e sacrilgios dos ministros do santurio. 'Si n o fossem os anjos que assistem no altar, quantos seriam fulminados na celebrao do acto sagrado! A estas palavras, a donzella empallideceu, os olhos arrazaram-so-lhe de lagrimas. Mas, quando o Senhor lhe perguntou si estava prompta a tomar sobre si a expiao cfaquellas profanaes, sem hesitar, respondeu: Sim, Senhor, sem demora! Descarrega a tua clera sobre mim; glorifica-te n'essa tua miservel creatura! Uma Irm enfermeira disse serva de Deus, prostrada sobre o leito cie d r : Caso Nosso Senhor te desse a escolher entre a vida cheia de padecimentos e a entrada immediata ao co, que preferirias? Respondeu Gemma, com a vivacidade que lhe era peculiar: Minha Irm, prefiro mil vezes todos os tormentos cVesta vida, si assim puder glorificar a Deus e soffrer por meu amabilissimo Jesus! Dizem que o cysne, quando est prestes a expirar, canta maravilhosamente como nunca o fizera; assim tambm Gemma jamais cantou hymnos to harmoniosos do que estes que acabo de referir.
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Deus pede a sua serva o sacrifcio da vida em flor como desaggravo dos crimes dos homens, e ella respondo por um Hat admirvel. Resignada a morrer pelo amor de Jesus e pelas almas que se perdem, Gemma, comtudo, est prompta a soffrer ainda mil tormentos, sacrificar at a viso beatifica immediata, si Deus assim fosse mais glorificado. Esse ta aridez, a pobre victiessas ma, desola0 palavras da e sosiTrm, foram nha, se conseu canto sumia pela de cysne. dr em Ao lado pleno holodas tortucausto ao ras phySenhor. sicas que Avisaram, supportava immediatacom tanta mente, o dipacincia, rector e Gemma foi este chegou privada jmm pressuroso, tambm pergun das doutando a ras da conGemma: templao e das mani- O racional, que o summo sacerdote Aaro ^Elltaoque festaes trazia sobre o peito, suspenso ao pescoo ostaiUOS fapor uma corrente e ouro. N'elle estavam enextraordi- gastadas oze peras preciosas. ZOlldo? nrias. Nes Vou a Jesus, respondeu a doente, n'um tom de immenso jubilo, sim, vou para o co; Jesus m'o disse claramente. No dia seguinte, foi-lhe administrado o santo viatico. Esta cerimonia, sempre to tocante, revestiu-se de uma solemnidade particular. Vestiram-na com 0 traje das Filhas de Maria, adornaram de flores o quarto, alcatifaram o cho com ptalas de rosas. O sacerdote, ao chegar, depositou o Santssimo sobre o lindo altar preparado adrede; ao contemplar o rosto da doente em xtase que irradiava fulgores
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como um sol nascente, ficou pasmado e to cheio de respeito em presena d'esse anjo em adorao, que n o se atreveu a chegar mais perto. 0 director ento mandou que lhe administrasse o santo viatico, n o obstante o estado exttico em que a moribunda se achava. De facto, a santa enferma abriu os olhos e voltou-se para o sacerdote, recebendo com a mxima devoo a santa communho. Depois de levar o SS. Sacramento, o padre voltou incontinente e, ajoelhado no quarto, ficou ahi, por muito tempo, rezando. Gemma sabia, entretanto, que sua ultima hora ainda no tinha chegado e que havia de soffrer perseguies da parte do demnio, antes de entrar em agonia. Para tornar saliente a bella cor do m r m o r e preciso que seja polido com esmeril e pedra pomes, e brunil-o com demora, sendo finalmente untado com verniz para dar-lhe o ultimo lustro. Assim tambm o Senhor quiz, para embellezar a alma de Gemma e lhe dar o derradeiro brilho, proval-a pelas ultimas tentaes de Satanaz. Com sanha furiosa, o demnio esforou-se em excitar a imaginao de Gemma j to enfraquecida, pela doena, com horrveis pbantasmas e apparies, depois tentou leval-a ao desespero. Em cores negras, traou-lhe o triste quadro de sua vida dolorosa, cheia de angustias e privaes de todo o gnero, fazendo-lhe ver, claramente, as desgraas, doenas e mortes na sua famlia. Fez passar-lhe diante dos olhos, como n u m a fita cinematographica, os officiaes de justia juntamente com os credores chegados em casa depois da morte de seu pae, para lanar mo de todos os bens, e jogar rua os pobres orphams que se desfaziam em lagrimas. Em seguida, lembrou a pobre doente as necessidades por que passara na pobreza, o seu desamparo e finalmente, n'um tom de ironia cynica, exclamava: E i s o que lucraste no servio de Deus! Servindo-se tambm da aridez de espirito em que se achava Gemma, da falta de consolao divina, da privao dos favores celestiaes, Satanaz, por seus ardis diablicos, tratou de convencel-a de que estava abandonada por Deus e que havia.de ser condemnada ao fogo eterno por suas infidelidades.
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A pobre martyr soffria, herica e resignadamente, tantos vexamos e, com donodo, rebatia as suggestes astuciosas do anjo cahido. Para livrar-se das garras do abutre infernal, achou de bom alvitre fazer, mais uma vez, a confisso geral. Por isso, mau grado a fraqueza extrema, escreveu, com o prprio punho, uma relao minuciosa de sua vida e mandou chamar um santo sacerdote; este lhe deu, juntamente com a absolvio, bons conselhos que lhe .dissiparam, por completo, os temores e lhe trouxeram a paz ao corao. Antes de se lhe escurecer a vista, Gemma lia os piedosos exerccios da preparao morte. A sua tia, que lhe perguntava si a morte lhe fazia medo, respondeu que no, que morria muito satisfeita, porque no tinha apego s cousas terrestres e s suspirava pelos bens celestes do paraso. No ultimo perodo da doena, Gemma tinha, muitas vezes, syncopes prolongadas e collapsos. O dia do passamento approximava-se, com rapidez. Estava-se na semana em que nosso Divino Redemptor morreu, qual purssima victima pelos peccados do mundoNa quarta-feira de trevas, Gemma recebeu a santa communho, respondendo, com voz sumida e repassada de dr, s preces dos agonizantes; na quinta-feira maior, tornou ainda a commungar, com fervor ineffavel, pela ultima vez. Na sexta-feira da Paixo, a irm enfermeira pediu licena doente para ir descanar um pouco, porque tinha passado a noite toda a sua cabeceira e estava realmente exhausta. Gemma disse, porm: No me deixeis sosinha, por piedade, at ser crucificada como Jesus, que me disse deverem seus filhos morrer na cruz em sua companhia. Em seguida, a doente entrou em agonia e ficou, o dia inteiro, com os braos estendidos como Jesus na cruz. Pela manh de sabbado, foi-lhe administrada a extrema-unco. Gemma respondeu, com voz clara, s oraes lithurgicas e, pouco depois, disse: Agora, verdade, no posso mais. Jesus, eu te recommendo minha pobre alma!
S faltava o ultimo suspiro, o desenlace final e, n'este mesmo, a santa moribunda havia de ser semelhante victima do Calvrio, mysticamente cravada na cruz, enfraquecida pela perda copiosa do sangue que brotara dos estigmas e lhe sahira dos olhos, em expiao das offensas feitas divina Majestade. A victima agonizava com Jesus n'ura mar de angustias, atormentada em todas as faculdades da alma e do corpo pelo inimigo infernal, sem receber conforto, nem do co nem da terra. A innocentissima creatura elevou ainda a voz, n o para se queixar, mas para suspirar amorosamente. Dous mil annos atraz, na cidade cie Jerusalm, na semana pascoal, ouviam-se os ternos balidos dos cordeiros que os judeus immolavam por milhares. Km cima do Golgotha, gemia tambm a victima sem mancha, o Cordeiro immaculado que tira os peccados do mundo, prefigurado, annunciado, e exemplificado pelo cordeiro do Egypto, cujo sangue salvou os primognitos do povo de Israel. De vez em quando, a pobre martyr dizia: No posso mais! O confessor fazia-lhe comprehender que, com a g r a a de Deus, tudo se pode, e ella conservava-se calada. Como uma pessoa presente dissesse: A falar verdade, a pobrezinha no pode mais, Gemma tornou: Sim, posso ainda um pouquinho. No deserto de E n g a d d i , dir-vos-ei com S. Ambrsio, ha um p o que distilla um perfume delicioso quando pisado e machucado. Posso empregar uma comparao semelhante, mais adequada, e mais moderna: Ha, na vossa fertilissima terra brasileira, pos e fruetos que tanto mais so odorantes quanto mais pisados e reduzidos a p, como sejam a canella, a baunilha, o cacao e tutti quanti. Quanto mais a alma de Gemma, alma penitente no supremo g r o de perfeio, foi pisada e triturada, mais distillou o aroma da virtude e, sobretudo, da santa pacincia, cuja fragrncia ha de perdurar pelos sculos vindouros. S. J o o Evangelista, narrando a morte do Salvador, diz: Et inclinato capite reddidit spiritumJesus inclinou a cabea e entregou o espirito. Assim Gemma inclinou para um lado a cabea e, com um meigo sorriso nos lbios, falleceu de dr e de amor, no dia 11 de A b r i l de 1903. Era
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sabbado de 'Allluia. Como o cordeiro pascoal, a doce victima, espontaneamente offerecida em expiao dos sacrilgios, foi immolada na vspera da Paschoa de Resurreico. O padre no altar acabava de entoar, por trs vezes, o aleluia triumphal, repetido pelos cantores como um grito de alegria e de esperana. Os sinos, mudos havia trs dias, repicavam festivamente, annunciando ao povo christo a gloriosa resurreico do Senhor, echoando alegremente no corao dos fiis adoradores do Christo glorioso, quando da humilde casita de Lucca, voou para o co a alma de Gemma Galgani, e l nas alturas do paraiso, unindo a voz s melodias dos espirites celestes, continuou o cntico dos anjos, interrompido um instante pela morte: Laudamus te, benedicimus te, adoramus te, glorificamus te/ Durante a vida mortal, a serva de Deus exprimira, muitas vezes, o desejo de morrer n'uma solemnidade. Deus ouviu-lhe a aspirao, dando-lhe melhor do que pensara. Morreu na maior solemnidade do cyclo litrgico, na mais pomposa festividade do anno ecclesiastico. Depois de ter padecido, juntamente com Jesus, durante a semana dolorosa, relembradora de sua sagrada Paixo, a doce amante do Christo no poude morrer antes que o padre no altar entoasse a antiphona: Vespere autem sabbati, allluia. Depois de ter sido crucificada mysticamente, a doce victima no poude expirar antes que o padre cantasse o Magnificat anima mea Dominum, incensando ao mesmo tempo o altar e enchendo o santurio das nuvens odorferas do thuribulo. Nosso Senhor, que a Igreja chama nossa vida o nossa resurreico, quiz buscar a purissima esposa no sabbado de Allluia, para celebrar com ella, no co, o glorioso anniversario de sua resurreico. Ningum notou o passamento, porque as feies n o se lhe mudaram, conservando-se bellas e regulares como d'antes. Gemma parecia adormecida. Morreu a sorrir, n'um abrao do divino Esposo. A bellissima alma, como a chrysalida, creou azas diaphanas, quebrou os laos que a prendiam terra e, fu-
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gindo da priso, como linda borboleta a sahir do casulo, onde vivia, n'um surto arrojado, voou para os eternos tabernculos, em companhia do Anjo da Guarda e cercada por uma multido de almas que lhe deviam a salvao: Benedieite, angeli, Domino, laudate Dominum, omnes angeli ejusf Uma pessoa, iembrando-se do que Gemma desejara, durante a vida mortal, fazer profisso na Ordem das passionistas, vestiu-a com o habito pardo da mesma, collocanclo-lhe sobre o corao o emblema da Paixo, seu distinctivo. Coroada de flores, com o tero do Maria ao pescoo, a graciosa serva de Deus, C O K . as mos postas segundo costumava tel-as, quando estava arrebatada em xtase, parecia viva e abstrahida em intima communicao com Deus. Muita gente, ao saber do fallecimento da serva do Senhor, veiu com sofreguido orar perante o santo corpo. O enterro foi, pela concurrencia extraordinria do povo, uma consagrao de suas virtudes e da fama de sua santidade. Sobre o tumulo, collocaram-lhe uma lapide com dizeres em latim, cuja traduco a seguinte: Gemma Galgani de Lucca, a innoeentissima donzella que foi consumida, mais pelo amor divino do que pela doena, na, idade de 25 annos, aos 11 de Abril de 1008, voou ao paraso, para celebrar as bodas com seu divino Esposo. Descana em paz, doce alma, em companhia dos anjos! Treze dias depois do fallecimento da serva de Deus, o medico extrahiu-lhe o corao, encontrando-o cheio de sangue vermelho como um corao vivo. No anno de 1908, com licena da autoridade episcopal, desenterraram o corpo virginal e collocaram-no n'uma catacumba encimada de um lindo monumento funerrio que se tornou, em breve, um ponto de attraco para muitos e um logar de romaria. Em pouco tempo, as paredes do mausolo cobriram-se de expressivas inscripes, testemunho da f e confiana dos fieis na intercesso da Virgem de Lucca. Eis algumas: Gemma, lembra-te do meu pae!Gemma, reza por meu marido!Cara Gemma, converte meu irmo!Querida
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Gemma, aeode-me para desterrar os mos pensamentos! Minha querida Gemma, esposa de Christo, do alto do co volve os olhos s almas que me foram confiadas, protege as boas emprezas, intercede pelo rebanho e pelo pastor, alcana para todos a santidade! Nossa heroina morreu; sua memoria, porm, eterna, como disse o propheta-rei : In memoria wterna erit justa*. Nossa heroina morreu; todas as geraes, porm, se lemb r a r o d'ella e lhe glorificaro o nome. Seu corpo jaz no sepulcro, mas a joia das Filhas de Maria viver para sempre no corao dos homens: Corpora ipsorum in paee sepulta suat et nomen eorum vivei in generationem et generationem. (Eeel. 54.) O nome de Gemma Galgani ser o synonimo da pureza. Todas as Filhas de Maria esforar-se-o para seguir os gloriosos vestgios d'esta santa donzella e para tri Ih atua senda de luz em que andou. Todas procuraro imitar-lhe a santa vida, cuja synthse amor e reparao. Transportemo-nos em espirito ao cemitrio de Lucca, onde descana a terna virgem, a dormir o ultimo somno. Embora o nome de cemitrio, etymologicamente falando, queira dizer logar do somno, embora este nome encerre um bello symbolismo nas lnguas latinas, porque o somno implica o despertar futuro na eterna gloria, prefiro ainda o nome anglo-saxonico, usado pelas populaes oriundas d'esta raa, no centro e no norte da Europa: Gottesaeker vou&do de Deus,a sementeira de Deus. Que bella allegoria! Como cada famlia de aldeia tem um pequeno roado para trabalhar, tambm Nosso Senhor, ao redor da egreja parochial, tem seu roado onde lana as sementes, que so os corpos dos christos. A morte abre o sulco n'este roado bemdito e alli viceja a seara humana: Renascendo os justos para sempre,
Ho de f l o r i r n'este Eden segundo, Unindo seus perfumes aos de outras flores Quaes nunca vicejaram n'este mundo.
(Aureliano
Pimentel.)
Ao p do tumulo aberto que, segundo o bello epigrapho encontrado nos cemitrios de Frana, o bero do co, meditemos sobre os conceitos consoladores do Padre Bourdaloue. Os trabalhos, as tentaes, as doenas, o invencvel desejo de uma felicidade que, n'este mundo, n o se encontra, tudo nos chama a essa grande eternidade, onde a f nos promette, com a posse de Deus, o descano, a paz, o summo bem a que aspiram todas as potencias de nossa alma. Eis porque os santos gemem to amargamente debaixo do peso dos laos que os prendem terra! Eis porque exclamava o Apostolo S. Paulo: Desejo que meu corpo se dissolva afim de estar com Jesus. E n t o no h a v e r mais nem temores, nem lagrimas, nem combates, mas um eterno triumpho e uma alegria sem fim. Si apenas um fraco vislumbre da eterna belleza transportava Gemma durante a vida, que ser quando a contemplarmos em seu inteiro esplendor! Diz a Imitao : Desde agora nos to caro o amor, que ser quando nos saciarmos na sua fonte perenne e pura! .. . Quando vos parecer pesada a vida mortal, quando estiverdes a ponto de succumbir tristeza, levantae os olhos e contemplae a aurora de vossa liberdade. Ah, si a congreganista visse a coroa immortal que os santos possuem no co, e a gloria de que esto gozando, diria com certeza: Que importa alguma fadiga? Jesus foi antes de ns para preparar-nos a morada em casa de seu Pae, e depois vir e nos l e v a r comsigo para que, onde esteja, estejamos tambm. Ouvi Jesus dizer-vos: Assim ao co fulgente Levanta a face tua, Eis-te commigo; Meus santos todos grandes luctas Sustentaram no sculo inimigo; Agora gozam glorias impollutas, Agora consolados so. Repousam agora e resplandecem E commigo sem termo permanecem, No reino de meu Pae!' ( Imitao. A ffonso Celso.)
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Anhelae, pois, a ventura celeste. Suspirae pelo Senhor, como suspirava Gemma, a Filha de Maria modelar, cuja alma desfallecia e gemia por seu bem supremo, como suspira o cervo sequioso pela frescura da fonte. Dizei com o piedoso Padre Bourdaloue : Apressae-vos, Senhor, fazei brilhar sobre ns a luz de vossa face, afim de que nos guie celeste Jerusalm, ao p do throno do Cordeiro. Alli no transporte do amor, no immortal extase de alegria, os coros dos bemaventurados celebraro o Deus santssimo, e as virgens, em unio com os anjos, cantaro um hymno que s ellas sabero, seguindo o cordeiro por onde fr. E ns, Senhor, na margem do rio de Babylonia, cantamos com saudades de Sio. Consola-te,minha alma, diz o psalmista, no ouves o primeiro murmrio que annuncia a vinda do Esposo? Espera mais um pouco e vel-o-s, mais um pouco e nada poder separar-te d'elle. Dize como S. J o o no ultimo verso do Apocalypse : O que d testemunho d'estas coisas diz: Certamente que venho loa o. Amen.
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DECIMA O I T A V A C O N F E R E N C I A .
O espirito cie Gemma O-alg-a-ni.Consideraes fmaes.
H o c e n i m sentite in vobis quod et in Christo Jesu. (Philipp, s.)
os magnficos paramentos pontifcios do summo sacerdote Aaro, destacava-se o racional do juizo, feito de um riqussimo tecido escarlate, de linho e purpura, suspenso ao pescoo por uma corrente de ouro de lei. Trazia engastadas doze pedras preciosas, dispostas em quatro ordens; sobre cada pedra estava gravado o nome de uma das tribus de Israel. Na primeira ordem, viam-se um sardnico, um topzio e uma esmeralda, na segunda, um carbnculo, uma saphira
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e um jaspe; na terceira, um ligurio, uma gata e um amethysta; na quarta, um beryllo, uma cornalina e um chrysolito, engastados em ouro nos logares prprios. Lembrei-me de comparar algumas pedras finas do racional de A a r o s virtudes que, como outras tantas pedras raras, rebrilham na coroa celeste de Gemma, desde que entrou na Nova Jerusalm a cantar os louvores de Deus. Disse com acerto o venervel Thomaz de Kempis: As virtudes e as dores so os brilhantes que resplandecem na coroa do justo, no paraiso.
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Temos contemplado a coroa de Gemma, formada de fino ouro, marchetada de finissimos diamantes, graciosas esmeraldas e abrazados rubis. Depois de termos analysado as principaes virtudes de Gemma, separadamente, e admirado os maravilhosos effeitos da graa divina, manifestados n'esta admirvel vida, resta-nos apenas falar do seu espirito. Assim faremos, em poucas palavras, a synthse do nosso trabalho. As excelsas virtudes da serva de Deus, os favores celestes de que foi favorecida com tanta abundncia, as graas espirituaes de que sua alma foi inundada resumem-se n'uma s palavra - -o sobrenatural. A disposio d'alma, as tendncias espirituaes, as intenes concretizam-se-lhe na affeio do sobrenatural. O espirito peculiar a Gemma o amor ao sobrenatural, a aspirao ao ideal celeste. O paisagista Millet representou na tela o Semeador a espargir o trigo no sulco do arado, n'uma tarde resplandecente dos fulgores do sol poente. (3 artista, para salientar o profundo symbolismo da mo do Semeador que nutre toda a humanidade, n'elle concentrou o jogo da luz com tanta pericia, que essa m o nervosa reala estriada cie veias azues salientes e attrae a vista. Quanto mais o espectador contempla-lhe o bello gesto, mais sente-se fascinado. A terra clesapparece aos olhos, evapora-se o p r p r i o vulto do Semeador, a vermelhido do co eclipsa-se diante d'essa mo benfica e generosa.
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Assim o leitor da vida de Gemma, sente-se attrahido pelo seu espirito, cuja belleza sobrepuja o brilho de suas virtudes. O espirito de Gemma, a affeio ao sobrenatural, n o uma virtude, mas uma belleza que obscurece tudo o mais. O espirito de Gemma tem o perfume da flor e possue o resplandor da joia. O espirito de Gemma o foco da luz, sendo-lhe a do o consevirtude os lho do Aposraios, *"a altolo : Seja ma que anima' todas as -vosso sentir virtudes, a o sentir de fora motriz Jesus, cada das operaqual tem um es da graa. trao caracte ' O espirito ristico, uma de Gemma disposio v a l o r i z a tod'alma, uma das as suas tendncia, praticas reli-' n'uma palaglosas. vra, um espirito. Ainda que Monsenhor os santos se Carnus, bispo esforassem de Belley, por adquirir nos transmittodos os sentiu, n'nm timentos de 0 summo sacerdote aro. .bello livro, o Jesus, segun--
espirito de seu santo amigo Francisco de Salles. Lancicius nos fala do espirito de S. Gertrudes.--O espirito de S. Ignacio se perpetua na Companhia de Jesus. S. Francisco de Assis imprimiu nas suas obras, suas palavras e praticas, na sua Ordem religiosa, o cunho pessoal e inconfundivel do seu espirito seraphico.Os carmelitas estudam e imitam o espirito de S. Thereza; os passionistas admiram e seguem o de S. Paulo da Cruz. O espirito de Soror Thereza do Menino Deus foi a confiana inabalvel no valor da orao que, j n'esta
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terra, alcanava todas as g r a a s que pedia; e, agora no alto do co, seu poder de intercesso e de impetrao realmente assombroso. Nunca se ouviu dizer que algum lhe implorasse o patrocnio sem ter sido attendido. Soror Thereza do Menino Jesus prophetizou este poder milagroso, dizendo pouco antes de morrer: Depois da minha morte, hei de fazer caliir uma chuva de rosas. O espirito, de outra carmelita dos tempos modernos, propagadora da devoo ao Espirito Santo, Soror Isabel da Trindade, que floresceu em Dijon na Frana, no mesmo tempo que Gemma florescia na Itlia, e morreu em odor de santidade no anno de 1906, foi a vida escondida em Deus. Dizia ella: Achei meu paraiso sobre a terra, porque Deus o co e est no meu peito. O espirito de Gemma Galgani o amor do sobrenatural, realando e palpitando em cada pagina da sua vida. Gemma Galgani foi, antes de tudo, uma creatura sobrenatural; n'ella nada havia de material o terrestre; foi um ente sobrenatural nos pensamentos, nas palavras, nas cartas, nos affectos, nos sentimentos, nas obras, nos desejos, nas praticas religiosas, nas oraes: foi sobrenatural em tudo. Para se conformar aos conselhos de S. Paulo, despiu-se dos sentimentos do velho homem e revestiu-se das virtudes do novo que Jesus Ghristo. O velho homem, Ado, terrestre, o novo homem, Jesus Christo, todo celeste. Induemini Jesum Ghristum. (Rom. 14.)Revesti-vos de Nosso Senkor' e no faceies caso da carne. bella alma de Gemma, revestida do espirito de Jesus, como de um manto de gloria, vestida como rainha ornada de franjas de ouro! (Ps. 44.) Quo airosos so os teus passos! Ella n o se revestiu somente dos sentimentos de Jesus, sino que este bom Senhor, enxertando-lhe seus divinos sentimentos, deu-lhe uma vida nova, sobrenatural e divina. Nas veias estuou-lhe a seiva espiritual de Jesus. Gemma poude exclamar com S. Paulo: Mihi enim viver'e Christus est. O Christo c meu viver, e s terei a lucrar, quando morrer. Vivo, porm no sou eu que vivo, Christo que vive em mim. (Galat. 2.)
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Ensina o doutor anglico, S. Thomaz de Aquino, que o mrito das obras da alma justa augmenta em proporo do motivo sobrenatural que as inspira. Quo grandes so os merecimentos de Gemma Galgani inspiradas como foram as suas obras por to elevados motivos sobrenaturaes ! Nunca admiraremos bastante o espirito de Gemma Galgani, espirito mystico e sobrenatural, cujo caracter, inconfundvel e pessoal, se encontra impresso nos seus escriptos, nas suas obras, nas suas virtudes. Gemma, em toda a sua vida, s aspirava, s tendia para o sobrenatural, Terminada a humilde tarefa que me impuz, em p r o l das almas piedosas em geral, e das Filhas de Maria em particular,pois, talvez possam tirar algum proveito d'estas despretenciosas preleces,- -seja-me permittido ainda estender-me em duas consideraes. Parece, primeiro, que a biographia de Gemma exerce uma certa attraco e chama a nossa atteno, porque esta bella alma foi nossa contempornea e viveu em nossos dias. Quanto mais perto de ns esto os signaes e os exemplos de santidade, mais nos attraem, tornando-se, para bem dizer, visveis e palpveis. A coroa celestial dos santos brilha como as estrellas do firmamento, nas trevas de tempos afastados e na penumbra de eras longnquas e desconhecidas, ao passo que a aureola de Gemma de Jesus, toda constellada de magnficos brilhantes, scintilla perto de ns e podemos contemplar-lhe o nimbo no nosso sculo, pois que a serva de Deus morreu, em odor de santidade, no anno de 1903, na aurora cio novo sculo, pelo que ser a primeira santa do sculo XX. Ser um feliz prognostico para o triumpho da Igreja, e far bem augurar da ra nova. Semelhante florzinha que, pelo fim do inverno europeu, traspassa a camada de gelo e domina, com a haste gracil, os prados cobertos de branca neve, chamando a atteno de quantos a vm; assim Gemma foi uma graciosa campnula, perce-neige, (tomo a chamam em Frana, sendo a primeira flor de santidade que embellezou o mundo, na primavera do nosso sculo.
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Gemma ser a alegria de Israel, a honra do nosso povo christo, a gloria de Jerusalm, e um raio luminoso d'esta gloria recae tambm sobre ns, seus contemporneos, redundando em nossa honra. Eis ahi um dos motivos porque milhares de exemplares da vida da serva de Deus, escripta pelo Padre Germano, foram espalhados pelo mundo afora, n u m curto espao de tempo. Grande era a sofreguido com que os leitores catholicos liam a biographia de Gemma, e continuam a ler com avidez uma vida to edificante da santa dos tempos modernos. A biographia escripta em italiano foi vertida em nove l n g u a s ; encontra-se na Frana, na Allemanha, na Hespanha, na Blgica, na Rssia, na Inglaterra, na Hollanda, etc; penetrou tambm na America, na China e nas n d i a s . Esta vida pode competir com a dos santos dos tempos medievaes e assemelha-se bastante s chronicas da Ordem franciscana, Fioretti de san Francesco. E' mais uma prova frisante da vitalidade e fecundidade da Igreja catholica, que nunca deixou e nem deix a r de produzir alguns santos. Em todos os tempos, sob todos os climas, a Igreja foi um formosssimo vergel de almas privilegiadas e sempre o s e r ! Vicejam flores sob todas as latitudes, por mais desfavorveis que estejam vegetao. No cume dos Alpes cobertos de gelo eterno, floresce o <Edel\veiss, rosa scintillante de alvura. Nas plagas adustas do S ah ar a, v-se florir a tamareira. T a m b m as flores de santidade aformoseiam e balsamizam todas as ras, todas as terras, quando so bafejadas pela aragem do Espirito Santo e orvalhadas pela g r a a divina. Uma outra circumstancia torna muito sympathica a vida assaz milagrosa da Virgem de Lucca, mandada por Deus a esta terra para a salvao de muitas donzellas: que ella se santificou no rebulicio do sculo. Embora desejasse immenso consagrar-se a Deus na vida religiosa e ligar-se pelos tres votos evanglicos de obedincia, pobreza e castidade, por um desgnio da divina Providencia n o chegou a recolher-se a um convento, acabando a carreira mortal no sculo.
As superioras dos conventos onde Gemma pediu entrada, no percebendo talvez o alcance das graas anormaes e receando fossem manifestaes mrbidas de hysterismo ou, pelo menos, de fanatismo, no quizeram admittil-a, apezar os favores excepcionaes de que estava enriquecida, ou qui por esta mesma causa. Ningum se admirar d'isto, sciente de que a vida de communidade, alm de exigir que tudo seja uniforme e regular, exclue ainda a singularidade. Na vida dos santos encontram-se diversos casos seme- . lhantes. Por exemplo, S. Camillo de Lellis foi obrigado, por diversas vezes, a deixar a communidade onde professara. O anglico Benedicto Jos Labre de Frana foi coagido a deixar os conventos dos trappistas, dos cartuchos e dos cistercienses, n o obstante a sua grande santidade. Tinha a vocao de percorrer o mundo, viver em perpetuas romarias aos principaes santurios da Europa, edificar os homens por suas virtudes e alegrar os anjos pelas graas recebidas.
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Assim aconteceu a Gemma. O arcebispo de Lucca, Monsenhor Ghilardi, no consentiu que ella se fizesse freira, porque temia a fraqueza de sua saide. Gemma desejava professar nos mosteiros da Visitao, por gratido para com a B. Margarida Maria que a curara milagrosamente. Depois sentiu-se chamada Congregao das I r m s chamadas Barbentini, que a trataram nas doenas. Finalmente, uma secreta inspirao e uma fora irresistvel a attrahiam Ordem das passionistas. O B. Gabriel Possenti a chamara sua irm, mostrando lhe o habito de sua Ordem com as insgnias da Paixo do Senhor. A serva de Deus fez diversos retiros n'estas casas religiosas, mas no chegou a entrar para o noviciado, porque tal n o era a vontade de Deus. Os votos da profisso j os havia feito alis por devoo; freira e passionista era-o em espirito, visto que trazia as insgnias e os estigmas de Jesus impressos na propria carne. A Providencia quiz que Gemma exercesse, no sculo, um apostolado activo; que, semelhante a. S. Paulo, fosse 11m
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vaso de eleio, levando o nome do Senhor aos filhos de Israel. Deus quiz que fosse uma trombeta retumbante que publicasse ao mundo inteiro o amor ao sobrenatural; ou, conforme uma outra interpretao d'esta palavra bblica, um vaso de eleio, como havia, no templo de Jerusalm, riqussimos jarros de metal precioso, para servirem aos sacrifcios, cuja riqueza proclamavam a gloria do Deus de Sio, e que os levitas enchiam de aromas preciosos, para serem queimados no altar dos perfumes; como nos palcios principescos, os vasos artsticos de alabastro, collocados sobre lindos pedestaes, guarnecidos, pelos ulicos, de ramiIhetes e grinaldas perfumosas. precioso vaso de eleio, Gemma Galgani, agora aformoseias o paraso, como outr'ora embellezaste a terra! Levaste o nome de Deus a todas as Filhas de Maria, glorificaste o Senhor por tuas egrgias virtudes! Santificaste, por teu exemplo, muitas almas, salvando outras por teu zelo ardoroso! (') Gemma Galgani, no co continuas ainda a gloriosa misso de zeladora dos interesses de Jesus: s o vaso de eleio; n o te esqueas da terra, pede por n s ! A serva de Deus foi destinada, na economia da Providencia, a ser o modelo das pessoas do sexo frgil que querem e devem santificar-se no sculo. S. Francisco de Salles escreveu o bello livro A Introduco vida devota, para instruir os que vivem nas cidades, nos negcios, e provar-lhes que a verdadeira devoo possvel em todas as emergncias, em todos os estados, e os que vivem entre a multido dos negcios temporos nem por isso podem deixar de pretender a palma da piedade enrista. Gemma Galgani pz em pratica os couselhos do mellifluo doutor da Igreja, e sua santa vida, no meio do mundo corrupto e seduetor, um exemplo vivo e um modelo acabado da perfeio a que possam aspirar as pessoas que n o vivem em communidade. Gemma Galgani, por sua fidelidade e correspondncia aos effluvios do Espirito Santo, por sua obedincia aos superiores, suas virtudes no lar paterno, seu recolhimento, seu proceder modelar na sociedade e, finalmente, pelo con-
junto de todos os egrgios predicados, tornou-se um livro em aco, jam quadro vivo em que as personagens se movem e falam. s pessoas obrigadas por vocao a viverem neste mundo modelem a conducta pelas normas que Gemma deu, por seus escriptos e seu exemplo. Esta delicada e olente florzinha de santidade no desabrochou na estufa tpida e perfumada de um claustro, nem foi orvalhada pelas aguas lmpidas da pura fonte de um mosteiro, sino floresceu e derramou o subtil odor das virtudes entre os espinhos do sculo, sob os ardores de um sol abrazador que tantas virtudes faz murchar. A serva de Deus no chegou a gozar das castas delicias das almas consagradas a Deus que o mavioso poeta allemo Weber cantou, num incomparvel lyrismo, na epopeia Dreizehnlinden (O convento das treze tilhas). Gemma no levou a vida a cantar os louvores perennes n'um coro benedictino, assistindo s augustas ceremonias do culto, que o poeta descreve em to bellos versos, repassados de santo enthusiasmo: No rico santurio conventual Rebrilhava o branco cirio paschoal, Mais bellos os coraes resplandeciam, Em fulgentes ardores se consumiam. O altar enfeitavam cheirosas flores; Mais olentes eram os mysticos amores. De lirios, de rosas sentiam a aragem, Das sublimes preces bellissima imagem. ( Dreizehnlinden, 22.)
Gemma no foi embalada com os hymnos sagrados de freiras que, como as pombas dos Cantares, arrulham, na caverna do muro e na abertura da pedra. Sua alma no foi inebriada pelas nuvens odorferas do incenso da orao coral, sino que, durante vinte e cinco annos, respirou a atmosphera asphyxiante do mundo corrupto.
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Aos tympanos resoaram-lhe, s vezes, as blasphemias dos dementes, a risota dos atheus, as deprecaes dos mpios, os motejos dos falsos christos. Gemma n o passou uma vida de quietude na m a n s o da paz, n o deambulou no claustro, debaixo das arcadas silenciosas, onde as esposas de Ghristo prelibam, antecipadamente, as alegrias da viso beatifica, mas passeava, quotidianamente, por essas ruas agitadas da cidade moderna, onde campeia a trplice concupiscncia dos olhos, da carne e da soberba, presenciando as loucuras humanas, exposta aos attractivos da sensualidade, s falsas blandcias do sculo e a todas as seduces que tem algo de inebriante. Gemma n o viveu entre os quatro muros de uma cella monstica como Soror Thereza do Menino Jesus, a flor do convento do Carmo cie Lisieux; muros que abafam o tumulto e onde os rumores do sculo, as exploses das paixes terrenas, a musica cios festins e as novas da terra vo morrer como, na praia, as ondas encapelladas do oceano. A pobre barquinha de Gemma foi batida e aoitada, horrivelmente, pelos ventos contrrios da fortuna instvel; a purssima virgem nunca se deixou seduzir pelo canto enganador das sereias; por isso sua barquinha n o foi despedaada pelos arrecifes da tentao n'este mar tempestuoso, fertilissimo em naufrgios. A propsito convm citar o verso de Virgilio: Rari nantes in gurgite vasto, Nossa heroina, muito superior aos grandes vultos da Eneida, foi uma cias raras almas que n o se afundam na voragem, onde perecem, misera e irreparavelmente, a virtude, o caracter, a dignidade ; luctou, valorosamente, contra a correnteza do vicio, das falsas mximas, dos preconceitos, dos maus costumes, semelhante s bias luminosas que, noite, guiam, os navios para a entrada do porto; seu bello exemplo brilha, mostrando a todos o recto caminho a seguir. Incontestavelmente, em virtude das circumstancias que acabo de alluclir, nossa santa adquire jus ainda mais a nossa admirao, sentimento nobre suscitado pelo que bello, grande e sublime. Por isso, repito, a biographia de Gemma de Jesus espalhou-se rapidamente, lida com vivis-
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simo interesse, esgottando-se as edies feitas em diversas lnguas. Tambm o livro que contem a sua correspondncia espiritual tevp grande acceitaoo em todas as classes da sociedade. Sbios e ignorantes, padres e leigos leram sfregos as paginas que primam pela simplicidade encantadora, cujo tom de verdade impe-se ao leitor. O Papa Pio X, de santa memoria, depois de ler o livro do Padre Germano, encarregou o cardeal Merry Del Val, secretario do Estado de Sua Santidade, de agradecer a offerta. Eis os termos da honrosa carta: Rvmo. Snr. O Santo Padre encarregou-me de expressar a V. Rvma. a grande alegria que teve em percorrer o livro em que V. Rvma. patenteou profundos conhecimentos da theologia mystica, bem como os thesouros de graa com que o Senhor dignou-se de enriquecer a alma desta innocentissima donzella. Outrosim, o santo Padre deseja ardentemente que este livro accenda em todos os coraes as chammas do amor para com as cousas sobrenaturaes, que os inimigos da f pretendem diminuir cada vez mais. O mesmo santo Padre, tendo ouvido falai- de uma converso milagrosa alcanada pela intercesso de Gemma Galgani, mostrou-se visivelmente commovido e declarou que ia invocar a santa donzella para obter graas semelhantes. Um Cardeal da cria romana que tinha grande venerao a Gemma, e se interessava por tudo o que lhe dizia respeito, invocava-a para progredir no amor de Jesus e de Maria. Muitos outros prelados altamente collocados na jerarchia ecclesiastica, como o Exmo. e Rvmo. sr. Arcebispo de Camerino, que conheceu a serva de Deus e lhe ouviu a confisso, expressaram-se, por vezes, do mesmo modo. Foi lle testemunha ocular dos xtases e da estigmatizao e viu, com os prprios olhos, o sangue brotar-lhe das chagas. Praza a Deus que as Filhas de Maria escutem a voz do soberano Pontfice Pio X que, durante o glorioso reinado, tanto se esmerou, por suas immortaes encyclicas e obras, em promover a scieiicia da thologia mystica, esse
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culto do sobrenatural, levantando todos, os coraes s alturas sobranceiras do espirito. A exemplo de Gemma, perfeito modelo da donzella que quer santificar-se no sculo, esforcem-se as Filhas de Maria por se levantarem acima das preoccupaes vulgares dos interesses mesquinhos de uma vida rasteira. S. Paulo nos recommenda que provemos o espirito que nos anima, para sabermos si verdadeiramente vem de Deus: Probate spiritum si ex Do est. Emquanto pudermos, estudemos o espirito de Gemma Galgani e imitemol-o. Peamos a g r a a de seguir este espirito maravilhoso, imprimindo tambm, em vida, o cunho do sobrenatural. Uma Filha de Maria deve ser uma pessoa espiritual, como foi Gemma Galgani. Procurem alargar o horizonte apertado da formiga, (conforme a expresso franceza), dilatem o circulo estreito de pensamentos oriundos do materialismo. As Filhas de Maria n o sigam a doutrina epicurista, ensinando falsamente que o prazer o summo bem do homem e todos os nossos esforos devem tender a obtel-o. No, mil vezes n o ! Toda a nossa aspirao seja para o ideal. Pela nobreza de sua misso, a congreganista n o pode rastejar na lama do mundo; no, deve correr a passos agigantados no rasto perfumado das virtudes de Gemma Galgani, semelhantes as companheiras da Esposa dos Cantares que diziam: Altrahi-nos a vs, corremos frag anci dos vossos unguentos. A vida de Gemma Galgani que acabamos de analysar, foi uma ascenso continua para o ideal, para o co, Diz o psalmista: Beatus homo cujus est auxilium abs te; ascensiones in cor de suo disposuit (88). B ema/u enturado o varo que de Deus espera soccorro, e dispz elevaes no seu corao. Gemma Galgani bemaventurada porque esperou no Senhor, e este a elevou at a eterna gloria. Eis ahi vosso modelo! Ide t a m b m de virtude em virtude, erguei-vos cada dia mais; seja vossa vida uma ascenso n o interrompida e sem desanimo! Tal a cotovia que, de madrugada, ergue o vo em crculos graciosos e sobe s nuvens, cantando sem cessar, a
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Filha de Maria ha de alar-se pelas azas da contemplao s espheras ethereas, acima dos sentidos, onde pairam a santidade e a paz. A Filia de Maria no se deixe illudir pelo falso brilho do mundo riem pelas miragens enganadoras de uma terra sensual, sino procure subir e subir sem parar at aos pncaros da perfeio! A Filha de Maria ha de forosamente elevar-se alm dos limites da matria, afim de no se parecer aos gals, arrastando a pesada corrente de ferro que, segundo a bellissima comparao de Bossuet, significa e symboliza a cadeia das misrias humanas e dos peccados: Trainant aprs lui, la toureie chame cie ses pcJis. A Filha de Maria ha de quebrar os grilhes que a prendem a este planeta miservel, afim de poder voar e chegar, em graciosas espiraes, s alturas serenas da perfeio. Filhas de Maria, no vos deixeis levar pela concupiscncia, porque, dir-vos-ia com um piedoso autor, o immoderado desejo de gozar prejudica como veneno a sade da alma, inspirando averso aos bens eternos a que todos, de preferencia, devemos aspirar. Os bens da fortuna, os prazeres que o mundo possa proporcionar nunca nos ho de saciar, antes, como a agua do mar, nos augmentar a sede. S um bem consegue saciar-nos a sede: Deus! E s t inquieto o corao at que repouse no Senhor, escreveu S. Agostinho que verificou, pela prpria experincia, a verdade d'esta sentena urea. Ad maiora natus sum, disse um p a g o ambicioso. A Filha de Maria nasceu para cousas sublimes e no para as frivolidades de um mundo indigno d'ella, que no lhe pode encher o vcuo do corao. Por isso ha de metter de permeio um muro forte e duplo, como disse o propheta: Murum et antemurale ponam, entre a sua alma e todo o gnero de desejos mundanos. A opulncia, a formosura, o engenho, a fortaleza, nenhum valor tm diante do Senhor; sem a sua graa e vistas do alto, so futilidades despreziveis. A Filha de Maria ha de, pois, desembaraar-se d'estas vaidades, como desembaraou-se Gemma Galgani, pelo desapego total das
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creaturas. Assim pode voar com liberdade perfeita at o co, dizendo com o propheta: Quem me dera azas de pomba para voar e deseanar! Dir-vos-ei com Thomaz de Kempis: A causa de haver hoje to poucas pessoas contemplativas, porque so raras as que sabem desapegar-se inteiramente das creaturas e dos bens transitrios. Para isto necessrio uma graa poderosa, levantando a alma e a transportando acima de si. Todos conhecem os lindos versos do poeta inglez Longfellow, tendo por titulo: Exeelsior. Como aquelle moo corajoso subindo os Alpes a cantar, empunhando a bandeira com a divisa Exeelsior, sempre mais alto, a Filha de Maria ha de deixar as intimas regies de uma vida sensual e rasteira e subir, a cantar alegre, s culminancias de uma toda espiritual e celeste. O moo destemido sobe as altas montanhas sem se deixar desanimar, nem por um ancio que o conjura a regressar, devido aos grandes perigos das geleiras traioeiras, e nem se deixa amollecer pelas lagrimas de pessoas caras, tremendo vel-o perder a vida em flor. Os monges do Monte S. Bernardo ouvem a voz argentina do moo como um clarim, resando nos campos scintillantes de neves eternas: And, like a silver clarim rung The accents ot'lhat mikuotrn, long Exeelsior. Sim; Exeelsior seja o lemma, bordado em lettras de ouro, da bandeira gloriosa das Filhas de Maria. Sempre mais alto na virtude, Sempre mais alto na meditao, Sempre mais alto na perfeio, Sempre mais alto no amor de Deus. Levavi culos meos in montes unde vniel auxilium mihi. Alae os olhos aos montes sagrados d'onde vir o auxilio do Altssimo! Alae os olhos aos pncaros mysticos da vida unitiva com Deus, d'onde descer a gloria e a felicidade sem fim. Em companhia de Gemma Galgani, a Virgem de Lucca, e amparadas pelas suas oraes, sem desanimardes, cheias
de coragem, o corao dilatado pela santa alegria, subi, sorrindo, o monte do Thabor. Bom , direis com S. Pedro a Jesus, que estejamos aqui, a falar com Moyss e Elias, na lcida nuvem, a contemplar, n'um xtase de amor, Jesus na transfigurao, e ser alumiadas tambm pelo reflexo dos raios luminosos de seu rosto divino, refulgente como o sol, ouvindo a dulcssima voz de Deus Padre, falando com o querido Filho em quem pz toda a complacncia. Filhas de Maria, dir-vos-ei, erguei as vistas ao anil do firmamento; no vedes, um pouco mais alm, no halo do sol da justia, o coro das virgens vestidas de branco, aureoladas, ornadas de grinaldas e com palmas nas mos? No vedes entre ellas Gemma Galgani, nimbada de luz? No lhe ouvis a voz suave que vos chama para o alto? No lobrigaes ao longe o aceno amvel que vos convida a alar-vos e a subir, n'um surto arrojado, at as alturas? No vos sentis attrahidas pelo fulgor da coroa immortal, cuja belleza tantas virtudes realam? No vos sentis inebriadas dos perfumes mysticos que este anjo, no curto adejar sobre a terra, deixou na atmosphera? No vos sentis fascinadas pela formosura deslumbrante d'esta joia? No tendes vontade de seguir o rasto de luz que este astro, na rpida trajectria, deixou na terra e no co alm? Para cima! pois, a mente! no me canarei de vol-o repetir. Para cima os coraes! vos diz todos os dias, o sacerdote na santa missa: Stirswu corda!
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Datas m e m o r v e i s na vida de G e m m a Galgani: 1878 12 de Maro, dia do nascimento; baptisou-se no dia seguinte. 1885 26 de Maio, G e m m a foi chrismada. 188(5^17 de Setembro, morre a m e . 1887 17 de Junho, festa do Sagrado C o r a o de Jesus, fez a primeira com m u n h o . 1897 11 de Setembro, morre o pae. 1899- na primeira sexta-feira do raez de M a r o , G e m m a foi curada milagrosamente. 18998 de Junho, Gemma recebe as cinco chagas. 1900 1 de Setembro, G e m m a v pela primeira vez o Padre Germano passionista, seu director e biographo* 1901 na primeira sexta-feira do mez, G e m m a recebe os outros estygmas da P a i x o do Senhor. 1902 n a oitava do E s p i r i t o Santo, a s e r v a de Deus adoece gravemente, 1903 8 de A b r i l , quarta-feira de trevas, G e m m a recebe a c o m m u n h o em vi atio. 1903 11 de A b r i l , sabbado de Alleluia, dia do passamento. 1903 12 de Abril, Paschoa da R e s u r r e i o , enterro.
E i n vista da p r o h i b i o feita pelo Summo Pontfice Urbano V I I I na sua c o n s t i t u i o a p o s t l i c a relativa c a n o n i s a o dos santos, de invocar publicamente os servos c servas de Deus que ainda n o forem inscriptos no catalogo dos santos, as pessoas que quizerem fazer uma novena s e r v a de Deus Gemma Galgani, sirvam-se da o r a o que se segue:
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Orao S S . T r i n d a d e
para alcanar graas pela intercesso das santas Virgens. Eterno e divino Padre, que com o vosso ineffavel poder vos dignaes operar coisas grandes, por meio do que no mundo se julga fraqueza, para vencer a f o r a dos soberbos; pelos merecimentos das vossas santas Virgens, nas quaes tanto vos glorificastes, concedei-nos t a m b m a f o r a de vencer todos os o b s t c u l o s , que nos impedem de chegar at a V s , e n o nos negueis a g r a a particular, que aqui prostrados aos vossos p s Vos pedimos. Tres Gloria Patri. Eterno e divino Filho, que com a luz da vossa infinita sabedoria a f u g e n t e s as trevas da i g n o r n c i a e do erro, nas quaes est envolvido o mundo; pelos merecimentos das vossas santas Virgens, das quaes fostes to glorificado, concedei-nos t a m b m um raio desta luz celestial, que nos e s c l a r e a e conforte para caminhar alegremente pelas sendas da santidade e da j u s t i a , e n o nos negueis a g r a a particular, que prostrados aos vossos p s Vos pedimos. T r s Gloria Patri. Eterno e divino Espirito, fonte inexgottavel d a q u e l e infinito amor, que com os vossos sete dons derramaes sobre as almas para santifieal-as; pelos merecimentos das vossas santas Virgens, nas quaes tanto vos comprazestes, concedei-nos t a m b m a g r a a de participar deste amor, para que, conservando puro o nosso c o r a o de todo affecto terreno, possamos amar somente a V s , summo Bem, e possuir-Vos amando-Vos. N o nos negueis a g r a a particular, que prostrados aos vossos p s Vos pedimos. Tres Gloria Patri, BenedicUo et claritas, et wpientia, et gratiarum aciio honor, vir tus et fortitudo Deo nostro in smcula sceeulorum. men.
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Quem tiver conhecimento de graas e milagres recebidos por intercesso desta serva de Deus, ou quizesse enviar esmolas para auxiliar a causa da beatificao, poder dirigir-se ao postulador dos passionistas (SS. Griovawtii e Paolo) Homa,~-ou aos padres passionisiasCaixa Postal 1828, Capella do Calvrio, Villa Cerqueira Gezar em, So Paulo (frasil). Quem quiser possuir tim folheto do resumo da vida da serva de Deus e o retrato, dirija-se ao Padre Xavier Thuet, vigrio de So
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Alagoas*
CORRIGENDA,
Pagina VI linha penltimasorrir-lhes, em vez de sorria-lhes. leia-se: Ditosa criana a quem foi dado conhecer, 28 13 a o filho de Jpiter, em vez deo deus celeste. 10 22 a v e r per10 31 u i virgaeta* virgulta, 23 49 a t i confisses. Confisses, 2K fio (t egiglio. e giglio, 28 71 u (f ii emia. -la, mia, 29 71 n u (f nel, 29 71 i tt ffivioso, givoso. 29 71 t i i it Clermont, Chermont. 15 86 t na, 11 da, 87 tc tanto, 29 tanta, 94 (t a te ahrazado, 30 atracado. 101
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Segunda
gani na sua infncia. T e r c e i r a C o n f e r e n c i a - Devoo de Gemma Galgani a Maria Santssima. . Q u a r t a C o n f e r e n c i a A prola das virtudes. pureza de Gemma Galgani* , . Quinta Conferencia O crysiaL A simplicidade de Gemma Galgani Sexta ConferenciaDevoo e Gemma Galgani ao Santssimo Sacramento .
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7 17 25 35 45 r7 f>9 77
Stima
Conferenciaamethysta, O
espirito
de
orao e a unio com Deus e Gemma Galgani. . O i t a v a C o n f e r e n c i a Uma saphira. A humildade profunda de Gemma Galgani N o n a C o n f e r e n c i a Vises e extases de Gemma. Signaes e effeito maravilhosos do amor de Deus D e c i m a C o n f e r e n c i a impresso milagrosa das cinco chagas de N. S. na carne virginal de Gemma Gaigani D e c i m a p r i m e i r a C o n f e r e n c i a Uma linda, gata. O zelo pela salvao das almas . . . . . . . . . D e c i m a s e g u n d a C o n f e r e n c i a Uma esmeralda. O desapego.A obedincia, de Gemma Galgani. . . . D e c i m a t e r c e i r a C o n f e r e n c i a Um diamante, A fortaleza e a herica pacincia de Gemma, Galgani. . D e c i m a q u a r t a C o n f e r e n c i a A devoo de Gemma Galgani ao Anjo da Guarda. D e c i m a q u i n t a C o n f e r e n c i a Um topzio. A constncia nas tentaes D e c i m a s e x t a C o n f e r e n c i a () chrysolito. Um pingo de fogo.A devoo de Gemma Galgani pelas almas do Purgatrio
D e c i m a stima C o n f e r e n c i a ^ santa morte de Gemma
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99
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Galgani
D e c i m a oitava Supplemento C o n f e r e n c i a O espirito
de
Gemma
Gal167
, 182
gani. Consideraes
finaes.