Entrevista A Augusto Lopes Teixeira

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Em tempo de eleies Autrquicas 2013, no podemos deixar de recordar uma entrevista ao 1 Presidente de Cmara da Covilh eleito democraticamente.

Nesta entrevia ao jornal da UBI, Augusto Lopes Teixeira (Presidente de Cmara eleito pelo PS), faz um pequeno e esclarecedor retrato do nosso concelho nos anos 70.

Entrevista a Augusto Lopes Teixeira

"O 25 de Abril foi uma revoluo salvadora"


Augusto Lopes Teixeira foi o primeiro presidente da Cmara da Covilh aps o 25 de Abril de 1974. Lugar que ocupou durante trs mandatos consecutivos. Com a boa disposio que o caracteriza fala dos tempos em que viveu na oposio ao regime e das dificuldades que a "A UBI foi a grande salvadora social e revoluo dos cravos permitiu superar. Aos 75 anos de econmica desta regio" idade afirma que acima de tudo gosta de conversar e de viver a vida. Lopes Teixeira continua atento ao que se passa em seu redor e lembra o que ainda faz falta na Covilh, cidade que o viu nascer.

Por Catarina Rodrigues

Urbi @ Orbi- Como foi ser o primeiro presidente de Cmara aps o 25 de Abril? Augusto Lopes Teixeira- J vinha de longe a minha participao na poltica, sempre nas fileiras da oposio. Pertenci a todas as comisses e esta foi uma da razes pela qual ingressei nos quadros da Cmara. Primeiro como vice-presidente da Comisso Administrativa e s depois que fui convidado pelo Partido Socialista a candidatar-me a presidente da Cmara. Ganhei com maioria absoluta e fui presidente durante trs mandatos sucessivos. No continuei porque no quis, devido a conturbaes existentes dentro do Partido Socialista. No gostei de certos caminhos e certos comportamentos e por conseguinte disse chega. U@O- Em que ano foi eleito para o cargo? ALT- Fui eleito em 1976, com as primeiras eleies livres que houve para as Cmaras. U@O- Como surgiu o seu gosto pela poltica? ALT- Como qualquer rapaz da minha idade sentia o peso do p da ditadura. O que derivava duma organizao que era a Mocidade Portuguesa. Andvamos todos fardados e isso desagradava-me. Eu no gostava das fardas. Acho que as

fardas so para os militares e nunca tive esprito militarista. A minha tendncia vem j de muito novo. O ambiente que vivia em casa tambm me influenciava, o facto de ser de uma famlia particularmente republicana e democrata, por conseguinte contrria ao regime e situao que ento existia. U@O- Para alm de se dedicar poltica, o que fazia antes de ser presidente de Cmara? ALT- Era um simples homem de negcios. U@O- Que tipo de negcios? ALT- Tinha representaes de vria ordem, mas sobretudo na rea da construo civil. U@O- Como era a Covilh antes da Revoluo de 1974? ALT- Antes do 25 de Abril, a Covilh era uma cidade feudal onde havia uma classe que dominava completamente os outros. Era a classe dos industriais. A indstria detinha o poder econmico, o qual tambm conseguia manobrar a prpria poltica, sobretudo nessa altura onde predominavam os ideais salazaristas. Um dia, eu e um conjunto de rapazes de 18, 19 anos pensmos contestar os poderosos desta terra que eram os industriais. Tommos Cunha Leal como retrato, essa clebre figura da Repblica, que aproveitava as reunies das Assembleias Gerais das empresas, onde era accionista, para atacar as directivas impostas sociedade portuguesa pela ditadura de Oliveira Salazar. Fomos s associaes, no de carcter econmico mas sim desportivas e no s, contestar o seu poder, discordar dos seus mtodos e discutir solues. Assim atacvamos o regime e tomvamos uma nota de liberdade sem pr em perigo a nossa situao social e humana de sermos perseguidos pela polcia. U@O- Essa contestao no teve consequncias? ALT- A partir desta data tive vulgarmente a visita da polcia poltica sempre em minha casa, obrigando-me a levantar s tantas da manh, obrigando-me a mostrar os papis, trs, quatro e cinco vezes ao longo dos anos, sobretudo nas datas festivas, 5 de Outubro ou 1 de Maio. O 25 de Abril foi tambm por isso uma revoluo salvadora. U@O- Depois do 25 de Abril como que se sentiu essa liberdade na Covilh? ALT- As diferenas mais significativas foram do ponto de vista social. Aquele fosso enorme que existia entre patres e empregados, entre industriais e no industriais desapareceu. A classe dominante recuou e refugiou-se em sua casa.

"Se algum fez obras no nosso Pas foi o poder local"

"Foi uma poca muito difcil e para algumas classes sociais foi at doloroso. "

U@O- Quais as principais obras que recorda enquanto presidente de Cmara? ALT- O tempo em que fui presidente, foi um poca terrvel. Havia uma certa anarquia. A dada altura j no se sabia quem mandava no Pas, se era o Presidente da Repblica se era uma Comisso de Moradores. No se tratou apenas de tirar um Governo e pr outro, tratou-se de se alterar todo um sistema implantado. Esta situao criou dificuldades imensas. Houve um perodo em que amos buscar emprstimos l fora para comer c dentro. Foi uma poca muito difcil e para algumas classes sociais foi at doloroso. Recordo-me de uma vez entrar na reunio da Cmara e de ouvir os operrios do Ernesto Cruz dizerem-me "ajude-nos senhor presidente porque temos fome". um quadro que no pode deixar ningum indiferente. U@O- Ou seja, no se fizeram grandes obras porque o dinheiro era preciso para bens essenciais? ALT- No havia dinheiro para nada. Mas importante dizer que foi feito o saneamento bsico do concelho. Quando entrei para a Cmara havia apenas uma freguesia que tinha saneamento, que era o Tortosendo. Das restantes 30 freguesias nenhuma tinha saneamento. Quando sa ficaram oito por fazer. Do ponto de vista da electrificao temos que ser justos. A anterior situao poltica j tinha feito algum trabalho nesse domnio. O concelho estava todo electrificado. A variante Covilh tambm uma obra do meu tempo, embora fosse uma soluo que j viesse de trs, foi concretizada e inaugurada no meu tempo. U@O- Como era a indstria txtil nessa altura? ALT- Nessa altura a indstria txtil estava bem e os negcios eram ptimos. As dificuldades no eram grandes e no se assistiu a um grande nmero de falncias. Apenas houve algumas conturbaes por motivos de reivindicao operria. U@O- Quais as principais diferenas que assinala entre o poder autrquico da altura e agora? ALT- Na sua essncia e no seu suporte legal, o poder autrquico o mesmo. Se

algum fez obras nosso Pas foi o poder local. Com todas as suas limitaes, o poder local debruou-se sobre os problemas e sobre o drama das populaes que no tinham estradas, no tinham saneamento, no tinham sequer cemitrios. Neste domnio houve uma obra imensa do poder local. Pergunte-me como foi possvel ou onde se foi buscar tanto dinheiro e eu no lhe sei responder. o poder local que est mais prximo das populaes e sente a presso da necessidade de fazer alguma coisa apesar das limitaes existentes. U@O- Como v hoje a poltica? ALT- Vejo a poltica como sempre a vi, com bons e maus polticos. Hoje fala-se muito contra os polticos sem razo porque as ideias no so todas iguais. Os homens no tm todos as mesmas ideias. No posso pensar mal das solues apresentadas pelos outros a no ser que sejam ineficazes e que essa ineficcia seja propositada. Acusam-se os deputados de cometer irregularidades e de no servirem o Pas. Isso no verdade. No h democracia sem parlamento e no h parlamento sem deputados. O que os homens so bons ou maus. O problema se os homens so srios ou no so srios. Isso fundamental.

"Se no fosse a Universidade, a Covilh andava de chinelos de corda"

"A produo agrcola tem que estar ao lado da produo industrial"

U@O- Acompanhou a passagem do antigo Instituto Universitrio a Universidade da Beira Interior. Como v hoje o papel desempenhado pela UBI? ALT- Quando apareceu o Instituto Politcnico e a Universidade foi um passo de gigante para o benefcio desta regio. Mas para alm disso teve implicaes srias e positivas no domnio do escalonamento social e da orientao do ponto de vista econmico. Se no fosse a Universidade, a Covilh h muito andava de chinelos de corda. A UBI foi a grande salvadora social e econmica desta regio. O aparecimento da Faculdade de Medicina vem reforar isso. o trazer para cima o movimento social e econmico desta regio. A Faculdade de Medicina deve-se exclusivamente a dois homens: Antnio Guterres e Jos Scrates. U@O- Esteve 12 anos como Director Delegado na Associao de Municpios, qual era o papel desta entidade nessa altura? ALT- Fui Director Delegado da Associao de Municpios entre 1986 e 1998, depois de ter terminado o mandato como presidente de Cmara. Na altura dizia e continuo a dizer que as Associaes de Municpios so indispensveis por uma

razo muito simples: ningum se d bem nos pequenos espaos, se os pequenos espaos fossem a soluo ideal do recorte lgico e territorial, econmico e demogrfico das regies, no se tinha formado a Unio Europeia. A Associao de Municpios funcionava como um grande espao demogrfico, social e econmico. Eu disse uma vez ao presidente da Cmara de Castelo Branco que um homem inteligente: faa o que eu tentei e no consegui, uma sub regio da Cova da Beira com peso demogrfico, econmico e com o peso poltico que no tem. Mas tem uma coisa fundamental que a gua. A Serra da Estrela um dos maiores mananciais de gua da Pennsula. Hoje os presidentes de Cmara tm que ter uma viso para alm do simples saneamento ou da construo de uma ponte. A Associao um grande espao que devia ter sido aproveitado e que at hoje no foi. Eu fui Director Delegado, tinha toda a liberdade, mas a deciso poltica no era minha. U@O- Considera ento que era importante a criao de uma Comunidade Urbana ou Intermunicipal? ALT- Com uma perspectiva mais restrita que so as Associaes de Municpios, entendo que tudo o que convergir esforos tem maior utilidade e melhores resultados do que o esforo isolado de uma Cmara ou de duas Cmaras amigas. Estas solues no se podem pr no plano da amizade, mas sim dos interesses da regio. U@O- Na sua opinio o que que ainda faz falta na Covilh? ALT- Muita coisa. Falta um metropolitano de superfcie que ligue a grande sub regio da Cova da Beira. O crescimento da zona da Beira Baixa tem que passar obrigatoriamente por trs cidades: Covilh, Fundo e Castelo Branco. Falta tambm a instalao de novas industrias e relacionado com a gua, falta o regadio da Cova da Beira que pode e deve ser a alavanca do desenvolvimento desta zona. A produo agrcola tem que estar ao lado da produo industrial. U@O- Porque que acha que o processo do regadio est a levar tanto tempo a concretizar? ALT- Essa a interrogao que eu coloco h muito tempo e que nunca ningum me soube responder. Quando fui presidente da Cmara estive diversas vezes em Lisboa com responsveis pelo Ministrio da Agricultura e nunca me souberam responder a essa questo. U@O- Quanto implementao de novas industrias, como que possvel atrair empresas para se fixarem na regio? ALT- Tem que ser feito um plano de industrializao. Eu cheguei a propor esse plano na Associao de Municpios da Cova da Beira. Vamos pedir para que seja feito um estudo econmico de toda esta zona e que depois descobrir que aproveitamento, que industrias, que meios financeiros so necessrios. Caso

contrrio no ser possvel fazer nada de til. U@O- Considera que o Parkurbis nesse aspecto um passo importante? ALT- Acho que sim. Tudo o que se faa neste domnio e tudo o que mexa com a cincia e com a tcnica indiscutivelmente um benefcio para as regies que tiverem a coragem e os meios capazes de o desenvolver.

Perfil

"Nem todos podemos ser doutores e prefervel haver um bom presidente da Cmara do que um mau doutor"

Augusto Lopes Teixeira nasceu a 16 de Julho de 1928 na Covilh. Estudou no Liceu Municipal e depois passou para o Colgio Moderno onde concluiu o liceu. "Gostava de ter seguido para Direito", afirma. Mas no sabe por que razo acabou por ficar no Interior. "Nem todos podemos ser doutores e prefervel haver um bom presidente da Cmara do que um mau doutor". casado e no tem filhos. O seu gosto pela poltica nasceu cedo, talvez impulsionado pela oposio ao regime em vigor e sempre contra os ideais salazaristas. O tempo em que assumiu a presidncia da autarquia "foi difcil porque no havia dinheiro para nada", mas havia algo fundamental: a liberdade. Aos 75 anos de idade, Lopes Teixeira, afirma gostar da pardia mas acima de tudo de viver a vida. isso que me tem mantido at esta idade", sustenta.

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